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O poema que não quis nascer

Outro dia tentei escrever um poema,


Mas meus músculos de poetizar estavam rijos.
Logo pensei: é a academia.
Não aquela que trabalha os músculos do corpo,
a das ideias.
A academia das ideias secou a seiva poética
que outrora escorria em des-limite.
Com muita sofreguidão, talhei uns versos esmaecidos.
Nasceu um poema raquítico e anêmico de doçura.
Não digo que feio, tampouco que triste.
Desenxabido, como dizia minha mãe.
Como um tipo envergonhado, acanhando.
Com vergonha de existir.
Contrariado de ter sido escrito, não queria aparecer.
Ocultei-o por um tempo, por concordância mútua.
Minha e dele, claro!
O pacto durou até o dia em que nos desentendemos.
Ele, tímido, recatado e do lar, almejava o anonimato da solidão.
Eu, sempre disposto à vergonha da existência, ansiava sua exposição.

Juca Barcellos

O Brasil anda tão confuso


Que não faço outra coisa que não
Chorrir de tanta alegreza

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