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O PULPITO NA BERLINDA: POBREZA E DECADENCIA DA PREGAÇÃO

2 Timóteo 4.1-5 (NVI):

“Na presença de Deus e de Cristo Jesus, que há de julgar os vivos e os mortos por sua manifestação e por
seu Reino, eu o exorto solenemente:
Pregue a palavra, esteja preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija, exorte com toda a
paciência e doutrina.
Pois virá o tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, sentindo coceira nos ouvidos,
segundo os seus próprios desejos juntarão mestres para si mesmos.
Eles se recusarão a dar ouvidos à verdade, voltando-se para os mitos.
Você, porém, seja sóbrio em tudo, suporte os sofrimentos, faça a obra de um evangelista, cumpra
plenamente o seu ministério.”

Não é preciso exercício intelectual para se perceber a aguda crise e a preocupante decadência da
pregação em nossa pátria. Alguém analisando o contexto da pregação em nossos púlpitos afirmou
que estamos vivendo aquilo que chamou de “o crepúsculo da arte da pregação”.

Essa crise se percebe em ambos os horizontes denominacionais – tradicionais históricos e


pentecostais. O perigoso jogo dos extremos. A sutil armadilha dos excessos.

A ortodoxia sem vida dos tradicionais. De um lado temos o púlpito tradicional histórico com sua
forte ênfase na lucidez teológica, nos arrazoados doutrinários, mas sem calor. Sobra-lhes luz na
mente, mas lhe falta calor no coração. Seus sermões são bem estruturados, bem organizados,
eruditos, mas sem vida. Muita luz na mente, mas sem calor no coração

O púlpito pentecostal que surfa nas ondas perigosas do misticismo sincrético perdendo suas
referências e raízes. Ora sofremos influencia do neopentecostalismo, queria nos neopentecostalizar.
Agora a proposta é nos calvinizar. Conceitos calvinistas como expiação limitada, Graça irresistível,
eleição incondicional são repetidos aos borbotões. Tenho um colega que considera-se pentecostal
calvinista

A revista Administração Eclesiástica, publicou um ensaio como título “Há lugar para a pregação?”, e o
colunista com uma afirmação inquietante:

“O lugar da pregação no culto tem sido questionado. Já não é o mesmo do passado. O


momento da apresentação da prédica, antigamente, tão aguardado e tido como clímax do
culto está desaparecendo. O púlpito que outrora viveu dias de poder e ascensão, em muitas
igrejas, hoje, enfrenta terrível declínio” 1

A constatação que se faz discernir é que há uma insatisfação latente, real e perceptível quanto à
pregação contemporânea.

Estamos vivendo um tempo de pregação pobre, aguada e mal preparada que enfraquecem os
conteúdos. É a superficialidade no púlpito. Muitos pastores têm oferecido uma sopa rala para o povo
de Deus e não alimento. O resultado é uma espiritualidade faminta (Rt. 1.1-2).

1 Citado por Jilton Moraes em O Clamor da Igreja: em busca da excelência no púlpito, São Paulo: Mundo Cristão, 2012, p.
16
1
A pobreza e a decadência do púlpito é um tema sério demais para passarmos de largo. A constatação
que Jeremias fez em seus dias, é atualíssimo: “E curam superficialmente a ferida da filha do meu povo,
dizendo: Paz, paz; quando não há paz”. (Jr.6.14). Dito de outro modo: “Ao contrário do que estão
dizendo, as coisas não estão bem”. O Púlpito com raras e honrosas exceções está combalido

A pobreza e a decadência do púlpito evangélico são sintomáticas. Quais são, portanto, os sintomas?
Quais são os indicadores dessa patologia pulpitana?

Pensei em quatro

1. Crise vocacional – falta-nos arautos

2. Crise de integridade – quando a performance homilética contradiz o estilo de vida

3. Crise da superficialidade de conteúdo –

4. Crise dos resultados – a perigosa sedução do pragmatismo

5. Crise do sensacionalismo – a tirania das sensações intimistas

6. A Crise da espetacularização homilética

Proponho um exercício simples de identificação dessa crise

1. Faltam-nos arautos – a crise vocacional

Vivemos na denominada “cultura religiosa pós-vocacional”. A paixão pelo púlpito e o ministério da


palavra vem desvanecendo. A vocação enquanto requisito fundamental ao ministério da Palavra tem
sido substituído pelo profissionalismo eclesiástico. Pastores estão deixando de ser arautos do
evangelho para serem gestores administrativos eclesiásticos.

Chamo de vocação uma chamada específica para uma tarefa específica que confere à vida razão e
sentido essencial.

No romance Dom Casmurro de Machado de Assis, Bentinho, personagem central do romance, vive
uma enorme crise vocacional. O desejo de sua mãe é que ele se tornasse um sacerdote católico, e o
envia para o seminário, mas bentinho não se sente vocacionado para o ministério, sua vocação é
amar Capitu. Ele precisa decidir. E decide. Decide viver não vocação de sua mãe, mas a sua própria.

Jesus foi o primeiro a orar pelas vocações, ao ensinar a mais perfeita e a mais eficaz oração
vocacional: "a obra é grande, mas os trabalhadores são poucos! Pedi, pois, ao Senhor da obra que
envie operários para a sua messe" (Mt 9,37-38; Lc 10,2

Essa crise se configura de varias formas, quatro pelo menos, a meu ver:

1. Pela ausência de referenciais inspiradores. Quem são os referenciais pastorais, ministeriais


que os inspiram ao exercício da tribuna?

2
2. Pelo conflito vocacional interior. Essa talvez seja a mais comum. “Será que sou mesmo
vocacionado?”, será que fui chamado para isso? Esses questionamentos são fortes
indicadores que aquele os faz é alguém vocacionado.
3. Pelo esfriamento radical da chama vocacional. Gente que perdeu a paixão pelo púlpito, pela
pregação num lento processo de esfriamento da chama que ardia no peito. “Um dia, em
algum lugar, essa chama que arde foi apagando em Timóteo, e Paulo percebeu e o
aconselhou: “Rogo que reacendas o dom que há em ti” (1Tm.4.14). Por algum motivo,
Timóteo estava se esquecendo que recebera um dom de Deus, simbolicamente transmitido
pela imposição de mãos.
4. Pelo abandono simplesmente. Há um batalhão de gente deliberadamente, abandonando sua
vocação e chamada, por razões diversas: cansaço, frustrações, pressões, circunstancias.
Demas é ilustrativo (2Tm. 4.10)

2. A crise de integridade: quando o estilo de vida contradiz a performance


homilética:

Uma das maiores crises da atualidade que afeta drástica e terrivelmente a pregação é a crise de
integridade. Integridade é a qualidade daquilo que é inteiro, não fracionado, não dividido.

Paulo escrevendo ao seu pupilo Timóteo, aconselha-o: “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina.
Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem”
(1 Timóteo 4:16).

Há uma ordem de prioridade na recomendação paulina: primeiro “cuida de ti mesmo”, e depois “da
doutrina”, da didaquê, da didática, do ensino, da instrução, da pregação.

O pregador precede o sermão. A vida antecede o desempenho e a performance no púlpito. O Dr.


Sttot afirma que a prática da pregação jamais pode ser divorciada da pessoa do pregador 2. Por detrás
da prédica, existe um modo de vida.

Estou absolutamente convencido que de nada adiantará um púlpito erudito, com exegese exigente,
com teologia brilhante e retórica sofisticada sem um homem cuja espiritualidade dignifique a Deus e
honre sua vocação. Pois não é a grandes talentos que Deus busca, mas homens que andem com ele.

Não faço aqui juízo de valor da espiritualidade de ninguém. Mas não nos faltaria exemplos de
pregadores “famosos”, midiáticos e “pulpiteiros” do nosso meio (há suas exceções), aqueles que
arrastam multidões após si, cuja vida é um acinte, uma vergonha para o evangelho. Gente de vida
torta, mal resolvida, com deficiências morais, éticas e familiares gravíssimas.

O Sermão da Sexagésima, do Padre Antonio Vieira, é um libelo que necessita ser resgatado para que
os grandes sermões não desapareçam dos nossos púlpitos. Baseado na Parábola do Semeador (Lucas

2 STOTT, Jonh, Eu creio na pregação, São Paulo: Editora vida, 2003, p. 284
3
8), Vieira desafiou os seus contemporâneos a deixarem resplandecer a excelência de Deus, todas as
vezes que proclamassem a Palavra. Atualíssimo, embora proferido em 1655.

Inconformado com a decadência dos pregadores e como isso repercutia nos resultados de seus
sermões, ele perguntou:

“Será porventura o não fazer fruto hoje a palavra de Deus, pela circunstância da pessoa? Será por
que antigamente os pregadores eram santos, eram varões apostólicos e exemplares, e hoje os
pregadores são eu e outros como eu?” Ele mesmo respondeu: “Boa razão é esta. A definição do
pregador é a vida e o exemplo... Uma coisa é o soldado, e outra o que peleja; uma coisa é o governador
e outra o que governa. Da mesma maneira, uma coisa é o semeador, e outra o que semeia; uma coisa é
o pregador, e outra o que prega. O semeador e o pregador é nome; o que semeia e o que prega é ação;
e as ações são as que dão o ser ao pregador. Ter nome de pregador, ou ser pregador de nome não
importa nada; as ações, a vida, o exemplo, as obras são as que convertem o mundo. O melhor conceito
que o pregador leva ao púlpito, qual cuidais que é? É o conceito que de sua vida têm os seus ouvintes.
Antigamente convertia-se o mundo, hoje por que não se converte ninguém? Porque hoje pregam-se
palavras e pensamentos, antigamente pregavam-se palavras e obras. Palavras sem obras, são tiro sem
bala; atroam, mas não ferem.”3

A título de exemplo, a vida de Samuel pode ser visto como um arquétipo da vida de muitos ministros
que se tornaram profissionais do sagrado, mas que não sabem discernir a voz de Deus (1 Sm. 3.9).

3. Superficialidade reflexiva e déficit de conteúdos: a crise de conteúdos

“Aquele que não semeia no estudo, não irá colher no púlpito”. (Spurgeon)

A professora Frances Popovich, missionária tradutora do Novo Testamento para a língua


Maxacali,dizia que “Deus usa tudo aquilo que aprendemos”,

Essa é, sem dúvida, uma das mais agudas crises do atual movimento histórico da igreja – a crise da
preguiça teológica. Gente pregando o supra-sumo da ignorância. Raciocínio pífios, exegeses
esfarrapadas, hermenêuticas rasas, formulas mágicas de um abracadabra evangélico profundamente
pobre, beirando o ridículo.4

Uma nota necessária: não estou me referindo à intelectualidade fria elaborada na torre de marfim
do academicismo pedante que exala mofo. Não é teologismo de gabinete, sem conectividade e
relação com a vida de pessoas reais com seus dramas concretos.

Sermões não descem dos céus prontos. Não existe abracadabra. Deus nos dá a Palavra, mas
precisamos de preparo sério, o que demanda tempo e suor. Paulo diz a Timóteo que “Os presbíteros
que administram bem a igreja são dignos de dobrados honorários, principalmente os que se dedicam
ao ministério da pregação e do ensino” (1 Tm. 5.17).

A Bíblia A mensagem tradução de Eugene Peterson, traduz assim esse texto:

3
VIEIRA, Padre Antonio, Obras completas do Padre Antonio Vieira –Sermões, vol. 1, p.32
4 BRIZOTTI, Alan, Desafios da liderança no século 21: Para não nos tornarmos tragédias eclesiásticas, 2ª Ed. – Goiânia:
Primícias, 2011, p. 103.
4
“Dê um prêmio aos líderes que fazem um bom trabalho, especialmente aos que esforçam na
pregação e no ensino”.

A idéia do texto é a de um esforço extenuante que leva à exaustão. Isso porque “uma boa pregação
exige trabalho árduo. [...] Estou convencido de que o motivo básico das pregações pobres é a falta de
gastar o devido tempo e energia na pregação”.5

Muitos pastores tentam justificar o seu descaso ao estudo e a ignorância, usando textos fora do seu
devido contexto. p.ex:

Mateus 10:19.

2 Co.3:6.

Afirmam: “A letra mata, e a teologia enterra”

Indicação: O livro Pentecostal de coração e mente: um chamado ao dom do intelecto, de Rick Nãnez,
São Paulo: Ed. Vida, 2007

Jonh Sttot disse que ouviu o Dr. Billy Graham, numa preleção em Londres dirigida a cerca de 600
ministros, em novembro de 1970, dizer:

“Se tivesse que recomeçar o meu ministério de novo, estudaria três vezes mais do que estudei.
Tenho pregado muito e estudado tão pouco. Se me fossem dados apenas três anos para servir
ao Senhor, passaria dois desses anos estudando e me preparando”. 6

Infelizmente, há muitos pregadores despreparados no púlpito. A maioria, talvez por falta de recursos
financeiros, falta de entusiasmo pelo estudo e, ainda, falta de prazer pela leitura. O que sobra é a
repetição maçante de jargões nos púlpitos. Frases de efeito são copiadas e multiplicadas nos
sermões, servem para esconder o despreparo teológico e a falta de esmero ministerial. É o
esvaziamento de conteúdos.

Desconfio da vocação de um pregador que diz amar o púlpito e a pregação, mas que é relapso em
seus estudos e que afirma não gostar de leituras. E em nome de uma preguiça religiosa, atribuem ao
Espírito a culpa de suas mensagens rasas: “foi isso que o Espírito me entregou”.

Os melhores pregadores contemporâneos que tenho ouvido, e de quem tenho aprendido, são ávidos
leitores de boa literatura. Aliás, ler boas obras deveria ser um hábito permanente de quem se dedica
ao ministério.

 O verdadeiro evangelista é culturalmente relevante – Paulo em Atenas- Atos 17.287

5 Redescobrindo o ministério pastoral, p. 288.


6
STTOT, op. cit.,
7
Paulo cita os poetas gregos Arato e Cleantes. Arato viveu por volta do ano 300 a. C. e era poeta da província da Cicília,
onde Paulo nasceu nascera. A citação de Paulo foi extraída do seu poema didático “Fenômenos”. Cleantes, foi um filósofo
grego (300-220 a. C.) Paulo extraiu a sua citação do seu poema “Hino a Zeus” – Champlin. NT Interpretado, p. 377. Ver
ainda , Marchall, Atos, p. 272
5
 Não permite a mente embotar, mas desenvolve o habito de leitura como exercício do
pensar – Paulo – 2 Timóteo 4.13

4. Pragmatismo: a crise dos resultados

Definindo o conceito: É uma corrente de idéias que prega que a validade de uma doutrina é
determinada pelo seu bom êxito prático. Está relacionado ao movimento filosófico norte-americano
baseado em idéias de Charles Sanders Peirce 1839-1914e William James 1842-1910).

O espírito que governa as relações no século XXI é o pragmatismo: “programa”, em grego. No


pragmatismo, a palavra de ordem é o funcional! Quando a produtividade industrializada da fé se
estabelece o que importa é “dar resultado”, mesmo que os métodos para isso sejam os mais
canalhas.

A lógica é simples: Não importa o que se está pregando, se está dando resultados, não mecha!”

Ilustração:

Diz-se que um músico escreveu um hino e estava cantando quando seu pastor o interrompeu e, em
tom de perplexidade afirmou: “essa letra contradiz a Bíblia!” O que o moço respondeu: “de fato é
não bíblica, mas que rima, rima”.

Essa pregação utilitária relativiza valores, princípios, verdades em nome do lucro. No pragmatismo
pulpitano; a fé é uma moeda de troca; o púlpito, um balcão de negócios; os crentes, clientela. E
Deus? Deus é um ser cósmico ao estilo de “papai Noel”.

O pragmatismo muda a mensagem, adocicando-a, tornando-a mais palatável ao paladar do ouvinte a


fim de cativá-los

O Cristo caricaturado pelos pregadores pragmáticos é uma espécie de “quebra-galhos celestial”, “um
“gênio da lâmpada divino” usado para satisfazer nossa fome de sucesso, para depois ser aprisionado
na solidão da lâmpada vazia. Esquecido até que se precise dele de novo.

Leonardo Boff com lucidez e genialidade própria de seus escritos, analisa de maneira crítica essa
instrumentalização da espiritualidade:

“É importante [...] manter sempre nosso espírito crítico, porque com espiritualidade
também se pode fazer dinheiro. Há verdadeiras empresas manejando os discursos da
espiritualidade para criar um exercito de seguidores que muitas vezes falam mais aos
seus bolsos do que aos seus corações”.8

Boff acertou de cheio! É possível manipular o texto bíblico, manejar os discursos a fim de capitalizar
em cima da fé simples de um povo que sofre. Devidamente enfeitiçados pela ideologia do mercado,
líderes inescrupulosos, calhordas distribuem ópio religioso. Vendedores de ilusão. E na “ânsia de
vender, perdem a alegria de ter de graça o que de graça receberam e nem sequer notaram!” 9

8
BOFF, Leonardo, Espiritualidade: um caminho de transformação, Rio de Janeiro: Sextante, 2001, p. 12-13.
9
BRIZOTTI, Op. cit., p. 33.
6
5. Experiencialismo: a crise das sensações intimistas

O púlpito pentecostal moderno trabalha na esfera do empirismo: o que importa é sentir, é ter
sensações que gerem arrepios. É a tirania das experiências pessoais. É o império do misticismo: a
supervalorização dos sentimentos subjetivos que aborta o culto racional.

Quais são os pregadores de maior visibilidade e aceitação dentro do movimento: aqueles que são
experts em conduzir o povo à histerias coletivas, à êxtases alucinatórios, a arrebatamentos de
sentidos numa espécie de esoterismo pagão.

Na edição de Janeiro/Fevereiro de 2000, da revista Ultimato, o Pr. Ricardo Gondim escreveu um


artigo intitulado “Pentecostal, não esotérico” onde escreveu:

“Acredito que muitas igrejas, identificadas hoje como pentecostais, estão


teologicamente muito próximas de um misticismo pagão. Distantes da teologia clássica,
incorporaram valores de uma espiritualidade esotérica. Com certeza, há fortes
segmentos de um novo pentecostalismo que não caminham com o que a igreja primitiva
chamava de “doutrina dos apóstolos”. Urge mostrar que é possível ser pentecostal sem
ser esotérico”10

Manipulam-se os auditórios, eleva-se a temperatura emotiva dos cultos, mas não se cria um
enraizamento de princípios. São pregações que geram arrepios, emocionam, mas que não geram
mudanças concretas na vida de quem as ouve.

Essa é uma das principais razões porque o púlpito está perdendo a sua autoridade e excelência. Não
estou defendendo tradicionalismo frio e nem ortodoxia morta, concordo Martyn Lloyd-Jones quando
afirma que “Pregação é lógica pegando fogo! É teologia em chamas! É raciocínio eloqüente!”

O que defendo é que não podemos fazer das experiências o critério último da verdade. Pelo
contrário, toda experiência por mais legítima, bonita e verdadeira que seja deve ser submetida ao
escrutínio da Escrituras.

O que é arrependimento? O vocábulo grego no Novo Testamento para conversão é metanóia.


Metanóia é mais que mudança de direção, é mudança de mente, de cosmovisões, de mentalidade,
do jeito de pensar, de compreender, de discernir. Conversão é alguma coisa que realinha nossos
pensamentos aos pensamentos de Deus. Tudo começa na cabeça, depois desce pro coração.

Paulo foi radical com a presença do gnosticismo na igreja de Colossos. A comunidade havia
incorporado na sua liturgia o culto aos anjos (Col. 2:18)

É comum ouvirmos em cultos, afirmações as mais esdrúxulas possíveis

Qualquer semelhança com o agnosticismo dos dias de Paulo não, não é mera coincidência!

 Chega de emocionalismos canalhas que deturpam o rosto, onde um dia, lágrimas sinceras
correram

10
Revista Ultimato. Edição 262 Janeiro/Fevereiro, p. 28
7
 Chega dessa pregação que gera apenas ilusões, que infantiliza.

5. A espetacularização do discurso: a crise da homilética espetacular

Luzes, câmeras, pregação!

Um dos primeiros pensadores a fazer uma análise crítica da atual sociedade do consumo sob a
perspectiva do espetáculo foi Guy Débora. Em 1967 escreveu A sociedade do espetáculo. Ele
antecipou de maneira muito lúcida aquilo que estava para se tornar a sociedade moderna.

A tese do livro é a de que a vida das sociedades modernas “se apresenta como uma imensa
acumulação de espetáculos”; isto é: “tudo que é vivido diretamente tornou-se uma representação”.
A grande realidade é a realidade da representação, do simulacro.

É impressionante como os (des)valores e os pressupostos dessa cultura foram incorporados na


prédica cristã, o que eu chamo de a homiletica espetacular. De modo que, do ponto de vista da
sociedade do espetáculo, a igreja é um espaço que oferece entretenimento; o pregador é uma
espécie de show-men que tem o estrelato e o sucesso como meta última da “carreira” ministerial.

Esta é uma das agudas e sérias razões da falência e decadência do púlpito contemporâneo: a tirania
do sucesso, do estrelato. Há pregadores que atropelam tudo e todos numa corrida transloucada de
reconhecimento e prestígio. Na busca por “sucesso ministerial”, deixam um rastro de destruição na
vida dos filhos, esposas e amigos.

Buscar fama, aplausos ou proeminência tem um componente luciferiano. Essa foi a proposta
tentadora de Satanás a Jesus –Mateus 4.5,6:

“Então o diabo o levou à cidade santa, colocou-o na parte mais alta do templo e lhe
disse: "Se você é o Filho de Deus, jogue-se daqui para baixo. Pois está escrito: „Ele
dará ordens a seus anjos a seu respeito, e com as mãos eles o segurarão, para que você
não tropece em alguma pedra‟".

É a tentação de transformar a fé em espetáculo, um “show da fé” para que todos vejam nossa
espiritualidade e se impressionem com o sucesso da nossa religião. Saltar de um alto pináculo e ser
amparado nos braços de um anjo seria uma boa ocasião para Jesus se provar e arrancar aplausos de
todos. Jesus deu um sonoro: Não!

Jesus sempre preferiu a discrição. Quando a multidão veio ouvi-lo pregar, foi para um lugar tranqüilo
e solitário para orar (Lc. 5:15-16).

“Todavia, as notícias a respeito dele se espalhavam ainda mais, de forma que


multidões vinham para ouvi-lo e para serem curadas de suas doenças. Mas Jesus
retirava-se para lugares solitários, e orava”.

Artuh Cravan previu: “Dentro em breve, nas ruas só haverá artistas, e vai ser muito difícil encontrar
um homem”.

8
Minha paráfrase: “Se não tivermos cuidado, muito em breve, nos púlpitos só haverá artistas, e vai ser
muito difícil encontrar um santo”

Faço parte daqueles que anseiam por uma nova reforma no cristianismo! Que ela comece pelo
púlpito, pelos pregadores, por mim.

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