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Resumo matéria de HD da segunda fração – tópicos mais importantes

Concessão do condado portucalense

Os árabes chegaram à Península em 711, tendo rapidamente dominado praticamente todo o


território. Desta forma, a partir do noroeste e do nordeste peninsulares, os monarcas cristãos
concretizaram a sua aspiração de recuperar território aos árabes tarefa dificultada pela
resistência muçulmana e pelas próprias divisões e rivalidades no seio dos cristãos.
Assim, formaram e desenvolveram-se os Estados Cristãos da Reconquista, isto é, os Reinos das
Astúrias, de Leão, de Navarra, de Castela, de Aragão e de Portugal.
Mais tarde, por desmembramento do Reino de Leão, deu-se a independência do então
Condado Portucalense, no tempo do rei Afonso VII (1105 – 1157).
Nos finais do século XI, D. Raimundo e D. Henrique, nobres borgonheses, vindos à Península
Ibérica para participar na sua reconquista, desposaram, respetivamente, D. Urraca e D. Teresa,
filhas de Afonso VI de Leão (1047 — 1109), esta última fora do casamento.
Após o casamento de D. Henrique com D. Teresa, em 1093, Afonso VI outorgara-lhes a terra
portucalense. Porém, discute-se, a que título devido à ausência do documento que formalizou
esta ação, gerando muitas incertezas doutrinais. Desta forma, existem cinco principais teses
sobre o assunto.
A primeira hipótese é que o dote de D. Teresa era a outorga do condado, e, por isso, esta
assumiu a natureza de senhorio hereditário; existe assim, segundo esta ótica, um título jurídico
associado à fundação de Portugal.
A segunda hipótese, na esteira de Paulo Merêa, é que a concessão derivou de uma doação de
senhorio hereditário, com vínculo de vassalagem. Desta forma, D. Teresa seria compensada
face à sucessão ao trono da sua irmã, D. Urraca.
A terceira hipótese defende a existência de uma concessão hereditária de tipo feudal.
Consequentemente, não se vislumbra aqui a transferência do domínio pleno sobre o Condado.
Isto, no plano objetivo dos poderes sobre o território.
Deste modo, as teses supramencionadas pressupõem um título jurídico, enquanto as seguintes
não.
A quarta hipótese, segundo Alexandre Herculano, é que o governo do Condado Portucalense
foi confiado a D. Henrique temporariamente e livremente revogável por Afonso VI. Tratava-se,
no fundo, de uma simples tenência amovível, semelhante às dos distritos encabeçados por
ricos-homens de confiança dos reis leoneses.
A quinta hipótese sustenta a persistência de uma tenência hereditária, instituição de origem
extra-peninsular.
Não obstante, a presença soberana de D. Teresa e D. Henrique é indiscutível e manifestou-se
através de outorga de forais, cartas de couto, doações e préstamos, entre outros.
Desta forma, a rapidez dos acontecimentos propulsionou a concessão do condado e em 1140
D. Afonso Henriques começa a usar o título de rex e é reconhecido, em 1143, por Afonso VII,
rei de Leão, na Conferência de Zamora. Em 1179, o Papa Alexandre III aceita D. Afonso
Henrique como seu vassalo direto através da Bula Manifestis probatum est. Assim surgiu um
país chamado Portugal, o primeiro estado europeu, atualmente existente com fronteiras
historicamente definidas.

Fontes anteriores à fundação da nacionalidade


O direito muçulmano é marcado por uma não distinção entre os elementos religioso e jurídico,
ao contrário do que o que acontecia com o ordenamento jurídico visigótico. Por conseguinte,
os seus critérios normativos eram baseados nos preceitos religiosos.
Por outro lado, tratava-se de um sistema jurídico personalista, cujo âmbito de aplicação não
era definido pela raça, mas pelo credo religioso, abrangendo, assim, toda a comunidade de
crentes do mundo islâmico peninsular.
Outrossim, ressalva-se que à data da chegada dos Árabes à Península Ibérica, o seu direito
encontrava-se ainda em fase de formação.
Assim sendo, as fontes básicas do Direito Muçulmano são o Alcorão e a Sunna.
Por um lado, o Alcorão é um conjunto de revelações de Alá, declamadas pelos fiéis e que,
segundo Maomé, lhe foram feitas de modo explícito. O Alcorão não é apenas um livro
religioso, mas também um código político, moral e jurídico. Aliás, variadíssimas normas da vida
individual e social dos fiéis estão nele consagradas, como expressão da vontade de Deus. A
comunidade dos crentes é uma sociedade teocrática: o califa é o representante de Alá na
terra; a autoridade política decorre diretamente do poder religioso.
Por outro lado, a Sunna compreende a conduta pessoal de Maomé, explanada em atos,
palavras e silêncios positivos. Por conseguinte, são ensinamentos revelados de forma implícita.
Inicialmente, conhecidos pela tradição oral (hadith) tais ensinamentos foram compilados, a
partir de meados do século VIII.
A par destas, existem cinco fontes complementares deste ordenamento jurídico: o consenso
unânime da comunidade, a ciência do direito, as escolas de interpretação jurídica, o costume e
os precedentes judiciais e as qanum.
Em primeiro lugar, o Ijma ou consenso unanime da comunidade. Este constituía uma
manifestação indireta e difusa da vontade de Deus que era apurada de acordo com o critério
em vigor na Península Ibérica, à opinião comum dos teólogos e juristas da mesma época, e não
de todo o povo islâmico.
Em segundo lugar, a fiqh ou ciência do direito. Um modo decisivo de evolução do direito
muçulmano, sem prejuízo do nexo religioso que se desenvolvia a partir da analogia e do
raciocínio lógico, realizados pelos jurisconsultos, os alfaquis, com base no Alcorão e na Sunna.
Os pareceres destes juristas são equivalentes aos iura dos romanos.
Em terceiro lugar, as escolas de interpretação jurídica. DE salientar as escolas Hanifita,
Chafeíta, Hanbalita e Maliquita, que prevaleceu na Península.
Em quarto lugar, o costume e os precedentes judiciais. Apesar de considerado pelo Ijma como
fonte oficial, o costume nunca se desvanece na sua totalidade da sociedade.
Em quinto lugar, as qanum eram as normas jurídicas emanadas da autoridade soberana, cuja
pertinência sempre foi ofuscada pelos preceitos sagrados fundamentais.
Quanto à aplicação deste direito na Península, eram vigentes as seguintes regras: por um lado,
o direito islâmico aplicava-se apenas às relações mistas, ou seja, entre moçárabes (hispano-
godos que assumiram o estatuto de protegidos do Islão, mantendo a fé cristã) e muçulmanos e
na esfera penal; por outro lado, os moçárabes continuavam a obedecer ao seu próprio direito,
assente no Código Visigótico, em todas as relações jurídico-privadas e relacionadas com a
moral, e a religião. Com efeito, só se ingressava na sociedade islâmica através da conversão ao
islamismo.
Às mulheres cristãs capturadas e escravizadas durante das expedições militares muçulmanas
eram-lhes aplicável a lei do invasor, isto é, dos muçulmanos.
Paralelamente, os judeus possuíam idêntica autonomia jurídica, dado eu as comunidades
hebraicas, radicadas na Península, permaneceram adstritas ao seu direito, de carácter
confessional e personalista.
Fontes posteriores à fundação da nacionalidade

Em primeiro lugar, o Código visigótico constituía a legislação de referência para os povos


peninsulares.
Desta forma, o único corpo normativo sistematizado à época permaneceu como umas das
principais fontes de direito no reino português durante todo o século XII; resta apenas a dúvida
se este era aplicado de forma efetiva, tal como defende Braga Cruz, ou se não era um conjunto
de fórmulas de estilo utilizada por juízes e tabeliães, tal como defende Espinhosa Gomes da
Silva.
Paralelamente, a partir do século XIII, por um lado, o código começa a perder importância para
o direito consuetudinário local e Direito Romano-Canónico, em Portugal, e, por outro lado, no
reino de Leão e Castela, a vigência do código prolonga-se, sendo até traduzido para castelhano
por iniciativa de Fernando III, na primeira metade do século XIII.
A par do Código Visigótico, as leis dimanadas das assembleias realizadas em Leão (1017),
Coiança (1050) e Oviedo (1115) mantiveram a sua vigência após a independência do Reino de
Portugal.
Todavia, perdura a incerteza se estas leis tratavam de cúrias, órgão político auxiliar do
monarca que dealbou as cortes, ou de concílios, órgão eclesial. Dado que os altos
representantes da Igreja participavam em ambas as assembleias, para além de, quer a Cúria,
quer o Concílio, serem convocados pelo rei e neles participarem leigos.
Assim, a diferenciação entre ambas passa por avaliar, em cada caso concreto, a entidade
convocante, matérias abordadas e sanção canónica ou régia das decisões.
Determinou-se doutrinalmente, desta forma, Cúria de Leão e aos Concílios de Coiança e
Oviedo.
Quanto ao Direito Português, as leis dimanadas das assembleias de Leão e de Coiança foram
incluídas em cartulários ou registos portugueses e as leis de Oviedo foram juradas por D.
Teresa e D. Afonso Henriques.
Outrossim, os forais do século XI e dos inícios do século XII mantiveram a sua vigência nas
localidades a que diziam respeito, mesmo depois da independência do reino português.
Os forais são diplomas concedidos pelo rei, por um senhor laico ou por um senhor eclesiástico
a determinada localidade, diplomas esses que continham um corpo de normas que regulavam
as relações dos habitantes entre si e destes com a entidade outorgante e que reconheciam a
existência jurídica do município, outorgados a uma magistratura própria e privativa; Paulo
Mêrea discorda de Alexandre Herculano no critério da existência de magistraturas municipais.
São exemplos os forais de S. João da Pesqueira, Penela e Paredes.
Assim sendo, estes diplomas integram a categoria mais ampla das cartas de privilégio, isto é,
de direito especial, consistindo em diplomas outorgados por uma entidade titular de poderes
públicos através dos quais se concedia um regime especial ou de favor a determinada pessoa
ou a um agrupamento de pessoas.
Por sua vez, os forais são fruto de uma importante evolução ao longo do tempo, que passa por
diferentes configurações.
Inicialmente, existiam simples contratos de aforamento que procediam à repartição, entre
duas partes, do aproveitamento de um terreno.
Posteriormente, evolui-se para cartas de povoação, ou seja, contratos agrários coletivos, cujo
objetivo se prendia com o povoamento de locais ermos ou com o atrair de mão-de-obra para
localidades já habitadas. Através dos referidos contratos, a entidade outorgante concedia
terras para cultivo e outras regalias aos povoadores, ficando estes obrigados ao pagamento de
um tributo.
Com efeito, os forais incidiam nas seguintes matérias, geralmente: liberdades e garantias
pessoais e dos bens dos povoadores; impostos e tributos; sanções e multas devidas pela
prática de crimes; imunidades coletivas; serviço militar; encargos e privilégios dos cavaleiros
vilãos; ónus e forma das provas judiciais, citações, arrestos e fianças e aproveitamento de
terrenos comuns.
Deste modo, enquanto fonte de direito local, os forais eram instrumentos de garantia dos
direitos individuais e concretos das pessoas. Trata-se, contudo, de instrumentos particulares,
concedidos em favor de um grupo determinado.
No essencial, os forais continham normas de Direito Público, embora, neste âmbito, fosse o
costume a regular um conjunto importante de matérias juspublicísticas. Por regra, os forais
não continham preceitos de Direito Privado.
Por fim, frequentemente, a outorga de um novo foral tomava como modelo um foral anterior,
limitando-se a reproduzi-lo ou, quando muito, a introduzir alterações pontuais. Desta forma,
surgiram grupos ou famílias de forais.
Ademais das fontes supra explanadas, o costume foi uma fonte normativa que perdurou além
da fundação da nacionalidade portuguesa, sobretudo no que diz respeito ao Direito Privado,
de fonte quase exclusivamente consuetudinária.
Aliás, além de perdurar, o costume foi até acentuado dado a preocupação dos monarcas até
ao reinado de D. Afonso III (1248/1279) no dealbar de Portugal enquanto nação, deixando para
trás o processo normativo. Desta forma, é vasto o rasto consuetudinário deixado.
Para mais, enquanto para o Direito Romano o costume era uma prática geral e constante,
acompanhada da convicção da obrigatoriedade da respetiva norma, para o Direito da Idade
Média, o costume assume uma dimensão ampla, compreendendo todas as fontes de direito
tradicionais de cariz não legislativo. Por conseguinte, incluíam-se também no costume as
sentenças da Cúria Régia (mais tarde, apelidadas de costumes da Corte), de juízes municipais e
de juízes arbitrais, que se tornavam precedentes vinculativos, e os pareceres de jurisconsultos.
Destarte, existiam poucas manifestações legislativas registando-se a promulgação de uma lei
de D. Afonso Henriques (1139-1185), cuja data se desconhece e de uma provisão de D. Sancho
J (1185-1211), datada de 1210, ambas com as características de diploma geral. A estas somam-
se várias leis emanadas da Cúria de Coimbra, convocada por D. Afonso II (1211-1223), em
1211. Já no reinado de D. Sancho II (1223-1247), não há quaisquer indícios do exercício do
poder legislativo originário.
As leis gerais eram influenciadas em parte pelas compilações justinianeias, verificável na
ligação e sistematização que apresentam; contudo, esta previsto, alegadamente, que o Direito
Canónico prevalecia sobre as leis gerais em caso de conflito.
No geral, referiam-se a assuntos relativos à proteção da fazenda da coroa e ao combate aos
abusos dos funcionários régios, mas também à garantia das liberdades individuais (à
semelhança dos forais), à condenação expressa da vingança privada e à defesa das classes
populares ante a prepotência dos poderosos.
A partir do reinado de D. Afonso II, os monarcas são propensos a sobrepor a lei às normas
consuetudinárias inconvenientes. No entanto, esta legislação ainda não era produto da
vontade exclusiva do rei, como acontecerá mais tarde, dado que a promulgação das leis
dependia da consulta prévia da Cúria.
Associadamente, as concórdias e as concordatas designam os acordos, realizados entre o
monarca e as entidades eclesiásticas, através dos quais se comprometiam mutuamente a
reconhecer direitos e obrigações relativos ao Estado e à Igreja.
Têm a sua origem em resposta aos agravamentos proferidos pelos representantes do Clero,
nas Cortes, ou em negociações do rei com as autoridades eclesiásticas nacionais (concórdias) e
com o papado (concordatas).
As primeiras concórdias e concordatas remontam aos reinados de D. Sancho I (1185-1211), D.
Afonso II (1211-1223) e D. Sancho II (1223-1247), tendo-se incrementado posteriormente.
Finalmente, os contratos agrários, feitos em função da exploração agrícola ou do crédito,
desempenharam um importante papel no panorama económico e social da Idade Média, pois
a agricultura e indústrias afins eram as atividades predominantes.
Aquando do renascimento normativo justinianeu é que estes contratos passaram a estar
previstos por lei, a serem mais definidos e não se resumir à sua finalidade económica.
De entre os contratos de exploração agrícola destacam-se a enfiteuse e a complantação.
Por um lado, a enfiteuse, também denominada de aforamento ou emprazamento, era o
contrato através do qual se atribuía ao senhorio tinha o direito a receber uma pensão anual,
em princípio, proporcional ao rendimento do prédio, enquanto a exploração do prédio,
conferia à enfiteuta, por exemplo, o direito anexo de alienar a sua posição a terceiro, com ou
sem a estipulação de um direito de preferência a favor do senhorio. A enfiteuse fazia-se por
prazo longo ou perpétuo.
Por outro lado, a complantação era um tipo de contrato de exploração agrícola que implicava a
cedência de um prédio, pelo seu proprietário, a um agricultor, investido da obrigação de o
fertilizar, nomeadamente, com a plantação de vinhas: no final do prazo estabelecido
(estipulado, em regra, entre os quatro e os oito anos), o prédio era dividido, em partes iguais,
entre o proprietário inicial e o agricultor. Juridicamente, dir-se-ia que está aqui em causa o
princípio da conquista da propriedade através do trabalho, tão importante no direito medievo.
Paralelamente, os contratos de crédito, nomeadamente os de compra e venda de rendas e
penhor imobiliário, facilitam o acesso ao capital por parte de quem não o tem.
Por um lado, a compra e venda, de rendas implicava que o proprietário de um prédio, carecido
de capitais, cedesse a uma pessoa com capacidade financeira, em compensação de
determinada quantia, recebida definitivamente, o direito a uma prestação monetária anual
imposta como encargo desse prédio; era, portanto, uma espécie de empréstimo com juros,
então proibido, dando, mais tarde, origem à renda perpétua e à renda vitalícia, ainda hoje
previstas no atual Código Civil Português.
Por outro lado, o penhor imobiliário implicava a transmissão de um prédio pelo proprietário-
devedor ao respetivo credor, como garantia e compensação da cedência de capital ou como
modo de proporcionar o reembolso progressivo da dívida, através do aproveitamento do
prédio. O instituto do penhor imobiliário deu lugar à hipoteca de configuração romanística.

O pensamento jurídico medieval

Para os pensadores medievais, o fundamento do direito vigente na ordem jurídica, neste caso
o natural, ultrapassava os governantes temporais de cada momento.
Para este efeito, contribui S. Tomás de Aquino (1225 – 1274), provavelmente o melhor
pensador à época. Este destrinçou diferentes noções que visavam descrever a normatividade
própria da vida humana. Desta forma, temos, quatro grandes conceitos: lei eterna, lei natural,
direito natural e lei humana.
Primeiramente, a lei eterna corresponderia à própria razão de Deus enquanto ela governa e
ordena todas as coisas.
Segundamente, a lei natural seria a participação da lei eterna, que é própria da criatura
racional, revelando-se na capacidade de distinguir o bem do mal e na consciência da obrigação
de fazer o bem.
Em terceiro lugar, o direito natural seria o conjunto de coisas que devem ser dadas a quem
tem um título sobre elas, segundo aquilo que é determinado pela natureza humana. Segundo,
Gaius este direito seria em tudo muito semelhante à aceção romano-clássica.
Em quarto lugar, a lei humana seria inferior à lei natural e constituía uma certa determinação
da razão, dirigida ao bem comum, ditada por aquele que tem a seu cargo a comunidade; era,
portanto, derivada da lei natural, fosse por conclusão ou determinação.
Deste modo, no pensamento medieval, uma norma humana, positiva, que fosse contrária à lei
natural não possuía valor, independentemente de ser escrita ou costumeira.
A par da renovação do direito natural deu-se o renascimento do direito romano, devido a um
interesse teórico e pratico pelas coletâneas do corpus iuris civilis – repare-se, no entanto, que
a presença das tropas bizantinas na zona peninsular sul, foi insuficiente para que o corpus
produzisse influências jurídicas substanciais.
Todavia, não se pode falar num verdadeiro renascimento do direito romano uma vez que o
Direito Romano vulgar estava presente e mesmo o próprio Direito Romano justinianeu não
deixou de ser conhecido, estudado e aplicado até à transição da Alta Idade Média para a Baixa
Idade Média, simplesmente e sobretudo a partir do século XI, os juristas voltaram a estudá-lo e
a utilizá-lo com uma profundidade que não se verificou nos séculos anteriores, profundidade
tal que esteve na base da evolução conducente à ciência jurídica moderna. Note-se que a já
aludida subsistência do Direito Romano vulgar é que tornou possível este renascimento, ao
permitir o reencontro com as estruturas do Direito Romano clássico.

Cortes medievais

As cortes medievais partilhavam com o rei a representação nacional, dealbando no instituto da


cúria régia, quando ela funcionava em sessão plenária ou extraordinária.
As Cortes, convocadas pelo monarca sempre que ele assim entendesse, a par do rei, têm
representação nacional, num primeiro momento, com a presença dos concelhos, os
dignatários da nobreza e clero (1254, Leiria), posteriormente, com a participação nas tomadas
de decisão (1261, Coimbra) e, num terceiro momento, com reuniões, ainda que à parte, com a
população (1331, Santarém). Assim, nas Cortes estavam representadas as diferentes classes
portuguesas segundo o princípio qualitativo, ou seja, contava-se por cabeça. Antes da
introdução deste princípio, que chegou já tarde, e em resultado de queixas em Cortes, o clero
e a nobreza muitas das vezes bastavam para aprovar determinada deliberação, pois apesar de
representarem uma menor percentagem da população, formavam 1+1=2, superior a 1 (povo).
Doravante, passou-se a contar por cabeça e não por ordem social.
Desta forma, as instituições políticas em questão tinham o dever de aconselhar o rei, ratificar
tratados de paz e de amizade, formular pedidos, elevar queixas e exercer direitos de petição.
Ademais, segundo Marcello Caetano, as Cortes intervieram em matéria monetária e tributária,
lançamento de impostos e emissão e quebra da moeda (diminuição de metal precioso usado
na sua fabricação), por exemplo. Contrariamente, nunca foi aceite a intervenção vinculativa
destas na decisão do casamento do rei. Para além disto, com a crise de 1385, competiu a esta
instituição a declaração de vagatura do trono e a eleição do rei, expressão máxima do seu
poder; semelhante aconteceu em 1438/1439, com a mudança de regente à morte de D.
Duarte; em 1642 com a aclamação de D. João IV.
Como suprarreferido a promulgação de leis gerais, além de ser um processo raro, exigia a
intervenção da Cúria para a consulta da oportunidade das leis (não são por isso fonte de
Direito), que apesar de não vinculativa. De qualquer forma, a partir do século XIII, esta
intervenção, outrora necessária, foi extinta, já que estas limitavam o poder do rei (neste
sentido são o protótipo do parlamento).
Direito subsidiário nas ordenações

O direito subsidiário consiste no conjunto de normas jurídicas chamadas a suprir lacunas ou


falhas de regulamentação de um determinado sistema jurídico. Este direito pode ser geral ou
especial consoante esteja em causa colmatar lacunas de uma ordem jurídica no seu todo ou de
um ramo de direito ou instituição, respetivamente.
Desta forma, o direito subsidiário existe devido (i) a ausência de um sentido de verdadeira
autonomia dos ordenamentos jurídicos e da consequente pretensão da plenitude lógica do
ordenamento jurídico nacional e (ii) a possibilidade de resolver os casos omissos através do
recurso a outros ordenamentos jurídicos.
Assim, deve-se ressalvar que o direito subsidiário apenas é compatível com uma conceção
monista mitigada das fontes de Direito uma vez que esta pressupõe uma afirmação da
primazia da aplicação do ordenamento nacional sobre os outros ordenamentos.
Todavia, já que o legislador podia recorrer a normas de outros ordenamentos que não o
nacional, não havia a necessidade de integrar lacunas. Assim sendo, só no século XIX, com o
princípio de legislação autónoma e unitária, é que o legislador se viu obrigado a aplicar de
forma rígida a integração de lacunas, a recorrer à analogia.
Ademais, no mesmo sentido da incompletude do ordenamento jurídico nacional concorre,
atualmente, a receção de amplos conteúdos normativos de proveniência externa, decorrente
da integração de Portugal na União Europeia.
Neste seguimento, as Ordenações Afonsinas foram pioneiras ao estabelecer um quadro
sistemático das fontes do direito. Distinguindo entre fontes imediatas e mediatas.
Como fontes imediatas de direito eram referidas as leis do Reino, os Estilos da Corte e os
costumes antigamente usados. De acordo com o legislador afonsino, estas fontes assumiam
um carácter imperativo e prevalente, só podendo ser afastadas se as mesmas não oferecessem
solução para o caso concreto, hipótese em que era lícito o recurso ao Direito subsidiário.
Como fontes mediatas de Direito, tínhamos Direito Romano e Canónico, Glosa de Acúrsio e
Opinião de Bártolo, e a resolução do monarca.
Em primeiro lugar, o Direito romano e o direito canónico. Enquanto o primeiro era aplicável às
questões temporais exceto se a sua observância fizesse incorrer em pecado. Por sua vez
Direito Canónico era aplicável às questões espirituais e sempre que a aplicação do Direito
Romano fosse contrária à moral cristã e quando se ausentasse uma norma romana aplicável.
Em segundo lugar, a glosa de acúrsio e a opinião de Bártolo. Esta era a alternativa à supra
fonte mediata referida.
Segundo o legislador a Opinião de Bártolo prevalecia sobre a opinião de outros doutores,
graças à maior racionalidade jurídica das suas opiniões, para evitar, incertezas e confusões
jurisprudenciais, e ao uso português nesse sentido, desde D. João I.
Em terceiro lugar, a resolução do monarca. Nas situações em que os elementos precedentes
não oferecessem resposta suscetível de colmatar a lacuna bem como nas situações em que,
não se tratando de matéria de pecado, na falta de regulamentação por parte do Direito
Romano, houvesse opiniões contraditórias do Direito Canónico e dos doutores que
interpretavam o Direito Romano, o caso seria resolvido através de consulta ao rei. As
resoluções emitidas pelo monarca tinham força vinculativa no caso concreto e também nos
casos futuros.
O quadro normativo sistemático das ordenações afonsinas anteriormente explanado foi
remodelado formalmente e transitado para as Ordenações Manuelinas e Filipinas.
Das Ordenações Afonsinas para as Ordenações Manuelinas destaca-se a justificação da
vigência subsidiária do Direito Romano, cuja aplicação se devia à autoridade que lhe é própria
e não a qualquer subordinação política do Reino de Portugal ao Império.
Por sua vez, as Ordenações Filipinas, por confronto com as Ordenações Manuelinas,
apresentam apenas pequenos retoques, passando a matéria do Direito subsidiário a integrar o
livro dedicado ao direito processual e já não das relações entre a Igreja e o Rei. Por
conseguinte, dá-se a rutura definitiva entre o problema do Direito subsidiário e o conflito das
jurisdições do poder temporal e do poder eclesiástico, isto é, o Direito subsidiário passou a ser
considerado um mero problema de natureza técnico-jurídica de determinação do direito
aplicável.
Outrossim, são duas as grandes diferenças entre as Ordenações Afonsinas e as demais.
Por um lado, elimina-se a distinção entre questões temporais e espirituais, mantendo-se
apenas o critério do pecado.
Por outro lado, impôs-se que a communis opinio era fonte subsidiária, antes da Glosa de
Acúrsio e da Opinião de Bártolo (apenas na prática porque a primeira não é verdadeira fonte
de direito).
Não obstante a hierarquia das fontes de Direito estabelecida pelas Ordenações, nos termos
descritos, sempre se levantavam dúvidas sobre o direito aplicável, gerando-se, assim,
confusões e desvios à letra e ao espírito do sistema.
O panorama jurídico português era, no geral, dominado pelo romanismo escolástico,
sobretudo nas magistraturas ordinárias mais elevadas e em certas magistraturas
extraordinárias, exercidas por quem tinha formação universitária.
Em contraste, o exercício da maioria das magistraturas ordinárias menores não exigia
formação superior, sendo, por vezes, exercidas por analfabetos. Por este motivo, aplicavam
um direito de carácter local, desprovido da eloquência da cultura jurídica da época. Neste
contexto, destaca-se o papel desempenhado pelos juízes de fora e pelos corregedores das
comarcas, bem como do expediente dos recursos que permitia eliminar deficiências das
decisões.

A escola racionalista do direito natural

A escola racionalista contaria a Escola espanhola de direito natural e reconduz este último a
um código minucioso de normas formuladas através da dedução racional, erradicando a ideia
de direito natural como preceito do direito positivo.
Desta forma, ao separar o Direito natural do Direito positivo, como um corpo autónomo, a
Escola racionalista do Direito natural facilita a rejeição daquele, que está nas origens do
positivismo.
Os nomes fundamentais desta corrente do pensamento jurídico são Hugo Grócio (1583/1645),
Pufendorf, Thomasius e Wolff (na Alemanha); também são jusracionalistas Hobbes e Locke
(em Inglaterra) e Rousseau (em França), todos autores situados entre o século XVII e o século
XVIII.

A lei da boa razão

A lei da boa razão (17 de agosto de 1769) contribuiu para as mudanças relativas ao sistema de
fontes de Direito, a reta razão racionalista é o novo dogma supremo das atividades
interpretativa e integradora das normas jurídicas.
Desta forma, os objetivos da lei da boa razão são impedir irregularidades em matéria de
assentos e de fontes primárias do ordenamento jurídico, fixar normas precisas sobre a
validade do costume e determinar os elementos a que a interpretação podia recorrer no
preenchimento de lacunas.
Aplicam-se, portanto quatro grandes soluções: (i) os estilos da corte só são válidos se
aprovados por assentos da Casa da Suplicação, (ii) a autoridade é exclusivamente dos assentos
da Casa da Suplicação, tribunal supremo do reino pelos que os assentos dos Tribunais da
Relação só alcançam valor normativo com a sua confirmação; a par e passo, os assentos,
entretanto, serão considerados inconstitucionais, em 1996, por serem atos de órgãos de
Estado com força obrigatória e geral, não previstos na Constituição, (iii) o costume tem que ser
conforme à boa razão, não pode contrariar a lei e tem que ter mais de 100 anos de existência,
(iv) a subsidiariedade está sujeita à boa razão e ao direito natural e das gentes, nos termos da
lei da boa razão, num âmbito prático, que está definido nos estatutos da universidade,
estatutos esses que mandam aplicar supletivamente o usus modernus pandectarum;
paralelamente, a aplicação do Direito canónico é relegada para os tribunais eclesiásticos e,
quanto à Glosa de Acúrsio, a Opinião de Bártolo e a opinião dos doutores, estes têm a sua
aplicação proibida.

Os estatutos novos da universidade

A reforma pombalina dos estudos universitários é a continuação e o reforço ideológico da lei


da boa razão. Desta forma, em 1770, nomeia-se uma Junta de Providência Literária para emitir
pareceres sobre as causas da decadência do ensino universitário e de como reformá-lo, em
1771, segue-se uma critica, retomando a perspetiva de Verney, por parte do Compêndio
Histórico da Universidade de Coimbra, critica esta que igualmente desacreditava o ensino e a
influência da Companhia de Jesus, até então preponderante na Universidade em Portugal.
Seguiu-se, assim, a elaboração, pela mesma Junta, dos novos Estatutos da Universidade, os
Estatutos Pombalinos, aprovados por Carta de Lei de 28 de agosto de 1772. Para a reforma das
Faculdades de Leis e de Cânones foi determinante Azeredo Coutinho.
Desta forma, foram descobertos graves defeitos foram descobertos no ensino do Direito entre
eles a preferência absoluta pelo Direito romano e pelo Direito canónico, em detrimento do
Direito pátrio, o abuso do método bartolista, o respeito cego pela opinião comum e o
completo desprezo pelo Direito Natural e pela História do Direito.
Por conseguinte, surge um novo curriculum dos estudos jurídicos, (i) mantém-se a divisão por
Leis (corpus iuris civilis, fundamentalmente) e Cânones (corpus iuris canonici,
fundamentalmente), (ii) incluem-se matérias novas como o Direito Natural, a História do
direito e instituições do direito pátrio, (iii) o curso reduz-se para cinco anos, com a atribuição
do grau de bacharel aos alunos que terminassem o 4.º ano, (iv) estabelece-se o método
sintético-demonstrativo-compendiário (matriz germânica).
Este método começa por oferecer uma panorâmica geral da cadeira, opera por
complexificação progressiva, passa para outras proposições só depois do esclarecimento
científico das anteriores, edita manuais adequados, sujeitos a aprovação oficial e leciona toda
a matéria do programa. Ao passo que o antigo método analítico, ou exegético, de ensino
conserva-se, doravante, em apenas duas cadeiras práticas de fim de curso para aprender a
interpretar e a executar as leis.
Nos Estatutos Pombalinos faz-se uma regulamentação minuciosa pelo Estado do programa das
cadeiras e a imposição aos professores da escola jurídica considerada preferível: a escola
histórico-crítica ou cujaciana.
Ademais, o direito subsidiário, à semelhança do que acontecia na lei da boa razão, era baseado
no usus modernus pandectarum. O carácter ideológico regalista da reforma transparece
sobretudo nas prescrições para o estudo da História da Igreja, do Direito canónico, da Teologia
e da Filosofia.
Além disso, aspiravam-se compêndios breves, claros e bem ordenados pelos professores, em
substituição das velhas sebentas copiadas pelos alunos.
Entretanto, previa-se a utilização provisória de obras estrangeiras, que se eternizou. Exceção a
este quadro foram algumas obras de História do Direito, de Direito Civil e de Direito Público.
Contudo, apesar das grandes melhorias registadas, foram surgindo grandes críticas. Não
obstante, beneficiando da inércia subsequente a qualquer reforma legislativa, o Estatuto
manteve-se. Por fim, em 1805, no reinado de D. Maria, aprovaram-se algumas medidas
complementares ao Estatuto.

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