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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA

FILHO” – FACULDADE DE CIENCIAS HUMANAS E SOCIAIS


CAMPUS DE FRANCA

Gabriel Lopes
4º Ano - História - Noturno

A CONTRACULTURA, O ROCK E O HIBRIDISMO CULTURAL

Franca
2020
A CONTRACULTURA, O ROCK E O HIBRIDISMO CULTURAL

Um dos pontos de ligação entre a contracultura e o rock foi o hibridismo cultural,


o qual promoveu uma aproximação entre a cultura popular e aquela chamada “cultura de
massa”. Exemplo claro desta aproximação entre a música de vanguarda e a música
popular é o álbum dos Beatles Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, lançado em junho
de 1967 e que, por meio de suas colagens e elementos inusitados, tensiona o limiar entre
o popular e a arte culta, convergindo para uma espécie de hibridismo (FENERICK e
MARQUIONI, 2008, p. 1).
A contracultura, em linhas gerais, se refere a uma série de manifestações que se
desenvolveram paulatinamente entre os anos de 1950 e 1970 nos Estados Unidose que,
grosso modo, contestavam a cultura dominante do Ocidente, questionando seus valores
fundamentais (VARGAS, 2011).
Segundo Roszak (1972), o objetivo dos jovens intelectuais e artistas que atuaram
em contracorrente a partir da segunda metade dos anos 60 era justamente abalar as bases
em que se assentava a sociedade ocidental, permeada pelo materialismo, pelo
racionalismo e pela tecnocracia.
George Martin, produtor dos Beatles, diria após algumas décadas do lançamento
do álbum Sgt. Peppers, que este foi a “sinfonia hippie definitiva”. Contudo, como
pontuam Fenerick e Marquioni (2008), o álbum não foi produzido em alguma
comunidade hippie de San Francisco, mas sim, nos estúdios da EMI em Londres.
Ademais, sem as condições tecnológicas de gravação em estúdio não seria possível sequer
fazer o álbum.
A própria concepção do LP possibilitou aos integrantes uma abordagem mais livre
como o desvencilhamento das temáticas adolescentes dos álbuns anteriores, as quais
incomodavam aos próprios integrantes, enfastiados com a Beatleamania dos fãs. A ideia
que permeia o disco é justamente a criação de uma banda fictícia, integrada por alter-
egos: a banda do Sgt. Pepper. Isso possibilitou uma visão crítica dos elementos
integrantes da banda com relação ao mercado da música e à indústria cultural. Desse
modo, é possível concluir que “por mais paradoxal que possa ser, foi a própria lógica da
indústria cultural que possibilitou essa reflexão” (FENERICK e MARQUIONI, 2008, p.
8).
Com o intuito de sair da lógica do show business a qual, obrigatoriamente, ligava
a carreira das bandas com as inumeráveis turnês e shows, o LP dos Beatles, Sgt. Pepper's
Lonely Hearts Club Band, foi concebido de modo a ser ele o próprio show. Assim, é
possível deflagrar essa intenção por detrás da elaboração do disco nas letras, como na
canção de abertura que diz “We’re Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, We hope you
will enjoy the Show” e nas colagens presentes na capa do álbum, com a ilustração dos
alter-egos dos integrantes e de diversas figuras ilustres, mistas entre o Ocidente e o
Oriente. Isso se faz presente também nos ruídos que simulam a plateia e a afinação dos
instrumentos (FENERICK e MARQUIONI, 2008).
Fenerick e Marquioni (2008) colocam que os Beatles passaram cada vez mais a
entender o estúdio como um instrumento a parte, que podia empregar recursos diferentes
nas canções. Também se percebe o tensionamento do sistema tonal, com o emprego de
instrumentos orientais (cítaras, harpas, etc). Em suma, o grupo distancia-se das canções
pop que outrora faziam sucesso. Mas novamente, ressalta-se que isso só pode ser feito
dentro de uma lógica de estúdio, munidos dos recursos de produção em estúdio. É desse
modo que o hibridismo cultural se faz presente, sendo que após o Sgt. Pepper toda essa
plêiade de elementos tão díspares; ruídos, instrumentos não-usais, colagens; pôde ser
empregada na estética pop dos anos seguintes. Desse modo, uma ilustração deste
hibridismo pode ser apreendida ao observarmos o que acontece no antigo “vazio” de 24
compassos na canção Day in the Life, o qual fora preenchido por uma orquestra:

o campo da música popular era ampliado com a inclusão de técnicas


provenientes das vanguardas musicais dos anos 50 e 60 (especialmente
a partir das pesquisas de John Cage, Karlheinz Stockhausen, Luciano
Berio e Pierre Boulez); mas essa canção, apesar de tudo, não deixava
de ser música popular, e enquanto tal, com limites para as
experimentações (FENERICK; MARCHIONI, 2008, p. 15).

Portanto, percebe-se que a criação do álbum dos Beatles, Sgt. Pepper's Lonely
Hearts Club Band foi, desde a sua concepção inicial, uma tentativa de aglomerar os
elementos vanguardistas dentro ainda de uma estética popular, apresentando um
sincretismo de elementos que tencionam a usual música popular antes feita pelo grupo e
introduzindo elementos inéditos, e muitas vezes totalmente aleatórios, adicionando novas
abordagens à forma tradicional de gravação em estúdio.
REFERÊNCIAS

FENERICK, José Adriano; MARQUIONI, Carlos Eduardo. SGT. PEPPER’S LONELY


HEARTS CLUB BAND: UMA COLAGEM DE SONS E IMAGENS. Fênix – Revista
de História e Estudos Culturais Janeiro/ Fevereiro/ Março de 2008 Vol. 5 Ano V nº 1.

GOFFMAN, Ken; JOY, Dan. Contracultura através dos tempos: do mito de Prometeu
à cultura digital. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007.

ROSZAK, Theodore. A contracultura: reflexões sobre a cultura tecnocrática e a


oposição juvenil. Petrópolis: Vozes, 1972.

VARGAS, Herom. Tinindo trincando: contracultura e rock no samba dos Novos Baianos.
Comunicação e cultura, vol. 9. n. 3, 2011.

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