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A concepção da Dialética em história – Antônio Gramsci

O problema da História e Filosofia

31. Na discussão cientifica, já que se supõe que o interesse seja a pesquisa da


verdade e o progresso da ciência, demonstra ser mais “avançado” quem se coloca no
ponto de vista segundo o qual o adversário pode expressar uma exigência que deva
ser incorporada, ainda que como um momento subordinado, na sua própria construção
[...] isso é colocar-se no ponto de vista crítico.

32.O que devemos entender por filosofia? Qual a significação das filosofias?
Benedetto Croce define filosofia como prática, todos praticamos, na medida em que
buscamos concepções do mundo, por exemplo, na religião que de uma concepção de
mundo se tornou norma de vida [...] História das filosofias dos filósofos é a história da
tentativa de tentar mudar, corrigir e aperfeiçoar as concepções de mundo [...] o estudo
da história da lógica das diversas filosofias dos filósofos não são suficientes como
orientação metodológica [...] Não serve analisar apenas um fragmento de um ou outro
filosofo [...] o que interessa é filosofia da grande massa, que de uma filosofia culminou
numa norma de ação coletiva, isto é, torna-se história concreta e completa [...] nesse
sentido história e filosofia são inseparáveis.

33. Filosofia criadora: Que é filosofia? Uma atividade puramente receptiva e quando
muito ordenadora, uma atividade absolutamente criadora? [...] receptivo: a certeza de
um mundo exterior absolutamente imutável [...] Ordenador: parecida com o receptivo,
porém implica a atividade do pensamento, essa atividade é limitada [...] deve-se fugir
do solipsismo [...] deve-se colocar o problema de forma historicista e colocar na base
da filosofia a “vontade”, mas uma vontade racional, não arbitrária [...] Se esta vontade
é incialmente representada por um indivíduo singular, a sua singularidade é atestada
por ser ela acolhida por um grande número e acolhida permanentemente, isso é, ela
se torna cultura, um “bom senso”, uma concepção de mundo [...] Até a filosofia alemã,
a filosofia foi concebida como atividade receptiva [...] Ao que parece, somente a
filosofia da práxis realizou um passo a frente no pensamento da filosofia alemã
historicizando o pensamento na medida em que assume como concepção de mundo
como ‘bom senso” difuso na multidão, difuso a ponto de se tornar norma [...] é criador
no sentido em que ensina que não existe uma realidade em si para si, sempre numa
relação histórica.

34. Estabelecidos os princípios de que todos os homens são filósofos [...] o filosofo
pode-se chamar de operário qualificado [...] o filosofo profissional ou técnico pensa
com maior rigor lógico os sistemas, além disso, conhece toda história do pensamento,
isto é, sabe quais as razões do desenvolvimento que o pensamento sofreu até ele, e
está em condições de retomar os problemas a partir do momento em que ele se
encontre após terem sofrido a mais alta tentativa de solução.

35. O senso comum era exaltado no século XVII e XVIII quando houve um principio de
autoridade representado pela bíblia e Aristóteles, descobriu-se que no senso comum
há uma dose de experimentalismo e de observação direta da realidade, ainda que
empírica e limitada.

36. [...] a filosofia como concepção de mundo é uma luta cultural para transformar a
“mentalidade” popular e divulgar as inovações filosóficas que se revelem
“historicamente verdadeiras” [...] a questão das línguas e linguagem devem ser postas
em primeiro plano [...] Linguagem é essencialmente um nome coletivo [...] não
pressupõe uma coisa única [...] linguagem significa também cultura e filosofia [...]
linguagem é uma multiplicidade de fatos mais ou menos organicamente coerentes e
coordenados [...] pode-se dizer que todo ser falante tem uma linguagem própria e
pessoal, ou seja, um modo pessoal de sentir e pensar. As ideias pragmatistas são
inaceitáveis. Todo ato histórico não pode deixar de ser realizado pelo coletivo, isto é,
ele pressupõe a obtenção de uma unidade cultural-social.

37. Revela-se a importância da questão linguística geral, isto é, da obtenção coletiva


de um mesmo clima cultural. Esse problema pode e deve ser relacionado com a
colocação moderna da doutrina e da pratica pedagógica, segundo as quais a relação
entre o professor e aluno é uma relação ativa, de vinculações reciprocas, e que,
portanto, todo professor é sempre aluno e aluno, professor. Mas a relação pedagógica
não pode ser limitada as relações especificamente escolásticas, através das quais as
novas gerações entram contato com as antigas e absorvem suas experiências e seus
valores historicamente construídos, amadurecendo e desenvolvendo uma
personalidade própria e culturalmente superior [...] toda relação de “hegemonia” é
necessariamente uma relação pedagógica, que se verifica não apenas no interior de
uma nação, entre as diversas forças que a compõem, mas em todo campo
internacional e mundial.

38. um filosofo consciente de que a sua personalidade não se limita a individualidade


física, mas é uma relação social ativa de modificação do ambiente cultural [...] isto é, a
relação da filosofia e história. O que é o homem? [...] ou melhor, o que o homem pode
se tornar? [...] o homem é um processo, precisamente o processo de seus atos. [...]
tomando o sistema católico como exemplo, apesar de ser um sistema religioso que
centraliza seus princípios de forma organizada, seria ele capaz de fomentar homens
de iguais personalidades? Não, há cristãos que acreditam que acredita que se levar a
cabo todo o escrito bíblico esse será estranho, portanto, mesmo nesse sistema
centralizado, o homem faz suas escolhas e todos são singularmente diferentes.

39. A humanidade se reflete na singularidade [...] daí possível dizer que cada ser
humano transforma a si mesmo e modifica todo conjunto de relações [...] assim todo
filosofo é politico [...] se a própria individualidade é o conjunto dessas relações,
conquistar uma personalidade significa adquirir consciência dessas relações, modificar
a própria personalidade significa modificar o conjunto dessas relações [...] dizer que
cada indivíduo pode modificar é até certo ponto certo, já que o indivíduo pode
associar-se com todos que querem a mesma modificação, se esta modificação for
racional, esse indivíduo poderá multiplicar-se por um elevado número de vezes
obtendo uma modificação bem mais radical que a primeira. Me parece não ser
totalmente certo que o homem deva ser analisado sempre no ponto de vista do
coletivo, por vezes, é necessário perceber a sede dessa atividade coletiva que é a
consciência individual, do homem que pensa, cria, deseja.

44. [...] dessa forma, chega-se também à igualdade ou equação entre filosofia e
política, entre pensamento e ação: em suma, a uma filosofia da práxis. Tudo é político,
inclusive as filosofias ou filosofias, e a única filosofia é a história em ato, ou seja, a
própria vida. [...] Progresso e devenir. São mesmos conceitos? O progresso está
atrelado a noção de quantidade e qualidade, sempre mais e melhor. Enquanto o
devenir, é associado a uma mudança, não necessariamente para melhor, mas
mudança, que tange ao idealismo, se atendo mais ao movimento dialético.

49. No idealismo, encontra-se a afirmação de que a filosofia é a ciência democrática


por excelência na medida em que se refere à faculdade de raciocinar, comum a todos
os homens, motivo pelo qual os aristocratas tem ódio à filosofia e as proibições legais
contra o ensino e a cultura por parte das classes do antigo regime.

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