Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
REUNIÃO E ORGANIZAÇÃO
– PROF JOÃO RIBAS(JOÃOZINHO)
INSTAGRAM: @literabrasil
YOUTUBE: LíteraBrasil SPOTIFY:
Professor Joãozinho
BOCA DO INFERNO
Ana Miranda
1. Dados da autora
Ana Miranda nasceu em Fortaleza, em 1951. Morou em
Brasília, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Hoje vive no Ceará.
Estreou como romancista em 1989, com Boca do Inferno. De lá
para cá escreveu diversos romances, entre eles Desmundo
(1996), Amrik (1997) e Dias & Dias (2002, prêmio Jabuti de
romance e prêmio da Academia Brasileira de Letras). Foi
escritora visitante em universidades como Stanford e Yale, nos
Estados Unidos, e representou o Brasil perante a União Latina,
em Roma. Sua obra nasce de uma relação pessoal com a
história literária brasileira, e trabalha pela preservação do nosso
tesouro linguístico.
Principais obras
Anjos e Demônios (poesia), 1978;
Boca do Inferno (romance), 1989;
A Última Quimera (romance),1995;
Desmundo (romance), 1996;
Clarice (novela), 1996;
Amrik (romance), 1997;
Dias & Dias (romance), 2002;
Mig, o descobridor (infantil), 2006;
Yuxin, alma (romance), 2009;
Semíramis (romance), 2014;
Musa Praguejadora, A vida de Gregório de Matos (biografia), 2014;
Xica da Silva, A Cinderela Negra (biografia) 2016.
Lançamento da obra
Romance histórico, Boca do Inferno é o primeiro romance de Ana Miranda e foi
publicado em 1989. Foi traduzido nos Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha,
Itália, Espanha, Suécia e Holanda, entre outros países. Ganhou o prêmio Jabuti de
revelação.
Foco narrativo
Romance narrado em 3ª pessoa. Narrador onisciente.
Tempo
Boca do Inferno se passa no século XVII (1863), na Bahia colonial, durante o governo
tirânico do militar Antônio de Souza de Menezes, apelidado de Braço de Prata, por
usar uma peça deste metal no lugar do braço (perdido numa batalha naval contra os
invasores holandeses).
Espaço
A ação se passa na cidade da Bahia, hoje Salvador. Nessa cidade de desmandos e
devassidão, desenrola-se a trama de Boca do Inferno, recriação de uma época turbulenta
centrada na feroz luta pelo poder entre o governador Antônio de Souza deMenezes e
a facção liderada por Bernardo Vieira Ravasco, da qual faziam parte o padre Antônio
Vieira e o poeta Gregório de Matos.
Linguagem
Linguagem histórica, com expressões chulas (vulgares), uma referência à sátira
mordaz do poeta Gregório de Matos Guerra.
LINGUAGEM SIMPLES – SINTÉTICA – CAPÍTULOS CURTOS
CORTES CINEMATOGRÁFICOS – EXPERIÊNCIA COMO ATRIZ E ROTEIRISTA DE
CINEMA.
A lua começava a aparecer, vermelha. As encostas das montanhas com sua vegetação
variada estavam cobertas de tons de negro. O céu clareava lentamente, as estrelas
desapareciam com a luz da lua.
Personagens
Gregório de Matos Guerra: poeta do Barroco. O boca do inferno – genial canalha –
fazia críticas mordazes aos políticos da Bahia do século XVI.
Padre Antônio Vieira: em seus sermões e cartas, atacava o clero brasileiro e políticos,
revelando a seus fiéis as contradições sociais.
Francisco Teles de Menezes: alcaide mor (oficial de justiça) da cidade da Bahia, primo
do governador, homem devasso e violento, persegue politicamente os Ravascos, com a
anuência e conivência do Braço de prata. É assassinado por oito conspiradores
encapuzados, sendo decepada e levada a sua mão direita na execução do crime.
Trama central
“antigamente, havia muito respeito. Hoje, até dentro da praça, nas barbas da infantaria,
nas bochechas dos granachas, na frente da forca, fazem assaltos à vista”*
Estrutura do livro
O romance é dividido em 6 partes:
A Cidade,
O Crime,
A Vingança,
A Devassa,
A Queda
O Destino.
Resumo do enredo
1ª parte - A Cidade
A narrativa se inicia com a descrição da cidade da Bahia (hoje Salvador) do século
XVII – imagem de um paraíso natural, mas onde os demônios aliciavam almas para
proverem o inferno.
“Numa suave região cortada por rios límpidos, de céu sempre azul, terras férteis,
florestas de árvores frondosas, a cidade parecia ser a imagem do Paraíso. Era, no
entanto, onde os demônios aliciavam almas para povoarem o Inferno” (Miranda, 1998:
12).
CAPÍTULO 1
Gregório de Matos pensa no poeta barroco espanhol Gongora y Argote, ordenado
sacerdote aos 56 anos, criador do estilo culteranista (cultista). Ele estivera tentando
unir a alma elevada do homem à terra e seus sentimentos carnais.
Fala que a cidade dava entrada a todo tipo de gente: persas, armênios, gregos, judeus,
assírios, turcos...De noite, os mesmos que frequentavam missas andavam em
direção aos calundus e feitiços, não ser raro haver também sacerdotes nesses
rituais. (SINCRETISMO RELIGIOSO)
A porta da igreja ficava repleta de miseráveis, com tanta riqueza, havia grande
pobreza. Os escravos ficavam fora da igreja. Senhores faziam de suas escravas
prostitutas (CRUZ E SOUSA – CONSCIÊNCIA TRANQUILA)
2ª parte - O Crime
– Depois de despachar, o alcaide-mor Francisco Teles de Menezes, sai ainda muito
cedo para a casa de uma prostituta
“o sexo com prostitutas eram associados às sombras da noite, quando Deus e seus
vigilantes se recolhiam e o Diabo andavam à solta”. (OPOSIÇÃO BARROCA ENTRE
DEUS E DIABO)
CAPÍTULO 1
Após sair da casa da barregã Cipriana, o alcaide é emboscado por 8 homens
encapuzados, tem sua mão arrancada do braço e é morto por Antônio de Brito, que
retirou o capuz antes de matá-lo. O motivo se deu por perseguição política –
estarão envolvidos no crime: Gonçalo Ravasco, sobrinho do Padre Vieira, filho de seu
irmão, Bernardo Ravasco, e Moura Rolim, primo de Gregório. Os homens fogem para
o Colégio dos Jesuítas, mas o governador da Bahia – Antônio de Sousa Menezes,
O Braço de Prata, será avisado e começará uma terrível perseguição contra todos
envolvidos.
CAPÍTULO 2
Foca em Maria Berco, dama de companhia de Bernardina Ravasco, filha de
Bernardo, viúva sem filhos, jovem senhora, de saúde frágil.
Maria diz a Bernardina que na cidade fala-se que Gonçalo era o assassino de Teles de
Menezes.
Gregório foi informado sobre a morte do alcaide e reflete sobre a ampla corrupção
moral da cidade da Bahia (fidalgo que furta, a filha amaziada, a mulher enfeitada, o
letrado prevaricador, o mercador avarento, a viúva dissipadora e promíscua, o próprio
poeta esperava a sua vez, o abade do convento roubava o dinheiro da instituição para
gastar com prostitutas...
A seguir o poema na íntegra, do qual a autora utiliza alguns versos entremeio à sua
narrativa.
Descreve o que era naquele tempo a cidade da Bahia
.....................................................................................................................
O capítulo termina com uma conversa entre Bernardo Ravasco e a filha Bernardina.
REFERÊNCIA: Semíramis
Era assim chamada a rainha casada com Nino I, rei assírio. Segundo a tradição, a
cidade de Babilónia foi fundada por ela, assim como uma das Sete Maravilhas do
Mundo, os Jardins Suspensos (estes foram de facto construídos pelo rei
Nabucodonosor). Destacou-se por ser uma pessoa extremamente ambiciosa e devassa,
tendo-lhe sido feitas acusações de incesto com Nino II, seu filho, e de bestialidade.
Converteu-se em pomba depois de morta, sendo divinizada. No século XIX o
compositor italiano Gioachino Rossini compôs a sua ópera "Semiramis" com base na
história desta rainha.
Bernardo entrega a mão embrulhada num pano a Maria Berco e pede que ela desse
um fim naquilo.
Em quarenta anos foram mortos e destruídas, na costa e nos sertões, mais de dois
milhões de índios e mais de quinhentas povoações como grandes cidades, como Vieira
escrevera ao rei Afonso VI. Começava naquele ano a truculenta Guerra dos Bárbaros,
a mais sangrenta e destruidora luta contra os índios, que resistiam à expropriação de
suas terras. E dessas mortes e destruição, nunca se veria castigo.
CAPÍTULO 4
O governador move extraordinário número de soldados a cavalo em busca dos
suspeitos, comandando pessoalmente as buscas. Casas de pessoas ligadas aos
Ravascos eram arrombadas e saqueadas, móveis jogados nas ruas e incendiados,
porém “ninguém abriu a boca”.
CAPÍTULO 5
Relata o episódio de Maria Berco para se livrar da mão do Alcaide.
Pensou em jogar no lixo, mas desistiu. Pensou em jogar na água, pegou um barco
de aluguel com um barqueiro bêbado e mal intencionado. Quando estavam longe da
margem, o homem toma o embrulho de Maria, joga a mão, mas fica com o anel de prata.
Porém, quando voltam são abordados por soldados e o homem dá o anel para que Maria
o esconda. Os dois são presos.
Também Bernardo Ravasco é preso quando chega em sua casa. O governador diz que
o próximo será Vieira.
— Hoje em dia é assim: um moço sem pai, mal herdado da natureza, sem valor para
seguir as armas, sem engenho para cursar as letras, moço sem talento, nem indústria
para granjear a vida por outro exercício. É desonesto? Vai governar. É honesto? Vai
ser padre.
CAPÍTULO 6
Maria Berco sai da prisão no dia seguinte sem ser revistada, leva o anel a uma loja
de penhores e penhora a joia. Recebe cem patacas de cem réis. O joalheiro percebe,
pelo pequeno valor aceitado, que o anel era roubado.
A caminho de casa, Berca entra numa taberna, e come sofregamente um pastel.
Compra também sapatos, meias, uma veste de seda, uma camisa de linho, um
chapéu fino para seu marido, entre outras coisas...
Chega em casa e é xingada pelo marido, o velho avarento, João Berco. Porém o
homem mesmo recebendo o chapéu maltrata Maria, pois acha que ela recebeu o
dinheiro por ter feito sexo com alguém.
Corta para o palácio do governador, onde o Braço de prata faz aulas com Serotino.
Enquanto esgrima com seu professor, o governador faz a seguinte avaliação de Vieira
e dos jesuítas:
Se vai o padre para o inferno leva consigo os fiéis. Intrometiam- se nos centros depoder
e decisão - para salvar a alma alheia? , haviam sido molinistas, antijansenistas,
confessores de reis e de poderosos, quando sopravam aos ouvidos do poder suas idéias,
quer na tentativa de manter a decadente submissão das monarquias à Igreja, quer na
erradicação do protestantismo, ecos das idéias de Erasmo sobre a inutilidade da
monarquia. Monachatus non est pietas, acreditavam. E estavam ali no Brasil defendendo
a liberdade dos indígenas para os terem, eles mesmos, como cativos - de suas idéias.
Como se podia explicar que sendo contra a escravidão calavam-se frente ao que ocorria
com os negros africanos? Simples! O braço do negro era imprescindível ao
enriquecimento da colônia. Assim eram os jesuítas e padre Vieira mais do que todos
De repente, Serotino diz a Braço de prata que precisará fazer “aquilo” e atenta contra a
vida do governador com sua espada. Porém, com a ajuda de seu braço de metal,
Meneses consegue se livrar, chama os guardas para a ajuda-lo a prender Serotino,
porém, o mestre de esgrima consegue fugir.
CAPÍTULO 7
Aparece novamente Gregório de Matos (PERCEBA QUE ATÉ AQUI A PARTICIPAÇÃO
DELE NA NARRATIVA É MÍNIMA)
Menciona a relação do poeta com a prostitua Anica de Melo.
Gregório pensa na sua admiração desde menino pela erudição e talento de Vieira.
O poeta lembra da sua infância, de seu pai, que era tesoureiro e procurador.
Também pensa na sua atração pelas mulheres desde menino.
Nas ruas o menino ficava extasiado com as mulheres de carne e osso, com seus
rostos e suas formas, alvas como jasmins, vermelhas, azeitonadas ou escuras como a
noite. As meninas eram lindas, as índias nuas pareciam-lhe deusas pagãs, as
escravas lhe sugeriam estátuas de ferro pronto a incandescer. Sua irmã, um
demoniozinho falante, tinha um mistério que Gregório de Matos observava com fervor
quase religioso. Sentia-se atraído por todas as mulheres como uma abelha pelo
jardim. Encantava-se com qualquer gesto, qualquer rufar de saia, detalhes mínimos.
Mesmo as feias tinham para ele um encanto qualquer: uma orelha bem feita, um par
de tornozelos sólidos, unhas saudáveis, cabelos abundantes, uma boa estrutura óssea,
batatas das pernas grossas, nádegas redondas e fartas, um ar sonhador, timidez,
brilho de inteligência ou um nariz que lembrasse uma jovem da dinastia lágida. Como ele
gostava de dizer: — são feias; mas são mulheres.
— Ah, tu és um demônio, disse Anica de Melo.
— Não, não, somos bastante diferentes. Demônios são vós, mulheres.
— O bigode fanado feito ao ferro está ali num desterro, e cada pêlo em solidão tão
rara, que parece ermitão da sua cara: da cabeleira, pois, afirmam cegos, que a mandaste
comprar no arco dos Pregos. Olhos... olhos...
— Por que paraste, Mata? Anda, prossegue.
— Olhos... olhos ca - cagões que cagam sempre à porta, mas tem esta alma torta,
principalmente vendo-lhe as vidraças no grosseiro caixilho das couraças: cangalhasque
formaram, luminosas, sobre arcos de pipa duas ventosas. De muito cego, e não de
malquerer a ninguém podes ver; tão cego és que não vês teu prejuízo, sendo cousa que
se olha com juízo: tu és mais cego que eu que te sussurro, que, em te olhando, não vejo
mais que um burro. Agora fala sobre o nariz, senhor governador. Devo continuar?
— Sim.
Mata raspou a garganta, sua voz estava quase um fio. — Chato o nariz de cocras sempre
posto: te cobre todo o rosto, de gatinhas buscando algum jazigo adonde o desconheçam
por embigo; até que se esconde onde mal o vejo por fugir do... do fedor do teu bocejo.
A sátira falava ainda da boca de Antônio de Souza, das pernas e pés, do casaco, do
odre, da bengala que sempre levava sob a axila; sugeria roubo, tirania, corrupção.
O governador, depois do Mata se retirar, pensa “as sátiras são inteligentes. Se não
fossem contra mim mesmo até me teriam divertido...”
És um poeta brasileiro e aqui tudo é diferente. Sem dúvida o fato de ser um poeta
brasileiro fazia com que Gregório de Matos se sentisse um idiota. Vivia afastado da
metrópole e perdia-se em divagações bastante confusas sobre si mesmo. Achava que
nada mais tinha a perder depois que voltara para sua terra, viúvo e solitário. RimarJesus
com eus, Deus com ateus, igreja com inveja, jesuíta com alcovita, juiz com infeliz, poeta
com pateta, santo Antônio com demônio, letra com punheta ou história
com chicória, tanto fazia. Tinha os mesmos sentimentos para escrever sobre a mulata,
o amor, o muleiro, o caralho, o papagaio, o governador, el rei ou Deus. E era perseguido
pelas mulheres com uma velocidade indecorosa...
CAPÍTULO 9
Antônio de Sousa invade o colégio jesuíta e prende os conspiradores
Levaram Antônio de Brito, João de Couros, Antônio Rolim, Manuel Dias, alguns
jesuítas e estudantes. Também foi preso o capitão de presídio, Diogo de Souza, o Torto.
Gonçalo Ravasco escapou.
Corta para uma cena em que Gonçalo Ravasco, às escondidas, consegue invadir o
palácio do governador e recuperar os textos de seu pai.
TEXTO ORIGINAL
Triste Bahia! ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vejo eu já, tu a mi abundante.
Gregório conversa com Gonçalo, depois deste retornar da casa do governador e o poeta
lhe diz: “sou um escravo das mulheres”.
CAPÍTULO 10.
Aparece o arcebispo João da Madre Deus, que tinha um olho só, apesar do aspecto
aterrador, era um padre mais confiável, pois “com apenas um olho via somente meios
pecados” (IRONIA E HUMOR)
Eles pedem ajuda ao religioso para tirarem seus amigos e parentes da cadeia e João
da Madre de Deus diz que pensará no que fazer e decidirá de acordo com seus
pensamentos...
Gregório sai enfurecido...
Ao final do capítulo, Gregório lembra de Maria Berco, pensando no que poderia querer
com ela.
3ª Parte - A Vingança
– Antônio de Brito será torturado junto com Diogo de Sousa, o Torto, e delata os
envolvidos.
CAPÍTULO 1
Antônio Teles vai ao governador e relata a delação de Antônio Brito, dizendo que
Bernardo não sujara as mãos com o assassinato, mas que tudo fora tramado com o seu
consentimento. Relata ainda que quem havia mesmo esfaqueado seu irmão fora Antônio
Brito. Também são delatados o vereador Luiz Bonicho e o mestre de esgrima, Serotino.
— Bem, então temos o quadro quase completo. Recapitulando: Antônio de Brito, Luiz
Bonicho e Donato Serotino, João de Couros.
— Quatro.
— Diogo, o Torto.
— Cinco.
— Manuel Dias.
— Seis.
— Moura Rolim.
— Sete.
— Sete. Então?...
— Então falta um, disse o alcaide Teles. — Quem poderia ser?
— Brito falará. Apertem-no mais duramente.
— Suspeito de Gonçalo Ravasco. Antônio de Brito o deve estar protegendo. Podemos
pegar aí um grandão, um Ravasco.
CAPÍTULO 2
O governador interroga Bernardina.
“Se o jovem seu irmão se entregar, darei livramento ao seu pai”, diz o Braço de prata.
Bernardina visita padre Vieira, seu tio, para pedir conselho sobre o que fazer.
Vieira diz não ser bom trocar um Ravasco por outro e avalia com cansaço a sua situação
naquele momento da vida.
Porém, Vieira decide mais uma vez lutar, mandando uma carta para Portugal, pedindo
ajuda do Rei e manda que Gregório e Gonçalo escondam-se o quanto puderem.
CAPÍTULO 3
O Blasfemo, um personagem que se fingia de lunático, mas na verdade era espião
de Luiz Bonicho, estava preso e depois de ser solto da prisão vai avisar a Luiz e
Serotino, que ambos foram delatados e tiveram ordem de prisão decretada.
Corte para Maria Berco tira sua roupa diante do espelho e lembra de Gregório de Matos.
Acendeu o candil e foi à sala. Pegou um chicote e voltou para o quarto. Há anos
não tinha uma noite de amor, o marido velho já não mais a dormia. Diante do espelho
desamarrou a blusa e a saia. As roupas caíram a seus pés. Despiu- se das roupas de
baixo. Viu-se nua, sua imagem difusa no vidro, deformada. Sua pele parecia feita de
queijo. Aproximou-se do espelho. A boca, cujos lábios superiores eram mais bem
desenhados, destacava-se da pele do rosto. Viu seus dentes, os caninos levemente
pontudos lhe davam um ar animal. A língua era muito vermelha, trêmula. Os seios
redondos, pequenos, começavam nas clavículas. Pelo meio das curvas brancas da
cintura e dos quadris descia uma penugem escura até o ventre, que se abria num tufo
negro. Sua respiração apressou-se, seu coração disparou.
Gregório de Matos. Jamais se desnudara diante de um homem. E poucas vezes
diante de si mesma. A nudez era pecado, estava caindo no abismo, aquele quesonhara.
Diziam que em Roma havia estátuas de homens nus dentro das igrejas. Beijou sua
própria boca no espelho. Pensou que havia demônios dentro de si. Esperava-a um fim—
amargoso como o absinto. Pegou o chicote e flagelou-se, como via fazerem nas
procissões os penitentes, caminhando atrás dos andores, descalços, arrastando-se de
joelhos, macerando o corpo com açoite, deixando vestígios de sangue nas pedras das
ruas. Tinha que devolver o anel, tinha que esquecer Gregório de Matos.
Corte para a prostituta e amante de Gregório, Anica de Melo. Ela conta ao poeta que
os homens do governador invadiram o quarto dele e revistaram tudo
Quando Gregório de Matos entrou em seu quarto verificou que haviam mexido nos
seus livros. Não se tratava de simples vasculhar à procura de algo, os livros estavam
jogados no chão, alguns rasgados: tudo fora feito com muita ferocidade.
Gregório de Matos sentiu duramente o golpe, estava acostumado a pensar que
mesmo os mais rudes e vis tinham algum respeito pelos livros. Mas as pessoasodiavam
tudo que não compreendiam. Os homens do Braço de Prata não sabiam ler. Ninguém
sabia ler. Os livros eram inimigos.
As moças que habitavam os quartos contíguos olhavam Gregório de Matos com
pena.
Algumas vieram se oferecer para ajudá-lo a arrumar tudo e consertar os livros. Uma das
moças trouxe uma panela de grude para colar as páginas arrancadas. Era a negra
novata. Gregório de Matos empurrou as outras moças para fora. Ficou sozinho no quarto
com a mulher. Sem falar com ela, sem ao menos perguntar seu nome, tirou a roupa dela
e colocou-a, nua, deitada na cama, depois de jogar os livros no chão. Elaera suntuosa,
noturna. Ele agarrou o corpo dela com fervor e possuiu-a muitas vezes seguidas, sem
dizer uma só palavra. Depois pegou um dos livros e leu para ela enquanto ela se vestia,
um pouco assustada:
— Quem, com piedade, ao andaluz não mira? E quem, ao andaluz, seu favor nega?
CAPÍTULO 4
Maria Berco encontra Gregório levando pedido de Bernardina para que Gonçalo se
entregue e dessa forma, o pai deles seja libertado. Gregório diz que Gonçalo continuará
escondido, pois se ele se entregar o governador prenderá os dois Ravascos.
— Bem, talvez eu possa ajudar, afinal estou neutro e tenho, assim como vós, amigos
no governo, apesar de judeu e perseguido, ou mesmo por isso. Não posso me esquecer
o quanto devemos à vossa atuação e à vossa inteligência quando da criação da
Companhia Geral do Comércio para o Brasil, que foi para nós um grande benefício, mais
ainda, um duro golpe na Inquisição, nossa velha inimiga, que deixou de recolher o
confisco de nossos bens para, com nosso próprio dinheiro, nos queimar em fogueiras
nos suntuosos autos-de-fé. Na verdade, todos os judeus vos devem um grande favor.
CAPÍTULO 6
Cena na casa de Luiz Bonicho, que conta a Serotino que o Blasfemo fora
assassinado, pois descobriram que ele não era louco e trabalhava para o vereador como
espião.
Corta para Bernardina conversando com Gregório sobre Maria e que ela
provavelmente seria enforcada, Gregório diz que tentará encontrar um procurador
para defendê-la. Assim é resumida a vida de Maria:
Pobre Maria, passou a infância açoitada pelo pai, depois foi jogada nas celas escuras do
orfanato, depois ao lado de um velho rabugento. Não teve sorte no casamento, nem na
vida. Uma mulher tão linda, até os cães, em sua presença, lambem-lhe os pés, arrastam
o pêlo em suas pernas, feito lontras apaixonadas. Os rapazes, tais como cães, rastejam
a seus pés e ela, sempre virtuosa, fiel ao velho cego. Como pode amar um homem
daqueles?
CAPÍTULO 7
São relembrados episódios da vida de Vieira, que fora confessor da Rainha Cristina,
da Suécia, respondera a processo inquisicional em Roma, fora conselheiro do Rei
de Portugal.
Corta para a sala do governador, a carta de Vieira tem resultado na Corte e o rei enviará
um emissário para julgar o caso do assassinato. O alcaide pede para agir do
seu modo, pela violência, já que a justiça poderá pender para o lado dos Ravascos.
O governador então consente:
CAPÍTULO 8
Inicia com mais uma descrição da cidade:
Faz-se mais uma vez menção ao trabalho escravo e a importância do povo negro
na construção da Bahia/Brasil e o tratamento inversamente proporcional que
recebiam.
Naquele ano de 1683, a cidade da Bahia devia ter quase cem mercadores que
dominavam o comércio com Portugal e África, sendo esta atividade atrelada ao aumento
do tráfico com a Costa da Mina, onde o rum e o tabaco baianos competiam com os
produtos europeus. Só do porto de Whydah entravam, anualmente, cerca de oito mil
escravos na Bahia, que se tornava a cada momento mais africana. Toda agricultura e o
comércio dependiam do escravo negro, que, tanto nos engenhos e plantações quanto
nas vilas, sofria uma curta vida miserável e torturada. — Na falta de Angola, afirmavam
os conselheiros ultramarinos, — o Brasil se perderá sem outra guerra.
— Sem africanos, não havia Bahia. Sem Angola não havia Brasil.
No entanto, apesar da prosperidade aparente, a população pobre estava cada
vez mais faminta e miserável. Os pobres esperavam todos os dias que alguma coisa
viesse do céu mandada por Deus para solucionar seus conflitos e suas privações. Deus
haveria de saber o que eles mereciam.
Gregório encontra Samuel da Fonseca e conhece seu filho, Gaspar, que diz ser
admirador da poesia de Gregório.
Gregório entrega a Samuel os escritos de Bernardo para que o judeu os guarde, e
este diz que irá os mandar em segurança para Amsterdã. Samuel também diz que
gostaria de mandar imprimir na Holanda um livro com os poemas de Gregório.
(QUESTÃO BIOGRÁFICA, GREGÓRIO NUNCA PUBLICOU NENHUM LIVRO EM VIDA.
NO BRASIL NÃO HAVIA IMPRENSA E ERA PROIBIDO PELA METRÓPOLE
PUBLICAÇÕES NA COLÔNIA).
Gregório então diz sobre si e sua poesia: “Eu não sou um poeta. Não como queria
de ser”, e ainda, “Faço versos para os que não sabem ler”
CAPÍTULO 9
O Alcaide Teles, acompanhado do seu capanga, O Gordo, invadem a casa do
escrivão Manuel Dias, um dos conspiradores encapuzados, e violentamente matam
o escrivão e sua mulher.
CAPÍTULO 10
Gonçalo encontra Vieira.
Vieira lamenta a distância entre o Brasil e a corte:
Luiz Bonicho e Serotino, disfarçados, tentam fugir por mar, mas são interceptados
pelo Alcaide Teles e O Gordo, ambos. Serotino é morto, Bonicho tem a mão direita
decepada por Teles, mas consegue mesmo assim, fugir de navio para a Europa.
CAPÍTULO 11
Conversa entre o arcebismo, João da Madre de Deus e o governador, Braço de prata.
O religioso pede que cessem as contendas e perseguição a Vieira, dizendo não ser um
pedido dele, mas de toda a Igreja.
O mundo já não era mais o mesmo, os grandes homens aos poucos se acabavam. E ele
estava ali, um arcebispo, naquelas ladeiras sujas e longínquas, trafegando entre uma
gente medíocre, mestiços, maganos, marranos, mazombos, envolvido em disputas
menores e sem sentido. Tinha vindo parar num inferno, um inferno que não estava nas
ruas nem nas casas, ou na natureza. Estava nos homens.
O arcebispo então convoca Gregório para uma conversa: diz que a única forma
dele parar de ser perseguido por Teles seria receber votos, ou seja, se tornar padre
para ter as imunidades totais que a Igreja oferece. Gregório, porém, recusa.
Corta para um flashback em que Gregório relembra de seu pai, colonizador rico vindo
do Norte de Portugal, que chegou a ter cento e trinta escravos. Seu irmão, Eusébio,
que era um “padre famoso por seus sermões e pelo tamanho do seu membro”.
Também seu outro irmão, Pedro, plantador de cana, que lutava para manter as terras
do pai, mas que tinha a mesma fama dos dois irmãos.
Lembra também que fora casado em Portugal com uma dama de família influente na
magistratura, Dona Michaela, de 19 anos, que jamais dera importância às
aventuras do esposo. Fora, em Portugal, Juíz de Fora de Alcácer do Sal, magistrado
de respeito e poeta de boa fama.
Porém, gastava grande parte do seu tempo e dinheiro nos bordéis.
4ª parte - A Devassa
Chega Rocha Pita, homem pequenino e recurvado, de aspecto frágil, cabeleira mal-
arranjada sobre a cabeça, o nomeado desembargador para investigar a morte do
Alcaide.
CAPÍTULO 1
Rocha Pita conversa com o governador
Palma, também desembargador, nega a vingança planejada pelo governador e diz ser
ele alvo de intrigas arquitetadas por Vieira e os Ravascos.
CAPÍTULO 2
Rocha Pita conversa com seu auxiliar, Manuel Porto, sobre o que fazer e ele lhe
responde:
Mas Rocha Pita diz: “Não. Vou devassar o que tiver que devassar”.
CAPÍTULO 3
Inicia com o processo envolvendo Maria Berco. Mas também se mostra um retrato
da confusão das leis no Brasil “daquela época”.
Era muito difícil mover-se no campo das leis, no Brasil. As normas chegavam através
de cartas de lei, cartas-patentes, alvarás e provisões reais, regimentos, estatutos,
pragmáticas, forais, concordatas, privilégios, decretos, resoluções de consulta,portarias
e avisos, que formavam um desordenado conjunto de regras, cada uma com sua
duração específica.
As Ordenações filipinas, sobre o direito penal, eram de um rigor que tornava, em certos
casos, sua execução impossível.
Rixas e crimes ocorriam todos os dias na Bahia. Gregório de Vlatos leu o rol de causas
que haviam tido audiência àquele ano. Eram aproximadamente duzentos assassinatos
ou ataques criminosos, como morte a punhaladas, a estocadas, a espingarda; cerca
de trezentos banimentos, a maior parte sobre negros e mulatos, pois muitos
escravos praticavam atos criminosos por ordem de seus senhores, ficando com a
culpa; por volta de mil perdões e fianças; mil e seiscentos delitos leves; mil e setecentas
disputas cíveis, testamentos ou negócios do tesouro; mil setecentas e
tantas ações criminais no total. Para uma população de cerca de cem mil pessoas, aquilo
era bastante.
Os problemas levados ao Tribunal eram o retrato da cidade. O poder ficava
restrito a um pequeno grupo, quase sempre impune; a população desobediente
quanto às normas de convivência estava sujeita a castigos que iam desde a multa
em dinheiro, exílio, galés, até marcação com ferro quente, espancamento,
enforcamento e decapitação.
O Pelourinho, em frente ao colégio dos jesuítas - que lutavam para conseguir a
transferência para outro local alegando que os gritos dos supliciados e o rumor da
chusma que assistia atrapalhavam as atividades do colégio - estava sempre recebendo
prisioneiros condenados. Os enforcamentos e decapitações eram feitos num travessão
de madeira situado à frente da Misericórdia.
Todas as outras capitanias estavam subordinadas à Relação da Bahia. A Coroa rejeitava
qualquer proposta no sentido de se criarem tribunais separados em outras regiões,
alegando insuficiência de recursos financeiros para o sustento dos juizes.
Acreditavam, em Portugal, que o Brasil não deveria possuir grande número de
letrados, pois a colônia — necessitava de soldados e não de advogados. Havia
poucos advogados na cidade. Sem o certificado de exame no Desembargo do Paço ou
oito anos de estudos em Coimbra não se podia advogar na Bahia. A maior parte dos
advogados, porém, impossibilitada de ir à universidade por não ser de família de muitos
recursos, era de sujeitos não formados nem examinados, que burlavam as regras. Eram
numerosos os falsos foros,
— anéis de cobre com pedra de cantaria— .
Havia, entretanto, grandes juristas na colônia, com importantes clientes. As Ordenações
regulamentavam os honorários, mas os advogados famosos cobravam o que queriam.
O Tribunal tinha permissão para somente oito juizes. Os processos tramitavam com
lentidão. Os magistrados reclamavam do excesso de trabalho: investigações especiais
ordenadas com prioridade pela Coroa, deveres extras de cunho administrativo, além do
vasto rol de causas. Muitos crimes ficavam sem punição porque o quorum
obrigatório de seis juizes não podia ser reunido.
Havia uma rigorosa programação quanto aos procedimentos na sala do Tribunal:primeiro
eram julgadas as causas cíveis; depois as criminais; por último os assuntos deinteresse
da Coroa. As causas cíveis eram tão volumosas que jamais sobrava tempo para as
demais. Em conseqüência, os que respondiam processos criminais degeneravam-se nas
cadeias, morrendo grande parte por doenças, fome. Os carcereiros mantinham um
próspero mercado de extorsão às famílias dos acusados e poucos prisioneiros podiam
receber ajuda da Irmandade da Misericórdia, que procurava ampará- los.
Alguma coisa podia ser feita por Maria Berco. Mas qualquer esforço teria que ser sobre-
humano.
— O que nos há de suceder nestas montanhas, com ministros de leis tão previstos
em trampas e maranhas?, murmurou Gregório de Matos.
Gregório de Matos visita Rocha Pita para interceder em favor de Maria Berco. O
desembargador diz que se o marido dela pagar uma fiança, haveria possibilidade de
ela ser solta.
Gregório vai visitar João Berco. O poeta diz que o valor da fiança seria de seiscentos
mil réis e João responde:
— Com essa quantia compro uma boa mulata e uma negra ladina. Ou então três
negros bem-feitos. Ou então um trombeteiro e três cavalos sendeiros. Ou outra mulher
novinha em folha, de treze anos, tudo com troco. O que ganho com isso?
— Mas... Gregório de Matos começou a falar. João Berco o interrompeu.
— Cem calções de pano fino. Cinqüenta camisas de seda.
Trezentas ceroulas de linho.
Oitenta chapéus finos de castor. Quatrocentos e cinqüenta canivetes. O que lucro com
isso? A rascoa deve estar estragada. Não vale mais nada. Sabes muito bem o que os
soldados costumam fazer na enxovia. Sabes muito bem o que uma mulher leva nas
vias de urina quando vai presa. Não deve ter mais olho ao lado de olho, dente ao lado
de dente.
— Solicitas a mercê se eu pagar?
— Se ela voltar para mim, solicito, disse, sem hesitar.
CAPÍTULO 4
Bernardina Ravasco cai doente de cama. Gregório pede dinheiro a ela para a fiança de
Maria, porém, Bernardina diz não ter.
Gregório então recorre a Samuel Fonseca, que disse lhe emprestar o dinheiro.
Gregório sai a cavalo com o filho de Samuel, Gaspar, para buscarem o dinheiro. No
caminho, sofrem uma emboscada a tiros, mas conseguem escapar jogando-se de um
alto monte para as águas de um rio. Gregório, antes de pular, diz que não sabia nadar,
mas que era uma boa ocasião para aprender (AÇÃO E HUMOR –
CARACTERÍSTICAS CINEMATOGRÁFICAS)
CAPÍTULO 5
Anica encontra Gregório e diz que os guardas invadiram sua casa e roubaram tudo
que ela tinha. Queimaram os livros e papeis do poeta, bateram no criado Vicente e a
violentaram.
Com João Berco morto, Gregório pensa ser impossível livrar Maria da forca.
Entretanto, por orientação de Rocha Pita e ajuda de padres, Gregório suborna os
carcereiros e consegue livrar Berca da prisão disfarçada de frade. Maria será
escondida no engenho de Samuel da Fonseca. (LIBERTAÇÃO POR MEIO DA
CORRUPÇÃO)
Enquanto isso, na revista de rotina feita nas bagagens dos passageiros do navio
mercante que partia para a Holanda, os fiscais da alfândega encontraram um baú lacrado
em poder do estudante Gaspar da Fonseca, que estava sendo vigiado pelos homens do
governo. O baú foi apreendido e levado diretamente para o governador. Ao abri-lo,
Antonio de Souza teve uma enorme e agradável surpresa. Lá estavam, intactos,
amarrados no mesmo cordel, os escritos de Bernardo Ravasco.
Antonio de Souza queimou as páginas, uma a uma, na chama do candil.
Quanto a Gaspar, desapareceu. Seu pai, despreocupado, pensando que o filho partira,
recebeu um duro golpe quando o corpo de Gaspar foi dar na praia, os olhos e as vísceras
comidos pelos peixes.
O Alcaide Teles, furioso com a soltura de Bernardo, diz que o governador lhe traíra.
Gregório diz a Anica que é a última noite que passa com ela, pois não tendo mais
cargos na Cúria, precisará partir.
E num trecho repleto de versos de poemas do Boca do inferno, ele diz a Anica:
Eu estava na Corte, tão seguro, mas, néscio, deixei-a por um mau futuro. A Bahia é
um vil monturo da Corte, aqui só há roubo, injustiça e tirania. Nos palácios reais e
eclesiásticos os anos são mais curtos. De hoje em diante cantarei flores e passarinhos.
Sei que os bens do mundo são inconstantes, o sol não dura mais que um dia, depois
se segue a noite escura. A luz e a beleza não duram. Minha alma nasceu para os
tormentos. Minhas lágrimas não são bastantes contra os incêndios que, ardentes, me
maltratam.
5ª parte - A Queda
Inicia falando sobre o Recôncavo e mais uma vez destacando a situação dos negros
em oposição à situação dos brancos. (RELAÇÃO COM AS HISTÓRIAS CURTAS DE
CRUZ E SOUSA)
As casas dos senhores, com suas capelas e varandas, se elevavam entre o verde da
paisagem; eram cenário de recreações, galas, jogos, cerimônias religiosas, dos
quais participavam os senhores e suas famílias, os oficiais, sacerdotes capelães,
hóspedes.
Nas senzalas, os negros viviam entre trabalho, castigos, folguedos, acidentes,
casamentos, doenças, mortes, suicídios, abortos, religiões, sexo.
CAPÍTULO 1
Ansioso por rever Maria Berco, Gregório vai ao engenho de Samuel Fonseca.
Fonseca comentou que os europeus estavam cada dia mais ricos e desenvolvidos.
Inventavam máquinas, leis de proteção aos mercadores, maneiras de fabricar
melhor.
Um judeu de Barbados o procurara, mostrando-lhe um nov tipo de engenho de açúcar,
que produzia maiores quantidades com menos esforço. Mas dom Samuel não possuía
cabedais para investir e tentara, junto á Coroa, apoio para instalação de tal invento na
Bahia. Encontrara apenas descrédito, escárnio. Nem mesmo a universidade pretendida
pelos jesuítas era criada no Brasil, por negativas obstinadas de el rei e do Conselho
Ultramarino. Na França, tinham inventado uma máquina maravilhosa, chamada Marly,
para elevar as águas do Sena. O inglês Newton descobria coisas admiráveis. Papin
inventara uma válvula de segurança e criara a teoria do uso do vapor em máquinas.
Estava sendo chamado de lunático, eram todos lunáticos, mas assim o mundo ia indo,
impulsionado por mentes proféticas.
Gregório recebe, no engenho de Samuel, a visita do amigo Tomás Pinto Bandeira, para
quem o poeta diz:
— Além de perder o pudor, já perdi alguns sonhos e um bocado de esperança.
Também não tenho a unha de um dedo do pé, foi uma topada horrível numa pedra. Perdi
meus livros, minha mulher; perdi meus cargos e perdi um bocado de tempo
perambulando.
Porém o amigo diz que tem feito cópias de seus poemas, principalmente os satíricos
e distribuído por toda a cidade da Bahia. Diz que todos “decoram, repetem, modificam,
copiam em cadernos” seus poemas. E que todos se divertem com a sua poesia.
Gregório finalmente encontra Maria Berco para uma conversa antes dela partir para
Portugal. Está rica com os bens herdados do marido. Encontram-se na capelado
Engenho, sentaram-se lado a lado. Berco tinha o rosto marcado por cicatrizes eo
poeta “sentiu aumentar o seu amor e arrefecer o seu desejo”. (BERCO É A ÚNICA
MULHER QUE GREGÓRIO AMA MAIS QUE DESEJA).
Ele diz que a quer, mas ela responde que não falasse assim com ela.
No entanto, Berco agradece a ajuda de Gregório e admite só estar viva pela
intervenção dele.
Ele diz para que se casem. Ela lhe diz adeus.
Porém, logo em seguida...
Gregório de Matos ficou sozinho sentado sobre o muro de pedra. Ouviu novamente
o som da viola. Vultos começaram a surgir na praia, reunindo-se em torno do escravo
que tocava. Acenderam uma fogueira. Tambores, vozes, risos femininos.
— O que ouço? Roçagares de saias? Ah, mulheres, minhas pretas. Foi,
saltitando, para a praia.
CAPÍTULO 2
O governador recebe a comunicação real de que Bernardo Vieira Ravasco fora
restituído ao cargo que tinha direito e que volte aos seus provimentos e ofícios.
Porém Vieira também fora derrotado, pois o Rei mandou que fossem suspensos
todos os benefícios dados a ele, exceto os garantidos pela imunidade eclesiástica. Isso
sem falar em outras penalidades mais severas.
— Quem sobe ao alto lugar que não merece, homem sobe, asno vai, burro parece,
que o subir é desgraça muitas vezes. A fortunilha, autora de entremezes, transpõe em
burro herói, que indigno cresce: desanda a roda, e logo homem parece, que é discreta
a fortuna em seus revezes. Homem eu sei que foi vossenhoria, quando o pisava da
fortuna a roda; burro foi ao subir tão alto clima. Pois, alto! Vá descendo onde jazia, verá
quanto melhor se lhe acomoda ser homem embaixo do que burro em cima.
“Afinal, não ficara bem claro quem estava condenado, quem estava glorificado, no
resultado da contenda”.
6ª parte – epílogo
O destino
Apresenta como o nome sugere a sequência do que aconteceu com os personagens
mais importantes do livro, levando em consideração os dados históricos.
Algum tempo depois, Gregório foi degredado para Angola. Passado algum tempo
recebeu como recompensa a liberdade para deixar Angola, mas não de volta à Bahia,
senão rumo a Pernambuco, conforme determinação de João de Lencastre, que não o
queria mais na cidade onde residia.
Em Recife, o poeta foi proibido de escrever suas sátiras. Trabalhou como advogado, num
escritório decorado com bananas. Andava nu, assustando as pessoas. Sem recursos,
doente, viveu até 1695, escrevendo sonetos e, é claro, sátiras. Acometido de uma —
febre maligna e ardente, morreu, com cinqüenta e nove anos, em Recife.
Suas poesias foram registradas num livro, pelo povo, a pedido do governador João de
Lencastre. O livro ficava aberto numa sala do palácio e havia, às vezes, filas de pessoas
com sátiras e poemas líricos nas mãos, ou de cor, para serem transcritos.
Poucos sabiam se tais escritos eram realmente de Gregório de Matos, mas ele fora o
grande mestre nas sátiras, nas imprecações, nos xingamentos condenatórios, na
ridicularização da autoridade e das instituições, na ambivalência, no preconceito, na
dessacralização, na profanação, nas histórias escatológicas, sexuais, e no amor.
*
BERNARDO RAVASCO morreu dois dias depois de seu irmão. Enfermo, não soube da
morte de Antônio Vieira.
Deixou numerosa obra poética, em português e castelhano.
Após a morte de dom Bernardo, seu filho GONÇALO RAVASCO Cavalcanti de
Albuquerque, conforme licença de 13 de julho de 1663, foi nomeado secretário de Estado
em lugar do pai. Foi um secretário exemplar.
JOÃO DE ARAÚJO GOIS, morreu com a peste, que vitimou inúmeros na Bahia.
*
ANTONIO DE BRITO ficou homiziado até 1692, quando foi perdoado pelo rei dom Pedro
II, por interferência do papa Inocêncio XII, para comprazer ao grão-duque da Toscana,
irmão do cardeal d´ Este.
*
O hakham SAMUEL DA FONSECA, logo depois da deposição do Braço de Prata, partiu
para Amsterdã. Casou-se com Judith, filha de um rabino, jovem e muito bondosa. Mas
sua esposa logo morreu. Tornou-se membro do colégio rabínico, posto que ocupou até
a morte, em 1698. Sua fortuna foi convertida em livros. Vendeu todos os bens, ficando
apenas com a casa impressora. Imprimiu uma Sefer Torah com ornamentos. Dedicou
seus últimos anos de vida, como era seu sonho, a ler e a imprimir livros. Foi sepultado
em Amsterdã.
ANICA DE MELO recebeu de volta sua casa de alcouce, ali permanecendo por alguns
anos, sempre visitada por Gregório de Matos, mesmo casado. Quando do degredo do
poeta, Anica de Melo partiu para Angola, na esperança de reencontrá-lo. Porém sua
embarcação soçobrou perto da costa de África, num ataque de corsários holandeses.
Anica de Melo morreu, afogada, a poucas léguas de Gregório de Matos, sem que o poeta
jamais soubesse de sua morte.
MARIA BERCO esperou, em vão, que Gregório de Matos a procurasse, de volta à Bahia,
após a partida do Braço de Prata. Rica, teve muitas propostas de casamento, apesar de
seu rosto desfigurado, não aceitando nenhuma delas. Sofreu muito quando soube do
casamento do poeta com a viúva Maria de Povos, e do nascimento de um filho.
Partiu para Lisboa na capitânia que levava Antônio Luiz da Câmara Coutinho, ao término
de seu governo. Em Portugal, após afirmar para vizinhos invejosos de sua
riqueza que os judeus no Brasil eram bons, foi denunciada à Inquisição. Passaram-lhe
mandado de prisão, em dezembro de 1697, sob suspeita de práticas judaizantes, e por
dizer palavras — que ofendiam muito as orelhas cristãs. No julgamento, confirmou suas
convicções sobre a bondade dos judeus. Ameaçada com os martírios pelos inquisidores,
muito aterrada pediu misericórdia com lágrimas e mostras de arrependimento. Porém
jamais mencionou o nome de Samuel da Fonseca, que a havia ajudado a libertar-se e a
acolhera em seu engenho.
Fim
“…se eu tiver que morrer, seja por aqui mesmo. E valha-me Deus, que não seja pela
boca de uma garrucha, mas pela cona de uma mulher.”
Fontes auxiliares:
Roseana Nunes Baracat de Souza Figueiredo
Denis Pereira
Daniel Magalhães Porto Saraiva
MANUELLE TOMAZ OLIVEIRA E SILVA
https://www.passeiweb.com/estudos/livros/boca_do_inferno/
Características complementares:
IDENTIDADE BRASILEIRA
O romance traz como enfoque a arte, a história e a cultura brasileira, que
busca de uma forma de conhecer/reconhecer uma identidade brasileira, mais
precisamente, a história do Brasil Colônia, que se constrói ou se reconstrói por meio
da narrativa.
HISTÓRICO E BIOGRÁFICO
Para Morais (2003) esta obra apresenta dois focos: o biográfico e o histórico.
É através da voz dos personagens que a história vai se montando, constituindo um
marco no processo de formação e/ou transformação política, literária, cultural e,
principalmente, a constituição da identidade do povo brasileiro, a identidade nacional.
MARCAS DO BARROCO
Do ponto de vista da Literatura enquanto disciplina, estão presentes na obra
elementos do barroco brasileiro: movimento pendular se faz em atos e palavras, pois
o poeta observa e descreve a cidade, e ao mesmo tempo faz parte dela, eleparticipa
diretamente da mesma. Algumas características do Barroco e da poesia de Gregório
de Matos, a exemplo do Cultismo/Conceptismo ou das figuras de linguagem
antíteses e paradoxos estão presentes na narrativa. Nas palavras de
Gregório/personagem: (...) a cidade parecia a imagem do Paraíso. Era, no entanto,
onde os demônios aliciavam almas para povoarem o Inferno (MIRANDA, 1989).
Esses contrastes, de certa forma resumem os sentimentos dos habitantes daquele
espaço, a capital da colônia, um misto de: fartura e miséria, de religiosidade e
materialismo, de divino e infernal.
"Começarei pelo princípio: loquaz, sedutor, um letrado que agora está ajoelhadodiante
da Virgem Maria e em seguida afunda-se no colo das meretrizes. Graduado na
universidade da luxúria, que é braba universidade. Tudo com tal publicidade..." (p. 91).
FICÇÃO E REALIDADE
O romance de Ana Miranda, Boca do Inferno, mesmo sem perder a sua
essência literária, traz ficcionalizado, a realidade histórica do Brasil no século XVII,
período de plena efervescência mercantilista. Nesse período a exploração foi palavra
de ordem.
Mesmo sendo ficção, o teor de historicidade do narrado se aproxima dos fatos
históricos descritos nos manuais escolares/acadêmicos. Morais (2003) afirma que
esse romance apresenta uma narrativa meta ficcional historiográfica situada num
entre-lugar discursivo, já que apresenta um grau de verossimilhança maior que o
permitido para uma narrativa histórica e um grau de veracidade maior que o permitido
para uma narrativa ficcional em normalmente se privilegia o caráter imaginativo.
Alguns nomes como os de Tomás Pinto Brandão, o Arcebispo João da
Madre de Deus, Maria dos Povos, Bernardo Ravasco, o desembargador João
da Rocha Pita, entre outros, são nomes históricos e documentados. O que deve
ficar bem claro é que muito do que se encontra no romance Boca do Inferno é
histórico, verdade documentada, mas até então pouco explorada, como as
descrições do Braço de Prata, de Câmara Coutinho, que tinha o nariz de Tucano,
do Pe. Vieira e do poeta Gregório de Matos. Também as descrições dos lugares, da
época e dos costumes constituem uma forte marca da história. As falas foram
recriadas, baseadas nos poemas, nas cartas e nos sermões, que registram a
linguagem da época.
Quanto às mulheres, sabe-se que não tinham voz nenhuma, não apareciam
com destaque e nem eram solicitadas politicamente. Anica de Melo e Maria Berco
não existiram, Bernardina Ravasco existiu, porém não se sabe com qual nome,
sabe-se apenas que Bernardo Ravasco teve uma filha que morreu jovem, vítima de
problemas cardíacos.
A morte do alcaide foi um fato e a rivalidade entre os Meneses e Ravasco
também, esses fatos fizeram parte da história.
A história torna-se ficção a partir do momento em que se apanha um fato e
dele se desenrola uma trama contada por alguém. Esse alguém que conta passa a
ter o direito de revelar os fatos à sua maneira e de controlar o desfecho.
A EXPLORAÇÃO CONSTANTE
Tudo o que pudesse ser explorado e convertido em lucro, servia, inclusive o
ser humano, que mesmo contrariando conceitos humanitários e divinos, tornava-se
mercadoria. Na História do Brasil, essa exploração violenta do homem pelo homem
foi retratada/denunciada e na literatura de Ana Miranda, através de Padre Antônio
Vieira que denuncia a violência contra os indígenas:
LINGUAGEM DE GREGÓRIO
a linguagem de Gregório de Matos com palavras obscenas e de baixo calão.
Com essa linguagem ele denuncia a corrupção sacerdotal e administrativa. Para expor
seu ponto de vista, quando perguntado o que iria falar a respeito da colônia, ele
responde: “Que dois efes se compõem esta cidade, a meu ver: “um furtar, outro foder”.
(MIRANDA, 1989, p.111).
E também:
Lá vai o frade fodinchão (...). Frade descalço pregando de meia.
São uns velhacos. Recebem putas nos conventos, transformam
igrejas em alcovas. Na manhã seguinte acompanham a
procissão com hipocrisia açoitando-se diante de todos, ainda
com odores da ardente noite anterior (...). E vem com lérias nos
sermões a recomendar cilícios (...) (MIRANDA, 1989, p. 327).
A BOCA DO INFERNO
A imagem da Bahia como um antro temeroso, pernicioso e atrasado, a autora
lança mão única e exclusivamente de reprovações alicerçadas em uma moral
eminentemente religiosa. Sua intenção parece ser representar a Bahia como um reino
cristão decaído, ou uma espécie de Sodoma tropical. Relatar padres freqüentando
cerimônias de umbanda ou participando de orgias.
As atividades dos baianos: “concubinatos, incestos, jogatinas, nudez
despudorada, bebedeiras, prevaricações, raptos, defloramentos, poligamia,
roubos, desacatos, adultério, preguiça, paganismo, sodomia, glutonaria”.
Na Bahia de Ana Miranda: elas deixaram de ser fruto da ação particularizada
dos indivíduos, e passaram a ser uma herança da cidade. É a Bahia, a vilã da história,
a responsável pela perpetuação inexorável dos pecados.
A lógica da narrativa destina-se a convencer o leitor de que se vivia uma situação
de degradação tão aguda que era impossível não pecar. Os personagens, quando
pecam, não se consideram imputáveis pelos seus atos, mas sim vítimas daquela cidade
ímpia.
Este ponto se evidencia quando os conspirados debatem entre si o tema da
salvação de suas almas. João de Couros pergunta: “Como teremos argumentos
diante de Deus para provar que não merecemos as profundezas?”. Eis que o
vereador Luiz Bonicho, um autoproclamado especialista em assuntos relativos à
“Terra do Cão”, rouba a cena. Segundo ele, matar o alcaide-mor foi fazer-lhe um favor,
pois mesmo o inferno é lugar melhor que a Bahia.
Venais? Está bem, somos venais. Mas quem não o é nesta cidade? Então o que fazemos
nós, os vereadores? A segunda melhor opção: se não podemos beneficiar a todos então
vamos beneficiar a alguns. A quem? Ora, aos senhores de cana, à aristocracia
proprietária dos escravos. A quem mais? Ao alcaide. Aos desembargadores. Ao
governador. A quem mais? A nós mesmos.15
“Durmo com uma mulher que gosta de me ver mijar. Eu mijo nela e ela em mim.
Ninguém escapa de cagar e mijar. Mesmo Deus caga. E caga na nossa cabeça”.
OS NÃO CORROMPIDOS
Em contraponto à corrupção generalizada, temos o incorruptível João da Rocha Pita,
o qual, ao lado do rabino Samuel da Fonseca, é o único que permanece intocado pela
devassidão colonial.
Rocha Pita faz lembrar a figura do apóstolo pobre, sem luxos e vaidades, Samuel da
Fonseca figura como um exemplar do sucesso em- presarial moderno, da racionalidade
econômica combinada com um severo rigor moral.
Mas principalmente Maria Berco.
BOCA DO INFERNO - QUESTÕES
QUESTÃO 01
Trecho I
“Numa suave região cortada por rios límpidos, de céu sempre azul, terras férteis,
florestas de árvores frondosas, a cidade parecia ser a imagem do Paraíso. Era, no
entanto, onde os demônios aliciavam almas para povoarem o Inferno.” (MIRANDA, p.8)
Trecho II
"Esta cidade acabou-se", pensou Gregório de Matos, olhando pela janela do sobrado, no
terreiro de Jesus. "Não é mais a Bahia. Antigamente, havia muito respeito. Hoje, até
dentro da praça, nas barbas da infantaria, nas bochechas dos granachas, na frente da
forca, fazem assaltos à vista." (MIRANDA, p.9)
TEXTO
Triste Bahia
Analise os trechos citados e o poema do poeta Gregório de Matos Guerra para somar
as proposições corretas.
01. O trecho I vai de encontro às ideias expostas no soneto de Gregório, à medida que
apenas faz elogios à Bahia.
02. O poeta deixa transparecer sua frustração relativa às mudanças sociais sofridas
tanto no comércio quanto nos comportamentos e relações pessoais.
04. A antítese presente no soneto, nos versos “Que em tua larga barra tem entrado” e
“Um dia amanheceras tão sisuda”, correspondem à ideia exposta em “Antigamente,
havia muito respeito.” No trecho II.
16. Os dois trechos e o soneto discursam sobre visões diferentes da mesma Bahia,
sobre tempos mais prósperos, em que a sociedade valorizava os aspectos culturais
disseminados entre as comunidades urbana e rural.
QUESTÃO 02
“Gregório de Matos queria, como o poeta espanhol, escrever coisas que não fossem
vulgares, alcançar o culteranismo. Saberia ele, Gregório de Matos, escrever assim?
Sentia dentro de si um abismo. Se ali caísse, aonde o levaria? Não estivera Gongora
tentando unir a alma elevada do homem à terra e seus sofrimentos carnais? Gregório de
Matos estava ali, no lado escuro do mundo, comendo a parte podre do banquete.”
(MIRANDA, p.9)
01. O trecho destacado no excerto mostra a influência que Gregório recebeu para adotar
uma vertente mais cultista em boa parte de sua produção literária.
02. Gregório expõe as mazelas sociais que praticavam suas relações comerciais e
sociais de acordo com os preceitos religiosos pregados pelo poeta espanhol.
04. Gongora, poeta inspirador para Gregório de Matos, faz versos que denotam
hipocrisia religiosa, sem rebuscamentos e estruturado em termos marcados pela
oralidade.
08. Através da leitura do fragmento pode-se inferir que o homem daquele contexto
histórico e social, baseia seu comportamento apenas em preceitos bíblicos, incluindo
ainda os conflitos com outras vertentes religiosas.
16. É possível observar, no fragmento, as angústias vividas pelo homem barroco, uma
dualidade que fazia o poeta sofrer por conta da decadência moral e social da época.
QUESTÃO 03
TRECHO I
TRECHO II
“Tudo, naquela cidade, dependia da força pessoal. Já não se enforcavam mais tão
comumente os ladrões e os assassinos, tampouco os falsários e os maldizentes. Não
havia grandes assaltantes na Bahia, diziam, mas quase todos furtavam um pouquinho.
Alguns salteadores de estradas, raros ladrões violentos ou cortadores de bolsas
andavam por ali, porém uma desonestidade implícita e constante fazia parte do
procedimento das pessoas.
Negros fugidos tornavam as estradas e certas ruas mais perigosas. A cobiça dodinheiro
ou a inveja dos ofícios, além disso, era um sentimento comum. Muitos queriam ver seus
patrícios abatidos de crédito, ou arrastados pela pobreza, ou mortos, numaluta destra
e sinistra. Nem ao sagrado perdoavam, fosse rei, bispo, sacerdote ou donzela metida em
seu retiro. Todos levavam seus golpes, todos sofriam com as intrigas cruéis e nefandas.
Gregório de Matos suspirou.
01. Não se vê, nos trechos citados, marcas sociais ligadas a uma realidade factual. As
descrições têm base ficcional inspirada na cultura europeia.
02. o trecho revela parte do contexto histórico e cultural da época que a obra
representa, visto que revela costumes ligados a práticas religiosas diferentes.
04. Pode-se dizer que há uma crítica ao clero presente no fragmento, mostrando que
determinados costumes também se aplicavam a essas pessoas daquela sociedade.
08. Uma das características pertinentes à escola literária do Barroco está na dualidade;
o homem barroco sentia-se dividido entre a luz e a escuridão, a fé e o pecado.
16. No fragmento “Todos levavam seus golpes, todos sofriam com as intrigas cruéis e
nefandas.”, há uma metáfora estabelecida entre a cultura europeias e a brasileira.
QUESTÃO 04
“Na igreja do colégio, Vieira e Bernardo Ravasco foram avisados da morte do alcaide,
do cerco à cidade em busca de seus amigos. "Para isso foi que abrimos os mares nunca
dantes navegados? " disse Vieira cravando seus olhos redondos no rosto do irmão. "Para
isso descobrimos as regiões e os climas não conhecidos? Para isso contrastamos os
ventos e as tempestades com tanto arrojo, que apenas há baixio no oceano que não
esteja infamado com miserabilíssimos naufrágios de portugueses? E depois de tantos
perigos, depois de tantas desgraças, depois de tantas e tão lastimosas mortes, ou nas
praias desertas sem sepultura, ou sepultados nas entranhas dos alarves, das feras, dos
peixes, que as terras que assim ganhamos as hajamos de ver assim?"” (MIRANDA, p.
37)
01. Tanto o trecho como a obra em sua integralidade foram estruturados em discurso
direto, com foco narrativo centrado na 3ª pessoa do discurso.
02. As aspas foram usadas para marcar o discurso direto na estrutura textual, indicando
as falas das personagens envolvidas no enredo, assim como a fala do narrador
observador.
04. Observamos, na fala de Bernardo Ravasco, a oratória e o jogo das ideias, firmados
em uma linguagem rebuscada e hermética, próprio do estilo barroco.
QUESTÃO 05
TRECHO I
TRECHO II
01. Há uma crítica de cunho político no discurso de Antônio Vieira, ele tece elogios ao
clero estabelecendo comparações com benevolentes governantes da época e suas
benfeitorias em prol de uma sociedade em desenvolvimento.
02. Há um tom irônico nas palavras do trecho “É desonesto? Vai governar. É honesto?
Vai ser padre.”, denotando a reprimenda de Antônio Vieira aos maus hábitos dos homens
que deveriam servir ao povo.
04. Em, “Nossos homens públicos são ou contemplativos ou ladrões. Roubar uma moeda
faz um pirata, roubar uma cidade e seus palácios faz um Alexandre.”, há uma referência
literária ao “Sermão do bom ladrão”, escrito pelo padre Antônio Vieira.
16. A partir da análise dos fragmentos, é possível inferir que a crítica se estende não só
ao exercício dos governantes, mas também ao exercício do clero, revelando uma visão
angustiada sobre o contexto histórico da época.
QUESTÃO 06
TRECHO I
“E estavam ali no Brasil defendendo a liberdade dos indígenas para os terem, eles
mesmos, como cativos — de suas ideias. Como se podia explicar que sendo contra a
escravidão calavam-se frente ao que ocorria com os negros africanos? Simples! O braço
do negro era imprescindível ao enriquecimento da colônia. Assim eram os jesuítas e
padre Vieira mais do que todos, pois — era necessário reconhecer — tinha brilhante
espírito. Sim, ele e Antônio Vieira haviam-se tornado inimigos. Vieira já estaria a essas
horas mexendo as peças de seu tabuleiro para derrubar o governo. Mas não seria mais
capaz disso. Ou seria?” (P.57)
TRECHO II
“Em um engenho sois imitadores de Cristo Crucificado: porque padeceis de um modo
muito semelhante ao que o mesmo senhor padeceu na sua cruz. (...) Cristo despido, e
vos despidos, Cristo sem comer e vós famintos; Cristo em tudo maltratado, e vós
maltratados em tudo. (...) Eles mandam e vós servis, eles dormem e vós velais; eles
descansam, e vós trabalhais; eles gozam o fruto de vossos trabalhos, e o que vós colhei
deles é um trabalho sobre o outro. Não há trabalhos mais doces do que os da vossa
oficina; mas toda essa doçura para quem é? (...) (Fragmento do Sermão XIV do Rosário,
Padre Antônio Vieira)
02. No trecho II, o argumento utilizado pelo padre em um de seus sermões mostra a
preocupação em humanizar o tratamento dispensado aos escravos, muito embora, não
haja, neste fragmento, uma indicação de que o religioso defendesse abertamente a
abolição da escravatura.
04. O apoio do clero era imprescindível para a manutenção da mão escrava nas lavouras
brasileiras, sendo os jesuítas os responsáveis pelos castigos e pelas punições dirigidas
aos escravos rebeldes.
TEXTO I
“Ao entrar para o colégio dos jesuítas, Gregório de Matos já se interessava pelas
mulheres. Desde menino gostava de olhar nos livros imagens femininas: santas, rainhas
desenhadas com benevolência e que sempre pareciam mais belas do que deveriam ser,
altivas condessas, duquesas, princesas e até mesmo bruxas condenadas pelo Santo
Ofício. Nas ruas o menino ficava extasiado com as mulheresde carne e osso, com seus
rostos e suas formas, alvas como jasmins, vermelhas, azeitonadas ou escuras como a
noite. As meninas eram lindas, as índias nuas pareciam-lhe deusas pagãs, as escravas
lhe sugeriam estátuas de ferro pronto aincandescer. Sua irmã, um demoniozinho falante,
tinha um mistério que Gregório de Matos observava com fervor quase religioso. Sentia-
se atraído por todas as mulheres como uma abelha pelo jardim. Encantava-se com
qualquer gesto, qualquer rufar de saia, detalhes mínimos. Mesmo as feias tinham para
ele um encanto qualquer: uma orelha bem feita, um par de tornozelos sólidos, unhas
saudáveis, cabelos abundantes, uma boa estrutura óssea, batatas das pernas grossas,
nádegas redondas e fartas, um ar sonhador, timidez, brilho de inteligência ou um nariz
que lembrasse uma jovem da dinastia lágida. Como ele gostava de dizer: "são feias; mas
são mulheres". "Ah, tu és um demónio", disse Anica de Melo. "Não, não, somos bastante
diferentes. Demónios são vós, mulheres."”(P. 61)
TEXTO II
01. Uma das características presentes na estilística do Boca do Inferno é justamente sua
visão de que as mulheres são caminhos para o pecado; tal característica recorre tanto
no primeiro quanto no segundo texto.
02. Ao se comparar os dois textos, é possível constatar que a mulher é descrita e tratada
com grande distinção: no primeiro texto, ela é idealizada; no segundo, ela é descrita
pelos moldes realistas.
04. O texto II apresenta estrutura em soneto e uma escolha vocabular rebuscada, que
faz uso de figuras de linguagem como a metáfora do verso “Sois Anjo, que me tenta, e
não me guarda.”.
08. O soneto de Gregório de Matos traduz em versos as descrições feitas sobre o autor
no texto I, fato que fica evidente no fragmento “Se pois como Anjo sois dos meus altares”.
16. Tanto o soneto, quanto o fragmento, descrevem a figura feminina pela ótica
idealizada, baseando tal descrição em um determinismo naturalista.
QUESTÃO 08
“"Que gentil feição de damas, não sei como vo-lo diga que tudo é eu e mamas e barriga"
(Diogo Fogaça). "Minha flor, cá me entregaram este vosso passarinho com menos penas
que as penas que eu trago por dar coninho... Mas para que nisto falo se até quando falo
nisto eu já não caibo na pele ou de todo me arrepio" (Capitão Bonina). As trovas
burlescas haveriam de marcá-lo para sempre. A ele, Gregório, e a outros estudantes da
Universidade de Coimbra(...)” (P.64)
Faça a somatória das proposições verdadeiras sobre o trecho, a leitura da obra “Boca
do Inferno” na íntegra e aspectos ligados à estilística de Gregório de Matos Guerra.
01. Embora se valha de termos chulos, o escritor mantém uma linguagem culta e
elogiosa dirigida às figuras políticas com quem mantinha relações conflituosas.
02. A leitura integral da obra revela um autor com inteligência perspicaz e mordaz que
se utiliza de um talento poético para exaltar os grandes feitos políticos e sociais sem
distinções.
04. O trecho representa uma característica estilística do autor também chamado de Boca
do Inferno, a agressividade para criticar comportamentos de tipos sociais.
08. Além do aspecto satírico, Gregório de Matos também escreveu poesias líricas e
religiosas, com influências do poeta espanhol Gongora, em uma vertente cultista.
16. O tom irônico no trecho é dirigido ao trabalho feito pelos jesuítas em prol da
libertação de escravos indígenas e africanos, haja vista o comprometimento da economia
pela falta de mão de obra.
QUESTÃO 09
“Bernardina Ravasco trocou o chapéu meio a contragosto. "Estou ansiosa quanto a meu
companheiro de viagem. É o poeta Gregório de Matos. Sei bem que é desembargador,
vai tomar ordens sacras, mas tem uma fama..." "Que fama, senhora?" "Começarei pelo
princípio: loquaz, sedutor, um letrado que agora está ajoelhado diante da Virgem Maria
e em seguida afundado no colo das meretrizes. Graduado na universidade da luxúria,
que é braba universidade. Tudo com tal publicidade..."”(P.66)
QUESTÃO 10
“"Quanta lacônica eloquência!" "Esta é uma grande virtude. Quae fuerant vitia mores
sunt (O que antes eram vícios agora são hábitos.). Sim, sim, creio que há vícios que se
tornam virtudes. Tudo depende de quando, como e por que se faz a coisa." "Para ti
tudo são vícios, e por isso vives atormentado com medo do inferno." "Mas tudo hoje são
vícios. E vícios hoje são virtudes." "Nos dias de hoje Francesca da Rimini estariano
paraíso e não no inferno." "E onde mais deveria estar?", disse Gregório de Matos,
indignado.”(P.93)
01. É possível observar um homem barroco atormentado pelos vícios vigentes naquela
sociedade que parecia se desviar dos valores morais.
02. Gregório de Matos Guerra foi um poeta eloquente, de linguagem rebuscada que
evidenciava sua formação intelectual e sua crença religiosa.
08. Uma vertente mais cultista faz parte da estilística referente ao poeta barrocoGregório
de Matos como se pode observar no trecho e na constituição geral da obra de Ana
Miranda.
16. O fragmento traz uma crítica implícita aos meirinhos que, em seus papéis de
representantes dos interesses públicos, mantiveram-se neutros e não tomaram frente
nas questões abolicionistas.
GABARITOS
QUESTÃO 01
GABARITO: 02 + 08
QUESTÃO 02
GABARITO: 01 + 16
QUESTÃO 03
GABARITO: 02 + 04 + 08
QUESTÃO 04
GABARITO: 01 + 08
QUESTÃO 05
GABARITO: 02 + 04 + 08 + 16
QUESTÃO 06
GABARITO: 01 + 02 + 16
QUESTÃO 07
GABARITO: 01 + 04 + 08
QUESTÃO 08
GABARITO: 04 + 08
QUESTÃO 09
GABARITO: 01 + 04
QUESTÃO 10
GABARITO: 01 + 02 + 08