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Psicologia Médica: TEMA 1

PSICOLOGIA E MEDICINA. MODELOS DO


FUNCIONAMENTO MENTAL e BASES BIOLÓGICAS,
PSICOLÓGICAS E SOCIAIS DO COMPORTAMENTO.

Prof. Doutor Gonçalves Pereira, Prof. Doutor Jaime Grácio, Prof. Doutor Joaquim
Alves da Silva & Corpo Docente de Psicologia Médica
Estes apontamentos/compilação de textos destinam-se a guiar o aluno na leitura da bibliografia
recomendada. São disponibilizados para uso pessoal do estudante, exclusivamente na plataforma
Moodle institucional da FCM/NMS-UNL. Todos os direitos estão reservados.

OBJECTIVOS GERAIS DE APRENDIZAGEM:

1. Valorizar as contribuições da Psicologia e Ciências do Comportamento para a Medicina, sabendo


exemplificar, com base na evidência científica (cf. cap. 1 de Ayers & Visser, 2021).
2. Saber quais os principais modelos do funcionamento mental e suas características principais (cf. modelo
psicodinâmico, modelo cognitivo-comportamental, modelo sistémico, modelo bio-psico-social; os
modelos biológicos não são abordados, especificamente, nesta UC).
3. Reconhecer, sabendo exemplificar, a utilidade dos modelos do funcionamento mental na
compreensão/explicação dos comportamentos (cf. exemplos nas páginas seguintes – Tema 1 – assim como
na bibliografia essencial – cap. 10 de Ayers & Visser, 2021; para saber mais, ver bibliografia
complementar, v.g. cap. 19 de Ayers & Visser, 2021 ou Yarns & Zhu, 2020).
4. Aplicar o estudo dos modelos do funcionamento mental a conteúdos já aprendidos (Psicopatologia básica
– 2º Ano, UC Introdução à Prática Clínica), como introdução ao estudo de Psiquiatria e Saúde Mental (nos
últimos anos do MIM). Para tal, consultar caps. 16 e 19 de Ayers & Visser, 2021.

Nota introdutória:
Para atingir estes objectivos, sugere-se ao aluno que:
1º) leia, com a ajuda destes tópicos, os capítulos correspondentes de Ayers & Visser, 2021 (cfr. bibliografia
essencial); esta é base para as discussões de casos nas aulas;
2º) explore a bibliografia complementar, com destaque para Yarns & Zhu (2020) – como introdução
relativamente simples e clinicamente ilustrativa ao modelo dinâmico - e partes do cap. 19 de Ayers & Visser
(2021) – ex: aplicabilidade prática de psicoterapias analíticas e cognitivo-comportamentais.

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CONTEÚDOS TEÓRICOS:

1. CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA E DAS CIÊNCIAS DO


COMPORTAMENTO PARA A MEDICINA
 O que é a psicologia? A psicologia (como ciência ‘básica’) aborda a complexidade dos
comportamentos. Há diferentes especializações: psicologia da saúde, clínica, educacional,
ocupacional, neuropsicologia, etc. O conceito de Psicologia difere de:
 Psicopatologia (incluindo o estudo dos sintomas/síndromes/doenças mentais, embora
abrangendo aspectos mais vastos do que esta ‘semiologia’)
 Psiquiatria (especialidade médica focada no diagnóstico/ tratamento/ intervenção nas
perturbações mentais / sofrimento psicopatológico)
 Saúde mental (o conceito pode ser entendido de formas diferentes, por exemplo: 1) como
abordagem não categórica à dicotomia saúde-doença nas dimensões predominantemente
psíquicas, sublinhando a continuidade; 2) traduzindo a intervenção multidisciplinar (não
apenas médica/psiquiátrica) nestas áreas, com enfoque não só na prevenção secundária
como nos outros níveis de prevenção da doença e na promoção da saúde).
 As definições de saúde continuam em discussão: o conceito é multidimensional. A saúde pode ser
entendida como um contínuo. A ‘saúde mental positiva’ abarca o que vai além da ausência de
sofrimento psíquico. Os modelos salutogénicos estudam os factores de manutenção/promoção da
saúde (Antonovsky), complementando a visão tradicional centrada nos factores de risco de doença.
 Importância da Psicologia em Medicina. Importância do trabalho em equipa multidisciplinar na
saúde, incluindo especialidades da psicologia (e.g. clínica, ocupacional, da saúde).

[Desenvolvimento e exemplos ilustrativos no Cap. 1 de Ayers & Visser (2021). A articulação entre o médico
(psiquiatra ou não) e o psicólogo (clínico ou doutras especialidades) é fundamental; note também que Psicologia ≠
psicoterapia (por exemplo, as psicoterapias não são feitas só por psicólogos e nem todos os psicólogos estão habilitados
a fazer psicoterapias estruturadas; por outro lado, o trabalho do psicólogo não se restringe à intervenção clínica).
Alguns destes pontos serão também desenvolvidos na UC Psiquiatria – 5º ano MIM, incluindo o conceito de
Psicopatologia, com vertentes que não se esgotam no estudo da semiologia psiquiátrica; para Jaspers (1913), a
Psicopatologia envolve ‘sentir, aprender e reflectir sobre o que realmente acontece na vida mental do homem’.]
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2. PERSPECTIVA GERAL SOBRE ‘MODELOS’ DO DESENVOLVIMENTO E


FUNCIONAMENTO MENTAL (OU PSÍQUICO)

 ‘Modelo’: neste contexto, um conjunto de teorias científicas que permite interpretar o


funcionamento mental ou, como se estudará em Psiquiatria, as perturbações e doenças mentais.
 Para perceber a utilidade (relativa) destes modelos, é útil rever os conceitos de ‘compreender’ e
‘explicar’ ((verstehen e erklären, no alemão original) em Psicopatologia, no sentido de Karl
Jaspers. A ‘compreensão’ estará mais próxima da intuição empática; a ‘explicação’ recorre a algo
extrínseco, como uma teoria científica (Pio de Abreu, 1994). Noutras palavras, ‘compreendem-se’
os significados pessoais, subjectivos dos comportamentos e ‘explicam-se’ os comportamentos
através da sua regularidade e padrões. [UC Introdução à Prática Clínica – 2º ano MIM]
 Os modelos são incompletos, têm evoluído e continuarão a evoluir: nenhum constitui uma
‘verdade’ absoluta, embora no passado alguns dos seus defensores assim tenham pensado (ou
levado outros a pensar). Em casos concretos, ajudam-nos a interpretar os comportamentos e
intervir. Nalgumas situações uns serão mais adequados que outros, noutras sucede o inverso. O
clínico experiente e sensato saberá fazer essa distinção.
 Interacções entre o biológico, o psicológico e o social: a importância relativa dos três tipos de
determinantes varia consoante as situações e a dimensão temporal. Independentemente dessa
variabilidade, o comportamento humano radica em (ou é modulado por) múltiplos factores.
 Alguns tipos de ‘modelo’ e seus pressupostos fundamentais:
 Modelos biológicos: as alterações (neuro)biológicas/físicas/químicas permitem explicar
satisfatoriamente, (quase) só por si, os comportamentos (ou as doenças).
 Modelos psicodinâmicos: recurso a postulados como a existência do inconsciente e de
conflitos intrapsíquicos para compreender melhor a génese de comportamentos/sintomas
que não têm uma explicação imediata, aparente (foco em padrões de sentimentos, dos quais
muitas vezes não nos apercebemos – e isto por mais importantes que sejam).
 Modelos cognitivo-comportamentais: foco na análise de comportamentos e pensamentos
(cognições), ao nível consciente.

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 Modelos sistémicos: foco na interpretação dos comportamentos no contexto dos sistemas


que estão em relação com o indivíduo (e.g. matriz familiar).
 Modelos biopsicossociais: valorizam (mais explicitamente do que os outros modelos) a
interacção entre os factores de tipo biológico, psicológico e social.

NOTAS:
A discussão dos modelos predominantemente biológicos extravasa o âmbito desta UC, mas o aluno pode
rever, a propósito, matérias da UC Fundamentos de Neurociências (2º Ano MIM). Muitas vezes, na literatura
psicológica e sociológica, os modelos biológicos são designados ‘modelo biomédico’ (como Ayers & Visser,
2021, que contrapõem modelos biomédicos e biopsicossociais). Esta nomenclatura/dicotomia não é
consensual - pode questionar-se a colagem do pensamento médico, que sempre foi ecléctico, às abordagens
estritamente biológicas; os modelos ‘verdadeiramente’ médicos, partindo do conhecimento aprofundado das
raízes biológicas do comportamento, valorizam (com base na evidência) factores psicológicos e sociais.

As páginas indicadas do Cap. 16 (Ayers & Visser, 2021) – cf. bibliografia essencial - dão uma boa ideia dos
modelos dos 3 Ps e de vulnerabilidade-stress, a propósito de ‘modelos psicossociais’.

Encontrará na literatura referências aos chamados modelos ‘sociais’; compreenderá esta noção ao estudar a
importância dos ‘acontecimentos de vida’ (life events) ou dos determinantes socioeconómicos na saúde.

Tyrer & Steinberg (2013) discutem vários modelos aplicados às doenças mentais (cf. bibliografia
complementar); esta discussão é crucial também na aplicação nos comportamentos ‘normais’, mas o livro
pode ser demasiado complexo para o estudante pré-graduado, sobretudo antes da UC Psiquiatria.

Uso da expressão ‘modelo’ noutros Temas (por exemplo, na bibliografia sobre personalidade (TEMA 2) o
termo é também empregue). Os modelos psicodinâmicos do desenvolvimento da personalidade derivam da
aplicação dos princípios aqui descritos na secção 3; por outro lado os ‘modelos dos traços’ ou o ‘modelo
psicobiológico’ (Cloninger) surgiram no contexto específico do estudo da personalidade.

Para exemplos clínicos da utilização psicoterapêutica dos princípios dinâmicos (de inspiração psicanalítica),
cognitivo-comportamentais ou sistémicos/terapia familiar (cf. secções seguintes), o aluno poderá consultar o
Cap. 19 (Ayers & Visser, 2021) e os capítulos correspondentes do livro Shorter Oxford Textbook of Psychiatry
indicado na UC Psiquiatria e para a PNA – cf. bibliografia complementar. Na verdade, é difícil perceber estes
modelos sem uma noção geral da sua aplicabilidade, o que é difícil nesta UC pelas limitações de tempo.

Para uma ideia geral sobre diferentes formas de psicoterapia, pode também consultar os sites da “American
Psychological Association” (secção: Different approaches to psychotherapy) ou do “UK Council for
Psychotherapy” (secções: What is psychoterapy?/Types of psychotherapy/How psychotherapy works).

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3. MODELOS PSICODINÂMICOS (OU DE INSPIRAÇÃO PSICANALÍTICA)


[Enumeram-se abaixo as características destes modelos, segundo Zeldow (2010) entretanto actualizado por
Yarns & Zhu (2020); embora considerado bibliografia complementar, a leitura deste último capítulo é rápida
e permite perceber melhor os tópicos deste Tema, recorrendo a exemplos clínicos.]

 Importância do inconsciente (“to a large extent we are characters living out a script written by the
unconscious” in Psychodynamic psychiatry in clinical practice – Gabbard (2005). Qualquer formulação
psicodinâmica do comportamento humano pressupõe que as nossas vidas são reguladas por forças internas
das quais não estamos conscientes. Estas ‘forças’ (imagens, pensamentos, sentimentos) seriam, neste
modelo, os determinantes primários do que somos e do que fazemos.
 Noção de conflito (inevitável, em termos intrapsíquicos e interpessoais). Pode haver conflito entre dois
impulsos, entre um impulso e uma proibição, entre opções a tomar, etc.
 Freud propôs inicialmente um modelo topográfico (inconsciente, pré-consciente, consciente), que
reformulou posteriormente no modelo estrutural (Id, Ego, Superego).

Modelo estrutural do ‘aparelho psíquico’ (de acordo com a teoria freudiana)

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 O ‘princípio do prazer’ (tentativa de obter gratificações e intolerância ao seu adiamento) governa o Id, que
actua conforme o ‘processo primário’ de pensamento (primitivo). O Ego (ou Eu) permite transacções
adaptativas com o ambiente, agindo sob o ‘princípio da realidade’ e de acordo com o ‘processo secundário’
de pensamento (mais maduro e sinónimo de pensamento realista, adaptado à resolução de problemas).
Pode considerar-se que o Superego inclui a Consciência e também o ‘ideal do Eu’ (conceitos diferentes).
 Mecanismos de defesa do Eu (exemplos relacionados com o quotidiano e a prática clínica): denegação,
projecção, regressão, fixação, repressão, identificação, formação reactiva, isolamento, intelectualização,
deslocamento, supressão, humor, altruísmo, antecipação.
[Para explicação dos pontos acima, consultar Yarns & Zhu (2020) - inclui definições e ilustrações sobre
os mecanismos de defesa do Eu, adaptadas ao contexto da Medicina e do estudante de Medicina].
Especificação de alguns mecanismos:

 Denegação – mecanismo primitivo pelo qual os factos ou implicações da realidade externa não são
reconhecidos

exemplo: doente que não se apercebe, conscientemente, da gravidade de um


diagnóstico/prognóstico apesar de esta lhe ter sido comunicada, de forma clara, numa consulta.
Conta em casa: “O médico disse-me que não havia grande problema” – quando, na verdade, o
médico não lhe disse isso. Note-se que os médicos podem, obviamente, ter o mesmo tipo de defesa
(como qualquer pessoa em circunstâncias difíceis) …

 Projecção – os impulsos/desejos reprimidos ou inaceitáveis são atribuídos a outra pessoa (e não


aceites como próprios)

exemplo: doente que está convencido de que um médico não gosta dele – quando na realidade, é
ele que poderá não gostar do médico; a hipótese dinâmica é que esses sentimentos, menos
aceitáveis para o doente, sejam ‘projectados’ no outro, de forma inconsciente. Note-se que poderia
ocorrer o inverso, no sentido do médico para o doente…

 Deslocamento – as emoções são redireccionadas do seu objecto original para um substituto que
seja mais aceitável

exemplo: pessoa que está muito irritada com um amigo, de forma muito exagerada face a um
pequeno problema entre os dois; o amigo fica surpreendido, acha que se trata de um mal-
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entendido, ‘uma tempestade num copo de água’; ao mesmo tempo, sabe que a pessoa está a passar
por dificuldades no emprego, em conflito com o patrão; a hipótese dinâmica é que a irritação com
o patrão surja ‘deslocada’ para o amigo, após um desencadeante banal. Só se tratará de um
verdadeiro ‘mecanismo de defesa’, no sentido psicanalítico, se o processo for inconsciente: a
pessoa pode reagir com surpresa genuína quando confrontada directamente com a hipótese de
‘deslocamento’. Se a hipótese for verdadeira e a pessoa tiver capacidade de insight, então aquilo
que poderia estar próximo da consciência – saber que a zanga verdadeira não se prendia com o
amigo – torna-se consciente…

Os mecanismos de defesa, por definição inconscientes, podem ser classificados de acordo com o grau
em que distorcem a percepção da realidade. São geralmente considerados mecanismos ‘maduros’
(componente consciente variável): supressão, humor, altruísmo ou antecipação. Exemplos de
mecanismos menos maduros: denegação, projecção (grau apreciável de distorção da realidade).

 Determinismo psíquico – importância do passado no presente: os acontecimentos do passado,


principalmente infantil, têm influência profunda no nosso comportamento enquanto adultos (neste sentido,
a nível inconsciente). Perspectiva do desenvolvimento psicossexual (Freud): ‘zonas erógenas’ e fases do
desenvolvimento (importância da relação com o corpo no decurso do desenvolvimento).
 Transferência e contra-transferência.
o Transferência (Nemiah, 1973; ap. Zeldow, 2010): ‘atitudes, sentimentos e fantasias que um doente
pode experimentar em relação ao médico, muitos deles com origem, aparentemente irracional, nas
suas próprias necessidades inconscientes e conflitos psicológicos, e não nas circunstâncias
presentes da relação terapêutica’. Trata-se de um fenómeno essencialmente regressivo, baseado em
factores psicológicos e não na realidade do ‘aqui e agora’.
o A contra-transferência passa-se no sentido inverso, do médico para o doente.

EM RESUMO:

O modelo psicodinâmico tem pontos fortes (aceita a complexidade humana e tenta esclarecê-la;
potencialidades clínicas, incluindo o uso diagnóstico e terapêutico da relação médico-doente; há estudos
promissores sobre as ligações entre ‘mente’ e ‘cérebro’, num reenquadramento de alguns princípios da
psicodinâmica – pode pesquisar o conceito de ‘neuropsicanálise’, por exemplo em Marini et al, 2016).
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Tem também limitações (subjectividade –variabilidade entre observadores diferentes; dificilmente testável,
pelo que alguns críticos têm contestado uma base verdadeiramente científica; tudo pode ser interpretado…;
utilização clínica pode ser demorada e cara, no que se refere a tratamentos psicanalíticos estruturados).

A génese da psicanálise clássica deve ser contextualizada historicamente. Depois do seu apogeu, no século
XX, o modelo tornou-se controverso; alguns conceitos psicodinâmicos iniciais têm sido abandonados,
questionados e/ou revistos. Porém, o legado de Freud e dos seus discípulos mais próximos inspira múltiplos
autores recentes (v.g. Yalom), sendo crucial pela utilidade clínica de que se continua a revestir. Devendo
reconhecer-se que, no momento presente, a ‘evidência’ (prova científica) de resultados das terapias de
inspiração psicanalítica é relativa, tal não nos permite concluir ‘ausência de resultados’: as áreas clínicas
intrinsecamente interpessoais e subjectivas são mais difíceis de avaliar. Para aprofundar, a nível avançado:
Fonagy, 2003 (Psychoanalysis today) ou ‘O inconsciente está no cérebro’ (J.C. Melo, 2017; Climepsi, Lisboa).

NOTAS:

O desenvolvimento psicossexual na perspectiva freudiana e a perspectiva psicossocial de Erikson serão


abordados, em ‘Desenvolvimento humano e ciclo de vida’ – TEMA 3. Os conceitos ‘transferência’ e
‘contratransferência’ serão ilustrados nas aulas sobre comunicação e relação médico-doente – TEMA 10.

Nesta UC, não se espera que o aluno vá além dos aspectos genéricos dos modelos dinâmicos. Deverá saber as
suas características principais e, por exemplo, o que se entende por denegação, projecção ou deslocamento:
isso será útil para a discussão de casos nas aulas (incluindo as práticas) e para compreender a utilidade da
formulação dinâmica de diversas situações clínicas. Para outras fases de aprendizagem, mas podendo ser
trazidos para discussão nas aulas:

 Teorias das relações de objecto (e.g. Balint, Klein, Mahler, Winnicott, Fairbairn)
 As relações com pessoas significativas (mãe, pai, etc,) são ‘internalizadas’ (sob a forma de
representações pessoais internas na nossa mente.
 Não existe uma correspondência integral (relação de um para um) entre a pessoa (objecto) real e
a representação internalizada por outro…
 Objecto transitivo, conceito de “mãe suficientemente boa” / “good enough mother” (Winnicott).
 Desenvolvimento do narcisismo na perspectiva de Kohut.
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4. MODELOS COGNITIVO-COMPORTAMENTAIS

Nesta secção, aconselha-se inverter a ordem habitual do estudo, lendo primeiro Ayers & Visser (2021) – cap.
10, secção Aprendizagem; em baixo, são esclarecidas algumas dúvidas terminológicas e aprenderá conceitos
úteis para o 5º ano MIM (Psiquiatria).
Interessa apreender a utilidade genérica dos modelos cognitivo-comportamentais em Medicina e não
propriamente memorizar todos os conteúdos (incluindo os Glossários em ANEXO); por exemplo, deverá saber
distinguir condicionamento clássico e operante, discutindo aplicações práticas; reconhecer a utilidade da
aprendizagem social; ou compreender o significado de ‘distorção cognitiva’, ilustrando-o com exemplos.

 Enquadramento

Os modelos comportamentais e os modelos cognitivos surgem como: a) resposta possível às lacunas dos
modelos psicodinâmicos, nomeadamente a impossibilidade de observar e manipular os elementos
envolvidos no processo explicativo do funcionamento mental; b) corolário de contribuições de duas
correntes: o comportamentalismo ou “behaviourismo” (foco na aprendizagem) e o cognitivismo.

COMPORTAMENTALISMO
Princípios da aprendizagem:

a. Aprendizagem por HABITUAÇÃO: diminuição da tendência para responder a estímulos que se


tornaram familiares devido a exposição repetida.

b. CONDICIONAMENTO CLÁSSICO (Pavlov)


 A reacção da pessoa (resposta condicionada) acontece automaticamente na presença de um
estímulo condicionado que previamente não produzia reacção. Esta resposta surge como o
resultado de uma aprendizagem, que decorre da associação (através de emparelhamentos)
de um estímulo neutro com um estímulo incondicionado. A resposta que era evocada pelo
estímulo incondicionado (resposta incondicionada) passará também a ser evocada na
presença de um estímulo igual/semelhante ao estímulo neutro, designado então por
estímulo condicionado. Este processo é na sua maior parte implícito e involuntário para a
pessoa. Existe evidência neurofisiológica do condicionamento clássico, nomeadamente
com o estudo dos mecanismos de facilitação pré-sináptica e da memória implícita.
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 Ver a descrição das experiências de Pavlov em Ayers & Visser, 2021 – pp 257-8 (pode
aprofundar em qualquer livro clássico de Psicologia ou consultar Simply Psychology -
acesso em 1/9/2022).

 Exemplo clínico importante: ‘náusea antecipatória’ - Ayers & Visser (2021) – pp 258-60.
 Pode ajudar, na leitura da bibliografia, consultar o ANEXO (glossário de mecanismos
adicionais de aprendizagem por condicionamento clássico).

c. CONDICIONAMENTO OPERANTE (Skinner)

Pontos fundamentais no referencial teórico do condicionamento operante:

 As consequências de um comportamento determinam a probabilidade de esse


comportamento ocorrer no futuro.

 A aprendizagem explica-se pela ocorrência de contingências de reforço.

 A pessoa pode estar consciente do processo de aprendizagem e pode ter algum


controlo voluntário sobre ele.

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Reforço positivo, reforço negativo e punição

Reforço positivo – aumenta a probabilidade de um comportamento se repetir. A pessoa


terá maior probabilidade de voltar a exibir um comportamento (aprende a adoptar um
comportamento numa situação) se nessa situação (ou semelhante) esse comportamento for
imediatamente seguido por um estímulo reforçador positivo (recompensa). Essa
probabilidade será mais forte quanto maior for o número de ensaios (estímulo,
comportamento e consequência).

Punição – é o oposto do reforço positivo. Diminui a probabilidade de um comportamento.


A pessoa tende a deixar de exibir um comportamento numa situação se esse comportamento
for seguido por um estímulo reforçador desagradável ou aversivo, ou caso seja removido
um reforçador positivo (i.e. custo da resposta).

Reforço negativo – tal como o reforço positivo, aumenta a probabilidade de um


comportamento acontecer. A pessoa aprende a exibir um comportamento para evitar ou
remover/cessar um estímulo reforçador negativo, desagradável ou aversivo (presente
inicialmente na situação). A recompensa resulta da remoção do estímulo desagradável.
Exemplo: utilização de analgésicos de acção rápida eficazes no controlo da dor.

[Alguns textos quase sobrepõem os conceitos de reforço negativo e punição, como acontecia
em Ayers & Visser (2018). Porém os dois processos são diferentes, como mencionado em Alder
et al (2009), do qual o quadro em baixo foi adaptado].

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d. APRENDIZAGEM SOCIAL (Bandura)

Aprendizagem de comportamentos pela observação e imitação de modelos


(‘modelagem’/modelling). Importância na aprendizagem médica ou em promoção da saúde.

Leia a bibliografia essencial sobre a aplicação dos princípios da aprendizagem em saúde e na clínica (efeito
placebo, fobias hospitalares, náusea antecipatória na quimioterapia em oncologia, adesão ao tratamento).

[para exemplos, consultar o Cap. 10 de Ayers & Visser (2018) ou, de forma bem sistematizada, Alder &
Abraham et al - “Understanding learning”, in Alder et al: Psychology and Sociology applied to Medicine.
3rd edition. Churchill Livingstone, 2009 (pp 22-23), disponível na Biblioteca FCM-UNL]

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COGNITIVISMO
 Os pensamentos são considerados mediadores dos comportamentos e sentimentos da pessoa numa
determinada situação. As pessoas podem focar-se nas suas atribuições e interpretações acerca das
situações, sem integrar todos os aspectos da realidade. Estes erros do pensamento são as distorções
cognitivas.

 Seguem-se exemplos de distorções cognitivas (frequentes no dia-a-dia e, mais sistematicamente,


em estados emocionais marcados ou mesmo quadros patológicos, como a depressão). Em casos
concretos pode haver uma certa sobreposição quanto a tipos diferentes de distorção, presentes em
simultâneo (por exemplo, combinações de generalização excessiva e abstracção selectiva):

Pensamento dicotómico – classificar as situações em extremos (tudo ou nada); ex: “este médico
é perfeito”, “a consulta foi um desastre”, “sou um falhado, não consigo fazer nada na vida”.

Conclusões apressadas – tirar uma conclusão ou interpretar uma situação considerando apenas
uma explicação possível ou um número muito reduzido de hipóteses; ex: doente que diz (ou pensa),
vendo o médico a conter um bocejo: “o Sr. Dr. está farto das minhas queixas” (note que o doente
não sabe que o médico quase não dormiu na noite anterior, em que esteve de urgência).

Raciocínio emocional – classificar uma situação ou prever algo em relação ao futuro com base
nos sentimentos que está a experimentar no momento, não considerando elementos objectivos da
situação; ex: “acordei angustiado e acho que a cirurgia não vai correr bem”.

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Generalização excessiva – quando acontece algo muito relevante, a pessoa tende a sobrestimar a
probabilidade dessa situação ocorrer novamente (quando na realidade essa probabilidade pode ser
baixa); ex: “não quero voltar a tomar a pílula porque da última vez fiquei com mais borbulhas”

Abstracção selectiva – classificar uma situação apenas com base num elemento da mesma, sem
considerar o todo (i.e., interpretar a situação fixando-se apenas num aspecto); ex: “falhei, hoje
abusei nos doces e não consigo parar de pensar nisso” (quando tem cumprido a dieta regularmente).

Personalização – achar que um acontecimento se refere a si sem base aparente para tal; ex: “hoje
o médico disse que estavam a ter um dia complicado nas consultas, deve ser porque o meu caso o
preocupou muito”.

Pensamento auto-injuntivo – utilização recorrente na linguagem de “devo…” e “tenho de…”. A


pessoa orienta as suas acções demasiado em conformidade com a desejabilidade social e ideais de
perfeição; ex: “não devemos pôr em causa as pessoas que nos estão a ajudar e por isso não vou
perguntar ao médico se há outro hospital mais especializado no meu problema”.

EM RESUMO: o modelo cognitivo-comportamental teve um enorme desenvolvimento nas últimas décadas.


Mas, tal como todos os outros modelos, tem também sido alvo de críticas.

Alguns pontos fortes:

 A sua aplicação prática e clínica é mais facilmente mensurável/testável. Em muitos domínios, há hoje uma
documentação alargada da evidência científica que sustenta o modelo.
 Foco concreto (a nível do consciente), o que torna a sua utilização geralmente menos morosa e
consequentemente mais económica.

Algumas críticas:

 Considerado por alguns críticos como “superficial”. Por exemplo, pode não procurar explicar a fundo o
que leva ao aparecimento das distorções cognitivas.
 Possibilidade de ‘substituição de sintomas’, na opinião de alguns autores psicodinâmicos e.g. em fobias
(embora a evidência tenha contrariado parcialmente esta crítica).

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5. MODELOS SISTÉMICOS
 Baseados na teoria geral de sistemas (von Bertalanffy) e na teoria cibernética. Um sistema é
composto de elementos que se inter-influenciam constantemente. Grande ligação ao estudo das
famílias e às terapias familiares. [o modelo sistémico é desenvolvido no TEMA 7: saúde e doença
na família; nesse Tema compreenderá melhor os conceitos e exemplos seguintes]
 Um comportamento pode permanecer inexplicado até ser colocado em contexto i.e., enquadrado
no conjunto de crenças, situações, relações e acções que constituem a sua ‘matriz’ (exemplo:
fenómenos de triangulação, termo proposto por Bowen).
 Enfoque na contextualização do indivíduo enquanto ser relacional (“relaciono-me, logo existo”):
a intervenção toma como objecto um sistema (e.g. família, grupo de trabalho, organização). Muitos
autores sistémicos formularam princípios/axiomas que podem ser enunciados de forma
simplificada:
a. Princípio da totalidade/“não somatividade” (um sistema é mais que a soma das partes).
Por exemplo, a informação decorrente de observar a interacção de elementos da família
pode ser muito diferente da que obtemos falando em separado com esses elementos.
b. Princípio da circularidade (o indivíduo e o sistema de que faz parte são inseparáveis;
influenciam-se reciprocamente e continuamente). Por exemplo, o comportamento de um
pai pode ser muito influenciado pelo comportamento de um filho, e reciprocamente, até ao
ponto de ser difícil (e arbitrário) estabelecer onde está a causa e o efeito.
c. Princípio da equifinalidade (caminhos diferentes podem levar a um mesmo resultado). Os
sistemas ‘abertos’ (nós, as nossas famílias) funcionam de forma diferente dos sistemas
‘fechados’. Por exemplo, um comportamento de consumo de drogas resulta habitualmente
de vários factores, em combinações complexas consoante as pessoas e as circunstâncias. O
mesmo problema pode radicar em determinantes muito diferentes (biológicos, hereditários,
situações de vida, psicopatologia, problemas familiares ou sociais, etc.). Noutro exemplo,
um indivíduo pode tender para certas convicções ideológicas ou religiosas por influência
familiar (todos as partilham, sendo essa a cultura da família) ou porque reage contra outras
convicções na família ou no meio cultural (sendo aqui fulcral a necessidade de afirmação
pessoal/diferenciação do ‘self’).

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Psicologia Médica: TEMA 1

6. MODELOS BIO-PSICO-SOCIAIS
 A designação ‘modelo biopsicossocial’ foi introduzida por G. Engel (1977), médico e académico
norte-americano que se notabilizou no campo da medicina psicossomática e psiquiatria de ligação.
Visava contrariar certas perspectivas então dominantes, demasiado centradas nos factores
biológicos. Intentava uma perspectiva mais equilibrada, que valorizasse igualmente os
determinantes das áreas psicológica e social. Este movimento derivou do reconhecimento das
potencialidades, mas também das críticas aos modelos predominantemente biológicos:
 Pontos fortes dos modelos biológicos
o Trouxeram benefícios inquestionáveis à medicina em geral:
 Melhoria do conhecimento sobre mecanismos fisiopatológicos
 Descoberta de novos factores etiológicos
 Avanços no diagnóstico e tratamento
o Modelos teóricos geralmente sólidos e claros, o que permite que sejam testados.
 Críticas aos modelos biológicos
o Princípio do reducionismo – a tentativa de interpretar fenómenos complexos como
o adoecer através de e.g. reacções neuro-químicas é muitas vezes insuficiente.
o Mesmo doenças com mecanismos fisiopatológicos bem documentados, v.g.
diabetes, têm apresentações diferentes dependendo da pessoa e contexto.
o Se o anterior é verdade para doenças com fisiopatologia bem documentada, o que
dizer em relação às perturbações do estado mental?
 No fundo, o modelo bio-psico-social pode ser considerado um modelo do tipo sistémico.
 Actualmente, traduz-se numa filosofia subjacente à prestação dos cuidados e num conjunto de
princípios práticos com aplicação clínica, adaptando a prática dos serviços às necessidades
específicas de cada pessoa ou sistema (Borrell-Carrió et al, 2004).

EM RESUMO:

O Modelo biopsicossocial (à semelhança dos restantes) tem pontos fortes:

 potencia uma perspectiva abrangente, dita ‘holística’, com potencialidades clínicas;

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 privilegia a visão ‘centrada na pessoa’, em comparação com modelos predominantemente biológicos;


 ajuda a que os cuidados fossem pensados de forma integrada, em equipas multidisciplinares;

e também limitações:

 considerado por alguns críticos como ‘ateórico’ ou (e.g. Ghaemi, 2009), redutível a mero eclecticismo;
o termo bio-psico-social tornou-se omnipresente e quase lugar-comum, sem que exista (em muitos
contextos) uma aplicação equivalente dos seus princípios na prática clínica quotidiana;
 seria desejável desenvolver formas efectivas para testar o seu funcionamento empírico.

[Estes conteúdos são ilustrados no Cap. 1 de Ayers & Visser (2021) – bibliografia essencial. O aluno não se
pode limitar a repetir acriticamente termos vagos como ‘biopsicossocial’ ou ‘holístico’; deve perceber a sua
aplicabilidade específica – por exemplo, na análise dos casos para as aulas práticas; com interesse prático e
histórico, pode ler uma descrição do modelo no artigo original de Engel na Science (1977) e a discussão de
um caso clínico (Engel, 1980 – cf. bibliografia complementar).]

 Como corolário deste Tema, retenha o conceito de ‘Compreensão Situacional’, na linha do Professor
Eduardo L. Cortesão (compreensão dinâmica das interacções personalidade/self em situação: importância
das matrizes familiar, laboral e sociocultural). Existe uma relação óbvia entre esta perspectiva, de
inspiração psicodinâmica inicial, e os modelos sistémico e biopsicossocial: trata-se de um bom exemplo
de como modelos diferentes do funcionamento psíquico podem não ser antagónicos, mas complementares.

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BIBLIOGRAFIA:

Essencial:
 S. Ayers, R. de Visser: Psychology for Medicine. Sage, 2021. [disponível na Biblioteca FCM-UNL]
o Cap. 1 Psychology and Medicine [foco nas págs. 4-22]
o Cap. 10 Cognitive psychology: pp 245-273 [para o TEMA 1/Aprendizagem: pp 257-264]
o Cap. 16 Psychiatry and Neurology: pp 417-420 [secção ‘Models of psychiatric disorders’]

Complementar:
 Ayers S, de Visser R: Psychology for Medicine. Sage, 2021. Cap. 19 Psychological Intervention: pp 489-
509. [páginas focadas nas psicoterapias cognitivo-comportamentais e psicodinâmicas]
 Engel, GL. The clinical application of the biopsychosocial model, Am J Psychiatry 1980; 137 (5): 535-
544. [em acesso livre via Google Scholar]
 Harrison, Cowen, Burns & Fazel (2018). Shorter Oxford Textbook of Psychiatry. 7th ed, Oxford
University Press. [aconselhado na UC Psiquiatria e PNA; pode consultar os capítulos de Etiologia – secção
sobre Ciências Sociais e Psicologia - e de Terapias Psicológicas; na Biblioteca FCM-UNL]
 Tyrer P, Steinberg D (2013). Models for mental disorder. Wiley Blackwell (5th edition). [texto mais
pormenorizado e avançado; indicado apenas como referência futura]
 Wright CD et al (2019). A Framework for Understanding the Role of Psychological Processes in Disease
Development, Maintenance, and Treatment: The 3P-Disease Model. Frontiers in Psychology 10:2498:
[ilustra em pormenor como aplicar o modelo biopsicossocial em termos de variáveis predisponentes,
precipitantes e perpetuantes; exemplos na dor crónica, doenças gastro-intestinais ou cardíacas]
 Yarns & Zhu: “Psychodynamic approaches to human behavior”, in Wedding & Stuber: Behavior &
Medicine. 6th Ed, 2020 (pp 137-149). [apresenta o modelo psicodinâmico, suas limitações e pertinência à
luz da DSM-5 e dos avanços das neurociências; a 5ª edição do mesmo livro, também disponível na
Biblioteca FCM-UNL, incluía o capítulo homónimo de Zeldow (2010), tradicionalmente indicado na UC.]

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ANEXO - GLOSSÁRIO:

MECANISMOS ADICIONAIS DE APRENDIZAGEM POR CONDICIONAMENTO CLÁSSICO:

Extinção – acontece quando o estímulo condicionado é apresentado frequentemente e durante muito


tempo sem o estímulo incondicionado.
Generalização – estímulos diferentes, mas com semelhanças relativamente ao estímulo condicionado
podem igualmente produzir respostas condicionadas.
Ofuscação – acontece quando um estímulo condicionado é composto por vários elementos (uma música
e um cheiro intenso, como no exemplo abaixo). No caso em que um desses elementos é mais saliente (i.e.,
se impõe com mais facilidade) a resposta condicionada que esse estímulo evoca isoladamente é mais forte,
em comparação com a resposta ao estímulo menos saliente.
Considere, por exemplo, um atleta que sofreu uma contractura muscular num ginásio. Nesse momento,
ouvia-se uma certa música ambiente e sentia-se um cheiro intenso particularmente agradável (este
segundo estímulo era mais saliente). Entretanto, durante o tempo de paragem do atleta e como forma
de diminuir os custos, os gestores do ginásio decidiram colocar a fragrância referida nos difusores de
cheiro, apenas alguns dias por semana, embora mantendo a música ambiente habitual. No regresso aos
treinos, o atleta, que mantinha algumas dores, passou a desenvolver reacções estranhas. Nos dias em
que as fragrâncias eram colocadas nos difusores, sentia-se mais tenso, em particular na região
lesionada. Nos restantes dias, havendo apenas música, os treinos corriam muito melhor.
Bloqueio – acontece quando um estímulo condicionado impede que um estímulo neutro novo se possa
associar a este emparelhamento, mesmo que seja apresentado várias vezes em conjunto com o estímulo
condicionado e o estímulo incondicionado (i.e. o estímulo previamente condicionado impede outro de
evocar a resposta condicionada). No caso da experiência mais conhecida de Pavlov, quando o som de uma
campainha se torna um estímulo condicionado forte na resposta condicionada de salivação, será difícil
introduzir um novo elemento no emparelhamento. Se houvesse intenção de adicionar outro estímulo a este
emparelhamento (ex: luz), o estímulo previamente condicionado (som) iria impedir que a luz se associasse
mesmo tentando inúmeros emparelhamentos (som+luz+comida). Quando testada isoladamente a luz não
iria produzir salivação, mas o som continuaria a produzir essa resposta condicionada.

Considere o seguinte exemplo, extraído do quotidiano, sobre um restaurante que tinha uma
luminosidade muito característica e servia pratos muito saborosos. Logo à entrada, os clientes diziam
frequentemente que, só de ali chegarem, ficavam ‘satisfeitos’ e com uma sensação de prazer. Por isso,
toleravam bem o tempo de espera no hall de entrada, que tinha exactamente a mesma composição de
luzes que o interior do restaurante. Contudo, mesmo sendo evidente a vantagem deste jogo de luz, os
proprietários viram-se obrigados a encontrar uma alternativa: as lâmpadas em causa fundiam com
facilidade e tinham-se tornado muito caras. Intuitivamente conhecedores dos princípios do
condicionamento clássico, os proprietários tentaram associar uma música agradável, com propriedades
sensoriais intensas, ao jogo de luzes em questão. A sua intenção era a de, no futuro, substituir a
composição de luzes pela música introduzida. Mas quando finalmente passou a existir apenas música
no restaurante, apesar de a comida continuar saborosa e de os velhos clientes se manterem, os
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proprietários ficaram surpreendidos por perceber que esses clientes se tinham tornado menos tolerantes
com o tempo de espera. Ou seja, não foi possível tornar o estímulo neutro (música) em estímulo
condicionado. Pelo contrário, os novos clientes (aqueles que começaram a frequentar o restaurante na
fase em que passara a haver música a par do jogo de luzes) toleraram muito bem a retirada das luzes.
Com frequência, estes novos clientes, referiam que só de ouvir a música característica do restaurante
logo à entrada, ficavam ‘satisfeitos’.

OUTROS MECANISMOS DE REFORÇO POR CONDICIONAMENTO OPERANTE:

Certos autores distinguem entre reforço e reforçador. Reforço corresponde ao processo ou mecanismo de
aprendizagem (ex: reforço positivo ou negativo). Reforçador corresponde a um estímulo relacionado com
o processo de reforço; este estímulo pode ser uma recompensa (reforçador positivo) como no mecanismo
de reforço positivo, ou um punidor (reforçador negativo) como pode acontecer na punição, quando o
reforçador é introduzido, ou no processo de reforço negativo, quando o reforçador é removido.
Reforço diferencial – reforço positivo do comportamento apenas quando ele é exibido nas situações
desejadas. A pessoa aprende a exibir comportamento apenas naquela situação.
Extinção – o comportamento deixa de ser seguido pelo estímulo reforçador e extingue-se.
Reforço intermitente – o estímulo reforçador é apresentado apenas nalguns ensaios. O intervalo de
reforço pode ser de razão fixa ou variável. Quando um comportamento é adquirido por reforço intermitente
pode ser mais difícil de extinguir (ex: casinos).
Reforço por aproximações sucessivas (moldagem/shaping) – comportamentos reforçados positivamente
são aproximações do comportamento final desejado.
Sistema de economia de fichas (token economy) – utiliza-se um mediador do estímulo reforçador positivo
que a pessoa vai acumulando até obter a recompensa final (ex: sistema de pontos nos estabelecimentos
comerciais – pode ser usado para adesão a um tratamento).

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