Você está na página 1de 13

JARDINS VERTICAIS: POTENCIALIDADES PARA O AMBIENTE URBANO

Minéia Johann Scherer (UFRGS, Brasil) mineiaarq@gmail.com


Beatriz Maria Fedrizzi (UFGRS, Brasil) beatrizfedrizzi@gmail.com

Resumo: O acelerado crescimento das cidades, com intensificação do uso e


ocupação do solo, está levando a uma diminuição das áreas disponíveis para a
vegetação, sendo visíveis as perdas de qualidade ambiental. A presença de es-
paços vegetados favorece um microclima agradável e minimiza os efeitos da
ilha de calor urbana. Na escala da edificação, a vegetação pode contribuir para
o conforto térmico, reduzindo a necessidade de sistemas de climatização artifi-
cial. Os benefícios estéticos e psicológicos também representam uma impor-
tante justificativa para o aumento do verde, uma vez que o bem estar do ho-
mem está intimamente ligado ao seu contato com a natureza. Desta forma, es-
te artigo tem como objetivo discutir as potencialidades do uso dos jardins ver-
ticais como um novo suporte a ser explorado para ampliar as áreas urbanas ve-
getadas. A metodologia do trabalho está baseada em revisão bibliográfica so-
bre o tema, na qual são apresentadas diferentes tipologias de jardins verticais,
bem como, exemplos realizados utilizando uma das técnicas, as chamadas cor-
tinas verdes, a qual se destaca por também assumir a função de elemento de
proteção solar para a edificação. Os resultados demonstram o grande potencial
dos jardins verticais para a economia de energia, além dos benefícios sociais,
psicológicos e de qualificação dos ambientes de trabalho.
Palavras-chave: Jardim vertical. Cortinas verdes. Proteção solar. Conforto
térmico. Sustentabilidade.

Abstract: The rapid growth of cities, with increased use and soil occupation, is
leading to a decrease in available areas for vegetation being visible losses of
environmental quality. The presence of vegetated promotes a microclimate and
minimizes the effects of urban heat island. On the scale of the building, vegeta-
tion can contribute to thermal comfort, reducing the need for artificial climate
control systems. The aesthetic and psychological benefits are also an important
reason for the increase in green areas, considering that human is closely linked
to his contact with nature. Thus, this article aims discusses the potential use of
vertical gardens as a new support to be explored to increase vegetated urban
areas. The work methodology is based on bibliographical review about the sub-
ject, which presents different types of vertical gardens as well, examples per-
formed using one of the techniques, called green curtains, which stands out by
also assume the function of element sun protection for the building. The results
demonstrate the great potential of vertical gardens for energy savings, as well
as social, psychological and qualification of the workplace benefits.
Keywords: Vertical Garden. Green curtains. Sunscreen. Thermal comfort. Sus-
tainability.

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


49
1. Introdução

Os impactos decorrentes da urbanização acele- A vegetação contribui para a amenização do


rada estão sendo sentidos em diferentes aspec- microclima devido ao processo de evapotrans-
tos, o que leva à degradação ambiental das piração das espécies vegetais, também chama-
nossas cidades e, conseqüentemente, à dimi- do de resfriamento evaporativo: a energia do
nuição da qualidade de vida dos cidadãos. Um sol é absorvida pela planta, resultando na perda
dos pontos de maior relevância é a escassez de de calor na atmosfera e na umidificação do
áreas vegetadas no meio urbano, cada vez mais ambiente. Além disso, o sombreamento causa-
dominado por edifícios e pavimentações. do pela vegetação diminui as temperaturas
Mesmo sendo de amplo conhecimento os bene- superficiais dos pavimentos e fachadas das
fícios da vegetação para a qualificação ambien- edificações, uma vez que intercepta grande
tal e a sustentabilidade, nos deparamos com a parte da radiação solar incidente (LYLE, 1994;
intensificação de uso e ocupação do solo urba- CANTUÁRIA, 1995; DE LA TORRE, 1999;
no, desordenado e seguindo principalmente MASCARÓ: MASCARÓ, 2005).
critérios econômicos. As áreas destinadas ao Diante da constatação de que o crescimento
verde são reduzidas aos índices mínimos pre- acelerado das grandes cidades está levando a
vistos no lote e praticamente inexistem novas um esgotamento das áreas públicas disponíveis
áreas que possam ser contempladas com praças para implementação de novos parques ou áreas
ou parques. Isto, além de limitar o importante revegetadas, este artigo propõe o incentivo ao
contato do ser humano com a natureza, influ- uso dos jardins verticais, ou seja, das superfí-
encia no conforto ambiental das cidades, alte- cies verticais das edificações como novos su-
rando o seu microclima e intensificando o fe- portes para desenvolvimento do verde em nos-
nômeno da ilha de calor urbano. sas cidades.
A ilha de calor ocorre nos centros urbanos Tendo em vista as recentes técnicas para exe-
devido à grande concentração de edificações e cução dos jardins verticais e o limitado número
superfícies pavimentadas, que absorvem, retém de publicações sobre o assunto, especialmente
e refletem mais energia solar do que superfí- no Brasil, este texto tem como objetivo princi-
cies vegetadas. Deste modo, a temperatura do pal, levar ao conhecimento do leitor as diferen-
ar tende a elevar-se, modificando as condições tes tipologias de jardim vertical, discutindo
climáticas naturais do local. A presença da suas principais potencialidades para o meio
vegetação, em uma proporção compatível com urbano e para as edificações. Após, o foco é
as áreas construídas, é, portanto, uma impor- direcionado para uma tipologia específica de
tante estratégia para manutenção do conforto jardim vertical, as chamadas cortinas verdes,
térmico das cidades, além de reter partículas de que agregam importante potencial como prote-
poluição, umidificar o ambiente, reter a água ção solar para as fachadas das edificações,
da chuva e modificar a ação dos ventos. apresentando alguns exemplos bem sucedidos
Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014
50
executados com esta técnica. O estudo apro- volvimento em sua superfície de vegetação
fundado das cortinas verdes é tema de douto- auto-aderente ou com auxílio de suportes, nos
ramento do autor, no Programa de Pesquisa e quais as raízes do vegetal estão na base desta
Pós-graduação em Arquitetura da Universidade estrutura, em contato direto com o solo ou com
Federal do Rio Grande do Sul. outro tipo de substrato (DUNNETT; KINGS-
A metodologia do trabalho está baseada em BURY, 2004). A partir desta definição geral,
revisão bibliográfica, com levantamento e or- podemos classificar diferentes tipos de jardim
ganização de dados coletados sobre a temática vertical, sendo que neste trabalho vamos adotar
dos jardins verticais e das cortinas verdes. o proposto por Sharp et al. (2008) e Pérez
(2010), onde há distinção de basicamente três
2. Classificação dos Jardins Verticais
tipos: os sistemas extensivos tradicionais, as

A denominação de fachada verde, dos termos cortinas verdes e o sistema intensivo denomi-

em inglês “green wall” ou “green façade”, nado parede viva (Quadro 1).

refere-se ao revestimento de alvenarias ou


outras estruturas verticais, por meio do desen-

QUADRO 1: CLASSIFICAÇÃO DOS JARDINS VERTICAIS


Sistemas extensivos Sistemas intensivos
Fachadas verdes Fachada verde tradicional
Dupla fachada verde ou cortina verde Modular
Treliça
Com fio ou cabeada
Malha
Jardineiras perimetrias

Paredes vivas Em vasos ou cavidades


Painéis geotêxteis
Fonte: Adaptado de Pérez, 2010

A diferença dos sistemas extensivos está, basi- complexa e exige um elevado nível de manu-
camente, no plantio de espécies trepadeiras tenção posterior.
diretamente no solo ou em jardineiras, enquan-
2.1 Fachada verde tradicional
to que no sistema intensivo não há presença de
solo e as espécies, geralmente de pequeno por- Os sistemas extensivos tradicionais se caracte-
te, são fixadas em painéis especiais. Sistemas rizam pela presença de espécies trepadeiras
extensivos são, no geral, mais fáceis de cons- auto-aderentes que são capazes de se fixar
truir e demandam pouca manutenção, enquanto diretamente nas alvenarias, por meio de raízes
que o sistema intensivo tem implantação mais
Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014
51
adventícias ou gavinhas ramificadas, formando observar a posição em que será plantada a mu-
um revestimento que remete a uma pele verde da quando o objetivo é o revestimento de fa-
na edificação (Figura 1). Algumas das espécies chadas. É interessante plantá-la na região mais
mais comuns são a Parthenocissus tricuspidata sombreada, pois desta forma seu crescimento
(falsa-vinha), Hedera helix (hera-inglesa) e a naturalmente irá ser direcionado para o restante
Ficus pumila (unha-de-gato ou falsa-hera). da superfície (DUNNETT; KINGSBURY,
A maioria das espécies auto-aderentes tende a 2004).
crescer em direção à luz, portanto, é preciso

FIGURA 1: PELE VERDE DE CRESCIMENTO ESPONTÂNEO E INTEGRADO AO PROJETO AR-


QUITETÔNICO

Fonte: KÖHLER, 1993, p. 97 e UFFELEN, 2011, p. 148

(tumbérgia-azul).
2.2 Cortina verde Como já citado, a tipologia denominada corti-
na verde será exemplificada a seguir, através
Também denominada dupla fachada verde, são
de exemplos arquitetônicos materializados com
sistemas em que é necessária a instalação de
esta técnica. A particularidade mais relevante
algum tipo de suporte ao longo do qual a vege-
em relação aos outros tipos de jardim vertical é
tação trepadeira irá se desenvolver. Oss upor-
a possibilidade do elemento estar sobreposto às
tes podem variar quanto aos materiais usados,
aberturas ou regiões envidraçadas da edifica-
ao formato, a distância entre os apoios e tam-
ção, e não somente às paredes opacas. Esta é a
bém quanto ao afastamento da parede. As es-
característica dominante que vai classificar a
pécies propícias são inúmeras, dependendo de
cortina verde como elemento de proteção solar
cada região. Alguns exemplos para o sul do
em arquitetura.
Brasil são a Lonicera japônica (madressilva),
As duas principais subdivisões das cortinas
Wisteria SP (glicínia), Thunbergia grandiflora

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


52
verdes são: ou em grandes jardineiras contínuas, o que
Modular: consiste na combinação de módulos propicia um desenvolvimento maior da trepa-
metálicos prontos, com jardineira e treliça, deira. As treliças permitem maior possibilidade
fixados na fachada das edificações. Neste caso, de variação nas composições de fachada, na
a vegetação trepadeira possui uma área de utilização de diferentes materiais e na distância
substrato e de crescimento limitada, o que faci- em relação à parede para sua execução (Figura
lita a manutenção (Figura 2). 3).
Treliça: ao contrário do sistema anterior, o
plantio das espécies se dá diretamente no solo

FIGURA 2: SISTEMA MODULAR COM CONTAINERS, DA EMPRESA GSKY PLANT SYSTENS

Fonte: GSKY PLANT SYSTENS, 2012.

FIGURA 3: SISTEMA COM TRELIÇA DO EDIFICIO CONSORCIO, SANTIAGO, CHILE, E DO


EDIFÍCO EX-DUCATI, ITÁLIA

Fonte: ENRIQUE BROWNE Y ASOCIADOS, 2012 e MARIO CUCINELLA ARCHITECTS, 2012.

2.3 Parede viva fica-se como intensivo e diferencia-se dos an-


teriores por adotar módulos especiais para o
Também chamado de sistema modular, classi-
desenvolvimento das plantas, sendo constituí-

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


53
dos por painéis geotêxteis, vasos ou blocos velocidade de crescimento das plantas (Figura
com cavidades para o substrato, não havendo 5).
contato da raiz da planta com o solo na base da
3. Potencialidades do uso dos Jardins
estrutura. Comumente adotam o sistema hidro-
Verticais
pônico, onde não há substrato, somente irriga-
ção com fertilizantes solúveis. Assim como as demais formas de aplicação da
Podem utilizar uma grande variedade de espé- vegetação no meio urbano, desde a presença de
cies, geralmente samambaias, bromélias e ar- espécies arbóreas em ruas, praças ou parques,
bustos de pequeno porte, formando uma parede até a implementação de telhados verdes, uso já
com grande impacto visual, sendo muitas ve- amplamente valorizado, os jardins verticais
zes tratada como obra de arte. Atualmente podem contribuir de forma impactante na qua-
diversas empresas a nível mundial executam lificação ambiental das cidades e também no
diferentes sistemas de paredes vivas, sendo que conforto térmico das edificações, reduzindo a
a classificação pode ser subdividida em basi- necessidade de climatização artificial. Peck et
camente dois grandes grupos, conforme segue. al (2007) ressaltam que o efeito dos jardins
Vasos ou cavidades: este sistema utiliza mó- verticais pode ser superior ao obtido com te-
dulos onde, geralmente, a vegetação já está lhados verdes, principalmente no caso de edifí-
desenvolvida. Um exemplo é o sistema desen- cios com vários pavimentos. Isso porque a área
volvido pela empresa Norte Americana GSky de superfície vertical é geralmente superior e
Plant System, onde a execução é realizada com abrange todos os pavimentos e não somente a
a fixação dos módulos a uma estrutura metáli- cobertura. Desta forma, as superfícies verticais
ca anexada às paredes (Figura 4). representam um vasto território a ser explora-
Painéis geotêxteis: a técnica do botânico Pa- do, uma grande oportunidade para aumento da
trick Blanc é pioneira e consiste no plantio de massa vegetal nas cidades.
arbustos de pequeno porte e forrações ao longo Na escala da edificação, os diferentes tipos de
de uma manta geotêxtil fixada e estruturada em jardim vertical atuam na melhoria do desem-
uma grelha metálica ou de PVC, sem a presen- penho térmico das edificações, pela combina-
ça de solo. Os minerais necessários para de- ção de diversos fatores. As fachadas verdes,
senvolvimento da vegetação são oferecidos com espécies trepadeiras aderentes às paredes,
durantes as frequentes regas do sistema. Tam- por exemplo, age como um revestimento iso-
bém pode ser aplicado no interior de edifica- lante, capaz de reduzir a energia necessária,
ções, desde que exista iluminação, natural ou tanto para aquecer, como para resfriar os ambi-
artificial, suficiente. O processo de planeja- entes internos (DUNNETT; KINGSBURY,
mento do painel leva em consideração as ca- 2004).
racterísticas das espécies escolhidas, seu porte Johnston e Newton (2004) acrescentam que, ao
e coloração. Já o resultado final depende da contrário da crença popular, fachadas cobertas

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


54
com vegetação são mais secas, outro fator que até o solo, evitando a penetração até a parede,
reduz a perda de calor por condutividade. A que permanece seca.
água é absorvida pelas folhas e o excesso escoa

FIGURA 4: SISTEMA COM MÓDULOS FIXADOS EM ESTRUTURA METÁLICA, DA EMPRESA


GSKY PLANT SYSTENS

Fonte: GSKY Plant Systens, 2012

FIGURA 5: PROCESSO DE PLANEJAMENTO E EXECUÇÃO DO SISTEMA DE JARDIM VERTI-


CAL DO BOTÂNICO PATRICK BLANC

Fonte: Stylepark, 2012

A utilização das cortinas verdes, com espécies para que no inverno o sol atinja a fachada e
trepadeiras afastadas das paredes, por outro aqueça os ambientes (JOHNSTON; NEW-
lado, atua especialmente no bloqueio da radia- TON, 2004).
ção solar direta. Além disso, o processo de Sobre as espécies caducifólias, Cantuária
evapotranspiração das plantas retira calor e (1995) comenta sobre a propriedade de adapta-
umidifica o ar, realizando naturalmente sua ção às variações climáticas a curto e longo
refrigeração antes de chegar ao ambiente inter- prazo, já que, de acordo com o ângulo de inci-
no. Em regiões de clima composto, o ideal é a dência dos raios solares e a intensidade da
utilização de algumas espécies caducifólias, temperatura da primavera, as folhas são reor-

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


55
ganizadas, inclinadas ou até mesmo tem seu revestimento para projetos de edifícios ecoló-
brotamento antecipado. Dessa forma, a sombra gicos. Foi reconhecido que as fachadas verdes
adequada à edificação é fornecida também no eram relativamente fáceis de construir e um
momento adequado. programa de incentivo foi desenvolvido em
Kwok e Grondzik (2013) complementam a Berlin para seu uso. Por este motivo, até pou-
atuação das cortinas verdes com uma constata- cos anos atrás, a maioria das publicações sobre
ção surpreendente: o uso da vegetação pode ser o assunto restringia-se ao idioma alemão, o que
mais eficiente que o sombreamento realizado dificultou a difusão e o incentivo para novas
por elementos de proteção solar fixos, tendo pesquisas no resto do mundo.
em vista o comportamento da vegetação a qual Mais recentemente, a partir do ano 2000, o
acompanha melhor as variações de temperatura botânico francês Patrick Blanc revolucionou a
do que os ângulos solares. integração entre arquitetura e paisagem, desta-
Desta forma, pode antecipar sua brotação em cando-se no paisagismo atual por suas criações
um ano em que o aquecimento da primavera de jardins verticais em edificações.
começa mais cedo ou vice-versa. Da mesma Atualmente, o uso da vegetação integrada com
forma, pode perder antes ou permanecer com a fachada da edificação é considerada uma
as folhas mais tempo, dependendo da condição técnica coerente com os princípios de sustenta-
de início do outono, de maior ou menor neces- bilidade e de eficiência energética, sendo que
sidade de sombreamento. existe cada vez mais incentivo e movimentos a
Além disso, enquanto os materiais usuais utili- nível internacional que tratam deste assunto.
zados em proteções solares, como plásticos ou Grandes cidades, tais como Londres na Ingla-
metais, absorvem mais calor aquecendo o ar terra, Seattle nos Estados Unidos e Toronto no
circundante, a vegetação, ao contrário, resfria o Canadá, implantaram nos últimos anos políti-
ar pelo processo de evapotranspiração. Isto é cas de incentivo ao uso de telhados verdes,
mais uma evidência das vantagens no uso da jardins verticais e demais formas de vegetação,
vegetação como elemento de proteção solar. a fim de aumentar a superfície vegetada em
suas áreas urbanas e, assim, minimizar seu
4. Edificações com Cortinas Verdes
impacto ambiental.

Segundo Köhler (2008), o interesse científico Da mesma forma, campanhas nacionais no

pelo uso da vegetação em fachadas e em seu Japão e em Cingapura, incentivam pesquisas e

benefício ambiental é relativamente recente. aplicações dos jardins verticais como forma de

Na Alemanha, no final da década de 1970, redução no consumo energético para climati-

eclodiu um movimento para propor mudanças zação (PECK et al, 2007; SHARP et al., 2008).

nos paradigmas da arquitetura, onde o uso da Especificamente sobre a tipologia das cortinas

fachada verde era visto como alternativa de verdes, um dos exemplares mais significativos

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


56
construídos com esta técnica localiza-se no logias, a vegetação se desenvolve, cresce e
Chile e foi projetado pelo arquiteto Enrique revigora a imagem do edifício com o passar
Browne, ainda na década de 90 do século pas- dos anos (BROWNE, 2007).
sado. Outro exemplo de edificação que utiliza as
O Edifício Consorcio em Santiago possui fa- cortinas verdes é o Edifício Ex Ducati, na Itá-
chadas envidraçadas, porém protegidas do lia, projetado pelo arquiteto Mario Cucinella e
excesso de sol pelo uso da vegetação trepadei- executado em 2006.
ra, que se desenvolve em grandes floreiras e A fachada principal e as laterais são cobertas
fixa-se em suportes metálicos afastados das com uma espécie trepadeira que cresce auxili-
aberturas. Além do sombreamento, regulado ada por uma grelha de aço. Esta solução de
pela densidade da folhagem que varia segundo fachada, segundo o próprio arquiteto, cria a
as estações do ano, a vegetação promove cor- aparência de jardins verticais suspensos e re-
rentes de ar pelo “efeito chaminé” e o resfria- mete aos edifícios tradicionais cobertos com
mento da fachada (Figura 6). hera (UFFELEN, 2011).
O comportamento energético do edifício foi A vegetação cresce a partir do solo e também
avaliado por Reyes apud Browne (2007), onde em jardineiras dispostas ao longo do segundo
foi realizada uma comparação entre dois pavi- pavimento, onde forma na varanda dos escritó-
mentos do edifício: um sem a vegetação como rios um espaço permeável ao ar e à luz, além
elemento de sombreamento e outro com a cor- de permitir o contato dos ocupantes com a
tina verde. natureza (Figura 7).
O resultado mostrou que o pavimento protegi- Mais recentemente, em Cingapura, o escritório
do consome 35% menos de energia, como uma WOHA Arquitetos projetou uma edificação
redução de 25% nos custos. destinada a uma escola especializada em artes
Outro aspecto relevante da utilização da vege- visuais e performativas. O conceito adotado no
tação como componente do projeto é o efeito projeto prioriza a ventilação e luz natural em
visual interessante e as transformações que a todos os espaços, revelando os novos paradig-
fachada apresenta ao longo dos anos e das mas da arquitetura em Cingapura, voltada aos
variações sazonais. Ao contrário dos materiais preceitos do bioclimatismo e da sustentabilida-
de construção usuais, que se deterioram com o de.
tempo ou que são substituídos por novas tecno-

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


57
FIGURA 6: EDIFÍCIO CONSORCIO SANTIAGO DETALHE DAS CORTINAS VERDES E COM-
PORTAMENTO TÉRMICO DO EDIFÍCIO

Fonte: Enrique Browne y Asociados, 2012

mover o resfriamento evaporativo da ventila-


Uma das características plásticas e funcionais ção que entra nos espaços.
marcantes no projeto é a presença das cortinas Estes são apenas alguns exemplos de prédios já
verdes, em todas as fachadas do edifício (Figu- executados com a utilização das cortinas ver-
ra 8). Cingapura está incentivando a aplicação des, sendo que, a cada dia, verificam-se inúme-
dos jardins verticais na cidade e nas edifica- ros projetos em fase de estudos, em todas as
ções, como estratégia de redução no consumo regiões do planeta, o que dá uma previsão do
energético com climatização artificial. A vege- quanto sua aplicação tende a crescer nos pró-
tação atua como filtro ambiental, contra o ex- ximos anos.
cesso de luz, calor e poluentes, além de pro-
FIGURA 7: FACHADA COM VEGETAÇÃO TREPADEIRA E VARANDAS DOS ESCRITÓRIOS

Fonte: Mario Cucinella Architects, 2012

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


58
FIGURA 8: O EDIFÍCIO EM CINGAPURA E DETALHE DAS CORTINAS VERDES ATUANDO NO
SOMBREAMENTO DOS ESPAÇOS

Fonte: Archdaily, 2012

incorporadas na edificação, representam uma


5. Considerações finais
importante alternativa para a escassez de áreas

O uso da vegetação representa uma forte estra- urbanas disponíveis para parques e praças.

tégia para o futuro das cidades, já que são inú- Este é o caso dos jardins verticais, onde as

meros os benefícios proporcionados pelo au- fachadas das edificações são aproveitadas co-

mento do verde nos centros urbanos. Os bene- mo suporte para o desenvolvimento da vegeta-

fícios ambientais estão relacionados aos efeitos ção e, particularmente, das cortinas verdes que

sobre a radiação solar, purificação do ar, reten- foram exemplificadas neste trabalho.

ção de poluentes e umidificação. Este tipo de fachada verde, além de proporcio-

Os agentes combinados podem representar nar maior contato com a vegetação, representa

economia no consumo de energia para climati- uma técnica de controle da radiação solar e

zação da edificação, tornando naturalmente o amenização do microclima interno das edifica-

micro-clima mais agradável. Por outro lado, os ções, evitando o uso excessivo de climatização

benefícios sociais, estéticos e psicológicos artificial.

também representam uma importante justifica- Através dos exemplos arquitetônicos apresen-

tiva para o aumento do verde e qualificação tados, que utilizam as cortinas verdes enquanto

dos ambientes de trabalho, uma vez que o bem elemento de proteção solar e, ao mesmo tem-

estar do ser humano está intimamente ligado po, de composição arquitetônica, podemos

ao seu contato com a natureza. observar o quanto promissor pode ser a adoção

Neste contexto, novas formas de revegetação, desta estratégia natural e de baixo impacto

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


59
ambiental. Timber Press, 2004.
Ao mesmo tempo em que seu uso vem sendo ENRIQUE BROWNE Y ASOCIADOS. Disponível
gradativamente explorado a nível mundial, em <http://www.ebrowne.cl>, acesso em 18
fev. 2012.
constata-se que ainda existem poucos estudos
científicos que discutam suas potencialidades e GSKY PLANT SYSTEM. Disponível em
<http://www.g-sky.com>, acesso em 02 ago.
fragilidades, seu desempenho como elemento 2012.
de proteção solar e auxiliem os projetistas para
JOHNSTON, Jacklyn & NEWTON, John. Build-
a aplicação prática das cortinas verdes em ing Green: a guide to using plants on roofs,
walls and pavements. London, 2004.
arquitetura.
No Brasil, a utilização das cortinas verdes KÖHLER, Manfred. Fassaden-und dachbe-
grünung. Stuttgard: Ulmer, 1993.
ainda é insipiente, com poucos exemplares, a
maioria ainda em fase projetual. No âmbito KÖHLER, M. Green facades - a view back and
some visions. Urban Ecosyst, n. 11, p. 423-
científico, o cenário nacional é ainda mais 436, 2008.
defasado, o que justifica a realização de inves- KWOK, Alison G; GRONDZIK, Walter T. Ma-
tigações sobre seu uso, sobre sua aplicabilida- nual de arquitetura ecológica. Porto Ale-
gre: Bookman, 2013.
de para a realidade tecnológica, cultural e cli-
mática de nosso país. LYLE, J. T. Regenerative design for sustaina-
ble development. New York: John Wiley &
Sons, 1994.
Referências
MARIO CUCINELLA ARCHITECTS. Disponível
ARCH DAILY. Disponível em em <http://www.mcarchitects.it>, acesso em
11 mar. 2012.
<http://www.archdaily.com>, acesso em 11
mar. 2012.
MASCARÓ, L. & MASCARÓ, J. Vegetação Ur-
BROWNE, E. El Edificio “Consorcio- bana. Porto Alegre: +4 Editora, 2005.
Santiago” 14 Años Después. Santiago, 2007.
Disponível em: <http://www.ebrowne.cl>, PECK, S.; et al. Greenbacks from Green Roofs:
acesso em: 10 jul. 2010. Forging a New Industry in Canadá. In: Re-
search Highlight – Technical Series 01-101.
CANTUÁRIA, G. A. C. Microclimatic impact Ottawa: Canada Mortgage and Housing Corpo-
of vegetation on building surfaces. MA ration, 2007. Disponível em:
Dissertation – Environment and Energy Studies <http://www.cmhc-
Programme. London : A. A. School of Architec- schl.gc.ca/odpub/pdf/62665.pdf>, acesso em:
ture, 1995. 7 jan. 2012.

DE LA TORRE, J, M, O. La vegetación como PÉREZ, G. Façanes vegetades: estudi del seu


instrumento para el control microclimá- potencial com a sistema passiu d’estalvi
tico. 1999. Tese (doutorado). Programa de d’energia, en clima mediterrani continen-
Doctorado Ámbits de Recerca de la Construcció tal. Tese (doutorado). Programa de Doctorado
i l'Energía a l'Arquitectura. Universitat Politècni- Ámbits de Recerca de la Construcció i l'Energía a
ca de Catalunya, Barcelona, 1999. l'Arquitectura. Universitat Politècnica de Cata-
lunya, Barcelona, 2010.
DUNNETT, N. & KINGSBURY, N. Planting
Green Roofs and Living Walls. Portland: SHARP, R.; et al. Introduction to Green
Walls: Technology, Benefits & Design. In:

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


60
Green Roofs for Healthy Cities, 2008. Dis-
ponível em <http://www.greenroofs.net>,
acesso em 08 out. 2009.

STYLEPARK. Disponível em
<http://www.stylepark.com/en/architecture/
anatomy-of-a-green-facade/299143>, acesso em
02 ago. 2012.

UFFELEN, C. V. Façade Greenery: contempo-


rary landscaping. Ed. Braun, 2011.

Revista Latino-Americana de Inovação e Engenharia de Produção Vol. 2, n. 2. Jan./jun. 2014


61

Você também pode gostar