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1- Samuel
- Você não tem jeito, Samuel… Se bem que dessa vez foi por uma
razão justificável. Sentirei falta de suas músicas dando vida a
taverna, e - Parou e olhou em volta - nem tanto assim de limpar a
bagunça.
Vivo na grande casa de meu pai, nas terras que são suas por direito,
cresci correndo pelas fazendas ao redor da grande casa e fazendo
travessuras na vila dos servos que trabalhavam para meu pai. Em
determinado ponto no começo de minha adolescência um grupo de
bardos itinerantes chegou às terras de meu pai, havia uma grande festa
pelo nascimento de meu segundo meio-irmão, eu pouco participei pois
minha madrasta proibiu-me de entrar na casa grande durante as
festividades, mas naquele dia apaixonei-me por música, e decidi que
aquele era o caminho que eu buscaria trilhar.
E aqui estou eu anos depois, andando na vila dos servos de meu pai após
uma festa de despedida com alguns amigos que fiz ao longo dos anos.
Imagino a cara estática e feliz de minha madrasta ao ouvir os guardas
dizerem que finalmente parti. Se dependesse de minha madrasta eu seria
um analfabeto igual ao resto dos servos, mas ao saber de meu desejo de
virar um bardo itinerante ela insistiu para que meu pai me colocasse sob
a tutela do mesmo professor de meus irmãos, ao menos uma coisa aquela
mulher amarga fez por mim.
Caminhei pelos campos de trigo e cevada até a casa grande onde recolhi
meus pertences: meu fiel alaúde, algumas roupas, uma cama de peles,
alguns livros, um cantil de couro, um caneco de madeira, um mapa do
reino, um pouco de ouro que consegui de meu pai e uma faca de cozinha
velha que não fará falta. Fui até as cozinhas da casa grande e peguei um
pão que havia sobrado do dia anterior e coloquei junto de minhas coisas,
envolvido num pano.
Eu estava pronto.
Dei uma boa olhada para trás após seguir a estrada, para ver onde cresci
uma vez mais, vi a vila dos servos com suas casas simples e pobres, os
campos dourados cultivados arduamente sendo iluminados pelo sol da
manhã, e vi a casa grande no topo da colina, acompanhada pela torre dos
guardas. Senti um pouco de melancolia, mas respirei fundo e segui pela
estrada que deveria me levar a cidade de Lisvera, a capital do reino.
Segui viagem meio cansado pela forma abrupta que acordei, mas logo
animei-me ao ver no horizonte um lugar conhecido, a pequena cidade de
Trava. Era uma pequena cidade burguesa na beira do feudo, me lembro
que só a visitei 2 vezes, quando meu pai me levou junto em algumas de
suas viagens. Pus me a andar mais depressa e de semblante alegre, a
estrada deixou de atravessar bosques e colinas para dar lugar a um
campo semiaberto, ao chegar mais perto pude ver algumas plantações
sendo aradas por camponeses, haviam repolhos, cenouras e tomates
crescendo e amadurecendo. Ao caminhar distraído admirando a
paisagem senti subitamente o chão tremer perto de mim e mal vi uma
grande mancha marrom com crina a poucos palmos de minha fuça,
joguei-me para o lado em um pulo de susto. Caí sentado e pude ver um
homem montado com muita pressa, ele nem sequer se virou e pareceu
rir de meu susto.
Sacudi a poeira da estrada de minhas calças e pus me de volta a andar,
desta vez mais atento. A viagem estava um pouco menos gloriosa do que
imaginei nos dias que me preparava, mas ainda assim estava um pouco
cômica. Comecei a passar por um ou outro viajante, às vezes passava
uma carroça, pelo menos já estava vendo rostos novos.
Admito que fiquei meio atordoado com todo o movimento de pessoas, fui
para um canto e pude ver melhor a grande rua que se estendia à minha
frente, havia uma grande feira que se estendia ao longo da rua abraçada
pelas charmosas casas de dois andares típicas desse tipo de cidade.
Haviam barraquinhas vendendo grande variedade de vegetais, e até
especiarias, e oficinas de artesãos abertas. Após poucos minutos
andando na grande feira avistei uma taverna bem grande de portas
abertas onde um grupo de senhores conversavam perto da porta.
Sorri por um segundo, abri minha boca, mas hesitei por um instante
para pensar em como melhor me expressar.
- Boa tarde, senhor. -Disse eu na minha melhor educação - Sou um
bardo viajante e acabei de chegar em trava, gostaria de saber se
estaria interessado em meus serviços.
O homem me fitou atentamente, coçou a barba e olhou seu
estabelecimento.
- Veja bem. -disse em tom sério e calmo- o último bardo que
trabalhou aqui me causou muitos problemas, roubava e bebia de
meus armazéns, cortejava as garçonetes enquanto estavam
ocupadas, e dormiu com a esposa de meu melhor freguês, no que
terminou naquela mancha de sangue perto da entrada.
- Pois bem! - disse ele ao colocar sua mão esquerda sobre o balcão. -
Vou te dar 3 dias como provação, eu quero esta taverna animada,
principalmente quando ela estiver mais cheia após os expedientes
dos trabalhadores acabarem. - Me disse enquanto gesticulava com
sua mão livre, em seguida apontou para cima.- Você vai ter um
quarto no final do primeiro corredor no segundo andar…-ele parou
por 1 segundo e deu uma leve risada.- Ainda não nos apresentamos
adequadamente, não? Diogo Alvim! A seu dispor! - Disse-me
alegre e com as bochechas vermelhas e estendendo a mão.
O sr. Diogo bateu palmas 2 vezes e chamou uma das moças servindo as
mesas.
- Joanne! - Gritou-lhe - Leve o novo bardo para o quarto dele! O do
final do corredor!
Era uma moça alta, com roupas simples e podia ver um pouco de seu
cabelo loiro por baixo do pano que usava em sua cabeça, nariz fino e
pequeno e olhos castanhos que ela rolou para cima ao ser chamada pelo
sr. Diogo para me ajudar.
Dei uma risadinha por dentro e a segui até o segundo andar. Subimos as
escadas até um corredor, ao andar pelo corredor cheguei na sacada
aberta que dava para o primeiro andar formando um quadrado, podia
ver a taverna de cima e logo percebi que começavam a chegar mais
fregueses!
“Que mulher apressada” pensei para mim mesmo. Dei uma leve risada e
pus me a organizar meus pertences. Ajeitei minhas roupas no armário e
lavei minhas mãos e rosto no lavabo. Peguei meu alaúde e um de meus
livros de canções e desci com pressa ao andar de baixo.
A taverna estava quase cheia, o sr. Diogo fez sinal para que eu
começasse. Toquei varias musicas e cantigas animadas e o clima
rapidamente ficou alegre e descontraído. O grande movimento deve ter
durado umas 3 horas, até que os fregueses começaram a ir embora,
alguns cambaleantes devido a bebedeira, outros ainda dançando e
cantarolando. Ajudei as moças a arrumar e limpar a taverna e sr. Diogo
parecia bem satisfeito. Me senti muito bem como não me sentia a muito
tempo.