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O MONSTRO COMO ARAUTO DO ENTRELUGAR:

SOBRE O FAUNO E O LABIRINTO

Marvin Kenji Nakagawa e Silva

O presente trabalho busca fazer uma análise do monstro como fragmento e distorção em
O Labirinto do Fauno (DEL TORO, 2006) tendo como base teórica as teses III e IV de
Jeffrey Jerome Cohen (2000) e O corpo impossível (2015) de Eliane Robert Moraes.
Nesse sentido, como diretor, produtor e roteirista de cinema Guillermo Del Toro trabalha
com temas como a violência e o horror de forma constante, de modo que se se fala em
contos de fadas ligados a trabalhos de sua autoria, não se pode relacionar esses contos ao
que o senso comum pensa ser destinado ao público infantil, uma vez que a atmosfera de
hostilidade e repressão utilizados pelo diretor raramente se comparam aos contos
adaptados dos irmãos Grimm como se pode ver em Branca de Neve, Cinderella ou
Rapunzel (GRIMM, 1982-1985), os quais em sua forma adaptada, encontram estórias
com finais felizes, com príncipes e princesas em total harmonia. Como afirma a Dra.
Karin Volobuef (2015), os contos de fadas, originalmente possuíam um amplo público,
não direcionados exclusivamente ao público infantil, desse modo, eram entretenimento
tanto para adultos como para crianças, ainda que, seu papel mais importante era o de
educar os seus ouvintes crianças, o que pode os ter “relegado ao quarto das crianças’,
assim como a mobilha velha ou fora de moda é relegada à sala de recreação,” (TOLKIEN,
2013). Assim, o Labirinto do Fauno de Guillermo del Toro é um conto de fada que se
conecta as origens do gênero pela violência, mesmo as presenças não violentas possuem
uma dualidade, como o Lobo que tenta conquistar com base no carisma a Chapeuzinho
Vermelho. Nesse sentido, a figura do Fauno apresenta muitos dos atributos presentes na
tese III e IV de Cohen (2000), em sua tese III — “O monstro é o arauto da crise de
categorias” — afirma que os monstros são “híbridos” de corpos “incoerentes”, o fauno na
narrativa possui características antropomórficas, botânicas e animalescas, tornando
assim, um fragmento da figura humana, o que reafirmado no Corpo impossível, em que
há “a perda da integridade corporal” (MORAES, 2015, p. 13). Desse modo, a tese IV de
Cohen (O monstro mora nos portões da diferença), afirma que o monstro sempre é de
uma categoria externa (estrangeira) mas tem origem interna, o que o torna estranhamente
familiar, desse modo, o conceito de Unheimlich psicanalítico faz-se presente. Assim, a
origem não natural do monstro, evoca as características do grotesco de Wolfgang Kayser
(2013), e como tal, torna o mundo infamiliar. Tal perspectiva faz-se importante no mundo
de O Labirinto do Fauno, pois o Fauno, é o porta voz do entrelugar, do mundo subterrâneo
e do mundo terreno, e diferente dos familiares contos de fadas, as ações do fauno
apresentam uma dualidade ao espectador, um verdadeiro estranhamento. Nesse sentido,
a figuração do fauno é fruto do imaginário de Ofélia, sendo assim, os conflitos que
perpassam a sua jornada, formam um corpo de guerra, deformado pela própria natureza
da humanidade, manchado pelo padrasto franquista, marcando o tom do maravilhoso.

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