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Autores Associados Ltda. Copyright js de Catalogasae acionas de Caalonasee ervat re lsta eign Tes na Publicagao (CIP) Dados Interna Swindell Sa pe rit, quai ame fedagol pina SP Autres Associ contemporaine’): rico-crit sogia histo Bibliogratia ISBN 978-85-7496-429-4 1. Edueagio - Aspectos politicos 2, Fi Brasil 4 Educayao 1.0 2019 by Baio ora Autores Assocados La novas aproximagoes | Dermeval \dos, 2019. ~ (Colegae educagao | | iducagao - Aspectos sociais 3. Educagao - sJocofia 5. Pedagogia histOrico-critica I. Titulo I. Serie CDD-370.115_| yy.ng0g7 Indice para catélogo sistemstico: 1. Pedagogia historico-critica : Educagdo Cute Masta Dias - Bistrorecania ~ CRB-8/9427 Impresso no Brasil agosto de 2019 EDITORA AUTORES ASSOCIADOS LTDA. Uma editora educativa a servigo da cultura brasileira ‘Av Albino J.B. de Oliveira, 901 Bardo Geraldo | CEP 13084-008 Campinas - SP ‘Telefone: +55 (19) 3789-9000 E-mail: editora@autoresassociados.com.br Catilogo on-line: www.autoresassociados.com br Conselho Editorial “Prof. Casemiro dos Reis Filho” Bernardete A. Gatti Carlos Roberto Jamil Cury Dermeval Saviani Gilberta S. de M. Jannuzzi Maria Aparecida Motta Walter E. Garcia Diretor Executive Flavio Baldy dos Reis Coordenadora Editorial Erica Bombardi 370.115 Revisto Larissa Quachio Costa Diagramagao e Arte-final Erica Bombardi Capa Imagem baseada em Rudimenta grammaticae (1492). de Perotti (detalhe) Capa com colaboragao de Maria Aparecida D. Motta Fotografia de Dermeval Saviani Por Joao Zinclar abr” dace 0c 15 SS PRESSUPOSTOS GRAMSCIANOS DA PEDAGOGIA HISTORICO-CRITICA! E° € uma atividade inserida no ambito da disciplina “Gramsci e a educa- G40” em decorréncia de convite do professor René José Trentin Silveira, res- ponsivel pela referida disciplina no Programa de Pés-Graduacao em Educagao da Unicamp. O tema sobre o qual ele me pediu para falar hoje foi enunciado por ele mesmo na forma dos pressupostos gramscianos da pedagogia historico- -critica. Cabe-me, pois, tratar desse tema dirigindo-me aos alunos da disciplina ea todos os demais que, pela abertura da atividade, se interessaram em vir aqui nesta Sala de Videoconferéncias, no Salao Nobre da Faculdade de Educagao da UNICAMpP, ou se conectando na Sala de Videoconferéncias em Fortaleza, no Ceara, e em eventuais outros lugares a partir das respectivas inscrigdes pela internet. A todos agrade¢o a atengao e a deferéncia em prestigiar e enriquecer esse nosso encontro. Quando aceitei o convite eu imaginava tratar-se apenas de uma aula em que eu compareceria para uma conversa com 0s alunos, tro- cando ideias e Ihes passando algumas informagées sobre grau de influéncia que o pensamento ea obra de Gramsci teriam exercido sobre a construgao da pedagogia histérico-critica, Em seguida, porém, René me informou que, eu aceitando o convite, ele poderia abrir para outros interessados além dos alunos. da disciplina. Claro que concordei, mas ainda pensando que essa abertura na pratica ficaria de certo modo circunscrita aos demais alunos e, eventualmente, a alguns de nossos colegas professores da propria faculdade de educagio da Unicamp. Nesse ambito, me parecia tratar-se de algo que nao exigiria maior preparagao, razdo pela qual, mesmo estando exes compromissos, dispondo apenas do tempo da manha desta terga-feira, 30 de maio, nao me custava atender ao pedido do René. De fato, porém, a atividade vamente sobrecarregado de 1 Aula-conferéncia proferida em 30 de maio de 2017 na forma de videoconferéncia aberta, no iambito da disciplina FE 194 ~ Seminario Avangado I ~ Gramsci ea educagao, ministrada pelo professor Reng José ‘Trentin Silveira no Programa de Pos-Graduagao em Educagao da UNICA -—.. 246 — PEDAGOGIA HIsTORICO-CRITICA, QUADRAGESIMO ANO assumiu um novo cardter, ampliando em muito a minha Tesponsabilidade na exposigdo que agora devo fazer. Por isso quero, de antemao, pedir desculpas a todos pelo fato de nao ter tido tempo suficiente para preparar mais Profunda € sistematicamente o que vou apresentar. Entrando sem mais delongas no tratamento do tema proposto Penso que a presenca de Gramsci na construgao da pedagogia histérico-critica Pode ser considerada de diferentes maneiras. A primeira delas seria marcada pela afinidade de propésitos entre o empreendimento filoséfico-tedrico e politica. -pré co gramsciano e aquele que procurei desenvolver. A segunda maneira seria de carter metodoldgico, ou seja, pela adogao na construgao da pedagogia histérico-critica da mesma posigio assumida por Gramsci diante da concep. 40 tedrico-filoséfica elaborada por Marx. E a terceira estaria configurada pelas anilises e categorias elaboradas por Gramsci que se incorporaram & formulagao da teoria pedagogica hist6rico-critica. Abordemos, entao, cada um desses pontos. 1. AFINIDADE DE PROPOSITOS ENTRE A PERSPECTIVA GRAMSCIANA EA PERSPECTIVA PEDAGOGICA HISTORICO-CRITICA Minha relagéo com Gramsci reveste-se de certa peculiaridade. Fiz 0 curso de filosofia e, nos terceiro e quarto anos, produzi trabalhos com alguma densidade tedrica para a avaliagao das disciplinas que cursava. No quarto ano, em 1966, em razao de um convite do professor Joel Martins para me preparar para assumir a cadeira de filosofia da educagao, elaborei um programa para a disciplina que ele considerou consistente e inovador. Ainda como aluno do quarto ano de filosofia desenvolvi esse programa no segundo semestre em duas aulas semanais para o terceiro ano de pedagogia. Uma vez concluido o curso de filosofia fui contratado, em marco de 1967, como professor assistente da area de filosofia da educagao no curso de pedagogia da PUC-SP, 0 que me levou. ja que nao estava ainda institucionalizada a pés-graduacao, a me inscrever, eM fevereiro de 1968, para fazer o doutorado que conclui ao defender a tese &™ 18 de novembro de 1971. Em todo esse processo de formagao nao tive contato com Gramsci. Filosoficamente transitei rapidamente do tomismo para a fen0- menologia existencial e desta para 0 marxismo. B, diante dos problemas que enfrentava, fui desenvolvendo conceitos que, surpreendentemente, quando tive contato mais sistematico com a obra de Gramsci, 0 que ocorreu por 0c desafio que me foi proposto pela primeira turma de doutorado da PUC-SP @ iao do peRMeval savian! 247 me solicitar a oferta, no primeiro seme pensamento ¢ a ob: re de 1978, de uma disciplina sobre 0 cebi gr vinha formulando e as ideias ja mais amadurecidas ¢ elaboradas por Gramsci Esse foi 0 caso, por exemplo, do conceito de “ideologia” que formule: em correlagao com os conceitos de “filosofia” ¢ “filosofia de vida” no calor a de Gramsci, p nde convergencia entre o que eu dos acontecimentos quando pude detectar, em 1968, por ocasido da tomada da PUC pelos alunos, 0 conflito entre uma filosofia de vida pequeno bur- guesa ¢ a adocao de uma ideologia de esquerda, na época identificada com 0 nacionalismo desenvolvimentista. Isso me permitiu escrever que nossa agao segue sempre certa orientago; a todo momento estamos fazendo escolhas, mas isso nao significa que estamos sempre refletindo; a ago nao pressupoe necessariamente a reflexao; podemos agir sem refletir (embora nao nos seja imos, fazemos escolhas es- possivel agir sem pensar). Nesse caso, nés dei pontaneamente, seguindo os padrdes, a orientagao que 0 proprio meio nos impose. E assim que nds escolhemos nossos clubes preferidos, nossas amizades; Eassim que os pais escolhem o tipo de escola para os seus filhos, colocando-os em colégio de padres (ou freiras) ou em colégio do Estado; é assim também que certos professores elaboram o programa de suas cadeiras (vendo o que 0s outros costumam transmitir, transcrevendo os itens do indice de certos e é assim, ainda, que se fundam certas escolas ou que livros didaticos ete. 0 governo toma certas medidas. Nessas situagoes nés nao temos consciéncia ‘udo ocorre clara, explicita, do porque fazemos assim e nao de outro modo. normalmente, naturalmente, espontaneamente, sem problemas. Proponho que se chame esse tipo de orientagao “filosofia de vida’. Todos e cada um de nés temos a nossa “filosofia de vida”, Esta constitui-se a partir da familia, do ambiente em que somos criados. No entanto, quando surge o problema, ou seja, quando nao sei que rumo tomar e preciso saber, quando ni a exigéncia do filosofar, ai eu comego a refletir. E cu preciso saber e nao sei, isto significa que eu nao tenho a resposta; busco, 10 Sei olher e preciso saber, ai surge a rellexdo & aberta; pois se uma resposta e, em principio, ela pode ser encontrada em qualquer ponto (dai nto). A medida, porém, que a reflexao anecessidade de uma reflexao de conj prossegue, as coisas comegam a ficar mais claras ea resposta vai delineando-se, Estrutura-se entao uma orientagdo, principios sao estabelecidos, objetivos definidos e a ago toma rumos novos tornando- tada, mais coerente. Note-se que também aqui se trata de principios e normas que orientam a nossa agao; mas aqui nds temos consciéneia lar sto e compreensivel, fundamen- explicita, losofia do porque fazemos assim e nao de outro modo. Contrapondo-s 248 pepacosia HistORIco-cRiTICA, QUADRAGESIMO ANO de vida’, proponho que se chame esse segundo tipo ee eats Observe-se, ainda, que a op¢a0 ideologica pode taml °P " re sofia de vida” (pense-se no burgués que se decida por oe ideol ogia re . lucionaria): nesse caso, 0 conflito pode acarretar certas incoeréncias na ce : eterminadas pela superposigao ora de uma, ora de outra. Aqui se faz mais necessdria ainda a vigilancia da reflexao. oe A partir dessas consideragées propus uma esquematiza¢ao da dialética “Acao-problema-reflexao-acao” nos seguintes termos: / Podemos, pois, para facilitar a compreensao, formular o seguinte dia- grama: 1. Acao (fundada na filosofia de vida) suscita; 2. Problema (exige reflexao: a filosofia) que leva a; 3. Ideologia (consequéncia da reflexao) que acarreta; 4. Agao (fundada na ideologia). Nao se trata, porém, de uma sequéncia ldgica ou cronolégica; é uma sequéncia dialética. Portanto, nao se age primeiro, depois se reflete, depois se organiza a a¢ao e por fim age-se novamente. Trata-se de um processo em que esses momentos se interpenetram, desenrolando o fio da existéncia humana na sua totalidade. Como nao existe reflexdo total, a acao trara sempre novos problemas que estardo sempre exigindo a reflexio; Por isso a filosofia é sempre necessaria e a ideologia sera sempre parcial, fragmentaria e superavel. Assim, poderiamos continuar o diagrama anterior da seguinte forma: 4. Acao (fundada na ideologia) suscita; 5. Novos problemas (exigem reflexao: a filosofia) que levam i; 6. Reformulacio da ideologia (organizacao da agao) que acarreta; 7. Reformulacao da ago (fundada na ideologia reformulada). Eu ja havia antecipado esse conceito de ideologia no texto que teve exa- tamente o titulo “Esboco de formulacao de uma ideologia educacional para o Brasil’ escrito cle um folego s6 20 final de 1969 para concluir os trabalhos da disciplina Filosofia da Educagao, ministrada durante 0 ano todo para o ter- ceiro ano do curso de pedagogia da PUC-SP, movido pela urgéncia de evitar DERMEVAL saviAN! 249 para ser reproduzido no mimeg, : grafo e previamente e discutido n, distribuido aos alunos para ser lido a semana s "guinte, Nele me propus a mostrar que a reflexa Ofics mows q exao filosofica se encaminha para uma formulacao ideologica Cologia parece-nos ser o complemento n ist atural da filosofia. Esta, embor distinta daquela, rel ia. Esta, embora ‘Aciona-se dialeticamente com el. ja. Com efeito, se na filosofia NOs refletimos sobre 1 ©s problemas da ago examinando implicagdes, isso 86 ¢ feito obje organizagao da aco é precisa amplamente as suas tivando a organizacao coerente dado; ora, essa mente a ideologia [SaviaNt, 2011, p. 53] Eacrescentei, langando mao de uma metafora: “A filosofia é a garantia de que 0 horizonte nunca se fecha; a ideologia, enquanto fechamento provisorio do horizonte, é a garantia de que nao ficamos no mesmo lugar”. Ao publicar essa reflexdio como capitulo um do livro Educagao: do senso comum a consciéncia filosofica, fiz constar, sobre 0 conceito de “filosofia de vida’, a seguinte nota de rodapé: “Esta nogao de ‘filosofia de vida’ corresponde, na terminologia gramsciana, ao conceito de ‘senso comum. Cf. Gramsci (1975), es- pecialmente o Caderno 10 (na tradugao brasileira pode-se ver Gramsci (1978), Concepgao dialética da historia, em especial a Parte 1)” (Saviant, 2013a, p. 25) Sobre 0 conceito de “ideologia’, fiz constar em outra nota de rodapé: “a nogao adotada neste texto, ainda que sem pretensio de se algar ao plano de uma teoria da ideologia, obtém forte apoio em Gramsci (ver principalmente Concepgaio dialética da historia, p. 61-63 € 114-119)” (SavIANI, 2013a, p. 26). Acrescento, ainda, também em Concep¢do dialética da historia (p. 264-273) em que, fazendo a critica de Croce, Gramsci trata do “nexo entre filosofia, religido, ideologia no sentido croceano” e da “doutrina das ideologias politicas’ Cabe observar que, ao tratar do conceito de ideologia, Gramsci se apoia, em grande medida, no texto do prefacio de Marx a Contribuigao para acritica da economia politica, especificamente na passagem referente 3 “imensa supe- restrutura” por ele descrita como “as formas juridics s as, em resumo, as formas ideolégicas pelas , politicas, religiosas s 0s ho- i qua artisticas ou filosofic ; eh 1 sos ho mens tomam consciéncia deste conflito, levando-o As Ultimas consequencias (Marx, 1973, p. 29). E também nesse prefacio que tenho me apoiado para a ARX, , p. 29). E a cei leologia. acao do conceito de id . / ar foi justamente a partir dai que tive um didlogo com Marilena ids, s Chaui, em 21 de fevereir de seu livro Cultura e democ! em que formulei minha critics s em que ela, sob 0 titulo “o conceit co de 1981, quando participei do evento de langamento racia: o discurso competente e outras falas, ocasiao 4 & sua abordagem no livro O que ¢ ideologia, 19 marxista de ideologia’, baseando-se na 10 ANO 250. peoacocia wistorico-cRITIcA, QUADRAGESIM obra A idcologia alema, identifica o conceito mmaraista de ideolagia com se reduvindo so significado de falsa conseignela. Argume ne eno, com omen cionado texto do preticio considerando que, se € no terre as ideologias que os homens tomam consciéncia do conflite entre forgas Proditivas¢telasies Sociais de produgio eo levam as tiltimas: eee an ideologia, no sentido marxista, nao é apenas falsa consciéncia, mas é também tomada de consciéncia. Mostrei, entao, como es : significado aparece em Gramsci assim como em Lénin, o qual assume explicitamente a nogao de “ideologia do pro. letariado” Obviamente, nao se trata, ai, da falsa consciéncia do proletariado, Quando terminamos o debate pedi seu autégrafo em meu exemplar do livro Cultura e democracia e ela entao escreveu: “Para Dermeval, amigo, esse Cul tura ¢ Democracia, um salto no vazio de minhas ilusdes. Marilena, 21/2/81” Quando, em 1980, reuni em livro um conjunto de 19 textos que havia produzido ao longo da década de 1970, dei 0 titulo de Educagéo: do senso comum & consciéncia filoséfica (SAVIANI, 2013a). Justifiquei esse titulo com um texto introdutério fartamente apoiado em Gramsci, ainda que apenas 0 ultimo deles tinha algum apoio direto em Gramsci. No preficio & segunda edi¢ao esclareci que 0 objetivo do texto introdutério era somente justificar 0 titulo dado ao conjunto dos ensaios, observando: Se foram feitas diversas citagdes de Gramsci, isto ocorreu simplesmente porque a tematica concernente a relacdo entre senso comum e filosofia & constante ¢ central no pensamento gramsciano. E, ainda que eu tenha me preocupado com essa problematica independentemente da influéncia do vigoroso pensador italiano, nao senti necessidade de o proclamar preferindo, ao contrario, realgar a relevancia do tema pondo em evidéncia que tais Preocupagées ja fortemente presentes num autor hoje considerado classico [Saviant, 2013a, p. XVII-XIX]. stavam Portanto, © contato com Gramsci consis ul, para mim, num grande achado, pois me permitiu fundamentar com maior consistal concepgao de mundo, de sociedade e de educagio que vinha elaborandlo. Da forma, Gramsci acabou tendo Presenga gar, De fato, quando desenvolvia pes livre-docéncia, defendida em 1986, sob: legislagao do ensino, Ncia e seguranga a ‘antida em minha produgao tedrica. quisa que resultou em minha tes re © papel 0 referencial tedrico adot: Gramsci tal como o ilustra resumidamente de I do Congresso Nacional na ado est todo ele apoiado em © Seguinte paragrat Em sintese, 0 referencial teérico que orienta Ac ordenar: tiltuem o presente trabalho: compoe do seguinte fe asanalises que cons- “Pstado’ ‘ixe de categoria DERMEVAL SaviAN| = 251. em sentido amp! en to ampliado, abarcando, portanto,asociedade politica” ea “sociedade civil” organicamente wt ganicamente articulados entre si. “Partido”, também em sentido amplia o, distinguindo-se. do, distinguindo-se, assim, em set interior, os “partidos politicos” eos “partidos ideologicos Liberalismo’, “conciliagio", “ ‘autoritarismo desmobilizador” ‘autoritarismo triunfante” que traduzem as estratégias basicas que vigoraram no petiodo analisado, “Democracia restrita” c “democracia excludente’, que designam os regimes politicos correspondentes as estratégias referidas. £, ob: viamente, “Parlamento’, orgao da sociedade politica mais diretamente ligado A sociedade civil [SavtANt, 1996, p. 8] Também em Histéria das ideias pedagdgicas no Brasil (SaviAN!, 2013, p. 10-11), langado em 2007, em contraposigao a categoria braudeliana de “lon- ga duracao’, incorporo a distingao gramsciana entre movimentos organicos € conjunturais para a anali: estrutural de periodos histéricos. Na conclusao do livro A pedagogia no Brasil: histéria e teoria me reporto a necessidade posta por Gramsci (1975, p. 1544-1546) de superagao da “fase romantica” em direcao 2 “fase classica” para propor uma nova perspectiva para 0 curso de pedagogia no Brasil, inspirando-me, ainda, na problematizagio efetuada por ele sobre a centralidade da cultura greco-romana na velha escola e sobre a necessidade de se substituir 0 grego e o latim como fulcro da escola formativa. Gramsci, porém, observava que “nao sera facil dispor a nova matéria ou a nova serie de matérias numa ordem didatica que dé resultados equivalentes” aqueles que eram obtidos com 0 grego € 0 latim na escola classica. Minha conclusio foi que a matéria que pode vir a desempenhar papel equivalente numa escola adequada aos tempos atuais seria exatamente a Historia. Esta ¢a materia que deve ocupar o lugar central no novo principio educative da escola do nosso tempo: “uma escola unitéria porque guiada pelo mesmo principio, oda radical historicidade do homem e organizada em torno do mesmo conteudo, a pro- pria historia dos homens, identificado como o caminho comum para formar SAVIANL, 2012, p. 129). individuos plenamente desenvolvidos” (S Enfim, tenho trabalhado com varias categorias gramscianas entre as guais nomeio, a seguir, aquelas que tomet como referéneia para expor aquilo que poderiamos considerar como uma teoria gramsctana dla educagao e da escola: homem; relagoes de forga bloco historico; hegemonia; Estado amt: pliado; intelectual; partido ampliados revolugao; retorma intelectual e moral no interior da escola, diseiplina e caturse. Passemos, entio, educagao; escola a coneidevar a seguncha maneita «le manifestagdo dt presenga dle Gramsci na construgao da pedagogia histor ico-critica. 252 PEDAGOGIA HISTORICO-CRITICA, QUADRAGESIMO ANO 2. LIGAO DE METODO, MARCA DISTINTIVA DO POSICIONAMENTO DE GRAMSCI DIANTE DE MARX E DO MARXISMO m considerar 0 marxismo, Nesse ponto destaco 0 empenho de Gramsci por ele também chamado de “filosofia da praxis’, como uma filosofia integral. Assume, pois, uma posigao ortodoxa entendendo, pelo conceito de ortodoxia, que © marxismo se basta a si mesmo, contém em si todos 0s elementos fun damentais, nao s6 para construir uma total concep¢ao do mundo, uma total filosofia, mas para vivificar uma total organizagao pratica da sociedade, isto é, para se tornar uma integral, total civilizagao [GRamsct, 1975, vol. I, p. 435}. A leitura que Gramsci faz de Marx é, portanto, uma leitura ortodoxa, ou seja, fiel ao espirito da concepcao original; mas ele deixa claro que nao se trata de uma ortodoxia do tipo religioso que enrijece a doutrina tornando-a impermeavel as transformagoes historicas. O que esta em causa é a ortodoxia do método praticado por Marx. Anilise concreta de situagdes concretas, eis 0 que Marx exercitou na pesquisa sobre o processo de nascimento, desenvolvimento, transformacoes e possivel superagao do capitalismo. Gramsci, fiel a essa diretriz metodolégica aplicou o método marxista examinando a nova situa¢ao que se pds ao longo do século XX para a revolugao proletaria no Ocidente, o que 0 levou a elaborar a “teoria do Estado ampliado’, também chamada de “teoria do Estado integral”. E qual é 0 método de Marx? Como se configura, em sua obra, a andli- se concreta de situag6es concretas? Entendo que “situagdes concretas’, para Marx, é um todo articulado tal como esta expresso no “método da economia politica”: “o concreto é concreto por ser a sintese de multiplas determinagoes, logo, unidade da diversidade” (Marx, 1973, p. 229). E “analise concreta” é 0 procedimento que possibilita apreender a situagao (0 concreto real) ¢ repro- “O método duzi-lo no plano do pensamento. Nas palavras do proprio Mar que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto é para o pensamento preci- samente a maneira de se apropriar do concreto, de o reproduzir como concreto pensado” (Marx, 1973, p. 229). Foi pondo em movimento esse método que Gramsci construiu um conjunto articulado de categorias para apreender, no plano do pensamento, 0 movimento organico do “bloco hist6rico capitalista-burgués” na forma como foi se constituindo a partir do inicio do século XX. Cabe-nos, pois, adotar em relacao a Gramsci a mesma atitude que ele tomou em relagdo a Marx. Lendo DERMEVAL saVIAN! = 253 Gramsci com esse espirito ed. ramsci com esse espirito e dando continuidade A aplicagao do métod Xista constataremos que aguela forma do capa ; ee implicou a mudanga de estrategi, , no final do século XX, cabendo concreta que estamos vi alismo detectada por ele, que a da revolugao Proletaria, atinge seu apogeu “Nos realizar a andlise concreta da situagao a esse inici é a : vendo nesse inicio do século XX1, a fim de identificar e por em movimento a estratégia adequ: ada 4 luta revolucionaria dos tre a- thadores nessas novas condiga * Se Para deixar mais claro e . ara deixar mais claro esse posicionamento de Gramsci, convém fazer a ‘rams, dns aoe Hak A problematica originaria éames- > S fentativa de levante operario na Itdlia, se perguntou: porque a revolugao proletaria teve éxito na Russia e fracassou na Italia? A mesma questao € posta pela “Escola de Frankfurt” diante do fracasso do movimento operdrio na Alemanha. Em suma, em ambos os casos, 0 pro- blema que se punha era o das condi¢ées de realizagao da revolugao socialista no ocidente. E ouso considerar que esta é a grande questao, o problema fun- damental do século XX. Assim, 0 século XX, que se anunciou como a grande esperanga da revolucao socialista mundial orientada pela teoria marxista, logo em seguida, no inicio da década de 20, teve abortada essa esperanga. Esclare- ¢amos brevemente esse ponto. Segundo a teoria marxista a revolucdo socialista s6 poderia ocorrer em sa, a entendia como termos mundiais e Lénin, quando liderou a Revolugao Rus um primeiro elo da revolugao proletaria universal. Por isso, sua expectativa era que, uma vez vitoriosa a revolu¢ao na Russia, sucessivamente os principais paises do mundo capitalista seguiriam 0 mesmo caminho. A Unido Soviética se instalou, pois, com os olhos voltados para o ocidente, em especial para a ficientemente amadurecidas Alemanha, cujas condigées eram vistas como je para se deflagrar a revolugao proletaria. A frustra minou uma inteira mudanga de rumo nao apenas na estratégia do socialismo mundial, mas na propria revolugao soviética. A tese do socialismo num s6 pais, car a continuidade da experiéncia que se iniciava > dessa expectativa deter- entao levantada para justi que na Uniao Soviética, ja nao correspondia a teoria marxista. Efetivamente, 0 desenvolvimento da Russia soviética seguiu um caminho que, embora justi- se detinia como ficado em termos socialistas e tendo a frente um partido que 0 partido do proletariado, nao se configurava, propriamente, como de carater nda, comunista, Dai que os analistas divergiram quanto socialista e, menos giram quanto ao seu enquadramento tedrico dividindo-se, basicamente, em dois grupos: uns. ‘ cada que buscava criar as vam como um regime de economia plan oconside: i " volugdo socialista; outros 0 tomavam, condigdes materiais para uma futura re a é ‘ANO 254 PEDAGOGIA HisTORICO-cRiTICA, QUADRAGESIMO Jo. Fo século XX se encerra pondo haviam definido no seu inicio quando simplesmente, como capitalismo de Es a nu essa situagdo cujos contornos ja se slia, em 1922, € na Alemanha nao lograram éxito os levantes operarios Na Italia, » e| é Sy em 1923. O entendimento desse problema ¢ Po se compreender toda a dinamica do século XX. condigao indispensavel para agio de Gramsci e da “Escola Portanto, o problema que mobiliza a teor! " FF smo: o fracasso das tentativas de revolucao no ocidente. da qual partem também éa mesma: 0 marxismo. de Frankfurt” é 0 me: A perspectiva de analise : : No entanto, 0 modo como se posicionam diante dessa perspectiva tedrica é distinto. Enquanto Gramsci se posiciona, como ele mesmo di ia, em termos ortodoxos, eu diria que os membros da “Escola de Frankfurt” adotam uma postura heterodoxa. Gramsci toma o marxismo em termos ortodoxos, isto é, ele entende que a “filosofia da praxis” é uma filosofia integral, uma teoria completa que dispoe de todos os elementos necessirios para dar conta dos problemas enfrentados, Nao necesita, pois, de muletas, quer dizer, nao precisa ser complementada por outras teorias, Inversamente, os tedricos da “Escola de Frankfurt” conside- raram o marxismo como a referéncia basica, mas nao suficiente, entendendo que ele deveria ser complementado por outras teorias, fundamentalmente pela sociologia empirica e pela psicandlise. Observo, ainda, que esses tedricos - ao menos € essa a sensagao que me passam - encararam 0 marxismo de um ponto de vista que eu chamaria de intelectualista, quer dizer, uma teoria que, mercé de sua alta elabora¢ao, buscaria explicar, por assim dizer, de fora, os problemas postos pela pratica social, politica, historica. Por isso, para eles, o marxismo se converteu em um componente da “teoria critica da sociedade”. Tratava-se de intelectuais que, dominando um aparato conceitual sofisticado em fungio de suas condigées de vida privilegiadas, se empenhavam em compreender criticamente a sociedade. Gramsci, ao contrario, vivia intensamente a pratica humano-historica e, a partir de seu interior, punha em funcionamento sua capacidade intelectual, aprimorada por uma vontade férrea que exercitava Continuamente 0 movimento entre o sentir, o compreender e condi¢ao para transformar os subal em homens livres. © saber como fernos em senhores do préprio destino, Reiterando: sim, Gramsci confessa. A leitura que leitura ortodoxa, isto é, fiel ao espirito di nao se trata de uma ortodoxia 4 moda r ele faz de Marx é uma @ leoria original, mas acrescenta que cligiosa que estiola a doutrina enrije- 1 a Las transformagées historic, uma ortodoxia do método. Assim como Marx ¢ cendo-a e tornando-a impermeave eer rata-se de Xercitou a exaustio o método DERMEVAL saviani = 255 da analise concreta de situ: i ages concretas debrugando-se na : vimento, transforma talismo, mantendo-se atento sobre 0 proceso de (GOes e possivel superagao do capi acontecimentos importantes de sua ‘amsci, dar continuidade a esse procedimento a diretriz me situagao historica vem colocando. cimento, desenvol a todos os época, cabe, conforme entende Gr enfrentando cor e m a mesm: todolégica as novas questoes que a nova a esse espirito, Gramsci aplicou o método marxista da andlise con- creta d e situagoes concretas ao problema das condigdes da revolucao proletaria no ocidente. Essa anilise o levou a elaborar a “teoria do E ado ampliado’, for- mulando um conjunto significativo de categorias originais e de extrema efica- cia para a compreensao dos problemas analisados. Tais categorias revelam-se eficazes exatamente porque foram construidas a partir e em fungao da pratica historica em que os referidos problemas se manifestaram. Contrastando com a situacao do “oriente” (caso da Ruissia), no “ocidente’, (onde se situa a Italia e também o Brasil) 0 Estado nao se identifica totalmente com a “sociedade politica” (aparelho governamental). Diferentemente, ele sintetiza, em seu conceito, a sociedade politica e a sociedade civil. Em consequéncia, também o conceito de partido se alarga abrangendo os partidos politico e ideolégico que se sintetizam no “partido revolucionario”. “Situag6es concretas’, isto é, um todo articulado tal como o entendera Marx no “método da economia politica”: “o concreto é concreto por ser a sintese de miltiplas determinagées, logo, unidade da diversidade” (MaRx, 1973, p. 229). “Andlise concreta”, ou seja, 0 procedimento que permite apreender a situacao (0 concreto real) e reproduzi-lo no plano do pensamento: “o metodo que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto € para o pensamento preci- samente a maneira de se apropriar do concreto, de o reproduzir como concreto pensado” (Marx, 1973, p. 229). Assim procedendo, Gramsci foi construindo um conjunto articulado (um sistema) de categorias que lhe permitiu apreender com clareza 0 movi- mento organico do “bloco hist6rico capitalista-burgués” na forma como ele e consolidava, cimentando suas caracteristicas basicas a partir do inicio do século XX, Assumindo essa mesma atitude de Gramsci diante de Marx, dei inicio a elaboragao da pedagogia historico-critica, pondo em movimento o método que nos legou 0 proprio Marx. ; rcurrso em busca de uma teoria da educagio Nesse processo fiz um p' a, especificamente ba ira constatagao a que cheguei foi que nas matri- cada no materialismo histérico. efetivamente dialéti Nessa caminhada a prime 256 PeDAcoaia tuisronico-critich, QUADRAGESIMO ANO zes do materialismo historico nao encontramos uma teoria sistematizada da educagiio, Nem Marx ¢ Engels, nem Lénin, Lukies ou Gramsci, assim como 08 Mais recentes como Mészaros, se dedicaram direta € especificamente 4 claboragao tedriea no campo da educagao. O que encontrei foram estudos que ar no conjunto da obra as passagens referida ou extrair das andlises marxianas ¢ marxistas sobre a hist6ria, a economia & buscaram ident a educagio a sociedade derivagdes de sentido para a educagao Busquei, entao, nos escritos de autores marxistas sobre educagao e nas experiéncias dos paises socialistas a sistematizagao tedrica ou, pelo menos, elementos que apontassem para a direcao de uma teoria historico-dialética da educagao. Foi assim que, além de ler os estudos marxistas sobre edu- cagdo, ministrei disciplinas cuja bibliografia incluia autores como Pistrak, Makarenko, Manacorda, Lucio Lombardo Radice, Dina B. Jovine, G. Betti, F. Lombardi, Snyders, Schmidt-Kowarzik, Suchodolski e textos analisando as experiéncias pedagégicas na Unido Soviética, China, Cuba, Republica Democratica da Alemanha. Conclui que, para a construgao de uma pedagogia inspirada no ma- terialismo historico, nao basta recolher as passagens das obras de Marx e Engels diretamente referidas a educacao, como o fizeram Dommanget (1972), Dangeville (1976) e Manacorda (1964; 1991). Também nao ¢ suficiente pers- crutar as implicagdes educacionais do conjunto da obra dos fundadores do materialismo histrico, como o fez Suchodolski (1966). Penso que a tarefa da construgio de uma pedagogia inspirada no mar xismo implica a apreensao da concepgio de fundo (de ordem ontologic epistemoldgica e metodol6gica) que caracteriza o materi Imbuido dessa concepgao, trata-se de a, alismo historico. Penetrar no interior dos processos pedagogicos, reconstruindo suas caracteristicas objetivas e formulando diretrizes pedagogicas que possibilitario a reorganizac: tivo sob os aspectos das finalidades e objetivos di. formadoras, dos age as 0 do trabalho educa- a educagao, das instituigoes ntes educativos, dos contetidos curricul, ares e dos proce- dimentos pedagogico-didaticos que mov Imentardo um novo ¢thos educativo voltado a construgao de uma nova socied: jade, uma nova cultura, um nove homem, enfim. "mM suma, quando tomei conhecimento da afirmas (1999, p. 201-417), em seu trabalho sobre a *Signitica da psicologia’, segundo a qual “a psicologia tem nee (p. 393), ocorreu-me que o caminho que situagao de considerar que também Capital. do de Vigotski do bh Orica da crise dade do seu Capital” Percorri me colocou nessa mesma 4 pedagogia tinha necessidade do seu DeRMevat savian’ 257 ___ Foiisso g que procurei fazer ao formular a proposta da pedagogia his- térico-critica. Para tanto, recorri a alguns textos fundantes de Marx (1978), especificamente a distingao entre producao material e nao material, tendo em vista a caracterizacao da natureza e especificidade da educagao. Igualmente recorri ao texto O método da economia politica (Manx, 1973, p. 228-240) a0 estruturar 0 método da pedagogia historico-critica, ocasido em que indiquei de onde eu retirava 0 critério de cientificidade do método pedagogico proposto: nao é do esquema indutivo tal como o formulara Bacon; nem é do modelo expe- rimentalista ao qual se filiava Dewey. E, sim, da concepgao dialética de ciéncia ca", concluindo que tal como a explicitou Marx no “método da economia pol “o movimento que vai da sincrese (‘a visao cadtica do todo’) a sintese (‘uma rica totalidade de determinagées e relagdes numerosas’) pela mediagao da anélise (as abstracdes e determinagdes mais simples’) constitui uma orientagao segura tanto para o proceso de descoberta de novos conhecimentos (0 método cien- tifico) como para o processo de transmissao-assimilagao de conhecimentos (0 método de ensino)” [Savrani, 2007a, p. 74] Eis 0 movimento pelo qual esta sendo construida a pedagogia dialética correlato da construgao da psicologia dialética tal como se propds Vigotski. Como ja observei no capitulo anterior, ao afirmar que a psicologia precisa também de seu Capital, Vigotski se referia 4 necessidade de uma teoria dia- Iética mediadora entre a ciéncia geral da dialética e a psicologia. Por isso ele observou que assim como a histéria precisou da mediacdo do materialismo historico para passar da filosofia materialista dialética a ciéncia dialética da histdria, também a psicologia precisa da mediacao de um materialismo psico- logico para passar do materialismo dialético & ciéncia dialética da psicologia (CE Vicorsk1, 2004, p. 392-393). E podemos acrescentar: assim igualmente a mediadora, um materialismo pedag6- pedagogia precisa de uma teoria geral tico a dialética da pedagogia entendida gico, para passar do materialismo dialé como a ciéncia dialética da educagao. Passemos, enfim, ao ultimo ponto de minha exposi¢ao tratando da pre- senca de Gramsci na pedagogia hist6rico-critica. 3, PRESENCA DE GRAMSCI NA CONSTRUGAO TEORICA DA PEDAGOGIA HISTORICO-CRITICA ‘Além de Marx, Gramsci que, dentre os tedricos marxistas, foi aquele que mais avancou na discussao da questao escolar, alimentou minhas andlises 258 PEDAGOGIA HISTORICO-CRITICA, QUADRAGESIMO ANO z categoria “catarse” para caracteri- pedagogicas. Inspirado nele lancei mao da categoria B sgogia histrico-critica, constitutivo do 2ar 6 quarto passo do método da ped quarto passo do método da p jucando ascende a 7 ando o edi Momento culminante do processo educativo, qua et ento da pratic expresso claborada da nova forma de entendimento Cap © entendendo-a como a “ela- ‘a social, Pareceu- -Me que a acepgao gramsciana do termo “catarse’, 2 a boragao superior da estrutura em superestrutura na consciencia dos homens’ (Gram 1978, p. 53) se revelava perfeitamente adequada para exprimir o momento da efetiva incorporagao dos instrumentos culturais, transformados, pela mediagao do trabalho pedagégico, em elementos ativos de transformagao social (SAvIANI, 2007a, p. 72) Também em Gramsci me inspirei para indicar 0 caminho para a con: trugio de um curriculo escolar adequado as condigées atuais proprias desse periodo de transigdo da forma social capitalista para uma sociedade socialista. Expressei esse encaminhamento na conclusao do livro A pedagogia no Brasil (Saviant, 2012, p. 128-130) nos seguintes termos: “buscando encaminhar essa questo, 0 eixo da organizacao da educagao escolar nas condigées da nossa época me foi suscitado pela problematizacao efetuada por Gramsci (1968, p. 134-136; 1975, p. 1544-1546) em sua reflexao sobre a questo escolar”. Reporto-me a passagem em que ele se referia a centralidade que tinhaa cultura greco-romana na velha escola, traduzida no cultivo das linguas latina e grega e das respectivas literaturas e historias politicas. Constituia-se, por esse caminho, 0 principio educativo da escola tradicional, “na medida em que 0 ideal humanista, que se personifica em Atenas e Roma, era difundido em toda a sociedade’, sendo “um elemento essencial da vida e da cultura nacionais”. O latim, como lingua morta, permitia o estudo de um processo histérico inteiro, analisado desde o seu nascimento até sua morte; mas Gramsci acrescenta: “morte aparente, poi: abe-se que 0 italiano, com o qual o latim é continua- mente comparado, é latim moderno”, studando a histéria dos livros escritos em latim, sua historia politica, as lutas dos homens que falavam latim, o jovem submergia na historia, adquirindo “uma intuigao historicista do mundo e da vida, que se torna uma segunda natureza, quase uma espontaneidade, j 4 que nao é pedantemente inculcada pela ‘vontade’ exteriormente educativa” E acres- centa: “Este estudo educava, (sem que tivesse a vontade expres amente de rada de fazé-lo) com a minima intervengao ‘educativa’ do profes sor: educava porque instruia’. Claro, ele assinala, isto nao se devia educativa intrinseca ao grego e€ ao latim., Esse r a tradigao cultural, viva nao apenas na escol Uma vi a uma suposta virtude sultado era produto de toda ‘ a, mas principalmente fora dela. “modificada a tradicional intuigio da cultura’ ", a escola entrou em DERMEVAL SAVIAN! = 259 cris “Serd neces: ecom ela entrou em crise o estudo do latin e do grego. Dai a conclusao jo sul ; te bstituir o latim eo grego como fulero da escola formativa; esta substiluigao ocorrera, mas nao sera facil dispor a nova matéria ou a nova série de matérias numa ordem didiitica que dé resultados equivalentes” Desde a primeira vez em que li essas passagens, nos idos da década de empre me perguntava sobre a ou as maté 1970, s nhar, numa nova as quie pudessem desempe- scola adequada aos tempos atuais, papel equivalente aquele desempenhado pelo latim e pelo grego na velha escola e, assim, uma ideia comegou a tomar forma em meu espirito. Essa ideia é a de que a Historia seria exatamente essa matéria que ocuparia o lugar central no novo principio educativo da escola do nosso tempo: uma escola unitaria porque guiada pelo mesmo principio ~ 0 da radical historicidade do homem ~ e organizada em torno do mesmo contetido ~ a propria historia dos homens, identificado como o caminho comum para formar individuos plenamente desenvolvidos. Com, efeito, que outra forma poderiamos encontrar de “produzir, em cada indivi- duo singular, a humanidade que ¢ produzida hist6rica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (Sav1AN1, 2005, p. 13), sendo fazendo-os mergulhar na propria historia e, aplicando 0 critério do “clissico’, permitindo-Ihes vivenciar 0s momentos mais significativos dessa verdadeira aventura temporal humana? Além desse eixo central, também me baseei na concepgio gramsciana ia para propor a organizagao do curriculo e do ensino em seu da escola unit conjunto abrangendo, pois, a educagao basica e educagio superior, tomando como referéncia o principio educativo do trabalho tal como enunciado por Gramsci. Para identificar os contetidos basicos que devem compor os curti culos de toda a educacao basica, desde a educagao infantil ate 0 ensino medio, tomo como referéncia o conceito do trabalho como principio educativo. De modo geral, podemos considerar que esse conceito compreende Jos: num primeiro sentido, o trabalho € principio educative na trés significad medida em que toricamente, o modo de ser da educag: Jo correspondem modos distintos de educar com uma jo, Bm um segundo sentide, 0 determina, pelo grau de desenvolvimento social atingido his Jo em seu conjunto. Assim entendido, aos modos de produ correspondente forma dominante de educag: 2 medida em que coloca exigene js especiti trabalho ¢ principio educativo 1 ‘o educativo deve preencher, em vista da participayao direta cas que 0 proces Je no trabalho socialmente produtive, Finalmente, dos membros da sociedad 6 trabalho € principio educa determina a educagao como modalidade especitica & dit na mediala ent que tivo, num terceiro sentido, enciada de trabalho: 6 trabalho pedagogico. 260 Pevacosia HISTORICO-CRITICA, QUADRAGESIMO ANO Para a definigao da base curricular relativa a educacao infantil devemo, tomar 0 aporte da Psicologia Historico-Cultural que indica como reteréncig Para a identificagao do contetido e forma do desenvolvimento do ensing g atividade-guia propria de cada periodo da vida dos individuos. Partindo da vida intrauterina com a transicdo pos-natal nds temos, no primeiro ano de vida, a atividade emocional direta com 0 adulto como atividade-guia. Nesse Momento, o contetido da educacdo envolve a compreensao das caracteristicas proprias da vida uterina e pés-natal, em que a estabilidade da formacio do bebé é diretamente dependente da comunicacao emocional direta com o adulto (mae-pai, cuidador....). Evidencia-se, assim, a natureza tipicamente social do bebé e a determinagao de seu desenvolvimento pelas condigdes educacionais em que 0 referido desenvolvimento ocorre. Na etapa seguinte, correspondente ao segundo e terceiro anos de vida, a atividade-guia é a atividade objetal manipulatoria. Nessa fase ja se trata de organizar intencionalmente os contetdos, meios e procedimentos, guiados: pela atividade objetal manipulatoria para assegurar um processo de ensino que viabilize a aprendizagem da crianga nos seus primeiros anos de vida, Passa-se, em seguida, a idade pré-escolar (4° e 5° anos) na qual a ati- vidade-guia é a brincadeira de papeis sociais. Aqui ja se trata de organizar 0 ensino de maneira a possibilitar 4 crianga a apropriagao do acervo cultural da humanidade superando-se as concepgdes naturalizantes do ato de brincar. Da-se, assim, a transigao da educagao infantil para o ensino fundamental Neste a atividade-guia ¢ a atividade de estudo. Tomando como referéncia as reflexdes de Gramsci sobre o trabalho como principio educativo da escola unitaria, esbocei, em trabalho anterior (SAVIANI, 2014, p. 66-74), a conformagao do sistema de ensino tendo em vista as condig6es da sociedade brasileira atual. Levando em conta que 0 entendi- mento gramsciano da escola unitaria corresponde a fase que hoje, no Brasil, € definida como a educagao basica, especificamente nos niveis fundamental e médio, retomo, agora, com eventuais ajustes, o referido esbogo. Considerando 0 primeiro sentido do trabalho como principio educativo, vemos que 0 modo como esta organizada a sociedade atual é referencia para a organizacao do ensino fundamental. O nivel de desenvolvimento atingido pela sociedade contemporanea coloca a exigéncia de um acervo minimo de conhecimentos sistematicos sem 0 que nao se pode ser cidadao, isto é, nao se pode participar ativamente da vida da sociedade. O acervo em referéncia incluia linguagem escrita ea matematica, ja incorporadas na vida da sociedade atual; as ciéncias da natureza, cujos elementos basicos relativos ao conheci- mento das leis que regem a natureza so necessarios para se compreender as DERMEvAL saviani 261. sformagées operadas pela ag tran Jo do home! . homens, as formas como eles se onganizam asinsituigoee que crigm wae fetes de convivéncia que estabelecem, com a consequente detinicao de direitos © deveres. O ultimo componente (ciéncias da sociedade) corresponde, na atual estrutura, aos contetidos de historia e geografia , Eis ai como se configura 0 curriculo da escola elementar, complemen- tado pela Educagao Artistica e Educagao Fisica. A primeira, em continuidade com as atividades ja desenvolvidas na educagao infantil, permite as criangas a objetivacao de sua expres nado apena: Jo criativa, mas sua iniciagao e fami- liarizagdo com as produgoes artisticas mais desenvolvidas da humanidade. ‘A segunda permitira as criangas progressivamente assumirem plenamente sua corporeidade adquirindo controle do proprio corpo tanto em relacao a0 desenvolvimento pleno dos movimentos corporais como, em sentido inyerso, desenvolvendo a capacidade de contengio do movimento fisico exigida pela disciplina necessiria a realizagao do trabalho intelectual. A base em que se assenta a estrutura do ensino fundamental € 0 prin- cipio educativo do trabalho. O estudo das ciéncias naturais, assinala Gramsci, visa introduzir as criangas na “societas rerum” e pelas ciéncias sociais elas sao introduzidas na “societas hominum”: O conceito ¢ 0 fato do trabalho (da atividade teérico-pratica) é 0 principio educativo imanente 4 escola elementar, j4 que a ordem social e estatal (dire e deveres) é introduzida e identificada na ordem natural pelo trabalho. O con- ceito do equilibrio entre ordem social e ordem natural sobre o fundamento do trabalho, da atividade tedrico-pratica do homem, cria os primeiros elementos de aria, e fornece o ponto de uma intuicdo do mundo liberta de toda magia ou bru partida para 0 posterior desenvolvimento de uma concepyao historico-

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