Você está na página 1de 363

Antígona: a eterna sedução da filha de Édipo

Pociña, Andrés, ed. lit.; López, Aurora, ed. lit.; Morais, Carlos, ed. lit.;
Author(s: Silva, Maria de Fátima Sousa e, ed. lit.
Published by: Imprensa da Universidade de Coimbra; Annablume Editora
Persistent URL: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/38520
DOI: DOI:http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2

Accessed : 22-Jul-2022 21:25:43

The browsing of UC Digitalis, UC Pombalina and UC Impactum and the consultation and download of
titles contained in them presumes full and unreserved acceptance of the Terms and Conditions of
Use, available at https://digitalis.uc.pt/en/terms_and_conditions.

As laid out in the Terms and Conditions of Use, the download of restricted-access titles requires a
valid licence, and the document(s) should be accessed from the IP address of the licence-holding
institution.

Downloads are for personal use only. The use of downloaded titles for any another purpose, such as
commercial, requires authorization from the author or publisher of the work.

As all the works of UC Digitalis are protected by Copyright and Related Rights, and other applicable
legislation, any copying, total or partial, of this document, where this is legally permitted, must contain
or be accompanied by a notice to this effect.

pombalina.uc.pt
digitalis.uc.pt
Antigone sulle mura • Quatro funerais e um
casamento. Mortos e vivos naSÉRIE
Antígona de Sófocles
MITO E (RE)ESCRITA

• Da velhice à justiça: Antígona e a crítica


platônica da tirania • Jean Cocteau e a filha
de Édipo • Las Antígonas de Espriu • Entre
Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza
en la refección de Memé Tabares • Antígona:
nome de código – A peça em um ato de Mário
Sacramento • Antígona e Medeia no conto “a
Benfazeja”, de João Guimarães Rosa • Creonte,
o tirano de Antígona. Sua recepção em Portugal
• Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono
de Elsa Morante • Algunas Antígonas en España
(s. XX) • Antígona entre muros, contra os muros de
silêncio: Mito e História na recriação metateatral
de José Martín Elizondo • Antígona: Norma

antígona
a eterna sedução
da filha de édipo
Andrés Pociña, Aurora López, Carlos Morais
e Maria de Fátima Sousa e Silva
coordenação

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


COIMBRA UNIVERSITY PRESS

e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia


• La Antígona en lengua asturiana • Antígona
(Página deixada propositadamente em branco)
Antigone sulle mura • Quatro funerais e um
casamento. Mortos e vivos naSÉRIE
Antígona de Sófocles
MITO E (RE)ESCRITA

• Da velhice à justiça: Antígona e a crítica


platônica da tirania • Jean Cocteau e a filha
de Édipo • Las Antígonas de Espriu • Entre
Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza
en la refección de Memé Tabares • Antígona:
nome de código – A peça em um ato de Mário
Sacramento • Antígona e Medeia no conto “a
Benfazeja”, de João Guimarães Rosa • Creonte,
o tirano de Antígona. Sua recepção em Portugal
• Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono
de Elsa Morante • Algunas Antígonas en España
(s. XX) • Antígona entre muros, contra os muros de
silêncio: Mito e História na recriação metateatral
de José Martín Elizondo • Antígona: Norma

antígona
a eterna sedução
da filha de édipo
Andrés Pociña, Aurora López, Carlos Morais
e Maria de Fátima Sousa e Silva
coordenação

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


COIMBRA UNIVERSITY PRESS

e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia


• La Antígona en lengua asturiana • Antígona
Estruturas Editoriais
Série Mito e (Re)escrita
Estudos Monográficos

ISSN: 2182‑8814

Diretor Principal
Main Editor

Maria de Fátima Silva


Universidade de Coimbra

Assistentes Editoriais
Editoral Assistants

Elisabete Cação, Nelson Ferreira


Universidade de Coimbra

Comissão Científica
Editorial Board

Ana Maria Tobia Francisco de Oliveira


Universidad de la Plata Universidade de Coimbra

Andrés Pociña José Augusto Bernardes


Universidad de Granada Universidade de Coimbra

Carmen Morenilla Maria das Graças Augusto


Universidad de Valencia Universidade Federal do Rio de Janeiro

Concepción López Rodríguez Milagros Quijada


Universidad de Granada Universidad Pais Basco

Fernando García Romero Nair Castro Soares


Universidade Complutense de Madrid Universidade de Coimbra

Francesco de Martino Tereza Virgínia Barbosa


Università di Foggia Universidade Federal de Minas Gerais

Todos os volumes desta série são submetidos a arbitragem científica independente.


Antigone sulle mura • Quatro funerais e um
casamento. Mortos e vivos naSÉRIE
Antígona de Sófocles
MITO E (RE)ESCRITA

• Da velhice à justiça: Antígona e a crítica


platônica da tirania • Jean Cocteau e a filha
de Édipo • Las Antígonas de Espriu • Entre
Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza
en la refección de Memé Tabares • Antígona:
nome de código – A peça em um ato de Mário
Sacramento • Antígona e Medeia no conto “a
Benfazeja”, de João Guimarães Rosa • Creonte,
o tirano de Antígona. Sua recepção em Portugal
• Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono
de Elsa Morante • Algunas Antígonas en España
(s. XX) • Antígona entre muros, contra os muros de
silêncio: Mito e História na recriação metateatral
de José Martín Elizondo • Antígona: Norma

antígona
a eterna sedução
da filha de édipo
Andrés Pociña, Aurora López, Carlos Morais
e Maria de Fátima Sousa e Silva
coordenação

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


COIMBRA UNIVERSITY PRESS

e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia


• La Antígona en lengua asturiana • Antígona
Série Mito e (Re)escrita
Estudos Monográficos

Título Title
Antígona. A eterna sedução da filha de Édipo
Antigone. The eternal seduction of Oedipus’ daughter
Coord. Ed.
Andrés Pociña, Aurora López, Carlos Morais, Maria de Fátima Sousa e Silva

Editores Publishers
Imprensa da Universidade de Coimbra Annablume Editora * Comunicação
Coimbra University Press
www.uc.pt/imprensa_uc www.annablume.com.br
Contacto Contact Contato Contact
imprensa@uc.pt @annablume.com.br
Vendas online Online Sales
http://livrariadaimprensa.uc.pt

Coordenação Editorial Editorial Coordination


Imprensa da Universidade de Coimbra
Conceção Gráfica Graphics
Carlos Costa
Infografia Infographics POCI/2010
Nelson Ferreira
Projeto UID/ELT/00196/2013 -
Impressão e Acabamento Printed by Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade
Simões & Linhares, Lda. de Coimbra

ISSN
2182‑8814
ISBN
978-989-26-1110-5
ISBN Digital
978-989-26-1111-2 © Novembro 2015
Annablume Editora * São Paulo
DOI Imprensa da Universidade de Coimbra
http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2 Classica Digitalia Vniversitatis Conimbrigensis
http://classicadigitalia.uc.pt
Depósito Legal Legal Deposit Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos
da Universidade de Coimbra

A ortografia dos textos é da inteira responsabilidade dos autores.

Trabalho publicado ao abrigo da Licença This work is licensed under


Creative Commons CC‑BY (http://creativecommons.org/licenses/by/3.0/pt/legalcode)
Antígona. A eterna sedução da filha de Édipo
Antigone. The eternal seduction of Oedipus’ daughter
Coord. Ed.
Andrés Pociña, Aurora López, Carlos Morais, Maria de Fátima Sousa e Silva

Filiação Affiliation
Universidade de Granada, Universidade de Aveiro, Universidade de Coimbra

Resumo
Este volume reúne um conjunto de estudos que têm por motivo o mito de Antígona, a sua expressão clássica e
a sua recepção moderna e contemporânea, em diferentes contextos culturais (Portugal, Brasil, Espanha, França
e Itália).

Palavras‑chave
Literatura, filosofia, teatro.

Abstract
This volume includes several texts about the myth of Antigone, its classical expression and modern and
contemporary reception, in different cultural contexts (Portugal, Brazil, Spain, France and Italy).

Keywords
Literature, philosophy and theatre.
Coordenadores

Andrés Pociña Pérez (Lugo, 1947) es Catedrático de Filología Latina de la


Universidad de Granada, de la que fue Decano de la Facultad de Filosofía y
Letras y Director del Departamento de Filología Latina. Responsable del Grupo
de Investigación HUM 318 de la Junta de Andalucía. Imparte las enseñanzas
de Literatura latina (Grado) y Teatro grecolatino y su pervivencia en los teatros
modernos (Máster). Investiga fundamentalmente sobre Literatura latina (diversos
géneros); Pervivencia del teatro clásico; Literatura gallega; Poesía griega del siglo XX.

Aurora López López (Sarria, Lugo, 1948) es Catedrática de Filología Latina de


la Universidad de Granada y Directora de la Unidad de Igualdad entre Mujeres
y Hombres. Responsable de las asignaturas de Textos latinos (Grado), Mujeres
romanas (Máster) y Teatro grecolatino y su pervivencia (Máster). Sus líneas prefer‑
entes de investigación son: Literatura latina, especialmente los géneros comedia y
tragedia; Estudios sobre la literatura de la mujer y referente a la mujer; Pervivencia
y tradición clásica, sobre todo en el campo teatral.

Carlos Morais é Doutor em Literatura pela Universidade de Aveiro, na especialidade


de Literatura Grega, com a tese O Trímetro Sofocliano: variações sobre um esquema,
publicada em 2010 (Lisboa, FCT/FCG). Professor do Departamento de Línguas e
Culturas da Universidade de Aveiro, tem desenvolvido a sua principal investigação
em literatura grega e na receção do teatro clássico. Neste domínio, publicou Máscaras
Portuguesas de Antígona (Aveiro 2001) e vários estudos, em livros e revistas internac‑
ionais, sobre o mito de Antígona nas literaturas portuguesa e espanhola.

Maria de Fátima Sousa e Silva é Professora Catedrática do Instituto de Estudos


Clássicos da Universidade de Coimbra. Desenvolveu, como tese de doutoramento,
um estudo sobre a Comédia Grega Antiga (Crítica do teatro na Comédia Grega
Antiga), e, desde então, tem prosseguido com investigação nessa área. Publicou
já traduções comentadas de outras nove comédias de Aristófanes, além de um
volume com a tradução das peças e dos fragmentos mais significativos de Menan‑
dro. Coordena, neste momento, um projecto de estudos de recepção no Centro de
Estudos Clássicos e Humanísticos da mesma Universidade.
Editors

Andrés Pociña Pérez (Lugo, 1947) is Professor Catedrático of Latin Philology in


the University of Granada, where he has been Decano in the Faculty of Philosophy
and Letters, and Director of the Department of Latin Philology. He was also
responsible for the Research Group HUM 318 in Andalucía. He makes courses
about Latin Literature, Greek and Latin Theatre and their reception in modern
stages. As research, his priorities are Latin Literature (different genres), reception of
classical theatre, literature from Galicia and poetry from the 20th century Greece.

Aurora López López (Sarria, Lugo, 1948) is Professor Catedrática of Latin


Philology in the University of Granada and Director of the Unity for Women and
Men Equality. She is responsible for courses of Latin language, Roman women,
Greek and Roman theatre and their reception. Her research is mainly about Latin
Literature, comedy and tragedy; studies on literature written by women or about
women; reception of classical tradition, mainly in theatre.

Carlos Morais obtained his PHD in ancient Greek Literature by the University of
Aveiro, in the specialty of Greek Literature, with a thesis about Sophoclean trimeter:
variations of a metric model, published in 2010 (Lisbon, FCT/FCG). He is now
Professor of the Department of Languages and Cultures in the University of
Aveiro, and has been making his research about Greek literature, mainly theatre,
and its reception. He published Portuguese masks of Antigone (Aveiro 2001) and
several studies, in books and international periodicals, about the myth of Antigone
in Portuguese and Spanish literatures.

Maria de Fátima Sousa e Silva is Professor Catedrática in the Institute of Classical


Studies of the University of Coimbra. As her PHD thesis, she worked about
Ancient Greek Comedy (Theatrical criticism in Ancient Greek Comedy). From
then, she went on with the same research and published several articles. She also
published translations, with commentary, of nine of the Aristophanic comedies,
and a volume with the translation of the plays and the most well preserved
fragments of Menander. She is now coordinating a project on reception studies in
The Center of Classical and Humanistic Studies of Coimbra.
(Página deixada propositadamente em branco)
SUMÁRIO

Apresentação......................................................................................................................11

Francesco De Martino, Antigone sulle mura


(Antigone on the Walls) .......................................................................................................15

João Diogo R. P. G. Loureiro, Quatro funerais e um casamento


Mortos e vivos na Antígona de Sófocles
(Four funerals and one marriage. Dead and alive in Sophocles’ Antigone)............................................51

Maria das Graças de Moraes Augusto, Da velhice à justiça:


Antígona e a crítica platônica da tirania
(From oldness to justice: Antigone and Platonic criticismo of tyranny).............................................. 63

Maria do Céu Fialho, Jean Cocteau e a filha de Édipo


(Jean Cocteau and Oedipus’ daughter).................................................................................... 87

Carmen Morenilla Talens, Las Antígonas de Espriu


(Espriu’s Antigone(s)).......................................................................................................105

Núria Llagüerri Pubill, Entre Sófocles y Anouilh:


la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares
(Among Sophocles and Anouilh: Antigone and her nurse in Tabare’s refiguration).............................. 123

Maria Fernanda Brasete, Antígona: nome de código –


A peça em um ato de Mário Sacramento
(Antigone: code name - a play in one act, by Mário Sacramento)....................................................137

Gilmário Guerreiro da Costa, Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,


de João Guimarães Rosa
(Antigone and Medea in the short story “A Benfazeja”, by João Guimarães Rosa)................................157

Maria de Fátima Silva, Creonte, o tirano de Antígona


Sua recepção em Portugal
(Creon, the tyrant of Antigone. His reception in Portugal)..........................................................173

Andrés Pociña, Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante


(A different Antigone in Elsa Morante’s la Serata a Colono).........................................................193
Aurora López, Algunas Antígonas en España (s. XX)
(Some Antigone’s versions in Spain, 20th century).....................................................................219

Carlos Morais, Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:


Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo
(Antigone inside the walls, against the walls of silence:
Myth and history in the metatheatrical recreation of José Martín Elizondo).......................................... 241

Susana Hora Marques, Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia


(Antigone: Norm and Transgression in Sophocles and Hélia Correia)..............................................255

Ramiro González Delgado, La Antígona en lengua asturiana


(The Antigone in asturian language).................................................................................... 267

Stéphanie Urdician, Antígona otra vez...


aproximación a la escena francesa contemporánea
(Antigone again... approach of the French contemporary stage)..................................................... 285

Marta Isabel de Oliveira Várzeas, Antígona em cena no Teatro Nacional de São João:
Tradução e Dramaturgia
(Antigone on Stage in Teatro Nacional de São João: Translation and Dramaturgy).............................301

Index...............................................................................................................................333

Autores...........................................................................................................................357
Apresentação

A readaptação, sob várias formas artísticas, ou particularmente a reescri‑


ta dos mitos antigos tem sido, nas últimas décadas, motivo de uma reflexão
transversal, expressa em numerosa bibliografia nas diversas línguas. A sim‑
ples constatação da existência de múltiplos títulos sobre a matéria dá conta
do interesse que este tópico desperta, pelo que representa para a história da
cultura em geral e para a estética literária e dramática em particular. Ao
mesmo tempo que desvendam tradições que subjazem à moderna cultura
ocidental no seu todo, estes estudos sublinham a experiência particular de
cada povo, e a teia de referências que os unem como herdeiros de uma mes‑
ma cultura matricial greco-latina. Assim, além da filiação que remete às ori‑
gens do pensamento nosso contemporâneo, os estudos de recepção obrigam
a um diálogo com culturas irmãs dentro de um mesmo filão tradicional.
É por reconhecer esta teia diversificada de influências e de diálogos
interculturais que os encontros científicos, multidisciplinares por um
lado e internacionais por outro, fazem sentido. A aproximação de leituras
sobre um mesmo mito revela elementos predominantes na importação das
tradições, novidades que caracterizam as diferentes opções e um cruzamento
de leituras ao longo dos séculos. Este que foi, durante décadas, um plano
sobretudo europeu, redimensiona-se hoje em dia com uma abertura cada
vez mais expressiva à América Latina, onde o eco dos mesmos interesses se
tem revelado evidente.
Foi também durante muito tempo prática que os classicistas e os es‑
tudiosos da Literatura Portuguesa ou Comparada se ocupassem, cada um
desses grupos sob critérios e perspectivas distintos, deste tipo de textos, com
manifestas limitações. Este divórcio tem, no entanto, vindo a romper-se, em
nome de uma colaboração mais estreita que só pode trazer benefício a uma
leitura multifacetada, e por isso mais rica, desse objecto de estudo.
São também estes os princípios e objectivos que, no seu conjunto, têm
mobilizado um grupo internacional de investigadores que periodicamente
se encontram para dar sequência a este modelo de investigação. Em organi‑
zações anteriores, realizadas em distintos países – Espanha, Itália, França,
Brasil, Argentina, além de Portugal -, foram já abordados outros mitos (de
Medeia, Fedra, Helena, Agamémnon), que produziram um interessante

11
convívio científico em tempo de colóquio e, posteriormente, volumes temá‑
ticos que abrangem os estudos então apresentados, alargados com outros de
igual interesse para o formato final da publicação.
Inserido nessa mesma linha de investigação, este volume é, em primeira
mão, o resultado, revisto e ampliado, dos textos apresentados no colóquio
Antígona – A eterna sedução da filha de Édipo, que se realizou na Faculdade
de Letras de Coimbra entre 25-26 de Setembro de 2014. Pode considerar‑
-se que a proximidade com o calendário comemorativo dos 40 anos do
25 de Abril tornou a escolha particularmente apropriada. Na verdade, dos
múltiplos sentidos que o original sofocliano sugere – valores de justiça, diá‑
logo entre o divino e o humano, relacionamento familiar -, é sobretudo no
exercício do poder político, no abuso de autoridade que configura o tirano
e na voz heróica de uma oposição determinada, mas solitária, que ele incide.
Da sua importância para uma reflexão colectiva deram-se conta, antes dos
mais, os contemporâneos de Sófocles, que o distinguiram com um cargo
público de elevado prestígio, como reconhecimento da sua excelência no
‘pensar a cidade’.
Mas, por trás dessa motivação próxima, está o objectivo de prosseguir
uma cadeia de realizações, promovidas pelas Universidades espanholas de
Granada e Valência, juntamente com as portuguesas de Coimbra e Aveiro,
focadas na recepção dramática dos mitos clássicos. O tempo e um empenho
partilhado trouxe, a esta equipa que se mantém unida ao longo de décadas,
o incentivo principal de todo o processo: uma sólida amizade que se cons‑
truiu em torno “da eterna sedução” dos mitos gregos.
Por sua vez, o universo privilegiado pelo grupo de trabalho responsá‑
vel por este volume, embora com extensões a outras culturas e línguas – a
transdisciplinaridade natural nos estudos de recepção a isso aconselha – foi
sempre a literatura dramática de expressão portuguesa e espanhola. Com a
prioridade dada a esses textos, tem-se procurado preencher um vazio que
importantes estudos realizados por comentadores de primeira importância
no plano internacional têm, no entanto, deixado esquecidos.
Depois de outras iniciativas dedicadas a diferentes figuras do mito –
Medeia, Fedra, Helena, Agamémnon -, cabe agora a Antígona, a sempre
desafiadora e simbólica filha de Édipo, centrar as atenções e análises de
especialistas e estudiosos. Para os múltiplos tratamentos de que Antígona
foi objecto ao longo dos séculos, sob diversas formas literárias e artísticas, e
da particular incidência que este mito teve em tempos de ebulição política e
social, se obtiveram diversos contributos, que vieram inventariar e justificar
recriações contemporâneas da lenda tebana.

12
Qualquer bom estudo de recepção não dispensa uma reflexão sobre as
fontes essenciais que deram ao mito, já numa formulação literária e dra‑
mática, um modelo de exploração temática e estética. Neste caso, a versão
sofocliana de Antígona impõe-se por aquilo que ela, antes de mais, é: um
momento de excelência teatral. Mas acresce-lhe, dentro da Literatura Grega
antiga, outros contributos que, provenientes da poesia homérica, se multi‑
plicam na tragédia e continuam vigentes na literatura de época helenística.
A essas sucessivas leituras e releituras se dedicam os estudos de Francesco de
Martino, João Loureiro e de Maria das Graças de Moraes Augusto.
As versões francesas de Antígona, quer as que foram produzidas pelos
movimentos pioneiros do séc. XX como as mais recentes, pela habitual in‑
fluência que exercem no teatro ibérico, mereceram também atenção nos
estudos de Maria do Céu Fialho e Stéphanie Urdician.
No que diz respeito à presença destas reescritas na Literatura Portuguesa,
apesar de, aparentemente, ser restrito o interesse sobre este tipo de temas,
a verdade é que, nas diferentes etapas da nossa produção literária, eles re‑
aparecem, se não em grande quantidade, certamente com uma qualidade
e uma motivação expressivas para aspectos salientes da nossa cultura. Pela
sua mensagem central, a Antígona conheceu no séc. XX português, em
tempos de ditadura, um papel de intervenção relevante. Não só se multipli‑
caram, em Portugal, representações do original grego, como sobretudo se
recriaram novas Antígonas, que o adequassem de forma ainda mais ajustada
às preocupações e vivências nacionais do momento. António Sérgio, Júlio
Dantas, António Pedro, Mário Sacramento, em meados do séc., e já no
seu final Hélia Correia e Eduarda Dionísio, entre outros, retornaram ao
motivo tebano, motivados por diferentes contextos, objectivos e sensibili‑
dades. Este era o tempo em que, rodeando os anos da 2ª Guerra Mundial,
Anouilh e Brecht se valiam da mesma tradição para repensarem o momento
crítico que a Europa vivia. Em Portugal, ao mesmo tempo que se retomava
o modelo sofocliano para criar uma mensagem própria da realidade por‑
tuguesa, desencadeava-se um diálogo com essas outras influências, numa
perspectiva diacrónica. Deste património português dão conta os textos de
Maria Fernanda Brasete, Maria de Fátima Silva e Susana Marques Pereira.
A literatura brasileira, pela pena inspirada de Guimarães Rosa, tem também
presença no estudo de Gilmário Costa. Por fim, o interesse que a revitaliza‑
ção da velha Antígona em cena continua a conhecer nos palcos portugueses
está documentado no texto de Marta Várzeas.
De modo muito semelhante, inclusivamente do ponto de vista das mo‑
tivações políticas, à proliferação de novas visões portuguesas de Antígona

13
ao longo ao séc. XX, também em Espanha as houve muito abundantes
e dignas de consideração. No colóquio de Coimbra foram abordados os
tratamentos da admirável filha de Édipo, levados à cena ou na poesia, de
Salvador Espriu, José Martín Elizondo, María Zambrano, Julia Uceda, ou
mesmo do recentíssimo Memé Tabares, presentes nos textos que aqui pu‑
blicam Aurora López, Carlos Morais, Carmen Morenilla, Nuria Llagüerri.
Nem mesmo faltou a apresentação de uma Antígona em língua asturiana,
a de R. González Delgado.
Dizíamos no início que os estudos de recepção obrigam a um diá‑
logo com culturas irmãs dentro de um mesmo filão tradicional. Neste sen‑
tido, também esteve presente a análise de uma Antígona pouco conhecida,
a presente na única obra teatral da escritora italiana Elsa Morante, analisada
por Andrés Pociña.

Os editores,
Andrés Pociña
Aurora López
Carlos Morais
Maria de Fátima Silva

14
Antigone sulle mura
(Antigone on the Walls)

Francesco De Martino (frademartino@alice.it)


Università degli Studi di Foggia

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_1

15
(Página deixada propositadamente em branco)
Antigone sulle mura

Resumen - Spazio importante e simbolico delle città, confine tra intra ed extra


moenia, le mura accolgono in più occasioni anche donne. Da lassù, come da
una grande finestra, Elena, Ecuba, Andromaca, Cassandra, Deidamia, Medea,
Scilla scrutano mariti, figli, fratelli e impossibili amanti, uomini in difficoltà
e in condizioni ostili, proprio perché stanno fuori delle mura. Le esempla‑
ri teichoscopie omeriche al femminile hanno lasciato tutte tracce significative
nella teichoscopia di Antigone nelle Fenicie di Euripide (e poi nella Tebaide di
Stazio) ma specialmente quella di Cassandra che alla fine dell’Iliade  osserva
dalle mura il “fratello buono” ormai morto, modello polare per l’eroina tebana
che dalle mura smania di vedere il “fratello non più tanto cattivo” destinato a
morire.
Parole chiave: donne, mura, teichoscopia, Antigone.

A bstr act - Important and symbolic space of the city, border between intra
and extra moenia, the walls also host women. Like from a big window, Helen,
Hecuba, Andromache, Cassandra, Deidamia, Medea, Scilla scrutinize hus‑
bands, sons, brothers and impossible lovers, men in distress and in position
of enemies, because they are outside the walls. Homer’s exemplary female
teichoscopiai all have left significant traces in the teichoscopia of Antigone in
Euripides’ Phoenicians (and then in the Thebaid of Statius) but especially that
of Cassandra who - in the last book of the Iliad - observed from the walls the
“good brother” now dead. In the same way, Antigone desires to see the “brother
not so bad” destined to die.
Keywords: women, walls, teichoscopia, Antigone.

Spazio protetto. La storia delle mura, da Babilonia a Troia, ad Atene,


a Nubicuculia, alle città murate medievali, al muro di Berlino e al muro
del pianto, è tutta un romanzo. In questo romanzo un posto merita
anche Antigone sulle mura di Tebe, un unicum nel teatro greco e latino,
che troverà un rifacimento ma solo epico nella Tebaide di Publio Papinio
Stazio.
Le mura presuppongono un ‘universo contro’ da cui non bastano a pro‑
teggere1, ma offrono uno spazio2 estremo, marginale e di emergenza al‑

1
  Lentini 2013: 188, 193.
2
  Bachelard 2006 ha parlato di “poetica dello spazio”. Altra bibliografia sullo spazio
in Lentini 2013: 187 n. 1. Lentini (ivi, 190-191) intravede la metafora della teichoscopia e
della teichomachia in Lucr. 1. 66-67 e 2. 5-11.

17
Francesco De Martino

meno temporaneamente protettivo, dove possono incrociarsi sfere opposte,


non solo femminile e maschile, ma anche senile3 e infantile4.
Ma le mura sono anche luogo mediatico, di comunicazione e di «tra‑
smissione» della comunicazione, visiva, orale e persino scritta, perché erano
lo spazio specifico di affissione di notizie e di immagini, una sorta di “sito
web” ante tempus. Il posto ideale su cui Creonte avrebbe potuto far scrivere
il suo decreto sarebbero state le mura, magari vicino ad una porta. Platone
(Leggi 959a) dice che il tiranno «affigge per iscritto ordini e minacce sui
muri».
Fenicie. Le mura sono continuamente menzionate nelle Fenicie di
Euripide, come poi in quelle di Seneca5. Con le mura Antigone si deve
misurare, perché il suo atto cruciale, seppellire il fratello Polinice, sarà com‑
piuto extra moenia, fuori dalle mura di Tebe6. Le mura sono la frontiera che
deve attraversare. La sua battaglia personale deve andare a combatterla fuori
dalle mura.
Ma con le mura Antigone prende preliminarmente confidenza nelle
Fenicie, una tragedia rappresentata tra il 411 e il 406 a.C., verosimilmente
non prima del 409 a.C.7. Le Fenicie, a loro volta modello delle Fenicie del
comico Strattide (Fiorentini 2010) e presumibilmente anche di quelle di
Aristofane, fondono diversi modelli: Omero, Stesicoro (fr. 222b)8, Eschilo
(Sette a Tebe), ma anche Frinico.

3
  Nel prologo delle Fenicie con Antigone c’è un Vecchio servitore, in Stazio il vecchio
Forbante e il vecchio Actore, che non ce la fa (Theb. 7. 246 senem, 11. 357 senior comes […]
/ Actor). La salita sulle mura «può essere interpretata nel quadro della categoria lotmaniana
del superamento dell’ostacolo: oltre all’ascesa fisica, infatti, l’eroina deve anche farsi largo
fra la folla che, come lei, si accalca sulle mura per assistere al duello: [...] tacitos obstante
tumultu / Antigone furata gradus (354-355)» (Korneeva 2011: 186-187).
4
  In Il. 8. 517-519 Ettore dice agli araldi di convocare bambini e vecchi sulle mura,
mentre le donne devono rinchiudersi in casa. Nelle Troiane 1074 di Seneca Priamo tiene
in braccio il nipote Astianatte e gli fa vedere paterna […] bella. In Stat. Theb. 7. 240-242
le madri tebane mostrano ai figli le armi luccicanti dei padri.
5
  E. Ph. 79, 116, 239, 366, 593, 744, 752, 796, 823, 1137, 1150, 1357, 1475. Cf. Sen.
Ph. 343, 444-445, Troiane 634, 1075, 1091, 1119, e anche Stat. Theb. 5. 311, 351, 376, 410,
495, 7. 391, 433, 435, 12. 355, 362.
6
  Cf. Philostr. 2. 29: «(sc. Antigone) uscita di notte dalle mura» (§1), perché i cadaveri
stanno ovviamente «sotto le mura» (§2).
7
  Cf. Méridier in Grégoire-Méridier-Chapouthier 2002: 127.
8
  Su Euripide nel suo ultimo decennio (Elena, Oreste, Ifigenia in Aulide, Fenicie)
stesicoreo cf. Ercoles-Fiorentini 2011.

18
Antigone sulle mura

Il titolo stesso è un omaggio alle Fenicie di Frinico, tanto più ostentato


per la trama differente, allo stesso modo in cui Supplici è un omaggio di
Euripide al titolo delle Supplici di Eschilo, anche in questo caso con tra‑
ma differente9. Proprio perché riprende il titolo, Euripide riprende anche
la qualità esotica del Coro, le Fenicie10. Anzi ne riprende puntualmente
anche l’entrata, la parodo11. Il primo verso (202 Τύριον οἶδμα λιποῦσ᾽)
della parodo di Euripide imita infatti il fr. 9 Sn.-Kn. delle Fenicie di Frinico
(Σιδώνιον ἄστυ λιποῦσα), verosimilmente anch’esso il primo della parodo.
Forse proprio alla parodo aveva già alluso anche Aristofane nel 422 a.C.
nelle Vespe 219-220 «canticchiando canzoni archeomelisidonofrinicherata
(ajrchaiomelisidonophrynicherata)»12.
Il primo verso del prologo delle Fenicie (fr. 8 Sn.-Kn.) fu a sua volta
imitato da Eschilo nel primo verso dei Persiani (Frinico T 5 Sn.-Kn.), come
desumiamo dalla hypothesis:

Glauco, nel Sui miti di Eschilo, afferma che i Persiani sono stati ricre‑
ati a partire dalle Fenicie di Frinico. Cita anche l’inizio del dramma,
questo qui: Questa è la dimora dei Persiani partiti da tempo tranne che
là è l’eunuco che annunzia nell’inizio la sconfitta di Serse e dispone i
seggi per i consiglieri. Qui invece il Coro degli anziani recita il prologo
(prologizei).

In Frinico il verso era pronunciato da un Eunuco (con funzione di mes‑


saggero), un personaggio minore che sarebbe riaffiorato molto più tardi
come protagonista di una commedia di Terenzio, in Eschilo invece dal
Coro.

9
  Taplin 1989: 193 n. 1. Ad una casualità pensa invece Medda 2006: 18 n. 21. Sulle
Fenicie di Strattide frr. 47 e 48 K.-A. parodia di quelle di Euripide, cf. Fiorentini 2008-
2009: 37, 216-229 e 2010. Anche Aristofane scrisse Fenicie, cf. fr.*547 K.-A., che riprende
il v. 182 del dramma euripideo.
10
  L’estraneità del coro dalla trama, rilevata dallo scolio a Ar. Ach. 443 rende ancora
più evidente la natura di omaggio a Frinico.
11
  Cf. anche fr. 10 Sn.-Kn. καὶ Σιδῶνος προλιπόντα ναόν e Taplin 1989: 252. Nella
hypothesis dei Persiani il v. 202 delle Fenicie è ricordato come esempio di brani corali pa-
rodikan.
12
  Mastromarco 1983: 467 n. 48.

19
Francesco De Martino

Se, come risulterebbe da tante riprese, le Fenicie erano state il dramma di


maggior successo di Frinico, potrebbe essere stato uno dei drammi della te‑
tralogia che vinse nel 476 a.C., con Temistocle corego (Plut., Them. 5. 5)13.
Polinice verrà. Le Fenicie di Euripide si aprono14 con un monologo di
Giocasta che fornisce gli elementi genealogici ed onomastici (Giocasta,
Edipo, Ismene, Antigone) utili per capire lo sviluppo del dramma, ma an‑
che alcune grosse novità. Giocasta è viva15 e vivi sono Antigone e soprattut‑
to Polinice, anzi come si vedrà nell’esodo persino Edipo. La vera notizia è
che Polinice «verrà (ἦξειν)» (v. 83)16, come informa Giocasta. La notizia è
sicura, perché gliel’ha confermata un vecchio Servo inviato per convocare
l’eroe a Tebe per una tregua e che entra in scena subito dopo al v. 88 e al v.
170 ripete la notizia per Antigone «(sc. Polinice) verrà (hexei)». Polinice verrà
al v. 261 e resterà in scena fino al v. 636, cacciato da Eteocle. Ma, come dice
la hypothesis III, verrà “per niente”: «Anche Polinice viene per la tregua per
nulla».
Giocasta riprende a parlare al v. 301, dopo la parodo. Secondo uno
scolio (al v. 93) l’attore protagonista che impersona Giocasta esce per in‑
terpretare Antigone17. Il vecchio Servo18 appare in alto sulle mura e aiu‑

13
  In essa potrebbero esserci stati anche i Giusti o Persiani o Consessori (Lloyd-Jones
1966, cf. Taplin 1989: 63 n. 2). Se nella stessa tetralogia c’era anche la problematica Presa
di Mileto, la questione si complicherebbe ma con conseguenze interessanti. Sulla Presa di
Ecalia, cf. Mastromarco 2012 e Caroli 2012.
14
  Sull’inizio delle Fenicie, cf. Carrara 1994a e 1994b.
15
  Rispetto ai Sette a Tebe di Eschilo e all’Edipo re di Sofocle è «un elemento di sor‑
presa» (Medda 2006: 8).
16
  Il verbo è riusato da Giocasta al v. 463 (hekei) ed è un verbo speciale, con una storia
letteraria interessante, sulla quale tornerò in un’altra occasione. Significativamente si trova
anche nelle Fenicie di Strattide (fr. 46. 3 K.-A., verosimilmente proprio nel prologo, cf.
Fiorentini 2009: 221-222).
17
  « Si ritiene che Euripide abbia fatto ricorso a questo espediente perché il protagonista
potesse cambiare personaggio abbandonando il ruolo di Giocasta», Pickard-Cambridge
1996: 188 e 205 n. 87. Ai vv. 1270-1282 Giocasta e Antigone sono entrambe in scena e
in questo caso dovevano essere a cura di attori diversi, per questo motivo Di Benedetto-
Medda 1997: 228 distribuivano diversamente le parti. Taplin 1989: 368 paragona il break
dell’uscita di Giocasta a quello dell’Ifigenia in Tauride prima e dopo la scena con Oreste e
Pilade (867-922) e con quelli del prologo delle Eumenidi di Eschilo.
18
  Nell’elenco dei prosopa e nei mss è Pedagogo, in uno scolio un tropheus. Il modo
di comportarsi lo assimila ad un Pedagogo, Mastronarde 1994: 179. Su «the old men re‑
sembling messengers or paidagogoi» sui vasi, cf. Green 1999. La sua opera «sarà travolta e
rovesciata nel corso della tragedia» (Funaioli 2011: 81).

20
Antigone sulle mura

ta Antigone a salire, come ha concordato con Giocasta (89-91)19. Questa


seconda scena fa ancora parte del prologo20, perché il Coro non è ancora
arrivato. Prima della parodo, che per Aristotele (Po. 1452b), segna la fine del
prologo, Euripide ha inserito una specie di para-prologo, prologo in alto che
permette di dare precocemente21 risalto ad un personaggio centrale del mito
ma che in quella specifica tragedia sarebbe rimasto del tutto secondario,
perché Antigone tornerà in scena di nuovo molto tardi e in scene minori e
secondarie (1270ss., 1436ss., 1485ss.).

Prologo «a parte». Il Servo fa di tutto per far capire che la scena sulle
mura è «a parte»22. Nessuno vede Antigone, a parte il pubblico, come
dice il Servo: «no, non sbuca nessuno della città» (99). Quel “nessuno”
allude soprattutto ad Eteocle che nei Sette (182ss.) di Eschilo aveva
rimproverato le tebanine del Coro incapaci di sopportare lo stress
dell’assedio, a differenza di Antigone in grado invece di sopportarlo23.
Anche alla fine della scena il Servo controlla che Antigone rientri
subito in casa e non venga vista neppure dalle donne che stanno
arrivando, cioè dalle Fenicie. Anche in Stazio (Theb. 7. 243ss.) nella
prima delle due salite sulle mura 24 Antigone sta «appartata su una torre
isolata (turre procul sola)», perché «non le è ancora permesso mostrar‑
si in pubblico (concessa videri)» (7. 243). Con lei c’è solo il vecchio
Forbante, scudiero e auriga di Laio, che le fa una rassegna degli alleati
dei Tebani (7. 246-373).

19
  Anche in 1275 Antigone, preoccupata di lasciare la stanza delle vergini, è spinta da
Giocasta a non avere vergogna e a presenziare al duello tra Eteocle e Polinice, per sventarlo,
se ancora possibile.
20
  Il prologo tragico è di solito in almeno due scene o in una scena in due parti,
cf. Mastronarde 1994: 171. Secondo la hypothesis di Aristofane di Bisanzio (p. 153. 9
Chapouthier) Προλογίζει δὲ Ἰοκάστα, ma nel senso che il primissimo personaggio
che entra in scena, come confermano analoghe notazioni in altre hypotheseis (Antigone
nell’Antigone, la nutrice nella Medea, Apollo nell’Alcesti, Andromaca nell’Andromaca, ecc.).
21
  Esseri umani, non solo divinità, si trovano a volte in alto ma alla fine del dramma
(Medea nella Medea 1317ss., Oreste, Pilade, Elettra, Ermione in Oreste 1567ss.), cf.
Mastronarde 1990: 255-257 e Di Benedetto-Medda 1997: 77-78.
22
  Burgess 1987: 106-107 segnala altre scene «isolated»: Oreste e Pilade in Ifigenia in
Tauride e Elettra, Elena in Oreste, Teucro in Elena.
23
  Sulla parodo dei Sette come possibile teichoscopia, cf. Librán Moreno 2005: 237-239.
24
  Solo nella seconda salita sulle mura Antigone ormai senza il vecchio Actore rivolge
un discorso al fratello Polinice (Theb. 11. 363-382).

21
Francesco De Martino

La scena di Antigone sulle mura è «a parte», una sorta di extra anche


perché una donna sulle mura è un “cammeo” epico, una specie di omaggio
ad Omero. Questo ne agevolava un riuso come «a virtuoso piece» nelle re‑
pliche parziali che erano molto diffuse25. Omerico è anche il format di un
meros che può stare in un componimento più ampio, ma in sé e per sé è un
pezzo indipendente. Sezioni extra sono attestate infatti proprio in Omero,
non solo la Dolonia 26 ma la scena con Glauco e Diomede in Il. 6. 119-23627.
Casi analoghi di pezzi “a parte” sono testimoniati anche per Polibio (10. 21.
3-6) e per Dione Cassio (73. 23)28.
Il format «a parte» della scena euripidea di Antigone sulle mura è colto
nell’Argumentum III (p. 151. 7-13 Chapouthier)29:

Ἔστι δὲ τὀ δρᾶμα καὶ πολυπρόσωπον καὶ γνωμῶν μεστὸν πολλῶν


τε καὶ καλῶν. Τὸ δρᾶμα ἐστὶ μὲν ταῖς σκηνικαῖς ὄψεσι καλόν,
ἔστι δὲ παραπληρωματικόν. ἥ τε ἀπὸ τῶν τειχέων Ἀντιγόνη
θεωροῦσα μέρος οὐκ ἔστι δράματος. Καὶ ὑπόσπονδος Πολυνείκης
οὐδενὸς ἕνεκα παραγίνεται. ὅ τε ἐπὶ πᾶσι μετ᾽ὠδῆς ἀδολήσχου
φυγαδευόμεμος Οἰδίπους προσέρραπται διὰ κευνῆς.

Il dramma è sia multiprosopico sia pieno di molte e belle sentenze.


Il dramma è bello per le vedute sceniche. Ma è pieno di riempitivi.
Antigone che scruta dalle mura non è un meros del dramma. Anche
Polinice viene per la tregua per nulla. E soprattutto Edipo sulla via
dell’esilio con un canto è stato ricucito a vuoto.

Πολυπρόσωπον. Cf. Luc. Nigr. 8 «come sulla scena in un dramma mul‑


tiprosopico (πολυπροσώπῳ δράματι), uno che era schiavo ricompare come
padrone e un altro povero da ricco che era, un altro ancora satrapo o re da
povero, uno amico di costui, un altro nemico, uno ancora esule». In Ateneo
1. 20 è riferito alla danza: «la danza di Pilade era ampollosa, patetica e

25
  Burgess 1987: 103.
26
  Scolio ad Il. 10. 1: «dicono che la rapsodia sia stata sistemata a parte e non sia un
meros dell’Iliade. Fu collocata da Pisistrato nel poema»; Eust. ad Il. 785. 41-42: «gli antichi
dicono che questa rapsodia fu disposta da Omero idiai, e non era annoverata fra gli ele‑
menti dell’Iliade, e che fu disposta nella composizione da Pisistrato».
27
  Scolio a Il. 6. 119 «alcuni trasferiscono altrove questa systasis»; cf. Fornaro 1992: 25-29.
28
  Vox 1981; sulla terminologia aristotelica dello scolio omerico, cf. Gallavotti 1969.
29
  Sulla hypth. cf. Burgess 1987: 104.

22
Antigone sulle mura

multiprosopica (prolyprosopos)». L’osservazione potrebbe andar bene anche


per le Fenicie, se l’attore che interpretava il Servo era lo stesso che interpre‑
tava Polinice e Creonte (Di Benedetto-Medda 1997: 228). Γνωμῶν μεστὸν
πολλῶν τε καὶ καλῶν. Per la gnomica, cf. D.C. LI (Eschilo, Sofocle ed
Euripide ovvero l’arco di Filottete) 15 «Le liriche non hanno la sentenziosità
né l’esortazione alla virtù di quelle euripidee».

μεστόν. Cf. Gorg. fr. 24 D.-K. (= Ar. Ra. 1021) δρᾶμα (sc. i Persiani)
ποήσας Ἄρεως μεστόν, Plu. Mor. 389a (E di Delfi) «ditirambi pieni
(μεστάv) di passioni e movimento», Max. Tyr. 18. 9 (= Anacr., fr. 402/57
Page) «i suoi canti sono pieni (μεστάv) della chioma di Smerdi, degli occhi
di Cleobulo e della grazia giovanile di Batillo», Cf. Ar. Nu. 1367 Eschilo «è
pieno di chiasso» (la definizione è del sofistico Fidippide), Hor. Carm. 3.
25.1-2 «tui (sc. di Bacco)/ plenum». Cf. De Martino 2001: 156 n. 82.
Ἔστι δὲ τὀ δρᾶμα. Notazioni simili in varie hypotheseis: Τὸ δρᾶμα τῶν
πρώτων (Hipp.), τὸ δὲ δρᾶμά ἐστι σατυρικώτερον (Alc.), cf. Mastronarde
1994: 169 n. 2. Qualificazioni si trovano anche in Ar. Th. 166 κάλ […] τὰ
δράματα e Ra. 1254-1255 «moltissimissimi (πολὺ πλεῖστα)» e «bellissimi
(κάλλιστα)», Frinico, fr. 32. 3 K.-A. «molte e belle (πολλὰς … καλάς) tra‑
gedie»; Hyp. Cav. «il dramma è uno di quelli composti kalos».
μέρος οὐκ ἔστι δράματος. Cf. Arist. Po. 1453b ἔξω τοῦ δράματος,
1460a ἐν τῷ δράματι, scolio a Il. 10, in. μέρος τῆς Ἰλιάδος (sc. la
Dolonia). Non c’è bisogno di distinguere, come invece suggerisce
Mastronarde (1994: 169 e n. 1), tra presenza e assenza dell’articolo (Arist.
Po. 1453b ἐξω τοῦ δράματος, 1460a ἐν τῷ δράματι, scolio a Il. 10, in.
μέρος τῆς Ἰλιάδος).
ὑπόσπονδον. Cf. Ph. 81 Giocasta «ho convinto il figlio che al figlio ve‑
nisse protetto da una tregua (ὑπόσπονδον)» e 450 Eteocle «mi hai persua‑
so e hai potuto fare entrare entro le mura quest’uomo protetto dalla tregua
(ὑπόσπονδον μολεῖν/ τόνδε εἰσεδέξω τειχέων)». Frequente negli storici
(Hdt. 2. 144, 5. 72. 2, 5. 162. 2, 6. 103. 3, Th. 1. 103. 1), si usa spesso
per i morti (Th. 1. 63. 3 e 2. 79. 7 τοὺς νεκροὺς ὑποσπόνδους). Polinice
è virtualmente già morto. Cf. Ph. 172 ἔνσπονδος. In Ba. 924 è riferito a
Dioniso (dallo stesso Dioniso): «Prima (sc. il dio) non era propizio,/ ora è in
tregua (enspondos) con noi».
Chi ha scritto questa hypothesis conosceva bene le Fenicie. Il termine
hypospondos riprende hypospondon molein detto da Giocasta, ripetuto da
Eteocle (81 e 450) e variato in enspondos da Antigone (171). Polinice hypo-
spondos «arriva per nulla» e Edipo se ne va in esilio «a vuoto».

23
Francesco De Martino

L’impressione di spreco drammaturgico affiora anche nel termine


polyprosopon «dai molti personaggi», in riferimento agli 11 personaggi, il
massimo nella tragedia30, anche se solo 2 femminili (Antigone e Giocasta),
usati entrambi subito nel prologo, a parte le 15 fenicie del Coro. Un dramma
multiprosopico e centrifugo, una rarità rispetto ai tanti drammi centripeti31.
Non sappiamo a chi risalgano le osservazioni32. Interessante è comunque
la definizione del dramma come “pleromatico”. Le Fenicie sono insom‑
ma costruite con scene riempitive (perché superflue, a parte) all’inizio
(Antigone), al centro (Polinice) e alla fine (Edipo). Anche il terzo stasimo
dava l’impressione di qualcosa «per nulla», superfluo e ripetitivo, non atti‑
nente al dramma.
scolio a Ph. 1019: Per nulla queste cose. Era necessario che il coro espri‑
messe pietà per la morte di Meneceo o approvasse l’ardimento del giovane.
Ma espone i fatti di Edipo e della sfinge detti già molte volte, cf. Burgess
1987: 104 n. 8, Mastronarde 1994: 434-435.
Analoga sconnessione dei canti del coro nelle Fenicie affiora anche nello
scolio ad Aristofane, Acarnesi 443: «Euripide introduce cori che non dicono
cose connesse alla trama (τὰ ἀκόλουθα φθεγγόμενος τῇ ὑποθέσει), ma
raccontano delle storie mitiche (ἱστορίας τινάς), come nelle Fenicie».
Tanti pezzi scollegati tra di loro contribuivano a rafforzare l’effetto fina‑
le di dramma «pieno», troppo pieno, persino di sentenze, a partire da quella
sulle donne pettegole33. Una pienezza derivante dalla molteplicità di ingre‑
dienti non dall’eccesso di uno solo come i Sette a Tebe di Eschilo definiti da

30
  De Martino 2002: 114-115. 11 personaggi ha anche il Reso.
31
  Sulla struttura centripeta, cf. Medda 2006: 9 e 18-19 n. 22 dove ricorda lo scolio
ad Aristofane, Acarnesi 443.
32
  Mastronarde (1994: 169) ricorda come nella sua edizione dei frammenti (Aristo-
phanis Byzantii Fragmenta, Berlin 1986) W.J. Slater «omits the dramatic material entirely».
L’aggiunta di Scaligero ἐρεῖ καὶ καταπληροματικόν dipende dall’Argumentum. Ferrari
1996: 237 attribuisce ad Aristofane di Bisanzio l’Argumentum in questione.
33
  Cf. 198-201 «Le femmine sono una brutta razza: amano la maldicenza, se trovano
piccoli appigli per discorrere, li moltiplicano. È un piacere per loro sparlare l’una dell’altra»;
355-356 «I dolori del parto sono tremendi e non c’è donna al mondo che non ami la propria
creatura»; 358-360 «Ma la patria la amano tutti, inevitabilmente. Chi dice il contrario si
compiace di vuote parole; in realtà, dentro di sé, non fa che pensare alla patria»; 387-399 in
forma di domanda e risposta su cosa sia essere privato della patria; 814 «ciò che bello non
è, non fu mai bello». Altre gnomai (442, 524ss., 584s. 1320s., 1478s.) sono segnalate da Er‑
colani 2000: 171-173). Dione Crisostomo osserva invece che «i canti di Sofocle non hanno
molta gnomica (πολὺ τὸ γνωμικόν) né invitante alla virtù come invece quelli di Euripide».

24
Antigone sulle mura

Gorgia un «dramma pieno di Ares» (82 B 24 D.-K. = Rane 1021), perché


troppo e solo militaresco.
Ekphrasis cinetica. Il Servo – come spesso nel teatro antico – dà istru‑
zioni come se fosse il regista. Non solo avverte che la scena è “a parte”, ma
sottolinea anche che il momento è quello giusto, perché l’esercito è in mo‑
vimento (106-108):

ἰδοῦ ξύναψον, παρθέν’ ἐς καιρόν δ’ ἔβης/ κινούμενον γὰρ


Πελασγικὸν/ στράτευμα, χωρίζουσι δ’ ἀλλήλψν λόχους.

Ecco, tienti stretta a me. Sei arrivata al momento giusto. Le truppe dei
Pelasgi fanno manovra, i reparti si schiereranno ciascuno al suo posto.
(trad. U. Albini, qui e in seguito).

Il momento è giusto per vedere truppe “in movimento”, e per descri‑


verne i capi: un’ekphrasis militare “cinetica”. Militare perché la raccolta
dell’esercito è uno dei preliminari della guerra previsti nella teoria retorica
dell’ekphrasis34 , e riguarda il secondo dei cinque tipi di descrizione elencati
da Elio Teone (prosopa, pragmata, topoi, chronoi e tropoi), quello dei prag-
mata e del pragma per eccellenza, la guerra:

Cominceremo a descrivere i fatti (τὰ μὲν πράγματα ἐκφράζοντες) a


partire da quelli precedenti e poi quelli concomitanti e quelli conse‑
guenti per esempio nel caso di una guerra passeremo in rassegna prima
i precedenti della guerra, il reclutamento dell’esercito (stratologias),
le spese, le paure, il territorio saccheggiato, gli assedi, poi i traumi e
le morti e i lutti, e dopo tutte queste cose la conquista e la schiavitù
degli uni e la vittoria e i trofei degli altri. (Theon. Prog. X, p. 68. 16-
24 Patillon-Bolognesi).

Ciò che ora Antigone può vedere in diretta è la stratologia, cioè il con‑
vergere delle truppe coi loro comandanti. Ma anche altri dettagli, altre in‑
quadrature su manovre militari, come quella segnalata ai vv. 180-181, dove
il Servo dice che Capaneo «sta misurando in alto e in basso le mura». La
misurazione è un tratto importante già nella erezione delle mura, nei tei-
chismoi, come vediamo in Tucidide 3. 20. 3-4 e ed Erodoto 2. 127. 1, che

34
  De Martino 2013a-c, 2014, 2015.

25
Francesco De Martino

dice di aver misurato personalmente l’altezza della piramide di Chefren, e


in Aristofane, Uccelli 1130 (I Messaggero)35.
Il Servo spiega ad Antigone anche l’importanza degli emblemi per per‑
sonalizzare gli scudi e identificare gli eroi (Fenicie 142ss.). Successivamente
il Messaggero II ai vv. 1093ss. descriverà lo scontro tra assedianti e tebani
a Giocasta e ai vv. 1335ss. e 1427ss. il duello tra Eteocle e Polinice36 e la
morte di Giocasta al coro femminile. Alla fine Antigone descriverà la morte
di Giocasta ad Edipo (1567-1581). Giocasta si interessa persino di epigrafia,
quando immagina una brutta iscrizione del figlio se vincesse ma distrug‑
gendo Tebe (574-576): «E cosa inciderai sulle armi quando le consacrerai
lungo le rive dell’Inaco:/ Polinice offre questi scudi agli dèi dopo aver incen-
diato Tebe?». Un non isolato caso di epigrafia immaginaria, testimoniato
anche per Ecuba nelle Troiane, che varia la novità delle iscrizioni-fumetto
descritte dal Messaggero proprio ad Eteocle dei Sette.
I pragmata militari interessano sempre più le donne, come quelli sporti‑
vi. Nell’Elettra di Sofocle 680ss., il Pedagogo-Messaggero fa una vistosa ed
eccezionale ekphrasis sportiva per donne (Clitennestra, Elettra, Crisotemi).
Guerra e sport diventano interessanti per le donne se guerrieri e sportivi
sono le persone amate e in pericolo di vita.
Emblematicamente nessuna delle descrizioni delle Fenicie è destinata
ad Eteocle. Destinatario delle stupende descrizioni militari degli scu‑
di dei condottieri nei Sette di Eschilo37, Eteocle in Euripide, rivolgendosi
a Creonte, contesta invece tali elencazioni: «è tempo sprecato (διατρίβη
πολλήv) dire il nome di ciascuno,/ mentre i nemici sono sotto le mura
(τείχεσιν καθημένων)» (751)38. Questo Eteocle euripideo parla come un
militare esperto. Tucidide 7. 44 osserva infatti che persino di giorno in
pieno combattimento è difficile identificare gli avversari: «Di giorno si co‑
noscono i fatti più chiaramente, e tuttavia coloro che hanno preso parte a
una battaglia, neppure questi li conoscono tutti, ma ciascuno sa solo e con

35
  De Martino 2015.
36
  Interessante il dettaglio del «sudore» del pubblico. Il duello, descritto minutamente
come in una sceneggiatura, è consapevolmente spettacolare, cf. le reazioni dei Danaidi
(1395) e dei Tebani (1398-1399).
37
  In S. OC 1308-1325 Polinice fa una essenziale e fiacca rassegna dei 7 per Edipo
ed Antigone.
38
  «Contrapporrò condottiero a condottiero. Menzionarli per nome uno per uno
significa perdere tempo e i nemici sono già sotto le mura». Cf. Mastronarde 1994: 360-361
e Librán Moreno 2005: 248-249.

26
Antigone sulle mura

difficoltà quel che è accaduto vicino a lui» (trad. G. Donini)39. Polibio 5.


21 a sua volta suggeriva di descrivere i luoghi «non tanto cosa sia accaduto».
Antigone dunque trasgredisce in anticipo la gnome di Eteocle. E la tra‑
sgredisce anche Giocasta. «E la cinta delle sette torri? Com’è la situazione?»
(1077) chiede al Messaggero che le descrive uno per uno eroi e scudi,
mostrando che per lei il tempo non è sprecato perché i motivi non sono
militari ma di cuore, l’amore per i figli.
Chi realmente descrive è Antigone che poi chiede l’identità del con‑
dottiero al Servo. Ma formalmente l’ekphrasis è preannunciata al v. 95 dal
Servo, che in quanto testimone oculare (95 «avendo visto», 142 «avendo
visto i segni») può dire: πάντα […] φράσω. L’espressione è molto simile a
quella del Pedagogo-Messaggero in Sofocle, Elettra 680 τὸ πᾶν φράσω, o
di Prometeo in Uccelli 1507 φράσω σοι πάντα τἄνω πράγματα. Il verbo è
tecnico e prefigura il futuro ekphrazo, come in tanti altri passi come forse
già prophrazo in Esiodo (Opere 655 prophradmema), dove è riferito ai «molti
premi descritti con anticipo», cioè pubblicizzati.
Poiché riguarda i pragmata militari e i condottieri, l’ekphrasis è mista di
pragmta e di prosopa. È un peccato che non ci sia la descrizione del teichi-
smos40 delle mura di Tebe, costruite dal musico Anfione e dal pastore Zeto,
ricordati da Antigone (115 e 145), i due costruttori ricordati già in Od. 11.
260-26541. La città stessa prese il nome Tebe, la moglie di Zeto, e le porte
dal nome delle sette figlie di Anfione42.
Donne sulle mura. Antigone osserva la stratologia e i comandanti dalle
mura, in una teichoscopia, come si usa chiamarla con un termine che figura
una sola volta nello scolio a Ph. 88 e che «osservazione dalle mura», non
«delle mura» come suggerirebbero composti simili, per esempio oroscopia43.

39
  Analoghe critiche formula Teseo nelle Supplici 846-856 per criticare Eschilo che
nei Sette a Tebe si attardava a descrivere dettagliatamente i sette assedianti e i loro scudi
e nella scena che precede il riconoscimento nell’Elettra di Euripide, cf. Quijada Sagredo
2013: 35 e nn. 8-9.
40
  L’esempio che Elio Teone porta è banale, il περιτειχισμός di Platea (Th. 3. 21-22).
Esempi più significativi stanno in Erodoto (Babilonia) e in Tucidide (Atene) e negli Uccelli
di Aristofane. Cf. De Martino 2015.
41
  Cf. inoltre Paus. 9. 5. 6-8, Pherecyd. FGrHist 3 F 41, e n. 38.
42
  Apollod. 3. 5. 5-6 / 44-45, Hyg. Fab. 69. Per i nomi storici delle sette porte (Omo‑
loidi, Ogigie, Pretidi, Oncaidi, Ipsiste, Elettra, Crenidi), cf. A. Th. 375-685. Le mura
furono distrutte dagli Argivi all’epoca degli Epigoni, i figli vendicatori dei sette morti dieci
anni prima, cf. Apollod. 3. 7. 4. 85.
43
  Su questa teichoscopia cf. Curnis 2002 e 2004.

27
Francesco De Martino

Antigone non è né la prima né l’unica donna sulle mura. Donne sul‑


le mura o alle prese con le mura sono testimoniate da storici (Tucidide,
Diodoro Siculo, Cesare, Sallustio) e da Plutarco44, ma sono soprattutto un
topos dell’epica anche latina: Ennio45, Virgilio46, Stazio, Lucano, Valerio
Flacco, Silio Italico. In particolare Stazio nella Tebaide presenta due salite
sulle mura di Antigone, una con Forbante ed una da sola perché il vecchio
Actore che l’accompagnava non ha più fiato per completare la salita.
Stat.47 Theb. 4. 89-92: «ma mentre (sc. Polinice) si allontana si volge a
guardare Argia che, stravolta (attonitam), dall’alto della torre (de turre su-
prema), si protende verso di lui con tutto il corpo (totoque extantem corpore);
ed essa riporta a sé tutta l’attenzione del marito, facendogli per il momento
dimenticare la sua dolce Tebe (trad. G. Farando Villa) 48.

5. 342-356 e 376: «Che restava più del furibondo ardire? Salimmo


sulle mura che cingono il porto e abbracciamo i lidi (portus ampe‑
xaque litus/ moenia) e sulle torri più alte donde si può spingere lo
sguardo per largo tratto sul mare aperto; ciascuna portava con sé tutta
trepida, insieme a sassi e bastoni, le armi che ricordavano tristemente
i mariti, le spade ancora contaminate dalla strage; non si peritarono
nemmeno di indossare le corazze dalle ruvide maglie e di introdurre
sfrontatamente il capo negli elmi. […] Alla fatica di quei disgraziati
ci aggiungiamo noi, acquattate tra le rupi e dietro ogni riparo offerto
dalle mura (murorum aggere ab omni)». Le Lemnie guardano dalle
mura gli Argonauti e, scambiandoli per Traci, li attaccano49.
7. 240-242: «Il nemico non è ancora giunto, tuttavia già le madri,
piene di trepidazione, salgono sulle mura (conscendunt muros) e

44
  Th. 2. 4. 2 (donne di Platea mettono in fuga i tebani), D. S. 13. 89 e 108-111 (don‑
ne di Gela riparano il muro che i nemici stanno demolendo). Plutarco, Moralia 245 b-c (le
donne di Chio sulle mura lanciano pietre e dardi, facendo indietreggiare gli attaccanti),
Caes. Gal. 7. 47. 4-5 (le madri a Gergovia gettano dalle mura vesti e argento e si affacciano
«a seno nudo»), cf. Cipriani 1986: 50, Brescia 1997: 134. Su teichoscopie negli storici (Liv.
5. 40. 4-7, dal Campidoglio; Claud. Ruf. 2. 60-70; Sid. Apoll. Carm. 7 (= Elogio di Avito).
255-256) cf. Miniconi 1981: 76-77.
45
  Enn. fr. 9. 419 Vahlen (una teichoscopia femminile?, cf. Miniconi 1981: 74).
46
  Virg. Aen. 8. 592-593 (le madri guardano in muris gli eroi in partenza), cf. Kornee‑
va 2011: 185 n. 159; inoltre 11. 877 ss., 12. 131-133 e 585-587.
47
  Cf. Korneeva 2011: 184-185. Sulla teichoscopia in Stazio e Lucano, cf. Lovatt 2006.
48
  Argia sulle mura è modellata su Medea sulle mura in Valerio Flacco (Arg. 6. 681).
49
  Su questa teichoscopia parodica, cf. Korneeva 2011: 173-174.

28
Antigone sulle mura

mostrano da lì ai figlioletti (natis) il luccichìo delle armi (arma ni‑


tentia), additando loro i volti dei padri che sotto gli elmi appaiono
tremendi».
7. 242-373: «Lontano, su una torre isolata, si trova Antigone, cui
ancora non è permesso di mostrarsi in pubblico, e con un lembo
della veste nera si copre il tenero volto; le è vicino lo scudiero che
accompagnava Laio; la principessa prova venerazione per il vecchio
e in quest’occasione così gli si rivolge: «C’è speranza, padre mio, che
queste nostre schiere resistano ai Greci? C’è giunta voce che tutti i
popoli del Peloponneso si dirigono qui. Illustrami (dic), ti prego, gli
eserciti dei re stranieri! Da sola infatti posso riconoscere le insegne
(video […] signa) delle nostre schiere […] Qui si ferma l’esperienza di
Antigone e a lei il vecchio Forbante così risponde: «Ecco Driante alla
guida di mille arcieri […]». Dopo queste parole, la fanciulla si intro‑
mise nel suo discorso brevemente: «E quei due fratelli che vedo là da
che traggono origine? Hanno armi identiche, identico si leva nell’aria
il cimiero dell’elmo. Tale armonia regnasse anche tra i mie fratelli!».
A lei sorridendo il vecchio: «Non sei la prima, Antigone, che la vista
induce in errore […]. Ma ecco tutti si fermano e tuo fratello impone
silenzio alle schiere».
11. 354-375: «In un’altra parte della città Antigone intanto, sci‑
volando in silenzio e di nascosto in mezzo al tumultuare della
folla, incurante della sua condizione di vergine, sta correndo come
una pazza (furata), ansiosa di salire sulla cima delle mura Ogigie;
l’accompagna, seguendola da vicino, il vecchio Actore, che tutta‑
via non avrà fiato per giungere fin sulla rocca. La giovane, dopo
aver esitato un po’ scorgendo da lontano le armi e riconoscendo il
fratello che (delitto atroce!) con i giavellotti e con voce tracotante
assedia la città, dapprima riempie l’aria di fortissimi lamenti, poi
gli si rivolge a gran voce, sporgendosi dall’alto delle mura (ex
muris) come se volesse buttarsi giù (ceu descensura): «Fratello,
trattieni la tua mano armata, indirizza un momento lo sguardo a
questa torre e volgi verso di me le piume irte del tuo cimiero! […]
Libera almeno dell’elmo il tuo volto corrucciato; mi sia concesso
di vedere (liceat vultus fortasse supremum/ noscere dilectos), forse
per l’ultima volta, i lineamenti amati e scoprire (videre) se piangi,
udendo di miei lamenti […]».
Achill. 2. 23-26: «turre procul summa lacrimis comitata sororum/
confessumque tenens et habentem nomina Pyrrhum/ pendebat co‑

29
Francesco De Martino

niunx oculisque in carbasa fixis/ ibat et ipsa freto et puppim iam sola
videbat». Deidamia saluta per l’ultima volta Achille50.

Luc. Phars. 7. 369-370: «Siate certi che le madri romane, sciolte le


chiome, protese dall’alto delle mura cittadine, vi esortano alla batta‑
glia» e 12. 436-438.
Val. Fl.51 Arg. 6. 482-491: Giunone nelle sembianze di Calciope chiama
Medea e la conduce sulle mura. Salita sulle mura di Eea in Colchide
Medea osserva innamorandosene Giasone52. 482-491: “Dunque, so‑
rella – disse – tu sola non sai che, attraverso i/ flutti ignoti, i Minii
sono giunti qui e hanno unito le forze/ a nostro padre? Intanto gli altri
affollano/ le mura e si godono la vista delle armi divine degli eroi./
Tu invece siedi pigra nel talamo, tu sola attaccata alla/ casa paterna;
quando potrai rivedere duci così valorosi?”./ Quella non risponde; né
la dea le dà il tempo di farlo;/ l’afferra del male futuro e in mano a
una falsa sorella». 575-586: Ed ecco, invece, Medea, assisa sulle mura
paterne (muris […] paternis),/ mentre contempla (lustrat) uno ad uno
gli scontri della grande battaglia/ e da sola riconosce (ipsa […] agnoscit)
lontano alcuni principi, in una fitta/ nube e di altri chiede contro (è
Giunone a farle da guida):/ scorge in lontananza la testa di Giasone
e subito qui/ rivolge avidamente gli occhi, sensi e il favore del cuore:/
ora dove si lanciasse, ora dove deviasse per ripiegare,/ lo vedeva in
anticipo, e quanti cavalli e armi riversasse a terra da solo,/ e con che
fitti lanci d’asta arrestasse la corsa di guerrieri sbandati./ E dove, di
nuovo, con tacito volto, sbrigliò gli occhi erranti/ in cerca delle armi
del fratello o dello sposo promesso/ là, feroce e solo, Giasone venne
incontro alla misera. (trad. M. Fucecchi)
Sil. Pun. 2. 251-255.

50
  Cf. anche Silv. 5. 2. 22-124.
51
  Sulla teichoscopia in Valerio Flacco, cf. Fucecchi 1997: 175 (ai vv. 575-586).
52
  Giunone, assunto l’aspetto della sorella Calciope, inganna Medea e la trascina
sulle mura per farle vedere Giasone, il nuovo straniero arrivato (6. 503-506). Vedi anche
6. 575ss.: Medea e 6. 681-682 inminet e celsis audentius improba muris/ virgo nec ablatam
sequitur quaeritve/ sororem.

30
Antigone sulle mura

Un’altra eccezionale teichoscopia amorosa è quella di Scilla che dalle


mura di Megara53 scruta Minosse, il bel nemico di cui si è innamorata. La
fonte è Ovidio (Met. 8. 17-24)54:

Qui spesso era solita salire la figlia di Niso/ E percuotere i sassi sonori
con piccolo sasso – questo,/ almeno, in tempo di pace. Ma anche in
guerra soleva/ osservare di là gli scontri di Marte spietato./ Durando
la guerra tanto a lungo, aveva imparato anche i nomi/ dei capi, e le
armi, i cavalli, il portamento, le faretre cretesi.

L’archetipo di tutte queste donne sulle mura sono le donne omeriche


sulle mura di Troia. Donne insieme a bambini e vecchi stanno sulle mura
della città in guerra sullo scudo di Achille: «Le spose loro ed i piccoli figli
facevano guardia / Stando sul muro, come anche quelli gravati dagli anni»
(Il. 18. 514-515). Era si situa sulle mura di Eracle e Troia per vedere il com‑
battimento (Il. 20. 137, 145-146). Ma soprattutto memorabili e influenti
sono Elena, Ecuba, Andromaca, Cassandra (Il. 3. 139-244, 6. 386-389, 22.
460-465 e 699-719), sulle mura di Troia.
La teichoscopia di Elena: il duello dei mariti. Il primo modello di
Antigone sulle mura è Elena sulle mura (Il. 3. 121-244), ma abilmente va‑
riato. In entrambi i casi una donna ed un vecchio dialogano. Ma i ruo‑
li sono non solo capovolti55 ma diversi. In Omero il vecchio è il re, nelle

53
  Le sue mura erano “sonanti” (cf. Ov. Met. 8. 14 e 17 («vocalibus […] muris)», «reso‑
nantia saxa»), perché Apollo quando aiutò Alcatoo a costruirle poggiò su un masso la cetra
(kithara). Perciò colpendole con un ciottolo, come fa Scilla, suona come la corda di una cetra.
Sulle mura cf. Paus. 1. 41. 6 e 42. 1-2: «egli (= Alcatoo) ricostruì le mura dalle fondamenta,
poiché la vecchia cinta era stata distrutta dai Cretesi. […] Si mostra anche un focolare degli
dei chiamati Prodomeis; dicono che il primo a sacrificar loro sia stato Alcatoo, quando stava
per iniziare la costruzione delle mura. […] Come raccontano i Megaresi, con Alcatoo che
costruiva il muro cooperò Apollo e poggiò la cetra sul masso; se questo masso uno lo colpisce
con un ciottolo, risuona come quando si tocca una cetra» (trad. D. Musti). Il masso dove
Apollo posò la cetra doveva essere vicino ad una porta. Lo stesso Pausania ricorda subito dopo
(1. 42. 3) il Colosso di Memnone che al sorgere del sole emetteva un suono «e il suono asso‑
miglia a quello di una cetra o di una lira, quando si è rotta una corda». Alle due mura – quelle
preistoriche e quelle tardo-micenee di Alcatoo – si aggiunsero, nel 460/459, dopo l’invasione
persiana, le terze mura che collegavano la città al porto di Nisea, che furono poi smantellate
durante le guerre macedoni. Cf. Beschi-Musti 1982: 429, Kenney 2011: 308-309.
54
  Cf. Korneeva 2011: 185.
55
  Come nota Mastronarde 1994: 168 già nell’Iliade c’è «a conversation between
knowledgeable and unknowledgeable interlocutors», ma «the roles are reversed between
male and female».

31
Francesco De Martino

Fenicie non è Edipo, ma un Servo. E la donna non è più la moglie straniera


ma la sorella del principe. “Straniero” è diventato invece il fratello, Polinice.
Infatti sta nel posto sbagliato, fuori non dentro le mura, pur essendo un
principe di Tebe. Nell’Iliade stava Elena nel posto sbagliato, dentro non
fuori le mura. Essendo una regina greca, non dovrebbe stare affatto a Troia.
Fuori stanno gli eroi greci diventati ora suoi nemici. Un’altra differenza è
che Antigone e il Servo non sono visti da nessuno, mentre sulle mura di
Troia Elena era notata dagli altri vecchi troiani che ne evidenziavano la
bellezza e la pericolosità.
La torre in cui stanno Elena e Priamo con i vecchi troiani corrisponde
alle famose Porte Scee, ma che potrebbero essere le stesse chiamate in altre
occasioni dardanie56. Una zona adatta a duelli: quello famoso di Achille e
Ettore57 e quello di Menelao e Paride. Nonostante il doppio nome, è vero‑
simile che la porta del duello tra Achille e Ettore fosse la stessa di quello tra
Menelao e Paride e che da quella stessa porta uscissero i Troiani per affron‑
tare i Greci e fu demolita per far passare il cavallo di Troia.
Elena-moglie è stata infatti chiamata da Iris per assistere al duello tra
due mariti58, nella speranza che l’eroina provi nostalgia del primo marito,
il “buon marito”, mentre Afrodite costringe Elena ad andare a letto col se‑
condo marito (Il. 3. 390ss.). Il duello dei due mariti è una versione maschile
e militare del “certame delle mogli” testimoniato dal giambo di Semonide
contro le mogli, da Saffo, fr. 16. 7-11 Voigt («Elena abbandonando l’ottimo

56
  La torre è probabilmente la stessa descritta dal Nuntius in Seneca, Troades 1070-
1078: «Nuntius Di tutta Troia è rimasta ancora in piedi solo una grande torre, famigliare
a Priamo; dalla sua sommità e dai suoi più alti pinnacoli, sedendovi come arbitro delle
battaglie, egli guidava gli scontri. Su questa torre, custodendo affettuosamente in braccio il
nipote ( fovens nipotem), quando Ettore metteva in rotta con la spada e con il fuoco i Danai,
che fuggivano per il terrore, il vecchio mostrava al fanciullo le imprese del padre (paterna
puero bella monstrabat senex). Questa torre, che un tempo era celebre e l’ornamento delle
mura (muri decus), ed è ora un crudele scoglio, viene circondata da una folla di comandanti
e soldati riverberatasi da ogni parte; tutto il popolo dei Greci, abbandonando le navi, vi si
accalca» (trad. R. Cuccioli Melloni).
57
  Nel corso del quale l’eroe troiano tenta invano di ripararsi lì «sotto le solide torri,/
se mai dall’altro coi dardi gli dessero aiuto» (Il. 22. 194-196).
58
  Elena va sulle mura col velo bianco: «copertasi con un velo di bianchezza splen‑
dente» (Il. 3. 141), forse proprio un velo da sposa, come quello col quale va sulle mura
Andromaca e che lascia cadere dalla testa quando vede Ettore morto (Il. 22. 466-472). In
Stat. Theb. 7. 244-245 è vestita di nero. Nelle Fenicie Giocasta veste in nero (322-326).

32
Antigone sulle mura

marito andò a Troia e non provò nostalgia del primo marito, né della figlia
né dei cari genitori») e dall’episodio di Cornelia59.
Ad Elena però interessano di più i suoi fratelli Castore e Polluce, che
non vede, e che ipotizza che o non siano venuti o che si tengano fuori dal
combattimento (Il. 3. 236-244), e che invece sono morti entrambi a Sparta.

«[…] ma i due ordinatori d’eserciti non riesco a vedere,/ Castore do‑


matore di cavalli e Polluce forte nel pugno,/ i miei fratelli carnali, che
la mia stessa madre dette alla luce./ O non sono venuti con gli altri
dall’amabile Sparta,/ oppure sono venuti fin qui sulle navi che solcano
il mare,/ ma non vogliono ora gettarsi nella mischia degli uomini,/ per
paura della vergogna ch’è su di me, della grande ignominia»./ Così di‑
ceva, già invece li teneva sepolti la terra datrice di vita/ proprio laggiù
a Sparta, nella loro terra nativa» (trad. G. Cerri).

Il “certame” dei fratelli. Euripide ha dunque colto e sfruttato questo


dettaglio della teichoscopia di Elena e lo ha rielaborato. Come Elena, anche
Antigone ha due fratelli, tutti e due destinati a morire insieme, anche se
non ancora morti. Antigone è interessata soprattutto a Polinice, il fratello
cattivo da riabilitare. In Euripide il duello sarà raccontato dal I Messaggero
a Giocasta (1219-1263) e dal II Messaggero (1359-1454) al Coro, che
l’aveva chiesto: Coro «Ma com’è (πῶς) avvenuta l’uccisione di entrambi
i figli, come si è svolto il duello maledetto? Raccontami (σήμαινέ μοι)»
(1354-1355).
L’analogia è sottolineata anche letteralmente dall’espressione usata da
Elena e Antigone per i fratelli, nati da «unica madre»60. È tipico delle donne
ricordare la madre più che il padre61. Ma il topos diventa ironico in riferi‑
mento ai figli di Edipo e tanto più in bocca a Giocasta che al v. 11 preci‑
sa che Creonte, suo fratello, è nato «da un’unica madre» μητρὸς ἐκ μιᾶς,
«unius […] uteri» come dirà Stazio (Theb. 11. 407-408).

59
  Cf. De Martino 2014.
60
  Il. 3. 238 μία […] μήτηρ, Ph. 156-158 μία μήτηρ; cf. S. Ant. 513 in riferimento a
Eteocle, Stat. Theb. 11. 407-408: «Nel campo sta per compiersi un delitto tra consangui‑
nei, una lotta tremenda tra i figli di un unico ventre (unius ingens/ bellum uteri) (trad. G.
Faranda Villa).
61
  Il. 19. 293, E. IT 497 «Siete fratelli (sc. Oreste e Pilade)? Figli della stessa madre
(μητρὸς […] ἐκ μιᾶς)?», Xen. An. 3. 1.17.

33
Francesco De Martino

L’analogia tra Dioscuri e Polinice-Eteocle, quali copie di fratelli specu‑


lari, è anche nell’alternanza del loro status. I Dioscuri erano vivi e morti a
giorni alterni: «Essi anche sotto terra, onorati da Zeus,/ a vicenda vivono un
giorno per uno, a vicenda/ muoiono; e onore uguale ai numi hanno in sor‑
te» (Od. 11. 302-304)62. Anzi secondo Ps.-Apollodoro (Bibl. 3. 11. 2. 137)
proprio Polluce aveva chiesto di dividere a metà la presenza in Olimpo.
Eteocle invece non rispetta l’alternanza nel regno ad anni alterni che aveva
concordato con Polinice (70-74) e bandisce il fratello. Polinice ed Eteocle
sono dunque la versione deteriore dei Dioscuri: una coppia di fratelli legati
da un’alternanza annuale ma fallita.
Il tema dei due fratelli è ripreso e indebolito da Stazio nella teichoscopia
di Antigone e Forbante, che riguarda gli alleati di Eteocle non gli assedian‑
ti63. Antigone vede due fratelli e chiede informazioni al vecchio Forbante:
«E quei due fratelli che vedo là, da chi traggono origine? Hanno armi iden‑
tiche, identico si leva nell’aria il cimiero dell’elmo. Tale armonia regnasse
anche tra i miei fratelli».
Come spiega Forbante i due sono in realtà padre e figlio (Lapitaone e
Alatreo), ma così vicini di età da sembrare fratelli. I due fratelli di Antigone
sono invece non solo diversissimi, ma diversi anche dal padre che è in realtà
anche lui solo fratello più anziano, perché figli della stessa madre, Giocasta.
La teichoscopia di Ecuba. Anche Ecuba assiste ad un duello ma normale,
fra nemici, suo figlio Ettore e Achille. I guerrieri sono appena rientrati in
massa a Troia, tranne Ettore, che rimane definitivamente fuori. Dalle mura
Priamo e Ecuba lo incitano a rientrare «dentro le mura» (Il. 22. 56 e 85) ma
Ettore stesso, parlando al proprio thumos, scarta questa possibilità.
In questa seconda teichoscopia Priamo ed Ecuba64 fanno ciascuno un
discorso da padre e da madre ed entrambi stranamente con riferimenti a
parti intime. Priamo teme i cani che sbraneranno «il pube» di un «vecchio
ammazzato» (Il. 22. 74-76), un’immagine sfruttata poi da Tirteo (fr. 10. 25
West2). Ecuba, terrorizzata dall’idea di non poter piangere il figlio (Il. 22.

62
  Cf. Pi. N. 10. 87-88, P. 11. 63-64 «che un giorno abitate nelle sedi di Terapne/ e
l’altro nella dimora di Olimpo» (trad. B. Gentili).
63
  Forbante descrive lo scudo di Driante (7. 255-256 «un tridente e un fulmine sbal‑
zato in oro»), di Anfione, figlio o nipote del musico (7. 279 lira e toro sull’elmo, «insegne
degli avi»), di Ipseo (7. 310-311 «scudo fatto di sette strati di pelle»).
64
  Non è certo se stiano in postazioni diverse, come potrebbe suggerire l’avverbio
eterothen (Il. 22. 79). Cf. Il. 22. 430 e Castellaneta 2013: 16 n. 12, sulla base di Ameis
Hentze 1906: 9.

34
Antigone sulle mura

88-89), solleva e scopre una mammella 65 (Il. 22. 80 «scoprendosi il seno


con l’altra mano alzava la mammella») per attirare il figlio col ricordo del
«seno lenitivo (λαθικηδέα μαζόν)», che rende latenti le sofferenze (Il. 22.
83, cf. epilethon in Od. 4. 221): un gesto simbolico e a distanza 66.
Ecuba denuda il seno a distanza67 per salvare il figlio, come fa Calliroe
in Stesicoro, Gerioneide, S13. 2-5, non per salvare se stessa come fa invece
Clitennestra68. Per questo è di matrice omerica il motivo del seno denudato
di Giocasta nelle Fenicie, ricordato nel discorso di Antigone (1567-1569)69.
Giocasta è accorsa direttamente fuori le mura e mostra da vicino i seni nudi
ai figli70, ma non riesce a salvarli, come non era riuscita Ecuba col suo de‑
nudamento dalle mura. Tra i tanti denudamenti71 di seno quelli di Ecuba
e di Giocasta corrispondono a quello «di una madre che esibisce i seni al
figlio morto»72.

1434-1435 Messaggero Si gettò prima su un cadavere, poi sull’altro,


piangeva, si lamentava, ricordava con dolore il lungo sacrificio dell’al‑
lattamento (τὸν πολὺν μαστῶν πόνον/ στένων).

65
  Per Castellaneta 2013: 16-17, 22 anche il ventre, «facendo scivolare parte superiore
della veste fino alla vita, dov’era fermata dalla cintura». Ma sarebbe una scena anomala per
un poeta proude come Omero.
66
  Il gesto è simbolico, perché verosimilmente Ettore sarà stato allattato da una nutrice,
come Oreste è stato allattato da Cilissa (A. Ch. 750), non da Clitennestra. A distanza è il de‑
nudamento anche delle matres familiae di Gergovia che si affacciano dalle mura pectore nudo.
L’espressione κολπὸν ἀνιεμένη (v. 80) è ripresa da Teocrito nelle Siracusane (15. 134-135
«la veste allentata fino alle caviglie/ e il petto scoperto»), dove descrive il canto rituale nelle
Adonie. I vv. 82-83 sono ripresi invece in Carito 3. 5. 6, dove sono in bocca alla madre di
Cherea per convincerlo a non partire da Siracusa a Mitilene; cf. Castellaneta 2013: 115-116.
67
  Come poi le matres familiae di Gergovia che si affacciano dalle mura pectore nudo.
68
  A. Ch. 896-897, E. El. 1207, Oreste 527, 841 (cf. Mastronarde 1994: 585). Sul seno
di Giocasta in Euripide, Seneca e Stazio, cf. Castellaneta 2013: 81-87 e n. 11.
69
  Il I Messagero (1434-1435) descrive Giocasta che piange ricordando il «dolore
dei seni» (cioè dell’allattamento). In 1527 Antigone menziona il «seno privo di latte» della
madre.
70
  Cf. Mastronarde 1994: 547, 575, 585; inoltre Sen. Ph. 404-405, 469-470, Stat.
Theb. 7. 481-483, 522-524, 11. 341-342. In Stat. Ach. 1. 77-78 è Teti a seni nudi. Cf.
Castellaneta 2013: 87-88 n. 11.
71
  Pol. 2. 56.7-8 li criticava come tipici dello storico Filarco, ma lui stesso ne riferisce
uno della nutrice Agatoclea in 15. 31. 13, cf. Cipriani 1986: 71, Castellaneta 2013: 114.
72
  De Martino 1958: 224-225.

35
Francesco De Martino

1523-1529 Antigone Su quale cadavere per primo/ getterò come of‑


ferta/ le ciocche che mi strappo?/ Su mia madre, sul seno privo di
latte (ἀγαλάκτοις παρὰ μαστοῖς),/ o sui cadaveri sconciati/ dei miei
fratelli?
1567-1569 Antigone Tutti l’hanno vista piangere amare lacrime./ E
poi è corsa dai figli per supplicarli./ Con il seno scoperto, scoperto
(μαστὸν ἔφερεν)/ per supplicarli.

Nelle Fenicie di Seneca Antigone suggerisce a Giocasta di frapporre il


seno nudo tra le spade dei due figli e chiede a Polinice di deporre lo scudo
per permettere ai loro pectora di coire: 405 «Antigone tieni il seno nudo
fra le loro spade nemiche (nudun inter enses pectus infestos tene)», 469-470
«lo scudo impedisce al tuo petto di unirsi al petto materno (maternum tuo/
coire pectus pectori)» (trad. R. Cuccioli Melloni).
Nella Tebaide 7. 481-486 e 522-524 di Stazio Giocasta si precipita
all’accampamento argivo e «a petto nudo» (cf. 523-524 ista [...]/ ubera) for‑
za l’ingresso e di nuovo in 11. 341-342 si precipita da Polinice e gli mostra
il seno, ma in più accampa uno ius dell’uterus.

Theb. 7. 481-486: «La donna si spinge fino all’accampamento nemico e


col petto nudo (pectore nudo) cerca di forzarne l’ingresso mentre con voce
stridula e tremante supplica di esservi ammessa: «Apritemi le porte! È l’empia
madre, causa di questa guerra, che ve lo chiede! Il mio ventre ha un qualche
esecrabile diritto su questo accampamento (In his aliquod ius execrabile castris
huic utero est)!» I soldati sono presi da stupore e paura al solo vederla e ancor
più dopo averla udita». (trad. G. Faranda Villa)

Il diritto dell’uterus (7. 485) chiamato in causa da Giocasta riguarda


Polinice. Nel discorso che poco dopo rivolge al figlio fa riferimento di nuo‑
vo ai viscera (522) e agli ubera (524)73. Nelle Fenicie di Seneca Giocasta
incita nemici e cittadini ad assalire insieme il suo “ventre”74 e poi supplica
Polinice di ritirarsi da Tebe.

73
  Ai vv. 490-491 Giocasta chiede ai capi: «O capi Argivi, chi di voi mi indicherà il
nemico che io stessa ho partorito (hostem/ quem peperi)?».
74
  Per Castellaneta (2013: 22ss.) il gesto di Ecuba si potrebbe riferire al seno e al
ventre.

36
Antigone sulle mura

443-450 Giocasta Contro di me rivolgete le armi e le fiamme, contro


di me sola si scagli tutta la gioventù, quella gioventù coraggiosa che
viene dalle mura di Inaco o quella bellicosa che è scesa dalla rocca di
Tebe: concittadini e nemici, assalite insieme questo ventre (hanc petite
ventrem) che diede allo sposo i fratelli e le mie membra smembratele
e spargetele qua e là: io ho generato entrambi.

535-536 Giocasta Per la pesante fatica che il mio utero (uteri) ha


sopportato i dieci mesi della luna…

Il discorso alla gioventù amica e nemica va inteso come discorso ai due figli,
uno nemico ed uno ancora in patria, e dunque rappresenta un caso particolare
del discorso-rimprovero75 di una madre ai propri figli guerrieri, testimoniato da
Plutarco fra i detti delle madri spartane e in riferimento alle madri dei soldati di
Ciro in fuga nel corso del combattimento con i Medi di Astiage:

Detti delle donne spartane 5. 241b: volete ripararvi qui donde siete usciti?

Virtù delle donne 5. 246a (cf. 247ss.): «tirando su le tuniche dissero:


“dove (poi) correte, o peggiori fra tutti gli uomini? Fuggendo non
potete riparare qui da dove veniste fuori”»76;
Cf. Giustino 1. 6. 13-15 sublata veste obscoena corporis ostendunt
rogante, num in uteros matrum vel uxorum vellent refugere.

La teichoscopia di Andromaca. Una terza teichoscopia omerica è quella di


Andromaca quando ormai Ettore torna morto sul carro di Priamo.
Nel libro 6 Andromaca «insieme a suo figlio e all’ancella dal bel peplo/
se ne stava sopra la torre a piangere e disperarsi» (372-373). Era andata di
corsa, con la balia e il bambino, «alla torre alta di Ilio […] è corsa alle mura
con il fiato in gola,/ che sembrava una pazza (μαιομένη εἰκυῖα)» insieme
alla balia che porta il bambino «alla torre alta di Ilio» (Il. 6. 386, 388-389).
Da lì scende e va incontro ad Ettore che la sta cercando alle Porte Scee (Il.
6. 392-393), a nord-ovest di Troia, per rispedirla a casa (Il. 6. 490, 495). Al
v. 434 del libro 6 Andromaca dice ad Ettore di schierare l’esercito «dove

75
  Un singolare discorso di rimprovero di Antigone a Polinice è in Stat. Theb. 11.
363-382, Korneeva 2011: 159.
76
  L’episodio è testimoniato anche da Nic. Dam. fr. 66. 43-44 Jacoby e da Polyaen. 7.
45. 2. Cf. Cipriani 1986, De Martino 2002: 135.

37
Francesco De Martino

massimamente/ la città è accessibile (ἀμβατός ἐστι πόλις) e il muro è car‑


rabile (ἐπίδρομον ἔπλετο τεῖχος)»77. Il termine epidromos è lo stesso usato
da Antipatro per le mura carrabili di Babilonia (AP 9. 58. 1 Βαυλῶνος
ἐπίδρομον ἅρμασι τεῖχος)78. C’era dunque già sulle enormi mura di Troia
un punto dove ‒ verosimilmente con una rampa ‒ era possibile rientrare
in città con un carro, ma dove «per tre volte» gli Aiaci, Idomeno e Tideo
tentarono invano di penetrare in Troia. Anche Patroclo tenterà tre volte di
salire su una rampa del muro di Troia (Il. 16. 702).
Di nuovo nel libro 22, appena capisce che Ettore è morto, «corse fuori
di casa come una menade79 (μαινάδι ἴση),/ sconvolta in cuor suo; venivano
con lei due ancelle./ Appena poi giunse alla torre, dove s’era assembrata la
gente,/ si mise a scrutare dal muro (παπτήνασ’ έπὶ τεῖχεi>), ed ecco lo vide/
trascinato di fronte alla città: veloci i cavalli/ lo trascinavano senza pietà alle
concave navi degli Achei» (Il. 22. 460-465).
Un riflesso della follia di Andromaca si intravede nei giudizi duri di
Antigone in E., Ph. 151-153 (Partenopeo) e 179-180, 182-191 (Capaneo):

ANTIGONE Vorrei vederlo morto quest’uomo venuto a distruggere


la mia città, vorrei vederlo abbattuto dalle frecce di Artemide, la dea
che percorre i monti con sua madre.

ANTIGONE O Nemesi, cupi tuoni di Zeus, ardente luce del ful‑


mine voi annientate prepotenza e superbia. Ecco laggiù l’uomo che
minaccia di legare in schiavitù le Tebane e di consegnarle a Micene e
a Lerna, dove Poseidone con il tridente fece sgorgare acqua in onore di
Amimone. O veneranda Artemide dai riccioli d’oro, virgulto di Zeus,
che mai mai io debba patire una simile prigionia!

Ma soprattutto nel riferimento alle Menadi nei vv. 1751-1757:

Edipo Allora va all’inviolato recinto/ di Bromio, sul monte delle


Baccanti (mainadon)./ Antigone Bromio? In suo onore un giorno,
indossata/ la nebride cadmea, io celebrai Semele,/ danzando sui mon‑
ti, con una devozione/ che non è stata ripagata, mai.

77
  Sulla strategia militare ipotizzata da Andromaca, cf. Lentini 2013: 187.
78
  Sull’epigramma, cf. Argentieri 2003: 124-126.
79
  I due passi su Andromaca-menade sono l’unica esplicita menzione del menadismo
in Omero, cf. Prauscello 2007: 212.

38
Antigone sulle mura

Antigone è furiosa80 anche in Stazio (Theb. 11. 354-364).

In un’altra parte della città, Antigone intanto, scivolando in silenzio e di


nascosto al tumultuare della folla, incurante della sua condizione di vergine,
sta correndo come una pazza, ansiosa di salire sulla cima delle mura Ogigie
(volat Ogygii fastigia muri/ exuperare furens); l’accompagna, seguendola da
vicino, il vecchio Actore, che tuttavia non avrà fiato per giungere fin sulla
rocca. La giovane, dopo aver esitato un po’ scorgendo da lontano le armi
e riconoscendo il fratello che (delitto atroce!) con i giavellotti e con voce
tracotante assedia la città, dapprima riempie l’aria di fortissimi lamenti, poi
gli si rivolge a gran voce, sporgendosi dall’alto delle mura come se volesse
buttarsi giù (ex muris ceu descensura profatu): «Fratello, trattieni la tua
mano armata, indirizza un momento lo sguardo a questa torre e volgi verso
di me le piume irte del tuo cimiero!» […] (trad. G. Faranda Villa).
La teichoscopia funebre di Cassandra. Nel libro 24 anche Cassandra sale
sulle mura per vedere Priamo col carro funebre di Ettore (699-719). Anzi è
la prima a vederlo e a dare inizio alle onoranze funebri per il fratello.

Il. 24. 697-702: «[…] non li vide/ nessuno fra gli uomini, né fra le
donne dalla bella cintura,/ prima di lei; ma Cassandra, bella come
Afrodite d’oro/ salita alla rocca di Pergamo, vide suo padre/ ritto sul
carro, insieme all’araldo banditore;/ vide lui sopra i muli, composto
nella bara;/ ruppe allora in lamenti e lanciava il grido all’intera città:/
«Venite a vedere Ettore, Troiani e Troiane, se mai godevate/ di lui
quand’era vivo e tornava dalla battaglia,/ perché era una grande gioia
per la città e per il popolo tutto!»-/ Disse così, e nessuno rimase dentro
la città,/ né uomo né donna: su tutti calò un lutto accorato;/ raggiun‑
sero avanti alla porta colui che tornava col morto./ Si strappavano i
capelli per prime la moglie e la nobile madre,/ salite d’un balzo sul
carro veloce,/ gli carezzavano il volto; s’accalcava la folla piangente
(trad. G. Cerri).

Ettore è il paradigma del “buon” fratello rispetto a Paride. Antigone


guarda invece dall’alto Polinice, il «cattivo fratello», ancora vivo, morituro.
Come Cassandra, Antigone è la sorella del fratello morto, l’unico che le
interessi veramente. Solo per lui usa espressioni non polemiche, anzi enco‑
miastiche, paragonandolo ad un astro nascente.

80
  Korneeva 2011: 149-150.

39
Francesco De Martino

Antigone E dov’è il figlio che ha in comune con me la madre e un


destino penoso? Dimmelo, vecchio carissimo, dov’è Polinice?
Servo Laggiù, vicino alla tomba di Niobe, insieme a Adrasto. Lo vedi?
Antigone Sì, lo vedo, ma vagamente. Scorgo una figura, forse un
busto d’uomo. Oh, se potessi fendere l’aria, come una nuvola veloce
al vento, raggiungerlo – è un fratello a me carissimo – e gettargli le
braccia al collo dopo tanto tempo: è un esule, un infelice. E splendido
nella sua armatura intarsiata d’oro, arde di luce come i raggi del sole
mattutino.
Servo Grazie alla tregua verrà alla reggia e sarà per te gioia piena (E.
Ph. 156-170).

In Il. 6. 429-430 Andromaca aveva definito il marito «madre, padre,


fratello e marito». In S. Ant. 912 Antigone invece sostiene l’insostituibilità
del fratello – una volta morti i genitori – rispetto al marito.
Desiderio di vedere. È stato notato che nella teichoscopia di Antigone ci
sono ben dieci verbi di vedere (Mastronarde 1994: 167 n. 1). Il Servo descri‑
ve i re e soddisfa il desiderio di vedere di Antigone (194-195). L’espressione
somiglia a quella che usa il Pedagogo dell’Elettra di Sofocle per il desiderio
di vedere di Oreste, ma riguarda ora militari, come per le eroine omeri‑
che sulle mura, non località. Anche nelle Baccanti 913-914 Dioniso dice
a Penteo: «tu, tu che desideri vedere cose vietate ed impegnarti in cose
proibite».
Il desiderio di vedere è però tipicamente femminile. Come Elena, Ecuba,
Andromaca, Cassandra e Antigone, anche le signore di Calcide nell’Ifigenia
in Aulide (406 a.C., lo stesso anno delle Baccanti) vengono a vedere di per‑
sona quello che hanno sentito dire dai loro mariti81. Queste calcidesi sono
interessate alle navi e ai naviganti come Antigone era interessata ai militari
di terra.
Questi desideri di vedere militari, gli eroi in Aulide o gli assedianti a
Tebe, mettono in discussione il desiderio di vedere formulato da Saffo82,
interessata solo all’amore (fr. 16. 1ss. e 17s Voigt). A modo suo Antigone
sulle mura conferma che ciò che si ama e si desidera vedere è spesso proprio
un militare persino nemico o almeno divenuto nemico.

81
  De Martino 2013b: 212-219.
82
  Il fr. di Saffo è richiamato da Medda 2006: 14 e Lentini 2013: 191 n. 13. Med‑
da aggiunge Pi. I. 5. 1-6 e E. fr. 752f. 29ss. Kannicht (dall’Issipile) dove il coro incita la
protagonista ad andare ad ammirare l’esercito di Adrasto pronto per la spedizione a Tebe.

40
Antigone sulle mura

Appendice
Donne sulle Mura

Tebe

1. Giocasta, Antigone, Adrasto. Ms. Français 1386, fol. 15v, XIII-XIV sec. Paris, Bibliothèque
Nationale de France, Histoire ancienne jusqu'à César.

41
Francesco De Martino

2. Scontro tra armati (Eteocle e Polinice) davanti a Tebe turrita, morti in primo piano.
Miniatura delle Phoenissae di Seneca. Biblioteca Apostolica Vaticana, Vat. Lat. 7319
[XV sec.], f. 43 [82]. Vedere i classici: 342, Fig. 310,

3. Edipo cieco e Antigone. Sullo sfondo duello tra Eteocle e Polinice. Biblioteca Apostolica
Vaticana, Urb. Lat. 356 [XIV sec.], f. 34 (64). Vedere i classici: 304, Fig. 256.

42
Antigone sulle mura

4. Thomas Armstrong, Antigone and


Ismene.

5. Giorgio De Chirico,
Antigone consolatrice,
1973.

43
Francesco De Martino

Troia

1. Gustave Moreau, Elena sulle mura di Troia,


1885, olio su tela

2. Frederic Leighton, Elena sulle mura di Troia,


1865, olio su tela.

44
Antigone sulle mura

3. Walter Crane, Elena passeggia sulle mura di


Troia, 1913, illustrazione.

4. Fortunino Matania, Elena e Priamo sulle mura di Troia, s.d., illustrazione.

45
Francesco De Martino

1 2

1. Assalto alle mura di Troia, cf. Virgilio, Eneide 2. 440-452. Biblioteca Apostolica Vaticana, Vat.
Lat. 2761 [XIV sec.], f. 18v [40]. Vedere i classici, Roma, Palombi, 1996: 246, Fig. 163.

46
Antigone sulle mura

2. Troia dopo la sua ricostruzione. Ditti Cretese, De bello Troiano, Darete Frigio, De excidio
Troiae (versione francese di Benoit de Sainte-Maure, Roman de Troie). Biblioteca Apostolica
Vaticana, Reg. lat. 1505, f. 23v [54]. Vedere i classici: 279, Fig. 210,

47
Francesco De Martino

Megara

Scilla, innamorata, guarda dalle mura Minosse, Ovidio, Metamorfosi 8. 17-24, Incisione del
XVII secolo.

48
Antigone sulle mura

Roma

Roma (ROMA) conquistata dai Galli (GALLI) Sènoni di Brenno (390 a.C.) e assedio di
Campidoglio (CAPITOLIU[M]). Città del Vaticano, Biblioteca Apostolica Vaticana,
Vat. Lat. 3340, f. 9 [24]. Vedere i classici: fig. 122.

49
(Página deixada propositadamente em branco)
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles
(Four funerals and one marriage. Dead and alive in Sophocles’ Antigone)

João Diogo R. P. G. Loureiro (loureiro.joaodiogo@gmail.com)


Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_2

51
(Página deixada propositadamente em branco)
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles

Resumo – Exploramos aqui a ambiguidade moral da devoção de Antígona ao ir‑


mão morto, focando-nos em como esta se repercute na relação dela com os vivos. A
heroína despreza perigosamente Eros. Ismena, porém, peca igualmente por parcia‑
lidade. É este carácter de toda a acção que a tragédia nos obriga a pensar.1
Palavras chave: acção parcial, Antígona, Eros, maldição familiar, vivos & mortos.

Abstract – We will discuss the moral ambiguity of Antigone’s devotion to her


dead brother, namely how this affects her relationship with the living. She dange‑
rously despises Eros. Ismene’s stance, however, is likewise partial. Tragedy forces
us to think this trait of human action.
Keywords: Antigone, family curse, Eros, the living & the dead, partial action.

1. Maldição ou, à laia de introdução

O grande ensinamento da tragédia grega é o de que nem sempre há


um curso correcto de acção: é possível o sujeito ser confrontado com um
conflito de bens tal que não o pode resolver em termos morais (assim, por
exemplo, Orestes). Noutros casos, existindo uma hierarquia entre os bens,
o preterir-se um, por justificado que seja fazê-lo, acarreta a destruição (não
necessariamente física) do indivíduo (a situação de Antígona)2. Nas peças,
a parcialidade própria de toda a acção humana, isto é, a impossibilidade
de actuar respeitando todos os bens em jogo, obrigando necessariamente
a uma tomada de partido, é ilustrada de forma extrema: a impureza dos

1
  Este artigo baseia-se no segundo de um conjunto de três ensaios sobre a Antígona
desenvolvidos como trabalho final no âmbito do seminário de mestrado Filosofia do Mito,
leccionado em 2009/2010 pela Doutora Maria Luísa Portocarrero em Coimbra. Se a linha
argumentativa geral permaneceu intocada, o texto, por seu lado, sofreu alterações impor‑
tantes, com vista à clarificação de algumas teses. A reescrita, de forma silenciosa, reflecte
ainda, inevitavelmente, alterações na nossa forma de ver a peça. Não pretendemos, ainda
assim, ter chegado a uma perspectiva sobre esta livre de tensões.
2
  Simone Weil, um dos espíritos que, no século passado, mais de perto conviveu com
os antigos gregos, percebeu com nitidez o horror da situação des-coberta nas tragédias: em
L’Enracinement (publicado postumamente em 1949 pela Gallimard, em Paris), apresenta a
ordem – “un tissu de relations sociales tel que nul ne soit contraint de violer des obligations
rigoureuses pour exécuter d’autres obligations” (p. 18) – como a primeira necessidade da
alma humana.

53
João Diogo R. P. G. Loureiro

gestos é violentamente cobrada ao agente3. O cristianismo não aceita este


movimento: reconhecendo a existência de dilemas morais, não abdica de
uma ordenação dos bens e promete a quem se decida pelo magis a felici‑
dade (Deus não oferece menos), ainda que esta não implique a ausência de
sofrimento4.
A dualidade moral que tinge todo o gesto resulta de a acção humana
ocorrer sempre num contexto já poluído pelo mal e que se oferece como um
complexo deste e do seu oposto. O agente age numa dada circunstância que
o condiciona, em parte produto seu, em parte anterior a ele. Esta inquinação
da realidade de partida do sujeito é expressa miticamente pela figura da
maldição familiar. Um antepassado comete, por vezes até sem consciência
ou intenção, um crime terrível que condena os descendentes à desgraça: as
acções destes resvalam aphthonos para a catástrofe (para o grego, a realidade
é declinante). É também esta intuição que essa construção teológica que é o
pecado original quer designar.
Alguns estudiosos, na ânsia de apresentar um Sófocles humanista,
têm desvalorizado o peso das desgraças anteriores da casa na destruição
de Antígona, quase como o esta ser filha de Édipo fosse um acidente e a
sua morte resultasse tão-somente da sua obediência às agrapta nomima que
invoca junto de Creonte, representação da sua acção que, para confusão
da crítica, a própria nega em 904-912. Sófocles, pelo contrário, logo no
começo da peça inscreve Antígona na árvore genealógica dos Labdácidas,
pela boca da própria:

ὦ κοινὸν αὐτάδελφον Ἰσμήνης κάρα,


ἆρ᾽ οἶσθ᾽ ὅ τι Ζεὺς τῶν ἀπ᾽ Οἰδίπου κακῶν
ὁποῖον οὐχὶ νῷν ἔτι ζώσαιν τελεῖ;

Irmã comum, vera irmã, Ismena, Ismana cara,


diz-me, se sabes, qual, de entre os males de Édipai,
aquele que Zeus não completou em nós as duas
que ainda estamos vivas.

3
  O conceito de “acção parcial” foi cabalmente explorado no artigo do mesmo nome
(Loureiro 2012) que produzimos a partir do último dos três ensaios referidos na nota inicial.
4
  Apalpamos aqui uma das diferenças maiores entre a mundivisão trágica e a cristã.
Para a primeira, o Bem é algo periclitante, ancorado num conjunto de realidades sobre as
quais o sujeito não tem necessariamente controlo e, portanto, passíveis de lhe serem subs‑
traídas: o Humano, em suma, pode, em casos extremos, perder a possibilidade de ser feliz.
Para uma exposição magistral desta posição, vide Nussbaum 2001.

54
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles

Logo a segunda palavra (koinon: comum a quem? A Antígona e outro)


remete para Édipo ou Polinices (ou Etéocles, mas essa seria uma referência
sem interesse); o primeiro, epítome dos horrores passados da casa, o segun‑
do, dos males novos em preparação. O auto- em autadelphon também não é
inócuo: separa Ismena do pai, apenas meio-irmão das filhas5. Antígona não
esquece que sobre elas pesa a maldição de Édipo, ponto de partida, por isso
à cabeça, para a compreensão de tudo, maldição que devem tão somente à
sua linhagem, não a qualquer comportamento incorrecto para com o pai
que as tenha feito incorrer na ira deste, como acontece com os seus irmãos.
Há um mal que lhes corre no sangue, filhas de uma união incestuosa, e
como herança receberam a promessa da desgraça.
O tema é glosado ao longo de toda a peça. O coro é claro: “Saldas algu‑
ma disputa de teu pai” (856; Hölderlin recusa o eufemismo: “Stirbst aber
väterlichen Kampf” (itálico nosso)), e o canto de Antígona em resposta, no
caminho para o seu enterro, é um lamento pungente por uma sorte ignó‑
bil: sobre ela se abate enfim, também, o destino da família e não deixa de
haver uma ironia em ser precisamente a fidelidade aos seus que opera a sua
destruição. Ela repete em si a calamidade paterna: como Édipo (e não é esta
a única actualização do destino do pai na filha), também ela fica simbo‑
licamente cega: “Não é justo6 que eu, miserável, contemple/ ainda o santo
olho de luz” (879-880). A mudança da pena (o decreto original previa a
lapidação pública: 36) é um pequeno, porém profundamente significativo,
volte-face na acção. A entrada e saída de cena de Antígona são marcadas por
esta tomada de consciência da carga familiar, evocada pelo coro também
noutro passo: “E assim se manifesta a natureza selvagem7 da filha,/ [herda‑
da] do selvagem pai” (471-472), mas de forma especial em toda o segundo
estásimo, com a sua insistência: “não há salvação” (597; tradução deinos de
Marta Várzeas) para aqueles cuja casa os deuses decidiram destruir. A posi‑

5
  Griffith ad loc. concorda que o adjectivo deve ser vertido como “full-sister”, apesar
de reconhecer que não pode ser esse o seu sentido em A. Eum. 89. Parece-nos que erra: se
para Apolo a mãe em nada contribui para o ser dos filhos (cf. 658-661), então ele e Her‑
mes são, de facto, “full-brothers”, apesar de nascidos de mães diferentes. Ésquilo escolheu
cuidadosamente o termo.
6
  Themis: “in addition to the constraints imposed by Kreon, Ant. discerns an ine‑
xorable divine ordinance” (Griffith ad loc.). As traduções portuguesas consultadas calam
totalmente as implicações do termo para a questão da inocência de Antígona.
7
  Omos, à letra, cru (como em omo-fagia); por extensão, aplicado a pessoas, passou a
significar cruel e selvagem. Os tradutores portugueses expurgam o adjectivo do seu sentido
negativo, alimentando a ideia romântica da pureza moral de Antígona.

55
João Diogo R. P. G. Loureiro

ção estratégica, extrema, das referências de Antígona à sua herança familiar


afirma, paradoxalmente, a centralidade destas para a peça.

2. A noiva e o cadáver

Numa peça onde, no dizer de Steiner, se reúnem, caso único no cânone,


“all the principal constants of conflict in the condition of man” (sc. homem
e mulher, velhice e juventude, sociedade e indivíduo, vivos e mortos, huma‑
nos e deuses)8, o gesto de Antígona terá de pecar por parcialidade necessa‑
riamente a vários níveis, sendo redutor criticá-la apenas por desconsiderar o
bem “obediência civil” (para inverter a expressão de Thoreau)9. Admiti-lo
não implica negar a justiça, em última análise, da acção de Antígona – esta
vê sancionado pelos deuses o seu cuidado com o morto –, mas obriga-nos
a desistir de a apresentar como uma heroína sem mácula, como o quer a
narrativa convencional.
A sua admirável dedicação ao irmão caído não nos deve cegar para o
que, com a opção de o sepultar, ela sacrifica, a começar pela sua pertença
ao mundo dos vivos. Há algo de hipócrita naquele dual inicial – non zosain,
“nós as duas, que ainda estamos vivas” (3) –: Antígona, com a sua deci‑
são (ela não chama Ismena para um discernimento conjunto), retirou-se já
da comunidade dos viventes. Há nela uma tremenda pressa de morrer (a
Ismena pede que divulgue o seu feito (86-87), a Creonte, que se despache
(497-499) e isso revela uma vontade suicida que ofende os vivos. Antígona
preocupa-se mais com o seu morto do que com eles. Ela, que se apresenta
como modelo de philia familiar, rejeita afinal sem hesitação a irmã, quando
se apercebe de que esta não a ajudará, pouco se importando de, com a sua
morte, a deixar sozinha (cf. 58), resto último dos Labdácidas e mulher,
como é nítido, mais frágil do que ela. Ismena precisa de Antígona, ama-a
profundamente: “E como poderá a vida ser-me querida, se tu me abando‑
nares?” (548; cf. 566).

8
  Steiner 1984: 231. A ordem pela qual surgem elencados os cinco binómios e, no
interior de cada um, os seus membros, não é irrelevante.
9
  A acção de Antígona é deficiente, do ponto de vista político, também por outras
razões. Calamo-nos aqui, porém, por já termos analisado a questão no nosso trabalho
anterior (Loureiro 2012).

56
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles

Por sua vez, o seu desinteresse pelo noivo – a tentativa, contra os manus‑
critos, de atribuir a Antígona o verso 572 é apenas testemunho do desespero
de editores e tradutores em a salvar da acusação de frieza, que poluiria a sua
imagem doméstica de heroína máxima –, é tanto mais flagrante quanto a
Hémon, em boa medida, é a preocupação por Antígona (mas também pelo
pai, e isso é importante) que o move. Em última análise, o seu amor por
ela (e, em menor grau, a frustação por não conseguir matar Creonte) é a
causa fundamental da sua morte. Ele encontra-se enlouquecido (cf. 1228-
1230), sintoma próprio dos sob a influência de Eros (790). Antígona, pelo
contrário, não dá um só sinal da sua paixão. Não se veja aqui um estoicismo
louvável, de uma mulher que sabe calar os seus sentimentos em nome de
um dever mais alto, mas antes uma falha grave, o já referido desinteresse
pelos vivos, pelas relações presentes, aqui ampliado, no seu erro, por consti‑
tuir uma ofensa à divindade, a Eros, que é “das grandes leis par no poder”
(798-799). Estas “grandes leis” (ton megalon thesmon) por certo incluirão as
theon nomima (454-455) em que Antígona se funda (thesmos, que remete
para a esfera do divino, aponta para isso)10. É a própria peça, portanto, que
reconhece a parcialidade do gesto de Antígona, que, no seu respeito pelas
“leis do Hades” (519), esquece o poder de Eros.
Ela humilha, literalmente, o deus: dirige-o para o húmus, a terra, onde
jaz o irmão, esse sim, aparentemente, o objecto-(a)mor da sua afeição. Se a
loucura erótica de Hémon incide sobre Antígona, a de Antígona fixa-se em
Polinices (ela sabe que, de facto, aos olhos dos outros (cf. 99 e 220), só no
registo da moria o seu acto se torna inteligível (95 e 469). Antes de nós, já
outros insinuaram a presença na peça de um subtexto incestuoso. Creonte,
num exemplo maravilhoso da conhecida ironia sofocliana, não percebe,
porque não pode, o alcance das suas palavras: “Pois se és assim dada a
amar, agora que vais lá para baixo, ama/ os de lá” (524-525). Antígona, nos
momentos finais em palco, associa explicitamente casamento e morte: “Ó
túmulo, ó câmara nupcial, ó morada/ escavada na rocha que me guardarás
para sempre!” (891-892). Também nisto, de uma forma estranha e obscura,
Antígona parece ser assimilada à figura do pai, pela pulsão sexual incestuo‑
sa e hereditária que a atrai irresistivelmente para o irmão (de novo a família,
o dado como pré-condição da acção e, em Antígona, meio da ruína). Eros,

10
  Hölderlin, na sua busca incandescente pela verdade da peça, traduz en archais não
por “no poder”, mas, com toda a correcção, por “im Anbeginne”, nos começos, o que permite
postular um afastamento progressivo no tempo entre Eros e as “grandes leis”, abrindo assim
um espaço explícito para o seu conflito.

57
João Diogo R. P. G. Loureiro

assim de rosto para baixo, torna-se literalmente antí-gono, oposto à procria-


ção (numa das várias interpretações do onomástico). O nome “Antígona” é,
de facto, por si só, todo um manifesto anti-Eros.
Não pretendemos com o que acima ficou dito defender, com seriedade,
que Antígona ama o irmão. Quisemos tão só chamar a atenção para cer‑
tos indícios plantados no texto que não podem ser ignorados e nos parecem
produtivos para a análise da dinâmica Hades/Eros (ou mortos/vivos) que
aqui nos ocupa; densificam a tessitura ética da peça e multiplicam-lhe o
significado.

3. «Mas agora pensemos na refeição» [Il. 24. 601]

Será talvez aqui a altura de esclarecer que toda a reflexão dos parágrafos
anteriores não deve ser lida como uma defesa da tese de que Antígona havia
de ter seguido a admoestação de Cristo – “deixa os mortos sepultar os seus
mortos” (Mt 8, 22) – e permanecido fiel aos vivos (a irmã e o noivo). Isso,
e aqui reside a tragédia, teria sido tão parcial e tão eticamente correcto e
incorrecto como a sua escolha de enterrar Polinices. Mortos e vivos habitam
esferas distintas, que, porque diferentes, podem colidir, como sucede na
peça. Esta é uma realidade já reconhecida na Ilíada e é possível, aliás, que
não haja expressão mais bela dessa tensão do que a que encontramos em 24.
599-620 do poema. Aquiles dirige-se a Príamo, depois de terem chorado
copiosamente, e interpela-o: “mas agora pensemos na refeição”. Fala-lhe de
Níobe (a quem Antígona se compara em 823-833 — mas quão diferentes as
suas atitudes!) e de como também ela, dez dias após a morte dos filhos, ces‑
sou o pranto e comeu. Na contemplação da morte, a memória do alimento,
sinédoque da vida.
Ainda que os mortos mereçam o nosso choro, não podemos senão in‑
terromper as lágrimas para cuidar de nós, num acto próximo do sacrílego,
se considerado sub specie aeternitatis – mas a tragédia ensina-nos precisa‑
mente a vanidade desse tipo de raciocínio, condenando todas as éticas não‑
-prudenciais, que desconsiderem a dimensão encarnada do sujeito moral.
Alocámos um tempo para o luto, para com menor remorso retomar depois
o quotidiano – mas o morto continua morto. A fragilidade moral do nos‑
so comportamento é posta a nu quando dois tempos de nojo, diferentes,
se confrontam. Este é um dos topoi repetidamente explorados nas grandes
obras da literatura (e.g. Hamlet I. 2. 137-159). A continuação da vida é

58
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles

sempre pelo menos uma falta de respeito pelos mortos. Face ao cadáver,
não se pode senão chorar. Diz Príamo, na sequência da cena anteriormente
descrita: “desde que o meu filho às tuas mãos perdeu a vida/ [...] choro per‑
manentemente e penso nas incontornáveis tristezas,/ rojando-me no esterco
nos espaços fechados do pátio”11 (24. 638-640). Se a morte é eterna, o luto
não o pode ser menos. Se o valor de cada ser humano não pode ser definido,
porque cada um infinitamente precioso, então, insistimos, nenhum período
de nojo pela morte de uma pessoa pode ser considerado patologicamente
excessivo. O mais das vezes, porém, tendemos, melhor ou pior, a esquecer
os mortos: “O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco”, como reco‑
nhece Álvaro de Campos em Se te queres.
O esquecimento do morto é quase uma necessidade para continuar a
viver (por isso também o tempo durante o qual ele podia ser chorado foi re‑
gulamentado pelos legisladores antigos): “e as guerras/ de ainda agora, seja‑
-nos concedido esquecê-las” (150-151), pede o coro, que acabou de enterrar
Etéocles (cf. 23-25). É porque dá por morto o seu marido que Madalena
Vilhena, no Frei de Luís de Sousa, de Garrett, pode casar outra vez, e quando
o morto depois aparece é uma situação francamente aborrecida para todos:
João de Portugal, que se cria na paz dos mortos, acaba por vir perturbar a
paz dos vivos. O morto, arriscamos dizer, só tem o luto devido com a nossa
morte, pelo que a exigência da vida obriga a uma relativização do falecido, e
a verdade é que, num exercício de imoralidade quotidiana, “a child is being
born next door, a birthday celebrated below stairs, in the very instant of the
murder of Agamemnon or the blinding of Oedipus”12.
Esta “imoralidade”, porém, como dissemos a início, é-o apenas ab-solu‑
tamente e, por isso, pouco. A verdade do devido aos mortos tem de se con‑
frontar com aqueles que a podem pôr em prática: os vivos, que, enquanto
viventes, têm já outras responsabilidades, não menos imperativas. Isto não
os iliba dos seus deveres para com os mortos, mas introduz uma tensão di‑
fícil de gerir, como o prova Antígona. Antígona, a personagem, entre a vida
e a morte, escolhe, de forma clara, a segunda: “há já muito/ que morri, para
ajudar os que morreram” (559-560), e de forma total – por isso se suicida
(não fica à espera de morrer). “De facto, aquele que, como eu, vive entre
tantos males,/ como não há-de considerar um ganho o morrer?” (463-464).

11
  Para todos os versos da Ilíada que surgem no texto, inclusive o que utilizámos
como título do §3, servimo-nos da tradução de Frederico Lourenço, publicada em 2005
pela Cotovia, em Lisboa.
12
  Steiner 1996: 540.

59
João Diogo R. P. G. Loureiro

Na lógica binómica da peça, ela toma o partido dos mortos13. Ismena, por
sua vez, encarna a opção pela vida e o cuidado com os existentes: “Tu, po‑
rém, escolheste viver” (555). Compreendendo as razões de Antígona, recusa
juntar-se-lhe, preferindo, de alguma forma, “esquecer” os mortos, a quem
pede “compreensão, pois que a isto sou forçada:/ obedeço àqueles montados
no trono” (65-67; trad. semi-livre). É Ismena que se manifesta preocupada
com Hémon e não, sintomaticamente, a noiva deste. Só os missionários de
uma Antígona romântica podem teimar em ver Ismena como simples figu‑
ra de contraste introduzida pelo dramaturgo para realçar a virtude da irmã.
A acção de uma e de outra é, cada uma a seu modo, parcial, como ficou
claro. Parcial tem sido também a leitura corrente da peça, para cuja des‑
construção este pequeno texto quis contribuir. Sófocles prosseguirá a sua
reflexão sobre o lugar político dos mortos na negra Electra, onde nova pare‑
lha de irmãs se confronta com as exigências postas por outro corpo — mas
isso é matéria para inquéritos vindouros.

13
  Em nada o contradiz o facto de Antígona, no seu canto fúnebre, num exemplo da
composição em anel tão cara aos antigos, evocar o seu estatuto de viva (811 e 871). Trata‑
-se do momento de maior fragilidade emocional da personagem, em que ela, confrontada
directamente com a sua sorte, percebe as implicações da sua decisão e o valor do que sacri‑
ficou. Ainda assim, não recu(s)a.

60
Quatro funerais e um casamento
Mortos e vivos na Antígona de Sófocles

Âpendice: tradução do terceiro estásimo ou, Hino a Eros

für Leonor

Eros, invencível em combate,


Eros, que te abates sobre os rebanhos,
que no suave rubor de uma rapariga
gastas em vigia a noite,
que pairas sobre as águas
e os campos, andarilho.
Nenhum dos imortais se pode esconder de ti
nenhum dos humanos
que passam e morrem;
quem te possui, enlouquece:

tu, que o espírito dos justos


arrastas para a injustiça e até à desgraça;
tu, que esta discórdia entre homens
do mesmo sangue excitaste.
Triunfa o desejo em luz
nos olhos da noiva
prometida, das grandes leis par
no poder. Sem oposição
se diverte a deusa, Afrodite.

61
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania
(From oldness to justice: Antigone and Platonic criticismo of tyranny)

Maria das Graças de Moraes Augusto (mgmaugusto@yahoo.com.br)


Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
Universidade Federal do Rio de Janeiro

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_3

63
64
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Πατραλοίαν, ἦν δ’ ἐγώ, λέγεις τύραννον καὶ χαλεπὸν γηροτρόφον,


Pl., R. 569d 6-7.1

Resumo – As questões delineadas na tragédia de Sófocles, Antígona, são um tema


que, com todas as suas variações – metafísicas, estéticas, políticas e éticas – tem
inquietado os filósofos que, cedendo à “sedução” da filha de Édipo, refletiram
sobre as relações de ‘poder’ que envolvem a condição e as ações humanas. Nesse
sentido, não nos parece ser desconexa, sob essa ótica, a suspeita de que uma das
mais antigas, e porque não, a mais vital recepção de Antígona esteja no clássico,
igualmente vital, do pensamento antigo: a  República, de Platão. É, pois, nesse
contexto de recepção que vimos retomar aqui uma leitura já demasiadamente
conhecida – a radical crítica platônica à poesia trágica –, buscando, todavia, refletir
acerca de uma questão específica e comum a ambos os textos, na qual possamos
encontrar elementos que nos permitam constatar, no referido diálogo platônico,
uma ‘releitura’ específica do texto de Antígona, onde, em lugar do tradicional an‑
tagonismo entre poesia trágica e filosofia, esteja claramente delineada uma con‑
tinuidade reflexiva num tema comum a ambos os textos: a velhice.
Palavras-Chave: Sófocles-Antígona; Platão-República; Velhice e Tirania. Velhice
e Justiça.

Abstract – The issues outlined in the tragedy of Sophocles – Antigone – are a


theme that, with all its variations – metaphysical, aesthetic, ethical and political
– has troubled philosophers who, yielding to the “seduction” of Oedipus’s daugh‑
ter, reflected on the relations of “power” involving the human condition and the
human actions. In this sense, it does not seem to be inappropriate to suspect that
one of the oldest, and why not, the most vital reception of Antigone may be found
in the classic, equally vital, work of the ancient thought – the Republic of Plato.
It is therefore in this context of reception that we intend to revisit a very well-
known subject – the radical platonic critique of tragic poetry – seeking, however,
to reflect on a particular issue, common to both texts, in which it is possible to
find elements that let us see, in that platonic dialogue, a specific reinterpretation
of Antigone, where, instead of the traditional antagonism between tragic poetry
and philosophy, a reflexive continuity within a common theme to both texts – old
age – is clearly outlined.
Keywords: Sophocles – Antigone; Plato – The Republic; Old age and Tyranny. Old
age and Justice.

1
  “Parricida, pelo que dizes, e hostil com a velhice é o tirano, […]”.

65
Maria das Graças de Moraes Augusto

Antígona e as questões delineadas na tragédia de Sófocles é um tema


que, com todas as suas variações – metafísicas, estéticas, políticas e éti‑
cas – têm inquietado os filósofos desde Aristóteles até Hegel, de Hegel a
Hölderlin, Heidegger, Lacan, Derrida e tantos outros pensadores – que nos
seria impossível todos aqui nomear – que, cedendo à “sedução” da filha de
Édipo, refletiram sobre as relações de ‘poder’ que envolvem a condição e as
ações humanas. Nesse sentido, não nos parece ser desconexa, sob essa ótica,
a suspeita de que uma das mais antigas, e porque não, a mais vital recepção
de Antígona esteja no clássico, igualmente vital, do pensamento antigo: a
República, de Platão.
É, pois, nesse contexto de recepção que vimos retomar aqui uma leitura
já demasiadamente conhecida – a radical crítica platônica à poesia trágica 2
–, buscando, todavia, refletir acerca de uma questão específica e comum a
ambos os textos, na qual possamos encontrar elementos que nos permitam
constatar, no referido diálogo platônico, uma ‘releitura’ específica do texto
de Antígona, onde, em lugar do tradicional antagonismo entre poesia trági‑
ca e filosofia, esteja claramente delineada uma continuidade reflexiva num
tema comum a ambos os textos: a velhice.
A presença de Sófocles nos diálogos de Platão, embora não possa ser
demarcada por uma presença nominalmente forte – como, por exemplo,
as de Homero e Hesíodo –, está registrada em duas passagens da República
e do Fedro, que nos remetem para dois contextos fundamentais no âmbito
dos diálogos: [i] aquele que compõe o estatuto da natureza e da condição
humanas, expresso na República, pelo significado gnosiológico da velhice3,
e, [ii] aquele que envolve tanto a crítica geral da poesia, e da tragédia, em
particular, também enunciado na República4, quanto às relações entre phý-

2
  Sobre a crítica platônica à tragédia, vide, sobretudo, República, Simpósio, Fedro,
Filebo e Leis.
3
  Cf. Pl., R. 329c e 329d.
4
  No caso da tragédia, as interconexões na República são muitas, e em especial valeria
citar os livros VIII e IX, onde Platão nos oferece larga e contundente crítica da democra‑
cia – na qual a tragédia emerge, não nos esqueçamos –, e da tirania como as formas mais
corrompidas de governo. Nesse contexto, as aproximações entre os dois textos são muitas,
e se a atribuição feita já desde o final da Antiguidade e hoje aceita por muitos filólogos de
que o verso “οἱ σοφοὶ τύραννοί τῶν [...] σοφῶν συνουσίᾳ”, citado por Platão, no passo
568b 1 da República, e por ele atribuído a Eurípides, pertence a uma tragédia perdida de
Sófocles, Ájax de Locros (Fr.14 Pearson e Fr. 14 Radt) as ligações com Antígona ficariam
ainda mais evidentes. Sobre a questão Cf. Pearson 1963:8-10 e 12-13 e Radt 1999. Vale
observar ainda que o mesmo verso será citado no diálogo ‘suspeito’ Téages 125b 7, também
como sendo de Eurípides: {ΣΩ.} Τί οὖν ἂν εἰ Εὐριπίδῃ τι προσχρησαίμεθα, ὦ Θέαγες;

66
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

sis, meléte, epistéme, e a crítica da retórica na delimitação da ‘propriedade’,


do ‘poder’, isto é, da dýnamis do lógos filosófico5.
No presente estudo, vamos nos deter no aspecto [i], procurando mos‑
trar como a menção a Sófocles, o primeiro poeta nominalmente citado na
República, nos passos 329c e 329d, aponta para uma específica ‘releitura’
do texto da Antígona de Sófocles, e da importância dessa primeira recepção
para a constituição da temática do diálogo – a definição da justiça e o es‑
tatuto da ação justa como substrato da eudaimonía –, que será inferida por
Sócrates a partir da explicação dada por Céfalo acerca do “maior bem” que
lhe advém de sua “ousía”.6

1. Antígona: a velhice e a conquista do “tò phroneîn”.

Se tomarmos como ponto de partida de nossa reflexão a conclusiva fala


do Coro nos versos finais de Antígona –

{ΧΟ.} Πολλῷ τὸ φρονεῖν εὐδαιμονίας


πρῶτον ὑπάρχει· χρὴ δὲ τά γ’ εἰς θεοὺς
μηδὲν ἀσεπτεῖν· μεγάλοι δὲ λόγοι
μεγάλας πληγὰς τῶν ὑπεραύχων
ἀποτείσαντες
γήρᾳ τὸ φρονεῖν ἐδίδαξαν.

Em muito, a compreensão, da felicidade


é a primeira condição; aos deuses

Εὐριπίδης γάρ πού φησιν – σοφοὶ τύραννοι τῶν σοφῶν συνουσίᾳ· εἰ οὖν ἔροιτό τις τὸν
Εὐριπίδην· “Ὦ Εὐριπίδη, τῶν τίσοφῶν συνουσίᾳ φῂς σοφοὺς εἶναι τοὺς τυράννους;”
As discussões sobre a autoria desses versos parecem ter tido seu início com os scholia ao
verso 21 das Tesmofórias, de Aristófanes (Οἷόν γέ πού ‘στιν αἱ σοφαὶ ξυνουσίαι.), onde,
acreditam alguns comentadores, Aristófanes faria referência a esses versos como sendo de
Eurípides, e aonde, entretanto, o escoliasta anota que o verso citado pertence a Sófocles
e que ele pertenceria à tragédia, já naquele momento perdida, Ájax de Locros, acusando
também o equívoco em Platão e Antístenes. Cf. Adam 1963: v. 2. Esta informação parece
ser confirmada por Aulo Gélio, XIII, 68 e por Libânio, Epístola 33.
5
  Cf. Pl., Phdr. 268c 6 e 269a 1.
6
  Cf. Pl., R. 330d 1-3: Πάνυ μὲν οὖν, ἦν δ’ ἐγώ. ἀλλά μοι ἔτι τοσόνδε εἰπέ·τί
μέγιστον οἴει ἀγαθὸν ἀπολελαυκένι τοῦ πολλὴν οὐσίαν κεκτῆσθαι;

67
Maria das Graças de Moraes Augusto

não se deve a impiedade: grandes discursos,


grandes dores, pagam os irreverentes,
[só] a velhice a compreensão ensina.7

– e com eles acompanharmos o percurso narrativo que levou o Corifeu


a tal conclusão, veremos que os elementos que serão evocados por Platão na
passagem citada do Livro 1, e em suas consequências na conformação argu‑
mentativa da República, estarão plenamente demarcados no texto trágico.
Em primeiro lugar, a experiência de “tò phroneîn”, na Antígona, está as‑
sociada tanto às personagens da tragédia em suas escolhas existenciais e
políticas, quanto, na estrutura cronológica de cada uma delas, às suas idades
de vida: os jovens Ismênia, Antígona e Hêmon, o homem maduro que é
Creonte, e os velhos do Coro e Tirésias.
A primeira ocorrência do verbo phroneîn nos é dada na fala de Ismênia,
nos vv. 49-68:

{ΙΣ.} Οἴμοι· φρόνησον, ὦ κασιγνήτη, πατὴρ


ὡς νῷν ἀπεχθὴς δυσκλεής τ’ ἀπώλετο,
πρὸς αὐτοφώρων ἀμπλακημάτων διπλᾶς
ὄψεις ἀράξας αὐτὸς αὐτουργῷ χερί·
ἔπειτα μήτηρ καὶ γυνή, διπλοῦν ἔπος,
πλεκταῖσιν ἀρτάναισι λωβᾶται βίον·
τρίτον δ’ ἀδελφὼ δύο μίαν καθ’ ἡμέραν
αὐτοκτονοῦντε τὼ ταλαιπώρω μόρον
κοινὸν κατειργάσαντ’ ἐπαλλήλοιν χεροῖν.
Νῦν δ’ αὖ μόνα δὴ νὼ λελειμμένα σκόπει
ὅσῳ κάκιστ’ ὀλούμεθ’, εἰ νόμου βίᾳ
ψῆφον τυράννων ἢ κράτη παρέξιμεν.
Ἀλλ’ ἐννοεῖν χρὴ τοῦτο μὲν γυναῖχ’ ὅτι
ἔφυμεν, ὡς πρὸς ἄνδρας οὐ μαχουμένα·
ἔπειτα δ’ οὕνεκ’ ἀρχόμεσθ› ἐκ κρεισσόνων
καὶ ταῦτ› ἀκούειν κἄτι τῶνδ› ἀλγίονα.
Ἐγὼ μὲν οὖν αἰτοῦσα τοὺς ὑπὸ χθονὸς

7
  S., Ant. 1347-1354. A tradução dos versos 1347-1354 é nossa, as demais citações tra‑
duzidas da Antígona são as de Schüler 2006. Em algumas passagens alteramos a tradução
de “phroneîn” para preservar o sentido que acreditamos ser aquele que melhor compõe com
o texto platônico. Os grifos são nossos, e usados visando chamar a atenção do leitor para
os pontos da tragédia que nos parecem próximos da República. Para o texto grego citamos
a edição de Dain, Mazon e Irigoin 2002.

68
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

ξύγγνοιαν ἴσχειν, ὡς βιάζομαι τάδε,


τοῖς ἐν τέλει βεβῶσι πείσομαι· τὸ γὰρ
περισσὰ πράσσειν οὐκ ἔχει νοῦν οὐδένα.

Ai de mim! Compreende, irmãzinha, nosso pai,


pereceu odiado, escarnecido;
ao descobrir seus crimes, os dois
olhos arrancou, ele mesmo, com suas próprias mãos;
depois, ela, mulher e mãe dele, dois nomes para a mesma,
no laço de uma corda extinguiu a vida;
há pouco, nossos irmãos, num mesmo dia
se mataram, desditos, o destino
comum selaram, aniquilando-se mutuamente no poder dos braços.
Agora, restamos só nós duas; vê
que morte miserável teremos, se à força da lei
e à decisão soberana do tirano nos opusermos
Põe na cabeça isso, mulheres
somos, não podemos lutar com homens.
Há mais, somos dirigidas por mais fortes,
temos que obedecer a estas leis e a leis ainda mais duras.
De minha parte, rogo aos que estão debaixo da terra
que tenham piedade de mim, sou forçada a isso,
obedecerei a quem está no poder; fazer
mais do que isso não tem nenhum sentido.8

No contexto do prólogo, portanto, é Ismênia a primeira a dimensionar


o nível da ‘compreensão’ ao levar Antígona a examinar os seus argumentos
para não infringir as leis estabelecidas por Creonte: [i] as mortes de Édipo
e Jocasta, a morte de Éteocles e Polinices; [ii] o aspecto violento do nómos;
[iii] o poder do tirano; e, [iv] a ‘obediência à lei’ que abarca não só a condi‑
ção feminina, mas, também, o fato de serem governadas pelo “mais forte”
(kreissónon), donde o reconhecimento de que a obediência deve ser dada a
quem está no poder (e que, acreditamos, será retomada no argumento de
Trasímaco, em República, 338c, quando este afirmar que o “justo é o inte‑

8
  S., Ant. 49-68.

69
Maria das Graças de Moraes Augusto

resse do mais forte (kreíttonos)” e em seguida identificar o mais forte com o


governante, o que nos levará a um dos grandes temas do diálogo platônico9.
Na sequência, na segunda ocorrência, o que nos parece importante con‑
siderar são os versos 354-355, da Estrofe 2, do Primeiro Estásimo, cujo tema
maior, como todos sabemos, é o ‘homem’:

Καὶ φθέγμα καὶ ἀνεμόεν {Str. 2.}


φρόνημα καὶ ἀστυνόμους
ὀργὰς ἐδιδάξατο, καὶ δυσαύλων
πάγων <ἐν>αίθρεια καὶ
δύσομβρα φεύγειν βέλη
παντοπόρος· ἄπορος ἐπ› οὐδὲν ἔρχεται
τὸ μέλλον· Ἅιδα μόνον
φεῦξιν οὐκ ἐπάξεται, νό-
σων δ› ἀμηχάνων φυγὰ
ξυμπέφρασται.

A voz, o pensar
volátil e as urbanas leis
das assembleias ele as ensinou
a si mesmo, fugiu
da áspera agressão do frio
e dos dardos das tempestades.
Aparelhado, desaparelhado não acata nada
do que lhe advém; só da morte [do Hades]
fuga não lhe acena,
ainda que de indômitas moléstias
alcance escape.10

9
  Cf. Pl., R. 338c 1 e 338e 1-339a 1-4: φημὶ γὰρ ἐγὼ εἶναι τὸ δίκαιον οὐκ ἄλλο τι ἢ
τὸ τοῦ κρείττονος συμφέρον. [...]Τίθεται δέ γε τοὺς νόμους ἑκάστη ἡ ἀρχὴ πρὸς τὸ αὑτῇ
συμφέρον, δημοκρατία μὲν δημοκρατικούς, τυραννὶς δὲ τυραννικούς, καὶ αἱ ἄλλαι
οὕτως· θέμεναι δὲ ἀπέφηναν τοῦτο δίκαιον τοῖς ἀρχομένοις εἶναι, τὸ σφίσι συμφέρον,
καὶ τὸν τούτου ἐκβαίνοντα κολάζουσιν ὡς παρανομοῦντά τε καὶ ἀδικοῦντα. τοῦτ›
οὖν ἐστιν, ὦ βέλτιστε, ὃ λέγω ἐν ἁπάσαις ταῖς πόλεσιν ταὐτὸν εἶναι δίκαιον, τὸ
τῆς καθεστηκυίας ἀρχῆς συμφέρον· αὕτη δέ που κρατεῖ, ὥστε συμβαίνει τῷ ὀρθῶς
λογιζομένῳ πανταχοῦ εἶναι τὸ αὐτὸ δίκαιον, τὸ τοῦ κρείττονος συμφέρον.
10
  S., Ant. 354-363.

70
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Observemos que, enquanto ‘phrónema’, a compreensão (que será a seguir


perfeitamente identificável no contexto da República, sobretudo, quando
os modos de ser da cidade estiverem definidos como andreía, sophía, so-
phrosýne; a sophía, aquilo que é próprio do governante, será compreendida
como ‘phrónesis’)11 nos mostra como, juntamente com a voz, a conquista
da ‘humanidade’ se dá pelo exercício da vida política. Ou melhor, a ‘vida
política’ resulta da articulação do phroneîn com a voz e com a proteção da
cidade, que possibilitou aos homens superar o frio, as tempestades e as apo‑
rias (ἄπορος ἐπ᾽ οὐδὲν ἔρχεται) que lhes advêm, com exceção do Hades, de
onde não se pode fugir.12
É assim que na Antístrofe 2, do Primeiro Estásimo, no verso 375, volta‑
mos a encontrar o ‘phroneîn’, expressando, de modo específico e relativo, o
conhecimento do homem – entre a sophía e a tékhne, resguardadas as intrín‑
secas relações que a tradição entre elas estabeleceu, o sophós e o demiourgós
–, mediados pelo nómos e pela díke, que garantem a sua legitimidade:

Σοφόν τι τὸ μηχανόεν {Ant. 2.}


τέχνας ὑπὲρ ἐλπίδ’ ἔχων,
τοτὲ μὲν κακόν, ἄλλοτ’ ἐπ’ ἐσθλὸν ἕρπει,
νόμους παρείρων χθονὸς
θεῶν τ’ ἔνορκον δίκαν
ὑψίπολις· ἄπολις ὅτῳ τὸ μὴ καλὸν
ξύνεστι τόλμας χάριν·
μήτ’ ἐμοὶ παρέστιος γέ-
νοιτο μήτ› ἴσον φρονῶν
ὃς τάδ› ἔρδοι.

De saber fecundo,
move recursos inesperados
ora ao bem, ora ao mal.
Una as leis da terra
à justiça jurada

11
  Cf. Pl., R. 432a 5 e 433b 8.
12
  Sobre a “ode ao homem” e seus desideratos filosóficos e platônicos, vide, por exem‑
plo: Conford 1907: 228-232; Segal 1964: 46-66; Hester 1971 :11-59; Bodeüs 1984 :271-
290; Goldhill 1986: Saxonhouse 1986: 403-448; Oudemans e Lardinois 1987: 118-214;
Blundell 1989: 106-148; Nussbaum 2001: 51-117; Beer 2004: 19-30 e 67-80; Kitzincher
2008: 11-70.

71
Maria das Graças de Moraes Augusto

dos deuses, e amuralhado será;


desamuralhado
se saiba, porém,
atrevendo-se a insultá-las.
De meus altares
não se aproxime
nem perturbe meu pensar
quem assim procede.13

E aqui já poderíamos indicar as muitas questões que esses versos ad‑


juntam ao texto platônico: [i] as relações entre sophía e tékhne, tão enfati‑
camente abordadas no Livro I da República nas conversas de Sócrates com
Polemarco e Trasímaco, são delineadas por Sófocles em toda a sua ambigui‑
dade: a pluralidade de tékhnai que a sophía comporta pode voltar-se “ora ao
bem, ora ao mal” (e como é dito por Sócrates, no Livro I, exemplificando
essa ambiguidade, no exemplo da iatriké, o médico é o mais hábil seja para
curar, seja para matar14); daí a necessidade [ii] da união de nómos e díke, tal
como argumentará Céfalo ao falar da díke, como fonte do temor trazido aos
velhos ao se aproximarem da morte.15 E dessa união resultará a ‘muralha’
que resguarda os homens da adikía pela experiência da pólis; daí então que a
perda dessas muralhas instaure a condição “ápolis”, que ocorre àqueles que
insultam o nómos e a díke, e por isso o Coro pedirá que estes não pertur‑
bem o seu phroneîn, isto é, a sua capacidade de compreensão tanto da vida
política, quanto religiosa.
Se concordarmos que tal interpretação está correta, talvez pudéssemos
admitir já estar aqui indicada uma das fontes da tese platônica, demons‑
trada nos argumentos de Sócrates contra Trasímaco, de que a antinomia
sofística entre nómos e phýsis deve ser refutada em favor de sua natural coa‑
lescência, o que nos garantiria o modo reto de apreensão do que são a justiça
e a injustiça.
Quando passamos ao Segundo Episódio, que tem início com o Corifeu
anunciando que Antígona foi apanhada em estado de aphrosýne, pois havia
sido flagrada em plena desobediência (apístia) das leis da basileía, isto é, do
soberano da cidade, vamos encontrar duas variações de “tò phroneîn”, agora
na perspectiva de Creonte, nos versos 474-475 – em sua resposta ao Corifeu

13
  S., Ant. 365-375.
14
  Cf. Pl., R. 333e.
15
  Cf. Pl., R. 330d-331a.

72
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

quando este avalia o diálogo anterior do governante com Antígona , – e, em


seguida, no diálogo entre Ismênia e Antígona, no verso 557.
Dando sequência à interlocução entre o phýlax e Creonte e entre Creonte
e Antígona, onde ocorre o enfrentamento entre as ‘leis da cidade’ e as ‘leis
não-escritas’, “perenes, dos deuses”, e ainda entre Antígona e aquele que ela
chamará de “tirano”, veremos o Corifeu concluir que ela faz parte de “uma
estirpe inflexível, de um pai inflexível filha”, e que “não sabe ceder aos gol‑
pes do mal”. E será em resposta ao Corifeu que Creonte dirá:

{ΚΡ.} Ἀλλ’ ἴσθι τοι τὰ σκλήρ’ ἄγαν φρονήματα


πίπτειν μάλιστα, καὶ τὸν ἐγκρατέστατον
σίδηρον ὀπτὸν ἐκ πυρὸς περισκελῆ
θραυσθέντα καὶ ῥαγέντα πλεῖστ› ἂν εἰσίδοις.
Σμικρῷ χαλινῷ δ› οἶδα τοὺς θυμουμένους
ἵππους καταρτυθέντας· οὐ γὰρ ἐκπέλει
φρονεῖν μέγ› ὅστις δοῦλός ἐστι τῶν πέλας.

Sabe, entretanto, que os pensamentos mais rijos


são os que mais quebram. Verás o ferro
mais inflexível, endurecido a fogo,
rachar com frequência e romper.
Com um pequeno pedaço de bronze sei que os potros
mais xucros são domados. Não se mostre
altaneiro quem é escravo do pensar alheio.16

Após a acirrada discussão com Creonte e a chegada de Ismênia que,


diante da condenação de Antígona pelo tirano, oferece a koinonía anterior‑
mente negada – uma vez que o noûs que ambas trazem de nascimento não
permite que ela sobreviva ao infortúnio da irmã17 –, Antígona, rejeitando
a cumplicidade de Ismênia e assinalando que ela deve optar pela vida, dei‑
xará claro que a escolha de cada uma delas, embora distintas, é fruto do “tò
phroneîn”. Admitindo, então, que este é maleável, dirá: “pensas belamente
para uns, eu, para outros”.18

16
  S., Ant. 473-479.
17
  S., Ant. 563-564: Οὐ γάρ ποτ’, ὦναξ, οὐδ’ ὃς ἂν βλάστῃ μένει/ νοῦς τοῖς κακῶς
πράσσουσιν, ἀλλ’ ἐξίσταται.
18
  S., Ant. 557: Καλῶς σὺ μὲν τοῖς, τοῖς δ’ ἐγὼ ‘δόκουν φρονεῖν.

73
Maria das Graças de Moraes Augusto

Desse modo, a contraposição expressa entre a compreensão argumen‑


tativa de Creonte e a de Antígona dá-se em dois níveis: o cronológico, a
juventude de Ismênia e Antígona, contrapostas à maturidade de Creonte, e
a inflexibilidade do governante (ou do tirano), ao apontar para os excessos
que o “tò phroneîn” pode conter frente ao relativismo indicado por Antígona
diante da questão da obediência à lei e à religião.
Ao chegarmos aos versos dolorosos da abertura do Segundo Estásimo,
“feliz o que em vida não provou amarguras”,19 prenunciando as dores que
serão infligidas a Creonte, veremos mais uma vez um embate de “tò phro-
neîn” entre pai e filho, entre o jovem Hêmon e o pai Creonte, mediados
pela ‘velhice’ do Corifeu.
Com a chegada de Hêmon, anunciada pelo Corifeu, no Terceiro
Episódio, o debate acerca da ‘obediência’ ganha o estatuto do oîkos, para,
em seguida, justificar a obediência às leis da cidade como sendo o justo:

εἰ γὰρ δὴ τά γ’ ἐγγενῆ φύσει


ἄκοσμα θρέψω, κάρτα τοὺς ἔξω γένους·
ἐν τοῖς γὰρ οἰκείοισιν ὅστις ἔστ’ ἀνὴρ
χρηστός, φανεῖται κἀν πόλει δίκαιος ὤν.

“[...] Se eu tolerar os desmandos


da minha gente, perderei autoridade sobre os demais.
Quem é correto em sua própria casa
também agirá de modo justo na cidade.”20

Ao contrapor a anarquia – que devasta cidades e casas – à prosperidade


entabulada pela obediência, Creonte reafirmará o apoio devido àqueles que
velam pela ordem (toîs kosmouménois), sem jamais ceder a uma mulher, e
o Corifeu, já mediando a fala seguinte de Hêmon, sublinhará a questão da
temporalidade, ao afirmar:

Ἡμῖν μέν, εἰ μὴ τῷ χρόνῳ κεκλέμμεθα,


λέγειν φρονούντως ὧν λέγεις δοκεῖς πέρι

“se o tempo não me rouba o raciocínio,

19
  S., Ant. 584: Εὐδαίμονες οἷσι κακῶν ἄγευστος αἰών·
20
  S., Ant. 659-662. Tradução Schüler, com modificações.

74
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

posso afirmar que é sensato o que dizes.”21

Sob a suspeita imposta por khrónos, o Corifeu buscará saber o significa‑


do da condição de phronoúntos da fala de Creonte, isto é, qual o sentido da
ação do phroneîn na defesa da obediência por ele apresentada. E, mais uma
vez, o caráter unívoco contido na fala anterior de Creonte será confrontado
com a fala jovem, agora de Hêmon.
Ao trazer à tona o medo que o poder de Creonte inspira ao homem do
povo, Hêmon retornará à necessária flexibilidade de “tò phroneîn”: quem
julga deter um phroneîn único (mónos), possui “língua e alma estranha aos
outros”, e este, se o abríssemos, veríamos que está vazio, desprovido de “tò
phroneîn”!22. Para o homem, continua Hêmon, ainda que seja sábio, apren‑
der e continuamente ser flexível não é motivo de vergonha 23; e, embora
sendo jovem, pode reconhecer o velho dito que afirma que “nada supera o
homem dotado de saber”, isto é, o “homem dotado de epistéme.24
Entretanto, contrafazendo sua ‘maturidade’, Creonte irá indagar se é
lícito a um homem de sua idade aprender com o phroneîn de um jovem25, e
do conflito acerca dessa compreensão ‘entre as idades’ resultará a conclusão
de Hêmon, de certo modo acordada pelo Corifeu, de que Creonte estava
vazio de “tò phroneîn”, isto é, que havia perdido sua capacidade de ‘compre‑
ensão’: “Se não fosses meu pai, diria que estás louco”.26
Será, assim, nesse vazio de “tò phroneîn” que chegaremos ao Terceiro
Estásimo, onde o poder de Éros e a sedução de Afrodite permearão o Quarto
Episódio, quando até o Corifeu começará a distanciar-se das determinações
do soberano de Tebas ao ver Antígona aproximar-se da câmara mortuária.
O distanciamento do Coro será, por sua vez, ratificado com a chegada
de Tirésias, no Quinto Episódio, antecedido pelo Quarto Estásimo, com o
belo canto à deinótes das Moirai, conclamando Creonte, no verso 996, ao
21
  S., Ant. 681-682.
22
  S., Ant. 707-708: ὅστις γὰρ αὐτὸς ἢ φρονεῖν μόνος δοκεῖ,/ ἢ γλῶσσαν ἣν οὐκ
ἄλλος ἢ ψυχὴν ἔχειν,/ οὗτοι διαπτυχθέντες ὤφθησαν κενοί.
23
  S., Ant. 710-711: Ἀλλ’ ἄνδρα, κεἴ τις ᾖ σοφός, τὸ μανθάνειν/ πόλλ’ αἰσχρὸν
οὐδὲν καὶ τὸ μὴ τείνειν ἄγαν.
24
  S., Ant. 720-721: [...] φήμ’ ἔγωγε πρεσβεύειν πολὺ/ φῦναι τὸν ἄνδρα πάντ’
ἐπιστήμης πλέων·
25
  S., Ant. 726-727: Οἱ τηλικοίδε καὶ διδαξόμεσθα δὴ/ φρονεῖν ὑπ’ ἀνδρὸς
τηλικοῦδε τὴν φύσιν;
26
  S., Ant. 755:
Εἰ μὴ πατὴρ ἦσθ’, εἶπον ἄν σ’ οὐκ εὖ φρονεῖν.

75
Maria das Graças de Moraes Augusto

“tò phroneîn”: “Que há de novo, ó velho Tirésias?” (Τί δ᾽ ἐστιν, ὦ γεραιὲ


Τειρρεσία;)27, pergunta Creonte ao adivinho, e ele responderá:

Φρόνει βεβὼς αὖ νῦν ἐπὶ ξυροῦ τύχης.),


[....]
αὐθαδία τοι σκαιότητ’ ὀφλισκάνει.
Ἀλλ’ εἶκε τῷ θανόντι, μηδ’ ὀλωλότα
κέντει· τίς ἀλκὴ τὸν θανόντ’ ἐπικτανεῖν;
Εὖ σοι φρονήσας εὖ λέγω· τὸ μανθάνειν δ›
ἥδιστον εὖ λέγοντος, εἰ κέρδος λέγοι.

Toma cuidado, que agora a tua sorte está por um fio


[...]
A arrogância atrai a loucura.
Detém-te ante o morto. Não queiras matar
Quem já morreu. Que bravura há em exterminar um cadáver?
Falo pensando no teu bem. Doce é dar
ouvidos a quem fala bem, se é para nosso proveito.”28

E Creonte, não só acusando a velhice de Tirésias – “Ó velho, todos


voltam os arcos sobre mim, como se eu fosse o alvo”29 –, mas também
apondo à acusação a sedução do lucro que revestiriam suas “palavras vis‑
tosas”, dispensará a euboulía sugerida pelo adivinho. E, sem compreender
o significado de euboulía (que será depois retomada por Platão, no livro
IV, da República, como sendo a definição da sophía do governante30), irá
compreendê-la como negação de “tò phroneîn”, sendo incapaz de reconhecer
que este vazio é exatamente a doença que o afeta:

{ΤΕ.} ὅσῳ κράτιστον κτημάτων εὐβουλία;


{ΚΡ.} Ὅσῳπερ, οἶμαι, μὴ φρονεῖν πλείστη βλάβη.
{ΤΕ.} Ταύτης σὺ μέντοι τῆς νόσου πλήρης ἔφυς.
Que compreender é o maior dos bens,

27
  S., Ant. 991.
28
  S., Ant. 99, 1028-1032.
29
  S., Ant. 1033-1034: Ὦ πρέσβυ, πάντες ὥστε τοξόται σκοποῦ/τοξεύετ’ ἀνδρὸς
τοῦδε.
30
  Sobre a euboulía na República, vide o estudo de Lima 2012; Schofield 1999, especial‑
mente os capítulos 2, 4 e 5, e, no pensamento arcaico, Stevens 1933 e Schofield 1999, cap. 1.

76
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Como, penso, a falta de compreensão é o maior dos males.


É precisamente esta a doença que te afeta.31

Dessa forma, concluindo esta rápida exposição sobre o “tò phroneîn” na


Antígona, veremos o Corifeu, em uma nova menção ao tema da velhice, en‑
contrar no processo de embranquecimento dos fios de seu cabelo a verdade
das palavras do adivinho acerca da euboulía do governante. O desenrolar
dos acontecimentos mostrará que o reconhecimento da ‘justiça’, da díke,
por Creonte, foi tardio, pois o “tò phroneîn”, como condição primeira da eu-
daimonía, é o que a velhice, tanto de Tirésias, quanto do Corifeu, ensinam.
Com a noção de “tò phroneîn” assim delineada na Antígona, podemos,
então, passar para o texto da República e ao seu seu proêmio, o Livro I, onde
o diálogo entre Céfalo e Sócrates acerca das condições epistêmicas e morais
da velhice nos trará Sófocles como testemunho legítimo da compreensão
da velhice como a descoberta dos ‘desejos’ que nos conduzem aos “prazeres
do lógos”.32

2. A velhice e o argumento justo em República, I: os ecos de Antígona.

Antes de passarmos à discussão do passo 329a-d, parece-nos oportuno


indicar alguns aspectos da estrutura dramática da República em sua dialó‑
gica acerca da justiça e da injustiça, sublinhando alguns elementos que nos
parecem estar contidos na tragédia de Sófocles – o estatuto cronológico das
personagens e suas relações de familiaridade: [i] o dos jovens, distingui‑
dos sob diversos ângulos, além da idade – o da paternidade – no caso dos
filhos de Céfalo, Polemarco, Lísias e Eutidemo; e o da adelphía – no caso
dos irmãos de Platão, Gláucon e Adimanto –; [ii] o dos homens maduros,
distinguidos pela cidadania de Sócrates e pelo xenízein de Trasímaco; e, [iii]
o da velhice, na figura paterna de Céfalo. Portanto, a estrutura cronológica
que medeia a construção de “tò phroneîn”, na Antígona irá também mediar
a discussão acerca da busca dos sentidos de dikaiosýne na República.
Por outro lado, vale mencionar também que a República constitui-se em
uma espécie de narrativa mista (aquela que mescla a ‘haplè diégesis’ à míme-
sis, tal como indicado em República, 394c), na qual Sócrates, travestido de

31
  S., Ant. 1050-1052. Tradução de Schüler, com modificações.
32
  Pl., R. 328d.

77
Maria das Graças de Moraes Augusto

mimetés, narra a um interlocutor anônimo o que aconteceu no dia anterior


quando ‘desceu’ ao Pireu com Gláucon para contemplar as Bendidéias, e
como foi abalroado por Polemarco e Adimanto para que permanecesse no
Pireu para ver a nova festa que seria oferecida à noite, o que havia feito com
que ele e Gláucon fossem até à casa de Polemarco, para aguardar a festa
religiosa noturna. Lá, como é do conhecimento de todos, teremos um longo
diálogo, cujo tema é a construção, com o lógos, de uma pólis e de uma polieía
justas, capazes, portanto, de superar o impasse trágico da Antígona.
Ao chegar a casa de Polemarco, além dos jovens e de Trasímaco, lá esta‑
va também Céfalo, com ar envelhecido (καὶ μάλα πρεσβύτης μοι ἔδοξεν
εἶναι), sentado em uma cadeira almofadada e com uma coroa na cabeça,
indicando que havia acabado de fazer um sacrifício no pátio da casa. Logo
que viu Sócrates, Céfalo o saudou com as seguintes palavras:

Ὦ Σώκρατες, οὐ δὲ θαμίζεις ἡμῖν καταβαίνων εἰς τὸν Πειραιᾶ. χρῆν


μέντοι. εἰ μὲν γὰρ ἐγὼ ἔτι ἐν δυνάμει ἦ τοῦ ῥᾳδίως πορεύεσθαι
πρὸς τὸ ἄστυ, οὐδὲν ἂν σὲ ἔδει δεῦρο ἰέναι, ἀλλ’ ἡμεῖς ἂν παρὰ σὲ
ᾖμεν· νῦν δέ σε χρὴ πυκνότερον δεῦρο ἰέναι. ὡς εὖ ἴσθι ὅτι ἔμοιγε
ὅσον αἱ ἄλλαι αἱ κατὰ τὸ σῶμα ἡδοναὶ ἀπομαραίνονται, τοσοῦτον
αὔξονται αἱ περὶ τοὺς λόγους ἐπιθυμίαι τε καὶ ἡδοναί. μὴ οὖν
ἄλλως ποίει, ἀλλὰ τοῖσδέ τε τοῖς νεανίσκοις σύνισθι καὶ δεῦρο
παρ’ ἡμᾶς φοίτα ὡς παρὰ φίλους τε καὶ πάνυ οἰκείους.

Ó Sócrates, tu também não desces lá muitas vezes ao Pireu para nos


veres. Mas devias fazê-lo, porque, se eu ainda tivesse forças para ir
facilmente até à cidade (ásty), não seria preciso tu vires cá, mas nós é
que íamos visitar-te. Agora, porém, tu é que deves aparecer cá mais
vezes. Fica a sabê-lo bem: para mim, quanto mais murcham os outros
prazeres do corpo, tanto mais crescem os desejos e os prazeres do lógos.
Não deixes de estar na companhia destes jovens, mas vem também
aqui a nossa casa, não só como hóspede [phílous], mas, também, como
familiar [oikeíous].33

Às quais Sócrates respondeu com sua indagação acerca da velhice:

33
  Pl., R. 328c 5 -7d 1-4. Tradução de Rocha Pereira, com modificações; grifos nossos.

78
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Καὶ μήν, ἦν δ’ ἐγώ, ὦ Κέφαλε, χαίρω γε διαλεγόμενος τοῖς σφόδρα


πρεσβύταις· δοκεῖ γάρ μοι χρῆναι παρ› αὐτῶν πυνθάνεσθαι, ὥσπερ
τινὰ ὁδὸν προεληλυθότων ἣν καὶ ἡμᾶς
ἴσως δεήσει πορεύεσθαι, ποία τίς ἐστιν, τραχεῖα καὶ χαλεπή, ἢ
ῥᾳδία καὶ εὔπορος. καὶ δὴ καὶ σοῦ ἡδέως ἂν πυθοίμην ὅτι σοι
φαίνεται τοῦτο, ἐπειδὴ ἐνταῦθα ἤδη εἶ τῆς ἡλικίας ὃ δὴ “<ἐπὶ
γήραος οὐδῷ>“ φασιν εἶναι οἱ ποιηταί, πότερον χαλεπὸν τοῦ βίου,
ἢ πῶς σὺ αὐτὸ ἐξαγγέλλεις.

Com certeza, ó Céfalo, disse eu, pois também me comprazo bastante


em dialogar com pessoas de idade avançada (presbýtais). Efetivamente,
parece-me que devemos informar-nos junto deles, como de pesso‑
as que foram à nossa frente num caminho que talvez tenhamos de
percorrer, sobre as suas características, se é áspero e difícil, ou fácil
e transitável. Teria muito prazer em te ouvir discorrer sobre este as‑
sunto – uma vez que chegaste já à idade que os poetas chamam estar
“no limiar da velhice (géraos)” – se é uma parte hostil da vida, ou que
declarações (exangélleis) tens a fazer.34

Assim, uma primeira indicação da interlocução entre a República e a


Antígona parece estar no estatuto cronológico das personagens e suas rela‑
ções de familiaridade, os jovens, distinguidos sob diversos ângulos, além
da idade: [i] o da filiação e o da ‘adelphía’, no caso de Antígona, Hêmon e
Creonte; Antígona e Ismênia; [ii] os homens maduros: Creonte, Sócrates
e Trasímaco; e, [iii] e os homens velhos na figura paterna de Céfalo, em
Tirésias e no Coro de velhos da Antígona. Portanto, a estrutura cronológica
que medeia a construção de “tò phroneîn” irá também mediar a discussão,
isto é, o ‘diálogo’, acerca da busca dos sentidos de dikaiosýne, como veremos
mais à frente.
Com essa indicação, passemos então ao contexto da narrativa de Céfalo,
na qual Sófocles é duas vezes citado:

Ἐγώ σοι, ἔφη, νὴ τὸν Δία ἐρῶ, ὦ Σώκρατες, οἷόν γέ μοι φαίνεται.
πολλάκις γὰρ συνερχόμεθά τινες εἰς ταὐτὸν παραπλησίαν ἡλικίαν
ἔχοντες, διασῴζοντες τὴν παλαιὰν παροιμίαν·οἱ οὖν πλεῖστοι
ἡμῶν ὀλοφύρονται συνιόντες, τὰς ἐν τῇ νεότητι ἡδονὰς ποθοῦντες
καὶ ἀναμιμνῃσκόμενοι περί τε τἀφροδίσια καὶ περὶ πότους τε καὶ

34
  Pl. R., 338d-e. Tradução de Rocha Pereira, grifos nossos.

79
Maria das Graças de Moraes Augusto

εὐωχίας καὶ ἄλλ’ ἄττα ἃ τῶν τοιούτων ἔχεται, καὶ ἀγανακτοῦσιν


ὡς μεγάλων τινῶν ἀπεστερημένοι καὶ τότε μὲν εὖ ζῶντες, νῦν
δὲ οὐδὲ ζῶντες. ἔνιοι δὲ καὶ τὰς τῶν οἰκείων προπηλακίσεις τοῦ
γήρως ὀδύρονται, καὶ ἐπὶ τούτῳ δὴ τὸ γῆρας ὑμνοῦσιν ὅσων
κακῶν σφίσιν αἴτιον.
ἐμοὶ δὲ δοκοῦσιν, ὦ Σώκρατες, οὗτοι οὐ τὸ αἴτιον αἰτιᾶσθαι. εἰ
γὰρ ἦν τοῦτ’ αἴτιον, κἂν ἐγὼ τὰ αὐτὰ ταῦτα ἐπεπόνθη, ἕνεκά γε
γήρως, καὶ οἱ ἄλλοι πάντες ὅσοι ἐνταῦθα ἦλθον ἡλικίας. νῦν
δ’ ἔγωγε ἤδη ἐντετύχηκα οὐχ οὕτως ἔχουσιν καὶ ἄλλοις, καὶ
δὴ καὶ Σοφοκλεῖ ποτε τῷ ποιητῇ παρεγενόμην ἐρωτωμένῳ ὑπό
τινος· “Πῶς,” ἔφη,“ὦ Σοφόκλεις, ἔχεις πρὸς τἀφροδίσια; ἔτι οἷός
τε εἶγυναικὶ συγγίγνεσθαι”; καὶ ὅς, “Εὐφήμει,” ἔφη, “ὦ ἄνθρωπε·
ἁσμενέστατα μέντοι αὐτὸ ἀπέφυγον, ὥσπερ λυττῶντά τινα καὶ
ἄγριον δεσπότην ἀποδράς.” εὖ οὖν μοι καὶ τότε ἔδοξεν ἐκεῖνος
εἰπεῖν, καὶ νῦν οὐχ ἧττον. Παντάπασι γὰρ τῶν γε τοιούτων ἐν
τῷ γήρᾳ πολλὴ εἰρήνη γίγνεται καὶ ἐλευθερία· ἐπειδὰν αἱ
ἐπιθυμίαι παύσωνται κατατείνουσαι καὶ χαλάσωσιν, παντάπασιν
τὸ τοῦ Σοφοκλέους γίγνεται, δεσποτῶν πάνυ πολλῶν ἐστι καὶ
μαινομένων ἀπηλλάχθαι. ἀλλὰ καὶ τούτων πέρι καὶ τῶν γε πρὸς
τοὺς οἰκείους μία τις αἰτία ἐστίν, οὐ τὸ γῆρας, ὦ Σώκρατες, ἀλλ’ ὁ
τρόπος τῶν ἀνθρώπων. ἂν μὲν γὰρ κόσμιοι καὶ εὔκολοι ὦσιν, καὶ
τὸ γῆρας μετρίως ἐστὶν ἐπίπονον· εἰ δὲ μή, καὶ γῆρας, ὦ Σώκρατες,
καὶ νεότης χαλεπὴ τῷ τοιούτῳ συμβαίνει.

Por Zeus que te direi, ó Sócrates, qual é o meu ponto de vista. Na


verdade, muitas vezes nos juntamos num grupo de pessoas de idades
aproximadas, respeitando o velho ditado. Ora, nessas reuniões, a
maior parte de nós lamenta-se com saudades do prazer da juventude,
ou recordando os gozos do amor, da bebida, da comida e de outros
da mesma espécie, e agastam-se, como quem ficou privado de gran‑
des bens e vivesse bem então, ao passo que agora não é viver. Alguns
lamentam-se ainda pelos insultos que um ancião sofre dos seus paren‑
tes, e em cima disto entoavam uma litania de quantos males a velhice
lhes é causa.
Mas, a meu ver, ó Sócrates, eles não insistem na verdadeira causa. Se
a causa fosse a velhice, eu também, teria de passar por tudo aquilo,
como tantas outras pessoas que alcançaram a minha idade. Ora, nesse
particular já tenho encontrado muitos velhos com os quais nada disso
aconteceu. De uma feita, [mesmo] estando eu na companhia do poeta

80
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Sófocles, alguém lhe perguntou: “Como passas, ó Sófocles, no que res‑


peita ao amor? Ainda és capaz de te unires a uma mulher?” Ao que ele
respondeu: “Sinto-me felicíssimo por lhe ter escapado, como quem fu‑
giu de um senhor despótico e selvagem”. Boa me pareceu, então, sua res‑
posta, e hoje ainda a considero assim. De fato, a velhice engendra muita
paz e liberdade; quando os desejos afrouxam o seu domínio e deixam
de se fazer sentir, acontece inteiramente o dito sofocleano: livramo-nos
de uma multidão de déspotas enlouquecidos. Mas, sobre isso e quanto
aos familiares, a causa é uma só, não a velhice, ó Sócrates, mas o caráter
dos homens. Para aqueles que forem kósmioi e eúkoloi, ordenados e bem
dispostos, a velhice é um medido desconforto, se não forem assim, ó
Sócrates, tanto a velhice, quanto a juventude, serão difíceis.35

Partindo do primeiro nível da conversa acerca da velhice, expresso na


hospitalidade de Céfalo a Sócrates, já temos um tema que aproxima e que,
na recepção platônica da Antígona sofocleana, parece oferecer uma correção
ao efeito trágico: a conformação do lógos.
A hýbris por ele suscitada, tal como sublinhado no texto da Antígona,
parece estar, na República, desativada pelo acréscimo radical do diálogo. A
recepção de Céfalo a Sócrates parece preencher a aprendizagem (edídaxo)
do “tò phroneîn” indicada pelo Corifeu, com a escolha de um certo tipo de
diálogo, o diálogo filosófico (como o modo de ser da filosofia): aquele que
se faz entre os que são philoi e oikeíoi, cuja voz atravessará a paideía do justo,
e na medida em que for se constituindo, será, na velhice, um exercício da
alma. Os prazeres descortinados pela velhice, que dizem respeito ao lógos e
sua conformação dialógica, são, agora, determinantemente, ‘anímicos’, vis‑
to que explicitam a hedoné no todo da alma: sua extensão vai da epithymía
ao lógos, legitimando assim os prazeres próprios a cada uma das partes da
alma, descritas no livro IV. Portanto, aos “megáloi lógoi” Platão contrapõe
o diálogo.
E será nesse mesmo contexto dialógico que Sócrates responderá à sau‑
dação de Céfalo: marcando aí a hedoné relativa ao lógos, o valor específico
da conversa com os homens velhos, pois eles são, como já vimos, como um
“exángellos”, como o mensageiro das tragédias que nos diz o que se passa
fora da cena dramática; a menção não nos parece meramente circunstan‑
cial, mas, acreditamos, [é] seja um forte eco do texto trágico.

35
  Pl., R. 329a-d. Tradução de Rocha Pereira, com modificações.

81
Maria das Graças de Moraes Augusto

Mas, Sócrates, talvez relembrando a figura do velho Tirésias, indicará a


especificidade do conhecimento a ser transmitido: aquele que tem uma ida‑
de avançada já percorreu um caminho que os outros ainda não conhecem
em sua extensão, se é áspero e difícil ou fácil e transitável, e, ao contrário de
Creonte, mostrará sua disposição em conhecê-lo, através do lógos, em sua
função dialógica.
Atendendo, então, ao que lhe pede Sócrates, Céfalo irá falar largamen‑
te sobre a velhice, inicialmente, apontando para o que dizem os muitos
anciãos de sua convivência, quando se juntam em reuniões que respeitam
o velho ditado: “quem é de uma idade, agrada a quem é da mesma idade”,
assinalando os lamentos aí contidos pela perda dos prazeres da juventude
– os gozos do amor, da bebida, da comida e outros da mesma espécie –
, agastando-se como se fosse uma grande (megála) privação, relativa à
existência anterior, e ainda acrescentam os insultos que os velhos sofrem de
seus familiares, entoando hinos aos males de que a velhice é causa.
Ora, a ‘novidade’ da narrativa de Céfalo é que ela expressa uma outra
experiência da velhice, aquela na qual Sófocles, como no exemplo citado
(e aqui seria interessante observar que a citação é feita na forma dialogal,
resguardando, portanto, a dimensão trágica do autor dentro do diálogo,
digamos, filosófico), dentre outros, é o fundamento de tudo que por ele
será dito em seguida. É, pois, Sófocles quem afirma sobre o “bem estar”
instalado pela velhice com a perda dos prazeres da juventude, e que foi ela
quem lhe permitiu “livrar-se de um senhor delirante e selvagem” (329e).
Garantida a primazia de Sófocles em tal compreensão da velhice, Céfalo
acrescentará, não só seu integral acordo com as palavras do poeta, mas o re‑
conhecimento das causas que permeiam as queixas de muitos velhos quanto
às dificuldades da velhice,

[...] μία τις αἰτία ἐστίν, οὐ τὸ γῆρας, ὦ Σώκρατες, ἀλλ’ ὁ τρόπος τῶν
ἀνθρώπων. ἂν μὲν γὰρ κόσμιοι καὶ εὔκολοι ὦσιν, καὶ τὸ γῆρας
μετρίως ἐστὶν ἐπίπονον· εἰ δὲ μή, καὶ γῆρας, ὦ Σώκρατες, καὶ
νεότης χαλεπὴ τῷ τοιούτῳ συμβαίνει.

[...] a causa é uma só, não a velhice, ó Sócrates, mas o caráter dos
homens. Para aqueles que forem kósmioi e eúkoloi, ordenados e bem
dispostos, a velhice é um medido desconforto, se não forem assim, ó
Sócrates, tanto a velhice, quanto a juventude, serão difíceis.36

36
  Pl., R. 329d-e. Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira, com modificações.

82
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Maravilhado com as palavras de Céfalo, Sócrates desejando que ele con‑


tinuasse sua exposição, afirmará que a maior parte das pessoas não concor‑
dariam com ele se o ouvissem assim definir a velhice, argumentando que ele
a suportava bem por ser rico e não em virtude de seu caráter, o que o levará
a indagar acerca da origem da riqueza de Céfalo, se a obteve por herança
ou aquisição.
A resposta de Céfalo, apontando para uma medida entre ele, o pai e o
avô – pois o avô, que também se chamava Céfalo, havia recebido x e dei‑
xado para seu pai, Lisânias, x + y (herança e aquisição), e este, por sua vez,
havia perdido um pouco desses bens, deixando z para Céfalo, que dar-se-ia
por satisfeito se deixasse aos filhos z + y, isto é, uma quantia ligeiramente
maior do que aquela que havia recebido do pai, Lisânias – já prenuncia o
tratamento que será dado ao lógos quando este estiver também incluído
entre os ‘bens’ a serem herdados por Polemarco. E dessa semelhança de
nome e riqueza entre Céfalo e o avô é que Sócrates indagará “qual o maior
bem que Céfalo retira da aquisição de uma grande riqueza (τί μέγιστον οἴει
ἀγαθὸν ἀπολλελαυκέναι τοῦ πολλὴν οὐσίαν κεκτῆσθαι)”. É, pois, para
explicitar esse ‘μέγιστον ἀγαθόν’ advindo de sua ‘οὐσία’ que a questão do
justo e da justiça ganhará contornos específicos e tornará possível a indaga‑
ção socrática acerca da ‘definição’ da dikaiosýne, em 331d 1-2.37
Ao sublinhar a impossibilidade de persuadir a muitos acerca do maior
bem de que se pode beneficiar da aquisição de riquezas, Céfalo agregará ao
tema da velhice a constatação da morte, pois a proximidade desta faz com que
a velhice seja pensada em função de nossa partida para o Hades, e lá, se os po‑
etas estão corretos, teremos de dar a díke para as injustiças cometidas ao longo
de nossas vidas. E, se retomarmos a questão da antiga díke, veremos que ela
também abre caminho para que, ao lado do temor prenunciado pela tradição
épica, Céfalo possa mencionar uma determinada condição para aqueles que
têm a ‘consciência’ de não terem cometido injustiças e conduzido suas vidas
de modo justo e piedoso: em lugar do temor da morte, desfrutam de uma
“prazerosa esperança, sempre boa condutora da velhice” (ἡδεία ἐλπὶς ἀεὶ
πάρεστι καὶ ἀγαθὴ γεροτρόφος), tal como Píndaro diz em graciosos versos:

γλυκεῖά οἱ καρδίαν
ἀτάλλοισα γηροτρόφος συναορεῖ
ἐλπὶς ἃ μάλιστα θνατῶν πολύστροφον
γνώμαν κυβερνᾷ.

37
  Cf. Pl., R. 330d.

83
Maria das Graças de Moraes Augusto

Doce esperança
o acompanha, ama da velhice
que alimenta o seu coração
e mais que tudo, dos mortais a vacilante inteligência conduz. 38

E aqui vale notar que a interpretação de Céfalo dos versos de Píndaro,


interpretação que parece ser nitidamente platônica, atribuindo à ‘γλυκεῖά
... ἐλπὶς’ uma função ‘prazerosa e boa’, nos permite indagar se essa fun‑
ção não é também condição necessária à descoberta dos ‘prazeres do lógos’,
visto que o prazer resultante dessa esperança consiste na boa condução da
velhice através de uma vida justa e piedosa (δικαίως καὸ ὁσίως τὸν βίον
διαγάγει); portanto, ao contrário do valor ambíguo da ἐλπίς pindárica, a
correção proposta ao texto do poeta supõe, não só o contexto da morte de
Sócrates – a necessidade de uma vida justa e piedosa, como o Eutífron já
nos havia demonstrado – , mas, também, a indicação da impossibilidade da
épica e da mélica oferecerem uma ‘definição’ da justiça possível, na versão
platônica, apenas no âmbito dialógico do gênero filosófico. E a sequência
dos argumentos de Céfalo e Sócrates irá ratificar essa posição.
Ao reconhecer que os versos de Píndaro se constituem em um ‘εὖ λέγειν’
admirável, Céfalo delimitará o grande bem de sua ousía, não para todos os
homens, mas apenas para aqueles que forem ‘ἐπιεικεῖ ’, comedidos:

τὸ γὰρ μηδὲ ἄκοντά τινα ἐξαπατῆσαι ἢ ψεύσασθαι, μηδ’ αὖ


ὀφείλοντα ἢ θεῷ θυσίας τινὰς ἢ ἀνθρώπῳ χρήματα ἔπειτα ἐκεῖσε
ἀπιέναι δεδιότα, μέγα μέρος εἰς τοῦτο ἡ τῶν χρημάτων κτῆσις
συμβάλλεται.

“Não enganar ninguém nem mentir, mesmo involuntariamente, nem


ficar a dever, sejam sacrifícios aos deuses, seja dinheiro a um homem,
e depois partir para o além sem temer nada – para isso a posse de
riquezas contribui em alto grau.”39

Assim, será do encantamento com a total beleza das palavras de Céfalo


que Sócrates poderá delas retirar sua inquirição acerca do fundamento da
politeía,

38
  Pl., R. 331a 2-8. Píndaro, fr. 214 Snell.
39
  Pl., R. 331b 2-5.

84
Da velhice à justiça:
Antígona e a crítica platônica da tirania

Παγκάλως, ἦν δ’ ἐγώ, λέγεις, ὦ Κέφαλε. τοῦτο δ’ αὐτό, τὴν


δικαιοσύνην, πότερα τὴν ἀλήθειαν αὐτὸ φήσομεν εἶναι ἁπλῶς
οὕτως καὶ τὸ ἀποδιδόναι ἄν τίς τι παρά του λάβῃ, ἢ καὶ αὐτὰ ταῦτα
ἔστιν ἐνίοτε μὲν δικαίως, ἐνίοτε δὲ ἀδίκως ποιεῖν;

“Falas com toda a beleza, ó Céfalo, disse eu. Mas, esta mesma, a
justiça, diremos assim simplesmente que ela consiste na verdade e em
restituir aquilo que se tomou de alguém, ou diremos antes que essas
mesmas coisas, umas vezes é justo, outras injusto fazê-las?”40

A recepção de Antígona parece-nos, então, integrar-se perfeitamente na


variante platônica do “caráter dos homens” que explicita o conflito entre as
diversas ordens de poder – o político e o religioso – narrado na tragédia, e
imporá na sequência do argumento de Céfalo e na compreensão socrática
dessa sequência uma nova variante da adynamía de Creonte em reconhecer
a díke e com ela preencher o vazio de seu “tò phroneîn”. E, se aqui podemos
entrever muitas das questões contidas no conflito da tragédia de Sófocles, o
mais surpreendente será a solução socrática ao inferir das palavras de Céfalo
o tema capaz de suplantar os efeitos do trágico: a busca da definição da
justiça e do justo, da dikaiosýne e tò díkaion.

40
  Pl., R. 331c 1-4.

85
(Página deixada propositadamente em branco)
Jean Cocteau e a filha de Édipo
(Jean Cocteau and Oedipus’ daughter)

Maria do Céu Fialho (mcfialhofluc@gmail.com)


Universidade de Coimbra

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_4

87
(Página deixada propositadamente em branco)
Jean Cocteau e a filha de Édipo

Resumo – A Antígona, da juventude de Cocteau, representa um programa de ac‑


tualização dos clássicos não isento de provocação. Reagindo contra as formais re‑
presentações da Comédie Française, Cocteau propõe um trabalho sobre o texto
dramático de modo a obter um texto ‘pobre’, reduzido ao nervo, no contexto final,
em cena, de um teatro total, em que o elemento musical e cénico (guarda-roupa)
apresentam igual peso no espectáculo. A polémica instalada com a representação
de Antígona teve a virtude de converter em questão do tempo, no rico e variado
panorama da França de início dos anos 20, ‘como actualizar os Clássicos’ – o que
viria a dar fruto, nos anos subsequentes, com propostas diversas de vários autores.
Também Cocteau, reflectindo sobre a sua própria experiência, passando por vivên‑
cias-limite, com a perda de Radiguet, o ópio, a proximidade e fascínio do ‘outro
lado do espelho’, do anjo da morte, parente dos anjos rilkeanos, aprofundou a sua
relação com os clássicos: o teatro grego e o mito passam a ser linguagem dessa sua
mundividência, num teatro original, onde se cruzam referências culturais várias,
a construir a grande metáfora dramática. Em La machine infernale, de inspiração
livre em Rei Édipo e tocada por Édipo em Colono, Édipo, cego, sai para o exílio, no
final da peça, acompanhado por duas vozes que se sobrepõem – a fantasmática,
de Jocasta, e a de Antígona, que só se faz ouvir neste final. Tudo se passa como se,
freudianamente, o ciclo de atracções incestuosas dos Labdácidas se perpetuasse.
Palavras-chave: Cocteau, Antígona, avant-garde, Picasso, Honegger, resistência
estética.

Abstract – Written in Cocteau’s youth, Antigone represents an intention to upda‑


te the Classics where provocation is not entirely absent. Reacting against the for‑
mality of performances within the framework of the Comédie Française, Cocteau
opts for a ‘poor’ text, reduced to its minimum. This controversial proposal raised
qustions in France on how best to update the Classics. Cocteau used his own per‑
sonal experience to deepen his relationship with classical texts. Greek theatre and
myth became incorporated into his own language.
Keywords: Cocteau, Antigone, avant-garde, Picasso, Honegger, aesthetic
resistence.

C’est tentant de photographier la Grèce en aéroplane. On lui découvre


un aspect tout neuf.
Ainsi j’ai voulu traduire Antigone. A vol d’oiseau de grandes beautés
disparaissent, d’autres surgissent; il se forme des rapprochements, des
blocs, des ombres, des angles, des reliefs inattendus.
Peut-être mon expérience est-elle un moyen de faire vivre les vieux
chefs-d’oeuvre. A force d’y habiter nous les contemplons distraitement,
mais parce que je survole un texte célèbre, chacun croit l’entendre pour
la première fois.

89
Maria do Céu Fialho

Estas palavras antecedem o texto da peça na sua publicação e cumprem


um duplo fim: por um lado, chamar a atenção do leitor para o tipo de texto
com que se vai defrontar – uma ‘tradução’, não uma reescrita livre –, por
outro lado, bem dentro do espírito de rebeldia provocatória de Cocteau,
elas deixam trair que não se trata de uma tradução fiel, mas de um texto
aplanado, empobrecido, com o fim de provocar uma experiência de novi‑
dade quanto à tragédia de Sófocles. As imagens de voo e de fotografia aérea
sugerem o distanciamento, o desprendimento do pormenor, mas a perspec‑
tiva de conjunto realçada. E é nessa perspectiva de conjunto, realçada pelo
distanciamento, que Cocteau procura resgatar o efeito de novidade.
Estamos na França de inícios dos anos vinte. A geração de jovens intelec‑
tuais do tempo, herdando essa sede de auto-afirmação, vinda da Europa de
fin de siècle e potenciada pela experiência de fim de época, correspondente
ao termo de uma guerra recente e mortífera, vive com intensidade e euforia
criadora, por vezes, um novo tempo, a que responde com propostas diver‑
sas: desde um neo-conservadorismo, a uma procura por novas formas de
expressão artística que rejeitam o realismo naturalista do século que findou
e que podem perseguir o sonho da forma em si, do absolutamente novo.
Estas formas cortam, provocatoriamente, com as amarras à referência do
real, dando primazia a um nihilismo de non-sense, rompendo com padrões
do estético compreensível, trocados pela manifestação iconoclasta gratui‑
ta, como o efémero mas ruidoso Dadaísmo de Tristan Tzara e de Francis
Picabia, ou alargando o sentido de ‘real’ aos possíveis do inconsciente oní‑
rico. Esta tendência percebe-se já nos anos de uma guerra desgastante, da
qual não vão, verdadeiramente, sair vencidos nem vencedores, mas uma
paisagem global de desgaste. Logo no ano subsequente ao Armistício o
Dadaísmo cria raízes em Paris (1919-1920).
De facto, o grupo da revista Littérature, fundada por André Breton e
Aragon, favoreceu, num primeiro tempo, a aproximação ao grupo de da‑
daístas, mas distanciou-se, num segundo tempo. A ruptura dá-se em 1922.
André Breton e o seu grupo, marcados pela valorização freudiana do oní‑
rico, entendem a função e a natureza da arte como algo mais profundo do
que a mera iconoclastia e o efeito de surpresa pelo choque e pela agressão
estética. Os fundadores de Littérature vieram, assim, a tornar-se nos men‑
tores do Surrealismo, cujo Manifesto é lançado por Breton em 19241. O
termo havia sido criado por Apollinaire (1917), no contexto da sua polémica

1
  Para os factores que contribuíram para o aparecimento do surrealismo, e a história
deste, veja-se Nadeau 1964.

90
Jean Cocteau e a filha de Édipo

peça Les Mamelles de Tirésias. A ele se deve a criação do termo ‘Cubismo’


para assinalar uma nova arte que pretende representar o movimento (1911).
Vai-se tornando cada vez mais evidente a convicção da capacidade ex‑
pressiva e da mediação gnosiológica da arte em relação ao transracional no
homem, em relação a esse universo inexplorado e inesgotável do inconscien‑
te onírico, bem como à “revelação de uma sobrerrealidade que não é anu‑
lação, mas expansão, potenciação e reinvenção mítico-fantástica do real”2.
Neste panorama artístico de uma Europa marcada pela proliferação de
–ismos, pela sua afirmação pública de grupo, por vezes violenta e provoca‑
tória, do seu ataque a preconceitos estéticos ou a padrões pré-estabelecidos,
frequentemente com a produção de escritos de afirmação de princípios, re‑
alçamos, em particular, o triângulo Paris-Munique-Viena, como um triân‑
gulo de atracção e interacção de jovens artistas da época, em busca de novas
formas, novas ideias e novas oportunidades de criação e reconhecimento.
O jovem Cocteau, por natureza e por vivência sua, desde cedo sentiu a
necessidade de criar rupturas e de buscar novos caminhos na criação artís‑
tica, e assim se deixou fascinar por alguns desses –ismos, a que aderiu bre‑
vemente, como o Dadaísmo (participou, em 1919 na Anthologie Dada), na
fase inicial de Littérature, para deles se desvincular, pois a rebeldia do seu es‑
pírito não era consentânea com estéticas de grupo. Assim, o distanciamento
do Dadaísmo, que tornava expectável um percurso que acompanhasse os
caminhos do Surrealismo: foi fugaz, essa adesão – o que lhe viria a valer
a animosidade dos surrealistas. Em 1919 Cocteau publica, também, uma
sua obra de exercício futurista: Cap de Bonne Espérance, após ter iniciado o
seu convívio com pintores cubistas, ao tempo em que cria o seu polémico
ballet-théâtre Parade.
Porém, esta sedução é breve. O seu espírito irrequieto, inquiridor, se‑
dento de aventura estética que o levará à inovação contínua, ganhará, nos
caminhos da ficção literária e depois no cinema, o perfil do solitário enfant
maudit, progressivamente demarcado de movimentos e de escolas, para se
afirmar no seu inconfundível individualismo. Em contrapartida, Cocteau
procura uma expressão de arte total, pelo que é levado a estreitas relações
interpoéticas com pintores, músicos, dançarinos do seu tempo. Com eles
busca a criação e encenação de um teatro total, em que o texto verbal não
tem primazia, mas recua, em função do relevo dado ao texto musical, core‑
ográfico, cenográfico.

2
  Aguiar e Silva, V. M., Enciclopédia Verbo, s. u. ‘Sobrerrealismo”.

91
Maria do Céu Fialho

Constante e progressivamente acentuada se verifica ser a sua procura,


iniciada nos movimentos a que aderiu, de uma verdade no transracional, no
onírico, expressa através de uma linguagem do insólito –a que o poeta-me‑
diador dá forma – já bem cedo visível em Le Potomak (1919)3. Esse mundo
oculto e presente para lá do visível, do quotidiano, vai-se identificando cada
vez mais com a teia em que os deuses tecem o destino do homem despreve‑
nido e que é, em última instância, a morte.
Factor catalisador desta face do universo poético de Cocteau é a experi‑
ência da morte que o toca através da perda do seu íntimo amigo Raimond
Radiguet, arrebatado, súbita e inesperadamente, em 1923, em plena juven‑
tude, a uma brilhante e promissora carreira literária4.
O início dos anos vinte representa, assim, uma época privilegiada para
este tipo de cruzamentos e sinergias poéticas. Encontram-se num mesmo
círculo de interrogações estéticas e de procura de novos efeitos, ou de recu‑
peração do clássico (no caso de alguns compositores), o jovem pintor espa‑
nhol Picasso, os músicos Satie, Honegger, Milhaud, o russo Stravinsky que,
deixou a sua Rússia, tal como Diaghilev. Este alcançou um êxito estron‑
doso em 1908, junto do público parisiense, ao apresentar uma temporada
de ópera russa, bem como de bailado, no ano subsequente. Seguidamente,
Diaghilev instala-se em Paris (1910) e funda os famosos Ballets Russes.
Trouxe consigo o admirável dançarino dos Ballets, destacado de toda a
companhia: o famoso e inesquecível Nijinsky. Para Diaghilev o efeito a que
aspira um bom espectáculo e uma boa coreografia traduz-se na máxima
“étonne-moi”5.
Ora Diaghilev, com os seus Ballets Russes, significa exactamente a al‑
ternativa radical ao teatro de texto. No trabalho conjunto Cocteau tem,
então, a possibilidade de fazer a experiência artística de construir um teatro
onde corta com todo o academismo e onde deixa que tome primazia a cor, o
movimento, o aspecto e o gesto das personagens – ou a ausência dele - , que
ora adquirem uma simbologia própria, ora não são mais do que aquilo que
parecem, sem possuir qualquer significado, apenas como mera estesia que

3
  “Ce livre marque une étape décisive dans le rapport de Cocteau à la littérature et à
l’art : il y a un avant et un après. Avant : des recueils de poèmes, des nouvelles, des pièces
inédites, des activités de presse, mais une perception frivole de la condition de l’artiste et de
sa vocation, organisée dans la continuité d’une vie mondaine pleine d’un « besoin de gloire,
de contagions et d’épidémies » (« Prospectus »). Après : une découverte des exigences de
l’art, une plongée dans les profondeurs”: http://cocteau.biu-montpellier.fr/index.php?id=7
4
  Sobre a figura de Radiguet veja-se Goesch 1955.
5
  Fialho 1991: 128-129.

92
Jean Cocteau e a filha de Édipo

envolve ou distancia, sem racionalidade, o espectador. Cocteau escreve a


Stravinsky comentando, precisamente, o que pensa sobre a linguagem ideal
da dança: “la danse ne doit signifier rien”.
Este fascínio pelo espectáculo total, por parte de Cocteau, terá, certa‑
mente, contribuído para o seu fascínio pelo teatro grego, em que ritmo, de
dança, de canto, de prosódia, formavam um só conjunto, dando vida ao
mythos representado. Esta relação com a tragédia grega redescoberta nas
suas dimensões totais incentivou também, decerto, o trilho de Cocteau por
um itinerário de busca e de construção de uma nova estética dramática que
o individualizará e que, se porventura abre novos caminhos à dramaturgia
moderna, não deixa, por outro lado, de significar uma revivescência de as‑
pectos peculiares e esquecidos da original concepção helénica de teatro6.
São estes os colaboradores que Cocteau procura, de preferência, já em
1912, no ballet-teatro Le dieu bleu. O libreto é seu, a música de Hahn
(pertencente ao Grupo dos Seis), a concepção coreográfica de Diaghilev e
Nijinsky interpreta7. O polémico ballet Parade, de 1917, cujo libretto é tam‑
bém de Cocteau, envolve a dupla Diaghilev-Nijinsky, com música de Satie
e guarda-roupa concebido por Picasso. De uma para outra peça é de notar
uma progressiva, ainda que não total, libertação de elementos orientalizan‑
tes, trazidos por Diaghilev e pela tradição dos Ballets Russes, no sentido
de uma sobriedade cénica que será flagrante em posteriores encenações e
em que prevalece a concisão plástica do elemento visual, concisão essa que
tende a impor-se à música e que domina o texto, no seu sentido restrito.
Esta concisão e simplificação está próxima do geometrismo das experi‑
ências cubistas da pintura. Note-se que é contemporânea da fase cubista de
Picasso. Este ideal de concisão de Cocteau, que passa a dominar o texto em
sentido restrito, vê-o Kautz precisamente como um impulso proveniente
do seu convívio com os pintores cubistas8. Assim se verificará mais tarde
na concepção e representação de novo ballet-teatro, em 1924, Le train bleu,
com libretto de Cocteau, música de Milhaud, cenários de Picasso e con‑
cepção coreográfica e interpretação respectivamente pela dupla Diaghilev-
Nijinsky. O guarda-roupa é de Coco Chanel.
Situamo-nos dois anos após a representação de Antigone, em que Cocteau
tinha trabalhado com Milhaud, com Picasso, autor dos cenários, como o

6
  P. Balmas, apud Kautz 1970: 25.
7
  Este trabalho de conjunto com Diaghilev vai até 1924, com a encenação de Le train
bleu, no Théâtre des Champs Élysées.
8
  Kautz 1970: 46.

93
Maria do Céu Fialho

será de La machine infernale, e guarda-roupa também de Chanel. No entan‑


to, isto não significa que Cocteau queira dar aos Clássicos um tratamento
não diferenciado do de temas originais.
Defende Kautz9 que teria sido esse ideal de concisão e “estética do
mínimo”10 o motivo do distanciamento operado em relação à música
‘fauvista’ de Stravinsky, primeiramente admirado, e a aproximação a Erik
Satie, “o contraponto positivo de Wagner, pela sua limpidezza”, ou a Darius
Milhaud, o anti-impressionista pertencente ao ‘Grupo dos Seis’. Com Auric
e Honegger (autor da música para Antigone), do mesmo ‘Grupo dos Seis’,
colaborou Cocteau também11. A ‘reconciliação estética’ com Stravinsky dá‑
-se com a colaboração em Oedipus Rex e testemunha uma cedência ou con‑
versão estética de Stravinsky aos ideais musicais de Cocteau.
Dois momentos fundamentais marcam o contacto com o mundo clás‑
sico na adolescência de Cocteau: ainda aluno do famoso liceu Condorcet,
Cocteau compõe La danse de Sophocle, evocando a famosa anedota vinda
da Antiguidade, de que Sófocles, adolescente, teria feito parte dos Coros
formados para celebrar Salamina. O conjunto de poemas foi lido por um
artista de renome, ao tempo, numa sessão poética. Esta escolha atesta que
Cocteau estava familiarizado com a cultura grega, certamente pela sua pró‑
pria formação académica, e se sentia fascinado por ela.
A tal não foi, certamente alheio também o convívio com Barrès, o
autor de Voyages en Grèce, que visita com frequência já na adolescência12.
Curiosamente, Barrès é uma das figuras mais hostilizadas pelos vanguar‑

9
  1970: 38 sqq.
10
  Definição dada em Le Potomak, 12. Nessa condensação, que não pretende ser
simplificação, lê Kautz 1970: 31 sqq. a influência simbolista de Verlaine e Apollinaire.
11
  Milhaud foi autor da música para o mimo Le boeuf sur le toît, representado em
1920 no Théâtre des Champs Élysées, Auric compôs o Hino Real para o filme de Cocteau,
L’aigle à deux têtes. Foi também sobre música de Auric que Cocteau criou o bailado Fedra,
posto em cena na Ópera de Paris, em Junho de 1950.
12
  Visites à M. Barrès. Esta ligação a uma das figuras mais hostilizadas pelo vanguar‑
dismo estético da época – a ponto de o grupo de Breton ter encenado o seu julgamento
público (Nadeau 1964: 28-31) denuncia já (ou motiva?) a fricção entre Cocteau e os surre‑
alistas. É sintomático que a edição de Antigone abra com uma citação de Barrès a propósito
da filha de Édipo, Estas palavras de Barrès, extraídas de Voyage à Sparte, compreendem-se
se tivermos em conta a tensão e o fascínio exercido pela figura de Antígona, por ele compre‑
endida sob influência hegeliana, como seria de esperar, e a consciência de que o paradigma
de Antígona pode representar a ruína de toda a ordem de Estado: “...que je cède au prestige
d’Antigone, il n’y a plus de société...”: apud Fraisse 1974: 111. Sobre Antígona em Barrès,
Fraisse 1974: 111-112.

94
Jean Cocteau e a filha de Édipo

dismos literários da época – o que atesta as relações sui generis de Cocteau


com a vanguarda. E desta influência, ou admiração, nos dá sinal a citação
de Barrès, sobre Antígona, no pórtico da edição da peça de Cocteau: “Je
pleure Antigone et la laisse périr. C’est que je ne suis pas un poète. Que les
poètes recueillent Antigone. Voilà le rôle bienfaisant de ces êtres amoraux”.
O outro dos momentos tem que ver com uma representação de Antígona
na Comédie Française. Imagina-se uma representação padronizada, que
impressionou fortemente o jovem pela negativa. Ele confessa que o aca‑
demismo preponderava na representação, formal e sem novidade, em que,
nota com ironia, a idade da actriz que representava o papel de Antígona
tornava natural a sua descida ao Hades13.
Percebe-se, assim, que a proposta de Cocteau representa uma reacção
contra este tratamento dos clássicos, mediante uma estratégia de provoca‑
ção que consiste em suscitar a experiência de novidade através do corte com
esta tradição cristalizada, reduzindo o texto ao seu nervo, empobrecido,
condensado, a partir de uma tradução anteriormente feita ou trabalhada
pelo próprio Cocteau, juntamente com Rei Édipo14 .
A figuração e interpretação do Coro é reduzida a uma voz que, seca‑
mente, converte num curto texto narrativo odes que Sófocles havia mar‑
cado pela amplificação da expressão de sentimentos, como a do alívio e
júbilo pela vitória, traduzidos, no párodo, por uma saudação ao sol do dia
que nasce, como um novo dia de esperança para Tebas (100-161). Pode-se
apreciar o tratamento de Cocteau, vertido para escassas linhas, comparado
com Sófocles:

Les Argiens ont fui à toutes jambes sous ton oeil fou, soleil! Ils étaient
venus aux trousses de Polynice et de ses vagues prétentions. Jupiter
deteste la vantardise. Il a frappé de sa foudre les panaches et les armu‑
res d’orgueil. Les sept chefs qui marchaient contre nos sept portes ont
abandonné leurs armes. Il n’en reste sur place que deux frères ennemis.
Maintenant la victoire est assise dans Thèbes. Le peuple chante. Mais
voici Créon, notre nouveau roi.

13
  Sobre a tradição de fortes contenciosos entre escritores românticos (Victor Hugo,
Dumas, Delavigne) e a Comédie Française. Vide Ubersfeld 1974: 290 sqq.
14
  Na definição de Flashar 2000: 78: “Gänzlich unberührt von Problemen der poli‑
tischen Aktualität war dann die Antigone von Jean Cocteau (1922), die in anatomischer
Reduktion das Knochengerüst der Dichtung aus der Vogelperspektive in konzentrierter
Monumentalität hervortreten lässt, in nüchterner, wie gemeisselt wirkender Prosa”.

95
Maria do Céu Fialho

E a título de exemplo, se verifica o mesmo método de aplainar o texto,


extirpando-lhe o elemento poético, na intervenção do Coro, corresponden‑
te ao famoso estásimo I. Canta o Coro de Anciãos de Tebas em Sófocles
(Antígona, 332-383):

Muita coisa há que provoca assombro, nenhuma, porém, mais assom‑


brosa que o homem. Ele navega sobre o mar cinzento, enfrentando
o vento sul e a tempestade, e avança sob a força e o abismo de altas
vagas. É ele quem castiga a deusa de entre os deuses mais augusta – a
Terra, eterna, infatigável, que rasga, com seus arados, ano após ano,
sem cessar, trabalhando-a com a raça dos cavalos.

E à tribo das aves incautas, à estirpe das feras, à fauna marinha, a côn‑
cava rede lhes deita e as prende o homem, com seu engenho apurado. Ele
caça, com as suas artes, a fera selvagem que nos montes habita. Domina
o cavalo de longas crinas e o jugo lhe lança. Vence o touro indomável das
montanhas.

A fala e o pensar, ligeiro como o vento, o sentido regulador da ci‑


dade por si aprendeu, e a agreste geada do céu e os dardos da chuva
inclemente ele evita, de tudo capaz. Incapaz não avança para o que
há-de vir. Ao Hades somente não logra escapar. Porém, para doenças
implacáveis os meios de as superar já ponderou.

Engenhoso saber possui, para além das expectativas, com que ora toma
caminho para o mal, ora para o bem. Se da terra preza as leis e é fiel aos
compromissos com a justiça dos deuses, a cidade enaltece, mas a cidade
destrói quem por audácia se envolve no crime. Longe de meu lar se mante‑
nha e longe dos que pensam como eu aquele que assim se comportar.

Eis a réplica de Cocteau:

L’homme est innouï. L’homme navigue, l’homme laboure, l’homme


chasse, l’homme pêhe. Il dompte les chevaux. Il pense. Il parle. Il
invente des codes, il se chauffe e til couvre sa maison. Il échappe aux
maladies. La morte st la seule maladie qu’il ne guérisse pas. Il fait le
bien et le mal. Il est un brave homem s’il écoute les lois du ciel et de la
terre, mais il cesse de l’être s’il ne les écoute plus. Que jamais un cri‑
minel ne soit mon hôte. Dieux, quel prodige étrange! C’est incroyable,

96
Jean Cocteau e a filha de Édipo

mais c’est vrai. N’est-ce pas Antigone? Antigone! Antigone! Aurais-tu


désobéi? Aurais-tu été assez folle pour te perdre!

O espanto pelo prodígio algo assustador que é o homem, dado pelo ambí‑
guo δεινά grego, no início da ode, é reduzido a mera e seca afirmação, segui‑
da do elenco de todas as potencialidades humanas, cujo limite é a morte. O
mesmo desejo de manter afastados os criminosos é expresso mas, ao contrário
da ambiguidade do estásimo grego, que deixa no ar, inclusive, a hipótese de
que uma divindade tenha tido intervenção na tentativa de funeral de Polinices,
como uma censura velada ao édito de Creonte, apressa-se aqui a suspeita sobre
Antígona, acelerando e estreitando o fluxo da tragédia, como se as personagens
estivessem vinculadas, desde cedo, à acção que lhe conhecemos e o caminho de
Antígona já previamente indicado. No original grego a referência a Antígona é
feita após o Coro terminar de entoar a ode, em anapestos, como expressão de
espanto ao ver Antígona chegar, escoltada pelo Guarda (375 sqq.).
De igual modo, a rhesis inaugural de Creonte como governante, longa,
auto-justificativa das medidas tomadas, doutrinária e impositiva (162-214)
é condensada num discurso bem mais breve, cujos tópicos se mantêm, in‑
cluindo o da nau de estado, em que os traços do tirano são preservados
secamente, seguida de um diálogo quase telegramático com o Coro. A en‑
trada do Guarda, ainda que a personagem mantenha a atitude de receio,
reiterando a sua inocência, perde o efeito tipicamente sofocliano do trata‑
mento destas figuras secundárias, de estrato social inferior, que chegam,
portadoras de notícias pelas quais almejam alcançar algum lucro.
Nesta proposta de texto trágico condensado e aplanado, fica a pergunta:
Cocteau apenas se limitou a essa redução, para um espectáculo compen‑
sado por outros suportes textuais, como o musical, o cenográfico? Muito
subtilmente, Cocteau introduz breves elementos que, todavia, marcam uma
leitura, o perfil de Antígona e o sentido da acção: no diálogo entre Creonte
e o Guarda, após saber-se que alguém tentou dar sepultura a Polinices, o
Coro intervém, a medo, sugerindo que talvez se trate de “obra dos deuses”,
(“Senhor, há tempo que o meu espírito se interroga: acaso este feito não terá
tido origem nos deuses?” 278-279):

Prince, je me demande si ce n’est pas une machine des dieux.

Pela primeira vez nos aparece, ainda que com sentido dúbio, a expressão
‘machine des dieux’, que não pode deixar de nos remeter para a posterior
Machine infernale.

97
Maria do Céu Fialho

É de Cocteau a resposta determinada de Hémon a Creonte, conver‑


tendo em determinação de Hémon o que em Sófocles é ordem irada de
Creonte (“ deixa que ela vá desposar alguém lá no Hades”, 654). Cocteau
cruza as palavras de Creonte com o comentário do Mensageiro no êxodo da
peça sofocliana, ao relatar a morte de Antígona e o suicídio desesperado de
Hémon, ao seu cadáver enlaçado (“e ele jazia, um corpo enlaçado a outro,
depois de ter cumprido, o desditoso, os ritos nupciais na mansão do Hades”,
1240-1241):

Je l’épouserai donc la morte aux enfers.

No derradeiro diálogo, de despedida da vida, entre Antígona e o Coro,


Cocteau inova, reduzindo e amplificando, simultaneamente, uma das in‑
tervenções do Coro sofocliano (817-822). Comparem-se ambas as interven‑
ções, a de Sófocles e a de Cocteau:

Famosa e coberta de elogios tu partes para o trilho dos mortos, sem


que a doença te atingisse e consumisse, ou das espadas o salário te
coubesse, mas por tuas próprias leis, única entre os mortais, descerás
viva ao reino do Hades.

Tu mourras donc sans être malade, sans blessure. Libre, vierge, vivan‑
te, célèbre entre les mortes, tu entreras chez Pluton.

E Antígona justifica a sua morte em termos não sofoclianos, numa breve


fala da responsabilidade de Cocteau, que assim trabalha a manifestação do
desejo da protagonista de se juntar aos seus no Hades – aliás, a Plutão, já
que os deuses gregos aparecem latinizados:

Je suis une fille de l’inceste. Voilà pourquoi je meurs.

As núpcias no Hades ganham forma na supressão de versos do


Mensageiro que, sucintamente, anuncia:

Hémon s’est suicidé.

Como se viu, a ideia havia sido antecipada para sublinhar a raiva nas
palavras de Creonte a Hémon. Só posteriormente o relato é feito a pedido
de Euridice e assim concluído:

98
Jean Cocteau e a filha de Édipo

Ils s’épousent là dans la mort et le sang répandu.

Muitos poderiam ser os exemplos desta contenção em que, subtilmente,


Cocteau sublinha a associação núpcias/morte e o peso de um destino marca‑
do pelo incesto, um incesto que apela e atrai, a partir do mundo dos mortos.
A peça Antígona desprende-se, nesta versão descarnada, em que sub‑
tilmente se realçam traços não marcados no original, das leituras que a
tradição dela fez: a de mártir romântica de todas as resistências, ou a de
representante de uma das forças em conflito, de que o outro pólo é Creonte:
direito natural/direito positivo. É, de facto, uma Antígona livre, virgem e
célebre, quanto ao peso rotineiro e formalizante de representações, ou de re‑
leituras e apropriações oficiais, que Cocteau faz descer ao Hades, mas uma
Antígona, ao mesmo tempo, presa ao seu papel de filha de Édipo, que lhe
determina o rumo como um destino, quiçá determinado por uma primeira
sombra da ‘máquina dos deuses’.
Despolitizada Antígona, que sentido pode ter sido acolhido pela censura
aos anarquistas, duas vezes feita por Creonte na versão de Cocteau? Ambas
se situam no confronto Creonte-Hémon. A primeira vem numa sequência
que corresponde ao original (anarchia, 672), no contexto de uma rhesis em
que Creonte faz a apologia da obediência política e dos filhos de gover‑
nantes obedientes a seus pais e à ordem da cidade, por oposição àqueles
que cultivam a maior de todas as calamidades: a anarquia. Trata-se de um
tópico comum no discurso do tirano trágico, usado já no original, como
se vê. Mas Cocteau resume a rhesis, operando um salto de raciocínio com
linguagem do seu tempo:

Il n’y a pas de plus grande plaie que l’anarchie....Et si l’anarchiste est


une femme, c’est le comble.

A segunda referência, na mesma cena, situa-se pouco depois e, em boa


verdade, pode representar uma proposta aceitável para o original (ἔργον
γάρ ἐστι τοὺς ἀκοσμοῦντας σέβειν- «E as acções consistem em prestar
honras aos infractores da ordem?», 730), mas a insistência do Creonte de
Cocteau no anarquismo parece ter um objectivo:

C’est donc bien agir que de louer les anarchistes.

O Partido Anarquista Russo, perseguido por ordem de Trotsky desde


1918, reúne-se em Berlim, em 1922, após a sua expulsão da Rússia. Funda

99
Maria do Céu Fialho

a Associação Internacional dos Trabalhadores e aprova, simultaneamente,


uma declaração de princípios anarco-sindicalista. Torna-se, pois, uma refe‑
rência. Mas não é, certamente, este anarquismo que Cocteau tem em men‑
te, mas um “anarquismo estético”, com o qual o próprio autor se identifica,
rejeitando ditaduras estéticas de grupos da época15. Percebe-o o chefe de fila
do Surrealismo, André Breton, que, na terceira noite de representação, reage
violentamente nesta cena, dando azo a uma violenta troca de palavras entre
os surrealistas, sentados na assistência, e Cocteau, que interpretava a voz do
Coro, através de um megafone.
De resto, este timbre metálico, intemporal, distante e impessoal é dado
através da concepção do espectáculo. Para além desta opção de Coro, as
personagens proferem as suas falas com uma articulação marcada, mas
inexpressiva. Grandes actores da época, como Charles Dulllin em Creonte
e Antonin Artaud em Tirésias, fizeram parte do elenco. Fez também parte
uma jovem bailarina grega a quem a peça é dedicada – Génica Atanasiou –
que mal sabia francês e aprendeu de cor a fonética das suas falas, soletradas.
Assim cumpria Cocteau o que defendia numa sua carta a André Gide:
“Enlever une patine et montrer les couleurs fraîches fait croire au public
qu’on lui montre le plus absurde chromo”. Eis o efeito de novo. E tal efei‑
to, à imagem das experiências teatrais anteriores, explorou a concepção de
espectáculo total, de apelo aos sentidos pela cor, pela música, pelo movi‑
mento, ainda que marcados pela sobriedade. O cenário é de Picasso16: a
traços largos, testemunha quem assistiu, Picasso sugeriu colunas gregas e
deu-lhes relevo. Esboçando, entre as colunas, cabeças humanas. A música
é de Honegger e o guarda-roupa de Gabrielle Chanel: túnicas rústicas de
lã branca, vestida sobre apertados fatos de malha preta. Os actores usavam
uma estranha máscara similar à de esgrima, de modo que todo o grupo
assumia o aspecto de uma estranha tribo.
A peça esteve em cena três meses, com forte afluência, ainda que estives‑
se longe de ser um sucesso– muito provavelmente a afluência ficou a dever‑
-se, segundo o actor Dullin, à curiosidade por disfrutar da tríade Picasso-
Chanel-Honegger; além disso, o mesmo bilhete dava acesso a esta e a uma
peça de Ezra Pound. No entanto, Antigone teve a virtude de provocar um

15
  Steegmuller 1969: 292 sqq. apresenta uma reconstituição de todos os preparativos
para a estreia da peça, a partir de testemunhos vários, bem como dos incidentes decorridos
durante a representação.
16
  Para a intensa atividade artística de Picasso como pintor de cenários, à época, vide
Cooper 1967.

100
Jean Cocteau e a filha de Édipo

aceso debate sobre o modo como actualizar os Clássicos, sobretudo entre


Cocteau e Gide17. E, porventura na sequência desse debate, aconteceu, nas
duas décadas seguintes, uma onda de reescritas, em França, ou de escrita
inspirada em motivos da mitologia grega, caracterizadas por uma criativi‑
dade de grande qualidade18.
De Antigone fica uma sensação de mal-estar que há-de ser dramatur‑
gicamente recolhida e trabalhada (Anouilh). Quanto a Cocteau, por seu
turno, uma experiência de perda na morte do jovem Radiguet, que lhe
era tão próximo, leva-lo-á a uma vivência dessa morte por dentro da sua
vida que, sob o estímulo do ópio, sente como a paredes-meias com o outro
lado de um mistério, o outro lado de um espelho que os privilegiados, ou
os anjos da morte atravessam. Refeito desta fase crítica, Cocteau mantém
no seu imaginário e vive na sua sensibilidade essa quase física percepção de
uma morte companheira do quotidiano (a que não é alheia a influência dos
anjos rilkeanos) e representante de um divino que, tarde ou cedo, aniquilará
o homem, mediante um mecanismo que, lentamente, o prenderá.
Duas referências mitológicas dão expressão a este mundo: Orfeu e
Édipo. Édipo surge de novo, na linha de uma contenção cada vez mais
óbvia mas em outra direcção que não a de Antigone: Cocteau recupera o
contexto de sagrado do teatro grego. Tem a sua estreia em 1927, no Teatro
Sarah Bernard, Oedipus rex, uma “ópera-oratório” de Igor Stravinsky para
orquestra, solistas e coral masculino, estático. O libretto foi escrito por Jean
Cocteau e traduzido para latim por um jovem seminarista, aquele que viria
a ser o conhecido teólogo Jean Daniélou. A música de Stravinsky constitui
um exemplo do neoclassicismo.
As marcas desta ópera-oratório estão bem visíveis em La machine infer-
nale, estreada em 1934:

Regarde, spectateur, remontèe à bloc, de telle sorte que le ressort se


déroule avec lenteur tout long d’une vie humaine, une des plus parfai‑
tes machines construites par les dieux infernaux pour l’anéantissement
mathématique d’un mortel.

17
  A peça merece, pois, um juízo mais atento que o da referência de Steiner (1984) 69:
“Cocteau’s pallid, idiomatic...adaptation of Sophocles”. Também Guicharnaud 1969: 325
alude à peça em termos semelhantes.
18
  E. g.: Gide, Oedipe Roi; Giraudoux, Électre, Amphytrion 38, La guerre de Troie
n’aura pas lieu; Sartre, Les Mouches, Jean Anouilh, Antigone, Médée.

101
Maria do Céu Fialho

A Voz continua, em La machine infernale, a ser interpretada por Jean


Cocteau, como se o seu conhecimento de espectador supremo se elevasse
acima da acção. O destino é o de Jocasta e de Édipo, agora na plenitude
de uma reescrita livre, sarcástica, fortemente marcada por Freud e de uma
genial originalidade. Após o seu suicídio e a cegueira infligida por Édipo a
si mesmo, uma vez reconhecida a sua identidade, Jocasta torna-se-lhe visí‑
vel, não como fantasma de esposa, mas de mãe, como se os olhos do cego
se tivessem lavado.
E a filha de Édipo? No momento em que Édipo abandona Tebas para a
sua vida de exílio errante, Antígona aparece, insistindo em acompanhá-lo,
contra a vontade de Creonte. E assim o faz, até desaparecerem ambos de
cena, descendo os degraus. Antígona serve de guia a Édipo, contando os
degraus mas, num golpe de genial criatividade, Cocteau deixa que no final
desta peça ecoem, sobrepostas, a voz da mãe e da filha de Édipo, como se o
ciclo do espírito de incesto se fechasse.
Afinal, como disse Antígona na peça homónima, é por ser filha desse
incesto que a morte a chama, a reunir-se ao seu sangue, do outro lado do
espelho.
O eco de uma Antígona presa, desde o primeiro momento, ao seu papel,
por uma espécie de determinismo mitológico que a faz pronunciar quase
mecanicamente as suas falas, conforme Cocteau nos faz sentir na sua pro‑
tagonista, virá a ser sensível numa das melhores Antígonas do séc. XX: a de
Jean Anouilh.
O autor das Pièces Noires dá, no entanto, uma outra dimensão, de
admirável valor estético-dramático, a essa Antígona que existe para poder
caminhar até à morte e desempenhar, como um destino inalienável, o seu
jogo dramático.
Não é já de terror e compaixão a resposta do público de Anouilh à sua
peça. Conforme Aristóteles o preconizava, mas de um profundo mal-estar,
propositada e genialmente suscitados pelo autor. Um mal-estar desconcer‑
tante que levou os críticos de Anouilh a posições tão diversas e que nasce,
pensamos, da profunda lucidez, sem ilusões nem esperanças, com que as
personagens principais desta nova Antigone vivem o seu papel milenário,
para além de qualquer sentido dos seus actos.
E este efeito sobre o público, tão peculiar à criação dramática de Anouilh,
leva-nos a reflectir se acaso não terá, na sua génese, como recurso dramáti‑
co, uma centelha de influência de um outro mal-estar, provocado por uma
oura Antígona e nascido de uma representação feita exactamente vinte anos
antes, no mesmo espaço teatral: a de Cocteau.

102
Jean Cocteau e a filha de Édipo

Se essa outra Antigone de 1922, como proposta de “survoler les classi‑


ques” se manifestou um voo de limitado fôlego, teve a virtude de pôr em
dia, ainda que de modo polémico, como seria de esperar de Cocteau, a ne‑
cessidade de uma reflexão sobre os modos diversificados de diálogo com os
clássicos: será verdade que “la patine est la recompense des chefs-d’oeuvre”,
como contrapõe Gide (Journal, le 16 Janvier 1923) ao propósito de Cocteau
de remover essa ‘patine’?
O que é certo é que, na sequência desta viva polémica, se assiste a uma
motivação renovada para reescrever o teatro grego, do próprio Cocteau a
Gide, Giraudoux, mais tarde Sartre e Jean Anouilh19.

19
  Hamburger 19684.

103
(Página deixada propositadamente em branco)
Las Antígonas de Espriu
(Espriu’s Antigone(s))

Carmen Morenilla Talens (carmen.morenilla@uv.es)


Universidad de Valencia (España)

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_5

105
(Página deixada propositadamente em branco)
Las Antígonas de Espriu

Resumen – En marzo de 1939 Espriu escribe una Antígona comprometida ideoló‑


gicamente, en la que aboga por una superación del conflicto que desembocó en la
guerra. En las diversas ediciones la obra ha sufrido constantes revisiones; la 2ª vio
la luz en 1969, tras haber sufrido antes varias modificaciones. Es esta segunda la
que es conocida como la Antígona de Espriu, pero la comparación con la 1ª permite
desvelar los fines que el autor buscaba en cada momento.
Palabras clave: Antígona de Sófocles, Antígona de Espriu, adaptaciones y con‑
texto social.

Abstract – In March of 1939 Salvador Espriu wrote his Antigone in which the
heroine had a firm ideological commitment. In this play Espriu advocates for over‑
coming the conflict that leads to Civil War. The play was constantly revised by
Espriu himself: The second edition was published in 1969. Traditionally this se‑
cond edition is considered as Espriu’s Antigone, neverthless the contrast between
the first edition and the second edition might suggest the aim of Espriu at the
moment of writing.
Keywords: Sophocles’ Antigone, Espriu’s Antigone, refiguration and social context.

Desde que Sófocles creara el personaje, Antígona ha sido objeto de ad‑


miración, de lo que ha dado buena muestra el congreso “Antígona – a eterna
sedução da filha da Édipo” y la exposición de libros que se ha preparado
con tal motivo, congreso y exposición en los que se han estudiado y pre‑
sentado un buen número de recreaciones así como de ediciones de diversas
Antígonas pensadas para públicos diferentes. Una admiración por la figura
de Antígona que la ha convertido en uno de los personajes más veces recre‑
ados, incluso durante el periodo en el que no fue el teatro el género de refe‑
rencia de la cultura clásica, y ello gracias a su también destacada presencia
en la Tebaida de Estacio, obra que tuvo una gran influencia durante la Edad
Media. El teatro vuelve a ser el referente primero con el Renacimiento,
cuando se redescubre la tragedia griega. Desde ese momento hasta el actual
se ha venido recreando la figura de Antígona en obras de todo tipo, in‑
cluyendo las paródicas: desde las que la utilizan para mostrar conflictos de
sucesión dinástica, problemas religiosos o étnicos, lucha social o de género,
hasta otras en las que se crean nuevos personajes y tramas secundarias con
intrigas amorosas para adecuarlas al gusto de un público noble y eliminar
las lecturas políticas.
La recreación de figuras del mundo clásico y en particular de Antígona
logró un renovado impulso a partir del siglo XIX, cuando la difusión de las
traducciones de las tragedias a las lenguas vernáculas, unida al proceso de

107
Carmen Morenilla Talens

reteatralización, de repristinación del teatro, que lleva a los dramaturgos a


buscar las formas primigenias del drama, hace que los autores pongan sus
ojos en las tragedias griegas, ahora más accesibles para los no conocedores
del texto en su lengua original. A partir de este momento la tragedia de
Sófocles se convirtió en el referente casi exclusivo del personaje que nos ocu‑
pa, al que se han ido sumando algunas exitosas adaptaciones, como la de
Anouilh o la de Brecht, que funcionan como referentes secundarios, en oca‑
siones también como los primeros. En todas estas recreaciones, con escasas
excepciones, se ha dotado a la obra de un fuerte contenido socio-político, lo
que, por otra parte, ya era un componente esencial de la primera tragedia
sobre este personaje, la de Sófocles.
Aquí queremos ocuparnos de una recreación especial, la que realiza
Salvador Espriu, que, como es habitual en el quehacer literario de este au‑
tor, fue objeto de varios cambios sucesivos, algunos de ellos de relevancia y
que afectan a la concepción general de la obra. Para valorar correctamente
la decisión de Espriu de recrear la tragedia Sófocles debe tenerse en cuenta
que los precedentes hispanos son escasos, entre los que cabe destacar La des-
trucción de Tebas (1722) de Antonio de Zamora, de la que poco se sabe y que
al parecer también tomaba parte de su argumento de Antígona de Sófocles;
aún menos se sabe de Historia de la Nueva Antígona. Dedicada a la Reyna
Nuestra Señora Doña María Isabel de Braganza de Luis Fris Ducós, publi‑
cada en Madrid en 1817, sólo unos años antes de que viese la luz Antígona y
Hemón de Pedro Montengón y Paret, publicada en el exilio,1 de la podemos
decir algo más.
Montengón vive en una España convulsa, que lo lleva al exilio en 1767.
En 1820 publica en Nápoles un volumen de obras dramáticas, que incluye
Agamenón, Egisto y Clitemnestra, Edipo y esta Antígona y Hemón, obras que
durante años pasaron por traducciones de las tragedias de Sófocles. Como
es habitual en esta época, en la que no son sólo las tragedias griegas la fuente
de las recreaciones, Antígona y Hemón desarrolla una intriga amorosa que en
este caso muestra una clara influencia de Higino, en la que la prohibición
de honras fúnebres a Polinices está en el trasfondo. Esta intriga es utilizada
por Montengón con el fin de mostrar aspectos de la sociedad que a él le
interesan y que fueron causa de su exilio, en especial los relacionados con la

1
  A este respecto, cf. Bañuls & Morenilla 2008: 73-87 y Cerezo Magán 2011: 175-
225. Para un estudio en profundidad de la fortuna de Antígona, cf. Bañuls & Crespo 2008.

108
Las Antígonas de Espriu

educación y en general la situación de las mujeres, así como con la búsqueda


de la felicidad en una sociedad más justa y solidaria.2
La renovación del teatro en España y la influencia de las vanguardias eu‑
ropeas llevó a la experimentación también sobre la escena, tal es el caso de la
obra del reputado poeta catalán Guillem Colom Antígona. Poema dramàtic
(1935),3 pues, como indica el propio autor en el prefacio, esta obra de juven‑
tud, más que un intento de adaptación escénica de la tragedia de Sófocles,
es un ensayo de realización del teatro clásico según los cánones teatrales de
la época, siendo consciente de que: “en nom d’una estètica restringida o d’
un purisme a ultrança, se’ns volgués fer el retret d’innovadors temeraris”
(p. 7). En este esclarecedor prefacio explica Colom los principios que han
regido su propuesta poética, comenzando por el desenlace armónico que
sustituye a la catástrofe de la tragedia griega, como anuncio de la nueva
moral cristiana que inspira muchas de las modificaciones introducidas y
que convierten la tragedia griega en un melodrama romántico y cristiano.
Es el caso de la eliminación del ciego adivino Tiresias y de Eurídice, cuyo
suicidio no era aceptable, como tampoco lo era el de Antígona.
Como rasgo más sobresaliente, para lo que aquí nos interesa, se ha evi‑
tado el suicidio de Antígona, como ya hiciera Pierre-Simón Ballanche en su
Antigone, evitando enturbiar desde una visión cristiana la percepción positi‑
va de la heroína. Antígona simplemente muere en brazos de su novio, lo que
permite caracterizarla como mártir: como Cristo, una vez ha cumplido su
misión en este mundo, debe morir. Es la encarnación de la Piedad, que tiene
en su enamorado Hemón un fiel compañero y colaborador, un Hemón que
cobra una importancia decisiva en el desarrollo argumental de esta obra. El
planteamiento de la obra, en la que se ha ampliado la peripecia incorporan‑
do elementos de Siete contra Tebas de Esquilo y Fenicias de Eurípides, y en
la que el Coro de Ancianos sólo es un aglutinante colectivo, posibilitó que
fuese estrenada en el Teatro Romea de Barcelona, el 7 de Junio de 1951,

2
  La obra más conocida de Montengón es Eudoxia, hija de Belisario (1793), reiterada‑
mente reeditada (por ejemplo por la Generalitat Valenciana en 2005). Cuenta los amores
de Eudoxia con Maximio y está llena de discursos sobre el derecho de las mujeres a recibir
educación en igualdad con los hombres. Montengón defiende que las mujeres tienen igual
capacidad que los hombres, en explícita oposición al Emilio de Rosseau [1762], quien en el
libro V indica que la educación que reciban las mujeres debe ser sólo la necesaria para que
estén al servicio del hombre.
3
  Publicada en Barcelona con ilustraciones de Bracons-Duplessis. Para una panorá‑
mica de las Antígonas catalanas, cf. Bosch 1980: 93-111, en concreto sobre la obra de G.
Colom 95s. y Ragué Arias 1989: 39-41.

109
Carmen Morenilla Talens

durante la Dictadura, por la compañía titular del teatro. Con motivo de este
estreno la obra adquirió unas connotaciones políticas a las que había sido
ajena su génesis: la aclamación de Hemón por el pueblo y la destitución de
un Creón que llega a plantearse matar a su propio hijo, fue interpretada en
clave española.
La Guerra Civil marca una división fundamental en lo que afecta a
la cultura española. En el filo mismo del final de la guerra, finalizada en
Barcelona, en marzo de 1939, Salvador Espriu escribe una Antígona com‑
prometida ideológicamente, en la que aboga por una superación del conflic‑
to que desembocó en la guerra, del enfrentamiento civil y el establecimiento
de una paz social que aúne al pueblo, como bien señalaba el propio Espriu
en una entrevista con Salvador Gubert en 1965: “Antígona la escribí inme‑
diatamente después de finalizar la guerra civil (...) Era una obra que trataba
de superar el espíritu de guerra civil, sus oposiciones y odios”.4
Pero más allá de las intenciones expresas de Espriu, a las que, como en
el caso de cualquier otro autor, hay que dar sólo un crédito relativo, esta
misma lectura se desprende del texto, como bien indicaba José Mª Castellet:
Las trágicas experiencias de aquellos días se infiltran en las actitudes y
palabras de los personajes y les dan una dimensión “histórica” de grandes
proporciones. Por la época y el lugar, por los planteamientos. El tema cen‑
tral es la lucha fratricida de Eteocles y Polinices, que no traduce sino la real
que desgarra al autor y, con él, a toda España. (...) Así, el mito no es sino
el instrumento de que se sirve Espriu para destacar el horror de la guerra
civil. (...) En realidad, la fuerza trágica de la obra nace del hecho de que el
vencedor se haya negado a conceder el perdón al vencido: Polinices. (...)
Pese a todo, no hay críticas violentas ni dramatismos bruscos: hay sólo un
patetismo trágico y densamente humano. Un deseo de paz y concordia, de

4
  Entrevista con Gubern, 1965:14; este número de la revista Primer Acto recoge
varios artículos sobre Salvador Espriu con motivo de la primera puesta en escena de esta
Antígona. Los trabajos dedicados a estudiar la obra de Salvador Espriu son muy numerosos,
tanto en ámbito catalanohablante como fuera. Sus recreaciones dramáticas, en particular
este Antígona, son leídas incluso en las aulas de enseñanza secundaria en las asignaturas
de lengua y cultura catalana, por lo que pueden encontrarse numerosas páginas web, con
fines didácticos o sin ellos, en los que se explica el argumento, las fuentes, etc., así como
numerosos artículos dedicados a este reconocido autor. Nuestra intención aquí no es en
absoluto hacer un estado de la cuestión de la investigación que sobre ella se ha realizado,
sino aportar algunas ideas nuevas desde la perspectiva de la filología clásica, en las que
se pueda ver con mayor claridad la evolución de esta recreación en el conjunto de la obra
literaria de Espriu. Por lo que hace en concreto a la presencia del mundo clásico en Espriu,
tema también muy estudiado, remitimos a Miralles 1979: 29-48.

110
Las Antígonas de Espriu

perdón. Antígona, hermana de los dos príncipes en lucha, fuerte en su amor


desesperado es quien lo materializa. (...) Muere, si, condenada por las duras
leyes del nuevo rey, Creonte, pero su muerte es un ejemplo. El ejemplo que,
en días negros y turbulentos, proponía Espriu para restañar las crueles he‑
ridas de la guerra.5
Se trata, pues, de una obra que podríamos denominar “de urgencia”, con
la que el autor hace una llamada esperanzada a una reconciliación posible,
pero que muy pronto y de modo extremadamente cruel el tiempo demostra‑
rá que los vencedores no estaban dispuestos a llevar a cabo.
Desde el punto de vista literario también en esta obra podemos ver una
de las características más evidentes de la escritura de Espriu: el reiterado tra‑
tamiento de un mismo tema en obras diferentes y la reescritura de la misma
obra en versiones que con frecuencia se apartan mucho de la primera.6 La
obra fue escrita en 1939; en 1947 escribe un prólogo para la que parece que
va a ser su primera edición, pero que no verá la luz hasta 1955 en Ed. Moll
(Palma de Mallorca)7 y en las diversas ediciones hechas en vida del autor
la obra ha sufrido constantes revisiones que han ido matizando su sentido
originario. La segunda edición vio la luz en Edicions 62, Barcelona, 1969,
aunque ya había sido rehecha entre noviembre de 1963 y febrero de 1964 y
repasada en septiembre-octubre de 1967. Las matizaciones introducidas con
posterioridad van en la línea de realizar la denuncia del comportamiento no
adecuado y violento de un poder que se ha instaurado tras una contienda cí‑
vica, de tal modo que se separa esta segunda versión, que obviamente no es
una simple reedición, en aspectos muy relevantes de lo que pretendía la pri‑
mera, en la que se focaliza la atención en la superación del conflicto en los
momentos inmediatamente posteriores al final de la guerra, en los que aún
no se es muy consciente de la gestión de la victoria que los vencedores están
empezando a perpetrar. Esa constante actualización de la obra mediante
cambios, en ocasiones considerables, en el argumento y los personajes es la

5
  Castellet 1965: 7 s.
6
  Sirva de ejemplo la reescritura del mito de Fedra, para la que remitimos a Morenilla
2008: 435-480.
7
  Lo intenta en la editorial Selecta, que ya ha logrado permiso de la censura para
poder publicar algunas obras en catalán, pero que en este caso no obtiene la pertinente
autorización, probablemente porque ya ha pasado mucho tiempo para que pueda ser inter‑
pretada por las autoridades como una llamada a la reconciliación; cf. http://lletra.uoc.edu/
ca/edicio/editorial-selecta

111
Carmen Morenilla Talens

que posibilitó que pudiera ser reiteradamente puesta en escena, puesto que
la obra se iba adaptando a los nuevos escenarios socio-políticos.8
Precede a la obra un prólogo, a la manera de los de Eurípides, en el
que se relatan las vicisitudes de la saga tebana, pasadas y futuras, de tal
modo que los espectadores/lectores, antes de iniciarse la obra ya saben que
Antígona morirá condenada por transgredir una orden que prohibía enter‑
rar a su hermano, pero desconocen las razones de la mutua muerte de los
hermanos, así como las causas de esa prohibición de enterrar a Polinices y
de los motivos que mueven a la desobediencia a Antígona. “Escolteu ara, si
voleu, les raons dels personatges” (p. 76), son las palabras finales del Prólogo
con los que se inicia la acción.
La primera edición de 1955 se dividía en dos actos, el segundo de los
cuales se subdividía en dos partes, mientras que en la versión de 1969 la
obra se ha articulado en tres partes que corresponden a tres tiempos, tres
espacios y tres acciones muy delimitadas. También difieren en que en la
edición de 1955 los Consejeros anónimos de la edición de 1969 recibían
nombres, Ênops, Periclimen, Deípilos, Àstacos, nombres tomados de la tra‑
dición literaria de los Siete. De este modo en la 2ª edición se generaliza la
posición de los Consejeros y es más fácil la percepción de éstos como per‑
sonajes simbólicos.
El texto de Espriu es muy poético, prima la palabra sobre la acción, en
lo que está más próxima a la tragedia de Esquilo que a la de Sófocles. Sin
embargo, son las Fenicias de Eurípides y la Antígona de Sófocles las fuentes
preferentes de las que ha bebido en cuanto a las líneas estructurales. Además
se ha suprimido al Coro, ese Coro que encarna al pueblo son los especta‑

8
  La primera puesta en escena fue en el Teatro Candilejas de Barcelona en marzo de
1958 por la “Agrupación Dramática de Barcelona” bajo la dirección de Frederic Roda en
un ambiente de “resistencia a la francesa” (cf. Roda, 1965: 38s.). La siguiente, también en
Barcelona, fue en 1963 en el Teatre Romea y bajo la Cúpula del Coliseum por la compañía
“Adrià Gual” con la dirección de Ricard Salvat, en la que se incluían ya algunas de las
modificaciones introducidas en el texto por Espriu, como nuevos personajes y un cántico
coral. En 1978 el Teatre l’Horta representa la obra con dirección de Josep Montayès y Josep
Maria Segarra, montaje que inaugura la temporada del Grec en 1979. Más tarde, y a pesar
de que la obra adolecía de un cierto anacronismo, según puede desprenderse de la opinión
que el propio autor tenía cuando escribe Les roques i el mar: el blau, en el que cuestiona el
mito de Antígona como válido políticamente, se representa en el Teatro de Mérida en 1986
en versión castellana bajo la dirección de Joan Ollé y el año siguiente se representa en el
Grec. Ese mismo año de 1986, el 1 de noviembre, la televisión italiana, RAI, retransmitió
esta Antígona en la traducción de O. Musso publicada por la Assemblea Regione Sicilia,
Palermo 1988, y reeditada en Firenze, 1996.

112
Las Antígonas de Espriu

dores. Por razones similares se ha eliminado el personaje de Hemón, bien


explicadas por J. Malé, quien señala al respecto:
va eliminar de l’ obra el personatge d’ Hèmon, fill de Creont i promès
d’ Antígona, que al final de la tragèdia homònima de Sòfocles se suïcida
per amor. Més encara: va voler que la seva heroïna ni l’ esmetés ni fes cap
referència a conceptes com el matrimoni i l’amor conjugal. (...) A comen‑
çaments de 1939, l’únic amor que interessava Espriu era el fraternal, l’amor
entre germans que hauria pogut evitar una tan cruel guerra, i que ell confia‑
va que, després del conflicte, restabliria la pau - una confiança ben ingènua,
transformada en escepticisme i pessimisme en la darrera versió que va fer de
l’obra l’any 1964.9
El deseo, pues, de reforzar esa percepción de la necesidad de amor frater‑
nal es el que hace que se eviten las referencias a otro tipo de amor. De hecho,
Hemón sólo aparece nombrado por su padre, Creonte, en el tercer acto.
En la primera parte encontramos al esclavo Eumolpo que se revelará
portador de los más nobles valores. Él es quien acompaña a las mujeres,
a Eurídice, esposa de Creonte, y las damas de compañía Astimedusa y
Euriganeia10. Estas mujeres se encuentran en una habitación del palacio en
la que va a transcurrir la primera parte y con sus palabras sitúan la acción:
Antígona ha ido a ver a Polinices para tratar de convencerlo de que cesen
las hostilidades. Este es el punto de arranque de sus comentarios, en los que
expresan, desoladas, los avances de la guerra, la situación de indefensión
de la ciudad en la que sólo quedan mujeres, niños y ancianos, mientras los
jóvenes, sus hijos, han muerto. Ponen fin a los lamentos y comentarios, en
una estructura anular, con una nueva referencia a la entrevista de Antígona
con Polinices, anhelando que haya logrado su propósito.
La entrada de Eteocles nos presenta una escena en cierto modo similar a
la que se produce en Siete contra Tebas de Esquilo entre Eteocles y el Coro
de mujeres tebanas: Espriu hace que las mujeres expresen sus temores al jo‑
ven y Eteocles les ordena callar, como en la obra esquilea. Eteocles pregunta
por la causa de esos lamentos y en este momento el nombre de Antígona y la
entrevista con Polinices salen a la luz. Ante la iniciativa de la joven Eteocles
cree que su hermana le ha traicionado y que toma partido por el traidor
Polinices, porque en el momento en el que se encuentran no son los afectos

9
  Malé 2007: 136 s.
10
  Recordemos que este último nombre es el que algunas versiones antiguas daban
a la madre de Edipo. De hecho es te personaje mantendrá una relación muy especial con
las muchachas.

113
Carmen Morenilla Talens

fraternales los que mandan, sino la situación de conflicto y la posición so‑


cial: “Ara no sóc el germà, sino el rei. Em deu fidelitat. M’havia d’obeir.” (p.
79). Las mujeres se marchan ante la llegada de Antígona, que deberá rendir
cuentas a su hermano de sus acciones.
Como podemos ver desde el comienzo, desde esa iniciativa de intentar
lograr una reconciliación, esta Antígona ha adoptado rasgos de la Yocasta de
Fenicias. Se refuerza con las palabras que la joven dedica a ambos, en las que
vemos que ha sido una especie de segunda madre para sus hermanos, tanto
para Eteocles, del que dice “Et portava a banyar al riu, jo, la germana gran,
i sempre temia que, jugant, t’ofeguessis” (p. 80), como para Polinices, del
que también indica “Jo el vestia i el despullava, de petit, i el bressolava per‑
què s’adromís. M’agafava les trenes i em feia mal...” (p. 94), palabras llenas
de ternura y de nostalgia por la infancia que ahora parece muy lejana. Esa
estrecha relación con los dos es la que sirve de base para que esta Antígona
asuma el papel que Yocasta desarrolla en Fenicias e intente impedir el en‑
frentamiento fratricida.
Pero Eteocles no comprende las razones que Antígona le ofrece sobre su
visita a Polinices, sino que de la escena se desprende la diferente perspectiva
desde la que Eteocles y Antígona contemplan a Polinices: mientras para
Eteocles es un enemigo, para ella es un hermano. Esta diferencia en la per‑
cepción es trasladada más tarde al cuerpo sin vida de Polinices por Creonte
y Antígona y consecuentemente al tratamiento que debe recibir, algo ya
presente en la tragedia sofoclea.
Pero además Antígona, en un intento de hacer cambiar de opinión al
hermano, comunica a Eteocles que la ciudad está dividida en dos facciones,
introduciendo un argumento de tipo político: “També ell té partidaris a
la ciutat” (p. 81), partidarios que para Eteocles, en línea con lo que ya ha
manifestado antes, son enemigos de las leyes. Ante esta situación, Antígona,
que quería evitar la guerra fratricida, evitar el derramamiento de sangre,
que buscaba la paz y la concordia, es consciente de que “La ciutat ha de
seguir el seu destí” (p. 81). El diálogo que sigue entre Eteocles y Creonte
en presencia de Antígona sintetiza lo esencial de los siete pares de discursos
de la tragedia Siete contra Tebas de Esquilo y, como en la obra de Esquilo,
también anuncia Eteocles su intención de defender él la séptima puerta. En
este caso, Creonte, consejero fiel y prudente, trata de disuadirle, le aconseja,
incluso pide el apoyo de Antígona, a quien aquel no escucha y se marcha.
Entran Astimedusa, Eurídice, Euriganeia e Ismene, que vienen de pre‑
senciar los combates ante las siete puertas, y es Ismene quien relata cómo
los dos combatientes de la séptima puerta se han dado mutua muerte, en

114
Las Antígonas de Espriu

una línea de dar mayor protagonismo a este personaje, que más tarde será
desarrollado en profundidad por el propio autor, como veremos. La maldi‑
ción del padre se ha cumplido, la guerra fratricida ha llegado a su fin y es
Antígona da los nombres de esos muertos de los que Ismene desconoce la
identidad:

Antígona.- Has vist com morien els nostres germans.


Ismene.- Ai, els meus ulls, els meus ulls, i la boca que ho ha contat.
(p. 84)

Ahora Eurídice es la reina y Creonte el rey; su palabra, que antes era


consejo, ahora es ley, como lo anuncia Eumolpo, quien da cuenta además de
que Tebas es libre del asedio argivo. La llegada de Creonte confirma todas
las palabras de Eumolpo:

Creont.- Euridice, estimades filles, som lliures per l’esforç d’Etèocles,


ploreu el rei. No lamenteu, en canvi, la mort del maleït enemic de la
ciutat, odiós als seus divins protectors. Vet aquí el poder a les meues
mans, que es deuen al benestar d’aquest poble. Ara cal preparar els
funerals del rei, uns funerals dignes d’ell i de la nostra raça. I mano
també que l’altre cos sigui exposat nu als ocells i a la nit.
Antígona.- Oh, això no!
Ismene.- No, t’ho prego, això no!
Creont.-Per què no, Ismene?, per què no, Antígona? (...) He parlat, i
ara la meua paraula és llei. (p. 86)

Cierra esta primera parte una serie de intervenciones monológicas en


la que unas voces que representan al pueblo expresan sus sentimientos.
Creonte impone el silencio: de las cenizas de los vencidos no debe resurgir
ninguna llama y Euriganeia entona un canto de victoria por la salvación
de Tebas, análogo al del coro de ancianos tebanos sofocleos entonaba en
Antígona.
La segunda parte se desarrolla en el campo de batalla ante el cadáver de
Polinices y dramatiza los instantes previos al entierro de Polinices, una esce‑
na que bien puede estar inspirada en cierta medida en la Tebaida de Estacio.
Eumolpo ha conducido a Tiresias fuera de Tebas junto al cadáver, pues sabe
que Antígona va a enterrar el cuerpo de su hermano y quiere que el adivino
la persuada cuando llegue. Este Tiresias es presentado aquí como un perso‑
najes que se acomoda al poder, incluso es acusado por Eumolpo de servir al

115
Carmen Morenilla Talens

dinero, acusación que le hacían Edipo y Creonte respectivamente en Edipo


Rey y Antígona de Sófocles, aunque, como aquel Tiresias de Sófocles, éste es
consciente de que la decisión de Creonte es impía y sabe las consecuencias
que traerá:

Tirèsias.- (...) Polinices va ser culpable, és cert, però és també un crim


als ulls divins no perdonar els vençuts, després de la mort. I una in‑
violable llei defensa aquest crim. Aquesta sang perdrà Tebes. (p. 91)

De entre la oscuridad de la noche surgen Antígona, Ismene y Euriganeia.


Esta Ismene actúa a la inversa que la sofoclea, pues si aquella en un principio
se distanciaba de la acción de su hermana para después sumarse de palabra
a ella, ésta de Espriu acompaña en la iniciativa a la hermana y llega con
ella hasta el muerto Polinices: “Vull seguir la teva sort. (...) Faré el que tu
facis” (p. 91), afirma, pero en el momento de enterrar al muerto, de actuar,
duda y al no conseguir que su hermana desista de su propósito, lo que era
en realidad el fin último de su participación, abandona: “No puc ni violar
la llei ni vèncer la meva por .”(p. 93) Logra con ello el autor remarcar aún
más la firmeza de su protagonista, puesto que, frente a lo que sucedía en
al obra sofoclea, en la que desde el comienzo veíamos que estaba sola en su
plan de enterrar al hermano, aquí su decisión es aparentemente compartida
por Ismene, pero en el momento de la acción se queda sola, frente a los ar‑
gumentos de quien parecía compartir sus deseos. Antígona, efectivamente,
no es Ismene y por ello se mantiene firme en su decisión.
Junto a ellas ha marchado Euriganeia, su nodriza, que sólo anhela el
mismo destino que aguarda a las que son como sus únicas hijas, pues los
otros murieron en el campo de batalla. De este modo logra Espriu que el
dolor que esta nodriza manifiesta sea un símbolo del dolor de todas las
madres cuyos hijos mueren en la guerra. Al llegar las tres mujeres junto al
cadáver encuentran a Tiresias y a Eumolpo. Ismene se asusta del ciego adi‑
vino que le recuerda a su padre, pero Antígona, firme en su propósito, ante
las requisitorias de éste sobre la razón de su presencia allí, le responde: “Vinc
a enterrar un cos, el del meu germà Polinices, que haurien d’haver honorat
i incinerat segons els nostres antics preceptes.” (p. 91) Tras la infructífera
petición de Eumolpo de que desista, Tiresias trata por su parte de disuadir
a Antígona de llevar adelante su acción, para lo que enaltece la defensa de
Tebas que hizo Eteocles y subraya la traición de Polinices. Sin embargo, ésos
son hueros argumentos para la hermana, que sólo se mueve por sus senti‑
mientos fraternales y por la creencia en unas leyes superiores por encima

116
Las Antígonas de Espriu

de las de los mortales: “Tots ens devem primerament a les lleis eternes.” (p.
92), lo que no deja de ser chocante que tenga que ser recordado a quien se
supone que representa a la divinidad.
Antígona tampoco cede ante la advertencia de las consecuencias que se
va a acarrear con su acción, pues no teme a la muerte, de modo que Tiresias,
agotados sus argumentos, decide regresar con Ismene y Euriganeia, que son
enviadas de vuelta a palacio por Antígona. Pero Eumolpo decide quedarse
con ella, ayudarla y sufrir el mismo castigo, una decisión que sorprende
gratamente a Antígona. Tiresias al marchar afirma que advertirá a Creonte
de los presagios desfavorables de mantener el cadáver de Polinices insepulto
y quedan junto al cadáver Antígona y Eumolpo, en quien precisamente por
esta permanencia junto a Antígona se ha visto un trasunto de Argia, la es‑
posa de Polinicies, en las obras de Estacio e Higinio. Con todo la actitud del
personaje es totalmente diferente y es mucho más probable que este esclavo
represente el sentir general del pueblo.
Ambos, la hermana y el esclavo, entierran a Polinices con palabras de
recuerdo para Yocasta y aunque pueden huir, no lo hacen. Antígona afirma
que ella enterró a su hermano aunque sabía que estaba prohibido, ella ha
sido, no va a esconderse, asume su acción y su responsabilidad, y ella mis‑
ma se entregará a Creonte, “Apressem-nos a comparèixer davant Creont”
(p. 94), razón por la cual van al encuentro de los guardias. Finaliza así
la segunda parte. Pero éste es un cambio introducido en la 2ª edición: en
la publicada en 1955 Antígona y Eumolpo eran descubiertos y Antígona
aceptaba su destino ante la imposibilidad de escapar y el guardia, que la
había identificado, la lleva ante Creonte. La matización introducida en la
2ª edición engrandece al personaje de Antígona y su acción y consolida su
firmeza y valentía, a la vez que se convierte indirectamente en una llamada
al despertar de las conciencias en la medida en la que no se busca eludir la
responsabilidad de una acción que se considera justa, sino que se asume
desde el primer momento la condena que se ha dictado. Cabría esperar de
una sociedad sana la respuesta inmediata ante ese desafío, pero Espriu no
está describiendo como fondo de la acción que acontece en su obra una
sociedad sana.
La tercera y última parte se desarrolla en la sala del consejo donde se
hallan reunidos Creonte y sus consejeros, en la 2ª edición anónimos, delibe‑
rando sobre el futuro de la ciudad tras la guerra. De entre los consejeros, que
buscan agradar al nuevo mandatario, destaca el Lúcido Consejero, quien
tiene una percepción de los acontecimientos que va más allá de lo inmediato
y mantiene una cierta distancia de Creonte, al que cuestiona. Este Lúcido

117
Carmen Morenilla Talens

Consejero fue introducido en la 2ª edición, y mediante sus intervenciones se


logra una clara identificación entre Creonte y Franco, entre Tebas y España,
no tan evidente en la primera versión de 1939:

Però gairebé és un vell, i el seus fills i seguidors no valen res. A Tebes,


Creont no pot instituir perpètuament Creont. Què vols que visqui,
vint anys més, tal vegada trenta? Si no el colpeix molt abans una mort
violenta. (p. 97)

La referencia posterior en boca de Creonte al duelo y homenaje a “nues‑


tros héroes”, no hace sino reclamar el duelo y homenaje para todos los caí‑
dos en la guerra, algo que deberá acaecer cuando Creonte, esto es, cuando
Franco muera.
Llegan a continuación Eurídice y Tiresias, que transmite funestos pre‑
sentimientos, como había anunciado, si Polinices no es enterrado. Es en
este contexto de carácter político en el que se produce la única referencia a
Hemón en boca de Creonte, que afirma que casará a su hijo con Antígona,
pero Eurídice presagia nuevas desgracias a su familia si emparentan de nue‑
vo con el linaje de Edipo. Como vemos, no ha querido Espriu que hubiera
lugar en esta obra para concesiones románticas.
Un mensajero arriba con el relato de que Antígona, ayudada por
Eumolpo, ha enterrado a Polinices y a continuación ambos son acompaña‑
dos por el pueblo. El Lúcido Consejero, con la clarividencia que le caracte‑
riza, explica lo que va suceder: el pueblo no se alzará frente a Creonte, no
impedirá la muerte de Antígona, pero a partir de ese día Creonte sentirá
la repulsión que el cumplimiento ejecutivo de las leyes inspira siempre a
los súbditos contra el legislador (p. 99). Antígona y Eumolpo entran en la
sala y se produce entonces un breve agón entre Creonte y Antígona, que en
sus líneas argumentales sigue el de la tragedia de Sófocles. Antígona no se
defiende, acepta su castigo, sólo intercede para salvar a Eumolpo, pero éste,
que la ha acompañado desde un principio, se niega a abandonarla ahora.
Por su parte Ismene, como la sofoclea, desea ahora unirse al destino de su
hermana, pero Antígona la rechaza. Eurídice y Tiresias piden a Creonte
que se apiade de su sobrina y éste consulta al consejo quien confirma la
sentencia a muerte. La ley debe ser cumplida. De este modo crea el autor un
Creonte cercano al de Eurípides, aunque en esta parte final se revele como
el ser a la sombra del poder que siempre ha sido para Sófocles; por ello no
cae y consolida su poder en manos de los consejeros, aunque él cree que está
en las suyas.

118
Las Antígonas de Espriu

Las palabras finales de Antígona, lejos del treno de la tragedia griega,


resumen el espíritu de esta obra. Hace Antígona un llamado a la reconcilia‑
ción nacional que incluye a los muertos, la reconciliación de los vencedores
y de los vencidos, en un intento de superación de la división del país, de
aunar los esfuerzos: “Però no pertorbaré la pau de Tebes, tan necessària. (...)
Calmeu el poble i que torni a les cases, que cadascú torni a casa. (...) Que la
maledicció s’acabi amb mi i que el poble, oblidant el que el divideix, pugui
treballar...” (p. 101). En esta adaptación de Espriu tampoco hay lugar para el
suicidio de Antígona y se cierra con la protagonista que va a ser conducida al
suplicio, con lo que el autor obvia el conflicto desde la perspectiva cristiana
en torno al suicidio, pero no tanto por el rechazo moral al mismo como por
un posicionamiento personal del autor, que rechaza este modo de morir,
algo que se aprecia también en Una altra Fedra, si us plau.
La obra en la edición de 1969 no finaliza con las palabras programáticas
de Antígona, sino que cierra el texto un parlamento del Lúcido Consejero
en el que anuncia los destinos de los personajes:
Un lamentable però correcte acabament de l’episodi. Tirèsias llogarà de
seguida uns altres ulls experimentats i desvergonyits. Ismene esdevindrà
aviat una conca que no tindrà ni nebots. Impedit el desastrós matrimoni,
Euridice, després del decent i moderat disgust, respirarà en endavant més
tranquil.la. Creont, insegur al cols del seu recel, presidirà potser durant
alguns anys una organitzada demagògia... (p. 101)
Este parlamento final, como indica en la acotación que lo precede, pue‑
de ser suprimido, ya que no aporta nada nuevo desde el punto de vista
dramático, pero sus palabras, como él mismo reconoce, por lúcidas y claras,
dicen aquello que se percibe pero se calla, y por ello son peligrosas para los
espectadores. Pero más allá de esa escasa función dramática estas palabras
también resaltan lo que de grotesca tiene la situación que se ha creado, el
conflicto, la solución del mismo y la repercusión que esa solución, que esas
inmolaciones tienen en la sociedad.11
También las palabras finales de Antígona fueron revisadas en dos oca‑
siones: si en la primera Antígona se dirigía al pueblo de Tebas, “Honora,
poble, el teu príncep i oblida el que et divideix. Treballa, unit i en pau, per
la grandesa de la ciutat” (p. 55) y unas voces la llamaban, en 1963 y 1965
(1969) se dirige a Creonte y al Consejo respectivamente, acomodando la
obra a las nuevas circunstancias históricas, a los cuales Antígona pide que

11
  Para un estudio en profundidad de la función de lo grotesco en esta obra de Espríu
cf. Moreno 2010/2011.

119
Carmen Morenilla Talens

trabajen por el pueblo: “i tant de bo que tu, rei, i tots vosaltres el vulgueu i
el sapigueu servir” (p. 101). En esos años, desaparecida la esperanza de que
los vencedores supieran administrar la victoria con magnanimidad, era im‑
posible que se siguiera manteniendo una llamada al respeto al gobernante.
Con estas en apariencia pequeñas modificaciones cambia, pues, Espriu el
sentido de su obra en la versión posterior.
Muchos años después, en 1981, Espriu retornará este mito en los relatos
de “Antígona” e “Ismene” que incluye en Les roques i el mar: el blau, un con‑
junto de breves prosas poéticas basadas en personajes de la mitología grie‑
ga, desde los dioses de los mitos cosmogónicos hasta héroes como Héctor,
Medea, Alcestis, Clitemnestra, Electra, Helena, Fedra, Hipòlit, etc... hasta
un total de noventa y ocho. Vemos en ellos que culmina esa línea de mayor
relevancia de Ismene que habíamos comentado, puesto que aquí se le dedica
uno de los relatos.12
En el nuevo contexto socio-político de 1981 para Espriu la figura de
Antígona ha perdido el valor ideológico con el que la revistió en 1939 y en
las versiones posteriores de la obra. Por ello este relato, presentado bajo la
apariencia de un monólogo interior, nos presenta a una Antígona en extre‑
mo humana y despojada de su áurea mítica, un áurea que sus primeras pala‑
bras evocan, cuando la propia Antígona señala la fama que alcanzará con la
acción que se dispone a realizar: “Prou sé que, pel que vaig de seguida a fer,
em glorificaran estúpidament al llarg del temps, fins a la consumació dels
segles” (p. 141). Pero ella no comparte la visión que de ella misma y de su
acción expresarán la mayoría de poetas expresarán: “Alguns em qualifica‑
ran de simple tossuda, i crec que aquests tindran més raó” (p. 141), porque
ninguno la conoce, sólo conocen la apariencia que su acción parece revelar:
“Però jo endevino qui sóc de debò, trista conca, fadrina de cara allargassada
i dura” (p. 141).
Este desconocimiento de la verdadera identidad de Antígona es lo que
ha permitido entender su acción como un acto de amor y piedad hacia su
hermano. Pero esta Antígona afirma con claridad: “No puc soportar l’oncle:
vet aquí la meva veritat fonamental” (p. 141), es decir, su acción ha sido en
realidad movida por el odio hacia su tío Creonte más que por su amor al
hermano y el sentido del deber con respecto a su cadáver. Esta verdadera
causa hace que el cumplimiento de los ritos funerarios se presente de un
modo descarnado, ausente de idealismos y como una especie de provoca‑
ción al tío: “Duc a pes de braços, amb fatiga, un munt de terra i l’estendré

12
  Espriu 1981: 141s. y 155s.

120
Las Antígonas de Espriu

sobre el cadàver nu, negre de sang, esbocinat i fètid, el cos que em repugna
i em repeleix, el de Polinices, del qual ho ignoro tot.” (p. 141).
No hay aquí relación afectiva ninguna con un hermano, Polinices, del
que además Antígona afirma ignoralo todo, ni existe tampoco una exigen‑
cia moral de cumplir con unos preceptos. Antígona actúa movida por su
rechazo a su tío. Amanece y sólo resta aguardar a que la apresen y condenen
a ser emparedada, una variación de la cueva-tumba que también aparecía
en el sueño descrito en The years de Virginia Woolf. Hay también una bre‑
ve referencia a Hemón, cuyo amor ella niega; justifica su relación como el
resultado de una serie de maquinaciones políticas por parte de Creonte, en
las que Hemón no es más que un instrumento. La ruptura con los referentes
clásicos es total.
Si el proceso de humanización que realiza aquí Espriu despoja a esta
Antígona de su áurea mítica y nos la muestra descarnada, movida por el
odio y el resentimiento, todo lo contrario sucede con Ismene en el relato
“Ismene”, donde la humanización del personaje nos aproxima esta figura
desdeñada por la tradición y la engrandece, con un tratamiento que recuer‑
da al del poema de Yannis Ritsos. Este relato se presenta como un diálogo
fragmentario con Crisótemis, la hermana de Electra en la tragedia homóni‑
ma de Sófocles, un diálogo donde sólo interviene Ismene. Ambas, Ismene
y Crisótemis, crecieron y vivieron a la sombra de sus célebres hermanas,
“Sóc una simple ombra” (p. 155) afirma, algo de lo que se quejaba también
la Ismene de Ritsos. Y esto es así a pesar de que también ellas pertenecen
a insignes linajes: “Oh, vosaltres i nosaltres, les nostres famílies, quins lli‑
natges! I Electra i Antígona s’assemblaven, la seva essència era l’odi, el de
la meva germana contra l’oncle, al capdavall un bon home” (p. 156). En
las palabras de Ismene hay un matiz de amargura porque también ella por
linaje podía haber alcanzado la fama en la posteridad, y ésta es la finalidad
de la referencia a Teoclímeno, su prometido, a causa del cual Tideo le daba
muerte, según la versión perdida de Mimnermo, ya que, de haber sido cierta
su relación, ella habría tenido una vida plena o alcanzado con esta muerte
un cierto renombre. Pero no fue así y ahora, envejecida y sola, comenta a
Crisótemis sus quehaceres domésticos y su vida rutinaria. También en esta
presentación de Ismene ha eliminado lo que podía haberla engrandecido y
la muestra inmersa en su amargura y en la cotidianeidad más insignificante.
Después de la Guerra Civil, en España o en el exilio, muchas han sido
las obras de españoles escritas como denuncia explícita del abuso del po‑
der o como muestra de la desilusión ante las ocasiones desperdiciadas, con
planteamientos localistas o más universalistas, desde la Antígona del autor

121
Carmen Morenilla Talens

afín al régimen José Mª Pemán (1945) a las claramente opuestas, como La


sangre de Antígona de José Bergamín (1955), pasando por adaptaciones más
poéticas, sin referencias políticas claras, como La tumba de Antígona de
María Zambrano (1967). En este conjunto la Antígona de Salvador Espriu,
además de los valores literarios intrínsecos a las obras de Espriu, aporta
un aspecto más que la hace interesante para los estudiosos de la tradición
mundo clásico: el mito se convierte en una materia dúctil en las manos de
este autor, que somete sus obras a una constante reescritura y ese proceso
de recreación permite percibir los cambios no sólo de índole literaria, sino
en este caso sociopolíticos que se han producido en el entorno del autor y
en qué medida el autor ha ido cambiando de opinión con respecto a temas
fundamentales de la historia contemporánea y, por añadidura, sobre la he‑
rencia del mundo clásico.

122
Entre Sófocles y Anouilh:
la Antígona y su nodriza en la refección
de Memé Tabares
(Among Sophocles and Anouilh: Antigone and her nurse in Tabare’s refiguration)

Núria Llagüerri Pubill (nuria.llaguerri@uv.es)


IES Moixent – Universitat de València

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_6

123
(Página deixada propositadamente em branco)
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

Resumen1 – Dedicamos nuestro estudio a la refección de Memé Tabares de


Antígona escenificada en el contexto del IL Festival de Teatro Clásico de Mérida en
el año 2003. Esta refección toma como hipotexto la versión de Anouilh (1944) y la
versión de Sófocles (442 a.C.); como consecuencia, conserva el personaje de la no‑
driza de Antígona, que introdujo el dramaturgo francés, y el del adivino Tiresias,
si bien excluido por Anouilh, con idéntica función que en la tragedia sofoclea.
Nuestro objetivo es exponer las razones por las que Tabares conserva a la nodriza
junto a la heroína.
Palabras clave: recepción, Antígona, Sófocles, Anouilh, Tabares, nodriza.

Abstract – This paper studies Tabares’ refiguration of Antigone’s myth staged


in 2003 in the IL Festival de Teatro Clásico de Mérida. Tabares uses Anouilh’s
Antigone (1944) and Sophocles’ Antigone (442 a.C.) as hypotext. This fact is clearly
shown in Tabares’ refiguration as the Nurse takes part in the plot, as Anouilh’s
nurse did. The aim of this paper is to show the aim of Tabares in conserving the
character of the nurse in her refiguration.
Keywords: Refiguration, Antigone, Sophocles, Anouilh, Tabares, Nurse.

De entre las muchas heroínas trágicas de la tradición dramatúrgica gre‑


colatina una de las más versionadas es la figura de Antígona al tomarse
como paradigma de la reivindicación de la lucha por la justicia, pudiéndose
establecer que la evolución que el personaje experimenta se encuentra estre‑
chamente ligada al contexto sociopolítico y cultural en el que se lleva a cabo
la representación, así como con las tendencias escenográficas del momento2.
Uno de los mecanismos que suelen utilizar los diversos autores que han
llevado a cabo la refección de la historia de Antígona consiste en la adición
de personajes secundarios a la peripecia con el fin de configurar a Antígona
a través de la interactuación con ellos e incidir en los rasgos característicos
de la heroína trazados por Sófocles3. Un ejemplo de tal afirmación lo cons‑
tituye la versión de Memé Tabares a la que dedicamos nuestro estudio y en
la que en el elenco de personajes figura la Nodriza de Antígona e Ismene.
Sin embargo, la aparición de este personaje en la peripecia no es una inno‑
vación de la autora extremeña, sino que se basa en la versión de Antígona

1
  El presente trabajo se enmarca dentro del proyecto de investigación FFI2012-32071,
de la Dirección General de Investigación del Ministerio de Economía y Competitividad.
2
  Cf. García Sola 2009: 253.
3
  Al utilizar el término refección utilizamos la terminología acuñada por Hardwick
2003: 9 s.

125
Núria Llagüerri Pubill

que compusiera Jean Anouilh en 1944 y sobre la cual se apoya gran parte
de la trama de Tabares.

I. La versión de Tabares fue escenificada en el marco del IL Festival de


Teatro Clásico de Mérida en el año 2003 y se presentó bajo el título Antígona
de Anouilh/Sófocles en versión de Memé Tabares. Fue dirigida por Eusebio
Lázaro e interpretada por los siguientes actores: María Fernanda D’Ocón
(Antígona), Tania Garrido (Antígona-bailarina), Rosana Pastor (Ismene),
Pepe Sancho (Creonte), Miguel Meca (Hemón), Jesús Salgado (Narrador),
Ana Wagener (Nodriza), José Luis Torrijo (Guardia Jonás), Rafael Salama
(Tiresias), Jorge Picó (Polinices). La elección de María Fernanda D’Ocón
(1937) para el papel de Antígona condicionó en cierta medida la versión de
Tabares, pues en ese momento la actriz contaba con sesenta y seis años de
edad4. Claro ejemplo de esta afirmación lo constituye la frase con la que
el Narrador inicia la representación cuya finalidad no es otra que la de in‑
formar al público de cuál de los personajes que hay en escena es Antígona,
escena I5:

Narrador: Esa frágil mujer que ahí veis, casi una anciana, es Antígona
[…]

Seguirá durante su intervención destacando que, a pesar de que ha enve‑


jecido, Antígona sigue siendo una muchacha, escena I:

Narrador :Ya a veis: sigue siendo la misma muchacha envejecida de


entonces […]

La obra consta de un único acto, en paralelismo con la Antígona de


Anouilh, y de diez escenas; además, conserva el elenco de personajes de la
pieza de Anouilh, punto sobre el que volveremos más adelante, pero conser‑
vando el personaje de Tiresias de la obra sofoclea.

4
  Comportó una serie de fallos de coherencia en la trama examinados con detalle en
Morenilla 2006: 75 s.
5
  Agradecemos a la Prof. Morenilla el acceso al guión de la representación que no
está publicado.

126
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

Uno de los puntos a nivel escenográfico que diferencia esta versión de la


del dramaturgo francés y de la del dramaturgo ateniense es la introducción
de una danza en la escena X antes de iniciarse el desenlace trágico de la
trama con la entrada del Mensajero que anuncia las muertes de Hemón y de
Eurídice. Esta danza sustituye el canto a Dioniso que figura en la tragedia
sofoclea en 1115-1154.
Tabares combina en su versión dos textos que, a pesar de que tienen
como protagonista a la misma heroína, son claramente dispares en tono,
en caracterización de personajes y en finalidad: el texto sofocleo y el tex‑
to anhouiliano6. En base a la obra que la autora extremeña utiliza como
hipotexto de la versión hemos dividido la misma en dos partes: en la pri‑
mera parte, escenas I-IX, constituye el texto base la obra de Anouilh; en
cambio, en la segunda parte, última escena, la base es el texto sofocleo7.
Refiriéndonos al elenco de personajes cabe destacar que Tabares conserva el
personaje de Tiresias, desechado por el francés en aras al despojo del con‑
tenido religioso a la obra8, y conserva en cambio a la Nodriza anhouiliana.
Sobre este carácter, el de la Nodriza, centraremos nuestro estudio buscando
establecer las razones por las que Tabares pudiera haber procedido así.

II. Sófocles no introdujo en la peripecia dramática la figura de una no‑


driza que acompañara a Antígona, de manera que la aparición de este perso‑
naje junto a la heroína es una innovación posterior. La Antígona de Sófocles
se nos muestra como un personaje fuerte, que no titubea al enfrentarse a
Creonte y que no necesita a una nodriza que actúe como confidente o con‑
sejera, papel que, según se observa en la producción trágica griega que ha
llegado a nuestros días, fue reservado a esta figura9. Así, desde el principio

6
  No nos proponemos llevar a cabo un análisis extenso de la obra de Anouilh en com‑
paración con la obra de Sófocles, asunto sobre el que ya han trabajado diversos estudiosos
como, por ejemplo, más recientemente: García Sola 2009:251-264 ; Guérin 2010: 93-104;
Deppman 2012: 523-537.
7
  Si bien no queremos decir que no exista ninguna referencia a la obra de Sófocles en
la primera parte y a la de Anouilh en la segunda parte, no obstante, mayoritariamente el
hipotexto de la primera parte es la obra del autor francés y el de la segunda la del ateniense.
8
  Tal es la opinión de García Sola 2009: 259.
9
  Griffith 2012: 11 señala que al hacer que el Coro estuviera compuesto por ancianos
tebanos y no por mujeres aísla a la heroína hasta un grado inusual en el resto de sus tra‑
gedias. No obstante, podría discutirse esta visión de Griffith si entendemos que el héroe
trágico sofocleo es Creonte y no Antígona, como opinan, entre otros Bañuls 1999: 548-
550; Bañuls-Morenilla 2008: 82 s.

127
Núria Llagüerri Pubill

de la representación, Sófocles nos muestra a una heroína que no muestra


ningún signo de debilidad ante su hermana Ismene y que en ningún mo‑
mento duda sobre su actuación, como veremos más adelante.
Podría considerarse que la primera vez que tenemos atestiguada la pre‑
sencia de una nodriza junto a Antígona es en la versión que realiza Giovanni
Rucellai titulada Rosmunda.10 La Nodriza posee en esta obra la función
dramática de ser confidente y consejera de Rosmunda-Antígona, por lo que
la protagonista siempre cuenta con el consejo y apoyo de su Nodriza quien,
incluso, colabora con Rosmunda en el enterramiento de Cunimundo-
Eteocles.11 No parece haber rastro en los testimonios con que contamos de
la figura de la nodriza de Antígona hasta la versión de Anouilh. Con este
personaje, como veremos al analizar los pasajes en los que interviene para
establecer el paralelismo más que evidente con la versión de Tabares, consi‑
gue el dramaturgo francés dotar al carácter de la heroína de una dimensión
infantil desconocida hasta entonces, dimensión que reitera Tabares.
En la refección de Tabares la Nodriza de Antígona aparece en la prime‑
ra parte de la obra, parte en la que, como hemos indicado, se toma como
hipotexto la obra del francés. Aparece en el escenario en las escenas II y III
y su voz en off en la escena V, escena esta última que, desde nuestro punto
de vista, supone la frontera que separa a las dos de Antígonas presentes en la
obra de Tabares y en cuya configuración resulta del todo importante la apa‑
rición de la Nodriza. La primera Antígona que nos muestra Tabares, hasta
la escena V, es la misma que la de Anouilh, una heroína infantil que necesita
a su Nodriza; en cambio, a partir de la escena VI, la Antígona de Tabares se
transforma en la heroína sofoclea y abandona cualquier rasgo pueril.
La primera vez que ambos personajes interactúan en escena es en la
Escena II. La escena está compuesta en claro paralelismo con la versión de
Anouilh. Antígona ha salido de la casa durante la noche para enterrar el
cadáver de su hermano, aunque asegurará a la criada que ha salido a pase‑
ar, y la Nodriza descubre que la muchacha no está en la cama. La anciana
aparece en escena después de que la joven pronuncie las siguientes palabras:

Antígona: (Ilusionada como una niña) ¿También la nodriza? ¿Ha


venido mi nodriza?

10
  Puede consultarse el que podría ser la primera edición del texto realizada por Segno
del Pozo digitalizada en https://archive.org/details/image638TeatroOpal, con acceso en
diciembre de 2014.
11
  Para un análisis de esta obra cf. Bañuls-Crespo, 2008: 143-146.

128
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

En este momento se produce un intercambio dialógico entre ambas mu‑


jeres cuya función dramática es retratar a Antígona como una muchacha
extraña y ajena a la realidad cotidiana. Se redunda en el infantilismo de
Antígona en la siguiente intervención del personaje con una acotación simi‑
lar a la que aparece en su primera intervención:

Antígona: (Aún niña) De pasear, nodriza. Era hermosos. Todo es‑


taba gris. […]

La Nodriza la reprende porque cree que se ha marchado con un enamo‑


rado y que éste no es Hemón, su prometido, escena II:

Nodriza: Tenías una cita, ¿eh? Di que no, a ver.


Antígona: Sí, tenía una cita.
Nodriza: Tienes un enamorada.
Antígona: Sí, nodriza, sí. Tengo un enamorado, pobre mío.
Nodriza: ¡Ah, muy bonito!, ¡muy bien! ¿Tú, la hija de un rey! ¿Tómese
un trabajo para criarlas! Son todas iguales. Ahora que tu tío Creonte
se va a enterar de esto. ¡Te lo prometo!
Antígona: Sí, nodriza, mi tío Creonte se va a enterar de esto.
Nodriza: No te burles de mí sólo porque soy vieja. Eras mi preferida,
Antígona, a pesar de tu mal genio. Tu hermana era más dulce, pero
yo creí que tú me querías.

Sin embargo, la propia Antígona deshace el equívoco con los siguientes


palabras:

Antígona: Vamos, nana; no llores, por favor. (la acaricia) Soy pura.
No tengo otro enamorada más que Hemón, mi prometido; te lo juro.
Guarda tus lágrimas; guarda tus lágrimas, nodriza; quizá las necesites
más adelante. Cuando lloras así me vuelvo pequeña…Y hoy no debo
ser pequeña.

En esta ocasión Tabares ha suprimido parte de las palabras de la


Antígona anouilhiana, aquellas en las que se puede apreciar el vínculo afec‑
tivo existente entre ambas mujeres, así como aquellas que de alguna manera
prefiguran el final de la heroína, p. 2112:

12
  Seguimos en este pasaje y en los posteriores la paginación de Anouilh 1946.

129
Núria Llagüerri Pubill

Antigone: Ne pleure plus, s’il te plaît, nounou. (Elle l’embrasse.)


Allons, ma vieille bonne pomme rouge. Tu sais quand je te frottais pour
que tu brilles? Ma vielle pomme toute ridée. Ne laisse pas couler tes larmes
dans toutes les petites rigoles, por des bêtises comme cela- pour rien. Je suis
pure, je n’ai pas d’autre amoureux qu’Hémon, mon fiancé, je te le jure. Je
peux même te jurer, si tu veux, que je n’aurai jamais d’autre amoureux…
Garde tes larmes, garde tes larmes; tu en auras peut-être besoin encore,
nounou. Quand tu pleures comme cela, je redeviens petite… Et il ne faut
pas que je sois petite ce matin.

Antígona: No llores más, por favor, nana. (La besa) Vamos, mi vieja
manzanita colorada. ¿Recuerdas cuando te frotaba para que brillaras?
Mi vieja manzanita toda arrugada. Que no corran tus lágrimas en
todas tus zanjitas, por tonterías como ésta, por nada. Soy pura. No
tengo otro enamorado que Hemón, mi prometido, te lo juro. También
puede jurarte, si lo quieres, que nunca tendré otro enamorado…
Guarda tus lágrimas, guarda tus lágrimas; quizá las necesites todavía,
nana. Cuando lloras así me vuelvo pequeña…Y no debo ser pequeña
esta mañana13.

Resulta llamativo que la autora extremeña conserve el final resolutivo de


las palabras de Antígona: “hoy no puedo ser pequeña”; además, introduce
un diálogo entre Nodriza y heroína que redunda en ese aspecto:

Nodriza: Pero, ¿qué te ocurre?


Antígona: Nada. Es que me siento demasiado pequeña para enfren‑
tarme a todo esto.
Nodriza: ¿demasiado pequeña para enfrentarte a qué?
Antígona: A nada, nana. Menos mal que te tengo a mi lado. Tu mano
me ha salvado siempre. Quizá me salve todavía. Eres tan fuerte…
Nodriza: ¿Qué quieres que haga por ti?
Antígona: Sólo pon tu mano en mi mejilla. Así, ya está. (Silencio)

Con la inclusión de este intercambio dialógico en este momento, cer‑


rando la escena II, Tabares consigue poner de relieve la nueva dimensión,
ajena a la heroína sofoclea, que Anouilh le otorgó a Antígona: la debilidad
pareja a la actitud infantil y alienada del mundo que muestra la joven. No

13
  Citamos en este pasaje y en los posteriores la traducción de Bernárdez 21960.

130
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

obstante, cabe señalar que la heroína únicamente mostrará esta debilidad a


su Nodriza, así, cuando Ismene intenta que su hermana ceje de su empeño
por enterrar a Polinices, las palabras de Antígona no muestran un atisbo de
duda sobre la acción que está dispuesta a realizar, a pesar de que su hermana
le detalla las consecuencias que puede tener dicha acción, escena III:

Ismene: No podemos hacerlo. ¿Me oyes, Antígona? ¡No podemos


hacerlo! Nos condenará a muerte.
Antígona: Pues claro. Cada uno en su papel, ¿no? Él debe condenar‑
nos a muerte y nosotras debemos enterrar a nuestro hermano Polinice.
Ésos son los papeles.
[…]
Ismene: Somos mujeres, Antígona, y Creonte es más fuerte que noso‑
tras. Es el rey, y todos piensan como él en la ciudad. Nos insultarán.
Nos tocarán con sus mil brazos, con sus mil rostros. Nos escupirán
a la cara…
Antígona: Ampárate en esas excusas. Yo iré a dar sepultura a mi
hermano.
Ismene: ¡Tengo miedo! ¿Qué muerte horrible nos espera si desafiamos
los decretos y el poder del tirano? Pediré a Polinice que me perdone,
pero acataré a la autoridad.
Antígona: Ya no insistiré más. Ahora aunque quisieras, no te admi‑
tiría en la sagrada tarea. Haz lo que te parezca. Yo lo enterraré. Y si
morir es el precio, esa muerte me será dulce.

En este punto, la Antígona de Anouilh-Tabares guarda un cierto pa‑


ralelismo con la heroína sofoclea. La tragedia del dramaturgo ateniense se
abre con un diálogo entre las dos muchachas en el que se evidencia el dis‑
tanciamiento que existe entre ambas y en el que se aprecia desde el primer
momento tanto la soledad como la resolución de Antígona de luchar por
aquello que ella considera ser justo. El distanciamiento entre ambas mujeres
queda patente por el lenguaje que utiliza la propia heroína, así inicia la tra‑
gedia con estas palabras, v. 114:

ΑΝΤΙΓΟΝΗ. Ὦ κοινὸν αὐτάδελφον Ἰσμήνης κάρα

Antígona: ¡Oh, hermana Ismene, de mi misma sangre!

14
  Para el texto griego utilizamos la edición de Mazon reimpr.1967.

131
Núria Llagüerri Pubill

Es remarcable el hecho de que las primeras palabras que pronuncia


Antígona en escena hagan referencia al lazo sanguíneo que une a ambas
mujeres mediante el empleo del término koinón, al que une el término au-
tádelphon que redunda en la misma idea15. Sin embargo, cuando acaba la
escena, la actitud de la heroína hacia su hermana ha cambiado por comple‑
to, pues Ismene le ha negado su colaboración, y se dirige a ella del siguiente
modo, 93, 95-97:

ΑΝ. Εἰ ταῦτα λέξεις, ἐχθαρῇ μὲν ἐξ ἐμοῦ,


[…]
Ἀλλ’ ἔα με καὶ τὴν ἐξ ἐμοῦ δυσβουλίαν 95
παθεῖν τὸ δεινὸν τοῦτο· πείσομαι γὰρ οὐ
τοσοῦτον οὐδὲν ὥστε μὴ οὐ καλῶς θανεῖν.

Antígona: Si hablas así, te aborreceré […] Así que déjame a mí y a mi


funesta resolución sufrir lo terrible, pues no voy a permitir nada que
no sea morir honorablemente.

La desvinculación que Antígona siente es expresada con total claridad en


el v. 95, con políptoton del pronombre personal de primera persona singular
que enfatiza la identificación del emisor con la acción expresada, transmiti‑
éndolo sin equívoco al público asistente a la representación. Por otra parte,
a partir de estas palabras se aprecia por primera vez en la tragedia la soledad
que experimenta la heroína, que acude a su hermana en busca de apoyo,
pero no lo encuentra, es más, es la propia Antígona quien acaba rechazán‑
dola como se puede inferir a partir del empleo del verbo ἐάω en imperativo
en el v. 95. Tanto en Anouilh como en Tabares, Antígona acabará recha‑
zando a su hermana en el primer contacto que ambas tienen en escena, por
lo que se ve en este punto un paralelismo de ambas versiones con la tragedia
sofoclea. Sin embargo, hay un matiz en el que el francés se distancia del
texto sofocleo y del de Tabares. Así, en la versión de Anouilh leemos que,
tras un intento de Ismene por convencer a Antígona de que abandone su
propósito, la heroína la despide con las siguientes palabras, p. 31:
Antigone, sourit.- Tu m’as toujours dit que j’étais folle, pour tout, de‑
puis toujours. Va te recoucher, Ismène…Il fait jour maintenant, tu vois,
et, de toute façon, je ne pourrais rien faire. Mon frère mort est maintenant

15
  Cf. Kamerbeek 1978: 37.

132
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

entouré d’une garde exactement comme s’il avait réussi à se faire roi. Va te
recoucher. Tu es toute pâle de fatigue.
Antígona: (sonríe) Siempre me dijiste que estaba loca, por todo, desde
siempre. Anda a acostarte de nuevo, Ismena…Ya es de día, ¿ves?, y de todos
modos, no podría hacer nada. Mi hermano muerto está rodeado ahora de
una guardia, exactamente como si hubiera conseguido llegar a rey. Anda a
acostarte de nuevo. Estás pálida de fatiga.

Y en la versión de Tabares leemos, escena II:

Antígona: Hablas como enemiga mía y como enemiga de nuestro


hermano. Déjame sola con este empeño, que no han de ser mis males
tantos que me impidan morir con gloria.
Ismene: Tiemblo por ti, pobre Antígona; aunque es temerario lo que
vas a hacer, cumples al menos con lo que amas.
Antígona: No te angusties por mi y cuida de tu propia suerte.

Como se puede comprobar a partir de los pasajes expuestos, en el desenlace


del encuentro entre ambas hermanas la versión de Tabares se aproxima más a la
de Sófocles que a la de Anouilh. Al examinar con detenimiento la escena en la
obra del autor francés, se observa un intento en el autor de conferir a la heroína
un rasgo humano y un afecto de la heroína hacia su hermana que no aparece
en Sófocles y que se puede apreciar en las palabras de la Antígona. Este hecho
podría indicar que el principal objetivo de Anouilh al conservar este diálogo
es el de subrayar lo irrazonable de la actitud de Antígona al compararla con la
de Ismene16. Tabares decide seguir a Sófocles y eliminar esa cierta ternura de
Antígona eligiendo, según creemos, la conservación del personaje de la Nodriza
para mostrar dicho rasgo de la heroína, pues consideramos que la función prin‑
cipal de la Nodriza tanto en la obra del autor francés como en la versión de la
autora extremeña es humanizar a Antígona en tanto que de la interacción de
ambas mujeres se infiere la debilidad ocasional de la heroína, debilidad que
desaparece a partir de la última escena en la que interviene la criada.
La escena V, a la que nos hemos referido con anterioridad, supone el
paso de un parlamento de Ismene en la versión de Anouilh a un diálogo
entre tres personajes17. Desde nuestro punto de vista esta escena supone la
quiebra de la propia Antígona con cualquier matiz infantil de su carácter y

16
  Cf. Deppman, 2012: 528.
17
  Anouilh 1946: 46.

133
Núria Llagüerri Pubill

con cualquier signo de debilidad, de forma que podría concebirse como la


culminación del proceso de maduración al que es sometido el personaje, a
la vez que el inicio del desenlace trágico de la obra.
Aparecen en escena Antígona y Polinices que se encuentran mientras se
escucha en off las voces de Ismene, Hemón y la Nodriza. Se entiende que
estos personajes están dentro de la casa buscando a Antígona y que Ismene ha
comunicado al joven y a la esclava la intención de su hermana de enterrar a
Polinices. Podría inducirse que el reencuentro que se produce entre Polinices
y Antígona simboliza el acto de enterramiento llevado a cabo por la joven y
podría tratarse de una prolepsis de la muerte de la muchacha como conse‑
cuencia del mismo, pues, tal y como informa la acotación presente en el texto,
ambos abandonan la escena juntos dirigiéndose hacia una intensa luz:

Ismene: Pobre Antígona.


Nodriza: ¡Antígona, Antígona! ¿estás ahí?
Hemón: Antígona…
Ismene: Antígona, hermanita, estamos todos a tu alrededor. Hemón,
la nana y yo.
Nodriza: Y te queremos, Antígona.
Hemón e Ismene: Estamos aquí, Antígona. Y te necesitamos.
Nodriza: Polinice no te quería, mi pequeña.
Ismene: Siempre fue un extraño para nosotras, un mal hermano.
Nodriza: Olvídate de él, Antígona.
Hemón: Olvídalo.
Ismene: Olvídalo, como él nos había olvidado.
Nodriza: Deja que su dura sombra vague sin sepultura…
Hemón: … para siempre.
Ismene: Es la ley de Creonte.
Nodriza: No pretendas conseguir lo que no está a tu alcance.
Ismene: Siempre lo desafiaste todo, hermanita…
Hemón: Pero hoy eres muy pequeña, Antígona.
Nodriza: Muy, muy pequeña. Quédate aquí, con nosotros.
Hemón: No vayas; te lo suplico, amor mío.
Ismene: Quédate, Antígona. No persigas a una sombra. No te pierdas
en la oscuridad. (Antígona y Polinice se van untos hacia una intensa
luz en la que se pierden.) ¡Antígona!

Las intervenciones de los personajes en off son frases cortas, lo que po‑
dría dotar de cierta rapidez a la acción que se está llevando en escena, es

134
Entre Sófocles y Anouilh: la Antígona y su nodriza en la refección de Memé Tabares

decir, al reencuentro entre Polinices y Antígona. Asimismo, el lenguaje de


dichas intervenciones redunda en esa dimensión infantil que Anouilh y
Tabares quieren mostrar del carácter de Antígona. Utilizan diminutivos
referidos a la heroína: hasta en dos ocasiones Ismene se refiere a ella me‑
diante el término “hermanita”, en dos ocasiones más utilizarán el adjetivo
“pequeña”, incluso la Nodriza añadirá a este adjetivo el posesivo, aquí con
un tono claramente afectivo, “mi”. Respecto al contenido de este diálogo, se
observa como los tres personajes – Ismene, Hemón y la Nodriza – intentan
persuadir a Antígona para que acate la ley de Creonte y no dé sepultura a
Polinices, y lo hacen con lenguaje infantil, como si la heroína fuera una
chiquilla que se hubiera escondido de ellos. Al partir en intervenciones de
tres personajes el parlamento de Ismene que figura en la versión de Anouilh,
Tabares refuerza en el carácter infantil que el dramaturgo francés propor‑
cionó a la heroína, pues ya no es un solo personaje quien hace patente al pú‑
blico dicho rasgo, sino que lo hacen tres personajes cercanos a la muchacha.
A partir de este momento la Nodriza no volverá a aparecer ni tampoco
volverá a ser nombrada; en contraste, Antígona dejará de lado cualquier atisbo
de debilidad y de infantilismo y se convertirá en la Antígona sofoclea, quien, tal
y como la definirá Jebb, se muestra como una luchadora incansable y resuelta
por la justicia y por el cumplimiento de su deber.18 Se enfrentará a Creonte en
una escena (escena VII) muy cercana al texto sofocleo (473-526), y muy cer‑
cana en algunos puntos a la versión de Anouilh (pp. 69-91); y partirá hacia el
lugar en el que morirá recitando unos versos muy similares al canto que entona
en Sófocles, 824-832, 876-881, 916-929. Tabares conservará el personaje de
Tiresias, que como hemos apuntado Anouilh eliminó, con la misma función
que en la versión sofoclea. El final de la versión de Tabares combina elementos
sofocleos y elementos de la obra de Anouilh: Creonte pronuncia las mismas
palabras que en Sófocles (1319-1325), mientras que el narrador que concluye
la obra pronunciará las mismas que el coro en la versión de Anouilh (p. 126).

III. La versión de Memé Tabares sobre la historia de Antígona utiliza


como hipotexto la obra de Sófocles y la versión de la misma que realizó Jean
Anouilh. La innovación más importante del texto del francés es la introduc‑
ción de una nodriza que se sitúa como pareja dramática de la heroína en la
primera parte de la obra.19 Esta innovación es el objeto de nuestro estudio. En

18
  Cf. Jebb 2004: 28 (Easterling ed.).
19
  Innovación respecto a las recreaciones habituales y al texto sofocleo, puesto que,
como hemos apuntado, se había utilizado el personaje de la nodriza con anterioridad.

135
Núria Llagüerri Pubill

nuestra opinión, Anouilh intentó mostrar un aspecto del carácter de Antígona


que la tradición anterior a él le había negado, nos referimos al lado más hu‑
mano de la heroína y a su necesidad de buscar protección y afecto.20 De entre
todos los personajes de la tradición dramatúrgica, el que mejor puede conferir
este rasgo a la muchacha es sin duda el personaje de la nodriza y en este pun‑
to conviene Gil, quien afirma que esta Nodriza de Anouilh, que en poco se
aporta a los rasgos característicos de este personaje extraídos a partir de las
nodrizas que aparecen en la producción dramatúrgica griega, aporta a la he‑
roína ternura.21 Tabares recoge el testigo de Anouilh en este sentido y a través
del diálogo que establece la heroína con su nodriza se pone de manifiesto su
capacidad afectiva y el sentimentalismo. Por todo ello, podemos concluir que
la aparición de la nodriza humaniza a Antígona en tanto que le proporciona
al personaje una nueva dimensión desconocida hasta el momento, muestra a
una Antígona que necesita el apoyo de su Nodriza ante la debilidad que siente
sabiendo lo que le va a suceder como consecuencia de haber enterrado a su
hermano pasando por alto la prohibición de Creonte.
Tabares muestra además una Antígona que experimenta una evolución psi‑
cológica al poner en escena dos Antígonas en una misma obra y dependiendo
de si el hipotexto es la obra de Anouilh o la obra de Sófocles. Esta evolución
se pone de manifiesto con la desaparición del personaje de la Nodriza en la
trama, tal y como hemos establecido en nuestro estudio. Por consiguiente, en
la primera parte de la obra en la que aparece la Nodriza y en la que se toma en
mayor grado la obra de Anouilh como hipotexto, Antígona se muestra como
una niña, débil e indefensa, que precisa de su Nodriza para permanecer a su
lado en esos momentos. Su lenguaje en las primeras intervenciones contiene di‑
minutivos y términos afectivos referidos a su Nodriza. En cambio, a partir de la
escena V, escena en que la Nodriza interviene por última vez, Antígona cambia
radicalmente y se transforma en la heroína sofoclea; su lenguaje es el mismo que
el de la heroína sofoclea, de hecho, el paralelismo con los vv. 916-925 de la obra
del ateniense es más que evidente. Desaparece cualquier diminutivo o término
afectivo y emplea términos de elevada carga semántica como ley y piedad.
A la luz de lo expuesto podemos inferir que Tabares emplea la figura de
la Nodriza para incidir en la dimensión humana de la heroína, tal y como
hiciera Anouilh, y para demostrar ante el público la evolución psicológica
que experimenta la joven.

20
  Cf. Conradie 1959: 13.
21
  Cf. Gil 1962: 178.

136
Antígona: nome de código –
A peça em um ato de Mário Sacramento
(Antigone: code name - a play in one act, by Mário Sacramento)

Maria Fernanda Brasete (mbrasete@ua.pt)


Universidade de Aveiro

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_7

137
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

Resumo1– Sob a influência da Antígona sofocliana, Mário de Sacramento escre‑


veu uma peça homónima publicada, isoladamente, em 1959, no vol. XIX, nº 186
da “Revista Vértice”, e incluída, no ano seguinte, na tetralogia intitulada Teatro
Anatómico. Nesta peça em um ato, a tragédia homónima de Sófocles configura-se
um recurso metateatral de carácter crítico-reflexivo, em que o diálogo intertextual

1
  Médico, ensaísta, crítico literário, cronista e escritor, Mário Sacramento (1929-1969)
foi um intelectual português, nascido em Ílhavo, que se tornou um símbolo da cidade de
Aveiro, onde exerceu clínica e uma atividade laboriosa de homem de letras. O ensaísmo
constituiu a parte mais substancial da sua obra e, do seu copioso legado crítico-literário,
destacam-se, por exemplo, os títulos seguintes: Eça de Queirós – Uma estética da ironia (1945);
Fernando Pessoa – Poeta da hora do absurdo (1953); Ensaios de Domingo (o primeiro volume
publicado em 1959; os Volumes II e III, editados postumamente); Fernando Namora – O
Homem e a obra (1967); Há uma estética Neo-Realista? (1967). Incansável na luta abnegada
contra o regime ditatorial do Estado Novo (também designado por Salazarismo), revelou-se
um marxista convicto, alimentado por uma fé humanista, que se entregou, de corpo e alma, a
uma militância de resistência, política e cultural, contra o status quo e as circunstâncias opres‑
soras da época de ditadura em que viveu. Símbolo de uma geração de cidadãos, escritores e
pensadores inconformados com o regime ditatorial, extremamente devotado à coisa-pública,
e empenhado na luta antifascista, Mário Sacramento, apesar da sua predileção por assuntos
de índole literária, foi um político ativo, um homem aberto ao diálogo, que participou em
debates de todo o género e em sessões políticas. Criou os “Congressos Republicanos” e pro‑
moveu a iniciativa “Diálogo com os católicos”, cujos textos foram, postumamente, reunidos
no livro (1970), intitulado, Frátria, Diálogo com os Católicos (ou talvez não). Ao longo dos
cerca de quarenta anos do regime ditatorial português, o médico-escritor notabilizou-se
como um pensador controverso e um cidadão incómodo, cinco vezes detido pela PIDE
(Polícia Internacional de Defesa do Estado) e preso em Caxias (uma das prisões políticas do
Estado Novo), além de nem sempre ter sido compreendido pelos seus contemporâneos, no
panorama intelectual e literário português. Firme nas suas convicções e irredutível no seu
anseio de liberdade, um espírito contestatário e polémico, se bem que íntegro e tolerante,
desvela-se também nos textos jornalísticos que publicou, com assiduidade, em jornais da
época (e.g.: “O Comércio do Porto”, o “Diário de Lisboa” e o semanário aveirense “Litoral”)
ou ainda nas páginas do seu Diário, referentes aos anos 1967 e 1968. A incursão de Mário
Sacramento na escrita dramatúrgica foi uma experiência ocasional: na única obra publicada
– a tetralogia intitulada Teatro Anatómico (1959) –, o autor refere um outro projeto teatral
“em preparação” (A Linguagem Sibilina), que, todavia, ignoramos se alguma vez chegou a ser
concluído ou se permanece incompleto ou inédito no fundo de uma gaveta. Na sua laboriosa
atividade crítico-literária, Mário Sacramento revelou-se um leitor incansável e crítico de au‑
tores portugueses (e também estrangeiros), mas é, no terceiro volume de Ensaios de Domingo
(1974), que se encontra uma secção intitulada “Crítica de Teatro”(221-245), dedicada a peças
de alguns dramaturgos contemporâneos. Se bem que não encontremos nenhuma referência
às anteriores Antígonas portuguesas (mas, por certo, Mário Sacramento teria conhecimento
dessas peças), denotam-se, nestes seus escritos, uma consciência dramatúrgica e uma sensibili‑
dade teatral de um crítico intransigente, mas atento e lúcido, que perspetivou o teatro, na sua
relação entre a arte e a vida. Sobre o importante legado de Mário Sacramento no panorama
histórico-cultural e literário português vide Sarabando et al. 2009; Ferreira 2011.

139
Maria Fernanda Brasete

com o ancestral texto trágico promove uma leitura dramática do destino infor‑
tunado dos sobreviventes de uma família francesa, vítima da ocupação alemão,
na Segunda Guerra Mundial, que, como os últimos Labdácidas, confrontam o
sofrimento de situações-limite, ditadas por conflitos insolúveis da condição hu‑
mana. Neste «ensaio dramático de Mário de Sacramento, a protagonista é uma
mulher francesa, Ivonne, que no tempo do Maquis, escolhe, como nome de código,
“Antígona”. Pretende-se, neste estudo, apresentar uma análise da influência exer‑
cida pela Antígona sofocliana neste «ensaio dramático», ao nível da caracterização
das dramatis personae e do desenvolvimento da ação, que se sustenta numa refle‑
xão crítica sobre as motivações da filha de Édipo e o sentido trágico das suas ações.
Palavras chave: Antígona, Mário Sacramento, Sófocles, receção da tragédia gre‑
ga, teatro português.

Abstract – Influenced by the Sophoclean Antigone, Mário de Sacramento wrote


a homonymous play which was published independently, in 1959, in vol. 19, No.
186 of “Vértice magazine” and included in the tetralogy entitled Teatro Anatómico
in the following year. In this play in one act, Sophocles homonymous tragedy lays
out a metatheatrical resource of critical and reflective nature, in which the inter‑
textual dialogue together with the ancient tragic text promotes a dramatic reading
of the unfortunate fate of the survivors of a French family, victim of the German
occupation, in the Second World War, who, like the last of the Labdacids, face
the suffering caused by extreme circumstances, dictated by insoluble conflicts of
human condition. In this dramatic essay by Mário Sacramento, the protagonist
is a French woman, Ivonne, who at the time of Maquis chooses the code name
“Antigone”. This study intends to present an analysis of the influence exercised by
the Sophocle’s Antigone in this «dramatic essay», regarding the description of the
dramatis personae and the development of the action which is based on a critical re‑
flection about Oedipus’s daughter’s motivations and the tragic sense of her actions.
Keywords: Antigone, Mário Sacramento, Sophocles, reception of the Greek tra‑
gedy, Portuguese theatre.

Em 1958, Mário Sacramento publicava, na afamada revista “Vértice”,


uma peça intitulada “Antígona – peça em um acto”2 que, um ano mais tar‑
de, seria incluída na edição da sua única obra dramática conhecida, Teatro
Anatómico (Sacramento 1959), mas sob a sugestiva classificação de “ensaio
dramático”. Contrariamente às “Antígonas” portuguesas que, entre os anos
30 e 50, foram encenadas nos palcos nacionais e têm merecido a atenção

2
  Note-se que, sob este título, a peça de Mário Sacramento foi publicada isoladamen‑
te, no nº 182, vol. XVIII da revista literária “Vértice”.

140
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

de reputados estudiosos3, esta peça de Mário Sacramento nunca alcançou o


palco e, por conseguinte, não figura no elenco das “Antígonas” portugue‑
sas do século XX, referenciadas na obra Representações de Teatro Clássico
no Portugal Contemporâneo (2 volumes), coordenado por Maria de Fátima
Sousa Silva (2001). Tendo permanecido praticamente incógnita até há pou‑
co tempo4, esta não teve a mesma sorte de outras “Antígonas” mais afortu‑
nadas – particularmente três peças anteriores, cronologicamente mais pró‑
ximas: a de António Sérgio (1930), a de Júlio Dantas (1946) e a de António
Pedro (1953)5 –, nas quais a recriação dramática do arquétipo sofocliano
serviu também para veicular uma mensagem política de contestação ao re‑
gime de opressão vigente. Mas há que incluir, na história da dramaturgia
portuguesa do século XX, esta sétima “Antígona”, inspirada na heroína so‑
focliana, da autoria do médico-escritor aveirense.
1. Mesmo não tendo sido um “homem de teatro”, a verdade é que Mário
Sacramento exercitou-se também como dramaturgo, numa fase de maturi‑
dade do seu intenso labor ensaístico, com a publicação de Teatro Anatómico.
E esse seu interesse por aquela que é “a mais difícil das artes” manifestar-se‑
-ia ainda num outro nível: nos textos de crítica teatral que, ocasionalmente,
foi escrevendo, nomeadamente, em Ensaios de Domingo III (1990). Por tudo
isto, valerá a pena resgatarmos, das prateleiras mais esconsas da História
do Teatro Português, a sua única obra dramática publicada – a tetralogia
Teatro Anatómico6 –, em cujas páginas se encontra mais uma “Antígona”
portuguesa.
O sugestivo título escolhido pelo médico-escritor para a sua tetralogia
traz-nos à memória A. Vesálio (1514-1564), o médico renascentista que
consagrou a anatomia científica moderna. Ora o termo “anatomia” ter-se-á
convertido, subsequentemente, numa metáfora aplicável às diversas formas
da vida humana, intelectual e social, e a sua associação ao “teatro” deveu-se
não só ao facto de Vesálio ter utilizado o drama como analogia nos seus es‑

3
  Sobre as “máscaras portuguesas” de Antígona, muito próximas da peça sofocliana
homónima, e com uma intencionalidade político-pedagógica mais ou menos marcada,
escreveram alguns classicistas portugueses excelentes ensaios, que, sob a coordenação de
Carlos Morais (2001), foram editados no primeiro suplemento da revista Ágora. Estudos
Clássicos em Debate. Aí se reuniram sete importantíssimos estudos, dois deles inéditos,
sobre cinco das seis recriações dramatúrgicas conhecidas do tema de Antígona.
4
  Um primeiro estudo desta peça de Mário Sacramento foi publicado na 4.ª edição do
volume “Voltar a Ler”, coordenado por Ferreira 2011. See Brasete 2011.
5
  Vide Morais 2001: 85-101.
6
  Sacramento 1959.

141
Maria Fernanda Brasete

tudos do corpo humano, mas também porque as aulas de anatomia decor‑


riam em anfiteatros edificados com uma finalidade científico-pedagógica,
para que as dissecações fossem realizadas in praesentia de um público nu‑
meroso de espetadores. Pressente-se que, possivelmente, a conceção e arqui‑
tetura da tetralogia do médico-dramaturgo português esteja alicerçada na
própria polissemia da metáfora anatómica que, nas dicotomias vida/morte,
realidade/aparência, se projeta no teatro, onde a exposição pública do ser
humano se corporiza, dissecando-se mesmo a sua interioridade/subjetivi‑
dade, mas fomentando a interpretação do ‘olhar’ de quem observa. Neste
sentido, o teatro criava a ilusão de encenar uma “anatomia viva” e o drama,
mesmo parecendo indiferente ao espetador, dirigia-se a ele.
Estas brevíssimas considerações talvez nos permitam compreender me‑
lhor porque as quatro peças que compõem este Teatro Anatómico não apre‑
sentem um desenvolvimento estrutural aparentemente coeso, um corpus
unificado, e porque a autonomia/anatomia de cada uma delas se manifesta,
também, na diversidade genológica que as qualifica: uma tragédia a abrir
(que dá o título à obra, “Teatro Anatómico”); seguida de uma farsa (“Prédio
de rendimento”), com “Antígona” (um “ensaio dramático”), em terceiro lu‑
gar; e uma comédia a finalizar, (“A Boca e a dona”).
Sobre esta tetralogia, hoje praticamente esquecida, mas que não passou
despercebida aquando da sua publicação, Jorge de Sena, para quem Mário
de Sacramento era “um dos melhores críticos portugueses” (]1989]1998:
278), escreveu palavras tão incisivas quanto estas:

“São quatro peças num acto, que, em boa verdade, me custa a com‑
preender que Mário Sacramento tenha escrito e, tendo-as escrito,
publicado. Não lhes encontro nexo íntimo, transbordam de literatura
e de racionalizações abstractas, nada acrescentam ao teatro português
e servem muito mal ao prestígio real do autor.” (1998: 278)

Posteriormente, um outro prestigiado crítico teatral, Luiz Francisco


Rebello (1994: 246), viria a corroborar, ainda que num estilo mais mode‑
rado, as “lúcidas […] considerações” tecidas por Jorge de Sena a propósito
desta “tentativa dramático-literária” – falhada, subentenda-se – do presti‑
giado médico-escritor aveirense.
Mas a história da receção do teatro de Mário de Sacramento não se
resume a estas duas apreciações, manifestamente negativas, de dois pres‑
tigiados críticos teatrais, justamente reconhecidos no panorama nacional,
pelo valiosíssimo contributo que prestaram à reforma e à modernização

142
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

do Teatro Português. Mesmo sem nos determos na receção crítica7 à obra


teatral de Mário Sacramento, convirá salientar-se que a radicalidade dos
juízos de Jorge de Sena e da avaliação de Luiz Francisco Rebello terá de
ser interpretada em função de uma ideia de teatro, enformada por princí‑
pios programáticos e estético-ideológicos bem definidos, que privilegiavam,
acima de tudo, a concretização física da cena perante um público efeti‑
vamente presente e que a modernização dramatúrgica se consubstanciasse
numa renovação da arte do espetáculo. Ora, nesta perspetiva, a incursão de
Mário de Sacramento na arte dramatúrgica foi, efetivamente, uma “tenta‑
tiva falhada”, já que as suas peças não alcançaram o seu destino último – o
palco. Mas apesar de um projeto teatral malogrado, a obra literária perdura:
e ela merece, com toda a certeza, ser estudada de modo atento, em prol de
um melhor entendimento do moderno Teatro Português. Além disso, se
considerarmos a dispersa obra ensaística de Sacramento, verificamos que
o interesse e a reflexão crítica que dedicou ao Teatro modelam-se sobre as
linhas de força que enformam um pensamento estético- literário dominado
por preocupações sociopolíticas e uma aturada consciência crítica. Segundo
Luiz Francisco Rebello8, “o experimentalismo, as preocupações sociais e a
reflexão existencial” caracterizaram o teatro que se escreveu na primeira
metade do período compreendido entre o fim da Segunda Guerra e o fim
da ditadura salazarista. No final da década de 50, os dramaturgos portu‑
gueses distanciavam-se das estruturas teatrais tradicionais e, especialmente
sob a influência de Brecht, tendiam a recorrer a uma linguagem crítica, a
personagens e situações abstractas, que deformavam até ao absurdo a rea‑
lidade circunstante, por um lado, e por outro a transposição do presente
para factos e figuras exemplares do passado histórico, ou destas para aquele,
eram as várias tentativas de dizer-se o que, directamente, a censura não
consentia que se dissesse. (25)
Sob o lema de que “o Teatro é a ficção pura” (1959: 9) e perseguin‑
do a “lição de Pirandello” (10), os eixos temáticos que unem estas quatro
peças de Mário Sacramento sustentam-se no postulado de que é a partir
da imaginação que se constroem as personagens e, nos conflitos das suas
existências, são as ações concretas realizadas no cotidiano que definem uma
determinada subjetividade, sempre em função das escolhas feitas pelo in‑

7
  Na última secção do Livro de Amizade. Lembrando Mário Sacramento, intitulada
“Contributo para a Bibliografia de Mário de Sacramento”, referem-se catorze recensões ao
Teatro Anatómico, publicadas em periódicos da época. Cf. Sarabando et al. 2009: 315-6.
8
  Rebello 1984.

143
Maria Fernanda Brasete

divíduo. Como Pindarello e Sartre, o dramaturgo português9 equaciona a


temática de uma existência multifacetada, conflituosa e dialética, que sente
e respira as angústias da humanidade, especialmente quando confrontada
com a ideia da morte inevitável. O autor teatral expõe, assim, em cada uma
das quatro peças, o conflito de personagens particulares, em determinadas
experiências vividas, a partir de circunstâncias concretas do quotidiano,
mas dirigindo o olhar crítico do espectador para a realidade (imaginada)
do universal singular, permitindo-lhe contemplar, simultaneamente, a ob‑
jetividade e a subjetividade do ser-no-mundo. Poder-se-á dizer que, de certo
modo, a obra dramática de Sacramento procurar elevar o espetador/partí‑
cipe a uma dimensão reflexiva sobre as personagens em situação porque,
numa perspetiva existencialista, o homem é aquilo que ‘faz’ com a vida:
não há um destino pré-determinado; Deus não existe e não há heróis; a vida
não tem um sentido a priori; e o homem constrói-se numa existência que
alcança o seu sentido mais autêntico em face da morte.
No contexto teatral da época em que surgiu10, esta Antígona afigura‑
-se, assim, um caso singular na forma como o nome da desditosa filha de
Édipo faz reviver a matriz sofocliana, reconfigurando, de uma forma assaz
original, a antiga figura trágica que também marcava presença nos palcos
europeus11. Esta peça de Mário Sacramento testemunha, a seu modo, a so‑

9
  Mário Sacramento conheceria, inclusive, a Antigone de J. Anouilh (1944), mesmo
que não tenha assistido a nenhuma das duas representações da peça francesa, ocorridas em
Lisboa, nos anos de 1945 e 1946.
10
  Convém referir que, na mesma década, duas outras peças portuguesas recriaram
o mito de Antígona: a “Glosa Nova da Tragédia de Sófocles” de António Pedro (1953) e
a tragédia de João Castro Osório, inserida na Trilogia de Édipo (1954). Se bem que ambas
tivessem subido ao palco, foi a peça de António Pedro a que foi objeto de um maior número
de representações, em diferentes cidades do país. Duarte Ivo Cruz 1983: 205 observa que
“a partir de 1945, a evolução do teatro português se processou em termos de reflexão de
linhas evolutivas sócio-económicas peculiares” e desde o fim do período do pós-guerra até
à atualidade pode definir-se uma “trajectória coerente, no quadro dos seguintes pontos
matriciais: concentração num temário de análise e crítica social muito marcado e politi‑
camente empenhado; tentativa de renovação das expressões cênicas e do espetáculo; visão
cultural do teatro como um todo; certa irregularidade a nível de profissionalismo, com
grande ênfase dada ao experimentalismo e à descentralização por via profissional e amado‑
ra; irregularidade da frequência de público, com uma clara passagem do teatro comercial,
bom ou mau, para o teatro experimental ou culturalmente exigente, o que teve como efeito
a médio prazo o desaparecimento da revista” (2001: 303).
11
  See por exemplo, o marcante estudo de Steiner 2008, originalmente publicado em
1984, consagrado à influência que o mito/mito de Antígona exerceu, na tradição ocidental,
nos mais variados domínios: filosófico, político, teatral, literário e artístico. De salientar,

144
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

brevivência do mito grego mas revitalizado numa forma dramática, mode‑


lada sob a influência de princípios filosóficos e estéticas teatrais datados, e
em função de determinadas intencionalidades autorais. Não será, portanto,
despiciendo salientar a diferença que marca esta Antígona em relação às
suas homónimas coevas, particularmente portuguesas12. Libertando-se da
estrutura canónica da tragédia, sem enjeitar, no entanto, a matriz grega, e
com uma vocação teatral latente, que, infelizmente, nunca se concretizou,
esta configura também uma peça política de resistência, se bem que em
moldes muito diferentes dos adotados por outros dramaturgos portugueses
contemporâneos.

2. Atendamos, em primeiro lugar, à classificação genológica que Mário


Sacramento atribuiu, no Teatro Anatómico, a esta peça em um ato, publi‑
cada isoladamente, no ano anterior, como já se referiu, numa das revistas
literárias mais consagradas da época (Vértice). A designação de “ensaio dra‑
mático” que figura sob o título desta terceira peça da coletânea, projetava
de imediato um grau de estranhamento em relação ao intertexto trágico
sofocliano, o que se intensificava no facto de o nome de Antígona não fi‑
gurar no elenco das 3 personagens da peça: “MICHEL, aliás CHARLES,
aliás LOUIS (quarenta e tal anos); YVONNE (vinte e poucos anos); O
Cego (cerca de setenta anos)”13.Num cenário doméstico, a ação destas per‑
sonagens evolui num compartimento acanhado da casa – “a saleta” –, de
uma família francesa, durante a Segunda Guerra Mundial. O horizonte de
expetativas criado pelos elementos paratextuais prenunciava uma intencio‑
nalidade tácita de transfiguração da personagem mítica de Antígona, tal
como a designação de “ensaio dramático” sinalizava uma inusitada arti‑
culação dialética da forma dramática (que postulava o primado da ação,
mais não fosse por respeito à própria etimologia do termo) com o pendor
discursivo-argumentativo do ensaio, numa simbiose original, que não se
eximia, todavia, à antiga matriz helénica. Em vez do legado trágico conven‑

no entanto, que as “Antígonas” ibero-americanas não foram contempladas nesta obra. En‑
tre os vários estudos mais recentes sobre a receção do mito de Antígona destacamos, além
do já citado supl. 1 da revista Ágora. Estudos Clássicos em Debate, (Carlos Morais 2001),
Bosch 1979, Jabouille, Fialho 2000; Llinares 2001; Gil 2007; Bañuls Oller, Crespo Alcalá
2008; Duroux, Urdician 2010; Moretón 2011; Mee, Foley 2011; Camacho Rojo 2012;
Chanter, Kirkland 2014; López 2015; López, Pociña 2015.
12
  Para uma interpretação geral do tema de Antígona na dramaturgia portuguesa do
século XX, vide Silva 2010: 287-294.
13
  Sacramento 1959: 108.

145
Maria Fernanda Brasete

cional, esta peça em um ato – a forma constrangida que o drama moderno


privilegiou –, experimentava uma síntese, simultaneamente económica e
criativa em termos literário-teatrais, de dois géneros (o teatro e a filosofia)
que, na antiga Grécia, elegeram o diálogo14 como uma forma de expressão e
de representação privilegiadas, numa tentativa de interpretação do mundo
e da vida. Na verdade, a antiga tragédia grega representou através do mito
os mesmos problemas que mais tarde a filosofia levantaria de uma forma
racional e secularizada.
Neste “ensaio dramático” protagonizado por uma mulher francesa, de
“vinte e poucos anos”, chamada Yvonne, Antígona é, desde o início, uma
presença ausente que se converte, todavia, no élan mítico de um drama
familiar vivido em França, “durante a ocupação alemã” (Sacramento 1959:
113-115). Diferentemente de outras recriações dramatúrgicas portuguesas
anteriores, o modelo formal adotado afastava-se intencionalmente da es‑
trutura trágica canónica, ainda que o desenvolvimento linear da ação en‑
trecruzasse elementos tão paradigmáticos da antiga tragédia grega como a
anagnorisis e a peripatheia. Uma atmosfera iminentemente trágica pairava,
desde o início da peça, sobre as vivências subjetivas daquelas três persona‑
gens que encarnavam um drama em que o mythos se rememorava através
do logos. A ação passa-se no interior de uma casa francesa, habitada pela
protagonista, Yvonne, o seu velho pai, o Cego, e um hóspede, denominado
Michel, vítima de um cancro fatal. A didascália inicial fornecia as seguintes
indicações cénicas:

(Uma saleta. Portas ao fundo e à direita. Uma estante com livros.


Michel, sentado, escreve sobre uma prancheta apoiada nos braços
da cadeira. Está em pijama, envolto num xaile-manta. Semblante
de doença e sofrimento. Batem à porta do fundo.) (1959:107)

O sentido da peça excedia a intenção de adaptar a tragédia sofocliana à


mensagem política de uma peça de resistência; os conflitos concretizam-se
e interligam-se a partir de uma análise ético-social que os despe, os disse‑
ca, os expõe na sua vulnerabilidade existencial. O cenário emparedado da
saleta representava, por sinédoque, um lar francês destroçado pela Segunda
Grande Guerra, mas é o diálogo com o passado mítico-literário que vai

14
  Em Ensaios de Domingo III, Sacramento 1974: 230 escreve: “A situação do nosso
teatro é esta: quanto menos teatro temos, mais textos surgem. E é caso para perguntar:
porquê? Eu penso que nos falta diálogo”.

146
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

iluminar o drama infortunado daqueles sobreviventes de uma família fran‑


cesa, que, como os últimos Labdácidas, não podia eximir-se ao sofrimento
de uma existência trágica. O nível ideológico funde-se com o estético nessa
reconfiguração de uma visão dececionada da condição humana. Persistiam,
todavia, as tradicionais antinomias nomos/physis, masculino/feminino, in‑
divíduo/sociedade, vida/morte, amor/ódio, enquanto pilares de uma ação
movida por laços de consanguinidade e de solidariedade, que nos afetos
encontraria o último reduto para redimir o sentido de uma existência desi‑
ludida e irremediavelmente condenada ao sofrimento e à morte.
Sinalizando um claro caminho de modernidade, esta peça propunha
uma reflexão crítica, indiscutivelmente inovadora, sobre uma personagem/
tema mítico que, desde a tragédia sofocliana, se manteve vivo em centenas
de obras ao longo de sucessivos séculos e pela mão de muitos escritores –
numa proliferação significante que ainda hoje parece não ter terminado. E
a principal novidade desta peça residia, de facto, na forma inusitada como
Mário de Sacramento se apropria da figura trágica de Antígona.
3. A peça é dominada, desde o início, pelo diálogo entre a jovem pro‑
fessora de literatura, Yvonne, e o ex-membro do Maquis, Michel, que, na
fase terminal da sua doença (um cancro tardiamente diagnosticado) pro‑
curara “uma casa onde (…) acabasse à luz do dia” (p. 109). O isolamento
e o desalento destas personagens ensombram, desde o início, um cenário
constrangido que cria a ilusão de que o teatro é um reflexo da vida. O di‑
álogo desenvolve-se num discurso de pendor reflexivo em que os temas da
identidade, do amor e da luta pela liberdade se entrecruzam num jogo cé‑
nico que presume uma outra personagem ausente, curiosamente chamada
Madeleine, a mulher do Maquis que Michel ama e com quem Yvonne se
encontra para lhe entregar mensagens (relatórios e cartas pessoais) da‑
quele “resistente” que, mesmo naquela fase terminal do cancro, acredita
que o seu «dever é prosseguir na luta, se for possível”(p. 109). As duas
personagens em cena representam metaforicamente a deriva e o fracasso
do ser humano perante o estranho rumo da vida. Questionando a sua
identidade e manifestando um sentimento de desalento pelo percurso de
uma existência estilhaçada, sofrida e aparentemente sem sentido, Yvonne
expressa a sua angústia:

Nós estamos em margens opostas do grande rio do medo. Eu quero


partir. Você acaba de chegar. O rio tem uma ponte – a do heroísmo.
Chegando, você proclama o heroísmo um mal. Se bem que necessário.

147
Maria Fernanda Brasete

(…) Mas eu estou aquém do heroísmo e da plenitude. E quero seguir.


(pp. 117-118)

Perspetivando-se a vida como um fluxo incessante, o “porquê” de uma


existência constituía o projeto último do ser humano, que, no entanto, pre‑
cisa do Outro para esclarecê-lo sobre o sentido da sua própria vida. Por isso,
Yvonne, ao confessar que seu passatempo “nos abrigos, durante os bombar‑
deamentos” (p. 111) era fazer malha, questiona-se sobre as experiências vivi‑
das, solicitando a opinião daquele hóspede, na ânsia de encontrar o projeto
de futuro:

YVONNE – (…) Com esta herança de família, com esta herança de


sexo, terei eu o direito de me deixar conduzir pelas meras aspirações
da consciência? Não irei afogar-me no desprezo de mim mesma, pon‑
do em risco todas as missões que me sejam confiadas? Há muito que
desejo ouvir uma opinião sobre isto. E se é útil fazer malha: acaso será
inútil, Michel, ajudar-me a entrar em mim?” (pp. 114-115)

A intriga dramática evoluía, resgatando, obliquamente, alguns topoi da


antiga tragédia sofocliana nessa reflexão de pendor existencialista, mas o
mais relevante seria o facto de o arquitexto Antígona se transformar num
elemento metateatral que iria gerar um efeito de distanciamento crítico em
relação à tradição trágica. Uma tradução anotada da antiga peça é, na pró‑
pria ficção, objeto de reflexão e crítica por parte das personagens, que se
construem numa idealização estetizante da sua existência dramática, víti‑
mas de um pathos familiar que converte o espetáculo de dor e sofrimento
num teatro que encena as ações e a forma humana de viver, desligadas a
instância divina enquanto compreensão do sentido oculto das contingên‑
cias da vida.
Cruzando a influência do arquétipo sofocliano com a “lição” de
Pirandello, Mário Sacramento expôs o homem individual na sua solidão
e fez incidir o cerne do drama nas vivências e no pathos familiar das suas
personae. Todas as personagens da peça valem pela dignidade com que vi‑
vem uma existência incomplacente, especialmente naqueles momentos de
tensão em que a doença e a morte emergem como uma força inexorável
que limita e define a dimensão da existência humana. Mas esta Antígona
alicerça-se numa conceção de homem muito distanciada da antiga tragédia

148
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

grega. Na senda do existencialismo sartriano15, a cena dramática expõe o


homem, por forma a que ele se reconheça autenticamente nela, sobressain‑
do, assim, as facetas sentimental e psicológica daquelas três dramatis figurae
que, encarceradas no conflito concreto da situação, experienciam uma luta
contra o absurdo do mundo e a barbárie injustificada. No mundo moder‑
no da Segunda Guerra, as personagens desta peça insurgem-se contra a
situação político-social vigente e as agruras das suas vidas, mas submissas
à sua própria humanidade, despojadas, portanto, da grandeza dos antigos
modelos heroicos, porque não as movem princípios e valores universais.
Convencido de que “só a ação ensina” (p. 112) e de que “a lição da experiên‑
cia reside na própria memória dos factos” (p. 115), Michel (cujo pseudóni‑
mo era “Charles”, na Resistência16) responde às inquietações existenciais da
sua gentil hospedeira, com um argumento político-ideológico, sintonizado
com o pensamento revolucionário da época:

Só enfrentará os problemas do nosso tempo quem seja filho legítimo


ou adoptivo do povo. O seu caso é o da adopção – social e política, está

15
  Apesar de se tratar de um movimento filosófico e literário distinto, o Existencialis‑
mo foi particularmente difundido em meados do século XX através das obras do escritor
e filósofo francês Jean-Paul Sartre, em particular através da sua obra L’existentialisme est
un humanisme (1946). Anteriormente, no célebre ensaio L’ être et le néant (1943), Sartre
alicerçara os princípios basilares do seu pensamento existencialista numa reflexão filosófica
sobre a questão da liberdade. Sob a influência de um conceito cartesiano de sujeito, baseado
na relação “homem-mundo”, e sustentado na ideia de que é o homem que escolhe ‘ser’,
sendo o ‘fazer’ sempre intencional, postulava-se que não existiam valores éticos universais
para a vida humana. (Sobre a receção e influência do Existencialismo em Portugal, no
século XX, vide Real 2011. Na obra ensaística de Mário Sacramento são muito frequentes
as referências ao existencialismo filosófico e, nomeadamente, a Sartre. Por exemplo, num
texto intitulado “A Fé do Humanista”, publicado em De Fratria (apud Sarabando et alii
2009: 238), o escritor aveirense reconhece como preciosa a “contribuição” do existencialis‑
mo para o conhecimento da subjetividade mas defendendo sempre a ideia de que a experi‑
ência existencial deve ser entendida como uma praxis de vida coletiva, porque o homem é
um “ser eminentemente social”. À semelhança de J.P. Sartre, o escritor português recusava
uma visão individualista, abstrata ou transcendente das ações humanas, postulando que a
subjetividade é condicionada pelas vivências sociais e que o indivíduo dever ter a liberdade
de fazer as suas escolhas e, por conseguinte, a capacidade de transformar o mundo real.
16
  Durante a Segunda Guerra Mundial, surgiram em França vários movimentos de
resistência à ocupação alemã, entre os quais o célebre movimento colaboracionista francês
de Vichy, que constituíram a então denominada “La Résistance”. Esses grupos de resistên‑
cia também ficaram conhecidos pelo nome de “Le Maquis”, um termo que, em francês,
designava uma espécie de vegetação mediterrânica abundante nos bosques da região sudo‑
este do país, onde muitos desses resistentes se escondiam para atacar os ocupantes alemães.

149
Maria Fernanda Brasete

claro, que tem sobre a adopção comum esta diferença: parte do filho
para o pai e não do pai para o filho. No dia em que lhe corra nas veias
o sangue adoptivo do povo, Yvonne, a subjetividade do seu meio natal
não levará a melhor sobre os ditames da sua consciência. (pp. 115-116)

As interferências do real e do imaginário projetam a ação numa espécie


de sobre-realidade em que estas personagens pluridimensionais se movem e
se desvelam na sua intersubjevidade essencial, criando uma nova forma de
recriar a figura de Antígona.
O diálogo mantém-se natural, vivo, dinâmico, oportuno, sugerindo
energicamente a tensão dialética das personagens que, sob o poder da ilusão
teatral, evocam as antigas máscaras do mito sofocliano, num contexto em
que o passado longínquo se substancia, simbólica e materialmente, na ma‑
nipulação de um volume da antiga tragédia grega, cuja releitura impulsiona
o confronto de opiniões, numa família dizimada pela guerra, que resistia no
limiar de uma existência humanamente digna. Nessa perspetiva, estamos
perante um tipo de teatro metarreflexivo, a Antígona sofocliana ultrapassa
os limites da ficcionalidade “(re)ganhando vida”17, num espaço cénico ani‑
mado pelo realismo filosófico do discurso. É sob a influência da estética
pirandelliana que o dramaturgo português representa o eterno conflito
entre o “eu” e o mundo, em que a máscara consubstancia o artifício da
ficção que a personagem cria de si mesma. O teatro de Mário Sacramento
volta-se prioritariamente para a sua ficcionalidade, impondo-se como uma
forma estética, como uma convenção artística, em que a arte não pretende
reproduzir o real, mas reganhá-lo, tematizando-se a si própria e pondo em
questão as novas formas de relacionamento entre ficção e realidade.

4. A protagonista desta peça é Yvonne, “uma mulher de vinte e poucos


anos”, uma professora francesa de literatura, que corporiza, de uma forma
visceral, o drama de uma filha e de uma irmã a quem a Segunda Grande
Guerra destruiu a família e ensombrou a existência. Numa solidão abnega‑
da, busca um sentido para os seus problemas existenciais e familiares, com
uma dignidade dramática que a aproxima da Antígona de Édipo em Colono,
porque um sentimento extremo de devoção familiar leva-a a assumir de

17
  Na abertura do seu Teatro Anatómico, Mário Sacramento apresenta um texto pro‑
gramático, intitulado “À procura de Pirandello ou um ensaio em guisa de prefácio”, 1959:
8-18, no qual afirma: “A realidade ilusória do ser, formalizada em ficção, aspira a reganhar
a vida como realidade concreta.”

150
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

forma ativa o papel de guardiã do velho pai (o Cego). Logo na abertura da


peça, a philia e a compaixão revelam-se como traços essenciais do carácter
daquela filha que, só depois do consentimento do seu velho pai, acolhe em
sua casa Michel, um membro do Maquis (La Résistance), irremediavelmente
condenado à morte por um cancro fatal. Uma relação de empatia aproxima
Yvonne e o seu hóspede, num momento-limite da vida, mas a evolução da
ação precipita-se para a catástrofe anunciada – a morte do hóspede no final
da peça –, mas não sem antes ocorrer uma reviravolta (peripatheia) na in‑
triga, proporcionada pelo velho topos do reconhecimento (anagnorisis) entre
os dois irmãos.
Michel, cujo nome de código fora “Charles”, era afinal Louis, o Polinices
daquela “Antígona”, que apesar de vivo se defrontava com a iminência de
uma morte anunciada. Àquele sobrevivente de muitas batalhas, o destino
transformara numa vítima de uma doença incurável, a que nenhum ser
humano podia resistir. E é precisamente nesses últimos momentos de ago‑
nia trágica que os dois irmãos evocam as histórias das suas vidas, reais e
inventadas, num cenário oprimido pelo medo e pela impossibilidade de agir
livremente. No artifício do teatro, as personagens criam as suas máscaras
que transfiguram os rostos das personagens que encarnam, na ilusão de
“reganhar a vida como realidade concreta”18. É precisamente neste contexto
metateatral que Yvonne, cujo pseudónimo no Maquis havia sido simples‑
mente “a irmã de Charles”, decide então escolher como nome de código
“Antígona”, pelo significado que essa antiga personagem trágica detinha
naquela que considerava ser a sua própria tragédia familiar.

Yvonne _ O pseudónimo de meu irmão sei que é Charles. E Eu tinha


sido apenas «a irmão de Charles». (Emocionada) Mas de hoje em
diante serei…a Antígona!” (pp. 116-117)

Antígona era, também, a peça sobre a qual o seu querido irmão prepa‑
rava uma tese antes de partir para a guerra, mas presentificada em cena
num volume repleto de anotações, entretanto desaparecido da estante, e que
acabaria por precipitar o reconhecimento entre ambos19.

18
  Vide nota anterior.
19
  De referir que Yvonne, como explicará posteriormente ao irmão, desconfiara da sua
identidade quando percebera a dificuldade física que ele tinha em movimentar para trás o
braço esquerdo e o facto de continuar a utilizar nos seus apontamentos “umas abreviaturas

151
Maria Fernanda Brasete

YVONNE – (…) Não encontro o volume. Pertencia a meu irmão.


Tem as margens cobertas de anotações suas. Ainda ontem lhe peguei.
E voltei a pô-lo aqui…
MICHEL (sucumbindo e apontando a porta direita) – Levei-o, a noite
passada, para o meu quarto…
YVONNE (ardendo em expectativa) – E de todos estes livres, escolheu
esse precisamente…
MICHEL (erguendo-se, agitado) – Venceste, Yvonne, eu sou Louis!
(p. 121)

Seguidamente, Michel, que afinal era Louis, apazigua o desejo obsessivo


da irmã em cumprir o “dever familiar” de sepultar o corpo do irmão (p.
117), que imaginava morto em combate.

MICHEL – Escuta meu bem. É justo que sepultes o teu irmão. Não
pelos motivos de outrora. Pelos do teu coração. (pp. 121-122)

Ora é precisamente no decorrer do confronto contínuo entre estes dois


“mundos”, o real e o imaginário (mítico), o familiar e o social, que se inten‑
sifica o pathos do ser humano, nas vivências destas personagens ambíguas
que se constroem e se desconstroem na ficção. Assim, o jogo metateatral
que esta peça cria com a sua matriz originária – a antiga tragédia sofocliana
– põe em evidência a impossibilidade de solução para os conflitos huma‑
nos, um drama irremediavelmente condenado ao sofrimento e à morte. O
volume da tragédia Antígona, aparentemente desaparecido da estante, de‑
sempenha, por isso, uma função mais complexa do que a do adereço teatral
que propicia o reconhecimento entre os dois irmãos: converte-se material‑
mente na peça-dentro-da-peça, que conferir à reflexão crítica um grau de
verosimilhança imprescindível e eficaz em termos dramatúrgicos. O teor
discursivo da peça denunciava uma consciência estético-teatral ativa, em
que o olhar clínico do autor-médico se confundia com a arte do ensaísta‑
-dramaturgo. A peça derivava, assim, num drama de pendor filosófico que
concentrava o conflito na ambiguidade das ações e reações que as persona‑
gens corporizaram, bem como nos paradoxos de uma vida que dificilmente
podia ser entendida e muito menos podia prenunciar uma réstia duradoura
de felicidade .

tão patuscas” (p. 123). Estes dois “sinais” conferem verosimilhança ao reconhecimento que
se efetuara em termos verbais.

152
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

Se recordarmos as explicações que o Autor fornece no “Prefácio” à


coletânea, é à luz da confessada influência do teatro de Pirandello, – o
seu ponto de referência principal, que leu e estudou no original – pode‑
remos perceber como Yvonne, à semelhança das outras Seis personagens à
procura de um Autor, busca na ficção a essência do seu ‘ser’. O principal
ponto de partida do nosso dramaturgo é mostrar que a “verdade” da per‑
sonagem de ficção pode, muitas vezes, ser mais forte do que a “verdade”
do ser humano. Quando a identidade da personagem de ficção vacila no
agonismo das situações, a incerteza instala-se entre a máscara e o rosto,
num jogo metateatral que convoca, através da ficção, uma reflexão crítica
sobre o arquitexto mítico que, nesta peça, se pretendia reinterpretar. Esse
é o intento da personagem-Michel, quando, antes de se dar a reconhecer,
confronta a sua caridosa hospedeira com uma interpretação dissonante
da tragédia da verdadeira “Antígona” – a figura sofocliana, entenda-se.
Contrariando a tradicional tese de heroísmo, ele sugere que a filha do
desditoso Édipo agira em proveito próprio, na ilusão de que a sua recla‑
mação pública de cumprir um dever religioso – contra o édito tirânico
de Creonte, dar sepultura ao cadáver do irmão postergado - lhe poderia
devolver a glória perdida.

MICHEL (angustiado e tentando outra evasiva) – Perdemo-nos em lite‑


ratura, minha amiga. Cada um é responsável por si. E a Antígona de
Sófocles, se abstrairmos as ideias religiosas do tempo, apresenta-se-nos
hoje como uma mulher sedenta apenas de glória.” (p. 118)

Aliás, este era um dos temas da tese que preparava sobre as origens do
teatro (p. 117), antes de partir para a Guerra. “Michel/ Charles” considerava
“inútil” o heroísmo da heroína sofocliana, porque, na sua interpretação, se
baseava em razões puramente egoístas. Depois de uma breve sinopse da
peça sofocliana, Charles repete a sua tese: “Só as convicções religiosas do
tempo justificam Antígona” (p. 119). À boa maneira da dialética grega, ele
incitara Yvonne a contra-argumentar e a expor a sua interpretação, criando
um momento agónico em que, pelo confronto verbal, as personagens se
revelam nos seus dramata.
Na senda de uma exegese mais consentânea com a tradição, entendia
Yvonne que o ato de solidariedade demonstrado por Antígona, na situação‑
-limite do seu dilema familiar, conferia-lhe uma dimensão heroica, genuína
e irrepreensível, além de que não lhe restava outra possibilidade de ação: ela
não podia resgatar os erros dos seus familiares.

153
Maria Fernanda Brasete

YVONNE – Antígona foi uma pobre mulher, Michel. Uma pobre


mulher empenhada na sua própria dignidade. Não perca de vista o
drama familiar! Despedindo-se dela e do irmão, o pai predissera-lhes
o escárnio público, filhas da ignomínia que eram. Elas seriam a pos‑
teridade monstruosa, a progénie do crime. Antígona era noiva do filho
de Creonte, mas o incesto dos pais estava de permeio entre eles. Repare
que ela faz notar ao rei que o irmão não morrera como escravo. Foi
portanto a tragédia familiar que sobretudo a moveu. Ela perdeu o chão
sob os pés. E, não podendo resgatar os erros dos seus, solidarizou-se
com o que lhes restava de dignidade na desgraça. (…) (pp. 120-121)

Como oportunamente Michel já havia alegado, num estilo marcada‑


mente sentencioso, “há uma dialéctica entre egoísmo e altruísmo fora do
qual o mundo não tem sentido” (p. 111). Nesta disparidade de perspetivas,
ampliava-se então o ancestral dilema, trágico, porque irresolúvel; filosófico,
porque questionado a partir de argumentos lógicos modernos. Mas Yvonne
não se subjuga à interpretação do seu irmão, bem pelo contrário, revela-
se inabalável nas suas convicções, concluindo: “Nós estamos em margens
opostas do grande rio do medo. Eu quero partir. Você acaba de chegar” (p.
112). Neste mundo dramático em que os antigos deuses não existem mais,
os caracteres atuam movidos pela ilusão de que defendem princípios e va‑
lores que não se subsumem à sua própria tragédia familiar. Yvonne é uma
personagem que ganha alguma estatura trágica quando toma consciência
de que não abdica dos seus ideais e se decide, determinada, a vencer o medo
dos seus infortúnios. Resistirá e reganhará a vida, apesar da morte iminente
daquele irmão reencontrado, ao cumprir a “razão moral” (117) reivindicada
pela arquetípica sofocliana: conceder-lhe uma sepultura honrosa.
Por outro lado, a resistente devoção fraterna de Yvonne-Antígona es‑
pelha-se também na força do sentimento de philia familiar que dedica ao
seu velho pai, liminarmente designado de Cego, alquebrado pelos anos e
vergado pelo fardo de uma culpa, que nem os olhos vazados lhe “extingui‑
ram as visões” (p. 113). Ele fora um juiz que cometera o erro imperdoável
de colaborar com os nazis, condenando à morte inúmeros compatriotas
seus. Da expiação física dessa hamartia se encarregara a filha de um deles
(Franceline), que num ato desesperado de vingança lhe atirou para o rosto
um frasco de vitríolo, condenando-o irremediavelmente à cegueira. Fora,
no entanto, uma ilusão pensar que o medo acabara. Nas trevas de uma
existência condenada, restava-lhe apenas o amor incondicional de uma filha

154
Antígona: nome de código – A peça em um ato de Mário Sacramento

que o guiava numa vida subjugada a uma cegueira imobilizadora 20. Nas
contingências de uma existência, por natureza antinómica, e condenada ao
sofrimento, apenas a philia familiar prefigurava uma possibilidade redento‑
ra de uma sobrevivência amaldiçoada.
Neste “ensaio dramático”, tal como na antiga tragédia grega, não se pre‑
tendia representar o drama do ser humano isolado, mas sim o modo como
as suas ações afetavam os outros, num continuum em que o hic et nunc do
teatro se construía como metáfora das contingências inexoráveis da vida
humana. A figura sofocliana de Antígona, e principalmente a tragédia ho‑
mónima, constitui uma referência temática crucial para a interpretação des‑
ta peça em um ato de Mário Sacramento, indiscutivelmente inovadora na
forma como revivificava a antiga figura trágica, intencionalmente adaptada
a uma época de pós-guerra e ao contexto político-cultural português. As
novidades que Mário Sacramento introduziu nesta releitura crítica do tema
de Antígona constituem um testemunho vivo da ousadia do dramaturgo
que explorou a ambiguidade trágica do mito para reescrever uma peça sub‑
versiva, em termos ideológicos e estéticos, e que merecia ter cumprido o seu
destino teatral num palco português.

20
  Nesta peça, como acontece na homónima de Júlio Dantas, Yvonne incorpora traços
do carácter da Antígona de Édipo em Colono, revelando-se uma filha protetora que guia,
física e espiritualmente, o seu velho pai cego, incondicionalmente dedicada aos valores
familiares.

155
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa
(Antigone and Medea in the short story “A Benfazeja”, by João Guimarães Rosa)

Gilmário Guerreiro da Costa (gilmario.filosofia@gmail.com)


Universidade de Brasília e Universidade de Coimbra

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_8

157
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

Resumo – O presente artigo pretende analisar e interpretar os topoi clássicos pre‑


sentes nos estratos intertextuais do conto “A benfazeja”, do escritor brasileiro João
Guimarães Rosa. Essa narrativa elabora uma síntese cuidadosa de componentes
das personagens Antígona, de Sófocles, e Medeia, de Eurípides. Descreve-se a pro‑
tagonista do conto mediante traços afins às heroínas das duas peças gregas. Nesse
percurso, sobressai o questionamento dos limites do sacrifício e da culpa, indivi‑
duais e coletivos, tema por excelência da obra. É desse movimento intrinsecamente
trágico que nos ocupamos no presente trabalho, atentos não apenas aos planos de
semelhança entre os textos estudados, mas também à peculiaridade da narrativa
rosiana.
Palavras-chave: Guimarães Rosa; Antígona; Medeia; sacrifício; culpa

Abstract – This paper tries to analyse and interpret the Classical topoi present in
the intertextual strata of the short story “A benfazeja”, by the Brazilian writer João
Guimarães Rosa. This narrative elaborates a careful synthesis of some aspects of
Antigone, by Sophocles, and Medea, by Euripides. It describes the story´s protago‑
nist through traces related to both Greek plays´ heroines. The questioning of the
limits of the sacrifice and the guilt, individual and collective, stands out in the
course of the plot and is the theme par excellence of the story. We are especially
concerned with this intrinsically tragic movement. In addition, we are attentive not
only to the similarity of the plans, but also to the peculiarity of Rosa´s narrative.
Keywords: Guimarães Rosa, Antigone, Medea, sacrifice, guilt.

1. Introdução

O livro Primeiras estórias (1962), do escritor brasileiro João Guimarães


Rosa, encerra 21 contos marcados pela invenção lexical e aprofundamento
das técnicas de fragmentação já presentes em seu romance Grande sertão:
veredas (1956). Cada uma das suas pequenas narrativas apresenta as perso‑
nagens e o seu espaço a partir das margens da racionalidade ocidental e dos
discursos oficiais da nação. No interior desse projeto artístico divisam-se
exercícios de recepção de elementos da Antiguidade Clássica, mormente
aqueles tomados à tragédia grega. Em um dos seus contos, “A benfazeja”,
semelhante procedimento intertextual movimenta a síntese cuidadosa da
construção da protagonista com os traços afins às personagens Antígona, de
Sófocles, e Medeia, de Eurípides. O enredo vai paulatinamente inclinando
os leitores à interpelação dos limites do sacrifício e da culpa, individuais e
coletivos, tema por excelência da obra. É a esse veio trágico que o presente

159
Gilmário Guerreiro da Costa

ensaio intenta oferecer a análise e interpretação, atento não apenas aos pla‑
nos de semelhança entre os textos, mas também à delimitação do locus pe‑
culiar da narrativa rosiana.
Convém esclarecer inicialmente alguns pressupostos deste trabalho.
O conjunto da obra rosiana buscou oferecer a devida síntese aos polos do
localismo e cosmopolitismo1, bem como às oposições entre regionalismo
e espiritualismo, marcantes na literatura brasileira na primeira metade do
século XX 2. Sua obra, portanto, inscreve os traços regionais que represen‑
ta e os reinventa em diálogo com a literatura universal, que nunca perde
de vista. Outro pressuposto, intimamente ligado ao anterior, refere-se aos
traços distintivos do seu construto intertextual. Notam-se na obra rosiana
ideias, procedimentos e objetos tomados a outros autores. No entanto, em
nenhum momento o faz explicitamente. Não escreve, por exemplo, uma
Ilíada, Eumênides, Antígona, e, no entanto, aspectos dessas obras são obser‑
váveis em suas narrativas. Trata-se de uma intertextualidade alquímica: não
se atém apenas à presença, mas à sua revivificação com vistas a vincar novos
significados e possibilidades.
Tais considerações permitem-nos evitar dois modos a nosso ver equivo‑
cados de interpretar a obra rosiana: seja pela ênfase exclusiva na cor local,
seja pela celebração de ideias universais. Há ainda a considerar-se a forma
em que se plasma semelhante processo, a escrita fragmentária, um artesa‑
nato textual que se compromete com o inacabamento enquanto projeto
literário, envolvendo-se com o exercício artístico da perda. É a partir de tais
fios complexos que Rosa inseriu no âmbito da literatura brasileira e univer‑
sal a sua arte.

2. Exercício de intervenção a partir das margens da sociedade

O conto ora em análise encontra-se, como já indicamos, no livro


Primeiras estórias, título que desperta atenção pelo seu caráter algo inusi‑
tado. Suas narrativas configuram “primeiras estórias” no sentido de serem

1
  Candido 2006. O objeto de análise de Antonio Candido não é a obra de Guimarães
Rosa, mas o desenvolvimento do sistema literário brasileiro na primeira metade do século
XX. A nosso ver, seu diagnóstico aplica-se perfeitamente ao itinerário artístico do escritor
mineiro.
2
  Galvão 2000.

160
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

primordiais (originárias) e ficcionais (matéria de invenção). Mais precisa‑


mente, urdem a encenação das origens. São também a desmontagem das
histórias fundantes de uma comunidade, matriz de suas estruturas de poder
e exclusão. O adjetivo revelaria, nesse caso, feição acentuadamente irônica.
Alfredo Bosi sublinha que o tema da precariedade material é recorren‑
te no livro: “O espaço comum a essas histórias é também um universo
de pobreza; a figura de seres lesados, crianças doentes, animais indefesos,
mulheres e homens loucos só faz levar essa atmosfera até os confins da
indigência”3. Maria Luiza Ramos, por seu turno, nota a coerência entre a
renovação verbal rosiana e a sua busca por redescobrir os traços do huma‑
no por trás da massificação: “procura desvendar nas desgastadas palavras
de todos os dias a sua latente expressividade, lança-se inteiro na ansiosa
busca do humano, oculto na brutal mediocridade da massificação”4. Eis
a razão de predominarem no livro personagens infantis5. O espanto e o
surpreendente dominam o seu campo semântico, se atentamos às palavras
nele recorrentes: “vemos que essas palavras se circunscrevem a um mesmo
campo semântico, de que o surpreendente poderia perfeitamente ser o de‑
nominador comum”6. Adiante, amplia com acerto a dimensão filosófica
dessas escolhas de Guimarães Rosa: as palavras que examinou “convergem
para a problemática central: a falta de lógica da existência, ou a angústia
provocada pela insegurança da vida humana”7. Os dois críticos acertam
na ênfase concedida aos elementos comuns aos diversos contos da obra, ao
mesmo tempo em que não se esqueçam de encarecer a feição própria de
cada uma das narrativas.
No caso específico de “A benfazeja”, a história descreve e analisa os ges‑
tos e ações da protagonista que não tem nome, mas apenas a alcunha que lhe
impingiu os moradores da sua cidade: Mula-Marmela. Com isso qualificam
sua aparência indesejável a muitos, pois é uma mulher alquebrada, pobre e
mestiça. O foco narrativo é de primeira pessoa, embora o modo como apre‑
senta o material faz pressupor um conhecimento privilegiado, afim a um
narrador onisciente. Adiante se vai esclarecendo serem os fatos que apre‑
senta procedentes de informações colhidas no seio da própria comunidade.
O enredo movimenta o contraste entre essa mulher e o grupo social que a

3
  Bosi 2003: 34.
4
  Ramos 1991: 515.
5
  Ramos 1991: 515-516.
6
  Ramos 1991: 516.
7
  Ramos 1991: 519.

161
Gilmário Guerreiro da Costa

mantém às margens. Acusam-na de haver matado o marido e deixado cego


o enteado. A ambos também faltam nomes, sobram alcunhas: o primeiro é
o Mumbungo, o segundo, o Retrupé. De fato, o narrador esclarece ter sido
ela a autora desses crimes. Mas quando os praticou, movia-se pelo compa‑
decimento com as vítimas do marido, objeto que eram de terrível suplício.
O filho dele manifestava o mesmo caráter perverso do pai. A certa altura,
incapaz de manter-se alheia à espiral de violência provocada pelo esposo,
decide-se pela ação que todos na cidade desejavam, posto que lhes faltasse
coragem. A estratégia do narrador consiste em apresentar-se como espelho
das contradições e do ânimo dobre dessa comunidade. Em sua interpelação
acentuadamente irônica, sempre dirigida àquele grupo social, sustenta que a
pobre mulher submeteu-se a um sacrifício em favor da coletividade.
A já referida ausência de nome da protagonista é mencionada recorren‑
temente: “Soubessem-lhe ao menos o nome. Não; pergunto, e ninguém o
inteira. Chamavam-na de a “Mula-Marmela”, somente, a abominada”8. Sua
carência não deixava imune sequer o nome, o que contribui para lançá-la
ainda mais em espaço de invisibilidade. Em vez da nomeação, o insulto
– essa outra forma de contra-nomeação. O narrador parecia inquirir dos
pormenores da personagem, sem que ninguém acorresse em seu auxílio.
Focaliza assim uma mulher apagada, despercebida, em um lugarejo não no‑
meado. Com esse procedimento, intenta apresentar um grupo social a partir
das suas margens: “Sei que não atentaram na mulher; nem fosse possível”9.
É uma escolha feliz para o início da narrativa. Resume a essência da histó‑
ria e oferece a contrapartida da outra cegueira, a do seu enteado, Retrupé,
como veremos adiante. O perfil da protagonista nada tem de sublime:

A mulher – malandraja, a malacafar, suja de si, misericordiada, tão


em velha e feia, feita tonta, no crime não arrependida – e guia de um
cego. Vocês todos nunca suspeitaram que ela pudesse arcar-se no mais
fechado extremo, nos domínios do demasiado?10.

A aparência a todos desagrada, feita de faltas e ausências. A comunidade


tentou fazer corresponderem, nesse mulher, a feiura física e as falhas morais.
Os “domínios do demasiado” parecem aduzir ao âmbito da “desmedida”,

8
  Rosa 1994: 475.
9
  Rosa 1994: 475.
10
  Rosa 1994: 475.

162
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

da hybris, do que ela se veria impulsionada a realizar, como se obedecesse a


obscuros desígnios.
Um pouco adiante descrevem-se mais alguns aspectos da constituição
física de Mula-Marmela: “A que tinha dores nas cadeiras: andava meio se
agachando; com os joelhos para diante”11. Expressa ainda imagem por exce‑
lência da angústia12: “Qualquer ponto em que passasse, parecia apertado”13.
Todo o seu ser movia a desconfiança, o incômodo, mas jamais a filantropia
ou o compadecimento. Vivia como uma estrangeira em sua própria terra:
“Sabe-se se assustava-os seu ser: as fauces de jejuadora, os modos, contidos,
de ensalmeira? Às vezes, tinha o queixo trêmulo. Apanhem-lhe o andar
em ponta, em sestro de égua solitária; e a selvagem compostura. Seja-se
exato”14. É claro que não se devia exatamente ao seu ser, mas à aparência
que manifestava, o fato de instilar medo e espanto. Com isso se concentra‑
rá, por contraste, a força do seu sacrifício que a eleva como heroína trágica,
enquanto rebaixa a cidade que a condenou. É um modo ousado de conduzir
a tribunal precisamente o tribunal dos cidadãos.

3 Sacrifício e culpa

A presença, nessa história, dos elementos afins à personagem Antígona


situa-se em dois momentos: no fato de a protagonista do conto ser guia
de cego (tal como em Édipo em Colono) e no gesto de preterir o seu bem‑
-estar em favor de uma ação que pretendia beneficiar a cidade. Este último
é o mais significativo, pois se articula com o tema do sacrifício e da cul‑
pa, especialmente importante na compreensão dessa pequena narrativa de
Guimarães Rosa.
Antígona, no âmbito do sacrifício que se entretece paulatinamente, in‑
forma à sua irmã, Ismena, das decisões de Creonte (S. Ant. 23-36). Não

11
  Rosa 1994: 475.
12
  Referimo-nos à etimologia do termo: angustia significa “falta de espaço”, “es‑
treiteza”, “confinamento”, uma passagem estreita entre montanhas. Tudo isso aduz uma
sensação de sufocamento e medo. Observe-se ainda que o advérbio anguste significa “estrei‑
tamente”, “apertadamente”, e o verbo angusto “tornar estreito”, “estreitar”, “estrangular”,
“apertar” (Bryan-Brown 1968: 130-131).
13
  Rosa 1994: 475.
14
  Rosa 1994: 475.

163
Gilmário Guerreiro da Costa

apenas proibia que se prestassem honras fúnebres a Polinices, irmão de am‑


bas, mas ainda impunha a pena da lapidação pública aos desobedientes.
Ela então convida a irmã a que a ajude nos serviços fúnebres a que se sente
obrigada, sem que encontre, no entanto, o assentimento desejado. Faz, por
esse motivo, declaração firme que bem resume o cerne do polemos que mo‑
vimentará o enredo: “Sim, a esse irmão que é meu e teu, ainda que o não
queiras. Não me acusarão de o ter atraiçoado”15 (S. Ant. 45-46). Ela afirma
atender a valores sagrados: “e tu, se assim te parece, desonra aquilo que para
os deuses é honroso” (S. Ant. 76-77). A certa altura, em verso admirável, no
contexto das tentativas de Ismena de dissuadir a irmã, lê-se: “Conservas um
ânimo esquentado perante a fria realidade (Θερμὴν ἐπὶ ψυχροῖσι καρδίαν
ἔχεις)” (S. Ant. 88).
Na peça de Sófocles, Creonte apresenta-se como detentor legítimo do
poder político, após o fratricídio de Polinices e Etéocles (S. Ant. 170-174).
Em observação que haverá de, ironicamente, voltar-se contra si, ele afirma:
“É impossível conhecer o espírito, pensamento e determinação de qualquer
homem, antes de ele se ter exercitado no poder e nas leis” (S. Ant. 175-176).
Experimentará nele mesmo o acerto dessa expressão gnômica, ainda assaz
abstrata no momento em que a profere, quando vier a saber que o seu édito
foi desobedecido por Antígona. Esta, apanhada em flagrante, é levada à
presença do soberano, e afirma que tinha conhecimento da lei, mas ainda
assim a descumpriu, pois não lhe constava que representasse de modo al‑
gum o conselho dos deuses, em especial o de Zeus:

É que essas não foi Zeus que as promulgou, nem a Justiça, que coabita
com os deuses infernais, estabeleceu tais leis para os homens. E eu
entendi que os teus éditos não tinham tal poder, que um mortal pu‑
desse sobrelevar os preceitos, não escritos, mas imutáveis dos deuses
(S. Ant. 450-455).

O desfecho colocará em ênfase o sacrifício de Antígona, após a sua con‑


denação por Creonte. Com relação à culpa, transitará entre a heroína e o
próprio soberano, ao longo dos diversos passos da peça, conforme se obser‑
vam as reações do coro, sem que a peça forneça indicação cabal de haver se
inclinada em favor de um deles.
Imagens do sacrifício e da culpa movem assim os fios íntimos de ambas
as obras, a de Sófocles e a de Guimarães Rosa. No caso deste último, tecerá,

15
  Servimo-nos da tradução de Rocha Pereira 2012.

164
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

em um dos seus planos, a cumplicidade dialética entre o horror despertado


pela protagonista e, ao mesmo tempo, a necessidade que essa mesma cidade
tem desses párias, pois neles se sente autorizada a deitar as suas emoções
mais obscuras. Rejeita-os, e deles depende. O narrador provoca a cidade,
indagando se em algum momento cogitaram a possibilidade de haverem se
equivocado: “E nem desconfiaram, hem, de que poderiam estar em tudo e
por tudo enganados? Não diziam, também, que ela ocultava dinheiro, ra‑
pinicado às tantas esmolas que o cego costumava arrecadar?” Logo a seguir
apresenta sentença que acolhe em si o núcleo trágico e irônico dessa história:
“Rica, outromodo, sim, pelo que do destino, o terrível”16. A exemplo de
Antígona, o destino também opera aqui os seus fios misteriosos. Se articu‑
lamos essa passagem com a célebre “Ode ao homem”, no primeiro estásimo
da Antígona (332), o deinos se recobre de nova função, ao perder os matizes
de maravilhoso e prodigioso, para viger o estranho e o terrível.
O terceiro parágrafo do conto oferece a transição que movimentará a
trama, ou a recordação da trama. O narrador pede: “Lembrem-se bem,
façam um esforço”17. Assim como se enganaram com as faltas que repu‑
taram àquela mulher, também poderiam haver se equivocado com a sua
aparência: “Não fosse reles feiosa, isto vocês poderiam notar, se capazes de
desencobrir-lhe as feições, de sob o sórdido desarrumo, do sarro e crasso; e
desfixar-lhe os rugamentos, que não de idade, senão de crispa expressão”18.
Aparência e equívoco revelam-se figuras dominantes na história. Ao final
desse mesmo parágrafo, há a menção ao crime que ela cometeu. O narra‑
dor medita (em conjunto com os seus interlocutores, que nunca tomam a
palavra) sobre a natureza dessa transgressão. Esta lhe parece, se não justi‑
ficável, ao menos carecer dos mesmos componentes divulgados na cidade:
em grande medida, foi de um homem temível, mal sob vários aspectos, que
ela livrou a cidade:

Do que ouvi, a vocês mesmos, entendo que, por aquilo, todos lhe esta‑
riam em grande dívida, se bem que de tanto não tomando tento, nem
essa gratidão externassem. Tudo se compensa. Por que, então, invocar,
contra as mãos de alguém, as sombras de outrora coisas?19.

16
  Rosa 1994: 475.
17
  Rosa 1994: 475.
18
  Rosa 1994: 475.
19
  Rosa 1994: 475.

165
Gilmário Guerreiro da Costa

O narrador joga os múltiplos testemunhos entre si. Busca contrapor aos


surdos boatos uma narrativa mais coerente, a estória por trás das histórias
– ver, por trás das aparências, senão o verdadeiro, pelo menos a emergência
de um plano mais complexo e matizado. A cidade, ao invés, era quem devia
a essa mulher marginal.
A despeito da aparente indignação, todos sentiram-se aliviados com o
assassinato de Mumbungo: “quando ela matou o marido, sem que se saiba a
clara e externa razão, todos aqui respiraram, e bendisseram a Deus. Agora,
a gente podia viver o sossego, o mal se vazara, tão felizmente de repente” 20.
Apesar da incômoda afirmação de a cidade haver-se beneficiado com essa
morte, ninguém soube recompensar a sua autora – o narrador aqui joga
com notável perspicácia e malícia com a incoerência desse grupo: “Mas não
a recompensaram, a ela, a Mula-Marmela; ao contrário: deixaram-na no
escárnio de apontada à amargura, e na muda miséria, pois que eis” 21. Longe
de uma defesa moral do assassinato, lança sem rebuço na face da cidade os
silêncios e a dissimulação que a constitui, seu recalque ao lidar com os seus
desejos mais sombrios. É nesse caminho que se pode interpretar a obser‑
vação dele, a certa altura: “Dizem-se, estórias”22. A referência, mais direta,
eram aos boatos acerca da alma de Retrupé, que alguns julgavam essencial‑
mente malévola, danada mesmo. Em termos mais amplos, também alude à
tessitura de histórias que constitui uma cidade, não exatamente àquilo que
revelam, mas mais propriamente ao que as suas palavras esforçam-se por
disfarçar, e que ao fim se tornam espécie de palimpsesto inconsciente, escon-
dendo os seus segredos sob o traçado aparente dos discursos de acusação.
Movia a protagonista, a contrapelo do “discurso oficial”, o lamento
pela morte das vítimas de marido, delas se compadecia intensamente: “A
Marmela, pobre mulher, que sentia mais que todos, talvez, e, sem o sa‑
ber, sentia por todos, pelos ameaçados e vexados, pelos que choravam os
seus entes parentes, que o Mumbungo, mandatário de não sei que poderes,
atroz sacrificara”23. Ele era um homicida contumaz, afeito a toda sorte de
perversão: “Esse Mumbungo era célebre – cruel e iníquo, muito criminoso,
homem de gostar do sabor de sangue, monstro de perversias. Esse nunca
perdoou, emprestava ao diabo a alma dos outros”24. Em que pese o seu com‑

20
  Rosa 1994: 477.
21
  Rosa 1994: 477.
22
  Rosa 1994: 477.
23
  Rosa 1994: 477.
24
  Rosa 1994: 476.

166
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

portamento perverso, demostrava surpreendente afeição pela esposa: “O


amor é a vaga, indecisa palavra. Mas, eu, indaguei, sou de fora”25. Desponta
o caráter fluido, imprevisível de eros, capaz de dobrar aos seus caprichos os
seres mais improváveis. A passagem também interessa pela revelação que o
narrador faz de si: é um estrangeiro, ou seja, também um estranho, a exem‑
plo da protagonista da sua história, e assim mais propenso à empatia pelo
destino dela.
Há uma passagem sobremodo reveladora, o §11, em que a invisibilida‑
de social da personagem se constrói em contraste com a pressa com que a
julgaram. Fizeram-no sem que a tivessem, em nenhum momento, olhado
com vagar: “E outra vez vejo que vêm, pela indiferente rua, e passam, em
esmolambos, os dois, tão fora da vida exemplar de todos, dos que são os
moradores deste sereno nosso lugar”26. Apresenta-se um quadro narrativo
no qual se concita os moradores à imaginação, a confrontarem a indiferen‑
ça com o olhar atento aos párias da história: “Notem que o cego Retrupé
mantém sempre muito levantada a cabeça, por inexplicado orgulho”27. Em
seguida, o narrador desenvolve notável semântica de gestos antitéticos: a ru‑
deza de Retrupé e a delicadeza de Marmela: “Mas, notaram como é que
a Mula-Marmela lhe apanha do chão o chapéu, e procura limpá-lo com
seus dedos, antes de lho entregar, o chapéu que ele mesmo nunca tira, por
não respeitar a ninguém?”28. Tal como Antígona, a pobre sertaneja poderia
dizer: “Não nasci para odiar mas sim para amar” (S. Ant. 523). Alguns pa‑
rágrafos adiante, encontra-se esta descrição também atenta à delicadeza dos
gestos da protagonista: “Mas, reparando com mais tento, veriam, pelo me‑
nos, como ela não é capaz de pegar estouvadamente em alguma coisa; nem
deixa de curvar-se para apanhar um caco de vidro no chão da rua, e pô-lo
de lado, por perigoso”29. Seu olhar é em tudo diferente daquele dos demais
moradores, porque isento de indiferença – é, a rigor, a única que efetiva‑
mente vê na história: “Ela olha para tudo com singeleza de admiração”30. E
ainda: “Mas vocês não podem gostar dela, nem sequer sua proximidade to‑
leram, porque não sabem que uma sina forçosa demais apartou-a de todos,

25
  Rosa 1994: 476.
26
  Rosa 1994: 478.
27
  Rosa 1994: 478.
28
  Rosa 1994: 478.
29
  Rosa 1994: 479-480.
30
  Rosa 1994: 478.

167
Gilmário Guerreiro da Costa

soltou-a”31. Circunstâncias diversas, ao evidenciar a precariedade da condi‑


ção dessa personagem, cortaram os laços que a uniam aos outros moradores.
É uma narrativa do desfazimento dos laços entre homem e comunidade. A
escrita fragmentária do conto concede a isso forma bastante apropriada. Há
narrativas que unem, e outras que pretextam justificar o rompimento dos
liames, justificar a culpa e o desterro.
Em mais uma peça contundente de acusação, o narrador assevera: “Ela
não tinha filhos – “Ela nunca pariu...” – vocês culpam-na. Vocês, creio,
gostariam de que ela também se fosse, desaparecesse no não, depois de ter
assassinado o marido. Vocês odeiam-na, destarte”32. O agon característico
da Antígona, de Sófocles, é aqui substituído pelo uso idiossincrático de ex‑
pedientes retóricos, como, por exemplo, o epidíctico. O narrador responde
por essa via ao ato dos moradores, ao recusarem à protagonista a palavra.
Esta outra passagem é de grande beleza:

Vão-se [Marmelo e Retrupé]; nunca nenhum de vocês os observou, a


gente não consegue nem persegue os fios feixes dos fatos. Vivem em
aterrador, em coisa de silêncio, tão juntos, de morar em esconderijos.
A luz é para todos; as escuridões é que são apartadas e diversas33.

Escapa-nos a urdidura dos fatos, sua interligação – difícil, neste caso,


aceder ao reclamo aristotélico de estruturação dos acontecimentos (Arist.
Po. 1450a 5). Partilham o silêncio e a escuridão – uma escuridão muito
particular. Tal explica o modo desconcertante com que a pobre mulher
enxergava a realidade circundante: “Olhava na direção do não”34. Podia ver
melhor que os outros, pois intuía os pontos de fissura do cotidiano, suas
sombras escondidas.
A morte de Retrupé é tratada em tonalidade ambígua. Os moradores
reputam que Marmela o matara, qual Medeia, a mulher terrível na ima‑
ginação dessa comunidade – também tributavam à protagonista do conto
artes mágicas e feitiçaria. Relembremos algumas passagens em que ora se
anuncia, ora se efetiva o infanticídio na peça de Eurípides. A Ama, por
exemplo, afirma, em passagens diversas: “Abomina os filhos e nem se alegra

31
  Rosa 1994: 478.
32
  Rosa 1994: 478.
33
  Rosa 1994: 480.
34
  Rosa 1994: 480.

168
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

em vê-los”35 (E. Med. 36), “Ide, ó filhos, para dentro de casa, que lá tudo
estará bem. (...) eu já a vi olhá-los com os olhos bravos de um toiro, que vai
fazer algo de terrível; nem cessará a sua cólera, eu bem o sei, sem se abater
sobre alguém” (E. Med. 89-95), “Ai, ai de mim, desgraçada! Porque entram
as crianças na culpa que é do pai? porque os odeias? Ai, filhos, como eu
temo que algo sofrais!” (E. Med. 115-118). Medeia, por sua vez, expressa:
“Ó filhos malditos de mãe odiosa, perecei com vosso pai, e a casa caia toda
em ruínas” (E. Med. 112-114), “Gemo ao pensar na acção que em seguida
tenho de praticar. Porque eu vou matar os meus filhos” (E. Med. 791-793),
“Amigas, decidida está a minha acção: matar os filhos o mais depressa que
puder e evadir-me desta terra” (E. Med. 1236-1237). E, finalmente, o Coro
dirige-se a Jasão, confirmando a execução do infanticídio: “Teus filhos es‑
tão mortos pela mão de sua mãe” (E. Med. 1309). Não surpreende o fato de
os concidadãos de Mula-Marmela necessitarem dessa imagem, com a qual
supõem justificar o martírio e indiferença que lha impuseram. Por fim, em
vez da prisão, optam pelo seu banimento.

4. Transitoriedade e expiação

A estrutura vicária de que os moradores assim dependem liga-se não


apenas às ações vis, mas também aos sentimentos mais cruéis que atribuem
a outrem. Mula-Marmela, nesse sentido, funciona como perfeito bode ex‑
piatório. Cabia somente a ela a execução de um crime pelo qual todos ansia‑
vam: “A mulher tinha de matar, tinha de cumprir por suas mãos o necessá‑
rio bem de todos, só ela mesma poderia ser a executora – da obra altíssima,
que todos nem ousavam conceber, mas que, em seus escondidos corações,
imploravam”36. Logo a seguir, acrescenta: “Só ela mesma, a Marmela, que
viera ao mundo com a sina presa de amar aquele homem, e de ser amada
dele; e, juntos, enviados. Por quê? Em volta de nós, o que há, é a sombra
mais fechada – coisas gerais”37. Ninguém, senão ela mesma, estaria em con‑
dições de praticar esse ato temível, entre outras razões porque o destino
a vinculou ao marido. O narrador é cauteloso ao indagar os motivos que

35
  Todas as citações da Medeia procedem da tradução de Rocha Pereira 2013.
36
  Rosa 1994: 477.
37
  Rosa 1994: 477.

169
Gilmário Guerreiro da Costa

explicaria essa ligação. Em grande medida, as sombras a que alude figuram


os limites explicativos do quadro.
Conquanto se a apresente como bode expiatório, há não poucas dúvidas
sobre o merecimento da cidade a quem se oferece o sacrifício:

E ela ia se indo, amargã, sem ter de se despedir de ninguém, tropeçan‑


te e cansada. Sem lhe oferecer ao menos qualquer espontânea esmola,
vocês a viram partir: o que figurava a expedição do bode – seu expiar.
Feia, furtiva, lupina, tão magra. Vocês, de seus decretantes corações,
a expulsavam38.

O banimento, aqui, não confere legitimidade à cidade, que se reforçaria


mediante a figura do bode expiatória. A função do narrador, ao invés, reside
precisamente em confrontar o consolo psicológico da coletividade ao desfi‑
gurar com a sua narrativa a eficácia simbólica do exílio de Mula-Marmela.
Da exclusão à piedade marca-se transição demasiado súbita que instrui a
reserva e a desconfiança. Nessa narrativa de ausências de nomes, o próprio
corpo dessa mulher marca os signos do negativo.
De ausências e negatividade é também tecido o epodo em que Antígona
lamenta as diversas privações que perfazem o itinerário da sua vida, mor‑
mente após a condenação proferida por Creonte:

Sem lágrimas, sem amigos,


sem himeneu, desgraçada,
pelo caminho que me espera
sou levada.
Da luz o disco sagrado
não posso mais, infeliz,
contemplar.
A minha sorte, sem pranto,
amigo algum a lamenta.

Ἄκλαυτος, ἄφιλος, ἀνυμέναι-


ος <ἁ> ταλαίφρων ἄγομαι
τάν ἑτοίμαν ὁδόν·
οὐκέτι μοι τόδε λαμπάδος ἱερὸν
ὄμμα θέμις ὁρᾶν ταλαίνᾳ·

38
  Rosa 1994: 477.

170
Antígona e Medeia no conto “a Benfazeja”,
de João Guimarães Rosa

τὸν δ’ ἐμὸν πότμον ἀδάκρυτον


οὐδεὶς φίλων στενάζει39 (S. Ant. 876-882).

Duas cerimônias especialmente relevantes na vida da polis, o casamen‑


to e o funeral, são recusadas a Antígona. Nem lhe serão oferecidos os vo‑
tos alegres do matrimônio (anymenaios), nem o pranto triste perante a sua
morte (aklautos). Faltam-lhe amigos (aphilos) que pudessem partilhar de
ambos os eventos. Já nos versos iniciais evidencia-se, na própria construção
da linguagem, o espaço de negatividade que perfaz o itinerário da heroína.
O desfecho arremata o plano de privação que orienta a passagem: sem lá‑
grimas (adakryton), por inexistir quem pudesse lamentar a sorte que pesava
sobre ela. Mark Griffith observou, acerca dessa passagem: “In the astrophic
epode, Ant. sums up her situation, with renewed images of funeral and we‑
dding. Alpha-privatives and negatives underline the anomaly of her lonely,
unfulfilled death”40.
Como já vimos, descreve-se igualmente com construções negativas e
privativas a personagem Mula-Marmela, ora por seus traços físicos, ora por
qualificativos morais que a cidade não cessou de lhe impingir. Há, além
disso, outra linha de proximidade entre os dois casos: a ambas não se aplica
a punição inicialmente prevista. Em vez da lapidação pública, que constava
a princípio do édito de Creonte, Antígona será presa no interior de uma
caverna; Mula-Marmela, por sua vez, se verá condenada ao desterro. São
duas formas extremas de punir no outro o incômodo espelho dos vícios
mais próprios.
As últimas linhas de “A benfazeja” descrevem um plano desolador e mar‑
cado por intenso estranhamento e pela referência mais explícita à Antígona:

E, nunca se esqueçam, tomem na lembrança, narrem aos seus filhos,


havidos ou vindouros, o que vocês viram com esses seus olhos terri‑
vorosos, e não souberam impedir, nem compreender, nem agraciar.
De como, quando ia a partir, ela avistou aquele um cachorro morto,
abandonado e meio já podre, na ponta-da-rua, e pegou-o às costas,
o foi levando –: se para livrar o logradouro e lugar de sua pestilência
perigosa, se para piedade de dar-lhe cova em terra, se para com ele ter

39
  Compulsamos o texto grego preparado por Lloyd-Jones, Wilson 1990.
40
  Griffith 1999: 273

171
Gilmário Guerreiro da Costa

com quem ou que se abraçar, na hora de sua grande morte solitária?


Pensam, meditem nela, entanto.41

Posto que haja dúvidas sobre a motivação da protagonista, assinala-se na


sua última ação o gesto solitário de livrar a cidade de mais uma mácula que
poderia conspurcar o seu caráter e a sua paz. Nada obstante, a narrativa in‑
sinua residir no interior da própria cidade seus componentes mais viciosos,
faltas diversas que ainda aguardam a devida reparação. Também a exemplo
da protagonista de Sófocles, o conto faz sobressair a morte da sua impro‑
vável heroína: “Agora, não vão sair a procurar-lhe o corpo morto, para,
contritos, enterrá-lo, em festa e pranto, em preito?”42. À tirania de Creonte
corresponde aqui a tirania velada da cidade, com os seus juízos de exceção
recalcados com sucesso variado.
No entanto, se os temas do sacrifício e da piedade aproximam as
duas heroínas, ao menos duas diferenças importantes devem mencionar-se.
Primeiramente, seu extrato social é em tudo diferente – a protagonista de
Sófocles é membro da casa real, a de Rosa, uma sertaneja pobre. Em segun‑
do lugar, no cerne da peça grega sobressai o embate entre a lei positiva e a
lei natural, que ditou parte considerável dos rumos da sua fortuna crítica
ao longo dos séculos. Tal problema não se explicita no conto, sobretudo
pelo concurso da ironia do narrador, que desloca os valores ambiguamente
defendidos pela comunidade. De qualquer modo, às duas obras é comum a
reflexão acerca dos limites da aparência e da realidade, bem como do sacri‑
fício e da culpa. No conto de Guimarães Rosa configura-se, além disso, um
convite à memória no âmbito dessas histórias primordiais, da responsabili‑
dade como moral da história.

41
  Rosa 1994: 481.
42
  Rosa 1994: 481.

172
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal
(Creon, the tyrant of Antigone. His reception in Portugal)

Maria de Fátima Silva (fanp13@gmail.com)


Universidade de Coimbra

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_9

173
(Página deixada propositadamente em branco)
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

Resumo – O tema de Antígona aparece, no séc. XX português, em sucessivas rees‑


critas, que coincidem com a própria experiência política do país. Este artigo preten‑
de focar-se em particular no desenho do tirano, comparando o seu tratamento em
duas das mais sugestivas recriações portuguesas do modelo sofocliano: as Antígonas
de Júlio Dantas e de António Pedro.
Palavras-chave: legitimidade, justiça, oposição, palavra e silêncio, poder absolu‑
to e instituições do Estado.

Abstract – The subject of Antigone appears, in Portugal during the 20th century,
in different recriations, in coincidence with the political experience of the country.
This article looks in particular to the profile of the tyrant, making a comparison
of two of the most impressive, Portuguese remaking of Sophoclean model: Júlio
Dantas and António Pedro Antigones.
Keywords: legitimity, justice, opposition, word and silence, absolute power and
public institutions.

Numa literatura dramática que não foi particularmente marcada por in‑
fluências clássicas, como a portuguesa, é tanto mais expressivo quando um
tema se impõe e reaparece, em sucessivas reescritas, em anos relativamente
próximos. O caso mais significativo é aquele que a Antígona sofocliana re‑
presenta para o séc. XX em Portugal1. Marcado, durante mais de 40 anos
(1926-1974), por uma ditadura repressiva, de que Salazar foi o protagonista,
o país encontrou no teatro, e no tema de Antígona, um canal e uma mensa‑
gem que denunciassem, em diversos tons, a pressão política e social em que
se encontrava. Assim, entre os anos 40 e 502, sucederam-se as recriações do
modelo sofocliano, onde a dominante é aquela em que uma voz solitária,
débil mas determinada, a de uma jovem mulher, desafia o todo poderoso
soberano, Creonte, que ficou para a tradição como um dos símbolos mais
emblemáticos do poder absoluto e seus excessos. Das várias Antígonas por‑
tuguesas então produzidas, vamos fixar-nos em duas, pelo interesse da sua

1
  Assim, em Portugal, o tema sofocliano de Antígona suscitou as seguintes reescritas:
António Sérgio (1930), Júlio Dantas (1946), António Pedro (1953), João Castro Osório
(1954), Hélia Correia (1991) e Eduarda Dionísio (1992). Vide Morais 2001.
2
  Morais 2001: 85-86 justifica esta insistência no tema e a sua concentração nesta
década com razões de foro político: ‘Com a vitória dos aliados, o regime salazarista, “para
sobreviver à vaga de fundo democrática que percorria a Europa” e se adaptar à nova or‑
dem estabelecida, iniciou um processo superficial de relativa abertura e de diversificação
do regime. (...) Era (ou parecia ser) propícia a atmosfera para rupturas e renovações nos
mais diversos domínios. De imediato, timoratas acções de carácter político e cultural
sucederam-se a intentar quebrar o fundo e aterrador “silêncio”’.

175
Maria de Fátima Silva

abordagem e pela repercussão que tiveram nos palcos, circulando um pouco


por todo o país: a de Júlio Dantas (Antígona, peça em 5 actos, inspirada na
obra dos poetas trágicos gregos e, em especial na Antígona, de Sófocles, 1946) e
a de António Pedro (Antígona. Glosa nova da tragédia de Sófocles em 3 actos e
1 prólogo incluído no 1º acto, 1954). Delas procuraremos retirar os traços da
figura do tirano, sublinhando o que no Creonte português há de tradição
sofocliana, retocada com traços novos, adaptados a uma outra experiência
política e social, aquela que separa o Portugal do séc. XX da Atenas do séc.
V a. C.
Décadas mais tarde, já o regime salazarista tinha sido deposto há cer‑
ca de vinte anos, o tema de Antígona reapareceu na produção dramática
portuguesa, com breve repercussão nos palcos. Num tempo em que a re‑
pressão política tinha deixado de existir, o velho mito tebano impôs-se por
outros motivos; numa sociedade ainda à procura de uma nova estabilidade,
sobretudo no que diz respeito à ‘causa feminina’, Antígona passou a dar
voz à desadaptação de uma mulher, marcada por um crescimento irregular,
desenraizada dentro de uma teia familiar anormal, sujeita ao exílio, condi‑
ções que lhe foram deturpando a alma, até fazerem dela o bicho, a criatura
incompreensível e incompreendida, que se confronta não com o tirano –
que deixou de ser um adversário à altura -, mas com a própria vida, que não
dá lugar à realização dos seus anseios. Foi por mão feminina – a de Hélia
Correia, Perdição. Exercícios sobre Antígona, 1991, e a de Eduarda Dionísio,
Antes que a noite venha, 1992 – que Antígona conheceu este novo sentido;
desta vez o modelo sofocliano foi sujeito à filtragem de uma versão inter‑
média e muito inovadora, a de Jean Anouilh (Antigone, 1943), de manifesta
influência na expressão dramática portuguesa.
Como interlocutor e antagonista de Antígona, numa proporção que se
discute desde a criação de Sófocles – qual das duas personagens é de facto o
verdadeiro protagonista da peça3 -, Creonte é também, nas sucessivas pro‑
duções que iremos analisar em Portugal, condicionado pela focagem que
a filha de Édipo merece a cada nova reescrita. Vemo-lo agir, nas leituras
de pendor mais político, como paradigma de um déspota monocrático, e
assistimos, nas peças de maior focagem social e psicológica centradas em
Antígona-mulher, a um abrandamento, em que o tirano de outrora reveste
características de uma personalidade fraca e hesitante, investida, sem em‑
penho, de uma autoridade que não tem condições de exercer; ou mesmo,

3
  Para uma síntese desta questão e dos argumentos usados, vide Fialho 2001: 72-73;
Rocha Pereira 92010: 20-21.

176
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

no limite, em que Creonte se torna desnecessário ao conflito de Antígona, a


tal ponto este se interioriza e se torna, além de íntimo, individual. Para este
Creonte distanciado do autoritarismo que o poder suscita julgamos encon‑
trar o modelo último também em Sófocles, na personalidade que destinou,
no Rei Édipo, ao filho de Meneceu.
Apesar das variantes que o desenho de Creonte conheceu em todas as
criações portuguesas que o retratam como paradigma do tirano, há recur‑
sos e motivos permanentes, dentro da maleabilidade que os caracteriza.
Comecemos pelo exterior cénico mais conveniente para funcionar como
moldura simbólica do exercício de um poder prepotente. O palácio é, por
convenção, o cenário transversal que melhor convém à acção, explorado de
modos diferentes de acordo com objectivos específicos bem determinados.
Nos textos portugueses, as rubricas de cena tornaram-se não só uma orien‑
tação quanto aos movimentos previstos, complemento visual das palavras
que se atribuem aos intervenientes na acção, mas também denunciam as
preocupações dos dramaturgos em tornar sensível a marca da fonte clássica
que dá suporte à sua criação. Essas informações contribuem assim para a
articulação entre a reescrita e o seu modelo.
Dantas, numa rubrica de cena inicial, está manifestamente preocupado
em definir em pormenor um cenário, que coloque à vista do público um lo‑
gótipo helénico: ‘Escadaria exterior de pedra conduzindo ao palácio real dos
Labdácidas, que se levanta, à D., na majestade do seu peristilo dórico. À E.,
pórtico de cariátides arcaicas, debruçado sobre o caminho que conduz ao
templo de Palas, e donde se avistam parte da cidade e os campos tebanos’;
e remata: ‘O mesmo cenário nos cinco actos da peça’. Ao enquadramento
tendencialmente minimalista do teatro grego, Dantas prefere uma cons‑
trução, onde motivos de pormenor contextualizam, de forma mais visível,
o ascendente clássico que lhe está subjacente. É de sublinhar a menção e a
funcionalidade da ‘escadaria exterior de pedra’, onde se concentra a ima‑
gem que melhor convém ao movimento e atitudes de um tirano: por um
lado ela sugere distância hierárquica, por outro é a tribuna de contacto
entre o soberano e o povo da cidade. É, naturalmente, essa a via de acesso
para uma primeira aparição de Creonte (p. 29); e também nesse momento,
à escadaria, como caracterizadora do cenário, se juntam pormenores so‑
bre o trajo emblemático do senhor de Tebas: ‘Creonte, aparecendo no alto
da escadaria, envolto em púrpura, a fronte cingida da serpente de ouro de
Cadmo’. Se a púrpura é a cor emblemática do poder em geral, o dragão de
Cadmo, ostentado pelo novo monarca, é sem dúvida a sua marca de legiti‑
midade, um tema que, como veremos, merece nos sucessivos tratamentos

177
Maria de Fátima Silva

de Creonte discussão. A própria personagem, na alocução que então dirige


aos cidadãos, não deixa de esclarecer o objectivo desse acessório (p. 29): ‘O
meu primeiro pensamento, ao colocar sobre a cabeça a coroa de ouro dos
Labdácidas, foi chamar-vos, para vos agradecer a fidelidade e a comiseração
que sempre vos mereceu a desventurada familia de Édipo’. Estas são pala‑
vras que, ao recordarem a linhagem infeliz daquela casa, colocam quem as
profere no papel do último dos seus herdeiros legítimos.
Semelhante é a opção de António Pedro. Após um prólogo de tipo pa‑
rabático, o dramaturgo imagina a construção de um cenário à vista do pú‑
blico (p. 267); alguns apontamentos proporcionam a mesma recriação de
um ambiente grego: uma cortina azul, sob um foco de luz, pode sugerir o
céu helénico, ‘uma coluna jónica, em frente a um pano vermelho de veludo’
indicam o palácio de Creonte e são os sinais da sua realeza. A escadaria é
ainda um pormenor do exterior do palácio que se valoriza, como via de
acesso para um Creonte recém-investido nas suas funções, que dirige a sua
primeira alocução ao povo; em rubrica de cena, o dramaturgo escreve (p.
275): ‘Creonte está de pé no alto das escadas. Uma grande multidão de
homens e mulheres enche o palco por completo’. Sobressai neste caso a
altivez e a distância hierárquica, que separa o soberano da cidade de todos
aqueles cujo destino tem nas suas mãos. Com o progresso da acção, os
acontecimentos, apesar de cívicos, vão-se interiorizando na sua dimensão
familiar e pessoal. Talvez por isso, o agôn com Antígona (Acto II) nos leve,
nas preferências de António Pedro, ao interior do palácio, à sala do trono,
onde o diálogo continua a ser político, entre o soberano e um dos seus
súbditos, sem deixar de implicar, por sugestão dos próprios limites da casa,
que se trata de parentes que discutem o destino a dar ao que resta de outros
membros da mesma família. Este passará a ser o lugar de actuação de um
soberano cada vez mais afastado do seu povo, e mais centrado nos conflitos
que tem de gerir dentro da sua própria casa. Com a entrada de Ismena,
que vem agravar o sentimento de desobediência que fere Creonte, o autor
assinala (p. 298): ‘Enorme, de pé, sobre o estrado do trono, Creonte parece
uma estátua’. O estrado substitui, a uma dimensão mais comedida, o efeito
da escadaria, criando o espectáculo de um ascendente fictício. A rigidez que
se apodera da figura desumaniza-a, cristaliza-a mais como um molde de
autoridade do que como um verdadeiro rei, humano e activo nas relações
com cada um dos seus interlocutores. Esse continuará a ser o cenário da sua
experiência humana. Das alturas do trono, Creonte repele e insulta todos
os que lhe manifestam discordância, o filho e as sobrinhas; para depois se
quedar ‘sentado e cabisbaixo’ (p. 315), numa manifestação de impotência e

178
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

de cedência a um destino que sente já superior à sua vontade; é essa a atitude


com que recebe Tirésias, o adivinho de quem pretende auscultar o veredic‑
to. Do trono sairá apenas ao encontro dos destroços das suas vítimas, para
mergulhar na ruína que foi cavando pela sua própria obstinação.
Do contexto que o cerca, a atenção orienta-se então para o surgir de um
soberano ainda mal investido no seu poder4. E a primeira questão que tal
figura justamente levanta é a da sua legitimidade. Avaliado em proporção
com a ascendência labdácida, à qual Creonte não pertence, o seu acesso ao
poder coloca a questão do direito indiscutível ao trono. Desde logo a neces‑
sidade de o afirmar é a denúncia das dúvidas que o novo soberano alimenta
no espírito. Na sua alocução de posse, um momento permanente nas duas
reescritas de Antígona, o Creonte de Dantas (p. 29) considera que, se o po‑
der lhe cai nas mãos por força do fratricídio entre os filhos de Édipo, esses
de facto os herdeiros incontestados dos Labdácidas, reúne, por si, condições
para ser aceite como herdeiro colateral pelos súbditos: ‘A morte crudelíssima
dos dois filhos varões do monarca … investiu-me, pela força dos vínculos
de sangue, na plenitude da autoridade real’5. Como é natural em tempos de
crise, o poder não legítimo de Creonte aparece – tal como Salazar perante
a anarquia instalada em Portugal nos tempos da 1ª República – como sal‑
vador, e garante de paz e normalidade; é este um ponto de partida comum
para a tirania6 .

4
  No prólogo construído por A. Pedro, que tem por missão informar o espectador,
menos atento à tradição do mito de Antígona e da sua realização paradigmática por Sófo‑
cles, de alguns aspectos essenciais do modelo e das variantes que irão ser agora adoptadas,
cabe uma palavra ao elenco de personagens e ao simbolismo expresso por cada uma. É
sugestivo que a primeira a ser referida seja justamente Creonte (p. 259), o que deixa, en pas-
sant, a sugestão da focagem que se vai adoptar na proporção entre Antígona e o rei. Sobre
a tonalidade e função ‘didascálica e metateatral’ deste prólogo, vide Morais 2001: 94-95.
5
  A mesma preocupação e igual argumento são usados por António Pedro (p. 275) –
‘Morto o rei Édipo e mortos os seus filhos na batalha que enlutou a cidade, sou eu, Creonte,
pelos direitos de sangue, o vosso legítimo rei’. Cf. S. Ant. 173-174.
6
  Embora limitada e discutível no seu alcance, a leitura que Wilamowitz (apud Calder
1968: 391) faz do original de Sófocles como uma peça política serve bem a esta questão:
‘Em termos estritamente políticos, importa perguntar qual é a situação e as questões que
a mesma situação coloca. Trata-se de um governo de transição, em tempo de guerra –
convicto da sua legitimidade e aceite pelos cidadãos – que estabelece legislação contra
os inimigos do estado. Um agitador bem colocado, sem o devido procedimento, ataca a
legitimidade das disposições legais e nega a supremacia do governo. Pergunta-se: como há‑
-de o poder enfrentar esta contestação dentro da elite social que não se pode ignorar nem
discretamente negar?’

179
Maria de Fátima Silva

É, portanto, com prazer que ouve de um dos senadores, Enópides, uma


afirmação do reconhecimento dessa mesma legitimidade por parte das ins‑
tituições e do povo, no que se assemelha à formalização de um acto de posse
(p. 31): ‘O Senado e o povo tebano reconhecem em ti o seu guia e o seu
rei. Filho de Meneceu, repousam nas tuas mãos a vida, a riqueza e a glória
de Tebas’. Se há voz que veicule as dúvidas sobre o que, ainda que aceite, é
controverso, essa é a dos Labdácidas, que ressoa agora através de Antígona
(p. 52), para quem o novo rei, ‘da raça real de Cadmo, não tem senão a
serpente que lhe cinge a cabeça’.
Outro é o entendimento que António Pedro quer valorizar da mesma
questão no preâmbulo que antecede a peça, onde cabe à personagem do
Encenador caracterizar a traços largos o perfil de cada uma das figuras; a
Creonte, o Encenador reserva o seguinte comentário (p. 261): ‘Creonte é o
rei pelo acaso desta dupla derrota’. E o ‘acaso’ exprime ilegitimidade e até
algum oportunismo, apesar da afirmação de um velho cidadão que o louva
como rei legítimo (p. 261) e das aclamações gerais que o saúdam (p. 267).
É, portanto, de um tom de insegurança que se parte à proclamação do
novo soberano. Essa é feita, de acordo com o modelo sofocliano, em con‑
texto público, por um ‘discurso de posse’ da nova autoridade, momento que
nenhuma das leituras políticas do motivo dispensa7. O apelo de abertura
aos seus ouvintes é um pormenor significativo sobre a mentalidade do rei
em cada versão. A um simples e genérico ‘Meus senhores’, preferido por
Sófocles (Ant. 162, andres), que contribui para a ambiguidade do monarca
e das suas posições, Dantas (p. 29) substitui um restritivo ou elitista ‘Velhos
ilustres de Tebas’, que limita o seu auditório aos senadores que constituem o
coro8; A. Pedro (p. 275), por seu lado, democratiza a intervenção do rei com
um ‘Cidadãos de Tebas’, que abre a sua alocução a toda a cidade.

7
  Em S. Ant. 155-161, é o corifeu quem anuncia a vinda de Creonte e as intenções
gerais que a motivam, de apresentar-se ao povo e à cidade como o novo poder, segundo
uma concepção própria que ainda mantém todos na expectativa; é certo que já Antígona
se lhe referira (33-34), justificando-a com o desejo do rei de chamar a si a responsabilidade
directa de anunciar essa disposição, afinal aquela primeira ordem que marca o início do
seu mandato e lhe definirá um tipo de actuação, dentro do que considera ‘patriotismo’. A.
Pedro destina este anúncio a Ismena, e para a sua motivação vê já o desejo de afirmar com
determinação a sua autoridade (p. 269): ‘Creonte, o nosso tio, é o Rei. Tal é o empenho que
tem em que sejam cumpridas as suas ordens que, dentro em pouco, vem ele próprio aqui ler
o édito ao povo’. Dantas apresenta publicamente Creonte sem aviso prévio, jogando talvez
no efeito surpresa rodeado de aparato e solenidade.
8
  A opção de Sófocles por um coro de velhos cortesãos, cujos interesses se associam aos
da comunidade pública e não aos da protagonista, é mantida nas versões que analisamos.

180
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

A partir desta abertura, as palavras de Creonte flutuam, nos diversos


autores, de um sentido que lhes é comum para outras subtilezas de efeito.
Dantas parece acentuar o tom demagógico, quando o rei louva e agradece,
como numa captatio beneuolentiae, a ‘fidelidade e consideração’ (p. 29; cf.
S. Ant. 166-169) do seu auditório, com a intenção oculta, ou mesmo invo‑
luntária, de eliminar discordâncias de que suspeita – e de que o público,
que entretanto já assistiu a um primeiro diálogo entre os senadores, tem a
certeza. A própria imprevisibilidade da sucessão, que fez de Creonte o her‑
deiro colateral dos filhos de Édipo, lhe exige a declaração de uma espécie
de programa de governo, que o torne mais compreensível, nas suas opções
políticas, aos olhos dos governados (cf. S. Ant. 175-176). O que, em Sófocles
(178-191), é uma proclamação de patriotismo e de defesa incondicional da
terra-mãe, ganha, no autor português, novas cambiantes, que lhe dão o tom
de uma intervenção de propaganda (p. 30): ‘Não vos peço, por enquanto,
que confieis em mim. O senado e o povo não podem cegamente confiar
num homem cujas ideias e cujos sentimentos não conhecem’. Por isso, é
realmente ideológica a concepção de poder que anuncia, fundada na leal‑
dade interventiva dos seus subordinados. Da tirania, este Creonte traça um
retrato indesejável (p. 30): ‘Sempre considerei como os peores dos mortais
aqueles que espalham em volta de si a sombra, o silêncio e o terror. O poder,
por si só, não confere a quem o exerce, nem a clarividência, nem a virtude’;
para lhe contrapor o elogio de uma actuação democrática e colectivizante
(p. 30): ‘Nunca a minha complacência sacrificará a qualquer interesse priva‑
do o bem supremo do povo’. Para terminar, como é exigido pela acção, com
uma condenação prévia e ameaçadora dos traidores, ‘inimigos dos deuses e
do Estado’ (cf. S. Ant. 182-183, 206-207) e com o édito concreto que envol‑
ve o sepultamento de Etéocles e a exclusão de honras fúnebres de Polinices.

O seu teor eminentemente político assim o recomenda. Mas, nos autores portugueses, a
tendência vai no sentido da fragmentação desse colectivo, da individualização dos seus
elementos, que o é também das opiniões que veiculam. Em vez de um simples número
identificativo – 1º Velho, 2º Velho, 3º Velho – com que A. Pedro designa os elementos do
coro, num misto de individualidade e colectivo, Dantas prefere dar-lhes uma categoria, a de
‘senadores’. Com esse estatuto, torna mais nítido e menos incipiente o carácter institucional
da monarquia tebana sob o poder de Creonte. E, quando se trata de decisões polémicas,
como a que condena Antígona, além das vozes audíveis em cena, ressoa indirectamente a
presença das instituições, a quem o tirano trata com indiferença; na hora da execução da
filha de Édipo, Enópides deixa clara essa ruptura na gestão da cidade (p. 106): ‘O Senado
de Tebas não votou a morte de Antígona. Mas, se é essa a vontade de Creonte, lançai-lhe
aos pulsos a cadeia de bronze dos supliciados’.

181
Maria de Fátima Silva

Embora o Creonte de A. Pedro reconheça a mesma ignorância do povo


quanto aos seus projectos (p. 275), adia, para uma fase de concretização,
os seus objectivos. Parece não ter, ou não querer confessar, uma ideologia,
mas deixar que o tempo e a sua actuação a revelem: ‘Ora é mais pelas obras
do que pelas palavras que os homens se dão a conhecer’. E, no entanto, nas
suas palavras vem já contida uma visão absolutista do poder: ‘É pelas obras
que me ireis conhecendo, cidadãos de Tebas, a que deveis mais amor do
que a vós mesmos’. Quanto ao édito, dentro de um formalismo mais bu‑
rocrático do que ideológico, em vez de anunciado pelo próprio monarca, é
lido por um funcionário, um Pregoeiro, e seguido de aclamações populares.
Ameaças de morte como pena a aplicar a quem desobedecer ao édito levan‑
tam o véu sobre o alcance da acção que coroará as palavras; este é o Creonte
que, de facto, se reserva para a acção, deixando as palavras por conta de
fórmulas estereotipadas, a quem falta de facto uma ideologia onde sobra
imposição e autoritarismo. Creonte reserva-se, para depois do anúncio e dos
aplausos, uma afirmação final de ‘prioridade à pátria’ e de ‘Honra a quem a
serve e opróbrio e desonra eternos a quem tentar traí-la ou combatê-la’ (p.
277; cf. S. Ant. 194-201).
A partir desta proclamação, comum a todas as versões, as reacções
que desencadeia passam a ser o fio condutor da peça; na sua estrutura, a
Antígona é, em todas as suas reescritas de pendor político, uma sucessi‑
va interlocução de figuras, representativas dos diferentes estratos sociais,
com o tirano, a quem apoiam ou perante quem exprimem discordância.
A quase exclusividade na contestação que Sófocles confere a Antígona,
uma das suas habituais heroínas solitárias, é substituída por uma rede de
reacções que, por diversos motivos, criam em volta do tirano uma verda‑
deira controvérsia ideológica; com ela, também os argumentos e razões
vão divergindo.
O tema da justiça, cuja concepção e aplicação constitui a primeira das
prerrogativas do soberano e o cerne da sua primeira decisão, é, como se
sabe, o motivo central do agôn Antígona / Creonte em Sófocles. A dimen‑
são que aí é dada à questão polemiza uma concepção humana e cívica de
justiça em confronto com uma lei maior, atemporal e universal, ditada pelos
deuses: a do sepultamento incondicional dos mortos. Ora, ainda que a ques‑
tão central da justiça permaneça na recepção do tema, a sua dimensão, em
Sófocles colocada no plano dos princípios, tende a politizar-se e a envolver,
a par de Antígona, a expressão de outras opiniões, de modo a projectar um
verdadeiro fenómeno social sobre uma questão ética que, em Sófocles, en‑
volvia os diferentes níveis do universo.

182
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

Dantas antecipa a cena entre as duas filhas de Édipo, que discutem a


desobediência a Creonte e a necessidade do enterramento de Polinices, com
uma outra focada na mesma questão, mas em que os intervenientes são
os senadores tebanos. É claro o efeito conseguido por esta substituição. A
mesma oposição, entre o repúdio e a concordância que afasta Antígona de
Ismena, divide também neste caso as opiniões. Há os senadores que acei‑
tam incondicionalmente o édito de Creonte, primeiro porque se sentem
inclinados à obediência ao poder instituído, depois também porque o cri‑
tério invocado pela autoridade do Estado lhes parece correcto; é o caso de
Enópides (p. 14): ‘É preciso velar por que sejam cumpridas as ordens de
Creonte, novo rei de Tebas. Polinices traiu a pátria. Não tem direito a se‑
pultura’. Outros, apesar de timoratos – tal como Ismena -, não deixam de
colocar algumas dúvidas; para Egéon parece difícil de aceitar a diferença de
tratamento dado aos dois cadáveres, não com base na noção universal do
respeito devido à morte, mas com o reconhecimento do mérito guerreiro
que, independemente da causa que representavam, os igualava. São, portan‑
to, sobretudo políticas as razões aduzidas.
Segue-se, de acordo com o modelo sofocliano, a cena entre as duas ir‑
mãs. Mas também neste caso alguns retoques de pormenor têm por objecti‑
vo politizar de forma clara os motivos de Antígona. O abandono do cadáver
de Polinices é por ela entendido, de forma explícita, como uma ofensa de
Creonte, o filho de Meneceu, à sua família (p. 18, ‘não há ignomínia maior
para o sangue real de Lábdaco, que nos corre nas veias’); repetidamente,
na conversa com a irmã, a menção de uma estirpe de que ambas descen‑
dem ganha uma ênfase particular (p. 18, ‘Resignas-te à desonra, tu, neta
de Cadmo, filha de Édipo – minha irmã?’; ou, no momento de confrontar
Ismena com o dever da cumplicidade no enterramento (p. 19), ‘Filha de
Édipo: queres ajudar-me a cumprir o meu dever?’; e diante da negativa de
Ismena (p. 22), ‘Tu submetes-te aos tiranos? Onde está o orgulho da tua
raça?’. Mais do que focada no seu empenho pelos mortos, Antígona parece
agora particularmente sensível em lhes defender os direitos na cidade de que
foram senhores.
Antes que Creonte se apresente para a pronúncia do seu édito, é, pela
segunda vez, dada a palavra aos velhos senadores, para uma espécie de sín‑
tese das diferentes vozes da oposição. Além das herdeiras de Édipo, as ir‑
mãs do guerreiro vilipendiado, os velhos ‘do coro’ expõem o que se assume
como as dissonâncias na opinião pública. Se há, por um lado, concordância
com a decisão de Creonte, há também quem afirme sem sombra de dúvida
a sua discordância. Proceu fundamenta-a com motivos de gestão política;

183
Maria de Fátima Silva

recorrendo ao acordo estabelecido entre os dois filhos de Édipo de uma


governação em alternância (cf. E. Ph. 474-483), o velho senador substitui
os tradicionais epítetos de ‘patriota’ e ‘traidor’, dados a Etéocles e Polinices,
pelos de ‘exilado e proscrito’ face ao ‘usurpador’, legitimando assim o direito
de Polinices à reclamação dos termos de um protocolo de Estado. Polinices
não veio, do seu ponto de vista, como ‘inimigo de Tebas’, ‘veio como rei de
Tebas’ (p. 27)9. Por seu lado, o velho Ástaco amplia os motivos de ordem
política à dimensão de grandes princípios éticos; em sua opinião ‘sempre
que tu vejas perseguir um homem, vivo ou morto, já sabes que eu sou do
partido contrário’10 (p. 28).
Trata-se, neste agôn, de um verdadeiro prólogo ao que se irá transformar
em dissonâncias expressas em volta do próprio Creonte. Porque antes que
Antígona digladie com o monarca os habituais argumentos, de novo os
senadores se farão ouvir; nem um nem outro dos habituais contraditores, a
jovem e o rei, aqui estão sozinhos. Há, de facto, uma espécie ‘de partidos’
ou correntes de opinião em posições radicalmente divergentes. Enópides,
coerente com a sua posição anterior, aplaude a decisão régia, mas antecipa
possíveis vozes de discordância entre os que são próximos dos interesses la‑
bdácidas (p. 31: ‘Não sei, porém, se àcerca dos destinos de tão nobre estirpe
e dos seus despojos, todos pensarão como eu’). Esse é um estímulo a que
Proceu retome as palavras do próprio Creonte na sua proclamação, para
louvar o princípio democrático das decisões partilhadas e fundamentadas
no conselho. São essas afirmações demagógicas que lhe dão o direito de
interpelar o rei (p. 32): ‘Queres o nosso conselho sobre os filhos de Édipo,
ou vieste apenas ditar-nos as tuas resoluções?’. A resposta que obtém – ‘Os
reis perguntam. Não respondem’ – é um passo decisivo no desmascarar do
tirano, cujas palavras e acções em nada coincidem.
A.Pedro, num prólogo de tipo parabático em que intervêm, além do
Encenador, os três velhos do coro e Tirésias, deixa clara a sua dívida para
com Sófocles e valoriza o tema da justiça como prioritário na sua recriação.
Em comentários sucessivos, que procuram definir, em poucas palavras, o
teor de produção que vai seguir-se, os Velhos do coro explicitam (p. 260-

9
  Esta outra leitura legitimadora da vinda, em armas, de Polinices é reiterada por Ti‑
résias (p. 73): ‘Queres então que as aves de rapina levem no bico e nas garras (…) pedaços
apodrecidos do corpo de um rei, filho e neto de reis, culpado apenas de ter reclamado, de
armas na mão, a coroa real a que tinha direito?’.
10
  A palavra ‘partido’ não é aqui meramente ocasional; ela dá uma tonalidade contem‑
porânea a um sentido de oposição múltipla, organizada e identificada, de uma forma que
a Atenas do séc. V a. C. não conhecia.

184
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

261): esta é a ‘A tragédia de quem se recusa a obedecer à lei em nome de uma


lei que é superior aos homens’, o mesmo é dizer ‘a tragédia da liberdade’.
Com essa lei que o tirano corporiza irão defrontar-se ‘Isménia e Antígona,
os dois modos de sofrer a tirania’, e ‘Hémon, o filho, a justiça pelo amor’.
O tirano tem, portanto, como sua primeira prerrogativa a administração da
justiça, de uma justiça humana, não absoluta, fruto das circunstâncias e por
isso relativa. Dos seus limites se compreende que resultem decisões impli‑
citamente arbitrárias. Justiça e liberdade são valores equivalentes; logo se o
tirano cria a primeira, fruto de um contexto social, condiciona a segunda.
No debate entre Creonte e Hémon é acrescentada, à valorização da jus‑
tiça como arma do poder no seu sentido mais amplo, a ponderação sobre
a qualidade da sua execução. Hémon admite (p. 308) a violência coerciva
da lei, desde que correcta. Mas a visão que o próprio Creonte tem dessa
prerrogativa deixa adivinhar como facilmente o sentido de ‘lei’ se deturpa,
quando ‘ordem’ passa a querer dizer ‘ordens’ e o poder, entendido em pi‑
râmide, afunila para a vontade de um só os interesses da maioria (p. 309):
‘As ordens do rei são as ordens da cidade. Sem essa ordem não há senão a
anarquia e o caos. As cidades são como uma pirâmide. Qualquer desarmo‑
nia no arranjo das pedras da base faz desmoronar-se a construção toda …’.
Do alto da sua posição, o tirano tende a sentir-se olímpico, uma espécie de
deus na terra ou de agente credenciado por um poder maior para o desem‑
penho de uma missão. Torna-se-lhe então natural o uso do possessivo – ‘a
minha’, ‘a nossa’ – e consequente a substituição de ‘impor a lei’ por ‘exigir
a ordem’ (p. 309). Há, portanto, uma espécie de retórica da justiça, uma
argumentação com que o tirano procura ocultar a sua fragilidade e dúvidas
muito humanas, para assumir uma segurança e autoridade fictícias (p. 310);
na sua irritação, Hémon não deixa de o denunciar: ‘Há muitos que pensam
contra ti. Tu próprio, pelas tuas hesitações, pelo grande número de razões
com que envolves a tua hesitação, duvidas da justiça do que fizeste’. Contra
o medo inconfessável que o atormenta, o tirano estimula o orgulho, ‘crime
mais grave do que a desobediência’ – afirma Hémon – ‘a queda na injustiça
pela cegueira de ter razão’. Do mesmo modo para Tirésias, da clarividência
da sua condição de adivinho, a justiça é mesmo um bem maior, que no
horizonte humano se atinge só após longa aprendizagem, quando a hybris
natural cede enfim perante o desastre (p. 261): ‘Mas a justiça faz-se tarde.
A justiça, mesmo, não chega a fazer-se; deseja-se apenas, depois de uma
batalha de orgulho. Este é ruim de vencer …’.
Depois da cena entre as duas irmãs, muito próxima do seu modelo clás‑
sico, e da proclamação pública de Creonte, A. Pedro aborda de uma for‑

185
Maria de Fátima Silva

ma própria o tema da contestação / oposição. Vozes anónimas aplaudem e


aprovam a decisão do novo soberano, mesmo assim, tal como em Sófocles,
inseguro da concordância em sua volta e temeroso de ocultas reacções com‑
pradas a dinheiro por conspiradores invisíveis (S. Ant. 222, 322, 325-326).
É então que aos três velhos do coro é dado espaço para um breve comentário
– como se de um estásimo se tratasse – sujeito a uma espécie de mote (p.
278): ‘São as cidades que são dos homens, ou os homens que pertencem às
cidades?’ Esta relação política assenta num equilíbrio de parte a parte, sen‑
do as cidades, criadas pelos homens, o suporte de vida dos próprios homens.
Assinalam a sua existência as gentes que as habitam e ‘a pedra e cal’ que lhes
dão forma e parecem, na perenidade dos materiais que lhes dão memória,
grandes e eternas. Mas estão feridas da mesma efemeridade que afecta toda
a condição humana de que fazem parte (p. 279): ‘A grandeza não é outra
coisa senão a ideia que dela se faz’.
A notícia, trazida pelo guarda, da desobediência ao rei é um teste à
verdadeira dimensão da autoridade real. As discordâncias que, com maior
ou menor amplitude, todas as versões fazem ouvir tornam-se agora acti‑
vas e exigem, de Creonte, actuação. Desobediência e reacção constituem
também, em cada reescrita, um núcleo permanente, mas concretizado de
modos diversos e com diferentes intenções. Qualquer que seja, porém,
o motivo da contestação, Creonte reage pela suspeita e pelo temor de
ocultas conspirações, que denunciam a sua debilidade sob o manto do
autoritarismo.
A versão de Dantas assume duas novidades como ponto de partida: a
notícia é trazida não por um vulgar soldado, mas pelo chefe da guarda, o
que responsabiliza toda uma instituição do Estado na sua eficiência peran‑
te o governo central; e o cadáver não foi sujeito a qualquer sepultamento,
mas simplesmente desapareceu (p. 33). A própria variante é sujeita a um
aprofundamento no diálogo que sobre ela se estabelece entre o coro e o
rei. A questão de uma possível intervenção divina na desobediência, bem
conhecida de Sófocles (Ant. 278-279), merece agora discussão; e, mesmo
se a pergunta essencial é ‘obra de deuses ou de homens’, as respostas apon‑
tam no sentido da ‘humanização’ e ‘politização’ do episódio, relegando os
deuses e os seus motivos para segundo plano. Todas as considerações dos
conselheiros, cada uma ditada por uma concepção de cidadania, vão nesse
sentido (p. 37): ‘Enópides – Eu digo que foram os deuses, porque nenhum
cidadão de Tebas seria capaz de desobedecer às leis’; ‘Proceu – Eu digo que
foram os homens, porque os homens virtuosos aborrecem as leis injustas’;
‘Ástaco – Pois eu digo que não foram, nem os deuses, nem os homens. Os

186
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

deuses ocupam-se menos dos mortais do que eles pensam. E os homens,


quando roubam, não roubam os mortos, roubam os vivos’.
Creonte colabora nessa discussão com uma atitude estranha que regis‑
tou em Antígona, antecipando-se à certeza trazida pelo chefe da guarda;
percebeu, durante a noite, a ausência da sobrinha do palácio (p. 39). Para
essa ausência, Enópides produz uma suspeita: quem sabe Antígona tenha
fugido para Atenas11, onde mantém com Teseu, desde os tempos do exílio,
um vínculo de hospitalidade. Este elemento, retirado do Édipo em Colono
de Sófocles, contribui para a reincidência no que, no novo monarca, são
traços cada vez mais visíveis: a suspeita de traição e a insegurança que ela
traz à sua atitude. Imagina que Antígona não abandonou Tebas sem uma
intenção política, a de suscitar animosidades no rei de Atenas e um eventual
ataque à cidade de Édipo, ainda mal recuperada do conflito recente com os
Argivos; ‘o ressentimento da princesa pode ateá-la’ (p. 41). E mais imagina
também que, se o fez, não agiu sozinha, mas que uma rede de cúmplices
a rodeia e incentiva. A oposição tem rosto; a ‘raça degenerada de Édipo’,
como uma espécie de clã concorrente, avulta ao seu espírito como uma
eterna sombra (p. 41). Não é, portanto, no plano dos princípios que a diver‑
gência entre Creonte e Antígona tem lugar, mas num partidarismo político
rasteiro. Até que o achado do corpo vem calar especulações, afinal vazias
(p. 44): ‘Mãos piedosas tinham-no arrastado para aquele bosque de lourei‑
ros …’. De forma inovadora, Dantas repõe a cumplicidade sofocliana entre
deuses e homens no destino a dar ao cadáver de Polinices: são de homens as
mãos que arrastaram o corpo para a sombra do bosque, mas é de loureiros,
com todo o seu simbolismo religioso, o espaço que lhe deu acolhimento.
Sem mais reticências, o chefe da guarda detém já a resposta, sem necessitar
de uma nova vigilância e de uma segunda vinda: foi a filha de Édipo que,
talvez mesmo sem o saber, infringiu as ordens reais.
Mais fiel a Sófocles neste momento do anúncio da desobediência a
Creonte, A. Pedro limita-se a carregar nos tons dos sentimentos envolvidos
(pp. 280-283). O guarda é reduzido ao ridículo de um seruus currens, proli‑
xo nos comentários, exagerado nos temores e nos retardamentos até debitar
a notícia de que é portador. No seu convencionalismo cómico, no entanto,
suscita de quem o observa um comentário que lhe dá consistência dentro
de um regime ditatorial (p. 290): ‘Para ser um bom polícia não é preciso
ser inteligente. Basta ser mau como as ratoeiras’. Sobre Creonte, o drama‑
turgo português amontoa apontamentos que sublinham a impaciência, a

11
  A hipótese de fuga é vagamente aludida por Creonte, em Ant. 580-581.

187
Maria de Fátima Silva

fúria e o nervosismo, que agora encontram, para os alimentar, um primei‑


ro motivo objectivo (p. 281, ‘contendo uma irritação enorme’ (cf. S. Ant.
316), ‘Creonte toma-se de uma raiva imensa. Desce os degraus, devagar, e
explode, agarrando o soldado que ajoelha’; p. 290, ‘enervadíssimo’; p. 291,
‘Creonte faz um gesto de desespero perante a incontinência do falador’). A
partir de uma fala do Creonte sofocliano – ‘Se não conseguirdes revelar‑
-me os culpados, sereis levados a dizer que os grandes lucros podem trazer
prejuízo’, Ant. 324-326 – A. Pedro reforça as certezas do rei de que dinheiro
correu para pagar a traição e intensifica o tom das ameaças (p. 283): ‘Sereis
todos enforcados! Sereis todos enforcados se, até hoje ao anoitecer, não trou‑
xerdes à presença da minha justiça quem se atreveu a desrespeitar a minha
lei’.
O agôn Creonte / Antígona, sempre muito próximo do modelo atenien‑
se, marca, no entanto, sobretudo na reescrita de Dantas, uma dicotomia
bem explorada entre palavra e silêncio. Antígona é, naturalmente, a prota‑
gonista da contestação pela palavra, em contraste com todos os que a cer‑
cam e que ocultam, sob um silêncio ambíguo, sentimentos semelhantes. Por
outro lado, a usurpação do poder da palavra é uma prerrogativa do tirano,
que tende a silenciar todos os que o cercam. A Antígona portuguesa – tal
como a sofocliana, Ant. 504-509 – não tem dúvidas sobre os apoios tácitos
que aplaudem na sombra a sua decisão (p. 51): ‘Todos os tebanos pensam
como eu. Todos os tebanos te aborrecem como eu. Mas todos se calam, por‑
que tu não os deixas falar’. São disso exemplo os senadores, preocupados,
tal como em Sófocles, em não defrontarem o rei com a sua discordância.
Mas Dantas dá-lhes espaço para uma reflexão explícita sobre essa com‑
pressão subserviente da palavra (pp. 61-63). Ao monopólio que o tirano
cultiva, ajusta-se o temor dos que o cercam, numa cumplicidade forçada
que deixa sem controle o erro a que os poderosos são sujeitos. Proceu, um
dos senadores, tem de reconhecer (p. 61): ‘Não foi ele que não quis ouvir‑
-nos. Fomos nós que não tivemos a coragem de lhe dizer o que era preciso
que ele soubesse’. Contra a pressão do silêncio, o povo reage pela insurrei‑
ção; ‘à sombra dos ciprestes do templo de Apolo’ (p. 62), como quem se
abriga à protecção divina, os Tebanos manifestam a sua inquietação. Mais
próximos do monarca, os cortesãos, tal como os Guardas em Sófocles, não
sorteiam propriamente aquele a quem cabe ser portador de más notícias;
mas procuram transferir de uns para os outros essa missão, na certeza de
que ‘os homens poderosos não gostam de que se lhes diga a verdade’ (p. 63).
Creonte, por sua vez, alimenta esse silêncio, consciente de que em sua volta
se ‘rosna’ (p. 69) baixo, o que ele sente como sinal de controle da sua parte

188
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

e de obediência geral. É nesta base que o tirano entende as relações com os


seus mais directos interlocutores e com o povo no seu conjunto.
Quando já Antígona, condenada pelo autoritarismo régio, parte para a
morte, Creonte tem ainda uma intervenção pública, que é uma espécie de
desafio às reticências dos que assistem à execução da jovem. Perante o mu‑
tismo dos velhos, Creonte multiplica as perguntas12, retóricas porque não
esperam resposta, mas que confrontam a leitura que o monarca faz dos acon‑
tecimentos protagonizados por Antígona, com aquilo que Creonte imagina
serem as questões que o mutismo geral esconde. Das censuras implícitas nas
perguntas formuladas sobre o comportamento da jovem, Creonte passa ao
auto-elogio da sua própria actuação que lhe parece conforme com a justiça,
com a verdade e com o bem colectivo. Pelo mutismo que o cerca, estas suas
palavras tornam-se uma espécie de agôn íntimo, onde os seus argumentos
parecem interpelados pelas suas próprias perguntas. Este é o momento da
reclusão máxima do governante sobre si mesmo. Aos que lhe são próximos,
o tirano pede com insistência que quebrem o silêncio (p. 127): ‘Porque não
respondem? (…) Porque desvias os olhos de mim? Que silêncio é este?’. Mas
quando a resposta valoriza uma divergência, mesmo que lacónica – ‘O nos‑
so silêncio não significa confirmação – mas condenação’, p. 117 -, ei-lo que
se enfurece e volta a exigir silêncio. Este é o silêncio que de facto condena o
tirano: condena-o ao isolamento, ao repúdio, à incompreensão do seu povo;
e, por fim, condena-o também ao apedrejamento, quando a sua obstinação
recebe o castigo supremo, o que lhe depõe nos braços o cadáver de um filho,
cuja morte é obra sua.
Mais sóbrio na exploração deste motivo, A. Pedro não deixa, no entanto,
de lhe fazer breves referências (p. 296). Também a sua Antígona está certa
de ter do seu lado a gente honrada da cidade, e o seu Creonte de que tem o
acordo geral dos Tebanos. Mas não sobram dúvidas, decerto em nenhum
deles, de que esse silêncio obedece à prerrogativa da tirania: ‘Um dos direi‑
tos dos tiranos’ – denuncia Antígona – ‘é falar quando lhes apetece e não
deixar nunca falar quem tem argumentos para lhes opor’. Hémon virá tam‑
bém, como em Sófocles (Ant. 690-693), reforçar o jogo de palavra e silêncio

12
  ‘A que se deve, ilustres velhos, tão inexplicável consternação, como aquela que se
apossou de todos vós? Tebas nunca viu caminhar para a morte uma mulher? Porventura a
filha de Édipo, que acaba de sair daqui, é menos abjecta do que tantos outros criminosos?
Quem se atreverá, na minha presença, a defender Antígona? Quem, perante mim, será
capaz de contestar que essa mulher (…) violou as leis, ultrajou o poder real, atentou contra
a segurança do Estado e – fúria hedionda! – corrompeu a tal ponto o ânimo do meu filho,
que o levou a rebelar-se contra o pai? Nenhum de vós a defende?’, pp. 115-116.

189
Maria de Fátima Silva

que se desenrola em torno dos tiranos; a bajulação dos que lhe são mais
próximos tende a abafar o rumor surdo do desacordo que se levanta em sua
volta (p. 308): ‘Se tais censuras não te chegaram aos ouvidos, é porque a
lisonja dos teus cortesãos abafa o que não enaltece o teu orgulho’.
Dos restantes episódios sofoclianos, aquele que proporciona divergências
mais sugestivas nos autores portugueses é o de Hémon, a quem é atribuída
uma personalidade e uma actuação criativas. É particularmente significati‑
vo a recriação que Dantas faz deste episódio. Passa a cena de Hémon para
o final, retirando a Tirésias – e aos desígnios divinos de que é porta-voz – o
protagonismo absoluto no desfecho dos acontecimentos. Na preocupação
constante, que o seu Creonte manifesta, com a ameaça de cúmplices ocul‑
tos, ao saber do amor de Hémon por Antígona o soberano imediatamen‑
te se interroga sobre prováveis cumplicidades entre a princesa labdácida e
o filho (p. 56); e também, como consequência lógica desse raciocínio, o
desagrado pelos vaticínios de Tirésias o leva a suspeitas de corrupção; em
Sófocles, o tirano não vai além de uma acusação dirigida à raça suspeita dos
adivinhos (1035-1039)13, que o Creonte de Dantas converte numa acusação
directa contra Hémon (p. 74): ‘Foi o meu filho que te mandou injuriar-me?
Quantas dracmas te pagou pela traição, velho imundo?’. A traição ganha,
neste caso, na mente de Creonte, foros de conspiração revolucionária, que
visa apear o rei do seu poder e não apenas confrontar a sua autoridade; por
sua vez Hémon ganha, em função destas suspeitas, o relevo de uma espécie
de contraponto de Antígona em versão masculina, na sua contestação ao
rei e pai14.
O adiamento do diálogo entre pai e filho para o final da peça, depois
que as suspeitas vagas de Creonte se foram acumulando e ganhando vulto
na sua imaginação, torna o confronto final do tirano com o seu destino des‑
poletado por razões humanas e políticas, e não divinas. A vinda do príncipe
é antecedida por um diálogo entre Creonte e Eurídice, o par real; arrancada
do mutismo a que Sófocles a confinara, a rainha, que é mãe, tem em Dantas
a sua oportunidade para defender o filho. Mas todo o seu esforço por isen‑
tar Hémon de suspeitas sem fundamento, por parte do pai, resultam na

13
  Vai no mesmo sentido a preferência de A. Pedro (pp. 317-319), que faz Creonte
acusar Tirésias de corrompido e venal, sem contudo precisar qualquer cumplicidade.
14
  O próprio texto faz, explicitamente, esta aproximação, quando Ástaco, um dos
senadores, tomando nas mãos a cadeia destinada a aprisionar Antígona, interroga o rei
(p. 119): ‘Vês esta cadeia? É o grilhão ignominioso dos supliciados. Ninguém se atreveu a
prender com ela os braços da filha de Édipo. Que queres tu agora de nós, rei? Queres que
a lancemos aos pulsos do teu filho? – Não!’.

190
Creonte, o tirano de Antígona
Sua recepção em Portugal

confissão de uma ideia que contamina, na imaginação de Creonte, a linha‑


gem de Meneceu da mesma maldição que afecta os Labdácidas (p. 79): ‘Os
crimes continuam na nossa família. A fatalidade arrasta-nos pelos cabelos’.
A oposição a que Hémon está disposto não resulta, em Dantas, somente
de outro jogo de palavras. O temor de Creonte de que Hémon tenha in‑
tenção de o matar ganha alguma consistência pelo facto de o jovem entrar
em cena armado. Ao esforço diplomático do príncipe sofocliano, substitui‑
-se aqui uma leitura inovadora. Sem essa diplomacia, a atitude de Hémon
resulta mais agressiva, apesar de muitas das suas palavras retomarem as
do seu modelo ateniense. Este Hémon não hesita em pôr a condenação de
Antígona no centro da sua divergência com o pai, nem de colocar os seus
sentimentos ofendidos como causa desse diferendo. Mas logo inclui tam‑
bém argumentos políticos. Acusa o rei de não prestar atenção ao que o povo
diz ou pensa (p. 83; S. Ant. 688-691) e, desassombradamente, põe-lhe a nu
objectivos inconfessáveis e mesquinhos (p. 85): ‘Não! Não chames justiça à
vingança. Não chames justiça ao ódio. Tu sempre odiaste Édipo. Tu vingas‑
-te, nos filhos de Édipo, do desprezo que o pai tinha por ti’.
Ferido por tanta animosidade, Creonte condena à morte também o pró‑
prio filho. Não com uma condenação formal, como a que visou Antígona;
mas com a ordem aos seus guardas de que, se ele se abeirar do palácio, o
matem (p. 94). E Hémon reage, mata os guardas numa tentativa de evitar
o inevitável, a morte de Antígona, porque, além da crueldade imponderada
do rei, há que contar com o carácter extremo e decidido da filha de Édipo.
Como em Sófocles, todas as características do tirano, que lhe aconse‑
lham comportamentos imponderados e excessivos, o levam à condenação:
pelos deuses, que o punem em extremo; pelos homens, que lhe apontam
um dedo acusador ou lhe atiram a pedra do castigo; e pelo tribunal da sua
consciência. O Creonte de A. Pedro é o porta-voz desse reconhecimento, da
clarividência que se aprende pela dor. Diante do cadáver do filho, o tirano
enfim reconhece (p. 329) o difícil equilíbrio entre o que é a desejada arete e
o seu excesso: ‘A vaidade a que chamei sabedoria’; ‘O orgulho a que chamei
justiça’; ‘A obstinação a que chamei firmeza’. A que acrescenta o verdadeiro
drama humano: ‘Agora sei’. ‘Mas é tarde’.

191
(Página deixada propositadamente em branco)
Uma Antígona diferente, em la Serata a
Colono de Elsa Morante
(A different Antigone in Elsa Morante’s la Serata a Colono)

Andrés Pociña (apocina@ugr.es)


Universidad de Granada

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_10

193
(Página deixada propositadamente em branco)
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

Resumo – Entre as páginas 30 e 96 do variegado livro intitulado Il mondo salvato


dai ragazzini e altri poemi de Elsa Morante (1912-1985) encontra-se o drama La se-
rata a Colono, a única peça teatral escrita pela autora, inspirada fundamentalmente
pela tragédia Édipo em Colono de Sófocles. De forma diferente do original grego,
na obra de Morante sobressai como protagonista uma Antígona quase criança,
uma das personagens mais atraentes dentre todas as que criou a escritora italiana
no conjunto da sua obra.
Palavras-chave: Elsa Morante, Serata a Colono, Antígona, tradição, inovação.

Abstract – In the pages 30-96 of the variegated book Il mondo salvato dai ra-
gazzini e altri poemi of Elsa Morante (1912-1985) we find the drama La serata a
Colono, the only theatrical piece written by this writer, inspired fundamentally by
the tragedy Oedipus at Colonus of Sophocles. Unlike the original Greek, Morante’s
work emphasizes as fundamental protagonist Antigone, one of the most attractive
figures created by the Italian writer in the set of her work.
Keywords: Elsa Morante, Serata a Colono, Antigone, tradition, innovation.

1. Este Congresso, dedicado monograficamente à eterna figura de


Antígona, foi concebido num momento e ambiente ideais, quando um pe‑
queno grupo de helenistas e latinistas das Universidades de Aveiro, Coimbra
e Granada (Maria Fernanda Brasete, Aurora López, Carlos Morais, Andrés
Pociña e Maria de Fátima Silva) frequentavam, na Universidade argentina
de Rosario, um congresso de tema semelhante, se bem que de perspectiva
mais geral, o “Congreso Intern. sobre la pervivencia de los modelos clásicos
en el teatro iberoamericano, español, portugués y francés” (CLASTEA 2,
Rosario, agosto de 2013). De maneira diversa, todas e todos concordámos
em salientar o enorme poder de sugestão de que a personagem de Antígona
se acha revestida, já desde a altura em que – sobretudo graças à insuperá‑
vel tragédia homónima de Sófocles – a heroína começou a ganhar adeptos
entusiásticos. Tal prestígio tem continuado até aos nossos dias, e o mito
de Antígona tem exercido um fascínio inegável sobre um número surpre‑
endentemente extenso de criadoras e criadores dramáticos, que através dos
séculos e na atualidade, ousaram deixar-nos as suas visões particulares de
tão grande mulher. Todas e todos que lá estávamos tínhamos acrescenta‑
do também algum avanço, maior ou menor, aos estudos literários sobre
Antígona; era por isso – mas também porque a bibliografia publicada nos
últimos anos assim o revelava1 – que sabíamos até que ponto a admirável

1
  Para nos referirmos exclusivamente a obras essencialmente dedicadas, nas últimas
décadas, ao tema deste Congresso, lembraremos: Morais 2001; Ripoli; Rubino 2005;

195
Andrés Pociña

filha de Édipo detém uma significação universal bem maior o que aqui‑
lo que se poderia deduzir com base na leitura do livro clássico de George
Steiner2. Que este livro é de valor inegável, não sofre dúvida; contudo, está
largamente superado enquanto único referente bibliográfico para o assunto,
apesar de continuar a ser considerado como definitivo, ou quase, por certo
número de investigadores e investigadoras de leituras insuficientes. Tal foi,
portanto, uma das causas principais que nos impeliram a voltar aos estudos
sobre Antígona, sobre as reescritas da sua história, a pervivência do seu
mito, a sua sempiterna vigência, e a virmos falar acerca dela num lugar tão
propício como a ínclita cidade de Coimbra.
E é nesse contexto universal, de renovadas interpretações artísticas –
fundamentalmente dramáticas – nascidas no século XX -, que desejava
tentar agora a análise de uma Antígona diferente. Refiro-me àquela que
imaginou a insigne escritora italiana Elsa Morante (1912-1985), num drama
que, curiosamente, não recolhe, no título, o nome da heroína. Trata-se de
La serata a Colono, opúsculo inserido num poemário publicado em 1968,
com o título de Il mondo salvato dai ragazzini e altri poemi3. La serata... faz
parte, mais concretamente, de uma das secções do livro: aquela que recebe o
estranho rótulo de “La commedia chimica”4. Nem o título do livro, nem o
da secção, poderiam dar azo à suspeita de no seu interior se achar uma tra‑
gédia (a páginas 30-96), com uma denominação que imediatamente sugere,
enquanto hipo-texto, a famigerada tragédia Édipo em Colono, de Sófocles.
Estranho título, estranha localização e, em definitivo, estranho género li‑
terário, para uma autora que jamais tinha escrito teatro, nem voltaria a
fazê-lo. E o que mais é: estranha Antígona, aquela que nos apresenta esta
criadora que nunca nos deixa de surpreender, de nos intrigar, com as suas
formulações literárias, e de maneira muito especial com a criação de perso‑
nagens únicas. Tentarei demonstrar, nas páginas a seguir, como a Antígona
de La serata a Colono ocupa lugar de destaque, entre tais personagens.

Bañuls Oller, Crespo Alcalá 2008; Pianacci 2008; Duroux, Urdician 2010; López, Pociña
2010.
2
  Steiner 1991.
3
  Morante 1968; as citações de La serata a Colono fazem-se por esta edição (reimpr.
1995), o que também inclui o número das páginas. A razão para isso consiste em ser esta
a edição mais difundida, se bem que, direi de passagem, no ano passado, e com motivo da
estreia, depois de tanto tempo, da obra, Einaudi deu pela primeira vez à estampa La serata
a Colono, num pequeno volume independente, que provavelmente não tem obtido tanta
difusão como o outro, até ao momento presente (2013).
4
  Cf. Ceracchini 2011: 211-216.

196
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

2. Sempre que se fala, ou escreve, sobre La serata a Colono (que conti‑


nuarei a citar pelo nome em italiano, por faltar ainda – salvo erro – uma
tradução para português ou espanhol, mas que seria possível verter para a
primeira destas línguas como Entardecer em Colono é lugar-comum repetir
o facto de se tratar da única peça teatral de Elsa Morante, que nunca a
terá visto encenada, já que só foi levada ao palco a 15 de janeiro de 2013.
É, de facto, nesse ano que o Teatro Stabile di Torino, sob a direção de
Mario Martone, representou por primeira vez a tragédia, com Carlo Cecchi
– grande amigo e estudioso da autora – a interpretar o papel de Édipo, e
com Antonia Truppo a figurar como Antígona5.
Ora, a peculiaridade de pertencer a um género que, nem antes nem de‑
pois, foi cultivado por Morante, faz com que seja difícil de enquadrar ajei‑
tadamente este drama no conjunto da obra literária da nossa escritora. Com
efeito, La serata a Colono, como acontece também com outras composições
inscritas em Il mondo salvato dai ragazzini, patenteia um profundo conte‑
údo ideológico, concorde com os princípios de uma moral pessoal, sempre
presente, quer nas obras anteriores, quer nas posteriores, de Elsa Morante.
Uma moral ou, se assim o preferirmos, um conjunto de princípios para
enfrentar a vida, no meio de umas circunstâncias sociais verdadeiramente
negativas, que estão na base, e podem justificar, o óbvio pessimismo da
autora, manifesto já em algumas das obras precedentes mais importantes,
tais como Menzogna e sortilegio (1948) ou L’ isola di Arturo (1957), corres‑
pondentes já à sua época de maturidade. Mais tarde ainda, este sentimento
virá a ser fulcral naquela que será a sua obra-prima, do meu ponto de vista:
La Storia (1974); até que enfim, ele virá a marcar de forma indelével os der‑

5
  A estreia, como era previsível, foi um sucesso, o que se pode ver muito bem refleti‑
do em diversas notícias e páginas da Internet, que repetem insistentemente as imagens de
Édipo no hospital, com os olhos cobertos, interpretado por Carlo Cecchi, e da personagem,
sem dúvida importante, da Freira, representada por Angelica Ippolito. Após a estreia em
Turim, a peça foi representada no Teatro Argentina, de Roma, de 30 de janeiro a 17 de
fevereiro, com enorme sucesso (para se obter mais informação, pode procurar-se as diversas
notícias que respondem ao epígrafe “La serata a Colono di Elsa Morante”, na Internet, e
também, no mesmo meio, Letizia Bianchi - Serena Nostro, “La serata a Colono di Elsa
Morante. Regia di Mario Martone (Piccolo Teatro Grassi di Milano, stagione 2012/2013)”,
www.piccoloteatro.org/play/show/2012-2013/la-serata-a-colono. Está muito bem docu‑
mentada também a notícia dada por Jolanda Leccese, “’Antigone’ di Elsa Morante – in
‘Serata a Colono’”, Leggere Donna 160 (2013), que se pode ler no sítio: http://donnarte.
wordpress.com/2013/08/01/antigone-di-elsa-morante-in-serata-a-colono/

197
Andrés Pociña

radeiros anos da sua vida e as últimas produções, especialmente o romance


Aracoeli (1982)6.
Não pretendo abordar, nestas linhas, uma análise sobre o papel que Elsa
Morante concede à obra literária, como veículo de expressão da sua própria
maneira de pensar, e dos seus sentimentos pessoais – em suma, da sua ati‑
tude perante a vida, feita manifesta através das personagens por ela criadas
e das situações, reais ou fictícias, que lhe servem de ambientação7. Convirá,
no entanto, tomarmos em consideração que Il mondo salvato dai ragazzini
foi escrito entre os anos 1966 e 1968, e, muito embora tivessem transcor‑
rido, já na altura, alguns anos depois da morte em Nova Iorque – muito
presumivelmente por suicídio – do jovem pintor americano, Bill Morrow,
com quem a autora mantivera uma relação amorosa, o sentimento desta
tragédia devia manter-se especialmente vivo aquando da redação da obra,
pois que esta começa logo com uma primeira parte de título bem elucidati‑
vo: “Addio”. Esta primeira parte compreende dois poemas, o primeiro dos
quais, segundo acertada apreciação de Elisa Donzelli, cumpre a função de
proémio, dedicando-se ao falecimento do pintor; por sua vez, o segundo,
mais comprido, oferece chaves que nos introduzem na atmosfera da obra
no seu conjunto8. Por outro lado, é também por esses anos que teve lugar a
leitura, por parte de Morante, dos Cahiers de Simone Weil, cujo influxo em
La serata a Colono e, sobretudo, em La Storia, tem sido recenseado e estuda‑
do em diversas ocasiões9. A propósito da significação da obra de Weil para
Il mondo salvato dai ragazzini (e portanto também para La serata a Colono),
limito-me a reproduzir a excelente síntese de Flavia Cartoni:

“La lectura de los Cuadernos de Simone Weil, que se remonta a los


años 1966-1967, coincide con el comienzo de la percepción de una
irreversible transformación física, época durante la cual Elsa elabora la
teoría de la pesanteur. Esta ‘pesadez’ supone una falta de energía, una
transformación del aspecto físico, lo que la autora tiene por factores

6
  De todas estas obras existem traduções para espanhol; por ordem cronológica:
La isla de Arturo, trad. de Eugenio Guasta, Barcelona, Editorial Bruguera, 1969 (Madrid,
mesma versão, Espasa Calpe, 2004); Araceli, trad. Ángel Sánchez Gijón, Barcelona, Editorial
Bruguera, 1984; La Historia, trad. de Esther Benítez, Barcelona, Círculo de Lectores, 1992
(em data anterior, e incompleta, Algo en la historia, trad. de Juan Moreno, Barcelona, Plaza y
Janés, 1976); Mentira y sortilegio, trad. de Ana Ciurans Ferrándiz, Barcelona, Lumen, 2012.
7
  Cf. Morante 1987 (opiniões de 1959): 41-73.
8
  Donzelli 2007: 191-200, esp.192.
9
  Cf. de forma especial D’Angeli 1993: 109-135.

198
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

extremadamente negativos, puesto que siempre había considerado la


belleza como un punto de unión entre sensibilidad, armonía y justicia.
A partir de esa época el esfuerzo de la escritora se centra en acercarse
a la ligereza como meta, en observar –aún más- las injusticias sociales
y luchar contra las dificultades. El contraste entre el mundo ligero (es
decir, adolescente) y el mundo pesado (por lo tanto, adulto) se basa
justamente en la contraposición entre deseo y realidad, entre ligereza
y pesadez. El límite entre estos dos mundos está marcado, según la
autora, de manera nítida, y ayuda al lector a comprender la razón por
la que Elsa introduce muchos personajes adolescentes, e incluso niños
en su obra narrativa y poética”10.

Outro dado que pode entrar em linha de conta, para enquadrar o am‑
biente em que surge esta tragédia, é constituído pelo facto de, pelas mesmas
datas da sua redação, Pier Paolo Pasolini, grande amigo de Elsa Morante,
ter estreado o seu filme Edipo re11 (1967), cujo título reclama como hipo‑
-texto a outra tragédia de Sófocles, e no final do qual, Édipo, cego, é condu‑
zido, não por Antígona, mas por um moço, que recebe o nome de Anghelos
-Ângelo (p. 453). Rara é a ocasião em que tenho visto postas em relação
estas duas tragédias contemporâneas, a de Pasolini e a de Morante12, as‑
sunto este que espero vir a abordar em ocasião mais adequada. Seja como
for, não é pensável que duas pessoas que tinham mantido tão boas relações
(que, ainda que viessem a acabar, durarão pelo menos até 197113) e que
tinham partilhado experiências tão importantes como uma longa viagem
pela Índia, na companhia de Alberto Moravia, não tivessem trocado im‑
pressões e pontos de vista acerca da figura do desgraçado cego, Édipo.
Em último lugar, restaria esclarecer, para acabarmos esta listagem de
circunstâncias à volta da publicação de La serata a Colono, o facto, de di‑
fícil explicação sob todos os aspectos, de esta tragédia constituir a parte

10
  Cartoni 2006: 17.
11
  Pasolini 1991 (1998).
12
  É contudo interessante, neste sentido, o que escreve Donzeli 2007: 192 s.: “...
Anche per questa ragione Elsa Morante lo scelse e forse anche perché nel 1967, un anno
prima della pubblicazione de Il mondo salvato dai ragazzini, Pier Paolo Pasolini modellava
il finale cinematografico dell’Edipo re su quello dell’Edipo a Colono con un Ninetto Davoli
nella parte di Angelo che, come Antigone, accompagna per le strade un esausto e cieco
Edipo-Pasolini”.
13
  Sobre a intensa relação entre Elsa Morante e Pier Paolo Pasolini existem interessantes
estudos, entre os quais citaremos os de Siti 1995: 134; Fusillo 1995: 97-129.

199
Andrés Pociña

central, e talvez a mais atraente, de uma obra intitulada Il mondo salvato


dai ragazzini, se nos limitarmos a pensar no Édipo em Colono de Sófocles
como seu modelo. Na obra de Sófocles, com efeito, é protagonista indiscutí‑
vel um Édipo ancião, cego, envelhecido, vencido, encarando os derradeiros
momentos da vida. Convém, porém, notar, neste sentido, que, ao contrá‑
rio daquilo que estava a fazer contemporaneamente Pasolini, Elsa Morante
excluiu o nome do desventurado rei mítico do título do seu drama. O que
me convida a formular a pergunta seguinte: será que, de facto, é Édipo o
protagonista de La serata a Colono? Hei-de defender mais adiante, e com
bons argumentos, que a personagem principal, na reescrita morantiana, é
agora Antígona, uma “ragazzina” de catorze anos, representada como se não
tivesse mais do que onze ou doze; indubitavelmente, um dos “Felici Pochi”
que a própria escritora há-de vir a descrever-nos em pormenor. Antígona
é, pois, um dos “ragazzini”, aludidos no título do livro, um daqueles que
podem ser a salvação para um mundo em franco processo de desagregação
e auto-destruição.
Elsa Morante constrói destarte, mais uma vez, em La serata a Colono,
uma personagem, de poucos anos de idade, dotada de atributos que a trans‑
formam num autêntico caráter de valor universal, como fizera, já havia
muitos anos, com aquele menino-adolescente, Arturo Gerace, n’A Ilha de
Arturo, e como há-de fazer novamente, nos anos imediatamente subsequen‑
tes à publicação da peça em apreço, com o inesquecível menino Useppe,
d’A História.

3. Antes de aprofundarmos o estudo dramático da obra que nos ocupa,


convém esclarecer a sua colocação no interior de Il mondo salvato dai ra-
gazzini. Segundo é fácil de perceber com uma simples vista de olhos pelo
Índice do volume, o conjunto é formado por uma série de composições lite‑
rárias de muito variegado teor e sentido, as quais se articulam em três par‑
tes, de extensão diferente: Addio (pp. 5-17), La commedia chimica (pp. 21-
124) e Canzoni popolari (pp. 117-221). Ainda que não seja minha intenção
estudar em pormenor o conjunto da obra, gostava mesmo assim de lembrar
(já o fiz mais acima) que a parte inicial, Addio, é um episódio em memória
de Bill Morrow; na segunda, de título surpreendente, achamos, como peça
essencial, quer pela forma literária, quer pela extensão, La serata a Colono
(pp. 31-96); na terceira, enfim, podemos encontrar algumas chaves que nos
ajudem a compreender a concepção morantiana da Antígona recriada neste
drama, acabando esta parte, e também o livro, pela secção, cuja epígrafe

200
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

coincide com o título da obra, “Il mondo salvato dai ragazzini”, conjunto
graficamente surpreendente.
Logo na página inicial do drama, e mesmo por baixo do título deste,
encontramos o primeiro problema: La serata a Colono apresenta-se como
“Parodia”. Este termo, “paródia”, lido no seu sentido habitual, põe o dra‑
ma de Morante numa relação óbvia com a tragédia Édipo em Colono, de
Sófocles. Mas é adequada uma qualificação semelhante? Os dicionários
da língua portuguesa costumam oferecer definições da palavra “paródia”
do tipo da seguinte: “imitação de um texto literário, de uma personagem
ou de um tema, com propósitos irónicos ou cómicos”, e como segunda
definição, “imitação ridícula ou cínica de qualquer coisa”14; com esta de‑
finição15 vem coincidir a que dá o manual, já clássico, de Lausberg que,
citado pela tradução espanhola, vem dizendo: “imitación chistosa de un
modelo serio”16. Sem precisarmos de recorrer a explanações mais precisas
da palavra17, podemos concluir dizendo que as acepções tradicionais desta
não parecem convir em absoluto a uma obra como a tragédia de Morante,
cujo relacionamento, embora muito óbvio, com a obra de Sófocles nunca
poderia considerar-se engraçado, cómico, faceto ou burlesco. Procurando
alguma possível explicação para o emprego de “paródia” dado pela nossa
escritora na sua obra, deparámos com esta interessante solução, que lemos
em Carlo Sgorlon:

“La Morante lo definisce “parodia”, ovviamente dell’Edipo a Colono di


Sofocle. Ma qui parodia non sta per ‘rifacimento comico’ ma soltanto,
etimologicamente, per ‘canto paralelo’, poiché si trata di un rifacimen‑
to assai piú tragico dell’originale. Anche qui ricompare il tema della

14
  Definições tomadas do Dicionário da Língua Portuguesa (71994). Porto, Porto
Editora: 1346. É claro que a terceira definição que também aparece aí, como “pândega”,
não interessa aos nossos objetivos; para mais que, segundo se encontra averbado nesse
mesmo dicionário, tal definição se restringe a um âmbito linguístico de gíria.
15
  Mais breve e contundente é, por exemplo, a definição que dá, para a palavra
espanhola correspondente, “parodia”, o dicionário da Real Academia Española, Diccionario
de la Lengua Española.(222001). Madrid, Academia Española: 1143: “imitación burlesca”.
16
  Lausberg 1966: III, 292.
17
  Como possam ser a de Howatson 1991: 618, s.v. parodia: ”Imitar en forma burlesca
una obra poética seria para conseguir un efecto cómico era conocido en la literatura griega
desde tiempos remotos”; Gómez García 1997: 629: “Recurso teatral consitente en imitar,
burlesca o irónicamente, una obra consagrada, un argumento famoso, un estilo, un personaje
o una situación”.

201
Andrés Pociña

malattia o della pazzia, diventate ormai per la Morante caratteristiche


dominanti del mondo”18.

Podemos ouvir, igualmente, a voz autorizada de uma investigadora


que se tem ocupado em profundidade da comparação entre a tragédia de
Sófocles e a de Morante, Silvia Paglia19. Partindo das diversas possibilidades
de transformação intertextual analisadas por Gérard Genette, no seu bem
conhecido estudo Palimpsestos20, Paglia afirma:

“Pertanto, secondo tale clasificazione, la Serata non potrebbe de‑


finirsi una parodia, come dichiara la Morante, ma una trasposizio‑
ne dell’Edipo a Colono di Sofocle, in quanto coniuga la ripresa e la
trasformazione del contenuto con la serietà, anzi con la tragicità, del
registro, e si può considerare come una forma particolare ed origi‑
nale di trasposizione in quanto attua una mediazione tra il ricalco e
l’analogia da una parte e la trasformazione o, addirittura, l’opposizione
dall’altra” (p. 150).

Seguem-se duas citações poéticas, uma delas de dois versos em italiano,


de Marina Svietaeva, relativos a uma inquietante estrela errante, lembrados
talvez pela frequente alusão, no texto, a Apolo – Febo – Sol; a segunda, bre‑
víssima, de Torquato Tasso, cujo sentido me é obscuro, salvo no caso de se
dever à conhecida paixão da Morante pelos gatos. Seja como for, é claro que,
do ponto de vista performativo, são duas citações inoperantes; consequência
esta, sem dúvida, da escassa prática dramática da escritora. Também não tem
valor dramático o texto que, sob o título de Antefatto, apresenta, na página se‑
guinte, uma muito breve síntese da desgraçada história de Édipo, com especial
atenção ao seu final em Colono.
Chegando já ao começo do texto em si, também não parece ter trans‑
cendência cénica a citação que figura como abertura: “È da Lui, o amici,
che mi vengono tutti i miei mali. Edipo Re”. Morante indica a procedência
daquilo que, à primeira vista, parece ser um verso, bastante difícil de en‑
contrar no entanto, devido à redução e deformação a que foi submetido.

18
  Sgorlon 1988: 95 s.
19
  Paglia 2011: 149-163. Cf. igualmente, da perspetiva de um helenista estudioso
das tragédias de Sófocles, o excelente livro de Rodighiero 2007: especialmente 57-66,
dedicadas a Édipo em Elsa Morante e em Pier Paolo Pasolini.
20
  Genette1989: passim.

202
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

Trata-se, na verdade, dos dois primeiros versos (vv. 1329-1330) da estrofe


b de Edipo rey: “Apolo, amigos, Apolo foi destes males, destes meus males,
destes meus sofrimentos promotor”21. Cabe assinalar que, fazendo esta cita‑
ção, a escritora tem já presente a visão de Apolo através do Édipo moderno
da Serata, visão segundo a qual o deus grego se atualiza, se assim se pode
dizer, no Sol como astro, de cuja presença opressora Édipo não se consegue
libertar, na sua loucura, nem sequer estando cego; o Sol, por outro lado, é
posto em relevo de maneira muito especial, sendo referido, no texto, grafi‑
camente com maiúsculas, LUI22.
Após esta citação, começa o texto dramático propriamente dito, com
uma muito pormenorizada descrição do espaço cénico – uma descrição tal‑
vez um tanto prolixa, devido não sei se à inexperiência de Elsa Morante
enquanto autora teatral, ou a uma necessidade de se servir das didascálias
como meio de expressão complementar. De facto, esta didascália cénica ini‑
cial parece longa demais, indicando mesmo pormenores inesperados, como
o momento exato em que se situa a representação, num dia de um tépido
mês de novembro, à tardinha, de um ano próximo de 1960. Estamos num
corredor de um hospital policlínico, ao pé da secção de doentes mentais, no
andar inferior; os muros, sem relação direta com o exterior, estão caiados,
brancos da cal dos hospitais; a única mobília consiste num banco, encos‑
tado à parede, onde se podem sentar os três guardas. Através da parede
chega o rumor do trânsito, procedente do exterior e, sobretudo, a constante
cegarrega, monótona e inquietante, do Coro de internos, com cujas frases,
desvairadas e incoerentes, começa o desenvolvimento da peça. A didascália
deve ler-se com atenção, porque reflete muito bem o ambiente sombrio,
trágico e soturno em que irão decorrer os momentos finais da vida do Édipo
moderno; como havemos de ver imediatamente, fica bem claro que a auto‑
ra, já desde o início, pretende advertir-nos de que a cena deste novo Colono
– o interior opressivo de um hospital psiquiátrico – é o absoluto contrário
daquele lugar aprazível, cúmulo de paz e tranquilidade, onde o Édipo grego
terminará os seus dias; onde, nas belas palavras de Albin Lesky, no seu en‑
tusiástico louvor da última tragédia do veterano Sófocles, “se hace visible la
sublime paradoja de que los mismos dioses que precipitaron a Edipo en la
nochede la más profunda miseria, al mismo tiempo lo atraen por ello hacia
ellos mismos”23.

21
  Rocha Pereira, Ferreira, Fialho 2013: 275.
22
  Cf. La serata a Colono: 73 ss.
23
  Lesky 1966: 155 s.

203
Andrés Pociña

Para completarmos esta primeira aproximação a La serata a Colono, torna‑


-se quiçá necessário advertir que Elsa Morante não inclui, no começo, o habi‑
tual elenco de personagens.

4. Comparar pormenorizadamente o Édipo em Colono de Sófocles com La


serata a Colono de Elsa Morante excederia em muito os limites deste trabalho,
e não responderia ao propósito inicial, anunciado no título, de fazer uma apro‑
ximação da figura de Antígona, na sua recriação pela escritora italiana. Por
outro lado, é uma investigação que já foi realizada, e com notável acerto, por
S. Paglia24, que, para mais, forneceu uma muito interessante informação sobre
o conhecimento do grego clássico por parte de Morante, e sobre a possível
tradução italiana da tragédia de Sófocles que a nossa escritora teria utilizado25.
Seja como for, é claro que uma leitura profunda de La Serata deve fazer-se
tendo presente a tragédia de que ela partiu, como reescrita, sendo para isso
aconselhável usar, como termo de comparação, não apenas o original grego,
como também uma boa versão italiana26.

24
  Cf. Paglia 2011.
25
  Esta informação, que aparece em Paglia 2011: 151 n. 12, considero poder ser de
interesse para todo aquele que se preocupar a fundo por este assunto, razão pela qual tomo
a liberdade de a reproduzir aqui, expressando de passagem o meu agradecimento – e espero
que com a anuência – de S. Paglia: “Elsa Morante non conosceva bene il greco, come
testimonia Franco Serpia, Il greco di Elsa, in AA. VV. , Cahiers Elsa Morante 2, Salerno, Ed.
Sottotraccia, p. 78: “Elsa aveva fatto il ginnasio al ‘Visconti’ di Roma. Lì il suo professore
di lettere, un buon prete, tale padre F. più che insegnare il latino e il greco sfogava con gli
alunni la sua amara passione antifascista”. La lettura di Sofocle da parte di Elsa è avvenuta
attraverso la mediazione delle traduzioni le migliori delle quali, negli anni precedenti
la stesura della Serata, erano: Il mito di Edipo. Edipo re – Edipo a Colono – Antigone,
traduzione di Domenico Ricci, Milano, Rizzoli, 1951; Le tragedie di Eschilo e di Sofocle,
traduzione di Ettore Romagnoli, Bologna, Zanichelli, 1959; Le tragedie di Sofocle, a cura
di Giuseppina Lombardo Radice, Torino, G. Einaudi, 1966; Edipo a Colono, traduzione
in versi italiani di Ettore Bignone, Firenze, G. C. Sansoni, 1952; Edipo a Colono, a cura
di Dino Pieraccioni, Firenze, Vallechi, 1956; Edipo a Colono, introduzione e commento di
Angelo Nucciotti, Milano, Signorelli, 1957. Probabilmente, la Morante si è ispirata, nella
redazione della Serata, alla versione di Ettore Romagnoli”.
26
  Para o texto grego servi-me da ed. bilingue de Errandonea 1959. Como versão
italiana, ter-me-ia parecido preferível a de Ettore Romagnoli, que S. Paglia considera ter
sido provavelmente a utilizada por Morante, mas por não poder dispor dela servi-me da
seguinte edição, excelente sem dúvida: Sofocle, Edipo Re. Edipo a Colono. Antigone, a cura
di D. Del Corno, traduzione di R. Cantarella, Milano, Mondadori, 1982, obviamente
posterior à publicação de la Serata.

204
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

Sem querer abordar, portanto, uma análise comparativa, a leitura de am‑


bas as obras serve-nos para definir a obra de Morante, como uma reescrita
muito profunda da tragédia de Sófocles, feita a partir da modernização de
um fio argumental muito semelhante. Nas duas tragédias aparecem, como
elemento essencial, os momentos derradeiros da vida de Édipo; nos dois casos,
este é caracterizado como um homem idoso, cego, que sofreu uma existência
semeada de desgraças. Porém, e segundo se pode perceber melhor através da
comparação das personagens, ambos os Édipos são ao mesmo tempo muito
parecidos e muito diferentes, o mesmo acontecendo com Antígona e com o
Coro, de tal sorte que, ainda que seja fácil lembrarmos a cada passo a tra‑
gédia clássica, de que encontramos frequentemente transposições literais de
fragmentos para italiano, o resultado é, todavia, uma obra muito diferente.
Para a tornar tão diferente contribui de maneira muito importante, em meu
entender, a existência, na tragédia de Sófocles, de uma interferência alheia
ao momento presente, em Colono: refiro-me à focagem da difícil situação
em Tebas, prestes a cair numa guerra destrutiva, provocada pelos filhos de
Édipo, situação esta cuja solução passa por uma hipotética decisão, por parte
do ancião cego, de regressar a Tebas para apoiar um dos seus filhos. Tudo isto
fica excluído da obra de Morante, razão pela qual desaparecem dela três per‑
sonagens importantes: Ismene, Creonte e Polinices, resultando assim, desta
mudança, uma trama muito alterada; há que pensar apenas que isto implica a
ausência dos prolongados discursos do cunhado de Édipo, Creonte (728-760,
935-959), e, num sentido parecido, dos do seu filho Polinices (1254-1279,
1284-1345).
Mas a diferença mais profunda manifesta-se provavelmente na cons‑
trução dos personagens por parte do trágico grego, de um lado, e por par‑
te de Morante, do outro. Partindo daqueles, e tendo presentes, sempre, as
grandes diferenças, temporal e local, entre os dois dramas (mundo mítico/
século XX; bosque próximo a Atenas/ hospital psiquiátrico na Europa me‑
ridional), Elsa Morante põe em prática uma muito profunda recriação dos
personagens da obra, seguindo umas pautas que são habituais nas modernas
reescritas de tragédias e comédias antigas, como sejam a transformação,
omissão ou acrescentamento de personagens, em relação com os originais.
Uma listagem dos personagens que aparecem em cada um dos dois elencos
pode ajudar-nos a perceber as mudanças levadas a efeito:

Édipo em Colono La serata a Colono


Édipo Edipo
Antígona Antigone

205
Andrés Pociña

Estrangeiro
Coro de idosos de Ática Coro dei ricoverati
Ismene
Teseu Il Dottore
Creonte
Polinices
Mensageiro
La Suora
Il primo Guardiano
Il secondo Guardiano
Il terzo Guardiano

Embora o número de personagens seja quase o mesmo nas duas lista‑


gens, é mais rica em figuras significativas a de Sófocles, porquanto, se pres‑
cindirmos dos coros, esta apresenta seis personagens com papel relevante:
Édipo, Antígona, Ismene, Teseu, Creonte, Polinices. Elsa Morante reduziu‑
-os exatamente a metade: Édipo, Antígona e o Doutor, que é uma réplica
indubitável do rei Teseu de Atenas, se bem que com um papel de mui‑
to menor relevância no desenvolvimento da trama 27. Opera-se, pois, uma
mudança muito significativa por omissão de personagens, em vantagem
para o desenvolvimento da trama, no sentido de, na tragédia de Sófocles,
se acrescentar, ao tema central – ou seja, o caminho de Édipo para o seu
final em Colono – um outro, de âmbito diferente, e que diz respeito aos
acontecimentos que se estão a desenvolver, paralelamente, em Tebas; acrés‑
cimo que já foi apontado anteriormente. Na Serata, nada de exterior ao
Colono-hospital vem sobrepor-se: a redução de personagens resulta também
na simplificação da trama.
Há, contudo, um acrescento, em Morante, de personagens de papel
bastante secundário: face ao Estrangeiro (em realidade, um habitante de
Colono) e ao Mensageiro da obra de Sófocles, no hospital introduzem-se
três Guardas, espécie de enfermeiros de centro psiquiátrico, e uma Freira;
os três primeiros não têm importância real, a freira pelo contrário é muito
mais interessante. De facto, desde a sua primeira intervenção em cena, que a

27
  Cf. La serata a Colono, p. 51: EDIPO Chi sei tu? / Mi pare di riconoscerti / alla
corona di oro / che porti... IL DOTTORE Io sono / il re di questo paese [...] EDIPO Che regno
è questro tuo?... IL RE È il territorio consacrato alle sante figlie dell’oscurità / dai molti nomi.
/ Qua sotto esse abitano, qua è la loro chiesa. / Dalle nostre parti sono conosciute col nome / di
Benigne / oppure di Erinni, / e altrove / certuni le chiamano Furie, altri, Insulto, e altri, Paura.

206
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

freira é assimilada por Édipo à sua filha Ismene, confusão a que ela própria
ajuda (pp. 66-70). Mais adiante, na sua intervenção, fundamental para o
desfecho da peça, a freira transforma-se na imagem de Jocasta, a mãe de
Édipo, cujo papel assume enquanto lhe oferece a bebida fatal, e enquanto
entoa a canção de embalar do gigante Sacripante, a chamar-lhe “figghiuzzo
mio” (p. 91).
Mais do que estas figuras, suprimidas ou acrescentadas, requerem espe‑
cialmente a nossa atenção as duas personagens principais, Édipo e Antígona.
Na recriação de ambos, Elsa Morante realizou um labor de transformação
sumamente profundo, em consequência do qual, numa primeira leitura,
poderia dar a impressão de estas personagens continuarem a ser idênticas a
si próprias, quando, na verdade, são personagens novos, essencialmente no‑
vos. Quanto aos procedimentos empregados pela escritora em semelhante
recriação, estes serão analisados no parágrafo a seguir; cingir-me-ei, de mo‑
mento, aos aspetos descritivos que caracterizam os personagens de Édipo
e Antígona, novamente criados por Morante, aspetos que os tornam tão
diferentes daqueles transmitidos na obra de Sófocles.
Embora não pretendendo entrar numa análise pormenorizada da perso‑
nalidade do Édipo morantiano, para além das conclusões que da sua atu‑
ação ao longo da obra iremos tirando, podemos salientar a imagem que
dele nos aparece, já no início, imagem muito certeira, conseguida por um
procedimento muito original: a sua filha Antígona, que lhe serve como guia
e apoio, possui uma carta de recomendação, como ela mesma lhe chama, de
um doutor que o tratou previamente, noutro hospital (p. 40); o documento
é lido pelo Terceiro Guarda, que nos informar de que o nosso novo Édipo
tem 63 anos de idade, é um pequeno proprietário com posses, viúvo, quatro
filhos, dos quais, dois homens, maiores de idade, que intentaram uma de‑
manda por incapacidade contra ele (p. 42). Até aqui, as coincidências com
o Édipo sofocliano são máximas, mutatis mutandis, por causa da condição e
cronologia, distintas. Com o diagnóstico relativo ao velho, começa, porém,
o motivo básico da diferença maior: o médico que emitiu a informação des‑
creve-nos com todo o pormenor a sua loucura total, o alcoolismo, uma pos‑
sível toxicomania, escassa ou nula resposta a fármacos tranquilizantes ou
soníferos, alucinações visuais e auditivas... Tal como nós, o médico também
fica impressionado com a verbosidade surpreendente do louco, que des‑
creve assim: “Logorroico... magniloquente... stereotipie verbali di stilo pseudo-
-letterario... infioratto di citazioni classiche... Flusso verbale carat-teriz-ato da
lunghe monodie d’ intonazione pseudo-litur-gica o épica... Contenuti de-liranti
strut-turati... Acessi aggresivi... mito-manie... Manierismi... Fughe ideiche...”

207
Andrés Pociña

(p. 42). Segue-se, enfim, a enumeração das desgraças que o homem sofreu:
morte do pai na Primeira Grande Guerra, suicídio da mãe, emigração, par‑
ticipação na Segunda Grande Guerra, prisão em campos de concentração,
diversas desventuras domésticas após o regresso a casa, viuvez recente... Em
definitivo, uma reprodução, rebaixada ao nível humano e adaptada aos
tempos hodiernos, das inefáveis desgraças do mítico rei Édipo, em tempos
longínquos. O desfecho é, contudo, inteiramente diferente, pois que o novo
Édipo, ser absolutamente alienado, difere completamente daquele ancião
que caminha, sábio, tranquilo e feliz, à espera da morte, no final da tragé‑
dia de Sófocles. Maria do Céu Fialho soube sintetizar, em breves frases, o
sentido da última grande figura sofocliana:

“Édipo profeta /(1516-1517), Édipo mestre (1518), Édipo guia (1520-


1521), 1542-1545) são a derradeira imagem de uma figura que pola‑
rizou o universo poético de Sófocles: a do cego que vê. O enigma da
sua morte transcende a possibilidade de comunicação verbal (1526) e
oferece-se como espectáculo esmagador e revelação (1650) a um Teseu
que, em silêncio, venera o âmbito do ctónio e do olímpico (1654-1655)
e com o seu silêncio manterá recatado o mistério e a intimidade da
morte”28.

Quanto à figura de Antígona, e prescindindo também, no caso dela, da


imagem que a própria nos vai mostrando ao longo da obra, diremos que ela
é apresentada por Morante pouco depois do começo, logo após a primeira
intervenção do Coro, e com poucas palavras, embora muito precisas: “ra-
gazzina selvatica e tremante sui l4 anni, però poco sviluppata per la sua età”
(p. 36). Esta imagem de “ragazzina” de pouca idade, aparentando ser ainda
mais nova – devido ao seu comportamento, com frequência muito infantil
– é certificada pelas suas próprias palavras, por exemplo, quando confessa
aos Guardas que mal sabe ler, porque as coisas da escola não lhe tiram o
sono, e porque tudo o que tem a ver com os esforços da memória lhe produz
imenso cansaço (p. 42); daqui a pouco falaremos dela com a extensão que
a personagem merece.
Depois de termos reconhecido que Elsa Morante agiu, na sua recriação
da última tragédia de Sófocles, e no que toca ao elenco de personagens,
reduzindo drasticamente o número deles, e pondo em essencial destaque
apenas Édipo e Antígona, poderíamos encarar a causa que subjaz à reela‑

28
  Fialho 1992: 155.

208
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

boração do título, de Édipo em Colono a Entardecer em Colono. Porque não


conservou, no título, o nome próprio do desafortunado rei de Tebas, que
por si mesmo seria elucidativo junto do público receptor, do mesmo modo
como, por exemplo, pelas mesmas datas, Pier Paolo Pasolini mantinha o
título sofocliano, tal qual, para o seu Edipo Re? É aqui que medito pela
primeira vez na dúvida concernente ao protagonismo na Serata: manter em
silêncio, no título, o nome da primeira figura, seria um ato consciente da
autora, na incerteza relativa sobre qual dos personagens acabaria sendo pro‑
tagonista, se Édipo, se Antígona? Ou, muito mais simplesmente, ela estaria
convencida à partida que o papel protagonista, na sua reescrita, devia passar
do ancião cego à sua jovem filha? Esta última hipótese parece-me mais
convincente, de acordo com a minha leitura da peça de Morante, embora
deva admitir que não sou eu o primeiro a chegar a uma tal conclusão: Elisa
Donzelli já teve ocasião de a sustentar firmemente, há uns poucos anos:

“Questa bambina analfabeta è e non è una variazione sul mito eppure


resta la protagonista indiscussa della Serata a Colono. Nessun modello
tragico la definisce poiché la celebre fanciulla [...] non è più in grado
di ricordare il proprio celebre passato. In ciò consiste la ragione della
sua salvezza e integrità ed è per questo motivo che della parodia mo‑
tantiana Antigone risulta la figura più originale”29

5. Um dos aspetos mais surpreendentes da composição literária de La


serata a Colono consiste na utilização de diversos falares, desde a norma
padrão habitual do italiano – aquela que costumamos aprender como in‑
trodução à língua oficial atual, e que está na base da literatura hodierna – a
dialetos de difícil localização geográfica, próprios da Itália meridional, com
uma profunda raiz popular, detectável nos seus traços fonéticos, sintácticos,
e no seu vocabulário. Já que não possuo a formação obrigatória para empre‑
ender um estudo de precisão científica sobre este singular aspeto do drama
de Elsa Morante, advertirei desde logo de que sigo de muito perto um exce‑
lente trabalho, publicado em data recente por Silvia Paglia, sob o título de
“La sperimentazione linguistica e l’esplicitazione tematica dai romanzi alla
Serata a Colono di Elsa Morante”30.
É a própria Paglia a frisar, como ponto de partida, que as personagens
secundárias, quer dizer, os três Guardas, o Doutor e a Freira, falam um ita‑

29
  Donzelli 2007: 200.
30
  2011: 79-101.

209
Andrés Pociña

liano comum, um italiano padrão. Nestes casos, Morante assinala-os com


um falar particular, talvez por causa de os seus papéis não terem maior
relevo no desenvolvimento da trama; também porque, na minha opinião,
não estava na mira da autora tornar a Serata num compêndio de língua ita‑
liana e de falas populares comparadas. Deste modo, para dar um exemplo,
quando Antígona se queixa por terem deixado ficar o seu pai no corredor, o
primeiro Guarda responde num italiano padrão, falando porém num regis‑
to onde se põe de manifesto o “eloquio burocratico-ospedaliero”, bem como
a falta de sensibilidade e de delicadeza do guarda31:

IL PRIMO GUARDIANO
Per adesso
vista la situazione ospedaliera d’emergenza
l’ordine è di lasciarlo qua di fuori, in attesa
della sua destinazione.
Si tratta d’una disposizione provvisoria.
Un posto da sistemarlo si rimedia senz’altro
dentro stanotte (p. 38).

Por sua vez, o Doutor, sempre usando um italiano comum escorreito,


fala com uma superioridade evidente, primeiro com Antígona, que lhe pede
humildemente para lhe poderem ser afrouxadas, a Édipo, as ligaduras com
que ele está sujeito:

IL DOTTORE
Si tratta d’una percauzione elementare
e indispensabile, nell’interesse stesso
del malato (p. 50).

E, com igual superioridade, “come un fantocchio di legno”, na didascá‑


lia acertada de Morante, transforma-se numa réplica do rei Teseu, fazendo
continuar a confusão de Édipo à volta da sua pessoa:

Io sono
il re di questo paese. Anch’io ti riconosco alle orbite svuotate e
[sanguinose dei tuoi occhi
o punitore di te stesso, disgraziato figlio di Laio.

31
  Paglia 2011: 82.

210
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

Da molti mi è stata riferita la tua storia, con la notizia


del tuo prossimo arrivo (p. 51).

A Freira exprime-se com a linguagem maviosa – toda feita de falsida‑


de, no fundo – com que costumavam fazê-lo, na vida diária, as religiosas,
outrora habituais nos hospitais, tanto na Itália quanto na Espanha; Elsa
Morante introduz a sua intervenção, no momento de dar um medicamento
a Édipo, com estas palavras, contundentes e categóricas: “nel tuono mielato
che si usa coi mentecati e coi bambini”:

LA SUORA
Ma certo e come no? Vedrete vedrete
che adesso farete un bel sonno... Ecco, abbiamo finito, tutto è a posto,
e adesso
il niostro babbino farà un bel sonno, perché è stato bravo
a prendere quella medicina buona che fa bene... (p. 68).

Chegamos assim ao Coro. Silvia Paglia explica, em breves termos, três


fases distintas nas intervenções deste: “la prima che si prolunga quasi due
terzi dell’opera, di vaniloquio collettivo, la seconda, che copre l’altro terzo
della tragedia, in sintonia con la lucida ‘pazzia’ di Edipo, e la terza, brevis‑
sima e finale, di immedesimazione con lui” (p. 98). Qualquer trecho das
suas intervenções, na primeira parte, pode servir como exemplo da sua falta
de sentido, sugerindo um coro de alienados, que falam um italiano padrão,
mas cheio de frases sem acabar, desconjuntadas, repetidas com insistência,
vozes que tornam angustiante a estada no corredor, aonde chegam através
das paredes, pois o Coro fica de fora. Sirva como exemplo este passo:

CORO
Su quattrocentocinquanta concorrenti... Io non devo pensare non
devo pensare non devo pensare – Buon giorno come va? – Buon giorno
come va? – Fuoco! – Bisogna scrivere tutti i numeri in cifre romane
– Ho comprato un nastro rosso – Ho comprato – Quando l’ostia
sanguina è segno d’importanza – un nastro rosso – Mostri la tessera -
Su quattrocentocinquantamila concorrenti – Ho comprato un nastro
rosso – Un momento – Posso respirare per favore? – Un momento un
momento – Lei non ha rispetato il signale Stop – A TLATELOLCO
– Con la maschinenpistole – Posso fare un gran respiro per favore?
Grazie. (p. 49)

211
Andrés Pociña

Frases sem sentido, porém inquietantes, mesmo quando alguém, que


fala e lê italiano desde há quase cinquenta anos, depara com palavras que
não percebe, como “la maschinenpistole”, que os loucos repetem desde a
primeira intervenção (p. 36), ou aquela teima em ordenar “mostri la tesse‑
ra”, e em repetir “siamo tutti militari”, “uno che mi ha pedinato”, “li elimi‑
neremo li liquideremo è facile”, “ci sono machine che mi seguono”, “questa
e zona militare”, “questa tessera è scaduta”, “d’ordine del Generalissimo si
devono rifare tutti i caratteri in cifre romane”, “siamo rimasti orfani”, “chi
si ferma è perduto”. Não é mais do que um simples grupo de loucos? É evi‑
dente que há aqui qualquer coisa de mais fundo; encontramo-nos perante
um grupo de loucos que atravessaram experiências terríveis, militares, béli‑
cas, que continuam a refletir nas suas monótonas falas. São loucos anterio‑
res a 1968, e aparecem numa obra de Elsa Morante, que já tem em projeto
escrever La Storia (1974), uma obra imensa e pormenorizada sobre o terrível
e cruel século XX.
Dos desvairados discursos do Coro, transitamos com facilidade, sem
grandes problemas de adaptação, para as intervenções de um Édipo total‑
mente desnorteado, que chegou ao extremo de arrancar os próprios olhos
com o vidro de uma garrafa partida. Para ele, a vida mais não tem sido do
que uma sucessão de desgraças e dores. E é essa absoluta insânia, a que Elsa
Morante afeiçoa a nova imagem do antigo rei de Tebas, que se reflete no
seu modo de falar, sobre o qual eu precisaria de muito tempo para poder
dizer algo de novo. Perante a impossibilidade de o fazer, lembrarei mais
uma vez aquela informação que sobre ele realizou um médico, antes da
chegada de Édipo ao psiquiátrico de Colono: “Logorroico... magniloquente...
stereotipie verbali di stilo pseudo-letterario... infioratto di citazioni classiche...
Flusso verbale caratterizato da lunghe monodie d’ intonazione pseudoliturgi-
ca o épica... Contenuti de-liranti strutturati... Acessi aggresivi... mitomanie...
Manierismi... Fughe ideiche...” (p. 42).
Em contrapartida, não posso resistir a oferecer uma amostra do falar
mais curioso de todos, o da menina Antígona. Como assinala Silvia Paglia,
trata-se de uma invenção linguística extraordinária, porquanto não corres‑
ponde a nenhum dialeto existente, como podia ser o romanesco, mas antes
“è costruito in modo originale e poetico, mediante una contaminazione e
trasformazione di una pluralità di dialetti dell’area centro meridionale”32.
Elsa Morante foi quem criou, na verdade, um dialeto exclusivo, bem anali‑

32
  Paglia 2011: 94.

212
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

sado por Adriana Pelo33, para a sua Antigona, aquela menina de 14 anos que
aparenta ainda menor idade, quase analfabeta, sem nenhuma formação cul‑
tural; uma menina cheia de bondade, que, sem se preocupar consigo pró‑
pria o mínimo que seja, vive tão-somente para atender, com total entrega, o
pai, doente, cego, absolutamente louco. E é essa bondade, esse encanto in‑
comensurável da mocinha, o aspeto que a autora melhor soube transpor, de
forma tão admirável, para essa fala inculta, elementar, popular, infantil, que
lhe põe nos lábios. Vejamos o reflexo dessa fala, na tentativa da rapariga de
acalmar as visões angustiantes do cego Édipo, inventando um ambiente de
fantasia que nada tem a ver com o corredor do hospital onde se encontram:

ANTIGONE
Qua non ci stanno macerie che stiamo in un bel posto in una
/bella notte che stiamo
dentro a un bel giardino in una bella notte credete agli occhi
/miei caro padre che queste cose che dite voi
non sono verità quella è tutta un’estasi vostra per le ferite
dei vostri poveri occhi mutilati
che quello voi state come dentro a un dormiveglia
pa’.
EDIPO
Che c’è laggiú?
Che è quella bucca?
ANTIGONE
Quella...?
Quella
è una bella funtana di statue
con la illuminazione eletttrica anniscosta
che fa l’acqua di tanti belli colori! (p. 48)

6. Com o que ficou dito até aqui, deixei delineado, de um modo mais
ou menos aceitável, o contorno da Antígona proposta por Elsa Morante,
uma Antígona diferente, eu diria nova – seja como for, afastada da imagem
habitual que costumamos ter dela. Uma imagem nova, baseada sem dúvida
no seu comportamento exemplar de filha, que a leva a transformar-se na
bondosa condutora do pai cego (sobretudo no Édipo em Colono de Sófocles),
mas antes disso, na sua valentia feminina, ao cumprir as suas obrigações

33
  Pelo 2008: 137-151, esp. 143-144.

213
Andrés Pociña

ante a família, ante a humanidade e ante os deuses, desobedecendo às or‑


dens, dadas pelo rei Creonte, de não dar sepultura ao seu irmão Polinices
(sobretudo na Antígona de Sófocles). Não é, a Antígona de Morante, aquela
valorosa mulher nova que arriscou a vida para cumprir as suas obrigações
morais, cívicas e religiosas, mas antes, uma verdadeira menina, de 14 anos, é
certo, mas “poco sviluppata per la sua età” (p. 36). Uma mocinha ingénua,
de marcado caráter infantil, que nem ler sabe, mas que chama a nossa aten‑
ção, sobretudo pela sua bondade sem limites. De moça de cego, indispensá‑
vel ao pai (que, para além de se ter tirado a vista, ficou num estado de total
demência), chegará a ser a sua protetora constante: deforma a realidade,
sempre que preciso, para a afeiçoar aos desejos do pai (p. 40); tenta esquecer
a loucura dele sempre que possível, interpretando-lhe as alucinações como
próprias de um estado febril, sofrido pelo doente; preocupa-se com a ali‑
mentação dele (p. 45), teima em libertá-lo das correntes que o sujeitam (p.
69), confessa que daria os seus próprios olhos para o ver contente (p. 85)...
Essa sensibilidade, essa entrega total, esse amor sem medida para o pai,
ficam emotivamente patentes, por exemplo, nas palavras derradeiras que
ela troca com ele:

ANTIGONE
Si pa’
sto qua vicino a voi pa’ non datevi penziero di gnisuna cosa che
/ci sto sempre io qua vicino a voi
che tutte quelle imbressioni brutte che voi ve ne mettete paura pa’
quello
/non è niente pa’ non ci state a credere perché quello
è la frebbe
che a voi quella è la frebbe che vi fa stare come dentr’auninsogno
pa’
che adesso io vi bagno con l’acqua la faccia e i capelli
cosi avete un poco di ristoro.

EDIPO
... DOVE siamo?...

ANTIGONE
Siamo
...alla casa nostra siamo!
pa’!

214
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

stiamo su in camera alla casa nostra che è sera che saranno


le sette – sette e un quarto... (p. 88 s.)

No desfecho, espetacular, do drama, a cena fica submersa numa obscu‑


ridade total, em que se ouve primeiro a VOCE DE EDIPO, convertida em
Voz do Coro, e como fecho absoluto, de forma comovedoramente dramáti‑
ca, “la voce piangente di Antigone che grida”:

LA VOCE DI ANTIGONE
Pa’! Paaa’! Paaaa’! (p. 90)

Esta Antígona diferente ocupa um lugar de relevo ao longo de toda a


tragédia, e obriga-nos a discutir quem é, na intenção de Elsa Morante, o
ou a protagonista da sua recriação. Intitulando a obra como La serata a
Colono, a dúvida fica aberta, com a particularidade de não existir uma razão
óbvia para se ter suprimido o nome de Édipo, que constava do título do
original sofocliano. Pessoalmente considero que a protagonista é precisa‑
mente Antígona, opinião que me parece poder ser abonada, para além do
enorme interesse demonstrado por Elsa Morante na caracterização desta
personagem, partindo do seguinte raciocínio: este drama, único que a auto‑
ra escreveu ao longo da vida, foi por ela inserido, de maneira em aparência
inconsequente, numa obra, de conteúdo variegado, intitulada Il mondo sal-
vato dai ragazzini e altri poemi. Tenhamos em conta que aquilo que torna‑
ria, com efeito, inconsequente tal localização do drama seria o facto de a
Serata, no contexto de um livro subordinado a tal título, se referir ao final,
num hospital de alienados, de um cego enlouquecido, de idade avançada.
Evidentemente que este (aparente) contra-senso exigiria uma explicação.
Chegando à parte terceira, e última, da obra total, observamos que esta
tem um título geral, “Canzoni popolari”, e aparece articulada em duas sec‑
ções: 1. La canzone degli F.P. e degli I. M. in tre parti, e 2. Il mondo salvato
dai ragazzini. Como necessária introdução à sua visão do mundo, Morante
divide os humanos em duas classes: a dos F. P. e a dos I. M., o que quer di‑
zer, Felici Pochi e Infelici Molti. A parte positiva da humanidade é represen‑
tada pelos Felici Pochi, seres sempre “bel-lis-si-mi”, quer sejam lindos, quer
feios, e que surgem de modo imprevisível “ dove non s’ ha il vizio d’assassinare
i profeti / né di sterminare / i poeti” (p. 120). Todos os mais integram a clas‑
se dos Infelici Molti. Para nos oferecer uma amostra de F. P., já falecidos,
no propósito de enriquecer a nossa experiência e melhorar a nossa cultu‑
ra, Morante delineia um quadro, no qual se acolhem Antonio Gramsci,

215
Andrés Pociña

Arturo Rimbaud / Benedictus Spinoza, Giordano Bruno, Giovanna D’Arc,


Giovanni Bellini, Platone di Atene, Rembrandt / Simona Weil, Volfango
A. Mozar (p. 122). Mais adiante, dirá que estamos no “Secolo Ventesimo.
Era atomica. / A quanto pare, d’anno in anno / i Felici Pochi sono piú pochi
/ e sempre piú infelici” (p. 127). Nesse terrível mundo atómico, povoado de
Infelici Molti, é pouca a esperança que pode restar, e essa pouca que resta,
é apanágio de certos F. P.: os “ragazzini”. Jolanda Lecesse analisa-os em
termos muito justos:

“Antigone appartiene alla schiera dei ‘ragazzini’, gli unici in grado di


salvare il mondo dal ’caos dell’ irrealtà’. Sono essi il cuore mai domato
dell’umanità, appartengono ad ogni età, possono trovarsi ovunque,
rappresentano il ‘sale della terra’, la forza della giovinezza reale o
dell’anima, slancio vitale e gioioso, inno ad una vita relazionale, non
necessariamente conflittuale e violenta. Elsa li arruola al servizio di
una sua personalissima utopia, lontana da qualsiasi adesione a gruppi
politici; ne fa i latori di una sua visione del mondo governato dalla
gioia, dai valori autentici e spontanei rappresentati dagli umili, dagli
esclusi, dall’amore incondizionato per ogni aspetto dell’esistenza”34

O modelo fundamental criado por Elsa Morante para os F. P., na sua


obra de 1968, é justamente Antígona; seis anos mais à frente, no romance
La Storia, haverá vários F.P.; entre estes, porém, o exemplo mais cabal entre
os “ragazzini”, será, sobretudo, o menino Useppe. As parecenças entre am‑
bas as criações de Elsa Morante são surpreendentes.

7. Peça teatral única de Elsa Morante, segundo já repeti em várias oca‑


siões, nunca encenada até há cerca de um ano, nos começos de 2013, La
serata a Colono continua a ser, provavelmente, a obra mais desconhecida
da autora. E isto, não apenas por causa da total ausência de encenações
fora da Itália, como também pela inexistência de traduções: de facto, não
conheço, na atualidade, nenhuma versão em nenhum idioma. Na verda‑
de, o problema maior para uma boa divulgação internacional de La serata
a Colono acha-se, sobretudo, nas grandes dificuldades que a sua tradução
pode suscitar: eu, por exemplo, mal consigo imaginar uma Antígona a falar

34
  Leccese, “Antigone di Elsa Morante – in Serata a Colono”, Leggere Donna 160
(2013), também no sítio: http://donnarte.wordpress.com/2013/08/01/antigone-di-elsa‑
-morante-in-serata-a-colono/

216
Uma Antígona diferente, em la Serata a Colono de Elsa Morante

uma língua, seja do tipo que for, distinta do dialeto em que se exprime a fas‑
cinante miúda criada por Morante. Mesmo assim, uma tal tradução deveria
tentar-se, por parte de quem quer que seja que se sinta capaz de o conseguir,
pois que é esta, sem dúvida, uma tragédia muito formosa, e uma das mais
originais recriações da antiga heroína trágica.

217
(Página deixada propositadamente em branco)
Algunas Antígonas en España (s. XX)
(Some Antigone’s versions in Spain, 20th century)

Aurora López (auroral@ugr.es)


Universidad de Granada

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_11

219
(Página deixada propositadamente em branco)
Algunas Antígonas en España (s. XX)

Resumen – Después de algunas consideraciones generales sobre la pervivencia del


tema de Antígona a través de múltiples reescrituras, la autora analiza de manera espe‑
cial las realizadas por José Martín Elizondo en su drama Antígona entre muros y por
Julia Uceda en su poema “Antígona”, dos versiones poco conocidas, y plantea además
nuevas posibilidades de estudio de la muy famosa obra La tumba de Antígona de María
Zambrano, a partir de la excelente edición de V. Trueba Mira publicada en 2012.
Palabras clave: Antígonas españolas, Martín Elizondo, María Zambrano, Julia
Uceda.

Abstract – After some general considerations on the survival of Antigone’s topic


across multiple rewritings, the authoress analyzes in a special way the realized ones
for Jose Martin Elizondo in his drama Antígona entre muros and for Julia Uceda in
his poem “Antigone”, two little known versions, and she raises in addition new possi‑
bilities of study of the very famous work La tumba de Antígona of Maria Zambrano,
based on the excellent new edition of Virginia Trueba Mira (Madrid, 2012).
Keywords: Spanish Antigone’s versions, Martín Elizondo, María Zambrano,
Julia Uceda

1. Antígona, un tema siempre vivo.

Quiero expresar mi enorme satisfacción por encontrarme de nuevo en un


centro para mí tan querido como es la Facultad de Letras de la Universidad
de Coimbra, donde desempeñan su actividad docente e investigadora un
número tan grande de investigadoras e investigadores a quienes me une una
amistad ya muy larga y muy estrecha. Os agradezco de corazón que me ha‑
yáis invitado una vez más, ahora para volver monográficamente sobre una
persona mítica realmente simpática y admirable, de la que ya nos hemos
ocupado en otras ocasiones muchas y muchos de nosotros, pero que siempre
nos seguirá llamando la atención, en especial porque sigue sin cesar siendo
objeto de nuevas interpretaciones filológicas y, lo que es más importante
todavía, de nuevas reinterpretaciones literarias y artísticas.
Esta pervivencia y actualidad del tema de Antígona a que estoy alu‑
diendo es fácil de demostrar, tanto que basta un simple dato para hacerlo:
estrenada en Atenas la tragedia homónima de Sófocles en el año 442 a. C.,
en 2008 un voluminoso libro de José Vicente Bañuls y Patricia Crespo1, de

1
  Bañuls Oller, Crespo Alcalá 2008.

221
Aurora López

la Universidad de Valencia, pasa revista a 258 recreaciones del personaje


dramatizado por aquél gran tragediógrafo, desde el siglo V a. d. C. hasta
nuestros días, mostrando y analizando en consecuencia un porcentaje muy
elevado de interpretaciones de Antígona que corresponden ya a tiempos
modernos, y de manera especial a los siglos XX y XXI.
Ese gran interés que desde tanto tiempo atrás venía despertando la re‑
creación literaria, teatral, musical, pictórica, artística en una palabra, de
Antígona, encuentra un momento de gran atención en el ámbito de la in‑
vestigación al publicarse en Nueva York, en 1984, el libro ya clásico y de
referencia obligada de George Steiner, Antigones, pronto editado en versión
española 2, y traducido también a otras lenguas. Se trata de una obra exce‑
lente, sin lugar a dudas, y que ha marcado una pauta en una más profunda
interpretación de diversas versiones de Antígona, pero con un defecto grave,
también sin lugar a dudas, que es el total desconocimiento y ausencia en
todo su recorrido de las versiones españolas, latino-americanas y portugue‑
sas de este mito. A tratar y desarrollar ese vacío dejado por Steiner vinieron
una serie de estudios, en los que ocupa un indudable papel iniciático el
orientado desde una perspectiva panorámica por María José Ragué Lo que
fue Troya. Los mitos griegos en el teatro español actual, publicado en 19923.
Muy llamativo resultaba el desconocimiento de Steiner del notable nú‑
mero de reescrituras, muchas de ellas realmente interesantes, producidas
en Portugal, en cierto modo provocadas por la persistencia prolongada de
la dictadura de Oliveira Salazar, que sin duda daba pábulo y ocasión a una
tragedia tan política en sus planteamientos. Prestigiosos filólogos y filólo‑
gas, en buena parte presentes hoy en este Congreso, dieron un paso firme
para poner fin a esa profunda laguna en los estudios filológicos y teatrales
en el libro de 2002 coordinado por Carlos Morais Máscaras portuguesas de
Antígona4, obra también de referencia obligada.

2
  Steiner 1991.
3
  Ragué 1992. Otros trabajos de esta autora sobre reescrituras de los temas
mitológicos clásicos son: Els personatges femenins de la tragèdia grega en el teatre
català del segle XX, Sabadell, Editorial AUSA, 1990; Los personajes y temas de la
tragedia griega en el teatro gallego contemporáneo, Sada – A Coruña, Ediciós do
Castro, 1991. Y de gran interés para nuestro campo de estudio resulta igualmente
su libro El teatro de fin de milenio en España. De 1975 hasta hoy, Barcelona, Ed.
Ariel, 1996, que presenta la muy elogiable particularidad de recoger la información
sobre el mundo teatral español incluyendo también las aportaciones de las tres
autonomías conm lenguas propias, Galicia, Cataluña y País Vasco.
4
  Morais 2001.

222
Algunas Antígonas en España (s. XX)

Un sentido diferente tendrá, poco tiempo después, una aproximación al


tema desde perspectivas variadas coordinado por dos investigadoras italia‑
nas, Mariangela Ripoli y Margherita Rubino, Antigone. Il mitto, il diritto, lo
spettacolo5. Publicado en 2005, este libro convoca a estudiosos y estudiosas
de disciplinas muy variadas, fundamentalmente para examinar de nuevo la
Antígona de Sófocles, desde puntos de vista de la Criminología, el Derecho,
la Psicopatología, la Cinematografía, la Filosofía y el Teatro.
El mismo año en que aparece la amplísima recopilación de reescrituras
del tema de Antígona de Bañuls y Crespo al que me he referido hace un
instante, el filólogo y director teatral argentino Rómulo Pianacci publica su
tesis doctoral, realizada sobre las obras dramáticas sobre Antígona escritas
en las distintas repúblicas latinoamericanas, un trabajo realmente signifi‑
cativo, no sólo por la variedad de los tratamientos, sino por el número de
las obras, muy superior al que una carencia de estudios casi completa po‑
dría hacer suponer6 . Con estos trabajos, el cerco previamente existente a
las Antígonas redactadas en dos de las lenguas cultas más interesantes del
mundo, la española y la portuguesa, iba quedado definitivamente superado.
De este modo, quizá sea la última de las publicaciones de conjunto sobre
Antígona la propiciada y publicada en 2010 por las investigadoras francesas
Rose Duroux y Stephanie Urdician, Les Antigones contemporaines (de 1945
á nos jours)7, que conjuga el buen sentido y gran atractivo de que la colec‑
ción de trabajos que presenta no se centra exclusivamente en las Antígonas
francesas; en efecto, una serie de estudiosos y estudiosas se han ocupado en
el volumen de analizar reescrituras de Antígonas españolas, portuguesas,
argentinas, gallegas, y al lado de reescrituras dramáticas contemplan igual‑
mente las realizadas en otros géneros como la novela, etc.

2. Punto de partida: la Antígona de Sófocles.

Para introducirme ya en el tema, comenzaré por repetir lo que escribimos


Andrés Pociña y yo en un trabajo en memoria de María Luisa Picklesimer,
añorada compañera que también se había ocupado de nuestra heroína8: “La

5
  Ripoli, Rubino 2005.
6
  Pianacci: 2008.
7
  Duroux, Urdician: 2010.
8
  López, Pociña 2010: 355-356.

223
Aurora López

Antígona de Sófocles ... ha sido objeto de todo tipo de estudios y ha sido


contemplada desde diversos aspectos, desde épocas históricas muy lejanas a
la suya, así como por culturas muy diferentes. Podría decirse que sirve como
espejo en el que se miran la religión, la filosofía, la teoría y la praxis política,
el feminismo y otros muchos “-ismos”, los derechos humanos, etc… Ha
sido fuente de recreaciones y reescrituras teatrales innumerables, donde se
actualizan aspectos diversos en los que fijan su atención y sus convicciones
los autores o las autoras y que, por tanto, la convierten en un magnífico
ejemplo de lo que hoy consideramos una “obra abierta”, que goza de un
prestigio multisecular, o, en otros términos, lo que se considera una obra
clásica que se engrandece precisamente por estas múltiples lecturas”.
La Antígona de Sófocles plantea un enfrentamiento con el poder público
establecido ante un posicionamiento de éste con relación a un hecho de ám‑
bito privado y aceptado por la comunidad: el entierro digno y convencional
de los muertos. Antígona entierra a su hermano y ello a costa de su propia
vida. Esta acción lleva emparejada la soledad de la joven, que no se ve se‑
cundada en su desobediencia por su hermana Ismena, y la mueve a resistirse
ante los ruegos de su prometido Hemón, que finalmente se suicidará.
El rey Creonte intenta reforzar su soberanía, fortaleciendo su inseguri‑
dad con el castigo de quien ha llevado la guerra contra Tebas, Polinices, al
que se le niega la sepultura, rompiendo una de las normas más arraigadas
del ámbito familiar, enterrar a los muertos. Se considera el defensor de la
polis y paulatinamente va impregnándose de un amor al poder, desoyendo
al coro, a su hijo Hemón, al adivino Tiresias, a las dos hermanas, quedán‑
dose en consecuencia solo y padeciendo la tragedia de ver morir a todos los
suyos debido a su obstinación y empecinamiento. Frente a él se planta la
heroína, firme, segura, protectora de las leyes de los dioses subterráneos,
siempre portadora de la pietas, que exige una especial veneración a la familia
y por encima de ella a los dioses. Dicha pietas se había mostrado ya antes en
su entrega al cuidado de su padre Edipo, anciano y ciego, y posteriormente
con su hermano Polinices.
Todos estos presupuestos están presentes en la tragedia de Sófocles, a los
que sin duda hay que añadir todas las reinterpretaciones y reescrituras que
se suceden en el tiempo, que abarcan países muy distintos, que contemplan
regímenes y situaciones políticas diferentes, que sufren guerras civiles, que
abogan por una libertad individual, por un respeto a los derechos humanos,
por una reivindicación de los derechos de la mujer y un sinfín de situaciones
en las que se necesite una justicia real y efectiva. Es el antagonismo ético en‑
tre Antígona y Creonte quien arrastra a la muchacha, enérgica en la defensa

224
Algunas Antígonas en España (s. XX)

y en la práctica de sus convicciones, a la autodestrucción. Es sencillamente


un arquetipo y por tanto sigue nutriendo nuevas interpretaciones, dando
lugar sin fin a nuevas Antígonas.
La caracterización de la heroína reside en el enfrentamiento al poder, la
desobediencia, la fuerza; se desmarca de las razones de su hermana en lo que
atañe a su condición de mujer, con un linaje que las obliga a renunciar a la
vida en pro del respeto a la familia. En su opinión, tienen el deber religioso
de enterrar a los muertos, aunque ello las enfrente con el poder. La ley no
escrita en la que se ampara Antígona es la del corazón, de la conciencia,
del ámbito de lo privado, que lleva a un conflicto que desemboca en trá‑
gico calificado como negativo, pero con una valoración ética y pedagógica
positiva.
Mi trabajo de hoy intenta llamar la atención sobre tres reescrituras es‑
pañolas del mito, dos de ellas muy descuidadas: una teatral, Antígona entre
muros de José Martín Elizondo, otra poética, la de Julia Uceda. Por una
razón de peso que explicaré, quiero, además, traer de nuevo a la palestra
la aportación fundamental de Maria Zambrano, de cuya obra teatral La
tumba de Antígona nos hemos ocupado Andrés Pociña y yo en el ya aludido
homenaje a María Luisa Picklesimer. Las consecuencias de las guerras civi‑
les donde la ideología represora impide enterrar cadáveres, dejarlos sin sus
señas de identidad, someter sus escritos a la censura y obligar a algunos a un
exilio, que duró años, son los temas que se desarrollan en autores y autoras
de la posguerra.
En mi nuevo acercamiento a esta heroína admirable, ejemplo para todos
los tiempos, me servirán de breve introducción Virginia Woolf y Marguerite
Yourcenar, dos mujeres tan significativas para entender nuestro tiempo,
cuyas interpretaciones de Antígona, determinadas por un peculiar sesgo
femenino, están determinadas tanto por sus teorías como por la veneración
que ambas sintieron por la heroína griega.

3. Un paso por Virginia Woolf y Marguerite Yourcenar ante Antígona.

De todos y todas es conocido el interés de Virginia Woolf por la lengua


y la literatura griega, siendo Sófocles uno de sus autores preferidos, de modo
especial su tragedia Antígona. Sabemos que como guía en esta parcela de su
formación Virginia contó, de modo especial, con la guía de una profesora,
Janet Case, magnífica tanto en sus enseñanzas como preocupada por los
derechos de las mujeres, entre los cuales ocupaba un lugar esencial conse‑

225
Aurora López

guir el derecho al voto; Virginia no participó como activista en aquel mo‑


vimiento, pero contactó con su querida maestra para ayudar en labores de
voluntariado9. La pasión de esta gran mujer por la lengua griega y su cultura
ha sido objeto de un reciente libro de una profesora muy próxima a muchas
de las personas que asistimos a este Congreso, Lucía Romero Mariscal, titu‑
lado precisamente Virginia Woolf y el Helenismo, 1807-192510. En el mismo
año (2012) publicó también un artículo de intereses muy parecidos a los
que aquí nos ocupan, “Figuras del logos femenino en Virginia Woolf: Las
razones de Antígona”11; el pormenorizado estudio que allí puede encon‑
trarse acerca de las resonancias sofocleas en su obra Los años me exime de
referirme a tan interesante aspecto.
Un aspecto de Virginia que resulta verdaderamente interesante es su
preocupación por la difusión de la cultura, razón que la lleva a fundar la
editorial Hogatrh Press, conjuntamente con su marido Leonard, de la que
habla en su Diario y en la que actúa personalmente como tipógrafa y correc‑
tora de pruebas. Con relación a dicha ocupación le molesta relacionarse con
el personal universitario y así lo manifiesta poniendo muy claro su libertad
y su singularidad: “La sola idea de medrar a la sombra de esos petimetres de
universidad hace que se me hiele la sangre en las venas. Así es, soy la única
mujer de Inglaterra libre de escribir lo que me plazca”12.
Desde el punto de vista de su consideración sobre el papel de Antígona,
resulta especialmente interesante Tres Guineas, que, como sabemos, es una
reflexión contra los privilegios de los hombres, bajo los terribles augurios de
una guerra que provoca la angustia de nuestra escritora, quien propone una
sociedad con una integración de las mujeres que contribuirían a evitar esa
guerra, pero para las que exige que no se comporten como los hombres, sino
que reciban una educación y una profesionalidad adecuadas. Antígona y
Creonte son contemplados desde la perspectiva de un enfrentamiento entre
dos morales diferentes: la pública (Creonte) y la privada (Antígona). La jo‑
ven heroína es el modelo extraído de la literatura portavoz de una nueva ley.
Igualmente será libre de expresar que las escritoras deben de tener un
lenguaje diferente del masculino, sintiendo una especial veneración por la
escritora inglesa del siglo XVII Aphra Benn, destacando de ella que pudiese
ganar dinero con sus escritos, lo cual supondría el comienzo de la liberación

9
  Cf. Chikiar Bauer 2012: 421.
10
  Romero Mariscal 2012.
11
  Romero Mariscal 2012: 557-582.
12
  Cf. Lehmann 1995: 51.

226
Algunas Antígonas en España (s. XX)

de la mujer. Pone también de relieve la necesidad de muchas escritoras de


utilizar un nombre masculino para sus publicaciones, sin que puedan iden‑
tificarse como mujeres. En esa lucha por los derechos femeninos contempla,
en la distancia, la figura mítica de Antígona.
En cuanto a Marguerite Yourcenar, magnífica escritora de persona‑
lidad controvertida, nos interesa aquí especialmente su obra Feux, en la
que se ocupa, además de Antígona, de otras heroínas míticas como Fedra,
Clitemestra, Helena, así como de Safo y otros personajes griegos, a los que
añade María Magdalena.
El prólogo de la obra nos ofrece el dato interesante de que no se trata
de una obra muy de juventud, pues da el año 1935 como fecha de la pri‑
mera edición, lo que correspondería, según nos informa, a los 32 años de la
escritora; ediciones posteriores en 1957 y en 1974 no presentarán cambio
sustanciales. En dicho prólogo nos enteramos de que el libro ha sido escrito
después de una crisis pasional y que todas las narraciones que contiene ac‑
tualizan el pasado, haciendo la salvedad de “Antígona”, sobre la que precisa
que está “sacada del drama griego, pero acaso de entre todos los relatos
que se desgranan en Fuegos sea éste –pesadilla de guerra civil y de rebelión
contra una inicua autoridad- el más cargado de elementos contemporáneos
o casi premonitorios”13.
En Antígona o la elección, Yourcenar opina que: “esta sensibilización al
peligro político que pesaba sobre el mundo ha dejado en algunos poetas
y novelistas de la segunda preguerra, huellas innegables; es natural que
Fuegos lo mismo que otros libros de aquella época, contengan estas sombras
proyectadas” (pp. 17-18). El relato comienza con lo que puede ser un paisaje
en el que se entremezcla la muerte, un ardiente sol, y una caracterización
de Creonte, sin nombrarlo pero identificable: “el corazón del nuevo rey está
seco como la roca”. En una prosa poética muy trabajada se va introduciendo
por el destierro de Edipo acompañado por Antígona y por el regreso de ésta
a Tebas. Nos llama la atención su imagen de una Antígona descrita con “ca‑
bellos de loca, sus harapos de mendiga, sus uñas de ladrona muestran hasta
dónde puede llegar la caridad de una hermana. A pleno sol, ella era el agua
pura sobre las manos sucias, la sombra en el hueco del casco, el pañuelo en
la boca de los difuntos” (pp. 69-70). Frente a la heroína, “Creonte, acosta‑
do en el lecho de Edipo, descansa sobre la dura almohada de la razón de
Estado” (p. 71); pero finalmente resume nuestra autora que “El péndulo del
mundo es el corazón de Antígona” (p.72).

13
  Yourcenar 2009: 3. Todas las citas se refieren a esta versión española.

227
Aurora López

Antígona, Casandra y Electra son consideradas como “atípicas”, víctimas


de la historia familiar y caracterizadas por su heroísmo14. Electra y Antígona
tienen temperamentos viriles según la escritora francesa, que defiende con
pasión a Antígona, a la que, junto con las otras heroínas, considera libre, en
palabras de Mireille Bremond “chez tous les très grands personnages, nous
avons souvent l’impression que leur destin est voulu”15. Admira en Antígona
y Electra dos cualidades masculinas, consistentes en su coraje e inteligencia.
Me parece interesante resaltar que Marguerite Yourcenar le hizo una
entrevista a Virginia Woolf con motivo de haber publicado la traducción
al francés de su obra The Waves, en el año 1937. De los avatares de la en‑
trevista, que duró dos horas, nos informa Marie-Christine Paillard16 , en un
admirable trabajo sobre el encuentro de estas dos mujeres excelsas que me‑
rece la pena añadir anuestro conocimiento de ambas, nunca suficiente. La
opinión de Yourcenar sobre dicha entrevista es preciosa, y después de varios
años seguiría recordándola con nostalgia: “Moi [...] qui ne renoncerais pour
rien au monde au privilège d´avoir été reçue par Virginia Woolf”17.
En suma, dos grandes mujeres del siglo XX, cuyas espléndidas visiones
de la figura prototípica de Antígona debemos tener presentes para todo
acercamiento a cualquier interpretación de la misma en reescrituras de
nuestro tiempo.

4. José Martín Elizondo, Antigona entre muros.

Para iniciar mi aproximación a la peculiar Antígona de José Martín


Elizondo, utilizaré las palabras siempre autorizadas de una persona tan im‑
plicada en el desarrollo del teatro la España de nuestro tiempo como es José
Monleón, que desempeñaba el cargo de Director del Festival Internacional
del Teatro de Mérida en 1988, cuando se estrenó Antígona entre muros de
nuestro dramaturgo:

“Estamos, pues, ante una visión actual del mito de Antígona. Ante
un texto totalmente nuevo que, como el clásico, trata del inmarchi‑

14
  Cf. Bremond 2005: 221.
15
  Bremond 2005: 228.
16
  Paillard 2005: 109-123.
17
  Yourcenar 1995: 464 (noticia recogida por Paillard 2005: 111).

228
Algunas Antígonas en España (s. XX)

table tema de la libertad. Un tema absolutamente vigente, donde hay


tiranía, porque ésta se define como su negación; y, donde no la hay,
porque el conflicto entre la intimidad, los derechos de la persona, y
la intervención del Estado, constituye uno de los temas políticos de
la democracia”18.

Por las mismas fechas, esto es, cuando se publica la obra, que obtuvo el I
Premio Internacional Teatro Romano de Mérida, lo que conllevó su estreno
el 7 de julio de 1988, con un reparto excepcional formado por trece actrices
y un actor, la directora del espectáculo, María Ruiz, escribe:

“Al encarar su puesta en escena la primera cuestión es, como siempre,


llegar a comprender lo que el texto es y lo que contiene potencial‑
mente, lo que dice y sugiere, el sentido preciso de sus silencios que
es, probablemente, donde se dirime el acierto de las líneas de acción
dramática que van a ser el soporte de los comportamientos de los
personajes y de cuyo entrecruzamiento y choque han de resultar las
situaciones”19.

Y, en fin, tenemos la enorme fortuna de que el propio autor, antes de que


comencemos la lectura de su drama, nos confiese en palabras breves, pero
muy clarificadoras, las circunstancias personales y políticas de su gestación:

“He vivido largos años entre víctimas de la opresión y, por lo tanto,


este tema asoma con frecuencia en mis piezas teatrales. Nada ha
de extrañar, pues, que un día cediese a la tentación de abordar una
‘Antígona’. Mi vieja y joven heroína, al lado del abundante catálogo
de Antígonas..., ¿resulta española por estar escrita en esta lengua? ¿O
vive y muere en esta Grecia de los Coroneles donde se desarrolla la
fábula? ¿Se hermana más bien con la poética que con la ética? Me ha
quitado mucho sueño esta cavilación. Con todo, la heroína se ha ido
abriendo camino en su cárcel de mujeres cara a los perros de Creonte.
Dentro de esta cárcel trata de significar que los enfoques que se le
pueden dar a la naturaleza del poder son muchos e inagotables y que
en ello va suspendido el destino nuestro, sin olvidar que, consciente

18
  Monleón 1988: 8.
19
  Ruiz 1988: 9.

229
Aurora López

o inconscientemente, el poder, con bastante frecuencia, se las arregla


para robar el fuego del terror y amenazarnos con él”20.

Las palabras de Elizondo siguen teniendo eco y sentido en nuestra época


y los perros de los poderes políticos siguen manteniendo bajo su férula a los
pueblos, como a lo largo del siglo XX y todavía en duras décadas no lejanas,
que hemos sufrido tantas personas todavía vivas. La opresión tiene necesi‑
dad de una “Antígona” encerrada “entre muros” de libertad.
Elizondo escribe en su exilio en la ciudad francesa de Toulouse, en 1969,
esta obra con el título inicial Antígona y los perros. En 1980 la revisa y, con
alusión a la fecha, le da el nombre de Antígona 80; por último, con motivo de
estrenarse en el Teatro Romano de Mérida, regresado ya a España el autor, la
titulará definitivamente y editará como Antígona entre muros, en 1988.
Un espacio escénico: cárcel de mujeres en la Grecia contemporánea, go‑
bernada por el régimen dictatorial de los Coroneles. Los personajes son re‑
clusas que interpretan a los diversos caracteres de la tragedia cuyos nombres
son sofocleos: Antígona, Nodriza, Hemón, Tiresias, La Menoecea, Creón.
Además de ellas, grupo de reclusas cuyos papeles son: Detenida A (La
Delatora), Detenida B, Detenida C, Detenida D (La Nueva). La Delatora
y La Nueva tienen un papel determinado. Además: La guardiana, Jefe de
Prisiones, Dos guardianes, Dos perros lobos. No está marcado en el cuadro
de las Dramatis personae el coro, aunque cuando actúa como tal se sobren‑
tiende que pueda hablar como conjunto. La obra se divide en tres actos.
El espacio escénico escogido rodea a los personajes y por sí mismo implica
la falta de libertad física, a la que se une un trato despectivo y a veces muy
duro. Las mujeres que lo habitan son capaces de encontrar alivio y escapatoria
a la monotonía de sus días con la interpretación de la tragedia Antígona de
Sófocles. Existe en la cárcel una Detenida A, La Delatora, que va a estar pen‑
diente de lo que ocurra. El ambiente reflejado es de desconfianza por parte de
la Nodriza con relación a esa Detenida A, a quien ataca, con la consiguiente
inquietud por parte de ella, porque, como se descubre al final, es una espía.
Un personaje de los que interpretan la tragedia, pero que en realidad no
existe en la obra de Sófocles, es la Menoecea 21, personaje muy interesante,
que resulta ser la madre de Creón, personificación éste del poder, cuyo es‑

20
  Martín Elizondo 1988: 13.
21
  Aunque el personaje es creación de Martín Elizondo, su nombre no es ajeno a la
tradición clásica del tema de Antígona, ya que Meneceo, nieto de Penteo, era el padre de
Yocasta y de Creonte.

230
Algunas Antígonas en España (s. XX)

birro es el gobernante. Su función consiste en avasallar al que le obedece,


y su poder viene a ser la personificación de la dictadura. A medida que va
acercándose el final de la obra Creón se va mostrando menos seguro.
Personaje trágico de gran fuerza y predicamento es la Nodriza, presente
en tantas tragedias clásicas al lado y en apoyo de la protagonista, pero que
en la Antígona de Sófocles no podía figurar por razones obvias. A pesar
de ello, Martín Elizondo le da un fuerte protagonismo en la tragedia que
interpretan las presas, creándola de acuerdo con las pautas de las nodrizas
trágicas: siempre protege a la protagonista, dándole consejos, temiendo por
ella, ayudándola, a veces siendo la conciencia de su ama con amplísimas
intervenciones. Es el primer personaje que aparece en Antígona entre muros,
en cuyo estreno emeritense era interpretada por una actriz de la indudable
categoría y dominio de la escena como es Julieta Serrano.
El contraste entre la fantasía de una representación teatral y la realidad
de la cárcel permite observar las reacciones de los personajes que deambu‑
lan entre ambos espacios, haciendo que nos percatemos de tales reacciones
dentro de cada espacio con minuciosidad. Por ejemplo, si nos fijamos en
la presa que encarna a Tiresias, vemos como aparece nombrada por su pa‑
pel dentro del espacio escénico que corresponde a la cárcel, volviendo a su
patria y encarnando el papel de la tragedia, como adivino. Así se muestra
el cambio, por ejemplo después de la llegada de la Detenida D, La Nueva:
Tiresias se coloca una falsa barba hecha de crin de una colchoneta y una
manta por los hombros y le enseña a La Nueva su propia caracterización,
que sintetizo: pasos lentos, de un estuche de rimel con los párpados cerrados
se aplica una mancha negra que significa las cuencas vacías del personaje
mítico, y sus palabras: “Tiresias, el adivino, es ciego, pero ve, ¡claro que ve!
Ya se ha dicho que hay ciegos que ven muy bien cómo va el mundo” (p. 29).
De igual manera la estrategia del cambio de lo real de la cárcel a la ficción
teatral se continúa y la acotación lo marca muy bien:

Antígona se llega a ella y luego inclina una rodilla ceremoniosamente.


La Nodriza le pone un chal negro sobre los hombros y le invita a que se
levante. Las demás toman una serie de actitudes que dan a entender que,
si reconstituyen la vieja tragedia, no es por hacer teatro o por celebrar
algún rito, sino para utilizar el viejo simulacro como estimulante que les
ayude a mantener la moral (p. 29).

El coro, según he advertido ya, no figura en la lista de las dramatis per-


sonae, pero sí tiene intervenciones marcadas introducidas por la indicación

231
Aurora López

“Coro”, que en realidad consisten en las opiniones conjuntamente expresa‑


das por algunas presas22 .
El personaje de La Nueva se manifiesta en un primer momento muy
molesta ante el resto de presas. Es una mujer que ha estado en la lucha
contra la dictadura de los Coroneles. En el tercer acto recita el desenlace de
la tragedia Antígona, en el que Hemón se suicida junto a Antígona. Su par‑
lamento resulta verdaderamente conmovedor, y finaliza con estas estreme‑
cedoras palabras: Estaba Antígona bañada en sangre del tajo que le manaba
a Hemón y éste moría abrazado a ella (p. 53). A continuación una luz nos
descubre a Antígona en la cueva, pronunciando unas palabras que, en mi
opinión al menos, resultan tal vez ser lo más logrado de esta recreación de
Martín Elizondo:

Sola, en tibia cueva, se me acerca la


que muerde hasta las piedras.
Señores dioses, señoras diosas, me toca
ya la señora muerte.
¡Qué lejos los juegos de resplandores
y palomas que provocaban mi fantasía
en los huertos del amor!...
Ya no es tiempo de aquello, ni de encenderme
los labios con la sangre.

Las palabras de Antígona continúan, pero me limitaré a entresacar de su


interior tan sólo siete versos que compendian muy bien toda la magnitud
y el significado del personaje recreado por Martín Elizondo en un contexto
que remonta al pasado de la heroína griega, pero que no se cierra en ella,
sino que sigue abierto a otros tiempos y otras latitudes:

¡Fenece ya!, renazcas o no en otras


Antígonas salidas del polvo
-y de tu apagada ceniza- quienes perdidas
en el ovillo de los dioses serán a su vez
trama y tragedia para que siga rodando
la Historia bajo este sol de Grecia
u otros soles. (p. 54)

22
  Coro aparece en: p. 33, 34, 35, 36, 37, del acto I; p. 42, 43, 44, 45, 46 del acto II;
p. 49 acto III.

232
Algunas Antígonas en España (s. XX)

5. Maria Zambrano, La tumba de Antígona.

Sobre La tumba de Antígona de esa gran filósofa española que fue doña
María Zambrano (1904-1991) existe ya por fortuna una amplísima biblio‑
grafía, y yo misma me he ocupado de ella, en colaboración con Andrés
Pociña, en un artículo bastante cercano en el tiempo23; por ello, debo adver‑
tir que mi intención en las consideraciones que siguen no es tratar de nuevo
esta interesantísima reescritura, sino reflejar una serie de aspectos que re‑
legan a la categoría de superadas muchas partes de los trabajos hasta ahora
publicados, incluso en fechas recientes, señalando diversas perspectivas que
deberán ser tomadas en consideración en estudios nuevos, absolutamente
necesarios.
1. La tumba de Antígona de Zambrano, junto con su prácticamente con‑
temporánea La sangre de Antígona de José Bergamín, son reescrituras de
profunda enjundia filosófica, producidas en años muy próximos a la mitad
del siglo XX, lo que hace absolutamente incomprensible la ausencia total
de ambas obras en Antígonas de George Steiner, un libro de 1984, muchas
de cuyas páginas alcanzarían nueva clarividencia con la consideración de
estas dos versiones españolas. En los más recientes estudios sobre el drama
de Zambrano se pone de manifiesto, con sorpresa, esta laguna, difícilmente
admisible, en el libro de Steiner24.
2. Pese a existir una muy abundate bibliografía sobre La tumba de
Antígona, producida esencialmente en los últimos treinta años25, y de mane‑
ra paralela a la proliferación de estudios sobre la filósofa malagueña, resulta
en su práctica totalidad anterior a la edición del drama publicada en 2012
por Virginia Trueba Mira, que como diré en seguida presenta un nuevo
panorama de la obra, que exige sin duda nuevas aproximaciones, al ofrecer
datos fundamentales no tenidos tradicionalmente en cuenta. Queda paten‑
te, pues, que la nutrida bibliografía que aquí ofrecemos, en buena medida
debe ser sometida a revisión, a fin de tener una percepción más acertada de
la Antígona zambraniana.

23
  López, Pociña 2010.
24
  Cf. por ejemplo Iglesias 2005: 26; Trueba Mira (ed. de La tumba de Antígona)
2012: 13; etc.
25
  Castillo 1983; Johnson 1997; Morey 1997; Picklesimer 1998; Nieva de la Paz
1999; Prieto Pérez 1999; Llinares 2001; Quance 2005; Pino Campos 2005; Berenguer
2007; Pino Campos 2007; Bañuls, Crespo 2008; Santiago Bolaños 2010; S. Moretón 2011;
Lázaro Paniagua 2012; etc.

233
Aurora López

3. La preocupación por Antígona en la obra de María Zambrano es


muy anterior al año 1967, fecha que suele darse como inaugural de la obra,
debido al hecho de que en ese año apareció en México la primera edici‑
ón de La tumba de Antígona26 . De hecho, la nueva edición de 2012, a la
que estamos haciendo referencia, lleva como título La tumba de Antígona y
otros textos sobre el personaje trágico27, porque presenta, además de diversos
documentos manuscritos que tienen estrecha relación con la obra teatral,
sobre todo tres escritos sobre el tema Antígona: “Delirio de Antígona” (pp.
239-251), publicado en 1948 en Orígenes. Revista de Arte y Literatura (La
Habana), en 1948, dedicado “A mi hermana Araceli”; “El personaje au‑
tor: Antígona” (pp. 253-262), en realidad un capítulo del libro El sueño
creador, publicado en México en 196528; “Antígona o de la guerra civil”
(pp. 263-265), texto correspondiente a un cuaderno fechado en Roma en
1958; “Cuaderno de Antígona (M-404)” (pp. 267-278), manuscrito fecha‑
do en 1948; “Cuadernos de Antígona (M-264)” (pp. 279-285), fechado en
Roma en 1962, pero tal vez escritos en 194829. Como es lógico, todos es‑
tos escritos, publicados o manuscritos, ahora cómodamente reunidos por
Virginia Trueba Mira, anteriores en su totalidad a la publicación de La
tumba de Antígona, demuestran el profundo y prolongado interés de María
Zambrano por nuestra figura mítica, y deben ser tenidos muy en cuenta
para nuevos estudios del drama en el que van a confluir muchas de las ide‑
as y consideraciones en ellos expresadas. Con razón Trueba Mira, a quien
ahora debemos tanto quienes nos acercamos a esta obra de la filósofa ma‑
lagueña, ha escrito:

“Los textos de Zambrano sobre Antígona reafirman el protagonismo


de la heroína trágica en el siglo XX, un momento de la historia de
siniestra violencia y terror programado al que no fue ajena España,
como demuestra la propia vida/obra de María Zambrano, desarrollada
desde ese lugar llamado “exilio”, que devino tanto una “tumba” como

26
  Zambrano, La tumba de Antígona, México, Siglo XXI, 1967. En el mismo año
aparece en Madrid ”La tumba de Antígona”, Revista de Occidente 54 (1967) 273-293, pero
se trata en realidad del Prólogo del drama exclusivamente.
27
  Zambrano 2012.
28
  Cf. Trueba Mira, en Zambrano, La tumba de Antígona... 2012: 124.
29
  Cf. de nuevo el estudio detallado de Trueba Mira, en Zambrano, La tumba de
Antígona..., 2012: 124.

234
Algunas Antígonas en España (s. XX)

una “cuna” en la especial dimensión política y metafísica de su lectura


del personaje, nunca ajena a la ética de su pensamiento”30

Fue tan significativa la presencia de la mítica Antígona en la especula‑


ción filosófica de Zambrano, desde los años en que finaliza la guerra civil
española, que la Fundación María Zambrano, creada en Vélez-Málaga en
1987, al iniciar en el año 2007 la publicación de una Revista como medio
de difusión de sus actividades, le impone por nombre “Antígona”.
4. Uno de los aspectos más llamativos de La tumba de Antígona reside
sin duda en su particular estructura literaria, que la convierte en una de las
más originales reescrituras del tema. La obra se desarrolla en doce escenas,
de corta extensión, en las que Antígona monologa o dialoga con personajes
o con sus representaciones que entran en la cueva en la que está encerrada;
cada escena lleva un título indicador del nombre del personaje que entra en
la cueva, en su mayoría muertos fantasmagóricos que pertenecen al entorno
de la heroína, un fruto de su propio delirio. Se señala con frecuencia que
el texto no presenta acotaciones en su edición príncipe, existiendo tan solo
una, en la escena tercera, titulada “Sueño de la hermana”, quien no aparece
en escena por pertenecer al mundo de los vivos; dicha acotación indica so‑
lamente “señalando a un lugar” (p. 182)31. Las explicaciones que han venido
dándose a esa rareza en un texto dramático moderno son de índole muy
varia, que no podemos reflejar aquí. Sin embargo, la edición de 2012 con‑
tribuye de manera fundamental a una nueva comprensión de este extraña
estructura dramática de La tumba de Antígona debido a que su cuidadora,
Victoria Trueba Mira ha incorporado en notas, sin interferir para nada en
el texto zambraniano transmitido, las múltiples acotaciones escénicas que
se encuentran; merece la pena recordar sus palabras en el apartado “Esta
edición”:

“Para La tumba de Antígona he tomado como referencia la edición


original de 1967 aparecida en la editorial Siglo XXI. He corregido,
exclusivamente, errores ortotipográficos, manteniendo el texto íntegro
de Zambrano. Acompañan al texto, siempre en nota a pie de página,
las diversas acotaciones o notas de trabajo que Zambrano dejó escritas
en los diversos borradores conservados, que contienen parcialmente
esta obra” (p. 123).

30
  Trueba Mira, en Zambrano, La tumba de Antígona... 2012: 119-120.
31
  Hago las citas según la edición de 2012, de Trueba Mira.

235
Aurora López

Esta manera tan adecuada de proceder ha puesto en nuestras manos una


edición que respeta el texto emanado de la autora y siempre utilizado hasta
el presente en los estudios de esta obra, pero añadiéndole las acotaciones que
también proceden de María Zambrano, lo cual no solo indica que la autora
tuvo siempre una concepción teatral de la obra, sino que además nos ofrece un
material muy útil para entender esa concepción. En esa novedad de la edición
de 2012 reside sin duda la razón fundamental que nos hacía afirmar más arriba
que es preciso revisar los estudios sobre este drama de María Zambrano, ahora
intelegible desde una perspectiva mucho más clara en su aspecto performativo.
5. Además de las acotaciones recogidas e integradas, siempre en nota, en los
lugares correspondientes, el abundante material relativo a Antígona que se reu‑
ne y se estudia en la edición de 2012 ha permitido a Victoria Trueba Mira dedi‑
car una excelente apartado a “El carácter dramático del texto” (pp. 98-113), en
el que, después de ofrecer datos fehacientes sobre puestas en escena de la obra,
más numerosas de lo que se afirmaba con frecuencia32, analiza los diversos
aspectos sobre los que Zambrano ofrece su propia visión como dramaturga33.
Interesan a la filósofa aspectos especialmente problemáticos para la escenifica‑
ción, por ejemplo la “presencia” de personajes espectrales, no reales; cuestiones
de vestuario, de iluminación, etc. Como ejemplo de lo mucho que ha cambia‑
do nuestro conocimiento de La tumba de Antígona desde la “desnuda” edición
de 1967 hasta la actual de 2012, ahora, gracias al texto del M-343, conocemos
con detalle la concepción del espacio escénico por parte de la dramaturga:

“Cámara sepulcral. Una habitación alargada paralelamente al espec‑


tador. Un poco regular. Las esquinas nunca serán visibles enteramente
[así q. será como una elipse a la vista]. Del lado Oeste izquierda de
la escena, estará la puerta cerrada, de piedra también; los muros de
piedra rugosa, sin desbastar, un hueco excavado en la roca, con dos

32
  Cf. Trueba Mira, en Zambrano, La tumba de Antígona...2012: 100-102; quiero recordar
aquí tan solo que ya hay alguna representación de la obra, total o parcial, antes de la famosa de
1992 en el Teatro de Mérida, de la que nos dice: “Una de las más destacadas versiones es, sin
embargo, la del mismo Alfredo Castellón 1992, quien lleva a cabo la adaptación por encargo
de la propia Zambrano (citado en Nieva de la Paz 1999: 296). Según Máximo Durán, parece
que Zambrano llegó a ver el vídeo del montaje, de unos quince minutos, pero nada más, ya que
fallece en febrero de 1991. La versión se representó finalmente del 13 al 16 de agosto de 1991
en el Teatro Romano de Mérida”. Señala a continuación el gran éxito de la representación, en
parte debido a la interpretación del papel de la protagonista por la actriz Victoria Vera.
33
  Además de las páginas de la Introducción a esta ed. de 2012, resultan muy
interesantes las apreciaciones de la misma estudiosa en Trueba Mira 2010: 103-116.

236
Algunas Antígonas en España (s. XX)

paredes nada más, pero rústicas, de piedra y un techo de grandes pie‑


dras por cuyas junturas entrará aire, insectos, gotas de lluvia, estará
menos expresamente separado del cielo que del contorno. El suelo será
pedregoso, no de piedra enteramente, habrá huecos con tierra y alguna
débil yerba crecerá en ellos” (pp. 104-105).

Y, solo por recordar otro pasaje admirable, del mismo texto, veamos la
precisión de auténtica dramaturga con la que María Zambrano imagina y
planifica la luz en la puesta en escena de su obra:

“La atmósfera de la tumba tendrá una tonalidad grisácea verdosa, de acu‑


ario, a veces terrosa, atrás, en los momentos que se señalen. Blanquecina
en otros momentos. Al final, la claridad se irá intensificando como der‑
ramada desde arriba y desde el lado Este hasta hacerse luz blanca, pero
sin brillo ni resplandor. Terminará en blanco, en luz blanca, tendiendo
a ser compacta. La luz se irá espesando mientras muere” (p. 106).

6. La nueva y mucho más adecuada y rigurosa lectura que ahora puede


hacerse de La tumba de Antígona pone ante nuestros ojos una reescritu‑
ra mucho más profunda de lo que tradicionalmente se había considera‑
do, y se abre a nuevos análisis, facilitados por los múltiples estudios sobre
Zambrano que han surgido en los últimos años, de tal manera que no nos
parece exagerado decir que se trata de una de las más profundas reescrituras
de Antígona en cualquier lengua, en la segunda mitad del s. XX. En este
sentido, sin que queramos de momento anticipar algo que se encuentra en
mero proyecto, A. Pociña y yo estamos trabajando sobre una nueva visión
de esta obra desde la perspectiva de la filosofía de Zambrano, pero sobre
todo a partir no solo de su pensamiento, sino además de su biografía perso‑
nal y de la de su hermana Araceli Zambrano.

5. Julia Uceda, “Antígona”.

El poema “Antígona” de Julia Uceda (Sevilla, 1925) aparece, por fortuna


que no deja de causar sorpresa, muy bien tratado en algo más de una página del
libro de Bañuls y Crespo34, y subrayo ese por fortuna ante el olvido generalizado

34
  Bañuls Oller, Crespo Alcalá 2008: 402-403.

237
Aurora López

de la obra de la poeta Julia Uceda, de la que afirmaba con todo acierto el estu‑
dioso y crítico Enrique Molina Campos que “es una de las más importantes, y
acaso la más personal, entre las que tuvieron principio en la década de los 50,
e incluso –añadiría yo- entre las escritas en castellano por mujeres durante lo
que va de siglo”35. En el año 2003, la publicación de una magnífica antología
de toda su obra, titulada En el viento, hacia el mar (1959-2002)36, motivó que
se le concediese el Premio Nacional de Poesía, que como señalaron los medios
a bombo y platillo, se otorgaba por primera vez a una mujer. Parecía, pues,
que tal vez empezaría a hacerse justicia a la gran poeta, siempre relegada a
la indiferencia y al olvido, que entonces estaba cerca de los ochenta años de
edad. Pero no ocurrió así: Julia Uceda sigue siendo injustamente olvidada por
la investigación, la crítica y el público, tal como lamentaba y denunciaba hacia
el año 2000 por ejemplo Andrés Pociña37, sin que la situación parezca haber
mejorado mucho, a pesar de la publicación de nuevas obras realmente valiosas.
Precisamente en una de ellas, editada el año pasado, Escritos en la corteza
de los árboles38, casi nonagenaria, la poeta sevillana tiene el valor y el indudable
mérito de explicarnos el sentido de su vida y de su obra en un largo prólogo,
titulado “¿Somos quienes quisimos ser?”, del que reproduzco un corto párrafo
que me parece fundamental: “Siempre he creido que el poeta debe dar testi‑
monio de sí mismo, del lugar desde el que habla y de aquello que lo define”. Y
con esta confesión, nos vamos a la lectura de su poema “Antígona”.
El poema se publica en el volumen Sin mucha esperanza39, en 1966; el
año anterior, la poeta había emigrado a los Estados Unidos, como profesora
de Literatura Española en la Michigan State University, en East Lansing.
Pero cuando emigra, el poemario ya está escrito; sus poemas, profunda‑
mente autobiográficos, muestran desde la muy griega pieza “Ananke”, la ne‑
cesidad, el destino, a la sobrecogedora “Una patria se ve desde la cumbre”, la
postura absolutamente inconformista de Uceda ante el rigor de la dictadura
franquista, de la que se ha hecho profundamente consciente con motivo de
su viaje a París en 1959: Entonces supe / que no era libre; / que nunca nadie
/ había sido libre, para acabar diciendo: París, mil novecientos / cincuenta y
nueve. Era / mirar desde una cumbre / una imposible patria40 . Poco después,

35
  Cf. Pociña 2007: 302.
36
  Uceda 2002.
37
  Cf. Pociña 2007: 301-306.
38
  Uceda 2013.
39
  Uceda 1966.
40
  Cito por Uceda 1991.

238
Algunas Antígonas en España (s. XX)

según he dicho ya, se marcha a los Estados Unidos, y después de allí a


Irlanda, para no regresar a España hasta 1976. Y en ese lugar inaceptable del
que tiene que irse, porque, igual que el Coro de “Ananke”, Deseamos gritar,
/ Deseamos correr a los umbrales / y detener el tiempo, coloca a su “Antígona”,
siempre rebelde, siempre en desacuerdo:

Yo sé
que un día
voy a salir por estas calles,
como un trozo de llama,
quemando el aire con mi grito;
incendiando los lechos
y las fuentes.
No me compréis con lágrimas.
No tendáis vuestra mano
hacia este falso mármol
de las mías.
No me digáis,
no me digáis
ya más...

Lo sé ya todo.
Cerrad las puertas,
liberad a los perros
y a los pájaros, regad
las flores: será
la última vez...
Y no dejéis
que los grifos abiertos
inunden las estancias:
que el pétalo amarillo
de las horas encienda
de frío sol los ámbitos vacíos.
Después, dejadme
dormir. (pp. 127-128)

239
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona entre muros, contra os muros
de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral
de José Martín Elizondo
(Antigone inside the walls, against the walls of silence: Myth and history in the
metatheatrical recreation of José Martín Elizondo)

Myth and history in the metatheatrical recreation of José Martín Elizondo)

Carlos Morais (cmorais@ua.pt)


Universidade de Aveiro

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_12

241
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

Resumo – Escrita em 1969, em Toulouse, durante o exílio do seu autor, José


Martín Elizondo, Antígona entre muros viria a ser publicada apenas em 1988, ano
em que a peça teve a sua estreia, no Festival de Teatro Clássico de Mérida e em
que recebeu o I Prémio Internacional «Teatro Romano de Mérida». Num diálogo
permanente entre os acontecimentos de um dia numa cela da Grécia dos coronéis,
partilhada por dez presas políticas, e a representação descontínua e fragmentada
da Antígona de Sófocles, este exercício de escrita metateatral, aproveitando toda
a retórica de protesto do arquétipo grego, é um grito de revolta contra os muros
de silêncio impostos pelos regimes ditatoriais, sejam eles o grego ou o espanhol, e
simboliza a resistência coletiva dos que, na cela, na clandestinidade ou no exílio,
lutam pela liberdade, contra a política autoritária e repressiva do regime franquista.
Palavras-chave: Antígona, Sófocles, Elizondo, metateatro, exílio, franquismo,
ditadura dos coronéis.

Abstract – Written in 1969, at Toulouse, during the exile of its author, José Martín
Elizondo, Antigone inside the walls (Antígona entre muros) was only edited in 1988,
when it was performed for the first time, in the Festival of Classical Theatre of
Merida, winning the I International Prime “Roman Theatre of Merida”. In a per‑
manent dialogue between the events during a day in prison, in Greece during the
military government, with other ten political prisoners, and the discontinuous and
fragmented representation of Sophocles’ Antigone, this exercise of metatheatrical
style profits from all the rhetoric of protest of the Greek model. At the same time it
is a cry of revolt against the walls of silence imposed by dictatorial regimes, would
they be the Greek or the Spanish ones, and symbolizes the collective resistance of
those who, in prison, in clandestinity or in exile, fight for freedom, against the
authoritative and repressive policy of Franco’ s regime.
Keywords: Antigone, Elizondo, Sophocles, metatheater, exile, Franco’s regime,
dictatorship of the coronels.

1. O mito de Antígona em Espanha: da guerra civil à ditadura franquista

A Antígona de Sófocles, pelo fascínio que tem exercido desde que foi
produzida em Atenas, c. 441 a. C., é para muitos a obra de arte mais pró‑
xima da perfeição1. Dotada de “ductilidade semântica”2, mercê dos vários

1
  Sustentando esta opinião, Steiner 1995: 11 afirma que “a Antígona de Sófocles não
é um ‘texto qualquer’. É um dos actos duradouros e canónicos no interior da história da
nossa consciência filosófica, literária e política”.
2
  Ducroux & Urdician 2010: 13.

243
Carlos Morais

mitemas que a integram e que lhe concedem uma eterna atualidade e


uma grande dinâmica recriadora, esta tragédia foi muitas vezes revisitada
ao longo do século XX europeu, em momentos de crise, particularmente
em Espanha, cuja história ficou marcada por uma sangrenta guerra civil
(1936-1939) e por uma cruel ditadura de quatro décadas que se lhe seguiu
(1939-1977)3.
Servindo-se da ‘máscara de Antígona’ para veicularem, de forma velada,
questões sociais e políticas que, de outra forma, por causa do controlo aper‑
tado da censura, não poderiam ser abordadas, doze dramaturgos espanhóis
(alguns, a partir do exílio) produziram, ao longo deste período, várias re‑
leituras deste mito grego4. Numa primeira fase, exploraram, do arquitexto
sofocliano, sobretudo os mitemas da fraternidade e do amor com o objetivo
de afirmarem o seu desejo de reconciliação, de perdão e de paz, depois da
guerra fratricida que flagelou a Espanha em finais da década de trinta; e,
numa segunda fase, centraram-se mais no mitema do protesto contra a de‑
cisão injusta e autoritária de Creonte, para sub-repticiamente expressarem
a sua contestação à repressiva ditadura franquista, que calava as vozes dos
muitos que se lhe opunham.5
Entre os dramaturgos deste segundo grupo está José Martín Elizondo.
Nascido em Getxo (Vizcaya), a 26 de fevereiro de 1922, bem cedo foi
para San Sebastián, terra de seus avós, que ficaram responsáveis pela sua
educação, logo após a morte da sua mãe, quando tinha apenas um ano.
A sua juventude, repartida por Navarra e Valência, cidade onde estudou
Filosofia, ficou profundamente marcada pela guerra civil que obrigou o

3
  Incluímos neste intervalo, o período de transição para a democracia, que se proces‑
sou entre a morte de Franco (20 de novembro de 1975) e a realização das primeiras eleições
democráticas (15 de junho de 1977).
4
  Salvador Espriu, Antígona (1.ª: [1939] 1955; 2.ª: [1963-1964; 1967] 1969; sobre
esta peça, vide Morais 2012: 325-328; José María Pemán, Antígona (1945); José Berga‑
mín, La sangre de Antígona ([1955] 1983); Joan Povill i Adserà, La tragèdia d’ Antígona
(1961); Manuel Bayo, Ahora en Tebas (1963); Josep Muñoz i Pujol, Antígona (1965);
María Zambrano, La tumba de Antígona (1967); Carlos de la Rica, La razón de Antígona
([1968] 1980; sobre esta recriação, vide Morais (2014) 97-108); José Martín Elizondo,
Antígona y los perros (1969; esta peça veio a ter outros dois títulos: em 1980, Antígona 80;
em 1988: Antígona entre muros); Alfonso Jiménez Romero, Oración de Antígona (1969);
Xosé María Rodríguez, Créon... Créon (1975); e Manuel Lourenzo, Traxicomedia do
vento de Tebas namorado dunha forca (1977). Para todas estas peças, vide Bañuls Oller
& Crespo Alcalá 2008.
5
  Sobre esta questão, vide Fraisse 1973: 18, que estabelece seis mitemas para a Antígo-
na e dois para o Édipo em Colono; e ainda Morais 2001: 7-8.

244
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

seu pai ao exílio no México. Por razões políticas, o exílio acabaria por ser
igualmente o seu destino. Em 1947, contava então 25 anos, atravessa clan‑
destinamente a fronteira e instala-se em França, onde já se havia refugiado
em 1937, durante a cruenta guerra civil. Nos primeiros anos de exílio,
vive em campos de refugiados, na zona de Bordéus, e, para sobreviver,
trabalha como estivador, na construção civil e nas minas, até conseguir
um lugar de professor em Lille e, depois, em Toulouse, onde se fixa, após
dez anos de errância por terras gaulesas, e onde viverá até à sua morte, a
17 de fevereiro de 2009.
Nesta cidade do sul de França, transformada em capital do exílio re‑
publicano espanhol, cria, em 1959, a Associação de Amigos do Teatro
Espanhol (atualmente, “Théâtre sans Frontières”)6, que foi responsável
pela encenação de muitas peças de autores censurados ou proibidos em
Espanha7. Em paralelo, iniciou a sua intensa atividade de dramaturgo,
escrevendo cerca de 50 peças, 17 das quais seriam encenadas8. Desta sua
vasta produção, merece destaque Antígona entre muros, que recebeu, em
1988, o I Prémio Internacional “Teatro Romano de Mérida” e, em 1989,
o “Prémio El Público”.9 Tendo por tema a história do seu tempo, esta
obra traduz a sua oposição à ditadura e a todas as formas de opressão
e reflete o seu sofrimento de exilado, que nunca deixou de amar o país
que o viu nascer, aspeto particular que a aproxima das obras La sangre
de Antígona (1955), de José Bergamín, e La tumba de Antígona (1967), de
María Zambrano10.

6
  A propósito do importante papel de Elizondo na criação do grupo de “Amigos del
Teatro Español”, vide Aznar Soler 2009: 150-155.
7
  Para Pujol 1999: 331-333, o anti-franquismo, independentemente da filiação parti‑
dária de cada um, é o denominador comum que congrega todos os elementos deste grupo,
que encontraram no teatro a forma de afirmarem um vínculo afetivo e espiritual com a
terra-mãe.
8
  Para mais informações sobre a vida e obra de José Martín Elizondo, vide Pujol
2009: 156-166.
9
  “Memoria de los Pozos” foi outra obra galardoada, tendo recebido, em 1979, o Pré‑
mio Santiago Rusiñol para melhor texto.
10
  Como refere Ragué-Arias 2011: 362 e n.2, citando uma pasagem da obra Cómicos
sin tierra, Antígona, pelo seu caráter subversivo, é uma figura mítica importante na obra
teatral de Elizondo.

245
Carlos Morais

2. Antígona entre muros: pela liberdade e pela democracia

Escrita em 1969, durante o exílio em Toulouse, com o título original


Antígona y los perros, esta peça foi mudando de nome à medida que o autor
a foi revisitando. Em 1980, passou a designar-se Antígona 80 e, em 1988,
Antígona entre muros, título adotado para a primeira publicação11 e para a
estreia da peça, a 7 de julho desse ano, no 34.º Festival Internacional de
Teatro Clássico de Mérida12, o mesmo certame que recebeu, três dias antes,
a 4 de julho, o Rei Édipo, produzido pela Comuna, com encenação de João
Mota e a participação especial de Hélia Correia, que disse alguns excertos
em grego clássico. Nesta representação, com texto adaptado de uma tradu‑
ção de Agostinho da Silva, participou igualmente Rita Salema, no papel
de filha de Édipo13, atriz a quem Hélia dedicou, anos mais tarde, Perdição.
Exercício sobre Antígona, uma das várias recriações portuguesas do mito
de Antígona, a par das de António Sérgio, Júlio Dantas, António Pedro,
João de Castro Osório, Mário Sacramento, Eduarda Dionísio e Armando
Nascimento Rosa, peças incluídas na exposição que esteve patente na
Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, entre os dias 25 de setembro
e 31 de outubro de 201414.
Estruturada em três atos, a trama da recriação de Elizondo decorre na Grécia,
durante a ditadura dos coronéis (1967-1974), que coincide com os derradeiros
anos da ditadura franquista. Não obstante esta localização no país que pela
primeira vez assistiu à representação da Antígona de Sófocles, é inquestionável

11
  Elizondo, José Martín (1988), Antígona entre muros. Madrid: SGAE. Todas as
citações do texto serão feitas a partir desta publicação.
12
  Com direção de María Ruiz, este era o elenco que subiu à cena do Teatro de Mé‑
rida, em 1988: Kiti Manver (Antígona), Mar Díez (Creón), Julieta Serrano (La Nodriza),
Asunción Sánchez (Hemón), Begoña Valle (Tiresias), Mayrata O’Wisiedo (La Menoecea),
Amparo Valle (Detenida A – La Delatora), Paloma Paso Jardiel (Detenida B), Marina
Molano (Detenida C), Ana Gracia (Detenida D – La Nueva), Eva González (Detenida E),
Yolanda Porras (Detenida F), Zulema Katz (La Guardiana), Ángel Mora (Jefe de Prisiones).
13
  Sobre esta encenação, vide Fialho 1998: 73-74.
14
  Inaugurada no primeiro dia do Congresso Internacional “Antígona – a eterna sedução
da filha de Édipo”, esta exposição bibliográfica e documental, intitulada “Recriações de An‑
tígona”, integrou mais de meia centena de obras inspiradas no arquétipo sofocliano, oriundas de
Portugal (14), Espanha (22), França (11), Itália (3), Alemanha (7), Irlanda (2), Dinamarca (1),
Argentina (5), Brasil (1), Colômbia (2), Porto Rico (1) e México (1), bem como edições antigas
do original (5), estudos do mito (14), traduções do original para português (11) e ainda desenhos
e fotografias das três encenações da Antígona de António Pedro, pelo Teatro Experimental do
Porto (TEP). Sobre estas três encenações, vide Morais 1998: 59-62; e Morais 2004: 41-43.

246
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

que o autor pretendia, por paralelismo, evocar a situação política de repressão


em Espanha e sublinhar, de forma velada, a sua posição face a questões sensíveis
como a guerra fratricida, a censura, a pena de morte e o encarceramento, desa‑
parecimento e exílio dos opositores ao regime15. Isso mesmo é por ele destacado,
num texto de abertura, intitulado “sobre mí Antígona”, que apresenta, em tra‑
ços largos, o motivo da escrita da sua peça (13):

He vivido largos años entre víctimas de la opresión y, por lo tanto,


este tema asoma con frecuencia en mis piezas teatrales. Nada ha
de extrañar, pues, que un día cediese a la tentación de abordar una
«Antígona». Mi vieja e joven heroína, al lado del abundante catálogo
de las Antígonas…, ¿resulta española por estar escrita en esta lengua?
¿O vive y muere en la Grecia de los Coroneles donde se desarrolla la
fábula? ¿Se hermana más bien con la poética que con la ética? Me ha
quitado mucho sueño esta cavilación. Con todo, la heroína se ha ido
abriendo camino en su cárcel de mujeres cara a los perros de Creonte.
Dentro de esta cárcel trata de significar que los enfoques que se le
pueden dar a la naturaleza del poder son muchos e inagotables y que
en ello va suspendido el destino nuestro, sin olvidar que, consciente
o inconscientemente, el poder, con bastante frecuencia, se las arregla
para robar el fuego del terror y amenazarnos con él.

O microcosmo da ação é a cela de uma prisão feminina, onde 10 presas


políticas representam, de memória e de forma fragmentada, a Antígona de
Sófocles, num exercício de escrita metateatral (semelhante ao que encon‑
tramos em La razón de Antígona, de Carlos de la Rica16), que cruza o mito,
através de subtis referências intertextuais ao arquétipo sofocliano, com a
realidade política e as experiências pessoais das prisioneiras, vividas dentro
e fora da cela. A transição, suave, num perfeito continuum, entre estes dois
planos dramáticos, que recorrem a adequados e diferenciados registos de
linguagem – elevado, para a representação; prosaico, para a vida na cela17 –,

15
  A mesma estratégia de situar a ação na Grécia dos coronéis, para sub-repticiamente de‑
nunciar a ditadura franquista, será usada na peça Pour la Grèce, escrita em francês por Elizondo
e estreada no teatro Daniel Sorano, em Toulouse, no ano de 1971. Vide Pujol 1999: 340.
16
  Sobre esta questão, vide Morais 2014: 97-108.
17
  Cf. Pujol 1999: 343. Para Azcue 2011: 351, e 2013: 157, esta bipartição de registos
vai-se alterando ao longo da peça até à dissolução dos limites entre realidade e representa‑
ção, a partir da segunda metade do Ato II.

247
Carlos Morais

é facilitada por um cenário minimalista que, assimilando técnicas brechtia‑


nas, incorpora a peça no vanguardismo teatral europeu18.
A estes dois níveis de representação correspondem, grosso modo, dois gru‑
pos de personagens que se distinguem, desde logo, pela forma como são
designadas: o das prisioneiras que, não se identificando com o movimento
de resistência à ditadura, observa a representação da peça sem nela se envol‑
ver; e o das reclusas comprometidas com a luta, que participa ativamente
na recriação da tragédia. Em consonância com o seu grau de comprome‑
timento, as primeiras recebem nomes genéricos (Prisioneira A, Prisioneira
B, Prisioneira C) e as segundas, nomes das personagens gregas (Antígona,
Creonte, Hémon, Tirésias, Ama e Meneceia, às quais devemos acrescentar
“La Nueva” 19). De fora deste esquema, com intervenções mínimas, ficam os
dois guardas e seus cães, a guarda e o chefe das prisões, todos eles anónimos
agentes da repressão ditatorial.
Relativamente às personagens do arquétipo, Elizondo elimina Ismena
(representada, no seu não empenhamento, pelo conjunto das reclusas sem
nome), e ainda Eurídice e o Mensageiro; e cria duas outras, ausentes do
original: a Ama e Meneceia.
Comecemos pelas personagens criadas pelo autor. Presente em algumas
das recriações modernas de Antígona, a Ama, dotada de grande autorida‑
de moral, representa a voz da experiência e assume-se como protetora da
filha de Édipo, lamentando o destino que irá privar a jovem da luz, por se
ter insurgido contra o édito de Creonte. Por sua vez, Meneceia, a mãe de
Creonte, é uma mulher forte, com grande ascendente sobre o filho, que por
ela é comandado, ao longo da peça, como se de uma marioneta se tratasse
(44):

(La Menoecea le hace avanzar y retroceder. Créon tiene ademán de


renuncia por cesar de seguir representando el papel. Cuando intenta
quitarse la máscara, La Menoecea le retiene)

18
  Bosch 1979: 10.
19
  Ainda que, pelo nome, não se enquadre neste grupo, “La Nueva”, ao longo da peça,
vai sofrer um significativo processo de transformação que a leva a passar, como refere Azcue
2013: 155, de um estado inicial de rejeição do exercício dramático à assimilação do discurso
da tragédia de Antígona.

248
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

La Menoecea. (Haciéndole accionar las manos como a una marioneta:


la derecha alzada en signo de amenaza.) Creón ruge si es que sigues
perteneciendo a los de tu casta. Ahí tienes a Tiresias, no enmudezcas.

No rol das personagens importadas do original grego, duas coincidem


grosso modo com o arquétipo, no que respeita à sua caraterização (Hémon
e Antígona); e duas outras (Creonte e Tirésias) apresentam, como veremos,
traços distintos que as adequam ao contexto da representação.
Autointitulando-se “el gran pacificador” (39), mas considerado pelos
que se lhe opõem “el hijo de perra que fusila” (22) todos os adversários po‑
líticos, Creonte, o único que usa máscara, começa por ser o mesmo déspota
que encontramos no modelo grego. Porém, à medida que a intriga avança,
perde força e energia, sendo, como referimos já, completamente manietado
pela vontade de sua mãe que assume o comando, a ponto de ser ela que
responde ao seu neto, o revoltado Hémon, que se insurge, como no arqué‑
tipo, contra o édito injusto do pai. Com esta alteração na caraterização de
Creonte, o autor certamente pretende sublinhar que a reclusa que interpreta
a figura do déspota não se revê em tal papel, uma vez que a sua condição,
na realidade, é a de vítima e não a de opressora. Por isso, não pretendendo
prosseguir com a farsa, Creonte chega mesmo a fazer o gesto de lançar fora
a máscara (44).
Tal como o de Creonte, também o desenho do cego Tirésias não coinci‑
de com o do modelo sofocliano. Mais do que adivinho, ele é um “hombre
que se ha quedado sin raíces por vivir en el destierro” (29), um homem que
sente mas não vê a sua pátria. Representando todos os exilados, identifica‑
-se, assim, com o próprio autor (36)20:

Tiresias. (Alzando la voz.)


Me sigues callada, patria,
golpeando las sienes,
arruinándome día a día
de sentirte y no verte.

Transportando as mesmas caraterísticas do modelo grego, também o


jovem Hémon e a nobre e piedosa Antígona se identificam com o pen‑
samento do autor. Movido pelo amor, o primeiro desafia a autoridade do
pai, por iniquamente ter condenado a sua amada, acabando por se suicidar,

20
  Cf. Ragué-Arias 1992: 71.

249
Carlos Morais

depois de a ver morta na caverna onde fora emparedada – um quadro que


não é representado, mas apenas narrado, no Ato III (53), pela personagem
“La Nueva”, que analisaremos mais à frente. Por seu turno, a jovem heroína
é o paradigma do amor fraterno e da luta contra a injustiça e contra todas
as formas de opressão, representadas pelo tirano e pelas guardas e seus cães.
Persistente, procura ir mais além, até ao limite das suas forças, tendo por
meta provocar uma brecha que rompa os muros de silêncio impostos pelo
regime autocrático de Creonte, criptónimo de Franco, e permita a liberta‑
ção de todos os que foram presos, como elas, por delito de opinião (30)21:

Nodriza. – Pero, ¿adónde vamos? ¿Adónde vamos, Antígona?


Antígona. – ¡Más allá!
Nodriza. – ¿Más allá? Cada vez me obligas a seguirte más lejos.
Antígona. – Vieja, ¿no quieres seguir buscando la brecha?

Se, no plano da representação, ambos se suicidam, no plano paralelo da


ação quotidiana, as reclusas que os interpretam, após um protesto coletivo
no cárcere, no final do Ato II, são levadas e executadas, por estarem forte‑
mente implicadas na luta clandestina contra o regime ditatorial.
Morta Antígona, no preciso momento em que os dois planos se interse‑
tam, o compromisso de prosseguir a luta é assumido pela personagem “La
Nueva”, que representa a “figura da intelectual progressista”22. Depois de,
no início da ação, ter começado por hostilizar as colegas de cela, menospre‑
zando-as por entender que não estavam empenhadas na oposição ao regime
ditatorial dos coronéis, vai-se integrando gradualmente no espírito do gru‑
po, a ponto de as informar de que a luta clandestina prosseguia fora de mu‑
ros. Ato contínuo, toma conhecimento de que também elas, apesar das suas
origens humildes e da sua falta de instrução, estão implicadas na resistência
à ditadura, contando, entre os seus familiares, desaparecidos, condenados
ou presos políticos (27-28):

Nueva. – [...] Fuera están..., ¿pero es que no lo sabéis? Están arriesgán‑


dolo todo. Mis hermanos, con el grupo de Anexágoras, en la barricada
de la escuela del Norte.

21
  Procurando esfriar o ímpeto da jovem, a Ama relembra que pouco importa fugir,
uma vez que “el país entero es una prisión” (32).
22
  Ragué-Arias 1992: 71.

250
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

Nodriza. – (Feroz de autoridad.) ¿Y qué? (Tono más dominado) ¿Y qué?


(Pausa. Fría y objectivamente.) Aquí hay quien ha perdido a su marido,
ya hace mucho… y a quien se lo acaban de detener. (Por la que inter-
preta La Menoecea). Esa tiene a su cuñado con pena de muerte. Aquella
(por Antígona) es la novia de Miceno… ¿Lo conoces? Incomunicado
por salir elegido en las elecciones de septiembre. La otra... Bueno, para
que decirte más. ¿Qué crees? ¿Qué estás entre las de delito común? La
que más o la que menos, va acarreando lo suyo.
Nueva. – (Exaltada.) Quiero decir que la lucha sigue, que ha de
seguir...

Com esta partilha de informação, o seu envolvimento na causa coletiva


vai-se intensificando de tal modo que, no último ato, assume o espírito
combativo e resistente de Antígona que acabara de ser executada, bem como
a sua força de esperança luminosa, numa atitude de firmeza perante os
carrascos que encontra adesão nas restantes seis reclusas ainda em palco.
Algo enigmáticas e perturbadas, porém bastante significativas, as palavras
finais desta peça, que é deixada em aberto, sublinham, pela boca da Ama,
estas qualidades – força e esperança – necessárias para resistir e prosseguir
a luta (56):

Nodriza. – A ver si recuerdo lo que decía Teseo... Queréis creerme,


estoy perdiendo la memoria. Mala señal, vuestra Nodriza pierde la
cabeza. No me acuerdo si era en los Infiernos o en el Laberinto... Algo
decía Teseo sobre la fortaleza que tenemos que llevar dentro y también
no se qué sobre la esperanza. (Una pausa.) ¡Buenas noches! Mañana, si
me acuerdo, os diré lo que decía Teseo.

Operando a coletivização da heroína – Antígona, afinal, são todas as


que lutam dentro e fora de muros –, a peça de Elizondo, ao contrário das
anteriores recriações espanholas do mito, escritas depois de 1939, que evo‑
cam a guerra fratricida e a necessidade de reconciliação, centra-se, sobre‑
tudo, como sublinha a Ama, no destino dos que vivem e resistem a um
regime ditatorial repressivo e que, por isso, são perseguidos, encarcerados e
condenados à morte (41)23:

23
  Sobre esta questão, vide Azcue 2011: 346-353, e Azcue 2013: 147-162.

251
Carlos Morais

Nodriza. – […] Tu hermano, Antígona, ya está muerto y en el libro


de los muertos grabado su nombre. ¿Qué importa la prohibición del
tirano privándole de sepultura? Mira más bien por los que aguardan
condena, son legión.

Modelo de resistência e de oposição ao arbítrio do poder ditatorial, a


tragédia Antígona é um “viejo simulacro” (29) que, entre muros, funciona
como elemento congregador e identitário de todas as presas, que a usam ora
como forma de terapia ora como linguagem codificada. De facto, a repre‑
sentação fragmentada da tragédia de Sófocles, naquela cela que representa
todo um país enclausurado por muros de silêncio, tem uma função catár‑
tica, uma vez que serve como estímulo para manter a moral e para aliviar
as tensões dentro da cela, como evidenciam esta intervenção da Ama e a
didascália que a interpreta (29):

(Antígona se llega a ella y luego inclina una rodilla cerimoniosamente.


La Nodriza le pone un chal negro sobre los hombros y le invita a que
se levante. Las demás toman una serie de actitudes que dan a entender
que, si reconstituyen la vieja tragedia, no es por hacer teatro o por cele‑
brar algún rito, sino para utilizar el viejo simulacro como estimulante
que les ayude a mantener la moral.)

Nodriza. – (Altisonante.) ¡Que nos sirva de alivio el fingir la mueca


de dolor que los antiguos grabaron en esta tierra de perdición!

Mas a linguagem da tragédia é igualmente um código, que tem como


função ludibriar a feroz e apertada censura. Por saberem que entre elas exis‑
te uma delatora, as presas, na impossibilidade de poderem falar livremente,
ora o usam, ora se remetem a um silêncio defensivo (28):

Nodriza. – […] ¿Has sabido del atentado contra el coronel que tú


sabes? Pues puede que esté entre nosotras, o que estén entre noso‑
tras las que tienen que ver mucho con ese asunto. ¿Comprendes?
(La Nueva la mira sin comprender.) La que ha participado o las que
han participado en el atentado contra el coronel. ¿No estás? (La
Nueva afirma.) Lo que importa por el momento es que aquí, en
esta celda, hay quien tiene mucho interés en conocer los nombres...
¿Difícil de entender? ¿Verdad que no? Por eso, por regla general,
vale más no hablar de manera precisa de ése ni de otros asuntos.

252
Antígona entre muros, contra os muros de silêncio:
Mito e História na recriação metateatral de José Martín Elizondo

(Pausa.) Animos mujer. Y paciencia. La lucha sigue a pesar de


nuestras simplezas.

De facto, este exercício de escrita metateatral, aproveitando toda a retó‑


rica de protesto do arquétipo grego, é um grito de revolta contra os muros
de silêncio impostos pelos regimes ditatoriais, sejam eles o grego ou o espa‑
nhol, e simboliza a resistência coletiva dos que, sob o signo de Antígona, na
cela, na clandestinidade ou no exílio, lutam pela liberdade e pela democra‑
cia, contra a política autoritária e repressiva do regime franquista.
Foi esta a luta que José Martín Elizondo empreendeu, a partir do exílio,
servindo-se de peças codificadas, como Antígona entre muros, que abordam
de forma velada a História através do Mito24.

24
  Como afirma Azcue 2011: 369, “la Historia y el exilio han defenido su vida y
su teatro, su lucha contra la opresión política a partir del teatro, del exilio forzado en que
se vio obligado a vivir”.

253
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona: Norma e Transgressão, em
Sófocles e em Hélia Correia
(Antigone: Norm and Transgression in Sophocles and Hélia Correia)

Susana Hora Marques (smp@fl.uc.pt)


Universidade de Coimbra

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_13

255
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia

Resumo – É paradigmática a determinação de Antígona, a jovem princesa que


ousou desafiar o poder instituído em nome de valores como a eusebeia ou a philia,
numa atitude heróica que lhe custou a própria vida. A literatura e os palcos portu‑
gueses recuperaram de modo reiterado esta personagem modelar, de forma espe‑
cial no século XX, e em particular durante a vigência do regime salazarista, como
símbolo de uma liberdade desejada, mas veladamente reclamada. Hélia Correia,
fascinada pelos textos e pelas figuras da Grécia antiga, redesenhou também a filha
de Édipo, no final do século passado (cf. Perdição: exercício sobre Antígona): “tendo‑
-a tomado ao colo desde tenra idade”, como afirma, conferiu-lhe uma tonalidade
mais pessoal, mais intimista, mas não menos contestatária - a sua rebeldia, a sua
transgressão à norma acentua-se ao nível do privado e do familiar, ao nível do uni‑
verso feminino, essencial na escrita heliana. A desconstrução do modelo sofoclia‑
no, cujo núcleo é, todavia, claramente reconhecível, evidencia a plasticidade dos
mitos clássicos, sempre abertos a renovadas interpretações que os tornam perenes e
significativos nas mais diversas épocas e locais.
Palavras-chave: Sófocles, Hélia Correia, Antígona, norma, transgressão.

Abstract – Fascinated by the texts and characters of Ancient Greece, Hélia


Correia reconfigured Antigone in Perdição: exercício sobre Antígona. Hélia’s
Antigone is seen through a personal viewpoint, although the Greek heroine is still
seen as rebellious and transgressive. The deconstruction of Sophocles’ model shows
the plasticity of classical myths.
Keywords: Sophocles, Hélia Correia, Antigone, norm, transgression.

A sedução pela figura de Antígona, evidente na escolha do tema deste


congresso internacional, é recorrente, em diversas épocas e lugares – a jo‑
vem filha de Édipo é insistentemente convocada, ora como paradigma de
oposição ao poder tirânico instituído, ora como representante da condição
da mulher na sociedade e na família, ora também como elemento do par
romanesco que forma com Hémon, tópicos sublinhados por leituras moder‑
nas do mito, reveladores da vitalidade e da universalidade daquela persona‑
gem clássica, permeável a interpretações distintas. Atualizadas e reajustadas
a diferentes contextos e sensibilidades, essas leituras mostram-se, não raro,
menos enfáticas em relação a aspetos destacados pelo arquétipo sofocliano,
como a questão da justiça, universal e cívica, ou a importância do divino.
Com frequência, por outro lado, produções masculinas e femininas salien‑
tam mensagens diferentes, em conexão com relações tradicionais que ligam o
homem ao poder e à vida política, desde a Antiguidade, e a mulher, por sua
vez, ao foro doméstico, à vida privada, favorecendo uma atenção particular
ao papel de Antígona como mulher. Na literatura e nos palcos portugueses do

257
Susana Hora Marques

século XX, que recuperaram de modo reiterado aquela personagem modelar1,


a vigência do regime salazarista inspirou autores como Júlio Dantas (1946) ou
António Pedro (1954), por exemplo, a encontrarem em Antígona o símbolo
de uma liberdade desejada, mas veladamente reclamada. Hélia Correia, por
seu turno, fascinada pelos textos e pelas figuras da Grécia antiga, redesenhou
também a filha de Édipo no mundo hodierno (cf. Perdição. Exercício sobre
Antígona (1991)), conferindo-lhe uma tonalidade mais pessoal, mais intimis‑
ta, mas não menos contestatária - a rebeldia de Antígona, prenunciada na
etimologia do próprio nome, a sua transgressão à norma, pressagiada pela
natureza singular da sua ascendência, acentua-se ao nível do familiar, ao nível
do universo feminino, essencial na escrita heliana. Esta versão funde o mo‑
delo clássico sofocliano com a reescrita de Jean Anouilh, uma obra em que
Antígona vive também “…na diferença que a separa das outras personagens
‘normais’, que sobreviverão”, como bem observa Fialho 2006: 51. Marcas de
Anouilh “podem ser percebidas a dois níveis – um externo, o de motivos,
cenas ou personagens introduzidos pelo dramaturgo francês, como sejam a
figura da Ama e a existência da cadelita, o encontro de Hémon e Antígona
em cena, um laivo de rivalidade feminina de Antígona com Ismena perante
Hémon; o nível mais profundo toca o cerne da inspiração criadora de Hélia
frente (…) à figura de Antígona, cuja proximidade a escritora viveu no cora‑
ção da própria encenação de Édipo Rei no Teatro da Comuna, dirigida por
João Mota. (…) …o motivo anouilhano do cansaço de Antígona”2.
No século V a. C., Sófocles, um homem politicamente comprometido
com a Atenas em que viveu, imaginou a filha de Édipo a surgir num espaço
exterior, público, destinado, por convenção, ao mundo masculino. O coro
de anciãos, a presença insistente de Creonte em cena recordam de forma
repetida que o poder, a vida pública atenienses eram sobretudo apanágio
do homem. Transgredindo a norma associada ao seu estatuto na Atenas da
época3, a princesa sai do ambiente interior, mais recatado, e intromete-se no
universo masculino, estabelecendo uma relação de fratura com as práticas
vigentes, ainda que ela evoque razões de importância soberana para a sua

1
  Para uma cronologia das reescritas e das encenações do mito de Antígona em Portu‑
gal no séc. XX, cf. Morais 2001: 161-164. Cf. também Silva 2010: passim.
2
  Fialho 2006: 51-52.
3
  Sobre a situação da mulher na Grécia antiga, diferenciada de acordo com diferentes
locais e estatutos sociais, cf. Oliveira 2008: 65 sqq.

258
Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia

atitude, como a eusebeia ou a philia familiar4. Como é hábito em Sófocles,


a atuação da heroína contrasta com a de uma outra figura, desta feita tam‑
bém feminina, a da irmã, que, sob a pressão social exercida pelos valores
institucionalizados e pela herança recebida, manifesta uma relação de con‑
formidade com o que lhe fora transmitido, esquivando-se a pactuar com os
intentos de Antígona, fora do palácio, e chamando-lhe precisamente a aten‑
ção para a necessidade de respeitar o código instituído, em especial no que
concernia à sua condição feminina: “nascemos para ser mulheres e não para
combater com os homens5” (61-62); “somos governadas pelos mais podero‑
sos” (63-64). Consciente do conflito que a irmã estabelecia com as regras
determinadas por Creonte e aceites pela comunidade, Ismena, “incapaz de
atuar contra o poder da cidade” (78-79), considera um risco as pretensões
de Antígona e carateriza-a como “desvairada” (47), “insensata” (98-99).
O comportamento diverso das duas filhas de Édipo ilustra a forma di‑
nâmica como o indivíduo pode dialogar com o grupo em que se insere e
com o património herdado, produtores de hábitos e tradições que adquirem
um valor normativo. Ao longo da peça, de modo significativo, Ismena é
levada para o exterior por outra personagem, ao contrário de Antígona, que
atua preferencialmente nesse espaço.
Creonte, representante do poder em Tebas e do universo masculino, re‑
alça também o facto de Antígona ser mulher, condição que, de acordo com
um contexto de hábitos convertidos em normas de uma sociedade específi‑
ca, em consonância com valores e crenças coletivamente partilhados, a ini‑
biria de perturbar o tradicional funcionamento de uma polis com estrutura
patriarcal, na qual os papéis masculinos e femininos se revelavam distintos.
O comportamento inusitado da jovem Antígona face aos padrões instituí‑
dos, face à estrutura social, desencadeia em Creonte reflexões como “porém,
é ela que será um homem e não eu, se lhe deixo esta vitória impunemen‑
te”, ou propósitos do género “mas enquanto eu viver, não será uma mulher
quem me dá as ordens” (525), e ainda “devem conservar-se as determina‑
ções, e de alguma forma deixá-las aniquilar por uma mulher” (678 sqq.). A
posição do soberano, para além de remeter para uma das leituras frequentes

4
  Calero Secall 2008: 9-28, por exemplo, apresenta outros exemplos de ‘antiprototipos
de conductas femininas’ (Penélope e Artemísia de Halicarnasso).
5
  Tradução de Rocha Pereira 2010. As traduções da Antígona sofocliana são retiradas
desta versão.

259
Susana Hora Marques

da peça sofocliana, o confronto masculino/ feminino6, é expressiva, pois, de


convenções sociais da Atenas de então, definidoras do papel em geral menos
visível da mulher na vida pública da polis, em favor do lugar ocupado na
esfera doméstica. Sobreleva ainda o empenho de Creonte em preservar as
leis humanas, o direito positivo, fundamental para a polis 7 - como afirma o
coro, o homem “aprendeu as normas que regulam as cidades” (352 sqq.) e
que, transmitidas a cada novo indivíduo que integra essas poleis, se conver‑
tem em referentes de uma identidade coletiva, delineadores da especificida‑
de de cada comunidade. O desajuste entre as expectativas criadas pela polis
em geral, e em particular pelo seu chefe, e a atitude de Antígona produz um
conflito que custaria à princesa a própria vida, como se sabe.
Além de mulher, Antígona é uma jovem, fase da vida tradicionalmente
conectada com a contestação, com o inconformismo, com a rebeldia, e, por
isso mesmo, mais propícia à quebra de normas estabelecidas, muitas vezes
por insensatez ou por inexperiência. Se a atitude de Antígona, sobretudo no
confronto direto com Creonte, revela um caráter algo excessivo, imoderado,
próprio da juventude (cf. 472 sqq., 480-484, 497-499, 875), os argumentos
que apresenta em defesa da sua atuação, porém, radicam em grandes valores
universais, que insiste em não infringir, como seja o dever de prestar honras
fúnebres a um cadáver – ao honrar Polinices, Antígona acaba por teste‑
munhar um sentimento de pertença em relação a códigos que lhe haviam
sido anteriormente transmitidos, isto é, que se haviam constituído afinal
como padrões educativos com os quais se identificava. Note-se, ainda, que
Hémon, embora jovem, é capaz de chamar à razão Creonte, uma figura
mais velha e que, pela experiência de vida adquirida ao longo dos anos, de‑
veria mostrar-se mais sábia, como acontece em geral na épica homérica, por
exemplo. Todavia, em Sófocles, “os velhos não são necessariamente mais
sábios que os jovens”, como bem observa Romilly 1971: 1368.
Conhecedora da lei humana ditada por Creonte, Antígona transgride-a
por vontade própria, pelo que, em conformidade com o nomos regulador da
vida em comum, representado por Creonte, teria de ser punida. Consciente

6
  Não é propósito do presente estudo debater questões relacionadas com os sucessivos
agônes da peça, nomeadamente, com a oposição lei humana/ lei divina, ou valores cívicos/
valores familiares, por exemplo. Sobre esse assunto, cf. e. g. introd. de Rocha Pereira à
tradução portuguesa da obra, bem como bibliografia aí indicada.
7
  Sobre a soberania que os Helenos reconheciam ao nomos, cf. e. g. Hdt. 7. 102. 1.
8
  A propósito do tema da velhice na Antiguidade clássica, cf. e. g. bibliografia indi‑
cada em Suder 1991.

260
Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia

do risco que corria ao praticar um ato proibido por um édito real, não deixa
contudo de lamentar o ver-se privada daquele que seria o percurso habitual
de uma jovem princesa como ela – o casamento, a família. Deste modo,
também a nível pessoal e íntimo a vida de Antígona colide com a norma
esperada, ainda que isso apenas seja referido de passagem – em Sófocles,
sobressai o elemento político, no que à atuação de Antígona diz respeito.
Vozes masculinas (cf. Creonte, sobretudo) e femininas (cf. Ismena) con‑
jugam-se na denúncia da infração da heroína perante os códigos de conduta
de uma princesa, em particular no que toca à sua intromissão em assuntos
públicos, próprios da esfera masculina. A rutura de Antígona com a lei hu‑
mana, em nome de valores universais e divinos, não inibe porém Sófocles,
um homem da polis ateniense, de a conceber como uma mulher singular,
pela determinação com que defende princípios universais – a anormalida‑
de da sua atuação corajosa e ousada, numa sociedade regida por homens,
distingue-a como heroína trágica, evidenciando como norma e transgressão
mantêm uma conexão dinâmica, impulsionadora do percurso do ‘eu’.
O desajuste da Antígona heliana face aos padrões instituídos, por seu
turno, esbatendo a questão política, centra-se no domínio mais privado e
pessoal, como ficou dito, na senda dos traços caraterizadores do teatro cria‑
do por Hélia Correia, mais intimista, e no qual a importância do feminino,
das mulheres a conversar é incontestável9. No caso de Perdição. Exercício
sobre Antígona, esse relevo é marcado ora pela inclusão, no elenco, da fi‑
gura da Ama de Antígona, ora de um coro de Bacantes, ora também pelos
múltiplos diálogos entre mulheres, no pátio do palácio, espaço do femini‑
no, ora ainda pela presença e participação ativa das mulheres na discussão
com Creonte sobre o destino de Antígona, na sala do trono, sem que a sua
comparência conjunta nesse local seja sublinhada como uma intromissão
inusitada na esfera do poder.
A peça, concebida numa transgressão em termos gráficos, face ao origi‑
nal sofocliano (cf. a apresentação do texto em duas colunas, uma destinada
ao mundo dos vivos, a outra, ao das mortas, Antígona e a Ama), tem início
com um ditirambo entoado por um coro de Bacantes, escolha que permite
desde logo focar a atenção do público no universo feminino, por um lado,
e no distanciamento das convenções que os muros da cidade representam,
por outro, elementos importantes no desenho desta renovada Antígona.

9
  Cf. o facto de a autora ter escrito uma trilogia feminina – Perdição. Exercício sobre
Antígona (1991); Rancor. Exercício sobre Helena (2000); Desmesura. Exercício com Medeia
(2006).

261
Susana Hora Marques

Inebriadas pela presença do deus nos seus seres, as Bacantes entregam-se à


physis, longe da lei de Tebas, como sublinham (p. 19), inibidora do atrevi‑
mento, da libertação de regras – a presença de Dioniso no além cidade, no
contexto da natureza na sua essência, é capaz de desencadear um prazer que
a mulher em geral procura, mas que lhe é negado pela convenção social, fac‑
to que destaca desde logo uma dicotomia fundamental na reescrita heliana
- instinto natural/ ordem social10.Antígona, devido à forma anormal como
cresceu, fora da cidade e dos padrões da comunidade em que nascera, con‑
vive mal com os preceitos institucionalizados, mostrando-se obstinada em
relação às convenções próprias do universo feminino em particular e à nor‑
malidade social em geral. Hélia Correia, mais do que mostrar a heroína que,
por causa do irmão morto, enfrenta Creonte, testemunha uma intimidade
com Antígona, a quem “tomou ao colo desde tenra idade”, e revela-nos a
sua história, buscando no seu percurso de vida os motivos que a convertem
numa figura representativa da oportunidade de resistir, de se distanciar do
trajeto feminino, das regras sociais, com as quais tem uma incompatibilida‑
de visceral. Nesse sentido, a peça evidencia Antígona-mulher, recordando
uma história delineadora da sua infância e adolescência, do exílio, do con‑
fronto com a anormalidade. Na verdade, em diálogo com a Ama, Antígona
lembra o frio, a fome, o receio que sentiu durante o tempo que acompa‑
nhou, amparou e conduziu o pai, cego e débil, no exílio: inusitadamente
confrangida a sair do conforto e da prosperidade do palácio ainda menina,
aprendeu a sobreviver e a identificar-se com uma natureza selvagem, que
acabou por lhe moldar a identidade. As memórias de uma infância e de uma
adolescência inseguras, carentes de afetos, de ternura e de proteção impe‑
dem-na de se adaptar, no presente, a uma vida entendida como normal pelo
‘eu’ coletivo, impedem-na de ceder a pressões institucionais. O regresso da
jovem ao palácio confronta-a com uma normalidade estranha à sua penosa
experiência, bem como com o facto de ser uma figura incómoda, motivado‑
ra de más memórias para os que lhe são próximos. A forma inconvencional
como amadureceu instiga-a a uma relação clara e reiterada de fratura com a
vida que o meio social do momento lhe propõe. Eurídice, maternal, percebe
a irremediável desadequação de Antígona à vida em comum, assente em
regras, em comportamentos e valores determinados, pelo que afirma, de
modo expressivo: “se eu pudesse fazer nascer-te de novo. Criar-te devagar”
(p. 37), ilustrando como, para interiorizar os padrões sociais então vigentes,
a identidade da filha de Édipo teria de ser reformulada desde o princípio,

10
  Cf. Silva 2006: 13.

262
Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia

i. e., a jovem teria de ser moldada, desde o seu nascimento, nos princípios
educativos definidores daquele grupo específico. A experiência de Antígona
justifica assim que ela não nutra um sentimento de dívida e de pertença em
relação a valores de um património que é comum às restantes mulheres da
peça, em relação a hábitos coletivos convertidos em normas, institucionali‑
zados, mas que se identifique em vez disso com uma herança que é produto
de uma vida passada longe da sociedade, sujeita a códigos e a exigências
bem diversos.
O retorno a Tebas, depois do tempo passado no exterior da comunidade,
coloca-a num espaço por hábito familiar ao mundo feminino, representado
pela Ama, por Eurídice e por Ismena, um espaço onde, à partida, Antígona
se moveria com naturalidade, rodeada de mulheres como ela, conhecedo‑
ras dos moldes da vida feminina. Não é isso que acontece, porém. Jovem,
como a irmã, ela revela-se desde logo diferente das outras raparigas da sua
idade, das práticas femininas e, por isso, não tem amigas. Rir, tomar banho
na ribeira, regressar a casa “corada e enfeitada de juncos” (p. 26), saber
bordar (p. 50), estar alegre, gostar da beleza (p. 32) representariam com‑
portamentos/ atitudes padronizados das donzelas da sua faixa etária, como
testemunha Eurídice. Desintegrada da comunidade e dos seus modos de
vida peculiares, contudo, Antígona “cheira mal”, “não vai ao banho” (p.
29), como notam a Ama e Hémon, revelando exteriormente sinais do seu
desenquadramento social, da não interiorização de preceitos comuns. No
entanto, a princesa acaba por mostrar a alegria “natural na sua idade” (p.
32), em consequência de uma relação amorosa que estabelece com Hémon,
temática destacada pela leitura heliana, porquanto particularmente ligada
ao domínio pessoal, feminino e à ousadia definidora de Antígona, amante
de desafios. O paradigma educacional incutido pela pólis remetia as jovens
para o casamento, para a constituição de família, como acontecera com
Eurídice, por exemplo, e como deveria acontecer com Ismena; “todos pen‑
savam <contudo> que <Ismena> seria a noiva de Hémon” (p. 32) – uma vez
mais, Antígona quebra a regra e, seduzida por uma ligação amorosa desa‑
fiadora de expectativas, do ‘eu’ e do ‘outro’, entrega-se a ela com prazer (cf.
pp. 30-32), mesmo que isso tenha instigado Ismena a “fechar-se a chorar,
despeitada, ofendida pela humilhação” (p. 32).
Sem uma relação afetiva com a irmã, sem amigas da mesma idade,
Antígona, a namorar Hémon, quer conhecer precocemente “a arte das
mulheres” (p. 33) mais velhas, das mulheres adultas, talvez mais próxi‑
mas do amadurecimento prematuro a que ela própria se vira constrangida.
Ilustrativos de uma rotina dececionante, os testemunhos de Eurídice e da

263
Susana Hora Marques

Ama, simbólicos da normalidade que cabia às mulheres respeitar (cf. p. 38,


Eurídice – “Há as cidades e as florestas bravias. Nós, mulheres, habitamos
nas cidades”), exemplificam todavia experiências impensáveis para a rebel‑
dia de Antígona: “…uma vida (…) entre os teares, os armazéns e a lareira.
Entre o sangue dos meses e o sangue dos partos. A governar entre cria‑
das…” (Eurídice, p. 33); “e todas as criadas, as jovens, uma a uma, passarão
certa noite pelo corpo do senhor. Sem que nisso achem glória ou alegria. É
serviço de escrava, como um outro qualquer” (Ama, p. 33).
Os padrões que regem o universo feminino, independentemente da
idade e da condição da mulher, são incompatíveis para quem não cresceu
“protegida por paredes”, para quem assistiu a “conversas com ladrões” (p.
37), viu “emboscadas (…), <viu> cadáveres comidos pelos corvos” (p. 52) no
exterior do aconchego familiar, do palácio, da cidade – o questionamento,
a tensão constante com essa norma coletiva castradora da liberdade indi‑
vidual é a resposta possível de uma mulher diferente, que se distingue das
demais, mesmo das mais próximas por laços de sangue.
Consciente de que a inusitada curiosidade de Antígona infringe a ordem
social estabelecida (cf. p. 39, “sabes o que não deves e ainda não aprendeste
as pequenas habilidades das raparigas”), Eurídice considera a sobrinha “um
animalzinho por domar (…), descarado” (p. 39), assemelhando-a expressi‑
vamente às “éguas bravas”, à sua natureza agreste, com a qual Antígona se
identifica afinal, qual bacante indomável.
Na senda do modelo sofocliano, os domínios privado e público, femini‑
no e masculino acabam por se entrecruzar, ainda que com focos distintos
no confronto entre passado e presente, como foi dito, para dar conta do
cerne do mito de Antígona, revelador per se de transgressão – a concessão
de honras fúnebres ao irmão Polinices, apesar da proibição de Creonte. A
rebeldia, o excesso são traços incontornáveis em ambas as Antígonas, ora
mais a nível pessoal (cf. Hélia Correia), ora sobretudo a nível público (cf.
Sófocles). Em Perdição, a atitude da princesa suscita perspetivas diferentes
nas figuras femininas que a rodeiam: Ismena, a jovem modelada pelos pa‑
drões convencionais da polis e do palácio que habitava desde criança, reco‑
nhece que a irmã não escuta a razão, mas apenas “a voz do escândalo”, da
rutura de regras (pp. 45-46). Eurídice, mulher-mãe, recorda um argumento
justificativo da ação da sobrinha que remete para o paradigma sofocliano, a
piedade, mas agora destituído do estigma religioso de outrora e até contes‑
tado por Ismena (cf. p. 46). A Ama, que lhe perdera o rasto por longos anos,
insiste em compará-la aos animais, numa alusão à sua experiência de vida
anormal, perigosa, justificativa da indocilidade de então: “voltou-me para as

264
Antígona: Norma e Transgressão, em Sófocles e em Hélia Correia

mãos arisca como um bicho” (p. 51). A motivação da própria Antígona para
infringir a lei humana, por seu turno, não expressa o heroísmo do século V
a. C., mas tão somente a necessidade de contornar de alguma forma uma
vida de frustração, de tédio, de ressentimento: “qualquer coisa que tinha de
ser feita” (p. 46).
A singularidade de Antígona em relação à norma social e familiar é real‑
çada também pelo universo masculino, através das figuras de Hémon e de
Creonte. Se Hémon, que não é já o porta-voz da razão, como em Sófocles,
mas antes um jovem aventureiro e pronto a desafiar a norma, como é pró‑
prio da sua idade, é particularmente seduzido pela natureza indómita da
filha de Édipo (cf. pp. 30-32, 39), o chefe da cidade acredita que apenas
uma exorcização poderia integrar Antígona nas regras da comunidade que
ele governava, sujeita a códigos de conduta que deviam ser respeitados por
todos como garantia da ordem cívica e como reflexo de uma identidade
coletiva (cf. p. 48). As mulheres, “feliz raça que só segue o coração”, as emo‑
ções, segundo a convicção do Creonte heliano (p. 48), podem perturbar a
racionalidade das decisões a tomar, atrasando o cumprimento do dever, do
nomos regulador, necessário à dimensão relacional do ser humano.
A inflexibilidade, a imoderação, o confronto da Antígona heliana com
a norma isolam-na do ‘outro’, enquadrado num sistema que aceita e que
regula a sua experiência de vida; a jovem, desadaptada, amargurada, ressen‑
tida, não se ajusta ao mundo dos vivos, às imposições da comunidade: “já
nenhum homem a satisfaria”, como bem observa a Ama (p. 55); a própria
Antígona reitera aquela ideia: “E nenhuma casa. E nenhuma ninhada de
filhos para criar. Dias depois de dias, dias sempre. Até envelhecer” (p. 55).
Numa peça de mulheres, Antígona é uma presença contínua em cena,
não deixando qualquer dúvida sobre a verdadeira protagonista, a jovem sin‑
gular que “vigiava de noite, dormia de dia”, que “não respeitava a sucessão
dos tempos, que não respeitava nada” (p. 56), como reconhecem sucessiva‑
mente a Ama, Eurídice e Creonte no final da obra, em notas ilustrativas da
sua natureza inconvencional.
“Eu desdir-vos-ei” (Perdição, p. 51) – incapaz de interiorizar uma he‑
rança coletiva com a qual não se identifica ou de se constituir como re‑
cetora passiva dos comportamentos e valores da comunidade que a cerca,
Antígona reage, passa além da norma. A inadequação da jovem personagem
heliana face aos valores e aos princípios éticos do grupo em que se insere
resulta menos da sua idade ou da defesa de valores universais do que de
um processo de formação e de crescimento que a torna numa mulher so‑
frida, revoltada com o mundo, avessa a imposições humanas: é na physis

265
Susana Hora Marques

que Antígona encontra as suas diretrizes de vida, as suas próprias normas,


mesmo se esbarram com as balizas definidas pelas convenções do ‘outro’, tal
como acontece com o coro de bacantes que dá início à peça.
Em Hélia Correia, como em Sófocles, Antígona não se compatibiliza
com normas criadas pela comunidade humana que integra, reagindo indi‑
vidualmente e lançando-se num percurso de transgressão que a conduzirá a
uma morte aparentemente libertadora.
Hoje, como outrora, o ‘eu’ coletivo isola via de regra o indivíduo que
quebra os códigos, que evidencia uma rutura com a experiência de iden‑
tidade comum, assente na definição de particularismos identificadores do
grupo – a relação de estranhamento de Antígona face a padrões aceites
pelo ‘outro’, de modo mais ou menos tácito, a tensão com o normativo, nos
mais diversos domínios, revela-se, neste caso específico, em atitudes que
são afinal apanágio das Antígonas de todos os tempos: desafio, inconfor‑
mismo, resistência, contestação, manifestações tradutoras da singularidade
universal e intemporal da personagem feminina imortalizada por Sófocles.
A identidade individual da jovem princesa, consolidada pelo confronto com
a experiência do ‘outro’, pelo diálogo com a alteridade, distingue-a clara‑
mente desse ‘alter’ e indu-la a ultrapassar os limites estabelecidos pelas so‑
ciedades humanas, por heranças coletivas.

266
La Antígona en lengua asturiana
(The Antigone in asturian language)

Ramiro González Delgado (rgondel@unex.es)


Universidad de Extremadura

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_14

267
(Página deixada propositadamente em branco)
La Antígona en lengua asturiana

Resumen1 – Este artículo analiza la única recreación literaria del mito de Antígona
en las letras asturianas: el drama Antígona, por exemplu (1991) de Nel Amaro. El
autor transporta a los personajes de Sófocles al siglo XX y reflexiona críticamente
sobre la intemporalidad de algunas causas.
Palabras clave: Mito Griego. Tradición Clásica. Teatro. Antígona. Literatura
Asturiana.

Abstract – This article analyzes the unique literary recreation of the myth of
Antigone in Asturian Literature: the drama Antígona, por exemplu (1991) by Nel
Amaro. The author transports Sophoclean characters to the twentieth century and
ponders critically about timelessness of some causes.
Keywords: Greek Myth. Classical Tradition. Theatre. Antigone. Asturian
Literature.

1. Introducción

El artículo determinado con el que titulamos este trabajo no debe re‑


sultarnos extraño. La lengua asturiana no cuenta con ninguna traducción
de las tragedias griegas, tan sólo con los primeros versos del Edipo Rey de
Sófocles2, y ningún poema, cuento, novela u obra literaria presenta a una
protagonista llamada Antígona o que actúe como tal, a excepción de la que
hoy aquí nos ocupa: Antígona, por exemplu (1991) de Nel Amaro. Es por
tanto, hasta el momento, la única recreación literaria del mito de Antígona
en las letras asturianas y, a pesar de ello, esta pieza no cuenta todavía con
ningún estudio crítico3.

1
  Este trabajo se enmarca en el Grupo de Investigación LAPAR (HUM 002) financiado
por los fondos FEDER a través del IV Plan Regional de I+D+I del Gobierno de Extremadura
y en el proyecto FFI2013-41976-P del Ministerio de Economía y Competitividad.
2
  Sus primeros setenta y nueve versos fueron traducidos por Xosé Gago (traductor
al asturiano de Homero, Safo o Kavafis, entre otros) y publicados en la revista Adréi en
1989. González Delgado 2012: 91-94 señala que es una traducción fiel al texto griego e
indica: “La cuidada traducción está hecha desde el original griego, aunque no se indica qué
edición se tomó ni se reproduce el texto original. Mantiene el verso en la forma, el tono
trágico y respeta el mismo número de versos que el original. El texto viene precedido de
una acotación que presenta la obra en su contexto”.
3
  Esta obra aparece solamente citada en el índice de adaptaciones de Bañuls Oller
and Crespo Alcalá 2008: 609 y en González Delgado 2012: 117, 171, por tomar como
modelo la obra de Sófocles y por ser una heroína mítica inspiradora. En la Historia de la

269
Ramiro González Delgado

En este estudio vamos a analizar esta pieza teatral en un acto único, que
toma prestados los personajes de la tragedia sofoclea para transportarlos al
mundo urbano del siglo XX y reflexionar sobre la intemporalidad de algu‑
nas causas, como la lucha contra cualquier tipo de tiranía y que, indudable‑
mente, transporta a sus receptores a la dictadura que sienten más cercana,
en especial si ésta se asienta sobre una lucha fratricida. Veremos además que
su autor, del que hablaremos sobre todo de su producción teatral, utiliza el
mito para denunciar una realidad vivida, pero a la vez, el paso del tiempo le
permite realizar tanto crítica como autocrítica.

2. El autor y su producción dramática

Nel Amaro, pseudónimo de Manuel Amaro Fernández Álvarez (1946-


2011), fue un polifacético y premiado artista asturiano que escribió, en
castellano y en asturiano, poesía4, novela5 y teatro. Fundó y dirigió en el

Lliteratura Asturiana, Bolado García 2002: 703 le dedica un párrafo y señala: “Antígona,
por exemplu queda, como indica’l so títulu, como ún de los caminos posibles, como otra de
les corrientes na escritua ya nel facer teatral, dientro d’esi mundu complexu ya máxicu que
podría ser […] el panorama escénicu de nós”.
4
  En castellano, escribió: Responsos laicos (Langreo, 1979), Café Voltaire
(Palencia, 1980), Habitación de poeta (Mieres, 1981), Boca arriba, lentamente
naufragando (Mieres, 1982), Versos, boca arriba, para Marta B. (1990), Poemas
de San Francisco (Simancas, 1992), Las cuentas del anónimo (Valladolid, 1992)
y Mas (Poe) (Salamanca, 2000); en asturiano: Y, tú, Marta B., qu’entoncies nun
yeres, tampocu, l’Anna Karina de les películes de Jean Luc Godard (Mieres, 1990),
Reversos (Uviéu, 1990), Diariu d’un polizón (Uviéu, 1990), Poemes de San Francisco
(Mieres, 1993), Pruebes d’autor (Uviéu, 1994) y Cementeriu cívicu (Uviéu, 1999).
Fue incluido en varias antologías poéticas (sirvan de ejemplo, González-Fierro and
Yéschenko, 2000; Radatz and Torrent-Lenz, 2006; Argüelles, 2010).
5
  Para la narrativa prefirió la lengua asturiana. Escribió las novelas: ¡Adiós Dvorak!
(Avilés, 1990), Novela ensin títulu (Avilés, 1991) –sobre esta novela, véase Mariño Davila
2003—, L’ últimu del pelotón (Mieres, 1994), ¡¡¡Falanxista!!! (Uviéu, 1995) y Entós, cuando
ñevaba (Uviéu, 2002); también el cuento “Relatu s utaler” (Gijón, 1990) y las colecciones
de cuentos Prietu Jazz (Avilés, 1993 –contiene nueve relatos) y Na borrina (Mieres, 1993
–once—). Fue incluido en varias antologías de cuentos (Álvarez Llano, 1994; Nel Amaro,
1992; Piquero, 2004). También escribió varios artículos y ensayos sobre diversos aspectos
literarios, destacando los publicados en Lletres Asturianes sobre toponimia (22, 1986: 43-
52), personajes novelísticos (31, 1989: 69-80), una epístola del escritor asturiano Fernán
Coronas (33, 1989: 219-222), teatro (Nel Amaro 1989) o poesía visual/experimental (47,
1993: 187-192).

270
La Antígona en lengua asturiana

valle del Caudal las revistas Sapiens literario (1977-1978) y Cuélebre lite-
rario (1978-1981). Fue un destacado autor de la primera generación del
Surdimientu6 y su obra, influenciada por autores de otras literaturas más que
de la asturiana (como por ejemplo Carlos Álvarez, Gil de Biedma, Beckett,
Sastre…), se caracteriza por su compromiso social. En los últimos años de
su vida, desde 1994, deja de lado la creación estrictamente literaria para
dedicarse a la performance y a las artes plásticas y visuales7, centrándose en
el arte experimental y en lo que podríamos llamar lenguaje de lo visual. De
toda su producción, nos vamos a detener brevemente en su actividad teatral
antes de centrarnos en la pieza dramática que nos incumbe: Antígona, por
exemplu.
Nacido en una familia de izquierdas, desde su juventud se interesó por
el teatro, comenzando como actor con el grupo “García Lorca” (Mieres,
1965). Pasa luego a dirigir y a preparar montajes con textos ajenos (Arrabal,
Ionesco, Unamuno, Kafka, Benet, Beckett…) y propios, muchos de los cua‑
les solo vieron la luz en las efímeras tablas del teatro8. Durante los primeros
años del Surdimientu, va a cultivar este renovado género prácticamente en

6
  Sánchez Vicente 1991: 58 ya señala su profusa obra, muy variada en calidad y con
notables aciertos, caracterizada, en líneas generales, por una frase de complicada estructura
y amplio periodo y por vanguardistas procedimientos experimentales.
7
  Como performer, realizó acciones por varios puntos de la geografía española, for‑
mando parte, junto a Abel Louredo, del “Espacio arte excéntrico” (Colectivo de Acción y
Agitación Artística); o junto a José Luis Campal, del colectivo “Auxilios mutuos, S. L.”; o,
incluso, junto a su perro Pulgu, “Fundación Perruno-Situacionista Laszlo Kovacs”. Aparece
incluido en la antología editada por López Gradolí 2007: 39-44. Un buen ejemplo de su
producción es un ‘libro-objeto’, compuesto por cuarenta y cuatro hojas que se montan
formando cubos, los cuales forman una pirámide, y que carece de título, publicado por el
Ayuntamiento de Mérida (1990). Además, el autor aprovechó los recursos de Internet para
desarrollar y extender su obra, como podemos ver en los enlaces contenidos en el apartado
“Performances. Curriculum 2ª parte” en: <http://www.elvalledeturon.net/cultura/lite‑
ratura/nel-amaro-1> y también en: <http://boek861.blog.com.es/2011/04/04/fallece-nel‑
-amaro-poeta-experimental-10951347/> (consultas: 03 sept. 2014).
8
  Escribió varias obras que no fueron publicadas, como: 1.033 (1974); Antígona, en
capilla (1978, obra estrenada en Turón por el grupo “Primer Acto”); Glayíos nueos, vieya
murnia (1978, premio “Soto Torres”); Xénesis o Alborá de la concencia (1979); L’ únicu rebalbu
(1979); De sópitu... sonsones (1980); Sestaferia (1994, premio “Teatru Costumbrista”); etc.
Debemos citar también las obras infantiles estrenadas en Turón por la “Escuela de Teatro
infantil” García Lorca para los niños (1980), Siete vidas tiene un gato (1981) y Más moral
que Samaniego (1982). A día de hoy no hay ningún catálogo ni estudio que recoja toda la
producción literaria del autor, algo que hemos intentado hacer en estas pequeñas notas.

271
Ramiro González Delgado

solitario, siendo consciente de esta situación9. En este sentido, Nel Amaro


fue el renovador del teatro asturiano, pues introdujo de lleno las corrientes
innovadoras del siglo XX en un género todavía anclado en el costumbrismo
decimonónico. Así, este autor experimentalista y vanguardista, abandona
por completo la diglosia, presenta unas puestas en escena rompedoras y sus
temas están socialmente comprometidos. Especialmente significativo fue el
estreno en La Felguera, en 1979, de su obra Xénesis, o la alborá de la concien-
cia, a cargo del grupo Box, pieza no publicada pero que inaugura el nuevo
teatro asturiano10. Ya en fechas tardías, sólo publicó en lengua asturiana los
libros Antígona, por exemplu (Uviéu, 1991), de la que nos vamos a ocupar
aquí, y Les manes en caxón (tres pieces cortes y dos monólogos) (Uviéu, 2003)11;
en castellano, El banquete (El Entrego, 1996)12, aunque ya en los años seten‑
ta había publicado las piezas cortas Bloquea-dos y El niño y el ángel (Mieres,
1976) e Historia del niño que quiso ser poeta y terminó en libertino anarquista
(Bilbao, 1978)13. Su actividad teatral fue reconocida con los premios “Soto
Torres” (Langreo, 1979), “Conceyu d’Uviéu” (1980, ex-aequo con Julián
Burgos), Academia de la Llingua Asturiana (1991) y el del Certamen de
Teatro Costumbrista de Candás (1994). La innovación, el existencialismo y
la crítica político-social serán sus señas de identidad.

3. Origen y título de la obra

En un ensayo sobre el teatro en las letras asturianas, Nel Amaro re‑


pasa este género para reivindicarlo como instrumento de normalización
lingüística, ya que la búsqueda del éxito de público y taquilla del teatro
costumbrista de fines del siglo XIX y comienzos del XX introdujo el fenó‑
meno diglósico en el género con los graves prejuicios sociolingüísticos que

9
  Bolado García 2002: 702.
10
  Nel Amaro 1989: 26.
11
  Incluye las piezas cortas ¡Qué felicidá!, La píldora y L’angustia de Sixto P. y los
monólogos Ego (también publicado en el año 2000 en el número 14 de la revista valenciana
Art teatral) y Suicidiu a la carta.
12
  Esta obra, bajo el título Buffet-Tard, se estrenó, dirigida por el autor, en la Casa de
la Juventud de Turón el 12 de enero de 1978 a cargo del grupo “La Condena”.
13
  Las dos primeras se publicaron en Nueva Conciencia, revista del Instituto “Bernaldo
de Quirós”, en el número del año 1976; la tercera está incluida en una antología de teatro
breve: Jiménez Jiménez 1978.

272
La Antígona en lengua asturiana

en época del autor se percibían (el asturiano vinculado al mundo rural)14.


Esa reivindicación, que venía haciendo en sus montajes teatrales desde la
década de los setenta, cobra especial importancia en la que será su primera
pieza teatral publicada, Antígona, por exemplu. Con ella trata de dignificar
tanto la lengua como la literatura asturiana, introduciendo los personajes
trágicos de una literatura culta, modélica y universal, en una literatura pe‑
riférica, donde título, acotaciones y discurso de los personajes están escritos
en asturiano.
Sabemos que a finales de los años setenta había escrito y montado una
Antígona, en capilla que no llegó a publicar. Parece que al autor le gustaba
la historia mítica de la princesa tebana y la vuelve a recrear años más tarde
pues, por el título de la primera obra, no parece que ambas traten los mis‑
mos temas. Este gusto viene por una identificación personal con la heroína
pues, como Antígona, Nel Amaro también sufrió en sus carnes la represión
del poder. Hijo de militantes en el PCE, su hermana estuvo implicada en
un atentado en una cafetería de la calle Correo de Madrid, el 3 de octubre
de 1974, y toda la familia estuvo detenida por ese suceso. Fue además, en
varias ocasiones, preso político en los últimos años de la dictadura franquis‑
ta, de ahí que vayamos a ver conexiones entre la guerra fratricida del mito
(Antígona vinculada al bando perdedor, en el momento en que pone en
duda la legitimidad de la ley del tirano) y la guerra civil española.
Antígona, por exemplu fue galardonada con el premio que la Academia
de la Llingua Asturiana concede en su Concurso de Teatro, en la edición del
año 1991, publicándose la obra en la colección “Llibrería Académica”, con el
número 19. Ya la portada, con el título y el nombre del autor, avanzan el ca‑
rácter reivindicativo de la obra, pues los nombres propios aparecen escritos
en minúscula y se presenta la imagen de una mujer con pose sensual, como
si caminara por una pasarela de moda. Nada tiene que ver con la Antígona
de la Antigüedad.
El autor pone a Antígona como ejemplo, incitando de este modo a la
lectura de la obra para saber por qué es ejemplarizante una heroína moder‑
na. Es ejemplo… ¿de desobediencia civil? ¿de enfrentamiento al tirano? ¿de
lucha por un ideal? ¿de feminismo? ¿de mujer rebelde? ¿de piedad religiosa?
¿de respeto a los dioses? ¿de amor fraterno? ¿de moralidad y ética? ¿de de‑
fensa de las libertades? ¿de ruptura total? ¿de suicida? ¿de muerte trágica?
¿de castigo ejemplarizante?... Antígona puede ser ejemplo de muchas cosas y
aquí trataremos de descubrir por qué es ejemplar para Nel Amaro.

14
  Nel Amaro 1989.

273
Ramiro González Delgado

4. Estructura: análisis e interpretación

La obra aparece en un acto único, sin división en escenas15, y un epílogo.


Antígona es la protagonista que no abandona el escenario en toda la obra.
La presencia de dos personajes marca claramente dos partes en la obra, sepa‑
radas por un cuadro de transición en el que están los tres sobre las tablas16 .
En la primera, la tensión se establece entre Antígona (o la mujer) y Tiresias
(o el hombre clandestino), en tanto que la segunda estaría marcada por las
discusiones de la heroína con su tío Creonte. La acción se desarrolla en el
sótano oscuro de una imprenta, en una ciudad al atardecer.

a) Primera parte: Antígona y Tiresias


Una mujer y un hombre, sin saber que desde unas escaleras los vigila la
policía, terminan de empaquetar unos periódicos u octavillas con lo que
sería información subversiva. Este es el punto de arranque de la obra. Ya la
primera intervención del “home clandestín”, nos vincula ese ambiente mo‑
derno con la Antigüedad: “Dientru de pocos minutos, Tebas tendrá nes sos
manes la verdá” (p. 11). Poco a poco, vamos sabiendo que esos dos persona‑
jes no se conocen entre ellos, pero tienen en común que ambos luchan por
“la causa”. A pesar de que no se les permite identificarse, la mujer, nerviosa,
le echa en cara al hombre ser un “profesional” de la causa, un embaucador.
En sus palabras de réplica utiliza una comparación que recrea una escena
de tradición oral, a la vez que critica la modernidad que hace olvidar los
tiempos pasados (p. 13):

“Falaba comu los homes maduros, na casa, aconceyaos cabu’l llar,


rellatando hestories de socedíos na xornada llaboral, mentantu pren‑
den les pipes col arumosu tabacu danés, o holandés… Nesi momentu,
torné a la mio niñez, a les caricies paternes, pero non, vustedes enxa‑
más nun conocieron el fueu del llar, nin esi saborín a lleña quemao,

15
  La paginación sigue la única edición de la obra (Nel Amaro 1991). Por la presencia
de los personajes, se podría estructurar ese acto único en ocho escenas. La primera iría
desde el comienzo hasta la p. 19, justo cuando llegan los policías y habla el corifeo. La
tercera comenzaría en la p. 23, después de oscurecerse el escenario. La cuarta empezaría en
la p. 30, con la presencia de Creonte en las tablas y la quinta, en la p. 35, con la de Ismene.
Con la entrada en escena del mensajero, p. 37, da comienzo la sexta escena, que terminaría
cuando Creonte le manda que se vaya (p. 45). La octava y última escena, cuando el autor
indica “escuro”, abarcaría de la p. 48 hasta el epílogo (p. 51).
16
  Este cuadro se encontraría prácticamente en el centro de la obra (pp. 30-33).

274
La Antígona en lengua asturiana

nin l’arume del tabacu foriato amburando nes cazueles de les pipes de
bericiu o cerezal”.

Esta comparación acercaría la acción al mundo asturiano, al “llar” donde


se fraguaban todo tipo de historias. De esta manera, ya desde el comienzo,
el autor vincula la acción actual con la tradición asturiana y el imaginario
mítico griego, pues estamos en Tebas y, por el elenco de personajes, sabemos
que ese hombre y esa mujer son Antígona y Tiresias. Es más, ese hombre, al
que Antígona le pregunta si adivina el pasado o el porvenir17, le responde:
“Escoyí, nidiamente, el futuru” (p. 15). Los guiños con el mito griego se van
haciendo cada vez más patentes y pertinentes.
Por sus dotes intuitivas, pues afirma “nun soi un aldovín” (p. 16)18, el
hombre también le echa en cara a la mujer que, por sus manos, no sea de
la clase trabajadora19, centrándose luego el discurso de ambos en “la causa”.
Antígona la define claramente: “Cenciellamente lluchar. Contra la tiranía
d’Etéocles” (p. 16). Vemos que Nel Amaro ha querido innovar y retrotrae
la acción de la Antígona sofoclea al momento en que la ciudad es goberna‑
da por su hermano Eteocles y el ejército de argivos rodea las murallas de
la ciudad. Sabemos por el mito griego que Eteocles había pactado con su
hermano Polinices alternarse en el gobierno de la ciudad y, cuando llega
el momento de traspasar el poder, no quiso hacerlo, desterrando a su her‑
mano. Éste será acogido en la ciudad de Argos y organiza una expedición
para recuperar su trono. Sea cual sea el resultado de la guerra, en la obra
Antígona es consciente de la situación política, pues dice: “Mañana, si los
arxivos balten les puertes de Tebas, el tiranu camudará nel intre de nome”
(pp. 15-16).
Sin embargo, esa “causa” de la que el hombre y la mujer son simpatizan‑
tes es más compleja, pues no implica sólo la lucha contra la tiranía, sino la
lucha del pueblo trabajador contra la clase dominante y el establecimiento
de un nuevo sistema político y social; en resumen, la “causa” es la revolución
proletaria y clasista, promulgada por el marxismo, y tras los dos personajes
pueden estar representados líderes sindicales. A través de las palabras de
Antígona, vemos cómo el autor critica que, bajo el nombre de la causa, se

17
  Ya antes, en un guiño cómico, le había preguntado si era un actor frustrado (p. 14).
18
  Más adelante se contradirá y afirmará que es: “un aldovín, vieyu, cásique ciegu
dafechu” (p. 25) marcando así los rasgos más pertinentes del personaje mítico.
19
  Ya antes le había preguntado: “Tendrá un nome, una familia, esi padre del que me
faló. Un noviu, lluchador pola ‘causa’, un trabayu” (p. 13).

275
Ramiro González Delgado

pierda de vista la realidad 20, cuando la verdadera causa son los trabajadores,
“los descamisaos”. Este término nos transporta a Iberoamérica, en concreto
a la Argentina, pues, de raíces anarquistas21, fue utilizado principalmente
por el peronismo para referirse a los trabajadores (y también a los simpa‑
tizantes del partido). Aunque en asturiano este término es despectivo, en
la obra tiene una significación marxista, vinculado en cierta manera a los
sans-culottes de la Revolución Francesa.
Y de la “causa” se pasa a la “medrana”, al miedo que se siente por es‑
tar involucrados en dichos actos y que el hombre define como “debilidá
humana” y la mujer como “la muerte de la vida” (p. 18). Justo antes de
irrumpir la policía, el hombre señala que más que miedo, la “causa” produce
frustración. Vemos así en este primer diálogo cómo el autor, a través de las
certeras afirmaciones de los personajes, realiza una reflexión y una crítica
político-social con la perspectiva que le da el paso del tiempo. En esta pri‑
mera escena, bajo el ropaje de la tiranía tebana, se abordan también diversos
aspectos de la guerra civil española y la dictadura, cuando, a propósito del
derrotismo, señala: “Nun se fala d’aquello precisamente de lo que se quier
falar, por necesidá” (p. 12), crítica en la que vuelve a incidir más adelante:
“Los descamisaos, los sos fíos, falen menos. O nun falen. O falen en tiempu
presente” (p. 15); o de los bandos: “Nun tamos d’esti llau por mor de la ca‑
sualidá. Tase d’un llau o d’otru por cuenta delles razones. Vieyes, poderoses.
(Silenciu)” (p. 14); o de la situación del país: “En Tebas vivíase, polo menos,
creyíamos tar viviendo” (p. 14).
Por el elenco de personajes, parece que se oponen personajes mítico‑
-literarios a personajes actuales. Al menos así sucede con los principales:
Tiresias es también el “home clandestín” y Antígona la “muyer”; los tres
policías que irrumpen en escena son el coro y el corifeo, dando la sensa‑
ción de que los presenta en escena el hombre, cuando dice: “Les come‑
dies (sic) d’Esquilo, les traxedies de Sófocles, el drama del nihilismu, nún
Ionescu” (p. 19)22 . Este coro cumple una de las funciones que tenía en la

20
  Dice Antígona: “Falámos-yos de la «causa» de tal mou, tan enguedeyáu, que
lleguen a perder de vista la realidá. Ellos son la «causa»” (p. 16).
21
  El Descamisado fue el primer periódico anarquista argentino, que ve la luz en
Buenos Aires en enero de 1879. También en España, en los últimos años de la dictadura, en
concreto en 1973, se publicó Los Descamisados, aunque se cree que estaba financiado por el
gobierno para desacreditar a los miembros de la Primera Internacional (Íñiguez 2001: 181).
22
  El discurso continúa: “Frustraos, pue… ¿Medrana…?”. Frustración, como hemos
visto, tanto de los implicados en la causa como no sólo de los héroes y heroínas trágicos
griegos, sino también de los nihilistas o del teatro del absurdo.

276
La Antígona en lengua asturiana

Antigüedad: presentar el contexto y resumir las situaciones para que el


público pueda seguir la obra. Es el público el que, a partir de este momen‑
to, conoce la identidad de la mujer, Antígona, y, por ello, el autor se ve
obligado a realizar un resumen del mito (pp. 19-21). Se alude a la maldici‑
ón de Apolo, aunque la causa no fue por estar “enfadáu pola conducta de
Layo al enxendrar un fíu”, sino que fue lanzada por Pélope cuando Layo
raptó y violó a su hijo Crisipo, y que consistía en que su estirpe se exter‑
minaría a sí misma. Antígona es nieta de Layo e hija y hermana de Edipo.
También se alude a la maldición de Edipo, que afecta a sus hijos varones
(morir ambos, uno a manos del otro) e indirectamente a Antígona, y se
informa de la cronología mítica, pues sitúan la acción justo al final del
episodio de los siete contra Tebas, cuando los dos hermanos se baten en
duelo singular. Una vez que facilitan toda esta información 23, coro y cori‑
feo se transforman en policías y se continúa con la trama, sorprendiendo
la policía al hombre y a la mujer clandestinos en el sótano de la imprenta
y deteniéndolos. El policía les revela la identidad de cada uno, la princesa
Antígona, hermana de Eteocles, que fue quien dio la orden de la redada,
y Tiresias, el “conspirador palaciegu”24 . En las palabras del policía se opo‑
ne la “llei de los reis” frente a la “llei divina”; si en la tragedia griega la
oposición radicaba en el enterramiento del cadáver de Polinices, el tirano
Creonte lo prohibía frente a las leyes no escritas de dar sepultura a los
muertos, en la tragedia asturiana, “la llei de los reis foi dictada y escrita pa
ser cumplida por ellos mesmos, los sos familiares y descendencia” (p. 21).
Antígona, como miembro real, tendrá un fin diferente al de Tiresias, pues
la ley divina “nos fai a toos iguales delantre los Dioses” (p. 22). La suerte
no será idéntica para ambos, pues el hombre será fusilado al amanecer.
Por otro lado, Antígona se siente traicionada al conocer la identidad de
Tiresias, ya que lo ve como un cómplice silencioso de la tiranía 25, un polí‑

23
  No compartimos las transcripciones que el autor hace de los nombres griegos.
Frente a “Etéocles”, cita a “Polínice” y “Edipo”, y llama a la mujer de Creonte “Eurídices”.
El padre de Layo es “Labdaco”, del linaje de “Cadmos” y la ciudad donde transcurre la
acción es “Tebas”; tampoco estamos de acuerdo, en este contexto griego, con la utilización
de los teónimos latinos “Vulcano” y “Diana”.
24
  En Edipo Rey, 532-542, éste acusaba a Creonte de ponerse de acuerdo con Tiresias
para acusarle del crimen de Layo y desplazarle en el trono.
25
  El propio Tiresias afirma: “Cientos y cientos de veces acompangué al tiranu, fuera
ésti Polínice, Etéocles o, entovía viviendo to pá, baxé per eses escaleres, güeyé’l cuerpu,
los cuerpos fechos llamentu, llárimes y glayíos, súpliques que naide oyía. Pidimientos
llastimeros, a los que nengún de nós prestábemos nenguna atención. Un desconocíu

277
Ramiro González Delgado

tico que se sacrifica para mayor gloria del tirano, aunque ella conserva la
esperanza de que la “causa” siga viva en la calle. Tiresias le manifiesta su
odio y le cuenta un sueño en el que el tirano era un monstruo con cuatro
cabezas, tres de machos cabríos y una cuarta, que terminaba devorando
las otras tres. Sin embargo, comparten la misma “causa” y Tiresias augura
el día en el que las manos de los descamisados se unan para ahogar al
tirano.
No queremos terminar esta primera parte sin señalar que en ella tiene
importancia la iluminación y el contraste de claroscuros. Así, el sótano es
oscuro y Antígona y Tiresias visten ropa negra, en contraste con las ropas
claras de los policías.

b) Segunda parte: Antígona y Creonte


Cuando Creonte entra en escena (p. 30), comunica la salvación de
Tebas. Se vuelve a producir un cambio en los personajes, pues Creonte hará
de corifeo al frente del coro de policías. Este cambio de corifeo es un recurso
innovador y que llama la atención. Ya antes, cuando aparece la policía en
escena, el corifeo es claramente representado por el “Policía 3”, papel asu‑
mido luego por el “Policía 1”. Este nuevo corifeo cuenta la historia mítica e
informa de la situación actual: se describe la guerra y queda patente el dolor
de la victoria (a pesar de los miles de muertos, como dirá Antígona, se habla
de salvación, p. 31). Esta descripción de la guerra tebana creemos que es un
guiño a la guerra civil española (p. 31):

“[…] Y maldicen les muyeres, novies, hermanes y madres los nomes


de tolos xefes militares, de tolos políticos. (Pausa llarga). Los ríos re‑
cueyen nos sos calces la munchísima sangre que, esbordada, éntrase
peles chaboles de los miserables que vieron enantes quita-yos pola
fuercia, y pola mor de la impiedá de les lleis, a los sos seres más queríos.
Xinten les utres la humanidá de les víctimes, ensin el consuelu d’unes
cencielles honres fúnebres…”.

Antígona y Tiresias recriminan a un Creonte que, como en la obra grie‑


ga, se refugia “na soledá de la Maxistratura” (p. 32). Pero al autor le interesa

malváu recibía’l so castigu. Infractor de cualisquier llei, recibía como un perru los palos
del so amu” (p. 24). En Antígona de Sófocles, Tiresias ejerce de consejero de Creonte que,
cuando le informa de las desgracias que le acarreará su autoritarismo, toma consciencia de
sus actos, aunque sea tarde.

278
La Antígona en lengua asturiana

contar lo que viene después de la guerra, en clara alusión a la difícil situa‑


ción de la posguerra española. Será por boca del adivino Tiresias (p. 32):

“Tres los ximíos de los qu’amorrienten y familiares, uparánse miraes


d’esos derrotaos, miraes de noxu asgaya, ermos y chamuscaos, muertos
de fame tarrecen la to tiranía. (Pausa llarga). ¡Sal del to palacio-forta‑
leza! Sal agora y verás tolos campos enllamazaos de sangre, faciendo la
so protesta muda, ensin dar collecha, ensin dar una espiga tansiquiera.
(Pausa curtia). ¡Ai del gobernante torpe qu’escaez la necesidá del so
pueblu y nun apurre cachos de pan a los sos súbditos, ai…!”.

El nuevo tirano26 , surgido tras la guerra, es consciente de la destrucción


sufrida y de la dificultad de legislar la paz, para unir a todos los ciudada‑
nos y prosperar en común sin rupturas políticas. Pero tras este discurso de
Creonte, su primera decisión es condenar a muerte a Tiresias, que es sacado
de escena entre dos guardias.
Antígona quiere el mismo fin que su camarada, pero Creonte le dice que
le reserva un final más poético. Está apelando a lo que el autor llamó “llei de
los reis” y le ofrece la vida. Vemos, por tanto, que el autor crea esta nueva ley
para referirse a los políticos que legislan en su propio beneficio. Antígona
tiene aquí una vocación de mártir27, como por ejemplo sus antepasadas re‑
creadas por Marguerite Yourcenar o María Zambrano. El indulto que en la
obra asturiana le concede Creonte es por ser, a fin de cuentas y desde una
perspectiva actual, la legítima soberana de Tebas.
Aparece en escena Ismene que, al igual que en la obra griega, se opone
a las acciones de su hermana, aunque éstas sean diferentes. Si la Ismene
sofoclea, a pesar de no desobedecer la ley, quiere compartir el destino
sororal (algo que Antígona evita), en la obra asturiana se opone la forma
de pensar de ambas, pues Ismene le propone que acepte la amnistía de
Creonte. Es ella la que le informa de que sus dos hermanos están muer‑
tos ante las puertas de la ciudad y le ruega que no provoque otra muerte
en vano en el seno familiar. Las reflexiones que el autor se hace en este
diálogo entre las dos hermanas son también transferibles a un contexto
contemporáneo. Bajo las palabras de Antígona, critica la desigualdad del
trato recibido a los partidarios de cada bando: “¿Por qué esti castigu a los

26
  En Sófocles, tras el tirano Creonte estaría Pericles (Pino Campos 2010); en Nel
Amaro, Franco.
27
  Antígona: “El mio coral nun clamia polos beneficios de la (sic) amnistía” (p. 34).

279
Ramiro González Delgado

cayíos? […] ¿Visti a los homes lluchando, morriendo, saqueando, ¡impíos


toos! (Transición). Los d’un bandu y los del otru” (pp. 35-36). También,
por boca de Ismene, a los que se acogen a la amnistía del tirano: “El ye
quien te brinda l’olvidu, el perdón a la to rebeldía” (p. 36). Para Antígona
esto sería traicionarse a sí misma, pues si se olvida su rebeldía, se olvida, a
fin de cuentas, de ella misma.
Será un mensajero quien comunica a las dos hermanas que el nuevo rey,
Creonte, decreta los funerales en honor de Eteocles, por defender la ciudad,
pero prohíbe los de Polinices, por traidor28. Esta escena tiene su interés por‑
que, a pesar de que Creonte está presente, será el mensajero quien hable por él,
especialmente cuando Antígona le acusa de urdir una trama para hacerse con
el poder y animar a Polinices a luchar contra su hermano. Pero, sobre todo, la
tensión se establece cuando Antígona le recrimina la prohibición de las honras
fúnebres: “¡Gobiernes pola fuercia, non coles razones!” (p. 39). El tirano se
justifica diciendo que servirá de ejemplo de escarmiento para los que piensen
en la traición y Antígona no se perdona no haber parado a tiempo la absurda
lucha. El autor ofrece la imagen de un Creonte cínico, frío y calculador (llega
a afirmar: “Tengo ataos tolos filos”, p. 40) que intenta “sobornar” a su sobrina
diciéndole que el mundo no es civilizado y libre, que siempre habrá alguien
que ejerza la función de un tirano que lleve a la plebe por donde se quiera,
enfrentando lo bueno a lo malo. Incluso le pone un ejemplo y a Antígona, por
ejemplo: si rinde honores al defensor de la ciudad, de la libertad, y desprecia
al que se levantó contra ella, ¿en qué bando estaba Antígona y en qué bando
está ahora? La respuesta de Antígona será que ella siempre estuvo y estará con
el pueblo que trabaja la tierra y el mar pacíficamente (pp. 40-41):

“Del llau de los que nun queremos ver morrer los campos por falta de
brazos y manes fuertes. (Pausa). Del llau de los que quieren salir al
amanecerín a la gueta de comida fresco a la mar. (Pausa). Al llau de
les femes y los homes que quieren criar a los sos fíos sanos, en cuenta
da-y la teta a sierpes velenoses. (Pausa). Toi del llau d’aquellos que te
tarrecen, colos que vos aborrecen dafechu, a vosotros y tol vuestru
cainismu, los vuestros mensaxes, edictos, bandos, pedricañaces y re‑
bilicoque cortesanu. (Pausa). Toi colos que nagüen por que los campos
d’entrenu militar de los marines yanquis seyan otra vegada olivares,
viñes. (Pausa). Toi colos que quixeran enfilase nes fiestes col mostu

28
  La Antígona sofoclea comienza precisamente con Antígona informando a su
hermana de la decisión de Creonte.

280
La Antígona en lengua asturiana

d’estes eríes y non cola sangre que camienten puea ser, ensin previu
avisu, la d’ellos… un día cualisquiera…”.

La única referencia concreta y del mundo actual obedece al estable‑


cimiento de las bases militares estadounidenses en suelo español; no sólo
muestra una actitud pacifista, sino también un deseo de vuelta a la natura‑
leza, a la Arcadia.
Creonte, que pensaba que Antígona quería hacerse con el poder29, y parece
que conocía la profecía/sueño de Tiresias, interpretando que su sobrina sería
la tercera cabeza30, la quiere condenar de por vida, pues sabe que si la mata,
se volvería impopular. Además, manteniéndola viva le será más útil para “su”
causa y se lo explica claramente: “A ti necesítote porque yes de la castra de los
llamaos a mandar. Los que nacen, estudien, son forzaos, pa llevar el timón
de la nave” (p. 43)31. Creonte le exige a Antígona que se olvide de todo y
ponga paz tanto en su propia familia, evitando que haya más muertes, como
en Tebas, pues el pueblo la aclama y grita: “¡Viva Antígona! ¡Muera’l tiranu
Creonte! ¡Viva la llibertá! ¡Abaxu la dictadura! ¡Antígona cola llibertá y el pue‑
blu con ella!” (p. 44). Vemos así que Antígona se identifica con la libertad y
el pueblo, frente a un Creonte que representa la tiranía y la dictadura. Ismene
trata también de convencerla, defendiendo, como en la obra griega, la “causa”
de Creonte. Por último, aparecen en escena Eurídice y Hemón, esposa e hijo
del nuevo tirano. Hemón es el heredero del trono tebano, reforzado gracias
a los esponsales con su prima. A pesar de que en la obra es retratado como
un joven dependiente de su madre, por el amor que siente hacia Antígona,
les reprocha que no la traten con más respeto, sin conseguir, al final, lograr
entenderla, pues la joven quiere morir y el castigo de su futuro esposo será
tratarla con indiferencia. En las siguientes palabras de Eurídice se percibe bien
la soledad de Antígona: “Paeces la pieza sacrificada de la cacería. Y namás yes
una torre derrotada” (p. 48). Sin embargo, orgullosa, Antígona dice que el

29
  Dice Creonte: “¿Vas faceme creyer que tú, igual qu’Etéocles y Polínice, nun teníes
los tos güeyos llantaos sol tronu tebanu?” (p. 41).
30
  Tiresias interpretaba que Antígona era la cuarta cabeza (“La cuarta finaba xintando
a les tres…”, p. 28), siendo las anteriores Edipo, Eteocles y Polinices; sin embargo, para
Creonte es la tercera (“¡yes la tercera tiesta d’esa fiera!”, p. 41), interpretando que la cuarta
sería él, que devoraba a los tres hermanos.
31
  El autor introduce aquí una metáfora que hunde sus raíces en la lírica griega
arcaica, en la poesía alcaica, por ejemplo: la nave como representación del Estado (cf. Alceo
46 y 119 Diehl). Aquí, despectivamente, dice Creonte de Tiresias, el consejero privado que
le traicionó: “¡Esi vieyu yera un remeru!” (p. 43).

281
Ramiro González Delgado

enemigo es el recuerdo, a lo que responde Eurídice: “Yes el to propiu enemigu


fabricando alcordances. (Transición). ¡Fuxe d’él! (Pausa). Fuxe… de… tí (sic)
mesma, Antígona” (p. 50).

c) El epílogo
El final de la obra asturiana no es tan trágico como el de la obra griega,
con las muertes de Antígona, Hemón y Eurídice provocadas por la sinrazón
del tirano. El sótano donde transcurre la pieza sería un equivalente a esa cueva
bajo tierra donde es condenada y muere la heroína sofoclea. Por otro lado,
en la obra asturiana Antígona será tratada con indiferencia y se convertirá
en una muerta en vida, obligada por esa “ley de reyes” a estar con el poder.
Como los descamisados que mencionaba al comienzo de la obra, no hablará
y, al igual que la soledad del tirano, se sentirá sola y desamparada, fabricando
unos recuerdos de los que tendrá que huir si no quiere volverse loca. Antígona
termina estando encerrada en sí misma, ahogándose en sí misma, al igual que
la “causa” por la que luchaba. Esta es otra crítica más que el autor, militante
de dicha causa durante toda su vida, nos está ofreciendo. Un tirano cae, pero
se vuelve a instalar otro en el poder. Es como la historia, que siempre se repite.
Por eso, Nel Amaro concluye la obra con un breve epílogo, con el mismo
decorado de la obra y con un hombre y una mujer empaquetando octavillas,
luchando por la causa y siendo interrumpidos por la policía que llega a dete‑
nerlos. Comienzan precisamente hablando de la tragedia anterior: “Aquella
hestoria…nun debió finar asina” (p. 51). Si se hubiera respetado la ley divina
de que todos los hombres son iguales, Antígona debería haber muerto. La
heroína asturiana no tiene el suficiente coraje para tomar la decisión por la
que optó la griega: el suicidio. Así, el pueblo tiene de ella visiones dispares:
para la mujer, Antígona no aguantó y abandonó la causa, vendiendo a los
descamisados; para el hombre, Antígona estaba por encima de la causa e hizo
todo lo que pudo, pero los descamisados no debieron dejar la causa en manos
de personas ajenas a su clase (p. 52):

“El poder… (Pausa y transición) fízose dueñu de la protesta, moldi‑


ándola al so petite, ensin munches torgues. Antígona, cuandu vieno
la hora mala allugóse onde siempres tuviera allugada, nel sitiu que-y
pertenecía y qu’enxamás nun abandonara braeramente. (Pausa). Colos
de la so clas, en realidá. […] Namás hai un camudamientu de perso‑
nes, de nomes… Tolo demás sigue ehí, igual que siempres. La llucha
nun finó pa nós, collacia”.

282
La Antígona en lengua asturiana

Ciertamente, el pueblo cree lo que dicta el poder y la lucha social sigue


presente, con pocos cambios, desde la Antigüedad hasta hoy día. Esta es
otra reflexión y crítica que el autor muestra sobre la escena. Por eso recurre
al mito griego, porque los problemas son fruto de la humanidad y de la
naturaleza del hombre y, por ende, eternos. También recurre a las tragedias
griegas, en concreto a la Antígona de Sófocles, poniendo sobre las tablas a
todos sus personajes e introduciendo referencias metaliterarias, como cuan‑
do Antígona compara la pieza asturiana con su homóloga griega (p. 42):
“Finemos nel intre con esta tocha rocada, con toa esta falancia, camín de
camudase nuna triste asonsaña de les traxedies griegues”; o cuando Hemón
entra en escena y afirma: “Pue golese la traxedia, porque se fai tolo posible
pa qu’asina seya” (p. 48). Con estas palabras, Nel Amaro es consciente de
las modificaciones introducidas en su recreación según la tradición mítica
y literaria griegas, pero no quiere que su obra se tome como una reescritura
irónica o burlesca de la historia clásica; más bien, todo lo contrario: una
recreación que pretende ser lo más trágica posible.

5. Conclusiones

Tras el análisis de la obra, deteniéndonos en el título, la estructura, sus


personajes, las acotaciones de tiempo y espacio, las acciones y sus significa‑
dos, hemos visto cómo el autor, en un cuadro de dureza y actualidad, va en‑
tretejiendo los personajes del mito griego, la tragedia sofoclea, la guerra civil
española, la dictadura, la lucha de clases y la revolución social, el ansia por el
poder, los ciclos repetitivos de la historia… a la vez que trata de reflexionar
sobre todos ellos. También, como en otras obras suyas, Novela ensin títulu,
por ejemplo, el autor quiere plasmar la conciencia social ante la desigualdad
de los seres humanos. Según Mariño Dávila en esta novela:

“Esiste una crítica tremenda a la ideoloxía barnizada de los xóvenes


“progres”, na procura d’una aventura de mocedá pa recordar ente
los algodones d’una sólida posición na madurez y que nun ye, poro,
otra cosa que puru fumu, el xuegu burgués d’unos “páxaros de pasu”
universitarios. L’apostoláu cívicu resulta simple pallabrería y la visión
de los miserables, truculenta”32.

32
  Mariño Dávila 2003: 88.

283
Ramiro González Delgado

Aunque el enfoque es diferente33, la crítica sigue estando presente.


Antígona representa una joven “progre” que, desde una buena posición
social, se enfrenta al poder establecido, pero no sufre las consecuencias,
como los demás. A diferencia de la tragedia griega (Polinices al final recibe
sepultura), no se cumple en la obra asturiana la ley divina de que todos los
hombres son iguales. Antígona queda así como ejemplo de corrupción po‑
lítica, de las leyes que dictan los gobernantes para beneficio de sí mismos y
los de su clase.
Si en la obra clásica Antígona muere enterrada en vida, en la versión
asturiana este fin es metafórico, ya que debe aceptar con resignación su po‑
sición, su matrimonio y al tirano que se asienta en el poder: es una muerta
en vida, con sus viejos ideales muertos. Ella luchó por una causa justa que
la termina abandonando, una causa que se repite desde el comienzo de los
tiempos y que no parece tener solución. La profecía de Tiresias, todavía
está sin cumplir: “Munches [manes] faen falta agora pa, xuníes toes, facer
un círculu alredor del Tiranu y afogalu […] el día nel que los Aldovinos
nun seyamos necesarios yá” (p. 29). Aquí, Antígona es ejemplo de causas
perdidas.

33
  Con respecto al mundo clásico, también la mitología está presente en Novela ensin
títulu, pues paganismo y cristianismo se mezclan a través de los mitos griegos (las Musas,
Prometeo).

284
Antígona otra vez... aproximación a la
escena francesa contemporánea
(Antigone again... approach of the french contemporary stage)

Stéphanie Urdician (Stephanie.URDICIAN@univ-bpclermont.fr)


Université Blaise Pascal, Clermont-Ferrand, CELIS

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_15

285
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

« Brave petite Antigone, solide, souple, inusable,


elle résiste décidément à tous les mauvais traitements », Claude Sarraute1

Resumen – El artículo propone exponer las modalidades de reapropiación de


Antígona en la escena francesa actual. La selección de cuatro obras recalca su
papel de mediadora dentro de proyectos interculturales. Símbolo de lo fronterizo,
Antígona orquesta el encuentro entre diferentes culturas, edades y registros para
promover diálogos intergeneracionales donde se gestan búsquedas identitarias y
construcciones sociales.
Palabras claves: Antígonas francesas, escena actual, interculturalidad, coales‑
cencia, metateatro.

Abstract – The article proposes to expose the forms of appropriation of Antigone


on the current French stage. The selection of four plays emphasizes her role as a
mediator in intercultural projects. Symbol of the border, Antigone orchestrates
the encounter between different cultures, ages and registers to promote intergen‑
erational dialogues where search for identity and social constructions are arising.
Keywords: French Antigone, current scene, multiculturalism, coalescence,
metatheatre.

A modo de breve exégesis de este epígrafe, recordaré que Antígona atra‑


viesa los siglos, las fronteras, los ámbitos para participar incesantemente de
los debates públicos – de los más nobles a los más corrientes. En el ágora
contemporánea, Antígona resucita para apoyar la lucha de las Madres y
Abuelas de Plaza de Mayo, alias  « las Antígonas contemporáneas » o para
fomentar el programa « Antigones africaines : La loi et le lien » que pro‑
mueve la participación política de las jóvenes de África del oeste francófona
(Dakar, 2013). Pero también la recuperan movimientos identitarios en la
Francia del siglo XXI donde Antígona llega a alimentar estrategias de ma‑
rketing político. Con lo cual repetimos con Claude Sarraute que Antígona
sí que resiste a todos los (malos) tratos.
Quisiera inscribir este trabajo en los pasos de una primera incursión en
las representaciones de la hija de Edipo en el siglo XX con Les Antigones
contemporaines (de 1945 à nos jours)2 que coordinamos con Rose Duroux,
en el cual proponíamos un especial enfoque en el área ibérica 3 silenciada por

1
  Le Monde, 28 juin 1965 citado por Fraisse 1974: 163.
2
  Duroux, Urdician 2010.
3
  Con una sección dedicada a Perdição, traducida al francés, de Helia Correia (Du‑
roux-Urdician 2010).

287
Stéphanie Urdician

George Steiner en su famoso ensayo (Antigones, 1984). Recordar también


que simultáneamente, del otro lado del Atlántico, Rómulo Pianacci reali‑
zaba un estudio detallado de las Antígonas latinoamericanas4 que Steiner
tampoco menciona. Desde aquel entonces, me fue imposible alejarme
de la figura de Antígona que no deja de renacer hasta en los lugares más
inesperados.
Desde su origen, a saber el hipotexto sofócleo, la reescritura de Antígona
explora diversos procesos de transformación: la cristianización (cuando la
heroína tebana es avatar de la Virgen o de Cristo en Leopoldo Marechal
o José Bergamín, o de ambos en Kierkegaard5); la historicización, estra‑
tegia que domina las adaptaciones del siglo XX a raíz de los cataclismos
que representaron las guerras mundiales y civiles así como la serie de pro‑
nunciamientos en Hispanoamérica; la desmitificación en versiones paró‑
dicas (Antígona cerda de Luis Riaza, La serata a Colono de Elsa Morante,
subtitulada « Parodia »). El examen de las artes escénicas bien plasma los
mecanismos de flexibilidad y coalescencia del mito para recalcar las moda‑
lidades de la resurgencia de la figura mítica, entre invariantes y especifi‑
cidades según el contexto de recepción. El diálogo permanente que enta‑
blan los avatares dramáticos y escénicos con la Antígona que acompaña a
la humanidad desde hace 2500 años induce a rastrear, otra vez, las nuevas
formas, el sentido de los hipertextos y los ecos creados en el « espectalec‑
tor » contemporáneo por esta « eterna seducción de la hija de Edipo ».
En esta contribución, propongo un nuevo intento de actualización de
la extraordinaria vigencia de la figura de Antígona en la escena francesa
contemporánea a partir de una serie de obras estrenadas entre 2009 y 2013.
En las carteleras francesas, no pasa una temporada sin que se estrenen nue‑
vas Antígonas tanto en los teatros públicos como privados, tanto en el ámbito
profesional como en el amateur. La de Anouilh es la que ocupa un lugar pre‑
ferente en las taquillas. Después vienen las de Brecht y Bauchau (Antigone,
Le journal d’Antigone). Varias composiciones dan cuenta del palimpsesto que
constituye esta larga historia de reescrituras al proponer complejos ovillos
trágicos que parten de un hipotexto tan movedizo como múltiple.
La selección que sigue hace hincapié en tres ejes principales. Por una
parte, son obras que fomentan proyectos sociales e interculturales (dos
proyectos de cooperación con el Burkina Faso donde Antígona relee la his‑
toria de la colonización de África del Oeste y del apartheid en África del

4
  Pianacci 2008.
5
  S. Kierkegaard, Antígona (1942), trad. esp. de Juan Gil Albert.

288
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

Sur entablando un diálogo intercultural entre Francia y África, Francia y


la India. Por su inscripción topográfica intermediaria: « enterrada viva »,
Antígona simboliza lo fronterizo, lo híbrido y encarna la figura de la me‑
diadora (reconciliadora, fiel a la herencia zambraniana). Por otra, mez‑
clan los tonos y registros: lo culto (fiel al hipotexto griego) y lo popular
(adaptación a contextos urbanos actuales), lo serio y lo cómico dialogan
en la circulación de una figura que se dirige a todos, a un receptor amplio
–« grand public ». Además domina la dimensión metateatral en la historia
de las reescrituras de Antígona como un rasgo constante en la recepción
contemporánea de los clásicos. En términos de Denis Guénoun, « on ne va
voir la chose qu’on connaît que pour jouir du comment de sa représentation
nouvelle – de sa différence. En cela, les classiques permettent d’exercer un
regard proprement théâtral, de regarder exactement cela qu’est le théâtre, la
conduite de la monstration sur la scène »6 . Búsquedas identitarias, transmi‑
sión intergeneracional e intercultural, construcciones sociales van a guiar
nuestros pasos a través de estas creaciones para evidenciar el papel clave de
Antígona. Es la unidad, el zócalo que no se escinde en el ciclo de adapta‑
ciones sino que sigue siendo «  no vive, no muere sino que es », como bien
lo resume el director africano Sotigui Kouyaté, «  Il n’y a pas d’Antigone
africaine, japonaise, française ou grecque : il y a Antigone ».

Variations Antigone (2009), texto de Eugène Durif, puesta en escena7


de Philippe Flahaut, Compañía Création Ephémère

Eugène Durif, poeta y dramaturgo francés contemporáneo, adepto de


las figuras míticas (Fedra, Electra, Medea...), compone Variations Antigone,
largo poema en el que Antígona relata su vida otra vez para deshacerse del
peso que la agobia desde su nacimiento en un movimiento parecido al de la
Antígona de María Zambrano que convoca las sombras de su tragedia para
emanciparse y acceder a la claridad de la conciencia:

Sur le chemin de sa mort,
et avec elle, dans sa voix,


moi Antigone,

6
  Guénoun 1997: 155.
7
  Extracto de la puesta: http://www.youtube.com/watch?v=1egtqeAfuYA. Estreno el
5/11/2009 en la Maison du Peuple, Millau.

289
Stéphanie Urdician

elle Antigone
nous, parlant par sa bouche,
tous les personnages de cet‑


te histoire,
tous les protagonistes condamnés
à revivre dans le moment
du théâtre
cette histoire, encore une fois.

El autor escribe este texto pedido por el director P. Flahaut para quien es‑
cribió la historia de Edipo, « L’enfant sans nom » (2007), libremente inspirado
en Edipo Rey de Sófocles. Con esta colaboración, el director concreta su anhe‑
lo de expresar la fuerza y la presencia de las figuras arcáicas en lo cotidiano:

les mots anciens broyés dans notre langue, voilà ce qui me touche,
comment font écho pour moi les images et les figures archaïques,
comment elles sont présentes aujourd’hui pour moi, comment elles
s’inscrivent dans le quotidien, dans ce bouleversement de la langue et
du monde qui nous trament et nous constituent. 

Philippe Flahaut trabaja con un elenco « diferente » cuya participación


activa el motivo constitutivo de Antígona como figura « anómala », monstru‑
osa desde su filiación, hija y hermana de su padre. Los catorce actores « dife‑
rentes » de la compañía, con handicap mental, se apropian de la historia de
los Labdácidas con la cual llegan a identificarse al ser víctimas de un común
rechazo ajeno. Su reivindicación en una sociedad poco amena se asimila a la
rebelión de Antígona, a favor de la dignidad humana, el derecho a la diferen‑
cia, la desobediencia, la confrontación. Se entremezclan pues poesía e integra‑
ción social en un proyecto que acepta el desafío de contar una historia bien
conocida. Sin embargo, para Eugène Durif « cette contrainte d’une histoire
bien connue à raconter encore une fois donnait une plus grande liberté ». Este
desafío se traduce en un lenguaje elíptico, en un texto que es puro soplo poéti‑
co, un flujo ininterrumpido que repite la historia tantas veces contada hasta el
desenlace inexorable. Este retorno al origen de la tragedia va acompañado de
un retorno a la infancia cuyos recuerdos no dejan de resonar en los personajes
desde el subtítulo « Comme enfant on joue à mourir ». Es interesante la mise
en abîme del motivo de la locura utilizado por Creonte en el conflicto trágico
para extraer a Antígona del ámbito de la razón (política, de Estado). Remite
a la estrategia de relegar a la mujer más allá de la esfera que le corresponde
tradicionalmente, encerrándola en un espacio aun más circunscrito que le
arrebata la posibilidad de una voz pública. Le importa al director acentuar el
compromiso social del teatro: estética y dramatúrgicamente subraya el aporte
específico de los comediantes, los movimientos corporales diferentes que jue‑
gan con códigos diferentes en una comunicación auténtica (más inmediata

290
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

con el público y los demás actores « normales »). El trabajo del director francés
consiste en indagar en esta relación entre razón y locura a partir de una con‑
frontación de sensibilidades, destrezas y diferencias para cuestionar la norma
cualquiera que sea. Esa es la función de Antígona y de su innumerable prole:
fomentar la reflexión frente a la ley dictada por los hombres (mejor dicho el
poder, estos es un puñado de hombres), frente al conjunto de leyes y normas
(injustas o inhumanas) que excluyen en vez de (re)unir en torno a un proyecto
común: el rescate de la humanidad. Artísticamente, el director defiende la
diferencia (motor y método de su creación) en el escenario donde se alcanza
la emancipación, negada en la vida cotidiana, en sociedades que imponen su
dosis de « normalidad ».
Philippe Flahaut convirtió el poema de Eugène Durif en espectáculo
escandido y gótico, en particular en el vestuario, el maquillaje y los movi‑
mientos mecánicos de los soldados zombis. Largos silencios alternan con
la palabra, el canto y la música. La escenografia reelabora los contrastes
lumínicos que remiten a la dicotomía primigenia entre luz y sombra para
representar el conflicto entre Antígona y Creonte: la iluminación crea los
espacios dividos entre un proscenio donde un sacerdote, a modo de prólogo,
resume la fábula. En el escenario, el piano acompaña a la actriz-cantante
que hace de corifeo en sus modulaciones verbales y paraverbales: de la pala‑
bra al llanto pasando por suspiros y gemidos. Pero el elemento central del
decorado son dos estelas funerarias en torno a las que los fantasmas de los
hermanos muertos regresan para interpretar otra vez la lucha fratricida, de
fuerte impacto plástico: una lucha-danza de cuerpos, vigilados por el grupo
de soldados parecidos a autómatas zombis, que se pierden en un abrazo le‑
tal. En la larga mesa que ocupa la parte derecha de la escena, tiene lugar una
comida oficial encabezada por Creonte. A pesar de la separación visible de
Antígona e Ismene (ésta baja la cabeza en una actitud de sumisión mientras
que aquella mantiene la cabeza alta, signo de su resistencia), las dos herma‑
nas recuerdan la relación que María Zambrano pone de realce a saber una
complicidad, una sororidad que contrasta con la oposición de los hermanos.
Como ya tuve la oportunidad de escribirlo8 a propósito de la interpretación
zambraniana, si la hermandad es defectible, la sororidad es indefectible. En
efecto en Variations Antigone Antígona e Ismene se hablan en un susurro
que escapa de la atención de Creonte (quien se emborracha adoptando una

8
  Duroux, Rose y Urdician, Stéphanie (jun. 2012), « Cuando dialogan dos Antígonas.
La tumba de Antígona de María Zambrano y Antígona furiosa de Griselda Gambaro», in
Olivar 13, n°. 17, La Plata. Versiónon-line http://www.scielo.org.ar/cgi-bin/wxis.exe/iah/

291
Stéphanie Urdician

actitud que delata su ceguera). Las dos hermanas comparten una partitura
que manifiesta ternura y amor. Pueden convocar la memoria individual
de una hermandad « normal » (juegos, celos, gustos...) que se cruza con el
mito de los Labdácidas en un texto que juega con las repeticiones de frases
a modo de estribillo o ritornelo infantil. Todos los actores de la tragedia
familiar salen a escena: Edipo con los ojos vendados y Yocasta con la cabeza
hundida en velos, ambos exhibiendo los estigmas de la maldición. Los co‑
turnos que calza Tiresias lo ubican en otro plano, en otro tiempo como para
significar su papel distanciado, más allá de la tragedia –en la predicción–,
más allá del género –en la alternancia hermafrodita que caracteriza al pro‑
feta tebano–, bebe y escupe, en el escenario, la sangre de la historia que está
comentando. El conjunto combina poesía, emoción y reflexión. Apela a la
reconciliación más allá de la muerte de los hermanos: « Jocaste: Réconciliez-
vous au moins dans la mort ».
El siglo XXI, heredero de las guerras del pasado –« Histoires mortes
elles nous traversent tranchantes » según Eugène Durif– y testigo de las
guerras presentes, parece necesitar un mensaje de comunión no desprovisto
de determinación para defender la justicia y la diferencia frente a la ceguera
del poder y superar su tragedia. En realidad, el espectáculo pretende diri‑
girse a un receptor amplio y en particular a la juventud como lo expresa el
director: « Je veux que cette Antigone intéresse notre jeunesse. Le théâtre
ne doit pas donner des leçons, des conseils, des vérités toutes faites. Il doit
interroger, proposer. Je veux que cette Antigone pleine de doutes, de poésie,
nous interroge sur notre rôle à jouer sur cette route de la fatalité. » Montar
esta obra hoy día tiene que ver con la resonancia y necesidad actual de los
mitos para cuestionar nuestro destino, nuestra relación con lo espiritual.
Si esta obra pretende hablarle a la juventud actual, este destinatario cons‑
tituye también el receptor privilegiado de las creaciones de la compañía del
Théâtre du Pélican.

C’est là qu’un jour je jouerai Antigone (2009), texto de Françoise de


Chaxel, puesta en escena de Jean-Claude Gal (Théâtre du Pélican,
Clermont-Ferrand)

Françoise Du Chaxel combina varias actividades: directora de la colec‑


ción Théâtrales Jeunesse en la editorial Théâtrales y autora de piezas para
adolescentes, dirige talleres de escritura teatral (con los adolescentes, en los

292
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

barrios desfavorecidos y en cárceles adscribiendo a su labor artística una di‑


mensión social). Tiene una relación privilegiada con el director artístico del
Théâtre du Pélican quien le hace un pedido que desemboca en la publicaci‑
ón de su primera obra para adolescentes L’ été des mangeurs d’ étoiles (1994).
Jean-Claude Gal es también quien le pide la composición de C’est là qu’un
jour je jouerai Antigone, escrita durante la residencia de la autora y montada
por J.-C. Gal en Clermont-Ferrand en 2009.
C’est là qu’un jour je jouerai Antigone establece un paralelo entre las vidas
de varias jóvenes: unas en Francia, otras en la India. La figura de Antígona
contribuye al establecimiento de un puente entre esta juventud de dife‑
rentes contextos geográficos, políticos y culturales que sin embargo com‑
parten rasgos comunes (la soledad, el anhelo de seguir adelante). La obra
propone un enfoque en la condición de las adolescentes a partir de una reco‑
pilación de testimonios que va constituyendo un territorio verbal femenino
proteiforme donde alternan monólogos y diálogos en los que las locutoras
hablan del amor. En la puesta de J.-C. Gal9, una veintena de adolescentes
de la región de Clermont-Ferrand colaboraron con artistas profesionales. La
escenografía asocia los códigos de la indumentaria tradicional –con el tilak
o lunar en la frente que significa el estado matrimonial de la mujer, en otros
términos la subordinación con respecto a la autoridad masculina, convo‑
cando la vertiente feminista de algunas reinterpretaciones de Antígona– y
la creación original de la videasta Anne-Sophie Emard, que le da mayor
profundidad y materia al diálogo intercultural que la obra propone. Así es
como las jóvenes en el escenario entrecruzan sus historias –desde Francia–
con trayectorias hindúes a partir del momento en que una joven, Lucie,
señala con el dedo un mapa de la India:

Séquence 4
LUCIE
Ma chambre
Mon chat Tommy,
Mon MP3
[...] Mon ordi
Mon blog
Mon MSN
Le monde entier derrière l’écran
A portée de main

9
  Estreno el 23 de abril de 2009, Cour des Trois Coquins, Clermont-Ferrand.

293
Stéphanie Urdician

Sur le mur une affiche de théâtre


Antigone
Sur le mur
Une carte de l’Inde
Une croix sur la carte
Jaipur
C’est là qu’un jour je jouerai Antigone. (Du Chaxel 2009: 92-93)

Lucie acoge a las jóvenes del Ganges en una sucesión de imágenes ver‑
sicolores. Del otro lado del espejo virtual creado por el dispositivo escé‑
nico, irrumpe otra protagonista, Mira, para expresar la desesperación de
sus deseos amorosos silenciados. Ambas junto al coro femenino comparten
la soledad y la dificultad o imposibilidad de elegir su vida. La obra juega
con esta doble topografía a lo largo de las seis « secuencias » ensalzando la
creación de imágenes como gesto principal. Cada secuencia arranca con
esta acotación espacial, exclusiva: « En France », « En Inde »10, que orienta
todo el texto dicho por el coro de jóvenes en el escenario. Todas, desde su
lugar, hablan del « allá » en un flujo de palabras que crean un eco anafórico
entre el aquí y el allá :

Séquence 1
En France
Là-bas des couleurs,
Rose, safran, orange, jaune
Qui font vivre les corps
Là-bas les fleuves
Aux eaux magiques
qui effacent les souillures
Là-bas (Du Chaxel 2009, p. 90)

El texto funciona por acumulación de enumeraciones que convocan una


geografía, una cultura o mejor dicho dos naturalezas, dos culturas, dos so‑
ciedades con un especial enfoque en la diferencia social entre hombres y
mujeres a partir de la segunda secuencia:

Séquence 2
En Inde

10
  Du Chaxel 2012 : 90-94.

294
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

Là-bas des hommes et des femmes qui vivent au même rythme


Là-bas des écoles pour tous,
Là-bas des filles dans toutes les écoles
Là-bas des femmes qui osent montrer leur corps
Là-bas des femmes qui soutiennent le regard des hommes

Detrás de estas « mujeres que les sostienen la mirada a los hombres »


emerge el gesto de Antígona, la cabeza alta frente a Creonte mientras que
« las que obedecen », « las mujeres  sumisas » (p. 92) constituyen el séquito
de Ismene. Son palabras sencillas y lacónicas que muestran más que di‑
cen la separación de los sexos y el desfase entre una realidad y otra. Las
correspondencias interculturales orquestan el encuentro entre los «ídolos»
respectivos de Lucie y Mira: Antígona, la princesa tebana y Mirabaï, la
princesa mendiga, poetisa hinduista del siglo XVI. Mirabaï era esposa de
un rey asesinado por uno de sus hijos para acceder al trono. La esposa se
niega a cumplir con la tradición sati, esto es inmolarse en la pira funera‑
ria del marido recién fallecido. Frente a esta ley que impone el suicidio de
las viudas en un acto de subordinación post mortem al hombre, Mirabaï
encarna la figura femenina de resistencia. Este guión no deja de recordar los
motivos de la tragedia de Antígona: usurpación del poder, violencia, resis‑
tencia femenina, castigo. Sin embargo Mirabaï huye y abre una brecha para
imaginar la emancipación femenina. Entonces la joven Mira, al invocar a
la princesa rebelde, contempla una postal de París que representa a «  un
couple [qui] s’embrasse sans honte » (p. 94), convencida de que « Un jour,
j’embrasserai un homme dans la rue sans honte », una conclusión que abre
el camino hacia la esperanza en un destino diferente.
Esta creación no fue la única incursión de la compañía en el repertorio
mítico. En mayo de 2014, organizó la primera edición del festival de tea‑
tro de y para adolescentes sobre el tema Nuevas mitologías de la juventud11.
La figura elegida por los adolescentes en el marco del taller de creación
teatral fue... Antígona, porque resulta que Antígona sigue hablándoles
a los jóvenes, desde su postura de rebelde, motivo que estructura varios
modelos adolescentes. Rebelión frente a la autoridad cualquiera que sea su
rostro – biológico, político o simbólico. Figura que permite cuestionar las
relaciones filiales en una edad intermediaria de la vida: entre la infancia
y la madurez, etapa de transición, en algunas culturas, edad propicia al
rito de iniciación que pauta la trayectoria del ser humano entre el naci‑

11
  http://theatredupelican.fr/index.php?id=174

295
Stéphanie Urdician

miento y la muerte. Facilita también el cuestionamiento identitario que


impone una distancia con respecto a la autoridad vivida como injusta
porque impuesta para alcanzar la emancipación del sujeto adolescente. Al
fin y al cabo la figura de Antígona permite indagar en las relaciones de
parentesco, en la célula familiar y las relaciones intergeneracionales que
la componen.
La obra siguiente mezcla los ingredientes destilados en las reseñas ante‑
riores: por una parte la dimensión intercultural a través del diálogo entre
la cultura francesa y la cultura africana en una creación que se inscribe en
la problemática social de la escisión entre la periferie (los barrios desfavore‑
cidos) y el centro (la cultura oficial), por otra, la juventud contemporánea
como destinatario.

J’kiffe Antigone ! (2009) Texto e interpretación de Ladji Diallo, puesta


en escena de Alberto García Sánchez

Este original mosáico escénico consta de fragmentos de Sófocles, textos


sociológicos sobre los barrios populares – de donde proceden el autor y el
protagonista, un joven en situación de fracaso escolar – y canciones afri‑
canas que constituyen la memoria familiar del teatrista francés de origen
maliense. Este espectáculo consta de elementos autobiográficos con un re‑
lato de vida en busca de las raíces africanas del actor y míticos a través de la
figura de Antígona que desempeña un papel clave en la vida y en la creación
de Ladji Diallo.
El teatrista pone en escena el encuentro tan inesperado como maravillo‑
so entre el protagonista y el lenguaje teatral. A partir de este encuentro, se
mezclan los códigos teatrales y urbanos para suscitar emoción y humoris‑
mo en un montaje a la vez universal, existencial, íntimo y cotidiano. Ladji
Diallo también se inspira en el modelo de la tradición oral africana del
griot para transmitir una historia muchas veces contada y hacerla suya a
partir de su propio itinerario. Además, la estructura de la obra corresponde
a la tradición africana de los relatos que incluyen la reacción del público y
la interrupción de entremeses musicales como parte integrante de la acci‑
ón dramática así como comentarios éticos o filosóficos. Ladji Diallo, solo
en el escenario, a la vez narrador y actor, interpreta a todos los persona‑
jes: Sofiane el parlanchín, Younes el mitómano, Camille es guay, Marion,
Bouba y Ladji.

296
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

Durante este viaje iniciático a Mali, la búsqueda identitaria guía los pa‑
sos del autor conduciéndolo hacia el máximo representante maliense del
arte teatral: Sotigui Kouyaté. Es lo que cuenta en estos términos :

A vingt et un ans, je ressens le besoin de nourrir mes racines, restées


quelque part au Mali, le long du fleuve Niger, pour m’épanouir dans
un pays qui est le mien, la France, sur une terre qui n’est pas la mienne.
Cette quête d’identité me guide dans les profondeurs de l’Afrique, où
l’art et le sacré sont intimement liés. L’Afrique se révèle peu à peu. Je
m’en imprègne, j’en vis et j’en ris. Ma rencontre avec le grand Griot
Sotigui Kouyaté, ses enfants Hassane et Dani, me propulse dans l’art
de conter.12

Heredero de varias culturas, cabe recalcar con el propio teatrista la « fi‑


liación Antígona » que lo vincula con la famosa adaptación de Antígona de
Sófocles por el director, actor y griot Sotigui Kouyaté, en 1999 en el Théâtre
d’Aubervilliers13. Hoy día Ladji Diallo vive en una localidad de los Pirineos
cuya cultura absorbe nutriendo su palabra de esta diversidad cultural que les
otorga a sus creaciones una dimensión universal.
El narrador, músico y comediante cuenta e interpreta la historia de
este joven que se identifica con Antígona y los valores que le transmite.
Relata al espectador el encuentro inédito entre la cultura de los subur‑
bios parisienses y la mitología griega, entre jóvenes de hoy y personajes
antiguos, el coro griego y la música rap. El título bien anuncia la aso‑
ciación inesperada de los dos ámbitos al inscribir al personaje trágico en
un contexto actual muy connotado socialmente. En efecto « j’kiffe » se
refiere a la jerga de los jóvenes de los barrios periféricos, en su mayoría
descendientes de la inmigración de África del Norte, voz adoptada am‑
pliamente hoy día en el registro coloquial. El afiche del espectáculo

12
  «A los 21 años, experimento la necesidad de nutrir mis raíces, que se habían que‑
dado en alguna parte de Mali a lo largo del río Niger, para realizarme en un país que era el
mío, Francia, en una tierra que no era la mía. Esta busquedad de identidad me guía hasta
las profundidades de África donde el arte y lo sagrado resultan íntimamente ligados. África
se revela poco a poco. Me impregno de ella, (vivo con ella, me río de ella.) Mi encuentro con
el gran Griot Sotigui Kouyaté (sus hijos Hassane y Dani), me propulsa al arte de contar ».
Traducción nuestra.
13
  Texto y dramaturgia de J.-L. Sagot-Duvauroux. Estreno:
12-31 de enero de 1999,
con el Mandéka Théâtre de Bamako, actores africanos en traje tradicional y percusiones
que acompañan al coro que canta en bambara. Cf. Papalexiou 2010: 87-102.

297
Stéphanie Urdician

confirma estos componentes contenidos en una foto que representa a un


joven de la banlieue con el típico suéter con capucha de espaldas y frente
a un patio de butacas.
El teatro funciona como revelador de identidad y de conciencia en la for‑
mación de Ladji Diallo y en el protagonista de su obra. Multiculturalismo,
historia individual y memoria colectiva orientan esta adaptación muy pecu‑
liar de la historia de Antígona, mas bien de su resonancia en la vida de un
joven del siglo XXI. Habla de la inmigración y detrás de este fenómeno
que obsesiona tanto a los gobiernos europeos actuales, de las relaciones
coloniales y postcoloniales, del fracaso de las políticas de integración de la
inmigración magrebí y de la condición del exiliado y del immigrado. Todas
estas problemáticas políticas y sociales las evoca en la Antígona de Claudio
Brozzoni.

Antigone 466-64 (2013), textos de Sófocles y Nelson Mandela, puesta


en escena de Claude Brozzoni

La historicización del mito es una tendencia dominante a partir de la


Liberación. Es cuando Steiner habla de una « explosión de Antígonas »,
todas portavoz de la libertad en contra de la opresión. En su Antígona
466-64, Claude Brozzoni también bebe en las fuentes de su herencia
familiar, oriundo de una familia italiana emigrada a Francia en la que
la cultura consistía en un mundo de creencias y ceremonias religiosas.
Nada de libros en casa, el descubrimiento tardío del teatro le abre el uni‑
verso de la literatura, la pintura, la música. La cultura familiar le infunde
una aproximación íntima e intuitiva al mundo y a los otros, ajena a una
relación intelectual. A pesar de las estrecheces, aprendió de niño a soñar
con un mundo diferente: esa es la enseñanza de su madre. Esta impronta
familiar la va a restituir en algunas puestas suyas que pretenden rescatar
del olvido la vida, la cultura y la voz (mediante canciones muy presentes
en sus espectáculos) del pueblo obrero y campesino, de las « petites gens ».
Convoca en su teatro fuerzas telúricas para representar la vida auténtica.
Estos pasos permiten entender la relación privilegiada con el teatro y el
rito africanos de su obra comprometida.
Su Antígona es un proyecto de cooperación internacional, una co-rea‑
lización de la Compañía Brozzoni y Arts en intersections, la del burkinés
Paul Zoungrana. Se estrena en el Burkina Faso el 18/09/2013 con actores

298
Antígona otra vez... aproximación a la escena francesa contemporánea

y músicos locales14. El texto es un montaje de fragmentos de Un long che-


min vers la liberté, la autobiografía de Nelson Mandela y de la tragedia de
Sófocles que el propio Mandela interpretó, con el papel de Creonte, en la
cárcel de Robben Island en los años 60. El espectáculo relata el día del
estreno a la vez que relata episodios de la infancia del líder africano. La
correspondencia entre el mito atemporal y el ícono contemporáneo activa la
vigencia del gesto de resistencia frentre al pensamiento único y arbitrario.
Antígona y Mandela desde su lugar y su época participan de la construcción
de un mundo que respete la dignidad humana cualesquiera que sean la raza,
el sexo, la clase, el crimen.
El grito de Antígona encuentra un eco en una lucha contemporánea
que se resiste a la renuncia. En la vertiente más oscura y desesperada de
su resistencia, sigue brotando la energía necesaria al despertar colectivo
en contra de la ceguera y el racismo. Ambos luchan en contra de las leyes
humanas que deshumanizan. Es la historia de dos niños Nelson y Antígona
que se van convirtiendo en soldados de la libertad y de la hermandad. El
espectáculo metateatral reproduce la situación de los presos que abogan
por la libertad como Antígona desde su cueva-tumba. El título bien plasma
esta simbiosis adscribiéndole al nombre de la heroina tebana la matrícula
de Nelson Mandela en la cárcel: 466/64. Desde el paratexto dialogan dos
voces alejadas por la historia y próximas en su anhelo de justicia y en la mi‑
tificación de la figura histórica del líder sudafricano. La interpretación de
los dos personajes a cargo de un único actor, Paul Zoungrana, bien remata
la simbiosis.
El escenario resconstruye el patio de la cárcel donde Mandela permane‑
ció recluido durante veinte años y donde interpretó la tragedia de Sófocles.
Es un suelo de tierra batida en que los actores presos con cadenas en los
tobillos actúan detrás de una reja que circunde todo el escenario. Arranca
el texto con « un canto mooré » que introduce los recuerdos de la infancia
de Mandela seguidos de la representación de la tragedia sofóclea. Como en
la obra de Ladji Diallo y en la Antígona de Kouyaté, la música tradicional
desempeña un papel importante, a través de los cantos acompañados por
las percusiones africanas y el kora, al sostener las sucesivas estaciones de la
tragedia.
En esta adaptación, no sólo se trata de celebrar la memoria de un líder
continental de la lucha en contra del apartheid sino que también se inyectan
alusiones políticas burkinesas e incluso palabras en mooré. Se perfila detrás

14
  Estreno en el CITO, Carrefour International du Théâtre de Ouagadougou.

299
Stéphanie Urdician

de Creón (Charles Wattara) al militar Thomas Sankara, que encabeza un


golpe de estado en 1983, figura reinterpretada también por Sylvain Bemba
en la obra Noces posthumes de Santigone (1988), representativa de la interpre‑
tación de la historia contemporánea de África15 a la luz de los mitos clásicos.

A modo de conclusión, recordaré a Roland Barthes para quien «  le


mythe est une parole choisie par l’histoire ; il ne saurait surgir de la nature
des choses » y al dramaturgo inglés Edward Bond quien dice a propósito de
Antígona: « Ce n’est pas la nature humaine qu’il nous faut considérer, mais
sa situation. C’est pour cette raison qu’on ne peut réduire le drame moderne
au personnage, mais que l’on doit absolument le comprendre en terme de
“situation” ». Antígona renace en situaciones históricas que constituyen el
mantillo fértil para acoger la repetición de su gesto. Ahora bien, en la era
de la globalización entendida en su acepción amenazante por ser respon‑
sable de la confusión o destrucción de las identidades, de cierto vagabundeo
existencial que no parece resolverse desde las vanguardias del siglo pasado,
la permanencia de los mitos y el de Antígona en particular, junto con la
variedad de los casos de coalescencia que presentamos (Antígona-Mirabaï,
Antígona-Mandela), contribuye a la (re)construcción y recuperación de
una unidad primigenia en el gran estallido heterogéneo que caracteriza las
sociedades contemporáneas. Los ejemplos convocados recalcan la posibili‑
dad de un diálogo fructífero bajo los auspicios de Antígona entre Europa
y África, Europa e India, centro y periferie. Antígona resiste a todos los
tratos. La variedad de tratamientos –serio, paródico–, de registros –culto,
popular–, no debilita la figura sino que el contrapunto la regenera16 . Sigue
hablándonos la trayectoria de la hija de Edipo desde Sófocles hasta la puesta
más reciente que está por estrenarse mientras estamos hablando de ella,
con lo cual lo que sí podemos decir sin posibilidad de controversia es que
Antígona impone una renuncia a la exhaustividad...

15
  A propósito de la africanización de Antígona, ver también Tegonni: An African An-
tigone (1999, Ibadan: Opon Ifa) del dramaturgo nigeriano Femi Osofisan, centrada en la
figura de una joven yoruba que encarna la resistencia en contra del imperialismo británico ;
el ensayo de Goff, Simpson 2007).
16
  Cf. el análisis de Elsa Morante, La soirée à Colone. Parodia, Urdician 2008: 87 sqq.

300
Antígona em cena no Teatro Nacional
de São João: Tradução e Dramaturgia
(Antigone on Stage in Teatro Nacional de São João: Translation and Dramaturgy)

Marta Isabel de Oliveira Várzeas (mvarzeas@letras.up.pt)


Universidade do Porto – CECH

http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-1111-2_16

301
(Página deixada propositadamente em branco)
Antígona em cena no Teatro Nacional de São João: Tradução e Dramaturgia

Resumo – Na temporada de 2009-2010 o Teatro Nacional de São João no Porto


levou à cena a tragédia Antígona. A presente comunicação visa relatar a experiên‑
cia de tradução da tragédia grega para o palco e analisar alguns aspectos de dra‑
maturgia, defendendo a necessidade de um trabalho de estreita colaboração entre
tradutor, encenador, actores e outros responsáveis pela produção do espectáculo,
no processo de actualização daquilo que no texto dramático podemos dizer que
existe em potência.
Palavras-chave: Antígona, Tragédia grega, Tradução, Dramaturgia, Teatro.

Abstract – In the 2009-2010 season Antigone was played in Teatro Nacional de


São João, Oporto. This text aims to report the experience of translation of Greek
Tragedy to the stage and to analyse some aspects of the dramaturgy, defending
the need for a close collaborative working between translator, director, actors and
others responsible for the production of the show.
Key-words: Antigone, Greek tragedy, Translation, Dramaturgy, Theatre.

Num texto que escrevi para um ciclo de conferências sobre a Antígona,


promovido pelo Teatro Nacional de São João que, na temporada de 2009-
2010, pela primeira vez e por iniciativa de Nuno Carinhas, o director do
Teatro e encenador da peça, levava à cena uma tragédia grega, defendi a
fidelidade ao texto como o principal objectivo do tradutor, embora, como
é óbvio, tenha passado grande parte do tempo que durou essa conferência
a falar da impossibilidade de a tradução exprimir a densidade semântica e
conceptual do texto grego, a força da sua linguagem metafórica, as sub‑
tilezas estilísticas, o ritmo e a musicalidade do verso, a profundidade do
pensamento e a beleza poético-musical da tragédia. De facto, como afirma
Simon Goldhill, “no melhor de todos os mundos possíveis, a tragédia grega
devia ser representada em grego antigo.”1 Mas nós bem sabemos que não
vivemos no melhor dos mundos nem mesmo no melhor dos mundos pos‑
síveis. E se a tradução é sempre e inevitavelmente uma forma de traição ela
constitui, evidentemente, o único meio de proporcionar a todos aqueles que
desconhecem o grego antigo a experiência estética de lerem ou verem uma
tragédia.
Se o espectáculo teatral tem como base o texto dramático2, se é dele que
parte, só na cena se cumpre plenamente a sua função ou finalidade. Na sua

1
  Goldhill 2007: 153.
2
  Uso ‘texto dramático’ no sentido que lhe dá Aguiar e Silva 1986: 605, distinguindo-o
de texto teatral: “O texto dramático caracteriza-se estruturalmente por ser constituído por
um texto principal, isto é, pelas réplicas, pelos actos linguísticos realizados pelas personagens

303
Marta Isabel de Oliveira Várzeas

especificidade, o Teatro abre-se a uma grande variedade de actualizações


daquilo que no texto podemos dizer que existe apenas em potência, como
numa partitura musical. No caso de textos gregos compostos à distância
de vinte e cinco séculos e resistentes a uma versão única nas línguas mo‑
dernas, a tradução é uma primeira forma de actualização do texto original,
isto é, um acto de apropriação e de transformação. Tal acto de apropriação
deve pressupor, como é óbvio, o conhecimento mais profundo possível não
apenas do texto de origem – as suas estruturas gramaticais, a semântica, os
aspectos retórico-estilísticos – mas ainda do fundo histórico, religioso, cul‑
tural e ideológico em que ele nasceu. Também o processo de concretização
do texto dramático que constitui a sua teatralização necessita desses conhe‑
cimentos, ainda que o trabalho dramatúrgico se realize com total liberdade.
Daí a necessidade imperiosa de um trabalho de colaboração entre tradutor
e encenador, pois só assim poderão ser supridas as lacunas de que a tradução
fatalmente padecerá.
No caso presente, a tradução de Antígona respondeu a um pedido, a
uma encomenda do encenador, que tinha já construído a sua ideia da peça
e pretendia um texto que, como então disse, fosse dizível em cena pelos ac‑
tores, isto é, lhes permitisse aceder ao primeiro nível de sentido, sem terem
de tropeçar em construções arrevesadas e em sequências fónicas difíceis de
pronunciar. Com efeito, uma coisa é a tradução estritamente assente no ri‑
gor filológico e com fins didácticos, para ser usada nas universidades; outra
coisa é a tradução para a cena. Nas primeiras conversas que tivemos sobre
o assunto percebi que o encenador queria, tanto quanto possível, o texto
de Sófocles e não uma adaptação. Por outro lado, não enjeitava o registo
elevado da linguagem, pelo contrário, desejava mantê-lo, mas queria poder
ouvi-lo de forma clara e fluente.
Clareza, fluência e expressividade, juntamente com a tentativa de man‑
ter a proximidade com o original, foram, pois, os objectivos que nortearam
as opções de tradução de Antígona. Preocupei-me em traduzir as ideias,
ciente da dificuldade de transpor poesia para outra língua, sobretudo quan‑
do se trata, como aqui, de um texto poético-musical em que palavra, ritmo,
métrica e música se entrelaçam numa apertada tessitura, as mais das vezes

que comunicam entre si … e por um texto secundário, formado pelas didascálias ou


indicações cénicas”. Claro que, como sabemos, na tragédia grega só o texto principal existe.
Já “texto teatral”, segundo o mesmo autor, é “um texto oralmente realizado por instâncias
de enunciação ficticiamente encarnadas por actores … e comunicadas a espectadores pelo
canal vocal-auditivo”.

304
Antígona em cena no Teatro Nacional de São João: Tradução e Dramaturgia

difícil de exprimir em português. Apesar disso, tentei dar, na tanto quanto


possível, uma certa musicalidade ao texto, uma cadência ritmada, um ritmo
que foi sendo encontrado de modo intuitivo, de acordo com o que pare‑
cia soar melhor. E fui-me apercebendo de que certas opções pareciam soar
bem porque formavam decassílabos ou tinham a medida da redondilha, ou
ainda porque os espaços entre as sílabas tónicas criavam um ritmo mais ou
menos regular e eufónico.
O mesmo desejo de clareza e inteligibilidade levou-me a evitar os hipér‑
batos e as anástrofes, formas de inversão da ordem normal das palavras na
frase portuguesa que, se, por um lado, mais se aproximaria da língua grega e
produziria um texto de sabor mais arcaizante, por outro, obscureceria o seu
sentido e dificultaria a sua apreensão imediata pelo ouvintes e pelos actores.
É evidente que o propósito de criar um texto acessível para actores e
espectadores, corre sempre o risco de tornar trivial aquilo que em grego é
quase sempre linguagem densa, difícil e de um nível poético elevadíssimo.
Num dos capítulos do livro que escreveu sobre os elementos do drama afir‑
ma John Styan3 que o diálogo dramático é mais do que vulgar conversação.
Ora, se esta afirmação pode talvez ser aplicada a qualquer peça de teatro,
mesmo a mais realista, ela é especialmente verdadeira para a tragédia grega,
cuja natureza poética e filosófica a coloca num patamar muito distante
da naturalidade e do imediatismo do discurso não-ficcional, não-poético.
Tudo na tragédia grega, como se sabe, desde o uso convencional e tipificado
das máscaras e das vestes, o cenário, a dramaturgia do espaço – nomeada‑
mente, das entradas e saídas de cena – até à elevação da linguagem e àquele
illo tempore em que se movem as personagens míticas, tudo isso aponta para
um mundo outro, fictício, e a cuja construção o espectador é convidado a
aderir, deixando-se levar pelo jogo do “faz de conta”. No que respeita con‑
cretamente à linguagem da tragédia sofocliana ela é, de uma maneira geral,
elevada, por vezes solene, e mesmo nas frases aparentemente mais simples,
nos diálogos das personagens, está investida de um grande poder expres‑
sivo, de pregnância semântica, e possui um alcance filosófico que pouco
tem a ver com a vulgar conversação. As palavras, cada palavra, poderíamos
dizer, possui um peso extraordinário, lançando constantes desafios ao tra‑
balho de interpretação e principalmente de tradução para a nossa língua.
Dou o exemplo, talvez estafado, do primeiro verso de Antígona. Não
há tradutor que não se refira à impossibilidade de encontrar para ele uma
tradução satisfatória. E o problema não é só o de encontrar uma exacta

3
  Styan 1973: 11.

305
Marta Isabel de Oliveira Várzeas

correspondência linguística, tarefa impossível, mas mesmo o de arranjar


maneira de exprimir a profundidade de sentido de um verso que, para um
desconhecedor do texto original e de tudo o que nele está implicado, não
passaria de uma fórmula de chamamento marcada pelo afecto entre as duas
irmãs. Antígona dirige-se a Ismena com um vocativo composto de quatro
palavras – excluo o ὦ inicial que vulgarmente acompanha o vocativo e não
tem valor semântico – κοινὸν αὐτάδελφον Ἰσμήνης κάρα. Destas, apenas
uma é completamente transparente, o nome próprio Ismena; as restantes
são intraduzíveis, pois a tentar uma tradução o mais próxima possível do
original teríamos de dizer qualquer coisa como “ó cabeça de Ismena, [ca‑
beça] de verdadeira irmã que eu partilho” ou “que me é comum”. κάρα,
a palavra traduzida por ‘cabeça’, parece ser usada sobretudo na tragédia
como vocativo mais emocional e também mais elevado do que outras for‑
mas comuns de chamamento. Por seu lado o adjectivo κοινὸν e o primeiro
elemento do adjectivo αὐτάδελφον – αὐτ – remetem respectivamente para
a ideia de comunhão e para a de individualidade, ou mesmo de isolamento e
solidão. A maior parte das traduções, e a minha acabou por seguir o mesmo
caminho, opta por fazer deste vocativo uma expressão de carinho – “mi‑
nha irmã, minha querida Ismena” – para transmitir alguma da intensidade
emocional inscrita no grego. Na verdade, a ideia contida neste estranho
verso não é bem, ou não é principalmente, a da proximidade do afecto. Ele
exprime, antes, uma comunhão, uma condição existencial partilhada, uma
identidade de sangue que, ao isolar as irmãs do resto do mundo, as une de
forma muito íntima4. Antígona olha para a sua irmã e nela se vê reflecti‑
da, como se ambas fossem uma só pessoa. Essa ideia confirma-se ao longo
dos versos seguintes em que o uso do dual surge várias vezes a assinalar a
união das irmãs, união que, todavia, se revelará ilusória para a protagonista.
Assim que Antígona percebe que Ismena não a acompanhará no seu acto de
desobediência, nem com ele concorda, abandona o emprego do dual, fican‑
do clara, na linguagem usada, a cisão, a ruptura entre ambas. Como é fácil
perceber, a tradução não é capaz de dizer tanto. A representação, os gestos
dos actores podem dizer um pouco mais mas, para que isso aconteça, é
necessário que encenador e actores estejam cientes do que verdadeiramente
está em causa. No caso presente a solução encontrada pelo encenador foi a
de fazer entrar as personagens de mãos dadas, assim se mantendo, agarra‑

4
  Veja-se as penetrantes observações de Steiner 2008: 232-235 acerca dos primeiros
versos de Antígona.

306
Antígona em cena no Teatro Nacional de São João: Tradução e Dramaturgia

das uma à outra, num gesto de união que abruptamente se desfaz quando
Antígona percebe que Ismena rejeita a sua proposta de rebelião.
Como primeira apresentação de Antígona o verso é extremamente elo‑
quente, pois concentra em poucas palavras aquele que constitui, do meu
ponto de vista, um dos traços definidores desta personagem – a sua condição
de irmã. De irmã e de filha, porquanto aquilo que faz de Antígona e Ismena
irmãs entre si e irmãs de Etéocles e Polinices é o facto de todos serem filhos
de Édipo. Parece uma evidência, mas não é. Édipo não é um pai qualquer.
Ter Édipo como pai significa ser filho do próprio irmão e da própria avó.
É o horror do incesto e do parricídio que marcam a herança desta família e
fazem dos seus membros remanescentes, agora apenas Antígona e Ismena,
seres extraordinários, invulgares, estranhos, únicos pelas piores razões. Por
isso as palavras dos dois versos seguintes são também tão importantes. O
original diz algo como “dos males vindos de Édipo, conheces algum com
que Zeus não nos tenha atingido, enquanto estamos vivas?” Para sublinhar
a importância desta primeira referência a Édipo expandi a tradução deste
verso, transformando numa oração independente aquilo que no original
é apenas um complemento. Optei por dizer: ‘minha irmã, minha querida
Ismena, de Édipo, nosso pai, herdámos males sem conta. E haverá algum
com que Zeus não nos tenha ainda atingido?’ Procurei, desta forma, tornar
um pouco mais evidente para o ouvinte moderno, o peso da herança edipia‑
na, pois esse é um dos temas que o dramaturgo pontualmente convoca ao
longo da tragédia e faz entrar no jogo dramático. Trata-se, portanto, de um
dado relevante para a avaliação da problemática da tragédia e para a carac‑
terização da personagem, que resolvi sublinhar na sua primeira ocorrência,
pois se, para um Grego contemporâneo de Sófocles não só o nome de Édipo
seria o bastante para evocar uma série de dados acerca do nomeado, mas
ainda o próprio destaque que a palavra tem no verso – está no final – lhe
daria uma ressonância particular, o mesmo não acontecerá com o especta‑
dor moderno, para quem a simples referência a Édipo terá porventura um
menor poder evocativo.
De uma maneira geral, procurei clarificar o sentido do texto original
sem intervir demasiado, ou seja, sem cortes nem acrescentos. Algumas ve‑
zes o fiz, porém, na convicção de que as modificações eram inócuas e ser‑
viam apenas uma maior expressividade e um mais lógico encadeamento das
ideias.
Quem já traduziu tragédia grega sabe bem que as maiores dificuldades
surgem nas odes corais. Na impossibilidade de exprimir a elevada qualida‑
de e a densidade poética dessas intervenções do Coro, a sua musicalidade,

307
Marta Isabel de Oliveira Várzeas

o ritmo por vezes encantatório, as mudanças de registo lírico, mas tam‑


bém a opacidade semântica decorrente do carácter alusivo da narração e
da própria complexidade sintáctica, enfim, na impossibilidade de tudo isto
exprimir e, ao mesmo tempo, criar um texto inteligível, optei, em geral, por
simplificar a sintaxe e, sobretudo, por tentar dar um ritmo marcado aos
versos, recorrendo, aqui e ali, a repetições que, não existindo no original,
podiam ajudar a criar esse ritmo.
Todavia não são apenas problemas de tradução que as partes corais le‑
vantam. O tratamento da personagem do Coro é um dos aspectos drama‑
túrgicos que maiores dificuldades apresenta a um encenador moderno. Daí
a tentação que alguns sentem, e a que muitas vezes cedem, de excluir da
representação esta voz colectiva, cuja contínua presença em cena parece tão
inverosímil. A existência de um Coro constitui, de facto, um dos factores de
estranhamento mais difíceis de integrar na encenação. Como afirma Simon
Goldhill5,

“Não há nada mais entediante e deprimente no teatro do que um


grupo de actores vestidos de branco a entoar banalidades pomposas
com uma expressão muito profunda. Se um coro canta e dança é di‑
fícil não o associar às imagens de um music-hall de Hollywood... O
coro de Rei Édipo é constituído pelos anciãos da cidade: como podem
os Conselheiros de Estado, por assim dizer, cantar e dançar sem pare‑
cerem simplesmente ridículos?”

“Sem coros não há educação”, afirmava Platão, referindo-se à cultura


musical, de canto e dança, que caracterizava Atenas desde há séculos. Nós
diremos, “sem coro não há tragédia grega”. E aqui entra o nosso papel como
estudiosos da tragédia: não para propor soluções cénicas, evidentemente,
mas para ajudar a perceber o significado desta personagem colectiva, que
surge como contraponto em relação às personagens individuais, assim ge‑
rando um dos factores de tensão estruturantes da tragédia; para ajudar a
perceber a relevantíssima importância pedagógica e estética da sua presença
num universo cultural em que a música e a dança eram veículos de edu‑
cação; para ajudar a perceber como, em termos dramáticos, o Coro serve
ainda para estabelecer a ligação entre as cenas, funcionando as suas inter‑

5
  Goldhill 2007: 45-46.

308
Antígona em cena no Teatro Nacional de São João: Tradução e Dramaturgia

venções como uma espécie de “cavilhas” ou “dobradiças”6 , que lançam luz,


mais ou menos conscientemente, sobre o antes e o depois de cada episódio.
No caso de Antígona, o encenador começou por pensar usar apenas um
actor para representar o coro, até porque não dispunha de meios para con‑
tratar os quinze que Sófocles usava. Acabou, no entanto, como ele próprio
disse7, por perceber e sentir a necessidade de preservar o sentido de grupo,
de colectivo, que o coro representa. Por outro lado, essa pluralidade de vozes
parecia ser mais adequada à poesia das odes, ajudando a marcar dois modos
elocutórios distintos. A solução que encontrou e que correspondia a opções
que havia já tomado em encenações anteriores, como fora o caso de Breve
sumário da história de Deus de Gil Vicente, foi a de envolver todos os actores
na continuidade do espectáculo. À excepção de Maria do Céu Ribeiro, que
fez Antígona, e de António Durães, que fez Creonte, os restantes actores
incorporaram também o Coro. Apesar de não dançar nem cantar, a pre‑
sença do Coro não foi estática, os coreutas movimentavam-se em palco,
assumindo posições variadas no espaço. A primeira entrada do coro em
cena, no párodo, foi acompanhada de uma música em ritmo de marcha a
condizer com o ritmo anapéstico do original. Do estásimo quarto, cujas
referências míticas, na opinião do encenador, perturbariam o entendimento
por parte do público, o Coro entoou apenas a primeira estrofe. A ode final,
a invocação e prece a Baco, foi recitada apenas por um único actor, o cori‑
feu, feito por Jorge Mota, situação com que o encenador tentou aprofundar
o clima de “desolação” que se instala em cena depois dos acontecimentos
terríveis de que já se tomara conhecimento. Foi um momento dramático
muito impressionante, adensado pelo próprio espaço cénico que lembrava
uma paisagem vulcânica, desoladora.
Do trabalho a desenvolver junto de todos os envolvidos na produção
do espectáculo8 fez também parte a dilucidação de determinados conceitos
éticos que percorrem as falas das personagens e se apresentam como factores
de discórdia, de divisão, de ruptura. Exprimem, porém, ideias e valores fun‑
damentais muitas vezes difíceis de traduzir. São disso exemplo três campos
semânticos centrais na peça, e acerca dos quais não se chega nunca a uma
visão consensual, nem sequer coerente: o da philia, da sophrosyne e da eu-

6
  Goldhill 2007: 50.
7
  Antígona. Manual de Leitura: 10.
8
  Em todos os encontros com o encenador e os actores, quer nos ensaios de mesa quer
nos de palco, estiveram também presentes o criador dos figurinos, o ensaiador das vozes, e
outros responsáveis pela montagem do espectáculo.

309
Marta Isabel de Oliveira Várzeas

sebeia. Trata-se de conceitos verdadeiramente nucleares da axiologia grega


que já não têm, na nossa língua e na nossa sociedade, a carga moral e reli‑
giosa que tinham para os Antigos. O modo como as personagens usam estes
vocábulos e seus correlatos não é esclarecedor, eles encontram-se no centro
de um conflito que as divide e esse é um dos sinais da complexidade com
que foram desenhadas pelo dramaturgo. Antígona, por exemplo, defende
os seus philoi, os que lhe estão ligados pelo sangue, afirma ter nascido para
amar e não para odiar, mas é de ódio que fala a sua irmã Ismena, assim que
ouve as suas admoestações. E morre sem ter a certeza, afinal, da melhor ma‑
neira de classificar o seu acto. Por isso pergunta: “Que lei divina transgredi?
Como posso eu ainda olhar para os deuses? Qual deles invocar como aliado,
quando ímpia se tornou a minha piedade?” (922-924).
Esta é outra das marcas do estilo de Sófocles: o seu gosto pela expres‑
são antitética das ideias, pelo uso de oximoros e paradoxos que desafiam
qualquer leitura linear das peças e apontam para a radical ambivalência do
humano e do divino.
Essa noção do peso das palavras sofoclianas e da gravidade de tudo o
que é dito em cena esteve presente na própria direcção dos actores. Quando
lhe perguntaram quais haviam sido as suas maiores preocupações a este
nível, Nuno Carinhas respondeu9:

“Entre muitas outras, diria que me empenhei, sobretudo, em não


deixar que os actores tornassem o texto muito circunstancial, exces‑
sivamente quotidiano, mas que, pelo contrário, mantivessem sempre
uma certa espessura e uma certa ‘procura’ na forma de o dizer, que
não fosse banal. Se calhar, isso existe em relação a todos os textos, mas
aqui foi uma preocupação maior. Estivemos mais tempo à mesa do que
é habitual, à volta das palavras.”

A compreensão dos sentidos da peça como algo que se vai construindo


com a colaboração de cada uma das personagens, principais ou secundá‑
rias, levou a outra das opções dramatúrgicas do encenador, talvez das mais
polémicas, relacionada com a direcção dos actores. Refiro-me ao facto de o
encenador se recusar a tomar partido por qualquer uma delas, quer no que
respeita à relação de forças entre Antígona e Creonte, quer no peso relativo
dado às restantes personagens, que nunca foram tratadas como mero supor‑
te, nem apenas para iluminarem as figuras principais, como é tradicional‑

9
  Antígona. Manual de Leitura: 10.

310
Antígona em cena no Teatro Nacional de São João: Tradução e Dramaturgia

mente visto, por exemplo, o papel de Ismena. Esta foi uma das opções mais
criticadas por alguns espectadores. A actuação de Antígona, na opinião de
muitos, não transmitiu aquela força, obstinação e altivez com que Sófocles
a caracteriza, e a que o próprio Coro se refere em vários momentos da peça.
Talvez esse relativo apagamento da protagonista tenha sido potenciado pela
presença de um Creonte que até em termos físicos se impôs completamente.
Mas o propósito do encenador era justamente o de evitar “reforçar a heroi‑
cidade de qualquer das personagens”10. Por isso a figura de Ismena ganhou
um vigor inesperado, carecendo daquela fragilidade e insegurança que aju‑
dava a realçar, por contraste, a força de Antígona.
Esta, porém, não deixa de ser uma leitura possível da tragédia, que vem,
aliás, confirmar o que se dizia no início: o texto dramático é uma espécie
de partitura aberta a uma grande variedade de interpretações. E quanto ao
peso relativo das figuras de Antígona e de Creonte, e à questão de saber
qual deles é o verdadeiro protagonista, a questão é, como se sabe, uma das
mais discutidas na interpretação desta tragédia11. Não era intenção do en‑
cenador “torcer” por nenhuma das personagens, para dar a possibilidade ao
espectador de fazer o seu próprio juízo. Quer o tenha ou não conseguido, a
verdade é que esse seu desiderato foi uma tentativa de sublinhar a complexi‑
dade moral que caracteriza a tragédia grega, sempre preocupada em lançar
questões desafiadoras mas deixando completamente em aberto o espaço
para as respostas.

10
  Idem, ibidem.
11
  Para uma síntese dos principais argumentos que deram forma a esta polémica, vide
Rocha Pereira 2010: 17-22 e bibliografia aí citada.

311
(Página deixada propositadamente em branco)
Bibliografia

313
(Página deixada propositadamente em branco)
Edições e traduções de autores antigos

Adam, J. (1963), The Republic of Plato. Edited with critical notes, commentary and
appendices by James Adam. 2.ed. Cambridge: Cambridge University Press. [reimpr.
1965].
Albini, U. (ed.) (2000), Euripide. Fenicie. Introduzione e traduzione di Albini, U., note di
Barberis, F. Milano: Garzanti.
Ameis, K.F. and Hentze, C. (eds.) (19064), Homers Ilias, II/4. Leipzig-Berlin: Teubner.
Antígona. Manual de Leitura (2010). TNSJ.
Argentieri, L. (2003), Gli epigrammi degli Antipatri. Bari: Levante.
Beschi, L. and Musti, D. (eds.) (1982), Pausania. Guida della Grecia, Libro I. L’attica.
Milano: Mondadori.
Brown, A. (1987), Sophocles: Antigone ed. w. translation and notes. Warminster: Aris and Philips.
Corno, D. del (1982), Sofocle. Edipo Re. Edipo a Colono. Antigone, a cura di Del Corno, D.,
traduzione di Cantarella, R. Milano: Mondadori.
Dain, A., Mazon, P., Irigoin J. (72002), Trachines et Antigone. Texte établi et traduction par
Dain, A., Mazon, P., revue et corrigée J. Irigoin, J. Paris: Les Belles Lettres.
Errandonea, I. (1959), Sófocles. Tragedias. Edipo rey, Edipo en Colono. Texto revisado y traducido
por Errandonea, I. Barcelona: Ediciones Alma Mater.
Faranda Villa, G. (ed.) (1998), Publio Papinio Stazio. Tebaide, I-II. Milano: Rizzoli.
Gibbons, R., Segal, C. (2003), Sophocles Antigone. Oxford: Oxford University Press.
Grégoire, H., Méridier, L., Chapouthier, F. (eds.) (2002), Euripide. Tragédies, Tome V,
Hélène-Les Phoéniciennes. Paris: Les Belles Lettres.
Griffith, M. (102012), Sophocles. Antigone. Cambridge: University Press.
Henderson, J. (2000), Aristophanes. Birds. Lysistrata. Women at Themophoria. Cambridge,
Massachusetts: Havard University Press.
Jebb, R. (1962), Sophocles. The plays and Fragments. Antigone. With critical notes, commentary
and translation in english prose. 3.ed. Amesterdam: Adolf M. Hakkert Publisher.
Joyal, M. (2000), The platonic Theages. An introduction, commentary, and critical edition.
Stuttgard: Steiner.
Kamerbeek J. C. (1978) , The Plays of Sophocles. Comentaries. III The Antigone. Leiden, Brill.
Kenney, E. J. (2011), Ovidio. Metamorfosi. Milano: Mondadori.
Lloyd-Jones, H., Wilson, N. G. (1990), Sophoclis, Fabulae. Oxford: Oxford University Press.
Mastromarco, G. (ed.) (1983), Commedie di Aristofane. Torino: Utet.
Mastronarde, D.J. (1994), Euripides: Phoenissae. Cambridge: Cambridge University Press.

315
Mazon, P. (reimpr. 1967), Sophocles. Les trachinienes, Antigone, Ajax, Oedipe Roi. Paris: Les
Belles Lettres.
Medda, E. (ed.) (2006), Euripide. Le Fenicie. Milano: Rizzoli.
Melro, F. (52000), Sófocles. Antígona. Introdução, tradução e notas. Mem Martins: Inquérito.
Pearson, A. C. (1963), The Fragments of Sophocles. Edited with additional notes from the
papers of Jebb, R. C., Headlam, W. G. Amsterdam: Adolf M. Hakkert Publisher.
Powell, J. U. (1911), The Phoenissae of Euripides. London: Constable & Co.
Rocha Pereira, M. H. (52013), Eurípides, Medeia. Trad. port. Lisboa: Calouste Gulbenkian.
Rocha Pereira, M. H. (92010), Platão. A República. Introdução, tradução e notas. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian.
Rocha Pereira, M. H. (92010), Sófocles. Antígona. Trad. port. Lisboa: Gulbenkian.
Rocha Pereira, M. H., Ferreira, J. R., Fialho, M. C. (2013), Sófocles. Tragédias. Coimbra: Minerva.
Souillé, Joseph (1930), Platon. Théagès, in Platon. Oeuvres Complètes. Paris: Les Belles Lettres.
Schüler, D. (2006), Sófocles. Antígona. Introdução, tradução e notas. Porto Alegre: LP&M.
Várzeas, M. (2011), Sófocles. Antígona. Prefácio, tradução e notas. Vila Nova Famalicão:
Húmus.

Reescritas de temas clássicos

Anouilh, J. (reimpr.1946), Antigone. Paris. La Table Redonde.


Anouilh, J. (1961), Teatro. Trad. Bernárdez, A. Buenos Aires: Losada.
Anouilh, J. (1998), Antigone. Paris. editor
Bauchau, H. (1997), Antigone. Arles : Actes Sud.
Bachau, H. (1999), Journal d’Antigone (1989-1997). Arles : Actes Sud.
Bachau, H. (2009), La lumière Antigone, poème pour le livret d’opéra de Pierre Bartholomée.
Arles: Actes Sud.
Cocteau, J. (1948), Antigone. Paris: Gallimard.
Cocteau, J. (1992), La machine infernale. Paris: Livre de poche.
Colom, G. (1935), Antígona. Poema dramàtic. Barcelona: Barcino.
Correia, H. (22006), Perdição. Exercício sobre Antígona. Lisboa: Relógio d’Água.
Dantas, J. (1946), Antígona. Peça em 5 actos, inspirada na obra dos poetas trágicos gregos e, em
especial, na Antígona de Sófocles. Lisboa: Bertrand.

316
Du Chaxel, F. (2012), C’est là qu’un jour..., in La vie, je l’agrandis avec mon stylo. L’engagement :
écrits de jeunes et réflexions. Paris, Ed. Théâtrales: 90-94.
Espriu, S. (1955), Antígona. Palma de Mallorca: Ed. Moll.
Espriu, S. (1969), Antígona. Barcelona: Edicions 62.
Espriu, S. (1981), Les roques i el mar: el blau. Barcelona: El Mall.
Hölderlin, F. (1804), “Antigonä”, seguido de “Anmerkungen zur Antigonä”, in Knaupp, M.
(1992), Friederich Hölderlin. Sämtliche Werke und Briefe. Band II (edição). München,
Carl Hanser: 317-76.
Kierkegaard, S. (1942), Antígona. Trad. esp. de Albert, J. G. México : Seneca.
Martín Elizondo, J. (1988), Antígona entre muros. Madrid: SGAE. [também publicado em
Primer Acto 329 (2009) 169-190].
Morante, E. (1968, reimpr.1995), Il mondo salvato dai ragazzini e altri poemi. Torino: Einaudi.
Morante, E. (1976), Algo en la historia. Trad. de Moreno, J. Barcelona: Plaza y Janés.
Morante, E. (1984), Araceli. Trad. Sáncez Gijón, A. Barcelona: Editorial Bruguera.
Morante, E. (1992), La Historia. Trad. de Benítez, E. Barcelona: Círculo de Lectores.
Morante, E. (1969), La isla de Arturo. Trad. de Guasta, E. Barcelona: Editorial Bruguera.
Morante, Elsa (1995), La soirée à Colone, in Le monde sauvé par les gamins. Paris, Gallimard:
51-130.
Morante, E. (2013), La serata a Colono. Torino: Einaudi.
Morante, E. (2012), Mentira y sortilegio. Trad. de Ciurans Ferrándiz, A. Barcelona: Lumen.
Morante, E. (1987), “Sul romanzo” (opiniões de 1959), Pro o contro la bomba atomica e altri
scritti, a cura di Garboli. C. Milano, Adelphi: 41-73.
Pedro, A. (1981), Teatro Completo. Lisboa, INCM: 255-330.
Rosa, G. (1994), A benfazeja, in Ficção completa. II. Rio de Janeiro: Nova Aguilar.
Sacramento, M. (1958), “Antígona – peça em um acto”. Vértice 182, vol. XVIII: 604-610.
Sacramento, Mário (1959), Teatro Anatómico. Coimbra: Atlântida Editora.
Sacramento, M. (1974), Ensaios de Domingo – III. Porto: Editorial Inova.
Uceda, J. (2002), En el viento, hacia el mar (1959-2002), Edición de Pujol Russell, S., Sevilla:
Fundación José Manuel Lara.
Uceda, J. (2013), Escritos en la corteza de los árboles. Sevilla: Fundación José Manuel Lara.
Uceda, J. (1991), Poesía. Edición de Peñas Bermejo, F. J. Ferrol: Esquío.
Uceda, J. (1966), Sin mucha esperanza. Madrid: Ediciones Ágora.
Yourcenar, M. (1974), Feux. Paris: Éditions Gallimard.

317
Yourcenar, M. (2009), Fuegos. Trad. Calatayud, E. Madrid: Santillana.
Yourcenar, M. (1995), Lettres à ses amies et quelques autres. Paris: Gallimard.
Zambrano, M. (1967), La tumba de Antígona. México: Siglo XXI.
Zambrano, M. (1967),”La tumba de Antígona”, Revista de Occidente 54: 273-293.
Zambrano, M. (2012), La tumba de Antígona y otros textos sobre el personaje trágico. Edición
de Trueba Mira, V. Madrid: Cátedra.

Estudos

Adams, S. M. (1955), “The Antigone of Sophocles”, Phoenix 9: 47-62.


Aguiar e Silva, V. M. (1986), Teoria da Literatura. Coimbra: Almedina.
Álvarez, Llano, Á. (ed.) (1994), Antoloxía del cuentu asturianu contemporáneu. Mieres:
Editora del Norte.
Aranguren, J. L. (2009), “En el estreno de Antígona entre muros. Antígona y democracia”,
Primer Acto 329: 145-149.
Arguelles, J. L. (ed.) (2010), Toma de terra. Poetas en lengua asturiana. Antologia 1975-2010.
Gijón: Trea.
Azcue, V. (2009), “Antígona en el teatro español contemporáneo”, Acotaciones 23: 33-46.
Azcue, V. (2011), “Heroismo colectivo y defensa de los vivos en Antígona entre muros de José
Martín Elizondo”, in Aznar Soler, M., López García, J. R. (eds.): 346-353.
Azcue, V. (2013), “From the Tomb to the Prision Cell: José Martín Elizondo’s Antígona entre
muros”, in Duprey, J. (ed.): 147–162.
Aznar Soler, M. (ed.) (1999), El exilio teatral republicano de 1939. Sant Cugat del Vallès:
Associació d’Idees/GEXEL.
Aznar Soler, M. (2009), “José Martín Elizondo en Toulouse. La creación del grupo ‘Amigos
del Teatro Español’”, Primer Acto 329: 150-155.
Aznar Soler, M., López García, J. R. (eds.) (2011), El exilio republicano de 1939 y la segunda
generación. Sevilla: Editorial Renacimiento.
Bachelard, G. (2006), La poetica dello spazio, a cura di E. Catalano. Bari: Fratelli Laterza
(1957, La poétique de l’espace. Paris).
Bañuls J. V. (1999), “La imposible disuasión del héroe trágico” in Álvarez, M. C., Iglesias
Montiel, R. M. (eds.) (1999), Contemporaneidad de los clásicos en el umbral del tercer
milenio. Murcia, Universidad de Murcia: 543-551.

318
Bañuls Oller, J. Vte. & Morenilla, C. (2008), “Antígona, viva a través de tiempos y culturas”,
Debats  101/3: 73-87.
Bañuls Oller, J. Vte. & Crespo Alcalá, P. (2008), Antígona(s): Mito y personaje. Un recorrido
desde los orígenes. Bari: Levante Editori.
Bañuls J. V., Morenilla C. (2008), “Rasgos esquileos en la caracterización de algunos
personajes sofocleos”, CFC (G) 18: 73-87.
Barata, J. O. (1991), História do Teatro Português. Lisboa: Universidade Aberta.
Bartoloni, G. and Michetti L. M. (eds.) (2013), Mura di legno, mura di terra, mura
di pietra: fortificazioni nel Mediterraneo antico. Atti del Convegno Internazionale
Sapienza Università di Roma, 7-9 maggio 2012, Scienze dell’Antichità 19, 2/3.
Roma: Quasar.
Belardinelli, A. M., Greco, G. (eds.) (2010), Antigone e le Antigoni: storia forme fortuna di un
mito. Milano: Mondadori Education.
Berenguer, A. (2007), “Antígona. Un arquetipo de mujer”, Antígona 1: 11-18.
Bianchi, L., Nostro, S. (2013), “La serata a Colono di Elsa Morante. Regia di Mario Martone
(Piccolo Teatro Grassi di Milano, stagione 2012/2013)”, www.piccoloteatro.org/play/
show/2012-2013/la-serata-a-colono.
Bignotto, N. (1998), “O tirano clássico”, in O tirano e a cidade. São Paulo, Discurso Editorial:
85-103.
Blundell, M. W. (1989), Helping friends and harming enemies: a study in Sophocles and greelk
and ethics. Cambridge, Cambridge University Press: 106-148.
Bodeüs, R. (1984), “L’habile et le juste de l’Antigone de Sophocle au Protagoras de Platon”,
Mnemosyne 37: -271-290.
Bolado García, X. (2002), “El Surdimientu. El teatru”, in Ramos Corrada, M. (ed.), Historia
de la Literatura Asturiana. Uviéu, Academia de la Lingua Asturiana: 695-715.
Bonazzi, M. (2010), «Antigone contro il sofista», in Costazza, A., La filosofia a teatro. Milano,
Cisalpino, Istituto Editoriale Universitario: 205-222.
Bosch Juan, M. C. (1979), Antígona en la literatura Moderna. Barcelona: Ediciones de la
Universidad de Barcelona / Secretariado de Publicaciones, Intercambio Científico y
Extensión Universitaria (síntese da tese de doutoramento).
Bosch Juan, M. C. (1980), “Les nostres Antígones”, Faventia 2: 93-111.
Bosch Mateu, M. (2010), “El mito de Antígona en el teatro español exiliado”, Acotaciones
24, enero-junio: 83-104.
Bosi, A. (2003), Céu, inferno. São Paulo, Duas Cidades: Editora 34.
Bowra, C. M. (71965), Sophoclean tragedy. Oxford: Clarendon Press.

319
Brasete, M. F. (2011), “Sobre Antígona, um “ensaio dramático” de Mário Sacramento”, in
Ferreira 2011: 61-71.
Bremond, M. (2005), “Femmes mythiques chez Yourcenar”, in Ledesma Pedraz, M.,
Poignaut, R. (eds.), Marguerite Yourcenar. La femme, les femmes, une écriture - femme?,
Actes du Colloque Intern. Baeza (Jaén) 19-23 de Noviembre de 2002. Clermont-
Ferrand, SIEY: 219-232.
Brescia, G. (1997), La scalata del Ligure. Saggio di commento a Sallustio, Bellum Iugurthinum
92. 94. Bari: Edipuglia.
Bryan-Brown, A. N. (ed.) (1968), Oxford Latin Dictionnary. Oxford: Oxford University
Press.
Burgess, D. (1987), “The Authenticity of the Teichoscopia of Euripides’s Phoenissae”, CJ 83:
103-113.
Burnyeat, M. F. (2004), “Fathers and sons in Plato’s Republic and Philebus”, Classical
Quarterly 54: 80-87.
Calder, W. M. (1968), “Sophokles political tragedy, Antigone”, GRBS 9: 389-407.
Camacho Rojo, J. M. (2004), La Tradición Clásica en las Literaturas Iberoamericanas del siglo
XX: Bibliografía analítica. Granada: Universidad de Granada.
Camacho Rojo, J. M. (2012), “Recreaciones del mito de Antígona en el teatro del exílio
español de 1939. I: María Zambrano, La tumba de Antígona”, in Muñoz Martín, M.
N., Sánchez Marín, J. A. (eds.): 15-40.
Candido, A. (2006), Literatura e cultura de 1900 a 1945, in Literatura e sociedade. Rio de
Janeiro: Ouro sobre Azul.
Caroli, M. (2012), “Erodoto VI 21, 2. Una censura teatrale e ‘libraria’?”, A&R 6: 157-179.
Carrara, P. (1994a), “Sull’inizio delle ‘Fenicie’ di Euripide”, ZPE 102: 43-51.
Carrara, P. (1994b) “L’Inno a Helios di Elio Nicome e l’inizio delle ‘Fenicie’ di Euripide”,
Eirene 30: 37-41.
Cartoni, F. (2006), “Introducción” a Elsa Morante, El chal andaluz, Ed. de Cartoni, F. Madrid:
Ediciones Cátedra.
Castellaneta, S. (2013), Il seno svelato ad misericordiam. Esegesi e fortuna di un’immagine
poetica. Bari: Cacucci.
Castellet, J. Mª (1965), “Breve introducción a la obra de Salvador Espriu”, Primer Acto 60: 6-8.
Castillo, J. (1983), “La Antígona de María Zambrano”, Litoral 121-123: 9-15.
Catroga, F. (2001), Memória, história e historiografia. Coimbra: Almedina.
Ceracchini, S. (2011), “Le chiavi nascoste ne La commedia chimica di Elsa Morante”, in
Elisse: studi storici di letteratura italiana 6: 211-216.

320
Cerezo Magán, M. (2011), “Pedro Montengón, jesuita y literato alicantino del siglo XVIII:
su impronta clásica”, Nova Tellus 29/1: 175-225.
Chanter, T., Kirkland, S. D. (eds.) (2014), The Returns of Antigone. Interdisciplinary Essays.
New York: SUNY Press.
Chikiar Bauer, I. (2012), Virginia Woolf. La vida por escrito. Buenos Aires: Taurus.
Cipriani, G. (1986), Cesare e la retorica dell’assedio. Amsterdam: J.C. Gieben.
Conradie P. J. (1959), “The ‘Antigone’ of Sophocles and Anouilh. A Comparison”, Acta
Classica: 11-26.
Cooper, D. (1967), Picasso et le Théâtre. Paris: Cercle d’Art.
Cornford, F. M. (1907), “Elpis and Eros”, Classical Review 21: 228-232.
Couloubaritsis, L., Ost, J.-F. (eds.) (2004), Antigone et la Résistance Civile. Bruxelles: Les
Éditions Ousia.
Crane, G. (1989), “Creon and the “Ode to Men” in Sophocles Antigone”, Havard Studies in
Classical Philology 92: 103-116.
Curnis, M. (2002), “Cenni figurativi tra parola e immagine. Forme della percezione visiva
in Eur. Phoe. 99-155”, Quaderni del Dipartimento di Filologia Linguistica e Classica
«Augusto Rostagni» n.s. 1: 99-120.
Curnis, M. (2004), “Addendum euripideum alla teicoscopia di Phoe. 99-155: Demetrio
Triclinio ed esegesi metrica bizantina”, MEG 4: 101-108.
D’Angeli, C. (1993), “La presenza di Simone Weil ne La Storia”, in AA. VV., Atti del
Convegno ‘Per Elsa Morante’ (Parigi 15-16 gennaio1993). Milano, Linea d’Ombra
editore: 109-135.
De Martino, F. (1958), Morte e pianto rituale nel mondo antico. Dal lamento pagano al pianto
di Maria. Torino: Einaudi.
De Martino, F. (2001), “Generi di donne”, in De Martino, F., Morenilla, C. (eds.), El fil
d’Ariadna. Bari, Levante: 107-182.
De Martino, F. (2002), “Donne da copertina”, in De Martino, F., Morenilla, C. (eds.), El
perfil de les ombres. Bari, Levante: 111-186.
De Martino, F. (2013a), “Ekphrasis & pubblicità”, in Marino, S., Stavru, A. (eds.), Ekphrasis
(= Estetica. Studi e ricerche 1): 9-22.
De Martino, F. (2013b), “Ekphrasis e teatro tragico”, in Quijada Sagredo, M. and Encinas
Reguero, M. C. (eds.), Retórica y discurso en el teatro griego. Madrid, Ediciones Clásicas:
193-224.
De Martino, F. (2013c), “Tra narrare e descrivere”, in Ponzio, A. (ed.), Figure e forme del
narrare. Incontri di prospettive. Lecce, Milella: 130-143.

321
De Martino, F. (2014), “L’ekphrasis dello stupro: da Achille Tazio a Franca Rame”, in
Cerrato, D., Collufio, C., Cosco, S., Martin Calvijo M. (eds.), Estupro. Mitos antiguos
& violencia moderna. Homenaje a Franca Rame. Sevilla, ArCibel: 205-223.
De Martino (2015) = F. De Martino, “«Lenticchie e legumi»: l’ekphrasis negli storici greci”,
Veleia (cds).
Deppman J. (2012), “Jean Anouilh’s Antigone”, in Ormand, K. (ed.), A Companion to
Sophocles. Oxford, University Press: 523-537.
Di Benedetto, V., Medda, E. (1997), La tragedia sulla scena. La tragedia greca in quanto
spettacolo teatrale. Torino: Einaudi.
Donzelli, E. (2007), “Edipo salvato da Antigone. La serata a Colono di Elsa Morante”, in
Cappellini, K., Geri, L. (eds.), Il mito nel testo. Gli antichi e la Bibbia nella letteratura
italiana. Roma, Bulzoni: 191-200.
Duprey, J. (ed.) (2013), “Whose Voice Is This? Iberian and Latin American Antigones”,
Hispanic Issues On Line (Fall 2013): 147–162.
Duroux, R., Urdician, S. (eds.) (2010), Les Antigones contemporaines (de 1945 à nos tours).
Clermont-Ferrand: Presses Universitaires Blaise Pascal.
Duroux, R., Urdician, S. (jun.  2012), «  Cuando dialogan dos Antígonas. La tumba de
Antígona de María Zambrano y Antígona furiosa de Griselda Gambaro», Olivar 13, n°.
17, La Plata. Versiónon-line http://www.scielo.org.ar/cgi-bin/wxis.exe/iah/
Ercolani, A. (2000), Il passaggio di parola sulla scena tragica. Didascalie interne e struttura delle
rheseis. Suttgart-Weimar: Metzler.
Ercoles, M. and Fiorentini, L. (2011), “Giocasta tra Stesicoro (PMGF 222(b) ed Euripide
(Fenicie)”, ZPE 179: 21-34.
Ferrari, F. (1996), Introduzione al teatro greco. Milano: Sansoni.
Ferreira, A. M. (2011), Voltar a Ler 4 - Mário Sacramento. Aveiro: Universidade de Aveiro.
Fialho, M. C. (1991), “A Antígona de Jean Cocteau”, Biblos 67: 125-152.
Fialho, M. C. (1992), Luz e Trevas no Teatro de Sófocles. Coimbra: Universidade.
Fialho, M. C. (1998), “Sófocles, Rei Édipo”, in Silva, M. F. (ed.): 73-74. -Flashar, H. (2000),
Sophokles. Dichter im demokratischen Athen. München: C. H. Beck.
Fialho, M. C. (2001), “A Antígona de Júlio Dantas”, in Morais, C. (ed.), Máscaras Portuguesas
de Antígona. Aveiro, Universidade de Aveiro: 71-84.
Fialho, M. C. (2006), “O mito clássico no teatro de Hélia Correia ou o cansaço da tradição”,
in Silva 2006: 47-59.
Fiorentini, L. (2006/2008), Studi sul commediografo Strattide. Tesi dottorato, Università di
Ferrara.

322
Fiorentini, L. (2010), “Elementi paratragici nelle Fenicie di Strattide”, DEM 1: 52-68.
Flashar, H. (2000), Sophokles. Dichter im demokratischen Athen. München: C. H. Beck.
Fornaro, S. (1992), Glauco e Diomede. Lettura di Iliade VI 119-236. Venosa: Osanna.
Fraisse, S. (1974), Le mythe d’ Antigone. Paris: Armand Colin.
Fucecchi, M. (1997), La teichoscopia e l’innamoramento di Medea. Saggio di commento a
Valerio Flacco «Argonautiche» 6, 427-760. Pisa: ETS.
Funaioli M.P. (2011), “Il pedagogo sulla scena greca”, DEM 2l: 76-87.
Fusillo, M. (1995), “’Credo nelle chiacchere dei barbari’. Il tema della barbarie in Elsa Morante
e in Pier Paolo Pasolini”, in C. D’Angeli, C., Magrini, G. (eds.), Vent’anni dopo La
Storia. Omaggio a Elsa Morante. Pisa, Giardini: 97-129.
Gallavotti, C. (1969), “Tracce delle poetica di Aristotele negli scoli omerici”, Maia 21: 203-
208.
Galvão, W. N. (2000), Guimarães Rosa. São Paulo: Publifolha.
García Sola M. C. (2009), “La otra Antígona de Jean Anouilh”, in López, A., Pociña, A.
(eds.), En recuerdo de Beatriz Rabaza: comedias, tragedias y leyendas grecorromanas.
Granada, Universidad de Granada: 251-264.
Genette, G. (1989), Palimpsestos. La literatura en segundo grado, trad. de Fernández Prieto, C.
Madrid: Taurus.
Gil, I. C. (2007), Mitografias. Figurações de Antígona, Cassandra e Medeia no drama de
expressão alemã do século XX. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.
Gil, L. (1962), “Antígona o la areté política. Dos enfoques: Sófocles y Anouilh”, Anuario
de letras, accesible online http://www.revistas.unam.mx/ index.php/ral/article/
view/38416/0 con acceso en diciembre de 2014.
Goesch, K. (1955), Raymond Radiguet. Paris: La Palatine.
Goff, B., Simpson, M. (2007), Crossroads in The Black Aegean, Œdipus, Antigone, and Dramas
of the African Diaspora. Oxford: Oxford University Press.
Goldhill, S., Osborne, R. (1999), Performance culture and Athenian democracy. Cambridge:
Cambridge University Press.
Goldhill, S. (2007), How to Stage Greek Tragedy Today. London: Univ. of Chicago Press.
Gómez García, M. (1997), Diccionario del teatro, Tres Cantos: Ediciones Akal.
González Delgado, R. (2012), Canta, musa, en lengua asturiana. Estudios de traducción y
tradición clásica. Saarbrucken: EAE.
González-Fierro, F., Yéschenko, A. (eds.) (2000), Antoloxía poética asturiana (1639-2000)
= Antologia asturiisoi poézii (1639-2000). Xixón: Coleutivu Manuel Fernández de
Castro.

323
Green, J. R. (1999), “Tragedy and the spectacle of the mind. Messenger Speeches, Actors,
Narrative and Audience Imagination in Fourth Century BCE Vase-Painting”, in
Bergmann, B., Kondoleon, C. (eds.) (1999), The Art of Ancient Spectacle. Washington,
Yale University Press: 37-63.
Gubert, S. (1965), “Entrevista con Salvador Espriu”, Primer Acto 60: 13-17.
Guénoun, D. (1997), Le théâtre est-il nécessaire ?. Paris : Circé.
Guérin J. (2010), “Pour une lecture politique de l’Antigone de Jean Anouilh”, Études
Littéraries, 1: 93-104.
Guicharnaud, J. (21969), Modern French Theatre from Giraudoux to Genet. New Haven: Yale
University Press.
Hamburger, K. (21968), Von Sophokles zu Sartre. Griechische Dramenfigurenantik und modern.
Stuttgart: Kohlhammer.
Hathorn, R. Y., “Sophocle’s Antigone: Eros in Politics”, Classical Journal 54: 109-115.
Hester, D. A. (1971), “Sophocles the unphilosophical. A study in the Antigone”, Mnemosyne
24: 11-59.
Howatson, M. C. (ed.) (1991), Diccionario de la Literatura Clásica. Trad. Ávila, C. M. et al.
Madrid: Alianza Editorial.
Hualde Pascual, P., Sanz Morales, M. (2008), La literatura griega y su tradición. Madrid:
Ediciones Akal.
Iglesias, A. (2005), “La aurora de Antígona”, in AA. VV., El tiempo luz. Homenaje a María
Zambrano. Córdoba, Diputación: 17-32.
Iñiguez, M. (2001), Esbozo de una enciclopedia histórica del anarquismo español. Madrid:
Fundación de Estudios Libertarios Anselmo Lorenzo.
Jabouille, V. et al. (2000), Estudos sobre Antígona. Mem Martins: Inquérito.
Jiménez Jiménez, J. et al. (1978), Cuatro puntos teatrales. Teatro breve. Bilbao: El Paisaje.
Johnson, R. (1997), “María Zambrano as Antigone’s sister: towards an ethical aesthetics
possibility”, ALEC 22: 181-194.
Kautz, H. R. (1970), Dichtung und Kunst in der Theorie Jean Cocteaus. Heidelberg:
Buchbeschreibung.
Khim, J. J. (1960), Cocteau. Paris: Gallimard.
Kirkwood, G. M. (1958), A study of Sophoclean drama. Ithaca, New York: Cornell University
Press.
Kitzinger, M. R. (2008), The Choruses of Sophokles’ Antigone and Philoktetes. Leiden, Brill: 11-70.
Knox, B. M. W. (1964), The heroic temper: studies in sophoclean tragedy. Los Angeles, Bekerley,
Cambridge: University of California Press, Cambridge University Press.

324
Korneeva, T. (2011), Alter et ipse: identità e duplicità nel sistema dei personaggi della Tebaide
di Stazio. Pisa: ETS.
Lamo de Espinosa, E. (ed.) (1995), Culturas, estados, ciudadanos. Una aproximación al
multiculturalismo en Europa. Madrid: Ediciones Nobel.
Lausberg, H. (1966), Manual de retórica literaria. Fundamentos de una ciencia de la literatura.
Versão esp. Pérez Riesco, J. Madrid: Editorial Gredos.
Lázaro Paniagua, A. (2012), “La Antígona de María Zambrano o el oficio de la piedad”,
in López, A., Pociña, A., Silva, M. F. (eds.), De ayer a hoy: influencias clásicas en la
literatura. Coimbra, IUC: 253-259.
Leccese, J. (2013), “’Antigone’ di Elsa Morante – in ‘Serata a Colono’”, http://donnarte.
wordpress.com/2013/08/01/antigone-di-elsa-morante-in-serata-a-colono.
Lehmann, J. (1995), Virginia Woolf. Trad. de Conde Fisas, C. Barcelona: Salvat Editores.
Lentini, G. (2013), “Tra teikhoscopia e teikhomachia: a proposito delle mura dell’Iliade”, in
Bartoloni-Michetti 2013: 187-195.
Lesky, A. (1966), La tragedia griega. Trad. de Godó Costa, J. Barcelona: Editorial Labor.
Librán Moreno, M. (2005), Lonjas del banquete de Homero. Convenciones dramáticas en
la tragedia temprana de Esquilo. Huelva: Servicio de Publicaciones Universidad de
Huelva.
Llinares, J. B. (2001), “Noves interpretacions d’Antígona en la filosofía del segle XX”, in De
Martino, F., C. Morenilla, C. (eds.), El fil d’Ariadna. Bari, Levante Editori: 217-234.
Lloyd-Jones, H. (1966), “Problems of early Greek tragedy: Pratinas and Phrynichus”,
Cuadernos de la Fundación Pastor 13: 11-33.
López, A., Pociña, A. (2010), “La eterna pervivencia de Antígona”, Florentia Iliberritana 21:
345-370.
López, A., Pociña, A., Silva, M. F. (eds.) (2012), De ayer a hoy: influencias clásicas en la
literatura. Coimbra: CECHC.
López Gradoli, A. (ed.) (2007), Poesia visual española (antología incompleta). Madrid:
Calambur.
Loureiro, J. (2012), “A solidão egoísta de Antígona, ou A acção parcial. Problemas teológicos
e políticos na Antígona de Sófocles”, in Lopes, M. J. et al. (eds.), Narrativas do poder
feminino. Braga, Publicações da Faculdade de Filosofia, UCP: 127-135.
Lovatt, H.V. (2006), “The Female Gaze in Flavian Epic. Looking out from the Walls in
Valerius Flaccus and Statius”, in Nauta, R. R., van Dam, H. J., Smolenaars, J. J. L.
(eds.), Flavian Poetry. Leiden-Boston, Brill: 59-79.
Mariño Davila, E. (2003), “Un esperimentu lliterariu de nel Amaro: Novela ensin títulu
(1991)”, Lletres Asturienes 82: 79-93.

325
Mastromarco, G. (2012), “Erodoto e la Presa di Mileto di Frinico”, in Bastianini, G., Lapini,
W., Tulli. M. eds., Harmonia. Scritti di filologia classica in onore di Angelo Casanova,
Firenze, Firenze University Press: 483-494.
Malé, J. (2007), “‘Car hem aprés que l’ amor vençe la mort’. L’amor en els mites femenins
de Salvador Espriu”, in Malé, J. & Miralles, E. (eds.), Mites Clàssics en la literatura
catalana moderna i contemporània. Barcelona, Universitat de Barcelona: 123-145.
Martín Elizondo, J. (1988), “Sobre mi ‘Antígona’”, in Martín Elizondo, J., Antígona entre
muros. Madrid, SGAE: 13.
Mastronarde, D. J. (1990), “Actors on High. The Skene Roof, the Crane, and the Gods in
Attic Drama”, CA 9: 247-294.
Mattioli, U. desdobrar as iniciais para o índice (ed.) (1995), Senectus: la vecchiaia nel
mondo classico – vol. I: Grecia. Bolonha: editor
Medda, E. (2005), “Il coro straniato: considerazioni sulla voce corale nelle ‘Fenicie’ di
Euripide”, Prometheus 31: 119-131.
Mee, E. B., Foley, H. P. (2011), Antigone on the Contemporary World Stage. Oxford: Oxford
University Press.
Miniconi, P. J. (1981), “Un thème épique: la teichoskopia”, in Chevalier, R. (ed.), L’epopée
gréco-latine et ses prolonguements européens Calliope II. Paris, Les Belles Lettres: 71-
80.
Miralles, C. (1979), “El món clàssic en l’obra de Salvador Espriu”, Els Marges 16: 29-48.
Molinari, C. (1977), Storia di Antigona (de Sofocle al Living Theatre). Un mito nel teatro
occidentale. Bari: De Donato.
Monleón, J. (1988), “Del inmarchitable tema de la libertad”, in Martín Elizondo, J.,
Antígona entre muros. Madrid, SGAE: 7-8.
Moraes Augusto, M. G. (1992), « Le discours utopique dans la République de Platon», in
Gély, S., Sens et pouvoir de la nomination. Montpellier, Publications de La Recherche,
CNRS: 201-220.
Morais, C. (1998), “António Pedro, Antígona”, in Silva, M. F. (ed.): 59-62.
Morais, C. (ed.) (2001), Máscaras Portuguesas de Antígona. Aveiro: Universidade de Aveiro.
Morais, C. (2004), “António Pedro, Antígona (glosa Nova da tragédia de Sófocles)”, in Silva,
M. F. S. (coord.) (2004) 41-43.
Morais, C. (2012), “Mito e Política: variações sobre o tema da Antígona nas recriações de
António Sérgio e de Salvador Espriu”, in López, A., Pociña, A., Silva, M. F. (eds.), De
ayer a hoy: influencias clásicas en la literatura. Coimbra, CECH: 319-330.
Morais, C. (2014), “Antígona, ‘a razão suprema da liberdade’: intertexto e metateatro na
recriação de Carlos de la Rica (1968)”, in Pereira, B. F., Ferreira, A. M. (eds.): 97-108.

326
Morante, E. (1987), “Sul romanzo”, in Pro o contro la bomba atomica e altri scritti, a cura di
Garboli, C. Milano, Adelphi: 41-73.
Morenilla Talens, C. (2008), “La obsesión por Fedra de Unamuno (1912), Villalonga (1932)
y Espriu (1978)” in López, A. & Pociña, A. (eds.), Fedras de ayer y de hoy. Teatro,
poesía, narrativa y cine ante un mito clásico. Granada, Servicio de Publicaciones de la
Universidad de Granada: 435-480.
Moreno i Doménech, M. (2010/11), El tractament del grotesc a Antígona de Salvador Espriu.
Treball de Recerca del Màster Oficial Interuniversitari d’Estudis Teatrals: Universitat
Autònoma de Barcelona, http://www.recercat.net/bitstream/handle/2072/170120/
Eltractamentdelgrotesc.pdf
Moretón, S. (2011), “Antígona de María Zambrano”, Mediterránea 11/’11: 48-112 (en www.
retemediterranea.it).
Morey, M. (1997), “Sobre Antígona y algunas otras figuras femeninas”, in Rocha, T. (ed.),
María Zambrano: la razón poética o la filosofía. Madrid, Tecnos: 150-158.
Muñoz Martín, M. N. & Sánchez Marín, J. A. (eds.) (2012), Homenaje a la Profesora María
Luisa Picklesimer (In memoriam), Coimbra: CECHC.
Nadeau, M. (1964), Histoire du Surréalisme. Paris: Éditions du Seuil.
Nel Amaro (1989), “El teatro llariegu, un eficaz y forniu pegollu normalizador desaprocecháu”,
Lletres Asturianes 34: 17-28.
Nel Amaro (1991), Antígona, por exemplu. Uviéu: Academia de la Llingua Asturiana.
Nel Amaro et al. (1992), El secretu de la lluvia. Cuentos fantásticos. Uviéu: Academia de la
Llingua Asturiana.
Nieva de la Paz, P. (1999), “La tumba de Antígona (1967): teatro y exilio en María Zambrano”,
in Aznar Soler, M. (ed.), El exilio teatral republicano de 1939. Barcelona, Gexel: 287-302.
Nussbaum, M. (2001), The fragility of Goodness: luck and ethics in Greek tragedy and philosophy.
Cambridge: Cambridge University Press.
Oliveira, F. (2008), “Misoginia clássica: perspectivas de análise”, in Soares, C., Calero Secall,
I., Fialho, M. C. (eds.), Norma e transgressão I. Coimbra, IUC: 65-91.
Oudemans, Th. C. W., Lardinois, A. P. M. (1987), Tragic Ambiguity: Anthropology, Philosophy
and Sophocles’Antigone. Leiden: E. J. Brill.
Paglia, S. (2011), “La sperimentazione linguistica e l’esplicitazione tematica dai romanzi alla
Serata a Colono di Elsa Morante”, Critica letteraria 150 : 79-101.
Paglia, S. (2011), “Note sulla proiezione intertestuale dall’Edipo a Colono di Sofocle alla
Serata a Colono di Elsa Morante”, Maia 63 : 149-163.
Paillard, M. C. (2005), “Margherite Yourcenar et Virginia Woolf ‘dans le salon vaguement
eclairé par les lueurs du feu’: variations sur Une chambre à soi”, in Marguerite Yourcenar.

327
La femme, les femmes, une écriture - femme?, Actes du Colloque Intern. Baeza (Jaén)
19-23 de Noviembre de 2002. Clermont-Ferrand, SIEY: 109-123.
Papalexiou, E. (2010), «Mises en scène contemporaines d’Antigone  », in Duroux, R.,
Urdician, S., Les antigones contemporaines: 87-102.
Pasolini, P. P. (1991, 1998), Il Vangelo secondo Mateo. Edipo re. Medea. Introduzione di
Morandini, M. Milano: Garzanti.
Pelo, A. (2008), “ La Serata a Colono di Elsa Morante. Note sulla lingua e lo stile”, La lingua
italiana 4 : 137-151.
Pereira, B. F., Ferreira, A. (eds.) (2014), Symbolon IV – Medo e Esperança. Porto: FLUP.
Pianacci, R. E. (2008), Antígona: una tragedia latinoamericana. Irvine, California: Ediciones
Gestos.
Pickard-Cambridge, A. W. (1996), Le feste drammatiche di Atene, Seconda edizione riveduta
da Gould, J. e Lewis, D. M., trad. di Blasina, A., Scandicci (Firenze): La Nuova Italia
(1968, Oxford: Oxford University Press).
Picklesimer, M. L. (1998), “Antígona: de Sófocles a María Zambrano”, Florentia Iliberritana
9: 347-376.
Pino Campos, L. M. (2007), “Antígona, de la piadosa rebeldía de Sófocles a la mística
inmortal de María Zambrano”, Antígona 2: 78-95.
Pino Campos, L. M. (2005), “La condena de Antígona y el exilio de María Zambrano:
apuntes en torno a la historia sacrificial”, Revista de Filología de la Universidad de La
Laguna 23: 247-264.
Pino Campos, L. M. (2010), “Antígona y sus circunstancias”, Fortunatae 21: 163-187.
Piquero, J. L. (ed.) (2004), Antoloxía del cuentu eróticu. Lliteratura asturiana contemporánea.
Uviéu: Ámbitu.
Pociña, A. (2007), “Julia Uceda. ¿Poeta inexistente?”, in Tecer con palabras. Mulleres na poesía
en castelán, galego e portugués. Santiago, Edicións Correo: 301-306.
Prauscello, L. (2007), “’Dionysiac’ Ambiguity: HomHymn 7.27: ὅδε δ’αὖτ’ ἄνδρεσσι
μελήσει”, MD 58: 209-216.
Prieto Pérez, S. (1999), “El ethos de Eloísa y las figuras trágicas de Electra y Antígona en
María Zambrano a propósito de una distinción lucreciana”, in Adiego, I.-X. (ed.),
Actes del XIII Simposi de la Secció catalana de la S.E.E.C. Tortosa, Adjuntament:
263-269.
Pujol, M. (1999), “José Martín Elizondo: de una memoria defendida a un «teatro sin
fronteras»”, in Aznar Soler, M. (ed.): 331-347.
Pujol, M. (2009), “José Martín Elizondo. Una intensa vida de teatro”, Primer Acto 329:
156-168.

328
Pulquério, M. (1987), Problemática da tragédia sofocliana. Coimbra. editor
Quance, R. A. (2001), La tumba de Antígona de María Zambrano: Política y misterio. Madrid:
Visor Libros.
Quijada Sagredo, M. (2013), “La retórica de la súplica: los discursos de Adrasto y de Etra
(Eurípides, Supp. 162-92 y 297-331)”, in Quijada Sagredo, M., Encinas Reguero, M.
C. (eds.), Retórica y discurso en el teatro griego, Madrid, Ediciones Clásicas: 31-60.
Radatz, H.-I., Torrent-Lenzen, A. (eds.) (2006), Iberia polyglotta. Zeitgenossische Gedichte und
Kurzprosa in den Sprachen der Iberischen Halbinsel. Mit deutscher Ubersetzung. Titz: Axel
Lenzen Verlag.
Ragué Arias, Mª J. (1989), Els personatges femenins de la tragèdia grega en el teatre Català del
segle XX. Sabadell: AUSA.
Ragué Arias, María José (1990), Els personatges femenins de la tragèdia grega en el teatre català
del XX. Sabadell: Editorial AUSA.
Ragué, M. J. (1991), Los personajes y temas de la tragedia griega en el teatro gallego contemporáneo.
Sada – A Coruña: Ediciós do Castro.
Ragué Arias, M. J. (1992), Lo que fue Troya: los mitos griegos en el teatro español actual. Madrid:
Asociación de Autores de Teatro.
Ragué Arias, M. J. (1994), “La ideologia del mito. Imágenes de la Guerra Civil, de la
posguerra y de la democracia surgidas a partir de los temas de la Grécia Clásica en el
teatro de siglo XX en España”, Kleos 1: 63-69.
Ragué Arias, M. J. (1996), El teatro de fin de milenio en España (de 1975 hasta hoy). Barcelona:
Editorial Ariel.
Ragué Arias, M. J. (2005), “Del mito contra la dictadura al mito que denuncia la violencia y
la guerra”, in Vilches de Frutos, M. F.: 11-21.
Ragué Arias, M. J. (2011), “Mito y teatro en José Martín Elizondo”, in Aznar Soler, M.,
López García, J. R. (eds.): 362-369.
Ramos, M. L. (21991), Análise estrutural de Primeiras Estórias, in Coutinho, E. F. (ed.),
Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
Real, M. (2011), O Pensamento Português Contemporâneo 1890-2010. Labirinto da razão e a
Fonte de Deus. Lisboa: INCM.
Rebello, L. F. (1984). 100 Anos do Teatro Português. Lisboa: Brasília Editora.
Ripoli, M., Rubino, M. (eds.) (2005), Antigone. Il mito, il diritto, lo spettacolo. Genova: De
Ferrari & Devega.
Roda, F. (1965), “Notas al estreno de la primera versión de Antígona”, Primer Acto 60: 38-39.
Rodighiero, A. (2007), Una serata a Colono. Fortuna del secondo Edipo. Verona: Edizioni Fiorini.

329
Romero Mariscal, L. (2012), “Figuras del logos femenino en Virginia Woolf: Las razones de
Antígona”, in De Martino, F., Morenilla, C. (eds.), Teatro y sociedad en la Antigüedad
clásica. El logos femenino en el teatro. Bari, Levante Editori: 557-582.
Romero Mariscal, L. (2012), Virginia Woolf y el Helenismo, 1807-1925. Valencia: Ed.
Diputació de Valencia.
Romilly, J. (1971), Le temps dans la tragédie grecque. Paris: J. Vrin.
Ruiz, M. (1988), “Una ‘Antígona’ entre muros…”, in Martín Elizondo, J., Antígona entre
muros. Madrid, SGAE: 9-11.
Sarabando, J., Correia, J. Sacramento, C. (2009), Livro de Amizade. Lembrando Mário de
Sacramento. V. N. de Famalicão: Ed. Húmus.
Sánchez Vicente, X. X. (1991), Crónica del Surdimientu (1975-1990). Oviedo: Barnabooth.
Santiago Bolaños, M. (2010), “María Zambrano dialogue avec Antigone”, in Duroux, R.,
Urdician, S. (eds.), Les Antigones contemporaines…: 75-86.
Saxonhouse, A. (1986), “From tragedy to hierarchy and back again: women in Greek
political thought”, American Political Science Revue 80: 403-448.
Schofield, M. (1999), Saving the city: Philosopher-Kings and other classical paradigms. London,
New York: Routledge.
Segal, C. P. (1964), «Sophocle’s Praise of Man and the conflits of the Antigone», Arion 24: 46-60.
Seale, D. (1982), Vision and stagecraft in Sophocles. London and Canberra: Croom Helm.
Sgorlon, C. (1988), Invito alla lettura di Elsa Morante, Milano: Mursia editore.
Silva, M. F. (ed.) (1998), Representações de Teatro Clássico no Portugal Contemporâneo, vol. I.
Lisboa: Edições Colibri / FLUC.
Silva, M. F. (ed.) (2004), Representações de Teatro Clássico no Portugal Contemporâneo, vol. III.
Coimbra: FLUC.
Silva, M. F. (ed.) (2006), Furor: ensaios sobre a obra dramática de Hélia Correia. Coimbra: IUC.
Silva, M. F. (2010), “Le mythe d’Antigone sur la scène portugaise du XXe siècle”, in Duroux,
R. et Urdican, S. (eds.), Les Antigones contemporaines (de 1945 à nos jours). Clermont-
Ferrand, Presses Universitaires Blaise Pascal: 287-294.
Siti, W. (1995), “Elsa Morante nell’opera di Pier Paolo Pasolini”, in D’Angeli, C., Magrini,
G. (eds.), Vent’anni dopo La Storia. Omaggio a Elsa Morante. Pisa: Giardini.
Soares, C., Calero Secall, I., Fialho, M. C. (eds.) (2008), Norma e transgressão I. Coimbra: IUC.
Soares, C. Fialho, M. C., Alvarez Morán, M. C., Iglesias Montiel, R. M. (eds.) (2011),
Norma e transgressão II. Coimbra: IUC.
Staley, G. A. (1985), «The literary ancestry of Sophocles’ ‘Ode to Man’», Classical World 78:
561-570.

330
Steiner, G. (1991), Antígonas. Trad. Bixio, A. L. Barcelona: Editorial Gedisa.
Steiner, G. (1995; reimp. 22008), Antígonas. Trad. port. de Pereira, M. S. Lisboa: Relógio
d’Água.
Steiner, G. (1996), “Tragedy, pure and simple”, in Silk, M. (ed.), Tragedy and the tragic. Greek
theatre and beyond. Oxford, Clarendon Press: 534-46.
Stevens, E. B. (1933), «The topics of counsel and deliberation in Prephilosophical Greek
Literature», Classical Philology 28: 104-120.
Styan, J. (1973), The Elements of Drama. Cambridge: Cambridge Univ. Press.
Suder, W. desdobre-me esta inicial, por favor, para o índice (1991), Geras. Old age in Greco-
Roman Antiquity. A classified bibliography. Wroclaw: editor
Taplin, O. (1989), The stagecraft of Aeschylus. The Dramatic Use of Exits and Entrances in Greek
Tragedy. New York: Clarendon Press (with corrections; Oxford University Press 19771).
Trueba Mira, V. (2010), “La sierpe que sueña con el pájaro (algunos apuntes sobre María
Zambrano, dramaturga)”, Aurora 11: 103-116.
Ubersfeld, A. (1974), Le roi et le bouffon, Paris: Lire le théâtre. Éditions sociales.
Urdician, S. (2008), « Antigone, du personnage tragique à la figure mythique”, in Léonard-
Roques, V. (ed.), Figures mythiques, Fabrique et métamorphoses. Clermont-Ferrand,
PUBP: 87sqq.
Van Leeuw, M.-N. (2013), Le Mythe d’Antigone: sources et evolution. Editions des 3 hibouks
(e-book).
Várzeas, M. (2011), Sófocles. Antígona. Vila Nova de Famalicão: Humus (TNSJ).
Vilches de Frutos, M. F. (2005), Mitos e identidades en el teatro español contemporáneo (Foro
Hipánico 27). Amsterdam/New York: Edicions Rodopi.
Vilches de Frutos, M. F. (2006), “Mitos y exilios en la construcción de la identidad colectiva:
Antígona en el teatro español contemporáneo”, Hispanística XX 24: 71-93.
Vox, O. (1981), “Omero, Polibio, Dione Cassio: notizie editoriali”, Belfagor 36: 81-83.
Wiltshire, S. F. (1976), “Antigone’s desobedience”, Arethusa 9: 29-36.

331
(Página deixada propositadamente em branco)
Índice de Autores

Índice de Autores

Adam, James – 67 n. 4 3. 7. 4. 85 - 27 n. 42
Adréi - 269 n. 2 3. 11. 2. 137 - 34
Aguiar e Silva, Víctor Manuel – 92 n. 2, Aragon, Louis - 90
303 n. 2 Argentieri, Lorenzo – 38 n. 78
Albert, Juan Gil - 288 n. 5 Arguelles, José L.- 269 n. 4
Albini, Umberto – 25 Aristófanes
Alceu Acarnenses
Fr. 46 Diehl – 281 n. 31 Schol. 443 - 19 n. 10, 24, 24 n. 31
Fr. 119 Diehl - 281 n. 31 Aves - 27 n. 40
Álvarez, Carlos – 271
1130 – 26
Álvarez Llano, Ánxel - 269 n. 5
1507 - 27
Amaro, Nel (vide Fernández Álvarez,
Cavaleiros - 23
Manuel Amaro)
Fenícias – 18
Ameis, Karl Friedrich - 34 n. 64
Fr.*547 K.-A. - 19 n. 9
Anacreonte
Nuvens
Fr. 402/57 Page - 23
1367 – 23
Anouilh, Jean – 101, 102, 103, 108, 123-
136, 144 n. 9, 258, 288 Rãs
Antigone – 101 n. 18, 102, 144 n. 9, 176 1021 – 23, 25
p. 21 - 129 1254-1255 - 23
p. 31 - 132 Tesmofórias
pp. 69-91 - 135 166 - 23
p. 126 - 135 Schol. 21 – 67 n. 4
Médée – 101 n. 18 Vespas
Pièces Noires - 102 219-220 – 19
Antístenes – 67 n. 4 Aristófanes de Bizâncio - 21 n. 20, 24 n. 32
Antologia Palatina Aristóteles – 66, 102
9. 58. 1 - 38 Poética
Apollinaire, Guillaume – 90, 94 n. 10 1450a 5 - 168
Les mamelles de Tirésias - 91 1452b – 21
Apolodoro 1453b – 23
3. 5. 5-6 / 44-45 – 27 n. 42 1460a - 23

333
Índice de Autores

Arrabal, Fernando – 271 Berenguer, Alicia - 233 n. 25


Art Teatral - 272 n. 11 Bergamín, José – 122, 233, 244 n. 4, 245, 288
Ateneu La sangre de Antígona - 122, 233, 244 n.
1.20 - 22 4, 245

Aulo Gélio Bernárdez, Aurora - 130 n. 13

XIII, 68 – 67 n. 4 Beschi, Luigi – 31 n. 53

Auric, Georges - 94 n. 11 Bianchi, Letizia – 197 n. 5

Azcue, Verónica - 247 n. 17, 248 n. 19, 251 Biedma, Gil de - 271
n. 23. 253 n. 24 Bignone, Ettore - 204 n. 25
Aznar Soler, Manuel - 245 n. 6 Blundell, Mary Whitlock – 71 n. 12
Bodeüs, Richard – 71 n. 12
Bachelard, Gaston – 17 n. 2 Bolado García, Xosé - 264 n. 3, 272 n. 9
Ballanche, Pierre-Simón – 109 Bolognesi, Giancarlo - 25
Antigone - 109 Bond, Edward - 300
Balmas, Enea – 93 n. 6 Bosch Juan, María del Carmen – 109 n. 3,
Bañuls Oller, José Vicente – 108 n. 1, 127 145 n. 11, 248 n. 18
n. 9, 128 n. 11, 145 n. 11, 196 n. 1, Bosi, Alfredo - 161, 161 n. 3
221, 221 n. 1, 223, 233 n. 25, 237, 237 Brasete, Maria Fernanda - 141 n. 4, 195
n. 34, 244 n. 4, 269 n. 3 Brecht, Bertolt – 108, 143, 288
Barrès, Maurice – 95 Bremond, Mireille - 228, 228 nn. 14, 15
Voyage à Sparte - 94 n. 12 Brescia, Graziana – 28 n. 44
Voyages en Grèce - 94 Breton, André – 90, 94 n. 12, 100
Barthes, Roland – 300 Brozzoni, Claude - 298
Bauchau, Henry – 288 Antigone 466-64 – 298
Le journal d’ Antigone - 288 Bruno, Giordano - 216
Bauer, Irene Chikiar – 226 n. 9 Bryan-Brown, A. N. - 163 n. 12
Bayo, Manuel – 244 n. 4 Burgess, Dana - 21 n. 22, 22 n. 25, 22 n.
Ahora en Tebas - 244 n. 4 29, 24
Beckett, Samuel - 271 Burgos, Julián - 272
Beer, Josh - 71 n. 12
Bellini, Giovanni – 216 Calder, William M. – 179 n. 6
Bemba, Sylvain – 300 Calero Secall, Inés – 259 n. 4
Noces posthumes de Santigone - 300 Camacho Rojo, José María – 145 n. 11
Benet, Juan - 271 Campal, José Luís – 271 n. 7
Benítez, Esther - 198 n. 6 Campos, Álvaro de - 59
Benn, Aphra – 226 Candido, António - 160 n. 1

334
Índice de Autores

Cantarella, Raffaelle - 204 n. 26 Le Potomak – 92, 94 n. 10


Carinhas, Nuno - 303 Le train bleu – 93, 93 n. 7
Cáriton Visites à M. Barrès - 94 n. 12
3. 5. 6 - 35 n. 66 Colom, Guillem – 109, 109 n. 3
Caroli, Menico - 20 n. 13 Antígona. Poema dramàtic – 109
Carrara, Paolo – 20 n. 14 p. 7 – 109
Cartoni, Flavia - 198, 199 n. 10 Comércio do Porto - 139 n. 1
Castellaneta, Sabina - 34 n. 64, 35 nn. 65, Conradie, Pieter Jacobus – 136 n. 20
66, 68, 70, 71, 36 n. 74
Cooper, Douglas - 100 n. 16
Castellet, José María – 110, 111 n. 5
Cornford, Francis MacDonald – 71 n. 12
Castellón, Alfredo – 236 n. 32
Corno, Dario del – 204 n. 26
Castillo, Julia - 233 n. 25
Coronas, Fernán - 270 n. 5
Ceracchini, Silvia - 196 n. 4
Correia, Hélia – 175 n. 1, 246, 255-266
Cerezo Magán, Manuel – 108 n. 1
Desmesura. Exercício com Medeia - 261 n. 9
Cerri, Giovanni – 33, 39
Perdição. Exercício sobre Antígona – 176,
César – 28
246, 255-266, 287 n. 3
De bello galico
p. 19 – 262
7. 47. 4-5 - 28 n. 44
p. 26 – 263
Chanter, Tina - 145 n. 11
p. 29 – 263
Chapouthier, Fernand – 18 n. 7, 21 n. 20, 22
p. 30-32 - 263, 265
Cipriani, Giovanni – 28 n. 44, 35 n. 71,
p. 32 – 263
37 n. 76
p. 33 - 263, 264
Ciurans Ferrándiz, Ana - 198 n. 6
p. 37 – 262, 264
Claudiano
p. 38 – 264
Rufino
p. 39 – 264, 265
2. 60-70 - 28 n. 44
p. 45-46 – 264
Cocteau, Jean – 87-103
Antigone – 89, 93, 94, 94 n. 12, 95, 99, p. 46 – 264, 265
100, 101, 103 p. 48 - 265
Cap de Bonne Espérance - 91 p. 50 – 263
Fedra - 94 n. 11 p. 51 - 265
L’aigle à deux têtes - 94 n. 11 p. 52 – 264
La danse de Sophocle - 94 p. 55 – 265
Le dieu bleu - 93 p. 56 - 265
La machine infernale – 89, 94, 97, 101, 102 Rancor. Exercício sobre Helena - 261 n. 9
Parade - 93 Crespo Alcalá, Patricia – 108 n. 1, 128 n.

335
Índice de Autores

11, 145 n. 11, 196 n. 1, 221, 221 n. 1, p. 63 – 188


223, 233 n. 25, 237, 237 n. 34, 244 n. p. 69 - 188
4, 269 n. 3
p. 73 – 184 n. 9
Cruz, Duarte Ivo - 144 n. 10
p. 74 – 190
Cuccioli Melloni, Rita – 32 n. 56, 36
p. 79 – 191
Cuélebre literario - 271
p. 83 - 191
Curnis, Michele - 27 n. 43
p. 85 – 191
p. 94 - 191
Dain, Alphonse – 68 n. 7
p. 106 – 181 n. 8
D’Angeli, Concetta - 198 n. 9
p. 115-116 - 189 n. 12
Daniélou, Jean - 101
p. 117 – 189
Dantas, Júlio – 141, 155 n. 20, 175, 175 n.
p. 119 - 190 n. 14
1, 176, 177, 179, 181, 181 n. 8, 183,
186, 187, 188, 190, 191, 246, 258 p. 127 - 189

Antígona De Martino, Francesco – 23, 24 n. 30, 25


n. 34, 26 n. 35, 27 n. 40, 33 n. 59, 35
p. 14 - 183
n. 72, 37 n. 76, 40 n. 81
p. 18 – 183
Delavigne, Casimir de la - 95 n. 13
p. 19 – 183
Deppman, Jed - 127 n. 6, 133 n. 16
p. 22 – 183
Derrida, Jacques – 66
p. 27 – 184
Diaghilev, Sergei – 92, 93, 93 n. 7
p. 28 - 184
Diallo, Ladji – 296, 297, 298, 299
p. 29 – 177, 178, 179, 180, 181
J’kiffe Antigone ! - 296
p. 30 - 181
Diário de Lisboa - 139 n. 1
p. 31 – 180, 184
Di Benedetto, Vincenzo – 20 n. 17, 21 n.
p. 32 – 184 21, 23
p. 33 – 186 Dio Cássio
p. 37 – 186 73. 23 – 22
p. 39 – 187 Dio Crisóstomo – 24 n. 33
p. 41 – 187 Diodoro Sículo – 28
p. 44 – 187 13. 89 - 28 n. 44
p. 51 - 188 13. 108-111 – 28 n. 44
p. 52 – 180 Dionísio, Eduarda – 175 n. 1, 246
p. 56 - 190 Antes que a noite venha - 176
p. 61 – 188 Donini, Guido – 27
p. 61-63 - 188 Donzelli, Elisa – 198, 198 n. 8, 199 n. 12,
p. 62 – 188 209 n. 29

336
Índice de Autores

Du Chaxel, Françoise – 292 p. 80 - 114


C’est là qu’un jour je jouerai Antigone – p. 81 – 114
292, 293 p. 84 – 115
p. 90 - 294 p. 86 – 115
p. 90-94 – 294 n. 10 p. 91 – 116
p. 92 - 295 p. 93 - 116
p. 92-93 – 293-294 p. 94 – 114
p. 94 - 295 p. 97 – 118
L’été des mangeurs d’étoiles - 293 p. 99 – 118
Ducós, Luis Fris – 108 p. 101 – 119, 120
Historia de la Nueva Antígona - 108 p. 141 - 120, 121
Dumas, Alexandre - 95 n. 13 p. 155 - 121
Durán, Máximo – 236 n. 32 p. 156 - 121
Durif, Eugène – 289, 290, 291, 292 Una altra Fedra, si us plau - 119
Variations Antigone - 289, 291 Les roques i el mar: el blau – 112 n. 8, 120
Duroux, Rose - 145 n. 11, 196 n. 1, 223, p. 141 sq. – 120 n. 12
223 n. 7, 243 n. 2, 287, 287 nn. 2, 3, p. 155 sq. - 120 n. 12
291 n. 8
Ésquilo – 23, 112, 204 n. 25, 276
Coéforas
Easterling, Patricia - 135 n. 18
750 – 35 n. 66
El Descamisado - 276 n. 21
896-897 - 35 n. 68
Élio Téon – 25, 27 n. 40 Euménides - 20 n. 17, 55 n. 5, 160
Progymnasmata X, p. 68. 16-24 Patillon‑ 658-661 - 55 n. 5
-Bolognesi – 25
Persas – 19, 19 n. 11, 23
Emard, Anne-Sophie - 293
1 - 19
Énio - 28
Sete contra Tebas – 18, 20 n. 15, 21 n. 23,
Fr. 9. 419 Vahlen - 28 n. 45 24, 26, 27 n. 39, 109, 113, 114
Ercolani, Andrea - 24 n. 33 182 sqq. – 21
Ercoles, Marco – 18 n. 8 375-685 - 27 n. 42
Errandonea, Ignacio - 204 n. 26 751 - 26
Escalígero - 24 n. 32 Suplicantes - 19
Espriu, Salvador – 105-122, 244 n. 4 Estácio, Públio Papínio – 17, 28, 34, 35 n.
Antígona – 105-122, 244 n. 4 68, 117
p. 55 - 119 Aquiles
p. 76 - 112 1. 77-78 - 35 n. 70
p. 79 – 114 2. 23-26 – 29

337
Índice de Autores

Siluae 7. 535-536 - 37
5. 2. 22-124 – 30 n. 50 11. 341-342 - 35 n. 70, 36
Tebaida – 17, 28, 107, 115 11. 354-355- 18 n. 3
4. 89-92 – 28 11. 354-364 - 39
5. 241b – 37 11. 354-375 - 29
5. 246 – 37
a
11. 357 – 18 n. 3
5. 247 sqq. - 37 11. 363-382 – 21 n. 24, 37 n. 75
5. 311 – 18 n. 5 11. 407-408 – 33, 33 n. 60
5. 342-356 – 28 12. 355 – 18 n. 5
5. 351 – 18 n. 5 12. 362 – 18 n. 5
5. 376 – 18 n. 5, 28 Estesícoro – 18 n. 8
5. 410 – 18 n. 5 Fr. 222b – 18
5. 495 - 18 n. 5 Gerioneide, S13. 2-5 - 35
7. 240-242 – 18 n. 4, 28 Estrátis
7. 242-373 - 29 Fenícias – 18
7. 243 - 21 Fr. 46. 3 K.-A. - 20 n. 16
7. 243 sqq. – 21 Fr. 47 K.-A. – 19 n. 9
7. 244-245 - 32 n. 58 Fr. 48 K.-A. - 19 n. 9
7. 246 – 18 n. 3 Eurípides – 23, 35 n. 68, 66 n. 4, 67 n. 4,
7. 246-373 – 21 112, 118, 159, 168
7. 255-256 – 34 n. 63 Alceste – 21 n. 20, 23
7. 279 – 34 n. 63 Andrómaca – 21 n. 20
7. 310-311 - 34 n. 63 Bacantes - 40
7. 391 – 18 n. 5 913-914 - 40
7. 433 – 18 n. 5 924 - 23
7. 435 – 18 n. 5 Electra – 27 n. 39
7. 443-450 - 37 1207 - 35 n. 68
7. 481-483 - 35 n. 70 Fenícias – 17, 18, 18 n. 8, 20 n. 14, 23,
7. 481-486 – 36 24, 26, 32, 109, 112, 114
7. 485 – 36 11 – 33
7. 490-491 – 36 n. 73 70-74 - 34
7. 522 - 36 79 – 18 n. 5
7. 522-524 – 35 n. 70, 36 81 - 23
7. 524 - 36 83 - 20
7. 523-524 – 36 88 – 20

338
Índice de Autores

89-91 - 21 574-576 - 26
95 - 27 584 sqq. - 24 n. 33
99 – 21 593 – 18 n. 5
106-108 – 25 636 - 20
115 - 27 744 - 18 n. 5
116 – 18 n. 5 751 - 26
142 - 27 752 - 18 n. 5
142 sqq. – 26 796 – 18 n. 5
145 – 27 814 - 24 n. 33
151-153 - 38 823 – 18 n. 5
156-158 – 33 n. 60 1077 - 27
156-170 - 40 1093 sqq. - 26
170 – 20 1137 - 18 n. 5
171 - 23 1150 – 18 n. 5
172 – 23 1219-1263 - 33
179-180 - 38 1270 sqq. - 21
180-181 - 25 1270-1282 – 20 n. 17
182 – 19 n. 9 1275 – 21 n. 19
182-191 – 38 1320 sq. – 24 n. 33
194-195 - 40 1335 sqq. – 26
198-201 - 24 n. 33 1354-1355 - 33
202 – 19, 19 n. 11 1357 – 18 n. 5
239 – 18 n. 5 1359-1454 - 33
261 – 20 1395 – 26 n. 36
301 – 20 1398-1399 - 26 n. 36
322-326 - 32 n. 58 1427 sqq. – 26
355-356 – 24 n. 33 1434-1435 – 35, 35 n. 69
358-360 - 24 n. 33 1436 sqq. - 21
366 – 18 n. 5 1475 – 18 n. 5
387-399 – 24 n. 33 1478 sq. - 24 n. 33
442 - 24 n. 33 1485 sqq. – 21
450 - 23 1523-1529 – 36
463 – 20 n. 16 1527 - 35 n. 69
474-483 - 184 1567-1569 – 35, 36
524 sqq. – 24 n. 33 1567-1581 – 26

339
Índice de Autores

1751-1757 - 38 Fernández Álvarez, Manuel Amaro - 269-


Schol. 88 – 27 284
Schol. 93 - 20 Adiós Dvorak! - 269 n. 5
Schol. 1019 - 24 Antígona, en capilla - 271 n. 8, 273
Hécuba - 34 Antígona, por exemplu - 269-284
Helena – 18 n. 8, 21 n. 22 p. 11 - 274
Hipólito – 23 p. 12 - 276
Hipsípila p. 13 - 274, 275 n. 19
Fr. 752f. 29sqq. Kannicht - 40 n. 82 p. 14 - 275 n. 17, 276
Ifigénia em Áulide – 18 n. 8, 40 p. 15 - 275, 276
Ifigénia entre os Tauros – 20 n. 17, 21 n. 22 p. 15-16 - 275
497 – 33 n. 61 p. 16 - 275, 276 n. 20
867-922 - 20 n. 17 p. 18 - 276
Medeia – 21 n. 20, 159, 169 n. 35 p. 19 - 274 n. 15, 276
36 – 169 p. 19-21 - 277
89-95 – 169 p. 21 - 277
112-114 - 169 p. 22 - 277
115-118 – 169 p. 23 - 274 n. 15
791-793 – 169 p. 24 - 278 n. 25
1236-1237 – 169 p. 25 - 275 n. 18
1309 - 169 p. 28 - 281 n. 30
1317 sqq. - 21 n. 21 p. 29 - 284
Orestes – 18 n. 8, 21 n. 22 p. 30 - 274 n. 15, 278
527 – 35 n. 68 p. 30-33 - 274 n. 16
841 - 35 n. 68 p. 31 - 278
1567 sqq. – 21 n. 21 p. 32 - 278, 279
Reso – 24 n. 30 p. 34 - 279 n. 27
Suplicantes – 19 p. 35 - 274 n. 15
846-856 – 27 n. 39 p. 35-36 - 280
Troianas - 26 p. 36 - 280
Eustácio p. 37 - 274 n. 15
Ad Il. 785. 41-42 - 22 n. 26 p. 39 - 280
p. 40 - 280
Faranda Villa, Giovanna – 28, 33 n. 60, 36, 39 p. 40-41 - 280
Ferécides p. 41 - 281 nn. 29, 30
FGrHist 3 F 41 - 27 n. 41 p. 43 - 281, 281 n. 31

340
Índice de Autores

p. 44 - 281 Qué felicidá! La píldora y L’ angustia de Six-


p. 45 - 274 n. 15 to P. - 272 n. 11
p. 48 - 274 n. 15, 281, 283 ‘Relatu s utaler’ - 269 n. 5
p. 50 - 282 Responsos laicos - 269 n. 4
p. 51 - 274 n. 15, 282 Reversos - 269 n. 4
p. 52 - 282 Sestaferia - 271 n. 8
Bloquea-dos y El niño y el ángel - 272 Siete vidas tiene un gato - 271 n. 8
Boca arriba, para Marta B. - 269 n. 4 Suicidiu a la carta - 272 n. 11
Buffet-Tard - 272 n. 12 Y, tu, Marta B., qu’entoncies num yeres,
tampocu - 269 n. 4
Café Voltaire - 269 n. 4
Xénesis o Alborá de la concencia - 271 n.
Cementeriu cívicu - 269 n. 4
8, 272
De sópitu ... sonsones - 271 n. 8
Ferrari, Franco – 24 n. 32
Diariu d’un polizón - 269 n. 4
Ferreira, Ana Maria - 139 n. 1, 141 n. 4
Ego - 272 n. 11
Ferreira, José Ribeiro - 203 n. 21
El banquete - 272
Fialho, Maria do Céu Zambujo – 92 n. 5,
Entós, cuando ñevaba - 269 n. 5 145 n. 11, 176 n. 3, 203 n. 21, 208,
Falanxista!!! - 269 n. 5 208 n. 28, 246 n. 13, 258, 258 n. 2
García Lorca para los niños - 271 n. 8 Filarco - 35 n. 71
Glayíos nueos, vieya murnia - 271 n. 8 Filóstrato
Habitación de poeta - 269 n. 4 2. 29 – 18 n. 6
Historia del niño que quiso ser poeta y ter- Fiorentini, Leonardo – 18, 18 n. 8, 19 n.
minó en libertino anarquista - 272 9, 20 n. 16
L’ último del pelotón - 269 n. 5 Flahaut, Philippe – 289, 290, 291
L’ únicu rebalbu - 271 n. 8 Flashar, Helmut - 95 n. 14
Las cuentas del anónimo - 269 n. 4 Foley, Helene - 145 n. 11
Les manes en caxón - 272 Fornaro, Sotera – 22 n. 27
Más moral que Samaniego - 271 n. 8 Fraisse, Simone - 94 n. 12, 244 n. 5
Mas (Poe) - 269 n. 4 Freud, Sigmund - 102
1. 033 - 271 n. 8 Frínico (cómico)
Na borrina - 269 n. 5 Fr. 32. 3 K.-A. - 23
Novela ensin títulu - 269 n. 5, 283, 284 Frínico (trágico) – 18, 20
Poemas de San Francisco - 269 n. 4 Fenícias - 19
Poemes de San Francisco - 269 n. 4 Fr. T 5 Sn.-Kn. - 19
Prietu jazz - 269 n. 5 Fr. 8 Sn.-Kn. – 19
Pruebes d’ autor - 269 n. 4 Fr. 9 Sn.-Kn. - 19

341
Índice de Autores

Fr. 10 Sn.-Kn. – 19 n. 11 Goldhill, Simon – 71 n. 12, 303, 303 n. 1,


Homens em assembleia - 20 n. 13 308, 308 n. 5, 309 n. 6

Justos – 20 n. 13 Gómez García, Mario – 201 n. 17

Persas – 20 n. 13 González Delgado, Ramiro - 269 nn. 2, 3

Tomada de Mileto – 20 n. 13 González-Fierro, Frederico - 269 n. 4


Górgias
Fucecchi, Marco – 30, 30 n. 51
Fr. 82B 24 D.-K. – 23, 25
Funaioli, Maria Paola – 20 n. 18
Gramsci, Antonio - 215
Fusillo, Massimo - 199 n. 13
Green, J. Richard - 20 n. 18

Gago, Xosé – 269 n. 2 Grégoire, Henri – 18 n. 7

Gal, Jean-Claude - 292, 293 Griffith, Mark – 55 nn. 5, 6, 127 n. 9, 171,


171 n. 40
Gallavotti, Carlo – 22 n. 28
Guasta, Eugenio - 198 n. 6
Galvão, Walnice Nogueira - 160 n. 2
Gubert, Salvador – 110, 110 n. 4
Gambaro, Griselda – 291 n. 8
Guénoun, Denis - 289, 289 n. 6
Antígona furiosa - 291 n. 8
Guérin, Jean – 127 n. 6
García Lorca, Frederico – 271
Guicharnaud, Jacques - 101 n. 17
García Sánchez, Alberto - 296
García Sola, María Carmen – 125 n. 2, 127
Hahn, Reynaldo – 93
nn. 6, 7
Hamburger, Kate - 103 n. 19
Garrett, João Baptista de Almeida
Hardwick, Lorna - 125 n. 3
Frei de Luís de Sousa - 59
Hegel, Georg Wilhelm F. - 66
Genette, Gérard - 202, 202 n. 20
Heidegger, Martin – 66
Gentili, Bruno – 34 n. 62
Hentze, Karl - 34 n. 64
Gide, André – 100, 101, 103
Heródoto – 27 n. 40
Oedipe Roi - 101 n. 18
2. 127. 1 - 25
Gil, Isabel Capeloa - 145 n. 11
2. 144 – 23
Gil, Luis – 136, 136 n. 21
5. 72. 2 – 23
Giraudoux, Jean – 103 5. 162. 2 – 23
Amphytrion 38 - 101 n. 18 6. 103. 3 – 23
Électre – 101 n. 18 7. 102. 1 - 260 n. 7
La guerre de Troie n’aura pas lieu - 101 n. 18 Hesíodo – 66
Glauco – Trabalhos e Dias
Sobre os mitos de Ésquilo - 19 655 - 27
Goff, Barbara - 300 n. 15 Hester, D. A. – 71 n. 12
Goesch, Keith – 92 n. 4 Higino – 108, 117

342
Índice de Autores

Fábula 22. 88-89 – 34-35


69 - 27 n. 42 22. 194-196 – 32 n. 57
Holderlin, Friedrich – 55, 57 n. 10, 66 22. 430 - 34 n. 64
Homero – 18, 22, 22 n. 26, 31, 38 n. 79, 22. 460-465 – 31, 38
66, 269 n. 2 22. 466-472 - 32 n. 58
Ilíada – 17, 22 n. 26, 31 n. 55, 32, 58, 59 22. 699-719 – 31
n. 11, 160
24. 599-620 - 58
3. 121-244 - 31
24. 601 – 58
3. 139-244 - 31
24. 638-640 - 59
3. 141 – 32 n. 58
24. 697-702 - 39
3. 236-244 – 33
24. 699-719 - 39
3. 238 - 33 n. 60
Schol. 6. 119 - 22 n. 27
3. 390 sqq. - 32
Schol. 10. 1 – 22 n. 26, 23
6. 119-236 – 22
Odisseia
6. 372-373 – 37
4. 221 - 35
6. 386 - 37
11. 260-265 – 27
6. 386-389 – 31
6. 388-389 – 37 11. 302-304 - 34

6. 392-393 – 37 Honegger, Arthur – 89, 92, 94, 100

6. 429-430 - 40 Horácio

6. 434 - 37 Carmina

6. 490 – 37 3. 25.1-2 – 23
6. 495 - 37 Howatson, Margaret C. - 201 n. 17
8. 517-519 – 18 n. 4 Hugo, Victor - 95 n. 13
16. 702 - 38
18. 514-515 – 31 Iglesias, Amalia - 233 n. 24
19. 293 - 33 n. 61 Iñiguez, Miguel - 276 n. 21
20. 137 – 31 Ionesco, Eugène - 271
20. 145-146 – 31 Irigoin, Jean – 68 n. 7
22. 56 – 34
22. 74-76 – 34 Jabouille, Victor -145 n. 11
22. 79 - 34 n. 64 Jebb, Richard – 135, 135 n. 18
22. 80 – 35, 35 n. 66 Jiménez Jiménez, José - 272 n. 13
22. 82-83 - 35 n. 66 Jiménez Romero, Alfonso – 244 n. 4
22. 83 - 35 Oración de Antígona - 244 n. 4
22. 85 – 34 Johnson, Roberta - 233 n. 25

343
Índice de Autores

Justino Littérature - 90
1. 6. 13-15 – 37 Livro de Amizade. Lembrando Mário Sacra-
mento - 143 n. 7
Kafka, Franz - 271 Lletres Asturianes - 270 n. 5
Kamerbeek, J. C. - 132 n. 15 Llinares, Joan B. - 145 n. 11, 233 n. 25
Kautz, Hans Rudolf - 93, 93 nn. 6, 8, 94, Lloyd-Jones, Hugh – 20 n. 13, 171 n. 39
94 n. 10 López, Aurora – 145 n. 11, 195, 196 n. 1,
Kavafis, Konstantínos - 269 n. 2 223 n. 8, 233 n. 23
Kenney, Edward J. – 31 n. 53 López Gradoli, Alfonso - 271 n. 7
Kierkegaard, Soren – 288, 288 n. 5 Los Descamisados - 276 n. 21
Antígona - 288 n. 5 Louredo, Abel - 271 n. 7
Kirkland, Sean D. - 145 n. 11 Loureiro, João – 54 n. 3, 56 n. 9
Kirkwood, Gordon MacDonald - Lourenço, Frederico - 59 n. 11
Kitzinger, Margaret Rachel – 71 n. 12 Lourenzo, Manuel – 244 n. 4
Korneeva, Tatiana – 18 n. 3, 28 nn. 46, 47, Traxicomedia do vento de Tebas namorado
49, 31 n. 54, 37 n. 75, 39 n. 80 dunha forca - 244 n. 4
Kouyaté, Sotigui - 289, 297, 297 n. 12, 299 Lovatt, Helen V. - 28 n. 47
Antígona - 299 Lucano – 28, 28 n. 47
Kovacs, Laszlo - 271 n. 7 Farsália
7. 369-370 - 30
Lacan, Jacques – 66 12. 436-438 - 30
Lardinois, André P. M. – 71 n. 12 Luciano de Samósata
Lausberg, Heinrich - 201, 201 n. 16 Nigrino 8 - 22
Lázaro, Eusebio - 126 Lucrécio
Lázaro Paniagua, Alfonso – 233 n. 25 1.66-67 – 17 n. 2
Le Monde - 287 2. 5-11 – 17 n. 2
Leccese, Jolanda - 197 n. 5, 216, 216 n. 34
Lehmann, John - 226 n. 12 Malé, Jordi – 113, 113 n. 9
Lentini, Giuseppe – 17 nn. 1, 2, 38 n. 77, Mandela, Nelson – 298, 299, 300
40 n. 82 Un long chemin vers la liberté - 299
Lesky, Albin - 203, 203 n. 23 Marechal, Leopoldo - 288
Libânio
Mariño Davila, Esperanza - 269 n. 5, 283,
Epístola 33 – 67 n. 4 283 n. 32
Librán Moreno, Miryam – 21 n. 23, 26 n. 38 Martín Elizondo, José – 221, 225, 228, 230,
Lima, José Edmar - 76 n. 30 230 nn. 20, 21, 231, 232, 241-253
Litoral – 139 n. 1 Antígona entre muros / Antígona y los perros

344
Índice de Autores

/ Antígona 80 - 221, 225, 228, 230, Mazon, Paul – 68 n. 7, 131 n. 14


231, 232, 241-253 Medda, Enrico – 19 n. 9, 20 nn. 15, 17, 21
p. 13 – 247 n. 21, 23, 24 n. 31, 40 n. 82
p. 22 – 249 Mee, Erin B. – 145 n. 11
p. 27-28 – 250 Méridier, Louis – 18 n. 7
p. 28 - 252 Milhaud, Darius – 92, 93, 94, 94 n. 11
p. 29 – 231, 252 Le boeuf sur le toît - 94 n. 11
p. 30 – 250 Mimnermo – 121
p. 32 - 250 n. 21 Miniconi, Pierre J. - 28 nn. 44, 45
p. 33 – 232 n. 22 Miralles, Carles - 110 n. 4
p. 34 – 232 n. 22 Molina Campos, Enrique – 238
p. 35 – 232 n. 22 Monleón, José - 228, 229 n. 18
p. 36 – 232 n. 22, 249 Montayés, Josep - 112 n. 8
p. 37 – 232 n. 22 Montengón y Paret, Pedro – 108
p. 39 – 249 Agamenón, Egisto y Clitemnestra - 108
p. 41 - 251 Antígona y Hemón – 108
p. 42 – 232 n. 22 Edipo - 108
p. 43 – 232 n. 22 Eudoxia, hija de Belisario - 109 n. 2
p. 44 – 232 n. 22, 249 Morais, Carlos – 141 nn. 3, 5, 145 n. 11,
p. 45 – 232 n. 22, 248 175 nn. 1, 2, 179 n. 4, 195, 195 n. 1,
p. 46 – 232 n. 22 222, 222 nn. 4, 244 n. 4, 246 n. 14,
247 n. 16, 258 n. 1
p. 49 - 232 n. 22
Morante, Elsa - 193-217, 288
p. 53 – 232, 250
Addio – 198, 200
p. 54 – 232
p. 5-17 – 200
p. 56 - 251
Algo en la Historia - 198 n. 6
Cómicos sin terra - 245 n. 10
Antefatto - 202
Pour la Grèce - 247 n. 15
Aracoeli – 198, 198 n. 6
Martone, Mario - 197, 197 n. 5
Canzoni popolari – 200, 215
Mastromarco, Giuseppe – 19 n. 12, 20 n. 13
p. 117-221 - 200
Mastronarde, Donald J. – 20 n. 18, 21 n.
20, 21 n. 21, 23, 24, 24 n. 32, 26 n. 38, p. 120 – 215
31 n. 55, 35 n. 70, 40 p. 122 – 216
Mateus p. 127 - 216
8, 22 - 58 Il mondo salvato dai ragazzini e altri poemi –
Máximo de Tiro 195, 196, 197, 198, 199 n. 12, 200, 215
18. 9 - 23 L’isola di Arturo – 197, 198 n. 6, 200

345
Índice de Autores

La commedia chimica – Antígona - 244 n. 4


p. 21-124 - 200 Musso, Olimpio – 112 n. 8
p. 98 – 211 Musti, Domenico - 31 n. 53
La serata a Colono – 193-217, 288, 300
n. 16 Nadeau, Maurice – 90 n. 1, 94 n. 12
p. 30-96 – 196 Nicolau Damasceno
p. 31-96 - 200 Fr. 66. 43-44 Jacoby – 37 n. 76
p. 36 – 212, 214 Nieva de la Paz, Pilar – 233 n. 25, 236 n. 32
p. 38 – 210 Nostro, Serena – 197 n. 5
p. 40 - 207, 214 Nucciotti, Angelo – 204 n. 25
p. 42 – 207, 208, 212 Nueva Conciencia - 272 n. 12
p. 45 - 214 Nussbaum, Marta - 54 n. 4, 71 n. 12
p. 48 - 213
p. 49 - 211 Oliveira, Francisco de - 258 n. 3
p. 50 – 210 Ollé, Joan – 112 n. 8
p. 51 – 206 n. 27, 211 Orfeu - 101
p. 66-70 - 207 Osofisan, Femi – 300 n. 15
p. 68 – 211 Tegonni: An African Antigone - 300 n. 15
p. 69 – 214 Osório, João de Castro – 144 n. 10, 175
p. 73 sqq. - 203 n. 22 n. 1, 246
p. 85 – 214 Trilogia de Édipo - 144 n. 10
p. 88 sq. – 215 Oudemans, Theodorus Christiaan W. – 71
n. 12
p. 90 - 215
Ovídio
p. 91 - 207
Metamorfoses
La Storia – 197, 198, 198 n. 6, 200, 212,
216 8. 14 – 31 n. 53

Menzogna e sortilégio - 197, 198 n. 6 8. 17 - 31 n. 53

Moravia, Alberto - 199 8. 17-24 - 31

Morenilla Talens, Carmen – 108 n. 1, 111


n. 6, 126 nn. 4, 5, 127 n. 9 Paglia, Silvia - 202, 202 n. 19, 204, 204 nn.
Moreno i Doménech, María – 119 n. 11 24, 25, 26, 209, 210 n. 31, 211, 212,
212 n. 32
Moreno, Juan - 198 n. 6
Paillard, Marie-Christine – 228, 228 nn.
Moretón, Sara - 145 n. 11, 233 n. 25 16, 17
Morey, Miguel - 233 n. 25 Papalexiou, Eleni - 297 n. 13
Mota, João – 246, 258 Pasolini, Pier Paolo – 199, 199 nn. 11, 12,
Muñoz i Pujol, Josep – 244 n. 4 13, 200, 202 n. 19, 209

346
Índice de Autores

Edipo Re - 199, 199 n. 12, 209 p. 329 - 191


Patillon, Michel – 25 Pelo, Adriana - 213, 213 n. 33
Pausânias Pemán, José María – 122, 244 n. 4
1. 41. 6 – 31 n. 53 Antígona - 121, 244 n. 4
1. 42. 1-2 – 31 n. 53 Pianacci, Rómulo – 196 n. 1, 223, 223 n.
1. 42. 3 - 31 n. 53 6, 288, 288 n. 4
9. 5. 6-8 - 27 n. 41 Picasso, Pablo – 89, 92, 93, 100, 100 n. 16
Pearson, Alfred Chilton – 66 n. 4 Pickard-Cambridge, Arthur W. – 20 n. 17
Pedro, António – 141, 144 n. 10, 175, 175 Picklesimer, Maria Luísa – 223, 225, 233
n. 1, 178, 179 n. 4, 180, 180 n. 7, 181 n. 25
n. 8, 182, 184, 185, 187, 188, 189, Pieraccioni, Dino - 204 n. 25
190 n. 13, 191, 246, 246 n. 14, 258 Píndaro – 83, 84
Antígona. Glosa nova da tragédia de Sófocles Ístmica
– 144 n. 10, 176, 179, 246 n. 14
5. 1-6 - 40 n. 82
Acto II - 178
Nemeia
p. 259 – 179 n. 4
10. 87-88 – 34 n. 62
p. 260-261 - 184
Pítica
p. 261 - 180, 185
11. 63-64 - 34 n. 62
p. 267 – 178, 180
Fr. 214 Snell – 84 n. 38
p. 269 - 180 n. 7
Pino Campos, Luis Miguel - 233 n. 25, 279
p. 275 – 178, 179 n. 5, 180, 182 n. 26
p. 277 – 182 Piquero, José Luís – 269 n. 5
p. 278 – 186 Pirandello, Luigi - 143, 144, 148, 150 n.
p. 279 – 186 17, 153
p. 280-283 – 187 Platão - 63-85, 216, 308
p. 281 - 188 Eutífron - 84
p. 283 - 188 Fedro – 66, 66 n. 2
p. 290 – 187, 188 268c 6 - 67 n. 5
p. 291 – 188 269a 1 - 67 n. 5
p. 296 - 189 Filebo – 66 n. 2
p. 298 – 178 Leis – 66 n. 2
p. 308 – 185, 190 959a - 18
p. 309 – 185 República - 63-85
p. 310 - 185 Livro I – 68, 72, 77
p. 315 – 178 Livro IV – 76, 81
p. 317-319 - 190 n. 13 Livro VIII - 66 n. 4

347
Índice de Autores

Livro IX - 66 n. 4 Pociña, Andrés – 145 n. 11, 195, 196 n.


328c 5 - 7d 1-4 – 78 n. 33 1, 223, 223 n. 8, 225, 233, 233 n. 23,
237, 238, 238 nn. 35, 37
328d – 77 n. 32
Políbio
329a-d – 77, 81 n. 35
329c - 66 n. 3, 67 5. 21 - 27

329d – 66 n. 3, 67 10. 21. 3-6 – 22

329d-e – 82 n. 36 Polieno

330d – 83 n. 37 7. 45. 2 - 37 n. 76

330d 1-3 – 67 n. 6 Pólux – 34


330d – 331a – 72 n. 15 2. 56. 7-8 – 35 n. 71
331a 2-8 – 84 n. 38 15. 31. 13 - 35 n. 71
331b 2-5 - 84 n. 39 Portocarrero, Maria Luísa – 53 n. 1
331c 1-4 - 85 n. 40 Pound, Ezra - 100
331d 1-2 – 83 Povill i Adserà, Joan - 244 n. 4
333e – 72 n. 14 La tragèdia d’ Antígona - 244 n. 4
338c – 69 Pozo, Segno del - 128 n. 10
338c 1 – 70 n. 9 Prauscello, Lucia – 38 n. 79
338d-e - 79 n. 34 Prieto Pérez, Sonia - 233 n. 25
338e 1 – 339 1-4 - 70 n. 9
a
Primer Acto - 110 n. 4
394c - 77 Pujol, Martín - 245 nn. 7, 8, 247 nn. 15, 17
432 5 – 71 n. 11
a
Quance, Roberta Ann - 233 n. 25
433b 8 - 71 n. 11 Quijada Sagredo, Milagros – 27 n. 39
568b 1 - 66 n. 4
569d 6-7 - 65 Radt, Stephan von – 66 n. 4, 269 n. 4
Simpósio – 66 n. 2 Radice, Giuseppina Lombardo – 204 n. 25
Téages Radiguet, Raimond – 89, 92, 101
125b 7 – 66 n. 4 Ragué Arias, María José – 109 n. 3, 222,
Plutarco – 28 222 n. 3, 245 n. 10, 249 n. 20, 250
Moralia n. 22
5. 241b - 37 Ramos, Maria Luiza - 161, 161 nn. 4, 5, 6, 7
245 b-c – 28 n. 44 Real, Miguel - 149 n. 15
5. 246a – 37 Rebello, Luiz Francisco - 143, 143 n. 8
5. 247 sqq. - 37 Riaza, Luis – 288
389a - 23 Antígona cerda - 288
Temístocles Rica, Carlos de la – 244 n. 4, 247
5. 5 - 20 La razón de Antígona - 244 n. 4, 247

348
Índice de Autores

Ricci, Domenico – 204 n. 25 Ruiz, María - 229, 229 n. 19, 246 n. 12


Rimbaud, Arthur - 216
Ripoli, Mariangela - 195 n. 1, 223, 223 n. 5 Sacramento, Mário – 139-155, 246
Ritsos, Yannis – 121 Antígona – 139-155
Rocha Pereira, Maria Helena – 78 n. 33, 79 p. 107 – 146
n. 34, 81 n. 35, 82 n. 36, 164 n. 15, p. 108 - 145 n. 13
169 n. 35, 176 n. 3, 203 n. 21, 259 n.
p. 109 – 147
5, 260 n. 6, 311 n. 11
p. 111 – 148, 154
Roda, Frederic – 112 n. 8
p. 112 – 149, 154
Rodighiero, Andrea - 202 n. 19
p. 113 - 154
Rodríguez, Xosé María – 244 n. 4
p. 113-115 – 146
Créon... Créon - 244 n. 4
p. 114-115 – 148
Romero Mariscal, Lucía – 226, 226 nn. 10,
11 p. 115 – 149
Romagnoli, Ettore - 204 nn. 25, 26 p. 115-116 – 150
Romilly, Jacqueline de – 260 p. 116-117 – 151
Rosa, Eduardo Nascimento – 246 p. 117 - 152, 153
Rosa, João Guimarães – 157-172 p. 117-118 – 148
A benfazeja – 157-172 p. 118 – 153
p. 475 – 162 nn. 8, 9, 10, 163 nn. 11, p. 119 - 153
13, 14, 165 nn. 16, 17, 18, 19 p. 120-121 - 154
p. 476 - 166 n. 24, 167 n. 25 p. 121 – 152
p. 477 – 166 nn. 20, 21, 22, 23, 169 p. 121-122 – 152
nn. 36, 37, 170 n. 38
p. 123 - 152 n. 19
p. 478 – 167 nn. 26, 27, 28, 30, 168
A linguagem sibilina - 139 n. 1
nn. 31, 32
Diário - 139 n. 1
p. 479-480 – 167 n. 29
Eça de Queirós – Uma estética da ironia -
p. 480 - 168 nn. 33, 34
139 n. 1
p. 481 - 172 nn. 41, 42
Ensaios de Domingo – 139 n. 1, 141, 146
Grande sertão: veredas - 159 n. 14
Primeiras estórias - 159, 160 Fernando Namora – O Homem e a obra -
Rousseau, Jean Jacques – 109 n. 2 139 n. 1
Émile - 109 n. 2 Fernando Pessoa – Poeta da hora do absurdo
Rubino, Margherita – 195 n. 1, 223, 223 - 139 n. 1
n. 5 Frátria, Diálogo com os Católicos (ou talvez
Rucellai, Giovanni – 128 não) - 139 n. 1, 149 n. 15
osmunda - 128 Há uma estética Neo-Realista? – 139 n. 1

349
Índice de Autores

Teatro anatómico - 139 n. 1, 140, 141, 343 – 18 n. 5


145, 150 n. 17 404-405 - 35 n. 70
Safo – 40 n. 82, 227, 269 n. 2 405 - 36
Fr. 16. 1sqq. Voigt - 40 444-445 – 18 n. 5
Fr. 16. 7-11 Voigt – 32 469-470 - 35 n. 70, 36
Fr. 17 – Voigt - 40 Troianas
Sagot-Duvauroux, J.-L. - 297 n. 13 634 – 18 n. 5
Salústio – 28 1070-1078 – 32 n. 56
Bellum Iugurthinum 1074 – 18 n. 4
92. 94 - 1075 - 18 n. 5
Salvat, Ricard – 112 n. 8 1091 – 18 n. 5
Sánchez Gijón, Ángel - 198 n. 6 1119 - 18 n. 5
Sánchez Vicente, Xuan Xosé - 271 n. 6 Sérgio, António – 141, 175 n. 1, 246
Santiago Bolaños, María – 233 n. 25 Serpia, Franco - 204 n. 25
Sapiens literario - 271 Sgorlon, Carlo – 201, 202 n. 18
Sarabando, João - 139 n. 1, 143 n. 7, 149 Shakespeare, William
n. 15
Hamlet
Sarraute, Claude – 287
I. 2. 137-159 - 58
Sartre, Jean Paul – 101 n. 18, 103, 144, 149
Sidónio Apolinário
n. 15
Carmen 7. 255-256 - 28 n. 44
L’être et le néant – 149 n. 15
Sílio Itálico – 28
L’existentialisme est un humanisme – 149
n. 15 Punica
Les Mouches - 101 n. 18 2. 251-255 – 30
Sastre, Alfonso – 271 Silva, Agostinho da - 246
Satie, Eric – 92, 93, 94 Silva, Maria de Fátima - 141, 145 n. 12,
195, 258 n. 1, 262 n. 10
Saxonhouse, Arlene – 71 n. 12
Simpson, Michael - 300 n. 15
Schofield, Malcom – 76 n. 30
Siti, Walter - 199 n. 13
Schüler, Donaldo – 68 n. 7, 74 n. 20, 77
n. 31 Slater, William J. - 24 n. 32
Segal, Charles Paul – 71 n. 12 Sócrates – 67, 72, 77, 78, 80, 81, 82, 83, 84
Segarra, Josep María – 112 n. 8 Sófocles – 23, 24 n. 33, 51-61, 63-85, 89,
90, 95, 107, 108, 112, 118, 121, 123-
Semónides – 32
136, 139, 157-172, 173, 175, 176,
Sena, Jorge de - 143 177, 179 n. 6, 180 n. 8, 182, 184, 186,
Séneca – 35 n. 68 187, 188, 191, 195, 196, 199, 200,
Fenícias – 18 201, 202, 202 n. 19, 203, 204, 204

350
Índice de Autores

nn.  25, 26, 205, 206, 207, 208, 209, 98-99 – 259
213, 221, 223, 224, 225, 230, 231, 99 – 57, 76 n. 28
243, 243 n. 1, 246, 247, 255-266, 269,
100-161 - 95
269 n. 3, 276, 278 n. 25, 279 n. 26,
283, 290, 296, 297, 298, 299, 300, 150-151 – 59
303-311 155-161 - 180
Ájax de Locros – 66 n. 4, 67 n. 4 162 - 180
Fr. 14 Pearson - 66 n. 4 162-214 – 97
Fr. 14 Radt - 66 n. 4 166-169 - 181
Antígona – 21 n. 20, 51-61, 63-85, 107, 170-174 – 164
108, 112, 115, 116, 123-136, 157- 173-174 - 179 n. 5
172, 173, 175, 176, 182, 204 nn. 25, 175-176 – 164, 181
26, 214, 223, 224, 225, 230, 231,
178-191 – 181
243, 243 n. 1, 244 n. 5, 246, 247,
255-266, 276, 278 n. 25, 280 n. 28, 182-183 – 181
283, 297, 303-311 194-201 - 182
1 – 131, 305-306 206-207 - 181
3 – 56 220 – 57
23-25 – 59 222 - 186
23-36 – 163 278-279 – 97, 186
33-34 - 180 316 - 188
36 – 55 322 – 186
45-46 - 164 324-326 - 188
47 – 259 325-326 - 186
49-68 – 68, 69 n. 8 332 – 165
58 - 56 332-383 - 96
61-62 – 259 352 sqq. – 260
63-64 – 259 354-355 – 70
65-67 – 60 354-363 - 70 n. 10
76-77 - 164 365-375 – 72 n. 13
78-79 – 259 375 - 71
86-87 – 56 375 sqq. - 97
88 - 164 450-455 - 164
93 – 132 454-455 – 57, 70
95 - 132 463-464 - 59
95 - 57 - 132 469 - 57
95-97 - 132 471-472 - 55

351
Índice de Autores

472 sqq. – 260 790 – 57


473-479 – 73 n. 16 798-799 – 57
473-526 – 135 811 – 60 n. 13
474-475 - 72 817-822 - 98
480-484 – 260 823-833 - 58
497-499 – 56, 260 824-832 – 135
504-509 - 188 856 – 55
513 – 33 n. 60 871 - 60 n. 13
519 – 57 875 – 260
523 - 167 876-881 – 135
524-525 - 57 876-882 - 171
525 – 259 879-880 – 55
548 – 56 891-892 - 57
555 – 60 904-912 - 54
557 – 73, 73 n. 18 912 – 40
559-560 – 59 916-925 - 136

563-564 - 73 n. 17 916-929 - 135

566 – 56 922-924 – 310

572 – 57 991 – 76 n. 27

580-581 – 187 n. 11 996 - 75

584 – 74 n. 19 1028-1032 - 991 – 76 n. 28

597 – 55 1033-1034 - 76 n. 29

654 – 98 1035-1039 – 190


1050-1052 - 77 n. 31
659-662 - 74 n. 20
1115-1154 – 127
672 - 99
1228-1230 – 57
678 sqq. – 259
1240-1241 - 98
681-682 – 75 n. 21
1319-1325 - 135
688-691 - 191
Édipo em Colono – 89, 150, 155 n. 20,
690-693 – 189
163, 187, 195, 196, 199 n. 12, 200,
707-708 - 75 n. 22 201, 202, 204, 204 nn. 25, 26, 205,
710-711 - 75 n. 23 206, 209, 213, 244 n. 5
720-721 - 75 n. 24 728-760 – 205
726-727 - 75 n. 25 935-959 – 205
730 – 99 1254-1279 – 205
755 - 75 n. 26 1284-1345 - 205

352
Índice de Autores

1308-1325 – 26 n. 37 Cena V - 128, 133, 136


1319-1325 - 135 Cena VI - 128
1347-1354 – 68 n. 7 Cena VII - 135
1516-1517 – 208 Cena X - 127
1518 – 208 Taplin, Oliver – 19 nn. 9, 11, 20 nn. 13, 17
1520-1521 – 208 Tasso, Torquato - 202
1526 – 208 Teócrito
1542-1545 - 208 Siracusanas
1650 – 208 15. 134-135 -
1654-1655 - 208 Terêncio – 19
Édipo Rei - 20 n. 15, 89, 95, 116, 177, Thoreau, Henry David - 56
202, 204 nn. 25, 26, 246, 258, 269, Tirteu
290, 308 Fr. 10. 25 West2 - 34
532-542 - 277 n. 24 Tito Lívio
1329-1330 - 203 5. 40. 4-7 - 28 n. 44
Electra – 40, 60 Tomada de Hecália – 20 n. 13
680 - 27 Torrent-Lenzen, Aina - 269 n. 4
680 sqq. - 26 Trueba Mira, Virginia - 221, 233, 233 n.
Spinoza, Benedictus - 216 24, 234, 234 nn. 28, 29, 235, 235 nn.
Steegmuller, Francis - 100 n. 15 30, 31, 236, 236 nn. 32, 33
Steiner, George – 56, 56 n. 8, 59 n. 12, 101 Tucídides – 27 n. 40, 28
n. 17, 144 n. 11, 196, 196 n. 2, 222, 1. 63. 3 - 23
222 n. 2, 233, 243 n. 1, 288 1. 103. 1 – 23
Stevens, Edward Boucha – 76 n. 30 2. 4. 2 - 28 n. 44
Stravinsky, Igor – 92, 94, 101 2. 79. 7 – 23
Oedipus Rex - 94, 101 3. 20. 3-4 - 25
Styan, John - 305, 305 n. 3 3. 21-22 - 27 n. 40
Suder, W. - 260 n. 8 7. 44 – 26
Svietaeva, Marina – 202
Ubersfeld, Anne - 95 n. 13
Tabares, Memé – 123-136 Uceda, Julia – 221, 225, 237, 238, 238 nn.
Antígona – 123-136 36, 38, 39, 40
Cena I – 126 Ananke – 238, 239
Cenas I-X – 127 p. 127-128 - 239
Cena II – 128, 129, 130, 133 Antígona - 221, 237
Cena III – 128, 131 En el viento, hacia el mar - 238

353
Índice de Autores

Escritos en la corteza de los árboles - 238 p. 69-70 – 227


Sin mucha esperanza - 238 p. 71 – 227
Unamuno, Miguel de – 271 p. 72 - 227
Urdician, Stéphanie - 145 n. 11, 223, 223
n. 7, 243 n. 2, 287 nn. 2, 3, 291 n. 8, Weil, Simone – 53 n. 2, 198, 216
300 n. 16 Cahiers – 198
L’Enracinement – 53 n. 2
Valério Flaco – 28 Wilamowitz-Moellendorff, Ulrich von -
Argonautica 179 n. 6
6. 482-491 – 30 Wilson, Nigel G. - 171 n. 39
6. 503-506 - 30 n. 52 Woolf, Virginia – 225, 226, 228
6. 575-586 – 30, 30 n. 51 Diario - 226
6. 575sqq. - 30 n. 52 Three Guineas / Tres Guineas - 226
6. 681 – 28 n. 48 The years / Los años – 121
6. 681-682 - 30 n. 52 The Waves - 228
Várzeas, Marta - 55
Verlaine, Paul - 94 n. 10 Xenofonte
Vértice – 139, 140, 140 n. 2, 145 Anábase
Vesálio, Andrés - 141 3. 1.17 - 33 n. 61
Vicente, Gil – 309
Breve Sumário da História de Deus - 309 Zambrano, María – 122, 221, 225, 233,
234, 235. 236, 236 n. 32, 237, 244 n.
Virgílio – 28
4, 245, 279, 289, 291, 291 n. 8
Eneida
Delirio de Antígona – 234
8. 592-593 – 28 n. 46
p. 239-251 – 234
11. 877 sqq. – 28 n. 46
p. 253-262 – 234
12. 131-133 – 28 n. 46
p. 263-265 – 234
12. 585-587 - 28 n. 46
p. 267-278 – 234
Vox, Onofrio – 22 n. 28
p. 279-285 - 234
El sueño creador - 234
Yéschenko, Aleksey - 269 n. 4
La tumba de Antígona – 122, 221, 225,
Yourcenar, Marguerite – 225, 227, 227 n. 233, 234, 234 nn. 26, 27, 28, 29,
13, 228, 228 n. 17, 279 235, 236, 237, 244 n. 4, 245, 291
Antigone ou le choix /Antígona o la elección n. 8
- 227 p. 100-102 - 236 n. 32
Feux / Fuegos - 227 p. 103-116 - 236 n. 33
p. 17-18 – 227 p. 104-105 - 237

354
Índice de Autores

p. 106 - 237
p. 119-120 - 235 n. 30
p. 123 - 235
p. 124 - 234 nn. 28, 29
p. 182 - 235
Zamora, Antonio de – 108
La destrucción de Tebas - 108
Zoungrana, Paul – 298, 299

355
(Página deixada propositadamente em branco)
Autores

Andrés Pociña Pérez (Lugo, 1947) es Catedrático de Filología Latina de la


Universidad de Granada, de la que fue Decano de la Facultad de Filosofía y
Letras y Director del Departamento de Filología Latina. Responsable del Grupo
de Investigación HUM 318 de la Junta de Andalucía. Imparte las enseñanzas de
Literatura latina (Grado) y Teatro grecolatino y su pervivencia en los teatros moder‑
nos (Máster). Investiga fundamentalmente sobre Literatura latina (diversos géneros);
Pervivencia del teatro clásico; Literatura gallega; Poesía griega del siglo XX.
Aurora López López (Sarria, Lugo, 1948) es Catedrática de Filología Latina de
la Universidad de Granada y Directora de la Unidad de Igualdad entre Mujeres
y Hombres. Responsable de las asignaturas de Textos latinos (Grado), Mujeres
romanas (Máster) y Teatro grecolatino y su pervivencia (Máster). Sus líneas
preferentes de investigación son: Literatura latina, especialmente los géneros
comedia y tragedia; Estudios sobre la literatura de la mujer y referente a la mujer;
Pervivencia y tradición clásica, sobre todo en el campo teatral.
Carlos Morais é Doutor em Literatura pela Universidade de Aveiro, na
especialidade de Literatura Grega, com a tese O Trímetro Sofocliano: variações sobre
um esquema, publicada em 2010 (Lisboa, FCT/FCG). Professor do Departamento
de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro, tem desenvolvido a sua principal
investigação em literatura grega e na receção do teatro clássico. Neste domínio,
publicou Máscaras Portuguesas de Antígona (Aveiro 2001) e vários estudos, em
livros e revistas internacionais, sobre o mito de Antígona nas literaturas portuguesa
e espanhola.
Carmen Morenilla Talens, Catedrática de Filología Griega, fue Decana de la
Facultad de Filología, Miembro del Consell Valencià de Cultura y del Consejo
Rector de Teatres de la Generalitat; es Directora del Departamento de Filología
Clásica de la Universidad de Valencia. En sus investigaciones se ocupa del teatro
griego y de la tradición clásica. Dirige desde su fundación el GRATUV (Grup de
Recerca I Acció Teatral de la Universitat de València)
Francesco de Martino è ordinario di Letteratura greca e responsabile scientifico del
Laboratorio di ricerca Mu.S.A. (Musica, Spettacolo, Arte) presso il Dipartimento
di Studi Umanistici dell›Università degli Studi di Foggia. Ha promosso e curato
un ampio commento ai lirici greci (Lirica greca, 1996, in collaborazione con
Onofrio Vox) e volumi su aspetti dimenticati della cultura antica,  Lo spettacolo
delle voci (1995) e Studi sull’eufemismo 1999), entrambi in collaborazione con Alan
H. Sommerstein, Mito e caticature, Abiti da mito e Medea istantanea. Miniature,
incisioni, illustrazioni (2009), Antichità & pubblicità (2010), Puglia mitica (2012).
Gimário Guerreiro da Costa possui graduação em Filosofia, mestrado e doutorado
em Teoria da Literatura e pós-doutorado em Filosofia, todos pela Universidade de

357
Brasília. Está em fase de finalização do segundo pós-doutorado (bolsista CAPES),
na Universidade de Coimbra, acerca da recepção da Antiguidade Clássica no
Grande Sertão: veredas.
João Diogo Loureiro recebeu em 2012 o grau de Mestre pela Faculdade de Letras
da Universidade de Coimbra com uma tese sobre o Político de Platão. Bolseiro
da FCT, encontra-se actualmente a fazer o seu doutoramento. Integra a equipa
luso-brasileira responsável pela tradução das Vidas... de Diógenes Laércio. Tem
trabalhado nas áreas da filosofia antiga, filosofia política, Sófocles e estudos de
recepção.
Maria do Céu Fialho é Professora Catedrática do Instituto de Estudos Clássicos.
A sua actividade de investigadora e docente tem‐se centrado na língua e literatura
grega, e em estudos de teatro clássico, contexto e recepção, bem como de Poética.
Trabalha também a obra de Plutarco.
Maria de Fátima Sousa e Silva é Professora Catedrática do Instituto de Estudos
Clássicos da Universidade de Coimbra. Desenvolveu, como tese de doutoramento,
um estudo sobre a Comédia Grega Antiga (Crítica do teatro na Comédia Grega
Antiga), e, desde então, tem prosseguido com investigação nessa área. Publicou já
traduções comentadas de outras nove comédias de Aristófanes, além de um volume
com a tradução das peças e dos fragmentos mais significativos de Menandro.
Maria Fernanda Amaro de Matos Brasete (1962-) é licenciada em Humanidades,
pela Universidade Católica Portuguesa (1985), mestre em Literaturas Clássicas, pela
Universidade de Coimbra(1991) e doutorada em Literatura, pela Universidade de
Aveiro (2011). É docente do Departamento de Línguas e Culturas da Universidade
de Aveiro, desde 1986, e integra a equipa editorial da Revista Ágora. Estudos
Clássicos em Debate, além de participar no processo de arbitragem científica
em várias revistas portugueses. Editou três livros (e.g.: Máscaras, vozes e gestos:
nos caminhos do teatro clássico. Aveiro, 2001) e publicou cerca de três dezenas
de estudos (artigos ou capítulos livros) sobre a épica homérica, a lírica arcaica, a
tragédia grega, em especial euripidiana, e a receção do teatro grego na literatura
portuguesa.
Maria das Graças de Moraes Augusto é Professora Titular no Departamento de
Filosofia do Instituto de Filosofia e de Ciências Sociais da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ). A sua investigação sobre História da Filosofia Antiga
abrange temas como Platão e a herança platónica, filosofia e conhecimento no
pensamento antigo, filosofia e literatura na tradição antiga e recepção dos clássicos
gregos no Brasil.
Marta Várzeas Marta Isabel de Oliveira Várzeas - professora auxiliar do
Departamento de Estudos Portugueses e Estudos Românicos da Faculdade de
Letras do Porto e investigadora do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos
da Universidade de Coimbra. Doutorou-se em Literaturas Clássicas, especialidade

358
de Literatura Grega, com a dissertação A força da palavra no teatro de Sófocles:
entre retórica e poética (FCT/FCG 2009). Tem publicado vários trabalhos na área
da Literatura Grega, nomeadamente do Teatro trágico e da Poesia. No âmbito da
tradução de textos clássicos, é autora de Plutarco, Vidas de Demóstenes e Cícero
(Clássica Digitalia, 2010) e Sófocles, Antígona (TNSJ, Húmus, 2011); no prelo
encontra-se a tradução do tratado Do Sublime de Longino.
Núria Llagüerri Pubill es doctora en Filología Griega por la Universidad
de Valencia, miembro de GRATUV (Grup de Recerca i Acció Teatral de la
Universitat de València) desde el año 2009. Adscrita a los siguientes Proyectos
de Investigación: « Género y formas de comprensión y de expresión en el teatro
griego y su proyección en la tradición clásica », FFI2009-12687-C02-01 (2009-
2012); « El personaje secundario a través de su interacción en la obra dramática :
su configuración y desarrollo en el teatro grecolatino y en la tradición clásica »,
FFI2012-32071 (2013- actualidad). Varias publicaciones en revistas, así como
capítulos en libros y reseñas. Profesora en Secundaria desde el año 2008.
Ramiro González Delgado es profesor de Filología Griega en la Universidad
de Extremadura. Licenciado y Doctor en Filología Clásica por la Universidad
de Oviedo y Licenciado en Filología Hispánica por la UNED, sus trabajos de
investigación se han centrado fundamentalmente en la Literatura y Mitología
Griegas, la Tradición Clásica y la Historia de la Literatura Grecolatina, con varios
trabajos publicados en estos campos.
Stéphanie Urdician, Maître de Conférences en Etudes Hispaniques à l’Université
Blaise Pascal de Clermont-Ferrand, est membre du Centre de Recherches sur
les Littératures et la Sociopoétique. Sa recherche porte sur le théâtre hispano-
américain contemporain et la sociopoétique des mythes. Elle a publié plusieurs
travaux sur la figure mythique d’Antigone. Responsable du secteur théâtre du
Service Université Culture, elle encadre un atelier théâtre en espagnol.
Susana Maria Duarte da Hora Marques Pereira, professora auxiliar do Instituto
de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,
licenciou-se em 1993 em Línguas e Literaturas Clássicas e Portuguesa, tendo
obtido o grau de Mestre em Literatura Novilatina em Portugal em 1996, com a tese
Manuel da Costa, um jurista cultor das Musas. Obteve o grau de Doutor em 2006,
com a dissertação ‘Sonhos e visões na tragédia grega’. De entre o seu trabalho de
investigação destacam-se estudos, de natureza científica e pedagógica, nas áreas de
Literatura Grega, Perenidade da Cultura Clássica, Didática das Línguas Clássicas,
Literatura Novilatina em Portugal.

359
OBRA PUBLICADA
COM A COORDENAÇÃO
CIENTÍFICA

Você também pode gostar