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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ


CENTRO DE EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM SOCIEDADE,
CULTURA E FRONTEIRAS – NÍVEL MESTRADO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIEDADE, CULTURA E FRONTEIRAS

OLIRIO RIVES DOS SANTOS

MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS: PRINCIPAIS


ASPECTOS POLÍTICOS E JURÍDICOS DAS EXPERIÊNCIAS DE SÃO PAULO E
DO PARANÁ

FOZ DO IGUAÇU – PARANÁ


Abril/2019
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OLIRIO RIVES DOS SANTOS

MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS: PRINCIPAIS


ASPECTOS POLÍTICOS E JURÍDICOS DAS EXPERIÊNCIAS DE SÃO PAULO E
DO PARANÁ

Dissertação apresentada à Universidade


Estadual do Oeste do Paraná –
UNIOESTE, para obtenção do título de
Mestre em Sociedade, Cultura e
Fronteiras, perante o Programa de Pós-
Graduação Stricto Sensu em Sociedade,
Cultura e Fronteiras, área de
concentração: Sociedade, Cultura e
Fronteiras. Linha de Pesquisa: Trabalho,
Política e Sociedade.
Orientador: Fernando José Martins

FOZ DO IGUAÇU – PARANÁ


2019
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OLIRIO RIVES DOS SANTOS

MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS: PRINCIPAIS


ASPECTOS POLÍTICOS E JURÍDICOS DAS EXPERIÊNCIAS DE SÃO PAULO E
DO PARANÁ

Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do título de Mestre em


Sociedade, Cultura e Fronteiras e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-
Graduação Stricto Sensu em Sociedade, Cultura e Fronteiras – Nível de Mestrado,
área de Concentração em Sociedade, Cultura e Fronteiras, da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná – UNIOESTE, campus de Foz do Iguaçu.

COMISSÃO EXAMINADORA

________________________________________
Professor Doutor Fernando José Martins
Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE
(orientador)

_________________________________________________
Professora Doutora Maria Antonia de Souza
Universidade Tuiuti Paraná – UTP
Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG

__________________________________________
Professora Doutora Silvana Aparecida Souza
Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE

_________________________________________________
Professora Doutora Janaína Aparecida de Matos Almeida
Universidade Estadual do Oeste do Paraná- UNIOESTE
Professora Suplente

Foz do Iguaçu, 17 de abril de 2019


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Dedicatória
Dedico este trabalho às lideranças e aos
militantes dos movimentos sociais e
partidos de esquerda brasileiros, uma vez
que foi através deles e durante convívio
nos últimos vinte anos que percebi a
exclusão social e injustiças existentes no
Brasil. Assim, adquiri consciência da
urgente necessidade de transformação da
arcaica, conservadora e excludente
sociedade brasileira, o que somente
ocorrerá com a luta permanente e
progressiva dos movimentos sociais, bem
como do conjunto da sociedade.
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AGRADECIMENTOS

Com humildade e sinceridade agradeço de coração a todos que contribuíram


de uma forma ou outra para a realização deste estudo. Em especial agradeço ao meu
orientador, Professor Doutor Fernando José Martins, docente que conduz a orientação
de uma maneira que o trabalho realmente se realize, uma vez que prioriza a liberdade
do orientando ao ler, estudar e escrever, no entanto, sem permitir que se afaste do
rigor exigido pela pesquisa. Agradeço da mesma forma, todos os professores com
quem tive aulas durante o curso, considerando o esforço, dedicação e parcimônia ao
ensinar e saber compreender as dificuldades de quem está na condição de aluno.
Agradeço, também e, enormemente, aos docentes integrantes da banca
examinadora, em especial a professora doutora Silvana Aparecida de Souza, pela
disponibilidade e o esforço ao analisar e avaliar o trabalho realizado, bem como pelas
vastas e pertinentes sugestões realizadas.
Agradeço ao amigo de longa data, o professor Carlos Alberto da Silva, pelo
incentivo para a realização deste curso de Mestrado e, ainda, pelas contribuições ao
debate e sugestões relacionadas ao tema. Da mesma forma, meus agradecimentos à
querida amiga e colega de programa, a doutoranda Franciele de Camargo Ghellere,
considerando as vastas contribuições nas discussões atinentes aos temas
relacionados às várias matérias cursadas no Mestrado e também nessa pesquisa.
Agradecimentos sinceros e na proporção dos prontos e eficazes atendimentos
feitos aos discentes, pelos funcionários da Unioeste que trabalham na secretaria do
programa de Mestrado e Doutorado Sociedade Cultura e Fronteiras.
E agradeço, em “proporção cósmica”, a minha companheira Sandra Fagundes,
por saber compreender as longas horas de ausência em razão do curso.
Finalmente, agradeço aos colegas de turma pela companhia e companheirismo
ao longo de todas as aulas e demais eventos do decorrer do curso. No mesmo sentido,
agradecimentos especiais aos mestrandos e doutorandos com quem formei grupos
de trabalhos, considerando o desprendimento e boa vontade para contribuir no
decorrer das dúvidas e outras dificuldades relacionadas ao aprendizado e a busca de
conhecimentos, somatória de esforços sem a qual a presente realização, com certeza,
teria sido muito mais difícil.
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O todo sem a parte não é todo;


A parte sem o todo não é parte;
Mas se a parte o faz todo sendo parte;
Não se diga que é parte, sendo todo.

Gregório de Matos
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SANTOS, Olirio Rives dos. MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS


ESCOLAS: PRINCIPAIS ASPECTOS POLÍTICOS E JURÍDICOS DAS
EXPERIENCIAS DE SÃO PAULO E DO PARANÁ. Número de páginas, 179.
Dissertação. Mestrado em Sociedade, Cultura e Fronteiras – Universidade Estadual
do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Foz do Iguaçu.

RESUMO: Trata-se de pesquisa que teve por objetivo a análise política e jurídica do
Movimento de Ocupação das Escolas que ocorreu em São Paulo em 2015 e Paraná
em 2016. Para tanto, são estudados os principais aspectos políticos e jurídicos do
fenômeno em questão, partindo das atividades reivindicatórias estudantis ocorridas
no Brasil no período que antecedeu a ditadura militar e chega aos dias atuais com o
ocorrido em São Paulo e Paraná. Assim, iniciamos com a conceituação do método de
estudo, o qual é o Materialismo Histórico e Dialético, tendo em vista ser o instrumental
que mais facilita o acesso à essência do fenômeno pesquisado. Na sequência, aflora
na discussão o Movimento de Ocupação das Escolas como luta de classes, em cuja
ocasião são demonstrados os pormenores relacionados ao assunto e atinentes ao
objeto estudado. Com esse itinerário, após o debate sobre os relevantes
acontecimentos estudantis brasileiros de outrora, discutimos em profundidade os
feitos secundaristas de São Paulo de 2015 contra as medidas do governo paulista que
pretendia fechar 92 (noventa e duas) escolas, o que atingiria mais de um milhão de
estudantes, assim como o movimento dos estudantes do Paraná de 2016 contra as
pretensões do governo federal de reorganização do Ensino Médio e de contenção de
gastos no setor público, ocasionando o fechamento de 836 (oitocentos e trinta e seis)
unidades escolares paranaenses. Com isso, são demonstradas as causas, o
desenrolar e as consequências do movimento estudado, bem como a violência e
perseguição sofrida pelos estudantes e desencadeadas pelos governos e o contra
movimento, além das estratégias e articulações dos ocupantes ao longo do processo
de lutas desenvolvido, quando fica demonstrado que o fenômeno estudado é
albergado pelo sistema político vigente. Na sequência, o debate feito gira em torno
dos aspectos jurídicos do fenômeno, quando são delineados os direitos educacionais
assegurados pelo sistema jurídico brasileiro, tanto a nível constitucional, quanto
infraconstitucional, finalizando com a discussão travada nos tribunais em razão da
ocupação das escolas e demonstração da postura de classe de setores do Poder
Judiciário no que tange ao assunto. Consequentemente, é demonstrada a legalidade
das atividades estudantis analisadas, em cuja ocasião transparece o encontro entre
os fatores políticos e jurídicos consubstanciados na legislação, bem como a
necessidade de estudos sobre o contra movimento, com vista à superação de
barreiras e a obtenção da almejada qualidade do sistema educacional público do
Brasil, premissa que sempre foi vertente nos processos educacionais de resistências
e reivindicatórios no país.

Palavras-chave: Movimento de Ocupação das Escolas; aspectos políticos; aspectos


jurídicos; fechamento de escolas; participação da comunidade na gestão escolar.
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SANTOS, Olirio Rives dos. MOVIMIENTO ESTUDIANTILE DE OCUPACIÓN DE LAS


ESCUELAS: PRINCIPALES ASPECTOS POLÍTICOS Y JURÍDICOS DE LÁS
EXPERIENCIAS DE SÃO PAULO Y DEL PARANÁ. Número de páginas, 179.
Disertación. Maestría en Sociedad, Cultura y Fronteras - Universidad Estatal del Oeste
de Paraná - UNIOESTE - Campus de Foz do Iguaçu.

RESUMEN: Se trata de una investigación que tiene por objetivo a análisis político y
jurídico del Movimiento de Ocupación de las Escuelas que ocurrido en São Paulo y
Paraná. Para eso, se estudian los principales aspectos políticos y jurídicos del
fenómeno en cuestión, a partir de las actividades reivindicatorias estudiantiles
ocurridas en Brasil en el período que precedió a la dictadura militar y llega en los días
actuales con lo ocurrido en São Paulo en 2015 y Paraná en 2016. De esa forma,
empezamos con la conceptualización del método de estudio, lo qual és el Materialismo
Histórico y Dialéctico, teniendo en vista ser lo instrumental el cual más facilita el
acceso a la esencia del fenómeno investigado. En la secuencia, aflora en la discusión
el Movimiento de Ocupación de las Escuelas como lucha de clases, en cuya ocasión
se demuestran los detalles relacionados al asunto y relacionados al objeto estudiado.
Con ese itinerario, tras el debate sobre los relevantes acontecimientos estudiantiles
brasileños de antaño, discutimos en profundidad los hechos secundarios de San Pablo
de 2015 contra las medidas del gobierno paulista que pretendía cerrar 92 (noventa y
dos) escuelas, lo que alcanzaría más de un año y el movimiento de los estudiantes de
Paraná de 2016 contra las pretensiones del gobierno federal de reorganización de la
Enseñanza Media y de contención de gastos en el sector público, ocasionando el
cierre de 836 (ochocientos treinta y seis) unidades escolares paranaenses. Con ello,
se demuestran las causas, el desarrollo y las consecuencias del movimiento
estudiado, así como la violencia y persecución sufrida por los estudiantes y
desencadenadas por los gobiernos y el contra movimiento, además de las estrategias
y articulaciones de los ocupantes a lo largo del proceso de luchas desarrollado,
cuando se demuestra que el fenómeno estudiado es albergado por el sistema político
vigente. En la secuencia, el debate hecho gira en torno a los aspectos jurídicos del
fenómeno, cuando se delinean los derechos educativos asegurados por el sistema
jurídico brasileño, tanto a nivel constitucional, cuanto infraconstitucional, finalizando
con la discusión trabada en los tribunales en razón de la ocupación de las escuelas y
demostración de la postura de clase de sectores del Poder Judicial en lo que se refiere
al asunto. Consecuentemente, se demuestra la legalidad de las actividades
estudiantiles analizadas, en cuya ocasión se manifiesta el encuentro entre los factores
políticos y jurídicos consubstanciados en la legislación, así como la necesidad de
estudios sobre el contra movimiento, con vistas a la superación de barreras y la
obtención de la deseada calidad del sistema educativo público del Brasil, premisa que
siempre fue vertiente en los procesos educativos de resistencias y reivindicatorios en
el país.

Palabras clave: Movimiento de Ocupación de las Escuelas; legitimidad política y


jurídica; cierre de escuelas; PEC. 246/2016 y 55/2016; Plan Nacional de Educación.
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SANTOS, Olirio Rives dos. STUDENT MOVEMENT OF SCHOOL OCCUPATION:


MAIN POLITICAL AND JURIDICAL ASPECTS OF THE EXPERIENSE OF SÃO
PAULO AND PARANÁ. Number of pages, 179. Dissertation. Master in Society,
Culture and Borders - Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Foz
do Iguaçu Campus.

ABSTRACT: It is a research whose objective is to prove the political and legal


legitimacy of the Schools Occupation Movement that took place in São Paulo in 2015
and Paraná in 2016. The main political and legal aspects of the phenomenon in
question, whose studies, due to the historical factors and their relations with the current
movements, are part of the student protest activities that occurred in Brazil in the period
that preceded the military dictatorship and arrives in the current postponements with
what occurred in São Paulo and Paraná, as noted above, thereby we begin with the
concept of the study method, which is the Historical and Dialectical Materialism, in view
of being the instrument that facilitates the access to this study. Thus, we make
contributions in the debate about the occupation of schools as a category under
construction and the student movement as a class struggle, while the method of
research is Historical and Dialectical Materialism. With this itinerary, after the debate
on historical factors we discussed in depth the student achievements of São Paulo in
2015 against the measures taken by the São Paulo government to close 92 (ninety-
two) schools, which would reach more than one million students, as well as the
secondary movement in Parana in 2016, against the measures of the federal
government in reorganizing the High School and the containment of expenses in the
public sector, which would close 836 (eight hundred and thirty-six) schools in Paraná,
where the causes, the evolution and the consequences of the studied movement are
demonstrated, as well as the violence and persecution suffered by the students and
triggered by the governments and against the movement, besides the strategies and
articulations of the secondary students throughout the cycles of struggles developed,
when the political legitimacy of the movement is demonstrated. Following, it is
demonstrated the educational rights guaranteed by the Brazilian legal system, both at
the constitutional and infra-constitutional level, ending with the discussion held in the
courts due to the occupation of the schools and demonstration of errors and
correctness of the Judiciary regarding the matter. Finally, it is demonstrated the legal
legitimacy of the studied student activities, the encounter between the political and
legal factors and the necessity of studies on the counter movement, with a view to
overcoming barriers and obtaining the desired quality, in fact, of the public educational
system in Brazil, that was always the objective in the educational process of resistance
and vindicate in the country.

Keywords: Schools Occupation Movement; political and legal legitimacy; closure of


schools; community occupation in school management
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LISTA DE FOTOGRAFIAS

01 – Fotografia sobre o evento de fundação da União Nacional dos Estudantes (UNE)


em 1937.
02 – Fotografia retrata o velório do estudante Edson Luiz de Lima morto pela polícia
em 1968.
03 – Fotografia de uma assembleia do Movimento de Ocupação das Escolas em São
Paulo em 2015 vigiada pela Polícia Militar (PM).
04 – Fotografia de um estudante do Movimento de Ocupação das Escolas sendo preso
pela Polícia Militar de São Paulo em 2015.
05 – Fotografia de integrantes do Movimento de Ocupação das Escolas do Paraná em
assembleia em São José dos Pinhais em 2016.
06 – Fotografia dos integrantes do Movimento de Ocupação das Escolas trancando
rua em Curitiba em 2016.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

APP - Sindicato dos Trabalhadores de Educação Pública do Paraná


ALEP – Assembleia Legislativa do Paraná
APEOESP – Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo
AEE-SP – Secretaria de Estado da Educação de São Paulo
ANPUH – Associação Nacional de História
ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
APP – Sindicato dos Trabalhadores de Educação Pública do Paraná
AgRg – Agravo Regimental
CE – Colégio Estadual
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CGT – Central Geral dos Trabalhadores
CMI – Centro de Mídia Independente
CMP – Central de Movimentos Populares
CEFAM – Colégio Estadual Francisco Azevedo Macedo
CONIF – Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação
Dje – Diário de Justiça do Estado
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
EE – Escola Estadual
EJA – Educação de Jovens e Adultos
ETEC – Escola Técnica Estadual
ETESP – Escola Técnica Estadual de São Paulo
FND – Faculdade Nacional de Direito
Fund 1 – Fundamental Um
Fund 2 – Fundamental Dois
G. A. S. – Grupo Autônomo Secundarista
G. 1 – Portal de notícia do grupo Globo
GO – Goiás
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
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IFPR – Instituto Federal do Paraná


IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LAPEDUH – Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MASP – Museu de Arte de São Paulo
MCs – Enologia de Mestre de Cerimônia
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MG – Minas Gerais
MP – Ministério Público
MPL – Movimento Passe Livre
MPL-SP – Movimento Passe Livre de São Paulo
MP – Medida Provisória
MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
NRE – Núcleo Regional de Educação
NRE-DV - Núcleo Regional de Educação de Dois Vizinhos
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PGE – Procuradoria Geral do Estado
PIB – Produto Interno Bruto
PM – Polícia Militar
PNE – Plano Nacional de Educação
PR - Paraná
PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados
PSOL – Partido Socialismo e Liberdade
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PMDB – Partido da Mobilização Democrática Nacional
PNE – Plano Nacional de Educação
REsp – Recurso Especial
Rel – Relator
SAFEL – Colégio Estadual Santa Felicidade
SP – São Paulo
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SPTV – Telejornal Local Brasileiro da TV Globo de São Paulo


STJ – Superior Tribunal de Justiça
SUDE - Superintendência de Desenvolvimento Educacional
Seed – Secretaria de Estado de Educação
TJPR – Tribunal de Justiça do Paraná
TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo
UOL – Universo Online
UMES – União Municipal de Estudantes
UNE – União Nacional dos Estudantes
UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná
USAID – Agência dos Estados Unidos Para o Desenvolvimento
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LISTA DE ANEXOS

01 – Anexo 1 – Manual: COMO TRAVAR UMA AVENIDA 1.


02 - Anexo 2 – Manual: COMO TRAVAR UMA AVENIDA 2.
03 – Anexo 3 – Manual: AGORA A AULA É NA AVENIDA.
04 – Anexo 4 – Manual: COMO OCUPAR UM COLÉGIO?
05 - Anexo 06 - Cartilha: COMO OCUPAR SUA ESCOLA?
15

SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO ......................................................................................................17

1.1 - O MATERIALISMO HISTÓRICO E DIALÉTICO COMO MÉTODO NA


PRESENTE PESQUISA ............................................................................................26

2 – O MOVIMENTO ESTUDANTIL, A LUTA DE CLASSES E OS FATORES


HISTÓRICOS DA LUTA DOS ESTUDANTES...........................................................32

2.1 - O MOVIMENTO ESTUDANTIL, A OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS E A LUTA DE


CLASSES ..................................................................................................................33

2.2 – HISTÓRICOS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL BRASILEIRO .........................46

3 – O MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS EM SÃO


PAULO EM 2015, NO PARANÁ EM 2016: ASPECTOS POLÍTICOS .......................63

3.1 – O MOVIMENTO DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS EM SÃO PAULO EM


2015............................................................................................................................64

3.2 – O MOVIMENTO DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS NO PARANÁ EM 2016


....................................................................................................................................86

3.3 – OS PRINCIPAIS ASPECTOS POLÍTICOS DO FENÔMENO DE SÃO PAULO


EM 2015 E DO PARANÁ EM 2016...........................................................................106

3.3.1 - POLÍTICA DE RELAÇÃO COM A COMUNIDADE E NO INTERIOR DO


MOVIMENTO, BEM COMO IGUALDADE E DEMOCRACIA....................................108

3.3.2 – POLÍTICA DE INFORMAÇÃO.......................................................................111

3.3.3 – POLÍTICA DE DECISÕES TOMADAS DE FORMA HORIZONTAL..............115

4 – OS PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL DE


OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS DE SÃO PAULO EM 2015 E DO PARANÁ EM 2016
..................................................................................................................................121
16

4.1 - OS DIREITOS EDUCACIONAIS PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA A


PARTIR DE 1988 .....................................................................................................121

4.2 - DO DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO, DE


REUNIÃO E PLENA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO..............................................129

4.3 – O DIREITO DE PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NAS DECISÕES SOBRE


AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS.............................................................................133

4.4 – O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE.......................................................................................................141

4.5 - AS QUESTÕES POSSESSÓRIAS NOS LITÍGOS ENTRE O ESTADO E OS


ESTUDANTES E A EDUCAÇÃO COMO DIREITO SUBJETIVO PÚBLICO
..................................................................................................................................147

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................160

6 - REFERÊNCIAS ..................................................................................................165

ANEXOS ..................................................................................................................173
17

1 - INTRODUÇÃO

É preciso reconhecer de uma vez por todas que a criança e, sobretudo, o


adolescente, não se preparam apenas para viver, mas já vivem uma
verdadeira vida. Devem consequentemente organizar a vida. A auto-
organização deve ser para eles um trabalho sério, compreendendo
obrigações e sérias reponsabilidades. Se quisermos que as crianças
conservem o interesse pela escola, considerando-a como seu centro vital, é
preciso nunca perder de vista que as crianças não se preparam para se tornar
membros da sociedade, mas já o são, tendo já seus problemas, interesse,
objetivos, ideais, já estando ligada à vida dos adultos e do conjunto da
sociedade (PISTRAK, 2011, p. 33-34).

A epígrafe acima de autoria de Pistrak (2011) é de enorme atualidade, uma


vez que os movimentos estudantis de hoje, a exemplo dos ocorridos no passado,
salientam esse desejo juvenil de serem reconhecidos e respeitados de acordo com os
seus anseios, necessidades e objetivos. Porém, na maioria dos casos, essa legítima
reivindicação é ignorada por considerável parcela das gerações mais velhas e pela
política vigente, seja no meio escolar ou na sociedade, realidade que se coloca entre
as causas das grandes mobilizações dos estudantes nos últimos anos no Brasil e no
mundo e se apresenta como mais um problema educacional a ser resolvido.
Nesse sentido, esta pesquisa tem como objeto o Movimento de Ocupação
das Escolas1, cujo foco se encontra no fenômeno ocorrido em São Paulo em 2015 e
Paraná em 2016, acontecimentos que receberam influências dos estudantes chilenos
e de movimentos estudantis brasileiros de outrora, principalmente do período
relacionado à fundação da UNE (União Nacional dos Estudantes), em 1937, até os
acontecimentos do início deste século, passando pela participação estudantil no
movimento “Diretas já” e os denominados “Os caras pintadas”.
De acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 27-30), o motivo do
movimento em São Paulo foi a publicação pelo governo paulista, no dia 23 de
setembro de 2015, da política titulada como: Reorganização Escolar, que estabeleceu
a reorganização nas unidades de ensino e, consequentemente, a transferência de

1
A locução “Movimento de Ocupação das Escolas”, será escrita ao longo do texto com as iniciais
maiúsculas, uma vez que, em analogia à expressão “Sem Terra”, em maiúsculo e sem hífen significa
uma identidade de pertencimento de grupo ou coletivo. Não é mais um sujeito individual que não possui
terra, portanto, sem terra. Sem Terra significa sujeitos de uma escolha: a de lutar por mais justiça social
e dignidade para todos (CALDART, 2003). No mesmo sentido os estudantes, pois se encontram lutando
por uma escola pública de qualidade em benefício à nação como um todo, considerando os seus
anseios profissionais e a busca do pleno desenvolvimento da pessoa humana.
18

aproximadamente um milhão de alunos da rede pública, para que as escolas públicas


pudessem ser divididas em ciclos2. O Estado justificou a medida dizendo que iria fazer
a divisão, tanto nas séries iniciais e finais do Ensino Fundamental, quanto no Ensino
Médio, pois assim focaria naquilo que é a sua responsabilidade, ou seja, a Educação
Básica. A referida pretensão governamental, já formatada e em vias de
implementação, em nenhum momento passou pelo crivo do debate com a
comunidade escolar, portanto, além de inviável, ainda foi impositiva, por isso se
transformou em “pólvora” no meio estudantil paulista e culminou na ocupação de mais
de 200 escolas pelos alunos.
No Paraná, conforme destacaram Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 13-
17), a causa dos protestos, resistência e reivindicações foi devido a publicação da
Medida Provisória (MP) nº 746/2016, no dia 22 de setembro de 2016 pelo governo
federal e titulada como: Reorganização do Ensino Médio, tornando optativa nas
grades escolares uma série de matérias, entre elas Filosofia e Sociologia. Na “esteira”
da política já anunciada, o governo apresentou a Proposta de Emenda Constitucional
(PEC) nº 241/2016 (Câmara Federal) e nº 55/216 (Senado), que uma vez aprovada
passou a ser a Emenda Constitucional nº 95/2016, estabelecendo um teto de gastos
públicos no setor primário, no qual está incluso o educacional, pelo período de 20
anos. Esse conjunto de medidas “incendiou” as escolas públicas estaduais
paranaenses, tendo 836 (oitocentos e trinta e seis) escolas ocupadas de acordo com
o livro “Ocupa PR 2016”, além de universidades e institutos federais, bem como, a
exemplo do que havia ocorrido em São Paulo, trancaram ruas e avenidas no Estado
do Paraná como um todo, inclusive com enorme repercussão nas cidades do interior.
Diante do progressivo desenrolar das ocupações como forma de resistência
secundarista, tanto em São Paulo, quanto no Paraná, as ações e atividades dos
estudantes ocupantes, além do forte debate que suscitou na sociedade e nos espaços
de governo, desaguou nos juízos e tribunais, portanto, foi judicializada por iniciativa
estatal a partir de ações de reintegração de posse, por isso, a par do fator político, as
questões jurídicas também permeiam o fenômeno com enorme centralidade.

2O termo ciclo, usado pelos autores no livro Escolas de Luta, quando se referem à política denominada
Reorganização Escolar que o governo paulista pretendia implementar, diz respeito ao Ensino
Fundamental I, Ensino Fundamental II e Ensino Médio. E, de acordo com o Dicionário Aurélio é, 1.
Série de fenômenos que se sucedem numa ordem determinada: ciclo das estações; ciclo das horas [...]
4. Bras. Cada uma das divisões de certos programas de ensino.
19

Assim, uma vez no Poder Judiciário, conforme ocorreu no interior das


escolas, na sociedade e espaços oficiais, como no Poder Legislativo e Poder
Executivo, foi ampla a discussão política e jurídica sobre o assunto, o que fez o
Tribunal de Justiça paulista, diante da enorme pressão reivindicatória e de resistência
que se estabeleceu, reconhecer o direito vigente e assim decidiu por dar ganho de
causa aos estudantes, em que pese no primeiro momento, a nível de primeiro grau,
ter determinado a reintegração de posse das escolas ocupadas. No Paraná não foi
diferente, tendo em vista as divergentes decisões judiciais, pois tanto “a nível” de
juízes de primeiro grau, quanto no âmbito recursal, houve julgados ora favoráveis ao
Estado, ora aos estudantes, por isso, o debate jurídico oscilou entre decisões
determinando as reintegrações de posse e outras indeferindo as liminares e assim se
mantiveram as ocupações das escolas, o que fez aflorar os questionamentos que
pretendemos responder neste estudo.
Por isso, diante dos aspectos que permeiam o fenômeno estudado, devem
ser consideradas as proposições reformistas dos governos e as fortes resistências
estudantis, que se encontram na “arena política”, paralelo às posições e
contraposições de juízes, bem como o respectivo marco constitucional e legal, que se
encontram no âmbito do Direito3, eis a pergunta que esta pesquisa tem por pretensão
responder: O Movimento de Ocupação das Escolas no Estado de São Paulo em 2015
e no Paraná em 2016 encontra amparo no sistema político e legalidade no sistema
jurídico vigente?
Tendo por finalidade responder o questionamento referido, considerando a
necessidade de ver as relações dos acontecimentos, objeto desta pesquisa, com os
fatos de outrora e atinentes aos interesses dos estudantes, conforme colocado acima,
foram suscitados no debate os processos reivindicatórios anteriores, mesmo que
tenham ocorrido em um tempo distante, em relação ao que ocorreu em São Paulo em
2015 e no Paraná em 2016. Da mesma forma, consideramos fatos ocorridos no
passado longínquo e assim foi feito com vistas à discussão em relação ao Movimento
de Ocupação das Escolas quanto luta de classes, capítulo 2, subcapítulo 2.1, uma vez
que as causas, políticas e/ou jurídicas, o desenrolar dos processos reivindicatórios e

3 A palavra Direito escrita com a inicial maiúscula é para evitar ambiguidade, uma vez que se refere à
disciplina, portanto, ao curso acadêmico, e não ao simples cumprimento de uma obrigação, como por
exemplo: fazer direito a disciplina. E, também, de acordo com a base XIX do novo Acordo Ortográfico
(1990), entre os países de Língua Portuguesa, os nomes que designam domínios de disciplina do
saber, podem ser escritos com inicial maiúscula ou minúscula.
20

inclusive as consequências em muito se assemelham, mesmo que façam parte de


contextos ou períodos históricos e regiões geográficas distantes, o que fortalece o
entendimento de que as dificuldades dos estudantes das escolas públicas, e os
aspectos de suas lutas têm sido os mesmos ao longo da história, já que se referem a
filhos de trabalhadores em luta por melhores condições educacionais contra uma elite
econômica que conduz os destinos do Estado de acordo com os seus próprios
interesses e com vistas a manter privilégios que têm vigência histórica.
E nesse “passo a passo”, a exemplo das ações dos estudantes de épocas
passadas e enfrentando o Estado e todo o seu aparato e instrumentalização, os
secundaristas do Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo de 2015 e do
Paraná de 2016, constituíram e colocaram em prática uma série de reivindicações
políticas, consubstanciadas em uma pluralidade de relações e vínculos já existentes
ou que foram construídos no decorrer da caminhada reivindicatória e de resistência.
E não foi diferente no que tange ao âmbito jurídico, pois de acordo com o que lhes é
assegurado no marco constitucional e legal como política educacional, assim como
estudantes na condição de indivíduos titulares de direitos e, ao mesmo tempo, na
condição de pessoas em desenvolvimento, a rigor das regras presentes no Estatuto
da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), um cabedal de aspectos políticos e
jurídicos se tornaram prática e, portanto, como realidades permearam todo o processo
de ocupação das escolas ora em estudo.
Por isso, bem como em razão da problemática já elencada, esta pesquisa
tem os seguintes objetivos: a - Analisar os principais aspectos políticos do Movimento
de Ocupação das Escolas do Estado de São Paulo de 2015 e do Estado do Paraná
de 2016 e b - Identificar os principais aspectos jurídicos do Movimento de Ocupação
das Escolas do Estado de São Paulo de 2015 e do Estado do Paraná de 2016.
Trata-se de pesquisa teórica e documental, com base em livros, teses,
dissertações e artigos escritos sobre o tema, bem como na legislação vigente que
disciplina o assunto relacionado à educação e algumas ações judiciais atinentes à
ocupação de escolas, o que possibilita uma importante compreensão sobre o
fenômeno, suas causas, o desenrolar e as suas consequências. Salienta-se que o
material de pesquisa usado no estudo foi encontrado através de buscas realizadas no
sítio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)4 e

4
https://catalogodeteses.capes.gov.br/catalogo-teses/#!/ - http://www.periodicos.capes.gov.br/
21

considerando a pertinência relacionada ao tema em discussão, assim como a partir


das indicações e orientações feitas pelo professor orientador e demais professores do
programa e membros da banca. Com relação aos processos judiciais referenciados
no texto, a exemplo dos livros e artigos usados, a escolha foi feita de acordo com a
necessidade deste estudo e com vistas à contextualização do que ocorreu em relação
ao fenômeno, enquanto a busca processual se realizou a partir de estudos da
jurisprudência nos sítios dos tribunais5, e, por consequência, ao conteúdo das ações
possessórias e respectivas decisões, possibilitando a realização da pesquisa.
Para o fim de atingir os objetivos elencados acima e visando entender a
problemática estabelecida, além da necessidade de responder se o fenômeno em
estudo está ou não amparado sob o ponto de vista político e jurídico, no nosso
entender, depende fundamentalmente da identificação das relações que se
estabeleceram no decorrer do processo das ocupações, assim como se o Direito foi
ou não aplicado pelo Poder Judiciário conforme a sua respectiva vigência.
Para tanto, já nesta introdução, tópico 1.1, estabelecemos o debate sobre o
método utilizado nesta pesquisa, o qual é o Materialismo Histórico e Dialético, quando
demonstramos o seu conceito e como ocorre a pesquisa na dinâmica entre as
categorias, evidenciando o que possibilitou o desenrolar das atividades dos
estudantes envolvidos no fenômeno estudado e a rigor do debate realizado. Assim,
com relação ao método, nossa “âncora” teórica se encontra em Diniz (2006), Neto
(2011), Marx (2008) e Kuenzer (2013), uma vez que os referidos autores demonstram
a vasta importância assegurada à metodologia para sucesso de um projeto de
pesquisa, ao mesmo tempo em que José Paulo Neto traça o debate quanto à
relevância do método eleito por Marx e Acácia Kuenzer traz para a discussão a
importância das categorias metodológicas e de conteúdo no decorrer da busca dos
objetivos almejado em uma pesquisa científica.
Na sequência, no capítulo 2, subcapitulo 2.1, a discussão estabelecida é
sobre a luta de classes e cujas referências estão em Divardim, Schmidt e Sobanski
(2016); Campos, Medeiros e Ribeiro (2015); Poerner (1968), bibliografia a partir da
qual é possível o acesso aos acontecimentos fáticos relacionados ao fenômeno
estudado, o que possibilita, portanto, uma interação efetiva com a realidade do

5Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), Tribunal de Justiça
de Minas Gerais (TJMG) e Superior Tribuna de Justiça (STJ).
22

mencionado objeto de pesquisa. Já, a partir dos autores: Engels (2002); Marx e Engels
(1977); Santos, T. (1983); Souza, M. (2008); Paro (2012); Souza, S. (2018), é
possibilitado a interação com as teorias e, consequentemente, fica alargada a
possibilidade de concreta interação entre a teoria e a realidade de acordo com a
necessidade deste estudo e as exigências do método adotado.
Em continuidade, no capítulo 2, subcapitulo 2.2, a respeito das atividades dos
estudantes do Brasil Colônia até os anos 20006 (final da década passada e início da
década atual), o estudo é estabelecido a partir de Poerner (1968); Fiegenbaum,
Machado e Schneider (2012); Rocha e Lucio (2012); Quintão (2010) e Santos, D.
(2014), bibliografia que possibilita a discussão tanto pelo ângulo fático, quanto teórico
relacionado ao andar histórico da luta dos estudantes, o que propicia e facilita o
desenvolver da pesquisa e a busca do objetivo almejado, com a demonstração de que
as conquistas políticas e jurídicas dos estudantes ocorreu de forma crescente,
progressiva e a partir da luta de classes ao longo do tempo.
Assim, no que diz respeito à luta de classes no movimento estudantil, a partir
dos fatos narrados e do estudo realizado, o esforço é por esclarecer que essa foi a
realidade ao longo da história dos estudantes, o que se repetiu no fenômeno de 2015
em São Paulo e de 2016 no Paraná, propiciando a ocorrência da resistência e das
conquistas consolidadas. Em sentido semelhante, através da narrativa sobre a parte
histórica da luta estudantil, é esclarecido, que embora em períodos distintos, os
processos reivindicatórios e de resistências possuem causas, desenrolar e
consequências, iguais ou muito semelhantes, na relação entre o passado e os
acontecimentos do presente, ao mesmo tempo em que fica demonstrado que as
conquistas políticas e jurídicas foram um “passo a passo” de lutas ao longo do tempo.

6
O recorte temporal nos anos 2000 é em razão do perfil das grandes manifestações da primeira metade
da década atual, especialmente 2012, 2013 e 2014. De acordo com Maria da Glória Gohn, no livro:
“Manifestações de junho de 2013 no Brasil e praças dos indignados no mundo”, bem como Ilse Scherer-
Warren, no artigo: “Manifestações de rua no Brasil 2013: encontros e desencontros na política”, no
mencionado período ocorreu de tudo, foi um encontro de linhas de pensamento, de protestos e
reivindicações, inclusive, de grupos políticos da direita e da ultradireita. Por isso, entendemos que o
estudo dessa fase, difere das pretensões dessa pesquisa, o que faz com que retomemos a análise no
fenômeno de São Paulo em 2015 e do Paraná em 2016.
23

No capítulo 3, subcapítulo 3.1, delineamos o emaranhado de relações


consolidadas pelo Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo de 2015, assim
como no mesmo capitulo, porém no subcapítulo 3.2, o fazemos com relação ao
Movimento de Ocupação das Escolas do Paraná de 2016. E, considerando a mesma
pretensão, ainda no capitulo 3, subcapítulo 3.3, subdivido em 3 tópicos, debatemos e
elencamos as principais políticas praticadas em razão da formulação do Movimento
de Ocupação das Escolas, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016.
Para tanto, considerando os fins do capítulo 3, a pesquisa se encontra
amparada nos seguintes autores, sendo livros, teses, dissertações e artigos: Campos,
Medeiros e Ribeiro (2015); Poerner (1968); Santos, D. (2014); Corti, Corrochano e
Ribeiro (2015); Giroto (2016); Moraes e Ximenes (2016); Santos, M. (2016); Copiano
(2017); Silva, A. (2017); Divardim, Schmidt e Sobanski (2016); Moresco (2017);
Espíndola, Macedo e Rodrigues (2016); Lavoratti, Freitas, Machado, Correia e Galvão
(2017); Boutin e Flach (2017); Camasmie (2018); Steimbach (2018), bibliografia que
propicia o debate tanto pelo viés teórico, quanto a partir dos acontecimentos reais e
de acordo com a prática dos estudantes, do governo e do contra movimento, o que
conduz para uma compreensão real do fenômeno.
Assim, no capítulo 3, no subcapítulo 3.1, é debatido e demonstrado que em
São Paulo os estudantes enfrentaram o Estado e todo o seu aparato logístico em três
fases bem definidas, quais sejam, os protestos e passeatas de rua, a ocupação das
escolas e, por fim, os trancamentos e fechamentos de ruas e avenidas, com todas as
suas peculiaridades e percalços, até desaguar na derrota governamental. No capítulo
3, subcapítulo 3.2, demonstramos os acontecimentos sobre o movimento dos
estudantes no Paraná, onde também transparece a pluralidade de acontecimentos e
que contêm certa caoticidade, pois não se vê a mesma organicidade constatada em
São Paulo. E, finalmente, no capítulo 3, subcapítulo 3.3, tratamos das políticas
formuladas e colocadas em prática pelos estudantes ao longo do processo de
ocupação, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016, cujo esforço,
em conjunto com o capítulo 2, subcapítulo 2.2, é para verificar a existência de amparo
político do movimento pelo sistema vigente e a partir da problemática estabelecida.
Com relação aos fatores jurídicos, nesse sentido, ao tratarmos dos referidos
aspectos do Movimento de Ocupação das Escolas, tanto em São Paulo em 2015,
quanto no Paraná em 2016, a finalidade é demonstrar os direitos educacionais
assegurados aos estudantes e se as ações por eles praticadas são legais ou não sob
24

o ponto de vista do direito vigente. Assim, no capítulo 4, subcapítulo 4.1, debatemos


os direitos educacionais assegurados pelo sistema jurídico brasileiro, tanto no âmbito
da Constituição Federal, quanto na legislação ordinária, ao mesmo tempo em que nos
subcapítulos 4.2, 4.3, 4.4 e 4.5, são discutidos os aspectos jurídicos que, de fato,
tiveram influência nas decisões judiciais relacionadas às ações possessórias
ajuizadas pelo Estado contra os estudantes integrantes do movimento, objeto deste
estudo, e que “ancoraram" as ações dos secundaristas durante o fenômeno em São
Paulo em 2015 e no Paraná em 2016.
Dessa forma, quanto ao capítulo 4, subcapítulo 4.1, sobre os direitos
educacionais previstos na legislação brasileira e os aspectos jurídicos do Movimento
de Ocupação das Escolas de São Paulo em 2015 e do Paraná em 2016, a pesquisa
se encontra fundamentada na Constituição Federal, leis ordinárias, livros e artigos
científicos, sendo da seguinte maneira: o embasamento se encontra na Constituição
Federal de 1988, título VIII, capítulo III; Lei Federal nº 9.394/1996, Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB); Lei Federal nº 13.005/2014, Plano Nacional de
Educação (PNE), onde é possível visualizar, com bastante precisão, os direitos
relacionados à educação e que são devidamente previstos no marco constitucional e
legal e que se encontram em plena vigência.
Ainda quanto ao capítulo 4, porém no subcapítulo 4.2 (Do direito à liberdade
de expressão do pensamento, de reunião e plena liberdade de associação);
subcapítulo 4.3 (O direito de participação da comunidade nas decisões sobre
educação); subcapítulo 4.4 (O princípio da proteção integral da criança e do
adolescente); subcapítulo 4.5 (As questões possessórias nos litígios entre o Estado e
os estudantes e a educação como direito subjetivo público), os fundamentos teóricos
se referem a vários autores de livros, artigos, teses e dissertações; dispositivos da
Constituição Federal de 1988; leis e processos judiciais que tramitaram em razão das
ações de ocupação dos estudantes.
No sentido exposto, quanto ao capítulo 4, subcapítulo 4.2, a base teórica
utilizada é a Constituição Federal de 1988, art. 5º, incisos IV, XVI e XVII, bem como
os seguintes autores: Campos, Medeiros e Ribeiro (2015); Bastos (1996); os autos da
ação possessória nº 0012.059-08.2016.8.16.0044.
No que se refere ao capítulo 4, subcapítulo 4.3, nossa base teórica com
vistas à análise serão os artigos 205, caput e 206, inciso VI, da Constituição Federal
de 1988; art. 14 da LDB, Lei Federal nº 9.394/1996; Plano Nacional de Educação, Lei
25

Federal nº 13.005/2014, além dos seguintes autos de ação possessória: nº 001059-


08.2016.8.16.0044 de Apucarana e nº 4761-86.2016.8.16.0036, de São José dos
Pinhais, bem como os autos de Recurso de Agravo de Instrumento nº 1.569.056-7, do
Plantão Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, além dos seguintes
autores de artigos: Souza, A. (2001); Souza, D. (2008); Souza, S. (2012); Silva, M.
(2014); Furtado (2005); Araújo (2003); Santos, M. e Sales (2012); Ramos (2012);
Oliveira, Moraes e Dourado (2008).
Já, no que tange ao capítulo 4, subcapítulo 4.4, a pesquisa será alicerçada
nos autos de ação possessória nº 33.504-54.2016, da cidade de Cascavel; decisão
proferida no Recurso de Apelação nº 735-38.2015.8.16.0179 do Tribunal de Justiça
do Paraná; decisão proferida no Recurso Especial nº 1.623-098, do Superior Tribuna
de Justiça e oriundo do Estado de Minas Gerais; no art. 227, § 3°, da Constituição
Federal de 1988; art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal nº 8.069
de 1990. E, ainda, nos seguintes autores de artigos: Ferreira e Doi (2004); Gomes
(2009); Mendes (2006).
Finalmente, quanto ao capítulo 4, subcapítulo 4.5, a análise está “ancorada”
nos autos das ações possessórias nº 0031.318-31.2016.8.16.0030, da Segunda Vara
da Fazenda Pública de Foz do Iguaçu e nº 0031.389-33.2016.8.16.0030, do Plantão
Judiciário, também de Foz do Iguaçu; no art. 208, §§ 1° e 2º, da Constituição Federal
de 1988; Leis Federais nº 10.406/2002 (Código Civil) e nº 13.105/2015 (Código de
Processo Civil); nos seguintes autores: Cury e Ferreira (2010); Diniz (2016); Martins
(2011); Monteiro (1985); Rodrigues (1997).
E, por fim, tecemos as considerações finais, seguidas do referencial
bibliográfico que ampara o quadro epistemológico. Também são apresentados
anexos, compostos por 5 (cinco) documentos cujo conteúdo tem relação direta com
as atividades do Movimento de Ocupação das Escolas, tanto no Estado de São Paulo
em 2015, quanto no Estado do Paraná em 2016, cujo rol é o seguinte: Anexo 01 -
Manual como travar uma avenida 1; Anexo 02 - Manual como travar uma avenida 2;
Anexo 03 - manual: Agora a aula é na rua; Anexo 04 - manual: Como ocupar um
colégio?; Anexo 05 - cartilha: Como ocupar sua escola.
26

1.1 - O MATERIALISMO HISTÓRICO E DIALÉTICO COMO MÉTODO NA


PRESENTE PESQUISA

Aqui o que propomos é um debate relacionado à importância do método no


“universo” da pesquisa, bem como o que adotamos neste estudo, no caso, o
Materialismo Histórico e Dialético. Assim, destacamos a relevância e conceituamos a
metodologia adotada demonstrando como ocorre a aplicação do Materialismo
Histórico e Dialético na prática da pesquisa, ao mesmo tempo em que salientamos as
categorias universais que lhes são inerentes e indispensáveis para a atuação do
pesquisador que o adota, o que ocorre em conjunto com as categorias específicas do
objeto pesquisado.
Assim, de acordo com Maria Helena Diniz (2006), é o método de pesquisa
que dá a direção, que ordena o pensamento ao elaborar a ciência, uma vez que requer
atividade ordenada de acordo com princípios e regras próprias e peculiares, pois sem
isso não é possível demonstrar a verdade dos resultados obtidos no decorrer de todo
o processo de busca do conhecimento.

O método é a garantia de veracidade de um conhecimento. Método é a


direção ordenada do pensamento na elaboração da ciência. Logo, a ciência
requer uma atividade ordenada segundo princípios próprios e regras
peculiares. É ele que guia a investigação científica, provando que o resultado
de suas pesquisas é verdadeiro. [...] A ciência é, portanto, uma ordem de
constatações verdadeiras, logicamente relacionadas entre si, apresentando
a coerência interna do pensamento consigo mesmo, com seu objeto e com
as diversas operações implicadas na tarefa cognoscitiva. O conhecimento
científico pretende ser um saber coerente. O fato de que cada noção que o
integra possa encontrar seu lugar no sistema e se adequar logicamente às
demais é a prova de que seus enunciados são verdadeiros. Se houver
alguma incompatibilidade lógica entre as ideias de um mesmo sistema
científico, duvidosas se tornam as referidas ideias, os fundamentos do
sistema e até mesmo o próprio sistema (DINIZ, 2006, p. 18-19).

Com isso, a adoção do Materialismo Histórico e Dialético e suas respectivas


premissas se justificam em razão da natureza do objeto de pesquisa, uma vez que
serão utilizados com o fim de compreender, dentre o conjunto de atividades referidas
no estudo, se os estudantes do Movimento de Ocupação das Escolas consideraram
uma pluralidade de fatores, todos de enorme importância para o fim que se
propuseram. E, nessa totalidade, está incluso um rol de sentimentos, emoções e
interesses relacionados ao ensinar e ao aprender com qualidade, além de um conjunto
de valores que os alicerçam e que, consequentemente, conduzem para uma
27

variedade de reivindicações e de atividades de resistência, mesmo tendo como ponto


central a oposição à política de governo em vias de ser colocada em prática, tanto em
2015 no Estado de São Paulo, quanto em 2016 no Paraná.
Dessa forma, na análise do objeto de estudo a partir da dialética materialista, é
imprescindível a observância do que tange à interdisciplinaridade, eis que o fator
resistência, no sentido de rechaçar as pretensões do lado oposto e ao mesmo tempo
reivindicar, é o ponto comum que permeia a luta de classes, os processos históricos
de luta dos estudantes, bem como os aspectos políticos e jurídicos envolvidos no
contexto do fenômeno estudado, ao passo que as ações dos secundaristas são
construção de conhecimento a partir da escola e de acordo com um contexto nos
termos colocados acima. Por isso, essa realidade requer a integração dos
conhecimentos acumulados tanto pelos professores, quanto pelos alunos e
integrantes da comunidade escolar em suas respectivas diversidades, eis que aí se
faz presente uma pluralidade de vertentes, que de uma ou outra maneira, contribuíram
nesse processo de luta frente ao Estado, tanto em São Paulo em 2015, quanto no
Paraná em 2016, cuja percepção e materialização, em seu todo, é possibilitada pela
aplicação do Materialismo Histórico e Dialético, considerando como elemento
unificador dessa pluralidade, a busca de uma escola de qualidade.
Nesse sentido, o que é então o Método Materialista Histórico e Dialético de
Karl Marx? De acordo com José Paulo Neto (2011), Marx se reporta à Filosofia de
Hegel e aos escritos econômicos de Smith e Ricardo, bem como aos socialistas Owem
e Fourier, ao passo que faz a crítica ao conhecimento de forma racional e consciente
quanto aos seus fundamentos e limites, sem deixar de lado os conteúdos e os
processos históricos reais do conhecimento analisado.

Em Marx, a crítica do conhecimento acumulado consiste em trazer ao exame


racional, tornando-os conscientes, os seus fundamentos, os
condicionamentos e os seus limites – ao mesmo tempo em que se faz a
verificação dos conteúdos desse conhecimento a partir dos processos
históricos reais. É assim que ele trata a filosofia de Hegel, os economistas
políticos ingleses (especialmente Smith e Ricardo) e os socialistas que o
precederam Owen, Fourier et alii (NETO, 2011, p. 18).

Ainda de acordo com Neto (2011), Marx uniu teoria, método e pesquisa
considerando a teoria como uma modalidade do conhecimento, embora distinta dos
demais em razão de suas especificidades, uma vez que se refere ao objeto
pesquisado no que tange à sua estrutura e dinâmica e independente do pesquisador.
28

Com isso, a partir do que escreve Neto, a teoria para Marx é a reprodução do objeto
pesquisado no pensamento do sujeito pesquisador de uma maneira que reproduza a
sua estrutura e dinâmica, atingindo assim o conhecimento real, e o faz nos termos a
seguir delineados.

Para Marx, a teoria é uma modalidade peculiar de acontecimentos, entre


outras (como, por exemplo, a arte, o conhecimento prático da vida cotidiana,
o conhecimento mágico-religioso – cf. Marx, 1982, p. 15). Mas a teoria se
distingue de todas essas modalidades e tem especificidades: o conhecimento
teórico é o conhecimento do objeto – de sua estrutura e dinâmica – tal como
ele é em si mesmo, na sua existência real e efetiva, independentemente dos
desejos, das aspirações e das representações do pesquisador. A teoria é,
para Max, a reprodução ideal do movimento real do objeto pelo sujeito que
pesquisa: pela teoria, o sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura e a
dinâmica do objeto que pesquisa (NETO, 2011, p. 20-21).

E, voltando ao método, eis o que diz Marx quando se reporta ao estudo da


Economia Política, ocasião na qual salienta que se faz necessário considerar a
população, as classes sociais, bem como todos os elementos que compõem a
sociedade, como cidades, campos, ramos de produção, consumo, as mercadorias, o
trabalho assalariado, o capital, etc. Com isso esclarece Marx sobre a necessidade de
buscar as determinações mais simples no decorrer do estudo, e, chegando a esse
ponto, se faz necessário fazer o caminho de volta até chegar ao ponto de partida,
atingindo, assim, a totalidade de determinações e relações diversas.

Quando estudamos um país determinado do ponto de vista da Economia


Política, começamos por sua população, a divisão desta em classes, o seu
estabelecimento em cidades, nos campos, na orla marítima; os diferentes
ramos da produção, a exportação e a importação, a produção e o consumo
anuais, os preços das mercadorias etc. parece mais correto começar pelo
que há de concreto e real nos dados; assim, pois, na economia, pela
população, que é a base e sujeito de todo o ato social da produção. Todavia,
bem analisado, esse método seria falso. A população é uma abstração se
deixo de lado as classes que a compõem. Essas classes são, por sua vez,
uma palavra sem sentido se ignoro os elementos sobe os quais repousam,
por exemplo: o trabalho assalariado, o capital etc. Esses supõem a troca, a
divisão do trabalho, os preços, etc. O capital, por exemplo, não é nada sem
trabalho assalariado, sem valor, dinheiro, preço etc. Se começasse, portanto,
pela população, elaboraria uma representação caótica do todo e, por meio de
uma determinação mais estrita, chegaria analiticamente, cada vez mais, a
conceitos mais simples; do concreto representado chegaria a abstrações
cada vez mais tênues, até alcançar as determinações mais simples. Chegado
a esse ponto, teria que voltar a fazer a viagem de modo inverso, até dar de
novo com a população, mas dessa vez não como uma representação caótica
de um todo, porém como uma rica totalidade de determinações e relações
diversas (MARX, 2008, p. 259-260).
29

Como se vê, bem como de acordo com José Paulo Netto (2011), Marx segue
um itinerário e considera a teoria, o método e a pesquisa, e com isso constitui o
instrumento materialista e dialético, pois parte da realidade, vai até o plano das ideias
e retorna para a realidade, sempre objetivando as determinações mais simples e ao
fazer o retorno, atinge o conhecimento real e concreto do todo.

Como bom materialista, Marx distingue claramente o que é da ordem da


realidade, do objeto, do que é da ordem do pensamento (o conhecimento
operado pelo sujeito): começa-se “pelo real e pelo concreto”, que aparecem
como dados; pela análise, um e outro elementos são abstraídos e,
progressivamente, com o avanço da análise, chega-se a conceitos, a
abstrações que remetem a determinações as mais simples. Este foi o
caminho ou, se se quiser, o método (NETO, 2011, p. 42).

Por fim, considerando a importância das categorias metodológicas na


pesquisa ao aplicar o Método Materialista, salientamos a práxis, totalidade,
contradição e mediação, além de lembrarmos que não podem ser desprezadas
aquelas relacionadas a cada objeto de pesquisa de forma especifica, pois tais
premissas possibilitam, de forma efetiva, o sucesso no processo de interação entre
pesquisador e objeto pesquisado. Nesse sentido, destaca a educadora Acácia
Kuenzer ao escrever sobre o assunto:

Inicialmente, temos que definir as categorias metodológicas. Estas,


amplamente trabalhadas na literatura das teses, dissertações e pesquisas
que se desenvolvem no âmbito do materialismo histórico, são as categorias
do próprio método dialético: práxis, totalidade, contradição, e assim por
diante (KUENZER, 2013, p. 63, grifo nosso).

Com isso, se destaca nesse estudo a categoria metodológica contradição, tanto


no que se relaciona aos aspectos políticos, quanto jurídicos. Assim ocorre em razão
da flagrante contradição constante nas ações dos governos, uma vez que agem em
desfavor dos estudantes contrariando o direito vigente. Da mesma forma, no que
tange ao Poder Judiciário no Paraná, tendo em vista que os julgados referentes ao
Movimento de Ocupação das Escolas são largamente divergentes, considerando que
ora estão a favor do Estado, ora dos estudantes, ao mesmo tempo em que adotam
base jurídica distinta para processos judiciais idênticos, o que será amplamente
destacado no decorrer dos capítulos desta pesquisa.
Ainda quanto às categorias, prossegue Kuenzer, agora se referindo as
categorias de conteúdo, ou seja, aquelas relacionadas especificamente ao objeto de
30

pesquisa, uma vez que as demais possuem uma expressão universal, conforme
referidas na citação acima, ao passo que estas, ao se referirem ao objeto de pesquisa
de forma específica, possibilitam o itinerário proposto por Marx, uma vez que é com
elas que o pesquisador chegará na estrutura e dinâmica do objeto pesquisado, uma
vez que determinadas a partir dos seus objetivos e conforme a natureza do objeto.

Em resumo, pode-se afirmar que a metodologia se define através da


expressão das leis universais (categorias metodológicas que definem a forma
de investigação) e a sua aplicação ao particular (as categorias do conteúdo
específicas para cada pesquisa e determinadas a partir de seus objetivos),
derivando-se, da clareza que se tenha destas dimensões, sua fecundidade
(KUENZER, 2013, p. 66).

Aí temos, portanto, o Método Materialista Dialético marxista de acordo com a


sua formulação. Posto como contundente e eficaz instrumento de pesquisa científica
que possibilita o atingimento da dinâmica e estrutura do objeto pesquisado de maneira
real e concreta. Em razão de possuir esta natureza é que o referido método tem
aplicação no presente trabalho, já que o objetivo, nos termos acima expostos, é
demonstrar de forma concreta, se há ou não, amparo sob o ponto de vista político e
legalidade sob o ponto de vista do direito, no Movimento de Ocupação das Escolas,
tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016, nos termos mencionados
no tópico 1 desta introdução.
Nesse sentido, com vista a alcançar o objetivo almejado, e levando em
consideração a necessidade de análise das relações entre as categorias de conteúdos
envolvidas no contexto do objeto de estudo, teremos em conta que os estudantes
estabeleceram como premissas no decorrer do processo, e no que tange aos aspectos
políticos, o fator resistência. Assim, ao colocar em prática os valores relacionados à
identidade estudantil, bem como resistindo estrategicamente, conseguiram se opor à
supressão de direitos e ao mesmo tempo reivindicar enfrentando a violência, o
preconceito e os interesses estatais, fatores opostos às pretensões dos secundaristas
e largamente presentes na prática oficial e do contra movimento, transparecendo
claramente a larga resistência entabulada pelos secundaristas no decorrer do
processo como um todo. Com isso, por aflorarem no debate as questões jurídicas,
cujas respostas são imprescindíveis para compreensão do fenômeno estudado,
também consideramos no decorrer de toda a pesquisa, os fatores relacionados aos
direitos dos estudantes assegurados pelo sistema jurídico, além de outros atinentes
31

ao tema em estudo, o que propicia uma análise aprofundada no decorrer da pesquisa,


com a consequente e respectiva constatação almejada e referida nesta introdução.
Diante disso, estabelecemos como categorias de conteúdo, as seguintes:
política e direito, que por sua vez permearão todo o trabalho, possibilitando a
demonstração de que o processo reivindicatório estudantil ocorreu dentro de uma
estratégia de comunicação, de forma democrática, a partir de construção de relações
e seguindo o princípio da horizontalidade ao tomar as decisões, sempre com vistas à
totalidade dos interesses secundaristas e fatores políticos e jurídicos envolvidos no
decorrer do fenômeno. Isso tudo é colocado como “âncora” e que tem por finalidade
obter a resposta se o Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo em 2015 e
do Paraná em 2016 possui amparo ou não, sob o ponto de vista político, bem como
se é legal ou não, no que se refere ao fator jurídico, de acordo com o que já foi
salientado anteriormente.
32

2 – O MOVIMENTO ESTUDANTIL, A LUTA DE CLASSES E OS FATORES


HISTÓRICOS DA LUTA DOS ESTUDANTES

Neste capítulo é feito o debate sobre o movimento estudantil e as ocupações


das escolas como sendo ou não parte da luta de classes. Assim, inicialmente, será
feita uma revisão histórica relacionada ao fenômeno no Brasil até os anos 2000. Com
isso, no capítulo 2, subcapítulo 2.1 o debate é estabelecido em torno do movimento
estudantil e o fenômeno de ocupação no contexto das lutas de classes, sendo que,
para tanto, nosso esforço é por demonstrar como ocorre esse processo de luta dos
estudantes em relação às pretendidas políticas das elites dirigentes, além da condição
de luta de classes dos processos reivindicatórios estudantis no país, bem como com
o fim de ressaltar os aspectos políticos e jurídicos do fenômeno em estudo.
Na sequência, no capítulo 2, subcapítulo 2.2, o debate estabelecido é em
torno do período7 histórico do movimento dos estudantes8, onde consideramos os
estudos feitos por Arthur José Poerner desde o Brasil Colônia até a Ditadura Militar,
cuja base teórica é o livro O Poder Jovem. Em continuidade, estendemos o estudo até
o período relacionado aos anos 2000, sendo que a base teórica são os artigos
referidos na introdução e em cuja discussão é possível demonstrar uma série de
aspectos relacionados aos interesses do movimento estudantil, em especial as suas
“bandeiras” e a respectiva independência que o permeia, onde aflora a problemática
dos “Caras Pintadas”, já que o mencionado movimento é acusado de ter sido
manipulado pela grande mídia, especialmente pelas emissoras de televisão.

7Aqui o termo período está posto como periodização histórica, ou seja, se refere ao lapso temporal no
qual o estudo sobre as atividades dos estudantes foi realizado.

8
Movimento dos estudantes e movimentos estudantil amalgamam uma diferenciação que precisa ser
considerada, pois de acordo com Poerner (1968, p. 43-50), o último somente adquire essa condição,
de movimento estudantil, a partir de 1937 com a criação da UNE, quando passa a ter uma centralidade,
bem como um caráter organizado e de emancipação nacional. Antes disso, em razão da ausência dos
mencionados requisitos, o que se vê, em que pese as largas atividades desenvolvidas no decorrer da
história, é a condição de movimento de estudantes. Marini (1970, p. 8), por sua vez, salienta que é a
partir da referida fase que o movimento estudantil passa a adquirir consciência de que sua luta é luta
de classes, uma vez que percebe as necessidades de lutas por mudanças estruturais.
33

2.1 - O MOVIMENTO ESTUDANTIL, A OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS E A LUTA DE


CLASSES

Até hoje, a história de toda a sociedade é a história das lutas de classes9.


Homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de
corporação e aprendiz – em suma, opressores e oprimidos sempre estiveram
em oposição, travando luta ininterrupta, ora velada, ora aberta, uma luta que
sempre terminou ou com a reconfiguração revolucionária de toda a sociedade
ou com o ocaso conjunto das classes em luta (MARX, ENGELS, 2012, p. 44).

Conforme posto no preâmbulo acima, o esforço neste tópico é com vistas a


demonstrar se as atividades dos estudantes em estudo são ou não manifestação da
luta de classes, pois de acordo com o que demonstra a literatura sobre o Movimento
de Ocupação das Escolas em São Paulo em 201510, Paraná em 201611 e no Chile no
decorrer da década passada12, progride a consciência de que o enfrentamento e
resistência feitos pelos estudantes são contra os interesses das classes dominantes,
uma vez que se referia a jovens integrantes de famílias trabalhadoras em atividade
por uma escola pública de qualidade, resistindo, com isso, às políticas que uma elite
econômica e política, no exercício da administração estatal, pretendia colocar em
prática. Assim, e a exemplo dos estudantes de São Paulo, no mesmo sentido estão
os secundaristas integrantes do movimento estudantil paranaense, uma vez que veem
e sentem, em luta, no decorrer dos protestos e reivindicações em 2016, as reações
do Estado e do contra movimento, oportunidade na qual os ocupantes terminam
expressando o sentimento que ocorre em situações de conflito entre as classes

9
A rigor, a história escrita. Em 1847, desconhecia-se a pré-história da sociedade, a organização social
anterior a toda história escrita. Desde então, Hasthausen descobriu a propriedade conjunta da terra na
Rússia, e Maurer demonstrou ser ela o fundamento social do qual derivaram historicamente todas as
tribos alemãs. Pouco a pouco, descobriu-se que a forma primordial da sociedade eram pequenas
comunidades que compartilhavam a posse da terra, desde a Índia até a Irlanda. Por fim, a organização
interna dessa primeira sociedade comunista, em sua forma típica, foi desvendada pela descoberta
culminante de Morgan acerca da verdadeira natureza da gens e de seu papel na tribo. Com a dissolução
dessa coletividade original principia a cisão da sociedade em classes específicas e, enfim, opostas
umas às outras (MARX; ENGELS, 2016, p. 85).
10CAMPOS, Antonia M; MEDEIROS, Jonas; RIBEIRO, Marcio M. “Escolas de Luta”. São Paulo:
Veneta, 2016.
11SCHMIDT, Maria Auxiliadora; DIVARDIM, Thiago; SOBANSKI, Adriane. “Ocupa PR 2016: Memórias
de Jovens Estudantes”. Curitiba: W&A Editores, 2016.

12 ARRUÉ, Michèle. “El movimiento estudiantil en Chile (2011-2012): Una lucha contra la
discriminación”. Amérique Latine Histoire et Mémoire. Paris, n. 24, p. 1-39, 2012.
34

sociais, conforme exemplifica a fala da estudante paranaense Beatriz e constante no


livro OcupaPR 2016, uma vez que.

O dia que senti nojo de viver em uma sociedade onde uma mãe fala que o
Estado deveria governar apenas para os ricos, pois esta é a classe inteligente
do nosso país; e o dia que me emocionei ao conversar com uma menina de
17 anos que estava grávida, dizendo que estava lutando pelos direitos da filha
dela (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 42).

A realidade de luta, enfrentamento e resistência dos secundaristas no


decorrer das ocupações de 2016 também transparece na fala de outros estudantes,
uma vez que demonstraram a preocupação, como integrantes de famílias
trabalhadoras com uma educação de qualidade, ao mesmo tempo em que
expressaram revoltas com as elites dirigentes pelo fato de insistirem em conter
investimentos no setor educacional. Da mesma forma, se vê a preocupação dos
ocupantes pelo fato do ensino de qualidade se encontrar apenas à disposição de
alunos de famílias com condição econômica privilegiada, conforme salienta uma aluna
paranaense, eis que deixa clara a necessidade de reformas educacionais serem feitas
ouvindo a comunidade escolar e que não pode acontecer simplesmente suprimindo
matérias do curriculum.

Eu, como aluna do segundo ano do ensino médio, entendo que a educação
necessita pra ontem, de uma reforma, no entanto, essa reforma não pode ser
realizada às pressas, sem o diálogo com os profissionais da educação e os
alunos. Não é retirando matérias que fazem os alunos refletirem sobre a vida
política, econômica e social da sociedade que vamos “salvar” a educação, as
escolas não podem voltar a ser apenas para o filho do rico, pois com o ensino
integral, aqueles que precisam trabalhar para ajudar a família terão de
escolher o trabalho, crescendo assim o número de alunos que não concluem
o ensino médio (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 53-54).

E a fala da estudante acima referida encontra “âncora” no que diz Silvana


Aparecida de Souza (2018, p. 95) no livro “Educação Para a Emancipação ou Para a
Alienação?”, uma vez que a educadora mencionada ao se reportar à curta qualidade
no sistema educacional público brasileiro salienta que “[...] é preciso lembrar que
qualidade para apenas alguns não é qualidade, mas, privilégio”, o que faz evidenciar
a pertinência do processo de resistência e de reivindicação dos secundaristas do
Movimento de Ocupação das Escolas paulista e paranaense diante do opressor,
ocorrências típicas do contexto de luta de classes, pois os secundaristas, ao lutarem
35

por uma escola pulica de qualidade para todos, lutam contra os privilégios do opressor
que se encontra estabelecido e fortemente “enraizado”.
E mais uma vez um estudante secundarista, considerando a constatação
obtida no decorrer das atividades do movimento, externa o seu entendimento quanto
ao atingimento das medidas de governo contra a qual lutava, uma vez que salienta
que os únicos que não seriam atingidos seriam os estudantes oriundos das classes
abastadas. Ao mesmo tempo o secundarista integrante do movimento destaca o
pouco conquistado no decorrer das ocupações, o que fica claro mais uma vez a
ocorrência de um processo de disputa entre classes abastadas consubstanciada no
aparelho de Estado e as classes trabalhadoras lutando pelas mínimas condições de
vida. No caso, a luta travada foi para não perder os direitos já conquistados e na
tentativa de assegurar novos avanços na esfera política e jurídica relacionados à
educação, já que.

Participei ativamente da ocupação do colégio onde estudo. Acredito que essa


forma de protesto é uma das mais efetivas, já que, em grande escala, como
foi, gerou um imenso impacto social. Apesar de tudo, a conquista que tivemos
não foi a esperada, mas ainda sim, uma conquista. Vejo àqueles que se
posicionam contra a mobilização, como mal informados ou neoliberais13, além
disso, levando em consideração que a PEC 55/16 e MP 746/16 só não
atingiriam a alta burguesia, enquanto muitos desses se preocuparam com o
bimestre, nós nos preocupávamos com a estrutura social do Brasil pelos
próximos 20 anos (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 142).

O que ocorreu no Paraná, não foi diferente em São Paulo em 2015, pois a
postura dos integrantes do contra movimento, como uma verdadeira dose exagerada
de “sulfito”14 contra os estudantes que pacificamente protestavam e reivindicavam
direitos já garantidos legalmente. No caso, os integrantes do lado oposto destilavam
e colocavam em prática aquilo que compõem a sua maneira de agir, ou seja, ódio,

13 Neoliberalismo, de acordo com Jorge Yúdice, é o conjunto de políticas que compreende a


liberalização do comércio, a privatização, a redução (e, em alguns casos, a quase eliminação) dos
subsídios do Estado a serviços sociais como saúde e educação, a diminuição dos salários e a
evisceração dos direitos trabalhistas – contribui para a mudança na atenção política, da tomada do
poder estatal (que em muitos casos não resolveu a questão da soberania) para as questões dos direitos
humanos e civis e da qualidade de vida (YÚDICE, 2000, p. 427).

14De acordo com o Dicionário Aurélio: Designação comum aos sais e ésteres do ácido sulforoso. Os
consideramos como “sulfito” em razão da elevada dose de raiva, rancor e preconceito que externavam
contra os jovens estudantes ocupantes das escolas.
36

preconceito, raiva e violência, oriundos daqueles que se opõem aos direitos dos
trabalhadores que se encontram em disputa por melhores condições de vida.

Em uma denúncia do mesmo caso feita pela página Não Fechem Minha
Escola, foi publicado um vídeo que flagra o momento da invasão, com uma
pessoa (que seria o marido da diretora) arrebentando o cadeado que os
ocupantes haviam colocado em um portão, e depois um grupo de pessoas
entrando no pátio da escola. Ainda segundo esta denúncia, durante o ocorrido
a diretora teria mandado funcionários levarem embora a comida que os
ocupantes haviam recebido de doações e “incitado os estudantes puxas-
saco a partirem para cima dos estudantes da ocupação” (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 181, grifo dos autores).

Como é possível observar, trata-se de uma reação às reivindicações de


direitos oriundas do próprio Estado, inclusive de servidores integrantes da pasta
responsável pela gestão educacional, o que agrava ainda mais a situação, pois
demonstra os elevados graus de vulnerabilidade que a política oficial submete os
jovens estudantes no Brasil em suas condições de oprimidos. E, o que é pior, trata-se
de uma realidade com forte apoio de setores da sociedade e de autoridades públicas,
conforme denúncia de outro estudante paulista.

[PÁGINA DA OCUPAÇAO – FACEBOOK – 02/12/2015]


Como todos já sabem, desocupamos a escola ontem porque alguns alunos
alienados15 pela diretoria fizeram ameaças contra a ocupação e estavam
armados (e só pra deixar claro, a direção sabia das ameaças sim!), e
infelizmente não podemos contar com as nossas excelentíssimas autoridades
pra nos proteger pois os mesmos disseram que não ajudariam, e não
queríamos que tudo saísse de uma ocupação pacífica e prezamos a
segurança de todos que ali estavam (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015,
p. 224).

15
Mauro Luis Iasi, no livro ”Ensaios Sobre Consciência e Emancipação”, se reportando a Marx e
Mészáros, diz o seguinte quanto ao termo alienação: As relações sociais determinantes, baseadas na
propriedade privada capitalista e no assalariamento da força de trabalho, geram as condições para que
a atividade humana aliene em vez de humanizar. A vivência dessas relações produz uma alienação
expressa em três níveis. Ao viver o trabalho alienado, o ser humano aliena-se da sua própria relação
com a natureza, pois é através do trabalho que o ser humano se relaciona com a natureza, a humaniza
e assim pode compreendê-la. Vivendo relações em que ele próprio se coisifica, onde o produto de seu
trabalho lhe é algo estranho e que não lhe pertence, a natureza se distancia e se fetichiza. Num
segundo aspecto, o ser humano aliena-se de sua própria atividade. O trabalho transforma-se, deixa de
ser a ação própria da vida para se converter num “meio de vida”. Ele trabalha para o outro, contrafeito,
trabalho não gera prazer, é a atividade imposta que gera sofrimento e aflição. Alienando-se da atividade
que o humaniza, o ser humano se aliena de si próprio (autoalienação). Isso leva ao terceiro aspecto.
Alienando-se de si próprio como ser humano, tornando-se coisa (o trabalho não me torna um ser
humano, mas é algo que eu vendo para viver), o indivíduo afasta-se do vínculo que o une à espécie.
Em vez de o trabalho tornar-se o elo do indivíduo com a humanidade, a produção social da vida,
metamorfoseia-se num meio individual de garantir a própria sobrevivência particular (IASI, 2011, p. 21-
22).
37

Diante disso, com o fim de aprofundar a discussão, aflora a necessidade de


compreensão do conceito de classes sociais, uma vez que possibilitará a visualização
dos estudantes como oprimidos e o Estado e os integrantes do contra movimento
como opressores. E nesse sentido, conforme Theotônio dos Santos (1982), as
diferenças econômicas entre as classes não é de agora, é antigo, e o vemos na bíblia,
em São Tomás de Aquino, em Aristóteles, no Egito antigo, sempre evidenciando a
diferença entre ricos e pobres. Enquanto na Política a formação da sociedade se dá
entre pobres, classe média e rica. E aí então, estão as classes sociais (SANTOS, T,
1982). Sempre a classe abastada econômica e politicamente preponderando sobre a
classe menos favorecida, oprimindo, explorando, acumulando e criminalizando. É a
sociedade de classe na qual vivemos, é o sistema capitalista que oprime e explora
para acumular nos termos já salientados.

O conceito de classe social não foi uma criação do marxismo. Desde a


antiguidade grega, por exemplo (podemos mesmo encontrar documentos
egípcios em que se fala da existência de classes na sociedade), Aristóteles
divide a sociedade em escravos e homens livres. Além disso, na política,
divide os cidadãos em pobres, classe média e ricos. Nesta mesma obra,
Aristóteles estabelece relações entre formas de governo e predomínio de
certas classes sociais. Também entre os patriarcas da Igreja, segundo
Ossowsky, era bastante viva a consciência de uma sociedade escravista que
existia junto com a ideia da igualdade social. Os atos dos Apóstolos e o Novo
Testamento estão cheios de referências às classes sociais, sempre
observadas do ponto de vista da relação, pobres e ricos ou das relações
escravistas (SANTOS, T., 1982, p. 7).

Dessa forma, de acordo com Santos, T. (1982), a sociedade no sistema


capitalista é formada por classes sociais e a tensão e luta de classes nesse sistema é
permanente, explorados contra exploradores e vice-versa, sempre, por óbvio,
considerando a lei do mais forte. E, aí, deve ser considerada principalmente a
diferença de força econômica e política, vencendo o explorador, aquele que acumula
a riqueza produzida pelo explorado, detentor de poucas possibilidades de
preponderância em razão da hegemonia do opressor.
Com isso, sendo conhecido o conceito de classe social, bem como a
significância da organização das classes subalternas para as classes dominantes e,
em especial, qual é o instrumento de enfrentamento dos oprimidos em face dos
opressores, se faz necessário compreendermos o conceito de “classe em si” e “classe
para si”, pois aqui está o diferencial fundamental no interior do processo de luta no
que tange as possibilidades dos oprimidos. De acordo com Marx e os demais autores
38

referidos que o seguem, “classe em si”, é mera referência de uma classe, apenas
determinando o lugar e papel no processo produtivo, sem condição de defesa como
conjunto, portanto, sem possibilidades de enfrentamento do explorador, é o verdadeiro
“cada um por si”, enquanto a “classe para si” caracteriza outra dimensão, cada
integrante defende o todo e o todo defende cada um dos seus integrantes, pois
consciente dos seus interesses e inimigos, e nela está o principal instrumento em favor
dos menos favorecidos para o efetivo combate à exploração.
Nesse sentido, vejamos o que diz Santos T. (1982) sobre o assunto em
discussão, pois salienta que a classe se define de acordo com os modos de relações
que ensejam as possibilidades de interações entre os homens e assim o conceito de
consciência de classe é puro, ou seja, abstrato ou teórico, por isso, sem referência
empírica, o que significa representar os seus interesses em um modo de produção, o
que ocorre de forma mesclada com as ideias dominantes da sociedade onde o
indivíduo foi educado, o que forma a psicologia de classe. No entanto, de acordo com
Santos, T. (1982), quando essa psicologia de classe não representa a realidade das
relações, significa que estamos diante de uma “classe em si”, enquanto, por outro
lado, um agrupamento humano será uma “classe para si”, quando toma consciência
das relações como ideologia política que define as condições reais de vida, bem como
a existência de contradição entre os interesses de classes, além de perceber as
possibilidades concretas para superação dessa realidade, passando a albergar as
condições para construção de projeto de vida que esteja adequado aos seus
interesses de classe.

Uma classe se define primeiramente pelas relações ou modos de relações


que condicionam as possibilidades de ação recíprocas ente os homens, dado
um determinado modo de produção. Neste sentido, o conceito de consciência
de classe é um conceito puro, quer dizer, abstrato, teórico, não referenciável
diretamente a uma ou a algumas consciências empíricas. Neste nível, como
vimos, podemos definir a consciência de uma classe como a representação
consciente possível de seus interesses num dado modo de produção. Os
indivíduos que compõem ou ‘personificam’ estas categorias abstratas, quer
dizer, que realizam na prática estas relações, não dispõem em geral dos
meios teóricos para representá-la em sua consciência. Representam-nas de
modo caótico, assistemático e fragmentário, misturado com as ideias
dominantes em sua sociedade ou naquela em que foram educados. A
sistematização dessas impressões de um sistema de relações reais na
cabeça dos indivíduos forma a psicologia da classe. Na medida em que esta
psicologia de classe não expressa realidade destas relações num setor
significativo dos indivíduos que compõem uma classe, pode-se conceituar
estes agregados humanos como uma classe em si. Contudo, serão uma
classe para si numa situação social em que tomem consciência destas
relações sob a forma de uma ideologia política que defina claramente as
39

condições reais de sua existência e a contradição entre elas e seus interesses


como classe social, bem como lhe proponha os meios de superar esta
situação. Neste momento passa a se constituir uma classe para si, quer dizer,
uma classe capaz de elaborar um projeto de existência social adequado a
seus interesses de classe (SANTOS, T., 1982, p. 30-31).

Aí está, portanto, de acordo com o pensamento de Karl Marx e Theotônio dos


Santos, o procedimento e a influência dos valores que levam os trabalhadores
oprimidos à ascensão para a condição de “classe para si”. Assim, por consequência,
passam a contar com as condições para defesa concreta de “um projeto de existência
social adequado aos seus interesses de classe” (SANTOS, T., 1982, p. 31), que é
justamente o que buscavam os secundaristas ao ocuparem as escolas. Isso significa
enfrentamento aos interesses dos opressores e, portanto, o combate à opressão,
onde se vê que nos ensinamentos de Santos, T. (1982) estão postos que nesse
processo de compreensão e conscientização, juntamente com a luta, estão inseridos
valores que levam os trabalhadores, no caso em estudo os estudantes, a conquistar,
na luta, a sua almejada independência consubstanciada em uma educação de
qualidade.
Nesse sentido, de acordo com as características das “ações do mais forte”
na luta de classes, os agentes do Estado, no caso, diretores de escola, funcionários e
policiais, conforme relatam os estudantes paulistas, prosseguem com a violência no
decorrer do processo do Movimento de Ocupação das Escolas, pois assim evitariam
a resistência e o progressivo processo reivindicatório tido pelo opressor como um mal
e que precisava ser cortado em sua raiz.

Conforme as ocupações iam se tornando uma realidade no estado, medidas


preventivas passaram a ser adotadas pelas direções e dirigentes de ensino,
novamente com o apoio da polícia. Em uma escola em Santo André, por
exemplo, a direção recebeu a informação de que um representante de outra
ocupação da região iria realizar uma visita e procurou “cortar o mal pela raiz”
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 123).

E a luta que permeia os enfrentamentos dos estudantes no Brasil não é de


agora. Trata-se da natureza dos enfrentamentos feitos contra o governo e elites
dirigentes desde o Brasil Colônia, conforme é salientado por Poerner (1968), uma vez
que o referido escritor sugere a ampliação do movimento estudantil para a sociedade,
eis que esse seria o instrumento fundamental de fortalecimento do oprimido com vistas
a se opor às opressões sofridas e assim obter as mudanças almejadas.
40

E na educação política do povo os estudantes poderiam concentrar,


objetivamente, a sua política, através de campanhas de alfabetização ou da
prestação de assistência médico-dentária, técnico-habitacional e judiciária a
uma população que, afinal, carece de tudo: de escolas, de médicos, e
dentistas, de moradia, do apoio das leis e do próprio conhecimento dos seus
direitos. Do ponto de vista da segurança, esse trabalho político apresenta
inúmeras vantagens, pois será muito difícil – e sobretudo ainda mais
antipático – para o Governo, reprimir grupos estudantis organizados que, por
exemplo, subam favelas para impedir que mil crianças brasileiras continuem
a morrer, por dia, à míngua de comida e remédio (POERNER, 1968, p. 309).

E nesse contexto de disputa entre oprimido e opressor, o mais complicado de


tudo é que o Estado está cumprindo a sua função original, pois de acordo com
Friederich Engels (2002), ao escrever o livro “A Formação da Família, da Propriedade
Privada e do Estado”, deixa bem esclarecido quanto a realidade da exploração dos
trabalhadores pelos detentores do capital. Assim, tem o Estado a função de protetor
e defensor da propriedade privada e dos interesses elitistas, função para a qual foi
criado há séculos e que exerce com primazia e eficiência até os dias de hoje, em cujo
contexto se percebe o predomínio de uma classe abastada sobre aqueles que detêm,
unicamente, a força de trabalho para vender e assim sobreviver, de acordo com o
pensamento do autor acima referido.

Como o Estado nasceu da necessidade de conter o antagonismo de classes,


e como, ao mesmo tempo, nasceu em meio ao conflito dele, é, por regra geral,
o Estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante,
classe que, por intermédio dele, se converte também em classe politicamente
dominante e adquire novos meios para a repressão e exploração da classe
oprimida. Assim, o Estado antigo foi, sobretudo, o Estado dos senhores de
escravo para manter os escravos subjugados; o Estado Feudal foi o órgão de
que se valeu a nobreza para manter a sujeição dos servos e camponeses
dependentes; e o moderno Estado representante é o instrumento de que se
serve o capital para explorar o trabalho assalariado (ENGELS, 2002, p. 193).

Mas, os trabalhadores, em geral, e, os estudantes, em especial, não se


curvaram para esse estado de coisas, pois de acordo com Marx, em “O Dezoito
Brumário” e “A Miséria da Filosofia”, conforme lembrado por Montano e Duriguetto
(2000) em “Estado, Classe e Movimento Social”, demonstra que os trabalhadores
camponeses, ao viver o seu oposto modo de vida, interesses e cultura, aos de outras
classes, constituem a referida “classe em si”, assim como, na luta, essa massa se une
e forma a mencionada “classe para si”, levando-os ao enfrentamento da opressão,
conforme se percebe pelo texto da obra citada.
41

A “classe em si’ é constituída pela população cuja condição social


corresponde com determinado lugar e papel no processo produtivo, e que,
independentemente de sua consciência e/ou organização para a luta na
defesa de seus interesses, caracteriza uma unidade de interesses comuns
em oposição aos de outras. Não representa necessariamente um momento
‘imaturo’ da formação das classes, mas uma dimensão da sua constituição e
da análise social. ‘classe em si’ remete à mera existência de uma classe.
Conforme Marx apontou n’O Dezoito Brumário, ao tratar da classe
camponesa: ‘na medida em que milhões de famílias [...] vivem em condições
econômicas que [...] opõem seu modo de vida, os seus interesses e sua
cultura aos das outras classes da sociedade, estes milhões constituem uma
classe [em si]’ (ver Marx e Engels, 1977a, p. 277) (MONTANO &
DURIGUETTO, 2000, p. 97).

A “classe para si” caracteriza outra dimensão possível da constituição e da


análise da classe. Conforma uma classe para si aquela que, consciente de
seus interesses e inimigos, se organiza para a luta na defesa destes. Pode-
se verificar um momento histórico em que Marx observou a passagem da
“classe em si” para a “classe para si” no contexto em que, entre 1830 e 1848,
a classe trabalhadora se torna sujeito autônomo, consciente de seus
interesses e do seu antagonismo ao capital, e organizado para as lutas de
classes. Como Marx caracteriza em a Miséria da Filosofia, as condições
econômicas, inicialmente, transformam a massa [do povo] [...] em
trabalhadores [conformando uma classe em si]. A dominação do capital sobre
esses trabalhadores criou a situação comum e os interesses comuns dessa
classe. Assim, essa massa já é uma classe em si em relação ao capital, mas
não ainda uma classe para si mesma. Na luta [...] essa massa se une e forma
uma classe para si’ (1985, cap. 2, p. 159, § 5) (MONTANO & DURIGUETTO,
2000, p. 97).

No caso do Movimento de Ocupação das Escolas, tanto em São Paulo, em


2015, quanto no Paraná, em 2016, dentre as centenas e milhares de estudantes que
estiveram envolvidos nas atividades de luta ao longo do período, pelo que indica este
estudo, preencheram os requisitos da “classe para si”, uma vez que lutaram unidos e
em busca de um fim comum, ou seja, uma escola pública de qualidade para todos, ao
mesmo tempo em que rechaçaram unanimemente e, sem titubear, as pretensões do
inimigo comum, ou seja, as políticas educacionais excludentes do governo do Estado
de São Paulo em 2015, e as do Estado do Paraná e União Federal, no ano seguinte,
em 2016.
De acordo com o demonstrado, no sistema capitalista, seara de conflitos e
luta de classes, os integrantes das camadas mais favorecidas economicamente, lutam
com vistas à manutenção dos seus privilégios, portanto, o sistema de dominação e
exploração com vistas a se apropriar e acumular o produto do trabalho das classes
menos favorecidas, os trabalhadores oprimidos. Estes por sua vez, lutam para manter
em seu poder uma parcela a mais do produto do seu próprio trabalho e assim melhorar
as suas condições de vida. No caso do Movimento de Ocupação das Escolas,
42

integrado, em sua maioria, por membros de famílias de trabalhadores, lutam por


melhores condições de estudo com vistas ao crescimento humano e melhores
condições de trabalho, o que é negado pelo opressor ou classes abastadas,
considerando a necessidade de manter o montante já apropriado que lhe possibilita
um cabedal de privilégios que o sustenta.
E o Movimento de Ocupação de Escolas, considerando o seu viés político e
levando em consideração o que escreve Alysson Leandro Mascaro (2013), no livro
“Estado e forma política”, pode se dizer que está em conformação com a dinâmica do
sistema econômico e político vigente, uma vez que o referido modelo é uma dupla
implicação, levando em conta as constantes contradições. Nesse sentido, o Estado
capitalista não se mantém sem a luta de classes, ao mesmo tempo em que estas
também não subsistem sem a vigência do referido sistema econômico e político nos
moldes salientados, uma vez que, se no âmbito econômico ocorre o cerne da luta de
classes, ela também se estabelece no nível político, tendo em vista que, de acordo
com Mascaro, o político é forma que deriva das formas sociais que também se
encontram estabelecidas como luta de classes.

A dinâmica da luta de classes, grupos e indivíduos se apresentam


politicamente, no capitalismo, perpassada sempre pela forma estatal. Trata-
se de um processo de dupla implicação. Se a uta de classes é conformada
pelo Estado, este por sua vez está também enraizado nas contradições e
disputas múltiplas das sociedades capitalistas. A forma política estatal, no
entanto, não é um molde surgido de quaisquer dinâmicas de lutas de classes.
É apenas no tipo específico de luta de classes capitalistas que a forma política
estatal exsurge. Nas sociedades capitalistas, atravessadas pela dinâmica da
forma-valor, a forma política estatal se apresenta como derivação necessária
de suas relações sociais e, além disso, a luta de classes perpassa tanto o
próprio cerne da exploração da forma de trabalho pelo capital quanto a
própria vida política. Se no nível econômico dá-se o cerne da luta de classes,
ela se localiza também no nível político, seja porque o político é forma
derivada das formas sociais que também constituem a luta de classes, seja
porque esta é reconformada e refigurada pelo político. O Estado não é a
forma de extinção das lutas em favor de uma classe, mas sim de manutenção
dinâmica e constante da contradição entre classes. Sua forma política não é
resolutória das contradições internas do tecido social capitalista, sendo,
antes, a própria forma de sua manifestação, constituindo alguns de seus
termos e mesmo de seus processos mais importantes. Assim, não se há de
pensar na forma política estatal e na luta de classes como dois polos distintos
ou excludentes num mesmo todo social. Na mesma dinâmica da luta de
classes capitalistas estabeleceu-se a forma política estatal (MASCARO,
2013, p. 60).

Ruy Mauro Marini, por seu turno, ao estudar e contextualizar os


processos dos movimentos estudantis Latino-americanos, ocasião na qual demonstra
43

os porquês, bem como os avanços do referido fenômeno, o que faz no artigo “Os
movimentos estudantis na América Latina”16, traz esclarecimentos que demonstram
que é na luta de classes que os estudantes veem a possiblidade de combate à
proletarização e ao desemprego, o que deve ser feito a partir de mudanças estruturais,
uma vez que se refere a uma necessidade colocada pelo sistema econômico vigente,
considerado a fase de desenvolvimento na qual se encontra o capitalismo.

Engajados em um processo de formação que ameaça fazê-lo desembocar na


proletarização e no desemprego, o estudante latino-americano aos poucos
toma consciência do fato de que suas reivindicações universitárias não
podem encontrar soluções no quadro econômico em que vive e que, mesmo
se satisfeitas algumas demandas, não resolveriam sua problemática
profissional. A luta por uma mudança estrutural se impõe ao estudante como
uma necessidade e o leva a ocupar cada vez mais firmemente o terreno da
luta de classes (MARINI, 1970, p. 8).

Com isso, prossegue Marini (1968) demonstrando que as ações


reivindicatórias dos estudantes estão no contexto das lutas de classes, o que ocorre
em razão da contradição estabelecida entre as classes médias e populares, que visam
melhorias no sistema educativo com vistas à contemplação dos seus interesses,
contra as pretensões dos grupos dominantes que visam apenas a seleção e limitação
dos recursos orçamentários, pois os privilégios vigentes dos dominantes precisam ser
mantidos e até ampliados.

O conteúdo desta direção política, que age dialeticamente na sua capacidade


em mobilizar suas bases, não se define abstratamente, mas se estabelece
em função dos fatores que conduziram a radicalização dos estudantes
ao longo dos últimos anos. É nesse sentido que a questão universitária ocupa
uma função decisiva. É nesse sentido que a questão universitária ocupa uma
função decisiva. É nela que esta radicalização tem origem. Ela se cristaliza
na contradição existente entre a reivindicação das classes médias e

16
Texto publicado em francês na revista Les temps modernes, n°219, Paris, 1970, pp. 718 - 731. Les
temps modernes foi fundada em 1945 por Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir e segue sendo
editada até os dias atuais, sob a direção de Claude Lanzmann. O texto foi originalmente escrito em
espanhol e publicado, naquele mesmo ano, na Revista Rocinante, editada entre 1968 e 1971 em
Caracas, Venezuela; o número desta revista em que foi publicado o artigo de Marini, no entanto, não
consta na Biblioteca Nacional da Venezuela e é de impossível acesso no Brasil. Este artigo foi,
posteriormente, reproduzido em diferentes revistas da América Latina: em 1972, em Cuadernos
Universitários, revista de ciências sociais da Universidad Autónoma de Santo Domingo – primeira
universidade da América Latina –, e, mais recentemente, em 1997, na revista do Centro de Estudios
Miguel Enríquez, no Chile. É ilustrativo o fato de que, para a presente reprodução, foi mais fácil ter
acesso à versão francesa de Temps Modernes do que qualquer outra publicada na América Latina. A
tradução do francês ao português é de autoria de Jonathan Jaumont, com revisão de Fernando Correa
Prado e Vitor Hugo Tonin (MARINI, 1970, p. 1).
44

populares, que pressionam pela amplificação e melhoria do sistema


educativo, e os interesses dos grupos dominantes, que visam a seleção e a
limitação orçamentária. Isso revela uma contradição mais geral, a saber, o
divórcio entre a tendência natural do sistema econômico, que marginaliza
progressivamente setores crescentes da população, e as necessidades das
grandes massas no que toca ao emprego e ao consumo, contradição que
explica o porquê dos estudantes terem orientado sua ação para o terreno da
luta de classe (MARINI, 1970, p. 11, grifo do autor).

E essa dimensão de disputa e avanço da consciência da luta de classes nos


meios estudantis brasileiros, pelo que se vê, integra um contexto onde se encontra
crescente e englobado tanto o espaço urbano, quanto o rural, pois de acordo com os
estudos da educadora Maria Antonia de Souza (2008), no artigo “Educação do
Campo: políticas, práticas pedagógicas e produção científica”, trata-se de um
caminhar que avança, e esse progresso é nos espaços das políticas pública e com
vistas a superação de paradigmas para a construção de projetos de vidas de acordo
com os reais anseios dos trabalhadores, uma vez que.

A educação do campo tem conquistado lugar na agenda política nas


instancias municipal, estadual e federal nos últimos anos. Fruto das
demandas dos movimentos e organizações sociais dos trabalhadores
rurais, a educação do campo expressa uma nova concepção quanto ao
campo, o camponês ou o trabalhador rural, fortalecendo o caráter de
classe nas lutas em torno da educação. Em contraponto à visão de
camponês e de rural como sinônimo de arcaico e atrasado, a concepção de
educação do campo valoriza os conhecimentos da prática social dos
camponeses e enfatiza o campo como lugar de trabalho, moradia, lazer,
sociabilidade, identidade, enfim, como lugar da construção de novas
possibilidades de reprodução social e de desenvolvimento sustentável
(SOUZA, M., 2018, p. 1, grifo nosso).

E mais, esse campo de disputa entre opressor e oprimido “salta aos olhos”
quando os jovens estudantes secundaristas e trabalhadores ao mesmo tempo,
expressam alegria e tristeza por perceberem, no decorrer do fenômeno de ocupação
das escolas, apoio comunitário com vistas as suas demandas que nada mais são do
que resistências contra retiradas de direitos da classe trabalhadora. Ora, as retiradas
de direitos são feitas pelas elites econômicas que de uma forma ou outra conduzem
os destinos do país, ao passo que os atingidos são aqueles que possuem apenas a
força de trabalho, a qual é explorada pelo empregador, portanto, aí está evidenciado
o processo de disputa no seio do Movimento de Ocupação das Escolas, pois no
decorrer das ocupações os estudantes perceberam a sua importância quanto
instrumento de resistência, luta e de busca de direitos.
45

As ocupações demonstraram ser um exemplo de luta cotidiana dos


estudantes, ocupamos as escolas com muito apoio de setores da
comunidade escolar, conscientizamos boa parte da estudantada, momentos
de alegria e de tristeza, mas foi, sem dúvidas, um verdadeiro processo de
formação política e desenvolvimento de consciência de classes. A
estudantada deu uma aula de resistência contra a retirada de direitos
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 83).

E como a luta de classes, a partir das ações iniciadas pelo dominador, no


caso o Estado e os integrantes do contra movimento, se faz amalgamada pela força
e a violência, principalmente estatal. Este viés esteve representado em São Paulo em
muitas das atividades exercidas pela Polícia Militar, considerando que a forma de agir
dos agentes públicos conduzia os alunos ao medo, pavor e até desespero, como pode
ser constatado na citação seguinte e constante no livro “Escola de Lutas”.

[EE MARIA JOSÉ – FACEBOOK – 01/12/15]


Os olhos falam... Os olhos choram lágrimas de desespero, de medo e pavor.
Mas a esperança ainda está ali. Foi dado início a uma onda de repressão,
onde os policiais (representantes do Estado) invadem escolas, aterrorizam
jovens que estão em luta por uma educação de qualidade, e que são contra
uma ‘reorganização’, que não foi debatida com os principais interessados, os
alunos. A luta continua, ‘não tem arrego’. Não precisamos usar de força física,
os sprays de pimenta, nossas armas são outras. A aluna L., com canetas na
mão, afrontou a polícia na manhã de ontem dizendo “MINHA ARMA É
OUTRA!” (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 226, grifo dos autores).

Assim, considerando o exposto até aqui, é possível verificar que os


estudantes do movimento em estudo deram largos passos para além da mera
reivindicação, uma vez que conseguiram opor resistência às pretensões do Estado,
pois os governos, em vários momentos, se sentiram acuados em seu processo de
tomada de decisão. Os alunos ocupantes, por sua vez, a partir de uma forma de ação
posta em prática de forma estratégica, em mais de um momento, assumiram o
comando de espaços tradicionalmente conduzido pelo ente estatal, ou seja, o Estado.
Isso significa, de acordo com Vitor Henrique Paro (2012), uma importante caminhada
na busca da hegemonia no seio da luta de classes.

Da maneira geral vimos até aqui, a transformação social se resume, em última


instancia, no processo pelo qual a classe fundamental dominada busca
arrebatar a hegemonia social das mãos da classe dominante, construindo um
novo bloco histórico sob sua direção. Nesse contexto, a educação poderá
contribuir para a transformação social, na medida em que for capaz de servir
de instrumento em poder dos grupos sociais dominados em seu esforço de
superação da atual sociedade de classes (PARO, 2012, p. 133).
46

Por isso, conforme o que a pesquisa demonstra e considerando os


acontecimentos motivadores do Movimento de Ocupação das Escolas, bem como os
enfrentamentos que os estudantes tiveram que fazer durante o processo, é possível
afirmar que o fenômeno é expressão da luta de classes. Em movimento, os
secundaristas da escola pública e integrantes de famílias trabalhadoras conforme já
frisado, enfrentaram a violência estatal e os objetivos do contra movimento, que por
sua vez, unidos, fizeram a defesa dos interesses elitistas. Portanto, se vê em choque
interesses de classes sociais e econômicas distintas e em desníveis gritantes, ao
passo que os estudantes, claramente, e o tempo todo, conforme será debatido no
capitulo 3, com força buscaram uma condição hegemônica e independente, ao longo
de todo o processo de ocupação, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em
2016, com vistas a manter os direitos já conquistados e presentes no marco
constitucional e legal, bem como objetivando progresso na consolidação de um
sistema educacional de qualidade.

2.2 - HISTÓRICOS DO MOVIMENTO ESTUDANTIL BRASILEIRO

Os estudantes brasileiros têm uma história de luta. E essa caminhada iniciou


já no período do Brasil Colônia, de acordo com o que demonstra Arthur José Poerner
no livro “O Poder Jovem”, escrito e publicado em 1968, cujo vigor da pesquisa se
estende até os dias atuais. É certo que existem consideráveis diferenças entre os
movimentos estudantis do início do período referido e os que ocorrem atualmente. No
entanto, em que pese existirem aspectos distintos entre uma época histórica e outra,
se destacam relevantes semelhanças e relações, o que pretendemos pontuar e
verificar a sua abrangência, considerando os protestos e reivindicações realizados
pelos movimentos estudantis do passado e o Movimento de Ocupação das Escolas
que ocorreu no último período, ou seja, em 2015 no Estado de São Paulo e 2016 no
Paraná.
Com isso, como o Movimento de Ocupação das Escolas se encontra inserido
em um contexto, portanto, faz parte de uma totalidade, entendemos de fundamental
importância, de início, resgatarmos acontecimentos relacionados ao movimento
estudantil no Brasil a partir de suas primeiras manifestações, considerando a paulatina
conquista do reconhecimento político e dos direitos hoje assegurados. Assim será
47

feito em razão da relação entre o outrora reivindicado pelos estudantes e as demandas


que atualmente vêm se apresentando e adquirindo visibilidade via ações estudantis,
onde a argamassa entre um tempo e outro, as gerações de ontem e as de hoje, assim
como entre as “bandeiras” de cores distintas, se vê subentendida na memória que
encurta distâncias e chega até o estudante do presente no envelope chamado livro e
cujo correio é a unidade escolar ou, simplesmente, a escola, já que.

O movimento estudantil brasileiro é a forma mais adiantada e organizada que


a rebelião da juventude assume no Brasil. Tal como o entendemos e
conhecemos hoje, esse movimento existe somente a partir da criação da
União Nacional dos Estudantes, em 1937, quando alcança aquilo que o
movimento operário brasileiro só obteve – e mesmo assim de maneira muito
precária – durante um curto período do Governo João Goulart, com o CGT
(Comando Geral dos Trabalhadores), a centralização. É com a
centralização, na UNE, das lutas estudantis, que elas vão adquirir,
progressivamente, o caráter organizado e de emancipação nacional que
apresentam no momento, concomitantemente à desmistificação que
delineiam do significado da independência política formal conquistada pelo
Brasil em 1822 (POERNER, 1968, p. 43, grifo nosso).

Fotografia 01. Evento de fundação da UNE em 1937. Fonte: livro O Poder Jovem.
48

Dito isso, continuamos com a citação do parágrafo constante da capa do livro


de Poerner (1968), onde o referido autor, ao longo de 399 páginas, descreve os feitos,
reivindicações, protestos, sucessos e duras perseguições oriundas do aparato policial,
contexto no qual o movimento estudantil no Brasil sempre esteve envolvido desde o
período colonial, uma vez que os estudos históricos demonstram violência contra os
estudantes e desmobilização de suas reivindicações desde então.

Contra estruturas sociais esclerosadas, contra sistemas educacionais


inadequados, a favor da paz e da democracia, o PODER JOVEM é um
exército de heróis anônimos que não buscam medalhas nem acomodações.
Em todas as épocas, mas sobre tudo nos dias que vivemos, têm sacrificados
a própria vida para que o futuro, que lhes pertence, não traga em seu bojo a
carta negativa do imobilismo e da exploração do homem pelo homem
(POERNER, 1968, capa).

E na luta contra as estruturas ultrapassadas, nos termos postos por Poerner


(1968), mantidas apenas com o fim de conservar privilégios à custa da exclusão da
maioria, inclusive com violência contra os estudantes a ponto de tirar a vida de alguns.
Com isso, o alerta deixado aos estudantes é para que ajam para sair da zona de
conforto e partam para a luta em busca de direitos e mudanças de paradigmas. Assim,
de acordo com o estudo, no pensar das classes economicamente dominantes, é
imprescindível o uso da violência contra a resistência com o fim de manter o “status
quo” e o contexto de descasos perpetrados pelo Estado.
Esse quadro de violência iniciado pelo Estado e que muitas vezes chega a
casos de homicídios contra estudantes, é materializada através do assassinato do
jovem secundarista Edson Luiz de Lima Souto, morto pela polícia durante
reivindicações estudantis em 1968 e de acordo com a fotografia seguinte. O contexto
de luta no qual Edson foi assinado, conforme Poerner (1968, p. 394), significa que
“morrendo quando combatia pela conquista de um direito no futuro, Edson Luiz
simboliza precisamente o sentido do Poder Jovem numa nação que nem sempre o
compreende, mas para cuja redenção dele dependerá”.
E para essa redenção a partir da real compreensão do referido poder jovem,
a nação brasileira, consubstanciada na sociedade, terá que se despir dos interesses
pessoais e vigentes apenas no presente, para reconhecer valores e edificar
politicamente com vistas às gerações do futuro, portanto, sem olhar apenas para os
interesses imediatos e assim reconhecer a legitimidade dos ideais que estão nos
corações e mentes dos estudantes em luta e devidamente fundados na realidade.
49

Fotografia 2 que retrata os estudantes velando o colega assassinado. Fonte: livro O Poder Jovem.

De forma sistemática e de acordo com as fases das atividades dos


estudantes, o autor vai delineando os feitos históricos, reivindicatórios e de resistência
do meio estudantil, até as constantes reivindicações ocorridas no início do Regime
Militar, que iniciou em 1964. Assim, Poerner (1968) demonstra a força reivindicatória
estudantil, as várias “bandeiras” propostas e reivindicadas no decorrer desse lapso
temporal, sem se esquecer de citar a repressão violenta praticada pelo Estado em
desfavor dos estudantes e através do uso do seu braço armado, a instituição policial.
Assim, em citação que antecede a introdução da obra, Poerner (1968) não
se esquece de ocorrido violento contra estudantes universitários no período que
antecedeu a mencionada Ditadura Militar brasileira.

Aqui, em as noites históricas de 29 e 30 de maio de 1956, os acadêmicos de


Direito sofreram injustificáveis violências policiais e lutaram, brava e
heroicamente, para impedir fosse violado o Território Livre da Faculdade
Nacional de Direito. (Inscrição em placa afixada na parede lateral direita de
quem entra na FND) (POERNER, 1968, p. 23).

No entendimento de Poerner (1968, p. 27), “a crise da universidade brasileira


é decorrência da estrutura arcaica vigente no país. Precisamos renovar a estrutura
50

para que a universidade também se renove”, esse entendimento cabe, ainda, nos dias
de hoje e precisa ser estendido para o âmbito do Ensino Fundamental e Médio. E, ao
mesmo tempo, demonstrando os processos reivindicatórios dos estudantes,
prossegue Poerner.

A partir dessa conclusão, as ruas ganham um novo estudante, que passa a


estudar, no asfalto das passeatas, a matéria cujo ensino lhe é negado nos
bancos universitários: a realidade brasileira atual. Aprendida nas ruas, essa
matéria faz parte de um curso não oficial muito mais amplo, que poderia ser
chamado de Politização e Liderança e que terá, certamente, reflexos
decisivos na história futura do Brasil (POERNER, 1968, p. 27).

A partir daí e ao longo do texto, Poerner (1968), é demonstrado que o


movimento estudantil do Brasil Colônia até a fase relacionada ao Regime Militar,
passa por 2 (dois) grandes períodos. O primeiro é o que antecede a criação da União
Nacional dos Estudantes (UNE), o que ocorreu em agosto de 1937, ao passo que o
segundo se refere à fase seguinte e que perdura até os dias atuais.

Nascida no finalzinho da Segunda República, em 13 de agosto de 1937, na


Casa do Estudante do Brasil, a União Nacional dos Estudantes só entraria
em ação, verdadeiramente, durante o Estado Novo, razão pela qual não cabia
iniciar o seu histórico no capítulo precedente. Fruto de uma tomada de
consciência, quanto a necessidade da organização em caráter permanente e
nacional da participação política estudantil, a UNE representa, sem qualquer
dúvida, o mais importante marco divisor daquela participação ao longo da
nossa história. Por isso, o movimento estudantil brasileiro e este livro são
divididos em duas partes: antes da UNE e a partir da UNE (POERNER, 1968,
p. 131).

A diferença fundamental entre os dois períodos históricos no que tange a


atuação dos estudantes, conforme Poerner (1968, p. 132), é que as entidades
estudantis da primeira fase “pecavam todas pela transitoriedade, visando apenas os
problemas específicos e determinados, em função de cuja duração nasciam e
morriam”, ou seja, de acordo com o autor, os movimentos dos estudantes de então
lutavam por problemas pontuais e com os quais cessavam as suas reivindicações e
mobilizações.
E os mesmos movimentos estudantis, portanto, anteriores a criação da UNE,
ainda tinham um segundo grande vício, Poerner (1968, p. 132), “era a regionalidade,
favorecida pelo isolamento entre os Estados, contra o qual se mostraram infrutíferos
os esforços da Federação de Estudantes Brasileiros”, importando em que.
51

Os dois vícios minaram todas as tentativas de dar organicidade ao movimento


estudantil, só permitindo o funcionamento regular de entidades cujo raio de
ação raramente ultrapassava o limite dos muros da Faculdade em que tinham
sede, tais como os Grêmios e os Centros Acadêmicos, ou as associações e
agrupamentos de caráter específicos (POERNER, 1968, p. 132).

Por outro lado, no segundo período, portanto, após a criação da UNE,


conforme Poerner (1968, p. 136), os estudantes brasileiros passaram a contar com
um “instrumento ideal, de caráter amplo, nacional e permanente, somente surgiu em
11 de agosto de 1937, no Rio de Janeiro, com a instalação do 1º Conselho Nacional
de Estudantes, na Escola de Belas Artes”, em que pese a entidade ter sido
reconhecida somente no mês de dezembro do ano seguinte, portanto, em 1938,
considerando a realização do 2º Congresso Nacional dos Estudantes.
Agora, com o fim de demonstrar que as reivindicações dos estudantes frente
a estrutura arcaica do Estado brasileiro tanto na fase que antecedeu a criação UNE,
quanto naquela que a sucedeu, sempre foram contrapostas mediante violência,
muitas vezes em níveis extremos pelas forças policiais, citaremos trechos descritos
por Poerner (1968), conforme a seguir delineado.

Quanto à campanha republicana, se desenvolvera pari passu à campanha


abolicionista. Muitos estudantes punham mais ênfase naquela, por considerar
que a Abolição seria uma consequência automática da República. Tal ênfase
redundou em alguns incidentes, como a visita do Conde d’Edu a São Paulo,
quando um comício político estudantil foi dissolvido pela cavalaria, no largo
da Sé (POERNER, 1968, p. 57).

Como se vê, pelo contido na citação, os estudantes, ainda na fase imperial,


lutavam concomitantemente em duas frentes, na campanha pela implementação da
República e pela abolição da escravatura. Assim, ressalta-se a presença da luta de
classes amalgamando os movimentos estudantis no Brasil desde as suas primeiras
manifestações, o que, pelo que tudo indica, para o entender das classes dominantes,
justificaria o uso da violência policial contra os estudantes, inclusive a ponto de
dissolver um comício político estudantil.
E, as reivindicações dos estudantes perduraram no decorrer do Brasil
República, sempre em busca de melhores condições estudantis, serviços públicos de
qualidade e defesa de suas posições políticas, desaguando, em 1909, na chamada
52

Primavera de Sangue17, conforme Poerner (1968, p. 77-107) destaca com os


integrantes do movimento mais uma vez sendo vitimados pela violência policial.

A Brigada Policial veio em seguida, espaldeirando o povo, num assomo de


selvajaria. Tudo fora previamente combinado. Havia entre os policiais
desordeiros conhecidos nas rodas da malandragem. Capoeiras famosos,
como Bexiga, Bacurau, Serrote, Moringa, Turquinho. Resultado de tudo isso:
dois estudantes mortos e numerosos feridos. José de Araújo Guimarães,
acadêmico de Medicina e que fazia a vezes de sacristão, tombou ali mesmo,
com uma facada no ventre, nas escadarias da Escola Politécnica. Francisco
Pedro Ribeiro Junqueira, chamava-se o segundo estudante morto na chacina
(POERNER, 1968, p. 81).

Na segunda fase histórica do movimento estudantil brasileiro, ou seja, após


a criação da UNE em 1937, em que pese a força política da entidade e dos estudantes,
considerando a centralização e organicidade das atividades, o Estado, novamente
através dos organismos policiais, a exemplo das fases anteriores, continuou
respondendo às reivindicações mediante o uso de violência.

Daí por diante, até que a guerra estivesse praticamente ganha, em março de
1945, as relações entre os estudantes e o governo obedeceram a um regime
de trégua, vez por outra rompida, como em 10 de novembro de 1943, dia em
que, segundo a Carta de 1937, se convocariam eleições presidenciais. Como
Vargas não cumprisse tal disposição, os universitários realizaram em São
Paulo, sob a liderança do XI de Agosto, a “Passeata do Silêncio”, que acabou
em violenta repressão policial, com a morte, a tiros, do estudante Jaime da
Silva Teles (POERNER, 1968, p. 181).

E a violência perpetrada pelo Estado em desfavor dos estudantes e do


movimento estudantil se agravou ainda mais no decorrer da Ditatura Militar que teve
vigência no Brasil no período, 1964/1985, conforme se constata pela citação seguinte,
pois da condição de movimento de luta em razão das “bandeiras” postas em prática,
passaram a ser vistos como elementos de alta periculosidade para a segurança do

17
De acordo com Poerner (1968, p. 79-83), Primavera de Sangue é a denominação dada ao ambiente
fúnebre que se estabeleceu em função de ação policial em setembro de 1909 no Rio de Janeiro e que
matou dois estudantes e deixou vários feridos. Os jovens realizavam uma passeata comemorativa e
em função da chamada Campanha Civilista considerando a primeira eleição presidencial que se
avizinhava. No entanto, a ação policial optou pelo uso da violência extrema, cujos assassinatos
praticados ensejaram uma série de manifestações e denúncias na então capital da República, porém,
em que pese isso, prevaleceu a impunidade dos mentores dos crimes e apenas foram punidos os
soldados sem nenhuma expressão na comunidade.
53

país. E tudo isso, de acordo com Poerner (1968), por lutarem contra a Lei Suplicy e o
Acordo MEC-USAID18, por exemplo, se confundido com o processo de repressão
implementado pelos governos da Ditadura Militar.

A história da UNE e do movimento estudantil brasileiro se confunde,


inteiramente, a partir de abril de 1964, com a história da repressão às
liberdades e da intervenção estrangeira no Brasil. De um lado, a Lei Suplicy
de Lacerda. De outro, o Acordo MEC-USAID. Os estudantes, que vinham de
conquistas como a duplicação de vagas na Universidade do Brasil (atual
universidade Federal do Rio de Janeiro) – para isso, o Presidente Goulart
liberara, em 10 de março de 1964, uma verba de dois bilhões de cruzeiros
(velhos) -, passaram, automaticamente, à condição de elementos de alta
periculosidade para a segurança nacional, aos olhares “eternamente
vigilantes” das novas autoridades. Ser estudante equivaleria a ser
“subversivo” (POERNER, 1968, p. 229).

E essa realidade ainda pode ser constatada através dos noticiários dos
jornais da época e narrado no livro O Poder Jovem, uma vez que o governo via como
único instrumento a repressão contra os estudantes com o fim calá-los e dessa
maneira evitar protestos contra a Ditadura Militar, promoção de campanhas em favor
da alfabetização de adultos, bem como a reivindicação de uma série de direitos.

Esse flagrante da repressão policial-militar que colhemos, casualmente, em


três dias seguidos de junho (10, 11 e 12) de 1964, pela leitura do Correio da
Manhã, se repetiu durante todo o período governamental do Marechal
Castelo Branco. As autoridades não encontravam outro recurso senão calar
os estudantes, para evitar que protestassem contra o que se passava em sua
Pátria e para impedir que promovessem novas campanhas de
alfabetização de adultos, cujos organizadores e participantes eram, então,
submetidos aos atrabiliários Inquéritos Policiais-Militares (IPMs) (POERNER,
1968, p. 233, grifo nosso).

E Poerner (1968) faz o fechamento do livro através de uma nota


complementar, páginas 363 e seguintes, narrando à absurda motivação e sórdida
justificativa do chefe da polícia em razão do assassinato do jovem estudante Edson
Luiz de Lima Souto, ocorrida em 28 de março de 1968. O ocorrido, na realidade,
retrata um contexto de violência estatal contra os estudantes, o movimento estudantil,
assim como em desfavor de outras frentes de massa, compostas por trabalhadores,
que reivindicavam democracia e reconhecimento de direitos ao longo do período da

18O Acordo MEC-USAID foi realizado entre o Brasil e os Estados Unidos e regulado através da Lei
Federal nº 5.540/1968 com vistas ao desenvolvimento educacional. Foi negociado de forma secreta e
somente se tornou público no final de 1966, após intensa pressão popular e política (POERNER, 1968,
pp. 229-265).
54

Ditadura Militar que teve vigência no Brasil a partir de 1964 e se estendeu até 1985
nos termos já salientado acima.

O assassinato confirmava as previsões contidas em capítulos precedentes


sobe o aumento que se vem verificando na violência posta em prática, contra
os estudantes, pelo esquema de repressão policial. As marcas de balas nas
paredes do restaurante do Calabouço, bem como os sinais de depredação
no recinto, tornavam quase inacreditável que a ação policial – desencadeada
de surpresa, quando numerosos alunos faziam refeições - só tivesse
produzido a morte de um estudante. Logo surgiu a explicação do general
Osvaldo Niemeyer Lisboa, superintendente da Policia Executiva, para a
barbárie do massacre: - “A Polícia estava inferiorizada em potência de
fogo” (POERNER, 1968, p. 363-364, grifo nosso).

Assim, de acordo com o exposto, considerando a natureza das reivindicações


estudantis predominantes, sejam aquelas relacionadas ao período que antecedeu a
criação a UNE, ou os ocorridos posteriormente, uma luta travada contra uma estrutura
de Estado ultrapassada e excludente, nos conduz ao entendimento de que estamos
diante de acontecimentos relacionados à luta de classes. E assim é em razão dos
estudantes de então reivindicarem melhoramentos na estrutura universitária,
campanhas de alfabetização de adultos, criação de universidades, combate ao
sistema escravagista, além de uma série de outras “bandeiras” de cunho popular, ao
passo que o Estado, por outro lado, representando as elites dirigentes, sempre
respondeu através da violência, sendo o aparato policial o seu instrumento,
acontecimento típico da sociedade de classes e que tem vigência até os dias de hoje,
uma vez que é o meio usado contra os estudantes do presente.
E, nesse sentido, se encontra o entendimento de Poerner (1968) constante
da bibliografia em referência.

As manifestações estudantis do passado brasileiro representam sempre uma


posição de inconformismo da classe média urbana. As motivações aparentes
do inconformismo são as mais variadas, mas um elo comum pode ser obtido:
a superação das formas sociais nas diversas épocas, sejam elas colônia,
regência, império, escravatura (Antonio Noronha Filho e Pedro Meira, “A
verdade do movimento estudantil” jornal do brasil – Caderno Especial – 6 de
novembro de 1966 (POERNER, 1968, p. 44).

Outrossim, é fato, conforme o até aqui analisado, que os estudantes


brasileiros, até o período do Regime Militar se estruturaram, primeiramente, de forma
esparsa e através de movimentos, tendo como meio os protestos. Por outro lado, a
partir da criação da UNE, a estruturação se deu em torno dessa entidade e por meio
55

de grandes movimentos e variados protestos, cujas dinâmicas se referiam às


reivindicações de direitos e mudanças nos sistemas político, social e econômico. O
lado oposto, por sua vez, se vendo estruturado no seio do Estado e consubstanciado
nas classes dirigentes, se esforçou para rechaçar as reivindicações, e, para tanto,
sistematicamente, fez uso da violência policial com vista à manutenção do sistema
vigente e respectivos privilégios.
Mas, nesse contexto de vantagens do aparato estatal, em plena Ditadura
Miliar, os jovens estudantes prosseguem sua caminhada de luta e de acordo com José
Aparecido da Silva Rocha e Antônio Barbosa Lúcio (2012, p. 7) “[...] no Brasil, podem-
se trazer à memória, dois fatos importantes que ocorreram nas duas últimas décadas
do século XX: O movimento ‘Diretas Já’ (1983-1984) e o movimento ‘Fora Collor’
(1992), também conhecido como Movimento dos ‘Cara pintadas’”. O primeiro se refere
a pleito por eleições livres e o segundo de combate à corrupção no governo de
Fernando Collor de Melo, com vasta participação de secundaristas e universitários, o
que demonstra, mais uma vez, a presença dos estudantes na “arena” política
brasileira19.
E nesse “passo a passo” de luta, ao longo da década de 1980, Jones
Fiegenbaum, Patrícia Schneider e Neli Terezinha Galarce Machado (2012) lembram
as mudanças pelas quais os movimentos estudantis passaram, de acordo com o que
também se vislumbrava na sociedade, especialmente na seara política.

Nesse período aconteceram mudanças na forma de encarar o movimento


estudantil. Alteraram-se as personagens que pensavam o movimento e a
forma de agir no movimento estudantil. Essa etapa reflete o momento político
em âmbito nacional, final da Ditadura Militar, reabertura dos partidos, Diretas
Já etc., movimentos que, de certa forma, influenciaram os estudantes ligados
ao movimento estudantil da Instituição. (FIEGENBAUM; MACHADO;
SCHNEIDER, 2012, p. 160).

Trata-se de um período no qual a reivindicação primeira foi por eleições


diretas para a Presidência da República, com enormes manifestações sociais e onde
a presença do movimento estudantil sempre foi muito forte.

19 Conforme salientamos na introdução e cujo debate aqui é retomado, os estudantes tiveram


importante participação no movimento “Diretas já” nos anos 80 do século passado e com vistas à
redemocratização do país e a realização de eleições para a Presidência da República. Na sequência,
na década seguinte, foram protagonistas no fenômeno conhecido como “Os caras pintadas”, ocorrido
no início dos anos 90 e que contribuiu nas mobilizações e pleitos pelo processo de impeachment do
então Presidente Fernando Collor de Mello.
56

O movimento das “Diretas Já” ocorreu nas grandes capitais do país em 1983-1984.
Uma grande quantidade populacional, formada por jovens, operários, trabalhadores e
políticos, saíram nas ruas em protesto contra a Ditadura Militar (1964-1985) com o
interesse de pressionar o governo a realizar eleições diretas para Presidente da
República. Segundo Delgado (2009) ainda no período anterior ao Golpe Militar de
1964, ocorriam manifestações sociais autônomas, que sempre foram mal absorvidas
pelo processo político brasileiro. No Governo João Goulart (1961-1964), diversos
movimentos sociais cresceram em número e diversidade e ganharam maior
densidade e capacidade de pressão que ocorriam na esfera da sociedade civil
priorizando o campo do reformismo social, a exemplo das ligas camponesas, do
movimento estudantil e das organizações sindicais rurais e urbanas em uma
conjuntura marcada pela guerra fria, e atritos que, para Delgado, estaria em um mundo
dividido em socialismo e capitalismo (ROCHA; LÚCIO, 2012, p. 3, grifo nosso).

Em enormes reivindicações, ainda de acordo com José Aparecido da Silva


Rocha e Antônio Barbosa Lúcio (2012), no artigo “Protestos sociais no Brasil: os
jovens nos movimentos sociais, diretas já e fora Collor”, lembram que nos dias 12 e
13 de abril de 1984, as manifestações pelas “Diretas Já”, reuniram cerca de 300 mil
em Goiânia (GO), 50 mil em Ipatinga (MG) e 200 mil na cidade de Porto Alegre (RS).
Contudo, foi no Vale do Anhangabaú (SP) que uma multidão de cerca de 1 milhão e
700 mil pessoas pediam eleições diretas.
Com isso, considerando as atividades dos movimentos de massa com forte
participação estudantil, embora de forma indireta, em 1985, o Congresso Nacional
realizou eleições para Presidente da República do Brasil, tendo os estudantes
brasileiros estabelecidos, mais uma vez, o seu protagonismo político e reivindicatório.

As manifestações eram o sinal evidente do descontentamento popular e o


anseio por mudanças. Aquino et al. (2000) dizem que a expectativa era
grande na sociedade brasileira, porque seriam necessários 320 votos para a
aprovação da Emenda Dante de Oliveira, porém, os deputados não
aprovaram a emenda que pedia a realização de eleições diretas após mais
de 20 anos de regime militar, através de um artifício dos aliados da Ditadura
com a ausência de 113 deputados, 65 votos contra e 03 abstenções (ROCHA;
LÚCIO, 2012, p. 5).

Mais adiante, agora na década de 1990, com o apelido de “Caras pintadas”,


os estudantes brasileiros novamente surgem na cena política do país. Assim, nos
termos lembrados por Douglas Ferreira dos Santos (2014, p. 4) “O movimento dos
caras pintadas foi composto, em sua maioria, por jovens que exigiram o impeachment
do Presidente Fernando Affonso Collor de Mello, envolvido em esquemas de
corrupção e denunciado pelo irmão, Pedro Collor”. Esse movimento, a rigor do que
lembra Thales Torres Quintão (2010), surgiu como um elemento de força dentro de
um contexto que pleiteava a cassação de Collor de Mello.
57

“Os caras-pintadas” surgiram nesse período como figuras de destaque entre


as diversas forças responsáveis pela derrocada do primeiro presidente eleito
por voto direto em quase trinta anos. Esse movimento de caráter estudantil
se tornou uma espécie de “porta-voz” do movimento Fora - Collor junto
à esfera pública, mesmo existindo outras entidades civis nesse cenário e com
esse mesmo objetivo. Suas manifestações se tornaram emblemas da
participação popular na campanha para a saída de Collor, devido
principalmente a sua visibilidade adquirida (QUINTÃO, 2010, p. 6, grifo
nosso).

Essa vertente do movimento estudantil, bem como das demais iniciativas


oriundas da sociedade na época, é fruto da incoerência constante das políticas do
governo Fernando Collor, eleito com o voto popular e após um longo período de
Ditadura Militar, porém, sem conseguir responder os anseios da população e nem
mesmo os objetivos e privilégios dos seus principais aliados, graças aos destinos
políticos que adotou.

Assim, após sua eleição, Collor teve seu governo responsável pela introdução
do Neoliberalismo no país. Na presidência, não correspondeu às expectativas
alimentadas em campanha pelas classes populares e, sob seu governo, o
Estado brasileiro promoveu as primeiras privatizações do pós-Ditadura
ampliando o privatismo econômico e, especialmente, a liberação de medidas
protecionistas tornando legais as propostas neoliberais, além de se contrapor
ao Estado de bem-estar social, tornando explicita a afinidade política com o
neoliberalismo (ROCHA; LÚCIO, 2012, p. 5).

Com isso, sem os acertos políticos prometidos em campanha e deixando de


atender o círculo de aliados, bem como diante de fortes acusações de ocorrências de
corrupção no governo, inclusive oriundas do irmão Pedro de Melo, as mobilizações
sociais começaram a aparecer, inclusive com os chamados “Os caras pintadas”.

Em 9 de maio de 1992, a Revista Veja publicou um dossiê organizado por


Pedro Collor, irmão de Collor, revelando que o tesoureiro Paulo César Farias
possuía contas em paraísos fiscais. As acusações só aumentavam e no dia
23 de maio do mesmo ano, foi o próprio irmão do presidente, Pedro Collor,
que o denunciou como envolvido em um esquema de corrupção. As
denúncias de corrupção envolvendo seus aliados se intensificaram por todo
o mês de maio de 1992, culminando com a formação do Movimento pela Ética
na Política, composto por 18 entidades civis, como centrais sindicais, OAB e
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) (SOBRINHO, 2008)
(ROCHA; LÚCIO, 2012, p. 6-7).

Nesse contexto de denúncias e forte pressão popular, o Presidente eleito pela


via popular após longos anos de Ditadura Militar teve seu mandado cassado pelo
parlamento via processo de impeachment, no qual a mídia teve atuação ativa.
58

A mesma mídia que o apoiara nas eleições, após pressões populares, o


abandona, ou melhor, abandona o projeto político que colocava em xeque a
continuidade do modelo neoliberal que atendesse tanto o capital internacional
como o nacional. As pressões populares ocorreram tanto sob organização de
partidos de esquerda como através de movimentos estudantis,
possibilitando o “aparecimento” dos “Caras Pintadas” e mobilização nas
ruas das principais cidades brasileiras (ROCHA; LÚCIO, 2012, p. 7, grifo
nosso).

Como é possível perceber, os estudantes que foram apelidados de “Caras


pintadas” ou “Os caras pintadas”, tiveram participação política de destaque no
processo de cassação de Fernando Collor, a exemplo do que ocorreu em outras
ocasiões na história do país, em especial quando reivindicaram direitos do interesse
estudantil. Porém, conforme salienta Thales Torres Quintão (2010) ao escrever o texto
“Os media e a construção dos caras pintadas”, os secundaristas e universitários desse
período histórico não agiram de acordo e unicamente com os seus desígnios, e sim a
partir de forte influência dos meios midiáticos.

Nesse processo de exibição e produção do fato, “Os caras pintadas”


aparecem para o grande público. É um ator político, isso não se tem dúvida,
porém também é algo abstrato, uma ideia, um conceito, criados na e pela
mídia ao descrever as suas passeatas. E que ao fazer essa descrição tornou
visível essas passeatas, e legitimou-as para os brasileiros (QUINTÃO, 2010,
p. 7).

É certo que o estudo de Quintão (2010) não é objeto dessa pesquisa, porém,
diante da importância do tema e em razão dos esclarecimentos que traz sobre o
movimento em questão, entendemos de imprescindível importância o delineamento
do seu conceito, por isso, prosseguimos mesmo que de forma breve.

A política, em sua forma tradicional e cotidiana, não tem espaço nos media,
uma vez que esta não atrai o público, não seduz. Porém, com o movimento
dos “caras-pintadas” associado à prática política para o impeachment, o
texto político foi desvinculado do estigma desagradável e associado a
símbolos mais acessíveis, compreensíveis e novos. Isso foi possível ao
associar a política junto à ideia de espetáculo, o que propicia abarcar mais
campos sociais (QUINTÃO, 2010, p.11, grifo nosso).

E prossegue Thales Torres Quintão (2010) delineando o seu entendimento


de que “Os caras pintadas” foram uma construção dos meios midiáticos, considerando
as suas necessidades de espetacularização, considerando que.
59

A interligação entre comunicação (mídia) e política se aproximou, e deixou


tênue a linha de separação entre essas duas esferas, durante o processo de
impeachment de Fernando Collor de Mello. Como salienta Weber (2006), a
política exige atualmente, cada vez mais, novas linguagens e configurações
que sejam incluídas no processo de midiatização (adoção de todos os
espaços) e de espetacularização (midiatização acrescida de mobilizações
sociais, que nesse caso seriam “os caras-pintadas”) (QUINTÃO, 2010, p.12).

E Quintão finaliza chamando a atenção, ou melhor, demonstrando as


premissas utilizadas pela mídia na construção dos “caras pintadas”. Sendo assim
destaca a generalização do perfil dos estudantes e a ambiguidade da ação política,
fazendo desaguar em uma espécie de entendimento, eis que toma o todo pela parte.

A construção dos caras pintadas pelos meios de comunicação, como vimos,


se deu pelo aspecto da generalização do perfil dos estudantes que
participavam das passeatas; e pela ambiguidade presente nessa ação
política, que eram retratadas com sérios objetivos, mas se davam por atos de
“espontaneidade”, marcadas pela alegria, pela ironia, pelo deboche, e etc.
Assim, a imprensa, em geral, selecionava a parte e a apresentava como o
todo ao estabelecer narrativas sobre esse movimento juvenil (QUINTÃO,
2010, p.13).

E a argumentação de Quintão se encontra em consonância com o que dizem


José Aparecido da Silva Rocha e Antônio Barbosa Lúcio (2012), uma vez que ao se
referirem a Baudrillard, Marx e Santomé (2003), salientam que sem luta não haverá
mudanças e que todas as conquistas obtidas pelos povos foram em razão dos
processos de lutas sociais e das resistências implementadas.

Quando as massas ocupam-se com assuntos não relacionados ao social,


fortalecem a ideia de Baudrillard (1985) em que o autor critica sua
passividade, mediante o esquecimento dos sentidos. Marx (2000) por sua
vez, reforça que se não houver luta não haverá mudança e Santomé (2003)
afirma que não se pode esquecer que os homens lutaram contra a
escravidão, a opressão da mulher, regimes ditatoriais, contra a pena de
morte, entre inúmeras lutas que só foram possíveis com manifestação
popular. E não seria diferente nos dias atuais (ROCHA; LÚCIO, 2012, p. 8).

Mas o pensamento de Quintão tem o contraponto, e no caso é feito por


Douglas Ferreira dos Santos (2014) no artigo “Consciência Histórica Sobre o
Movimento dos Caras Pintadas”, onde o autor salienta que os jovens, a exemplo do
conjunto da massa, certamente foram influenciados pela mídia, porém, não no âmbito
de suas organizações nacionais, que era quem organizava e comandava as atividades
de protestos nas ruas do país.
60

Embora o movimento dos caras pintadas tenha sido uma organização, sobre
tudo de jovens ligados à União Nacional dos Estudantes, com sentimento de
insatisfação contra o governo de Fernando Collor de Mello, alguns aspectos
além deste são relevantes salientar no que diz respeito sobre o
comportamento da juventude. A mídia com certeza influenciou muitos sujeitos
a participarem das manifestações, mas não a ponto da organização em
âmbito nacional, conforme afirmado em livros didáticos e narrativas
realizadas sobre “Os caras pintadas” (SANTOS, D., 2014, p. 12).

E Santos, D. (2014) ainda contra-argumenta salientando que os jovens


integrantes do movimento “Os caras pintadas”, também tiveram a sua relevância e
importância na história das reivindicações políticas e dessa maneira também deixaram
o seu registro na história.

“Os caras pintadas” foi considerado por vários pesquisadores o último


manifesto de forma massiva realizado pela juventude brasileira até o advento
das manifestações em prol do transporte coletivo, que ocorreram no ano de
2013. Por se tratar de um acontecimento da História do tempo presente e
protagonizado pela juventude, o movimento dos caras pintadas permite, além
de trabalhar a História recente da política brasileira, abordar as questões que
envolvem o público juvenil como protagonismo e participação política
(SANTOS, D., 2014, p. 2).

Dessa maneira, conforme Quintão (2010), considerando que os jovens


secundaristas e universitários apelidados de “caras pintadas” e com importante
participação no movimento que levou ao processo de impeachment de Fernando
Collor de Mello, foram manipulados pela mídia e dessa maneira não defenderam os
seus legítimos interesses e sim um ponto de vista midiático, deve ser considerado que
se diferenciam dentro do contexto do movimento estudantil. Assim, precisa ser
colocado que as atividades em referência, ao se diferenciarem de outros processos
reivindicatórios desencadeados pelos estudantes, sejam aqueles ocorridos até as
“Diretas Já”, ou os que têm ocorrido no século atual, em que pese o seu lugar de
destaque, não representa um ponto fundamental entre as reivindicações estudantis.
Mas os estudantes não pararam com as mobilizações de rua dos “Caras
pintadas”, ao contrário, no decorrer da década passada, portanto, após o ano 2000,
também é possível observar importantes atividades estudantis, de acordo com o que
lembram Jones Fiegenbaum, Patrícia Schneider e Neli Terezinha Galarce Machado
(2012), referindo-se ao período de 2000 a 2012.

Esse período foi marcado por um maior engajamento e politização dos


diretórios, não no sentido de levantar bandeiras partidárias, mas de criar-se
61

uma rede de relações em esferas maiores, não somente na Instituição; mas,


sim, em instâncias estaduais e nacionais (FIEGENBAUM; MACHADO;
SCHNEIDER, 2012, p. 161).

E prosseguem os autores referidos ao salientar que no início da década


passada, considerando as condições econômicas do país, com inflação alta, elevada
influência do modelo neoliberal e com o salário dos trabalhadores em franco
descompasso em relação aos preços, colocava os movimentos sociais, e aí se
encontravam os estudantes, em marcha de reivindicação no mencionado período.

Cabe salientar que, nos anos de 2001 e 2002, o país passava por um período
de forte influência do modelo neoliberal, no qual a inflação estava a picos
elevados e o salário dos trabalhadores não acompanhava esse compasso, o
que trazia aos movimentos sociais maior poder de luta devido ao
descontentamento das categorias (FIEGENBAUM; MACHADO;
SCHNEIDER, 2012, p. 161-162).

Com isso, considerando a pesquisa realizada em relação ao período histórico


do movimento estudantil brasileiro, é difícil negar que os estudantes brasileiros
possuem um passado de luta e de enfrentamento de estruturas que já deveriam ter
sido superadas. Nesse enfrentamento, de acordo com o demonstrado, os jovens são
submetidos à violência e alguns chegaram a perder a vida, além de outras sortes de
prejuízos, inclusive ao ponto de serem vítimas da manipulação, cujo passivo
acumulado foi a perda do foco na reivindicação de suas reais necessidades.
Mas nos processos de luta, e de forma destemida, os estudantes não
deixaram de se opor aos desmandos e às políticas elitistas dos governos, pelo
contrário, sempre se manifestaram contra a realidade injusta estabelecida e
reivindicaram melhorias, não somente para o meio escolar, mas também para a
comunidade de um modo geral. Nessa toada, este estudo demonstra que de maneira
consideravelmente dispersa no período que antecedeu a criação da União Nacional
dos Estudantes, porém de forma orgânica e unificada após a constituição da entidade,
mas seja em uma ou em outra fase, a inquietação foi companheira da juventude
estudantil brasileira ao longo do tempo e o contexto de cada época, considerando os
esforços realizados e a busca dos objetivos almejados.
E ainda de acordo com o demonstrado no estudo, nas décadas relacionadas
à segunda metade do século passado, secundaristas e universitários tiveram
considerável influência nas reivindicações, seja nos pleitos pelas Diretas Já, no
62

processo constituinte, no “Fora Collor” ou nas manifestações mais recentes do final


do século passado e início do atual, de forma autônoma e com “bandeiras” bem
definidas. No entanto, também é notório e se encontra demonstrado, que mesmo
diante dos relevantes protestos e das importantes conquistas, as causas
fundamentais dos grandes movimentos ainda permanecem totalmente ativas e
resistentes, o que continua impulsionando a juventude para a luta, o enfrentamento e
a resistência, o que tem ocorrido de maneira organizada e com pautas unificadas e
centralizadas, conforme será debatido no capítulo seguinte.
Mas embora o horizonte ainda se encontre distante, pelo que se constata, a
massa estudantil tem se sobressaído e se encontra há alguns passos adiante em
relação ao lado oposto, pois com a contribuição da luta de classes, do Império
evoluímos para a República; o Sistema Escravocrata, pelo menos na forma como
outrora existiu, restou dissolvido; a Democracia ganhou um considerável grau de
amadurecimento; as universidades e unidades escolares se multiplicaram e, hoje,
temos milhares de jovens e adultos em sala de aula e sendo alfabetizados, embora
as inumeráveis e indiscutíveis carências ainda insistam em persistir ao lado de um
sistema que se mantém arcaico, opressor e com a finalidade de manter os privilégios
e a acumulação em favor dos interesses das elites econômicas, uma vez que o modo
de produção, desde outrora, não passou por modificações severas.
No entanto, a forma de luta se modificou e hoje, além da UNE e dos grandes
movimentos, os estudantes contam com o Movimento de Ocupação das Escolas, por
isso, a busca do horizonte com vistas à ampliação dos direitos e de mudanças
estruturais está tendo continuidade. No mesmo sentido, a luta prossegue contra os
setores sociais opressores, o Estado e as suas políticas conservadoras permeadas
pela violência policial diante dos protestos, da resistência e das reivindicações
estudantis que se mantêm na busca de modificações da injusta realidade vigente e
conforme o contexto da luta de classes, pois o estudo demonstra que as ações dos
estudantes, ao longo da história, nada mais são além da resistência, de busca de
avanços políticos e de consagração de novos direitos, o que significa contraponto aos
interesses das elites tradicionais, econômicas e políticas.
63

3 - O MOVIMENTO ESTUDANTIL DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS EM SÃO PAULO


EM 2015, NO PARANÁ EM 2016: ASPECTOS POLÍTICOS

Neste capítulo é feito o debate sobre o Movimento de Ocupação das Escolas


de São Paulo de 2015 e do Paraná de 2016, bem como sobre os respectivos aspectos
políticos do fenômeno. Com isso, no subcapítulo 3.1, ocorre o debate sobre o
Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo em 2015, enquanto que no
subcapítulo 3.2 fazemos a discussão relacionada ao fenômeno no Estado do Paraná
em 2016. Por fim, no subcapítulo 3.3, suscitamos na discussão, os respectivos
aspectos políticos do referido fenômeno, cujo objetivo, é o estudo sobre as atividades
desenvolvidas pelos estudantes no decorrer do fenômeno e a análise, se estão ou não
amparadas pelo sistema político vigente no país, bem como se o Movimento de
Ocupação das Escolas como um todo é contemplado ou não por esse amparo.
Assim, seguindo o referido itinerário, a partir da base teórica utilizada na
pesquisa, são demonstradas as causas do movimento, o seu desenrolar, bem como
o consequente desaguar, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016,
conforme constam nos subcapítulos 3.1, 3.2. Da mesma forma, no subcapítulo 3.3,
demonstramos as políticas, efetivamente, postas em práticas pelos movimentos
estudados, em especial, relação institucional e com a comunidade, democracia,
igualdade, comunicação e horizontalidade nas tomadas decisões.
Nesse sentido, no que se refere à política de relação institucional, transparece
os apoios obtidos pelos estudantes perante a sociedade, seja no que tange às
lideranças ou às entidades, como foi o caso de sindicatos e órgãos oficiais, como
Ministério Público e Defensoria Pública, por exemplo, fundamental para o sucesso
obtido. Da mesma forma, a política de relação interna, o que fortaleceu os laços entre
os secundaristas e, por consequência, beneficiou o movimento como um todo,
considerando a priorização de encaminhamentos de forma democrática e respeitando
a igualdade entre os integrantes das ocupações, principalmente, em razão das
decisões sempre tomadas de forma horizontal ou a partir de assembleias. No que se
refere à política de comunicação praticada pelos secundaristas, esta foi uma
necessidade em razão da postura dos meios de comunicação tradicional e facilitada
pelos instrumentos à disposição dos ocupantes através da internet, de acordo com o
que será demonstrado nos subcapítulos a seguir delineados.
64

3.1 - O MOVIMENTO DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS EM SÃO PAULO EM 2015

Fotografia 3. A PM vigiando uma assembleia estudantil em 2015. Fonte: livro Escola de Luta.

O Movimento de Ocupação das Escolas que ocorreu em São Paulo em 2015,


conforme salientado na introdução, teve início na segunda quinzena do mês de
setembro e a causa foi a política do governo paulista denominada Reorganização
Escolar, o que resultaria no fechamento de 92 escolas públicas, afetando mais de
1.000.000 (um milhão) de alunos. A medida em questão e em vias de implementação,
foi pensada e formatada à margem da comunidade escolar, e, considerando o elevado
grau de afetação dos estudantes, impulsionou os secundaristas para a ação de forma
imediata, cujas atividades logo foram conquistando apoio de setores da sociedade.
A razão do movimento estudantil e, por consequência, da ocupação das
escolas, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 27), é que o governo
de São Paulo “anunciava a transferência de nada menos do que um milhão de alunos
da rede pública estadual paulista para que escolas fossem divididas por ciclos”, o que
despertou a insegurança nos alunos e o sentimento de ter o governo agido com
65

arbitrariedade e total falta de planejamento, colocando em risco o direito à educação


de milhares de estudantes da escola pública.
E, de acordo com o demonstrado no capítulo anterior, com base em Poerner
(1968), no passado os estudantes brasileiros lutavam contra uma estrutura
ultrapassada e arcaica e encampavam um rol de “bandeiras” reivindicatórias. Diante
disso, mesmo sendo movimentos com reivindicações transitórias, regionais, e
específicas, eram combatidos com violência desencadeada pelo Estado via aparato
policial. Com isso, o Movimento de Ocupação das Escolas que ocorreu no Estado de
São Paulo em 2015, bem como no Estado do Paraná em 2016, a exemplo do ocorrido
em outras unidades da Federação no decorrer do segundo semestre do mesmo ano,
além do mesmo fenômeno em outros momentos, como é o caso da ocupação da
Escola Estadual Professor Luis Carlos Sampaio, no ano de 2012, na cidade de Nova
Andradina, no Estado do Mato Grosso do Sul, de acordo com Campos, Medeiros e
Ribeiro (2015, p. 57), guardam enormes semelhanças e fortes relações.
Os vínculos de lutas entre os movimentos estudantis do passado e o
Movimento de Ocupação de Escolas ocorrido nos últimos anos são fortes e relevantes.
Os referidos fenômenos, embora se distanciem quanto o momento histórico, se
aproximam e se assemelham em razão das “bandeiras” que defendem, pois em
ambos os casos se vê na resistência e luta estudantil a busca de uma melhor estrutura
escolar e uma educação com qualidade, além de reivindicações mais gerais, como é
o caso daquelas relacionadas ao apoio a outros movimentos e com natureza política
de âmbito geral. Da mesma forma, se aproximam e ao mesmo tempo se assemelham
em razão dos princípios da luta de classes se fazerem presentes em ambos os casos,
o que impulsiona a reação estatal violenta. Observa-se em ambos os momentos
históricos, o Estado combatendo os estudantes através da ação truculenta das forças
policiais, seja ela de forma oficial ou disfarçada, como pode ser constatado pela
citação a seguir retratando a fala de um secundarista paulista que narra o “passo a
passo” e a maneira de agir de servidores públicos e pessoas da comunidade contra
os estudantes.

Na semana que seguiu a essa reunião, a polícia de fato passou a agir de


maneira mais aberta e sistemática que antes, quando foram vistos muitos
casos de assédio moral, pressão psicológica e sabotagens aparentemente
assistemáticas e com graus de violência variados, geralmente mais graves
quando ocorridos durante a noite, longe dos olhos da mídia e do público. A
partir da segunda-feira, dia 30/11, podemos observar exatamente o que foram
66

estas ações de desocupações a força, articuladas em conjunto pelas


Secretarias de Educação e da Segurança Pública, se utilizando de pais e
alunos como massa de manobra (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p.
217).

Já no atual momento histórico, vejamos o que foi dito por juízes do Tribunal
de Justiça de São Paulo por ocasião de julgamento dos litígios entre o Estado e os
estudantes em razão das ações do Movimento de Ocupação das Escolas em 2015,
de acordo com Campos; Medeiros; Ribeiro (2015, p. 167, grifo dos autores), “Soa
estranho a retórica do processo e da própria conduta do Estado de São Paulo,
a perpetuar, aqui, a dificuldade atávica que o Estado Brasileiro tem ao lidar em
momentos sociais, fundada na matriz autoritária da sua gênese”. Por isso, como
é possível perceber, embora se distancie no tempo, as causas das reivindicações
estudantis de ontem, guardam enorme semelhança com o que ocorre atualmente.
E, ainda, quanto à prática reacionária do Estado, no que tange ao Movimento
de Ocupação de Escolas em São Paulo em 2015, se vê a criminalização sem distinção
dos estudantes, o que é feito através de servidores com obrigação legal de educar e
proteger crianças e adolescentes, no entanto, praticam o contrário em cumprimento
das determinações oficiais.

Independentemente disto, é possível afirmar que o Estado, através da Polícia


Militar ou de pessoas ligadas à base da burocracia da Secretaria de
Educação, colocou em prática – para além das campanhas de desinformação
e difamação – uma campanha de assédio e violência diretamente em cima
dos estudantes, na sua maioria, menores de idade que ocupavam as escolas
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 206).

Como se vê, essa realidade, mais uma vez demonstrada, aproxima os


movimentos estudantis relacionados às duas fases históricas distintas, uma vez que
lutam contra o mesmo problema, ao passo que as reivindicações também se
aproximam nos termos já salientados, o que nos dá segurança para afirmar que as
lutas e resistências estudantis da atualidade são continuidade das lutas
implementadas pelos estudantes no passado. No mesmo sentido, em ambos os
períodos, o problema enfrentado é uma estrutura estatal arcaica e segregadora de
direitos, que tem como dinâmica o uso da violência capitaneada pelos órgãos policiais,
no caso ora em estudo, principalmente a Polícia Militar, que age cumprindo a sua
função institucional e original ao mesmo tempo, ou seja, o cumprimento das ordens
oriundas de quem administra o Estado, portanto, da elite que exerce o poder.
67

Fotografia 4. Jovem Ocupante de Escolas sendo preso pela PM em 2015. Fonte Google20

E os vínculos e semelhanças nas relações estudantis não dizem respeito


apenas ao tempo, mas também no que tange ao fator geográfico, pois ultrapassam
fronteiras, já que o Movimento de Ocupação das Escolas brasileiro, quanto fenômeno
de massa, teve forte influência e talvez até o seu nascedouro no movimento estudantil
do Chile, assim como passou pela Argentina, considerando as diretrizes do manual
“Como ocupar um colégio?”, de acordo com o que diz Mariana dos Reis Santos (2016)
no artigo “Ocupação de Escola: O Levante Popular da Juventude Secundarista na
Rede Estadual de Ensino”.

Conforme relatos das primeiras lideranças estudantis a ocuparem as escolas


estaduais em São Paulo, a iniciativa inspirou-se na Revolução dos Pinguins
do Chile, que se originou em 2006. Tal movimento mobilizou maciçamente
estudantes secundaristas em nível nacional, organizando assembleias,
passeatas e, por fim, ocupando instituições e marcando historicamente o
cenário político daquele país. Reivindicava, entre suas bandeiras de luta,
gratuidade do exame de seleção para a universidade, passe escolar grátis e
sem restrição do horário para transporte municipal, melhoria e aumento da
merenda escolar e reforma das instalações sanitárias em mau estado em
muitas escolas (SANTOS, M., 2016, p. 4).

https://www.conjur.com.br/2015-dez-03/pm-viola-lei-ignora-stf-algemar-adolescente-manifestacao
20
68

Aqui, nos reportaremos ao ocorrido em 2012, considerando a resistência


colocada em prática pelos secundaristas de Nova Andradina e assim ousamos com a
seguinte pergunta: Será que o desenrolar das atividades dos estudantes paulistas não
se ancorou, principalmente, nas ações dos jovens da escola do interior do Estado do
Mato Grosso do Sul? Claro, é uma questão que pede resposta, uma vez que o
exemplo dos estudantes sul-mato-grossenses, por ser bem-sucedido, de acordo com
o demonstrado, contribuiu com as lutas estudantis subsequentes.
Com isso, considerando as relações que se observa entre as ações
estudantis no que se refere aos fatores tempo/espaço, novamente se faz necessário
se atentar para o ocorrido em Nova Andradina, e, por isso, precisamos voltar um
pouco no tempo e assim resgatar o acontecimento estudantil do sul-mato-grossense
a rigor do que consta na cartilha “Como ocupar um colégio? ”, técnica e ensinamento
bastante utilizado pelos estudantes paulistas e também pelos paranaenses em 2016.

Por fim, a cartilha se encerra com um exemplo brasileiro de luta: em 2012,


estudantes da escola Estadual Prof. Luiz Carlos Sampaio, em Nova
Andradina, Estado do Mato Grosso do Sul, ocuparam seu colégio como forma
de protesto. Seu objetivo era impedir que sua escola fosse municipalizada.
Conforme o movimento foi bem-sucedido em barrar a proposta do governo
estadual de lá, o manual toma o episódio como emblemático, tal qual a luta
dos estudantes chilenos e argentinos: “Se eles fizeram lá, podemos fazer
também aqui”. (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 5, grifo dos
autores).

Mas, sob o ponto de vista tático e até estratégico, conforme já referido acima,
o bom “vendaval” que impulsionou os jovens paulistas em 2015 e, no ano seguinte,
em 2016, os estudantes paranaenses, foi a cartilha formulada pelos jovens argentinos
por ocasião do Movimento de Ocupação das Escolas ocorrido no Chile, pois “A luta
dos estudantes não começou agora e está longe de terminar. Em 2006 e 2011, o
Chile viveu a ‘Revolta dos Pinguins’, um movimento imenso de estudantes
secundaristas que exigia uma educação pública gratuita e de qualidade”
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, P. 55, grifo dos autores).
Esse movimento estudantil chileno, ocorrido inicialmente em 2006, com
reiteração em 2011, teve vasta e relevante repercussão, inclusive em outros países
Sul Americanos. E significou uma reação às políticas neoliberais praticadas pelo
governo daquele país e, ao mesmo tempo, se engajou na busca de qualidades
educacionais no setor público, pois, na ocasião, os estudantes ocuparam a quase
totalidade das unidades escolares e contaram com o apoio de significativos setores
69

da sociedade, de acordo com o documentário “Lá Rebelion Pinguina21”, dirigido por


Carlos Pronzato e facilmente encontrado no You Tube22.
Considerando a dimensão, importância e objetivos, a repercussão do
fenômeno, após passar pela Argentina, chegou ao Brasil e gerou importante e
relevante influência através da cartilha ou manual denominado “Como ocupar um
colégio?”, sendo inicialmente aplicada no “Movimento de Ocupação das Escolas de
São Paulo em 2015”, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 54). E,
dessa maneira, com as orientações presentes na cartilha, surgiu a ideia das
ocupações no meio estudantil paulista, como se verifica nas palavras da estudante
paulistana da Escola Estadual Fernão Dais, o que ocorreu em conversas via grupo de
WhatsApp, Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 53-54), uma vez que.

[EE DIADEMA – ENTREVISTA – 26/11/15]


Só que aí, nesses milhões de grupos que surgiram no WhatsApp de
reorganização eu vi uma cartilha Do Mal Educado...que, isso, nossa, foi o
ápice do negócio... Eu primeiro já vi: “Como ocupar um colégio?”. Aí eu li
aquilo ali e aí: “Opa! Como assim?! Oi? Aí eu comecei a ler e vi: é uma galera
do Chile que tinha feito isso em 2006...2006 e 2011... foram 2 vezes. Teve na
Argentina também. Aí eu tava lendo e eu: “Caraca”! É loucura... Mas talvez
dê certo! (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, P. 54-55).

Com relação ao coletivo “O Mal Educado”, propriamente dito, conforme


Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 59-80) é composto por jovens e estudantes de
São Paulo, teve uma formação crescente e gradual e atuação fundamental no
decorrer de todo o movimento. Com uma existência que antecedeu as atividades dos
estudantes de 2015, se fez presente em todas as fases, seja na ocasião em que os
secundaristas, tanto no interior, quanto na capital, estavam fazendo apenas passeatas
e protestos, ou seja, na fase secundaria de ocupação ou na fase final, quando o
movimento mudou de tática e passou a fazer os fechamentos de ruas, cruzamentos e
avenidas. O coletivo esteve presente no movimento orientando, dando suporte e
informando estudantes e comunidade de um modo geral sobre o andar das atividades

21 Documentário sobre os motivos, desenrolar e consequências do movimento estudantil chileno de


2006, cujo fenômeno reuniu mais de um milhão de secundaristas contra o sistema escolar vigente. Com
isso, após os protestos de rua e ocupações de colégios, os estudantes do Chile, passaram a ser
denominados “Os Pinguins”, considerando a trajetória de luta e as características dos seus uniformes.
Trata-se de uma produção ganhadora do Prêmio Especial do Júri na XXXVI Jornada Internacional de
Cinema da Bahia (2009) e do Prêmio Internacional Roberto Rosellini, no Festival de Maiori, na Itália
(2009).
22
https://www.youtube.com/watch?v=3J_5EVhJaJQ
70

dos secundaristas e também das ações do Estado e do contra movimento, sendo elas
violentas ou não.
Assim, com a influência dos estudantes chilenos, espelhados na ocupação
da escola Professor Luis Carlos Sampaio, da cidade de Nova Andradina no Mato
Grosso do Sul e seguindo os passos traçados pela cartilha “Como ocupar um
colégio?”. Esse movimento estudantil paulista, que teve início na segunda quinzena
do mês de setembro de 2015 (24/09/2015), se estendeu até a primeira quinzena de
dezembro do mesmo ano (05/12/2015). Nesses cerca de dois meses e meio, o
movimento ocupou em torno de 200 (duzentas) escolas e envolveu milhares de alunos
e integrantes da comunidade paulista, tendo por objetivo evitar que o governo paulista
fechasse 92 (noventa e duas) unidades escolares no Estado (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, P.29-30/287-288).
E com o fim de conter o movimento estudantil que estava se desencadeando,
o chefe da Secretaria Estadual de Educação, na tentativa de explicar a política
educacional em vias de implementação veio a público com os termos seguintes, de
acordo com o que consta no livro “Escola de Lutas” (2015).

O secretario esclareceu que a intenção era dividir as escolas por ciclos:


apenas Ensino Fundamental I ou fundamental II ou Médio. Das mais de 5.000
escolas estaduais de São Paulo, pouco mais de 3.000 atendem a dois ciclos
e quase 500 atendem aos três. Segundo o secretário, o “movimento” era para
que cada escola se voltasse para um único ciclo e, assim, o estado pudesse
focar no Ensino Médio, que é de sua responsabilidade exclusiva (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, P. 28).

Ocorre que muitos estudantes ficaram sabendo da chamada reorganização


escolar do governo através dos meios de comunicação, outros na hora de realizar a
matrícula e, o que é pior, não poucos através dos colegas já se articulando para
organizar o movimento de resistência à inesperada política governamental. Tal
contexto demonstrou total fracasso da gestão da Secretaria de Estado da Educação,
bem como não apenas descaso com a comunidade escolar, mas também total
desleixo ao informá-la, consubstanciando-se em uma política impositiva e que, em
nenhum momento, levou em consideração as condições, dificuldades e
principalmente os direitos dos estudantes assegurados pela legislação (CAMPOS,
MEDEIROS, RIBEIRO, 2015, p. 31).
Dentre as incontáveis reações dos alunos, eis o que dizem Ana Paula de
Oliveira Corti, Maria Carla Corrochano e José Alves da Silva (2016), no artigo “Ocupar
71

e Resistir: A Insurreição dos Estudantes Paulistas”, onde se observa que as escolas


foram ocupadas de fato e amplamente, inclusive, com substituição do modelo vertical
e hierarquizado de administração, pela forma horizontalizada, o que perdurou durante
toda a fase de resistência desencadeada pelos ocupantes.

Os estudantes se apoderaram da escola no sentido amplo, tanto do espaço


físico quanto no campo simbólico e político. Uma vez trancados os portões,
apenas as pessoas por eles autorizadas poderiam ter acesso à escola. Não
seria exagerado afirmar que o evento foi inesperado; numa rede escolar
vertical, hierarquizada e burocratizada, nada parecia indicar uma ação
transgressora com tamanha força e poder (CORTI; CORROCHANO; SILVA,
2016, p. 3).

Diante desse contexto, o governo paulista se esforçou para convencer a


comunidade escolar e principalmente os alunos e familiares de que estava
implementando uma política de melhorias na qualidade educacional no setor público,
porém, essa pretensão não frutificou, considerando ser evidente o objetivo de fechar
escolas com vistas à diminuição de despesas. Assim, tratava-se de mais um exemplo
de política neoliberal, conforme ocorreu no Chile e motivou a já mencionada
“Revolução dos Pinguins”.
Nesse sentido, chamando a atenção para as reais pretensões
governamentais, se encontra a fala do líder do Movimento dos Trabalhadores Sem
Teto (MTST), Guilherme Boulos, em apoio ao movimento dos estudantes de São
Paulo. O apoio de Boulos coincidiu com o momento em que aumentava a adesão
popular tão necessária, quanto almejada pelos estudantes, ao mesmo tempo em que
denunciou que a pretendida reorganização anunciada pelo governo paulista, na
realidade, era apenas um ajuste fiscal.

Ao mesmo tempo, os movimentos populares também entraram de maneira


mais assertiva no debate sobre o fechamento das escolas. A Central de
Movimentos Populares (CMP) já havia soltado uma nota na qual orientava
suas entidades a discutirem “a conveniência” de ocupar as unidades que
seriam fechadas e “transformá-las em áreas de lazer, esporte, cultura ou
até mesmo em moradia popular”. Já Guilherme Boulos, um dos principais
dirigentes do MTST (e da recém-lançada Frente Povo Sem Medo), declarou
aos Jornalistas Livres que “as escolas que fecharem perto das nossas
ocupações, onde estão os trabalhadores sem-teto, nós vamos ocupar e
vamos reabrir”, e denunciou a “reorganização” como “um ajuste fiscal que
corta direitos” (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 75, grifos dos
autores).
72

E as reais pretensões do governo com o fechamento das escolas, contenção


de despesas e adoção da cartilha neoliberal, não transparece apenas na fala do líder
comunitário Guilherme Boulos, mas também no próprio discurso oficial, conforme se
constata no que diz o secretário de educação José Renato Nalini, medidas que, de
acordo com o que diziam os estudantes, agravariam ainda mais os carentes níveis de
qualidade da educação pública paulista. E essa visão oficial, no que se refere à
implementação das políticas educacionais no setor público paulista, a pesquisa
demonstra que não se refere apenas à vontade individual de uma ou outra autoridade,
mas sim de medidas de governo, uma vez que os secretários se sucedem na pasta,
já que Hernan foi sucedido por Nalini, porém as ações de contenção extrema de
despesas prosseguiram, conforme a citação seguinte.

Ex-comentarista do Jornal Cultura, Nalini publicou um artigo muito revelador,


de opinião política e pessoal, no site institucional da Secretaria de Educação:
“A sociedade órfã”. O novo secretário não esconde sua visão sobre o papel
do Estado que, segundo ele, deve ser mínimo, restrito à certas “missões
elementares”, nas quais o direito social à educação pública, embora
assegurado constitucionalmente, não estaria contemplado. [...] Enquanto
Hernan, um engenheiro de formação, tinha uma “justificativa pedagógica”
para o corte de gastos (a “reorganização” implicaria melhores índices de
desempenho), Nalini passa a professar uma justificativa moral para o ajuste
fiscal, aliando conservadorismo e ultraliberalismo, chegando até mesmo a
sugerir que as mães dos alunos deveriam se encarregar da merenda dos
filhos para que o Estado gastasse menos (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIROS, 2015, p. 318, grifos dos autores).

Aí está, portanto, a demonstração das reais intenções do governo paulista e


que levou ao desaguar do movimento estudantil ora em estudo. Contenção de
despesas e ultraliberalismo como regra, mesmo diante de um sistema educacional
cheio de enormes e visíveis necessidades a serem sanadas.
A falta de qualidade escolar em São Paulo é presente nas falas dos
estudantes, o que evidencia a carência de investimentos no setor público,
demonstrando que a política a ser adotada deveria ser outra e não a que o governo
pretendia colocar em prática, ou seja, fechar unidades escolares e atingir milhares de
alunos conforme disse o próprio secretário da pasta. No mesmo sentido, vejamos a
citação seguinte, uma vez que os autores salientam a vontade juvenil com vistas à
busca de uma escola que esteja de acordo com a atualidade e pautada nos valores
humanos, portanto, de acordo com os anseios dos estudantes.
73

Revelava-se o desejo por uma escola e por uma aula que tivessem sentido e
fossem significativas, que abordassem as dimensões fundamentais da
existência, da experimentação, da descoberta de si e do outro, tão próprias
da adolescência. As ações desencadeadas por esses jovens no espaço da
escola podem ser concebidas como atos políticos no sentido mais amplo do
termo, pois recolocam a dimensão da cidadania no espaço escolar (CORTI;
CORROCHANO; SILVA, 2016, p. 12).

E de acordo com as falas dos estudantes, também ocorria a evasão escolar,


uma enorme dificuldade quanto ao acesso e permanência dos jovens na escola e em
sala de aula, o que acontece justamente em razão de estarmos sob a vigência da
sociedade de classe, o que impede a ocorrência de serviços educacionais de acordo
com as necessidades de todos. Por isso, na visão dos ocupantes, é injustificável o
fechamento de escolas e facilmente compreensível a revolta dos estudantes. Vejamos
o que diz um secundarista da Escola Estadual Emiliano Di Cavalcanti, conforme
descrito pelos autores do livro “Escola de Luta” (2015).

[EE EMILIANO DI CAVALCANTI – YOUTUBE (WTV BRAIL) – 20/11/15]


[...] eles avisaram na sexta, mas desde o ano passado eles tão querendo isso,
eles estão falando que não tem vaga. Tem morador aqui no BNH, que é o
condomínio que tem aqui em volta, querendo entrar na escola e não pode
porque não tem vaga e depois eles vêm falar que não tem aluno... Têm várias
procuras aqui, pessoal liga direto e falam que não tem vaga... então a gente
fica chateado, a gente não sabe nem o que faz [...]. Pessoal não quer ouvir a
gente. A gente tenta fazer uma manifestação e o pessoal não quer ouvir a
gente (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 38).

E esse processo de resistência e de reivindicação dos estudantes paulistas


foi desencadeado em 3 (três) fases bem definidas e considerando as peculiaridades
do fenômeno e o andar dos enfrentamentos entre secundaristas e governo. Com
relação à primeira fase, que se refere aos protestos e passeatas, se estendeu de
23/09/2015 até meados de outubro de 2015 (Campos, Medeiros e Ribeiros, p. 35-51).
Já a segunda fase, que por sua vez se refere às ocupações das escolas propriamente
ditas, desenrolar no qual os estudantes ocuparam as cercas de 200 (duzentas)
unidades escolares, se estendeu da segunda quinzena de outubro de 2015 até a
segunda quinzena do mês de novembro de 2015 (Campos, Medeiros e Ribeiros, p.
83-210). Por fim, a última fase das ocupações em São Paulo, mesmo os alunos tendo
mantido as atividades das duas primeiras fases, as de destaque se referem aos
trancamentos de ruas e avenidas nas cidades paulistas e se estendeu de meados de
novembro de 2015 até o princípio de dezembro de 2015, quando o governo paulista
74

cedeu e publicou o decreto governamental nº 6.192/2015, revogando a


Reorganização Escolar (Campos, Medeiros e Ribeiros, p. 238-290).
E diante da realidade da ocupação, por todos os motivos que levaram ao
surgimento do Movimento de Ocupação das Escolas, tendo por premissa fundamental
a decisão oficial de fechar as unidades escolares, os estudantes estavam
inconciliáveis e sempre deixaram claro que jamais iriam ceder e que não teria “arrego”
para o Governo de São Paulo, contexto no qual demonstraram consciência dos seus
objetivos, conforme Eduardo Donizeti Girotto (2016).

E aqui se destaca a importância da organização dos estudantes


secundaristas e da luta que têm realizado. Em nossa perspectiva, eles têm
sido os principais sujeitos da construção dessa nova política de espacialidade
na escola pública. Com seus corpos, desejos e sonhos, destituíram a escola
da narrativa unitária que buscava totalizá-la. Construindo outros discursos,
práticas e ações, fizeram, no limite, outra escola, outra espacialidade.
Expondo a arbitrariedade de um projeto que não os reconhece como sujeitos,
os secundaristas tomaram para si as escolas e, em sua simultaneidade de
coexistência, têm construído a luta por outra escola pública (GIROTO, 2016,
p. 17).

E os apoios aos ocupantes, já na primeira fase, também começam a se


expandir a partir de professores e setores da comunidade, inclusive dando suporte
estrutural e doando alimentação, o que foi de fundamental importância ao movimento
e aos estudantes que se encontravam no interior das unidades escolares.

Um professor da rede estadual de Osasco que milita no OCA (Osasco Contra


o Aumento – movimento que luta pela Tarifa Zero) fez a conexão entre O Mal
Educado e os estudantes que estavam se mobilizando na cidade contra a
“reorganização”. Com a troca de contatos, uma integrante d’O Mal Educado,
secundarista, pôde auxiliar os alunos do “Fund II” na ocupação do Heloísa,
dando suporte, ajudando a fazer um jogral, tentando chamar apoio para trazer
comida e tirando fotos (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 90, grifo
dos autores).

E também na primeira fase, ou seja, já no início do fenômeno, se constata


que os estudantes paulistas se preocuparam com a comunicação, pois é possível vê-
los se organizando nas redes sociais de forma ativa e colocando em prática elevado
número de publicações convocando os colegas para a luta, a teor do que consta na
dissertação “O Movimento de Ocupação das Escolas e as novas formas de fruição da
juventude escolarizada nas classes populares no Brasil”, escrita por Mariana
Junqueira Camasmie, tendo a autora realizado estudos sobre o fenômeno nos
estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Goiás.
75

O ponto de partida foi o Estado de São Paulo, onde a luta dos estudantes
secundaristas teve início por meio de mobilizações via aplicativos de redes
sociais tais como Facebook, grupos de whatsApp, além do próprio cotidiano
escolar. Determinados mecanismos de midiatização permitiram aos
estudantes uma relativização da fronteira entre o dentro e o fora do espaço
escolar, possibilitando, dessa maneira, a publicização das questões que
englobam problemas da escola (CAMASMIE, 2018, p. 79).

E as ocupações rejeitando o princípio da hierarquia estabelecido na


sociedade adotaram a experiência da horizontalidade, bem como fizeram, ao longo
de todo o processo, uma gestão democrática e coletiva no interior das escolas
ocupadas, pois de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 128), “Mesmo
as questões mais prosaicas são submetidas a um processo decisório reflexivo coletivo
– a assembleia”.

Evidentemente, não existe um modelo perfeito de “autogestão horizontal” e


surgem desafios no caminho, pois são seres humanos que cresceram e foram
socializados em uma sociedade hierárquica, e estruturas de poder
profundamente enraizadas não podem ser magicamente desaprendidas.
Porém, ficou claro que os secundaristas conceberam as ocupações como
espaços democráticos e horizontais, não apenas pelas orientações do
manual “Como ocupar um colégio?”, mas também por um simples desejo de
que ali fosse um espaço diferente do que costumavam viver na escola
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 128).

Com isso, diante da adoção do princípio da gestão horizontalizada, os alunos


das ocupações, de início, já se diferenciaram do que ocorria cotidianamente no interior
das escolas, já que a direção, por obvio, sempre adotou o princípio da verticalidade,
cujos principais afetados sempre foram os estudantes, já que impedidos de participar
da formulação da política escolar praticada. Dentro do modelo adotado pelos
ocupantes, obrigatoriamente, todas as tarefas eram executadas de forma coletiva, o
que fortaleceu o estabelecimento de vínculos entre os secundaristas integrantes do
movimento, já que.

Segundo o que recomenda o próprio manual, a lógica mais comum de


organização da dinâmica das ocupações foi a criação de comissões
responsáveis pelas necessidades básicas. Assim, em grande parte
encontramos a “comissão de limpeza”, a “comissão de cozinha”, a “comissão
de comunicação” e a “comissão de segurança”. Em uma escola em Santo
Amaro, na zona Sul de São Paulo, os alunos fizeram um vídeo explicando
detalhadamente a separação de tarefas e procedimentos (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 130).
76

Dessa forma, com o andar das ocupações e a massificação do movimento,


as atividades do dia a dia eram colocadas em prática pelos secundaristas no interior
das escolas ocupadas, sempre privilegiando o conteúdo formativo único e preciso, o
que abrangia desde o político até o psicológico, uma vez que.

A cada dia o mesmo exercício se repete, fazendo da ocupação um espaço


formativo único e preciso, como os próprios estudantes reconheceram. O
aprendizado percebido é de diferentes ordens: vai do político ao psicológico
e rompe radicalmente com o que aprendiam na escola (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 133).

E a gestão compartilhada promovida pelos alunos ocupantes no interior das


escolas ocupadas, de acordo com o que demonstra esta pesquisa, trouxe-lhes
conhecimentos novos e amadurecimento no que tange não somente a tomada de
decisão, mas também no que se refere às relações e interações com os colegas e
demais pessoas da comunidade, uma vez que.

No movimento, princípios como: autogestão, ação direta, apoio mútuo e


solidariedade foram afirmados, não como discursos, mas como ações
cotidianas daqueles que, cansados de serem tratados como números,
afirmaram-se como sujeitos do seu próprio processo formativo. Após um mês
de ocupações, o governo estadual viu-se obrigado a recuar, decretando a
suspensão do projeto e prometendo construir o diálogo com a sociedade civil
(GIROTO, 2016, p. 3).

E mais, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 137), “A


naturalização da divisão sexual do trabalho é categoricamente recusada pelas
estudantes. Se elas protagonizaram o ato de ocupar a escola, por que deveriam
aceitar passivamente os papéis atribuídos de forma discriminatória às mulheres?”. Na
verdade, no interior das ocupações e ao longo do processo de reivindicação e de
resistência, ao demonstrar toda a energia que possuíam para se opor ao governo em
relação à política de exclusão que pretendia implementar, os coletivos estudantis
também externaram a vontade de vivenciar uma nova forma de administrar, oposta à
forma que impedia a participação dos estudantes na gestão e, por isso, no decorrer
do processo de ocupação, o método horizontalizado se estabeleceu.

Como o estudante destacou, este tipo de debate não era facilmente acessível
para muitos. Pelo contrário, as escolas em sua maioria reproduzem as
opressões – em uma escola em Santo André visitada pelos autores, por
exemplo, lia-se em um cartaz grande no mural: “Evite um estupro, vista-
se”. Esse é apenas um exemplo entre vários, pois não faltam depoimentos
77

de meninas sobre as discriminações que já sofreram por parte de professores


e diretorias, em especial a culpabilização da vítima em casos de assédio
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 140, grifo dos autores).

Ao que demonstra este estudo, no cotidiano no interior das escolas ocupadas,


teve vigência uma gestão coletiva e democrática. O que ocorreu pela via da adoção
do princípio da horizontalidade na tomada de decisão via assembleia, bem como no
que se refere à execução de todas as tarefas e atividades executadas.
E no interior das escolas ocupadas, ao longo do período de ocupação, com
o suporte de apoiadores da sociedade civil (organizações independentes), foram
desenvolvidas atividades culturais e educativas, o que levou os estudantes a uma
nova e rica experiência, propiciando uma nova maneira de ver o espaço escolar e com
isso uma nova visão de mundo e maneira de pensar, de acordo com o que escreve
Letícia Prudência Copiano (2017) no artigo “Atuação dos Estudantes Secundaristas e
as Influências Políticas Culturais: Escola Estadual Caetano de Campos”.

A forma descentralizada do movimento secundarista influenciado não só


pelas redes, mas a democracia direta com a tomada de decisão em
assembleia e a distribuição igualitária nas tarefas caracterizaram o
movimento. É interessante destacar também, o grande objeto de inspiração
e organização das ocupações: uma cartilha online escrita por estudantes
argentinos e chilenos que foi traduzida e adaptada a fim de servir como
orientação para as ações de grande parte dos secundaristas que ocuparam
as escolas (COPIANO, 2017, p. 10).

E no mesmo entendimento de Copiano (2017), se encontra o constatado no


livro “Escola de Luta”, pois os autores salientam que a questão de fundo quanto ao
descontentamento dos estudantes paulistas seria em razão do sistema de ensino ser
desestimulador como um todo, inclusive em razão da falta de atividades culturais,
além da escola não aproveitar o potencial dos alunos. E nesse sentido, no decorrer
do processo de ocupação, os ocupantes fizeram o debate nas redes sociais
demonstrando essa realidade não querida pelo meio estudantil e reivindicando
modificações que atendessem as pautas dos secundaristas, conforme o que segue.

A questão principal parece ser o descontentamento com um “ensino


desestimulador” em diferentes níveis, pois, desde as aulas de matemática
até a falta de atividades culturais, a escola atual não “estimula as coisas
boas que existem nos estudantes [EE Fidelino Figueiredo – Facebook –
27/11/15}. Uma questão levantada por muitos, tanto no Facebook quanto nas
entrevistas realizadas, foi o descontentamento com o fato de que a maioria
das aulas consiste em copiar conteúdos na lousa e “[...] decorar coisas para
fazer provas que não querem dizer nada quanto ao conhecimento do
78

aluno” [EE Frei Dagoberto Romag – Facebook – 320/11/15] (CAMPOS;


MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 153, grifos dos autores).

E, já no início da segunda fase das reivindicações estudantis, no decorrer do


mês de outubro de 2015, o Estado já mostra as suas “garras” através da Polícia Militar,
se opondo às ocupações e contrariando as reivindicações dos estudantes. E o que é
pior, sempre usando forças de forma despropositadas e desproporcionais com o
objetivo claro de intimidar e oprimir em pleno Estado Democrático de Direito, onde os
processos reivindicatórios são direitos assegurados na legislação, porém foram
enormemente desconsiderados pelo governo de São Paulo, conforme é possível
observar na citação seguinte.

A atuação da PM que teve maior visibilidade nesta primeira semana de


ocupações foi o cerco policial à EE Fernão Dias. Já no dia 10, a Polícia Militar
foi enviada para a escola. Com o passar do tempo, o cerco chegou a contar
com uma centena de policiais, sem contar as viaturas e camburões. Segundo
reportagem do G1, a Secretaria Estadual de Educação “registra boletim de
ocorrência por depredação ao patrimônio público”. Em resposta à
presença dos camburões, os alunos cantavam: [...] (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p.94, grifo dos autores).

Nessa toada, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 95-98), a


Procuradoria Geral do Estado (PGE), ajuíza Ação de Reintegração de Posse com
vistas à obtenção de liminar para conseguir a retomada das escolas ocupadas. A
pretensão do Estado foi deferida pelo Poder Judiciário em despacho proferido pelo
Juiz de Direito Felipe Ferrari Bedendi em 12 de novembro de 2015, ocasionando uma
série de “dissabores” aos estudantes e à comunidade escolar, pois a tentativa de
conciliação fracassa e a reintegração de posse era esperada como certa e de acordo
com os métodos que a Polícia Militar, reiteradamente, vinha usando em ocasiões
pretéritas, quais sejam, a violência.
Assim, conforme Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 98) “A perspectiva
ainda era tensa e preocupante. Alguns falavam do risco de um “novo Pinheirinho”,
referindo-se à violenta reintegração de posse de uma ocupação em São José dos
Campos em 2012”.
Porém, para a surpresa dos estudantes e seus apoiadores, na noite de sexta-
feira, dia 13 de novembro, o magistrado altera sua compreensão do caso e assim
suspende a liminar de reintegração de posse das escolas ocupadas. Para tanto, o juiz
utilizou, basicamente, três argumentos na sua decisão para a suspensão da medida
79

deferida no dia anterior em favor do Estado, sendo eles os seguintes: que as


ocupações não possuíam natureza possessória e sim de protesto; que eventual
desocupação não impediria o avanço dos estudantes; que o movimento era composto
por crianças e adolescentes protegidos pela legislação vigente.

Em primeiro lugar, o juiz reconheceu que as ocupações não tinham intenção


de tomar a posse da escola e sim tinham “caráter eminentemente
protestante”. Deste modo, fica provisoriamente legitimada no Poder
Judiciário a ocupação de escolas enquanto forma de manifestação: não se
trata de questão de posse e sim de política (e de política pública). Em
segundo lugar, caso se mantivesse a ordem de reintegração de posse, nada
impediria a expansão das ocupações de escolas [...]. E em terceiro lugar, o
juiz se refere ao “fato de que a maior parcela dos ocupantes é de
adolescentes ou crianças”. A partir do Estatuto da Criança e do
Adolescente, ele remete ao “dever de todos velar pela dignidade da
criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento
desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 98, grifos dos autores).

No entanto, o Estado por seu turno, não reconhecendo os direitos estudantis


e das crianças e adolescentes em especial, se manteve a margem das possibilidades
de construção de consenso com o movimento e totalmente avesso à possibilidade de
revogação do decreto de reorganização. Com isso, a Polícia Militar manteve a postura
de outrora, em que pese os limites estabelecidos judicialmente.

A justiça começou a estabelecer um limite para a via militarizada pela qual o


governo Alckmin planeja lidar com as ocupações, abrindo espaço para que o
movimento dos estudantes se expandisse, mas a violência policial na
abordagem às ocupações continuará nas semanas seguintes, embora de
modo mais silencioso, com intimidações, assédio moral, ameaças, pressão
psicológica para desestabilizar os ocupantes, sabotagem e eventualmente
invasões da escola e uso de violência física (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p. 101).

Mesmo com todos os obstáculos impostos pela Policia Militar, direções de


escolas e Secretaria de Educação, os secundaristas conseguiram fazer as ocupações
acelerarem de forma impressionante e de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro
(2015, p. 11), “apenas na virada do final de semana para segunda-feira dia 16/11, o
crescimento é da ordem de mais de 80%. A semana se encerra no domingo dia 22/11
com 89 escolas ocupadas no total, o que significa uma média de 8,2 escolas ocupadas
por dia durante este período”. Por isso, é seguro dizer que mesmo com todo o esforço
do governo e truculência da PM, não conseguiram impedir o avanço estudantil na
busca dos propósitos de manter as unidades escolares em funcionamento.
80

Como os estudantes não desistiam e com um movimento disseminado por


todo o Estado de São Paulo, com o passar dos dias e semanas vão ganhando terreno
e dessa forma expondo um contexto de reivindicações a par da pretensão de combater
a política de reorganização ou de fechamento de escolas.

Por fim, como a “reorganização” foi interpretada como mais um exemplo do


descaso do governo, as ocupações contra ela se tornaram a expressão de
um “basta”; um grito geral de que os estudantes possuíam sim opinião. Uma
ocupação em Jundiaí, por exemplo, inaugurou sua página no Facebook,
dizendo que haviam ocupado a escola no dia anterior “para mostrar ao
governo que os alunos possuem voz, que lutamos [...] e vamos
continuar lutando” [EE Barão de Jundiaí – Facebook – 24/11/15]. Em
Araraquara, os estudantes anunciavam: “[...] Não somos massa de
manobra do estado e infelizmente pensamos. Assim, cansamos de
aturar o descaso com que nos tratam” [EE Lysanias de Oliveira Campos –
Facebook -27/11/15] (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 113, grifos
dos autores).

E, dessa forma, os estudantes chegaram a cerca de 200 (duzentos)


ocupações no Estado ainda no mês de novembro de 2015, sem que fosse possível
avaliar se houve um procedimento padrão para tanto, o que demonstra o perfil
horizontal do Movimento de Ocupação das Escolas, pois.

Como é impossível avaliar se houve um procedimento padrão nas cerca de


200 ocupações, tanto do lado dos estudantes ocupantes quanto dos outros
atores, a exposição aqui se limita a alguns casos que ilustram a variedade de
situações vividas e quais os fatores mais determinantes naqueles primeiros
momentos de consolidação de uma ocupação (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p. 118).

E mesmo diante da consolidação do movimento, o interesse do governo em


manter a política de reorganização escolar que havia formatado, desconsiderando a
total resistência dos estudantes, decisões judiciais no sentido contrário e vasto apoio
na sociedade a favor do Movimento de Ocupação das Escolas, chegou ao ponto de
medidas praticamente extremas, uma vez que adotou estratégias praticamente
bélicas contra os secundaristas, de acordo com as citações que seguem.

No início da tarde do domingo, dia 29/11, o coletivo Jornalistas Livres divulgou


em sua página no Youtube um áudio que havia sido gravado apenas algumas
horas antes, em uma reunião chamada às pressas por Fernando Padula,
chefe de gabinete do então secretário de Educação Herman Woorwald, com
cerca de 40 dos dirigentes regionais de ensino do Estado. A gravação foi
obtida pela jornalista Laura Capriglioni, que se infiltrou na reunião sem
dificuldades (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 207).
81

E o referido e revelador áudio, que se tornou público à revelia do governo


paulista, não deixou dúvida da postura oficial demonstrando descompromisso com o
meio estudantil, já que ao invés de evidenciar preocupação com um projeto
educacional público de qualidade para todos, externou uma estratégia pautada em
meios sorrateiros contra os secundaristas em movimento, e o que é pior, de acordo
com a citação seguinte, englobando três competências: a Polícia Militar, Secretaria de
Segurança Pública e Secretaria de Educação. Com isso, o áudio em referência
divulgado pelos jornalistas livres expõe as estratégias do governo e deixa claro que
seriam usados todos os meios necessários para desvirtuar o movimento dos
estudantes e assim colocar em prática a política de fechamento das escolas, de
acordo com o que pode ser observado na publicação feita via Youtube e constante no
livro Escola de Lutas. Assim, segue um trecho do áudio no qual um indivíduo
integrante da reunião governamental dizia.

Este áudio é esclarecedor e coloca em perspectiva os meios de repressão


que foram descritos enquanto estratégia articulada entre a base da burocracia
da Secretaria e sua cúpula, em conjunto com a Secretaria de Segurança
Pública e a Polícia Militar, mesmo que as três partes pudessem
eventualmente agir e tomar iniciativas de maneira mais ou menos autônoma,
tendo a gravidade dessas ações variada entre diferentes ocupações,
conforme já mencionado [...]. [JORNALISTAS LIVRES – YOUTUBE –
29/11/15] [...] nós estamos no meio de uma guerra e temos que nos preparar
pra continuar enfrentando. Eventualmente a gente perde algumas batalhas,
mas temos que ganhar a guerra final. Então, pra isso, a gente tem que parar
um pouco e traçar algumas estratégias (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO,
2015, p. 208).

No entanto, tendo os objetivos definidos e estratégias estabelecidas, os


estudantes prosseguiam com suas atividades nas ruas de São Paulo, inclusive em
disputas dos espaços urbanos com a Polícia Militar ao longo de horas, ocasião na
qual fechavam ruas, avenidas e cruzamentos, o que demonstra uma vasta capacidade
do movimento dos ocupantes de mobilizar, organizar, resistir e reivindicar, tudo com
vistas a concretização de um projeto de educação que estivesse de acordo com os
seus anseios e necessidades do atual período histórico.

Conforme anunciado, o grupo fechou novamente a Faria Lima na altura da


Rebouças, mas em menos de quinze minutos foi dispersado por bombas de
gás atiradas pela Polícia Militar. Era “a terceira vez no dia que respiraram
bomba de gás, mas continuam firmes na luta e com muita disposição”.
Pouco depois, o grupo se reuniu e decidiu voltar a ocupar a via. Reocuparam
e foram novamente atacados pela polícia. Repetiram esse processo por
quase cinco km ao longo de toda a Faria Lima até a altura da Berrini onde
82

três estudantes foram detidos (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p.


249, grifo dos autores).

Com isso, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 255),


observa-se que “A inesperada virada tática de realizar a ação direta de trancar ruas e
avenidas, ainda mantendo as ocupações de escolas, foi crucial para o movimento”,
uma vez que precisou articular forte apoio perante a comunidade, bem como junto às
instituições com vistas a atingir esse objetivo.

No começo de dezembro, a forma ocupação já teria “virado o piso”, como


disse o estudante da EE Antonio Manoel citado no início desta seção, e seria
difícil fazer frente ao padrão repressivo e autoritário subterrâneo da
burocracia estatal sem uma mudança significativa de postura. A aposta –
catalisada pelo setor mais autonomista do movimento, mas com uma adesão
espontânea de outros estudantes – era arriscada e trazia ainda mais
evidencia pública para a luta dos estudantes. Para barrar a “reorganização”,
eles precisariam, além disso, do apoio tanto da população quanto de
determinadas instituições (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p.255).

E a presença e mobilização dos contrários também foi uma realidade. No


entanto, para além disso, a adesão da comunidade e artistas aos interesses dos
estudantes ocupantes foi muito forte, uma vez que receberam apoio estrutural e
suporte na área cultural, o que fortaleceu os objetivos dos secundaristas de resistir à
política do governo e assim o fizeram.

No processo, tratava-se também de gerir coletivamente os conflitos com a


polícia, os assédios sofridos por parte de alguns docentes e diretores, as
resistências de familiares, bem como o apoio recebido da comunidade
externa. Embora tenha havido críticas de parte das comunidades escolares
às ocupações, as manifestações de solidariedade recebidas foram bastante
significativas, expressando-se na doação de alimentos, água, sacos de
dormir, itens de higiene pessoal, e na oferta de atividades diversas, como
shows e atividades culturais, palestras, oficinas e cursos (CORTI;
CORROCHANO; SILVA, 2016, p. 12).

A simpatia ao movimento oriundo de pessoas ligadas à defesa da educação


pública estava presente, porém se transformou em apoio, ao mesmo tempo em que
vieram se somar na defesa da proposta estudantil uma série de outras grandes
agremiações formadas por grandes contingentes de pessoas, inclusive torcidas
organizadas das agremiações esportivas.

Se o posicionamento favorável aos estudantes vindo de intelectuais e


organizações ligadas à defesa da escola pública não eram surpresas,
também houve apoio político inesperado de outros atores. As torcidas
83

organizadas do Corinthians e do São Paulo – Gaviões da Fiel, Independente


e Dragões da Real – declararam publicamente apoio, oferecendo ajuda e
defendendo a legitimidade do movimento (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO,
2015, p. 260).

Assim, diante de um vasto apoio na sociedade, os estudantes ainda


conquistaram a adesão de artistas, já que de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro
(2015, p. 263), “A aproximação com uma espécie de mainstream da produção cultural
paulistana com relação ao movimento das ocupações atingiria seu ápice nos dias 6 e
7 de dezembro, com a virada das ocupações”. E nesse mesmo sentido Camasmie
(2018), uma vez que a enorme participação de artistas famosos em show apoiando
os estudantes demonstra o apoio que obtiveram na sociedade em torno do combate
à política de Reorganização Escolar proposta pelo então govenador Geraldo Alckmin.

O ápice das ocupações paulistanas talvez tenha sido em dezembro de 2015,


com o evento da Virada das Ocupações, que marcou o recuo do então
governador em relação ao projeto de “reorganização escolar”. De acordo com
os organizadores do evento, mais de 20 mil pessoas assistiram às
apresentações que ocorreram simultaneamente em dez escolas ocupadas.
O palco principal foi montado na Zona Oeste de São Paulo e teve como show
de abertura o Rapper Criolo, que subiu ao palco pedindo que fossem
respeitados os cartazes colocados pelos estudantes nas escadas em frente
ao palco com mensagens como: “Governador fala a verdade, educação
nunca foi prioridade!”; “Tira a minha escola e eu tiro o seu sossego”; “Ocupar
e resistir”; “As bi, as gay, as trava e as sapatão, tão tudo organizada pela
educação” . Outros artistas de renome participaram do evento em apoio à luta
dos estudantes secundaristas, como por exemplo, Maria Gadú, Céu, Paulo
Miklos, Arnaldo Antunes, Emicida, Tico Santa Cruz, Chico César, Pitty, entre
outros como Daniel Black que compôs a música “Trono do Estudar”, mais à
frente gravada em estúdio contando com a participação de cerca de 20
músicos. Entre eles(as) estavam, Chico Buarque, Zélia Duncan, Dado Villa-
Lobos, Paulo Miklos, Tiê, etc., “A música foi um sucesso quase instantâneo
nas redes com mais de 200 mil visualizações no Youtube, coroando o
processo de ‘mainstreamização’ da luta contra a reorganização” (idem, p.
265). Ninguém tira o trono do estudar Ninguém é o dono do que a vida dá E
nem me colocando numa jaula porque sala de aula essa jaula vai virar”
(CAMASMIE, 2018, p. 85).

Dessa maneira, de forma visível, os estudantes paulistas, através do


Movimento de Ocupação das Escolas, estavam prestes a atingir os seus objetivos,
em que pese o governo ainda resistir. No entanto, lembram Campos, Medeiros e
Ribeiro (2015, p. 271), “Além dos trancamentos de ruas e do amplo apoio da
sociedade civil às ocupações, um terceiro fator foi determinante no desdobramento do
processo político: a atuação do Ministério Público e da Defensoria Pública estadual
de São Paulo”, que por sua vez vieram e se somaram aos estudantes ocupantes.
84

Nessa toada e ao longo do processo das ocupações, uma série de medidas


jurídicas foram propostas contra o Estado e, de uma maneira ou outra, favoráveis aos
estudantes, considerando proposições da Defensoria Pública e Ordem dos
Advogados do Brasil; ações propostas por Promotores Públicos; decisões judiciais
que contrariavam os interesses do Estado relacionados ao tema posto na discussão
também foram proferidas no período, cujo contexto culminou favoravelmente aos
estudantes, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 271-274).
E, por fim, como tiro derradeiro, Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 274),
colocam que “Finalmente, no dia 03/12, promotores do MP e defensores públicos
entraram conjuntamente com uma ação civil pública no Tribunal de Justiça contra a
‘reorganização escolar’ no Estado de São Paulo inteiro”. Na ação, Promotores e
Defensores Públicos, requereram ao Poder Judiciário que suspendesse os efeitos da
política educacional implementada pelo Estado e que determinasse a realização por
parte do governo de agenda de discussão com a comunidade nos termos previstos
legalmente e com vistas à democratização da gestão escolar.

Além do pedido de que o governo sustasse os efeitos da “reorganização” em


todo o Estado de São Paulo, garantindo que todos os alunos permanecessem
matriculados nas mesmas escolas, a ação pedia que a administração
estadual fosse compelida a estabelecer no ano seguinte uma “ agenda oficial
de discussão e deliberações” sobre a qualidade da educação com as
comunidades escolares, incluindo “audiências públicas amplas”. Tudo isso
sob a pena de “multa diária no valor de 100 mil reais pelo não
cumprimento do determinado nos itens anteriores” (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 277, grifos dos autores).

Por fim, o governo recua. Os estudantes, através do Movimento de Ocupação


das Escolas, venceram uma grande batalha, considerando a informação constante do
Diário Oficial que fora publicada em 4 de dezembro de 2015, embora os secundaristas
tenham mantido um elevado grau de desconfiança diante da decisão do governo.

O recuo do governo, em novembro, e o anúncio da suspensão da


“reorganização” em pronunciamento público pelo governador consolidou a
vitória do movimento dos estudantes. A publicação do decreto nº 61.692/2015
no Diário oficial (SÃO PAULO, 2015) marcava uma grande conquista, poucas
vezes vista em mais de 20 anos de governo tucano. Aos poucos e de modo
diferenciado, impelidos pela violência ou pela avaliação autônoma do
movimento, em meio a hesitações e acordo com diretorias das instituições,
os estudantes foram desocupando as suas escolas. Mas a luta não terminara,
eles sabiam (MORAES; XIMENES, 2016, p. 4).
85

Entretanto, as desconfianças se justificavam, até porque após mais de 2


(dois) meses de muita disputa política e jurídica, resistências, mobilizações,
articulações e, enfim, muito trabalho, sem contar as pressões e até humilhações, uma
solução assim quase inesperada, sem dúvida, determina que se fique alerta. E, além
de tudo, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 279), “O decreto havia
sido assinado no auge da crise não fazia nem três dias e, dois dias antes, o chefe de
gabinete da Secretaria anunciara, em declaração, ao Jornal Hoje (da Rede Globo),
que não cogitava voltar atrás na medida”.
E, diante desse contexto, no dia 05/12, embora publicado o decreto
governamental nº 6.192/2015, nos termos acima citados, revogando o ato anterior que
instituiu a reorganização ou o fechamento das 92 escolas, o ambiente no meio
estudantil da escola pública paulista ainda era de muita dúvida. Essa postura dos
estudantes, de desconfiança diante do governo, ocorreu, com certeza, em função das
posturas dos dirigentes do Estado, mas também em razão do elevado grau crítico
adquirido pelos ocupantes ao longo do processo de ocupação, conforme Alcinéia de
Souza Silva (2017).

O que se evidencia é que os jovens se mostram cada vez mais politizados e


críticos em relação aos acontecimentos/realidades sociais, políticos,
econômicos e culturais da época, bem como mais autônomos, enquanto
sujeitos sociais às suas práticas espaciais. Esses sujeitos vislumbram
desafios e possibilidades de novos rumos ao país (SILVA, A., 2017, p. 3).

De acordo Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, p. 290), a desconfiança dos


estudantes em relação ao ato revogatório do governo sempre teve razão de ser,
considerando que “logo após a publicação no Diário Oficial, o coletivo Advogados
Ativistas divulgou uma interpretação do que seria o real significado da revogação do
Decreto 6.192/2015, que nada teria a ver com revogação da política de ‘reorganização
escolar’ e não apresentaria nenhuma garantia”.
E a desconfiança dos aguerridos estudantes, sem muita demora, se
consumou em realidade, uma vez que o governo Alckmin, ao recuar da política de
fechamento das escolas, simplesmente, prorrogou o prazo para o fechamento de
salas de aulas, considerando que em 25 de fevereiro de 2016, poucas semanas após
a decisão de recuar da política de fechamento de escolas, já tinha fechado 1.363 salas
no Estado de São Paulo.
86

Como prova de que o governo Alckmin não havia desistido da


“reorganização”, a APEOESP começou a sistematizar informações sobre o
que passou a ser chamado de “reorganização disfarçada” ou “reorganização
silenciosa”: em vez de fechar escolas (como estava previsto no pacote
anunciado em setembro do ano passado), na prática passou a se fechar
salas. No último balanço ao qual foi possível ter acesso, do dia 25 de
fevereiro, o sindicato apurou que 1.363 salas de aula em todo o estado de
São Paulo haviam sido fechadas. Desta vez, nem foi preciso editar um
decreto ou qualquer outro ato normativo; seriam atos administrativos
rotineiros, que passam ao largo da “agenda de debates e participação
popular”, referida na decisão liminar do juiz acerca da ação civil pública
apresentada pelo MP e pela Defensoria e reivindicada pelos estudantes
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 319-320).

Essa postura do governo de São Paulo, liderado por Geraldo Alckmin,


demonstrou descompromisso com a educação pública. E, é o que transpareceu ao
longo do processo de ocupação das escolas pelos estudantes, uma vez que
demonstrado a fragilidade estrutural do sistema educacional, ausência de diálogo com
os estudantes e a própria comunidade escolar e, para completar, o uso contínuo de
violência policial contra os estudantes. Além de tudo isso, o governo ainda se esforçou
sobremaneira para implementar uma política educacional totalmente contrária aos
interesses do movimento dos estudantes e, uma vez perdendo tanto no meio
estudantil, quanto na sociedade e no Poder Judiciário, quanto à pretensão de fechar
escolas, através de um “Cavalo de Troia”, partiu para o fechamento desmedido e
injustificado de salas de aula. Por isso, considerando o contexto do Movimento de
Ocupação das Escolas em São Paulo, mesmo com a declaração de “guerra” do
governo paulista, os estudantes se sagraram vencedores. Embora o governo, jogando
com “cartas fora do baralho”, tenha tido uma vitória após a finalização do processo em
razão do fechamento das salas de aula, os estudantes no decorrer do período,
“nocautearam” as pretensões estatais e pelo menos seu objetivo político de
fechamento de escolas. Assim, diante do contexto exposto e considerando o que foi
produzido politicamente, é que o Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo
em 2015, influenciou e contribuiu largamente para o movimento estudantil que ocorreu
em 2016 no Estado do Paraná, conforme estudaremos daqui em diante.

3.2 - O MOVIMENTO DE OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS NO PARANÁ EM 2016

O Movimento de Ocupação das Escolas no Paraná iniciou na segunda


quinzena do mês de setembro de 2016, de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski
87

(2016, p. 29), “calçado” em grandes mobilizações estudantis em todo o território


paranaense, considerando que “No dia 22 de setembro de 2016 o Ministro da
Educação, em uma coletiva de imprensa, anunciou a Medida Provisória nº 746. Tal
medida, relativa à reorganização do Ensino Médio brasileiro, trouxe surpresas,
incertezas e muita insegurança para estudantes de escolas públicas” de todo o Brasil.

A repercussão aconteceu imediatamente, com palestras realizadas em


diversas escolas e manifestações estudantis. Mas foi no dia 04 de outubro,
com a informação de que os estudantes do Colégio Estadual Arnaldo Jansen,
em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, tinham
ocupado a escola em reação à MP do Ensino Médio, que a relação dos
estudantes secundaristas com suas escolas começou a contar uma nova
história. Como um rastilho de pólvoras as ocupações de colégios se
espalharam pelo estado do Paraná (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 29).

De início o movimento dos estudantes paranaenses, composto


majoritariamente por secundaristas, se articulava e protestava contra a política do
governo federal constante da Medida Provisória nº 746/2016. No entanto, logo
adiante, foi incorporado ao debate e, portanto, também passou a fazer parte dos
protestos dos estudantes integrantes do fenômeno referido, a Proposta de Emenda
Constitucional nº 241/2016 (Câmara Federal) e nº 55/2016 (Senado Federal), também
de autoria do governo federal, medidas legislativas que modificaram profundamente o
curriculum e o sistema de financiamento da educação pública no Brasil, lesando os
interesses estudantis, assim como as políticas públicas educacionais vigentes no país.

Desde o início até agora (27 dias), o foco é que seja revogada a MP 746/2016,
juntamente com a PEC 241 (agora PEC 55). Nós estamos [...] declarando
nosso repúdio a MP 746/2016 como principal foco, mas no decorrer do
movimento acrescentamos a PEC 241 (Depoimento de jovens secundaristas
do Colégio Estadual Elza Scherner Moro – 31/10/2016)) (DIVARDIM;
SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 33).

E os estudantes paranaenses lutando contra uma política “calçada” no


discurso reorganizador e oriunda do governo federal, com o passar das semanas e o
avanço do movimento, incorporaram à demanda principal, uma série de outras
reivindicações, como qualidade educacional, observância e respeito à legislação
vigente pelas autoridades competentes, além de democracia nas decisões referentes
às políticas para o setor, como é possível observar na citação seguinte.
88

Em outubro de 2016, estudantes do Estado do Paraná iniciaram as


ocupações das escolas na cidade de São José dos Pinhais. E, ao final
daquele mês, a Ocupação já alcançava 850 escolas em todo o Estado, quase
a metade das unidades ocupadas. A crítica dos estudantes se deu,
inicialmente, ao aumento das escolas em tempo integral e à flexibilização das
matérias, e, ampliando seu foco, a mobilização estudantil passou a se
posicionar contra a “PEC do teto de gastos” (a PEC 241), aprovada na
Câmara dos Deputados, que impõe limites aos gastos públicos, contra o
projeto Escola Sem Partido, e contra o projeto de lei da Medida Provisória da
reforma do Ensino Médio MP 746/2016. O movimento de Ocupação no
Paraná pode ser analisado como sendo onde a dinâmica se deu de forma
mais dramática, pois, além de ser o estado com o maior número de escolas
ocupadas, adotaram diversas pautas das demais ocupações, e
representaram um momento em que os estudantes já se mobilizavam em
torno de questões que ultrapassam os muros da escola, pressionando o
governo a retirar as propostas supracitadas (CAMASMIE, 2018, p. 90-91).

No mesmo sentido, segue a fala da estudante Ana Clara, do Ensino


Fundamental de Curitiba, uma vez que se insurge contra a imposição do governo
Temer23 contida na política educacional combatida e ao mesmo tempo reivindica
qualidade e democracia nas formulações das políticas educacionais.

No dia 22 de setembro, o Presidente Michel (fora) Temer anunciou a famosa


reforma (ou deforma) do Ensino Médio. Chamo de Deforma, porque essa
proposta não melhora em nada o sistema educacional, pelo contrário,
acentua ainda mais a desigualdade social além de piorar a qualidade do
ensino, não foi à toa que ela foi imposta, de forma democrática não passaria
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 50).

Com isso, e tendo como foco primeiro o combate às medidas do governo em


vias de serem implementadas, os esforços dos estudantes no Paraná em torno dessa
“bandeira” é um fato concreto, uma vez que se refere a mais um estabelecimento
educacional ocupado. É o que se observa na fala de uma estudante secundarista de
Curitiba, “Sou estudante do Colégio estadual ‘AKN’, tenho 17 anos e moro em Curitiba.
Meu colégio também foi ocupado contra a MP 746 e PEC 55 (Antiga 241)”,
(DIVARDIM, SCHMIDT E SOBANSKI, 2016, p. 71).
E de acordo com o que ocorreu em São Paulo em 2015, o Movimento de
Ocupação das Escolas paranaense de 2016 também se espelhou em acontecimentos

23
A Medida Provisória 746/2016, publicada no dia 22 de setembro de 2016 pelo governo federal e
titulada como: Reorganização do Ensino Médio, tornando optativa nas grades escolares uma série de
matérias, entre elas Filosofia e Sociologia. Na sequência, apresentação da Proposta de Emenda
Constitucional nº 241/2016 (Câmara Federal) e nº 55/216 (Senado), estabelecendo um teto de gastos
públicos no Setor Primário, onde está incluso o educacional, pelo período de 20 anos.
89

estudantis históricos de outrora, sendo de grande contribuição as ações dos


estudantes paulistas e a “Revolta dos Pinguins”, acontecimentos que foram se
espraiando pela América do Sul, e, consequentemente, chegou ao Brasil, primeiro em
São Paulo e no ano seguinte no Paraná, a rigor do que diz Marcielly Cristina Moresco,
ao escrever o artigo “O Corpo ‘Fala’ Politicamente: As Performances Das/Nas
Ocupações Secundaristas do Paraná”.

Esse movimento de ocupação em São Paulo teve grande importância para


as ocupações do ano seguinte, no Paraná. Era unânime a resposta sobre a
inspiração para as ocupações: a mobilização estudantil em São Paulo e a
Revolta dos Pinguins, no Chile (MORESCO, 2017, p. 2).

Como se vê, embora no Estado de São Paulo, em 2015, os estudantes


tenham lutado, no primeiro momento, contra a política de fechamento de escolas
conforme pretendia o Govenador Geraldo Alckmin, enquanto que no Estado do
Paraná a luta se deu contra as medidas do governo federal liderado por Michel Temer,
existe a influência do movimento estudantil paulista no caso dos estudantes do Estado
do Paraná, de acordo com o que reitera a citação seguinte, demonstrado a partir da
fala de uma estudante paranaense e de acordo com o que consta a seguir.

Em 2015 o Estado de São Paulo mostrou ao Brasil como o movimento


estudantil pode ser forte. Em 2016, o Estado do Paraná se assustou com a
mobilização dos estudantes. “Minha escola está ocupada!” era a frase do
momento. Porque a educação está ameaçada! Porque posso ficar sem
estudar Filosofia e Sociologia! Porque ficarei sem aulas de Arte e de
Educação Física! Porque a MP 746 e a PEC 241/55 são um atraso para o
país (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 45).

Assim, em busca de uma escola de qualidade e na luta contra as medidas


em vias de implementação, os secundaristas do Paraná foram portadores de uma
reivindicação com vistas a manter o que já tinham conquistado, se organizaram em
movimento e, dessa forma, a “passos largos”, ocuparam as escolas paranaenses, pois
de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 38), “No dia 10 de outubro,
após uma semana, as ocupações chegam a 21 colégios de Ensino Médio de São José
dos Pinhais e 100 em todo o Paraná. Algo jamais visto antes na história da educação
secundarista” paranaense.
E esse desejo dos estudantes no Estado do Paraná em 2016 de resistir às
proposições do governo federal chefiado por Michel Temer e ao mesmo tempo
denunciar as dificuldades vivenciadas no dia a dia no interior das escolas motivado
90

pela baixa qualidade escolar, é possível constatar pela elevada participação de


estudantes nas assembleias e demais atos que o Movimento de Ocupação das
Escolas organizou, como é o caso do evento realizado em São José dos Pinhais e
registrado através da fotografia abaixo colacionada, ocasiões, nas quais, era
deliberado sobre todas as atividades a serem realizadas.

Fotografia 5. Estudantes em assembleia em São José dos Pinhais. Fonte Google24.

E neste contexto de luta pela manutenção e reivindicação de direitos, a


exemplo do que ocorreu em outras unidades da federação brasileira, o movimento dos
estudantes paranaenses se estendeu até a primeira semana de novembro de 2016,
tendo as atividades o caráter horizontal, uma vez que todas as deliberações e tarefas
eram definidas sempre de forma coletiva, de acordo com Mariana dos Santos Reis

24
http://giroemsaojosedospinhais.com.br/2016/10/10/governo-do-parana-pede-reintegracao-de-posse-
de-escolas-ocupadas/
91

(2016) no artigo “Ocupação de Escola: O Levante Popular da Juventude Secundarista


na Rede Estadual de Ensino”, quando a autora estuda o fenômeno e demonstra que
entre as premissas postas pelos estudantes está a busca de uma escola realmente
plural e de qualidade, já que.

Um dos aspectos mais latentes nas ocupações organizadas pelos estudantes


foi a materialização dos princípios políticos e metodológicos adotados,
refletindo desde a lógica da organização e visibilidade de seus movimentos
políticos até o desdobramento da divisão de tarefas manuais ou intelectuais
entre o conjunto de estudantes ocupantes. A dinâmica pedagógica de
organizar de forma igualitária as diferentes atividades e tarefas cotidianas,
sem predileções sobre quais perfis de estudantes ocupariam determinadas
funções do trabalho intelectual ou manual, configurou-se num importante
elemento de análise para se compreender esse movimento. As
características pedagógicas desse modelo de escola assemelham-se a uma
formação omnilateral ou integral, compreendida através da síntese de muitas
determinações sustentadas pelo conceito marxista de totalidade (SANTOS,
M., 2016, p. 8).

Em movimento, portanto, em luta, e buscando a ampliação das atividades de


resistência, mobilização e de reivindicação, os estudantes se depararam com um
conjunto de problemas e as soluções foram encontradas, seguindo o exemplo dos
secundaristas paulistas, uma vez que prevaleceu o princípio da horizontalidade, já que
as decisões foram tomadas sempre através de assembleias, nos termos da citação
abaixo e constante do artigo “Não é Só Pelo Diploma: As Ocupações das Escolas e
os Processos Curriculares”.

Como narrou um estudante: “a ocupação serviu para unificar. É um


movimento horizontal, em que os alunos têm voz. O professor não chega e
diz o que fazer, como se fossem seres sem luz. A aula será uma troca”. Outro
estudante ratificou: “está sendo algo para juntar: aluno ter intimidade com
professor. O professor não está dando liberdade, mas conhecendo de fato o
aluno” (ESPINDOLA; MACEDO; RODRIGUES, 2016, p. 15).

E o fenômeno no Paraná de 2016, além de horizontal, se mostrou plural e


democrático, considerando a diversidade do seu conjunto, conforme é possível
perceber no artigo “As Ocupações de Estudantes Secundaristas Nas Escolas
Estaduais do Paraná: Uma Análise a Partir da Cobertura do Jornal Gazeta do Povo”,
escrito por Cleide Lavoratti, Alessandra Regina Teixeira de Freitas, Amanda Machado,
André Henrique Mello Correa e Thaís Galvão (2017).
92

Ocorreu uma gestão democrática e igualitária, com muita participação dos


estudantes do movimento. Todos os dias uma atividade diferente era feita nas
escolas e também foram organizados coletivamente os horários para café da
manhã, almoço e jantar, limpeza dos espaços físicos. Escolas foram
reformadas pelos alunos, que aproveitava o tempo nas ocupações para pintar
carteiras, limpar jardim, etc (LAVORATTI; FREITAS; MACHADO; CORREA;
GALVÃO, 2017, p.5).

No entanto, conforme as ocupações avançavam, barreiras precisavam ser


rompidas. Porém os estudantes, tanto no interior das escolas, quanto nas atividades
de ruas, foram administrando os problemas que se estabeleciam cotidianamente, ao
mesmo tempo que prosseguiam na busca dos seus objetivos, quais sejam, o combate
às políticas do governo federal em vias de serem praticadas (MP nº 746 e PECs nº
241/2016 e nº 55/2016). E um mecanismo fundamental para tanto foi a decisão de
adotar o princípio da horizontalidade ao tomar decisões diante dos problemas surgidos
nos termos acima colocados, o que propiciou a boa convivência, união, igualdade e
postura democrática entre os secundaristas, ao longo de mais de 6 (seis) semanas,
período que durou o movimento, ao mesmo tempo que obrigou o Estado e o contra
movimento à exposição, pois adotaram a violência contra os estudantes, de acordo
com o estudo realizado por Steimbach (2018).

Esse dado da horizontalidade do movimento é capaz de ligar a nossa análise


a outro ponto: o da repressão sofrida e o da resistência diante dela. Se ele
representou importante contraponto às forças que compunham o mesmo
campo contra-hegemônico, ele também foi decisivo na luta contra a
hegemonia dada, especialmente, porque a repressão dela oriunda tentou
acompanhar essa horizontalidade e lançou mão de um artifício incomum – o
uso da violência não pelo elemento coator do Estado, mas pela própria
sociedade civil (STEIMBACH, 2018, p. 181).

E com o movimento já espalhado pelo Estado, Luana Mayara do Instituto de


Educação Estadual de Londrina (IEEL), lembra que tanto estudantes, quanto a própria
comunidade foram surpreendidos pela grandeza e relevância das ocupações,
considerando a capacidade de interação entre os integrantes, habilidades para
mobilizar e articular de acordo com as necessidades de cada fase desse processo de
luta. Ao mesmo tempo, a estudante destaca que a revolução realizada pelo
movimento é uma forma inteligente do intelecto, e que na sociedade brasileira existem
várias facetas, diversidade com a qual os secundaristas souberam interagir e conduzir
de acordo com suas reivindicações.
93

A ocupação de estudantes secundaristas surpreendeu aos mesmos, e a toda


população (mesmo que uma parcela se negue a acreditar, por conta do senso
comum) a sua capacidade de convivência em grupo, revolução, cuidados
com o que é de posse de todos os cidadãos, e dos próprios cidadãos. Mas
não só descobriu e aprendeu a revolucionar de uma forma inteligente e
pacífica através do intelecto, como mostrou aos estudantes as várias facetas
que há em nossa cidade, e em todo o Brasil, pela forma como cada pessoa e
área se portam diante de uma revolução (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 83).

E, nesse “passo a passo” de luta, como houve forte processo reivindicatório


e enfrentamento estudantil, como já era esperado pelo Movimento de Ocupação das
Escolas, o governo do Estado reage através dos pedidos de reintegração de posse
de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 38), “A partir deste momento
colégios de todo o Paraná aderiram ao movimento dos jovens secundaristas. Apesar
das ocupações continuarem acontecendo significativamente, a partir de 13 de outubro
tiveram início os pedidos de reintegração de posse solicitados pelo governo estadual
[...]”, ensejando muitas decisões judiciais contrárias aos interesses do governo, e em
que pese aquelas proferidas em favor do Estado, de acordo com o que será
demonstrado no capítulo 4 sobre os aspectos jurídicos do movimento.
E o Movimento de Ocupação das Escolas no Paraná não permaneceu
somente dentro das instituições de ensino, foram organizadas atividades externas e,
assim, também houve o bloqueio de ruas e avenidas, inclusive de principais vias
curitibanas como é o caso da Avenida João Negrão, possibilitando importante
visibilidade às atividades então desencadeadas.

Ao invés da ocupação os alunos optaram por manifestações de rua. Abaixo


momento de bloqueio da Rua João Negrão em Curitiba. Jornais da cidade
pautaram as manifestações, enquanto alguns destacavam o motivo dos
protestos (PEC 241 e MP 746) outros distorceram a informação do resultado
da assembleia como resultado de “movimentos anti-ocupação”. Os alunos
acionaram a justiça solicitando reparação da informação equivocada
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 55, grifo nosso).

A frase “Abaixo momento de bloqueio da Rua João Negrão em Curitiba”,


constante da citação acima, se refere às ilustrações presentes no livro OcupaPR2016
Memórias de jovens Estudantes, os autores retratam uma série de atos de
fechamentos de ruas e avenidas praticados pelos secundaristas em Curitiba, cuja
metodologia foi semelhante à usada pelos estudantes de São Paulo de 2015, e, é
ilustrada pela fotografia adiante colacionada, onde se vê os secundaristas fazendo
trancamento de ruas e avenidas na capital paranaense em 2016.
94

Com relação à metodologia usada pelo Movimento de Ocupação das Escolas


de São Paulo, é preciso se dito que embora semelhante em muitos pontos, também
sobre sai uma série de diferenças, pois os estudantes paulistas usaram as técnicas
de passeatas, ocupação de escolas e trancamento de ruas e avenidas em fases
distintas e sucessivas, de acordo com o que se constata no livro Escola de Lutas, ao
passo que no Estado do Paraná os secundaristas usaram os mesmos recursos, porém
sem que tenha sido em fases sucessivas e definas. Nesse sentido, conforme
demonstrado no livro Ocupa PR 2016, essas práticas foram feitas de forma
simultâneas e no decorrer do processo de ocupação.

Fotografia 6. Estudantes trancando rua em Curitiba em 2016. Fonte Google25.

E, assim, os estudantes paranaenses prosseguem ocupando escolas e


trancando ruas, em protestos contra as medidas do governo federal em vias de
implementação, conforme texto produzido coletivamente pelos ocupantes do Instituto
Federal do Paraná (IFPR), Campus de Paranaguá, de acordo com Divardim, Schmidt
e Sobanski (2016, p. 68) “Pois, além de uma medida provisória, que prometeu flagelar
nosso currículo, tivemos também uma proposta de emenda constitucional, que coloca

https://jornalggn.com.br/movimentos-sociais/novo-balanco-aponta-1197-escolas-ocupadas-pelo-
25

pais/
95

nosso orçamento em xeque, aí então, decidimos não nos calar”, por isso essa vasta
energia estudantil no processo de ocupação das escolas.
E o movimento no Paraná também foi vasto nas cidades do interior, inclusive
mobilizando milhares de estudantes e pessoas da comunidade no decorrer das
atividades de rua, como é o caso do município da Fazenda Rio Grande, onde os
secundaristas também demonstraram forte resistência contra a política proposta pelo
governo, de acordo com o livro “Ocupa Paraná 2016”.

No município de Fazenda Rio Grande, os alunos secundaristas organizaram


protestos de rua antes de dar início as ocupações. Assim, de acordo com a
Polícia Militar, mais de 2.000 alunos protestaram contra a Proposta de
Emenda Constitucional nº 241 e a Medida Provisória nº 746 em outubro de
2016 em ato realizado em um único dia (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 85).

E essas capacidades de mobilizar, protestar, reivindicar e resistir, sempre de


forma organizada e com autonomia e responsabilidade, foram demonstrados em
várias cidades e regiões do Estado do Paraná, conforme ocorreu na cidade de Ponta
Grossa, de acordo com a fala de um estudante secundarista.

Responsabilidade é a primeira coisa observada no período das ocupações.


Os alunos mostraram sua autonomia e a capacidade de resolver seus
problemas, coisas inimagináveis no sistema educacional imposto nas
escolas. Aqueles que antes eram taxados como vadios ou irresponsáveis
provaram que as instituições de ensino não avaliam de fato o indivíduo como
pessoa apta a tornar-se cidadã, mas sim como uma engrenagem a mais a
ser encaixada na máquina (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 89).

E de acordo com o estudo de Alan Andrei Steimbach (2018), na tese Escolas


Ocupadas no Paraná: Juventude na Resistência Política à Reforma do Ensino Médio
(Medida Provisória 746/2016) demonstra que os estudantes no decorrer do
movimento de ocupação, souberam ser sujeito educador e assim atuar na formação
de mentes em contraponto a uma formação hegemônica que lhes impôs a reforma
educacional. Com isso, de acordo com Steimbach, o meio estudantil foi impelido à
luta, o que ocorreu de forma consciente e, portanto, independente, educativa e
exemplar.
O movimento de ocupação foi capaz, dentro de seus limites, de ser este
sujeito educador que forma mentes em clara contraposição à formação
hegemônica. O movimento foi o intelectual orgânico de certos grupos sociais
e se pôs em posição de confronto, tanto à hegemonia política que lhes impôs
uma reforma de ensino, quanto aos intelectuais orgânicos que a construíram.
Ao se configurar desta maneira, o movimento foi capaz de, ao conscientizar,
96

“empoderar” os sujeitos, visto que os tirou da inércia e os impeliu à luta. Dito


de outro modo, os jovens passaram a lutar e o fizeram assumindo, de modo
consciente, seu lado e sua condição de contra-hegemonia (STEIMBACH,
2018, p. 189).

E nesse mesmo sentido a fala do estudante Eduardo de Curitiba, ao passo


que salienta a força do movimento, já que mesmo não atingindo todos os objetivos
que almejavam, conforme a citação abaixo, a união e a busca dos objetivos
continuam.

Foi difícil em alguns momentos para conciliar o movimento, a opinião de


alunos e seus familiares até professores, o interesse era voltar às aulas,
pensando somente em encerrar o ano letivo, nos acusando de massa de
manobra e acreditando em um governo que transformou esta sociedade em
“massa de manobra”, sabemos que a PEC 241 (55) e a MP 249 está aí para
ser aprovada, tentamos, não atingimos o nosso objetivo em 100 % mas
saímos fortalecidos com um grupo de poucas pessoas que fez a diferença e
ainda continuamos unidos traçando nossos objetivos (DIVARDIM; SCHMIDT;
SOBANSKI, 2016, p. 92).

E os jovens estudantes, além do conteúdo reivindicatório e de resistência que


impuseram aos governos no Paraná, também exerceram um papel educativo nos
espaços das escolas ocupadas, uma vez que souberam conquistar corações e mentes
de multidões de integrantes da comunidade escolar e convistas a uma política
educacional que esteja de acordo com o tempo atual. E por isso, dado a relevância
das pretensões políticas dos ocupantes, que governos e contra movimento, o tempo
todo, se abstiveram de reconhecer o poder de voz dos secundaristas, conforme se
denota na citação a seguir delineada.

Desta análise mais pormenorizada, erigiu um último elemento de grande


relevância: o papel educador do movimento. Na sua prática de resistência,
ao ocuparem mais do que o espaço físico das escolas, o movimento foi um
educador de si e dos jovens que o compuseram. A tentativa de transformação
de consciências, mostrada pela fala epigrafada nesta seção, revela, talvez, o
significado maior da rebeldia deste movimento: romper, no conteúdo e na
forma, mesmo que temporariamente, com a educação hegemônica, aquela
que se faz na escola ou em outros meios e que tem como objetivo central
“arregimentar mentes” para que aceitem as condições de vida que lhes são
impostas e que são derivadas de hegemonia que não lhes representa. Por
isso, além de não ouvir o que os jovens tinham a dizer, interessava à
hegemonia política que o movimento fosse encerrado o mais cedo possível,
pois, deste modo, eles também não poderiam falar aos outros jovens
(STEIMBACH, 2018, p. 192).

Dessa forma, ao enfrentar o Estado, setores conservadores na sociedade e


a série de problemas que afetam o cotidiano dos estudantes das escolas públicas, o
97

movimento estudantil paranaense também teve que conviver com a violência extrema.
Trata-se da morte do jovem Lucas, estudante de Curitiba assassinado no período das
ocupações, acontecimento que suscitou o debate no meio estudantil relacionado às
constantes perdas de jovens em razão da questão social, e que, tratam-se de
problemas que são simplesmente ignorados por relevantes setores da sociedade.

Somado aos acontecimentos que já estávamos presenciando, nada nos


abalou mais que o assassinato de menino Lucas, o qual recebeu um minuto
de silêncio durante uma reunião com pais e responsáveis. Nossa ocupação
ficou em luto. Sabemos que nossa juventude morre todos os dias e em
nenhum momento presenciamos tal apelo mediático quanto ao que vimos na
morte do nosso companheiro. Devido ao medo de alguns responsáveis,
perdemos alguns membros da nossa ocupação (DIVARDIM; SCHMIDT;
SOBANSKI, 2016, p. 68).

E a força dessa “bandeira” unificada facilitava a propagação dos objetivos dos


secundaristas, tanto é que as informações sobre os acontecimentos logo se
disseminavam por todo o Estado. No entanto, mesmo assim, o contra movimento
sempre atuou e procurou desestabilizar as reivindicações dos ocupantes, inclusive no
momento de extrema violência como foi na morte do menino Lucas mencionada
acima, embora o contraponto, a exemplo de outros acontecimentos, tenha sido
instantâneo e eficaz, de acordo com o relatado no livro OcupaPR 2016.

No dia 24 de outubro um estudante é morto numa escola ocupada no bairro


Santa Felicidade, em Curitiba. A polêmica tomou conta do estado. No dia
seguinte, um estudante participa da sessão da Assembleia Legislativa do
Paraná (ALEP) discursando contra as ocupações. É quando as estudantes
Nicoly Moreira, colega do estudante morto, e Ana Júlia, são convidadas a
também participar de sessão na ALEP, no dia 26 de outubro, desta vez
defendendo as ocupações (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 76).

Na mesma ocasião, de acordo com a fala da estudante na tribuna da


Assembleia Legislativa paranaense, mais uma vez é possível constatar que além do
combate às medidas do governo federal, os secundaristas do Paraná também tinham
um rol de reivindicação, no caso o livre debate político nas escolas, a ausência da
homofobia, combate ao racismo e a busca de uma formação estudantil crítica.

Atualmente, os estudantes secundaristas estão lutando contra as


reformulações conservadoras do Ensino Médio, pelo aumento da
Democracia, o fim do racismo, da homofobia, e do machismo em espaço
escolar além da busca por uma assistência estudantil de qualidade. E essa
luta, apesar de unificada, acontece com algumas particularidades em cada
98

Estado da Federação, como veremos a seguir (LAVORATTI; FREITAS;


MACHADO; CORREA; GALVÃO, 2017, p. 3).

Além disso, os estudantes do Movimento de Ocupação das Escolas no


Estado do Paraná também gritavam forte pela manutenção do rol de direitos sociais
já presentes no Constituição Federal e em risco de serem revogados pelo governo
Temer. Esse fato fica bastante claro na fala da estudante Ana Julia por ocasião do
discurso feito na tribuna da Assembleia Legislativa do Paraná, uma vez que salientou
que através da PEC nº 241/2016, além dos direitos estudantis, o governo também
estava afrontando a saúde pública, enfim a seguridade social como um todo, já que
foi atingida também a Previdência Social. Na realidade, a partir da luta dos estudantes,
fica clara a defesa de um ideal, de um programa que se faz consubstanciado em torno
dos direitos estudantis, pois além da oposição às medidas do governo de supressão
de direitos já conquistados e presentes no marco constitucional e legal, se vê
claramente a preocupação dos estudantes em relação ao futuro, preocupações com
o país e com o bem-estar das novas gerações, a rigor do que demonstra a citação a
seguir delineada.

A PEC 241 é outra afronta a gente. É inconstitucional! Ela é uma afronta à


Constituição cidadã de 88! Nela a gente tem a seguridade social. A PEC 241
acaba com isso! É uma afronta à Previdência Social, é uma afronta à saúde,
é uma afronta à educação, é uma afronta à assistência social! A gente não
pode, simplesmente, deixar isso acontecer! A gente não pode cruzar os
braços pra isso! A Nicoly está aqui por educação! O SAFEL estava ocupado
pela educação. Os colégios do Paraná e do Brasil estão pela educação. Nós
não estamos la pra fazer baderna, nós não estamos lá de brincadeira. Nós
estamos lá por um ideal! Nós estamos lá porque a gente acredita no futuro
do nosso país. Este país é nosso! Vai ser dos meus filhos, vai ser dos filhos
dos meus filhos e eu me preocupo com esse país! E nós estamos lá porque
nós nos preocupamos com esse país! (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 79).

E de acordo com Steimbach (2018), ao lutarem contra a indesejada reforma


do Ensino Médio, os secundaristas demonstraram grandes conhecimentos sobre o
assunto educação, uma vez que o contraponto ao governo foi em relação ao contexto
político, o que fizeram em momento de rearranjo de correção de forças, e isso, faz
transparecer os conhecimentos e habilidades que os secundaristas foram obrigados
a colocar em prática para a concretização das ocupações.

Os jovens lutavam contra a reforma do Ensino Médio empreendida desde a


Medida Provisória 746/2016 e, em relação a ela se posicionaram de maneira
99

a revelar grande conhecimento de questões educacionais, pelo menos, no


que concerne às suas necessidades mais imediatas. A política foi
transformada em lei, e seus anseios e angústias não foram por ela
apropriados. Esse fato, à primeira vista, poderia fazer do movimento de
ocupação das escolas, um fato pouco relevante. Contudo, quando fazemos
um movimento que amplia o olhar para seu contexto para, depois, voltar a
enxergar o objeto em seus detalhes, outros elementos se revelam. O contexto
político brasileiro que, por ser aquele em que o movimento de ocupação das
escolas se inseria, não pode ser perdido de vista. Ele demonstrava um claro
rearranjo da hegemonia política brasileira que revia o equilíbrio de forças
políticas e, ao fazê-lo, expurgava forças populares dos campos privilegiados
da política. Nesse contexto emerge a reforma do Ensino Médio. Se o
movimento resistiu à política, resistiu, também, ao contexto (STEIMBACH,
2018, p. 191).

E com essa visão política, fica clara e presente a vontade dos estudantes
paranaenses integrantes do Movimento de Ocupação das Escolas de 2016, não
somente de demonstrar as suas preocupações com o futuro do país, mas também a
vontade e preparo para estabelecer novos paradigmas. No mesmo sentido, é presente
e muito forte o desejo dos estudantes de superar uma agenda que já não tem mais
vigência entre eles, na qual os jovens são tratados com descaso, preconceito e até
criminalizados, uma vez que são tidos como vagabundos e outros termos altamente
desqualificadores, pois.

Nós, estudantes, que estamos nas escolas não somos vagabundos como
dizem aqui, como a sociedade lá fora diz. Nós estamos lá por ideais, nós
lutamos por eles, nós acreditamos neles. Eu convido vocês a irem nas
ocupações, a ver o nosso desgaste psicológico, a ver que não é fácil estar lá
e que a gente vai continuar lutando. A gente vai continuar lutando porque a
gente acredita nisso. A gente vai continuar lutando porque a gente está em
busca de conhecimento e que a gente não vai parar de ir atrás do
conhecimento. Eu convido vocês a ir lá conhecer o movimento e vocês vão
ser muito bem recepcionados, porque a nossa ideia é apresentar pra vocês
porque é que a gente tá lá (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 88).

Neste contexto discriminatório, o exemplo do que ocorreu em São Paulo em


2015, no Estado do Paraná em 2016 os estudantes também não tiveram nenhum
destaque da mídia oficial burguesa. Ao contrário, quando foi objeto no noticiário, a
notícia, de acordo com a pesquisa, ocorreu ao avesso dos fatos e sem demonstrar a
realidade do movimento e muito menos a forma como atuavam, de fato, os estudantes.

A mídia teve seu papel importante em relação às ocupações, ela informou os


motivos das ocupações, mesmo que por diversas vezes seu conteúdo
demonstrou que os alunos que participavam do movimento “Ocupa Paraná”
estavam sendo “manipulados” por questões partidárias e ideológicas. Nas 10
reportagens escolhidas para a análise apenas em uma delas sentimos que
foi enfatizado o real motivo dessa luta que é por uma educação libertária e de
100

qualidade, não uma educação que somente prepare para o mercado de


trabalho (LAVORATTI; FREITAS; MACHADO; CORREA; GALVÃO, 2017, p.
9).

E, em que pese os estudantes paranaenses terem sido os precursores


brasileiros do Movimento de Ocupação das Escolas em 2016, essa condição não foi
reconhecida pela mídia, de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 111),
“Além do jornal Zero Hora (RS) foram poucos os jornais de circulação nacional que
publicaram relatos informando que o estado do Paraná concentrou o maior número
das ocupações, bem como, foi o precursor desse movimento”.
Com isso, considerando o contexto exposto, os espaços na mídia tradicional
ou oficial burguês em favor dos estudantes foram, de acordo com esta pesquisa, muito
aquém do que os fatos determinavam, em especial, em razão da relevância do
movimento, considerando que se espraiou por todo o Estado e atingiu toda a
comunidade escolar.

Se por um lado muitos entenderam o real motivo das ocupações, apoiaram e


se colocam à disposição para dar suporte aos alunos nos protestos, a mídia
oficial por sua vez, reforçou em muitas reportagens a visão de que os
estudantes eram “baderneiros ou um bando de desocupados”, que estavam
atrapalhando as atividades escolares e, nem sabiam nem os reais motivos de
estarem participando do Movimento “Ocupa Paraná” (LAVORATTI;
FREITAS; MACHADO; CORREA; GALVÃO, 2017, p. 6).

Embora a ausência de destaque na mídia nacional, e pelo que tudo indica em


razão da magnitude e importância do Movimento de Ocupação das Escolas
paranaense, terminou sendo notícia na mídia internacional, como é o caso de jornais
americanos, quando salientam o elevado número de escolas ocupadas no Estado,
bem como a causa original do fenômeno.

Nos últimos anos o Brasil tem sido notícia nos principais jornais do mundo,
tanto por questões referentes a crise política e econômica a qual vivemos,
quanto pelos movimentos sociais, protestos e ocupações que ocorreram
nesse período, ou mesmo o fatídico 29 de abril de 2015 em que professores
acabaram sofrendo com a repressão do governo estadual (Beto Richa –
PSDB). Não foi diferente com as ocupações das escolas e os movimentos de
protestos dos estudantes paranaenses. A agência de noticia americana Fox
News deu destaque em sua versão online para as ocupações das escolas
brasileiras. Levou em consideração que eram mais de mil escolas ocupadas,
cerca de cem universidades e que o movimento teve início no estado do
Paraná. Lembrou que as ocupações tinham como reivindicação a retirada da
proposta de lei que congela os investimentos em educação por 20 anos.
Também, relatou que os alunos, também estavam protestando contra as
101

mudanças propostas pelo governo para o ensino médio (DIVARDIM;


SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 119/120, grifo dos autores).

Também outros jornais americanos destacaram a ação do Movimento de


Ocupação das Escolas brasileiro, tendo o Paraná como precursor, uma vez que
noticiaram, com certo destaque, o protagonismo dos secundaristas.

Outro grande jornal americano que dedicou espaço em sua versão online foi
o Washington Post. Essa matéria fez questão de trazer uma perspectiva dos
estudantes em relação ao movimento secundarista. Assim, muitos relatos e
comentários dos próprios alunos que ocupavam escolas ao redor do Brasil
foram destaque. Segundo o jornal, os estudantes tinham um grau de
organização ao ponto de criar aulas de dança, literatura, organizar a própria
biblioteca, enquanto outro grupo ficava responsável pelas refeições do dia.
Por fim, o jornal descreveu o discurso feito pela aluna Ana Julia Pires Ribeiro
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 109, grifo dos autores).

Mas essa postura da mídia oficial burguesa no Brasil, de não dar visibilidade
aos protestos e as atividades de resistência e reivindicatórias dos estudantes, os
impulsionou, de acordo com o que ocorre com os movimentos sociais de maneira
geral, para o uso das mídias alternativas, especialmente a internet. Com isso, os
estudantes do Paraná também estabeleceram uma política de comunicação ao longo
do processo de ocupação das escolas, de acordo com o que será debatido adiante,
no subcapítulo sobre os aspectos políticos do movimento.
Com isso, demonstrando consciência da problemática que afeta o sistema
educacional brasileira, frente a todo um contexto de adversidade, com adversários
batendo nos portões das escolas e de braços dados com o próprio Poder Público e a
partir do Estado, os estudantes demonstrando coragem e até se diferenciando da
maneira de agir do cidadão comum, concretizaram os seus protestos e as suas
reivindicações, de acordo com Alcinéia de Souza Silva (2017), no artigo “A Geografia
Escolar no Contexto dos Movimentos de Ocupação das Escolas Brasileiras”.

Os movimentos de ocupação das escolas no país, revelam que outros


projetos pedagógicos devem ser inventados e praticados no âmbito
educacional, pois essa juventude anseia e luta pela consolidação de espaços
mais democráticos nos processos decisórios do nosso país. Ao revelarem a
autonomia, a criticidade, a cidadania e a capacidade de ler e atuar
espacialmente (uma vez que esta prática social, é espacial), de forma a
romper com políticas centralizadoras, que reforçam as desigualdades sociais,
proclamam que, por suas práticas, abrangentes e complexas, necessitam de
uma formação capaz de empoderá-los e instrumentalizá-los para a
102

compreensão deste mundo contemporâneo em suas alteridades e seus


contrastes (SILVA, A., 2017, p. 9).

Como é certo, o movimento dos estudantes paraenses de 2016 não começou


no Paraná, uma vez que possui importantes antecedentes de acordo com o já
salientado. E não terminará com a saída dos estudantes ocupantes das escolas, pelo
contrário, prosseguirá a partir da construção realizada ao longo dos cerca de 40
(quarenta) dias de ocupação e considerando o que pensavam os secundaristas
integrantes das ocupações e de acordo com a citação seguinte:

Os secundaristas realizaram um movimento que não iniciou no Paraná em


2016 e não terminará com a retirada (ou não) da PEC 241/2016 (agora
55/2016) e da MP 746, não se trata mais disso. Os governos não se
relacionarão mais com os mesmos jovens. Assim como os professores não
terão mais os mesmos alunos, pois os jovens estudantes agora sabem mais
sobre política, economia, cultura e direitos. As narrativas apresentam que
novas formas de pensar, novos contatos foram realizados. E se os seres
humanos se transformam na relação com o mundo e com os outros seres
humanos, os jovens transformaram o seu mundo e a si mesmos nesse
processo. Talvez seja por isso que aqueles que são contrários a mudança
tentaram gritar e silenciar, mas não se cala e nem se segura um processo
que é parte daquilo que nos define como ser humanos, a capacidade de
transformação da realidade em busca de situações mais adequadas
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 140).

Dentre o patrimônio construído pelos estudantes no decorrer das ocupações,


e que permanecerá como legado e memória das futuras gerações, é difícil não
destacar o elevado número de escolas ocupadas, considerando o lema: “ocupar e
resistir”, posto em prática pelos ocupantes ao longo das ocupações, uma vez que
entendiam que os seus direitos se encontravam em flagrante ataque e, por isso,
centenas de escolas foram ocupadas. Tudo isso, de acordo com o já longamente
debatido, em função das ilegítimas pretensões do governo federal chefiado por Michel
Temer e sempre destacado pelos estudantes, a política de congelamento dos
investimentos no setor primário, onde se inclui a área educacional, por 20 anos. O que
ocorre de maneira bastante clara nesses enfrentamentos entre governo e estudantes
é a luta de classes, pois os fatos salientam, a todo o momento, a busca dos
secundaristas por melhores conquistas frente aos abastados cujos interesses estão
consubstanciados no aparato do Estado, inclusive, ao ver de alguns ocupantes, nem
se quer seriam atingidos pelas medidas que o governo pretendia colocar em prática,
como pode ser percebido pela narrativa constante no livro “Ocupa PR 2016”.
103

“Ocupar e resistir” foi o lema utilizados durante o maior movimento feito por
estudantes secundaristas no mundo. Fizemos nossa voz ser ouvida através
de mais de 1000 escolas ocupadas. Não aceitamos calados as ações
tomadas por um governo ilegítimo no que nos afeta diretamente. Alguns
achavam que estávamos brincando, eu não sei até que ponto duvidam da
capacidade de mobilização política dos jovens, mas nós já demonstramos
que estamos dispostos a provar o contrário. Avante secundaristas [...].
Participei ativamente da ocupação do colégio onde estudo. Acredito que essa
forma de protesto é uma das mais efetivas, já que, em grande escala, como
foi, gerou um imenso impacto social. Apesar de tudo, a conquista que tivemos
não foi a esperada, mas ainda sim, uma conquista. Vejo àqueles, que se
posicionam contra a mobilização, como mal informados ou neoliberais, além
disso, levando em consideração que a PEC 55/16 e a MP 746/16 só não
atingiriam a alta burguesia, enquanto muitos desses se preocupavam com o
bimestre, nós nos preocupávamos com a estrutura social do Brasil pelos
próximos 20 anos (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 142).

E o governo Temer, com vistas à aprovação de sua política, teve apoio do


contra movimento, e isso significou opressão contra os secundaristas ocupantes, pois
de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 145), “[...] lá fora, no portão,
havia gente ignorante, pessoas com grande nome na cidade (insignificante para nós,
claro), que protestavam contra nós. Porém não podiam fazer NADA! Sabe por quê?
Porque eles estavam cientes que nós tínhamos o direito de estar ali!”. O que
demonstra que os estudantes, ao longo de todo o decorrer do processo de ocupação
sabiam o que queriam e até onde deveriam e poderiam chegar, bem como quem eram
os seus adversários e seus respectivos perfis, o que souberam enfrentar e impor a
necessária resistência.
Porém, de acordo com o demonstrado, o oposto aos interesses dos
estudantes integrantes do Movimento de Ocupação das Escolas, integrado pelo
governo e seus órgãos, além de setores conservadores da sociedade, prevaleceu e
os secundaristas do Paraná decidiram por desocupar as unidades escolares. Porém,
também conforme o já esclarecido e debatido até aqui, foi realizado vasto avanço em
termos de conhecimento acumulado pelos estudantes, considerando as interações e
vivências ocorridas no decorrer do processo de ocupação e demais atividades como
um todo, uma vez que.

As práticas sociais, em especial as ocorridas a partir do ano 2013 explicitam


uma verdadeira mudança no comportamento juvenil ao longo da história da
humanidade. A presença e, mais que isso, a liderança desses movimentos
por jovens nas lutas sociais revela a importância e o peso de suas forças na
redefinição das estruturas consolidadas e nas estratégias políticas de
construção de novo desenho do Brasil. As razões se baseiam na questão de
o pano de fundo desses movimentos serem os atos políticos impactantes e
104

conflitantes na vida individual e social dos brasileiros, notadamente à


juventude (SILVA, A., 2017, p. 3).

Assim, nesse contexto, embora com uma enorme frente favorável, porém
diante de uma longa fileira conservadora, de acordo com Divardim, Schmidt e
Sobanski (2016, p. 144), ainda foi possível para os estudantes paranaenses do
Movimento de Ocupação das Escolas ocuparem 836 unidades escolares no Estado
em 2016, constituindo, assim, o maior movimento estudantil dos últimos anos no
Paraná, cujo legado político certamente será usado pelos jovens do futuro.
Embora todo esse contexto de construção, dado as reações do contra
movimento e, em especial, as reações do governo, consequentemente, os alunos
resolveram desocupar as escolas paranaenses de acordo com o trecho de uma nota
de desocupação feita pelos secundaristas e constante no livro Ocupa PR 2016, onde
se observa claramente que o movimento desocupa as escolas com os jovens
ocupantes de cabeça erguida e conscientes de que cumpriram uma etapa no processo
de luta de classes, bem como dispostos a enfrentamentos futuros. E os estudantes
finalizam a nota de desocupação do Colégio Abraham Lincoln em Colombo, na região
Metropolitana de Curitiba, ocasião na qual se constata preocupação de demonstrar
que deixaram a escola limpa e organizada, certamente com vistas a contrapor as
acusações que sofriam do governo e do contra movimento de que eram vagabundos,
preguiçosos, baderneiros, etc.

Pois é galera, trago a vocês a nossa comunicação: desocupamos o colégio


CEPAL, mas não porque estamos desistindo, não porque nos curvamos para
esse “governo doente” que temos, não porque a burguesia venceu, mas sim
pelo fato de que nosso objetivo foi alcançado. Mostramos para o país que,
felizmente, não são todos os jovens que estão sendo manipulados pela mídia,
não são todos os jovens que estão chegando ao ponto de ser ignorantes com
quem precisa sem mesmo entender o porquê de tudo aquilo. Mais de MIL
escolas foram e estão sendo ocupadas no nosso País e, com gratificação,
95% delas são escolas do Paraná [...]. Nós paramos, paramos porque o poder
não é de vocês, e sim de todos igualmente, e somos gratos pelo que fizemos.
A escola está limpa, as carteiras lavadas e brancas, os banheiros impecáveis,
e quem não gostou de nossa presença lá, convido para que um dia vá e ajude
alguma das faxineiras a limpar a escola, mostre que você pode, ou não...
(DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 145).

Embora as medidas propostas pelo governo tenham sido aprovadas, já que


a Medida Provisória foi transformada na Lei Federal nº 13.415/2017 e as PECs
aprovadas e se tornaram na Emenda Constitucional nº 95/2016, é de se reconhecer
105

o avanço do movimento dos estudantes, uma vez que além do enfrentamento feito ao
governo, também apresentaram um rol de reivindicações nos termos acima discutidos,
além de vasto acúmulo político que obtiveram, o que significa mais um importante
passo histórico na luta por conquistas políticas e jurídicas.
Assim, ao longo dos cerca de 40 (quarenta) dias de ocupação, no interior das
836 escolas ocupadas e nas atividades de rua realizadas em todo o Estado, os
estudantes paranaenses promoveram contínuos debates, e em que pese os
contrapontos do contra movimento e das forças do governo, obtiveram significativos
avanços em termos de consciência e progresso político. Dessa forma, de acordo com
o ocorrido com outros movimentos do passado, onde inclui as ocupações das escolas
em São Paulo em 2015, os estudantes do Paraná também deixaram um legado para
as gerações futuras em forma de memória e com enorme fortalecimento da identidade
estudantil. Com isso, fortaleceram uma identidade que investe nos protestos, ao
mesmo tempo em que reivindicaram direitos, fizeram o enfrentamento com resistência
ao governo e aos interesses de classes que lhes contrapõem.
Ainda em comparação ao movimento estudantil paulista e aqueles
relacionados ao período histórico até o final do século XX como já foi destacado, deve
ser salientado que no Paraná também vigorou o princípio da horizontalidade, assim
como política de relação, democracia e igualdade, a exemplo de São Paulo. Da
mesma forma, à semelhança com os movimentos estudantis anteriores, os estudantes
paranaenses também enfrentaram uma estrutura de Estado retrógrada, conservadora,
de classes e que tem a violência policial como instrumento de contenção das
reivindicações de direitos, para cuja superação, os grandes processos reivindicatórios
são conditio sine quão não26.
Em ambos os períodos, seja no Estado de São Paulo em 2015 ou no Estado
do Paraná em 2016, no que tange aos aspectos políticos e jurídicos, ressalta a
semelhança entre os movimentos, uma vez que os instrumentos usados, tanto pelos
estudantes, quanto pelo Estado, foram praticamente os mesmos, conforme será
demonstrado nos capítulos seguintes.

26
De acordo com o Dicionário Academia Brasileira de Letras Jurídicas “conditio sine qua non”. Loc.
(Lat. = sem a qual não.) Expressão empregada para definir condição, à falta da qual o ato não se
completa, ou não se realiza.
106

No entanto, algumas diferenças se estabeleceram em relação aos dois


movimentos, pois em São Paulo as atividades estudantis se desenvolveram por
longos dois meses e meio, enquanto que no Paraná o período de protesto foi cerca
de 6 semanas. No caso paulista, de acordo com a pesquisa, foram cerca de 200
escolas ocupadas, ao passo que no Paraná os registros demonstram que foram 836.
Quanto ao desenrolar do processo de ocupação, no fenômeno de 2015 se observa
uma sequência de atividades, primeiro as passeatas e outras formas de luta travadas
nas ruas, na sequência a ocupação nas escolas e, por último, os trancamentos de
vias públicas, enquanto no Estado do Paraná os estudantes não seguiram esse
itinerário, considerando a concomitância dos atos de protesto, resistência e de
reivindicação, portanto, em 2016 ocorreu um processo de luta mais concentrado.

3.3 - OS PRINCIPAIS ASPECTOS POLÍTICOS DO FENÔMENO DE SÃO PAULO


EM 2015 E DO PARANÁ EM 2016

Ao analisar o Movimento de Ocupação das Escolas ocorrido em São Paulo


em 2015 e no Paraná em 2016, a partir dos seus principais aspectos políticos, é
possível observar a amplitude desse fenômeno, uma vez que os estudantes
procuraram atingir uma totalidade em termos de envolvimento político e aí,
possivelmente, esteja localizada a receita do avanço obtido pelo movimento
estudantil, tanto em São Paulo, quanto no Paraná.
Antes de entrarmos nos aspectos políticos, propriamente ditos do movimento
secundarista em estudo, é de grande importância conceituar os termos aspectos e
política, considerando que o presente capítulo girará em torno dos mesmos e
convistas ao debate proposto sobre o tema.
Assim, de acordo com o dicionário Aurélio (2004) o vocábulo aspecto
significa: “1. Aparência de alguém ou de algo; 2. V. fisionomia (1). 3. Qualidade ou
característica peculiar; face, faceta”.
O dicionário Houaiss, por sua vez, conceitua o termo referido da seguinte
forma:

1. Ato de ser visto. 2. Aparência exterior 3. Maneira pela qual algo ou alguém
se apresenta à vista 4. Cada uma das facetas através das quais algo pode
ser visto. 6. Categoria semântica que expressa detalhes qualitativos ou
quantitativos internos de uma determinada ação, processo ou estado
(HOUAISS, 2001).
107

Com relação ao vocábulo política, na conceituação formulada pelo dicionário


Aurélio, verifica-se conexões entre o que fizeram os estudantes no decorrer do
processo de ocupação, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016,
considerando a amplitude do termo.

Política: 1. Conjunto dos fenômenos e das práticas relativas ao Estado ou a


uma sociedade. 2. Arte e ciência de bem governar, de cuidar dos negócios
públicos. 3. Qualquer modalidade de exercício da política (2). 4. Habilidade
no trato das relações humanas. 5. Modo acerado de conduzir uma
negociação; estratégia (AURÉLIO, 2004).

Já, o Dicionário de Política Norberto Bobbio traz a conceituação nos termos


seguintes, onde se observa que os valores referidos no conceito, integraram as
atividades e práticas dos estudantes integrantes do Movimento de Ocupação de
Escolas em estudo, vejamos:

O significado clássico e moderno de política. Derivado do adjetivo originado


de pólis (politikos), que significa tudo o que se refere à cidade e,
consequentemente, o que é urbano, civil, público, e até mesmo sociável e
social, o termo política se expandiu graças a influência da grande obra de
Aristóteles, intitulada Política que deve ser considerada como o primeiro
tratado sobre a natureza, funções e divisão do Estado, e sobre as várias
formas de Governo, com a significação mais comum de arte ou ciência do
Governo, isto é, de reflexão, não importa se com intenções meramente
descritivas ou também normativas, dois aspectos dificilmente discrimináveis,
sobre as coisas da cidade (BOBBIO; MATEUCCI; PASQUINO, 1983).

E os conceitos constantes nos dicionários acima referidos estão em


consonância com o debate vigente, pois de acordo com (SOUZA, S., 2018, p. 39), ao
se reportar a Vitor Paro (2004), salienta que o homem não é um ser isolado e sim
necessita da vivencia em sociedade, portanto, daí surge o conceito de política em seu
sentido maior, considerando a convivência entre os sujeitos e as suas respectivas
relações sociais. Com isso, é preciso ser tido em conta que o fazer política não é um
privilégio de instituições e de integrantes das camadas privilegiadas, ao contrário, faz
parte do cotidiano de todos aqueles que constroem relações sociais e de poder,
inclusive entre os estudantes e o seu meio como um todo, uma vez que.

A política, por exemplo, não pode ser pensada apenas como partidos,
eleições, ou mesmo apenas como luta pelo poder. A política se faz necessária
porque o homem não é um ser isolado. Ele é um ser social, ou seja,
necessariamente plural, pois depende do outro (melhor dizendo, dos outros,
de todos os outros) para viver. É, pois, um sujeito (autor, senhor de vontade),
entre outros sujeitos. Daí que precisa conviver com outros. E é aqui que surge
108

o conceito de política em seu sentido amplo e rigoroso, como a produção da


convivência entre sujeitos sociais (SOUZA, S., apud PARO, 2018, p. 36-37).

3.3.1 - POLÍTICA DE RELAÇÃO COM A COMUNIDADE E NO INTERIOR DO


MOVIMENTO, BEM COMO IGUALDADE E DEMOCRACIA

Diante das conceituações acima mencionadas pode-se dizer que os


secundaristas, de fato, fizeram política em vários aspectos, considerando a acepção
técnica do termo, pois nos Estados de São Paulo e Paraná, sem perderem tempo, os
estudantes tiveram a preocupação de construir as relações política ao longo das
ocupações de forma plural e de acordo com as necessidades e das atividades
desenvolvidas. Com isso, consideraram tanto a necessidade de construir relações
políticas internamente, ou seja, no interior do movimento, quanto com a sociedade,
uma vez que estabeleceram vínculos com movimentos e instituições, o que lhes
propiciou importante apoio no sentido político, estrutural, etc.

Análises de sindicatos, universidades e instituições de pesquisa também


evidenciavam críticas à reorganização. Segundo a APEOESP, a medida
levaria ao aumento no número de estudantes por sala e à diminuição de
vagas para docentes. Documento elaborado pela Rede Escola Pública e
Universidade (2016) analisou as tendências demográficas no estado de São
Paulo e os dados de fluxo escolar, concluindo que não havia tendência
consistente de redução da demanda educativa que justificasse o fechamento
de escolas e de salas de aula (CORTI; CORROCHANO; SILVA, 2016, p. 10).

Da mesma forma, os estudantes paranaenses, pois souberam construir um


conjunto de relações no decorrer da caminhada reivindicatória, tanto no seio do
movimento, quanto na sociedade, tendo em vista que foi bastante relevante o apoio
obtido de instituições organizadas na sociedade civil, o que refletiu diretamente no
alcance do resultado que almejavam. Dentre os apoios obtidos se encontra o do
Laboratório de Pesquisa em Educação Histórica (LAPEDUH) e de acordo com a
citação seguinte esteve, ao longo das ocupações das escolas do Paraná, pari passu,
aliado aos estudantes, sendo a referida relação fruto das políticas construídas pelos
secundaristas em movimento. E não foi somente com o LAPEDUH que os estudantes
do Movimento de Ocupação das Escolas do Paraná construíram política em 2016 no
decorrer do processo em estudo, mas sim com uma série de outras entidades e
organismos, de quem obtiveram apoio, pois.
109

Nós sabemos que vários grupos já apresentaram críticas à MP 746/2016. Os


estudantes das ocupações pelo Brasil já mostraram que sabem o que estão
fazendo e porque estão fazendo. Mas algumas coisas ainda precisam ser
ditas mesmo depois dos posicionamentos de associações científicas,
profissionais e sindicais que encaminharam críticas de pontos de vistas
políticos, econômicos e científicos a essa MP 746. Em relação a muitos dos
posicionamentos que já foram apresentados nós temos total concordância
(por exemplo, as notas da ANPUH, ANPED, CONIF, APP Sindicato) [...]. Os
integrantes do LAPEDUH estão aliados aos estudantes e à resistência e se
manifestam por meio desta carta e do livro, o que certamente auxiliará na
manutenção da memória (espaço privilegiado da história) o registro desta
ação, que sem dúvida colocou o jovem em seu devido lugar de protagonista
e agente histórico (DIVARDIM; SCHMIDT e SOBANSKI, 2016, p. 26).

Tanto no interior do movimento paulista em 2015, quanto no Paraná em 2016,


os estudantes souberam agregar e assim construíram politicamente, e o fizeram
reconhecendo o direito à participação de todos e respeitando a pluralidade existente,
indiferentemente das diferenças e com o conteúdo democrático que a situação
vivenciada exigia, uma vez que.

De modo geral, foram constituídas comissões responsáveis pelo cotidiano


das ocupações, realizando tarefas como alimentação, segurança, limpeza,
relações externas e informação. A decisão de participar em dada comissão
cabia a cada um dos estudantes mobilizados. O relato de algumas estudantes
revelou a preocupação em não reproduzir estereótipos de gênero na escolha
das comissões. A presença das jovens também foi significativa nessa direção
e mereceria análises aprofundadas (CORTI; CORROCHANO; SILVA, 2016,
p. 11).

O ocorrido em São Paulo no ano de 2015 se repetiu no Estado do Paraná em


2016, pois o respeito à diferença se fez presente entre os estudantes paranaenses ao
longo de todo o processo de resistência, o que fez convergir as energias e ações na
direção almejada pelo todo estudantil, a rigor do que diz o estudante Lu `Ilhè,
secundarista de Curitiba. E, também de acordo com o relato da estudante Julia
Perusselo, liderança da ocupação do Colégio Estadual Presidente Lamenha Lins, de
Curitiba, onde se vê uma franca integração de todos. Na fala de Julia é possível
observar que o Movimento de Ocupação das Escolas no Paraná construiu
politicamente com todos, independentemente da orientação sexual ou religiosa, se
branco ou negro, se mais ou menos novo no movimento ou se menino ou menina.
Assim, parece que o que importava mesmo era estar firme e convicto na defesa das
“bandeiras” encampadas pelo movimento estudantil.

A ocupação do Pedro Macedo pra mim foi mais do que protestar contra a
PEC 241 e a reforma do ensino médio. Nessa ocupação aprendi e vivi muitas
110

coisas que dificilmente viveria na minha rotina escolar. Lá aprendi a lidar


com diferentes personalidades, nunca fui tão respeitado antes. Sou trans
não binário com expressão de gênero masculina, então, por exemplo, na aula
de educação física a prof. dividiu os meninos e meninas e eu não sabia onde
ficar além da escola não estar nem aí pra como você se sente ou pode se
sentir, na ocupa não era assim, eu era (e ainda sou pelas pessoas que sou
amigo agora) respeitado e ouvido, tinha voz [...]. Orgulho, família e superação
podem definir essa ocupação do meu ponto de vista. Orgulho por ver esse
movimento ter crescido tanto, orgulho de ver minha escola na lista de escolas
na luta, orgulho por ter participado, orgulho dos amigos que fiz e orgulho de
ter feito a diferença. Família talvez seja pra definir as pessoas desse
movimento, alguns cristãos, outros ateus, homossexuais e heterossexuais,
negros, brancos, pessoas tímidas e pessoas que nem sabem o que é timidez.
Enfim, sabe esses milhares de pessoas que se uniram pela educação, pela
democracia? As escolas que eram “rivais” se unindo e dividindo comida.
Pessoas que nem se conheciam trabalhando junto. Chegavam pessoas na
escola “do nada” e falavam pra gente “oi, trouxe comida pra vocês. Continuem
lutando! Ocupar e resistir!” E essas pessoas, que eu não conhecia e que
levaram uma ajuda, me deram ainda mais forças pra continuar. Isso me fez
ver algo até além de uma família. Superação, por explorarmos até nossa
última gota de cansaço (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 57, grifo
nosso).

Por aí se vê, que tanto no movimento estudantil paulista em 2015, quanto no


paranaense em 2016, os estudantes adotaram como um dos seus aspectos políticos
a igualdade e a democracia, sendo que a partir da adoção dos referidos valores, ficou
facilitada a aproximação, a convivência e, portanto, a defesa do que almejavam no
processo de reivindicação, já que de acordo com o texto coletivo de estudantes que
ocuparam o IFPR em Paranaguá, a convivência progrediu com o passar dos dias e
isso fortaleceu a luta, considerando as políticas adotadas.

Conforme o tempo de convivência foi aumentando, vimos que cada vez mais
nos tornávamos uma família. Ficamos confortáveis para dividir problemas
pessoais e segredos com nossos companheiros. A socialização é gigantesca,
dividimos o máximo de coisas possíveis, desde chinelos até escovas de
dente. Atualmente, estamos nos aproximando do quadragésimo dia de
ocupação. Sendo a ocupação dos Institutos Federais que mais durou e
também, a mais duradoura do Litoral do Paraná (DIVARDIM; SCHMIDT;
SOBANSKI, 2016, p. 70).

Com isso, no Movimento de Ocupação das Escolas os estudantes


perceberam outra forma de vivenciar o cotidiano, distinta da maneira tradicional e
permeado pelos valores postos em discussão no “dia a dia” da sala de aula, no entanto
sem aplicação prática até então. Vejamos o que destacaram Adilmara Catarina
Delabona Brito Boutin e Simone de Fátima Flach (2017).
111

Nesse sentido, o movimento estudantil pode ser apontado como espaço


privilegiado para o processo formativo dos jovens, tendo como pressuposto a
compreensão da realidade e de suas contradições, oferecendo possibilidades
para uma tomada de decisão a respeito da manutenção ou transformação da
realidade. O processo educativo que ocorre na vivencia do movimento
estudantil se torna coletivo e desenvolve compromissos sociais, políticos e
econômicos, podendo ser caracterizado como uma verdadeira formação
humana, que tem o compromisso com toda a coletividade (BOUTIN; FLACH,
2017, p. 8).

Outro momento que demonstra bem a adoção dos valores igualdade e


democracia como política do movimento dos estudantes, é a fala de um secundarista
de São Paulo, da Escola Estadual (EE) Doutor (DR) Eloy de Miranda Chaves, quando
é possível observar que a tática era a seguinte: um por todos e todos por um.

[EE DR. ELOY DE MIRANDA CHAVES – FACEBOOK – 28/11/15]


[...] Estamos formando um só corpo em luta pela educação. Estamos, a cada
dia, mais unidos. A cada dia, mais amigos uns dos outros. Quando começou
a ocupação, a escola era formada por panelinhas, mas agora somos como
crianças que mal se conhecem, mas brincam como se fossem os melhores
amigos do mundo. Não estamos, porém, pra brincadeiras. Estamos aqui por
uma causa séria [...] Um por todos e todos por um! (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p. 135)).

Com isso, diante das relações construídas pelos ocupantes na sociedade


durante o fenômeno, bem como em razão da forma como concretizaram as interações
no interior do movimento, transparece que consolidaram uma sólida política de
relação, igualdade e democracia, o que contribuiu para o fortalecimento dos vínculos
entre os secundaristas e lideranças comunitárias, propiciando importantes passos
com vistas a alcançar os objetivos que almejavam.

3.3.2 – POLÍTICA DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Como se vê, os estudantes estavam em luta. E a luta era pela manutenção


de direitos outrora conquistados e em vias de serem suprimidos pela política estatal
paulista de reorganização escolar na denominação do governo ou de fechamento de
escolas nos termos batizados pelos estudantes. Diante disso, frente à força e
estratégias do governo, o Movimento de Ocupação das Escolas precisava se
fortalecer e ao mesmo tempo se defender do opositor e, para tanto, fez largo uso de
outro valor estratégico, no caso, a informação. Assim, ao longo do fenômeno e em
razão da necessidade, mas principalmente considerando a postura de parcialidade
112

adotada pelos meios de comunicação tradicional, desenvolveu uma política de


informação, o que contribuiu no convencimento dos pais e estudantes que
demonstravam resistência em razão das ocupações.

Quanto mais informação os pais tinham, mais tendiam a apoiar seus filhos,
em especial quando tinham a oportunidade de visitar pessoalmente a
ocupação. Muitas vezes, uma família que tinha sido resistente no início da
mobilização acabava se envolvendo cada vez mais (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p. 242).

Não foi diferente no Estado do Paraná em 2016. No entanto, desta vez os


estudantes paranaenses, a exemplo do ocorrido em várias unidades da federação no
mesmo período, embora também lutassem pela manutenção de direitos já
conquistados e em vias de serem suprimidos, tinham como adversário o governo
federal chefiado por Michel Temer e o governo do Estado do Paraná conduzido por
Beto Richa. Nos termos já postos acima, neste caso, a luta foi travada em razão da
Medida Provisória nº 746/2016 e Proposta de Emenda Constitucional nº 241/2016 na
Câmara Federal e nº 55/2016 no Senado, tendo para tanto, os estudantes
paranaenses, também usado fortemente da comunicação como política e incremento
de luta, precisando ser salientado que o instrumento foi a mídia alternativa27, pois a
mídia tradicional28 se colocou na oposição aos secundaristas nos termos ditos acima.

Aos que, através dos jornais, recebiam informações em outras regiões do


Brasil, que imagem poderia construir das ocupações secundaristas no
Paraná? Se para os que acompanham o processo de perto as informações
eram embaraçadas, que dirá para quem de longe tentava formar alguma
opinião. Os grandes jornais brasileiros impressos e digitais, fizeram relatos
tímidos das ocupações que chegavam a passar de mil instituições de ensino.
Em pesquisa realizada catalogamos aproximadamente 13 jornais nacionais,
em versões digitais, que noticiaram as ocupações do Paraná. Todavia,
apenas 5 dos jornais catalogados estão no rank dos 50 maiores jornais do
Brasil (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 109).

Mas os estudantes paranaenses souberam utilizar os meios alternativos e


assim implementar uma política de comunicação, tanto é que se verifica a presença

27 De acordo com o contexto da bibliografia utilizada nesta pesquisa, mídia alternativa ou contra
hegemônica é a opção aos meios hegemônicos de comunicação, se destacando os instrumentos
constantes na internet e de amplo acesso ao público, dentre os quais se incluem Facebook, whatsApp,
etc.

28De acordo com o contexto da bibliografia utilizada nesta pesquisa, mídia tradicional ou hegemônica
é compreendida como os grandes e hegemônicos meios de comunicação, como é o caso das
emissoras de televisão, rádios e jornais.
113

dos instrumentos digitais em todas as direções que dirigimos o olhar, como por
exemplo, conforme Divardim, Schmidt e Sobanski (2015, p. 9) “A Primavera do
#OcupaPR-2016” e (2015, p. 27) “#todoapoioasocupaçoes, #foraMP746,
#ocupatudo”, o que demonstra que a internet foi o meio de comunicação,
predominantemente, usado pelos ocupantes de escolas no Paraná.
Em São Paulo, no entender dos estudantes, sempre foi flagrante a
parcialidade da mídia tradicional, uma vez que não noticiava os fatos de acordo com
os acontecimentos, quando eram favoráveis aos estudantes. Por outro lado, os
interesses do governo eram privilegiados no noticiário dos grandes veículos de
comunicação, de acordo com Campos, Medeiros e Ribeiro (2015), uma vez que.

Enquanto [...], mais cedo, no Bom Dia SP (também da Rede Globo), após
mostrar os danos à escola, o repórter diz que não se sabe quem fez “esta
bagunça”; e o âncora acrescenta: “De qualquer forma, a gente volta pra
aquela... que a gente já viu anteriormente, que é o vandalismo no meio do
protesto, né?” A Globo não procurou entrevistar nenhum aluno ocupante. O
máximo que fez foi pedir o depoimento da presidente da Apeoesp. (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 227).

Na realidade os estudantes encontraram na mídia tradicional uma espécie de


braço forte do adversário, o que motivou muitas reclamações dos secundaristas
paranaenses, pois “[...] O dia que senti na pele a manipulação da mídia quando os
alunos do IFPR foram para as ruas lutar contra o retrocesso na educação, e disseram
que éramos um movimento anti-ocupação [...]” (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 42). E mais, os estudantes do Paraná deixaram claro o seu entendimento
quanto a necessidade de politização como forma de evitar equívocos em razão de
conteúdos informativos que não refletem a realidade, uma vez que “[...] Faço um apelo
aos pais, e as pessoas que criticam a postura dos estudantes que ocupam, leiam
sobre as mudanças que estão por vir, se politizem, não acreditem em tudo que a mídia
tradicional lhes diz, vamos dar voz aos jovens que não aceitam mais ser silenciados
[...]” (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 55).
Além das advertências dos estudantes paranaenses para que os pais e a
comunidade tomassem cuidados com as informações dos veículos tradicionais com
vistas à manipulação, pois conforme demonstrado acima, no entender dos ocupantes,
distorciam o conteúdo informativo do que realmente ocorria nas ocupações, ainda
deixaram uma forte mensagem contra a mencionada postura do setor ao encerrar uma
ocupação no final do processo em Curitiba, “[...] Nós acusamos, A MÍDIA
114

HEGEMÔNICA, que ignora o maior movimento secundarista da história. Não


obstante, trabalha sistematicamente apoiando o faminto neoliberalismo que se
alimenta do desmonte dos serviços públicos [...]” (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI,
2016, p. 147).
Mas os estudantes, tendo conhecimento de que não poderiam contar com o
apoio dos meios de comunicação tradicional e também pela disponibilidade dos
instrumentos alternativos, claro que procuraram amparo dos últimos. Dessa forma, o
uso da internet pelos secundaristas paulistas foi amplo e irrestrito, já que.

O apoio nas redes sociais foi expressivo. Participantes e apoiadores do


movimento souberam aproveitar o potencial de diversas plataformas distintas.
O WhatsApp foi o mais importante canal de comunicação entre os próprios
ocupantes. As páginas do coletivo “O Mal Educado” e a Não Fechem Minha
Escola eram certamente as principais referências no Facebook. Mais tarde, a
página do Comando das Escolas Ocupadas passou a ser uma espécie de
canal oficinal de comunicados dos estudantes. No Twitter, o perfil
#OcupaEscola e o perfil do Centro de Mídia Independente (CMI) de São
Paulo eram provavelmente as principais referências: o primeiro cumpria a
função de informar em tempo real aos apoiadores a situação e as
necessidades das diversas ocupações, já o segundo teve papel importante
nas manifestações, cobrindo-as ao vivo e transmitindo online via streaming
de vídeo (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 258).

E, dessa forma, os estudantes do Estado de São Paulo em 2015, estando


cientes da importância da comunicação e sendo conscientes que a disponibilidade de
fato era os meios alternativos, os adotaram, o que fizeram em conjunto com outros
instrumentos, como foi o caso do telefone, obtendo, assim, importantes resultados.

[JORNALISTAS LIVRES – YOUTUBE – 29/11/15]


O que vocês têm que fazer é: informar, informar, conversar. Fazer a guerra
da informação, ao máximo possível, porque é isso que vai desmobilizando
esse pessoal e criando as agendas positivas nas escolas [invadidas], eu acho
que a gente deveria agir de duas maneiras. Uma, que foi a sugestão da
professora C., é pegar o cadastro, ligar para mães que não... ou alunos que
não estão envolvidos na invasão e fazer a informação. Informação,
informação, informação, informação. Certo? Em geral... vai dar certo. Certo?
Elas vão ouvir e quem for na conversa vai concordar, né? É ... aí você vai,
depois, ter um grupo que...resiste. De duas maneiras. Um que resiste e tem
alguma reivindicação legítima, tá certo? Que é a coisa pontual, não é?
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 215).

Com isso, fica estabelecido mais esse relevante instrumento do Movimento


de Ocupação das Escolas em São Paulo em 2015 e no Paraná em 2016, qual seja,
uma política de informação. E foi dessa maneira que os secundaristas conseguiram
avanços no contraponto ao governo e aos poucos deram visibilidade à política que
115

defendiam e, finalmente, resistir à proposta oficial de fechamento de 92 (noventa e


duas) escolas estaduais paulistas ou a política de reorganização escolar nos termos
do discurso oficial. Ao mesmo tempo, no Estado Paraná em 2016, embora os
estudantes não tenham se sagrado vencedores frente ao governo Temer e ao governo
Beto Richa, de acordo com Divardim, Schmidt e Sobanski (2015, p. 144), chegaram a
“836 escolas ocupadas” em todo o Estado e se opuseram com força à política contida
MP nº 746/2016 e nas PECs nº 241/2016 e nº 55/2016, além de terem defendido ao
longo do processo das ocupações a implementação de políticas relacionadas à
qualidade na educação e resistido à pretensão governamental de diminuição dos
recursos orçamentários educacionais.

3.3.3 – POLÍTICA DE DECISÕES TOMADAS DE FORMA HORIZONTAL

E as ocupações de escola, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná


em 2016, o que também parece ter ocorrido nas demais unidades da federação, foi
auto gestada horizontalmente e assim permaneceu ao longo de todo o processo, pois
conforme Campos, Medeiros e Ribeiro (2015, 128) “Se esta ocupação foi auto gestada
de maneira horizontal – como foi no caso dos secundaristas, isto tende a fazer com
que toda atividade ou decisão, por mínima que seja, se torne uma experiência no
exercício da democracia e da horizontalidade”, o que se estabeleceu como uma das
mais importantes políticas no decorrer do fenômeno, de acordo com as falas dos
secundaristas e demonstrado neste estudo.
É claro que a adoção do mencionado modelo não foi fácil aos estudantes,
considerando a vivência cotidiana, seja na escola ou na sociedade, totalmente voltada
para a hierarquização. E, diante das dificuldades encontradas nas interações no
interior das ocupações, bem como considerando o contexto de tarefas surgidas, os
estudantes paulistas, democraticamente e horizontalmente, logo partiram para as
orientações constantes no manual traduzido pelo coletivo “O Mal Educado”.

Evidentemente, não existe um modelo perfeito de “auto-gestão horizontal” e


surgem desafios no caminho, pois são seres humanos que cresceram e foram
socializados em uma sociedade hierárquica, e estruturas de poder
profundamente enraizadas não podem ser magicamente desaprendidas.
Porém, ficou claro que os secundaristas conceberam as ocupações como
espaços democráticos e horizontais, não apenas pelas orientações do
manual “Como ocupar um colégio?”, mas também por um simples desejo de
que ali fosse um espaço diferente do que costumavam viver na escola [...].
116

Segundo o que recomenda o próprio manual, a lógica mais comum de


organização da dinâmica das ocupações foi a criação de comissões
responsáveis pelas necessidades básicas. Assim, em grande parte
encontramos a “comissão de limpeza” a “comissão de cozinha”, a “comissão
de comunicação” e a “comissão de segurança”. Em uma escola em Santo
Amaro, na Zona Sul de São Paulo, os alunos fizeram um vídeo explicando
detalhadamente a separação de tarefas e procedimentos (CAMPOS;
MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 130).

E, a exemplo dos paulistas, os estudantes paranaenses em 2016, também


seguiram o modelo assemblear, portanto, horizontal, uma vez que foi assim que
tomaram as decisões ao longo de todo o processo, inclusive, rejeitando com
veemência a autoridade das organizações estudantis tradicionais, uma vez que não
se sentiam representados pelas mencionadas entidades e com isso foi consolidado o
princípio da horizontalidade na tomada de decisão.

Mais do que uma estratégia de resistência política, a horizontalidade das


ocupações – pelo menos daquelas que investigamos – era uma forma de
contrapor-se às organizações estudantis oficiais. A grande frequência de
falas (novamente apenas um grupo não apresenta falas a respeito, enquanto
os outros três apresentam duas ou mais citações sobre essa temática em
cada um deles) quanto a esse dado mostrou, tanto uma decepção inicial com
as organizações estudantis, quanto um sentimento posterior de não serventia
das mesmas. Dito de outro modo, de início até houve tentativas de
aproximação com essas organizações estudantis, mesmo que não tivessem
sido elas as promotoras das ocupações. Contudo, o fortalecimento da
horizontalidade nas ocupações criou um fosso entre elas e as organizações
estudantis. O mais importante é destacar que, pelas falas coletadas, o que se
percebeu foi que os jovens não se sentiam representados pelas organizações
por essas duas razões, quais sejam: (a) as organizações estudantis não
ajudaram nas ocupações; e (b) quando o fizeram, na realidade, estavam
tentando assumir a liderança de um movimento que não queria ser liderado
(STEIMBACH, 2018, p. 62).

E a ausência do debate político na escola também é percebida pelos


estudantes no decorrer das ocupações, uma vez que muitos alunos durante as
assembleias, eram percebidos pelas lideranças estudantis como tímidos e com
dificuldade para se expressar e fazer uso do poder de fala, o que somente foi sendo
mudado aos poucos e com o passar do tempo e o envolvimento dos secundaristas no
processo de ocupação, em especial no espaço de decisão, como era o caso das
assembleias, de acordo com a fala de um aluno ocupante e constante no livro Ocupa
PR 2016, o que demonstra mais uma vez a politização feita pela ocupação. E a adoção
do princípio da horizontalidade, de acordo com a avaliação dos secundaristas, foi um
dos grandes ganhos obtidos pelos estudantes no decorrer do movimento, já que foi
117

um período em que se divorciaram da esfera tradicional e assim conseguiram, não


somente ter visibilidade, mas também tomar decisões de forma autônoma e conforme
com suas necessidades e vontades através dos debates feitos em assembleia. E isso
é possível perceber na fala da estudante Pamela da cidade de Ponta Grossa,
considerando a citação a seguir delineada.

Quando as assembleias ocorriam, percebi que os alunos tinham receio de


colocar a sua opinião em pauta, tinham receio de contrariar o que estava
sendo debatido. Aos poucos, conseguimos mudar isso, pois os alunos foram
percebendo que todos fazem parte do mesmo colégio, e devem participar das
decisões que o afetam [...]. Muitas coisas aconteceram de positivo, como as
assembleias, os alunos pela primeira vez conseguiram ter voz e falar o que
pensam. Também conhecemos pessoas novas, que talvez nunca
imaginássemos conhecer, teve de haver muita colaboração de todos em
questão de limpeza, oficinas, comida, doações. Ir aos outros colégios também
foi uma experiência única, pois conseguimos perceber a união do movimento,
e o mais importante era união e um único propósito, mostrar a nossa força
para o governo e que não iríamos ficar calados (DIVARDIM; SCHMIDT;
SOBANSKI, 2016, p. 90).

Com isso, além do vasto aprendizado propiciado aos estudantes, a iniciativa


de tomarem decisões a partir de assembleia e assim garantir a democratização no
interior das escolas ocupadas, de acordo com os estudantes este formato horizontal
trouxe as soluções aos problemas organizativos que se apresentavam, de acordo com
o texto coletivo produzido pelos ocupantes do IFPR de Paranaguá, conforme
Divardim, Schmidt e Sobanski (2016, p. 67) “Decidimos ocupar após uma assembleia
chamada pelo Grêmio Estudantil, que foi a maior assembleia estudantil da instituição,
onde o debate contemplou tanto posições contrárias e a favor da ocupação. Sendo
que foram 140 votos a favor, 74 votos contra e 16 abstenções”. Dessa forma, ao
mesmo tempo em que os estudantes enfrentavam os desafiantes problemas naturais
ou não de uma ocupação, em clara resistência ao Estado, se despiam das amarras
da tradicional hierarquização vivida no cotidiano, mas também precisavam se adequar
às novidades das assembleias, o que faziam em razão da necessidade de enfrentar
o que pretendiam superar a todo custo, conforme o ocorrido e constatado no
movimento dos estudantes de São Paulo em 2015.

Parecia claro que era preciso extrapolar os mecanismos tradicionais de


participação existentes na escola para enfrentar a medida autoritária de
reorganização escolar. As ocupações comandadas pelos estudantes
conseguiram desestabilizar as hierarquias estabelecidas. A circulação da
experiência dos secundaristas argentinos e chilenos pelas redes sociais foi
118

um elemento central para isso, mas foi a apropriação ativa, criativa e autoral
dos estudantes paulistas que tornou possível a produção cotidiana das
ocupações (CORTI; CORROCHANO; SILVA, 2016, p. 13).

E a vontade de demonstrar a sua autonomia e assim rejeitar o princípio da


hierarquia já era presente no meio estudantil, o que fizeram a partir de decisões
tomadas horizontalmente e em rejeição das pretendidas políticas liberalizantes do
governo Temer em via de ser colocada em prática, nos termos ditos por estudantes
paranaenses dos Colégios Estaduais Arnaldo Jansen e Elza Scherner Moro de São
José dos Pinhais. E ainda, de acordo com as falas dos estudantes no Estado do
Paraná em 2016, as políticas adotadas pelos ocupantes, entre elas a horizontalidade,
foi uma estratégia para a resistência à política do governo federal constante,
inicialmente, na Medida Provisória nº 746/2016, que na sequencia também incorporou
a Proposta de Emenda Constitucional nº 241 de 2016, nos termos que têm sido
demonstrados neste estudo e de acordo com a citação seguinte.

Alguns estudantes já tinham o interesse de fazer algo grandioso e que de


alguma forma comovesse toda a sociedade. Quando o 1º colégio ocupou
vimos que era isso que deveríamos fazer, um movimento grandioso e
histórico. Logo fomos o 2º a ocupar”. “A ocupação já era cogitada por alguns
alunos, o ocupa do Arnaldo foi um gatilho. Nesse momento pensamos: Isso
é possível e fomos atrás de informações para que se concretizasse”
(Depoimentos de jovens secundaristas do C.E. Elza Scherner Moro –
31/10/2016) [...]. Desde o início até agora (27 dias), o foco é que seja
revogada a MP 746/2016, juntamente com a PEC 241 (agora PEC 55). Nós
estamos desde o início declarando nosso repúdio a MP 746/2016 como
principal foco, mas no decorrer do movimento acrescentamos a PEC 241.
(Depoimento de jovens secundaristas do C.E. Elza Scherner Moro –
31/10/2016) (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p 33).

Dessa forma, com a adoção das políticas referidas acima, largamente


vigentes no processo do Movimento de Ocupação das Escolas, sendo elas: relação
interna e com a comunidade, igualdade, democracia, comunicação e horizontalidade,
os estudantes de São Paulo em 2015 e do Paraná em 2016, conseguiram fazer o
enfrentamento aos governos paulista e federal, e assim se oporem à pretensão estatal
de fechar 92 unidades escolares no Estado, e, ao mesmo tempo, defender a
construção de uma escola democrática e de qualidade. Da mesma forma, os
estudantes paranaenses no segundo semestre do ano de 2016, se opuseram, com
veemência, à pretensão do governo Michel Temer quanto a implementação da
reforma educacional e supressão de recursos orçamentários educacionais, ao mesmo
119

tempo em que apresentaram um rol de reivindicações, nas quais também se inclui


maior qualidade na escola pública.
Dessa forma, a luta dos secundaristas em São Paulo em 2015 com vistas a
manutenção dos direitos conquistados ou de enfrentamento da política do governo
paulista de reorganização escolar, assim como quanto ao movimento estudantil
ocorrido no Paraná em 2016 de enfrentamento da política educacional do governo
federal, ambos os temas já foram debatidos nos subcapítulos 3.1 e 3.2. Em que pese
o debate já realizado, considerando que em ambos os casos o Movimento de
Ocupação das Escolas, tanto em São Paulo, quanto no Paraná, os estudantes não se
limitaram em apenas rechaçar as pretensões dos governos, uma vez que fizeram uma
série de reivindicações, em especial de uma escola pública capaz de superar
paradigmas que não podem continuar vigendo, de acordo com o entendimento dos
estudantes, uma vez que buscaram a institucionalização de outro modelo escolar e
que estivesse de acordo com os anseios e necessidades do tempo atual.

Por isso, ao ocuparem as escolas, os estudantes não apenas conseguiram


barrar o fechamento das mesmas, mas lançaram o olhar de uma parcela
importante da sociedade para a discussão sobre o sentido da educação
pública no mundo contemporâneo, reafirmando a dimensão espacial da
escola e de si mesmos. Ao se apropriarem das escolas, ocupando-as em
suas diferentes dimensões, tornaram-se também responsáveis por elas e
capazes de definir a sua própria organização, produzindo outra geografia da
educação pública (GIROTO, 2016, p. 17).

Assim, o Movimento de Ocupação das Escolas nos Estados de São Paulo e


Paraná, ao se opor e resistir às políticas do governo que entendiam como retrogradas
em relação ao sistema educacional, no caso a política do governo de São Paulo de
fechar unidades escolares e o governo federal de reorganizar o Ensino Médio, bem
como suprimir recursos orçamentários educacionais, também denunciaram o cabedal
de mazelas que vivencia a escola pública brasileira. Além disso, ainda apresentaram
um rol de reivindicações, portanto, apontaram o problema e indicaram a solução, ao
mesmo tempo em que fizeram o enfrentamento demonstrando força social, coesão e
organização, ficando claro, conforme Divardim, Schmidt e Sobanski (2015, p. 102), de
acordo com a fala do estudante Arlequim do ensino médio de Curitiba “A juventude
liderou movimentos, produziu pensamentos e promoveu ideologias [...] uma juventude
que pensa, que liberta [...]”.
120

Diante disso, e sob o ponto de vista político, onde está o fator comum que
uniu ou une os estudantes em movimento? De acordo com o que demonstra o estudo
realizado, o ponto comum ou unificador dos secundaristas em torno das mesmas
bandeiras foram justamente as políticas praticadas pelo Movimento de Ocupação das
Escolas no decorrer das suas atividades, seja em São Paulo em 2015 ou no Paraná
em 2016, considerando os seus significados como instrumentos amalgamadores da
convergência dos jovens no combate às indesejadas políticas dos governos e em
busca da efetivação das suas reivindicações e resistências nos termos discutidos. A
par disso, também se encontra a vontade ímpar e o ânimo invencível de lutar dos
secundaristas, mais a elevada consciência da necessidade de estabelecer um novo
tempo que esteja de acordo com a atualidade e conforme os seus anseios, além dos
exemplos de resistência e lutas dos estudantes do passado. Esse conjunto de fatores
demonstra que as ações dos estudantes consubstanciadas no Movimento de
Ocupação das Escolas se encontram amparadas pelo sistema político vigente
atualmente no Brasil, ou seja, a democracia, inclusive considerando o marco
constitucional e legal em vigor, as políticas praticadas e a forma como a resistência,
protestos e reivindicações foram exercitados, o que significa mais uma importante
etapa da luta história dos secundaristas, tanto em 2015 no Estado de São Paulo,
quanto em 2016 no Estado do Paraná, cujo resultado é o acúmulo obtido nos
processos de luta desencadeados no decorrer do tempo.
121

4 - PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS29 DO MOVIMENTO ESTUDANTIL DE


OCUPAÇÃO DAS ESCOLAS DE SÃO PAULO EM 2015 E DO PARANÁ EM 2016

Aqui discutiremos os direitos educacionais assegurados pela legislação


brasileira, tanto na Constituição Federal de 1988, quanto na legislação
infraconstitucional, subcapítulo 4.1, bem como as questões relacionadas às
ocupações das escolas propriamente ditas e os meandros relacionados às
desocupações, o que envolve o direito à liberdade de expressão do pensamento, de
reunião e plena liberdade de associação, subcapítulo 4.2; o direito da participação da
comunidade nas decisões sobre educação, subcapítulo 4.3; a proteção integral da
criança e do adolescente, subcapítulo 4.4; assim como as questões possessórias nos
litígios entre o Estado e os estudantes, e a educação como direito público subjetivo,
subcapítulo 4.5, tendo em vista responder a questão se o Movimento de Ocupação
das Escolas ora em estudo possui legalidade ou não sob o ponto de vista da legislação
vigente.

4.1 - OS DIREITOS EDUCACIONAIS PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA


A PARTIR DE 1988

Com o fim de averiguar a legalidade do Movimento de Ocupação das Escolas


ocorrido no Estado de São Paulo em 2015 e Paraná em 2016 sob o ponto de vista da
legislação vigente, neste subcapítulo, serão destacados os direitos educacionais
assegurados pelo marco constitucional e legal. Para tanto, é analisado o combate feito
pelos estudantes às políticas do governo paulista e do governo federal em via de
serem implementadas nos períodos mencionados acima. Da mesma forma, será
demonstrada a busca da qualidade educacional feita pelos estudantes ao longo das
atividades do movimento, o que fizeram de maneira concomitante ao enfrentamento
e a resistência contra os governos.
Nesse sentido, é necessário debater o sistema educacional brasileiro, bem
como averiguar sob o ponto de vista das divergências que têm ocorrido entre os

29 Conforme o Dicionário Aurélio: 1. Relativo ou pertencente ao direito. 2. Conforme aos princípios do


direito; lícito; legal.
122

movimentos estudantis, de professores e setores sociais progressistas30 por um lado


e Estado, governo e setores sociais conservadores31 por outro. No que tange às
referidas divergências, conforme já colocado, tem estudantes, professores e setores
sociais progressistas de um lado e Estado, elites dirigentes e setores sociais
conservadores por outro. Por isso, fazemos a discussão demonstrando o esforço do
primeiro grupo na busca de qualidade educacional e os enfrentamentos e resistências
aos governos, assim como o descompromisso e irresponsabilidade do segundo com
uma política vigorosa de Estado voltada para o setor, inclusive rejeitando a pertinência
das reivindicações do Movimento de Ocupação das Escolas.
Quanto ao direito à educação, garantido pelo sistema jurídico, demonstramos
a sistemática adotada pela Constituição Federal de 1988 e todo o cabedal de direitos.
No mesmo sentido e como legislação ordinária ou infraconstitucional, o que é
assegurado no Plano Nacional de Educação (PNE), Lei Federal n° 13.005/2014, e Lei
Federal nº 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), com os avanços
obtidos até 2014, inclusive perseguindo importantes objetivos delineados pelos
compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito internacional.
No que se refere ao Movimento de Ocupação das Escolas, é debatido e
demonstrado que em São Paulo, no segundo semestre de 2015, os estudantes
lutaram contra as medidas do governo paulista de supressão de direitos e, portanto,
para garantir o que outrora foi conquistado, bem como a relação desse contexto de
disputa com a qualidade educacional. No que se refere às ocupações de escolas
ocorridas no Paraná em 2016, a exemplo de outras unidades da federação,
demonstramos que as causas são as medidas do governo federal chefiado por Michel
Temer e que tiveram por objetivos a contenção de gastos e reforma antidemocrática
do Ensino Médio, levando os estudantes à luta, e da mesma maneira, seguindo o
exemplo dos estudantes paulistas, se mobilizaram para garantir direitos já
assegurados juridicamente.

30De acordo com o contexto da bibliografia analisada nesta pesquisa, aqueles setores integrantes da
sociedade civil, que ao longo do período de ocupação das escolas deram apoio aos estudantes,
inclusive fornecendo alimentos, proferindo palestras e fomentando o debate sobre a necessidade de
investimento no setor e de defesa de uma educação com mais qualidade para todos.

31De acordo com o contexto da bibliografia analisada nesta pesquisa, aqueles setores integrantes da
sociedade civil, que ao longo do período de ocupação das escolas, se posicionaram contra a ação do
movimento dos estudantes, inclusive os agredindo verbal e fisicamente, além de, permanentemente,
defenderem a imediata desocupação das unidades escolares.
123

Por fim, considerando os fins para os quais o estudo se propôs, bem com os
seus limites, demonstraremos quais os aspectos jurídicos que permearam o
Movimento de Ocupação das Escolas. E que, no centro do movimento estudantil, está
a busca da qualidade no sistema educacional público brasileiro e contra os entraves
existentes para os avanços almejados nessa importante política pública.
É entre o que diz a legislação vigente32 e o que demonstra a realidade do
sistema educacional brasileiro que deveremos aferir o “nível” da qualidade da escola
pública à disposição do estudante do Ensino Básico em nosso país. Com o olhar
nesse sentido, logo percebemos quão cristalina é a discrepância entre a previsão legal
e o que os alunos vivenciam no interior das escolas, eis que evidente o
descumprimento do previsto legalmente, ao ponto do ensino público ser “palco” do
fenômeno aqui estudado, cuja pauta estudantil, de natureza plural, se referia, em
primeira mão, à manutenção de direitos já conquistados, ao passo que a pretensão
dos governos, por seu turno, embora com outro discurso, estava no sentido contrário
e com vistas à contenção de despesa, o que significava desconsiderar direitos outrora
conquistados e, portanto, já assegurados pelo sistema jurídico vigente.
E essa luta pela garantia de direitos foi verbalizada vastamente e com força
pelos estudantes no Paraná, de acordo com a fala da estudante Ana Julia Pires
Ribeiro na Assembleia Legislativa Paranaense (ALEP) durante as ocupações das
escolas do Estado no segundo semestre de 2016.

A PEC 241 é outra afronta a gente. É inconstitucional! Ela é uma afronta à


Constituição cidadã de 88! Nela a gente tem a seguridade social. A PEC 241
acaba com isso! É uma afronta à Previdência Social, é uma afronta à saúde,
é uma afronta à educação, é uma afronta à assistência social! A gente não
pode, simplesmente, deixar isso acontecer! A gente não pode cruzar os
braços pra isso! (DIVARDIM; SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 79).

A Constituição Federal do Brasil de 1988, em seu Título VIII, Capítulo III,


como regra maior, disciplina o acesso à educação de forma ampla, obrigatório e
gratuito para o Ensino Básico, dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos, e tendo-o como
direito público subjetivo, o que faz a partir do art. 205 até o 2014, em cujos dispositivos
é elencado um rol de direitos em favor dos estudantes e um cabedal de obrigações
impostas ao poder público em todos os âmbitos, tanto aos Municípios, quanto aos

32Constituição Federal 1988, Título VIII, Capítulo III; LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9.394 de 1996; Plano Nacional de Educação – Lei Federal 13.005 de 2014.
124

Estados e à União. Essa normatização deveria ensejar um elevado grau de segurança


e esperança, pelo menos na dimensão da previsão constitucional, o que, no entanto,
sabemos que não ocorre de fato em razão da insistente omissão da sociedade e do
Poder Público competente para tanto.
Vejamos, inicialmente, o que dispõe o artigo 205 da Constituição Federal, “A
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”
(BRASIL, 1988). Como se vê, trata-se de norma que obriga e impõe deveres a todos,
e com isso tem por objetivos o pleno desenvolvimento do ser humano, busca o ápice
da vida cidadã e, ao mesmo tempo, insere e estabelece a preocupação quanto à
formação para a vida profissional. O texto demonstra ser regra de valor lapidar e, por
ser constitucional, a vigência deveria ser plena e com aplicação imediata, o que não
ocorre na prática, conforme será demonstrado no decorrer deste estudo.
Mais adiante, no art. 208, além da obrigatoriedade e gratuidade do ensino
dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos e também a todos aqueles que não tiveram
acesso na idade própria, nos termos previsto no inciso I; o inciso II prevê a progressiva
universalização do Ensino Médio; o inciso III o atendimento especializado às pessoas
com deficiências; no inciso IV, para a Educação Infantil, prevê creche e pré-escola,
até 5 (cinco) anos; no inciso V o acesso aos mais elevados níveis do ensino, pesquisa
e criação artística de acordo com o potencial individual; no inciso VI o ensino regular
noturno de acordo com as condições do educando e, no inciso VII, acesso à escola,
em todas as fases da educação básica (Ensino Infantil, Fundamental e Médio), através
de programas suplementares de material didático, transporte, alimentação e
assistência à saúde.
Ainda no mesmo art. 208, com o fim de fortalecer a aplicabilidade das normas
acima referidas, o legislador constituinte, no § 1º, elevou o ensino obrigatório à
condição de direito público subjetivo, e no § 2º, disciplinou responsabilidade à
autoridade competente que não oferte, adequadamente, o ensino obrigatório. Além
disso, na mesma ocasião, no § 3º, ainda fortalecendo o direito ao acesso à educação,
atribuiu competência ao Poder Público para recensear os educandos no Ensino
Fundamental, assim como para fazer a chamada e zelar, juntamente com a família,
pela efetiva frequência à escola, conforme se observa nas normas a seguir citadas.
125

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. § 2º


O não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta
irregular, importa responsabilidade da autoridade competente. § 3º Compete
ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes
a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola
(BRASIL, 1988).

Dessa maneira, a nível constitucional, portanto, a partir da regra maior, o


legislador constituinte brasileiro elencou com enorme força o direito ao acesso à
educação, ao mesmo tempo em que definiu deveres e atribuiu responsabilidades aos
gestores públicos quanto à matéria, o que demonstra que o país delineou uma política
de Estado relacionada ao projeto educacional.
Da mesma maneira, a rigor do que se observa no art. 211 e respectivos
parágrafos da Constituição Federal da República de 1988, encontra-se rigorosamente
disciplinado na legislação a parte organizativa educacional. Com isso, é definida a
competência de cada ente federado, sendo os Municípios responsáveis pelo Ensino
Fundamental e Educação Infantil, enquanto Estados e Distrito Federal atuam,
prioritariamente, no Ensino Fundamental e Médio, com a seguinte determinação no
parágrafo quarto do mencionado artigo: “§ 4º Na organização de seus sistemas de
ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de
colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório” (BRASIL,
1988).
Antes disso, já no § 1º do art. 2011, ao tratar das questões organizacionais
de forma rigorosa, a Constituição Federal de 1988 passa a cuidar do financiamento
educacional, bem como no que se refere à qualidade, uma vez que impõe padrões
mínimos nesse sentido.

§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios,


financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria
educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização
de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino
mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e
aos Municípios (BRASIL, 1988, grifo nosso).

E, no art. 2012, com vista a garantir qualidade educacional, é aprofundado o


disciplinamento sobre o financiamento da educação, com definição dos percentuais
do orçamento a serem aplicados em educação por cada ente federativo, sendo, no
mínimo, dezoito por cento da União, enquanto Estados, Distrito Federal e Municípios,
pelo menos vinte e cinco por cento, montantes que não têm sido considerados
126

razoáveis diante da realidade brasileira para obtenção da qualidade educacional


almejada, por isso, as constantes reivindicações de aumento dos recursos destinados
à área educacional, bem como o comumente clamor de estudantes e professores.
Nesse sentido, e ainda com vistas a atingir os objetivos de alcançar melhorias
na área educacional, portanto, com vista à qualidade, a Constituição Federal de 1988,
determina o estabelecimento de Plano Nacional de Educação (PNE). Assim, elenca
um conjunto de objetivos a ser alcançado, o que faz de acordo com a regra do art.
214, a partir da Emenda Constitucional nº 59 de 2009, conforme o texto a seguir
delineado.

Art. 214. A lei estabelecerá o Plano Nacional de Educação, de duração


decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em
regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de
implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino
em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas
dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: I -
erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III
- melhoria da qualidade do ensino; IV - formação para o trabalho; V -
promoção humanística, científica e tecnológica do País; VI - estabelecimento
de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do
produto interno bruto (BRASIL, 2009, grifo nosso).

Com isso, cumprindo as determinações do art. 214 da Constituição Federal,


foi aprovado o Plano Nacional de Educação através da Lei Federal nº 13.005, de 25
de junho de 2014, cujo art. 2º definiu 10 (dez) diretrizes, nas quais está inclusa
melhoria na qualidade da educação, nestes termos:

Art. 2º São diretrizes do PNE: I - erradicação do analfabetismo; II -


universalização do atendimento escolar; III - superação das desigualdades
educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de
todas as formas de discriminação; IV - melhoria da qualidade da educação;
V - formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores
morais e éticos em que se fundamenta a sociedade; VI - promoção do
princípio da gestão democrática da educação pública; VII - promoção
humanística, científica, cultural e tecnológica do País; VIII - estabelecimento
de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do
Produto Interno Bruto - PIB, que assegure atendimento às necessidades de
expansão, com padrão de qualidade e equidade; IX - valorização dos (as)
profissionais da educação; X - promoção dos princípios do respeito aos
direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental
(BRASIL, 2014, grifos nosso).
127

De acordo com a lei acima referida, o Plano Nacional de Educação (PNE)


possui vigência por 10 (dez) anos, e o objetivo é o cumprimento de 20 (vinte) metas
até 2024, com destaque para o fator relacionado à qualidade. Porém, a pretensão em
questão não tem sido atingida, a rigor do que demonstram as reivindicações dos
movimentos estudantis e as pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE)
Assim, de acordo com a Lei nº 13.005/2014 já mencionada, é estabelecido
pela Meta 7 o seguinte: “fomentar a qualidade da educação básica em todas as
etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem de modo a
atingir as seguintes médias nacionais para o IDEB:” (BRASIL, 2014, grifo nosso).
Dessa forma, seguindo a orientação da Meta 7, da Meta 8 até a Meta 12,
define que até 2024, obrigatoriamente, o país precisa atingir uma série de objetivos
com vista a inserção escolar, portanto, se referindo ao acesso e permanência de
maneira a combater a evasão escolar e o analfabetismo, além da busca de indiscutível
progresso na formação profissional, inclusive nas regiões mais pobres do país.
Mais adiante, considerando a evidente necessidade de avanços em termos
de qualidade educacional, com a Meta 13 estabelece: “Elevar a qualidade da
educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente
em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75% (setenta
e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco por cento) doutores”
(BRASIL, 2014) (grifos nosso).
Por fim, na Meta 20, desta vez em respeito ao art. 212 da Constituição
Federal da República e com o fim de implementar o elenco de objetivos disciplinados
legalmente, o Plano Nacional de Educação cuida da política relacionada ao
financiamento da educação pública e, assim, estabelece o seguinte: “Ampliar o
investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar
de 7% (sete por cento) do Produto Interno Bruto - PIB do País no 5º (quinto) ano de
vigência desta Lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final
do decênio” (BRASIL, 2014).
Com isso, considerando o disposto na Constituição Federal da República
brasileira de 1988, assim como os objetivos elencados no Plano Nacional de
Educação, ou seja, na Lei Federal nº 13.005 de 2014, é difícil não reconhecer a
preocupação de setores do parlamento, bem como de elevada parcela da sociedade
brasileira com uma política educacional que fomente a qualidade, a partir de uma
128

concreta formação cidadã, desenvolvimento humano e real preparo para o trabalho.


Essa preocupação também se vê inserida na LDB (BRASIL, 1996), uma vez que em
seus dispositivos disciplina, organiza e fortalece toda a política já referida, em que
pese a realidade fática não se encontrar no mesmo sentido, a rigor do que
demonstram as constantes reclamações de estudantes, professores e setores
progressistas da sociedade civil, de acordo com a fala de um cidadão apoiador do
Movimento de Ocupação das Escoas no Paraná em 2016 e presente no livro Ocupa
PR 2016.

Sou apoiador das ocupações por saber o grande impacto negativo que vai
ocorrer com a aprovação da PEC 241, atual PEC 55/16 e da MP 746, a
primeira quer congelar investimentos de áreas precárias, como a educação,
onde há congelamento não há evolução. A segunda reorganiza o Ensino
Médio de modo que estudantes trabalhadores pobres serão prejudicados,
porque vão ter que escolher estudar ou até mesmo passar fome (DIVARDIM;
SCHMIDT; SOBANSKI, 2016, p. 143).

Os objetivos estabelecidos através da Meta 20 do Plano Nacional de


Educação, considerando os recursos orçamentários a serem disponibilizados à
educação, certamente poderiam facilitar e até concretizar a implementação da política
do setor previsto na Constituição da República de 1988 e na Lei Federal nº 9.394 de
1996 (LDB). Porém, o referido direito já conquistado sofreu um forte “golpe” com as
reformas feitas pelo governo Temer no decorrer dos anos de 2016 e 2017, através da
Lei Federal nº 13.415, de 17 de fevereiro de 2017 e da Reforma Constitucional nº 95,
de 15 de dezembro de 2016, o que significa um enorme retrocesso para o plano de
metas educacionais previstas na Lei Federal nº 13.005/2014, o que ensejou o
Movimento de Ocupação das Escolas no Brasil em 2016, inclusive no Estado do
Paraná, quando os estudantes resistiram e enfrentaram as pretensões do governo, de
acordo com o presente estudo e conforme o debate realizado no capítulo 3,
subcapítulos 3.2 e 3.3.
Em razão de política semelhante à praticada pelo governo federal, visando
contenção de despesas, em 2016, no decorrer do ano de 2015 os estudantes paulistas
também desaguaram um vasto Movimento de Ocupação das Escolas, o que ocorreu
considerando as pretensões do governador Geraldo Alkmin de simplesmente fechar
92 (noventa e duas) escolas com vistas à supressão de gastos, conforme já
demonstrado no capítulo 3, subcapítulo 3.1. Essas medidas, seja aquela adotada pelo
governo paulista ou a referente ao governo federal, significam um enorme tropeço das
129

pretensões de alcançar uma real qualidade na educação brasileira, com vasto prejuízo
aos estudantes e à sociedade como um todo, o que coloca o país na contramão dos
compromissos assumidos no plano internacional e com a própria sociedade brasileira,
ao mesmo tempo em que contrapõe os avanços obtidos através da legislação
aprovada nos últimos anos e até 2014, inclusive no que se referem ao PNE (Plano
Nacional de Educação), além dos demais direitos assegurados aos estudantes pelo
marco constitucional e infraconstitucional de acordo com o debate a seguir delineado.

4.2 - DO DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO, DE


REUNIÃO E PLENA LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO

A luta travada pelos estudantes, tanto em São Paulo em 2015, quanto no


Paraná em 2016, a partir da análise do direito à liberdade de expressão do
pensamento, a sinalização que encontramos é favorável ao pleito estudantil,
considerando o disposto no art. 5º, inciso IV, da Constituição Federal, uma vez que a
referida norma diz o seguinte “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado
o anonimato” (Brasil, 1988). Ora, o que os estudantes do Movimento de Ocupação
das Escolas fizeram, conforme já longamente demonstrado, foi se manifestar em
combate à política do governo com a qual não concordavam, e ao mesmo tempo
reivindicavam melhores condições educacionais, o que fizeram de forma totalmente
pública, portanto, sem nenhum anonimato. Com isso, a priori, até aqui não se vê
nenhuma ilegalidade nas atividades dos estudantes, por isso, considerando o estudo
realizado, é possível afirmar que o Poder Judiciário agiu de acordo com o sistema
jurídico vigente ao proferir decisões contra o Estado e, em via de regras, favoráveis
aos estudantes, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná no ano de 2016 a
respeito da ocupação das escolas, sendo no caso paranaense, pelo menos em
algumas situações, já que em outras as decisões foram favoráveis ao Estado, ocasião,
na qual, transparece o pensamento relacionado à luta de classes, representado pelos
Juízes de Direito que se posicionaram contra os direitos dos estudantes
flagrantemente previstos no sistema jurídico.
Mais adiante, ainda no art. 5º e desta vez no inciso XVI, a norma fundamental
estabelece “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao
público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião
anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à
130

autoridade competente” (BRASIL, 1988). Aqui, pelo que se vê, parece se encontrar o
“nó górdio” que precisa ser desatado, pois, como é certo, os estudantes integrantes
do Movimento de Ocupação das Escolas se reuniram de forma pacífica e sem armas
em local público e cujo evento, pelo que demonstra este estudo, era do conhecimento
das autoridades públicas. O problema, de acordo com as próprias alegações do
governo e do contra movimento, é que o mesmo espaço é destinado para outros
estudantes com pensamento contrário daquele defendido pelos secundaristas
ocupantes das escolas.
E, ainda, quanto ao direito à manifestação, precisamos verificar o disposto no
art. 5º, inciso XVII, da Constituição Federal da República, eis que assim estabelece,
vejamos: “é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter
paramilitar” (BRASIL, 1988). Portanto, mais uma vez, não se observa nenhuma
ilegalidade nas ações estudantis, pois os secundaristas, de acordo com os estudos,
sempre se associaram, tanto em 2015 em São Paulo, quanto em 2016 no Paraná,
para fins lícitos e à margem de qualquer pretensão paramilitar.
Os três dispositivos constitucionais retromencionados asseguram, portanto,
aos estudantes do Movimento de Ocupação das Escolas, a exemplo de qualquer outro
brasileiro, o direito à liberdade de pensamento e expressão, bem como de reunião e
associação, no entanto, sem que seja possível fugir da polêmica já estabelecida. E o
motivo do embate tem a sua razão de ser, pois “A liberdade de expressão de
pensamento é tida por uma das mais importantes. Talvez por isso mesmo seja das
que maior número de problemas levanta” (BASTOS, 1996, p. 173).
Na esteira do direito à liberdade de expressão, o direito de reunião e
associação, também, nem sempre conseguem se afastar da polémica, pois ainda de
acordo com Celso Ribeiro Bastos (1996), somente no início do século passado é que
as liberdades coletivas passaram a ter espaço no direito positivo europeu, que por sua
vez, influenciou a legislação brasileira.

Em síntese, é só no começo do século XX que as liberdades coletivas, de


reunião e de associação, acabam por encontrar seu lugar no direito positivo
francês, sendo desnecessário salientar a influência que este direito exerceu
no mundo, sobretudo em matéria de liberdades públicas. O direito brasileiro
sofre influência do europeu, cuja aversão ao direito de associação – descrita
especificamente no que concerne à França, como visto no tópico anterior –
era agasalhada igualmente por outros países (BASTOS, 1996, p. 188).
131

O exposto acima pode contribuir para compreendermos as dificuldades para


a aceitação e reconhecimentos de alguns direitos sociais, civis e políticos, em especial
quando se trata de estudantes em atividades de protestos e reivindicações na
sociedade de classes. Além disso, embora sem outros impedimentos, é preciso
considerar a limitação presente no inciso XVI, do art. 5º, da Constituição Federal, nos
termos acima referidos, pois “desde que não frustrem outra reunião anteriormente
convocada para o mesmo local” (BRASIL, 1988). Amparo sempre invocado pelo
Estado nas ações judiciais de reintegração de posse propostas contra os estudantes
ocupantes, considerando a alegação de necessidade de assegurar o acesso à escola
aos estudantes contrários ao movimento, definição que temos como totalmente
descabida. Não cabe, no caso, a referida alegação do Estado, pois, a partir do
constatado neste estudo, a divergência se estabelece em razão dos secundaristas
ocuparem as escolas exercendo direitos previstos na legislação vigente, o que podem
fazer em qualquer espaço público, enquanto, por outro lado, o direito assegurado aos
estudantes não ocupantes deve ser assegurado pelo Estado e sem que cerceie, em
nenhuma hipótese, as iniciativas daqueles que estão reivindicando, protestando e
resistindo, mesmo que seja no interior das escolas ou em qualquer outro espaço
público, considerando o direito constitucional de poder exigir educação de qualidade.
E nessa linha de entendimento, se encontra a decisão do Juiz de Direito de
São Paulo Luiz Felipe Ferrari Bedendi, uma vez que em ação possessória ajuizada
pelo governo paulista o teor da decisão proferida, de forma revisional, foi contrário aos
interesses do Estado e reconhecendo os direitos de protestos dos alunos ocupantes
entendeu que não se tratava de problema possessório, que os alunos exerciam o
direito de protesto assegurado em lei e que o assunto se referia a uma questão
política, de acordo com o que consta no livro “Escola de Luta’.

Surpreendentemente, na noite desta mesma sexta-feira 13, o juiz Luiz Felipe


Ferrari Bedendi altera sua compreensão do caso e suspende a reintegração
de posse das escolas ocupadas. Foram basicamente três argumentos
apresentados por ele em sua decisão para a suspensão. Em primeiro lugar,
o juiz reconheceu que as ocupações não tinham intenção de tomar a
posse da escola e sim tinham “caráter eminentemente protestante”.
Desse modo, fica provisoriamente legitimada no Poder Judiciário a ocupação
de escolas enquanto forma de manifestação: não se trata de questão de
posse e sim de política e de política pública (CAMPOS; MEDEIROS;
RIBEIRO, 2015, p. 98, grifos nosso).
132

No mesmo sentido e conforme foi reconhecido em decisão judicial proferida


na cidade de Apucarana nos autos de ação possessória nº 0012.059-
08.2016.8.16.0044, em cuja ocasião o magistrado paranaense reconheceu que os
alunos ocupantes tinham o direito à livre manifestação.

Neste contexto, concluo, em exame perfunctório, que o movimento de


ocupação reveste-se de direito à livre manifestação, este garantido
constitucionalmente. Afinal, o movimento visa a chamar a atenção da
sociedade para as medidas que se pretende adotar e que podem afetar a
educação. Pensar diferente é tolher o direito de livre manifestação (PARANÁ,
2016).

E prossegue o juiz referido ao decidir nos autos nº 0012059-


08.2016.8.160044, salientando que os secundaristas exerciam o direito à livre
manifestação assegurada constitucionalmente. Assim, mesmo diante das alegações
do Estado de que precisava garantir aos alunos integrantes do contra movimento
quanto ao acesso à escola e às aulas, os direitos dos ocupantes de protestar, se
manifestar e se expressar precisavam ser garantidos e dessa forma decidiu da
seguinte maneira.

Por derradeiro, convém realçar que este magistrado é sabedor de que há


muitos pais e alunos que não apoiam as invasões e que desejam que os
locais sejam desocupados para que seja garantido o sagrado direito à
educação e que não ocorram prejuízos no ano letivo, na realização do ENEM
ou na obtenção de certificado de conclusão de ensino médio (passaporte para
o ensino superior) advindos do movimento desencadeado pelos estudantes
“paredistas”. Entretanto, por ora, diante da colisão de direitos igualmente
conferidos e protegidos pela Carta Maior da República brasileira, como supra
examinado, há de ser fazer valer o direito a livre manifestação (PARANÁ,
2016).

E os fundamentos retro citados e utilizados pelo magistrado ao fundamentar


a decisão contra o Estado possuem forte razão de ser, uma vez que tanto os
estudantes paulistas33, quanto os paranaenses34, considerando o constatado neste
estudo, tiveram o direito à liberdade de expressão fortemente atacado, em que pese
terem resistido e assim exercitado o direito de se expressar, protestar e de reivindicar.

33
CAMPOS, Antonia M; MEDEIROS, Jonas; RIBEIRO, Marcio M. “Escolas de Luta”. São Paulo:
Veneta, 2016.
34 SCHMIDT, Maria Auxiliadora; DIVARDIM, Thiago; SOBANSKI, Adriane. “Ocupa PR 2016: Memórias

de Jovens Estudantes”. Curitiba: W&A Editores, 2016.


133

E nesse sentido é a fala de um aluno secundarista paulista no livro Escolas de Lutas,


uma vez que faz transparecer a tentativa estatal de calá-los o tempo todo.

[EE ROSA – FACEBOOK – 30/11/15]


Hoje não foi um dia como os outros ... talvez a repulsa e a revolta possam
tomar conta de mim, as isso não importa ... Saí de casa, eram mais ou menos
8h ... como de retina. Peguei o ônibus, não qualquer um, mais um que
carregava guerreiros. Quem tem coragem de se espremer, de se diminuir, de
colocar a sua cara à tapa todo dia de manhã. E quantos guerreiros há em um
dia só .... Hoje mesmo, eu vi ... a coragem que nós estudantes temos. Sempre
soube dela, mas hoje ela foi me apresentada de uma forma inesquecível de
como lutar pelo direito de estudar, como lutar pelo direito de ir e vir. Lutar e
não ser oprimido. Não é só a “reorganização”, é lutar contra um estado que
como vampiro, nos suga o sangue, nos suga até acabar com nossas energias
e esperanças ... e assim acha que somos uma presa fácil. Mas eles só acham
mesmo. [...] O dia acaba, mas a luta não ... Estamos preparados para a
guerra, mas uma guerra justa. Guerra que já saímos ganhando, sabe por
que? Porque não aceitamos calados. Vocês não vão sugar nosso sangue
(CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 242, grifos nosso).

Quanto ao ocorrido no Paraná, essa pretensão do Estado de cercear o direito


à liberdade de expressão dos jovens estudantes se torna cristalina no discurso da
secundarista Ana Julia Pires Ribeiro realizado na Assembleia Legislativa do Paraná
(ALEP) e presente no livro “Ocupa PR 2016” (p. 77/80), quando a estudante, de forma
muito incisiva, protesta contra pautas do governo como é era o caso da “Lei da
Mordaça” e Escola Sem Partido, em contraponto claro às posturas oficiais.
Com isso, a partir do exposto, já é possível visualizar que o direito dos
estudantes do Movimento de Ocupação das Escolas, na visão de parcela do Poder
Judiciário e de acordo com as decisões proferidas em função do fenômeno de 2015
em São Paulo e 2016 no Paraná, pelo menos um dos seus pilares, é decorrente do
direito de liberdade de expressão, de reunião e associação para fins lícitos nos termos
acima postos, tendo como fundamento primeiro o princípio democrático como
premissa assegurada na Constituição Federal de 1988.

4.3 O DIREITO DA PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NAS DECISÕES SOBRE


AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS

Quanto à participação da comunidade nas decisões sobre educação, a


exemplo do direito à liberdade de expressão e manifestação, é importante
observarmos a norma constitucional presente nos arts. 205 da Constituição Federal
134

de 1988, eis que fundamento primeiro de decisão judicial proferida pelo judiciário
paulista, uma vez que disciplina o seguinte: “A educação, direito de todos e dever do
Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988). Pelas mesmas razões,
eis o disciplinado no art. 206, inciso VI, também da Constituição Federal: “O ensino
será ministrado com base nos seguintes princípios: “[...] VI - gestão democrática do
ensino público, na forma da lei” (BRASIL, 1988).
E, seguindo os mandamentos constitucionais, como amparo imediato à
comunidade escolar, afloram as normas infraconstitucionais relacionadas à área
educacional e que asseguram o direito dos cidadãos, pais e estudantes, de influenciar
nas decisões administrativas relacionadas à matéria, a rigor do que reconhece a
decisão judicial citada no livro Escola de Luta e proferida em São Paulo e que diz o
seguinte:

O juiz Luiz Felipe Ferrari Bedendi (o mesmo que havia mudado de posição
em meados de novembro com relação ao pedido de reintegração de posse
das duas primeiras escolas ocupadas) foi responsável por julgar a ação civil
pública apresentada conjuntamente pelo MP e pela Defensoria Pública em
primeira instancia e, em sua decisão (datada de 16/12) suspendeu “todos os
efeitos da chamada reorganização escolar”. O governo tentou argumentar
que a ação civil teria perdido seu objeto tendo em vista que a “reorganização”
escolar já teria sido suspensa, com o decreto revogando o anterior publicado
no Diário Oficial. O juiz, porém, acolheu os pedidos do MP e da Defensoria,
em especial a “necessidade de implementação de agenda de debates e
participação popular ao longo de 2016”. Para ele, o principal ponto era que
“não se primou pela participação democrática na implementação de
projetos de tão grande intensidade”, algo problemático pois “a condução
do governo, num Estado Democrático, pressupõe a participação do
povo” e a gestão democrática do ensino público é um princípio constitucional
(artigo 206, inciso VI) regulamentado pela Lei de Diretrizes e Bases, a LDB
(artigo 14) (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 316- 17, grifos dos
autores).

E no mesmo sentido, uma vez que reconheceu o direito dos integrantes da


comunidade escolar e cidadãos de um modo geral, de participar das decisões sobre
gestão educacional, se encontra o julgado do Tribunal de Justiça paulista, pois negou
provimento ao recurso interposto pelo Estado e assim manteve a sentença proferida
pelo Juízo de Primeiro Grau. Isso significou a rejeição da pretensão governamental
de implementar a política de reorganização escolar ou de fechamento de 92 (noventa
e duas) escolas públicas.
135

Um mês depois (14/01), o desembargador Marcos Pimentel Tamasia, da 1ª


Câmara de Direito Público, negou em seu relatório o recurso com o qual havia
entrado o governo estadual, mantendo a suspensão de “todos os efeitos”
da “reorganização”. No recurso, o governo Alckmin tentou argumentar que “a
suspensão imposta em primeiro grau teria imposto medidas
desnecessárias. Entre elas, o estabelecimento de agenda oficial de
discussão e deliberações a respeito da política pública, com a
participação de grêmios estudantis e conselhos de escola, entre outros”
[Conjur – site – 14/01/16]. Em seu relatório, o desembargador responde de
maneira irônica: “francamente, a oitiva dos Dirigentes de Ensino, que
nada mais são que a própria administração estadual, não se traduz em
legitimação do objeto pela discussão em sociedade, em especial pelos
atores mais interessados na organização escolar” [decisão judicial –
14/01/16] (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 317, grifos dos
autores).

Conforme já dito, no mesmo itinerário se encontra a legislação ordinária, no


caso a LDB, Lei Federal nº 9.394/1996, uma vez que em seu art. 14 e respectivos
incisos, estabelece uma série de diretrizes, o que faz com vistas, justamente, de
propiciar a democratização da gestão escolar, bem como visando atingir melhores
índices de qualidade educacional.

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do


ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e
conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da
educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II - participação
das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes
(BRASIL, 1996).

E não é só. O Plano Nacional de Educação, Lei Federal nº 13.005 de 2014,


em todo o contexto que disciplina, frisa e refrisa, e ao mesmo tempo determina a
realização de procedimentos de democratização das decisões relacionadas à gestão
educacional. A referida base jurídica, sem dúvida, também contribuiu para o
sustentáculo das decisões judiciais proferidas em favor dos estudantes, e, com vista
a demonstrar essa ocorrência, transcreveremos a seguir as normas dos artigos 6º e
9º do mencionado diploma legal.

Art. 6o A União promoverá a realização de pelo menos 2 (duas) conferências


nacionais de educação até o final do decênio, precedidas de conferências
distrital, municipais e estaduais, articuladas e coordenadas pelo Fórum
Nacional de Educação, instituído nesta Lei, no âmbito do Ministério da
Educação (BRASIL, 2014).

Art. 9o Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão aprovar leis


específicas para os seus sistemas de ensino, disciplinando a gestão
democrática da educação pública nos respectivos âmbitos de atuação, no
136

prazo de 2 (dois) anos contado da publicação desta Lei, adequando, quando


for o caso, a legislação local já adotada com essa finalidade (BRASIL, 2014).

No mesmo sentido das decisões judiciais proferidas no Estado de São Paulo


em 2015, nos termos acima citados, constam vários julgados oriundos do Poder
Judiciário paranaense ocorridos em 2016, onde se vê claramente a aplicação do
direito vigente e acima descrito, em especial as normas consagradas na Constituição
Federal de 1988. Nesse sentido se encontra a argumentação do Juiz de Direito
Rogério Tragibo de Campos de Apucarana, ao decidir nos autos de ação de
reintegração de posse nº 0012059-08.2016.8.16.0044, quando o mencionado
magistrado indeferiu os requerimentos do Estado do Paraná.

De tudo que se apurou nos diálogos traçados, tanto em audiência como nas
visitas realizadas, é que as ocupações possuem como fundamento a
oposição à Medida Provisória (MP) n. 746/16 e à Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) n. 241/16. Segundo os estudantes, a MP e a PEC
poderão ocasionar profundos impactos sobre o exercício do direito
constitucional à educação. Ora, todos os brasileiros, mas principalmente os
estudantes e os professores, são diretamente interessados em debater
medidas adotadas pelos Poderes da República que influenciarão os rumos
da educação no país (PARANÁ, 2016).

E esse debate relacionado à participação da comunidade na formulação das


políticas educacionais, ou no que se refere à democratização da gestão escolar, não
fica somente na previsão legal, uma vez que é longa a discussão e rico o “arsenal”
teórico que cuida do assunto. Com isso, Angelo Ricardo de Souza (2001), Citando
Marilena Chauí, lembra que a escola pública pertence ao público, por isso, daí resulta
o direito assegurando a participação da comunidade na gestão escolar.

Por que é necessário buscarmos democratizar a gestão da educação


pública? Porque a educação pública é a educação de todos, para todos.
Conforme nos lembra Marilena CHAUÍ, o reconhecimento do que é público
decorre da necessidade de entendermos que existe uma esfera coletiva na
vida humana, de interface e convívio entre as pessoas. Para operar esta
esfera pública da vida humana, a democracia foi erigida. Isto é, para planejar,
decidir, coordenar, executar ações, acompanhar e controlar, avaliar as
questões públicas, é importante envolvermos o maior número possível de
pessoas neste processo, dialogando e democratizando a gestão pública
(SOUZA, A., 2001, p. 1).

E nesse sentido, de acordo com o debate que está proposto e conforme o


que já se encontra assegurado no marco constitucional e legal, nos reportamos às
considerações de João Ferreira de Oliveira, Karine Nunes de Moraes e Luiz Fernando
137

Dourado (2008), no artigo “Gestão Escolar Democrática: Definições, Princípios e


Mecanismos de Implementação”, pois salientam que a busca de qualidade
educacional é feita por vários setores da sociedade há vários anos. Essa busca
fortalecida na sociedade, de acordo com os autores, foi intensificada nos últimos anos
e resultou na concretização do princípio da gestão democrática na educação “a nível”
de texto constitucional, e cuja regulamentação é feita através de lei complementar.

Apesar de as lutas em prol da democratização da educação pública e de


qualidade fazerem parte das reivindicações de diversos segmentos da
sociedade há algumas décadas, essas se intensificaram a partir da década
de 1980, resultando na aprovação do princípio de gestão democrática na
educação, na Constituição Federal art. 206. A Constituição Federal/88
estabeleceu princípios para a educação brasileira, dentre eles:
obrigatoriedade, gratuidade, liberdade, igualdade e gestão democrática,
sendo esses regulamentados através de leis complementares (OLIVEIRA;
MORAES; DOURADO, 2008, p. 1, grifo nosso).

E prosseguem os autores referidos, salientando que a política relacionada à


gestão democrática, é uma realidade constante, também, da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, ao passo que também estabelece normas e paradigmas de
âmbito geral para a educação. Com isso, é possível perceber, a partir do marco
constitucional e legal, um projeto educacional vigente de cunho democrático.

Enquanto lei complementar da educação, a Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional (LDB nº 9.394/96) estabelece e regulamenta as diretrizes
gerais para a educação e seus respectivos sistemas de ensino. Em
cumprimento ao art. 214 da Constituição Federal, ela dispõe sobre a
elaboração do Plano Nacional de Educação – PNE (art. 9º), resguardando os
princípios constitucionais e, inclusive, de gestão democrática (OLIVEIRA;
MORAES; DOURADO, 2008, p. 1, grifo nosso).

Mas esse debate relacionado à participação da comunidade na gestão


escolar, embora previsto no sistema legal e reconhecido pela justiça paulista e pelo
menos por setores do judiciário paranaense nos termos já demonstrados, não é uma
questão pacificada, uma vez que o debate sobre o assunto é acalorado na farta e
importante bibliografia sobre o assunto.
A exemplo dos já citados, destacamos ainda outros artigos cujos autores
veem como avanço os parâmetros constitucionais e legais relacionados à
democratização da gestão da escola brasileira, como é o caso de Débora Quetti
Marques de Souza (2008), ao escrever o texto “Gestão Democrática da Escola
Pública: Desafios e Perspectivas”.
138

A gestão democrática faz parte da luta de educadores e movimentos sociais


organizados em defesa de um projeto de educação pública de qualidade.
Essa luta constante em busca da democratização resultou na aprovação do
princípio da gestão democrática instituída na Constituição Federal (BRASIL,
C. F. art. 206). Desse modo, as escolas passaram a ter legitimidade para
exercer a democratização da gestão enquanto possibilidade de melhoria do
processo educacional (SOUZA, D., 2008, p. 3).

E também Michele Pereira Silva (2014), ao escrever o artigo “A Participação


da Comunidade na Gestão Democrática: Os Mecanismos de Participação”, no qual a
autora destaca que a participação de cada cidadão é condição para construção da
qualidade educacional e atendimento das reais necessidades dos educandos nos
termos da política inserida no arcabouço jurídico vigente.

Dessa forma, o envolvimento de cada sujeito com a educação de qualidade


e a participação com a gestão democrática, para que o ensino seja feito por
meio de foco em qualidade e em atendimento as reais necessidades de
formação, se mostra como imprescindível a nova sociedade (SILVA, M.,
2014, p. 33).

E a participação comunitária na formulação das políticas educacionais denota


a presença ativa de pais, alunos e lideranças locais em todo o processo relacionado
à proposta pedagógica, desde a construção até a execução, pois é isso que
expressará a qualidade educacional baseada nos valores humanos. Assim, essa
participação, sendo meio e fim, propiciará a democratização que por sua vez enseja
a percepção dos problemas da instituição e respectiva relevância para a comunidade,
de acordo com Souza, S. (2012).

Participar no processo de tomada de decisão na escola implica participar na


construção, execução e acompanhamento de sua proposta pedagógica.
Implica ainda o conhecimento das intenções da escola no processo de
formação de seus alunos.
A aproximação da comunidade à escola pode conter ainda outra
positividade, na medida em que seja convertida em possibilidade de
demonstração do valor e importância de uma escola de qualidade e de
sua contribuição para a construção de uma sociedade cujo valor
fundamental seja o homem.
A participação da comunidade no processo de tomada de decisão na escola
é atividade-meio e atividade-fim ao mesmo tempo, na medida em que
propicia a melhora da qualidade da educação, e, por meio dessa
mesma participação, põe-se em ação uma espécie de exercício para a
democratização das relações sociais em geral. Também a aproximação
da comunidade à escola possibilita a percepção das deficiências dessa
instituição social, de suas necessidades e importância enquanto valor social
(SOUZA, S., 2012, p. 179, grifos nosso).
139

Como se vê, a realidade da gestão democrática, pelo menos no âmbito da


legislação brasileira, assim como nos debates travados no meio acadêmico é
totalmente factível e conforme já foi demonstrado nessa pesquisa, inclusive motivou
as decisões judicias contra o Estado de acordo com o que já mencionamos. Ocorre
que é forte a discussão, na qual autores chamam a atenção dizendo que o princípio
da gestão democrática escolar no Brasil se refere a uma estratégia neoliberal do
Banco Mundial. Para tal demonstração citamos Érica Luiza Matos Furtado (2005), pois
na dissertação “Políticas Educacionais e Gestão Democrática na Escola’, suscita essa
discussão, ocasião na qual salienta a Conferencia Mundial de Jomtien, Tailândia.

As políticas educacionais brasileiras, principalmente a partir dos anos de


1990, quando foi realizada a Conferência Mundial de Educação para Todos,
em Jomtien (Tailândia), encaminharam-se pelas orientações provindas do
Banco Mundial, que destacava, entre outras coisas, a importância de priorizar
o ensino básico, promover a descentralização dos sistemas escolares e
flexibilizar a gestão (FURTADO, 2005, p. 5).

E não é só, dentre outros autores que têm participação nessa discussão,
também citamos Alexandre Viana Araújo (2003), autor da dissertação “Políticas
Educacionais e Participação Popular: Um Estudo Sobre Esta Relação no Município
de Camaragelo – PE”, onde é salientado a articulação do governo brasileiro com as
agências internacionais e a concepção neoliberal.

No que se referem ao setor educacional, as reformas iniciaram-se também


no primeiro governo FHC e trazem uma direta articulação com as agências
internacionais que pensam a educação em nível mundial na concepção
neoliberal. As reformas visam, através da educação, melhorar as economias
nacionais e têm buscado fortalecer os vínculos entre a escolarização, o
trabalho, a produtividade, os serviços e o mercado (ARAUJO, 2003, p. 44).

Quantos aos fins da gestão democrática pelo viés neoliberal, vejamos o que
dizem Maria do Carmo Gonçalo Santos e Mônica Patrícia da Silva Sales (2012) no
artigo “Gestão Democrática da Escola e Gestão de Ensino: A Contribuição Docente à
Construção da Autonomia do Ensino”, quando estabelecem debate sobre o assunto e
salienta que no contexto neoliberal as parcerias realizadas não contribuem de forma
estrutural para obtenção da qualidade educacional.

No contexto neoliberal, o dever das políticas públicas com a educação é


“partilhado” com a sociedade civil, através de programas emergenciais e
parcerias que não contribuem de forma estrutural com a qualidade da
140

educação, e ainda, consolidam a prática da privatização, como se as


soluções para os problemas de ordem pública pudessem e devessem ser
resolvidas pela iniciativa privada (SANTOS, M.; SALES, 2012, p. 5).

E, por fim, quanto ao tema, Elizangela da Silva Barbosa Ramos,


parafraseando (AZEVEDO, 2002) no artigo “Gestão Educacional: Dos Parâmetros
Neoliberais aos Princípios Democráticos”, diz que pelo fato dos direitos educacionais
se encontrarem assegurados legalmente, não significa garantia na prática, o que
ocorre, de acordo com a autora, em razão do referido contesto neoliberal.

Na esfera educacional, com a consolidação da Constituição Federal de 1988


e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, surgem
determinações e indicações acerca da gestão democrática na escola. Mas,
apenas a citação legal garante que esta democratização na gestão realmente
seja vivenciada nas escolas, considerando-se o contexto neoliberal? Este
questionamento surge por perceber, nas reformas educacionais, parâmetros
que se inserem como solução aos padrões exigidos pelos modelos
econômico e político, demandados por um processo de valorização do
capital, favorecendo o crescimento da ação estatal como reguladora, onde as
práticas ditas “democráticas” trazem, como contraponto, o aumento dos
controles centralizados (RAMOS, 2012, p. 4).

E essa divergência na discussão sobre a matéria nos coloca numa condição


de atenção e preocupação com a busca da qualidade educacional, pois em que pese
à previsão legal no sentido da participação da comunidade, assim como os fortes
processos reivindicatórios e de resistência dos estudantes, na prática é frágil o
exercício do referido direito. E a prova disso é encontrada no resultado do movimento
de ocupação das escolas, tanto em São Paulo, quanto no Paraná, uma vez que os
estudantes paulistas foram vencedores, inclusive, em decisões judicias, no entanto, o
governo, sem muito demorar, implantou a política de fechamento de salas de aula
substituindo o fechamento das escolas, de acordo com o debate que fizemos no
capitulo 3, subcapítulo 3.1. E no Paraná, de forma semelhante ao ocorrido em São
Paulo, pois os estudantes ocupantes também obtiveram sucesso por ocasião do
julgamento de vários requerimentos liminares em ações possessórias, porém tiveram
que desocupar as escolas, o que significa que a previsão legal quanto ao direito à
participação na formulação da política educacional não lhes foi assegurado.
Portanto, pode se afirmar, a partir do estudo realizado, que a gestão escolar
democrática ou o direito dos estudantes, país e demais integrantes da comunidade
escolar de participarem da formulação da política educacional, embora ainda não seja
na dimensão que uma democracia avançada espera, é uma realidade no sistema legal
141

brasileiro, embora os estudantes tenham encontrado dificuldade quanto ao exercício


do mencionado direito, considerando posicionamentos de setores do Poder Judiciário,
do Poder Executivo e também da sociedade.
Entretanto, em que pese tais restrições encontradas pelos estudantes,
conforme demonstrado, além da previsão legal, é vasto e qualificado o debate na
doutrina e entre educadores e comunidade acadêmica em geral, por isso o aparato
estatal não deveria ter ignorado essa realidade, o que foi corrigido em São Paulo no
primeiro momento e graças a força política dos estudantes, devidamente endossado
sob o ponto de vista jurídico pelo Tribunal de Justiça paulista. E, em parte, por juízes
do Poder Judiciário do Paraná, também após o relevante processo reivindicatório e
de resistência do movimento secundarista paranaense, o que significa que o direito
em questão, pelo menos em parte, teve que ser reconhecido judicialmente.

4.4 O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Aqui discutiremos o princípio da proteção integral à luz das normas da


Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tendo em vista
ser uma norma principiológica vigente e que foi aplicada por juízes e tribunais por
ocasião do julgamento de requerimentos oriundos do Estado em desfavor dos
estudantes do movimento ora em estudo. Nesse sentido, partimos de excerto contido
na decisão do juiz paulista reconhecendo o direito dos estudantes menores de idade
ao referido amparo constitucional e ao mesmo tempo infraconstitucional.

[...] O juiz se refere ao “fato de que a maior parcela dos ocupantes é de


adolescentes ou crianças”. A partir do Estatuto da Criança e do
Adolescente, ele remete ao “dever de todos velar pela dignidade da
criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento
desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”
((CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 317, grifos dos autores).

E, ainda, prossegue o magistrado paulista quanto à necessidade de


observação do princípio da proteção integral, assim.

Caso imprescindível a utilização de força policial, por mais preparada e


capacitada que seja a corporação estadual, existe a probabilidade de ocorrer
algum prejuízo aos menores, já que o calor da situação, aliado à pressão
popular no entorno da escola são elementos suficientes a algum
acontecimento trágico (CAMPOS; MEDEIROS; RIBEIRO, 2015, p. 318).
142

De certa forma, no mesmo sentido da decisão citada acima, considerando a


direção dos argumentos e o resultado da decisão, se encontra a fundamentação do
Juiz de Direito Substituto em 2º Grau, Guilherme Frederico Hernandes Denz, ao julgar
o Recurso de Agravo de Instrumento nº 1.569.056-7 interposto pela Defensoria
Pública contra decisão liminar de reintegração de posse em favor do Estado do Paraná
deferida nos autos de ação possessória nº 4761-86.2016.8.16.0036 na cidade de São
José dos Pinhais. A decisão do magistrado na fase recursal, portanto, no nível de
Segundo Grau, foi favorável aos estudantes, assim.

É fato notório, que os alunos, muitas vezes em companhia dos pais,


promovem a manifestação de ocupação das escolas em razão do
descontentamento provocado pelas reformas do Ensino Médio pretendidas
pelo Executivo Federal. Certo ou errado – e neste momento não me cabe
avaliar – esse movimento, conforme noticiam os jornais, se espalha por todo
o Estado do Paraná e, em São José dos Pinhais, a realidade é a mesma.
Nessas circunstancias, a emissão de liminar de reintegração de posse, sem
qualquer oitiva do Ministério Público e da Defensoria Pública, e sem a
tentativa de intermediação de um diálogo entre os envolvidos, não se revela
a medida mais apropriada. A utilização da força policial, mesmo que
acompanhada pelas instituições nominadas na decisão, poderá implicar em
violência contra os adolescentes e um recrudescimento dos ânimos que irá
interditar de vez qualquer possibilidade de conciliação (PARANÁ, 2016).

Na cidade de Cascavel, PR, nos autos da ação de reintegração de posse com


pedido liminar nº 33.504-54.2016, proposta pelo Estado do Paraná contrário aos
alunos ocupantes, o Poder Judiciário através do Juiz de Direito Eduardo Villa Coimbra
Campos, também indeferiu as pretensões estatais. Essa decisão possibilitou a
continuidade das atividades relacionadas às ocupações, em cujo momento o
magistrado se utilizou da seguinte argumentação.

Contudo, ainda que aparentemente possa se argumentar que estariam


presentes os requisitos para a concessão da medida liminar pretendida,
necessário tecer algumas considerações iniciais, uma vez que o objeto da
lide não se resume à posse dos referidos imóveis, mas inclui as “ocupações”
realizadas pelos alunos dos Colégios Estaduais, em forma de protestos às
“reformas do Ensino Médio” propostas pelo governo federal, cujas
manifestações, é fato notório, acontecem em todo o Estado do Paraná e em
alguns outros Estados da federação.
Outrossim, oportuno consignar que, conforme extrai-se da narrativa exordial,
a maioria dos requeridos são menores de 18 (dezoito) anos, isto é, são alunos
dos colégios ocupados pelas manifestações. Dessa forma, merecem especial
atenção – por parte de toda a sociedade – à luz do princípio da proteção
integral, estampado na Lei 8.069-1990 – Estatuto da Criança e do
Adolescente [...] (PARANÁ, 2016, grifo nosso).
143

E prossegue o Juiz de Direito ao decidir salientando que eventual deferimento


de medida liminar, bem como o uso de força contra os estudantes para cumprir o
decidido judicialmente, poderia causar prejuízos aos menores em manifestação, o que
seria desrespeito à vida e à saúde desses ocupantes. Esse posicionamento do
magistrado deixa bastante claro, em especial, preocupação em dar cumprimento ao
princípio da proteção integral presente no sistema jurídico brasileiro. Por isso,
argumentou ao decidir sobre a necessidade de evitar possibilidade de prejuízo às
crianças e adolescentes estudantes.

[...] De outro norte, o deferimento da liminar pretendida, bem como o eventual


uso da força policial para cumprimento da medida, poderá causar prejuízos
irreparáveis às crianças e adolescentes que se manifestam nos mencionados
colégios estaduais, em desrespeito, consequentemente, ao direito de
proteção à vida e à saúde dos menores (PARANÁ, 2016).

Como é possível constatar nas decisões judiciais já referidas, os juízes


paranaenses ao decidir sobre as ocupações de São José dos Pinhais e Apucarana,
seguindo o exemplo dos juízes paulistas, adotaram como fundamento integral de suas
decisões o direito público. Nesse caso, o invocado foram os princípios e regras da
Constituição Federal e legislação ordinária atinente aos direitos educacionais, bem
como os direitos de proteção dos menores.
Já, na decisão proferida pelo juiz Vila Coimbra sobre as ocupações de
Cascavel, embora tenha invocado fundamentalmente o direito público, onde se incluiu
o Estatuto da Criança e do Adolescente, chamando a atenção para a necessidade de
se ater ao princípio da proteção integral, também o inseriu no debate, embora o
descartou ao decidir, o direito privado relacionado às questões possessórias. No caso
cascavelense, a decisão judicial favorável aos estudantes ocupantes, não deixa
dúvida da adoção do princípio da proteção integral e dos direitos à livre manifestação
e reivindicação previstos na Constituição Federal da República e já referidos nas
páginas anteriores.
Por ser oportuno e diante do debate que se coloca, achamos profícuo e
pertinente transcrever aqui a norma da Constituição Federal relacionada ao princípio
da proteção integral replicado e explorado em todo o contexto do Estatuto da Criança
e do Adolescente, Lei Federal 8.069 de 1990. Assim, vejamos a redação do art. 227
da nossa Carta Constitucional.
144

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao


adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988, grifo nosso).

No Estatuto da Criança e do Adolescente, embora o princípio da proteção


integral permeie todo o diploma legal em discussão, a norma se encontra de forma
expressa no art. 3º, nos termos seguintes:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais


inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que
trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade
(BRASIL, 1990, grifo nosso).

E ainda nessa linha de discussão, no contexto relacionado ao princípio da


proteção integral de crianças e adolescentes, por ser pertinente e em razão da
relevância dos debates relacionados à matéria, lembramos ainda que a legislação
brasileira, inclusive no âmbito constitucional, considera os integrantes da faixa etária
até os 18 anos como pessoas em desenvolvimento. E o faz quando se refere ao
cerceamento da liberdade dos menores e ao determinar o seguinte no art. 227, § 3º,
inciso V, se fazendo necessária “obediência aos princípios de brevidade,
excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento,
quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade” (BRASIL, 1988, grifo
nosso).
E no mesmo sentido se encontra o art. 6º do Estatuto da Criança e do
Adolescente, eis que diz o que segue: “Na interpretação desta lei levar-se-ão em conta
os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres
individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como
pessoas em desenvolvimento” (BRASIL, 1990, grifo nosso).
E o princípio sob comentário, como visto reconhecido por setores do Poder
Judiciário brasileiro por ocasião da ocupação das escolas, além de consolidado no
sistema legal pátrio, é largamente reconhecido na doutrina como um avanço, o que
certamente contribuiu para o convencimento dos magistrados que o reconheceram
em uma ocasião tão divergente, como foi o caso das ocupações. Nesse sentido se
145

encontra o entendimento de Luiz Antonio Miguel Ferreira e Cristina Terranice Doi


(2004), no artigo “A Proteção Integral de Crianças e Adolescentes Vítimas”.

Doutrina da proteção integral: representa um avanço em termos de


proteção aos direitos fundamentais, posto que calcada na Declaração
Universal dos Direitos do Homem de 1948, tendo, ainda, como referência
documentos internacionais, como Declaração Universal dos Direitos da
Criança, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, aos 20 de
novembro de 1959, as Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Administração da Justiça da Infância e da Juventude Regras de Beijing Res.
40/33 de 29 de novembro de 1985, as Diretrizes das Nações Unidas para a
prevenção da delinquência juvenil Diretrizes de Riad, 3 de 1º de março de
1988 e a Convenção sobre o Direito da Criança, adotada pela Assembleia
Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 e aprovada pelo
Congresso Nacional Brasileiro em 14 de setembro de 1990 (FERREIRA; DOI,
2004, p. 2, grifo nosso).

E Fabio Luiz Gomes (2009), no artigo “Princípio da Proteção Integral da


Criança e do Adolescente e o Princípio de Transitoriedade dos Abrigos”, lembra que
o princípio da proteção integral está, inclusive, inserido nas políticas sociais, e aí se
inclui o direito à educação.

Dentro das políticas sociais encontramos o princípio da proteção integral


da criança e do adolescente. Tal princípio se submete a uma norma de um
direito a prestações fáticas ou normativas, portanto, assegura à criança e ao
adolescente, dentre outros: o direito de igualdade dos filhos perante a lei, o
direito à educação, à cultura, a uma família (GOMES, 2009, p. 2, grifos
nosso).

Moacir Pereira Mendes, por sua vez, na dissertação “A Doutrina da Proteção


Integral da Criança e do Adolescente à Lei 8.069/90”, salienta a responsabilidade do
Estado para o efetivo cumprimento do princípio em questão.

Pela visão ampla do Estatuto da Criança e do Adolescente, somente com


esses envolvidos não seria suficiente, posto que poderia faltar-lhes condições
para o exercício pleno da doutrina da proteção integral. Para que
eventuais falhas pudessem ser supridas e para que todos os até então
envolvidos pudessem ter plenas condições de cumprir suas obrigações para
com os menores, o ECA fez por bem em incluir no rol dos responsáveis por
essa proteção integral o próprio Poder Público (MENDES, 2006, p. 43,
grifos nosso).

E a proteção integral das crianças e adolescentes também possui um grau


de consolidação nos tribunais brasileiros, como é o caso do Tribunal de Justiça do
Paraná, de acordo com o que se observa no julgamento do Recurso de Apelação em
146

decisão proferida pela 6ª Câmara Cível nos autos nº 0000735-38.2015.8.16.0179. O


julgado em referência não diz respeito ao Movimento de Ocupação das Escolas e sim
de assunto diverso, conforme se observa na citação seguinte, mas o mencionamos
com o fim de fortalecer o entendimento de que o princípio da proteção integral se
encontra estabelecido e consolidado na esfera judicial.

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO


DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO C/C DANOS
MATERIAIS E RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. I. OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA. REPETIÇÃO DOS ARGUMENTOS
CONTIDOS NA CONTESTAÇÃO QUE, NO CASO CONCRETO, SERVEM
AO ENFRENTAMENTO DA SENTENÇA. PRELIMINAR REJEITADA.
RECURSO CONHECIDO. II. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO DE
PENSÃO POR MORTE A MENOR (NETA) SOB GUARDA DE SERVIDORA
PÚBLICA FALECIDA. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO EM RAZÃO DO
IMPLEMENTO DA MAIORIDADE CIVIL. INCAPACIDADE DECORRENTE
DA SÍNDROME DE DOWN. BENEFICIÁRIA EQUIPARÁVEL A FILHO.
ARTIGO 42, II, B, DA LEI ESTADUAL Nº 12.398/98. COMPROVADA
DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA
PROTEÇÃO INTEGRAL E PREFERENCIAL DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE (ART. 227, CF). PREVALÊNCIA DO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL E DO
STJ. III. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA READEQUADOS
CONFORME AS TESES ESTABELECIDAS PELO STJ NO JULGAMENTO
DO RESP REPETITIVO 1.482.221-PR. IV. SENTENÇA ILÍQUIDA
PROFERIDA SOB A ÉGIDE DO NCPC. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS
POSTERGADA PARA A FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
SENTENÇA PARCIALMENTE ALTERADA EM SEDE DE REEXAME
NECESSÁRIO. RECURSO NÃO PROVIDO. “O art. 33, § 3º, da Lei n.
8.069/90 deve prevalecer sobre a modificação legislativa promovida na Lei
Geral da Previdência Social, uma vez que é norma que respalda o princípio
da proteção integral e preferencial da criança e do adolescente”. (STJ-2ª
Turma, AgRg no REsp 1540576/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, j.
04/05/2017, DJe 10/05/2017) (PARANÁ, 2015, grifos no original).

E essa compreensão não é diferente nos tribunais superiores, pois de acordo


com o lembrado pelo relator do julgado acima mencionado, quanto ao entendimento
da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Por isso, trazemos para essa discussão
o que disse o Ministro Marco Aurélio Bellize, ao proferir julgamento no Recurso
Especial oriundo de Minas Gerais nº 1. 623.098. Assim: “Ocorre que esse munus deve
ser exercido sempre visando atender ao princípio do melhor interesse do menor,
introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção
integral, consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal” (BRASIL, 2018, grifo
nosso).
147

Com isso, fica demonstrada a consagração do princípio da proteção integral


não somente na legislação brasileira, mas também no meio doutrinário e perante
juízos e tribunais do país, o que salienta que os magistrados que adotaram a decisão
de aplicar a legislação vigente e assim proferiram julgados com base, também, no
mencionado instituto e, dessa forma, indeferiram os requerimentos de reintegração de
posse formulados pelos Estados de São Paulo e Paraná contra os estudantes
ocupantes, agiram de acordo com a norma e, portanto, com base no direito vigente e
à margem das questões atinentes ao debate sobre a luta de classes.

4.5 AS QUESTÕES POSSESSÓRIAS NOS LITÍGIOS ENTRE O ESTADO E OS


ESTUDANTES, E A EDUCAÇÃO COMO DIREITO SUBJETIVO PÚBLICO

Os presentes aspectos jurídicos também tiveram relevante significado nas


análises feitas pelo Poder Judiciário em razão das ocupações escolares feitas pelos
estudantes no Paraná. Assim ocorreu em razão de juízes entenderem que as ações
dos estudantes se referiam a uma problemática possessória, e por isso, as liminares
de reintegração de posse em favor do Estado deveriam ser deferidas com a imediata
desocupação das escolas, ao passo que outros magistrados tiveram entendimento
oposto, ou seja, que as atividades dos ocupantes deveriam ser tratadas não pelo viés
do direito possessório e sim a partir das premissas debatidas nos itens anteriores, o
que faz aflorar a necessidade do debate relacionado à educação como direito
subjetivo dos estudantes ocupantes.
Com isso, iniciamos essa discussão a partir da argumentação apresentada
pelo Juiz de Direito Substituto em 2º Grau, Guilherme Frederico Hernandes Denz ao
julgar o recurso de Agravo de Instrumento nº 1.569.056-7, interposto pela Defensoria
Pública contra decisão liminar de reintegração de posse em favor do Estado do Paraná
deferida nos autos de ação possessória nº 4761-86.2016.8.16.0036 na cidade de São
José dos Pinhais. A decisão do magistrado na fase recursal, portanto, “a nível” de
Segundo Grau, foi favorável aos estudantes e os argumentos, em parte, foram os
seguintes quanto à problemática relacionada à posse.

Na realidade, embora possa se afirmar, em tese, a existência do esbulho, a


questão principal a ser resolvida não se restringe à tutela possessória. O
litígio ora instalado passa longe das discussões possessórias
tradicionalmente conhecidas pelo Direito Civil (PARANÁ, 2016).
148

Entretanto, conforme salientado acima, o anseio de alguns Juízes de Direito


integrantes do Poder Judiciário paranaense pela aplicação do direito privado, no caso
o direito possessório nos litígios em estudo, surgem com força razoável e que
precisam ser considerados, conforme é o caso das ações de reintegração de posse
que tramitaram na Comarca de Foz do Iguaçu, o que ocorreu ao menos em duas
oportunidades.
Assim, para ilustrar o debate que vem sendo proposto, inclusive por se tratar
de ações de reintegração de posse na qual as decisões proferidas foram a favor do
Estado e, portanto, contrárias aos interesses dos estudantes ocupantes das escolas,
nos reportaremos à ação possessória n° 0031.318-31.2016.8.16.0030, que tramitou
perante a 2ª Vara da Fazenda Pública de Foz do Iguaçu, bem como à ação, também
possessória, nº 0031.389-33.2016.8.16.0030, ajuizada perante o Plantão Judiciário da
comarca de Foz do Iguaçu.
No primeiro caso citado no parágrafo anterior, na ação de reintegração de
posse proposta pelo Estado do Paraná, o Juiz de Direito Wendel Fernando Brunieri,
deferiu a limar contra os estudantes ocupantes e a fundamentação da decisão foi
justamente o direito possessório disciplinado no Código Civil, portanto, privado35.
Vejamos a argumentação delineada nos termos seguintes, no qual o magistrado cita,
inicialmente, o civilista Antonio Carlos Marcato.

Na lição de Antonio Carlos Marcato é preciso ao autor para obter a liminar


possessória: ...provar a sua posse, a turbação ou esbulho praticado pelo réu,
a data em que a ofensa foi perpetrada e a continuação na posse, embora
turbada – na ação de manutenção -, ou a sua perda – na ação de reintegração
[...] (PARANÁ, 2016).

E prossegue o juiz Wendel Brunieri ao fundamentar a decisão favorável ao


Estado, quando argumenta que embora os ocupantes possuam o direito constitucional
de reunião, protesto, participação na formulação da política educacional e liberdade
de se expressar e de se manifestar, salienta ser obrigação do ente estatal prover os

35De acordo com Maria Helena Diniz: O direito público seria aquele que regula as relações em que o
Estado é parte, ou seja, rege a organização e atividade do Estado considerado em si mesmo (direito
constitucional), em relação com outro Estado (direito internacional), e em suas relações com os
particulares, quando procede em razão de seu poder soberano e atua na tutela do bem coletivo (direitos
administrativo e tributário). O direito privado é o que disciplina as relações entre particulares, nas quais
predomina, de modo imediato, o interesse de ordem privada, como compra e venda, doação, usufruto,
casamento, testamento, empréstimo, etc (DINIZ, 2006, p. 255).
149

alunos do contra movimento com o serviço público educacional, além de reiterar, no


seu entendimento, que a questão posta para decidir, se referia ao direito possessório
e, que, por isso, a liminar deveria ser deferida e assim o fez.

[...] Exposto isso, tenho que a medida postulada pelo autor reúne os requisitos
legais para ser deferida. A posse anterior dos colégios estaduais pelo ente
público autor – Estado do Paraná é inconteste, a teor do que dispõe o art.
211, § 3º da Constituição Federal, que atribui aos Estados-membros a
atuação prioritária no ensino fundamental e médio, o que confere ao ente o
direito de reaver a posse esbulhada. Isto, por si só, demonstra o requisito do
fumus boni iuris ou probabilidade do direito, aliado ao fato de que, se ao
Estado é obrigatória a prestação dos serviços relacionados à educação, aos
estudantes é assegurado o direito de acesso ao ensino, direito este que está
sendo impossibilitado pela atuação dos requeridos. Ainda que a ocupação
seja levada a efeito por inúmeros estudantes, vislumbro que os demais alunos
e também o corpo docente, funcionários da educação e etc têm o direito de
não terem os serviços interrompidos sem legítimo motivo. Não se quer
dizer que aos indivíduos não é dado o direito de reunião, protesto,
participação na política da educação e liberdade de expressão/manifestação
– direitos estes garantidos pela Carta Magna como fundamentais – porém, o
exercício de qualquer direito não pode ser considerado absoluto, devendo
haver compatibilização entre os demais direitos fundamentais, de modo que,
a priori, denota-se que a atuação dos requeridos está a prejudicar o próprio
funcionamento do acesso à educação. De outra manda, nada impede a
existência de protestos e manifestações pacíficas, levadas a efeito com
ponderação e razoabilidade, a fim de não trazerem maiores prejuízos a
própria sociedade, demonstrando que a garantia desses direitos não legítima
o esbulho possessório sobre os imóveis que sediam os colégios estaduais,
com o impedimento da normal ministração das aulas (PARANÁ, 2016, grifo
nosso).

Outrossim, de acordo com a citação acima, em que pese o magistrado


paranaense ter reconhecido como legítimos os direitos constitucionais dos
secundaristas ocupantes, e nesse sentido considerou como pertinentes as atividades
do Movimento de Ocupação das Escolas, por outro lado, nos termos colocados pelo
magistrado, suas razões de decidir se encoraram nos institutos possessórios ou no
direito civil, portanto, privado. Essa “âncora” no direito privado significa o oposto aos
interesses dos estudantes ocupantes, originado no direito púbico subjetivo à
educação, ao direito à livre manifestação, à participação nas decisões sobre as
políticas educacionais e à proteção integral, pelo que demonstra a pesquisa, é o
sustentáculo primeiro das decisões favoráveis ao Estado nas ações possessórias em
estudo e que sustentou o discurso oficial relacionado às ocupações.
No mesmo sentido da decisão acima referida, nos autos da ação cautelar n°
0031.389-33.2016, proposta pelos estudantes ocupantes do Colégio Estadual Ulysses
Guimarães de Foz do Iguaçu, com o fim de obter liminar e assim a proteção do Estado
150

contra integrantes do contra movimento que os ameaçavam com alegações de que


iriam desocupar a escola à força, o Juiz de Direito Marcos Antonio de Souza Lima, do
Plantão Judiciário, ao indeferir a medida pleiteada salientou que os ocupantes não
possuíam o direito de permanecer no interior das escolas ocupadas, ao passo que
seria direito dos demais alunos o acesso à educação e que o Estado precisava exercer
a sua obrigação relacionada à função social da propriedade prevista no art. 170, inciso
III, da Constituição Federal. Com isso, proferiu decisão contrária aos interesses dos
alunos que ocupavam a unidade escolar e o fez nos termos a seguir delineados.

Todavia não vislumbro ter os autores o direito de permanecer nas


dependências da escola e obstar o direito dos demais estudantes de nela
ingressar, se por mais não fosse, por violar o direito de outrem à educação
(art. 6º da Constituição da República) e o princípio da função social da
propriedade (artigo 170, III). É certo que em um Estado Democrático de
Direito cabe aos poderes do Estado, em especial ao Poder Judiciário, garantir
o exercício dos direitos pelas minorias. No entanto, não se pode perder de
vista que um dos pilares da democracia é justamente o fato de ser o governo
da maioria. Nesta ordem de ideias, na mesma medida em que os autores
exercem o seu suposto direito de protesto invadindo as dependências da
Escola, não podem querer impedir o exercício do mesmo direito constitucional
por parte daqueles que tem pensamento diametralmente oposto (PARANÁ,
2016, grifo nosso).

O acima exposto, no que se refere ao debate quanto à aplicação do direito


privado ou do direito público na problemática estudantil quanto ao Movimento de
Ocupação das Escolas é de vasta importância. E assim é em razão do fato dos juízes
que buscaram “âncora” nas normas do direito público, como é o caso das regras do
direito constitucional e do infraconstitucional relacionado ao direito à educação,
decidiram contra o Estado, indeferindo, assim, os requerimentos de reintegração de
posse. Por outro lado, nas ações possessórias cujo fundamento adotado pelos
magistrados foi o do direito civil, ramo do direito privado, as decisões foram favoráveis
ao ente estatal nos termos acima demonstrados.
Considerando isso, bem como em razão da necessidade de compreensão do
fenômeno, é de lapidar importância o aprofundamento da discussão, inclusive no que
tange aos conceitos de direito público subjetivo, direito de propriedade, direito
possessório e direito da comunidade de atuar na gestão educacional, discussão sem
a qual se torna impossível a demonstração da legalidade jurídica das ações dos
estudantes ocupantes. E, pelo mesmo objetivo, é necessário elastecer a discussão
em razão dessa contradição que se estabeleceu entre as decisões judiciais, eis que
151

de fundamental importância à obtenção de clareza quanto às posturas adotadas pelos


integrantes do Poder Judiciário no que se refere aos litígios relacionados ao processo
de ocupação, tendo em vista ser esclarecido neste estudo que os juízes não podem
usar princípios de direito privado material quando os processos versam sobre direito
público subjetivo, em especial quando cuida de interesses de crianças e adolescentes,
uma vez que nessa faixa etária a pessoa é amparada pelo princípio da proteção
integral, nos termos anteriormente debatidos.
Assim, relembramos, uma vez que já foi feito este destaque em páginas
anteriores, que a Constituição Federal, no art. 208, § 1°, estabelece o seguinte: “O
acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” (BRASIL, 1988). E,
no parágrafo 2º do artigo retro citado (208), se encontra estabelecido que “O não
oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa
responsabilidade da autoridade competente” (BRASIL, 1988).
Também relembramos que no caput do art. 208, o legislador constituinte
estabeleceu como ensino obrigatório e gratuito todo o Ensino Básico, composto pela
Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, o que fez nos termos seguintes:
“educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de
idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria” (BRASIL, 1988), o que demonstra que os estudantes
ocupantes estavam reivindicando direitos previstos em lei, de acordo com o que foi
discutido e demonstrado neste capítulo, subcapítulo 4.1, reivindicação jurídica legal,
uma vez que o reivindicado se refere a direito público subjetivo.
Com isso, aflora a necessidade de tecermos esclarecimentos quanto a
conceituação ora em debate. E esclarecemos a partir do que escreve Silvio Rodrigues,
uma vez que no livro “Direito Civil”, volume 1, diz o seguinte: “[...] encontramos a
prerrogativa individual, isto é, a faculdade conferida ao possuidor de invocar a seu
favor e na defesa de seu interesse o preceito geral: facultas agendi. Visto sob o
ângulo subjetivo, o direito é o interesse juridicamente protegido” (RODRIGUES,
1997, p. 7, grifo nosso). E prossegue Rodrigues ao conceituar os direitos subjetivos.

O fenômeno jurídico, embora seja um só, pode ser encarado sob mais de um
ângulo. Vendo-o como um conjunto de normas que a todos se dirige e a todos
vincula, temos o direito objetivo. É a norma da ação humana, isto é, a norma
agendi. Se, entretanto, o observador encara o fenômeno através da
prerrogativa que para o indivíduo decorre da norma, tem-se o direito
subjetivo. Trata-se da faculdade conferida ao indivíduo de invocar a
152

norma a seu favor, ou seja, da faculdade de agir sob a sombra da regra,


isto é, a facultas agendi (RODRIGUES, 1997, p. 6-7, grifo nosso).

E Maria Helena Diniz por sua vez, ao se referir a Goffredo Telles Jr, conceitua
direito subjetivo, esclarecendo que se refere à possibilidade do titular do direito de
exercer ou não a prerrogativa, ao mesmo tempo em que poderá, se quiser,
responsabilizar a autoridade pública caso o serviço não esteja à disposição a contento
e nos termos previstos legalmente, e o faz da seguinte maneira.

O direito subjetivo, para Goffredo Telles Jr, é a permissão, dada por meio de
norma jurídica válida, para fazer ou não fazer alguma coisa, para ter ou não
ter algo, ou, ainda, a autorização para exigir, por meio de órgãos competentes
do poder público ou através de processos legais, em caso de prejuízo
causado por violação de norma, o cumprimento da norma infringida ou a
reparação do mal sofrido (DINIZ, 2006, p. 246).

E prossegue a jurista mencionada conceituando nos termos seguintes: “O


direito subjetivo é subjetivo porque as permissões, com base na norma jurídica e em
face dos demais membros da sociedade, são próprios das pessoas que as possuem,
podendo ser ou não usadas por elas” (DINIZ, 2006, p. 247).
Dessa forma, considerando a conceituação doutrinária e o que disciplinam as
normas constitucionais, art. 208, caput e §§ 1º e 2º, conclui-se que, por ser o direito à
educação, de cunho subjetivo, podem os estudantes exigi-lo. E, em razão do não
atendimento da exigência, deve a autoridade pública competente ser responsabilizada
pela omissão em razão do mandamento constitucional e da legislação ordinária que
assim disciplinam o tema.
Portanto, compreende-se que os estudantes do Movimento de Ocupação das
Escolas, tanto em São Paulo em 2015, quanto no Paraná em 2016, fizeram uma
exigência ao poder público de cumprimento de dispositivos legais, inclusive através
do procedimento de protestos; exercendo o direito à liberdade de expressão e
manifestação; com base no direito de reunião e reclamando o exercício do direito de
participação da formulação da política educacional; exercendo o direito de reunião e
associação, exercitando o direito à proteção integral. Tudo isso expressamente
assegurado pelo sistema jurídico, inclusive no âmbito constitucional, de acordo com o
que já foi demonstrado acima e longamente reconhecido por relevante parcela da
comunidade jurídica, acadêmica e Juízes de Direito que proferiram decisões
relacionadas ao fenômeno em estudo.
153

Diante de tudo isso, é fato que os juízes que proferiram decisões favoráveis
ao Estado e contra o movimento dos estudantes que ocuparam as escolas, em razão
da desconsideração ao direito vigente dos estudantes, se alinharam aos interesses
do contra movimento, portanto, adentraram no campo da luta de classes. E o primeiro
aspecto desse fator a ser abordado, além dos já mencionados acima, se refere ao não
atendimento do princípio da proteção integral previsto no art. 227, da Constituição
Federal e art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, também já referidos nos
tópicos anteriores.
Outro fator adotado pelo Poder Judiciário através dos magistrados que
proferiram decisões contra os estudantes ocupantes, e aqui trata-se de problema
principiológico, considerando o constatado na pesquisa, se refere à adoção dos
fundamentos do direito privado em litígios de interesse público, como é o caso em
estudo. Com isso, pelo fato dos magistrados terem fundamentado suas decisões no
direito possessório e no direito de propriedade, desconsideraram o interesse
iminentemente público em conflito, no caso, o que é assegurado às crianças e aos
adolescentes através de Lei Federal e da Constituição da República. E o que é pior,
a adoção da referida linha de entendimento foi o fundamento de decisões em liminares
de reintegração de posse que ensejaram desocupações, portanto, altamente
prejudicial aos direitos dos secundaristas integrantes das ocupações.
O direito de propriedade também é um direito subjetivo, no entanto particular,
ao passo que ao envolver o interesse público, vinculando o Estado e os direitos
subjetivos públicos, como os educacionais das crianças e adolescentes, o ângulo de
visão e a tomada de decisão adquirem outro viés.
Nesse sentido, vejamos o entendimento de Celso Ribeiro Bastos quanto ao
assunto, uma vez que esclarece que ao tratar sobre a propriedade privada pelo ângulo
dos direitos subjetivos, precisa ser observado se o proprietário é o Estado ou o
particular. No caso, o particular exerce o direito como subjetivo, porém sendo o ente
estatal, a realidade é outra, considerando as limitações oriundas da legislação.

A propriedade, se vista do ângulo do direito civil, não é senão um direito


subjetivo, consistente em assegurar a uma pessoa o monopólio da
exploração de um bem e de fazer valer esta faculdade contra todos que
eventualmente queiram a ela se opor. Se, contudo, mudarmos o enfoque da
questão e passarmos a considerar a propriedade nas suas relações com o
Poder Público, a sua natureza ganha uma coloração bastante diversa
(BASTOS, 1996, p. 191).
154

E prossegue o jurista no que se refere à propriedade privada, quando escreve


que o direito de fruição plena é atinente ao particular e não ao Estado, por isso fica
claro o descabimento das decisões judiciais nas ações possessórias favoráveis ao
ente público, uma vez que deveriam ter prevalecidos os interesses e direitos dos
estudantes, tendo em vista que ocuparam bens públicos exercendo direitos subjetivos,
em cuja seara os poderes do Estado se diferem do particular e, com isso, se tornam
limitados de acordo com Celso Ribeiro Bastos.

Do ponto de vista da sua conceituação, o que se vê é que a propriedade, no


direito civil, consiste na fruição plena e exclusiva, por uma pessoa, de um
determinado bem corpóreo. A sua definição seria, portanto, extraível das
prerrogativas que o domínio oferece: usar, gozar, dispor e o de reivindicar a
coisa de quem quer que indevidamente a detenha (BASTOS, 1996, p. 191).

Por aí se observa que os princípios da propriedade privada, nos quais se


inclui o direito possessório, corolário das ações de reintegração de posse, estão
diretamente relacionados com os interesses individuais. Assim, disciplinados pelo
direito civil, privado, portanto, a rigor do que ensina o jurista Celso Bastos e largamente
positivado no sistema jurídico. Por isso, incabível a postura, que passa a ser tida como
de classe, dos juízes que adotaram essa base jurídica ao decidir conflitos de interesse
público, especialmente relacionados aos interesses de crianças e adolescentes de
acordo com o objeto desse estudo.
O direito possessório é disciplinado a partir do art. 1210 do Código Civil
brasileiro, Lei Federal 10.406 de 10 de janeiro de 2002, enquanto o procedimento para
reintegração de posse encontra estabelecido a partir do art. 560 do Código de
Processo Civil, Lei Federal 13.105 de 16 de março de 2015, regramento normativo
voltados, fundamentalmente, para cuidar de interesses privados quando se referem à
posse e cujos dispositivos dizem o seguinte36:

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de


turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência eminente, se
tiver justo receio de ser molestado (BRASIL, 2002, grifos nosso).

36 Citamos os dispositivos do Código de Processo Civil (art. 1.210) e do Código Civil (art. 560), com o
fim de facilitar a compreensão dos conceitos de posse, uma vez que realizado tanto pela legislação
quanto pelos juristas, cujo debate, neste estudo, consideramos de fundamental importância, uma vez
que se referem ao direito privado, e que, porém, foi usado por setores do Poder Judiciário para dirimir
litígios onde o interesse predominante era de crianças e de adolescentes, portanto, público.
155

Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de


turbação e reintegrado no caso de esbulho (BRASIL, 2015, grifos nosso).

É certo, de acordo com o entendimento predominante no meio jurídico, que


o Código de Processo Civil é “ramo” do direito público, ao passo que o Código Civil
integra o direito privado nos termos já colocados. Entretanto, o Código de Processo
Civil, como lei instrumental, nas ações possessórias em discussão, está visando
solução de lide cuja natureza é privada. Com isso, agora, conceituaremos o vocábulo
posse, e o fazemos com o fim de demonstrar que o mencionado instituto não deveria
ter sido usado nos debates processuais feitos por alguns juízes em razão dos litígios
relacionados ao Movimento de Ocupação das Escolas, em cujas ocasiões deferiram
as liminares requeridas pelo Estado, ocasionando vasto prejuízo ao direito dos
ocupantes, de acordo com o que já foi debatido e demonstrado anteriormente.
Conforme o entendimento de Silvio Rodrigues no livro Direito Civil, a posse é
conceituada da seguinte forma: “Em suma, poder-se-ia dizer que a) a posse é a
condição de fato da utilização econômica da propriedade; b) o direito de possuir faz
parte do conteúdo do direito de propriedade; d) a posse é uma rota que leva à
propriedade” (RODRIGUES, 1997, p. 20).
Washington de Barros Monteiro, por seu turno, citando Savigny, adota a
seguinte conceituação para posse:

Para Savigny, posse é o poder que tem a pessoa de dispor fisicamente de


uma coisa, com intenção de tê-la para si e de defendê-la contra a intervenção
de outrem. São dois, portanto, no seu entender, os elementos constitutivos
da posse: o poder físico sobre a coisa, o ato material de ter esta à sua
disposição, numa palavra, a detenção da coisa (corpus) e a intenção de tê-la
como sua, a intenção de exercer sobre ela o direito de propriedade (animus).
O primeiro designa o fato exterior, em oposição ao segundo, o fato interior.
Não basta a simples detenção. Torna-se preciso seja ela intencional. Para
ser possuidor não basta deter a coisa, requer-se ainda vontade de detê-la,
animus domini ou animus rem sibi habendi, isto é, como proprietário ou com
a vontade de possuí-la para si (MONTEIRO, 1985, p. 17-18).

E o art. 1.196 do Código Civil ainda estabelece o seguinte com relação à


posse: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não,
de algum dos poderes inerentes à propriedade” (BRASIL, 2002).
Com isso, conclui o doutrinador Silvio Rodrigues, “Portanto, se possuidor é
aquele que atua frente à coisa como se fosse proprietário, pois exerce algum dos
poderes inerentes ao domínio, a posse, para o codificar, se caracteriza como
156

exteriorização da propriedade, dentro da concepção de Ihering” (RODRIGUES, 1997,


p. 20).
Dessa forma, seja pelo estabelecido no marco legal, assim como na
conceituação doutrinária, as atividades dos estudantes ocupantes das escolas jamais
deveriam ter sido caracterizadas como possessórias, turbação ou esbulho, uma vez
que não ocuparam para fins de exercer poderes de domínio ou propriedade nas
unidades escolares. As ocupações, seja em São Paulo ou no Paraná, de acordo com
o que foi longamente demonstrado no capítulo 3, subcapítulo 3.1, 3.2 e 3.3, tiveram
por objetivo protestar e resistir contra as políticas dos governos paulista e federal, bem
como reivindicar avanços na qualidade educacional e demais políticas do interesse
educacional e estudantil.
É por isso que o Juiz de Direito Substituto em 2º Grau que atuou no Recurso
de Agravo de Instrumento nº 1.569.056-7, de forma escorreita, disse “Na realidade,
embora possa se afirmar, em tese, a existência do esbulho, a questão principal a ser
resolvida não se restringe à tutela possessória. O litígio ora instalado passa longe das
discussões possessórias tradicionalmente conhecidas pelo direito civil” (PARANÁ,
2016).
Portanto, conforme o demonstrado, e a rigor de todo o debate realizado,
transparece a legalidade do Movimento de Ocupação das Escolas de São Paulo em
2015 e Paraná em 2016, em que pese às decisões judiciais proferidas favoravelmente
ao ente estatal e assim fazendo cessar uma pertinente e progressista reivindicação
de direitos largamente assegurados pelo sistema jurídico.
Mas, e qual o porquê de juízes, a exemplo do ocorrido em São Paulo e casos
no Paraná, terem julgado favoravelmente aos estudantes enquanto outros adotaram
a posição desejada pelo Estado, mesmo diante de um sistema jurídico assegurando
o direito dos ocupantes de acordo com o já demonstrado? Entendemos que cabem
duas explicações. A primeira se refere ao fato de parcela significativa do Poder
Judiciário ainda não ter adquirido o domínio e conhecimento necessário sobre a
legislação educacional do país, cujo entendimento é do professor aposentado Carlos
Roberto Jamil Cury e do Promotor de Justiça Luiz Antonio Miguel Ferreira (2010),
considerando o artigo “Justiciabilidade no Campo da Educação”, onde os referidos
autores, citando Karina Melissa Cabral, procuram esclarecer essa questão, de acordo
com o a seguir transcrito.
157

Constata-se, do exposto, que a questão da qualidade da educação é


complexa e talvez, por conta disso, afirma Cabral (2008, p. 150) que não há
nenhuma decisão emitida pelos Tribunais Superiores brasileiros – Supremo
Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça – sobre ações pleiteando a
qualidade do ensino ou a responsabilização do Poder Executivo pela falta de
qualidade, em nenhum nível de ensino. Assim, não obstante o
reconhecimento legal pela Constituição Federal e pela Legislação, da
necessidade de uma educação de qualidade, no âmbito do Poder Judiciário
está questão ainda não foi debatida como deveria (CURY; FERREIRA, 2010,
p. 24).

A par do acima alegado, fazendo pender a balança para o lado oposto dos
interesses dos estudantes, entendemos que deve ser considerada a formação
ideológica de integrantes do Judiciário, a exemplo das demais esferas de poder na
República brasileira, uma vez que as linhas de pensamento que permeiam a
sociedade, por obvio, também atingem os espaços de decisão, pois, conforme Diniz
(2006, p. 495), ao discutir o papel da ideologia na aplicação jurídica, afirma “O sistema
jurídico está embebido de ideologia valorativa; logo, o magistrado ao aplicar o direito,
também o está, pois há, de sua parte, uma prévia escolha, de natureza axiológica,
dentre as várias soluções possíveis”. Com relação a esse ponto, para uma resposta
mais aprofundada, é necessário estudo sobre o contra movimento, uma vez que uma
grossa camada se opôs aos estudantes ocupantes no decorrer de todo o processo
das ocupações, de acordo com o que foi demonstrado nos capítulos anteriores, onde
se vê, de forma bastante clara, uma posição de classe, e aí, entendemos que devem
ser incluídos os integrantes da magistratura que se desviaram da legislação vigente e
aplicaram normas do direito privado em prejuízo dos estudantes.
Para a segunda explicação, nos termos prometidos acima, nos reportamos
ao que diz o educador Fernando José Martins no livro “A Ocupação da Escola: Uma
Categoria em Construção”, uma vez que o referido autor demonstra que as aquisições
dos direitos ocorrem através da politização dos sujeitos e na comumente luta no seio
do sistema vigente como um todo. E que, a fonte primeira nesse processo de
conquista, se refere às condições fundamentais de sobrevivência das pessoas,
justamente o que fizeram os secundaristas ocupantes, pois todo o processo de luta
implementado visou, em essência, melhores condições de vida, uma vez que.

A aquisição de direitos se faz mediante o processo de politização dos sujeitos


e a paulatina luta no interior do sistema estatal, jurídico e político. Entretanto,
o ponto de partida apontado no interior de tal dimensão é que antes ainda da
conquista dos direitos de cidadania, pela via política, o motor para a aquisição
158

dos direitos elementares (o que ocorre com a ocupação da escola) é a


necessidade urgente dos sujeitos diretamente ligada às condições básicas
de subsistência (MARTINS, 2011, p. 210).

Ao longo do texto, desde os primeiros capítulos, foi demonstrada a luta


travada pelos estudantes contra as políticas educacionais praticadas pelos governos.
E essa busca incessante, considerando as necessidades fundamentais dos
integrantes do Movimento de Ocupação das Escolas, mobilizou milhares de
estudantes e integrantes da comunidade como um todo, inclusive lideranças, artistas
e autoridades, uma vez que foram se tornando, todos, conscientes das necessidades
de avanços educacionais, primeiro em São Paulo em 2015 e, na sequência, em 2016,
no Paraná, o que gerou influência nos espaços de poder e com isso estabeleceu
pautas no Poder Judiciário, o que vem de encontro ao que afirma Martins (2010).
Queremos dizer que as decisões judiciais favoráveis aos estudantes foram fruto das
grandes mobilizações, pois, talvez, pelo que demonstra o estudo, setores da
magistratura paulista e paranaense não teriam pendido para o entendimento que
atingiram ao reconhecer o direito dos estudantes ora em estudo e presentes na
legislação.
Corrobora com o entendimento delineado no parágrafo anterior, a
argumentação do magistrado paranaense que proferiu decisão nos autos nº
1.569.056-7, ocasião, na qual, indeferiu o requerimento do Estado e o fez por entender
inviável a liminar sem diálogo entre as partes envolvidas no litígio.

Certo ou errado – e neste momento não me cabe avaliar – esse movimento,


conforme noticiam os jornais, se espalha por todo o Estado do Paraná e, em
São José dos Pinhais, a realidade é a mesma.
Nessas circunstâncias, a emissão de liminar de reintegração de posse, sem
qualquer oitiva do Ministério Público e da Defensoria Pública, e sem a
tentativa de intermediação de um diálogo entre os envolvidos, não se vela a
medida mais apropriada (PARANÁ, 2016).

Com tudo isso, a partir dos aspectos estudados, importantes passos foram
dados para a demonstração da legalidade do Movimento de Ocupação das Escolas.
E isso foi possível, considerando os direitos educacionais já conquistados e
integrantes do sistema jurídico, de acordo com o demonstrado ao longo desse estudo.
Da mesma forma, consideramos que o Movimento de Ocupação das Escolas e suas
respectivas ações, são fenômenos amparados na legislação, portanto, legal, uma vez
que os estudantes não foram ouvidos na formulação das políticas educacionais e, por
159

isso, reivindicaram participação nos processos de decisão relacionados à educação,


de acordo com o que foi reconhecido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. No
mesmo sentido se encontram decisões de vários juízes integrantes do Judiciário
paranaense, pois de acordo com a previsão legal, reconheceram o direito dos
secundaristas ocupantes de protestar, se manifestar, reivindicar e se reunir, inclusive
no interior das escolas públicas. Diante disso, evidencia-se, após a análise da luta
política e jurídica praticadas pelos estudantes, que o alcance do sistema educacional
almejado passa pelo permanente e aprofundado debate sobre o tema no conjunto da
sociedade, bem como pela resistência e constante exercício e busca de direitos, de
acordo com o que elevada parcela do meio escolar tem feito no decorrer da história.
160

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo, a partir dos aspectos políticos e jurídicos do Movimento de


Ocupação das Escolas de São Paulo em 2015 e do Paraná em 2016, se propôs a
constatar se o fenômeno referido encontra ou não amparo no sistema político
brasileiro, bem como se é legal ou não sob o ponto de vista do marco jurídico vigente
no país. Para tal pretensão, adotamos como método de estudo o Materialismo
Histórico e Dialético, ao mesmo tempo em que analisamos o fenômeno sob o ponto
de vista da luta de classes, ao passo que foram efetuados os estudos a partir das
atividades reivindicatórias, de resistências e de protestos dos estudantes ao longo de
sua caminhada histórica no Brasil até o fenômeno ora em estudo, com identificação
de vastas semelhanças e até identidade nas causas, desenrolar e consequências das
pautas estudantis nos diferentes momentos de lutas que os estudantes colocaram em
prática, evidenciando um progressivo processo de resistências e de conquistas
políticas e de direitos no decorrer do tempo.
E nessa jornada de pesquisa ficou clara a influência das atividades históricas
estudantis, bem como dos estudantes chilenos integrantes da denominada
“Revolução dos Pinguins”, nos processos reivindicatórios recentes e nas ocupações
de São Paulo em 2015 e Paraná em 2016, sendo a causa fundamental e primeira,
tanto no caso chileno, quanto nas ocupações das escolas brasileiras, as medidas
liberais dos governos com vista à contenção de gastos relacionados às políticas
públicas, em especial àquelas pertinentes à educação. E essa postura do governo,
como medida impeditiva de avanços da qualidade da escola pública, além da
supressão de direitos educacionais já conquistados, impulsionou uma vasta parcela
da comunidade escolar para as atividades do movimento estudado, obrigando, por
parte de setores do Poder Público, inclusive do Poder Judiciário, Ministério Público e
Defensoria Pública, a adoção de posições e decisões favoráveis aos estudantes,
inclusive considerando o que se encontra estabelecido juridicamente, seja na
Constituição Federal ou na legislação infraconstitucional no que tange aos direitos
educacionais, uma vez que se refere à política de Estado já definida e cujo exercício
é direito subjetivo público dos estudantes, bem como obrigação da administração.
Diante deste contexto, e considerando o estudo realizado, passos
importantes foram dados demonstrando o efetivo amparo das atividades de ocupação
desenvolvidas pelos secundaristas, bem como do Movimento de Ocupação das
161

Escolas como um todo pelo sistema político, considerando o regime democrático


vigente no Brasil, uma vez que a resistência oferecida pelos estudantes não se
divorciou do que lhes é assegurado politicamente. No mesmo sentido, foi
demonstrada a legalidade do fenômeno como um todo em razão dos estudantes
ocupantes, “simplesmente”, terem exercido direitos previstos tanto na Constituição
Federal de 1988, quanto na legislação infraconstitucional ao longo do processo de
ocupação, em que pese, de acordo com o resultado da pesquisa, essa realidade não
tenha sido reconhecida oficialmente em seu todo, assim como por setores da
sociedade brasileira, tanto no que se refere ao âmbito político, quanto no que diz
respeito aos aspectos jurídicos, considerando fatores relacionados à luta de classes.
E o amparo político aos secundaristas integrantes das ocupações se
encontra consubstanciado nos fundamentos constitucionais da República brasileira,
em especial nos direitos à livre manifestação do pensamento, direito de reunião e
plena liberdade de associação, corolários do Regime Democrático, conforme já
salientado, e ao mesmo tempo em razão do fato de exercitarem direitos educacionais
assegurados pelo marco jurídico em vigor. No mesmo sentido, o fenômeno estudado
encontra a devida legalidade no sistema jurídico brasileiro, considerando os direitos
constitucionais e os infraconstitucionais que são assegurados aos estudantes, como
é o caso da educação como direito subjetivo, o que lhes assegura o direito de exercê-
lo; o direito de participar da formulação da política educacional; o princípio da proteção
integral da criança e do adolescente; e, também, os próprios direitos que asseguram
o já referido amparo político.
Em que pese isso, em São Paulo em 2015, embora os estudantes tenham
vencido o embate, tanto no âmbito político, quanto na seara jurídica, de forma
“sorrateira”, o governo paulista logrou êxito e colocou a política que defendia em
prática, pois ao passo que os estudantes se desmobilizaram no processo de luta,
embora tenha desistido de fechar escolas, o Estado passou a fechar salas de aula em
larga escala. No mesmo sentido, no ano de 2016, no Estado do Paraná, embora a
vastidão do Movimento de Ocupação das Escolas, é fato e o estudo assim demonstra,
a política proposta por Michel Temer também foi aprovada na sua integralidade, em
que pese toda a rejeição e resistência do meio estudantil e de relevantes setores da
sociedade e de organismos oficiais, como foi o caso de órgãos do Poder Judiciário,
transparecendo o choque entre interesses divergentes, ou seja, o que importava aos
alunos da escola pública por um lado e o que o Estado neoliberal pretendia praticar.
162

E diante desse contexto histórico de luta de classes, considerando o estudo


realizado, pode-se afirmar que os estudantes brasileiros agregaram saldo positivo,
cujos ganhos já transparecem desde outrora, portanto, a partir dos primeiros
processos de luta e que tem seguido uma escala ascendente até os dias atuais. Nesse
sentido o esforço do Estado é pela supressão de direitos em razão dos objetivos de
conter despesas, enquanto, por outro lado, a ações estudantis são de resistência, e,
por isso, pela manutenção das conquistas obtidas, bem como pela busca de novas
realizações, seja no que tange à esfera política ou no que diz respeito à seara do
direito.
Nesse sentido, embora considerado vasto o saldo político e jurídico obtido
pelos estudantes do Movimento Estudantil de Ocupação das Escolas, tanto em 2015
em São Paulo, quanto em 2016 no Paraná, o estudo também constatou que o Estado
logrou êxito em seus objetivos, uma vez que as políticas combatidas pelos estudantes
e defendidas oficialmente foram vencedoras, pois aprovadas pelo parlamento. E o
sucesso estatal, em sua grande parte, seja no que tange ao viés político ou jurídico,
deve ser creditado ao apoio que o Estado obteve do contra movimento, no qual estão
inclusos estudantes, servidores públicos, parte da comunidade escolar e autoridades,
como é o caso de Juízes de Direito dispostos a aplicar a legislação privada em
processos judiciais cujo interesse é iminentemente público, o que faz ressaltar a luta
de classes novamente, desde outrora, até os dias atuais, amalgamada no decorrer de
todo o processo de ocupação dos estudantes, permeando não somente as atividades
do Movimento de Ocupação das Escolas e do contra movimento, mas também setores
da sociedade, Poder Público, e, inclusive, os magistrados que proferiram decisões nas
ações de reintegração de posse, no caso, aquelas cujos julgados foram contra os
secundaristas integrantes do movimento de ocupação.
E levando em conta as flagrantes contradições entre as decisões judiciais
proferidas em razão do fenômeno estudado, se impõe o entendimento de que o Poder
Judiciário precisa ser mais cuidadoso ao julgar as divergências oriundas do meio
educacional, principalmente com aquelas de cunho reivindicatório estudantil, pois,
assim, poderão ser evitadas decisões altamente maléficas às crianças e aos
adolescentes que se encontram no exercício de direitos já conquistados e constantes
no marco constitucional e legal. Talvez essa seja a mais importante lição oriunda do
Movimento Estudantil de Ocupação das Escolas como tributo às autoridades com
163

responsabilidade de execução da legislação vigente, inclusive às pessoas que


exercem funções no magistério e na administração escolar.
Com relação à comunidade escolar, aos estudantes e intelectuais da área
educacional de maneira geral, fica a lição fundamental de que os problemas
relacionados à matéria, precisam ser discutidos em profundidade e, acima de tudo, de
forma democrática e reconhecendo os direitos dos estudantes. Assim deve ser feito,
pois foi dessa forma que os secundaristas o fizeram no decorrer do processo de
ocupação e que propiciou os avanços obtidos pelo movimento durante o decorrer do
fenômeno e certamente será o que possibilitará ganhos e avanços políticos e jurídicos
no meio estudantil na inarredável luta de classes com vistas a uma escola pública
gratuita e de qualidade para todos.
E dentre outros ensinamentos deixados pelo Movimento de Ocupação das
Escolas, sobre sai a larga capacidade demonstrada pelos ocupantes em uma série de
aspectos. Dentre essas habilidades está a de administrar a escola e os problemas
dela oriundos; a de articular recursos com vistas a solucionar os problemas do
cotidiano da escola e dos próprios alunos; de formular politicamente e assim constituir
os meios com vistas a uma escola que esteja em patamares diversos daqueles que
foram longamente denunciados durante o fenômeno, ou seja, uma escola com
ausência de qualidade e gerida por premissas ultrapassadas. Nesse sentido, fica o
ensinamento e os secundaristas assim demonstraram, que estão habilitados para
atuar contribuindo na formulação da política educacional e que é enorme a
necessidade de um sistema educacional à altura do tempo atual.
E, ainda, em razão do fenômeno, considerando o estudo realizado, ficou o
ensinamento do quão necessário é a devida atenção aos eventos reivindicatórios e
de resistências implementados pelos estudantes por parte dos estudiosos da matéria,
uma vez que pouca atenção se vê nesse sentido, o que facilita a proliferação da força
do contra movimento e dificulta vastamente a propagação do que propõem os jovens
durante os atos de luta, cuja culpa é do tímido debate implementado pelos intelectuais
que estudam o assunto. É fato a existência de um amplo rol de publicações
relacionada à problemática, porém, na maioria dos casos, a discussão é pontual e
cuida de acontecimentos específicos e de temas pontuais, sem preocupação com o
todo dos processos de luta dos estudantes, e isso, é um problema que deve ser
superado pelos intelectuais que discutem o fenômeno e almejam qualidade
educacional.
164

Assim, levando em conta a relevante necessidade de avanços da escola


pública brasileira no que tange à almejada qualidade. E, da mesma forma,
considerando que importantes setores da sociedade e do Poder Público já possuem
essa compreensão, conforme demonstrado ao longo deste estudo. No mesmo
sentido, levando em consideração a legislação educacional de vanguarda que o país
já possui, sob o ponto de vista do sistema econômico vigente, inclusive classificando
os direitos educacionais como subjetivos públicos. Diante de tudo isso, com o objetivo
de alcançar, de fato, de maneira universal, a qualidade da escola pública brasileira,
além da devida atenção aos fenômenos de resistência e reivindicatórios, entendemos
como sendo de grande importância a realização de profundos estudos sobre o contra
movimento, eis que necessário compreender e demonstrar os meandros da violência
desencadeada pela polícia, por servidores e particulares contra os estudantes que
simplesmente reivindicavam os direitos que lhes são assegurados pelo sistema, tanto
no sentido político, quanto jurídico.
Também é necessário debater, de forma mais aprofundada, os motivos de
Juízes de Direito aplicarem, em conflito de interesse público, relacionado aos direitos
de crianças e adolescentes, normas de direito privado, uma vez que já é hora do Poder
Público, e aí se inclui a magistratura nacional, assumirem reais responsabilidades com
as políticas de Estado vigentes no país e relacionadas à educação. Por isso, com
vistas a superação de barreiras, o estudo do contra movimento é de fundamental
importância, ao mesmo tempo em que se estabelece o entendimento de que o
processo de luta dos estudantes, constitui forte instrumento para a busca e
consolidação dos direitos educacionais almejados pelos “jovens de luta” que
integraram o Movimento Estudantil de Ocupação das Escolas.
165

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173

ANEXOS
174

ANEXO 01 - Material obtido no livro Escola de Luta.


175

ANEXO 02 - Material obtido no livro Escola de Luta.


176

ANEXO 03 - Material obtido no livro Escola de Luta.


177

ANEXO 04 - Cartilha Como ocupar um colégio? Fonte: no livro Escola de Luta


178

ANEXO 04 - Cartilha: Como ocupar um colégio? Fonte: livro Escola de luta.


179

ANEXO 05 - Cartilha: Como ocupar sua escola? Fonte Google.


https://www.google.com.br/search?q=Cartilha+colorida+como+Ocupar+sua+Escola?

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