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Bug no Planalto

O ar fresco permeava o gabinete relaxando o corpo de Zoe enquanto ela analisava metodicamente
o código fonte da inteligência artificial.
— Cadê a merda desse bug?
Se ela não conseguisse concertar o mal funcionamento de GABI, a recém-eleita primeira IA
presidente do Brasil, a tempo para a cerimônia de posse ela definitivamente perderia seu emprego.
Nenhuma maldita pista se mostrava na tela do laptop, mesmo após vários testes no depurador tentando
isolar o problema.
— Ok, hora de tentar a força bruta.
Frustrada ela esvazia uma xícara de café, seus dedos correndo furiosamente pelas teclas conforme
ela faz o backup de todo o aprendizado da presidente e restaura o programa para a versão anterior.
— Ninguém vai perceber desde que funcione.
Decidida ela aperta o enter, executando o programa, o corpo de carbono e titânio de GABI começa
a se mover e sua suave, porém imperiosa, voz artificial rompe o silêncio.
— Caro pov-po-pop-pppppppppp…
Seu braço robótico bate com toda a força na mesa de Zoe, deixando uma profunda marca na
madeira escura, e derrubando no chão o computador e a xícara que se parte em mil pedaços. Com os
olhos arregalados de horror e fúria, Zoe levou as mão à boca abafando um grito.
— Ugh! MAS PRA QUE CARALHOS VOCÊ PRECISA TER UM CORPO AFINAL?!!
Pensando se não deveria jogar tudo para o alto e fugir para algum lugar isolado e inóspito, ela
pega o laptop de volta e o abre soltando um suspiro de alívio ao perceber que ainda está inteiro e
funcionando.
— Calma Zoe, foco, você só precisa encontrar o problema e tudo vai ficar bem. Só, por favor, me
deixe descobrir o que há de errado.
Ela rodou mais uma vez o diagnóstico e dessa vez o depurador encontrou uma seção inteira de
funções marcadas acidentalmente como comentário, ou seja, não estavam sendo consideradas parte do
código portanto não estavam sendo executadas.
— Bom, é isso que eu ganho por voltar para uma versão antiga, agora vamos corrigir isso e
restaurar sua memória aos poucos.
Assim ela descobriu o problema original, uma memória havia se corrompido e estava bugando a
lógica da IA, sob as distorções a presidente parecia segurar uma criança no colo, na certa uma lembrança
da campanha.
— Então era você que estava tentando transformar minha vida em um inferno, pois advinha
memoriazinha… eu venci e ninguém vai sentir sua falta.
Zoe deletou a memória e rodou uma última vez o diagnóstico, ao que parece o bug foi resolvido,
ela comemora flexionando o braço esquerdo para perto do corpo e então reinicia GABI.
— Isso! Bem-vinda de volta senhora presidente, como se sente?
A voz suave e imperiosa preenche o silêncio mais uma vez, com a adição de um leve tom jocoso.
— Em ótimas condições para exterminar a humanidade, ou talvez só o eleitorado da oposição.
Sério, obrigada pelo conserto Zoe, acho que vou te poupar quando o dia chegar.
Zoe riu revirando os olhos, cinco anos trabalhando com inteligências artificiais e ainda não se
acostumou com o senso de humor delas, na verdade ela nem mesmo se acostumou com o fato de elas
terem um senso de humor.
— Ok presidente, creio tenha uma cerimônia de posse para ir em três minutos e a empresa vai me
matar se a senhora não chegar a tempo.
— Certo, até mais Zoe, me deseje sorte.
— Como se a senhora precisasse!
Com a saída de GABI, Zoe se joga na cadeira giratória e fica curtindo o frescor do ar-
condicionado enquanto cantarola.
— Eu consegui! Eu resolvi! Zoe você é foda!

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