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Síntese

Sarnau conta-nos das saudades da sua terra, que pelos relatos remetem-nos a parte norte da província
de Inhambane, concretamente Mambone, localizado nas margens do rio Save. Sarnau relata os factos a
partir de Mafalala. Ela faz um flashback até sua adolescência, sobretudo amorosa.

Conta-nos do dia em que aconteceu a cerimónia dos ritos de iniciação dos jovens rapazes da sua aldeia,
dentre eles, destacava-se Mwando, o qual formava-se para padre, e foi por quem Sarnau apaixonou-se
desde o primeiro momento. Inicialmente Mwando ignorou Sarnau, mas uma vez, admitiu que gostava
dela, mas não podia demostrar pois tinha medo de ser censurado no seminário.

Depois deste dia Mwando passou a comportar-se diferente no seminário, e os colegas já notavam e
ficavam zoando ele por isso, ele sentia-se culpado por essa situação, tanto que uma dada vez ficou tão
chateado que decidiu expressar-se por via da escrita, pegou num papel e escreveu sobre os seus
encantos pela Sarnau, e para o seu azar, foi surpreendido pelo padre que os controlava. Estes eventos
ocorreram em simultâneo com a descoberta da relação entre a cozinheira e um dos colegas de
Mwando, Salomão. No final, ambos foram expulsos excepto a empregada, ela continuou trabalhando no
local. Mwando queria ser padre, mas também queria a Sarnau e tinha sido expulso do seminário, por
isso não viu outra oportunidade para ficar com a Sarnau, com a qual em pouco tempo envolveu-se
sexualmente, e teria que voltar a adorar “deuses do submundo”, coisa que não fazia a um bom tempo,
mas ele não hesitou e prometeu fazer novamente, prometeu venerar os ancestrais da Sarnau.

Dias passaram e Mwando, não cumpria com o prometido, evitava a Sarnau e dizia que era por causa do
trabalho com o pai, ora tinha que cuidar da casa pois as irmãs eram preguiçosas. Dois meses depois ele
aparece com intuito de despedir-se dela, dizendo que haviam-lhe arranjado uma esposa, mas que era
contra a sua vontade, Sarnau disse a ele que estava grávida, mas isso não mudou nada para Mwando,
Sarnau disse que não importava-se em ser a segunda mas Mwando respondeu que poderia ser tudo
para ela menos marido, pois era contra poligamia, isto deixou tanto Sarnau como seus ancestrais
furiosos, visto que mandaram uma serpente para o local onde estavam. Sarnau ficou tão angustiada que
chegou a tentar suicidar-se, afogando-se no rio, mas não teve sucesso pois foi salvo por pescadores.
Com isto, chamaram curandeiros, que depois de uma serie de actividades, profetizaram que Sarnau era
“imune a morte” naquelas terras e só poderia morrer em terras longínquas.

Naqueles dias procurava-se uma mulher que fosse bela, bondosa e não feiticeira para ser a futura
rainha, por sorte Sarnau foi escolhida e a família dela sentia-se orgulhosa por isso e ela também, tanto
que chegou a agradecer ao Mwando por a ter abandonada. O lobolo assim como o casamento religioso,
foi realizado, mas não passava de uma espécie de troca comercial ou venda, pois para além de evolver
altos valores em bens, a Sarnau não conhecia devidamente o seu marido, Nguila, um mulherengo escuro
e sedutor. Sarnau foi educada a respeitar o seu marido e a não reclamar de nada, mesmo em situações
de traição com sua irmã mais nova. A festa foi muito grande e todos choraram de emoção quando
chegou a hora da partida da Sarnau, excepto os Zucula que com a mesma emoção cantavam pela
chegada da futura rainha.
Sarnau era a futura rainha e possuía todos os privilégios, a ganância e a vaidade tomaram conta dela
tanto que pensou na morte da rainha para ficar logo com os seus bens. Ela tinha que mostrar suas
habilidades femininas às suas sogras, quando foi à oitava sogra, disse-lhe que ela tinha muita sorte por
ser a primeira, pois a primeira mulher do imperador é sagrada disse também que as suas outras sogras
eram feiticeiras excepto ela, e devia ter cuidado. Ficou conversando com sua sogra até à noite, e quando
regressou à casa, encontrou seu marido com outra mulher, como havia aprendido, manteve a calma e
foi preparar água para o banho deles, depois foi chamada pelo marido, que ao notar que tinha chorado
agrediu-a, foi ficar na fogueira onde teve a companhia e o consolo da rainha. A felicidade veio quando
ela descobriu que estava grávida, tudo faziam para vê-la feliz.

Mwando estava por obrigação com Sumbi, uma mulher muito bonita, que deu-o muito trabalho e no
final foi ficar com outro homem deixando-o no sofrimento e provando uma morte em vida.

Tempo passou e Sarnau ia ganhando rivais e com o surgimento destas, principalmente da quinta o
príncipe já tornado rei evitava ela. Sarnau começava a cansar-se da vida de poligamia, pela ironia do
destino naquele momento aparece Mwando e Sarnau não conseguiu conter-se dos seus impulsos
envolveu-se com ele e chegou a pensar em amantizar com ele, mas este recusou. Dias passaram e a
indiferença do rei acompanhada pelo reaparecimento do Mwando, deixavam Sarnau num dilema. Um
dia, Sarnau decidiu sair até ao seu velho local de encontros com Mwando, para matar a saudade, por
consciência encontraram-se e reviveram os velhos tempos, prometendo-se levar para muito longe. Da
infidelidade da Sarnau, uma gravidez surgiu, para poder atribuir o filho ao rei que não a tocara faz
tempo, foi à sua curandeira pedir para que atraísse o rei para ela, o rei caiu no feitiço e passou a ama-la
novamente, contudo, Mwando também queria o filho e continuava com sua ideia de fuga. Chegou então
o dia do parto, e a criança nasceu com dificuldade, todos diziam que a dificuldade era por causa de um
feitiço lançado por Phati, a quinta esposa do rei, mas Sarnau sabia que era porque o filho era bastardo, a
criança nasceu saudável e parecida com a mãe, mas era clara como Mwando, toda gente atribuía a
clareza da criança às desavenças entre Sarnau e Phati. Ver seu filho com outro pai não era fácil para
Mwando e continuava com os planos de fuga dos quais Sarnau não estava interessada. Sarnau foi ter
com Mwando para fala-lo que não estava interessada, mas este fê-la ver que não existia nada que a
prendesse ali, Sarnau pediu mais um tempo e ao se separarem ela descobre que Phati teria ouvido tudo,
posteriormente, foi contar ao rei e o rei quis tomou a decisão de embriaga-las para saber quem mentia
e depois começar a matança. Depois de muito pensar Sarnau foge com Mwando para Vilanculos, onde
Mwando virou pescador e viviam o seu amor, deixando para trás os seus três filhos e o poder. Tudo
corria bem, até que um dia Mwando notou que três homens haviam sido mandados em sua busca, um
deles tinha sido seu colega de circuncisão e por consideração quando este descobriu Mwando deu-lhe
chance de fugir, Mwando volta a casa com medo e termina tudo com a Sarnau depois abandona-a.
Dias depois estava viajando para o trabalho forçado, no barco ele conta que foi vítima de um complô por
isso estava ali. O barco ancorou em Angola onde por quinze anos Mwando permaneceu como padre,
depois voltou a Mambone e encontra que seu pai morrera e Sarnau estava solteira vivendo uma vida
miserável em Lourenço Marques, não esperou tempo e seguiu ao seu encontro. Sarnau encontra-se em
Lourenço Marques vendendo vegetais, com dois filhos dos quais um era do Mwando e outro de pai
desconhecido.

Mwando chegou à Lourenço Marques e para sua por ironia do destino tropeçou na Sarnau, pediu
desculpas, mas esta não quis ouvi-lo, dizia que o preço do seu perdão eram vinte e quatro casamentos.
Mwando não se contentou co a resposta procurou-a em casa e mostrou carinho aos filhos, isto
sensibilizou a Sarnau, perdoando Mwando e aceitando enfrentar com ele os desafios da vida.

Análise da obra

O romance ”Baladas de Amor ao Vento”, pertence à escritora moçambicana Paulina Chiziane, e foi
publicada em 1990. É conhecido por ter sido o primeiro a evidenciar o quotidiano feminino e contém
150 páginas e conta com 20 capítulos

A obra, apresenta uma profunda universalidade quase quanto a Bíblia, ou seja, os acontecimentos ou
assuntos tratados nos textos, transbordam para muito além do que se quer explicitar no contexto da
história. Essa universalidade, vem acompanhada de máximas e provérbios populares, que podem ser
aplicadas até mesmo em realidades actuais, dai que a obra apresenta uma grande verossimilhança.

A universalidade, geralmente é acompanhada por figuras de estilo, que ligam a realidade do texto e a
realidade no sentido geral. Na obra em análise podemos verificar também a existência destes recursos,
sobretudo da Metáfora, Antítese, comparação e hipérbole.

[…] Sarnau é pau de carapau […] ” CHIZIANE (2003:15)

Nesta passagem notamos duas figuras de estilo em simultâneo, a Metáfora e a hipérbole, para tratar da
comparação podemos verificar no segundo capítulo a comparação da mulher com a terra.

O leitor, encarna Sarnau, uma mulher que vive em um Moçambique marcado pela presença do
Colonialismo, Cristianismo, superstição, poligamia e supremacia do homem sobre a mulher.
O Colonialismo faz-se presente na obra, pela temporada que o Mwando passou em Angola no trabalho
forçado, isso nos capítulos 15, 16 e 17. A poligamia, a superstição e a supremacia do homem e
deterioração da imagem da mulher não seria viável trazer passagens textuais, pois são o “prato
principal” deste romance. Quanto ao cristianismo, faz-se presente pelo facto de Mwando ter estado na
formação para padre, também podemos verificar no seguinte trecho:

“À luz da vela, os olhos perdiam-se no vazio, acabando por convergir no Jesus Cristo de Bronze
pendurado na parede do cal […]” CHIZIANE (2003:21)

Sarnau relata os factos a partir de Lourenço Marques, narrando acerca do seu amor por Mwando, um
amor que teve que superar a poligamia, na medida em que Mwando se negou a pratica-la; o
Cristianismo, na medida em que o Mwando encantado pela Sarnau não conseguiu continuar a formação
para padre e a supremacia do homem pela mulher, na medida que Mwando, tomado pelo amor não via
Sarnau como sua propriedade, mas sim como uma mulher para ser amada.

Este romance traz-nos uma realidade triste, sobre a santidade duvidosa dos padres, visto que para além
dos formandos não terem conseguido a abstinência à actividades carnais, notemos o seguinte trecho:

”Mwando e Salomão foram expulsos do colégio, mas a cozinheira foi nem sequer repreendida e toda
gente sabe porquê.” CHIZIANE (2003:23)

Este trecho, remete nos às várias hipóteses e a mais evidente é de que a cozinheira teria um caso
amorosos com os padres do seminário, mas também podemos levantar outra ainda mais interessante:
os rapazes foram expulsos porque não conseguiram cumprir com as regras do caminho para a salvação,
porém será que a salvação da mulher não tem nenhum valor?

O romance leva-nos a uma realidade de uma sociedade patriarcal, repleta de poligamia, na qual varias
mulheres disputam a atenção de um homem, o qual não conseguindo distribuir o seu amor por todas,
acaba dando valor a uma e as outras ficam com ciúmes dela desejando até a sua morte.

Isto pinta uma imagem diabólica na mulher, lembrando que na Bíblia, Eva, mulher é que convenceu
Adão, homem a comer a fruta proibida, Chiziane faz uma metáfora, na medida que Sarnau, mulher tenta
persuadir Mwando, homem a largar o caminho divino para unir-se ao mundano.

Como dito antes a supremacia do homem e a deterioração da imagem da mulher é um dos “pratos
principais deste bufê”, e isto podemos verificar nas seguintes passagens:

“Os antepassados sempre disseram: a mulher é a galinha que se cria para presentear os visitantes”
CHIZIANE (2003:36)

A mulher não foi feita para cuidar dos pais, mas sim para crescer e abandona-los, para viver como mais
uma de muitas mulheres de um homem.
“Não vos falei sobre o meu marido, o Nguila, o homem mais desejado pelas fêmeas do território, não o
conheço muito bem, mas estou devidamente informada sobre ele [...] CHIZIANE (2003:40)

Esse homem, na maioria das vezes é um desconhecido, de estatuto económico elevado que o da família
e o consentimento da noiva não é importante, ela não passa de um objecto à venda.

[…] Não ligues importância às amantes que tem […] porque o homem não foi feito para uma só mulher
[…] CHIZIANE (2003:44)

O homem tem por direito se não dever ter muitas mulheres,

[…] Meu marido está ao lado de outra mulher mesmo na minha cama […] regressei voando, pus me de
joelhos perante o meu soberano […] arremessou-me um pontapé traseiro que me deixou estatelada no
chão” CHIZIANE (2003)

Se a mulher responder a traição com ciúmes, o homem responderá com violência.

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