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(Preparada pelo Centro de Catalogação-na-Fonte, ~MILE CHARTIER
Câmara Brasileira do .L ivro, SP)
(ALAI.N )

Alain, 1868-1951. .--..


A274c Reflexões sobre · a educação [por] Alain · (Émile . '
....:. - ~. ~ 1
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Chartier) ; tradução de Maria Elisa Mascarenhas.
São Paulo, Saraiva, 1978. ,,
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1. Educação I. Título.
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CDD-370
y· REFLEXÕES SOBRE
-..'l:.1,
1/
77-0354
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A EDUCAÇAO
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índice para catâlogo sistemâtico: !·
1. Educação 370 ).
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-.'.o:!r· Tradução de
MARIA ELISA MASCARENHAS
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f:. · Revisão Técnica


. e Notas d e
JOSE ALVYSIO REIS DE ANDRADE

Direitos exclusivos para a língua portuguesa adquiridos por


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37.01
' A3177 .
. DEDALUS-Acervo-FE
Reflexoes sobre a educacao .

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SARAIVA S.A. - Livreiros Editores . '
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.
São Paulo - SP .
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ALAIN E SUA OBRA
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i. I - Alain ou a pedagogia da dificuldade
:!
\ José ~ário Pires Azanha, da
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Facu.I dade de Educação da Universidade de S. Paulo
l
f. II Alain
José Aluysio Reis de Andrade
Instituto de Letras, Ciências Sociais e Educação de '"
Araraquara

Do original francês,
Propos sur l'Éducation

© 1932, Presses Universitaires de France


108, bd Saint-Gerrnain, 75279 Paris
l
1
Traduzido da 15'1- edição, 1972 ( .
·~
Assessoria Editorial: Prof. Dr. João Gualberto de Carvalho Meneses,
da Faculdade de Educação da Universidade. de São Paulo. ,,"
(

Capa de: Regina B. Tracanella e Maria Tereza A. Jorge.


O desenho da 4.ª capa é de Eugenio Colonnese.
Produção gráfica: Arlindo André Batista Meira e Luiz Vitiello Júnior.
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Algumas pessoas jogavam Letras, um passatempo conhecido;


"'}a-se de formar palavras com letras espars~s. Essas combinações
. ~taro prodigiosamente a atenção.· A grande facilidade dos peque-
' .
· '.s problemas de três ou quatro letras leva o espírito a um trabalho
, ~tiito fatigante; bela ocasião para o ensino dos termos té<?nicos e da
, )_ografia. Assim, pensava eu, é fácil prender a atenção da criança;
~amos para ela uma ponte que~á de seu~ jogqs até às no~~as=~~-ª.!!-·
'.as; e que e a se ponbãa-· 1;·ãba1Eãi.-Sem;;t>;;~-que tr-~1~-~ ---n~pois,
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··.}.Irante toda: a suaViaã,"" o estudo .ser~_.J!!!.L!~P--9:i,:1S<?. ·-~-· .\U'Aa. .alegria,


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. ·q.r ·causa desse hábitq da infância, enquanto que, par.a a maioria, a
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.ir . ....;......,.__ .... ,.. ·~·-··
•._, ... ,.. ,_ ....... ..... -·-· ·-·· .... - · .. - -.-............ -······-··-.... .... ···---·-· --- ···-·- - · ----·-· - - - ----·--··- ·--·--- ·--······- --· ..... ...... .
... ~
§rjlbran_ça dos estu.dos é como um suplí~!.9· Seguia as~im essa idéia ·
: ~antadõrã-em.-companhía-de-Mon.tãig~e 1 • · Mas a sombra de· Hegel
'· '
( . ": ou mais alto 2 •
....;cí
·,.r .· A criança, disse essa Sombra, não gosta de suas alegrias de
-' ~ança tanto quanto você pensa. Em -sua vida imediata, sim, ela é
~talmente criança, e contente por ser criança, mas para você, não
·.'. '.:'~ra ela mesma. Pela reflexão, logo rejeita seu estado de criança:
'' ~er tornar-se homem. E nisso é mais séria que você, menos crian-

. .L Alusão à concepção de Michel ·de Montaigne (1533-1592) expressa


ps Ensaios (1582), Liv. I , cap. XXVI, de · que o aprendizado deve 'ser ameno
, ~~: .
~;,~ri.ança. . ' - ··
;:~~Referência geral à concepção de Hegef ( 1770-1831) de.....Q!!e a criança
-'~o: se ~J!lpr.az c.om a sua própria maneira de ser. Aspira, natural e neêessa-
·:.~~nte, a s~ .homem, que constitui a realização da· idéia .
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ça que você, que se faz de criança. Porque o estado de homem,_
e
belo para quem a ele chega com todas as forças da infância. O sorl
l é um prazer de animal, sempre cinzento e algo sombrio, mas ne . ......
••• ! • 1 .... ; .
r ~ ' ;' ~. ~ :•

j logo nos perdemos; escorregamos para ele; mergulhamos, sem qu . ·~ - ~.... . ;' ...

e
qµer retorno a nós mesmos. E isso é o melhor. É todo o prarer
planta e do animal, certamente; é todo o prazer do ser que na~

e:
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supera, que não se ergue acima. de si mesmo. Mas embalar não :;
instruir. II
Ao contrário, disse essa grande Sombra, desejo que exista co
!· ·que. um fosso entre · a brin~~~~~f~_ ~- . ~ estud~:. Quê! Aprender ;
ler e a éscrever~~por~'ineio-de ·jogo de letras?- A contar com ave!ª
em atividade de símio? Antes temeria que estes grandes segred' · Já me ocorreu responder a algumas pesquisas de pedagogia. Já
não parecessem bastante difíceis, nem bastante majestosos. . : . ocorreu ter que responder a questões em inquéritos de peda-
idiota se diverte com tudo.; ele rói as nossas belas idéias, rumi; e&1-.ª~ -~-~P:rn.g} . 9 <?.IE~ ·~dª_E_E?.!~m;1 pontap~ po~t~de---instru~r
zomba. Tenho medo desse selvagem disfarçado de homem. ' ,:·:. ~rtindo. Lastimo perturhar hmnêiis-bnns-eermnentemente razoa-
porico de pintura, biincand.o ; algumas notas de música, repentiname :~Mas " que fazer? Os pedagogos sã _~çria:Q&ª5__.a.ill~as. Não
9
te interrompidas, sem· medida, sem a s~riedade da ooisa. Uma co ,i:. . ecem 0 -poder das paixões. o homem é um animal, e o homem
ferência sobre o rádio, ou sobre a telegrafia sem fio ou o~ raios _ . t,'e rior talvez seja ainda mais animal que os outros. Nele percebo
a sombra de um esqueleto, uma anedota. Um pouco de dança; u ·.~~ força que é disciplinada, mas que é sempre força. Isso me faz
pouco de política,. um pouco de religião. O Incognoscível em se "~~ªr~que ·é 0 animal que pensa, condição que ninguém pode evitar.
... .
,.
'·· palavras. "Eu sei, compreendi", diz o idiota. Mais lhe conviria ·~ ;:tl:etanto, os grandes modelos mostram também a imensa distância
.. tédio. Talvez ele o superasse. Mas nesse jogo de letras ele pe' fre 0 animal e o homem. Sei · como são treinados os cães, sei
manece assentado e muito ocupado; sério ao seu modo, e conten' -~ - 0 treino perfeito f~ com-que pareçam mais do que nunca _cães .
1

consigo mesmo. ·~}mto mais eu os domino, mais eles são cães. '>'. ·,., .. -
Prefiro, disse a Sombra, prefiro na criança este ~-SE~l~ -~~--!'!... ·:., ~~-t!.~t~_, __ )?~:!~11.t_o ~ de cJ.omestic_::i,r-..as crianças, ainda que
niell},. quando vê que é hora de estudo e que deseJamos ainda fazê-1 s.e para seu próprio bem. Muito pelo contrário, é necessário que
-;~:· Quero que ela se sinta bem ignorante, bem longe, bem abaix ;~ '9qÜem9ª_ seu próprio aprendizaaó· em- suas mãos, fortalecerid<? 'as:.
bem criancinha por si mesma; que se apóie na ordem humana; q~ ~ su~tff~def · P~rqtie-iião1iá-oü.fro- valcii: ·h~-~~?: aJ~m OS}.S~§_.. E
1 j se forme no respeito, porql,le somos grandes pelo respeito, e n~; 'o te õ'õ=trtopósito·· ·de -habitüai o homem aos ruídos repentinos,
-1 1 pequenos. Que conceba uma grande1....__1'.1_~bição, uma grande r~ -~ :~o se faz para os ca,valos do exército. Em suma, tud.Q._() que é
1
1 Iução, por um_a grande humildade. Que se discipline e se faça; sem ~-~t?.
·°-ª edu_c~ç_ão
nãó me :p~~~f~. ~t1~a.n(). Ou, por outro lado,
f -pre com esforço, sempre em ascenção. Aprender dificilmente ~ :experiênda-que interessa me parece mortal para o espírito. Te-
' 1 , coisas fáceis. Depois, saltar e gritar, segundo a natureza '. ' s mil exemplos disso. Os selvagens interessam-se pelo que é
l. i i .:Progresso, disse a Sombra, por oposições e negações. '. J ~a
e pesca, pelas mudanças de tempo, pelas estações, pelos sinais
'l 1 j 'J. , : '-·~ ·"s estações; vemo-los entretanto supersticiosos e çrédulos; ,_ é que
1! ( ,_ "·'· ~ .)!~.bito os governa. Eles sabem muito bem atirar com o arco e
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seguir uma pista, mas acr.e ditam também que um encantamento, isto i qu~~~!.+ vitó~~-a,~ .:>.~jam peno.~~ e atinw~~s ~~~-j~~~~~io _
é, uma conjuração de palavras, produz a morte. Viram os efeitos, ; e~t~~1!<.?> ...0 defe1.t~ do __'l!!~ :-~-J!l.~~r~~~~~... P~:-~~ c~?s!J~~~ ·P.:.~}~l~. ?~J
temem as causas. Nisso reconheço o movimento do ·animal que . { o~o apresentar dificuldade em nos .mteressar, e tanil2w~no Jàto de
te~e o chicote; quando tomamos o chicote ele começa a gemer. Ele ~· ~<?.-~~~P!~n~~õ~.E5is:·~~!-~~Rõi-vo11!.~~Rria~
. ·
se reconhece; reconhece os movimentos animais que são produzidos ./ que desprezo até mesmo a bela linguagem, que é uma maneira de
pelo ·hábito, e sente assim que a simples visão do chicote faz mal. •,:-- ,.: prender facilmen~e a atenção. E a criança não deve somente ser
O selvagem é governado do mesmo modo, e é ingênuo da mesma ..•. f capaz de vencer o tédio e a absfraçKõ;--aêve-··titmbém .. saber·que-::;'é .
- ··-- _.. - · - -.. ··--·-··- ... -.. .. .
maneira; julga que o simples olhar de um feiticeiro prejudicará um _} 1 ! _gã~~~~~~so:· Isso é que deve ·ser . reâlÇadõ~ ...e .Trãta-se, não mais,
dia de caçada, e, por acreditar nisso, ele o constata. Porque aquele ~;.:, :. .. ·ae aplicar à cultura do espírito os princípios que não podemos es-
que está certo de perder .a cªça, p~rdê,,.Ia...-á-;-_...'Esse tipo de armadilha, '! ~-; quecer quando ensinamos a ginástica. Experi!E~E:~~II1_os, :Pº.f.~~JJ:tO,
1

de mil formas, explica o incrível estado de barbárie e de furor do :f e~rud~-~~-!Od~?--~!~$~ -~e~~<?-~ -~~a· bela ambição,
de espírito que os cães não possuem. -· ·- · · · · · · .. _ -·
umà.
ambição
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qual há pouco saímos, e do qual a criança certamente ainda não saiu.

-
Porque ela nasce inteiramente nua, e traz em seu saco de pele t9g.as .. .,
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, as prux<?~~.. ;. , , · . :·,
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)'.. ~1F~>· O brienso pÚigo, e também a urgência, sempny·prement~, de se .''. _,, __"/.) i .1 · -~ •. ... . . .! ·' " • ~· l
.". (

\ti_!."ar a humanidade d~ barbárie J?.:róxima, exige )lúe :nos encaminh~~ :.\ \ '• J'. / :

mos d iretamente à' !inalidade humana. É nesessário que a criança -:~·


conheça o poder que ela tem de se governai e , antes de tudo, de
não se confi;f~ · tf tâ mberii priCisõ -qüe-feiiíiã: o sentimento de que t~~

·
este trabalho sobre si mesma:_é_difiçJl_~J2~l9.! Não direi apenas que i-,.
tud<? o que é fácil é mau; direi mesmo que o que julgamos fácil é ·&
mau. Por exemplo, a atenção fácil não é de modo algum a aten- ~· . - ,~

ção; ou, senão, poderemos dizer que o cão que espera o açúcar . ;;~
presta atenção. Igualmente, não quero vestígio de açúcar; e a ve- ·1;
lha história do cálice amargo cujas bordas são untadas de mel parece- :•·:; ~

me ridícula. Preferiria tornar ·amargas as bordas 'de um cálice


mel, todavia isso não é necessário; ~~rd.açleiros.. problemas são_ .. : :
..~I1i~ia~~~~~~-. ~~-~~~'='~--~~--~~~; o praz~r_ vi~á ~ã-;queies~ qÜeve~~. ·~:'. ' . ',
.. ·- - --- ·- - -·-- ...... .·~ \
cerem o amarg~r. Não pr9.in~~~~~i . .P..9!.!~!~\- ?. ..P.r.~!:~!.1_ ~~~.• ~ar~i · / '-._·.

c'o mo finalidade a dificl.lld_é!Q~ . ye.p._çJc;tª-··. Esse é o atr:;itivo que COll"'.' , . /


vém ao homem; somente assim é que co~seguirá pensar em vez "(t~ /,'j
'-/ -: :
experimentar. :
Toda a arte consiste em graduar as provas e e.m medir os es-
forços; . porque a grande tarefa é dar à criança uma elevada idéia de
;·ê.
~e~ P?der · 4~-~~ÍÚ~á=iâ-.p~fãs vffO~Tãs:-·--Mas ··ê-·tãmbém · impórtarite
- --·-·-- ··~ - --. ·- ·- ...

···· P.;;.._
- 1 !r, ' •
,e.; J.~ :,: .. -:! : i ' , ., . . " •.: .';': . C.A~1.9,-- , . -: · '
gánham ou perdem nesse regime; muitos dirão ·q ue há homens que '
.r
se assemelham a estes cavalos generosos que se consumiriam para'ul• .
. . · ~;,:)trapassar o vizinho, mas enfim que é ne:cessário bater mais na cabeça
f•
-... .
f ..
· ': 1 <:1 se desejarmos obter no mesmo tempo mais meio metro. Talvez o
'. .J · ~·'<.:::ii
.., ..
~. ·~

:~' ;'. 1 ~~~_()xeador aprenda mais depressa se o golpe for real, e s_e, por uma_.

III
\,.

:j ,'~ . . ..\. {!Ǫº de segundo~ o nariz sangrar ou o olho ficar· !n~ha'!º· . .Não
\:'·_. '
r ·-ci ~seria necessário concluir que então sua vontade é e~crava e que isso
\( \ . " '· "- .-,... ~ ,-S: ".lé o melhor; porque é o aprendiz de boxeador que quer que o golpe
·;<-' '· .
_· ·:· • ,.seja forte, e que suas faltas sejam punidas segundo ~ força, não se-::. ~ ·
- .. t'-' 1
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-~--
· ,_ ~ ·gundo a opinião. O mé~do de força_ teve decerto seus excessos. ~
: :J ~ Locke 3 , em seu tratado de pedagogia, recomenda que se surre for.;. ':·\ .
Crianças nascidas e criadas na burguesia imitam as conversa- ~- temente a criança mentirosa. Que falta aqui? Falta que a criança '·.: ~
ções e ·a polidez, oferecem seus lugares, acompanham as pessoas, - ~ · · mentirosa peça por si mesma para ser surrada. Eis aí a questão. __ ~-:·.: :~
saúdam, sem encontrar qualquer dificuldade nisso. ~ __ _que as coi- : i1srÇreciso que a criança, por si mesma,- pr()Çl]re a dificuldade, ~- recuse--. .:'
·- ' "' _,..
sas não são tão importantes quanto as pessoas. Os filhos de acro- _. -'. _};:; ~~alquer auxílio ~~- ap_oio,:<, T~~-~~i~n~_a_. ~~o apen~s exist~~ .: zias é .:\i;
batas, no tapete do circo, tentam 'manter-se de cabeça para baixo ou '" ~ ~esmo comum. ' . '· . . . ' ,•, ' . r . ) -.; ·_\. ..... . ('! "-". ' l. ,,,
~. :.: . .:;·· (".~·-:) ., e·: . ·\ -., ·"· ...../
dar saltos pe.rigosos, coisas nas quais .a opinião não importa, porque j ~:. -- . ,~::.- . J ·- \~~;.
'. -. / ....- O que leva adiante a criança não é o amor pelo jogo, porque, a · (;
. p peso corrige rudemente o desajeitado. Interfiram ou não os pais,
.·~ ' /"cada minuto, ela esquece um amor do jogo, e é como passar da ca- · ;_:
é como se a criança fosse puniôa a cada erro. Esses dois métodos
/fazem duas espécies de homens, -,duas espécies cÍe estima, duas es- ·' :; (1 misola para a calça. Toda a infância se passa em esquecer- a cr.!an--:: -:::~
,: pécies de glória. Um filho de virtuose imita ~ pai tocando sendo ::! ~ IJ ~~~~~e se era na vésp_· era_ . O cresc. im~nto. :qãb sigµifica outra coisa. E:"/j
j aplaudido, saudando, fa).ando aos p~·cipes; é a parte fácil do ofício; ~~ ;- ~!ll&-ª µaqa , tnª-i~ desej~ s_enão deixar_ -~e ser criança_. Ambição. -. ~
1 • \ '

1 • mas n~o. pode imitar .º.pai diante do vi~ino· ou do piano. ~~-!!L


·1~ que sem cessar cede lugar à atração do, j~go; do ~esmo_ modo o
\·1~:c_ es_s~n~- fo'.ç_á:lo_~".'tas _vezes; e mi:ito-\-'!!:li..Sta__s_f~~l!!lcial~nte t :
1 jogo contínuo sempre tem desgosto e ted10. A cnança pede so- .:
5~Bª-YEº?S..· ao --CU?·µ ro e ~ .:pr.ecis_ij_9ypr. _p-ahca9as ___çl_e_~ Consi- ) '. c()rro. Quer intensamente ser tirada do jogo; não pode fazer isso ., • j

<lerai;ido os resultados, segundo os valores. humanos, compreendemos ,;1'' por si mesma, mas por si mesm~ ela o deseja. É o começo e ccimo . ;.,~
que. f~ta ~!~- ~- um~ ._ ~?.uca~~2:-.~tQ~~;: ;-;l~_::?~ra;. Montaigne .e ra j ,:. o germe de sua vontade. Eis por que, protegendo das pancadas o "'i ,
despertado ao som dos· .instrumentos; não era esse o meio de formar que merece ser protegido, n~~_9.ey_e_!.!!QJL_~~L.À~S_gQs.tá:·la, .e....-ª~·-·-"-;
1 um ~úsico. , O J:io!l?._~-~---~? :~-~-~ i_~_l?_~-~-~-1:1-_cj~pelo _gue ..2'btém _d~ ___s,,L.-- :---;D ~~~IA,Q. ___.dev.emos. _Je:µi,~I ~e.r.:P.:!-~ . _agrac;láyeis. Ela. ama o que é se-
;. s~egun.,yo. ~.}1J.~tqd9___s~~.Y..~r.<:>; ~ Jt,queles _que reousam o método severo ~ inelhante, mas despreza-o também. _§_e, __~ _JtjudaJ_:g:rns____a__çon_t_ar, ela
· nunca valerão nada. -'----,· .\} . (- ... :r- .. ~> ·. :"}_
.•. j ~·'
·· "· cederá e ficª-J:.á__ c.ontent~. J;!grque ~ cri_@__ç_a.; mas s_~ _:r.i_ã.o a_ ajudarmo\)
Não quer isso dizer que eu ·seja favorável às pancadas. Pierre , e, .!~.5~t.J:~:r~ri~'- . ~~Pe.:r~:rp.g_~---~~P?:~_nte _qtie cl.i s~ . arranj.e. .sozinha,__ -~L ; t
1
Hamp, em seu belo livro em que nos apresenta a história de seus
ofícios, conta que um pequeno pasteleiro, por um erro, perdoáve~ ou '. · 3. John Locke (1632-1704), filósofo empirista inglês, teórico do ' libe-
.ralismo político e da tolerância religiosa e para quem a empresa da educação · ·: _,
não, logo recebe uma pancada de espátula na cabeça, um golpe que reside na formação de um caráter livre, recusa eficácia às sanções físicas, .
dói. Não sabemos dizer se a rapidez e a precisão dos movimentos sobrepondo-lhes as sanções morais ( cf. Pensamentos Referentes à Edu-
cação, 1693). '
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'.:;
~

~o~trarmos seus erros sem qualquer complacência, reconhecerá (!g_- ~J


!ão __S.~~---~:r_riigq verdadeiro, que não adula, que não engana. Quanto ;:~ ,,
-~-_severidade, Q§._ .PfQP~iC>$ ._~ÚIJ,:i~r.os se e:p._c;_a.,rr~g~rão _ . c:Iisso, pois não . "1 .. '·
tfm piedade. Assim é que _será .. ho_nrado como deve ser .o mestre .-. .:
pe valor. Jl

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IV
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Quando alguém diz, depois de tantos Jª o terem dito, que é


necessário agradar às crianças, e que esse é o verdadeiro meio de
instruí-Ias, deixamos passar. Mas não--··-····gosto . ::.+,::-:
muito de ...!.~J§.... c;Ioçµ:-
~ ....";~·'!:": ;_;.:;::..;;,;.,,:, ,,'•,7:,.'-!-"-::.,...._, ••.M••••"- ' ' "• ' • " ' ' . • -

ras, nem deste professor cortesão. Quando estava na escola en-


:_.'_'. Õntrei uni professor -rn.uítoafefüosô, e que s'abia interessar seu jo-
; J em auditório; posso até dizer que. o amávamos. Ora, ele ·não
~\b.~conseguiu superar uma certa desordem que, como me le~bro muito
·
0
pem, resultava de __sinais indiscretos de aprovação. E com isso vi.:.
J\) nha logo o tumulto, pelas forças da juventude, e pelas leis da mul-
~~ ~ Údão, que se agita à maneira dos elementos naturais. Do que
"' .
tirei uma espécie de regra de' ºª~·io; concordo que devemos provo- .
/car o interesse, mas
".; '_;·, ~@ent-e;-:-nãs--àeyémos
M· . .
-·não.
··deyemos querer interessa~__principal-
mo~trar .,que.-::fi queremos. Tal regra é boa
~ ,f~ i.!: também para o orador, e em todas as artes ela é encontrada, aínda
J;.-: q.ue esteja então profundamente escondida. Não tem o ator. o ofício
~ -~ · de agradar? Sim, mas existe agradar 'é agradar: e o difícil é fazer
•.'!Ç; • • · -·····-····-·--·--·-····-·· ·· ··- ··-·-· -··

if' : i ~?.1:1.1.. _q:u_e _os homens sejam l~yados a gostar f4talmente ~o que inici~l-
. ... . .
•· _
.\ - mente não -gostav.ªmlX- e.•> ]/... .. rL { ' .i.. V\JQJ ()k /.'.~ '" }-\ ,, ( i_ ' ' . ~<..i \
·--· ·· -· - ' .. ) ~- - \ ·j

O ofício de condutor de homens, qualquer que seja o grau em


que seja tomado, encerra muitos ardis. Os atores que resolveram .
trabalhar de costas para o público haviam julgado, e talvez por razões
secundárias, que um certo __ cg· __d~_jpdif.~.r~~"-S..~b.Y~ªlg1ull.~.iez~1LP.~Ll;! J
,çl~~p<;:.r.télr. a -a.tenção- ~~-·;rivel conve~ente, ~ pa.ra moswar·."~~~ espec~ ·
tadores ·um tipo de prazer que ele~ apenas nã9 concebi_W ·;:: .. :A arte
. l . . . ,_, ... :··-' -:.: . . :.~/:''.'cf:._.:t:_ .i" :. ..
·.
'do músico, se. ·. b.~m ouvi, _não começa agradando, mas sim forçando.
'; Muita . ~dulação.· inicialme'nte no _som pode ofender. Há também
\
uma· arquitefurà acjuladora e um - abuso de rosas 'em guirlandas. (
Sinto que o homem é um animal altivo e difícil e, abaixo dele, a \i ·1- .
criança é· mais homem que o homem. Uma criança mimada é uma (r-'
criança estragada por agrados e prazeres . feit~s.· · Que-- desêj~~-~i~­
.então,. e_ q11e__ c:leseja 9 holl!~m? _> ·D eseja o difícil, não o agradável,
e, quando não pode mante;·-esta' atitude de homem, deseja que
!

'.
V
' a ajudemos ~sso. · Pressente outros prazeres além dos que correm
\:
ao nível dos . seus lábios·; quer erguer-se inicialmente até perceber I

uma outra· paisagem de ·prazere~; quer enfim ser educada; eis aí um;{ ( .:
palav_ra muito bela. · · ·
~-~? .. !~~º- _l!l~i.~~ _ Ç<?.P-Í!ªP:ç_ª---~-es.s~s.. jªxdins___d~_jnfª-_l}_çiª---LºJJtras--,,
·uma bela palavra, cujo sentido a criança percebe muito bem, ( .....i~y_e!l_çõ.~s .P'?I ~ei°.. _dos ___q~_'!l~. -- pro_cu.!_8:~~~ _i!J-~~~l.'. .. -º-~:yertind_~· O
por este movimento natural de _ crescer que é seu. No nível da · método já não é excelente para os homens~ · Poderia citar pessoas
criança, pense nisso, você . só desperta o interesse de .seu ser de on- \\ que são consideradas instruídas, e que se entediam lendo La Char-
tem; ela diminui então un:i pouco o seu tamanho, a fim de que você .j. ··.,_treuse de Parme ou Lys dans la Vallée 4 • _Iai_~ pessoas sg,lêem obras
possa lhe agrad~r. Mas cuidado com o desprezo. O que existe ; f. d~al~~nd~_rio, n.as quais tudo está qjspost9 'mu.:a ...agradar ' à
de terrível no_ desprezo é a parte de
desprezo de si que nele existe, , ., . · p_~-~~-~~- yj~ta; mas, e~W~-~g~rido-se ~ _prazeres fáceis,-.. perdem .unL . 1

desprezo de si ultrapassado. Tal é o progresso da criança; se ela j ,j.' .P.-!".~~~-r___pla~ ___;:tJ~º- ..q\l~ _!e.!.!ª_m___ªciquirid.Q_RQr_meio . -de_, .um.. _po.uc0---de-
o faz sem o seu auxílio, vo~ê se torna então para ela apenas um l :; ,:~:~~~~ _e __ d~- -~t_enç~9. / Cl..,. w i:_ .\:: '="" 0 ,b,1..v -"-· ' e:_ ,l~-)cA;( -,'\ç.... d.t V._,, .•,. 1\
.' . 1/ (/'"":)"' f, .... 1')\,,' , : • ~• \ ~ • • ff
objeto de distração. E nada· é mais desprezível que o objeto de dis- .• Não há experiênc'1a que'··eduque melhor um. homem _q ue. a ..desco- .
tração. "Para esta ..criança de ontem, diz a criança a si mesma, meus · .'.;. ·berta de um prazer superior, que ele teria ignorado para ·sempre se
~.. •• • , • 1
brinquedos são suficientes."
Eis por que não acredito muito nessas lições divertidas que são
como o prosseguimento das brincadeiras. São .devaneios de boas
·! ~ (., " não tivesse se esforçado, um pouco, inicialmente. .~.o~t,ai~~ é di-
. ~; - · , fícil; é que é pr.eciso inicialmente conhecê-lo, Ofientar-se ~.:_iua
-· · i . l. ObJ.~.1 _)9-Y.~I~~~I;i~~ ço"1;i:L ~~y somen1e'"éfepois·- -disso- é-gu.~-épos.~j_y~l ~
1
i:essoas que não aprenderam seu ofício. Certamente é melhor per- descobri-lo. Do 'mesmo mÕcfo, à geometria·- por -cartões reunidos
ceber as causas, mas o ofício instrui de inodo mais rude e rústico. O · pÕde ·a gradar; mas os problemas mais rigorosos produzem também
sino ou o apito marcam o fim dos jogos e a volta a uma ordem {< Ç; um prazer mais vivo. Assim é que o prazer de ler uma o'!Jr.?..- '!9.
mais severa; e a prática ensina que não deve haver um~ passagem t :p?"' , \_:p_i~~? ~ão po~e ser perc~bido n~s . ~rimeir~s lições; é __pr:ç_is_o .sab.i;r-
insensível, mas, pelo contrário, uma mudança ·total, e muito clara \l: / \m~s - suportar o aborrecimento J.mcial. _ E is por que nao se pode
nas aparências. A atenção é elevada de um grau. Ela então não
procura mais lamber algum prazer, como fazem os cães. Não é
~ l 1
j · ~z~::;.m ~~e ~~ ' ~ian~as, sabo~~~m .~ ~'.ên~:~~ e as ~tes como sa- !
mai_s gulodice; é P!..iY.ª-窺~ .P.~~!~~cia; é uma espera· que olha acima
de ·,.s_i~-~1l~~}.; :; A atepção do_cãônão _é___~úeriç-ão; - ·- ·· ··--- ·· ·-· -.·J:·r
· · ----.- --- ·
•" . 4.tJStendhal (Henri Beyle, 1783-1842) e Balzac (1799-1850), respecti-
varilente autores dos romances A Cartuxa de Parma e O Lírio do Vale, esta-

~'.i~~;:~tl~f .·.. ~
"J -~
·{<, / ·
t:
-~ ê
vam entre os preferidos por Alain. Sobre cada um deles publicou ens~
Stendhal (1935) e Avec Balzac (1937). .
ios: ·
·.,
.
" • .
· .·.-.~:·:·:;~-~: ,e;.::._;;. ··.·-:4.:>
'
-
bóre~;,,os o~ doces de frutas. ·' O homem se forma pelo esforço; . des do trabalho, está melhor formado quanto ao caráter, não - ·1!I
seus verdadeiros prazeres, ele dé~e . ga~hâ~"fõs;·-mér~cê-los. Deve dar quanto ao espírito. Se aprendêssemos a pensar como aprendemos · 1
tl. \ .

antes de receber. É a lei. a soldar, conheceríamos o povo rei.


, · d e d"rstrarr
O f rc10 º
· e' sol'rc1ta
· d o e b em pago, e, no f un d o, se-.
· Ora, desde que nos aproximamos dos pensamentos reais, fica- 1

creta~ente desprezado. Que pensar dessas vazias revistas semanais/ mos todos submetidos a esta condição de receber inicialmente sem
cheias de imagens, nas quais todas as artes e todas as ciências são compreender, e por uma espécie de piedade. Ler é 9 verdadeiro
postas ao alcan ce çlo olhar mais distraído? Viagens, rádio, aero- culto, e o termo cultura mostra-nos tal fato. A opinião, o exem-
planos, política, economia, medicina, biologia, tudo reunido; e os pio, o rumor da glória nos dispõe da forma devida, mas a beleza
autores tiram também todos os espinhos. Esse magro prazer des- ainda mais. Eis por que estou bem longe de crer ql;le a criança deva
gosta; produz um enfado das coisas do · espírito, que são seve~as no compreender tudo o que lê e recita. Tomemos, portanto, La Fon-
início, mas deliciosas. Citei há pouco dois romances que não sãoi taine, sim, antes de Florian; tomemos Corneille, Racine, Vigny,
mais lidos. Quantos prazeres ignorados e que as pessoas poderiam· Hugo,. r:- ~, - · ·' -.
obter com a condição de terem um pouco de coragem! Ouvi conta* ,, ~,.) ~-':M~~····~erá isso muito para a criança? Por Deus, assim o
que uma criança muito amada, que ganhara um teatro de marionete$1 -\' e~pero. Ela será inicialmente tocada · pela J.:iarmonia. Escutar em
como presente de aniversário, instalava-se na orquestra como um\ . . si mesma as belas coisas, como uma música, é a primeira meditação.
velho ~enhor rico, enquanto sua mãe se esforçava para fazer com\ ("Devemos semear os verdadeiros· grã9s, e não areia. _QP.:e --~lª·ª---~

~u~~s r~~::,a~en;e:a:~;:s:~:,~:v::::a :::rig":i;nh~m p::~: ~


um pensamento magro, que caça a sua presa. .',·:'.',·).·:'·;·•L.',i. .,!.:;~..
li:.~ ;::~~:~~:!: &;;:~~;i;:lf ~gelo, de :~f71;.A~: ,,
_,.;.,----'C omo aprendemos uma língua? Pelos grandes autores, e nao )
·.
• / • • • • / 1

. _R!!_z:i·cip~lmente às crianças, ciue _ tê.~ ~anto fresccfr, tanta força, : ( de outro modo, Pelas frases mais densas, mais ncas, mais ~~.<?.-::._,.. :

. :::~~i:Ji~;::~;__!;;~:~~ ~~;='~;;~t~~:~~~g~e:~~:r; ~~:;l :'.\~·-d:~di~ici~!~t~e~asa~~~c;: ~:g~~ai~~~~ e~:esc~~::::~~~~da~p:s~:~


L§[rJi,__q~=:f~~Í}§..~ ça __s~ esfor.~. _e~se_ f'.tg-~..!~-~~~:~~.-9-,~!3~§.m:~iii.rm'õ'--. , . jóias de tríplice segredo. ~ão acredito que a criançá possa se. educar ._
6- a âm@ção que falta aqüi;~: · a:~5_iÇ.ão -e a melado esp!rito infantil. ',~ ~:, ·sem admiração e sem veneração; é nisso que ela é cri~nça..
A infância é um estado paradoxal no qual se percebe que nã_o é ~ ·:'.. _. E. a virilidade consiste em ultrapassar esses sentimentos, ~uando a
possível permanecer; o crescimento acelera imperiosamente este mo- ·'.(l ~ razão desenvolve sem fim toda a riqueza humana, inicialmente pres-
vimento de auto-superação, que, em seguida, tornar-se-á bem mais ~~ "~- sentida. A criança constrói uma idéia· muito grandiosa da idade
lento. O homem feito deve reconhecer que é em certo sentido me- ~( viril; é necessário entretanto que esta esperança seja também ultra-
nos razoável e menos·. sério que a criança. Há, sem dúvida, uma ::~ ': passada. Nada é demasiadamente belo para es'sa idade.
frivolidade da criança, uma necessidade de movimento e de ruído; 1
é a parte dos jogos; _!IlaS _é também necessário que a ériança se sint.a .. ;~ ~
crescer, quando passa do. jogo ao .trabalho. Esta . . .
bela passagem,
longe de torná-la insensível? eu a desejaria marcada· e sole~e. A
">· '
· .,

criança nos será reconhecida por ter sido forçada; mas desprezar-nos-
· ;-· .. -- Fh
á se tiver. sido adtllada. O aprendiz está em um melhor regime; ele .
. .. ' :•:·
sente a seri'e dade do trabalho; entretanto, pelas próprias necessida-
1 "".:. 1 •

~l>:il•.•.,. .•
• \ •,

., •.• ,_.. ..
.~ :.~~·~·
·'' ., •
Esteja a criança lendo, ou escrevendo, ou calculando, essa ação des-
.. nudada é seu pequeno mundo, e deve lhe bastar. E todo este abor-
recimento, em volta, e este vazio sem profundidade, são como uma
lição falante, porque _se há algo que lhe importa, meu pequeno: é
o que você faz. Se bem ou mal, logo você saberá. Mas faça º . que

VI você faz.
Esta simplicidade monástica nunca é aceita por suas verdadei-
ras causas, ainda que felizmente estejamos reduzidos a ela. "Oh,
solidão, oh, pobreza!" Todo homem é um poeta que se queixa.
Ouvi contar, a respeito de uma criança bem dotada, que seu pro- -11.
fessor de piano ocupava boa parte do tempo a lhe falar sobre bio-
Dois juízos falsos em tçx:Ios os nossos ensaios. Pensamos ini-
grafias, escolas e gêneros, o que talvez a prepare a falar razoavel-
cialmente, que a c-oisa é muito fácil; e, após uma primeira tent~ti:va.
julga:rno-la impossível. Os que fizeram girar um diabolô, jogo es~
mente sobre Beethoven, mas de modo algum a tocar as suas obras.
quec1do, _sabem o que é uma tentativa ridícula e sem qualquer espe- Ora, falar razoavelmente não é difícil; tocar é 'que é difícil. E en-
rança. Que dizer então do violino, do piano, do latim, do inglês? ..!_rn não há }?~_?gresso, para qualquer esco~ar que seja, nem no el~- -que ·I
ouve, p~m ~o quevê;JD.1fs-s-o1tíe1Ileno que ~-· -~~"'[),,~'i t ,,,_:_,---;_--;._
O esp_e táculo dos que já prosseguiram fortalece no começo nos-
sa coragem, ma~ quase logo em seguida arruína..:a com uma compa- .~ 'Y:J""' _Q_!"a, __ este méto~-º severo, _que encurta tão bem as visões sobre o
ra-ção. que esmaga. E por isso que a curiosidade, o primeiro impulso, . munc:tg,_ ~~amente °....S.1:1~ introduz ___ ªQ___ _m_µJ!çl_2~-~~P..Qiq_üe,-ímorlltãn:·
do-nos a resp_e ito de tudo, nunca_...sab.emos--uaà-a-. -- Ap~néiemos a ~
o ardor d~ qualquer começo não prometem muito aos olhos do mes-
polític_a transmitindo ordens e copiando despachos, ;--~i~ -d~--Õ.Ütro ,' !-
·tre. Ele sabe muito bem que essas provrsões serão logo devoradas.
WA9· cliegãrêTmeslliO a dlzér··-q1ie em quafquer... tf'ãf)alh~--;;· ct-~tj~-----
.Espera mesmo_ que o desespero e a falta de habilidade estejam ·liga-
das_ à primeira ambição, porque é necessário que· todas estas coisas de fazer bem deve ser usado no início; e disso qualquer ofício se
de entrada, boas e más, sejam enterradas e esquecidas; então. 0 tra- encarrega, e também o ofíciq de escolar, como os outros. Porque o
balho começa. Eis por que, se .trab"a lhamos sem mestre, as tentativas desejo visa muito longe, e estraga a ação presente, misturando a e's ta
terminam logo no momento em que o trabalho deveria começar. · a que se seguirá. Por mais exercitado que seja o ·pianista, sempre
terá tanto de decepções quanto de ambições. Por isso ele é levado
1
·O trabalho tem exigências espantosas, e que nunca oompreende- ao seu trabalho, e tudo lhe confia. Aqui começa toda a grandeza.
\mos suficientemente. Ele não tem paciência para esperar que 0 es-
Quero explicar assim que a paciência consiste em dispensar-se
~//pírito consid-ere fins distantes; quer toda a atenção. O ceifeiro não .
-;de provas; e a provação, e_m todo o seu sentido, significa isso. Do
\ olha a extr~piidade do campo. ·
~ escol~-·é·~~~-· Ioc~i-· ad~kâ~~i~ --A~h~--b~-~--~u~-- ~~ ~~íd~~-
.- -----.A __, - ·ex- -;r _:'.mesmo modo,__os impacientes sempre dizem que não se lembram de
jrrada, que não progridem, que tu-d~--é -diÍícil. -..Essa atitude do espí-
· .' ternos nela não penetrem. Gosto destas paredes nuas. Não apro- ':lt .~ito não_ é desprezível; existe nela certa . seriedade, uma severidade

~2:~;1~:~;;~:~ ::~;~~~· :º~=n:1:~~::~:~d~::~h:~b~:~~ .!' [.para consigo meSII10_, _uma nobre idéia da perfeição. Mas são ~ir-
; tudes prematura·s. É necessário superar essa tiroide? o;@l~osa. A

"' -,_ e·;. · e -, · ., 1


' ;:·:-~ ~~:;.~~;~~tit~:~~~.r~~:-~.-~:--
ambíção é então inteiramente levada ·a ações que estão sempre ao
alc~nce, como, ?or· exe~plo, regrar o emprego do tempo. E, por
meio desta hurmlde policia de si mesmo, o espírito fica então liber-
ta~o se_m que perceba. Esta arte de querer não se perde mais, mas
nao ve30 como possa ser adquirida fora do colégio. E aqueles que
são instruídos, tardiamente, como diz Platão, nunca a adquirem.
VII
''Que é a escola, dizia o pedagogo, ·s enão uma farm1ia maior e
'que desejaria substituir a mãe, sem muita esperança de consegui-lo,
ou pelo menos de se aproximar de tal finalidade? A educação
normal, para os de pequena idade, requer duas condições: a pri-
. meira, é que a mãe tenha tempo para instruir seu filho; a segunda,
é que ela seja capaz de fazê-lo. Entrementes, nós outros recebe-
mos d~legação do pai e da mãe; e temos obrigaçã'o de amar cin-
qüenta guris como se os tivéssemos feito. Há algo de artificial,
de abstrato e de inófgânico nessa instituição, que sem dúvida desa-
parecerá pela ação de uma melhor Economia e de uma melhor
,_
Sociologia."
Assim, tentava ele ligar as novas idéias com as antigas. Mas
º·v:elho sociólogo sacudia a cabeça e lançava ~aíscas através de. seus
·óculos. "Observemos, diz ele, não construa~os. Não creio que
haja tanto de· artificial e de inorgânico em vossas escolas; e também
não me agrada que se procure saber em que é que uma instituição

~~ .. /:·:
se assemelha a outra. De preferência, eu pensaria que a escola é
~ ~::'\. urna coisa natural, não menos natural q.ue a família; e muito dife-
., ~ · rente da família, e cada vez mais, à m·e dida que ela desenvolve sua
·~ ( p~rfeição própria. Tudo é feito com o mesmo fio, eu compreen-
J ~::._. · do bem; mas esta humanid~de escolar parece-me arranjada e tecida·
•;
·;~I ~H'? · de modo düerente. Desde que ·haja váFias fa~ílias .e m vizinhança
·-:·;~:· . -';} · .., e cooperação, o agrupamento das crianças segundo a idade se faz

~~-- .::· l~fS'>·


:';. naturalmente para as brincadeiras. -g. 'v erdad.e que o agrupa.mento

!
·. ::·.../ . -·- ..:·
1:
- familiar, com seus pequenos . e seus grandes conjuntos, e com esta : . 1
distribuição· natural dos poderes e dos deveres, é algo de belo e que · ':'.· í
nada pode sub$tituir. Aqui é a escola do sentimento; aqui movi- '.! 1
mentam-se o devotamento, a confiança, a admiração; os meninos ·
imitam o pai, as meninas imitam a mãe, cada um é ao mesmo . tempo · tià
prótetor e protegido, vener.ado e venerante. Mas por que tentar .:
imitar o que é inimitável? 'A reunião das crianças da mesma idade,
e que devem aprender as mesmas coisas, é uma sociedade natural
também; não do mesmo gênero, mas de gênero totalmente diverso;
VIII
diverso ._por sua estrutura, que eu hão inventei. Por que desejam
~·ocês afirmar que ir à escola seja menos natural que ter duas mãos,
um ouvido musical, e olhos sensíveis ao Televo e às· cores?"
. . A família instrui mal e mesmo educa mal. A comunidade do
O pedagogo abandonara seus lugares-comuns e espreitava a sangue desenvolve em seu seio afeições inimitáveis, mas mal regra-
idéia, porque o objeto assim focalizado era-lhe familiar e de certa das. A~.. pessoas cónfi_~I!l .._n~~-~ª~·- · af~_içê)_e.s; e assim, tiranizam de
forma estava sempre sob seus olhos .e em suas mãos já há alguns -,,.. todo o cÓ~~Ç-ão.· · 'rssc»-iem algo de selvagem. Uma total confiança,
anos. Mas o outro, boa cabeça, trazia ª'
palestra este espírito de '.l sem nenhuma liberdade. Pode-se exigir tudo, mas igualmente tudo
conjunto, que .faz Sl,lrgir as diferenças·.. Sacudindo novamente a · ca- ~ é devido. Quando a família vive sobre si mesma como uma planta,
beça, e como que olhando de lado; . ~le .
. dis~e~ "A.. escola oontrasta '
. - ..' sem o ar saudável dos amigos, dos cooperadores e dos indiferentes,
ao Contrário, coin a família, e esse próprio contraste . faz com que a ~; surge nela um fanatismo sem igual. É um furor de admirar e ao
criança desperte deste sono biológico e deste~: instinto .. fa~miliar que ;{. mesmo tempo de censurar. Não é permitida a dissidência porque
se , e11cerra .sobre si mesmo. · Aqui,' igualdade de· idades; elos bioló- ~~ · a concordância é muito esperada. O traço mais característico des-
gicos muito fracos, e além disso apagados. Dois gêmeos; dois pri- '. ·. sa existência puramente biológica é a diferença das' idades, q_u e im-
mos da mesma i~ade ficam aqui separados, e _fogo agrupados se- ; planta a hierarquia em tudo. Espantamo-nos com as disputas
gundo . outras afinidades. Talvez a criança seja. Íiberfada do amor \ · entre. irmãos; mas é preciso que nos lembremos de . que existe sem..:
por' este sino :_ por. est~ mest:e se,m coração. o. __, · stre de~~-·-
E,.orffiw. ·~ · pre um mais velho e um mais jovem; é uma comunidade, não uma
•• ~ ::_ igualdade.
1
~~::_~:_s5i1}-. c:~:.~ç~_<:>_;c,_~:~·--~~~:~~-1-~~~~~s ~~~~~~~~·~do c~~~~ · Ne~sa ~~gtunidacle_Q_ corpQ_Q.9deria~~Jªr . bem, Hmas o_
. !~~~:.:8.~C>....!TimL,~~ntad~..:-/~1e a eve s~-10, ele .º é. Aql.ll~ar~w · ·:: .
e spírito se revolta. Portanto, a natureza o castiga. Isso produz
o verdadeiro e o justo, 'ínas m edidos· pela }êiã<le-:"' ·Aqúi é ápãgada · \ . dramas, . me~mo ··~ um garotinho de sete anos. É n~cessário admi-
a ~~!!~~~ade de existir; tudo_,_~Jnicialniente· exterior é estranho. o tir que qualquer pensamento é injurioso em relação a um pai ou a
'h-ümano --s·ê·-·mostrã·-·nestà lingu~emregra<lã:-:·;:e·ste .-t;~~ã;;.i~te, uma mãe; é necessário. admitir que isso está ·bem e que só pode
nestes exercícios, e mesmo nestes erros que fazem parte do ceri- ser assim.
monial, e · não comprometem o coração. Uma certa indiferença Parece-me que as comunidades religiosas traduzem essa oposi-
aparece; o espírito lança o . seu olhar oblíquo e sua invencível pa- ção, mas abstratamente, isto é, . por simples negação. A idéia de
ciência. o olhar mede e conta, em': {ie~: de. esperar e de, temer. o que os elos de família constituem 'ôbstáculo à salvaçã'? é uma idéia
tempo .~orna...dimensão e valor. O . trabalho ·móstra seu . rosto frio, forte, ainda que não desenvolvida. É preciso que compreendamos
insensível à. · p~na· e .até mesmo ao prazer". que o espírito cristão foi um espírito de livre pensament<;>;. e q~e:.
\,

\ 1 ! .'
/
.
~(

ainda o é, ·e sempre o será; e a doutrina da salvação pessoal será{~ mais resta do erro. Aí então é que o espírito toma -esse ar de ne-
sempre um escândalo diante da instituição biológica.. Inversamentei:. gligência, que por si só não é bom, mas que é entretanto primordial, ·
os direitos do quilo, e as reivindicações da polpa nutriz sempre cons~{J! como o poder de cair sem se matar é primordial para o ginasta.
tituirão escândalo diante do espírito. Do que decorre esta divisão, :~~ Isto .é novo; podemos perceber apenas os frutos de uma organização
celebrada em Polyeucte 5 • ~... de sociedade na qual todo espírito terá sido 1,ivre e juiz. de si mesmo
," · durante alguns instantes. ·
:E', necessáno que o oposto imite o. seu oposto. A ingênua-'. i ~-·
igreja é uma família de espíritos, que reconstrói a família; o que ,~
encontramos no festim místico é a um só tempo negação e imitação~t
da mesa familiar. Daí a obrigação de venerar e de crer, e uma',~i
insuperável dificuldade de sair da infância. Esses tecidos de so- j;
ciedade deveriam ser estudados fisiologicamente, porque de qualquer \~
modo a biologia nos conduz e, por conseguinte, nos governa sem- ~
pre. Quantos homens são ainda crianças em doutrina, tal como f
esses pais que são ainda crianças diante do ancestral! A metáfora f
do Pai Eterno é justamente como estes movimentos de vida que ul- '.í
trapassam de longe nossos magros pensamentos, anunciando-os mui- .:~
tas vezes, e sempre os regulando. ' ,~ :'.~·
Se procurarmos agora o meio-termo, encontraremos a escola.
Quem não conheceu a escola nada sabe de seu pensamento. Eis aí ·:~ .~.
i ~f.
um outro tecido de sociedade e um belo objeto para o naturalista. ~~\· ~­
Mas atualmente não se pensa mais nisso. A escola se completa ·;.~. .~~
por meio dos jogos, nos quais necessariamente as mesma.S idades se ~- ) .-.
encontram. As crianças ficam naturalmente reunidas e tão estranhas ~ · \
em sua república de jogos, quanto na sociedade de intercâmbios e _;, ·:
na sociedade familiar. Mas como tentar a análise exata desta outra ;~~-~ ­
sociedade, que não tem indústria real, que talvez. nem mesm~· tenha '·' ·;,;.
afeições reais, e q'?e por algum tempo costuma escapar às necessida- '
des e às mais durns exigências? Te.mos sempre presente que o de-
senvolvimento do espírito nada tem de trágico, e que o próprio ·:+ ~ -
jogo conduz naturalmente a um pensamento de jogo, que escolhe ~:;? ; ·
e limita seus problemas, e nega as conseqüências. É certo que ..:(L~
a cr~ança que faz um erro de cál~ulo não fica arruinada por isso. .~ ::." '
Aqui o erro tem o seu lugar; hmpa-se o quadro-negro, e nada :i~:

5.. No . original qu' on l' é leve. Aqui, como em outras passagens (come> )
na p~g. l~, in fine), o autor usa élever ao mesmo teml?O ÇQffiQ ~levar e :
co~o}educ;~.
~ ..
i;.;·..,,.9(). ·- .
.111;;
\porta se fechou, ,ela se calou. Tornava-se ~scolar pela força da ~
••· 1'.;- · '1

·· .; · li\·~nstituição. ~ que um tipo d~~Jfer~nç~-~--q1:~ para o mestre é de l


\:
.,.
'-.,,\ "
....
§' ~fício, age prontamente, como um clima .

~~'." \--;~~~i~~~. -~~i~~..~ ·s~;ti~;;t~.


(..· .....~ ~:
C) ~) -•, •
Mas não esperemos dele servi-
"·. ;.•
. ços que não pode prestar. O tirano pensava que Guilherme Tell
\ ...
. .-·[·\ -. :
(1X/
. /
r '
tremeria por causa de seu filho. Ora, aquele que explica é como
um atirador de arco; não é necessário que o alvo seja de grande in-
teresse. ~o J!l~:l! __~ntend~r . o ..bom mestre é bastante indiferente, e
---
/

deseja sê-lo, exercita-se por sê-lo. Um pai pode dizer a seu filho:
"Faça isto para me agradar", mas contanto que não se trate de
prestar atenção, de examinar, de compreender. Porque, coisa es-
Todos nós sabemos que os pais, quando se imiscuem, instruem tranha, a boa vontade excessiva, o ardor, a vivacidade, coisas que
muito mal os seus filhos. Já vi um bom pai, que era também se assemelham, enfim, à paixão, são totalmente incompatíveis
um bom violinista, cair em acessos de cólera ridícula, e enfim com o exercício da inteligência. Quando um indivíduo nos toca
enviar seu filho a algum professor menos apaixonado. O amor não vivamente, por um motivo ou por outro, não estamos mais em con-
tem paciência. Talvez espere demasiadamente; talvez qualquer dições de dominá-lo pelo pensamento. :É: necessário usar inicial-
negligência possa lhe parecer uma espécie de insulto. Enfim esse mente o sentimento.
sentimento, tão apto a explicar os erros e a desculpar, g~~nçl9 se Y.ê. .
Por outro lado, o mestre não deve dizer: "Faça isto ou aquilo
na situação de mestre, torna-se · ainda mais severo do que seria se ..: : 'L
para me agradar". :B usurpar o direito dos pais. E a criança,
ensinasse a si mesmo. Mas não me surpreende que sejamos seve- :; t
ros para . com aqueles que nos dizem respéito:---·-pais--nã-o·-·soirios -~ ;. que tem em tal assunto um pudor extremo, logo sentirá todas as
também estranhamente seve11os em relação a nós mesmos? Um !z ~ provas de afeição como uma espécie de constrangimento injusto.
homem perdoa .com muito mais facilidade o erro de outrem. Mas ·~! '.~ O próprio tom da afeição desagrada quando provém daqueles que
a lembrança de seu próprio erro faz com que enrubesça, mesmo até l~ J! não têm direito de usá-la. Daí decorre o fato de que os sentimen-
dez anos depois. E assim se envergonha da ignorância de seu H tos paternos, em qualquer outro indivíduo que não o pai, tornam-
filho, como se envergonharia da sua própri;i ignorância. Perde .. :. se facilmente ridículos. Enfim, cada relação social tem seu ·ma-
todas as medidas, e as coisas não podem ir bem. tiz próprio; ao pai convém agir como pai, ao mestre como mestre.
-·. Alguns costumam ter escrúpulos; um pai teme amar demasiadamen-
Aristóteles disse que o sentimento logo tiraniza. :B preciso ..
te, um mestre procura amar. Creio que tais escrúpulos estragam
que vejamos dos dois lados. O pai imagina, quando percebe a fri-
tudo. :E: necessário que cada um saiba exatamente o que deve ser,
volidade do jovem, que seu filho não o ama. Mas o filho, por seu
e que a harmonia nasça das diferenças. A força da afeição está em
lado,
. compreende ainda menos que seu pai deseje forçá-lo.
, Ex-
. que, quando pede, .tudo ·perdoará. Ao contrário, a autoridade só se
penmenta todas as marcas do sentimento, e se não é bem sucedido, :-:· pode enfraquecer quando deseja adivinhar os pensamentos e provocar
desespera-se . . Há. um espírito de revolta e crises de paixão que ·~ os sentimentos. Porque se ela finge amar, torna~se odiosa, e se
;;\.
perturbam profundamente as famílias, e que a escola logo desfaz. . '.~ . ama realmente; não tem poder. Já observei, e este é um fato do
Vi· certa · yez 1,lllla criança . ser levada à escola aos gritos; logo ·qu~ .ª conhecimento dos que aprenderam o ofício, · que, logo que ..'~ ·:.:. d~iança

1 .... ·::.~.· ·~~·~i~:~{~::<~~


·. ':;'-:1.:~~..!'·3.-~tl·k:·.~~5:..tli"" ~
' ]111'
descobre o seu poder de afligir realmente o mestre por sua preguiça til'
· 111
ou por sua frivolidade, logo come9a a abusar. Pelo que sei, logo l i:
1
se inicia a desordem, quando a bondade do coração se ni.ostra. En-
fim, a escola não é de modo algum uma grande família. Na escola
mostra-se a justiça, que evita amar, e que não deve perdoar, por-
l
1
1

que nunca é realmente ofendida. -~ força ·do mestre, quando re- i


pr~ende, consiste no fato de· que logo ·-.no-instante seguinte não. pen- j
sará. :mais no caso; e a cri~nç(t () sabe. Il11'.Üto bem. Assim, a puni-
ção não . cai sobre aquele que a aplica. .Ao··contráriÔ do que ocor-
X
re com o pai, que pune a si mesmo quando pune o seu filho.

Sócrates 6 já observava que um pai, por mais eminente que seja,


não sabe instruir devidamente os seus próprios filhos. Vi um exem-
plo disso em uma avó muito instruída, que nunca conseguiu ensinar
à sua neta o cálculo ou a ortograf~a. Esse paradoxo irrita porque
os pais sempre estão dispostos a julgar que o mestre tem pouco zelo.
E espantam-se quando constatam, para seu próprio exemplo, que o
zelo não basta. Digo mais ainda, digo que .o zelo. prejudica.
É claro que o ensino ·é um ofício, como qualquer outro. Mas
também não creio muito nos procedimentos. Além disso, vi mes-
tres, e mestres que conheciam. o seu ofício, falharem com seus pró-
prios filhos, seja para o violino, seja para o .latim. A força .do ofí-
cio não está onde a procuramos; está mais abaixo. Considere-se o
caso de um mestre remunerado que chega na hora certa, e vai-se
embora também na hora certa; vai dar outras aulas. Aparece então
.·- :
aqui uma ordem inflexível e estranha. Não se leva em consideração
o fato de estar ou não. a criança bem disposta. Um mestre que se
apresenta na hora aprazada ·nunca será dispensado, a não ser por
motivos muito fortes. Assim, as aulas tomam o aspecto da necessi-
dade 7 • E é isso o que importa; porque a criança nunca se resignará
:~ '.'' a ficar séria e a prestar atenção quando tiver alguma esperança de
1·~-~
..,_..... ' '

. :· 6. O Sócrates referido pelo autor, nesta como em muitas outras passa-


.. , .. gens, é o que foi retratado nos Diálogos, de Platão, Especialmente na pri-
·;::{°.' meira parte desses escritos, nem sempre se consegue separar .o pensamento
;~~ .. dos dois filósofos.
·;..
-:r:.....
.'.1 ' 7. Termo usado no sentido filosófico de algo que não . pode .. ser de
·.· , ,·.. .... · '
,

.. ~:;' outra maneira, como lei do reat


:: :J)~ :,,.;~
.,,~·=- · '>! l ;. , ~· .,~.,;;;:~~t~;~i$&}~~;:~~1:~
• 1

mbém uma tentativa a fim de se ver até quando é poss{vel


perder um pouco de tempô. Todos n6s sabemos quê um pai que ro, e ta b
deseja fazer o papel do professor nunca será escravo da hora; assim, desagradar impunemente. E, como é eviden~e para am os. que a
. nao
ortograf ia - tem importância em comparaçao com, .o sentunento,
. , .
a criança não se prepara. Não estando· presa a uma regra que nunca
esse belo pensamento não demora a prejudkar gramat1ca, h1stona e
dá suas razões, nunca toma este hábito precioso de se dedicar intei-
ramente ao trabalho logo de início. Esquiva-se. Ora, a principal cálculo.
de todas as lições, e a mais importante, é a de que não podemos nos
esquivar diante da, necessid~de. Quem. aprende o sentido destas pa-
lavras é necessário já sabe muito.. ·
Outra conseqüência. O pai se alegra quando uma aula vai
bem; e com isso ele a prolonga. É ·ainda um grande erro manter
_a atenção além . do tempo:. fixad.Q. Os treinadores daqueles que se
·dedicam às competições de corridas sabem que nunca se deve ceder
a um certo tipo de entusiasmo que faz com que não se sinta a fadi-
ga. .O mestre pago talvez seja menos sábio, mas felizmente a ne-
cessidade exterior o convoca; ele se levanta com o despertador. O
que exfate de melhor para qualquer idade é o trabalho que não faça
uso do prazer. Fechamos o livro, passamos a outras ocupações, e
então é que a lehura repercute com sua própria força, e acaba de
amadurecer por unia espécie de falta de atenção. · Isso é aindà mais
válido para a criança.
Acrescentemos ainda o fato de que ..Q pai é exigente, e logo em
seguida impaciente, por mtiitas razões: é que ele espera muito, conta
demasiadamente com este · seu outro eu, que entretanto não tem sua
idade nem sua experiência. O pior é que conta com o sentimento,
de modo que qualquer erro é considerado. pelo lado trágico. Esta
criança, que mostra a leviandade própria de sua idade, logo é con-
siderada como não tendo amor por seu pai. Assim, qualquer se-
veridade lhe parece uma ho.r rível injustiça, Aliás, a própria crian-
ça faz o seu jogo; sabe que é amada; quer ser perdoada. Estes
pequenos · dr~mas, seguidos de reconciliações, esses sinais mistura-
dos de ternura e de despeito, passam a interessá-la mais do que a
gramática. Os sentimentos sinceros e profundos têm isto de te- : ,.·
mível: nada lhes importa a não ser sua própria vitória. Desejamos :.,·.'\
'(;

ser am~dos, sem contudo demonstrar· que o merecemos; tudo o que


lembr~.; uHiê'.·'~!9ça ou uma . recompensa é profundamente desprezado.
Eis. ·. pç r ·"q~~;:~~i~te uma certa vaidade em todo seµtimento verdadeí-
1<.. . . . .·:J·.}f;: ·\ . : •• , •\ • ~ ·<. • • • · 2~~·
·: 1

~ .< . . ·~.. !. . . • . "J'···.~··'!-·. ..:..~ ~~~.-.i..!


lia: mentiroso, menino maldoso, sem coração, e out.~as ~~isas · 11

.... desse gênero. 'r


1

Não sei como essa guerra havia começado; mas agora com-
preendo que ela durava por sua própria força. , ~ pai s~~h~va com
os meios de corrigir seu filho, e julgava necessano qualifica-lo sem

XI fraqueza; e 0 filho, interessado nesta espécie de guerra, não de_Drava


de se mostrar desobediente, mentiroso e brutal, segundo os Julga-
mentos paternos. Esses dramas foram esquecidos, e a criança ter-
rível tornou-se um homem semelhante aos de~ais.

Muitas vezes constatei depois, com as crianças e também com


os homens, que a natureza humana se m?lda com facilidade segun-
Meu irmão de leite era um garoto silencioso, engenhoso, e, ao
do ·os julgamentos de outrem, assim como se dá a réplica n~ teatro,
que eu soubesse, afetuoso. Eu não o deixava; juntos construímos
barcos, fabricamos pólvora e criamos bichos-da-seda. Não me lem- mas talvez também por esta razão mais profunda de que eXlS~.~~
bro de ter sofrido de sua parte alguma injustÍÇa;· nunca o vi tam- -espécie de direito de mentir para com quem nos julga mentir~.s~sl-~ ,
bém · separar se~s brinquedos dos meus. Enquanto estava comigo ·.. : . bater em quem nos julga brutos, e assim por diant~. ·A contraprova
sob o domínio de meus pais, tornava-se esquecido, aventuroso e muitas vezes é bem sucedida; não costumamos l?a.ter em al~ém . qu'?
imprudente como uma criança .comum; tal como eu mesmo. Mas está com as mãos nos bolsos, e não gostamos. de .enganar a con- .
obediente, polido e. conveniente diante do poder, tanto quanto eu. fiança verdadeira. E daí concluo que não devemos julgar apressa-
damente o caráte~, como se decretássemos que um é tolo e o outro
Quando estávamos em sua casa, e sob a outra dinastia, as preguiçoso para sempre. Quando um galé é marcado, ele adquire
coisas mudavam. Vinham cenas violentas e punições terríveis.
para sempre uma espécie de direito selvagem. No fundo de todos
Lembro-me de que seu pai quebrou sucessivamente mais de vinte
os vícios, há sem dúvida alguma condenação na qual se acredita. E,
soldados de chumbo para conseguir que ele dissesse bom-dia à sua
em todas as relações humanas, isso leva muito long~, já· que Q· julga-
avó; e ele não disse. Eu estava fora dessa guerra· privada, e con-
mento pede sua prova e a prova fortifica o julgamento. Procuro
tudo muito chocado com a cena, por causa dos soldàdos de chumbo.
Logo que ficávamos sós, nenhum sinal de aborrecimento nô g·aro- ~nca julgar muito alto, nem mesmo muito baixo, porque os olha-
tinho, e recomeçávamos nossas brincadeiras. Mas desde que o po- res e a atitude sempre falam demasiadamente; e espero o bem após
der surgia, ainda que com aparências pacíficas, fosse o avô, a avó 0 · mal, muitas vezes pelas mesmas causas. E nisso não me engano
ou o pai, devo dizer que era mal recebido. A criança terrível logo ...... .muito: todo homem é bem rico.
~

atacava, segundo as regras da guerra, fazendo abertamente o que Com isso, entrietanto, creio firmemen.te que cada indivíduo
era proibido, jogando pedras nas janelas, e servindo-se de palavras .... ".::,º
~ive e morre segundo sua própria · natureza, assim como o
injuriosas que comigo nunca eram usadas. Por fim, o garoto acaÇa- crocodilo é crocodilo, e não muda. . Mas . essa natureza pertence à
va preso a uma janela, exposto ao olhar dos transeuntes, com ore- ordem da vida; está abaixo de nossos juízos. ·};: um fundo de
tempe-
lhas de burro, ou então expondo sobre o peito um cartaz no qual ramento e como um regime de vida, que· por si mesma não encerra
~. ·
Ji
1· ~.?~ ·-1.:~_!E:. __Q__mal~.-nem--uma. _yJrtu4e_..nem._tim ví · • :~·
1

; ; , um modo inimitável e único d . . -- . cm,. . mas_ antes


. . .d - - ·· - ·· · e ser franco ou . ardiloso cruel ou c
;~n~:º·e:~:r:~uh~::~os;~raj~=e::~:ue existte be~·
.menos d~f=~~,:
vard encon ro, e o mesmo co-·
e em um outro, que entre dois heróis e dois covardes. ' .

XII
Os sociólogos 8 estudam os costumes dos selvagens e se admi-
ram. Por que não estudam os costumes das crianças? Esse povo
é mal conhecido. Todos querem julgá-lo de acordo com as crian-
ças que observam em suas próprias famílias. Erro de método, que
·um sociólogo, ·por seus prejuízos próprios, deve evitar. Na famí-
lia a criança não está em relação com seus semelhantes; está presa
entre pessoas mais velhas ou mais jovens, e movida por sentimentos
./ '.. invencíveis que são marcados na carne. Somente na escola é que
f.:· ·encontra seu semelhante e seu igual. Na escola ela é outra, algu-
ff
"1:·· .
mas vezes melhor, algumas vezes pior; diferente, digamos. E isso
·é o que quase todos os mestres ignoram. Eles contam com o senti-
mento, e o sentimento só pode ser muito fraco. Nunsa somos pais
por decreto. É verdade que uma criança isolada é comumentç po-
lida diante de um homem que ela não conhece. Mas quando são
reunidas crianças .da mesma idade, os sentimentos fortes nessa mul-
tidão resultam de .imitação e de contágio. Se julgarmos que esse ser
coletivo tem semelhança, em suas reações, em suas opiniões, em
suas paixões, com os indivíduos que o compõem, iremos de erro
em erro, e conheceremos o insulto contínuo, falando por cinqüenta
rostos.

8. É preciso que se tenha em conta que Alain escreveu a. maior parte


destas reflexões nas : primeiras décadas do século, quando os estudos· sobre
sociabilidade infantil eram pouco difundidos, por se encontrarem ainda em
·seus começos.

!'.) J
·'f, . .
l ':I~~ 11'
x,· ;1~-sação a criança também o ama; .e. principalm~nte •. a crià.·~Ça é a úni~a
Esse povo criança é capaz de amar e respeitar. Não inicial~t ,:. .
·-:~ ..,; em sua i a
'd de di'ante do pai · E toda a família,
<
h1erarqu1camente dis-.
mente por pensamentos, mas pelo . poder de todos sobre oada um:·~ i.{::' posta, é reguladora e testemunha. Cois~ digo~ de ~ota, esse p~dE
E esses sentim.entQs coletivos se imprimem tão fortemente que;:\i J:
paterno é totalmente incapaz de. in!1rmr; e isso e compreensivel.
mesmo na solidão, algo permam:cerá. Apenas é preciso inicial-:~~ .:t Por um lado, 0 erro de ortografia e tomado como uma ofe~sa do
mente que esta multidão esteja em ordem, e orientada segundo o J · coração; mas em éompensação, qualquer movimento v~rdadeiro d~
silêncio e a atenção. O silêncio é tão contagioso quanto o riso. :.· coração apaga 0 erro de ortografia. Nesta outra soc1e~ade que :
Mas se essa sociedade de crianças se dispõe mal para começar, tudo . a escola 0 sentimento não se conta; · em um certo sentido tudo e
está perdido, e muitas vezes irremediavelmente. O riso sacode até ·..f~ · _.., ~perdoad~·; em outro, nada é perdoado. .Aqui, não se mostra amor
mesmo os mais prudentes e tranqüilos: Assim, todos sentem qqe . ·. .._:_· ~.e· · nao - se espera por ele. A ordem que deve s~ estabelecer nessa ·1·
são as partes de um elemento cego como o mar; sentem logo que esta:):' ' sociedade não deve parecer de modo algum· com a ordem fami iar ·
força coletiva é irresistível. A polidez, que é um hábito familiar~.i" Mas seria necessário descrever com. seqüência estes costumes pouco
não tem · mais lugar aqui. A criança está em estado selvagem): conhecidos. Como poderemos admitir que nenhum sociólogo tenha
Isso já reduziu ao desespero mais de um homem estimável, devotado~ : pensado seriamente em tal assunto?
afetuoso. j~~ ·
O primeiro pensamento que pode iluminar o mestre, nessa difí-.:'/;(''.
cil situação, é o de. que não há maldade nessas desordens, nem mes- ::5:1: :,
mo por pensamento. São efeitos físicos, que r~sultam do número. · '. / ~
Esse pensamento, quando seguido; conduzirá á uma espécie de in- .:;~~ .~ .
dulgência e também

a uma espécie de severidade.
.
Porque não se.. •:·~.r."';. l.~;-.
trata no caso de pesar nem de julgar; trata-se de impedir. E se o ::·~· ~
mestre age como uma força física, diretamente oposta à desordem, . ' .
imediatamente triunfará. Não quero dizer com isso que. ele vá se
bater; aliás, não seria o .mais forte. Mas dispõe de punições muito
sensíveis a essa idade agitada, punições que são sempre suficientes,
contanto que sejam inflexíveis, à maneira das forças naturais.
.,,
Observei, quando era criança, que aqueles que mantêm a or-
dem como se estivessem varrendo, como se estivessem arranjando
objetos materiais, eram logo temidos por esta indüerença, que tira-
va qualquer esperança. E, sem exceção, aqueles: que queriam per-
suadir, escutar, discutir, perdoar enfim às promessas, eram despre-
zados, vaiados, e, coisa triste de· ser dita, finalmente odiados; en-.
quanto os outros, os homens sem coração, eram fi.iialmente amados.
A situação de um pai é totalmente diferente. Por um lado,
ele ama o seu filho, e a . criança sabe disso. A criança tem este te-
mível meio de punir seu pai ; obrigá-lo a· punir. ·. Mas em compen-
. 33
1:r '·
' 'i

i.:! _,' mas sem qualquer deus exterior. Esse povo tem seu próprio deus;
'1 ) adora suas próprias cerimônias e nada mais; é a bela idade das re-
.'
• 1
ligiões. Os profanos causam escândalo quando ·são espectadores;
'i
e mais ainda quando se misturam nos jogos: o hipócrita não pode
enganar aqueles que têm fé. Daí ocorrem movimentos de humor

XIII
incompreensíveis. Lembro-me de um pai indiscreto que queria
~: brincar com soldados de chumbo com as crianças entre as quais eu
'.·\:"·::estava;· eu via claramente que ele não entendia nada; seu próprio
·· filho demonstrava mau humor e estragava tudo. .~ pessoas gran-
des-minca. devem brinçª-t ...COfil__as__ç.r,ianç.as..- .Parece-me --.qüe õ--p:ar-
.· tido mais sábio é ser polido e reservado para com elas, como sería-
1
,1 O ~lefante, em Kipling 9 , puxa corda, arranca piqruetes, 'respon- . mos para com um povo estranho. Quando uma criança se . vê se-
parada das de sua idade, só brinca bem sozinha.
de aos apelos . noturnos, ~ corre nesta dança de elefantes, cerimônia :,
~
1
que os homens nunca vrram. Em seguida esse fiel amigo do ho- _· A escola é, portanto, uma coisa natural. O povo criança nela
mem volta .ªº seu cercado. Assim também a criança, exilada de ; se encontra em sua unidade. E aprender é também uma cerimônia.
se~ povo, fica atrás da janel~ fechada, escutando o chamado das · Mas é preciso que o mestre seja estranho e distante. Desde o mo-
cnanç.as. A ~ria~ça é ligada ~ sua família por elos muito fortes; mento em que :ele se aproxima e quer passar por criança, há um
mas hga-s~ tambem ao povo criança por relações que não são me- escândalo. Como se um profano entrasse em uma sociedade se-
nos .n~tura1s. Em ~ certo · sentido, ela é menos estranha no meio creta. ,_Q . povo ci;iap.ça tem suas leis sagradas, e guarda-as para si.
das cnanças que em sua família, onde não tem iguais nem se _ Este elo tão forte e~tre--oscarnaradas dê jogõs--prende até mesmo o
lhantes E" 1 me
· · . is p~r que, ogo que consegue roer a sua corda, corre homeip. feito, e de certa forma ele logo se torna amigo de um outro
par~ . a brmcade1ra, q~e é a . ce.ri~ônia e 0 culio do povo criança. homem que não via há vinte anos, e que quase. não conhece. O
Felicidade plena, entao, de 1m1tar seus semelhantes e de perceber povo criança cresce assim e torna-se povo de homens, estranho aos
em seus . movimentos a imagem de seus próprios movimentos. ,,
que são mais velhos, estranho àqueles que o seguem. A conversa
.-
j Ein .sua família ~· cri~nça não é ela mesma· pede com um irmão· mais velho é sempre difícil; é quase impossível corr
l tado· iiruta o - ~ d ' tudo empres- ., ,1
um pai; é mais natural com um estranho de uma outra idade; mai:
1 . ' . que nao e e sua idade. Disso decorre um enfado
natural com um professor de língua ou de ciência, ou de literatura
j a~tado, que conhecemos mal. Aqui a . criança é como que estran- ·'
'
'

porque o mestre conhece e mantém as ·diferenças, enquanto que un


1 .ge1~a, ~porque nã.o experimenta nem os sentimentJos que lhe são
irmão ou um pai desejam se aproximar e compreender, e logo si
l atnbwdos, nem os que ~la mesma. exprime. _o que se deseja cha- ' ,.
irritam por não o conseguirem. De modo__g_l,!_e__.Q__ mestre se torn:
1 ~ar de m~ldade em certas crianças é sem dúvida somente impaciên-
embaixador e negoclad~I-..~~re o poy9__J2-ªLe .. o ...pQy~-criaiiÇa~--
j
i
c1~ po~ nao poder romper a corda e ir encontrar-se com seu povo
criança. · Esse pov~ é ateu e religioso; tem ritos e preces nos jogos, -- ·---- ----·· ... --- -- -

9. Referência a Rudyard Kipling (1865 1936) · ·


1 cupações tipicamente vitorianas t - , escritor mglês, d~ preo-:
:
~ ·. ;'4Livro da i.f,;;!1, Mi:u'"::'o.
conhecidas t da 1 , omou, como assunto de suas obras mais
da lndfa, então •Ob dominação britânica. Cf.

- '
3
i /

muitas vezes são recompensados, e outras vezes são punidos; onde.


o curso do tempo desvia e carrega, porque é necessário seguir os
movimentos da fortuna, e criticar o violino quando se ganha a vida
tocando flauta. :E: que os acasos humanos pesam demasiadamente

XIV sobre cada homem. Os encontros fazem os negócios, e a ação..


corre à frente do pensamento
.... ~
.
~-~i~~ncia_ do....pnv..o.....criança....encontra ..se___ entã9_ .fora._desse.. fil~"'.
vimento
::f~- agitado.
-- -.. · · ·- --·-·· . .
O homenzinho, carregado com seus livros, . atra-
vessa os acontecimentos da rua, e encontra outros acontecimentos,
ordenados ao seu tamanho e de acordo com a sua expectath;a, ver-
O· povo criança vai se reagrupar, e abrir novamente seu par-
lamento de dez meses. são ou problema. E os programas não são coisa pequena, porque
são seguidos. Ora, não há um homem vivo, já saído dos estudos,
A família, nesse tempo de férias, esgotou seu poder de pensar, que tenha alguma vez podido seguir um programa, e passar de um
que não vai longe. Porque, pela troca de sentimentos afetuosos problema a outro segundo a ·ordem da dificuldade crescente. Os
cada um fica fechado em si mesmo, exercendo seu poder de escra-' acontecimentos folheiam o livro de trás para diante, sem nos dar
vo e usando de seu humor sem precaução, o que faz com que o in- tempo de acabar o capítulo, ou pelo menos a frase. Mas na escola
ferior governe e com que o tédio reine. ~--ç.ri-ançª, .. _gµ~ _n~~ tem ~ ;.L encontra-se ainda esta preciosa condição cujo passo é regulado pela
1 .-~-~ yp.ações, improvisa em m..~io a obstáculos, sei;gI>r~-P~rturbada ·pela· --.;~~ ·iJC massa dos iguais, de modo que a elite revê o que já sabe, e cura-se
·-~~!:~~v~~~~.: Mas ei-la - quêvãC-voÚ~ às su-;~ .. ocÜpaçõ~'. { ~· assim da surpresa. Em todos, uma espa~tosa · segurança, por este
1 próprias, e encontrar novamente seu pensamento em seu parlamen- !1 '. ;~ socorro que não é suspeito, e esta confirmação de todos os instantes
to. Dizer que a escola convém aos pensamentos de infância. é ainda misturando convicção e persuasão segundo os meios de cada · um
dizer muito pouco. Porque é bem possível que só haja pensamento Para as menores coisas, para um verso de Virgílio ou 'para um cál
na escola, e que nossa sabedoria, depois, seja somente a lembrança culo, a opinião verdadeira se estabelece, com o ·auxílio do. mestre
desse belo tempo.
pela união das provas e do rumor público. E agradável passar ai
A experiência instrui pouco, mesmo quando é conduzida segun- lado de um grupo de escolares que caminha em direção à escola
do o método mais severo. Ora, quem portanto · interroga assim a discutindo e comparando, a propósito de um particípio ou de ur
n~tureza? Ta!v~ algum professor, reconduzido à sua própria infân- peso específico. Cada qual puxa o seu papel, e algumas vezes u1
cia pel~ assembleia do povo criança, mais possante então que a as- hesitante corrige o seu sob a fé das au~oridades, que são tambér
sembléia acadêmica, onde a intriga, a adulação e a preponderância garotos, sem majestu...çle nem borla de doutor. Este feliz estado d
dos velhos doentes e atrabiliários logo fazem com q1Ue se es- espírito h~mano nunca mais se repetirá. Nem mesmo dois profe:
~~eç~ a experiência _sã e o cálculo honesto. Em geral, é a · expe- sores reunidos têm tamanha boa fé, nem uma tão pura consciênci

·l nencia humana que substitui a outra, a experiência humana, na


qual nada 'é bem sucedido de acordo com o razoável, onde os erros t "•

.
.,
dos valores verdadeiros.
O povo criança-feFja...Jdéia&.;-Q._J29VO dos__homens faz·-delas,. e
--=------ --···-·;"' .
~'
é> ·. 36 ~ ··~ · ,!
i.:·•
' seguida,
..._ _________ o que pode, muitas vez~_§__J1atendo.--COJ!!___~ tenaz, muit
- -· --- ------ ·----- .. ______ /
·~. . ' 1
l' vezes torcendo fracos cinzéis para cortar 0 ferro. Por causa dessa
pressa. d-~ que e~ falava, p~_~us!._9o _~n;iprevis_to, _,pela _aflição.,: E
essas ideias torcidas são algumas·- vezes muito belas, trazendo jun-
tas as marcas da guerra e a linha do espírito. Eis por que as lom-
badas dos livros de aula são ainda algUmas das melhores coisas que
tem9s para considerar. Lembran~a e recordação.

-·\ ;·,
X\7
·. ,
') ~ '

·~ ·.j·f
.:f ~~~I

Esse pânico de crianças e esse afogamento levam-me a pensar


que a escola, que é propriamente a sociedade das crianças, é e deve '~ 1

ser separada da natureza. A escola requer jardins, isto é, uma na-


tureza desenhada, ordenada, limitada pelo homem. · Toda a ativi-
.;1· dade se desenvolve então no trabalho escolar e no jogo, sem qual-
quer preocupação real de produção ou de defesa. Essas condi-
·'
ções são reguladas pela própria natureza da criança, que é absolu-

r tamente sem defesa contra as paixões.. Um desespero de criança


logo ultrapassa qualquer medida e levaria à convulsão, se uma
1 força superior, que é a da mãe ou da ama, não a tirasse da terra
indiferente, exageradamente severa para essa idade, e não a enro-
lasse novamente no tecido humano do qual ela acaba de sair, do
qual se espalha, sobre o pequeno ser, com o calor e· o amor, o forte
remédio das lágri~as e do sono.·
Vendo uma criança levada ao colo compreendemos esta justa
proporção entre a infância, que não sabe viver, e a humanidade, que
protege a infância; Vemos também por toda parte, no trabalho, e
mesmo no movimento agitado de nossas cidades, a criança feliz ou
a criança adormecida, transportada, carregada, tão tTanqüila neste
gesto envolvente quanto em seu berço. Esta sabedoria da criança
nos engana; ela pertence a nós, não a ela.
O povo criança é belo de ser visto na escola. Aí é que a crian-
-,ç a encontra uma força conveniente à sua. Mas, se observarmos
bem, perceberemos defesas e barreiras contra todas as ameaças ex-

t
·C
ternas. A criança brinca no barco ou no veículo, mas falta a água,
' ..
faltam os cavalos e a curva da estrada. Desde que a criança
encontra em relação com uma força real, ainda que seja no carro ~J
puxado por cabras, é preciso que tudo seja organizado e medido, e
que, enfim, cabras, vekulos e crianças sejam dominados pela força
superior das amas e dos zeladores. Não se concebe um bonde de
ver·dade, ainda que . de dimensões reduzidas, servindo de brinquedo
para crianças, e do qual elas fossem os condut"Ores, os passageiros e os
viajantes. A força mecânica, que é cega e desumana, não se presta
à brincadeira. Ou então é necessário que os brinquedos mecânicos
sejam muito pequenos, e que o pezinho possa derrubá-los sem es-
forço.
o psicólogo discorria seguindo a inclinação, como um ~egar_o.
Na própria natureza, e sob as condições normais da vida hu-
mana, o povo criança é um monstro, pelo medo, que é a primeira "Só a experiência, dizia ele, pode nos instruir. A obse~~açao nao
das paixões e talvez a malª oculta de todas. Uma assembléia de nos levaria longe se não tivéssemos aprendido com os oflc1os a arte
crianças supõe um terreno plano, sem segredos nem armadilhas, e de modificar os fenômenos naturais, produzindo por nós mesmos
no qual tudo será brincadeira, Desde que apareça a ameaça, é mudanças bem determinadas das quais medimos os e~eitos. Que_ é
preciso que a assembléia de crianças seja dividida, e governada de um físico, que é um químico, senão um homem que poe em questao
perto por um bom número de seres mais firmes, que não trocam os objetos, rompendo-os, pulverizando-os, submetendo-os ao calor
medo por medo. Essa justa proporção entre natÜrezas reguladoras ou ao frio? Sem estas inumeráveis tentativas, teríamos alcançado a
e naturezas reguladas é oferecida por essas famílias numerosas que lei oculta? Do mesmo modo a psicologia só se elevará à dignidade
afrontam os perigos comuns em uma viagem a Meudon. Devemos de uma ciência quando submetermos o homem a experiências pre-
lembrar ainda aqui que as crianças não têm todas a mesma idade paradas. Os médicos já procurar~m muito por esse lado; infeliz-
e que o filho mais velho encontra naturalmente uni grande reforço' mente, eles só consideravam os loucos. É preciso que os e?ucado-
de razão e de coragem em seu papel de protetor. A escola, ao con- res submetam também as crianças das escolas a experimentações. e
trário, reúne crianças da mesma idade, o que provoca uma bela paz,
contanto que sejam mantidas as condições próprias à escola; mas l provas, a fim de que se possa enfim apreender algo de positivo so-
bre esta natureza humana em sua infância, que eles conhecem mal..
surgem também terríveis pânicos, desde que o elemento desumano
. apareça. De maneira muito sábia, nas grandes escolas, já costumam
l Sem essas investigações metódicas, perderão seu tempo. Para ins-
truir a infância, é necessário, inicialmente, conhecê-la." Que dizer
ser também instituídos exercícios de fuga tranqüila, comandados pelo
grito: "Fogo". Assim substitui-se a autoridade habitual dos mestres,
t contra isso? A evidência é nossa cabeça de Medusa.
oSociólogo de óculos terá, entretanto, o se~uinte a dizer: "Se
fonte de confiança, pelo poder desumano do fogo, e principalmente
os conhecimentos humanos tivessem sido formados na ponta de nos-
pelo medo, rei dos poderes desumanos. Daí talvez perceberemos que
a escola é uma sociedade de um determinado tipo, bem diferente da
1 sos dedos, como dizem vocês, o problema humano seria bem mais
simples do que é, e isso me alegraria. Infelizmente, i~so não ocor-
família, bem diferente também da sociedade dos homens, e que tem
reu. Em todos os povos antigos vemos que os oflc1os chegam a
suas condições próprias e sua organização própria, bem como seus
uma espantosa perfeição, ao mesmo tempo em que os artesãos per-
cultos. e suas paixões próprias. Belo tema para o sociólogo.
( 1 1

manecem atados às n:iais ridículas superstições. Poderíamos


cluir disso que o objeto que muda sob as mãos não instrui.
chamo a sua atenção para uma outra prova universal. A primeira ,'1:.
éiênda, e da qual ·s aiu a primeira idéia da lei natural, foi por toda ;~>
parte a astronomia; e os objetos astronômicos são justamente os j,;
únicos que estão fora de nosso alcance e que não podemos mudar. · ·:;
_Assim o astrônomo .-foi protegido contra esta curiosidade indiscreta, ·~k
que muda o objeto em lugar de considerá-lo com paciência. E ain-
da agora a experimentação', da qual. vocês fazem tanta questão, só
1.;'.,:

XVII
instrui o homem prudente e formado pela astronomia, isto é, aquele
que observou muito t~mpo. Se é perigoso, para quem quer instruir,
alongar muito rapidamente a mão, que diremos desse olhar psicólogo
que muda o objeto humano sobre o qual se detém? E desconfio o ensino deve ser resolutamente retardatário. Não retrógrado,
ainda mais dessas experiências que logo agitam seu tenro e frágil muito pelo contrário. .E para andar no sentido diteto que ele recua.
objeto. ~ preciso observar o homem com o canto do olho, e sem Porque se não nos colocarmos no momento superado, como superá-
avisar. E é curioso que vo~ês observem a infância de hoje, que, .Io? Seria
' um louco empreend'imento, m esmo para um homem em _
com 'as palavras da língua, aprende em alguns meses a sabedoria dos toda a força, tomar os conhecimentos em seu último estado; ~ao
séculos, quando a infância da espécie se mostr~· sobre foda a ·terr·à. . ., teria entusiasmo, nem qualquer esperança razoável. . v:endo..so a
em séus templos . e seus deuses". insuficiência por toda parte, aposto que ele .se veria ~a 1~obill~~~~
irroniana 10 porque, compreendendo tudo, nada afirmana.
Ele se calou e limpou os óculos. "Àgora, disse, tenho ainda
outra coisa a dizer, não como sociólogo, mas como professor, porque ~ontrário, q~em acorre das idades antigas é como qu~·;_la~çado se-
gundo 0 movimento exato. Sabe vencer. Essa expenencia faz os
aprendi o· ofício. ·Vocês dizem que é preciso conhecer·a. criança
espíritos vigorosos.
para instruí-la, mas isso nao é verdade; direi . antes que é preciso
'.instruí-la para conhecê-Ia, porque sua verdadeira natureza é aquela . A Bíblia anuncia muito, e mais ainda se~undo o espí~to que
desenvolvida pelo estudo das línguas, dos autores e das ciências. . segundo a letra. Porque não podem.os parar ai. Mas tambe~ log~
· b mos que não vamos ·_parar. Este pensamento selvagem e abs .
. _ homens su~
Formando-a no canto é que saberei se ela é um musicista."
sa e rochoso abrupto,
trato, .--·---·tem f uturo. E J'á 'q ue tantos
·?:·
raram a ant I6 a le'i, cada um pode se dar a perm1ssao de nela acre- de
ditar: E assim é .que será 'ievada à maturidade ~s~ pro~essa
. dem melhor. Falta-nos, para sermos cnstaos senamente,
uma or . .. 'alm f ·
-'..i termos sido· pagãos ou judeus. Quem não é rmc1 ente anse~,
como poderia se curar de sê-lo? E também quantos hom~ns .s ao
~

,.
'· fariseus quando velhos! Tal é a marcha retrógra~a'. . Isso e ~
0 direito nos faz sentir, porque o direito nunca é suficiente, e isso
qu:
.- ~.

." 10. Alusão a


Pirro de EÜ~ _(360~270 a.C.),· fund31dor :~a ~:ti~a~~~;
cismo. Defendia a suspe_nsão do 1u1z~ sobre todas as colSas, P .
j;;.·
:·~·: a de8ejada imperturbabilidade (ataraxza).
• I ' • t

bem fácil de ser compreendido. · Mas também esse : amargo pensa- ./'J:
mente a nada conduz. É o jurista que muda o direito para melhor, :::
justamente porque o · conhece, porque acredita nele e porque a ele
está ligado. .'f: pela suficiência, e não pela jns_yfi.ciência,- -que--uma_ :~~
idéia promete outra. Diante da espécie, o juiz de paz pensa algo ''
de novo, pela própria força doutrinal; assim se faz a jurisprudência,
bem mais forte e de muito maior alcance que a ironía do litigante.
_A criança tem necessidade de futuro. ~ Não é a última palavra
XVIII
,.
do homem que lhe deve ser .-dada, mas antes a primeira. Isso é o
que fazem de modo maravilhoso os antigos autores, que deveriam
ser chamados Profetas. Eles nos dão a amêndoa, para que a que-
bremos. A virtude das Belas-letras consiste no fato de que é preciso . b saber Quando um professqr começa a expli-
Existe sa er e · " · e de-
ouvirmos o oráculo. E não há melhor modo de nos interrogarmos . d 0 céu descrevendo inícialmente as aparencias,
car as c01sas • " dos astros muitas
a respeito de nós mesmos, como anunciava o frontão de Delfos 11 , finindo o leste e o oeste pelo nascer e pelo por , 1-
Nas ciências, ao contrário, acontece muitas vezes que, pela perfei- . a dÍzer· "Não é verdade que o Sol se e
vezes surge um gun par , · . . disse" Esse tipo de
ção ~o resumo, não vemos mais o obstáculo. Em um elegante cur- vanta e se deita· a Terra e que gira, papai me .
so de mecâníca, nada se detém. E perguntamos: "Para que serve ber não tem ;emédio, porque ·aquele que sabe tão prem,..atu.ramen-
isto?", em vez de indagarmos: "De que pode isso me livrar?" O sa Terra cnra nunca dará suficiente atenção às aparencias. ~
contrário ocorre em Descartes 12, como podemos ver bem, porque ele te oue a e>· T - 0 pode de1-
se lhe falamos da .esfera terrestre, forma a~x1 ~ar que na , . não
se engana e se desengana; bem mais perto de nós. Mas Tales vale ara descrever as aparencias, pensara que .
mais. Sócrates tinha .essa arte de levar qualquer idéia à primeira xar de ser usad a P . na
, . recurará, em vão, naturalmente, a ordem co~ermca, '
infância 13 • .'f: bom pensar a respeito dos líquidos com Arquimedes, e e assrrµ, e lpa seria vista de u ma estrela. A ordem copermcana e a
sobre o barômetro com Pascal; e até mesmo esta confusão que per- tal como e ,. 1. , · d 01s.
Mas julgo que são necessanos · o u três
manece em seus raciocínios não é ainda bastante nossa. Aproxima-
se, todavia, de nós. Os antigos possuem o novo; é o que os moder-
::r!a~: ~~::!:~~: :~guidas, e, segundo as aparências'. antes~ de s:
'd' . do sistema solar. É um mal irreparavel,
nos muitas vezes não têm, porque sua verdade não está no nível de formar realmente a 1 eia ·
muito comum, -duvidar antes de se ter certeza.
nossos erros. A Terra gira, isso é velho e gasto; o fanático não
vê mais aí qualquer dificuldade. Mas quanto ·a isso será menos O público se instrui mal, porque imagina que a última verdad~ é
fanático, ou mais? Eu não saberia dizer. - ·-- , Mas a verdade não pode ser derramada assim
0 que lh e convem. . f 1 d
de um espírito para outro. Para quem não a ~onqmsto.u a .ªn ~
· 11. O Templo de Delfos, dedicado a Apolo, trazia em seu frontispício
a inscrição: "Conhece-te a ti mesmo", que era como uma advertência ao das aparências ela nadá é. Quantas pes~oas abriram os - 3orna1s d1":'
homem a respeito de seus próprios limites. Fonte de inspiração do pensa- zendo: "Vejamos um pouco se o princípio da conservaçao da en~r.,
mento de Sócrates. ". ---._ . . d d . ,, Ambição vã . . Não podemos renunciar
· 12. Referência ao pensamento cartesiano, que a ntes de alca nçar a cer- gia con tmua ver a eiro · . . . . . , .
teza, se exercita na dúvida (dúvida metódica) até ão exagero (ÇlúVida hiper- àquilo aue não temos. .'f: preciso posSUlf lDlClalmente O pnnc1p10,
bólica). Cf. Descartes, Primeira Meditação. ·,
13 . . Sc)crates, que lutava contr~ a~ falsas competências, principalmente e tentar -com milhares de exemplos, para que s:_ possa ap:mas co~~e-
as di1>s,(:minadas pelos Sofistas, propunha aos seus interlocutores a volta ao · ' · 0 , chamado de degradaçao,
ber o segund o prmc1p1 .· que
. . nao
, .. destro1 o
estado de ignorância original, como . ponto de ·partida · de qualqúer .indagação. .. . :.'.
' 1

11. •.- •• • :J\ :-:..


' ' '• ·' 1 '
'primeiro, e que não tem qualquer sentido sem o primeiro. f: preci- ( '
, \
so ter aplicado ambos muitas vezes, para que se possa duvidar .de -
um ou de outro. A dúvida é uma passagem. Para experimentá-la,
é preciso sentir inicialmente sob o pé uma inquebrantável resistência. \: \

A dúvida é o sinal da· certeza.


L
XIX
\
Considerem atentamente Descartes 1 4, o mais ousado duvidador \
que já existiu. Poderíamos dizer na verdade que duvida ainda
\.
menos que o ébrio, o delirante ou o louco. Porque diante desses ( .\ .

pobres espíritos o mundo se desfaz a cada momento. As aparên- ,, \ ·J 1


cias tomam mil formas; é como um caos, do qual os sonhos nos dão 1 ·. \

.
alguma idéia. Mas também ninguém desejará dizer que esses es-
píritos fracos estejam em estado de duvidar. E de que duvida- ' .familias a escolha de
Acho ridículo que se dê às crianças e as
riam? Ao contrário, vejam que Descart~s duvida, ao lado àe sua aprender isto antes daquilo. Ridículo também que se acuse o Es-
lareira, mais desperto, mais liberado de qualquer paixão, mais se- . . uil Ninguém deve escolher, e a
tado de querer impor isto ou aq o. _ . .
guro deste mundo sólido que qualquer homem. E, guardadas as escolha está feita. Acredito que Napoleao expnmm em duas, pa~
proporções, eu diria que o célebre Poincaré H 5 bem podia duvidar do lavras o que todo homem deve saber da melhor fori:ia poss1vel.
movimento da Terra, porque inicialmente e por muito tempo . 1 t'm Ampliemos. compreendamos por latim o estudo
havia pensado intensamente a tal respeito. Mas isso não faz com t ;... geomet na e a i • • . · E t-
t~~ ,.. . · 1 · t de toda a poesia humana. n ao,
das grandes obras, e prmc1pa men e
· que qualquer guri possa se levantar do .seu banco para dizer: "Não
está tudo dito.
é verdade que a Terra gira, isso é só ~m modo de dizer". Há um
caminhar de idéia em idéia, e finalmente para além de qualquer idéia, /( A geometria é a chave da natureza. Quem não é geômetra
que cada espírito deve seguir por sua conta, sempre com o cuidado nunca perceberá bem este mundo em que vive e do qual depende:
•~ ,1
de construfr a verdade, mas pouco curioso de recebê-la. Se essa sa- Mas antes sonhará segundo a paixão do momento, enganando a si
bedoria fosse melhor compreendida, quase todos os homens, diante mesmo a respeito do poder antagonista, medindo mal, cont.and~
dos paradoxos de Einstein, diriam como digo: "Ainda não che- mal nocivo e infeliz. Não quero dizer também que se deve :ns1-
guei lá". nar 'toda a natureza, ri.ão. Mas regular o espú:'ito segundo o objeto,
segundo a necessidade claramente percebida.. Nem mais. nem me-
não tem qualquer idéia a respeito da necessidade geo-
nos. Q uem 'd d
métrica, tem também deficiência da própria idéia de necessi a e e:-
terior. Nem toda a física e toda a história natural juntas poderao
~\ : suprir essa deficiência. Pouca ciência, portanto: mas uma boa
;'·
l
"'"
(•
.
'
ciência, e sempre a mais rigorosa prova. Q __q-y_~,. e bel~ .!l..ª--g~Q.:t;Q.~­
tria é que há_·-~~tá.:~.<:1-8... ~~-)?.!'.PY.~.~'--~....~lg2.. 9~__ç}~o e ~a~io em t~das
!
'.
~~ ·····-·-· .. ·-·· .... ·· · ··--··· · f · ma portanto nos deem hçoes de coisas.
14. V. nota 12. .
·~- \.
·~ ' .,.: elas. Que a es era e o pns , , . .
15. Referência a Henri Poincaré (1854-1912), matemático, físico;:mate-
mático ~. ·. filósofo da .ciência francês, a quem se devem importantes contri-
i!' '"
~ !
-A-~em? A todos. f: bem curioso decidirmos que. .uma .cnança
ign~rará a geometria porque tem dificuldade em. ,coe!17r~~11dê"'.la; .
buições nesses campos especializados.
. ;;.,.·;.
~:.~ . . .·-. .-ª
~::;~~~~:~ ~\~~ ~~ ~
este é, muito pe1o contrário, o si~al de que se deve fazer paciente-
mente com q~e ela penetre na g~ometria. Tales não sabia toda a. ·~·~
n~;a geometria: Mas o que ele sabia, sabia bem. Assim, qualquer :~,
v1sao da necessidade será uma luz P.ara toda utna vida. Não con- .-·
tem por.tanto as horas, não meçam as aptidões, mas "digam apenas:
"E: preciso".
1- A . ,
·
poes~a e -ª ·-~~!!'!:.~ ..9~--2~9_e~).!E!!!.!:l.na, e,___ ~9!11º j§ disse muitas
vezes'. o e~~QQ __ Q_'!._ ah~a. _.~~~- _i:iã~ ..~ __ pgesi~----~<.?~ feÍt;·--~~ ~i~~~.
/
XX
especialmente ar a · ' · -·- ···;·--------·
-.-- .. . __ ·--..R-..ª-..__ __'.' _ -:-C.!_~!?S~:S.'. _Ao contrar~<;>_,,._~ ___!I,l~ls ~lt_ét poesia,
a 111a1s_ ~enerad?.:_ Muitas vezes se diz que a criança não a c;;~-=:-·
preendera. É verdade que inicialmente ela não compreenderá.
N!_~~·- Q...~~<?.:1" .da poesia cons~!~to, e~ cada leiturà: inicialmente, O garoto que mostra aptidões <?U tão-somente um gosto acen-
do um modelo h
..
~1!!5'.~...c:!~-~-Qs_..1.!!~LU.!!~,-- -~~ª n.9-~~·:· g_i~p9.~-e~lc:>s __s~:ms-e __ p~IÓ-ritnio, segun-
· · · -- - - -- - - ---- ·--
tuado pelo estudo é log~ tirado de sua cidadezinha. Cada qual ql,ler
-:·--·-·--·- -----.. ·-·--·· - ... .. E.1!?:~-~-º--~-º..!Y..e:!.sal. .E isso é bom também para a levá-lo adiante à sua maneira, e ele é celebrado pelas comadres. É
cn.ança. Como aprende ela a falar, senão regulando sua natureza um belo traço do homem esta admiração diant~ de u~a criança que
~~=aluse;u~do este canto humano que escuta? __ !:~Ç~!1.?--~.. -P 9 !".~~-1?:~.2. talvez seja alguém . Os condiscípulos também fazem um belo coro
... _________,q:· .~~ .e.c1t.e escrupulos~rneI?:~e. __ 2 _!.?_~_lC?....s'.~!!!9~. _,,/~·§.ê.i.fil..~~-mi~ . ---!"-~_fil!­ nesses 'louvores. E conheci pess~as que, mesmo depois de passados
lando 1 ~1f.ial!n_~!!!~..-~E..~~---P~-~x_9_es,,, __~I~.Je _P<?~ _em seguida em situa("ã-o · sessenta anos, ainda tinham orgulho de terem. sido coleg~, elas, pes-
de com reend · - ·-·· --- · -------·-·------=-
_____JQ!____ . --~r .. ~q_c)_~s ...a_s pa1~.o~s, elevan<:lº-":_~_e. .. _lgg9 ao sentimento soas medíocres, de um homem bem sucedido. Assim todos pro-
mmtQ ·-º~--Q!J.se!_vaçã<:>. _tje __o.n.9-~. :~.~. -<!:~~~~!?!:~__!c_:>_~~--~- .. P.~i~~g~~~-h~~-;~;: ' curam o gênio e falam muito a seu respeitó. Todos nós · conhece-
Ma~ a criança é grosseira e como que selvagem? Indifer~-~; a mos gente desse tipo, pessoas boas, mas que so se enganavam por
essas colSas? Não acredito. A grande poesia tem efeito sobre to- esperar demasiadamente. Em suma, as bolsas nã? faltam, os bolsis-
dos.~ .os mais rude~ garotos querem a maior poesia. f: 0 melhor tas é que faltam. E assim são procurados os can<;lidatos para as altas
remedro con.tra a careta, que . é uma espécie de poesia', mas sem so-
corro. , Portanto, toda a poesia para todos, e 0 mais possível. E
to~a hngua humana, o mais possível. O homem que não é disci-
~;·p::an::e:~~:~;ai;:.;~•e:;:::rn~:·:~:~.::~~is
~lema está resolvido; não há barragem. · Lembro, como exemplo,
i:,:
plmado segundo ess~ imitação não é um homem. todos estes filhos de camponeses e de operários que estão atualmente
-jl-~~triª e p~a: isso basta. Uma tempera ·a outra. Mas situados, e muitos acima do que valiam. Mas também não quero
ambas
I - são necessárias.
A . Homero e Tales ·conduzirão, 0 e s t u d ante seguir estas fracas declamações sobre aqueles que, tendo sido cha-
' ~·
pe a mao. . . ~nança tem esta ambição de ser homem. Não deve- mados, não são eleitos. Entre esses, e conheço-os bem, não vejo
mos. qecepc1ona-la. E menos ainc!-a deixá-la escolher em meio ao que um desclassificado em cem; quase todos voltam para suas províncias,
ela ignora. Sem o que. o catecismo faria com que enrubescê~semos. ·onde não provocam ruído, mas permanecem acima de suas pequenas
Por~ue os teó~.qgos ensmavam a todos tudo 0 que sabiam dete d .
funções, e úteis ainda pelo conselho; é um .bom levedo.
. dia n t e d o esp1~1to
se ' · · .reb ~Ide. E, na dúvida, batizavam
· qualque~-ior-
' n o-
ma hum,an~ .. >~V~1os nos, então, escolher e recusar o batismo hu- Restam ainda aquéles que ·não são suficientemente instruído~,
manq· ao fqypJ~~:Q.u ao adormecido? . sej-a porque não querem aprender, seja porque· não pc;:>~·em. Aqu;
. . ··. -~:.. ~~~·~.~~> .

LA o
,.
·está o verdadeiro pr?blema. Houve um tempo em que o garoto que apenas pensará nas .coisas divinas e humanas, mal ou bem, como fa-
raciocinava mal uma ou duas vezes sobre os triângulos era logo zem todos, mas, além disso, decidirá a respeito da paz e da guerra,
abandonado. Conduta razoável, se o poder só pTocura recrutas . do justo e do injusto, da nobreza, da baixeza, e enfim a respeito de
para a ~art: governant~; conduta ridícula, se o poder· deseja real-~......:~
tudo, talvez de maneira louca, com todo o seu peso de homem,
certamente. O mais livre dos escritores sente a cada instante este
mente . c1dadaos esclarecidos. ~~QQ.._UnLIDen.419_..não...mostt;a_,q"""u_atD=.
peso em sua pena. E também não é pouco se um homem, destina-
qu~:...~E!~~.~.C?. E~. ~ as~~1e.mátiGas,-iss-1ré -um ..avi~.9 .~.QJJ.~uecessá­
-·--
r10 ensin~ matemática obstinada e engenhosamente... Se não
··-·----- -------- .--- ~---_...------- - ..~-'""'
compreende o que é mais simples, que podera então compreender?
do ao comércio, à agricultura, ou tão-somente à prática dos meca-
nismos,· lê Descartes, Montaigne e Pascal, ou pelo menos entrevê a
majestade aos teoremas mais ~:Este ~uncto- irá sempre .. e:o.~~ . ./.
Evidentemente, no que se refere ao mais fácil, é aceitável esse julga- "
mento sumário, que ainda ·é muito ouvido: "Este menino não é in- vai, se õ---te-souro"âã.S Humanidades estiver reservado àqueles que são
teligente". Mas nem isso é permitido. Muito ao contrári~, é o mais. dignos dele. Mas se nos puséssemos a instruir os ignorantes, .ve-
erro capital em relação ao homem, . e constitui injustiça essencial ríamos coisas novas. . .. ...___________ __ ---T""·----·"
mandá-lo assim para junto dos animais, sem empregar em seu favor
- - · ..- .. ·.- .
( . .....-i
· .- - - ··-- - - .- - •• ·-
b I
(l\_.O..-.d .•Ç Y''·.' r'>Ov.Q.
~ -

todo. o espírito que se tem e todo o calor de amizade de que se é .. \"~·"/ ·." 0<- n.. Edu! e
r\~'-'
capaz, fazendo voltar à vida estas partes geladas. Se a ar.te--de-·· ' •,
.._,
i~~~~uir
\ /' ·r O 1 j l •. '··<:->elo_
\ só tem .._a finalidade de esclarecer os gênios, eí.;_t_rldícula, Ü j .o · r,
\ porque ôS gênio~< Stirgerii ..ao primeiro 'd}amaao,...e..afrãvess-ãm Os.Ob - \ \ '. ' .
\_ táculos. Mas aqueles · qüe ·s e agarrãm- em--tudÕ- e se engãriãrn: com : .-. " (( >.>''- L-

a~~eles 9~~·.: ';:


1

\t.u do, que são sujeitos a perder a coragem e a desespera,r_.. \ '. /


~eu espmto, esses é que devem_ ~e..r . a.:l1.!9.~d9_s ...- - - - - ·· ....---- '\.; . -' C ( ,·
. --:&1e~~~- ~ . maÍ~r ~~idado não seria exagerado, nesse julgamento; :i.1 '.L'. '-,
e, por meu lado, se eu tivesse que julgar algum espírito ousado e vi- l ~ '---
goroso, faria com que ele se pusesse a desfiar as primeiras noções ·,i: o.L,t~
com pequeno escravo, como fazia Sócrates. Suspeito até que o gênio,
em seus discursos para si mesmo, seja mais criança do que podería-
··~
mos pensar, e procura o selvagem, o escravo, o tolo, o retardado, 0
sup.ersticioso, o estúpido, o adormecido, em si mesmo. Eis por que ·.'
''
muitas vezes pensei que não estaríamos perdendo tempo se Terunísse-
mos a cauda do rebanho, revirando de mil modos os ·primeiros ele-
mentos até vencer os· espíritos mais obtusos. ~__melhores gª-11ha-
riam ~om isso, e tambéz:g o .~mestre, .. .p.oL meio desta reflexão sobre o
_ . qµe . acredita:~os.. sa])~,!,_ C()ii:;a, muito rara. . · ·------·-- - ·'.....
Não há. homem, evid~ntemente, a respeito do qual se possa de-
clarar que lJ.ãC) pense além de seu ofício. Ainda que ele seja es~ravo,
como E~'?P~~ sempre pensará. Ora, ele não seTá escravo. Não
··
_... ..
~.

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