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Acompanhamento

Terapêutico e
Inclusão
Escolar
Profa. Débora Mariana Stahelin
Prof. Jairson José Leichtweis Reis
Prof. José Carlos Lunelli
Profa. Nislândia Santos Evangelista

Indaial – 2022
1a Edição
Elaboração:
Profa. Débora Mariana Stahelin
Prof. Jairson José Leichtweis Reis
Prof. José Carlos Lunelli
Profa. Nislândia Santos Evangelista

Copyright © UNIASSELVI 2022

Revisão, Diagramação e Produção:


Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI

S781a

Stahelin, Débora Mariana

Acompanhamento terapêutico e inclusão escolar. / Débora


Mariana Stahelin; Jairson José Leichtweis Reis; José Carlos Lunelli;
Nislândia Santos Evangelista. – Indaial: UNIASSELVI, 2022.

210 p.; il.

ISBN 978-85-515-0487-1

1. Transtorno globais de aprendizagem. – Brasil. I. Stahelin,


Débora Mariana. II. Reis, Jairson José Leichtweis. III. Lunelli, José
Carlos. IV. Evangelista, Nislândia Santos. V. Centro Universitário
Leonardo Da Vinci.
CDD 370

Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Acadêmico, seja bem-vindo ao livro didático Acompanhamento Terapêutico
e Inclusão Escolar. Nesta disciplina, você compreenderá, a partir de diferentes óticas,
conceitos e questões específicas sobre o tema da inclusão, em constante diálogo com
as demandas próprias do Acompanhamento Terapêutico. Neste sentido, esta disciplina
tem o intuito de lançar um olhar sensível sobre os tópicos que tratará.

Na Unidade 1 serão vistos tópicos voltados aos movimentos históricos, sociais


e políticos da inclusão, versando sobre as formas que a sociedade se relacionou com
aqueles que foram e/ou são diferentes da norma estabelecida. Estes aspectos são
importantes para que se tenha compreensão e consciência das lutas e dos limites do
tema, dando mais suporte e repertório de ação ao acompanhante terapêutico em seus
diferentes lócus de trabalho.

Na Unidade 2 serão apresentados os Transtornos Globais do Desenvolvimento –


TGD – e os transtornos que se enquadram nele, bem como sua relação com o processo
de aprender. Nesta unidade, você também será apresentado aos Transtorno Globais de
Aprendizagem, seu diagnóstico e a sua relação com o sucesso escolar.

Na Unidade 3, você será apresentado aos problemas de aprendizagem e


toda a relação com a escola e o ambiente escolar, juntamente a suas dificuldades e
necessidades específicas. Também será abordada a atuação do acompanhamento
terapêutico e a sua relação com a escola junto a uma visão geral sobre a aprendizagem.

Desejamos uma boa jornada a todos e sucesso frente aos desafios intelectuais,
éticos e pessoais proporcionados pelo estudo do Acompanhamento Terapêutico e
Inclusão Escolar.

Bons estudos!

Profa. Débora Mariana Stahelin


Prof. Jairson José Leichtweis Reis
Prof. José Carlos Lunelli
Profa. Nislandia Santos Evangelista
GIO
Olá, eu sou a Gio!

No livro didático, você encontrará blocos com informações


adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos


os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
produção de folhas de papel, por exemplo.

Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente,


apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Preparamos também um novo layout. Diante disso, você


verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.

QR CODE
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e
dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR Codes
completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite que você
acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar
essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só
aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos.
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!

LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conheci-


mento, construímos, além do livro que está em
suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem,
por meio dela você terá contato com o vídeo
da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa-
res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de
auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que


preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


SUMÁRIO
UNIDADE 1 - ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO, INCLUSÃO SOCIAL E ESCOLAR.............. 1

TÓPICO 1 - INCLUSÃO E EXCLUSÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS E SOCIAIS.........................3


1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................3
2 PARADIGMAS CIENTÍFICOS E SOCIAIS..............................................................................4
2.1 PARADIGMA DA EXCLUSÃO................................................................................................................. 6
2.2 PARADIGMA DA SEGREGAÇÃO (INSTITUCIONALIZAÇÃO)............................................................7
2.3 PARADIGMA DE INTEGRAÇÃO E SERVIÇO .................................................................................... 9
2.4 PARADIGMA DE SUPORTE.................................................................................................................. 9
3 DEFICIÊNCIA: CONCEPÇÕES SOCIAIS .............................................................................11
3.1 MODELO SOCIAL DA DEFICIÊNCIA ...................................................................................................12
3.2 NEURODIVERSIDADE......................................................................................................................... 13
3.3 OS MOVIMENTOS PRÓ-CURA E ANTICURA.................................................................................. 18
RESUMO DO TÓPICO 1.......................................................................................................... 21
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 22

TÓPICO 2 - AÇÕES E POLÍTICAS PARA A INCLUSÃO SOCIAL E ESCOLAR...................... 25


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 25
2 GOVERNOS DA INCLUSÃO/EXCLUSÃO........................................................................... 26
2.1 DEFICIÊNCIA E BIOPOLÍTICA.............................................................................................................33
3 INCLUSÃO ESCOLAR........................................................................................................ 36
4 DOCUMENTOS OFICIAIS.................................................................................................. 39
RESUMO DO TÓPICO 2..........................................................................................................47
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 48

TÓPICO 3 - ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO............................................................... 51


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 51
2 EDUCAÇÃO COMO PROCESSO SOCIALIZADOR E INCLUSÃO ESCOLAR....................... 51
3 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÕES ...................................................... 54
3.1 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÃO ESCOLAR....................................................56
3.2 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÃO SOCIAL.......................................................60
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................. 63
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................... 69
AUTOATIVIDADE...................................................................................................................70

REFERÊNCIAS.......................................................................................................................72

UNIDADE 2 — ASPECTOS E DIAGNÓSTICOS DOS TRANSTORNOS


RECORRENTES AO AMBIENTE ESCOLAR........................................................................... 77

TÓPICO 1 — OS TRANTORNOS GLOBAIS E DE APRENDIZAGEM........................................79


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................79
2 TRANSTORNOS GLOBAIS DE DESENVOLIMENTO – TGD............................................... 80
2.1 TRANSTONO GLOBAL DO DESELVOLVIMENTO NO APRENDER................................................85
3 TRANSTORNOS GLOBAIS DE APRENDIZAGEM.............................................................. 86
RESUMO DO TÓPICO 1.......................................................................................................... 91
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 92
TÓPICO 2 - TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO (TGD)
E ESCOLARIZAÇÃO DESTES ALUNOS.................................................................................95
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................95
2 TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO: DO QUE SE TRATA? ......................96
2.1 TGD NA VISÃO DA CID-10 E DO DSM-IV.........................................................................................98
2.2 OS TGD DO PONTO DE VISTA BIOMÉDICO...................................................................................100
3 ESCOLARIZAÇÃO NA CLASSE COMUM DO ALUNO COM TRANSTORNOS
GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO E O ATENDIMENTO
EDUCACIONAL ESPECIALIZADO.......................................................................................106
RESUMO DO TÓPICO 2.........................................................................................................111
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 112

TÓPICO 3 - PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E DE DIAGNÓSTICO DOS TRANSTORNOS.......... 115


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 115
2 DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM: DO HISTÓRICO AO DIAGNÓSTICO.................... 116
3 CLASSIFICAÇÃO DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ........................................ 119
4 AVALIAÇÃO DOS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM.................................................123
5 COMO OCORRE O DIAGNÓSTICO DOS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM...............125
6 TRATAMENTO................................................................................................................... 127
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................129
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................135
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 137

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................139

UNIDADE 3 — ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO DO ACOMPANHAMENTO


TERAPÊUTICO, ANAMNESE, ENTREVISTA, MODELOS DE INTERVENÇÃO
E PLANO TERAPÊUTICO.....................................................................................................145

TÓPICO 1 — ESCOLA E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM...................................... 147


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 147
2 A ESCOLA, O TERRITÓRIO ESCOLAR..............................................................................148
3 ESCOLA E SUAS DIFICULDADES E NECESSIDADES ....................................................150
4 O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR..............................................................155
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................162
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................163

TÓPICO 2 - ATUAÇÃO DO ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR..........................165


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................165
2 ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR: BREVE
CONTEXTUALIZAÇÃO COM BASE NAS LEIS.....................................................................165
3 DIFERENÇAS ENTRE O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR
E O ACOMPANHANTE ESPECIALIZADO ............................................................................169
4 CARACTERÍSTICAS DA ATUAÇÃO DO ACOMPANHANTE
TERAPÊUTICO ESCOLAR ..................................................................................................170
5 IMPORTÂNCIA E FUNÇÃO DO ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR ................ 173
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................ 179
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 181
TÓPICO 3 - VISÃO GERAL SOBRE A APRENDIZAGEM
E O PROCESSO DE ANAMNESE..........................................................................................183
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................183
2 VISÃO GERAL SOBRE A APRENDIZAGEM ......................................................................184
2.1 MAU DESEMPENHO ESCOLAR........................................................................................................185
2.2 TRANSTORNO ESPECÍFICO DE APRENDIZAGEM (TEA)...........................................................186
3 CRITÉRIOS CLÍNICOS: ANAMNESE.................................................................................189
3.1 AVALIAÇÃO DO MATERIAL ESCOLAR............................................................................................190
3.2 JOGOS E DESENHOS.........................................................................................................................191
3.3 EXEMPLOS DE TESTES UTILIZADOS PELO PSICODIAGNÓSTICO .........................................191
3.4 ASPECTOS PSICOMOTORES........................................................................................................... 193
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................195
RESUMO DO TÓPICO 3....................................................................................................... 202
AUTOATIVIDADE................................................................................................................ 204

REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 206
UNIDADE 1 -

ACOMPANHAMENTO
TERAPÊUTICO, INCLUSÃO
SOCIAL E ESCOLAR

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os aspectos de inclusão a partir de uma perspectiva crítica;

• compreender como a ideia de normalidade/anormalidade é uma construção;

• compreender a inclusão a partir de uma teia também política e histórica;

• conhecer alguns documentos oficiais que norteiam as práticas de inclusão;

• compreender como o Acompanhamento Terapêutico pode atuar na inclusão;

• compreender as aproximações entre Acompanhamento Terapêutico e Inclusão.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – INCLUSÃO E EXCLUSÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS E SOCIAIS


TÓPICO 2 – AÇÕES E POLÍTICAS PARA A INCLUSÃO SOCIAL
TÓPICO 3 – ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÃO ESCOLAR

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

1
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UNIDADE 1!

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2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -

INCLUSÃO E EXCLUSÃO: ASPECTOS


HISTÓRICOS E SOCIAIS

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, neste tópico, iniciaremos os estudos que versam sobre os aspectos


de inclusão, exclusão e os temas que dialogam com estes fenômenos, como a construção
da ideia de normalidade/anormalidade. Para isto, compreenderemos como, em cada
época e cultura, a sociedade constituída se relaciona com aqueles que compõem o
quadro de diferença social. Os diferentes são aqueles que, por alguma razão, afastam-
se dos padrões estabelecidos em determinados contextos. Estas diferenças podem ter
um caráter físico, moral, sexual, comportamental, entre outros.

A construção desses fenômenos é algo, como todos os processos sociais,


construídos em diálogo com as crenças, as políticas, a economia, a moral, os modos de
produção de uma época, entre outros fatores específicos que podem ir tecendo uma
rede cada vez mais complexa. Assim, falamos também a partir da concepção do que
são paradigmas e como eles se renovam ou se repetem a depender, justamente, das
necessidades que vão se delineando em cada sociedade e em cada época.

Desta forma, antes de iniciarmos, reflita: o que você considera como


anormalidade? O que é deficiência? Anormal e deficiente em relação a qual normalidade
e a qual eficiência? Por que precisamos de políticas de inclusão? Quem são os excluídos
e como se deu este processo de exclusão? Há a necessidade de exclusão? Estas
questões serão discutidas no primeiro e no segundo tópico desta unidade.

No Tópico 3, veremos sobre as aproximações entre o Acompanhamento


Terapêutico (AT) e as teorias, políticas e práticas voltadas à inclusão. Qual a aproximação
entre estes temas? Podemos pensar, a priori, que tanto um quanto o outro surgem para
contestar mecanismos de exclusão e violência para aqueles que são marginalizados e
patologizados em suas existências. Tanto o AT quanto a inclusão surgem para pensarmos
as práticas de saúde e cidadania com respeito aos direitos dignidade humana, numa
lógica antimanicomial e numa luta por respeito e acesso a todos à educação e aos
demais espaços e possibilidades sociais.

3
2 PARADIGMAS CIENTÍFICOS E SOCIAIS
Para pensarmos sobre inclusão e exclusão, partiremos da concepção de
paradigmas para compreendermos a trajetória histórica ou como surgem novas formas
de perceber determinados fenômenos quando mudamos as lentes utilizadas e quando
surgem novas necessidades na sociedade.

Paradigmas são o grupo de regras estabelecidos por alguma teoria que pode
ser rejeitada ou posta em evidência como a “certa”. A ciência ser normal, atualmente,
significa que ela é atrelada, necessariamente, às concepções/interesses das classes
dominantes? Thomas Kuhn desenvolve uma leitura sobre a história das revoluções
científicas em que não há, de fato, cumulação de conhecimento, mas antes substituições
de um paradigma que vem incorporado com conceitos, abordagens, metodologias,
instrumentos e regras próprios que servirá de substituo do paradigma vigente, ou seja,
a ciência normal.

DICAS
Para expandir seus conhecimentos, leia na íntegra o livro de Thomas Kuhn, que ao
mesmo tempo que discute a construção do que conhecemos como ciência, como
se desenvolvem os paradigmas científicos e sociais, também questiona este modelo
estabelecido. Este é um cânone para pensarmos sobre a formação de pensamentos e,
consequentemente, também a construção de políticas públicas, afinal, a construção de
conhecimento e a solidificação de práticas sociais caminham juntas.

FIGURA – CAPA DO LIVRO A ESTRUTURA DAS REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS, DE AUTORIA


DE THOMAS KUHN

FONTE: <https://bit.ly/3r9eIbz>. Acesso em: 30 mar. 2022.

4
Na ciência normal, há universalização das regras e busca-se sempre uma
verdade ou uma concordância geral, os cientistas montam o quebra-cabeça a partir
de regras previamente estabelecidas. Na medida em que surgem anomalias (e podem
surgir de diversas formas), muda-se o jeito de olhar, muda-se a perspectiva. Kuhn (1975)
faz analogias com a metáfora de figura e fundo, da Gestalt, em que se muda o que estará
mais em evidência a depender do paradigma. No entanto, o autor critica esse modelo
de não cumulação de conhecimento, competição entre pesquisadores, a existência
de manuais que guiam as regras do jogo, sem dar ao estudante a noção histórica da
ciência e, portanto, o quanto os conceitos são abstratos que se atualizam à realidade e
não estão descolados da realidade social e política.

Para a mudança de paradigma, surge o que Kuhn (1975) denomina de anomalia,


que seriam ‘peças’ que não se encaixam ao quebra-cabeça, o que pode gerar uma crise
na ciência normal, a tentativa de novo consenso (logo, o desenvolvimento de novas
teoria e instrumentos para responder à crise, para encaixar todas as peças, busca-se
por unanimidade) e a instalação de um novo paradigma, o qual substitui o anterior, os
manuais são renovados, mudam-se os termos e os instrumentos, sem considerar o
processo evolutivo e as considerações do anterior. Como uma teoria nunca responderá
a todos os problemas, o jogo de quebra-cabeça continua sem caráter cumulativo.

Kuhn mostra como a ciência contemporânea atua partindo de exemplos das


ciências exatas ou naturais, na maior parte dos exemplos. A ciência é ensinada a partir
dos manuais e muitas vezes perde-se o caráter histórico da construção de uma nova
teoria pela substituição, de forma que o conhecimento não é cumulativo, de fato. As
“velhas” teorias viram superstição (KUHN, 1975).

Acadêmico, você já observou que há fenômenos que, por exemplo, na época


da infância de sua mãe ou de sua avó eram naturalizados e que hoje são questionados
ou nem mesmo existem? Como há fenômenos que em outras épocas eram tidos como
“verdades absolutas” e atualmente não fazem mais sentido na estrutura que estamos.
Isso vale para saber como tratar as crianças, como se relacionar com a ideia de higiene,
a frequência na escola, algumas normas sociais, algumas tradições em relação à
alimentação, entre outros.

Nesse sentido, para pensarmos a inclusão, faremos um resgate histórico dos


paradigmas que estão incrustados socialmente e que dão base para teorias e práticas
políticas e sociais. Até o momento de a inclusão servir como paradigma vigente,
outras perspectivas estavam em vigor e estas não apresentavam uma modalidade de
cidadania e dignidade para as pessoas com deficiência. Você já ouviu falar quais eram
os tratamentos aos “anormais”, antigamente? Em outras épocas, a ideia de inclusão, tal
como temos hoje, não era sequer levantada como uma questão legítima. O que mudou
social e politicamente?

5
O processo histórico relacionado às pessoas com deficiência, ainda hoje,
tem se delineado de forma segregativa e exclusiva. Embora as práticas tenham esse
sentido, os argumentos para segregação e exclusão estão sempre acompanhados de
uma localização cultural e social correspondente a cada período histórico (ARANHA,
2005). Dessa maneira, vamos postular sobre diferentes perspectivas – paradigmas –
referentes à relação da sociedade ocidental com a deficiência de acordo com o modelo
de organização econômica e sociopolítica vigente que deu o alicerce para uma forma de
pensamento e para determinadas práticas sociais.

ATENÇÃO
Acadêmico, precisamos ficar atentos às terminologias, mas sem cometer
anacronismos históricos. Assim, termos como “deficiência” ou “deficiente”
são relativamente recentes, surgidos em meados do século XX. Embora
utilizemos esses termos para pensar em outros períodos históricos,
precisamos lembrar que não havia essa terminologia, embora houvesse
uma série de modos sociais de funcionar em relação às pessoas que fugiam
da norma em termos de corpo físico, mental ou social.

2.1 PARADIGMA DA EXCLUSÃO


Há poucos registros sobre o período histórico ocidental que conhecemos por
“Antiguidade”, nomeadamente Roma e Grécia Antigas. Um dos livros que pode ser
usado como fonte documental para pensarmos sobre o funcionamento da sociedade é
a Bíblia, pois há passagens que apresentam alguns procedimentos e configurações da
época (ARANHA, 2005). A começar pela economia, que era pautada pelas atividades de
produção e de comércio agrícola, pecuário e de artesanato. Em termos de organização
social e política, havia a existência de dois grupos sociais que eram a sua maneira,
dominantes e dominados. De um lado, havia a nobreza, pautada no poder social, político
e econômico e, por outro lado, havia o populacho, que não tinham dignidade e cidadania
tal como concebemos nos dias atuais.

Em outras palavras, a maior parte da população trabalhava e produzia os bens


de consumo, mas era a nobreza que tinha acesso a estes bens, ficando para o populacho
as “sobras indesejadas na nobreza” (ARANHA, 2005, p. 7). E, neste cenário, a pessoa
que se apresentava minimamente diferente, com limitações em alguma ordem, eram
abandonadas de forma que isso não seria um problema de natureza ética ou moral, pelo
contrário, essa atitude segregatória era a atitude em voga, era a normalização da forma
de tratar essas pessoas.

Já na Idade Média, embora o sistema econômico continuasse, basicamente, por


meio de atividades de pecuária, artesanato e agricultura, a organização política e social
passou por alterações mais pungentes. Nesse período histórico, o clero, segmento
6
representante do cristianismo e da Igreja Católica, ganhou cada vez mais destaque
e fortalecimento. Nesta nova configuração, o clero tinha um poder político, social e
espiritual de excomungar as pessoas, o que significava bani-las do reino dos céus.

Não obstante, com o crescimento do cristianismo, cresceu também a noção de


vida concebida por um Deus, de forma que as pessoas doentes, diferentes, “defeituosas”
ou “mentalmente afetadas” não mais eram exterminadas, por também serem filhas de
Deus, mas também não era prestado nenhum tipo de assistência. Ou seja, as pessoas
que fugiam à norma eram ignoradas e abandonadas à própria sorte. No entanto, a partir
do século XIII, algumas instituições foram delegadas para a acolhida de pessoas com
deficiências mentais.

A chamada “demonologia” diz respeito à crença de que forças sobrena­turais


e diabólicas atuam sobre o comportamento humano, causando a anormali­ dade (a
loucura). Mesmo antes da Idade Média, há evidências, em forma de rolos de papiro e
monumentos, apontando que egípcios, árabes e hebreus acreditavam que a loucura
seria decorrente de fontes míticas, como deuses raivosos, maus es­píritos e castigo
divino (HOLMES, 1997). Na verdade, também no Império Persa de 900 a 600 a.C.,
todos os transtornos físicos e mentais eram considerados mani­festações demoníacas
(BARLOW; DURAND, 2015).

No entanto, devemos considerar que, nessa época, outros fenômenos tam­bém


eram atribuídos à ira dos deuses, como tempestades, inundações ou incên­dios. Dessa
forma, a partir da cosmovisão e da compreensão de mundo da época, era esperado que
também o “desvio” da norma dos comportamentos humanos, ou o contágio de alguma
doença, também fosse associado a entes “superiores”. Essa concepção de loucura/
anormalidade a partir de uma ótica mítica tem íntima relação com o imaginário popular,
presente ainda nos dias atuais, sobre a eterna batalha entre o bem e o mal. Assim, as
pessoas com deficiência passam a ser vítimas de acusação de heresia, pois fugiam, de
alguma maneira, da norma estabelecida.

Desse modo, se na Antiguidade a pessoa com deficiência não chegava mesmo


à categoria de “humano”, na Idade Média, a concepção de deficiência e/ou loucura
passou a ser considerada como metafísica, de natureza mística ou religiosa. Assim, se
pensarmos novamente de acordo com a concepção de paradigma de Thomas Kuhn
(1975), vemos que as práticas, as nomenclaturas e as instituições mudaram, mas a
prática de exclusão continuou.

2.2 PARADIGMA DA SEGREGAÇÃO (INSTITUCIONALIZAÇÃO)


Quando pensamos na Antiguidade ou na Idade Média relacionamos os trata-
mentos às pessoas com deficiências à exclusão. Mas não havia nem esta terminolo-
gia, nem um processo voltado especificamente a esta população. Assim, a primeira
via formal para uma relação com pessoas com deficiência foi a partir do Paradigma de
Institucionalização.

7
O filósofo Michel Foucault, em uma de suas pesquisas, aborda o tema da
história da loucura e aponta-nos para a reconfiguração do social. Dito de outra for­
ma, no início da Idade Média, havia uma quantidade, em franco crescimento, dos casos
de lepra, de forma que havia um local específico para alojar leprosos. Essa medida
continha a contaminação ainda maior da doença. A lepra, na alta Idade Média, era o
verdadeiro temor e terror da população que, de acordo com Foucault (1978), um a cada
cem parisiense teve contato com a doença. O fato da diminuição radical da doença
deixou esses espaços de internação ao léu e só foram de fato re­avivados quase dois
séculos depois, onde a loucura, por assim dizer, tomou conta do medo e do imaginário
popular, e assim vemos, novamente, reações de divisão, de exclusão e de purificação
dos indivíduos (FOUCAULT, 1978).

Trata-se de recolher, alojar, alimentar aqueles que se apresentam de


espontânea vontade, ou aqueles que para lá são encaminhados pela
autoridade real ou judiciária. É preciso também zelar pela subsistên­
cia, pela boa conduta e pela ordem geral daqueles que não puderam
encontrar seu lugar ali, mas que poderiam ou mereciam ali estar
(FOUCAULT, 1978, p. 56).

Desse modo, a partir da Renascença, podemos perceber um delineamento maior


do internamento, tal qual na Idade Média, quando os leprosos eram se­gregados, porém,
agora, o público-alvo era outro (FOUCAULT, 1978). Contudo, temos que ter em mente
que o gesto de aprisionamento, de internamento, carrega um leque de significados para
além da questão clínica em si, pois também há camadas sociais, políticas, religiosas,
econômicas e morais (FOUCAULT, 1978). Essas esferas e a forma como nos relacionamos
com a loucura, com a dita anormalidade, depende sempre do conjunto da história e
da cultura. Assim, mui­tas vezes, a prática do internamento está condicionada a faltas
morais, conflitos familiares e libertinagem, sendo, então, o internamento a medida social
adotada para ser a casa da loucura (VIEIRA, 2007).

Assim, instituições tais como conventos e asilos, além dos próprios hospitais
psiquiátricos passam a constituir um local de confinamentos. Pode-se falar, em
alguma medida, que se tratava de prisões voltadas àqueles que são diferentes. Esses
dados têm extrema influência da Medicina, pois esta passou a produzir e sistematizar
conhecimentos que mediavam e categorizavam os indivíduos de acordo com critérios
socialmente aceitos. Este paradigma era amplamente aceito e considerado como ético
e legítimo até, pelo menos, o século XX, por volta da década de 1960, onde passou a ser
examinado e criticado.

Não obstante, ingenuidade posta ao lado, por um lado, em termos de economia


também era viável que se cessasse a lógica de institucionalização, pois isso custava
um alto valor para o sistema político. Por outro lado, é a partir da década de 1960 que
se delineia um processo geral de reflexão e de crítica voltada aos direitos humanos
das minorias, liberdade sexual, subjetividade e cidadania. Desse modo, o paradigma de
institucionalização era revisto tanto em termos acadêmicos e científicos, como a partir
do viés econômico e de diferentes categorias profissionais (ARANHA, 2005).

8
A partir de agora, pensaremos em termos de normalização e de
desinstitucionalização.

2.3 PARADIGMA DE INTEGRAÇÃO E SERVIÇO


O movimento de transição ou justaposição do Paradigma de Institucionalização
passou pela ideia de normalização, adotando-se, assim, o Paradigma de Integração, o que
se refere à intervenção junto às pessoas com deficiência para que elas possam, cada vez
mais, integrar de maneira normativa a sociedade da qual participa. Em outras palavras,
busca-se modificar o indivíduo para que ele “caiba” na régua estabelecida socialmente.

Assim, buscou-se uma rede de serviços (Paradigma de Serviço) para que


a pessoa com deficiência fosse assistida e “corrigida”. Assim, estes serviços partiam
de etapas, em que a primeira dizia respeito à avaliação do sujeito por uma equipe de
profissionais que decidiam o que necessitaria ser modificado na vida do indivíduo para
que ele fosse considerado o mais perto da normalidade possível (ARANHA, 2005). A
segunda etapa no paradigma de serviço destinava-se à intervenção, em que havia um
atendimento formal e sistematizado para alcançar determinados objetivos. A terceira e
última etapa, por fim, tinha um caráter de encaminhamento da pessoa com deficiência
de volta para a comunidade.

Esse paradigma de serviço servia como uma luva para o sistema educacional
e para os centros de reabilitação. O problema da lógica de normalização está justa-
mente em buscar padrões universais de categorias ou estágios que todos alcancem,
da mesma maneira, e sob a mesma temporalidade. Dessa forma, logo em seu início,
este modelo de serviço passou por duras críticas da ala acadêmica, que julgava não ser
adequado – nem ético – expectar que todos os indivíduos fossem “iguais” e, ao mesmo
tempo, como se a diferença tivesse um fator de menor valor, o que em absoluto não tem
(ARANHA, 2005).

2.4 PARADIGMA DE SUPORTE


O último paradigma reconhecido do processo de relação da sociedade com
pessoas com deficiência trata-se do paradigma de suporte. Neste, há o reconhecimento
de que pessoas com deficiência precisam de serviços especializados e capacitados,
mas também se reconhece que há outras possibilidades viáveis.

Entre as possibilidades, inclui a organização social que garanta o acesso a


todos os cidadãos, em termos de estrutura, tecnologia, educação, metodologia, entre
outros. Neste ínterim, o Paradigma de Suporte tem como premissa essencial que a
pessoa com deficiência tem o direito à convivência de maneira plena, sem exclusão
ou segregação, aos recursos e aos bens e materiais simbólicos e de consumo da so-
ciedade (ARANHA, 2005).

9
Este Paradigma está atrelado, portanto, à ideia crua de inclusão, pois busca
suportes e instrumentos que garantam o acesso da pessoa com deficiência a qualquer
recurso e/ou evento da sociedade. A diferença deste paradigma em relação aos outros
está na forma como se delineia, ou seja, não busca segregas nem normalizar o indivíduo,
mas reconhece suas diferenças e potencialidade para agir de acordo com elas. Assim,
a pessoa com deficiência passa a ser reconhecida como humana, como cidadã, como
digna e com direitos que devem ser garantidos e respeitados.

FIGURA 1 – EXCLUSÃO, SEGREGAÇÃO, INTEGRAÇÃO, INCLUSÃO

FONTE: <https://bit.ly/3jd68E6>. Acesso em: 30 mar. 2022.

Assim, vimos até aqui, como a construção de um paradigma – uma ciência


normal – norteia tanto o caminhar das pesquisas sobre determinado tema, como
direciona, também, os tipos de práticas que são socialmente aceitáveis, permissíveis e
almejáveis em relação a algum grupo – como os diferentes. De forma a dialogar com a
ideia de paradigma de Thomas Kuhn, tal como vimos no início deste tópico, as formas
de relacionamento e as tentativas de educação destes sujeitos partiram de diferentes
abordagens no decorrer do tempo. Contudo, todas ainda partem, a priori, de uma
ideia geral e universalizante de normalidade. A exclusão, a segregação, a integração
e a inclusão dos diferentes ainda tem o ponto de partida de uma ideia homogênea de
indivíduo e de sociedade.

Por isso, pensando a partir de Thomas Kuhn, podemos questionar se, de fato,
há cumulação de conhecimento ou se há uma substituição de um termo por outro
sem considerar a construção do outro modo. Um ponto diferente da ideia de inclusão
é, justamente, que a margem e a quantidade de “indivíduos diferentes” têm sido tão
grandes ao nível de ser modificado o ponto central do que se considera a norma. Ou,
ainda, o ponto central que partimos para pensar o que é normal tem sido cada vez mais
exigente e inflexível ao ponto de “caber” cada vez menos indivíduos?

10
3 DEFICIÊNCIA: CONCEPÇÕES SOCIAIS
Há diferentes compreensões e definições para o termo “deficiência”. De uma
maneira geral, pressupõe-se que haja variações de alguma das habilidades que podem
ser classificadas como restrição ou lesão (DINIZ; SANTOS, 2009). Contudo, não há
consenso entre os atores da área sobre quais variações ou quais funcionalidades que
poderia, por si, indicar uma deficiência. Isto porque há pessoas que apresentam lesões
e não necessariamente são deficiências e, de forma similar, há pessoas sem lesões
que estão no espectro da deficiência. Trata-se, portanto, de uma fronteira tênue entre
o conceito e as possibilidades de expressões da diversidade humana. Deste modo,
podemos compreender o conceito (acadêmico, político e social) da deficiência a partir
de, pelo menos, duas frentes.

A primeira atrela-se à noção de manifestação da diversidade humana, no


sentido de um corpo que vivencia uma série de impedimentos de ordem física,
intelectual e sensorial. Não obstante, o problema não diz respeito ao corpo, em si, mas
às barreiras sociais que impedem que o indivíduo participe de maneira socialmente
ativa, dando margens para a desigualdade e delineando-se um cenário de exclusão.
Esta perspectiva chamamos de Modelo Social da Deficiência, em que se defende que a
garantia de igualdade entre pessoas com ou sem impedimentos corporais deve ir além
da oferta de serviços biomédicos, sendo uma questão de direitos humanos, assim como
outros temas sociais, como a questão racial e de gênero, por exemplo.

Uma segunda forma de compreender a deficiência percebe-a como limitante,


em si mesma, tratando-se de uma desvantagem natural e o trabalho em cima disso
volta-se para tentar “reparar” ou “corrigir” as “falhas” apresentadas. Deste modo, não
se trabalha em cima da problemática das barreiras sociais que impedem o acesso a
estes indivíduos, mas olha-se para o impedimento corporal como algo indesejado e,
por isso, busca-se neste corpo, ainda, a normalidade. Esta perspectiva chamamos de
Modelo Biomédico da deficiência, em que se percebe tanto as causas como as supostas
soluções através de intervenção da ala de medicina. Isto porque o que o Modelo Social
chama de impedimentos corporais, o Modelo Biomédico determina como lesões, de
forma que as práticas de reabilitação são oferecidas e muitas vezes impostas aos
indivíduos para que eles sejam “mais normais”.

A entrada do olhar médico marcou a dicotomia entre normal e pa-


tológico no campo da deficiência, pois o corpo com impedimentos
somente se delineia quando contrastado com uma representação do
corpo sem deficiência. O desafio, agora, está em recusar a descrição
de um corpo com impedimentos como anormal. A anormalidade é
um julgamento estético e, portanto, um valor moral sobre os estilos
de vida, não o resultado de um catálogo universal e absoluto sobre os
corpos com impedimentos (DINIZ; SANTOS, 2009, p. 68).

11
Assim, podemos refletir que a deficiência já foi vista de diversas maneiras e
o debate ainda segue em aberto. Em outros tempos, a deficiência já foi vista como
um drama pessoal ou familiar. Como vimos há pouco, já foi atribuída benção ou praga
divina. Não obstante, hoje não falamos que a causa de deficiência reside num pecado
ou numa ausência de Deus, não se trata de culpa ou azar, agora o discurso volta-se para
aspectos genéticos, doenças degenerativas.

3.1 MODELO SOCIAL DA DEFICIÊNCIA


O Modelo Social da Deficiência é oriundo da aproximação da deficiência com a
cultura de direitos humanos a partir da Union of the Physically Impaired Agains Segre-
gation (UPIAS), a partir da década de 1970. Inicialmente, o mote de referência para esta
compreensão de deficiência era o materialismo histórico, pois relacionava os modelos
de opressão à lógica capitalista que exige um tipo de corpo, a saber: produtivo e fun-
cional. Pelo viés do materialismo histórico, os corpos com algum tipo de impedimento
seriam inúteis à lógica de produtividade, considerando que a diversidade também não
cabe na lógica capitalista. Com o passar do tempo, outras teorias passaram também a
compor o arcabouço teórico para pensarmos a deficiência, como as teorias feministas
e culturalistas. Por esta lógica “não era a natureza quem oprimia, mas a cultura da nor-
malidade, que escrevia alguns corpos como indesejáveis” (DINIZ; SANTOS, 2009, p. 69).

Ao pensar e criticar a concepção de deficiência como um problema, per si, o


Modelo Social colocou luz nas problemáticas que eram, na verdade, da vida pública. Não
se tratava de culpabilizar a pessoa com deficiência por sua condição, mas da opressão
sofrida e na construção de uma cultura que não abre os olhos para os caminhos de
alteridade e opta pela exigência de uma norma que é importa “goela abaixo”.

Não obstante, ao pensarmos na deficiência saindo do lugar privado, a casa, a


família, o consultório, e pensamos a partir de holofotes sociais e culturais, isto alinhar-
se também à concepção de Acompanhamento Terapêutico, uma vez que essa profissão
também nasce desse deslocamento. Ou seja, trata-se de pensar o indivíduo em rede, de
maneira humanizada e digna de atenção e cuidado.

Assim, o modelo social articula por um outro tipo de deficiência, sendo esta
compreendida como uma experiência de desigualdade compartilhada por pessoas com
diferentes tipos de barreiras ou impedimentos. Desse modo, não se trata de pensar o
surdo, o cego, o autista ou outra categoria a partir de suas particularidades físicas ou
relacionais, mas trata-se de barreiras, impedimentos e discriminações que se constroem
pela cultura da normalidade. Falamos, então, de um modelo social que questiona os
padrões de normalidade estabelecidos. Neste sentido, os estudos da deficiência
aproximam-se dos estudos culturais para respeitar – quiçá exaltar – as diferenças em
termos de constituição pessoal e social dos diferentes. Trata-se, portanto, de colocar
uma ótica sobre as pessoas com deficiência a partir de seus próprios termos.

12
Um dos obstáculos para a escolarização é justamente as barreiras culturais,
sejam elas físicas (ausência ou precariedade nas instalações para acessibilidade, ar-
quitetônica, técnica ou comunicacional), atitudinais (como reprodução de estereóti-
pos e estigmas em relação às pessoas com deficiência) (FREITAS, 2016). Em outras
palavras, barreiras que correspondem também ao social e aos políticos implicam na
forma, na expectativa e nas possiblidades de escolarização deste grupo. Assim, de
uma maneira geral, há uma baixa expectativa em relação às pessoas com deficiência,
seja em relação à aprendizagem ou em relação à produção e inserção no mercado de
trabalho. Por esta via, consideramos que se trata de uma visão social arraigada em
preconceitos que têm uma carga histórica. Por outro lado, se pensarmos num contex-
to sem as barreiras impostas socialmente, as deficiências não seriam evidenciadas,
mas apenas pontuais diferenças.

Neste sentido, há grupos que são diagnosticados como patológicos, que


não consideram a si mesmos como doentes ou deficientes. Assim, estes grupos
consideram a si mesmos a partir de uma ótica de identidade e cultura, com uma forma
de comportamento, relacionamento e comunicação próprias (FREITAS, 2016). Estes
grupos estão argumentando em nome da alteridade, do respeito à diferença e buscam
afirmar-se coletiva, pessoal e politicamente. Deste modo, pensarmos a partir de uma
neurodiversidade, não apenas perceber os aspectos neurológicos a partir do normal e
do patológico, mas a partir das diferentes formas de existir no mundo, ou seja, trata-se
de diversidades de funcionamento.

3.2 NEURODIVERSIDADE
A neurodiversidade é uma abordagem dentro do campo dos “estudos da
deficiência” que busca a compreensão dos sujeitos a partir da diferença e da identidade.
Por esta via, a perspectiva da neurodiversidade afasta-se do discurso de médicos,
educadores e especialistas que tratam as deficiências como doenças/lesões (ORTEGA,
2009). Boa parte do material produzido sobre os estudos da deficiência são de autores
e pesquisadores “deficientes” e sua origem foi fermentada junto ao bojo de outros
movimentos a partir da década de 1970, como a reforma psiquiátrica, o feminismo e os
movimentos de raça.

CURIOSIDADES
Temple Grandin é uma mulher autista que é levada por sua mãe para a fazenda da tia,
com o intuito de integrar a jovem com o campo, animais e, consequentemente, um alívio
aos pontos negativos que o autismo trazia para ela na cidade. Assim, neste lugar, Grandin
– um tanto arredia com as pessoas a sua volta –, começa a observar o modo como os
trabalhadores lidam com a criação do gado que existe na fazenda: desde a alimentação
até o abate.

13
Em um desses momentos, Grandin cria uma espécie de objeto, baseado no tronco
de contenção – hoje usualmente utilizado com o gado –, apelidada de “Máquina
do Abraço”. Como não gosta de ser tocada por ninguém, nem mesmo pela mãe, a
personagem sente a necessidade de se sentir protegida nos momentos de angústia e
medo. Dessa forma, sempre que se sente acuada, ela recorre à “Máquina do Abraço”
a fim de se acalmar.
Atualmente, Grandin dá palestras em diversos países, contando um pouco de sua
história e de como o autismo não se tornou uma barreira invencível para que pudesse
chegar aonde chegou. Há inúmeras produções que contam a história de Grandin,
como um filme intitulado com seu nome, e o livro escrito por ela mesma. Além disso,
há também disponível um TED em que Grandin aborda sobre a necessidade de todos
os tipos de mentes, um elogio à alteridade. Você pode ver em: https://bit.ly/3jd75MH.

FIGURA – TEMPLE GRANDIN

FONTE: <https://bit.ly/3DPhvLT>. Acesso em: 30 mar. 2022.

A socióloga com síndrome de Asperger, Judy Singer, foi quem cunhou o termo
“neurodiversidade”, em um texto intitulado Por que você não pode ser normal uma vez
na sua vida? De um “problema sem nome” para a emergência de uma nova categoria de
diferença. Para a autora, o movimento da neurodiversidade surgiu a partir de um terreno
fértil para a autoconfiança das mães que passaram a questionar as visões dominantes
que a culpavam pelo transtorno autista dos filhos.

Para ela, o aparecimento do movimento tornou-se possível por vários


fenômenos, principalmente a influência do feminismo, que forneceu
às mães a autoconfiança necessária para questionar o modelo
psicanalítico dominante, que as culpava pelo transtorno autista dos
filhos; a ascensão de grupos de apoio aos pacientes e a subsequente
diminuição da autoridade dos médicos, possibilitado, sobretudo,
pelo surgimento da Internet, que facilitou tanto a organização dos
grupos como a livre transmissão de informações sem mediação dos
médicos; e, finalmente, como vimos, pelo crescimento de movimentos

14
políticos de deficientes, movimentos de autodefesa e auto advocacia,
especialmente de surdos, que estimulou a autorrepresentação da
identidade autista (ORTEGA, 2009, p. 72).

Uma inflexão que o movimento da neurodiversidade traz é a divisão em “lesão”


e “deficiência”, sendo a primeira algo relacionado às condições físicas da pessoa, e a
segunda deficiência, sendo uma construção social que impõe uma forma de perceber
a pessoa com alguma deficiência. Assim, argumenta-se no sentido de que a dicotomia
lesão-deficiência é análoga à categoria de sexo-gênero que também apresenta regras
sociais a partir de condições biológicas (ORTEGA, 2009).

Mike Oliver denomina esse modelo de “modelo da tragédia pessoal”.


Para os teóricos do modelo social, a deficiência não é uma tragédia
pessoal; é um problema social e político. Ela não existe para além da
cultura e do horizonte social que a descreve como tal e nunca pode
ser reduzida ao nível biológico e/ou patológico. Para eles, só existem
atributos ou características do indivíduo considerados problemáticos
ou desvantajosos em si por vivermos em um ambiente social que
considera esses atributos como desvantajosos. Assim, por exemplo,
andar de cadeira de rodas é um problema apenas por vivermos em
um mundo cheio de escadas, e consideramos deficientes indivíduos
que não olham nos olhos quando se comunicam, como é o caso dos
autistas, apenas por que nossa sociedade estabelece o contacto
visual como um elemento básico da interação humana (ORTEGA,
2009, p. 68).

Assim, o termo “neurodiversidade” salienta que a “conexão neurológica” atípica


(neurodivergente) não é uma doença, mas uma diferença que deve ser respeitada como
tantas outras (sexuais, raciais, geográficas, etárias etc.). Os indivíduos diagnosticados com
autismo, sobretudo com Síndrome de Asperger, são os precursores deste movimento.

DICAS
O livro A Diferença Invisível, uma história em quadrinhos escrita por Julie Dachez,
e ilustrada por Mademoseille Caroline, conta a história de uma mulher que foi
diagnosticada, aos 27 anos, com síndrome de Asperger. A narrativa foca a rotina da
protagonista, Margueritte, em sua vida privada, com seus amigos e no seu ambiente
de trabalho, mostra como ela era incompreendida e os movimentos que fez para
assumir sua alteridade sem a necessidade de patologização. Essa história é também
autobiográfica, servindo de inspiração e representatividade.

15
FIGURA – CAPA DO LIVRO (À ESQUERDA) E PÁGINA DO LIVRO (À DIREITA)

FONTE: Os autores

A partir dessas óticas, foi-se construindo outra lógica linguística para se pensar,
compreender e debater sobre estudos de deficiência, sobretudo com autores que se
afastam da lógica marxiana, como Derrida e Foucault. Com estas novas referências,
podemos repensar as questões da normalização como também um pressuposto da
deficiência. Isso vai no sentido de que uma construção social, onde se coloca um marco
para o que consideramos “normal” e o que sai dessas margens delimitadas, passa a
configurar como “anormal”. Desse modo, a deficiência é uma construção social tal como
a normalidade também é, e isso passa a regulamentar os corpos e, não obstante, recusar
a aceitação daqueles que fogem aos padrões estabelecidos (ORTEGA, 2009).

As comunidades surdas são precursoras para pensar, estudar e divulgar


conhecimento na perspectiva da neurodiversidade, isso porque o povo surdo possui
uma linguagem própria, além de uma série de artefatos, como literatura e política, que
são próprios da “cultura surda”. Em torno disso, nesse sentido, desenvolve-se também a
construção de uma identidade surda, devido ao sujeito estar correspondentemente de
acordo com a cultura constituída, há uma sensação de pertencimento a um grupo. De
todo modo, estas percepções do povo surdo foram construções sociais e políticas no
decorrer do tempo. Houve uma época em que os surdos eram proibidos de se comunicar
a partir da língua de sinais e o oralismo era compulsoriamente imposto como forma
de socialização e escolarização. Deste modo, há diversos fatos históricos e políticos e
marcam vitórias do povo surdo em relação aos seus direitos linguísticos e humanos.

16
No Brasil, a publicação da Revista Estudos Surdos (2006-2009) ganha
destaque com pesquisas e publicações que mostram perspectivas que visam à
alteridade e não um diagnóstico. Além disto, boa parte dos autores é surdo, o que
também proporciona mais representatividade da categoria, alimentando a lógica de
cultura e identidade específicos.

A tomada de consciência desse movimento (e de deficientes em um


sentido mais genérico, incluindo a cultura autista) vem produzindo
processos de coming out deficiente, análogos aos coming outs
de gays, lésbicas e negros, declarando um “orgulho surdo” que
remete ao orgulho gay, lésbico ou negro, o qual corresponde na
neurodiversidade à declaração do orgulho autista, como veremos
(ORTEGA, 2009, p. 75).

Deste modo, podemos pensar a partir de novos modos de subjetivação a partir


da autocategorização da deficiência. Ou seja, quando uma pessoa diz “sou deficiente”
numa sociedade onde esta afirmativa pode gerar uma série de estigmatizações,
consideramos este processo como um coming out, ou seja, como uma espécie de saída
dos moldes pré-estabelecidos socialmente e uma afirmação e celebração de si a partir
da diferença. Em termos mais amplos, estes movimentos são coletivos e políticos em
prol da luta contra as barreiras sociais que incapacitam ou inviabilizam os indivíduos
com algum tipo de lesão.

Um ponto fulcral e de extrema importância para o movimento da neurodiver-


sidade que busca a compreensão da deficiência a partir de categorias identitárias diz
respeito ao fato de não se procurar curas para estes quadros. Ou seja, trata-se de
um “movimento anticura” em que se argumenta que se não há uma deficiência, mas
modos diversos de funcionar, então não se deve falar em termos de curas, mas de
qualidade de vida. A ideia de cura, nesse sentido, estaria atrelada a um modelo que
busca à perfeição corporal, comportamental ou linguístico para grupos que, como já
vastamente enfatizado, funcionam de maneira diversa.

FIGURA 2 – REPRESENTAÇÃO DA PESSOA COM TEA A PARTIR DA DIFERENÇA, NÃO DO DÉFICIT

FONTE: Tramantino (1980, p. 6)

17
O movimento da neurodiversidade, especificamente em relação à cultura
autista, está relacionada também à inflexão com as concepções psicanalíticas. Ou seja,
o autismo passa a ser visto não mais a partir do viés psicanalítico, mas a partir do viés
biológico e cerebral. A contribuição da psicanálise para a compreensão do autismo estava
fortemente vinculada a uma culpabilização da família pelo estado do filho, de forma a
argumentar em termos de falhas no estabelecimento das relações do indivíduo. Uma
dessas teses diz respeito à “mãe-geladeira”, que atribui o autismo da criança à ausência
de afeto por parte da mãe. De todo modo, mesmo as perspectivas psicanalíticas têm
sido atualizadas neste sentido em prol de uma compreensão mais neurológica.

3.3 OS MOVIMENTOS PRÓ-CURA E ANTICURA


A contradição gerada a partir das inflexões de pensamento sobre a deficiência
está entre o afastamento das compreensões psicanalíticas que contribuiu para um
movimento da neurodiversidade (anticura) e a construção de um movimento de pais e
professores que requerem a cura para o austismo. Ambas as formas de perceber o au-
tismo não se guiam pela psicanálise, mas partem de processos diferentes. Enquanto o
movimento da neurodiversidade não busca cura, mas integração social e diminuição
das barreiras sociais a partir da celebração da cultura e da identidade dos diferentes,
o movimento pró-cura requer a cura e se alinha a terapias comportamentais e psico-
farmacológicas.

A autoadvocacia do autismo, totalmente alinhada às concepções de neurodi-


versidade, são desenvolvidas por pessoas autistas. Neste sentido, argumenta-se que
a busca pela cura de um indivíduo neurodiverso, a tentativa de cura seria uma forma
de apagamento da diversidade. No Brasil, atualmente, há o Movimento Orgulho Autista
Brasil, que integra uma rede de países que celebram a neurodiversidade comum, dia
comemorativo para tal. Houve, em Brasília, em 2005, o “dia do orgulho autista, que foi
realizado em Brasília.

A partir dos anos 1960 surgem as primeiras associações que reúnem pais,
médicos, cientistas e professores que buscam pesquisas biomédicas sobre o autismo
e estando focadas na educação deste grupo, como por exemplo, o grupo Cure Autism
Now. Estas organizações recebem críticas no sentido de terem uma visão limitada do
transtorno e limitarem as experiências das pessoas autistas. No Brasil, associações de
pais e professores que buscam a cura para o autismo também têm crescido, como por
exemplo, a Associação de Amigos Autistas (AMA) e a Associação de Amigos da Criança
Autista (AUMA).

Em relação às formas de tratamento, escolarização e socialização também


há controvérsias entre os modos de compreender o autismo. Neste ínterim, a terapia
cognitiva ABA (Análise Aplicada do Comportamento) ganha destaque junto ao movimento
pró-cura, uma vez que esta terapia permite que as crianças realizem uma série de
progressos em relação ao contato visual e certas tarefas cognitivas. Por outro lado, para

18
os ativistas autistas, esta modalidade de terapia determina um tipo de comportamento
adequado, não respeitando, assim, a neurodiversidade. A complexidade disto vai se
ampliando no sentido de que se há um movimento que luta contra estas terapias,
também há menos investimentos públicos para as terapias voltadas para o autismo,
o que torna também os ativistas do autismo como alvo de críticas por recusarem o
financiamento das terapias.

Situações como essas vêm elevando enormemente a temperatura do


debate: de um lado, as famílias de autistas e suas lutas por acesso aos
tratamentos e terapias comportamentais – que implicam reconhecer
o autismo como uma doença (principalmente com causas genéticas
e/ou cerebrais) – e para quem os movimentos de autistas com sua
retórica anticura e pró neurodiversidade representam um ultraje a
suas reivindicações (ORTEGA, 2009, p. 73).

Além disso, vale ressaltar que em termos de políticas públicas, o movimento


pró-cura tem mais claro quais são as propostas para o autismo, quais sejam: acesso
e financiamento de terapias comportamentais, sobretudo a ABA, busca por recursos
para pesquisa genética e neuroquímica do transtorno. No caso do movimento da
neurodiversidade, anticura, estas políticas e ações não estão bem delineadas, pois
entram em confronto com as premissas estabelecidas pelo movimento pró-cura.
De todo modo, há propostas para uma distinção entre “deficiências neurológicas”
e “neurodiversidade” para tentar amparar os dois movimentos e oferecer tratamento
àqueles que querem/precisam, sem entrar em confronto com aqueles que percebem o
autismo como uma identidade cultural.

Outro ponto a ser ressaltado diz respeito aos protagonistas do modelo da


neurodiversidade, que são, geralmente, autistas diagnosticados com síndrome de
Asperger que são considerados como tendo um “alto funcionamento”, de forma que a
educação e a socialização, para eles, passam por crivos diferentes daqueles autistas
que apresentam um “baixo funcionamento”. Por ser um espectro, o autismo possui um
guarda-chuva para abarcar diferentes níveis e modalidade do transtorno. Desta forma,
como há diferentes formas de funcionamento, nem todas elas são percebidas, pelos
próprios autistas, como um “estilo de vida” ou uma “identidade”, não possuindo capacidade
cognitiva para a fala ou expressão dos sentimentos, de forma que esta luta política
não os alcança nem os contempla. Assim, apreciariam terapias de comportamento. Isso
delineia o movimento da neurodiversidade como minoritário dentro do espectro total.
Por outro lado, os ativistas também possuem coerência ao temer políticas agressivas de
tratamento aos autismos em busca de padrões de normalidade cerebral.

De uma maneira geral, ambos os movimentos apresentam um ponto de vista que


está atrelado às necessidades e problemáticas sociais e levantam questões relevantes
também para o campo da psicopedagogia no sentido de como intervir ou programar
sessões com indivíduos neurodiversos. Por um lado, localizando o contexto e as
possibilidades do sujeito em respeito à neurodiversidade e, por outro lado, descobrindo,
em relação, quais as melhores estratégias de aprendizagem em cada caso.

19
Acadêmico, até aqui, vimos um panorama geral dos paradigmas que envolvem
a inclusão em termos históricos e críticos. Vimos diferentes pontos de vista de
compreender, lidar e educar aqueles que são considerados diferentes. Você considera
que alguma forma é superior à outra ou que há formas erradas de pensar a inclusão/
exclusão?

Vamos para o Tópico 2 para vermos alguns posicionamentos filosóficos e


políticos que envolvem o tema.

20
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Paradigmas são o grupo de regras estabelecidas por alguma teoria que pode ser
rejeitada ou posta em evidência como a “certa”.

• O Paradigma da Exclusão, embora não tivesse este nome, representa a forma pela
qual a sociedade relacionava-se com a deficiência na Antiguidade e na Idade Média.

• O Paradigma da Segregação implica institucionalizar as pessoas com deficiência.

• O paradigma da Integração busca que o indivíduo se integre sem que haja formas
estruturais de fazê-lo.

• O Paradigma de Serviço oferece assistência, sobretudo médica, e visa à correção do


indivíduo com deficiência.

• O Paradigma do Suporte corresponde de maneira mais plena à noção de inclusão, pois


ao mesmo tempo que considera os saberes médicos, pensa a inclusão de maneira
mais ampla e requer diferentes atores e políticas para que seja efetivada a inclusão.

• O Modelo Biomédico busca causas, soluções e tratamentos de maneira orgânica,


física e/ou biológica.

• O Modelo Social, em vigor, questiona o modelo biomédico e oferece uma leitura social
e cultural para compreender a opressão sofrida pelas pessoas com deficiência.

• A neurodiversidade é uma abordagem dentro do campo dos “estudos da deficiência”


que busca a compreensão dos sujeitos a partir da diferença e da identidade.

• Muitos autores e protagonistas da causa da Neurodiversidade são, pelo modelo


Biomédico, pessoas com deficiência.

21
AUTOATIVIDADE
1 Compreender a deficiência é algo complexo na sociedade contemporânea, visto que
o debate está, ainda, em franco crescimento e não há consenso sobre alguns pontos
essenciais, o que contribui para várias perspectivas de deficiência e de inclusão. Cite
os paradigmas de relação entre a pessoa com deficiência e a sociedade.

2 Entre as várias perspectivas para que compreendamos os momentos históricos e as


ideologias que sustentam as teorias sobre deficiência, o Modelo Social é uma vertente
que tem tido destaque na área. Sobre o Modelo Social, marque V para Verdadeiro e F
para Falso.

( ) O Modelo Social tem como base o modelo biomédico.


( ) Valoriza perspectiva cultural e de direitos humanos.
( ) Surgiu no Brasil na década de 1970.
( ) Trabalha com potencialidade, não apenas com o déficit.

Assinale apenas a alternativa CORRETA:


a) ( ) F, V, F, V.
b) ( ) V, F, V, F.
c) ( ) F, V, F, F.
d) ( ) F, V, V, F.

3 A Neurodiversidade é um movimento que surgiu através dos estudos de deficiência e


tem como protagonistas pessoas que seriam, pelo Modelo Biomédico, consideradas
deficientes. Quais as características e objetivos da Neurodiversidade?

4 Oposto ao movimento de Neurodiversidade, há alguns movimentos “pró-cura” no


âmbito dos estudos e dos atores na área de deficiência. Sobre o movimento pró-cura,
assinale apenas a opção correta:

a) ( ) Movimento pró-cura, especificamente em relação ao autismo, é visto como as


perspectivas mais vanguardistas e voltada para a diversidade.
b) ( ) Propõe acesso e financiamento de terapias comportamentais, sobretudo a ABA,
busca por recursos para pesquisa genética e neuroquímica do transtorno.
c) ( ) A Associação de Amigos da Criança Autista (AUMA) é crítica ao modelo pró-cura.
d) ( ) Não há construção de diretivas para políticas públicas, sendo muito abstrato.

22
5 O movimento da neurodiversidade, uma forma de compreensão de diag­nósticos
neurológicos, surgido a partir da década de 1970, carrega, como pressuposto:

a) ( ) A concepção da alteridade como forma de se relacionar com o outro.


b) ( ) A defesa pelo direito à cura do transtorno autista, considerando a diversidade.
c) ( ) Tem, como base, os movimentos psicanalíticos surgidos a partir de maio de 1968.
d) ( ) A Associação Amigos dos Autistas é uma grande defensora do movimento.

23
24
UNIDADE 1 TÓPICO 2 -

AÇÕES E POLÍTICAS PARA A INCLUSÃO


SOCIAL E ESCOLAR

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, vimos no tópico anterior, a relação social, política e econômica
que a sociedade estabelece com as pessoas com deficiência ou, de uma maneira
geral, com as pessoas que apresentam algum tipo de diferença ou distante da norma
estabelecida. Este cenário nos dá alicerce para continuarmos o debate sobre inclusão
e pensarmos de que forma o paradigma atual sobre inclusão funciona e se configura.
Quais são os pontos de discussão? Como se pensa a inclusão? Qual a perspectiva
crítica da inclusão? E quais políticas têm sido implementadas para dar conta desta
construção de a/normalidade e ex/inclusão?

Neste tópico, veremos alguns destes aspectos a partir de uma perspectiva


provocadora e crítica. Ao passo que reconhecemos a importância, a legitimidade e a
urgência da inclusão em termos sociais, educacionais e de cidadania, também precisamos
compreender as fraturas e as artimanhas desta modalidade de relacionamento entre
sociedade e alteridade.

Neste sentido, partimos do pressuposto de que a inclusão existe porque


existe a exclusão e, de forma paralela, a ideia de anormalidade e deficiência sustenta
o outro lado, ou seja, a ideia de normalidade e de eficiência. Estes termos dicotômicos
funcionam sempre como “opostos complementares”, interdependentes. Pensaremos
como a inclusão funciona, no limite, para alimentar a ideia de exclusão e acenar para
um tipo de normalidade.

Por fim, abordaremos alguns documentos oficiais que direcionam práticas


e sustentam teórica e politicamente as ações voltadas para a inclusão. Lembrando
sempre que o Brasil, a saber, é um país continental de forma que os documentos e as
leis estabelecidas muitas vezes não cobrem, de forma integral, a mudança de posturas
e práticas voltadas para aqueles que precisam de inclusão. Isto porque a mudança em
termos de leis e programas de governo é apenas uma das formas de mudança, sendo
que a moralidade e o senso comum, bem como a falta de recursos necessários, ainda
são realidades em muitos locais brasileiros.

25
2 GOVERNOS DA INCLUSÃO/EXCLUSÃO
A inclusão pode ser compreendida como “um conjunto de práticas que
subjetivam os indivíduos a olharem para si e para o outro, fundadas em uma divisão
platônica das relações; também pode ser entendida como uma condição de vida em
luta pelo direito de se autorrepresenta...” (VEIGA-NETO, 2001, p. 34). Contudo, até o
momento de ser considerada como este conjunto de prática que abarca subjetividades
e individualidades, o processo de inclusão e exclusão passou por outros processos até
se delinear como um dispositivo biopolítico e neoliberal.

INTERESSANTE
FOUCAULT E BIOPOLÍTICA: “A biopolítica se constitui em um conjunto de tecnologias de
biopoder que, desde o século XVIII, se configura numa forma de exercer um poder sobre a
vida da população, particularmente, se responsabilizando pela sua saúde, pelos cuidados
com a procriação e o sexo entre os seus integrantes, com vistas a formar políticas capazes
de governar, de regulamentar e normalizar os seus modos de existência, tomando-a como
objeto de várias ciências para tal e formando um corpo social, relativamente, homogêneo.
Antes de estar sujeito ao império do poder soberano a quem caberia o direito sobre a sua
morte e ao poder disciplinar ou, de uma, “anátomo-política do corpo” (FOUCAULT, 1997),
a biopolítica se ocuparia de administrar a vida da população, evitando que morra, para
fazê-la viver, se ramificando pelas diversas artes de governo e atuando sobre o corpo de
cada indivíduo para que este último a governe por e para si mesmo, segundo os saberes
científicos e as tecnologias do biopoder vigentes. Tais saberes e tecnologias, por sua
vez, trazem a promessa de prolongarem a sua existência, ainda que para torná-la mais
produtiva e ao mesmo tempo menos prenhe de vida, enquanto que a sua liberdade se
reduz a esse jogo de perder a vivacidade para servir a algo que lhe assegure a sobrevivência,
com as possibilidades de viver somente dentro de uma racionalidade econômica, algo
que fundamentará o liberalismo. No neoliberalismo, de acordo com Foucault (2008),
a biopolítica se torna um modo de existência, marcado pelo empresariamento de si e
pela formação do capital humano, encontrando aí e nessa espécie de individuação um
processo de coesão e de constituição do corpo social. Ao problematizar tanto aquela
quanto essa forma de liberdade, segundo Judith Revel (2005, p. 27), nas suas obras tardias
e em seus cursos no final da vida, Foucault propõe uma rearticulação da política com a
ética ou, melhor seria dizer, a bipolítica “representaria a passagem do político ao ético”
em sua obra. Isso ocorreria na medida em que coloca a vida não apenas como lócus
de controle pelas tecnologias cada vez mais sofisticadas de biopoder e da política, como
também de um contrapoder ou de algo que extrapola qualquer dominação plena e resiste
ao poder que pretende subjugá-la, criando outras formas de subjetivação”. Este trecho
foi retirado do artigo “Da exclusão a um modelo identitário de inclusão: a deficiência como
paradigma biopolítico”, de autoria de Pedro Ângelo Pagni. Acesse o link e leia o artigo na
íntegra: https://bit.ly/3JmX3TM.

26
FIGURA – MICHEL FOUCAULT

FONTE: <https://bit.ly/3DO06Di>. Acesso em: 30 mar. 2022.

Se em outras estruturas políticas o Estado funcionava como protetor de


interesses individuais dos seus súditos, uma proteção externa, no liberalismo, por outro
lado, os interesses individuais e as noções de segurança são diferentes (FOUCAULT,
2008). No liberalismo, há sempre uma arbitragem entre a noção de liberdade e segurança
em relação à noção de perigo. Nesse sentido, é ao mesmo tempo produtor de liberdade
e de perigo. Produz tanto um quanto outro. A liberdade, então, não é uma coisa pronta
onde “se chega”, muito menos que está posta naturalmente, mas o liberalismo se propõe
a produzi-la a cada instante.

O cálculo do custo dessa fabricação está em volta da noção de segurança, onde


os interesses individuais e coletivos são barganhados, numa lógica de que um não deve
representar perigo à liberdade do outro. Ou seja, lançar duas vias de interesses e realizar
tentativas de conciliação em que, por exemplo, não haja abuso de poder dos interesses
coletivos em relação aos interesses individuais e nem que os interesses individuais
representem perigo para economia e produção. “Liberdade e segurança, é isso que vai
animar internamente, de certo modo, os problemas do que chamarei de economia de
poder própria do liberalismo” (FOUCAULT, 2008, p. 89).

Numa lógica neoliberal, há uma espécie de condução de subjetividades, em que


algumas normas são instituídas para que o sujeito se posicione dentro de uma rede e de
alguns saberes que determinam quem ele é. Trata-se de um constante “voltar-se para
si mesmo”, com toda a permissão para o uso de um pleonasmo, neste caso. O fato é que
numa lógica neoliberal todos estamos sempre sendo levados a determinadas práticas
que nos coloca no jogo social e político vigente.

27
Uma das práticas que, implícitas ou explícitas, sempre é posta em cena é a
necessidade de que os indivíduos sentem em estarem sempre em atividade, de forma
que ninguém pode, efetivamente, ficar de fora, parar, elaborar um ócio. Pelo contrário,
todos (todos!) precisam estar nas malhas sociais, seja através do Estado, seja através
do mercado. Imbricada a esta noção, está o fato de que numa lógica neoliberal todos
precisam estar incluídos na lógica do Estado ou mercado ou política ou comunidade,
ainda que nem todos tenham as mesmas condições de acesso ou de permanência.
“Para tanto, as condições principais de participação são três: primeiro, ser educado em
direção a entrar no jogo; segundo, permanecer no jogo (permanecer incluído); terceiro,
desejar permanecer no jogo” (LOPES, 2009, p. 155).

Deste modo, podemos pensar que educação e inclusão são intimamente


próximas, considerando que a escola é o modo social de inclusão, de apresentação do
mundo para todos os atores, para todos que chegam e nascem em sociedade (LOPES,
2009). Isto dá-se, pois, é na escola onde os valores sociais são repassados, a convivência
em grupo e a compreensão da diferença. Muito além de conhecimentos formais, está
o desenvolvimento de uma habilidade social de viver em sociedade. Não obstante, o
querer permanecer no jogo implica também numa continuidade ad infinitum desta
busca por educação, ultrapassando o período exigido como obrigatório nas escolas
básicas. Isto faz parte da lógica neoliberal tanto do sentido de manter-se em atividade
como a necessidade de estar incluso.

Essa lógica implica um movimento que soa muito natural, pois é construído
e incutido de maneira simultaneamente sutil e coercitiva, da escola para o mercado
de trabalho. A escola é a instituição obrigatória socialmente para as crianças, pois é
quem vai garantir esta compreensão do funcionamento da sociedade e contribuirá para
a produção de corpos e de subjetividades que levará ao mercado de trabalho – ou ficará
frustrado pela falta de acesso a estes nichos.

Permanecer no jogo (permanecer incluído) – essa é a segunda


condição de participação. A inclusão, via políticas de inclusão
escolares, sociais, assistenciais e de trabalho, funciona como um
dispositivo biopolítico a serviço da segurança das populações. Ao
estarem incluídas nos grupos, nos registros oficiais, no mercado
de trabalho, nas cotas de bolsa-assistência, na escola, etc., as
pessoas tornam-se alvos fáceis das ações do Estado. Trata-se de
ações que visam a conduzir as condutas humanas dentro de um
jogo com regras definidas, no interior dos distintos e dos muitos
grupos sociais. Tais regras não engessam as relações e nem mesmo
as participações variadas da população e dos indivíduos em cada
ação em que se mobiliza ou é mobilizada. Desejar permanecer no
jogo. Essa é a terceira condição de participação. É o desejo que faz
com que ninguém fique de fora; é ele que mobiliza os jogadores
a quererem que seus pares continuem jogando. Não se trata de
preocupação, de qualificação e de cuidado com o outro; trata-
se, sim, da necessidade da permanência do outro. Para que a
permanência do outro se mantenha, até mesmo para sustentar as
redes de trabalho, a capacidade de consumir deve estar instalada.

28
Para isso, as ações do Estado, quando esse opera em consonância
com uma lógica de mercado, devem ser desencadeadas para que
mesmo aqueles que não possuem formas de gerar seu próprio
sustento consigam recursos para girar, mínima e localmente, uma
rede de consumo (LOPES, 2009, p. 156).

Neste sentido, a partir de uma leitura foucaultiana, compreende-se que o


ponto em comum entre o econômico e o social parte-se da premissa de não exclusão.
Dito de outra forma, ninguém deve ser excluído nem do âmbito social nem do âmbito
econômico. Se observarmos ao nosso redor, a palavra “exclusão” está presente em
diferentes âmbitos, como nas políticas públicas, nas campanhas de saúde e sobretudo
nas políticas educacionais (LOPES, 2009). Quando pensamos em “não excluir”, quase
automaticamente pensamos em pessoas com deficiência, nos tidos como loucos, os
analfabetos, as crianças de rua, os pobres e demais minorias (LOPES, 2009), ou seja,
aqueles que de alguma maneira não passaram pelo crivo social que é a escola.

Em alguma medida, portanto, este movimento também representa uma crise do


que seria “incluir a todos”. Neste sentido, podemos pensar o termo “exclusão” de uma
maneira mais radical, ou seja, no sentido de que excluídos são aqueles que escapam do
sistema e dos serviços prestados pelo Estado, embora ainda estejam dentro da lógica
de governamentalidade (LOPES, 2009).

Por estas vias, podemos pensar como políticas públicas se delineiam quando
se trata de “os anormais” e os espaços públicos, ou seja, de que forma os sujeitos
que fogem às normas socializarão ou não em sociedade. Estes “anormais” são “[...]
divididos cada vez mais em numerosas categorias que a Modernidade tem incansável
e incessantemente inventado: os sindrômicos, deficientes, psicopatas, os surdos, os
cegos, os aleijados, os rebeldes, os pouco inteligentes, os estranhos, os ‘outros’” (VEIGA-
NETO, 2001, p. 23).

A inclusão, em alguma medida, é fruto noção de norma. A partir do momen-


to que alguma diferença é percebida, há um estranhamento, um não reconhecimento
daquele “outro” como um semelhante. Trata-se, efetivamente, da dicotomia mesmo vs
outro. Dito de outro modo, é como se o que se considera normal e o que se conside-
ra anormal trata-se de uma relação de interdependência de forma que um só existe
porque o outro também existe, e um precisa do outro para sua noção de segurança e
sobrevivência (VEIGA-NETO, 2001).

Não obstante, a busca por compreensão em termos de inclusão deve passar,


justamente, pela quebra dessa noção dicotômica, deve ir além de compreensões biná-
rias. Como exemplo, “ser surdo” não deve indicar, automaticamente, um “ser ouvinte”,
nem mesmo ter o “ser ouvinte” como antagonismo de “ser surdo”, pois trata-se, na ver-
dade, de coisas, de modos, de corpos diferentes, não sendo opostos, per si, mas essa
oposição sendo construída social e historicamente através de práticas, de costumes, de
políticas, de educação.

29
Para Foucault, esse polimórfico grupo ao qual hoje denominamos os
anormais formou-se "a partir de três elementos, cuja constituição
não foi exatamente sincrônica" (Foucault, 1997, p. 61): os monstros
humanos, o indivíduo a corrigir e o onanista. É claro que todos esses
três "tipos" já existiam desde tempos muito remotos; a novidade que
se afirma, desde início do século XIX, é tanto o agrupamento deles
numa categoria mais ampla quanto vê-los muito menos como um
objeto de curiosidade e muito mais como um problema (VEIGA-NETO,
2001, p. 29, grifos do autor).

Assim, embora as categorias dos “diferentes” sempre existissem, a forma pela


qual a sociedade passou a lidar com elas mudou radical e estruturalmente. Um dos
fatores para essa mudança decorre, a partir do século XVIII, devido ao surgimento de
“população” que é “essa novidade enquanto problema ao mesmo tempo científico (da
ordem da vida) e político (da ordem do poder) passa a ser entendida como um novo
tipo de corpo, um corpo com múltiplas cabeças sobre o qual são necessários novos
saberes” (VEIGA-NETO, 2001, p. 33). Temos, nos dias de hoje, uma série de medidas
sociais e políticas que medem suas populações através de estatísticas, bem-estar
social, moradia, saúde pública, renda, entre outras categorias.

DICAS
Jefrey Cohen, em seu texto A Cultura dos Monstros: sete teses, elabora uma ideia
de que o corpo do monstro é um corpo cultural. Isto significa que toda a ideia de
monstruosidade é construída num arsenal cultural do que seria o ideal antagônico ao
monstro. Isto serve para pensarmos os personagens do cinema ou de lendas míticas,
mas também serve para refletirmos sobre quem são as figuras, em nossa sociedade,
que são personificadas como monstruosas. Nas palavras do autor, “Qualquer tipo de
alteridade pode ser inscrito através “construído através” do corpo monstruoso, mas, em
sua maior parte, a diferente monstruosa tende a ser cultural, política, racial, econômica
e social” (COHEN, 2000, p. 32). Em outros termos, o corpo do deficiente só é visto como
monstruoso na medida em que os padrões de normalidade são rígidos a um ponto
isotrópico, que não tolera qualquer tipo de diferença, mas é o que se busca até o
limite. Por outro lado, o corpo diferente é o que escapa à norma, por isso é desenhado,
muitas vezes, como um perigo, pois não foge dos critérios estabelecidos a priori. Para
ater-se mais a estas teses, leio o texto do autor, na íntegra, que está presente no livro
Pedagogia dos Monstros: os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras.

30
FIGURA – CAPA DO LIVRO PEDAGOGIA DOS MONSTROS: OS PRAZERES E OS PERIGOS DA
CONFUSÃO DE FRONTEIRAS

FONTE: <https://amzn.to/3uk5YkT>. Acesso em: 30 mar. 2022.

Assim, através desta organização social que também implica uma organização
e um ajustamento dos corpos dos indivíduos, é possível identificar médias e margens,
anomalias e correções. É a partir desta estrutura – que parte de muitos saberes, mas
que dialogam e se retroalimentam – que se inclui ou exclui-se categorias, estilos de
vida, determinados corpos e determinados tipos de desejo.

Dentro deste novo conjunto de modalidades que passam por crivos disciplinares,
judiciais e judiciários, os loucos – ou uma ideia de loucura que se foi delineando
lentamente – passaram a ocupar um lugar especial nos conhecimentos psi (Psiquiatria
e Psicologia). Deste modo, questões como indisciplina, rebeldia, indocilidade que
antes não tinham um estatuto moral marginal ou pejorativo, agora são cada vez mais
enquadradas no bojo das loucuras inscritas em manuais e estatísticas da psiquiatria. Na
categoria de “loucos” entra diversos tipos de indivíduos, deficientes, diferentes.

Com o desenvolvimento das sociedades e a transformação do conceito e a


compreensão da loucura, a medicina ganhou cada vez mais espaço com seus métodos e
técnicas clínicas. Deste modo, a psiquiatria teve cada vez mais acentuada relevância para
o entendimento moderno do que seria loucura (SCHNEIDER, 2009). Agora enquadra-se
o conceito no bojo de uma doença mental. Ou seja, o que antes era reconhecido como
bruxaria ou perda da razão, agora tem um nome, que é regido por uma área do saber (a

31
medicina) e está relacionado com adoecimento do próprio corpo. Assim, uma série de
nomenclaturas e descrições são elencadas a fim de medir e mesurar a mente humana.
Ainda neste pensamento, consagra-se a ideia de cura, pois assim como a medicina sara
as doenças do corpo, também cura os males da mente (SCHNEIDER, 2009).

Em O Nascimento da Clínica, Michel Foucault aborda como a medicina tem sua


base na análise e observação clínica dos casos, desenvolvendo a descrição de sinais e
sintomas para que se possa fechar um diagnóstico. Isso coloca os pensamentos e os
quadros clínicos de maneira classificatória, em seu início. Com o decorrer do tempo,
no entanto, a medicina desenvolve uma perspectiva experimental e científica, o que
consolidará a clínica moderna, pautada, sobretudo, na anatomia e na patologia do
século XIX, sob forte influência dos pensamentos iluministas que saúdam a razão e o
controle total do corpo como sinal de civilização.

É essa dupla realidade da norma - de um lado: norma como regra


de conduta, como oposição à irregularidade e à desordem; de
outro lado: norma como regularidade funcional, como oposição ao
patológico e à doença - que faz dela um operador tão útil para o
biopoder. Ela coloca-se, ao mesmo tempo, sobre um corpo individual
e sobre um corpo coletivo do qual esse corpo individual faz parte e
ao qual contribui para dar sentido. [...] Além disso, a norma, ao mesmo
tempo que permite tirar, da exterioridade selvagem, os perigosos, os
desconhecidos, os bizarros capturando-os e tornando os inteligíveis,
familiares, acessíveis, controláveis, ela permite enquadrá-Ios a uma
distância segura a ponto que eles não se incorporem ao mesmo.
Isso significa dizer que, ao fazer de um desconhecido um conhecido
anormal, a norma faz desse anormal mais um caso seu. Dessa forma,
também o anormal está na norma, está sob a norma, ao seu abrigo.
O anormal é mais um caso, sempre previsto pela norma. Ainda que
o anormal se oponha ao normal, ambos estão na norma. É também
isso que faz dela um operador tão central para o governo dos outros;
ninguém escapa dela (VEIGA-NETO, 2001, p. 33).

Ninguém escapa à norma. Isso também se aplica ao pensarmos a inclusão social


e escolar, em que se discute, entre outras coisas, sobre reunir “normais” e “anormais”
num mesmo espaço, numa mesma sala e quais estratégias são possíveis a partir da
junção de polos que, em teoria, funcionam socialmente como opostos. Além disto,
um ponto curioso sobre a norma é que ela é, basicamente, uma e sempre a mesma,
enquanto o anormal é diverso, é múltiplo, representa inúmeros subtipos. Deste modo,
pensar em termos de inclusão também implica em deslocar o que pensamos como
norma (VEIGA-NETO, 2001).

Não obstante, essa inclusão não é dada, a priori. Essa inclusão não é algo
natural em termos de natureza ou em termos de sociedade. Assim como direitos
humanos, democracia e cidadania, a inclusão também se trata de uma construção, com
historicidade em diálogo com aspectos políticos e econômicos. Partindo da compreensão
de um mundo isotrópico, com um equilíbrio perfeito e pleno, qualquer sinal de diferença
dentro duma lógica rigidamente estabelecida, pode ser vista como disfunção, pois

32
quebra a noção de equilíbrio (VEIGA-NETO, 2011). É nesse cenário delineado com base
numa falsa ideia de equilíbrio – ou de normalidade – que a inclusão aparece, para incluir,
para colocar no desenho isotrópico, aqueles que fogem aos equilíbrios anunciados.

Assim, num mundo “perfeitamente equilibrado”, “isotrópico”, não há espaço para


a diferença. Um mundo onde todos ocupam igualmente o mesmo espaço pode ser pe-
rigoso, pois coloca como “o outro”, como “a anomalia” todos aqueles que fogem à norma
estabelecida. Estes “outros” que não couberam na norma são os excluídos e torna-se
imperativo incluir a todos. Neste leque, por um lado, cada vez mais diversos de dife-
renças e, por outro lado, cada vez mais rígido quanto à ideia de normalidade, a palavra
“inclusão” corre o risco de esvaziar-se, considerando que é cada vez mais múltiplos
aqueles que são excluídos, podendo ser por questões sociais, etárias, por questões de
gênero, de raça, de origem, de renda, de credo, de aprendizagem, entre outros.

O perigo deste largo leque de excluídos é que as estratégias de inclusão passam


a ser as mesmas, independentemente de qual categoria o indivíduo se encontre. Como
coloca Veiga-Neto (2011, p. 129), “é bastante comum que a escola adote o mesmo
processo de inclusão quer se trate de uma criança autista, quer se trate de um jovem
surdo, quer se trate de um adulto cedo, etc.”.

2.1 DEFICIÊNCIA E BIOPOLÍTICA


O Estado Social, ou seja, o papel social do Estado, oferece ao indivíduo uma
possibilidade de proteção contrarrupturas de laços social, exclusão, desfiliação.
Em outras palavras, o Estado Social é a forma pela qual se regula e se organiza as
disfunções sociais. A partir de então, o diagnóstico médico serve, a um só tempo, para a
área médica, para a área jurídica e para a área moral, instaurando, assim, um estatuto de
pessoa pela qual as políticas e o Estado, como Estado Social, que protege os indivíduos,
passa a se guiar (CASTEL, 1984). Por estas vias, o saber médico-psicológico passa a
ser a política diferencial das populações, mais do que representa uma perspectiva de
cuidado, representa uma perspectiva de gestão, de governamento, de alinhamento de
expectativas e políticas.

De acordo com Castel (1984), a definição de deficiência passou por um crivo ju-
rídico, sendo enquadrada em termos de leis e procedimentos que o Estado, ou a estru-
tura social, precisaria lidar. Neste sentido, em 1967, uma concepção de deficiência seria:

Aqueles que sofrem, em seguida a seu estado físico, mental ou de


caráter, ou de sua situação social, perturbações que constituem
para eles “dificuldades”, quer dizer, fraquezas, servidões particulares
em relação à normalidade, esta estando definida como a média das
capacidades e das oportunidades da maioria dos indivíduos que
vivem na mesma sociedade (CASTEL, 1984, p. 102).

33
Por esta definição, vemos o estatuto de deficiência ganhar o delineamento da
inaptidão, do deslocado, daquele que foge à média padrão. Neste sentido, a deficiência,
física ou mental, visível ou sugestionável, passa pelo crivo da eficiência. Se a figura do
louco, em outros momentos, pode ser considerada como genial, na figura do deficiente
sempre há algo que falta, nunca há eficiência plena do corpo e das atividades (CASTEL,
1984). Isto, é claro, se referindo à definição de deficiência por onde as leis passaram a ser
desenvolvidas. Assim, a linha de pensamento mais forte sobre a deficiência foi pensada a
partir da medicina e da psiquiatria social que se preocupavam com aspecto de trabalho,
de reinserção social, de adaptação profissional, classificação social e recuperação de
mão de obra.

Dando um diagnóstico de deficiência, o técnico objetiva diferenças


em relação a uma combinatória de performances, requisitadas
no nível da escolaridade ou do trabalho, que são atualmente os
dois principais setores de localização de anomalias. A partir dessa
discriminação, no sentido literal da palavra, o indivíduo submetido à
expertise se põe a transitar num circuito especial. Assim, na rede de
deficiência. Se não se sabe muito a que corresponde, clinicamente
falando, a deficiência, e se estamos ainda mais embaraçados
para tratar os deficientes, por outro lado, essa etiqueta coloca
a pessoa em um percurso social bem balizado. Não é absurdo
admitir outros perfis diferenciais, aos quais corresponderiam séries
homogêneas de abonos sociais programáveis antecipadamente. Os
"superdotados", por exemplo, apresentam em positivo exatamente
as mesmas características objetivas que os deficientes. Também
esboça-se para eles igualmente um círculo social especial, que
consistiria em maximizar suas oportunidades de se tomarem as
futuras elites. Mas, mais geralmente, toda diferença, a partir do
momento em que é objetivada, pode dar lugar à constituição de um
perfil (CASTEL, 1984, p. 125).

Em outras palavras, pensava-se a deficiência a partir dos termos de eficiência


para o mercado de trabalho. Quem são essas pessoas que ficariam sem ocupar os
espaços laborais da sociedade? Quais crianças não cumpririam sua parte de ir à escola
e quando adulto também não iria ao trabalho? Isso não seria um modo de desajuste
num mundo hipoteticamente isotrópico? Isto, pois, a ideia de inclusão, em um grande
sentido, reforça a ideia de ineficiência e inaptidão para a sociedade.

Continuamos, portanto, pensando na via da inclusão e da diferença sob uma


ótica neoliberal onde todos precisam estar incluídos no mercado de trabalho, pois isso
demonstra eficiência e é a partir do campo laboral que se delineia quem “escapa”, quem
é “excluído” das malhas sociais. As políticas de inclusão, no limite, alimentam também a
perspectiva neoliberal de eficiência e de normalidade.

Nas palavras de Castel (1984, p. 106), “se esta tradição visa incluir mais do
que excluir, ela o fez banalizando a deficiência como sob a forma de um déficit que
se pode compensar. A atenuação da deficiência se obtém através dos processos de
aprendizagem que diferem profundamente da terapia”. Por outro lado, porém, essas

34
medidas podem indicar um movimento diferente àquele que coloca unicamente no
organismo e busca, sempre, a etiologia do problema e passa a ser mais concentrado
na performance, na mudança de comportamento através da aprendizagem, através
de exercícios de desenvolvimento. Isso, como temos visto, pode indicar um tipo de
problema ou de marginalização, mas também se afasta de uma medida essencialmente
biológica e higienista deste quadro.

A escola, como um lugar que identifica aqueles que fogem à norma, identifica os
anormais, se justifica sob o contexto de que se cobra responsabilidade do governo ou
de outra instituição na ação de corrigir este indivíduo, socializar ao ponto que ele está
apto para a vida social (PAGNI, 2017). Busca-se, assim, o aspecto funcional e utilitário
em incluir os deficientes no mercado de trabalho. Isto dialoga com o que foi exposto no
Tópico 1 sobre a relação da sociedade com os desajustados estar também relacionado
com a lógica de produção, de trabalho e de economia do momento e do local.

Assim, esta investigação, esta linha de corte que é colocada entre o normal e
o anormal também se torna um estudo de mapeamento dos riscos da população, ou
seja, identificar quais indivíduos precisariam estar sujeitos às políticas que promovem a
superação de déficits e, assim, se estabelece uma hipotética igualdade, volta-se ao ideal
do isotropismo (PAGNI, 2017). Nestes estudos, nestas cartografias sobre os desajustados
desenvolvem-se políticas estatais, investimentos privados e regulações de mercado em
busca de finalidades e tecnologias voltadas especificamente a este público desajustado,
que indica uma suposta falha num mundo em que a racionalidade opera em nome de
um tipo de perfeição e faz parte do jogo buscar um tipo de igualdade a todos.

Uma outra problemática que surge a partir desta concepção social que preza
sempre por um ideal de perfeição, a famigerada isotropia, está relacionada com
“aumentar até o limite” a margem do que seria a normalidade. Nas sociedades ocidentais
atuais, a normalidade volta-se para o corpo idealmente padrão, para o corpo malhado,
lipoaspirado, fitness, sem marcas, sem estrias, sem idade (PAGNI, 2017). Ou seja, este
padrão de normalidade é cada vez mais distante da realidade palpável das populações,
de forma que a ideia de deficiência acaba por atingir cada vez mais pessoas que estão
corporalmente distantes do ideal, como pessoas obesas, idosas, pessoas queer, não
binárias, pessoas negras, pessoas baixas demais, pessoas altas demais, pessoas que
pertencem a algum tipo de subcultura, entre outros.

Como efeito colateral desta violência em forma de padrão e de norma


desenvolve-se uma série de doenças em decorrência da busca por esse corpo e essa
moral estabelecida, são doenças como a bulimia e a anorexia, por exemplo, que são
resultados da percepção de fracasso por não atingir o limite da régua social sobre como
deve ser um corpo “normal” (PAGNI, 2017). Assim, com a linha da norma cada vez mais
rígida e rigorosa, o preconceito e a marginalização contra todos que não cumpriram a
ascética socialmente estabelecida também cresce.

35
3 INCLUSÃO ESCOLAR
A Educação Inclusiva, hoje, é um dos pontos marcantes das políticas voltadas
para as pessoas com deficiência. A Educação Inclusiva propõe que todas as pessoas
participam do processo de escolarização formal do ensino em todos os níveis sociais.
Para tal, além da busca pela garantia de acesso, também se busca a permanência desta
população, oferecendo-lhe meios para que a educação seja efetivada.

Para que a inclusão escolar seja posta em prática, uma série de documentos
e legislações são utilizadas, como a elaboração de políticas públicas, a organização
da escola, o envio de recursos financeiros e materiais pedagógicos, a preparação de
pessoal, professores e gestores, a preparação do espaço físico caso sejam necessárias
a liberação de barreiras (DELMLING; MOSCARDINI, 2012).

Desta forma, quando pensamos em inclusão, vamos além da noção de políticas


e organização da educação especial, mas pensamos também num contexto mais amplo,
onde todos, sem exceção, devem participar das salas de aula do ensino regular. Isso vai
além da ideia de integração, não basta inserir no espaço e no contexto, é preciso um
arsenal maior e mais diverso onde todos sejam atendidos em suas necessidades.

Portanto, pensamos a partir dos paradigmas, pois é isto que uma educação
verdadeiramente inclusiva requer, pois atinge, afeta e modifica todos os envolvidos, pois
mexe na raiz, na estrutura e nos atores envolvidos; por isso, há supressão da subdivisão
entre o que seria ensino especial e o que seria ensino regular. Na prática, todos devem
fazer parte do ensino regular, isto porque a inclusão é antagônica da segregação, da
separação por hierarquias, porque é uma quebra de paradigma em relação a outros
modelos que integram sem incluir ou mesmo que excluem efetivamente.

Neste sentido, a escola brasileira tem sido marcada e recheada de fracasso


escolar e pela evasão de alunos que se veem marginalizados e sem êxito em suas
atividades, privados de acesso a bens culturais e materiais, gerando, também, uma
baixa autoestima. Mas a que corresponde ao que chamamos de fracasso escolar? Quem
fracassa e a partir de quais termos há fracasso?

Em pesquisa realizada com profissionais da educação e da saúde, Moysés e


Collares (1994) investigaram sobre as causas do fracasso escolar e constataram que
todos os entrevistados, independentemente da área de atuação, relacionavam o fracasso
escolar às crianças e às famílias que historicamente o fracasso escolar foi construído
em cima de normas e réguas estabelecidas que deixam à margem os indivíduos que
não têm acesso a bens e materiais.

Ainda na mesma investigação, as autoras constataram que todos os entrevistados


consideravam que o fracasso e a dificuldade de aprender estavam localizados em
fatores biológicos. O fato de as crianças terem esses “problemas biológicos” é a causa

36
das dificuldades no sistema educacional brasileiro, como desnutrição e disfunção
neurológica. Alguns trechos da fala dos profissionais entrevistados na pesquisa de
Moysés e Collares (1994, p. 64):

“Hiperativa é criança com problema neurológico. Não para, nada a


satisfaz, distraídas, dispersas, incomodam ...” “Dislexia é uma doença
neurológica, que se caracteriza pela grande dificuldade em aprender a
1er e escrever.” “As crianças não conhecem, não discriminam, não têm
sequência de ideias, não têm coordenação motora.” “A hiperatividade
é uma doença neurológica que dificulta a aprendizagem.”

Neste sentido, a vulgarização e a naturalização da situação das crianças é


biologizada de forma que os profissionais apresentam um pensamento cristalizado
baseado em premissas recheadas de preconceito. Por esta via, Moysés e Collares (1994)
discutem a legitimidade dos instrumentos padronizados para avaliar os conhecimentos
e as habilidades das crianças. Isto porque os testes padronizados apresentam uma
crença na possibilidade de avaliar o potencial intelectual da pessoa baseada no que ela
já deve fazer, já deve ter aprendido.

Este método desconsidera que uma atividade é ensinada e transmitida por um


grupo social e isto representa uma série de valores históricos e políticos de determinado
grupo, o que é essencialmente um valor de classe. Por esta via, “ao assumir que as
expressões das classes sociais privilegiadas são as superiores, as corretas, o que se
está assumindo é uma determinada concepção de sociedade e de homem, fundada
na desigualdade e no poder, em que alguns homens são superiores a outros, algumas
raças são superiores a outras” (MOYSÉS; COLLARES, 2013, p. 65).

Uma lógica não medicalizante e não patologizante da aprendizagem consideraria


como fundamental aprender a olhar, olhar a criança, perceber o que ela tem, o que ela
gosta e o que ela pode. Assim, sem um instrumento já previamente definido, sem uma
linha de chegada determinada a priori, é possível perceber, com muito mais amplitude,
as expressões que a criança já adquiriu. Esta perspectiva inverte o jogo de diagnóstico,
pois não é o aprendente quem tem que responder ao que profissional quer, mas é o
profissional que deve se ater às expressões, aos gostos e aos valores das crianças.

Ao invés de buscar o defeito, a carência da criança, o olhar procura


o que ela já sabe, o que tem, o que pode aprender a partir daí. O
profissional tenta, mais que tudo, encontrar o prisma pelo qual a
criança olha o mundo, para ajustar seu próprio olhar. Sabendo que
existem limites para seu olhar, que está sujeito a erros, pois não
está lidando com verdades absolutas. Esta proposta de avaliação
tem um requisito essencial: profissionais mais competentes, com
conhecimentos mais sólidos e profundos sobre o desenvolvimento
da criança, sobre o conceito de normalidade, profissionais que não se
satisfaçam com visões parciais, estanques, que não tenham medo
de suas próprias angústias (MOYSÉS; COLLARES, 1994, p. 68).

37
A via de ensinar e aprender sem que haja de antemão um ponto de chegada,
um pódio limite. Ou, ao contrário, um modo de aprender que não precise ser demarcado
por linhas específicas que prendem as possibilidades da criança em criar e imaginar
outras coisas, experienciar outros modos de maturar informações. Quando olhamos a
partir da alteridade, não da falta, não da ausência, não da doença, então vemos mais
necessidade e mais potência num encontro do que, muitas vezes, na necessidade de
intervenção medicamentosa para casos de problemas comportamentais.

Sendo feitas estas considerações, voltamos ao aspecto da inclusão. Será que ela
tem sido implementada de forma a reconhecer as diferenças no interior da escola, entre
alunos que vêm de diferentes lugares, diferentes classes sociais, diferentes acessos a
bens e à cultura. Além disto, estas políticas reconhecem e valorizam as diferenças ou
atuam para que todos estejam mais perto da linha do “normal” socialmente estabelecido?

Muitas propostas de ações educacionais realizadas estão imbrincadas a


orientações morais com dimensões éticas conservadoras, como pensar a inclusão
através da tolerância e do respeito com o outro (MANTOAN, 1999). São dois sentimentos,
a tolerância e o respeito, que são subjetivos e, ao mesmo tempo, flexíveis. Nas palavras
de Mantoan (1999, p. 19):

A tolerância, como um sentimento aparentemente generoso, pode


marcar uma certa superioridade de quem tolera. O respeito, como
conceito, implica um certo essencialismo, uma generalização que
vem da compreensão de que as diferenças são fixas, definitivamente
estabelecidas, de tal modo que só nos resta respeitá-la.

Assim, estas “difserenças fixas” são justamente relacionadas aos problemas


das deficiências vinculadas a aspectos biológicos, voltados para a natureza e postos
numa cadeia hierárquica inferior. Neste sentido, não haveria outra coisa a se fazer a
não ser aceitar esta diferença fixada, estática. Entre outras coisas, estas diferenças são
medidas, quantificadas a partir de uma série de recursos e dispositivos da modernidade,
como testes de inteligência, predisposição para o trabalho, nível de comprometimento,
categorias educacionais, entre outros (MANTOAN, 1999).

Essas diferenças vistas como entidades sem possibilidade de alteração criam


uma ideia de integração que, na verdade, serve como espaços protegidos, à parte, e
voltadas especificamente para “Portadoras de Necessidades Educacionais” (PNEE).
Esse espaço protege a quem? Protege quem nele transita ou protege as demais pessoas
quanto a esses “portadores” de alguma coisa? Para Mantoan (1999, p. 20 grifos da
autora), “a diferença, nesses espaços, “é o que o outro é” – ele é branco, ele é religioso,
ele é deficiente [...] “é o que está sempre no outro” que está separado de nós para ser
protegido ou para nos protegermos dele”. De todo modo, essa relação entre o “mesmo”
e o “outro” impede, todavia, que haja uma experiência com a diferença.

38
Acredita-se, portanto, que é a partir da ética, numa dimensão crítica, que se
alcança a inclusão. A partir da ética aproxima-se da compreensão pela diferença, pela
alteridade. Por isso, a inclusão precede e advoga por uma escola plural, democrática
e transgressora (MANTOAN, 1999). Ela é transgressora na medida que abala a ordem
estabelecida, que questiona a norma, que coloca lentes sobre a imprevisibilidade e a
capacidade de mudança no olhar e na postura com os diferentes. Por isso, num contexto
de educação inclusiva não há uma sala específica para os “Portadores de Necessidades
Especiais” porque nem mesmo se coloca este termo para se referir a determinadas
pessoas; o aluno de uma educação inclusiva não tem uma identidade fixa, não é
essencial nem permanente em si, mas está aberto a aprendizagens e a ensinagens. É a
este direito às diferenças que a educação inclusiva prega.

Se a igualdade é referência, podemos inventar o que quisermos para


agrupar e rotular os alunos como PNEE, como deficientes. Mas se a
diferença é tomada como parâmetro, não fixamos mais a igualdade
como norma e fazemos cair toda uma hierarquia das igualdades e
diferenças que sustentam a “normalização”. Esse processo — a
normalização — pelo qual a educação especial tem proclamado o seu
poder propõe sutilmente, com base em características devidamente
selecionadas como positivas, a eleição arbitrária de uma identidade
“normal” como um padrão de hierarquização e de avaliação de alunos,
de pessoas. Contrariar a perspectiva de uma escola que se pauta
pela igualdade de oportunidades é fazer a diferença, reconhecê-la e
valorizá-la (MANTOAN, 1999, p. 25).

Neste sentido, também devemos reconhecer a pluralidade de uma maneira


ainda mais alargada, compreender a multiplicidade que a diferença carrega. Como
dissemos anteriormente, a ideia de norma tem se delineado de maneira tão rígida
que excluídos e tidos como inadequados são todos aqueles que não alcançam este
padrão, o que inclui um número de corpos, personalidades e performances. Por isso,
também devemos reconhecer diferentes culturas, diferentes formas de pensamento,
diferentes possibilidades de organização social, diferentes modalidades de se relacionar
afetivamente. O que se advoga, portanto, é por uma nova ética escolar.

4 DOCUMENTOS OFICIAIS
Os marcos legais que apontam para o direito à educação estão preconizados
em documentos oficiais em nível internacional e nacional. Em termos internacionais,
a Declaração Mundial sobre Educação Para Todos, aprovada pela Conferência Mundial
sobre Educação para Todos, em Jomtien, Tailândia, de 5 a 9 de março de 1990, por
exemplo, é um documento que preconiza que qualquer pessoa com deficiência tem
direito de expressar opiniões, desejos ou insatisfações em relação à educação que
recebe. De forma similar, a família também tem o direito inerente de ser consultada
sobre as propostas de educação e quais as formas mais apropriadas às necessidades e
aspirações de suas filhas e filhos.

39
De todo modo, vale destacar que mesmo que se organize leis que garantam a
inclusão, o conceito de diferença ainda apresenta grandes preconceitos, discriminação
e exclusão, isto sendo percebido também em muitas políticas educacionais voltadas
para a inclusão.

A maioria dos alunos das classes especiais é constituída pelos


que não conseguem acompanhar os seus colegas de turma, os
indisciplinados, os filhos de lares pobres, os filhos de negros e
outros. Pela ausência de laudos periciais competentes e de queixas
escolares bem fundamentadas, esses alunos correm o risco de
serem admitidos e considerados como PNEE (MANTOAN, 1999, p. 21).

Assim, os alunos que, muitas vezes, são enviados para classes especiais não
chegam a ter um diagnóstico, mas apresentam uma série de características que, por
si, são discriminatórias, como ser indisciplinado ou ser pobre. Isso implica estar fora
dos critérios de como deveria ser ou se comportar nos muros da escola. Além disso,
há muitas dúvidas sobre a precisão dos textos legais para organizar planos de aulas
ou propostas educacionais concretas, sendo tudo vago e generalizante. Isso freia as
iniciativas, ou mesmo faz com que elas retrocedam.

Também indo por este viés, a Declaração de Salamanca, promulgada em 1994,


na Espanha, discorre sobre a inclusão de crianças com deficiência. Essa declaração é
um marco, pois reafirma a vertente da escolarização inclusiva e apoia o desenvolvimento
da educação especial como parte integrante de todos os programas educacionais.

O viés de educação especial tratado na Declaração de Salamanca postula sobre


o fato de todas as crianças possuírem características, habilidades e necessidades
únicas de aprendizagem. Neste sentido, os sistemas educacionais deveriam levar em
conta a vasta diversidade e, portanto, diferentes necessidades no que diz respeito ao
processo de ensino-aprendizagem. Com isto, todas as crianças, independentemente de
suas necessidades educacionais, devem estar incluídas no sistema regular de ensino.

Ainda nesta perspectiva, além do acesso ao ensino regular, também se postula


para uma pedagogia centrada na criança, em vista de atender às necessidades
específicas de cada caso. Este caminho de inclusão e adaptação de todos na escola
regular constitui um meio eficaz para combater atitudes discriminatórias e, tendo, assim,
maiores eixos acolhedores. Este modelo implica princípios onde todas as crianças
possam se beneficiar ao assumir que lidar com pessoas diferentes, em vários níveis, faz
parte do social, assim como o respeito necessário às diferenças.

A declaração de Salamanca, assim, levanta a bandeira para uma pedagogia


centrada na criança, pois percebe nessa vertente, o fortalecimento das esperanças e
a consequente redução das taxas de desistência e repetência escolar. Além disto, uma
perspectiva centrada na criança também oferece princípios de respeito e dignidade a
todos os seres humanos a partir, justamente, de uma mudança de perspectiva social,
onde a sociedade percebe e ressalta as diferenças ao invés de inabilitar e oferecer mais
foco aos impedimentos do que aos potenciais de determinadas pessoas.

40
Neste sentido, uma escola inclusiva é aquela onde as crianças aprendem juntas,
independentemente das dificuldades inerentes a elas. Isto significa um grande desafio
no ramo educacional, visto que se preconiza que a escola se adapte às crianças, seja
através de currículos apropriados, seja através de mudanças na estrutura ou nos arranjos
organizacionais. Portanto, não se pretende que as crianças se adaptem ao ambiente,
mas sim que o ambiente ofereça meios facilitadores e respeito às peculiaridades de
cada criança. Assim, crianças com deficiência têm o direito de receber suporte extra
requerido para assegurar uma educação mais efetiva.

Na esfera nacional, a nossa Constituição Federal de 1988 considera a educação,


juntamente com saúde, alimentação, trabalho, moradia, entre outros, como direitos
sociais do povo e dever do Estado. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
também preconiza, com absoluta prioridade, a inserção de crianças e adolescentes nas
escolas visando tanto ao desenvolvimento enquanto pessoa, como também cidadão e
tendo qualificação para o trabalho. A Educação, assim, é responsabilidade da família, da
comunidade geral e do Estado. O ECA estabelece, também, igualdade nas condições de
acesso e permanência, e direito de ser respeitado.

A nossa Constituição Federal de 1988 respalda os que propõem


avanços significativos para a educação escolar de pessoas com
deficiência, quando elege como fundamentos da República a
cidadania e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, incisos II e III)
e, como um dos seus objetivos fundamentais, a promoção do
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, inciso IV). Ela
garante ainda o direito à igualdade (art. 5U) e trata, no artigo 205 e
seguintes, do direito de todos à educação. Esse direito deve visar ao
“pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e
sua qualificação para o trabalho” (MANTOAN, 1999, p. 22).

O ECA está em acordo com documentos oficiais de cunho internacional, como


a Declaração Universal de Direitos do Homem, de 1948, e a Convenção Internacional
dos Direitos da Criança (CDC), de 1989. A Declaração Universal de Direitos do Homem
já proclamava fortemente o direito de todas as crianças à educação, a partir de uma
perspectiva protecionista. Com o advento da CDC, passa a ser assegurado às crianças
não apenas o direito de proteção, mas também o direito de participação e voz na
sociedade (ROSEMBERG; MARIANO, 2001).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, em seu


art. 59, trata dos sistemas de ensino que assegura aos educandos com necessidades
especiais, quais sejam:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização


específicos, para atender às suas necessidades;
II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir
o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude
de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o
programa escolar para os superdotados;

41
III – professores com especialização adequada em nível médio ou
superior, para atendimento especializado, bem como professores do
ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas
classes comuns;
IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva
integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas
para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho
competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem
como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas
áreas artística, intelectual ou psicomotora.

Assim, já na LDB 9394/96 está preconizado o atendimento às crianças que


até então não recebiam a devida atenção, como a adaptação de currículo, métodos,
técnicas e/ou infraestrutura e o acompanhamento da pessoa com deficiência. Ainda,
esta abertura de demanda para as pessoas com deficiência está dentro da norma
regular, com oferta e acesso gratuito em toda a rede pública de ensino.

Em 2003 foi implementado o “Programa Educação Inclusiva: direito à diver-


sidade”, com o intuito de “disseminar a política de educação inclusiva nos municípios
brasileiros e apoiar a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação
dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos (BRASIL, 2006, p. 1).
De acordo com Caiado e Laplane (2009), o programa tem como ações previstas, a im-
plementação de sala com recursos funcionais e formar e acompanhar os docentes para
o desenvolvimento de uma educação na perspectiva inclusiva. Com isso, as práticas de
educação inclusiva são ampliadas para a formação de professores e em busca de uma
maior compreensão de inclusão e integração dos atores envolvidos.

A Convenção sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, divulgada em Nova


York, em 2006, e promulgada no Brasil a partir do Decreto nº 6.949 em julho de 2009,
é considerada um marco por definir e direcionar o modelo de implementação que
aponta para falhas atitudinais, estruturais e culturais que podem criar obstáculos que
dificultam a integração da pessoa com deficiência em sociedade (GUARESCHI, 2016).
Desta forma, a Convenção estabelece o conceito de deficiência e alguns meios pelos
quais a sociedade pode propiciar novas formas de acessibilidade, além de estabelecer
princípios como não discriminação, participação plena e efetiva na sociedade, igualdade
de oportunidades (BRASIL, 2007). Assim, essa declaração abarca diversas formas de
deficiência, como física, mental, sensorial ou múltipla – nisso também se encaixa o TEA.
Essa convenção serviu como base e direção para outras políticas e leis instituídas no
Brasil, posteriormente.

42
INTERESSANTE
A Lei Ordinária Federal nº 12.764, de 7 de dezembro de 2012 institui a Política Nacional
de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Essa lei
é denominada “Lei Berenice Piana” em homenagem à mãe que luta pelos direitos das
pessoas com autismo e institui para todos os efeitos legais que o autismo é considerado
uma deficiência. O Art. 3º desta lei trata dos direitos conferidos à pessoa com transtorno
do espectro autista, quais sejam:

a) vida digna, integridade física e moral, livre desenvolvimento da personalidade,


segurança e lazer;
b) proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;
c) acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades
de saúde, incluindo o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo, o atendimento
multiprofissional, a nutrição adequada e a terapia nutricional, os medicamentos e as
informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento;
d) acesso à educação e ao ensino profissionalizante;
e) acesso à moradia, inclusive à residência protegida;
f) acesso ao mercado de trabalho; e,
d) acesso à previdência social e à assistência social.

Essa lei é interessante para pensarmos no que discutimos no


Tópico 1 e Tópico 2 desta unidade. As pesquisas em nível de
estatística que quantificam os casos de determinada doença
ou diferença serve, a um só tempo, para manter os níveis de
segurança e de proteção social. A partir destas práticas, sabe-
se quantos sujeitos estão à margem da noção de normalidade
e o Estado – ou iniciativas privadas – podem se organizar para
pensar de que forma estes indivíduos podem ser levados para
mais próximo do centro, ou seja, mais longe da margem. É a partir
deste quantitativo que se organizam políticas e ações voltadas
para determinado grupo. É o respaldo médico, social, jurídico e
moral agindo de maneira sincrônica.

Em 2015 foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência


(Estatuto da Pessoa com Deficiência), nº 13.146, de 6 de julho, a LBI, em que fica
incumbido ao poder público promover acesso e igualdade às pessoas com deficiência.
No âmbito da educação, a LBI ressalta como função e poder do Estado “assegurar, criar,
desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar” o sistema educacional
voltadoa pessoas com deficiência em diversos âmbitos, desde a promoção de acesso ao
desenvolvimento e implementação de recursos pedagógicos e técnicos. A LBI ressalta
que estsas medidas são válidas para todas as modalidades de ensino, com meios para
infraestrutura e capacitação de pessoal e que também deve ser posta em práticas
medidas para a permanência destas pessoas no âmbito educacional. Para Santos e
Vieira (2017), tanto a LBI (2015) como a Lei Berenice Piana (2012) ressaltam a importância
de políticas que busquem a integralidade de pessoas com deficiência.

43
A Lei nº 13.861, de 18 de julho de 2019 vigora que nos censos demográficos
realizados a partir de 2019 serão inclusas as especificidades inerentes ao transtorno
do espectro autista, em consonância com o  § 2º do art. 1º da Lei nº 12.764, de 27 de
dezembro de 2012.

QUADRO 1 – ALGUNS DOCUMENTOS OFICIAIS PARA PENSAR A INCLUSÃO

ANO/ O QUE PROMULGA


DOCUMENTO LEGAL
LOCAL (para educação e/ou TEA)

Educação a todas as pessoas como um


Constituição Federal 1988, Brasil
direito social e dever do Estado.

Inserção, com absoluta prioridade, de


crianças e adolescentes nas escolas visando
Estatuto da Criança e
1990, Brasil tanto ao desenvolvimento enquanto pessoa,
do Adolescente
como também cidadão e tendo qualificação
para o trabalho.

Declaração Mundial Qualquer pessoa com deficiência tem direito


1990,
sobre Educação Para de expressar opiniões, desejos ou insatisfa-
Tailândia
Todos ções em relação à educação que recebe.

Declaração de 1994, Inclusão de crianças com deficiência educa-


Salamanca Espanha cionais no âmbito das escolas regulares.

O atendimento às crianças que até então


Lei de Diretrizes e não recebiam o devido atendimento, como
bases da Educação 1994, Brasil a adaptação de currículo, métodos, técnicas
Nacional e/ou infraestrutura e o acompanhado da
pessoa com deficiência.

Disseminar a política de educação inclusiva


Programa Educação nos municípios brasileiros e apoiar a forma-
Inclusiva: direito à 2003, Brasil ção de gestores e educadores para efetivar
diversidade a transformação dos sistemas educacionais
em sistemas educacionais inclusivos.

Promover, proteger e assegurar o exercício


Convenção sobre o 2007, pleno e equitativo de todos os direitos
Direito das Pessoas Estados humanos e liberdades fundamentais por
com Deficiência Unidos todas as pessoas com deficiência e promover
o respeito pela sua dignidade inerente.  

44
Política Nacional
Institui para todos os efeitos legais que o
de Proteção dos
autismo é considerado uma deficiência.
Direitos da Pessoa 2012, Brasil
Também discorre sobre os direitos das
com Transtorno do
pessoas com TEA.
Espectro Autista (TEA)

Assegurar a inclusão escolar de alunos com


Política Nacional de
deficiência – entre elas o TEA. Esta política
Educação Especial
2008, Brasil busca garantir o acesso ao ensino regular,
na Perspectiva de
com participação, aprendizagem e continui-
Educação Inclusiva
dade nos diversos níveis de ensino do Brasil.

Destinada a assegurar e a promover, em


Lei Brasileira de condições de igualdade, o exercício dos
Inclusão da Pessoa 2015, Brasil direitos e das liberdades fundamentais
com Deficiência por pessoa com deficiência, visando a sua
inclusão social e cidadania.

Inclusão as especificidades inerentes ao


CENSO 2020 2019, Brasil transtorno do espectro autista nos censos
demográficos. (Censo 2020).

FONTE: Os autores

Esses documentos norteiam práticas e discursos na nossa sociedade. Como se


trata de um campo que abarca diferentes saberes – médicos, morais, jurídicos, sociais,
culturais, familiares, psicológicos – estão em aberto para o debate de como implementar
e melhorar a inclusão. Por um lado, pensamos em termos de cidadania e de necessidade
de inclusão social e educacional para todos, sem distinção de raça, cor ou credo. Por
outro lado, como profissionais da área de saúde, também é preciso compreender as
artimanhas e as fissuras dos discursos, compreender processos históricos e sociais
pelos quais passamos até assumir determinado tipo de prática como legítima.

As estratégias e linguagens que formam as concepções para o processo


educacional atual estão alicerçadas em questões filosóficas sobre o que é o Homem
e quais meios possíveis – se é que existem – para que se garanta o contato com uma
essência e natureza próprias de quem é humano (BIESTA, 2013). Dessa forma, no decorrer
do século das luzes, o movimento iluminista e as concepções humanistas imbricaram-
se e influenciaram a construção moderna de educação, em que seria desenvolvida uma
autonomia racional que possibilitaria o esclarecimento e emancipação do Homem em
relação ao mundo natural.

45
No que diz respeito à educação, as crianças, tidas como recém-chegadas
são consideradas um nível hierárquico inferior e, portanto, devem ser disciplinadas e
treinadas moralmente para desenvolver e adquirir os pré-requisitos necessários para
que, enfim, sejam consideradas humanas (BIESTA, 2013). Tal abordagem de socialização
humanista, sem surpresas, incita desigualdades e não considera o singular, preocupa-
se com a ordem vigente. Dessa forma, questões teóricas e filosóficas sobre a questão do
homem têm implicações práticas e refletem como pensamos as estratégias e processos
educacionais.

Não obstante, a linguagem é um elemento cultural que delineia e articula


possibilidades e limites de atuação e, no caso da educação, houve, progressivamente,
uma sobreposição de uma linguagem da educação por uma nova linguagem da
aprendizagem. Desnecessário dizer que tal mudança de perspectiva linguística não
advém apenas de um lugar ou instituição, mas trata-se de um contexto multifacetado,
sob influências de diferentes áreas, como no campo de produção teórica ou nas
condições do Estado de bem-estar social (BIESTA, 2013).

Ao considerar o contexto neoliberal e de alta tecnologia, estimula-se/incita-


se o desenvolvimento de técnicas, não de conteúdos e as relações entre a partes do
processo educativo (instituição, professor, aprendente) são muito mais econômicas
que políticas, em que o estado é o provedor de serviços, e o contribuinte, o cliente
(BIESTA, 2013). Uma lógica mercadológica aplicada à educação (ou a processos de
aprendizagem) conduz a uma má compreensão do processo educacional e dificulta
pensar em termos de conteúdo sem que a lógica de mercado de flexibilizar para a
satisfação das preferências individuais adéque-o para a produção de uma educação
fast food, recheada de técnicas, rápida, fácil, agradável e sem riscos (BIESTA, 2013).

Para repensar e reinventar questões filosóficas sobre o homem que impliquem


práticas efetivamente mais humanas, torna-se um desafio pensar o homem em outros
termos, com outra roupagem, outra linguagem, sem as amarras normativas das
concepções de socialização ou humanismo (BIESTA, 2013). Pelo contrário, postula-
se sobre uma educação responsável e que assuma os riscos que a transformação de
si pode trazer, às vezes de forma violenta, pois não se sabe ao certo o status que se
alcançará, uma vez que não há pódio de chegada para quem preencher os requisitos
para se tornar humano.

Dessa forma, questões filosóficas sobre o que é homem, refletem em como se


concebem as práticas educacionais para, assim, legitimar as questões filosóficas outrora
estabelecidas e possíveis através da produção, desenvolvimento e mudança em vários
setores da estrutura social, agendas políticas, produção de conhecimento teórico,
articulação da linguagem, práticas do senso comum. Assim, através da linguagem,
sugere que seja feito um movimento em prol da educação, uma educação que não seja
pautada em termos normativos, econômicos e individuais, mas que seja pensada em
termos sociais e inter-relacionais, a considerar o outro e o singular (BIESTA, 2013).

46
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• No liberalismo, há sempre uma arbitragem entre a noção de liberdade e segurança


em relação à noção de perigo.

• Numa lógica neoliberal, há uma espécie de condução de subjetividades.

• Podemos pensar que educação e inclusão são intimamente próximas.

• A inclusão, em alguma medida, é fruto noção de norma.

• Embora as categorias dos “diferentes” sempre existissem, a forma pela qual a


sociedade passou a lidar com elas mudou radical e estruturalmente.

• Ninguém escapa à norma, nem mesmo o anormal.

• A inclusão não é dada, a priori. A inclusão não é algo natural em termos de natureza
ou em termos de sociedade.

• A definição de deficiência passou por um crivo jurídico, sendo enquadrado em


termos de leis e procedimentos.

• A linha de pensamento mais forte sobre a deficiência foi pensada a partir da medicina
e da psiquiatria social que se preocupavam com aspecto de trabalho, de reinserção
social, de adaptação profissional, classificação social e recuperação de mão de obra.

• A escola como um lugar que identifica aqueles que fogem à norma, identifica os anormais.

• Para que a inclusão escolar seja posta em prática, uma série de documentos e legisla-
ções são utilizadas, como a elaboração de políticas públicas, a organização da escola.

• A Declaração de Salamanca, promulgada em 1994, na Espanha, discorre sobre a


inclusão de crianças com deficiência.

• O viés de educação especial tratado na Declaração de Salamanca postula sobre o


fato de todas as crianças possuírem características, habilidades e necessidades
únicas de aprendizagem.

• A Convenção sobre o Direito das Pessoas com Deficiência foi divulgada em Nova
York, em 2006, e promulgada no Brasil a partir do Decreto nº 6.949 em julho de 2009.

47
AUTOATIVIDADE
1 Os documentos que regem algumas práticas da educação inclusiva têm caráter
internacional e nacional. Entre os documentos internacionais há a Declaração de
Salamanca. Sobre este documento, marque V para Verdadeiro e F para Falso.

( ) Foi instituída na Espanha, em 1994.


( ) Advoga pela inserção de todas as crianças no ensino regular.
( ) O Brasil é um dos únicos países não signatários.
( ) Alinha-se a uma educação centrada no professor.

Estão CORRETAS apenas:


a) ( ) V – V – F – F.
b) ( ) V – F – V – F.
c) ( ) F – V – F – F.
d) ( ) V – V – V – F.

2 O “Programa de Educação Inclusiva: direito à diversidade” é uma das políticas, no


plano nacional, para pensar e promover a inclusão na escola regular. Sobre isso,
assinale apenas a opção CORRETA:

a) ( ) Tinha como intuito disseminar a política de educação inclusiva.


b) ( ) Foi promulgada em Nova York, em 2003.
c) ( ) Negligencia a formação de professores.
d) ( ) Organiza ações de inclusão em hospitais.

3 A produção da anormalidade é um outro lado da produção da norma. Esses são


aspectos do governamento dos sujeitos na atualidade, o que também se aplica
para pensarmos a inclusão e a exclusão. Disserte sobre como a produção da norma
relaciona-se com as problemáticas de inclusão social e escolar.

4 Uma sociedade rígida e exigente quanto à ideia de norma produz um mundo


hipoteticamente isotrópico, com alta sensibilidade à diferença. Sobre este universo
isotrópico, analise as sentenças a seguir.

I- Num mundo isotrópico, todos ocupam igualmente os mesmos espaços.


II- Num mundo isotrópico, a anomalia é a regra.
III- Num mundo isotrópico, a inclusão é considerada natural.
IV- Questões sociais, de gênero e raça não podem ser consideradas diferenças.

48
Estão CORRETAS apenas:
a) ( ) Estão corretas apenas I e III.
b) ( ) Estão corretas apenas I, II e III.
c) ( ) Estão corretas apenas III e IV.
d) ( ) Estão corretas apenas II e III.

5 A inclusão escolar requer, entre outras coisas, uma quebra de paradigma em relação às
antigas formas de se relacionar, socializar e educar os diferentes. Um desses aspectos é
abandonar a ideia de “diferença fixa”. Comente sobre o termo.

49
50
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO
E INCLUSÃO ESCOLAR

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, nos tópicos anteriores, vimos alguns aspectos conceituais, histó-


ricos e filosóficos para pensarmos e discutirmos inclusão e exclusão. Vimos o quanto
esses conceitos estão atrelados à lógica social da época em termos de economia, de
meios de produção, além do caldo político, social e científico que está em voga em
determinados períodos.

Isso posto, agora partiremos para a discussão sobre inclusão no âmbito


do acompanhamento terapêutico. Isso porque estas são duas áreas e esferas que
podem dialogar em diferentes frentes, desde o caminho para uma construção ética
da cidadania e dos direitos de todos, até a perspectiva de cuidado a partir da inclusão
que está para além dos meios educacionais formais, mas permeia por todas as ações
e intervenções do acompanhante terapêutico que opera sempre para reabilitar e
ressocializar o sujeito em sofrimento psíquico. Por estas vias, concebemos que tanto o
trabalho de acompanhamento terapêutico quanto as ideias em torno da inclusão visam
à reabilitação, ressocialização, respeito à alteridade e direitos do indivíduo.

Para tal, veremos alguns aspectos da importância da educação como um as-


pecto essencialmente socializador na nossa sociedade no que diz respeito à relação e
à troca de conhecimento entre a geração mais velha e os recém-chegados. Por con-
seguinte, veremos alguns termos e provocações para pensar a interseção do acom-
panhante terapêutico e inclusão para além do conhecimento formal. Estas diferentes
maneiras de manejar a inclusão nos diferentes espaços requerem tanto a sensibilidade
da prática para identificar e compreender o tipo de inclusão necessária em cada caso,
como também é necessário o suporte técnico e teórico que permite direcionar o olhar
e a intervenção.

2 EDUCAÇÃO COMO PROCESSO SOCIALIZADOR


No texto A Educação como processo socializador: função homogeneizadora
e função diferenciadora, Émilie Durkheim (1983) postula sobre a ação que os adultos
exercem sobre as crianças e os adolescentes e chama isso de educação. Nesse sentido,
para melhor explicar essa concepção de educação, Durkheim confronta definições de
“educação” sugerida por outros pensadores, como também discorre sobre o padrão
histórico em que a geração mais velha age sobre a mais nova.

51
A definição de Kant diz que “o fim da educação é desenvolver, em cada indivíduo,
toda a perfeição que ele seja capaz” (DURKHEIM, 1983). Perfeição se colocada no sentido
de harmonia pregada por Durkheim, seria inviável para a realização individual, afinal,
não devemos fazer todos a mesma coisa. Imagina se absolutamente todas (já quase) 8
bilhões de pessoas do planeta Terra fizessem especialização em educação?

O problema é quando se pensa na educação como “ideal, perfeita, apropriada


a todos os homens, indistintamente”. Porém, se procurarmos na história, não veremos
nada parecido. Ela muda de forma de acordo com o meio e o tempo. A forma como a
sociedade funcionava na Antiguidade, em Atenas ou Roma, depois como funcionava
durante a Idade Média, na Renascença, como nos relacionamos hoje? O que tinha de
fundo comum nessas outras formas de organização social que não nos cabe hoje e
vice-versa? Desde o nascimento, a pessoa está posta em sociedade e assimilará as
regras locais, linguagem, religião, regras de conduta, regimes disciplinares a depender
de qual fim que a sociedade, como um todo, se propõe naquele momento histórico ou
naquela localidade.

Nesse contexto, o que se exigia dos homens, fisicamente, na Antiguidade, é bem


distante do que se exige hoje, em termos físicos para essa harmonia social. No entanto,
é até engraçado pensar no uso de computadores ou internet na Grécia Antiga. Então
somos preparados, física e psicologicamente para o que a sociedade requer e precisa
para seu funcionamento. Antiguidade: politeísmo, poligamia. Idade média: monoteísmo,
monogamia. Faz parte do fundo comum, o contexto determina como se dão as relações
entre os homens.

Não é individualmente que se constrói esse sistema de educação, esse


esquema de valores. Isso depende de outras instituições e outros fatores, como “religião,
organização política, grau de desenvolvimento das ciências, estado das indústrias etc.”.
É necessário, portanto, que compreendamos, quando olhamos para as outras formas
de socialização, o contexto social da época, senão fica no vazio. Então, passamos por
processos históricos até chegar ao ponto que a educação está hoje, sistematizada,
separada por faixa etária, por classes, com horários e séries definidas. Isso foi construído
devagar e lentamente e ainda sobre influência das outras instituições, paradigma
vigente etc.

Para Durkheim (1983), precisamos conhecer esse conjunto de realidades


sobrepostas até o ponto em que estamos hoje. É necessário observar. E, muito devido à
época, ele compara com outras ciências. O físico observa a matéria, o biólogo, o ser vivo,
o sociólogo, a sociedade. Assim, pode-se dizer que a função educativa é de preparar as
crianças. Para isso, é necessário observar “em que cenário esse preparo tem consistido
e a que necessidades tenha atendido, no passado”.

52
Então, já entendemos que para que haja educação precisamos que a geração
mais velha haja sobre a mais jovem. Agora, precisamos entender como se constitui
essa natureza nos outros sistemas educacionais que existiram em outros tempos e sob
outras normas. Educação, em todos os tempos, é una e múltipla.

É múltipla se pensarmos por castas. A educação do rico não é a mesma que a


educação dos pobres. Diferença de classe social, portanto. A educação na região sul não
é a mesma da região norte, que não é a mesma dos países orientais, que não é a mesma
de quatro séculos atrás. E, por mais que haja argumento de que essa desigualdade não
deveria existir e que o destino das crianças não deveria estar à mercê desses (digamos)
detalhes. Porém, ainda que a sociedade fosse mais homogênea nesse sentido, ainda
assim seria múltipla se pensarmos na quantidade de profissões existentes. Devemos
saber que não houve momentos em que houvesse homogeneidade total da sociedade.

O que existe de comum em todos os povos é o repasse das práticas sociais às


crianças, independentemente do fim da sociedade ou da época. E, ainda que as castas
sejam fechadas, há o fundo comum. A educação, portanto, tem a função de preparar,
através da socialização, as crianças para a vida social, importa em desenvolver número
de estados físicos intelectuais e morais que são aclamados pela sociedade política no
geral e pelo convívio mais direto que tiver (DURKHEIM, 1983).

Em cada um de nós existe dois seres: um individual e um social. A função da


educação trata-se de uma socialização metódica das novas gerações para que seja
desenvolvido esse ser social (DURKHEIM, 1983). Há de se considerar, é claro, que esse
ser social não nasce com o homem, mas também não se trata de mera espontaneidade,
uma vez que somos submetidos a tantas regras e códigos. Isso é para a harmonia social,
não espontaneidade individual.

Em suma, para pensarmos a constituição do social, atualmente, passamos ine-


vitavelmente pela escola. Por isso pensamos em escola quando pensamos em inclusão.
Isto, pois, a criança moderna é essencialmente escolar, ela tem por ofício ser aluno.

DICAS
A socióloga da infância aborda os conceitos de “ofício de criança” e “ofício de aluno”
para pensar a situação da criança na sociedade moderna. Sirota (2001) discute que a
emergência de uma Sociologia da Infância deve-se ao surgimento do chamado “ofício
de criança”, em que se busca uma discussão sobre a infância, afastando-se dos termos
da sociologia da educação. O ofício de criança, nas sociedades que determinam a
escolaridade como exercício obrigatório das crianças, revela o desempenho de papéis
institucionalmente prescritos, validando a condição de aluno e atribuindo progressos
em termos de maturidade e desenvolvimento (SIROTA, 2001). Para Sarmento (2011,
p. 588), “com a escola, a infância foi instituída como categoria social dos cidadãos
futuros, em estado de preparação para a vida social plena”, pois ao ocupar-se

53
essencialmente do aluno, a instituição destaca a figura do aprendiz,
que é avaliado, premiado ou sancionado tendo como meta a idade
adulta. Sob essa perspectiva, desaparece a “criança” enquanto sujeito
que carrega emoções, saberes e aspirações, nascendo o sujeito “aluno”.
Para compreender melhor, leia o artigo A Emergência de uma Sociologia
da Infância: evolução do objeto e do olhar, de autoria de Régine Sirota,
no Cadernos de Pesquisa, em 2001. Segue o link para acesso: https://
bit.ly/3jckWmB.

Assim, a escola também é responsável, tal como nas palavras de Durkheim, pela
socialização das crianças, e este processo está vinculado à interação entre gerações,
entre o velho e o novo. Por esta via, a escola é responsável oficial pela preparação do
cidadão futuro – estes sendo, em seu início, crianças. Na escola se alfabetiza, na escola
se consegue diplomas, na escola se prepara o corpo para que fique sentado por horas
seguidas, tal como depois será necessário na vida adulta.

A concepção de Durkheim sobre a função da educação pode ser tida, entre os


debates teóricos, como conservadora ou positivista. Não obstante, utilizaremos esta
perspectiva para compreendermos a dimensão e a importância que há nesta socialização.
Ademais, podemos realizar uma dobra neste pensamento para também pensarmos
de que forma queremos, almejamos – fantasiamos – que seja essa socialização. Que
tipo de conhecimento, de moral, de ética desejamos, enquanto geração mais velha,
repassarmos para os recém-chegados? Que tipo de relação com a alteridade, com o
diferente, ensinaremos e compartilharemos entre nós?

Como vimos no decorrer deste tópico, grande parte da ideia de socialização


e inclusão que temos desenvolvido dialoga de maneira muito íntima com o cenário
neoliberal de eficiência e voltado para o mercado de trabalho.

Neste sentido, a escola também pode ser um palco para o Acompanhante


Terapêutico, pode ser um território fértil para repensar a própria existência dos atores
sociais naquele local. Assim, espaços que são comumente utilizados pelos, uma quadra
de futebol, o refeitório, a horta da escola, todos são espaços comuns e utilizados para
propósitos específicos, mas que, com a atuação do AT pode ser ressignificada e passar
a alcançar outros tipos de experiência (SERENO, 2006).

3 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÕES


A partir dessas concepções oriundas da psicanálise, podemos pensar toda uma
postura e uma ética do acompanhamento terapêutico no sentido de não manter “dentro”
aquele que se vê aprisionado pelo “fora”, que está sempre à mostra. Não obstante, uma
prática para “fora” coincide e dialoga coerentemente, dentro dos possíveis, com uma

54
situação psicológica que também está fora. Neste sentido, a atuação do acompanhante
terapêutico está voltada não apenas para as fronteiras em termos de espaços, mas
sobretudo nas interrupções de processo do paciente. Ou seja, isso implica uma atuação
em que se favorece que os movimentos do sujeito sigam um fluxo num sentido de
administrar o “fora” e o “dentro”.

A clínica, neste sentido, seja um consultório, na rua, na escola ou em outro


ambiente, consiste, a partir destas lógicas aqui apresentadas, à forma como cada
um lida com seus desajeitamentos e que nisto está a singularidade dos sujeitos e os
mecanismos pelos quais delineiam suas existências (ROLNIK, 1997). Assim, a prática do
AT pode estar enquadrada em diferentes perspectivas teóricas, mas apoia-se sobretudo
a partir de uma ética em que vê possibilidade de criatividade de potências ativas.

Assim, devido ao fato de o AT desenvolver um tipo de atividade de atendimento


clínico caracterizado pela prática de saída pelas cidades ou acompanhar o sujeito em
suas atividades cotidianas, alinha-se de maneira ontológica com as propostas de saúde
em rede. Deste modo, a marca do AT é, essencialmente, o trabalho interdisciplinar,
associando aos serviços como CAPS e consultórios de rua. Assim, a interdisciplinaridade
é um potente fator para a promoção de inclusão social em dificuldades psicossociais.

O Acompanhamento Terapêutico é uma clínica que acontece no


cotidiano, nos mais variados espaços e contextos. Entre as suas
características mais marcantes estão o resgate e a promoção da
circulação do paciente pela cidade, construindo ou simplesmente
explorando redes sociais preexistentes. Predominantemente o
Acompanhamento Terapêutico tem sido um recurso utilizado no
tratamento de pacientes diagnosticados como psicóticos, sendo,
entretanto, cada vez mais indicado para pacientes com outros
diagnósticos (CHAUI-BERLINCK, 2012, p. 44).

Desse modo, os atendimentos do AT, como toda sua prática, não têm um caráter
fixo e homogêneo, sendo relativizados, em termos de configuração, de acordo com a
demanda de cada paciente. Os atendimentos podem ocorrer uma, duas ou mais vezes
durante a semana e o tempo de duração pode ir em até três horas (PITIÁ; FUREGATO,
2009). As atividades realizadas devem promover os objetivos terapêuticos traçados
para o restabelecimento do indivíduo em sociedade e com o mundo que o cerca.

Interessante observar, portanto, que a aproximação entre a ideia de inclusão e os


preceitos de Acompanhamento Terapêutico é dada e de fácil associação. Primeiramente,
tanto a inclusão pela perspectiva que temos tratado até aqui quanto o contexto de
surgimento do AT e sua práxis atual estão vinculadas a movimentos similares, como
direitos humanos, cidadania, antipsiquiatria, reinserção social, ética no cuidado, entre
outros. A atuação do AT junto ao ambiente escolar sob a ótica da inclusão, portanto,
serve para ressignificar os espaços e também as relações dos atores da saúde no
ambiente escolar. Além do fato de a escola ser um território de atuação possível e cheio

55
de possibilidades, também pode caber à atuação do AT uma expansão de possibilidades
e fronteiras para além da escola, mas que também subsidiariam e guiaram formas de
educação e de socialização que calhassem em cada caso de acompanhamento. Para
tal, o que importa é a sensibilidade atrelada à técnica e à prática do AT.

Adiante, veremos, então, alguns aspectos de inclusão escolar e inclusão


social – que não deixa de ser também educacional – que pode envolver o trabalho do
acompanhamento terapêutico.

3.1 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÃO


ESCOLAR
O Acompanhamento Terapêutico surge, em seu estágio embrionário, para
atuar junto a pacientes psicóticos e com foco na reinserção social. Seu campo de
atuação, seu território, foi sendo expandido com o tempo, atuando de maneira nômade
e expandindo as fronteiras de clínica e de encontro com paciente, também tem sido
pensado para auxiliar no processo educacional de crianças com transtornos mentais
ou sofrimento emocional agravado (FRAGUAS; BERLINK, 2001). Como em todos os
outros territórios ocupados pelo AT, também a escola é uma aposta no encontro com
o outro de maneira ética. Para tal, é necessário ter um olhar atento – e quiçá desviante
– das problemáticas possíveis, como as precariedades das escolas, dos bairros, das
comunidades, a vulnerabilidade que cada acompanhado terá em diferentes níveis –
sociais, econômicos, barreiras estruturais, entre outros.

A escola como um ambiente obrigatório para crianças pressupõe que o traba-


lho dos ATs seja voltado a este público também. E embora o acompanhamento tera-
pêutico seja amplo quanto aos seus acompanhados, especificamente sobre a escolari-
zação de crianças psicóticas e autistas, há um consenso geral sobre a importância da
escolarização formal para elas. Para além da função social óbvia da escola, e já discu-
tida aqui neste tópico, ela também pode ser um valor terapêutico na medida em que
pode contribuir para algum ordenamento do sujeito em termos sociais (SERENO, 2006).

Assim, uma parte do trabalho do AT com crianças é contribuir para o despertar


da curiosidade e da criatividade das crianças, ainda que seja de maneira parcial e
inicialmente fragmentária. Isto, é claro, também tropeça num problema das políticas
de inclusão que é precisamente a presença de um “outro”, um ator que não faz parte
da estrutura da escola e que atuaria voltado a uma criança ou poucas crianças, o que
seria um tipo de serviço especializado paralelo à classe regular (SERENO, 2006). Isto, em
alguma medida, indicaria um aceno da diferença, o que deve ser manejado com muito
cuidado para que também não indique a segregação do acompanhado, ao invés de sua
inclusão escolar efetiva.

56
Para tal, além das éticas necessárias para se trabalhar com inclusão e com
saúde mental, por exemplo, também é necessário pensar a inclusão a partir de um
sistema social, político e econômico mais amplo, de forma que são muitos os atores
e as instituições envolvidas. Em outras palavras, a inclusão deve contar com serviços
especializados, caso seja necessário, e também precisam estar numa escola regular.
Não se deve negar um serviço especializado assim como não se deve negar o acesso
e garantir a permanência da criança na sala de aula regular. Para tal, é necessário que
haja toda uma reorganização do sistema educacional, com revisão de paradigmas
relacionais, burocráticos, éticos e políticos para lidar com o outro (SERENO, 2006).

Este cenário implica, como temos debatido até aqui, uma crise na instituição
escolar em relação ao seu contato com a loucura, com a deficiência, enfim, com a
diferença. A escola como um território conservador e rígido quanto às diferenças é
posta à prova em suas estratégias para a produção de subjetividade e de identidades
(SERENO, 2006). Não obstante, é esta crise de visão e de paradigma que pode indicar
uma abertura para um outro tipo de desenvolvimento social e pessoal das crianças.

No que diz respeito às crianças com transtornos mentais, especificamente, a in-


clusão vai além de modalidades escolares, com aprendizagem de matemática ou física,
mas passa pela essência primeira da escola: a socialização. A inclusão serve, nestes ca-
sos, para a aprendizagem mais básica para viver em sociedade que se trata do convívio
diário, aprender a conviver. E isto vem “[...] com outras três aprendizagens (aprender a
ser, aprender a fazer e aprender a aprender), o que constitui os quatro pilares da edu-
cação para este milênio, segundo o relatório Jacques Delors” (SERENO, 2006, p. 172).

ESTUDO DE CASO
“Marcos, um menino autista de 11 anos, separava tão bem esses espaços
que durante bom tempo deixou sua loucura, desorganização, para as
Oficinas Terapêuticas, organizando-se na escola. Depois, tudo se
misturou, a desorganização ocupou todos os espaços, em casa e na
escola. Queria ele deixar sua marca? De qualquer jeito, e isso torna-
se relevante, alguns meses após esse tumulto, falou a primeira frase
(de sua vida) na escola, dirigindo-se para o AT, que conversava com
a professora: “vem me pegar!”, estabelecendo um laço inédito de
relação, usando um repertório infantil em que está implícita a dimensão
do jogo! O efeito disso foi sensacional. A professora foi muito elogiada:
“ela o ensinou a falar!”. Isto disparou um movimento da escola (que nos
toma como parceiros, e também à família) de inseri-lo na rede de saúde
de seu município, próximo de São Paulo, articulando alternativas para
um tratamento na região, a fim de garantir maior frequência, consistência
e continuidade de seu projeto escolar” (SERENO, 2006, p. 173).

57
Há dois tempos de processo de escolarização para crianças com transtornos
mentais, a saber: i) a ambientação; ii) depois da entrada na sala de aula. O primeiro, a
ambientação, diz respeito aos primeiros momentos, como entrar na escola, compreender
os códigos e os signos do ambiente, desenvolver um tipo de repertório escolar para se
adaptar à classe. Este tempo primeiro de ambientação é respeitado e acompanhado
pelo AT, que observa o ritmo e as necessidades, e que busca captar toda as linguagens
e formas possíveis estabelecidas para a convivência dentro e fora da escola ou da sala
de aula. Isso implica observar como a criança se relaciona, com quem ela estabelece um
tipo de vínculo, quais objetos ela se interessa, quais tipos de diálogo estabelece, com
quem e por quanto tempo. Este é o tempo fértil para a compreensão e disseminação de
códigos sociais.

Isso implica, essencialmente, o AT ocupando a dimensão e a forma de uma


presença ativa, presença em termos de corpo, pois está presente em todos os espaços
com o acompanhado, acompanhando a travessia de explorar e expandir fronteiras de
experimentos, de vivências de afetos e sensações. Essa presença também se manifesta
enquanto linguagem ou enquanto tradutor de “línguas estrangeiras”, pois o AT é peça de
diálogo entre a criança, os pais, a escola e/ou outros profissionais que atuem junto ao
caso (SERENO, 2006). Trata-se de uma presença inteira e plena, a que se coloca, a que
atravessa, a que se afeta, que faz mediação, que fornece o encontro, que está aberta ao
imprevisível, mas que se permite acontecer.

O trabalho do AT na escola implica um acompanhamento durante todo o período


escolar e fora dele, estando com a criança ou adolescente dentro e fora da escola,
procurando integrá-la ao grupo de crianças e envolvê-la em atividades que surjam
(FRAGUAS; BERLINCK, 2001). Assim, o AT atua em nome de uma educação que vai
além das habilidades formais de educação, prezando pela socialização, apresentando e
acompanhando possibilidades de transitar pelos espaços, que realize mais interações
sociais, resolva os conteúdos escolares etc. (ARAÚJO; NASCIMENTO, 2021). Por isso
pensamos a inclusão para além dos conhecimentos escolares, isto é apenas um dos
objetivos do AT na escola, mas toda experiência e vivência, dentro ou fora deste espaço,
pode ser rico em potencialidades.

Assim, o papel do AT não é correspondente ao papel do professor, do gestor, do


segundo professor ou da família. O AT tem um papel de suporte, auxilia e acompanha
quando necessário, trabalhando também para a independência de seu acompanhado.
O AT pode atuar, também, de maneira educativa com o professor e demais colegas,
podendo ter um papel de conscientizar sobre o que o cenário pedir, além de atuar
junto ao processor para intervir em crises e para dar segurança para o acompanhado
(ARAÚJO; NASCIMENTO, 2021).

O at é, portanto, um mediador entre sujeito-escola, sujeito-família,


escola-família e principalmente um mediador entre os outros
profissioniais envolvidos no tratamento. Cabe ao at colecionar
informações importantes, a fim de auxiliar os profissionais e promover

58
as novas medidas decididas e elaboradas pelos mesmos e, por
acompanhar o sujeito, ter uma intervenção mais frequente e mais
apropriada nos diversos ambientes afetados (REIS, 2012, p. 195).

O trabalho do acompanhante terapêutico pode servir a diferentes casos e


especificidades. Em seu estágio inicial, o trabalho do AT voltava-se para o atendimento
de casos psicóticos. Ainda hoje, serve a este propósito, mas também pode atuar em
outros casos, sem psicose, ou mesmo sem que haja um quadro de transtorno mental.
Pode acompanhar crianças com deficiências de outra ordem.

O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) também pode


ser uma possibilidade para o acompanhamento terapêutico. O diagnóstico deve ser
estabelecido por outros profissionais da área de saúde mental, utilizando os documentos
normativos que regem a área. Contudo, vale lembrar que o diagnóstico deste caso
tem um caráter clínico e comportamental. Os sintomas podem aparecer a partir dos
seis anos de idade e trata-se de um transtorno crônico, seguindo até a vida adulta. O
tratamento para TDAH está voltado também para a modificação de comportamentos,
trabalhando na rotina e na organização do cotidiano, havendo também a possibilidade
de intervenção medicamentosa, mas esta não implica na redução do transtorno,
servindo apenas para o tempo que durar o efeito do medicamento, tendo, portanto,
também um efeito momentâneo e voltado para o comportamento.

CURIOSIDADES
O Brasil é um dos países que mais apresenta diagnóstico de TDAH em
crianças e, também nessa linha, é o segundo maior consumidor mundial
de metildenidato (Ritalina, Concerta); a venda destes medicamentos tem
crescido cada vez mais em “ritmo assombroso: 71.000 caixas em 2000;
739.000 em 2004; 1147.000 em 2008; em 2010 as vendas passaram de
2 milhões de caixas” (MOYSÉS; COLLARES, 2013, p. 68). O tratamento
farmacológico pode ocorrer no sentido de diminuir a impulsividade e a
atividade motora e aumentar a vigilância, além de melhorar a memória
recente e o desempenho escolar. Um dos fármacos mais comuns nestes
casos é o metilfenidato, que se trata de um psicoestimulante e seu
efeito recai sobre os aspectos comportamentais que duram o tempo do
efeito do fármaco, não auxiliando nos casos de autoestima ou mudança
no quadro do transtorno (ROTTA, 2016). Este fármaco é conhecido
comercialmente como Ritalina, com duração de cerca de quatro horas.
Outra forma de encontrar comercialmente o metilfenidato é através do
Concerta, com tempo de ação de até 12 horas.

Assim, para pensarmos em termos de inclusão, as intervenções devem


ultrapassar a lógica medicamentosa e atuar através de ações psicossociais no
ambiente escolar. No caso de TDAH, há um ideal de intervenção onde as aulas sejam
bem estruturadas e com a presença de poucos alunos, além de uma rotina consistente

59
um ambiente relativamente previsível. Atividades físicas costumam ser recomendadas
neste caso também, o que se considera um tipo de ensino ativo. Verificar também se
há a necessidade de um reforço de conteúdo em determinadas disciplinas (REIS, 2012).

Considerando que o trabalho do AT também implica mediar atores e institui-


ções, este pode orientar os pais e pensar numa possibilidade de treinamento para que
se conheça melhor as estratégias de organização do filho. Além disto, é essencial que se
trabalhe os aspectos emocionais e de convívio social da criança, voltando-se para sua
autoestima e autoconfiança.

O AT, portanto, precisa desenvolver boas relações com a equipe da escola,


atuando conforme consta em seus pressupostos, de maneira interdisciplinar, prezando
pela horizontalidade. Além de, se necessário, ter supervisão de profissionais mais
experientes na área. Com isto, pode-se abrir portas para debates e conscientização
sobre a inclusão de crianças. Assim, desenvolve-se a questão da socialização, da
aprendizagem e da comunicação tanto com o acompanhado quanto com os demais
envolvidos (REIS, 2012).

3.2 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E INCLUSÃO SOCIAL


Ao pensarmos em inclusão, quase automaticamente pensamos em escola. E
quando se trata de crianças isso se torna ainda mais ressaltado, pois se a família é a
primeira instância de socialização das crianças, a escola é a segunda. Assim, quando
a criança apresenta algum problema de desenvolvimento, pensamos em formas de
incluí-la nesta norma social. Ainda neste sentido, se a criança, por algum motivo, não
tem condições de ir à escola, nós como adultos nos preocupamos com seu futuro,
com sua cidadania, com as possibilidades materiais do mundo social e do trabalho
(JERUSALINSKY, 2002).

Além disso, em muitas escolas, os termos de inclusão são obscuros, no sentido


de que não há aprendizagem efetiva para a criança naqueles moldes, mas ela frequenta
como uma forma de socialização. Dessa forma, muito do seu potencial pode ser
negligenciado quando não é dada a devida atenção às demandas necessárias para cada
caso. Por isso, é importante que a família esteja a par do projeto pedagógico da escola,
para além das leis que garantem o acesso, embora sem instrução e instrumentos para
garantir a permanência.

Esses processos de tomada de consciência sobre o projeto pedagógico da


instituição e a busca pela aprendizagem possível das crianças importa para que suas
ações e experiências não sejam esvaziadas. Ao colocar a criança junto a outras crianças
sem que seus recursos sejam conhecidos como potentes dentro das possibilidades, a
autonomia da criança é limitada, rechaçada. Pois, assim, sem escolher, sem estimular,
também estamos, na prática, atuando a partir de uma perspectiva capacitista.

60
IMPORTANTE
O capacitismo como preconceito e discriminação se manifesta principalmente quando
uma pessoa subestima a capacidade da outra pelo simples fato de ela ser pessoa com
deficiência. Geralmente a pessoa com deficiência é tratada de forma infantilizada, e
pormenorizada pelo simples fato de ter alguma deficiência que é visível, sem ser notada
ou percebida pela sua capacidade, mas apenas pela sua deficiência. Entender o que é
capacitismo é muito importante, principalmente pelo fato de que, por não ser muito
conhecido, acabamos praticando de forma involuntária. Como é o caso dos vieses
inconscientes, o capacitismo também pode ser evitado quando compreendido e
estudado. Manifestações capacitistas: Pessoas sem deficiência que utilizam
os banheiros para pessoas com deficiência, ou até mesmo pessoas sem
deficiência que questionam a necessidade do banheiro adaptado; Pessoas
que se admiram ao ver alguma pessoa com deficiência vivendo sua vida
normalmente e fazem comentários como “ela vive a vida como se
fosse normal”; Pessoas que ficam surpresas com a conclusão
de curso de uma pessoa com deficiência; Parabenizações pela
pessoa com deficiência ter feito alguma coisa “mesmo com
essas condições”. Expressões capacitistas que devemos evitar:
cego de raiva; dar uma de joão sem braço; sequelado; mongol;
deformado; capenga.

FONTE: <https://bit.ly/3KkNWnT>. Acesso em: 30 mar. 2022.

O “faz as mesmas coisas que todos” – fala tão presente em relação a crianças
com problemas de desenvolvimento – muitas vezes encobre com uma aparente
democracia e pé de igualdade com os outros, o anonimato e a ausência de projeto de
vida no qual uma criança é lançada. Frequentar a escola simplesmente “porque todos
vão”, se bem possa ter um aparente efeito normalizador, não implica a inclusão social
de uma criança se esta ida à escola não a toma num projeto maior de transmissão de
cultura (JERUSALINSKY, 2002, p. 33).

É neste sentido que o AT pode atuar junto a crianças que apresentem proble-
mas de desenvolvimento e contribuir para sua autonomia e, assim, também com sua
cidadania. Há, contudo, algumas precauções que devem ser tomadas, como a atenção
às demandas e necessidades do paciente. Deste modo, não basta que o AT passe a
apresentar uma série de atividades que julgue importante e necessário para o pacien-
te, pois isto seria uma mera transmissão e não uma apropriação por parte do paciente.
Assim, as práticas devem fazer sentido, sobretudo, para o paciente.

Estes processos que envolvem inclusão/exclusão, autonomia/dependência,


público/privado nos informa sobre o contexto da paciente. Uma criança que não
vai à escola, que não tem amigos, que não sai à rua sozinha, que precisa de um
acompanhante terapêutico pode ser uma criança que, em grande medida, sente-se
sozinha (JERUSALINSKY, 2002). Nestes processos, o AT atua nos entres, nas travessias
de uma coisa para a outra e na busca por brechas para que o paciente encontre sua
autonomia e sua autenticidade no seu cotidiano e no seu contexto como um todo.
61
Deste modo, a relação estabelecida entre AT e criança tem relação com as
formas urbanas que experimentamos e, assim, desatar uma série de normas e valores
que as prendem e as julgam. O AT convida a criança a trilhar um novo caminho, sem
que indique qual a direção e dando possibilidade para diferentes dobras (MEIRA, 2013).
Assim, pensamos que é a criança quem leva o acompanhante terapêutico à cidade, ao
seu mundo, ao seu cotidiano.

A criança, com seus olhares curiosos de infância, não caminha


velozmente. Está sempre olhando para o lado, para cima, para os
detalhes. Seu corpo não acompanha a velocidade imposta pelo
ritmo da rua. Quando acompanhamos sua temporalidade, seu ritmo
desacelera, torna-se vagaroso, quase em suspenso. Há pausas a
cada passo, diante de singulares e diminutos traços: uma formiga
no, uma pedra, um brinquedo, um largado no chão, um buraco, uma
poça de água, um movimento, um som, um olhar ou uma fala. Em
outros momentos, torna-se veloz, descendo ladeiras e desafiando o
tempo, disparando uma corrida sem fim, onde as ladeiras convocam
ao movimento desenfreado (MEIRA, 2013, p. 41).

Para que isso seja possível em sua gama vasta de possibilidades, é necessário
que o AT se desprenda da formalidade e da temporalidade padrão, os roteiros prontos,
tudo com script e hora marcada, afinal, isto é ir no sentido contrário da criança. Assim,
os diagnósticos e as medicações importam para saber a demanda, mas na hora do
acompanhamento, a presença e a disponibilidade do AT em estar com coração e cabeça
abertas para o momento é força propulsora de atravessamentos e mudanças.

Desse modo, podemos pensar que o elo entre o trabalho de acompanhamento


terapêutico e a inclusão é, essencialmente, ética. Essa aproximação dá-se desde o
contexto de formação de ambos os casos e está presente independentemente do local
de atuação do profissional. A ideia de acompanhar um indivíduo com sofrimento psíquico
carrega, em seu âmago, a busca pela inclusão efetiva deste indivíduo em sociedade
para que ele acesse novos modos de criatividade e de socialização.

O AT no ambiente escolar também atua de maneira socializante, à maneira de


Durkheim, ao passo que também opera de uma maneira ética que se afasta de uma
lógica isotrópica e neoliberal de normalidade, pois não coloca a situação – ou diagnóstico
– dos indivíduos de maneira essencialista. Pelo contrário, o AT se compromete com o
novo, com o inesperado, com a possibilidade de dobras e novas perspectivas de convívio
entre indivíduo e mundo.

No âmbito escolar, essas características do trabalho do AT são postas em


evidência, de forma que vai se delineando esta ética do cuidado e da amizade que inclui
e socializa sem buscar uma dicotomia de apoio, sem colocar identidades fixadas nos
processos e nos sofrimentos dos indivíduos. O AT no campo da inclusão compreende
que a construção da ideia de anormalidade, de loucura e de deficiente advoga com uma
lógica de psiquiatrização e patologização da existência humana e, portanto, trabalha
com a perspectiva da inclusão, de uma ética inclusiva e emancipadora.

62
LEITURA
COMPLEMENTAR
ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO EM ESCOLA REGULAR:UM CASO DE
INCLUSÃO

Fábio Alberto Fontoura e Silva

Introdução

O acompanhamento terapêutico (AT) “é uma prática clínica realizada por


agentes, que tem como objetivo fazer com que a pessoa que se encontra isolada
do convívio social possa aumentar sua participação na tomada de atitude perante a
própria vida.” (SILVA, 2001). O surgimento da atividade de AT está ligado à necessidade
de inserção de pacientes com quadros clínicos específicos na sociedade em geral. A
figura do acompanhante terapêutico (at), representa um elo importante de mediação
social, uma vez que seu papel inclui ampliar o convívio entre o paciente atendido e a
comunidade em que ele está inserido.

Na escola regular, durante os últimos anos, vem crescendo de maneira


constante o número de matrículas de crianças com necessidades especiais (BIAGGIO,
2007), onde o trabalho do at entra como um agente facilitador do processo inclusivo.
Regulamentada por lei LDB 9394/96 (BRASIL, 1996), a matrícula de uma criança com
necessidades especiais no ensino particular passa a ser uma questão de inclusão, ou
seja, o maior ou menor grau de adaptação do aluno ao ambiente de ensino regular.
Por meio de seu trabalho, o at cria as condições para que a criança possa frequentar a
escola, beneficiando-se do processo educativo.

Caracterização do Caso

Este trabalho constitui o relato do AT de um menino com 8 anos de idade, com


necessidades especiais, durante o período de aulas em uma escola de ensino regular.
Além da descrição de algumas atividades de AT, são pontuadas algumas reflexões
consideradas pertinentes ao trabalho, principalmente no tocante à inclusão escolar e
social. O AT foi realizado durante o período de um semestre em uma escola da rede
particular de ensino regular, em sala de aula e no decorrer das atividades curriculares e
extracurriculares relacionadas a esta escola.

A criança acompanhada é V, um menino de 8 anos de idade diagnosticado


com um caso incomum de polimicrogiria (malformação da organização cortical que
se caracteriza por múltiplos pequenos giros separados por sulcos espessos e rasos –
TEIXEIRA, 2006), em que uma malformação congênita levou a um quadro de hemiparesia

63
(caracterizada pela perda total ou parcial da função motora, resultando em vários níveis
de comprometimento e incapacidade – BASTELLI, 2010), comprometendo grande
parte de suas funções motoras e de comunicação. Apesar de seu quadro, o menino foi
alfabetizado pela mãe durante os anos precedentes, e participa da maioria parte das
atividades em que a turma na qual está inserido atua.

V já foi avaliado por diversos profissionais da área de saúde. No entanto, apre-
senta características peculiares de comportamento que não se enquadram em diag-
nósticos simples de autismo ou de transtorno invasivo. Ele frequenta o ensino regular
desde a pré-escola, sempre com o auxílio de um at individual em sala de aula.

Intervenção

Acompanhei V desde agosto do ano de 2009, até o final do ano letivo, no mês
de dezembro. Durante este período, foi realizado o acompanhamento diariamente,
sempre às tardes, durante as atividades acadêmicas. V cursou em 2009 o segundo ano
curricular, dos nove anos do ensino fundamental. O currículo inclui aulas de Português,
Matemática, Ciências, Educação Física, Música, Artes Visuais e Informática/Biblioteca,
das quais V participou integralmente, e aulas de História, Geografia e Inglês, das quais
V não participou. Isso se deve a duas principais razões: tempo e foco. Devido às suas
limitações, V precisa de mais tempo que a maioria dos alunos para realizar as mesmas
tarefas. Como o foco de sua aprendizagem foi determinado em algumas áreas, foram
privilegiadas as disciplinas relacionadas às áreas contempladas.

As instruções para a intervenção eram bastante específicas, uma vez que a


criança tem sido acompanhada há anos na escola, basicamente com as mesmas
atividades: auxiliar a realização de tarefas escolares, no tocante à compreensão de
instruções e facilitação motora, auxiliar na interação com colegas de sala e funcionários
da escola, facilitando a socialização e zelar pela integridade da criança nas diversas
situações do cotidiano escolar. Em todas as ocasiões, existe a preocupação não só
com a realização das atividades, mas com a maneira como são realizadas e o contexto
educacional, para que essas atividades sejam significativas para o acompanhado e
também benéficas para os que o cercam.

Segundo Santos (2009), “é por meio da criação de ações e pela realização
de atividades ligadas ao cotidiano dos pacientes que a clínica do at terapêutico se
realiza, buscando retomar ou criar inserções sociais não estereotipadas e capazes de
contemplar a alteridade que é própria ao paciente e a todos nós”.

Durante uma tarde típica na escola, V chega com outras crianças já no horário
da aula começar, pelo ônibus escolar. A primeira tarefa como at é levá-lo até a sala de
aula, através das escadas. V sempre solicitava apoio para andar, e descia as escadas
degrau por degrau, sempre começando pelo mesmo pé (esquerdo). Normalmente, o
acompanhado chegava bem disposto e sentia voluntariamente na última carteira

64
de uma das fileiras. Uma das funções do at é lembrá-lo de cumprimentar colegas e
professoras, uma vez que esse comportamento ainda não é totalmente espontâneo.
Segundo Moreno (1993), “a evolução consciente através do treino da espontaneidade
abre novos horizontes para o desenvolvimento da raça humana.” Assim, mesmo as
atividades mais básicas podem exigir treino antes de se tornarem espontâneas.

Uma vez que um dos objetivos principais é propiciar independência ao


acompanhado em grau sempre maior, V foi sempre acompanhado nos momentos
de lanche e toalete, porém auxiliado minimamente, na medida do possível, para que
gradualmente essas tarefas básicas possam ser realizadas por conta própria. Já
nos momentos de interação, sempre houve mediação mais intensa. V precisa ser
constantemente lembrado de cumprimentar e se despedir das pessoas. Como apresenta
diversos comportamentos atípicos, as crianças costumam percebê-lo como diferente
dos demais colegas e costumam se referir a ele como “especial”.

Para a maioria das crianças que convivem com V na escola, ser “especial”
significa ter alguns comportamentos peculiares e várias limitações. A atitude de muitos
reflete um comportamento que é geralmente dispensado a crianças mais novas – a
atitude que teriam com um irmãozinho mais novo, por exemplo. A maioria das crianças
tem curiosidade e busca contato com V, e é muito importante para o at estar atento a
essas tentativas de aproximação, pois elas formam uma base sólida para o processo de
socialização do acompanhado. Como V não se verbaliza oralmente, seu at passa a ser
uma espécie de porta-voz de suas necessidades, impressões e atitudes – uma grande
responsabilidade.

Mauer e Resnizky apud Londero e Pacheco (2006) sugerem as funções principais


do at, sendo elas: conter o paciente; oferecer-se como modelo de identificação; trabalhar
em um nível dramático-vivencial e não interpretativo; emprestar o “ego”; perceber,
reforçar e desenvolver a capacidade criativa do paciente; informar sobre o mundo
objetivo do paciente; representar o terapeuta; atuar como agente ressocializador; e servir
de catalisador das relações familiares. De fato, em várias ocasiões, a criança gostaria
inclusive de permanecer deitada. Na maioria das ocasiões esse comportamento deve
ser evitado, não só pelas implicações óbvias no condicionamento físico da criança, mas
também porque o estado de ócio costuma levar V a diversas estereotipias: balançar
a cabeça, fazer movimentos ou sons com a língua, colocar as mãos nos ouvidos,
emitir sons repetitivos dar risada sem contexto. Essas estereotipias representam não
apenas comportamentos socialmente desvalorizados, mas também costumam refletir
a tendência de V em se focar no seu próprio corpo, em detrimento da interação com o
ambiente e as pessoas que o cercam. De acordo com Hoffmann (1996), “não é necessário
apenas o isolamento social para que a criança refugie-se em seu corpo psicomotor e
deixe de ampliar seu leque de habilidades motoras, afetivas e verbais.”

Com relação às atividades acadêmicas, o foco sempre foi que V pudesse
acompanhá-las no ritmo mais aproximado possível da média da turma, desde que
pudesse verificar sua aprendizagem efetiva dos conteúdos. V não possui dificuldades

65
intelectuais significativas, com exceção da dificuldade de se manter atento do início
ao fim de uma tarefa qualquer. Para V, as instruções devem ser concisas e a tarefa
não deve requerer mais do que dez minutos de atenção focada, pois, além de perder o
foco da atividade, a criança mostra crescente irritabilidade toda vez que é submetida a
tarefas prolongadas.

V parece compreender a maior parte do que é lhe dito, pois responde a estímulos
verbais, alterando em diversas ocasiões seu comportamento. O trabalho de AT com
V deve sempre considerar este fato, mesmo porque o trabalho envolve que ambos
assumam algumas responsabilidades em relação ao processo (LONDERO e PACHECO,
2006). V demonstra também consciência de suas limitações, tanto em ocasiões em que
se mostra frustrado e irritado como em circunstâncias de esquiva de tarefas, quando
parece duvidar de suas capacidades.

Apesar de tudo, o AT foi realizado com um enfoque positivo, ou seja, não apenas
par- tindo das capacidades de V, mas também valorizando os incrementos de repertório
e as mudanças favoráveis de comportamento, com menos ênfase a comportamentos
inapropriados ou aparentes perdas de repertório. “O objetivo principal nesta área é
permitir ao paciente um melhor desenvolvimento, conduzindo-o a um relacionamento
social mais amplo, em casa e na comunidade, com ênfase à realização das atividades
do dia a dia, à autoajuda e à comunicação oral” (CARVALHO, 2010).

Algumas atividades são evidentemente mais interessantes para V. Ele se


relaciona positivamente de maneira geral com desenhos, seja desenhando com giz
de cera e caneta hidrográfica, seja observando pessoas desenharem. De fato, antes
mesmo do trabalho atual de acompanhamento terapêutico, sua antiga at já desenhava
para ele como forma de recompensa por comportamentos esperados.

Além disso, V apresenta grande interesse por computadores e aparelhos ele-


trônicos em geral, mas principalmente relacionados a áudio e vídeo. Foi pensando
nisso que sugeri à família que proporcionasse um canal eletrônico de comunicação
com V. Optamos pelo IPod, um aparelho que armazena desde pequenos textos até
música, vídeo e imagens. Como V já há muito tempo se utilizava de imagens para ex-
pressar alguns de seus pensamentos e vontades, seu repertório cotidiano de vocabu-
lário – que incluía lugares frequentados, alimentos que costumava consumir, pessoas
de sua convivência, etc. – foi digitalizado e armazenado no aparelho. Dessa forma, V
passou a utilizar-se com frequência do aparelho para comunicar suas intenções. Além
disso, seus colegas de sala passaram a demonstrar mais interesse em suas atividades
cotidianas, motivados pela curiosidade com relação ao aparelho e suas funções. A
interface eletrônica era de grande apelo para as crianças em geral, sendo que estas
pareciam atribuir um valor diferenciado para o que era comunicado através do apare-
lho. Acredito que o fato deu a V a oportunidade de perceber seus colegas mais atentos
ao que ele comunicava.

66
Devido à sua condição de hemiparesia, V tem mais dificuldade de movimentação
nos membros do lado direito do corpo. Sua exploração sinestésica do meio ambiente
se dá quase que exclusivamente com a mão esquerda – ele a usa para pegar objetos,
sinalizar, interagir com o próprio corpo e com as demais pessoas. Sua mão direita
permanece imóvel grande parte do tempo, com ocasionais movimentos, a maioria
dos quais sem grande objetividade. Quando anda, V não articula completamente os
pés, o que causa a impressão de que ele arrasta as pontas dos pés – principalmente
o pé direito. Obviamente, V usa a mão esquerda para escrever e usar objetos como
cola e tesoura, em sala de aula. Apesar de limitado pelo escasso uso da mão direita,
seu domínio de materiais e atividades escolares é satisfatório. V parece ter consciência
de sua limitação física, e se mostra bastante frustrado quando não consegue realizar
alguns movimentos.

Como at, uma de minhas principais preocupações era auxiliar V tanto em suas
atividades como na interação social – principalmente nas atividades curriculares e,
de maneira geral, como “intérprete” –, entretanto sem transmitir uma impressão de
incapacidade àqueles que o cercam, na medida do possível. A maioria das crianças
que interagem com V diariamente percebeu minha presença de maneira positiva,
pois manifestavam suas opiniões de que eu “ajudava V” ou era “amigo dele”. Como
apontado por Barretto (2001), a pessoa que auxiliava o paciente nos seus afazeres
cotidianos costumava ser chamada de amigo-qualificado, mas se distingue do que hoje
entendemos como a função do at. É claro que uma das funções do at é justamente
esclarecer suas funções. Ademais, procurava sempre auxiliar as outras crianças em
momentos de dificuldade – um aspecto muito interessante do trabalho.

Na verdade, toda vez que auxiliava um dos colegas de V, não apenas me


aproximava um pouco mais da criança, mas também tinha a chance de apontar que
todos nós, por vezes, temos dificuldades, e que nisso V não era diferente. Os alunos
entendem que nem tudo pode ser realizado sem a ajuda alheia, e a presença de uma
criança com necessidades especiais em seu meio é uma ótima maneira de lembrar a
todos as limitações e possibilidades de cada um. Além disso, o comportamento em
geral sugere mais tolerância, não só com a pessoa com ne- cessidades especiais, mas
também com cada um de seus colegas. Além de V, a turma ainda contava com pelo
menos outras três crianças com necessidades especiais, embora bastante distintas e
em diversos graus. Nenhuma delas tinha at.

Considerações Finais

O trabalho realizado envolveu não só o at e a família, mas também a equipe de


profissionais do colégio onde foi feito o acompanhamento. Durante todo o tempo em que
estive presente, contei com a participação de professores, funcionários e colegas em
um ambiente escolar de inclusão. Também é importante ressaltar a questão do vínculo
com a criança, sem o qual o trabalho encontraria mais empecilhos, principalmente no
caso de um paciente com características autistas. Desde o início, o vínculo com V foi
bastante espontâneo e recompensador, possibilitando grande aproximação.

67
No presente, podemos notar manifestações de independência por parte de
V. Ele já costuma andar sozinho em terrenos planos, solicitando apoio apenas para
subidas, descidas e terrenos irregulares. Em diversas ocasiões, demonstra preferência
em explorar lugares e objetos por conta própria. Nessas ocasiões, preferi privilegiar a
iniciativa da criança e apenas observar, deixando para intervir apenas se necessário como
facilitador ou para prevenir acidentes iminentes. Outra mudança positiva observada
foi na movimentação de V. Ele passou a subir escadas sozinho e a arriscar andar em
terrenos menos regulares por conta própria, sempre sob o olhar do acompanhante.
Ele continua realizando atividades que auxiliam em sua propriocepção, como aulas
de natação e capoeira, além da aula regular de educação física na escola. Os ganhos
motores são sensíveis, embora muitas vezes sutis, e o aumento gradual na atividade
física, estimulado pelo at nas aulas de educação física e de capoeira, principalmente,
também parece refletir em um comportamento mais calmo e menos estereotípico em
sala de aula.

Continuo com o objetivo de demonstrar aos pais que a imposição crescente


de limites também contribui para o amadurecimento de seu filho, e que essa atitude
favorece mais adaptação social. Os pais de V procuram atualmente “adivinhar” o que
o filho quer antes mesmo de ele comunicá-lo, embora tenham muito medo de deixar
quaisquer de suas necessidades insatisfeitas. Carvalho (2010) relata um caso em que
a mãe de um jovem paciente acompanhado pelo terapeuta “deixa de chamar a sua
atenção temendo alguma reação de crise”, sendo que ao longo da intervenção o at
orienta essa mãe a atitudes mais assertivas.

Também professores, funcionários e colegas da escola onde V estuda mostram


bastante entendimento dos benefícios de sua autonomia, embora alguns deles ainda
façam muitas coisas para V que ele poderia realizar sozinho. De qualquer maneira,
muitos deles compreendem que o caminho para V ter uma vida saudável passa pela
sua maior independência. Apesar de o at ser normalmente contratado pela família do
paciente para realizar seu trabalho, devemos compreender que este não inclui apenas
corresponder às demandas de seus contratadores, mas também contribuir em geral de
maneira positiva para a inclusão da pessoa com necessidades especiais na sociedade
e para uma convivência mais ampla entre paciente e sociedade, de maneira que todos
em torno do sujeito – e ele principalmente – possam se beneficiar dessa convivência.

FONTE: SIGNORI, Solange E. Manual de Acompanhamento Terapêutico: Contribuições Teórico-Práticas


para a Aplicabilidade Clínica. Disponível em: Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2012.

68
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Para que haja educação precisamos que a geração mais velha haja sobre a mais jovem.

• A função da educação trata-se de uma socialização metódica das novas gerações


para que seja desenvolvido esse ser social.

• A aproximação entre a ideia de inclusão e os preceitos de Acompanhamento


Terapêutico é dada e de fácil associação.

• A escola como um ambiente obrigatório para crianças pressupõe que o trabalho dos
ATs seja voltado para este público também.

• Uma parte do trabalho do AT com crianças é contribuir para o despertar da curiosidade


e da criatividade das crianças, ainda que seja de maneira parcial e inicialmente
fragmentária.

• O trabalho do AT na escola implica um acompanhamento durante todo o período


escolar e fora dele, estando com a criança ou adolescente dentro e fora da escola.

• O papel do AT não é correspondente ao papel do professor, do gestor, do segundo


professor ou da família.

• O AT tem um papel de suporte, auxilia e acompanha quando necessário, trabalhando


também para a independência de seu acompanhado.

• O AT pode atuar junto a crianças que apresentem problemas de desenvolvimento e


contribuir para sua autonomia.

69
AUTOATIVIDADE
1 Para Durkheim, Educação é um dos pilares da sociedade, devido à função social que
ela ocupa. Defina o que é Educação para Durkheim.

2 A Educação Inclusiva e o Acompanhamento Terapêutico podem ter aspectos e


pressupostos semelhantes, dado os aspectos que criticam e que, ao mesmo tempo,
aproximam estas duas áreas. Comente sobre as interseções entre Educação Inclusiva
e Acompanhamento Terapêutico.

3 O Acompanhante Terapêutico pode desempenhar um importante e inclusivo papel no


território escolar. Sobre esta demanda do AT, assinale V para Verdadeiro e F para Falso.

( ) O AT pode funcionar como facilitador da expansão da criatividade e da curiosidade


da criança.
( ) O AT atua juntamente com o professor, funcionando como um segundo professor.
( ) O AT é essencialmente desvinculado da equipe escolar, tendo um trabalho à parte.
( ) O AT funciona como um mediador em relação aos atores e às instituições envolvidas.

Assinale apenas a opção CORRETA:


a) ( ) V – F – F – V.
b) ( ) V – V – F – V.
c) ( ) V – F – V – V.
d) ( ) V – F – F – F.

4 A presença do AT nos territórios da escola opera em inúmeras dimensões diferentes.


Sobre esta presença ativa, analise as sentenças a seguir.

I- Presença em termos de corpo, pois está presente em todos os espaços com o


acompanhado.
II- Presença também se manifesta enquanto linguagem ou enquanto tradutor de
“línguas estrangeiras” do acompanhado.
III- Presença inteira e plena, a que se coloca, a que atravessa, a que se afeta, que faz
mediação, que fornece o encontro.
IV- Trata-se de uma presença alheia ao corpo de professores e gestão escolar.

Assinale apenas a opção CORRETA:


a) ( ) Estão corretas apenas I, II e III.
b) ( ) Estão corretas apenas I, II e IV.
c) ( ) Estão corretas apenas II, III e IV.
d) ( ) Estão corretas apenas I e II.

70
5 O acompanhamento terapêutico no ambiente escolar representa uma ruptura com
antigos paradigmas e também lida com algumas dificuldades na atuação. Sobre a
função do AT no processo de inclusão, assinale apenas a opção CORRETA:

a) ( ) O AT funciona como um mediador entre as partes para ampliação de repertórios.


b) ( ) O AT tem como principal papel ensinar aos professores novas metodologias.
c) ( ) O AT é a peça principal em todo o processo de inclusão.
d) ( ) O AT pode acompanhar apenas casos que envolvam psicose.

71
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75
76
UNIDADE 2 —

ASPECTOS E DIAGNÓSTICOS
DOS TRANSTORNOS
RECORRENTES AO
AMBIENTE ESCOLAR
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os conceitos transtornos globais e de desenvolvimento;

• entender o processo de inclusão escolar;

• compreender o processo de avaliação e diagnóstico dos transtornos de aprendizagem;

• entender o processo de escolarização.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – OS TRANTORNOS GLOBAIS E DE APRENDIZAGEM


TÓPICO 2 – TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO (TGD)
E ESCOLARIZAÇÃO DESTES ALUNOS
TÓPICO 3 – PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E DE DIAGNÓSTICO DOS TRASNTORNOS

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

77
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!

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78
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
OS TRANTORNOS GLOBAIS E DE
APRENDIZAGEM

1 INTRODUÇÃO
A inclusão passou por um grande processo histórico de mudanças, evoluindo e
mudando em suas características para que, em seus períodos, pudesse alcançar a sua
atual transformação. Não a muito tempo, podemos recordar que a visão da pessoa com
deficiência era de uma pessoa louca, doente e incapaz, dessa forma sendo excluída da
sociedade e de todo convívio social. Ainda antes de alcançar os pressupostos atuais
da pessoa com algum tipo de deficiência, era atribuído, absolutamente, ao sujeito a
responsabilidade de se adaptar à sociedade (BRASIL, 2001).

O Brasil, durante esse período de adaptação, foi atualizando suas políticas e


atualizando diretrizes para a melhor inserção dessas pessoas na sociedade. Assim,
nosso país se adequou com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990) e
com a Declaração de Salamanca (1994), dessa forma, trabalhando para que esse grupo
conseguisse participar de forma ativa de atividades de lazer, saúde, educação e muitas
outras (CIANTELLI; LEITE; MARTIN, 2014).

NOTA
A Declaração Mundial sobre Educação para Todos é um plano de ação
no qual as nações do mundo afirmam que toda pessoa tem direito à
educação. A conferência foi realizada de 5 a 9 de março em 1990, onde foi
reconhecido como direito fundamental de todos, sendo estes, mulheres
ou homens, dentre todas as idades, todos devem ter acesso à educação.
A Declaração de Salamanca foi um documento elaborado na Conferência
Mundial sobre Educação Especial, que possuía o objetivo de fornecer
bases e diretrizes para a estrutura de uma reforma política de todos os
sistemas educacionais, focando a inclusão social.

Nos tempos atuais, fica em evidência a discussão acerca de pessoas que


apresentem deficiências ou transtornos globais de desenvolvimento no contexto das
dificuldades de aprendizagem dentro do ensino educacional regular. Dessa forma,
espera-se que estes indivíduos possam se beneficiar da educação, conseguindo atender
às demandas de suas especificidades (CUNHA; FARIAS; MARANHÃO, 2008).

79
A deficiência é um fenômeno construído socialmente, pensando assim,
transforma em dever a sociedade se movimentar em direção da igualdade, possibilitando
e oportunizando ajustes que adéquem o sistema para o desenvolvimento humano de
formas diferenciadas para as necessidades e condições específicas que determinados
grupos possuem, sendo esses direitos agora assegurados por lei (AMARAL, 1998).

Assim, a inclusão se torna algo cada vez mais presente em discussões e deba-
tes da atualidade, sempre em visão da defesa dos direitos de todos, principalmente dos
antes não assegurados, as pessoas com deficiência, nos planos de educação de ensino
regular. Mesmo ainda sendo perceptível que em muitos lugares essa inclusão ainda
apresente grandes dificuldades, principalmente se referindo às necessidades educacio-
nais de pessoas com deficiência. O movimento para a inclusão continua, se adaptando e
procurando desenvolver a inclusão e desenvolvimento social (BRASIL, 2003).

Acadêmico, neste tópico, você será apresentado aos Transtornos Globais de


Desenvolvimento e de Aprendizagem, em que você terá contato com os sintomas e
diagnóstico e entenderá como elas afetarão o indivíduo.

2 TRANSTORNOS GLOBAIS DE DESENVOLIMENTO – TGD


Os Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) são aqueles que se referem a
um grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, sendo assim, são os transtornos que
afetam o desenvolvimento de uma criança, em que eles são apresentados no indivíduo
de forma precoce, podendo se apresentar até mesmo antes da idade escolar. Os sintomas
desse transtorno podem ser apresentados como déficit persistente na interação e
comunicação social da criança, acontecendo em vários ambientes e contextos, possui
a tendência de apresentar padrões repetitivos e restritos de comportamento, interesses
e atividades (APA, 2014).

Percebemos, então, como os Transtornos Globais do Desenvolvimento se


caracterizam através das diferentes e diversas áreas que atingem o desenvolvimento da
criança. Assim, com seu desenvolvimento neuropsicomotor afetado, pode comprometer
as mais diversas áreas da sua vida, como suas relações sociais, sua comunicação,
causando até mesmo estereotipias motoras.

80
INDICAÇÃO DE FILME
Um amigo inesperado – After Thomas, 2006

SINOPSE: O casal Rob Graham e Nicala Graham tem um filho de seis


anos de idade, chamado Kile. O filho do casal Graham tem autismo. Seus
pais fazem de tudo para tentar se comunicar com ele. O garoto Kile não
consegue se relacionar de forma emocional. O casal compra um Golden
Retriever, chamado Thomas, para viver na casa da família Graham. A vida
de toda a família muda, depois de Thomas.

O prejuízo desses indivíduos em suas capacidades são qualitativos e definem


as condições de forma atípica quando se trata do nível de desenvolvimento mental
da criança. Existem alguns transtornos que se enquadram no TGD, pois apresentam
grave comprometimento no desenvolvimento do indivíduo (APA, 2014). Dentre
esses transtornos é importante ter em mente que muitas características específicas
podem ser compartilhadas, ou seja, podem ser encontradas em outros transtornos
pertencentes a esse quadro. Porém, é necessário ressaltar que se estamos falando de
um grupo heterogêneo, ao desenvolver o decorrer da história da criança, os recursos
práticos e até mesmo metodológicos podem ser uma dificuldade para a mediação do
desenvolvimento e aprendizagem do sujeito (MISQUIATTI et al., 2013).

Percebendo a deficiência como a perda de uma ou mais funções do indivíduo,


sendo elas físicas, psicológicas ou sensoriais. Elas podem ser apresentadas de diversas
formas, porém se forem recebidas e cuidadas de formas adequadas, o sujeito será
capaz, ou seja, se os profissionais que trabalham e interagem com esses indivíduos
adquirirem os conhecimentos, instrumentos, métodos e técnicas necessárias para
auxiliarem nesse processo e proporcionar a aprendizagem, seria possível amenizar
diversas incapacidades existentes (SCHIRMER et al., 2007).

81
O conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento surge no final
dos anos 60, derivado especialmente dos trabalhos de M. Rutter e D.
Cohen. Ele traduz a compreensão do autismo como um transtorno
do desenvolvimento. O autismo é explicado e descrito como um
conjunto de transtornos qualitativos de funções envolvidas no
desenvolvimento humano. Esse modelo explicativo permitiu que o
autismo não fosse mais classificado como psicose infantil, termo que
acarretava um estigma para as famílias e para as próprias crianças
com autismo. Além disso, o modelo permite uma compreensão
adequada de outras manifestações de transtornos dessas funções
do desenvolvimento que, embora apresentem semelhanças,
constituem quadros diagnósticos diferentes. A compreensão dos
transtornos classificados como TGD, a partir das funções envolvidas
no desenvolvimento, aponta perspectivas de abordagem, tanto
clínicas quanto educacionais, bastante inovadoras, além de contribuir
para a compreensão dessas funções no desenvolvimento de todas
as crianças (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010, p. 12).

Tendo em mente os aspectos já apresentados sobre o Transtorno Global de


Desenvolvimento existem alguns grupos que são caracterizados dentro do TGD, como:
Transtorno do Espectro Autismo (os quais se adentram em síndrome de Asperger,
Síndrome de Rett e Autismo), Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtornos Invasivos
sem outra especificação. Podemos perceber aqui que em sua maioria os transtornos
presentes possuem características em comum, apresentando em geral dificuldades na
aprendizagem e adaptação escolar, possuem associações a limitações e dificuldades do
processo de desenvolvimento pessoal e social e dificuldade no acompanhamento das
tarefas diárias colocadas no âmbito escolar. Observe o quadro a seguir.

QUADRO 1 – AUTISMO

Idade de Importante para o


Características principais
manifestação diagnóstico diferencial

Prejuízo no desenvolvimento
da interação social e da comu-
nicação. Pode haver atraso ou Prejuízo no funcionamen-
ausência do desenvolvimento to ou atrasos em pelo
da linguagem. Naqueles que a menos 1 das 3 áreas: Inte-
Antes dos 3 anos de
possuem, pode haver uso es- ração social; Linguagem
idade
tereotipado e repetitivo ou uma para comunicação social;
linguagem idiossincrática. Re- Jogos simbólicos ou ima-
pertório restrito de interesses e ginativos.
atividades. Interesse por rotinas
e rituais não funcionais.

FONTE: Belisário Filho e Cunha (2010, p. 13)

82
QUADRO 2 – SÍNDROME DE RETT

Idade de Importante para o


Características principais
manifestação diagnóstico diferencial

Desenvolvimento de múltiplos
déficits específicos após um pe-
ríodo de funcionamento normal
nos primeiros meses de vida.
Desaceleração do crescimen-
to do perímetro cefálico. Perda
das habilidades voluntárias das Primeiras manifesta-
mãos adquiridas anteriormen- ções após os primeiros
Presença de crises con-
te, e posterior desenvolvimen- 6 a 12 meses de vida.
vulsivas. Desaceleração
to de movimentos estereoti- Prejuízos funcionais do
do crescimento do perí-
pados semelhantes a lavar ou desenvolvimento dos
metro cefálico.
torcer as mãos. 6 meses aos primeiros
O interesse social diminui após anos de vida.
os primeiros anos de manifes-
tação do quadro, embora pos-
sa se desenvolver mais tarde.
Prejuízo severo do desenvolvi-
mento da linguagem expressi-
va ou receptiva.

FONTE: Belisário Filho e Cunha (2010, p. 13)

QUADRO 3 – TRANSTORNO DE ASPERGER

Características Importante para o


Idade de manifestação
principais diagnóstico diferencial

Diferentemente do Autismo,
podem não existir atrasos
Tem início mais tardio do clinicamente significativos
Prejuízo persistente na
que o Autismo ou é perce- no desenvolvimento cog-
interação social. Desen-
bido mais tarde (entre 3 e nitivo, na linguagem, nas
volvimento de padrões
5 anos). Atrasos motores habilidades de autoajuda
restritos e repetitivos de
ou falta de destreza mo- apropriadas à idade, no com-
comportamento, inte-
tora podem ser percebidos portamento adaptativo, à ex-
resses e atividades.
antes dos 6 anos. ceção da interação social, e
na curiosidade pelo ambien-
te na infância.

FONTE: Belisário Filho e Cunha (2010, p. 14)

83
QUADRO 4 – TRANSTORNO DESINTEGRATIVO DA INFÂNCIA

Idade de Importante para o


Características principais
manifestação diagnóstico diferencial

Regressão pronunciada em
múltiplas áreas do funciona-
mento, após um desenvolvi-
mento normal constituído de
comunicação verbal e não ver-
bal, relacionamentos sociais,
jogos e comportamento adap-
tativo apropriado para a idade. O transtorno não é melhor
As perdas clinicamente signi- explicado pelo Autismo ou
ficativas das habilidades já ad- Esquizofrenia. Excluídos
Após 2 anos e antes
quiridas em pelo menos duas transtornos metabólicos
dos 10 anos de idade
áreas: linguagem expressi- e condições neurológicas.
va ou receptiva, habilidades Muito raro e muito menos
sociais ou comportamento comum do que o Autismo.
adaptativo, controle intestinal
ou vesical, jogos ou habilida-
des motoras.
Apresentam déficits sociais
e comunicativos e aspectos
comportamentais geralmente
observados no Autismo.

FONTE: Belisário Filho e Cunha (2010, p. 14)

QUADRO 5 – TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO SEM OUTRA ESPECIFICAÇÃO

Características Idade de Importante para o diagnóstico


principais manifestação diferencial

Quando tais características estão


Existe prejuízo severo no
presentes, mas não são satisfeitos
desenvolvimento da inte-
os critérios diagnósticos para um
ração social recíproca ou
Transtorno Global do Desenvol-
de habilidades de comuni-
vimento ou para outros quadros
cação verbal e não verbal
diagnósticos como Esquizofrenia,
ou comportamentos, inte-
Transtorno da Personalidade Es-
resses e atividades este-
quizotípica ou Transtorno da Per-
reotipados.
sonalidade Esquiva.

FONTE: Belisário Filho e Cunha (2010, p. 14)

84
2.1 TRANSTONO GLOBAL DO DESELVOLVIMENTO
NO APRENDER
Tendo em mente que as crianças com TGD não conseguem lidar com mudanças
abruptas, barulho e com pessoas desconhecidas, colocar essas crianças na escola se
torna um local onde todas as coisas que angustiam esses indivíduos acontecem de
uma vez só, assim, se torna claro o grande desafio que esse movimento irá proporcionar.
Muitas dessas crianças, nesse momento de inserção, podem se isolar em resposta à
agonia que estão passando, ou até mesmo ter respostas mais agressivas, porém
isso não deve ser tomado como o comportamento natural da criança. Com isso, fica
perceptível a necessidade de um profissional qualificado para lidar com as crianças com
Transtorno Global de Desenvolvimento, sabendo como lidar com esses momentos e
como compreender o aluno, de forma a auxiliar a criança a integrar o ambiente escolar
e, juntamente, integrar o ambiente escolar a ele, diminuindo o sofrimento do indivíduo
(MAGALHÃES, 2018).

É natural que crianças pequenas, nos ensinos iniciais, muitas vezes ao entrar na
escola têm receio de deixar seus pais, acabam chorando ou até mesmo sendo agressivas
com os professores, pois para pequenas crianças, deixar seus entes queridos e ter uma
mudança da rotina é algo difícil, até mesmo para alguns pais que têm medo de deixar
seus filhos na escola por receio de que não serão bem cuidados, medo de deixar com
pessoas desconhecidas. Essa perspectiva sobre as crianças pequenas fica ainda mais
destacada em crianças com TGD. Então, é de grande importância que nos dias iniciais
da criança na escola seja proporcionado a ela boas experiências, aprendendo a rotina e
a convivência com os outros alunos da forma mais previsível o possível para ela.

Isso deve ser feito, obviamente, sem retirar a naturalidade do ambiente


escolar, mas tendo em mente que a mesma inflexibilidade que torna
tão difíceis as primeiras experiências nesse ambiente poderão
também promover o apego a situações que posteriormente poderão
se tornar indesejáveis. Em outras palavras, é importante, na tentativa
de acolhimento àquela criança, não proporcionar a ela vivências que
não farão parte da sua rotina no futuro. A inflexibilidade e o apego
a rotinas poderão levar a criança a estabelecer rotinas inadequadas
no interior da escola, que causarão dificuldades posteriores para os
profissionais e para a própria criança quando forem reformuladas.
Exemplos disso são os acolhimentos individuais com acesso a
brinquedos que não é dado às demais crianças, horários reduzidos
para adaptação progressiva, permanência separada da turma em
espaços como sala da coordenação ou direção da escola, alimentação
em horário diferente do restante da turma, etc. O cotidiano escolar
possui rituais que se repetem diariamente. A organização da entrada
dos alunos, do deslocamento nos diversos espaços, das rotinas em
sala de aula, do recreio, da organização da turma para a oferta da
merenda, das aulas em espaços diferenciados na escola, da saída
ao final das aulas e outros são exemplos de rituais que se repetem e
que favorecem a apropriação da experiência escolar para a criança
com TGD. Esses rituais escolares proporcionam a todas as crianças
o desenvolvimento de aspectos cognitivos úteis à vivência social,

85
envolvendo antecipação, adiamento da atuação imediata, entre
outros. A diferença é que a necessidade de exercício explícito de
ensino e aprendizagem empreendidos junto à criança com TGD, em
tais situações, torna visível tal processo (BELISÁRIO FILHO; CUNHA,
2012, p. 23).

Teixeira e Coelho (2015) colocam que a dificuldade de aprendizagem é atribu-


ída a alunos por uma perspectiva de viés biológico, em que há falha ou até mesmo a
deficiência biológica de um sujeito. Porém, as instituições de aprendizagem junto com
suas políticas vêm cada vez mais se atualizando, de acordo com avanços tecnológicos,
políticos, econômicos e sociais do país. Ampliando suas funções e atuações com os in-
divíduos, não sendo mais limitada ao atendimento dos alunos e na compreensão de que
aprendizagem que é colocada nesse local se resume às habilidades de leitura e escrita.

3 TRANSTORNOS GLOBAIS DE APRENDIZAGEM


Uma grande demanda de alunos acaba reprovando ou até mesmo evadindo de
suas escolas por apresentarem transtornos de aprendizagem. Este é um assunto, que
muitas vezes, faz-se faltante para os professores, logo se tornando ainda mais fácil de
não compreender esses alunos e de fortalecer essas dificuldades (TULESKI, 2007).

Os transtornos de aprendizagem podem ser tomados como um grupo de sinais,


os quais causa uma série de perturbações no processo de aprender do indivíduo,
ou seja, são causas que interferem no processo que a criança tem sobre adquirir o
conhecimento e sobre como efetuar a manutenção destas informações (GONÇALVES;
CRENITTE, 2016).

Ainda em um contexto geral é importante a compreensão de que estes


Transtornos Gerais da Aprendizagem (TGA) são comumente falados de duas formas,
quando nos referimos ao grupo ou quando diferenciamos eles entre si. Entendendo
melhor isso, podemos compreender a classificação colocada nos transtornos de
aprendizagem como os Transtornos globais de Aprendizagem e os Transtornos
específicos de Aprendizagem.

Neste tópico, iremos compreender os Transtornos Gerais de Aprendizagem,


o qual tem como característica principal afetar todo o resultado cognitivo, ou seja,
o indivíduo com TGA terá dificuldade em todo seu aspecto de desenvolvimento da
aprendizagem em suas respectivas habilidades e em suas desenvolturas relacionadas
aos afetos pessoais e sociais. Tendo em mente que estas habilidades não permanecem
apenas no ambiente escolar, mas sim em sua totalidade, na família, em seus grupos de
afinidade, na comunidade e na sociedade (DIAZ, 2011).

86
Romero (apud COLL et al., 1995) coloca o TGA como um atraso maturativo, dessa
forma, oportunizando e criando atrasos no processo de aprendizagem da criança, tendo
assim uma característica grave para a criança. O autor ressalta que elas também podem
ser advindas de lesões ou algum tipo de dano ao cérebro.

Outras pesquisas que também estudaram o TGA trazem resultados em homo-
geneidade, os quais podem ser utilizados para trazer mais clareza às características
do TGA (TORRES et al. 1990). Os quadros a seguir representam as características da
constituição do TGA.

QUADRO 6 – CARACTERÍSTICAS GERAIS DO TGA

Características dos atrasos maturativos psicológicos

Um desenvolvimento psicológico (cognitivo) com determinado


A ritmo, cuja curva de crescimento não se modifica facilmente com
a experiência, nem com a aprendizagem propriamente dita.

Progressões de desenvolvimento (aprendizagem) espontâneas,


B uniformes e invariáveis onde o entorno modula e modifica, porém
não as determina, nem as gera.

Um ritmo da lentidão diferente em cada criança, dependentes de


C fatores genéticos e, inclusive, pré e perinatais relacionados com
gestação e parto, respectivamente.

Uma natureza cognitiva e evolutiva, onde os atrasos são


D essencialmente na cognição e estão presentes antes de iniciar
as aprendizagens.

Do ponto de vista psicométrico, seus resultados não são muito


E
diferentes aos de crianças sem deficiências na aprendizagem.

FONTE: Diaz (2011, p. 278)

QUADRO 7 – CARACTERÍSTICAS DO TGA

Incapacidade para seguir o ritmo da aprendizagem dos colegas


1
em sala de aula.

2 Insuficiente desenvolvimento dos processos cognoscitivos.

3 Imaturidade da esfera afetiva.

87
4 Possível disfunção do sistema nervoso.

5 Associação a condições desfavoráveis de vida e/ou educação.

6 Capacidade potencial para a aprendizagem.

FONTE: Torres (apud DIAZ, 2011, p. 278)

QUADRO 8 – CARACTERÍSTICAS ESPECÍFICAS DO TGA

Dificuldade
Oscilação da Impulsividade
Déficit da atenção da abstração-
memória emocional
generalização

Negativismo Instabilidade Pensamento de


Distração
comportamental emocional manipulação

Pobre
Déficit na autorregulação
Déficit na expressão Imprecisão
seletividade (na atenção,
verbal sensoperceptual
sensoperceptual emoções e
comportamentos).

Hiperatividade ou Agressividade ou Memória verbal


Vocabulário pobre
hipoatividade timidez diminuída

Astenia (de
Pobre autocontrole Apatia
Incongruência aparição rápida ou
emocional (choro, (desinteresse,
afetiva tardia, com curso
riso, crises em geral) desmotivação)
progressivo)

Baixa capacidade Pouca


de trabalho independência
(de atividade) em geral (à maior
associada à frustração, maior
astenia dependência)

FONTE: Diaz (2011, p. 279)

Com isso é possível perceber características específicas marcantes, como


uma lentidão generalizada, individual e transitória no desenvolvimento, se referindo
especificamente à esfera cognitiva, de forma fundamental, porém também pode afetar
a esfera afetiva. Esse transtorno se manifesta exatamente da mesma forma, como uma
lentidão generalizada, individual e transitória do ritmo de aprendizagem (DIAZ, 2011).

88
Diaz ainda destaca:

Destaco que seu caráter generalizado decorre, como já foi dito, da


afetação que se produz em toda a atividade cognitiva e que sustenta
o aprender matizando toda sua aprendizagem; assim, este menor tem
dificuldade para aprender a montar bicicleta, para desenhar e colorir,
para jogar futebol e xadrez, para aprender determinadas normas
de conduta, para aprender a ler, escrever e calcular, para aprender
conceitos etc., embora – e isto é importante – quando consegue
aprender, seus aprendizados não diferem muito dos aprendizados
ditos “normais”. Quanto a seu caráter individual, deve-se a que a
lentidão no ritmo da aprendizagem é peculiar a cada criança ou aluno,
segundo sua experiência pessoal e a estrutura de sua personalidade,
como resultado da integração interno-biológica e psicológica – e
externa – social e educativa – (heterogeneidade) encontrando
então que ademais todos os menores com TGA apresentam iguais
características – lentidão – (homogeneidade), alguns serão mais
lentos e outros menos lentos para aprender. (DIAZ, 2011, p. 280).

Alunos que apresentam as características de Transtornos Gerais de Aprendi-


zagem possuem uma diferença de maturação com uma diferença aproximada de 2 a
4 anos, em média, em relação a outras crianças que não apresentam esse transtor-
no. Ainda é importante perceber que essas diferenças em relação à idade dependem
do atraso neuropsicológico, ou em relação ao desenvolvimento propriamente de sua
conduta, mas que com o seu desenvolver, ou podemos colocar, com a melhora de seu
próprio quadro de desenvolvimento de aprendizagem, a desigualdade deste processo
deve reduzir de forma gradual até se tornarem imperceptíveis, com maior destaque
ainda na adolescência (ROMERO apud COLL et al., 2004).

INDICAÇÃO DE FILME

89
Como estrelas na terra: O jovem Ishaan tem muita dificuldade para se
concentrar nos estudos e mal consegue escrever o alfabeto. Depois de
diversas reclamações da escola, o pai, que acredita que Ishaan não faz as
tarefas por falta de compromisso, decide levá-lo a um internato, o que leva
o menino a entrar em depressão. Mas, um professor substituto de artes,
Nikumbh, logo percebe o problema de Ishaan, e entra em ação com seu
plano para devolver a ele a vontade de aprender e, sobretudo, viver.

Outros autores, como Torres (1990), colocam a causa do TGA como a lentidão
maturativa do sistema nervoso e que tem principal relação com agentes genéticos que
são inatos ou podem ser adquiridos de alguma forma no decorrer do desenvolvimento da
criança e isso é o que atrapalha a evolução da criança em seu processo de maturidade.

Percebendo então que o atraso dessa maturidade é algo marcante dentro do


Transtorno Geral de Aprendizagem, Diaz (2011, p. 282) apresenta alguns fatores que
provocam este acontecimento.

Entre os fatores que podem provocar este descompasso maturativo,


temos fatores de tipo constitucional (por exemplo, enfermidades
somáticas crônicas que afetam estrutural ou funcionalmente
o tecido nervoso), de tipo psicossocial (por exemplo, privações
sensoriais, afetivas e/ou sociais nos primeiros meses de vida que
freiam o desenvolvimento maturativo por falta de estimulação) e/ou
de tipo lesional (por exemplo, lesões particulares inatas ou adquiridas
que só afetam a maturidade nervosa) as quais retardam a associação
funcional (estrutural e/ou bioquímica) das sinapses neuronais
afetando principalmente o impulso nervoso quanto à velocidade de
resposta e, portanto, repercutindo no ritmo de aprendizagem que
também será lento.

Por fim, ainda se torna importante destacar que o diagnóstico desse transtorno
tem grande frequência entre as idades de 7 a 9 anos, correspondendo às séries iniciais
da educação. Também é importante destacar que na literatura se torna muito mais fácil
encontrar conteúdo sobre os transtornos específicos de aprendizagem do que sobre
os Transtornos Gerais. Esse fato pode acontecer quando estamos cientes de que, ao
falar de transtornos específicos, estes são muito mais fáceis de serem diagnosticados e
percebidos do que quando falamos de Transtornos Gerais (DIAZ, 2011).

Ainda é perceptível que o diagnóstico do TGA acontece em sua maioria de


forma tardia, em que só é reconhecida já em anos escolares, porém com atenção e
cuidado, ele pode ser diagnosticado ainda mais cedo, aproximadamente pela faixa de
6 a 7 anos, focando em características como o retardo da motricidade, a percepção,
a sua linguagem e até mesmo a sua afetividade. Desta forma, a atenção em leves
retardos nestas áreas pode ser um aspecto de alerta em que o desenvolvimento da
criança pode ser acompanhado. Sem esperar por manifestações maiores deste atraso,
a criança já pode ter os devidos estímulos para as capacidades afetadas da criança,
complementando e auxiliando o desenvolvimento dela (DIAZ, 2011).

90
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Não a muito tempo, podemos recordar que a visão da pessoa com deficiência era de
uma pessoa louca, doente e incapaz, dessa forma, sendo excluída da sociedade e de
todo convívio social, mas essa visão já passou por grandes mudanças.

• Foi através da atualização das políticas e diretrizes que o Brasil fez seu caminho para
a melhor inserção dessas pessoas na sociedade.

• A deficiência é um fenômeno construído socialmente, pensando assim, se transforma


em dever a sociedade se movimentar em direção à igualdade.

• Os Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) são aqueles que se referem a um


grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, sendo assim, são os transtornos
que afetam o desenvolvimento de uma criança, em que eles são apresentados no in-
divíduo de forma precoce, podendo se apresentar até mesmo antes da idade escolar.

• Transtornos Globais do Desenvolvimento se caracterizam através das diferentes e


diversas áreas que atingem o desenvolvimento da criança.

• Os transtornos que se enquadram dentro do TGD possuem muitas características


específicas que podem ser compartilhadas, ou seja, podem ser encontradas em
outros transtornos pertencentes a esse quando.

• Os transtornos que se enquadram no TGD são: Síndrome do Espectro Autismo (os


quais se adentram em síndrome de Asperger, Síndrome de Rett e Autismo), Transtorno
Desintegrativo da Infância, Transtornos Invasivos sem outra especificação.

• Os Transtornos Globais de Aprendizagem são uma das grandes causas de evasão e


reprovação de alunos.

• O TGA é um atraso maturativo, dessa forma, oportunizando e criando atrasos no


processo de aprendizagem da criança, tendo uma característica grave para a criança.

• É possível perceber características específicas marcantes no TGA, como uma


lentidão generalizada, individual e transitória no desenvolvimento, se referindo
especificamente à esfera cognitiva, de forma fundamental, porém também pode
afetar a esfera afetiva.

• É comum que o diagnóstico de TGA seja feito de forma tardia, porém é possível fazer
esse diagnóstico com antecedência prestando atenção já nos primeiros sinais de atraso.

91
AUTOATIVIDADE
1 Existem alguns transtornos que se enquadram no quadro do TGD, pois apresentam
grave comprometimento no desenvolvimento do indivíduo (APA, 2014). Os Transtornos
Globais de Desenvolvimento (TGD) são aqueles que se referem a um grupo de
transtornos do neurodesenvolvimento, sendo assim, são os transtornos que afetam
o desenvolvimento de uma criança, em que eles são apresentados no indivíduo de
forma precoce, podendo se apresentar até mesmo antes da idade escolar. Tendo isso
em mente, analise as sentenças a seguir e classifique V para verdadeiro e F para falso,
referente ao TGD.

FONTE: APA – American Psychiatric Association. DSM-V: manual diagnóstico e estatístico de transtornos
mentais. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

( ) Com seu desenvolvimento neuropsicomotor afetado, ela pode comprometer as


mais diversas áreas da sua vida, como suas relações sociais, sua comunicação,
causando até mesmo estereotipias motoras.
( ) O prejuízo desses indivíduos em suas capacidades são qualitativos e definem as
condições de forma atípica quando se trata do nível de desenvolvimento mental da
criança.
( ) São causas que interferem no processo que a criança tem sobre adquirir o
conhecimento e sobre como efetuar a manutenção destas informações
( ) Terá dificuldade em todo seu aspecto, suas respectivas habilidades e em suas
desenvolturas relacionados aos afetos pessoais e sociais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – V – F – V.
b) ( ) F – V – F – V.
c) ( ) V – V – F – F.
d) ( ) F – F – V – V.

2 Uma grande demanda de alunos acaba reprovando ou até mesmo evadindo de suas
escolas por apresentarem transtornos de aprendizagem. Este é um assunto, que
muitas vezes, faz-se faltante para os professores, logo, se tornando ainda mais fácil
de não compreender esses alunos e de fortalecer essas dificuldades (TULESKI, 2007).
Analise as sentenças a seguir e classifique V para verdadeiro e F para falso referente
ao TGA.

FONTE: TULESKI S. C. Eidt N. Repensando os distúrbios de aprendizagem a partir da psicologia


históricocultural. Psicol. estud., v. 12, n. 3, p. 531-40, 2007.

92
( ) O TGA pode ser colocado como um atraso maturativo, dessa forma, oportunizando
e criando atrasos no processo de aprendizagem da criança.
( ) Lentidão maturativa do sistema nervoso e que essa relação tem principal relação
com agentes genéticos que são inatos ou podem ser adquiridos de alguma forma
no decorrer do desenvolvimento da criança.
( ) O prejuízo desses indivíduos em suas capacidades são qualitativos e definem as
condições de forma atípica quando se trata do nível de desenvolvimento mental da
criança.
( ) Percebendo a deficiência como a perda de uma ou mais funções do indivíduo,
sendo elas físicas, psicológicas ou sensoriais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F – V – F – V.
b) ( ) V – F – F – V.
c) ( ) V – V – F – F.
d) ( ) F – V – V – V.

3 Tendo em mente os aspectos já apresentados sobre o Transtorno Global de


Desenvolvimento, existem alguns grupos que são caracterizados dentro do TGD,
como: Síndrome do Espectro Autismo (os quais se adentram em síndrome de Asperger,
Síndrome de Rett e Autismo), Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtornos
Invasivos sem outra especificação. A seguir, relacione alguns transtornos com suas
características.

I- Autismo
II- Síndrome de Rett
III- Transtorno de Asperger
IV- Transtorno Desintegrativo da Infância

( ) As perdas clinicamente significativas das habilidades já adquiridas em pelo menos


duas áreas: linguagem expressiva ou receptiva, habilidades sociais ou comporta-
mento adaptativo, controle intestinal ou vesical, jogos ou habilidades motoras.
( ) Primeiras manifestações após os primeiros 6 a 12 meses de vida. Prejuízos
funcionais do desenvolvimento dos 6 meses aos primeiros anos de vida.
( ) Prejuízo no funcionamento ou atrasos em pelo menos uma das três áreas: Interação
social; Linguagem para comunicação social; Jogos simbólicos ou imaginativos.
( ) Prejuízo persistente na interação social. Desenvolvimento de padrões restritos e
repetitivos de comportamento, interesses e atividades.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) II – I – IV – III.
b) ( ) I – II – III – IV.
c) ( ) III – IV – I – II.
d) ( ) IV – II – I – III.

93
4 Os Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) são aqueles que se referem a um
grupo de transtornos do neurodesenvolvimento, sendo assim, são os transtornos
que afetam o desenvolvimento de uma criança, em que eles são apresentados
no indivíduo de forma precoce, podendo se apresentar até mesmo antes da idade
escolar. Disserte sobre os transtornos que fazem parte do TGD.

5 Os transtornos de aprendizagem podem ser tomados como um grupo de sinais, os


quais causam uma série de perturbações no processo de aprender do indivíduo,
ou seja, são causas que interferem no processo que a criança tem sobre adquirir o
conhecimento e sobre como efetuar a manutenção destas informações (GONÇALVES;
CRENITTE, 2016). Disserte sobre o TGA.

FONTE: GONÇALVES, T. S.; CRENITTE, P. A. P. Concepções de professoras de ensino fundamental sobre os


transtornos de aprendizagem. Rev. CEFAC, v. 16, n. 3, p. 817-829, 2014.

94
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
TRANSTORNO GLOBAL
DO DESENVOLVIMENTO (TGD)
E ESCOLARIZAÇÃO DESTES ALUNOS

1 INTRODUÇÃO
A expressão autismo foi utilizada pela primeira vez por Bleuler em 1911, para
designar a perda do contato com a realidade, o que acarretava uma grande dificuldade
ou impossibilidade de comunicação. Kanner, em 1943, usou a expressão autismo na
descrição de 11 crianças que apresentavam em comum comportamentos bastante
originais. Kanner sugeriu que se tratava de uma inabilidade inata para estabelecer com
outras pessoas contato afetivo e interpessoal e que era uma síndrome bastante rara,
porém, provavelmente, mais frequente do que o esperado, pelo pequeno número de
casos diagnosticados. Em 1944, Asperger descreveu casos em que havia algumas
características semelhantes ao autismo em relação às dificuldades de comunicação
social em crianças com inteligência normal (BRAGA JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

As observações feitas por Kanner com as 11 crianças e as observações feitas


por Asperger apresentam semelhanças e diferenças. No que conta às diferenças, é
interessante apresentar que Asperger se intrigava com o aspecto educacional dessas
crianças, já para Kanner, esta preocupação não era tão importante nos seus estudos.
As diferenças entre as crianças observadas, pelos dois estudiosos, são evidentes,
principalmente no desenvolvimento da comunicação e da linguagem. Através dessas
diferenças se caracterizaram quadros distintos, com o autismo e o transtorno de
Asperger. Casos de transtornos do desenvolvimento humano vêm sendo estudados pela
ciência há quase oito décadas, sobre os quais ainda permanecem grandes questões e
divergências para poder responder a muitas das dúvidas relacionadas (BRAGA JUNIOR;
BELCHIOR; SANTOS, 2015).

Para começarmos a conhecer os Transtornos Globais do Desenvolvimento


(TGDs), precisamos saber como eles se compõem enquanto categoria diagnóstica.
Isso porque pertencem aos TGDs outras cinco subcategorias diagnósticas, descritas
pelo DSM-IV, que veremos a seguir (SCHMIDT, 2010). Os Transtornos Globais do
Desenvolvimento são uma categoria diagnóstica que inclui um grupo de outros
transtornos caracterizados no DSM-IV. Esses outros transtornos estão incluídos
nos TGDs porque todos apresentam sintomas em comum, ou seja, o prejuízo severo
e invasivo em diversas habilidades de interação social recíproca, nas habilidades de
comunicação e a presença de comportamento, interesses e atividades estereotipados.
Essas três características caracterizam os TGDs. Nessa classificação, estão incluídas
cinco categorias diagnósticas:

95
• Transtorno Autista.
• Transtorno de Rett.
• Transtorno Desintegrativo da Infância.
• Transtorno de Asperger.
• Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra Especificação.

Faz-se importante buscar informações e qualificações para atender a esses


indivíduos alunados, para não lhes negar um direito inquestionável, esta é uma
determinação legal inserida na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência/ou
Estatuto da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015).

Art. 4o Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de


oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma
espécie de discriminação. § 1o Considera-se discriminação em razão
da deficiência toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por
ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar,
impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e
das liberdades fundamentais de pessoa com deficiência, incluindo
a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias
assistivas (BRASIL, 2015, s.p).

2 TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO:


DO QUE SE TRATA?
A percepção de alterações de comportamentos, considerados incomuns aos
comportamentos socialmente permitidos, são relatados desde a Antiguidade, podendo
estes comportamentos estarem associados ao autismo, caso evidenciados por
comportamentos de retração pessoal, com características específicas de dificuldades
na comunicação e na interação social e ações restritivo-repetitivas (OLIVEIRA, 2014).

O psiquiatra suíço, Èugene Bleuler, em 1911, utilizou o termo “autismo” para
descrever pacientes que apresentavam características com particularidades de
dificuldades na interação com a realidade, na comunicação e nas relações pessoais
(BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010). Já a primeira descrição formal de Autismo Infantil,
de acordo com Perissinoto (2003), foi feita por Kanner, em 1943, na condução de um
estudo com crianças que apresentavam um comportamento típico que enfatizava
seu isolamento social. Depois disso, vários outros autores publicaram estudos sobre
crianças que apresentavam o mesmo tipo de comportamento ou contendo pequenas
diferenças no quadro geral, por exemplo, Asperger (1944) e Wing (1981). Ainda de acordo
com Perissinoto (2003), a partir de 1989, a Associação Americana de Psiquiatria (APA)
propôs a identificação do Autismo como um grave distúrbio do desenvolvimento que
compromete várias áreas.

96
Klin (2006) descreve que na sequência das publicações de Kanner, em 1943,
surgiram as contribuições referentes às pesquisas de Hans Asperger, colaborando
com a percepção denominada como psicopatia autística, diferenciando a partir do
estudo do déficit intelectual, a Síndrome do Autismo. O autor relata que a Síndrome de
Asperger se trata de uma alteração na personalidade, em que as crianças apresentavam
comprometimento nos relacionamentos interpessoais e na comunicação não verbal,
contudo mantinham as habilidades intelectuais preservadas.

As semelhanças entre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e a Síndrome de


Asperger foram unificadas a esses termos e renomeados como Transtornos Invasivos
do Desenvolvimento (TID), caracterizados como uma família de condições marcada
pelo início precoce de atrasos e desvios no desenvolvimento das habilidades sociais,
comunicativas e demais habilidades (KLIN, 2006).

Atualmente, na 5ª edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos


Mentais – Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM), em 2013,
propôs a eliminação das categorias devido às características semelhantes e unificação
dos termos para compreender melhor os transtornos e orientar medidas terapêuticas
para os pacientes, como os termos Transtorno Autista, Transtorno Desintegrativo da
Infância, Transtorno de Asperger e Transtorno Invasivo do Desenvolvimento Sem Outra
Especificação (TID-SOE). Em substituição às definições anteriores, adotou-se partir
de então, o termo Transtorno do Espectro Autista (TEA) (BRAGA JUNIOR; BELCHIOR;
SANTOS, 2015).

São diversos os campos de estudos sobre o TEA. Segundo Paula et al. (2017), se
destacam aqueles desenvolvidos sob o escopo das Ciências da Saúde – com princípios
na genética ou na neurologia, pesquisas sobre as causas orgânicas e tratamentos com
medicamentos, e pela psicologia – com abordagens comportamentalistas, pautada na
análise experimental do comportamento nos estudos da aprendizagem, cognitivistas
que investigam como o transtorno afeta o comportamento e as interações sociais, e a
psicanalítica expressa a reflexão do outro visando à subjetivação, sendo utilizado como
terapia, o ambiente escolar. Diante da perspectiva cognitiva e psicanalítica, Oliveira
(2014) descreve que para o autista, o ato de ir à escola, frequentar este ambiente
social pode, a partir dessa inserção escolar, ser possível uma retomada e reorganização
da estrutura psíquica deste sujeito.

Embora a classificação e as nomenclaturas para o Transtorno Global do


Desenvolvimento possam variar de acordo com a área de atuação do profissional, ou
até dentro da mesma área, geralmente o diagnóstico é efetuado por um profissional da
área médica (neurologista, psiquiatra, pediatra, entre outros) a partir de uma concepção
clínica que toma por base as manifestações orgânicas e/ou comportamentais. Ou seja,
o foco acaba sendo aquilo que essas crianças não fazem: não falam, não olham, não
interagem socialmente (PAULA et al., 2017).

97
2.1 TGD NA VISÃO DA CID-10 E DO DSM-IV
Os Transtornos Globais do Desenvolvimento caracterizam-se por um compro-
metimento grave e global em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de inte-
ração social, habilidades de comunicação ou presença de estereótipos de comporta-
mento, interesses e atividades. Os prejuízos qualitativos que definem essas condições
representam um desvio acentuado em relação ao nível de desenvolvimento ou idade
mental do indivíduo (APA, 2002).

Esses transtornos, em geral, se manifestam nos primeiros anos de vida da


criança e, frequentemente, estão associados a algum grau de comprometimento in-
telectual e características descritivas, podendo haver anormalidades no desenvolvi-
mento das habilidades cognitivas. Ao longo do seu processo evolutivo, a criança pode
deixar-se envolver passivamente em interações sociais, mesmo nesses casos, elas
podem tratar as pessoas de maneira incomum. Os índices do transtorno são quatro
a cinco vezes superiores para o sexo masculino. As meninas com o transtorno estão
mais propensas a apresentar comprometimento mental mais grave (BRAGA JUNIOR;
BELCHIOR; SANTOS, 2015).

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças – 10ª Revisão (CID-


10), elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), ou o Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (APA, 2002), elaborado pela Associação de Psiquiatria
Americana (APA), encontram-se incluídas na categoria Pessoas com Necessidades
Especiais aquelas que apresentam deficiências físicas, visuais, auditivas, síndromes e
comprometimentos neurológicos (Síndrome de Down, Paralisia Cerebral etc.) e distúrbios
de comportamento (dificuldades de socialização, déficits de percepção, limitações no
campo cognitivo, distúrbios psiquiátricos, entre outros).

De acordo com a APA (2002), os Transtornos Globais do Desenvolvimento


(TGD) englobam os transtornos caracterizados por grave comprometimento em
inúmeras áreas do desenvolvimento. Esse grupo de transtornos é caracterizado por
severas anormalidades nas interações sociais recíprocas, nos padrões de comunicação
estereotipados e repetitivos, além de um estreitamento nos interesses e atividades
da criança. Geralmente, os sintomas se manifestam desde a primeira infância, e são
frequentemente associados a algum grau de Retardo Mental.

A criança que recebe o diagnóstico médico de Transtorno Global do Desenvolvi-


mento (TGD) está incluída em uma categoria que engloba diversos quadros compostos
pelo autismo e outros transtornos que estão associados a este espectro, tais como:
Transtorno de Rett; Transtorno Desintegrativo da Infância; Transtorno de Asperger e
Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação; além de estarem in-
cluídas outras nomenclaturas referentes ao autismo, como: autismo infantil precoce,
autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico
(APA, 2002).

98
Ainda de acordo com a APA (2002), nesses casos, o desenvolvimento se
encontra acentuadamente anormal ou prejudicado em três áreas principais: repertório
restrito de atividades e interesses, interação social e comunicação. No que se refere
à interação social, o prejuízo é considerado amplo e persistente, marcado por vários
comportamentos não verbais, como a não manutenção de contato visual direto,
expressão facial pobre, posturas e gestos corporais não condizentes com a ação
realizada. Essas manifestações contribuem, fundamentalmente, para a dificuldade de
desenvolver relacionamentos, compartilhar interesses, participar de jogos e brincadeiras
sociais. As brincadeiras, jogos de imitação ou rotinas da infância também tendem a
aparecer fora de contexto ou de um modo mecânico.

Quanto à comunicação, o APA (2002) alerta para a possibilidade de alterações


nas habilidades comunicativas verbais e não verbais, tanto nos aspectos expressivos
quanto nos receptivos. O prejuízo pode variar da falta total de desenvolvimento da
linguagem oral até o uso estereotipado e repetitivo da linguagem com comprometimento
acentuado na capacidade de iniciar ou manter uma conversação. Além disso, o timbre,
a velocidade, o ritmo ou a ênfase da fala pode estar comprometido, contribuindo,
também, para o prejuízo da atividade dialógica. O emprego de estruturas gramaticais
simples e o uso estereotipado e repetitivo de emissões (ecolalia), bem como a presença
de uma linguagem metafórica que só é compreendida, por exemplo, pela família,
marcam outras possíveis alterações de linguagem. Nos aspectos receptivos observa-se
nítida dificuldade no entendimento de perguntas, orientações ou piadas simples que se
agravam quanto mais abstrato for o conteúdo da emissão do interlocutor.

No que tange ao repertório restrito de interesses e atividades, podem ser


observados padrões estereotipados com foco de interesse anormal; por exemplo,
abrir e fechar uma porta ou acender e apagar a luz, adesão inflexível a rotinas e rituais
específicos e não funcionais, como percorrer exatamente o mesmo caminho para a
escola, preocupação persistente com partes de objetos como rodinhas de brinquedos
ou botões, comportamentos motores repetitivos, como bater palmas, estalar dedos,
balançar-se e alterações da postura corporal, como andar na ponta dos pés (APA, 2002).

Ainda de acordo com a APA (2002), para o diagnóstico de Transtorno Global


do Desenvolvimento (TGD), as manifestações clínicas nas áreas de interação social,
comunicação e repertório restrito de interesses e atividades presentes nas crianças
devem ocorrer antes do terceiro ano de vida. Cabe ressaltar, entretanto, que o quadro
não envolve todas as áreas do comportamento na mesma proporção.

Atualmente, o DSM-V absorveu esses transtornos em um único diagnóstico –


Transtornos do Espectro Autista. Na DSM-V da APA (2014), indivíduos com um diagnóstico
do DSM-IV estabelecido de Transtorno Autista, Transtorno de Asperger ou Transtorno
Global do Desenvolvimento sem outra especificação devem receber o diagnóstico de
Transtorno do Espectro Autista. Indivíduos com déficits acentuados na comunicação
social, cujos sintomas, porém, não atendam de outra forma, critérios de Transtorno do

99
Espectro Autista devem ser diagnosticados como transtorno da Comunicação Social,
da Linguagem e da Fluência, dependendo de suas características específicas (BRAGA
JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

O Transtorno do Espectro Autista, segundo a Lei de nº 12.764, de 27 de


dezembro de 2012 é considerado como deficiência para todos os efeitos legais. E suas
manifestações comportamentais o definem e incluem déficits qualitativos na interação
social e na comunicação, padrões de comportamento repetitivos e estereotipados e
um repertório restrito de interesses e atividades. A grande variabilidade no grau de
habilidades sociais e de comunicação e nos padrões de comportamento que ocorrem
em pessoas com Transtornos do Espectro Autista tornou mais apropriado o uso do
termo Transtornos Globais (invasivo) do Desenvolvimento – TGD (BRASIL, 2012).

2.2 OS TGD DO PONTO DE VISTA BIOMÉDICO


Segundo critérios de diagnóstico médico, os TGD abarcam vários transtornos,
sendo eles:

• Transtorno Autista.
• Transtorno de Rett.
• Transtorno Desintegrativo da Infância.
• Transtorno de Asperger.
• Transtorno Global Sem Outra Especificação.

Eles poderão estar ou não acompanhados de deficiência intelectual. A


compreensão dos transtornos envolvendo o TGD, a partir das funções envolvidas no
desenvolvimento, orientam para uma abordagem tanto clínica quanto educacional,
bastante inovadoras, além de contribuir para a compreensão dessas funções no
desenvolvimento de todas as crianças (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010).

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais –


DSM-IV utilizado inclusive pelos documentos do MEC como referência para descrevê-los,
todos os transtornos apresentam em comum a tríade composta por “comprometimento
grave e global em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de interação social
recíproca, habilidades de comunicação ou presença de estereotipias de comportamento,
interesses e atividades” (APA, 2002, p. 98).

Os quadros a seguir foram retirados do documento do Ministério da Educação


Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: transtornos globais do desen-
volvimento, escrito por Belisário Filho e Cunha (2010), que foi elaborado em conjunto
com a Universidade Federal do Ceará.

100
INDICAÇÃO DE LEITURA
Caro acadêmico, para aprofundar o seu conhecimento no assunto,
sugerimos a leitura da seguinte cartilha: Transtorno Globais do
Desenvolvimento, de Schmidt, de 2010, que pode ser acessada pelo link:
https://bit.ly/37szWd7.

• Transtorno de Rett

O Transtorno de Rett ou Síndrome de Rett, descrita em 1966 pelo neurologista


Andréas Rett, é uma doença neurológica provocada por uma mutação genética que
atinge, na maioria dos casos, crianças do sexo feminino. Caracteriza-se pela perda
progressiva de funções neurológicas e motoras após meses de desenvolvimento
aparentemente normal. Dos 6 aos 18 meses de vida ocorre a estagnação do
desenvolvimento, desaceleração do crescimento do perímetro cefálico e tendência ao
isolamento social (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010; SCHMIDT, 2010; BRAGA JUNIOR;
BELCHIOR; SANTOS, 2015).

É uma doença progressiva e evolutiva em que a criança vai diminuindo sua


ação no mundo, as habilidades de fala, capacidade de andar e o controle do uso das
mãos começam a regredir, sendo substituídos por movimentos estereotipados, invo-
luntários ou repetitivos, perde a marcha, necessita de ajuda intermitente para hábitos
diários. Em relação aos outros TGD é a menos estudada, em função da perda de sua
autonomia e habilidades e sua inserção na instituição regular, geralmente requer um
acompanhante diariamente (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010; SCHMIDT, 2010; BRAGA
JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

QUADRO 9 – TRANSTORNO DE RETT

FONTE: Adaptado de Belisário Filho e Cunha (2010)

101
• Transtorno Desintegrativo da Infância

O Transtorno Desintegrativo da Infância foi descrito pela primeira vez pelo Dr.
Theodore Heller em 1908, muitos anos antes do primeiro diagnóstico de autismo. É por
isso que também é chamado de síndrome de Heller, é um transtorno extremamente
raro, caracterizado por seu início tardio e tem um padrão distinto de regressão em
múltiplas áreas do funcionamento que sobrevém a um período de pelo menos dois anos
de desenvolvimento normal. No entanto, por volta dos três ou quatro anos, perdem
repentinamente as habilidades adquiridas, que causa atrasos no desenvolvimento de
habilidades motoras, funções sociais, linguagem e habilidades sociais. Nesse transtorno,
não há deterioração continuada; após a regressão inicial, chega-se a um estado
estável, mas com grande impacto durante toda a vida (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010;
SCHMIDT, 2010; BRAGA JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

QUADRO 10 – TRANSTORNO DESINTEGRATIVO DA INFÂNCIA

FONTE: Adaptado de Belisário Filho e Cunha (2010)

• Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação

Esta é uma categoria diagnóstica de exclusão. Quando há um comprometimento


grave e global do desenvolvimento da interação social recíproca ou de habilidades
de comunicação, tanto verbal quanto não verbal, ou quando existem estereotipias
de comportamentos, atividades e interesses, mas não em intensidade ou frequência
suficientes para enquadrar o transtorno em nem um Transtorno Global do Desenvolvimento
específico, entende-se que existe um transtorno global do desenvolvimento sem outra
especificação. Pode-se considerar também pessoas que possuam menos do que seis
sintomas no total requerido para o diagnóstico do autismo ou idade de início maior
do que 36 meses (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010; SCHMIDT, 2010; BRAGA JUNIOR;
BELCHIOR; SANTOS, 2015).

102
QUADRO 11 – TRANSTORNO GLOBAL DO DESENVOLVIMENTO SEM OUTRA ESPECIFICAÇÃO

FONTE: Adaptado de Belisário Filho e Cunha (2010)

• Transtorno Autista

Na década de 1940, Léo Kanner dedicou-se a estudar detidamente 11 crianças


que apresentavam características diferentes de tudo visto até então, encontrando
comprometimento fundamental na incapacidade para relacionamentos com pessoas
e situações, desde o início da vida. Em 1943, publicou seu trabalho Distúrbio Autístico
do Contato Afetivo, no qual apresentava as principais características dessas 11
crianças estudadas:

• Ausência de movimento antecipatório.


• Dificuldades para aconchegar-se ao colo.
• Descontextualização no uso de palavras.
• Ecolalia (imediata e tardia).
• Inversão pronominal.
• Distúrbios na alimentação.
• Atividades e movimentos repetitivos.
• Resistência à mudança.
• Limitação da atividade espontânea (SCHMIDT, 2010).

Um marco importante na classificação do transtorno autista ocorreu em 1979,


quando o psiquiatra inglês, Michael Rutter, propôs uma definição do autismo com base
em quatro critérios que avançou os conceitos da época, sendo eles:

• Atraso e desvio sociais não só como função de retardo mental.


• Problemas de comunicação, novamente, não só em função de retardo mental associado.
• Comportamentos incomuns, tais como movimentos estereotipados e maneirismos.
• Início antes dos 30 meses de idade (SCHMIDT, 2010).

O transtorno autista é uma condição que se manifesta de forma universal em


qualquer região geográfica, independentemente de raça, etnia, classe social ou cultural.
O transtorno autista costuma aparecer progressivamente, porém observa-se melhor
seus traços por volta dos 2 a 3 anos de vida. As manifestações do transtorno na primeira

103
infância são mais sutis e mais difíceis de definir do que observar após os 2 anos de idade
da criança. O transtorno autista é mais comum nos meninos, com uma proporção de
três meninos para cada menina afetada. Quanto mais cedo se descobrir, mais recursos
poderão usar para estimular a criança (COHEN; MARCELLI, 2010; SCHMIDT, 2010).

O autismo se caracteriza pela presença de um desenvolvimento acentuada-


mente prejudicado na interação social e comunicação, além de um repertório marcan-
temente restrito de atividades e interesses. As manifestações desse transtorno variam
imensamente a depender do nível de desenvolvimento e idade (BELISÁRIO FILHO;
CUNHA, 2010; SCHMIDT, 2010).

Os prejuízos na interação social são amplos, podendo haver também prejuízos


nos comportamentos não verbais, como o contato visual direto, expressão facial, gestos
corporais, que regulam a interação social. Também pode-se observar dificuldades na
espontaneidade, imitação e jogos sociais, bem como uma inabilidade em desenvolver
amizade com seus companheiros. As crianças com autismo podem ignorar outras
crianças e não compreender as necessidades delas (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010;
SCHMIDT, 2010).

Os prejuízos na comunicação também são marcantes e podem afetar


habilidades verbais e não verbais. Pode haver atraso ou falta total de desenvolvimento
da linguagem falada, uso estereotipado e repetitivo da linguagem. Quando a fala
chega a se desenvolver, pode existir prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma
conversação, ou uma linguagem idiossincrática (uso peculiar de palavras ou frases não
possibilitando entender o significado do que está sendo dito), o timbre, a entonação, a
velocidade, o ritmo ou a ênfase podem ser anormais, por exemplo, o tom de voz pode ser
monótono ou elevar-se de modo interrogativo ao final de frases afirmativas (BELISÁRIO
FILHO; CUNHA, 2010; SCHMIDT, 2010).

O terceiro item da tríade de comportamentos refere-se aos padrões restritos,


repetitivos e estereotipados de comportamentos, interesses e atividades. Estes podem
ser manifestados através do interesse por rotinas ou rituais não funcionais ou uma
insistência irracional em seguir rotinas, e pela preocupação persistente com partes
de objetos como botões e partes do corpo. Também pode haver uma fascinação
por movimento em geral, por exemplo, as rodinhas dos brinquedos em movimento,
ventiladores ou outros objetos com movimento giratório rápido, o abrir e fechar de
portas. O indivíduo também pode apegar-se intensamente a algum objeto inanimado,
por exemplo, um pedaço de barbante ou uma faixa elástica (BELISÁRIO FILHO; CUNHA,
2010; SCHMIDT, 2010).

104
QUADRO 12 – TRANSTORNO AUTISTA

FONTE: Adaptado de Belisário Filho e Cunha (2010)

• Transtorno de Asperger

A Síndrome de Asperger caracteriza-se essencialmente por prejuízo persistente


na interação social, assim como no desenvolvimento de padrões repetitivos de
comportamento, interesses e atividades, idêntico ao autismo, porém se distingue
dele porque não apresenta retardo significativo da linguagem falada ou na percepção
da linguagem e no desenvolvimento cognitivo ou nas habilidades de autocuidado e
curiosidade acerca do ambiente na infância (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010; SCHMIDT,
2010; BRAGA JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

O Transtorno de Asperger ou Síndrome de Asperger parece ter um início


mais tardio do que o Autismo, ou parece ser identificado mais tarde. Por causa das
características se apresentarem de forma mais leve que no Autismo, na Síndrome
de Asperger as dificuldades de interação social podem tornar-se mais manifestas no
contexto escolar, as crianças tendem a ser socialmente isoladas, mas não parecem
tímidas ou retraídas na presença de outras crianças, como fazem as pessoas com
autismo, com isso essas crianças geralmente recebem o diagnóstico apenas na fase
pré-escolar. Quando adultos, podem ter problemas com a empatia e modulação da
interação social (SCHMIDT, 2010; BRAGA JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

Pode-se destacar que para ser considerado com Asperger, se faz necessário
que as dificuldades do indivíduo, tanto da interação social quanto dos interesses
restritos, devem resultar em um prejuízo significativo no seu funcionamento social ou
ocupacional. Isso quer dizer que tais dificuldades interferem negativamente na relação
do indivíduo com as pessoas no ambiente de trabalho ou social (SCHMIDT, 2010; BRAGA
JUNIOR; BELCHIOR; SANTOS, 2015).

105
QUADRO 13 – TRANSTORNO DE ASPERGER

FONTE: Adaptado de Belisário Filho e Cunha (2010)

DICA
Caro acadêmico, para aprofundar o seu conhecimento no tema, sugerimos
a leitura da seguinte cartilha: Transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/ superdotação e o atendimento educacional especializado, de
Braga Júnior e Belchior, de 2015, que pode ser acessado pelo link: https://
bit.ly/3uYPVb8.

3 ESCOLARIZAÇÃO NA CLASSE COMUM DO ALUNO COM


TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO E O
ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO
Faz-se necessário compreendemos que o processo de escolarização se
constitui de um conceito constante e complexo, envolvendo diversos aspectos ligados
entre eles, como as referências culturais e sociais pertencentes ao ambiente escolar
em questão e, sobretudo, a escola enquanto meio de socialização e transmissão
de saberes técnicos e científicos. Além disso, se faz relevante entender que é na
escola que também se faz possível dar significado e sentido nas interações entre
professores e alunos, ocorrendo cotidianamente o ensino-aprendizagem (BUENO,
2012; GUERREIRO, 2012).

Capellini e Rodrigues (2009) defendem a convivência desde sempre entre as


pessoas sem deficiência juntamente às pessoas com deficiência, pois ao aprenderem
a lidar com as diferenças e com as problemáticas envolvidas nessa situação, poderá se
desenvolver na sociedade uma cultura mais altruísta, e portanto, a inclusão escolar é
um ponto-chave, por garantir a participação das crianças com deficiência no primeiro
ambiente social mais amplo, em nossa cultura, tem sido percebida como um ponto-
chave para um processo de inclusão global (CAPELLINI; RODRIGUES, 2009).

106
Bueno (2012) aponta que grande parte dos escritos acadêmicos sobre as polí-
ticas de educação especial implementadas após a promulgação da atual Constituição
Federal e, mais especialmente, após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, considerando que atra-
vés destas legislações acarretou avanços significativos nos processos de escolariza-
ção de alunos com deficiência. Conforme o autor, a ênfase dada à inclusão é um ponto
importante desses avanços.

Conforme Bueno (2012), na busca de uma melhor operacionalização desse prin-


cípio, o Conselho Nacional de Educação promulgou as Diretrizes Educacionais da Edu-
cação Especial na Educação Básica, em que se estabeleceu a inclusão escolar como
forma preferencial de escolarização, mas abriu quando necessário, a possibilidade de
encaminhamento deste aluno para classes e escolas especiais, os casos em que veri-
ficasse a impossibilidade permanente ou temporária da inclusão em classes regulares.

De qualquer forma, não cabe ao ensino regular excluir ninguém e sim buscar
recursos e meios para a inclusão. Os alunos com TGD têm garantido por lei seu acesso e
permanência nas escolas e a construção de um sistema que seja capaz de desenvolver
suas habilidades e potencialidades e atender as suas demandas. Cabe a cada um
envolvido no processo de escolarização, levando inclusive em consideração todas as
possíveis dificuldades envolvendo a rotina da escola regular e seus desafios, buscar o
melhor para a interação de todos os alunos (CAPELLINI; RODRIGUES, 2009).

Aqui, vale reafirmar o compromisso legal, como apresentado na Lei de Diretrizes


e Bases da Educação Brasileira (LDB), Lei n° 9.394 de 20 de dezembro de 1996, com
alteração da redação do Artigo 59 pela Lei nº 12.796 de 2013, que é assegurado ao aluno
com TGD todos os direitos pertinentes ao seu processo de escolarização, a Lei e o Artigo
59 estabelecem os seguintes princípios:

CAPÍTULO V
DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
[...] Art. 58.  Entende-se por educação especial, para os efeitos desta
Lei, a modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na
rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
(Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)
§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado,
na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de
educação especial.
§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou
serviços especializados, sempre que, em função das condições
específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes
comuns de ensino regular.
[...] § 3º A oferta de educação especial, nos termos do caput deste
artigo, tem início na educação infantil e estende-se ao longo da vida,
observados o inciso III do art. 4º e o parágrafo único do art. 60 desta
Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.632, de 2018)

107
[...] Art. 59.  Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilida-
des ou superdotação: (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização
específicos, para atender às suas necessidades;
II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir
o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude
de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o
programa escolar para os superdotados;
III - professores com especialização adequada em nível médio ou
superior, para atendimento especializado, bem como professores do
ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas
classes comuns;
IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva
integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas
para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho
competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem
como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas
áreas artística, intelectual ou psicomotora;
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais
suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.
Art. 59-A.  O poder público deverá instituir cadastro nacional de alu-
nos com altas habilidades ou superdotação matriculados na educa-
ção básica e na educação superior, a fim de fomentar a execução de
políticas públicas destinadas ao desenvolvimento pleno das poten-
cialidades desse alunado. (Incluído pela Lei nº 13.234, de 2015)
Parágrafo único.  A identificação precoce de alunos com altas habi-
lidades ou superdotação, os critérios e procedimentos para inclusão
no cadastro referido no caput deste artigo, as entidades responsá-
veis pelo cadastramento, os mecanismos de acesso aos dados do
cadastro e as políticas de desenvolvimento das potencialidades do
alunado de que trata o caput serão definidos em regulamento.
Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão
critérios de caracterização das instituições privadas sem fins
lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação
especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público.
[...] Parágrafo único.   O poder público adotará, como alternativa
preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades ou superdotação na própria rede pública regular de
ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste
artigo. (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013) (BRASIL, 1996, s.p.).

Através da constituição fica evidenciado que o aluno com TGD tem garantido
em lei seu direito de estar presente na escola e sobretudo aprender de igual maneira.
Com isso se faz necessário destacar políticas públicas que favoreçam não só a presença
destes indivíduos, mas também a permanência e o aprendizado adequado. Uma das
políticas que têm impactado o processo de inclusão na escola comum é o oferecimento
das diversas possibilidades de atendimento educacional especializado. Os sistemas de
ensino podem adotar diversas modalidades do ensino, como ensino colaborativo, sala
de recursos multifuncional, sala de recursos categorial, atendimento individualizado em
sala de aula inclusiva realizado por professor especializado e ensino itinerante, dentre
outras iniciativas regionais que garantam suporte educacional visando atender às
necessidades dos alunos com TGD (FONSECA; WALTER; FERREIRA-DONATI, 2014).

108
Vale destacar a iniciativa da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
instituiu a Resolução SE nº 68/2017, que também reafirma que ao aluno com TGD,
devidamente matriculado na rede estadual de ensino, será assegurado Atendimento
Educacional Especializado – AEE, e deve ter garantido seu pleno desenvolvimento
respeitando sua individualidade e necessidades específicas, “todos os profissionais
da escola estarão envolvidos no Atendimento aos Alunos Público-Alvo da educação
especial, com o objetivo de reduzir ou eliminar barreiras, propiciando o apoio necessário
a todos eles” (SÃO PAULO, 2017, s.p.).

Em se tratando especificamente do atendimento especializado para o aluno com


TGD no Ensino Médio na Rede Estadual de Ensino de São Paulo, conforme a Resolução
SE 68/2017, de acordo com as características e nível de comprometimento, o aluno
poderá ser direcionado a uma das modalidades de atendimento, a saber:

Artigo 1º - Consideram-se, para efeito do que dispõe apresente


resolução:
I - Sala - espaço físico para a realização de atividades pedagógicas;
II - Sala de Recursos - sala multifuncional para a realização de ativida-
des referentes ao atendimento educacional especializado em turmas
distintas compostas por alunos de acordo com suas necessidades;
III - Turma - agrupamento de alunos que frequentam o mesmo período,
organizado por uma única área de deficiência ou de Transtorno do
Espectro Autista ou de Altas Habilidade sou Superdotação;
IV - Modalidade Itinerante/Itinerância - atendimento realizado por
professor especializado que se desloca até a escola de matrícula
do aluno quando comprovada a inviabilidade de abertura de sala de
recursos em espaço físico próprio;
V - Educação Especial Exclusiva - processo de ensino--aprendiza-
gem que ocorre em substituição ao ensino regular sempre que es-
gotados todos os recursos da escola necessários à transposição das
barreiras à inclusão do aluno público-alvo da educação especial no
ensino comum;
VI - Classe Regida por Professor Especializado - CRPE - classe de
educação especial exclusiva em escola da rede estadual de ensino;
VII - Instituição Especializada - instituição privada que mantém
vínculo com a Secretaria da educação para atendimento a alunos em
classes de educação especial exclusiva;
VIII- Avaliação Pedagógica - avaliação realizada por professor
especializado com o objetivo de identificar os recursos e apoios
necessários (SÃO PAULO, 2017, s.p.).

Sobre as condições necessárias para a implementação da política de inclusão


escolar, Bueno (2012, p. 290) enfatiza que:

O primeiro requisito para se implementar, de fato, uma educação


inclusiva de qualidade com relação a alunos com deficiência ou
distúrbios refere-se à implementação de políticas que possam
incluir a todos os alunos, ou seja, a busca de melhor qualidade de
escolarização de alunos com deficiências ou distúrbios deve se
subordinar à melhoria da qualidade do ensino em geral, na perspectiva
de atendimento da diversidade do alunado.

109
Contudo, as pesquisas na área de educação inclusiva, em grande parte, têm
se restringido a descrever e constatar as dificuldades enfrentadas pelos profissionais
professores regentes em sala de aula, sem que se amplie os estudos para as condições
efetivas que os diferentes sistemas oferecem para que a inclusão possa ocorrer com
qualidade (HEREDERO, 2010; BUENO, 2012).

110
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os Transtornos Globais do Desenvolvimento caracterizam-se por um comprometi-


mento grave e global em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de interação
social, habilidades de comunicação ou presença de estereótipos de comportamento,
interesses e atividades. Os prejuízos qualitativos que definem essas condições re-
presentam um desvio acentuado em relação ao nível de desenvolvimento ou idade
mental do indivíduo.

• Os Transtornos Globais do Desenvolvimento, em geral, se manifestam nos primeiros


anos de vida da criança e, frequentemente, estão associados a algum grau de com-
prometimento intelectual e características descritivas, podendo haver anormalida-
des no desenvolvimento das habilidades cognitivas.

• Para o diagnóstico de Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), as manifestações


clínicas nas áreas de interação social, comunicação e repertório restrito de interesses
e atividades presentes nas crianças devem ocorrer antes do terceiro ano de vida. Cabe
ressaltar, entretanto, que o quadro não envolve todas as áreas do comportamento na
mesma proporção.

• Segundo critérios de diagnóstico, os TGD abarcam vários transtornos, sendo eles:


Transtorno Autista, Transtorno de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Trans-
torno de Asperger e o Transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação.

111
AUTOATIVIDADE
1 Os Transtornos Globais do Desenvolvimento são uma categoria diagnóstica que inclui
um grupo de transtornos e estão incluídas cinco categorias diagnósticas: Transtorno
Autista, Transtorno de Rett, Transtorno Desintegrativo da Infância, Transtorno de
Asperger e Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra Especificação. Todos
estes transtornos apresentam sintomas em comum, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os TGD têm em comum os sintomas de prejuízo leve e invasivo em diversas


habilidades de interação social recíproca e a presença de comportamento,
interesses e atividades estereotipados.
( ) Os TGD têm em comum os sintomas de prejuízo leve e invasivo em diversas
habilidades de interação social recíproca, presença de comportamento, interesses
e atividades estereotipados e poucas habilidades de comunicação.
( ) Os TGD têm em comum os sintomas de prejuízo severo e invasivo em diversas
habilidades de interação social recíproca, presença de comportamento, interesses
e atividades estereotipados e poucas habilidades de comunicação.
( ) Os TGD têm em comum os sintomas de prejuízo severo e invasivo em diversas
habilidades de interação social recíproca, presença de comportamento, interesses
e atividades estereotipados e habilidades de comunicação.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) F – V – F – F.
b) (   ) F – F – F – V.
c) (   ) V – F – F – F.
d) (   ) F – F – V – F.

2 A criança que recebe o diagnóstico médico de Transtorno Global do Desenvolvimento


(TGD) tem o desenvolvimento acentuadamente anormal ou prejudicada no que se
refere à interação social. Descreva esta inabilidade e de que forma essa manifestação
contribui para a dificuldade de desenvolver relacionamentos.

3 O transtorno autismo é uma condição que se manifesta de forma universal em


qualquer região geográfica, independentemente de raça, etnia, classe social ou
cultural. O transtorno autista costuma aparecer progressivamente, quanto mais cedo
se descobrir, mais recursos se poderá usar para estimular a criança. Classifique V para
as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

112
( ) Observa-se melhor seus traços por volta de 1 a 3 anos de vida.
( ) Observa-se melhor seus traços por volta dos 2 a 3 anos de vida.
( ) As manifestações do transtorno na primeira infância são mais sutis e mais difíceis
de definir do que observar após os 3 anos de idade da criança.
( ) O transtorno autista é mais comum nos meninos, com uma proporção de três
meninos para cada menina afetada.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) F – V – F – V.
b) (   ) V – F – F – V.
c) (   ) V – F – V – F.
d) (   ) F – V – V – F.

4 Descreva o que caracteriza a Síndrome de Asperger e no que se diferencia do Autismo.

5 Através da constituição fica evidenciado que o aluno com TGD tem garantido em lei
seu direito de estar presente na escola e, sobretudo, aprender de igual maneira. Com
isso se faz necessário destacar políticas públicas e regionais que favoreçam não só
a presença destes alunos, mas também a permanência e o aprendizado, e suporte
educacional visando atender às necessidades dos alunos com TGD. Uma das políticas
que têm impactado o processo de inclusão na escola comum é o oferecimento das
diversas possibilidades de atendimento educacional especializado. Classifique V para
as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os sistemas de ensino podem adotar diversas modalidades do ensino, como


ensino colaborativo, sala de recursos multifuncional, sala de recursos categorial,
atendimento individualizado psicológico especializado e ensino itinerante.
( ) Os sistemas de ensino podem adotar diversas modalidades do ensino, como
ensino colaborativo, sala de recursos multifuncional, sala de recursos categorial,
atendimento individualizado psicológico em sala de aula e ensino itinerante.
( ) Os sistemas de ensino podem adotar diversas modalidades do ensino, como
ensino colaborativo, sala de recursos multifuncional, sala de recursos categorial,
atendimento individualizado em sala de aula inclusiva realizado por professor
especializado e ensino itinerante.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) V – F – F.
b) (   ) F – F – V.
c) (   ) F – V – F.
d) ( ) F – V – V.

113
114
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E DE
DIAGNÓSTICO DOS TRANSTORNOS

1 INTRODUÇÃO

De acordo com Sulkes (2020), os transtornos de aprendizagem são os trans-


tornos que causam discrepâncias entre os níveis reais de desempenho acadêmico, e
envolvem deficiências ou dificuldades na concentração, atenção, linguagem ou proces-
samento visual de informações. O diagnóstico desses transtornos vai incluir avaliações
médicas, psicológicas, intelectuais, educacionais, de fala e linguagem e o tratamento
consiste na abordagem educacional e, em alguns casos, terapêutica, médica, compor-
tamental e psicológica.

Há uma necessidade de iniciativas que busquem pela construção de novas me-


todologias de ensino, evitando assim que uma dificuldade de aprendizagem resulte no
fracasso educacional. A criança em idade escolar com dificuldades não deve ser con-
siderada um fracasso, ela deve ser conduzida através de ajuda profissional e da equipe
da instituição de ensino a vencer barreiras através de estratégias eficazes (SILVA, 2008).

A educação, em especial as séries iniciais do Ensino Fundamental, passa por


um desencontro de ações, uma crise com relação às dificuldades de aprendizagem
que alguns alunos apresentam no decorrer do processo de ensino-aprendizagem.
Ocorre também uma falta de comprometimento da parte da escola e de muitos pais e
responsáveis, o que pode ocasionar algumas situações como, por exemplo: o professor
que não recebeu uma formação específica para trabalhar com este tipo de aluno, e o
próprio aluno que se sente frustrado e excluído de um sistema de ensino elaborado
apenas para alunos que têm um bom ritmo de aprendizagem (SILVA, 2008).

O fato de não se saber como proceder de forma correta diante de alguma criança
com dificuldades acaba tornando a escola uma reprodutora do problema, sendo incapaz
de auxiliar nesses casos devido sua forma de organização. O que torna esta temática tão
complexa está nos fatores geradores dos problemas de aprendizagem, que podem ser
os de ordem biológica, psicológica, pedagógica e social (SILVA, 2008). Dockell e McShane
(1997) analisam as dificuldades de aprendizagem, os aspectos psicopedagógicos e
demonstraram que a memória é fator indispensável a tais aprendizagens.

115
Acadêmico, neste tópico, abordaremos as seguintes temáticas: as dificuldades
de aprendizagem abordando parte do histórico de como surgiram as dificuldades
de aprendizagem até o diagnóstico, como ocorre a classificação das dificuldades de
aprendizagem, como acontece a avaliação dos trasntornos de aprendizagem, como
ocorre o diagnóstico e, por fim, o tratamento das dificuldades de aprendizagem.

2 DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM: DO HISTÓRICO


AO DIAGNÓSTICO
Desde o princípio da humanidade há relatos sobre a marginalização e tratamento
estigmatizado aos indivíduos que são diferentes, não considerados normais, pelo fato
de não atenderem aos padrões preestabelecidos. A relação com o diferente era cruel
e violenta em parte das civilizações. Doentes incuráveis na Índia eram jogados no rio
Ganges. Na Grécia Antiga, as pessoas com deficiencia eram jogadas do alto do monte
Taijeto. Os Celtas permitiam que os filhos matassem os pais quando estes estivessem
velhos e doentes. Os primeiros habitantes das Américas, os índios, abandonavam os
doentes e incuráveis e sacrificavam recém-nascidos deficientes (SILVA, 2008).

Na Idade Média, as pessoas com deficiência (PCD) representavam o castigo, a


imperfeição, justificando a segregação e a rejeição da sociedade (VIZIM, 2003). Mas, com
o avanço da ciência, as pessoas com necessidades especiais passaram a ser estudadas,
mas ainda assim eram pouco compreendidas pela sociedade em geral. Tendências mais
humanitárias passaram a ser utilizadas, tratando pessoas com distúrbios como pessoas
de verdade.

FIGURA 1 – CRIANÇA EM IDADE ESCOLAR REALIZANDO TAREFAS

FONTE: <https://bit.ly/38vCUhz>. Acesso em: 13 fev. 2022.

116
No ano de 1963 ocorreu a fundação oficial do campo de estudo das dificuldades de
aprendizagem, quando Samuel Kirk popularizou o termo Dificuldades de Aprendizagem
em uma comunicação apresentada na Conference on Exploration into Problems of the
Perceptually Handicapped Child, nos Estados Unidos (CRUZ, 1999). Nesta conferência,
Kirk utilizou o termo dizendo o seguinte:

Eu usei o termo ‘dificuldades de aprendizagem’ para descrever um


grupo de crianças que têm desordens no desenvolvimento da lin-
guagem, da fala, da leitura, e das habilidades associadas à comuni-
cação necessárias para interação social. Neste grupo eu não incluo
crianças que têm déficit sensoriais tais como cegueira ou surdez,
porque temos métodos para lidar e treinar os surdos e os cegos, eu
também não excluo deste grupo crianças que apresentam um atraso
mental generalizado (CRUZ, 1999, p. 30).

Através deste discurso foi criada a Assocition for Children with Learning
Disabilities (ACLD), que mais tarde, em 1989, mudou o nome para Learning Disabilities
Association of América (LDA) (SILVA, 2008).

Kirk restringiu os critérios de classificação das dificuldades de aprendizagem


(DA) e identificava estas como crianças (CRUZ, 1999):

a) Que mostravam uma discrepância entre seu potencial de aprendizagem e o de


execução.
b) Em que o atraso acadêmico não se devia a outras deficiências sensoriais.
c) Que não tinham aprendido pelos métodos usuais e que necessitavam de métodos
especiais de instrução.

O psicólogo Samuel Kirk (SANCHEZ, 1998) observou que as dificuldades


apresentadas pelas crianças eram inexplicáveis e não se encaixavam na educação
especial, ou estavam relacionadas ao nível de inteligência, ambiente familiar ou
instrução dada, pois eram perfeitamente adequados; usou o termo dificuldades de
aprendizagem para se referir a problemas na aprendizagem acadêmica. Lançou uma
proposta educativa, não médica, deixando o problema ser dividido e discutido com,
além dos especialistas, pais, professores, governo e a sociedade em geral.

DICAS
Para uma melhor compreensão da temática de dificuldades de aprendizagem,
recomendamos a leitura do seguinte livro: Dificuldades de Aprendizagem de A a Z: guia
completo para educadores e pais, de Corinne Smith e Lisa Strick, de 2007.

117
FONTE: SMITH, C.; STRICK, L. Dificuldades de aprendizagem de A a Z: um
guia completo para pais e educadores. Porto Alegre: Artmed, 2007.

Existem muitas controvérsias nas pesquisas das dificuldades de aprendizagem e


tal questão está ligada paralelamente ao desenvolvimento das sociedades (SILVA, 2008).

Para as crianças ou adolescentes com dificuldades de aprendizagem serem


identificados, deveria haver a observância de algumas características cognitivas e
comportamentais que constituiriam uma taxonomia educacional. A fundação oficial do
campo das dificuldades de aprendizagem foi em 1963, e em 1965, sua constituição,
como uma divisão da Organização Internacional de Educação Especial, no Conselho
Internacional para as Crianças Excepcionais, o que tem uma história de 39 anos
(SANCHEZ, 1998, SILVA, 2008).

Para Sanchez (1998, p. 36), dificuldades de aprendizagem:

É um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de


transtornos que se manifestam por dificuldades significativas na
aquisição e uso da recepção, fala, leitura, escrita, raciocínio ou
habilidades matemáticas. Estes transtornos são intrínsecos ao
indivíduo supõe-se que devido à disfunção do sistema nervoso
central e podem ocorrer ao longo do ciclo vital (life span). Podem
existir juntamente com as dificuldades de aprendizagem, problemas
nas condutas de autoregulação, percepção social, e interação
social, mas não constituem por si mesmas uma dificuldade de
aprendizagem. Ainda que as dificuldades de aprendizagem possam
ocorrer concomitantemente com outras condições incapacitantes
(por exemplo, deficiência sensorial, retardo mental, transtornos
emocionais graves) ou com influências extrínsecas (tais como as
diferenças culturais, instrução inapropriada ou insuficiente), não são
o resultado dessas condições ou influências.

118
O campo das dificuldades de aprendizagem agrupa uma série de conceitos,
critérios, teorias, modelos e hipóteses, sendo um fenômeno extremamente complexo.
Historicamente, já foi aceito que as dificuldades de aprendizagem incluiriam dificuldades
acadêmicas e não acadêmicas. As acadêmicas seriam as dificuldades de leitura,
matemática, soletração e escrita, e as não acadêmicas são os problemas visomotores, no
processamento fonológico, na linguagem, na memória e também problemas perceptivos
(SILVA, 2008). Já para Lozano e Rioboo (1998), há a existência das dificuldades de
aprendizagem permanentes, que afetam as partes cognitiva, sensorial, física, motora,
afetiva, emocional e sociocultural, englobando uma base neuropsicológica, biológica
ou constitucional afetada. Também mencionam as dificuldades de aprendizagem
transitórias que surgiriam em algum momento do processo de aprendizagem, e
corresponderiam aos déficits de funções superiores (cognitivas, linguagem, raciocínio
lógico, perceptivo-atencional, afetivo-emocionais transitórias e as devidas à baixa
qualidade socioambiental), e às estratégias e técnicas básicas de aprendizagem.

Os principais fatores que afetam as dificuldades de aprendizagem são: a


personalidade do próprio sujeito, as instituições educativas, incluindo suas áreas
metodológicas e de organização e os contextos familiares e sociais. Muitas vezes, as
dificuldades de aprendizagem ocorrem devido ao ambiente onde vivem os alunos. As
condições em casa e na escola fazem a diferença entre uma leve dificuldade e um
problema incapacitante, por isso é importante entender como os ambientes do lar e da
escola afetam o desenvolvimento da criança e também sua aprendizagem. A maioria
das dificuldades de aprendizagem não tem causas orgânicas e nem está relacionada
com as atividades cognitivas da criança, mas tem relação com problemas educativos
ou ambientais. A família e o ambiente são importantes no processo de aprendizagem,
já que a falta de determinadas experiências pode comprometer aspectos como, por
exemplo, a coordenação motora (DOCKELL; MCSHANE, 1997; SILVA, 2008).

3 CLASSIFICAÇÃO DAS DIFICULDADES DE


APRENDIZAGEM
A classificação das dificuldades de aprendizagem pode ser feita através do sis-
tema etiológico ou do sistema funcional (DOCKELL; MCSHANE, 1997). O sistema etioló-
gico classifica as dificuldades de aprendizagem com base na sua causa. Pode predizer
uma dificuldade em longo prazo, desde que já tenha sido observada e possibilita exa-
minar o conjunto de dificuldades de uma etiologia. Mas muitas dificuldades de aprendi-
zagem têm etiologia desconhecida, e também podem ser semelhantes, mas podem se
manifestar de forma distinta, requerendo estratégias de intervenção diferentes.

O segundo sistema de classificação, o funcional, distingue as crianças com base


nas medidas de inteligência: aquelas com desenvolvimento intelectual abaixo da média,
consideradas lentas ou deficientes mentais, e aquelas com desenvolvimento intelectual
normal, mas com dificuldade específica em alguma tarefa, como por exemplo, a leitura.

119
É comum que crianças com o desenvolvimento intelectual normal apresentem uma
diferença entre o nível de sucesso na área em que se situa a dificuldade específica e os
níveis de sucesso em outras áreas do funcionamento cognitivo (SILVA, 2008).

Acadêmico, a seguir, podemos ver um quadro que mostra os principais trans-


tornos específicos de aprendizagem, classificando-os de acordo com sua manifestação:

QUADRO 14 – TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICOS COMUNS

Transtorno Manifestação

Dislexia  (comprometimento da
Problemas com a leitura
leitura)

Dislexia fonológica Problemas com análise do som e memória

Problemas com o reconhecimento visual


Dislexia superficial
das formas e estruturas das palavras

Disgrafia (comprometimento da Problemas com compreensão, expressões


expressão escrita) escritas ou grafia

Discalculia (comprometimento Problemas com matemática e dificuldades


da matemática) para solucionar questões

Ageometria (ageometresia) Problemas de raciocínio matemático

Dificuldades na formação de conceitos


Anarritmia básicos e inabilidade para adquirir aptidões
de computação

Dificuldades para recordar palavras e


Afasia anômica (disnomia)
solicitar informações da memória

FONTE: Sulkes (2022, p. 21)

A preocupação em diagnosticar as dificuldades de aprendizagem é antiga, mas


a sua presença baseia-se na presença de dificuldades significativas, em uma diferença
entre o resultado escolar esperado e o alcançado pela criança. Isso fez surgirem
questionamentos sobre a formação do professor, recursos e técnicas utilizados, falta de
pesquisa e verbas para tal (SILVA, 2008).

120
O baixo rendimento é uma manifestação das dificuldades de aprendizagem, e
pode ser um indicativo de que a criança pode apresentar dificuldades de aprendizagem.
Segundo Sanchez (1998), os critérios para identificar alunos de risco são: dois anos
de atraso no seu nível em leitura ou matemática, suspensões anteriores, participação
em programas de apoio, ausências escolares frequentes, reprovação em algum ano e
recomendação do professor.

Diferenciar crianças com baixo aproveitamento escolar de crianças com


dificuldades de aprendizagem tem se mostrado difícil, pois os testes psicométricos de
inteligência que têm sido utilizados para diagnosticar as dificuldades de aprendizagem
se mostram ineficientes para um diagnóstico diferencial. Porém, conseguiram
identificar perfis diferenciais de habilidades em subtipos. O teste WISC, por exemplo,
está relacionado a fatores conceituais como vocabulário, semelhanças, compreensão
das crianças com dificuldades de aprendizagem, podendo mostrar uma parte do perfil
dessas crianças (SILVA, 2008).

Alunos com dificuldades de aprendizagem têm uma autoimagem mais nega-


tiva na área acadêmica do que a dos estudantes sem dificuldades de aprendizagem;
que, na dimensão social, as dificuldades de aprendizagem também se refletem no
autoconceito, pois esses alunos se veem como piores colegas e piores filhos do que
os outros (SILVA, 2008).

DICAS
Para compreender melhor a temática tratada neste tópico, sugerimos a leitura do DSM-5
no capítulo dos transtornos de aprendizagem.

FONTE: AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual de Diagnóstico


Estatística das Perturbações Mentais. 4. ed. DSM-IV, 1994.

121
A CID-10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças) denomina essa
situação, no capítulo intitulado Transtorno do Desenvolvimento das Habilidades Esco-
lares, descrevendo como:

Transtornos nos quais as modalidades habituais de aprendizado


estão alteradas desde as primeiras etapas do desenvolvimento.
O comprometimento não é somente a conseqüência da falta de
oportunidade de aprendizagem ou de um retardo mental, e ele não
é devido a um traumatismo ou doença cerebrais" (ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DE SAUDE, 1993, p. 52).

Não devemos tratar as dificuldades de aprendizagem como se fossem problemas


insolúveis, mas sim como desafios que fazem parte do próprio processo da aprendizagem,
que pode ser normal ou não normal. É importante também a necessidade de identificar e
prevenir o mais breve possível as dificuldades de aprendizagem, de preferência ainda na
pré-escola (SILVA, 2008).

Sendo assim, é muito importante o diagnóstico e a avaliação global da criança


ou adolescente, considerando as diversas possibilidades de alterações que resultam nas
dificuldades de aprendizagem, para que o tratamento seja o mais específico e objetivo
possível (SILVA, 2008).

DICAS
Para compreender melhor a temática tratada neste tópico, sugerimos a leitura da CID- 10
capítulo Transtorno do Desenvolvimento das Habilidades Escolares.

FONTE: ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Classificação Estatística


Internacional de Doenças CID-10, 1993.

122
4 AVALIAÇÃO DOS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM
A avaliação interdisciplinar é fundamental para fechar um diagnóstico em
transtornos de aprendizagem, o trabalho em equipe mostra quais habilidades estão
mais deficitárias no indivíduo. Essa avaliação envolve três grandes áreas, que são a
neuropsicologia, fonoaudiologia e psicopedagogia. Na avaliação psicológica, observa-
se os problemas de coordenação motora fina, déficit de memória operacional e
problemas de lateralidade. O teste psicológico WISC-IV é utilizado para mostrar o nível
intelectual, e os subescores que atingem menores resultados são os de aritmética,
códigos, informações e dígitos. As avaliações fonoaudiológicas podem demonstrar
um déficit em memória e síntese auditiva, problemas de processamento auditivo e um
déficit desproporcional da consciência fonológica. Na avaliação psicopedagógica, a
leitura de palavras pode demostrar piores resultados em palavras de baixa frequência,
irregulares, e percebe-se erros visuais e sonoros frequentes. Na leitura de textos, pode
ser observado se o indivíduo o faz de uma maneira silabada, e são cometidos erros por
substituição viso-sonora, além de erros compatíveis com série escolar mais baixa. No
ditado, acontecem trocas fonéticas, e o indivíduo apresenta dificuldades com o uso de
números e suas relações (BRITES, 2020).

Determinar uma maneira eficiente de avaliar as dificuldades de aprendizagem


que surgem no processo de ensino e fazer a distinção entre as dificuldades de origem
ambiental (as chamadas dificuldades de aprendizagem) das de origem biológica
(os chamados transtornos específicos de aprendizagem) é um desafio (PINHEIRO;
MARQUES; LEITE, 2018).

Conforme Brites (2020, p. 13), os objetivos da avaliação neuropsicológica são:

Identificar padrões cognitivos passíveis de intervenções, possibilitar


comparações ao longo do desenvolvimento, auxiliar no planejamento
do tratamento, orientar a equipe multidisciplinar e auxiliar no
diagnóstico diferencial. O diagnóstico diferencial determina se a
função está ou não prejudicada. As funções que devem ser avaliadas
são: habilidades motoras, processos atencionais e executivos,
formação de conceitos, raciocínios abstratos, julgamento, linguagem,
memória verbal e não verbal, entre outras. Para a avaliação
neuropsicológica, é necessário ter dimensão do comportamento,
para se observar o principal objeto de análise: a cognição. A cognição
é a forma como o cérebro processa as informações, ou seja, é a
operação mental necessária para executar determinadas tarefas,
como atenção, memória, processamento viso-espacial e construtivo,
linguagem oral e escrita e funções executivas.

Os testes são selecionados a partir de uma hipótese com base nas queixas e na
história de vida do estudante. A hipótese vai ser confirmada ou descartada à medida que
ocorre a testagem, variando os instrumentos de acordo com os resultados apresentados
pelo paciente. É importante que a avaliação neuropsicológica comece pela anamnese,
quando serão avaliados vários aspectos, desde como foi o encaminhamento para a
avaliação e as principais queixas dos pais e professores até coletar o maior número de
informações sobre o comportamento do avaliado e sua história de vida (BRITES, 2020).

123
Conforme Brites (2020), os testes em que a avaliação vai se basear são
divididos em baterias que podem ser: fixas, em que serão avaliadas determinadas
funções, como as baterias de memória, inteligência ou as que abrangem determinadas
funções neuropsicológicas, e flexíveis, em que os testes que se adaptam aos problemas
e necessidades específicas de cada caso, que são selecionados pelo neuropsicólogo.

A avaliação nada mais é do que um recorte momentâneo de um estado em


que o indivíduo se apresenta. Por este motivo, não se faz apenas uma avaliação, mas
sim várias avaliações, buscando os melhores resultados. É muito importante que o
profissional esteja atento a todas as esferas da aprendizagem. Primeiramente, é feita
a anamnese com os pais ou responsáveis e depois são feitas provas, testes, jogos,
atividades e conversas com o avaliado. Após isso, acontece a devolutiva para os pais
sobre o resultado dos testes e acerca do desenvolvimento da criança, podendo indicar
se precisará de encaminhamento para outro profissional. Após isso, é feito um contato
com a escola, de forma a dar as devidas orientações (BRITES, 2020).

FIGURA 2 – TESTE PSICOLÓGICO COMO INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO DOS TRASNTORNOS DE


APRENDIZAGEM

FONTE: <https://bit.ly/3LTAwQq>. Acesso em: 13 fev. 2020.

Avaliação educacional e do desempenho através das observações feitas pelos


professores quanto ao comportamento na sala de aula e desempenho acadêmico é muito
importante como parte do diagnóstico. Essas avaliações podem medir as habilidades
no reconhecimento, compreensão, fluência e decodificação da palavra. Amostras da
escrita podem ser obtidas para avaliar a ortografia e fluência de ideias. As habilidades
matemáticas também devem ser avaliadas em termos de computação, conhecimento
das operações, compreensão dos conceitos (SULKES, 2020).

124
Avaliação médica dos transtornos de aprendizagem inclui uma detalhada
história familiar da criança, exame físico, neurológico e do desenvolvimento neural, para
encontrar a causa do distúrbio. As anormalidades físicas e sinais neurológicos podem
indicar causas médicas que podem ser tratáveis. Problemas de coordenação motora
podem indicar déficits neurológicos ou retardo do desenvolvimento neural. Os níveis de
desenvolvimento são avaliados de acordo com critérios padronizados. Já a avaliação
psicológica pode identificar os distúrbios de conduta, ansiedade, depressão e reduzida
autoestima, que estão frequentemente associados, e devem ser diferenciados das
dificuldades de aprendizagem. Devem ser analisadas as atitudes na escola, a motivação,
o relacionamento com os colegas e a autoconfiança (SULKES, 2020).

DICAS
Recomendamos o acesso ao site: https://satepsi.cfp.org.br/. O SATEPSI foi
desenvolvido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) com o objetivo de
avaliar a qualidade dos instrumentos psicológicos para uso profissional
e divulgar informações sobre os testes psicológicos à comunidade e
aos profissionais psicólogos. No site do SATEPSI são apresentados os
instrumentos que podem ser usados pelos psicólogos que incluem os
psicológicos favoráveis e instrumentos não privativos do psicólogo e
também os testes que não podem ser utilizados na prática profissional.

5 COMO OCORRE O DIAGNÓSTICO DOS TRANSTORNOS


DE APRENDIZAGEM
O processo de avaliação com finalidade diagnóstica deve ser bem abrangente,
pois além dos processos cognitivos, outros processos mentais, como os executivos e
emocionais, também afetam a atuação infantil (JARDIM, 2001).

As crianças com dificuldades de aprendizagem têm disfunções em habilidades


necessárias para haver aprendizagem efetiva, apresentando problemas na compreensão
de leitura, organização e retenção da informação e na interpretação de texto. São
lentas ao processar informações, têm estratégias pobres para escrever, problemas de
organização espacial e muita distração, o que acarreta dificuldades de comunicação e
hábitos ineficientes de estudo (JARDIM, 2001).

De acordo com Mousinho e Navas (2016), o DSM-5 para os transtornos específicos


de aprendizagem traz uma proposta de resposta à intervenção, em que o diagnóstico
não é dado a priori; inicialmente, pode ser estabelecida uma hipótese diagnóstica, que
deve ser confirmada após um período de intervenção eficaz e cientificamente embasado.

125
FIGURA 3 – MODELO DE RESPOSTA À INTERVENÇÃO

FONTE: Mousinho (2014, p. 39)

O diagnóstico é importante para coletar informações precisas e confiáveis sobre


a competência da criança, podendo ser feito através de provas formais de habilidades e
sucesso acadêmico que demonstrem se o desenvolvimento da criança está alterado ou
atrasado. Essa avaliação deve considerar todo o contexto no qual o sujeito está inserido.
As informações sobre o desenvolvimento normal é que nos dão orientações sobre onde
reside o problema de uma criança com dificuldades (SILVA, 2008).

Para comparar a atuação de um estudante em uma tarefa é necessário fazer


comparações entre diversos grupos, de diferentes idades. Quando se quer conhecer a
dimensão das diferenças entre um grupo de crianças com dificuldades de aprendizagem
e os seus colegas, então devemos comparar grupos de mesma idade. Pode-se comparar
um grupo de crianças que apresentam dificuldade numa área com um grupo de crianças
mais novas e que não apresentem dificuldade. Um outro método é o de estudar a relação
longitudinal entre a habilidade na qual estamos interessados e as habilidades que se
relacionam com ela de modo causal (LOZANO; RIOBOO, 1998).

FIGURA 4 – TRABALHO EM EQUIPE PARA O DISGNÓSTICO EM TRASNTORNOS DE APRENDIZAGEM

FONTE: <https://www.maisopiniao.com/sobre-a-mobilidade/>. Acesso em: 13 fev. 2022.

126
O aluno com dificuldades de aprendizagem nem sempre é identificado como tal
por conseguir alcançar o desempenho mínimo necessário para ser aprovado. É o baixo
rendimento que leva ao insucesso na vida escolar, às baixas notas é que indicam que
os alunos que podem ter dificuldades de aprendizagem, se destacando do seu grupo de
sala de aula. Isso pode acarretar consequências no âmbito do grupo que nem sempre
são positivas para o sujeito (SILVA, 2008).

Todos os alunos são diferentes, tanto em suas capacidades, quanto em suas


motivações, interesses, ritmos evolutivos, estilos de aprendizagem, situações ambientais
e sabemos que este é um processo complexo em que estão incluídos inúmeros
fatores: alunos, professores, concepção e organização curricular e metodologias.
Porém, a aprendizagem do aluno não depende somente dele, e sim do grau em que a
ajuda do professor esteja ajustada ao nível que o aluno apresenta em cada tarefa de
aprendizagem. Se houver um ajuste entre o professor e a aprendizagem do aluno for
apropriada, o aluno aprenderá e apresentará progressos (SILVA, 2008).

6 TRATAMENTO
O tratamento da maioria dos transtornos de aprendizagem focaliza a conduta
educacional, mas também pode envolver tratamentos médicos, comportamentais e
psicológicos. Os programas de ensino com uma abordagem estratégica podem amenizar
o uso dos fármacos e possibilitar ensinar a criança como aprender (SULKES, 2020).

Algumas crianças podem necessitar como tratamento instruções especializadas


em apenas uma área enquanto continuam a frequentar classes regulares. Já outras
crianças podem necessitar de programas educacionais separados e mais intensos
(SULKES, 2020).

Os medicamentos afetam minimamente as aquisições acadêmicas, inteligência


e habilidades de aprendizagem, mas certos remédios podem melhorar a atenção e a
concentração, permitindo que o indivíduo possa responder de maneira mais efetiva às
instruções a ele dadas (SULKES, 2020).

127
DICAS
Algumas novidades na área de dificuldades de aprendizagem são a maior conscientização
da sociedade sobre esta problemática, em virtude disto foi criada a Lei nº 14.254, que
institui o acompanhamento integral para educandos com dislexia, transtorno do déficit de
atenção com hiperatividade (TDAH) ou outro transtorno de aprendizagem. Com a criação
desta nova política poderá ser feita a identificação precoce do transtorno, encaminhamento
da criança para diagnóstico e apoio educacional na rede de ensino, e o terapêutico
especializado na rede de saúde. Segundo a nova lei, as escolas da educação básica das
redes pública e privada devem garantir o cuidado e a proteção a esses alunos garantindo
seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, com auxílio das
redes de proteção social governamental ou não governamental. Conforme
a nova lei, caso seja verificada a necessidade de intervenção terapêutica, ela
deverá ser realizada em serviço de saúde em que seja possível a avaliação
diagnóstica, com metas de acompanhamento por equipe multidisciplinar.
Os sistemas de ensino devem garantir aos professores da educação básica
amplo acesso à informação, inclusive quanto aos encaminhamentos que
devem ser tomados, e capacitação continuada.

FONTE: BRASIL. Lei nº 14.254, de 30 de novembro de 2021. Dispõe sobre


o acompanhamento integral para educandos com dislexia ou Transtorno
do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) ou outro transtorno de
aprendizagem. Diário Oficial da União, 30 de novembro de 2021.

128
LEITURA
COMPLEMENTAR
DIFERENÇAS ENTRE DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E TRANSTORNOS DE
APRENDIZAGEM

Queli Ghilardi Cancian


Vilmar Malacarne

É grande o número de crianças que apresentam alguma dificuldade em relação


ao aprendizado. Tal situação colabora na confusão de identificação dos distúrbios, o que
faz com que pais e educadores optem por tomada de decisões equivocadas que podem
prejudicar o desenvolvimento da criança.

Em geral faz parte do instinto da criança a busca pelo aprendizado, o conhecer


e o executar novas atividades, quando este interesse parece não existir e a criança
encontra-se desmotivada, ou executada as atividades de modo falho, sem êxito, isso
pode ser um sinal de que algo não está bem. Desta forma existe a necessidade de uma
observação mais minuciosa, a fim de detectar os fatores que estão comprometendo o
interesse e o aprendizado desta criança.

Geralmente a dificuldade de aprendizado e causada por algum acontecimento


ou situação frustrante, como a mudança de escola, troca de professor, chegada de um
irmão, óbito de um familiar próximo, desentendimentos familiares, separação dos pais
entre outros, de modo que se torna necessário pesquisar os motivos que influenciam
negativamente o desempenho da criança (GIROTTO; GIROTTO; OLIVEIRA, 2015).

Porém quando as dificuldades de aprendizado são persistentes e acompa-


nham o histórico da criança por muito tempo, sem motivos evidentes e em várias
áreas do conhecimento, muito provavelmente é que está tenha um transtorno de
aprendizagem, aonde existe um comprometimento de ordem neurológica que por sua
vez ocasiona uma dificuldade no desenvolvimento sensorial e intelectual da criança.

Normalmente esses transtornos de aprendizagem são percebidos apenas no


Ensino Fundamental, mas se o professor e os pais tiverem um olhar mais crítico ao
observar os sinais demostrado pela criança, esse tipo de transtorno pode ser detectados
logo no início, permitindo assim que essa criança recebe o tratamento adequado,
diminuindo as percas de aprendizado. A criança pode apresentar um único transtorno
(dificuldade para ler, escrever ou fazer contas) ou várias dificuldades associadas
(MOOJEN et al., 2016).

129
De acordo Moojen et al. (2016), a dificuldade de aprendizagem está relacionada
diretamente com problemas de ordem pedagógica, sociocultural, emocional ou até
mesmo neurológica. Porém os transtornos de aprendizagem são oriundos das disfunções
do sistema nervoso central e relacionados a problemas da aquisição e processamento
da informação adquiridas dentro do seu meio ambiente.

De fato, os problemas de aprendizagem são mais evidentes no contexto es-


colar, aonde necessita-se de uma atenção aos termos utilizados para descrever tais
problemas, pois é comum nessa fase haver comparação de crianças da mesma idade
cronológica, em observação ao desempenho e as capacidades de aprendizagem.

É através da comparação que se observa a defasagem de aprendizado, até ai


tudo certo, o erro se concretiza na confusão em identificar se existe ou não um real
distúrbio, o que pode ser confundido como fracasso escolar ou simplesmente falta de
interesse e preguiça, comprometendo o desenvolvimento da criança.

O que diferencia a dificuldade de aprendizado com os transtornos de aprendi-


zado é que os problemas que ocasionam essa dificuldade no aprendizado têm origens
externas ao indivíduo destacando se problemas socioculturais ou pedagógicos (FELIX
e FREIRE, 2012).

As causas da dificuldade de aprendizado podem ter relações físicas ou sensoriais.


Sendo como principais causas físicas, um estado físico geral que ocasione desconforto,
dores ou perturbação no indivíduo como (febre, dores de cabeça e de ouvido, cólicas
intestinais, anemia, asma, verminoses, entre outras). As causas Sensoriais são
ocasionadas por uma disfunção nos órgãos dos sentidos (visão, audição, comunicação),
problemas relacionados ao modo de captação das mensagens do mundo exterior,
referentes ao processamento das informações (GIROTTO; GIROTTO; OLIVEIRA, 2015).

O mais importante é saber que, diante de um aluno que apresente dificuldade


para aprendizado, o mais importante e buscar melhorar a atitude do educador de forma
a diversificar o ensino, estando atento ao perfil de aprendizagem de cada um de seus
alunos, além de orientar os pais que estejam atentos ao comportamento e características
do filho e buscar um acompanhamento de um especialista.

TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM

Os transtornos de aprendizagem são caracterizados por terem origem de


disfunções do sistema nervoso central e relacionados a problemas da cognição e
processamento das informações (MOOJEN et al., 2016).

Para Siqueira e Gurgel-Giannetti (2011) o transtorno de aprendizagem possui


uma relação direta com problemas na aquisição e desenvolvimento de funções cerebrais
as quais envolvem o ato de aprender, podendo destacar a dislexia e a discalculia.

130
O transtorno de aprendizado e caracterizado por problemas relacionados a
distúrbios de ordem interna ou externa do indivíduo, apresentando dificuldades no
uso da escrita, leitura, calculo, raciocínio entre outros, problemas esses que se não
acompanhados de forma adequada e em tempo hábil podem gerar danos irreparáveis a
criança (CIASCA, 2003).

DISLEXIA

A dislexia e um dos transtornos que afetam o aprendizado do indivíduo nos cam-


pos da leitura e da escrita. A criança que apesenta este tipo de distúrbio demostra dificul-
dades em decodificar as letras do alfabeto, sente dificuldade em atividades que envolva a
leitura, de modo que essa falha prejudica o seu desempenho (CLEIVA et al., 2006).

A dislexia e uma forma de transtorno que se manifesta de forma cognitiva e com-


portamental, ou seja, heterogênea, combinada na maioria das vezes por outros transtornos
como déficit de atenção, hiperatividade e/ou distúrbios de conduta. (MOOJEN et al., 2016).

Esse tipo de dificuldade refere-se a um transtorno genético e hereditário, que


compromete a capacidade de ler e escrever de forma correta. O problema tem origem
neurobiológica, e se manifesta ainda na infância, podendo persistir durante a vida adulta.

A dislexia e um tipo de transtorno ocasionado por uma alteração no cromos-


soma, sendo comum que mais de uma pessoa na família apresente o problema. São
muitos os especialistas que consideram que o primeiro sinal do problema costuma ser a
dificuldade na fala, de modo que a criança demora mais do que as demais crianças para
começar a falar, desenvolvendo problemas na percepção fonética, ou seja, começa a
pronunciar palavras erradas porque não consegue assimilar os sons básicos das sílabas
e letras (CLEIVA et al., 2006, MOOJEN et al., 2016, CIDRIM e MADEIRO, 2017).

O transtorno de Leitura/Dislexia advém de um transtorno de base neurobioló-


gica, caracterizado principalmente pela Inversões, substituições ou omissões de letras,
caracterizado por uma leitura lenta, tanto em voz alta quanto na leitura silenciosa, baixo
desempenho, sendo inferior ao esperado para a idade/ano, mesmo com potencial inte-
lectual na média ou superior, além da dificuldade para compreender o que leu (CIDRIM
e MADEIRO, 2017).

Sendo a dislexia um distúrbio de ordem neurológica, seu comprometimento


influência na habilidade de decodificação e soletração, consequências de uma
deficiência fonológica da linguagem. A maior dificuldade enfrentada por uma pessoa
com dislexia ocorre na linguagem escrita, na ortografia e na lentidão da leitura (CIDRIM
e MADEIRO, 2017).

Em alguns casos o indivíduo com dislexia pode apresentar também a presença


de disgrafia (letra feia), ou da discalculia (dificuldade com a matemática, sobretudo
na assimilação de símbolos e na tabuada). Ocasionado ainda comprometimento

131
e dificuldades em memorização a curto prazo, organização, na orientação “como
seguir uma indicação de um caminho”, a execução de tarefas de modo sequencial, a
compreensão de textos e o aprendizado de uma segunda língua (RODRIGUES, 2016).

O aluno disléxico apresenta inúmeras dificuldades no aprendizado, que pode


ainda estar associada a desmotivação ou falta de interesse ou esforço do aluno.
Sendo assim a associação negativa que muitas vezes e feita sobre as dificuldades de
aprendizado da criança disléxica, ocasionam na mesma uma falta de autoconfiança e
autoestima o que faz com que ela se sinta menos capaz ou inteligente que os colegas,
aumentando os prejuízos em seu aprendizado e rendimento escolar (SILVA, 2016)

Embora tenha-se o conhecimento que a dislexia tem relações hereditárias


alguns pesquisadores apontam que a dislexia pode surgir de repente na vida adulta
sendo denominada de “dislexia adquirida”, ou afasia e que se difere da dislexia de
desenvolvimento, que é hereditária e congênita (RICHART e BOZZO, 2009).

DISCALCULIA

A discalculia é um transtorno de aprendizado definido como uma desordem


neurológica específica que afeta a habilidade de uma pessoa de compreender e manipular
números. Para que o individuo possa ser enquadrado com transtorno de discalculia o
mesmo não pode ser causada por problemas na visão e/ou audição (GIROTTO; GIROTTO;
OLIVEIRA, 2015).

O termo discalculia engloba especificamente à dificuldade de executar opera-


ções matemáticas ou aritméticas, sendo definido por alguns profissionais educacionais
como uma inabilidade mais fundamental para conceitualizar números, como um con-
ceito abstrato de quantidades comparativas (DA SILVA; DA COSTA, 2008).

Para Bernardi e Stobäus (2011), é importante que o transtorno seja reconhecido


o mais rápido possível, o diagnóstico tardio pode comprometer o desenvolvimento
escolar da criança, prejudicando sua autoimagem e autoestima o que pode ocasionar
medo de enfrentar novas experiências de aprendizagem. Desta forma a criança adota
comportamentos inadequados, tornando-se agressiva, apática ou desinteressada

Os individuos com discalculia apresentam dificuldades com as operações arit-


méticas, operações matemáticas e situações problemas, ocasionados por uma disfunção
cerebral orgânica. Sendo assim o indivíduo com esse tipo de dificuldade passam por mui-
tos obstáculos relacionado a atividades que envolvam o raciocínio lógico e aos processos
ligados aos números e quantidades. Para uma pessoa que não apresente nenhum dis-
túrbio, é simples dizer quantos jogadores participam de uma partida de futebol, mas para
uma pessoa com discalculia pode ser um desafio (SIQUEIRA; GURGEL-GIANNETTI, 2011).

Para que haja a detecção da discalculia o professor precisa estar atento à


trajetória da aprendizagem do aluno, observando e analisando as atitudes do mesmo.
A principais característica são: apresentação de símbolos matemáticos malformados,

132
evidenciando a incapacidade de operar com quantidades numéricas; a não distinção
dos sinais das operações; demonstração de dificuldade na leitura de números e não
conseguir localizar espacialmente os sinais e operações de multiplicação e divisão (DA
SILVA; DA COSTA, 2008).

COMO O PROFESSOR PODE CONTRIBUIR NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA


CRIANÇA COM TRANSTORNO DE APRENDIZAGEM

A capacidade do professor em identificar os transtornos de aprendizagem e


de extrema importância para o desenvolvimento da criança. Através da identificação
do distúrbio é possível proporcionar ao aluno um suporte adequado, melhorando sua
capacidade de aprendizagem.

O ato de compreender as fases em que o aluno se encontra torna-se uma


ferramenta necessária para auxiliar na eficácia do aprendizado. A compreensão permite
que o professor execute um trabalho que contribua para o desenvolvimento da criança,
compreendendo que a interrupção em uma das fases pela qual a criança ainda está
se apropriando pode originar a dificuldade de aprendizagem (DE OLIVEIRA; LUKASOVA;
MACEDO, 2010).

Os programas de intervenção mais eficazes na reeducação da dislexia e da


discalculia são direcionado para a estimulação e treino dos seus diferentes componentes
sensoriais, com particular enfoque nas áreas do cérebro responsáveis pela leitura e
escrita no caso da dislexia e raciocínio lógico-matemático na discalculia.

COMO ESTIMULAR O APRENDIZADO DE CRIANÇAS COM DISLEXIA

A escolar precisa ser organizada de modo que considere as particularidades


de cada aluno. Quanto a dislexia, a escola deve buscar meios para que os docentes
desenvolvam estratégias para proporcionar a criança disléxica o melhor atendimento
quanto as suas necessidades.

De acordo com Silva (2011), algumas atividades devem ser desenvolvidas a


fim de estimular o desenvolvimento do aluno. Em relação as dificuldades fonológicas o
professor deve promover atividades de rima, de adição, de segmentação e de inversão
fonêmica. Já as atividades alienadas ao treino ortográfico devem incluir sessões de
leitura de palavras e de textos, de memorização de morfemas e de construção de
palavras. Desta forma, ambos os trabalhos proporcionam desenvolvimento de leitura e
da consciência fonológica.

A estimulação fonológica pode ocorrer através de atividades que estimulem as


habilidades discriminatória como: sons variados, associação de sons a fontes, percepção
auditiva, concentração e atenção, estimular atividades que possibilitem a compreensão
da fala e como e formada por sequência de palavras, estimulação a percepção da ordem
das palavras e compreensão do seu significado, promoção de atividades que gerem a
compreensão de que as palavras são formadas silabas (TABAQUIM et al., 2016).

133
Os jogos também podem ser utilizados como subsídio para o desenvolvimento
da aprendizagem, através de movimentos corporais (como palmas), possibilitando a
percepção e compreensão da relação das palavras com os gestos, utilizando a repetição
como meio de memorização. Podem ser utilizados também artifícios tecnológicos
como o trabalhos e aulas gravados para proporcionar melhor entendimento do aluno
(SCHIRMER; FONTOURA; NUNES, 2004; SILVA, 2013).

De acordo com Silva (2011) atitudes como proporcionar mais tempo para
conclusão das atividades, auxiliar o aluno a realizar anotações, marcações e destaques
em texto, adaptar as atividades de acordo com as necessidade do aluno, simplificar
instruções escritas, destacar as partes convenientes e mais importantes, diminuir o
texto a ser lido, evitar objetos, ações que ocasionem a distração do aluno, são algumas
das atividades que se devem ser desenvolvidas pelo professor.

COMO ESTIMULAR O APRENDIZADO DE CRIANÇAS COM DISCALCULIA

A pessoa com discalculia deve ser estimulada a realizar uma relação mais
próxima com os números, ou seja, da quantidade com a assistência de materiais
próximos a sua realidade e de maneira concreta que estimulem seu interesse e favoreça
a capacidade de aprendizado.

Como auxílio no aprendizado da criança com discalculia sugere-se algumas


atividades práticas como o desenvolvimento da orientação temporal e espacial; jogos
matemáticos; material concreto; blocos lógicos; quadro valor, lugar; simulação de
compras; atividades de estimativa e medidas entre outras. Assim sendo o professor deve
proporcionar aos alunos atividades que auxiliem e motivem a criança com discalculia
a aprender. Lembrado sempre que as atividades devem respeitar as diferenças e as
individualidades de cada aluno (MORAES, S/D).

E muito importante que a criança que apresente transtorno de aprendizagem


“discalculia” seja o mais rapidamente possível inserida a atividades relacionadas à sua
realidade de forma concreta, de modo que se relacione o aprendizado com materiais
auxiliares e com a realidade além da escola, deste modo aumentando a eficácia no
aprendizado.

Atividades desenvolvida como projetos, dramatizações, gincanas e outras


alternativas devem compor o repertório de ensino do professor como estratégia de
estimular o aluno para que possa atingir o objetivo que é o da aprendizagem. Atividades
diversificadas podem atrair e estimular o interesse do aluno aumentando sua capacidade
de retenção das informações (DA SILVA; DA COSTA, 2008).

FONTE: <https://bit.ly/38H0qbP>. Acesso em: 31 mar. 2022.

134
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os transtornos de aprendizagem são os transtornos que causam discrepâncias entre


os níveis reais de desempenho acadêmico, e envolvem deficiências ou dificuldades
na concentração, atenção, linguagem ou processamento visual de informações.

• Desde o princípio da humanidade há relatos sobre a marginalização e tratamento


estigmatizado aos indivíduos que são diferentes, não considerados normais, pelo
fato de não atenderem aos padrões preestabelecidos.

• A fundação oficial do campo das dificuldades de aprendizagem foi em 1963, e em


1965, sua constituição, como uma divisão da Organização Internacional de Educação
Especial, no Conselho Internacional para as Crianças Excepcionais, o que tem uma
história de 39 anos.

• O campo das dificuldades de aprendizagem agrupa uma série de conceitos, critérios,


teorias, modelos e hipóteses, sendo um fenômeno extremamente complexo.

• Historicamente, já foi aceito que as dificuldades de aprendizagem incluiriam


dificuldades acadêmicas e não acadêmicas. As acadêmicas seriam as dificuldades
de leitura, matemática, soletração e escrita, e as não acadêmicas são os problemas
visomotores, no processamento fonológico, na linguagem, na memória e também
problemas perceptivos.

• Os principais fatores que afetam as dificuldades de aprendizagem são: a personalidade


do próprio sujeito, as instituições educativas, incluindo suas áreas metodológicas e
de organização e os contextos familiares e sociais.

• A maioria das dificuldades de aprendizagem não tem causas orgânicas e nem está
relacionada com as atividades cognitivas da criança, mas tem relação com problemas
educativos ou ambientais. A família e o ambiente são importantes no processo de
aprendizagem, já que a falta de determinadas experiências pode comprometer
aspectos como, por exemplo, a coordenação motora.

• É muito importante o diagnóstico e a avaliação global da criança ou adolescente,


considerando as diversas possibilidades de alterações que resultam nas dificuldades
de aprendizagem, para que o tratamento seja o mais específico e objetivo possível.

• A avaliação interdisciplinar é fundamental para fechar um diagnóstico em transtornos


de aprendizagem, o trabalho em equipe mostra quais as habilidades que estão mais
deficitárias no indivíduo.

135
• A avaliação nada mais é do que um recorte momentâneo de um estado em que
o indivíduo se apresenta. Por este motivo, não se faz apenas uma avaliação, mas
sim várias avaliações, buscando os melhores resultados. É muito importante que o
profissional esteja atento a todas as esferas da aprendizagem.

• O diagnóstico é importante para coletar informações precisas e confiáveis sobre a


competência da criança, podendo ser feito através de provas formais de habilidades e
sucesso acadêmico que demonstrem se o desenvolvimento da criança está alterado
ou atrasado. Essa avaliação deve considerar todo o contexto no qual o sujeito está
inserido. As informações sobre o desenvolvimento normal é que nos dão orientações
sobre onde reside o problema de uma criança com dificuldades.

• Todos os alunos são diferentes, tanto em suas capacidades, quanto em suas motiva-
ções, interesses, ritmos evolutivos, estilos de aprendizagem, situações ambientais e
sabemos que este é um processo complexo em que estão incluídos inúmeros fato-
res: alunos, professores, concepção e organização curricular e metodologias.

• O tratamento da maioria dos transtornos de aprendizagem focaliza a conduta


educacional, mas também pode envolver tratamentos médicos, comportamentais
e psicológicos. Os programas de ensino com uma abordagem estratégica podem
amenizar o uso dos fármacos e possibilitar ensinar a criança como aprender.

• Algumas crianças podem necessitar como tratamento instruções especializadas


em apenas uma área enquanto continuam a frequentar classes regulares. Já outras
crianças podem necessitar de programas educacionais separados e mais intensos.

136
AUTOATIVIDADE
1 Os transtornos de aprendizagem são os transtornos que causam discrepâncias entre
os níveis reais de desempenho acadêmico, e envolvem deficiências ou dificuldades
na concentração, atenção, linguagem ou processamento visual de informações. Com
relação ao diagnóstico destes transtornos, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O diagnóstico desses transtornos vai incluir avaliações médicas, psicológicas,


intelectuais, educacionais, de fala e linguagem e o tratamento consiste na abor-
dagem educacional e, em alguns casos terapêutica, médica, comportamental e
psicológica.
b) ( ) O diagnóstico desses transtornos não deve incluir avaliações médicas, psicoló-
gicas, intelectuais, educacionais, de fala e linguagem.
c) ( ) O diagnóstico desses transtornos vai incluir somente avaliações psicológicas,
intelectuais, educacionais, de linguagem, comportamental e psicológica.
d) ( ) O diagnóstico desses transtornos vai incluir avaliações médicas, psicológicas,
intelectuais, educacionais, de fala e linguagem e o tratamento consiste na abor-
dagem educacional e, em alguns casos terapêutica, médica, comportamental e
psicológica.

2 O campo das dificuldades de aprendizagem agrupa uma série de conceitos, critérios,


teorias, modelos e hipóteses, sendo um fenômeno extremamente complexo. Com
base nas dificuldades de aprendizagem, analise as sentenças a seguir:

I- Há a existência das dificuldades de aprendizagem permanentes, que afetam as par-


tes cognitiva, sensorial, física, motora, afetiva, emocional e sociocultural, engloban-
do uma base neuropsicológica, biológica ou constitucional afetada.
II- Os principais fatores que afetam as dificuldades de aprendizagem não são: a
personalidade do próprio sujeito, as instituições educativas, incluindo suas áreas
metodológicas e de organização e os contextos familiares e sociais.
III- Historicamente, já foi aceito que as dificuldades de aprendizagem incluiriam
dificuldades acadêmicas e não acadêmicas. As acadêmicas seriam as dificuldades
de leitura, matemática, soletração e escrita, e as não acadêmicas são os problemas
visomotores, no processamento fonológico, na linguagem, na memória e também
problemas perceptivos.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

137
3 A classificação das dificuldades de aprendizagem pode ser feita através do sistema
etiológico ou do sistema funcional. De acordo com a classificação das dificuldades de
aprendizagem, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

(   ) O sistema etiológico classifica as dificuldades de aprendizagem com base na sua


causa. Pode predizer uma dificuldade em longo prazo, desde que já tenha sido
observada e possibilita examinar o conjunto de dificuldades de uma etiologia.
Mas muitas dificuldades de aprendizagem têm etiologia desconhecida, e também
podem ser semelhantes, mas podem se manifestar de forma distinta, requerendo
estratégias de intervenção diferentes.
(   ) O sistema de classificação funcional distingue as crianças com base nas medidas
de inteligência: aquelas com desenvolvimento intelectual abaixo da média,
consideradas lentas ou deficientes mentais, e aquelas com desenvolvimento
intelectual normal, mas com dificuldade específica em alguma tarefa, como por
exemplo, a leitura.
(   ) É comum que crianças com o desenvolvimento intelectual normal apresentem uma
diferença entre o nível de sucesso na área em que se situa a dificuldade específica
e os níveis de sucesso em outras áreas do funcionamento cognitivo.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) V – F – F.
b) (   ) V – V – V.
c) (   ) F – V – F.
d) (   ) F – F – V.

4 A avaliação interdisciplinar é fundamental para se fechar um diagnóstico em trans-


tornos de aprendizagem, o trabalho em equipe mostra quais habilidades estão mais
deficitárias no indivíduo. Disserte sobre o que envolve este processo.

5 A avaliação nada mais é do que um recorte momentâneo de um estado em que o


indivíduo se apresenta. Por este motivo, não se faz apenas uma avaliação, mas sim
várias avaliações, buscando os melhores resultados. Neste contexto, disserte sobre a
importância de o profissional estar atento a todas as esferas de aprendizagem.

138
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São Paulo: Associação de Leitura do Brasil, 2003.

143
144
UNIDADE 3 —

ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO
DO ACOMPANHAMENTO
TERAPÊUTICO, ANAMNESE,
ENTREVISTA, MODELOS DE
INTERVENÇÃO E PLANO
TERAPÊUTICO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os conceitos que caracterizam a interface do Acompanhamento


Terapêutico;

• entender as estratégias de intervenção que caracterizam a interface do Acompanha-


mento Terapêutico;

• compreender o processo de avaliação e diagnóstico dos transtornos de aprendizagem;

• entender o planejamento e acompanhamento de intervenções junto a instituições e


familiares.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ESCOLA E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM


TÓPICO 2 – ATUAÇÃO DO ACOMPANHANTO TERAPÊUTICO ESCOLAR
TÓPICO 3 – VISÃO GERAL SOBRE A APRENDIZAGEM E O PROCESSO DE ANAMNESE

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

145
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!

Acesse o
QR Code abaixo:

146
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
ESCOLA E AS DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM

1 INTRODUÇÃO
A inclusão escolar se relaciona, historicamente, com a noção da diferença.
O pensamento atual aponta para uma ressignificação da diferença, para um
reconhecimento da diferença como inerente à constituição humana. Através das leis e
da elaboração dos projetos políticos voltados à “diferença”, se debruça, inicialmente, para
o atendimento das demandas para contornar as situações de exclusão e discriminação.
Direitos resguardados por lei como a educação, lazer, trabalho e direitos estão descritos
na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Brasil, Lei 13.146/15), entretanto,
a sociedade tem que ser convidada e envolvida a acolher a diversidade como forma de
garantir o direito de todos, e com isso surgem as ações inclusivas e os movimentos
de acolhimento e aceitação da diferença como recurso minimizador da exclusão e do
abandono social (BRASIL, 2015).

A escola como instituição social tem seu papel através da transmissão e a


veiculação de saberes e práticas para todos. Por meio das relações de diálogo e da criação
de vínculos, e tendo a diversidade como valor, deve trabalhar no sentido de romper com
a lógica da exclusão e da homogeneização. Ou seja, seu papel principal é formar as
crianças para a tarefa de renovar um mundo que está ainda repleto de situações de
exclusão. Nessa perspectiva, são pressupostos que o processo de aprendizagem de
cada criança é singular, que toda a criança aprende e que todas são importantes para o
processo de construção de conhecimento no ambiente escolar (MIRANDA, 2003).

Mas a dita educação inclusiva vem com suas dificuldades físicas e institucio-
nais que se refletem na necessidade de formação qualificada e de apoio técnico no
trabalho com os alunos, no entendimento do professor sobre a inclusão, devido às
mudanças no cotidiano do seu trabalho, e, principalmente, no processo de ensino,
que ainda está parado no formato tradicional binário ensinar-aprender, vinculado às
premissas de ajuste ou correção do indivíduo, modelo que não viabiliza o processo de
inclusão (CABRAL; MARIN, 2017).

Para auxiliar os alunos que necessitam de ajuda, a escola está se firmando no


Acompanhamento Terapêutico Escolar, que tem seus referenciais históricos nas ideias
propostas pela Reforma Psiquiátrica. Segundo Pitiá e Furegato (2009), o Acompanha-
mento Terapêutico surgiu nesse contexto de transformações e influências direcionadas
para o fechamento dos manicômios na Europa Ocidental na década de 1960. Assali et

147
al. (1999) situam que a nomeação deste profissional que acompanha as crianças na es-
cola como Acompanhante Terapêutico é um empréstimo do Acompanhante Terapêutico
que surge a partir da Reforma Psiquiátrica, e isto pode ser entendido pela função que
o acompanhante realiza tanto na rua como na escola, uma vez que participa da reinte-
gração do paciente no universo social e faz uma ponte entre estes sujeitos e as mais
diversas problemáticas que possam enfrentar no laço social. Este seria o ponto comum
entre o que a autora nomeia como Acompanhante Terapêutico da Reforma Psiquiátrica
e o Acompanhante Terapêutico na escola. Portanto, coube então a este profissional no-
vamente tirar vantagens e poder acompanhar a loucura onde ela esteve sempre excluí-
da, no caso da infância, trata-se necessariamente do território escolar (SERENO, 2006).

Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos uma breve contextualização sobre a


importância da escola para as crianças, na sequência apresentaremos uma breve
análise sobre as dificuldades e as necessidades da escola para atender às necessidades
das crianças, e, por fim, o papel do acompanhante terapêutico escolar.

2 A ESCOLA, O TERRITÓRIO ESCOLAR


A criança moderna é, por definição, escolar; a escola apresenta e oferta um lugar
social para as crianças socializarem entre outras crianças, é na escola que se constrói
parte da identidade de ser e pertencer ao mundo. A escola tem o papel oficial responsável
pelo reconhecimento e organização da constituição do futuro cidadão produtivo,
através da aquisição dos princípios éticos e morais que permeiam a sociedade, seja
do ponto de vista da ordem prática, da alfabetização através da aquisição dos modelos
de aprendizagem até o diploma; ou do ponto de vista do valor, da entrada na lógica
de produção capitalista, também tem a ação preventiva à violência quando as escolas
convertem-se em espaços articuladores de redes de saúde, cultura, educação, lazer e
qualificação profissional (KUPFER, 2000).

A criança, desde seu nascimento, já pertence a um determinado grupo social


denominado família, tendo suas necessidades básicas inevitavelmente supridas pelos
membros mais velhos da família e estão programadas para serem satisfeitas em
sociedade. O grupo social onde a criança nasce também necessita da incorporação
deste novo membro para manter-se e sobreviver e, por isso, além de satisfazer as
suas necessidades necessárias a sua sobrevivência também lhe transmite a cultura
acumulada ao longo dos anos de vivência. Esta transmissão cultural envolve valores,
normas, costumes, atribuição de papéis, ensino da linguagem, habilidades e conteúdos
escolares, bem como tudo aquilo que cada grupo social foi acumulando ao longo da
história evolutiva, e que é realizado através de determinados agentes sociais, que
são encarregados de satisfazer às necessidades da criança e incorporá-la ao grupo
social. Entre esses agentes sociais estão os pais, os meios de comunicação, a escola
e o professor. Assim, o processo de socialização é uma interação entre a criança e seu
meio. Esta interação e seu resultado dependem das características da própria criança e
da forma de agir dos agentes sociais (COLL, 1999; PALÁCIOS; COLL; MARCHESI, 1995).

148
Faz-se importante essa socialização inicial, por isso é importante garantir o
direito ao acesso à escola para todas as crianças. Segundo Kupfer (2006), a escola
garante um lugar de pertinência, quem vai à escola recebe o estatuto de criança. Além
disso, a escola representa uma passagem de uma convivência apenas familiar para uma
ampliação dos laços sociais.

Continuando com Palácios, Coll e Marchesi (1995), os autores descrevem que a


socialização ocorre através de três processos: os processos afetivos de socialização; os
processos mentais de socialização; e os processos condutuais de socialização:

• Os processos afetivos de socialização são uma das bases mais sólidas do


desenvolvimento social da criança, sendo a empatia (capacidade de se colocar no
lugar do outro, sentir o que a outra pessoa possivelmente está sentindo), o apego
(a criança se apega instintivamente a quem cuida dela) e a amizade (relação afetiva
entre os indivíduos), não só uma forma de união ao grupo, mas também mediadores
de todo o desenvolvimento social.
• Os processos mentais de socialização correspondem ao conhecimento dos valores,
costumes, pessoas, normas, instituições, bem como aprendizagem da linguagem e a
aquisição de conhecimentos transmitidos através da escola.
• Por fim, os processos das condutas de socialização envolvem a aquisição das
condutas consideradas socialmente desejáveis, evitando aquelas que são julgadas
como erradas ou antissocial.

As motivações que favorecem a conduta social podem basear-se na moral


(o que pressupõe interiorização de normas), o raciocínio sobre a utilidade social de
determinados comportamentos, o medo do castigo, ou o medo de perder o amor ou
os favores que recebem dos demais. Assim, entende-se que o desenvolvimento social
implica aprender a evitar as condutas consideradas socialmente indesejáveis e a
aquisição de determinadas habilidades sociais (PALÁCIOS; COLL; MARCHESI, 1995).

A forma pela qual as crianças lidam com as regras, com a justiça e a moral varia
no decorrer do processo de desenvolvimento. Para Moura (2003), a escola pode ser
pensada e considerada um território. Território este que se refere ao espaço entendido
como um local composto de relações, com suporte material e eventuais regras de
relações. Para o autor, esse espaço se constitui juntamente aos outros integrantes
deste território e aquilo que justifica estar aí.

Para as crianças, nesse território escolar, nas suas relações com os seus iguais,
descobrem que é necessária a reciprocidade para agir conforme as regras, levando
em conta que as regras são efetivas, desde que as pessoas envolvidas na situação
concordem em aceitá-las. Sua procedência não mais deriva da autoridade externa, mas
resultam de acordos entre os indivíduos envolvidos e, portanto, podem ser modificadas
(PIAGET, 1994).

149
Este meio escolar pode ser considerado um microcosmo da sociedade, onde a
criança se relaciona com muitas outras pessoas, com diferentes graus de conhecimento
com as quais estabelece as mais diversas relações, sendo, além disso, um ambiente
que, em si mesmo, constitui um sistema social, com normas e funcionamento alheios à
criança, mas nos quais esta é mergulhada e deve ir compreendendo (PALÁCIOS; COLL;
MARCHESI, 1995).

Como afirma Jerusalinsky (2006), a escola é a instituição incumbida pela


sociedade de transmitir cultura, instruir, proteger e preparar as crianças para o futuro,
enquanto as possibilidades de escolhas não chegam. Isto implica que, frente à inclusão
de crianças com necessidades especiais, a escola tenha um projeto de transmissão de
cultura inclusive para estas crianças, um projeto que crie e dê expectativas quanto a
sua aprendizagem e lhes propicie desafios fundamentais para suas aquisições e não
apenas deixá-las na escola porque todas as crianças vão.

A escola, juntamente à família, é a instituição social que mais vai trazer


repercussões para a criança. A escola não só intervém através da transmissão do
saber cientificamente organizado e da cultura como também intermedeia todos os
aspectos relativos aos processos de socialização e individuação da criança, como são
o desenvolvimento das relações afetivas, a aquisição de destrezas relacionadas com a
competência comunicativa, a habilidade de participar em situações sociais, das condutas
pró-sociais e da própria identidade pessoal (PALÁCIOS; COLL; MARCHESI, 1995).

Segundo Jerusalinsky (2006), o circular na escola e na sociedade não basta, o


que importa é pensar a partir de quais referências se constitui o percurso a ser traçado
durante esta trajetória. O caminho vai sendo construído não aleatoriamente, só para
distrair ou passar o tempo, ele deve ser construído de acordo com o despertar dos
interesses que comparecem ao estabelecimento do laço entre o desejo de uma criança,
com a singularidade que ele comporta, e o social.

3 ESCOLA E SUAS DIFICULDADES E NECESSIDADES

A Legislação Brasileira através da LDB, Lei nº 9.394/96 prevê igualdade de


condições ao acesso e permanência na escola para todas as crianças. Com essa
legislação em vigor fica garantido o direito de as crianças com necessidades educacionais
especiais estarem matriculadas em escolas regulares e, assim, coloca em evidência os
desafios sobre a questão da inclusão escolar. No entanto, não é o fato de o direito ao
acesso à escola estar garantido, que garante uma inclusão escolar bem-sucedida. Este
processo não é simples e nem sem obstáculos, nem para as crianças, nem para as
escolas, ainda mais quando se trata de uma criança com comprometimento psíquico
grave, pois implica mudanças e possíveis dificuldades para ambas as partes.

150
FIGURA 1 – NA SALA TODOS SÃO IGUAIS

FONTE: <https://bit.ly/3jqLr7D>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Com relação à Lei nº 9.394/96, vale frisar que seu capítulo V trata da educação
especial, no qual é afirmado que a educação das pessoas com necessidades especiais
se deve dar, preferencialmente, na rede regular de ensino. Segundo Baumel e Moreira
(2001), essa questão tem gerado muita polêmica, principalmente para as escolas, pois se
de um lado a busca por uma educação de qualidade é uma luta travada historicamente,
por outro, as ações governamentais sustentadas em práticas neoliberais, que apontam
para a organização autônoma da população e para a formação de associações privadas,
entendendo ser este o caminho para uma “sociedade igualitária”, têm causado incertezas
e inquietações em relação à atuação do Estado na garantia e no cumprimento de suas
obrigações para a efetivação de uma educação que respeite a diversidade.

É relevante destacar que no artigo 5º das Diretrizes Nacionais para a Educação


Especial na Educação Básica os alunos com necessidades educacionais especiais são
considerados os que apresentam:

I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no


processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento
das atividades curriculares, compreendidas em dois grupos:
a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica;
b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou
deficiências;
II – dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos de-
mais alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos apli-
cáveis;
II - altas habilidades/superdotação, grande facilidade de aprendiza-
gem que os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e
atitudes (BRASIL, 2001, s.p.).

151
Diante disso, a escola se encontra com a responsabilidade de pensar em es-
tratégias que possam viabilizar este processo de interação, ou seja, que viabilizem a
permanência destas crianças na escola, a convivência e a interação com as outras
crianças, com os professores, a participação ativa delas no cotidiano escolar, e, prin-
cipalmente, que elas possam ser inseridas num projeto pedagógico (PEGORELLI, 2011).

Sendo assim, amplia-se a abrangência da educação especial, sendo ela amplia-


da para passar a incorporar não apenas as dificuldades de aprendizagem relacionadas a
condições, disfunções, limitações e deficiências, mas também aquelas não vinculadas
a uma causa orgânica específica, levando em conta que por dificuldades cognitivas,
psicomotoras e de comportamento, os alunos geralmente são frequentemente negli-
genciados ou mesmo excluídos dos apoios escolares (CORNELSEN, 2007).

A falha do sistema educacional também se relaciona com os profissionais que


lidam diretamente com o aluno que possui necessidades especiais, ou seja, o professor.
Sobre isso, há a publicação de Silveira e Neves (2006), autoras que estudaram a
concepção de pais e professores acerca da inclusão escolar de crianças com deficiência
múltipla. As autoras relatam que os dados que obtiveram na pesquisa apontam para
uma necessidade evidente de mudanças no sistema de ensino, enfatizando a formação
profissional como uma questão central para a implementação da escola inclusiva.

Silveira e Neves (2006), em seu estudo, notaram que professores de Centros de


Ensino Especial do Distrito Federal demonstraram descrença quanto à possibilidade de
inclusão escolar de crianças com deficiência múltipla e relatam experienciar o sentimento
de frustração, fracasso e decepção em relação ao atendimento que dispensam a esses
alunos diante da falta de perspectiva quanto ao seu desenvolvimento. Apesar de ser
um estudo envolvendo professores de alunos com deficiência múltipla, com essas
experiências constatamos que os resultados da pesquisa mencionada talvez possam
ser estendidos para outros casos de alunos considerados com necessidades especiais.
Além disso, não se restringem às escolas públicas; encontramos as mesmas dificuldades
referentes a professores despreparados, desmotivados e descrentes na potencialidade
das crianças em instituições particulares de ensino.

Até meados dos anos 1990, os princípios da educação brasileira estavam


sedimentados nos processos de integração e normalização, que consistiam em ajudar
as pessoas com necessidades educacionais especiais a adquirir condições e padrões
da vida cotidiana o mais próximo do normal possível, objetivando sua inserção junto à
sociedade. Nesse processo, os alunos com necessidades especiais eram organizados
com raras exceções, de forma a separá-los dos grupos de crianças consideradas
normais, fosse mantendo-os em escolas especiais, ou nas classes especiais, em escolas
de ensino regular (CORNELSEN, 2007).

152
A concepção da escola, de uma maneira geral, ainda visa ao fim em si, e não
a processo do aprender por diferentes caminhos. A busca por resultados positivos
(sendo os resultados ditos positivos, considerados os altos índices de aprovação, em
contraposição à repetência e evasão escolar) ao longo da experiência escolar tende
a direcionar o trabalho pedagógico, pois há conteúdos programáticos que devem
ser trabalhados em uma organização temporal inflexível, e a escola, pelo papel dos
professores, são cobrados por isso. Essa tendência a focalizar os resultados, e não o
processo de aprendizagem dificulta a inserção de alunos com necessidades educacionais
especiais em classes regulares de ensino. A escola tem que levar em consideração que
está lidando com seres diferentes, que caminham com ritmos diferentes. Se a escola
não valoriza as diferenças, acaba por privilegiar apenas alguns alunos, em termos
de disponibilidade de informações e acesso ao conhecimento científico, mas para o
desenvolvimento humano em nada contribui, pelo contrário, fortalece o individualismo
e a competição que movem o mundo do trabalho hoje (CORNELSEN, 2007).

FIGURA 2 – NA SALA TODOS TÊM DIREITO

FONTE: <https://bit.ly/3jqLr7D>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Parra (2009) relata em sua pesquisa que mesmo nas escolas públicas, que são
o alvo principal da legislação, desde as leis federais até a lei distrital, como no caso do
Distrito Federal, não se tem hoje uma garantia de atendimento educacional adequado.
Sua experiência com crianças atendidas por terapeutas do grupo e matriculadas na
rede pública de ensino demonstrou a grande discrepância entre o que vem ocorrendo
na prática e o que está escrito nos documentos:

Acompanhamos o caso de uma criança de 10 anos, há quatro


estudando em classe de condutas típicas de uma escola pública
de ensino regular. Esse garoto, que chamarei de Gustavo, teve sete
professores diferentes em um período de dois anos. A psicóloga
sempre se mostrou disponível para a escola, marcando reuniões
com diretora e cada professora que trabalhou com Gustavo. Nessas
reuniões, sempre era afirmado pela equipe escolar que o trabalho
estava sendo desenvolvido, e que os objetivos vinham sendo
alcançados. Entretanto, em 2008, a professora mais recente de
Gustavo sugeriu, em reunião com a psicóloga e posteriormente
com a mãe, que o garoto fosse encaminhado para o Centro de

153
Ensino Especial (CEE), o que deveria ser considerado um absurdo,
pois é exatamente o contrário do que estabelece a proposta de
inclusão escolar. Na ocasião, a professora explicou que as atividades
realizadas com Gustavo em sala de aula eram as mesmas que
seriam propostas no CEE, com a vantagem de que nesse último o
garoto teria uma atenção maior – na classe de condutas típicas,
havia duas professoras e ele estudava com mais dois colegas; no
CEE, ele teria a exclusividade de um professor. A professora havia
trabalhado durante anos em centros como esse e se mostrava
bastante favorável ao local, alegando ser equivocada a visão que
todos têm de ser um ambiente que incentiva a segregação. Contudo,
os pais estiveram no CEE e a impressão que tiveram, segundo relato
dos mesmos, não está de acordo com o que afirmou a professora.
Sentiram que, ao contrário do que a professora havia dito, o centro
era sim um ambiente segregador. Além disso, afirmaram que a pouca
estrutura que oferece estava malconservada. Esse fato chamou
bastante atenção e suscitou questionamentos quanto ao sistema de
ensino público em geral, principalmente o fato de uma professora
participante do sistema educacional inclusivo estar propondo o
caminho inverso ao do processo de inclusão escolar de uma criança
(PARRA, 2009, p. 116-117).

É preciso estar alerta às diversas formas de exclusão que ocorre dentro do meio
escolar, desde as ligadas aos aspectos sociais, políticos, raciais e culturais, que em sua
maioria acabam por promover o preconceito, a competição e o individualismo. É preciso
conceber este espaço educativo como uma mola mestra na formação de pessoas
humanas, mais solidárias, mais cooperativas e autônomas (CORNELSEN, 2007).

A promoção do conhecimento científico e da aprendizagem é função


essencialmente da escola. Segundo Libâneo (2004), a escola continua sendo o lugar
de mediação cultural, e através da prática pedagógica do professor constitui-se como
prática cultural intencional de produção e internalização de significados, o que de certa
forma promove o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos seus alunos.

O trabalho do Acompanhante Terapêutico com crianças trata, diferentemente


da conduta com adultos, da criação de condições para a emergência de uma estrutu-
ração da personalidade; dentro do ambiente escolar, faz-se necessário o vínculo cons-
truído entre o Acompanhante Terapêutico e a criança, pois existe uma diferenciação do
que é pedagógico e o que é terapêutico. Na perspectiva de Kupfer (1997), toda educação
é terapêutica, e toda terapia é educativa, e em algum momento do repertório escolar,
esses dois saberes se entrelaçam.

De acordo com Parra (2009), o Acompanhante Terapêutico tem sido um


procedimento cada vez mais adotado pelas escolas, como forma de facilitar a inclusão
escolar de crianças que possuem algum comprometimento no desenvolvimento. Porém,
foi observado que há divergência entre a equipe de Acompanhantes Terapêuticos e
a escola no que se refere à definição da função do Acompanhante Terapêutico, pois
essas definições partem de diferentes perspectivas de constituição do sujeito. Existe

154
um conflito de paradigmas entre psicólogos e educadores em relação a esse assunto.
Para a equipe terapêutica de uma aluna, por exemplo, a inserção do Acompanhante
Terapêutico seria uma ferramenta a mais no processo de inclusão da criança. No
entanto, para a escola, parece que o Acompanhante Terapêutico deve assumir uma
posição de saber e poder, que acaba desvirtuando essa proposta.

Segundo Gavioli, Ranoya e Abbamonte (2001, p. 2): “[...] para a educação, o


pedido da presença de um at está relacionado, na maioria das vezes, à demanda de que
ele possa responder pelas atitudes e pela educação da criança ainda não adaptada ao
universo escolar e com a qual, o corpo docente acredita não saber lidar”.

4 O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR


A partir de observações realizadas em um hospital-dia entre os anos de
1983 e 1992, Antonucci (1994) observou que muitas destas crianças submetidas à
modalidade de AT (associado ou não a outros tratamentos), durante períodos de um
a dois anos, apresentaram evolução expressiva no contato afetivo e nas condutas
sociais, comparando com as condições anteriores ao acompanhamento terapêutico.
A evolução das últimas décadas, sobre a discussão acerca da exclusão propiciou
condições para o desenvolvimento de políticas públicas visando à inclusão social de
indivíduos considerados à margem da sociedade por possuírem alguma dificuldade e/
ou necessidade especial. Esse movimento resultou na elaboração de documentos –
declarações, planos, decretos, leis, alguns destes sendo exposto nesse material.

No caso específico da inclusão escolar, uma das formas encontradas pelas


instituições de ensino escolar de corresponder a essa demanda de acolher os alunos
ditos com necessidades educacionais especiais foi a inserção do Acompanhante
Terapêutico em sala de aula. O termo Acompanhante Terapêutico surgiu, inicialmente,
para dar nome a uma prática exercida nas ruas fora dos muros de qualquer instituição,
tendo como uma de suas funções primordial, a função de devolver a vida social aos
pacientes em grave sofrimento psíquico que até então permaneciam trancafiados e
isolados do restante do mundo (GAVIOLI; RANOYA; ABBAMONTE, 2001).

Conforme os movimentos em prol da inclusão ganhavam consistência e se


firmavam através de inúmeras diretrizes políticas, as escolas passaram a receber cada
vez mais essas crianças diferentes, que até então estavam afastadas ou isoladas a
circular apenas pelos espaços de tratamento ou de assistência. No caso específico
relacionado às crianças, a inclusão social envolvia necessariamente a inclusão no
território escolar, uma vez que este é o espaço socialmente atribuído a estes pequenos
futuros adultos (PARRA, 2009).

O Acompanhante Terapêutico está ampliando o seu público de intervenções


e sua prática demonstrando bastante eficácia no acompanhamento de crianças com
Transtorno do Espectro Autista (TEA) e com as que têm deficiência intelectual. Isso é

155
confirmado por Coelho (2006), ao relatar que o Acompanhamento Terapêutico não se
limita somente a pacientes diagnosticados como psicóticos, esse profissional também
intervém em indivíduos com autismo, e acrescenta que essa ampliação exige do
Acompanhante Terapêutico capacidades diferenciadas do trabalho com os pacientes
com psicose. Tomando como base a maneira pela qual a inclusão escolar está sendo
feita atualmente, o Acompanhamento Terapêutico é sugerido, como forma de facilitar
esse processo na inclusão escolar, em alguns casos específicos.

Parra (2009) destaca que o Acompanhamento Terapêutico realizado com


crianças com sofrimento psíquico grave acontecia, inicialmente, através da via do
encaminhamento da escola a partir de uma demanda de queixa escolar. Segundo Fráguas
(2004), o Acompanhamento Terapêutico passou por uma ampliação de seus conceitos
e de suas atuações, o que possibilitou que fosse introduzido como um recurso auxiliar
nos projetos de inclusão escolar. Desta forma, algumas escolas regulares passaram a
solicitar o trabalho do Acompanhamento Terapêutico com o objetivo de facilitar esse
processo da inclusão de crianças com deficiências.

De acordo com Alves (2003, p. 39), “a escola é o meio onde a criança retira
recursos para atuar por meio das condutas educativas disponíveis a ele”, ou seja, a
escola é o ambiente onde esses pequenos sujeitos aprendem a se comportar dentro
do contexto social externo, sendo o modelo de socialização e de aprendizagem que a
criança possui e o maior influenciador de suas condutas fora do ambiente escolar.

Colocava-se, portanto, um grande desafio para as instituições escolares que,


além de tentar promover ensino de qualidade para todos, passa a focalizar de forma
mais ativa suas funções de espaço de convivência e de inclusão social. A partir da
entrada destas crianças que demandam flexibilizações nas metodologias e atividades
curriculares, a necessidade da parceria das escolas com profissionais da saúde se
intensificou, e o Acompanhante Terapêutico é um desses profissionais que vem
ampliando sua atuação para a área escolar. Gavioli, Ranoya e Abbamonte (2001) abordam
essa transição um tanto paradoxal do Acompanhante Terapêutico, que trabalhava nas
ruas, para as escolas:

[o Acompanhante Terapêutico] tem sido um termo utilizado, por


empréstimo, para identificar esta prática na escola. O empréstimo
do termo pode ser entendido pela função que o acompanhante
possui em escutar, dar voz e encaminhar in locus, as construções
particulares que os sujeitos encontram como saídas possíveis para
as diversas problemáticas que enfrentam no laço social (GAVIOLI;
RANOYA; ABBAMONTE, 2001, p. 1).

156
IMPORTANTE
Como já vimos anteriormente, sempre é bom reforçar que a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) defende o direito de todos à
educação, assim como a inclusão escolar. Porém, além disso, a inclusão
celebra a diversidade a fim de amparar uma política de respeito ao
outro, gerando uma educação sem preconceitos, em que é respeitada a
diferença e enfatizada a necessidade que a escola tem em se modificar
e se adaptar, se necessário, desde a sua estrutura até o seu projeto
curricular, para desta forma acolher a todos os seus alunos.

FIGURA 3 – SOMOS TODOS IGUAIS NAS DIFERENÇAS

FONTE: <https://www.ufrgs.br/forumpelainclusao/?page_id=9>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Ao ser introduzido no contexto educacional, o Acompanhamento Terapêutico


ganha um formato diferenciado de atuação, sendo envolvido também pela dimensão
pedagógica, além das questões psíquicas. Segundo Fráguas e Berlinck (2001), o
Acompanhante Terapêutico escolar exerce uma função situada na dimensão do “entre”,
ou seja, trabalha e intervém entre o campo pedagógico e o campo terapêutico. Na
mesma direção, Coelho (2007) afirma que o Acompanhante Terapêutico, que pretende
atuar no contexto da inclusão escolar, precisa estar preparado para circular entre uma
postura pedagógica e uma postura terapêutica. Além disso, é possível destacar que o
Acompanhante Terapêutico trabalha entre a sua criança objetivo e as outras crianças,
entre a criança e a professora, entre a criança e a escola e, em alguns casos, entre a
criança e a família (NASCIMENTO, 2015).

Uma das funções fundamentais do Acompanhamento Terapêutico é a


manutenção do laço social, questionando a invisibilidade da criança acompanhada
e tornando-a protagonista da sua própria história. É papel fundamental também do
Acompanhante Terapêutico desconstruir os estereótipos relacionados à patologia,
procurando possibilitar aos professores e aos colegas perceberem as qualidades e
as capacidades da criança, diminuindo a dificuldade da interação social, mediando a
linguagem e orientando as brincadeiras (CAVALCANTE; LISBOA, 2021).

157
Nesse lugar subjetivo do entre, o Acompanhante Terapêutico escolar pode
investir na possibilidade de criar vínculos entre a criança acompanhada e os outros
envolvidos em seu dia a dia, além de envolver a criança a ser introduzida em um contexto
de rotinas e regras, considerando que ao submeter a criança a essas regras, supõe-se
a existência de um sujeito, o que pode produzir efeitos terapêuticos benéficos para esta
criança (ASSALI et al., 1999). O Acompanhante Terapêutico escolar atua, também, com
diálogo frequente como referência para a criança, disponibilizando um apoio sobretudo
quando esta precisa sustentar funções subjetivas e simbólicas na relação com o aluno,
para além da função pedagógica (KUPFER; PETRI, 2000).

Barretto (1998) fala dessa presença do “outro”, no caso, o Acompanhante


Terapêutico, como uma das posturas que caracterizam a função de holding. O autor
utilizou o termo referindo-se a tudo aquilo que o ambiente oferece a um indivíduo para
que ele tenha a experiência de continuidade, tanto física quanto psíquica. Barretto
(1998, p. 63) afirma:

No acompanhamento, em muitos momentos do percurso com um


paciente, essa função (holding) exerce um papel marcante. São
momentos em que simplesmente estamos ali, juntos do nosso
acompanhado – caminhando ou parados – compartilhando, às
vezes, uma dor ou a conclusão de alguma tarefa; talvez, o momento
que a antecede, ou quando nos aproximamos do final do encontro.
Situações em que percebemos que não há o que fazer ou dizer; e,
o fato de estarmos ali, nossa presença, já significa bastante para
nosso acompanhado. Penso que o valor dessa experiência não se
dá somente por haver um corpo junto ao corpo do paciente – a
proximidade de dois corpos –, mas por ser um corpo habitado, um
corpo atento, um corpo que carrega a história do próprio vínculo.

Aqui, cabe uma breve explicação do que seria esse conceito do holding,
geralmente traduzido como sustentar ou segurar, o termo faz referência ao suporte
físico e psíquico oferecido ao bebê pela sua progenitora ou seu cuidador. Envolve um
padrão empático e uma rotina nos cuidados desse bebê, no período logo posterior
ao seu nascimento e se expressa como um conjunto de comportamentos afetivos
relacionados ao alimentar, limpar, proteger, ou seja, os cuidados concretos com o
bebê, que necessita estar fisicamente seguro, contido e psicologicamente acolhido ou
sustentado para desenvolver-se de maneira satisfatória. O holding permite uma certa
estabilidade e previsibilidade do ambiente, o que é fundamental para o amadurecimento
desse indivíduo, toda vez que se compreende profundamente um paciente, e se
demonstra através de uma interpretação correta e feita no momento certo, se está de
fato sustentando este paciente (MEDEIROS; AIELLO-VAISBERG, 2014).

Conforme Cenamo e Cagna (1991), o Acompanhante Terapêutico tem a função


de ser a ponte de ligação entre a instituição escolar com a vida social ou pessoal do
aluno. Gavioli, Ranoya e Abbamonte (2002) descrevem algumas posturas que são da
responsabilidade do Acompanhante Terapêutico dentro do contexto escolar, como
ser testemunha do que ocorre nas situações cotidianas do aluno na escola, a fim de

158
destacar e comemorar suas produções bem-sucedidas. Dessa forma, o Acompanhante
Terapêutico também traduz e introduz para a criança as regras impostas pela escola, ao
mesmo tempo em que cria um espaço para a autonomia daquele aluno, dando-lhe voz
e lugar, valorizando a subjetividade do indivíduo acompanhado.

De acordo com Albano (2015), atualmente, observa-se que há muitos Acom-


panhantes Terapêuticos trabalhando nas escolas particulares de São Paulo, inclusive,
alguns destes profissionais buscam montar a sua própria equipe de Acompanhantes
Terapêuticos para atender a esta demanda crescente de inclusão proveniente das ins-
tituições escolares. A autora relata que notou que isso se passa dentro de um processo
que naturaliza a presença do Acompanhante Terapêutico na escola, ao ponto de se
tornar uma regra de uma determinada escola, que todas as crianças ditas de inclusão
deveriam ter um profissional com a função de Acompanhante Terapêutico (outras no-
meações dadas pelas escolas também são de Acompanhante Pedagógico (AP), tutor,
auxiliar de inclusão e shadow (sombra) são alguns dos nomes atribuídos ao profissional
que se ocupa de apoiar o processo de inclusão escolar das criança ditas diferentes) du-
rante todo o tempo em que a criança permanecesse na escola. Ter um acompanhamen-
to individualizado, pago pelos pais desta criança, era uma condição para que a criança
pudesse estudar, nesta instituição em questão, e não havia espaço para negociações.

Já em outro estado da federação, no Distrito Federal, esse processo vem


ocorrendo tanto em escolas da rede pública de ensino, como na rede particular, onde a
inclusão é obrigatória, de acordo com as leis vigentes. Nas escolas particulares vem-se
constatando que a presença do Acompanhante Terapêutico é uma prática cada vez mais
usual. Contudo, o fato de estar se tornando cada vez mais comum não tem garantido
que esse trabalho tenha seus objetivos e funções definidos. Dessa forma, os alunos são
matriculados nas classes de ensino regular com a condição de que seja contratado um
estagiário ou profissional que exerça a função de auxiliar a inclusão escolar da criança. O
estagiário ou profissional pode receber o nome de Acompanhante Terapêutico, Auxiliar
Pedagógico, Acompanhante Pedagógico, Acompanhante Educacional, dentre outros,
tendo os custos do trabalho deste profissional geralmente arcados pelos pais da criança
(PARRA, 2009).

Cenamo e Cagna (1991) citam algumas funções do Acompanhante Terapêutico


na escola quando se trata do acompanhamento de uma criança com espectro autista,
como transferir suas vontades e desejos apresentados na escola para o seu contexto
em casa, assim como promover a generalização da conduta adequada da criança
acompanhada, apresentada na escola nos aspectos de aprendizagem, individual e
de socialização. E, por consequência, trabalhar na escola alguns comportamentos
apresentados em casa, justamente fazer a ponte do entre a casa, a escola e a
criança. Essas sugestões de Cenamo e Cagna (1991) são relevantes, pois apresentam
a necessidade de o Acompanhante Terapêutico ter acesso aos projetos pedagógicos
da escola e fazer parte da equipe, porém isso pode dar a impressão de ele ser um
acompanhante da escola e não necessariamente do indivíduo. É importante ressaltar

159
que o Acompanhante Terapêutico se envolve com as questões curriculares da escola e
executa intermediações entre os envolvidos com a inclusão escolar, visando ao bem-
estar e ao pleno desenvolvimento da criança, visto que seu foco está na criança e isso
faz com que ele permaneça um acompanhante da criança e não da escola.

É importante mencionar, no entanto, que a presença constante do Acompa-


nhante Terapêutico escolar pode camuflar as faltas institucionais (ASSALI et al., 1999),
ou seja, pode permitir que aquilo que sabidamente faz parte das responsabilidades da
escola não seja visto desta forma, pois o acompanhante é posicionado ou se coloca
em tal posição como sendo aquele profissional que pode ou deveria resolver todas as
questões de aprendizagem ou relacionado ao comportamento desta criança. Segundo
Jerusalinsky (2016), o acompanhante pode vir a ocupar o lugar de para-choque diante
daquilo que fracassa no encontro da criança com a escola. A demanda feita ao acompa-
nhante refere-se a suportar o que é insuportável para a escola. O acompanhante, nesse
caso, precisa dar conta do que a criança não dá e daquilo que a escola não supre nesse
desencontro. Fazendo as vezes de um para-choque, o acompanhante, nessa posição,
protege o professor, ou os demais atores escolares, de entrar em colisão com tudo aqui-
lo que aparece dessa criança como uma exceção ao aluno ideal (JERUSALINSKY, 2016).
Nesse sentido, tal lugar de para-choque pode vir a encobrir aquilo que surge enquanto
questionamento, ao professor, sobre essa criança.

Uma maneira de manejar esses problemas é de o Acompanhante Terapêutico


poder pensar juntamente à escola e aos professores qual o foco do trabalho do
acompanhante naquele momento, quais as necessidades e limites daquele aluno, pensar
em intervenções que poderiam ajudar a criança sem excluir a participação do professor
e ajudar o professor a pensar na construção de um projeto pedagógico que envolva a
criança em questão, ou seja, implicá-lo e incluí-lo neste processo (PEGORELLI, 2011).

O Acompanhamento Terapêutico Escolar (ATE) é uma prática que tem sido


utilizada no processo de inclusão escolar de crianças com necessidades educativas
especiais (PEGORELLI, 2011). Fráguas e Berlinck (2001) descrevem que o trabalho do
acompanhante consiste em estar com a criança dentro do contexto escolar, ou seja,
dentro e fora da sala de aula, sempre buscando integrar a criança ao grupo e levá-
la a um envolvimento com as atividades propostas pelos professores, observando e
respeitando seus limites e reforçando suas potencialidades. Para Assali et al. (1999),
o acompanhante precisa trabalhar descobrindo o universo da criança e, com isso,
construir condições para que ela possa frequentar a escola e aproveitar ao máximo
esse momento de modo singular. O papel do acompanhante é auxiliar as crianças com
dificuldades severas, como o autismo, atuando como mediador e facilitador do processo
de inclusão (BARROS; BRANDÃO, 2011).

É importante destacar que existem diferentes formas de realizar o Acompa-


nhamento Terapêutico, sendo que esta atuação não é específica de uma única área
ou abordagem teórica. Profissionais de diversas áreas, como Psicologia, Educação,

160
Fisioterapia e Educação Física têm atuado como Acompanhantes Terapêuticos, com
perspectivas teóricas e metodológicas diversificadas. Isso significa que os objetivos e
as intervenções podem assumir características bem diferentes, de acordo com o pro-
fissional que atua e com a sua respectiva abordagem teórica. Parra (2009) menciona
que a atuação do Acompanhamento Terapêutico Escolar deve levar em consideração o
fato de que a criança se encontra em processo de construção psíquica. Por isso, é im-
prescindível a compreensão de que a inclusão é um processo singular que se faz caso
a caso, respeitando as subjetividades de cada criança, turma, professor, coordenador e
currículo pedagógico (JERUSALINSKY, 2016)

Kupfer (1997) aponta que a intenção do Acompanhamento Terapêutico é


aproveitar o potencial terapêutico que está presente em todo ato educativo voltado
para a criança. Kupfer e Petri (2000) afirmam que a inclusão escolar/social produz ainda
efeitos terapêuticos para a criança cuja subjetivação encontra obstáculos que um
velho pátio de escola pode ajudar a ressignificar e a transpor. Sendo assim, o trabalho
do Acompanhante Terapêutico Escolar se dá sobre uma criança com dificuldades de
diversas ordens, principalmente simbólicas, e se orienta para a emergência, retomada e
fortalecimento desta criança.

O acompanhante trabalha e intervém, como dito anteriormente, no espaço do


entre o pedagógico/educativo e o terapêutico (FRÁGUAS; BERLINCK, 2001), tecendo
articulações possíveis na direção das estratégias inclusivas e no processo de constituição
subjetiva desta criança. Dessa forma, podemos reafirmar que o acompanhante trabalha
em um lugar do entre: entre a criança e as outras crianças, do seu dia a dia, entre a
criança e seus professores, entre a criança e sua escola e, em alguns casos, entre a
criança e sua família. Segundo Assali et al. (1999), há um investimento na possibilidade
da criação de vínculos com as outras crianças e com a professora; e busca-se ajudar
a criança a permanecer na sala de aula o máximo de tempo possível, convidando-a
incessantemente para as atividades propostas, aproveitando e significando todas as
suas iniciativas, envolvendo-a neste contexto social e educacional momentâneo. Assim,
o acompanhante convida e auxilia a criança para a rotina e para as regras, atuando
também sobre o ato educativo e ao mesmo passo produzindo um efeito terapêutico,
pois ao submetê-la às regras escolares, supõe-se a existência de um sujeito, o qual
pode vir a compreendê-las e sustentá-las (ASSALI et al., 1999).

Nesse sentido, Jerusalinsky (2016) enfatiza que o diálogo entre família, escola
e clínicos é fundamental, e o Acompanhamento Terapêutico Escolar pode contribuir
significativamente com o processo inclusivo se for convocado não para obstruir, mas para
fazer circular as possíveis faltas que possibilitam que todos se questionem e busquem
saídas diante das dificuldades desta criança. Por, muitas vezes, ser um profissional que
adentra o espaço escolar, mas vem de fora, o Acompanhante Terapêutico Escolar tem
a chance de produzir questionamentos sobre os ideais e revelar a impossibilidade das
tarefas educativas, ao mesmo tempo em que trabalha constantemente com os demais
atores escolares, construindo um lugar possível e suportável para a criança juntamente
às outras crianças na escola (SPAGNUOLO, 2017).

161
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• A escola tem o papel oficial responsável pelo reconhecimento e organização da


constituição do futuro cidadão produtivo, através da aquisição dos princípios éticos e
morais que permeiam a sociedade.

• A socialização ocorre através de três processos: os processos afetivos de socialização,


os processos mentais de socialização e os processos condutuais de socialização.

• A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) defende o direito de todos à


educação, assim como a inclusão escolar.

• Conforme os movimentos em prol da inclusão ganhavam consistência e se firmavam


através de inúmeras diretrizes políticas, as escolas passaram a receber cada vez mais
essas crianças diferentes, que até então estavam afastadas ou isoladas a circular
apenas pelos espaços de tratamento ou de assistência.

• O Acompanhante Terapêutico tem sido um procedimento cada vez mais adotado


pelas escolas, como forma de facilitar a inclusão escolar de crianças que possuem
algum comprometimento no desenvolvimento.

• Com relação à Lei nº 9.394/96, vale frisar que seu capítulo V trata da educação espe-
cial, no qual é afirmado que a educação das pessoas com necessidades especiais se
deve dar, preferencialmente, na rede regular de ensino.

• Ao ser introduzido no contexto educacional, o Acompanhamento Terapêutico ganha


um formato diferenciado de atuação, sendo envolvido também pela dimensão
pedagógica, além das questões psíquicas.

• O Acompanhante Terapêutico trabalha entre a sua criança objetivo e as outras


crianças, entre a criança e a professora, entre a criança e a escola e, em alguns casos,
entre a criança e a família.

• Uma das funções fundamentais do Acompanhamento Terapêutico é a manutenção


do laço social, questionando a invisibilidade da criança acompanhada e tornando-a
protagonista da sua própria história.

• É imprescindível a compreensão de que a inclusão é um processo singular que se


faz caso a caso, respeitando as subjetividades de cada criança, turma, professor,
coordenador e currículo pedagógico.

162
AUTOATIVIDADE
1 A criança, desde sua concepção, já pertence a um determinado grupo social
denominado de família, tendo por estes integrantes as suas necessidades básicas
supridas e estão programadas intrinsecamente para serem satisfeitas em sociedade.
O grupo social onde a criança nasce também necessita da incorporação deste novo
indivíduo para manter-se e sobreviver e, por isso, também lhe transmite a cultura
acumulada ao longo dos anos de vivência. Assinale as alternativas CORRETAS:

a) ( ) Esta transmissão cultural envolve os costumes, valores, normas, atribuição de


papéis, ensino da linguagem, habilidades e conteúdos escolares, bem como
tudo aquilo que cada grupo social foi acumulando ao longo da história evolutiva.
b) ( ) Este processo de socialização depende de uma interação entre a criança e seu
meio. Esta interação e seu resultado dependem das características da própria
criança e da forma de agir dos agentes sociais.
c) ( ) Entre os agentes socializadores estão os pais, os meios de comunicação, a
escola e o professor.
d) ( ) Este processo de socialização depende de uma interação entre a criança e seu
meio. Esta interação e seu resultado independem das características da própria
criança, mas dependem da forma de agir dos agentes sociais.

2 A socialização ocorre através de três processos: os processos afetivos de socialização,


os processos mentais de socialização e os processos condutuais de socialização.
Descreva estes processos.

3 Sobre o artigo 5º das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação


Básica, os alunos com necessidades educacionais especiais são considerados os que
apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo
de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares.
Assinale as alternativas CORRETAS:

a) ( ) Aquelas dificuldades não vinculadas a uma causa orgânica específica.


b) ( ) Aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências.
c) ( ) Os que têm dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais
alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis.
d) ( ) Somente as dificuldades vinculadas a uma causa orgânica específica.

4 Ao ser introduzido no contexto educacional, o Acompanhamento Terapêutico ganha


um formato diferenciado de atuação, sendo envolvido também pela dimensão peda-
gógica, além das questões psíquicas. Este profissional exerce uma função situada na
dimensão do entre. Descreva este espaço descrito como sendo o entre.

163
5 A presença constante do Acompanhante Terapêutico escolar pode acabar camu-
flando as possíveis faltas da escola, pode permitir que aquilo que sabidamente faz
parte das responsabilidades da escola não seja visto desta forma, pois o acompa-
nhante é posicionado ou se coloque em tal posição como sendo aquele profissional
que pode ou deveria resolver todas as questões de aprendizagem ou relacionado
ao comportamento desta criança. O acompanhante pode vir a ocupar o lugar deno-
minado de para-choque diante daquilo que fracassa no encontro da criança com a
escola. Referente a esta expressão, assinale as alternativas CORRETAS:

a) ( ) A demanda feita ao acompanhante é de suportar o que é insuportável para a


escola. O acompanhante, nesse caso, precisa dar conta pelo que a criança não
dá conta e daquilo que a escola não supre nesse desencontro.
b) ( ) A demanda feita ao acompanhante refere-se a suportar o que é insuportável
para a escola. O acompanhante, nesse caso, precisa dar conta do que a criança
não dá e daquilo que a escola não supre nesse desencontro.
c) ( ) Fazendo as vezes de um para-choque, o acompanhante, nessa posição, protege
o professor, ou os demais atores escolares, de entrar em colisão com tudo aquilo
que aparece dessa criança como uma exceção ao aluno ideal.
d) ( ) Fazendo as vezes de um para-choque, o acompanhante, nessa posição, protege
o aluno dos demais atores escolares, de entrar em colisão com tudo aquilo que
aparece dessa criança como uma exceção ao aluno ideal.

164
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
ATUAÇÃO DO ACOMPANHANTE
TERAPÊUTICO ESCOLAR

1 INTRODUÇÃO
O acompanhamento terapêutico foi desenvolvido inicialmente como uma
alternativa aos asilos psiquiátricos, sendo um recurso que possibilitava a inclusão social
a partir de um método em que os usuários dos centros de saúde mental circulavam
pelos diferentes espaços da vida pública acompanhados (NASCIMENTO et al., 2019).
A grande demanda do Acompanhamento Terapêutico com crianças ocorre no âmbito
escolar, pois a escola é um dos principais contextos de socialização infantil. Por isso,
levando em consideração os movimentos sociais e políticos atuais, que promovem uma
escola mais inclusiva, hoje se fala em Acompanhamento Terapêutico Escolar (ATE).
Quando consideramos o Acompanhamento Terapêutico com crianças, é importante
que este seja um trabalho voltado para a socialização das que apresentam um psíquico
grave (COELHO, 2007).

De acordo com Nascimento et al. (2019), existem ainda muitas dúvidas sobre
como se caracteriza a atuação do Acompanhante Terapêutico no âmbito escolar,
quais são as possibilidades e entraves dessa prática diante das demandas da inclusão
escolar. Por isso, se faz necessária uma reflexão sobre essas questões devido à atuação
do acompanhante terapêutico escolar ter se tornado uma prática crescente, sendo
marcada por certo grau de ambiguidade e falta de consenso.

Acadêmico, no Tópico 2, abordaremos uma breve contextualização do acom-


panhante terapêutico com base em leis, na sequência, as diferenças entre o acompa-
nhante terapêutico escolar e o acompanhante especializado, a seguir, as características
de atuação do acompanhante terapêutico escolar, e, por fim, a função e a importância
do acompanhamento terapêutico escolar.

2 ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR: BREVE


CONTEXTUALIZAÇÃO COM BASE NAS LEIS
Carvalho (2002, p. 12) afirma que entre as características mais marcantes do
AT estão “o resgate e a promoção da circulação do paciente pela cidade, construindo
ou simplesmente explorando redes sociais pré-existentes”.

A Educação Terapêutica é a articulação entre o tratar e o educar no atendi-


mento às crianças que apresentam um desenvolvimento atípico, principalmente para
as crianças que demonstram falhas na inscrição do registro simbólico (KUPFER, 1997).

165
Parra (2009) destaca que o acompanhamento terapêutico com crianças
com sofrimento psíquico grave acontecia, inicialmente, por encaminhamento da
escola a partir de uma demanda de queixa escolar. De acordo com Fráguas (2004),
o acompanhamento terapêutico passou por uma extensão de seu conceito e de sua
atuação, o que fez com que fosse introduzido como um recurso auxiliar nos projetos de
inclusão escolar. Algumas escolas passaram a solicitar o trabalho do acompanhamento
terapêutico com o objetivo de facilitar a inclusão de crianças com deficiências.

Foi realizada, em 1994, a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas


Especiais, na cidade de Salamanca, focando a preocupação sobre o lugar das pessoas
com necessidades educativas especiais. A Declaração de Salamanca foi importante
para mudanças nas áreas da política, da educação e das práticas relacionadas às
necessidades educativas especiais (ABENHAIM, 2005; SANTOS, 2016; NASCIMENTO et
al., 2019).

A Declaração de Salamanca defende que todas as escolas tenham o dever


de garantir a entrada de crianças com todos os tipos de necessidades educativas
especiais, convocando às escolas para promoverem espaços onde a discriminação
possa ser combatida. Esta declaração foi um marco muito importante para o Brasil, pois
houve uma promoção de discussões e ações mais efetivas para que as crianças com
necessidades educativas especiais tenham melhor acesso às escolas (UNESCO, 1994).

Segundo o artigo 24 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência


(Decreto 6.949/2009), “os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com
deficiência à educação”, alem de assegurar o sistema educacional inclusivo em todos os
níveis, garantindo o aprendizado ao longo de toda a vida. Os estados também precisam
garantir as adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais de cada
indivíduo e que as pessoas com deficiência recebam o apoio necessário no sistema
educacional, além do apoio individual para auxiliar no desenvolvimento acadêmico e
social (NASCIMENTO et al., 2019).

Em 2012, foi instituída a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa


com Transtorno do Espectro Autista (TEA), com a Lei nº 12.764 que garante o direito ao
acessoà educação e ao ensino profissionalizante, bem como à moradia, ao mercado de
trabalho e à previdência social e à assistência social (Art. 3º, IV).

Na Lei nº 13.146 de 2015, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência


(Estatuto da Pessoa com Deficiência), no capítulo IV, Artigo 27, consta o direito à
educação que diz o seguinte:

A educação constitui direito da pessoa comdeficiência, assegurados


sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao
longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento
possível de seus talentose habilidades físicas, sensoriais, intelectuais
e sociais, segundo suas características, interessese necessidades de
aprendizagem (BRASIL, 2015, s.p.).

166
INDICAÇÃO DE LEITURA
Para uma maior compreeensão sobre a temática abordada neste tópico, sugerimos
a leitura da Lei nº 13.146 de 2015 através do livro Estatuto da Pessoa com Deficiência:
comentários à Lei 13.146/2015.

FONTE: MARTINS, G. M.; HOUAISS. L. P. Z. Estatuto da Pessoa com


Deficiência: comentários à Lei 13.146/2015. 1. ed. Editora Foco, 2019.

O Art. 28 da Lei nº 13.146 de 2015 fala sobre o dever do poder público em


assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar algumas
medidas. Nessas medidas está a oferta de um projeto pedagógico que institucionalize o
atendimento educacional especializado, e os demais serviços e adaptações necessárias
para atender às características dos estudantes com deficiência, garantindo o acesso
ao currículo em condições de igualdade, promovendo a conquista e o exercício de sua
autonomia (BRASIL, 2015).

O poder público deve garantir a oferta de profissionais de apoio escolar, confor-


me consta no Art. 28 da Lei 13.146 de 2015, o profissional de apoio escolar é a pessoa que
exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência e
atua em todas as atividades escolares necessárias, em todos os níveis e modalidades de
ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos
identificados com profissões legalmente estabelecidas (BRASIL, 2015).

Ainda segundo a Lei 13.146 de 2015:

167
Às instituições privadas, de qualquer nível e modalidade de ensino,
aplica-se obrigatoriamente o disposto nos incisos I, II, III, V, VII, VIII,
IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII e XVIII do caput deste artigo, sendo
vedada a cobrança de valores adicionais de qualquer natureza em
suas mensalidades, anuidades e matrículas no cumprimento dessas
determinações (BRASIL, 2015, s.p.).

Na Lei 12.764 de 2012 consta que a pessoa com TEA, incluída nas classes
comuns de ensino regular, tem direito a um acompanhante especializado, em casos de
necessidade comprovada. A garantia do direito a um acompanhamento especializado é
um avanço na direção da efetivação da inclusão (BRASIL, 2012).

FIGURA 4 – ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO ESCOLAR (ATE)

FONTE: <https://bit.ly/3v7hgYz>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Mas, apesar destes avanços, ainda surgem alguns questionamentos: quem


é esse acompanhante especializado? É um profissional de alguma área específica de
conhecimento? Pede-se alguma formação para esse acompanhante? De certa forma,
essa oferta de um profissional de apoio escolar e do acompanhante especializado revelam
uma preocupação social e política em garantir o suporte necessário e individualizado
para os estudantes que apresentam alguma dificuldade na escolarização. Porém, antes
destas leis, o Acompanhamento Terapêutico Escolar (ATE) já mostrava que poderia
contribuir para o desenvolvimento de uma educação inclusiva nas escolas privadas.
Apesar de serem parecidas, as práticas desenvolvidas, cada contexto escolar utiliza
uma nomenclatura para caracterizar a atuação, como: acompanhante psicopedagógico,
acompanhante terapêutico, monitor, tutor (MATOS; DINIZ, 2014).

168
3 DIFERENÇAS ENTRE O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO
ESCOLAR E O ACOMPANHANTE ESPECIALIZADO
Tendo em conta o disposto na LBI/2015, entende-se que os profissionais
de apoio escolar são profissionais do ensino médio que devem cumprir requisitos
relacionados com higiene, locomoção e alimentação. O acompanhante especializado
trabalha com crianças com TEA no contexto de serem incorporados ao sistema regular
de ensino. Não é possível determinar qual a peculiaridade da prática de tal profissional,
ou seja, se ele é responsável por cuidados básicos ou pelo processo de ensino. Mas fica
claro que os profissionais devem ser especializados em questões sobre o Transtorno
do Espectro Autista (TEA). Já o Acompanhante Terapêutico Escolar é responsável ​​por
mediar o processo de integração escolar do aluno (NASCIMENTO et al., 2019).

No cenário atual brasileiro, observa-se que o espaço profissional reservado aos


acompanhantes terapêuticos escolares tem sido ocupado, na maioria dos casos, por
estagiários (MATOS; DINIZ, 2014). Os estagiários, de modo geral, são vinculados aos
cursos de psicologia, pedagogia, mas há também profissionais de áreas como educação
física e fisioterapia (NASCIMENTO, 2015). Entretanto, de modo distinto, o acompanhante
especializado não pode ser um estagiário, considerando que deve ser um especialista.
Já o profissional de apoio escolar, como mencionado anteriormente, possui apenas o
nível médio.

FIGURA 5 – ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO NA ESCOLA

FONTE: <https://bit.ly/37pSued>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Diante disso, foram observadas três representações distintas entre eles, embora
sirvam a um propósito semelhante: apoiar alunos com certas dificuldades no processo
de inclusão escolar. Mas como apoiá-lo? Para quais áreas da experiência escolar os
alunos precisam de apoio? Talvez as tentativas de responder a essas perguntas nos
levem a escolher o profissional certo, pois as necessidades podem variar, por exemplo,

169
em cuidados pessoais, ensino e subjetivos. É importante notar que o cuidado pessoal
é destinado aos profissionais de apoio escolar, e as questões pedagógicas e subjetivas
a um acompanhante especializado ou um acompanhante terapêutico escolar,
entendendo que existem semelhanças entre essas atuações, mesmo que difiram na
formação necessária (NASCIMENTO et al., 2019).

Conforme Nascimento et al. (2019), há uma diferença relativa às demandas que


se apresentam, considerando pelo menos a atuação do profissional de apoio escolar
e do acompanhante terapêutico escolar. A demanda envolve os aspectos, sobretudo
subjetivos, mas sem excluir os aspectos pedagógicos. É fundamental que o trabalho
seja exercido por um acompanhante terapêutico escolar, pois conta com suporte teórico
e também de supervisão para o desenvolvimento da sua atuação.

FIGURA 6 – EDUCAÇÃO INCLUSIVA

FONTE: <https://bit.ly/36XF89n>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Conforme Jerusalinsky (2006), alguns alunos que apresentam sérias


questões subjetivas demonstram sérios impasses e dificuldades na vivência escolar. O
acompanhante atua no sentido de promover a autonomia do aluno e o envolvimento da
instituição escolar no processo educacional do aluno. Isso significa que o acompanhante
deixa de ser necessário, principalmente quando se torna possível ao sujeito construir
vínculo com o outro.

4 CARACTERÍSTICAS DA ATUAÇÃO DO ACOMPANHANTE


TERAPÊUTICO ESCOLAR
De um modo geral, o acompanhante terapêutico é tido como um mediadorentre
a criança e os desafios que lhes são apresentados. Essa particularidade na atuação tem
sido utilizada pelas escolas como estratégia para viabilizar o processo de inclusão e
permitir que o estar na escola não seja tão oneroso para a criança (MATOS; DINIZ, 2014).

170
O acompanhante terapêutico escolar atua em constante diálogo com os pro-
fessores do aluno, apoiando quando precisa sustentar funções subjetivas e simbólicas
na relação com o aluno, para além da função pedagógica (KUPFER; PETRI, 2000).

Algumas atribuições compatíveis com a atuação deste profissional foram levan-


tadas por Duk (2006), quando esta autora reflete sobre a importância do profissional de
apoio no processo inclusivo: participar na elaboração do programa e nas flexibilizações
curriculares necessárias a determinados alunos; nas adaptações do material didático;
na elaboração e planejamento de diferentes estratégias de ensino; no esclarecimento
das necessidades educacionais especiais de alunos com problemas de aprendizagem;
no apoio aos alunos; no atendimento contínuo na sala de aula; no apoio fora da sala de
aula; e no apoio aos pais.

FIGURA 7 – ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

FONTE: <https://bit.ly/3jkZr2Q>. Acesso em: 1 abr. 2022.

A importância dos acompanhantes terapêuticos como mediadores torna-se


evidente quando se considera o conceito de mediação de Vygotsky. Segundo Matos
e Diniz (2014), os acompanhantes não só proporcionam a aprendizagem, mas também
formam a consciência dos alunos, mediando a relação dos alunos com os saberes
formais e informais da escola, bem como as relações que as crianças desenvolvem neste
contexto. Nessa perspectiva, essas ferramentas atuam como intermediárias entre o
sujeito e o mundo, auxiliando na aprendizagem do chamado material cultural que ocorre
de um nível interpsíquico para outro. O acompanhante muitas vezes atua como um
veículo para realizar essa mediação. Assim, pode-se argumentar que os acompanhantes
terapêuticos escolares ocupam uma posição de "limite", embora possibilite incertezas e
inseguranças por não estarem em uma posição consolidada, que é uma característica
do desempenho do acompanhante terapêutico escolar.

Nascimento, Silva e Dazzani (2015) ampliam essa discussão ao considerar que os


acompanhantes trabalham em posições 'entre', ou seja, entre crianças e outras crianças,
entre crianças e professores e entre crianças e famílias, num lugar de incerteza e instabi-
lidade, onde os acompanhantes podem contribuir para o desenvolvimento e o processo
de inclusão da criança, oferecendo a possibilidade de construção de vínculos sociais.

171
No entanto, o estudo realizado por Sanini, Sifuentes e Bosa (2013) sugere que a
presença de adultos na sala pode dificultar o processo de inclusão. Isso pode ser devido
ao fato de outras crianças não estarem mais em contato com o adulto, o que, por sua
vez, pode levar a um menor contato com as crianças que estão acompanhadas.

Santos (2016) aponta para a necessidade de observar a atuação dos profissio-


nais, sua formação e os objetivos de sua prática, pois a mera presença de outro adulto
em sala de aula não representa a dificuldade do processo de inclusão, e é uma prática
sem embasamento teórico e longe de parâmetros éticos, envolvendo propostas in-
clusivas efetivas. Dessa forma, a ação pautada no “entre”, ou seja, na relação, implica
a própria relação desse profissional com a criança e demais atores escolares. Se um
profissional está atuando na relação, como isso pode representar um obstáculo?

FIGURA 8 – CRIANÇA E ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO

FONTE: <https://bit.ly/3KnTrSX>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Conforme Kupfer e Petri (2000), o acompanhante pode ajudar o professor


na compreensão da singularidade da criança, tendo um olhar ampliado para além da
função pedagógica. O Acompanhante Terapêutico Escolar também pode contribuir com
a atuação do professor e demais profissionais da escola ao possibilitar a percepção dos
avanços da criança que passaram a dimensão das aprendizagens formais.

O acompanhante terapêutico escolar não é um profissional específico de um


determinado campo ou de uma abordagem teórica (NASCIMENTO; SILVA; DAZZANI,
2015). Os profissionais de Psicologia, Educação, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, e
de outras áreas, têm contribuído para a realização do Acompanhamento Terapêutico
Escolar a partir de perspectivas metodológicas diferentes. Matos e Diniz (2014) afirmam
que há discordâncias sobre as práticas realizadas e também sobre a definição do que
seja educação inclusiva e qual o papel do acompanhante nesse processo, demonstrando
diferentes visões e falta de consenso existente, indicando um lugar ainda indefinido
ocupado pelo Acompanhante Terapêutico Escolar na Educação Inclusiva.

172
Matos e Diniz (2014) revelam um círculo vicioso que envolve as práticas desse
profissional, levantando dados de que os profissionais eram, em sua maioria, recém-
formados ou com poucos anos de prática e que começaram a atuar como acompanhantes
sendo estagiários de psicologia. O Acompanhamento Terapêutico Escolar surge como
possibilidade de ter um trabalho, mas a função tem mostrado uma certa desvalorização
profissional, com baixas remunerações e sem direitos trabalhistas, assim, muitos
estagiários deixam o acompanhamento quando se tornam mais experientes e possuem
condições de um retorno financeiro e profissional mais satisfatório.

É importante destacar que os acompanhantes estagiários ou recém-formados


desenvolvem um trabalho importante para o processo inclusivo dos estudantes, pois
apresentam curiosidade e interesse pela nova experiência. Assim, estes acompanhantes
produzem avanços para a área, mas a consolidação da atuação do Acompanhante
Terapêutico Escolar ocorre com o acúmulo de experiências e de conhecimentos.

5 IMPORTÂNCIA E FUNÇÃO DO ACOMPANHANTE


TERAPÊUTICO ESCOLAR
O Acompanhamento Terapêutico Escolar pode ser realizado por diferentes
profissionais e através de diferentes tipos de contratação, e há diversas formas de
atuação dentro da área. A atuação do Acompanhante Terapêutico Escolar deve ser
entendida como um ato terapêutico, pois ocorre no contexto escolar o estabelecimento
de um laço social, contemplando os aspectos subjetivos envolvidos no processo de
inclusão (KUPFER, 1997).

Como já falamos repetidamente, mas é importante frisar, Fráguas e Berlinck


(2001) afirmam que o acompanhante atua em uma posição entre o pedagógico e o
terapêutico. Montellano et al. (2009) consideram que o acompanhante interpreta e
traduz as diversas linguagens da criança e atua no lugar do “entre”, ao passo em que
contribui para a afirmação da sua identidade.

Para Gavioli, Ranoya e Abbamonte (2002), o acompanhante precisa atuar


produzindo questões na escola. Para Nascimento (2015), produzir questões significa
possibilitar a abertura para o diálogo, além de fazer com que as dúvidas sobre o aluno e
sobre o processo inclusivo circulem e ganhem espaço. É importante não dar orientações
e prescrições aos professores, mas conduzir as questões para que os profissionais
escolares se interroguem sobre suas práticas e possam construir algo de produtivo e
criativo com suas perguntas e inquietações (SPAGNUOLO, 2017).

Para Parra (2009), a atuação do acompanhamento terapêutico escolar deve


levar em consideração o fato de que a criança se encontra em processo de constituição
psíquica. Por isso, é importante a compreensão de que “a inclusão se faz caso a caso, com
cada criança, turma, professor, coordenador e currículo pedagógico” (JERUSALINSKY,
2016, p. 31).
173
Para Sereno (2006), o acompanhante estimula e convoca os professores e
funcionários a se relacionarem diretamente com o aluno, contribuindo com a autonomia
da criança e dos demais profissionais escolares. A atuação do acompanhante terapêutico
escolar contempla e articula aspectos pedagógicos e terapêuticos, tanto da educação e
da escola como aspectos subjetivos (NASCIMENTO et al. 2019).

Conforme Nascimento et al. (2019, p. 454):

Na concepção da inclusão como ato terapêutico, sem desconsiderar


a função social e pedagógica da instituição educativa, surge a
necessidade de atentar para ambos os aspectos - terapêutico e
pedagógico -, caracterizando uma atuação que se posiciona no
“entre”. É importante mencionar ainda que sem um posicionamento
intermediário entre tratar e educar não se poderia falar em uma
educação terapêutica, não haveria inclusão escolar como ato
terapêutico. Assim, torna-se necessária a mediação entre o estudante
e a instituição educativa, no sentido de facilitar a articulação entre
tais aspectos.

Nascimento (2015, p. 91) afirma que o acompanhante observa sua atuação


“entre o subjetivo e o pedagógico; entre a sustentação do desejo e as regras sociais/
escolares; entre o ‘sair da sala’ e o ‘ficar no grupo’; entre o ‘não pode’ e a flexibilidade”.

É muito importante o avanço nas políticas voltadas para a inclusão escolar, mas
elas por si só não garantem a efetivação de maneira a contemplar todos os aspectos
no processo de inclusão. O Acompanhamento Terapêutico Escolar é uma ferramenta
de mediação no processo inclusivo, considerando os efeitos terapêuticos que abrem
espaço para emergência do sujeito. A atuação do Acompanhante terapêutico é marcada
por uma indefinição e de delimitação do que pode ser realizado, o que dificulta a prática
profissional do acompanhante (NASCIMENTO et al., 2019).

Conforme Nascimento et al. (2019, p. 455):

Compreende-se que a atuação do ATE possui características


gerais, mas se revela como uma atuação do “entre”, marcada por
indefinições e incertezas, as quais possibilitam que a direção seja
tomada a partir do sujeito. Por isso, um enquadre profissional seria
importante, e mostra-se urgente, mas um enquadre que abra espaço
para o singular. O acompanhante, atuando no “entre”, pode trabalhar
contribuindo para que a criança/adolescente ingresse na escola,
adentre no laço social e seja contemplado nas políticas públicas
para educação. Espera-se, portanto, que os pontos aqui destacados
possam promover a continuação do debate, na expectativa de uma
atuação profissional comprometida eticamente com o sujeito.

174
FIGURA 9 – CRIANÇAS EM IDADE ESCOLAR

FONTE: <https://bit.ly/3LLcxT6>. Acesso em: 1 abr. 2022.

175
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Existem ainda muitas dúvidas sobre como se caracteriza a atuação do Acompa-


nhante Terapêutico no âmbito escolar, quais são as possibilidades e entraves dessa
prática diante das demandas da inclusão escolar.

• Entre as características mais marcantes do AT estão o resgate e a promoção


da circulação do paciente pela cidade, construindo ou simplesmente explorando
redes sociais pré-existentes.

• O poder público deve garantir a oferta de profissionais de apoio escolar, conforme


consta no Art. 28 da Lei 13.146 de 2015, o profissional de apoio escolar é a pessoa
que exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com
deficiência e atua em todas as atividades escolares necessárias, em todos os níveis e
modalidades de ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou
os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas.

• Na Lei 12.764 de 2012 consta que a pessoa com TEA, incluída nas classes comuns
de ensino regular, tem direito a um acompanhante especializado, em casos de
necessidade comprovada. A garantia do direito a um acompanhamento especializado
é um avanço na direção da efetivação da inclusão.

• O acompanhante especializado trabalha com crianças com TEA no contexto de


serem incorporadas ao sistema regular de ensino.

• No cenário atual brasileiro, observa-se que o espaço profissional reservado aos


acompanhantes terapêuticos escolares tem sido ocupado, na maioria dos casos, por
estagiários.

• De um modo geral, o acompanhante terapêutico é tido como um mediador entre a


criança e os desafios que lhes são apresentados. Essa particularidade na atuação tem
sido utilizada pelas escolas como estratégia para viabilizar o processo de inclusão e
permitir que o estar na escola não seja tão oneroso para a criança.

• O acompanhante pode ajudar o professor na compreensão da singularidade da


criança, tendo um olhar ampliado para além da função pedagógica. O Acompanhante
Terapêutico Escolar também pode contribuir com a atuação do professor e demais
profissionais da escola ao possibilitar a percepção dos avanços da criança que
passaram a dimensão das aprendizagens formais.

176
• Os profissionais de Psicologia, Educação, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, e de
outras áreas, têm contribuído para a realização do Acompanhamento Terapêutico
Escolar a partir de perspectivas metodológicas diferentes.

• O acompanhante estimula e convoca os professores e funcionários a se relacionarem


diretamente com o aluno, contribuindo com a autonomia da criança e dos demais
profissionais escolares. A atuação do acompanhante terapêutico escolar contempla
e articula aspectos pedagógicos e terapêuticos, tanto da educação e da escola como
aspectos subjetivos.

• Os estagiários, de modo geral, são vinculados aos cursos de psicologia e pedagogia,


mas há também profissionais de áreas como educação física e fisioterapia.

177
AUTOATIVIDADE
1 A grande demanda do Acompanhamento Terapêutico com crianças ocorre no âmbito
escolar, pois a escola é um dos principais contextos de socialização infantil. Por isso,
levando em consideração os movimentos sociais e políticos atuais, que promovem
uma escola mais inclusiva, hoje se fala em Acompanhamento Terapêutico Escolar
(ATE). Com base nisso, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O acompanhante terapêutico escolar atua sem diálogo com os professores do


aluno, apoiando quando precisa sustentar funções subjetivas e simbólicas na
relação com o aluno, para além da função pedagógica.
b) ( ) O acompanhante terapêutico escolar atua em constante diálogo com os
professores do aluno, apoiando quando precisa sustentar funções subjetivas e
simbólicas na relação com o aluno, mas sem a função pedagógica.
c) ( ) O acompanhante terapêutico escolar atua em constante diálogo com os
professores do aluno, apoiando quando precisa sustentar funções subjetivas e
simbólicas na relação com o aluno, para além da função pedagógica.
d) ( ) O acompanhante terapêutico escolar não atua em constante diálogo com os
professores do aluno, não apoiando quando precisa sustentar funções subjetivas
e simbólicas na relação com o aluno, para além da função pedagógica.

2 Algumas atribuições compatíveis com a atuação do acompanhante terapêutico


refletem sobre a importância deste profissional de apoio no processo inclusivo. Com
base nisso, analise as sentenças a seguir.

I- Participar na elaboração do programa e nas flexibilizações curriculares necessárias a


determinados alunos.
II- Nas adaptações do material didático; na elaboração e planejamento de diferentes
estratégias de ensino.
III- No esclarecimento das necessidades educacionais especiais de alunos com
problemas de aprendizagem.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

178
3 Os acompanhantes não só proporcionam a aprendizagem, mas também formam
a consciência dos alunos, mediando a relação dos alunos com os saberes formais
e informais da escola, bem como as relações que as crianças desenvolvem neste
contexto. Com base nessa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F
para as falsas:

(   ) Os acompanhantes terapêuticos escolares ocupam uma posição de "limite", em-


bora possibilite incertezas e inseguranças por não estarem em uma posição con-
solidada, que é uma característica do desempenho do acompanhante terapêutico
escolar.
(   ) Os acompanhantes trabalham em posições 'entre', ou seja, entre crianças e outras
crianças, entre crianças e professores e entre crianças e famílias, num lugar
de incerteza e instabilidade, onde os acompanhantes podem contribuir para o
desenvolvimento e o processo de inclusão da criança, oferecendo a possibilidade
de construção de vínculos sociais.
(   ) O acompanhante não pode ajudar o professor na compreensão da singularidade da
criança, tendo um olhar ampliado para além da função pedagógica.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) V – F – F.
b) (   ) V – V– F.
c) (   ) F – V – F.
d) (   ) F – F – V.

4 O acompanhante terapêutico escolar não é um profissional específico de um determi-


nado campo ou de uma abordagem teórica. Disserte sobre quais são as possibilidades
de atuação do Acompanhante Terapêutico.

5 O Acompanhamento Terapêutico Escolar surge como possibilidade de ter um traba-


lho, mas a função tem mostrado uma certa desvalorização profissional, com baixas
remunerações e sem direitos trabalhistas, assim, muitos estagiários deixam o acom-
panhamento quando se tornam mais experientes e possuem condições de um retorno
financeiro e profissional mais satisfatório. Neste contexto, disserte sobre essa temática.

179
180
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
VISÃO GERAL SOBRE A APRENDIZAGEM
E O PROCESSO DE ANAMNESE

1 INTRODUÇÃO

Desde o início do século, já havia a preocupação em se entender por que certas


crianças tinham dificuldades em aprender. Vários pesquisadores se dedicaram a este
tema, em diversas partes do mundo. No mundo moderno, a educação formal possui
importante valor sociocultural. O bom desempenho escolar é indicativo de sucesso
pessoal e social, não existindo inclusão social sem educação de qualidade (FORTES,
2014; SIQUEIRA, 2011).

As dificuldades ou problemas de aprendizagem podem ser relacionados a


ambientes desfavoráveis, principalmente no ambiente familiar e escolar. O incentivo
familiar à educação tem papel primordial. Quanto às escolas, existe forte correlação
entre boas escolas, disponibilidade de recursos e progresso escolar. A má qualidade da
educação afeta diretamente as crianças mais vulneráveis provenientes de condições
socioeconômico-culturais mais precárias. Além disso, as dificuldades ou problemas
de aprendizagem podem ter a possibilidade de serem decorrentes de problemas
emocionais, alterações sensoriais, doenças neurológicas e transtornos mentais, como
o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Estima-se, de acordo com
estudos em vários países, que as dificuldades de aprendizagem podem variar de 15,0 a
20,0% no segundo ano escolar (primeira série, segundo nomenclatura anterior), mas que
esta taxa pode alcançar 50,0% dos escolares nos primeiros seis anos de escolaridade
(FORTES, 2014; SIQUEIRA, 2011).

Para uma aprendizagem de qualidade, faz-se necessárias várias habilidades


cognitivas associadas a oportunidades adequadas. Ter um ambiente com várias
experiências sensoriais disponíveis é fundamental, sendo que a privação pode levar
à dificuldade e prejuízos futuros para a criança. Ambientes familiares precários ou
com poucos estímulos e com pouca interação sociolinguística podem levar a criança
à interferência no desenvolvimento de suas aptidões e habilidades. É bem conhecido
e explorado nas pesquisas literárias que as condições desfavoráveis socioeconômicas
e culturais influenciam negativamente o desempenho cognitivo de crianças em fase
de aprendizagem e acadêmicas, ocasionando maior índice de mau desempenho e
insucesso escolar. Este grupo de crianças com vulnerabilidade social é considerado de
risco para dificuldade escolar (DE) e, também, por alguns autores, para transtorno de
aprendizagem (TA) (PASTURA; MATTOS; ARAÚJO, 2005; FORTES, 2014).

181
Nos últimos anos, vem se fortalecendo um movimento em nível mundial para o
acesso universal à educação formal. E no Brasil, a gratuidade da educação fundamental
é garantida através de leis em vigor, por meio de escolas públicas, entre 6 e 14 anos.
Desde a última década, a maioria das crianças brasileiras estão matriculadas no ensino
fundamental. A oportunidade de acesso à escola deixou de ser deficiente para a maioria
da população, porém quando se fala em qualidade de educação e a evasão escolar,
estes ainda são problemas que carecem serem superados. O atual acesso universal
às escolas e a maior exigência educacional fizeram do mau desempenho escolar e da
dificuldade em aprender queixas muito frequentes das escolas e, consecutivamente, nos
consultórios médicos. Essa situação torna necessária a atualização e aperfeiçoamento
dos profissionais da educação e da saúde, para uma melhor identificação e abordagem
destas crianças (FORTES, 2014; SIQUEIRA, 2011).

Acadêmico, no Tópico 3, abordaremos uma breve contextualização sobre o


processo de aprendizagem, na sequência, diferentes dificuldades de aprendizagem e
suas especificidades e, por fim, o processo de diagnóstico envolvendo a dificuldade de
aprendizagem.

2 VISÃO GERAL SOBRE A APRENDIZAGEM


Dentre as várias definições encontradas na literatura consideram a aprendizagem
como sendo um processo que ocorre mediante a integração de diversas funções
do sistema nervoso, promovendo a melhor adaptação do indivíduo com o meio. Na
aprendizagem, ocorre a interação entre o indivíduo e o meio com base na experiência,
promovendo mudanças (REBOLLO; RODRÍGUEZ, 2006).

O processo ligado à aprendizagem depende de uma importante tríade, ligadas


pela escola, ambiente através do qual o indivíduo tem acesso à educação; do grupo
familiar, que proporciona oportunidades para o aprendizado; e de aspectos biológicos,
que lhe propicia o grau de aptidão que o indivíduo irá apresentar para absorver o que lhe
é ensinado. Assim, ambos fatores genéticos e ambientais apresentam forte influência
no aprendizado. Como exemplo, Haviou-Thomas (2008) aponta para a contribuição
do componente genético e ambiental para o desenvolvimento das habilidades iniciais
linguísticas e da fala e da sua relação com a leitura e a maneira como esta será
desenvolvida.

É importante que se leve em consideração que o desempenho apresentado


na escola depende de diferentes fatores: as características da escola, tais como as
instalações físicas, o material pedagógico e a qualificação dos professores, a estrutura
familiar também interfere, dependendo do nível de escolaridade dos pais, presença dos
pais e interação dos pais com a escola e quanto à ajuda para a execução dos deveres
e as características do próprio indivíduo. Então, pode-se ver que a dificuldade de
aprendizagem está ligada a diversos fatores biopsicossociais e encontra interfaces de
educadores, sociólogos, psicólogos e médicos (ARAÚJO, 2002).

182
Desde as primeiras oportunidades que a criança tem de se comunicar, ela já
passa a ser avaliada pela sociedade que a cerca através da observação das suas capa-
cidades intelectuais e motoras antes mesmo dela iniciar na escola. Quando a criança
entra no final de sua primeira infância, seus avanços começam também a ser media-
dos através de seu desempenho apresentado na escola, sendo, neste primeiro conta-
to dentro da escola, o momento em que a criança demonstra com mais clareza suas
dificuldades e limitações, assim como suas aptidões e talentos. As oportunidades de
aprendizagem se apresentam a todo o momento em que a criança se depara com uma
nova situação. No ambiente escolar, tanto com a demanda acadêmica de aprendiza-
gem quanto através da interação social com as outras crianças e adolescentes, estas
oportunidades se apresentam em inúmeras situações. No entanto, quando apresenta
alguma dificuldade de aprendizagem, é importante que professores estejam atentos
para perceber e intervir, com o claro propósito de que essas dificuldades de aprendi-
zagem sejam sanadas. No entanto, essas dificuldades podem atrapalhar de maneira
significativa, neste momento é importante que haja o rápido reconhecimento para in-
tervir precocemente, comunicando e orientando a família desta criança para buscar as
intervenções necessárias. Quando as dificuldades de aprendizagem se tornam incapa-
citantes, elas podem se caracterizar como um transtorno de aprendizagem, neste caso
tornando mais difícil o tratamento e assim exigindo que o foco de intervenção seja mais
específico e intensivo (REBOLLO; RODRÍGUEZ, 2006; FORTES, 2014).

2.1 MAU DESEMPENHO ESCOLAR


O mau desempenho escolar (MDE) pode ser compreendido como um rendimento
escolar abaixo do esperado para idade de referência da criança, habilidades cognitivas
e escolaridade. O MDE deve ser visto como um sintoma associado a várias etiologias.
Independentemente da etiologia, o MDE pode levar a problemas emocionais (baixo
autoestima, desmotivação) e preocupação familiar, além de repercussão em diversas
áreas, incluindo a individual, familiar, escolar e a social. O MDE pode ter mais de uma
causa, podendo ser uma somatória de fatores (por exemplo, filhos de mães alcoolistas
expostos a álcool durante a gestação em meio sociocultural pouco favorável) (CUNHA,
2007; SIQUEIRA, 2011).

Diante da criança com MDE é de fundamental importância buscar a causa para


traçar o melhor tratamento, respeitando a individualidade de indivíduo. As causas são
variadas, destacando-se dois grupos: fatores extrínsecos (ambientais) e intrínsecos
(individuais). Neste contexto, é importante distinguir dificuldade escolar (DE) de transtorno
de aprendizagem (TA). A DE está relacionada a questões de origem pedagógica e/ou
sociocultural. Sem haver qualquer envolvimento orgânico. É extrínseco ao indivíduo. O
TA está associado a problemas na aquisição e no desenvolvimento de funções cerebrais
envolvidas com comportamento de aprendizagem, tais como dislexia, discalculia e
transtorno da escrita. Além dos transtornos específicos de aprendizagem, transtorno

183
de déficit de atenção/hiperatividade (TDA/H) e transtorno de desenvolvimento de
coordenação (TDC), estes também são listados ao mau desempenho escolar. Todas estas
condições têm base neurobiológica; ou seja, são intrínsecas ao indivíduo (SIQUEIRA,
2011; SIQUEIRA; GIANNETTI, 2011).

FIGURA 10 – PRINCIPAIS CAUSAS DE MAU DESEMPENHO ESCOLAR

FONTE: Siqueira (2011, p. 21)

2.2 TRANSTORNO ESPECÍFICO DE APRENDIZAGEM (TEA)


Os distúrbios de aprendizagem nos últimos anos receberam diferentes
definições. Na atual edição do Manual Estatístico dos Transtornos Mentais, o DSM-5
realoca o Transtorno de Aprendizagem da seção prévia de “Transtornos primeiramente
diagnosticados na Infância ou Adolescência”, para uma nova seção denominada de
“Transtornos do Neurodesenvolvimento”, sendo que nesta nova versão renomeia o
Transtorno de Aprendizagem para Transtorno Específico de Aprendizagem (TEA).
O TEA é definido como desordem neurodesenvolvimental da aquisição e uso da
leitura, da escrita. Manifesta-se em diferentes línguas, culturas, etnias e condições
socioeconômicas. Estima-se a prevalência de 5 e 15% nas crianças em idade escolar,

184
em diferentes países, e acomete mais meninos do que meninas, com proporções de
2:1 e 3:1. Podem co-ocorrer com outras desordens, como o TDAH e outros transtornos
mentais, como os Transtornos de Ansiedade, Depressão e Transtorno Bipolar (TB). Essas
morbidades não excluem o diagnóstico de TEA, porém dificultam o seu diagnóstico
(BRITES, 2020; CRUZ, 2017).

De acordo com Brites (2020), é importante definir se a criança está dentro dos
critérios do DSM-V para afirmar que ela está em um quadro de transtorno específico
de aprendizagem. Esses critérios são adequados e resultado de anos de pesquisas e
evidências científicas sobre os transtornos de aprendizagem.

Nos diagnósticos do DSM-5 são definidos quatro critérios diagnósticos


principais: A, B, C e D, de acordo com APA (2014):

• Critério A – dificuldades de aprendizagem e do uso de habilidades acadêmicas,


indicado pela presença de pelo menos um dos seis sintomas e que tenha persistido
por pelo menos 6 meses, apesar das intervenções dirigidas a essas dificuldades.

1. Leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço. Por exemplo: o


estudante lê palavras isoladas em voz alta, de forma incorreta, lenta, adivinhando
palavras e com dificuldade para soletrá-las.
2. Dificuldade para compreender o sentido do que é lido. Por exemplo: o estudante lê
com precisão, mas não entende o que leu e nem a sequência desta leitura.
3. Dificuldades para escrever ortograficamente. Por exemplo: pode adicionar, omitir ou
substituir vogais e consoantes nas palavras.
4. Dificuldades com a expressão escrita. Por exemplo: comete vários erros de gramática
ou pontuação nas frases; faz uma organização inadequada de parágrafos; expressa
as ideias sem clareza.
5. Dificuldades para dominar o senso numérico ou cálculos. Por exemplo: entende
números, e suas relações de forma insatisfatória; conta com os dedos para adicionar
números de um dígito em vez de lembrar o fato aritmético; perde-se no meio dos
cálculos e pode trocar as operações.
6. Dificuldades no raciocínio. Por exemplo: tem grave dificuldade em aplicar conceitos,
fatos ou operações matemáticas para solucionar problemas quantitativos.

• Critério B – as habilidades acadêmicas afetadas estão abaixo do esperado para a idade


do indivíduo. Isso causa interferência no seu desempenho acadêmico, profissional e
nas atividades cotidianas. Essa interferência negativa pode ser confirmada por testes
e por avaliação clínica de profissionais médicos ou não médicos especializados.
• Critério C – as dificuldades de aprendizagem iniciam-se durante os primeiros anos
escolares, mas podem não se manifestar completamente até que as exigências pelas
habilidades acadêmicas afetadas excedam as capacidades limitadas do indivíduo.
Com o passar do tempo, a criança vai ficando mais velha e expondo cada vez mais as
dificuldades enquanto as exigências escolares aumentam e o indivíduo não consegue
acompanhar.

185
• Critério D – as dificuldades de aprendizagem são significativas, mas não podem ser
explicadas por alguns problemas, como os exemplificados na Figura 11, adiante.

Segundo o DSM-5, as principais habilidades afetadas no quesito leitura são


precisão na leitura de palavras, fluência e compreensão leitora. No conhecimento
referente à matemática, os especificadores são senso numérico, fluência ou precisão
em cálculos, memorização de fatos aritméticos, precisão na resolução de problemas
matemáticos. Os descritores das habilidades escritas englobam a clareza e organização
na expressão escrita, bem como a precisão ortográfica, gramatical e na pontuação
(CRUZ, 2017).

De acordo com o DSM-5 (2014), o TEA também pode ser especificado quanto à
gravidade:

• O indivíduo que apresenta um quadro leve tem algumas dificuldades na aprendizagem


de um ou dois domínios acadêmicos, contudo, com aptidão para compensar seu
desempenho quando suprido de adaptações adequadas, recursos diferenciados ou
serviços de apoio, especialmente durante os anos escolares.
• No que se refere à gravidade moderada, os problemas acentuados na aprendizagem
de um ou mais domínios acadêmicos, de tal modo que seja improvável que o indivíduo
se torne proficiente em uma área do conhecimento sem alguns intervalos de ensino
intenso e especializado ao longo dos anos escolares. Podem ser necessárias algumas
adaptações ou serviços de apoio para que as atividades sejam completadas de
maneira eficiente e precisa.
• Quando o indivíduo apresenta um grau severo do Transtorno Específico de
Aprendizagem, estão afetados vários domínios acadêmicos, de modo que seja
improvável que o indivíduo aprenda sem um ensino especializado, intensivo e
individual durante os anos escolares. Mesmo com adaptações apropriadas ou
serviços de apoio, o indivíduo pode não ser capaz de completar todas as atividades
eficientemente.

O diagnóstico do TEA é realizado por meio de avaliações padronizadas


e administradas individualmente, por avaliação clínica, com base na história de
desenvolvimento individual (médica, educacional e familiar). Para indivíduos acima dos
17 anos, o histórico documentado dos problemas de aprendizagem pode substituir a
avaliação padronizada. O TEA não é diagnosticado em idade pré-escolar. Porém, alguns
dos sintomas podem se manifestar precocemente, por exemplo, o pouco interesse
em jogos de linguagem ou os de repetição de palavras e rimas. Pode ser observado
frequentemente nessas crianças, o uso de falas regressivas, dificuldades na pronúncia
de palavras e problemas para lembrar nomes, letras, números ou os dias da semana
(CRUZ, 2017; MARGARI et al., 2013).

186
FIGURA 11 – PROBLEMAS QUE NÃO PODEM SER INCLUÍDOS NO TRANSTORNO ESPECÍFICO DE
APRENDIZAGEM

FONTE: Brites (2014, p. 8)

3 CRITÉRIOS CLÍNICOS: ANAMNESE


É muito importante que a avaliação neuropsicológica comece pela anamnese,
em que serão avaliados vários aspectos, desde como foi o encaminhamento para a
avaliação e as principais queixas dos pais e professores até a obtenção do maior número
possível de informações sobre o comportamento da criança e da sua história de vida,
com informações que muitas vezes podem anteceder seu nascimento (BRITES, 2020).

O processo de anamnese é fundamental, pois é o momento em que se torna


possível um melhor contato com os pais e é quando são adquiridas informações
valiosas que serão utilizados em quase todo o processo de diagnóstico. Neste momento
é feita uma entrevista com os pais ou responsáveis pela criança, e todas as informações
colhidas são sigilosas. É importante anotar tudo, pois todos os detalhes fazem a diferença.
Também é necessário avaliar a postura corporal dos pais, o tom da fala e a dinâmica
familiar, devendo sempre manter uma postura neutra frente à fala dos informantes, não
demonstrando emoções durante a avaliação. Também neste momento será explicado
todo o processo de avaliação (BRITES, 2020).

187
FIGURA 12 – ANAMNESE

FONTE: <https://bit.ly/3xffZS8>. Acesso em: 1 abr. 2022.

Segundos Brites (2020), a avaliação é um recorte momentâneo de um estado


que o indivíduo apresenta. Por este motivo não é feita apenas uma avaliação, mas
sim várias avaliações, buscando os melhores resultados. É muito importante que o
profissional esteja atento a todas as esferas da aprendizagem. Após a anamnese, no
primeiro encontro com a criança é necessário ter muita clareza e honestidade, deixando
bem claro o motivo pelo qual a criança está sendo avaliada e como está sendo o processo.

3.1 AVALIAÇÃO DO MATERIAL ESCOLAR


É muito importante a análise do material escolar da criança, para que se possa
verificar se está adequado ao nível escolar dela. Sempre que possível, é importante
serem aplicadas algumas provas adaptadas para a idade escolar da criança. Além disso,
é fundamental terem atividades de leitura, ditados, produção de texto, consciência
fonológica, rima, aliteração e problemas matemáticos de numerais etc. (BRITES, 2020).

FIGURA 13 – AVALIAÇÃO DO MATERIAL ESCOLAR

FONTE: <https://bit.ly/3xffZS8>. Acesso em: 1 abr. 2022.

188
3.2 JOGOS E DESENHOS
Dentro do processo de avaliação também é possível trabalhar com jogos, que
serão escolhidos de forma a estarem adaptados para a idade da criança. É necessário
ter claro o motivo da aplicação e o que será avaliado durante a execução, sempre de
acordo com a queixa (BRITES, 2020).

De acordo com Brites (2020), durante a realização dos desenhos, devem ser
analisados aspectos como a coordenação motora, a distribuição espacial, e uma análise
geral do desenho, observando se há componentes psicológicos presentes.

FIGURA 14 – AVALIAÇÃO DO DESENHO INFANTIL

FONTE: <https://bit.ly/3E8uXL5>. Acesso em: 1 abr. 2022.

3.3 EXEMPLOS DE TESTES UTILIZADOS PELO


PSICODIAGNÓSTICO
Destaca-se a ajuda que os testes neuropsicológicos e as escalas podem trazer
quanto ao auxílio para o diagnóstico da patologia e também no momento de traçar um
plano de tratamento dos resultados apresentados. Com os testes neuropsicológicos
é possível identificar áreas cerebrais que estão envolvidas e acabam refletindo no
funcionamento cognitivo e na conduta da criança (GRAEFF; VAZ, 2006).

O WISC-III se destaca como uma das principais referências, e a mais utilizada


para aferir à medida da inteligência de crianças e adolescentes. A utilização deste
instrumento está voltada para os contextos clínico, psicoeducacional e de pesquisa,
possibilitando a avaliação minuciosa das capacidades cognitivas desde as crianças,
adolescentes até os adultos. Além disso, a aplicabilidade desta escala pode ser útil nos
casos de acompanhamento de crianças com histórico de problemas de aprendizagem,
porque se pode medir isoladamente a performance verbal, percepto-motora e o
quociente intelectual total (MELLO et al., 2011).

189
A Escala de Inteligência Wechsler para Crianças – 3ª edição (WISC-III) – tem como
objetivo avaliar a capacidade intelectual de crianças, adolescentes e adultos. O WISC-
III é composto por 13 subtestes, organizados em dois grupos: Verbais e Perceptivos-
motores ou de Execução, que são aplicados nas crianças em ordem alternada, ou seja,
um subteste de Execução e depois um subteste verbal e vice-versa. Os Subtestes
Verbais são compostos pelos itens: Informação, Semelhanças, Aritmética, Vocabulário,
Compreensão e Dígitos, enquanto que os subtestes de Execução são formados pelos
itens: Completar Figuras, Código, Arranjo de Figuras, Cubos, Armar Objetos, Procurar
Símbolos e Labirintos (CRUZ, 2005; MOUTINHO, 2014).

O WISC III é um teste padrão que faz parte do conjunto de testes da Escala We-
chsler e tem como objetivo medir três níveis de Quociente de Inteligência dos sujeitos
avaliados: QI total, QI verbal e o QI de execução. O teste é composto majoritariamente por
figuras, e as tarefas dadas aos que passam pelo teste geralmente envolvem nomeá-las,
classificá-las, separá-las, organizá-las em sequência etc. (CRUZ, 2005; MOUTINHO, 2014).

O teste é composto por treze subtestes e recomenda-se que todos sejam


aplicados em uma única sessão de setenta minutos. É recomendado que a sessão seja
interrompida caso o aplicador perceba que o avaliado está cansado ou muito desatento
e que se dê continuidade em outro dia. Os treze subtestes são organizados em três
categorias: subtestes verbais, subtestes de execução e subtestes suplementares
(CRUZ, 2005; MOUTINHO, 2014).

Apesar do aumento de interesse na área, a realidade da avaliação de


desempenho escolar no Brasil tem sido caracterizada por uma carência de instrumentos
cientificamente construídos para nossa realidade de ensino. O único instrumento
psicopedagógico brasileiro voltado para avaliação ampla do desempenho escolar é o
Teste de Desempenho Escolar (TDE) criado em 1994 (MOUTINHO, 2014; STEIN, 1994).

O TDE é um instrumento psicométrico de aplicação individual que busca


avaliar de forma ampla as capacidades fundamentais para o desempenho escolar,
mais especificamente de três áreas: 1) leitura – reconhecimento de palavras isoladas
do contexto, 2) escrita – escrita do nome próprio e de palavras contextualizadas,
apresentadas sob a forma de ditado e 3) aritmética – solução oral de problemas e
cálculo de operações aritméticas por escrito, indicando de uma maneira abrangente
quais são as áreas da aprendizagem escolar que estão preservadas ou prejudicadas na
criança (MOUTINHO, 2014; STEIN, 1994).

Esse teste foi desenvolvido e normatizado com o objetivo de avaliar as crianças


em séries escolares de 1ª a 6ª séries do Ensino Fundamental. Cada um dos subtestes
apresenta uma escala de itens em ordem crescente de dificuldade que são propostos
à criança em sequência e independentemente de sua série. A aplicação dos subtestes
acabam quando o aplicador identifica que os itens apresentados são muito difíceis de
serem resolvidos pela criança (MOUTINHO, 2014; STEIN, 1994).

190
3.4 ASPECTOS PSICOMOTORES
Na avaliação psicopedagógica, é de igual importância que sejam avaliados
aspectos psicomotores das áreas básicas. São aplicados testes de equilíbrio, coordenação
global e fina, esquema e imagem corporal, dominância e lateralidade (BRITES, 2020).

FIGURA 15 – ASPECTOS IMPORTANTES A SEREM AVALIADOS NA LINGUAGEM

FONTE: Brites (2020, p. 35)

FIGURA 16 – ASPECTOS IMPORTANTES A SEREM AVALIADOS NA ESCRITA

FONTE: Brites (2020, p. 37)

191
FIGURA 17 – ASPECTOS IMPORTANTES A SEREM AVALIADOS NA LEITURA

FONTE: Brites (2020, p. 36)

192
LEITURA
COMPLEMENTAR
AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA DE CRIANÇA COM ALTERAÇÕES NO
DESENVOLVIMENTO: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Leila Santos Batista


Bárbara Gonçalves
Márcia Siqueira de Andrade

O presente estudo se desenvolveu a partir do relato de um processo de


Diagnóstico Psicopedagógico numa perspectiva teórica clínica.

Diagnóstico Psicopedagógico Clínico

O diagnóstico, para o terapeuta, tem a mesma função que a rede para um


equilibrista, ou seja, ele dará o suporte para que o psicopedagogo caminhe de maneira
segura durante o processo de intervenção. O sucesso e a eficácia do diagnóstico
psicopedagógico pressupõem por parte do terapeuta: profundo conhecimento teórico do
processo de aprendizagem, postura clínica, capacidade de observação e instrumentos
e métodos adequados.

O objetivo do diagnóstico psicopedagógico clínico é identificar a modalidade


de aprendizagem, o nível da escrita e o nível cognitivo. Os instrumentos aplicados no
diagnóstico psicopedagógico aqui relatado são descritos no item método e fazem parte
do protocolo utilizado na clínica-escola campo desta pesquisa.

Modalidade de aprendizagem

A forma como cada indivíduo entra em contato com o objeto de conhecimento,


a modalidade de aprendizagem, é particular, individual e oferece um saber que é singular
para cada indivíduo. A modalidade de aprendizagem é construída desde o nascimento
e nas várias situações de aprendizagem, constituindo-se como um esquema de operar
ou processar as informações.

Para melhor compreensão do processo que resulta em modalidade de


aprendizagem, é importante compreender o movimento definido como “adaptação”.
Adaptação é o resultado de um duplo movimento complementar de assimilação e
acomodação. Por meio da assimilação, o sujeito transforma a realidade para integrá-la
às suas possibilidades de ação e, através da acomodação, transforma e coordena seus
próprios esquemas ativos, para adequá-los às exigências da realidade.

193
As modalidades de aprendizagem sintomáticas são geradas por um desequilíbrio
nos movimentos de assimilação e/ou acomodação. O excesso (hiper) ou escassez (hipo)
em um desses movimentos afeta o resultado (aprendizagem), ou seja, dificuldades de
aprendizagem estão relacionadas a uma hiperatuação ou hipoatuação de um desses
processos. Quando há o predomínio da assimilação, de aprendizagem são da ordem
da não resignação, o que leva o sujeito a interpretar os objetos de modo subjetivo, não
internalizando as características próprias do objeto. Quando a acomodação predomina,
o sujeito não empresta sentido subjetivo aos objetos, antes, resigna-se sem criticidade.

Desenvolvimento Infantil

O conceito de desenvolvimento infantil pode ser entendido como um processo


que envolve vários aspectos: crescimento físico, maturação neurológica, construção de
habilidades relacionadas ao comportamento e às esferas cognitivas, social e afetiva da
criança. O desenvolvimento adequado habilita a criança a atender à demanda do meio,
tornando-a “competente” para responder às suas necessidades, considerando o seu
contexto de vida.

Neste contexto, a reabilitação é o processo pelo qual a criança com alterações


no desenvolvimento poderá ser adequadamente estimulada com o objetivo de melhorar
a funcionalidade das suas habilidades físicas, mental e/ou social. Nessa perspectiva,
todo trabalho de reabilitação, independentemente da idade, deve estar centrado nas
habilidades da criança, lembrando que sua integridade e dignidade devem sempre
ser respeitadas. Para tal, importa que, ao planejar os programas de reabilitação e de
apoio, o terapeuta possa impreterivelmente considerar os costumes, possibilidades
e as estruturas da família e da comunidade, adequando sua proposta terapêutica às
dificuldades e necessidades da criança.

Participante

É estudante do 3º ano do Ensino Fundamental I, com idade de 9 anos, lê e escreve


com dificuldade, não apresenta problemas de comportamento e foi encaminhado ao
atendimento psicopedagógico pelo Neurologista por apresentar:

a) atraso no desenvolvimento neuropsicomotor: refere-se a atraso no desenvolvimento


de dois ou mais domínios: motricidade, linguagem, cognição, habilidades sociais ou
aquelas requeridas em atividades da vida diária, e/ou ainda, uma inadequação no
desenvolvimento que impossibilita a saudável sequência de estágios considerados
importantes marcadores semiológicos de integridade do sistema nervoso central;
b) desatenção: refere-se à dificuldade de concentração ou à falta de atenção;
c) dificuldade de aprendizado: refere-se a problemas na aquisição e uso de habilidades
como leitura, escrita e matemática, conduzindo a rendimento escolar abaixo do es-
perado. As dificuldades de aprendizagem possuem etiologias diversas e são distintas

194
dos transtornos de aprendizagem, que são específicos e de origem neurobiológica.
Assim, dificuldades de aprendizagem podem estar associadas a problemas pedagó-
gicos, sociais, deficiência intelectual ou ser secundários a outros transtornos.
F83: Transtornos específicos misto do desenvolvimento. Esta categoria agrupa
transtornos que apresentam ao mesmo tempo sinais de um transtorno específico do
desenvolvimento da fala e da linguagem, das habilidades escolares, e das funções
motoras, mas sem a predominância suficiente de elementos para constituir o
diagnóstico principal.
F98.8: Outros transtornos comportamentais e emocionais especificados com início
habitualmente na infância ou adolescência. Inclui sintomas como comer unhas, déficit
de atenção sem hiperatividade, enfiar os dedos no nariz, masturbação exagerada e
sucção do polegar.

Instrumentos

Em conformidade com o protocolo implantado na clínica-escola citada, os


instrumentos utilizados no processo e considerados para o presente estudo foram:

• Desenho da Família: nessa atividade, observa-se a estrutura familiar, a fim de investigar


como se dá a relação entre seus membros como um todo e individualmente;
• Desenho da Família Cinética: essa atividade busca compreender como se dá o
estabelecimento de vínculos entre os membros da família;
• Desenho do Par Educativo: essa prova traz subsídios específicos para a compreensão
da relação entre quem ensina, quem aprende, e o objeto de conhecimento, como é
percebido pelo sujeito;
• Hora do Jogo Diagnóstica: a aplicação dessa prova tem como objetivo geral identificar
a modalidade de aprendizagem do sujeito e de analisar como o mesmo se apropria
do objeto de conhecimento desejado. Por outro lado, analisa-se, também, como ele
lida com o não conhecer, como ele trabalha com questões cognitivas relacionadas às
habilidades mentais de classificar, ordenar e seriar;
• Sondagem da Escrita: essa prova tem por objetivo identificar o nível conceitual da es-
crita do sujeito: se ele já reconhece as letras, se já está alfabetizado ou não e como está
seu processo de aquisição da leitura e escrita. Com base em Ferreiro é possível identifi-
car em que nível de aquisição da leitura/escrita o paciente se encontra, dentro das se-
guintes possibilidades: pré-silábico, silábico, silábico alfabético, alfabético e ortográfico;
• Provas Piagetianas: tem por finalidade identificar o estágio do desenvolvimento
cognitivo em que o sujeito se encontra. Para isso, foram aplicadas provas de
conservação: conservação de pequenos conjuntos discretos de elementos,
conservação de quantidades contínuas e conservação de líquido (transvasamento);
• Entrevista com os Pais: pretende-se obter o máximo de informação possível sobre
a história de vida do sujeito, a relação estabelecida entre ele, enquanto alguém com
possibilidades de aprender, e os pais como aqueles que podem ensinar. Tem de se
ter em conta não só o que é dito, mas também como é dito, bem como observar a
linguagem corporal dos entrevistados.

195
RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estabelecimento do Vínculo: na primeira sessão, o paciente não interagiu


com o grupo. Comportou-se de maneira tímida, introvertida e apresentou problemas
na fala (linguagem). Participou da atividade proposta (jogo pega-varetas), porém não
demonstrou compreensão das regras. Desenho da Família: após a consigna “desenhe
uma família”, Pedro desenhou os três membros da família (ele, pai e mãe); conforme
Figura 1, notam-se esquemas corporais empobrecidos, olhos vazados e ausência de
braços; observa-se que Pedro se desenhou ao lado da mãe; o tamanho relativo dos
personagens foi evidenciado e a produção foi centralizada na folha; por fim, evidencia-
se que Pedro desenhou a sua família real, composta por ele, pai e mãe, o que sugere
uma percepção de relação saudável entre os membros.

Desenho da Família Cinética: nesta atividade foi solicitado o desenho de uma


família fazendo alguma coisa. Pedro desenhou os personagens sem diferenciação de
sexo; todos os membros da família num mesmo ambiente, porém cada um fazendo uma
coisa diferente. Essa situação sugere comprometimento no vínculo familiar.

Desenho do Par Educativo: foi solicitado ao grupo o desenho de alguém


aprendendo alguma coisa e alguém ensinando. Pedro se desenhou fazendo uma prova;
observa-se no desenho que ele está ao lado de uma folha, com um lápis na mão; a
ausência de ensinante sugere vínculo comprometido com quem ensina e não com o
objeto de conhecimento (folha de prova); o tamanho do aprendente, o tamanho do
objeto de conhecimento e o contato do aprendente com o lápis sugere vínculo saudável
com o objeto de conhecimento.

Entrevista com os pais: durante a entrevista a mãe relatou que Pedro é autista
(apesar dessa informação não constar no relatório médico), tem problemas na fala e
dificuldades de socialização. Faz acompanhamento neurológico, fonoaudiólogo e usa os
medicamentos Risperidona e Tofranil. Na entrevista, foi evidenciado que Pedro tem um
primo (filho de um tio por parte de mãe), com a idade de 7 anos, que também é autista.
A mãe relatou que Pedro nasceu de parto normal, sem complicações e começou a falar
com 1 ano 2 meses.

Figura 1 – Desempenho de Pedro na Prova da Família.

196
Hora do Jogo Diagnóstica: após apresentar a caixa, foi solicitado ao grupo para
realizar a atividade. Pedro não fez inventário, pegou um livro e ficou folheando, depois
pegou a lata de palitos e brincou um pouco, sem demonstrar muita vontade, por fim, fez
um desenho, utilizando canetinhas e papel sulfite, porém não terminou. Essa atitude
demonstra a dificuldade da criança em se apropriar do objeto de conhecimento desejado;
o contato superficial com a caixa e com os objetos oferecidos sugere dificuldades em
lidar com a situação e com o não conhecer.

Sondagem da Escrita: conforme Figura 2, a escrita de Pedro foi classificada como


silábica-alfabética, sem o registro da sílaba de três letras, estando aquém do esperado
para a idade, de acordo com a padronização do teste. As palavras ditadas ao paciente
foram: elefante, rã, formiga, cachorro e tigre; e a frase foi: “O elefante pisou na formiga”.

Frente às Provas Piagetianas, apresentou respostas perceptivas e de não-


conservação, quando o esperado para a idade seria uma resposta cognitiva (lógica) e
conservativa, próprias do estágio do desenvolvimento cognitivo operacional-concreto,
adequado a crianças de 7 a 11 anos.

Figura 2 – Desempenho de Pedro na Sondagem da Escrita.

Desde a primeira sessão, Pedro apresentou dificuldades relacionadas à


interação social e comunicação (linguagem verbal). Nota-se o comprometimento do
desenvolvimento da fala e da linguagem de forma acentuada, conforme descrição da
CID-10 F8311. Interagiu pouco com o grupo e com a psicopedagoga, limitando muitas
respostas a “sim” ou “não”. Respostas mais complexas, adequadas às perguntas,
surgiam apenas quando abordado de forma mais precisa e individualizada, o que
sinaliza prejuízos associados às possíveis alterações das funções cognitivas, dentre elas
a linguagem, apresenta- das pelo quadro (CID-10 F83).

197
Déficits relacionados às funções motoras, descritos na CID-10 F83, foram evi-
denciados durante a execução das atividades de Sondagem da Escrita, e nos Testes
piagetianos, e percebidos também nas brincadeiras e jogos lúdicos (montagem de que-
bra-cabeça, pega-varetas, entre outras). Prejuízos relacionados à desatenção não foram
evidenciados na avaliação, Pedro se mostrou atento às normas e às consignas solicitadas.

À medida que os encontros foram se constituindo, Pedro foi se integrando ao


grupo, e essa integração pôde ser percebida em atitudes comportamentais, tais como:
rir com os colegas diante de uma situação engraçada; chamar a terapeuta pelo nome;
expressar o desejo de contar histórias diante dos testes projetivos (família, família
cinética e par educativo) e contar sobre sua rotina diária.

Foi principalmente nas atividades lúdicas, a partir da 4ª sessão, que se tornaram


evidentes uma melhor compreensão do grupo com relação às dificuldades apresentadas
pelo Pedro (comunicação e coordenação motora fina). Com relação à modalidade de
aprendizagem, Pedro foi classificado como Hipoassimilativo/ Hipoacomodativo. Na
hipoassimilação, ocorre pobreza de contato com o objeto, e déficit lúdico e criativo; na
hipoacomodação, além de pobreza de contato com o objeto, ocorre também dificuldade
na interiorização das imagens.

Apesar dos déficits e prejuízos apresentados, Pedro cumpriu todas as atividades


propostas. A avaliação psicopedagógica demonstrou déficits da aprendizagem da
escrita, dificuldades relacionadas à coordenação motora e à comunicação (linguagem
verbal), além de prejuízo no desenvolvimento cognitivo. Com relação aos aspectos
emocionais, os resultados obtidos a partir das análises da produção da criança sugerem
a existência de percepção saudável da estrutura familiar; vínculo saudável com o objeto
de conhecimento, percepção de ausência de vínculo familiar, e vínculo comprometido
com o ensinante.

Frente ao desempenho do paciente nas atividades propostas, presume-se que


as dificuldades de aprendizagem apontadas pelo relatório médico sejam oriundas, em
parte, das alterações no desenvolvimento (CID-10 F83; F98-8), e em parte da falta de
atendimento adequado às suas necessidades especiais, considerando a realidade das
instituições públicas de ensino e das políticas sociais nacionais.

CONCLUSÃO

A descrição do processo avaliativo da criança com alterações no desenvol-


vimento teve como objetivo ilustrar o processo diagnóstico psicopedagógico, seus
instrumentos e possibilidades de interpretação de seus resultados. Dessa forma, a
avaliação psicopedagógica permitiu uma análise abrangente do sujeito e de sua apren-
dizagem, contribuindo para a compreensão de como Pedro se coloca na construção do
conhecimento, subsídios que auxiliarão ao encaminhamento do caso.

198
A avaliação psicopedagógica deve possibilitar o entendimento das especifici-
dades e necessidades da criança, suas dificuldades, sua relação com o outro e com
a aprendizagem, possibilitando delinear ações terapêuticas para atendimento dessas
necessidades. Limitações e direções futuras apontam para o fato de que o atendimento
em grupo não otimiza o processo de avaliação e o próprio desenvolvimento das crian-
ças, exceto com relação à interação social e comunicação, uma vez que muitas crian-
ças que chegam às clínicas de psicopedagogia podem requerer atenção individualizada
para lidar com suas dificuldades.

FONTE: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoped/v32n99/06.pdf>. Acesso em: 23 fev. 2022.

199
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Dentre as várias definições encontradas na literatura, consideram a aprendizagem


como sendo um processo que ocorre mediante a integração de diversas funções do
sistema nervoso, promovendo a melhor adaptação do indivíduo com o meio.

• O mau desempenho escolar (MDE) pode ser compreendido como um rendimento


escolar abaixo do esperado para idade referência da criança, habilidades cognitivas e
escolaridade.

• O TEA é definido como desordem neurodesenvolvimental da aquisição e uso da


leitura, da escrita.

• É importante definir se a criança está dentro dos critérios do DSM-V para afirmar que
ela está em um quadro de transtorno específico de aprendizagem. Esses critérios
são adequados e resultado de anos de pesquisas e evidências científicas sobre os
transtornos de aprendizagem.

• As principais habilidades afetadas no quesito leitura são precisão na leitura de


palavras, fluência e compreensão leitora.

• O diagnóstico do TEA é realizado por meio de avaliações padronizadas e administradas


individualmente, por avaliação clínica, com base na história de desenvolvimento
individual (médica, educacional e familiar).

• É muito importante que a avaliação neuropsicológica comece pela anamnese, onde


serão avaliados vários aspectos, desde como foi o encaminhamento para a avaliação
e as principais queixas dos pais e professores até a obtenção do maior número
possível de informações sobre o comportamento da criança e da sua história de vida,
com informações que muitas vezes podem anteceder seu nascimento.

• O processo de anamnese é fundamental, pois é o momento em que se torna possível


um melhor contato com os pais e é quando são adquiridas informações valiosas que
serão utilizadas em quase todo o processo de diagnóstico.

• A avaliação é um recorte momentâneo de um estado que o indivíduo apresenta. Por


este motivo não é feita apenas uma avaliação, mas sim várias avaliações, buscando
os melhores resultados.

200
• É muito importante a análise do material escolar da criança, para que se possa
verificar se está adequado ao nível escolar dela.

• Dentro do processo de avaliação também é possível trabalhar com jogos, que serão
escolhidos de forma a estarem adaptados para a idade da criança. É necessário ter
claro o motivo da aplicação e o que será avaliado durante a execução, sempre de
acordo com a queixa.

• Destaca-se a ajuda que os testes neuropsicológicos e as escalas podem trazer


quanto ao auxílio para o diagnóstico da patologia e também no momento de traçar
um plano de tratamento dos resultados apresentados.

• Apesar do aumento de interesse na área, a realidade da avaliação de desempenho


escolar no Brasil tem sido caracterizada por uma carência de instrumentos
cientificamente construídos para nossa realidade de ensino. O único instrumento
psicopedagógico brasileiro voltado para avaliação ampla do desempenho escolar é o
Teste de Desempenho Escolar.

• Na avaliação psicopedagógica, é de igual importância que sejam avaliados aspectos


psicomotores das áreas básicas. São aplicados testes de equilíbrio, coordenação
global e fina, esquema e imagem corporal, dominância e lateralidade.

201
AUTOATIVIDADE
1 É importante que se leve em consideração que o desempenho apresentado na escola
depende de diferentes fatores: as características da escola tais como as instalações
físicas, o material pedagógico e a qualificação dos professores, a estrutura familiar
também interfere dependendo do nível de escolaridade dos pais, presença dos pais
e interação dos pais com escola e quanto a ajuda para a execução dos deveres e
as características do próprio indivíduo. Com relação a isso, assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) Pode-se ver que a dificuldade de aprendizagem está ligada a diversos fatores


biopsicossociais e encontra interfaces de educadores, sociólogos, psicólogos e
médicos.
b) ( ) Pode-se ver que a dificuldade de aprendizagem está ligada a um único fator.
c) ( ) Pode-se ver que a dificuldade de aprendizagem está ligada a diversos fatores
biopsicossociais.
d) ( ) Pode-se ver que a dificuldade de aprendizagem está ligada a diversos fatores
psicológicos.

2 Desde as primeiras oportunidades que a criança tem de se comunicar, ela já passa a


ser avaliada pela sociedade que a cerca através da observação das suas capacidades
intelectuais e motoras antes mesmo dela iniciar na escola. Quando a criança entra no
final de sua primeira infância, seus avanços começam também a ser mediados através
de seu desempenho apresentado na escola, sendo, neste primeiro contato dentro da
escola, o momento em que a criança demonstra com mais clareza suas dificuldades e
limitações, assim como suas aptidões e talentos. Com base no desempenho escolar,
analise as sentenças a seguir.

I- As oportunidades de aprendizagem se apresentam a todo o momento em que a


criança se depara com uma nova situação.
II- No ambiente escolar, tanto com a demanda acadêmica de aprendizagem
quanto através da interação social com as outras crianças e adolescentes, estas
oportunidades se apresentam em inúmeras situações.
III- Quando as dificuldades de aprendizagem se tornam incapacitantes, elas podem
se caracterizar como um transtorno de aprendizagem, neste caso, tornando mais
difícil o tratamento e assim exigindo que o foco de intervenção seja mais específico
e intensivo.

Assinale a alternativa CORRETA:

202
a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 É muito importante que a avaliação neuropsicológica comece pela anamnese, em


que serão avaliados vários aspectos, desde como foi o encaminhamento para a
avaliação e as principais queixas dos pais e professores até a obtenção do maior
número possível de informações sobre o comportamento da criança e da sua história
de vida, com informações que muitas vezes podem anteceder seu nascimento. De
acordo com o processo de anamnese, classifique V para as sentenças verdadeiras e
F para as falsas:

(   ) O processo de anamnese é fundamental, pois é o momento em que se torna


possível um melhor contato com os pais e é quando são adquiridas informações
valiosas que serão utilizadas em quase todo o processo de diagnóstico.
(   ) Não é importante anotar tudo, pois todos os detalhes não fazem a diferença.
(   ) É necessário avaliar a postura corporal dos pais, o tom da fala e a dinâmica familiar,
devendo sempre manter uma postura neutra frente à fala dos informantes, não
demonstrando emoções durante a avaliação.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) (   ) V – F – F.
b) (   ) V – V – V.
c) (   ) F – V – F.
d) (   ) V– F – V.

4 A avaliação é um recorte momentâneo de um estado que o indivíduo apresenta. Por


este motivo não é feita apenas uma avaliação, mas sim várias avaliações, buscando
os melhores resultados. Disserte sobre o que envolve este processo.

5 O único instrumento psicopedagógico brasileiro voltado para a avaliação ampla do de-


sempenho escolar é o Teste de Desempenho Escolar. Descreva o Teste de Desempenho
Escolar.

203
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