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Universidade de Brasília – UNB

Programa de Pós-Graduação em Linguística


Aplicada
Disciplina: Aquisição de Segunda Língua
Prof. Dr. Yuki Mukai
Aluna: Laís Caroline S. Cruz

Resenha Crítica
“Instructed SLA: Constraints, Compensation, and Enhancement”
Catherine Doughty

Este capítulo aborda a instrução de segunda língua (L2) por aprendizes adultos,
mas especificamente, pós período crítico, com o foco principal no desenvolvimento da
compreensão e produção oral de L2. A autora revisa estudos sobre instrução, assim
como os tipos, e dividi o capítulo em quatro partes. A primeira parte é uma revisão de
casos que apontam ser contrários a efetividade da instrução, e a segunda parte é uma
revisão de casos a favor. Na terceira e quarta parte, a autora reflete sobre as restrições
dos adultos ao processar L2, e mostra como as pesquisas sobre instrução pode auxiliar
nesse processamento.
Muitos teóricos no início dos estudos de segunda língua eram céticos em relação
ao tratamento instrucional. Para Krashen, por exemplo, a única contribuição que a
instrução poderia trazer é prover input compreensível que pode não estar disponível fora
da sala de aula. Com isso, se gerou duas posições não-intervencionista, onde a primeira
defende que o mesmo mecanismo, a Gramática Universal, que guia a aquisição da
primeira língua (L1), também guia a aquisição de L2. A segunda posição, que também
leva o nome de Hipótese do Input (Krashen, 1982, 1985), defende que, como a L1, a
aquisição da L2 ocorre incidentalmente. Por essas posições, a instrução se faz
desnecessária. Para a autora, esse posicionamento é muito extremo, e fica próximo do
total descarte da instrução de L2. Doughty argumenta que a aquisição de L1 e a
aquisição de L2 não fazem parte do mesmo fenômeno que ocorre em instantes
diferentes da vida do aprendiz, pois eles envolvem diferentes processos cognitivos, e
para o adulto aprendiz de L2 esses processos se tornam mais difíceis e lentos sem a
instrução.
Long (1983) trouxe uma questão que gerou a atual agenda de estudos sobre
instrução de L2. Ao verificar se a instrução fazia diferença no aprendizado de L2. Em
uma tentativa de rever a teoria de Krashen sobre aprendizagem/aquisição, os resultados
encontrados indicam que para aqueles que tem apenas a sala de aula como oportunidade
para input, a instrução traz benefícios. Ao comparar instrução com exposição, os
resultados mostraram que a instrução faz diferença na aprendizagem de L2. Em 1988,
Long reconsidera a mesma questão sobre o efeito da instrução, mas desta vez dentro de
quatro domínios operacionalizados de ASL (aquisição de segunda língua). São eles: (1)
processos de ASL; (2) rota de ASL; (3) taxa de ASL; (4) nível de obtenção final de L2.
Os resultados mostraram alguns benefícios da instrução, e, embora a autora apontar que
os estudos relacionados aos domínios de ASL ainda são escassos, serviram como base
da suposição de que a instrução de L2 é eficaz. A partir disso, o foco da pesquisa sobre
instrução voltou-se para a questão do tipo de instrução mais facilitador de ASL.
Devido as comparações da eficácia dos tipos de instruções serem muito gerais a
princípio, Doughty aponta três elementos importantes para uma pesquisa de cunho
experimental sobre os efeitos da instrução, sendo eles (1) um alvo de aprendizagem
específico (ou seja, algum aspecto da L2); (2) o tratamento instrucional deve ser
psicolinguísticamente apropriado; e (3) ganhos específicos na L2 devem ser avaliados
em relação ao objetivo da instrução (por exemplo, incluir um grupo controle). A autora
aponta também ser importante que a instrução seja gravada para que o tratamento possa
ser examinado posteriormente, pois além de facilitar a interpretação dos resultados, e se
torne uma prática regular nas pesquisas de instrução de L2.
A seguir, Doughty analisa um estudo que busca determinar a eficácia geral da
instrução em L2, assim como a eficácia relativa dos tipos de instrução. O estudo
Effectiveness of L2 Instruction: A Research Synthesis and Quantitative Meta-analysis
(NORRIS; ORTEGA, 2000) consiste em uma síntese de pesquisa primária sobre a
eficácia da instrução L2, com dois propósitos em mente. Primeiro, o de sintetizar o
estado dos métodos de pesquisa experimentais e quase-experimentais e as práticas de
relatórios dentro do domínio dos estudos que investigam a eficácia instrucional da L2, e,
o segundo, fornecer um resumo quantitativo dos resultados sobre várias variáveis de
interesse geral para a pesquisa de tipo de instrução em L2. Dentre 250 estudos, apenas
49 apresentaram dados suficientes para serem analisados.
Esperava-se que essa meta-análise fornecesse uma representação precisa do que
a pesquisa até agora encontrou sobre a eficácia instrucional em L2 e várias variáveis
relacionadas. No entanto, Doughty aponta que o estado da pesquisa sobre instrução de
L2 é ainda muito menos robusto do que o necessário para que os resultados relatados
sejam considerados verdadeiramente confiáveis.
A operacionalização dos tratamentos instrucionais passou a ser mais relevante
para os estudos pois é considerada melhor ao ser analisada psicolinguísticamente em
termos de aprimoramentos de processamento de input que facilitam aos aprendizes de
L2 extrair formas e mapeá-las para significado e função. A questão geral aborda se a
instrução implícita ou se a explícita é a melhor, e até que ponto, e de que maneira a
atenção do aluno deve ser direcionada para os elementos da linguagem envolvidos no
mapeamento. Nos tipos de instrução explícita, as regras linguísticas são explicadas de
forma consciente para os alunos, e na instrução implícita os alunos aprendem as formas
linguísticas sem estar consciente delas. Conforme Norris e Ortega (2000), a instrução
que incorpora técnicas explícitas leva a efeitos mais substanciais do que a instrução
implícita a instrução que incorpora focus-on-form integrada no significado é tão eficaz
quanto a instrução que envolve um focus-on-forms. Assim, embora as abordagens
instrucionais focus-on-form e focus-on-forms resultem em ganhos grandes e
probabilisticamente confiáveis durante o curso de uma investigação, a magnitude desses
ganhos difere muito pouco entre as duas categorias instrucionais.
A autora aborda alguns vieses nas pesquisas que através da meta-análise do
Norris & Ortega pode-se analisar. O ponto principal levantado pela autora é que há
muitas medidas descontextualizadas de ensino com focus-on-forms e avaliação
metalinguística que não se baseia na competência da L2 nem no desempenho da L2
durante as fases de instrução ou avaliação dos estudos. Em vez disso, eles apenas
ensinam e exigem conhecimento da linguagem como objeto. Além disso, deve-se notar
que, mesmo quando os alvos de L2 eram ensinados por procedimentos pedagógicos
implícitos, eles ainda tendiam a ser medidos dessa maneira descontextualizada.
Na seção seguinte do capítulo, a autora aborda pesquisas relacionadas ao
processamento de L2 que foram realizadas em ambientes não orientados, para entender
melhor como investigar processamento durante a instrução de L2. Um dado que pode se
inferir dos estudos anteriores é que aquisição da linguagem infantil e a aquisição de L2
para o adulto envolve diferentes tipos de processamento para o aprendizado da
linguagem. De acordo com a autora, o processamento para o aprendizado de linguagem
muda completamente de um modo infantil, que envolve a aquisição automática de
exposição por um mecanismo específico de linguagem, para um modo adulto não
específico de domínio, que envolve um pensamento analítico durante o processamento
de input de L2.
A seguir, a autora investiga como aprimorar os estudos de instrução de L2 para
adultos, e como a instrução pode auxiliar na aquisição de L2. Duas linhas de pesquisa
abordam a questão fundamental de como direcionar a atenção do aprendiz para
estruturas linguísticas as quais ele não perceberia sozinho. São elas, processing
instruction studies e focus-on-form studies. Essas linhas de pesquisas foram motivadas
pela Noticing Hypothesis (Schmidt, 1990). De acordo com Bergsleithner (2009):

“Schmidt (1995) usa o termo noticing para registrar a ocorrência de algum


evento por meio de um registro consciente. Ele acredita que o registro
consciente de aspectos linguísticos durante o input tem um papel importante
no processo de aprendizagem de uma L2, e uma vez que, se os aprendizes
registram toda ou qualquer nova informação linguística, essa informação
pode ser internalizada” (p. 102)

A instrução focus-on-form é uma abordagem que redireciona a atenção do


aprendiz durante o processo de input, tanto durante quanto através de enunciados, (o
que remete a hipótese do Noticing), e assim, exige uma intervenção pedagógica, por
exemplo, a instrução. Essa abordagem foca em resolver problemas quando eles ocorrem
incidentalmente durante o uso comunicativo da língua na sala de aula.
Outra questão que a autora traz para aprimorar os estudos de ASL para adultos, é
entender os modos de processamento. Para Doughty, as pesquisas mostram que, para ter
sucesso, ASL deve incluir dois modos de processamento, o modo implícito e o modo
explícito, este último, de acordo com a autora, para ser acionado apenas quando o
processamento implícito é insuficiente.
Doughty conclui que o objetivo da instrução deve ser organizar o espaço de
processamento que permite que os adultos notem as pistas provenientes do input, como
quando eles faziam quando crianças. Um desafio para os pesquisadores de ASL é
determinar como a organização desse espaço pode ser implementado nos procedimentos
pedagógicos. Um segundo desafio seria desenvolver medidas psicolinguísticamente
relevantes do processamento de ASL. Por fim, instrução de L2, se tratado em termos de
processamento, pode auxiliar aprendizes ao organizar o espaço de processamento.
A partir do texto analisado, percebe-se que a autora traz em seu estudo pontos
chaves para a compreensão da instrução de L2, e como abordar esse tema em futuras
pesquisas. De acordo com Ellis (1994), “o objetivo dos estudos de ASL é a descrição e
explicação da competência linguística ou comunicativa do aprendiz” (p. 15). A forma
como Doughty constrói sua análise, onde ela investiga como ocorre o processo de ASL
em adultos, e as restrições que precisam ser levadas em consideração, fazem desse
capítulo um estudo de extrema relevância para futuras pesquisas na área.
Ao tomar um caminho diferente de diversos estudos, a autora mostra como a
instrução deve ser tratada. Muitos estudos prévios analisaram de forma enviesada, o que
gerou uma definição não muito clara sobre como o tratamento instrucional pode auxiliar
no aprendizado de L2. Ao perceber esse problema, a autora busca propor formas de
como futuros estudos podem trabalhar com a instrução para chegar a um resultado
relevante para a área, pois muitos estudos passaram a ter resultados mais conclusivos ao
incorporar os elementos propostos pela autora.
Outro ponto relevante tratado neste capítulo é a abordagem psicolinguística
adotada, que visa como os processos mentais ocorrem na aquisição de L2. De acordo
com Housen (2005), “a instrução é qualquer tentativa sistemática de possibilitar ou
facilitar a aprendizagem de uma língua, manipulando mecanismos de aprendizagem
e/ou as condições sob as quais estes ocorrem” (p. 2). Para Doughty, é preciso
compreender os processos envolvidos nesses mecanismos para se possa ter uma
definição clara de como usar a instrução a favor do aprendizado de L2. Sendo assim,
processos de ASL é um fator importante nos estudos sobre instrução.

Referências

BERGSLEITHNER, Joara Martin. Mas afinal, o que é a noticing


hypothesis? Interdisciplinar-Revista de Estudos em Língua e Literatura, v. 9, 2009.

DOUGHTY, C. Instructed SLA: constraints, compensation, and enhancement, [w:]


The handbook of second language acquisition, red. C. Doughty, MH Long. 2003.

ELLIS, Rod; ELLIS, Rod R. The study of second language acquisition. Oxford
University, 1994.

HOUSEN, Alex et al. Investigating instructed second language


acquisition. Investigations in instructed second language acquisition, p. 1-27, 2005.

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