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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Vasconcelos, Francisco Herbert Lima. / Santos, Maria José Costa dos. / Neto, Josaphat Soares. (Orgs.)
Tecnologias da educação: Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Francisco Herbert Lima Vasconcelos / Maria José Costa dos Santos / Josaphat Soares Neto (Orgs.)
Campinas, SP : Pontes Editores, 2018

Bibliografia.
ISBN 978-85-2170-052-4

1. Educação - tecnologias 2. Formação de professores I. Título

Índices para catálogo sistemático:

1. Educação - tecnologias - 370


2. Formação de professores - 370.7
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2018 - Impresso no Brasil


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................7

FORMAÇÃO TECNOLÓGICA PARA PROFESSORES:


UM GRANDE DESAFIO.....................................................................................................11
Michèle Artigue

EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO ESCOLAR: FORMAÇÃO DE PROFESSORES


QUE ENSINAM MATEMÁTICA EM CLASSES HOSPITALARES.........................43
Uyara Soares Cavalcanti Teixeira
Ricardo Antonio Gonçalves Teixeira
Mário José de Souza
António Pedro Costa

PROPOSTA DE GÊNESE INSTRUMENTAL PARA O ENSINO DE


COMPARAÇÃO DE FRAÇÕES: SITUAÇÕES DIDÁTICAS.......................................71
Edmo Fernandes Carvalho
Luiz Márcio Santos Farias
Maria Auxiliadora Lisboa Moreno Pires

REFLEXÕES SOBRE OS RESULTADOS DAS AVALIAÇÕES EM LARGA ESCALA


A PARTIR DAS MANCHETES NOS JORNAIS: CAMINHOS E DESCAMINHOS
DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA.........................................................................................101
Maria José Costa dos Santos
Josaphat Soares Neto
António Fernando Zucula

UMA PROPOSTA DE STORYBOARD PARA O ENSINO DE TRIGONOMETRIA


A PARTIR DO QUADRANTE NÁUTICO: CONSTRUINDO UM OBJETO
DE APRENDIZAGEM.........................................................................................................113
Ana Carolina Costa Pereira
Antonia Naiara de Sousa Batista
Isabelle Coelho da Silva
Eugeniano Brito Martins
OLHARES SOBRE A ANTIGUIDADE DOS AUTÔMATOS AO COTIDIANO
DA ROBÓTICA EDUCACIONAL NO AMBIENTE ESCOLAR.................................137
Fernando Barros da Silva Filho
José Rogério Santana

TIC’S NA EDUCAÇÃO: UM NOVO MODELO EDUCACIONAL NA


FORMAÇÃO DOCENTE E DISCENTE..........................................................................157
Anne Karoline Cardoso Silva
Raphael Alves Feitosa

A TIPIFICAÇÃO DO RACIOCÍNIO MATEMÁTICO EM PEDAGOGOS: IDEIAS


PARA UMA NOVA VISÃO SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES.............171
Antonio Marcelo Araújo Bezerra

CONVERSA COM O PROF. DR. HERMÍNIO BORGES NETO: DO SEU


PERCURSO ACADÊMICO E PROFISSIONAL À IDEALIZAÇÃO DA
SEQUÊNCIA FEDATHI......................................................................................................181
Fernanda Cíntia Costa Matos
Maria José Costa dos Santos

DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA TUTORIA NA EAD........................................191


Maria José Costa dos Santos
Francisco Herbert Lima Vasconcelos

A SAÚDE MENTAL DO PROFESSOR DO 1.° E 2.° ANOS DO ENSINO


FUNDAMENTAL DOS ANOS INICIAIS........................................................................209
Janne Cristina de Araújo Silva
Gilmar Alves de Farias
Alberto dos Santos Paiva Filho

SOBRE O QUE PENSAM A ESSE RESPEITO OS FUTUROS PROFESSORES


DE FÍSICA NO IFCE – CAMPOS FORTALEZA...........................................................239
Alles Lopes de Aquino

SOBRE OS AUTORES.........................................................................................................253
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

APRESENTAÇÃO

A obra intitulada TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO: Formação


docente, inovação científica e práticas pedagógicas, trata-se de
uma coletânea de textos oriundos de práticas, experiências, re-
flexões e críticas de ações que ocorreram no âmbito do ensino,
pesquisa e extensão sobre a educação, processos de ensino e de
aprendizagem, e a formação docente. A partir desse delinear
investigativo, foram selecionados textos e autores(as) que traba-
lhassem em suas pesquisas temáticas atuais e inovadoras. Foram
selecionados textos como a proposta a Formação Tecnológica de
Professores, numa visão internacional, e mais globalizante, sob
a égide da autora renomada Michele Artigue, que traz no título
a ideia de uma formação docente em matemática, a partir das
tecnologias digitais, laboratórios de informática e metodologias
inovadoras.
Em seguida, esta obra propõe ao leitor se deleitar nas lei-
turas sobre formação docente, mas agora voltada para a edu-
cação especial e a inclusão escolar, com foco especial também
na matemática, em Classes Hospitalares. Voltando à escola, a
obra nos contempla com uma reflexão acerca da Proposta de
Gênese Instrumental para o Ensino de Comparação de Fra-
ções, a partir de Situações Didáticas. Sabemos que o ensino
de matemática, tem tido enormes repercussões na mídia bra-
sileira, e isso se dá, especialmente, por conta dos resultados
das Avaliações em Larga Escala, e é disso que um dos textos
da obra trata, trazendo à tona o papel da mídia jornalística, o
qual influencia sobremaneira nos caminhos e descaminhos da

7
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

educação brasileira. A matemática, nessa obra tem um espaço


relevante, dada também a relevância dessa área nos espaços da
escola, no currículo escolar, e os autores nos propõem a leitura
sobre uma proposta prática, de construção de um Objeto de
Aprendizagem, a partir da ideia de Storyboard para o ensino de
Trigonometria, por meio do Quadrante Náutico. Buscando forta-
leza da matemática e sua história, seguimos com o texto Olhares
sobre a antiguidade dos autômatos ao cotidiano da Robótica
Educacional no ambiente escolar, mas com um olhar também
na atualidade, a obra retoma a discussão sobre tecnologias na
Educação, um novo modelo educacional na formação docente e
discente, bem como, desafios e possibilidades da tutoria na Ead,
porém considerando nesse caminho e descaminho a tipificação
do raciocínio matemático em pedagogos, a partir de uma nova
visão sobre a formação de professores.
A obra também nos transporta à reflexão que, sem me-
todologia, o ensino pode resultar numa prática inócua, e
apresenta uma conversa que a doutoranda Cíntia Mattos do
Grupo de Pesquisa Tecendo Redes Cognitivas de aprendizagem
(G-TERCOA/CNPq) realizou como o Prof. Dr. Hermínio Borges
Neto, pesquisador, coordenador do Laboratório de Pesquisa
MultiMeios-MM, trazendo informações desde o seu percurso
acadêmico e profissional até a idealização da metodologia
Sequência Fedathi, a qual é utilizada como metodologia de
formação docente, pesquisa e ensino. Por fim, mas não menos
relevante, apresetamos artigos que versam sobre a formação
didática, a partir de um estudo de caso visando a compreensão
do que pensam esses profissionais sobre o ensino de Física,
bem como, a preocupação com a saúde mental do professor
dos anos iniciais do ensino fundamental.
Em linhas gerais, esta obra é o resultado de um trabalho
sério de seus autores sobre educação, e, portanto, reflete o
compromisso dos organizadores em apresentar ao público
da educação, uma possibilidade de pensar sobre à educação

8
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

a partir do prisma da inovação científica, numa visão não só


local, mas em esfera também internacional. Agradecemos a
todos(as) os(as) autores(as), e desejamos ao público em geral
boas reflexões.

Francisco Herbert Lima Vasconcelos


Maria José Costa dos Santos

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

FORMAÇÃO TECNOLÓGICA PARA PROFESSORES:


UM GRANDE DESAFIO1-2

Michèle Artigue3

Introdução

Cada dia mais as tecnologias digitais influenciam as práticas


privadas e profissionais de um número crescente de pessoas
neste planeta, e isso de um número exponencialmente crescente
de maneiras. A escola não poderia escapar dessa evolução, e de
fato ela não escapa. A evolução tecnológica modifica as expecta-
tivas da sociedade a seu respeito, modifica os meios disponíveis
para que possa cumprir sua missão educacional, as condições e
restrições a sua ação. Modifica também as características de seus
diferentes atores, suas interações, bem como as relações entre a
escola e o mundo exterior.
No que diz respeito ao ensino e à aprendizagem da mate-
mática, a situação pode parecer paradoxal em certo sentido.
Informática ciências da computação e matemática mantiveram
ligações privilegiadas desde o surgimento desta nova área. Muito
cedo, surgiu a questão para saber em que o desenvolvimento
1 Este trabalho foi apresentado em uma conferência plenária sobre Didática do I CEMACYC,
a qual ocorreu em Santo Domingo, República Dominicana, no ano de 2013 e publicado em
2014 no número 12 dos Cuadernos de Investigación y Formación en Educación Matemática
(pp. 41-360). '
2 Este texto foi traduzido pela professora Dra. Maria José Costa dos Santos e pelo prof. Dr.
Hermínio Borges Neto. Trata-se de um convite à professora Michele Artigue para compor os
capítulos deste livro.
3 LDAR (EA 4434), Université Paris-Diderot, UA, UCP, UPEC, URN, France. E-mail: michele.
artigue@univ-paris-diderot.fr.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

da informática iria, e se deveria afetar a organização curricular


em matemática. Muito cedo, também, queríamos ver nas novas
tecnologias uma alavanca privilegiada para renovar o ensino
da matemática, tanto em seu conteúdo e forma, e torná-lo mais
motivador, mais acessível e mais eficaz. Não é coincidência que
o primeiro estudo lançado pelo ICMI em 1985 foi dedicado à in-
fluência de computadores e informática em matemática e seus
ensinamentos (CHURCHHOUSE, 1986). Neste estudo, grandes
expectativas foram formuladas, expectativas que os resultados
de experiências e inovações já conduzidos legitimavam a priori.
No entanto, 20 anos depois, quando a ICMI lançou seu segundo
estudo nesta área, as expectativas expressadas no primeiro es-
tavam longe de serem realizadas. Ao mesmo tempo, a paisagem
tecnológica tinha mudado profundamente, como destacado na
introdução deste estudo:

Desde o primeiro estudo ICMI em 1992, tem havido


grandes desenvolvimentos nas tecnologias digitais em
termos de hardware: computadores de todos os tipos,
calculadoras e tecnologias portáteis, tecnologias digitais
amplamente utilizadas na sociedade em geral, como te-
lefones celulares e câmeras digitais, e é claro a enorme
influência da World Wide Web. Alinhados a essas mudan-
ças de hardware, novos softwares foram desenvolvidos
com impacto potencial em todas as fases da educação e
em contextos informais de educação. Na época do estudo
17 da ICMI, as tecnologias digitais tornavam-se cada vez
mais ubíquas sua influência tocava a maioria, se não to-
dos, dos sistemas educacionais. Em muitos países, é difícil
conceber um mundo sem interatividade e conectividade
de alta velocidade. (HOYLES and LAGRANGE, 2010, p. 2)

Este cenário continuou a mudar desde que este segundo


estudo foi conduzido, a uma velocidade muito acelerada, dando

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

a impressão de que, apesar de os esforços realizados e o inegável


progresso observado, o fosso entre a Escola e a Sociedade, no
caso das tecnologias digitais, só cresce. Muitos parâmetros sem
nenhuma dúvida, contribuem para as dificuldades encontradas
efetivamente no uso eficaz das tecnologias digitais para o ensino
e a aprendizagem da matemática. Uma integração bem sucedida
dessas tecnologias no ensino, pressupõe uma vontade política
que permita o engajamento a longo prazo da multiplicidade de
atores necessariamente envolvidos, equipamentos adequados e
regularmente renovados, tanto material quanto humano, para o
uso deste equipamento. Também envolve extenso trabalho sobre
o que se deseja ensinar e como formas de avaliação compatíveis
com visões desenvolvidas, em resumo, escolhas curriculares
adaptadas, sabendo que terão que ser atualizadas regularmen-
te. Mas uma alavanca igualmente importante nesta área como
qualquer outra em educação, é a formação, tanto inicial como
contínua de professores. É a este tema que este texto é dedicado.
O segundo estudo da ICMI já mencionado fez um dos seus
eixos prioritários, e, em seguida, discutirei sobre as evoluções
e realizações que o estudo destaca, mas também a problemas e
dificuldades resistentes. Tomando como referência particular-
mente, diferentes trabalhos, tanto teóricos quanto experimentais,
realizados no meu laboratório, eu então me perguntarei sobre
o que sabemos sobre as práticas do professor, mediadas pelas
tecnologias digitais, um conhecimento indispensável para pen-
sar a formação. Terminarei apresentando um projeto europeu,
o projeto EdUmatics, que visa ao desenvolvimento colaborativo
de recursos de formação para favorecer esta integração.

Formação de professores no estudo ICMI 17 sobre a tecnologia

A formação de professores em tecnologia tem sido insatis-


fatória por muito tempo, porque, por um lado, era muito focado
na aprendizagem técnica, por outro lado, muitas vezes, foi con-

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

duzido por uma visão militante que não era muito sensível às
reais necessidades de professores. Inicialmente, consistia em
convencer os professores do potencial oferecido pelas “Novas
tecnologias” para o ensino e a aprendizagem de matemática. A
isso também contribuiu o fato de que a pesquisa neste campo tec-
nológico tem sido por muito tempo quase exclusivamente focada
nos estudantes. O meta-estudo que coordenamos na virada dos
anos 2000 (LAGRANGE et al., 2003) mostrou a baixa proporção
de pesquisa sobre práticas docentes em ambiente tecnológico e
a formação nesta área.
A Seção 3 do segundo estudo ICMI intitulada “Professores e
Tecnologia” mostra que, no final dos anos 2000, isso não é mais
o caso. A preparação de professores para ensinar matemática
na era digital e a análise de suas práticas tem sido objeto de
muito trabalho. A complexidade de integração das tecnologias
digitais, as mudanças profundas que ela implica em termos de
prática, como isso afeta todos os níveis de vida de classe agora
é reconhecida:

Os estudos que existem mostran que mudar as práticas


de ensino para incluir novas ferramentas não são uma
façanha para os professores. Além de dominar as várias
possibilidades de fazer a matemática oferecidas por
diferentes ferramentas digitais, eles também precisam
repensar uma série de problemas de gerenciamento de
sala de aula, adaptar seu estilo de ensino para incluir
novas formas de interação - com alunos, entre alunos,
e entre alunos e ideias matemáticas - assumir um papel
proeminente na projeção de atividades de aprendizagem
para seus alunos e afrontar uma série de questões epis-
têmicas relacionadas com a aceitação e legitimação de
práticas matemáticas não familiares o completamente
novas (HEALY & LAGRANGE 2010, p. 288)

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Três capítulos constituem esta seção. O primeiro (FUGLES-


TAD, HEALY, KYNIGOS & MONAGHAN, 2010) diz respeito à co-
laboração entre pesquisadores e professores na integração de
tecnologias digitais. Baseia-se em três estudos de caso realizados
em três países diferentes: Noruega, Grécia e Brasil. Os contextos
e culturas são diferentes, e as abordagens teóricas também, mas
regularidades emergem. O primeiro, o foco no design colaborati-
vo. Em cada caso, o diálogo entre professores e pesquisadores é
organizado em torno do projeto interativo e conjunto em torno
da concepção interativa e conjunta de artefatos tecnológicos e de
atividades associadas, bem como, sua experimentação. A ruptura
é claramente assumida, a partir de uma visão clássica da con-
cepção e divulgação de recursos. A segunda regularidade é que
se o design é central, sua finalidade, particularmente no que diz
respeito ao design de artefatos tecnológicos, não é necessaria-
mente para produzir objetos acabados, mas objetos adaptáveis e​​
transformáveis pelos usuários, que captura a ideia de “half-baked
tools”. Conforme expresso na conclusão do capítulo:

Talvez envolvendo professor em todas as etapas do pro-


cesso de design, a extensão total do impacto do uso de
ferramentas digitais na sala de aula, seu impacto em não
apenas o aprendizado dos alunos e as abordagens didáticas
dos professores, mas na gestão, tempo de ensino e conhe-
cimento matemático ele mesmo, torna-se mais aparente.
Aumentando o senso de propriedade que os professores
sentem pelas ferramentas e tarefas a serem implemen-
tadas, talvez torna-se também mais natural aceitar os
desafios de se tornarem agentes ativos no processo de
criação de novas culturas de prática que aproveitam as
possibilidades das ferramentas digitais. (p. 309).

O segundo capítulo (GOOS & SOURY-LAVERGNE 2010) diz


respeito aos quadros teóricos. Os autores, primeiro apontam a

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

necessidade de quadros teóricos mais elaborados do que aque-


los que acompanharam as primeiras décadas de trabalhos em
tecnologia, para entender o papel do professor em ambientes
tecnológicos, os diferentes fatores que influenciam o uso da
tecnologia pelos professores e suas inter-relações, quais são
os usos produtivos e como progredir nessa direção. Eles então
se concentram em algumas abordagens teóricas que parecem
promissoras para eles nesta perspectiva e, em particular, duas
que percebem como complementares. O primeiro é a abordagem
instrumental que vou discutir mais plenamente na próxima parte.
O segundo é baseado na teoria das zonas de Valsiner que amplia
o conceito da zona de desenvolvimento proximal (ZPD) devida
a Vygotsky. Para dar conta do desenvolvimento de um indivíduo
(professor ou aluno) e suas interações com outros atores, em um
ambiente tecnológico, essa abordagem acrescenta ao conceito
de ZDP, duas outras zonas: a ZFM (zona de livre movimentação)
associada ao acesso aos diferentes componentes do ambiente e
aos meios de ação sobre eles, e a ZPA (zona de ação favorecida
associada a atividades promovidas no ambiente). Os autores
insistem na necessidade de continuar desenvolvendo quadros
teóricos que possibilitem abordar as características dos profes-
sores, contextos institucionais e processos de aprendizagem e
desenvolvimento profissional.
O terceiro capítulo, finalmente, (GRUGEON, LAGRANGE &
JARVIS, 2010) é dedicado diretamente à formação de professores.
Baseia-se, em particular, em cinco contribuições apresentadas
na conferência associada ao estudo ICMI em 2006 (HOYLES,
LAGRANGE, LE HUNG SON & SINCLAIR, 2006), cada uma das
quais é baseada em um programa de formação específico, três
de formação inicial e dois de formação contínua. Os contextos
desses programas, oferecidos em três continentes, são muito
diversos, e este é também o caso dos próprios programas. Para
refletir essa diversidade, diferentes critérios são introduzidos,
respectivamente, sobre as visões subjacentes (implementação

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

da tecnologia, mudanças no papel do professor, adaptação das


práticas de ensino), conteúdo e estratégias de formação. Gráficos
como aqueles reproduzidos abaixo sintetizam os resultados do
estudo. Observe a diversidade de posicionamento nos conteúdos
e estratégias de formação listados, e que entre as quatro estra-
tégias de formação identificadas nestes cinco exemplos, a única
comum é a chamada “demonstration of good practices”!

Figura 1: Posição das formações de acordo com os seis conteúdos listados.

Fonte: (Figura 15.4, p. 339)

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Nota: Estes conteúdos são: Currículo (impacto da tecnologia


na matemática e evolução resultante do currículo); Potencial de
software (potencial das tecnologias para aprendizagem de ma-
temática); Gênese instrumental (noção de gênese instrumental
e imbricação entre conhecimento matemático e tecnológico);
Novas e antigas tarefas (criação de novas tarefas e estudo de sua
interação com tarefas existentes); Novas habilidades de ensino
(novas competências requeridas aos professores); Contexto
profissional (introdução de tecnologia em um contexto profis-
sional dado).

Figura 2: estratégias de formação identificadas.

Fonte: (Figura 15.5, p. 342)

Nota: As estratégias listadas são: Demonstração (apresen-


tação do funcionamento de artefatos e atividades usando-os);
Role playing (professores resolvem tarefas com tecnologia em
posição de estudante) e discussão coletiva; Na prática (concep-
ção com o formador de uma sessão de ensino, experimentação
na sua classe e análise reflexiva com o formador); Comunidades
(ênfase colocada na aprendizagem entre pares dentro de uma
comunidade).
Como os autores apontam na conclusão do capítulo, cada
curso tem sua própria coerência, mas as razões subjacentes às
diferentes escolhas feitas não são sempre fáceis de identificar
nas contribuições. E eles concluem enfatizando que:

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Embora seja amplamente reconhecido que o desenvolvi-


mento de professores é crucial para a integração êxitosa
da tecnologia na sala de aula de matemática, atualmente
há muito pouco disponível para orientar decisores políti-
cos, pesquisadores e educadores de professores quanto
à relevância de diferentes pontos de vista, seleção de
conteúdo ou a real eficácia de várias estratégias de ensino
e aprendizagem envolvendo tecnologia. (p. 344)

As experiências relatadas neste segundo estudo ICMI agora


datam de alguns anos. Como indiquei em (ARTIGUE, 2013), o
contexto tecnológico certamente é diferente hoje. As tecnologias
digitais afetam, cada vez mais, os diferentes aspectos da vida
familiar e profissional. Novos artefatos surgiram no espaço de
alguns anos: telefones celulares e tablets, com um número cres-
cente de aplicações matemáticas. Vendem-se hoje mais tablets
que computadores e é em termos de tablets que agora pensamos
em equipamentos para estudantes, o desenvolvimento de livros
didáticos eletrônicos. Touch screens tornam-se o padrão para
interfaces gráficas, renovando a ideia de manipulação direta re-
alizada pelo uso do mouse. Recursos educacionais como applets
e videoclipes se multiplicam exponencialmente. Redes sociais
assumem uma parte cada vez mais importante nos modos de
comunicação em todos os níveis. Já não há dúvida de que vivemos
hoje na era digital.
Ao mesmo tempo, os programas de aprendizagem pre-
sencial e a distância se multiplicaram, tomando novas formas,
como evidenciado pelo avanço dos MOOC (Massive Open Online
Courses), uma sigla desconhecida até há poucos anos. Esses
cursos de formação levam cada vez mais em conta o fato que
ensinar matemática nesta era digital, não se limita a aprender a
integrar ao seu ensino tecnologias como calculadoras, softwares
de geometria dinâmica, planilhas e Sistemas de Cálculo Formal
(CAS) que têm sido o emblema dessa integração, mesmo que a

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

integração efetiva dessas tecnologias “antigas” permaneça mar-


ginal. Mas se está aprendendo a aproveitar os múltiplos recursos
que fornece o mundo digital para o ensino e aprendizagem, e os
novos modos de interação social e comunicação que ele promove.
Isso é claramente visível, por exemplo, nas especificações elabo-
radas na França para a formação de professores e o certificado
de aptidão C2I2E associado para a tecnologia�. Mais do que
nunca, a necessidade de reflexão aprofundada sobre as práticas
de formação em tecnologias digitais é da atualidade, a necessida-
de de uma melhor compreensão das práticas de professores em
ambiente tecnológico, seus determinantes, dinâmicas possíveis
de evolução.
Na seção a seguir, retornamos à abordagem instrumental
mencionada acima e seus desenvolvimentos recentes, tentare-
mos mostrar o seu interesse em apoiar as reflexões e pesquisas
necessárias.

Práticas de professores em tecnologia em ambiente de


formação: o filtro da abordagem instrumental

A abordagem instrumental surgiu na França em meados da


década de 1990, como explicado em (ARTIGUE, 2007, 2011).
Por não ser possível assumir que o leitor é familiarizado com
essa abordagem, primeiro a apresentarei brevemente antes de
examinar os seus desenvolvimentos particularmente interes-
santes para estudar práticas de ensino e formação. A abordagem
baseia-se em dois pilares, por um lado, a abordagem de ferra-
mentas e instrumentos desenvolvida na ergonomia cognitiva de
Vérillon e Rabardel (RABARDEL, 1995), por outro lado a teoria
antropológica do didático (TAD na sequência) iniciada por
Chevallard (1991, 1999). A abordagem instrumental emergiu
no contexto tecnológico, especialmente em pesquisa realizada
sobre a integração de software de cálculo formal, como Derive e
calculadoras simbólicas (TI92 e TI89 em particular) no ensino

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

médio. A abordagem instrumental adopta prioritariamente da


abordagem ergonômica na distinção feita entre um artefato e
um instrumento. Um artefato aqui é um artefato tecnológico,
calculadora, software, lousa digital Interativa, applet, plataforma
interna... , ou uma parte dele. O instrumento é o que este artefato
se torna para um indivíduo, uma comunidade que o usa inten-
cionalmente para executar uma determinada tarefa ou conjunto
de tarefas. Um instrumento é, portanto, a combinação de um
artefato e técnicas ou esquemas (de acordo com a linguagem
de (RABARDEL & VÉRILLON) que o usuário desenvolveu ou se
apropriou. A transformação de um artefato em um instrumen-
to geralmente não é auto-evidente e, é particularmente o caso
dos artefatos digitais complexos de hoje. Opera a partir de um
processo que Rabardel chama de genesis instrumentale que afe-
ta ambos o artefato e o usuário. Isso afeta o artefato porque o
usuário o coloca a sua mão, descobrindo progressivamente seus
possíveis usos ou mesmo introduzindo derivações não previstas
pelo fabricante, pois enriquece, armazena dados, programas. É
o processo de instrumentalização. Ele afeta o usuário porque ele
elabora ou se apropia técnicas, desenvolve equemas de uso que
le transformam, isto é o processo de instrumentação.
A pesquisa coordenada na última década sobre software de
geometria dinâmica mostrou como a gênese instrumental do
deslocamento (ou arrastar) era uma coisa complexa, indo além
do conhecimento dos comandos e gestos associados. Por muito
tempo, porém, a pesquisa em tecnologias digitais subestimou
a complexidade desses gêneses instrumentais, ou mesmo sim-
plesmente os ignorou. Ela subestimou quanto eles imbricavam
conhecimento matemático e conhecimento do artefato, fazendo
com que o uso de artefatos tecnológicos afetasse profundamente
não só o modo de aprender, mas também do que é realmente
aprendido. A abordagem instrumental tornou visível esta com-
plexidade. Ela forneceu uma linguagem para expressá-lo, e guias
para seu estudo. Ela ajudou a compreender os limites das visões

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

que estavam reduzindo a tecnologia ao único papel de ferramenta


de motivação e complemento pedagógico.
Mas, como foi enfatizado no final da seção anterior, no que
diz respeito à educação e à formação, o papel das instituições e
culturas em que são construídas essas gêneses instrumentais
também não devem ser subestimadas. É por isso que na abor-
dagem instrumental aqui descrita, as construções de Rabardel
e Vérillon são combinadas com as da TAD. A TAD nos dá, por sua
vez, a linguagem para expressar que todo conhecimento emerge
de práticas que estão institucionalmente situadas. O elemento
chave desta linguagem é a noção de praxeologia que se propõe
modelar práticas humanas de qualquer tipo, especialmente as
práticas matemáticas e didáticas. Uma forte hipótese é que qual-
quer praxeologia consiste em dois blocos: um bloco prático e um
bloco teórico discursivo. Em outras palavras, não existe nenhuma
prática humana situada institucionalmente sem uma forma de
discurso que descreve, explica, justifica issa, em formas mais ou
menos elaboradas. No nível mais básico, o bloco prático de uma
praxeologia consiste em um tipo de tarefa e uma técnica para
resolver esse tipo de tarefa (não necessariamente algorítmica); o
bloco teórico consiste num discurso dito tecnológico (no sentido
etimológico de termo) descrevendo, explicando, justificando a
técnica, e num discurso teórico mais ou menos elaborado e ex-
plícito justificando esse discurso tecnológico.
Nos trabalhos sobre ambientes digitais, além da perspectiva
institucional que é consubstancial - as praxeologias matemáticas
e didáticas estão condicionadas e fortemente restringidas pelas
instituições em que se desenvolvem e são vivenciadas - essa
abordagem tem sido particularmente útil para superar a oposição
enganosa, muitas vezes feita entre a atividade técnica e conceitual
em matemática. Pela visão dialética que apresenta das relações
entre técnicas e teorias, ela ajudou a esclarecer e exprimir a
dupla função das técnicas (assim também das técnicas instru-
mentadas): uma função pragmática porque são meios de ação

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

no mundo, de produção de resultados; una função epistêmica,


porque contribuem de forma essencial para a compreensão dos
objetos (especialmente matemáticos) que envolvem. A legitimi-
dade didática das técnicas ensinadas baseia-se em equilíbrios
sutis entre estas duas funções, conforme demonstrado pelos
debates recorrentes em torno do lugar a ser dado no currículo
ao ensino da técnica operativa de longa divisão. Demonstrou-se
que a introdução de artefatos tecnológicos perturba o equilíbrio
entre essas duas funções, em detrimento da função epistêmica.
Isto se deve, em particular, ao fato de que as tarefas espontane-
amente concebidas pelos professores são tarefas mais frequen-
temente adaptadas do ambiente papel-e-lápis onde os artefatos
tecnológicos são usados principalmente para o seu potencial
pragmático. É importante, portanto, que além da atenção dada
à gêneses instrumentais, as formações propostas aos profes-
sores não caem em dicotomias sumarias que podem constituir
obstáculos à integração produtiva, mas tornam os professores
sensíveis à necessidade de estabelecer equilíbrios satisfatórios
e equipam-los para explorar o potencial epistêmico das técnicas
instrumentadas.
O trabalho realizado, segundo a abordagem instrumental, foi
preocupado em primeiro lugar com os estudantes, procurando
entender os processos de gêneses instrumentais nestes, primeiro
no contexto de ambientes de cálculo formal e depois envolvendo
progressivamente outras tecnologias: planilhas e software de
geometria dinâmica, principalmente. Mas, logo, expandiram-se
para o professor, para a suas gêneses instrumentais tanto pessoal
quanto profissional, e à contribuição do conhecimento dessas
gêneses para a inteligibilidade das práticas e suas dinâmicas
observáveis ou possíveis. Esta ampliação começou com a incor-
poração do conceito de orquestração instrumental por Trouche
(2005), sendo essa noção em seguida reformulada em colabora-
ção com Drijvers (2011) para chegar a uma tipologia de formas
de orquestração. Uma orquestração instrumental é realmente

23
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

definida como uma dupla constituída por: 1. uma configuração


didática; (uma organização do ambiente artefatuais que geral-
mente inclui vários artefatos), 2. um modo de exploração desta
configuração.
Trouche, por exemplo, explorou em seus trabalhos e descre-
ve em detalhes o modo que ele chamou o modo Sherpa. Neste
modo, um estudante vem manipular um artefato em frente à
classe, tornando-se portador das intenções e realizações do cole-
tivo, dando visibilidade e compartilhamento, ajudando também
o professor a coletar informações importantes sobre o estado
da gênese instrumental dentro da classe. Estas teorizações são
descritas e ilustradas por vários exemplos no segundo estudo
ICMI. Salienta-se na subestimação na maioria das formações
e na complexidade desses processos de gênese instrumental,
tanto em relação a estudantes como professores, bem como as
suas imbricações.
Nos últimos anos, dentro do meu laboratório, o LDAR, o po-
tencial de extensão da abordagem instrumental para o professor
foi sistematicamente explorada para melhor compreender as
práticas dos professores e pensar sobre as formações. Isso foi
feito particularmente no âmbito do projeto nacional GUPTEN
sobre a gênese do uso de tecnologias digitais para professores
principiantes (LAGRANGE, 2013), e ao fazê-lo, no plano teórico,
a sua ancoragem mudou. Na verdade, o trabalho de pesquisa
combinou a abordagem instrumental que acabei de descrever
com a dupla abordagem ergonômica e didática (DA na sequência)
das práticas de ensino iniciada no LDAR por Robert e Rogalski
(2002). A referência à ergonomia cognitiva é comum às duas
abordagens, mas a DA depende das teorias da atividade e não
da TAD. O ensino é visto como um ofício, e um ofício particu-
larmente exigente porque o professor trabalha em um sistema
complexo e aberto. As práticas dos professores são vistas como
um sistema coerente, complexo e estável. Elas são definidas
como o conjunto do que o professor faz, dentro e fora da sala de

24
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

aula, como um profissional, e são abordados a partir dos cinco


componentes a seguir: cognitivo, mediátivo, institucional, social
e pessoal (VANDREBOUCK, 2013).
A dimensão cognitiva é a escolha do professor para o conte-
údo matemático: tarefas propostas aos alunos, sua organização
no tempo. Essa dimensão é diretamente em jogo no trabalho
de preparação feito pelo professor fora da classe. A dimensão
mediátiva, como o próprio nome sugere, está associada com o
que o professor faz na sala de aula quando ele implementa seu
projeto, como as tarefas são apresentadas, transformadas, quais
são os auxílios oferecidos. As outras três dimensões relacionam-
se a diferentes tipos de subjugação que influenciam esses dois
primeiros componentes e atuam como determinantes das prá-
ticas. Estes são os componentes social, institucional e pessoal.
A exploração deste quadro teórico para analisar práticas de
professores em ambientes tecnológicos levou os pesquisadores
a distinguir três contextos de uso tecnológico para professores
(ABBOUD-BLANCHARD & VANDEBROUCK, 2012) (ABBOUD-
BLANCHARD, 2013). O primeiro, o contexto privado, corresponde
às atividades tecnológicas desenvolvidas pelos professores em
sua esfera privada, não diretamente relacionadas às atividades
da sala de aula; o segundo, o contexto profissional privado cor-
responde às atividades tecnológicas realizadas em antecipação as
atividades na aula mas fora da sala de aula; o terceiro, o contexto
profissional público, correspondente as atividades tecnológicas
realizadas em sala de aula. As Tecnologias digitais instrumen-
talizam as atividades dos professores em cada um desses três
contextos, mesmo que seja apenas no terceiro contexto que a
atividade instrumentalizada do professor interage com a ati-
vidade instrumentada do aluno. As gêneses instrumentais dos
professores devem ser consideradas levando em conta esses três
contextos. Os resultados dos estudos realizados no âmbito do
projeto GUPTEN tendem a mostrar que uma utilização profissio-
nal e eficaz das tecnologias digitais requer, de fato, uma sinergia

25
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

entre as práticas nesses diferentes contextos, e isso, claro, tem


implicações óbvias em termos de formação.
Inspirados pelos recentes desenvolvimentos em ergonomia
cognitiva e didática profissional (RABARDEL & PASTRÉ 2005),
os pesquisadores do projeto GUPTEN também sentiram a neces-
sidade de ampliar a noção de gênese instrumental em relação a
um artefato dado a gênese de uso. Isto foi para melhor levar em
conta os múltiplos contextos e a combinação de usos pessoais e
profissionais mencionados acima, mas também para notar que
“os instrumentos não estão isolados e que a atividade do sujeito
geralmente envolve o uso de um sistema de instrumentos [...]
mobilizado no curso de ação de acordo com os objetivos e as ne-
cessidades operacionais do momento”. (ABBOUD-BLANCHARD
2013, p.32). Como explicado em (LAGRANGE, 2013), a ideia de
gênese de uso transcende os artefatos e sua diversidade, e leva
em consideração a coerência de práticas específicas para um
determinado professor. Finalmente, para analisar a evolução
das práticas dos professores, a abordagem dupla também dis-
tingue três níveis em sua organização: o nível micro que é o de
automatismos e rotinas, o nível local que é o da vida cotidiana
da classe, e o nível global que é o de projetos e cenários, com
maior temporalidade. A introdução de artefatos tecnológicos
induz tensões nesta organização que afetam a um mesmo tempo
esses três níveis e suas interações. Por exemplo, as análises reali-
zadas nas práticas de professores novatos no uso de tecnologias
digitais mostram que a ausência de rotinas específicas no nível
micro e ao mesmo tempo duma visão global dos usos no nível
macro induz para eles uma sobrecarga de trabalho no nível local
da classe, frequentemente problemática. As análises realizadas,
ao longo do tempo, também mostram que os desenvolvimentos
positivos observados podem ser expressos em termos de movi-
mentos entre esses diferentes níveis (ABBOUD-BLANCHARD &
VANDEBROUCK, 2012), (ABBOUD-BLANCHARD, 2013). Todos
esses instrumentos conceituais, e estão longe de serem os únicos,

26
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

nos ajudam a entender melhor a complexidade dos processos


envolvidos nas gêneses do uso e as possíveis dinâmicas de evo-
lução, então a melhor entender as necessidades de formação de
professores.
A abordagem instrumental finalmente se expande nos
últimos anos para o que é chamado o trabalho documental de
professores (GUEUDET & TROUCHE, 2009), (GUEUDET, PEPIN
& TROUCHE, 2012). A visão instrumental levou estes autores a
introduzir a este nível uma distinção paralela a estabelecida entre
artefato e instrumento. Eles portanto, distinguem o recurso (ma-
nual ou parte do manual, sitio internet, vídeo. . .), constituindo o
análogo do artefato do documento que é o instrumento profis-
sional em que torna-se para um professor que o usa, adapta-o às
suas necessidades específicas (instrumentalização) e se constitui
ou se apropria dum esquema de uso (instrumentação).
A pesquisa neste campo ainda é recente, mas ela questiona a
visão usual dos recursos educativos e sua disseminação. Rejeita-
se a dicotomia entre designer/usuário, focando o trabalho de
transformação produzido pelo professor e sua participação no
trabalho de concepção. Ela também se foca no fato que a ativi-
dade de concepção continua durante o uso, em uma sucessão de
ciclos de uso. Uma tal abordagem parece particularmente inte-
ressante no contexto atual marcado por mudanças significativas
nos sistemas de produção de recursos educativos, e nas novas
oportunidades oferecidas aos usuários para fazê-los evoluir de
acordo com as suas necessidades e estilos próprios. Isto ressoa
com a ideia de “ half-baked tool “ mencionada acima.
Como mencionei na introdução desta seção, esses avanços
conceituais apoiados nas práticas efetivas dos professores de-
veriam nos ajudar em estabelecer formações mais adaptadas às
necessidades reais dos professores do que aquelas que foram no
passado, mais respeitosas da complexidade do trabalho de pro-
fessor em ambientes digitais, capazes de levar em consideração

27
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

o aumento da diversidade dos impactos desse mundo digital na


profissão docente e sabendo também criar as sinergias e colabo-
rações necessárias. Esses avanços inspiram as formações de pro-
fessores que organizamos no seio do IREM de Paris 7 e nos IUFM
associados ao LDAR, e também a formação tecnológica no Master
(equivalente ao Mestrado) didático de formação de formadores
que foi criado na minha universidade. Pois, se tratamos neste
texto de formação de professores, uma formação de qualidade
não pode existir sem formadores eles mesmos bem formados.
Nesta área, trabalhos recentes. (ABBOUD-BLANCHARD E EM-
PRIN, 2010) mostram que muito resta a fazer. Na última parte
deste texto, expandirei a perspectiva e utilizarei o que precede
para apresentar e discutir um projeto europeu no qual estive
envolvida de 2010 a 2012 e que se propõe a ajudar professores
e formadores.

Desenvolvimento colaborativo de recursos para formação:


o Projeto EdUmatics

O projeto EdUmatics4 é um projeto europeu Comenius. Por


dois anos, a partir de 2010 a 2012, reuniu vinte parceiros (10
universidades e 10 escolas de nível médio associadas) de sete
países muitos dos quais já haviam iniciado contatos no decorrer
de experimentos com a calculadora Texas Instruments TI-nSpire
Calculator organizados a partir de 2006, experimentos em que
professores e pesquisadores colaboraram de perto. Este foi par-
ticularmente o caso na França, onde os três IREM envolvidos,
os de Lyon, Montpellier e Paris 7 colaboraram no projeto piloto
e-colab5 coordenado pelo INRP (Institut National de Recherche
Pédagogique) para produzir coletivamente recursos para o ensi-
no usando esta calculadora, em um processo de design iterativo.
Recursos ou embriões de recursos produzidos por um IREM

4 Consulte http://www.edumatics.eu
5 Informação acessível em http: //educmath.ens-lyon.fr/Educmath/recherche/archives/partenariat-
inrp-08-09 / E-colab

28
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

foram testados e eventualmente adaptados por pelo menos um


outro IREM; em seguida adaptações e resultados das experiências
foram então sistematicamente analisados e comparados, durante
os encontros presenciais ou a partir da plataforma do projeto.
Este trabalho colaborativo resultou em produção e publicação
de três livros, um por ano de ensino médio (graus 10, 11 e 12,
que corresponde ao 1o, 2o e 3o anos do ensino médio brasileiro)
(ALDON, 2009, 2010, 2011) e a vários artigos, artigos de pesquisa
(ARTIGUE & BARDINI, 2010, por exemplo), mas também artigos
para professores em revistas de interface, como a revista Repères
IREM, publicada pela rede dos IREMs (ALDON et al., 2008).
O objetivo do projeto EdUmatics era significativamente
diferente, por se tratar de desenvolver de forma colaborativa
módulos não diretamente para o ensino, mas para uma forma-
ção de professores que poderia ser realizada em grande parte a
distância e seria direcionada à integração de tecnologias digitais
no ensino da matemática. Cinco módulos foram decididos e uma
estrutura comum elaborada, e a realização de cada um deles
contou com a colaboração de dois pares (universidade, ensino
médio) de dois países diferentes. Mais uma vez, a concepção do
design foi interativa. As situações didáticas que constituiriam a
base dos módulos de formação foram selecionadas ou desenvol-
vidas em conjunto por pesquisadores e professores dos pares
relacionados, depois testados nas classes destes professores e
diversos dados foram recolhidos na ocasião. Esses primeiros
experimentos, realizados em contextos diferentes, foram, em
seguida, analisados, comparados, discutidos e, a partir deles,
os pares elaboraram um projeto de módulo de formação. Este
projeto, publicado na plataforma do projeto, foi então submetido
a uma avaliação externa (às equipes de concepção) por outros
dois pares de EdUmatics, de acordo com uma grelha elaborada
coletivamente por todos os parceiros. Esta avaliação implicava, se
possível, o uso do módulo de treinamento com professores fora
do projeto, mas isso raramente ocorreu. O resultado geral dessas

29
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

avaliações também foi coletivamente discutido para decidir as


modificações a serem feitas em cada módulo, mas também para
fortalecer os links e a coerência entre os diferentes módulos. Eles
de facto foram desenvolvidos em grande parte independente-
mente um do outro após o enquadramento inicial.
Em um última etapa, finalmente, os módulos uma vez finali-
zados foram traduzidos para ser acessíveis na plataforma pública
não só em inglês, mas também em alemão, francês, italiano, eslo-
veno, checo6, como nos comprometemos em relação à Comissão
Europeia. A colaboração entre os parceiros combinava modos
de comunicação síncrona (encontros presenciais ou a distância,
de subgrupos ou coletivos) e assíncrona através da plataforma e
trocas de e-mails. Como se poderia antecipar, a diversidade dos
contextos educacionais e os currículos tornaram este projeto um
desafio real. Foi uma fonte de criatividade em que gostaria de
enfatizar no contexto regional do projeto CANP. Ele se encaixa
na visão acima mencionada de recursos como objetos flexíveis
e pensados para que sua concepção possa prosseguir no uso,
de colaboração estreita entre pesquisadores e professores, e
atenção à complexidade do trabalho do professor em ambiente
tecnológico, das gêneses instrumentais e gêneses de uso.
Foram desenvolvidos cinco módulos:

1. Começar a trabalhar com as TICE;

2. Das representações estáticas às representações dinâmicas;

3. Modelizar e construir funções;

4. Utilizar as TICE na sala de aula;

5. Relações entre software.

6 Algumas dessas traduções já foram feitas para os fins das experiências.

30
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Exceto o quarto que é estruturado em torno da análise de 13


curtos clipes de vídeo, os diferentes módulos são organizados em
torno de algumas situações desenvolvidas e experimentadas em
aulas como parte deste projeto. Eu me apoiarei aqui mais espe-
cialmente sobre o módulo 3, na realização do qual nossa equipe
tem particularmente investido. É apresentado no sitio web do
projeto de acordo com uma estrutura comum a todos módulos:

1. O que eu vou aprender neste módulo?

2. O que eu já preciso de saber?

3. Como este módulo se relaciona com outros módulos?

4. Quais atividades este módulo oferece e quanto tempo demora


para completá-lo?

Está estruturado em torno de três famílias de situações. Para


essa realização, nós de fato, confiamos na ideia de « famille de
situations » que nos pareceu relevante, tanto para criar recursos
flexíveis quanto para facilitar o trabalho didático sobre estes últi-
mos em uma perspectiva de formação. Pensando na flexibilidade
de recursos, é de fato distinguir em um recurso:

1. Por um lado, o que constitui a essência, as fontes essenciais, o


que falta de ser preservado arrisca privar a fonte de suas razões
de ser e de seu potencial didático.

2. Por outro lado, o que é de natureza mais contingente.

Existem, sem dúvida, maneiras diferentes de conceituar essa


distinção. Nossa cultura didática, alimentada pela teoria das situ-
ações didáticas iniciada por Guy Brousseau (BROUSSEAU, 1997)
e a teoria antropológica do didático iniciada por Yves Chevallard

31
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

(CHEVALLARD, 1992, 1999) indubitavelmente influenciou a ma-


neira como nós expressamos isso, a partir da ideia de família de
situações. A teoria das situações postula que podemos associar
a cada conhecimento uma situação fundamental, objeto ideal
que expressa sua essência, sua epistemologia. Uma situação
fundamental é, de fato, através da escolha de variáveis ​​didáticas
que lhe estão associadas, divide-se em uma família de situações
que preservam a essência desse saber e podem apoiar o seu
surgimento gradual. Fomos inspirados por essa ideia no módulo
para conceber duas famílias de situações, as famílias dos letreiros
e das interseções. Tomarei como exemplo aqui a dos letreiros
associada à uma modelização funcional interna à matemática,
a partir de problemas relativos a comprimentos e áreas. Este é
um contexto de modelização presente no ensino de vários paí-
ses europeus envolvidos no projeto, já a priori conhecido pelos
professores em formação. O desafio é trabalhar no que pode ser
feito em um ambiente tecnológico, insistindo especialmente nas
conexões dinâmicas nos quadros algébricos e geométricos, que
ele permita e as representações em cada um desses quadros
que ele permite. Esta família é apresentada da seguinte forma:
“A família dos letreiros que usamos como ilustração é uma fa-
mília de situações que podem ser descritas da seguinte forma:
damos uma forma geométrica (quadrado, retângulo, círculo ... ou
mesmo forma 3D) e um ponto móvel desta forma (de um lado,
uma diagonal, uma mediana, um diâmetro, uma linha particular
...) que permite dividi-la em várias partes; a partir desta divisão,
uma marcação é criada, cuja área depende da posição do ponto
móvel (veja os exemplos na figura1 onde o ponto de mudança é
M e o segmento no qual ele se move é desenhado em vermelho).
Várias questões surgem naturalmente sobre a variação da área
global do letreiro ou de suas diferentes partes e seus relações,
os valores mínimos e máximos. . . Para responder a isso, a mo-
delização funcional é particularmente útil. Pode ser considerada
de forma diferente, dependendo das perguntas feitas; ela pode

32
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

envolver uma variedade de funções, desde funções lineares até


funções complexas para um estudante do ensino médio. Observe
que apresentamos essa família de situações em um contexto de
modelização matemática interna, mas que esta situação geo-
métrica pode resultar de uma modelização de letreiros cujas
partes coloridas e não coloridas correspondem a materiais de
diferentes custos.”
Os dois exemplos abaixo são representantes entre muitos
outros possíveis para esta família:

Figure 3: Dois exemplos de letreiros

Para construir um modelo funcional, é preciso escolher


uma variável independente, por exemplo, um número positivo
real que representa o comprimento AM para letreiros da figura
acima. Esta questão é explicitamente abordada na apresenta-
ção da família de situações, antes do potencial oferecido pela
tecnologia. O foco está na diversidade de possíveis usos e, em
particular, no fato de:

1. que a utilização de um software de geometria dinâmica permite


uma primeira abordagem de variações com uma ideia de dependência
funcional que pode permanecer implícita,

33
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

2. que se pode explorar e conjecturar sem apresentar expressão al-


gébrica para as funções em jogo, e que graças ao comando « lieu de
points » se pode obter algumas representações gráficas e explorá-las,

3. que os dados capturados ao mover o ponto móvel também


podem ser transferidos para a planilha associada e os pontos
correspondentes traçados, esta técnica também possibilita fa-
zer conjecturas sobre variações, os extremos, sobre os tipos de
funções envolvidas antes de expressá-las em forma algébrica, e
que a utilização da planilha pode também ajuda para conjecturar
equações usando as funções de regressão,

4. que, dependendo da forma do letreiro e das perguntas feitas,


os valores particulares procurados podem ser mais ou menos
simples e acessíveis, exatamente, ou apenas em valor aproxi-
mado, uma variável na qual o professor poderá desempenhar,
se quiser trabalhar nesse contexto tecnológico, relações entre
cálculo exato e aproximado,

5. que a intervenção de questões que envolvem perímetros pode


levar a expressões complexas para o estudo das quais módulos
de cálculo formais como aqueles oferecidos por calculadoras
simbólicas podem ser úteis,

6. que o uso de um cursor não é necessário e que induz uma


modelização funcional que pode permanecer invisível para os
estudantes.

A noção de família de situações também é apresentada no


módulo de outra maneira, mais em consonância com a forma de
engenharia didática associada a teoria antropológica do didático,
em termos de percurso de estudo e pesquisa (CHEVALLARD,
2015). Nesta abordagem, o que é essencial é a existência de uma
poderosa questão geradora em torno da qual o trabalho conjunto

34
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

do professor e dos estudantes poderá se organizar, combinando


elaborações próprias e o estudo de obras que já oferecem respos-
tas parciais na cultura, a compreender, a discutir ou a adaptar.
Dizer que uma questão tem um forte poder gerador significa que
podem gerar-se múltiplas sub-perguntas e permitir o encontro
progressivo de um conjunto consistente de saberes e práticas,
fazendo perceber o seu motivo de ser. No módulo, a família de
jogos de busca que envolve modelos funcionais de “realidades”
extra-matemáticas parece-me mais representativo desse tipo.
Nesta família, o ponto de partida é uma série de vídeos que visu-
alizam várias situações de perseguição. A questão inicial é: o que
é comum, diferente entre todas estas situações? Trata-se para
os estudantes de identificar diferentes tipos de perseguições,
esquematizá-los e caracterizá-los. Propõe-se, então, desenvolve-
rem modelos de simulações simplificadas com Geogebra ou com
uma planilha eletrônica, a fim de explorarem essas simulações.
Modelizações funcionais, implícitas e explícitas, podem
emergir ao mesmo tempo na realização de simulações, e nas
questões levantadas pelo seu uso. Em torno deste quadro co-
mum é possível uma diversidade de percursos de acordo com
os vídeos que usamos, as sub-perguntas que privilegiamos, a
responsabilidade dada aos estudantes na realização das simu-
lações, a extensão que desejamos dar a este trabalho e, claro, o
conhecimento matemático dos alunos. Podemos vê-lo compa-
rando as realizações nas aulas francesa e checa realizadas em
dois diferentes níveis de ensino (final da escola secundária, 9o
ano na República Checa e primeiro ano ensino médio, grau 10 na
França), com duas tecnologias diferentes (planilha na República
Tcheca, Geogebra na França), e sob condições que permitam dedi-
car a esses jogos de perseguição um número de sessões diferentes
(de 2 sessões na República Tcheca a 6 sessões em França como
parte de um curso opcional “Méthodes et pratiques scientifiques”
introduzido na recente reforma do ensino médio. O trabalho de
formação proposto sobre as três famílias de situação do módulo

35
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

é organizado em várias fases. Para a família dos letreiros e das


equações e interseções, o cenário é semelhante e descrevemos
abaixo para a família de letreiros. Começa com uma prévia análise
matemática e tecnológica voltada para identificar o potencial de
modelização funcional e o potencial tecnológico da família, atra-
vés do estudo de exemplos desta família e combinando trabalho
em grupos em diferentes exemplos com artefatos possivelmente
diferentes, discussões e sínteses coletivas.
Esta fase é seguida por uma fase de análise pedagógica or-
ganizada em torno da análise de alguns episódios de vídeos das
experimentações conduzidas e mostrando casos susceptíveis de
fomentar discussões interessantes sobre o comportamento dos
alunos, interações entre professores e alunos, e o uso da tecno-
logia. Finalmente, em uma terceira fase, “cada pessoa formada é
comprometida com a construção de um cenário para uma situação
de ensino considerando seu próprio contexto educativo. O cenário
deve tornar claro os específicos objetivos didáticos desta situação,
bem como o suposto conhecimento matemático instrumental dos
estudantes, as escolhas feitas na família dos letreiros e seus moti-
vos, a(s) ferramenta(s) tecnológica(s) que são contemplada(s) e
como ela(s) supostamente ajudam a aprendizagem dos estudan-
tes, os respectivos papeis previstos dos alunos e do professor nas
diferentes fases do cenário e os recursos fornecidos aos alunos”.
Propõe-se que esses cenários sejam trocados, comparados e dis-
cutidos coletivamente com a ajuda dos formadores. Na família
dos jogos de perseguição, a situação é diferente. Se as duas pri-
meiras famílias corresponden a problemas famíliares para muitos
professores, que eles utilizem ou não as tecnologias digitais em
seus ensinos, este não é mais o caso. Pretende-se no módulo uma
abertura para práticas mediadas pela tecnologia:

1. não limitadas ao uso de software dedicado à matemática, como


os de geometria dinâmica, mas combinando o uso de diferentes
tipos de recursos,

36
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

2. envolvendo simulações e sua exploração criativa,

3. mobilizando potencialmente uma grande variedade de tipos


conhecidos ou desconhecidos de funções para os estudantes.

Não assumimos a hipótese que, depois de trabalhar com este


módulo, um professor poderá necessariamente se envolver em
tais práticas. É mais sobre, em termos de gênese de uso, traba-
lhar em contextos pessoais e profissionais privados, para abrir
novas perspectivas. Se, como parte da formação, for proposto
uma experiência, pelo menos, para ser realizada e relatada, é
claro que estas são as duas primeiras famílias que parecem mais
indicadas para explorar tais conquistas.
O cenário geral de formação é descrito para o treinamento
presencial, mas é pensado para ser adaptado a uma formação
semipresencial. Vários recursos são realmente fornecidos para
ajudar o trabalho autônomo dos professores, bem como o dos
formadores que desejam usar este módulo: arquivos e aplets
Geogebra associados às diferentes potencialidades oferecidas
por este artefato para explorar cada família (exploração geomé-
trica de variações, associação de curvas obtidas como lugares de
pontos ou de uma entrada algébrica, usos da planilha...), cenários
possíveis de classe e relatórios experimentais, videoclipes sobre
episódios de trabalho estudantil, interação estudante-professor,
ou screenshots do computador, referências bibliográficas. Estes
recursos são elementos que o professor ou formador poderá
transformar em documentos.
É, portanto, claro como essa abordagem é moldada pe-
las visões expressas acima e pelas realizações da pesquisa
didática. Uma atenção especial é para a gênese instrumental
e as interações entre o desenvolvimento do conhecimento
matemático e instrumental. A influência da teoria das situa-
ções é visível na atenção dada à análise a priori das situações
e ao seu potencial didático, à identificação de suas variáveis​​

37
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

didáticas. O cenário de formação proposto enfatiza o traba-


lho colaborativo dos professores, os intercâmbios e procura
equipar o trabalho de design necessário aos professores. Ele
contém situações mais ou menos distantes das práticas cur-
riculares existentes, incluindo as práticas curriculares instru-
mentalizadas e tenta levar em conta os diferentes contextos
identificados na gênese do uso.
Este módulo não é para de forma alguma ser visto como
um modelo. As restrições deste tipo de projeto europeu, in-
cluindo termos de duração (2 anos) e financiamento (cobrindo
principalmente reuniões entre professores e pesquisadores, e
entre parceiros), a falta de continuidade uma vez concluído o
projeto, o desafio de criar um objeto na interseção de culturas
diferentes, faz com que o que foi conseguido é muito imperfei-
to. Por exemplo, nós não conseguimos construir um cenário
de formação unificado para a família mais delicada dos jogos
de perseguição, ou assumir para cada família, a diversidade
de artefatos tecnológicos susceptíveis de serem utilizados;
os recursos fornecidos para apoiar o trabalho autônomo, são
muito insuficientes. No entanto, o conjunto dos módulos reve-
lou para nós uma ferramenta muito interessante para montar
em 2013 uma formação de 3 dias no IREM para professores
como parte dos planos de formação das academias da região
parisiense. Esta formação que combinou uma exploração de
diferentes módulos, um trabalho mais específico no módulo 3,
com o desenvolvimento de uma experimentação inspirada em
uma das atividades dos três primeiros módulos, a volta a essas
experiências durante o último dia, usando uma grelha decidi-
da em comum, e em seguida, agrupou em uma plataforma de
formação todos os recursos desenvolvidos pelos professores,
foi muito apreciada, e foi repetida em 2013-2014. Também foi
apreciado na abertura internacional que ela ofereceu. O intenso
trabalho de coordenação realizado no projeto EdUmatics não
impediu que cada um dos módulos refletisse a própria cultura

38
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

dos parceiros que o projetaram. Isso levantou muitas questões


durante a formação e as discussões permitiram aos participan-
tes ver sua própria cultura com um novo olhar, e interrogar
certas certezas.

Considerações finais

Neste texto dedicado à formação de professores em tec-


nologias digitais, parti da referência constituida pelo segundo
estudo ICMI, que mostrou que se foram feitos progressos desde
o primeiro estudo, realizado 20 anos antes, esta questão crucial
da formação de professores permaneceu em grande parte aberta.
E, em seguida, apoiando-me em um conjunto de trabalhos
iniciados pelo surgimento e o desenvolvimento de abordagens
instrumentais da integração tecnológica, tentei mostrar que hoje
temos uma ferramenta conceitual coerente e a priori eficiente
para avançar sobre esta questão, ligando-a mais amplamente
a questão das praticas instrumentalizadas dos professores.
Finalmente tentei ilustrar como essas ferramentas conceituais
e as visões que elas carregam podem orientar a construção co-
laborativa de formações e recursos, em um contexto regional e
não mais nacional. Espero, assim, ter contribuído para a reflexão
e o trabalho coletivo mais do que nunca necessário sobre estas
questões, uma vez que fica claro que a integração efetiva das tec-
nologias digitais, na diversidade de suas faces, é um pré-requisito
para sobrevivência da escola.

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Comentarios

Nota 1: se deve por que o texto da conferencia há sido publicado no


numero 12 dos Cuadernos de Investigación y Formación en Educación
Matemática, em 2014, pp. 41-360.
Nota 2: se deve correger a afiliacion : Michèle Artigue, LDAR (EA 4434),
Université Paris-Diderot, UA, UCP, UPEC, URN
O LDAR esta agora associado a 5 universidades e devemos mencionaras
todas

42
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO ESCOLAR:


FORMAÇÃO DE PROFESSORES QUE ENSINAM
MATEMÁTICA EM CLASSES HOSPITALARES

Uyara Soares Cavalcanti Teixeira1


Ricardo Antonio Gonçalves Teixeira2
Mário José de Souza3
António Pedro Costa4

Introdução

Este texto é resultado de parte de uma pesquisa realizada


com professores de classe hospitalar ligados ao Núcleo de Aten-
dimento Educacional Hospitalar do Estado de Goiás (NAEH),
órgão vinculado à Secretaria de Estado de Educação, Cultura e
Esporte de Goiás, Brasil (Seduce).
A classe hospitalar é uma área da educação especial que
aborda a modalidade de atendimento pedagógico a educandos
em tratamento de saúde, sem condições de frequentarem a sala
de aula comum do ensino regular. Enquanto política, é contem-
plada, dentre outras, pela a Lei n. 8.069/1990 (BRASIL, 1990a),
que propõe a continuidade da educação do jovem e adolescente

1 Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional do Instituto de Ma-


temática e Estatística da Universidade Federal de Goiás, Goiás, Brasil. uyaras@gmail.com;
mariojsouza@gmail.com
2 Programa de Pós-Graduação em Educação e Mestrado em Saúde Coletiva da Universidade
Federal de Goiás, Goiás, Brasil. professorricardoteixeira@gmail.com
3 mariojsouza@gmail.com
4 Ludomedia e Centro de Investigação Didáctica e Tecnologia na Formação de Formadores (CI-
DTFF), Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal.
apcosta@ua.pt

43
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

em tratamento de saúde como um direito fundamental; pela Lei


n. 8.080/1990 (BRASIL, 1990b), que preconiza a humanização e
integralidade na atenção à saúde e compreende educação como
um princípio de saúde; pela Resolução n. 2/2001 (BRASIL, 2001),
que apresenta o atendimento educacional domiciliar e hospitalar
como um dever do Estado e direito do educando cabendo ao po-
der público encontrar formas de organizá-lo; pelas orientações
da política de ensino especial do Ministério da Educação (MEC)
(BRASIL, 2002), que estrutura, organiza e estrutura o atendi-
mento educacional hospitalar e domiciliar para educandos da
educação básica em todos os estados brasileiros.
Em Goiás, com base nas bases apresentadas e na política
nacional de educação especial (BRASIL, 1999), o atendimento
pedagógico domiciliar e hospitalar teve origem no ano de 1999,
por meio do Projeto Hoje. No ano de 2013, o referido projeto
assume uma dimensão estrutural no organograma institucional
e se transforma em núcleo (NAEH).
Compreender as diferentes experiências pedagógicas nas
classes hospitalares, nos remetem a algumas questões de inves-
tigação: como se dá a organização, tanto por parte dos hospitais
quanto da Secretaria de Educação, para o atendimento pedagógi-
co aos educandos em tratamento de saúde? Que tipo de relação
se estabelece entre os profissionais da saúde e de educação no
ambiente hospitalar? Como se dá o processo de formação do
professor que ensina matemática para o atendimento pedagó-
gico hospitalar? Com base nas questões norteadoras, nos pro-
pomos, enquanto objetivo, apresentar o processo de construção
coletiva de um curso de formação de professores que ensinam
matemática a educandos internados em hospitais conveniados
com a Seduce. Elegem-se como objetivos específicos: levantar
na literatura os elementos que particularizam o ensino nos
hospitais, com vista a apontamentos de recursos materiais, es-
tratégias metodológicas, processos de avaliação, dentre outros;
compreender, a partir de aproximação com os professores do

44
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

NAEH, a dinâmica do trabalho pedagógico realizado nas classes


hospitalares em Goiás; construir uma proposta de formação
com o coletivo de professores do NAEH, de forma participativa
e colaborativa, visando contemplar as especificidades, anseios
e necessidades demandadas pelo grupo.
Metodologicamente, a pesquisa se apresenta como explora-
tória, descritivo-analítica, de abordagem qualitativa, valendo-se
da Pesquisa-Ação Integral e Sistêmica proposta por André Morin
(2004), cujo detalhamento se apresenta em seção específica. Em
função da démarche característica da pesquisa-ação, o próprio
processo de investigação ditou o ritmo dos trabalhos, desde os
contatos institucionais iniciais, ao envolvimento da equipe nas
propostas, até a percepção dos pesquisadores sobre as opor-
tunidades que o campo trazia enquanto espaço de trabalho e
pesquisa. Na Pesquisa-Ação, o trabalho é compreendido como
um ato coletivo, participativo e colaborativo.
Este estudo, em síntese, se caracterizou como uma oportu-
nidade de vivências e trocas, enriquecimento teórico e metodo-
lógico, trabalho em equipe recheado de discussões e aprofun-
damentos.

Educação matemática e as perspectivas de ensino

A matemática e seu ensino tem se constituído, historica-


mente, como uma área do saber pouco acessível aos educandos,
em especial da Educação Básica, não só no Brasil, mas em todo o
mundo. Expressões como “matemática é difícil”, “complexa”, “para
poucos” parte de uma crença constituída a partir de experiências
negativas com um modelo proposto e o seu ensino. A matemática
atingiu nos sistemas de ensino um caráter inédito, a universa-
lidade – disciplina ensinada em todo o mundo praticamente da
mesma maneira (D’AMBRÓSIO, 1993).

45
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Até meados do século XX, o ensino de matemática presente


nas escolas europeias, americanas e brasileiras era baseado no
modelo dedutivo da obra “Os Elementos”, de Euclides de Ale-
xandria5.
A base de transição dos novos caminhos para o ensino de
matemática foi fortemente discutida nos encontros internacio-
nais denominados de “����������������������������������
International Commission on Mathe-
matical Instruction” (ICMI). Nesses eventos, os educadores e
pesquisadores em matemática de vários países apresentaram
as principais questões, demandas e problemas enfrentados no
ensino de matemática. Foi no ICMI de 1908, realizado em Roma,
Itália, que o artigo do matemático alemão Félix Klein intitulado
“Matemática elementar de um ponto de vista avançado”, um
forte crítico ao modelo de ensino da matemática vigente, ganha
repercussão e as ideias frente a um nova proposta passa a ser
fortemente discutida.
No ano de 1934, um grupo de matemáticos franceses, de
pseudônimo coletivo Nícolas Bourbaki, lançou uma série de
obras que abordava conteúdos de matemática moderna (mais
de sete mil páginas). Estas obras orientaram um movimento que
vinha a nascer na década de 1960: o Movimento de Matemática
Moderna (MMM).
De acordo com Miorim (1998), até meados do século XX,
o modelo de matemática ensinado nas escolas se baseava na
matemática teórica reunida na obra de Euclides. O MMM, in-
tensificado nos anos de 1960, ganha um novo contorno, e se
baseia na teoria dos conjuntos e da álgebra para o ensino de
matemática. Excetuando a Itália e os países ditos comunistas, o
referido movimento passou a ser difundido em todo o mundo e
suas propostas curriculares implementadas.

5 A referida obra, com exceção da Bíblia Cristã, é tida como uma das mais reeditadas em todo o
mundo. “Os Elementos” é um tratado de matemática, escrito em 13 volumes pelo matemático
grego Euclides, em Alexandria, por volta do ano 300 a. C.

46
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

No Brasil, as obras de Bourbaki teve enorme repercussão,


sobretudo nas décadas de 1940 e 1950 (D’AMBRÓSIO, 1996).
A partir da segunda metade da década de 1960, as primei-
ras obras contemplando o novo modelo proposto de matemá-
tica no Brasil começaram a ser divulgadas, difundindo ainda
mais o MMM. Na década de 1970, com a instituição da Lei n.
5.692/1971, que integra em um único bloco os cursos primários
(atual anos iniciais do Ensino Fundamental) e ginasiais (atual
anos finais do Ensino Fundamental), a moderna proposta de
ensino de matemática, com base estritamente formal e distante
da realidade dos estudantes, apresenta resultados altamente
insatisfatórios, tornando-se base de críticas no Brasil, cujos re-
sultados compactuam com os também apresentados na maioria
dos países do mundo. É importante reforçar que o MMM foi
implementado em quase todos os países do mundo a partir de
uma mesma base, ideia e proposta curricular, universalizando
a matemática e seu ensino.
Na visão de Pires (2000, p. 14), “a reforma acabou se tradu-
zindo bem mais por um jargão impenetrável, por um excesso de
simbolismo, por austeras abstrações do que por uma pedagogia
ativa e aberta, como se pretendia”. Muito embora, conforme
D’Ambrósio (1996), o MMM tenha provocado importantes rup-
turas com o sistema educacional, aproximações entre escola e
universidade, não se pode negar os insatisfatórios, senão trági-
cos, resultados provocados na área de matemática pelo modelo
tecnicista, formalista e abstrato assumido.
Para além das observações dos resultados locais, a obra do
professor estadunidense da Universidade de Nova York, Morris
Kline, intitulada, “Why Johnny can’t add: The failure of the new
math”, publicada originalmente em 1973 e traduzida para o
português sob o título “O fracasso da Matemática Moderna” em
1976, tem impacto e repercussão ampla no Brasil. O que era
ponto de crítica restrito à academia, a partir da obra de Kline,

47
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

com divulgação da imprensa escrita e televisiva, passa a ser de


conhecimento de toda a sociedade (SOARES, 2001).
Os fracassos escolares promovidos principalmente pela
matemática eram notórios. Os altos índices de repetência eram
fruto de uma matemática extremamente teórica, formal, mesmo
para anos iniciais, e de rigor dedutivo, distante da realidade
prática e aplicada dos educandos. Adicionando a tais elementos
um modelo de ensino centrado no professor e tendo a avaliação
com fim em si mesma. A demanda por uma revisão nos moldes
de abordagem e ensino se faziam necessários.
Na visão de Oliveira (2012, p. 152),

[...] o fracasso escolar, em grande parte, é oriundo da


matemática moderna que causou problemas no ensino
da Matemática no Brasil em consequência de um ensi-
no preocupado pelo formalismo ou de rigor dedutivo,
quando de fato deveria ter o cuidado de se evitar a me-
canização dos processos e com o objetivo de despertar a
iniciativa do aluno, tanto no aproveitamento dos meios
expeditos, como na faculdade de operar, quanto possível,
mentalmente.

Em contraposição aos rumos e direções que a matemática e


o seu ensino haviam tomados, surge, na década de 1970 um novo
movimento, denominado de Educação Matemática. Em 1976 foi
criado, no Rio de Janeiro, o Grupo de Estudos e Pesquisas em
Educação Matemática (GEPEM) que, como primeira atividade,
promoveu o I Seminário sobre ensino de matemática com o obje-
tivo de discutir a situação da matemática e o seu ensino no Brasil.
O evento, as discussões e os cursos de formação de professores
de matemática, em nível lato sensu, na década de 1970, e stricto
sensu, na década de 1980, impulsionou o crescente movimento
de Educação Matemática no Brasil. Esse movimento ganha força

48
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

e se consolida na década de 1980, com propagação das ideias


educacionais contrapondo ao desgastado, porém praticado, mo-
delo de ensino embasado nos pressupostos do MMM.
As discussões promovidas nas academias, nos cursos de
formação continuada de professores, pelos eventos e pela Socie-
dade de Educação Matemática (criada durante o II Encontro de
Educação Matemática – II ENEM, em 1988), provocou rupturas
ao modelo vigente nas escolas (MMM) e impulsionou uma nova
perspectiva de ensino de matemática cujos indicativos foram,
de certo modo, contemplado em uma proposta de política deno-
minada Parâmetros Curriculares de Matemática (PCN) (BRASIL,
1997), um documento oficial constituído em resposta à nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n. 9.394/1996).
Muito embora os PCN de matemática apresentem limitações
em diversas dimensões, proporcionaram um avanço considerá-
vel nos rumos da educação matemática no Brasil. Tais avanços,
impulsionados a partir dos anos 2000, aos poucos têm mostrado
resultados positivos no âmbito da pesquisa, nas universidades, e
práticas pedagógicas, promovidas nas escolas. Há, porém, que se
considerar a persistência de práticas no ensino de matemática
recorrentes aos moldes tradicionais, privilegiando conteúdos
distantes da realidade dos educandos, com o fim em si mesma,
sem provocar reflexão acerca de atitudes individuais e coletivas;
de práticas pedagógicas centradas no professor, não valorizando
o educando e sua trajetória de vida social e acadêmica; com va-
lorização extrema da avaliação da aprendizagem dos conteúdos
como elemento de prova.
A formação continuada de professores de matemática con-
siste em uma importante ação para o avanço e ressignificação
da educação no Brasil.
Com o avanço das políticas de atenção a educandos com
necessidades educacionais especiais, no tocante à educação
especial, o ensino, principalmente o de matemática, deve ser pla-

49
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

nejado em conformidade com as demandas e especificidades de


cada um, contemplando adaptações de currículos e programas,
cujos conteúdos, estratégias didático-pedagógicas, recursos e
meios proporcionem condições adequadas para a aprendizagem
significativa dos educandos e sua inclusão no meio educacional
e social.

Contextualização das classes hospitalares

Educação e saúde são direitos fundamentais do ser humano


consagrados constitucionalmente como um dever do Estado
que deve zelar para que sejam estendidos a todos os cidadãos,
especialmente àqueles que, em idade de escolarização, são aco-
metidos por doenças que os obrigam a deixar o convívio social
habitual para vivenciar a realidade do tratamento de saúde no
contexto de internação hospitalar ou do período de convales-
cença na própria residência.
Esta situação, por si só, é ameaçadora, fragilizando a pessoa
humana em todos os seus aspectos vitais, ainda mais quando se
trata de crianças ou adolescentes. Para a criança em tratamento
hospitalar, tal situação representa risco à vida, afastamento do
convívio social e familiar e enfrentamento de uma realidade de
dor e sofrimento em um ambiente novo e desconhecido.
O atendimento educacional hospitalar e domiciliar é uma
modalidade da educação especial que, enquanto política públi-
ca, visa atender crianças, jovens e adultos em fase escolar – da
Educação Básica – sem possibilidades de frequentar a sala de
aula comum do ensino regular em função do seu estado de saúde.
Para a equipe de saúde, situações desta natureza implicam
em cuidados especiais, desde compreender a natureza do traba-
lho dos professores que passam a dividir espaços, nos arranjos da
infraestrutura, disponibilização de equipamentos próprios para
as aulas, sobretudo, na criação de uma cultura institucional de

50
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

respeito e acolhimento ante à fragilidade da criança adoentada


para atendimento pedagógico.
Mas, possivelmente, o desafio maior desta situação é coloca-
do aos profissionais da educação, em nosso caso os professores
que ensinam matemática, que, em meio a uma realidade atípica
da docência com educandos em situação de doença, atuando em
espaços distintos ao da sala de aula comum do ensino regular e
para as quais, muitas vezes, não estão devidamente preparados
nem pela formação inicial, nem pela formação continuada.
Compreender as diferentes experiências pedagógicas no
âmbito hospitalar e domiciliar, o perfil dos professores e ges-
tores atuantes no NAEH e o processo de formação do professor
que ensina matemática, se apresentaram como metas claras e
suficientes para indicar a relevância social deste estudo, que
pretendeu construir conhecimentos acerca de uma realidade
situada na intersecção das áreas da Educação e da Saúde.
O cuidar da saúde e o da escolarização dos pacientes em
tratamento precisam ser vistos como espaços em que o elemento
fundante são as relações humanas que se estabelecem entre as
pessoas envolvidas com estes processos e destes com a criança
em tratamento. Partindo desta perspectiva, esta pesquisa procu-
rou trabalhar com uma visão holística da educação matemática,
não com foco exclusivo no ensino regular, com vista a conteúdos
matemáticos, mas em uma perspectiva inclusiva, que engloba
aspectos sensíveis do ser humano, em práticas inter e transdis-
ciplinares, em ações integradas e coletivas, em nosso caso, no
atendimento pedagógico ao escolar em tratamento de saúde.

Procedimentos metodológicos

O presente estudo se caracteriza como pesquisa explorató-


ria, descritivo-analítica, valendo-se da Pesquisa-Ação Integral e
Sistêmica (PAIS), proposta por Morin (2004). De acordo com o

51
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

autor, a PAIS é “uma metodologia de pesquisa que utiliza o pensa-


mento sistêmico [...] para modelar um fenômeno complexo ativo
em um ambiente igualmente em evolução, no intuito de permitir
a um ator coletivo intervir nele para induzir uma mudança” (p.
91). Neste caso, o ator coletivo foi se constituindo ao longo da
pesquisa a partir do núcleo de profissionais que atuam junto à
coordenação do NAEH.
A escolha da pesquisa-ação como metodologia orientadora
da presente pesquisa se deu pela sua natureza ativa e reflexiva
diante da realidade pesquisada; pela produção de saber gestado
na ação e na reflexão; pelo desenvolvimento de ações de inter-
venção construídas a partir da colaboração e participação de
outros atores em cena; por valorizar o processo que culmina na
produção de mudanças, muitas vezes inacabadas, mas colocadas
em curso, e por se apresentar a pesquisa-ação como instrumento
de mudança social.
Os sujeitos eleitos na pesquisa foram os professores da Sedu-
ce, que atuam nos hospitais e nos domicílios, equipe pedagógica,
de apoio e gestores do NAEH.
Como princípio da PAIS, ressalta-se a parceria firmada en-
tre o NAEH e a Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio
do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UFG) e o
Programa de Mestrado Profissional em Matemática (ProfMat/
UFG) no contexto de aprofundamentos de estudos e pesquisa
no campo das classes e formação de professores. Daí o interesse
pelo encaminhamento deste estudo sob a égide dos princípios
da pesquisa-ação.
Com teor prático e aplicado, essência da pesquisa-ação, as
iniciativas conjuntas dos pesquisadores e da equipe gestora do
NAEH, não prescindiram da necessária incursão no campo teóri-
co, com o levantamento dos procedimentos e das contribuições
conceituais sobre as áreas de educação e saúde, em especial no
que diz respeito à educação matemática e educação inclusiva.

52
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Além das questões teóricas, fizeram parte da pesquisa estudos de


bases documentais, com proposta de levantamento de referendos
legais e oficiais sobre educação especial em Goiás e no Brasil.
A pesquisa de campo foi realizada no período de outubro
de 2016 a agosto de 2017, desenvolvida em diferentes espaços
e ambientes da Seduce, tendo sempre como direcionamento o
atendimento educacional hospitalar e domiciliar.
Para consolidação do desenho de pesquisa, nos propomos a
fazer uma revisão sistemática (cujos procedimentos e resultados
são apresentados em uma seção específica) sobre a produção de
conhecimento acerca de atendimentos pedagógicos realizados
em hospitais. Além de levantar os principais veios dos estudos,
compreender as dinâmicas próprias e específicas das classes
hospitalares e os principais meios, recursos e estratégias peda-
gógicas adotadas.
Paralelamente ao processo de revisão sistemática, buscamos
informações junto aos professores do NAEH sobre formação
básica e continuada, experiência acadêmica, bem como experi-
ência docente na educação regular e especial. Para essa etapa de
coleta de dados, além da observação participante, foi aplicado um
questionário contendo questões abertas e fechadas. Em essência,
os instrumentos foram construídos com o objetivo de coletar
dados referentes à formação inicial e continuada dos professo-
res, principais práticas pedagógicas adotadas nos atendimentos
pedagógicos em hospitais e domicílios, bem como demandas de
formação na área de matemática.
A condução do processo de análise dos dados da revisão
sistemática e instrumentos aplicados aos docentes se valeu
da Análise de Conteúdo, tendo como pressupostos de Amado,
Costa e Crusoé (2017), Bardin (2010) e Franco (2004). Embora
em etapas distintas, a análise dos artigos valendo-se a Revisão
Sistemática, e dos questionários aplicados, procedeu de forma
análoga, com leituras densas e contínuas dos materiais; levan-

53
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

tamento das principais ideias-chave que emergiam do texto;


convergência das ideias-chave que, a posteriori, conduziram a
aproximações; que, por sua vez, se convergiram em categorias
do estudo.
Como suporte ao processo de análise dos dados, utilizou-se o
software de análise qualitativa webQDA (2016), uma ferramenta
online que proporciona a pesquisadores um ambiente colabo-
rativo e distribuído. Como resultante desse processo, iniciamos
a construção coletiva de uma formação solicitada por profes-
sores que ensinam matemática, cujas etapas e detalhamentos
encontram-se descritos nos resultados.
Muito embora se possa adiantar que a formação proposta
ocorreu com grande êxito, este texto se concentra na etapa da
construção da proposta de formação de professores de classe
hospitalar que ensinam matemática.
Ressalta-se que, em conformidade com a metodologia de
pesquisa-ação, todas as iniciativas oriundas do processo de inves-
tigação foram resultado de um trabalho coletivo e colaborativo
entre pesquisadores de diferentes níveis e instituições de ensino,
educadores da Seduce e profissionais da asaúde.

Principais resultados da pesquisa

As informações levantadas no trabalho de campo foram


essenciais para a construção do desenho do campo de pesquisa.
Nesse processo, nos propomos a conhecer as diferentes frentes,
condições, estruturas e dinâmicas de trabalho para então levan-
tarmos as demandas de formação na área de matemática.
As observações do trabalho pedagógico, bem como entrevis-
tas com docentes, profissionais de apoio e gestores nos possibi-
litou conhecer melhor a realidade do trabalho para construção
de um plano de formação on demand, em conformidade com a
realidade que é própria do NAEH.

54
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Um elemento fundamental era conceber uma formação na


área de matemática que fosse direcionada à classe hospitalar e
que atendesse às especificidades daquele grupo. Para tanto, como
ponto de partida, era essencial que compreendêssemos quais
elementos no campo didático pedagógico eram específicos da
classe hospitalar; quais as estratégias metodológicas adotadas
nos estudos; que recursos materiais eram sugeridos para uma
prática pedagógica inclusiva; e, por fim, como o processo de
avaliação era conduzido nesse contexto.

Revisão sistemática sobre práticas pedagógicas nas


classes hospitalares

Valendo-se da Revisão Sistemática enquanto método de


estudo, buscamos os artigos para leitura na estrutura de in-
dexação das bases do Portal Periódicos da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do
Scientific Electronic Library Online (Scielo). Os descritores de
busca adotados foram: classe hospitalar, atendimento pedagógico
hospitalar, escola no hospital, pedagogia hospitalar e escolari-
zação em hospitais.
Como critério de inclusão da publicação no contexto da pes-
quisa, a amostra foi limitada a artigos científicos com publicações
realizadas no período de 2005 a 2016. A pesquisa nas bases, a
partir dos descritores de busca, retornou a 173 materiais. Após
o processo de filtragem adotado (tipo de recurso; período de
publicação; estruturação) a busca retornou um número de 56
artigos, sendo 46 selecionados e 10 excluídos por estarem re-
plicados em ambas as bases de busca.
Com o procedimento de leitura dos materiais previamente
selecionados, o número de artigos contemplado para a fase de
leitura foi reduzido para 26. Destaca-se que os artigos excluídos
abordavam questões destoantes e/ou temáticas direcionadas a
outros campos que não o da educação.

55
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Ressaltamos que os resultados do estudo referentes aos


aspectos políticos, conceituais e perfil das publicações foram
publicados, como artigo, na Revista Brasileira de Política e
Administração da Educação (TEIXEIRA et al., 2017a), para a
formação, em específicos, procuramos informações referentes
a especificidade de práticas pedagógicas no âmbito das classes
hospitalares.
A partir do contexto de análise, com utilização do WebQDA,
no campo das estratégias metodológicas, as mais citadas, por
ordem, foram: uso de recursos lúdicos, atenção individual ao
educando, necessidade de adaptações curriculares, conforme se
observa no Gráfico 1. Como subsídio para leitura gráfica, “Freq.”
representa a contabilização dos elementos observáveis uma vez
em cada obra presente, enquanto “Ref.” indica o número total
de vezes que a referência encontra-se presente. Como exemplo,
das 26 obras analisadas, o lúdico se fez presente em 10 (38,5%)
delas; nessas 10 obras, mencionado 20 vezes, estando presente
mais de uma vez em algumas das obras; e, ainda no Gráfico 1,
no quesito “Contextualização” dos conteúdos, embora presente
em poucos artigos, três (11,5%), obteve bastante destaque em
termos de frequência (nove).

Gráfico 1. Estratégias metodológicas presentes nos artigos analisados

Fonte: Revisão dos autores

56
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Em termos de recursos pedagógicos mais utilizados nas


aulas, destacaram-se, na ordem, recursos tecnológicos, livro
literário e jogos (Gráfico 2).

Gráfico 2. Estratégias metodológicas presentes nos artigos analisados

Fonte: Revisão dos autores

No tocante à avaliação, poucos artigos analisados abordam


essa questão. Os principais instrumentos adotados, em ordem,
foram: relatório avaliativo, avaliação diagnóstica, avaliação de-
mandada pela escola (Gráfico 3). Não se verificou nos artigos
analisados a presença da “prova” aos moldes tradicionais, ou seja,
quantitativa com foco na verificação da aprendizagem, mesmo
nas avaliações demandadas pela escola.

Gráfico 3. Estratégias metodológicas presentes nos artigos analisados

Fonte: Revisão dos autores

Na análise sobre o que é próprio ou específico das classes


hospitalares, os seguintes elementos foram apontados nas obras:
legislações próprias/específicas; ambientes (hospital, domicílios,
outros ambientes); relações com profissionais do campo da saú-
de; demandas de conhecimento e formação em biossegurança;

57
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

lida com situações de fragilidade do educando com necessárias


e constantes adaptações no currículo da atividade planejada;
classes multisseriadas (salas de aula com alunos de várias ida-
des e séries/ano escolar); carga-horária de ensino reduzida em
relação ao ensino regular; professores de uma área de formação
atuantes nas diferentes disciplinas; constante vivência com si-
tuações de dor, sofrimento e morte do educando; ambiente de
trabalho insalubre; demanda de formação específica; estrutura
inadequada para o ensino; novos saberes necessários à prática
docente (pedagógico/saúde).

Construção da proposta de formação de professores para


o ensino de matemática nas classes hospitalares do NAEH

Em paralelo à fase de análise dos artigos, buscou-se levantar,


junto aos docentes do NAEH, informações da mesma natureza
referentes ao trabalho pedagógico. Para isso, foi aplicado um
questionário com questões abertas e fechadas. As perguntas
elaboradas diziam respeito sobre formação inicial e continuada,
segurança para condução das aulas de matemática, avaliação do
ambiente, espaços e recursos de apoio disponíveis para o ensino,
dentre outros. Responderam ao instrumento 31 docentes.
Em síntese, os professores do NAEH apresentam que a for-
mação inicial em ensino superior não proporciona condições de
atuação nas classes hospitalares, cabendo ao docente interessado
nesse trabalho buscar formação específica. Que a formação con-
tinuada ofertada pelo NAEH melhora as condições de trabalho e
possilita o avanço em práticas pedagógicas.
No quesito ensino de matemática, embora todos os docentes
apresentem cursos de grau licenciatura, ressalta-se que nenhum
deles possui formação específica em matemática. A justificativa
dada pela coordenação do NAEH é que, na Seduce, a área de
matemática é tida como prioritária para o ensino em classes
comuns do ensino regular, sendo os professores da área impedi-

58
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

dos, salvo casos específicos, de assumirem a função docente em


outros espaços ou cargos/funções administrativas ou de gestão.
Na análise das questões abertas, conduzimos as respostas
por aproximações de ideias-chave que, a posteriori, se conver-
giram em categorias.
Sobre a questão de como se dá o planejamento para as aulas
de matemática, a Tabela 1 apresenta a síntese dos posicionamen-
tos dos docentes. A frequência de intervenções não diz respeito
ao número de docentes (que foram 31), mas das recorrências de
apontamentos destacadados.

Tabela 1. Categorias relacionadas à condução do planejamento


das aulas de matemática

CATEGORIAS Freq. %

Leva em consideração as condições do ambiente 11 28,21%

Leva em consideração a série/idade dos educandos 7 17,95%

Leva em consideração o momento pedagógico do educando 7 17,95%

O planejamento é feito interdisciplinarmente 5 12,82%

Os conteúdos são aproximados aos diferentes educandos 4 10,26%

Não apresenta um direcionamento próprio/específico 3 7,69%

Leva em consideração o estado físico e emocional do edu-


2 5,13%
cando

TOTAL 39 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa

Sobre como fazem a seleção dos conteúdos para as aulas de


matemática, 52,8% apresentam o Currículo Referência da Seduce
como base, 22,2% que adotam os conteúdos em conformidade
ao momento pedagógico do educando, e 11,1% que exploram
os conteúdos indicados pela escola de origem do educando.
Embora a utilização do Currículo Referência da Seduce seja uma

59
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

orientação para toda a rede de ensino de Goiás (seja ela para o


ensino regular ou especial), há orientações do NAEH quanto à
liberdade do docente em promover as adaptações curriculares
necessárias, em conformidade com o momento pedagógico do
educando (GOIÁS, 2013; 2014).
Em estudo feito especificamente sobre o referido currículo
da rede estadual e publicado internacionalmente (TEIXEIRA
et al., 2017b), apresentamos, como resultado de análise, que o
mesmo conduz uma proposta pedagógica para ensino de ma-
temática aos moldes tradicionais, ou seja, “traz como essência,
uma estrutura conteudista e bimestralizada. Assim, o processo
de flexibilização, também presente como orientação nos docu-
mentos da Seduce (GOIÁS, 2013; 2014), se torna complexo no
sentido de chocar com a proposta inflexível presente no modelo
do Currículo Referência” (p. 162).
Quanto às estratégias de ensino adotadas nas classes hospi-
talares, algumas atividades interativas como atividades lúdicas
(presentes no resultado da pesquisa nas obras) e uso de mate-
rial concreto, disputam espaço com modelos mais centrados
no professor como aulas expositivas e resolução individual de
exercícios (Tabela 2).

Tabela 2. Estratégias pedagógicas mais utilizadas nas aulas de matemática

CATEGORIAS Freq. %

Atividades lúdicas 12 24,49%

Aulas expositivas 10 20,41%

Resolução individual de exercícios 8 16,33%

Uso de material concreto 6 12,24%

Aulas com vídeos 3 6,12%

Resolução de problemas 3 6,12%

Desenvolvimento de projetos 2 4,08%

60
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

História da Matemática 2 4,08%

Metodologia de questionamento 1 2,04%

Aulas dialogadas 1 2,04%

Temas do dia a dia 1 2,04%

TOTAL 49 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa

A análise acerca das condutas docentes quanto ao uso de


recursos pedagógicos nas aulas de matemática, nos conduziu às
seguintes categorias expressas na Tabela 3.

Tabela 3. Recursos materiais adotados nas aulas de matemática

CATEGORIA Freq. %

Jogos 14 30,43%

Material concreto (Material dourado, blocos lógicos...) 8 17,39%

Material impresso (lista de exercícios, figuras, imagens...) 5 10,87%

Livro didático 4 8,70%

Computador/internet 3 6,52%

Brincadeiras 2 4,35%

Livros literários 2 4,35%

Quadro/lousa 2 4,35%

Caderno escolar 2 4,35%

Materiais de matemática (régua, compasso, sólidos...) 1 2,17%

Materiais reciclados/sucatas 1 2,17%

Material de papelaria (tesoura, cola, recortes...) 1 2,17%

Recursos audiovisuais 1 2,17%

TOTAL 46 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa

61
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Compreendendo que há licenciados em outras áreas de for-


mação e atuando em diferentes fases do ensino – da educação
infantil ao ensino médio – levantamos quais as principais dificul-
dades enfrentadas pelos professores que ensinam matemática
nas classes hospitalares. Não só pela resposta ao instrumento,
mas também pelas conversas informais e relatos nas reuniões,
ensinar matemática para os docentes do NAEH se caracteriza
como um grande desafio e uma barreira a ser enfrentada. A Ta-
bela 4 expressa tais dificuldades.

Tabela 4. Principais dificuldades apontadas para o ensino de matemática

CATEGORIA Freq. %

Aprender os conteúdos para ensinar (formação em outra área) 12 28,57%

Dificuldade dos alunos de acompanhar os conteúdos 8 19,05%

Falta de professor graduado na área 5 11,90%

Acompanhar o Currículo Referência da Seduce 4 9,52%

Fragilidade do estado de saúde do educando 4 9,52%

Classes multisseriadas 4 9,52%

Falta de recursos de apoio 3 7,14%

Fragmentação de conteúdos 2 4,76%

TOTAL 42 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa

No tocante ao processo de avaliação, há também uma varia-


ção de proposta que se aproxima das orientações apresentadas
na síntese dos artigos expostos (mais centradas no processo de
desenvolvimento do educando) e avaliação focada no processo de
verificação de conteúdos (mais centrada no resultado, centrada
na aprendizagem dos conteúdos ensinados) (Tabela 5).

62
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tabela 5. Tipo de avaliação proposta nas aulas de matemática

CATEGORIA Freq. %

Acompanhando o desenvolvimento do educando 12 27,27%

Por meio de conteúdos de matemática 10 22,73%

Pelo desempenho nas atividades/produções 8 18,18%

Pelo interesse/participação/envolvimento 7 15,91%

Por meio de atividades/exercícios 2 4,55%

De forma processual e contínua 3 6,82%

Valorizando toda a produção do educando 2 4,55%

TOTAL 44 100,00%

Fonte: Dados da pesquisa

De posse dos dois materiais consolidados (Revisão Sistemá-


tica e síntese dos questionários respondidos), fizemos uma prévia
proposta de formação para ser discutida e apreciada pelos edu-
cadores do NAEH (equipe gestora, de apoio e docentes) e muitas
contribuições foram dadas, até que chegamos a uma versão mais
madura. Como resultante das discussões e análise do material
exposto, foram feitas adequações e acréscimos no material inicial
e consolidado coletivamente o novo modelo com conteúdos, estra-
tégias metodológicas, carga-horária e demais elementos.
Assim, chegamos, coletivamente a uma proposta de forma-
ção de professores do NAEH para o ensino de matemática.
Ficou decidido que a formação teria carga-horária total de
120 horas-aula, no formato de encontros presenciais e momentos
de estudos e aprofundamentos teóricos com desenvolvimento
de atividades. O curso foi registrado como atividade de extensão
e contou com a parceria de duas unidades da UFG: Instituto de
Matemática e Estatística (via ProfMat) e Faculdade de Educação
(via PPGE).

63
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

O curso foi distribuído em três blocos de aulas, organizados


a partir de temas geradores. De forma a não comprometer o
calendário escolar, o curso foi proposto em períodos de planeja-
mentos. O primeiro e segundo blocos, contendo quatro encontros
cada, foram realizados, respectivamente, nos meses de janeiro
e abril de 2017; sendo o terceiro e último bloco, contendo dois
encontros, foi realizado no mês de junho de 2017. Ressalta-se
que. no intervalo entre os blocos, os professores recebiam ativi-
dades de leitura, de aprofundamentos, de desenvolvimento de
materiais pedagógicos, de produção e aplicação dos conteúdos
abordados nos encontros.
Como apoio, complemento e suplemento às atividades re-
alizadas no curso, foi desenvolvido um blog, de acesso aberto
e livre6. No blog, além da memória dos conteúdos, debates e
materiais trabalhados nas aulas, foram disponibilizados vídeos
de assuntos correlatos, materiais de apoio, propostas de aula,
dicas de atividades pedagógicas, links externos, dentre outros.
Reconhecidamente pelos cursistas, o blog se caracterizou como
uma importante ferramenta de apoio ao curso.
A formação proposta, intitulada “Formação de professores
para o ensino de matemática em classes hospitalares”, elegeu
como objetivo aprofundar conhecimentos em temáticas relacio-
nadas ao processo ensino-aprendizagem de matemática no con-
texto hospitalar/domiciliar; levantar discussões sobre métodos,
técnicas, estratégias e procedimentos pedagógicos para o ensino
de matemática; proporcionar avanços pedagógicos na aborda-
gem de conteúdos da área de matemática, em uma perspectiva
inclusiva, de forma a proporcionar aprendizagem efetiva e sig-
nificativa por meio de tarefas concretas e práticas para, segundo
Libâneo (1990), uma assimilação consciente de conhecimentos,
habilidades e hábitos direcionados pelo professor.

6 Acesso ao blog da formação pelo endereço: www.matematicanaehgo.blogspot.com.br.

64
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Como princípio básico, foi proposta a exploração individual


e coletiva de conteúdos: a) factuais, por meio de vivências dos
principais fatos, personagens e questões históricas; b) conceitu-
ais, a partir de exploração de situações-problemas e quotidianas
possibilitando a construção e percepção de definições e con-
ceitos próprios e de pesquisadores; c) procedimentais, a partir
da construção colaborativa dos procedimentos matemáticos
necessários à resolução dos problemas e questões propostas;
d) atitudinais, por meio da formação crítica e criativa do sujeito
histórico e competente (DEMO, 2002).
Enquanto estrutura, partimos da concepção de Demo (2002)
no sentido de uma formação que valorize a pesquisa, o questio-
namento e a reconstrução. A pesquisa compreendida enquanto
elemento de construção da autonomia no processo de formação
continuada; como atitude cotidiana e emancipatória. O questio-
namento com base no olhar crítico, vislumbrando a capacidade
de mudar, de inovar, de buscar compreensões e novos olhares.
Na classe hospitalar, o questionamento, a reflexão, o olhar sen-
sível se constitui como importante na base impulsionadora do
processo de formação e mudança. A reconstrução observada na
busca por novos conhecimentos e saberes, sempre renovados,
ressignificados, como base da formação do sujeito competente.
Em nosso caso, perpassa pela ressignificação o ambiente, o aluno,
as condições de trabalho, o significado pedagógico, a equipe de
trabalho, dentre outros. O desejo e intenção de mudança e os
objetivos de aprendizagem são elementos orientados para um
trabalho coletivo, de base colaborativa.
Um dos elementos de difícil construção, muito em função
do grupo de professores não possuir formação específica em
matemática e pela caracterização do seu ambiente de atuação,
foi a distribuição dos conteúdos a serem abordados na formação
e as estratégias pedagógicas a serem contempladas na proposta.

65
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Os conteúdos trabalhados na formação foram apresenta-


dos em conformidade com as situações-problemas, os desafios
apresentados ou temáticas abordadas. Em nossa visão, com essa
proposta não se correria o risco de uma abordagem de conte-
údos fragmentados, com aplicações limitadas ou segmentadas.
A finalidade foi contemplar o tema gerador proposto e não o
conteúdo em si cujo ensino deveria ser esgotado.
Os temas geradores contemplados na formação foram: o
lúdico nas aulas de matemática, trabalhado em duas etapas;
matemática e as tecnologias; matemática e literatura; consumo
e cidadania; arte e matemática; e instrumentos clássicos da
matemática.
A primeira parte do tema gerador “o lúdico nas aulas de
matemática” contemplou a exploração dos seguintes conteúdos
matemáticos: números e operações: princípio aditivo e multipli-
cativo, cálculo mental, resolução de situações problema; propor-
cionalidade: grandezas e medidas; geometria plana: princípios,
bases e operações; progressão aritmética e geométrica: estrutura,
princípios e operações. Enquanto recursos materiais, explorou-
se: jogos tradicionais (de tabuleiro, de cartas) e materiais ma-
nipuláveis (Material Dourado de Montessori, Escala Cuisenaire,
Blocos Lógicos, Geoplano).
A segunda parte do mesmo tema gerador abordou: cons-
trução da lógica do sistema de numeração com outras bases;
operações numéricas nos números naturais, inteiros e racionais;
função exponencial e progressão geométrica; raciocínio lógico,
cálculo mental. Os recursos materiais utilizados foram: ábaco
japonês Soroban, cartela de ovo e bolinhas, Torre de Hanói, jogo
de boliche, Senha.
O tema gerador “Matemática e as tecnologias” contemplou
os seguintes conteúdos de matemática: aritmética: números
pares e ímpares, primos e compostos, múltiplos e divisores,
expressões numéricas; função: afim, quadrática, exponencial e

66
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

logarítmica; geometria plana: circunferência e círculo, ângulos,


relações métricas e trigonométricas, poligonais e polígonos,
perímetro e áreas.
O tema “Matemática e Literatura” abordou: História da Ma-
temática: conhecimento de fatos históricos que contribuíram
para o desenvolvimento da matemática por meio da literatura;
fundamentação de conceitos, aplicações e usos de diferentes
abordagens de conteúdos, princípios e bases da matemática.
Como recursos materiais, explorou-se: literatura na área de ma-
temática: O homem que calculava – de Malba Tahan, O diabo dos
números - de Hans Magnus Enzensberger, O último teorema de
Fermat - de Simon Singh; literatura de outras áreas com direcio-
namento pedagógico em matemática: diversas obras literárias.
O tema gerador “Trabalho, consumo e cidadania” contem-
plou os conteúdos de História da Matemática: estudo da proba-
bilidade e estatística; razão; proporção; matemática financeira:
razão, proporção, porcentagem, custo, lucro, receita, despesa;
função: linear, quadrática e exponencial; educação financeira:
planejamento individual e coletivo (planejamento familiar), a
função social da organização financeira, consciência e planeja-
mento de receitas e despesas; trabalho: trabalho, emprego, renda
e planejamento de carreira. O tema gerador “Arte e Matemática”
explorou os conteúdos: ângulos: elementos da geometria (ideia
de ponto/vértice; segmento/lado; diagonal; eixo de simetria;
ângulos; dentre outros); demonstração da propriedade de soma
dos ângulos internos de um polígono; simetria axial, pontual e de
rotação; construção de curvas como parábola e hipérbole. Como
estratégia, utilizaram-se técnicas da arte japonesa de dobradura
de papéis (Origami).
Por fim, o tema gerador “Instrumentos clássicos da ma-
temática” abarcou a proposta de orientação no uso de régua,
compasso, transferidor; construções geométricas como ângulos,
segmentos paralelos e concorrentes, construção de circunferên-

67
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

cias, triângulos e quadriláteros, figuras regulares internas a uma


circunferência, ortocentro, incentro, baricentro e circuncentro.
Como recursos materiais, utilizou-se compasso, régua e trans-
feridor.
Para avaliação dos participantes, ficaram acordados dois
critérios: 1) Qualidade nas aulas – participação nas aulas, envol-
vimento com os temas discutidos, colaboração com os colegas
– valor 30% da nota; e, 2) Qualidade dos produtos – registro dos
encontros em um caderno de registros individuais (portfólio),
realização das atividades propostas e apresentação oral e escrita
dos resultados – valor 70% da nota. O percentual de frequência
e nota mínima para aprovação estabelecidos foram, respectiva-
mente, 75% e 8,0.

Considerações finais

A compreensão de diferentes experiências pedagógicas nas


classes hospitalares, nos remeteu à questões de cunho investiga-
tivo acerca da organização, tanto por parte dos hospitais quanto
da Seduce, para o atendimento pedagógico aos educandos; das
relações estabelecidas entre profissionais da saúde e da educação
atuantes no ambiente hospitalar; do processo de formação do
professor que ensina matemática para educandos em condições
especiais. As questões norteadoras aliadas à Pesquisa-Ação como
suporte metodológico, na perspectiva Integral e Sistêmica (PAIS),
permitiu-nos buscar contribuições com ações de teor pedagó-
gico na área de educação matemática no processo de formação
de professores que atuam no ensino de matemática no contexto
das classes hospitalares.
Em função das espirais, característica do método, o próprio
processo de investigação ditou o ritmo dos trabalhos, desde os
contatos institucionais iniciais, ao envolvimento da equipe nas
propostas, até a percepção dos pesquisadores sobre as opor-
tunidades que o campo trazia enquanto espaço de trabalho e

68
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

pesquisa. Na Pesquisa-Ação, o trabalho é compreendido como


um ato coletivo, participativo e colaborativo.
Esta pesquisa, em síntese, se caracterizou como uma
oportunidade de vivências e trocas, enriquecimento teórico e
metodológico, trabalho em equipe permeado de discussões e
aprofundamentos. Assim, embora se tenha boas avaliações em
termos de resultados, ressalta-se que, na Pesquisa-Ação, dá-se
maior valor aos processos, aos ganhos sensíveis que não se men-
sura ou computa nas plataformas de avaliação.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

PROPOSTA DE GÊNESE INSTRUMENTAL PARA O ENSINO


DE COMPARAÇÃO DE FRAÇÕES: SITUAÇÕES DIDÁTICAS

Edmo Fernandes Carvalho1


Luiz Márcio Santos Farias2
Maria Auxiliadora Lisboa Moreno Pires3

Introdução

No presente artigo discutimos a relação entre situações


didáticas e o processo de gênese instrumental no ensino de sabe-
res matemáticos. Trata-se de um recorte de um desdobramento
de uma investigação sobre estudo das situações didáticas e das
praxeologias matemáticas no âmbito da Teoria Antropológica do
Didático (denominaremos a partir daqui TAD), desenvolvida no
Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa em Ensino e Didática das Ci-
ências, Matemática e Tecnologias – NIPEDICMT/UFBA. A mesma
surge da necessidade de apresentar o conhecimento matemático
sobre números fracionários, a partir de um trabalho pautado
numa análise a priori de uma tarefa experimentada numa turma
do 6º ano, breve análise institucional do manual escolar (livro
didático) e das soluções dos estudantes para uma tarefa, em
que foram disponibilizados lápis e papel, calculadora e software
matemático livre numa versão on-line, Geogebra tube. Com isso
1 Professor de Matemática. Doutorando do PPGEFH/UFBA – Bahia – Brasil. E-mail: edmofc@
gmail.com
2 Licenciado em Matemática. Doutor em Didática da Matemática. Université de Montpellier
II, UM2, França. Coordenador do Programa de Pós-graduação em Ensino, Filosofia e História
das Ciências-UFBA – Bahia – Brasil. E-mail: lmsfarias@ufba.br
3 Licenciada em Matemática. Doutor em Educação pela UFRN. Docente da Universidade Estadual
de Feira de Santana (UEFS) - Bahia – Brasil. E-mail: auxpires@terra.com.br

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

analisamos as praxeologias de estudantes diante de uma situação


de comparação de números fracionários na primeira etapa e de
reconstrução de praxeologias na etapa seguinte.
Convém ressaltar, que uma primeira motivação para pen-
sarmos na integração de recursos tecnológicos no ensino dos
mais variados objetos matemáticos vem das discussões já postas
sobre o uso de celulares e tablets na sala, o que ganha cada vez
mais espaço entre os temas emergentes no âmbito educacional.
E observando o aumento crescente desses aparelhos na sala de
aula, surgiram algumas indagações acerca do uso desses recursos
no ensino de objetos matemáticos, cuja aprendizagem ainda tem
se mostrado problemática, e nesse ponto surgem duas noções
importantes: a de artefato e instrumento (RABARDEL, 1995).
Ademais, baseamo-nos nos relatórios de avaliações de larga
escala, como o PISA (Programa de avaliação internacional de
estudantes), como indicadores de dificuldades no processo de
ensino e aprendizagem matemática, nos diferentes eixos propos-
tos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). De acordo com
o último relatório publicado, o Brasil encontra-se no nível 1 da
escala de proficiência, indicando que os estudantes são capazes
de responder a questões definidas com clareza, que envolvem
contextos conhecidos, nas quais todas as informações relevantes
estão presentes. Conseguem identificar informações e executar
procedimentos rotineiros de acordo com instruções diretas em
situações explícitas. São capazes de executar ações óbvias e dar
continuidade imediata ao estímulo dado (OECD, 2014).
Por conseguinte, questionamo-nos, por exemplo, sobre o
papel do uso desses recursos tecnológicos no desenho da prática
de estudantes e professores de matemática no estudo do objeto
matemático comparação de números fracionários, delimitando
assim o objeto de investigação. Além disso, é interessante saber
como desenvolver praxeologias matemáticas de estudantes para
o estudo do saber em jogo.

72
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A percepção supracitada, da atenção dada aos celulares,


por meio do qual os alunos acessam a internet durante as aulas,
especialmente as redes sociais, contribuiu para a definição da
proposta de pensar em um ambiente em que a tecnologia esteja
integrada (BITTAR et al., 2008) à praxeologia matemática dos
atores de uma dada instituição, o que significa pensar num traba-
lho de gênese instrumental (RABARDEL, 1995) com a mudança
de status de um determinado recurso (calculadora, software
matemático) de artefato para instrumento nessa instituição.
Por outro lado, existe uma preocupação com a utilização de
mais de um recurso tecnológico, e dessa forma outras noções
como a de configuração didática que tem como pressupostos as
noções de gêneses instrumental (RABARDEL, 1995) e Orques-
tração Instrumental (TROUCHE, 2004), permearam os questio-
namentos sobre o uso de tais recursos na sala de aula. Nesse
contexto, pensou-se num ambiente organizado para o ensino e
aprendizagem do saber em jogo, pela escolha dos recursos nele
disponibilizados, das técnicas de trabalho para apreensão dos
objetos matemáticos por meio das tecnologias e o papel dessas
neste processo (DRIJVERS et al, 2010).
Assim foram definidos como recursos o computador pelo
qual seria feito uso do Geogebra versão 5.0, uma calculadora
simples, lápis e papel. Como a proposta é para o sexto ano,
buscou-se, no Geogebra tube, “organizações didáticas prontas”
em que os estudantes utilizassem para realizar a tarefa de com-
parar os fracionários.

Elementos teóricos para caracterização do cenário de


experimentação

O cenário para experimentação da tarefa embasou-se na no-


ção de configuração didática, na tentativa de dar conta de como
compreender a relação dos sujeitos com o objeto matemático
mediada por recursos tecnológicos.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Pensar nesse cenário para estudo do objeto do saber vai


além da inserção de alguns recursos tecnológicos. É um trabalho
que envolve, antes de tudo, uma análise a priori da proposta de
experimentação de uma tarefa. Com isso, busca-se antever quais
estratégias os estudantes devem utilizar, qual(is) técnica(s)
compõe essa estratégia? E por quê? Além disso, procura-se um
modelo de referência compatível com o modelo dominante do
saber (BOSCH & GASCON, 2010), esta é uma tentativa de orien-
tar a reconstrução das praxeologias matemáticas dos sujeitos
daquela instituição.
Um software educacional pode ser somente, e talvez tenha
sido em muitas instituições, um artefato. Essa afirmação faz
referência a forma que esses recursos são aproveitados ou su-
baproveitados, quando são propostas situações de ensino.
Diante do que fora exposto, a gênese instrumental (RA-
BARDEL, 1995) é o processo que vai modelizar a transformação
gerada pela ação do sujeito sobre o artefato, tornando-o num
instrumento. Se o estudante utiliza a calculadora apenas para
representar na forma decimal um número fracionário e depois
colocá-lo em ordem crescente, talvez a calculadora tenha aí um
status de artefato, mas na verdade o que garantirá reconhecer seu
verdadeiro status será uma confrontação entre dois momentos
imprescindíveis para a experimentação da situação, a análise a
priori com a análise a posteriori.
Nota-se que o papel do professor nesse processo vai além
da observação e das intervenções que fará durante a aula. Ele
analisa possíveis estratégias corretas e/ou erradas e depois
as compara com os dados construídos. Na verdade, esse é um
papel de um professor pesquisador, ou apenas do pesquisador.
Parece-nos que seria uma postura a ser adotada pelo professor
ainda que não estivesse envolvido em alguma investigação, mas
não há espaço para essa discussão aqui.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Existe uma preocupação, no âmbito em que realizamos


a investigação, de que tal situação com utilização de recursos
tecnológicos não seja encarada apenas como momento lúdico.
Essa é, verdadeiramente, uma atividade de investigação mate-
mática, em que as praxeologias vão sendo reveladas na busca de
estabilizar-se um saber.
Diante disso, pensa-se os recursos tecnológicos nesse cená-
rio, como meio que deve retroagir conforme o estudante age, e
essa ação continuada sobre os artefatos torne-os em instrumento,
à medida que desenvolve esquemas de uso (instrumentalização)
e evoluem tais esquemas de uso (instrumentação), de tal modo
que sem este a situação fique inviabilizada.
Em suma, o quadro teórico utilizado (Teoria da instrumen-
tação) embasa essa investigação, auxiliando a compreender e
modelar as ações docente e discente em um ambiente tecnológico
por meio de uma configuração didática diferente da comumente
praticada, um modo de exploração e do desempenho didático
(COUTO, 2015).
A relação desta investigação com o quadro teórico supra-
citado se estabelece pelos objetivos de investigação, dentre os
quais está o de identificar efeitos dessa nova organização didática
desenvolvida por um professor no ensino da comparação de nú-
meros fracionários, tendo como situação fundamental atividade
descrita a seguir.

Tipo de tarefa: Comparação de números fracionários


T1: Escrever os números fracionários em ordem crescente.
Veja os números fracionários a seguir:
3/7; 8/3; 4/5; 11/4; 21/35; 1 5/7; 9/5; 17/7; 14/5 e 11/9.
Escreva-os em ordem crescente.

Posteriormente, as estratégias e técnicas serão discutidas,


tendo como recorte as soluções propostas por estudantes do sex-

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

to ano. Além disso, as análises sobre essa tarefa experimentada


na referida turma são compostas de uma análise a priori, que
por sua vez, subdivide-se em análise do modelo epistemológico
dominante do objeto números fracionários e do modelo de re-
ferência desse objeto do saber, e análise a posteriori.

Abordagem metodológica

Nesse texto, destaca-se a partir de um recorte de uma inves-


tigação sobre ensino de números fracionários, elementos de duas
etapas de uma micro engenharia (ARTIGUE, 1988): a análise a
priori e a posteriori. Na primeira análise, são apresentados al-
guns aspectos da epistemologia do saber matemático números
fracionários, e evidencia-se dois modelos epistemológicos do
saber, o dominante e o de referência. Já a análise a posteriori,
tem elementos apresentados na seção resultados e discussões.
Na sequência as duas análises são confrontadas o que no pano-
rama teórico utilizado constitui-se como validação do dispositivo
metodológico.

Modelo epistemológico dominante do objeto tamanho dos


números fracionários

Cabe esclarecer que nesse trabalho empregamos o termo


número fracionário, para indicar qualquer número que pode
a
ser representado por uma classe de frações b , com b≠ 0 , a e b
podendo ser números reais ou polinômios (SILVA, 2005). Essa
escolha dentre outras que podem ser encontradas analisando-se
alguns trabalhos que abordem essa temática, se justifica por ser
essa a forma mais abrangente possível e que atenda às necessi-
dades do nível de ensino para o qual propomos tal trabalho, o
Ensino Fundamental. Também nos referiremos às frações, que
representam um número fracionário, e nesse caso, é importan-
te notar que existem inúmeras representações que podem ser

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

manipuladas para representar um mesmo número fracionário,


como é o caso de ·, que pode ser representado pelas frações ,
, (SILVA, 2005).
Posto a partir de que perspectiva falamos de números fra-
cionários e frações, seguimos com alguns elementos da episte-
mologia desse saber. Apresentamos um recorte do trabalho de
dissertação do segundo autor.
O uso desse termo, para indicar os números escritos na for-
a
ma de fração b , encontra algumas barreiras tais como: o sujeito
que estuda o reconhece como dois números um sobre o outro, e
não como uma única entidade; e não o compreende como uma
entidade multifacetada (LOPES, 2008), composta de diferentes
concepções (SILVA, 2005); está ligado a técnicas dominantes de
disseminação, de acordo com um modelo epistemológico domi-
nante institucional, em termos do saber matemático.
Em termos epistemológicos, nos cabe, de forma mais econô-
mica e eficiente, identificar qual modelo didático pressupõe um
modelo de estudo (de ensino e aprendizagem) institucionalizado
da matemática (BOSCH, GASCÓN, 2010). Esses autores apon-
tam que os modelos que dão conta de somente um momento,
centrado no momento tecnológico-teórico, ou num momento
do trabalho da técnica ou ainda num momento exploratório,
fizeram surgir outros tipos ideais de modelos didáticos que eles
caracterizaram de bidimensionais, porque integram dois mo-
mentos do processo de estudo da matemática. Um é o momento
clássico centrado no processo tecnológico-teórico e do trabalho
da técnica; o empirista, que considera os momentos de trabalho
da técnica e exploratório; e o construtivista que combina os mo-
mentos exploratório e tecnológico-teórico (Ibidem).
O discurso sobre esses aspectos e consequentemente a
análise dessas instituições visam, nessa investigação, minimizar
lacunas na forma de olhar as restrições que ocorrem no sistema
de ensino, normalmente presentes em pesquisas no campo da

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Didática da Matemática, apontados por Bosch & Gascón (2010),


como a concentração nos fenômenos que estão circunscritos nos
limites estreitos do trabalho em sala de aula, aqueles em que
se olha apenas para os momentos de ensino ou aprendizagem,
sem se dar conta de outros elementos que estão relacionados as
escolhas didáticas dos professores para o ensino da matemática.
Os números fracionários assumem um lugar de destaque no
cenário de dificuldades em matemática, entre os conceitos mais
complexos, que podem ser encontrados por estudantes durante o
Ensino Fundamental. E um dos principais fatores que contribuem
para tal complexidade é a noção multifacetada de conceitos, que
englobam outros cinco conceitos interrelacionados: parte-todo,
proporção, operador, quociente e medida (CHARALAMBOUS &
PITTA-PANTAZI, 2005). Entretanto, chamamos a atenção, que
esse problema pode ser visto sob a ótica da Antropologia da Di-
dática, que considera, além de aspectos cognitivos, outros ligados
à instituição, como às condições ou restrições da organização
didática para o ensino desse saber.
Delimitamos o objeto matemático para aprofundarmos o
estudo de um fenômeno didático, a perda da razão de ser do
objeto em questão, que ajuda a configurar o problema didático,
a dificuldade de compreensão da razão de ser do objeto de saber,
números fracionários.
O ensino e aprendizagem de números fracionários tem sido
tradicionalmente problemático (CHARALAMBOUS & PITTA-PAN-
TAZI, 2005) e provavelmente é um dos mais graves obstáculos
à maturação matemática das crianças (BEHR, HAREL, POST &
LESH, 1993), para entender tal objeto matemático, precisamos
esclarecer como se compreende o conceito de número fracio-
nário. Quando, por exemplo, conceituamos fração como repre-
sentação de um número que pode indicar parte de um inteiro
ou de uma quantidade e associamos essa ideia a uma figura, os
estudantes podem associar parte da figura a um número fracio-

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

nário mesmo que ela não esteja dividida em partes iguais. É o


caso do número associado a figura 1.

Figura 1 – Forma equivocada de associar um número fracionário a uma figura

Fonte: mdmat. mat.ufrgs.br

Percebe-se que de forma dominante a concepção de parte-


todo (com uso da técnica de dupla contagem) é a mais mobilizada
na prática institucional, ao realizar a análise do objeto matemáti-
co no livro didático, supomos o motivo pelo qual isso ocorre. Por
exemplo, no número ·, 4 é o denominador e indica em quantas
partes o inteiro foi dividido, e o 3 é o numerador, e por sua vez
indica quantas partes foram consideradas.
Segundo Silva (2005), não se sabe quando o ensino passou a
mobilizar essa concepção, da forma que encontramos hoje na sala
de aula, normalmente apoiado na representação de superfícies
e adotando como técnica a dupla contagem das partes. Valente
(2002) citado por Silva (2005), aponta que no início do século
XX, Euclides Roxo publicou um material instrucional, que dentre
outras coisas tratava das frações mobilizando a concepção de
parte-todo associado à medida, o que talvez seja um indício de
quando tenha começado esse movimento de mobilização desse
conceito.
A ideia de fração em sua gênese se deu de forma simultânea
às necessidades das antigas civilizações em tarefas de medição,
comparação e distribuição (SILVA, 2005). Tais necessidades
evocaram outras também essenciais como registrar e calcular,
que conduziram os sujeitos envolvidos nesse processo ao desen-

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

volvimento de registros e regras operatórias, tanto com números


fracionários como com valores desconhecidos, fazendo surgir
outra necessidade mais geral, a de estruturar o ensino dessas
concepções associadas às principais tarefas dos sujeitos na
sociedade (ibidem, 2005). Temos, assim, evidência da razão de
ser desse objeto, numa dimensão social, a de medida e registro.
De forma efetiva, somente membros da sociedade chamados
calculadores utilizavam as frações, enquanto que outros faziam
uso limitado de acordo com suas necessidades, da ideia de me-
tades, um quarto, terça parte, ou seja, frações unitárias, aquelas
que têm essencialmente numerador 1, como é o caso de . Para
fracionários com numeradores maiores que um, combinavam-se
algumas frações unitárias por meio da adição destas (WALL, 2014).
A notação que se aproximava da que utilizamos hoje foi a
usada na Índia, entretanto, sem a barra (WALL, 2014). E a respei-
to das representações de números fracionários na antiguidade,
não eram consideradas pelos matemáticos como números, e essa
rejeição perdurou até século XIX, mesmo após sua sistematiza-
ção (SILVA, 1997). Segundo essa autora, tal rejeição constitui-se
como um dos obstáculos epistemológicos no desenvolvimento
histórico desse saber de referência, isso em parte deve-se ao fato
de, diferente dos números naturais, essa nova entidade numérica
não surgir naturalmente de um processo de contagem.
Fazendo um recorte sobre o número fracionário na escola
moderna, têm-se evidências que a concepção de parte-todo mo-
bilizada nos atuais manuais escolares e nas práticas docentes, de
forma dominante, ganhou vida própria sem que se tenha registro
exato de quando isso ocorreu (SILVA, 2005). Para essa autora,
tal concepção desvinculada da submissão na relação com outras
concepções é uma orientação recente do ensino, e talvez isso se
dê pelo fato das necessidades práticas do ensino anteriormente
realizado, como o praticado nas academias militares, não fizes-
sem sentindo para o ensino de crianças.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Mas, Silva (2005) ainda destaca que um marco para o desen-


volvimento do ensino e do estudo das frações foi a mudança de
registro da escrita fracionária à escrita decimal e o desenvolvi-
mento das estruturas algébricas com operações bem definidas,
afastando, de certa forma, o ensino dos fracionários de situações
que lhes dessem sentido em termos de necessidades sociais.
Ocorreu o processo de privilegiamento de definições e investiu-
se em terminologias em detrimento da razão de ser desse objeto
matemático no processo de ensino.
Ademais, outro obstáculo de ordem epistemológica rela-
cionado a esse tipo de número foi o conhecimento do número
natural. Esse que contribuiu para o desenvolvimento desse saber,
ainda surge atualmente, implicando diretamente na aprendiza-
gem do conceito de número fracionário. Diante de situações em
que seja necessário mobilizar o conceito global dos números fra-
cionários, o estudante tenta utilizar seu conhecimento numérico
relacionado aos números naturais, incluindo a mesma forma de
comparar, podendo ocorrer, por exemplo, situações em que o
estudante faça , porque 3 > 2.
A forma supracitada para comparação de números fracioná-
rios é condizente com o modelo algébrico: .
Tal modelo é dominante na instituição livro didático, e normal-
mente por consequência nas práticas desenvolvidas na escola,
ou seja, é um modelo dominante institucional. Mas, tal técnica
para comparar este tipo de número, se alicerça em um modelo
de referência, adotado para esta investigação, modelo este que
é baseado no princípio da contagem. Para o investigador, ele é
relativo, surge como algo a ser adotado na experimentação e
sobre o qual surgem suas análises (FARRAS, BOSCH, GASCÓN,
2013) em concordância com o quadro teórico assumido.
Além da razão de ser de ordem epistemológica, é possível
ver uma tentativa de se dar sentido social para o uso dos nú-
meros fracionários de modo geral, e também para as operações

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

com tais números. A exemplo de uma razão de ser social do


saber “números fracionários”, historicamente construída, tem-
se a necessidade de medir e representar medidas, retomando
o trabalho dos “esticadores de cordas” egípcios, diante de um
problema social e econômico, as enchentes do rio Nilo (SILVA
& SODRÉ, 2000).
Diante do modelo algébrico que sustenta as estratégias do-
minantes de resolução de tarefas sobre a comparação de núme-
ros fracionários, especialmente se comparados com os manuais
escolares, o foco desse estudo passa as possíveis estratégias dos
estudantes diante da tarefa proposta. Para efeito de análise das
repostas, é feito um recorte com um grupo de três estudantes
de uma mesma classe, o melhor detalhado na seção resultados
e discussões.
Desse modo, acredita-se que se podem encontrar duas
possíveis estratégias, a primeira correta, baseando-se no mo-
delo apresentado anteriormente , conforme
exemplos de procedimentos do livro didático utilizado na escola.
A segunda, baseada nos conhecimentos dos números naturais,
em termo de contagem, representaremos aqui com a simbologia
prescrita na TAD.
Para tarefa T1, ordenar os números fracionários, a técnica
t1 prevista é:
t1.1: Comparam-se aqui dois números para exemplificar a
técnica. Considerando os números e . Primeiro o estudante
calcula o menor múltiplo comum (mmc) dos denominadores 7
e 3, encontrando o valor 21. Escreve fracionários equivalentes
às duas representações iniciais: e , e compara-os
< , pois . Este procedimento se aplica a todos os nú-
meros fazendo com que o estudante tente calcular um mmc dos
denominadores de todos os números fracionários da lista.
Uma variação para essa estratégia entre dois números
fracionários é realizar a multiplicação cruzada. Nesse caso, a

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

comparação deve ser realizada dois a dois. Entretanto, o que


justifica tal técnica é a estratégia anterior.
t1.2: Consiste em comparar os numeradores. < pois 3 < 8.
Neste caso o estudante ignora o processo de escrita de números
equivalentes.

Um modelo epistemológico de referência: princípio da


contagem e cálculo de área de retângulos

Buscando elementos na epistemologia desse saber, acredi-


tamos que essa noção pode ser construída pela associação do
princípio da contagem e área de retângulos, para isso serve de base
uma investigação empreendida por (GUERRA e SILVA, 2008), que
aponta para a adição de números fracionários. Essa noção evoca
a ideia de área de um retângulo como produto de dois segmentos
conforme foi feito por Euclides a partir do livro II. Descreve-se a
seguir um modelo baseado no que os referidos autores apresentam
aproximando tal modelo da tarefa de comparação de números
fracionários. Mas uma questão importante emerge diante des-
sa proposta: Como esse modelo se integrará nas praxeologias
matemáticas dos estudantes do 6º ano no que se refere ao uso
de recursos tecnológicos? Se tomamos um quadrado de lado 1
(unitário), como medida unitária de área, e dividimos tal quadra-
do em n partes iguais, cada uma dessas partes terá da unidade
de área. Tomando-se como exemplo, um quadrado dividido em 4
partes iguais, cada parte mede um quarto de unidade de área como
segue representado abaixo pelos retângulos de dimensões 1 e .

Figura

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A área de um retângulo cujas dimensões são 1 e é igual


a . Esse cálculo permite observar que está contido 4
vezes na unidade (quadrado) e se considerarmos a área como
uma “nova unidade” é possível dizer que a nova medida de área
do quadrado unitário é .
Vemos a seguir que a propriedade da equivalência entre
números fracionários pode ser compreendida por esse modelo.
Se um dos lados do quadrado unitário for dividido em 4
partes iguais e o lado adjacente em 3 partes iguais, obtêm-se 12
retângulos de área . Dessa forma, considera-se a área de um
retângulo e nessa nova divisão tem-se , o mesmo pode
ser feito com o número fracionário representado por caso em
que o fracionário equivalente é dado por .
Para realizar a comparação dos números e , faz-se pri-
meiro e depois .
Segundo Guerra e Silva (2008), esse processo permite des-
tacar uma “nova unidade” comum que pode ser considerada a
partir de uma unidade referencial, baseada na matemática grega:

No livro X, teorema 5, Euclides explicita que se dois


segmentos são comensuráveis, ou seja, têm uma medida
comum, a razão entre eles é igual à razão que guardam
entre si dois números. Aqui, similarmente, admitir ter
uma medida comum para duas áreas A e B ... é dizer que
se nenhum múltiplo inteiro de A cabe exatamente em B,
é possível dividir a área A em n partes iguais de modo
tal que a área A/n caiba exatamente m vezes na área B
e, neste caso, a medida de B em relação a A é m(A/n),
ou que B/A=m/n. Isso evidencia a medida por meio de
processo de contagem de unidades comuns de retângulos
que representam as frações. (GUERRA, SILVA 2008, p.48).

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Essa construção passou por modificações (processo trans-


positivo) para que o objeto do saber se tornasse ensinável, re-
sultando possivelmente no modelo que foi apresentado como
dominante em alguma instituição.
Esse modelo de referência embasado no quadro teórico no
que se refere às praxeologias dos sujeitos das instituições é um
ponto de partida tanto para estratégias diferentes de resolução
quanto para criação de novas tarefas. Porém, existe uma dificul-
dade ao processo, que se refere a estruturar tal estratégia com
uso de um software matemático, por exemplo.

Resultados e discussão

As análises nesse estudo são guiadas pelo quadro teórico


de base da Didática da Matemática, por elementos da Teoria da
Instrumentação - TI (RABARDEL, 1995) e da Teoria Antropoló-
gica do Didático – TAD (Chevallard, 1999) TAD. Com relação a
esta última, olha-se para um sujeito de uma instituição diante
de um saber matemático, e de modo mais especifico, perante
situações matemáticas.
O termo “antropológico” refere-se ao fato de Chevallard
propor que a TAD situa a atividade matemática bem como o es-
tudo da matemática dentro do conjunto de atividades humanas
e de instituições sociais. Nesse contexto uma instituição (I) é
um dispositivo social, que pode ter uma extensão reduzida no
espaço social, que permite a seus sujeitos, maneiras próprias de
fazer e de pensar. Isso é muito importante, pois traz luz à forma
de pensar as práticas matemáticas institucionais e compreender
a diversidade das instituições.
Nesse estudo, utiliza-se a compreensão de praxeologia como
a realização de certo tipo de tarefa T, que pertence a um conjunto
de tarefas do mesmo tipo T, por meio de uma técnica t·, justifi-
cada por um discurso racional composto por uma tecnologia θ,

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

e por uma teoria Θ, que representa a justificativa da tecnologia.


Com efeito, a praxeologia matemática, representa a realização
de uma atividade matemática por um sujeito numa determinada
instituição, que pode ser representada pelo conjunto completo
[T, t, θ, Θ ] que representa dois distintos blocos, o do saber-fazer
e tecnológico-teórico, que justificam as práticas matemáticas
institucionais sejam elas mediadas por recursos tecnológicos
ou não.
Normalmente nesse início de ciclo do Ensino Fundamental,
no qual se realizou a investigação, os estudantes detêm-se ao
bloco do saber-fazer, observa-se isso quando propõem-se ana-
lisar as estratégias utilizadas para realizar a tarefa “Escrever os
números fracionários em ordem crescente”. Não quer dizer que
não detenham algum conhecimento em termos de justificação
das técnicas que utilizam, mas que diante de tarefas que exijam
um custo cognitivo maior, haja certa barreira para compreensão
da heurística da tarefa.
Isso justifica o interesse pelas estratégias dos estudantes,
como forma de compreender as restrições e condições de exis-
tência do saber em jogo na instituição investigada, para então
propormos a reconstrução de praxeologias, em que seja pensada
a integração de recursos tecnológicos.

Contexto da investigação

A investigação foi realizada com uma turma do sexto ano,


com um total de 28 alunos, com idade entre 11 e 12 anos. A
experimentação ocorreu no momento em que os estudantes já
haviam estudado números fracionários. Nesse contexto, coube
investigar as contribuições da integração de recursos tecnológi-
cos na resolução de problemas; assim, analisamos um processo
de gênese instrumental nas práticas dos sujeitos da instituição
pesquisada.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Ao analisar os documentos de referência, encontrou-se


um local para o estudo dos números fracionários, bem como
suas operações, durante os terceiro e quarto ciclos do Ensino
Fundamental. Entretanto, consultando o livro didático adotado
naquela instituição, identificamos que é no sexto ano, que se
destina maior espaço para o tema.

Descrição e análise da proposta de integração dos recursos


tecnológicos para o ensino do objeto em jogo

Com a referida tarefa objetivou-se reconstruir praxeolo-


gias em que fossem utilizados, de forma efetiva, dois artefatos
(inicialmente compreendidos assim por ainda não sabermos
características do seu uso naquele contexto), uma calculadora
e o software Geogebra, para a construção do conhecimento
dos estudantes sobre a comparação de números fracionários.
Esperava-se que, à medida que o meio fosse retroagindo com
o estudante a partir de sua ação, estes artefatos fossem sendo
transformados em instrumentos, por seu uso efetivo sendo de
fato integrado ao repertório desses estudantes. Essa hipótese se
constituía como parte da análise a priori que realizamos.
Uma variável importante na situação experimentada foi o tipo
de número fracionário que seria comparado, chamada aqui de variá-
vel V1 e o recurso utilizado pelo estudante (Variável V2) que poderia
ser a calculadora, o Geogebra tube, ou lápis e papel. Consideramos
variáveis didáticas de acordo com Brousseau (1986) aquelas que
alteram as estratégias dos estudantes diante de situações didáticas
que lhes são propostas. Além dessas, a interação entre os estudantes
pode também modificar suas estratégias, assim foi considerada
variável V3. Pensava-se que o uso desses recursos enquanto valores
da variável modificaria a hierarquia das estratégias dos estudantes.
Mas este é um processo não tão trivial, visto que a integração de um
recurso é algo que depende do processo de aculturação pela qual
sabemos que passam os estudantes.

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Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Ao utilizar a calculadora (simples), o estudante poderia


tentar solucionar tal tarefa efetuando a divisão dos numeradores
pelos denominadores. Entretanto estaria diante de outra situação
um tanto conflituosa, a comparação de números decimais. No
ambiente lápis e papel, poderia tentar o mesmo método, mas
desta vez realizando só cálculos no próprio papel (algoritmo
da divisão de números naturais) e neste caso poderiam existir
duas dificuldades, a divisão e a comparação dos resultados. Além
disso, um obstáculo de ordem epistemológica poderia se confi-
gurar, ou seja, a compreensão de número fracionário enquanto
razão de dois números naturais. Com o Geogebra tube, a partir
de uma sequência inicial de comparação, o estudante teria um
trabalho de comparar os números de dois a dois, e analisar uma
regra implícita que surge na janela principal do software, como
é possível verificar na figura 2, abaixo.

Figura 2 – Tela Geogebra tube, comparação de números fracionários

Diante dessa tela, surge uma análise para ser desenvolvida


pelo estudante, que ocorre com a intervenção do professor.
Porque aparece 15 < 28? O que isso quer dizer? Existe aí uma
regra implícita, que torna a comparação correta, que se baseia no

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modelo dominante desse objeto matemático. Tal regra consiste


em multiplicar 3 por 5 e 7 por 4. Mas isso pode aparecer entre
as estratégias dos estudantes desde que estes tenham contato
anterior com tal estratégia, seja por vê-la no livro didático ou
apresentada pelo professor.
São apresentadas, a seguir, as soluções de três estudantes,
comparando o modelo lápis e papel com uso do Geogebra tube,
duas atividades publicadas, e a calculadora. E a respeito dessas
estratégias considera-se o que propõe Brousseau.

Em geral, adota-se uma estratégia descartando intuiti-


vamente ou racionalmente, uma anterior. Submetida à
experiência, a nova estratégia pode ser aceita ou não,
conforme apreciação que o aluno faça de sua eficácia. A
sucessão de situações de ação constitui o processo pelo
qual o aluno vai aprender um método de resolução de
um problema. (BROUSSEAU, 2011, p.22).

Com isso, pretende-se analisar apenas o momento da ação


do estudante, e no máximo a formulação feita a partir da situa-
ção proposta. Esse momento constituiu-se de um momento de
trabalho da técnica e uma tentativa de investigação de estra-
tégias corretas. A questão posta anteriormente a respeito da
comparação 15 < 28, surge como uma gênese de um discurso
tecnológico, ou seja, entender o porquê do uso de tal técnica no
software, ao mesmo tempo que integra o uso de tal recurso a
prática matemática de quem o utiliza. Entretanto, como o foco
foi o trabalho com estudantes do 6º ano, tal discurso não surge
naturalmente. Acredita-se, que tal fato se deve a pouca vivência
de outras situações e de atividades de investigação matemática,
entre as tarefas dos estudantes.
Nessa investigação, a institucionalização feita pelo professor
não é analisada, nem nas aulas anteriores, nem a partir dessa

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experimentação. O olhar é sobre a ação do estudante diante de


uma situação didática e com um meio pensado para integração
de recursos tecnológicos nas práticas desses estudantes.
Os estudantes são chamados aqui por pseudônimos. Foram
dois garotos (Paulo e Marcos) e uma garota (Juliana) que inte-
graram um mesmo grupo, mas utilizaram inicialmente recursos
diferentes. No primeiro momento todos apresentam uma solução
sem a utilização dos recursos calculadora e Geogebra Tube.
Os três estudantes apresentam a seguinte solução: ; ;
; ; ; ; ; ; e , esta foi a resposta modal dentre uma
amostra composta de 28 estudantes. O que eles fizeram foi colo-
car os números fracionários em ordem crescente, pelo valor do
numerador, por exemplo, < porque 3 < 4, outro ponto inte-
ressante é que o número é escrito como . Isso pode indicar
que esses estudantes não tenham estudado esse tipo de número.
Mas também a ordem sequencial dos números naturais é algo
forte na atividade dos estudantes, e ocorre implicitamente.
Essa estratégia é bastante comum, aparecendo entre as apre-
sentadas pela maioria dos estudantes (utilizada por 23 estudan-
tes). Dois estudantes não responderam e 3 utilizaram estratégias
diferentes. Nenhum estudante apresentou a solução correta. Os
23 estudantes, utilizam uma regra implícita de comparação de
números naturais aplicada à comparação de fracionários. O que
faz com que os estudantes continuem utilizando-a?
A questão anterior remete a outra: que condição torna tal
regra válida? Se os estudantes se deparassem com uma sequên-
cia de números fracionários todos com denominadores iguais, a
regra implícita adotada estaria correta. Isso é forte para os estu-
dantes. Consultado o livro didático, encontrou-se como primeiro
exemplo a comparação de fracionários com denominadores
iguais, da mesma forma, as três primeiras tarefas, o que implici-
tamente instaura um contrato quanto ao uso da referida técnica.

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O estudante Paulo foi convidado a utilizar a calculadora, Ju-


liana a fazer desenhos para resolver a tarefa e Marcos o Geogebra
tube. Ao fazer essa sugestão incorremos num risco de invalidar
o processo de integração, visto que os sujeitos participantes da
investigação não escolheram os recursos que utilizariam. No
entanto, no desenvolvimento da tarefa, Paulo consulta o caderno
para lembrar-se da estratégia que já teria visto, que consiste em
escrever números fracionários equivalentes aos da lista dada,
promovendo multiplicação dos numeradores e denominado-
res por naturais até que se encontrassem todos os números
envolvidos com o mesmo denominador. Ou então, encontrando
fracionários equivalentes a partir do cálculo do mmc dos deno-
minadores dos números da lista dada na tarefa.
O fato de consultar possibilita o estudante modificar sua
estratégia. Desse modo Paulo faz: ; ;
; ; , o estudante percebe que não é possivel
para fazer o mesmo com , e ; mas utiliza essa regra para o
número , e mais uma vez não leva em consideração o tipo de
número. Duas questões são postas aos estudantes: Porque não é
possível fazer o mesmo com todos os números? E a calculadora
ajudaria a responder a questão? As respostas foram evasivas.
Juliana tenta apresentar uma solução desenhando um re-
tângulo dividido em 35 partes de medidas de área iguais. Dessa
forma outra questão foi posta: o que fazer com os números ,
e ? A resposta foi que esses denominadores não podem ser
transformados em 35. Tal estratégia abriu espaço para retomar
a ideia de equivalência de números fracionários.
Diante da atividade publicada no Geogebra tube, o estudante
Marcos, inicia a manipulação, o professor forneceu orientações
prévias da utilização deste (esquema de ação instrumentada),
e revezou com o estudante a representação dos números fra-
cionários de forma aleatória. Depois, Juliana assume o lugar do
professor, manipulando o software em dupla com Marcos, depois

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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foram os estudantes Paulo e Marcos, e configuraram-se outras


duplas. O objetivo era que, de forma aleatória, eles experimen-
tassem a comparação com os fracionários. Essa exploração da
comparação no Geogebra tube, é intencional (percurso para
concepção de esquemas de uso). Espera-se que a partir dela os
estudantes percebam propriedades que estão implícitas.
Depois foi necessário realizar outra intervenção, solicitando-
se que utilizassem os números listados na tarefa T1. Retomou-se
a dupla Juliana e Marcos e atribuindo-se à aluna o número e
ao aluno . Além disso, foi solicitado que eles anotassem o que
fosse percebido na tela da atividade construída no software. Foi
indicado que esse procedimento deveria ser repetido com outros
números fracionários da tarefa.
Na figura abaixo, em destaque, aparece a respeito da compa-
ração dos números e , novamente a regra implícita 32 < 33.

Figura 3 – Captura da tela Geogebra tube

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Foram perguntados sobre o porquê do número ser menor


que . Juliana perguntou como se acha 32 < 33. Nesse momento
chegou-se a um ponto crucial da situação, o desejo da estudante
em compreender o que significa a explicação para justificar a
comparação entre os dois fracionários. O que está sendo feito
no Geogebra é um truque conhecido como multiplicação cru-
zada, que reforça o modelo dominante do saber apresentado
anteriormente.
O uso dessa atividade, não permitiu a construção da noção
do objeto matemático por meio do princípio da contagem e área
de retângulos, modelo de referência adotado nessa investigação.
Seria necessário construir uma nova sequência com esta finali-
dade, o que está em desenvolvimento.
Na figura 4 abaixo, surge uma ideia bem inicial desse traba-
lho. É possível comparar os números fracionários por meio da
quantidade de quadrinhos da unidade (o quadrado), utilizando
a noção de equivalência, com divisões diferentes nos dois qua-
drados.
Outro modelo, utilizando o geogebra tube, também faz refe-
rência à equivalência entre os números fracionários, por repre-
sentação na reta numérica. Nesse, os estudantes não visualizam
a regra implícita da multiplicação cruzada. A comparação pode
ser visualizada nas retas. Não é dada ênfase à reta, mas ela como
uma unidade inteira que pode ser repartida em uma determinada
quantidade de partes iguais.

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Figura 4 – Ideia inicial para aproximação do modelo de referência


para o objeto matemático

Fonte: www.geogebra.org

Figura 5 – Comparação de números fracionários com auxílio de reta numérica

Fonte: www.geogebra.org

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Retomando a regra implícita utilizada pela maioria dos es-


tudantes, analisamos seus casos de validade. Como já foi dito, tal
regra é válida para números com denominadores iguais, e isso
pode ser constatado pelos estudantes ao realizarem atividades
do livro em que comparam números desse tipo, atividades que
reforçam implicitamente um contrato para esse saber.
Outra regra, utilizada por um estudante, indica que uma
fração imprópria é maior que uma fração própria. Entretanto,
não é uma tarefa trivial, comparar uma quantidade maior de
fracionários, como é o caso da que foi proposta aos estudantes.
Nesse caso, os estudantes podem utilizá-la de forma associada
à primeira regra. Quanto maior é o numerador, maior será o
número fracionário. Essa regra é válida para alguns números,
por exemplo, < , pois 8 < 11, mas não é válida para compa-
rar, por exemplo, os números e . Isso pode ser visto com
o Geogebra tube utilizando a regra implícita de multiplicação
cruzada, porém no jogo da comparação, tal regra não aparece
(a que utiliza retas numéricas). Visualizando os fracionários nas
retas os alunos podem perceber que a regra 1 é válida, mas que
pode ser pensada uma nova regra.Esse trabalho com o uso do
software, inicialmente com as atividades publicadas, representa
a ação do sujeito sobre o artefato. Nessa configuração didática,
a calculadora foi subaproveitada, desta forma, não há um traba-
lho de orquestração, concentrando-se este numa proposta de
instrumentação.
É sabido que o uso de softwares em sala de aula, normalmen-
te, não tem resultado em aprendizagem em relação ao conheci-
mento (BITTAR, 2011). Uma forma de aferir isso foi pensada em
continuidade à tarefa 1, como proposta do estudante localizar
numa tabela os mesmos números fracionários. Além disso, in-
vestir na proposta de criar problemas matemáticos para serem
experimentados, como forma de ofertar aos estudantes tarefas
suficientemente problemáticas para fazer emergir distintas
técnicas de resolução dessas tarefas.

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Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Bittar (2011) chama a atenção ainda para a necessidade de


investigar o fato de o professor inserir os artefatos à sua prática
sem conhecer seu potencial e suas restrições. Isso compromete o
processo de gênese instrumental. A esse respeito, o NIPEDICTM/
UFBA tem investido em investigações que visam à formação
docente, de forma continuada, para a integração de diferentes
recursos tecnológicos. Persiste-se na crença de que o preparo dos
professores para uso de tecnologia em suas aulas, relaciona-se
ao conhecimento dos artefatos e o como integrá-los às praxeo-
logias matemáticas, tornando seus usos de fato efetivos, ou seja,
integrar às suas escolhas didáticas tais recursos pensando-se em
situações didáticas que serão propostas aos seus estudantes, e
como se efetivará a (re)construção de praxeologias matemáticas
a partir do uso desses recursos.
O Geogebra, na versão publicação de tarefas, se constituirá
num instrumento se fizer parte do arsenal do professor e, conse-
quentemente, dos estudantes na realização das tarefas. É possível
pelo recorte apresentado, perceber que o seu uso, possibilita
estudos das propriedades que por vezes estão implícitas nas
estratégias de resolução dos professores e estudantes.
Quanto aos esquemas de uso, pode-se dizer que é o que
definirá tal recurso como artefato ou instrumento. Como cada
sujeito constrói seus próprios esquemas, podemos dizer que
a medida de passagem do status de artefato para instrumento
também depende do sujeito. Para estudantes que não utilizaram
e não veem sentido no uso do Geogebra, este continua sendo
um artefato. Já para os que o utilizaram, este pode se tornar um
instrumento a depender do seu esquema de uso. A estudante Ju-
liana, dos três estudantes que constituem o recorte que fizemos,
foi a que primeiro indicou o elemento diferente próprio do seu
esquema de uso. O software, quando solicitamos a comparação
dos números, apresenta uma propriedade implícita, ele é um
meio econômico para fazer a comparação, mas relaciona-se a
um modelo dominante do saber.

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Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Quanto mais o professor e os estudantes utilizarem esse


instrumento, mais esquemas podem ser construídos (BITTAR,
2011), e foi esse o intuito ao confrontar duplas de estudantes
com a atividade de comparação no Geogebra tube. Da mesma
forma, as duas diferentes propostas nesse software contribuem
para essa diferenciação dos esquemas de uso, foi o que ocorreu
com a comparação representada na reta, ficou implícita a regra
utilizada.

Considerações Finais

Surgem algumas questões pertinentes à organização didá-


tica do docente, que Bosch e Gascón (2010) chamaram de pro-
blemas docentes, que são questões formuladas pelo professor
acerca do saber a ser ensinado, ou da forma como pode efetivar
o ensino desses, mesmo após a experimentação dessa situação.
Tais questões auxiliam no processo de organização do cenário
para integração dos recursos tecnológicos para o estudo do saber.
Porque os estudantes não utilizaram à calculadora? A aten-
ção dada a questões como essa deve contribuir com a organi-
zação do cenário de experimentação. Um elemento adicional à
concepção de tal cenário é a análise a priori da situação. Nela, o
professor pode já identificar possíveis estratégias, corretas ou
não, a serem utilizadas pelos estudantes, incluindo como se dá o
processo de resolução com o uso dos recursos que se pretende
utilizar e integrar às práticas.
Há que se perceber a vantagem do uso desses recursos, não
no âmbito da ludicidade, mas na consolidação da aprendizagem
do saber ensinado/estudado. Se esses modificam a hierarquia
das estratégias, temos indícios de que a ação do sujeito sobre o
artefato o transforma em instrumento.
Novas perspectivas para o processo de gênese instrumental,
no âmbito das investigações realizadas no NIPEDICTM/UFBA,

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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levam em consideração que o instrumento não é algo acabado,


devendo ser pensado como o que pode ser reelaborado e um ca-
minho possível para isso. Acreditamos que seja pela diversidade
de tarefas que se propõe para o uso dos recursos tecnológicos,
constituindo-se como uma das metas de investigação o estudo
das relações de professores e alunos com os objetos matemáticos
por meio da tecnologia.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

REFLEXÕES SOBRE OS RESULTADOS DAS AVALIAÇÕES


EM LARGA ESCALA A PARTIR DAS MANCHETES
NOS JORNAIS: CAMINHOS E DESCAMINHOS
DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA1

Maria José Costa dos Santos2


Josaphat Soares Neto3
António Fernando Zucula4

Introdução

As avaliações externas (PISA, PROVA BRASIL, SPAECE,)


têm apresentado os níveis de aprendizado dos alunos, e esses
dados têm nos despertado para pensar acerca dos obstáculos
didáticos e/ou epistemológicos do ensinar e aprender no século
XXI. No entanto, queremos destacar nesse texto a importância
de pensar os dados a partir da evolução e progresso da edu-
cação, e não apenas pelas manchetes de jornais, que muitas
vezes subestimam a competência do aluno e do professor.
Quais os desafios da escola no século XXI? O que é ensinar e
aprender nessa escola? A Matemática e a Ciência são áreas de
conhecimento amplas, e como disciplinas na educação básica,
1 Parte desse texto foi publicado no I Simpósio de Ensino em Ciências e Matemática do Nordeste
(ISECMAT), realizado na Universidade Federal do Ceará, pelo Programa de Pós-Graduação
em Ciências e Matemática (ENCIMA), Fortaleza-Ceará, 2017.
2 Professora Adjunta da Universidade Federal do Ceará/Programa de Pós-graduação em Ensino
de Ciências e Matemática/Programa de Pós-Graduação em Educação/mazzesantos@ufc.br
3 Professor da Educação Básica da rede Estadual do Ceará/Secretaria de Educação do Estado do
Ceará/jsoaresnet@hormail.com
4 Professor de Estatística/Probabilidade na Academia de Ciências Policiais (ACIPOL) – Mo-
çambique.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

são fascinantes, portanto, democratizar seu ensino deve ser o


papel do professor na escola.
Ponderamos sobre o dito popular “de médico e de louco todo
mundo tem um pouco”, no Brasil ‘todo mundo’ tem uma opinião
e fala de/sobre educação como um especialista. Tal fenômeno é
impulsionado pelas manchetes estampadas nos jornais de grande
circulação, seja escrito, falado, televisionado ou on-line. O que nos
motiva a fazer essa discussão são as notícias veiculadas nessas
mídias que muitas vezes tomam como mote apenas os dados
obtidos por índices comparativos.
Para realizar essa discussão tratamos de selecionar algumas
manchetes dos últimos resultados das avaliações externas de
Matemática e Ciências em nível mundial (PISA, 2015), nacional
(PROVA BRASIL, 2015) e nível estadual (SPAECE, 2015). Nosso
recorte, aqui, é apenas sobre as manchetes que falam sobre os
resultados das avaliações externas, e comentamos apenas as
manchetes, pois não há espaço para aprofundamentos teóricos.
Portanto, essa pesquisa é de cunho qualitativo e os dados
foram coletados nos sites oficiais como Mec/Inep e nas mídias de
maior e mais fácil acesso pela maioria da população brasileira, no
caso os jornais e revistas on-line. Para a análise dos dados fixa-
mos uma categoria que nos norteou, a saber: O que está por trás
das manchetes de jornais sobre educação, especialmente, sobre
os resultados das avaliações externas de Matemática e Ciências?
Para o desenvolvimento da temática, temos esta seção como
introdução, a seguir falamos sobre avaliações externas e expomos
algumas manchetes selecionadas, em seguida apresentamos as
considerações e as referências.

As avaliações externas: o que dizem as manchetes?

O debate sobre as avaliações externas, também chamadas


de avaliações em larga escala, envolve um leque de questões,

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

tanto de natureza técnica quanto de ordem política, ambas atre-


ladas às ações de políticas públicas que visam à qualidade na
educação. Desde o final dos anos 1980 são crescentes as ações
que envolvem a avaliação externa de sistemas educativos e de
escolas. Em todos os países, praticamente, deixa de ser possível
imaginar processos educativos que não conduzam a modalidades
de julgamentos.
A avaliação externa é apontada como peça central das re-
formas educacionais ocorridas a partir do final do século XX.
Diversos estudos vêm evidenciando fortes similaridades entre
tais reformas, “como se estivessem seguindo um receituário
de políticas educacionais, algum tipo de orquestração ou, no
mínimo, uma história de origens comuns” (BROOKE, 2012, p.
325). Por um lado, as avaliações e seus resultados tiveram o
mérito de revelar os processos de desigualdades que permeiam
os sistemas educativos. Muitos estudos foram conduzidos com
o propósito de buscar compreender a distribuição desigual da
educação escolar entre os diversos grupos sociais, culturais e
econômicos.
Há ainda os que defendem a avaliação externa como um
processo social, que precisa ser entendido em toda a sua com-
plexidade, particularmente, por possibilitar às escolas refletir
sobre as suas práticas numa perspectiva mais alargada. Por
outro lado, têm surgido críticas às formas como as avaliações
vêm sendo conduzidas, em especial, por estarem pautadas em
uma lógica de mercado que justificam práticas meritocráticas
e ranqueamento, que conduzem a uma compreensão estreita e
reduzida do sentido de “qualidade” e induzem a uma padroni-
zação da produção curricular.
É nesse cenário que as manchetes dos jornais de grande
circulação se apoiam.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Figura 1. PISA 2015.

Fonte: g1.globo.com5

A manchete acima reflete o que amplamente é divulgado


na sociedade sobre os resultados do PISA 2015. Essa informa-
ção teve ênfase e impacto nesse ano de 2015, em Ciências, e
sobre isso o ministro da Educação brasileira - Mendonça Filho,
ao declarar os resultados, classificou-os como “tragédia para
o futuro dos jovens brasileiros”. (MEC/Inep, 2016). Isso reper-
cutiu negativamente na sociedade, e o ensino público mais
uma vez é desvalorizado, pois as análises foram generalistas,
não consideram os altos índices alcançados pelos Institutos
Federais (IFs), e esse olhar parcial se confirma. também, nos
resultados do estado do Ceará que. na contra mão desse dis-
curso, nessa mesma edição do PISA 2015, obteve média geral
397 pontos, ficando acima da média Nacional que foi de 395
pontos, e ainda, na área de Matemática, alcançou 382 pontos,
bem acima também da média nacional que foi de 377 pontos.
O Ceará, no cenário nacional, se apresenta como o primeiro da
5 Fonte: https://g1.globo.com/educacao/noticia/brasil-cai-em-ranking-mundial-de-educacao-
em-ciencias-leitura-e-matematica.ghtml. Acesso em 14 de setembro de 2017.

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região Nordeste, e do total de 27 estados do Brasil, assumiu a


9.ª colocação.
A PROVA BRASIL e o Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Básica (Saeb), são avaliações externas para avaliar a
qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasi-
leiro a partir de testes padronizados e questionários socioeco-
nômicos. Estes testes, em larga escala, são desenvolvidos pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep/MEC). Vale ainda esclarecer que essas avaliações
têm o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo
sistema educacional brasileiro a partir de testes padronizados
e questionários socioeconômicos6.
A PROVA BRASIL é muito importante para as escolas, pois
faz parte do cálculo do Ideb que é feito usando os resultados
dessa prova e informações sobre a aprovação ou repetência dos
estudantes. Ela ainda compõe a Avaliação Nacional da Educação
Básica (Aneb), uma das três avaliações que integram o Sistema
de Avaliação da Educação Básica (Saeb). As análises dos resul-
tados dessa prova foram assim destacados em manchetes, como
apresentamos a seguir, na figura 2.

Figura 2. Prova BRASIL.

Fonte: Globo. com7

6 Informações disponíveis em: http://portal.mec.gov.br/prova-brasil. Acesso em 11 de março de


2018.
7 Informação disponível em: https://oglobo.globo.com/sociedade/prova-brasil-2015-analise-do-portal-
qedu-traca-retrato-sombrio-da-educacao-no-pais-21084493. Acesso dia 14 de setembro de 2017.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Sobre esses resultados que a manchete impõe à sociedade,


como absurdamente negativos, apresentamos que de outro ân-
gulo temos sim, resultados positivos. E, nesse sentido, apresenta-
mos os resultados do Ceará, o qual obteve o melhor resultado da
Prova Brasil 2015 entre os estados do Nordeste. O Estado, apesar
de a apresentar desempenho abaixo da média nacional (14%)
nos testes de matemática do 9.º ano das escolas estaduais, com
apenas 12% do nível de aprendizado adequado, teve resultados
bem acima dos estados vizinhos. (O POVO8, 2017).
Evidentemente, que não queremos dizer que o Ceará, ou
que a educação do Brasil não tem suas dificuldades, desafios, e
que os resultados não sejam motivo de preocupação, sabemos
que temos uma longa caminhada a seguir, mas o que queremos
destacar é que os índices, por si sós, não significam a realidade
da educação brasileira, é preciso um olhar mais contemplativo,
analítico e isento de senso comum9. E certamente, nesse cenário,
tentar culpabilizar o professor pelo insucesso dos alunos é uma
forma cruel de não reconhecer a importância desse profissional
na melhoria desses resultados.
É comum discursos que direcionam ao professor parte maior
de responsabilidade pelo desempenho dos estudantes, vejamos
o que diz o Diretor-executivo do QEdu, César Wedemann, o qual
reforça:

o corpo docente precisa apelar cada vez mais para so-


luções criativas que driblem o orçamento apertado do
poder público. — Os professores devem pensar em no-
vas maneiras para acompanhar os alunos — aconselha.
— Precisam se reunir e bolar sugestões que facilitem,
sem aumentar os custos, a transmissão da matéria. Por

8 Fonte: https://www.opovo.com.br/jornal/brasil/2017/03/ceara-tem-melhores-resultados-do-
nordeste-na-prova-brasil.html. Acesso em 14 de setembro de 2017.
9 Senso comum: É um saber que não se baseia em métodos ou conclusões científicas, e sim no
modo comum e espontâneo de assimilar informações e conhecimentos úteis no cotidiano. Fonte:
https://www.significados.com.br/senso-comum, Acesso dia 14 de setembro de 2017.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

exemplo, se os estudantes de uma escola tiverem difi-


culdade com um conteúdo, devem ser apresentados a
algum modo alternativo de aprendizado que deu certo
em outro colégio10.

Sobre isso destacamos a forma simplista como o referido


diretor aborda as questões da qualidade de ensino, pois, para
nós, qualidade ensino não é sobrecarregar cada vez mais o
professor, como se ele já não pensasse ou fizesse tudo isso que
ele aponta como solução para a educação no país, sabemos que
fatores econômicos, sociais e culturais, e mesmo a violência têm
bases fixas e são fundantes nesses resultados, sejam positivos,
sejam negativos. O que acontece quando os índices melhoram?
Vamos analisar a seguir a manchete do jornal O Povo on-line que
destaca o desempenho dos alunos no SPAECE 2017.

Figura 3. Resultados do SPAECE 2017.

Fonte: Jornal O Povo online11

10 Fonte: https://oglobo.globo.com/sociedade/prova-brasil-2015-analise-do-portal-qedu-traca-
retrato-sombrio-da-educacao-no-pais-21084493. Acesso em 14 de setembro de 2017.
�� Disponível em: https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2018/03/fortaleza-alcanca-melhor-
resultado-da-historia-na-alfabetizacao-de-alu.html. Acesso em 11 de março de 2018.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A manchete do jornal, diz o seguinte12,

Os dados preliminares do Sistema de Avaliação Perma-


nente da Educação Básica do Estado do Ceará (Spaece e
Spaece-Alfa), de 2017, indicam que Fortaleza alfabetizou
91,9% dos alunos na idade certa. O resultado é o melhor
da história da rede municipal de ensino. Foram avaliadas
202 escolas no nível adequado.

Destacamos, nessa manchete, que ao apontar a melhoria nos


resultados, o jornal diz que “(...) Fortaleza alfabetizou 91,9% dos
alunos na idade certa. (...)” e continua trazendo a fala do prefeito
da cidade de Fortaleza-Ceará, o senhor Roberto Claudio, “O resul-
tado deste ano mostra que das 206 escolas, 202 estão ensinando
a ler e escrever na forma adequada”.
Durante todo o texto da reportagem, um dado relevante e
ausente, nos chama atenção, pois quando os dados são negativos,
quando os alunos não têm bom desempenho, imediatamente o
professor é colocado em pauta, e tem questionado sua didática/seu
método, mas quando os dados são positivos, esse profissional em
momento algum é destacado, e preferem dar mérito a um elemento
subjetivo e inoperante, do ponto de vista da ação-reflexão-ação,
basta obervar que a manchete diz que “Fortaleza alfabetizou”,
quem alfabetiza são os professores seus alunos, já dizia Freire
(2002, p. 36) que “Ensinar é uma especificidade humana”. Mas o
prefeito Roberto Cláudio, continua, “202 estão ensinando a ler e
escrever na forma adequada”. O jornal continua com a manchete
e continua o destaque da fala do prefeito, informa ao jornal que
Fortaleza evoluiu no percentual de alunos do 5º e do 9º ano em
português e matemática, e, categoricamente, diz: “Nossa meta é
alcançar 100% das crianças alfabetizadas em Fortaleza”.

�� Reportagem O Povo online. Disponível em: https://www.opovo.com.br/noticias/fortale-


za/2018/03/ fortaleza-alcanca-melhor-resultado-da-historia-na-alfabetizacao-de-alu.htmlAcesso
em 11 de março de 2018.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Por que o professor não foi citado, nessa manchete? Nas


manchetes analisadas anteriormente, em que os índices não se
apresentam “adequados”, os especialistas entrevistados, dão
destaque a problemas na formação docente, e inferem que o
professor deve melhorar sua prática, mas em momento algum
falam em melhoria salarial, melhores condições de trabalho e
melhores infraestruturas para as escolas.
Sobre isso Freire (2002, p. 26) informa,

A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua


dignidade deve ser entendida como um momento impor-
tante de sua prática docente, enquanto prática ética. Não
é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo
que dela faz parte. O combate em favor da dignidade da
prática docente é tão parte dela mesma quanto dela faz
parte o respeito que o professor deve ter à identidade do
educando, à sua pessoa, a seu direito de ser.

Destacamos que é necessária uma reflexão sobre o papel


relevante do professor, e o cuidado com as manchetes sensacio-
nalistas que desejam impor à sociedade um ideal educacional
pautado na ideologia de mercado, apoiados por um segmento da
sociedade em constante manifesto elitista e conservador.

Considerações finais

Consideramos as reflexões dessa pesquisa relevante, pois


apesar de apresentar dados iniciais, objetiva desmitificar con-
ceitos equivocados, em geral, formados a partir de manchetes
sensacionalistas, esquecendo que, para essas análises, alguns
fatores, tais como o social, econômico e cultural, são determi-
nantes para a compreensão dos dados, mas que em geral são
desconsiderados, pois apenas tomam o índice como resposta a
todas essas questões.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

As análises nos direcionaram para a reflexão de que é preciso


cuidado na relação número, índice e dado, pois as interpretações
podem variar de acordo com o olhar do avaliador, e a demanda
a qual ele quer atender. A imprensa é isenta? Esse não foi nosso
objeto de estudo, mas deixamos o questionamento para futuras
pesquisas.
Recomendamos, com base nessa reflexão, um estudo mais
profundo sobre esses temas que envolvem resultados das ava-
liações externas, especialmente, Ciências e Matemática e as
implicações desses resultados na qualidade da educação, bem
como, os impactos na relação professor e sociedade.
Certamente que para nós é preciso o cuidado com as análises
dos índices apresentados por essas avaliações em larga escala
que tentem colocar o professor no centro do problema, que o
coloque como responsável primário desses resultados negativos,
pois compreendemos que não importa em que medida o profes-
sor tenha sido formado, e esteja bem preparado didaticamente
e epistemologicamente, esse professor, sempre irá precisar de
condições mínimas de trabalho, respeito e salário digno.
Quando o Brasil reconhecer esse profissional como parte
importante do processo, mas não como o “salvador da pátria”,
quando a sociedade reconhecer e começar a lutar por uma edu-
cação pública de direito de todos, como diz a Constituição Federal
(BRASIL, 1988), então teremos um projeto de nação - e não de
governo - para a educação.

Referências

ABICALIL, C. A. Sistema Nacional de Educação Básica: nó da avaliação?


Educação; Sociedade. Campinas, vol. 23, n. 80, set. 2002. Disponível
em: <http://www.scielo.br>. Acesso em: fev. 2008.
BRASIL. Brasil no PISA 2015: análises e reflexões sobre o desempenho dos
estudantes brasileiros / OCDE-Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico. — São Paulo: Fundação Santillana, 2016.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

________. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília, DF, Senado, 1998.
CEARÁ. Secretaria da Educação. SPAECE – 2015. Universidade Federal de
Juiz de Fora, Faculdade de Educação, CAEd. v. 1 ( jan./dez. 2015), Juiz
de Fora, 2015 – Anual. Conteúdo: Boletim Pedagógico - Matemática
– 5º. ano do Ensino Fundamental.
FREIRE. Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes Necessários à Prática
Educativa. Paulo Freire. – São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção
Leitura) Editora paz e terra, 25.ª edição, 2002.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

UMA PROPOSTA DE STORYBOARD PARA O ENSINO DE


TRIGONOMETRIA A PARTIR DO QUADRANTE NÁUTICO:
CONSTRUINDO UM OBJETO DE APRENDIZAGEM

Ana Carolina Costa Pereira1


Antonia Naiara de Sousa Batista2
Isabelle Coelho da Silva3
Eugeniano Brito Martins4

Introdução

Ao discutir técnicas para o ensino de matemática, é comum


citar as Tendências da Educação Matemática, que são propos-
tas que visam aperfeiçoar a instrução dessa disciplina. Para
Cavalcanti (2010), a modelagem, a resolução de problemas, a
utilização de jogos, o uso de tecnologias e história da matemá-
tica como recursos para o ensino de Matemática são exemplos
de tendências.
Dentre as citadas, destacamos o uso da história da mate-
mática e das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC),
que podem ser aliadas para propor atividades para alunos da
Educação Básica, buscando ampliar as possibilidades de ensino
dessa disciplina. Esse tipo de abordagem pode ser visto em Sousa
(2016), que apresenta um material de apoio para professores
e alunos baseado nessa união, em conjunto com a Investigação

1 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte(2001)Atua na for-


mação de professores de Matemática com ênfase na área de História da Matemática.
2 Licenciada em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará(UECE)
3 Licenciada em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará(UECE)
4 Licenciada em Matemática pela Universidade Estadual do Ceará(UECE), Professor do IFCE.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Matemática5. Assim, ela defende que o tempo utilizado pela


investigação e a história da matemática pode ser otimizado a
partir das TIC, pois a análise dos resultados pode ser facilitada.
Além disso, ainda há uma escassez de estudos e propostas
que trabalhem a união entre essas duas tendências, mas os pou-
cos trabalhos encontrados foram relevantes e foi possível ver que
os resultados foram positivos e as potencialidades da história da
matemática foram intensificadas a partir das TIC (SOUZA, 2016).
Nesse sentido, vemos que a história da matemática pode ser
um recurso que auxilie o professor em sala de aula, mobilizando
conhecimentos matemáticos de uma forma contextualizada no
passado. Gasperi e Pacheco (2016, p. 2) afirmam que “com a his-
tória da matemática, tem-se a possibilidade de buscar outra forma
de ver e entender essa disciplina, tornando-a mais contextualizada,
mais integrada com as outras disciplinas, mais agradável”. Portan-
to, procuramos potencializar esses benefícios que a história ofere-
ce através no uso das TIC, pois, como declara Borba (2007, p. 3),

Os softwares educacionais têm a capacidade de realçar


o componente visual da matemática atribuindo um pa-
pel importante à visualização na educação matemática,
pois ela alcança uma nova dimensão se for considerado
o ambiente de aprendizagem com computadores como
um particular coletivo pensante [...].

Dentre as possibilidades de utilização dessas TIC, conside-


ramos os Objetos de Aprendizagem (OA) uma forma de engajar
o aluno na aula, tornando o conteúdo mais interessante e prá-
tico. Segundo Willey (2000), um OA é qualquer recurso digital
que possa ser utilizado para o ensino, portanto, a proposta do
recurso digital mostrado neste texto pode ser disponibilizada

1 Investigar na matemática, e em outras áreas, significa formular “questões que nos interessam,
para as quais não temos resposta pronta, e procurarmos essa resposta de modo tanto quanto
possível fundamentado e rigoroso”. (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2005, p.9).

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

em um repositório de Objetos de Aprendizagem, buscando o


seu compartilhamento para diversos profissionais da educação.
Dessa forma, buscamos unir essas duas Tendências da Edu-
cação Matemática para produzir um Objeto de Aprendizagem que
pudesse levar o aluno ao contexto em que um instrumento náuti-
co seria utilizado, mobilizando variados conceitos matemáticos.
Alguns Objetos de Aprendizagem, envolvendo a história da
matemática, foram encontrados durante a pesquisa para a ela-
boração deste. Porém, em todos eles, observamos a utilização da
históica da matemática em um papel secundário, apenas como
cena para a inserção do real objetivo das atividades.
O instrumento histórico pode ser um recurso possível de uso
no campo da educação matemática, tendo-o como uma interface
entre o ensino e a história. Ele pode ser inserido nas situações
em que foram constituídos e observar o processo da produção
do conhecimento no seu significado real, pois a sua construção
e seu uso mostram questões importantes do fazer matemático
do período estudado (SAITO; DIAS, 2011).
No entanto, para que haja essa articulação da matemática e
dos aspectos históricos, vimos na construção de interfaces um
caminho por meio do qual podemos utilizar esses instrumentos
matemáticos. Segundo Saito e Dias (2013, p. 91 - 92):

(...) por construção de interface queremos aqui nos refe-


rir à constituição de um conjunto de ações e produções
que promova a reflexão sobre o processo histórico da
construção do conhecimento matemático para elaborar
atividades didáticas que busquem articular história e
ensino de matemática.

Essas ações e produções serão realizadas sobre os instru-


mentos matemáticos, no intuito de que possam emergir questões
de ordem matemática, sendo elas teórica ou prática; juntamente

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

com os aspectos históricos, mais especificamente, questões


políticas, econômicas, sociais, culturais, religiosas, que tiveram
influência sobre a matemática inserida nesse instrumento.
Dentre os instrumentos históricos possíveis de utilização
para o ensino de matemático encontramos o “Quadrante Náutico”.
Ele possibilita ir além no uso da história da matemática, em que
não iremos ver apenas uma história narrada sobre determina-
do assunto, voltando para o conteúdo na sua forma tradicional.
Dessa forma, propomos o uso desse instrumento para realizar
medidas dentro do seu contexto, em que, após a conclusão do
desafio, o professor poderá construí-lo com seus alunos para
realizar medições dentro do contexto do aluno.
O quadrante foi um instrumento utilizado nas grandes na-
vegações nos séculos XVI e XVII, que é formado por um quarto
de circunferência graduado de 0º a 90º, com duas pínulas com
um orifício no centro de cada uma, localizadas na extremidade
do ângulo de 90º. Além disso, contém um fio de prumo no vér-
tice reto para demarcar a localização latitudinal. Para utilizá-lo,
localize a estrela Polar, olhando através dos orifícios das duas
pínulas. Neste ponto, pressione o fio de prumo sobre o quadrante,
marcando sua localização.
O presente artigo traz uma proposta de criar um Objeto
de Aprendizagem que utilize a história da matemática como
elemento chave para a exploração de conceitos matemáticos
através do Quadrante. Para isso, apresentamos o storyboard do
Objeto de Aprendizagem para uma futura implementação por
meios tecnológicos, assim como orientações para o professor
em uma futura implantação.

O uso de objetos de aprendizagem no Ensino de Matemática

O ensinar matemática com a utilização de objetos de apren-


dizagem (OA), é uma das diversas formas de proporcionar aos

116
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

professores recursos didáticos que motivem os alunos durante


o ensino dos conteúdos escolares, desta forma, estar-se-ia re-
alizando um ensino focado em aplicações e não em abstrações
como Klein afirmou “no ensino é não só admissível, como abso-
lutamente necessário, ser menos abstrato no início, manter uma
constante abertura às aplicações” (2009, p vii).
Para os alunos, aprender de forma aplicada permite não
apenas um melhor significado dos conceitos lecionados, como
também, possibilitar uma melhor construção abstrata dos con-
ceitos matemáticos (KLEIN, 2009). Assim, observa-se que “Os OA
e/ou os software educacionais podem proporcionar representa-
ções mentais e a troca de informações sem muita dificuldades”
(BULENGON e MUSSOI, 2014, p 65). Tem-se, então, que os OA
são recursos didáticos que possibilitam aplicações dos conteúdos
lecionados.
Ao apresentar as potencialidades dos OA como recurso didá-
tico, Bulengon e Mussoi (2014) expõem que um OA deve “fazer
uma representação adequada da realidade, esta deve levar em
conta os conceitos sociais, culturais e comunicativos, além das
emoções e integração com o meio” (p 65). Um fato observado
nos OA que foca o ensino da matemática é a utilização de cená-
rios matemáticos ou históricos matemáticos como o principal
elemento de construção e aplicação do OA.
A proposta deste OA é que o aluno aplique os conceitos
leccionados em um ambiente que simule situações práticas
similares às vivenciadas historicamente, para esse propósito,
utilizamos um instrumento histórico e sua utilização prática
como cenário principal do OA a ser construído. O aluno será
apresentado a uma situação histórica e, ao vivenciá-la, estará
colocando em prática conhecimentos matemáticos lecionados
e praticados pela humanidade há vários séculos.
A construção e aplicação de OA destinado ao ensino de ma-
temática facilitam a compreensão dos conteúdos lecionados ao

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

tornar aplicável o que fora apenas abstrato. As maneiras como


um OA é implementado dão ao professor uma diversidade de
utilização limitada apenas pela criatividade, pois, além das ativi-
dades inseridas, é possível utilizar-se da gameficação, realizando
competições entre os alunos.
Para construir um OA é necessário o trabalho de um pro-
gramador e um design gráfico para transformar as instruções
recebidas do criador em uma interface que permita sua utilização
para o ensino e a aprendizagem de algum conteúdo. Salles (2005)
descreve algumas das etapas necessárias para a construção de
um OA com finalidades educacionais. São elas:

• Desing Pedagógico é primeira apresentação do que será o OA, sendo


dividido em: a) Explicação e justificativa do tópico escolhido, sua in-
teratividade com o mundo real e que trabalhos semelhantes existem;
b) os objetivos desejados com a criação deste OA; c) Os recursos de
interatividade, vídeos, sites, janelas de ajudas que existiram; d) Plane-
jamento e sugestão de atividades; - essa é a descrição o mais detalhada
possível, de como será o OA e que atividades serão possíveis de serem
realizadas; e e) as recomendações de acessibilidade e usabilidade
para o OA, esta parte diz respeito à forma como os alunos acessaram
e utilizarão o programa quando ele estiver disponível.

• Storyboard é a próxima fase, trata-se da descrição quadro a quadro


do que estará contido em cada passagem do OA, como será composto,
o que conterá cada recurso disponível para os alunos e como será o
progresso dos alunos ao longo de cada etapa. Os programadores e
designers gráficos utilizarão o storyboard para tornar realidade o OA,
por isso, o detalhamento ser crucial para a construção adequada do AO.

• Guia do Professor: documento que faz a apresentação do OA ao pro-


fessor, fornecendo todas as informações necessárias para que o OA seja
utilizado para a finalidade prevista. Deixando o professor livre para
criar outras utilizações para o programa.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

• Plano de aula: É a sugestão de como o professor deve desenvolver


sua aula quando da utilização do OA.

Finalizados esses passos, temos um objeto de aprendizagem


com toda uma documentação que permite sua utilização em sala
de aula e a reutilização em outras atividades, conforme a cria-
tividade dos professores. Neste aspecto, apresentamos a seguir
a construção de um OA focado na utilização de um instrumento
histórico que possibilitou aos navegantes dos séculos XVI e XVII
singrarem os mares até então não navegados pelos europeus.

Um pouco da história do quadrante

Foi no período das Grandes Navegações e Descobrimentos


Marítimos, século XV e XVI, que os instrumentos destinados a
orientar os pilotos em alto-mar começaram a surgir ou a serem
aperfeiçoados. Corroborando com isso, Bruyns e Dunn (2009)
afirmam que o quadrante náutico teria se derivado de outro
instrumento utilizado pelos astrônomos em meados dos séculos
XIII. Durante essa época, o primeiro instrumento a ser inserido
nessas viagens foi o quadrante, seguido posteriormente, pelo
astrolábio, e substituído pela balestilha. Costa (1958, p.28) nos
apresenta que,

O primeiro registro do uso náutico do quadrante deve-


se a Diogo Gomes, na sua Relação do Descobrimento da
Guiné. Lá se lê esta passagem célebre: <<E eu tinha um
quadrante, quando fui a estes países, e escrevi na tábua
do quadrante a altura do polo árctico>>.

Essa viagem se deu em torno de pouco mais da metade do


século XV, quando seguia para as ilhas de Cabo Verde. Mesmo
sendo utilizado pelos pilotos, diversos fatores foram surgindo
no intuito de contribuir para o desuso desse instrumento, entre

119
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

eles, podemos destacar, a instabilidade na hora de aplicação do


mesmo em meio ao convés de um navio em movimento (BRUYNS,
DUNN, 2009).
O quadrante utilizado nas grandes navegações era formado
por um quarto de círculo, de madeira ou bronze, juntamente com
um limbo graduado de 0º a 90º (localizado na borda do arco),
duas pínulas alinhadas, no qual cada uma possuía um orifício no
seu centro. A primeira pínula estava alocada ao lado do ângulo
de 90º e segunda na extremidade do vértice do ângulo reto. E
do vértice partia um fio com um pequeno peso na ponta (figura
1). (BRUYNS, DUNN, 2009).

Figura 1 - Quadrante em um quarto de círculo.

Fonte: X Afonso (1863, p. 303).

Além disso, o instrumento possui seis arcos concêntricos


que fornecem as horas do dia e sobre o vértice de 90º se en-
contra um quadrado, chamada de quadrado das sombras, ou
escala altimétrica, divida em doze partes destinadas à resolução
de problemas de topografia. Para realizar as medições com o
quadrante poderia se utilizar para orientação em alto-mar dois
astros, a estrela Polar ou o sol. No caso da observação fazendo

120
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

uso da estrela Polar, o piloto deveria pôr o instrumento na ver-


tical e com o olho na pínula localizada ao lado do ângulo de 90º
inserido no limbo, deveria visualizar o astro, simultaneamente
com a outra pínula. Em seguida, devia pressionar sobre o corpo
do quadrante o fio de prumo e verificar em qual ângulo o mesmo
parou, encontrando assim, a altitude do astro em relação à linha
do horizonte (figura 2). (SILVA, 1945).

Figura 2 - Principio da medição com o quadrante

Fonte: Silva (1945, p. 268).

A segunda maneira de realizar a medição, devido aos raios


solares, não seria necessário colocar o olho nas pínulas, pois
seria impossível realizar a aplicação desta forma, mas bastava
que o observador colocasse o quadrante de maneira vertical e
percebesse o momento em que um raio de sol passe simultanea-
mente pelas pínulas e novamente deveria apertar o fio de prumo
e visualizar qual a distância angular obtida. (SILVA, 1945). Assim,
por meio do quadrante era possível encontrar a altitude de uma
estrela ou do sol, saber as horas e descobrir altura, distância
(comprimento) ou largura de algum objeto.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Um relato inicial de um Storyboard

A ideia de inserir um Objeto de Aprendizagem (OA) atrelado


à história da Matemática veio como forma de utilizar as tecno-
logias no ensino de Matemática como forma de mobilizar co-
nhecimentos matemáticos a partir de um instrumento histórico.
Como pré-requisito para esta atividade é necessário que o
aluno tenha internalizado conceito de ângulos e suas operações,
estudado no 7o ano do ensino fundamental. A aula fazendo uso
deste OA pode ser desenvolvida em dois tempos de 50 minutos,
contudo o professor poderá aumentar este tempo com alguma
atividade extra ou complementar, após uma discussão sobre os
conceitos trabalhados no OA.
Destacamos que, para a utilização desse OA, “Nos mares da
Trigonometria”, será necessário: computadores; internet para
acesso ao repositório on-line; sistema operacional Windows;
Flash Player; e Browser (Chrome, Mozilla, etc.) instalados.
Na condução da aula o professor inicialmente poderá fazer
uma explanação dos conteúdos matemáticos que estão incluí-
dos no AO. Ao finalizar essa explicação o docente convidaria os
alunos, de forma individual ou em equipes, a pesquisar sobre
como o conteúdo trabalhado e sua relação com os instrumentos,
quadrante náutico, por meio de atividade investigatórias�, e le-
vantar questionamentos, como por exemplo, o que influenciou o
início das Grandes Navegações, como surgiram os instrumentos
na área da náutica, entre outros. Quando a curiosidade e o nível
crítico já estiverem adequadamente provocados, o professor
pode levar os alunos para a sala de informática, para que eles
conheçam mais a fundo um dos instrumentos históricos que
possibilitou viagens afastadas da costa marítima, nosso caso o
quadrante náutico. Ressaltamos que é necessário o professor
guiar os alunos para o site do repositório em que este OA estará
disponível, orientando-os quanto a sua manipulação.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

É importante que durante a produção de atividades, o pro-


fessor provoque os alunos para que eles apresentem solução para
as situações problemas apresentadas, incentivando-os a criarem
outras novas situações. Após a atividade, um momento de dis-
cussão é necessário para que o professor destaque os conceitos
mobilizados neste objeto de aprendizagem. Para complementar
essa aula sugerimos que, nesse momento, o professor proponha
a construção física e aplicação do quadrante, como exemplo, para
descobrir a altura de uma torre, poste, montanha, entre outros.
Pode-se questionar qual a medida utilizada para calcular a
localização do marinheiro, abordando os conceitos de latitude e
longitude. Além disso, também, pode- se indagar os alunos sobre
a razão das escolhas feitas, como a direção que ele escolheu para
seguir o caminho ao seu destino, trabalhando os pontos cardeais
e colaterais.
Dessa forma, além desse Objeto de Aprendizagem possi-
bilitar o trabalho com diversos conceitos matemáticos, como
medição de ângulos, arcos, trigonometria, entre outros, de ma-
neira a dialogar com a história da matemática, permite também
o professor explorar conceitos relacionados à geografia ou as-
tronomia, potencializando o mesmo como um OA que promove
a interdisciplinaridade. A seguir, apresentaremos um recorte do
Stoyboard confeccionado para a criação do Objeto de Matemática
(OB) intitulado “Nos mares da Trigonometria”.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tela 01
Título da animação: Página inicial do OA, “Nos mares da trigono-
metria”.
Sem elementos textuais: Nos mares da trigonometria.
Explicação sobre a ação: Essa tela inicial do OA deverá vir com um céu
estrelado, juntamente com uma lua, de forma que fique semelhante à
imagem a esquerda. Em seguida, deverá aparecer o mar se movimen-
tando com ondas médias e sobre as mesmas deverá ter um navio, com
um marinheiro dentro da cabine, dirigindo o mesmo. Seria interessante
que o navio e o marinheiro não ficassem tão pequenos, mas pudéssemos
vê-los com clareza, com visibilidade análoga à imagem. Gostaria que a
tela inicial do OA não ficasse paralisada, mas que o navio juntamente
com o mar se movimentasse sem sair do local, e as estrelas ficassem
brilhando. Na parte superior da imagem da Tela 01, à esquerda deverá
ficar o título do OA (o título deverá vir com letras maiúsculas, com uma
mistura de tonalidades na cor azul). E na parte inferior da imagem da
Tela 01, no lado direito, deverá ficar o botão “Iniciar” juntamente com o
símbolo do “play” e no lado esquerdo o botão “Sair”.

Tela 02
Título da animação: Pane elétrica
Elementos Textuais: “BoooM!!”
Explicação sobre a ação: Nessa segunda, tela o OA continuará igual
à imagem da Tela 01, exceto o título do AO, o botão “Iniciar” e o “Sair”,

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que serão retirados por completo. Essa tela mostrará o navio se locomo-
vendo de forma lenta, e de repente aparecerá um barulho “BoooM!!!!”,
juntamente com algumas faíscas amarelas e fumaça saindo da cabine
do navio, representando um problema na parte elétrica do painel de
controle do mesmo.

Tela 03
Título da animação: Sem saída
Elementos Textuais: Balão de diálogo: “O painel de controle do navio
explodiu, como vou chegar ao meu destino?!!!
Explicação sobre a ação: Esta tela mostrará o interior da cabine do
navio. Então, no painel de controle, à direita da imagem, continuará
aparecendo fumaça. E o marinheiro estará à esquerda do painel de
controle, olhando para o mesmo com uma cara de espanto e dizendo:
“O painel de controle do navio explodiu, como vou chegar ao meu
destino?!!!”.

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Tela 04
Título da animação: O livro sobre instrumentos.
Elementos Textuais: Balão de diálogo: Acho que algum desses livros
poderão me auxiliar na continuidade dessa viagem!!!
Explicação sobre a ação: O marinheiro resolve procurar uma alternati-
va para se localizar, e chegar ao seu destino, Portugal. Nesse momento o
marinheiro estará em frente ao painel de controle do navio e perceberá
que à sua esquerda há uma pilha de livros, e dentre eles, se encontra
um livro sobre instrumentos náuticos, mais especificamente o primeiro
livro, azul, intitulado, “Antigos instrumentos utilizados na navegação”.

Tela 05
Título da animação: Livro azul flutuando.
Sem Elementos Textuais
Explicação sobre a ação: O livro intitulado, “Antigos instrumentos
utilizados na navegação”, começará a “brilhar” ou “flutuar”. O objetivo
é chamar a atenção do aluno, para que o mesmo clique em cima do
livro e obtenha mais informações sobre os instrumentos.

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Tela 06
Título da animação: A abertura do livro.
Sem Elementos Textuais
Explicação sobre a ação: Ao clicar no livro azul, o mesmo irá aberto
para as mãos do marinheiro. E permanecerá “brilhando” ou “flutuando”,
de maneira que o aluno possa novamente clicar em cima do mesmo.

Tela 07
Título da animação: O zoom no livro azul.
Sem elementos textuais
Explicação sobre a ação: Ao clicar em cima do livro, o mesmo sofre-
rá um zoom, de maneira que as duas páginas possam ser vistas bem
claramente.

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Tela 08
Título da animação: Página esquerda.
Sem elementos textuais
Explicação sobre a ação: Nessa página aparecerá a imagem do qua-
drante náutico.

Tela 09
Título da animação: Página direita.
Elementos textuais: Um pouco da história do Quadrante Náutico...
Os elemenros que compõem o Quadrante Náutico... Para que serve o
Quadrante Náutico...
Explicação sobre a ação: Nessa página aparecerá três menus, de
maneira ressaltada para chamar a atenção do aluno, e o mesmo po-
derá clicar em qualquer um deles, dependendo da sua necessidade
ou curiosidade.

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Tela 10
Título da animação: O zoom desaparece e dá lugar à imagem original.
Elementos Textuais: Balão de diálogo: Será que tenho esse instru-
mento aqui dentro do navio?
Explicação sobre a ação: Nessa tela é desfeito o zoom e a imagem
retorna à forma original. Nesse momento o marinheiro dará uma volta
de 180º e olhará para o final da sala, onde se encontrará um armário.

Tela 11
Título da animação: O armário com os instrumentos.
Elementos Textuais:
Explicação sobre a ação: No final da sala haverá um armário com
quatro prateleiras, na qual cada uma acomodará um instrumento
diferente, o astrolábio, o quadrante, um sextante e uma luneta.

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Tela 12
Título da animação: Selecionando o quadrante.
Elementos Textuais:
Explicação sobre a ação: Quando o aluno clicar no Quadrante Náutico,
o mesmo irá para a mão do marinheiro. Então, a porta inserida na figura
à direita será aberta para o marinheiro passar com o quadrante em
mãos. O marinheiro se encaminhará para a parte da frente do navio,
objetivando realizar as medições com a estrela Polar.

Tela 13
Título da animação: Conhecendo as estrelas.
Elementos Textuais
Explicação sobre a ação: O marinheiro encaminha-se para a proa
(frente) do navio, é necessário que o céu esteja bem estrelado, ou seja,
que a estrela Polar seja retratada em conjunto com as outras estrelas
que ficam em seu entorno. Nesse momento seria interessante que todas
as estrelas, e mais ainda a estrela Polar, estivessem como alto relevo,
e, à medida que o aluno fosse passando o curso do mouse por cima da
mesma, pudesse ver o nome correspondente à mesma.

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Tela 14
Título da animação: Iniciando as medições.
Elementos Textuais
Explicação sobre a ação: Nessa tela à medida que o aluno
mobilizar o quadrante para baixo ou para cima, o fio de prumo com
marca à distância angular da estrela Polar em relação à linha do
horizonte. Para auxiliar na visualização foi colocada, na direita da
foto, uma escala de 0º a 90º marcando a distância angular durante o
momento em que o aluno está movimentando o quadrante náutico.

Tela 15
Título da animação: Encontrando a Estrela Polar.
Explicação sobre a ação: Quando finalmente o aluno conseguir visu-
alizar pelas duas pínulas a estrela Polar, o fio de prumo irá marcar o
grau de visualização da estrela em relação à linha do horizonte, conse-
quentemente, o aluno irá visualizar com maior nitidez essa distância
angular por meio da tabela na lateral.

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Tela 16
Título da animação: Descobrindo a localização atual.
Elementos Textuais: 1o Balão de diálogo: Agora achei minha locali-
zação atual! Preciso apenas realizar os cálculos e ver o quanto preciso
navegar para chegar até Portugal.
2o Balão de diálogo: Se minha latitude atual é 15º graus e a de Portu-
gal é aproximadamente 40º. Então, preciso percorrer uma distância
angular de 25º.
Explicação sobre a ação: Essa tela deverá ser bem parecida com a
imagem acima.

Tela 17
Título da animação: Se lançando nos mares.
Explicação sobre a ação: Nessa tela deverá aparecer o globo terrestre,
com o marinheiro navegando em seu navio. Nesse momento o aluno
poderá guiar o barco no seu percurso e à medida que for se deslocando
irá calculando novamente a latitude do local na qual estaria fazendo
uso do quadrante. Sendo que no lado direito abaixo da lista de graus
terá também uma bússola.

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Tela 18
Título da animação: Se aproximando de Portugal.
Explicação sobre a ação: À medida que o aluno for conduzindo o
navio e realizando as medições com o quadrante, quando chegar na
altura do 40° o aluno terá que planejar estrátegias de navegação para
se chegar até Portugal, com ajuda da bússola.

Tela 19
Título da animação: Descendo no Farol de Nazaré em Portugal.
Explicação sobre a ação: Nessa tela o marinheiro irá aplicar o Qua-
drante Náutico para descobrir a altura do Farol de Nazaré em Portugal.
A partir dessa medição o professor poderá abordar conceitos relacio-
nados à trigonometria no triângulo retângulo, seno, cosseno, tangente,
complemento de um ângulo.

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Considerações Finais

A utilização de instrumentos para a abordagem de conceitos


matemáticos é uma interessante estratégia de ensino, pois cada
artefato, como o quadrante, possui diversos conceitos matemá-
ticos incorporados na sua construção e disseminados através do
seu uso. Além disso, o instrumento permite unir a teoria com a
prática, possibilitando ao aluno construir seu conhecimento de
maneira interativa.
Entretanto, trabalhar com esses instrumentos em uma pla-
taforma digital, no formato de um OA proporciona relacionar
diversos conhecimentos além, dos matemáticos, oportunizando
assim, a chamada interdisciplinaridade. De maneira a deixar o
aluno livre para relacionar os conceitos de diversas áreas, como
a história da matemática, a própria matemática, a geografia e
astronomia, e tentar ao final construir e elaborar um conheci-
mento amplo e concreto.
Além disso, quando trabalhos com um OA, objetivamos
permitir a esse aluno ter a liberdade para executar movimentos
e ações que não seriam possíveis frente ao instrumento confec-
cionado fisicamente, mas que de maneira digitalizado permite
ao estudante realizar diversos movimentos, como viajar pelo
planeta através dos mares, conhecer as constelações, realizar
experimentos que podiam ser perigosos manuseados com as
mãos, entre outros.
Deste modo, propomos essa maneira alternativa, por meio
da utilização de um OA juntamente com o quadrante náutico,
visando uma aula diferenciada, que englobe vários conceitos de
diversas áreas e proporcione ao discente uma aprendizagem mais
significativa e que alcance novos horizontes de conhecimentos.

134
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Referências

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Horizonte: Autêntica, 2007.
BULEGON, Ana Marli e MUSSOI, Eunice Maria. Pressupostos Pedagógicos
de Objeto de Aprendizagem. In: TAROUCO, Liane M. R. et al. Objetos
de Aprendizagem: teoria e prática. Porto Alegre: Evangraf, 2014. 502 p.
BRUYNS, Willem Fredrik Jacob Mörzer; DUNN, Richard. Sextants at
Greenwich: A Catalogue of the Mariner’s Quadrants, Mariner’s
Astrolabes Cross-staffs, Backstaffs, Octants, Sextants, Quintants,
Reflecting Circles and Artificial Horizons in the National Maritime
Museum, Greenwich. Oxford: Oxford University Press, 2009.
CAVALCANTI, J. D. B. As tendências contemporâneas no ensino de Matemática e
na pesquisa em Educação Matemática: questões para o debate. II SEEMAT,
2010, Conquista. 6 p. Disponível em: <http://www.uesb.br/mat/semat/
seemat2/index_arquivos/mr_d.pdf>. Acesso em: 10 fev. 2016.
COSTA, Abel Fontoura da. A ciência náutica dos portugueses na época dos
descobrimentos. Lisboa: Comissão Executiva das Comemorações do
Quinto Centenário da Morte do Infante D. Henrique, 1958. 107 p.
GASPERI, Wlasta Nadieska Hüffner De; PACHECO, Edilson Roberto. A
História da Matemática Como Instrumento para a Interdisciplinaridade na
Educação Básica. Secretaria da Educação do Paraná. Portal Dia a Dia
Educação. Disponível em http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/
arquivos/File/deb_nre/matematica/historia_matematica.pdf. Acesso
em: 10 fev. 2016.
KLEIN, Felix C. Matemática Elementar de um Ponto de Vista Superior – Volume
I – 1a Parte: Aritmética. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Matemática,
2009. 116 p.
MENDES, Iran Abreu. Investigação histórica no ensino da matemática. Rio
de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda, 2009.
PONTE, João Pedro da; BROCADO, Joana; OLIVEIRA, Hélia. Investigações
Matemáticas na Sala de Aula. 1. ed. 1ª reimp. Belo Horizonte: Autêntica,
2005.
REIS, A. Estácio dos. O quadrante náutico. Lisboa: Editora da Universidade
de Coimbra, 1988.
SAITO, Fumikazu; DIAS, Marisa da Silva. Articulação de entes matemáticos
na construção e utilização de instrumentos de medida do século XVI. Natal:
Sociedade Brasileira de História da Matemática, 2011. 63 p.
SAITO, Fumikazu; DIAS, Marisa da Silva. Interface entre história da
matemática e ensino: Uma atividade desenvolvida com base num
documento do século XVI. Ciência & Educação, São Paulo, v. 19, n. 1,
p.89-111, 2013.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

SALLES, Gilvandenys Leite. QUANTUM: Um Software para Aprendizagem dos


Conceitos da Física Moderna e Contemporânea. 2005. 122 f. Dissertação
(Mestrado em Computação Aplicada) – UECE, Fortaleza, 2005.
SOUSA, Giselle Costa de. Uso da história da matemática e tecnologias
de informação e da comunicação: alianças possíveis e potenciais para
o ensino de matemática. In: ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA, 12., 2016, São Paulo. Anais do XII ENEM. São Paulo,
2016. p. 1 - 13. Disponível em: <http://www.sbem.com.br/enem2016/
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SILVA, Luciano Pereira da. 1864-1926: Obras Completas. Lisboa: Agência
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WILLEY, D. A. Connecting learning objects to instructional design theory:
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Instructional Use of Learning Objects: Online Version, http://reusability.
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X, D. Afonso. Libros del saber de Astronomía: Libro del quadrante pora retificar.
2. ed. Madrid: Tipografia de Don Eusebio Aguado, 1863. 1277 p.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

OLHARES SOBRE A ANTIGUIDADE DOS AUTÔMATOS


AO COTIDIANO DA ROBÓTICA EDUCACIONAL
NO AMBIENTE ESCOLAR

Fernando Barros da Silva Filho1


José Rogério Santana2

Introdução

Nos últimos anos temos presenciado o interesse da comu-


nidade escolar pelas atividades que envolvem a Robótica Edu-
cacional. Tema este que, apesar de se referenciar na atualidade,
trata-se de uma área que está em desenvolvimento ao longo dos
séculos. Motivado em questões do cotidiano que estão sendo
exploradas mediante os problemas de natureza energética e
ambiental, que envolvem uma formação crítica multidisciplinar
e interdisciplinar que contempla saberes e conhecimentos em
áreas como: física, química, matemática, linguagem, geografia,
biologia, história entre outras áreas.
Sendo assim, se pretende, neste trabalho, apresentar ar-
gumentos favoráveis ao uso de fatos históricos sobre o desen-
volvimento de autômatos na antiguidade para fundamentar
os elementos constituintes da história da robótica enquanto

1 Mestrando em Educação pela Universidade Federal do Ceará (LAPEDI/DFE/FACED-UFC).


Práticas Culturais Digitais/NHIME/PPGEB/FACED-UFC.
2 Professor associado da Universidade Federal do Ceará, Coordenador do Laboratório de Práticas
Educativas Digitais e Imagéticas LAPEDI/DFE/FACED-UFC. Doutor em Educação Brasileira/
Práticas Culturais Digitais/NHIME/PPGEB/FACED-UFC.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

introdução aos elementos básicos da Robótica Educacional3. Afi-


nal, ainda hoje, muitas pessoas acreditam que a área conhecida
como robótica seja algo recente ou, em outras palavras, que a
robótica tenha tido origens a partir do século XX.
A robótica na antiguidade se estabeleceu como ciência duran-
te o século XX, entretanto a mesma já se fazia presente em diversas
civilizações antigas através dos desenvolvimentos e construções
de dispositivos automatizados, mecanismos e ferramentas.
Normalmente é atribuído à Grécia Antiga (1100 a.C - 146
a.C.) o local de advento dos primeiros autômatos, entretanto
diversos estudos (BRETT, 1954; HOBSBAWM, 1952; THOMP-
SON, 1988) indicam que este tipo de atividade data de períodos
e povos mais antigos dentre os quais se pode citar a civilização
Egípcia (3150 a.C. - 1070 a.C.) em que mecanismos autônomos
de segurança eram implementados nas edificações de pirâmides
a fim de impedir a ação de saqueadores ou outros tipos de inva-
sores de acordo com a tradução de Pierre Vattier do manuscrito
árabe redigido por Murtada Ibn Al-Khafîf (1154-1237), normal-
mente intitulado l’Egypte de Murtadi fils du Gaphiphe (O Egito
de Murtadi filho do Gaphiphe), do qual segue trecho a seguir:

“...num lugar quadrado, como para realizar uma assem-


bleia, havia muitas estátuas e, entre elas, havia a figura
de um galo de ouro vermelho. Essa figura era incrível, e
estava adornada por pedras preciosas, das quais duas
representavam seus olhos, os quais resplandeciam como
grandes tochas... quando os homens se aproximam, o
animal emite um urro terrível, começa a bater as asas e,
ao mesmo tempo, se ouvem vozes procedentes de todas
as direções...” (in VATTIER apud AL-KHAFIF, 1666, p.57)

3 Nota explicativa: Ao falar sobre robótica e Robótica Educacional é necessário ter em mente
que o primeiro termo não necessita ter relação com os fenômenos educacionais. No entanto,
a Robótica Educacional implica no trabalho formativo para aprendizagem e divulgação da
robótica enquanto prática docente/discente para formação em áreas afim como: física, química,
matemática entre outras.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Dispositivos como este compunham um conjunto de me-


canismos projetados e construídos de tal forma a aproveitar
propriedades ópticas de pedras preciosas, bem como, da
canalização de fluxos de ar dentro de dutos de ventilação, a
fim de promover o referido efeito de tochas na impressão de
presença de outros seres por meio dos sons gerados pela mo-
delação do ar. O que nada mais é do que uma versão primitiva
dos alarmes eletrônicos que temos hoje instalados em nossos
veículos e casas.
A cultura judaica também está permeada de citações a meca-
nismos autômatos dentre os quais se expõe a descrição do trono
do rei Salomão dentro de histórias contadas nas festividades
tradicionais do Purim referenciado à Meguilá de Esther4.

Quando o rei Shlomo5 subia ao trono, começava a funcio-


nar um mecanismo especial. No primeiro degrau, o boi e
o leão estendiam suas patas para sustentar e ajudá-lo a
subir ao próximo degrau. De cada lado e em cada degrau,
os animais mantinham firmemente o rei até que ele se
sentasse no trono.

O trono em questão é descrito como obra do próprio rei Sa-


lomão sendo a ele atribuída a autoria de seu projeto e concepção.
Evidências da existência deste trono são somadas ao analisar
outros estudos que indicam o confisco do mesmo durante o
domínio babilônico e das invasões persas entre 586 a 333 a.C
(KITCHEN, 2003, p. 66)

4 Meguilá de Esther: Tem significado de “rolo” ou “pergaminho” em hebraico. Compõe o cânon


bíblico composto por cinco livros curtos escritos após ao Pentateuco e Profetas. Nas festividades
de Purim, onde se comemora a salvação do povo judeu na antiga Pérsia, a Meguilá de Esther
é lida a partir de um pergaminho manuscrito.
5 Shlomo: Forma escrita tradicional do nome do rei Salomão de Israel apresentada na Meguilá
de Esther.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Na literatura e na mitologia sempre se encontram ele-


mentos que inspiram a criatividade humana. Na antigui-
dade este fato já era evidenciado pela busca da criação
de dispositivos que viessem a servir às ordens de seus
criadores o que encontramos por exemplo nas obras de
Homero, o qual inspirado pelos fascínios da criação de
seres perfeitos, relatou na Ilíada a existência dos autô-
matos6, seres mecânicos inteligentes, criados pelo deus
Hefesto os quais eram seus serventes e protegiam seu
palácio feito de metal.

À Vulcânea estrelada e incorruptível, Estupendo lavor


do coxo mestre; Suado a azafamado aos foles o acha,
Trípodes vinte a fabricar, adornos Da aênea régia: em
rodas áureas pousam, Com que espontâneo ao divinal
congresso Vão-se e tornem-se à casa, oh maravilha! Per-
feitas quase, as pegas só lhes faltam, Cujos cravos aguça.
Ao tempo que ele Isto engenhava, aproximou-se Tétis.
(HOMERO, 720 a.C., Livro XVIII)

De acordo com a narrativa de Homero, o deus Hefesto cons-


truiu em seu palácio seres autômatos que lhe serviam como
ajudantes em suas tarefas e protegiam seus domínios. Dentre
estes autômatos Hefesto teria criado os trípodes que continham
rodas de ouro o que as permitiam locomover-se sozinhas para
as reuniões dos deuses.

6 Autômato: conversão latina da palavra grega αὐτόματον, autômato, que significa “agindo pela
vontade própria”. Comumente descreve máquinas que se movimentam de forma autônoma,
especialmente aquelas que imitam ações humanas ou de animais

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Figura 1 - Apolo sobrevoando o mar utilizando um Trípode alado

Fonte: ResearchGate repositório digital7

Ainda no contexto da mitologia grega temos a apresentação


de Dédalo, um personagem cujas tramas narradas por vários
autores demonstram um potencial influente sobre os ofícios dos
estudiosos e intelectuais da época. Dédalos era considerado um
habilidoso engenheiro o qual foi responsável pela construção do
labirinto de Minos. Ao cair em desagrado do rei Dédalos se vê
obrigado a fugir junto com seu filho conforme é narrado na obra
“O Livro de Ouro da Mitologia” (BULFINCH, 2002):

Pôs-se, então, a fabricar asas para si mesmo e para seu


jovem filho, Ícaro.... Prendeu as penas maiores com fios
e as menores com cera e deu ao conjunto uma curvatura
delicada, como as asas das aves... Em seguida, equipou o
filho da mesma maneira e ensinou-o a voar, [...] recomen-
do-te que voes a uma altura moderada, pois, se voares
muito baixo, a umidade emperrará tuas asas e, se voares
muito alto, o calor as derreterá.

Obras como as de Homero e de outros escritores da época


possivelmente vieram a servir de inspiração para estudiosos
7 Disponível em: <https://www.researchgate.net/figure/303820506_fig2_Fig-4-Apollo-flying-
over-the-sea-on-his-winged-tripod-Below-him-dolphins-fish-and> Acesso em out. 2017.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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como Ctesibius, matemático e engenheiro grego que viveu en-


tre 285-222 a.C. em Alexandria no Egito. Durante a juventude
Ctesibius prestava assistência ao pai que era barbeiro, ofício
no qual concebeu sua primeira invenção, que consistia num
espelho suspenso contrabalanceado por pesos de chumbo, que
com a ajuda de um sistema de varas, permitiam ajustar a altura
do mesmo de acordo com a estatura do cliente. Neste ofício
Ctesibius também presenciou sua primeira experiência com a
pneumática na qual eventualmente percebeu que o contrapeso
de chumbo utilizado em seu engenho anteriormente citado, ao
passar por dentro de um tubo, comprimia o ar que ao escapar por
pequenas fendas emitia sons que podiam ser modelados abrindo
assim sua mente para o desenvolvimento de vários mecanismos
pneumáticos e autômatos, que vão desde instrumentos musicais
até armas militares.

Figura 2 - Ctesibius de Alexandria

Fonte: Enciclopédia Britânica Online8

Ainda em Alexandria, outro grego chamado Heron (10 d.C. -


80 d.C.) construiu diversas invenções, dentre as quais se destaca
8 D i s p o n í v e l e m : < h t t p s : / / w w w. b r i t a n n i c a . c o m / b i o g r a p h y / C t e s i b i u s - o f
Alexandria?oasmId=136707> Acesso em out. 2017.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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a primeira máquina de “vender água da história”, que liberava


um jato de água ao receber uma moeda do usuário.
Heron foi responsável pelos primeiros experimentos com
energia eólica, e aperfeiçoou o funcionamento do Hydraulis, um
órgão a água construído por Ctesibius, através da integração de
um pistão em um cata-vento, o que alimentava os dutos do órgão
com um fluxo contínuo de ar. Também lhe é atribuída a criação
de diversos outros mecanismos: a eolípila9, a seringa, a bomba
de pressão projetada para uso dos bombeiros de Roma, os tea-
tros de autômatos, a porta automática e um veículo móvel capaz
de se movimentar para frente e para trás movido pela energia
cinética proporcionada pela queda de grãos de trigo dentro de
um mecanismo sendo este considerado um dos mais autênticos
autômatos da época.

Figura 3 - Máquina de vender água

Fonte: Greek Boston10

9 Eolípila: considerado o primeiro motor a vapor documentado, a eolípila consiste em uma câmara
com tubos curvados por onde vapores são expelidos impulsionando o movimento da câmara
em torno dos hemisférios dos quais está suspensa.
10 Disponível em: < http://www.greekboston.com/culture/inventions/vending-machine/> Acesso
em nov. de 2017

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Figura 4 - Eolípila

Fonte: ResearchGate11

Figura 5 - Teatro de autômatos

Fonte: Explorable.com12

Diante destes exemplos, fica esclarecido porque é atribuído


historicamente aos gregos a construção dos primeiros autômatos
(AZEVEDO, 2006 p. 4).

11 Disponível em: < https://www.researchgate.net/figure/226680721_fig16_Fig-16-a-Heron%27s-


aeolipile-and-b-a-modern-replica-photographed-by-Katie-Crisalli> Acesso em nov. de 2017
12 Disponível em: < https://explorable.com/heron-inventions> Acesso em nov. de 2017

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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Com o passar dos séculos muitos dispositivos robóticos


foram concebidos pela humanidade em várias civilizações. No
entanto, aos árabes, se atribui o interesse no desenvolvimento de
mecanismos que fossem ao encontro das necessidades humanas
dando um destaque especial ao polímata Al Jazari (1136–1206)
que viveu durante a Idade do Ouro Islâmico, equivalente à Idade
Média, ao qual é atribuída a autoria do manuscrito “O Livro do
Conhecimento de Dispositivos Mecânicos Engenhosos”, em que
é descrito com detalhes o funcionamento e instruções de cons-
trução de cem mecanismos que vão desde relógios até sistemas
de irrigação.

Figura 6 – Sistema de irrigação

Fonte: O Livro do Conhecimento de Dispositivos Mecânicos Engenhosos (Al-Jazari)

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Figura 7 – Sistema de irrigação

Figura 8 - Relógio

Fonte: O Livro do Conhecimento de Dispositivos Mecânicos


Engenhosos (Al-Jazari)

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
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A partir do século XV os autômatos começam a trilhar rumo


a uma maior complexidade quando, dentre outros destaques,
Leonardo da Vinci (1452 – 1519) desenvolveu uma extensa in-
vestigação acerca da anatomia dos animais possibilitando assim
a disponibilidade de consideráveis referências para o desenvol-
vimento e criação de articulações mecânicas. Neste período se
notam o surgimento de diversos exemplares de bonecos que
moviam os membros, os olhos e que conseguiam executar ações
simples como escrever ou tocar alguns instrumentos. Neste mo-
mento presenciamos o surgimento dos conceitos trabalhados
atualmente na biônica, na medicina de próteses e na ciberné-
tica, ciências que buscam integrar organismos vivos, sistemas
eletromecânicos e computacionais para o desenvolvimento de
próteses, órgãos artificiais e exoesqueletos de melhoria artificial
de humanos.
Nesta época já se discutia o impacto da existência de má-
quinas que pudessem consequentemente substituir a força de
trabalho, principalmente após contribuições do inventor e artista
francês Jacques de Vaucanson (1709 – 1782) ao qual é atribuída
a construção do primeiro androide13, o qual tinha a capacidade
de tocar flauta. De fato, este impacto realmente começou a ser
percebido durante o século seguinte no qual presenciou-se a
primeira revolução industrial, em que ocorreu um intenso des-
locamento da população rural para os centros urbanos, criando
enormes concentrações urbanas (KNAPP, 1989, p. 77). Os ope-
rários viviam em péssimas condições de trabalho e moradia
bem como expostos à insalubridade, o que levava a dispersão
de várias doenças.
Após os primeiros anos da industrialização, foi, na tecno-
logia fabril, financiada pela produtividade da classe operária,
que se iniciou um rápido processo de desenvolvimento a fim de
promover a substituição de mão de obra humana por máquinas

13 Androide: Aparelho ou máquina que se assemelha à figura humana inclusive apresentando


movimentos e ações idênticas.

147
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

e equipamentos (HOBSBAWM, 1952), o que promoveu a rápida


ascensão do nível de desemprego refletindo no grande número
de famílias vivendo em estado de miséria nos centros urbanos.
Por outro lado, ao passo que se desenvolveu a revolução indus-
trial, se notou a revolução agrícola em função da presença da
mecanização, que também abrangeu os processos rurais. Isto
possibilitou o aumento na produtividade e oferta de alimentos,
o que levou à redução de custos e consequentemente garantiu
a subsistência destas famílias em situação de miséria, o que por
sua vez promoveu um aumento da taxa de natalidade da popu-
lação intensificando ainda mais a densidade demográfica e os
problemas sociais.
Por volta de 1860. se presenciou uma segunda Revolução In-
dustrial, que estava caracterizada pela investida às inovações téc-
nicas, dentre as quais destaca-se a energia elétrica, a siderurgia
do aço, os avanços e desenvolvimento nos meios de transportes e
o surgimento de novos meios de comunicação como o telégrafo,
e telefones. Neste momento, a mão de obra operária da qual até
então não se exigia considerável capacitação técnica, passou a
ser cobrada cada vez mais pela especialização que atendesse à
crescente demanda dos processos de produção condizente com
os avanços tecnológicos.

A partir da Revolução Industrial, o capitalismo passa a


dominar a economia de mercado e esta passa a abarcar a
maior parte das atividades econômicas. A pesquisa cien-
tífica é realizada em escala crescente, em universidades
e instituições públicas e privadas, contando com amplo
financiamento, proveniente, em parte, do orçamento
governamental e, em parte, de doações privadas, estas
últimas em geral estimuladas por generosas isenções
fiscais. [...] o ensino científico foi transformado em função
das necessidades do novo modo de produção. (SINGER,
1983, p. 20)

148
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Entendendo que a Educação é uma prática social que é deter-


minada por seu contexto histórico, há evidências que, no período
por hora em destaque, a escola assumiu um papel fundamental na
formação da mão-de-obra necessária ao modelo de produção indus-
trial, tanto que a classe hegemônica garantia materiais didáticos para
que não faltasse meios às escolas de possibilitar a qualificação dos
operários nas habilidades requeridas pelos meios de produção. Isto
refletia na própria escola, uma vez que a mesma estava a se deparar
com inovações, que até então os professores também ainda não
tinham formação para uso e compreensão.
E será na virada do século XIX para o século XX, com o de-
senvolvimento do behaviorismo, que se define com mais clareza o
significado do termo “tecnologia do ensino e aprendizagem”, em
parte detalhado e desenvolvido pelo trabalho de Skinner (1972),
pesquisador que apresentou fortes influências no período, as quais
repercutem ainda nos dias de hoje através de seus estudos compor-
tamentalistas, a partir dos quais foram desenvolvidos diversos pro-
cessos ou programas de ensino denominados métodos de instrução
(SILVA, 2006, p. 2), os quais fundamentam o instrucionismo.
Voltando a atenção à resposta cultural apresentada na época,
presenciamos um momento marcante na história dos autômatos,
quando, pela primeira vez, a terminologia robô foi utilizada. O
escritor e dramaturgo tcheco, Karel Capek (1890-1938), em uma
de suas peças teatrais intitulada R.U.R.14, conta a história de um
cientista chamado Rossum que cria uma substância química
utilizada para construção de robôs humanóides, que deveriam
ser obedientes e realizar todo o trabalho físico. Entretanto, o
exército de robôs construídos se torna muito inteligente e do-
mina o mundo.
Outras produções culturais da época também apresentam
em sua trama a natureza ostensiva dos robôs sobre a humanida-
14 R. U. R. Rossumovi Univerzální Roboti (Robôs Universais de Rossum). A frase em inglês
“Rossum’s Universal Robots” foi usada como legenda na versão checa original. O termo robô
derivaria do tcheco e significaria “escravo”, o que implicaria em influência crítica marxista
nesta peça de teatro.

149
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

de, destacando-se, entre elas, o filme alemão de ficção científica


“Metrópolis”15 no qual se apresenta a preocupação crítica com a
mecanização da vida industrial nos grandes centros urbanos.
Dentre as influências culturais sobre o tema nos anos 1940,
se destaca o escritor russo Isaac Asimov (1920-1992, o qual
trilhou um caminho inverso acerca da relação humana com a
mecanização, até então muito criticada em função de quase três
séculos de submissão social, apesar da considerável evolução
econômica presenciada.
Asimov dedicou-se à produção de ficções que buscavam
mostrar as possibilidades da humanidade ao utilizar a robótica
no contexto diário e, dentro destas produções, um trecho muito
famoso é o que se destaca a seguir retirado da obra “Eu, Robô”
de 1950:

“1 – Um robô não pode ferir um ser humano ou, por


omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal.
2 – Um robô deve obedecer às ordens que lhe sejam dadas
por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens
contrariem a Primeira Lei.
3 – Um robô deve proteger sua própria existência, desde
que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e
a Segunda Leis.”
(ASIMOV, 1969)

A partir deste momento a robótica se consolida como ciência


e surgem os esforços para a construção de robôs industriais. É
atribuída ao engenheiro Joseph F. Engelberger (1925-2015) a
construção do Unimate, primeiro robô industrial montado e
comercializado mundialmente pela General Motors.

15 Metropolis é um filme de ficção científica alemão lançado no ano de 1927 e dirigido por Fritz
Lang.

150
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Deste ponto em diante, a robótica é disseminada indus-


trialmente e fortalece o produtivismo decorrente do modelo
econômico estabelecido. Os robôs industriais começaram mais
uma vez a efetivar a preocupação social iniciada no século XVI,
buscando o aumento na produtividade, a melhoria na qualidade
dos produtos, consequentemente possibilitando a redução de
custos com o operariado. A seguir nossas considerações:

Considerações finais

Atualmente a robótica está tão internalizada no cotidiano


humano que muitas vezes não se percebe sua presença, como
por exemplo, nos telefones celulares, os quais possuem diversos
sensores e sistemas de captação, armazenamento e exposição
de informações, ou até mesmo ao ativar o alarme e tranca au-
tomática de um veículo, o que podemos considerar nada mais
que uma grande evolução do mecanismo egípcio apresentado
na abertura deste artigo.
Além dos meios de produção, vários outros aspectos da vida
cotidiana estão de certa forma ligados a processos robóticos e
computacionais. A saúde, a segurança pública, a educação, a eco-
nomia, a política, os meios de transporte e comunicação, todos
estão interligados de alguma maneira a sistemas computacionais
e de certa forma estes estão não somente sendo utilizados como
precursores de processos, mas influenciando profundamente na
forma de como estas demandas sociais se desenvolvem.
A aquisição, domínio e transformação do conhecimento tem
sido colocada como premissa individual dos sujeitos, caracteri-
zando este momento histórico como uma era na qual o indiví-
duo é produtor do próprio saber e a autonomia é pressuposto
necessário para a educação contemporânea.

151
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Conscientes deste momento histórico, a legislação educa-


cional brasileira inseriu na redação dos PCN16 do ano 2000 esta
característica autônoma da educação, descrevendo o Ensino
Médio como um sistema em mudança advindas da consolidação
do Estado Democrático, da inserção das Tecnologias Digitais de
Informação e Comunicação na sociedade brasileira bem como das
mudanças nos meios de produção de bens e serviços, os quais
exigiram que a escola se posicionasse de maneira que permitisse
aos alunos integrarem-se ao mundo contemporâneo nas dimen-
sões fundamentais da cidadania e do trabalho.
Estudos recentes têm mostrado que atividades que envolvem
tecnologias educacionais propiciam meios para que o aprendiz
atenda as demandas suscitadas pelo Ministério da Educação na
redação dos PCN do ano 2000, pois, através delas, nota-se que
os estudantes desenvolvem as habilidade de formular hipóteses
relacionadas ao seu objeto de investigação, bem como observa-
se a postura exploratória de ideias que os levam à discussão e
a colocar em prática a sua própria maneira de pensar e validar
resultados construindo argumentos que possam ser aplicados,
como cita (REZENDE, 2002):

Materiais didáticos que incorporem novas tecnologias


são capazes de oferecer uma reestruturação do proces-
so de aprendizagem, depende do esforço de relacionar
novas abordagens teóricas sobre a aprendizagem a seu
desenho instrucional. Tomando, porém, como exemplo a
pesquisa no campo da informática educativa nos últimos
dez anos, pode-se observar que a transferência de des-
cobertas nas ciências cognitivas e sociais para a prática
do planejamento de materiais didáticos raramente é um
processo tão direto.

16 Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN): são referências expedidas pelo Governo Federal
para orientar a composição curricular e as estratégias metodológicas de docentes objetivando a
garantia da oferta dos conhecimentos mínimos reconhecidos como necessários para o exercício
da cidadania

152
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Apesar de toda uma fundamentação legal e da percepção


dos educadores brasileiros e das políticas públicas frente às
demandas metodológicas atuais, a utilização da robótica en-
quanto possibilidade educacional tem enfrentado uma série de
empecilhos que vão desde a dificuldade do emprego de recursos
financeiros de maneira objetiva, até a estruturação metodológica
que atenda a rotina escolar. No contexto da rede pública pode-
se destacar que no estado do Ceará tem se observado que estas
demandas começaram a ser atendidas a partir da construção dos
laboratórios de ciências e informática na rede pública a partir
do ano 2000.
Desde então, tem-se notado uma considerável mudança
de postura metodológica dos professores, em especial aos que
atuam em disciplinas que envolvem as ciências da natureza,
em função provavelmente da disponibilização de um ambiente
específico para desenvolvimento de atividades experimentais.
As atividades experimentais, quando bem elaboradas e
desenvolvidas, permitem ao estudante a capacidade de ser pre-
cursor do seu próprio saber através das descobertas estrategica-
mente orientadas pelos professores, estes por sua vez deixam de
ser meros expositores de conceitos preexistentes e agora passam
a engenheiros de conhecimento.
Na rede educacional do Estado do Ceará, se presenciou duas
ações fortalecedoras deste processo: a primeira foi o estabeleci-
mento da função de professor laboratorista por meio de portaria
específica, que estabelece a lotação de professores na função
de atuar na coordenação de todas as atividades laboratoriais,
desde o controle de investimentos até a replicação da formação
de professores e a segunda foi a implantação de um recurso
bienal de manutenção laboratorial, recurso este encaminhado
diretamente às escolas objetivando a garantia da manutenção das
atividades experimentais por meio da aquisição de materiais de
consumo, reagentes químicos, modelos de estudo, equipamentos

153
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

laboratoriais, bem como, de serviços de manutenção predial e


ações de formação e capacitação dos professores.
Dentre as oportunidades de investimento, muitas escolas
estaduais aproveitaram o momento para investir na aquisição
de Kits de Robótica Educacional, os quais geralmente acompa-
nhavam um curso de capacitação em robótica aplicada ao ensino
de ciências, o que possibilitava aos professores trabalharem com
os alunos conceitos básicos de: mecânica, cinemática, automa-
ção, hidráulica, informática e inteligência computacional em
um ambiente educacional tornando o aluno capaz de observar,
entender, compreender e atuar sobre o ambiente ao seu redor.
Ao observar a repercussão da presença de atividades de
Robótica Educacional dentro das escolas estaduais, a própria
Secretaria da Educação (SEDUC-CE) passou a fazer a distribuição
desses kits para algumas escolas, possibilitando assim a criação
de grupos de estudos e promoção de ações de iniciação cien-
tífica, tendo, neste momento como marco, uma era de intensa
valorização da produção de conhecimento dos estudantes, o que
culminou com o estabelecimento da categoria específica de Ro-
bótica Educacional dentro da Mostra Estadual de Ciências, evento
este que ocorre anualmente e tem estrutura similar às mostras
e feiras de produção científica promovidas por instituições de
ensino superior. A fim de acompanhar a proposta e demanda
metodológica citada anteriormente nos PCN, a rede municipal
de educação de Fortaleza também vem investindo na aquisição e
distribuição de kits de robótica educacional para as escolas que
atendem os ditos Ensinos Fundamental I e II.
Atualmente, a Robótica Educacional se enquadra dentre as
categorias de iniciação científica que mais atrai a atenção e au-
diência nos eventos de divulgação científica do estado do Ceará.
Este fato tem levado a alguns problemas dentre os quais se pode
destacar a concentração de esforços administrativos a fim de
preparar um número restrito de estudantes para representação

154
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

institucional diante da rede de ensino, mascarando a realidade


de que a maior parte dos alunos não têm acesso às atividades e
materiais para trabalhar com esta tecnologia educacional. Muitas
instituições relatam esta opção em função do material limitado
que impossibilita difusão real destas ações a todos os estudan-
tes, bem como muitas colocam que não dispõem de professores
preparados para utilizarem esta tecnologia de forma integrada
aos conteúdos curriculares, justificando assim o motivo de
restringi-la a um grupo limitado de alunos.
Além das questões acima expostas, também se pode afirmar
que, ao entender o desenvolvimento histórico tanto da robótica
quanto da robótica educacional, tendo em vista limites e possibili-
dades educacionais, se torna possível avançar rumo a uma formação
crítica sobre os temas que envolvem interdisciplinaridade, trans-
disciplinaridade, automação, cibernética e tecnologias digitais de
comunicação com base no desenvolvimento de ações didáticas que
visem uma robótica educativa que prepare nossos estudantes para
os desafios que estão se apresentando neste início de século XXI.

Referências

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des pyramides, du débordement du Nil, et des autres merveilles de
cette Province. (P. VATTIER, Trad.) Paris, 1666.
ASIMOV, I. - Eu, Robô (2ª ed.). (L. H. Matta, Trad.), 1969. Disponível em
< www.planonacionaldeleitura.gov.pt/upload/e_livros/clle000024.
pdf> Acesso em out. 2017.
BULFINCH, T. - O livro de ouro da mitologia: a idade da fábula: histórias de
deuses e heróis (26ª ed.). (D. J. JUNIOR, Trad.) Rio de Janeiro: Ediouro
publicações S/A, 2002.
BRETT, G. - The Automata in The Byzantine. A Journal of Medieval Studies,
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Present Society. Oxford: Oxford University 1952.
HOMERO – Ilíada. Livro XVIII - Texto integral da Ilíada, (M. Odorico,
Trad.), revisado e digitalizado por Sálvio Nienkötter, Disponível em:
< iliadadeodorico.wordpress.com > Acesso em out. 2017.

155
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

KITCHEN, K. - On the Reliability of the Old Testament. Cambridge:


Eerdmans Publishing, 2003.
KNAPP, B. - Challenge of the human environment. Longman, 1989.
LAMB, W. - The Berlin Painter - Der Berliner Maler. Berlin: Heinrich Keller,
1930.
REZENDE, F. - As novas tecnologias na prática pedagógica sob a perspectiva
construtivista. Ensaio - Pesquisa em educação em ciências, 2002.
SILVA, M. C. - A segunda revolução industrial e suas influências. Anais do
VII seminário nacional de estudos e pesquisas “história, sociedade e
educação no Brasil”. Maringá: UEM, 2006.
SINGER, P. - Aprender economia. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1983.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

TIC’S NA EDUCAÇÃO: UM NOVO MODELO EDUCACIONAL


NA FORMAÇÃO DOCENTE E DISCENTE

Anne Karoline Cardoso Silva1


Raphael Alves Feitosa2

Introdução

A respeito do grande avanço tecnológico dos tempos atuais,


o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s) é,
ainda, um desafio para professores e alunos dos cursos de licen-
ciatura, no sentido de levar as TIC’s para dentro da sala de aula
como recursos educacionais. Quando citamos tecnologias, de
imediato relacionamos o uso do computador, mas não devemos
referenciar apenas a utilização de máquinas, as TIC’s educacio-
nais abarcam todas as ferramentas utilizadas para ampliação
do desenvolvimento de uma aula. A lousa sendo digital ou não,
pincel, instrumentos que são utilizados no contexto do ambiente
escolar, temos tantas outras tecnologias inseridas frequente-
mente como tv, vídeo, dvd, data show, retroprojetor, sistemas
de aparelhagem de som, essas servem como assistência para os
docentes a partir de novas ferramentas didáticas, auxiliando no
aperfeiçoamento das aulas.
A pretendida qualidade na escola engloba o uso das TIC’s no
processo educativo, considerando a familiaridade da geração atual
com essas tecnologias, nativas digitais. O professor, em especial,

1 Licenciada em Ciências da Natureza pela Universidade Federal do Piauí(UFPI)


2 Doutor e mestre em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará( UFC).

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

conecta-se com as tecnologias, exigindo que a instituição de ensino


se aproprie de habilidades inovadoras que, de acordo com as Dire-
trizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica (BRASIL,
2013, p. 22), devem ser fundamentadas na capacidade para aplicar
técnicas e tecnologias orientadas pela ética e pela estética.
Reconhecendo que a qualidade no ensino resulta da partici-
pação coletiva, norteada pelo princípio educacional da responsa-
bilidade social, na tentativa de superar a distância existente entre
as tecnologias disponibilizadas no tempo atual e os recursos
tradicionais ainda adotados pela escola de hoje, temos como ele-
mento propulsor o estímulo à criatividade e à inovação na seleção
e no uso de recursos tecnológicos de informação e comunicação
na educação. Desse modo, o uso das TIC’s, no presente texto, é
compreendido como um processo de dinamização dos ambientes
de aprendizagem, buscando a consolidação de novas práticas
didático-pedagógicas, através da proposição de atividades de
estudo com o uso das TIC como recursos educacionais voltados
para o Ensino de Ciências e Biologia.
Nesse sentido, através de uma exposição a respeito da litera-
tura da área, no formato de uma revisão de literatura (NÓBREGA-
THERRIEN; THERRIEN, 2004), o presente texto objetiva discutir
o uso das TIC’s na educação formal escolar, com foco na atuação
docente.
Atualmente, é imperativo aprender sobre as diferentes tec-
nologias e as formas de utilização da internet para seu melhor
benefício, com intuito de desenvolver uma melhor utilização das
tecnologias e sobre o mundo virtual. Uma sociedade que conse-
gue compreender melhor os avanços tecnológicos estabelece
uma relação cordial com o constante avanço da tecnologia. Nesse
contexto, o docente deve caminhar, juntamente na sua formação
inicial e continuada, a aprender, pensar e agir na construção de
um presente e um futuro com mais criatividade, liberdade e res-
peito às diferenças. As novas tecnologias podem contribuir para

158
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

o desenvolvimento de tais características (FREIRE; GUIMARÃES,


2011; VALENTE, 1999).
As TIC’s, usadas no ensino, vêm provocando mudanças em
diversas atividades da vida educacional moderna, atualmente
as transformações ocorrem em ritmo acelerado, com a chegada
da Internet, de outros recursos e ferramentas tecnológicas, o
processo de ensino aprendizagem vem sofrendo uma grande
evolução. As inovações tecnológicas são responsáveis pelo sur-
gimento de novos provimentos digitais, que são classificados em
diferentes vertentes bem como e-mail, redes sociais, web blogs,
dentre outros. Isso levou ao início de estudos sobre as práticas
pedagógicas, permitindo a incorporação de novos paradigmas
educacionais e a evolução do conhecimento e das teorias sobre
os diferentes gêneros (FREIRE; GUIMARÃES, 2011; KENSKI,
1996; LEMOS, 2013; LEVY, 2008). A tecnologia passou a ser vista
como instrumento cotidiano, no qual se torna um mecanismo
de intercâmbio de informações transmitidas de forma contínua,
mostrando diferentes maneiras de adquirir conhecimento.
São diversas as formas de utilização dos provimentos digitais
na educação usadas em sala de aula, o que vai proporcionar tan-
tos aos professores como aos alunos uma troca de experiências,
motivação para aprender o manuseio de novas tecnologias e
publicação dos seus trabalhos (KENSKI, 2007, 2009). O trabalho
desenvolvido com o auxílio de meio digital é de suma importante
para o desenvolvimento e a ampliação da oferta de conhecimento
na ação docente com seus discentes. As tecnologias digitais são
responsáveis pelos novos rumos tomados na educação e é de
suma importância aprofundar essas teorias dentro do ensino
para que todos possam se envolver e interagir mutuamente.
Para Mirian (2011, p. 57):

O conceito educação tecnológica prende-se, evidente-


mente, aos conceitos específicos de sua expressão, mas

159
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

na sua interação e integração diz respeito à formação do


indivíduo para viver na era tecnológica, de uma forma
mais crítica e mais humana, ou à aquisição de conheci-
mentos necessários à formação profissional, tanto uma
formação geral como específica, assim como às questões
mais contextuais da tecnologia, envolvendo tanto a inven-
ção como a inovação tecnológica.

Diante do desafio de qualificar a educação, são várias as


iniciativas nas esferas das políticas públicas, que visam à for-
mação de professores. Segundo o Ministério da Educação (MEC)
(BRASIL, 2001), os currículos escolares devem desenvolver
competências de obtenção e utilização de informações por
meio do computador, sensibilizar os alunos para a presença de
novas tecnologias no cotidiano. Destarte, essa discussão não se
restringe a escola básica, mas já está em discussão sua inserção
nas Instituições de Ensino Superior (IES) (PRETTO, 2011).
Inevitavelmente, os graduandos dos cursos de Licenciatura
e os alunos da educação básica da contemporaneidade estão
conectados às mais diversas tecnologias, para as quais dedicam
muitas horas de seu dia. O professor que almeja contribuir para
o processo de ensino-aprendizagem da disciplina, para além das
aulas convencionais, pode compartilhar os avanços das TIC’s,
expressas nos mais diversos instrumentos, podendo tornar-se
uma excelente ferramenta didática. Assim sendo, o educador
passaria a atuar de maneira mais próxima à mediação (LEMOS,
2003; LOPES, 2005), não mais como um transmissor de informa-
ções e conhecimento, mas como um norteador de possibilidades
para sua construção.
A influência mútua é parte da interação do processo pedagó-
gico e pode incidir diversas formas, presencialmente ou não. As
mudanças ocorridas à chegada das TIC’s nos remetem a reflexões
sobre esta nova perspectiva de realidade de um mundo hiperco-
nectado. Antes as comunicações seguiam em limite horizontal

160
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

e linear no sentido de um todo, presentemente elas incidem no


sentido apenas de todos, em constante interação e participação,
em forma de rizoma (SILVA; CLARO, 2007).
Na atualidade, as formas de ensino e aprendizagem adqui-
rem outros modos de construção. Com as tecnologias educacio-
nais digitais, esse movimento pode se potencializar. Neste con-
texto, nosso modo de conhecer, ler e comunicar-se, encontra-se
o professor de Biologia e de Ciências, que se vê diante do desafio
de ensinar as competências e habilidades que dela requerem
discutir questões de inovação científica na área das ciências.
A mediação na utilização de diferentes ferramentas tec-
nológicas e pedagógicas para realização de práticas escolares
é um processo de ensino que tem mostrado que o trabalho
do professor tem importância igual ou possivelmente maior,
pois sua concretização busca chamar a atenção dos discentes,
despertando curiosidades a respeito de temas vistos em sala
ou temas interdisciplinares, promovendo a interação, visto que
não se restringe a uma série específica e sim a toda escola, neste
campo que o professor pode atuar para criar possibilidades de
aprendizagem, abandonando a posição de aluno-objeto para as-
sumir a de sujeito. Um sujeito que desenvolve sua autonomia ao
interagir, assumindo a construção de seu próprio conhecimento
e do grupo.
Essa construção do aprender significa “apropriar-se” do
mundo, adquirir um saber, mas o aprender pode virar mais amplo
na medida em que mantém relações com o meio (SILVA, 2015)
Nesse aprender que encontramos o saber tecnológico, no
qual é entendido como o saber que vai além do conhecimento
sobre as técnicas computacionais e do entendimento do por que
e como integrar os recursos tecnológicos digitais na sua prática
pedagógica, para o professor utilizá-los necessita ir além do co-
nhecer os recursos, Para integrá-los aos conteúdos trabalhados
em sala de aula, ele precisa também ter o domínio das múltiplas

161
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

linguagens que englobam as mídias digitais, por exemplo, o com-


putador congrega uma diversidade de mídias, sobretudo quando
está conectado à internet.
A tipificação designa, portanto, os conhecimentos elabora-
dos provenientes do processo de apropriação e de integração
técnica, pedagógica e das linguagens das mídias digitais presen-
tes na cultura digital. Refletir sobre os saberes docentes, frente
ao uso das tecnologias digitais na escola, permite compreender
que a prática docente é constituída por uma multiplicidade de
saberes, o qual não pode ser desconsiderado. (LOPES, 2011;
MIRIAN; ZIPPIN, 2005).
O duplo desafio para a educação é adaptar-se aos avanços
das tecnologias e orientar o caminho de todos para o domínio e
a apropriação crítica desses novos meios, como afirma Kenski
(2007, p.18). No mesmo sentido, (VALENTE, 1999) destaca que a
formação e a atuação crítica do professor diante do computador
exigem um conhecimento técnico e pedagógico. O domínio do
conhecimento técnico e pedagógico permite que o computador
não seja usado nas escolas como uma máquina de instrução
programada, mas como uma tecnologia que permite o acesso
ao mundo virtual e amplia o processo de pesquisa e de acesso
à informação.
Diante das novas demandas da sociedade, o papel do profes-
sor atual está se modificando, sua identidade profissional está
em constante reconstrução, assim como seus saberes (KENSKI,
2007). Ao interagir com as tecnologias e mídias digitais na edu-
cação, o professor vai elaborando um conhecimento tecnológico
que sinaliza o diálogo com a cultura digital. Propõe-se, a seguir,
neste trabalho, uma reflexão, sob a ótica da formação dos futuros
professores, juntamente, com as tecnologias que sempre estive-
ram presentes na história da humanidade, desde o surgimento
das primeiras sociedades até as mais complexas, de maneira
que a história humana não pode ser contada sem que se leve

162
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

em consideração o desenvolvimento científico e tecnológico


que influenciam profundas mudanças na cultura e, nos tempos
contemporâneos.
Citamos a Cibercultura, um fenômeno global de mudanças
socioculturais complexas, de novas formas de relação social.
Para Lemos (2003, p. 12), a Cibercultura pode ser definida como:

A Cibercultura é a cultura contemporânea marcada pelas


tecnologias digitais. Vivemos já a Cibercultura. Ela não
é o futuro que vai chegar, mas o nosso presente (home-
banking, cartões inteligentes, celulares, palms, pages,
voto eletrônico, imposto de renda via rede, entre outros).

O desafio que a Cibercultura coloca é o paradoxo entre as


potencialidades e as dificuldades para o uso desses recursos
tecnológicos digitais, principalmente, no interior das escolas. Os
professores estão diante de um cenário desafiador referente à
aprendizagem, ao conhecimento e à docência, pois não se trata
apenas de uma evolução tecnológica acelerada, mas de quebras
de paradigmas (SIQUEIRA, 2008).
A esse respeito, Marcelo (2009, p. 9) mostra que, para ser
um docente nesse século, é necessário:

Assumir que o conhecimento e os alunos (as matérias


primas com que trabalham) se transformam a uma ve-
locidade maior à que estávamos habituados e que, para
se continuar a dar uma resposta adequada ao direito
de aprender dos alunos, teremos de fazer um esforço
redobrado para continuar a aprender.

O professor mediador tem um papel social importante, pois


é ele quem vai criar estratégias didático-pedagógicas que propi-
ciem a participação, o diálogo, a exploração, a troca e a reflexão

163
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

entre alunos e os professores, contribuindo para apropriação


do conhecimento da inovação científica e tecnológica. Segundo
Lopes (2005, p. 34) as tecnologias “exigirão a elaboração de uma
nova abordagem teórica, centrada na valorização do conheci-
mento que signifique aprender a buscar o saber’.
As tecnologias, mídias digitais e suas linguagens específicas
precisam ser compreendidas e apreendidas pelos professores no co-
tidiano da escola. É preciso identificar como acontece o processo de
apropriação, integração e uso das tecnologias digitais por parte do
professor em sala de aula. Compreender o processo de apropriação/
integração/utilização das tecnologias é uma tarefa difícil. Essa tríade
(apropriação/integração/utilização) é impossível de ser concebida
de forma disjuntiva, por um pensamento redutor (MORIN, 2001).
Esse processo de apropriação, integração, utilização das tecnologias
estão articulados, interligados, inter-relacionadas da mesma forma
que acontece com a identidade docente.
Kenski (2007) ressalta que as tecnologias educativas devem
ser bem compreendidas e incorporadas pedagogicamente para
provocar transformações nos processos educativos. E para que
ocorra a apropriação de novos recursos tecnológicos digitais,
Kenski (2009, p. 48) observa que é preciso que o profissional
tenha tempo e oportunidades de familiarização com as novas
tecnologias educativas, suas possibilidades e seus limites, para
assim poder integrá-la à sua prática.
É preciso que o professor tenha também compreensão da
lógica que permeia a movimentação entre os saberes no atual
estágio da sociedade tecnológica. A compreensão dessa lógica
que permeia a sociedade exige do professor um pensar mais
abrangente, multidimensional, complexo e contextualizado,
pois, como afirma Pretto (2011), no campo das tecnologias da
informação e comunicação, torna-se necessário intensificar a
apropriação das TIC’s enquanto elementos de cultura, e não
apenas como aparatos tecnológicos.

164
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

É no contexto do ensino que se pode abrir espaço para o


diálogo e para a intervenção por parte dos discentes e docentes,
analisa-se que um dos espaços principais para discussão, diálogo
e aprendizagem sobre as tecnologias digitais é a formação inicial.
Por esse motivo, a formação docente aqui apresentada se torna
pertinente. Na formação docente é possível explorar e pesquisar
o uso das tecnologias digitais na escola e nas IES. A mudança e
inovação percorrem os espaços escolares e as práticas discursi-
vas na formação docente seja ela inicial ou continuada.
Relatos de estudantes norteiam-se para a necessidade de
mudanças na escola, com a inserção das tecnologias digitais, e de
reestruturar as metodologias de ensino – ainda muito enraizadas
em práticas pedagógicas tradicionais –, possibilitando a oferta
de conteúdos mais interativos (SILVA, 2015). Pois, com a vinda
da internet, é possível em poucos segundos se conectar com
diferentes sujeitos em qualquer lugar do mundo. É só “clicar”,
o acesso à informação está na palma das suas mãos. Em meio a
essas realidades tecnológicas disponíveis nos tempos atuais, é
possível ouvir alguns questionamentos sobre a real necessidade
de existirem professores, uma vez que um sítio eletrônico é capaz
de responder os questionamentos dos estudantes. No entanto,
apesar das facilidades tecnológicas, o papel do professor é indis-
pensável, pois cabe a ele a função de mediar as relações entre o
acesso a informações e a construção do conhecimento.
Portanto, a ação de ensinar e aprender assume hoje uma
nova forma capaz de dialogar e horizontalizar as relações entre
alunos e professores em busca de uma aprendizagem significativa
e sem imposição de verdades, uma vez que ambos são agentes
construtores de conhecimentos. Porém, para que estudantes e
professores possam se apropriar dessas ferramentas é funda-
mental que se rompa a barreira da simples instrumentalização
e que as tecnologias se tornem como objeto de estudo de forma
crítica. O uso concomitante destes recursos, buscando suprir
as necessidades dos sujeitos e contemplar suas variações. Isso

165
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

significa que “novas” e “velhas” tecnologias podem ser usadas


simultaneamente pelo mesmo usuário, de modo que não haja
uma ruptura entre elas. Incluir tecnologias no contexto escolar,
não significa, portanto, deixar de utilizar os materiais didáticos
e demais recursos que fundamentam a prática docente e, sim,
conviver com os tradicionais cadernos, livros, mapas e demais
materiais, ao passo que se ampliam as possibilidades de apren-
dizagem com a inserção de novos recursos.
São evidentes os benefícios que o avanço tecnológico pode
proporcionar à prática educativa, porém, incorporar e fazer uso
das Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTIC’s)
na educação e, especificamente no contexto escolar, é uma tarefa
complexa, que demanda a organização de todos os sujeitos en-
volvidos. Para que o processo de mudança não se atenha apenas
ao espaço físico da sala de aula, é necessário que seja mais que
uma demanda pedagógica, que compreenda uma ação política,
administrativa e cultural. Portanto, a tarefa de desenvolver uma
cultura que incorpore as TIC´s às práticas escolares, não é incum-
bência única do professor.
O uso das NTIC’s na educação exige competências muito
específicas, principalmente no que se refere ao domínio das ques-
tões técnicas que envolvem esse processo, tornando fundamental
uma formação capaz de acompanhar estas necessidades. Cabe
aos professores e pedagogos dialogar com os saberes técnicos
e pedagógicos para que a aprendizagem ocorra de forma signi-
ficativa (SILVA, 2015).
Visando constituir uma relação harmônica entre a escola
e este mundo em constante transformação, se faz necessário
buscar ferramentas que favoreçam o processo de ensino-apren-
dizagem e solidifiquem uma prática educativa libertadora, que
compreenda o aluno como protagonista deste processo. Nesse
sentido, as TIC’s são um excelente recurso, pois a sua utilização
consciente permite ao professor potencializar o desenvolvimento

166
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

da criatividade, do espírito crítico e da pesquisa, facilitando o


entendimento dos conteúdos escolares e favorecendo a apren-
dizagem. O uso das TIC’s, de forma consciente e integrada, pos-
sibilita aos estudantes, a partir da pesquisa, selecionar assuntos
diversos segundo seus interesses, ampliando os olhares de um
mesmo conteúdo – processo fundamental na emancipação dos
sujeitos e a formação de um cidadão crítico e reflexivo.
Se utilizadas de modo significativo, as tecnologias possibili-
tam o enriquecimento das aulas, tendo o professor, a disponibili-
dade de trabalhar com uma grande gama de materiais, dentre eles
multimídias e informações atualizadas. Estes recursos permitem
elucidar a explicação de conteúdos de difícil compreensão, possi-
bilitando uma aprendizagem de maneira concreta e satisfatória.

Considerações Finais

O ensino na atualidade se depara com uma nova realida-


de da sociedade. Com base no que foi apresentado, é possível
entender a inserção das tecnologias educacionais no processo
de ensino-aprendizagem na formação docente como recursos
de ensino que atuam positivamente no estímulo e reforço da
aprendizagem. A utilização desses recursos em sala de aula, pelo
professor formador, é uma forma de instrumentalizar o aluno,
favorecendo seu processo de assimilação e desenvolvimento
cognitivo por meio de uma adaptação à sua própria realidade,
ou seja, a sociedade da informação. A apreensão da complexi-
dade dessa realidade torna-se uma tarefa árdua, especialmente
levando em consideração as rápidas transformações das diversas
instâncias sociais. No cenário escolar não poderia ser diferente.
Os problemas de infraestrutura, remuneração do corpo docente
e falta de qualificação profissional fazem com que, a cada dia, o
interesse dos alunos pelas aulas tradicionais pautadas apenas a
uma lousa, pincel e explicação do professor esteja cada vez mais
baixo. Para reverter esse quadro é preciso difundir, expandir as

167
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

novas tecnologias disponíveis, para aplicar como recursos que


dinamizam e tornam mais interessantes as aulas, sobretudo as
aulas de ciências e biologia. As tecnologias estão vinculadas nos
padrões da informação e comunicação, depositando importância
nos aspectos visuais da realidade. As imagens, em substituição
à escrita, parecem assumir o papel de protagonista desta peça.
É preciso usufruí-las nas concepções teóricas que envolvem o
uso das tecnologias, a fim de informar e orientar os discentes
na utilização dessas ferramentas distintas, com isso a instituição
de ensino pode tornar-se um local agradável, de transmissão de
conhecimento, ou seja, que docente em sua formação inicial ou
continuada desempenhe seu importante papel social perante a
comunidade que ao utilizarem-nas mostram aos seus alunos, aos
colegas e aos futuros professores que é possível e muito eficaz
ensinar os conteúdos tendo as tecnologias como aliadas.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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169
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A TIPIFICAÇÃO DO RACIOCÍNIO MATEMÁTICO EM


PEDAGOGOS: IDEIAS PARA UMA NOVA VISÃO SOBRE A
FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Antonio Marcelo Araújo Bezerra1

Introdução

Este artigo trata especificamente da relação entre os tipos


de raciocínios matemáticos já classificados por Johannot (1947)
e as possíveis mudanças que estes conhecimentos podem trazer
à percepção sobre a formação de professores. Tal ação busca
destacar as particularidades sobre o raciocínio matemático
diante da categorização feita por Johannot (1947) em que se
manifestam por quatro tipos, a saber, os raciocínios concreto,
gráfico, aritmético e algébrico.
De forma resumida, o entendimento sobre estes raciocínios
se dão na seguinte forma: em se tratando do raciocínio concreto,
este utiliza ou necessita de elementos manipuláveis para operar;
já no gráfico há uma forte representação em suas manifestações
feitas por desenhos e/ou gráficos; o aritmético já permite utilizar
de números e operações; e o algébrico por conseguir associar
números a diferentes outras formas de símbolos. Ou seja, o con-
creto seria o mais elementar dos raciocínios, o gráfico se destaca
por ter um forte apelo à questão visual, o aritmético já permite
generalizações por meio de um sistema abstrato-numérico e o
algébrico permite o uso de simbolismos (BARRETO, 2001).
1 Universidade Federal do Ceará, marcelo@multimeios.ufc.br

171
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Nas ações voltadas à formação de professores, a visão que o


pedagogo assume diante das práticas do professor que ensina mate-
mática envolve a necessária compreensão, na menor das instâncias,
da forma como os seus alunos manifestam suas estratégias diante
de problemas matemáticos e como utiliza destes conhecimentos
na melhoria da sua atuação. Mesmo sendo um conhecimento im-
prescindível ao planejamento do professor, ainda há situações e
estratégias utilizadas na sala de aula que não consideram a contento
o tipo e a manifestação destes tipos de raciocínios.
Diante do conhecimento destes raciocínios e suas tipifica-
ções, seria possível que o professor desenvolvesse uma variedade
maior de estratégias levando assim à formação de raciocínios
algébricos mais gerais? Bem como, ao compreender como os ra-
ciocínios matemáticos se manifestam na resolução de problemas
matemáticos, como esse conhecimento pode contribuir com a
sua formação como pedagogos?
De fato a formação do professor que ensina matemática
envolve a compreensão de várias competências que vão além
das especificidades da formação e a transposição didática, mas
também os conhecimentos em educação e o domínio tecnológi-
co (BORGES e OLIVEIRA, 2002). Desta forma, para a formação
do pedagogo os cursos de formação precisam ser melhorados
principalmente no que compete à composição do currículo Curi
(2005), pois muitas das ideias conceituais sobre o saber perma-
necem equivocadas pelos pedagogos (SANTOS, 2015).
Ou seja, o pedagogo precisa estar constantemente modifi-
cando e criando uma nova concepção epistemológica quanto à
sua prática, não descuidando do olhar sobre a percepção que
os alunos possuem ao responderem determinado problema por
meio de raciocínios que, se bem observados, possuem uma rede
comum de particularidades.
Desta forma, mesmo que a ação do professor seja alicerçada
nestas competências e saberes, o entendimento sobre a mani-

172
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

festação dos raciocínios matemáticos poderiam ser mais bem


aproveitados quando o professor passasse a buscar entendê-los.
Com isto, tanto haveria uma contribuição para um melhor ensino,
bem como uma formação do professor com maior qualidade.

Resultado e Discussão

Numa definição mais generalista, a compreensão do raciocí-


nio matemático, inicialmente colocado por Russel (1999), expõe
que nós o usamos para pensar sobre as propriedades de um
determinado objeto matemático, desenvolvendo generalizações
que se apliquem a toda classe de objetos. Enquanto que Johan-
not, de forma mais superficial, define-o como “o raciocínio que
intervém durante a resolução de problemas matemáticos que faz
chamada a um simbolismo aritmético e algébrico” (JOHANNOT,
1947, p. 25, tradução nossa).
Johannot, ao realizar uma pesquisa sobre o raciocínio
matemático em adolescentes, toma como referência o estágio
operatório formal de Piaget na intenção de classificar o nível
de desenvolvimento do raciocínio matemático em quatro tipos:
o concreto, o gráfico, o aritmético e o algébrico. De forma mais
detalhada o autor os classifica como:

[...] classes de respostas corretas em quatro estágios


fundamentais correspondentes aos quatro estágios do
raciocínio matemático. Estes estágios variando assim:
Etapa I: Respostas corretas a um nível concreto único,
até os 13 anos.
Etapa II: Respostas corretas a um plano de representação
gráfica, de 12 a 14 anos.
Etapa III: Respostas corretas a um plano intuitivo ou
formal aritmético, de 13 a 17 anos.
Etapa IV: Respostas corretas a um plano algébrico de 17
anos apenas. (JOHANNOT, 1947, p. 51).

173
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

O raciocínio concreto é o primeiro e mais elementar dos


raciocínios classificados por Johannot (1947). Sua operaciona-
lidade básica repousa no uso de elementos concretos, ou seja,
”o raciocínio concreto só pode ser efetuado em suas quantida-
des concretas, isto é, perceptíveis e manipuláveis” (JOHANNOT,
1947, p. 32).
No raciocínio gráfico “o desenho constitui o ponto de vista
psicológico e intermediário entre o corpo material e a palavra, é
um dos primeiros signos da realidade” (JOHANNOT, 1947, p. 34).
Para o autor, o desenho é um dos elementos de transição entre
o concreto e o simbólico, ou seja, como no concreto o sujeito
apenas compreende o significado dos valores iniciais e finais, no
raciocínio gráfico este intensifica a abstração levando o sujeito a
um patamar mais próximo da representação por símbolos.
No terceiro tipo de raciocínio abordado por Johannot (1947),
quando o sujeito passa a usar um modelo numérico abstrato em
substituição à necessidade de manipular ou ver as quantidades
que ele opera, toma forma um pensamento mais elaborado que
os anteriores (concreto e o gráfico), surgindo, então, o do tipo
aritmético. Para Johannot (1947) esse tipo de raciocínio pode
ser dividido em dois tipos: o primeiro, em que a solução do pro-
blema é apresentada por um exemplo numérico e o outro, uma
generalização a partir do raciocínio lógico, mas sem recorrer ao
dispositivo algébrico.
Quanto ao raciocínio algébrico, o aluno se desassociará
totalmente da realidade, pois será mais contundente o uso de
elementos abstratos “no momento onde os sujeitos percebem
que uma expressão algébrica é apenas a tradução em uma lin-
guagem simbólica de operações do dia a dia” (JOHANNOT, 1947,
p. 51). Não diferente dos raciocínios anteriores, há vantagens e
desvantagens na execução do raciocínio algébrico, pois os aspec-
tos positivos residem no fato de se seguirem as transformações
consecutivas dos dados na ordem lógica, permitindo com que se

174
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

alcance a resposta correta. Já nas desvantagens, uma parte dos


cálculos operados mentalmente “necessita de uma grande con-
centração e muitas vezes impedem de discernir as semelhanças
entre problemas do mesmo tipo”, bem como “as obrigações de
ter em conta as transformações intermediárias” (JOHANNOT,
1947, p.50).
Podemos então tomar como exemplo um pedagogo que
pretenda ensinar um determinado conteúdo matemático e se
depara com um aluno ou grupo de alunos expondo em suas
estratégias um dos tipos de raciocínios já detalhados, é perfei-
tamente possível que de imediato suas reflexões girem em torno
de quais estratégias poderiam ser desenvolvidas na certeza que
novas situações atendessem a estas formas de raciocínio levando
à mudança para raciocínios mais elaborados (BEZERRA, 2017).
Embora sendo uma ação inerente a sua prática, ou seja, o ato
de refletir sobre o que de melhor pode planejar e executar, isto
perfeitamente aperfeiçoará sua prática de formação, pois não se
trata de apenas mais segurança no processo de mediação com os
alunos, mas um grande passo e sua melhoria como profissional.
No processo de compreensão destes estágios, as aquisições
anteriores ocupam a posição de um patamar necessário para as
aquisições subsequentes que ocorrem na forma de equilibra-
ções sucessivas entre os mecanismos adaptativos do indivíduo
expressados pela assimilação e acomodação (JOHANNOT apud
BORGES, 1999). Esta definição sustenta o argumento que o
sujeito reelabora suas ideias. tendo como referências conceitos
anteriormente já elaborados, ideias estas que futuramente pas-
sarão por um novo processo de melhoria.
Como resultado da categorização destes raciocínios, é
possível que o pedagogo de posse desse conhecimento passe
a compreender as múltiplas formas sobre como planejar e
mediar suas ações frente aos alunos. Essa posição toma maior
importância quando se trata de pedagogos, pois já tomam como

175
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

condição importante o conhecimento sobre esses raciocínios em


seu processo de formação.
Convém destacar que o sujeito, quando não consegue domi-
nar ou compreender um estágio complexo para si, suas estruturas
de raciocínio atuais buscam nas estruturas anteriormente já as-
similadas um ponto de equilibração e uma resposta (JOHANNOT,
1947). Somente com novas e mais adequadas desequilibrações
ele poderá construir e acomodar novos conhecimentos. Ou
seja, a capacidade de raciocínio matemático não se desenvolve
por memorização de conceitos e procedimentos apenas, mas
na imersão que se dá diante de variados problemas em que o
pedagogo reconstrói conceitos já compreendidos.
Desta forma, a elaboração de estratégias por parte dos peda-
gogos remete ao professor formador a tarefa de constantemente
estar submetendo-os a problemas imersos em várias situações
tendo em vista a construção de novos conhecimentos matemáti-
cos, Bezerra (2017), pois a maneira como o pedagogo irá tratar
com seus alunos envolve saber se “os alunos serão capazes de
recorrer a várias representações, para que as conversões entre
elas se tornem mais simples, desenvolvendo uma maior compre-
ensão dos objetos e conceitos matemáticos, e uma maior riqueza
de significações” (PONTE, MATA-PEREIRA e HENRIQUES, 2012,
p. 375).
É exatamente num espaço de melhores significações ao
aluno que o professor necessita compreender antecipadamen-
te como o raciocínio matemático pode se manifestar, para que
assim sua capacidade na elaboração e aplicação de situações
mais significativas seja exitosa, pois, na condição de professores,
é preciso que:

[...] conheçam os processos de raciocínio dos seus alunos


e reflitam sobre eles. Se esta análise revelar lacunas,
mesmo de aqueles que mostram bom desempenho, será

176
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

necessário modificá-las para que os alunos sejam mais


críticos e desenvolvam a Matemática com compreensão.
Tudo isto requer, certamente, um trabalho específico no
âmbito do desenvolvimento curricular e das práticas
profissionais na sala de aula (PONTE, MATA-PEREIRA e
HENRIQUES, 2012, p. 375).

Aliado ao entendimento sobre os diferentes raciocínios


matemáticos, a compreensão do professor “diante da necessi-
dade de reorganizar suas ações, o faz por meios de apropriações
coletivas” Moretti (2007, p. 177), isto revela que o professor
modifica suas percepções e ideias diante do desafio de melhor
‘transpor’ didaticamente os conteúdos matemáticos. Este impor-
tante elemento adquire maior relevância quando aliado a uma
metodologia que agregue: o conhecimento sobre como os alunos
expõem suas ideias, a mediação correta do professor e um bom
planejamento, ambas sempre direcionadas a aprendizagens mais
significativas dos alunos (BEZERRA, 2017).
Desta forma, isto remete a outros trabalhos que enfatizem o
fazer didático do professor agregando constantemente ao estudo
sobre os raciocínios matemáticos outros elementos que também
necessitam de destaque, no caso, o planejamento, a mediação e
diferentes instrumentos de avaliação.

Considerações finais

Ao saber das características que envolvem o raciocínio mate-


mático, qualquer iniciativa didática a ser tomada pelo professor,
caso não tenha um bom instrumento didático-metodológico,
não atuará a contento em seu planejamento e, possivelmente,
aprendizagens não ocorrerão. Contudo, a compreensão sobre
estes conhecimentos por parte do professor já remetem a uma
nova visão quanto à forma de abordar um determinado conteúdo
matemático.

177
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

O uso do conhecimento sobre os raciocínios matemáticos


na formação do pedagogo para o ensino de matemática, além
de expor suas dificuldades e percepções diante de problemas
matemáticos relacionados à forma como foram ensinados, passa
a oferecer melhores instrumentos de mediação para o ensino a
posteriori, ou seja, o professor de matemática já tendo trabalha-
do estas particularidades muito mais preparado estará quando
submeter-se a ensinar uma turma da Educação Básica em que,
sem dúvida, os raciocínios matemáticos serão abordados impli-
citamente em várias situações matemáticas.
Desta forma, é perfeitamente possível que um trabalho pio-
neiro seja desenvolvido quanto ao entendimento destes raciocí-
nios matemáticos à luz das práticas usuais do fazer pedagógico,
seja no planejamento, no uso de metodologias de ensino ou nos
processos de avaliação.
Contudo, saber unicamente como se apresenta esses raciocí-
nios não necessariamente garanta bons resultados ao professor,
pois concomitante a esta ação “a reflexão sobre o trabalho e o
exercício da avaliação são elementos centrais para o aperfeiço-
amento e a inovação” (NOVOA, 2009, p. 30). Isto revela que há
ainda muito a ser discutido e aprimorado no campo das práticas
do ser professor, mas um primeiro e significante passo é dado
pelo pedagogo ao estar ciente sobre as diferentes formas que
o raciocínio matemático pode assumir diante de um problema
matemático.

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Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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RUSSEL, S. Mathematical reasoning in the elementary grades. In: STIFF,
L. V.; CURCIO, F. R. (Eds.). Developing mathematical reasoning in grades
K-12. Reston: NCTM, 1999. p. 1-12.
SANTOS, Maria José Costa dos. A formação do pedagogo para o ensino
de matemática nos anos iniciais do ensino fundamental: reflexões
dedutivas e epistemológicas. IN: CIAEM, 14, 2015.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

CONVERSA COM O PROF. DR. HERMÍNIO BORGES NETO:


DO SEU PERCURSO ACADÊMICO E PROFISSIONAL À
IDEALIZAÇÃO DA SEQUÊNCIA FEDATHI

Fernanda Cíntia Costa Matos1


Maria José Costa dos Santos2

Introdução

O presente texto é fruto de uma conversa de natureza educa-


cional realizada com o Professor Dr. Hermínio Borges Neto, que é
professor idealizador da metodologia Sequência Fedathi (SF). A
conversa teve, como foco principal, conhecer e contextualizar como
se deu o processo de idealização e desenvolvimento da SF, metodo-
logia estudada principalmente pelos pesquisadores do estado do
Ceará e de outros estados do Brasil. A entrevista realizada pela dou-
toranda em Educação da Universidade Federal do Ceará, Fernanda
Cíntia Costa Matos, tem como finalidade atualizar os estudos sobre
a metodologia, assim como aprofundá-la em bases internacionais.

Para início de conversa...

O Professor Dr. Hermínio Borges Neto é brasileiro, nascido


na cidade de Fortaleza-Ceará. Graduado no curso de bacharela-
do em Matemática. Concluiu o doutorado em Matemática pela

1 Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do


Ceará(UFC)
2 Pós-doutora em Educação.(PropEd/UERJ) e doutora na área de Educação Matemática .Pro-
fessora Adjunta da Universidade Federal do Ceará(UFC/FACED)

181
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Associação Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada


(IMPA) em 1979. Atualmente é Professor Titular da Universidade
Federal do Ceará. Pesquisador e orientador nas áreas de Mate-
mática e Tecnologias da Educação. Idealizador da metodologia
Sequência Fedathi (SF), que possui seu foco centrado na postura
do professor, entendendo que o mesmo é peça fundamental nos
apontamentos em sala de aula. A SF é uma metodologia que se
preocupa com o antes, durante e depois de uma aula, configurada
em etapas a priori (plateau) e a posteriori (tomada de posição,
maturação, solução e prova) as etapas a posteriori podem acon-
tecer de forma linear ou não.

A entrevista

Professor Hermínio Borges Neto, primeiramente agradecemos


sua disponibilidade, em estar nesse momento conosco falando um
pouco da sua trajetória profissional, enfatizando principalmente
a metodologia Sequência Fedathi, pensada e idealizada pelo se-
nhor e concretizada com o apoio de profissionais da educação.
Inicialmente gostaríamos que contasse um pouco do seu percurso
acadêmico e profissional, destacando as principais linhas teóricas
as quais considera que contribuíram e influenciaram a sua forma-
ção e como foi se constituindo seu interesse pela educação e como
estes lhe influenciaram a pensar a SF.
Como sabem, eu sou matemático de formação e de carreira,
na formação de matemática existem várias correntes de forma-
ção: a americana, que é muito formalista, muito especializada; na
Europa, temos a corrente russa e francesa. A corrente francesa
vem desde a época em que Napoleão montou a escola técnica na
França para formar engenheiros e, na verdade, formava matemá-
ticos, e formava esses matemáticos com a concepção de serem en-
genheiros, com o intuito de aplicar o conhecimento matemático
com alguns reativos, isso que não é o caso da formação americana.
A formação americana é bem especializada, pois eles necessitam

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

de pessoas com essa especialização, é a história da matemática


moderna, desde cedo, trabalhar a matemática desde cedo o quan-
to tempo antes, para que as pessoas se tornem, em menor tempo
possível, formadas em matemática, hoje encontramos pessoas
com 20, 30 anos já formadas e alguns até com doutorado. Então,
o que aconteceu comigo, eu entrei na graduação em matemática,
na época era o instituto matemático, ligado ao instituto básico
da UFC, nessa época tinha uma intercâmbio muito forte entre o
nosso instituto com as escolas básicas europeias, em especial
as francesas, o nosso forte era uma integração com as escolas
francesas de matemática, tempos depois foi que os estudantes
saíam para fazer doutorado fora, no mercado americano, e isso
mudou a orientação que era dada aos institutos. Os convênios
foram sendo feitos em sua maioria com as escolas americanas do
que as europeias, mas eu tive a sorte de ter o convênio que tinha
muitos franceses trabalhando no instituto, e também americanos,
então eu peguei o período da mistura, então os meus dois anos
essencialmente com professores brasileiros e franceses, assim eu
pude sentir como se podia trabalhar a matemática com os france-
ses que tinham a forma de trabalhar da seguinte maneira, que é
focar o problema, que é o que ninguém está fazendo atualmente,
e sim trabalha-se a disciplina, e como trabalhávamos era discutir
problemas de matemática, arguição forte, tinha corrente que che-
gava na arguição e te dava um problema que eles entendiam que
a gente tinha condições de resolver, (que corresponde o platêau
da sequência fedathi), mas tinham dificuldades agregadas que
era preciso, a partir da base de conhecimentos (isso é o platêau),
poder desenvolver e resolver, e isso é o que estamos fazendo
no momento. Para você ter uma ideia, o currículo do curso de
matemática não tinha cálculo, álgebra linear, análise, o que tinha
era quatro disciplinas de matemática um, dois, três e quatro.
Na matemática se estudavam todas as matemáticas integradas,
assim como hoje é feito: cálculo um, calculo dois, todas em uma
disciplina só e integradas, então assim se podia discutir, como

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

uma determinada técnica de conhecimentos podia ser utilizada


em outras áreas, isso é o que chamamos na SF de transposição
didática, que é aquela habilidade que você tem de saber utili-
zar um conteúdo em outra área e em outro contexto diferente
podendo migrar as ferramenta que você tinha dominado. Então
essa é a escola francesa que dominava, os franceses são menos
especialistas do que os americanos, especialistas no sentido da
medicina, onde cada um tem a sua área: urologista, ginecologista
e outros. E se você é especialista em uma coisa não entende da
outra. Isso eu justifico, para que mais na frente se entenda, pois
quando fui estudar no Instituto de Matemática Pura e Aplicada
(IMPA) eu me formei dentro da lógica especialista, pois o IMPA
tinha modelo de formação americano, mas o meu grupo de orien-
tação de professores no IMPA tinham formação alemã e francesas,
então tive privilégio de não deixar de ter a formação americana
“específica”, mas também não deixei de ter uma formação mais
abrangente como a francesa e alemã, e foi assim que eu tive
abertura para trabalhar outras áreas da matemática e não fica
em uma específica só. No departamento de matemática da UFC
eu fui uma das primeiras a trabalhar a matemática com o compu-
tador. Nos anos oitenta fui chefe de departamento da matemática
da UFC durante quatro anos e na época nós estávamos com um
problema muito grande com relação ao ensino. Minha primeira
ação, pensando em reverter esse quadro, foi quando eu indiquei
a um grupo de professores do departamento de matemática
que não tinham mestrado e doutorado, que deveriam ir fazer
a pós-graduação stricto-senso na educação, pois entendia que
aqueles professores deveriam entender mais de ensino. Então
entrei em contato com o pessoal da educação para que fizessem
uma seleção interna com esses professores, pois, naquele mo-
mento em que a matemática estava sendo trabalhada de forma
muito técnica, se esses professores fossem fazer uma prova de
educação, por exemplo de LDB 9.394/96, não iriam atingir o
perfil. Então, o pessoal da educação concordaram e fizeram uma

184
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

seleção interna e um grupo de cinco professores terminaram seus


mestrados e doutorados na educação. A partir daí, analisamos
que os resultados melhoraram e identificamos que basicamente
o problema estava na formação de professores, e desse modo
esses fatores foram os que influenciaram um pouco mais tarde
a minha vinda para a educação.
Com tantas teorias e metodologias na área da educação, nós
poderíamos compreender que a SF surge como alternativa a essas
teorias e metodologias? Qual a base ou bases teóricas e epistemo-
lógicas dão suporte a SF?
Inicialmente a SF foi concebida sem base nenhuma de educa-
dores, inclusive Paulo Freire, que é um fundamentador da SF, eu
só vim conhecê-lo e suas leituras quando estava na França. Todos
esses teóricos da educação eu não conhecia nenhum, isso porque
a ideia inicial da SF era que quem poderia pensar a matemática
era o matemático, pois entendíamos que o problema de aprender
matemática estava na forma de se transmitir esse conhecimen-
to, e dessa forma passamos a entender que a melhor forma de
aprendizagem para o aluno era fazê-lo comportar-se como um
matemático, dentro da lógica do pesquisador, da experimentação
até achar a solução, portanto é nesse viés que a SF definiu suas
etapas. No curso de pedagogia da Faculdade de Educação da
UFC, também havia a preocupação com a disciplina Ensino de
Matemática, em se trabalhar não somente dentro da lógica do
conhecimento das teorias e metodologia da educação, mas tam-
bém por professores que soubessem matemática e quando eu me
transferi para a educação, entrei para o curso de pedagogia com
essa lógica. Na ocasião, a profa Ana Iorio era coordenadora e me
ajudou a criar a disciplina tópicos de matemática (que possui sua
ementa aberta), que foi pensada em se trabalhar dentro do mo-
delo francês, de forma macro, mais abrangente do conhecimento.
Em algumas turmas às quais ofertamos a disciplina, trabalhamos
dentro da lógica de problematizar, fazer com o aluno busque a
solução do problema, era a tentativa e erro, e isso caracteriza

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

a Sequência Fedathi. Em sequência, nós montamos um grupo


de estudos em que discutíamos essas relações entre teoria e
aprendizagem voltadas ao Ensino de Matemática. Nessa época a
profa. Ana Iorio foi convidada pelo Governo do Estado para dar
formação de professores, era uma época em que o construtivismo
estava com muita força, então o nosso grupo foi escolhido para
dar essas formações e daí oficializamos o grupo Fedathi.
O grupo Fedathi era caracterizado por ter integrantes que
eram envolvidos profundamente com a matemática e integrantes
que tinham conhecimentos das teorias pedagógicas, como é o
exemplo da professora Ana Iorio, e o grupo foi um sucesso du-
rante um bom período, mas deixou de avançar mais por questões
políticas e financeiras. Então a SF não caiu do céu, ela foi fruto de
experimentação, porém, no início, não conseguimos enxergar os
teóricos que estavam lá, então somente depois pudemos fazer
isso e fomos sofisticando mais a metodologia.
Analisando a visão instrumental da educação, com vistas à
superação do ensino centrado no aluno, o senhor considera que
o foco da SF está centrado no trabalho em sala de aula? Como o
senhor compreende essa centralidade? Quais são as fundamenta-
ções teóricas que a SF considera necessárias para essa superação?
Qual a visão de educação que a SF sustenta?
Normalmente o que eu vejo em todas as teorias e metodo-
logias é uma preocupação mais acentuada no aluno, claro que o
aluno é o cliente e como cliente é o principal produto. Falo “clien-
te”, não no sentido mercadológico, mas no sentido de “ser o foco”,
porém a SF tem uma forma diferente de pensar, pois estamos
mais direcionadas ao ensino, ao comportamento do professor em
sala de aula, pois é daí que vamos obter os reflexos dos alunos.
Professor, a realidade de nossa sala de aula é marcada por um
desnivelamento muito acentuado de nossos alunos, como o senhor
percebe a viabilidade da SF dentro dessa realidade? Como o senhor
entende o conceito de saber, conhecimento, ensino e aprendizagem

186
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

e como eles se relacionam nessa posição teórica? Na SF quais são


os conceitos chaves?
A sala de aula atual tem um modelo totalmente fora da nossa
realidade, isso é verdade, no sentido de repositório de conteúdo
com prazos pré-definidos. Porém, penso que não podemos deixar
de trabalhar os conteúdos básicos de forma calma, que seja bem
maturado pelo aluno, pois o aluno de posse dessa base conseguirá
avançar em outros conhecimentos. Os professores precisam ser
autônomos em decidir o que devem fazer em sua sala de aula e
quebrar regimentos que não levam ao um avanço da educação
e sim um retrocesso.

Considerações finais

A Sequência Fedathi, além de ser uma metodologia de ensino


e formativa, também auxilia o professor no processo da apren-
dizagem do aluno, porém não no sentido de transmitir, mas sim
de envolver o aluno em um espiral de questionamentos para
que esse seja tomado de reflexões críticas, e é por meio dessa
ação que se constrói o conhecimento, como reconhece Radford
(2017) que “conhecimento é a atualização e materialização do
saber” (RADFORD, 2017, p.107, tradução nossa).
Sobre as informações, por meio da entrevista, foram re-
levantes para nos fazerconhecer melhor a origem de como foi
pensada essa metodologia, e assim, nos possibilitou entender
qual postura o professor deve assumir frente aos obstáculos
de sala de aula, não somente para o ensino de matemática, mas
também em qualquer disciplina, como também qualquer situação
que remeta à educação escolar.
Como ressaltou o professor Dr. Hermínio Borges Neto, a
metodologia foi pensada inicialmente para o Ensino de Matemá-
tica, porém como é uma metodologia em constante plasticidade,
docentes de outras áreas, juntaram-se ao grupo, e foi possível a

187
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

condução de saberes e novas possibilidades de se trabalhar com


a SF em outras áreas.
Consideramos relevante ressaltar que o professor justificou
que, com sua chegada à Faculdade de Educação/UFC, engajou-
se com professores ligados às teorias educacionais clássicas e
isso fez com que a SF incorporasse uma postura de ensino e
aprendizagem interagindo e pensando em práticas humanas e
conhecimentos críticos.
Sobre a SF, Santos, (2016), também reforça a importância
de se pensar no antes, durante e depois de uma aula, pois é
muito importante para que as situações de desafios de ensi-
nar sejam amenizadas, e o professor tenha oportunidade de
reforçar seus, conhecimentos já que necessita estar sempre em
processo de atualização, seja nos conteúdos, seja nos aparatos
que irá utilizar em sala. Em consequência disso, o professor
repensa sua postura, faz uma autorreflexão de seu ensino e da
aprendizagem do aluno.
Por fim, ficamos honrados pela oportunidade de indagar
essas questões com o professor Hermínio, mentor e idealizador
da Sequência Fedathi, e entendemos que a metodologia passou
e passa por mudanças, e isso é valioso, pois a educação neces-
sita sempre ser formada e reformada, pensada para atender as
necessidades do alunado e da sociedade.

Referências

Entrevista com Hermínio Borges Neto. Disponível em: https://www.


youtube.com/watch?v=zJ88neAANYo Acesso em: 18.03.18.
RADFORD, Luis. Saber y conocimiento desde la perspectiva de la Teoría
de la Objetivación. (p. 107) In: D’Amore, B., & Radford L. (2017).
Enseñanza y aprendizaje de las matemáticas: problemas semióticos,
epistemológicos y prácticos. Bogotá, Colombia: Universidad Distrital
Francisco José de Caldas. (192 p.).
SANTOS, Maria José Costa dos. A formação do professor de matemática:
metodologia sequência fedathi (sf). Revista Lusófona de Educação,

188
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

[S.l.], v. 38, n. 38, mar. 2018. ISSN 1646-401X. Disponível em: <http://
revistas.ulusofona.pt/index.php/rleducacao/article/view/6261>. Acesso em:
08 mar. 2018.
SANTOS, Maria José Costa dos & MATOS, Fernanda Cíntia Costa. A
insubordinação criativa na formação contínua do pedagogo para o
ensino da matemática: os subalternos falam?. Revista de Ensino de
Ciências e Matemática - RenCiMa. Edição Especial - Insubordinação
Criativa nas Pesquisas Qualitativas em Educação Matemática v.
8, n. 4 (2017). ISSN 2179-426X. Disponível em: http://revistapos.
cruzeirodosul.edu.br/index.php/rencima/article/view/1491. Acesso
em 08 de março de 2018.
SOUSA, F. E. E. et al. (Orgs.). Sequência Fedathi: uma roposta pedagógica
para o ensino de Ciências e Matemática. Fortaleza: Edições UFC, 2013.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA TUTORIA NA EAD

Maria José Costa dos Santos1


Francisco Herbert Lima Vasconcelos2

Introdução

No Brasil, nos últimos anos, o Ensino a Distância (EAD) vem


ganhando espaço nas instituições de ensino superior e financia-
mento por parte do Governo Federal pelo programa Universidade
Aberta do Brasil (UAB). A UAB representa uma maneira de ame-
nizar o problema da falta de acesso ao ensino superior por parte
da população que mora nos centros urbanos ou rurais que não
posuem nenhuma instituição de ensino superior, com o propó-
sito de amenizar as desigualdades sociais. Nessa perspectiva, o
Ministério da Educação (MEC) estabelece critérios para garantir
a qualidade das instituições credenciadas na oferta de cursos e
programas de educação superior, por meio da EAD.
A flexibilização (tempo x espaço) que a EAD propõe é
preponderante para os que têm de trabalhar para seu próprio
sustento, mas desejam progredir intelectualmente, profissio-
nalmente e, consequentemente, financeiramente. Em EAD é
preciso que o estudante tenha autodisciplina, importantíssima,
no que concerne à produção das tarefas acadêmicas. O curso,
em sua grande parte, é desenvolvido de forma assíncrona (tem-
pos diferentes) e a figura do professor presente fisicamente é
1 Pós-doutora em Educação.(PropEd/UERJ) e doutora na área de Educação Matemática .Pro-
fessora Adjunta da Universidade Federal do Ceará(UFC/FACED)
2 Doutor na área de Pesquisa em Avaliação da Efetividade e do Desempenho da Aprendizagem.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

substituída pela interação/interatividade do estudante com o


Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), com seus colegas
e tutor online. Mas, quem é o tutor online? Será um professor
com demandas profissionais cada vez mais exigentes? É um ser
humano ou uma máquina?
Inicilamente, precisamos compreeender a relevância da
Educação a distância-EaD no contexto brasileiro; é comum cha-
marmos, mesmo que errôneamente, de ensino à distância. Nesse
sentido, afirmamos que EaD é a modalidade de ensino que pos-
sibilita ao aluno, mesmo que não esteja fisicamente presente em
um ambiente formal de ensino, uma aprendizagem diferenciada,
pela forma como é estruturada.
De fato, podemos perceber que, com os avanços da tecno-
logia, as Instituições de Ensino e Profissionalização precisam
se adaptar, e por conta disso, vêm modificando seus métodos e
agregando o Ensino a Distância como uma das ferramentas de
ensino e aprendizagem de grande abrangência, contudo, notamos
que, mesmo com todos os avanços vivenciados, ainda se confi-
gura em um período de transição, assim, é preciso imbricarmos
diversas discussões sobre a temática.
Nesse sentido, é preciso ampliar e embasar essas preocu-
pações considerando as proposições de Prado e Valente apud
Almeida (2002) acerca da abordagem que eles têm de Educação
a Distância, em que denominam de ‘estar junto virtual’, que pres-
supõe a aproximação dos emissores e dos receptores dos cursos,
admitindo a criação de condições de aprendizagem telecolabo-
rativa, desmistificando a tese de que estar longe temporalmente
e geograficamente são questões negativas na aprendizagem a
distância.
Diante desse cenário, a EaD precisa ser vista também como
uma modalidade de ensino de qualidade, e portanto, precisa ser
bem planejada, bem elaborada, bem discutida, bem avaliada, e
principalmente, fiscalizada pelos órgãos competentes, pois na

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

febre de se fazer EaD muitos acabam fazendo de qualquer jeito,


sem se preocupar com o produto mais importante, que é o aluno.
Essa modalidade precisa de um aluno autônomo, capaz de
gerir seu próprio estudo em tempo e local à escolha, mas precisa
de suporte técnico e didático, ou seja, além de um ambiente de
aprendizagem propício com ferramentas adequadas, um bom
tutor online e presencial que possa lhe assessorar quando for
solicitado.
Sabemos que uma das muitas peculiaridades da Ead é a
separação temporal e/ou espacial entre professores (tutores)
e alunos. Contudo, se houver um bom material didático e um
ambiente colaborativo/interativo, essa separação poderá ser
superada sem traumas para as partes envolvidas.
A conexão entre professor e aluno precisa se dar por meio
de tecnologias, de forma síncrona ou assíncrona, pela internet
pelo uso das hipermídias, mas também por outros meios como
o correio, rádio, televisão, vídeo, CD-ROM, telefone celular, fax,
ipod, iphone, notebook�������������������������������������������
, tabletes, dentre
�������������������������������
outras tecnologias digi-
tais que tenham o sentido de colaborar e cooperar com a relação
de professores e alunos na modalidade EaD.
Nesse modelo de ensino e aprendizagem, essa conexão
(professor x aluno) é de suma importâcia, e para que aconteça
de forma qualitativa é necessário, nesse contexto, como já dito
nesse texto, um ambiente virtual interativo, que prevê a) alunos
autonômos; b) bom material didático – on-line e impresso; c)
apoio ao aluno de forma síncrona e assíncrona; e d) tutor de fácil
acesso, presente na plataforma, a fim de auxiliar os alunos para
que não se sintam sós, mas juntos virtualemente.

Papel do tutor: dificuldades enfrentadas na modalidade

O tutor online não é visto pelos alunos como o professor


que está diariamente presente para lhes tirar as dúvidas; nesse

193
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

sentido, ele muitas vezes se sente órfão no ambiente virtual, e


quando o material não é bem apresentado nos encontros pre-
senciais, esse problema toma proporções desastrosas no que
concerne o desenvolvimento de sua aprendizagem e de suas
atividades no curso.
Mais acentuadamente percebemos essa lacuna nas li-
cenciaturas como Física, Matemática e Química. Existe uma
‘reclamação’ dos alunos, pois os encontros presenciais não
são suficientes e claros para lhes tirar as dúvidas, e ainda os
ambientes virtuais, que são suas salas de aulas virtuais, não
dispõem de ferramentas adequadas para lhes dar suporte
no aprendizado. Infelizmente, ainda são presentes nos polos
de EaD problemas como: acesso à Internet, bibliotecas locais
temáticas, laboratórios, salas de webconferências, elementos
que poderiam contribuir para minimizar esses problemas
apresentados pelos alunos, para que se evitasse a forte evasão
nesses cursos, principalmente, queremos aqui ressaltar, nos
cursos de licenciatura em Física.
Infelizmente, já tivemos que ministrar aula para turmas de
Licenciatura em Física com um único aluno matriculado, pois no
vestibular não houve concorrência, e também porque as turmas
vão se esvaziando pelas dificuldades encontradas pelos alunos
diante dessa modalidade. Muitas das dificuldades apontadas pe-
los alunos de licenciatura em Física poderiam ser resolvidas, mas
é preciso maior dedicação nos planejamentos, pois não se pode
planejar aulas para a modalidade à distância da mesma forma
que se planejam as aulas presenciais. Faz-se necessário que o
tutor on-line, responsável pela disciplina, conheça metodologias
que auxiliem melhor nessa relação professor-conteúdo-aluno.
Considerando que mesmo na modalidade presencial esses
cursos têm seus obstáculos didáticos e epistemológicos, que
envolvem, necessariamente, a prática docente e o conteúdo, os
alunos da modaldiade a distância assinalam que o material didá-

194
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

tico, algumas vezes, não é muito claro e falta maior detalhamento


na plataforma virtual.
Assim, diante dessas questões, os próprios alunos sentem
a necessidade de mais encontros presenciais, melhores meto-
dologias de acesso ao conteúdo, principalmente nas aulas que
são de conteúdos específicos, como as disciplinas do curso de
Física, também assinalam que se tivessem videoaulas seria mais
fácil de entender os conteúdos, e assim, solicitam mais webaulas,
webconferências, material prático e atividades no laboratório,
além de um tutor presencial mais presente, e um tutor online
mais interativo.
Jaeger e Accorssi (2004) respondem essa questão expondo
que o tutor online é um professor com formação na área, que
deve interagir diariamente com o estudante, esclarecendo suas
dúvidas acerca dos conteúdos e estimulando sua permanência
no curso. Em sua concepção, o tutor online deverá:

Ter a capacidade de realizar uma integração dos conte-


údos trabalhados ao longo das disciplinas do curso. É
sua função ter uma noção ampla que possa fundamentar
a sua atuação de modo que os conteúdos não fiquem
segmentados e desconexos, mas formem uma rede com-
plexa integradora do mesmo, formando dessa forma um
grande hipertexto contemplador de todas as disciplinas
do curso. Isso demandará do tutor um entendimento
amplo do processo de aprendizagem, possibilitando ao
aluno oportunidade de ir em busca do conhecimento
que lhe é mais motivador. Baseados nos pressupostos
de Educação a Distância da PUCRS Virtual: autonomia,
aprendizagem, espaços colaborativos de aprendizagem, o
tutor será mais um facilitador da aprendizagem tendo sua
atuação voltada para a concretização destes princípios.

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Oliveira (2004) também tem a mesma opinião quando afir-


ma que o tutor é o responsável em aproximar o estudante dos
conteúdos trabalhados, bem como do próprio “conteúdo tecno-
lógico”, que é tão necessário ao trânsito autônomo em ambientes
virtuais de aprendizagem. A esse respeito, Souza (2004) diz que:

1. Há várias maneiras de definir o conceito. A tutoria pode


ser entendida como uma ação orientadora global, chave
para articular a instrução e o educativo. (...) 2. No siste-
ma de EaD, o tutor, vale frisar, tem papel fundamental,
pois garante a interrelação personalizada e contínua do
aluno no sistema e se viabiliza a articulação necessária
entre os elementos do processo e execução dos objetivos
propostos. Cada instituição que desenvolve EaD busca
construir seu modelo tutorial, visando o atendimento das
especificidades locais e regionais, incorporando, como
complemento, as TICs.

Poderíamos citar diversos artigos e livros nos quais encon-


traríamos as funções do tutor, o papel do tutor, pois a sociedade
globalizada e globalizante espera pessoas que atuem de forma
diferenciada. Desse modo, essa teoria leva o tutor a se apropriar
(o termo seria sobrecarregar-se) de novas funções, papéis que
lhes são atribuídos ao passo que a EaD avança tecnologicamente
e espacialmente.
O maior desafio que se impõe ao tutor é que ele promova
uma ação ampla, globalizante e seja hábil ao implementar trans-
formações a partir de conhecimentos totalizantes edificados
colaborativamente. O Ceará, nosso contexto pesquisado, tem sua
própria legislação sobre EAD pautada na resolução n.º 360/2000
que trata sobre o uso desses recursos no estado.

O Conselho de Educação do Ceará, no exercício de suas


atribuições legais, com o intuito de normatizar a utiliza-

196
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

ção dos recursos de educação de educação a distância, no


âmbito do sistema de Ensino do Ceará, compatibilizando-
os com os demais sistemas da Federação - apoiado no
que dispõem o Art. 80 da Lei Federal nº 9.394, de 20
de dezembro de 1996, os dispositivos contidos nos
Decretos Presidenciais nºs 2.494, de 10 de fevereiro
de 1998, e 2.561, de 27 de abril de 1998, bem como na
Portaria Ministerial 301, de 1º de abril de 1998, e, ainda,
em consonância com deliberações de outros Conselhos
Estaduais de Educação do País...(Art. 2º) São caracterís-
ticas fundamentais a se observar em todo programa ou
curso de educação a distância: flexibilidade de organi-
zação, de modo a permitir condições de tempo, espaço e
interatividade condizentes com a situação especial dos
alunos que procuram aprender sob essa modalidade;
organização sistemática dos recursos metodológicos e
técnicos utilizados na mediatização do processo de ensi-
no e aprendizagem; interatividade sob diferentes formas
entre os agentes do processo da aprendizagem e os do
ensino, de sorte a que se supra eventual distância entre
alunos e professores; o indispensável apoio por meio de
um sistema de tutoria, que poderá se estruturar presen-
cial, a distância ou de forma mista, com vistas ao acom-
panhamento do curso ou programa; sistema de avaliação
do processo de aprendizagem e ensino. (Fonte: http://
www.ipae.com.br/pub/pt/re/rbead/61/materia4.htm)

O que se observa é que há realmente um avanço na norma-


tização do processo de regulamentação da EaD, enquanto uma
modalidade de ensino que propicia o avanço e disseminação de
conhecimentos, competências e habilidades em áreas diversas,
no intuito de melhorar o acesso ao nível superior por uma parte
da sociedade que antes ficava à margem. Mas, ao mesmo tempo,
não se percebe uma política de melhoria e reconhecimento da

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

função tutorial como uma prática pedagógica, digo ainda como


um profissional, indispensável à efetivação da modalidade a
distância.
Fato esse que podemos constatar na legislação, nas instituições
de ensino superior, no próprio Ministério da Educação, quando pro-
põe “bolsas” para remunerar esses profissionais, e, principalmente,
constatamos essa insatisafação nos depoimentos dos 8 tutores que
participaram de um questionário investigativo que tratava da ação
tutorial, e que procura entender quem é esse profissional.
A profissionalização docente, ou a semiprofissão como
classifica Perrenoud (2001) é uma profissão em vias de pro-
fissionalização. Isso por que falta a essa profissão uma base de
conhecimentos procedimentais comuns e uma explicitação dos
próprios esquemas e das formas de desenvolvê-los e avaliá-los,
como ocorre nas profissões de maior valorização social, como
advogados, médicos e engenheiros que seus conhecimentos são
bem definidos e mensuráveis, pois em caso de erro no exercício
profissional pode acarretar consequências desastrosas.
Sabemos que muitas são as exigências das partes aluno/
tutor, contudo, não adianta todas essas mudanças se o aluno tam-
bém não tiver um perfil autônomo, disciplinado e interessado.
No entanto, é preciso um olhar mais atento nas licenciaturas de
Física, Química e Matemática, pois estamos formando futuros
professores, e se questionamos a formação presencial, não pode-
mos deixar de querer que esse aluno da modalidade a distância
tenha sua formação pautada no mesmo rigor.

Sugestões e possibilidades para melhorias nos cursos EAD

Os cursos a distância têm características particulares e bem


diferentes da modalidade presencial. Nesse sentido, entendemos
que é preciso observar algumas variantes como: tutores mais
compromissados; ambiente virtual mais interativo; videoaulas

198
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

de conteúdos específicos; disponibilidade de Software e Objetos


Educacionais sobre os conteúdos estudados; livros virtuais de
fácil acesso; aulas offline para leitura e impressão, marcar grupos
de estudos nos polos com o tutor presencial.
Nesse mesmo sentido, é certo que poderemos atingir uma
visão telecolaborativa mediada pelas Tecnologias Digitais de
Informação e Comunicação na Educação (TDICE) às quais vêm
inovando a Educação a Distância, seja pelas plataformas virtu-
ais, seja pelos softwares interativos. Assim, a telecolaboração se
apresenta como um conceito chave quando o assunto é aprendi-
zagem por meio de tecnologias digitais na Educação a Distância
mediada por plataformas de aprendizagem virtual.
Essa visão mais abrangente envolvendo as variantes aci-
ma apontam para uma visão holística da educação a distância,
pois entendemos e concordamos com Mattar (2011, p. 3) que
a EaD é uma modalidade de educação, planejada por docentes
ou instituições, em que professores e alunos estão separados
espacialmente e diversas tecnologias de comunicação são utiliza-
das. Desse modo, o paradigma da visão holística contribui como
uma tendência para se lançar pontes sobre todas as fronteiras
e reducionismos humanos, estabelecer os seus dois distintos e
completares fundamentos: a holologia e a holopraxis. (CREMA,
1989, p. 72). Sendo a holologia um enfoque experiencial da
Holística, relacionado ao pensamento discursivo, e a holopráxis
sendo o conjunto de métodos experienciais de vivência direta
do real pelo ser humano.
Com isso entendemos que a visão holística traz para a EaD,
uma abordagem que atende as esferas do saber e do atuar hu-
mano, desde a teoria do conhecimento a teorias da educação,
entrando em outras áreas do saber, e com isso, dando aporte
metodológico para uma visão da EaD mais abrangente, que
destacamos no quadro 1, a seguir.

199
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Quadro 1. Aspectos para promover uma abordagem holística para o ensino a distância.

Aspectos a serem enfatizados/EAD Abordagem holística

Ensino Harmônico, consciente e global; foco


no contexto

Aprendizagem Visão da totalidade

Professor Percebe o aluno como um ser; impor-


tância as coisas simples; analisa as
situações em sua totalidade

Aluno Sujeito ativo e valioso

Tendência pedagógica Progressista libertadora

Educação Visão do todo: educação dos sentimen-


tos; formação de valores

Fonte: Elaboração própria (2009)

Com o intuito de especificar a relevância dessa abordagem


apresentamos o quadro acima com a finalidade de promover uma
reflexão sobre o especial valor de repensarmos nossa forma de fazer
EaD, enfatizando o aluno, como a principal variável desse processo.

Resultados: análises dos questionários acerca da prática


da tutoria na EAD

Neste panorama conceitual, e frente à problemática que


envolve a experiência docente em cursos superiores online, rea-
lizamos um questionário com alguns tutores sobre suas impres-
sões acerca da modaldiade EAD. Os resultados foram colhidos a
partir das respostas obtidas nos questionários, respondidos por
8 tutores de diversas instituições públicas e particulares. Dos
entrevistados, 7 atuam em instituições públicas e 1 atua tanto
na instituição pública como na particular. Realizamos questões
referentes às práticas e a relevância do relacionamento com
alunos, e também sobre a valorização profissional.

200
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Os dados colhidos apontaram que 3 tutores possuíam um


ano na ação tutorial, 1 com um ano e meio, 3 com dois anos e 1
com 3 anos de atuação. Quanto à ocupação principal 3 tem como
função principal a tutoria e 5 tem outra atividade profissional. Em
relação ao tempo que utiliza para trabalhar no curso exercendo
suas funções tutoriais: 5 tutores utilizam os momentos de folgas
da ação principal, e os demais, ( 3), realizam suas atividades à
noite, antes de ir dormir.
Quando indagados sobre o motivo de ser um tutor online,
todos alegaram que gostam da atividade, mas 2 deles também
ressaltaram ter como motivo a complementação salarial. Em re-
lação à credibilidade da EAD, 6 tutores responderam que confiam
na importância da EAD para a formação docente, e 2 não confiam
e ainda ressaltam que trabalham por precisar do dinheiro.
Quando perguntados sobre sua atuação na sala virtual se
eles têm os mesmos critérios de qualidade que na sala presencial,
todos os 8 ressaltaram ser criteriosos nas duas modalidades. So-
bre o reconhecimento da atividade docente enquanto profissão
respeitada pela sociedade fica meio a meio, ou seja, 4 pensam
que sim, são reconhecidos, e 4 disseram que não há reconheci-
mento. As justificativas para esse misto de sentimentos são as
mais diversas, vejamos algumas a seguir:

Tutor A
“a luta dos profissionais da educação é fundamental para que na lei e
na prática o professor seja reconhecido.”

Tutor B
“O professor é uma figura de peso na sociedade, mesmo que financei-
ramente esteja na contramão do processo, é importante perceber que
há reconhecimento social de que o professor precisa é fundamental no
desenvolvimento do cidadão e da própria sociedade’.

201
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tutor C
“O próprio MEC vulgarizou a função, contrariando a própria lei (que
exige formação mínima de Latu Sensu em EaD), permitindo que pes-
soas com currículo apenas com graduação exerça a função (na prática
constatamos que há pessoas sequer com graduação trabalhando como
tutores). Além disso, foi proibida a cumulatividade de atividades tutoriais
e de bolsas. As instituições superiores ainda tiveram coragem de sugerir
duas situações: a) o uso de “laranjas” para o recebimento e bolsas; b)
o exercício cumulativo, mas com remuneração rateada por R$ 600,00/
mês. Além de ilegal, imoral! Nesse contexto não vejo futuro para a função
(com dignidade). Ou seja, não será trabalho que permita ao profissional
a devida dedicação, interesse por aprofundamento e pesquisa na área.”

A carga horária, também, fator importantíssimo diante da


ação tutorial, é uma das variantes mais discutidas nessa moda-
lidade, pois vimos que os tutores são profissionais com outras
atividades e na sua maioria vêem a tutoria como uma alternativa
para complementar seu salário, pela desvalorização da profissão
docente, assim há uma sobrecarga nos tutores online que não é
apenas fruto das tutorias, mas dessas outras atividades, e isso
é ocasionado, de certo modo, pela renumeração aquém de suas
atribuições para o exercício de tutoria. No entanto, um dos tutores
entrevistados disse que não há uma sobrecarga. A questão a seguir
reforça a forma como esse profissional da educação é contratado.
Perguntamos sobre a forma de contratação dos tutores e se tem
contribuído para a precarização do trabalho docente no contexto
da EaD. Assim, 7 entrevistados concordam que há um desgaste da
profissão, mas um pensa que não. Vejamos as justificativas a seguir.

Tutor B
Em parte. Não diria precarização, mas uma subutilização de uma boa
mão de obra que se reveza para conseguir cursos e assim manter uma
certa renda. A falta de um vínculo empregatício torna o processo de
ensino a distância frágil.

202
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tutor A
Muitos são contratados sem formação específica.

Tutor F
As instituições em que atuo sempre priorizam contratar professores
especializados na área de EAD e que tenham experiência, e que tenham
também curso de formação de tutor.

Tutor G
Se o professor é consciente, procurará fazer seu trabalho da melhor
forma possível

Nossas análises também contemplaram a problemática que


envolve, no contexto da EaD, fatores como: a) intensificação do
trabalho; b) desvalorização profissional, má remuneração; e, c)
elevado número (ou reduzido demais) de alunos e turmas nas
plataformas.
Dos entrevistados todos concordam com esses fatores. Ve-
jamos algumas justificativas a seguir.

Tutor B
Até pelo fato de que a EAD massifica o processo, pois é um sistema. Nesse
sentido é importante estabelecer metas de alcance, democratização do
ensino, mas pautado em parâmetros justos.

Tutor C
Sem a valorização profissional do professor e uma remuneração justa,
motivadora, digna e estável, profissionais comprometidos com a siste-
mática serão raros de encontrar. Além disso há reflexo nos alunos que
percebem a queda do nível dos tutores e professores. Potencializados os
percentuais de evasão/abandono.

203
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tutor A
O professor da EAD, especificamente, o tutor precisa estabelecer um di-
álogo com cada aluno e isso se torna complicado quando a quantidade
de estudantes é elevada. Isso complica, quando há uma desvalorização
e baixa remuneração desse profissional, ficando este desestimulado.

Ao final do questionário, solicitamos aos tutores online que


eles discorressem sobre o que pensam acerca da sua real atuação
profissional cada vez mais presente e necessária para a expansão
e interiorização da EaD no País. E assim eles falaram sobre o que
é necessário para valorizar a “profissão docente”, no contexto da
EaD. Vejamos alguns desses sentimentos expressos pelos tutores,
sobre a valorização de sua “profissão” - tutoria online.

Tutor D
Formação contínua.

Tutor A
É necessário, inicialmente, que a EAD seja considerada uma modalidade
de ensino séria e comprometida com a qualidade da educação. Para que
isso aconteça, é preciso que o professor seja valorizado e bem remunerado
para que ele atue nessa área não como um bico, mas como algo prazeroso.
A formação específica para os professores também é fundamental para
que eles reflitam sobre seu trabalho e resignifiquem suas concepções de
homem, mundo e sociedade.

Tutor B
É importante estabelecer vínculo empregatício relativo à tutoria, seja a
distância ou presencial. Outro ponto que merece destaque é o número
de alunos por turma, para cada tutor. Penso também na necessidade
de formação continuada para tutorias. Condições de trabalho, também
ficam evidenciadas na medida em que é importante respeitar datas dos
encontros presenciais, bem como do depósito das bolsas e gastos com
deslocamento e alimentação do tutor.

204
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tutor F
É necessário uma maior valorização dos profissionais da EAD, melhorar
o salário e melhorar as condições de trabalho.

A EaD a cada dia evolui e se estabelece como uma modal-


didade de ensino cada vez mais solicitada pela sociedade, por
outro lado. as leis que a regem não apontam para uma valorização
dos profissionais que atuam nessa modalidade e entendem que
o tutor deve ser um profissional bem qualificado do ponto de
vista conteudista e didático, mas juridicamente não há nenhuma
ação para regularizar essa profissão que cresce e que aos poucos
está se proletarizando, principalmente, porque as instiuições
particulares estão barganhando cada vez mais os salários desses
profissionais, que acabam se rendendo, por necessidade finan-
ceira, a esses “exploradores” da mão de obra barata.

Considerações finais

Nossos estudos apontaram que a Educação a Distância (EaD) 


vem despertando expressiva relevância  de diversos grupos   e
instituições (públicas e particulares). Tal interesse é total e inde-
pende do alcance de intensidade social e econômica dos países,
pois mesmo com diferentes necessidades  e perspectivas, há
uma concordância quando se fala da importância do aumento
nos índices de escolaridade no país em todos os níveis de ensino,
com ênfase para a profissionalização de adultos trabalhadores,
visando a uma ampliação fundamental na formação no ensino
superior, com um foco nos cursos de licenciaturas para alunos
nos interiores dos estados brasileiros.
O tutor online nada mais é que um professor que age nos
programas de ensino e de aprendizagem, orientando o processo
de educação a distância. Ele ainda atua diretamente com os alu-
nos, por meio de uma plataforma de ensino virtual, ou seja, de
um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), auxiliando esses

205
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

alunos na compreensão e na justaposição dos conhecimentos,


fazendo uso de distintas ferramentas para o ensino dos conte-
údos, por meio das tecnologias da informação e comunicação.
Assim, nesse sentido, pretendemos que sejam dentro de
um processo de valorização da profissão docente, e tenham o
reconhecimento como um profissional que exerce as funções de
professor que é cobrado, exigido como tal, e que, portanto, preci-
sa entender que pode e deve lutar pelos seus direitos. Com isso,
seguimos firmes para originar a definição e conceitualização da
função tutorial como chave para o desenvolvimento qualitativo
da educação a distância.
Presenciamos avanços e constatamos que é crescente a de-
manda por conhecimento e modernização, fatores que ocorrem
concomitantes a partir da abrangência das tecnologias digitais
de comunicação e informação (TDIC), colocando, assim, a EAD
como uma opção   propícia   para o atendimento educativo nesse
cenário. Nesse sentido, entendemos que. para a melhoria dessa
formação profissional. é necessário mais empenho dos atores
envolvidos nessa modalidade, no intuito de minimizar as dificul-
dades e desafios enfrentados pelos cursistas, mas que é inerente
à modalidade de educação em questão.
Entendemos, dessa forma, que é preciso um olhar holístico
para dentro dessa modalidade que a possa transformar como
uma das modalidades mais abrangentes atualmente no país,
que tem a capacidade de fazer com que o desejo de uma pessoa
que more numa localidade longe da universidade, possa tê-la
dentro de casa, contudo precisamos fiscalizar, pois com esse
desejo de ampliar o acesso não podemos deixar que a mesma
seja realizada de qualquer jeito, é preciso responsabilidade e
compromisso de todos.

206
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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208
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A SAÚDE MENTAL DO PROFESSOR DO 1.° E 2.° ANOS DO


ENSINO FUNDAMENTAL DOS ANOS INICIAIS

Janne Cristina de Araújo Silva1


Gilmar Alves de Farias2
Alberto dos Santos Paiva Filho3

Introdução

Pode-se dizer que ser professor não é somente uma profis-


são e sim uma vocação, pois sua atuação vai além do processo de
ensino e aprendizagem, abrangendo uma relação humanizada
e próxima aos seus alunos, familiares e equipe de trabalho. Ser
professor não se restringe apenas em se preocupar com sua
formação continuada, com o planejamento de suas aulas, com a
participação nas atividades gerais da escola ou com os resultados
do desempenho de seus alunos.
A profissão do professor desempenha um papel de admi-
nistrar suas atividades de trabalho estabelecendo uma relação
humana e emocional, que reflete em suas práticas diárias, na
sua vida pessoal e profissional, que envolve a formação e a
transformação dos cidadãos. Dentro desse contexto, o pro-
fessor exerce funções a mais do que foi adquirida na univer-
sidade, pois a ligação estabelecida no trabalho o faz sentir-se
responsável na formação de cidadãos pensantes, que irão
1 Especialista em Psicologia Organizacional e do Trabalho pela Universidade Estadual do Ceará
(UECE)
2 Mestre em Atividade Física e Saúde pela Universidade do Desporto do Porto-Portugal.
3 Mestre em Administração de Empresas.

209
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

influenciar e colaborar para o crescimento e desenvolvimento


de uma sociedade.
Deste modo, conforme diversidade de tarefas e responsa-
bilidades. pode-se dizer que a profissão do professor parece ser
de duas especialidades peculiares que torna diferente de outras
profissões. As duas especialidades dizem respeito a saberes e
saber fazer, que transmitem técnicas e conhecimentos, como
também diz respeito à vocação de formar cidadãos pensantes
transformadores de realidades (PRADO, 2013).
Apesar da sua função de facilitador no processo de ensino e
aprendizagem e das atividades extra sala de aula, o professor pre-
cisa ainda se preocupar com a sua formação continuada, pois o
mercado de trabalho exige que os profissionais estejam cada vez
mais qualificados para desempenhar sua profissão com eficácia.
Os requisitos acima citados classificam e qualificam a per-
manência do professor no mercado de trabalho, fazendo com que
ele seja exigente consigo mesmo, tornando-se útil, produtivo, dis-
ponível e integrado ao seu convívio profissional, social e familiar.
Diante das responsabilidades e exigências da vida profis-
sional, muitos professores sentem-se sobrecarregados e isso
pode gerar consequências, que afetam sua saúde física, emo-
cional e mental. O aumento da necessidade de produtividade,
inovações e regras, transformam conceitos e influenciam na
mudança de estilos e de vida destes indivíduos de maneira que
acarreta esgotamento físico, mental e emocional (BEZERRA,
2015, 29). Entende-se com isso que, na rotina do professor, há
uma exigência diante da diversidade de tarefas que ele precisa
realizar, as responsabilidades nos resultados e as necessidades de
aperfeiçoamento, gerando, assim, cansaço, angústia, sofrimento
e preocupação com sua vida profissional e pessoal.
Diante deste contexto, surge o seguinte questionamento
que serviu de direção para esta pesquisa: quais os fatores que
ocorrem na rotina de trabalho do professor do Ensino Funda-

210
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

mental I do 1º e 2º anos, que são considerados pelos mesmos


como acontecimentos que afetam sua saúde mental?
O trabalho tem como objetivo geral, averiguar a rotina do
professor do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental I, fatores
que afetam sua saúde. Para alcançar esse objetivo, será neces-
sário conhecer as exigências do mercado de trabalho para a
formação e atuação do professor, conhecer na rotina de como
se estabelece a relação de trabalho e identificar os fatores que
afetam sua saúde mental. Como objetivos específicos foram
definidos: (i) identificar os fatores físicos que contribuem para
as doenças dos professores; (ii) Identificar os fatores mentais
que contribuem para causar doenças nos professores; (iii)
Identificar os fatores que menos contribuem para gerar doenças
nos professores.
Estudar questões que afetam a saúde mental do professor
é relevante, pois as expectativas geradas diante da sua forma-
ção geram percepções, sentimentos e comportamentos que in-
fluenciam na realização de seu trabalho e no seu modo de vida.
Uma vez afetada a realização do trabalho e seu estilo de vida, o
professor corre grande risco de comprometer sua saúde física
e mental. Baseado nisto, percebe-se a relevância de pesquisar
sobre a saúde mental do professor, mediante a relação que ele
estabelece com o trabalho na tentativa de cumprir com a profis-
são e suprir suas necessidades familiares e sociais.
O estudo foi desenvolvido por meio da realização de uma
pesquisa de tipologia exploratória, natureza qualitativa, através
da metodologia do estudo de caso, pois o seu propósito é de for-
necer dados referentes às vivencias reais, através de descrição
do contexto onde está sendo realizada a pesquisa. A pesquisa
exploratória, segundo Vergara (2007) é realizada em área na
qual há pouco conhecimento acumulado e sistematizado. Por
sua natureza de sondagem, não comporta hipóteses que, todavia,
poderão surgir durante ou ao final da pesquisa.

211
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Esta pesquisa é qualitativa, e de acordo com Vergara (2007),


a pesquisa qualitativa é aquela que aborda o conjunto de ex-
pressões humanas constantes nas estruturas, nos processos,
nos sujeitos, nos significados e nas representações e tem sido
frequentemente utilizada em estudos voltados para a compre-
ensão da vida humana em grupos, em campos como sociologia,
antropologia, psicologia, dentre outros das ciências sociais.
Para a coleta de dados foi utilizado como instrumento, um
questionário estruturado por meio de uma escala de 5 pontos,
que investigou o grau de contribuição de cada fator para possíveis
doenças ocupacionais dos professores pesquisados. De acordo
com Vergara (2007) um questionário estruturado é aquele que
tem objetivos claros para os respondentes da pesquisa. A apli-
cação do questionário foi realizada na escola estudada de forma
in loco, no período de 15 a 30 de novembro de 2017, cujo a co-
ordenadora do 1º grau selecionou um grupo de 38 professores,
que foi considerado a amostra desta pesquisa.
Utilizou-se como processo de amostragem o método não
probabilístico, cuja amostra é escolhida de acordo com a conve-
niência do pesquisador e dos pesquisados e de forma intencional,
como no caso desta pesquisa, onde a coordenadora da escola
selecionou os participantes de acordo com sua disponibilidade.
Para tabulação dos dados foi utilizado o software Microsoft
Excel do Windows 10, que apresentou os resultados da análise
dos fatores através de tabelas, onde optou-se por apresentá-los,
por se perceber que os resultados ficam mais fácil dos leitores
entenderem melhor.
Para apresentar a pesquisa, o trabalho está estruturado em
quatro partes. Na primeira parte, discute-se sobre o trabalho e o
sofrimento no trabalho. Na segunda parte, discorre-se a respeito
da relação de trabalho do professor. Na terceira parte, discute-se
a saúde mental do professor mediante relação estabelecida no
trabalho. Na quarta e última parte, discute-se a apresentação e

212
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

análise dos resultados baseados na percepção dos professores


diante da relação estabelecida com o seu trabalho.

O trabalho e o sofrimento no trabalho

A palavra trabalho vem do latim “tripalium”, termo utilizado


para designar instrumento de tortura, ou mais precisamente,
instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes ainda
munidos de pontas de ferro, nas quais agricultores bateriam o
trigo, as espigas de milho, o linho, para rasgá-los e esfiapá-los
(PRADO, 2013).
No grego a palavra trabalho tem dois significados, ponos
para referenciar ao esforço e penalidade e ergou que referencia a
criação e obra de arte. O trabalho era visto em função do produto,
e este, por sua vez, em função de sua utilidade ou capacidade de
satisfazer à necessidade humana (WOLECK, 2002).
A partir do referido conceito é importante refletir que o
trabalho possui outra face e que não é somente fonte de prazer
e realização, que o sujeito ao trabalhar também pode sofrer, e
que os impactos desse sofrimento poderão ter repercussão no
cotidiano do trabalhador. Que na busca desenfreada de atender
aos inúmeros perfis sugeridos pelas organizações, a subjetivida-
de do ser humano pode ser fragmentada e/ou desconsiderada,
como afirma Rosso (2008):

Na tentativa de se adaptarem aos padrões de performan-


ce para o mercado de trabalho ou as exigências das novas
formas de relação amorosas, as pessoas submetem-se
sem questionar modelos. Os ideais no amor e de suces-
so no trabalho são muitas vezes inatingíveis, por isso a
sensação sempre presente de perda e de falta (ROSSO,
2008, p.260).

213
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

E nessas condições emergem o sofrimento que pode ser atri-


buído ao choque entre uma história individual portadora de proje-
tos, de esperanças e de desejos e uma organização que os ignora.
Christophe Dejours é médico do trabalho, psiquiatra e psi-
canalista francês, que desenvolveu a teoria da Psicodinâmica
do Trabalho que, desde 1993, aborda a análise do sofrimento
psíquico resultante do confronto dos homens com a organização
do trabalho. (BUENO; MACÊDO, 2012, p. 308).
A organização do trabalho constitui as categorias da Psi-
codinâmica do Trabalho que aborda vários elementos, que se
destacam nesta pesquisa, as condições de trabalho e as relações
do trabalho. A primeira diz respeito ao ambiente físico, biológi-
co, higiene e segurança. A segunda refere-se às relações que o
trabalhador estabelece com o seu trabalho, sejam elas de chefia,
membros da equipe e com clientes. A teoria Psicodinâmica do
Trabalho também estuda a importância do reconhecimento, a
relação estabelecida com o real e a construção da identidade do
trabalhador.
Considerando esse contexto, Dejours (1987) afirma que a
organização do trabalho exerce sobre o homem uma ação espe-
cífica, cujo impacto é o aparelho psíquico. A contraditoriedade
proveniente dos desejos dos empregados e dos interesses das
organizações podem gerar problemas de comunicação, afetar
resultados, e costumeiramente afetar o estado emocional dos
envolvidos na relação trabalhista.
Percebe-se que na relação de trabalho sempre existirá so-
frimento, porque sempre haverá divergências de objetivos, isso
significa que as organizações terão seus próprios interesses
considerados acima dos interesses dos trabalhadores, e o tra-
balhador sempre se esforçará para atender as expectativas das
organizações. E quando o mesmo não conseguir se encaixar na
expectativa da empresa, a sensação de inadequação, de incom-
petência e angústia pode gerar sofrimento (DEJOURS, 1987).

214
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Segundo Dejours (2006), as exigências do trabalho e da vida


são uma ameaça ao trabalhador, e tais exigências podem alterar
o funcionamento da pessoa atingindo todas as áreas da vida, daí
a importância de ressaltar como o sofrimento no trabalho pode
afetar o mundo externo e interno do ser humano.
Na busca pelo sucesso profissional e na tentativa de se encai-
xar nos padrões organizacionais, o sujeito encara o trabalho como
algo essencial na vida, dedicando horas do dia para o trabalho
e procurando se profissionalizar nas horas de lazer, com o obje-
tivo de garantir a empregabilidade. Torturando-se quando não
encontra tempo para melhorar seu currículo, como se o mesmo
tivesse que mostrar o tempo inteiro que merece estar ali. Essa
busca pelo sucesso profissional pode ser cruel e impiedosa, e
pode gerar transtornos de ansiedade, por isso Dejours (2006)
afirma que existe uma busca por aptidão que é um estado de
autoexame, autorrecriminação e autodepreciação contínuos,
que gera a ansiedade.
De acordo com Dejours (1987), o trabalhador experimenta o
sofrimento quando utiliza todo o conhecimento e poder que tem
dentro de uma organização e não pode mais investir em outra
tarefa, a ponto de não conseguir diminuir o nível de insatisfação,
esgotando assim todas as suas defesas. A incompreensão da ta-
refa e/ou a expectativa frustrada em investir todos os recursos
que possui na organização leva o trabalhador a uma condição
de sofrimento, confirma ele.
Já para Morin (2001), o sofrimento psíquico compreende-se
como uma vivência que pode ser compartilhada e/ou individu-
al de experiências dolorosas - ansiedades, medos, angústias e
receios - provenientes da contradição e conflitos das necessi-
dades e desejos dos trabalhadores e das características do seu
trabalho em termos de organização, condições e relações sócio-
profissionais.

215
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

A justificativa utilizada pelas organizações para expor


os trabalhadores a situações que geram sofrimento e podem
adoecer os mesmos é que o mercado é competitivo e que é
importante acompanhar as mudanças, ajustando-se aos novos
momentos e modelos. Situando os sujeitos em um ambiente
similar à guerra, havendo competição com as outras empresas,
e até mesmo entre os próprios trabalhadores, criando rankings
de metas atingidas e premiações excludentes, podendo cons-
tranger os colaboradores.
Essas circunstâncias fazem com que os trabalhadores se
sujeitem às regras sem questionar, sem compreender muitas
vezes o porquê de estar naquele cargo, desempenhando de-
terminada tarefa, fazendo o que não se identifica - por medo
de perder o emprego e sentirem-se excluídos do mercado de
trabalho. Torna-se importante adequar-se ao perfil desejado
sem questionar as solicitações das empresas e compreender
que não há tempo para discussão a respeito das consequências
das mudanças, do impacto na relação sujeito-trabalho (ROSSO,
2008).
Morin (2001) afirma que o sentimento de insegurança,
quanto à manutenção de emprego, também pode ser instrumen-
tado, pois com medo de perder o emprego e suas garantias, o
empregado se vê numa condição de obediência plena às ordens
dos empregadores, inclusive trabalhando mais do que deve,
concluindo suas tarefas no prazo e para não passar a imagem de
desocupado, interpretado por muitos como desinteressado ou
incompetente, busca mais atividades para manter-se trabalhando
e assim mostrando utilidade e competência.
Com base nesta afirmativa, pode-se afirmar que o ambiente
de trabalho se torna competitivo quando os trabalhadores sen-
tem medo, qualquer acontecimento pode soar como ameaçador,
as relações com os colegas de trabalho tornam-se estranhas e
os laços afetivos rompem-se por qualquer motivo, se for preciso

216
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

competir com outro trabalhador para garantir seu espaço, o de-


sejo por destaque como garantia da vaga de emprego pode fazer
com que o trabalho em equipe seja comprometido, e o empre-
gado seja individualista, menosprezando o valor das relações e
a importância do trabalho em equipe (ROSSO, 2008).
De acordo com Rosso (2008), muitas vezes os trabalha-
dores são submetidos a altos níveis de sofrimentos e sequer
percebem, e quando percebem não têm a coragem de reclamar
ou questionar as solicitações das empresas. Não podem contar
com os colegas de trabalho porque não desenvolvem relações de
confiança e vivem sozinhos, com o sentimento de desamparo e a
falta de garantias. Deve-se considerar que o sofrimento é perce-
bido pela organização quando o empregado está numa situação
crítica, precisa se afastar do cargo, não consegue mais alcançar
os resultados esperados, solicita ajuda médica.

A relação de trabalho do professor

Durante sua formação, um professor se depara com um cur-


rículo acadêmico vasto de ensinamentos de matérias, didáticas e
metodologias. Ao se formar e exercer sua profissão, o professor
percebe que existem outras atividades relacionadas ao seu cargo,
onde ele precisará ser criativo, habilidoso e competente, além
de saber administrar o seu tempo para conseguir cumpri-las.
Essas atividades abrangem suas ações em sala de aula, ações
extra sala de aula, formação continuada, vida pessoal e social.
Ressalta-se que algumas dessas atividades são desenvolvidas
fora do seu local de trabalho e em dias que seriam destinados
para descanso laboral, pois muitas vezes, a carga horária de tra-
balho não é suficiente para a realização da quantidade de tarefas
(COLOMBO, 2008).
De acordo com Abrucio (2016, p. 30), a docência lida com
uma série de aspectos da carreira e do contexto escolar, apon-

217
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

tando para habilidades e competências que vão além da didática


sobre determinado conteúdo.
Bezerra et al (2015) afirma que o mercado de trabalho
estabelece algumas exigências, que requer dos profissionais o
cumprimento de regras que influenciam no seu estilo de vida.
Essas exigências podem ser vistas como pressões que geram
sobrecarga para suprir as necessidades de produtividade.

Em um mundo globalizado, a forte pressão do capita-


lismo mundial sobre a classe trabalhadora torna visível
o aumento da necessidade de produtividade, gerando
inovações e estabelecendo regras, transformando
conceitos e influenciando mudanças de estilos de vida
destes indivíduos de maneira que acarreta esgotamen-
to físico, mental e emocional (desilusão), conduzindo
ao mal-estar do trabalho extenuante (BEZERRA et al,
2015, p. 29).

O dia-a-dia do profissional mostra outras demandas que


precisam ser supridas conforme a necessidade. As ações desen-
volvidas para essas demandas dependerão da subjetividade de
cada profissional que desempenha de forma criativa e autônoma.
Segundo Leão (2012, p. 301), o trabalho é compreendido como
atividade do sujeito, complexa e intersubjetiva, que mobiliza
dinâmicas coletivas de criação de normas e formas particulares
de agir, irredutíveis às prescrições. Para Dejours (2004), existem
três premissas da Psicodinâmica do Trabalho:

a. O sujeito em busca de auto realização – todo o indivíduo é ha-


bilitado pelo desejo de realização, na busca da identidade com
finalidade de contribuir com a criação social.

b. Trabalho prescrito e trabalho real – são as subjetividades de-


senvolvidas no dia-a-dia mobilizadas para dar conta das lacunas

218
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

que surgem no trabalho. O trabalho prescrito, refere-se às atribui-


ções pré-estabelecidas e descritas em um determinado cargo que
devem ser executadas. O trabalho real refere-se àquele executado
pelo trabalhador diariamente de maneira subjetiva e criativa.

c. Reconhecimento – desejo de julgamento e olhar do outro.

O professor do Ensino Fundamental I do 1º e 2º anos, assim


como os demais profissionais, conhece as atividades prescritas
que precisam ser desenvolvidas com seus alunos, mas o seu dia a
dia mostra que existem outros fatores atreladas à função, como,
decorar a escola, participar de reuniões fora do horário de tra-
balho, modificar comportamentos de seus alunos considerados
inadequados, desenvolver atividades de acolhimento para todos
os alunos, pais e funcionários da escola, qualificar-se visando à
formação continuada e, finalmente, conseguir cuidar da sua vida
social e familiar (COLOMBO, 2008).
Além de participar de atividades que mostram a atualidade
do mercado para a área, o profissional precisa se identificar com
a profissão e ter prazer pelo que faz, diferenciando-se através
de comportamentos, habilidades, atitudes, visando desenvolver
suas competências de forma que possa sentir-se satisfeito e com
autoestima elevada. Para Santos; Alves (2017, p. 114), o processo
de formação do docente deve ser algo constante, pois este ne-
cessita em sua prática, está em todo momento, se atualizando
no que diz respeito à educação.
Na execução do seu exercício, ele percebe a responsabili-
dade que tem, não só no ensinar a ler e escrever, mas também
em formar cidadãos que contribuam na construção de uma
sociedade melhor, que tenham valores e comportamentos éti-
cos (SANTOS; ALVES, 2017, p. 115). Assim, vale ressaltar que
o trabalho do professor envolve algumas funções como ensi-
no, aprendizagem, cuidado com o bem-estar dos seus alunos,
realização de inúmeras tarefas dentro e fora da sala de aula,

219
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

participação nas decisões pedagógicas, realização de projetos


e pesquisas de forma mais efetiva e coletiva, sem esquecer a
interação com pais e alunos.

A saúde mental do professor mediante relação estabeleci-


da no trabalho

Normalmente, o trabalhador passa mais tempo no local de


trabalho do que no convívio familiar e social. Quando a relação
do homem com o trabalho é satisfatória, gera prazer, alegria e
saúde ao trabalhador, mas, caso essa relação seja contrária, re-
sultará em algo ameaçador, sem significado, sem sentido gerando
sofrimento que possivelmente afetará sua saúde.
A dinâmica de trabalho do professor é bastante intensa e
por isso muitos não conseguem conciliar o seu tempo com as
atividades escolares, ocasionando sobrecarga com maior dedica-
ção ao trabalho e menor atenção para a sua vida pessoal. Diante
disso, ele estabelece uma relação diária composta de fatores que
causam fadiga, ansiedade, cansaço e tensão que comprometem
sua saúde (MARIANO; MUNIZ, 2006).
De acordo com Mariano e Muniz, (2006, p. 80), o exercício
da profissão docente é composto de fatores que comprometem
sua saúde física e mental, causando-lhe sofrimento e desgaste
que desencadeiam doenças somáticas e psíquicas ou psicosso-
máticas. Essa relação não atinge só o corpo físico do professor,
como também afeta a sua saúde mental, através de sentimentos
negativos, baixa a autoestima, aumenta a insatisfação e o despra-
zer. Por outro lado, as exigências que o professor recebe fazem
com que o mesmo se dedique mais, gerando novas expectativas,
necessidade de reconhecimento e valorização.
A maneira como o professor lida com esses fatores irão
determinar se a relação por ele estabelecida afetará sua saúde
mental ou não. Portanto, verifica-se que é de suma importância

220
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

dar atenção ao professor no que se refere à sua saúde mental e


a relação que estabelece diante da sua rotina de trabalho.
Com isso, o trabalho do professor tem a cada dia se intensifi-
cado, com acúmulo de atividades diárias e sobrecarga constante,
por isso descrevem Appel e Jungch (1990) apud NÓVOA (1992,
p. 12), a intensificação leva os professores a seguir por atalhos,
a economizar esforços, a realizar apenas o essencial para cum-
prir a tarefa, obrigando-os a apoiarem-se nos especialistas. A
intensificação na rotina de trabalho pode fazer com que sintam
dificuldades de realizar suas tarefas básicas, comportando-se de
forma menos autônoma.
Cardoso et al (2012, p. 2 – 3) relata a prática pedagógica
a partir da centralidade na figura do professor, através do pes-
quisador Maurice Tardif qu,e desde o ano de 2004, estuda os
saberes docentes e a sua relação profissional e, por consequência,
desenvolveu os quatro saberes que implicam na atividade do
professor, conforme demonstra abaixo:

Quadro 1 - Os 4 Saberes do Professor.

Nº SABERES SIGNIFICADO

1 Formação profissional São aqueles adquiridos durante a formação


inicial e continuada, isto é, conhecimento pe-
dagógico relacionados ao saber fazer.

2 Saberes disciplinares Referem-se àqueles reconhecidos como per-


tencentes aos campos de conhecimento como
linguagem, ciências humanas, ciências exatas,
ciências biológicas e outras.

3 Saberes curriculares São os programas escolares e formas como as


instituições educacionais realizam a gestão e
que os professores devem saber e aplicar.

4 Saberes experienciais São os saberes produzidos durante o próprio


exercício e vivência da atividade profissional.

Fonte: Cardoso et al (2012, p. 2 – 3)

221
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Muitos dizem que ser professor é uma vocação, mas em


uma visão de profissionalização o ser professor está relacionado
às várias responsabilidades que são impostas, com objetivo de
melhorar seu desempenho e alcançar suas metas, mas que, na
realidade, aumentam sua carga de trabalho, e automaticamen-
te o responsabilizam, juntamente com a escola, a modificar o
comportamento de seu alunoresponsabilidade que deveria ser,
primordialmente, dos pais. Essa transferência de responsabili-
dades agrega outras ações e preocupações que sobrecarregam
o professor (CARDOSO ET AL, 2012).
Ainda dentro do mesmo assunto o autor Nóvoa (1992),
descreve sobre a dicotomia que há entre os educadores, pais e
professores na escola.

Os pais exigem da escola a defesa de valores, de tolerância


e do diálogo, reclamando mesmo a restauração de ordem
e de normas de disciplina ditas de “tolerância zero”, são os
mesmos pais que deixam os filhos ver filmes impróprios
ou divertirem-se com jogos de computadores de extrema
violência. (NÓVOA, 1992, p. 17).

Portanto, discursos e valores que deveriam ser de outras


esferas, são levados para a escola e, algumas vezes, são contro-
versos, isto é, exige-se do professor e da escola, mas não se to-
mam as devidas precauções para evitar certos comportamentos
apresentados pelo aluno.
O mercado de trabalho demonstra a necessidade de o profes-
sor estar sempre se reinventando, renovando, redefinindo o seu
papel na escola e na sociedade, pois reproduzir os conhecimentos
adquiridos nas academias não são suficientes para manterem-se
atuantes. Conforme Prado (2013, p. 9), possuir conhecimentos
ou capacidades específicas, não é garantia de que um profissional
seja “competente”, porque apesar de muitos profissionais pos-

222
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

suírem conhecimentos e capacidades importantes, nem sempre


sabem mobilizá-los de modo adequado no momento oportuno
levando em consideração o contexto atual.
Como essa relação estabelecida não envolve somente o local
de trabalho, abrange as famílias dos alunos e a imagem do pro-
fessor perante a sociedade, em alguns casos, percebe-se que o
atual cenário gera uma sensação de desvalorização e banalização
da profissão, pois são exigidas várias atribuições ao professor,
que ele mesmo não se vê em condições de realizá-las na sua
totalidade. É importante frisar que esse processo está presente
durante toda a sua vida profissional (PRADO, 2013).
Em toda profissão existem pontos positivos e negativos,
sendo o primeiro vital para o sucesso profissional, motivação,
satisfação e bem-estar do indivíduo, como por exemplo, ter
consciência da importância do seu papel diante da vida do ci-
dadão que precisa ser ensinado e transformado com o objetivo
de produzir uma sociedade melhor e bem desenvolvida. No se-
gundo ponto denota que necessita de uma atenção maior a ser
trabalhado com a finalidade de modificar, melhorar ou adaptar
conforme o cenário que se apresenta, como por exemplo, ações
que sobrecarregam o dia a dia do profissional, influenciam no
resultado que o mesmo pretende alcançar, gerando insatisfação e
desmotivação. Bezerra et al (2015, p. 65) afirma que a exigência
por produção faz do trabalhador um mero reprodutor de servi-
ços, com perda da autonomia e abdicação do produto final. Vale
lembrar que as exigências do mercado são realidades das quais
não se pode fugir.
Alguns estudiosos demonstram preocupação com a profis-
são docente, devido ao mesmo estar diretamente ligado aos seus
clientes, que são os alunos, familiares e colaboradores da escola.
Essa ligação submerge além do profissional, pois seu ofício mui-
tas vezes envolve uma relação afetiva, emocional e de referência
social. O produto do trabalho pedagógico é a transformação da

223
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

personalidade do aluno, que deve permanecer por toda a vida


(BEZERRA et al, 2015, p. 65).
Inúmeros fatores que ocorrem no dia a dia do professor
dificultam seu trabalho, sejam eles, as constantes mudanças que
o mercado propõe, aumento de atividades e responsabilidades
que sobrecarregam, condições de trabalho precária, demanda
elevada, intensificação das atividades dentro e fora da escola,
reformas políticas, que não têm a participação do professor,
desvalorização econômica, descaracterização do real papel que
deve exercer, violência envolvendo alunos contra professor, meio
ambiente desconfortável, ruído constante, desgaste da voz, alu-
nos com diversos problemas que impedem as ações do professor,
medo e incertezas devido às modificações e transformações da
sociedade, falta de reconhecimento pelo trabalho exercido, falta
de tempo para sua vida social e familiar (BEZERRA et al, 2015).
Além das situações na relação professor-aluno, ressalta-se
a relação professor-professor, professor-diretor, professor-
comunidade e professor-família. Caso essa relação esteja além
da capacidade de enfrentamento, existe a probabilidade de
acarretar sofrimento que interfere na saúde, na qualidade do
serviço, resultando diminuição na produtividade. Para confirmar
este relato Servilha e Pereira (2008) afirmam que:

O excesso de atividades e responsabilidades impostas


ao professor, podem gerar ansiedade, estresse, aumento
no índice de absentismo e de atestado médico, esgota-
mento físico, mental e emocional, mudança de profissão,
depressão. As relações interpessoais dentro das escolas
nem sempre são tranquilas e facilitadoras, pois existe
competitividade, egocentrismo e falta de companheiris-
mo, o que acarreta comprometimento físico, distúrbios
mentais e outros problemas de saúde na comunidade
docente (SERVILHA; PEREIRA, 2008, p. 23).

224
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Observa-se que mesmo diante das dificuldades, alguns


professores conseguem exercer seu ofício com prazer, tentando
dar um novo significado a sua carreira e desenvolver estratégias
de defesa. Percebe-se que há comportamentos construídos e
mobilizados pelo próprio professor, cujo cansaço e desgaste
apresentado se transforma em vontade de realizar seu trabalho
da melhor forma possível, influenciando vidas, para promover
um futuro promissor.
Segundo Gilna e Rocha (2016, p. 266), encontram-se profes-
sores que, mesmo com todos os obstáculos já referidos, fazem o
exercício diário de buscar novas formas de lidar com os limites
e as dificuldades de seu trabalho.
As pressões recebidas no local de trabalho são consequên-
cias das constantes mudanças e exigências do mundo globalizado,
e a elas, o profissional precisa adaptar-se e desenvolver estra-
tégias que possam fazer com que ele mesmo se sinta realizado.

Apresentação e análise dos resultados

Neste capítulo apresentam-se os resultados coletados na


escola selecionada para este estudo, e a posterior análise destes
dados.
O item 1 identificou o gênero dos respondentes para compor
o perfil dos respondentes e conforme dados, verificou-se que
existe uma predominância do sexo feminino na escola, pois na
pesquisa encontraram-se 92% dos respondentes femininos, e
apenas 8% do total é do sexo masculino. Fato que se torna bem
compreensível, por se tratar de profissionais que atuam no ensi-
no fundamental I. Vive-se na consequência de que desde o início
da história da educação no Brasil, a maioria desses profissionais
que atuavam principalmente nas séries iniciais era de mulheres,
pois seu papel na escola era visto como extensão do lar e asso-
ciado ao cuidado. O conceito de feminização do magistério não

225
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

se refere apenas à participação maciça de mulheres nos quadros


docentes, mas também à adequação do magistério às caracterís-
ticas associadas tradicionalmente ao feminino, como o cuidado
(O PERFIL DOS PROFESSORES BRASILEIROS, 2004, p. 43).
O item 2 identificou a faixa etária dos respondentes para
compor seu perfil e, conforme pesquisa, observa-se que um maior
percentual de 34% está na faixa etária entre 32 a 37 anos, seguido
de 28% que estão na faixa etária entre 25 a 31 anos. Em seguida,
com 22% das afirmativas, vem o grupo de idade entre 38 a 43
anos, 11% estão na faixa etária de 18 a 24 anos e 5% com mais
de 44 anos. Então, no grupo dos respondentes da escola, 84%
têm entre 25 e 43 anos. Pode-se afirmar com isso que é um grupo
relativamente jovem, mas que traz uma bagagem de maturidade
que os capacita a lidar com os desafios de formar crianças do
ensino fundamental como afirma Abrucio (2016, p. 30), quando
diz que a docência lida com uma série de aspectos da carreira e
do contexto escolar, apontando para habilidades e competências
que vão além da didática sobre determinado conteúdo.
O item 3 identificou o grau de instrução dos respondentes
para compor o perfil dos respondentes e, conforme pesquisa,
verifica-se que 82% dos professores respondentes encontram-
se no nível de pós-graduação, enquanto que 18% afirmaram
que possui curso superior completo, não se encontrando nesta
amostra componente que tenha como seu último estágio o nível
médio na modalidade normal. Este resultado é enriquecedor para
a pesquisa, pois demonstra que a escola objeto deste estudo tem
um quadro de profissionais qualificados trabalhando no ensino
fundamental, confirmando o que diz Fleig (2003) quando afirma
que é unicamente do trabalhador a responsabilidade por sua
qualificação, ou seja, a exigência por profissionais cada vez mais
qualificados e produtivos gera no trabalhador o sentimento de
responsabilidade por sua formação para atender requisitos do
cargo que ocupa.

226
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

O item 4 identificou o tempo de trabalho dos respondentes


para compor o perfil dos respondentes e, conforme pesquisa,
verifica-se que uma maioria de 34% tem entre 8 e 11 anos de
trabalho, seguindo de um percentual de 28% que trabalham de
4 a 7 anos, um percentual de 22% que trabalha há mais de 11
anos na escola de ensino fundamental e 5% têm menos de 1
ano. Este resultado também é expressivo para este estudo, pois
constata-se que a maioria está na escola há bastante tempo, ou
seja, já reuniram uma experiência de vida também no ambiente
de trabalho.
Com este item encerra-se o bloco e foi delineado o perfil
dos participantes da pesquisa, que, por fim, é composto predo-
minantemente por mulheres, com idade entre 25 e 43 anos, no
grau de instrução predominante de pós-graduação e que têm no
mínimo 4 anos de trabalho na escola, sendo que uma parte delas
tem mais de 11 anos de trabalho na instituição.

Quadro 2 - Perfil.

Gênero

Masculino Feminino

8% 92%

Faixa Etária

18 a 24 25 a 31 32 a 37 38 a 43 Mais de 44
anos anos anos anos anos

11% 28% 34% 22% 5%

Grau de Instrução

Nível Médio Nível Médio Nível Médio Nível Superior Pós-Gradu-


Incompleto Completo Incompleto Completo ação

0% 0% 0% 18% 82%

227
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Tempo de Trabalho

Menos de 1 1a3 4a7 8 a 11 Mais de 11


ano anos anos anos anos

5% 11% 28% 34% 22%

Fonte: Dados da pesquisa de campo, 2017.

O item 5 identificou a rotina extensa como fator contributivo


para afetar a saúde dos professores e, conforme dados coletados,
verificou-se que uma maioria de 45% afirma que contribui muito,
seguindo-se de um percentual de 30% que acredita que afeta
totalmente. Um percentual de 14% demonstrou ser indiferente
na percepção deste aspecto, enquanto que 11% afirmaram que
contribui pouco. Diante do percentual de contribuição, pode-se
afirmar que este resultado corrobora com o que relatam Maria-
no e Muniz, (2006, p. 80), quando descrevem que o exercício da
profissão docente é composto de fatores que comprometem sua
saúde física e mental, causando-lhe sofrimento e desgaste que
desencadeiam doenças somáticas e psíquicas ou psicossomáti-
cas. Essa relação não atinge só o corpo físico do professor, como
também afeta a sua saúde mental, através de sentimentos nega-
tivos, baixa a autoestima, aumenta a insatisfação e o desprazer.
O item 6 identificou a escassez de tempo como fator contri-
butivo para afetar a saúde dos professores e, conforme dados
coletados, verificou-se que 48% dos pesquisados afirmam que
contribui muito, seguindo-se de um percentual de 27% que decla-
ram que contribui totalmente, enquanto 25% deles demonstra-
ram ser indiferentes na análise deste aspecto. O total de 75% de
percepção de contribuição deste fator como um dos que afetam
a saúde dos professores, concorda com o que dizem Mariano e
Muniz (2006) quando afirmam que a dinâmica de trabalho do
professor é bastante intensa e por isso muitos não conseguem
conciliar o seu tempo com as atividades escolares, ocasionando

228
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

sobrecarga com maior dedicação ao trabalho e menor atenção


para a sua vida pessoal. Diante disso, ele estabelece uma relação
diária composta de fatores que causam fadiga, ansiedade, cansaço
e tensão que comprometem sua saúde.
O item 7 identificou os baixos salários dos respondentes
como fator contributivo para afetar a saúde dos professores e,
conforme dados coletados, verificou-se que um percentual de
34% dos pesquisados afirmaram que o critério baixos salá-
rios contribui totalmente para afetar a saúde dos professores,
enquanto que o mesmo percentual de 34% declararam que
contribui muito. Um percentual de 10 % declarou-se indiferen-
te e pequeno percentual de 5% disse que contribui pouco. Este
resultado confirma o que dizem Bezerra et al (2015), quando
eles afirmam que inúmeros fatores que ocorrem no dia a dia
do professor dificultam seu trabalho, sejam eles as constantes
mudanças que o mercado propõe, aumento de atividades e
responsabilidades que sobrecarregam, condições de trabalho
precárias, demanda elevada, intensificação das atividades dentro
e fora da escola, reformas políticas, que não têm a participação
do professor, desvalorização econômica, descaracterização do
real papel que deve exercer, violência envolvendo alunos con-
tra professor, meio ambiente desconfortável, ruído constante,
desgaste da voz, alunos com diversos problemas que impedem
as ações do professor, medo e incertezas devido às modificações
e transformações da sociedade, falta de reconhecimento pelo
trabalho exercido, falta de tempo para sua vida social e familiar,
dentre outros.
O item 8 identificou a sobrecarga de trabalho como fator con-
tributivo para afetar a saúde dos professores e conforme dados
coletados, verificou-se que 61% dos pesquisados declararam que
a sobrecarga de trabalho contribui muito para afetar a saúde dos
professores, enquanto que 34% deles afirmaram que contribui
totalmente. Um pequeno percentual de 5% afirmou que é indi-
ferente na análise deste aspecto. Este resultado está de acordo

229
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

com o que descreve Nóvoa (1992), quando afirma que o trabalho


do professor tem a cada dia se intensificado com o acúmulo de
atividades diárias e sobrecarga constante. Essa intensificação
na rotina de trabalho pode fazer com que o professor sinta di-
ficuldades de realizar suas tarefas básicas, comportando-se de
forma menos autônoma.
O item 9 identificou a desvalorização da profissão como
fator contributivo para afetar a saúde dos professores e, con-
forme dados coletados, verificou-se que um percentual de 50%
dos pesquisados afirmaram que a desvalorização da profissão
de professor afeta muito a saúde dos profissionais desta área e
ainda 28% deles afirmaram que afeta totalmente. Um percentual
de 14% afirmou que é indiferente na análise deste aspecto e 8%
percebem que contribui pouco. O alto percentual de percepção
de que este fator afeta a saúde dos professores confirma o que
diz Prado (2013), quando ele descreve que, em alguns casos,
percebe-se que o atual cenário gera uma sensação de desvalori-
zação e banalização da profissão de professor, pois são exigidas
várias atribuições a ele, que ele mesmo não se vê nas condições
de realizá-las na sua totalidade, e é importante frisar que esse
processo está presente durante toda sua vida profissional.
O item 10 identificou o desinteresse dos alunos como fator
contributivo para afetar a saúde dos professores e, conforme
dados coletados, verifica-se que 50% dos pesquisados percebem
que o desinteresse dos alunos contribui totalmente para afetar a
saúde dos professores e que 38% deles afirmaram que contribui
muito. Um percentual de 12% demonstrou ser indiferente na
análise deste fator. Este resultado vem confirmar o que descre-
vem os autores Bezerra et al (2015) quando eles afirmam que
inúmeros fatores que ocorrem no dia a dia do professor dificul-
tam seu trabalho, sejam eles, [...] alunos com diversos problemas
que impedem as ações do professor, [...] dentre outros.

230
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

O item 11 identificou o ambiente inadequado como fator


contributivo para afetar a saúde dos professores e, conforme
dados coletados, verificou-se que 56% dos pesquisados decla-
raram que trabalhar em um ambiente inadequado contribui
muito para afetar a saúde dos professores, enquanto que 39%
afirmaram que contribui totalmente e um pequeno percentual
de 5% disseram que são indiferentes à análise deste fator. Este
resultado confirma o que dizem Bezerra et al (2015), quando
eles afirmam que inúmeros fatores que ocorrem no dia a dia do
professor dificultam seu trabalho, sejam eles, as [...] condições
de trabalho precárias, [...], meio ambiente desconfortável, ruído
constante, desgaste da voz, [...], falta de tempo para sua vida
social e familiar, dentre outros.
O item 12 identificou a violência como fator contributivo
para afetar a saúde dos professores e, conforme dados coleta-
dos, verificou-se que 56% acreditam que contribui totalmente
e 36% declararam que contribui muito. Um percentual de 5%
demonstrou que é indiferente à análise deste fator, 3% afirma-
ram que contribui pouco. Este resultado confirma o que dizem
Bezerra et al (2015), quando eles afirmam que inúmeros fatores
que ocorrem no dia a dia do professor dificultam seu trabalho,
sejam eles, [...] violência envolvendo alunos contra professor,
[...], dentre outros.
O item 13 identificou o não reconhecimento por parte da
direção como fator contributivo para afetar a saúde dos profes-
sores e, conforme dados coletados, verificou-se que 42% dos
pesquisados afirmaram que contribui muito o não reconheci-
mento de suas práticas para afetar sua saúde, enquanto que 34%
acreditam que contribui totalmente. Um percentual de 16% deles
afirmaram que são indiferentes à análise deste fator e ainda 3%
que afirmaram que contribui pouco e 5% que declararam que
não contribui. O maior percentual de que este é um fator que
afeta a saúde dos professores vem a confirmar o que dizem Glina
e Rocha (2016) quando afirmam que são encontrados professo-

231
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

res que, mesmo com todos os obstáculos já referidos, fazem o


exercício diário de buscar novas formas de lidar com os limites
e as dificuldades de seu trabalho, pois as pressões recebidas no
local de trabalho são consequência das constantes mudanças e
exigências do mundo globalizado, e a elas, o profissional precisa
adaptar-se e desenvolver estratégias que possam fazer com que
ele mesmo se sinta realizado.
O item 14 identificou o fator falta de políticas educacionais
como fator contributivo para afetar a saúde dos professores e,
conforme dados coletados, verificou-se que 38% dos pesquisados
acreditam que este fator contribui muito para isso e ainda 36%
deles declararam que contribui totalmente. Tem-se ainda que um
percentual de 15% afirmou que contribui pouco e 8% se coloca-
ram como indiferentes para a análise deste aspecto, porém, um
pequeno percentual de 3% afirmaram que não contribui. Este
alto percentual de contribuição confirma o que dizem Bezerra
et al (2015), quando eles afirmam que inúmeros fatores que
ocorrem no dia a dia do professor que dificultam seu trabalho,
sejam eles, [...] reformas políticas que não têm a participação do
professor, [...], dentre outros.
Portanto, segue abaixo gráfico geral com a avalição dos fato-
res e suas respectivas notas conforme percepção dos professores
entrevistados.

232
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Quadro 3 - Avaliação Geral dos Fatores

Não Contribui Indiferente Contribui Contribui


contribui pouco muito total-
mente

Rotina 0% 11% 14% 45% 30%


extensa

Escassez de 0% 0% 25% 48% 27%


tempo

Baixos 0% 5% 10% 42% 43%


salários

Sobrecarga 0% 0% 5% 61% 34%


de trabalho

Desvalo- 0% 8% 14% 50% 28%


rização da
profissão

Desinteresse 0% 0% 12% 38% 50%


dos alunos

Ambiente 0% 0% 5% 56% 39%


inadequado

Violência 0% 3% 5% 36% 56%

Não reco- 5% 3% 16% 42% 34%


nhecimento
por parte da
direção

Falta de 3% 15% 8% 38% 36%


políticas
educacionais

Fonte: Dados da pesquisa de campo, 2017.

Sendo assim, encerra-se este capítulo dando sequência ao


trabalho por meio das considerações finais, que depois desta
análise já pode responder aos objetivos propostos.

233
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Considerações finais

É possível perceber que os profissionais da área de educação


que trabalham com alunos de 1º e 2º anos do ensino fundamental
são afetados por diversos fatores do seu dia a dia de trabalho
que podem levá-los a contrair doenças, sejam elas de natureza
física ou mental.
O primeiro objetivo específico deste trabalho se propôs a
identificar os fatores físicos que contribuem para as doenças dos
professores e identificou-se que são rotinas extensas, sobrecarga
de trabalho e o ambiente inadequado. As análises comprovam
os estudos de Dejours (1993), no que diz respeito à importância
que deve ser dada às condições de trabalho, que neste caso, estão
relacionadas não só ao ambiente físico, como também a higiene.
O segundo objetivo específico se propôs a identificar os
fatores mentais que contribuem para causar doenças nos profes-
sores e identificou-se que os fatores mentais são o não reconhe-
cimento por parte da direção, escassez de tempo, o desinteresse
dos alunos, os baixos salários, a violência e a desvalorização da
profissão. As análises confirmam os estudos de Dejours (1987)
que diz que a organização do trabalho exerce sobre o homem uma
ação específica, cujo impacto é o aparelho psíquico. Ressaltam-se
também, nesta análise, as relações de trabalho defendidas pelo
mesmo autor.
O terceiro objetivo específico se propôs a identificar o fa-
tor que menos contribui para gerar doenças nos professores e
identificou-se que este fator, segundo a pesquisa realizada nesta
escola de ensino fundamental I, é a falta de políticas educacionais.
O fator falta de políticas educacionais na pesquisa foi considerado
como menos significante.
Rotina extensa, escassez de tempo e de recursos, baixos
salários, sobrecarga de trabalho, desvalorização da profissão,
desinteresse dos alunos, ambiente inadequado, violência, não

234
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

reconhecimento por parte da direção da escola e falta de po-


líticas educacionais são fatores apresentados pelos autores da
base teórica deste estudo, os quais contribuem para o processo
de adoecimento mental do profissional professor (ROSSO, 2008;
DEJOURS, 2006; FLIEG 2003).
Por outro lado, os mesmos autores relatam que o professor
consegue relacionar-se afetivamente e prazerosamente com
seus alunos, de modo que estabelece uma relação de doação. De
acordo com Dejours (apud Glina; Rocha, 2016, p. 249), a relação
trabalho-saúde não é apenas fonte de doença e infelicidade, mas
atua também como operadora de saúde e prazer.
Este trabalho, que partiu da problemática onde eram in-
dagados quais os fatores que ocorrem na rotina de trabalho do
professor do Ensino Fundamental I do 1º e 2º anos, que são con-
siderados pelos mesmos como acontecimentos que afetam sua
saúde mental, dá-se por concluído e a pesquisa identificou que
entre os dez (10) fatores colocados em ordem de importância de
percepção nas escalas contribui totalmente e contribui muito,
encontram-se: 1º sobrecarga de trabalho com 95%, 2° ambiente
inadequado com 95%, 3º violência com 92%, 4º desinteresse dos
alunos com 88%, 5º baixos salários com 85%, 6° desvalorização
da profissão com 78%, 7° não reconhecimento por parte da
direção com 76%, 8° escassez de tempo com 75% e 9º rotinas
extensas com 75% e 10° falta de políticas educacionais com 74%.
Sendo assim, o trabalho que se propôs a analisar na rotina
do professor do 1º e 2º anos do Ensino Fundamental I, fatores
que afetam sua saúde mental como objetivo geral, alcançou o
seu propósito e os fatores que afetam a saúde dos professores
deste nível estão relacionados em ordem classificatória no pará-
grafo anterior, onde a problemática da pesquisa foi respondida.
Conforme dados coletados nessa pesquisa, vale ressaltar que
os resultados referem-se a uma amostra de professores de uma
escola privada, portanto, não podem ser generalizados. Desde

235
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

modo, sugere-se que seja dada sequência a este estudo em mais


de uma escola privada ou em uma escola pública, para assim
poder comparar os resultados.

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www.periodicoshumanas.uff.br/ecos/article/view/1010. Acessado em:
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28/09/2017.
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GLINA, D. M. R., ROCHA, L. E. Saúde Mental no Trabalho: da teoria à prática.
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TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

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237
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

SOBRE O QUE PENSAM A ESSE RESPEITO OS FUTUROS


PROFESSORES DE FÍSICA NO IFCE – CAMPOS FORTALEZA

Alles Lopes de Aquino1

Introdução

Este artigo trata de uma experiência docente voluntária na


disciplina de Didática Geral no curso de Licenciatura em Física
do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará
(IFCE)-Campus Fortaleza, durante o semestre de 2013.1. Com
uma carga horária de 80 horas, esta foi trabalhada em uma turma
inicialmente com 29 inscritos, mas que, ao final, foi encerrada
com 24 licenciados.
Segundo informações disponibilizadas pelo site da insti-
tuição ofertante2, o curso de Licenciatura em Física teve o início
de suas atividades no segundo semestre do ano de 2002, sendo
reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) em 18 de junho
de 2007. O mesmo oferece 35 vagas semestralmente e deve ser
cursado no mínimo em 3 anos. Possui em sua matriz curricular
um total de 60 disciplinas, das quais 37 são obrigatórias e 23 são
optativas, tendo como principais formas de ingresso o vestibu-
lar, e agora, com a adesão aos novos meios de acesso ao ensino
superior no país, o Exame Nacional do Ensino Médio, bem como
por meio de transferência de curso ou ainda por solicitação de

1 Doutor e mestre em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC)


2 http://www.ifce.edu.br/20-cursos-ofertados/cursos-em-fortaleza/320-licenciatura-em-fisica45.
html

239
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

entrada como aluno graduado.


Escolhemos desenvolver nossos argumentos segundo duas
perspectivas principais que permearão todo o texto: a primei-
ra está relacionada à importância da Didática na formação de
professores de um modo geral, tendo em vista ser o ensino uma
das principais ações no campo profissional docente; a segunda
discorre sobre a dificuldade e a resistência dos futuros licencian-
dos de Física em aceitar estudar e trabalhar com as chamadas
disciplinas pedagógicas em sua formação, uma vez que há uma
cultura de se priorizar aquelas que envolvem o cálculo e Física
propriamente dita.
Sobre esse assunto, há um problema que agora iremos
apenas anunciá-lo, mas que mais adiante trataremos de ma-
neira mais aprofundada. No interior da instituição, existe uma
tradição de formação técnica muito grande e esta tem reflexos
diretos naquilo que vamos chamar de cultura institucional de
formação dos futuros professores de Física. Toda essa realidade
interfere diretamente naquilo que os licenciados pensam sobre a
licenciatura e o ensino, fato este que iremos tratar mais adiante
nos resultados alcançados com a pesquisa.
Desta forma, advinda dessas ponderações preliminares,
apresentamos uma questão que nos inquietou por todo o semes-
tre e que se constituiu como problema central deste trabalho:
porque os licenciandos em Física daquela instituição possuem
tanta resistência em conhecer e se apropriar dos conhecimentos
didático-pedagógicos, uma vez que estão se preparando para o
trabalho docente?
Nosso trabalho consistiu, portanto, na busca de uma respos-
ta para essa indagação segundo a visão dos próprios licenciados,
como contribuição ao estudo da didática, especialmente, pelo
campo de pesquisa ter demonstrado um ambiente inicialmente
de certa hostilidade e resistente aos estudos desta disciplina.
Assim, temos como objetivo principal para esta empreitada,

240
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

discutir sobre o que pensam os licenciandos sobre sua formação


em Didática, a partir da experiência docente na disciplina de
Didática Geral ministrada no curso de licenciatura em Física do
IFCE – Campos Fortaleza, no semestre 2013.1.
Adiante apresentamos nosso referencial teórico no intuito
de consubstanciar a fala dos sujeitos entrevistados e dos dados
apresentados ao final deste trabalho.

Conversando com outros autores

Partindo do pressuposto e do entendimento pacífico de que


o ensino é parte integrante e estrutural do ato educativo na e
da escola, parece-nos que este não pode ser deixado de lado ou
mesmo estudado de forma alinhavada no processo de formação
docente, a despeito do nível em que se vai trabalhar.
Franco (2012) afirma que a prática docente pode ser consi-
derada como verdadeira prática pedagógica na escola, quando
está clara a intencionalidade da aula de um professor, qual o seu
sentido no processo de formação do educando, cuja ação seja
capaz de integrar e expandir esta formação, dialogando com suas
necessidades, sobretudo, insistindo em sua aprendizagem. Tais
condições não são garantias desta última, mas, entendemos ser
este o caminho mais consciente e justo para se levar adiante o
ensino em uma sala de aula.
Inevitavelmente, todo professor ensina. Entretanto, lidar
com este aspecto na formação docente é condição sine qua non
para que no futuro esse profissional da educação seja capaz de
cumprir suas atribuições para além do pragmatismo da obriga-
ção, que possa de fato pautar o ensino não apenas como mais
uma rotina a ser levada a cabo em sua(s) sala(a)s de aula(s), mas
que se possa neste fazer construir uma via de mão dupla onde
ambos, professor e educando, possam partilhar tanto da expe-
riência de ensinante como a de aprendende. Encontramos eco

241
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

deste entendimento em Japiassu (1992) ao trazer um trecho da


obra de Ganton Bachelard ao dizer que um “(...) homem é uma
péssima companhia. Aprendemos sempre e um mestre deve
sempre se fazer aluno”.
É preciso, portanto, buscar melhor entendimento sobre o
que de fato é ensinar e como esta ação deve ser empreendida no
contexto da educação escolarizada. A didática, como principal
campo da pedagogia para lidar com as questões que envolvem
os processos de ensino e aprendizagem possui legitimidade e
advoga para si cuidar desta parte da educação, mas, imbuído do
sentimento de nossa questão de pesquisa, por que esta disciplina
possui tanta resistência em ser estudada nas licenciaturas, em
especial, naquelas diferentes do campo de estudo dos pedagogos?
Talvez tenhamos parte desta resposta recorrendo a Garri-
do (2011) ao tratar da gênese da didática no Brasil, afirmando
que sua introdução na academia ocorreu como uma disciplina
nos cursos de formação de professores, identificada e reduzida
como aquela capaz de prescrever métodos e técnicas de ensinar,
destituindo-a do seu papel político, transformando-a em um
receituário mágico para tratar do ensino. Cremos que essa con-
cepção enviesada da didática tenha contribuído visceralmente
para que, no campo da formação de professores, em especial,
nas chamadas didáticas específicas, termo utilizado por alguns
autores como Garrido (2011) e Libâneo (2012) para tratar do
ensino em campos epistemológicos particulares em cada ciência,
como a Física, por exemplo, tenham levado a Didática a ocupar
reduzidos espaços e de importância secundária na formação
docente.
Em um caminho inverso e tentando colocar a Didática em
seu devido lugar, entende-se que lidar com esse campo do co-
nhecimento requer, ante de tudo, apropriação epistemológica e
metodológica do que de fato é a didática, retirando de si esse o
entendimento reducionista anteriormente mencionado. A esse

242
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

respeito, Sforni (2012, p. 469) asseverou:


Nesse contexto, parte-se do pressuposto de que a função
primordial da escola é a socialização do conhecimento,
produzido historicamente e consolidado nos diversos
conteúdos curriculares, cabendo ao professor o domínio
desse conhecimento, bem como dos meios para torná-lo
acessível aos estudantes. Nessa perspectiva, o eixo central
da formação de professores está na interação do campo
disciplinar com o campo da Didática, não apenas quanto
ao domínio dos conhecimentos técnicos, como também
quanto ao domínio teórico da atividade de ensino.

Trata-se, portanto, em buscar o entendimento e a compre-


ensão de que, na formação docente, é responsabilidade do futuro
educador desenvolver em si não apenas os conhecimentos téc-
nicos inerentes ao campo disciplinar escolhido, mas, também,
promover ao longo de sua formação e principalmente quando
do seu efetivo trabalho, caminhos pelos quais se construam ma-
neiras de se caminhar juntos, onde seja possível que o educando
tenha, quando necessário, o suporte do professor ao lhe ensinar,
porém, sem que se perca a capacidade de se tornar um sujeito
autônomo.
Para o futuro professor de física este é um caminho que se
apresenta tão imperativo quanto em qualquer outra área do co-
nhecimento. Nesse caso, é preciso estar claro o porquê que ele
deve se preocupar para além dos conteúdos específicos desta
disciplina. Para tanto, verifiquemos o que nos traz Abril e Nardi
(2015, p. 02):

Partimos do pressuposto de que ensinar Didática da


Física implica o ensino de conhecimentos para que o
professor compreenda o que é que vai ensinar, como,
por que e para quem. Assim, esse tipo de conhecimento
vai além dos conteúdos das ciências exatas, uma vez que

243
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

são necessários conhecimentos das ciências humanas e


das ciências sociais relacionados à questão do ensino
da física. Por isso consideramos que os resultados de
pesquisa no campo de ensino de física podem auxiliar na
consolidação dos conteúdos e das metodologias a serem
trabalhados em um curso de Didática da Física.

Tendo em vista esse quadro, o de que é preciso auxiliar na-


quilo que é necessário e possível ao futuro professor de física,
entender de que maneira ele pode melhor desenvolver suas ações
no processo de ensino e aprendizagem e de que há, no tocante à
formação de professores no IFCE – Campos Fortaleza, uma certa
resistência dos licenciados dessa área em cursar as disciplinas
pedagógicas, neste caso, a de Didática Geral, é que partimos para
discutir os problemas e os entendimentos que foram construí-
dos sobre a obrigatoriedade de cursar essa disciplina em nossa
experiência docente nesta instituição.

Materiais e métodos

Este trabalho constitui uma pesquisa de abordagem qualita-


tiva, uma vez que procurou discutir uma determinada realidade
a partir do entendimento dos atores constituintes da mesma,
utilizando para isso a estratégia do estudo de caso. Ao todo fo-
ram ouvidos quatro licenciandos do quarto semestre do curso
de Licenciatura em Física do IFCE – Campus Fortaleza. Apesar
da disciplina, naquela oportunidade, contar com a presença de
licenciados de um outro curso, no caso, de Licenciatura em Artes
Visuais, optamos em levar em consideração apenas a fala dos
educandos de física, tendo em vista o recorte intencionalmente
dado à pesquisa, restrito ao curso de Física.
Os instrumentos de pesquisa foram a observação direta no
ambiente de sala de aula, tomando o cuidado de não fazer lei-
turas parcializas daquilo observado, procurando ser o mais fiel

244
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

possível na apreensão da realidade em estudo. Os licenciados


foram informados que, a partir de um determinado momento da
disciplina, o professor passaria a observá-los, tomando, daquele
momento em diante, todos os acontecimentos como material
a ser estudado, tendo livre consentimento da turma para isso.
A pesquisa bibliográfica constituiu o principal suporte para a
construção do referencial teórico. Além desses, foram realizadas
entrevistas semiestruturadas, que foram pensadas segundo uma
visão abrangente, permitindo aos entrevistados passar suas im-
pressões pessoais sobre o que estava sendo pesquisado.
Os registros de toda a pesquisa limitaram-se estritamente a
escrita dos depoimentos, sendo também sistematizados em uma
caderneta os apontamentos daquilo que ia sendo observado em
cada encontro.
Os dados da pesquisa foram agrupados segundo as princi-
pais categorias surgidas no campo de pesquisa. Estas passaram
por um critério de escolha pautado em suas recorrências e impor-
tância demonstradas pela própria fala dos sujeitos pesquisados.

Os dados de pesquisa

Apresentamos agora os resultados desta pesquisa, consis-


tindo em uma discussão sobre o que pensam um grupo de licen-
ciados do curso de Física do IFCE – Campos Fortaleza, acerca da
formação desses futuros professores na área da Didática. Muitas
categorias surgiram no contexto das entrevistas e por meio das
nossas observações colhidas em sala de aula. No entanto, três
delas se mostraram, senão mais importantes, mais expressivas
e recorrentes durante todo o processo. Foram elas: a importân-
cia da formação em Física em detrimento de qualquer outra; a
Didática como conhecimento e prática secundária; por fim, após
o trabalho ao longo do semestre 2013.1, o reconhecimento da
Didática para além de um conjunto de técnicas de ensino.

245
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Recuperando as palavras de Garrido (2011), ao tratar da


gênese da Didática em nosso país e sua introdução na acade-
mia, cujo papel seria o de fornecer um conjunto de métodos e
técnicas de ensino, é possível inferir que essa forma de ver a
Didática transpassou os anos e se constitui ainda como verda-
de nos dias de hoje. A posição dos educandos vai ao encontro
do que diz a autora, coadunando-se com o desejo destes em
serem físicos bacharéis, o que nos parece bastante contradi-
tório, uma vez que o curso em questão trata da formação de
professores, logo, natural que se exija, também, uma formação
para a docência.
Desta forma, passamos a discutir a primeira categoria, a qual
demonstra que existe consenso entre os licenciados da importân-
cia da formação em física em detrimento de qualquer outra, no
sentido de uma prioridade plena. Esse posicionamento encontra
eco na fala de um dos educandos entrevistados, ao dizer:

Não tenho nem dúvida que eu quero mesmo é ser físico,


fazer pesquisa. Esse negócio de ter que cursar disciplina
da pedagogia, a própria Didática, não é pra mim não.
Gosto mesmo é de cálculo, de fórmula, e só estou aqui
porque não tem bacharelado. Até mesmo os professores,
quase todos são bacharéis e não estão muito preocupados
se a gente faz ou deixa de fazer outras disciplinas fora da
física. Aliás, nem comentam sobre isso (Aluno 1).

Essa maneira de perceber a Didática não pode ser reputada


integralmente ao educando. Pelo contrário, há uma culpa, se é
que assim podemos falar, muito maior por parte da tradição
científica no tocante ao embate entre as ciências exatas e as
sociais, onde as primeiras advogam para si o status de ciências
verdadeiras, a própria posição da instituição em reduzir cada vez

246
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

mais na matriz curricular do curso de Licenciatura em Física o


número de disciplinas pedagógicas, e, por último, a resistência
dos educandos em perceberem quão importante deva ser o seu
desenvolvimento, também, na área da educação como um todo.
Não há dúvidas de que na atualidade existe um entendi-
mento cada vez mais ampliado da necessidade de integramos à
formação docente um rol de conhecimentos que extrapolam a
especialidade em cada área, recorrendo a recursos, epistemo-
logias e linguagens que proporcionarão maior capacidade do/
no professor em envolver, facilitar e ampliar as possibilidades
de discussão no fazer escolar ou mesmo em nível universitário,
em especial, na ação de ensino em sala de aula. Novamente
retomamos a Abril e Nardi (2015, p. 4) para referendar nosso
posicionamento, ao dizer que

Para o caso da formação de professores de física, é


preciso, então, considerar resultados de pesquisa que
permitam orientar o licenciando, tanto para a maior
compreensão do conhecimento científico que vai ensinar
(a física), quanto para o conhecimento que lhe permita
entender o contexto no qual vai ensinar, os objetivos de
ensinar, e as estratégias de ensino, a fim de atingir os
objetivos educacionais propostos.

A citação acima nos chama a atenção para uma das maiores


razões pela qual uma pessoa se torna professor, independente-
mente de sua área de atuação: a necessidade de compreender
onde, o que, e o porquê deverá ensinar. Essa clareza significa, em
última análise, permitir que o educando escolar ou universitário
seja capaz de participar de um processo de ensino que promova
maior multiplicidade de oportunidades de aprendizagem, ou seja,
é preciso que o professor, além de ter propriedade na disciplina
na qual irá trabalhar, torna-se imperativo que tenha consciência
de que aquilo que ele sabe a mais só terá algum sentido se isso

247
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

se coadunar com os anseios e prioridades estabelecidas pelo


educando, em uma ação onde todos aprendem entre si.
Nesse contexto, vê-se que as características ressaltadas
no parágrafo anterior, no momento em que essa pesquisa foi
realizada, escapavam, pelo menos parcialmente, do entendi-
mento dos licenciados em Física acerca da Didática e o seu
verdadeiro papel na educação. Isso nos remete à segunda
categoria, quando os respondentes consideraram a Didática
como algo secundário:

Eu só curso a disciplina de Didática por pura obrigação,


pois acho uma leitura muito teórica e não consigo en-
contrar conexão com a Física. Sei que ela fala do ensino,
de técnicas para isso, mas não consigo vê-la como algo
que efetivamente contribua com minha formação em
Física (Aluno 4)

Secundária. É assim que considero a Didática em minha


formação. Isso acontece porque não vejo muito sentido
nesta ciência, apesar de saber que ela trata das técnicas
de ensino. (Aluno 2)

Tais posicionamentos apresentam equívocos sobre o que de


fato a Didática significa para o processo de formação docente.
Esse posicionamento surgiu por diversos momentos em sala de
aula, como no caso em que estudávamos um texto que tratava
das diversas concepções sobre a Didática e um dos educandos
perguntou qual a validade de ler tudo aquilo, se não poderia ser
aplicado na Física?
Reputamos a esse conjunto quase uníssono sobre o que vem
a ser a didática naquele coletivo, não apenas à cultura instalada
na instituição sobre a formação do físico, tão arraigada no ba-
charelado, mas, também, pela tradição dos educandos em não

248
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

ler, não pesquisar e não procurar entender mais da importância


de se ter uma sólida formação na Didática. Entretanto, esse é um
problema que extrapola os muros daquela unidade educacional,
encontrando eco em análises cuja escalas são bem maiores, como
nas palavras de Pimenta (2010, p. 9):

No entanto, dadas as condições difíceis em que a escola


hoje se apresenta; as condições de pauperização dos
docentes; a falta de um pacto social de valorização da
escola e, em especial, da escola pública, a Didática tem
sido desafiada: como encontrar espaços de significação
diante de tantas condições desfavoráveis?

A crise da escola brasileira é também uma crise no processo


de formação de professores. Esses escolhem fazer um curso de
licenciatura, na maioria das vezes, sem ter a dimensão da res-
ponsabilidade do que de fato é ser professor, e as afirmações até
aqui discutidas demonstram a gravidade desta situação.
Todavia, nem tudo foi negativo em nossa experiência. Pelo
contrário, ao final do semestre saímos com a certeza de termos
deixado uma semente plantada, ainda que não possa germinar
na atuação de cada licenciando daquela turma, terminamos o
semestre diferentes do que começamos, e aqui passo a falar da
nossa última categoria, que foi o reconhecimento da Didática para
além de um conjunto de técnicas de ensino. Ao percebermos a
resistência da turma em trabalhar com a Didática, adotamos a
estratégia da sensibilização, a buscar trabalhar com as experi-
ências de alguns licenciandos que já atuavam como professores,
e, sobretudo, escutá-los.
Assim, muito mais do que procurar instrumentalizá-los no
campo da Didática, nosso trabalho foi de tentar fazer com que eles
encontrassem sentido para aquele semestre, e que seria possível
aliar a formação em Física ao que nos disse Pimenta (2010, p.

249
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

8), afirmando que a “Didática é, acima de tudo, a construção de


conhecimentos que possibilitem a mediação entre o que é preciso
ensinar e que é necessário aprender”.
Em uma avaliação final, muitos ainda disseram que sentiam
grande dificuldade em perceber e principalmente aplicar a Di-
dática em suas aulas, mas, a grande maioria da turma passou a
expressar que passaram a sentir a necessidade de não apenas
se apropriar mais da Didática, mas de entender que o professor
deve ir para a sala de aula com o foco no educando, e que o seu
conteúdo, seus métodos de ensino, seus instrumentos de ava-
liação, tudo, antes de ser aplicado, deve levar em consideração
onde eles estão e quais os interesses, vontades e disposições das
pessoas com as quais estão trabalhando.
Podemos dizer, então, que é de suma importância o despren-
dimento de energia na formação didática do licenciando. A falta
de consciência das questões aqui discutidas existe muito mais
pelo desconhecimento do que pelo posicionamento definido na
maneira de lidar com a docência. Cremos que ao final do semes-
tre colhemos bons frutos e que o esforço de buscar aprender em
conjunto prevaleceu ante a necessidade de repassar um modelo
pré-fabricado de ministrar essa disciplina naquela instituição.

Para não concluir

Este trabalho consistiu em uma pesquisa realizada durante


o semestre de 2013.1, em uma experiência como docente na
disciplina de Didática Geral do curso de Licenciatura em Física
do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará.
Procurando saber mais do porquê da resistência dos li-
cenciados desse curso em conhecer e se apropriar dos conheci-
mentos didáticos, nosso trabalho consistiu em tentar entender
as razões pelas quais essa dinâmica existia naquela instituição,
cujo intuito maior seria agregar ao campo da Didática discussões

250
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

decorrentes dessa realidade, a partir da discussão da posição


dos próprios educandos sobre sua formação para o ensino e à
docência.
Tratou-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, cuja
estratégia para a consecução da pesquisa foi um estudo de caso,
uma vez que entendemos que aquela realidade não seria capaz
de nos dar condições para uma maior generalização acerca do
fenômeno estudado. Entretanto, podemos asseverar que muitas
situações vivenciadas e aqui relatadas encontram ressonância
nos estudos sobre a Didática apresentados por diversos autores
do campo da Didática, como Franco (2012), Pimenta (2010,
2011), Libâneo (2012), dentre outros.
Nossas conclusões são, de fato parcializadas, e, na verdade,
consiste muito mais em dúvidas que dão ensejo a novas pesquisas
neste campo do que propriamente palavras finais. Como prin-
cipais contribuições, frutos deste trabalho, podemos ressaltar a
própria experiência em si, ministrando um curso de Didática na
formação de futuros professores de Física, uma vez que tínhamos
dentro de nós a certeza de que existe uma tradição de resistência
e recusa dos estudantes dessa área em lidar com as disciplinas da
educação. Assim, nossas suspeitas iniciais foram confirmadas, e,
com a pesquisa, podemos aprofundar ainda mais essa questão,
cujo percurso nos demonstrou que esse comportamento decorre,
sim, dos licenciandos, mas tal característica se apresentou com
condição secundária. Isso porque, no dia a dia da instituição
pesquisada, ficou patente que há uma tradição de formação para
o bacharelado, ainda que o curso de Física seja uma licenciatu-
ra. Os próprios professores são bacharéis e contribuem para a
continuidade desta visão.
Além dessas questões, percebemos também influências ex-
ternas na formação dessa opinião, decorrentes principalmente
da crise pela qual a escola brasileira passa, pesando bastante a
desvalorização da profissão docente. Isso contribui bastante para

251
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

que os licenciandos sintam que estão fazendo um curso de Física


de segunda categoria, uma vez que aquela de maior valorização
é o que trata da Física pura e das pesquisas nessa área.
Desta forma, encerramos este texto externando nossa satis-
fação em ter participado do processo, e que, ao final, foi possível
contribuir, pelo menos em alguns educandos, para o despertar da
necessidade de conhecer mais sobre a Didática e aprofundando-
se mais sobre as questões que envolvem a atividade docente,
como possiblidade de uma maior qualificação do curso que estão
fazendo. Trata-se de um processo em permanente construção.

Referências

ABRIL, Olga L. Castiblanco; NARDI, Roberto. OS “OBJETOS DE ESTUDO”


DA PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA SEGUNDO PESQUISADORES
BRASILEIROS.  Ens. Pesqui. Educ. Ciênc. (Belo Horizonte),  Belo
Horizonte ,  v. 17,  n. 2,  p. 414-433,  Aug.  2015 .   Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-
21172015000200414&lng=en&nrm=iso>. access on  08  Feb.  2016. 
http://dx.doi.org/10.1590/1983-21172015170207.
FRANCO, Maria Amélia do Rosário Santoro. Pedagogia e prática docente.
1ª Ed. – São Paulo: Cortez, 2012.
LIBÂNEO, José Carlos. A integração entre didática e epistemologia das
disciplinas: uma via para a renovação dos conteúdos da didática. Simpósio
“Epistemologia e didática” – XV ENDIPE, Belo Horizonte, 2012.
JAPIASSU, Hinton. Introdução ao pensamento epistemológico. 7ª Ed. – Rio
de Janeiro: F. Alves, 1992.
PIMENTA, Selma Garrido. Epistemologia da prática ressignificando a Didática.
In: FRANCO, Maria Amélia do Rosário Santoro. PIMENTA, Selma Garrido
Didática – embates contemporâneos. São Paulo: Edições Loyola, 2010.
_________, Selma Garrido. ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos.
Docência no ensino superior. 5ª Ed. – São Paulo: Cortez Editora, 2011.
SFORNI, Marta Sueli de Faria. Formação de professores e os conhecimentos
teóricos sobre a docência. In: LIBÂNEO, José Carlos . ALVER, Nilda. Temas
de Pedagogia – diálogos entre didática e currículo. 1ª Ed. – São Paulo:
Cortez, 2012.

252
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

SOBRE OS AUTORES

Alberto dos Santos Paiva Filho Graduado em Administração, Pós-


graduado com especialização em Gerência de Marketing e Mestre em
Administração de Empresas, é professor universitário e consultor de
empresas. Atuou 21 anos na função de gerente executivo em diversas
empresas como: Farmácia Dose Certa, Unimaq Moto Honda e Óticas
Boris. Professor na Faculdade Lourenço Filho nos cursos de Adminis-
tração e Gestão e professor do IEPRO na Universidade Estadual do
Ceará nos cursos de Pós Graduação em Gestão Empresarial.

Alles Lopes de Aquino - É Doutor pelo Programa de Pós-Graduação


em Educação Brasileira da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Ceará, Mestre em Educação Brasileira pela Faculdade de
Educação da Universidade Federal do Ceará, Especialista em Educa-
ção de Jovens e Adultos pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Ceará (2012), Especialista em Desenvolvimento e Meio
Ambiente pela Universidade Federal do Ceará (2002) e Licenciado em
Geografia pela Universidade Estadual do Ceará (1998). É professor da
Secretaria da Educação do Estado do Ceará na disciplina de geografia,
atuando desde 2001 em um Centro de Educação de Jovens e Adultos
(Ensino Fundamental e Médio).

Ana Carolina Costa Pereira - É licenciada em Matemática pela


Universidade Estadual do Ceará (2001) e doutora em Educação pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2010). Atua na forma-
ção de professores de Matemática com ênfase na área de História da
Matemática.

253
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Anne Karoline Cardoso Silva - Mestranda em Ensino de Ciências e


Matemática - IFCE, campus Fortaleza. Pós-graduada latu sensu em
Tecnologia da Informação e Comunicação para Educação (2017); En-
sino de Biologia (2016), pela Universidade Cândido Mendes ? UCAM.
Graduada em Licenciatura em Ciências da Natureza pela Universidade
Federal do Piauí ? UFPI (2015). Atualmente é professora de Ciências e
Biologia na rede Privada ? no município de Teresina-PI.

Antonia Naiara de Sousa Batista - É mestranda da Pós-Graduação


em Ensino de Ciências e Matemática (PGECM/IFCE). Licenciada em
Matemática pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Membro do
Grupo de Pesquisa em Educação e História da Matemática (GPEHM/
UECE). Foi bolsista de Iniciação Cientifica (PIBIC/CNPq). Desenvolve
atividades na linha de pesquisa relacionada à História da Matemática
e Formação de Professores.

António Fernando Zucula (e-mail: anzucula@gmail.com) - Licenciado


em ensino de Matemática e Física, pela Faculdade de Ciências Naturais
e Matemática da Universidade Pedagógica – Moçambique, Mestre em
Ciências Naturais e Matemática pela Faculdade de Educação da Univer-
sidade Eduardo Mondlane – Moçambique e Doutorando do Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (ProPEd/UERJ) desde 2015, área de concentração: Currículo,
Grupo de Pesquisa: Políticas de Avaliação, desigualdades e Educação
Matemática. Professor de Estatística/Probabilidade na Academia de
Ciências Policiais (ACIPOL) – Moçambique e coordenador de área de
ciências exatas (2007-2014) e de estágio profissional (2009-2014) e
professor de Matemática e Estatística/probabilidade na Universidade
São Tomás de Moçambique (USTM) e coordenador do Grupo de Mate-
mática e Estatística (2009-2014).
http://www.acipol.ac.mz.

Antonio Marcelo Araújo Bezerra - Mestre em Ensino de Matemática


pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Especialista em Ensino de
Matemática pela Faculdade Ateneu e licenciado em Matemática pela

254
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Universidade Vale do Acaraú (UVA). Professor da rede municipal de


Canindé-Ce e da Secretaria da Educação do Estado do Ceará (SEDUC)

António Pedro Costa  - É um dos investigadores do software de apoio


à análise qualitativa webQDA (www.webqda.net), área em que tem
publicados, em co-autoria, diversos artigos em congressos nacionais e
internacionais, artigos em revistas e capítulos de livros. É o Coordena-
dor do Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa (www.
ciaiq.org) e do World Conference on Qualitative Research (www.wcqr.
info). É membro do working group 1: “Theory, analysis and models of
peer review” da ação COST “New Frontiers of Peer Review” (http://
www.peere.org/). Paralelamente, é Professor Auxiliar no Instituto de
Gestão e Tecnologia (ISLA), em que lecciona Unidades Curriculares
de Metodologias de Investigação. Atualmente, está desenvolvendo o
Pós-Doutoramento “Implementação e Avaliação de Instrumentos para
Análise Qualitativa na Investigação em Educação” Centro de Investiga-
ção em Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF), da 
Universidade de Aveiro. É colaborador do Laboratório de Inteligência
Artificial e Ciência de Computadores (LIACC), da Faculdade de Enge-
nharia da Universidade do Porto. É diretor de edições científicas da
editora Ludomedia (www.ludomedia.pt). As suas áreas de investigação
contemplam a Investigação Qualitativa e Métodos Mistos, a Interação
Homem-Máquina e Desenvolvimento de software.

Edmo Fernandes Carvalho - É Licenciado em Matemática, Universi-


dade Católica do Salvador (UCSAL). Doutorando no programa de pós-
graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências, Universidade
Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Estadual de Feira de Santana
(UEFS). Professor de Matemática na rede pública de ensino do estado
da Bahia e Substituto no Departamento de Ciências Exatas (UEFS).

Eugeniano Brito Martins - É professor do Instituto Federal de Edu-


cação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). Especialista em Ensino
de Matemática (UECE) e em Planejamento Educacional (UVA-CE).
Graduado em Estatística (UFC) e Licenciado em Matemática (UECE).

255
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e
Matemática (PGECM – ICE). Pesquisa em História da Matemática, fontes
históricas, instrumentos e artefatos históricos aplicado ao Ensino de
Matemática.

Fernanda Cíntia Costa Matos - Doutoranda pelo Programa de Pós-


graduação em Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Mestre em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da
Universidade Federal do Ceará (UFC). Especialista em Gestão Escolar
pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Graduada em Pedagogia
pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisadora cadastrada no
CNPq pelo Grupo de Pesquisa Tecendo Redes Cognitivas de Aprendi-
zagem (G-TERCOA). Atua nas áreas de Educação Matemática; Didática;
Metodologia; Educação a Distância; Educação de Jovens e Adultos;
Estágio Supervisionado e Orientação de TCC.

Fernando Barros da Silva Filho - Tem experiência na área científica


educacional, com ênfase na coordenação de laboratórios de ciências,
atuando principalmente nos seguintes temas: atividades experimentais,
iniciação a pesquisa, projetos científicos e culturais. Possui experiência
em orientação de projetos na área de mecatrônica, robótica educacional
e tecnologias sustentáveis tendo com isto realizado importantes contri-
buições principalmente no estudo e desenvolvimentos de aeronaves não
tripuladas (VANTs) para atuarem no sensoriamento ambiental, manuten-
ção de sistemas de difícil acesso, segurança pública, resgates e salvamento.

Francisco Herbert Lima Vasconcelos - Secretário da Educação


de Sobral, Herbert Lima é professor efetivo da Universidade
Federal do Ceará (UFC), vinculado ao Instituto Universidade
Virtual - Instituto UFC Virtual; e exerceu o cargo de Diretor
do Centro de Educação a Distância do Ceará. Herbert Lima é
graduado em Física pela Universidade Federal do Ceará (UFC),
Mestre em Ciência da Computação e Doutor em Engenharia de
Teleinformática, ambos pela UFC. Realiza trabalhos de pesquisa
na área de avaliação educacional com modelagem matemática
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

computacional, novas tecnologias para a educação, educação a


distância e informática educativa. Coordenou o curso de Forma-
ção Continuada em Conselho Escolar da UFC; foi consultor do
Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares
da SEB/MEC; coordenou o Pacto pelo Fortalecimento do Ensino
Médio no Estado do Ceará e foi coordenador ajunto do Comitê
Gestor Institucional de Formação Inicial e Continuada de Pro-
fissionais da Educação Básica da UFC.
herbert.seducsobral@gmail.com

Gilmar Alves de Farias (profgilfarias@hotmail.com) - Mestre em Ati-


vidade Física e Saúde pela Universidade do Desporto do Porto-Portugal
(2012), especialista em Handebol pela Universidade Federal do Pará e
graduado em Educação Física pela Escola Superior de Educação Física
do Pará. Professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal
do Ceará (FACED-UFC). Ministra as disciplinas: Pesquisa Científica,
Pesquisa Educacional e Trabalho de Conclusão de Curso. Coordena
projetos de extensão do Grupo de Pesquisa Tecendo Redes Cognitivas
de Aprendizagem (G-TERCOA). site: http://www.getrcoa.ufc.br

Isabelle Coelho da Silva - É graduada em Licenciatura em Matemá-


tica pela Universidade Estadual do Ceará (2015). Tem experiência
na área de Educação, com ênfase em Ensino de Matemática, atuando
principalmente nos seguintes temas: História da Matemática, educa-
ção matemática e formação de professores. É membro do Grupo de
Pesquisa em Educação e História Matemática - GPEHM. Atualmente,
cursa mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências
e Matemática - PGECM, pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Ceará (IFCE).

Janne Cristina de Araújo Silva (E-mail: jannecristinaas@gmail.com)


- Especialista em Psicologia Organizacional e do Trabalho pela Univer-
sidade Estadual do Ceará (2018), graduada em Psicologia (2015) e em
Recursos Humanos (2007) pelo Centro Universitário Estácio do Ceará.

257
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Josaphat Soares Neto - Possui graduação em Ciências Biológicas pela


Universidade Estadual do Ceará (2003) e graduação em Engenharia
Agronôma pela Universidade Federal do Ceará (1989). Especialização
em Coordenação Pedagógica pela Faculdade 7 de Setembro (FA7). Mes-
tre em Ensino de Ciências e Matemática pelo Instituto Federal do Ceará
(IFCE/2017) Atualmente é professor da E.E.F.M. Matias Beck. Também
atua como tutor on-line da Universidade Federal do Ceará (UFC). Tem
experiência nas áreas que envolvem a Integração das Tecnologias ao
Currículo, em Engenharia Agronômica, Biologia Geral, com ênfase em
Laboratórios de Biologia, em Projetos de Gestão Ambiental, Educação
Ambiental e Projetos Educacionais que envolvem movimentos sociais,
através da Educação para Jovens e Adultos no campo.

José Rogério Santana - É graduado em pedagogia pela Universida-


de Federal do Ceará (UFC), com formação em Educação Matemática.
Possui Pós-doutorado pela Universidade Federal da Paraíba, na linha
de Pesquisa História da Educação. Mestre acadêmico e doutor em
Educação com área de pesquisa em Educação Matemática e Tecnolo-
gias Digitais pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Atualmente é
estudante de Pós-doutorado em História da Educação no Programa
de Pós-graduação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), bem
como, é professor associado I da Universidade Federal do Ceará no
Instituto UFC Virtual trabalhando com Educação a Distância (EaD)
e Tenologias Digitais. Possui experiência na área de Educação, com
ênfase em Tecnologia Educacional, Atua nos nos seguintes temas:
informática educativa, educação a distância, educação matemática,
geometria dinâmica e formação de professores. Também desenvolve
trabalhos sobre a relação Imagem e Memória na perspectiva da Peda-
gogia das Imagens Culturais. Em 2010 iniciou estudos de graduação
em Biomedicina pela Faculdade de Tecnologia Intensiva do Ceará. É
participante e colaborador do Labicult/UECE (Universidade Estadual
do Ceará) que trabalha com estudos em fisiologia do exercício.

258
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Luiz Marcio Santos Farias - Graduado em Matemática (UFBA/UCSAL),


Pós-graduado em Didática e Metodologia do Ensino Superior (EEAB),
Mestre (UJF-França) e Doutor (UM2-França) em Didática das Ciências
e Matemática. Atualmente é Professor Adjunto, do Instituto de Huma-
nidades, Artes e Ciências Prof. Milton Santos (IHAC), da Universidade
Federal da Bahia (UFBA). É Coodenador e professor permanente do
Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciên-
cias da UFBA/UEFS. É pesquisador visitante da Université de Grenoble
Alpes (Laboratoire de Informatique de Grenoble - Equipe MeTAH-LIG).
Membro do Observatoire international de la pensée algébrique - OIPA.
Membro da Association pour la Recherche en Didactique des Mathé-
matiques (ARDM) e da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros
(ABPN). É membro da Sociedade Brasileira de Educação Matemática
(SBEM). Coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa, Ensino
e Didática das Ciências, Matemática e Tecnologias (NIPEDICMT).

Maria Auxiliadora Lisboa Moreno Pires - Possui graduação em Ma-


temática pela Universidade Católica do Salvador (1980), Mestrado em
Educação pela Universidade Federal da Bahia (1999) e Doutorado em
Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2012).
Professora Adjunto da Universidade Estadual de Feira de Santana,
Professora da Universidade Católica do Salvador. Tem experiência na
área de Matemática, com ênfase em Educação Matemática, atuando
principalmente nos seguintes temas: educação matemática, ensino
aprendizagem de matemática, estágio curricular supervisionado,
matemática e pedagogia de projetos.

Maria José Costa dos Santos - Professora, pesquisadora e orientadora na


graduação e pós-graduação (FACED/UFC) no programa de pós-graduação
em educação (PPGE/UFC), e commestrado profissional em ensino de
Ciências e Matemática (ENCIMA/UFC). Atua nas áreas de Educação, Edu-
cação Matemática, Formação Matemática do Pedagogo e do Llicenciado
em Matemática, Ensino e Aprendizagem de Matemática no Ensino Funda-
mental, Currículo, Avaliação (interna e externa), Formação de Professores
(ensino regular e EJA), Integração das Tecnologias ao Currículo, Psicologia

259
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Educacional e do Desenvolvimento Cognitivo de Matemática, Tecnologias


Digitais, EaD e Informática Educativa voltadas para o ensino (criativo e
inovador) de Matemática a partir da criação de redes intelectivas. Tem
artigo premiado, livro e capítulos de livros organizados e publicados nas
áreas listadas. Foi coordenadora do curso de Aperfeiçoamento em EJA, pela
SECADI(2012-2015). Coordenadora Adjunta do PNAIC, na área de Mate-
mática. Coordenadora Adjunta do PACTO pelo Ensino Médio (2014-2015).
Coordenadora do Curso de Pedagogia/FACED/UFC(2014-2015). Desen-
volve pesquisas CNPq/PIBIC e PIBITI (2015-2018) com foco na relação da
pós-graduação com a graduação, a inovação e criatividade tecnológica na
educação, além dos projetos deiniciação à docência e de extensão sobre a
formação matemática do professor que leciona no ensino fundamental,
visando colaborar para a formação desse profissional na construção de
sua identidade e aproximação profissional com o curso. É pós-doutora
pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pelo programa de
Pós-graduação em Educação (ProPEd) (nota máxima na Capes -7). É líder
do Grupo de Pesquisa Tecendo Redes Cognitivas de Aprendizagem (G-
TERCOA/CNPq) e desenvolve também um projeto de graduação que tem
como objetivo diminuir a evasão no curso de Pedagogia da UFC/FACED,
fundamentado na ética e consciência político-social do curso.
mazzesantos@ufc.br

Mário José de Souza - Professor do Instituto de Matemática e Estatís-


tica e coordenador do Mestrado Profissional em Matemática em Rede
da Universidade Federal de Goiás. Graduado e Mestre em Matemática
e Doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Campinas,
Unicamp, SP.

Michèle Artigue - Nasceu em Bordères-sur-l’Échez. É uma pesquisa-


dora matemática francesa, uma das responsáveis pelo estabelecimento
do método e teoria da Engenharia Didática. Leciona matemática no
ensino superior desde 1970. Atualmente é professora emérita da
Universidade Paris Diderot.

260
TECNOLOGIAS DA EDUCAÇÃO:
Formação docente, inovação científica e práticas pedagógicas

Raphael Feitosa - Professor do Departamento de Biologia da Univer-


sidade Federal do Ceará (UFC), docente do PGECM-IFCE (Mestrado
Acadêmico em Ensino de Ciências e Matemática) e do ENCIMA-UFC
(Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática). Doutor
em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação pela UFC,
Mestre em Educação Brasileira pela UFC, Graduação (Licenciatura e
Bacharelado) em Ciências Biológicas pela mesma Instituição. É con-
siderado Especialista em Ensino de Biologia pelo Conselho Regional
de Biologia (CRBio-5). Home: http://raphaelfeitosa.blogspot.com.br/

Ricardo Antonio Gonçalves Teixeira - Programa de Pós-Graduação


em Educação da Universidade Federal de Goiás. Doutorado em Educa-
ção, Pós-doutorado em Tecnologias de Investigação pelo Departamento
de Educação da Universidade de Aveiro, Portugal; Pós-doutor em
Tecnologias Assistivas pela Faculdade de Engenharia Elétrica da Uni-
versidade de Uberlândia (UFU, MG); Pós-doutor em Mídias Interativas
pelo Programa Avançado de Cultura Contemporânea da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, RJ); Pós-Doutor em Educação e Saúde
pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de São
Paulo, Unicamp, SP.

Uyara Soares Calvalcanti Teixeira - Mestrado Profissional em Ma-


temática em Rede da Universidade Federal de Goiás. Professora da
rede estadual de educação e pesquisadora no Núcleo de Atendimento
Educacional Hospitalar da Secretaria de Estado da Educação, Cultura
e Esporte de Goiás. Graduada em Matemática e Engenharia Civil. Mes-
trado em Matemática pela Universidade Federal de Goiás (UFG, GO).

261

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