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DINÂMICA E BILHARES ELÍPTICOS

Artur Jorge Marinho1 e Ronaldo Alves Garcia2


1 Estudante, Instituto de Matemática e Estatística, Universidade Federal do Goiás - IME
e-mail: arturxjorge@discente.ufg.br
2 Orientador, Instituto de Matemática e Estatística, Universidade Federal do Goiás - IME
e-mail: ragarcia@ufg.br

Resumo.No texto abaixo será apresentada a simples ideia de bilhar, dando enfoque
aos bilhares elípticos, que apresentam características singulares e interessantes de
fácil compreensão. Começaremos caracterizando um bilhar e logo depois se iniciará
nossa discussão nas elipses. Primeiramente um exemplo computacional muito sim-
ples será apresentado, de forma a se entender, na prática, a ideia de bilhar. Logo
em seguida discutiremos um belo resultado envolvendo elipses retirado de [1], mos-
trando o quão interessante são tais bilhares. A ideia de cáustica será trazida logo em
seguida, e um resultado de existência de cáusticas em bilhares elípticos será apresen-
tado e devidamente demonstrado [2]. Caracterizaremos as circunferências por meio
dos bilhares e, por meio da construção de um contra exemplo, mostraremos que tal
caracterização semelhante à das circunferências não é possível em elipses mais ge-
rais.

Palavras-chave: Bilhar matemático, elipses, hipérboles, bilhares elípticos, cáusticas,


trajetória de um bilhar, trajetórias 3-periódicas, triângulos, reflexão, aplicação bola de
bilhar.

• INTRODUÇÃO

Um bilhar matemático consiste em um domínio contido no plano (uma mesa de


bilhar), e um ponto de massa (a bola de bilhar) que move nesse domínio livre-
mente. No entanto, esse ponto de massa se move respeitando certas condições;
o ponto se movimenta somente em linha reta com velocidade constante até se
encontrar com a fronteira do domínio. Nesse encontro ocorre uma reflexão elás-
tica que está sujeita a uma lei familiar da física: o ângulo de incidência é igual
ao ângulo de reflexão (em relação ao vetor normal da fronteira). Depois da re-
flexão o ponto de massa continua seu movimento com a nova velocidade até se
encontrar com a fronteira novamente. E assim por diante.
Numa região compacta do plano, a órbita de um bilhar é uma curva poligonal
formada por segmentos de retas com vértices localizados na fronteira do domí-
nio. A órbita do bilhar é chamada periódica quando for uma poligonal fechada.
Os exemplos mais simples são as órbitas triangulares e são denominadas 3-
periódicas. Vale enfatizar que neste trabalho daremos uma interessante atenção
à esse tipo de órbita.
Padrões muito bonitos surgem quando investigamos trajetórias 3-periódicas em
elipses, e alguns deles serão apresentados ao leitor.

trajetória do bilhar

α
α

Figura 1:
Órbita de um bilhar em uma região do plano.

• METODOLOGIA

O texto abaixo escrito teve como suporte o direcionamento do orientador, e o principal


pilar que o sustentou foi o estudo individual do estudante.

1. BILHARES ELÍPTICOS

Como já foi dito, os bilhares elípticos apresentam padrões e características fasci-


nantes. Ilustremos aqui um exemplo computacional da ideia de bilhar elíptico.

Exemplo 1. Comecemos com a elipse mais simples de todas, isto é, uma cir-
cunferência. Iremos aplicar na prática, com métodos computacionais elementares, a
ideia de bilhar, mostrando a simplicidade de tal conceito. Para isso, consideremos a
circunferência unitária centrada na origem onde a denotaremos por K , que consiste
no conjunto de pontos que satisfazem a equação x 2 + y 2 = 1. Escolhamos o ponto
p 1 =(-1,0)∈ K . Queremos então determinar um triângulo ∆ inscrito em K e que tem
como um dos vértices o ponto p 1 e, além disso, queremos que ∆ determine uma tra-
jetória 3-periódica de um bilhar nessa circunferência. Consideremos a circunferência
orientada positivamente, isto é, no sentido anti-horário.
Defina N 1 o vetor normal unitário à K em p 1 apontando para a origem e T1 o vetor
tangente unitário à K em p 1 . Queremos encontrar um ângulo α tal que as direções
d 12 = sin αT1 + cos α N 1 e d 13 = − sin αT1 + cos α N 1 definam os dois lados do triângulo
cujo vértice é p 1 e define uma órbita 3-periódica, veja a Figura 2 abaixo.

d 13
α
α N1
d 12
T1

Figura 2:

Encontrando a interseção das retas γ1 (t ) = (−1, 0) + t · d 12 = (−1 + t cos α, −t sin α) e


γ2 (t ) = (−1, 0)+t ·d 13 = (−1+t cos α, t sin α) com K , obtemos p 2 = (−1+2 cos2 α, − sin 2α)
e p 3 = (−1 + 2 cos2 α, sin 2α). Denotando o vetor normal a K no ponto p 2 por N 2 , temos
N 2 = −p 2 e, de maneira análoga, N 3 = −p 3 . Respeitando a lei de reflexão nos bilhares,
queremos que

⟨p 1 − p 2, N 2 ⟩ ⟨p 3 − p 2, N 2 ⟩ ⟨p 1 − p 3, N 3 ⟩ ⟨p 2 − p 3, N 3 ⟩
= , =
|p 1 − p 2 ||N 2 | |p 3 − p 2 ||N 2 | |p 1 − p 3 ||N 3 | |p 2 − p 3 ||N 3 |
.
A primeira igualdade resulta em cos α = sin 2α, enquanto que a segunda igualdade
resulta na mesma equação. Portanto nosso problema possui solução e o ângulo que
π
procuramos é α = .
6

Com !isso, podemos !agora determinar os dois vértices restantes do triângulo, p 2 =


√ √
1 3 1 3
,− e p3 = , . Veja Figura 3 abaixo.
2 2 2 2

O que acabamos de fazer foi: escolhemos uma elipse K e um ponto p 1 ∈ K e nos


perguntamos se existe um triângulo inscrito em K tal que define uma órbita 3-periódica
onde p 1 é um vértice de tal triângulo. Para esse caso particular conseguimos encontrar
sem muita dificuldade tal órbita. Podemos nos perguntar ainda mais; será que existe
outro ponto em K com a mesma propriedade de p 1 ? Se existe, quantos são? Será
que infinitos pontos se comportam assim? O conjunto de tais pontos seria enumerá-
vel ou não?. Ao menos sabemos que o conjunto dos pontos p ∈ K que satisfazem tal
propriedade é não vazio. Porém, algo de fantástico ocorre, o que de fato acontece é
que qualquer ponto p ∈ K satisfaz a propriedade de p 1 . E a veracidade desse fato é
comprovada pela Proposição 1 abaixo.

Facilmente se mostra que a órbita que encontramos acima define um triângulo


equilátero, e de acordo com a Proposição 1 abaixo, todo ponto de uma circunferência
é vértice de um triângulo inscrito tal que é uma órbita 3-periódica, e tais triângulos
são também todos equiláteros. Mostraremos logo mais que se uma curva convexa e
fechada C tem a propriedade de que todos os seus pontos são vértices de um triângulo
equilátero inscrito tal que define uma órbita 3-periódica, então C é uma circunferência.
Poderemos então caracterizar uma circunferência utilizando a ideia de bilhar.
√ !
1 3
p3 = ,
2 2

(−1, 0) = p 1 α
α

√ !
1 3
p2 = , −
2 2

Figura 3:

Com o mesmo método que usamos para encontrar uma órbita de um bilhar elíptico
no Exemplo 1, podemos provar o seguinte resultado. Para uma demonstração com-
pleta, consulte [1].

x2 y2
Proposição 1. Seja ξ a elipse definida por 2 + 2 = 1. Para todo p 1 = (x 1, y 1 ) ∈ ξ
a b
existe um único triângulo ∆(p 1 ) = {p 1, p 2, p 3 } inscrito em ξ tal que ∆(p 1 ) define uma
órbita 3-periódica do bilhar inscrito em ξ. Veja Figura 4 abaixo.

Ideia da demonstração. Os passos são idênticos aos feitos no Exemplo 1 acima.


Tome p 1 ∈ ξ e denote o ângulo α como sendo o de incidência e reflexão no vértice
p 1 . Seja T1 e N 1 os vetores tangente e normal à ξ em p 1 respectivamente. Defina as
direções d 12 = sin αT1 + cos α N 1 e d 13 = − sin αT1 + cos α N 1 e encontre a interseção
das retas γ1 (t ) = p 1 + t d 12 e γ2 (t ) = p 1 + t d 13 com ξ e detone-as por p 2 e p 3 . Temos
agora um triângulo ∆(p 1 ) = {p 1, p 2, p 3 } inscrito em ξ. Imponha as condições

⟨p 1 − p 2, N 2 ⟩ ⟨p 3 − p 2, N 2 ⟩ ⟨p 1 − p 3, N 3 ⟩ ⟨p 2 − p 3, N 3 ⟩
= , =
|p 1 − p 2 ||N 2 | |p 3 − p 2 ||N 2 | |p 1 − p 3 ||N 3 | |p 2 − p 3 ||N 3 |
onde N 2 e N 3 são os vetores normais a ξ em p 2 e p 3 respectivamente.
Isso resultará na equação

c 4 |T1 | 4 cos4 α + 2(a 2 + b 2 )|T1 | 2 cos2 α − 3 = 0

Onde a 2 = b 2 + c 2 . A equação acima possui a solução que queremos e ela é dada


por
p √
a 2 b −a 2 − b 2 + 2 a 4 − b 2 c 2
cos α = q
c a 4 − c 2 x 12
2

.
Finalizando a demonstração.

T1 p 1 T3
α
α
N1 N3 p3
N2
p2
T2

Figura 4:
Ilustração da Proposição 1.

2. CÁUSTICAS EM BILHARES ELÍPTICOS

Continuemos tratando de bilhares elípticos. Uma fenômeno harmônico que ocorre


em tais bilhares são as chamadas cáusticas. Uma cáustica nada mais é, neste caso,
uma curva ϕ contida no interior da região delimitada pela elipse ξ na qual tem a se-
guinte propriedade: existe uma trajetória de um bilhar tal que as linhas contendo os
segmentos de tal trajetória são todas tangentes à ϕ.
No entanto, no caso dos bilhares elípticos algo surpreendente ocorre: ϕ é sempre
ξ

Figura 5:
ϕ é uma cáustica da trajetória do bilhar.

uma elipse ou uma hipérbole confocal com ξ, isto é, possui os mesmos focos que
ξ. Trataremos agora de demonstrar esse belíssimo fato. Para tal, precisaremos de
alguns resultados preliminares, consulte [2].

ϕ ϕ
ξ ξ
ϕ

F1 F2 F1 F2

Figura 6:
ϕ é uma cáustica da trajetória do bilhar. F1 e F 2 são os focos da elipse ξ.

Notação: Para quaisquer dois pontos P e Q , P Q denotará tanto o segmento li-


gando P e Q quanto o comprimento desse segmento. Denotaremos por l (P , Q ) a reta
passando por P e Q . A demonstração do Lema 1 é muito intuitiva e simples e portanto
será omitida. Veja Figura 7 abaixo.

Lema 1. Sejam P e Q dois pontos distintos em um mesmo lado com relação à


uma reta l . Seja Q ′ a reflexão de Q em l , e seja R o ponto de interseção de P Q ′ com
l . Então o valor mínimo de P X + Q X , X ∈ l , é atingido em R e é igual a P Q ′. Os
segmentos P R e R Q definem ângulos iguais com relação à l .
Q

X R

Q′

Figura 7:

De maneira semelhante, temos o

Lema 2. Seja Q ′ a reflexão de Q em l . Se P e Q não são equidistantes a l e


estão em lados opostos em relação a l , então l (P , Q ′) intersecta l em um ponto R .
Nesse caso, o valor máximo de |P X − Q X |, X ∈ l , é atingido em R e é igual a P Q ′.
Os segmentos de reta P R e R Q fazem ângulos iguais com l . Se P e Q são equidis-
tantes a l , então l (P , Q ′) é paralelo a l . Nesse caso |P X − Q X | < P Q ′ para X ∈ l , e
|P X − Q X | −→ P Q ′ quando P X −→ ∞.

Notação: ∠ABC representa o ângulo entre os segumentos AB e C B

Teorema 1. i- Seja C uma elipse com focos F 1 e F 2 . Seja P um ponto de C , e seja


l a tangente à C em P . Então F 1 P , F 2 P fazem ângulos iguais com l .
ii- Seja C uma hipérbole com focos F 1 , F2 . Seja P um ponto de C , e seja l a
tangente à C em P . Então l bisecta ∠F 1 P F 2 . Veja Figura 8.

i- P Q ii-
l P
P′

F1 F2 F1 F2
l
C C

Figura 8:
Demonstração: i- Seja Q qualquer ponto em l distinto de P , e denote por P ′ a
interseção de F 1 Q com C . Podemos ver na Figura 8 i- que a seguinte desigualdade é
verdadeira

Q F 1 + Q F 2 = P ′F 1 + Q P ′ + Q F 2 > P ′F 1 + P ′F 2 = P F 1 + P F 2 .

Portanto P é o ponto em l que maximiza X F1 + X F2 , X ∈ l . Assim, Teorema 1 i-


segue do Lema 1.
ii- Provamos de uma maneira similar que P é o ponto onde l maximiza |F 1 X −
F 2 X |, X ∈ l . Então Teorema 1 ii- segue do Lema 2.

Corolário 1. Seja ξ uma elipse. Se a trajetória de um bilhar passa, em algum mo-


mento, por um dos focos de ξ então todos os segmentos posteriores dessa trajetória
passam pelos focos de ξ.

Demonstração: Segue diretamente do Teorema 1 i- .

Uma consequência direta dos Lema 1, Lema 2 e Teorema 1 é o

Corolário 2. Seja C uma elipse com focos F 1 , F 2 . Tome F 2′ a reflexão de F 2 em l , a


reta tangente à C em P . Então F 1, F 2′, P são colineares e F1 F 2′ = F 1 P + F 2 P . Uma afir-
mação semelhante segue quando C é uma hipérbole, onde agora F1 F 2′ = |F1 P − F 2 P |.

Podemos agora enunciar e provar o resultado principal desta seção:

Teorema 2. As retas contendo os segmentos de uma trajetória de um bilhar em


uma elipse C são ou todos tangentes à outra elipse confocal com C ou são todas tan-
gentes à uma hipérbole confocal com C .

A1
C

F1 F2 A2
F 1′ B 1
B2
F 2′
l
A

Figura 9:
Demonstração. Seja A1 A e AA2 segmentos consecutivos de uma trajetória (Figura
9). Assuma que A1 A não intersecta F1 F 2 (o caso em que A1 A intersecta F 1 F2 é tratado
de maneira similar).
Segmentos A1 A e AA2 fazem ângulos iguais com l , a tangente à C em A. Pelo
Teorema 1 i- o mesmo acontece com F 1 A e AF2 . Portanto

∠A1 AF 1 = ∠A2 AF 2 (1)

Para i = 1, 2, tome Fi′ a reflexão de Fi em AAi . Seja C i , com focos F1, F2 , na qual é
tangente à AAi no ponto B i . Pelo Corolário 2, os pontos F 2, B 1, F 1 são colineares, e

F 1′B 1 + F2 B 1 = F 2 F 1′ . (2)

Similarmente

F 1 B 2 + F2′B 2 = F 1 F 2′ . (3)

Devemos mostrar que C 1 = C 2 , pelo qual, em vista de (2) e (3) se resume a mostrar
que

F 2 F 1′ = F1 F 2′ (4)

Como Fi′ é a reflexão de Fi em AAi , temos, para i = 1, 2,

F i′ A = F i A (5)

∠Fi′AFi = 2∠Ai AFi (6)

Equações (1) e (6) nos dá

∠F1′AF 2 = ∠F 1 AF 2 + 2∠A1 AF 1 = ∠F 1 AF2 + 2∠A2 AF 2 = ∠F 2′AF 1 (7)


Concluímos então, de (5) e (7) que os triângulos F 1′AF 2, F 2′AF 1 são congruentes, o
que resulta em (4).

Vale enfatizar que, caso a trajetória de um bilhar elíptico passa em algum momento
entre os focos da elipse, os segmentos da trajetória estão contidos em retas tangentes
ou assintóticas à elipse. Veja Figura 6 acima.

• RESULTADOS

3. CURVAS CONVEXAS NAS QUAIS SEUS PONTOS SÃO VÉRTICES DE BI-


LHARES TRIANGULARES

Apresentaremos nesta seção uma caracterização da circunferência, tal caracteri-


zação está intimamente ligada ao Exemplo 1 acima. Mostraremos que se uma curva
fechada C ∞ convexa possui a propriedade de que todo ponto é vértice de um tri-
ângulo equilátero que define uma órbita 3-periódica, então tal curva é uma circunfe-
rência.Trataremos de mostrar também que se tirarmos a hipótese de tais triângulos
serem equiláteros, podemos ter curvas diferente das elipses com essa propriedade.
Para isso, devemos antes definir algumas ferramentas.

Seja c : [0, L] uma curva convexa fechada C ∞ com |c ′ (s)| = 1 para todo s ∈ [0, L] e
tome {e 1, e 2 } um campo ortogonal sobre c com c ′ = e 1 . Pela formula de Frenet temos
que
e ′1 (s) = k (s)e 2 (s); e ′2 (s) = −k (s)e 1 (s)

para cada s ∈ [0, L], onde k (s) é a curvatura da curva c em c (s). Para cada (s, u) ∈
[0, L] × (−1, 1) defina m (s,u) : Ò → Ò2 como a reta dada por
p
m (s,u) (t ) = c (s) + t (ue 1 (s) + 1 − u 2 e 2 (s))

. Definimos então a Aplicação Bola de Bilhar ϕ = (f , g ) : [0, L]×(−1, 1) → [0, L]×(−1, 1)


assim: f (s, u) é o parâmetro de c, diferente de s que intersecta c. g (s, u) é o cosseno

do ângulo de e 1 (f (s, u)) com ue 1 (s)+ 1 − u 2 e 2 (s). Seja l (s, u), (s, u) ∈ [0, L] ×(−1, 1), o
comprimento do segmento que conecta c (s) e c (f (s, u)), ou seja, l (s, u) = |c (f (s, u)) −
c (s)|.
Temos então as seguintes fórmulas.

1 − u2 k (s)l (s, u)
fs (s, u) = − p +p
1 − g (s, u) 2 1 − g (s, u) 2
.
l (s, u)
fu (s, u) = − p
(1 − u 2 )(1 − g (s, u) 2 )
. q p
g s (s, u) = k (s) 1 − g (s, u) 2 + k (f (s, u)) 1 − u 2 − k (s)k (f (s, u))l (s, u)

.
1 − g (s, u) 2 k (f (s, u))l (s, u)
p
gu (s, u) = − √ + √
1 − u2 1 − u2
det dϕ (s, u) = fs (u, s)gu (u, s) − fu (s, u)g s (u, s) = 1

g (s, u) e 1 (f )
e 2 (f )
c (f )
m (u,s )
c (s) θ = arccos(u)

Figura 10:

Com essas ferramentas em mãos pode-se demonstrar o Lema 3 abaixo. Nesse


trabalho, quando dissermos que uma curva C ∞ é convexa, estaremos dizendo que
sua função curvatura não muda de sinal.

Lema 3. Uma curva fechada convexa C ∞ c : [0, L] → Ò2 com |c ′ | = 1 é uma


circunferência se, e somente se, c satisfaz uma das seguintes condições:
(1) Existe u 0 ∈ (−1, 1) tal que g (s, u 0 ) e fs (s, u 0 ) são constantes em s ∈ [0, L].
(2) l (s, u) depende apenas do parâmetro u ∈ (−1, 1).
(3) g (s, u) depende apenas do parâmetro u ∈ (−1, 1).
(4) fs (s, u) depende apenas do parâmetro u ∈ (−1, 1).

Demonstraçao: Consulte [3].

Caro leitor, caso ainda não tenha bagagem em geometria diferencial, poderá pen-
sar que a hipótese |c ′ | = 1 é muito restritiva. Não é uma hipótese forte pois é bem
conhecido o fato de que qualquer curva convenientemente diferenciável pode ser re-
parametrizada de maneira com que tenhamos |c ′ | = 1, e este é o caso da circunferên-
cia.

Nosso objetivo agora será extrair o máximo de informações sobre uma curva ge-
nérica C ∞ , convexa e fechada na qual tem a propriedade de que todos seus pontos
são vértices de triângulos que definem uma órbita 3-periódica. Com isso, poderemos
encontrar uma caracterização para as circunferências e construir um exemplo interes-
sante de curva com a propriedade que leva o título dessa seção.

Seja c : [0, L] → Ò2 uma curva C ∞ fechada e convexa com |c ′ | = 1. Assuma que


cada ponto c (s) é um vértice de um bilhar triangular e que os bilhares triangulares
dependem diferencialmente do parâmetro s ∈ [0, L]. Denotamos os vértices do bilhar
triangular definido por c (s) poe c 1 (s) = c (s), c 2 (s), c 3 (s), e os comprimentos dos lados
por l 1 (s) = |c 2 (s) − c 1 (s)|, l 2 (s) = |c 3 (s) − c 2 (s)|, l 3 (s) = |c 1 (s) − c 3 (s)|, e os ângulos que
os lados com a curva c em cada vértice por α1 (s), α2 (s), α3 (s), respectivamente. Se
{e 1, e 2 } é o campo ortonormal sobre c com c ′ = e 1 então pode-se mostrar facilmente
que

c 1 (s) = c (s) (8)


c 2 (s) = c 1 (s) + l 1 (s)(cos α1 (s)e 1 (s) + sin α1 (s)e 2 (s)) (9)
c 3 (s) = c 1 (s) + l 3 (s)(− cos α1 (s)e 1 (s) + sin α1 (s)e 2 (s)) (10)

E, para todo s ∈ [0, L] vale

α1 (s) + α2 (s) + α3 (s) = π

Diferenciando l 1, l 2, l 3

l 1′ (s) = |c 2′ (s)| cos α2 (s) − cos α1 (s)


l 2′ (s) = |c 3′ (s)| cos α3 (s) − |c 2′ (s)| cos α2 (s)
l 3′ (s) = cos α1 (s) − |c 3′ (s)| cos α3 (s)

para todo s ∈ [0, L], e portanto

l 1 (s) + l 2 (s) + l 3 (s) = const ant e. (11)

para cada s ∈ [0, L]. Com isso temos que, utilizando a identidade sin(x ) + sin(y ) +
sin(z ) − sin(x + y + z ) = 4 sin((x + y )/2) sin((y + z )/2) sin((x + y )/2)
R cos α3 (s)
l 1 (s) = (12)
2 sin α1 (s) sin α2 (s)
R cos α1 (s)
l 2 (s) = (13)
2 sin α2 (s)α3 (s)
R cos α2 (s)
l 3 (s) = (14)
2 sin α3 (s) sin α1 (s)

Com mais alguns cálculos, utilizando as equações acima, obtemos as seguintes


equações diferenciais com relação aos ângulos

2 sin α1 sin α2 sin α3


 
sin α2 cos α1
−1 + α1′ + α2′ = k − (15)
sin α1 cos α3 cos α2 cos α3 R cos α2 cos α3

2 sin α1 sin α2 sin α3


 
sin α3 cos α1
1− α1′ + α3′ = k − (16)
sin α1 cos α2 cos α2 cos α3 R cos α2 cos α3

Podemos agora enunciar e provar o

Proposição 2. Seja c : [0, L] → Ò2 uma curva fechada C ∞ convexa. Se cada ponto


c (s), s ∈ [0, L], é um vértice de um triângulo que define uma órbita 3-periódica, e se
esses triângulos equiláteros dependem diferenciavelmente do parâmetro s ∈ [0, L],
então c é uma circunferência.

Demonstração: Usemos as mesmas notações acima. Sabemos que por (11)

l 1 (s) + l 2 (s) + l 3 (s) = const ant e.

para todo s ∈ [0, L]. Como os triângulos são equiláteros,

l 1 (s) = l 2 (s) = l 3 (s) = const ant e.

Então, pelas fórmulas derivadas da aplicação bola de bilhar definida acima, c 2 (s) =
c (f (s, 1/2)), fs (s, 1/2) = 1 para qualquer s ∈ [0, L], pois g (s, 1/2) = 1/2 para todo
s ∈ [0, L]. Portanto por (1) no Lema 3 a demonstração está completa.

Mostraremos agora que, se retirarmos a hipótese de que os triângulos são todos


equiláteros, pode acontecer de a curva nem mesmo ser uma elipse.
Com efeito, tome K a circunferência unitária em Ò e ∆ABC um triângulo equilátero

no qual os vértices A, B, C estão em K . O comprimento dos lados é 3. Fixe os
positivos ε e ε ′ de forma que sejam menor do que π/3. Defina c : [0, L] → Ò2 uma
curva C ∞ com |c ′ | = 1, c (0) = A, c (λ) = B, c ([0, ε] ∪ [λ − ε ′, λ]) ⊂ K . Se k (s) é a
curvatura de c, assuma que k (s) é suficientemente próxima de 1 mas não constante.
Motivados por (15) e (16), denote por (α1 (s), α2 (s)) a solução do sistema

2 sin x sin2 x
x + 2y = π; √ = k (s).
3 3 cos y
Ponha α3 (s) = α2 (s). É de fácil verificação que α1 (s) + α2 (s) + α3 (s) = π/3 para todo
s ∈ [0, ε] ∪ [λ − ε ′, λ]. Defina l 1, l 2, l 3 como em (12), (13) e (14). e os pontos c 1 (s), c 2 (s)
e c 3 (s) como em (8), (9) e (10). O que temos aqui é que a curva D = c 1 ∪ c 2 ∪ c 3 ([0, λ])
é C ∞ , convexa e fechada, na qual tem a propriedade de que todos os seus pontos são
vértices de triângulos equiláteros que definem órbitas 3-periódicas de bilhares. Tal
construção aqui apresentada foi pouco detalhada e, para o leitor que se interessar em
verificar o processo construtivo de forma mais completa, consulte [3]. Pela construção
da curva, temos que ela não pode ser uma elipse.

O exemplo acima mostra que, muito embora a característica de ter todos seus pon-
tos como vértices de bilhares triangulares equiláteros é uma propriedade intrínseca de
certa espécie de elipses, ao tirar a hipótese de que os triângulos são equiláteros, po-
demos obter curvas diferentes da elipse com a propriedade do título dessa seção. Ou
seja, isso mostra que as elipses não são as únicas curvas que satisfazem a Proposi-
ção 1.

• CONCLUSÕES FINAIS

O desenvolvimento do estudo necessário para fundamentar o presente trabalho


possibilitou a compreensão de uma simples ideia muito interessante. Com noções
básicas de geometria, foi mostrado que embora simples, os bilhares podem nos for-
necer belíssimos resultados e, no caso dos elípticos, nos mostrou uma surpreendente
harmonia. Deve-se enfatizar de que os bilhares matemáticos é uma área muito pro-
missora no campo de pesquisa atual, anualmente temos muitas publicações de artigos
de todos os cantos do globo sobre esse assunto. Há também muitos resultados de
fácil compreensão que não foram comentados nesse texto, mas muito deles podem
ser vistos nos materiais referenciados abaixo.

Referências
[1] Garcia, R. Alves - Circuncentros das Órbitas Triangulares de um Bilhar Elíptico.
NEXUS Mathematicae, 2018.
[2] Flatto, Leopold - Poncelet’s Theorem. American Mathematical Society, 2008.

[3] INNAMI, Nobuhiro - Convex curves whose points are vertices of billiard triangles.
Kodai Math. J. 11, 1988.

[4] TABACHNIKOV, Serge - Geometry and Billiards.

• CERTIFICADOS

Figura 11:

Figura 12:

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