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10.26843/rencima.v11i6.

2683 eISSN 2179-426X


Recebido em 30/08/2020 | Aceito em 22/09/2020 | Publicado em 01/10/2020

Grupos sanguíneos a partir da aprendizagem baseada em problemas:


elaboração e avaliação de uma proposta didática investigativa

The problem-based learning of blood types: development and evaluation of a


didactic investigational proposal

Paula Fernandes Tavares Cezar-de-Mello


Colégio Pedro II
paulamello@cp2.g12.br
http://orcid.org/0000-0002-9293-9773

Pamela Rosa-Gonçalves
Colégio Pedro II
pamelarosa@cp2.g12.br
http://orcid.org/0000-0002-2425-5310

Resumo

Os benefícios alcançados por meio de metodologias de ensino-aprendizagem centradas no


educando parecem ser consenso entre os estudiosos da Educação Básica. Assim, observa-
se uma crescente preocupação no desenvolvimento de estratégias pedagógicas que
viabilizem a implementação de metodologias ativas. Em consonância com essa tendência,
desenvolvemos uma atividade de Aprendizagem Baseada em Problemas do tipo Estudo de
Caso, no âmbito da Genética, com a finalidade de proporcionar o aprendizado de conteúdos
conceituais e atitudinais relacionados ao tema Grupos Sanguíneos. A atividade contou com
quatro casos diferentes que tiveram início durante uma aula prática simulada de tipagem
sanguínea – sistemas ABO e Rh. A adequação da atividade foi avaliada de modo quali-
quantitativo e indicou que os estudantes conseguiram aplicar conhecimentos prévios e
desenvolver novos saberes pautados em discussões acerca dos temas geradores, à
medida que se envolviam na resolução dos casos. Além disso, a sequência didática
adotada permitiu introduzir o conteúdo de Epistasia a partir de um dos casos. Grupos
Sanguíneos foi um tema estrategicamente escolhido por estar intimamente relacionado ao
cotidiano dos estudantes, com potencial para fomentar discussões contextualizadas com
tecnologias, sociedade e ética.

Palavras-chave: aprendizagem baseada em problemas; grupos sanguíneos, ensino de


genética; metodologias ativas.

Abstract

The benefits of student-based teaching-learning methods seem consensual among Basic


Education scholars. Therefore, there is growing concern regarding the development of

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pedagogical strategies that allow the implementation of active methods. Hence, we have
developed a case-study type Problem-Based Learning activity in the field of Genetics to
facilitate the learning of concepts and attitudinal aspects related to Blood Types. The activity
included four different cases introduced during a blood-typing simulation – ABO and Rh
systems. The suitability of activity was evaluated in a quali-quantitative manner, and we
found that students were able to put previously-acquired knowledge to use and develop new
knowledge after the discussions on the original subject as they moved forward on solving
the cases. Moreover, the didactic sequence adopted allowed the introduction of the notion
of Epistasis, based on one of the cases. The subject of Blood Types was strategically picked
because it is part of the daily lives of students, which could potentially stir contextualized
discussions on technology, society and ethics.

Keywords: problem-based learning; blood types; genetic teaching; active learning


methodologies.

Introdução

Este trabalho se propõe a utilizar a metodologia da Aprendizagem Baseada em


Problemas (ABP) do tipo Estudo de Caso, a fim de proporcionar o aprendizado de
conteúdos relativos ao tema Grupos Sanguíneos contextualizados com o ensino de
Genética. Ao longo deste artigo apresentaremos o arcabouço teórico-metodológico
utilizado na elaboração da atividade, bem como sua adaptação para o nível do Ensino
Médio (EM). A avaliação acerca da adequação da atividade se deu ao longo de todo o
processo, de forma quali-quantitativa, através do registro de observações acerca da
aprendizagem dos conteúdos, manifestos nas produções dos estudantes e nas discussões
por eles levantadas.

A aprendizagem baseada em problemas

O excesso de aulas e conteúdos curriculares a serem alcançados, em detrimento do


incentivo ao desenvolvimento de habilidades fundamentais como o pensamento crítico, a
resolução de problemas e a comunicação vêm sendo questionados (LUJAN; DICARLO,
2006). Entre as possíveis soluções, têm sido propostas estratégias que, de modo geral,
privilegiam a interação entre os estudantes. Dentre elas, destacam-se os jogos educativos,
aprendizado com os pares, a elaboração de modelos e utilização de atividades
experimentais (LUJAN; DICARLO, 2006).
As Metodologias Ativas surgem como práxis alternativa ao método de ensino
tradicional, centralizado na figura do professor detentor e transmissor do conhecimento,
inserido em um cenário escolar onde o aluno é o receptor das informações transmitidas.
Desse modo, as Metodologias Ativas preconizam uma ruptura com o processo tradicional

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de ensino-aprendizagem. Com elas, busca-se colocar o aluno no cerne desse processo,
como sujeito, onde, através de seu protagonismo, passa a ter maior gerenciamento de sua
aprendizagem (BERBEL, 2011). O docente, no entanto, ocupa papel vital, passando a ter
a responsabilidade de criar meios, instrumentos e oportunidades de aprendizado que
contemplem os objetivos educacionais que se deseja alcançar. O professor passa a
assumir o papel de mediador, supervisor e facilitador da aprendizagem dos estudantes
(LOVATO; MICHELOTTI; LORETO, 2018).
A Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) constitui um tipo de abordagem
contido no universo das Metodologias Ativas. A ABP teve seu início na Universidade de
Harvard, na década de 1930, ainda de modo embrionário através do “método do problema”,
baseado em estudos de caso da Escola de Direito. Na década de 1960, estudiosos da
Universidade de McMaster (Canadá) reformularam esse método para o ensino da educação
médica – surgindo o método Problem-based learning (PBL), cujo desenvolvimento e
consolidação se deu na Universidade de Maastricht na Holanda (RIBAS, 2004; SAVERY,
2006).
Entre as diferentes abordagens possíveis, neste trabalho, inspiramo-nos na ABP do
tipo Estudo de Caso. Para Barrows (BARROWS, 1986 apud RIBEIRO, 2005), os estudos
de caso devem ser formulados de modo a privilegiar conhecimentos prévios dos estudantes
e servir de base para a aquisição de novos conhecimentos e habilidades. Nesta
modalidade, a aprendizagem se dá por meio do problema apresentado. Assim, é comum
que os estudantes recebam um texto que sintetiza e organiza uma determinada situação a
ser investigada, embora outros meios possam ser utilizados (BORGES et al., 2014).
Para a elaboração dos casos e seus problemas, buscamos inserir elementos de
familiaridade e contextualidade que, segundo Ribas (2004), são fundamentais para
despertar a motivação da aprendizagem. Para Ribas (2004, p. 86, tradução nossa) “Isso
permite descobrir o que você sabe e o que ainda precisa aprender. Por isso, propõe-se
conhecer mais para que, a partir daí, compreenda-se a utilidade da matéria submetida ao
seu julgamento”. Por familiaridade, preconiza-se o uso de elementos que aproximem o
problema ao cotidiano do aluno e, por contextualidade, espera-se que o problema possa
ser de fácil identificação.
Dentro dessa proposta, Grupos Sanguíneos é um tema que permeia o dia-a-dia dos
alunos, trazendo a familiaridade pretendida. Os casos foram elaborados de modo que, ao
longo do processo, fosse possível identificar contradições que levam à contextualização e
percepção do problema, evidenciando as incongruências. Este artifício foi utilizado como
uma tentativa de tornar os casos mais palatáveis e possíveis de serem resolvidos por
alunos do Ensino Médio.

A escolha do tema Grupos Sanguíneos

O tópico Grupos Sanguíneos reúne uma série de possibilidades pedagógicas para


aproximar o estudante de contextos reais, de modo a estimularmos o pensamento crítico e

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a tomada de decisões mediante questões científicas de interesse social, tecnológico e ético.
Em concordância, Fonseca e Tatarotti (2017, p. 3) afirmam que

O estudo dos grupos sanguíneos é permeado por processos de construção


do conhecimento na forma científica e é também influenciado por
conhecimentos do senso comum e como outros tantos temas na biologia é
ensinado a partir de processos de transposição bem como enfrenta
obstáculos epistemológicos. A genética dos grupos sanguíneos é
especialmente influenciada por concepções relacionadas a sociedade tais
como, os exames rotineiros de sangue que são presentes em temáticas
curriculares nas escolas do ensino básico brasileiras (...).

Como estes autores apontam, há uma evidente relação entre a temática e o cotidiano
da sociedade. De fato, Grupos Sanguíneos é um dos temas onde os alunos trazem,
naturalmente, uma grande bagagem de conhecimentos prévios potencialmente adquiridos
no seu meio social (FONSECA; TARTAROTTI, 2017; PINHEIRO; COSTA; SILVA, 2013) e,
por esse motivo, carregam mais sentidos relacionados ao senso comum do que à Ciência.
Em concordância, tal percepção é compartilhada pela docente autora deste trabalho,
através da experiência agregada em sua práxis, o que justificou a escolha da temática para
o desenvolvimento desta proposta didática. Como estratégia, optamos pela inserção de
discussões mais amplas acerca do tema, para além de vínculos de paternidade e
probabilidades de heranças de tipos sanguíneos, fomentando discussões relativas à ética
e ao impacto da Ciência na sociedade. Além disso, procuramos sanar alguns erros
conceituais frequentes em livros didáticos, como já apontado por diferentes autores, por
exemplo, a possibilidade da ocorrência de reação transfusional entre doador/receptor
compatíveis para os sistemas ABO/Rh, reconhecer o Falso O como um fenótipo diferente
do grupo sanguíneo O (BATISTETI et al., 2007a, 2007b; PSCHISKY, 2003; VIEIRA, 2013).
Desse modo, o presente trabalho teve como objetivo elaborar, aplicar e avaliar a
adequação de uma proposta didática de aprendizagem ativa, do tipo ABP, para o ensino
de Grupos Sanguíneos aos alunos do Ensino Médio.

Metodologia

Nesta seção abordaremos o contexto escolar, a sequência didática utilizada para a


aplicação da atividade, o percurso metodológico para a coleta de dados e a avaliação da
proposta pedagógica. Adicionalmente, explicaremos a estrutura e as finalidades dos
“Estudos de Caso sobre Grupos Sanguíneos”. Um exemplo de roteiro dos estudos de caso
e o protocolo para a produção do kit de tipagem sanguínea artificial estão disponíveis nos
Apêndices A, B e C.

Contexto escolar e didático

A presente atividade foi aplicada para três turmas de 3ª Série – totalizando noventa
e três alunos – do Ensino Médio Regular de um Colégio Federal de Ensino Básico,
localizado na cidade de Duque de Caxias, Rio de Janeiro.

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A atividade “Estudos de Caso sobre Grupos Sanguíneos” foi apresentada aos alunos
no âmbito das aulas de Biologia (conteúdo curricular de Genética), que foram ministradas
durante 2 tempos semanais de aula, com duração de 1 hora e 30 minutos. Os estudos de
caso foram aplicados na semana subsequente à aula expositiva sobre Grupos Sanguíneos
(1ª semana), conforme as etapas da sequência didática resumida na Quadro 1.

Quadro 1: Sequência didática para a aplicação e resolução da atividade “Estudos de Caso


sobre Grupos Sanguíneos”
Planejamento semanal Sequência didática
1ª Semana Aula expositiva-dialogada – Sistema ABO e fator Rh
Aplicação dos “Estudos de Caso sobre Grupos Sanguíneos”
2ª Semana
(Etapas a – c presentes no roteiro)
Pesquisas, tutorias presenciais e à distância via plataforma
3ª Semana
Moodle (Etapa d)
Apresentação dos casos durante o “Congresso Interno do
4ª Semana
Hospital Caxias” (Etapa e)
Aula expositiva-dialogada sobre Epistasia com aplicação de um
5ª Semana
texto sobre “O Falso O”
Fonte: as autoras.

Na 1ª semana, antes da aplicação da atividade, preocupou-nos fornecer subsídios


teóricos (Quadro 2) os quais os estudantes pudessem utilizar como ponto de partida para
a compreensão inicial de cada caso. Nesse sentido, propomos uma pequena alteração no
conteúdo tradicional da aula expositiva, retirando ou incluindo temas estratégicos. Assim, é
importante destacar a omissão intencional do tópico “Doença hemolítica do recém-nascido”
(DHRN), usualmente abordado durante as aulas sobre Fator Rh. Além disso, consideramos
necessária a realização de uma breve abordagem sobre a composição e função do tecido
sanguíneo, bem como a relação entre a substância H e os aglutinogênios do sistema ABO.

Quadro 2: Conhecimentos prévios requeridos para a realização dos estudos de caso


Sistema ABO Fator Rh
▪ Polialelia ▪ Monoibridismo
▪ Apresentação dos fenótipos e genótipos ▪ Apresentação dos fenótipos e
genótipos
▪ Tipo de dominância
▪ Tipo de dominância
▪ Aglutinogênios e aglutininas
▪ Aglutinogênio e aglutinina
▪ Tipagem sanguínea do sistema ABO
▪ Tipagem sanguínea do fator Rh
▪ Doação de sangue
▪ Doação de sangue
▪ Tecido sanguíneo: composição e função

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dos componentes*
▪ Substância H*
* temas que não são abordados com frequência. Fonte: as autoras.

A aplicação dos “Estudos de Caso sobre Grupos Sanguíneos” ocorreu na 2ª semana


e foi iniciada no laboratório de biologia, com uma aula prática que simula a tipagem
sanguínea dos sistemas ABO e Rh. As turmas foram divididas em quatro grupos de
aproximadamente sete alunos, onde cada grupo recebeu um caso diferente relacionado à
tipagem sanguínea simulada. Todo o processo de resolução dos casos foi realizado de
modo colaborativo, método onde não há hierarquia imposta ou divisão de tarefas pré-
determinadas entre os membros do grupo (TORRES; IRALA, 2014). Os estudantes
dispuseram de duas semanas para pesquisar e resolver seus respectivos casos. Na 3ª
semana foram disponibilizados dois momentos de orientação1 pela docente e à parte das
aulas regulares; um momento presencial e outro, mais flexível, através de fóruns
específicos para cada caso na plataforma Moodle2.
A culminância da atividade ocorreu na 4ª semana, durante o tempo previsto para as
aulas regulares, e foi chamada de “Congresso Interno do Hospital Caxias”. Neste momento
os grupos fizeram uma apresentação formal, entre 15 – 20 minutos, acerca da resolução
do caso, respeitando-se a sequência numérica crescente. Ademais, entregaram um
relatório – que sintetizou a resolução dos casos –, o roteiro contendo as respostas da aula
prática e os slides das apresentações.

Eixos estruturantes para a elaboração dos estudos de caso

Foram elaborados quatro Estudos de Caso a partir dos temas geradores: 1- Reação
Febril Não Hemolítica; 2- Doação de Medula Óssea; 3- Doença Hemolítica do Recém-
Nascido e 4- O Falso O. Os nomes dos casos, porém, foram omitidos nos roteiros
fornecidos aos alunos. Elegemos a estratégia de elaborar roteiros pois, deste modo,
acreditamos permitir maior autonomia na execução dos procedimentos e na auto-gestão no
desenvolvimento da atividade. Um exemplo de roteiro dos Estudos de Caso encontra-se no
Apêndice A.
Os estudos de caso foram contextualizados com o conteúdo curricular “Polialelia”,
onde a temática de Grupos Sanguíneos (sistema ABO) configura-se como o principal
exemplo deste tipo de herança genética em seres humanos (PSCHISKY; FERRARI, 2002).
Os roteiros de cada caso foram estruturados de modo a apresentar três etapas comuns,
sendo elas: a) apresentação do caso, b) tipagem sanguínea e c) contato com a situação-
problema. As etapas subsequentes que completam toda a atividade da ABP não são
roteirizadas, e podem ser identificadas como, d) investigação e e) Congresso Interno do

1 O método ABP preconiza a realização de tutorias. Aqui, adaptamos com a inclusão da modalidade de ensino
à distância.
2 O Moodle (do inglês Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment) é uma plataforma online, de

livre acesso, que disponibiliza um ambiente virtual de ensino-aprendizagem aos usuários.

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Hospital Caxias, as quais foram desenvolvidas ao longo das 3ª e 4ª semanas,
respectivamente. Um resumo da cronologia e dos objetivos de cada etapa é apresentado
na Figura 1. Nesta figura, as etapas de ‘a – c’ são partes do roteiro de cada estudo de caso
e configuram um momento crucial do brainstorming (chuva de ideias) dos estudantes. Em
‘d’, ocorre o período de pesquisas. A culminância da atividade ocorre na etapa ‘e’. O papel
do professor mediador estende-se ao longo de todas as etapas.
Figura 1 – Objetivos de cada etapa da atividade de ABP “Estudos de Caso sobre Grupos
Sanguíneos”.

Fonte: as autoras. (As imagens utilizadas concedem licença para uso e foram obtidas no domínio
https://www.publicdomainpictures.net/ , exceto pela imagem usada em ‘a’, obtida em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Hemifilia.png).

A seguir, apresentaremos a organização e os objetivos pretendidos em cada uma


das cinco etapas da atividade.
a) Apresentação do caso: esta é a etapa em que os estudantes entram em contato
com o papel que viriam a desempenhar: médicos residentes em um hospital hipotético. Um
grupo de residentes recebe do “supervisor” (interlocutor fictício presente no roteiro) um caso
ao qual devem se dedicar até a sua resolução final. Todos os casos são relativos a
problemas cuja resolução sugere-se depender apenas da identificação do tipo sanguíneo
de um indivíduo. Os estudantes analisam o heredograma das famílias e podem fazer
deduções dos genótipos a partir dos fenótipos apresentados; estratégia empregada para
engajar os educandos e que permitiu: coletar informações iniciais, aplicar e consolidar
conhecimentos prévios de Genética (1ª Lei de Mendel e Polialelia). Contudo, algumas

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análises não são concordantes e/ou conclusivas, portanto, será necessário obter mais
dados. Os casos apresentam algumas variações de organização, assim, é possível que a
percepção do problema seja identificada nesta (a) ou nas etapas subsequentes (b – c).
b) Tipagem sanguínea: nesta etapa, os estudantes realizam a tipagem sanguínea do
sistema ABO e do fator Rh para confirmar ou identificar o fenótipo do indivíduo em questão.
Para isso, são utilizados kits artificiais de diagnóstico, que simulam os resultados obtidos
com o teste real. De posse do tipo sanguíneo, os estudantes analisam e interpretam os
resultados obtidos e tentam conciliá-los com a etapa anterior (análise do heredograma). O
protocolo de produção dos kits está detalhado nos Apêndices B e C.
c) A situação-problema: com todos os dados analisados até aqui, é nesta fase que o
problema se delineia nitidamente. Os estudantes são convidados a confrontar o problema
com os dados das etapas anteriores, de maneira a perceber que sua correta compreensão
exige a busca por novos conhecimentos. É importante salientar que as pistas cruciais são
fornecidas pelo médico supervisor da equipe de residentes (uma personagem presente no
roteiro). Estas pistas são estratégias para promover e orientar a conexão entre os saberes
aprendidos e aqueles necessários para a conclusão do caso. Deste modo, espera-se que
o cenário colocado frente aos estudantes os motivem a seguir um percurso investigativo,
centrado na aprendizagem acerca do problema.
d) Investigação: é o período que os grupos utilizam para buscar informações
necessárias ao esclarecimento do caso, produzir um relatório e elaborar a apresentação
com a resolução do caso para a etapa seguinte (e). Como preconizado pela metodologia
de ABP (BORGES et al., 2014), disponibilizamos momentos de orientação (ou tutorias), um
deles presencial e o outro à distância, adaptado para a nossa realidade, utilizando fóruns
de discussão na plataforma Moodle.
e) O Congresso Interno do Hospital Caxias: foi a etapa de culminância da atividade.
Os estudantes apresentaram à turma os seus respectivos casos clínicos, as evidências
coletadas, e o caminho percorrido para a resolução dos problemas. Eles também
produziram um relatório onde sistematizaram a elucidação do caso.

Coleta e análise dos dados

Este estudo consistiu em uma pesquisa de campo por meio da observação


participante onde a avaliação da adequação da proposta didática foi realizada de forma
quali-quantitativa (GIL, 2008). Realizamos apontamentos, por escrito, em um caderno de
registros durante todo o tempo dispendido para a aplicação dos Estudos de Caso (2ª – 4ª
semana). Também realizamos análise documental a partir das respostas contidas nos
roteiros da aula prática e as informações presentes nos slides das apresentações
elaboradas pelos grupos. Além disso, registramos o grau de motivação dos estudantes por
meio de suas atitudes e engajamento durante as aulas.
Delineamos perguntas gerais a serem respondidas em cada semana da atividade.

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Durante a aplicação da aula prática (2ª semana) procuramos responder: os conhecimentos
prévios fornecidos foram suficientes para a interpretação dos heredogramas? Os
conhecimentos prévios fornecidos foram suficientes para a interpretação da tipagem
sanguínea? O roteiro elaborado permitiu a autonomia dos estudantes na execução da
tipagem sanguínea? Na 3ª semana registramos a procura dos estudantes pelos momentos
de tutoria e o tipo de interação realizada. Durante a apresentação dos alunos (4ª semana)
avaliamos: Os alunos alcançaram o conteúdo conceitual mínimo para a correta resolução
dos casos? Quais objetivos propostos na atividade não foram contemplados? Que outros
aspectos relacionados aos casos foram trazidos pelos alunos de forma espontânea (isto é,
conteúdos e discussões que não foram exigidos/previstos pela atividade)?
Com essas perguntas, buscamos identificar o atingimento de (1) conteúdos
conceituais mínimos (CCM), que são aqueles necessários para a elucidação/conclusão dos
caso, (2) conteúdos conceituais adicionais (CCA), ou seja, que não são necessários à
conclusão dos casos mas que refletem o aprofundamento no tema proposto pela atividade
e (3) conteúdos atitudinais (CA), a atividade não exigia CA em sua elaboração. Dessa
forma, os CA analisados correspondem às discussões espontaneamente trazidas pelos
alunos durante suas apresentações.

Resultados e discussões a partir de considerações caso a caso

Inicialmente é importante ressaltar que a repercussão desta atividade foi,


claramente, bastante positiva. Durante a atividade prática, foi perceptível o alto nível de
motivação e engajamento dos alunos ao entrarem em contato com os casos e travarem
discussões com seus colegas de grupo. Destaca-se a fala do aluno 1: “essa é uma das
atividades mais legais que eu fiz na escola. Por que não fazemos isso mais vezes?”. Outras
falas indicaram a alegria de poder simular situações reais, usando termos que poderiam ser
entendidos como “médico de faz-de-conta”. Observamos a busca de autonomia por parte
dos estudantes. Durante a aula prática, por exemplo, os mesmos começaram a realizar
pesquisas em seus celulares, procurando pistas para o caso estudado. Ao passo que é
correto afirmar que a etapa de investigação (d) e tutoria, para alguns grupos, foi antecipada
e aconteceu eventualmente no laboratório, no curso da atividade experimental. Nesse caso,
as interações durante a aula prática foram especificamente relacionadas aos CCM. Além
disso, todos os grupos conseguiram interpretar os heredogramas, identificando os
genótipos e a transmissão de genes, bem como identificar o resultado da tipagem
sanguínea artificial.
Foi curioso notar que os estudantes não aproveitaram o tempo reservado para a
tutoria presencial, contrariando a expectativa docente. Foi realizada apenas uma interação
pontual via plataforma Moodle:

Aluno 2 – “Professora, eu entendi que Epistasia é quando um gene inibe a


manifestação de outro gene, porém não compreendi como a epistasia está
relacionada com o Falso O... é meio que o Falso O não produz antígenos
(A, B nem H ) pois um outro gene impediu a atuação do gente "responsável"

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pelo sistema ABO, impossibilitando a produção dos antígenos A, B e H? Se
sim, que gene é esse que impediu? ”

Nota-se que o aluno 2 já havia reunido informações importantes para a resolução do


caso 4. O aluno foi orientado a revisar, nos slides da aula teórica (1ª semana), a relação
existente entre a substância H e os antígenos A e B. Isso indicou que incluir o ensino da
substância H como conhecimento prévio foi uma escolha acertada. A respeito da baixa
procura pelos momentos de tutoria, destacamos que a mesma não era obrigatória, visto
que seria realizada em um horário à parte das aulas regulares. Acreditamos que a não
adesão à tutoria, conforme planejado, pode ser uma possível explicação para o fato de que
alguns CCA não tenham sido satisfatoriamente atingidos pelos grupos, sugerindo que são
conceitos que precisam de maior mediação. Assim, para futura reprodução dessa
metodologia, seria interessante incluir a etapa da tutoria no tempo previsto para as aulas
regulares. Não obstante, todos os grupos atingiram satisfatoriamente os CCM requeridos
para a resolução dos casos, o que será discutido mais adiante em conjunto com os CCA
alcançados ou não.
Para Barrows e Tamblyn (1980, p. 1, grifo nosso) a ABP é “a aprendizagem que
emerge do processo de trabalhar para a compreensão ou a resolução de um problema.
(...)”. Sob esta perspectiva, escolhemos avaliar a adequação da atividade proposta, de
forma quali-quantitativa, através da análise da aprendizagem que emergiu deste processo.
Para isso, foram feitos apontamentos durante as apresentações acerca da elucidação dos
casos, destacando as discussões mais relevantes suscitadas. A análise indicou os
resultados de aprendizagem – conteúdos conceituais e atitudinais – obtidos pelos
estudantes e proporcionados pela atividade. De modo geral, todos os grupos alcançaram
os conhecimentos mínimos requeridos para a conclusão satisfatória dos problemas. A
seguir, teceremos comentários e análises pontuais, ressaltando o atingimento dos objetivos
(conteúdo conceitual mínimo (CCM) e conteúdo conceitual “adicional” (CCA)) e das
discussões espontâneas trazidas pelos alunos que refletem os conteúdos adicionais (CA).
Também discutiremos as limitações observadas em cada caso.
Caso 1 – Reação febril não-hemolítica. O objetivo educacional deste caso foi permitir
a quebra de paradigmas no conceito de compatibilidade sanguínea e transfusão entre
indivíduos compatíveis para os sistemas ABO e Rh. Esse CCM foi alcançado por todos os
grupos. Tal reflexão propiciou maior aproximação com a realidade dos procedimentos,
precauções e riscos advindos de qualquer transfusão entre indivíduos compatíveis para
esses sistemas. É comum encontrarmos, na maioria dos livros didáticos, a ideia de que a
transfusão entre indivíduos compatíveis (sistemas ABO e fator Rh) é isenta de problemas
(PSCHISKY, 2003). Contudo, essa é uma visão limitada da realidade. Por exemplo, os tipos
sanguíneos O e AB são, respectivamente, considerados doadores e receptores universais
na transfusão de sangue total, ignorando as implicações decorrentes das aglutininas
(BATISTETI et al., 2007a, 2007b). Assim, por meio deste caso, tivemos a oportunidade de
discutir esta questão (CCA) durante a apresentação. No entanto, apenas 1 grupo
conseguiu, satisfatoriamente, alcançar esse CCA.

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Com esse caso, os estudantes refletiram sobre a influência dos demais componentes
sanguíneos nas transfusões, perceberam que antígenos dos leucócitos e das plaquetas,
bem como proteínas (citocinas) produzidas por leucócitos não são inertes, mas podem ser
relevantes no que tange às reações transfusionais (CCM). Nesse sentido, consideramos
que ensinar sobre Tecido Sanguíneo previamente foi um fator facilitador. Além disso,
notamos que o caso 1 foi atravessado por questionamentos e comentários, durante a
apresentação dos alunos, que versavam sobre ética na doação de sangue (CA); riscos de
contaminação por doenças infecciosas; o pensamento de alguns grupos religiosos sobre a
doação de sangue (CA); e até mesmo a restrição temporária de doação por parte de
homens homossexuais (CA) (BRASIL, 2016). Destaco, contudo, a ausência de discussões
efetivas sobre doação de hemoderivados (CCA).
Caso 2 – Doação de Medula Óssea. Este caso inseriu o conhecimento sobre a
possibilidade de alteração do tipo sanguíneo mediante transfusão de medula óssea (MO),
onde o receptor tem sua MO colonizada pelas células transplantadas do doador, CCM
alcançado por todos os grupos. Incialmente, eles se depararam com uma incompatibilidade
sanguínea entre os pais e seu filho, paciente que necessitava de transfusão de sangue.
Durante a aula prática, registramos que as hipóteses predominantes entre os grupos foram:
a criança seria fruto de um outro relacionamento, adotada, ou teria acontecido uma falha
no teste laboratorial. Uma vez discutidas e descartadas, tais hipóteses deram lugar a outras
mais fundamentadas, auxiliados pela informação (pista) de que o paciente havia sofrido de
leucemia e obtido a cura após transplante heterólogo de MO.
Foi um caso extremamente rico e promissor para aquisição de novos conhecimentos
contextualizados com tal realidade simulada. Na apresentação do caso, os estudantes
abordaram a gênese do tecido sanguíneo (CCM), a leucemia – definição (CCM) e sintomas
(CCA) –, doações de MO – em que situações ela é necessária e os procedimentos
empregados (CCA), a colonização da MO por novas células e a possibilidade de mudança
do tipo sanguíneo como uma possível consequência dessa colonização3 (CCM).
Além disso, as discussões levantadas pelos estudantes permitiram compreender a
dificuldade de compatibilidade entre doadores de MO e a importância de manutenção de
um banco de doadores de MO. As discussões foram permeadas por aspectos éticos,
sociais e tecnológicos. Nesse sentido, observou-se a apropriação de CA.
Caso 3 – Doença Hemolítica do Recém-Nascido (DHRN). Este caso é sobre o
nascimento de irmãs gêmeas, onde apenas uma delas apresenta sintomas clássicos da
DHRN. A compreensão sobre a DHRN, portanto, foi o principal objetivo educacional deste
caso (CCM). A partir do diagnóstico, os estudantes buscaram entender as causas do
quadro clínico e o porquê apenas uma das gêmeas manifestou-o. As perguntas norteadoras

3 Curiosamente, no momento de redação desse artigo, noticiou-se o segundo caso de cura de pessoas
soropositivas após transfusão de MO em decorrência de uma leucemia (“Paciente fica ‘livre’ de HIV após
transplante de células-tronco”, 2019). Acredito que o caso 2, de algum modo, tenha aberto a possibilidade de
compreensão do ocorrido por parte dos estudantes que participaram dessa atividade. Esse é um exemplo
prático de como casos simulados podem favorecer o entendimento de aplicações biotecnológicas com
impacto na saúde e na sociedade.

928 REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, p. 918-936, out./dez. 2020


do roteiro os levaram a responder em que situações a DHRN acontece e as formas de
prevenção (CCM). Os estudantes também discutiram os testes clínicos adicionais para o
fechamento do diagnóstico (CCA). A realização do acompanhamento pré-natal foi
levantada por todos os grupos, o que proporcionou a conscientização sobre a importância
do pré-natal para a saúde da gestante e do nascituro (CA).
No entanto, foi observado que os grupos não conseguiram, satisfatoriamente,
correlacionar a possibilidade de um dos bebês4 sofrer DHRN em virtude dos anticorpos
maternos anti-A (CCA). Isto sugere uma limitação dos dados fornecidos pelo estudo de
caso ou, ainda, os conhecimentos prévios da aula teórica não foram suficientes para
viabilizar o aprendizado. O foco da pergunta está no reconhecimento de que as aglutininas
anti-A poderiam, por analogia à aglutinina anti-D, atacar as hemácias fetais. De fato, é mais
raro encontramos a abordagem sobre a DHRN relativa ao sistema ABO em livros didáticos
(PSCHISKY, 2003), sendo esta uma discussão não trivial. Esperava-se, ainda, discutir a
ocorrência de anticorpos ditos “naturais” (anti-A e anti-B) em contraposição aos anticorpos
produzidos mediante exposição prévia (anti-D) (CCA). Este objetivo educacional, porém,
não foi alcançado.
Caso 4 – O Falso O. Este caso demandou a inserção de um novo tipo de herança
genética, a Epistasia. Neste estudo de caso, os estudantes depararam-se, inicialmente,
com as limitações atreladas a simples análise de heredogramas, mas também do teste
laboratorial. Foi possível perceber e discutir que há maior complexidade fenotípica sobre o
sistema ABO do que é habitualmente ensinado (CCM).
Um ponto facilitador foi incluir o ensino da substância H como conteúdo prévio, como
explicitado anteriormente. A premissa está em informar sobre a existência de um
carboidrato que, posteriormente, será fundamental para a compreensão desta Epistasia e
de incompatibilidades transfusionais (CCA) entre os fenótipos O e falso O. Um dos
resultados que merece destaque foi o fato de que dois dos três grupos apresentaram a
notícia de uma recente doação de sangue falso O, que envolveu um brasileiro (doador), e
um bebê colombiano (receptor)5. Adiante, discutiremos como esse caso facilitou a aula
seguinte sobre Epistasia.
Analisando coletivamente os ganhos educacionais relatados, destacamos que, além
da introdução a novos conhecimentos e quebras de paradigmas conceituais, essa
abordagem pedagógica teve suas dimensões ampliadas pela óptica dos educandos, de tal
modo que cada grupo trouxe suas colaborações, curiosidades e contextos proporcionais ao
envolvimento individual e interesses que emergiram das interações colaborativas. Em
outras palavras, enquanto um grupo se deteve em aspectos mais conceituais sobre o caso
1, o grupo de outra turma deu mais ênfase aos aspectos éticos com relação aos critérios

4 No caso, propõem-se que uma das gêmeas nasceu saudável (sem DHRN) e tem tipo sanguíneo A.
5 A notícia veiculada conta sobre o primeiro caso de doação de sangue internacional de um brasileiro,
residente no Ceará, com o fenótipo falso O. A receptora foi uma bebê colombiana. A reportagem diz, ainda,
que há apenas 11 famílias brasileiras com tal fenótipo registradas (“Sangue raro presente em apenas 11
famílias brasileiras salva bebê na Colômbia”, 2017).

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de doação de sangue, por exemplo. Dinâmica observada para a maioria dos casos.
Acreditamos que a ênfase dada pelos diferentes grupos a respeito de discussões
sobre um mesmo caso é explicada, justamente, pelo caráter ativo da metodologia.
Enquanto sujeitos, os educandos partiram do tema gerador, cumpriram um “currículo
mínimo” para a resolução do caso e se aprofundaram na temática de acordo com suas
possibilidades de aprendizado e interesses. Fato que reafirma que Grupos Sanguíneos é
um tema multidimensional e cheio de possibilidades. A Tabela 1 resume a análise
quantitativa dos conhecimentos alcançados pelos estudantes em cada caso e especifica a
etapa.

Tabela 1: resumo dos conteúdos conceituais e atitudinais obtidos em cada caso.


Etapas
Categorias Casos/ Avaliação
envolvidas

Conteúdos
Conteúdos necessários para a a, b, c I, II, III, IV
Conceituais
elucidação e/ou conclusão do Todos os grupos
Mínimos
caso. e atingiram (100%).
(CCM)

Conteúdos Conteúdos não necessários à I, II, III – apenas um


Conceituais conclusão dos casos, mas que d grupo atingiu (33,3%);
Adicionais refletem o aprofundamento no e IV – dois grupos
(CCA) tema proposto pela atividade. atingiram (66,7%).

I – todos os grupos
apresentaram, pelo
menos, um tipo de CA
Conteúdos contextualizados que
(100%);
contribuem na formação de
Conteúdos II – dois grupos
valores e atitudes, avaliados a
Atitudinais atingiram (66,7%);
partir de discussões e
(CA) III – todos os grupos
espontaneamente trazidas pelos
atingiram (100%);
alunos.
IV – nenhum grupo
atingiu (0%).

Os Estudos e Caso estão numerados de I – IV Fonte: dados da pesquisa.

A Figura 2 ilustra a produção dos educandos por meio de slides representativos de


suas apresentações.

Figura 2 – Exemplos da produção dos educandos.

930 REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, p. 918-936, out./dez. 2020


A) caso 1, reconhecimento da possibilidade de ocorrência de complicação transfusional entre
indivíduos compatíveis para os sistemas ABO e Rh (CCM). B) caso 2, discussão sobre doação de
medula óssea (CCA); C) caso 3, elucidação do caso com montagem final do heredograma da
família estudada (CCM) e D) caso 4, demonstração da organização de informações e
levantamento de hipóteses importantes para a resolução do caso (CCM). Fonte: dados da
pesquisa.

Expansão da proposta – Introdução à Epistasia. Sua ocorrência nos livros didáticos


geralmente versa sobre cor da pelagem de roedores e/ou penas de aves. Poucos livros
abordam a temática do Falso O (PSCHISKY, 2003). Ao longo da prática pedagógica da
autora e docente, foi percebido que Epistasia costuma ser um tema desinteressante e de
difícil compreensão. Quando a docente passou a utilizar o exemplo do Falso O ou efeito de
Bombaim por meio de estudos dirigidos, o aumento da curiosidade e interesse dos alunos
foi perceptível. No entanto, o tema ainda era percebido com dificuldades. Assim, nossa
estratégia foi dar sequência ao conteúdo curricular de Epistasia na semana seguinte (5ª
semana) à finalização dos estudos de caso, partindo de um momento motivacional
favorável, fomentado pelas discussões levantadas durante a apresentação da resolução do
caso 4. Nesse relato de experiência, observamos que os alunos se mostraram bastante
receptivos e curiosos com relação à matéria. Nossa metodologia consistiu na leitura de um
texto sobre o Falso O e, em seguida, na realização de exercícios sobre Falso O e grupos
sanguíneos. Também resgatamos as discussões e exemplos trazidos pelos estudantes
durante a apresentação de seus trabalhos. Para complementar, após a correção das
atividades propostas, seguiu-se uma aula expositiva-dialogada sobre outros exemplos de
Epistasia, retomando e reforçando conceitos discutidos no caso 4 e apontando as
diferenças entre Epistasia recessiva e dominante. Assim, a partir de nossas experiências,
concordamos que “Os questionamentos surgidos no trabalho com o Caso podem facilitar,

931 REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, p. 918-936, out./dez. 2020


em uma etapa subsequente, o estudo de novos conteúdos relacionados aos assuntos que
despertaram o interesse dos alunos” (MONTANHER, 2015). Os estudantes interagiram com
a docente ao longo da aula demonstrando domínio e interesse pela matéria.
A ABP tem sido aplicada como método de ensino e aprendizagem em diferentes
áreas. Estudos utilizando ABP para o ensino de Ciências (MORGADO et al., 2016),
Geografia (DE FARIAS, 2017), Química (LOPES et al., 2011) e Estatística (FREI, 2020),
desde o âmbito do Ensino Fundamental ao Ensino Superior também registraram
experiência exitosa envolvendo um aumento do desempenho cognitivo, autonomia,
promoção da interdisciplinaridade e aquisição de habilidades.
Encontram-se na literatura diferentes propostas metodológicas que visam ensinar
Grupos Sanguíneos, tais trabalhos reúnem métodos lúdicos (DE CAMPOS JÚNIOR et al.,
2009), aulas práticas simuladas e inclusivas para alunos cegos (ARNOLD et al., 2012),
determinação do fator Rh (ESQUISSATO; ARRUDA; SOARES, 2007), sequências
didáticas que aliam aulas práticas reais de tipagem sanguínea a jogos (PINHEIRO; COSTA;
SILVA, 2013) e práticas simuladas de cunho investigativo (MIRANDA; TORRES, 2018). Em
relação às duas últimas propostas citadas, observou-se o intento de identificar possíveis
doadores de sangue, discutindo-se a compatibilidade transfusional. Além disso, Miranda e
Torres (2018) propuseram a identificação de vínculos de filiação por meio de um caso
hipotético de troca de bebês na maternidade.
No que tange à contextualização de Grupos Sanguíneos com situações-problemas,
é interessante notar uma convergência de ideias entre esses autores e nossa atividade. A
proposta que ora apresentamos, entretanto, é orientada, especificamente, pelo percurso
proporcionado pela Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e objetivou a aquisição
de conteúdos conceituais e atitudinais acerca dos grupos sanguíneos.

Considerações finais

Neste trabalho apresentamos a proposta de associar o modelo de aula prática de


tipagem sanguínea com a metodologia de ABP do tipo estudo de caso. Neste modelo, os
alunos receberam um caso completo, organizado pela docente, e que contemplou os
conhecimentos prévios dos alunos. Historicamente, a ABP foi desenvolvida em íntima
relação com o ensino em áreas da saúde, tais como medicina e enfermagem, com a
finalidade de oferecer uma formação técnico-científica em prol da formação profissional
(BERBEL, 2011). Todavia, como mostrado neste trabalho, é possível ampliar as
possibilidades de aprendizado por meio da contextualização com temas que envolvem
ética, tecnologias e seus impactos sociais, com vistas a propiciar a formação dos
estudantes enquanto cidadãos. Nesse sentido, destacamos os CA espontaneamente
trazidos pelos alunos. Adicionalmente, foi possível discutir alguns erros conceituais
recorrentes em livros didáticos e aprofundar conteúdos por meio de alguns CCA. Isto
evidencia que a elaboração e a condução dos casos devem ser cuidadosamente
planejadas, com o intuito de permitir estas discussões, o que salienta o papel fundamental
do professor no universo das Metodologias Ativas. A não adesão à tutoria presencial

932 REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, p. 918-936, out./dez. 2020


representou, possivelmente, uma limitação para o aprendizado de alguns CCA.
Como revisto por Souza e Dourado (2015), a inserção da ABP no cotidiano de ensino
pode provocar percepções negativas por parte dos docentes, gerando inseguranças quanto
à sua implementação. Os autores destacam algumas inquietações tais como, inadequação
curricular e preocupação com o tempo. Em consonância com estes resultados, Santana e
Franzolin (2018) acrescentam o desafio no planejamento, a escassez de ideias e a falta de
espaço apropriado. Nesta experiência pedagógica, as três turmas participantes não
sofreram nenhum tipo de prejuízo quanto ao conteúdo curricular a ser coberto, bem como
quanto ao tempo dispendido para a conclusão da atividade. Nesta perspectiva, ressaltamos
a importância do planejamento cuidadoso da SD, que viabilizou a organização do tempo
disponível em função do ensino-aprendizagem do conteúdo curricular.
Consideramos que a experiência aqui relatada foi extremamente exitosa, a começar
pela grande motivação dos estudantes durante a aula prática, o que se refletiu no
engajamento e na qualidade de sistematização dos saberes apresentados no trabalho final.
A formalização do conhecimento construído indicou que os instrumentos de aprendizagem
oferecidos foram adequados para a aquisição dos CCM almejados. Tais ferramentas
permitiram, a partir da realidade simulada, a aplicação dos conhecimentos prévios dos
alunos e o desenvolvimento de novas competências, saberes e valores, entrando em
contato com o fazer científico ao explorarem hipóteses, evidências e proporem soluções.
Por fim, esperamos ter contribuído para que mais docentes possam lançar-se no desafio
de implementar métodos de ensino-aprendizagem ativos mais criativos e dinâmicos.

Agradecimentos

Agradecemos à Christiane Coelho Santos pelas produtivas discussões e críticas nas


fases iniciais de elaboração desse manuscrito.

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❖ Apêndice A — um modelo dos Estudos de Caso

Nesta seção apresentaremos um dos roteiros utilizados a título de exemplo.


Posteriormente compartilharemos os procedimentos e materiais requeridos para a
produção dos kits de tipagem sanguínea.
Resumidamente, todos os casos foram organizados em três etapas, sendo a etapa
2 comum a todos eles, dado que é referente à atividade experimental de tipagem
sanguínea. A etapa 1 introduz as personagens do caso, oferecendo elementos iniciais que
serão utilizados no processo investigativo. A etapa 3 contém pistas importantes para que o
estudantes consigam iniciar o processo de investigação e, consequentemente, construam
novos conhecimentos. Na redação dos casos, buscamos utilizar uma linguagem lúdica e
mais próxima dos estudantes. Nesta lógica, os alunos são conduzidos pela figura do médico
supervisor, artifício que os guiou durante a leitura do roteiro e execução da atividade prática,
reduzindo a interação com o docente. A seguir, para exemplificar, fornecemos o caso 1.

O CASO 1

Como médicos residentes e membros da equipe do HemoCaxias, liderada pelo Dr.


Marc Van, do Hospital Caxias, vocês têm muitas atribuições a fazer. Vocês atuam nos
serviços de hematologia e hemoterapia, participam das rotinas e procedimentos de
doação sanguínea, realizam acompanhamento de pacientes que receberam transfusão de
sangue e derivados, e análise de casos.

Etapa 1 — Análise de heredograma


Hoje é o primeiro dia de vocês como médicos residentes na equipe do Dr. Van. Logo
nas primeiras horas de estágio, Dr. Van explica que sua equipe está envolvida no caso do
paciente Z, que é bastante simples. Por conta de uma cirurgia, Z precisa de uma doação
de sangue. A pedido do Dr. Van, vocês assumem o caso. Vocês conversam com os pais
de Z sobre o tipo sanguíneo dos familiares e chegam à conclusão que vocês expressam no
heredograma abaixo:

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Etapa 2 — Tipagem sanguínea
Dr. Van fala que as suposições apresentadas não são suficientes, ele explica que é
necessário a realização de um teste sanguíneo seguro antes da transfusão sanguínea.
Sendo assim, vocês vão para o laboratório realizar a tipagem sanguínea do paciente Z.
Para isso, vocês têm em sua bancada:
▪ Um tubo contendo o sangue do paciente Z;
▪ Frasco conta-gotas contendo anticorpos anti-A;
▪ Frasco conta-gotas contendo anticorpos anti-B;
▪ Frasco conta-gotas contendo anticorpos anti-D;
▪ 2 lâminas de vidro;
▪ 1 pipeta Pasteur;
▪ 2 palitinhos.

Procedimento para tipagem sanguínea:


I. Descobrindo o sistema ABO
1. Pingue uma gota de sangue em cada extremidade da lâmina;
2. Pingue de uma a duas gotas de soro anti-A sobre a gota localizada na
extremidade esquerda;
3. Pingue de uma a duas gotas de soro anti-B sobre a gota localizada na
extremidade direita;
4. Se precisar, mexa cuidadosamente nas gotinhas de sangue com o
palitinho, sem misturá-las;
5. Observe o que ocorre e esquematize na lâmina abaixo:

anti-A anti-B

6. A reação de aglutinação foi observada onde você pingou o(s) soro(s)

II. Descobrindo o fator Rh


1. Pingue uma gota de sangue no centro da segunda lâmina;
2. Pingue de uma a duas gotas de soro anti-D sobre a gota de sangue;
3. Se precisar, mexa cuidadosamente na gotinha de sangue com o
palitinho;
4. Observe o que ocorre e esquematize na lâmina abaixo:

anti-D

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5. A reação de aglutinação aconteceu?
6. Dados os resultados anteriores, qual o tipo sanguíneo do paciente Z?
7. Sabendo que há sangue de todos os tipos disponíveis no banco de
sangue do HemoCaxias, qual tipo sanguíneo vocês escolheram para realizar a
transfusão? Justifique sua resposta.

TIREM FOTOS DOS RESULTADOS DE TIPAGEM SANGUÍNEA OBTIDOS PARA APRESENTAÇÃO


NO DIA DO CONGRESSO INTERNO DOS RESIDENTES DO HOSPITAL CAXIAS

Etapa 3 — Situação-problema
O paciente Z foi encaminhado para receber a transfusão de sangue. Logo após o
início da transfusão, transcorridos 30 minutos, vocês percebem que Z está apresentando
algumas reações: tremores, calafrios e vômito. Além disso, vocês também percebem que
a temperatura do paciente aumentou em torno de 1oC. “O paciente está tendo uma reação
à transfusão!!” - Diz Dr. Van. Vocês ficam com receio de não ter feito a tipagem sanguínea
correta ou terem utilizado uma bolsa de sangue errada. Sabendo que fizeram todos os
procedimentos corretos, o que pode estar acontecendo?
Com sua experiência, Dr. Van explica que os sintomas são característicos de uma
reação febril não-hemolítica, um dos tipos de reações transfusionais mais comuns. Faz
sentido? Não... vocês mataram algumas aulas quando estavam na faculdade... que feio!!!
Agora precisam correr atrás do prejuízo. Vamos lá!

▪ Dados para pesquisar:


⮚ Reação febril não-hemolítica (RFNH): por que ocorre? Quais são os principais
sintomas? Como evitar? Que pacientes são mais suscetíveis à RFNH?

❖ Apêndice B — A elaboração do kit diagnóstico do sistema ABO e do fator Rh

A elaboração dos materiais para tipagem sanguínea teve como premissa envolver
os alunos em uma atividade experimental de modo seguro, sem riscos de exposição ao
sangue humano e a objetos perfuro-cortantes contaminados. Para isso, foram preparadas
amostras e reagentes artificiais e isentos de material biológico, de forma a mimetizar o
sangue humano e o kit de reagentes (anticorpos) de tipagem sanguínea para os sistemas
ABO e fator Rh.
O kit de insumos (Figura 2) — específico para cada estudo de caso — é composto
de: tubo de ensaio de vidro com tampa de rosquear, identificado (Figura 2A, correspondente
ao sangue do paciente); kit de reagentes contendo três frascos conta-gotas rotulados
(Figura 2B, correspondente aos anticorpos reagentes “anti-A”, “anti-B” e “anti-D”); papel de
filtro com marcação; dois palitos de madeira; duas lâminas de vidro 25,4 x 76,2 x 1,0 mm
(Figura 2C) e suporte para tubos de ensaio (Figura 2A).
Os kits de anticorpos reagentes apresentam em sua composição água, corante
alimentício azul ou amarelo e presença ou ausência de vinagre branco. A amostra que

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mimetiza o sangue é composta por leite integral e corante alimentício vermelho. Para
simular a reação de aglutinação entre antígeno-anticorpo, foi empregada a precipitação das
proteínas do leite (caseína) em meio ácido, cuja visualização é feita a olho nu (KALUMUCK,
2005 apud ARNOLD et al., 2012; ESQUISSATO; ARRUDA; SOARES, 2007). O protocolo
de produção dos reagentes e sangue artificial consta no Quadro 3.
Figura 2: Componentes do Kit diagnóstico do sistema ABO e do fator Rh

(A) sangue artificial; (B) anticorpos anti-D, anti-A e anti-B, respectivamente; (C) palitos, lâminas de vidro e
papel de filtro posicionado embaixo das lâminas para orientar o local onde gotejar o sangue e os anticorpos.
Fonte: as autoras.

Quadro 3: Protocolo de produção do sangue artificial e do Kit diagnóstico para tipagem


sanguínea
Reagentes Modo de preparo
Artificiais Ingredientes Proporção
Leite integral 5 mL
“Sangue" q.s.p. atingir a
Corante alimentício vermelho
coloração desejada
Vinagre 2 mL
Corante alimentício azul (“anti-A”) ou
“Anticorpo” q.s.p. atingir a
amarelo (“anti-B”) ou sem corante
reagente coloração desejada
(“anti-D”)
Água 8mL
Corante alimentício azul (“anti-A”) ou
q.s.p. atingir a
“Anticorpo” não- amarelo (“Anti-B”) ou sem corante
coloração desejada
reagente (“anti-D)
Água 10 mL
Fonte: Elaboração das Autoras

REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, out./dez. 2020


❖ Apêndice C — A chave para os Estudos de Caso

Foi elaborado um cartão-chave a fim de correlacionar determinado estudo de caso


à composição necessária dos reagentes. Por conseguinte, foi possível obter os resultados
planejados, de acordo com o tipo sanguíneo, ABO e fator Rh, a ser diagnosticado em
determinado caso clínico proposto (Quadro 4). Os alunos não tiveram acesso a este cartão.

Quadro 4: Cartão-chave: correspondência entre os casos e os Kits para tipagem


do sistema ABO e do fator Rh
CASOS SANGUE Anti-A Anti-B Anti-D RESULTADOS
1 – Reação Água + Água +
Corante Água +
Febril Não vinagre + vinagre +
vermelho + corante Sangue AB -
Hemolítica corante corante
leite amarelo
(RFNH) azul amarelo
Água + Água +
Corante Água +
2 – Doação de vinagre + vinagre +
vermelho + corante Sangue B +
Medula Óssea corante corante
leite azul
amarelo amarelo
3 – Doença Água +
Corante Água + Água +
Hemolítica do vinagre +
vermelho + corante corante Sangue O +
Recém-nascido corante
leite azul amarelo
(DHRN) amarelo
Água + Água +
Corante Água +
vinagre + vinagre +
4 – O Falso O vermelho + corante Sangue A +
corante corante
leite amarelo
azul amarelo
Fonte: Elaboração das Autoras

Referências

ARNOLD, Savittree Rochanasmita et al. The classroom-friendly ABO blood types kit: Blood
agglutination simulation. Journal of Biological Education, v. 46, n. 1, p. 45–51, 2012.

ESQUISSATO, Giovana Natiele Machado; ARRUDA, Gisele; SOARES, Maria Amélia


Menck. Modelo didático para o fator Rh. In: V ENCONTRO INTERNACIONAL DE
PRODUÇÃO CIENTÍFICA CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ, 2007, Anais do V
EPCC. Maringá/BR: CESUMAR, 2007.

REnCiMa, São Paulo, v. 11, n. 6, out./dez. 2020

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