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Paisagens Culturais no Brasil e a virtualidade dos lugares.

Margareth Afeche Pimenta

São tantas e tão variadas as paisagens brasileiras! Neste vasto território, a imensa pluralidade
regional e local foi historicamente constituída pela tensão permanente entre grandes interesses
econômicos e pequenas práticas de manejo e transformação do ambiente. Essa diversidade
paisagística, construída por saberes tradicionais, representa justamente o objeto de elaboração
do conceito de paisagens culturais, que a Unesco vem desenvolvendo desde 1972, visando
preservar, conjuntamente, lugares, ambiente e práticas tradicionais. Mas, por aqui, são muitas
vezes preteridas pela associação entre interesses corporativos e políticas públicas.

Selecionar o que deveria ser considerado paisagem cultural nem sempre obedece a critérios
históricos ou sociais, quando o peso dos grandes empreendedores se faz sentir de forma cada
vez mais renovadora e homogeneizante. As opções governamentais vem pesando,
seletivamente, no sentido de privilegiar interesses turístico-imobiliários que, nesse caso,
confrontam-se diretamente, pelo embate do território, com pequenas comunidades
empobrecidas.

As inquietações passam a aflorar, quando a promissora expectativa de novas construções


sociais, implicadas no conceito de paisagens culturais, é confrontada com a banalidade visual de
nossas cidades. Num simples lance de olhar, percebe-se a fraca proteção patrimonial.
Subsistem, apenas, pequenos fragmentos históricos, no permeio de uma intensiva ocupação
verticalizada. São processos sem retornos possíveis. O tempo conspira, também, contra a
permanência dessas pequenas comunidades em lugares privilegiados, com atrativos
paisagísticos que despertam múltiplas cobiças. Políticas públicas associadas a tendências
concentradoras vêm promovendo o esvanecimento de paisagens singulares, suprimindo
consigo traços culturais compositivos da heterogeneidade social.

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São as características dos sítios, lapidados pela apropriação peculiar dos grupos que ali vivem,
que elaboram a diversidade paisagística. Estabelece-se, portanto, um elo insubstituível entre
grupo social e lugar, ali onde um cotidiano é compartido entre as mais diversas tipicidades, e se
realiza a vida em comum. Existem sistemas complexos e solidários que, sem ser limitados a um
organismo político determinado, são localizáveis no tempo e no espaço, atribuindo
especificidade aos lugares. São eles que, se valorizados, podem constituir outras formas de vida
e novas proposições sociais. As paisagens trazem em si essa potencialidade, de elaboração
conjunta de projetos ambientais e societários; de, em se preservando a vida no lugar, passarem
a fazer coincidir especificidade imagética e evocação sensível. Sem elas, esvanece-se a evocação
ao passado e a história que podem contar sobre os lugares, suas formas de vida e suas
representações.

Florianópolis, villa marinera. Foto da autora

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