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Visão, de Gonçalves Dias (Nova coleção de recitativos...

1)

Quando o sono me pesa nos olhos,


Revoar sinto em torno de mim,
Vaga sombra que ameiga os meus sonhos
Talvez forma de algum serafim.

Toda a noite um adejo suave


Me acalenta com meigo frescor,
Vem meu anjo dos cílios retintos
Vem levar-me nas asas de amor.

Passo a noite se acaso repouso,


Sempre a ver-te nos meus sonhos d'ouro
Alva a tez, breve boca rosada,
Sobre o véu escondido um tesouro!

Numa rede d'encantos me prendes


Com grinalda de místico odor,
Vem meu anjo dos cílios retintos
Vem levar-me nas asas de amor.

Bela fada que doura meus sonhos,


Que simpática a vida me fez!
Já não és ilusão mentirosa
Eu te vejo acordando talvez!

Belo anjo d'uma alma celeste


Seu doce olhar de graça e pudor,
Vem meu anjo dos cílios retintos
Vem me arroubar d'extremos de amor I

O desejo, Pedro de Calazans (Nova coleção de recitativos...)

Mulher, és bela qual não sei pintar-te!


Só sei amar-te, e como eu sei ninguém
Tipo sublime de apurado gosto
N'alma e no rosto, no sorrir também !

Dessa cadeia em que se liga o belo,


Tu foste o elo mais perfeito, oh! sim !
Como que em prova do requinte d'arte

1
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Quis Deus formar-te — tão formosa assim.

Úmidos lábios de acender desejos,


Provocam beijos de paixão infinda ;
Que amenidade d'expressão tem ela !
Oh! como é bela, sedutora e linda !

Na sala ostenta caprichosas ondas,


Formas redondas do corpinho leve;
Quanta nobreza, que pisar sereno !
Que pé pequeno... que cintura breve !

E as mãos macias, cetinosas, puras...


Tranças escuras, fronte veneranda,
Colo de cisne, voz sonora e doce,
Como se fosse uma harmonia branda!

E aquele agrado, que por ti resume


Todo o perfume da mulher moral,
E' como o ímã que seduz a gente,
Filtro inocente, que não tem igual.

Eu que a idolatro, com fervor sincero,


Nada mais quero que em silêncio a amar ;
No tabernác'lo de meu peito oculto,
Votei-lhe um culto — verdadeiro altar!

E por ventura, se a ambição cegar-me


Não vou prostrar-me a importuná-la, não;
Já peço muito, se disser : — desejo
Depor um beijo na mimosa mão.

Revelação de amor, Manoel de Almeida (Nova coleção de recitativos...)

Ouve e atende à fervorosa súplica,


Que venho humílimo a teus pés depor ;
Ouve-a, que é um hino mavioso cândido,
Que te revela o mais ardente amor!

Ouve e soletra esse fragmento íntimo,


Filho da crença, que em minh'alma existe ;
Depois verás que o meu futuro próspero
De ti depende e só em ti consiste.
Anjo! mulher! ou criação fantástica,
A quem minh'alma e coração vendi:
Eis-me curvado, delirante e súplice,
De amor, um sorriso, a implorar de ti.

Amo-te muito, minha pomba ingênua,


Amo-te, e sinto, no pulsar do peito,
De uma paixão dominadora e férvida
O mais sublime e poderoso efeito !...

Amo-te e creio, peregrina sílfide,


Quando se encontra o meu olhar com o teu,
Que és tu a imagem sedutora e tímida
Que em áureos sonhos me apontava o céu

És tu, que o leio neste rosto angélico,


Nos teus sorrisos, na cintura breve ;
Nas lindas curvas dos teus seios túmidos
E nesse colo da mais pura neve!

És tu, que o leio nessa fronte esplêndida,


Nas longas tranças, no sereno andar;
No porte grave e nessa voz suavíssima,
E na volúpia do teu doce olhar!....

És tu, e enfim, desta medonha dúvida,


Que me cobria de cruel receio,
Oh! jamais temo que o seu manto fúnebre
Ensombre a luz que me irradia o seio.

Resta-me agora dos teus rubros lábios


Ouvir-te alegre murmurar um — sim ;
Depois, risonho, delirante e rápido,
Voar nos solos da poesia ao fim.

Desprende, pois, as tuas asas níveas,


Quero contigo remontar-me aos ares;
Quero embalar-te nas regiões esféricas
Ao som de ignotos e gentis cantares!...

Quero, distante deste mundo vário,


Onde não chegue o seu feroz rumor,
Contigo, ó anjo, arrebatado em êxtase
Morrer, sentir e delirar de amor!...
Solitária e triste, Fagundes Varella (Nova coleção de recitativos...)

Quando ao sol posto, solitária e triste


Vagas à beira do sombrio mar,
E sobre as franjas do horizonte róseo
Cismando elevas um sentido olhar.

Quando teu vulto se desenha airoso


Da tarde estiva na serena luz;
E o manso vento te movendo as saias
Cobre de afagos teus pezinhos nus.

Quando teus lábios sedutores, belos,


Quais finas conchas de punícia2 cor,
Bebemos sopros que das ondas correm
Pejando os seios de amoroso ardor.

Quando as estrelas — infantil cardume —


Que a noite embala no cerúleo véu,
Ao vivo brilho de teus olhos negros,
Tremem ciosas na amplidão do céu.

Rude poeta, dos sertões amigo,


Gênio indomável como os euros são,
De teus encantos no feitiço preso
Luto sem forças, me debato em vão!

Mudo, ofegante, nos sarçais oculto


Nem me atrevendo a respirar sequer,
Qual dos desertos o caimão faminto
Miro-te as formas sensuais, mulher!

Um fluido estranho, que escraviza e doma,


Teu vulto exala e me encadeia então!
Se me cuspiras nesse instante ao rosto,
Eu te beijara, suspirando, a mão!

Eu bendissera teus divinos lábios!


Eu bendissera teu desdém talvez!
E me curvara como um cão rasteiro,

2
De acordo com o Dicionário Raphael Bluteau (1712): PUNÍCEO. De cor vermelha resplandecente.
Puniceus, a, um. Virgílio diz Puniceus color. Chama Horário a umas rosas muito vermelhas. [...]
Lambendo humilde teus mimosos pés!

A Transviada, de Ed. Villas-Boas (Nova coleção de recitativos...)

[...]

Assim foi ela : essa vil mundana,


Na orgia insana se atirou — perdeu !
Foi mariposa, que queimando as asas,
Do ardor das brasas nunca mais s’ergueu!

E essa infame desprezando o esposo,


Qu’eterno gozo lhe faria ter,
Prestes se atira — que fatal loucura !
Na vida impura, que lhe dá prazer!

[...]

Mulher perdida, do que servem galas,


Ou meigas falas que fingidas são?
Se desses olhos em que afetas calma,
Lê-se a tu'alma que só diz traição?!

[...]

Desenfreada nas paixões insanas,


As vis mundanas atirar-se vão;
Todo seu ouro gastam em coquetice,
E na velhice, nem sequer pra pão!...

Altivos paços habitar pretendem,


Elas que vendem seu fingido amor.
Rubras se mostram, virginais, fugaces,
Mas nessas faces já não há pudor!

Cínicas vivem, na miséria morrem!


Nem as socorrem benfazeja mão!...
Bem penitentes ao sepulcro baixam
E lá nem acham, uma cruz no chão!

Perfumes e amor, de Casimiro de Abreu (As primaveras3)

3
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NA PRIMEIRA FOLHA DUM ÁLBUM.

A flor mimosa que abrilhanta o prado


Ao sol nascente vai pedir fulgor;
E o sol, abrindo da açucena as folhas,
Dá-lhe perfumes – e não nega amor.

Eu que não tenho, como o sol, seus raios,


Embora sinta nesta fronte ardor,
Sempre quisera ao encetar teu álbum
Dar-lhe perfumes – desejar-lhe amor.

Meu Deus! nas folhas deste livro puro


Não manche o pranto da inocência o alvor,
Mas cada canto que cair dos lábios
Traga perfumes – e murmure amor.

Aqui se junte, qual num ramo santo,


Do nardo o aroma e da camélia a cor,
E possa a virgem, percorrendo as folhas,
Sorver perfumes – respirar amor.

Encontre a bela, caprichosa sempre,


Nos ternos hinos d’infantil frescor
Entrelaçados na grinalda amiga
Doces perfumes – e celeste amor.

Talvez que diga, recordando tarde


O doce anelo do feliz cantor:
– “Meu Deus! nas folhas do meu livro d’alma
Sobram perfumes – e não falta amor!”

Junho – 1858.

Quando tu choras, de Casimiro de Abreu (As primaveras)

Quando tu choras, meu amor, teu rosto


Brilha formoso com mais doce encanto,
E as leves sombras de infantil desgosto
Tornam mais belo o cristalino pranto.

Oh! nessa idade da paixão lasciva


Como o prazer, é o chorar preciso:
Mas breve passa – qual a chuva estiva –
E quase ao pranto se mistura o riso.

É doce o pranto de gentil donzela,


É sempre belo quando a virgem chora:
– Semelha a rosa pudibunda e bela
Toda banhada do orvalhar da aurora.

Da noite o pranto, que tão pouco dura,


Brilha nas folhas como um rir celeste,
E a mesma gota transparente e pura
Treme na relva que a campina veste.

Depois o sol, como sultão brilhante,


De luz inunda o seu gentil serralho,
E às flores todas – tão feliz amante –
Cioso sorve o matutino orvalho.

Assim, se choras, inda és mais formosa,


Brilha teu rosto com mais doce encanto:
– Serei o sol e tu serás a rosa...
Chora, meu anjo, – beberei teu pranto!

Rio – 1858.

Nêmesis, de Carvalho Júnior (Hespérides4)

Há nesse olhar translúcido e magnético


A mágica atração de um precipício;
Bem como no teu rir nervoso, cético,
As argentinas vibrações do vício.

No andar, no gesto mórbido, spleenético


Tens não-sei-quê de nobre e de patrício,
E um som de voz metálico, frenético,
Como o tinir dos ferros de um suplício.

És o arcanjo funesto do pecado,


E de teu lábio morno, avermelhado,
Como um vampiro lúbrico, infernal,

Sugo o veneno amargo da ironia,


O satânico fel da hipocondria,

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Numa volúpia estranha e sensual.

O perfume, de Carvalho Júnior (Hespérides)

A Artur de Oliveira

Unge-te a pele fina e cetinosa


Um perfume sutil, insinuante,
Igual à planta da Ásia venenosa,
Cuja sombra atraiçoa o viandante;

O nardo, o benjoim e a tuberosa,


As tépidas essências do Levante,
Do meio-dia a flora luxuosa,
De cores e de aromas abundante,

Não disputam-lhe o passo, a primazia,


Nem produzem-me a lânguida apatia
Que em noites de verão, lentas, calmosas,

Sinto quando debruço-me em teu seio,


Afogando-me em morno devaneio
Num mar de sensações voluptuosas.

Páginas de boêmia – XI: No cáucaso, de Múcio Teixeira (Novos Ideais5)

Assim como o cascalho em vão tenta ocultar-se


Na transparência azul dos lagos silenciosos,
Os pensamentos meus, os grandes criminosos,
Que riem-se a chorar... e vivem a matar-se!...

Procuram no meu crânio embalde concentrar-se,


Voam aos seios teus, trementes, voluptuosos...
E quais feras, rugindo em antros pavorosos,
Que a vítima aguardando espreitam-na em disfarce;

Contemplam-te da treva e na mudez te falam...


E como os vagalhões que no rochedo estalam,
Atiram-se a teus pés... volvem ao peito meu!

Seduzes como um crime e atrais como um abismo...

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Teus olhos, sóis — girando em céu de magnetismo,
São abutres sensuais... e eu — um Prometeu!...

Páginas de boêmia – XII Quadro de F. Mayster, de Múcio Teixeira (Novos Ideais)

A luz crepuscular bate-lhe em cheio


Nas formas sensuais; os olhos belos
Estão cerrados, soltos os cabelos,
As pernas nuas... descoberto o seio!

Nessa langue atitude, em que o enleio


Faz fugir o pudor, ante os anelos
Que surgem, quais fantásticos castelos,
Formados do crepúsc’lo ao bruxuleio...

Vive, sem vida, a nos tirar a vida!


Em lasciva indolência adormecida,
Como uma estrela n’amplidão etérea...

Eu sinto, ao vê-la, as crispações nervosas


Das naturezas tropicais, fogosas,
Rendido à prepotência da matéria!...

Páginas de boêmia – XIV: A lenda dos amores V, de Múcio Teixeira (Novos


Ideais)

Tens às vezes o gelo dos cristais


E a transparência vítrea das redomas,
Quando cerras as pálpebras e domas
Os potros dos desejos sensuais...

Como as nuvens em fortes temporais,


Inflamam-se a tremer as tuas pomas...
E desmaias, lasciva, ébria de aromas,
Em volúpias sombrias, infernais!...

És o Anjo do Mal!... bem o previa...


Tens o riso insolente da ironia
E o cínico disfarce da bacante!

Perdoa-me, Senhora! eu sou um louco:


De amor vou definhando pouco a pouco...
De ciúme te insulto a todo o instante!...
À mulher americana, de Luís Guimarães Júnior (Sonetos e Rimas6)

III

Cabe a ti o prazer, a ti, mulher, a glória


Que o Mundo eletrizado hoje festeja e aclama:
Nasceu o herói de ti, — e a grande voz da Fama,
Eco dos lábios teus, vai retumbar na História.

Do despotismo um dia a púrpura irrisória


Tentou — oh! grande dor! — manchar da pátria a flama:
Teu coração viril, que ensanguentado ama,
Rasgou-se, mas pulsou no seio da Vitória.

És a loira criança e a máscula firmeza:


Nobre, pura e serena: ora forte, ora terna,
Semelhante ao destino e igual à Natureza.

Raia nos olhos teus a Inspiração eterna:


Salve pois, ó doçura! ó matinal grandeza!
Salve, nova mulher! Salve, mulher moderna!

Impressos no Globo do Rio — 1876.

Tenebrosa, de Alberto de Oliveira (Canções românticas7)

Tu és como as visões de um cérebro doente.


Tens no teu grande amor o filtro da serpente.
O arsênico do Mal matou-te o coração.
Tu vives sem saber se acaso existe ou não
O arcanjo da Fé, o querubim da Crença.
O Tédio te envolveu nas asas da doença.
Tu és como um Calvário onde não há mais cruz,
D’onde roubou-se o Cristo e se extinguiu a luz.
Há as tristezas de um claustro, a solidão profunda,
No teu céu sem clarões, no ar que te circunda.
O silêncio do chão em que se vai pousar
Um féretro, essa paz sinistra, tumular,
O silêncio da dor que enrosca-se à caveira
Tem antenas pra ti, prende te a vida inteira.
Tu és um lago escuro, um pântano fatal;
Em ti só cresce um lírio—a negra flor do Mal;
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Disponível em: <https://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=118103>
Tens no teu seio a Morte, e a superfície calma
Anda sempre a esconder-me o que te corre n’alma!
Secas-te ao sol, à chuva, aos cânticos do dia,
Assim como se extingue e se esvaece e esfria
Uma lágrima negra em pálpebra de gelo.
Tu és a encarnação de um torvo pesadelo,
Ligado à minha sombra e preso à minha dor;
És da Morte e da cova, e és do meu amor !
……………………………………………………...
Que sejas triste, embora, e sejas muda, muda...
Que a Dor crave-te mais sua lanceta aguda,
Que o Mal te dilacere e a Febre te ajoelhe,
Que a figura da Morte o teu semblante espelhe,
Que morda-te da Angústia a garra envenenada,
Que escutes a descer das solidões do Nada,
Como um velho tambor rufando compassado,
As músicas do Horror!... Que morras! — Ao teu lado.
Aqui, em toda parte, a te seguir asinha,
Minha serás, mulher ! eternamente minha !

Tarde romântica, de Alberto de Oliveira (Canções românticas)

A CARVALHO JUNIOR

Obliquamente o sol, em púrpuras velado,


Fere com um beijo morno o crespo transparente,
E aos hálitos da luz o tépido ambiente
Envolve-se num véu prismático e dourado.

Trescala o incenso, a mirra, o cravo rescendente


Nas jarras orientais; então do cortinado,
Medrosa, abrindo os véus, num gesto namorado,
Ei-la a Bacante nua! a Sílfide ridente!

Faz-se, agora, talvez, como um mistério estranho...


A carne sensual, refrigerada ao banho,
Toma os crivos, a renda, os folhos, o cetim;

Enquanto n’água fresca e láctea e perfumada,


O róseo sabonete, a flor purpureada.
Desbrocha entr’alva espuma a ponta de carmim.

Après le combat, de Raimundo Correia (Sinfonias)


Entrei e achei-a só, sobre um estrado,
Com a frente oposta ao reposteiro erguido;
Lúbrico, o vento — sátiro estouvado —
Agitava-lhe o trêmulo vestido…

Ela para saudar-me, com enfado,


O alvo braço estendeu desfalecido,
E levantou pra mim o olhar rasgado
De uns violáceos círculos tingido.

Mórbido o gesto, o lábio seco e langue,


Do semblante o livor, como viscoso
Rastro de inseto vil em flor exangue…

Tudo era o vosso efeito perigoso,


Ó explosões da pólvora do sangue!
Deliciosa síncope do gozo!

A nuvem, de Teófilo Dias (Fanfarras8)

Sulcas o ar de um rastro perfumoso


Que os nervos me alvoroça e tantaliza,
Quando o teu corpo musical desliza
Ao hino de teu passo harmonioso.

A pressão do teu lábio saboroso


Verte-me na alma um vinho que eletriza,
Que os músculos me embebe, e os nectariza,
E afrouxa-os, num delíquio langoroso.

E quando junto a mim passas, criança,


Revolta a crespa, luxuosa trança,
Na espádua arfando em túrbidos negrumes,

Naufraga-me a razão em sombra densa,


Como se houvera sobre mim suspensa
Uma nuvem de cálidos perfumes!

Roast-beef, de Fontoura Xavier (Opalas9)

Ela tem a beleza, a flácida estrutura,


Os contornos viris, geométricos, altivos,
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A branca carnação dos bons modelos vivos
Do mágico buril dos Fídias da escultura.

Ressumbra-lhe a epiderme — alvíssima textura —


Os filtros sensuais, os tóxicos lascivos,
Que aos mártires da Fé, aos crentes primitivos,
Serviram de adoçar o cálix da amargura.

Ao vê-la, não cobiço os ócios d’um nababo,


Nem penso num cavalo elástico do Cabo
Para furtá-la às mãos de um Jônatas patife,

Ouço um coro ideal e harmônico de beijos!


E sinto fervilhar-me o pego dos desejos
De um Tântalo faminto em face de um roast-beef!

Pomo do mal, de Fontoura Xavier (Opalas)

Dimanam do teu corpo as grandes digitalis,


Os filtros da lascívia e o sensualismo bruto!
Tudo que em ti revive é torpe e dissoluto,
Tu és a encarnação da síntese dos males.

No entanto, toda a vez que o seio te perscruto,


A transbordar de amor como o prazer de um cálix,
Assalta-me um desejo, ó glória das Onfales!
—Morder-te o coração como se morde um fruto!

Então, se dentro d'elle um mal que à dor excite


Conténs de mais que o pomo estéril do Asfaltite,
Eu beberia a dor nos estos do delírio !.

E podias-me ouvir, excêntrico, medonho,


Como um canto de morte ao ritmo d'um sonho,
O poema da carne a dobres de martírio

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