Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO

PROBLEMA 1 – ABERTURA: do pescoço), aspiração de boca e narinas, e

a secagem do RN.
ATENDIMENTO AO NEONATO NA SALA DE PARTO:
É necessário avaliar a FC e a respiração
Nascem no Brasil cerca de 3 milhões de
simultaneamente após os passos iniciais,
crianças por ano, das quais 98% em
com estetoscópio no precórdio por 6
hospitais. Ainda que a maioria dos recém-
segundos, multiplicando por 10 para obter os
nascidos (RN) apresente boa vitalidade, 10%
batimentos por minuto, e inspecionar o tórax
necessitam de ventilação com pressão
do RN para detectar a presença de
positiva (VPP) para deflagrar ou manter os
movimentos respiratórios regulares. Os
movimentos respiratórios, 1% precisa ser
possíveis desfechos são:
intubado ou receber massagem cardíaca, e
0,1% requer intubação, compressões e  Recém-nascido com respiração regular e
medicamentos. FC >100bpm: avaliar condições clínicas e
se possível, iniciar cuidados de rotina
Essa necessidade de intervenções para
junto à mãe;
reanimação aumenta quanto menor a idade
 Recém-nascido com FC <100bpm e/ou
gestacional ou o peso ao nascer. Além disso,
apneia/gasping: iniciar VPP no 1º minuto
nascimentos via parto cesáreo, entre 37 e 39
de vida (“golden minute”). Ao mesmo
semanas de gestação, também aumentam o
tempo, locar oxímetro no punho ou mão
risco de que seja indicada a ventilação.
direita e eletrodos do monitor cardíaco
em cada braço próximo ao ombro e na
FLUXOGRAMA DE ATENDIMENTO NA SALA DE
face anterior da coxa, sem secar a pele.
PARTO E PRINCÍPIOS D A ATENÇÃO AO RN DE
RISCO: Acompanhar a FC pelo monitor cardíaco
e a saturação de oxigênio pelo oxímetro
Para que a atenção ao RN seja realizada de
e seguir o fluxograma da reanimação
forma segura, é necessário que toda sala de
neonatal.
parto conte com equipe capacitada para
reanimação neonatal e com fonte de calor A ventilação com pressão positiva deve
radiante, material para aspiração e ocorrer com frequência de 40 a 60
ventilação, além de medicamentos. movimentos por minuto (aperta/solta/solta),
com valores de oxigênio inicialmente iguais
Imediatamente após o parto, caso alguma
aos do ambiente. Realiza-se o boletim de
das perguntas a seguir tenha resposta
Apgar no 1º e 5º minuto para avaliar a
negativa, o RN deverá ser conduzido a uma
resposta do RN às medidas de intervenção
mesa de estabilização.
realizadas.
 A gestação chegou a termo? (Conduzir à Caso a VPP ainda não consiga manter o
mesa tanto RN prematuros tardios quanto neonato com boa saturação ou já esteja
RN pós-termo) sendo realizada por longos períodos de
 O RN está respirando ou chorando? tempo, o RN tenha hérnia diafragmática ou o
 Há tônus muscular em flexão? bebê tenha indicação para massagem
cardíaca, é recomendada intubação
Em 30 segundos, os passos iniciais a serem
orotraqueal. Após intubação, inicia-se a
desenvolvidos na mesa de estabilização são
ventilação, na mesma frequência e pressões
a disponibilização de calor (temperatura
descritas para VPP.
ambiente em 23-26ºC, com portas fechadas,
secagem e remoção de campos úmidos),
reposicionamento da cabeça (leve extensão
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Está indicado a massagem cardíaca se a
frequência cardíaca for menor que 60bpm
após 30 segundos de VPP com técnica
adequada através de cânula traqueal e O2 de
60 a 100%. Aplicar a massagem cardíaca
sincronizada com VPP pela intubação, na
relação de 3 compressões para 1 ventilação
(3:1 – um e dois e três e ventila), durante 60
segundos e reavaliar a FC, seguindo o
fluxograma da reanimação.
Medicações são indicadas quando a FC se
mantém abaixo de 60bpm mesmo após
associação da ventilação por pressão
positiva (oxigênio a 100%) com massagem
cardíaca adequada. As prescrições mais
comuns são de Adrenalina, expansores
volêmicos ou ambos.
EXAME FÍSICO E ESCAL AS DE VITALIDADE DO RN:
A primeira avaliação do RN, realizada ainda
na sala de parto, tem por finalidade avaliar a
vitalidade, determinar fatores de risco e
identificar malformações congênitas,
tocotraumatismos (acidentes durante o
parto) e alterações cardiopulmonares que
possam afetar a saúde desse neonato.
O primeiro ponto analisado se dá antes do
nascimento, baseando-se numa anamnese
detalhada com dados maternos e da
gestação, como a idade da mãe, número de
gestações, abortamentos e paridades, tipos
de parto, ocorrência de consanguinidade,
realização adequada do pré-natal, histórico
de amenorreia, doenças prévias e
gestacionais, uso de medicações, drogas
ilícitas, tabaco e álcool, anestesia e
informações sobre o trabalho de parto, além
dos resultados dos exames laboratoriais,
ecografias e de monitorizações fetais. A
importância de coletar todas essas
informações está na descoberta antecipada
de situações de risco, auxiliando a equipe a
receber e assistir da melhor forma o neonato.
Logo após o nascimento, o RN sadio deve
ser colocado em contato direto (pele a pele)
com a mãe, enquanto a equipe espera que
sejam cessados os batimentos do cordão
umbilical, por 1 a 3 minutos, para fazer o
clampeamento tardo dessa estrutura (caso
esteja respirando/chorando e com tônus
muscular em flexão, do contrário, realizar
essa ligadura de forma imediata de modo a
não atrapalhar o início da VPP).
Algumas medidas devem ser realizadas para
estender o cuidado ao recém-nascido
enquanto ele está junto à mãe, como a
manutenção da nortmotermia (temperatura
corporal entre 36,5 a 37,5ºC), secando o RN
com compressas aquecidas e deixando-o
sobre a pele da mãe envolto num pano seco
e aquecido, a manutenção de vias aéreas
pérvias, com leve extensão do pescoço e
aspiração de boca e narinas (quando
necessário), a avaliação contínua de FC,
respiração e tônus do bebê, e a garantia da
amamentação na primeira hora.
O neonato deve ser mantido próximo à mãe
por uma hora, mostrando os sinais de que
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ele está pronto para a amamentação, que
deve ocorrer nesse espaço de tempo. Nesse
momento é realizado o primeiro exame físico
dessa criança, de forma rápida e objetiva,
para determinar sua vitalidade e possíveis
intervenções.
O teste mais utilizado nesse processo é a
Escala (ou Índice) de Apgar, que
compreende a avaliação de 5 sinais no
primeiro e no 5º minuto de vida, atribuindo a
cada parâmetro uma pontuação entre 0 e 2.
São avaliados a frequência cardíaca, a
respiração, o tônus muscular, a cor da pele e
a presença de reflexos. Ao somar todos os
pontos, teremos o índice de Apgar.
Apgar 8 a 10 significa que o bebê nasceu em
ótimas condições. Apgar 5 a 7 significa que
o bebê apresentou uma dificuldade/asfixia
leve. Apgar 3 a 4 traduz uma dificuldade de
grau moderado e Apgar 0 a 2 aponta uma
dificuldade de ordem grave, que pode
acarretar distúrbios metabólicos caso não
seja manejada a tempo. A presença de
mecônio enquadra-se como um agravante.
Ao avaliar o RN para desconforto
respiratório, o médico analisa o esforço e o
ritmo da respiração da criança. A presença
de dificuldade respiratória pode revelar tanto
comprometimento pulmonar (pneumotórax,
Síndrome do Desconforto Respiratório,
aspiração de mecônio) como extrapulmonar
(acidose, malformação cardíaca, hérnia
diafragmática, atresia de coanas, etc.). As
possíveis lesões obstétricas também devem
ser alvo de investigação detalhada por parte
do examinador, que busca por lesões na
pele, partes moles e vísceras, fraturas,
danos ao SNC e ao sistema nervoso
periférico.
Esse exame permite que malformações
externas de urgência sejam detectadas e
tratadas com prontidão. Além disso, a
análise dos orifícios pode auxiliar no manejo
de eventuais disfunções na alimentação e na
respiração, ao identificar atresia nas coanas,
no ânus ou no esôfago.
As alterações placentárias e no cordão
umbilical também têm papel importante para
o esclarecimento diagnóstico de diversas
possíveis complicações na saúde do RN,
como asfixia, desnutrição e infecções.
O recém-nascido ainda teve ter suas
medidas antropométricas colhidas, com a
mensuração do peso ao nascer,
comprimento e perímetros torácico e
cefálico. Esses últimos dados podem ser
anotados após o primeiro banho, mas não
devem deixar de ser comparados às curvas
de crescimento.
A estimativa da idade gestacional realizada
na sala de parto permite que o RN seja
classificado como a termo, pré-termo ou pós-
termo, auxiliando a estabelecer riscos ao
desenvolvimento imediato ou a longo prazo.
Nesse momento, essa determinação ocorre
por meio do cálculo da amenorreia (pouco
confiável) ou da data indicada na ecografia
fetal (altamente confiável se realizada até a
12ª semana). Depois de 12h do nascimento,
o recém-nascido pode ser submetido a
verificação de características somáticas e
neurológicas, apresentando margem de erro
de uma ou duas semanas.
Os dois métodos mais empregados nesse
propósito são o Método de Capurro e o
Método de Ballard, que tem como
fundamentos:
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 Método de Capurro: criado em 1978, seguida estendendo-o ao máximo
utiliza somente 5 parâmetros somáticos. através da tração das mãos, soltando-
Ao total de pontos obtidos de cada item, o. Deve-se observar o ângulo entre
soma-se 204 e divide-se por 7, obtendo braço e antebraço;
assim a idade gestacional em semanas o Ângulo poplíteo: com o RN em
(limitado a 29 semanas). São avaliadas a decúbito dorsal e a pelve apoiada na
textura da pele, a forma da orelha, superfície de exame, a perna é
formação do mamilo, tamanho da flexionada por completo sobre a coxa
glândula mamária e presença de sulcos com uma das mãos, e com a outra
plantares; mão, a perna é estendida observando-
se o ângulo obtido;
o Sinal do Xale: Com o RN em decúbito
dorsal, segura-se uma de suas mãos,
levando-a o máximo possível em
direção ao ombro do lado oposto.
Pode-se também levantar o cotovelo
sobre o corpo. A contagem de pontos
se faz segundo a localização do
cotovelo;
o Manobra calcanhar-orelha: consiste
em levar um dos calcanhares o
máximo possível em direção à cabeça
sem que a pelve se levante da mesa.
 Método de New Ballard: Ballard e Cols o Parâmetros de observação somente
propuseram, em 1991, um método de visual: pele, lanugo, superfície plantar,
avaliação neonatal no qual são utilizados desenvolvimento da glândula
6 padrões somáticos e 6 neurológicos. O mamária, olhos/orelhas e genitais
somatório dos pontos é aplicado a uma masculinos/femininos.
tabela, indicando a IG. Esse método é
simples, com execução rápida e aplicável
a todos os RN, inclusive os mais
comprometidos. Em 1993 foi modificado
para contemplar neonatos de até 20
semanas. Ele pode ser realizado até as
primeiras 96 horas de vida. Os
parâmetros avaliados são:
o Postura: observa-se a atitude dos 4
membros quando o RN se encontra em
repouso;
o Ângulo de flexão do punho: flexiona-se
a mão sobre o punho do neonato com
pressão o suficiente para gerar a maior
flexão possível. Em seguida, mede-se
o ângulo entre a eminência hipotênar e
a face anterior do braço;
o Retração do braço: flexionar ao
máximo o antebraço por 5s, em
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Descoberta a idade gestacional, é possível
correlacioná-la ao peso ao nascer (além do
sexo do bebê) para estimar o padrão de
crescimento fetal, descrito em percentis:
 Adequado para a Idade Gestacional
(AIG): peso entre os percentis 10 e 90;
 Grande para a idade gestacional (GIG):
peso acima do percentil 90;
 Pequeno para a idade gestacional (PIG):
peso abaixo do percentil 10.
A análise da localização das medidas
individuais dos RN nos gráficos utilizados
como referência permite avaliar a situação
nutricional de cada recém-nascido ao
nascimento e pode sinalizar a qualidade do
crescimento intrauterino. A monitorização do
crescimento no período extrauterino também
pode ser feita da mesma forma, e poderá
sinalizar níveis de risco nutricionais, além de
ocorrência de deficiências no
neurodesenvolvimento a médio e longo
prazo. Para tal fim, a curva de Fenton é a
mais utilizada.
Após 12 a 24 horas do nascimento, o
neonato saudável deve ser submetido a um
exame físico mais criterioso, pois essa
criança sofreu diversas alterações que
permitiram sua sobrevivência num meio que
requer independência fisiológica. São
utilizados todos os dados coletados
previamente, sendo esse um período
adequado para a análise de eventuais
parâmetros faltantes.
A respeito da investigação segmentar, os
achados comuns no RN a termo são:
 Pele: lisa, fina úmida e brilhante, rosada
ou avermelhada (de cor branca e filhos de
pais negros), com maior acúmulo de
melanina nos mamilos, nas margens do
umbigo, região periungueal (borda
inferior da unha) e na genitália;
 Cabeça: algumas deformidades
transitórias da passagem pelo canal de
parto são evidentes. O perímetro cefálico
deve ser aferido com fita métrica,
passando pela protuberância occipital e
pela região mais proeminente da fronte,
medindo pelo menos 33cm;
 Pescoço: o exame dessa região busca
por bócio, fístulas, cistos, restos de arcos
do período embrionário, torcicolo
congênito e indícios de alterações
cromossômicas (pescoço alado ou pele
redundante na nuca);
 Tórax: normalmente cilíndrico, tem
perímetro 2 cm menor que o cefálico;
 Aparelho respiratório: o RN possui
respiração costoabdominal, com FR
entre 40 e 60 irpm;
 Sistema cardiovascular: FC varia entre
120 e 160bpm, sendo possível ouvir
sopros nos primeiros dias de vida;
 Abdome:
o Inspeção: é do tipo semigloboso, com
perímetro de 2 a 3 cm menor que o
cefálico;
o Palpação: o fígado é palpável até 2
cm após o rebordo costal, sendo
também possível apalpar o baço na
primeira semana.
 Tecido subcutâneo: pregas cutâneas têm
em média 1 cm no RN a termo,
uniformemente distribuídas pelo corpo;
 Mucosas: realizado de forma mais bem-
sucedida ao longo do choro da criança,
devem ser investigadas a cor, a umidade
e a presença de lesões;
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 Musculatura: um RN normal nascido a
termo apresenta hipertonia em flexão dos
membros. Em decúbito dorsal, apresenta
os membros superiores fletidos e os
inferiores semifletidos, cabeça
lateralizada e mãos cerradas. Quanto
mais próximo do termo, maior o tônus
muscular do neonato;
 Esqueleto e membros: avaliar a presença
de deformidades ósseas, inadequações
de mobilidade e dor à palpação de todos
os ossos e articulações do RN.
 Aparelho geniturinário: a primeira diurese
pode se dar ainda na sala de parto ou nas
primeiras 48 horas. Pontos vermelhos
nas fraldas podem ser encontrados pela
presença de urato (sais comuns em urina
ácida), mas desaparecem com o tempo e
não são importantes para a clínica.
o Sexo masculino: o pênis normal do
RN mede entre 2 e 3 cm. O
examinador deve apalpar a bola
escrotal, averiguando se houve a
descida dos testículos de forma
completa;
o Sexo feminino: proeminência dos
pequenos lábios e do clitóris. Pode
ser vista secreção esbranquiçada
mais ou menos abundante.
 Sistema nervoso: necessário observar
atitude, reatividade, choro, tônus,
movimentos e reflexos.
O ALOJAMENTO CONJUNTO:
O alojamento conjunto (AC) é um sistema
hospitalar instituído pela Portaria MS/GM nº
1016, de 26 de agosto de 1993 (mas a
idealização desse sistema remonta a 1977),
no qual o recém-nascido sadio, logo após o
nascimento, permanece ao lado da mãe 24
horas por dia, no mesmo ambiente até a alta
hospitalar.
Na primeira hora após o parto, o estado de
consciência da mãe e do bebê favorece a
interação entre eles. Nesse período, o
profissional de saúde deve favorecer ao
máximo o contato íntimo, pele a pele, entre
mãe e bebê, evitando procedimentos
desnecessários ou que possam ser
postergados. A separação da mãe e do bebê
ou a sedação da mãe privam o binômio
desse momento fundamental.
O AC consiste na assistência hospitalar
simultânea à puérpera e ao RN, colocados
lado a lado no pós-parto. A mãe é estimulada
a amamentar e cuidar de sua criança tão
logo quanto possível com o objetivo principal
de proporcionar e fortalecer o vínculo mãe-
filho e favorecer o aleitamento materno.
Essa forma de alocamento tem como
principais benefícios:
 Humanização no cuidado do conjunto
mãe-bebê e de sua família;
 Manutenção da convivência contínua
entre mãe e bebê, favorecendo o
conhecimento mútuo e a pronta
satisfação de necessidades físicas e
emocionais do RN;
 Maior envolvimento de terceiros (pais e
outros membros da família) no cuidado
futuro com a criança;
 Estabelecimento de vínculo afetivo
precoce entre mãe e filho;
 Possibilidade da mãe (principalmente
quando primagesta) aprender noções e
cuidados com o recém-nascido,
aumentando sua autoconfiança;
 Promoção do aleitamento materno;
 Tranquilidade materna quanto ao cuidado
direcionado para o RN;
 Troca de experiências com mães que
dividem o mesmo quarto;
 Maior interação e construção de vínculos
entre a família e os profissionais de saúde
envolvidos no cuidado do binômio mãe-
filho;
 Redução do risco de infecção hospitalar.
Todo conjunto mãe-filho com as seguintes
características deve permanecer em AC até
a alta hospitalar, por no mínimo 48h: mãe
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livre de patologias que contraindiquem o
contato com o RN, bebês com boa vitalidade,
capacidade de sucção e controle térmico
(geralmente têm mais que 2,2kg, mais de 35
semanas de gestação e índice de Apgar
maior ou igual a seis no 5º minuto).
O atendimento ao RN no alojamento
conjunto deve ser feito na presença da mãe.
Em um primeiro contato, caso o profissional
ainda não conheça a família, deve
apresentar-se à mãe e aos familiares, se
presentes, tendo o cuidado de tratá-los pelo
nome.
BOAS PRÁTICAS PROFISSIONAIS NO ALOJAMENT O
CONJUNTO:
A equipe de saúde atuante no AC tem como
atribuições:
 Encorajar o aleitamento materno em livre
demanda;
 Não fornecer outros alimentos ou bebidas
ao RN, a menos que indicados pela
equipe médica;
 Não dar bicos artificiais (chupetas) aos
neonatos, pois isso pode causar
“confusão de bicos” e afetar o
desenvolvimento da lactação
(movimentos distintos dos lábios e língua
no processo de amamentação e ao sugar
uma chupeta);
 Orientar as mães para evitar a
amamentação cruzada (amamentar
outros RN ou deixar que seu filho seja
amamentado por outra mulher),
buscando evitar a contaminação por
patógenos capazes de ser liberados pelo
leite materno;
 Realizar visitas diárias para orientar e
assegurar a mãe quanto ao estado de
saúde do seu filho.
O profissional de saúde deve prover
atendimento humanizado e seguro às
mulheres, aos RN, aos acompanhantes, aos
familiares e aos visitantes, e ser capaz de
acolhê-los.
Acolher implica recepcionar o usuário, desde
sua chegada, responsabilizando-se
integralmente por ele, ouvindo suas queixas,
permitindo que ele expresse suas
preocupações e angústias, e dando-lhe
respostas adequadas, considerando suas
experiências.
Além de possuir os conhecimentos e
habilidades necessários, o profissional
também precisa se comunicar com
eficiência, objetivo alcançado com o auxílio
do aconselhamento (ouvir, entender, discutir
e ajudar na tomada de decisões). Essa
ferramenta requer confiança da mãe para
com o profissional, conseguida por meio da
demonstração real de interesse deste último.
Cabe também a equipe de saúde orientar a
mãe e a família quanto a aspectos
importantes do cuidado com o recém-
nascido, como:
 Amamentação: os primeiros dias são
imprescindíveis para o aleitamento bem-
sucedido, sendo importante abordar
aspectos relativos ao tempo de duração
do fornecimento de leite materno (se
possível por dois anos ou mais), o papel
da exclusividade da amamentação
durante os seis primeiros meses, a
flexibilidade do tempo de permanência
em cada mama por mamada, a
prevenção de problemas decorrentes da
amamentação, a manutenção de hábitos
maternos saudáveis, o desenvolvimento
de técnicas adequadas para a nutrição do
bebê e a capacitação na ordenha do leite
(a alta deve ser realizada com a mãe
sabendo ordenhar seu leite, pois em
diversos momentos essa habilidade pode
ser útil);
 Uso de mamadeira: deve ser
contraindicado de modo a evitar o
desmame precoce. Fornecer água e chás
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nos primeiros meses de vida também não
é recomendado, devendo o profissional
explicar que somente o leite materno já é
suficiente para satisfazer todas as
necessidades nutricionais daquele bebê;
 Uso de chupeta: deve ser
desaconselhado por interferir na duração
do aleitamento e no desenvolvimento
futuro da criança, como mudanças no
formato do palato e maior número de
infecções orais;
 Comportamento normal do recém-
nascido: deve ser fundamentalmente
enfocado no AC, pois a compreensão da
mãe e das pessoas que vão conviver com
o bebê acerca de alguns
comportamentos habituais da criança
pequena é fundamental para a
tranquilidade de todos os membros da
família, uma vez que a má interpretação
dos comportamentos fisiológicos desse
recém-nascido pode interferir
negativamente em sua saúde física e
mental. É importante enfatizar para a mãe
que cada bebê é único, respondendo de
maneiras diferentes às diversas
experiências. Comparações com filhos
anteriores ou com outras crianças devem
ser evitadas, podendo inclusive interferir
na interação entre mãe e filho;
 Interação com o bebê: o contato entre
mãe e filho nos primeiros dias de vida é
muito importante para uma relação sadia
no futuro. Deve ser abordado que essa
interação pode ser realizada sem medo
de torna-lo mais dependente, pois o
carinho e a proteção tendem a aumentar
sua confiança. Para que esses momentos
sejam melhor aproveitados, é importante
informar sobre os estágios de maior
atividade do RN (estado quieto-alerta) e
sobre suas competências. Já no
alojamento conjunto, os profissionais
devem estimular o pai da criança, quando
presente, a participar ativamente dos
cuidados com o bebê. A exemplo do
vínculo mãe-bebê, os primeiros meses de
convivência são cruciais no
estabelecimento da função paterna;
 Posição da criança dormir: a prática de
colocar o RN para dormir em decúbito
dorsal no AC e o fornecimento de
informações claras quanto a esse
posicionamento devem fazer parte da
rotina do AC, evitando complicações
futuras para esse bebê, seja por baixa
qualidade de sono ou pela morte súbita
associada à posição prona (de bruços);
 Acompanhamento da criança:
idealmente, toda criança deveria sair da
maternidade já com o agendamento de
sua primeira consulta (de preferência na
primeira semana de vida). Os
responsáveis ser orientados quanto à
importância do teste do pezinho, que
idealmente deve ser realizado entre o
terceiro e o quinto dia de vida. Se a
criança estiver internada com mais de 48
horas de vida, o teste do pezinho deve
ser colhido ainda na maternidade. A
Caderneta da Criança deve ser
preenchida pelo profissional que
acompanhou aquele RN, e os pais devem
ser estimulados a ler suas informações
iniciais;
Cabe aos profissionais de saúde identificar
as crianças que apresentam risco de
adoecimento e morte de forma precoce na
maternidade, recomendando o
acompanhamento prioritário desta nas
unidades de saúde, podendo ser empregada
busca ativa. São considerados fatores de
risco:
 Residência em área de risco;
 Baixo peso ao nascer (menor que 2,5kg);
 Prematuridade;
 Índice de Apgar menor que 5 no 5º minuto
(indica asfixia grave);
 Necessidade de internação ou
intercorrências na assistência ao RN;
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 Necessidade de orientações especiais no
momento de alta;
 Mãe adolescente;
 Mãe com baixa instrução (8 anos ou
menos de ensino formal);
 Histórico familiar de morte em crianças
menores de 5 anos.
TESTES DE TRIAGEM NE ONATAL:
O Programa Nacional de Triagem Neonatal
(PNTN) é uma ferramenta de rastreamento
populacional que tem como objetivo geral
identificar, em tempo hábil (entre 0 e 28 dias
de vida), distúrbios e doenças no recém-
nascido, garantindo tratamento
acompanhamento contínuo às pessoas com
diagnóstico positivo, de modo a reduzir a
morbimortalidade e melhorar a qualidade de
vida desses indivíduos.
A premissa do PNTN foi inicialmente
mencionada pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente ainda em 1990, definindo que
hospitais e demais serviços de atenção à
saúde da gestante, sejam eles públicos ou
particulares, são obrigados a ofertar exames
diagnósticos e terapêuticas adequadas para
as anormalidades do metabolismo do RN,
assim como orientar os pais acerca desses
acometimentos.
Em 2001, por meio de uma portaria do
Ministério da Saúde, o Programa Nacional de
Triagem Neonatal foi instituído no SUS. As
doenças que integravam o programa nesse
momento eram fenilcetonúria,
hipotireoidismo congênito, doença falciforme
e outras hemoglobinopatias e fibrose cística,
analisadas por meio do “teste do pezinho”.
Uma outra portaria, publicada em 2012,
atualizou essa lista, que passou a contar com
a triagem neonatal para hiperplasia adrenal
congênita e deficiência de biotinidase.
Outros exames foram adicionados
posteriormente à essa iniciativa, como o
teste do reflexo vermelho (“teste do olhinho”),
a oximetria de pulso (“teste do
coraçãozinho), o teste de acuidade auditiva
(“teste da orelhinha”), e o “teste da
linguinha”.
A tiragem neonatal contempla o diagnóstico
presuntivo, o diagnóstico de certeza, o
tratamento, o acompanhamento dos casos
avaliados e a associação de tecnologias para
a promoção da saúde, a prevenção de
agravos e o cuidado integral.
É responsabilidade das equipes de saúde
alocadas nas maternidades, casas de parto
ou centros de saúde indígena, alertar e
e orientar a puérpera e familiares sobre a
necessidade de realização dos testes de
triagem neonatal no ponto de coleta da
Atenção Básica adstrito à sua residência,
quando a coleta não for realizada naquele
local.
TESTE DO PEZINHO:
Esse exame de triagem neonatal utiliza
amostras de sangue do RN para detectar
anomalias metabólicas de forma precoce,
identificando casos de hipotireoidismo
congênito, fenilcetonúria, hemoglobinopatias
(ex.: anemia falciforme), fibrose cística,
hiperplasia adrenal congênita e deficiência
de biotinidase. Sua realização deve ocorrer o
mais rapidamente possível, de preferência
entre o 3º e o 5º dia de vida do bebê.
A coleta do material a ser analisado acontece
nos pontos de atendimento da Atenção
Básica em Saúde, podendo também, em
alguns estados, ocorrer nas maternidades,
casas de parto e comunidades indígenas. No
entanto, independentemente do local
escolhido para a realização da triagem
biológica, esta deve ser registrada e
informada nos sistemas do SUS.
Deve ser considerada como uma condição
de exceção toda coleta realizada após o 28º
dia de vida, mesmo que não recomendada,
por se tratar de um exame fora do período
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neonatal. As condições presentes nessa segurar o pé da criança de forma a imobilizá-
ressalva incluem a dificuldade de acesso em lo, mas mantendo a circulação no local.
aldeias indígenas e populações do campo e
da floresta, questões culturais e casos de
negligência.

Crianças que não tenham realizado o teste

no período neonatal devem ser avaliadas
pelo serviço médico para orientação e
investigação diagnóstica específica, caso
necessário. Essa busca será considerada
com a finalidade de um diagnóstico tardio e,
nessas condições, a criança detectada se
beneficiará com o acesso ao tratamento e
acompanhamento especializado e,
consequentemente, a uma melhor qualidade
de vida.
Caso os pais se recuse a realizar a coleta, o
profissional responsável deve orientá-los
acerca dos riscos atrelados a essa decisão,
e o ocorrido deve ser documentado com a
assinatura dos responsáveis.
PROCEDIMENTO DE COLETA E ENTREGA DOS
RESULTADOS:
O primeiro passo para a coleta da amostra
de cada criança consiste na lavagem das
mãos e colocação de luvas de procedimento.
O profissional deve então posicionar a
criança de modo que o calcanhar se
mantenha abaixo do nível do coração
(favorece a circulação para os pés da
criança). O acompanhante deve ficar de pé,
segurando o RN, enquanto o realizador está
sentado de frente para o bebê.
Realiza-se a assepsia do calcanhar com
algodão ou gaze embebida suavemente em
álcool 70%, massageando bem o local para
aumentar o fluxo sanguíneo (região deve
ficar avermelhada).
A punção deve ser feita com lancetas
próprias para a coleta de sangue periférico,
e o local deve ser escolhido de forma
adequada, sempre nas laterais plantares da
região do calcanhar. O profissional deve
Ao puncionar o local, deve-se aguardar a
formação de uma grande gota de sangue,
desprezada num algodão, pois pode conter
outros fluidos teciduais capazes de modificar
os resultados. Com a nova gota formada,
encostar o verso do papel filtro no pé do
bebê, movendo o primeiro em movimentos
circulares até que as áreas demarcadas para
coleta sejam preenchidas (só levantar o pé
do bebê nesse ponto. Não é necessário que
os limites do sangue coincidam com os
limites dos círculos impressos no papel-filtro.
Esse processo deve ser repetido em todos
os pontos de coleta, jamais retornando a um
círculo incompleto.
Se o fluxo de sangue for interrompido, o
profissional de saúde deve fazer uma nova
massagem na região, comprimindo-a com
algodão para remover o tampão de fibrina.
Caso ainda assim não seja possível retornar
a coleta, uma nova punção deve ser
realizada.
É necessário fazer a verificação imediata da
qualidade da amostra, colocando o papel
filtro contra a luz. Todo o círculo deverá ter
um aspecto translúcido na região molhada
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
com o sangue, que deverá estar espalhado
de forma homogênea. O RN não pode ser
dispensado até que se assegure a coleta
correta. Após o término do procedimento, a
criança deve ser deitada, e seu calcanhar é
levemente pressionado para estancar o
sangramento, podendo ser feito um curativo
no local.
Após a coleta e a verificação, as amostras
serão secas em temperatura ambiente e
enviadas para o laboratório, onde será feita
a análise. Entre a realização do exame e o
transporte não devem se passar mais do que
dois dias, porem o uso de refrigeradores
pode ser empregado em casos excepcionais
(coleta no fim de semana ou em locais
isolados).
Todos os resultados deverão ser entregues
às famílias o mais breve possível, assim que
a Unidade de Coleta os receba do
Laboratório Especializado, fisicamente ou
por meio eletrônico. Como esse momento
traz ansiedade para a família, é necessário
informar claramente a conformidade da
amostra com os parâmetros analisados,
propondo estratégias de conformação e
acompanhamento em caso de retorno
sugestivo para determinada doença.
DOENÇAS INVESTIGADAS:
FENILCETONÚRIA:
A fenilcetonúria é um dos erros inatos do
metabolismo, com padrão de herança
autossômico recessivo. O defeito metabólico
gerado, frequentemente causado pela
enzima Fenilalanina Hidroxilase, leva ao
acúmulo do aminoácido Fenilalanina (FAL)
no sangue e ao aumento da excreção
urinária de Ácido Fenilpirúvico. Foi a primeira
doença genética a ter tratamento
estabelecido com terapêutica dietética
específica.
Sem a triagem precoce e o início de
tratamento antes do 3º mês de vida, a
criança afetada pela Fenilcetonúria
apresenta quadro clínico clássico,
caracterizado por atraso global do
desenvolvimento neuropsicomotor,
deficiência mental, comportamento agitado
ou padrão autista, convulsões, alterações
eletroencefalográficas e odor característico
na urina.
Recomenda-se que a coleta seja feita
somente após 48 horas do nascimento, pois,
para que o aumento da FAL possa ser
detectado, é fundamental que a criança
tenha ingerido uma quantidade suficiente de
proteína.
O tratamento consiste basicamente em uma
dieta com baixo teor de FAL, mantendo-se os
níveis adequados desse aminoácido para
permitir o crescimento e desenvolvimento
normais do indivíduo.
HIPOTIREOIDISMO CONGÊNITO:
O Hipotireoidismo Congênito (HC) é causado
pela incapacidade da glândula tireoide do
recém-nascido em produzir quantidades
adequadas de hormônios tireoidianos, que
resulta numa redução generalizada dos
processos metabólicos.
O quadro de manifestações clínicas inclui
hipotonia muscular, dificuldades
respiratórias, cianose, icterícia prolongada,
constipação, bradicardia, anemia,
sonolência excessiva, choro rouco, hérnia
umbilical, alargamento de fontanelas, sopro
cardíaco, dificuldade na alimentação com
deficiente crescimento pôndero-estatural,
atraso na dentição, retardo na maturação
óssea, pele seca e sem elasticidade, atraso
de desenvolvimento neuropsicomotor e
retardo mental.
O tratamento da doença consiste na
reposição dos hormônios deficitários,
reposição de levotiroxina sódica, sal sódico
do isômero sintético da Tiroxina (T4). Sua
utilização produz a normalização do estado
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metabólico que se encontra deficiente no
hipotireoidismo.
DOENÇA FALCIFORME E DEMAIS
HEMOGLOBULINEMIAS:
A Doença Falciforme (DF) é uma afecção
genética com padrão de herança
autossômico recessivo, causada por um
defeito na estrutura da hemoglobina, que
leva as hemácias a assumirem forma de lua
minguante, quando expostas a determinadas
condições, como febre alta, baixa tensão de
oxigênio ou infecções. As alterações
genéticas nessa proteína (hemoglobina) são
transmitidas de geração em geração.
O paciente afetado apresenta as seguintes
alterações clínicas: anemia hemolítica,
crises vaso-oclusivas, crises de dor,
insuficiência renal progressiva, acidente
vascular cerebral, maior susceptibilidade a
infecções e sequestro esplênico. Podem
ocorrer também alterações no
desenvolvimento neurológico, com provável
etiologia vaso-oclusiva de sistema nervoso
central.
FIBROSE CÍSTICA:
A fibrose cística (FC) é uma doença
hereditária grave determinada por um padrão
de herança autossômico recessivo e afeta
principalmente os pulmões e o pâncreas, que
são obstruídos pelo aumento da viscosidade
do muco (favorece infecções respiratórias
crônicas e má nutrição). Muitas crianças com
FC não apresentam nenhum sinal ou
sintoma da doença ao nascimento. Isso pode
perdurar por semanas, meses ou mesmo
anos.
O curso clínico da doença se caracteriza por
períodos de remissão e períodos de
exacerbação, com aumento da frequência e
gravidade das exacerbações com o passar
do tempo. Sintomas mais graves e
complicações incluem a desnutrição, o
diabetes, a insuficiência hepática e a
osteoporose. No trato gênito urinário,
observa-se puberdade tardia, azoospermia
em até 95% dos homens, e infertilidade em
20% das mulheres.
O exame confirmatório dos casos suspeitos
é a dosagem de cloretos no “Teste de Suor”.
A quantidade anormal de sal nas secreções
corporais, especialmente no pulmão e no
pâncreas, leva a uma perda pelo suor, fato
que é característico da doença em bebês e
crianças maiores.
O tratamento do paciente com Fibrose
Cística consiste em acompanhamento
médico regular, suporte dietético, utilização
de enzimas pancreáticas, suplementação
vitamínica (vitaminas A, D, E, K) e
fisioterapia respiratória.
HIPERPLASIA ADRENAL CONGÊNITA:
A Hiperplasia Adrenal Congênita (HAC)
engloba um conjunto de síndromes
transmitidas de forma autossômica
recessiva, que se caracterizam por
diferentes deficiências enzimáticas na
síntese dos esteroides adrenais.
As manifestações clínicas na HAC
dependem da enzima envolvida e do grau de
deficiência enzimática (total ou parcial). A
apresentação clínica pode se expressar por
insuficiência glicocorticoide, insuficiência
mineralocorticoide, excesso de andrógenos
ou ainda por insuficiência de andrógenos.
DEFICIÊNCIA DE BIOTINIDASE:
A Deficiência de Biotinidase (DBT) é uma
doença metabólica hereditária na qual há um
defeito no metabolismo da biotina. Como
consequência, ocorre uma depleção da
biotina endógena devido a uma incapacidade
do organismo fazer a sua reciclagem ou de
usar a biotina ligada à proteína fornecida
pela dieta.
Clinicamente, manifesta-se a partir da sétima
semana de vida, com distúrbios neurológicos
e cutâneos, tais como crises epiléticas,
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hipotonia, microcefalia, atraso do
desenvolvimento neuropsicomotor, alopecia
e dermatite eczematoide. Nos pacientes com
diagnóstico tardio observam-se distúrbios
visuais, auditivos, assim como atraso motor
e de linguagem.
O tratamento medicamentoso é muito
simples, de baixo custo e consiste na
utilização de biotina em doses diárias, de
acordo com a subclassificação da deficiência
de biotina, baseada em testes quantitativos.
TESTE DO OLINHO:
O teste do olhinho, também chamado de
Teste do Reflexo Vermelho (TRV) é um
exame simples, rápido, indolor e de baixo
custo realizado em recém-nascidos, cujo
objetivo é a detecção precoce de problemas
oculares congênitos que comprometem a
transparência dos meios oculares e que
podem impedir o desenvolvimento visual
adequado.
Inicialmente esse método era utilizado para
avaliar a simetria de fixação binocular e
identificar estrabismo. A observação do
reflexo vermelho da retina indica que as
estruturas oculares internas estão
transparentes. A opacidade desses meios
pode causar leucocoria (pupila branca) ou
perda do reflexo.
A realização desse teste não deve substituir
a consulta oftalmológica a qual todo bebê
deve ser submetido em seu primeiro ano de
vida, pois ele não é suficiente para assegurar
a saúde ocular plena da criança.
O TRV é realizado com o oftalmoscópio
direto, cuja luz projetada nos olhos,
atravessa as estruturas transparentes,
atinge a retina e se reflete, causando o
aparecimento do reflexo vermelho
observado nas pupilas (semelhante ao que
ocorre em fotos tiradas com flash). Esse tom
é atribuído à vascularização da retina e do
coroide e ao epitélio pigmentado. Na
presença de opacidade dos meios oculares
no eixo visual, esse reflexo estará ausente
ou diminuído.
Durante o teste, a sala em penumbra facilita
a observação dos reflexos, não havendo a
necessidade de dilatação das pupilas com
colírios. O oftalmoscópio deve ser
posicionado a uma distância de 50 cm a um
metro dos olhos do recém-nascido (cerca de
um braço esticado). Em seguida, localizam-
se os olhos da criança através do orifício do
equipamento e iluminam-se suas pupilas.
Observa-se então, o reflexo vermelho em
cada uma delas, avaliando-se sua presença
ou ausência e na presença, comparar a
intensidade e simetria entre os olhos.
No resultado do TRV consideram-se três
respostas possíveis: reflexo presente,
ausente ou duvidoso, este último quando há
assimetria evidente ou suspeita do reflexo
alterado, sendo um resultado duvidoso até
por não se saber qual é o reflexo do olho
normal.
Reflexos vermelhos presentes e simétricos em
ambos os olhos (normal)
Leucoria no olho direito
Reflexo vermelho duvidoso por assimetria, mais
brilhante no olho esquerdo (estrábico)
Se o reflexo for ausente em um ou ambos os
olhos ou duvidoso, a criança deverá ser
encaminhada ao oftalmologista para ao
exame oftalmológico completo de modo a
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
elucidar o diagnóstico e assegurar a conduta
necessária.
As principais causas de TRV alterado são a
catarata congênita, glaucoma congênito,
retinoblastoma, leucoma, inflamações
intraoculares da retina e vítreo, retinopatia da
prematuridade (ROP) no estágio 5,
descolamento de retina, vascularização fetal
persistente e hemorragia vítrea. Também
podem alterar o reflexo vermelho produzindo
assimetria entre os olhos a presença de
estrabismo, anisometropia (erros de refração
distintos entre os olhos), altas ametropias,
luxações de cristalino e malformações como
o coloboma de polo posterior.
O teste do reflexo vermelho é realizado pelo
pediatra na maternidade, antes da alta do
recém-nascido. Embora todos tivessem que
ser submetidos ao teste, se não for possível,
deve-se realizá-lo o mais breve ainda no
primeiro mês de vida. Recomenda-se ainda
que o teste seja repetido durante as visitas
pediátricas regulares, e toda vez que se
suspeitar de alguma anomalia ocular. Filhos
de ais com doenças oculares de caráter
hereditário ou de mães acometidas por
doenças infecciosas na gestação devem
tanto realizar o “teste do olhinho” como
também ser encaminhados para avaliação
oftalmológica.
TESTE DO CORAÇÃOZINH O:
O teste do coraçãozinho, denominação
popular para o teste da oximetria de pulso,
busca averiguar a presença de cardiopatias
congênitas críticas (afetam 1 ou 2:1000 RN),
que podem evoluir rapidamente para
choque, hipóxia e óbito precoce caso não
diagnosticada precocemente.
Essas doenças podem ser causadas por
fluxo pulmonar ou sistêmico dependente do
canal arterial, ou por transposição das
grandes artérias.
Na maioria das Unidades Neonatais, a alta
hospitalar é realizada entre 36 e 48 horas de
vida, período no qual a manifestação clínica
desses acometimentos pode não ter
ocorrido, com ausculta normal.
O diagnóstico precoce é fundamental, pois
pode evitar choque, acidose, parada
cardíaca ou agravo neurológico antes do
tratamento da cardiopatia. Idealmente, esse
rastreamento seria realizado por meio de
ecocardiograma com mapeamento de fluxo
em cores, seja no período fetal ou pós-natal,
porém ele é inacessível para triagem em
amplo espectro.
No grupo dessas cardiopatias ocorre uma
mistura de sangue entre as circulações
sistêmica e pulmonar, o que acarreta uma
redução da saturação periférica de O2. Neste
sentindo, a aferição da oximetria de pulso de
forma rotineira em recém-nascidos
aparentemente saudáveis nascidos a termo
tem mostrado uma elevada sensibilidade e
especificidade para detecção precoce destas
doenças.
A oximetria deve ser aferida no membro
superior direito e em um dos membros
inferiores. Para que essa medição seja
adequada, é necessário que o recém-
nascido esteja com as extremidades
aquecidas e o monitor evidencie uma onda
de traçado homogêneo.
Os resultados esperados são a saturação
periférica maior ou igual a 95% em ambas as
medidas e diferença menor que 3% entre o
membro superior direito e membro inferior.
Caso os resultados sejam diferentes desse
padrão, o teste deve ser refeito após uma
hora. Se ainda se mantiverem deturpados, o
RN deve ser submetido a um
eletrocardiograma nas próximas 24h.
Este teste apresenta sensibilidade de 75% e
especificidade de 99%, logo não descarta a
necessidade de realização de exame físico
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
minucioso e detalhado em todo recém-
nascido, antes da alta hospitalar.
TESTE DA ORELHINHA:
A prevalência da deficiência auditiva varia de
um a seis neonatos para cada mil nascidos
vivos, número considerado elevado quando
comparado a outras doenças passíveis de
triagem na infância, como fenilcetonúria
(1:10.000), e anemia falciforme (2:10.000).
São diversos os fatores de risco para o
desenvolvimento de disfunções auditivas no
período neonatal, como infecções
congênitas, Apgar entre 0 e 4 no 1º minuto,
anomalias craniofaciais, uso de medicações
ototóxicas, permanência na UTI por mais de
5 dias e antecedentes familiares de surdez
permanente desde a infância.
A Triagem Auditiva Neonatal (TAN) tem por
finalidade a identificação de forma mais
precocemente possível da deficiência
auditiva nos neonatos e lactentes. Consiste
no teste de medidas fisiológicas e
eletrofisiológicas da audição, com o objetivo
de encaminhar os infantes para diagnóstico
dessa deficiência, e propor intervenções
adequadas à criança e sua família.
Esse teste deve ser realizado no primeiro
mês de vida do infante (preferencialmente
após 24 a 48h do nascimento),
independentemente da presença de fatores
de risco. Ele é organizado em duas etapas,
teste e reteste, ambos indolores e não
invasivos, realizados por fonoaudiólogos em
3 a 5 minutos, sendo possível aplica-lo
mesmo durante o sono da criança.
Um pequeno fone é acoplado na orelha do
RN, gerando estímulos sonoros que
mostram como o ouvido do recém-nascido
reage aos sons. Dois resultados podem ser
extraídos desse exame: se o ouvido do bebê
responder aos sinais propostos, ele
apresenta audição normal e deve iniciar a
fala em torno de 1 ano de vida e ser capaz
de construir frases simples aos 2 anos. Caso
isso não aconteça, é indicado realizar uma
nova avaliação da audição, e o bebê deve
ser enviado o para um acompanhamento que
inclui a realização de outros exames para
esclarecer se o problema é temporário ou
permanente.
TESTE DA LINGUINHA:
O teste da linguinha é um exame
padronizado que possibilita diagnosticar e
indicar o tratamento precoce das limitações
dos movimentos da língua causadas pela
anquiloglossia (língua presa) que podem
comprometer as funções exercidas pela
língua: sugar, engolir, mastigar e falar.
Esse teste deve ser realizado por um
profissional da área da saúde qualificado,
como por exemplo, o fonoaudiólogo. Ele
deve elevar a língua do bebê para verificar
se está presa, e também observar o bebê
chorando e sugando. O exame não tem
contraindicações e deve ser feito
precocemente, por volta de 48h após o
nascimento. Recomenda-se que a avaliação
do frênulo da língua seja inicialmente
realizada na maternidade. A avaliação
precoce é ideal para que os bebês sejam
diagnosticados e tratados com sucesso,
evitando maiores complicações.
Existem graus variados de língua presa, por
isso a importância de haver um teste que
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leva em consideração os aspectos
anatômicos e funcionais para fazer um
diagnóstico preciso e indicar a necessidade
da realização do “pique no frênulo lingual”.
Para posicionar adequadamente o bebê, é
solicitado que a mãe ou responsável apoie a
nuca da criança no espaço entre o braço e o
antebraço, segurando as mãos desta. Para
elevar a língua é utilizada uma manobra
específica onde são introduzidos os dedos
indicadores enluvados embaixo da língua,
pelas margens laterais, evitando abrir
demais a boca do RN. Se o escore dos sinais
observados for superior a 7, um reteste deve
ser feito após 30 dias, momento no qual será
definida a real necessidade de intervenção
cirúrgica.
ADAPTAÇÕES CARDIOPULMONARES DO RECÉM -
NASCIDO:
O sistema cardiovascular fetal é planejado
de modo a suprir as necessidades pré-natais
e a permitir modificações após o nascimento
para estabelecer a circulação neonatal.
A boa respiração do recém-nascido é
dependente das mudanças circulatórias
normais ao nascimento, que resultam na
oxigenação do sangue nos pulmões quando
cessa a corrente sanguínea vinda da
placenta. Os pulmões pré-natais não fazem
trocas gasosas e os vasos pulmonares estão
contraídos. As três estruturas vasculares
mais importantes na circulação de transição
são: o ducto venoso, o forame oval e o ducto
arterial.
CIRCULAÇÃO FETAL:
O sangue altamente oxigenado e rico em
nutrientes retorna da placenta por meio da
veia umbilical. Ao se aproximar do fígado,
cerca da metade do sangue sob alta pressão
passa diretamente para o ducto venoso (DV),
um vaso fetal que comunica a veia umbilical
com a veia cava inferior (VCI). A outra
metade do sangue da veia umbilical flui para
os sinusoides hepáticos e entra na VCI
através das veias hepáticas.
A circulação do sangue através do DV é
regulada por um esfíncter próximo à veia
umbilical. Quando o esfíncter se relaxa,
passa mais sangue por esse ducto. Quando
o esfíncter se contrai, mais sangue é
direcionado para a veia porta e sinusoides
hepáticos e menos para o DV. Embora um
esfíncter anatômico tenha sido descrito no
ducto venoso, sua presença não é
universalmente aceita. Entretanto, acredita-
se que exista um esfíncter fisiológico que
impede a sobrecarga do coração, quando o
fluxo na veia umbilical é alto, por exemplo,
durante as contrações uterinas.
Após um pequeno trajeto na VCI, o sangue
entra no átrio direito do coração. Como a VCI
contém sangue pobremente oxigenado vindo
dos membros inferiores, do abdome e da
pelve, o sangue que chega ao átrio direito
não é tão bem oxigenado quanto o que vem
da veia umbilical, mas ainda apresenta alto
teor de O2.
A maior parte do sangue da VCI é
direcionado pela borda inferior do septo
secundário, a crista dividens, através do
forame oval, para o átrio esquerdo. Nesse
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
local, ele se mistura com uma quantidade de
sangue relativamente pequena e fracamente
oxigenada que está retornando dos pulmões
pelas veias pulmonares. Os pulmões fetais
extraem oxigênio do sangue, em vez de
provê-lo. O sangue passa, então, do átrio
esquerdo para o ventrículo esquerdo e deixa,
assim, o coração através da aorta
ascendente.

As artérias para o coração, cabeça, pescoço

e membros superiores recebem sangue bem
oxigenado. A pequena quantidade de
sangue bem oxigenado da VCI que sobra no
átrio direito se mistura ao sangue pouco
oxigenado da VCS e do seio coronariano e
passa para o ventrículo direito. Esse sangue,
com um conteúdo médio de oxigênio, deixa
o coração através do tronco pulmonar. MODIFICAÇÕES PARA A CIRCULAÇÃO NEONATAL:

Ao nascer, ocorrem importantes mudanças

Cerca de 10% do sangue vai aos pulmões,
mas a maior parte dele passa através do
ducto arterial para a aorta descendente e vai
para o corpo fetal, retornando para a
placenta através das artérias umbilicais. O
DA protege os pulmões da sobrecarga
circulatória e permite que o ventrículo direito
se fortaleça em preparação para a sua total
capacidade funcional após o nascimento.
Por causa da alta resistência vascular
pulmonar na vida fetal, a circulação pulmonar
é baixa.
Somente um pequeno volume de sangue da
aorta ascendente (cerca de 10% do débito
cardíaco) entra na aorta descendente.
Aproximadamente 65% do sangue na aorta
descendente passam para as artérias
umbilicais e retornam para a placenta para a
reoxigenação. Os 35% restantes suprem as
vísceras e a parte inferior do corpo (sangue
menos oxigenado).
circulatórias quando é cessada a ação da
placenta, e os pulmões do neonato se
expandem, iniciando seu funcionamento.
Logo que o bebê nasce, o forame oval, o DA,
o DV e os vasos umbilicais não são mais
necessários. O esfíncter do DV se contrai de
tal forma que todo o sangue que entra no
fígado passa através dos sinusoides
hepáticos. O fechamento da circulação
placentária causa uma queda imediata da
pressão sanguínea na veia cava inferior e no
átrio direito.
O processo de aporte de gases pelos
pulmões está associado a queda expressiva
da resistência vascular local, ao aumento
acentuado da circulação sanguínea
pulmonar, e ao adelgaçamento progressivo
das artérias da região (decorrente do
estriamento provocado pela dilatação dos
pulmões).

Em virtude do aumento da circulação

sanguínea, a pressão no átrio esquerdo
torna-se então mais alta do que no átrio
direito, fechando o forame oval por
pressionar a sua válvula contra o septum
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
secundum. Todo o sangue do ventrículo
direito flui agora para o tronco pulmonar.
Como a resistência vascular pulmonar é
mais baixa do que a resistência vascular
sistêmica, o fluxo sanguíneo no DA se
inverte, passando da aorta para o tronco
pulmonar.
Como o ventrículo direito trabalhava mais
ativamente durante o desenvolvimento fetal,
suas paredes são mais espessas no RN,
porém essa dinâmica é alterada tão logo o
primeiro mês de vida se completa, pois agora
é o ventrículo esquerdo o mais ativo,
atrofiando a musculatura do lado menos
usado.
O DA se contrai ao nascimento, mas há
frequentemente um pequeno desvio de
sangue, utilizando essa via, da aorta para o
tronco pulmonar por 24 a 48 horas em um
bebê normal a termo. Ao final das 24 horas,
20% dos ductos estão funcionalmente
fechados, 82% em 48 horas e 100% em 96
horas. O oxigênio é o fator mais importante
no controle do fechamento do ducto arterial
em bebês a termo.
O fechamento do DA parece ser mediado
pela bradicinina, uma substância liberada
pelos pulmões durante a sua distensão
inicial. A bradicinina tem potentes efeitos
contráteis na musculatura lisa. A ação dessa
substância parece estar na dependência do
alto teor de oxigênio do sangue aórtico
resultante da aeração dos pulmões ao
nascimento. Quando a PO2 do sangue que
passa através do DA alcança
aproximadamente 50 mmHg, a parede do
ducto se contrai. Os mecanismos pelos quais
o oxigênio causa a constrição ductal não são
ainda compreendidos. Os efeitos do oxigênio
no músculo liso ductal podem ser diretos ou
mediados por seus efeitos na secreção de
prostaglandina E2 (PGE2). O fator β de
crescimento transformante P (TGF-p)
provavelmente está envolvido no
fechamento anatômico do DA após o
nascimento.
Durante a vida fetal, a abertura do DA é
controlada pelo baixo teor de oxigênio no
sangue que atravessa esse dueto e por
produção de prostaglandinas (PG)
endógenas que atuam no músculo liso de
sua parede, causando o seu relaxamento. A
hipóxia e outras influências ainda mal
definidas causam a produção local de PGE2
e prostaciclina, que mantêm o DA aberto.
As artérias umbilicais contraem-se ao
nascimento, impedindo a perda de sangue
do bebê. O cordão umbilical não é ligado por
um minuto ou mais, de modo que o fluxo
sanguíneo continua através das veias
umbilicais, transferindo o sangue fetal da
placenta para o bebê. A mudança do padrão
circulatório fetal para o padrão adulto não
ocorre repentinamente. Algumas alterações
ocorrem com a primeira respiração, outras
têm lugar após horas e dias. Durante a fase
de transição, pode haver um fluxo da direita
para a esquerda através do forame oval. O
fechamento das estruturas necessárias a
circulação fetal é, inicialmente, uma
alteração funcional. Mais tarde, o
fechamento anatômico resulta da
proliferação de tecidos epitelial e fibroso.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
DERIVAÇÕES DAS ESTRU TURAS VASCULARES arredondada, a margem da fossa oval (L.
FETAIS: limbus fossae ovalis) que marca o limite
Em virtude da alteração da circulação fetal inicial do forame oval. Há,
para a neonatal, algumas estruturas frequentemente, uma impressão em
anteriormente funcionais passam a não ser forma de lua crescente no lado esquerdo
mais necessárias. Nesse contexto, após do septo interatrial, que indica o local
alguns meses, surgem as seguintes original do forame oval;
modificações:

 Veia umbilical e ligamento redondo: a

veia umbilical permanece patente por um
período considerável após o nascimento,
podendo ser empregada para a
realização de transfusões no período
neonatal. Mesmo em adultos esse vaso
pode manter-se viável, uma vez que a
porção intra-abdominal da veia umbilical
se torna o ligamento redondo do fígado,
ligado ao ramo esquerdo da veia porta;
 Ducto Venoso e Ligamento Venoso: o DV
transforma-se no ligamento venoso, que
perpassa o fígado desde o ramo
esquerdo da veia porta até a VCI, à qual
é conectado;  Ducto Arterial e Ligamento Arterial:
 Artéria Umbilicais e Ligamentos normalmente, o fechamento funcional do
Abdominais: a maior porção do segmento DA é completado nos primeiros dias após
intra-abdominal das artérias umbilicais se o nascimento. O fechamento anatômico
torna os ligamentos umbilicais mediais, dessa estrutura e a formação do
ao passo que a região proximal destes ligamento arterial normalmente ocorrem
vasos persiste como as artérias vesicais até a 12a semana. Esse ligamento denso
superiores, que suprem a bexiga urinária; e curto vai da artéria pulmonar esquerda
ao arco da aorta, auxiliando o suporte
desse esquema vascular.

 Forame e Fossa Oval: o forame oval

geralmente se fecha fisiologicamente
com o nascimento, porém o fechamento
anatômico se dá no terceiro mês e resulta
da proliferação de tecidos e da fusão do
septum primum com a margem esquerda
do septum secundum, compondo o
assoalho da fossa oval. A borda inferior
do septum secundum forma uma prega
A ASFIXIA PERINATAL:
A asfixia perinatal refere-se a injúrias
causadas ao RN decorrentes de condições
durante a primeira e segunda etapas do
trabalho de parto que comprometem a troca
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
gasosa para o bebê, causando hipoxemia e As possíveis etiologias para hipóxia (redução
hipercapenia fetal. de oxigênio) e isquemia (restrição de fluxo
sanguíneo) podem ser múltiplas, incluindo:
Sua identificação se dá por meio da acidose
fetal, mensurada no sangue arterial do  Fatores maternos: hipertensão,
cordão umbilical. O pH sanguíneo que define hipotensão, infecções, hipóxia decorrente
a asfixia não é o principal determinante de de doenças pulmonares ou cardíacas,
lesões cerebrais, uma vez que mesmo com diabetes, doenças vasculares e
pH inferior a 7,0 a probabilidade de exposição à cocaína;
comprometimento no cérebro é baixa.  Fatores placentários: implantação
anormal (acretismo placentário),
A asfixia perinatal acomete
descolamento, infarto e fibrose da
aproximadamente 1 a 1,5% dos nascidos
placenta;
vivos em países desenvolvidos, sendo
 Ruptura uterina;
inversamente proporcional à IG e ao peso ao
 Disfunções e acidentes com o cordão
nascer. Esse quadro é responsável por cerca
umbilical (prolapso, nó verdadeiro,
de 20% dos óbitos no período neonatal,
anormalidades vasculares e
número que pode aumentar para 50% ao
compressões);
considerarem-se os natimortos. A incidência
 Fatores fetais: anemia, infecções,
mais elevada é observada em recém-
cardiomiopatia, hidropsia, insuficiência
nascidos de mães diabéticas ou toxêmicas,
naqueles com restrição do crescimento cardíaca/circulatória grave;
intrauterino, apresentação pélvica e recém-  Fatores neonatais: hipertensão
nascidos pós-termo. persistente do recém-nascido,
cardiomiopatias, doença congênita
Em recém-nascidos a termo, a asfixia pode cianótica do coração, e outras
ocorrer no período pré-parto ou durante o modalidades de choque (cardiogênico ou
parto, em decorrência diminuição das trocas séptico) neonatal.
gasosas através da placenta, o que leva a
inadequação no suprimento de oxigênio e na A respeito da fisiopatologia da asfixia
remoção de dióxido de carbono e hidrogênio perinatal e de suas complicações, alguns
(H+) do feto. Esse quadro também pode eventos comuns durante o curso do trabalho
ocorrer no período pós-parto, geralmente de parto fazem com que a maior parte dos
secundária a anormalidades pulmonares, RN apresente baixas reserva de oxigênio,
cardiovasculares ou neurológicas. como a redução do fluxo sanguíneo
placentário decorrente das contrações
Dentre os fatores que aumentam o risco de uterinas, desidratação e alcalose (resultado
desenvolvimento da asfixia perinatal da hiperventilação) materna, a consequente
incluem-se: diminuição na liberação de O2 para o feto, e
o aumento generalizado do consumo de
 Disfunções na oxigenação materna; oxigênio pelo binômio mãe-filho.
 Diminuição do fluxo sanguíneo materno
em direção à placenta; A hipóxia-isquemia causa uma série de
 Redução do fluxo placentário para o feto; modificações bioquímicas e fisiológicas, a
 Troca gasosa prejudicada, seja a nível saber:
placentário ou nos tecidos fetais;
 Em quadros de asfixia leve, há elevação
 Aumento da demanda fetal por O2;
transitória sucedida por diminuição da
FC, elevação moderada na pressão
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
arterial, crescimento na pressão venosa imediata ou tardia, promovida por
central e nenhuma alteração no débito necrose ou apoptose.
cardíaco. Essas alterações são o A morte imediata (necrose) de
acompanhadas por redistribuição do DC neurônios pode ocorrer por sobrecarga
em proporção aumentada para o osmótica de sódio e cálcio intracelular
encéfalo, coração e glândulas resultante de defeitos na bomba
suprarrenais (fenômeno denominado iônica, ou na falha da regulação de
reflexo do mergulho). Quando o grau de neurotransmissores excitatórios que
asfixia é grave, mas ainda de duração atuam na manutenção dos níveis de
breve, esses desvios não ocorrem, íons;
culminando no padrão de lesões típicas o A morte neuronal tardia (apoptose)
no núcleo subcortical e no tronco ocorre de forma secundária à ativação
encefálico; descontrolada de enzimas e segundos
 Na asfixia prolongada, pode haver perda mensageiros no interior da célula (a
na autorregulação da pressão ou na maioria deles dependente de algum
vasorreatividade ao CO2. Esse dos íons em concentração elevada),
acometimento pode levar a outras perturbação no transporte de elétrons
perturbações no fluxo sanguíneo no ciclo respiratório das mitocôndrias,
cerebral, principalmente quando há produção de radicais livres e óxido
envolvimento cardiovascular com nítrico (citotóxicos) e depleção das
hipotensão e/ou diminuição no débito reservas energéticas;
cardíaco. A diminuição no fluxo o Caso o tecido previamente isquêmico
sanguíneo cerebral resulta em sofra reperfusão, os danos causados
metabolismo anaeróbico e eventual falha podem ser ainda maiores, uma vez
energética celular, em virtude do que esse processo pode causar a
aumento na utilização de glucose pelo formação excessiva de espécies
encéfalo e queda na concentração de reativas de oxigênio, sobrecarregando
glicogênio, fosfocreatina e ATP. A asfixia os mecanismos endógenos de limpeza
prolongada normalmente resulta em e causando prejuízos aos lipídios,
lesão difusa às estruturas corticais e proteínas e ácidos nucleicos celulares,
subcorticais, com maior prejuízo para as bem como à barreia hematoencefálica.
populações neuronais particularmente Todo esse mecanismo pode causar
suscetíveis a quadros de hipóxia e um influxo de neutrófilos que, juntos à
isquemia; micróglia ativada, liberam citocinas
 As disfunções celulares se dão em inflamatórias e tóxicas.
virtude da redução da fosforilação
Sobre os possíveis desfechos em crianças
oxidativa e da produção de ATP. Esse
com asfixia perinatal, a frequência de
déficit energético afeta o funcionamento
sequelas no desenvolvimento
da bomba de íons, causando acúmulo de
neuropsicomotor na infância e de 30%.
Na+, Cl-, H2O e Ca2+ intracelular, e K+
Sobreviventes desse quadro tem risco de
extracelular, além de neurotransmissores
desenvolvimento de paralisia cerebral (PC)
excitatórios. Esses prejuízos podem
variando entre 5 a 10%, comparado a 0,2%
ocorrer durante os agravos iniciais da
na população geral. Nota-se que a maior
hipóxia-isquemia, ou se manifestarem de
parte das PC não é relacionada à asfixia, e a
forma secundária, entre 6 e 24 horas
maior parte dos casos de asfixia perinatal
após o episódio. A morte celular pode ser
não causa PC.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O prognóstico específico dependerá da
gravidade da encefalopatia desenvolvida, se
houveram ou não convulsões e dos
resultados de exames de imagem e de
eletroencefalogramas.
Os estágios clínicos de Sarnat para a
encefalopatia por hipóxia-isquemia auxiliam
o profissional de saúde a determinar as
possíveis complicações:
 Estágio 1 (encefalopatia leve): 98% a
100% dos RN terão desfecho neurológico
normal, pois os impactos ao tecido
neuronal são brandos. A mortalidade
nesse grupo é de menos de 1%;
 Estágio 2 (encefalopatia moderada) 20 a
37% dos afetados morrem ou manifestam
desenvolvimento neurológico anormal.
Exames de imagem e a avaliação da
ocorrência de convulsões podem ajudar a
refinar esse prognóstico. Esse grupo se
beneficia das medidas de hipotermia
terapêutica;
 Estágio 3 (encefalopatia grave): há maior
chance de morte, inclusive ocasionada
pela retirada de aparelhos de suporte de
vida quando houverem evidências de
lesões graves com prognóstico sombrio.
Os sobreviventes podem ter uma ou mais
deficiências graves no desenvolvimento
neurológico, como PC, deficiência
intelectual, deficiência visual ou epilepsia.
A ocorrência de convulsões aumenta o risco
de PC do recém-nascido em 50 a 70 vezes.
A mortalidade e morbidade a longo prazo são
mais elevadas para as convulsões que se
iniciam dentro de 12 horas após o
nascimento, são eletrográficas (vistas no
EEG) ou são frequentes.
ALTERAÇÕES DERMATOLÓ GICAS DO RECÉM-
NASCIDO:
A pele tem função vital no período neonatal,
pois fornece uma barreira protetora que
auxilia na prevenção de infecções, facilita a
termorregulação e ajuda a controlar a perda
hídrica insensível e o equilíbrio eletrolítico,
além de permitir a sensação tátil e a
colaborar na proteção contra toxinas.
As três camadas principais da pele são a
epiderme, a derme e a camada subcutânea.
A epiderme é a camada mais externa que
constitui a primeira linha de proteção contra
lesões. Exerce uma função de barreira
crucial, conservando calor e líquido e
conferindo proteção contra infecções e
toxinas ambientais. Seu desenvolvimento
estrutural geralmente está completo com 24
semanas de gestação, mas a função de
barreira da epiderme só se completa após o
nascimento. A maturação demora
tipicamente 2 a 4 semanas após a exposição
ao ambiente extrauterino. A epiderme
compõe-se principalmente de queratinócitos,
que amadurecem formando o estrato córneo.
A derme é composta de colágeno e fibras de
elastina que conferem elasticidade e
conectam a derme com a epiderme. Vasos
sanguíneos, nervos, glândulas sudoríparas e
folículos pilosos são outros componentes
essenciais desse estrato. A camada
subcutânea, composta por tecido conjuntivo
adiposo, confere isolamento, proteção e
armazenamento calórico.
RN prematuros apresentam menos camadas
de estrato córneo do que um indivíduo
nascido a termo, condição evidenciada pelo
aspecto rosado e translúcido da cútis desses
neonatos.
A inspeção e a avaliação diárias de todas as
superfícies cutâneas são parte essencial dos
cuidados com a pele do neonato, permitindo
diagnóstico e intervenções precoces em
caso de lesões ou outras alterações
dermatológicas. Ferramentas próprias para a
avaliação da pele podem ser empregadas,
geralmente investigando a presença de
eritema, ressecamento e feridas.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Lesões de pele encontradas no exame físico
do RN podem ser congênitas ou adquiridas
no período perinatal. Podem ainda
representar condições transitórias
(referentes à fisiologia da maturação da pele)
ou permanentes. Embora a maioria das
dermatoses neonatais compreenda
erupções momentâneas ou lesões de pele
benignas (como o eritema tóxico), podem
também ser o sintoma de infecções graves
(por exemplo, herpes simples neonatal) ou
doenças genéticas (epidermólise bolhosa).
Alguns fatores de risco para o
desenvolvimento desses quadros são a
prematuridade, o uso de equipamentos de
monitorização e fitas adesivas, a presença
de edema, a imobilidade (lesões por
pressão), o uso de medicamentos e a
exposição a dispositivos capazes de gerar
lesões térmicas.
A limpeza do RN deve ser feita com cautela,
pois esse é um momento propício para o
desenvolvimento de feridas e demais
complicações dermatológicas. O primeiro
banho deve ser dado entre 2 a 4 horas após
a internação, após a estabilização da
temperatura, de modo a evitar hipotermia. O
ambiente deve estar aquecido, e os
sabonetes devem ser suaves e não alcalino,
sem perfumes e corantes. A frequência
preferível é não mais do que 2 ou 3 banhos
por semana.
A prevalência de doenças de pele no período
neonatal varia entre 40 a 99%, dependendo
do local de realização dos estudos. Os
acometimentos mais comuns são:
 Eritema tóxico: é uma lesão cutânea
transitória comum (20 a 60% dos RN)
marcada pela erupção de pápulas,
máculas ou vesículas benignas,
assintomáticas e autolimitadas. As lesões
se iniciam entre 24 e 72 horas de vida,
sendo caracterizadas pelas lesões
supracitadas, circundadas por um halo
eritematoso de 1 a 2 cm. Ainda que seja
mais comum no tronco, pode acometer
toda a pele, com exceção de palmas e
plantas. A etiologia é desconhecida e são
sugeridos fatores ambientais, irritação
mecânica e química. Como o
desaparecimento é espontâneo é
necessário apenas assegurar a mãe
quanto a benignidade da erupção;
 Angiomas planos (nevos
telangiectásicos): são originados da
dilatação vascular superficial excessiva,
criando uma zona vermelha na pele.
Existem diversos acometimentos dentro
dessa classificação, como:
o Mancha salmão: ocorre em 50 a 70%
dos RN de pele branca, caracterizada
por manchas róseas de limite
indefinido, desaparecendo ao
pressionar o local. É mais frequente
na região occipital e na glabela,
recebendo os nomes de “bicada da
cegonha” ou “beijo dos anjos”. Sua
coloração se torna mais intensa com
o choro e o esforço, pois é causada
por imaturidade vascular. Sua
evolução é marcada por melhora
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gradativa até o desaparecimento
total, entre o 1º e o 3º ano de vida;

 Mílio/Cisto de milia: são pápulas de

aspecto perolado observadas em 50%
o Mancha vinho do Porto: é uma lesão dos RN, localizadas principalmente na
permanente decorrente de região frontal ou no mento, mas podendo
malformação dos capilares. ser encontradas em outros pontos.
Caracteriza-se por mancha de Consistem em cistos de inclusão
coloração vinhosa intensa e epidérmica, próximo a folículos
homogênea que não se altera pelo pilosebáceos, persistindo por semanas
esforço. Sua localização é frequente ou meses sem que seja necessário
na face, geralmente de forma isolada tratamento;
e unilateral, mas também podem
indicar a ocorrência de uma síndrome
extracutânea.

 Miliária: observada principalmente em

regiões de clima quente, em RN em
estado febril ou colocados em
incubadoras, pois é causada por
obstrução das glândulas sudoríparas.
 Melanose pustulosa transitória neonatal:
Devido à sua etiologia, apresenta piora
representa uma dermatose benigna e
em situações de estresse térmico e
autolimitada que acomete somente 1 a
roupas justas. Na miliária cristalina, a
4% dos RN, mais observada em crianças
obstrução é causada por detritos de
com a pele mais retinta. As lesões são
queratinócitos, formando vesículas
presentes ao nascimento, representadas
superficiais de 1 a 2 mm de diâmetro sem
por pústulas vesiculosas de poucos
eritema. Localiza-se principalmente na
milímetros que podem acometer todo o
face, cabeça, pescoço e tronco superior,
corpo, não se esquivando das regiões
manifestando-se nos primeiros dias de
palmar e plantar. Em seguida, essas
vida. Na miliária rubra, a obstrução é mais
lesões se rompem, liberando um corante
profunda, na derme, resultando em
descamativo que evolui para manchas
pequenas pápulas avermelhadas pelo
hipercrômicas, o que auxilia no
processo inflamatório. Sua aparição é
diagnóstico. Na dúvida, a coleta de
mais tardia, depois da primeira semana
material da pústula indicará a presença
de vida. Na miliária rubra (também
de acúmulo de neutrófilos e escassos
chamada de brotoeja), o nível da
eosinófilos e a cultura para bactérias será
obstrução é superficial, extracórneo.
negativa. Não requer tratamento já que a
Manifesta-se por vesículas superficiais,
melhora é espontânea, sem lesões
transparentes, de 1 a 2mm de diâmetro,
residuais;
sem atividade inflamatória ao redor,
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contendo exclusivamente suor.
Localizam-se na região cervical, nas
axilas e no tronco. O tratamento consiste
em evitar o aquecimento, utilizando
roupas adequadas ao clima;
 Bolhas de sucção: caracterizadas por
bolhas individuais ou erosões no dorso
das mãos e dedos, oriundas dos
movimentos de sucção exercidos na vida
intrauterina;
 Manchas mongólicas: frequente em toda
a população da América Latina, acomete
10% dos brancos, 40% dos latinos, 80%
dos negros e 90% dos orientais.
Caracteriza-se por manchas de
coloração marrom azulada ou arroxeada
localizadas principalmente na região
lombosacral, mas pode afetar também o
tronco e as extremidades. O tamanho
pode variar de poucos a vários
centímetros, e tende a desaparecer com
o passar dos anos. Sua causa é um
defeito na migração dos melanócitos da
crista neural para a derme durante o
desenvolvimento embrionário, causando
sua acumulação nessa última região.
Pelo caráter auto-involutivo não
necessitam de tratamento;
 Impetigo: é uma infecção bacteriana
superficial da pele muito comum e
altamente contagiosa, vista mais
frequentemente em áreas úmidas da
pele, como área das fraldas, virilha, axilas
e dobras do pescoço. Inicia-se
geralmente ao redor de 2 a 3 dias de vida,
sob a forma de lesões superficiais
vesiculares, pustulosas ou bolhosas,
sobre base eritematosa, que se rompem
facilmente, formando crostas. A
incidência de impetigo nas unidades de
cuidados neonatais é um excelente
indicador da qualidade da prevenção de
infecções de uma maneira geral. O
tratamento será tópico ou sistêmico
dependendo do estado clínico do RN.
Considerando-se que os agentes
etiológicos mais frequentes, recomenda-
se o uso de unguento ou creme de
mupirocina a 2% nas lesões. Deve-se
evitar o contato do medicamento com os
olhos;
 Verniz caseoso: o feto é revestido por
uma película de gordura protetora no
terceiro trimestre de gestação,
protegendo o concepto contra a abrasão
do líquido amniótico, permitindo o
desenvolvimento adequado da pele. Ao
nascimento, fica evidente a presença
dessa camada, branca e graxenta, que
facilita a passagem pelo canal do parto.
O verniz confere ainda um sistema de
defesa poderoso, além de conferir
barreira mecânica contra bactérias. Isso
ocorre pois algumas das suas proteínas
constituintes são peptídeos
antimicrobianos e citocinas (Il-1a, IL-1b e
IL-6). A quantidade e distribuição corporal
dessa substância varia com a IG, a via de
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
parto, a raça e o contato com mecônio. O
verniz representa uma importante ajuda
para a transição entre o meio
extremamente hidratado e de alta
pressão hidrostática do útero, para o
meio extrauterino, que é seco e de baixa
pressão. O ressecamento lento do estrato
córneo é necessário para a proteólise da
filagrina e produção do fator de
hidratação natural. Nesse contexto, o
verniz caseoso não deve ser removido
nas primeiras horas de vida (exceto se
houver risco de transmissão de doenças
maternas), aguardando o momento do
banho.
A ICTERÍCIA NEONAATA L:
A icterícia é um dos problemas neonatais
mais comuns, secundária a níveis de
bilirrubina indireta (BI) superiores a 1,5mg/dL
ou de bilirrubina direta (BD) maior que
1,5mg/dL, desde que esta represente mais
que 10% do valor de bilirrubina total (BT). A
coloração amarelada da pele, principal
indício clínico desse acometimento, torna-se
presente quando os níveis sanguíneos desse
pigmento se mantêm entre e 5 a 7 mg/dL.
A icterícia pode estar presente ao
nascimento ou aparecer em qualquer
momento do período neonatal, dependendo
da etiologia. Ela geralmente fica visível em
progressão cefalocaudal, com início na face
e avanço para o abdome e depois até os pés,
à medida que os níveis séricos aumentam. A
pressão sobre a pele pode revelar a
progressão anatômica do quadro.
A bilirrubina é formada a partir do
metabolismo do heme pigmento, resultante
da remoção de hemácias envelhecidas e do
catabolismo da mioglobina, proteínas e
enzimas hepáticos. Esse pigmento, sob ação
da enzima heme oxigenase, produz uma
molécula de CO excretada pelos pulmões,
uma molécula de biliverdina e uma molécula
de ferro incorporada às reservas do
organismo.
A biliverdina, já no sistema retículo-
endotelial, sofre a ação da biliverdina
redutase e se transforma em bilirrubina
nativa (IX Bilirrubina), que por sua vez se liga
à albumina plasmática. O conjunto
bilirrubina-albumina atinge o fígado, sendo
que apenas a bilirrubina atravessa a
membrana dos hepatócitos ligando-se a uma
proteína denominada ligandina. No retículo
endoplasmático liso do hepatócito a
bilirrubina é conjugada com o ácido
glicurônico pela ação da enzima UDP-
glicuronil-transferase, em 2 passos,
formando primeiro monoglicuronato, depois
diglicuronato, que é a forma predominante.
Esse processo torna a bilirrubina conjugada
e hidrossolúvel, podendo ser excretada para
os canalículos biliares. Através das vias
biliares, atinge a luz intestinal e, sob a ação
das bactérias da flora local, é transformada
em urobilinogênio, o qual ou é reabsorvido e
excretado pelas vias urinárias ou é
transformado em estercobilinogênio e
eliminado pelas fezes. Uma pequena parcela
dos glucurônides de bilirrubina que atingem
a luz intestinal pode ser hidrolisada e retorna
à forma de bilirrubina nativa e ácido
glucurônico. Essa bilirrubina, novamente não
conjugada, atravessa a mucosa intestinal e
retorna à circulação, constituindo-se no
chamado ciclo entero-hepático.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
circulação e permitindo o acesso à
placenta.

Com o nascimento, esses fatores são

normalizados, pois a pressão de oxigênio
aumenta gradualmente, reduzindo a
necessidade de novas hemácias e a
produção de bilirrubina, o aumento da ação
das transferases de conjugação da
bilirrubina, e a redução da -glucuronidase
Na prática, 98% dos RN apresentam níveis por colonização intestinal, promovendo a
séricos de bilirrubina total acima de 1 mg/dL normalização da excreção dessa substância.
durante a primeira semana de vida, sendo
que cerca de dois terços ou mais As causas de hiperbilirrubinemia indireta
desenvolvem icterícia com valores podem ser devidas à sobrecarga de
superiores a 5 mg/dL. Estudos realizados bilirrubina ao hepatócito ou as decorrentes
pela Universidade Johns-Hopkins da conjugação hepática deficiente.
observaram que os valores de BT não
 Sobrecarga de bilirrubina no hepatócito:
ultrapassam o platô de 13mg/dl, que passou
decorre da produção e da circulação
a ser considerado fisiológico. Os principais
êntero-hepática aumentadas de
motivos atrelados a esse aumento são:
bilirrubina indireta.
 Aumento da massa eritrocitária fetal com o Doenças hemolíticas podem ser os
meia vida de 45-90 dias (menor que no agentes causadores da
adulto): como o feto vive em um ambiente hiperbilirrubinemia neonatal, pois a
onde a pressão parcial de oxigênio para hemólise acentuada promove maior
saturar seus eritrócitos é bastante baixa, produção de bilirrubina. Nesse
ele consegue um transporte adequado contexto, os acometimentos podem
desse gás, aumentando sua massa de ser hereditários, autoimunes
eritrócitos. Assim ocorre um aumento de (incompatibilidade de grupo
hemoglobina a ser transformada em sanguíneo ou fator Rh) ou adquiridas
biliverdina nos primeiros dias de vida, (infecções bacterianas e virais);
atingindo níveis 2 a 2,5 vezes maiores o Coleções sanguíneas
que os de um indivíduo adulto; extravasculares também favorecem o
 Baixa atividade das glucoronosil- acúmulo de bilirrubina, presente
transferases: essas enzimas são principalmente em hemorragias
importantes para que a bilirrubina intracranianas, pulmonares,
produzida pelo feto não seja conjugada, gastrointestinais, equimoses e
podendo assim ser excretada pela hematomas;
membrana placentária (a conjugação e o Policitemia (baixa concentração de
consequente hidrossolubilidade dificulta diversas células sanguíneas)
esse transporte); também está associada à ocorrência
 Aumento da atividade da - de maior produção de bilirrubina;
glucuronidase intestinal (10x maior que o O aumento da circulação
no adulto): permite que a bilirrubina seja enteroepática de bilirrubina está
desconjugada no feto, adentrando a associado a anomalias no TGI como
obstruções e estenose hipertrófica do
piloro, a jejum oral (ou baixa oferta
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
enteral), além da oferta inadequada sanguínea de glicose-6-fosfato
de leite materno. desidrogenase.
 Deficiência ou inibição da conjugação de
bilirrubina: nessa categoria, o destaque é
para a síndrome da icterícia pelo leite
materno, definida como a persistência da
icterícia fisiológica para além da primeira
semana de vida, ocorrendo em até 1/3
dos RN amamentados com leite materno.
A icterícia do leite materno deve ser
distinguida da icterícia do aleitamento,
relacionada a baixo aporte de leite, que
ocorre nos primeiros 7 dias de vida,
resultando em perda excessiva de
líquidos e peso. Geralmente recém-
nascidos com icterícia causada pelo leite Mesmo com a realização desses exames,
materno apresentam bom estado geral, 50% dos casos não terão sua etiologia
bom ganho de peso, função hepática estabelecida, mas a precocidade diagnóstica
normal e não há evidência de hemólise. pode ajudar a diminuir as complicações
Mesmo que a icterícia seja atribuída a decorrentes de doenças hemolíticas graves.
esse fator (após o descarte de outras
Uma das formas de avaliar a progressão da
possíveis causas), não é recomendada a
icterícia por hiperbilirrubinemia indireta é
suspensão rotineira do fornecimento
pelas zonas de Kramer:
desse composto, exceto quando os níveis
de bilirrubina total estiverem próximos  Zona 1: icterícia somente na face,
aos limites para indicação de associada a valores de BI menores que
exsanguíneotransfusão. 5mg/dL;
 Zona 2: icterícia desde a cabeça até a
cicatriz umbilical, com valores de BI entre
5 e 12mg/dL;
 Zona 3: icterícia até os joelhos e
cotovelos, podendo apresentar valores
de 8 a 16mg/dL;
 Zona 4: icterícia em pernas e braços,
correspondendo a valores de 10 a 18
mg/dL;
Para a elucidação diagnóstica do quadro de  Zona 5: icterícia em planta de pés e
hiperbilirrubinemia, devem ser obtidos os palma das mãos, indicando valores acima
valores de bilirrubina total e suas frações de 15 mg/dL.
direta e indireta, hemoglobina, hematócrito e
morfologia de hemácias, tipagem sanguínea
e fator Rh da mãe e do bebê, teste de
Coombs direto (no sangue do cordão
umbilical) ou indireto, realização do teste do
pezinho (hormônios tireoidianos) e dosagem
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Essa ampla variabilidade de valores
encontrada em cada zona demonstra que
não existe boa concordância entre a
avaliação clínica da icterícia e os valores de
bilirrubina sérica. A visualização da icterícia
depende, além da experiência do
profissional, da pigmentação da pele do RN
e da luminosidade, fatores que podem
subestimar ou prejudicar a análise de uma
forma geral.
O tratamento dessa condição pode ser
realizado por exsanguineotransfusão
(primeira terapêutica desenvolvida com
sucesso), que permite a remoção de
hemácias ligadas a anticorpos, repondo-as
por outras, livres, substitui a albumina
neonatal pela proteína adulta, mais afim à
bilirrubina e promove rápida redução dos
níveis plasmáticos dessa substância, mas
apresenta elevada morbidade, ou por
fototerapia, capaz de degradar a bilirrubina
em produtos incolores e não tóxicos,
excretados na urina, ou de isomerizá-la para
facilitar sua solubilidade em água e permitir a
excreção pelas vias biliares.
A eficácia da fototerapia é influenciada por
três características: o comprimento de onda
da energia emitida que deve estar na faixa
entre 425 e 475 nm, na qual a bilirrubina é
absorvida; a irradiância, isto é, a energia
emitida pela fonte. Sabe-se que, quanto
maior a área irradiada, melhores serão os
resultados.
A consequência mais importante da
hiperbilirrubinemia é a encefalopatia
bilirrubínica (kernicterus). Apresenta uma
fase mais aguda com letargia, hipotonia e
sucção débil. Evolui para hipertonia com
hipertermia e choro agudo de alta
intensidade. A hipertonia manifesta-se com
retroarqueamento do pescoço e do tronco,
progredindo para apneia, coma, convulsões
e morte. A encefalopatia bilirrubínica na fase
aguda em RN a termo pode, ocasionalmente,
ser reversível, desde que haja intervenção
terapêutica imediata e agressiva.
PROBLEMA 1 – INTERMEDIÁRIA:
PRINCÍPIOS DA PUERIC ULTURA:
A puericultura refere-se ao fornecimento de
cuidados à criança, tendo como pilares a
prevenção e a educação em saúde, o que
justifica sua classificação como “pediatria
preventiva”.
Outro dos enfoques principais dessa
modalidade de atenção é a abordagem de
doenças do adulto com raízes na infância, e,
portanto, preveníveis nesse período. Um
exemplo dessa correlação é o baixo peso ao
nascer como fator de risco para o
desenvolvimento de doenças
cardiovasculares, diabetes e obesidade.
A efetivação da puericultura se dá por meio
do acompanhamento periódico e sistemático
da criança, avaliando seu crescimento e
desenvolvimento, verificando o calendário de
vacinação, fornecendo orientações aos
responsáveis acerca do aleitamento materno
e alimentação durante o desmame, da
prevenção de acidentes, e da importância da
higiene pessoal e ambiental, além de
identificar precocemente os agravos para
que possam ser implementadas
intervenções eficazes e apropriadas. Nesse
sentido, tal atividade requer a atuação de
toda a equipe de saúde que assiste o infante
e sua família, analisando seu contexto
biopsicossocial por meio da consulta de
enfermagem, consulta médica, consulta
odontológica, grupos educativos e visitas
domiciliares presentes no contexto da
Atenção Básica.
De forma a garantir a extensão da cobertura
do atendimento infantil na rede básica de
saúde e assegurar o aumento da capacidade
resolutiva desses serviços, desde 1984 o
Ministério de Saúde prioriza cinco ações
básicas em saúde importantes para a
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
redução da morbimortalidade infantil:
acompanhamento do crescimento e de conhecer e monitorar o estado geral da
desenvolvimento infantil, promoção do
aleitamento materno e orientação alimentar
para o desmame, prevenção e controle das
doenças diarreicas, prevenção e controle
das infecções respiratórias agudas, e
imunização.
A primeira avaliação da criança é realizada
pelo pediatra idealmente ainda na sala de
parto, devendo ocorrer até a alta hospitalar.
A partir daí preconiza-se que o infante seja
avaliado na primeira de semana de vida e
seja acompanhado na Atenção Básica nas
UBS com retornos, no 1º mês, 2º mês, 4º
mês, 6º mês, 9º mês e 12º mês, além de
duas consultas no 2º ano de vida (no 18º e
no 24º mês) e, a partir do 2º ano de vida, com
consultas anuais, próximas ao mês do
aniversário, até que sejam completos 5 anos
de idade (esse período é o que apresenta
maior velocidade de crescimento,
justificando o monitoramento constante).
Nas consultas periódicas, a equipe de saúde
observa a criança, indaga aos pais sobre as
atividades do filho, reações frente a
estímulos e realiza o exame clínico. Quanto
mais nova a criança, mais frágil e vulnerável,
daí a necessidade de consultas mais
frequentes.
Idealmente, a primeira consulta deve ser realizada
ainda na primeira semana de vida, momento no qual
são avaliados o andamento do aleitamento materno
e o crescimento
O crescimento é um dos indicadores mais
importantes da saúde infantil, sendo
considerado um pré-requisito para qualquer
estratégia de promoção da saúde nessa
faixa etária, sendo sua avaliação uma forma
saúde de uma criança e o desenvolvimento
socioeconômico e de saúde da comunidade
onde ela vive.
De modo geral, pode-se dizer que o
crescimento do ser humano é um processo
dinâmico e contínuo que ocorre desde a
concepção até o final da vida, considerando
os fenômenos de substituição e regeneração
de tecidos e órgãos.
Na avaliação do crescimento infantil, devem-
se considerar as medidas antropométricas e
a evolução de certas estruturas físicas
conhecidas como indicadores do
crescimento, sendo os mais comuns o peso,
a estatura (dois parâmetros básicos e
essenciais de avaliação na puericultura), os
perímetros cefálico, torácico e braquial, a
erupção dentária, o fechamento das
fontanelas e suturas e, eventualmente, a
idade óssea da criança.
Sobre os dados antropométricos, é
importante ressaltar que a variação do peso
em relação à idade é mais rápida que a da
altura, refletindo de forma quase imediata
quaisquer alterações no estado de saúde da
criança, mesmo que por processos agudos.
O acompanhamento do perímetro cefálico
deve ser feito principalmente nas crianças de
zero a 24 meses de idade, período de maior
crescimento pós-natal da cabeça e do
cérebro. Com essa medida em mãos, deve
ser realizada a evolução do fechamento das
fontanelas e suturas cranianas. A fontanela
anterior ou bregmática deve se fechar entre
9 e 18 meses. A fontanela posterior ou
lambdoide costuma fechar entre um e dois
meses de idade. O fechamento precoce da
fontanela (craniossinostose) pode ocasionar
comprometimento do crescimento cerebral.
O desenvolvimento infantil contempla a
interação do indivíduo com o ambiente que o
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
cerca, sofrendo influência de diversos
fatores, que podem ser divididos em
intrínsecos (aspectos neuroendócrinos e
genéticos) e ambientais (pré-natais e pós-
natais), gerando uma transformação
complexa, dinâmica e permanente que inclui,
para além do crescimento físico, o
aprendizado e os aspectos psíquicos e
sociais.
A avaliação do desenvolvimento da criança
será sempre mediada por outras pessoas,
sejam familiares, profissionais da educação
ou da saúde. A interação com a sua rede
social de proteção assegura a sobrevivência
e molda seu relacionamento com o mundo.
Nas relações com adultos, o infante assimila
habilidades como sentar, andar, falar e
controlar os esfíncteres. Durante os 2
primeiros anos de vida, um aspecto
importante reside no desenvolvimento
afetivo, caracterizado pelo apego.
Uma segunda interpretação desse
parâmetro reside no caráter qualitativo, que
compreende o aprendizado e a busca pela
independência, sendo um processo
contínuo, que também deve ser incorporado
à Caderneta da Criança.
Aspectos essenciais que devem ser avaliados nas
consultas de puericultura nos diferentes grupos
etários
As consultas com enfoque na criança devem
acontecer desde a 32ª semana de gestação
de modo a esclarecer dúvidas da família
sobre os cuidados com o infante. Já na
maternidade, as mães devem ser orientadas
sobre os “sinais de alerta do bebê”, que,
quando identificados, significam
necessidade imediata de atendimento
médico. Estes sinais são:
 Choro franco, sonolência e dificuldade
para despertar (principalmente quando
isso surge subitamente);
 Dificuldade para respirar ou presença de
gemidos, ainda mais relevante se durante
o aleitamento;
 Alteração na cor de mãos e pés (palidez,
cianose, icterícia);
 Aceitação reduzida de leite materno;
 Vômito em grande quantidade,
acompanhados ou não por febre e
diarreia;
 Aumento no número de evacuações ou
presença de fezes líquidas ou com
sangue, especialmente quando
acompanhadas por vômito, febre e/ou
recusa alimentar;
 Distensão abdominal;
 Ausência de diurese nas últimas 12h;
 Urina escurecida e de odor forte;
 Icterícia estendida para braços, pernas
ou região abaixo do umbigo;
 Umbigo avermelhado ou com mau cheiro;
 Temperatura corporal inferior a 35,5ºC ou
maior que 37,8ºC (bebês de até 3 meses
de idade apresentam problemas para
regular sua temperatura corporal, então
podem se mostrar febris quando muito
agasalhados em climas quentes);
 Convulsões.
Há, na Atenção Primária à Saúde, uma forte
preocupação com a primeira semana de vida
da criança. Espera-se garantir a visita
domiciliar do agente de saúde ao binômio
mãe e filho no contexto da família, para
orientação de todos sobre o cuidado de
ambos, bem como para ofertar as ações
programadas para a primeira semana na
Unidade de Saúde, se possível
oportunizando tudo para a mesma data
(consulta para o bebê e para a puérpera),
estimulando a presença do pai ou outro
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
familiar próximo sempre que possível, que as doenças triadas apresentam
fornecendo apoio ao aleitamento materno, e gravidade elevada e podem impactar na
promovendo imunizações e a coleta de qualidade e expectativa de vida dos
sangue para o teste do pezinho, caso não indivíduos acometidos, que se beneficiariam
tenha sido colhido na maternidade. Depois do tratamento após diagnóstico precoce
disso, até a criança completar 2 anos de
idade, o objetivo é um acompanhamento
cuidadoso do crescimento e
desenvolvimento desse indivíduo pela
equipe de saúde (inclusive com busca ativa
dos faltosos), com um olhar biopsicossocial
não só para o infante, mas também para as
condições do contexto de saúde e da vida de
sua mãe e da família.

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRIAGEM

BIOLÓGICA NEONATAL ( TESTE DO PEZINHO):

O teste do pezinho básico é de realização

gratuita e obrigatória pelo SUS em todo o
Brasil, identificando fenilcetonúria,
hipotireoidismo congênito, fibrose cística,
anemia falciforme e demais
hemoglobinopatias, hiperplasia adrenal
congênita e deficiência de biotinidase.

Testes ampliados são oferecidos no sistema

particular de saúde, podendo identificar
outros agravos que não são cobertos pelo
teste comum ao empregar o método de
espectrometria de massas na análise da
amostra (verifica todos os aminoácidos),
tendo como exemplos a deficiência da
glicose-6-fosfato-desidrogenase (afeta o
metabolismo de glicose), galactosemia
(incapacidade de metabolizar a galactose em
glicose), leucinose (disfunção no
metabolismo de aminoácidos),
toxoplasmose congênita, e demais distúrbios
de evolução sombria. Esses exames
geralmente dividem-se em dois subtipos, um
que avalia 10 acometimentos, e outro que
consegue identificar 50.
Existem ações judiciais e pleitos em
tramitação que solicitam a inclusão do
método de análise ampliado ao exame
ofertado pelo SUS, se baseando no fato de
A VIGILÂNCIA DO CRES CIMENTO INFANTIL:
O acompanhamento do crescimento e
desenvolvimento de saúde da criança é o
eixo estruturante das linhas de cuidado da
atenção integral à saúde da criança (0 a 10
anos) e possibilita a identificação de
necessidades especiais abordadas em
momento oportuno, devendo ser valorizada
pela equipe de saúde através do registro
sistemático de informações relevantes a
cada atendimento na Caderneta de Saúde
da Criança (dividida entre meninos e
meninas), compartilhando esse
acompanhamento com a família. Em um
período curto de tempo, ocorreram
mudanças consecutivas na caderneta da
criança, ocasionando a presença paralela de
diversos modelos na rotina das unidades,
com múltiplos escores e parâmetros de
avaliação.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
São utilizados o score z (unidades de desvio
padrão acima ou abaixo da média
populacional) ou o percentil (escala em
ordem percentual de adequação a uma
característica, numa amostra geral de 100
indivíduos) para quantificar e representar
graficamente, nas curvas de crescimento, os
dados antropométricos coletados
(estatura/comprimento, peso e IMC),
utilizando-se as referências. A cada consulta
a equipe de saúde deverá anotar os dados
de perímetro cefálico (até o 2º ano de vida),
peso e comprimento nos respectivos gráficos
para acompanhar o grau de crescimento da
criança e avaliar o desenvolvimento
nutricional desta.
Curva de crescimento Altura x Idade para meninos
de 0 a 5 anos, em percentil (limites extremos: 3 e
97%)
Curva de crescimento Peso x Idade para meninos de
0 a 5 anos, em score Z (pontos de corte extremo: -3
e 3)
VIGILÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO INFLANTIL:
Na puericultura, o profissional de saúde deve
avaliar a performance da criança em relação
a marcos importantes do desenvolvimento,
logo a família deve ser orientada a promover
estímulos em todos os aspectos do
desenvolvimento (sensorial, perceptivo,
motor e emocional), principalmente durante
o primeiro ano de vida.
As avaliações do desenvolvimento infantil
devem sempre levar em consideração as
informações e opiniões dos pais e da escola
sobre a criança. Cabe à equipe profissional
ouvir, informar e discutir assuntos que dizem
respeito às habilidades desenvolvidas e à
maneira como a criança as explora,
relacionando-as aos riscos de lesões não
intencionais e às medidas para a sua
prevenção.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A criança deve atravessar cada estágio
segundo uma sequência regular. Se o infante
não for estimulado ou motivado no devido
momento, ele não conseguirá superar o
atraso do seu desenvolvimento, uma vez que
o desenvolvimento infantil se dá à medida
que a criança vai crescendo e vai se
desenvolvendo de acordo com os meios
onde vive e os estímulos deles recebido.
Ao observar incongruências quanto ao
desenvolvimento da criança, o profissional
poderá encaminhá-la para a realização de
exames complementares que fundamentem
o diagnóstico de distúrbios
desenvolvimento, excluindo doenças
associadas como toxoplasmose
hipotireoidismo congênito, sendo possível
iniciar métodos terapêuticos adequados ao
contexto individual, seja por meio da
interação entre pais-criança (se há falta de
estímulo) ou atividades em terapia
ocupacional (redirecionar o foco da
estimulação). A Caderneta de Saúde da
Criança apresenta informações que auxiliam
a família no momento da tomada de
decisões, abordando aspectos importantes
acerca do Transtorno do Espectro Autista e
da Síndrome de Down.
A CÓLICA NO LACTENTE – ETIOLOGIA E
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
O termo “cólica” se refere à dor abdominal
aguda e espasmódica, que pode ocorrer em
qualquer indivíduo, independentemente de
sua faixa etária. A cólica do lactente, por sua
vez, é mais bem definida como ataques
paroxísticos (súbitos) de choro forte, agudo,
estridente, inexplicável e inconsolável
(medidas de conforto comuns não surtem
efeito), geralmente ao anoitecer (19-23
horas), típicos do primeiro trimestre de vida.
Quando acometido por esse quadro, o bebê
fica inquieto e avermelhado, virando a
cabeça para os lados, fechando os punhos e
fletindo as coxas sobre o abdômen. Por
vezes ocorre a eliminação de gases, que
trazem certo grau de alívio momentâneo.
Com pequenos intervalos, o choro pode
persistir por horas, o que acarreta estresse
aos pais, que sentem-se incapazes e
frustrados por não conseguir solucionar o
incômodo.
O método clínico mais aceito para chegar ao
diagnóstico de cólica (que é realizado por
exclusão, uma vez que o exame físico é
normal e não há causa identificável via
exames complementares) é o da “regra dos
de
3” proposta por Weasel: verifica-se se os
episódios de agitação e choro se mantém por
e pelo menos três horas por dia, mais de três
dias na semana e em ao menos três
semanas em crianças previamente
saudáveis.
A cólica do lactente é uma condição
transitória, sem risco de mortalidade
associada e que não afeta o crescimento da
criança, mas pode alterar o desenvolvimento
desta por meio do reflexo negativo que as
crises provocam na relação do bebê com
seus pais, ou deixar sequelas emocionais,
levando ao surgimento de transtornos
somáticos no lactente.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O choro é, de todos os padrões de
comportamento pré-verbais, o que mais
chama a atenção dos pais, sendo comum a
tentativa de identificação dos padrões de
específicos para cada necessidade (fome,
dor e frio). Estudos demonstram que as
mães conseguem interpretar com acurácia
essa forma de comunicação infantil, fazendo
com que o choro relatado seja o critério mais
fidedigno para o diagnóstico de cólica.
Ainda que essa manifestação seja estudada
há mais de 50 anos, a etiologia da cólica
segue pouco esclarecida. Alguns possíveis
fatores causais são a imaturidade/processo
de amadurecimento do trato intestinal,
hipertonicidade congênita, alergia ao leite de
vaca (pesquisas comparativas observaram
que bebês alimentados com leite de soja
apresentam redução dos sintomas e de sua
frequência), componentes ambientais e até
mesmo por tensão dos pais (ansiedade,
inexperiência, insegurança materna).
A alimentação materna também pode
influenciar na duração e intensidade da
cólica, com estudos que apontam risco
relativo de 2,0 para ingestão de leite de vaca;
1,7 para cebola; 1,5 para chocolate; 1,3 para
brócolis e repolho 1,2 para couve-flor; e 0,7
para carne vermelha.
O tabagismo durante a gestação é outro fator
que pode estar associado ao quadro, com
incidência dobrada de cólica em filhos de
mulheres que fumavam 15 ou mais cigarros
na gravidez ou o puerpério.
O tratamento das cólicas em lactentes é
bastante amplo, raramente empregando
terapias medicamentosas. O contato físico,
seja por pressão, massagem ou calor local,
é bastante utilizado em meio doméstico,
tendo como objetivo a eliminação de gases.
Chás de ervas diversas também são muito
frequentes, devendo apenas ser feita a
ressalva de que sua administração deve ser
feita com cautela e moderação, pois seu
excesso pode acabar prejudicando a
amamentação ou causando distúrbios
nutricionais.
A modificação comportamental entre o
binômio mãe-filho e a maior interação
familiar também aparentam ter efeito
terapêutico, pois ao serem orientados acerca
do caráter remissivo da cólica e da
importância do pronto atendimento das
necessidades do bebê, os pais apresentam
menor nível de estresse, o que pode auxiliar
a reduzir a intensidade das crises. A
aplicação do Método Canguru de contato
com o lactente também é uma boa
ferramenta, minimizando, prevenindo ou até
mesmo interrompendo os episódios de
choro.
EXAMES E AVALIAÇÕES NEUROLÓGICAS NA
PUERICULTURA:
A avaliação neurológica na semiologia da
criança é bastante complexa, uma vez que
varia constantemente ao longo do
desenvolvimento infantil, buscando por
lesões ao mesmo tempo em que avalia
aquisições sensitivas, motoras, cognitivas e
somáticas. Também há que se levar em
conta aspectos da plasticidade funcional ao
longo da maturação e, ainda, o
conhecimento dos estágios do
desenvolvimento da aprendizagem.
Para que o exame seja satisfatório, é
recomendado que o ambiente esteja com
temperatura amena, com o bebê/criança
acordado e sem choro, após 30 minutos a 1
hora da última mamada (em caso de
lactentes). O procedimento deve iniciar pela
cabeça e demais estruturas que evitem
despir a criança. Em seguida, aplica-se o
princípio da manipulação mínima
ASPECTOS NORMAIS DA SEMIOLOGIA
NEUROLÓGICA EM CRANÇ AS:
AVALIAÇÃO DO CONTATO COM O MUNDO:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A fixação do olhar na mãe durante a
amamentação e a sucção efetiva são
precoces no RN, manifestando-se desde a
32ª semana de idade concepcional.
A expectativa em relação ao exame,
quantidade de movimento e reação
emocional às manobras do examinador
devem ser observadas. O choro espontâneo
deve ser vinculado às necessidades
fisiológicas e, durante o exame, ao
desconforto ou às manobras realizadas,
como aquelas empregadas para
desencadear o reflexo de Moro (queda súbita
da cabeça, amparada pelo examinador,
causa extensão e abdução dos membros
superiores seguida por choro, iniciada entre
a 28ª e 32ª semana de gestação, persistindo
até o sexto mês de vida).
O sorriso social motivado surge aos 2 meses
de vida, e entre o 3º e o 6º mês é observado
o início da lalação, manifestada inicialmente
por sons guturais, evoluindo para o balbucio
de vogais com intensa movimentação dos
lábios, quando estimulado pela mãe ou pelo
examinador.
Até o final do primeiro de vida, o bebê
começa a elaborar palavras com duas
sílabas e significado concreto, e, até os 18
meses expressa palavras-frase (indica um
pedido por meio de um substantivo. Frases
agramaticais (sem pronomes e preposições)
surgem até 24 meses de vida. Aos 3 anos, a
criança assimila o pronome “eu” em sua fala,
um passo importante na distinção “eu-outro”.
A linguagem compreensiva precede a
expressiva, sendo observada desde os
primeiros contatos com o ambiente por meio
de reações positivas ou negativas aos
diversos estímulos. Tarefas simples são
realizadas pelo bebê ao final do primeiro ano,
realizadas por meio da imitação sob
comando.
EXAME DO SEGUIMENTO CEFÁLICO:
Com o bebê ainda vestido, são realizadas a
inspeção e a coleta das medidas do crânio.
A medida do perímetro cefálico é feita com
fita métrica, que envolve o osso occipital e o
osso frontal, sendo avaliada junto à estatura.
Diz-se macrocefalia ou microcefalia quando
o perímetro craniano se encontra acima ou
abaixo de dois desvios padrões da média
esperada para a estatura observada,
respectivamente.
Diz-se braquicéfalo, quando a medida
biauricular é maior que a anterior e
dolicocéfalo ou escafocéfalo, quando a
medida biauricular é menor do que a
anteroposterior, dando ao crânio um formato
de quilha de navio. Idealmente essa
proporção deve ser igual a 1.
A fontanela anterior, ou bregmática, em
forma de losango, tem em média ao
nascimento dois centímetros, no sentido
coronal e 3 cm, no sagital. Até os nove
meses, 50%, e, até um ano e meio 100% das
crianças não mais a apresenta. A fontanela
posterior ou lambdoide, triangular, está
presente em 40% dos bebês a termo ao
nascimento, mas não ultrapassa um
centímetro em sua maior extensão, e o seu
fechamento ocorre no primeiro mês.
Os nervos cranianos do RN encontram-se
mielinizados da mesma forma que os nervos
medulares, porém suas conexões com o
tronco/córtex cerebral ou entre si encontram-
se em processo de amadurecimento. Os
nervos cranianos e suas funções podem ser
examinados:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
 I – Olfatório: todas as funções sensoriais
iniciam sua mielinização no período fetal
e estão amadurecidas no primeiro
semestre, pós-natal. Na prática, é
possível pesquisar o olfato, após o quarto
ou quinto ano de idade, quando a criança
pode fornecer informação fidedigna.
Pesquisa-se em cada narina,
isoladamente, por meio da estimulação
com odores conhecidos e não irritantes;
 II – Óptico: a resposta visual varia de
acordo coma a maturação da criança.
Com 26 semanas, o RN pisca em
resposta a exposição ao estímulo
luminoso. Com 32 semanas, enquanto se
mantém o estímulo luminoso a criança
persiste com os olhos fechados. Nesta
idade também tem a capacidade de fixar
o olhar com um estimulo visual. Com 34
semanas, aproximadamente 90% das
crianças tem a capacidade de seguir
estímulo visual. Ao termo, a capacidade
de fixar o olhar e seguir um estímulo
visual está bem desenvolvida. Para testar
a resposta visual (fixar e seguir) utilizam-
se cartões com contraste claro/escuro ou
objetos coloridos. À fundoscopia, o disco
óptico do RN é de coloração mais clara
que a do adulto, com vascularização,
mácula e restante da retina similares aos
encontrados na fase adulta. A análise da
contração pupilar também é feita ao
examinar as funções desse nervo;
 III, IV e VI – Oculomotor, Troclear e
Abducente: são responsáveis pela
movimentação do globo ocular e das
pálpebras. A pesquisa da motricidade
extrínseca ocular deve ser realizada,
primeiramente, à simples inspeção e, a
seguir, enquanto se pesquisa a
percepção visual, utilizando-se como
estímulo visual um foco luminoso ou um
cubo colorido. A fixação no foco luminoso
é breve no pré-termo. No período do
termo, o bebê acompanha brevemente a
luz no sentido horizontal. Até o 3º mês,
segue no sentido vertical e em círculo;
 V – Trigêmeo: sua atividade pode ser
testada por meio da avaliação da
sensibilidade da face (estímulo tátil,
algodão ou toque da ponta de uma paleta
de madeira);
 VII – Facial: este nervo é responsável
pela motricidade facial e pela gustação
dos 2/3 anteriores da língua, salivação
parotídea e lacrimação. Podemos
observar a expressão facial do bebê
quando este chora ou sorri, quando
acompanha um objeto com os olhos,
elevando os supercílios e, também,
durante o piscamento. Observando-se o
bebê dormindo, o fechamento incompleto
das pálpebras (uni ou bilateralmente)
pode ser sinal de comprometimento
periférico do nervo facial. A função
gustativa pode ser avaliada com gotas de
limão, sal ou açúcar. A função lacrimal
pode ser avaliada pelo teste do papel de
filtro colocado sobre o conduto lacrimal. A
lacrimação com choro é observada até 10
dias após o nascimento a termo;
 VIII – Vestibular: a audição deve ser
testada desde o 1º dia de vida para que
possam ser identificadas disfunções que
influenciem o desenvolvimento da
linguagem. Ao ouvir o som de um
determinado objeto (não padronizado), o
bebê deve modificar sua postura e
padrão respiratório para uma atitude
atenta. Até o final do primeiro mês, 100%
dos bebês se voltam em direção ao som.
Até o sexto mês, localiza o som à altura e
abaixo dos ouvidos, estando sentados, e
até treze meses, acima da cabeça;
 IX e X – Glossofaríngeo e Vago: são
avaliados ao observar a deglutição, a
motilidade do palato e a voz (parte
motora), a gustação e o reflexo do vômito
(funções sensoriais e autônomas);
 XI – Acessório: é responsável pela
tonicidade dos músculos
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
esternocleidomastoideo e trapézios, que
devem ser cuidadosamente palpados e
inspecionados. Em lesões unilaterais há
tombamento da cabeça e encurvamento
do corpo para o lado afetado;
 XII – Hipoglosso: responsável pela
motricidade da língua, esta deve ser
A sucção reflexa é outro exemplo de reflexo
examinada quanto ao trofismo,
primitivo, manifestado por meio da
motilidade, força muscular e
estimulação dos lábios, após a qual há
centralização da linha média. Em lesão
vigorosa sucção, desaparecendo por volta
unilateral, em repouso, dentro da boca a
do 6º mês.
língua está desviada para o lado oposto
ao da lesão. Ao exteriorizá-la há desvio
para o mesmo lado da lesão.

BEBÊ EM DECÚBITO DORSAL:

O tônus muscular deve ser examinado em

cada segmento, movimentando e palpando
as articulações, sendo registrada a
resistência à flexão ou extensão do membro.
Aprende-se, através da prática, a reconhecer
a hipertonia fisiológica dos membros nos
primeiros meses, a hipotonia fisiológica
global que se instala a partir do quarto mês e
se estende até o final do segundo ano.
REFLEXOS PRIMITIVOS:
Os reflexos primitivos são respostas
assintomáticas e estereotipadas a extensão do membro superior do lado
determinados estímulos externos, presentes
ao nascimento, mas que devem ser inibidos
ao longo dos primeiros dias de vida,
momento no qual surgem os reflexos
posturais. Sua presença indica que o
Sistema Nervoso está intacto, porém sua
permanência sugere disfunções
neurológicas.
A persistência do sinal de Moro,
anteriormente descrito, para além do sexto
mês de vida, indica atraso de
desenvolvimento, ao passo que sua
ausência em lactentes com
hiperbilirrubinemia pode indicar kernicterus.
O reflexo de busca é desencadeado por
estimulação da face ao redor da boca, com o
neonato rotacionando a cabeça na tentativa
de buscar o objeto, com subsequente sucção
do mesmo.
O reflexo do esgrimista é desencadeado pela
rotação da cabeça enquanto o examinador
estabiliza o tronco do RN. Observa-se
análogo à rotação e flexão do membro
superior contralateral. A resposta dos
membros inferiores obedece ao mesmo
padrão, mas é mais sutil. Deve regredir por
volta do 3º mês de vida.
A preensão palmar é observada após
pressionar a palma da mão, observando-se
flexão dos dedos. Ausência antes dos 3
meses, assimetria ou persistência após os 6
meses pode corresponder à anormalidade.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A preensão plantar, por sua vez, é
desencadeada pela pressão na base dos
pododáctilos (dedos dos pés), que se
flexionam. Ausência antes dos 3 meses,
assimetria ou persistência após os 12 meses
pode corresponder à anormalidade.
Quando o RN é colocado, apoiado pelos pés,
numa superfície dura, observa-se extensão
das pernas, correspondendo ao reflexo do
apoio plantar.
A marcha reflexa é desencadeada por meio
da inclinação do tronco do RN após obtenção
do apoio plantar, quando se observa o
cruzamento das pernas, uma à frente da
outra.
O reflexo de Galant é desencadeado por
estímulos táteis na região dorsolateral,
observando-se encurvamento do tronco na
região estimulada.
O reflexo da escada é observado após
estímulo tátil do dorso do pé, com o bebê
sendo sustentado pelas axilas. O pé se eleva
como se estivesse subindo uma escada.
CRIANÇA EM POSIÇÃO SENTADA:
A manobra de tração permite verificar o
tônus cervical. Puxando-se o bebê pelos
punhos, da posição em decúbito dorsal para
sentada, a cabeça pendente é sinal de
hipotonia cervical anterior, que até o final do
terceiro mês, no lactente nascido a termo, é
fisiológica. Mantendo-se o bebê sentado com
apoio nas axilas e deixando-se a cabeça cair
para frente, ocorre imediata extensão
cervical, demonstrando tonicidade normal no
grupo muscular posterior, extensor cervical.
No final da primeira semana, 95% dos RN
nascidos a termo apresenta a musculatura
cervical posterior normotônica.
CRIANÇA EM PÉ:
No RN, são avaliados os já citados reflexo da
escada e o reflexo da marcha, e o reflexo de
sustentação dos membros inferiores
(extensão dos membros inferiores que pode
ou não se disseminar para o tronco e região
cervical.
SUSPENSÃO VENTRAL:
Examina-se o tônus muscular ao erguer o
bebê em posição ventral, apoiado pelo tórax,
testando a extensão tronco-cervical, útil
principalmente no primeiro ano de vida, pois
auxilia a diferenciar a hipotonia fisiológica (a
partir do 4º mês) da patológica. A resposta
extensora máxima do tronco, cervical e
membros constitui o reflexo de Landau, que
acompanha a hipotonia normal.
DECÚBITO VENTRAL:
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Os reflexos próprios do RN observados
nessa posição são o reflexo do
arraste/postural (ao ser colocado em
decúbito ventral, o neonato imediatamente
inicia movimentos de reptação [análogos a
um lagarto] por alguns segundos), e o reflexo
do esgrimista, já descrito.
Em decúbito ventral, o bebê pode ser
examinado quanto aos tônus cervical
posterior, abdominal e paravertebral. A
reação de fuga à asfixia deve-se ao tônus
normal da musculatura cervical posterior,
que permite a extensão da cabeça. O tono
abdominal e paravertebral podem ser
examinados, através da extensão passiva da
coluna vertebral, elevando os membros
inferiores da mesa de exame e observando-
se a amplitude do movimento.
POSTURA E MARCHA:
A sequência no desenvolvimento postural
obedece sempre à mesma ordem: primeiro,
o bebê firma o pescoço, e em seguida,
sucessivamente com e sem apoio, senta-se,
ergue-se e anda. Variações culturais no
manejo do bebê modificam o período das
fases, mas não a sua cronologia sequencial.
O controle cervical ocorre primeiro no grupo
posterior ou extensor e depois, até o final do
terceiro mês, no grupo anterior.
O “sentar com apoio” deve ser observado em
duas de suas fases: na primeira, que ocorre
em torno do sexto mês, quando, colocando-
se o bebê sentado, este permanece por
algum tempo sem cair para os lados, apoiado
nas próprias mãos (colocadas pelo
examinador) entre os membros inferiores. Há
curvatura da coluna vertebral, em
decorrência da hipotonia do tronco. Outra
fase ocorre por volta do nono mês, quando a
criança senta por si mesma, agarrando-se a
um suporte. O “sentar-se sem apoio”
também é avaliado da mesma forma: a
primeira análise no nono mês, quando,
colocando-se o bebê sentado, este
permanece por algum tempo sem apoio das
mãos, mas pode desequilibrar-se para os
lados. A coluna está retificada, indicando
tono adequado no tronco. Outra fase ocorre
até o décimo segundo mês, quando o bebê
pode passar sozinho da posição em decúbito
dorsal para sentado.
Para atingir a fase do sentar-se sem apoio é
necessário, além de ter completado a
maturação cervical, ter também completado
a fase de mudança de decúbito. Até o final
do quinto mês, os bebês mudam de decúbito
prono para supino e até o final do sétimo
mês, de supino para prono, parte importante
para conseguir sentar-se sem necessidade
de suporte.
Quanto à marcha sem apoio, ela ocorre até
os 12 meses, em 20% das crianças
brasileiras normais. A aquisição da marcha
sem apoio, de modo geral tem sido
considerada até a idade de 18, no entanto
existem crianças, inclusive na mesma
família, que deambulam um pouco mais
tarde, no final do segundo ano, sem
apresentarem patologia. Cerca de 12 a 20%
dos bebês não engatinham e cerca de 3%
exibem o engatinhar atípico, evoluindo bem
até o sentar sem apoio, mas passam a
engatinhar de nádega, ou de barriga, ou
reptando para trás e demoram até 24 meses
para andar sem apoio.
A prova do equilíbrio estático, através da
capacidade de manter-se em pé sem apoio,
com os pés unidos somente é possível a
partir dos três anos de idade.
O surgimento dos reflexos de apoio lateral e
do paraquedas estão associados com a
manutenção do equilíbrio estatocinético.
Ambos iniciam seu aparecimento em torno
do oitavo mês, pós-nascimento a termo e
estão sempre presentes aos 12 meses. O
reflexo de apoio lateral se obtém quando o
lactente se senta sozinho. Estando sentado,
mãos sobre as coxas, ao ser empurrado para
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um dos lados, estende o membro superior e
apoia-se, lateralmente, com a mão
espalmada na mesa de exame. O reflexo do
paraquedas é obtido elevando-se o bebê em
suspensão ventral e procedendo rápida
inclinação do polo cefálico, em direção à
mesa de exame. Há anteposição e extensão
dos membros superiores, simetricamente,
buscando apoio das mãos sobre a mesa.

Quando a marcha se torna independente,

inicialmente, no segundo ano, apresenta-se SENSIBILIDADE E FUNÇÕES CORTICAIS SUPERIORES:
com base alargada em decorrência da
Observamos que, no RN a termo, há
imaturidade cerebelar, porém não é ebriosa
resposta à pesquisa de todos os reflexos, e
(desvios laterais na passada). Logo a criança
dos 12 pares de nervos cranianos. A
contorna bem obstáculos e, no terceiro ano,
sensibilidade superficial termalgésica e tátil
consegue correr.
grosseira, também estão em adiantada fase
COORDENAÇÃO MOTORA: de amadurecimento, podendo-se pesquisá-
las, entretanto, apenas qualitativamente,
A preensão palmar passa a ser voluntária,
através das reações motoras até os 5 anos
em 100% das crianças, aos 4 meses de
de idade, quando a criança começa a
idade. Inicialmente, a preensão é
fornecer informações verbais fidedignas.
predominantemente ulnar, em seguida
medial e, até o final do primeiro ano deve ser A coordenação visual-motora é uma das
em pinça. funções corticais superiores que podem ser
avaliadas precocemente. No terceiro mês, o
A habilidade de apanhar um objeto sem errar
bebê olha para as próprias mãos, e logo
o alvo (eumetria) amadurece ao longo dos
inicia movimentos de apanhar a outra mão
dois primeiros anos. Justificam-se as
presente no campo visual, fazendo o mesmo
tentativas e erros ao tentar alcançar a colher
com objetos colocados neste campo. No
e levá-la à boca. A prova index-nariz é
quinto mês, passa a estender os membros
fidedigna a partir dos 4 anos. Até o sétimo
superiores para buscar o objeto próximo ao
ano, é perfeita a eudiadococinesia, ou seja,
campo visual, voluntariamente, e o passa de
movimento alterno da mão estendida, em
uma mão para a outra. Do oitavo ao décimo
pronação-supinação do antebraço. Aos 7
segundo mês, descobre um objeto que
anos, pode se verificar a prova de
observa ser escondido sob um lenço. A
coordenação tronco-membros, em que,
prova lenço-rosto pode ser utilizada no
estando a criança em decúbito dorsal, braços
período neonatal, registrando-se o
cruzados, senta-se sem apoio e sem elevar
comportamento do bebê e, em torno do
o calcanhar.
oitavo mês, o lactente exibe movimento de
retirada do lenço, colocado pelo examinador
sobre o seu rosto.

Nesse período de aspectos motores e

sensitivos bem definidos, ainda há
amadurecimento das funções corticais
superiores, representadas principalmente
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pela práxis (fluência na sequência de
movimentos para um fim) e gnosias
(reconhecimento).
Quanto a praxia de mãos, aos 4 anos a
criança é capaz de abotoar e aos 7 anos dar
laço no sapato. Aos 5 anos, em torno de 50%
das crianças realizam movimentos como
abrir uma das mãos e fechar a outra
alternadamente, como também unir,
sequencialmente, o polegar aos demais
dedos. As idades para os movimentos
bucofonatórios, como assoprar, chupar no
canudinho, exteriorizar a língua e colocá-la
para cima, ou entre o lábio inferior e gengiva,
não estão bem estabelecidas. A praxia de
fala, ou seja, a capacidade de sequenciar
sílabas nas palavras, sem hesitações,
depende do amadurecimento da zona pré-
motora da linguagem e suas conexões, o que
ocorre em torno dos 2 anos, quando a
criança emite palavras e constrói frases
agramaticais. Gagueira fisiológica pode
ocorrer em torno de três anos de idade.
A gnosia auditiva pode ser testada pelo
reconhecimento de ritmos, sons e, no
hemisfério dominante para a fala, a gnosia
verbal, ou seja, o reconhecimento dos sons
falados. A gnosia visual pode ser testada
através da identificação de formas como
bandeiras (colocam-se duas iguais entre
outras para serem encontradas) para a idade
de 5 anos. Gnosia tátil pode ser testada
através do reconhecimento de formas pelo
tato (estereognosia), a partir dos 4 anos.
PROBLEMA 2 – ABERTURA:
COMPONENTES E IMPACTOS DA ALIMENTAÇÃO
COM TIPOS VARIADOS DE LEITE:
LEITE MATERNO:
O leite materno e o colostro, seu precursor,
estimulam a adaptação bem-sucedida do RN
à vida extrauterina. O volume secretado
diariamente varia de 10 a 100mL, com média
em torno de 30mL.
O colostro é uma substância viscosa e
amarelada que preenche as células
alveolares mamárias ao longo do terceiro
trimestre de gestação, secretado nos
primeiros dias após o nascimento, em
volume gradativamente maior, atingindo a
composição de leite maduro em 30 a 40
horas pós-parto.
Esse primeiro produto materno possui alta
densidade e pequeno volume, contendo
menor quantidade de lactose, gorduras e
vitaminas hidrossolúveis e maior percentual
de vitaminas lipossolúveis (principalmente,
vit. E, A e K) e minerais, exemplificados por
sódio e zinco, com concentração bastante
elevada de imunoglobulinas.
O colostro atende às necessidades
específicas do RN, pois seus rins imaturos
não conseguem processar grandes volumes
de líquido sem que haja estresse metabólico,
a produção de lactase e demais enzimas
intestinais ainda é incipiente, fazendo bom
uso desse alimento que, assim como o leite
propriamente dito, modula o crescimento e o
desenvolvimento de seu organismo. Os
fatores carreados pelo colostro auxiliam a
proteger a mucosa intestinal, os fatores de
crescimento estimulam e regulam os sinais
vitais desse neonato e os antioxidantes e
quinonas protegem-no contra doenças
hemorrágicas e dano oxidativo. A oferta de
água ou outras substâncias não é justificável
nesse período.
O leite maduro, constituído entre 3 e 14 dias
após o parto, é formado por diversos
nutrientes já conhecidos, mas que podem ter
sua proporção alterada entre mulheres,
gestações, entre mamas, em mamadas
diferentes ou durante o curso de uma mesma
rotina de aleitamento, fenômeno
considerado como funcional.
Quando a lactação se aproxima do término
e as mamas involuem, o leite terminal
secretado é semelhante ao colostro, com
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teor elevado de anticorpos, responsáveis por catalizadora da trans-sulfuração de
proteger tanto o bebê quanto a mama. metionina em cistina ainda é ausente no
cérebro e fígado. A presença de taurina,
PROTEÍNAS: outro importante aminoácido, também é
Ainda que sejam consideradas as variações maior no leite humano, sendo necessária à
fisiológicas supracitadas, o leite humano conjugação dos sais biliares (metabolismo
apresenta o menor teor de proteínas dentre lipídico), além de atuar como
os mamíferos, com concentração média de neurotransmissor e neuromodulador no
1,15g/100ml (exceto no 1º mês, no qual desenvolvimento do SNC.
atinge 1,3g/ml). Algumas pesquisas apontam
que esse valor pode ser ainda menor,
orbitando entre 0,8 e 0,9g/100ml, das quais
25 a 30% correspondem a nitrogênio não
proteico (ureia), tornando o percentual
biodisponível (capaz de ser usado pelo
organismo) ainda menor, ao se GORDURAS:
considerarem compostos anti-infecciosos O conteúdo de lipídios presentes no leite
como a IgA, lisozimas e lactoferrinas, que maduro é suficiente para suprir as demandas
não são absorvíveis. impostas pelo RN, passando de 2g/100ml
para 4 a 4,5g/100ml 15 dias após o parto.
Essa fração reduzida ainda é mais do que
Esse é o componente mais variável do
suficiente para o crescimento saudável de
produto humano, obedecendo a flutuações
infantes, gerando carga reduzida para a
circadianas, com pico no final da manhã e
filtragem renal do bebê.
começo da tarde.
Embora existam semelhanças entre os leites
O percentual de gordura pode oscilar numa
humano e de vaca, nenhuma das proteínas
mesma amamentação, na qual o leite final
é a mesma entre essas substâncias. Dentre
apresenta de 4 a 5 vezes mais lipídios que o
as proteínas do soro humano estão a α-
leite inicial, agindo assim como regulador de
lactoalbumina humana, importante para a
apetite. Essa situação faz com que o tempo
síntese adequada da lactose. A contraparte
das refeições não possa ser regulado
bovina é representada pela β-lactoglobulina
arbitrariamente, uma vez que o menor
bovina, que não apresenta similar no leite
volume de leite secretado pode ser
humano e é capaz de contaminar o produto
responsável por boa parte da ingesta
produzido por mães que bebem leite de
calórica do bebê.
vaca, provocando resposta antigênica em
bebês atópicos. A maior proporção de soro Todo esse conteúdo lipídico é secretado em
para caseína (80/20) causa formação de glóbulos microscópicos, menores que
coalho gástrico mais brando, que diminui o aqueles presentes no leite de vaca. A
tempo de esvaziamento gástrico e estimula a predominância é de triglicérides (TAG),
digestão. representando 98% da gordura total. As
membranas dessas estruturas globulares
O leite materno conta com maiores
são formadas por fosfolipídios, esteroides
concentrações de aminoácidos livres e
(colesterol) e proteínas. A composição de
cistina, em oposição a valores menores de
ácidos graxos é relativamente constante,
metionina que aqueles presentes no leite
com cerca de 42% de ácidos saturados e
bovino. A cistina é essencial para os fetos e
57% de compostos insaturados. Mesmo que
RN prematuros, pois a cistationase, enzima
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a presença de ácido linoleico e demais
gorduras polinsaturadas seja influenciada
pela dieta e pela disposição corporal
materna, o leite é rico em ácidos graxos
insaturados de cadeia longa, imprescindíveis
ao desenvolvimento e à mielinização dos
neurônios cerebrais.
Os ácidos araquidônicos e linoleicos são
distintos dentre as gorduras polinsaturadas,
sendo o primeiro essencial na infância por
não poder ser obtido por transformação
biológica in vivo. O conteúdo de ambos é
quase 4 vezes superior no leite humano
quando comparado ao de vaca (0,4 e
0,1g/ml, respectivamente). As
prostaglandinas, intimamente dependentes
da disponibilidade desses lipídios, se
difundem amplamente pelo trato
gastrointestinal, contribuindo para a do leite humano, mas também se mostram
maturação das células intestinais e para a
defesa global do organismo.
Mesmo que a fonte principal de energia para
os bebês seja a glicose, a ingesta de
gorduras também atende a esse fim, com 35
a 50% das calorias ingeridas diariamente
sendo associadas a esse grupo nutricional.
O consumo dessa dieta rica em gorduras se
dá num momento no qual tanto a secreção
de lipase pancreática quanto a conjugação
eficaz de sais biliares são imaturas. Essa
deficiência é parcialmente compensada por
enzimas linguais e gástricas, mas a presença
de lipases não específicas secretadas junto
ao leite tem grande significância, uma vez
que contribui para a digestão de lipídios ao
se conjugar com produtos da bile, fenômeno
ausente na maioria dos outros substitutos
alimentares, e que processa 30 a 40% do
volume total de TAGs em 2 horas.
A lipase é apenas uma dentre dezenas de
enzimas presentes no leite humano que
agem como moduladores metabólicos de
forma única, irreproduzível por outros
alimentos.
A presença abundante de colesterol no leite
materno é evidente, porém ainda não se
sabe o papel desse composto para a saúde
da criança, sendo necessária maior
investigação científica nesse campo.
Algumas evidências, no entanto, sugerem
que a exposição precoce a esse esteroide
pode implicar em seu metabolismo e
utilização na idade adulta.
LACTOSE:
A lactose representa o principal carboidrato
presentes pequenas quantidades de
galactose, frutose e alguns oligossacarídeos.
Sua concentração varia de 4% no colostro a
7% no leite maduro, os maiores valores entre
os leites, únicos produtos nos quais essa
substância está presente.
Esse carboidrato aparenta ser um nutriente
específico da infância, pois a lactase é
encontrada somente nos filhotes de
mamíferos. A permanência dessa enzima é
encontrada na população europeia e em
algumas outras, mas a maioria dos
indivíduos deixa de tolerar esse composto
após a metade da infância, podendo
manifestar distúrbios intestinais decorrentes
de sua ingestão.
Esse açúcar representa, isoladamente, 40%
das necessidades energéticas do infante. É
metabolizado em glicose (fonte de energia) e
galactose, componente dos galactolipídeos,
necessários ao desenvolvimento do SNC.
Além disso, facilita a absorção de cálcio e
ferro e promove a colonização intestinal por
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Lactobacillus bifidus (intensificada por um
fator de crescimento específico não
encontrado em substitutos nutricionais),
bactérias fermentadoras que estimulam a
acidez no TGI, impedindo o crescimento de
compostos patogênicos.
A intolerância primária à lactose é bastante
incomum, sendo marcada pela perda da
lactase por lesões à borda em escova do
intestino. O bebê desprovido dessa enzima
irá sofrer fermentação desse carboidrato por
bactérias comensais, produzindo assim
fezes líquidas/espumosas e ácidas, que
degradam ainda mais a mucosa do intestino,
e desconforto abdominal. Em casos
extremos, essa disfunção pode afetar o
crescimento e levar à desidratação, mas
ainda assim a amamentação não deve ser
interrompida, podendo ser aumentada nos
períodos de diarreia.
Outra possível condição de intolerância é
postulada em infantes sensíveis, com cólicas
e evacuação frequente e liquefeita, que
urinam e regurgitam constantemente,
apresentando ou não redução de
crescimento. A hipótese é que se a mãe não
permite que o bebê esvazie a primeira
mama, mudando para a outra
arbitrariamente, a ingesta de lactose pode
ser preferida em detrimento de gorduras. Às
vezes, esse quadro pode se resolver em 24
horas, com a técnica de esvaziamento do
seio antes de oferecer o próximo. Depois de
1 ou 2 dias mamando por escolha de uma só
mama, a produção de leite diminuirá e o
bebê voltará se alimentar de ambas, mas
sem os sintomas previamente descritos.
VITAMINAS:
A concentração de vitaminas no leite
humano é quase sempre suficiente para as
necessidades do bebê, embora dependa da
ingestão materna desses compostos. As
frações lipossolúveis são dependentes da
presença de gorduras, também afetada pela
alimentação da mãe.
A presença de vitamina A é maior no produto
humano que no leite de vaca, com exceção
de populações marcadamente deficientes.
No colostro, a concentração dessa vitamina
é 4 vezes maior que no leite maduro.
A concentração de vitamina K é maior no
período pós-parto imediato que no leite final,
pois cerca de duas semanas após o
nascimento, o bebê já possui em sua
microbiota a flora responsável pela oferta
desse nutriente. Crianças que não foram
amamentadas com colostro apresentam
maior risco de desenvolver doenças
hemorrágicas, a menos que lhes tenha sido
oferecida uma dose no período neonatal.
O conteúdo de vitamina E presente no leite
humano atende às necessidades do RN,
exceto se há um aumento na ingestão
materna de gorduras polinsaturadas sem a
adequação no consumo dessa vitamina.
A vitamina D encontrada no leite materno
está em baixa concentração (0,15μg/100ml),
sendo incialmente considerada insuficiente
para corresponder à demandas nutricionais
do bebê, porém evidências apontam que a
melhor via de absorção dessa vitamina não
é o trato intestinal, mas sim a pele, que ao
receber quantidades adequadas de luz solar
(10 minutos sem roupa ou 30 com exposição
de cabeça e mãos), passa a produzir esse
nutriente em qualidade satisfatórias,
evitando que sejam absorvidos valores
superiores àqueles que podem ser usados e
armazenados pelo corpo.
Variações dentre as vitaminas hidrossolúveis
dependem da dieta materna, mas as
concentrações presentes no leite de
mulheres bem nutridas é mais que suficiente.
Os relatos de deficiências em infantes são
raros, mesmo em filhos de mães
desnutridas, de mulheres que usaram
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anticoncepcionais orais por períodos
prolongados ou vegetarianas estritas, que
têm maior risco de déficit de vitaminas do
grupo B. A porcentagem de vitamina B12 é
baixa no leite, porém sua biodisponibilidade
é intensificada pela presença de fatores de
transferência específicos. Niacina, ácido
fólico e ácido ascórbico são encontrados em
maior quantidade que em leite de
ruminantes. Embora as mães possam não
apresentar sinais clínicos de deficiência, seu
leite pode ser deficiente com consequências
adversas para o bebê.
MINERAIS:
A concentração de grande parte dos
minerais (cálcio, zinco, ferro, fósforo,
magnésio, flúor [sua participação é apenas
vestigial] e potássio) não é afetada por
intercorrências dietéticas na mãe, pois
mecanismos compensatórios como redução
da excreção urinária de Ca2+ entram em
cena, fazendo com que somente em casos
extremos as reservas maternas sejam
afetadas.
Mesmo que os valores totais sejam inferiores
aos dos demais substitutos, os minerais
presentes no leite materno são mais bem
adaptados às necessidades da criança. O
cálcio tem sua absorção potencializada
devido à proporção elevada entre Ca/P (2:1),
evitando que o fósforo seja captado em
excesso pelo organismo do bebê, o que
resultaria em hipocalcemia neonatal. A
disponibilidade de cálcio do leite de vaca é
ainda menor pela formação de sabões
insolúveis no intestino (pela interação com a
caseína), que podem causar obstrução e
perfuração intestinal.
A elevada biodisponibilidade de ferro do leite
humano é resultante de um conjunto de
interações complexas entre os constituintes
do leite e o organismo do infante. A acidez
elevada do TGI, associada à presença de
valores adequados de zinco, cobre e
lactoferrina (fator restritivo do aposte desse
nutriente por bactérias, uma vez que só
permite sua liberação quando destravado
pelos receptores específicos) são partes
importantes para aumentar a absorção de
ferro (internalização de 70% do valor total,
em oposição a 30% do leite de vaca). Bebês
a termo sadios nascidos de mães bem
nutridas têm reserva hepática de ferro
suficiente para atender as necessidades da
maior parte do primeiro ano.
O zinco é essencial para a composição de
enzimas e para estimular o funcionamento,
crescimento e a imunidade das células. Suas
quantidades nessa forma de aleitamento são
pequenas, mas suficientes às demandas da
criança, sem que sejam notados impactos à
regulação de cobre e ferro, havendo elevada
disponibilidade biológica do que é ingerido.
OLIGOELEMENTOS:
Os níveis de cobre, cobalto e selênio no leite
humano são inferiores aos encontrados no
leite de vaca. A biodisponibilidade
aumentada do cobre nessa mistura decorre
da ligação a proteínas de baixo peso
molecular, evitando deficiências nutricionais
e distúrbios neurológicos em crianças
alimentadas por substitutos artificiais. Aos 3
meses de idade, a situação nutricional para
o selênio é melhor em infantes
amamentados de forma exclusiva, podendo
ter concentração reduzida em áreas onde os
solos são pobres nesse mineral.
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As concentrações de manganês, crômio e
alumínio são relativamente baixas no leite
humano, se opondo aos valores exorbitantes
presentes nos substitutos artificiais, que
estão ligados ao aprendizado tardio e ao
crescimento ósseo. A ingesta de chumbo por
bebês mantém-se controlada mesmo em
locais onde a água exceda os padrões
recomendados pela OMS. O iodo, por sua
vez, pode se concentrar no leite materno,
causando impactos à tireoide do infante
amamentado.
OUTRAS SUBSTÂNCIAS:
Além de diversos nutrientes, o leite materno
também conta com moduladores
metabólicos e hormônios, incluindo
oxitocina, prostaglandinas, esteroides
adrenais/ovarianos, prolactina, hormônio
liberador da gonadotrofina (Gn-RH), fator de
liberação do hormônio do crescimento
(GRF), insulina, somatostatina, relaxina,
calcitonina e neurotensina em níveis
superiores aos do sangue materno, e
hormônio liberador de tireotrofina (TRH),
hormônio estimulante da tireoide (TSH),
tiroxina, triiodotironina, eritropoietina e
bombesina (estimulador da liberação de
gastrina) em concentrações menores.
Nucleotídeos e diversos fatores de
crescimento também estão presentes no
leite humano. O último grupo contempla
fatore de crescimento da epiderme (EGF), de
crescimento semelhante à insulina (IGF-1),
de crescimento específico do leite humano
(HMGF-1, 2 e 3) e de crescimento dos
nervos (NGF), cujos papéis no
desenvolvimento infantil ainda não são
completamente conhecidos.
As enzimas liberadas no leite materno têm
caráter multifuncional, refletindo
modificações fisiológicas nas mamas, ou
ajudando no desenvolvimento do neonato
(peroxidase, enzimas proteolíticas, xantino-
oxidase), ou potencializam suas enzimas
digestivas (α-amilase e lipase estimulada
pelos sais biliares), muitas delas mais
frequentes no colostro que na fase de leite
maduro.
CARACTERÍSTICAS IMUNOLÓGICAS:
O leite humano não é somente uma coleção
de nutrientes, mas sim um composto com
grande complexidade biológica, com forte
ação imunomoduladora, promovendo
proteção não somente contra alergias e
infecções, mas estimulando o
desenvolvimento correto do sistema imune
do bebê. O resultado mais evidente da
amamentação no que concerne à imunidade
é a redução da morbimortalidade de infantes
amamentados quando comparados aos
alimentados com substitutos artificiais, com
implicâncias ainda mais exacerbadas em
comunidades pobres.
A proteção conferida pelo aleitamento
materno é mais evidente em idade precoce,
proporcional à frequência e à duração do
fornecimento desse tipo de leite. Logo ao
nascer, o bebê deve superar diversos
desafios imunológicos, como a colonização
do trato digestivo, a produção de toxinas de
efeito patogênico e a ingestão de antígenos
macromoleculares, sendo que qualquer um
desses fatores é capaz de causar impactos
negativos à saúde se conseguirem
atravessar a barreira imune intestinal. Esse
fenômeno seria executado facilmente devido
à incipiência dos mecanismos de defesa
neonatais, porém a profusão de substâncias
imunológicas e mediadores de crescimento
presentes no colostro/leite auxiliam a
proteger o organismo dessas ameaças.
A capacidade antiinfectiva do leite materno
decorre tanto de componentes solúveis
quanto celulares. Os integrantes do primeiro
grupo incluem as imunoglobulinas, (IgG, IgA
e IgM), lisozimas, lactoferrina, fator bifidus e
demais imunorreguladores. Dentre os
representantes celulares, evidenciam-se os
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macrófagos, linfócitos, granulócitos,
neutrófilos e células epiteliais. A
concentração dessas substâncias é maior no
colostro, diminuindo com a formação do leite
maduro, o que não afeta a ingesta desses
fatores, pois o volume de leite consumido
também aumenta.
O bebê é protegido de forma substancial com
o fornecimento exclusivo de leite materno,
com o aporte de 0,5g de IgA por quilo de
peso diariamente, auxiliando a proteger a
mucosa intestinal nas primeiras 4 a 6
semanas de vida, nas quais as células
subepiteliais plasmáticas ainda são imaturas
para iniciar a produção dessa proteína. As
IgA resistem a enzimas proteolíticas e ao
baixo pH estomacal, recobrindo o intestino
como uma camada de tinta, que o
impermeabiliza contra patógenos.
A lactoferrina, glicoproteína insaturada
resistente à proteólise, apresenta papel
imunológico ao ligar-se ao ferro de forma
mais intensa, impedindo a conexão de
microorganismos ferro-dependentes, sendo
bacteriostática. O fator bifidus, presente no
colostro e no leite materno fresco, é um
carboidrato nitrogenado facilmente
degradado em altas temperaturas, que
promove a colonização do intestino na
presença de lactose. O pH que resulta
dessas interações é muito baixo, evitando
assim que bactérias Gram-negativas e
fungos se proliferem na região.
O leite contém também fragmentos virais não
replicáveis que estimulam respostas
antigênicas nos bebês, imunizando-os antes
da exposição aos agentes ativos ou
aumentando sua resposta imunológica em
caso de encontro com esses organismos.
ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS:
As vantagens do aleitamento materno são
diversas, sendo que os principais
argumentos envolvem:
 Redução na mortalidade infantil: a
proteção contra infecções promovida
pelo leite humano pode reduzir até 13%
das mortes por causas preveníveis entre
crianças de até 5 anos em todo o mundo,
sendo mais eficaz quanto menor for a
idade do infante;
 Prevenção contra diarreias: é mais
observada em crianças com contexto
socioeconômico mais vulnerável, porém
se faz eficaz somente se o aleitamento for
exclusivo, sem o fornecimento de água
ou chás. Caso essa doença se instale,
sua severidade será menor em indivíduos
amamentados, que assim terão menor
probabilidade de sofrer com
desidratação;
 Prevenção contra infecções respiratórias
e otites;
 Reduz o desenvolvimento de alergias: a
amamentação exclusiva durante os
primeiros meses de vida pode diminuir o
risco de alergia à proteína do leite de
vaca, de dermatite atópica, asma e de
outras manifestações alérgicas. Expor o
RN a pequenas doses de leite de
ruminantes no início da vida pode acabar
por elevar o risco de alergia ao leite, não
devendo ser empregado;
 Reduz o risco de desenvolvimento futuro
de hipertensão, diabetes e colesterol alto:
a amamentação tem benefícios que se
estendem para o decorrer da vida,
induzindo indivíduos alimentados com
leite materno a apresentar menor pressão
arterial e dosagem de colesterol, e
reduzindo em 15% a incidência de DM
tipo 2 (essa tendência de redução de
risco também e aplicável à lactante). O
leite de vaca, por sua vez, é considerado
um intensificador do risco para a diabete
melitus tipo 1 em até 500%;
 Diminuição das chances de obesidade:
quanto maior o tempo em que o indivíduo
foi amamentado, menor será a chance de
ele vir a apresentar sobrepeso ou
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
obesidade após os 3 anos de idade. Entre
os possíveis mecanismos atribuídos a
essa proteção, encontram-se um melhor
desenvolvimento da autorregulação de
ingestão de alimentos em crianças
amamentadas e a composição única do
leite materno participando no processo de
“programação metabólica”;
 Melhor poder nutritivo: por ser da mesma
espécie, o leite materno contém todos os
nutrientes essenciais em quantidades
adequadas ao crescimento e conta principalmente em núcleos de
desenvolvimento adequados do
bebê/criança, além de ser mais
facilmente digerido. Até o 6º mês de vida,
a ingestão de leite materno é suficiente
para atender às necessidades
metabólicas individuais, e continua
representando uma importante fonte de
nutrientes até o segundo ano de vida;
 Efeito positivo na inteligência: evidências
apontam para melhor desenvolvimento
cognitivo decorrente do aleitamento
materno, porém seus mecanismos
específicos ainda não são
compreendidos;
 Melhor desenvolvimento da cavidade
bucal: o exercício de sucção realizado
para retirar o leite da mama tem suma
importância para o desenvolvimento
adequado da cavidade oral, com melhor
conformação do palato duro, que implica
em alinhamento dentário correto e
oclusão dentária satisfatória. O desmame
precoce e/ou o uso de bicos artificiais
podem atrapalhar a consolidação desse
processo, empurrando o palato para cima
e diminuindo o espaço designado para a
passagem do ar, podendo prejudicar a
mastigação, deglutição, respiração e
fonação;
Os pontos positivos da amamentação se
estendem para além do lactente, podendo a
mãe se beneficiar dos seguintes fatores:
 Proteção contra o câncer de mama: o
risco de desenvolver essa modalidade de
câncer diminui 4,3% a cada 12 meses de
aleitamento, não estando relacionado à
idade materna, paridade ou etnia;
 Prevenção contra novas gestações: há
98% de eficácia para a amamentação
como medida contraceptiva nos seis
meses que sucedem o parto, com a
ovulação sendo inversamente
proporcional à frequência de mamadas
diárias;
 Menor custo financeiro: é levado em
baixa renda, pois para além da fórmula
infantil escolhida, que já pode representar
gasto elevado, ainda é necessário investir
em mamadeiras, bicos e gás de cozinha
para aquecer o alimento. Gastos
decorrentes de doenças também são
mais comuns;
 Promoção do vínculo afetivo mãe-filho: o
contato contínuo entre esse binômio, com
olhos nos olhos representa um momento
de fortalecimento dos laços de amizade e
intimidade, transmitindo segurança e
proteção para o lactente e autoconfiança
e realização para a mulher;
 Melhor qualidade de vida: crianças
amamentadas adoecem menos,
requerendo menor número de
intervenções, internamentos e
procedimentos cirúrgicos, reduzindo o
número de faltas no trabalho, de
situações estressantes e de gastos
decorrentes desse processo. A felicidade
do conjunto mãe e filho também pode
estimular a melhor convivência
doméstica, favorecendo a qualidade de
vida familiar.
Algumas desvantagens e possíveis
causadores de interrupção que podem ser
associados ao aleitamento materno dizem
respeito ao:
 Conforto pessoal durante a
amamentação (amamentar não deve
causar dor, com a exceção dos primeiros
10 dias, onde podem surgir incômodos
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
referentes à pega, durando cerca de um
minuto por mamada);
 Duração e frequência do fornecimento de
leite (há maior comprometimento de
tempo por parte da mãe, que deve
amamentar seu filho com maior
frequência devido à rápida digestão do
leite materno);
 Necessidade de manutenção de uma
dieta adequada (a alimentação saudável
deve ser preconizada para lactentes, de
modo a produzir um leite rico e
adequando às necessidades nutricionais
do infante);
 Condições patológicas prévias, uso de
medicações e cirurgias no seio.
Nota-se, no entanto, que a maioria desses
fatores pode ser corrigida com
acompanhamento pela equipe de saúde.
LEITE DE VACA:
O leite de vaca é bastante diferente do
humano, tanto na quantidade de nutrientes
como em sua qualidade (aplicabilidade às
necessidades nutricionais do RN), não sendo
recomendado para crianças menores de 1
ano.
Esse alimento apresenta proteínas em
quantidade elevada, relação caseína/soro
inadequada, alto teor de sódio, cloreto e
fósforo, e quantidades insuficientes de
carboidratos, ácidos graxos essenciais,
vitaminas e minerais para essa primeira fase
da vida. Além de todo o desequilíbrio
nutricional, o leite de vaca ainda é altamente
alergênico para crianças.
De acordo com um inquérito nacional entre
as crianças que recebiam outros leites, o
leite de vaca foi consumido por 62,4% das
crianças menores de seis meses, por 74,6%
das crianças de 6 a 12 meses e por
aproximadamente 80% das crianças maiores
de doze meses. O consumo de fórmulas
infantis foi de 23% em crianças menores de
seis meses, 9,8% na idade de 6 a 12 meses
e menor 1% nas demais idades. O consumo
de leite de soja variou de 14,6% a 20% nas
idades investigada.
Apesar do leite de vaca, líquido ou em pó,
não ser a melhor opção de alimentação para
crianças menores de um ano, por vezes esse
é o único alimento disponível em função do
baixo custo. Assim, é importante que os
profissionais de saúde saibam orientar as
mães e as famílias quanto à utilização mais
adequada e segura, quando esgotadas todas
as possibilidades para manutenção do
aleitamento materno e impossibilidade
financeira para aquisição de fórmula. Esses
pontos incluem:
 Em crianças de idade < 4 meses:
o Diluir o leite de vaca líquido em 1/3 de
água fervida, e o composto em pó na
proporção de 1 colher de sobremesa
rasa para cada 100ml de água
tratada, sendo necessário adicionar 1
colher de chá de óleo a cada 100ml
para reconstituir os valores
necessários ao desenvolvimento
infantil;
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
o Fornecer, a partir do 2º mês de vida,
suplemento de vitamina C na dose de
30mg/dia;
o Fornecer 1mg de ferro elementar por
quilo diariamente, com início no 4º
mês, perdurando até os 2 anos;
o Oferecer água entre as refeições.
 Em crianças com idade > 4 meses:
o Não é necessário diluir o leite a partir
dessa idade;
o Iniciar a introdução de alimentos
complementares;
o Oferecer água entre as refeições;
o Limitar o consumo máximo de leite a
500ml por dia.
Durante os primeiros dias de vida deve-se
iniciar a alimentação com leite de vaca com
60 ml/kg/dia e aumentar 20 ml/kg por dia,
divididos em 6 a 8 “refeições” em 24 horas.
Se a criança não estiver sendo alimentada
com leite materno e nem fórmula infantil, a
partir dos quatro meses de vida deve-se
iniciar a introdução de outros alimentos para
suprir suas necessidades nutricionais. A
partir dessa idade, a criança deverá receber
duas porções de papa principal (almoço e
jantar) e duas frutas, além do leite sem
adição de açúcar.
Mesmo após a introdução dos alimentos, o
consumo de leite continua sendo uma
importante fonte de vitaminas e minerais.
Crianças menores de dois anos devem
receber leite integral, não sendo
recomendado o uso de leite desnatado, no
volume máximo supracitado.
O “leite engrossado” é uma mistura de leite
de vaca com farinhas de cereais (aveia, arroz
ou milho, podendo ser vistas combinações
entre esses componentes) comumente
ofertado para crianças no combate à
desnutrição, baseando-se na concepção de
que o leite materno é “fraco”. Esse substituto
alimentar não deve ser indicado para a
alimentação regular do infante devido a seu
elevado teor de açúcar e calorias, que
podem representar risco para o
desenvolvimento de obesidade
FÓRMULAS:
As “fórmulas infantis” para lactentes
correspondem a leites manipulados
industrialmente indicados para crianças que
não estão em processo de aleitamento
materno. A maioria dos produtos existentes
no mercado deriva do leite de vaca, atingindo
padrões nutricionais pré-estabelecidos,
porém mesmo com essa adaptação com
relação aos macro e micronutrientes, os
fatores imunológicos e bioativos não são
encontrados nesses substitutos.
Frente à impossibilidade da continuação da
amamentação, recomenda-se que crianças
menores de seis meses sejam alimentadas
com fórmulas infantis de partida, e de 6 a 12
meses, com fórmulas de seguimento para
lactantes.
A preparação desse composto deve ser feita
cuidadosamente, respeitando as instruções
de cada fabricante, sendo administrado em
porções adequadas ao peso e altura da
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
criança, devendo-se sempre respeitar as
regras de higiene, ainda mais valiosas nos
primeiros seis meses de vida.
O profissional de saúde deve orientar as
mães e cuidadores quanto à importância de
seguir as recomendações de diluição do
produto. Leites muito concentrados ou muito
diluídos podem ser prejudiciais para a saúde
da criança, pois podem resultar,
respectivamente, em uma sobrecarga renal
de sais e proteína ou desnutrição. Deve-se
também fornecer orientações quanto à
quantidade de fórmula ofertada e à
necessidade de oferecer água filtrada entre
as refeições.
A introdução de alimentos complementares
para bebês em uso de fórmula deve ser feita
normalmente aos seis meses de vida,
seguindo as mesmas estratégias
empregadas para crianças amamentadas.
IMPACTOS DA AMAMENTAÇÃO NO CRESCIMENTO
INFANTIL:
As maiores velocidades de crescimento do
peso e comprimento ocorrem nos primeiros
dois anos de vida e na adolescência. As
curvas de crescimento infantil, no entanto,
variam muito devido à complexidade de
fatores associados ao seu comportamento,
que abrangem não somente fatores
endógenos, compreendendo determinantes
biológicas, genéticas e étnicas, como
também, fatores exógenos, tais como as
condições nutricionais, culturais, ambientais
e sociais. O crescimento no primeiro ano de
vida é influenciado, principalmente, pelos
fatores exógenos. Até os dois anos estes
fatores afetam o crescimento de forma mais
determinante do que os endógenos, que só
começam a interferir no crescimento de
forma mais expressiva a partir dos dois anos
de idade.
Estudos observam que crianças alimentadas
com leite materno apresentam inicialmente
peso mais elevado que aquele registrado em
infantes que recebem fórmulas
industrializadas, ocorrendo depois uma
inversão nesses valores. No entanto, a perda
de peso neonatal é reduzida naqueles que se
alimentam por substitutos lácteos (3,5%
contra 6,6% em crianças amamentadas), e
sua recuperação é mais acelerada.
O diferencial no comportamento das crianças
amamentadas ao seio e com fórmulas
lácteas ou leite engrossado pode ser
atribuído ao fato de que o leite materno pode
não ser suficiente para suprir o aumento nas
necessidades nutricionais para o
crescimento de crianças após os quatro
meses de idade.
Pesquisas concluíram que as crianças
amamentadas ao seio, embora mais magras,
parecem regular seu consumo de calorias a
níveis mais baixos do que as que recebem
fórmulas lácteas, tendo uma taxa metabólica
mais baixa. As diferenças na utilização de
nutrientes ilustram a adaptabilidade biológica
da criança, que está munida de mecanismos
que promovem o crescimento normal
independentemente da variabilidade de seu
consumo de nutrientes.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A amamentação está associada à
aceleração do crescimento, podendo ganhar
peso e de comprimento nos primeiros meses
de vida. Esse fator pode, contudo, implicar
no fenômeno de casualidade reversa, ou
seja, o crescimento precário (ou a
prematuridade) podem induzir a alteração da
alimentação do bebê para compostos que
não o leite humano.
Essa interrupção do aleitamento exclusivo
está diretamente relacionada à introdução de
alimentos complementares, realizada
antecipadamente dentre crianças
alimentadas com fórmula. Diversos estudos
corroboram a necessidade de postergar a
alimentação sólida até os seis meses de
idade, com evidências apontando que
infantes que recebem precocemente
alimentos complementares podem sofrer um
retardo do crescimento físico. Além disso,
um estudo em Bangladesh constatou que
crianças com amamentação complementada
com outros alimentos ou crianças não
amamentadas têm um risco 2,4 vezes maior
de morte infantil por infecção respiratória e
3,9 vezes maior de morte por diarreia do que
as amamentadas exclusivamente.
A qualidade dos alimentos complementares
oferecidos em países em desenvolvimento
pode também estar associada ao diferencial
do crescimento, pois a oferta alimentar em
muitos países em desenvolvimento é,
geralmente, de teor nutricional inadequado
ou pode estar contaminada, proporcionando
um risco crescente de infecções intestinais,
além de oferecer baixa densidade calórica.
AMAMENTAÇÃO – TÉCNICAS E ORIENTAÇÕES:
Amamentar é um processo que vai muito
além da simples nutrição da criança.
Representa um momento de interações
profundas e significativas entre mãe e filho,
repercutindo no seu crescimento, em sua
capacidade imunológica, no seu
desenvolvimento (emocional e cognitivo), e
na manutenção de sua saúde a longo prazo,
além de beneficiar aspectos físicos e
psicológicos maternos.
A OMS classifica a amamentação em
diversas categorias, a saber:
 Aleitamento materno exclusivo: refere-se
à situação em que a criança recebe
somente leite materno (direto da mama,
ordenhado ou por outra fonte [banco de
leite]), sem outros líquidos e sólidos na
dieta, com exceção de medicamentos,
vitaminas, sais de reidratação oral ou
vitaminas de uso oral;
 Aleitamento materno predominante:
indica que a criança recebe, para além do
leite materno, água ou bebidas à base de
água (chás, infusões e água adocicada),
sucos de frutas e fluidos rituais;
 Aleitamento materno: o critério de
inclusão é a oferta de leite materno em
suas diversas apresentações,
independentemente de receber ou não
outros alimentos;
 Aleitamento materno complementado: é
definido como a dieta que associa o leite
humano a qualquer alimento sólido ou
pastoso no intuito de complementar a
alimentação, sem substituir o fator
materno;
 Aleitamento materno misto ou parcial:
ocorre quando a criança recebe vários
tipos de leite, incluindo o materno.
A amamentação deve, segundo a OMS e o
Ministério da Saúde, ser mantida de forma
exclusiva nos seis primeiros meses de vida,
podendo se estender por dois anos ou mais,
período no qual o leite materno continua
sendo fonte importante de vitaminas e
minerais, além de manter as funções
imunológicas.
TÉCNICA DE AMAMENTAÇ ÃO:
Ainda que a sucção do RN seja motivada por
reflexo, ele deve aprender a retirar o leite do
seio de forma eficiente, de modo a formar um
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
lacre perfeito, garantindo a formação do
vácuo, que estabiliza a aréola e o mamilo na
boca do bebê.
Nesse movimento, a língua eleva suas
bordas laterais e a ponta, assumindo a forma
de uma concha (canolamento), que conduz o
leite em direção à faringe posterior e ao
esôfago, induzindo o reflexo da deglutição. A
ordenha é feita pelo movimento ritmado da
ponta da língua para trás, comprimindo o
mamilo suavemente. O bebê consegue,
enquanto mama, respirar pelo nariz
normalmente, mantendo os padrões
respiratórios fisiológicos. Todo esse conjunto
de movimentos mandibulares (para baixo,
para a frente, para cima e para trás) permite
que a face cresça harmonicamente.
A técnica aplicada durante a amamentação,
ou seja, o posicionamento do conjunto mãe-
filho para amamentar/mamar e a pega e
sucção do bebê são imprescindíveis para
que a ordenha do leite seja bem-sucedida e
também para que os mamilos não sejam
lesionados.
Caso um dos integrantes desse processo
esteja mal posicionado, a boca do infante
terá mais dificuldade em circundar as
estruturas mamárias superficiais, resultando
no que se denomina como “má pega”. Esse
fenômeno atrapalha o esvaziamento
completo da mama, o que, por sua vez, pode
implicar na redução da produção de leite.
Outro resultado comum inclui o ganho
ponderal reduzido (mesmo que passe longos
períodos junto ao seio), pois há dificuldade
em retirar o leite final, mais denso
caloricamente.
Além de dificultar a alimentação da criança,
a pega deficitária machuca os mamilos que,
desprotegidos da fricção e compressão
(essa estrutura aloja-se inteiramente na boca
do infante), pode sofrer com lesões.
A mãe deve escolher uma posição que traga conforto
a ela e à criança
O profissional de saúde deve ter habilidade
suficiente para observar de forma crítica uma
mamada, prestando atenção aos seguintes
itens:
 As roupas devem ser adequadas,
deixando os seios totalmente expostos
sempre que possível, e permitindo o
movimento dos braços do infante;
 A mãe deve estar posicionada
confortavelmente, sem estar curvada
para trás nem para a frente, e relaxada,
sendo recomendável manter os pés
apoiados acima do nível do solo;
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
 O corpo do bebê deve estar próximo da
mãe, todo voltado para ela (“barriga com
barriga”);
 O pescoço do bebê deve estar levemente
estendido, não torcido (alinhamento entre
cabeça e corpo);
 O braço inferior do bebê não pode
impedir o contato entre os corpos de mãe
e filho;
 As nádegas da criança devem estar
apoiadas firmemente, promovendo leve
encurvamento de seu corpo;
 A mãe deve manter a aréola desobstruída
ao manipular a mama, não sendo
recomendado o “movimento de tesoura”;
 O bebê deve ter a cabeça posicionada ao
nível da mama, com o nariz na altura do
mamilo;
 A mãe deve esperar o infante abrir a boca
e rebaixar a língua antes de colocá-lo no
seio, observando se ele abocanha uma
porção da aréola (2cm além do mamilo);
 O posicionamento da face infantil deve
contar com o queixo tocando o seio,
mantendo o nariz livre e a boca bem
aberta colada à mama, sem comprimir os
lábios;
 A língua da criança deve encontrar-se
sobre a gengiva inferior (pode ser
necessário abaixar o lábio para averiguar
esse item), com suas bordas laterais
elevadas, sem escorregar do mamilo;
 A mandíbula do bebê deve ter
movimentação visível, com a deglutição
podendo ser verificada auditiva ou
visualmente.
A mãe deve ser educada a estimular que o
infante venha à mama, e não o contrário,
podendo fazer uso de movimentos para
estimular o contato quando ambos estiverem
prontos.
Quatro pontos são descritos pela OMS para
caracterizar o posicionamento e a pega
adequados:
 Pontos-Chave do posicionamento
adequado:
o Bebê com rosto de frente para a
mama, com nariz na altura do mamilo;
o Corpo da criança próximo do da mãe;
o Alinhamento entre cabeça e corpo do
bebê;
o Bebê bem apoiado.
 Pontos-chave da pega adequada:
o Mais aréola visível acima da boca do
bebê;
o Boca do infante bem aberta;
o Lábio inferior projetado para fora;
o Queixo junto ao seio.
Técnicas inadequadas de amamentação se
evidenciam por meio dos seguintes
aspectos:
 Encovamento das bochechas do bebê a
cada sucção;
 Presença de ruídos da língua;
 Seio esticado ou de aparência deformada
durante a amamentação;
 Mamilos com estrias vermelhas ou áreas
esbranquiçadas ou achatadas quando a
mama é solta;
 Dor ao amamentar.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Se a mama está muito cheia, a aréola pode
estar tensa e endurecidas, dificultam a pega
e a sucção, sendo recomendado que se
retire manualmente um pouco de leite do
seio ingurgitado.
ACONSELHAMENTO EM ALEITAMENTO MATERNO:
A equipe multiprofissional deve engajar-se
no aconselhamento das mulheres em
diversas etapas do processo da
maternidade, auxiliando-a na tomada de
decisões levando em consideração seu
conceito cultural e socioeconômico, para
além dos aspectos médicos e biológicos.
A promoção da amamentação ainda no
período gestacional tem impactos positivos
na prevalência desse hábito, especialmente
entre mães de primeira viagem,
representando um ótimo momento para
motivar a mulher e seu companheiro.
O exame das mamas é fundamental, pois por
meio dele podem-se detectar situações que
poderão exigir uma maior assistência à
mulher logo após o nascimento do bebê,
como a presença de mamilos muito planos
ou invertidos e cicatriz de cirurgia de redução
de mamas.
A “preparação das mamas” para o
aleitamento não é mais uma recomendação
de rotina, estando a cargo do próprio
desenvolvimento gestacional. Manobras que
envolvem o esticamento manual dos
mamilos ou esfrega-los com toalhas ásperas
na tentativa de fortalece-los não é
recomendado, pois na maioria das vezes não
apresentam efeito ou são prejudiciais. Em
mulheres com mamilos planos ou invertidos,
a intervenção logo após o nascimento do
bebê é mais importante e efetiva que
intervenções no período pré-natal. O uso de
sutiã adequado ajuda na sustentação das
mamas, pois na gestação elas apresentam o
primeiro aumento de volume.
Caso durante toda a gravidez a mulher não
perceba aumento nas mamas, será
necessário acompanhar de perto ganho de
peso do bebê, pois é possível que haja
insuficiência de tecido mamário.
Os primeiros dias após o parto são cruciais
para o sucesso da amamentação,
contemplando momentos de intenso
aprendizado para a mãe e para o RN. Nesse
contexto, os seguintes pontos devem ser
abordados pela equipe multiprofissionais:
 Comportamentos normais do bebê: a
família deve ser orientada de modo a
compreender que cada criança apresenta
um perfil distinto, podendo chorar mais ou
menos que outras, sem que seja
indicativo de prejuízos à saúde. Cabe à
mãe atender com prontidão às
necessidades do RN, permitindo a
formação de vínculo afetivo entre esse
binômio;
 Número e duração das mamadas: é
recomendado que a criança seja
alimentada sem restrição de horário e de
tempo mínimo de permanência na mama,
método que se chama amamentação em
livre demanda. Nos primeiros meses, é
normal que a criança mame com
frequência e sem horários regulares. Em
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
geral, um bebê em aleitamento materno
exclusivo mama de oito a 12 vezes ao
dia. O tamanho dos seios pode estar
associado à frequência de aleitamento,
mas não têm relação com a produção e a
“força” do leite produzido;
 Uso de mamadeiras e chupetas: esses
dois artifícios são contraindicados pois
podem induzir a “confusão de bicos”, que
reduz a qualidade da mamada pelo
lactente. Além disso, a oferta de
mamadeiras de água e chás também não
deve ser recomendado, pois relacionam-
se ao desmame precoce e à redução no
crescimento infantil;
 Aspecto do leite: a equipe de saúde deve
informar a mulher sobre a aparência de
seu leite para evitar pré-julgamentos que
possam afetar o discorrer da
amamentação. O leite no início da
mamada tem alto teor de água, sendo
mais translúcido, porém conta com
muitos anticorpos. Já o leite do meio da
mamada tende a ter uma coloração
branca opaca devido ao aumento da
concentração de caseína. E o leite do
final da mamada, o chamado leite
posterior, é mais amarelado devido à
presença de betacaroteno.
Para estimular a manutenção da
amamentação, é necessário que os
profissionais de saúde orientem a mãe sobre
a necessidade de manter uma alimentação
saudável, aumentando somente 500 calorias
por dia para suprir às necessidades da
lactação.
A alimentação ideal (variada e equilibrada)
de uma nutriz pode não ser acessível para
muitas mulheres de famílias com baixa
renda, o que pode desestimulá-las a
amamentar seus filhos. Por isso, a
orientação alimentar deve ser feita levando-
se em consideração, além das preferências
e dos hábitos culturais, a acessibilidade aos
alimentos. É importante lembrar que as
mulheres produzem leite de boa qualidade
mesmo consumindo dietas subótimas.
A hipovitaminose B em crianças
amamentadas por mães vegetarianas é uma
condição que merece atenção, pois essa
vitamina não é encontrada na alimentação
dessas mulheres.
O retorno ao trabalho também pode ser um
fator de complicação para a amamentação,
em especial a exclusiva. A manutenção do
processo nesse caso depende da ocupação
materna e da possibilidade de flexibilização
para o atendimento das demandas infantis.
Para as mães manterem a lactação após
retornarem ao trabalho, é importante que o
profissional de saúde estimule os familiares,
em especial o companheiro, quando
presente, a dividir as tarefas domésticas com
a nutriz e oriente a mãe trabalhadora quanto
a algumas medidas que facilitam a
manutenção do aleitamento materno, como
a intensificação no número de mamadas
quando estiver em casa, armazenar o leite
em baixas temperaturas (resiste por 12 horas
na geladeira e por 15 minutos no
congelador), além da ordenha do leite
materno, preferencialmente manual
(movimento em C).
SITUAÇÕES DE RESTRIÇÃO NO ALEITA MENTO
MATERNO:
Algumas poucas situações fazem com que o
aleitamento materno seja contraindicado
pelo médico, requerendo substituição parcial
ou integral da alimentação.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Os seguintes quadros induzem a não
recomendação absoluta da amamentação:
 Infecção materna por HIV ou HTLV-1 e
HTLV-2;
 Uso de medicações incompatíveis com a
amamentação (principalmente anti-
neoplásicos e radiofármacos), exigindo a
atualização constante do profissional de
saúde aos protocolos mais recentes;
 Criança afetada pela galactosemia
(incapacidade de processar a galactose,
presente em toda forma de leite animal).
Caso a mãe apresente uma das condições a
seguir, o aleitamento deve ser
temporariamente suspenso, podendo ser
retomado com a reversão do quadro inicial:
 Infecção herpética na mama
(amamentação mantida na mama sadia);
 Varicela: se a mãe apresentar vesículas
na pele cinco dias antes do parto ou até
dois dias após o parto, recomenda-se o
isolamento da mãe até que as lesões
adquiram a forma de crosta, e realiza-se
a administração de imunoglobulinas anti-
varicela para o neonato nas primeiras 96
horas de vida;
 Doença de Chagas aguda ou na
presença de sangramento mamilar;
 Consumo de drogas de abuso ilegais
(anfetaminas, ecstasy, cocaína, maconha
e opioides) e legais.
Em todos esses casos, deve-se estimular a
produção do leite com ordenhas regulares e
frequentes, até que a mãe possa amamentar
o seu filho.
Em casos de tuberculose, hanseníase,
hepatites B e C, dengue, tabagismo e
etilismo o aleitamento segue sendo
recomendado, tomando as devidas medidas
de proteção para evitar prejuízos ao bebê.
Alguns exemplos são o uso de máscaras,
redução do tempo de contato mãe-filho,
administração de vacinas, prevenção de
fissuras mamilares e redução/interrupção no
consumo de substâncias como cigarro e
bebidas alcoólicas.
PRINCIPAIS DISTÚRBIO S NUTRICIONAIS NA
PRIMEIRA INFÂNCIA:
A desnutrição pode ocorrer precocemente na
vida intrauterina (baixo peso ao nascer) e
frequentemente na primeira infância, em
decorrência da interrupção precoce do
aleitamento materno exclusivo e alimentação
complementar inadequada nos primeiros
dois anos de vida, associada, muitas vezes,
à privação alimentar ao longo da vida e à
ocorrência de repetidos episódios de
doenças infecciosas diarreicas e
respiratórias. A desnutrição possui múltiplos
determinantes, representados
principalmente pelas condições sociais da
família.
O déficit estatural é melhor que o ponderal
como indicador de influências ambientais
negativas sobre a saúde da criança, sendo o
indicador mais sensível de má nutrição nos
países.
O desenvolvimento precoce de obesidade é
um dado alarmante em todo o mundo, pois
pode gerar consequências a curto e longo
prazo, afetando a qualidade de vida do
indivíduo adulto. Sendo assim, a prevenção
desde o nascimento é necessária, tendo em
vista que os hábitos alimentares são
formados nos primeiros anos de vida. A
ingestão de alimentos com alta densidade
energética, ou seja, ricos em açúcar, gordura
e sal, pode prejudicar a qualidade da dieta e
diminuir o interesse dessas crianças por
alimentos saudáveis. O consumo desses
alimentos é facilitado na população de baixa
renda em função de seu baixo custo.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A deficiência de vitamina A também é um
importante indicativo do estado nutricional
não só do infante, como também da nutriz.
Esse composto tem papel fundamental para
o desenvolvimento da visão, o crescimento
ósseo e na resposta imunológica, tendo sua
suplementação indicada em áreas
endêmicas para sua deficiência.
A gordura armazenada ao redor da porção
A anemia por deficiência de ferro é um
glandular determina o tamanho das mamas
problema de saúde pública muito comum no
não lactantes. Seu corpo circular fica
Brasil, onde a prevalência em indivíduos com
apoiado sobre um leito que se estende
menos de 5 anos chega a 30,9% (com
transversalmente desde o esterno até a linha
valores de 25,5% na região Nordeste). Esse
axilar média, estendendo-se da 2ª a 6ª
quadro pode afetar seriamente o
costela. Dois terços dessa camada são
desenvolvimento estatural e cognitivo da
formados pela fáscia peitoral sobre o
criança, que pode manifestar baixo
músculo peitoral maior; o outro terço, pela
rendimento escolar, contribuindo assim para
fáscia que cobre o músculo serrátil anterior.
a transmissão intergeracional da pobreza,
Entre a mama e a fáscia peitoral há um plano
afetando o progresso geral do país.
de tecido conectivo frouxo ou espaço
MORFOFISIOLOGIA DA M AMA EM LACTAÇÃO: potencial, o espaço retromamário. Esse
plano, que contém pouca gordura, permite
ANATOMIA DA MAMA FEMININA: que a mama tenha algum grau de
movimento. Uma pequena parte da glândula
As mamas são as estruturas superficiais
mamária pode estender-se ao longo da
mais proeminentes na parede torácica
margem inferolateral do músculo peitoral
anterior, principalmente entre as mulheres,
maior em direção à fossa axilar, formando
sendo formadas por tecido glandular e tecido
um processo axilar.
fibroso de sustentação aderidos a uma
matriz adiposa, entremeados por vãos
sanguíneos, linfáticos e nervos.

As glândulas ou ácinos mamários são as

unidades funcionais da mama, localizadas
na tela subcutânea, entre os músculos
peitoral maior e peitoral menor. Essas
estruturas são formadas por uma camada
única de células epiteliais secretoras de leite,
e são envolvidas por células mioepiteliais
com uma rede capilar adjacente. Células
contráteis circundam os canais interlobulares
que se relacionam aos ácinos, comunicando-
os com o mamilo por meio dos canais
galactóforos/ductos lactíferos.
Os ductos lactíferos dão origem a brotos que
formam 15 a 20 lóbulos da glândula
mamária, que constituem o parênquima
local. Assim, cada lóbulo é drenado por um
ducto lactífero, que convergem e têm
aberturas independentes. Cada ducto tem
uma parte dilatada, situada profundamente à
aréola, chamada seio lactífero, na qual uma
pequena gotícula de leite fica retida na
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
lactante. Quando o neonato começa a sugar,
a compressão da aréola (e do seio lactífero
abaixo dela) expele as gotículas acumuladas
e estimula o neonato a continuar mamando
enquanto ocorre o reflexo de ejeção do leite,
mediado por hormônios. O leite materno é
secretado na boca do bebê, e não sugado da
glândula por ele.
As aréolas da mama contêm muitas
glândulas sebáceas, que aumentam durante
a gravidez e secretam uma substância
oleosa, que atua como um lubrificante
protetor para o aleitamento. A aréola e a
papila estão particularmente sujeitas a
fissuras e irritação no início da
amamentação.
As papilas mamárias são proeminências
cônicas ou cilíndricas situadas nos centros
das aréolas, não possuindo gordura, pelos
nem glândulas sudoríparas. As
extremidades das papilas são fissuradas e
os ductos lactíferos abrem-se nelas. As
papilas são formadas principalmente por
fibras musculares lisas circulares que
comprimem os ductos lactíferos durante a
lactação e causam a ereção das papilas em
resposta à estimulação de sucção.
As glândulas mamárias são glândulas
sudoríferas modificadas, portanto, não têm
cápsula nem bainha. O contorno
arredondado e a maior parte do volume das
mamas são produzidos por gordura
subcutânea, exceto durante a gravidez,
quando as glândulas mamárias aumentam e
há formação de novo tecido glandular. Os
alvéolos que secretam leite são organizados
de modo semelhante a cachos de uvas.
Na maioria das mulheres, as mamas
aumentam ligeiramente durante o período
menstrual em razão do aumento da liberação
dos hormônios gonadotrópicos (FSH e LH)
no tecido glandular.
DESENVLVIMENTO MAMÁR IO MEDIADO POR
HORMÔNIOS:
As mamas têm seu desenvolvimento iniciado
na puberdade, sendo estimulado pelos
estrogênios liberados pelo ciclo menstrual.
Esses hormônios induzem o crescimento da
porção glandular da mama e do depósito de
gordura responsável por dar massa a essa
estrutura. Esse desenvolvimento se acentua
ainda mais durante a gravidez, quando os
grandes níveis de estrogênio secretados
promovem a maturação completa para o
início da produção de leite.
Os ductos mamários são intensamente
estimulados pela secreção placentária de
estrogênio, permitindo seu crescimento e
ramificação. Simultaneamente, o estroma do
seio se expande, tornando-se um local para
o depósito de gordura.
Outros quatro hormônios mostram-se
igualmente importantes para o crescimento
desse sistema de ductos, o hormônio do
crescimento (GH), a prolactina, os
glicocorticoides adrenais e a insulina.
O desenvolvimento final das mamas também
requer a ação da progesterona. Após a
maturação glandular, esse hormônio, agindo
sinergicamente com as demais substâncias
secretadas, causará o crescimento dos
lóbulos mamários, multiplicando o número de
alvéolos e desenvolvendo o caráter secretor
das células presentes nessa região. Todas
essas ações são análogas àquelas
desempenhadas pela progesterona ao fim do
ciclo menstrual, visando preparar o epitélio
para agir na manutenção de uma nova vida.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
PROMOÇÃO DA LACTAÇÃO:
Embora o estrogênio e a progesterona sejam
essenciais ao desenvolvimento físico das
mamas durante a gravidez, um efeito
especial desses hormônios é inibir a
secreção de leite. A prolactina, por outro
lado, tem o efeito exatamente oposto,
promovendo-a. Esse hormônio é secretado
pela hipófise anterior materna, e sua
concentração no sangue da mãe aumenta
uniformemente a partir da quinta semana de
gravidez até o nascimento do bebê, época
em que já aumentou por 10 a 20 vezes do
nível normal não grávido.
A placenta secreta grande quantidade de
somatomamotropina coriônica humana, que
provavelmente tem propriedades
lactogênicas, apoiando assim a prolactina e
materna durante a gravidez. Mesmo assim,
devido aos efeitos supressivos do estrogênio
e da progesterona, não mais do que poucos
mililitros de líquido sejam secretados até
após o nascimento do bebê. A produção do
colostro, secretado durante os últimos dias
antes e nos primeiros dias após o parto é
cerca de 1/100 da taxa subsequente de
produção de leite.
Imediatamente após o nascimento, a perda
súbita da secreção de estrogênio e
progesterona placentários permite que o
efeito lactogênico da prolactina assuma seu
papel natural de promotor da lactação, e
durante os próximos 1 a 7 dias as mamas
começam a eliminar quantidades elevadas
de leite. Essa mudança requer secreção
adequada da maioria dos outros hormônios
maternos também, porém os mais
importantes são o hormônio do crescimento,
cortisol, paratormônio e insulina. Esses
hormônios são necessários para fornecer
aminoácidos, ácidos graxos, glicose e cálcio
fundamentais para a formação do leite.
Depois do nascimento do bebê, o nível basal
da secreção de prolactina retorna aos níveis
não grávidos durante algumas semanas,
mas, cada vez que a mãe amamenta o bebê,
sinais neurais dos mamilos para o
hipotálamo causam um pico de 10 a 20
vezes da secreção de prolactina, que dura
aproximadamente uma hora. Esta prolactina
age no seio, mantendo as glândulas
mamárias secretando leite nos alvéolos para
os períodos de amamentação subsequentes.
Se o pico de prolactina estiver ausente ou for
bloqueado em decorrência de dano
hipotalâmico ou hipofisário, ou se a
amamentação não prosseguir, as mamas
perdem a capacidade de produzir leite dentro
de mais ou menos 1 semana. Entretanto, a
produção de leite pode se manter por vários
anos se a criança continuar a sugar, embora
normalmente diminua consideravelmente
depois de 7 a 9 meses.
O hipotálamo tem papel essencial no
controle da secreção de prolactina.
Entretanto, esse controle é diferente em um
aspecto: o hipotálamo essencialmente
estimula a produção de todos os outros
hormônios, mas efetivamente inibe a
produção de prolactina. Consequentemente,
o comprometimento do hipotálamo ou o
bloqueio do sistema porta hipotalâmico-
hipofisário geralmente aumentam a secreção
de prolactina, enquanto deprimem a
secreção dos outros hormônios
supracitados.
Nesse sentido, acredita-se que a secreção
hipofisária de prolactina seja controlada em
sua quase totalidade pelo hormônio inibidor
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
da prolactina, formado no hipotálamo e
transportado à hipófise anterior pelo sistema
porta, agindo de forma quase idêntica à
dopamina, que pode reduzir em até 10 vezes
a liberação de prolactina.
Na maioria das nutrizes, o ciclo ovariano não
retorna até poucas semanas após o término
do aleitamento. A razão disso parece ser que
os mesmos sinais neurais das mamas para o
hipotálamo que causam a secreção de
prolactina durante o ato de sugar, inibem a
secreção do hormônio liberador da
gonadotrofina pelo hipotálamo. Isto, por sua
vez, suprime a formação dos hormônios
gonadotróficos hipofisários (FSH e LH).
Entretanto, após vários meses de lactação
em algumas mulheres, especialmente
naquelas que amamentam seus bebês
apenas parte do tempo, a hipófise começa a
secretar hormônios gonadotrópicos o
suficiente para restabelecer o ciclo sexual
mensal, muito embora a amamentação
continue.
PROCESSO DE EJEÇÃO DO LEITE:
A secreção do leite ocorre de forma contínua
nos alvéolos mamários, porém não flui
instintivamente pelos ductos e não causa
vazamentos constantes. O leite deve ser
ejetado em direção ao sistema ductal para
que o bebê tenha acesso a ele, processo
motivado por reflexos neurogênico e
hormonal, que envolve a ocitocina, produzida
na hipófise posterior.
Quando o bebê suga, ele não recebe quase
nenhum leite durante os primeiros 30
segundos. Primeiro é preciso que impulsos
sensoriais sejam transmitidos através dos
nervos somáticos dos mamilos para a
medula espinal da mãe e então para o seu
hipotálamo, onde desencadeiam sinais
neurais que promovem a secreção de
ocitocina, ao mesmo tempo em que causam
secreção de prolactina. A ocitocina é
transportada no sangue para as mamas,
onde faz com que as células mioepiteliais
(que circundam as paredes externas nos
alvéolos) se contraiam, transportando assim
o leite dos alvéolos para os ductos sob
pressão positiva de 10 a 20 mmHg. Em
seguida, a sucção do bebê passa a remover
o leite. Esse processo é denominado ejeção
ou “descida” do leite.
O ato de sugar uma mama faz com que o
leite flua não só naquela, mas também na
oposta. É especialmente interessante que
quando a mãe pensa no bebê ou o escuta
chorar, muitas vezes isso proporciona sinal
emocional suficiente para o hipotálamo
causar a expulsão de leite.
Diversos fatores psicogênicos ou a
estimulação simpatia generalizada no corpo
materno podem inibir a secreção de ocitocina
e, consequentemente, afetar a ejeção de
leite. É por essa razão que as mães devem
ter um período de transição para a lactação
sem transtornos de modo a obter sucesso na
amamentação de seu filho.
ORIENTAÇÕES NUTRICIO NAIS ATÉ O 1º ANO DE
VIDA:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A amamentação deve, como mencionado
anteriormente, persistir de forma exclusiva
até os seis meses de idade, período no qual
o leite materno é suficiente para atender às
demandas nutricionais do bebê. A partir
desse momento, a alimentação
complementar deve ser iniciada, de modo a
prover as quantidades necessárias de água,
calorias, lipídios, proteínas, vitaminas e
minerais por meio da introdução gradual da
dieta da família para a criança.
Por volta do sexto mês de vida, a criança já
desenvolveu os reflexos necessários para a
deglutição, manifesta interesse quando
observa o alimento e já consegue sustentar
a cabeça, facilitando a alimentação com
colher, além de iniciar a erupção dos
primeiros dentes, promovendo a mastigação.
A descoberta de novos sabores, texturas e
cores também é acentuada nessa fase, com
a descoberta de preferências alimentares,
fazendo com que a introdução de alimentos
não tenha finalidade somente metabólica,
mas sim de adaptar o infante a uma nova
fase da vida.
O sucesso desse processo depende da
paciência, do carinho e do afeto depreendido
pelos cuidadores da criança, que devem
contribuir positivamente nessa fase. A
introdução da alimentação complementar se
mostra como um momento no qual toda a
família pode aprender a comer de forma
saudável, além de permitir a interação mais
próxima entre o bebê e os demais indivíduos
em seu convívio (participação mais ativa do
pai, por não ser a mulher a única provedora
de alimento). O profissional de saúde deve
mostrar-se empático e disponível para
atender às demandas oriundas desse
período de grandes mudanças, colaborando
grandemente para o desfecho geral dessa
etapa.
A definição do período adequado para iniciar
a introdução alimentar deve levar em conta
não só a idade, mas também a maturidade
neuromuscular e fisiológica da criança,
direcionando especial atenção aos alimentos
disponíveis para esse fim e às condições de
preparo dos mesmos. Os pontos-chave
observados no desenvolvimento infantil são
o desaparecimento do reflexo de protusão (o
infante não joga mais para fora o que é
colocado em sua boca), a capacidade de
manter-se sentado sem apoio e de
movimentar a cabeça (importante para
sinalizar a rejeição do alimento).
A partir dos 4 meses de idade, ocorre a
depleção do estoque de ferro, e a
alimentação passa a ter papel fundamental
na prevenção da anemia. O ferro na forma
heme, presente nas carnes, é mais
facilmente absorvido, enquanto o ferro que
não está na forma heme, presente nos
vegetais, precisa estar na forma ferrosa e
depende do estado nutricional e dos outros
alimentos para ser absorvido. É importante
conhecer os alimentos que favorecem (sucos
cítricos e cereais crus/farelos [ácidos
orgânicos]) ou prejudicam (leite [cálcio –
afeta inclusive a hemoglobina heme] e
chás/cafeína [polifenóis]) a absorção para
incluí-los ou não nas refeições ricas em ferro,
como o almoço e o jantar. O período de
intervalo é de 2 horas, para não haver
interferência.
O leite materno, durante o intervalo de 6 a 12
meses de idade, contribui com metade da
energia necessária pela criança, e a 1/3 da
demanda calórica entre 12 e 24 meses.
Esses dados justificam a importância de se
manter a amamentação mesmo após a
consolidação da alimentação complementar,
uma vez que o leite ainda auxilia no
desenvolvimento imunológico.
Com início no 6º mês de vida, a criança deve
receber três refeições por dia (uma papa
principal e duas papas de fruta). Com 7
meses completos, a segunda papa principal
pode ser introduzida, composta for feijão,
arroz, carnes, legumes ou verduras. Aos 12
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
meses, devem ser fornecidas 5 refeições
diárias, oferecendo água filtrada ao longo do
dia.
Embora a amamentação deva continuar em
livre demanda após os seis meses de vida, é
possível estabelecer um esquema para a
administração da alimentação
complementar, de forma a aproximar
gradativamente os horários da criança aos
da família, o que pode auxiliar no estímulo à
ingestão do alimento e na consolidação de
significado para a refeição.
Nos primeiros dias após a apresentação
inicial da alimentação complementar não é
preciso se preocupar com o volume de
comida ingerida, sendo o foco promover uma
introdução gradual da criança ao alimento
para que ela se acostume. Além disso, em
decorrência de seu desenvolvimento
psicomotor, o infante não se satisfaz mais
em manter papel passivo no processo,
querendo explorar o ambiente e manipular a
comida, o que aumenta o interesse pelo
processo.
A dieta infantil deve ser a mais variada
possível, de modo a garantir que ela receba
todos os nutrientes necessários ao
crescimento saudável, e também para ajudar
a formar hábitos alimentares.
A energia requerida pela alimentação
complementar para as crianças em
aleitamento materno é de aproximadamente
200kcal/dia de seis a oito meses de idade,
300kcal/dia de nove a 11 meses de idade e
550kcal/dia de 12 a 23 meses.
Na fase inicial, a comida pode ser amassada,
peneirada ou batida em liquidificador até
adquirir consistência de papa ou purê, que
possui maior densidade energética. Com o
desenvolvimento da criança, passa a não ser
mais necessário que os alimentos tenham
consistência lisa, incentivando a mastigação
e apresentando o bebê a diversas texturas,
podendo ser oferecidos picados ou em
pedaços aos 8 meses de idade. Ao final do
1º ano de vida, a maioria das crianças já é
capaz de ingerir alimentos na mesma
consistência da refeição do restante da
família.
É válido salientar que a alimentação inicial
dessa criança precisa incluir ao menos um
elemento de cada grupo alimentar (cereais,
hortaliças/frutas, carnes/ovos e grãos), e não
deve conter níveis elevados de açúcar, sódio
e gorduras, de modo a estimular a
manutenção dessa preferência ao longo da
vida (infantes são mais propensos a gostar
do que lhes é oferecido frequentemente). Mel
e alimentos em conserva ou embutidos
também devem ser evitados, pois podem
conter esporos de Clostridium botulinum,
bactéria cuja toxina, facilmente produzida no
trato intestinal infantil, é responsável pelo
desenvolvimento do botulismo.
O consumo precoce de sal está associado ao
aparecimento de hipertensão arterial, e
consequente aumento no risco
cardiovascular, quando adulta. Opções de
ervas e temperos naturais podem ser
utilizados para temperar as refeições, o que
estimula a redução do uso do sal e evita a
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
adição de condimentos prontos e armazenamento
industrializados, e que apresentam em suas
composições elevado teor salino e de
gorduras, além de aditivos que deveriam ser
evitados.
Dez passos foram estabelecidos para
auxiliar no desenvolvimento da alimentação
saudável até o 2º ano de vida:
 Passo 1: “Dar somente leite materno até
os seus meses, sem oferecer água, chás
ou qualquer outro alimento”;
 Passo 2: “A partir dos seis meses,
introduzir de forma lenta e gradual outros
alimentos, mantendo o leite materno até
os dois anos de idade ou mais”;
 Passo 3: “Após seis meses, dar alimentos
complementares (cereais, tubérculos,
carnes, leguminosas, frutas, legumes)
três vezes ao dia, se a criança receber
leite materno, e cinco vezes ao dia, se
estiver desmamada”;
 Passo 4: “A alimentação complementar
deve ser oferecida de acordo com os
horários de refeição da família, em
intervalos regulares e de forma a
respeitar o apetite da criança”;
 Passo 5: “A alimentação complementar
deve ser espessa desde o início e
oferecida de colher; começar com
consistência pastosa e, gradativamente,
aumentar a consistência até chegar à
alimentação da família”;
 Passo 6: “Oferecer à criança diferentes
alimentos ao dia. Uma alimentação
variada é uma alimentação colorida”;
 Passo 7: “Estimular o consumo diário de
frutas, verduras e legumes nas
refeições”;
 Passo 8: “Evitar açúcar, café, enlatados,
frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos
e outras guloseimas nos primeiros anos
de vida. Usar sal com moderação”;
 Passo 9: “Cuidar da higiene no preparo e
manuseio dos alimentos: garantir o seu
e conservação
adequados”;
 Passo 10: “Estimular a criança doente e
convalescente a se alimentar, oferecendo
sua alimentação habitual e seus
alimentos preferidos, respeitando a sua
aceitação”.
A MATURAÇÃO DO TRATO INESTINAL:
Os primeiros mil dias de vida de um
indivíduo, iniciados no momento da
concepção, representam uma etapa crítica
para o desenvolvimento e para a saúde do
ser humano. Nesse contexto, o intervalo
entre o nascimento até os dois anos de idade
constitui uma importante parcela desse
período, marcado pela elevada velocidade
de crescimento e desenvolvimento dos
órgãos e sistemas.
A maturação do sistema digestório envolve
não só seus aspectos anatômicos e
funcionais, mas também o desenvolvimento
do sistema imunológico e microbiota
intestinais, e suas interações locais e
sistêmicas.
O intestino é um dos órgãos mais complexos
do corpo humano, tanto do ponto de vista
morfológico quanto em relação à sua
fisiologia. As células e tecidos que compõem
essa estrutura derivam de todos os três
folhetos embrionários (as células-tronco
intestinais originam-se do mesoderma, a
porção muscular do endoderma, e o sistema
nervoso entérico do ectoderma).
Além das funções digestiva e absortiva,
existe ainda o sistema endócrino intestinal,
atuante na regulação dos níveis sistêmicos
de nutrientes e no comportamento alimentar,
e a barreira intestinal, que impede que os
microrganismos e o conteúdo presente na
luz do intestino passem para o interior do
organismo. A função epitelial é exercida por
4 tipos celulares (enterócitos, responsáveis
pela absorção, e três tipos de células
secretoras, as células caliciformes
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
[produzem muco], as células de Paneth
[ação antimicrobiana], e as células
enteroendócrinas [modulam a saciedade, a
proliferação de células pancreáticas, a
absorção de nutrientes e a ação de outros
hormônios]).
Destaca-se, ainda, a intensa proliferação
epitelial a partir de células tronco, que renova
em poucos dias a superfície luminal do
intestino, e a complexa interação entre o
epitélio, os músculos lisos e o sistema
nervoso entérico para assegurar o fluxo
unidirecional proporcionado pelo
peristaltismo intestinal.
Durante a gestação, o desenvolvimento
intestinal se dá em 4 etapas básicas:
diferenciação celular, digestão, absorção e
motilidade. Ao nascer, o bebê passa por
múltiplas transições, sendo uma delas da
alimentação parenteral (influxo de nutrientes
pelo cordão umbilical), com pequeno volume
de líquido amniótico deglutido, para a
obtenção integral de substâncias pelo
colostro e leite materno. Esse é um momento
no qual o intestino passa por rápido
crescimento, tanto em comprimento (passa
de 100 cm para 200 cm nas primeiras
semanas de vida) quanto em superfície
absortiva, fortemente estimulado pelo
aleitamento materno.
No cólon, podem ser encontrados mais de
1013 microrganismos por grama de conteúdo
intestinal, compondo a microbiota local. Esse
número é tão vasto que se acredita que o
número total de genes dessas populações
seja cem vezes maior que o valor encontrado
no corpo humano. Há uma interação
benéfica entre essas bactérias (comensais)
e o hospedeiro, permitindo não somente a
ocorrência relações nutricionais
(fermentação que gera ácidos graxos de
cadeia curta absorvíveis e hidrólise de
lipídios e proteínas), como também a
comunicação com o sistema imune entérico.
No primeiro dia de vida, ocorre uma rápida
colonização do intestino do RN com
microrganismos oriundos da microbiota
materna (colônica ou vaginal) e do ambiente.
Os primeiros organismos a se fixarem
pertencem aos gêneros Escherichia e
Enterococcus. Posteriormente, bactérias
dependentes da anaerobiose, dos gêneros
Bifidobacterium e Bacteriodes são
observadas. Essa dinâmica evidencia que as
primeiras cepas bacterianas presentes são
anaeróbias facultativas, que contribuem para
o desenvolvimento de um ambiente
adequado para os tipos anaeróbios
obrigatórios.
A introdução precoce de alimentos
complementares à dieta do lactente causa
impactos à sua microbiota, que expressa
redução na atividade das bifidobactérias
(que ainda permanecem como
predominantes, e aumento na diversidade e
na atuação de bactérias dos gêneros
Clostridium e Bacterioides.
A colonização do TGI neonatal e do lactente
depende de diversos fatores, principalmente
da via de parto e da alimentação,
observando-se alterações no processo inicial
de desenvolvimento da biota intestinal, que
se assemelha àquele presente em crianças
nascidas por parto normal na marca do 2º
ano de vida. Infantes alimentados
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exclusivamente com leite materno também
terão evolução distinta em seu ecossistema
intestinal, influenciada pelos
oligossacarídeos intrínsecos à composição
do leite. É especulado também que bactérias
intestinais maternas consigam alcançar a
mama (hipótese enteromamária) ou pela
penetração nas glândulas mamárias até o
mamilo, sendo transferidas ao infante.
Estima-se que 800 ml de leite materno
podem conter até 105 a 107 unidades
formadoras de colônias. As bactérias que
vêm sendo identificadas em amostras de
leite materno pertencem principalmente aos
gêneros Lactobacillus, Staphylococcus,
Enterococcus e Bifidobacterium.
Os MAMPs (via molecular associada a
microrganismos) interagem com o sistema
imunológico e a barreira intestinal, afetando
a produção de muco ao estimular a
proliferação celular nas criptas e das células
de Paneth (o que aumenta a produção de
defensinas, peptídeos antimicrobianos).
Essa relação se dá por meio de “cross-talk”
com receptores específicos, como os TLR
(Toll-like Receptors). Caso respostas
inflamatórias sejam induzidas, elas podem
ser suprimidas por linfócitos T reguladores,
que produzem IL-10, mecanismo muito
importante para a consolidação da tolerância
oral.
DIGESTÃO DOS ALIMENTOS NO PERÍODO DE
ADAPTAÇÃO NEONATAL:
DIGESTÃO DE CARBOIDRATOS:
A digestão dos carboidratos nos primeiros
meses de vida de um bebê se dá de forma
distinta da de um adulto. Ainda que seja
evidente a presença de amilase salivar,
infantes não conseguem iniciar o
metabolismo de açúcares na boca/esôfago.
A atividade da amilase no intestino de bebês
corresponde a cerca de 10% dos níveis
encontrados na vida adulta, sendo atribuída
principalmente à glicoamilase, uma vez que
a amilase pancreática é pouco expressiva
até o 6º mês de vida. Independentemente da
via, é preciso um processo de adaptação
para que o bebê jovem digira amido, o que
pode levar dias ou semanas e explica a
frequência de distúrbios gastrointestinais,
principalmente de diarreia, em bebês que
recebem alimento com amido.
A atividade das dissacaridases, por sua vez,
é total, presente nas mesmas quantidades
que em crianças mais velhas, o que faz com
que a digestão dos açúcares do leite ocorra
normalmente, empregando delta-
glicosidases (hidrolisam sacarose e maltose)
e beta-glicosidases (hidrolisam lactose).
DIGESTÃO DE PROTEÍNAS:
A secreção gástrica de ácido clorídrico e
pepsina já é bem desenvolvida no RN a
termo, ainda que em pequenas quantidades,
que vão aumentando gradualmente com o
passar dos meses. De qualquer forma, a
digestão desses nutrientes ocorre
principalmente no intestino delgado, que
abrange atividade proteolítica similar à do
adulto. Assim, mesmo que possa ter
dificuldades em processar compostos como
a caseína, que dependem de manipulação
gástrica, a capacidade total de digestão
proteica é preservada no neonato. Mantém-
se a recomendação de evitar a ingestão
excessiva desses compostos, pois seus
metabólitos causam estresse renal,
interferindo no equilíbrio acidobásico.
Em bebês mais velhos, como nos adultos,
proteínas são absorvidas como aminoácidos
e peptídeos pequenos. A maior parte é
digerida ao passar pela mucosa, sendo
essencialmente aminoácidos livres os que
entram na circulação. Moléculas grandes,
que podem atuar como antígenos,
normalmente não atravessam a mucosa
intestinal. No período neonatal, contudo, e
durante tempo variável, o bebê é capaz de
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absorver moléculas intactas de proteínas, o
que constitui um possível mecanismo de
desenvolvimento da alergia à proteína do
leite de vaca.
DIGESTÃO DE GORDURAS:
Como a maior parte da energia do leite
advém de lipídios, é necessário um ajuste
drástico no metabolismo desse componente.
Em crianças maiores e adultos as gorduras
são inicialmente hidrolisadas no intestino
delgado, principalmente pela ação das
lipases pancreáticas. Os produtos da lipólise
são solubilizados pela ação dos sais biliares,
porém o RN apresenta pouca atividade
enzimática nesses locais, reduzindo a
quebra de gorduras à lipase lingual e às
lipases presentes no leite humano.
Lipases linguais são secretadas pelas
papilas da parte posterior da língua e atuam
no estômago. Os produtos da lipólise (ácidos
graxos e monoglicerídios) contribuem na
emulsificação, compensando a baixa
concentração de sais biliares. Este
mecanismo de lipólise pré-duodenal é
completado pela lipase do leite materno
(estimulada por sais biliares), importante
também para digestão e absorção de
gorduras e que ademais possui atividade de
esterase, vital para o uso da vitamina A do
leite.
APORTE DE VITAMINAS E MINERAIS:
Parece não haver problemas maiores na
utilização de vitaminas e minerais da dieta no
começo da vida, uma vez que a absorção de
vitaminas lipossolúveis está intimamente
ligada à absorção de gorduras.
O ferro é mais absorvido em bebês do que
em crianças e adultos, situação relacionada
à maior necessidade de minerais no início da
vida. Além disso, a biodisponibilidade do
ferro é muito maior no leite materno do que
no de vaca ou em fórmulas ou preparos
complementares. O mecanismo é
desconhecido, embora se observe que ela
diminui drasticamente quando se dão
alimentos sólidos de origem vegetal a bebês
amamentados.
ABSORÇÃO DE ÁGUA E ELETRÓLITOS:
A permeabilidade da mucosa intestinal à
água e eletrólitos é maior na infância, o que
normalmente não tem maior significado, mas
se torna importante em situações de alta
osmolaridade do conteúdo intestinal, que
intensifica a massagem pela mucosa e pode
causar distúrbios sistêmicos.
AVALIAÇÃO DO SESENVOLVIMENTO INFANTIL NO
1º ANO DE VIDA:
Com o avanço da tecnologia e o maior
acesso a serviços médicos de qualidade, foi
observada redução nos níveis de
mortalidade perinatal. Esse cenário fez vir à
tona uma maior incidência de condições
patológicas na infância associadas à história
de sofrimento pré, peri e pós-natal. Diante
disso, tornou-se necessário desenvolver
escalas e testes de triagem capazes de
avaliar o decorrer do desenvolvimento da
criança, investigando alterações de modo a
fornecer tratamentos precoces e mais
eficazes.
TESTE DE GESELL:
Conhecido atualmente como Escala de
Desenvolvimento de Gesell e Amatruda, é
um teste de referência que envolve a
avaliação direta e a observação da qualidade
da integração de comportamentos, sendo
aplicado em crianças de 4 semanas a 36
meses de idade.
As categorias analisadas nessa escala são:
comportamento adaptativo (cognição,
organização e adaptação sensório-motora),
comportamento motor grosseiro e delicado
(rotação da cabeça, sentar, manipular
objetos com as mãos), comportamento de
linguagem (expressiva ou receptiva), e
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
comportamento pessoal-social (relação com
o ambiente ao seu redor)
Esses componentes são observados nas
idades-chave de 4 semanas, 16 semanas, 40
semanas, 12 meses, 18 meses, 24 meses e
36 meses. O resultado final, quantitativo,
pode ser expresso sob a forma de quociente
de desenvolvimento, e é comparado a uma
escala elaborada com base em
comportamentos padronizados em cada
faixa etária.
O teste apresenta algumas limitações: não
considera a movimentação espontânea do
bebê, sua qualidade de movimentos e
baseia-se na teoria neuromaturacional do
desenvolvimento.
ESCALA DE DESENVOLVIMENTO INFANTIL DE
BAYLEY (BAYLEY II):
A Bayley II é uma avaliação padronizada das
habilidades mentais e motoras de crianças
entre dois meses e três anos de idade, cujos
principais aspectos avaliados são a sub-
escala mental (capacidades sensoriais e
perceptivas), sub-escala motora
(motricidade fina e ampla), e sub-escala
comportamental (avaliação qualitativa da
interação da criança com objetos e pessoas).
Quanto às propriedades psicométricas
dessa escala, pode-se verificar alta
sensibilidade (principalmente no exame de 8
meses) e alta especificidade, assim como
seus valores preditivos negativo e positivo
para atrasos no desenvolvimento.
Algumas limitações desse teste são a
exclusividade de aplicação por psicólogos e
a cautela necessária na aplicação em
prematuros
EXAME NEUROLÓGICO DO BEBÊ A TERMO
(PRECHTL E BEINTEMA):
Tem como objetivo identificar sinais
neurológicos anormais no período neonatal,
sendo o primeiro a utilizar os cinco estados
comportamentais (sono quieto, sono ativo,
despertar quieto, despertar ativo e choro)
como parte integrante da avaliação,
mostrando sua relação com outros reflexos
do neonato.
O Exame Neurológico do Bebê a Termo
pode ser utilizado como um instrumento
clínico ou de pesquisa, sendo extenso e
bastante detalhado. O padrão de exame
inclui um período de observação e outro de
análise. É realizado um exame geral de 10
minutos para determinar se é necessária a
avaliação completa de 30 minutos com 63
itens ao total, os quais avaliam a postura,
tono, reflexos e movimentos espontâneos.
TESTE DE DENVER:
O teste de Denver é o instrumento mais
utilizado para triagem de população
assintomática, pois permite fácil treinamento
e rápida administração. Foi desenvolvido
com o objetivo de direcionar o cuidado para
as crianças com fatores de risco de forma
precoce, e não de diagnosticar atrasos no
desenvolvimento.
O teste pode ser aplicado por vários
profissionais da saúde em crianças de 0 a 6
anos, classificando-a de forma dicotômica
em risco ou normal. É composto por 125
itens distribuídos na avaliação de quatro
áreas distintas do desenvolvimento
neuropsicomotor: motricidade ampla,
motricidade fina-adaptativa, comportamento
pessoal-social e linguagem. Esses itens são
registrados através da observação direta da
criança e, para alguns deles, solicita-se que
a mãe informe se o filho realiza ou não
determinada tarefa.
Apesar das mudanças e adaptações
realizadas desde sua criação, o teste de
Denver ainda tem como limitações a não
regulamentação no Brasil, o baixo fator
prognóstico e a insuficiência na avaliação de
mudanças qualitativas cronologicamente
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
TESTE DE TRIAGEM SOBRE O DESENVOLVIMENTO
DE MILANICOMPARETTI:
É um teste de critério de referência, o qual
fornece dados normativos. O objetivo do
teste é avaliar o nível funcional da criança e
detectar precocemente algum atraso ou
déficit neuromotor.
Esse exame de triagem avalia o
desenvolvimento motor desde o nascimento
até 24 meses. Observa-se tanto
comportamentos espontâneos (controle
postural e padrões de movimentos ativos)
quanto respostas evocadas (reflexos
primitivos, reações de endireitamento e
equilíbrio), analisando o desenvolvimento
motor com base na correlação entre as
aquisições funcionais motoras da criança e
as estruturas reflexas.
A construção do teste depende de
observações objetivas além de declarações
dos pais, o que constitui em alguns casos
prejuízo quanto à fidedignidade das
informações.
GRÁFICO DO DESENVOLVIMENTO MOTOR DE
ZDANSKA-BRINCKEN:
Tem como objetivos principais avaliar não só
o desenvolvimento de acordo com a idade,
mas o grau de aceleração ou retardo e
identificar diferenças entre desenvolvimento
motor e físico. Inicialmente criado para
avaliar o desenvolvimento postural de bebês
ao longo de vida, conta atualmente com
tabelas que analisam movimentos da cabeça
e do tronco, postura sentada, postura bípede
e locomoção.
NVENTÁRIO PORTAGE OP ERACIONALIZADO (IPO) :
O Inventário Portage Operacionalizado não
constitui um teste ou escala, mas um guia de
descrição de comportamentos de crianças
de 0 a 6 anos de idade, cujo objetivo é a
elaboração de uma proposta de intervenção
no ambiente natural de crianças a partir da
detecção do atraso no desenvolvimento, por
meio de treinamento específico dado aos
pais, visando a aceleração do desempenho
destas crianças durante a idade pré-escolar.
O IPO é composto de 580 itens que
abrangem cinco áreas do desenvolvimento
(socialização, cognição, linguagem,
autocuidados e desenvolvimento motor) e
ainda inclui uma área de estimulação infantil,
destinada a bebês na faixa etária de recém-
nascidos até os quatro meses de vida.
O guia apresenta limitações pois deve ser
usado em combinação com escalas de
desenvolvimento padronizadas, porque
serve apenas como método de avaliação não
padronizado e informal.
AVALIAÇÃO DOS MOVIMENTOS DA CRIANÇA
(MAI):
Apresenta como objetivos identificar o
lactente com risco de sofrimento e/ou lesão
do sistema nervoso central e monitorar as
alterações do bebê após a realização de
intervenções, possibilitando descrever seus
efeitos.
A MAI destina-se a avaliar o
desenvolvimento motor de crianças de até
um ano de idade. A aplicação adequada e
eficiente desse exame exige um examinador
com experiência em desenvolvimento infantil
e com habilidades específicas no manuseio
da criança.
O teste é composto por 65 itens distribuídos
em quatro aspectos: tono, reflexos primitivos,
reações automáticas, movimentos
voluntários eliciados. O teste não tem escore
normativo, mas foram criados perfis de
desempenho para quatro, seis e oito meses.
AVALIAÇÃO NEUROLÓGIC A DE BEBÊS
PREMATUROS E A TERMO (MÉTODO DE
DUBOWITZ):
Consiste em um exame sistemático e
rapidamente administrado (10 a 15 minutos),
tanto para prematuros como para bebês a
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
termo, com a finalidade de detectar
precocemente anormalidades neurológicas,
podendo ser aplicado entre 0 e 12 meses.
O teste é composto de nove itens de
neurocomportamento (capacidade do bebê
se habituar a estímulos luminosos e sonoros
repetidos, movimentos espontâneos do
corpo, reação defensiva, observação de
movimentos oculares anormais, orientação
auditiva e visual, e atenção aos estímulos
visuais e auditivos), 15 itens que avaliam o
tônus muscular e 6 itens que verificam os
reflexos primitivos e profundos. Durante a
aplicação do teste também são
acompanhadas as categorias do estado
comportamental, previamente descritas.
PEABODY DEVELOPMENTA L MOTOR SCALE
(ESCALA PDMS):
Tem como objetivos identificar lactentes com
atraso no desenvolvimento motor e suas
necessidades, avaliar o progresso motor ao
longo do tempo ou em resposta a
intervenção, bem como identificar os
objetivos motores e as estratégias de
intervenção.
A PDMS apresenta uma grande amostra de
dados normativos e é padronizada para
mensurar habilidades motoras grossas e
finas de crianças desde o nascimento até 5
anos de idade. A escala motora grossa
contém 170 itens cujas tarefas são: reflexos,
equilíbrio, atividades estáticas e de
locomoção, a recepção e propulsão de
objetos. A escala motora fina contém 112
itens. Sendo que as tarefas motoras finas
incluídas nesta avaliação são: pressão, o uso
da mão, a coordenação olho-mão e a
destreza manual.
Essa escala, no entanto, apresenta algumas
limitações, como a ênfase reduzida aos
aspectos qualitativos do movimento que
diferenciaria os padrões de movimentos
normais e anormais, e o não fornecimento de
todos os itens necessários para a
administração da escala motora fina e a
escala motora ampla, o que ameaça sua
padronização.
AVALIAÇÃO NEUROLÓGIC A DO RECÉM-NASCIDO E
DO BEBÊ (AMIEL -TISON E GRENIER):
Tem como objetivo avaliar o comportamento
neuromotor de bebês a termo e descrever
padrões de desenvolvimento a partir da 28ª
semana de gestação até o final do primeiro
ano de vida.
O exame deve ser feito no 3 a dia de vida e
no final da 1 a semana, em caso de
anormalidades. A avaliação inclui exame do
crânio, avaliação do tônus, reflexos primários
e a observação da postura e movimento. Os
marcos do desenvolvimento e habilidades
funcionais não são avaliados. A criança pode
ser classificada em normal, anormal ou
suspeita, e quando a anormalidade é
detectada esta pode ser designada como
leve, moderada ou grave.
ESCALA MOTORA INFANTIL DE ALBERTA (AIMS):
Tem como objetivo avaliar o
desenvolvimento motor amplo ao longo do
tempo dos recém-nascidos a termo e dos
pré-termos de 0 a 18 meses de idade,
identificando assim os bebês cujo
desempenho motor esteja atrasado ou
anormal em relação ao grupo normativo. É
uma medida observacional da performance
motora infantil que aborda a
neuromaturação, perspectiva da dinâmica
motora e avaliação da sequência do
desenvolvimento motor.
Os 58 itens avaliam os padrões motores e
posturas usando-se três critérios:
alinhamento postural, movimentos
antigravitacionais e superfície de contato
(sustentação de peso), com sub-escalas
determinadas para cada postura (prona,
supina, sentada e de pé). Ao final, os pontos
em cada postura são somados em uma
pontuação total de itens observados.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
É um teste de critério de referência, com
classificação percentual normatizada para
permitir a determinação de onde o indivíduo
se encontra em uma medida de habilidade
ou traço comparado com aqueles do grupo
referente.
PROBLEMA 2 – INTERMEDIÁRIA:
ALIMENTAÇÃO E INFECÇ ÕES RESPIRATÓRIAS DE
VIAS AÉREAS SUPERIORES (IVAS):
A desnutrição calórico-proteica (induzida
pela carência de macronutrientes, como
carboidratos, lipídios e proteínas) é um dos
mais importantes distúrbios nutricionais,
afetando milhões de indivíduos, com maior
gravidade dentre gestantes, idosos e
crianças, que sofrem com atrasos no
crescimento e no desenvolvimento. Essa
situação também representa uma das
principais causas de mortalidade infantil nos
países em desenvolvimento, motivada
principalmente por níveis elevados de
pobreza, conflitos armados, educação
precária, incidentes ambientais e acesso
reduzido aos serviços de saúde.
A manifestação clínica desse acometimento
é mais frequente em crianças entre seis e 24
meses de idade, associada ao desmame
precoce, a dietas pobres em proteínas e
infecções severas e/ou frequentes. Estima-
se que quase um terço da população infantil
residente em países em desenvolvimento
sejam desnutridas.
O diagnóstico da desnutrição é feito por meio
do exame físico e da coleta de dados
antropométricos, associados ao estado
nutricional por meio do cálculo do Índice de
Massa Corporal (IMC). A presença de
desnutrição pode ser identificada por
medidas que estão dois desvios-padrão
abaixo do que é recomendado para a curva
de peso por idade (baixo peso), de altura por
idade (retardo de crescimento, presente em
casos crônicos de desnutrição), e de peso
por altura (desnutrição aguda).
Cada uma das categorias supracitadas
apresenta um histórico de déficits
nutricionais. As restrições de crescimento,
que ocorrem com maior frequência nos
primeiros dois ou três anos de vida, estão
associadas à exposição a condições
econômicas adversas e ao saneamento
básico inadequado, tendo como principais
impactos a maior incidência de infecções e a
baixa reserva metabólica. A ocorrência de
baixo peso para a idade sugere um histórico
de saúde precária ou deficiências
nutricionais, abrangendo moléstias
recorrentes ou crônicas e a fome. O baixo
peso para a altura, por sua vez, indica a
presença de doenças agudas, perda de
massa corporal ou dificuldade em engordar.
Além dessa categorização, a desnutrição
infantil pode ser enquadrada em três grupos
de severidade baseando-se na comparação
entre o peso individual e a média de peso
para a idade (classificação de Gómez).
Casos leves (ou de primeiro grau) abrangem
crianças com peso entre 76 a 90% do valor
esperado pela idade; Casos moderados (de
segundo grau) implicam em peso entre 61 e
45% dos valores médios; Casos severos (de
terceiro grau) correspondem a indivíduos
que pesam 60% ou menos que a população
de mesma idade.
As formas severas de desnutrição surgem
em três formas clínicas principais: o
marasmo, caracterizado por peso
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
extremamente baixo, oriundo da ingesta elevada num período de redução ainda maior
deficiente de calorias e proteínas, da ingesta de alimentos.
habitualmente associado ao desmame
precoce; O Kwashiorkor, marcado por
retardo moderado no crescimento,
mudanças na coloração da pele e do cabelo,
edema, fásceis de lua cheia e
hepatoesplenomegalia, decorrente de
déficits proteicos; E o Kwashiorkor
marasmático, situação na qual ocorre edema
e peso baixíssimo para a altura.

Crianças desnutridas sofrem em maior

proporção com infecções gastrointestinais e
do trato respiratório, pois a primeira linha de
defesa contra os patógenos causadores
desses quadros consiste na imunidade inata
e suas barreiras físicas, mucosas ou
epiteliais, que são fortemente afetadas pela
carência nutricional, como a deficiência de
vitamina A (causa a morte de células
A interação entre desnutrição e infecções
produtoras de muco).
pode ser considerada sob dois aspectos, o
primeiro sendo o comprometimento das
defesas do hospedeiro, e o segundo,
representado pela doença agravando um
quadro prévio de nutrição deficiente ou
promovendo o seu desenvolvimento por
meio de aspectos fisiopatológicos. A
probabilidade do desenvolvimento de um
segundo quadro infeccioso é maior em
crianças desnutridas, tendo seu prognóstico
afetado.

Além dessas interações no processo A resposta de proteínas do sistema imune

patológico, a desnutrição também afeta o
sistema imune como um todo, uma vez que
ele tem demanda intensa por energia
derivada do metabolismo de nutrientes,
provocando balanço negativo de nitrogênio
(perdura após quadros de febre,
incentivando a perda de peso), aumento na
gliconeogênese e na oxidação de lipídios.
Durante a resposta imunológica, essa
situação se torna ainda mais grave, uma vez
que a necessidade calórica se mantém
depende tanto da severidade da infecção
quanto do estado nutricional do hospedeiro.
Esses compostos têm ação reduzida em
situações de desnutrição, seja pela redução
na disponibilidade de percussores ou na
diminuição da síntese de citocinas pró-
inflamatórias (principalmente IL-1 e IL-6).
Também é observada menor concentração
sérica de C3, proteína imprescindível para a
ativação do sistema complemento, que por
sua vez é necessário para a atividade
fagocitária antimicrobiana.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A desnutrição é um fator fortemente
associado a maiores taxas de mortalidade
em caso de infeções respiratórias agudas
IRA), representando risco mais relevante
para o desenvolvimento de pneumonia do
que de diarreia.
As IRA correspondem a 30-50% das
condições médicas pediátricas e a 20-40%
das hospitalizações nessa faixa etária. Os
fatores de risco para essas manifestações
clínicas são pobreza, baixa educação
parental, baixa renda familiar, não-
amamentação e, com maior destaque, a
desnutrição.
Entre 1980 e 2011, foram registradas
aproximadamente 100 mil mortes anuais
motivadas por infecções respiratórias
agudas no grupo de crianças com menos de
um ano no continente americano, com cinco
países sendo responsáveis por 85% dos
casos (Brasil [40%], México [19%], Peru
[14%], Bolívia [7%] e Haiti [5%]). A
Organização Pan-Americana de Saúde
estima que a porcentagem de óbitos
atribuídas a essas doenças varia entre 2 e
16%. Em países desenvolvidos, como
Canadá e Estados Unidos, esse número é de
apenas 2%.
Cerca de dois terços das crianças
desnutridas hospitalizadas por IRA são
diagnosticadas com pneumonia (maior
incidência em indivíduos acometidos pelo
Kwashiorkor marasmático), geralmente
causada pelo S. pneumoniae. Mesmo com a
disponibilidade de antibióticos, taxas de
mortalidade e mortalidade continuam altas,
com risco relativo oscilando entre 2,9 e 121,2
para graus severos de desnutrição e 2,5 a
35,3 em quadros moderados.
DOENÇA DO REFLUXO GA STROESOFÁGICO:
A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)
é o distúrbio esofágico mais comum entre
crianças, independentemente da faixa etária.
O refluxo esofágico em si significa
movimento retrógrado do conteúdo gástrico
pelo esfíncter esofágico inferior (EEI).
Episódios ocasionais desse fenômeno são
fisiológicos, principalmente em lactentes
(regurgitação normal), mas quando são mais
frequentes e persistentes, causando
esofagite ou acometimentos respiratórios,
passam a ser considerados patológicos.
Os fatores determinantes da manifestação
esofágica do refluxo abrangem a duração da
exposição (produto da frequência pela
duração de cada episódio), a acidez da
substância e a susceptibilidade do esôfago
ao dano.
A barreira antirrefluxo é o esfíncter esofágico
inferior, que forma uma válvula na junção
esofagogástrica. Em algumas situações
esse esfíncter não possui tônus adequado,
se relaxa anormalmente ou é acometido pela
hérnia de hiato, que evita que a pressão
sobre o EEI aumente de forma proporcional
àquela presente durante a contração
abdominal, podendo ser exacerbada em
caso de exercício intenso ou esforço
respiratório.
A duração de cada episódio de refluxo é
aumentada quando há ausência de
deglutição (durante o sono) e por defeitos no
movimento peristáltico esofágico. Esse
último fenômeno dá origem a um círculo
vicioso, uma vez que a esofagite, em seu
estado crônico, produz disfunção na
motilidade desse órgão, além de redução do
tônus esfincteriano e processo inflamatório
com encurtamento do esôfago, induzindo a
formação de hérnias de hiato.
O relaxamento transitório do EEI (RTEEI) é o
mecanismo-chave para a ocorrência do
refluxo. Os RTEEI correm
independentemente dos movimentos de
deglutição, reduzindo a pressão
esfincteriana para 0-2 mmHg, durando
menos de 10 segundos. Esse estímulo surge
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
ainda no período gestacional, em sua 26ª
semana. Cabe ao reflexo vagovagal,
decorrente de mecanorreceptores aferentes
na região do estômago e eferentes no
esfíncter esofágico, regular esses
relaxamentos.
A distensão gástrica (seja ela pós-prandial,
por deglutição de ar ou por rápido
esvaziamento estomacal) é o estímulo
principal para o RTEEI. O esforço em meio a
esse relaxamento torna o refluxo mais
provável, assim como adotar posições que
coloquem a junção esofagogástrica abaixo
da porção hidroaérea do estômago. Outros
fatores que influenciam a dinâmica entre
pressão e volume gástricos, como
movimento aumentado, esforço, obesidade,
ingesta volumosa de alimentos e aumento do
esforço respiratório, podem ter o mesmo
efeito.
O refluxo do lactente torna-se evidente já nos
primeiros meses de vida, com picos por volta
do 4º mês, resolvendo-se em grande parte
(88%) até o primeiro ano e desaparecendo
totalmente aos 24 meses de idade. Os
sintomas em crianças mais velhas tendem a
ser crônicos, crescendo e se reduzindo, com
resolução completa em somente metade dos
casos.
A DRGE, além de interferências ambientais,
pode ter causas atreladas a marcadores
genéticos, sendo uma evidência forte a
presença de uma forma autossômica
dominante em crianças com manifestações
otorrinolaringológicas e respiratórias,
presente no cromossomo 13q14, no locus
denominado DRGE1.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA DGRE:
A maioria das manifestações clínicas
comuns de doenças esofágicas podem
sugerir a presença de DRGE. O refluxo do
lactente manifesta-se com maior frequência
por meio da regurgitação (majoritariamente
pós-prandial), sinais de esofagite
(irritabilidade, engasgo, ânsia de vômito,
recusa alimentar) e retardo no crescimento,
com desaparecimento espontâneo.
As crianças maiores, por sua vez, podem
persistir com regurgitação durante os a idade
pré-escolar (2 a 4 anos), queixando-se de
dor abdominal ou torácica podendo continuar
até a adolescência. Alguns indivíduos podem
cursar com síndrome de Sandifer
(lateralização da cabeça, arqueamento e
torção cervical).
As manifestações respiratórias também
dependem da idade das crianças
acometidas. Em lactentes, a DRGE pode
apresentar-se como apneia
obstrutiva/estridor ou por agravamento de
infecções de vias aéreas inferiores, além de
otite média e sinusite. O quadro em crianças
mais velhas é frequentemente relacionado a
asma ou outras situações
otorrinolaringológicas (principalmente
laringite e infecções sinusais).
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA DOENÇA DO
REFLUXO GASTROESOFÁGICO:
Na maioria dos casos, principalmente ao
tratar de crianças mais velhas, o conjunto de
anamnese e exame físico detalhados são
suficientes para firmar o diagnóstico inicial,
sendo identificados pontos pertinentes à
confirmação da DRGE e da eliminação de
outras hipóteses. Alguns diagnósticos
diferenciais importantes a serem
considerados na avaliação de um lactente ou
criança com vômitos crônicos são alergias
alimentares, esofagite eosinofílica, estenose
pilórica, obstrução intestinal (especialmente
má rotação com volvo intermitente), doenças
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
inflamatórias não esofágicas, infecções,
erros inatos do metabolismo, hidronefrose,
pressão intracraniana elevada, ruminação e
bulimia.
Caso a entrevista clínica não seja suficiente,
alguns exames complementares podem ser
empregados, dentre os quais destacam-se:
 Estudo radiográfico com contraste:
analisa o esôfago e a porção superior do
TGI, sendo realizado em crianças com
vômitos e disfagia para avaliar acalasia
(peristaltismo defeituoso), estreitamentos
ou estenoses, hérnias de hiato ou
obstruções de saída gástrica ou
intestinal. Apresenta pouca sensibilidade
e especificidade no diagnóstico da
DRGE;
 Monitoramento prolongado do pH
esofágico: documenta de forma
quantitativa e sensível os episódios de
refluxo ácido, principal fenômeno a ser
acompanhado em quadros patológicos.
As indicações mais importantes para
monitoração do pH esofágico são para
avaliação da eficácia da supressão do
ácido durante o tratamento, avaliação de
episódios apneicos associados ao
pneumograma e avaliação de
apresentações atípicas de DRGE, como
tosse, estridor e asma;
 Endoscopia: possibilita o diagnóstico de
esofagite erosiva e suas complicações,
como estreitamentos ou esôfago de
Barret (desgaste epitelial por exposição
constante ao suco gástrico). A
endoscopia também é usada
terapeuticamente para dilatar as
estenoses induzidas por refluxo.
A terapia conservadora e a modificação de
estilo de vida são a base para o tratamento
da DRGE. As medidas dietéticas para
lactentes incluem normalização das técnicas
alimentares, dos volumes e da frequência,
quando deturpadas. O espessamento de
alimentos ou uso de fórmulas comerciais
favorece a ausência de regurgitação, diminui
a sua frequência diária e vômitos, e aumenta
o ganho de peso da criança, mas pode
acarretar em distúrbios nutricionais e
imunológicos se realizado de forma
descabida. As crianças mais velhas devem
ser estimuladas a evitar alimentos (tomate,
chocolate e menta) e bebidas (sucos ácidos,
café e refrigerante) que induzem o refluxo,
podendo também ser beneficiados pela
perda de peso (se obesos) e pela redução da
exposição ao tabaco.
Medidas de posicionamento podem trazer
conforto aos lactentes que ainda não são
capazes de definir espontaneamente sua
posição ao mamar. A posição sentada piora
o refluxo, e deve ser evitada em casos de
DRGE. Por mais que a posição supina
também intensifique o quadro de refluxo, ela
é recomendada durante o sono do bebê, de
modo a prevenir a síndrome da morte súbita
do lactente. Quando acordado e sob
observação, o infante deve ser mantido em
posição prona e carregado ereto,
minimizando assim o desconforto causado
pelo refluxo ácido. Em indivíduos mais
velhos, por sua vez, a orientação é que se
mantenham deitados para seu lado
esquerdo, com a cabeça elevada (mudança
na posição da cabeceira, evitando a flexão e
compressão do abdome) durante o sono.
A farmacoterapia é orientada para melhorar
a acidez do conteúdo gástrico ou para
promover seu movimento para longe da
boca. Os antiácidos são a terapia antirrefluxo
mais comumente usada e estão prontamente
disponíveis sem prescrição, promovendo
alívio rápido, mas transitório, dos sintomas
pela neutralização ácida. As principais
classes medicamentosas empregadas são:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
 Antagonistas do receptor da histamina 2
(ARH2 – ranitidina, cimetidina e outros):
inibem de forma seletiva os receptores de
histamina presentes nas células
secretoras do estômago. São
recomendados como terapia de primeira
linha por apresentar um bom perfil geral
de segurança, prescritos principalmente
em casos brandos a moderados de
DGRE;
 Inibidores da bomba de prótons (IBP –
omeprazol): têm efeito antirrefluxo mais
potente, uma vez que bloqueiam os
canais de hidrogênio-potássio ATPase no
final da via de secreção gástrica. Os IBP
são superiores aos ARH2s no tratamento
de esofagite severa e erosiva.
INFECÇÕES DE VIAS AÉ REAS SUPERIORES EM
CRIANÇAS:
Na faixa etária de seis meses aos três anos,
as crianças têm de seis a nove infecções
respiratórias agudas por ano. Entre os três e
cinco anos, esse número cai para três a
quatro por ano, e crianças acima dos cinco
anos apresentam um a dois quadros
anualmente, como ocorre nos adultos. Esse
é um comportamento fisiológico decorrente
do desenvolvimento do sistema imunológico
infantil.
As crianças apresentam condutos
respiratórios com lúmem mais estreito, o que
faz com que reduções mínimas por edema
ou obstruções mucosas aumentem a
resistências dessas vias e,
consequentemente, o trabalho respiratório.
A laringe é composta por quatro cartilagens
maiores (epiglote, aritenoide, tireoide e
cricoide, ordenadas de cima para baixo) e
pelos tecidos moles que circundam essas
estruturas. A cartilagem cricoide envolve as
vias respiratórias logo abaixo das cordas
vocais e define a porção mais estreita das
vias respiratórias superiores em crianças
menores de 10 anos.
As infecções respiratórias agudas podem ser
classificadas segundo sua localização
anatômica em: infecções das vias aéreas
superiores, que compreendem rinofaringite,
faringite e amigdalite, otite média, sinusite e
laringite; e infecções das vias aéreas
inferiores, tais como bronquite, bronquiolite e
as pneumonias.
RINOFARINGITE (RESFRIADO COMUM):
A rinofaringite tem etiologia
predominantemente viral, podendo ter
centenas de agentes etiológicos, dentre os
quais se destacam o rinovírus, o coronavírus,
o vírus sincicial respiratório, o adenovírus, o
parainfluenza, o influenza e o enterovírus.
Sua manifestação clínica se dá por meio de
coriza, espirros e tosse seca, podendo ou
não estar associada a febre (com
intensidade variável, dor de garganta e perda
do apetite. Vômito e fezes amolecidas com
muco podem acompanhar o quadro
respiratório. São infecções benignas,
autolimitadas, com duração da febre em
torno de três dias e dos sintomas
respiratórios ao redor de 10 dias.
A orofaringe, a mucosa nasal e a membrana
timpânica podem estar hiperemiadas e
inflamadas, causando certo desconforto.
A rinofaringite pode evoluir com
complicações decorrentes do aumento do
processo inflamatório infeccioso às
estruturas adjacentes, ou por diminuição da
liberação de secreções e consequente
crescimento bacteriano. As principais
complicações observadas são a otite média
aguda e as sinusites.
O tratamento desse quadro é sintomático,
tendo como estratégias mais utilizadas a
prescrição de antitérmicos, analgésicos e
soro fisiológico para limpeza das narinas.
OTITE MÉDIA AGUDA:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Clinicamente, a otite se apresenta como
evolução de um quadro de rinofaringite no
qual há persistência do quadro febril,
podendo ser referida dor de ouvido nas
crianças maiores e irritabilidade nas crianças
menores. Os principais agentes são
pneumococo, hemófilo ou moraxella.
O desenvolvimento de sintomas não ocorre
em diversas crianças, sendo a presença de
achados otoscópicos fundamental para o
diagnóstico adequado.
SINUSITE AGUDA:
A sinusite corresponde à inflamação dos
seios nasais e paranasais, principalmente os
maxilares e etmoidais, decorrente da
diminuição da drenagem de secreções num
quadro de infecção de vias aéreas
superiores. É importante ressaltar que os
seios etmoidais são os únicos que estão
desenvolvidos ao nascimento. Os seios
maxilares se tornam visíveis ao raio X no
sexto mês, e o seio frontal não é visível até
os três a nove anos.
Em quadros de evolução insidiosa, refere-se
persistência de rinorreia, tanto anterior
quanto posterior, acompanhada por tosse
diurna, persistindo por mais de dez dias,
intratável. A febre, geralmente de baixa
intensidade, e a dor com edema periorbital
ao acordar são sintomas frequentemente
associados. Crianças mais velhas podem
queixar-se também de dor nos seios da face
afetados. A sinusite aguda pode também
evoluir de forma súbita com febre alta, com
dor ou inflamação periorbital mais intensa.
Os diferentes seios podem originar
manifestações distintas, como a etmoidite,
que causa dor retro-orbital; a sinusite
maxilar, que gera dor na região do arco
zigomático ou na região acima dos molares;
e a sinusite frontal, na qual a dor é referida
na região das sobrancelhas.
Os patógenos que causam sinusite são
usualmente o pneumococo, o hemófilo não
tipável, a moraxella e o estreptococo beta
hemolítico
FARINGITE E AMIGDALITE:
No caso das amigdalites purulentas, o
agente etiológico mais comum é o
estreptococo beta hemolítico do grupo A,
sendo necessária a utilização de antibiótico
para o tratamento. Nesse quadro, as
manifestações típicas têm início com dor de
garganta intensa acompanhada de febre alta
(39 a 40ºC), de início súbito, e,
frequentemente, cefaleia e vômito. Ao exame
físico, as amígdalas encontram-se
hiperemiadas e hipertrofiadas com presença
de secreção e petéquias no palato mole. Os
gânglios da região cervical anterior
encontram-se aumentados.
A faringite com exsudato e a adenite cervical
são pouco frequentes nas crianças menores
de três anos, nas quais se observa um
quadro clínico mais insidioso, com febre
baixa, coriza concomitante e palidez. Nessa
faixa etária, a etiologia viral é predominante.
LARINGITE E CRUPE:
A inflamação da laringe se apresenta com os
quadros de Crupe (laringotraqueobronquite)
e epiglotite. O quadro clínico da
laringotraqueobronquite compõe-se de
sintomas iniciais de infecção das vias aéreas
superiores, especialmente em crianças
pequenas, que evoluem com a característica
“tosse de cachorro”, rouquidão e estridor
laríngeo. O estridor, nos casos leves, só é
percebido quando a criança se agita, porém,
pode ser audível mesmo em repouso,
acompanhado de falta de ar, retrações e
cianose nos casos mais graves. A febre é
geralmente baixa ou ausente.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Na epiglotite os pacientes apresentam um
quadro súbito de febre, dispneia, disfagia e
salivação abundante, voz abafada, retração
inspiratória, cianose e estridor suave. Esse
quadro é grave, podendo evoluir para parada
respiratória. O vírus parainfluenza é o agente
mais frequente, porém outros vírus como o
sincicial respiratório, o influenza, o
adenovírus e o micoplasma também podem
ser responsáveis. Na epiglotite os agentes
etiológicos responsáveis são o H. influenza,
o S. piogenes e o S. pneumoniae.
INFECÇÕES DE VIAS AÉ REAS SUPERIORES E A
CRECHE:
As crianças que frequentam creches têm
maior risco de desenvolver IVAS, pois estão
em contato constante com outros indivíduos
num período de imaturidade imunológica.
Em crianças saudáveis, espera-se que
algum episódio de infecção respiratória
ocorra nos primeiros seis meses de
exposição a esse novo meio. Caso haja
recorrência (3 ou mais casos num semestre),
é necessário reavaliar o paciente para que a
causa-base desse fenômeno seja
diagnosticada e tratada (ex.: alergias, que
induzem a produção de muco, favorecendo o
crescimento de culturas de agentes
infecciosos).
Para auxiliar a família a definir a “idade ideal”
de ingresso na creche, é necessário
considerar a maturação dos fatores
imunológicos, como IgA (presente no leite
materno, sendo pouco produzido até os 2
anos, com níveis que se elevam até os 10
anos), IgM (atinge valores ideais em torno
dos 4 anos), e IgG (é majoritariamente
materno ao nascimento, com ocorrência de
hipogamaglobulinemia fisiológica entre 4 e 8
meses, atingindo valores normais aos 4
anos).
Quando a creche for uma necessidade para
a família, pode ser considerado seu ingresso
aos 2 anos, mas recomenda-se que os pais
avaliem o local onde a criança vai ficar, as
condições de higiene, ventilação,
iluminação, o número de crianças por sala e
a presença de cuidadores tabagistas.
Nesse contexto de início da vida escolar, o
profissional de saúde deve orientar que o
calendário vacinal seja constantemente
atualizado, com destaque para as
imunizações sazonais contra influenza e as
doses da pneumocócica conjugada.
Também deve-se reforçar a necessidade de
higienização nasal, tanto no ambiente
domiciliar quanto na creche, uma vez que
evita o crescimento bacteriano no muco
retido, previne a respiração bucal e promove
a remoção de partículas irritantes. A criança
que já sabe assoar o nariz deve fazê-lo
suavemente, uma narina de cada vez, antes
de aplicar a solução salina isotônica. Em
lactentes ou crianças que ainda não têm
essa habilidade, deve-se retirar secreções
espessas ou crostas do vestíbulo nasal
utilizando-se de um cotonete umedecido
previamente à aplicação do soro.
DERMATITE DAS FRALDA S:
A dermatite das fraldas é um termo genérico
que abrange um conjunto de dermatoses
inflamatórias que afetam a região do períneo,
glúteos, abdome inferior e coxas,
frequentemente cobertos pela fralda.
Incluem-se nessa classificação,
principalmente com finalidade didática, as
erupções causadas diretamente pelo uso
dessa vestimenta, como dermatite das
fraldas irritativa primária (DFIP) e a dermatite
de contato alérgica ao material plástico da
fralda (rara); as dermatites exacerbadas pelo
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
uso das fraldas (psoríase, eczema atópico,
dermatite seborreica, miliária, candidíase e
dermatite de contato alérgica); e aquelas que
se manifestam nessa localização, mas não
se relacionam ao seu uso (acrodermatite
enteropática, histiocitose de células de
Langerhans, granuloma glúteo infantil,
dermatite estreptocócica perianal, impetigo
bolhoso, escabiose, sífilis congênita, AIDS).
Dessa forma, a dermatite das fraldas não
deve ser interpretada como um diagnóstico
específico, mas sim como uma indicação da
localização do acometimento, que pode ter
diversas etiologias.
A manifestação mais prevalente desse
quadro é a dermatite da área da fralda
irritativa primária, conhecida popularmente
como “assadura”. Trata-se de uma dermatite
de contato por irritantes primários, e afeta
mais de 50% dos bebês, sendo
provavelmente a afecção cutânea mais
prevalente na primeira infância. O uso de
fraldas ocasiona aumento da temperatura e
da umidade do local, macerando a pele, que
se torna mais susceptível à abrasão induzida
pelo contato prolongado com urina ou fezes.
Com frequência é acompanhada por
infecções secundárias por Candida albicans
ou por bactérias como Bacillos faecallis,
Proteus, Pseudomonas, Staphylococcus e
Streptococcus. A aplicação de óleos, pós e
sabões pode piorar o quadro.
Algumas crianças apresentam maior
predisposição para o desenvolvimento dessa
condição, o que levanta indícios precoces de
susceptibilidade a outros problemas
cutâneos crônicos, como a dermatite atópica.
Por causar grande desconforto ao infante,
essa doença deve ser encarada com cuidado
e severidade.
É difícil afirmar com precisão a prevalência
desse tipo de acometimento, uma vez que
são comumente tratados de forma
conservadora no próprio domicílio. Embora
possa ocorrer em qualquer idade, é mais
frequente nos dois primeiros anos de vida,
com pico de incidência entre o sétimo e o
décimo segundo mês, período de maior
utilização da fralda. Não há nenhum tipo de
predileção (sexo, raça ou padrão social).
Crianças mais velhas afetadas por alguma
situação de incontinência urinária/fecal
também podem desenvolver a dermatite,
com mesma apresentação e complicações
supracitadas.
Houve, nos últimos anos, diminuição na
frequência e na gravidade dos casos de
dermatite na área das fraldas, principalmente
devido aos avanços na tecnologia
empregada na sua produção, com o
lançamento de produtos superabsorventes.
FISIOPATOLGIA DA DER MATITE DAS FRALDAS
IRRITATIVA PRIMÁRIA:
A etiologia e a patogênese da DFIP ainda
não é totalmente compreendida, mas é
impressionante conhecer os principais
aspectos da fisiopatologia da doença para
que sejam instituídas medidas preventivas e
terapêuticas adequadas. Algumas crianças
são mais afetadas que outras, mas ainda não
há uma definição dos marcadores genéticos
envolvidos nesse processo. Sabe-se que a
susceptibilidade em indivíduos atópicos ou
seborreicos é bem maior, sendo a ingestão
de antibióticos associados à diarreia
considerada um fator de risco.
O papel das fraldas ainda persiste
desconhecido. No começo do século XX,
pesquisadores afirmavam que a amônia
excretada na urina fosse o principal
responsável pela etiologia dessa dermatite,
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
conhecida no período como dermatite
amoniacal. Em 1977, no entanto, estudos
descartaram a atuação desse composto
como preponderante para o Estudos sugerem que a redução de íons de
desenvolvimento das assaduras.
Na década de 1980, um modelo foi proposto
para explicar a forma como vários fatores
relacionados com o uso da fralda promovem
o desenvolvimento e a progressão dessa
dermatite. Nesse esquema, a dermatite da
área da fralda irritativa primária é
interpretada como o resultado final de uma
cascata de eventos, desencadeada
inicialmente por lesões no nível do estrato
córneo, induzidas por exposição a múltiplos
fatores, como hiper-hidratação, fricção,
temperatura, irritantes químicos, urina e
fezes. Após comprometimento da barreira
cutânea, vários fatores adicionais do mesmo
tipo potencializam essas alterações
originando um ciclo vicioso vulnerável às
infecções por agentes microbianos
oportunistas.
FRALDAS:
Apesar da denominação desse quadro, a
fralda, por si só, é raramente relacionada ao
desenvolvimento de dermatites de contato
ou alergias em crianças. As fraldas
descartáveis atualmente disponíveis
possuem três camadas: uma interna, que
funciona como filtro, uma intermediária, com
capacidade de absorção de líquidos, e, por
fim, uma camada externa à prova d’água.
Essa última linha de revestimento tem papel
fundamental na impermeabilidade do
produto, porém previne a respiração da pele,
contribuindo para o aumento da temperatura
e da umidade.
CONTATO COM URINA E FEZES:
Apesar da amônia não representar a causa
principal da DFIP, ela pode atuar como fator
agravante na pele já lesionada, uma vez que
sua produção causa aumento no pH cutâneo
e maior permeabilidade a substâncias
irritantes.
hidrogênio na pele pode aumentar a
atividade de proteases e lipases fecais, estes
sim fatores importantes na etiopatogenia das
assaduras. Quando em contato prolongado
com a superfície cutânea revestida pela
fralda, essas substâncias causam alterações
consideráveis na barreira física da epiderme,
que podem também ser degradada pelos
ácidos biliares.
FRICÇÃO:
A fricção pele com pele e pele com fralda
durante a movimentação da criança, por
mais que não seja um fator determinante,
representa, ao menos, uma condição
predisponente para o desenvolvimento das
assaduras.
Essa situação é apoiada pela predileção
dessa dermatite por superfícies convexas
(genitália, glúteos, parte inferior do abdome
e área proximal das coxas) e pelo não
acometimento das pregas cutâneas. Essa
localização peculiar faz com que a DFIP seja
conhecida como dermatite em W.
HIDRATAÇÃO:
O meio de hiper-hidratação é causado não
somente pelas fraldas, mas também pela
ureia presente na urina e por certas
manifestações clínicas, como a febre.
Mesmo com as fraldas modernas contendo
material absorvente (o que reduziu
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
significativamente a umidade), o meio quente
e úmido não foi totalmente eliminado.
O excesso de hidratação torna a pele mais
vulnerável à fricção sob a fralda. Além disso
pode causar maceração cutânea, que
culmina em mudanças na epiderme,
formando um ambiente ideal para o
crescimento e a disseminação de
microrganismos.
TEMPERATURA:
O uso da fralda dificulta a respiração da pele
subjacente, causando elevação da
temperatura no local. Esse aumento
promove a vasodilatação e,
consequentemente, a inflamação.
IRRITANTES QUÍMICOS:
Com o estabelecimento de um quadro de
dermatite, vários são os agentes que podem
intensificar a irritação cutânea, como
sabonetes, óleos, talco, banho de ervas ou
cremes. Alguns resíduos de detergentes
presentes nas fraldas, sabões usados no
banho ou até mesmo alguma loção aplicada
na pele do bebê podem ser considerados
potencialmente irritantes.
Algumas medicações de ação sistêmica
podem influenciar na motilidade e na flora
intestinal, assim como o controle autônomo
dos esfíncteres, enquanto outras podem ter
caráter abrasivo quando eliminadas pelo
corpo.
SUSBSTÂNCIAS COM PODER SENSIBILIZANTE:
A DFIP é por vezes confundida com a
dermatite de contato alérgica às fraldas, mas
essa situação é excepcional nos primeiros
anos de vida.
MICRORGANISMOS:
Em situações nas quais a barreira física da
pele foi degradada, seja por qualquer motivo,
há maior susceptibilidade a infecções
secundárias. O quadro de dermatite da área
das fraldas não é exceção, sendo rotineiros
achados simultâneos desse quadro com
superinfecção por Candida albicans e
Staphylococcus aureus, microorganismos da
flora cutânea e intestinal, bactérias como
Bacillos faecallis, Proteus, Pseudomonas e
Streptococcus.
A Candida albicans contamina
frequentemente crianças com DFIP com
mais de três dias de evolução, sendo
raramente isolada nessa região na ausência
de dermatite. Vários estudos sugerem forte
associação entre a gravidade da dermatite e
o número de colônias presente.
As bactérias fecais têm provável efeito
sinérgico com a Candida em produzir a
erupção. Além disso, o fungo é capaz de
penetrar a barreira epidérmica por liberação
de queratinases.
MANIFESTAÇÃO CLÍNICA :
A dermatite da área das fraldas irritativa
primária caracteriza-se por apresentar lesão
eritematosa brilhante, que varia de
intensidade ao longo do tempo. Pode
manifestar-se através de pápulas
avermelhadas associadas a edema e leve
descamação. Atinge as regiões de maior
contato com a fralda, com as pregas
cutâneas sendo comumente poupadas.
A candidose é considerada a principal
complicação da dermatite, e, quando ocorre
simultaneamente, o eritema se intensifica e
surgem lesões papulopustulosas satélites.
Quando o eritema começa a melhorar, a pele
torna-se enrugada, semelhante a um
pergaminho. Em crianças com menos de
quatro meses de idade, a primeira
manifestação pode ser um ligeiro eritema
perianal.
Se não houver tratamento, ou se infeccionar,
pode evoluir para maceração e exsudação,
formação de pápulas, vesículas ou bolhas,
erosão ou ulceração da pele, infecção do
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
pênis, vulva ou do trato urinário. Além disso,
pode até mesmo ocorrer sinéquias ou
cicatrização dos órgãos genitais.
Há dois subtipos menos frequentes da DFIP,
a saber:
 Dermatite de Jacquet:
É decorrente da persistência e da
agressividade do agente causador,
associado principalmente a fatores
agravantes, como produtos de uso tópico e
infecções fúngicas.
Caracteriza-se por pápulas firmes e
salientes, de coloração vermelho-escura,
que sucedem fase vésico-erosivo-ulcerativa,
com ulcerações ovais ou redondas, de fundo
raso e de configuração crateriforme. Nos
meninos, as úlceras podem ocorrer na
glande e meato urinário, levando a
desconforto e disúria.
Acomete, principalmente nádegas, coxas
superiores e, eventualmente, panturrilhas.
Ao regredir, esse tipo de dermatite pode
resultar em atrofia e hiperpigmentação.
Geralmente, acomete crianças com mais de
seis meses de idade.
 Dermatite das marés:
Caracteriza-se por eritema em faixa,
confinado às margens da fralda, na região de
coxas e abdome. Esse tipo de dermatite
resulta da fricção constante que ocorre na
borda da fralda, agravada por ciclos
consecutivos de umidade e secagem.
NEGLIGÊNCIA E DERMAT ITE NA ÁREA DAS
FRALDAS:
A omissão do cuidado pode ser observada
em duas apresentações distintas: a primeira,
sociocultural, acontece em situações de
miséria, por ausência das condições sociais
mínimas de sobrevivência ou ignorância
sobre os cuidados necessários ao bem-estar
e ao desenvolvimento adequado de uma
criança, representando o fracasso dos
mecanismos sociais, sendo a atenção
familiar direcionada apenas à sobrevivência;
A segunda, denominada como negligência
intencional, acontece em qualquer nível
sociocultural, associada à ausência de
vínculos entre pais e filhos. Esse último
quadro é frequentemente isolado, dirigido a
um dos membros da prole (não aceitação) ou
a todos os descendentes.
A forma mais frequente de violência por
omissão, seja ela intrafamiliar ou não, é o
não atendimento das necessidades básicas
do infante, trazendo prejuízos para a higiene,
educação, estado nutricional, orientação
moral, desenvolvimento (em qualquer uma
de suas faces), proteção e afetividade.
A dermatite de fraldas não pode ser
enquadrada diretamente como produto da
negligência, uma vez que pode ser causada
por fatores genéticos ou pela interação com
produtos cotidianos, sendo necessária uma
investigação minuciosa por parte do
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profissional de saúde, desenvolvendo a
melhor intervenção para cada caso.
O ACOMPANHAMENTO INFANTIL EM CASOS DE
INFECÇÕES RESPIRATÓR IAS E DERMATITES:
A PUERICULTURA:
A puericultura tem como base a consulta
médica periódica e sistemática, com foco na
prevenção e na educação em saúde, sendo
fundamental o estabelecimento de vínculo
entre o pediatra e o conjunto criança-família.
O atendimento ambulatorial em puericultura
é destinado para crianças saudáveis, agindo
para a prevenção, e não para o tratamento
de eventuais moléstias. O pediatra deve
estar apto a avaliar e identificar os seguintes
parâmetros:
 Estado nutricional da criança;
 História alimentar;
 Curvas de crescimento;
 Estado vacinal adequado para a idade;
 Desenvolvimento neuropsicomotor;
 Desempenho escolar e cuidados
prestados nesse local;
 Prática de atividade física diariamente;
 Acuidade visual;
 Condições ambientais de moradia;
 Cuidados prestados à criança em seu
domicílio;
 Desenvolvimento da sexualidade
(durante e após a puberdade);
 Qualidade e quantidade de horas de
sono;
 Capacidade auditiva;
 Saúde bucal;
 Exposição à mídia.
As atividades desempenhadas nesse
processo são descritas por um estudo
americano como uma “integração vertical”
dentro dos serviços de saúde, englobando
todos os profissionais da área e pessoal
auxiliar, e “integração horizontal” com as
instituições comunitárias (creches/escolas,
igrejas e serviços públicos de saúde),
permitindo que o paciente seja avaliado em
sua totalidade, inserido num contexto familiar
e comunitário.
A importância desse mecanismo de
acompanhamento não é restrita somente ao
aspecto clínico-epidemiológico da medicina
preventiva, mas diz respeito à educação em
saúde tanto da criança/adolescente quanto
de sua família, permitindo que decisões
sejam tomadas de forma autônoma,
embasadas em evidências científicas,
garantindo assim melhoras amplas na
qualidade de vida.
ACOMPANHAMENTO EM CA SO DE INFECÇÕES
RESPIRATÓRIAS:
As infecções respiratórias de repetição (IRR)
são bastante frequentes na prática clínica
pediátrica, acometendo um número
significativo de crianças menores de seis
anos de idade. Para definir as IRR são
empregados alguns critérios, como a
ausência de doenças de base que
justifiquem tais acometimentos e a presença
de ao menos uma dentre as seguintes
condições: seis ou mais IRA por ano; uma ou
mais moléstias respiratórias por mês; ou três
ou mais infecções anuais que afetem a
porção inferior desse sistema.
É importante que todas as crianças que
atendam aos parâmetros supracitados sejam
submetidas a uma investigação clínica,
procurando diagnosticar os fatores de risco
que elevam sua susceptibilidade à repetição
de processos infecciosos. Cerca de metade
desses pacientes serão saudáveis, ao passo
que os outros 50% serão compostos por
alérgicos (30%), portadores de doenças
crônicas (10%) e imunodeficientes (10%).
Nesse sentido, é recomendado ao pediatra
que:
 Identifique se a criança apresenta alguma
doença de base. A presença de infecções
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
com características similares, como
pouca gravidade e curta duração, é bem
diferente de infecções graves com curso
prolongado e complicações, às vezes
causadas por agentes oportunistas,
acompanhadas de atraso no crescimento
e, não raro, uma história familiar com
morte precoce na família. Dessa forma,
uma história clínica e exame físico
detalhados são, na maioria das vezes,
suficientes para excluir doenças mais
graves;
 Atente-se aos fatores de risco
relacionados as IRR em crianças
(frequentar creche, ter irmãos mais
velhos, ser exposto à fumaça do cigarro,
viver em ambientes com altos níveis de
poluição do ar, residir em locais com
aglomeração e inserir-se em contexto de
vulnerabilidade socioeconômica),
fazendo o possível minimizar seu
impacto. Evidências apontam que a
obesidade infantil e a presença de
infecções respiratórias sejam fatores
preditivos do desenvolvimento de IRR na
vida adulta;
 Reconheça a imaturidade imunológica
(principalmente quanto à resposta
adaptativa) nos primeiros anos de vida,
situação que predispões a criança a
essas infecções, sem repercussão
importante ou ligação com doenças pré-
existentes;
 Identifique quadros alérgicos. Os
sintomas de rinite alérgica são
frequentemente confundidos com os de
IVAS, fazendo com que a criança seja
erroneamente diagnosticada como
portadora de infecções respiratórias e
não receba o tratamento adequado para
as alergias. Crises de asma são muitas
vezes equivocadamente diagnosticadas
como broncopneumonias de repetição.
No entanto, esses dois quadros são
importantes fatores de risco para o
desenvolvimento de IRR tanto em
crianças como em adultos jovens. O
diagnóstico dessas condições pode ser
realizado por testes cutâneos de
hipersensibilidade imediata para
alérgenos intra e extradomiciliares, pela
determinação sérica da IgE total e
específica para alérgenos e espirometria
(verifica a quantidade de ar inspirada e
expirada pelo paciente). Essa
propedêutica tem como outro objetivo a
orientação adequada de profilaxias
ambientais, de modo a reduzir a
exposição aos alérgenos e otimizar o
tratamento;
 Reconheça o refluxo gastroesofágico,
que frequentemente provoca tosse
noturna e pode, portanto, ser confundido
com infecções respiratórias. É comum a
presença de manifestações
extraesofágicas, como erosão dentária,
sinusite, otite média recorrente, faringite,
laringite, pneumonia e fibrose pulmonar
idiopática, embora as mesmas sejam
mais prevalentes em adultos do que em
crianças.
A criança saudável apresentará crescimento
e desenvolvimento normais, encontrando-se
hígida entre os episódios infecciosos. Essas
manifestações não apresentam curso
prolongado ou complicações, sendo
causadas pela exposição aumentada a
agentes patogênicos presentes no meio
ambiente nos primeiros anos de vida,
evidente no momento de introdução à creche
ou escola, principalmente durante o outono e
o inverno.
Outra importante questão a ser considerada
é a imaturidade do sistema imunológico na
primeira infância. O recém-nascido
apresenta redução progressiva dos níveis
séricos de IgG, adquiridos passivamente
através de passagem transplacentária. Essa
redução se dá por catabolismo e se inicia por
volta do quarto mês de vida, estendendo-se
até o oitavo mês na maioria dos lactentes.
Esse período, que coincide com uma baixa
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
capacidade de síntese própria de
imunoglobulinas pelo lactente, é os quadros infecciosos apresentam evolução
denominado hipogamaglobulinemia
fisiológica, no qual a criança pode apresentar
IRR, na maioria das vezes sem repercussão
clínica importante. Eventualmente, essa
hipogamaglobulinemia pode se estender até
4 ou 5 anos de vida, normalizando-se após
essa idade.
Ainda nesse contexto, sabe-se que o
lactente apresenta níveis bastante reduzidos
de IgA, que é a principal imunoglobulina
presente nas mucosas dos tratos respiratório
e gastrintestinal. Dessa forma, níveis
reduzidos de IgA em mucosas podem
facilitar a penetração de alérgenos e
patógenos através desses epitélios. Sob
esse aspecto, o estímulo ao aleitamento
natural é de suma importância, na medida
em que o colostro e o leite materno fornecem
grandes quantidades de IgA específica
contra alguns patógenos respiratórios como,
especulando-se que esses anticorpos
espalhados pela mucosa do trato respiratório
possam impedir a aderência e a proliferação
de tais patógenos, tanto em vias aéreas
superiores como inferiores.
É evidente, ainda, que lactentes têm
capacidade limitada de produção humoral
contra patógenos dotados de cápsula
polissacarídica, como pneumococos,
Neisseria e Haemophilus influenzae B, o que
os torna mais suscetíveis a essas infecções
nessa fase da vida.
Crianças podem também ser acometidas por
imunodeficiências primárias (IDP), distúrbios
em um ou mais componentes do sistema
imunológico, majoritariamente decorrentes
de fatores hereditários e congênitos.
O espectro clínico das IDP é amplo,
geralmente se manifestando como infecções
de repetição por microorganismos
específicos ou por germes de baixa
virulência. Embora as infecções possam ser
de pequena gravidade, na maioria das vezes
prolongada, resposta inadequada à
antibioticoterapia habitual e elevados riscos
de complicações e hospitalizações.
Imunodeficiências humorais cursam com
infecções sinopulmonares por bactérias
extracelulares encapsuladas e
gastrintestinais por enterovírus e Giardia
lamblia. Nas formas graves, podem ocorrer
complicações como bronquiectasias,
doenças gastrintestinais, malignidade e
autoimunidade.
Deficiências da imunidade celular ocasionam
infecções graves por patógenos de
replicação intracelular, como vírus, fungos,
micobactérias e salmonela. Indivíduos
portadores de deficiências dos componentes
terminais do sistema complemento
geralmente apresentam infecções por
neissérias. Deficiências fagocíticas cursam
com infecções cutâneas, respiratórias,
neurológicas e do sistema retículo-endotelial
por estafilococos, bactérias Gram-negativas
e fungos.
O diagnóstico das IDP é fundamental,
requerendo uma anamnese detalhada,
contemplando o histórico familiar
(imunodeficiências ou consanguinidade) e a
história patológica pregressa (número de
infecções e sua duração, reações vacinais
graves e hospitalizações). O exame físico
deve verificar o crescimento pondero-
estatural, a presença de fenótipo típico de
manifestações de imunodeficiência e a
ausência de tonsilas (sem cirurgia) ou
linfonodos.
Para facilitar esse processo e acelerar o
diagnóstico, foi desenvolvida uma lista com
os dez sinais de alerta para
imunodeficiência, que são:
 Duas ou mais pneumonias no último ano;
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 Quatro ou mais novas otites no último
ano;
 Estomatites (inflamação da mucosa oral)
de repetição ou candidíase por mais de
dois meses;
 Abcessos de repetição ou ectima
(infecção cutânea purulenta que afeta a
derme);
 Um episódio de infecção sistêmica grave
(meningite, osteoartrite, septicemia, etc.);
 Infecções intestinais de repetição ou
diarreia crônica;
 Asma grave, doença do colágeno ou
doença autoimune;
 Reação à BCG ou infecção por
micobactérias;
 Fenótipo clínico associado a síndromes
com imunodeficiência;
 Histórico familiar de imunodeficiência.
No que se refere a orientações terapêuticas
fornecidas em caso de IVAS ou IRR, o
médico deve orientar a família quanto a
medidas gerais e específicas para cada
quadro, a saber:
 Tratamento geral:
Contempla o repouso durante períodos
febris, a hidratação (preferencialmente
direta, mediante aceitação infantil), a higiene
e desobstrução das narinas com solução
salina isotônica, evoluindo para a podem ser prescritos em quadros mais
administração de descongestionantes nasais
conforme necessidade, a umidificação do
ambiente e a prescrição de antitérmicos e
analgésicos de acordo com o quadro
individual do paciente.
 Tratamento específico:
o Rinofaringite aguda: apresenta
tratamento majoritariamente
sintomático, podendo ser
complementado, em casos mais
severos, pela prescrição de
Oseltamivir (inibidor da neuraminidase
viral);
o Otite média aguda: antes de iniciar a
antibioticoterapia, deve-se avaliar o
paciente para permitir uma possível
regressão espontânea do quadro,
reavaliando após 48 horas. Caso seja
necessário, o medicamento de escolha
é a amoxicilina, por um período de sete
a dez dias, que pode se estender por
até duas semanas em caso de
exsudato. A administração de
anestésicos tópicos, anti-inflamatórios
e analgésicos deve ser feita de modo a
reduzir a dor;
o Sinusite: podem ser prescritos
diversos antimicrobianos de amplo
espectro, como a amoxicilina (primeira
escolha), cefuroxina ou amoxiciclina
associada ao ácido clavulânico,
claritromicina e azitromicina. Caso as
manifestações não regridam em até 72
horas, é recomendada mudança
terapêutica. Corticosteroides podem
ser usados tanto de forma tópica nasal
quanto sistêmica, associados ou não
aos antibióticos;
o Faringite/Amigdalite: são empregados
antimicrobianos, com os antibióticos
de primeira escolha sendo a a
penicilina G ou a amoxicilina;
o Laringite: por ser um quadro
geralmente viral, o tratamento é
sintomático, porém corticosteroides
graves, com predileção pela
budesonida.
ACOMPANHAMENTO EM CA SO DE DERMATITE NA
ÁREA DAS FRALDAS:
Durante o atendimento de uma criança com
suspeita de quadro de dermatite, cabe ao
médico realizar o diagnóstico diferencial da
dermatite da área das fraldas dentre os
outros possíveis acometimentos, de modo a
fornecer as melhores estratégias
terapêuticas e profiláticas para aquele caso.
As principais manifestações que se
assemelham à DFIP são:
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 Candidose: decorrente de processos
inflamatórios causados pelo fungo
Candida albicans, é cada vez mais
comum na atualidade, devido ao uso de
antibióticos de amplo espectro (causam
diarreia e alteram o pH da região
perianal). Clinicamente, apresenta-se
como placas eritematosas que se podem
estender à genitália, associadas a
descamação periférica e pústulas
satélites eritematosas, acometendo as
regiões perineal anterior, perianal e
dobras;
 Dermatite de contato alérgica: representa
a verdadeira alergia à fralda, que pode
tanto agravar um quadro pré-existente de
dermatite quanto surgir isoladamente,
não sendo comum antes do segundo ano
de vida. Caracteriza-se por eritema e
descamação leves, e, eventualmente,
vesículas e pápulas, localizadas em
superfícies convexas ou pregas
(principalmente quando o quadro for
provocado pelo uso de produtos tópicos).
A suspeita surge quando a criança não
responde aos tratamentos habituais para
DFIP, e o diagnóstico é clínico, realizado
por meio de testes de contato;
 Dermatite atópica: normalmente poupa a
área da fralda, mesmo que os atópicos
sejam mais susceptíveis a agentes
irritantes. Quando há manifestação nessa
região, o aspecto das lesões é similar ao
da DFIP, porém tende a ser crônica e
relativamente resistente ao tratamento.
Podem ser observados exsudatos e
crostas secundárias a infecção
bacteriana, além de prurido e
escoriações, mais frequentes após os
dois anos de idade.;
 Dermatite seborreica: é uma doença
crônica que acomete com frequência a
área das fraldas, iniciando-se entre três e
12 semanas de vida. Clinicamente, são
placas eritematosas com escamas de
gordura nas pregas cutâneas e demais
superfícies convexas (há acometimento
posterior do couro cabeludo, face, pregas
retroauriculares, axilas, pescoço e
umbigo). Embora atinja
preferencialmente as pregas, não
apresenta lesões satélites, ao contrário
da candidose. O diagnóstico é clínico e,
geralmente, ocorre resolução
espontânea por volta dos três aos seis
meses de idade;
 Psoríase: é uma doença rara em
crianças, mas quando se desenvolve ao
longo do primeiro ano de vida, tende a
iniciar na região das fraldas (pregas
cutâneas e nádegas). Esse fato deve-se
ao fenômeno de Koebner, que descreve
a reprodução, em área traumatizada, de
lesões secundárias ao uso da fralda (as
escoriações decorrentes da fricção
estimulam a formação local de escaras
psoriáticas). Clinicamente, apresenta-se
com lesões bem delimitadas, com
escamas espessas e micáceas. Devem-
se pesquisar feridas típicas de psoríase
em outras localizações habituais da
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doença, como, por exemplo, cotovelos,
joelhos, face e couro cabeludo;
Além do diagnóstico acertado, o profissional
de saúde deve orientar a família acerca dos
cuidados dispensados a crianças com
dermatite, reforçando medidas de
prevenção, principalmente em indivíduos
saudáveis.
A remoção da oclusão ainda é a melhor
forma de prevenção e tratamento. Para isso,
recomenda-se um conjunto de medidas que
tem como objetivos principais manter seca a
área englobada pela fralda. Nesse sentido, é
necessário evitar irritação e maceração,
limitar a mistura e dispersão de urina e fezes,
e reduzir seu contato com a pele, o que ajuda
a preservar a função de barreira cutânea e
manter, sempre que possível, pH ácido.
Dessa forma, busca-se eliminar ou minimizar
todos os fatores que influenciam na
etiopatogenia desse quadro. A orientação
deve perpassar cinco pontos principais:
 Frequência da troca de fraldas: devem
ser repostas quando sujas de urina, de
modo a não superar a capacidade de
absorção do material, evitando assim seu
contato com a pele. Fraldas com fezes
precisam ser trocadas imediatamente.
Em RN, a toca deve ser horária,
passando a regime de intervalo de 3 a 4
horas em bebês mais velhos;
 Capacidade de absorção das fraldas: os
materiais empregados na produção das
fraldas descartáveis são cada vez mais
aptos a absorver grandes volumes de
líquido, transformando-se num gel que
evita a interação da pele com a urina.
Ainda assim, a oclusão é maior nesses
produtos do que em fraldas de pano, e o
contato com as fezes é mantido, fazendo
com que o uso de uma mesma fralda por
longos períodos seja contraindicado;
 Fraldas descartáveis x Fraldas de pano:
os materiais superabsorventes presentes
no primeiro grupo são mais eficazes em
manter a pele seca e não despertam, até
então, reações alérgicas, mas alguns
profissionais seguem recomendando o
uso de fraldas de pano, uma vez que
reduzem a oclusão e o aumento da
temperatura. Para melhor ajuste e
diminuição dos danos, a fralda deve
ajustar-se ao corpo;
 Controle de infecções: a C. albicans
contamina frequentemente a região
afetada pela dermatite, representando a
principal complicação dessa doença. A
presença desse fungo deve ser
pesquisada e tratada em quadros com
mais de três dias de evolução;
 Higiene diária: é suficiente para a limpeza
da urina somente um algodão umedecido
em água, sem a necessidade de
sabonetes, que podem induzir dermatite
de contato. Em caso de contato com
fezes, sabões brandos são
recomendados. Os lenços umedecidos
devem ser usados somente em situações
de deslocamento, pois também podem
causar lesões à barreira cutânea.
Preparações tópicas para prevenção da
dermatite não precisam ser usadas por
crianças com pele saudável, uma vez que
seus aditivos têm o potencial de causar
sensibilização de contato, irritação ou
toxicidade cutânea.
Para evitar a umidade excessiva da área
das fraldas, minimizar as perdas
transepidérmicas de água e diminuir a
permeabilidade da pele, utilizam-se
cremes ou pastas mais espessas e
aderentes, à base de óxido de zinco,
dióxido de titânio e amido ou cremes com
dexpantenol. Esses produtos podem
ajudar a prevenir o contato das fezes com
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a pele já danificada, pois se aderem à
epiderme. Não são facilmente removidos
com água, mas sim com óleos e não
devem ser retirados a cada muda de
fralda para não irritar a pele. Sua
utilização pode ser dispensada se as
medidas de higiene e troca forem
executadas adequadamente.
O tratamento medicamentoso da dermatite
da área das fraldas baseia-se em medidas
simples, aplicadas conforme a gravidade do
acometimento e da origem deste.
Para dermatites leves, a intervenção mais
importante é o aumento na frequência da
mudança das fraldas e a utilização de
modelos superabsorventes. Devem-se
evitar, também, fraldas de pano, que
permitem maior contato da urina e fezes com
a pele e exigem medidas de eliminação de
microorganismos (lavagem com sabão e
fervura). É recomendável, na limpeza da
área afetada, primeiro usar algodão
embebido em óleo, para remover o óxido de
zinco e resíduos de fezes aderidos à pele, e
só depois proceder à lavagem com
sabonetes pouco agressivos e água
corrente.
Se o eritema persistir, é possível associar
corticoide tópico de baixa potência, como
hidrocortisona a 1%, no máximo duas vezes
ao dia por dois a sete dias a fim de aliviar a
inflamação. Deve-se ficar atento também aos
efeitos colaterais sistêmicos dessa
substância, como síndrome de Cushing e
hipertensão intracraniana, que têm sido
relatados mesmo com os de baixa potência,
pois, além da oclusão (que aumenta o efeito
tópico), a superfície corporal dessa área é
significativa.
Se ainda assim a dermatite não melhora,
mantendo eritema intenso e pústulas, a
suspeita principal é de infecção por Candida.
Nesse caso, deve ser prescritos cremes com
ação fúngica, como o cetoconazol, com duas
aplicações diárias por sete a 15 ou nitrato de
miconazol 1% tópico, ambos eficazes e
seguros. O corticoide pode ser revezado
com o antifúngico, aplicando-os antes do
creme de barreira.
Infecções bacterianas são mais raras com as
fraldas descartáveis do que eram com as de
pano e podem ser tratadas com neomicina,
gentamicina ou mupirocina tópicas a 2%, não
devendo ser aplicadas em mais de 20% da
superfície corporal, pois há risco de
nefrotoxicidade.
Caso ocorra piora nos sintomas prévios,
mesmo com tratamento adequado, devem
ser pesquisados os diagnósticos diferenciais
supracitados. O acompanhamento de
crianças com dermatite deve ser regular e
contínuo, intensificado nos períodos
diarreicos e quando há uso de antibióticos
sistêmicos.
O FUNCIONAMENTO DA C RECHE PARA O
DESENVOLVIMENTO INFA NTIL:
Com a Revolução Industrial, no século XVIII,
diversas mudanças socioeconômicas e
ideológicas alteraram a dinâmica familiar e o
papel feminino perante a comunidade,
levando ao surgimento de instituições
educacionais capazes de cumprir as
atividades anteriormente exclusivas ao
componente materno, como cuidar de
crianças.
Inicialmente, a creche tinha como funções a
guarda e proteção infantil, particularmente da
população mais pobre, sendo caracterizada
como uma instituição assistencial, caritativa.
Entretanto, a partir da Constituição Federal
de 1988, em que as crianças de zero a seis
anos passaram a ser detentoras de direitos,
a educação infantil tornou-se fundamental e
foi incorporada aos objetivos das creches e
pré-escolas. A partir dessa mudança, essas
instituições, locais onde as crianças passam
a maior parte do tempo, tornaram-se
responsáveis também pelo apoio às famílias
durante o desenvolvimento infantil. Além
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
disso, essas organizações estão envolvidas
no direito das crianças à socialização, às
vivências infantis e cuidados específicos,
bem como atendimento em educação,
acesso ao saber e necessidade de
desenvolvimento intelectual.
Para permitir o desenvolvimento integral e
harmonioso dessas crianças, é necessário
que a creche apresente profissionais atentos
e capazes de intervir e prevenir situações
associadas ao equilíbrio saúde-doença, já
que entre as fases de vida de um indivíduo a
primeira infância é uma das mais vulneráveis
às condições do meio e aos agravos à
saúde, justificando-se a necessidade de
mais atenção nas creches, uma vez que os
quadros mais prevalentes nesse grupo
(infecções respiratórias, diarreia, desnutrição
e alterações cutâneas) são passíveis de
prevenção.
A creche, em sua estrutura organizacional,
conta com um conselho diretor consultivo e
normativo, formado por representantes de
funcionários, pais e da Coordenadoria, além
da Coordenação Pedagógica e da Direção
da Creche. Esse Conselho é acionado para
deliberar questões de natureza política e
administrativa que extrapolem as atribuições
da Direção, estabelecendo a filosofia da
Instituição. Os principais componentes da
creche são:
 Direção: composta pelo Diretor e Vice-
Diretor, que têm como principais
atribuições planejar, administrar,
coordenar e supervisionar o pessoal e os
serviços, bem como participar do
atendimento global às crianças;
 Secretaria: contempla o setor
encarregado de questões administrativas
relativas aos funcionários, materiais e ao
patrimônio;
 Nutrição: essa área está encarregada
em coordenar, supervisionar e orientar os
serviços de produção de alimentos, tanto
na cozinha quanto no lactário, devendo
atender aos diversos cardápios servidos
diariamente. Também acompanha as
crianças, orienta os professores e presta
atendimento individualizado aos pais,
estando alerta a restrições alimentares e
outras demandas que possam ocorrer no
cotidiano;
 Pedagogia: deve garantir a execução da
Proposta Pedagógica da Creche, visando
promover o desenvolvimento das
crianças em cada uma das faixas etárias
e a adequação do trabalho pedagógico
aos recursos disponíveis na comunidade.
Também acompanha o crescimento dos
grupos nas diferentes áreas, promovendo
a integração entre família e escola,
visando coerência na ação pedagógica
junto à criança;
 Psicologia: esse setor trabalha de forma
integrada com os demais componentes,
tendo por objetivo favorecer o
desenvolvimento global das crianças,
acolhendo as necessidades dos
diferentes segmentos que compõem a
comunidade atendida na creche,
contribuindo para o bem-estar nas
relações entre criança-família-escola;
 Saúde: conhecido também como setor de
enfermagem, atende as crianças em suas
intercorrências diárias, acompanha o
crescimento e desenvolvimento das
mesmas através do controle pôndero-
estatural e desenvolve projetos
educativos de saúde junto com os
professores. Também presta
esclarecimentos aos pais no cuidado
integral da criança, atuando como apoio
para outros setores da creche. Os
funcionários do local, da mesma forma,
contam com atendimento dos
trabalhadores desse setor nas avaliações
e acompanhamentos de saúde;
 Ludoteca: é um componente estrutural da
organização da creche, contemplando
um acervo de livros infantis para diversas
faixas etárias, disponíveis para toda a
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comunidade dessa instituição (alunos,
pais, professores e outros funcionários),
além de materiais didáticos, como jogos
e fantoches, aos quais as crianças têm
acesso mediante a supervisão dos
docentes, proporcionando assim
momentos de leitura e lazer. Uma sala de
vídeo, anexa a esse espaço principal, é
usada na exibição de filmes, desenhos e
documentários que se relacionam aos
projetos em desenvolvimento.
A responsabilidade do adoecimento da
criança que frequenta essas instituições de
ensino é, por vezes, direcionada a um dos
componentes do conjunto família-escola-
serviço de saúde. No âmbito da creche, a
concepção saúde-doença normalmente é
baseada em um modelo curativo centrado no
médico, atribuindo toda a responsabilidade
aos profissionais de saúde de modo
unissetorial. Não existe, por parte dos
educadores, a compreensão holística de que
a saúde das crianças é influenciada por
fatores fisiológicos, psicológicos, sociais,
culturais e econômicos. Apesar de a
educação e a saúde em creches serem
complementares, parecem estar
distanciadas e fragmentadas na prática,
talvez por não se constituírem como temas
relevantes ou até mesmo pela falta de
capacitação das educadoras infantis nas
temáticas referentes à saúde das crianças.
As práticas em saúde podem ocorrer em
qualquer espaço social, a fim de atingir
condições de vida que promovam a saúde,
buscando melhoria da qualidade de vida. E
como as crianças não têm autonomia para
cuidarem da própria saúde, elas têm o direito
de receber cuidados e apoio na formação de
valores e no desenvolvimento de hábitos de
vida saudáveis.
PROBLEMA 3 – ABERTURA:
O DESENVOLVIMENTO DO SISTEMA IMUNE NA
CRIANÇA:
Durante a vida intrauterina, o
desenvolvimento do feto requer que seu
sistema imune se mantenha tolerante aos
aloantígenos maternos, mas logo após o
nascimento, a exposição súbita a antígenos
ambientais, derivados principalmente das
bactérias comensais que colonizam o
intestino, faz com que rápidas mudanças
ocorram no organismo infantil.
O SISTEMA IMUNE INATO:
De forma geral, o sistema imune inato
encontra-se silenciado ao nascer, situação
enfrentada pelo feto não somente para
tolerar os antígenos maternos não-
compartilhados, mas também para suportar
os níveis de estresse e a remodelação
constante que se manifesta nesse período.
Isso faz com que o neonato, com maior
ênfase para o prematuro, seja mais
susceptível a infecções bacterianas e virais.
O sistema imune inato contempla a primeira
linha de defesa contra patógenos, sendo
mediado por meio de células como
neutrófilos, monócitos, macrófagos e células
dendríticas, todas capazes de interagir com
a resposta adaptativa. Esses tipos celulares
se desenvolvem em diferentes etapas da
embriogênese humana, apresentando
menor capacidade funcional em recém-
nascidos quando comparados a outros
grupos etários.
Neutrófilos maduros são encontrados no
embrião desde o fim do primeiro trimestre da
gestação, com sua população crescendo de
forma acentuada próximo ao nascimento
graças ao fator estimulador de colônias de
granulócitos (G-CSF). Esses números
retornam a valores estáveis poucos dias
após o parto, porém mostram atividade
bactericida reduzida, respostas insuficientes
a estímulos inflamatórios, baixa capacidade
de adesão a células endoteliais e quimiotaxia
deficiente, características ainda mais
evidentes em bebês prematuros, que
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também apresentam níveis séricos menores
de IgG e de proteínas do sistema
complemento.
Em neonatos, os monócitos e macrófagos
também encontram-se com atividade
reduzida, ainda em estado imaturo. A
expressão dos receptores Toll-like 4 é
reduzida, impedindo a expressão eficiente
dos padrões de sinalização, resultando numa
resposta de citocinas diminuída, quando
comparada a um adulto. Em decorrência
disso há baixa reposição tecidual, fagocitose
ineficaz de patógenos e baixa secreção de
biomoléculas. Assim como ocorre entre os
neutrófilos, a quantidade de macrófagos e
monócitos aumenta nos primeiros dias de
vida.
O sangue do cordão umbilical, quando
comparado ao de crianças e adultos,
apresenta menor concentração de células
dendríticas (DC) do tipo mieloide, além de
baixa expressão de MHC classe II, que
reconhece antígenos externos, produção
baixa de IL-12 (fomentam resposta Th1), e
expressão menor de células CD80 e CD86,
percussoras de imunoglobulinas. O RN,
entretanto, secreta níveis de citocinas
indutoras de resposta Th17 semelhantes aos
do adulto quando tem suas células
dendríticas estimuladas por receptores TLR.
As células dendríticas plasmocitoides do
adulto secretam grandes volumes de
interferon alfa (IFN-α) em resposta à ativação
de receptores Toll-like 7 e 9, porém no
neonato essas mesmas estruturas são
severamente limitadas quanto à secreção de
interferon após exposições virais, mesmo
que o número de receptores seja análogo ao
visto na fase adulta. Dessa forma, respostas
imunes a patógenos como o vírus sincial
respiratório, o herpes simplex e polissacarídeos e endotoxinas.
citomegalovírus são precárias, explicando a
maior vulnerabilidade dos bebês a essas
infecções.
Em adultos, as células NK restringem a
replicação e a disseminação viral antes do
estabelecimento de mecanismos de controle
por parte da imunidade adaptativa, regulados
por receptores sensíveis a HLA-A, B, C e E,
contribuindo para a autotolerância. No início
da gestação, essas células são
hiporresponsivas para o rastreamento
celular, sendo suprimidas pelo TGF-β (fator
de transformação do crescimento,
responsável por modular a proliferação
celular). Com a progressão da gestação, a
atividade citotóxica desses tipos celulares
cresce, porém representam só a metade dos
índices da fase adulta no momento do parto,
com baixo poder de respostas a ativações
por IL-2 e IL-15 (estimuladoras da produção
de imunoglobulinas e da maturação
leucocitária), sendo de certa forma
“compensado” pelo menor limite para
deflagração de resposta.
As três vias do sistema complemento são
essenciais para o desencadeamento de
inflamação e do estado de defesa do
organismo. Esses componentes facilitam a
opsonização de microrganismos, promovem
a quimiotaxia de células da imunidade inata,
mediando a morte celular, e influenciam a
produção de anticorpos. Nos recém-
nascidos, quase a totalidade dos
componentes circulantes encontra-se em
concentração 10 a 80% menor que a de um
adulto, com atividade reduzida.
Os níveis das proteínas-complemento
sobem com o nascimento, podendo alcançar
o patamar de normalidade no primeiro mês
de vida (fator B) ou evoluir mais lentamente.
Como a produção de imunoglobulinas ainda
é baixa nesse período, a ativação do sistema
complemento depende da via alternativa e
de lectina ligada à manose, ativada por
O SISTEMA IMUNE ADAP TATIVO:
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Os linfócitos T desenvolvem-se no timo, que
é maior no nascimento e durante os
primeiros anos de vida. A detecção de
células TCD4 e TCD8 maduras ocorre
precocemente, por volta da 15ª semana de
gestação, abundantes na periferia tímica
bem antes do momento do parto.
Essas células, no entanto, apresentam
diferenças significativas quando comparadas
às de um adulto, refletindo a exposição
restrita a antígenos durante a vida intra-
útero. A funcionalidade dos linfócitos T
encontrados nas primeiras fases da vida
difere do papel dessas células em um adulto,
discrepância que pode ser exemplificada
pelo desenvolvimento de células T CD25
reguladoras a partir de percussores CD4
estimulados por aloantígenos, mediante a
influência supressora do TGF- β,
promovendo a autotolerância. O número de
linfócitos Treg corresponde a cerca de 3% do
valor total de células CD4 imaturas,
persistindo por períodos extensos, o que
confere ao período perinatal uma resposta
imune de perfil anti-inflamatório.
A ativação de linfócitos T na fase final do
período fetal ou no período perinatal por
antígenos externos deflagra uma resposta
imune deslocada para manifestações Th2,
reforçada pelas células dendríticas e fatores
epigenéticos no recém-nascido. Assim, a
resposta adaptativa primária no início da vida
é marcada por reatividade tolerogênica,
baixa detecção de aloantígenos e reação
deficiente a antígenos presentes no
ambiente.
No RN, além das células T convencionais,
que reconhecem peptídeos antigênicos
pelas moléculas tradicionais de MHC, há
também populações celulares de receptores
γδ de linfócitos T (TCR)-positivos e linfócitos
T análogos à imunidade inata, que
contemplam células NK invariantes que
rapidamente produzem interferon, células T
invariantes associadas à mucosa (MAIT),
além dos recém-descobertos linfócitos T
imaturos secretores de interleucina 8, que
conecta as respostas inatas e adaptativas.
As células MAIT desenvolvem-se no timo,
mas sua maturação pode ocorrer em tecidos
da mucosa fetal antes da colonização da
microbiota. Os linfócitos T secretores de IL-8
produzem funções importantes nos bebês
em seus primeiros momentos de vida, uma
vez que podem ativar neutrófilos e células T
γδ, cuja atividade diminui com a idade. De
forma contrastante ao adulto, deficiente em
linfócitos gama-delta, esses componentes
neonatais apresentam uma variedade de
cadeias e combinações de receptores que se
altera com o curso da gravidez, podendo
produzir níveis altos de INF-γ após uma
estimulação policlonal, suplementando a
clássica ação Th1 desencadeada em
situações de infecção.
Dois tipos de linfócitos B emergem de
caminhos distintos de desenvolvimento e
maturação. As células B1, que representam
40% do volume circulante dessas estruturas
durante os primeiros meses de vida,
secretam de forma espontânea IgM de baixa
afinidade, com um escopo reduzido de
antígenos específicos para os quais é eficaz
(abrange polissacarídeos bacterianos), com
menos mutações, servindo como uma
primeira linha de proteção. Como eliminam
IL-10 e TGF- β, os marcadores B1 induzem
respostas não inflamatórias, de tipo Th2. Os
linfócitos B2 (“convencionais”) são derivados
de um progenitor linfoide comum às células
T, criando um amplo leque de
imunoglobulinas com elevada especificidade
(diversas combinações das porções V, D e
J), estando presentes nos órgãos linfoides
secundários e na medula óssea, onde
contribuem para a resposta adaptativa
humoral.
A maior parte das respostas mediadas por
anticorpos, incluindo aquelas a proteínas e
polissacarídeos bacterianos ou vacinas
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conjugadas, são dependentes de linfócitos T,
nos quais ocorrem interações entre os TCR
e a rede de conectores CD28 e CD40 ligados
à células T auxiliares (CD4) foliculares ou de
manifestação Th2 e seus pares (peptídeo
HLA, CD80/86 e CD40) em células B
antígeno-específicas. As células B de parasitas, tendo boas chances de
neonatais, no entanto, apresentam baixas
quantidades desses conectores, limitando
sua capacidade de ação. Além disso, níveis
reduzidos do fragmento C3d impedem
reações a conglomerados de
polissacarídeos-proteínas do sistema
complemento.
O conjunto dessas situações contribuem
para respostas humorais menos precisas,
com mudança de classe incompleta dentre
as imunoglobulinas, mesmo que exista a
formação de linfócitos B de memória. Além
disso, em bebês com menos de dois meses
de idade também é observada menor
incidência de mutações somáticas do
processo de maturação de anticorpos por
afinidade. Por fim, há distúrbios nas células
do estroma da medula óssea de neonatos
que dificultam a sobrevivência a longo prazo
de plasmoblastos (células B imaturas) e sua
diferenciação em células plasmáticas, de
forma que quaisquer anticorpos IgG
fornecidos ao corpo serão rapidamente
degradados depois da imunização, o que
não ocorre em crianças mais velhas ou em
adultos.
Dessa forma, percebe-se que a eficiência do
sistema imune adaptativo em responder
precocemente aos antígenos dependentes
de células T é marcadamente reduzida nos
neonatos, o que é relevante principalmente
para os programas de vacinação pois, a
imunidade inata prejudicada, a fraca ação de
Th1 e anticorpos faz com que essa
população se torne ainda mais vulnerável em
casos de exposição a patógenos.
A EVOLUÇÃO DO SISTEMA IMUNE DA INFÂNCIA À
FASE ADULTA:
A criança, mesmo durante o processo de
maturação das respostas inata e adaptativa,
ainda se encontra vulnerável a maioria dos
vírus, bactérias e fungos patogênicos, além
sobrevivência em países desenvolvidos, nos
quais as condições privilegiadas de nutrição,
higiene e vacinação previvem um grande
número de óbitos.
O sistema imune se desenvolve
gradualmente ao longo da infância. A
proteção primária contra várias infecções
vivenciadas pela mãe é transmitida de forma
passiva e temporária pelo IgG, seja por via
transplacentária ou pelo aleitamento. Assim
que essas imunoglobulinas desaparecem, os
infantes tornam-se mais susceptíveis a
infecções, porém o risco se torna menor por
conta das diversas vacinas administradas
que estimulam respostas protetivas no
sistema imunológico em maturação. Ainda
assim essas crianças podem continuar
manifestando quadros virais, bacterianos,
fúngicos ou parasitários que devem ser
controlados e superados por seu próprio
organismo, o que irá promover não só a
convalescência, mas também a formação de
memória imunológica, que irá aumentando
com o passar dos anos (podendo
desaparecer na velhice), tornando os adultos
menos propensos a essas condições.
Salienta-se que o quadro infeccioso por
vezes pode ser subclínico, ou seja, não
manifestar sintomas, porém normalmente é
suficiente para a estimulação ou
potencialização de uma resposta imune, que
confere proteção intensa, por vezes
duradoura e vitalícia. A manutenção de
células B de memória é notável, uma vez que
as imunoglobulinas do tipo IgG possuem
meia-vida in vivo de cerca de 25 dias. As
células plasmáticas produtoras de anticorpos
migram para a medula óssea, na qual são
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conservadas. Também pode ocorrer a
regeneração contínua desses tipos celulares
em caso de exposição persistente ao
antígeno e a linfócitos T auxiliares, sendo
que os primeiros podem se manter nos
linfonodos por anos, ancorados pelas células
dendríticas.
Além da imunidade contra antígenos
patogênicos, o recém-nascido é exposto a
outras moléculas de caráter imunogênico,
pois é rapidamente exposto a um grande
número de microrganismos após
permanecer num ambiente relativamente
estéril (útero). A primeira grande exposição a
bactérias ocorre durante a passagem pelo
canal de parto e quando o bebê realiza o
primeiro contato oral, respiratório e dérmico
com o exterior. Desse ponto em diante, a
exposição aos mais diversos compostos é
constante.
resultado da presença bacteriana nas
diferentes mucosas, criando linfócitos
capazes de reagir a antígenos inéditos por
meio de reações cruzadas (presença de
epítopos semelhantes entre duas moléculas
causa deflagração de respostas similares). A
presença de bactérias filamentosas
segmentadas no intestino é necessária para
o desenvolvimento de fatores Th17, e a
manifestação de Clostridium spp. fomenta a
diferenciação de linfócitos reguladores.
A composição do plantel imunológico será
diferente em cada indivíduo, seja pelo tipo de
antígeno ao qual ele foi ou não exposto, às
mutações somáticas que ocorreram nas
suas células B, ao formato de seus genes
HLA, a marcadores específicos ou a fatores
ambientais, fazendo com que nem mesmo
gêmeos monozigóticos apresentam as
mesmas características.

Boa parte das bactérias comensais no

intestino e em outras mucosas é essencial
para uma vida saudável, auxiliando no
processo de digestão e na absorção de
nutrientes. Aproximadamente 20% de todos
os linfócitos estão alojados no trato intestinal,
expostos a vários possíveis imunoantígenos
externos, estando constantemente em
monitoramento para fontes de infecção.
Essas bactérias influenciam o
desenvolvimento de linfócitos Th17, T reg, e
células T de memória. FISIOPATOLOGIA DAS INFECÇÕES DE VIAS AÉREAS
SUPERIORES MAIS PREV ALENTES NA IDADE PRÉ-
Ao nascer, quase todas as células de defesa ESCOLAR:
carregam a glicoproteína CD45RA, típica de
Determinados vírus respiratórios podem
linfócitos imunes, nunca expostas a
acometer amplamente a mucosa, mesmo
antígenos externos, mas há também
que aparente que alguns deles tenham
diversos linfócitos T reguladores com
predileção por porções específicas das vias
marcador negativo. Com o decorrer da
aéreas. As doenças de acometimento
infância, a quantidade de células Treg cai,
respiratório por vezes se sobrepõem,
enquanto células de memória com padrão
fazendo com que um mesmo patógeno
Th1, Th17 e Th2 gradualmente se elevam
esteja associado a diversos quadros clínicos.
até igualar o valor de linfócitos imaturos.
Mesmo que algumas dessas células
RINOFARINGITE:
armazenadas seja resultante de um quadro
infeccioso ativo, um grande volume delas é
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O resfriado comum é uma doença de causa
quase que totalmente viral (dois tipos de
vírus são causadores de 2/3 dos casos da
doença, enquanto bactérias induzem cerca
de 4% dos casos). Os rinovírus (RV) são os
agentes etiológicos mais observados em
todas as faixas etárias, fazendo com que a
maioria das crianças de dois anos de idade
já possuam anticorpos específicos para ele.
Enterovírus também são fortemente
associados ao quadro, junto ao vírus sincial
respiratório e ao influenza, esses dois
últimos também provocando acometimentos
das vias aéreas inferiores.
Os sinais e sintomas do resfriado em infantes
não são tão bem descritos quanto os
evidentes em adultos, uma vez que isso
depende da memória do paciente ou do
profissional que prestou atendimento a ele,
fazendo que somente com o advento das
técnicas RT-PCR (reverse-transcriptase
polymerase chain reaction) fosse possível
determinar e acompanhar a história natural
da doença. O quadro clínico mais comum
consiste em tosse e espirros, associados à
congestão nasal e coriza, persistindo por, em
média, uma semana. A ocorrência de febre é
incomum, com incidência de 15% no primeiro
dia, decrescendo ainda mais com a evolução
natural da doença.
Esse quadro está associado a uma resposta
inflamatória mediada por neutrófilos na
mucosa, que promove aumento na
permeabilidade e na secreção de muco.
Diferentemente de outros vírus, o RV não
destrói a barreira epitelial das vias aéreas,
sendo os sintomas descritos para a doença
resultantes da intensidade da resposta
imune do hospedeiro.
SINUSITE AGUDA (RINO SSINUSITE):
A sinusite, por definição, é a inflamação dos
seios da face, sendo denominada
atualmente como rinossinusite, uma vez que
as conchas nasais médias penetram o seio
etmoidal, disseminando para essas fossas
os acometimentos que afligem a região
vestibular do nariz. Essa condição ocorre
com frequência na população infantil, sendo
uma das principais causas de consulta ao
médio e de abstenções na escola.
No recém-nascido, já se encontram
presentes os seios maxilares, os seios
esfenoidais e algumas poucas células
etmoidais, entretanto, apenas primeiros e os
últimos têm tamanho suficiente para
apresentarem quadros inflamatórios. Aos 4
anos de idade, o seio etmoidal já está
formado. O assoalho do seio maxilar atinge
o mesmo nível do assoalho da fossa nasal
em torno de 7 a 8 anos de idade. Os seios
frontais não estão presentes ao nascimento,
mas, com o crescimento de células oriundas
da porção anterior do etmoide em direção
cranial, estarão formados em torno dos 5
anos. Os seios esfenoidais se mostram
completamente desenvolvidos aos 15 anos.
Na criança, a rinossinusite é marcada pela
presença de dois ou mais sintomas, sendo
que um deles deve ser obrigatoriamente a
congestão nasal ou a presença de secreção
anterior ou posterior. Tosse e sensações de
dor ou pressão facial podem estar
associados. Numa endoscopia nasal,
espera-se encontrar secreção
mucopurulenta no meato médio, edema de
mucosa ou pólipos nasais.
De acordo com a duração dos sintomas, a
rinossinusite pode ser classificada em aguda
(até 12 semanas), recorrente (6 ou mais
episódios agudos anualmente, sem sintomas
nos intervalos) e crônica (duração superior a
12 semanas).
A sinusite aguda pode ser classificada como
viral, com sintomas que se estendem por até
10 dias, tendo origem numa grupe ou
resfriado, em pós-viral, em que há piora dos
sintomas após 5 dias ou persistência dos
sintomas após 10 dias, regredindo com
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menos de 12 semanas de evolução, e a
rinossinusite bacteriana, subtipo do segundo
grupo, na qual são observados secreção
mucopurulenta nasal e retronasal, febre, dor
facial ou piora dos sintomas após fase inicial
da evolução.

As bactérias mais frequentemente

encontradas na infecção sinusal bacteriana
aguda são Streptococcus pneumoniae,
Haemophilus influenzae não tipável,
Moraxella catarrhalis, Streptococcus beta-
hemolítico do grupo A e S. aureus. OTITE MÉDIA AGUDA:

A otite média aguda (OMA) é definida como

Alguns diagnósticos diferenciais que devem
ser investigados são a presença de corpos
estranhos e atresia unilateral das coanas
(apresentam sintomas em uma só narina e
são facilmente identificadas após a coleta da
história clínica e o exame endoscópico), a
rinite alérgica (não manifesta febre ou
secreções mucopurulentas), e a adenoidite
(seu quadro clínico é muito semelhante ao da
sinusite, dificultando o diagnóstico correto).
Para o diagnóstico da rinossinusite em
crianças, são fundamentais e suficientes a
história clínica, o exame físico e a
endoscopia nasal, que pode ser seguida de
análise de culturas em caso de suspeita de
acometimento bacteriano.
Mesmo que não sejam frequentes, as
complicações da sinusite são graves e
necessitam de identificação precoce e
tratamento adequado. Podem ser
classificadas de acordo com o acometimento
em: orbital, intracraniana e óssea, sendo a
primeira a mais encontrada.
a presença de líquidos preenchendo a
cavidade da orelha média sob pressão, com
início súbito de sinais e sintomas causados
pela inflamação local. Representa uma das
principais causas de consultas médicas em
crianças menores de 15 anos de idade, mas
ainda que tenha grande prevalência, sua
progressão é autolimitada e apresenta baixo
índice de complicações.
A OMA apresenta diversos fatores de risco,
que podem depender tanto da criança
(hospedeiro) quanto dos fatores ambientais:
 Fatores associados ao hospedeiro:
o Primeiro episódio de otite antes dos
seis meses de idade favorece a
recorrência do quadro;
o Presença de fenda palatina,
síndrome de Down, malformações
craniofaciais, imunodeficientes e com
discinesia ciliar primária (alteração no
batimento dos cílios da mucosa
respiratória);
o Presença de marcadores genéticos
específicos nas regiões 10q e 19q;
o Etnia aborígene, esquimó ou nativa-
americana.
 Fatores de origem ambiental:
o Temperaturas mais baixas (inverno);
o Creches e pré-escolas (maior
prevalência de IVAS);
o Tabagismo passivo;
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o Consumo de mamadeiras em Dentre os sinais da OMA, os achados da
posição supina. membrana timpânica na otoscopia e na
A otite média aguda é mais comum em pneumotoscopia são os mais relevantes.
lactentes e crianças pequenas devido a Caso essa membrana esteja hiperemiada,
fatores anatômicos e imunológicos típicos abaulada, opaca, com mobilidade reduzida
desse período. A tuba auditiva (TA) ventila a ou com secreções já há grandes indícios da
orelha média, encontrando-se fechada ocorrência de otite.
durante o repouso. Sua luz, virtual, abre-se
de forma intermitente por meio da contração
do músculo tensor do véu palatino durante o
bocejo ou a deglutição. Na criança, a TA é
bais curta e horizontalizada que a estrutura
adulta, favorecendo a migração de
microrganismos da rinofaringe para a orelha
média, desencadeando novos processos
A otorreia define o diagnóstico, pois é
inflamatórios nessa região.
necessária a presença de efusão ou líquido
A OMA é causada por vírus respiratórios ou na cavidade da orelha média. O
infecção bacteriana no espaço da orelha acometimento bilateral é indicativo de maior
média, como resultado da resposta do gravidade, havendo mais benefícios no
hospedeiro à infecção. A otite ocorre mais tratamento com antibióticos. Eventualmente,
frequentemente como consequência de uma a OMA pode ter como complicações as
IVAS que causa inflamação ou disfunção da mastoidites e evoluir para um colesteatoma
TA, à pressão negativa da orelha média e ao (cistos que se disseminam na região
movimento de secreções, contendo os vírus meníngea, com alta capacidade
causadores da IVAS e bactérias proliferativa).
patogênicas, para a cavidade da orelha
média. O vírus sincial respiratório e o
adenovírus estão entre os vírus mais
comumente associados à otite média aguda.

O padrão-ouro para determinar a etiologia

bacteriana da OMA é a cultura de fluido por
meio da timpanocentese, da drenagem
através dos tubos de ventilação ou pela
otorreia espontânea. O Streptococcus FARINGITE/AMIGDALITE:
pneumoniae, o Haemophilus influenzae não
Dores de garganta representam a 3ª maior
tipável e a Moraxella catarrhalis são os
queixa em serviços de emergência, sendo as
principais otopatógenos bacterianos que
tonsilites (amigdalites) e as faringites
colonizam a nasofaringe.
responsáveis por 5% das consultas médicas.
Na otite média aguda, são sintomas Essas duas doenças são IVAS de ocorrência
constantes a otalgia (evidente pela frequente, normalmente autolimitadas, com
manipulação constante da orelha), o choro recuperação plena em 3 ou 4 dias, tanto para
abundante, a febre, a irritabilidade, crianças como para adultos, ainda que
mudanças no padrão de sono e no possam ocorrer complicações em alguns
comportamento, e a diminuição do apetite, casos.
podendo também ser observada a diarreia.
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Essas infecções estão mais ligadas a
etiologias virais, porém podem ser causadas
por bactérias, principalmente pelo
estreptococo beta-hemolítico do grupo A,
patógeno para o qual o tratamento
medicamentoso com antimicrobianos está
totalmente indicado, visando prevenir
sequelas supurativas (liberadoras de pus) e
não supurativas.
As tonsilas palatinas têm como função a
secreção de imunoglobulinas (produz 5 tipos,
IgA, IgC, IgM, IgD, e IgE), além de compor
cadeias J que completam a estrutura
molecular dos anticorpos, sendo um tecido
imunocompetente. Com isso, impedem a
replicação bacteriana e viral no trato
respiratório superior, representando a
primeira linha de defesa contra doenças
infecciosas na região.
Em crianças e adolescentes, que frequentam
constantemente locais de amplo contato com
outras pessoas, a transmissão ocorre por
meio de gotículas de saliva, com período de
incubação de 1 a 4 dias. As infecções de
origem viral correspondem a 75% dos casos
em crianças menores de 3 anos e diminuem
após a puberdade, tanto nos casos agudos
quanto nos recorrentes. Antes dos 3 anos de
idade, a prevalência das infecções
bacterianas de orofaringe é baixa, em virtude
da proteção fornecida pela IgG materna.
Vários vírus, bactérias e alguns fungos
podem causar tonsilites e faringites. Entre os
vírus, os agentes mais comuns são
adenovírus, influenza, parainfluenza,
coxsackie, vírus sincicial respiratório, herpes
e vírus de Epstein-Barr. estreptococo beta-
hemolítico, Haemophillus, Moraxella,
Staphylococcus aureus, pneumococo,
germes anaeróbios, clamídia e micoplasma
são as principais bactérias envolvidas na
gênese das infecções faringotonsilares.
Aspectos da história clínica podem direcionar
o diagnóstico para uma de suas etiologias,
porém com baixa especificidade e
sensibilidade. Coriza, obstrução nasal,
espirros, rouquidão, aftas e sintomas
gastrointestinais associam-se
frequentemente a doenças virais,
acompanhados ou não de febre.
Acometimentos bacterianos, por sua vez,
têm início súbito, elevação da temperatura
corporal (acima de 38ºC), dor de garganta e,
ao exame físico, hiperemia, hipertrofia e
exsudato tonsilar, junto com linfadenopatia
cervical anterior.
Para realizar o diagnóstico de faringotonsilite
de forma correta é empregado o exame
cultural da orofaringe, no qual um swab faz a
retirada de material de ambas as tonsilas e
da parede faríngea, incubando a amostra
semeada em placas de Petri por 20 a 48
horas, de modo a observar a proliferação de
eventuais bactérias.
O diagnóstico diferencial dessas inflamações
agudas deve incluir a mononucleose
infecciosa, doença causada pelo vírus
Epstein-Barr. Esse agente causa edema
difuso dos tecidos linfáticos da região
cervical, axilar e inguinal. Produz odinofagia
intensa, que pode causar desidratação e
aumento das tonsilas palatinas e faríngeas,
podendo causar obstrução importante das
vias aéreas superiores.
A anamnese costuma revelar sintomas
repentinos, que podem persistir por
semanas, além de tentativas falhas de
terapias com antibióticos. Ao exame, o
paciente geralmente apresenta mal-estar
geral, astenia, temperatura normal ou
elevada, amígdalas muito aumentadas e
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com exsudato, hepatomegalia e traqueia e alteração de mobilidade das
esplenomegalia.
LARINGOTRAQUEOBRONQUITE (CRUPE):
A “síndrome do Crupe” é um termo amplo
que caracteriza um grupo de doenças com
diferentes graus de envolvimento anatômico
e etiológico, mas que compartilham os
seguintes sintomas: rouquidão, tosse
ladrante (semelhante a um cachorro),
estridor inspiratório e desconforto
respiratório variável.
O agente etiológico mais envolvido nesses
quadros é o vírus parainfluenza I,
responsável por 50% dos casos durante o
inverno. O parainfluenza II, influenza A,
adenovírus, vírus respiratório sincicial e,
mais raramente, Mycoplasma pneumoniae,
respondem pela outra metade.
O Haemophilus influenza tipo b (Hib) era
responsável pela grande maioria dos casos
de epiglotite bacteriana, mas com o advento
da vacina conjugada contra Hib, a incidência
de doença invasiva causada por esta
bactéria tem diminuído consideravelmente.
Outros agentes que têm sido envolvidos são
Streptococcus pneumoniae, Klebsiella
pneumoniae, Haemophilus influenza não
tipado, Candida albicans, Staphylococcus
aureus, Neisseria meningitidis, varicella
zoster, e herpes simplex tipo I.
A infecção viral inicia na nasofaringe e se
dissemina através do epitélio respiratório da
laringe, traqueia e árvore bronco-alveolar. De
acordo com o grau de extensão da lesão do
epitélio respiratório, são vistos diferentes
achados no exame físico. Há inflamação
difusa, eritema e edema das paredes da
cordas vocais. A mucosa da região
subglótica é pouco aderente, permitindo a
formação de um edema significante com
potencial comprometimento das vias aéreas,
uma vez que restringe consideravelmente o
fluxo de ar.
A fisiopatologia da epiglotite é um pouco
diferente. Nesta, o que ocorre é uma celulite
de estruturas supraglóticas, com localização
preferencial na epiglote. Observaremos
edema e eritema que evoluem, levando a
uma obstrução gradativamente rápida da via
aérea superior, caracterizando uma
emergência clínica.
A doença se inicia com rinorreia clara,
faringite, tosse leve e febre baixa. Após 12 a
48 horas iniciam-se os sintomas de
obstrução de vias aéreas superiores, com
progressão dos sinais de insuficiência
respiratória e aumento da temperatura
corpórea, se resolvendo em 3 a 7 dias. Nos
casos mais graves há aumento das
frequências cardíaca e respiratória,
retrações claviculares, esternais e de
diafragma, batimento de aletas nasais,
cianose, agitação psicomotora e até
sonolência, podendo perdurar por 14 dias.
A maioria das crianças com laringotraqueíte
têm sintomas leves que não progridem para
obstrução progressiva das vias aéreas, mas
a monitorização da oximetria de pulso se faz
indispensável em quadros com estridor, de
modo a avaliar o risco de falência
respiratória.
O diagnóstico dessa doença é basicamente
clínico, com achados radiográficos (sinal da
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ponta de lápis) apresentando baixo valor
diagnóstico, uma vez que podem estar
presentes em crianças com estreitamento
anatômico das vias aéreas ou nem se
desenvolverem ao longo da história da
moléstia. Exames de imagem se fazem úteis
apenas no processo de diagnóstico
diferencial, comprovando a ausência de
corpos estranhos.
A IMUNIZAÇÃO NA INFÂNCIA (0-7 ANOS):
A vacinação é um direito que deve ser
respeitado, protegido e assegurado,
mencionado inclusive na Convenção sobre
os Direitos da Criança, mediada pela Unicef
em 1989, determinando que todas as
crianças devem ter acesso igualitário à
vacinação eficaz. Nesse sentido, a cobertura
vacinal é considerada um importante
indicador de saúde e da qualidade dos
cuidados prestados à população, revelando
a garantia ou não dos direitos da criança e
do adolescente.
Mesmo que progressos substanciais tenham
sido observados no aumento da cobertura
vacinal de forma mundial, os diversos
indicadores podem acabar ocultando
disparidades acentuadas entre nações, ou
até mesmo dentro de um próprio país. Assim
cabe às instituições governamentais, sejam
elas de países desenvolvidos ou em
desenvolvimento, a criação de diretrizes e
pactos que assegurem o planejamento e os
recursos humanos e financeiros necessários
para que o direito à imunização seja
garantido.
No Brasil, a contribuição do Programa
Nacional de Imunização (PNI), criado em
1973, para a mudança do perfil
epidemiológico de doenças
imunopreveníveis é inegável, sendo seus
resultados considerados uma das maiores
conquistas da saúde pública no país.
Contudo, o acesso à vacinação ainda
encontra alguns entraves, como a recusa
dos pais à imunização, o que gera questões
éticas que precisam ser refletidas e
discutidas, buscando respeitar e proteger os
direitos das crianças e dos adolescentes.
O PNI realiza a normatização técnica acerca
do uso de imunobiológicos no âmbito do
SUS, decidindo quais serão os integrantes
do calendário oficial de vacinação, quais
serão definidos para uso por grupos
populacionais específicos ou em situações
especiais, e regulando a ampliação da oferta
desses compostos. Atualmente, as vacinas
que fazem parte da rotina de imunização do
Programa são as seguintes:
 Vacina BCG;
 Vacina hepatite B (recombinante);
 Vacina adsorvida hepatite A (inativada);
 Vacina poliomielite 1, 2 e 3 (atenuada) -
VOP;
 Vacina poliomielite 1, 2 e 3 (inativada) -
VIP;
 Vacina adsorvida difteria, tétano,
pertussis, hepatite B (recombinante) e
Haemophilus influenzae B (conjugada) -
pentavalente;
 Vacina adsorvida difteria, tétano e
pertussis – DTP;
 Vacina adsorvida difteria e tétano adulto -
dT;
 Vacina rotavírus humano (atenuada) -
VORH;
 Vacina febre amarela (atenuada);
 Vacina sarampo, caxumba e rubéola -
tríplice viral;
 Vacina sarampo, caxumba, rubéola e
varicela (atenuada) - tetra viral;
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 Vacina meningocócica C (conjugada);
 Vacina pneumocócica 10-valente
(conjugada);
 Vacina varicela (atenuada);
 Vacina influenza (inativada);
 Vacina raiva humana;
 Vacina papilomavírus humano 6, 11, 16 e
18 (recombinante) – HPV.
Alguns imunobiológicos podem ser
administrados por indicação médica para
situações especiais e em populações
específicas, disponibilizado no Centro de
Referência para Imunobiológicos Especiais
(CRIE), sendo descritos a seguir:
 Vacina Haemophilus influenzae B
(conjugada);
 Vacina pneumocócica 23-valente
(polissacarídicas);
 Vacina adsorvida difteria e tétano infantil
- DT;
 Vacina adsorvida difteria, tétano e
pertussis (acelular) – DTPa;
 Vacina adsorvida hepatite A (inativada);
 Vacina varicela (atenuada);
 Vacina febre tifoide;
 Vacina cólera (inativada).
CONTRAINDICAÇÕES E SITUAÇÕES ESPECIAIS E M
IMUNIZAÇÃO:
Alguns fatores e condições pode ser
considerados como possíveis
contraindicações gerais à administração de
qualquer imunobiológicos, sendo necessária
uma avaliação por parte do profissional
dessaúde, que irá adiar ou suspender a
vacinação. Em geral, as vacinas bacterianas
e virais atenuadas não devem ser
administradas a usuários com
imunodeficiência congênita ou adquirida,
portadores de neoplasia maligna, em
tratamento substâncias imunodepressoras,
bem como gestantes, exceto em situações
nas quais o risco de exposição à doença é
superior ao da vacina, como é o caso da
febre amarela.
 Contraindicações comuns a todos os
imunobiológicos (riscos da vacinação são
maiores e mais sérios do que aqueles
relacionados à doença):
o Hipersensibilidade confirmada após o
recebimento de dose prévia;
o Histórico de reações de
hipersensibilidade a qualquer
componente da vacina.
 Situações especiais (avaliadas
individualmente):
o Uso de corticoides fazem com que a
vacinação seja administrada após três
meses da suspensão da droga;
o Pacientes vivendo com o HIV devem
ser analisados individualmente, sendo
direcionados para a vacinação de
acordo com a sua capacidade
imunológica;
o Crianças filhas de mãe com HIV,
menores de 18 meses de idade, com
sorologia negativa e assintomáticas
devem receber todas as vacinas do
programa e do CRIE o mais
precocemente possível;
o Usuários com imunodeficiência clínica
ou laboratorial grave não devem
receber vacinas de agentes vivos
atenuados;
o Indivíduos pós-transplantados de
medula óssea devem ser
encaminhados ao CRIE de seis a doze
meses após o procedimento para que
seja reavaliado.
 Adiamento da vacinação:
o Uso de corticoides – vacinar 90 dias
após o fim do tratamento;
o Usuários que necessitam de
transfusão sanguínea – não vacinar
com vírus vivos ou atenuados nas
quatro semanas que antecedem e até
90 dias depois do recebimento de
frações de sangue;
o Indivíduos que manifestam doença
febril grave – não vacinar até a
resolução do quadro, para que os
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sinais e sintomas da condição de base
não sejam atribuídas ao
imunobiológicos.
 Vacinação simultânea: consiste na
aplicação, num menos momento, de
diferentes imunobiológicos em regiões
anatômica e vias de administração
distintas. De um modo geral, as vacinas
dos calendários de vacinação podem ser
administradas simultaneamente sem que
ocorra interferência na resposta
imunológica, exceto as vacinas contra
febre amarela, tríplice viral, contra
varicela e tetra viral, que devem ser
administradas com intervalo de 30 dias;
 Falsas contraindicações:
o Doenças agudas benignas sem febre
(em crianças sem histórico de doença
grave ou de IVAS);
o Prematuridade/baixo peso ao nascer –
a administração das vacinas será feita
por meio da idade corrigida, com
exceção da vacina BGC, aplicada
somente em crianças com peso ≥ 2kg;
o Ocorrência de reações locais em
doses anteriores;
o Diagnóstico prévio de doenças
imunopreveníveis;
o Doença neurológica estável ou
pregressa com sequela evidente;
o Antecedentes familiares de convulsão
e morte súbita;
o Alergias;
o Histórico de alergias não específicas,
individual ou familiar;
o Uso de antibiótico ou antiviral;
o Tratamento com corticoides em dias
alternados ou em dose não
imunossupressora;
o Uso de corticosteroides inalatórios ou
tópicos ou com dose de manutenção
fisiológica;
o Indivíduos que coabitam com
gestantes;
o Período de recuperação de doenças
agudas;
o Usuários em profilaxia pós-exposição
e na reexposição com a vacina raiva
inativada;
o Internação hospitalar;
o Mulheres no período de
amamentação.
VACINAS OFERTADAS ATÉ O 7º ANO DE VIDA:
VACINA BCG:
A vacina é preparada com bacilos vivos, a
partir de cepas do Mycobacterium bovis
atenuadas, sendo indicada para prevenir as
formas graves da tuberculose (miliar e
meníngea).
Além das contraindicações gerais
supracitadas, a BCG é contraindicada para
crianças a partir dos 5 anos de idade e/ou
portadoras de HIV, mesmo que
assintomáticas e sem manifestação de
imunodeficiência.
O esquema de vacinação com a vacina BCG
corresponde à dose única o mais
precocemente possível, preferencialmente
nas primeiras 12 horas após o nascimento,
ainda na maternidade. Na rotina, a vacina
pode ser administrada em crianças até 4
anos, 11 meses e 29 dias.
A aplicação se dá por via intradérmica, na
região do músculo deltoide, na face externa
superior do braço direito, especificidade que
tem como fundamento a identificação
facilitada da cicatriz em avaliações futuras.
Quando essa recomendação não puder ser
seguida, registre o local da administração no
comprovante de vacinação.
VACIN HEPATITE B RECOMBINANTE:
A vacina contra hepatite B apresenta o
antígeno recombinante de superfície
(HBsAg) purificado e adsorvido, podendo
estar isolado ou combinado a outros
imunobiológicos.
Essa apresentação vacinal é indicada para
recém-nascidos, de forma mais breve
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possível (primeiras 24 horas, com
preferência para as 12 primeiras), até o 30º
dia de vida, podendo ser administrada a
todos os outros grupos populacionais e
faixas etárias (até 49 anos), seja na sala de
vacinação das unidades de saúde ou no
CRIE. As contraindicações seguem os
parâmetros gerais citados anteriormente.
O esquema de administração corresponde,
de maneira geral, a três doses, com intervalo
de 30 dias entre a primeira e a segunda
doses e de seis meses entre a primeira e a
terceira doses (0-1-6).
Recém-nascidos devem receber a primeira
dose ainda na maternidade ou na primeira
visita ao serviço de saúde, até 30 dias de
vida. A continuidade do esquema vacinal
será com a vacina pentavalente e, nesta
situação, o esquema corresponderá a quatro
doses, para as crianças que iniciam
esquema vacinal a partir de 1 mês de idade
até 4 anos, 11 meses e 29 dias. Em
indivíduos maiores de 5 anos sem
comprovação de histórico vacinal, devem ser
aplicadas as três doses conforme o esquema
proposto. Se a imunização for incompleta,
basta fornecer as doses faltantes. Sua via de
administração é a intramuscular (vasto
lateral em crianças menores de 2 anos, e
deltoide nas mais velhas).
VACINA PENTAVALENTE:
A vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis
(coqueluche), hepatite B e Haemophilus
influenzae B, também conhecida como penta
ou pentavalente, é composta por antígenos
purificados ou atenuados dos patógenos
acima. É indicada para a vacinação de
crianças menores de 5 anos de idade como
dose do esquema básico. Não devem
receber essa vacina os pacientes que
apresentam quadro neurológico em
atividade, maiores de 7 anos e aqueles que
registraram sinais de anafilaxia em doses
anteriores com esses componentes.
O esquema corresponde a três doses,
administradas aos 2, aos 4 e aos 6 meses de
idade, com intervalo de 60 dias entre as
doses. São necessárias doses de reforço
com a vacina adsorvida difteria, tétano e
pertussis (DTP), que devem ser
administradas aos 15 meses e aos 4 anos de
idade. O limite de idade para a administração
de imunobiológicos com a fração pertussis é
de 6 anos, 11 meses e 29 dias.
A vacina é administrada por via
intramuscular profunda, com os mesmos
locais de aplicação da vacina para hepatite
B.
DTP:
A vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis
(DTP ou tríplice bacteriana) é apresentada
sob a forma líquida com epítopos purificados,
indicada para a vacinação de crianças
menores de 7 anos de idade como dose de
reforço do esquema básico da vacina penta.
As contraindicações seguem os parâmetros
da vacina penta.
O primeiro reforço deve ser administrado aos
15 meses e, o segundo, aos 4 anos de idade.
A via de administração também é a muscular
profunda, aplicada no vasto lateral ou no
deltoide, conforme a idade da criança.
VACINA POLIOMIELITE INATIVADA (VIP):
A vacina para poliomielite 1, 2 e 3 contem
epítopos dos três subtipos do vírus,
inativados por formaldeído. Esse
imunobiológico é indicado para criança a
partir de 2 meses até menores de 5 anos de
idade, como doses do esquema básico,
sendo contraindicado em casos de reação
anafilática a qualquer dose anterior ou a
qualquer um dos seus componentes.
Esta vacina integra o esquema sequencial
com a vacina poliomielite atenuada (VOP),
correspondente a três doses, sendo duas
doses da vacina VIP (aos 2 e 4 meses) e uma
dose da VOP (aos 6 meses), com intervalo
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
de 60 dias entre as doses, com um mínimo
de 30 dias.
A vacina pode ser administrada
simultaneamente com as demais doses de
imunização preconizadas pelo Ministério da
Saúde, sendo aplicada por via intramuscular,
nas mesmas regiões supracitadas.
VACINA POLIOMIELITE ATENUADA (VOP):
A vacina é trivalente, ou seja, contém os três
tipos de poliovírus 1, 2 e 3 em estado de
atividade patogênica reduzida. Sua
apresentação geralmente se dá em bisnagas
conta-gotas de plástico.
O PNI recomenda a vacinação de crianças
de 6 meses até menores de 5 anos de idade
como dose do esquema básico ou reforço.
As contraindicações são as mesmas
descritas no item anterior. A via de
administração é a oral, com aplicação de
duas gotas.
VACINA PNEUMOCÓCICA CONJUGADA 10 VALENTE:
A pneumo-10 é preparada a partir de
polissacarídeos capsulares bacterianos
purificados do Streptococcus pneumoniae
(pneumococo), com 10 sorotipos (1, 4, 5, 6B,
7F, 9V, 14, 18C, 19F e 23F).
A vacinação por esse imunobiológico é
indicada para prevenir contra infecções
invasivas (sepse, meningite, pneumonia e
bacteremia) e otite média aguda, em
crianças menores que 2 anos. As
contraindicações gerais são aplicáveis a
essa vacina.
A vacina deve ser administrada aos 2, 4 e 6
meses de idade, com intervalo de 60 dias
entre as doses e mínimo de 30 dias, em
crianças menores de 1 ano de idade. O
reforço deve ser feito entre 12 e 15 meses,
preferencialmente aos 12 meses,
considerando-se o intervalo de 6 meses após
o esquema básico. Em crianças entre 12 e
23 meses de idade sem comprovação
vacinal ou com esquema incompleto,
administra-se uma única dose, que pode ser
administrada simultaneamente (ou com
qualquer intervalo) com outras vacinas do
calendário.
A vacina é administrada por via
intramuscular profunda, nos mesmos
músculos descritos anteriormente.
VACINA ROTAVÍRUS HUMANO (VORH):
A vacina é constituída por um sorotipo do
rotavírus humano atenuado da cepa
(RIX4414). É indicada para a prevenção de
gastroenterites causadas por rotavírus dos
sorotipos G1 em crianças menores de 1 ano
de idade. Embora seja monovalente, a
vacina oferece proteção cruzada contra
outros sorotipos de rotavírus que não o G1.
As contraindicações para esse
imunobiológico são as mesmas apontadas
anteriormente, porém o principal aspecto a
ser considerado é a aplicação fora da faixa
etária adequada. Mesmo se a criança estiver
nesse grupo, a vacinação é contraindicada
se:
 Houver quadro de imunodepressão
severa;
 O paciente estiver em uso de corticoides
em doses imunossupressoras;
 A criança tiver histórico de invaginação
ou malformação do trato intestinal.
O esquema corresponde a duas doses,
administradas aos 2 e 4 meses de idade. A
primeira dose pode ser administrada a partir
de 1 mês e 15 dias até 3 meses e 15 dias. A
segunda dose pode ser administrada a partir
de 3 meses e 15 dias até 7 meses e 29 dias.
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Deve ser respeitado um intervalo mínimo de
30 dias entre as doses.
Essa vacina não pode ser injetada no
organismo, devendo ser administrada por via
oral.
VACINA MENINGICÓCICA C:
A meningo C é constituída por
polissacarídeos capsulares purificados da
Neisseria meningitidis do sorogrupo C. Ela
está indicada para a prevenção da doença
sistêmica causada por essa bactéria em
crianças menores de 2 anos, com
contraindicações análogas às descritas
anteriormente.
O esquema corresponde a duas doses,
administradas aos 3 e 5 meses de idade,
com intervalo de 60 dias entre as doses, com
mínimo de 30 dias. O reforço deve ser feito
entre 12 e 15 meses (preferencialmente aos
15). Em crianças entre 12 e 23 meses de
idade sem comprovação vacinal ou com
esquema incompleto, é administrada uma
única dose.
Essa vacina é administrada exclusivamente
por via intramuscular, não devendo ser
aplicada sob nenhuma circunstância por
outras rotas.
VACINA CONTRA FEBRE AMARELA:
Essa vacina é composta de vírus vivos
atenuados da febre amarela derivados da
linhagem 17 DD, estando indicada para a
prevenção de residentes ou viajantes que se
deslocam para as áreas com recomendação
de vacinação e países com risco para a
doença, a partir dos 9 meses de idade.
As contraindicações desse imunobiológicos
seguem os parâmetros supracitados, mas
também não devem ser aplicadas em
crianças menores de seis meses,
imunodeprimidos graves, portadores de
doenças autoimunes, ou que tiveram
reações anafiláticas após ingerir ovo de
galinha (nesse caso a vacinação é feita em
ambiente hospitalar, após avaliação
médica).
O esquema vacinal com a vacina febre
amarela corresponde à administração de
uma dose a partir dos 9 meses de idade.
Esse imunobiológico é administrado por via
subcutânea, preferencialmente no deltoide.
TRÍPLICE VIRAL:
A tríplice viral é composta por vírus vivos
atenuados da rubéola, do sarampo e da
caxumba, sendo indicada para usuários a
partir do 12º mês de vida, tendo como
contraindicações as mesmas condições
mencionadas anteriormente.
O esquema básico da vacina é de duas
doses, podendo apresentar variações
conforme a faixa etária dos indivíduos, mas
naqueles de 12 meses a 19 anos:
administram-se duas doses conforme a
situação vacinal. A primeira dose (no 12º
mês) deve ser com a tríplice viral, ao passo
que a segunda (15º mês) deve ser feita com
a tetra viral.
Para as crianças acima de 15 meses de
idade não vacinadas, administra-se a vacina
tríplice viral observando o intervalo mínimo
de 30 dias entre as doses. É considerada
vacinada a pessoa que comprovar duas
doses de vacina com componente de
sarampo, caxumba e rubéola.
A via de aplicação desse imunógeno é a
subcutânea, com preferência para a área do
músculo deltoide.
VACINA CONTRA HEPATITE A:
Essa vacina contém o antígeno do vírus da
hepatite A, sem a presença de antibióticos,
sendo indicada para crianças entre 12 meses
até menores de 2 anos de idade, sendo a
contraindicação a presença de reações
anafiláticas a algum componente do
imunobiológico.
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Recomenda-se uma dose aos 12 meses de
idade na rotina de vacinação, com situações
individuais sendo encaminhadas ao CRIE.
Sua via de administração preferencial é a
intramuscular, na região do vasto lateral da
coxa.
TETRA VIRAL:
A vacina tetraviral é composta por vírus vivos
atenuados de cepas do sarampo, rubéola,
caxumba e varicela, sendo indicada para
crianças maiores de 15 meses que já tenham
recebido a primeira dose da tríplice viral, com
contraindicações básicas mencionadas
anteriormente. Recomenda-se não fazer uso
de ácido acetilsalicílico (AAS) por seis
semanas após a vacinação.
Em situação de bloqueio vacinal em surto de
sarampo ou rubéola para crianças menores
de 12 meses, é administrada uma dose da
vacina tríplice viral entre 6 meses e 11 meses
de idade, mantendo o esquema vacinal sem
alterações.
Essa vacina não deve ser administrada
simultaneamente à vacina contra febre
amarela, devendo ser respeitado um
intervalo mínimo de 30 dias entre uma
imunização e a outra.
A vacina é administrada por via subcutânea,
no músculo deltoide, na face externa do
braço.
VACINA INFLUENZA
Essa vacina é composta por diversas cepas
do vírus Myxovirus influenzae inativados,
fragmentados e purificados, cultivados em
ovos embrionados de galinha, que são
definidas a cada ano em função do perfil
epidemiológico, determinante das cepas que
circulam de forma predominante nos dois
hemisférios.
É indicada para a proteção contra a gripe e
suas complicações, principalmente as
pneumonias bacterianas secundárias. Suas
contraindicações específicas dizem respeito
à não aplicação em menores de seis meses
e a avaliação de indivíduos alérgicos ao ovo
de galinha, que devem ser vacinados em
ambiente hospitalar.
Esse imunobiológico é administrado
anualmente para os grupos elegíveis,
contemplando, nas crianças o intervalo entre
6 meses completos e 6 anos incompletos.
Sua via de administração preferencial e a
intramuscular, porém pode ser aplicada de
forma subcutânea em casos de pacientes em
uso de anticoagulantes.
CALENDÁRIOS DE IMUNIZAÇÃO NA INFÂNCIA:
CALENDÁRIO VACINAL D O MINISTÉRIO DA SAÚDE:
O Ministério da Saúde define, por meio do
Programa Nacional de Imunização, as
vacinas que compõem o calendário vacinal
do SUS, abrangendo o cidadão desde seu
nascimento até a terceira idade.
Para que seja vacinada, basta levar a criança
a uma Unidade Básica de Saúde com a
caderneta da criança.
O ideal é que cada dose seja administrada
na idade recomendada, mas, caso a família
perca o prazo para alguma dose é importante
voltar à unidade de saúde para atualizar as
vacinas. A maioria das vacinas disponíveis
no Calendário Nacional de Vacinação é
destinada a crianças, dispostas da seguinte
forma:
 Ao nascer: BCG e Hepatite B;
 2 meses: pentavalente, VIP, Pneumo-10
e rotavírus (1ª dose de cada uma);
 3 meses: meningocócica C (1ª dose);
 4 meses: pentavalente, VIP, Pneumo-10
e rotavírus (2ª dose de cada uma);
 5 meses: meningocócica C (2ª dose);
 6 meses: pentavalente e VIP (3ª dose de
cada uma), início da participação nas
campanhas de vacinação sazonal contra
gripe;
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 9 meses: febre amarela (dose única);
 12 meses: tríplice viral (1ª dose),
pneumo-10 e meningocócica C (reforço
de ambas);
 15 meses: DTP (1ª reforço), VOP (1º
reforço), hepatite A (uma dose), e tetra
viral (uma dose, atua como reforço da
tríplice viral);
 4 anos: DTP (2º reforço), VOP (2º
reforço), febre amarela (2ª dose) e
varicela (uma dose).
CALENDÁRIO VACINAL D A SOCIEDADE RASILEIR A
DE PEDIATRA:
O calendário da SBP é elaborado para
crianças e adolescentes hígidos (do
nascimento até 19 anos de idade), sendo
que o regime vacinal proposto pode sofrer
alterações por conta de imunodeficiências ou
de situações epidemiológicas específicas.
Quando a vacinação se inicia fora da idade
padronizada, os esquemas podem ser
adaptados, sendo necessário ater-se
somente ao intervalo necessário entre cada
dose.
Esse cronograma apresenta algumas
discrepâncias quando comparado ao
calendário do Ministério da Saúde, a saber:
 Imunização para Hepatite B realizada em
três doses (12 horas, um ou dois meses
de idade e seis meses), sendo que nestas
duas doses, podem ser utilizadas vacinas
combinadas acelulares;
o Crianças com menos de 2kg ao
nascer ou prematuros com IG menor
que 33 semanas devem receber,
além da vacina ao nascer, mais três
doses (0, 2, 4 e 6 meses)
 Aplicação de cinco doses totais da tríplice
bacteriana (DTP), com três doses no
primeiro ano de vida (2, 4 e 6 meses),
primeiro reforço aos 15 meses e segundo
entre 4 e 6 anos. Pode ser aplicada uma
dose de DTPa na adolescência, entre 13
e 15 anos de idade;
 Doses de reforço para a vacina
meningocócica entre o 5º e o 6º ano de
vida e na adolescência (a partir dos 11
anos), baseada na rápida diminuição nos
títulos de anticorpos resultantes da
vacinação. Recomenda-se, sempre que
possível, utilizar a vacina MenACWY pelo
maior espectro de proteção;
 Vacina meningocócica B recombinante
entre 3 e 12 meses de idade, com duas
doses com intervalo mínimo de 2 meses
entre elas, além de uma dose de reforço
no segundo ano de vida. Adolescentes
não vacinados devem receber duas
doses;
 Duas doses para a imunização contra a
hepatite A, a partir do 12º mês de vida,
com reforço no 18º. Adolescentes não
vacinados devem receber as mesmas
duas doses ou realizar esquema
combinado entre hepatite A e B, no
mesmo esquema vacinal da última (0, 1,
6);
 Vacina contra a dengue ofertada para
todas as crianças a partir dos nove anos
de idade, num esquema de três doses (0,
6 e 12 meses), desde que já tenham tido
contato prévio com a doença. Esse
imunobiológico não deve ser
administrado junto a outras vacinas.
CALENDÁRIO DA SOCIED ADE BRASILEIRA DE
IMUNIZAÇÃO:
A SBIm cria, de forma bianual, um calendário
atualizado com recomendações para que o
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esquema vacinal seja feito de forma
completa, apresentando algumas diferenças
em relação ao modelo padronizado pelo
Ministério da Saúde. Essas divergências
são:
 Imunização para hepatite B em 3 doses
(ao nascer, 2 meses e 6 meses de idade),
podendo ocorrer com 4 aplicações em
caso de combinações com outros tipos de
imunobiológicos, administradas no
esquema 0, 2, 4 e 6 meses;
 Administração da vacina VPC13 no lugar
da pneumo-10, permitindo a imunização
contra outros três sorotipos. Se a criança
menor de seis anos já tiver o esquema
completo com a pneumocócica 10-
valente, podem ser observados
benefícios da 13-valente. A SBIm
mantém a mesma resolução quanto ao
número de doses, aplicadas aos 2, 4 e 6
meses de vida, com reforço podendo ser
feito entre o 12º e o 15º mês;
 Vacina meningocócica B em duas doses
para crianças de 3 a 11 meses,
respeitando um intervalo mínimo de dois
meses entre cada uma, idealmente aos 3
e 5 meses de idade, e uma dose de
reforço entre 12 e 15 meses;
 Administração de duas doses da vacina
contra influenza no primeiro contato com
crianças menores de 9 anos, sendo
recomendada a vacina 4V (não ofertada
pelo SUS);
 Vacinação contra hepatite A como forma
de compensar o bloqueio vacinal de
hepatite B ao longo do primeiro ano, em
esquema de vacinação conjugada (A + B)
com intervalo de seis meses entre as
doses (idealmente aos 12 e 18 meses de
vida);
 Vacinação contra a dengue preconizada
para crianças soropositivas, sendo feito
um esquema de três doses com seis
meses de intervalo entre elas (0, 6, e 12),
havendo contraindicação para indivíduos
imunodeprimidos e soronegativos (sem
contato prévio com a doença).
A ESCOLA E A SOCIALIZAÇÃO:
As crianças vivem a cidade a partir de quatro
espaços-lugares: a família, a escola, os
espaços de lazer, e os espaços criados por
elas próprias, sendo que a atribuição de
sentido a esses locais é intimamente
atrelada às suas relações sociais, baseadas
em amizades, negociações e troca intra e
intergeracionais.
As primeiras teorias sociológicas para o
desenvolvimento da capacidade de
socialização infantil, produzidas por
Durkheim e Parsons, descreviam a infância
como um período de passagem, que não era
importante em si, mas que representava a
espera pela vida adulta, favorecendo a
internalização de normas e regras, de forma
que as crianças se tornassem integradas à
sociedade, o que colaborou para a
construção científica da irracionalidade, da
natureza e da universalidade da infância.
Após o seu nascimento, a criança passaria a
ser conformada pelas instituições sociais: a
família, a comunidade e a escola. Dessa
relação, ela assimilaria a moral e os
costumes que conduzem ao convívio social
e, aos poucos, incorporaria as regras
coletivas aos seus valores individuais, pois,
do contrário, ela se tornaria excluída. A visão
Durkheiniana é ainda mais categórica ao
pontuar que a criança só se torna completa
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quando deixa para trás a infância, atingindo
a maturidade e uma espécie de plenitude
inerente a ela.
Em 1997, Corsaro, numa tentativa de
reconstruir a socialização como um conceito
sociológico, afirmou que a infância não se
trata somente de um problema de adaptação
e internalização, mas de um processo de
apropriação e reinvenção, criando assim o
conceito de reprodução interpretativa.
Nesse sentido, três são as modalidades que
promovem a socialização:
 Processos mentais: baseia-se no
conhecimento de valores, costumes,
normas e instituições, além da
compreensão da linguagem e dos
conhecimentos transmitidos na escola;
 Processos afetivos: manifestam-se por
meio do exercício da empatia, do apego
e da amizade;
 Processos condutuais: referem-se a
internalização das condutas aceitáveis
naquele meio, buscando evitar as não
aceitáveis.
Para Piaget, educador que também
contribuiu para a elucidação da socialização
infantil, o indivíduo desenvolve suas próprias
crenças, através da interação com o meio, a
partir da formação de um juízo moral que
passa por uma fase de heteronomia (quando
não concebe as regras como um contrato
firmado entre as pessoas), até uma fase de
autonomia (quando já compreende as regras
como esse contrato). Essas fases seguiriam
as mesmas etapas do desenvolvimento
cognitivo, demonstrando que a evolução das
atitudes morais pressupõe uma
reorganização sequencial relacionada com a
idade da criança.
É somente a partir dos 7 anos de idade, na
idade escolar, que o infante começa a evoluir
para uma autonomia moral. Na escola, em
contato com outras de mesma faixa etárias,
a criança descobre que é necessária a
reciprocidade para agir conforme as regras,
na medida em que essas somente são
efetivas se as pessoas concordarem com
elas.
Nesse sentido, nota-se que as instituições de
ensino são os espaços nos quais os
pequenos produzem seus conhecimentos
sociais, começam a compreender as
características do outro e de si mesmos,
estabelecem relacionamentos estratificados
e absorvem, por necessidade, regras de
convivência distintas daquelas de seu
espaço familiar, representando o lugar onde
ocorre a socialização secundária.
As reações de poder na escola são do tipo
“sociedade disciplinar”, descrita por Michel
Foucault como uma instituição que orbita em
torno de um inspetor central metafórico
onipotente, onipresente e onividente,
fazendo com que a ordem seja mantida sem
necessidade de punição. Assim, a escola
seria o espaço no qual o poder pela disciplina
é capaz de produzir o saber, pois ser
observado, olhado e contado
detalhadamente passa a ser um meio de
controle, de dominação, um método para
documentar individualidades. Ao dividir os
alunos e os saberes em séries, a escola
reforça as diferenças, recompensando os
que se submetem ao sistema escolar e
punindo com “reprovação” os que não se
submetem. Com o avanço da tecnologia, as
relações escolares internas se deslocaram
para uma “sociedade de controle”, na qual a
vigilância é realizada e almejada por todos,
sem que sejam empregados aparatos
explícitos para tal fim.
É também nas dependências escolares que
são criados e estreitados os laços de
amizade, permitindo que a criança
compreenda o papel do outro e reconheça-o
como um indivíduo com vontades, opiniões e
conduta diferentes. Esse contato constante
com o diferente também é fundamental para
a internalização do conceito de partilha e a
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educação para evitar o conflito. Além da
construção de relações, nesse ambiente
ocorre a estratificação destas, com a
definição do “amigo” e do colega,
introduzindo os conceitos de proximidade e
confiança.
MECANISMOS DE ESTIMU LAÇÃO SOCIOAFETIVA
DA CRIANÇA:
A estimulação precoce é imprescindível para
prevenir ou atuar eventuais atrasos ou
defasagens, que apresentam maior
relevância nos primeiros três anos de vida.
Esse processo conta com vários
facilitadores, desde a equipe
multiprofissional presente nas creches até a
família da criança, cujo papel é central em
seu desenvolvimento. Os principais objetivos
e atividades desse processo são:
 Zero a 12 meses: promoção de vínculos
afetivos, com o desenvolvimento do
autoconhecimento e da autoimagem. São
promovidos também o desenvolvimento
da autonomia e de ações intencionais,
ampliando assim a capacidade de
socialização.
o Manutenção de contato visual e verbal
com o bebê nas diversas atividades de
sua rotina;
o Dizer o nome de partes do corpo;
o Fazer gestos e expressões para que a
criança possa imitar o cuidador;
o Deixar, de forma segura, a criança
sozinha para brincar, explorando os
estímulos externos por conta própria;
o Introduzir a criança ao espelho;
o Permitir que o bebê explore sua face e
a do cuidador;
o Colocar o bebê na companhia de
outras crianças;
o Apresentar as atividades diárias à
criança por meio de pelúcias e
bonecas.
 12 a 24 meses: a promoção de vínculos
afetivos e familiares é fundamental,
mantendo o trabalho quanto ao
autoconhecimento, socialização e
autonomia.
o Incentivar a criança a comer sozinha e
explorar a comida;
o Ler histórias fazendo uso de
entonações e tons de voz distintos;
o Incentivar a criança a pedir sua vez em
brincadeiras;
o Promover o desenvolvimento da
percepção do corpo;
o Ensinar a criança a se despir e a ajudar
o cuidador ao colocar uma roupa;
o Favorecer o contato com outras
crianças;
o Desenvolver a partilha;
o Expor a criança a hábitos de higiene e
alimentação.
 24 a 36 meses: o desenvolvimento da
identidade pessoal, fortalecimento das
relações familiares, a compreensão de
regras e normas e a ampliação do círculo
social são os pontos-chave desse
momento.
o Ler histórias com a criança,
estimulando a imitação e a observação
de figuras;
o Explorar a fotografia e as memórias;
o Incentivar a interação social entre
crianças (dizer “oi”);
o Estimular o uso de “por favor” e
“obrigado”;
o Contar histórias nas quais os
personagens resolvam conflitos por
meio do diálogo.
AVALIAÇÃO DO DESENVO LVIMENTO INFANTIL EM
CRIANÇAS:
O desenvolvimento cognitivo é o processo de
surgimento da capacidade de compreender,
pensar e decidir como agir no mundo que
nos cerca. É a construção do conhecimento
e de formas de resolver problemas que se dá
através de um conjunto de processos
mentais que envolvem a percepção,
atenção, memória, raciocínio e imaginação.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Dessa forma, um desenvolvimento cognitivo  Egocentrismo;
integral depende de relações satisfatórias  Animismo (personificação de animais,
entre as diversas funções (sensorial, objetos e fenômenos);
perceptiva, motora, linguística, intelectual e  Centragem (foco exclusivo numa parte de
psicológica), bem como das etapas críticas um estímulo, deixando de se atentar aos
da maturação neurocerebral do indivíduo. detalhes);
Por consequência, a ausência, escassez ou  Irreversibilidade (a criança apresenta
presença de estimulações nos momentos desejo de conservação, crendo que o
oportunos pode alterar o curso do valor de um objeto será alterado por
desenvolvimento. conta da modificação de sua aparência).
A participação e mediação de outro ser
humano são fundamentais em todo o
processo de desenvolvimento, pois é o outro
que apresenta para a criança esse universo
cultural constituído de objetos, ideias, modos
de se comunicar, fazer e resolver problemas.
Deve-se, portanto, garantir a promoção de
relacionamentos estimulantes, estáveis e
ricos em experiências de aquisição uma vez
que os benefícios alcançados serão
permanentes à aprendizagem,
comportamento e saúde física e mental da
criança.

Ao avaliar o desenvolvimento infantil, é

essencial considerar a história clínica,
escutar as impressões dos pais sobre seu
bebê, observar sua interação com o meio e,
se preciso, proceder algumas atividades com
o uso de brinquedos. Essa avaliação permite
ao profissional de saúde analisar se o
desenvolvimento da criança progride como
esperado, ou se há sinais de atraso que
merecem uma intervenção mais direcionada.
Nesse momento é válido ressaltar que a
criança deve estar tranquila e motivada
durante esse exame, de forma a se engajar
verdadeiramente nas atividades.
Piaget determina que, durante o objetos. O aprendizado se dá principalmente
desenvolvimento cognitivo, a criança de 2 a
6 anos é caracterizada por formas de
raciocínio pré-operacional, representando
um salto dramático no uso da linguagem,
mantendo, no entanto, concepções falhas
sobre a lógica. As principais manifestações
comportamentais nesse período são:
De forma geral, espera-se observar o
desenvolvimento de algumas habilidades
cognitivas e sociais e certos marcos do
domínio da linguagem nos três primeiros
anos de vida de um indivíduo:
 Primeiro ano de vida:
Nesse momento, o desenvolvimento
cognitivo será intrínseco aos avanços
motores, havendo predominância desses
últimos. Suas respostas passarão
gradativamente de reflexos a movimentos
voluntários, podendo assim fazer o
movimento de pinça, engatinhar e segurar
por imitação, e expandirá seu tempo de
atenção e capacidade mnemônica surgindo
as noções de permanência e de causa e
efeito. Um dos marcos desse período é a
atenção conjunta, com o bebê tornando-se
capaz de coordenar seu interesse entre um
objeto e seu companheiro social.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A linguagem desempenha um papel
essencial na organização perceptual, na
recepção e na estruturação das informações,
na aprendizagem e nas interações sociais do
ser humano. É a partir da entrada no mundo
da linguagem (mundo simbólico) que a
criança nasce, também, como sujeito em um
meio social.
Mesmo na fase pré-linguística, que vai até
por volta dos 12 meses de vida, ainda que
não saiba falar, a criança apresenta
linguagem, iniciando a interação simbólica
com o outro pelo olhar e expressão facial,
pelos movimentos e contatos corporais. Nos
primeiros meses acalma-se com a voz da
mãe, presta atenção aos sons e às palavras.
Posteriormente, por volta de 6 a 7 meses de
vida, as emissões orais evoluem para
balbucios, aos 12 meses surgem as
primeiras palavras contextualizadas.
 Segundo ano de vida:
A criança começa a conquistar maior
mobilidade e independência com o
desenvolvimento de várias expressões de
motricidade ampla (correr, chutar, pular) e
fina (fazer traçados simples, abotoar botões
grandes e folhear livros). A memória se
expande, ponto crucial para o aprendizado
futuro.
A criança compreende grande parte da fala
dirigida a ela. As vocalizações e
protopalavras (palavras únicas com vários
significados possíveis) dão lugar para o uso
de palavras que determinam objetos e
pessoas, e para associações de duas e três
palavras, que constituem frases. Há muita
variabilidade na aquisição da linguagem
mas, apesar disso, grande parte das
crianças tem um repertório de, ao menos,
dez palavras aos 18 meses, que se expande
para mais de 50 aos 24 meses, permitindo a
narração de situações simples.
O pensamento simbólico ganha
complexidade e, nas brincadeiras de faz-de-
conta, a criança exercitará e aplicará tanto
sua habilidade linguística quanto sua
cognição sobre o mundo circundante. É
capaz de controlar seus esfíncteres durante
o dia, ganhando assim ainda mais autonomia
e autossuficiência, com confiança para
interagir com desconhecidos. Apreciará a
companhia de outras crianças, mas tenderá
a permanecer, em boa parte do tempo, em
ações e jogos mais autocentrados.
 Terceiro ano de vida:
A criança dá um salto evolutivo na
motricidade ampla e na cognição, sendo apta
a montar quebra-cabeças simples, recortar
figuras, fazer traçados mais fortes,
esboçando figuras. O uso da linguagem oral
será cada vez mais refinado, facilitando a
comunicação à medida em que se torna
atenta e independente. Nesse momento,
inicia-se o processo de assumir papéis em
jogos e histórias, que representam a busca
por um lugar no mundo.
Aumenta o tempo de atenção, a memória se
expande e se articula mais fortemente à
linguagem, possibilitando brincadeiras mais
complexas, que envolvem narrativas mais
longas. É possível agora separar objeto em
grupos por critérios de cor, forma e tamanho,
tanto por conta do maior domínio da fala
como também da percepção espacial
otimizada. A criança apresentará uma melhor
compreensão das regras de jogos e
começará a participar de brincadeiras
sociais. Ela desenvolverá um sentimento de
independência que auxiliará na conquista da
autonomia em relação à alimentação,
vestuário e asseio.
Para mensurar todas essas conquistas, é
necessário que o profissional de saúde utilize
escalas e avaliações, sendo uma delas os
indicadores de desenvolvimento, tabelas
com os marcos esperados pela idade, que
devem ser analisados de forma global para
estimar o grau de desenvolvimento do
infante.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Uma escala muito valiosa nesse processo é
a escala de Denver II, uma forma de
rastreamento de risco de desenvolvimento
infantil amplamente usada no Brasil e no
mundo. Este instrumento inclui avaliação de
comportamento social e pessoal, linguagem
e habilidades motoras preconizadas como
típicas do desenvolvimento. O
desenvolvimento cognitivo da criança é
avaliado pela capacidade de compreensão
de instruções, conceituação de palavras,
nomeação de figuras e habilidades pessoal-
social. Os fatores que fundamentam a
escolha dessa escala são sua elevada
sensibilidade e a validade dos resultados.

A padronização do teste de Denver para a

população brasileira foi realizada em um
estudo em Porto Alegre. Os autores
avaliaram 3.389 crianças menores de cinco
anos, permitindo, assim, o ajuste do teste de
desenvolvimento de Denver II ao contexto
cultural brasileiro.
O preenchimento desse teste é feito por meio
de indagações de um pesquisador a um
infante, que deverá, da melhor forma
possível, atender ao que lhe for solicitado.
Com base na resposta, o examinador irá
atribuir-lhe uma pontuação (“passa”, “falha”),
que será comparada com o percentual de
associações para aquela idade. Atividades
que apresentam 90% de “passa” são
consideradas como típicas daquela idade.
Salienta-se, no entanto, que esse não é um
teste diagnóstico, e o laudo decorrente de
sua avaliação deve ser usado somente como
documento de encaminhamento para
avaliação por profissionais qualificados e
como forma de estímulo ao
desenvolvimento.
A Escala de Inteligência de Wechsler para
Crianças (WISC – III) é uma medida bastante
robusta do desenvolvimento cognitivo para
crianças em idade escolar (dos seis até 16
anos e 11 meses), consistindo numa bateria
de provas com materiais diversos (quebra-
cabeças, cubos, questões e histórias) e
lúdicos que permitem a criança testar
diversas competências de cunho cognitivo,
como concentração velocidade de
processamento, organização perceptiva e
memória. As considerações para a
pontuação das respostas no WISC-III são
objetivas e exigem pequenas ou nenhuma
interpretação dos critérios e, os tópicos
relacionados a esse princípio são: como usar
as respostas dadas pela amostra, respostas
acrescentadas após o questionamento,
respostas erradas, conceitos gerais sobre os
itens de compreensão e respostas múltiplas.

PROBLEMA 4 – ABERTURA:

DESNUTRIÇÃO NA INFÂN CIA:

 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A desnutrição pode ser definia como uma
condição clínica decorrente de deficiência ou
excesso, relativo ou absoluto, de um ou mais
nutrientes considerados essenciais. A
desnutrição calórico-proteica, por sua vez é
o conjunto de condições patológicas
resultantes da carência simultânea tanto de
calorias quanto de proteínas, ocorrendo com
maior frequência em lactentes e crianças em
idade pré-escolar, associada com infecções
de repetição e a outros distúrbios
nutricionais.
Por ser associada a condições
socioeconômicas precárias, sanitárias e
ambientais, a desnutrição é uma doença
social, determinada pelo modelo de
desenvolvimento econômico, político, social
e cultural de um país. Essa é uma condição
de elevada prevalência em países em
desenvolvimento, sendo responsável, direta
ou indiretamente, pelas altas taxas de
morbidade e mortalidade em menores de
cinco anos de idade. Calcula-se que nessa
faixa etária, em todo o mundo, mais da
metade dos óbitos está relacionada com
desnutrição.
As repercussões da desnutrição,
principalmente em crianças, são gerais,
afetando todos os sistemas, interferindo no
crescimento e desenvolvimento adequados,
reduzindo a qualidade de vida e restringindo
as chances dela se tornarem adultos
saudáveis.
ETIOLOGIA E QUADRO CLÍNICO:
Algumas situações aumentam a gráfico, a análise da reta formada por eles é
probabilidade de desenvolvimento da
desnutrição, tornando o rastreamento e a
identificação de famílias nesses critérios
fundamentais para prevenir agravos e atuar
na promoção de saúde destes. Esses fatores
de risco são descritos por:
 Vulnerabilidade socioeconômica;
 Desnutrição materna;
 Desmame precoce;
 Baixo peso ao nascer;
 Gemelaridade;
 Internações hospitalares repetidas;
 História de desnutrição na família;
 Manifestação repetida de diarreia nos
primeiros dias de vida;
 Irmão falecido antes dos cinco anos de
idade;
 Ganho de peso menor que 500g mensais
no 1ª trimestre de vida;
 Ganho de peso menor que 250g mensais
no 2º trimestre de vida;
 Baixa escolaridade materna;
 Vínculo fraco entre mãe e filho;
 Histórico de maus-tratos na família.
A Carteira de Saúde da Criança é um
instrumento de registro importante para
acompanhar dados relativos ao
desenvolvimento e ao estado geral do
infante. Os gráficos de peso para a idade
nele contidos apresentam faixas de
diferentes cores, cada uma discriminando
percentis específicos (vermelho – p 3 a p 97/
amarelo – p 15 a p 85/ verde – p 50).
Além de avaliar os pontos descritos no
importante para descrever o processo de
crescimento adequado. Se a curva for
crescente, essa criança apresenta-se em
bom estado; quando retilínea, há um sinal de
alerta, pois o infante não está ganhando
peso adequadamente; uma linha
decrescente, por sua vez, desperta grande
perigo, pois demonstra que há uma
tendência de perda ponderal.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A desnutrição pode se apresentar de
diversas maneiras, devido à variedade de
suas manifestações clínicas. Ela vai desde
casos leves, cuja ocorrência não põe em
risco a saúde da criança, até os
considerados graves e de grande
repercussão. Entre estes podemos encontrar
o Kwashiorkor e o marasmo, responsáveis
por altas taxas de mortalidade e que se
manifestam de maneira distinta. Algumas
crianças podem ainda apresentar uma forma
mista, conhecida como Kwashiorkor-
marasmático.
O Kwashiorkor é um tipo grave de
desnutrição que provoca despigmentação do
cabelo e da pele, alopecia, lesões cutâneas
com descamação e áreas de hiper ou
hipopigmentação, além de edema
nutricional, causado pela hipoalbulinemia,
que pode mascarar a perda nutricional. As
crianças afetadas também são mais
propensas a imunodeficiências e infecções
de repetição. Sua ocorrência se dá quando a
carência proteica supera a deficiência na
ingestão total de calorias (ex.: por
alimentação inadequada, com excesso de
carboidratos), tendo impactos sobre o
desenvolvimento infantil mais graves do que
os do marasmo.
O marasmo nutricional também é uma
manifestação severa, marcada pelo extremo
enfraquecimento do corpo sendo associada
ao jejum e a fome aguda, com séria depleção
calórica. As crianças afetadas sofrem com
retardo de crescimento e perda de massa
muscular (os músculos tornam-se finos) e de
panículo adiposo, uma vez que essas
reservas são mobilizadas como fonte de
energia. A cabeça parece grande demais em
relação ao resto do corpo, com face
envelhecida. Observa-se ainda, presença de
anemia e deficiência de múltiplas vitaminas.
Casos de infecções simultâneas são
comuns, decorrentes da evidente
imunodeficiência.
Essas duas formas de carência alimentar
podem apresentar-se conjuntamente, como
o Kwashiorkor-marasmático ou desnutrição
energético-proteica, sendo descrita por
sintomatologia de marasmo nutricional na
presença de edema.
Uma maneira simples de distinguir esses
dois tipos de desnutrição e sua forma
intermediária foi proposto em 1970. Essa
classificação chamada Wellcome é baseada
na presença ou ausência de edema e déficit
de peso corporal, sendo útil para distinguir as
formas graves de desnutrição. Crianças com
edema que pesam entre 60-80% de peso
esperado para a idade são classificadas
como tendo Kwashiorkor. Aquelas sem
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
edema pesando menos que 60% de peso
esperado para a idade são consideradas
marasmáticas. O diagnóstico de
Kwashiorkor-marasmático foi estabelecido
para crianças com edema e menos de 60%
do peso esperado.
O baixo peso para a idade como índice
isolado para o diagnóstico de desnutrição é
bastante difundido pela facilidade de
obtenção e sensibilidade para detectar
precocemente os casos, porém conta com
algumas limitações, o que faz com que o
Ministério da Saúde adote uma outra
classificação, que relaciona peso para idade,
inclinação da curva de peso e sinais clínicos.
FISIOPATOLOGIA:
A desnutrição desencadeia uma série de
respostas adaptativas com alterações no
metabolismo. A diminuição do peso é uma
das respostas iniciais à carência proteico-
energética. Seguem-se a desaceleração do
crescimento, as alterações hormonais,
enzimáticas e da resposta imunológica. As
crianças desnutridas são mais susceptíveis
às infecções, têm dificuldades para absorver
certos nutrientes, são mais propensas à
diarreia, aos distúrbios hidroeletrolíticos, à
hipoglicemia e hipotermia. A anemia não
somente é consequência das carências
específicas, como também aparece em
resposta à baixa demanda de oxigênio pelos
tecidos, devida à inatividade física e
economia de aminoácidos. A desnutrição em
crianças mais jovens acomete o sistema
nervoso central, interferindo na mielinização
e na produção de neurotransmissores.
MECANISMOS FISIOLÓGICOS DE MANEJO DA
ALIMENTAÇÃO:
As pesquisas em fisiologia da alimentação
afirmaram, por décadas, que o hipotálamo
seria a região cerebral envolvida no processo
de controle da ingesta alimentar, teoria
proposta após ser evidenciado que lesões
eletrolíticas provocadas às fibras nervosas
na porção lateral resultavam em afagia e
perda de peso, enquanto danos provocados
na parte ventro-medial levavam à hiperfagia,
compondo assim um “centro da fome” e outro
“centro da saciedade”.
Atualmente, sabe-se que esse mecanismo é
muito mais complexo, estando relacionado a
múltiplas áreas do sistema nervoso que
recebem estímulos sensoriais e químicos,
como a amígdala e o córtex pré-frontal, que,
por sua vez, estão intimamente relacionados
ao hipotálamo.
A amígdala contém centros importantes do
sistema olfativo, que controlam os atos
mecânicos de comer. Lesões bilaterais da
amígdala causam perda da capacidade de
controle do tipo e da qualidade de alimento
ingerido, mas sem dúvida o hipotálamo
continua sendo visto como a região de
concentração de fibras nervosas com função
de controle do comportamento alimentar.
Existe uma regulação curta e uma regulação
longa da ingestão alimentar. O controle curto
é feito pela distensão da parede do
estômago, pelos hormônios gastrointestinais
e por receptores orais sensíveis aos efeitos
da mastigação, salivação, deglutição e gosto
do alimento. Os mecanismos de controle a
longo prazo, por sua vez, são feitos a partir
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
do estado nutricional do indivíduo. Isso pode são ativados processos catabólicos ou
ser visualizado por meio da associação da anabólicos.
queda da concentração sérica de glicose
com a fome (teoria glicostática da fome). A
glicose, além disso, é o substrato metabólico
mais importante do cérebro, apesar de não
ser o único, e neurônios sensíveis à glicose
ou que se utilizam de glicose estão
espalhados por todo o sistema nervoso.
Descobriu-se, ainda, que baixas
concentrações de aminoácidos ou de corpos
cetônicos e ácidos graxos podem acarretar FISIOPATOLOGIA E BIOQUÍMICA DO MARASMO:
os mesmos efeitos provocados pelos
No marasmo, a perda muscular e a depleção
açúcares, formando uma nova teoria, dessa
das reservas de gordura subcutânea são
vez global, para a deflagração da sensação
produtos finais da proteção parcial aos
de fome, de acordo com a qual todos os
órgãos vitais, como coração, vísceras e
micronutrientes supracitados são
importantes para o controle do volume de cérebro, de um detrimento de tecidos menos
alimentos consumidos. importantes do ponto de vista da
homeostase.
Hoje se sabe que o efeito da glicose no
sistema nervoso resultando em Os processos de catabolismo podem ser
vistos nas crianças muito antes delas
hipersecreção de insulina, diminuição da
apresentarem peso inferior a 60% do
produção hepática de glicose e hipoglicemia
esperado para sua idade, e o sucesso desse
acontece via nervo vago, e que a secção
desse nervo, ou vagotomia, provoca o processo de adaptação metabólica é
desaparecimento desses efeitos. Este evidenciado pelo metabolismo regular a
ausência de hipoalbulinemia severa.
processo produz uma rápida utilização de
glicose na periferia para produção de lipídios Os tecidos corporais necessitam de energia
e glicogênio após a ingestão de alimentos. para a sobrevivência e se a ingesta calórica
pela alimentação não é suficiente, o corpo
Por outro lado, o mesmo sistema também
precisa provê-la de alguma forma. Nesse
está envolvido na resposta a uma falta de
glicose, durante os períodos de privação sentido, são os hormônios glicocorticoides
alimentar, para prevenir a hipoglicemia. então que entram em ação promovendo o
catabolismo proteico dos músculos. A
Níveis baixos de glicose no SNC produzem
quebra das proteínas musculares garante o
uma resposta hiperglicemiante nos tecidos
periféricos mediada pela ativação dos fornecimento de aminoácidos para o
centros noradrenérgicos e estimulação do processo de transaminação até alanina, o
mais importante dos substratos da
sistema nervoso simpático. Essa
gliconeogênese hepática, via que tem como
estimulação aumenta a produção de
glucagon pelo pâncreas e a produção de produto final a glicose. Este mecanismo é
glicose pelo fígado. Este parece ser um dos essencial como fonte de energia para o
cérebro, principalmente nos primeiros
sistemas principais de controle da
estágios da privação calórica total. Os
homeostase, ou seja, dependendo do
aumento ou diminuição de glicose sanguínea aminoácidos essenciais e os outros
metabólitos fornecidos pelo catabolismo
servem também para a síntese de diferentes
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
componentes vitais para a manutenção da
homeostase do organismo.
Além disso, a concentração de beta-
lipoproteína, a proteína essencial para o
transporte de triglicerídeos do fígado para os
depósitos de gordura no corpo, também está
mantida no marasmo e pode contribuir muito
para o não-aparecimento de esteatose
hepática nessas crianças, fato comumente
observado em pacientes com Kwashiorkor.
Em geral, a ausência de anormalidades
metabólicas e desarranjos celulares neste
tipo de desnutrição indica uma habilidade,
mesmo em crianças muito jovens, para
manter a homeostase por prolongados
períodos de restrição alimentar.
FISIOLOGIA E BIOQUÍMICA DO KWASHIORKOR:
O Kwashiorkor, também conhecido como
desnutrição edematosa, ainda pode ser
descrito como uma doença de patogênese
duvidosa. A perda de peso é normalmente
menos severa que a do marasmo, embora
seja muito variável (algumas crianças têm
baixo peso para a idade, enquanto outras
mantém-se com peso normal, mesmo após a
redução do edema).
Essa manifestação está associada a uma
série de disfunções bioquímicas que podem
ser observadas muito antes do aparecimento
de fato da doença. O fígado é
particularmente afetado e, em consequência,
ocorre uma perda dos mecanismos
homeostáticos. Estes infantes não mobilizam
os estoques de proteína da sua musculatura
para manter a função dos órgãos essenciais,
sendo observados baixos níveis de cortisol e,
num período “pré-Kwashiorkor” há elevação
nos níveis de insulina.
As mudanças metabólicas mais importantes
são uma redução marcante na concentração
de proteínas plasmáticas, produzidas pelo
fígado, levando a um padrão alterado de
destes compostos, com redução do nível de
aminoácidos essenciais, mas com valores
normais ou até elevados de aminoácidos
não-essenciais. Essa baixa de nutrientes
essenciais causaria diminuição da síntese de
albumina no fígado, que é a proteína
produzida e liberada em maior quantidade
por esse órgão.
Por fim, pode-se considerar que o
Kwashiorkor seja provocado por mensagens
conflitantes que chegam ao hipotálamo
levando a uma manutenção de níveis mais
elevados de hormônios anabólicos, mesmo
num estado em que dá depleção de
substrato.
TRATAMENTO:
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O acolhimento do desnutrido e o
atendimento não programado em situações
emergenciais devem ser garantidos, ainda
que não haja agendamento, uma vez que a
desnutrição é sempre uma condição de
elevado risco para doenças
infectocontagiosas. As famílias das crianças
faltosas deverão ser contatadas por busca
ativa.
O calendário de atendimentos ao infante
desnutrido será feito de forma a concordar
com os seguintes pontos:
 Em crianças menores de dois anos e com
desnutrição leve, o intervalo máximo
entre os atendimentos deve ser de até 30
dias;
 Para crianças maiores de dois anos com
desnutrição leve, o intervalo máximo
entre os atendimentos não deve exceder
60 dias;
 As crianças com desnutrição moderada
deverão ser atendidas inicialmente em
intervalos semanais, com espaçamento
progressivo (quinzenal), à medida que
ganharem peso;
 Os atendimentos individuais deverão ser
intercalados com atividades em grupo,
enfocando os processos de educação e
promoção de saúde.
Os atendimentos deverão ser espaçados
para a criança que, durante três meses
consecutivos, apresentar ganho de peso
satisfatório com a curva de peso para idade
em ascensão e cuja família esteja
claramente envolvida no seu processo de
recuperação. Após esse período ainda
haverá o acompanhamento específico, mas
para o infante que se mantiver sem
intercorrências e com curva de ganho
ponderal crescente, será decretada alta, com
as visitas à Unidade de Saúde retomando ao
calendário regular de puericultura.
A conduta empregada na recuperação de
crianças desnutridas irá variar conforme o
grau do acometimento, sendo que:
 Crianças com desnutrição grave deverão
ser imediatamente encaminhadas para
internação devido à sua maior
susceptibilidade a complicações graves e
risco de morte;
 Crianças com desnutrição primária leve
ou moderada deverão ser tratadas pela
equipe de saúde;
 Crianças com desnutrição mista deverão
ser avaliadas pelo médico da equipe
quanto à necessidade de
encaminhamento;
 Crianças com ganho de peso insuficiente
deverão ser investigadas para
identificação de causas e tratadas pela
equipe de saúde.
Nota-se que mesmo após o
encaminhamento a serviços especializados,
esses pacientes devem continuar com o
acompanhamento pela equipe de saúde de
sua UBS.
O tratamento da criança desnutrida tem
como diretrizes:
 Adequação da dieta – deve enfatizar os
seguintes aspectos:
o Estimular o aleitamento materno e a
relactação;
o Utilizar alimentos de alto valor
nutricional, levando em conta o
equilíbrio entre nutrientes e densidade
energética;
o Aumentar a densidade calórica das
refeições com a adição de óleo vegetal
a cada refeição salgada (uma colher
de sobremesa para menores de um
ano, e uma de sopa para os mais
velhos), estimulando o uso consciente
de outros lipídeos;
o Utilizar alimentos adequados à idade
da criança;
o Evitar alimentos muito diluídos ou ricos
em açúcar;
o Incentivar o uso de alimentos
regionais, respeitando a cultura, o
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
paladar e o contexto socioeconômico
da família;
o Recomendar o consumo de frutas da
estação e com maior densidade
energética;
o Estimular o consumo de cereais e
folhas verdes;
o Variar constantemente os alimentos
ofertados, evitando a monotonia
alimentar;
o Respeitar os limites de capacidade
gástrica da criança;
o Aumentar o número de refeições
diárias (6 a 8), reduzindo o
espaçamento entre elas;
o Prescrever suplementação de sais de
ferro em caráter profilático ou
terapêutico;
o Prescrever suplementação vitamínica
em casos de risco de carência, com
enfoque para a vit. A;
o Orientar sobre a aquisição, o
armazenamento e o preparo dos
alimentos.
 Prevenção e controle dos processos
infecciosos e infestações parasitárias:
A prevenção e o controle dos processos
infecciosos e infestações parasitárias na
criança desnutrida são medidas essenciais
para interromper o círculo vicioso que se
instala nessas condições. O diagnóstico e as
intervenções precoces têm papel decisivo
para o sucesso da recuperação.
Nesse sentido, é necessário manter o
esquema vacinal atualizado, reforçar a
atenção para detectar sinais de alerta
(sintomas iniciais) e tratar parasitoses assim
que elas forem diagnosticadas.
 Estimulação do desenvolvimento
neuropsicomotor:
As famílias devem ser orientadas a interagir
e estimular suas crianças de acordo com as
potencialidades individuais e particulares de
cada faixa etária. Essa estimulação não
requer técnicas especiais e deve ser feita
durante o cuidado diário com as crianças.
Tocar, olhar, conversar, brincar, demonstrar
afeto e prazer em estar junto à criança são
formas de estimulação muito importantes em
todas as faixas etárias.
 Educação para a saúde e suporte para as
famílias:
A abordagem da criança desnutrida inclui
necessariamente a abordagem da família. O
fortalecimento do vínculo mãe-filho e a
participação ativa da família no tratamento
são fatores decisivos para o sucesso deste.
Além das atividades informativas e
educativas, a equipe deve estar preparada
para acolher a família do desnutrido sempre
que necessário e para promover uma rede
de apoio que inclua toda a equipe, em
especial o agente comunitário de saúde,
lideranças da comunidade e outras mães.
PROFILAXIA:
As principais maneiras de prevenir a
desnutrição são:
 Orientar corretamente a população a
respeito do aleitamento materno, através
da formação de profissionais de saúde e
educadores capacitados;
 Divulgar informações práticas sobre o
conceito de alimentação saudável em
locais e em meios de comunicação de
fácil acesso à população;
 Realizar programas governamentais de
suplementação alimentar que atinjam
todo o país e, especialmente, os mais
necessitados.
Além desses itens, o Ministério da Saúde
elaborou os “10 mandamentos da
alimentação saudável”, com atitudes que
devem ser seguidas no cotidiano para
garantir uma dieta adequada:
 Comer frutas e verduras;
 Para cada 2 colheres de arroz, comer 1
de feijão: esses dois alimentos se
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
complementam, principalmente no que
diz respeito às proteínas;
 Evitar gorduras e frituras;
 Usar 1 lata de óleo para cada 2 pessoas
da casa por mês;
 Realizar 3 refeições principais e 1 lanche
por dia;
 Comer com calma e não na frente da TV;
 Evitar doces e alimentos calóricos;
 Ter uma alimentação variada, com
especial atenção para as frutas, legumes,
verduras e cereais, sem esquecer da
hidratação;
 Praticar atividades físicas com duração e
frequência adequados (junção do 9º e 20º
mandamento).
Por fim, a higiene dos alimentos e pessoal é
imprescindível no combate à desnutrição,
pois reduz o risco de contaminação por
parasitoses. Nesse sentido, deve-se reforçar Apesar da significativa redução de sua
a importância da lavagem das mãos e dos prevalência nas duas últimas décadas, a
produtos alimentícios, o cozimento desnutrição continua sendo um sério
adequado de carnes, o consumo de água problema para a saúde pública brasileira,
filtrada, a escovação dos dentes, o banho especialmente em áreas rurais e nas regiões
diário e o uso de roupas limpas. mais pobres do país. Atualmente, verifica-se
o predomínio das formas leves e moderadas
EPIDEMIOLOGIA: da doença, que, por se manifestarem apenas
por déficit de peso ou altura, são menos
No Brasil, a Pesquisa Nacional sobre
diagnosticadas e valorizadas.
Demografia e Saúde (PNDS), realizada em
1996, constatou que a proporção de crianças
brasileiras de 0 a 5 anos com baixa estatura
para idade era 10,5%; com baixo peso para
idade era 5,7% e baixo peso para altura era
2,3%. Essa pesquisa constatou ainda que a
proporção de crianças com baixo peso para INTERAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO
idade era duas vezes maior no meio rural, e INFANTIL:
que as regiões Norte e Nordeste eram as que
O desenvolvimento de uma criança resulta
apresentavam a maior prevalência de
da ação conjunta dos fatores sociais e
desnutrição infantil.
culturais em que está inserida, além de suas
características biológicas, tornando as novas
habilidades conquistadas pela criança um
produto direto de a sua faixa etária e da
interação que ela mantém com os outros
indivíduos. Múltiplos são os fatores que
afetam o desenvolvimento, desencadeando
déficits e atrasos, sendo que alguns estudos
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
apontam a desnutrição como a principal
responsável, dentre as causas ambientais,
pelo atraso do desenvolvimento motor.
Há evidências de que o organismo de uma
criança desnutrida promove uma diminuição
da atividade perceptível quando comparada
às atividades de crianças que se alimentam
de maneira adequada. Isso ocorre porque o
organismo lança mão de mecanismos de
adaptação, com a finalidade de promover um
balanço energético. Mesmo sem a
ocorrência de lesões cerebrais, uma criança
que tem a fome não saciada pode perder a
motivação para explorar o ambiente e,
assim, ter um atraso na aquisição de certas
habilidades cognitivas.
As consequências da desnutrição no
desenvolvimento infantil são numerosas,
incluindo desde retardo no crescimento, que
seria uma das manifestações mais comuns,
a retardo mental, atraso do
neurodesenvolvimento, baixa capacidade
para resolução de problemas e recorrência
de infecções, dentre outras, com
acometimento geral de seus sistemas
orgânicos.
A desnutrição pode levar a criança a
apresentar ainda olhos encovados,
glândulas atrofiadas, secura nos olhos e na
boca, reduzida produção de suor e danos
cerebrais, conduzindo a um aprendizado
deficiente e à insuficiência na organização
das atividades neuromotoras,
comprometendo o intelecto e o rendimento
escolar (as áreas da coordenação
visiomotora, da memória e da linguagem são
mais afetadas).
ALTERAÇÕES HORMONAIS E A DESNUTRIÇÃO:
AÇÃO DO HORMÔNIO GH:
A ação do hormônio do crescimento
(somatostatina/GH), produzido pela hipófise,
se dá por meio da ação de somatomedinas,
das quais a mais importante para o
crescimento somático é a somatomedinas-c,
também chamada de fator de crescimento
semelhante à insulina (IGF-1). Esse
mediador é produzido por estímulos
hepáticos de GH e por incentivo da insulina,
que modula o potencial de ligação dos
receptores desse hormônio.
Estudos mostraram que crianças
desnutridas com marasmo, Kwashiorkor e
Kwashiorkor-marasmático possuíam níveis
elevados de GH no jejum, ao passo que a
somatomedina-c estava reduzida quando
comparada com crianças-controle.
Acredita-se que a redução na atividade da
somatomedina-c ocorre por elevação dos
valores séricos de cortisol que afetam a ação
desse mediador sobre as cartilagens, pela
diminuição na capacidade de síntese devido
à redução de substrato, ou pela redução nos
níveis plasmáticos de insulina. Postulou-se
ainda que os níveis reduzidos de
somatomedina-c são adaptativos, permitindo
o direcionamento dos substratos escassos
para necessidades metabólicas agudas, ou
seja, para manutenção da homeostase.
ALTERAÇÕES TIREOIDIANAS:
Os efeitos da desnutrição energético-
proteica no eixo hipotálamo-hipófise
tireoidiano dependem da duração da
desnutrição. No Kwashiorkor foi descrito
diminuição nos níveis circulantes de T4 e T3
devido à diminuição das proteínas
carregadoras TBG, pré-albumina e
albumina, além da diminuição em nível
periférico (fígado e rim) da atividade da
enzima que converte T4 em T3 5'-
desiodinase, que promove a ação do
hormônio em nível celular.
Na desnutrição aguda, existe uma redução
nos níveis totais de T3 e T4 devido à redução
das proteínas plasmáticas, mas permanece
o estado de eutiroidismo. Já a desnutrição
prolongada destrói os mecanismos
adaptativos, resultando em hipotireoidismo
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
com baixos níveis de T3- livre, a forma ativa
do hormônio, com aumento de rT3, seu
subtipo inativo. A depleção do hormônio
biodisponível causa a diminuição na
termogênese e no consumo de oxigênio, o
que permite maior conservação de energia
frente à quantidade limitada de substrato.
Esses efeitos parecem ser regulados
perifericamente no organismo e não via
sistema nervoso central, uma vez que é
normal a resposta do hormônio estimulador
de tireóide (TSH) ao estímulo provocado pelo
hormônio hipotalâmico liberador do TSH
(TRH).
METABOLISMO DA GLICOSE:
Uma série de anormalidades foram relatadas
no metabolismo da glicose na desnutrição
energético-proteica, variando conforme a
duração e a gravidade do quadro.
Hipoglicemia severa é um sinal geralmente
encontrado em casos terminais, mas, em
geral, são encontrados níveis baixos de
glicemia de jejum ou normais acompanhados
por insulina baixa. É descrito também um
certo grau de intolerância à glicose,
desaparecimento retardado desta
liberação de insulina diminuída, inclusive
após testes de tolerância oral. Este
fenômeno persistiu por vários meses após a
recuperação nutricional, tendo como
possíveis causas a absorção retardada por
atrofia da mucosa intestinal, por deficiência
nos fatores celulares beta-citotróficos, ou por
deficiência endócrina do pâncreas por falta
de insulina, sendo que os dois últimos podem
agir sinergicamente.
A homeostase glicêmica é fator fundamental
no sucesso da adaptação à desnutrição
energético-proteica. Até que o cérebro e
outros tecidos que se alimentam de glicose
possam se adaptar ao uso de corpos
cetônicos como combustível, é necessária a
manutenção de níveis glicêmicos
adequados. A glicogenólise (quebra de
glicogênio pelos tecidos) é só uma medida
temporária. Por outro lado, a gliconeogênese
(síntese de glicose pelo fígado) estimulada
pelo aumento do cortisol tem um papel
importante, juntamente a uma captação
diminuída de glicose pelos tecidos
estimulada pela deficiência insulínica ou
resistência à insulina juntamente ao excesso
de GH.
FUNÇÃO ADRENOCORTICAL:
O cortisol é o principal hormônio responsável
pelo controle do stress no organismo. Como
o Kwashiorkor é considerado como uma
desadaptação e o marasmo é uma resposta
adaptada a um stress nutricional, nota-se
que que os níveis de cortisol estivessem
aumentados no marasmo, o que foi
observado em diversos estudos pelo mundo.
Respostas normais ao ACTH (hormônio
produzido na hipófise e responsável pela
estimulação das adrenais) são encontradas
nas crianças desnutridas, mas a meia-vida
dos hormônios adrenocorticais está
aumentada, indicando uma baixa taxa de
degradação metabólica destes. O aumento
e na concentração desses dois hormônios
(cortisol e ACTH) favorecem a
gliconeogênese e a liberação de ácidos
graxos pelo tecido adiposo, inibindo a ação
da somatomedina-c sobre o crescimento,
favorecendo assim a economia de
substratos.
HORMÔNIOS REPRODUTIVOS:
A etiologia da maturação sexual e da função
reprodutora em pacientes com desnutrição é
secundária às disfunções evidenciadas no
sistema nervoso. Essa população, com
puberdade retardada, apresenta níveis de
FSH ainda mais baixos que os de LH em
ambos os sexos, enquanto a concentração
de prolactina é aumentada, sendo esse
segundo fator o possível responsável para o
retardo no desenvolvimento. Esse hormônio
age alterando a função aminérgica no
hipotálamo e assim inibe a liberação de
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
GnRH, que é o hormônio estimulador das
gonadotrofinas, que, por sua vez, são
responsáveis pela maturação gonadal.
Além disso, é evidente a necessidade de
uma composição corporal e de uma taxa
metabólica mínima para alterar a
sensibilidade do hipotálamo ao mecanismo
de retroalimentação negativa pelos
esteroides gonadais.
RAQUITISMO:
O raquitismo e a osteomalácia são doenças
caracterizadas pelo defeito de mineralização
do osso. Elas usualmente coexistem na
criança, até o fechamento das cartilagens de
crescimento, quando somente a última
permanece. A osteomalácia ocorre por
defeito na mineralização da matriz óssea, se
apresenta na vida adulta e é uma das causas
de baixa densidade mineral óssea, enquanto
que o raquitismo é o defeito de mineralização
das cartilagens de crescimento na criança e
se apresenta com retardo no crescimento e
deformidades esqueléticas.
D, tubulopatia perdedora de fósforo,
deficiência da enzima fosfatase alcalina
(hipofosfatasia), alteração no pH do osso
(nas acidoses metabólicas) ou presença de
substâncias inibidoras da mineralização
(como bisfosfonados, alumínio, e flúor).
A deficiência de vitamina D destaca-se, no
entanto, como a causa de maior relevância.
Esta vitamina normalmente é sintetizada na
pele humana exposta a UVB e é
transformada em 25-hidroxivitamina D no
fígado, que é a forma mais abundante da
vitamina e é medida como marcador de
suficiência da mesma. No rim, sob controle
mais estrito, é sintetizada sua forma mais
ativa, a 1-25-dihidroxivitamina D, que está
relacionada aos processos de absorção
intestinal do cálcio.

Uma vez que a cartilagem e o osteóide da

placa de crescimento se expandem
normalmente, mas não são adequadamente
mineralizados, essa placa se espessa e tem
sua circunferência aumentada, o que
provoca algumas das manifestações mais
evidentes do raquitismo, o alargamento de
punhos e tornozelos. Há um “amolecimento”
geral dos ossos, que passam a se curvar
facilmente quando submetidos a forças,
QUADRO CLÍNICO:
como no suporte do próprio corpo ou na
tração de um músculo, promovendo fraturas A maioria das manifestações do raquitismo
e deformidades. decorre de alterações esqueléticas.

O defeito na mineralização óssea que

caracteriza a patogênese destas duas
doenças pode ocorrer por várias razões:
alteração na produção do osteóide, falta dos
substratos (cálcio e/ou fósforo), carência
nutricional, deficiência ou incapacidade de
absorver, metabolizar ou utilizar a vitamina
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO

A depressão horizontal ao longo da porção

inferoanterior do tórax, conhecida como
O craniotabes, amolecimento dos ossos
sulco de Harrison, ocorre em razão da tração
cranianos, pode ser detectado aplicando-se
das costelas, que estão amolecidas pelo
pressão no osso occipital ou sobre os ossos
diafragma durante a inspiração). O
parietais, com sensação semelhante à de se
amolecimento das costelas também
apertar e depois soltar uma bolinha de
compromete o movimento do ar e predispõe
pingue-pongue. O craniotabes também pode
os pacientes a atelectasias e pneumonia.
ser secundário à osteogênese imperfeita,
hidrocefalia e sífilis. Este achado é normal
em muitos neonatos, especialmente na
proximidade das linhas de sutura, mas
costuma desaparecer poucos meses após o
nascimento.

A queixa principal em crianças com

O alargamento das junções costocondrais
forma o rosário raquítico, que dá a sensação
de palpar contas de rosário à medida que os
dedos do examinador se movem ao longo
das junções condrocostais de costela em
costela. O espessamento da placa de
crescimento também é responsável pelo
supracitado alargamento dos punhos e
tornozelos.
raquitismo é muito variável. Muitas crianças
são levadas ao médico porque apresentam
deformidades esqueléticas, outras por
dificuldades ao andar em razão de uma
combinação de deformidades e fraqueza
muscular. Outras queixas comuns incluem
déficit de crescimento e hipocalcemia
sintomática.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
As alterações raquíticas são visualizadas
mais facilmente nas radiografias
posteroanteriores do punho, embora as
alterações características do raquitismo
possam ser observadas em outras placas de
crescimento. As margens da metáfise
perdem sua borda aguda e são descritas
como desgastadas. Além disso, a
extremidade óssea distal, que normalmente
tem uma superfície convexa ou plana, passa
a ter uma superfície mais côncava. Isso é
denominado epífise em taça, que é mais
facilmente observada nas extremidades
distais do rádio, ulna e fíbula. Há também
alargamento da extremidade distal do osso,
que corresponde às manifestações de
rosário raquítico e alargamento de
punho/tornozelo.
DIAGNÓSTICO E AVALIAÇÃO CLÍNICA:
A maioria dos casos de raquitismo é
diagnosticada tendo como base a presença
de alterações radiográficas típicas. O
diagnóstico é sustentado por achados no
exame físico, pelo histórico e por resultados
de exames laboratoriais compatíveis com a
etiologia específica (dosagem de vitamina D,
cálcio ou fósforo, por exemplo).
Como a maioria das crianças com raquitismo
apresenta deficiência nutricional, a avaliação
inicial deve se concentrar no histórico
alimentar, enfatizando a ingestão de vitamina
D e cálcio.
A síntese cutânea mediada pela exposição à
luz solar é uma fonte importante de vitamina
D. É importante perguntar sobre o tempo que
a criança permanece ao ar livre, uso de
protetor solar e vestuário, especialmente se
houver algum motivo cultural para uma
cobertura maior da pele. Uma vez que a luz
solar do inverno é ineficaz na estimulação da
síntese cutânea de vitamina D, a estação do
ano é um fator adicional. Crianças com pele
mais escura apresentam maior risco de
deficiência de vitamina D em razão da
redução da síntese cutânea.
A presença de fatores de risco materno para
deficiência nutricional de vitamina D,
incluindo dieta e exposição solar, constitui
uma importante consideração quando o
neonato ou o lactente jovem apresentam
sinais de raquitismo, principalmente se a
criança for alimentada ao peito. Determinar a
ingestão de laticínios, a principal fonte
alimentar de cálcio, permite uma visão geral
do consumo desse nutriente pela criança.
O uso de medicamentos pela criança é
relevante porque alguns deles, como os
anticonvulsivantes fenobarbital e fenitoína,
aumentam a degradação da vitamina D, e
outros, como os antiácidos contendo
alumínio, interferem na absorção do fosfato.
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Doenças renais ou má absorção intestinal
também devem ser analisadas, uma vez que
ambas as manifestações implicam
drasticamente na disponibilidade de vitamina
D ativa no organismo.
Os exames laboratoriais iniciais para
crianças com raquitismo devem incluir cálcio
sérico, fósforo, fosfatase alcalina,
paratormônio, 25-hidroxivitamina D, 1,25-di-
hidroxivitamina D3, creatinina e eletrólitos.
O exame de urina pode ser útil na detecção
de glicosúria e aminoacidúria observadas na
síndrome de Fanconi, outra possível causa
do raquitismo. A avaliação da excreção
urinária de cálcio (coleta de 24 horas para
cálcio ou relação cálcio-creatinina) é útil se
houver suspeita de raquitismo
hipofosfatêmico familiar com hipercalciúria
ou de síndrome de Fanconi. A dosagem
direta de outras vitaminas lipossolúveis ou a
avaliação indireta de sua eficiência (tempo
de protrombina para avaliar a deficiência de
vitamina K) será apropriada, se houver
possibilidade de má absorção.
ANEMIA FERROPRIVA NA INFÂNCIA:
ETIOLOGIA E QUADRO CLÍNICO:
A anemia é, segundo a Organização Mundial
da Saúde (OMS), a condição patológica na
qual a concentração sanguínea de
hemoglobina (Hb) encontra-se abaixo do
valor esperado (inferior a 2 desvios padrões),
tornando-a insuficiente para suprir as
necessidades fisiológicas exigidas conforme
a idade, o sexo, a presença de gestação e a
altitude. Esse quadro tem origem
multifatorial, associado à deficiência de ferro
ou de outros micronutrientes, à perda
sanguínea, a processos infecciosos e
patológicos, ou ao uso de medicações que
impeçam ou prejudiquem a absorção
nutricional. De todos os fatores, a principal
causa desse distúrbio é a carência
nutricional de ferro (anemia ferropriva),
associada a mais de 60% dos casos em todo
o mundo.
O ferro é o metal presente em maior
abundância no corpo humano, participando
em todas as fases da síntese proteica e dos
sistemas respiratório, oxidativo e
imunológico. A maior parte do ferro utilizado
no organismo humano é proveniente do
próprio sistema de reciclagem de hemácias,
com uma pequena parte proveniente da
dieta, advindo de fontes vegetais ou
inorgânicas (ferro não hemínico), e da carne
e ovos (ferro hemínico ou orgânico).
Diferente do ferro não heme, que sofre
intensa influência de fatores antinutricionais
no seu processo absortivo, o ferro heme tem
regulagem própria e independente de ação
de mecanismos inibidores ou facilitadores da
dieta. A secreção de ácido clorídrico no
estômago, necessária para a solubilização
dos sais de ferro e para a manutenção de sua
forma ferrosa, também é importante para a
correta absorção dessa substância.
Crianças de até dois anos de idade e
gestantes são os grupos mais afetados por
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esse distúrbio. Após o nascimento, a criança
precisa absorver grande quantidade de ferro
diariamente para manter um nível adequado
do mineral, volumes que aumentam em caso
de prematuridade ou baixo peso ao nascer.
A absorção desse nutriente pela alimentação
varia de 1 a 40%. O ferro presente no leite
humano, embora em baixa proporção, é bem
absorvido, mas, outros alimentos contendo
fitatos, taninos e cálcio impedem a sua
adequada absorção.
Mesmo entre as crianças, alguns grupos são
mais vulneráveis aos impactos da carência
de ferro, seja por questões fisiológicas ou
pela qualidade da alimentação. Os principais
acometidos são:
 Prematuros e RN de baixo peso;
 Lactentes a termo em aleitamento
artificial;
 Lactentes em aleitamento materno por
mais de seis meses, sem aporte
adequado de ferro dietético (as reservas
de ferro formadas durante a gestação se
esgotam em torno de quatro a seis
meses, enquanto as necessidades
diárias aumentam progressivamente,
acompanhando o crescimento acelerado
do lactente);
 Adolescentes de ambos os sexos;
 Crianças com quadros diarreicos
frequentes e prolongados e infestação
parasitária;
 Gestantes e nutrizes.
As manifestações clínicas da deficiência de
ferro são determinadas pelos estágios de
depleção de ferro e anemia propriamente
dita, quando as repercussões clínicas e
fisiológicas são aparentes, como apatia,
cansaço, cefaleia, irritabilidade, síndrome
das pernas inquietas e taquicardia. Além
disso, pode haver a presença de pica, a
perversão alimentar por terra, papéis, amido
ou gelo, bastante específica em situações de
deficiência de ferro. Alguns pacientes, no
entanto, são assintomáticos, sem clínica
típica, reconhecendo os sintomas somente
após o tratamento. Pacientes com ferritina
baixa e sem anemia podem ter os mesmos
sintomas.
FISIOPATOLOGIA:
O ferro caracteriza-se por ser um metal de
transição e a ampla gama de sua utilização
biológica está na capacidade de existir em
diferentes estados de oxidação, formar
muitos complexos, além de agir como um
centro catalítico para diversas funções
metabólicas. Presente na hemoglobina, este
mineral é de fundamental importância para o
transporte de oxigênio e dióxido de carbono,
essenciais à respiração celular aeróbica,
além de participar de componentes de
numerosas enzimas celulares, importantes
para o funcionamento do sistema
imunológico, assim como dos citocromos
que são indispensáveis para a produção de
energia, de enzimas no ciclo do ácido cítrico
e, ainda, na síntese de dopamina,
serotonina, catecolaminas e, possivelmente,
do ácido gama-aminobutírico e na formação
de mielina.
Em condições normais, quando não ocorrem
perdas sanguíneas ou processo de
gestação, a quantidade de ferro presente no
organismo é altamente preservada, sendo
que apenas uma pequena quantidade a cada
dia é perdida. A quantidade diária desse
mineral necessária ao funcionamento regular
do organismo é de 40 mg, usadas
principalmente para a substituição da
hemoglobina. A reciclagem fisiológica é tão
eficiente que apenas 1 a 1,5mg de ferro
proveniente da absorção intestinal é
necessário para manter o balanço interno.
Na infância, particularmente em períodos de
rápido crescimento (6 a 24 meses), e na
adolescência, as necessidades de ferro são
elevadas, sendo que as doses diárias de
ferro para crianças, adolescentes
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
masculinos e adolescentes femininos são
1,0mg, 1,2mg e 1,5mg, respectivamente
Na suspeita de anemia ferropriva, deve-se
solicitar um hemograma completo e
dosagem de ferritina, podendo ser prescritos,
mas de forma não obrigatória a concentração
de ferro sérico, de transferrina e de
saturação da transferrina, que apresentam
resultados baixos, altos e baixos,
respectivamente.
No organismo do homem adulto saudável
existem de 4 a 5g de ferro. Desta quantidade,
60 a 70% são classificados como essencial
ou funcional e 30 a 40% como reserva ou
não-essencial. O ferro essencial está
incorporado à hemoglobina, mioglobina e
certas enzimas respiratórias (citocromos),
que catalisam os processos de oxidação-
redução dentro da célula. O ferro não
essencial pode ser encontrado nos estoques
de ferro do organismo, como a ferritina e a
hemossiderina, além da transferrina.
Detalhes precisos quanto aos mecanismos
específicos da absorção intestinal de ferro,
tanto seus mecanismos bioquímicos como
sua regulação, não são totalmente
conhecidos. Entretanto, a absorção de ferro
consiste de sua captação pela mucosa, de
seu movimento através da célula e,
finalmente, de sua liberação para que possa
atingir a circulação.
O ferro hematínico, altamente biodisponível
e pouco afetado por fatores dietéticos, é
absorvido de forma distinta à do ferro não-
hematínico, como complexo de porfirina-
heme intacto pelas células da mucosa
intestinal. A porção heme, após ser liberada
da globina no lúmem intestinal, é absorvida.
Na célula da mucosa, o radical heme sofre
degradação enzimática pela ação da heme-
oxigenase e o ferro é liberado. O ferro não-
hematínico, por sua vez, é insolúvel em água
e tem a absorção afetada pela composição
da dieta. Presente nos alimentos,
principalmente na forma férrica, após a
digestão pela ação do ácido clorídrico
contido no suco gástrico, este tipo de ferro é
reduzido a uma forma ferrosa, mais
facilmente absorvida. Apesar de ambas as
formas serem solúveis no pH ácido do
estômago, apenas o ferro ferroso permanece
solúvel no duodeno.
A absorção do ferro não-heme pode ser
aumentada por substâncias como o ácido
ascórbico (vitamina C), que forma quelantes
de ferro de baixo peso molecular, assim
como as proteínas, a frutose e o citrato, que
compõem complexos solúveis, facilmente
absorvidos. Por outro lado, essa
incorporação pode ser prejudicada por
taninos, folatos, polifenóis e oxalatos, que
geram estruturas insolúveis, afetando a
biodisponibilidade mineral.
No estômago, as duas formas de
apresentação do ferro são liberadas do
alimento e rapidamente formam complexos
solúveis e insolúveis. No intestino, os
complexos de ferro solúveis são captados
pela membrana da borda em escova. Após a
absorção, dependendo do estado nutricional
do organismo, este componente pode ser
armazenado como ferritina no citosol da
célula intestinal, podendo retornar ao lúmem
intestinal pela descamação natural das
células da mucosa, ocorrendo em um
período de dois a quatro dias ou ser
rapidamente transportado através da célula
e entrar no fluído intracelular e no plasma.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A deficiência de ferro pode ocorrer como
resultado do balanço negativo prolongado de
ferro ou devido à falha do organismo em
atender às necessidades fisiológicas
aumentadas.
O balanço negativo de ferro pode ocorrer em
condições de baixo consumo de ferro
biodisponível, de prejuízo na absorção
(acloridria, cirurgia gástrica, doença celíaca)
e de aumento nas perdas de ferro pelo
organismo (sangramento gastrintestinal,
fluxo menstrual excessivo, doação de
sangue, hemoglobinúria, sangramento auto
induzido, distúrbio de hemostasia,
insuficiência renal crônica ou hemodiálise). A
maior demanda fisiológica corresponde à
infância, gravidez e lactação, pois
caracterizam-se por etapas que apresentam
necessidades aumentadas de ferro para
suportar o período de intenso crescimento.
A deficiência de ferro, caracterizada por
longos períodos de balanço negativo deste
elemento químico, pode levar ao
esgotamento das reservas do organismo,
dificultando assim a produção de hemácias,
ocorrendo então a anemia ferropriva. Neste
sentido, a definição de três estágios da
deficiência no organismo é reconhecida. A
deficiência de ferro pré-latente ou a depleção
de ferro, refere-se à redução nas reservas
(ferritina sérica) sem redução dos níveis de
ferro sérico. A deficiência latente de ferro
ocorre quando são exauridas as reservas de
ferro, mas o nível de hemoglobina
permanece acima do limite inferior do
normal. Tal estágio caracteriza-se por
algumas alterações bioquímicas no
metabolismo de ferro, principalmente a
redução da saturação da transferrina, assim
como um aumento na capacidade total de
ligação de ferro. A anemia ferropriva ocorre
quando a concentração de hemoglobina no
sangue encontra-se abaixo do limite inferior
do normal, ocorrendo também produção de
eritrócitos microcíticos.
DIAGNÓSTICO:
O primeiro estágio da anemia, a depleção de
ferro, é caracterizado por diminuição dos
depósitos de ferro no fígado, baço e medula
óssea e pode ser diagnosticado a partir da
ferritina sérica, principal parâmetro utilizado
para avaliar as reservas de ferro, por
apresentar forte correlação com o metal
armazenado nos tecidos. Entretanto, a
concentração de ferritina é influenciada pela
presença de doenças hepáticas e processos
infecciosos e inflamatórios, devendo ser
interpretada com cautela. Valores inferiores
a 12μg/L são fortes indicadores de depleção
das reservas corporais de ferro em crianças
menores de 5 anos, e inferiores a 15μg/L
para crianças entre 5 e 12 anos.
No segundo estágio, de deficiência de ferro,
são utilizados para diagnóstico a própria
redução sérica desse nutriente, o aumento
da capacidade de ligação da transferrina
(>250-390μg/dl) e a diminuição de sua
saturação (menor que 16%).
De acordo com a OMS, a anemia é
considerada como leve ou moderada se a
hemoglobina se encontra entre 7 a 12 mg/dl,
e grave quando a concentração for inferior a
7 mg/dl. Para as crianças entre 6 e 59 meses
de idade, a anemia é definida como uma Hb
abaixo de 11 g/dl, entre 5 e 11 anos como
uma Hb abaixo de 11,5 g/dl e entre 12 e 14
anos como uma Hb abaixo de 12 g/dl.
A concentração da ferritina sérica é o mais
confiável marcador das reservas de ferro do
corpo. Os valores normais variam de 40 a
200 ng/ml, não havendo nenhuma situação
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clínica em que índices baixos não
signifiquem deficiência de ferro. Portanto,
todo indivíduo com concentração de ferritina
menor do que 10 a 15 ng/ml tem deficiência
de ferro, com uma sensibilidade de 59% e
uma especificidade de 99%. Como a
sensibilidade é baixa, aceita-se que o valor
limite para o diagnóstico da anemia seja de
30 a 41 mg/dl. Como a ferritina é um reator
de fase aguda, com níveis aumentados em
doenças inflamatórias, infecciosas, malignas
ou hepáticas, pode haver uma ferritina
falsamente elevada na presença destas
doenças de forma simultânea à anemia.
TRATAMENTO:
O tratamento da anemia ferropriva é pautado
na orientação nutricional para o consumo de
alimentos fonte, e reposição de ferro por via
oral com dose terapêutica de 3 a 5 mg/kg/dia
de ferro elementar para crianças por mínimo
de oito semanas. A suplementação deve ser
continuada visando a reposição dos
estoques de ferro, o que varia entre dois a
seis meses ou até obtenção de ferritina
sérica maior que 15 μg/dL (ressalta-se a
importância de que o valor alcance os
valores esperados entre 30 e 300μg/dL).
Dentre os diversos tipos de sais de ferro
disponíveis para a suplementação
destacam-se o sulfato ferroso, o fumarato
ferroso e o gluconato ferroso. Os sais de
ferro são eficazes na correção da
hemoglobina e reposição dos estoques de
ferro, apresentam baixo custo e a rápida
absorção por meio de difusão ativa e
passiva, no duodeno. A suplementação com
sais de ferro também exige cautela quanto
ao excesso de dosagem, uma vez que a
oxidação do ferro ferroso gera radicais livres,
e a absorção excessiva eleva a saturação da
transferrina e o ferro livre no plasma, tóxico
para o metabolismo. Por sofrer influência dos
componentes dietéticos, a suplementação
com sais de ferro deve ser realizada longe
das refeições, recomendando-se a tomada
em jejum, uma hora antes das refeições ou
antes de dormir.
Apesar da eficácia, a adesão ao tratamento
com esses sais é geralmente baixa devido
aos sintomas adversos frequentes (35% a
55% dos casos) e típicos da suplementação,
como náuseas, vômitos, gosto metálico,
pirose, dispepsia, plenitude ou desconforto
abdominal, diarreia e obstipação. Assim, a
dose ideal torna-se a dose tolerada pelo
paciente. Apesar disto, o sulfato ferroso
ainda é o composto de escolha pelo
Ministério da Saúde para os programas de
suplementação no Sistema Único de Saúde,
o que se reflete em potencial abandono do
tratamento ou da profilaxia.
Os sais férricos e aminoquelatos também
podem ser utilizados com melhor perfil de
adesão, apresentando padrão de absorção
mais lento e fisiologicamente controlado, por
não sofrerem alterações com a dieta (o que
permite administração durante ou após as
refeições), e por provocarem menos efeitos
adversos, tendo eficácia semelhante à dos
sais ferrosos no combate à anemia
ferropriva.
O ferro quelato também apresenta alta
biodisponibilidade, pois a união do ferro ao
aminoácido impede a formação de
compostos insolúveis, além de que não é
prejudicado por fatores inibidores da dieta e
não é exposto diretamente à mucosa
intestinal, apresentando as mesmas
vantagens do uso dos sais férricos.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O ferro carbonila é a alternativa mais
abundante em teor de ferro elementar (98%),
com boa disponibilidade e efetividade, e
menor taxa de efeitos adversos em relação
aos sais ferrosos, porém mais do que os
outros sais férricos. Diferentemente das
demais alternativas, pode ter sua absorção
diminuída por componentes da dieta,
devendo ser administrado em jejum.
Apesar da absorção lenta e controlada, todas
as alternativas mencionadas requerem maior
tempo de tratamento e de apresentar custo
para o paciente, uma vez que ainda não são
distribuídos gratuitamente na rede pública.
Assim, a família deve ser educada quanto à
importância da adesão ao tratamento.
Além da suplementação de ferro via oral, a
reposição parenteral de ferro é recomendada
em casos excepcionais como os de
hospitalização por anemia grave após falha
terapêutica do tratamento oral, necessidade
de reposição de ferro por perdas
sanguíneas, doenças inflamatórias
intestinais, quimioterapia ou diálise ou após
cirurgias gástricas com acometimento do
intestino delgado.
A monitorização do quadro deve ser
realizada pelos parâmetros laboratoriais,
com um hemograma completo a cada 30 a
60 dias, e dosagem de marcadores do
estoque de ferro-ferritina, com 30 e 90 dias,
sendo que o tratamento deve durar até a
reposição dos estoques de ferro, quase
sempre por volta dos seis meses de
tratamento.
PROFILAXIA:
Ações de educação alimentar e nutricional
voltadas para a prevenção da anemia
ferropriva preveem o estímulo ao acesso
universal à alimentação adequada e ao
aleitamento materno exclusivo e prolongado,
de forma a aumentar o consumo de
alimentos fontes de ferro, bem como de
alimentos que aumentam a
biodisponibilidade e a absorção desse
nutriente na introdução de alimentos
complementares. A contraindicação de uso
de leite de vaca in natura, não processado,
em pó ou fluido antes dos 12 meses (com
limitação de consumo de 500ml/dia após
esse marco) também é uma estratégia
reconhecidamente protetora contra a
deficiência de ferro e o desenvolvimento de
anemia ferropriva, devendo ser
continuamente incentivada.
Dentre as políticas nacionais que visam a
prevenção da anemia ferropriva em crianças,
observa-se a fortificação de alimentos,
adotada em consonância com a OMS e que
visa uma abordagem sustentável e custo-
efetiva para a prevenção da anemia
ferropriva, a estratégia NutriSus (oferta de
sachês com 15 micronutrientes em pó para
acréscimo às preparações da criança na
rotina escolar), e a fortificação da água
potável com ferro. A política nacional de
fortificação de alimentos foi recentemente
atualizada pela ANVISA, prevendo
atualmente o enriquecimento das farinhas de
trigo e milho com fumarato ferroso e sulfato
ferroso em 4 a 9 mg para cada 100g de
farinha (RDC n° 150 de 2017).
O Brasil também apresenta políticas para a
suplementação do ferro desde 2005, com a
implantação do Programa Nacional de
Suplementação de Ferro (PNSF), atingindo
crianças de seis a 24 meses de idade,
gestantes e lactantes até o terceiro mês pós-
parto com suplementação profilática com
sulfato ferroso via oral. Segundo o programa,
crianças entre seis e 24 meses devem ser
suplementadas com sulfato ferroso na
dosagem de 1 mg/kg peso/dia. A
recomendação vigente da Sociedade
Brasileira de Pediatria orienta a
suplementação profilática com dose de 1 mg
de ferro elementar/kg ao dia dos três aos 24
meses de idade, independentemente do
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
regime de aleitamento. Para lactentes
nascidos pré-termo ou com baixo peso
(menor de 1500 g), a recomendação é de
suplementação com 2 mg/kg/dia a partir do
30º dia até os 12 meses. Já para os
prematuros com baixo peso (entre 1000 g e
1500 g) a recomendação de suplementação
é de 3 mg/kg/dia até os 12 meses, e para
recém-nascidos com menos de 1000g, de 4
mg/kg/dia.
Após o 1º ano de vida, a suplementação em
todos os casos reduz-se para a dose de 1
mg/kg/dia por mais 12 meses. A dose de
suplementação profilática recomendada é
diferenciada (30 mg/ dia) para crianças entre
2 e 12 anos residentes em regiões com
prevalência de anemia ferropriva superior a
40%.
A suplementação profilática é demonstrada
em estudos como sufi ciente para elevar a
concentração de hemoglobina e estoques de
ferro, contribuindo para a redução do risco de
anemia.
Além das políticas nacionais mencionadas
acima, a importância de ações no escopo do
atenção básica à saúde para a prevenção e
controle da anemia, como o manejo de
doenças infecciosas e parasitárias,
ampliação da rede de saneamento básico e
higiene pessoal, bem como acesso a água
tratada, é inegável, bem como ações
voltadas para a saúde reprodutiva da mulher,
como a prevenção da gravidez na
adolescência, planejamento familiar,
estímulo ao acompanhamento nutricional no
pré-natal precoce, acesso a cuidados
perinatais e pós-natal (clampeamento
adequado do cordão umbilical, prevenção de
hemorragia pós-parto e intervalo Inter
gestacional maior que 18 meses).
EPIDEMIOLOGIA:
Mesmo acometendo todos os grupos etários
e níveis sociais, com ampla distribuição
geográfica, a anemia ferropriva ainda é uma
doença que atinge prioritariamente as
camadas socialmente menos favorecidas, de
menor renda e desenvolvimento.
A prevalência de anemia por deficiência de
ferro aumenta em populações com carências
nutricionais, com ingestão ou absorção
inadequada de ferro, hábitos vegetarianos,
dietas com muito chá ou café, que inibem a
absorção de ferro, ou sem vitamina C (frutas
cítricas), que favorece a sua absorção, baixo
nível socioeconômico e educacional,
presença de infestações endêmicas
(malária, ascaridíase, helmintoses e
protozooses intestinais), e pelo estado
nutricional influenciado pelo baixo peso,
principalmente de mulheres em idade
gestacional, associado à multiparidade e não
uso de suplementação de ferro na gestação.
A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde
de 2006 mostra que a prevalência de
deficiência de ferro entre crianças menores
de 5 anos no Brasil é de 20,9%, com
prevalência de 24,1% em menores de 2 anos
e de 29,4% das mulheres férteis. No entanto,
outros estudos brasileiros apontam para uma
mediana da prevalência de anemia em
menores de 5 anos de 50%, chegando a 52%
nas crianças que frequentam escolas ou
creches e 60,2% nas que frequentam
Unidades Básicas de Saúde. A prevalência
geral no Brasil varia entre 30% e 69%,
dependendo do tipo de comunidade
estudada.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A prevalência para as crianças varia com a
idade, sendo de 76% quando abaixo de 23
meses e de 31% quando acima de 6 anos.
Nas mulheres não há correlação com a
idade. Para ambos há correlação de anemia
com grupo socioeconômico mais baixo e
com os negros, mas a anemia também é
identificada nas classes mais altas,
chegando a afetar 34,3% das crianças e
31,4% das mulheres adultas.
As causas e a epidemiologia da anemia
diferem nas crianças de 2 a 5 anos. Por volta
do terceiro ano de idade, a velocidade de
crescimento diminui, a necessidade de ferro
diária é reduzida e as crianças autocorrigem
a sua deficiência. Neste grupo, a má
nutrição, deficiência de B12 ou folato,
hemoglobinopatias, verminoses e malária
podem ser as causas principais de carência
nutricional. A depleção de ferro nesta faixa
etária pode levar a consequências funcionais
além da anemia, com prejuízos na
motricidade, no crescimento físico e no
desenvolvimento cognitivo. A menores de um ano (37.501 óbitos), quase
suplementação melhoraria estes desfechos,
mas algum prejuízo seria irreversível. As
crianças com anemia ferropriva recebem
escores menores em testes de
desenvolvimento mental quando
comparadas com seus pares com melhor
status de ferro e demonstram dificuldades
afetivas antes do tratamento, e estudo
mostra que têm também desvantagens em
relação ao aleitamento materno e às
experiências familiares.
PREVENÇÃO DE ACIDENTES COM CRIANÇAS:
MORTALIDADE E MORBID ADE EM ACIDENTES
INFANTIS:
Mesmo com as tendências de queda no
número de filhos por mulher, o Brasil ainda
apresenta contingente populacional
significativo de crianças e adolescentes. Em
relação à saúde desse grupo, nota-se
diminuição na taxa de mortalidade em
crianças menores de um ano, com 158 óbitos
a cada mil nascidos vivos entre os anos de
1930-1940 e 14,5:1000 em 2013, com
padrão decrescente em todas as idades.
Um dos fatores preponderantes de
mortalidade e morbidade de crianças e
jovens, em qualquer lugar do mundo, são os
traumas pelas chamadas causas externas
(“acidentes” e violências), como trânsito,
afogamentos, agressões, queimaduras,
quedas, asfixias e intoxicações. Estas
causas, intencionais e não intencionais,
determinam a cada ano a morte de cerca de
23.000 menores de 19 anos
(aproximadamente 30/100.000 habitantes),
enquanto um número dez vezes maior sofre
traumas não fatais, mas com grande
potencial de incapacitação permanente.
Em 2015, os óbitos de crianças e
adolescentes por todas as causas
totalizaram 72.611, sendo que praticamente
a metade desse valor correspondeu aos
30% tinha entre 15 e 19 anos e valores mais
baixos corresponderam às idades
intermediárias. Houve predomínio absoluto
das causas externas, com exceção dos
menores de um ano, responsáveis por 23%,
30%, 43% e 74% das mortes,
respectivamente nas faixas etárias de 1-4, 5-
9, 10-14 e 15-19 anos.
Mais marcantes que os dados sobre
mortalidade são os aspectos da morbidade:
é estimado que uma a cada dez crianças
brasileiras saudáveis necessite de
atendimento nos serviços de saúde em
decorrência de traumas, ocupando de 10 a
30% dos leitos hospitalares, e deram cerca
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
de três casos de deficiência permanente a
cada mil habitantes.
O Sistema de Informações Hospitalares
(SIH/SUS) demonstra que há predomínio de
acidentes em todas as faixas etária. O SUS
é responsável por 70% das admissões no
país, e por não haver estatísticas referentes
ao número de pacientes internados por meio
de planos de saúde ou atendimento
particular, verifica-se a importância que o
sistema público representa para esses
agravos.
EXPOSIÇÃO E RISCO:
Algumas características inerentes ao infante
ou ao adolescente podem intensificar ou
reduzir a probabilidade de ocorrência do
trauma, como a faixa etária, o sexo, a
exposição a álcool e drogas, a resiliência
infantil e descritores socioeconômicos,
exemplificados por:
 Fatores econômicos, como a renda
familiar (os pais podem não ser capazes
de supervisionar adequadamente seus
filhos, deixando-os sozinhos ou com os
irmãos enquanto trabalham, e também
podem não ter condições de comprar
equipamentos de segurança);
 Fatores socais, como a educação
materna;
 Fatores relacionados à estrutura familiar,
como número de moradores na casa,
pais solteiros, idade da mãe e número de
filhos;
 Fatores relacionados ao lar, como o tipo
de morada, situação de superlotação e as
condições gerais do bairro.
A criança que vive na pobreza pode ser
exposta a ambientes perigosos, incluindo
grande volume de tráfego, espaços
inseguros para o lazer, moradia precária e
janelas, escadas e telhados desprotegidos.
CLASSIFICAÇÃO DAS LE SÕES E A MAIOR
SUSCEPTIBILIDADE INFANTIL:
Uma lesão ocorre quando o corpo é exposto
a uma energia maior que sua capacidade
para absorvê-la. A energia pode se encontrar
de várias formas:
 Energia mecânica: conhecida também
como cinética, está associada ao
movimento, e é a causa mais frequente
de traumatismos, incluindo quedas,
acidentes de trânsito e obstrução de vias
aéreas;
 Energia térmica: é correlacionada à
temperatura, seja ela alta ou baixa. Inclui
chamas abertas, superfícies ou líquidos.
As causas líderes de acidentes sob essa
classificação é o fogo, que produz as
queimaduras. Diversas situações
produzidas por esse tipo de energia
podem levar a criança a óbito, sendo um
dos tipos mais devastadores e dolorosos
de acidentes a qual o ser humano pode
ser submetido;
 Energia elétrica: está associada a
eletricidade, fiações e tomadas. Os
perigos mais comuns são circuitos
sobrecarregados pela utilização de fios
desgastados, podendo causar choque
elétrico ou queimaduras;
 Energia química: está presente nas
substâncias “químicas” em seu estado
sólido, líquido ou gasoso. Nesse grupo
estão incluídos os medicamentos,
produtos de limpeza, metais pesados ou
compostos cáusticos ou ácidos. A lesão
mais comum é o envenenamento, que
pode ser agudo, como em overdose por
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
ingestão de drogas em dose única, ou
crônica, descrita em casos de inalação de
chumbo ou derivados. Outros
acometimentos são queimaduras pelo
contato com secreções de baterias e
desgaste respiratório pela inalação de
gases.
Perigos, por sua vez, são descritos como
risco potencial para o desenvolvimento de
uma lesão. Nesse sentido, todas as formas
de energia são perigosas, sendo necessário
intervir na educação acerca desses riscos.
As lesões geradas por esses agentes podem
ser clarificadas em menores, moderadas,
críticas ou fatais, tendo como fatores
determinantes a quantidade de energia, a
distribuição desta no tempo e no espaço e a
parte do corpo afetada.
As crianças não são “adultos em miniatura”,
mas sim organismos menores em tamanho e
com diferenças no desenvolvimento, na
experiência de vida e no comportamento,
estando em processo de crescimento e
aprendizado em todos esses setores. Nesse
sentido, sua propensão a acidentes é maior
que a de um indivíduo na fase adulta. Nesse
contexto, algumas condições se destacam:
 Tamanho pequeno da criança:
o Maior acesso aos perigos: o corpo
pequeno pode fazer com que a
criança fique presa ou se sufoque ao
entrar em locais inacessíveis ao
adulto;
o Centro de gravidade mais alto: o
maior tamanho e peso da cabeça faz
com que o centro de massa infantil
esteja à altura do tórax (em adultos,
esse ponto localiza-se na cintura).
Esse fenômeno faz com que sejam
mais propensas ao desequilíbrio e
quedas, além de ser mais difícil de se
libertarem ao cair dentro de alguma
estrutura;
o Exposição a maior área de superfície:
crianças apresentam maior risco de
comprometimento extenso ao serem
expostas ao mesmo perigo que um
adulto;
o Menor tolerância: infantes são
capazes de absorver menores
quantidades de energia, o que causa
efeitos adversos após a exposição a
um volume muito menor de toxinas.
 Desenvolvimento infantil natural:
o Proteção natural limitada: os
sistemas do corpo infantil ainda estão
em processo de amadurecimento,
com órgãos internos mais vulneráveis
a danos químicos, pele mais
sensível, ossos frágeis e cérebro
mais propenso a lesões decorrentes
de quedas;
o Habilidade limitada de escapar de
situações perigosas;
o Habilidade limitada em reconhecer
perigos: o desconhecimento das
relações de causa e efeito faz com
que crianças coloquem fios elétricos
na boca ou entrem em locais
apertados sem ciência do impacto
dessas ações;
o Maior atração a perigos potenciais:
os estímulos sensoriais associados à
falta de experiência fazem com que a
criança se exponha mais facilmente
ao risco de lesão (ex.: a preferência
por doces e tons vibrantes faz com
que o infante seja atraído a consumir
produtos de limpeza com odor
adocicado e cores fortes);
o Modelo adulto: como as crianças
aprendem por meio da repetição
(positiva ou negativa) das ações de
um adulto, elas podem tentar
executar atividades arriscadas, como
se barbear, ligar o forno ou trocar
lâmpadas.
 Falta de experiência:
o Menor base de conhecimento: o
aprendizado por meio de situações
más ou desconfortáveis pode ser
uma boa forma de proteção, devendo
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
haver um equilíbrio entre a
experimentação e o resguardo,
permitindo assim a aquisição de
experiências;
o Falta de medo: a combinação da falta
de experiência com o Para proteger as crianças dessa idade,
desconhecimento de consequências
faz com que crianças tentem
qualquer coisa, independentemente
da potencialidade dos riscos.
 Desenvolvimento comportamental:
o Desejo de explorar: a criança
manifesta profunda curiosidade e
interesse de aprender por meio de
todos os seus sentidos. Quando
realizam esse ato sem supervisão, há
maior chance de causar acidentes;
o Tendência a explorar pela boca: o
sufocamento, o envenenamento,
choques elétricos e queimaduras se
fazem mais presentes em crianças
menores de três anos, que
apresentam como uma das principais
formas de apreensão e informações
o contato oral.
Os fatores de risco para lesões em crianças
de zero a quatro anos são:
 Falta de habilidade em compreender e
reconhecer perigos;
 Coordenação motora em processo de
desenvolvimento;
 Tendência imitativa quanto aos
comportamentos do adulto;
 Habilidade limitada para a reação de
maneira rápida e correta.
Em crianças mais velhas, temos como
fatores causadores de acidentes:
 Assumir tarefas dos adultos;
 Maior interesse pelo perigo;
 Interesse em correr riscos;
 Tendência de desafiar e a responder
propostas para agir perigosamente.
 Maior tempo sem supervisão do adulto
ACIDENTES MAIS PREVALENTES EM CRIANÇAS E
MÉTODOS DE PREENÇÃO:
ZERO A 1 ANO:
O infante é bastante frágil, sendo mais
susceptível à sufocação (letal na maioria dos
casos) e a quedas.
recomenda-se:
 Transportar o bebê em assento tipo bebê-
conforto, de costas para o painel, quando
em veículos;
 Não dormir em cama compartilhada;
 Não deixar o bebê sobre um apoio alto e
sem proteção (ex.: camas, poltronas e
trocador);
 Não deixar que o bebê mame sozinho a
mamadeira, por risco de aspiração do
leite e engasgo;
 Banir o uso de andadores;
 Não oferecer objetos de risco como
embalagens de pomadas e
medicamentos, ou materiais
pontiagudos;
 Nunca segurar um bebê no colo quando
houver proximidade a materiais quentes;
 Não incentivar brincadeiras com animais
desconhecidos;
 Jamais deixar em móveis baixos
medicamentos, objetos pesados ou
quebráveis.
2 A 4 ANOS:
Crianças nessa faixa etária são curiosas e
inconsequentes, sendo mais acometidas por
acidentes de trânsito e afogamentos
(geralmente letais), quedas e queimaduras.
Algumas dicas para a proteção desse grupo
são:
 Proteger com redes ou grades as
varandas e janelas;
 Utilizar antiderrapantes em tapetes;
 Restringir o acesso da criança à cozinha
durante o preparo das refeições;
 Usar as bocas de trás do fogão, com os
cabos das panelas voltados para dentro;
 Colocar protetores em tomadas;
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
 Restringir o acesso ao banheiro, à
lavanderia ou à piscina;
 Não deixar baldes com água em locais de
fácil acesso;
 Usar cadeirinha apropriada no transporte
veicular;
 Manter medicamentos em recipientes
com tampas de segurança, bebidas
alcóolicas e produtos de limpeza em
embalagens originais, em armários
trancados;
 Guardar em lugar seguro objetos
pontiagudos e cortantes;
 Transmitir medidas educativas de
proteção como subir escadas degrau por
degrau, usar capacete ou descer do sofá
sentado;
 Não deixar a criança sem supervisão,
andando de mãos dadas na parte interna
da calçada.
5 A 9 ANOS:
Crianças nessa idade são influenciáveis e
com habilidades motoras ainda não afetadas
pelo julgamento crítico. Os eventos mais
comuns são acidentes de trânsito e
afogamentos (comumente letais), quedas e
queimaduras. Para prevenir esses
acidentes, deve-se:
 Manter os cuidados das etapas
anteriores, estimulando a criança a
reconhecer suas competências, limites e
dificuldades;
 Tentar deixar a criança sempre em
ambientes seguros (em casa, na escola
ou na casa de familiares);
 Não deixar que a criança ande sozinha na
rua;
 Utilizar assentos de elevação infantil
durante o transporte veicular;
 Quando em piscina, mar, lagos, rios ou
represas, vestir a criança com colete
salva-vidas de tamanho adequado;
 Manter supervisão constante.
10 A 14 ANOS:
Nessa fase, a criança é bastante vulnerável
a pressões sociais, e manifesta o desejo
constante por liberdade, acreditando ser
invulnerável. Os principais eventos letais
estão associados a acidentes de trânsito e
afogamentos enquanto as lesões são
provocadas principalmente por quedas e
queimaduras.
Para afastar o risco de acidentes, é possível
adotar as seguintes medidas:
 Servir de modelo em atitudes preventivas
concretas e abstratas;
 Estimular no adolescente a noção de
consequência de suas ações e escolhas;
 Ensinar que ande sozinho na rua,
respeitando a sinalização de trânsito;
 Não facilitar ou estimular o acesso a
armas de fogo, tabaco, bebidas
alcóolicas ou outras drogas.
Uma vez que os fatores condicionantes dos
eventos traumáticos e suas consequências
tenham sido identificados, intervenções de
controle apropriadas podem ser propostas
para diferentes etapas. A prevenção primária
tenta evitar a ocorrência dos acidentes e
violências. A prevenção secundária envolve
o bloqueio da transferência de energia à
vítima em quantidades que excedam seus
limiares de tolerância (ex.: uso de capacete
ou cinto de segurança) e um sistema efetivo
de atendimento de emergência e cuidados
hospitalares. A prevenção terciária, por sua
vez, trata de auxiliar a vítima a voltar ao seu
potencial máximo anterior ao evento
traumático, com o menor grau de deficiência.
O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA COMO ESTRATÉGIA
DE REDUÇÃO DA DESNUT RIÇÃO INFANTIL:
Todo ser humano tem direito à alimentação
e nutrição adequadas, segundo a
Declaração Universal dos Direitos Humanos,
feita em 1948 e assinada por diversos
representantes de Estado em todo o mundo.
Assim, todos os indivíduos devem ter acesso
à alimentação adequada garantida, seja por
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
seus próprios recursos, de preferência, ou
com o auxílio do governo. Ter “Direito
Humano à Alimentação Adequada” significa
ter uma alimentação saudável e estar livre da
fome e da má-nutrição.
O governo brasileiro, ao elaborar a Política
Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN),
parte integrante da Política Nacional de
Saúde, reafirmou o caráter irrevogável da
alimentação como direito do homem. A
importância dessa garantia é muito grande,
pois a alimentação e nutrição adequadas são
ingredientes fundamentais para o contidas no Cadastro Único para Programas
desenvolvimento do ser humano, garantindo
a ele a realização de sua capacidade de
produção, de sua cidadania e do seu bem-
estar.
Nesse sentido, torna-se essencial garantir a
Segurança Alimentar e Nutricional, condição
de acesso aos alimentos básicos seguros e
de qualidade, em quantidade suficiente,
atendendo aos requisitos nutricionais, de
modo permanente e sem comprometer
outras necessidades essenciais com base
em práticas alimentares saudáveis,
contribuindo assim para uma existência
digna colaborando para o desenvolvimento
integral dos indivíduos.
O Programa Bolsa Família (PBF), criado em
2003, é um programa de transferência de
renda diretamente às famílias pobres (renda
de R$ 89,01 a R$ 178,00 per capita) e
extremamente pobres (renda de até R$
89,00 por pessoa), que vincula o
recebimento do auxílio financeiro ao
cumprimento de compromissos
(condicionalidades) nas áreas de Saúde e
Educação, com a finalidade de promover o
acesso das famílias aos direitos sociais
básicos.
Esse programa seleciona as famílias
participantes com base nas informações
Sociais do Governo, o CadÚnico. São pagos
valores variáveis de acordo com a renda
mensal média na família e com o número de
crianças e adolescentes até 15 anos e
adolescentes de 16 e 17 anos. Atualmente,
existem três modalidades de benefício,
descritas a seguir:
 Benefício Básico: é concedido às famílias
consideradas extremamente pobres,
mesmo sem crianças ou jovens, no valor
de R$ 89,00;
 Benefício Variável: destinado a famílias
em situação de pobreza ou de extrema
pobreza que tenham em sua composição
gestantes, nutrizes, crianças e
adolescentes de até 15 anos. O valor de
cada benefício é de R$ 41,00, sendo que
cada família pode acumular até 5
benefícios, num total de R$ 205,00:
o Benefício Variável 0 a 15 anos;
o Benefício Variável à gestante: podem
ser pagas até nove parcelas
consecutivas a contar da data do início
do pagamento, desde que a gestação
seja detectada até o nono mês;
o Benefício Variável Nutriz: é destinado
a famílias com crianças de zero a seis
meses de idade em sua composição,
com as parcelas podendo ser pagas de
forma consecutiva a partir do momento
de início do pagamento, desde que a
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
criança seja identificada pelo
CadÚnico até o 6º mês.
 Benefício Variável Jovem: é destinado às
famílias em situação de pobreza ou
extrema pobreza e que tenham em sua
composição adolescentes de 16 a 17
anos. O benefício tem valor de R$ 48,00,
podendo acumular no máximo dois
benefícios, totalizando R$ 96,00;
 Benefício para Superação da Extrema
Pobreza: seu valor varia conforme
cálculos realizados a partir da renda
familiar por pessoa e dos benefícios já
recebidos. O valor é único e mensal.
As condicionalidades a serem realizadas
pelas famílias inclusas no Programa são:
 Condicionalidades da Saúde: são
direcionadas principalmente para o
desenvolvimento nutricional das famílias
do PBF, e contam com as seguintes
pactuações:
o Para gestantes e nutrizes, deve ser
feita a inscrição no Pré-Natal,
garantindo a frequência adequada às
consultas conforme calendário do
Ministério da Saúde. Além disso cabe
às beneficiárias participar de ações
educativas sobre o aleitamento
materno e promoção da alimentação
saudável;
o Para os responsáveis por crianças de
zero a sete anos, é necessário
manter em dia o calendário vacinal
preconizado pelo Ministério da
Saúde, realizar o acompanhamento
adequado de puericultura, e é promover informação contínua sobre as
participar de atividades educativas
desenvolvidas pelas equipes de
saúde na promoção de alimentação
saudável.
 Condicionalidades da Educação: para
continuar a receber o benefício, as
famílias devem matricular seus filhos nas
escolas do município, garantindo
presença superior a 85% para crianças
de 6 a 15 anos e de 75% para
adolescentes de 16 e 17 anos. É
importante também que os responsáveis
estejam atentos ao aprendizado e ao
desenvolvimento escolar, comparecendo
às reuniões pedagógicas.
O caráter intersetorial do Programa Bolsa Família
favorece o desenvolvimento familiar, contribuindo
para sua melhor inserção na dinâmica social e
econômica comunitária, o que se reflete com a
redução dos índices de mortalidade em menores de
5 anos
As equipes de saúde do município podem
contribuir com a boa utilização do benefício
pelas famílias ao orientá-las para a compra
de alimentos saudáveis, de preferência
aqueles típicos da região, conforme sua
sazonalidade, a aquisição de insumos para a
montagem de uma horta ou pomar, ou a
obtenção de produto de higiene para o
domicílio e seus habitantes. Além disso,
reforçar o papel dos beneficiários na
dinâmica social é imprescindível para o
reconhecimento de sua cidadania e a
construção de sua independência.
AÇÕES DE PROMOÇÃO DA SAÚDE, ALIMENTAÇÃO
E NUTRIÇÃO NO PROGRA MA BOLSA FAMÍLIA:
Realizar a Vigilância Alimentar e Nutricional
condições nutricionais da população e sobre
os fatores que as influenciam. Seu emprego
contribui para o conhecimento dos
problemas de nutrição, possibilitando a
identificação de indivíduos ou grupos de
pessoas com maior risco por área geográfica
(ex.: área rural), segmentos sociais (ex.:
população de baixa renda) e grupos
populacionais.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Dessa forma, colocar em prática esse
programa permite a avaliação do estado
nutricional das pessoas, promovendo a
manutenção de índices positivos e evitar a
gravidade de problemas nutricionais
diversos, evitando suas consequências à
saúde individual a curto e longo prazo.
Para executar esse acompanhamento é
necessário coletar dados de identificação
(data de nascimento e sexo) e índices
antropométricos (peso e altura) da
população assistida. Uma vez em posse
dessas informações é possível realizar a
vigilância do estado nutricional tanto em
indivíduos quanto em grupos, levando em
consideração os diferentes parâmetros
empregados para cada faixa etária.
Vale destacar que estes dados podem ser
complementados com informações sobre a
situação alimentar, como hábitos
alimentares e o acesso às refeições, e social,
relativo à escolaridade e às condições de
moradia, do indivíduo, além da avaliação
clínica e de exames (ex.: hemograma
parasitológico de fezes), uma vez que esses
itens podem ajudar a formular um
diagnóstico mais adequado da situação
nutricional.
O Mapa de Acompanhamento do Bolsa
Família é o formulário proposto pelo
Ministério da Saúde para o registro do
acompanhamento dos beneficiários do PBF,
para posterior inclusão de dados no Sistema
Informatizado do Programa na saúde. Os
registros de estado nutricional serão
computados no SISVAN (Sistema de
Vigilância Alimentar e Nutricional).
A vigilância do consumo alimentar, por sua
vez, deve ser realizada conforme os
marcadores do SISVAN. Quando aplicados a
indivíduos com menos de seis meses, esses
parâmetros têm por objetivo avaliar a prática
correta do aleitamento materno, ao passo
que em crianças até os 23 meses, o intuito é
verificar a introdução da alimentação
complementar de qualidade e os possíveis
riscos para a deficiência de ferroou o
desenvolvimento de excesso de peso. Todo
o restante da população, o que, para o
acompanhamento dos beneficiários do PBF
são as crianças de até 7 anos e as mulheres
em idade fértil, é investigado quanto a
adoção de práticas alimentares saudáveis
(como o consumo de frutas, verduras,
legumes e feijão diariamente) e daquelas
contraindicadas (consumo frequente de
alimentos fritos ou realização de refeições
em frente à televisão).
A promoção da alimentação saudável deve
ser estimulada ao longo de todo o curso da
vida, pois é essencial para a saúde dos
indivíduos e da comunidade, já que suas
consequências refletem na longevidade e na
qualidade de vida. A alimentação saudável
na infância e na adolescência promove a
saúde, o crescimento e o desenvolvimento, e
previne problemas de saúde, como a anemia
por deficiência de ferro, obesidade, e cárie
dental, ou condições de desenvolvimento a
longo prazo, como doenças cardíacas,
câncer, diabetes, hipertensão, osteoporose e
outras.
No que diz respeito à alimentação saudável,
é necessário reforçar à população que ela
não se baseia somente no consumo de
alimentos in natura e de diversos grupos
nutricionais em quantidades adequadas,
mas sim na segurança dos insumos
ingeridos, uma vez que eles também podem
transmitir doenças (conhecidas como DTA).
Ou seja, os alimentos não devem estar
contaminados ou estragados, nem conter
substâncias potencialmente nocivas, com
condutas educativas voltadas para a prática
de medida de higiene no manuseio destes.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
As orientações propostas para a alimentação
saudável variam conforme as diversas fases
da vida e suas necessidades metabólicas.
Os beneficiários do Programa Bolsa Família
devem estar inseridos nas campanhas de
suplementação alimentar, que têm por
finalidade evitar as avitaminoses e seus
agravos. As deficiências de ferro e de
vitamina A são as principais formas de
deficiência nutricional presentes no Brasil,
causadas principalmente por uma
alimentação pobre. O distúrbio por
deficiência de iodo, também conhecido como
bócio, já foi considerado uma carência
importante, mas, hoje, encontra-se sob
controle no Brasil, em virtude da adição de
iodo ao sal utilizado para o consumo
humano.
As ações do Ministério da Saúde para reduzir
as deficiências desses micronutrientes na
população brasileira estão apoiadas na
educação alimentar e nutricional, na
suplementação com megadoses de vitamina
A e sulfato ferroso e na fortificação de
alimentos, como farinhas de trigo e milho
com ferro e ácido fólico.
O Programa Nacional de Suplementação de
Ferro consiste na suplementação preventiva
em todas as crianças de 6 a 24 meses de
idade com solução de sulfato ferroso,
gestantes a partir da 20ª semana gestacional
com comprimidos desse composto e de
ácido fólico, e mulheres no pós-parto ou pós-
aborto com comprimido de sulfato ferroso por
3 meses. A distribuição dos suplementos é
realizada em todos os municípios brasileiros.
O Programa Nacional de Suplementação de
Vitamina A consiste na suplementação
preventiva com megadoses de vitamina A de
100.000 UI em crianças de 6 a 11 meses
uma vez ao ano, com 200.000 UI em
crianças de 12 a 59 meses, uma vez a cada
6 meses, e em mulheres no pós-parto
imediato com uma dose de 200.000 UI. A
distribuição dos suplementos é realizada
somente na região Nordeste, na região norte
do estado de Minas Gerais (vale do
Jequitinhonha e Murici) e no Vale do Ribeira
em São Paulo, locais endêmicos para esse
tipo de avitaminose.
DIREITOS MATERNOS FRENTE AO ADOECIMENTO
DOS FILHOS:
A Consolidação das Leis Trabalhistas,
prescrevem dentre seus incisos, situações
que possibilitam abstenção do serviço sem
prejuízo salarial. No que diz respeito à
dinâmica familiar, os quadros mais
relevantes são:
 Até dois dias consecutivos em caso de
morte de dependente econômico
declarado na Previdência Social e na
Carteira de Trabalho;
 Até três dias consecutivos em
decorrência de casamento;
 Dois dias para o acompanhamento de
consultas de pré-natal da
esposa/companheira (sancionado pela lei
nº 13.257 de 2016);
 Até um dia por ano para acompanhar o
filho de até seis anos em consulta médica
(sancionado pela lei nº 13.257 de 2016)
A Lei nº 13.257 também foi responsável pela
instituição do Programa Empresa Cidadã,
que prolonga por até 60 dias a licença-
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
maternidade estabelecida por Lei, e por 15
dias a licença-paternidade estabelecida
legalmente (de cinco dias), desde que o pai
comprove a participação em cursos ou
atividades de orientação para o cuidado com
a criança.
O atestado médico de acompanhante se
trata de uma declaração assinada por um
médico que ateste a necessidade de
determinada pessoa em acompanhar
doente, normalmente familiar, em casa ou no
hospital, por necessitar de cuidados
especiais, durante um determinado período.
O preenchimento do CID-10, caso seja
realizado, deverá contar com o registro
Z76.3, de pessoa em boa saúde
acompanhando pessoa doente.
O afastamento para acompanhamento a
outro tipo de familiar que não aqueles
supracitados, ou além do número de dias
citados, não tem cobertura para efeito de
pagamento de dias não trabalhados, mesmo
que seja um motivo justificado. Por
deliberação da empresa, atestado de
acompanhamento em qualquer outra
situação poderá ser aceito, para efeito de
pagamento de dias não trabalhados, se
assim a empresa decidir.
Ressalte-se que a convenção coletiva e o
acordo coletivo de trabalho têm prevalência
sobre a lei quando dispõem sobre benefícios
para o trabalhador. Assim, nada impede que
convenção ou acordo coletivo estabeleçam
deliberações em benefício do trabalhador, a
exemplo de abonar dias não trabalhados
além daqueles estipulados em Lei.
SURGIMENTO DA DENTIÇ ÃO:
A erupção dental refere-se, de forma mais
restrita, à incisão dos dentes através da
gengiva, porém, num sentido mais amplo,
esse processo compreende toda a
movimentação do dente de sua localização
óssea original até atingir sua posição
funcional na cavidade bucal, dividindo-se em
três fases:
 Fase pré-eruptiva: intraóssea, sem
movimentação do germe dentário;
 Fase eruptiva: o dente em formação se
move de forma rápida até o plano de
oclusão;
 Fase pós-eruptiva: o dente busca
adequar-se às mudanças na
conformação da cavidade bucal e ao
crescimento ósseo.
Poucos dias antes do irrompimento do dente
decíduo na cavidade bucal, geralmente
ocorrem manifestações locais e/ou
sistêmicas. As manifestações locais, como
salivação abundante, prurido, edema local e
eritema gengival, têm sido atribuídas a uma
complexa interação de células inflamatórias,
proteínas da matriz do esmalte e
imunoglobulina E, que também é
responsável pelo desenvolvimento de
quadros febris associados à
hipersensibilidade.
É válido salientar que o ser humano, em seu
processo de desenvolvimento, apresenta
três estágios de desenvolvimento da
oclusão, que são:
 Dentadura decídua: conhecida como
“dentes de leite”, essa fase ocorre na
infância, desde a erupção do primeiro
dente (seis meses até os três anos) até o
surgimento dos primeiros dentes
permanentes, aos 6 anos de idade;
 Dentadura mista: perdura entre os seis e
13 anos de idade, quando há presença
simultânea de dentes decíduos e
permanentes na cavidade bucal;
 Dentadura permanente: todos os dentes
decíduos já esfoliaram e apenas dentes
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
permanentes estão presentes na
cavidade bucal.
Estudos têm demonstrado que a cronologia
de erupção pode variar entre as populações
devido, especialmente, a fatores relativos ao
gênero, etnia, alterações sistêmicas,
aspectos socioeconômicos, estado
nutricional da criança e prematuridade. A
idade de erupção dentária decídua entre as
crianças varia, com a seguinte escala
cronológica sendo relatada como mais
prevalente: incisivo central (9 a 10 meses),
incisivo lateral (11 a 12 meses), primeiro
molar (15 a 16 meses), caninos (17 a 18
meses) e segundos molares (21 a 28
meses). No Brasil, por sua vez, esse período
se dá entre os 11 e 30 meses para meninos
e 12 a 30 meses para meninas.
INTERFERÊNCIAS NO PROCESSO DE ERUPÇÃO
DENTÁRIA:
PREMATURIDADE:
Crianças nascidas antes do tempo normal
apresentam atrasos no processo de
desenvolvimento, necessitando de um
tempo maior para completar a formação e
erupção dos dentes após o nascimento.
Considerando-se o tempo de gestação e o
período que precede a emergência dos
primeiros dentes na cavidade bucal, não há
diferenças significativas entre prematuros e
crianças nascidas dentro do tempo
considerado normal, ou seja, o somatório
desses períodos é coincidente.
ESTADO NUTRICIONAL:
As correlações entre amamentação e
desenvolvimento dentário ainda não são
explícitas, com estudos apontando tanto
para atrasos em crianças não expostas ao
leite materno, para o retardo em infantes
amamentados, quanto para a ausência de
diferenças significativas entre esses dois
grupos. Recomenda-se, no entanto, que
após os seis meses de idade, as crianças
sejam apresentadas a alimentos que
estimulem o crescimento e o
desenvolvimento do sistema
estomatognático, que contempla os ossos e
músculos envolvidos na mastigação e na
deglutição.
Alterações na cronologia da erupção dos
dentes podem ser fortemente influenciadas
pela situação nutricional da criança,
principalmente em quadros de desnutrição
calórico-proteica. Se o quadro de deleção é
crônico, desde o período pré-natal, os
acometimentos se estendem a toda a arcada
dentária, uma vez que a odontogênese ainda
não está completa, mas em situações
agudas de desnutrição, até o sexto mês de
vida, esses prejuízos são observados
somente nos primeiros e segundos molares.
A odontogênese na dentição humana
começa no período intrauterino. E a
formação do esmalte (amelogênese) ocorre
em três fases distintas: deposição da matriz
do esmalte; calcificação (quando os minerais
são depositados e as proteínas removidas) e
maturação. O processo de formação do
dente pode ser alterado por deficiências
nutricionais proteicas e minerais. Tanto a
dentição decídua como a dentição
permanente pode ser afetada, sendo que a
época da agressão está determinada pela
localização do defeito na coroa dental, uma
vez que o processo de esfoliação e erupção
segue uma cronologia bem definida.
Um tipo de má formação dental é a
hipoplasia de esmalte, resultado de um
distúrbio na formação da matriz do esmalte,
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
o ameloblasto. Esse quadro é decorrente
principalmente da deficiência crônica de
vitaminas, como a vitamina D, e é
encontrado desde o início da humanidade,
sendo atualmente mais prevalente em
regiões de vulnerabilidade socioeconômica.
A deficiência de vitamina A é conhecida por
alterar a amelogênese, a dentinogênese e a
função imunonológica, reduzindo ainda a
síntese de glicoproteínas salivares
específicas para aglutinação de bactérias.
O potencial cariogênico na dentição afetada
é aumentado devido às irregularidades, às
cavidades e aos sulcos causados pelos
defeitos hipoplásicos os quais fornecem
maior retenção mecânica das bactérias, e,
com a redução da quantidade de minerais e
a dureza do esmalte, há uma estreita relação
entre a hipoplasia e lesões de cárie.
A condição bucal pode ainda ser influenciada
por alterações nas glândulas salivares, pois
a saliva é essencial à saúde dentária.
Crianças desnutridas podem apresentar
retardo no fluxo salivar e mudanças em sua
composição, alterando o funcionamento de
suas ações protetoras (efeito tampão para
evitar a acidificação oral após a ingesta de
sacarose e aglutinação bacteriana).
NÍVEL SOCIOECONÔMICO:
A associação desse fator aos distúrbios na
erupção dentária assemelha-se com os
pontos discutidos no item acima, uma vez
que crianças em situação econômica e social
precária acabam sendo mais vulneráveis à
desnutrição.
Análises comparativas denotam que há
atraso considerável na apresentação
decidual dos dentes em crianças de menor
status socioeconômico, com cerca de dois a
cinco dentes a menos que uma criança de
mesma idade com maior poder aquisitivo.
CONDIÇÕES SISTÊMICAS:
Indivíduos afetados por Síndrome de Down,
Síndrome de Turner, Displasia
Cleidocraniana, atrofia hemifacial e
mucopolissacaridose têm como
características o atraso no irrompimento da
dentição.
Os pacientes com Síndrome de Down, por
exemplo, manifestam tardia de incisivos e
caninos em indivíduos do sexo masculino,
sendo observado no sexo feminino atraso na
erupção de incisivos, caninos e molares.
PROBLEMA 5 – ABERTURA:
ENTEROPARASITOSES NA INFÂNCIA:
As parasitoses intestinais são doenças cujos
agentes etiológicos são helmintos ou
protozoários, os quais, em pelo menos uma
das fases do ciclo evolutivo, localizam-se no
aparelho digestivo do homem, podendo
provocar diversas alterações patológicas.
Essas condições representam um problema
de saúde no Brasil e em outros países em
desenvolvimento, uma vez que acometem
um grande número de pessoas, mas
necessitam de ainda mais atenção quando
afetam crianças, principalmente em situação
de carência alimentar. As enteroparasitoses
podem causar a desnutrição, do mesmo
modo que a desnutrição pode facilitar a
ocorrência de infecções por enteroparasitos.
A redução das condições físicas e das
atividades de cada indivíduo parasitado
representa uma perda óbvia previsível tanto
em dias de trabalho, capacidade para o
aprendizado, quanto no atraso no
desenvolvimento físico, mental e social.
Nesse sentido, o binômio “verminose-
nutrição” reforça a necessidade de
programas contra esses parasitas em
comunidades assistidas oficialmente com
enriquecimento alimentar, pois os distúrbios
no metabolismo, resultantes das lesões
intestinais impedem absorção adequada dos
nutrientes.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A biodiversidade de enteroparasitoses em
escolares é um indicador da falta de
informação da população sobre os hábitos e
condições propícias para a transmissão
destes patógenos. Além disso, tomando a
escola como instituição centralizadora de
medidas de educação e saúde, pode-se
relatar os aspectos epidemiológicos das
comunidades ao redor das mesmas,
observando os possíveis fatores de risco.
GIARDÍASE:
ETIOLOGIA:
A Giardia lamblia, frequentemente
encontrada em países em desenvolvimento,
é um dos principais parasitas intestinais
humanos. O seu acometimento em crianças
é ainda mais importante, pois representa
uma das causas mais comuns de diarreia
nesse grupo, que em decorrência dessa
infecção, podem manifestar distúrbios
nutricionais e de crescimento.
Esse parasita apresenta duas formas
evolutivas, o trofozoíto, em formato de pera,
com um disco suctorial/adesivo em sua
porção ventral, margeado pela franja
ventrolateral, e quatro pares de flagelos; e o
cisto, ovalado, com dois a quatro núcleos e
diversas fibrilas (estruturas contráteis
flagelares). O disco tem sido considerado
uma importante estrutura para a adesão do
parasito à mucosa, por meio da combinação
de forças mecânicas e hidrodinâmicas.
Abaixo da membrana citoplasmática do
trofozoíto existem numerosos vacúolos
atuantes na pinocitose de partículas
alimentares. No citoplasma do trofozoíto
observa-se ainda a presença de retículo
endoplasmático, ribossomos, aparelho de
Golgi e vacúolos de glicogênio, não sendo
encontradas mitocôndrias. No cisto, todas as
estruturas descritas são vistas, embora de
forma desorganizada.
A Giardia é um parasita monoxeno, com ciclo
biológico direto. A via normal de infecção do
homem é o consumo de cistos, presentes em
água sem tratamento ou deficientemente
tratadas (uso exclusivo de cloro) ou
alimentos contaminados (frutas mal lavadas
e verduras cruas). Após a ingesta do
patógeno, o desencistamento é iniciado no
meio ácido do estômago e completado no
duodeno e jejuno, localização que favorece a
colonização intestinal pelos trofozoítos.
Com a infestação da Giardia no epitélio
intestinal, inicia-se um processo acentuado
de divisão binária longitudinal que forma
trofozoítos binucleados (a separação do
citoplasma ocorre tão logo há a divisão do
material genético). O encistamento começa
no baixo íleo e principalmente no ceco,
desencadeado pelo pH intestinal, pela ação
dos ácidos biliares e pelo destacamento do
parasita da mucosa, deflagrado pela
resposta imune do hospedeiro. Dentro do
cisto ocorre nucleotomia, podendo ele
apresentar-se então com quatro núcleos.
Essas estruturas são resistentes, envoltas
por uma membrana de quitina, e podem
sobreviver por ao menos dois meses no
ambiente, quando em condições adequadas
de umidade e temperatura.
Baratas e moscas podem disseminar os
cistos, ampliando as formas de contágio, que
também podem incluir o contato pessoa a
pessoa, pelas mãos mal lavadas, seja no
núcleo familiar ou em creches, ou pelo
contato com animais domésticos acometidos
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
por formas parasitárias de morfologia
parecida com aqueles de trofismo humano.
FISIOPATOLOGIA:
A fisiopatologia da giardíase ocorre sem que
haja invasão dos trofozoítos no epitélio
intestinal, uma vez que paralelamente ao
processo de adesão dos parasitas à mucosa
ocorre uma série de eventos que se
interligam na produção do quadro diarreico,
como a disfunção na barreira do intestino, o
encurtamento da borda em escova das
microvilosidades (acompanhado ou não por
atrofia dos vilos), as deficiências nas
dissacaridases, a ativação linfocitária pelo
hospedeiro e o aumento do trânsito
intestinal.
Na giardíase crônica ocorre perda de função
da barreira epitelial, fator este que está
diretamente associado ao aumento da
ativação dos genes que levam às cascatas
de apoptoses dos enterócitos, estando
dependente de caspase-3 e de caspase-9,
que induzem aumento na expressão de
proteínas pró-apoptóticas em detrimento
daquelas anti-apoptose (Bcl-2). Esse
fenômeno ocorre, em parte, porque os
trofozoítos de Giardia consomem a arginina
local e inibem os enterócitos de produzirem
óxido nítrico, substância imunomoduladora
cuja ação anti-inflamatória inibe a produção
de citocinas ou impede a produção dos
mediadores inflamatórios locais, que
retardariam o desenvolvimento dos
trofozoítos.
O aumento da permeabilidade intestinal
mediado pelo parasito é resultado das
alterações ocorrentes nos complexos
juncionais apicais, que incluem interrupções
na produção de actina filamentosa, proteína
de junção estanque-1, e claudina-1
(impermeabilizante das junções celulares),
componentes do anel de actomiosina que
regula o fluxo paracelular. Durante a infecção
pode ocorrer a redução da área total de
absorção, seguida ou não da atrofia das
vilosidades, o que representa um fator
importante para diarreia via má-absorção de
vitaminas e minerais e má-digestão.
Outra possível explicação para o
desenvolvimento das manifestações
diarreicas nessa enteroparasitoses é a
própria resposta imune do hospedeiro. O
parasito entra em contato com macrófagos
que ativam os linfócitos T que, por sua vez,
ativam os linfócitos B que produzem IgA e
IgE. A IgE se liga aos mastócitos, presentes
na superfície da mucosa intestinal,
provocando a degranulação dessas células e
a liberação de várias substâncias, entre elas
a histamina. Assim, é desencadeada uma
reação anafilática local que provoca edema
da mucosa e contração de seus músculos
lisos, levando a um aumento da motilidade
do intestino, favorecendo dessa forma o
aumento da renovação dos enterócitos. As
vilosidades ficam repletas de células
imaturas, ainda deficientes em enzimas,
levando a problemas de má absorção e,
consequentemente, à diarreia. Por outro
lado, os mastócitos também liberam fatores
ativadores de eosinófilos e neutrófilos, que
agem mais tardiamente, provocando um
aumento dessas células no local da reação,
dando origem a uma reação inflamatória
local, que pode ocasionar a lesão das células
epiteliais.
A ação hormonal da prostaglandina, liberada
por intermédio de monócitos ativados pelo
patógeno e de mastócitos próprios, também
pode auxiliar no desenvolvimento da diarreia,
pois seu efeito se dá diretamente na mucosa
intestinal e na estimulação das moléculas de
adenilciclase na região, acelerando o
peristaltismo.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
A giardíase apresenta quadro clínico diverso,
estendendo-se desde indivíduos
assintomáticos até pacientes sintomáticos
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
com diarreia aguda autolimitante, ou com
quadro persistente, com indícios de má
absorção de nutrientes e perda de peso.
Essa diversidade é multifatorial, atribuída a
fatores associados ao parasita, como a cepa
e o número de cistos ingeridos, e ao
hospedeiro, como o pH gástrico, resposta
imunológica, estado nutricional e microbiota
intestinal.
As infecções assintomáticas, que
contemplam a maior parte dos
acometimentos, ocorrem tanto em adultos
quanto em crianças, que podem eliminar
cistos nas fezes por até seis meses. Os
indivíduos com sintomas, representados
principalmente pelos infantes, podem
desenvolver a forma aguda da doença,
geralmente na primoinfecção, na qual a
ingesta de um pequeno volume de cistos
pode induzir quadro diarreico aquoso (que
evolui posteriormente para esteatorreia),
explosivo e de odor fétido, acompanhado por
gases e distensão abdominal, com ou sem
febre baixa, associado a anorexia e náuseas,
comumente de caráter limitado.
As principais complicações da giardíase
estão associadas à má absorção de gordura
e de nutrientes, como vitaminas lipossolúveis
(A, D, E, K), vitamina B12, ferro e lactose.
Essas deficiências nutricionais raramente
produzem danos sérios nos adultos, contudo
em crianças, podem ter efeitos graves.
DIAGNÓSTICO:
Em crianças de oito meses a 12 anos, a
sintomatologia mais indicativa de giardíase é
diarreia com esteatorreia, irritabilidade,
insônia, náuseas e vômitos, perda de apetite
(acompanhada ou não de emagrecimento) e
dor abdominal, o que fomenta a possibilidade
de diagnóstico clínico.
A análise laboratorial é, no entanto, o método
mais confiável para verificar a infecção por
Giardia lamblia. Para confirmar a suspeita
clínica, prescreve-se o exame parasitológico
de fezes, que apresenta variações conforme
a amostra em análise:
 Fezes formadas:
Cistos podem ser detectados em
preparações a fresco pelo método direto,
porém os métodos de escolha são os de
concentração, com destaque para o Método
de Faust (flutuação). O material pode ser
corado com hematoxilina férrica para a
análise em microscópio.
 Fezes diarreicas:
Uma vez que as fezes diarreicas contêm
trofozoítos, recomenda-se que a coleta da
amostra seja feita no laboratório, com análise
imediata, ou que o material seja
acondicionado em recipientes com
conservadores adequados, como o SAF
(acetato de sódio, ácido acético e
formaldeído), uma vez que essas formas
parasitárias sobrevivem por somente 15 a 20
minutos no meio externo. O exame das fezes
pode ser feito pelo método direto e, caso seja
necessário, podem ser feitos esfregaços
corados pelo método da hematoxilina.
Um aspecto importante com relação ao
diagnóstico da giardíase é o fato de que
indivíduos parasitados não eliminam cistos
continuadamente, criando o chamado
“período negativo”, que tem duração variada
não só entre indivíduos como também num
mesmo paciente. Assim, o diagnóstico por
análise laboratorial de fezes deve ser
realizado a partir de três amostras coletadas
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em dias alternados, minimizando as chances
de resultados falso-negativos.
Em pacientes com diarreia crônica a
identificação pode continuar sendo negativa,
apesar da presença de trofozoítos na região
duodenal. Nesses casos, o diagnóstico pode
ser feito por biópsia jejunal ou pelo exame de
fluido duodenal, ambos mais invasivos que
os métodos supracitados. No que se refere
ao estudo das secreções do duodeno, a
forma de exame mais empregada na
atualidade é o “Entero Test”, no qual uma
cápsula gelatinosa contendo um fio de náilon
é administrada em jejum, tendo como
objetivo a remoção de uma das pontas do fio
após 4 horas da ingestão, observando-se o
muco aderido ao equipamento à fresco ou
após ser corado com hematoxilina.
Métodos de análise imunológica também
podem ser empregados, tendo como
amostras tanto o material fecal (podendo
haver coleta única) quanto o soro sanguíneo.
As formas de análise mais comuns são a
imunofluorescência indireta e o ELISA. A
detecção de anticorpos anti-Giardia no soro
apresenta problemas relacionados com a
ocorrência de falso-positivos e baixas
sensibilidade e especificidade. Nessas
reações, anticorpos IgG permanecem
elevados por um longo período, o que
impede a distinção entre infecções passadas
e recentes, dificultando o diagnóstico nas
áreas endêmicas. A detecção de antígenos
nas fezes (copro-antígenos) empregando a
técnica de ELISA tem demonstrado
resultados satisfatórios, com sensibilidade
de 85% a 95% e especificidade de 90% a
100%.
A realização de testes de PCR (reação da
cadeia polimerase), inicialmente
empregados em mecanismos de
monitoramento ambiental) também podem
representar uma ferramenta de elevada
especificidade para a detecção desse
parasita.
AMEBÍASE:
A Entamoeba histolytica é responsável por
parasitoses em até 10% da população
mundial, com focos endêmicos frequentes
nos trópicos, especialmente em áreas de
maior vulnerabilidade social e acesso
precário ao saneamento básico. Na maioria
dos indivíduos infectados, a Entamoeba
parasita a luz do trato gastrointestinal e
causa poucos sintomas ou sequelas. As
duas formas mais comuns de doença
causada por esse parasita são a colite
amebiana, com invasão da mucosa
intestinal, e o abcesso hepático amebiano,
com a disseminação desses protozoários
para o fígado.
ETIOLOGIA:
Existem duas espécies morfologicamente
idênticas, mas geneticamente distintas de
Entamoeba que comumente infectam seres
humanos. A Entamoeba dispar, a espécie
mais prevalente, não causa doença
sintomática. A E. histolytica, a espécie
patogênica, causa um espectro de doenças
e pode se tornar invasiva. Além dessas duas
outras espécies, há uma grande variedade
de protozoários pertencentes a esse gênero
e que podem estar presentes na biota
intestinal humana sem, no entanto, induzir
um quadro patológico.
A Entamoeba apresenta, em seu ciclo
biológico, três fases morfologicamente
distintas, a saber:
 Trofozoíto:
É pleomórfico, ativo e alongado, com
emissão contínua e rápida de pseudópodes,
grossos e hialinos. Quando corado, é
possível observar a presença de um único
núcleo, que é pouco visível em formas vivas.
Sua movimentação é direcional, semelhante
à de uma lesma.
Quando decorrentes de quadros de
disenteria, a presença de enterócitos no
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citoplasma é comum, ao passo que aqueles
não-invasivos expressam bactérias, amido e
outros detritos em seu citosol, que divide-se
em ectoplasma, bastante claro e hialino, e
endoplasma, finamente granuloso, com
vacúolos, núcleos e restos alimentares.
Na parte central do núcleo arredondado
encontra-se o cariossoma, pequeno e com
constituição semelhante à cromatina
periférica (granular e justaposto). Às vezes,
o cariossoma apresenta-se formado por
pequenos grânulos centrais, dando uma
configuração, com a cromatina, de "roda de
carroça".
Na microscopia eletrônica, os trofozoítos da
E. histolytica se caracterizam pela ausência
de mitocôndria, aparelho de Golgi, retículo
endoplasmático, centríolos e microtúbulos,
que são organelas diferenciadas e
encontradas nas células eucariotas.
 Pré-cisto:
Representa uma fase de transição entre o
trofozoíto e o cisto. Apresenta-se oval ou
ligeiramente arredondado, com tamanho
menor que o do trofozoíto. Em seu
citoplasma podem ser vistos corpos
cromatóides com pontas arredondadas,
semelhantes a bastonetes.
 Metacisto:
Forma multinucleada que emerge dos cistos
presentes no intestino delgado, sendo
precursora dos trofozoítos.
 Cisto:
Forma resistente da E. histolytica, é oval ou
esférico, com aparência hialina e clara, com
núcleos pouco visíveis quando analisados à
fresco ou sem coloração, mas que se torna
bem visíveis em colorações com lugol ou
hematoxilina, presentes em número entre um
e quatro.
A membrana celular é mais escura que a do
trofozoíto devido ao revestimento de
cromatina, que é mais escura. Também são
encontradas regiões que se coram de
castanho pelo lugol, as reservas de
glicogênio, também chamadas como
"vacúolos de glicogênio".
O ciclo biológico desses parasitas é
monoxeno e relativamente simples, com o
início dessa infecção sendo marcado pela
ingestão dos cistos, encontrados na água
não tratada e em alimentos contaminados
por fezes de portadores desse protozoário.
Essas formas parasitárias passam pelo
estômago, resistindo à ação do suco
gástrico, e chegam ao final do intestino
delgado ou início do intestino grosso, onde
ocorre o desencistamento, com a saída da
forma metacística (oito pequenas amebas
com um núcleo cada) através de uma
pequena fenda na parede cística, que se
aderem à mucosa intestinal, obtendo
alimento para chegar a sua fase final, com
forma trofozoítica.
As amebas maduras são maiores que as
metacísticas e muito ativas. Fagocitarn
bactérias e outras partículas nutritivas do
meio e podem multiplicar-se indefinidamente
na luz do intestino grosso, principalmente no
cólon. Mas, em dado momento, essas
formas se desprendem da mucosa e, por
motivos ainda não esclarecidos, sofrem ação
da desidratação, reduzindo sua atividade
metabólica para compor o estágio pré-
cístico, sobre o qual é secretada uma
membrana resistente, chamada parede
cística. Nesse momento, o núcleo se divide
duas vezes, para formar a organização típica
de um cisto.
Essa formação cística permite que o parasita
se mantenha viável, mesmo quando exposto
ao meio externo, sendo identificável nas
fezes formadas de um portador, mas não
sendo encontrados em fezes líquidas.
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do cólon, as amebas liberam uma proteinase
rica em cisteína que possibilita a penetração
através da camada epitelial.

As células do hospedeiro são destruídas por

processos de citólise, mediada pela
liberação de amebaporos, fosfolipases e
hemolisinas pelo trofozoíto, e de apoptose,
que também pode ser induzida por proteínas
formadoras de poros, em casos de colite
amebiana e de manifestação hepática.

Em algumas situações, o equilíbrio entre o

parasita e o hospedeiro pode ser rompido,
levando os trofozoítos a invadirem a
submucosa intestinal e a se multiplicarem de
forma ativa no interior das úlceras, podendo
alcançar, por meio da circulação porta, o
fígado e, posteriormente, os pulmões, rins,
cérebro ou a pele, causando a amebíase
extra-intestinal. Quando em outros tecidos, o
parasito alimenta-se de sangue e são muito
ativos, porém não formam cistos. Uma vez que os trofozoítos de E. histolytica
O ciclo não-patogênico, na luz do intestino invadem a mucosa intestinal, eles se
grosso, e o ciclo patogênico podem ocorrer multiplicam e disseminam-se lateralmente
simultaneamente ou não. A sobrevivência do embaixo do epitélio intestinal, produzindo as
parasito a longo prazo, no entanto, depende úlceras características em forma de garrafa,
das amebas que permanecem na luz descritas em sua forma inicial como pontos
intestinal, únicas capazes de serem avermelhados ao longo da mucosa, mas que
transmitidas de um hospedeiro ao outro evoluem para escaras de bordos nítidos e
quando encistadas. hiperêmicos, com presença de material
necrótico.
FISIOPATOLOGIA:

Os trofozoítos patogênicos são responsáveis

pela invasão e destruição tecidual. Eles
aderem às células epiteliais do cólon através
de uma galactose e de N-acetil-D-
galactosamina-lectina específica. Este
receptor também é considerado responsável
pela resistência à lise mediada por
complemento. Uma vez aderidas à mucosa
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Ao alcançarem o fígado, as amebas
produzem lesões semelhantes àquelas
presentes no intestino. Estas feridas são
comumente denominadas abscessos,
embora não contenham granulócitos.
Úlceras bem-estabelecidas e abscessos
hepáticos amebianos exibem pequena
resposta inflamatória local. Estes podem ser
vários, mas em geral um só está presente,
alcançando grandes dimensões. O material
necrosado termina por fundir-se em um
líquido espesso, castanho-avermelhado ou
cor de chocolate, que contém tecido hepático
lisado, sangue, bile e algumas amebas. Por
seu aspecto, costuma ser referido como “pus
chocolate”.
Ocasionalmente, os trofozoítos podem
induzir uma resposta inflamatória
proliferativa com formação de uma massa
granulomatosa, chamada "ameboma", mas
esta não é muito comum em quadros de
amebíase.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
O período de incubação desse parasita é
bastante variável, com difícil determinação,
podendo oscilar entre uma semana e quatro
meses, a depender do volume de cistos
consumidos e da integridade do trato
digestório do hospedeiro.
As apresentações clínicas variam da
passagem assintomática de cisto até uma
colite amebiana, disenteria amebiana,
ameboma e doença extra-intestinal. A
infecção por E. histolytica é assintomática
em cerca de 90% das pessoas, mas tem
potencial para se tornar invasiva e deve ser
tratada, inclusive para evitar a transmissão
do parasito. A doença grave é mais comum
entre crianças pequenas, gestantes,
desnutridos e pessoas que estão recebendo
corticosteroides. A doença extra-intestinal
geralmente acomete apenas o fígado, mas
manifestações menos comuns incluem
abscesso cerebral amebiano, doença
pleuropulmonar e lesões na pele e no trato
geniturinário.
COLITE NÃO DISENTÉRICA OU CRÔNICA:
Essa manifestação é marcada por duas a
quatro evacuações diárias com fezes
amolecidas ou pastosas, podendo conter
muco ou sangue. O paciente pode
apresentar desconforto abdominal ou
cólicas, referidas na sua porção superior,
sendo rara a ocorrência de febre.
O que caracteriza essa forma clínica da
amebíase é a alternância de períodos
sintomáticos e intervalos silenciosos, com
funcionamento normal do intestino. A maioria
das amebas provenientes deste quadro
clínico foi identificada como E. dispar.
COLITE AMEBIANA:
A disenteria amebiana aparece mais
frequentemente de modo agudo,
acompanhada de cólicas intestinais e
diarreia, com evacuações
mucossanguinolentas ou com
predominância de um desses componentes,
acompanhadas de cólicas intensas, de
tenesmo ou tremores de frio. A frequência
dessas evacuações pode variar entre seis a
oito por dia.
A colite amebiana afeta todos os grupos
etários, mas sua incidência é
consideravelmente mais elevada em
crianças de 1 a 5 anos, grupo no qual tende
a ser rapidamente progressiva com
envolvimento extra-intestinal frequente e
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altas taxas de mortalidade, particularmente
em países tropicais. A disenteria amebiana
também pode resultar em desidratação e
distúrbios eletrolíticos.
Casos agudos e fulminantes podem ser
encontrados, acometendo todo o cólon com
úlceras e possíveis perfurações. O quadro
clínico é dominado por uma síndrome tóxica,
febril, com dor em todo o abdome que pode
apresentar reação de defesa, rigidez da
parede e ausência de ruídos intestinais,
devido à peritonite, ou mostrar-se distendido
por um íleo paralítico. Cólicas fortes e
tenesmo acompanham as evacuações
mucossanguinolentas. Desidratação
hemorragia intestinal podem complicar o
quadro.
FORMAS EXTRA-INTESTINAIS:
O abscesso hepático amebiano, uma grave
manifestação da infecção disseminada, é
incomum em crianças, que podem
apresentar um aumento difuso do órgão,
mas não as lesões necróticas típicas dessa
manifestação.
Os abscessos hepáticos amebianos podem
ocorrer meses ou anos após a exposição,
dessa forma, a obtenção de uma história
cuidadosa sobre viagens é fundamental. Em
crianças, a febre é o principal marcador do
abscesso hepático amebiano, sendo
frequentemente acompanhada de dor
abdominal, distensão e aumento doloroso do
fígado. Podem também estar presentes
alterações na base do pulmão direito, como
elevação do diafragma e atelectasias ou
derrame.
O abscesso amebiano no fígado é
geralmente simples, com uma única lesão
em 80% dos casos, acometendo
principalmente o lobo direito do órgão.
DIAGNÓSTICO:
Manifestações clínicas atribuídas à E.
histolytica podem ser errôneas devido à
grande superposição de sintomas comuns à
várias doenças intestinais. Na maioria dos
casos, principalmente na fase aguda, essa
doença poderá ser facilmente confundida
com a disenteria bacilar, salrnoneloses,
síndrome do cólon irritado e
esquistossomose, o que fundamenta a
necessidade de exames laboratoriais.
Essa análise complementar é feita
usualmente por meio de fezes, soro e
exsudatos, tendo como objetivos a
identificação de trofozoítos e cistos. Embora
o exame de fezes seja cansativo, consuma
muito tempo na sua execução e dependa da
e competência do microscopista, é, sem
dúvida, o mais usado para este fim.
A amostra deve ser coletada sem urina e
sem contaminação com outros materiais e
nunca após contato com o solo, pois pode
haver contaminação com amebas de vida
livre, ao passo que o condicionamento desse
material deve ser feito em recipientes
adequados, com conservadores, para
garantir a preservação do parasita.
A verificação do aspecto e da consistência
das fezes é muito importante, principalmente
se ela é disentérica e contém muco e
sangue. A utilização de fezes liquefeitas
após o uso de purgativos (fezes purgadas) é
frequente e, em muitos casos, aumenta a
positividade dos exames.
A análise direta da amostra sem conservador
é muito importante na distinção entre a
disenteria amebiana e a bacilar. Nesta
última, o número de evacuações é sempre
maior, com tenesmo intenso e grande
número de piócitos e hemácias intactas, o
que não ocorre na amebíase. O exame a
fresco deve ser feito em até 20 ou 30 minutos
após a coleta, pois tem a finalidade de
detectar a movimentação das amebas e as
características citoplasmáticas, permitindo a
identificação da espécie, que é um
importante método de triagem.
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 Fezes formadas:
O diagnóstico laboratorial é feito através do
encontro dos cistos, utilizando-se de
diversas técnicas de concentração, como a
flutuação (Método de Faust) e a
centrifugação em éter. Além destes, podem
ser usadas também técnicas de
sedimentação espontânea em água (Método
de Lutz).
Recomenda-se sempre realizar o exame
direto com triagem, seguido pelas análises
supracitadas, que apresentam elevada
especificidade. Como a eliminação dos
cistos é intermitente e irregular, aconselha-
se coletar as fezes em dias alternados e
coloca-las em conservadores,
homogeneizando o recipiente a cada nova
amostra, permitindo diagnosticar mais de
90% das infecções
O diagnóstico sorológico está sendo cada
vez mais empregado, principalmente em
casos extraintestinais, fazendo uso das
técnicas de ELISA, imunofluorescência
indireta, hemaglutinação indireta, e apresentar eliminação parasitária nas fezes.
radioimunoensaio, sendo diretamente
beneficiados pela obtenção de antígenos
cada vez mais puros.
A técnica de ELISA mostra-se muito sensível
e de fácil execução, mesmo nas condições
que acompanham os trabalhos de campo.
Dá altos títulos com o soro de pacientes
portadores de amebíase hepática e valores
menores na amebíase intestinal invasiva,
porém mais elevados que os obtidos com
outros métodos imunológicos.
A hemaglutinação e a
contraimunoeletroforese são muito
sensíveis, mas como os anticorpos
detectados nesses processos persistem
durante muitos anos após a infecção, eles
pouco informam sobre a situação atual do
paciente. Sua principal utilidade é nos
inquéritos epidemiológicos, para revelar a
proporção de indivíduos que têm ou tiveram
amebíase em determinada localidade.
Em populações pouco sujeitas a reinfecções,
a imunofluorescência é um bom método de
triagem, mas pode dar títulos baixos (1:64)
tanto em casos de amebíase ativa, como em
pessoas com história pregressa de
disenteria. A técnica que apresenta maior
correlação com as infecções efetivamente
em curso é a de difusão de precipitinas em
ágar-gel. Nos casos em que ela se mantenha
positiva por mais de um ano, deve-se
suspeitar de que a infecção amebiana do
paciente não foi eliminada pelo tratamento.
Para os abcessos hepáticos, além da tríade
sintomática clássica, é possível confirmar o
diagnóstico por meio de radiografia,
cintilografia, ultrassonografia ou tomografia
computadorizada, métodos capazes de
identificar, em 95% dos casos, a localização,
o número e a evolução do abscesso. A
associação desse quadro com a infecção
parasitária, por sua vez, é um pouco menos
clara, pois esses pacientes podem não
ASCARIDÍASE:
A ascaridíase é um acometimento
cosmopolita e a mais frequente das
helmintoses em humanos. Na maior parte
dos casos, a infecção é leve e benigna, com
uma média de seis parasitas por pessoa. As
crianças pequenas são as mais
pesadamente atingidas, razão pela qual essa
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doença apresenta alto interesse pediátrico e
social.
ETIOLOGIA:
O Ascaris lumbricoides é um helminto
encontrado em quase todos os países do
mundo, com frequência variada em
decorrência das condições climáticas,
ambientais e, principalmente,
socioeconômicas da população.
A análise morfológica desse parasita deve
ser feita conforme os diferentes estágios
evolutivos deste, com os vermes adultos
apresentando corpo cilíndrico, com
extremidades afiladas, principalmente na
região anterior. As demais características do
Ascaris são:
 Machos:
Apresentam 20 a 30 cm de comprimento e
cor leitosa. A boca está localizada na
extremidade anterior do corpo, contornada
por três lábios fortes e serrilhados, sendo
seguida pelo esôfago musculoso e pelo
intestino, de trajeto retilíneo. O reto está
localizado próximo à extremidade posterior.
Esse helminto apresenta um testículo
filiforme e enovelado, que se diferencia em
canais deferentes, contínuos até a abertura
da cloaca, também na região posterior. Para
auxiliar na cópula, o macho conta com dois
espículos iguais.
A extremidade posterior fortemente
encurvada para a face ventral é o caráter
sexual externo que o diferencia facilmente da
fêmea.
 Fêmeas:
Medem entre 30 e 40 cm quando adultas,
apresentando corpo mais robusto que o do
macho. Seu aparelho digestório é similar ao
do sexo oposto.
No sistema reprodutor, conta com dois
ovários enovelados que continuam como
ovidutos, diferenciando-se em úteros, unidos
numa única vagina, exteriorizada no terço
anterior do parasito por meio da vulva.
Graças a essa conformação, sua
extremidade posterior é retilínea.
 Ovos:
São inicialmente brancos, mas adquirem cor
castanha devido ao contato com as fezes.
Têm tamanho grande (50 µm de diâmetro) e
formato oval, com cápsula espessa
decorrente da membrana mamilonada
(mucopolissacarídea), secretada pela
parede uterina. A essa membrana seguem-
se uma membrana média constituída de
quitina e proteína e outra mais interna,
delgada e impermeável à água constituída
majoritariamente por lipídios. Esta última
camada confere ao ovo grande resistência
às condições adversas do ambiente.
Internamente há uma grande quantidade de
células germinativas.
É possível encontrar ovos inférteis nas fezes,
apresentando aspecto mais alongado, com
membrana externa delgada e citoplasma
granuloso.
O ciclo biológico do Ascaris lumbricoides é
monoxênico, com as formas adultas desse
verme sendo encontradas no jejuno e no
íleo, mas em infecções mais graves estes
podem ocupar toda a extensão do intestino
delgado, estando aderidas à mucosa ou
migrando pelo lúmen intestinal.
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A primeira larva (L1), formada dentro do ovo, cópula e ovipostura, já sendo encontrados
é do tipo rabditoide, ou seja, possui o ovos nas fezes do hospedeiro. Os vermes
esôfago com duas dilatações nas adultos têm uma longevidade de um a dois
extremidades e uma constrição no meio. anos.
Após uma semana, ainda dentro do ovo,
essa larva sofre muda transformando-se em
L2 e, em seguida, nova muda
transformando-se em L3 infectante com
esôfago filarioide (retilíneo), mantendo sua
capacidade patogênica por meses no solo,
podendo ser ingeridas pelo hospedeiro.

Após o consumo do ovo embrionado,

encontrado em água não tratada e em
alimentos contaminados (com destaque para
hortaliças não lavadas ou irrigadas com água
FISIOPATOLOGIA E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
imprópria para consumo), ou disseminado
por meio da poeira, de aves e insetos, a L3 Calcula-se que apenas um a cada seis
irá atravessar todo o trato digestivo, indivíduos infectados irão manifestar
eclodindo no intestino delgado, mediada por sintomas, devido ao pequeno número de
estímulos decorrentes do próprio ovos ingeridos. Nesses indivíduos, o quadro
hospedeiro, como a presença de agentes patogênico ocorre em duas fases,
redutores, o pH, a temperatura, os sais e a dependendo do estado evolutivo do parasita:
concentração de CO2, fundamental ao
 Larva (processo de migração):
desenvolvimento larvário.
Em infecções de baixa intensidade,
As larvas, mais uma vez liberadas, irão
normalmente não se observam nenhuma
atravessar a parede intestinal na região do
alteração decorrente desse período, ao
ceco e cair nos vasos linfáticos e nas veias,
passo que em acometimentos mais graves
invadindo o fígado entre 18 e 24 horas após
podem ser encontradas lesões hepáticas e
a infecção. Após dois a três dias, esses
pulmonares. No fígado, quando são
parasitas penetrarão o átrio direito através do
encontradas numerosas formas larvares
fluxo sanguíneo proveniente da veia cava
migrando pelo parênquima, podem ser vistos
inferior e superior, e depois de mais quatro
pequenos focos hemorrágicos e de necrose
ou cinco dias, penetrarão os pulmões, dando
que futuramente tomam-se fibrosados. Nos
início ao ciclo de Loss.
pulmões ocorrem vários pontos de
Cerca de oito dias da infecção, as larvas hemorragia na passagem das larvas para os
sofrem muda para L4, rompem os capilares alvéolos.
e caem nos alvéolos, onde mudam para L5.
O acometimento respiratório torna possível o
Sobem então pela árvore brônquica e
desenvolvimento de um quadro pneumônico
traqueia, chegando até a faringe, onde
com febre, tosse, dispneia e eosinofilia, além
podem ser expelidas pela expectoração ou
de edemaciação alveolar com infiltrado rico
deglutidas, atravessando incólumes o
em eosinófilos do parênquima e
estômago e fixando-se no intestino delgado.
manifestações alérgicas, sintomas
Os parasitas irão transformar-se em adultos
correspondentes à Síndrome de Loeffler. Na
jovens 20 a 30 dias após a infecção, e em 60
tosse produtiva, o catarro pode ser
dias alcançam a maturidade sexual, fazem a
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sanguinolento e apresentar larvas do
helminto. Estas manifestações geralmente
ocorrem em crianças e estão associadas ao
estado nutricional e imunitário das mesmas.
 Verme adulto:
O hospedeiro não irá apresentar
manifestações clínicas em infecções de
baixa intensidade, porém quando esse
acometimento envolve um maior número de
larvas (infecções médias e maciças), é
possível encontrar uma miríade de
alterações, a saber:
o Ação espoliadora: os helmintos
consomem proteínas, carboidratos,
vitaminas (principalmente A e C) e
lipídios em grande quantidade,
levando o paciente, principalmente
quando infante, a um quadro de
subnutrição e comprometimento no
crescimento e desenvolvimento;
o Ação tóxica: a reação entre antígenos
parasitários e anticorpos do
hospedeiro pode causar edema,
urticária, convulsões, entre outros;
o Ação mecânica: os parasitas causam
irritação nas paredes intestinais,
podendo enovelar-se em sua luz,
deflagrando um processo obstrutivo,
que representa a mais comum das
complicações agudas, afetando
principalmente as crianças, que
possuem menor diâmetro do intestino
delgado;
o Localização ectópica: em situações de
elevada carga parasitária ou quando o
parasita sofre ações irritativas, como
pela febre, pelo uso incorreto de
medicamentos ou pelo consumo de
alimentos muito condimentados, o
helminto irá deslocar-se de seu habitat
regular, atingindo sítios distintos. Esse
quadro de migração é conhecido por
Ascaris errático.
As manifestações ectópicas da ascaridíase
têm locais de predileção, como o apêndice
cecal, o colédoco (frequente em pacientes
com 5 a 12 anos) e o canal de Wirsung
(estrutura pancreática), podendo ser
necessária intervenção cirúrgica para
reverter o quadro.
Crianças podem também sofrer alterações
cutâneas quando acometidas pelo Ascaris,
causadas pela depleção de vitamina A e C
decorrente da espoliação parasitária,
formando despigmentações circulares, que
desaparecem com o tratamento.
DIAGNÓSTICO:
Usualmente a ascaridíase humana é pouco
sintomática, e por isto mesmo difícil de ser
diagnosticada em exame clínico, sendo a
gravidade da doença determinada pelo
número de vermes que infectam cada
pessoa. Como o parasito não se multiplica
dentro do hospedeiro, a exposição contínua
a ovos infectados é a única fonte
responsável pelo acúmulo de vermes adultos
no intestino do hospedeiro, auxiliando a
compor um panorama epidemiológico para
aquele paciente.
A pesquisa laboratorial é feita pela pesquisa
de ovos nas fezes. Como as fêmeas
eliminam constantemente milhares de ovos
por dia, não há necessidade de metodologia
de coleta em dias alternados ou de
enriquecimento amostral, bastando a técnica
de sedimentação espontânea para a análise.
O Método de Kato-Katz é bastante eficiente
e recomendado pela Organização Mundial
de Saúde para inquéritos epidemiológicos,
permitindo a quantificação dos ovos e a
determinação do grau de parasitismo,
possibilitando maior rigor na verificação das
medidas de tratamento.
Deve-se ressaltar que em infecções onde há
a presença exclusiva de fêmeas adultas, a
totalidade dos ovos será infértil, enquanto
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que em acometimentos decorrentes do pelas maiores dimensões das fêmeas, como,
parasitismo por machos o resultado dos principalmente, pela morfologia da
exames será constantemente negativo. extremidade posterior.

Os machos medem de 8 a 11 mm de
comprimento, com 40 µm de diâmetro. Sua
extremidade posterior apresenta uma bolsa
copuladora e gubernáculo bem
desenvolvidos. As fêmeas, por sua vez, têm
10 a 18 mm de comprimento por 600 µm de
largura, com abertura genital no terço
posterior do corpo e extremidade posterior
mais fina, com um pequeno processo
espiniforme em sua região terminal. O ânus
ANCILOSTOMOSE: localiza-se antes do final da cauda.

ETIOLOGIA: Os adultos da espécie Necator amercanus

são semelhantes aos A. duodenale, diferindo
Dois principais gêneros de ancilostomídeos,
pelo formato semilunar e disposição dorsal
exemplos de nematódeos, infectam os seres
dos dentes e pela presença de um dentículo
humanos. O Necator americanus, único
longo no fundo da cavidade bucal. O
representante do seu gênero, é também um
tamanho geral dos parasitas dessa espécie
importante ancilostomídeo antropofílico, e é
é inferior aos do tipo supracitado, com
a causa mais comum da ancilostomíase
machos medindo entre 5 a 9 mm de
clássica (conhecida no Brasil como
comprimento e fêmeas, entre 9 a 11 mm.
amarelão). Os ancilostomídeos do gênero
Não há a presença de gubernáculo nos
Ancylostoma incluem o principal
parasitas masculinos, e as fêmeas possuem
ancilostomídeo antropofílico, o Ancylostoma
vulva no terço anterior do corpo, com
duodenale, e outras espécies zoonóticas
extremidade posterior desprovida de
menos comuns A zoonose humana pelo
processo espinhoso.
ancilostomídeo do cão, A. caninum, está
associada a uma síndrome de enterite
eosinofílica. O estágio larval de A.
braziliense, cujos hospedeiros definitivos
incluem cães e gatos, é a principal causa da
larva migrans cutânea.

O Ancylostoma duodenale apresenta

machos e fêmeas cilíndricos, com
extremidade anterior curvada dorsalmente.
A cápsula bucal é profunda, com dois pares
de dentes ventrais na margem interna da
boca, e um par de lancetas ou dentes
triangulares subventrais ao fundo dessa
região. Em ambos os sexos, a cor é rosada,
quando a fresco, e esbranquiçada, após
fixação por soluções de conservação. O
dimorfismo sexual é bem acentuado, tanto
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Os ovos dos ancilostomídeos depositados
pelas fêmeas, no intestino delgado do
hospedeiro, são eliminados para o meio
exterior através das fezes. No meio exterior,
os ovos necessitam de um ambiente
propício, com boa oxigenação, alta umidade
e temperatura elevada, condições
indispensáveis para que se processe a
embrionia, formação da larva de primeiro
estádio (L1), do tipo rabditoide, e sua
eclosão.
No ambiente, a L1 recém-eclodida,
apresenta movimentos serpentiformes e se
alimenta de matéria orgânica e depois de 15 dias da infecção primária,
microrganismos, devendo, em seguida,
perder a cutícula externa, após ganhar uma
nova, transformando-se em larva de
segundo estádio (L2), que é também do tipo
rabditoide. Subsequentemente, a L2, que
também tem movimentos serpentiformes e
se alimenta de detritos orgânicos, começa a
produzir uma nova cutícula, internamente,
que passa a ser coberta pela cutícula velha,
transformando-se em larva de terceiro
estádio.
O contágio parasitário se dá tanto por meio
da penetração de larvas L3 (filarioides) pela
pele quanto pela infiltração dessas na
mucosa da região oral. Vale a pena ressaltar
que a autoinfecção endógena não ocorre por
Ancylostomidae. Em contato com a pele
humana, seja dos pés ou de outras áreas
cutâneas, as larvas penetram utilizando as
lancetas do vestíbulo bucal e suas secreções
contendo enzimas dos tipos
mucopolissacaridase e protease, processo
que dura em média 30 minutos. A bainha
larval é abandonada na superfície da pele.
Tendo alcançado a circulação linfática ou
sanguínea, os parasitas serão levados ao
coração e aos pulmões, três a cinco dias
após a penetração inicial. Ocorre então a
passagem ativa dos capilares pulmonares
para os alvéolos.
Nos pulmões, durante dois a sete dias,
ocorre a terceira muda, que resulta na
formação de larvas L4, dotadas de cápsula
bucal provisória. Essas formas serão
arrastadas pelas secreções da árvore
respiratória e pelos batimentos ciliares desse
epitélio, ascendendo para a laringe e a
faringe do hospedeiro, completando-se o
ciclo de Loss.
O hospedeiro, sentindo a presença de muco
nas vias aéreas, fará a deglutição dos
parasitas, dando acesso ao intestino. Nesse
pondo, as larvas farão sua quarta muda
transformando-se em L5, dotadas de cápsula
bucal definitiva. Crescendo e amadurecendo
sexualmente, passam a constituir,
finalmente, os helmintos adultos, machos e
fêmeas.
Quando a infecção se der por via oral, as
larvas perderão sua cutícula em meio ao pH
ácido do estômago depois de dois a três dias
da infecção, migrando para o intestino
delgado, onde penetram pela mucosa rumo
às células de Lieberkuhn, onde sofrem
transformação para o estágio L4, após cinco
dias da infecção. Em seguida, as larvas
voltam a luz do intestino, se fixam a mucosa
e iniciam o repasto sanguíneo, devendo
depois mudar para L5 no transcurso de 15
dias da infecção, processo seguido pela
maturação terminal em vermes adultos.
O período de pré-patência, isto é, desde o
momento da penetração das L3 até a
eliminação dos ovos dos ancilostomídeos
pelas fezes, varia entre 35 e 60 dias para A.
duodenale e 42 a 60 dias para N.
americanus.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
FISIOPATOLOGIA E QUADRO CLÍNICO:
A ancilostomose é determinada por etiologia
primária ou secundária, sendo a primeira
relacionada com a migração das larvas e a
implantação dos parasitos adultos no
intestino delgado do hospedeiro, e a
segunda, decorrente da permanência
parasitária na região intestinal, que induz
vários fenômenos bioquímicas e nutricional.
hematológicos associados ao curso crônico
da doença.
Tão logo penetrem na pele do hospedeiro, as
larvas podem provocar, no local de
penetração, lesões traumáticas, seguidas
por fenômenos vasculares. Transcorridos
alguns minutos, surgem os primeiros sinais e
sintomas, representados por uma sensação
de picada associada a hiperemia, prurido e
edema resultante do processo inflamatório,
intensificado pela produção de metabólitos
larvais. Os acometimentos apresentam
intensidade variável conforme o número de
parasitas que invadiram a pele, sendo mais
intensas em casos de reinfecção (reações de
hipersensibilidade imediata), com formação
de pápulas, vesículas e edema, com
adenopatia regional. As dermatites por larvas
de ancilostomídeos, quando não apresentam
maiores complicações, tendem a cessar
após dez dias de instaladas.
Alterações pulmonares, resultantes da
passagem das larvas, são pouco usuais,
embora possa ocorrer tosse de longa ou
curta duração e febrícula.
É o parasitismo intestinal que bem
caracteriza a ancilostomose, com sinais e
sintomas abdominais presentes logo após a
chegada das larvas ao intestino delgado. A
anemia causada pelo intenso
hematofagismo (0,05 a 0,3 ml/sangue/dia)
exercido pelos vermes adultos é o principal
sinal dessa verminose.
Duas formas de acometimento podem ser
evidenciadas, a saber:
 Fase aguda (migração larval até a
instalação dos vermes adultos no
intestino delgado), com sintomas já
descritos;
 Fase crônica (fase de anemia): é
determinada pela presença do verme
adulto no intestino, iniciando o processo
de espoliação sanguínea e depleção
Apresenta sintomas
primários, decorrentes da ação
parasitária direta, e secundários,
decorrentes da anemia e da
hipoproteinemia, sendo os últimos mais
frequentes, revertidos com a melhora na
dieta do paciente, independente da
presença do Ancylostoma.
A ancilostomose crônica, causando anemia
por deficiência de ferro, é mais permanente
em indivíduos submetidos a reinfecção, mas
na-primoinfecção o quadro pode persistir por
muitos anos. Os ancilostomídeos A.
duodenale e N. americanus têm uma
longevidade média de cinco anos. Com a
instalação e persistência da anemia
(microcítica e hipocrômica), da leucocitose,
da eosinofilia e da baixa taxa de
hemoglobina, várias mudanças fisiológicas e
bioquímicas agravam o estado orgânico do
hospedeiro. Além disso, as reservas
nutricionais de ferro biodisponível
encontram-se exauridas, dificultando a
reposição das hemácias consumidas pelo
parasito. Embora a hipoalbulinemia ocorra,
sua presença parece estar relacionada à
diminuição da capacidade de síntese de
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
albumina pelo fígado, à perda de plasma no
local da inflamação (onde se fixam os
vermes) e à desnutrição. Nesse sentido,
observa-se com caráter frequente a
diminuição do apetite e a perversão deste,
evidenciada pelo quadro de pica (ex.: ingesta
de terra).
Os ancilostomídeos se fixam a mucosa do
duodeno, podendo ocorrer no jejuno e, nas
infecções maciças, atingir a porção anterior
do íleo. Inicialmente, provocam lesões
mecânicas no local de implantação da
cápsula bucal e suas adjacências. O exame
histológico dessa área revela processo
inflamatório, com predominância de
eosinófilos íntegros e degranulados, além de
neutrófilos e macrófagos; congestão, edema
e minúsculas áreas de hemorragia no cório.
Nas áreas lesadas, e particularmente nos
tecidos contidos na cápsula bucal dos
parasitos, ocorrem fragmentos de células
mucíparas absortivas e inflamatórias, bem
como fibrilas colágenas desintegradas e
destruição de vasos.
Em casos fatais por A. duodenale, os
exames post-mortem revelaram jejunite e
jejuno-ileíte, com ulcerações, graves
hemorragias, supuração, necrose, gangrena
e peritonite fibrino-purulenta.
DIAGNÓSTICO:
Os ovos dos ancilostomídeos são típicos e
costumam ser abundantes na matéria fecal
dos pacientes, o que faz om que o exame
parasitológico, feito com um simples
esfregaço em lamina de microscopia,
preparado com fezes e solução fisiológica,
seja suficiente para a detecção da
parasitose. Os exames qualitativos que
indicam ou não presença de ovos de
ancilostomídeos, são feitos pelos métodos
de sedimentação espontânea, de
sedimentação por centrifugação, e de
flutuação. Para se avaliar o grau de infecção
do paciente, usa-se o método quantitativo de
Stoll, cujo resultado expressa o número de
ovos dos parasitos por grama de fezes.
A intradermorreação, que induz
hipersensibilidade imediata, tem área de
reação é diretamente proporcional ao nível
de infecção do paciente, podendo ser útil no
monitoramento de regiões endêmicas. Esse
método, no entanto, não é eficaz na rotina
clínica, uma vez que pode geral falso-
positivos em indivíduos tratados.
ENTEROBIOSE:
ETIOLOGIA:
A enterobíase, também conhecida como
oxiurose, é a verminose intestinal devida ao
Enterobius vermicularis, pequeno nematoide
da ordem Oxyuroidea, mais conhecido
popularmente como oxiúro. A infecção
costuma ser benigna, mas incômoda, pelo
intenso prurido anal que produz e por suas
complicações, sobretudo em crianças.
Os infantes são frequentemente acometidos
por essa parasitose devido à noção reduzida
de higiene, o que favorece não só a
disseminação do nematódeo como também
a autoinfecção.
O E. vermicularis apresenta nítido
dimorfismo sexual, entretanto, alguns
caracteres são comuns aos dois sexos,
como a cor branca e a aparência filiforme. Na
extremidade anterior, adjacentes à boca,
notam-se expansões vesiculosas muito
típicas, chamadas "asas cefálicas". A boca é
pequena, seguida de um esôfago também
típico, claviforme, terminando em um bulbo
cardíaco. Os caracteres específicos de cada
forma são os que se seguem:
 Macho: mede 5 mm de comprimento por
0,2 mm de diâmetro, apresentando cauda
marcadamente curada em direção
ventral, com presença de um espículo, e
um único testículo;
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 Fêmea: mede cerca de 1 cm de
comprimento por 0,4 mm de diâmetro,
apresentando uma cauda pontiaguda e
longa. A vulva abre-se na porção média
anterior, seguida por uma curta vagina
que se comunica com dois úteros, com
cada ramo uterino se comunicando com
o oviduto e o ovário;
 Ovo: mede 50 µm de comprimento por 20
µm de largura, assemelhando-se
grosseiramente a um D. Possui
membrana dupla, lisa e transparente,
com presença de larva em seu interior
desde a oviposição.
migrando para o ceco, onde
transformam-se em vermes adultos;
 Retroinfecção: ocorre após a eclosão
externa das larvas, que penetram o corpo
pelo ânus e percorrem o intestino grosso
em direção ao ceco, onde se tornarão
parasitas adultos.
O ciclo biológico desse parasita é
monoxênico. Depois da cópula, os machos
são eliminados junto às fezes e morrem,
enquanto as fêmeas, repletas de ovos,
desprendem-se da mucosa do ceco e
dirigem-se ao ânus, principalmente durante a
noite. A liberação dos ovos seria realizada
por meio do rompimento da fêmea,
decorrente de traumatismos ou
dissecamento.

Os ovos, já embrionados, tornam-se

infectantes em poucas horas e são ingeridos
novamente pelo hospedeiro. No intestino
delgado, as larvas rabditoides eclodem e
sofrem duas mudas no trajeto intestinal até o
ceco. Nesse ponto, transformam-se em
vermes adultos. Um a dois meses depois as
fêmeas são encontradas na região perianal.
Não havendo reinfecção, o parasitismo
extingue-se nesse momento.

A transmissão desse parasito pode ocorrer

por diversos métodos, como:

 Heteroinfecção: ovos presentes na poeira

ou em alimentos atingem um novo
hospedeiro, sendo conhecida como
primoinfecção;
 Infecção indireta: ovos presentes na
poeira ou em alimentos contaminam o
mesmo paciente que os eliminou;
 Autoinfecção externa/direta: a criança
(principalmente) leva os ovos da região FISIOPATOLOGIA E QUADRO CLÍNICO:
perianal à boca, sendo o principal
A ação patogênica do Enterobius no intestino
mecanismo responsável pela cronicidade
é principalmente de natureza mecânica e
dessa infecção;
irritativa, decorrente de pequenas erosões da
 Autoinfecção interna: é um processo raro
mucosa nos pontos em que se fixam com
no qual as larvas eclodem ainda no reto,
seus lábios, ou ao determinarem uma
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
inflamação catarral, se o número de
parasitas for suficientemente grande.
De cada vinte crianças parasitadas apenas
uma apresenta sintomas atribuíveis aos
enteróbios, pois o parasitismo leve é
geralmente assintomático. A descoberta de
que um indivíduo alberga o parasita
geralmente só ocorre quando ele sente um
ligeiro prurido anal, resultante da presença
parasitária na pele da região. Ao exame
físico, a margem do ânus apresenta-se
avermelhada, congestionada e repleta de
muco, que pode ou não conter sangue.
Manifestações em forma de crises de
urticária também não são incomuns, levando
ao surgimento de perturbações do sono,
irritabilidade, nervosismo e insônia. No
âmbito genital, essa irritação pode conduzir
a exagerado erotismo e masturbação
decorrentes do prurido vulvar. O paciente, na
tentativa de aliviar o desconforto, pode
acabar lesionando a região perianal, criando
uma porta de entrada para patógenos
bacterianos.
Nos casos de parasitismo intenso, instala-se
uma colite crônica, com produção de fezes
moles ou diarreicas, inapetência e
emagrecimento.
DIAGNÓSTICO:
A presença de prurido anal contínuo ou a
observação das larvas em toalhas ou roupas
de cama pode fomentar uma suspeita de
infecção por Enterobius vermicularis, porém
a confirmação dessa hipótese depende do
exame laboratorial, que não faz uso de
amostras de fezes (não há a presença
expressiva de fêmeas, ovos ou larvas no
material), mas sim da técnica da fita adesiva,
também conhecida como Método de
Graham.
Essa forma de análise laboratorial envolve a
colocação repetida de uma fita autocolante
na região perianal, com o objetivo de
recolher ovos ou formas larvais, sendo o
material resultante analisado ao microscópio
como uma lamínula. A coleta da amostra
deve ser feita ao amanhecer, previamente ao
banho e repetida em dias sucessivos, em
caso de resultado preliminar negativo.
TENÍASE:
ETIOLOGIA:
Os vermes adultos da tênia do boi (Taenia
saginata) e da tênia do porco (Taenia solium)
são parasitas achatados, em forma de fita, e
de grande porte, nomeados em função de
seus hospedeiros intermediários, sendo
encontrados em sua forma adulta
encontrados apenas no intestino humano. O
corpo do verme maduro é uma série de
centenas ou milhares de segmentos planos
(proglótides) conectados, e o segmento mais
anterior (escólex) ancora o parasita à parede
intestinal. Novos segmentos surgem na
extremidade caudal do escólex, seguidos por
segmentos progressivamente mais maduros.
Os segmentos terminais grávidos são
repletos com milhares de ovos, que junto aos
próprios proglótides intactos, são eliminados
com as fezes.
Tanto a T. solium como a T. saginata, na fase
reprodutiva, vivem no intestino delgado
humano, mas, durante a fase de cisticerco, a
estrutura da primeira é encontrada no tecido
subcutâneo, muscular, cardíaco, cerebral e
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
no olho de suínos e acidentalmente em
humanos e cães. O cisticerco da Taenia
saginata, por sua vez, é encontrado nos
tecidos dos bovinos.
A principal diferença entre as duas tênias é
que o estágio intermediário da tênia do porco
(cisticerco) também é capaz de infectar os
seres humanos e causar morbidade
significativa, denominada cisticercose.
Morfologicamente, a T. solium mede de 1,5 a
4m de comprimento, ao passo que a T.
saginata atinge ente 4 e 12m, justificando a
denominação popular de “solitária”. A cor é
geralmente branca, de aspecto leitoso,
outras vezes levemente amarelada ou
rosada devido a substancias absorvidas pelo
verme no intestino. A superfície é lisa,
brilhante, eventualmente enrugada pelas
contrações musculares, com linhas
transversais marcando os limites entre as
proglotes.
Seu corpo é dividido em:
 Escólex:
É uma pequena dilatação da porção anterior
do parasita, atuando como um órgão de
fixação do cestódeo à mucosa do intestino
delgado.
Apresenta quatro ventosas formadas de
tecido muscular, arredondadas e
proeminentes. A T. solium possui o escólex
globuloso com um rostro situado em posição
central, entre as ventosas, armado com
dupla fileira de acúleos em formato de foice.
A T. saginata, por sua vez, não expressa
nenhuma dessas características.
 Colo:
É a porção mais delgada do corpo desse
parasita, com intensa capacidade
multiplicativa, compondo a zona de
crescimento e formação das proglotes.
 Corpo (estróbilo):
Representa o restante do corpo da tênia,
iniciado logo após o colo. As proglotes jovens
localizam-se mais superiormente, sendo
mais largas do que longas, não
apresentando órgãos genitais,
desenvolvidos na porção medial do parasita
(em cada proglotes há um órgão copulador,
ou cirro, e uma vulva). A cerca de um metro
do escólex já é possível ver as
segmentações maduras, com comprimento e
largura semelhantes, e desenvolvimento
sexual completo.
Apesar do hermafroditismo, o
desenvolvimento dos órgãos genitais
masculinos é mais rápido que o dos
femininos, havendo, pois, protandria. De
cada testículo, parte um canal eferente que
converge com os demais para formar um
deferente único e bastante tortuoso. Este
transforma-se depois em um órgão
copulador, o cirro, envolvido pela bolsa do
cirro.
Os órgãos femininos, por sua vez,
compreendem um ovário bilobulado, situado
próximo à margem distal da proglotes, uma
glândula vitelina ramificada, e um tubo
uterino mediano. Do ovário parte um oviduto
que se continua com o útero. Em seu trajeto,
o oviduto recebe o canal da glândula vitelina
e o canal seminal, continuação da vagina.
Esta abre-se no poro genital, junto à bolsa do
cirro.
Na medida em que as proglotes vão se
afastando do escólex e passando a proglotes
gravidas (comprimento maior que largura),
verifica-se que os testículos, em primeiro
lugar, e depois os ovários, sofrem um
processo regressivo, ao mesmo tempo que o
útero se hipertrofia, ramifica-se cada vez
mais e enche-se de ovos.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Em relação aos ovos, estes são esféricos e
morfologicamente indistinguíveis,
constituídos por uma casca protetora, o
embrióforo, que é formado por blocos
piramidais de quitina unidos entre si por uma
substância proteica cementante que lhe
confere resistência no ambiente.
Internamente, encontra-se o embrião
hexacanto ou oncosfera, provido de três
pares de acúleos e dupla membrana.
O cisticerco da T. solium é formado por uma
vesícula translúcida com líquido claro,
contendo em seu interior ou escólex com
quatro ventosas, rostro e colo),
características também presentes para a
Taenia saginata, com exceção da presença
do rostro. A parede da vesícula dos
cisticercos é composta por três membranas:
cuticular ou externa, uma celular ou
intermediária e uma reticular ou interna.
Estas larvas podem atingir até 12 mm de
comprimento, após quatro meses de
infecção.
Os humanos parasitados eliminam as
proglotes grávidas cheias de ovos para o
exterior. Em alguns casos, durante a apólise
(desprendimento das proglotes) pode
ocorrer formação de hérnia entre os
segmentos devido à não-cicatrização nas
superfícies de ruptura entre os mesmos, o
que facilita a expulsão dos ovos para a luz
intestinal e a eliminação com as fezes. De
forma mais frequente, essas estruturas se
rompem no meio externo por efeito da
contração muscular ou decomposição de
suas estruturas, liberando milhares de ovos
no solo. No ambiente úmido e protegido de
luz solar intensa os ovos têm grande
longevidade mantendo-se infectantes por
meses.
Um hospedeiro intermediário próprio (suíno
para T. solium e bovino para T saginata)
ingere os ovos, e os embrióforos (casca de
ovo) no estômago sofrem a ação da pepsina,
que atua sobre a substância cementante dos
blocos de quitina. No intestino, as oncosferas
sofrem a ação dos sais biliares, que são de
grande importância na sua ativação e
liberação. Uma vez ativadas, as oncosferas
liberam-se do embrióforo e movimentam-se
no sentido das vilosidades, penetrando-as
com o auxílio dos acúleos. Essas formas
parasitárias permanecem nesse local por
cerca de quatro dias, período de adaptação
às condições fisiológicas do novo
hospedeiro, seguindo o processo de invasão
por meio da entrada na circulação venosa e
linfática mesentérica, de onde será
transportada a todos os tecidos do
organismo até atingir o local de implantação,
determinado pelo bloqueio capilar.
Posteriormente, atravessam a parede do
vaso, instalando-se nos tecidos
circunvizinhos.
As oncosferas desenvolvem-se para
cisticercos em qualquer tecido mole (pele,
músculos esqueléticos e cardíacos, olhos,
cérebro), mas preferem os músculos de
maior movimentação e com maior
oxigenação (masseter, língua, coração e
cérebro).
No interior dos tecidos, perdem os acúleos
(mesmo na Taenia solium) e cada oncosfera
transforma-se em um pequeno cisticerco
delgado e translúcido, que começa a crescer,
atingindo ao final de quatro ou cinco meses
de infecção 12 mm de comprimento,
mantendo-se viáveis por meses.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A infecção humana ocorre pela ingestão de
carne crua ou malcozida de porco ou de boi
infectado. O cisticerco ingerido sofre a ação
do suco gástrico, evagina-se e fixa-se,
através do escólex, na mucosa do intestino
delgado, transformando-se em uma tênia
adulta, que pode atingir até oito metros em
alguns meses, com início da emissão de
proglotes grávidas após três meses da
infecção.
A Taenia solium tem uma longevidade de
três anos no intestino humano, enquanto a
Taenia saginata sobrevive por até dez anos.
Durante o parasitismo, várias proglotes
grávidas se desprendem diariamente do
estróbilo, três a seis de cada vez em Taenia
solium e oito a nove (individualmente) na
Taenia saginata. O colo, produzindo novas
proglotes, mantém o parasito em
crescimento constante.
PATOGÊNESE E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
Apesar da sólida fixação das tênias à
mucosa intestinal, os estudos
anatomopatológicos não revelam produção
de lesões a esse nível. A teníase é
frequentemente assintomática, tomando-se
o indivíduo consciente do parasitismo
apenas depois de ter constatado a expulsão
de proglotes. Só depois de saber-se
parasitado é que muitos desses pacientes
começam a manifestar alguma
sintomatologia, o que revela um componente
psicológico importante no quadro clínico
apresentado por tais doentes.
A presença de T. saginata causa mais
alterações da motricidade e da secreção
digestiva do que alterações diretas à
mucosa, sendo observado em cerca de 70%
dos casos uma redução da secreção
gástrica. Nos casos mais típicos, após um
período de incubação de dois ou três meses,
surgem perturbações gastrintestinais,
principalmente dor epigástrica com caráter
de "dor de fome". Essa dor simula, por vezes,
a da úlcera duodenal, surgindo com o
estômago vazio, e passando com a ingestão
de alimentos. Outra manifestação frequente
é a perda de peso. Nas crianças, o
emagrecimento pode vir com inapetência,
mas pode haver apetite muito aumentado,
com dores abdominais fugazes.
O acelerado crescimento do parasito requer
um considerável suplemento nutricional, que
leva a uma competição com hospedeiro,
provocando consequências maléficas para o
mesmo. Tonturas, astenia, apetite
excessivo, náuseas, vômitos, alargamento
do abdômen, são alguns dos sintomas
observados em decorrência da infecção.
Obstrução intestinal provocada pelo
estróbilo, ou ainda a penetração de uma
proglote no apêndice, apesar de raras, já
foram relatadas.
A infecção por Taenia solium, por sua vez,
produz no homem uma forma muito menos
evidente, pois o verme é menor e suas
proglotes, menos ativas, passando
despercebidas na massa fecal. Com ela nao
ocorrem complicações devidas aos vermes
adultos.
O quadro clínico, quando presente, é
semelhante ao produzido pela tênia do boi,
ainda que as formas assintomáticas e
benignas sejam mais frequentes. A
gravidade desta tênia decorre do fato de que
o homem representa, além do hospedeiro
para o verme adulto, um hospedeiro
intermediário para as larvas, processo do
qual resulta a cisticercose.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIAGNÓSTICO:
O diagnóstico da teníase, por contar com
sintomas inespecíficos do trato digestório e
nem sempre ser facilitado pelo relato de
evacuação de proglotes, deve ser
confirmado laboratorialmente por meio de
exames.
Na análise parasitológica é feita a busca de
proglotes e, mais raramente, de ovos da
tênia presentes numa amostra de fezes,
fazendo uso da tamisação, que consiste na
diluição da amostra, posteriormente passada
numa peneira de malha fina, coletando os
segmentos.
Para o diagnóstico de espécie, essas
proglote gravidas serão comprimidas
fortemente entre duas laminas grossas de
vidro e o conjunto submerso em ácido
acético, para clarear. Depois de dissolvidas
as concreções calcarias do parênquima, a
forma do útero e de seus ramos tornam-se
aparentes e permitem a distinção das
estruturas uterinas:
 Ramificações dicotômicas e muito
numerosas (15 a 30 em cada lado das
hastes): Taenia saginata;
 Ramificações pouco numerosas e de
aspecto dendrítico (7 a 16 por haste):
Taenia solium.
A detecção de antígenos de ovos de Taenia
sp. nas fezes resultou em melhora profunda
no diagnóstico de teníase. Os antígenos
podem ser detectados na ausência de ovos
na matéria fecal, independem do seu
número, e, após o tratamento eficaz,
desaparecem em poucos dias. Os
coproantígenos (CoAg) são testes com base
em ELISA de captura com antissoro
policlonal formado tanto contra a larva como
contra os produtos excretados e secretados
por ela, sendo considerado um método
simples e sensível.
TRATAMENTO E PROFILAXIA PARA AS
ENTEROPARASITOSES:
Segundo a taxonomia, os parasitas dividem-
se em dois grupos principais, os
protozoários, unicelulares, e os helmintos,
que são pluricelulares. Os fármacos
empregados para o tratamento de
acometimentos são diferentes para cada
grupo, não havendo eficácia cruzada entre
eles.
AGENTES ANTIPARASITÁRIOS:
METRONIDAZOL:
É prescrito para o tratamento de giardíase e
amebíase. Esse fármaco mantém-se inativo
até ser reduzido pelas células microbianas,
que apresentam elevado potencial redox
negativo. O Metronidazol, quando ativado,
forma compostos citotóxicos que se ligam a
proteínas, membranas celulares e ao próprio
DNA, causando lesões graves.
A sensibilidade a esse medicamento está
relacionada à presença da enzima piruvato
ferridoxina-oxirredutase (PFOR – favorece a
conversão de piruvato a Acetil-CoA em
organismos anaeróbios), geralmente
indetectável em eubactérias e em células
eucariotas, mas que pode estar presente em
casos de tecidos pouco oxigenados, como
abcessos. Como PFOR é expressa em
protozoários, porém não tem nenhum
equivalente no sistema de mamíferos, o
fármaco normalmente é seletivamente tóxico
para amebas e microrganismos anaeróbios.
Mostra-se ativo contra trofozoítos da E.
histolytica nos tecidos, porém exibe muito
menos atividade contra amebas
intraluminais, o que ocorre, em grande parte,
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
dada a extensa absorção do fármaco no trato
gastrintestinal superior, resultando em baixa
concentração na luz do cólon, onde vivem as
amebas. Assim, indivíduos com amebíase
invasiva geralmente são tratados em
primeiro lugar com Metronidazol, para
erradicar trofozoítos que invadem
ativamente os tecidos do hospedeiro, e, a
seguir, com um segundo fármaco
apresentando maior atividade intraluminal,
como iodoquinol ou paromomicina, cujos
mecanismos de ação são desconhecidos,
mas são pouco absorvidos pela mucosa
intestinal.
A dose recomendada desse medicamento é
de 7,5 mg/kg de 8 em 8 horas, por cinco dias,
apresentando taxa de cura de 98% após 21
dias do início do tratamento. Os efeitos
adversos do Metronidazol consistem em
desconforto gastrintestinal, cefaleias,
neuropatia ocasional, gosto metálico e
náuseas, o que faz com que não seja bem
aceito pelas crianças.
TINIDAZOL:
O Tinidazol, fármaco de segunda geração
relacionado ao metronidazol, também se
mostra eficaz contra diversos protozoários,
sendo recomendado para o tratamento de
giardíase, amebíase e tricomoníase vaginal.
Seu mecanismo de ação não está bem
esclarecido, porém se acredita que seja
semelhante ao de metronidazol e
relacionado com a geração de radicais livres
citotóxicos.
Alguns dos benefícios particulares do
tinidazol são ter duração de ciclo terapêutico
mais curta que a de metronidazol e ser
melhor tolerado pelo paciente (seus efeitos
adversos são raros e brandos, consistindo
em desconforto gastrintestinal e
desenvolvimento ocasional de gosto
metálico na boca). Esse fármaco não é eficaz
como agente lumicida no tratamento da
amebíase, e também não deve ser prescrito
durante o primeiro trimestre de gestação, o
aleitamento, e antes dos três anos de idade.
A dose pediátrica recomendada para esse
medicamento é de 50 mg/kg (no máximo 2 g)
em dose única para giardíase, 50 mg/kg/dia
(com máximo de 2 g) por 30 dias para
amebíase intestinal e extra-intestinal.
NITAZOXANIDA:
Esse fármaco também é estruturalmente
relacionado ao metronidazol, apresentando
um amplo espectro de ação, incluindo
atividade contra protozoários, bactérias
anaeróbias e helmintos.
Como análogo estrutural de pirofosfato de
tiamina, nitazoxanida inibe a PFOR e,
consequentemente, os processos
metabólicos dela decorrentes. Seu
mecanismo de ação contra helmintos não
está bem esclarecido. Após administração
oral, a nitazoxanida é rapidamente
hidrolisada ao metabólito ativo, tizoxanida,
que é excretado pela urina, bile e fezes.
A sua tolerância é satisfatória, com
ocorrência de efeitos adversos leves e
transitórios (dor abdominal e diarreia), não
causando interrupção do tratamento. A dose
indicada para crianças de 1 a 3 anos é de
100 mg de 12 em 12 horas durante três dias,
enquanto que crianças de 4 a 11 anos têm
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prescrição de 200 mg de 12 em 12 horas
durante três dias.
AGENTES ANTIHELMÍNTICOS:
AGENTES QUE INTERROMPEM A ATIVIDADE
NEUROMUSCULAR:
IVERMECTINA:
A ivermectina atua contra uma ampla gama
de helmintos e artrópodes, apresentando
mecanismo de ação baseado na
potencialização ou ativação direta dos canais
de cloreto regulados por glutamato nas
membranas plasmáticas de nematódeos.
Essa ação resulta na hiperpolarização de
células neuromusculares e paralisia da
faringe do parasita.
Acredita-se também que ivermectina afete a
transmissão inibitória do ácido
gamaaminobutírico (GABA), potencializando
sua liberação em terminações pré-
sinápticas, ativando diretamente seus
receptores e potencializando sua ligação ao.
Todos esses efeitos aumentam
transmissão de sinais mediada por GABA em
nervos periféricos, resultando em
hiperpolarização. O efeito final é variável,
dependendo do nematódeo em estudo,
porém o resultado final consiste em bloqueio
da transmissão neuromuscular e paralisia do
verme.
A ivermectina não interage com receptores
de GABA em vertebrados, apresentando
afinidade 100 vezes maior pelos receptores
de invertebrados. Cestódeos e trematódeos
carecem de receptores de ivermectina com
alta afinidade, o que pode explicar a
resistência desses organismos ao fármaco.
Em seres humanos, receptores de GABA
são encontrados principalmente no SNC,
mas como a ivermectina não atravessa a
barreira hematoencefálica, o fármaco é, em
geral, bem tolerado. Quando essa barreira se
torna permeável, como em pacientes com
meningite, esse fármaco pode ser mais
tóxico, o que resulta em cefaleias, ataxia e
coma.
Efeitos adversos decorrentes da ivermectina
são usualmente atribuídos a respostas
inflamatórias e incluem cefaleias, tontura,
fraqueza, exantema, prurido, edema, dor
abdominal, hipotensão e febre, porém são
leves e transitórios, não afetando a adesão
ao tratamento. A dose pediátrica
recomendada é de 200µm/kg, uma vez ao
dia por dois dias, tanto para o tratamento da
ascaridíase, quanto para enterobíase,
estrongiloidíase e tricuríase.
PAMOATO DE PIRANTEL:
Esse fármaco é empregado no tratamento de
infecções pelo Enterobius vermicularis,
Ascaris lumbricoides e por ancilóstomos,
tendo como principais efeitos colaterais
distúrbios gastrintestinais, sonolência,
cefaleia e tontura, motivo pelo qual foi
substituído por outros compostos mais bem
a tolerados e mais efetivos
O pamoato de pirantel promove a liberação
constante da acetilcolina, causando a
ativação persistente dos receptores
nicotínicos parasitários, promovendo
paralisia tônica destes.
A dose proposta para o tratamento da
ascaridíase e da enterobíase é de 11 mg/kg
por via oral em dose única (dose máxima de
1 g), enquanto para o manejo da
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ancilostomose, recomenda-se a prescrição
de pamoato de pirantel na mesma dose, com
uma dose diária durante três dias.
PIPERAZINA:
A piperazina pode ser usada para tratar
infestações pelo Ascaris lumbricoides e pelo
Enterobius vermicularis. Essa substância
inibe, de modo reversível, a transmissão
neuromuscular no verme, provavelmente
simulando o GABA nos canais de cloro
controlados no músculo do nematódeo. Os
vermes paralisados são expelidos vivos
pelos movimentos peristálticos intestinais
normais. É administrada em conjunto com
um laxante, a fim de facilitar a expulsão dos
vermes.
A piperazina é administrada oralmente e
somente uma parte é absorvida. É
parcialmente metabolizada, e o restante é
eliminado, de modo inalterado, pelos rins. O
fármaco apresenta pouca ação
farmacológica no hospedeiro.
Quando usada para tratar A. lumbricoides, a
piperazina é efetiva em dose única, mas no
caso do E. vermicularis, faz-se necessário
usá-la por um período maior (7 dias), em
dosagem menor.
Os efeitos adversos podem incluir alterações
gastrointestinais, urticária e broncoespasmo.
Alguns pacientes apresentam tonturas,
parestesias, vertigens e dificuldade de
coordenação.
OUTROS AGENTES ANTI-HELMÍNTICOS:
ALBENDAZOL, MEBENDAZOL E TIABENDAZOL:
Todos esses fármacos inibem a algumas alterações gastrointestinais possam
polimerização da β-tubulina helmíntica,
interferindo, assim, nas funções
dependentes dos microtúbulos, como, por
exemplo, a captura de glicose. Apresentam
ação inibidora seletiva, sendo 250-400 vezes
mais efetivos na produção desse efeito no
tecido helmíntico do que no tecido do
mamífero. No entanto, o efeito leva algum
tempo para se desenvolver, e os vermes
podem não ser expelidos por vários dias. As
taxas de cura costumam situar-se entre 60%
e 100% na maioria dos parasitas.
Apenas 10% do mebendazol são absorvidos
depois da administração oral, porém uma
refeição gordurosa aumenta esse
percentual. É rapidamente metabolizado,
sendo os metabólitos eliminados na urina e
na bile em 24 a 48 horas. Em geral, é
administrado em doses de 100 mg, duas
vezes ao dia, por três dias, no caso de
infestações por ancilóstomo e por
nematelminto, podendo haver a
administração de 500 mg, por via oral, em
dose única para todas as idades.
O tiabendazol é rapidamente absorvido pelo
trato gastrointestinal, metabolizado muito
velozmente e eliminado pela urina na forma
conjugada. Ele pode ser administrado em 25
mg/kg duas vezes ao dia, por três dias, em
infestações por Strongyloides, e por até
cinco dias em infestações pelo ancilóstomo e
pelos nematelmintos.
O albendazol é também mal absorvido, mas,
como acontece com o mebendazol, a
absorção é aumentada pelos alimentos,
especialmente gorduras. É metabolizado
extensivamente pelo metabolismo pré-
sistêmico em metabólitos de sulfóxido e
sulfona, sendo a forma ativa a primeira. Seu
esquema terapêutico é de 400 mg em dose
única.
Os efeitos adversos são poucos com o
albendazol ou com o mebendazol, embora
ocorrer ocasionalmente. Os efeitos adversos
com o tiabendazol são mais frequentes,
porém, em geral, revelam-se transitórios. As
alterações gastrointestinais são as mais
comuns, embora tenham sido relatadas
cefaleia, tonturas e sonolência e possam
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ocorrer algumas reações alérgicas, como
febre e erupções cutâneas.
O mebendazol não deve ser administrado a
mulheres grávidas ou crianças com menos
de 2 anos.
PRAZIQUANTEL
O praziquantel é um fármaco anti-helmíntico
de amplo espectro e muito ativo que foi
introduzido há mais de 20 anos, sendo o
fármaco de escolha para o tratamento da
esquistossomose, também sendo
empregado no manejo da teníase e da
cisticercose.
O fármaco compromete a homeostase do
Ca2+ no parasita, unindo-se aos locais de
ligação reconhecidos da proteína quinase C,
em uma subunidade β dos canais de cálcio
controlados por voltagem, induzindo o influxo
de cálcio com contração muscular rápida e
prolongada da musculatura, resultando em
sua paralisia e eventual morte. O
praziquantel compromete ainda o tegumento
do parasita, disponibilizando novos
antígenos, e, como resultado, pode tornar-se
mais suscetível às respostas imunológicas
normais do hospedeiro.
Administrado oralmente, o praziquantel é
bem absorvido, pois parte significativa do
fármaco é rapidamente transformada em
metabólitos inativos na primeira passagem
pelo fígado, e esses metabólitos são
eliminados na urina.
O praziquantel apresenta efeitos adversos
mínimos em sua dosagem terapêutica. Tais
efeitos, quando ocorrem, costumam ser
transitórios e raramente têm importância
clínica. Incluem alterações gastrointestinais,
tontura, dores musculares e articulares,
erupções cutâneas e febre baixa. Os efeitos
podem ser mais marcantes nos pacientes
com infestação acentuada de vermes e
podem ser causados pelos produtos
liberados pelos vermes mortos. Em crianças,
a dose recomendada para o tratamento da
teníase é de 50-100 mg/kg/dia três vezes ao
dia, por 30 dias.
MEDIDAS PROFILÁTICAS PARA
ENTEROPARASITOSES:
Devido à influência das enteroparasitoses
sobre a saúde infantil e seu crescimento
adequado, medidas profiláticas podem ser
implementadas para reduzir as taxas de
contaminação e evitar as complicações
decorrentes dessas doenças, a saber:
 Implantação de medidas sanitárias
apropriadas (água encanada e rede de
esgoto);
 Prevenção da transmissão fecal-oral por
meio do incentivo à lavagem das mãos,
principalmente nas escolas, com exame
regular de indivíduos que manipulam
alimentos;
 Não fazer consumo de água não tratada;
 Evitar o consumo de verduras cruas;
 Promover a lavagem de frutas, verduras
e hortaliças com água e água sanitária;
 Realizar o tratamento universal dos
indivíduos contaminados;
 Evitar o uso de fezes humanas como
fertilizantes;
 Não consumir carnes cruas ou
malcozidas;
 Não compartilhar roupas de cama ou
banho com pessoas doentes.
FATORES SOCIOECONÔMI COS E CULTURAIS E
SEUS IMPACTOS NA PRE VALÊNCIA DE
ENTEROPARASITOSES IN FANTIS:
A chamada teoria da transição demográfica
postula que os países em geral costumam
apresentar quatro estágios na sua dinâmica
populacional, partindo de padrões
caracterizados por alta mortalidade e alta
fecundidade, para um último estágio com
baixos níveis desses indicadores. Assim, as
sociedades primitivas estariam no primeiro
estágio, apresentando, do ponto de vista
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epidemiológico, as doenças infecto-
parasitárias como principal causa de
morbimortalidade, enquanto as sociedades
modernas vivenciariam o quarto e último
estágio, exibindo as doenças crônicas não
transmissíveis como maiores causadoras de
óbitos. Os países em desenvolvimento,
como o Brasil, estariam enquadrados numa
situação intermediária, denominada
transição epidemiológica, com doenças
infecto-parasitárias em queda progressiva de
importância na geração de doenças, mas
ainda com significativos níveis de
prevalência e dando lugar às doenças
crônicas não transmissíveis.
Nesse sentido, as parasitoses intestinais
ainda constituem um sério problema de
Saúde Pública, apresentando-se de forma
endêmica em diversas áreas do Brasil.
Apresentam maior prevalência em
populações de nível socioeconômico mais
baixo e que vivem em condições precárias
de saneamento básico, resultando em altos
índices de morbidade e mortalidade.
Essas infecções podem desencadear
alterações no estado físico, psicossomático
e social, afetando diretamente a qualidade
de vida de seus portadores, representados
principalmente por crianças de classes
sociais mais baixas, com precárias
condições sanitárias, maus hábitos de
higiene, em situação de desnutrição e em
locais de aglomerações tais como creches,
escolas, asilos e orfanatos, onde há
facilidade de contaminação e disseminação
de parasitoses.
Segundo dados da Organização Mundial de
Saúde (OMS), as doenças infecciosas e
parasitárias continuam a se destacar entre
as principais causas de morte, sendo
responsáveis por 2 a 3 milhões de óbitos por
ano, em todo o mundo. Apesar de alguns
avanços nas últimas décadas, a região
Nordeste do Brasil continua a apresentar
elevados índices de mortalidade causados
por doenças diarreicas, sobretudo entre
crianças menores de cinco anos.
As espécies de parasitas mais prevalentes
na região Nordeste são o Ascaris
lumbricoides, ancilostomídeos e o T.
trichiura. Geo-helmintíases, a exemplo da
ancilostomose, são mais frequentes em
crianças que vivem em casas com lixo em
suas proximidades, cuja mãe tem baixa
escolaridade (inferior a três anos), cuja renda
familiar é igual ou inferior a um salário
mínimo, e que habitam domicílios
desprovidos de água encanada.
Pesquisas produzidas com crianças em
idade escolar na região Nordeste apontam a
prevalência constante de parasitoses,
principalmente causadas por protozoários, e
a associação destas com a desnutrição, uma
vez que a espoliação nutricional promovida
por enteroparasitas é um fator importante
para a carência nutricional infantil.
Nos núcleos familiares afetados pelo
parasitismo é possível observar com
frequência que a realização de necessidades
fisiológicas se dá ao ar livre, que a água para
consumo é retirada de poços manuais sem
tratamento ou fervura, e que os resíduos
domésticos são queimados ou jogados em
terrenos baldios pela ausência de coleta
periódica no bairro onde vivem, fatores estes
que criam um ambiente peridomiciliar
insalubre, favorável ao desenvolvimento de
parasitoses.
Os altos índices de prevalência registrados
para o Ascaris lumbricoides refletem
diretamente a capacidade de proliferação do
agente, que ocorre principalmente pelo
contágio com água e alimentos
contaminados com ovos maduros,
eliminados junto com as fezes dos
hospedeiros. Este contágio, por sua vez é
reflexo da falta de educação sanitária, de
investimento em infraestrutura, em
saneamento básico, além do baixo nível
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socioeconômico e cultural da população, motivação necessária, representando a mais
sendo estes fatores determinantes para comum das deficiências de aprendizagem.
aumentar as dificuldades de controle das
mesmas. Na tentativa de ler em voz alta, a maioria das
crianças e adultos com dislexia mostra uma
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM EM CRIANÇAS: abordagem de esforço para decodificar e
reconhecer palavras simples, uma
O desenvolvimento neurológico funcional é
abordagem em crianças caracterizada por
um processo cerebral básico necessário
hesitações, erros de pronúncia e tentativas
para o aprendizado e a produtividade. Uma
repetidas de pronunciar palavras
variação do desenvolvimento neurológico
desconhecidas. Em contraste com a
refere-se a diferenças no funcionamento
dificuldade que experimentam na
neurológico. Grandes variações nessas
decodificação de palavras simples, as
funções existem dentro dos indivíduos e
pessoas com dislexia tipicamente possuem
entre eles. Essas diferenças podem mudar
vocabulário e sintaxe bem desenvolvidos.
com o tempo e não representam
necessariamente patologias ou Existem diversas teorias sobre a etiologia da
anormalidades. As disfunções do dislexia, incluindo as que implicam déficits no
desenvolvimento neurológico, por sua vez, processamento temporal de estímulos
refletem rupturas da estrutura auditivos e visuais, e aquelas que levantam
neuroanatômica ou da função a hipótese de prejuízos específicos de
psicofisiológica, que podem estar linguagem. A última categoria postula que,
associadas a problemas cognitivos, em nível cognitivo-linguístico, a dislexia
acadêmicos e/ou comportamentais, reflete déficits dentro de um componente
emocionais, sociais e de funcionamento específico do sistema de linguagem, o
adaptativo. módulo fonológico, que está envolvido no
processamento dos sons da fala. De acordo
Distúrbios de aprendizagem são problemas
com esse modelo, as pessoas com dislexia
que afetam a capacidade da criança de
têm dificuldades de desenvolvimento de uma
receber, processar, analisar ou armazenar
consciência de que as palavras, faladas e
informações. Tanto o Manual de
escritas, podem ser segmentadas em
Classificação Internacional de Doenças
pequenas unidades elementares, os
(CID-10), organizado pela Organização
fonemas. As habilidades linguísticas
Mundial de Saúde, quanto o Manual
relacionadas à aprendizagem da leitura
Diagnóstico e Estatístico de Transtorno
envolvem fonologia, e déficits nesse aspecto
Mentais (DSM-IV), organizado pela
da consciência são um forte preditor de
Associação Psiquiátrica Americana em,
dislexia.
consideram a existência dos seguintes
distúrbios: da leitura (dislexia), da escrita PATOGÊNESE E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
(disgrafia e disortografia) e das habilidades
A análise de exames de imagem do cérebro
matemáticas (discalculia).
de disléxicos e de leitores normais sugere
que existem diferenças nas regiões
DISLEXIA:
temporoparieto-occipital esquerdas, que
A dislexia é caracterizada por dificuldade apresentam falha na ativação durante a
inesperada de leitura em pessoas que de leitura, com maior ativação das regiões
outra forma possuem inteligência e frontais, criando um padrão chamado de
assinatura neural da dislexia.
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Esses métodos de observação permitiram
materializar um acometimento até então
desconhecido, evidenciando não somente o
aspecto físico desse distúrbio, como também
os mecanismos de compensação orgânica
para suprir essa dificuldade, mesmo que não
totalmente.
Refletindo a fraqueza fonológica subjacente,
os disléxicos manifestam problemas na
linguagem falada e escrita. Dificuldades da
língua falada são tipicamente manifestadas
por erros de pronúncia, falta de loquacidade,
fala sem fluência com muitas pausas ou
hesitações e grunhidos audíveis,
dificuldades de encontrar palavras com a
necessidade de tempo para convocar uma
resposta oral e a incapacidade de chegar a
uma resposta verbal rápida quando
questionado.
Os sinais cardinais da dislexia observados
em crianças em idade escolar e adultos são
uma abordagem de esforço e trabalho de
decodificação, reconhecimento de palavras
e leitura de texto, com compreensão auditiva
normalmente nem intercorrências. Crianças
mais velhas apresentam melhora na
precisão da leitura ao longo do tempo,
embora sem ganho proporcional em sua
fluência, mantendo-se no patamar de leitores
lentos. Alterações na caligrafia e na
habilidade ortográfica também são
observada em decorrência da inaptidão
fonológica.
A história dos pais frequentemente identifica
dificuldades precoces sutis de linguagem em
crianças disléxicas. Durante os anos do pré-
escolar e do jardim de infância, crianças em
risco apresentam dificuldades em jogos de
rimas e em aprender os nomes de letras e
números. Avaliações do jardim de infância
dessas competências linguísticas podem
ajudar a identificar crianças com risco para
dislexia. Apesar de a criança disléxica gostar
e beneficiar-se de que leiam para ela, ela
pode evitar a leitura em voz alta para os pais
ou ler independentemente.
É possível dividir a dislexia em três tipos, a
saber:
 Dislexia disfonética: tem dificuldade para
ler palavras não-familiares, havendo
inversões, omissões ou agregação de
fonemas na leitura e na escrita (ex.: lata
por alta, mar por marte);
 Dislexia diseidética: a criança tem
dificuldade para realizar a leitura global,
para perceber as palavras inteiras. A
leitura é lenta e feita de forma soletrada,
letra a letra. As falhas na acentuação e as
inversões de letras são os erros mais
evidentes;
 Dislexia mista: caracterizada por
alterações associadas das duas formas
anteriores em diferentes combinações e
intensidades.
DIAGNÓSTICO:
A dislexia é um diagnóstico clínico, e a
história é especialmente crítica para esse
processo. O médico procura determinar,
através da entrevista, observação e
avaliação psicométrica, se existem
dificuldades inesperadas na leitura, com
base na capacidade cognitiva da pessoa,
como mostrado por idade, inteligência ou
nível de educação ou status profissional, e
problemas linguísticos associados ao nível
do processamento fonológico. Não há
pontuação de teste único que seja
patognomônica de dislexia, sendo a
consolidação do diagnóstico o produto de
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uma síntese detalhada de todas as
informações colhidas.
Para triagem informal, além de história
cuidadosa, o médico de atenção primária em
consultório pode ouvir a criança ler em voz
alta a partir de leitura apropriada ao seu nível
escolar, promovendo uma medida sensível
de precisão e fluência para os signos
escritos.
É necessário pontuar, no entanto, que os
testes empregados devem ser condizentes
ao estado de desenvolvimento do indivíduo,
evitando, por exemplo o emprego de testes
de reconhecimento de palavras para leitores
jovens e adultos uma vez que eles não
contemplam o esforço da leitura. Nesse
caso, a melhor alternativa diagnóstica seria o
emprego de testes cronometrados.
ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA DISLÉXICA:
O manejo da dislexia exige uma perspectiva
contínua, que se estende ao longo da vida.
Inicialmente, o foco deve ser a remediação
dos problemas de leitura. Conforme a
criança amadurece e entra no ritmo mais
exigente das séries mais avançadas do
ensino fundamental, a ênfase desloca-se
para o importante papel de fornecer
adaptações, momento no qual se destacam
os programas de intervenção de leitura, que
devem abranger cinco áreas fundamentais: a
consciência fonêmica (manipular os sons
das sílabas na linguagem oral); a fonética
(associação das letras a seus respectivos
sons); a fluência (reconhecimento
automático das palavras, baseado na leitura
oral repetida e guiada); o desenvolvimento
de vocabulário e a compreensão da leitura.
Para aqueles no ensino médio e na
graduação, o fornecimento de adaptações,
em vez de remediação, na maioria das vezes
representa a abordagem mais eficaz para a
dislexia. Estudos de imagem agora fornecem
evidências neurobiológicas para a 
necessidade de tempo extra para alunos
disléxicos e, consequentemente, os
universitários com histórico infantil de
dislexia requerem tempo extra em trabalhos
que envolvem leitura e escrita, além de
exames. Outras adaptações úteis incluem o
uso de computadores com verificadores
ortográficos, uso de audiolivros, o acesso a
anotações de aula, serviços tutoriais, testes
de alternativas de múltipla escolha, e uma
sala separada e tranquila para fazer
avaliações.
DISGRAFIA:
A disgrafia é caracterizada pela dificuldade
na escrita. Ocorre uma falha no
estabelecimento entre o sistema simbólico e
as grafias que o representam. As letras são
invertidas, aglomeradas ou omitidas,
traçadas com lentidão.
O desenvolvimento da grafia depende de
uma lateralidade definida, de uma postura
adequada no ato de escrever, de noções de
posição e orientação espacial e habilidade
manual de preensão, que, quando afetados,
podem dar origem a essa condição,
chamada também como “letra feia”.
A criança disgráfica tem dificuldade para
passar para a escrita o estímulo visual da
palavra, ou seja, não consegue passar para
o plano motor o que captou no plano visual.
No entanto, não apresenta nenhum
comprometimento visual, motor ou
intelectual. A dificuldade na escrita também
fica caracteriza quando não há boa
coordenação visomotora, ou seja, os olhos
não guiam os movimentos motores da mão,
impedindo a criança de perceber por onde
deve iniciar o traçado da letra, tornando a
escrita ilegível.
As dificuldades são variadas entre os
pacientes afetados, mas os acometimentos
mais comuns são:
Dificuldades no controle motor: a área do
cérebro responsável por garantir que as
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letras sejam grafadas numa sequência
contínua não funciona corretamente,
embora a criança tenha capacidade de
traçar uma letra isolada;
 Deficiência na percepção visual: o
problema está na forma como o cérebro
interpreta as informações transmitidas
pelos olhos, o que afeta a percepção da
forma e configuração das letras;
 Distúrbio na forma de segurar o lápis: o
problema é devido ao baixo tônus
muscular em pequenos músculos das
mãos. Baixo tônus implica numa certa
flacidez muscular que dificulta o controle
do lápis;
 Deficiência da memória visual:
dificuldade em recordar o formato das
letras;
 Deficiência de controle espacial:
dificuldade em arrumar a escrita na
página;
 Taxa de processamento diminuído: a
escrita é normal, mas feita muito
lentamente e quando a criança tenta
escrever num ritmo normal, a escrita fica
desorganizada.
A escrita é uma habilidade difícil de ser
avaliada em testes padronizados, o que
dificulta a identificação da disgrafia. A falta
de conhecimento a seu respeito faz com que
a criança com esse distúrbio de escrita seja
estigmatizada e mal compreendida.
Aanálise da disgrafia deve ser global, feita
por um indivíduo experiente que observará a
postura e a forma como a criança segura a
caneta ou o lápis. Para uma avaliação, é
preciso três amostras de escritas: uma
redação com tema livre, um trecho de um
ditado e uma cópia de algum material
impresso. Durante a redação, normalmente,
a criança tem um tempo determinado para
escrever e nas outras amostras, observa-se
o tempo que ela leva para escrever. Por meio
desses testes é possível comparar a
eficiência da escrita da criança e descrever
sua dificuldade, sendo necessário também o
parecer médico da ausência de
acometimentos motores ou visuais que
possam interferir no desenvolvimento dessa
habilidade.
DISORTOGRAFIA:
A disortografia caracteriza-se pela
dificuldade em transcrever corretamente a
linguagem oral. Na escrita ocorrem trocas
ortográficas ou de letras, embora não haja
diminuição na qualidade da grafia das
palavras. Assim como a disgrafia, a
disortografia não está ligada à falta de
estímulos e instruções pedagógicas.
Esse distúrbio de aprendizagem pode ser
identificado quando a criança apresenta uma
idade ortográfica dois anos abaixo da média
em relação a outras crianças de mesma
idade. Todas as crianças com disortografia
precisam ser submetidas a uma avaliação
auditiva específica, pois algumas
dificuldades ortográficas podem ser
decorrentes de déficits auditivos.
Os principais tipos de erros que uma criança
com essa dificuldade pode manifestar são:
 Trocas auditivas: troca de consoantes
surdas por consoantes sonoras (v/f, p/b,
ch/j), troca de vogais nasais por orais;
 Trocas visuais: há confusão entre letras
simétricas ou semelhantes;
 Troca de sílabas com tonicidade
semelhante (-ão e – am);
 Confusão entre palavras de estrutura
semelhante;
 Dificuldade para internalizar que um
fonema pode ser expresso por múltiplas
letras;
 Dificuldade para lembrar a sequência dos
sons de uma palavra.
DISCALCULIA:
A discalculia é definida pelo Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
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Mentais (DSM-IV) como uma dificuldade
para realizar cálculos e raciocínio
matemáticos, isto é, a capacidade do
indivíduo para realizar operações aritméticas
está abaixo daquela esperada para sua faixa
etária e nível de escolaridade, interferindo
não somente no desempenho acadêmico
como nas atividades da vida diária.
Alunos com discalculia apresentam
dificuldade com a generalização das
habilidades matemáticas, podem aplicar um
procedimento em uma situação com um
conjunto de dados, mas não aplicá-los em
uma outra situação com dados diferentes,
algo que a maioria dos alunos faria
naturalmente. Um dos sinais mais evidentes
apresentados pelas crianças no início da
escolarização é a dificuldade para
compreender os conceitos de grande,
pequeno, diferente, igual.
Muitas tentativas de classificar a discalculia
têm sido feitas com o objetivo de facilitar sua
definição, porém uma divisão didática pode
ser feita da seguinte forma:
 Discalculia practográfica: a criança tem
dificuldade para colocar em prática
procedimentos matemáticos, em utilizar
materiais concretos ou graficamente
ilustrados. É difícil para ela ordenar,
classificar, comparar objetos quanto ao
peso, tamanho, diferença e semelhança;
 Discalculia espacial: refere-se à
dificuldade de avaliação e organização
visoespacial;
 Anaritmetria: refere-se à dificuldade em
escolher procedimentos aritméticos para
resolver operações escritas, como
adição, subtração e multiplicação;
 Discalculia léxica (alexia): refere-se à
dificuldade em compreender a linguagem
matemática e sua relação com os
símbolos, ou seja, a criança não
consegue associar, por exemplo, o
símbolo “-“ aos termos subtrair, retirar,
menos;
 Discalculia gráfica (agrafia): dificuldade
para grafar os números necessários para
os cálculos.
Os sintomas mais frequentes em crianças
com essas manifestações são inabilidade
para efetuar cálculos simples, dificuldade
para fazer a leitura correta de números com
muitos dígitos, dificuldade para memorizar
fatos numéricos, colocação e separação
incorreta dos números em operações de
multiplicação e divisão.
No Brasil ainda não há um teste específico
para o diagnóstico da discalculia. Sabe-se
que a avaliação deve ser detalhada, deve
observar os principais sintomas desse
distúrbio e ser realizada por uma equipe
interdisciplinar, composta de médico,
psicopedagogo, fonoaudiólogo, entre outros
profissionais, que poderão diagnosticar e
indicar aos professores estratégias eficazes
que permitirão o avanço do seu aluno com
dificuldade.
TRANSTORNO DE DÉFICI T DE ATENÇÃO E
HIPERATIVIDADE (TDAH):
O TDAH é o transtorno
neurocomportamental mais comum da
infância, estando entre as condições
crônicas de saúde mais prevalentes que
afetam crianças em idade escolar, e é o
transtorno mental da infância mais
extensamente estudado.
Esse distúrbio é caracterizado por
desatenção, incluindo aumento da
distraibilidade e dificuldade de sustentar a
atenção, controle pobre do impulso e
diminuição da capacidade autoinibitória, e
pela superatividade e inquietação motoras.
As crianças afetadas comumente sofrem
com insucesso escolar, problemas com
relacionamentos interpessoais com
familiares e colegas, e baixa autoestima.
Nenhum fator isolado determina a expressão
do TDAH, podendo representar a via final
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
comum para uma grande variedade de
processos complexos de desenvolvimento
cerebral. É evidente que mães de filhos com
esse transtorno são mais propensas a
complicações no parto, e o consumo de
drogas durante a gestação aparenta ter
impacto sobre o risco de desenvolvimento
dessa condição, da mesma forma que o
tabagismo, o consumo de álcool e a
exposição materna ao chumbo.
Há, no entanto, um forte componente
genético para o TDAH, com destaque para
dois marcadores, o gene transportador de
dopamina (DAT1) e uma forma particular do
gene receptor de dopamina 4 (DRD4).
Anormalidades estruturais com impacto
funcional têm sido identificadas em crianças
com TDAH sem lesão cerebral preexistente
identificável, incluindo a desregulação do
circuito frontal subcortical, volumes corticais
pequenos nessa região, pequeno volume em
todo o cérebro e anormalidades do cerebelo.
Estressores psicossociais da família também
podem contribuir ou exacerbar os sintomas
de TDAH.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:
Os atuais critérios do DSM-IV, propostos
após estudos de campo com crianças de 5 a
12 anos, afirmam que o comportamento deve
ser inapropriado de acordo com o
desenvolvimento, ou seja, substancialmente
diferente do de outras crianças da mesma
idade e nível de desenvolvimento,
começando antes dos sete anos, devendo
estar presentes por pelo menos seis meses,
presentes em duas ou mais situações e não
ser secundário a outro transtorno. Há três
subtipos de TDAH que podem ser
diagnosticados com base nesses
parâmetros, o TDAH predominantemente
desatento, diagnosticado
predominantemente em meninas, o
transtorno de déficit de atenção/
hiperatividade, predominantemente do tipo
hiperativo-impulsivo, e transtorno de déficit
de atenção/hiperatividade, do tipo
combinado, que são mais prevalentes em
meninos.
As manifestações clínicas podem variar com
a idade, sendo que os sintomas abrangem
desde a inquietação motora e
comportamento agressivo e disruptivo, que
são comuns em crianças pré-escolares, para
desorganizado, distraído e desatento, que
são mais típicos em adolescentes mais
velhos e adultos.
DIAGNÓSTICO E DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS:
O diagnóstico de TDAH é consolidado após
uma avaliação completa, incluindo história
clínica detalhada, de modo a identificar
outras causas ou fatores contribuintes para o
quadro, análises de escalas de avaliação de
comportamento, exame físico e quaisquer
testes de laboratório que possam ser
indicados. É fundamental que o profissional
colete informações de diversas fontes,
incluindo a criança, seus pais, professores,
médicos e outros cuidadores.
A entrevista clínica permite compreensão
abrangente sobre se os sintomas preenchem
os critérios de diagnóstico para TDAH.
Durante a entrevista, o médico deve coletar
informações referentes à história dos
problemas apresentados, saúde e
desenvolvimento geral da criança, e história
social e familiar. A entrevista deve enfatizar
os fatores que podem afetar o
desenvolvimento ou a integridade do sistema
nervoso central, ou revelar doenças
crônicas, deficiências sensoriais ou o uso de
medicamentos que possam afetar o
funcionamento da criança. Fatores sociais
perturbadores, como discórdia familiar,
estresse situacional e abuso ou negligência,
podem resultar em comportamentos
hiperativos ou ansiosos.
As escalas de avaliação de Comportamento
são úteis para a magnitude e a abrangência
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
dos sintomas, mas não são suficientes por si
sós para fazerem um diagnóstico de TDAH,
o que pode ser reforçado pela grande
variedade de escalas desenvolvidas para
este fim.
Ao exame físico, o médico deve prestar
atenção a prejuízos na motricidade fina, na
coordenação motora e à presença de sinais
leves, como o bater dos dedos e movimentos
alternados, porém seu diagnóstico também
não deve ser amparado somente nesse
critério. Também é importante descartar
quaisquer alterações na visão e na audição
como sendo causadores das alterações
comportamentais.
Dentre os diagnósticos diferenciais para o
TDAH estão doenças crônicas, como
enxaqueca, crises de ausência, asma e
alergias, doenças hematológicas, diabetes e
câncer infantil, que podem prejudicar a
atenção e o desempenho escolar das
crianças por conta de aspectos inerentes à
própria doença ou aos medicamentos
empregados em seu tratamento. Em
crianças mais velhas, o abuso de
substâncias também deve ser considerado,
pois pode resultar em declínio do
desempenho escolar e comportamento
desatento.
Transtornos do sono, incluindo aqueles
secundários a quadros crônicos de
obstrução das vias aéreas superiores
(edema de tonsilas e adenoides), também
resultam em comprometimento
comportamental e emocional, embora sua
relação com o TDAH possa ser mais bem
explicada em sentido inverso (transtornos
comportamentais geram alterações no
sono).
A depressão e o transtorno de ansiedade
podem causar muitos sintomas similares aos
do TDAH, como desatenção, inquietude,
incapacidade de focar e de concentrar-se no
trabalho, má organização e esquecimento,
mas por diversas vezes essas condições são
comorbidas. O transtorno obsessivo
compulsivo também pode mimetizar os
desvios de atenção, principalmente quando
manifestados sob a forma de pensamentos
recorrentes e persistentes, que interferem
nas atividades diárias normais.
Transtornos de ajustamento secundário a
estresses maiores da vida (falecimento de
familiar próximo, divórcio dos pais, violência
familiar, abuso de substâncias pelos pais,
uma mudança) ou distúrbios na relação entre
pai e filho envolvendo conflitos de disciplina,
abuso infantil/negligência evidente ou
superproteção podem resultar em sintomas
semelhantes aos do TDAH.
TRATAMENTO:
Após o estabelecimento do diagnóstico de
TDAH, os pais e a criança devem ser
educados acerca das formas em que esse
distúrbio afeta o aprendizado, o
comportamento a autoestima, as habilidades
sociais e o funcionamento da família, sendo
estabelecidas metas para incentivar o
desenvolvimento das relações interpessoais
do infante, desenvolver habilidades de
estudo e minimizar os comportamentos
disruptivos.
Tratamentos voltados para o manejo
comportamental tem como objetivo fazer o
clínico identificar comportamentos-alvo que
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
causem prejuízo na vida da criança
(comportamento disruptivo, dificuldade na
realização de tarefas de casa, falha em
obedecer às regras da escola ou em casa) e
ajudar a criança melhorar progressivamente
a sua aptidão nessas áreas. O médico deve
orientar os pais e professores a
implementarem regras, consequências e
recompensas para incentivar os
comportamentos desejados.
O tratamento medicamentoso por meio de
psicoestimulantes também pode ser
recomendado. Nas primeiras quatro
semanas, o médico deve aumentar a dose
da medicação, conforme tolerado,
mantendo-se efeitos colaterais mínimos ou
ausentes, para alcançar o máximo de
benefícios. Se esta estratégia não produzir
resultados satisfatórios ou se os efeitos
colaterais impedirem o prosseguimento do
ajuste da dose com a persistência dos
sintomas, o médico deve usar uma classe
alternativa de estimulantes que não foi usada
anteriormente, repetindo esse período inicial
de adaptação.
O uso isolado de medicações nem sempre é
suficiente para tratar o TDAH em crianças,
particularmente nos casos em que as elas
têm múltiplos transtornos psiquiátricos ou
vêm de ambientes domésticos estressados.
Quando os infantes não respondem à
medicação, pode ser apropriado encaminhá-
las para um especialista em saúde mental,
como um psiquiatra ou psicólogo infantil, que
podem determinar a adição de novos
componentes e métodos de suporte para o
programa global de tratamento
PROBLEMA 6 – ABERTURA:
ALTERAÇÕES MORFOLÓGI CAS DA PUBERDADE:
A adolescência é definida com um período
de desenvolvimento, enquanto a puberdade
marca o processo biológico pelo qual uma
criança se torna um adulto. Essas mudanças
incluem o surgimento das características
sexuais secundárias, o crescimento até o
tamanho adulto e o desenvolvimento da
capacidade reprodutora.
A produção adrenal de androgênios, com
destaque para o sulfato de de-
hidroepiandrosterona (DHEA) pode ocorrer a
partir dos seis anos de idade, com o
desenvolvimento de odor axilar e pelos
pubianos leves, deflagrando o processo da
adrenarca. Os níveis do hormônio
luteinizante (LH) e do hormônio
foliculoestimulante (FSH) aumentam
progressivamente por toda a infância sem
efeitos drásticos. As mudanças puberais
rápidas começam com a sensibilidade
aumentada da hipófise ao hormônio liberador
de gonadotrofina (GnRH), a liberação pulsátil
deste, a liberação de LH e FSH durante o
sono e aumentos correspondentes em
androgênios e estrogênios gonadais. Os
gatilhos para essas mudanças são diversos,
podendo estar relacionados à obesidade, à
localização geográfica, à exposição a
fitoestrógenos ou toxinas similares ao
hormônio endógeno encontradas em
plásticos, ou a fatores genéticos.
O PROCESSO DE CRESCI MENTO:
O processo de crescimento físico é dinâmico
e contínuo, iniciado logo após a concepção,
apresentando diferentes velocidades em
razão das fases de desenvolvimento. Na
fase intrauterina, a VC (velocidade de
crescimento) é muito alta (1 a 1,5
cm/semana) e, após o nascimento, há uma
desaceleração gradual, fazendo com que a
criança cresça em média 25 cm no primeiro
ano e 15 cm no segundo. Entre o terceiro ano
e o início da puberdade há um crescimento
estável e constante, entre 5 e 7 cm/ano. Na
fase puberal ocorre novamente uma
aceleração durante um período de 2 a 3 anos
(VC de 10 cm/ano) e, na fase final da
puberdade, há uma desaceleração abrupta
com VC entre 1 e 1,5 cm/ano.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Fatores extrínsecos podem influenciar
negativamente o crescimento em todas as
suas etapas. Agravos físicos e emocionais
(privação afetiva), falta de acesso a macro e
micronutrientes equilibrados na alimentação
e o sedentarismo são fatores que atuam
restringindo o alcance do potencial genético
determinado desde a concepção. O fator
intrínseco mais determinante da estatura
final do indivíduo é a carga genética familiar,
e sua avaliação pode ser realizada por meio
do cálculo do alvo parental, no qual a altura
dos pais é usada para prever o potencial de
crescimento da criança de forma puramente
estatística.
Na fase pós-natal, o hormônio do
crescimento (GH) age por sua ação direta na
diferenciação celular, na placa de
crescimento e no hepatócito, onde aumenta
a secreção de fator de crescimento insulina-
símile (IGF-1). O IGF-1, secretado pelo
fígado, tem ação específica na expansão e
hipertrofia da placa epifisária, e é
transportado por uma proteína carreadora
(IGFPB3), que tem como função aumentar a
meia-vida plasmática dos IGF. Os hormônios
tireoidianos são necessários para o
crescimento desde a infância, por sua ação
de estímulo à produção e secreção de GH,
síntese de IGF-1 e por sua ação nas epífises
ósseas.
Na fase inicial da puberdade, além da
elevação dos níveis séricos dos esteroides
sexuais, há um aumento na frequência e na
amplitude dos pulsos de GH, com aumento
de duas a até dez vezes por pulso, o que
aumenta a produção de IGF-1 pelo fígado.
Age, também, em outros órgãos, como
musculatura cardíaca, diafragma, adipócitos
e sistema hematopoético, o que é essencial
para adequar esses órgãos às novas
necessidades impostas pelo crescimento.
O ganho de peso é paralelo ao crescimento
linear, com atraso de vários meses, de modo
que parece que os adolescentes primeiro
esticam e depois engordam.
Os hormônios sexuais, principalmente os
estrogênios, apresentam função importante
para o crescimento em ambos os sexos, uma
vez que atuam sobre receptores específicos
da placa epifisária, estimulando o aumento
estatural e o fechamento dessas cavidades
do osso, criando um processo autolimitado.
Na adolescência, a intensidade e a
velocidade do crescimento são
desproporcionais, iniciando-se pelas
extremidades distais, dando ao jovem uma
aparência peculiar, prolongando-se pela
região proximal até atingir o tronco, momento
no qual há um retorno à proporcionalidade
corporal.
As meninas, além de iniciarem a puberdade
mais cedo, apresentam um pico de
velocidade de crescimento mais
precocemente que os meninos, entre os
estádios 2 e 3 de Tanner. No entanto,
desaceleram mais cedo e, após a menarca,
o restante do crescimento esperado é entre
5 e 6 cm. Os meninos apresentam seu pico
entre os estádios 3 e 4 de Tanner e acabam
desacelerando mais tarde.
Há uma relação próxima entre a altura inicial
da criança e sua estatura final. Em geral, ao
longo da puberdade, os adolescentes
manifestam ganho de 20 a 25 cm para
indivíduos do sexo feminino e 25 a 30 cm
para aqueles do masculino.
PUBERDADE:
Desde o terceiro trimestre de gestação até os
6 meses de vida há uma ativação parcial do
sistema hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG)
que ocasiona algumas manifestações
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
clínicas como telarca (desenvolvimento do
tecido mamário), trofismo genital e acne
neonatal.
A partir sexto mês de vida há uma redução
significativa dos níveis de hormônio LH e
FSH, que permanecem baixos até o início da
puberdade. Em dado momento, os fatores
permissivos (como neuropeptídios, leptina,
insulina e IGF-1) atuam sobre o sistema
HHG, provocando aumento da frequência e
amplitude da produção de GnRH pelos
neurônios hipotalâmicos que, pelo sistema
porta hipofisário, ativam receptores
específicos localizados na adenoipófise,
desencadeando aumento da produção de
gonadotrofinas. A liberação de FSH e LH
estimula ovários e testículos a produzirem os
esteroides sexuais que induzirão todo o
processo de modificações corporais,
capacitando o organismo para as funções
reprodutivas.
O marco do início da puberdade e seu
primeiro sinal visível é o desenvolvimento
dos brotos mamários, que ocorre entre os 8
a 12 anos de idade, com média aos 9,7 anos.
A menarca geralmente ocorre após 2 ou 2,5
anos após esse evento, geralmente durante
o quarto estágio de Tanner (média aos 12
anos, com variações normais abrangendo o
grupo de 9 a 16 anos de idade). Esse
fenômeno marca a desaceleração do
crescimento, que passa a ser de somente 4
a 6 cm por ano. Os ciclos iniciais da
adolescente podem apresentar certa
irregularidade nos primeiros 2 a 4 anos
(ciclos anovulatórios).

Embora o eixo HHG seja fundamental nesse

período, é necessária a ativação de outros
mecanismos que terão ação sinérgica no
crescimento e desenvolvimento físico na
puberdade. A produção de androgênios
pelas glândulas adrenais, controlada pelo
ACTH, é anterior à produção de esteroides
gonadais, ocorrendo entre 6 e 8 anos de
Os estágios de Tanner aplicados à
idade (adrenarca), e representa o momento
puberdade feminina referem-se ao
de aparecimento e manutenção de
desenvolvimento das mamas e ao
condições iniciais para o desenvolvimento
surgimento de pelos na região íntima.
puberal, como pilificação nas axilas e na
região íntima e aumento da oleosidade da
pele.

Uma vez iniciada a puberdade, a sequência

resultante de mudanças morfofisiológicas dá
origem à classificação de maturidade sexual
(SMR) ou estágios de Tanner. A variação da
progressão normal pela maturação sexual é
vasta, porém segue uma ordem cronológica
bem demarcada.

DESENVOLVIMENTO PUBERAL EM MENINAS:

 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Cerca de 40 a 65% dos meninos púberes
apresentam algum grau de hipertrofia
mamária no segundo estágio de Tanner
devido à estimulação estrogênica relativa.

Os meninos normalmente atingem o ápice do

ganho estatural entre 2 e 3 anos depois das
meninas, em estágio de desenvolvimento
posterior e continuam seu crescimento linear
por dois ou três anos depois do fim do
crescimento das meninas.

Algumas mudanças menos óbvias também

ocorrem simultaneamente, como o aumento
dos ovários, do útero, do clitóris e dos
grandes lábios, e o espessamento da
mucosa vaginal e do endométrio.
De forma a aumentar a capacidade
reprodutiva, é durante a puberdade que os
padrões de distribuição da gordura corporal
são alterados, com maior acúmulo nos
quadris e nas mamas.
Alguns impactos paralelos da puberdade no
sexo masculino são o aumento da massa e
força muscular, da resistência física e a
mudança na voz, decorrente da hipertrofia
das cartilagens faríngeas, que se inicia com
o fenômeno de “voz rachada”.

DESENVOLVIMENTO PUBERAL EM MENINOS:

Nos meninos, o primeiro sinal visível da

puberdade é o aumento testicular a partir dos
9,5 a 10,7 anos de idade, atingindo um
volume inicial de 4 ml (averiguado por um
orquidômetro). Esse evento é seguido por
aumento no diâmetro (estágio 3 de Tanner)
e no comprimento penianos (estágio 4 de
Tanner).

O pico de crescimento ocorre quando o

volume dos testículos atinge 9 a 10 ml, em
meio ao quarto estágio de Tanner. Sob a
influência do LH e da testosterona, túbulos
seminíferos, epidídimo, vesículas seminais e
próstata aumentam.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
PUBERDADE PRECOCE:
Por definição, a puberdade precoce ocorre
quando o desenvolvimento dos caracteres
sexuais secundários se dá antes dos 8 anos
e m meninas e antes dos 9 em meninos. O
estabelecimento dessa idade de corte para o
início da puberdade é decorrente do
aumento do risco para causas orgânicas
quando esse processo é desencadeado
precocemente. No sexo feminino a
puberdade precoce central (PPC) tem
origem idiopática em 90% dos casos, por
ativação precoce do eixo HHG,
manifestando-se pelo desenvolvimento das
mamas. No sexo masculino, 70% são de
causa orgânica.
O desencadeamento da PPC tem etiologia
genética bem embasada, pois estudos de
acompanhamento familiar indicaram que em
25% dos participantes havia ao menos mais
um parente acometido. Os estudos genéticos
identificaram, em alguns casos, supressão
ou ativação de peptídios, que seriam
responsáveis pela ativação precoce do eixo
hipotálamo-hipófise-gonadal. No entanto,
não conseguiram identificar as mesmas
alterações em estudos com grande número
de casos, considerados idiopáticos. As
causas secundárias de puberdade precoce
central incluem exposição crônica a
esteroides sexuais usados para tratamento
de outras doenças e a disruptores
endócrinos, substâncias presentes em
plásticos, solventes, pesticidas, cosméticos
e poluentes industriais que, por sua ação
estrogênica ou antiandrogênica, podem
afetar a dinâmica neuroendócrina normal.
A puberdade precoce pode ser de origem
central, envolvendo gonadotrofinas, ou
periférica, independente destas. Outra
classificação, entretanto, também se faz
necessária, relacionando-se com a
concordância dos caracteres sexuais com o
sexo do indivíduo, culminando em uma
divisão isossexual (geralmente central) ou
heterossexual, de origem periférica,
decorrente da virilização ou da feminização.
A importância do diagnóstico dessas
situações decorre da necessidade de
identificar e tratar eventuais lesões
expansivas intracranianas e, nas formas
fisiológicas, de evitar a fusão prematura das
epífises desencadeada pelos esteroides
sexuais e o consequente comprometimento
da estatura final. Outro dado a ser
valorizado, além da idade do aparecimento,
é a velocidade observada nas mudanças,
que podem ocorrer lentamente, como na
puberdade normal, ou de modo rápido e
progressivo, que requer reconhecimento e
tratamento precoce.
Os métodos empregados no diagnóstico são
o aparecimento de caracteres sexuais do
estágio 2 de Tanner, a dosagem de LH basal,
a radiografia do punho e da mão não
dominante, dosagem de testosterona (nos
meninos) e a ultrassonografia pélvica, para a
avaliação do volume uterino e ovariano nas
meninas. A ressonância magnética pode ser
utilizada para diferenciar os acometimentos
orgânicos e idiopáticos.
O tratamento da PPC baseia-se no bloqueio
da produção de gonadotrofinas de modo a
estabilizar ou regredir os caracteres sexuais
e desacelerar o processo de maturação
esquelética, preservando a estatura dentro
dos parâmetros do alvo familiar. A escolha
terapêutica geralmente é direcionada os
análogos agonistas sintéticos do GnRH, que
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
atuam na hipófise anterior de forma
competitiva com o hormônio liberador das
gonadotrofinas. Esses medicamentos estão
disponíveis em injeções de aplicação mensal
ou trimestral e, quando mantidos até os 11
anos de idade cronológica ou 12 anos de
idade óssea, estão associados a melhores
resultados na estatura final.
PUBERDADE ATRASADA:
Considera-se como atraso puberal a falta de
desenvolvimento dos caracteres sexuais
secundários do segundo estágio de Tanner
aos 13 anos de idade nas meninas e 14 anos
nos meninos. Sua causa mais comum é o
atraso constitucional do crescimento e da
puberdade (ACCP), condição duas vezes
mais frequente para o sexo masculino, com
herança genética autossômica dominante.
Tanto a puberdade quanto a maturação
óssea e o crescimento estão atrasados por
falta de ativação do eixo HHG.
O diagnóstico será confirmado
definitivamente quando ocorrer o
desenvolvimento puberal, pois quando não
ocorre espontaneamente, pode se tratar de
hipogonadismo. Os exames laboratoriais
disponíveis atualmente podem não fazer a
distinção entre as duas situações.
As causas patológicas desse atraso podem
ser classificadas, do ponto de vista
bioquímico, em hipogonadotrófica ou
hipergonadotrófica. Nos meninos, o
hipogonadismo hipogonadotrófico,
apresenta além da ausência de caracteres
sexuais e de desenvolvimento testicular,
baixos níveis séricos de testosterona e
concentrações normais ou baixas dos
hormônios FSH e LH, sejam basais ou após
estímulo com GnRH injetável. Nas meninas,
ocorre ausência de desenvolvimento puberal
aos 13 anos de idade e baixos níveis de FSH
e LH. A anorexia nervosa é o principal
causador desse distúrbio em meninas, mas
outras doenças que cursam com balanço
energético negativo também são
responsáveis por esse retardo puberal.
O fator ambiental também deve ser
considerado para o diagnóstico de ACCP. A
prática de exercícios físicos intensos tem
impacto evidente sobre essa disfunção. A
relação entre os chamados disruptores
endócrinos, principalmente os ftalatos
(substância tóxica presente em diversos
tipos de plástico), e o atraso puberal tem sido
objeto de vários estudos, porém, ainda sem
conclusões definitivas.
Frente à ausência das causas supracitadas,
a investigação desse fenômeno recai sobre
fatores congênitos, sendo crucial avaliar a
presença ou não de anosmia (percepção
olfativa inexistente). O hipogonadismo
associado a esse sinal ou à hiposmia está
presente na síndrome de Kallmann, que
ocorre devido à hipoplasia dos bulbos
olfatórios e deficiências na migração dos
neurônios GnRH. Esse distúrbio pode estar
ligado ao cromossomo X, ser autossômica
dominante ou recessiva com penetrância
variável têm sido descritas, e a prevalência é
cinco vezes maior nos meninos. O
diagnóstico se dá por meio de ressonância
magnética.
O hipogonadismo hipergonadotrófico pode
ter como etiologia doenças que afetam as
gônadas ou procedimentos cirúrgicos que
afetem os ovários ou testículos. A síndrome
de Turner (45 XO), nas meninas, e a
síndrome de Klinefelter (47 XXY), nos
meninos, são as causas mais frequentes e
serão confirmadas pela realização de
cariótipo.
No tratamento do hipogonadismo, nos casos
de doenças em que não há possibilidade de
tratamento ou correção da disfunção que
originou o distúrbio hormonal, a reposição
hormonal tem por objetivo induzir o
desenvolvimento puberal e o estirão de
crescimento, a incorporação da massa óssea
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
e a função sexual consequentes, além de
assegurar, quando possível, a capacidade
reprodutiva.
O acompanhamento clínico é importante,
ocorrendo por meio da evolução do volume
mamário nas meninas. As doses vão sendo
aumentadas progressivamente ao longo do
período médio de dois anos. Várias
formulações estão disponíveis, como
estrogênio oral, esterificado, efenil estradiol,
estrogênio conjugado, transdérmico e gel. A
associação com progesterona pode ser
iniciada após o segundo ano de terapia com
estrogênio, ou quando houver a presença de
sangramento vaginal nas meninas.
Em adolescentes com ACCP que, mesmo
com as orientações adequadas com relação
à evolução natural do processo, se
encontrem com impactos emocionais
significativos, podem se beneficiar com a
indução da puberdade após os 13 anos nas
meninas e 14 anos nos meninos, causando
melhora na autoestima e na adequação
social, pois a percepção da imagem corporal
é de extrema importância para essa fase da
vida. A reposição hormonal segue as
mesmas doses usadas no hipogonadismo e
deve ser mantida por 3 a 6 meses, tempo que
a testosterona leva para ativar o eixo HHG.
Há necessidade de controles clínicos e
laboratoriais periódicos para avaliar a
resposta do organismo a essas medidas.
DESENVOLVIMENTO PSIC OAFETIVO E OS
CARACTERES SEXUAIS SECUNDÁRIOS:
Costuma-se pensar em sexo e nas
manifestações da sexualidade com
mentalidade e a experiência do adulto,
esquecendo do processo de vivência e da
descoberta desse fenômeno. Pode-se dizer
que a sexualidade, de imediato, está
diretamente associada à genitalidade, mas,
todo o corpo é erótico, fazendo com que o
prazer não seja encontrado somente via
relações sexuais ou pela masturbação.
É pelo corpo que o indivíduo sente o mundo
ao nascer. A proximidade física e emocional
dos pais tem papel crucial nessa etapa,
garantindo ao infante uma sensação de
segurança e amor ou de frustração. A
capacidade materna em lidar com essas
atitudes do bebê permite que se
desencadeie o processo de “alfabetização”
dos sentimentos, carregados ao longo de
toda a vida. Nesse sentido, o
desenvolvimento afetivo-sexual de um
indivíduo será o produto da combinação
entre o componente biológico (o
temperamento do infante), o ambiente e o
meio cultural no qual ele está inserido, com
participação fundamental dos pais nesse
último.
O DESENVOLVIMENTO DA SEXUALIDADE ENTRE
ZERO E 9 ANOS DE IDADE:
A criança começa, às vezes antes do
primeiro ano de vida, a brincar e a ter prazer
com seu próprio corpo, o que pode ser
exemplificado por sequências de
movimentos de contração e relaxamento
realizados pelo bebê, que reage
negativamente quando interrompido, uma
vez que essa atividade lhe dá satisfação. A
relação boa com a mãe possibilita um
autoerotismo genital, o que fomentará o
prazer e a alegria de viver no adulto.
Nesse período, o bebê vivencia sua fase
oral, em que a boca é o local do corpo mais
associado ao prazer, sendo a ferramenta de
descoberta e investigação do mundo. No
futuro, essa sensação irá se manifestar no
ato de beijar, comer, falar, fumar ou qualquer
outra ação que envolve a boca.
Entre as idades de um ano e dois meses a
dois anos, a criança vive a fase anal,
momento de iniciação ao controle dos
esfíncteres. Esse processo gera grande
prazer ao infante, uma vez que as fezes e a
urina são suas primeiras “produções”. Essa
sensação irá se manifestar em todos os
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produtos intelectuais posteriores. Esse é o
momento no qual se estrutura mentalmente
a anatomia.
Por volta do terceiro ano de ida inicia-se a
fase fálica, conhecida também como a “fase
dos porquês” devido à constante realização
de perguntas. Algumas curiosidades sexuais
podem se manifestar, com a exposição de
seus genitais a terceiros ou tentativa de ver
o do outro. É preciso que pais e educadores,
ao não saber responder a alguma das
indagações, reconheçam sua ignorância,
bem como os erros cometidos. É nessa fase
que a criança percebe que a mãe “pertence”
ao pai e vice-versa, expressando ciúme
dessa relação parental e sentindo-se
excluídas.
A socialização ainda é difícil, com o
comportamento infantil sendo marcado pela
intransigência e pela rejeição de novidades.
Há uma tentativa de descobrir a si mesma,
opondo-se ao que já existe, de modo
semelhante ao que ocorre durante a
puberdade. O pai e a mãe são figuras
importantes, amadas e admiradas, mas a
criança começa a andar ou correr para longe
destes, usando algumas palavras de forma
adulta.
É muito comum que os pequenos queiram
representar papeis parentais em
brincadeiras, vestindo-se com peças de
roupas e acessórios dos pais. Toda criança,
inclusive, passa por fases de imaginar-se
como do sexo oposto, e por isso
transvestem-se quando brincam nos
armários. Em decorrência da inveja do papel
do pai e da sensação de exclusão, a criança
pode descontar sua raiva, tornando doloroso
esse relacionamento conjugal imaginário, no
qual uma das partes, ou ambas, seriam
prejudicadas.
Aos três anos há uma tendência de
universalidade quanto a fantasias cruéis, e
praticamente todas as crianças com essa
idade se masturbam. Caso esse
comportamento se torne excessivo ou exclua
a realização de outras atividades, há
profundos indícios de dificuldades no
processamento emocional. Como não se
deve sugerir que a masturbação faz mal ou é
errada, porque a criança já passa por muitos
sentimentos negativos de ostracismo, culpa
e inveja, deve-se orientá-la que esse ato é
prazeroso, mas deve ser feito quando o
indivíduo está sozinho e em locais
apropriados. Brincar é o modo de a criança
aprender sobre si mesma e acerca do
mundo. Brincar com o próprio corpo é um
meio de obter conhecimentos sobre si
mesmo e de adquirir sensação de pessoa
separada da mãe.
Aos 4 anos, geralmente já há, por parte da
criança, consciência de sua identidade
sexual. É comum a manifestação autoerótica
dentro das roupas íntimas, como de forma a
verificar a integridade e a permanência dos
órgãos genitais. O desenvolvimento de
amigos imaginários é algo natural, e os
cuidadores devem fornecer oportunidades
para que eles brinquem juntos. Esse é o
momento no qual o infante começa a se
socializar de forma mais consistente, criando
vínculo com outras pessoas. Tornam-se
também muito interessados em falar sobre
morte, religião e sexo, e se entenderem que
esses temas são tabus não voltam a indagar
sobre esses temas, ainda que o interesse se
mantenha.
Aos cinco anos, já têm vocabulário extenso,
formulando frases complexas. Nesse
período o relacionamento com o sexo oposto
é melhorado, com a criança declarando estar
“namorando” e arriscando o beijo na boca.
Há um esforço cada vez maior de parecer
com o pai/mãe, que se mantêm como os
seres mais importantes do seu convívio, com
redução da tendência de tomar os lugares
parentais. O debate de conceitos de certo e
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errado já se manifesta nessa fase, marcando
o início de uma consciência moral.
Permanece nos meninos alguns aspectos
ditos femininos, o que também ocorre dentre
as meninas, sendo necessário que ambos
entendam o que é sentir-se
masculino/feminino. A aceitação por parte
dos adultos tende a ser mais fácil perante o
comportamento “amolecado” dentre as
garotas do que o lado “feminizado” dos
garotos, comportamento que se origina na
maior preocupação com o “desenvolvimento”
da homossexualidade masculina. Como
resultado, muitos crescem envergonhados
acerca de seus sentimentos mais pessoais e
apresentam grande dificuldade em
expressá-los.
A enurese noturna (“molhar a cama”) é
comum, mas uma forma de encorajar a
criança a conquistar esse controle,
aproveitando suas tendências sociais, é
dormir na casa de algum colega. As
perguntas sobre sexualidade são frequentes,
devendo ser respondidas de forma
informativa, concreta e restrita ao tópico da
dúvida.
Por volta dos seis anos inicia-se o período de
latência. A criança fala fluentemente, mas
com um repertório lexical ainda limitado. Sua
autoconfiança é oscilante, variando entre a
dependência e a autossuficiência. O
comportamento de formar grupos orientados
para o mesmo sexo durante as brincadeiras,
a partir dos 7 anos, auxilia a descobrir quem
são e com quem se assemelham. As
frequentes brigas entre meninos e meninas
surgem quando se exteriorizam as
vergonhas e os desconfortos associados a
seu próprio sexo. A exploração do próprio
corpo e do outro é natural, manifestada nas
brincadeiras de médico e enfermeira, sendo
somente a obsessividade preocupante.
Inicia-se o desenvolvimento de fantasias e
teorias sobre diferenças sexuais, origem dos
bebês e religião.
A última fase sexual é a genital, que se faz
presente a partir dos 9 anos de idade,
deflagrada pela puberdade e pela
adolescência.
A SEXUALIDADE NO ADOLESCENTE:
Uma pesquisa realizada na década de 1990
pela Secretaria de Saúde do Estado de São
Paulo em parceria com a OPAS e a OMS
informa que na primeira relação sexual, as
mulheres têm medo de não agradar, e os
homens apontam o receio de falhar. Essa
relação de gênero já foi abordada por
diversos programas de saúde, sendo um dos
fatores que dificultam a promoção da saúde
sexual e reprodutiva. Dados coletados nesse
estudo também apontam que o sexo entre
jovens já fazia parte do namoro nesse
período, com 90% do grupo amostral
conhecendo os métodos contraceptivos.
Reconhecer a experiência e os sentimentos
dos adolescentes é fundamental para que o
cuidado seja feito de forma integral e
abrangente, direcionando-se não somente à
informação, mas sim aos aspectos
comportamentais, uma vez que conhecer
não garante o uso dos métodos.
Dentre as manifestações afetivas no âmbito
da sexualidade na adolescência, são
encontrados os seguintes conceitos:
 Ficar:
Querer “ficar” implica no desejo de beijar,
abraçar ou ter relações sexuais com uma
pessoa. O indivíduo satisfaz essa vontade e
“fica” com o outro por alguns dias,
esquecendo-se do parceiro pouco depois.
As características desse contato são a
brevidade do contato, não exclusividade,
descartabilidade do outro e não
obrigatoriedade da presença de
sentimentos.
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Essa tendência pode ser associada a um
treinamento, um ensaio a dois para que as
partes se preparem para relações futuras.
 Rolo/Ficar sério:
Quando o “ficar” já se consolida na rotina e
sentimentos começam a surgir entre os
jovens é deflagrado o estágio de “rolo”,
quase um namoro assumido. Os indivíduos
já se relacionam há muito tempo, mas não há
ainda um compromisso consolidado,
representando mais uma etapa de
aprendizado para as relações vindouras.
 Namoro:
O namoro surge de forma repentina, sendo
marcado pela necessidade de estabelecer
um compromisso frente aos sentimentos
descobertos entre os indivíduos.
Esse é o primeiro relacionamento afetivo, a
primeira experimentação do convívio em
casal. Geralmente, os adolescentes não
namoram logo, iniciando seu contato pelo
“ficar”.
 Primeira vez:
A primeira vez, que sempre preocupa os
pais, que consideram o momento sempre
muito precoce, não deve levar em conta o
tempo cronológico, mas sim o kairós, ou
seja, o momento certo. Há muitas perguntas
que envolvem sentimentos e emoções, e
estas devem ser compreendidas pela família,
comunidade e sociedade em um processo de
alfabetização das emoções.
As indagações mais comuns dizem respeito
ao próprio conceito de virgindade, sendo o
momento para que o pediatra explique sobre
o hímen e seus diversos tipos. Essas
questões por vezes refletem o medo de não
ser mais virgem, sendo esse um conceito
apenas cultural.
Outra pergunta muito frequente recai sobre a
ocorrência de dor durante o ato sexual. A
dor, na maior parte das vezes, depende da
relação, sendo que para que ela não ocorra
é necessário que a vagina esteja lubrificada
e que a mulher esteja à vontade e possa ter
sido preparada emocionalmente (beijos e
carícias) para diminuir a tensão. A falta de
intimidade entre o casal e os medos, como
de locais inadequados, entre outros
aspectos, permitem que haja desconforto na
primeira relação.
 Masturbação:
A prática da estimulação autoerótica é mais
frequente nos homens do que nas mulheres,
e as diferenças anatômicas contribuem para
que o erotismo feminino possa permanecer
reprimido do conhecimento sobre a
sexualidade Por muito tempo, a masturbação
foi considerada como uma prática não
adequada do ponto de vista cultural e social.
Os homens podem questionar que a perda
do sêmen os debilita física e intelectualmente
e temem que seus órgãos genitais possam
ficar comprometidos. A ideia do pecado e da
culpa está mais presente nas mulheres. Os
adolescentes acreditam que a masturbação
pode ter reflexos na pele, na palidez da cútis
e nas olheiras. Outros consideram que a
masturbação constante possa trazer
perturbações mentais. O aumento dos
temores pode explicar-se, em parte, pela
ansiedade que o despertar sexual gera nos
adultos e, dessa forma, a facilidade com que
os adolescentes se influenciam por mitos. A
culpa, a vergonha e os preconceitos podem
fazer com que os adolescentes reprimam
seus impulsos sexuais.
A atividade masturbatória é normal na
adolescência e faz parte da descoberta da
sexualidade de quase todas as pessoas. O
conhecimento das características dos
órgãos genitais possibilita o adolescente a
lidar melhor com as sensações de prazer que
seu corpo pode lhe proporcionar.
O pediatra deve lembrar que algumas
religiões podem condenar esse ato, mas
também deve esclarecer ao adolescente que
a masturbação não traz nenhum dano à
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saúde. O que deve ser analisado é se ele não  Papéis de gênero: refere-se à
está deixando de fazer outras atividades apresentação como masculino ou
estimulantes, ou seja, descobrir se o seu feminino;
tempo é gasto em masturbação, e se está o Papel de comportamento de gênero:
usando o seu corpo como única fonte de se refere a características de
prazer. personalidade, aparência e
comportamento que são, em
 Prazer e orgasmo: determinada cultura e tempo,
A dificuldade em atingir o orgasmo feminino, considerados masculinos ou
principalmente em suas primeiras relações femininos.
sexuais associada ao mito do orgasmo faz
 Sexualidade: é uma combinação do
com que as mulheres não consigam
corpo que a pessoa possui (sexo
identifica-lo ou senti-lo, culminando na
biológico), das pessoas por quem sente
omissão ao parceiro quanto ao prazer
atração (conduta sexual), de como a
sexual. Esse sentimento negativo é, por
pessoa se identifica (identidade de
vezes associado a si mesma, afetando seu
gênero) e como se comporta (papel de
desenvolvimento emocional e sexual.
gênero).
O pediatra pode falar de forma geral das
diferenças entre o prazer masculino e o
feminino, os tempos da etapa do prazer e a
necessidade de segurança, intimidade na
maneira de o adolescente sentir e vivenciar
o orgasmo.

DIVERSIDADE SEXUAL NA ADOLESCÊNCIA:

Perante a diversidade sexual inerente ao ser

humano, pode-se, de forma didática,
conceituar alguns pontos importantes para o
entendimento do profissional de saúde:

 Sexo biológico: trata-se dos órgãos

sexuais resultantes dos cromossomos
oriundos da fecundação. Pode ser
genitália masculina ou feminina;
 Identidade de gênero: é o sentimento
interno, a percepção de se sentir homem,
mulher ou outro, que cada pessoa tem de
si. Desenvolve-se, inicialmente, por volta
dos 3 anos de idade, paralelamente ao
desenvolvimento da personalidade e
linguagem com as primeiras palavras, e
solidifica-se por volta dos 6 a 7 anos;
 Conduta/Orientação sexual: refere-se ao
objeto de desejo sexual em todas as suas
variações de gênero, ou seja, para onde
a libido está direcionada;
No caso da homossexualidade e da
bissexualidade, o indivíduo possui
identidade sexual idêntica ao sexo biológico.
No entanto, sua orientação afetivo-sexual
está voltada para pessoas do mesmo sexo
biológico (homo) ou para ambos os sexos
(bi). Não se pode, entretanto, durante a
adolescência, dizer que o indivíduo é homo,
hétero ou bissexual, mas sim deve-se
oferecer um aconselhamento para
proporcionar aos jovens experiências
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saudáveis e seguras de descoberta da
sexualidade.
No caso de transgêneros, a identidade
sexual não está de acordo com o sexo
biológico, portanto não reconhecem o corpo
designado ao nascimento como seu e não
seguem os papéis de gênero estigmatizados
pela sociedade. Esses indivíduos sofrem
desde muito cedo, já que percebem essa
incongruência desde os 6 a 7 anos de idade.
Nesse sentido, a criança ou o adolescente,
bem como sua família, deve ser bem
acompanhada por equipe multidisciplinar até
a idade de 16 anos para ingressar em um
serviço especializado de orientação e
redesignação sexual, onde continuará sob
cuidados multidisciplinares e passará por
grande oportunidade de autoconhecimento.
Geralmente, transgêneros necessitam
mudar seus corpos para a realidade interna,
entretanto, genitalizam o desejo e
masturbam-se por meio de seus órgãos
genitais do sexo biológico, fazendo com que
a genitália não necessita ser modificada.
Os transexuais, por sua vez, não
reconhecem a genitália como sua, não
genitalizam o desejo, não se masturbam,
podendo até se esquecerem de se higienizar
intimamente em razão da negação do órgão
sexual, necessitando de cirurgia de
redesignação sexual.
A respeito da conduta sexual, esta não está
vinculada à identidade sexual e, portanto,
pode ser hétero, homo ou bissexual.
Em qualquer das manifestações da
diversidade sexual, o importante é acolher o
adolescente e sua família, criar grupos de
discussão sobre LGBTfobia em
comunidades com levantamento de focos de
tensão e enfrentamentos possíveis e mostrar
que o serviço de saúde é um espaço
protetivo e de acolhimento a qualquer
momento.
TRANSTORNOS ALIMENTA RES NA ADOLESCÊNCIA:
O comportamento alimentar é definido como
respostas comportamentais ou sequenciais
associadas ao ato e a maneira de alimentar-
se, descrevendo padrões rítmicos nesse
processo. Esse tipo de comportamento é
influenciado por condições sociais,
demográficas e culturais, pela percepção
individual e dos alimentos, por experiências
prévias e pelo estado nutricional, sendo
fortemente influenciado principalmente pela
mídia, que expõe de forma contraditória o
apelo a um estilo de vida saudável ao mesmo
tempo em que se enaltece o ideal da
magreza e se incentiva o consumo de
alimentos calóricos.
Na busca por esse estereótipo, a perda de
peso é induzida por métodos inadequados,
como jejum e exercício físico intenso, sendo
o ganho de massa muscular estimulado por
rotinas de exercício intensas, alimentação
inadequada e uso de anabolizantes. Embora
os transtornos alimentares em grande parte
afetem meninas brancas adolescentes, eles
também afetam meninos e cruzam todas as
fronteiras raciais, étnicas e culturais.
Os transtornos alimentares (TA) estão
relacionados a diversas complicações
clínicas possíveis, que variam conforme a
etiologia de cada distúrbio, podendo ocorrer
déficit de crescimento, queilose (formação de
manchas e descamações nos lábios em
decorrência da carência nutricional), erosão
dental, periodontites, hipertrofia das
glândulas salivares, hipovolemia,
desequilíbrio hidroeletrolítico e ganho de
peso.
Quando o início do TA se dá na
adolescência, esses transtornos prejudicam
as relações sociais e familiares, e a ideação
suicida se torna mais comum. Nesse grupo
há maior propensão ao início precoce da vida
sexual (antes dos 16 anos), e também há
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risco elevado de abortamentos ou gestações
indesejadas.
ETIOLOGIA DOS TRANSTORNOS ALIMENTA RES:
Os transtornos alimentares têm etiologia
multifatorial, ou seja, são determinados por
uma diversidade de fatores biológicos,
genéticos, psicológicos, socioculturais e
familiares que interagem entre si para
produzir e perpetuar a doença. Distinguem-
se nesse sentido os fatores predisponentes,
que aumentam a chance de aparecimento do
TA), precipitantes (induzem a manifestação
dos sintomas) e os mantenedores, que
determinam se o transtorno será perpetuado
ou não.
São considerados fatores predisponentes:
sexo feminino, baixa autoestima, traços
obsessivos e perfeccionistas (no caso da
anorexia nervosa) ou impulsividade e
instabilidade afetiva (para a bulimia),
dificuldade em expressar emoções, história
de distúrbios psiquiátricos como depressão,
transtornos de ansiedade (na anorexia) e
dependência de substâncias (na bulimia),
tendência à obesidade, alterações na
neurotransmissão, abuso sexual,
hereditariedade, padrões de relacionamento
familiar envolvendo rigidez e intrusividade
(anorexia) ou desorganização e falta de
cuidados (bulimia nervosa), além dos fatores
socioculturais supracitados. A puberdade
precoce é um fator de risco, particularmente
para o desenvolvimento da bulimia.
O aumento importante da gordura corporal
em meninas adolescentes requer uma
reorganização da imagem corporal e pode
reforçar as preocupações prévias com o
peso. Nesse sentido, o papel das mães na
formação da opinião de seus filhos acerca do
valor da aparência é bastante relevante, uma
vez que as genitoras de pacientes com TA
tendem a ser mais críticas e preocupadas
com o peso de suas filhas, estimulando-as a
fazer dieta. Pertencer a grupos profissionais
que reforçam a demanda por um corpo
magro, como atletas, bailarinas e modelos
também é um fator de risco para essas
condições.
A realização de dietas para emagrecer é o
fator precipitante de maior frequência nos
TA, tendo como possível justificativa o fato
de que restrições alimentares favorecem o
surgimento da compulsão alimentar, dando
início ao ciclo compulsão/purgação da
bulimia nervosa. Algumas pessoas em
restrição alimentar, no entanto, conseguem
aumentar cada vez mais a restrição,
instalando-se a desnutrição, que aumenta a
distorção da imagem corporal e,
consequentemente, o medo de engordar e o
desejo de emagrecer, perpetuando assim a
anorexia nervosa.
Eventos estressores envolvendo
desorganizações no estilo de vida ou
ameaças à integridade pessoal (doença,
gravidez, abuso sexual ou físico), alterações
na dinâmica familiar e expectativas irreais
podem ter um papel desencadeador do
transtorno por reforçar sentimentos de
insegurança e inadequação.
Os fatores mantenedores dessas doenças
podem ser diferentes daqueles que a
desencadearam, incluindo o papel das
alterações psicológicas e fisiológicas
produzidas frente à desnutrição e os
episódios constantes de compulsão,
tendendo a perpetuar o transtorno.
Na anorexia nervosa, o estado de
desnutrição gera alterações
neuroendócrinas que podem contribuir para
a manutenção de vários sintomas do
distúrbio. Uma possível hiperatividade de
hormônio liberador de corticotrofina (CRH)
pode contribuir para manter o baixo peso na,
já que esse hormônio causa anorexia,
aumenta a atividade motora e inibe a
atividade sexual. Os níveis plasmáticos de
leptina são alterados devido à desnutrição na
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e esses podem normalizar-se
prematuramente ao peso, dificultando a
recuperação e manutenção do ganho
ponderal normal.
Episódios bulímicos têm um impacto adverso
sobre o metabolismo de glicose e insulina,
pois ocorre um aumento de glicemia de jejum
no dia após uma crise e maior resposta da
insulina durante um teste bulímico. Estas
evidências possivelmente justificam a
dificuldade de se estabelecer um balanço
energético adequado em pacientes com
esse TA.
socioeconômico, perfeccionismo e tendência
a evitar conflitos e riscos, podendo lutar
contra distúrbios de ansiedade ou humor.
Os critérios definidos no para diagnosticar a
anorexia definidos no DSM-IV incluem a
amenorreia, peso abaixo de 85% do mínimo
esperado para a idade e altura, distúrbios no
reconhecimento do próprio peso e medo
intenso de engordar.

Fatores psicológicos (distorção da imagem

corporal, deturpações cognitivas e
pensamentos obsessivos sobre comida e
maior necessidade de controle
desencadeado pela privação alimentar),
interpessoais e culturais também atuam A bulimia nervosa (BN) é caracterizada por
perpetuando o transtorno. Há também os episódios em que se come compulsivamente
aspectos reforçadores produzidos pelo uma grande quantidade de comida num
sucesso em controlar o peso, tão valorizados período breve, seguido de vômitos
culturalmente, em indivíduos que costumam compensatórios, uso de laxantes e exercício
vivenciar sentimentos de baixa autoestima e ou jejum para livrar o corpo dos efeitos de
sensação de falta de controle sobre a própria comer em demasia, em um esforço para
vida. evitar a obesidade. Esse quadro tende a
surgir na adolescência tardia, por vezes
OS PRINCIPAIS TRANSTORNOS ALIMENTARES NA evoluindo da NA, sendo tipificada pela
ADOLESCÊNCIA: impulsividade e características do transtorno
A anorexia nervosa (AN) envolve uma de personalidade borderline que estão
significativa superestimação do tamanho e associadas à depressão e às alterações de
da forma corporal, com busca incansável humor.
pelo emagrecimento que, normalmente,
Os critérios diagnósticos para a BN, de
combina dieta restritiva (limitando o consumo
acordo com o DSM-IV são episódios de
de carboidratos e lipídios) excessiva e
compulsão alimentar recorrentes e ou
exercícios compulsivos. No subtipo de
comportamentos compensatórios
excesso e purgação (binge-purge), os
inapropriados, com frequência de ao menos
pacientes podem comer em demasia de
uma vez por semana, por três meses, além
forma intermitente e depois tentar livrar-se
da autoavaliação deturpada quanto ao peso
das calorias por vômitos ou tomando
e à altura.
laxantes, ainda com forte busca pela
magreza. As características clássicas de um
paciente com esse distúrbio são ser uma
garota no período inicial ou intermediário da
adolescência, com bom status
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
A maioria dos adolescentes com transtornos
alimentares não preenche todos os critérios
diagnósticos para as síndromes
supracitadas, mas podem ser encaixados na
categoria de transtorno alimentar não
especificado (TANE). Nesse grupo estão os
quadros subclínicos de AN e BN, a
compulsão alimentar clínica ou subclínica, a
purgação e outas manifestações diversas.
Compulsões alimentares, de um modo geral,
estão associadas a três ou mais dos
seguintes indícios:
 Comer muito mais rapidamente que o
normal;
 Comer até se sentir desconfortável;
 Comer grandes volumes de alimento sem
estar com fome;
 Comer sozinho por sentir-se
envergonhado da quantidade que está
ingerindo;
 Sentir-se desapontado comigo mesmo ou
deprimido após o exagero alimentar.
Diferentemente da BN, na compulsão
alimentar o indivíduo não utiliza métodos
para compensar a quantidade exagerada de
alimentos ingerido. Esse quadro é comum
em crianças, principalmente naquelas
obesas. Casos subclínicos de tal transtorno
também podem ocorrer, nos quais o
sentimento de falta de autocontrole está
presente mesmo sem ingesta exagerada.
O transtorno purgativo é um TA pouco
estudado. Nele, o indivíduo utiliza métodos
de expulsão alimenta, como como o vômito e
o uso de laxativos e diuréticos, sem que a
compulsão necessariamente preceda esse
evento. Nos casos clínicos, os episódios
ocorrem em média duas vezes por semana
durante três meses. Nos casos subclínicos,
o critério de frequência e duração não é
atendido.
A obesidade também se enquadra como um
transtorno alimentar. Desde o início da vida
é a mãe que apresenta a alimentação a seu
filho, por meio do aleitamento. Nesse
sentido, é estranho o fato de que mesmo
sendo o leite materno o alimento ideal para o
bebê, muitos deles desenvolvem sobrepeso
já nos primeiros meses de vida. Essas são
situações nas quais é possível diagnosticar
distorções na relação mãe e filho, com uma
necessidade compulsiva da genitora de
“alimentar” ou manter-se ligada à criança.
Da mesma forma, em crianças pequenas, já
aparece a obesidade, ou seja, o peso muito
acima do esperado para a idade, com os pais
ou cuidadores oferecendo os excessos e a
criança correspondendo a eles, inicialmente
de forma obediente e passiva aos desejos
dos mais velhos. Quando questionados,
habitualmente colocam a responsabilidade
da ingesta inadequada e exacerbada na
própria criança, como se ela tivesse a
autonomia na obtenção do alimento nocivo.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:
A formulação de uma hipótese diagnóstica
adequada deve ser fruto não só da
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identificação de sinais e sintomas típicos de
TA, como também de da coleta de um
histórico detalhado e da realização de exame
físico completo.
A perda de peso pode ocorrer com qualquer
condição na qual haja aumento do
catabolismo ou má absorção, mas essas
doenças estão geralmente associadas a
outros achados e muitas vezes não são
associadas à diminuição da ingestão
calórica. Pacientes com doença intestinal
inflamatória podem reduzir a ingestão para
minimizar cólicas abdominais; comer pode
causar desconforto abdominal e saciedade
precoce na anorexia nervosa em virtude da
atonia gástrica associada à significativa
perda de peso, e não à má absorção. Da
mesma forma, sinais de perda de peso na
AN podem incluir hipotermia, acrocianose
(extremidades frias e pegajosas) com
preenchimento capilar lento e neutropenia
sugerindo sepse intensa, mas o quadro geral
nos transtornos é de relativa estabilidade
cardiovascular.
Endocrinopatias também são diferenciais de
TA. Com a bulimia nervosa, o apetite voraz
em face da perda de peso pode sugerir
diabetes mellitus, mas os níveis de glicose
no sangue são normais ou baixos nesses
distúrbios alimentares. A insuficiência
adrenal mimetiza muitos sintomas e sinais
físicos encontrados na anorexia nervosa
restritiva, mas está associada a níveis
elevados de potássio e hiperpigmentação.
Embora os distúrbios da tireoide sejam
muitas vezes considerados, devido a
alterações no peso e outros sintomas na AN,
a apresentação geral inclui tanto sintomas de
tireoide hipoativa quanto hiperativa, como
hipotermia, bradicardia e prisão de ventre,
além de perda de peso e atividade física
excessiva, respectivamente.
No sistema nervoso central,
craniofaringiomas e tumores na bolsa de
Rathke podem mimetizar alguns dos
resultados da anorexia nervosa, como perda
de peso e falta de crescimento, e mesmo
alguns distúrbios de imagem corporal, mas
os últimos são menos fixos do que nos
transtornos típicos e estão associados a
outros achados, incluindo evidências de
aumento da pressão intracraniana. Qualquer
paciente com apresentação atípica de um
TA, com base na idade, sexo ou outros
fatores não típicos de AN ou BN, merece
uma busca escrupulosa de explicação
alternativa.
As principais características dos hábitos
alimentares disfuncionais, como distúrbio de
imagem corporal e mudança no peso, podem
coexistir com condições como diabetes
mellitus, em que os pacientes podem
manipular a dosagem de insulina para perder
peso.
COMPLICAÇÕES CLÍNICA S DOS TRANSTORNOS
ALIMENTARES:
As complicações clínicas relacionadas à
anorexia nervosa são decorrentes da própria
desnutrição, enquanto na bulimia nervosa,
estas são comumente relacionadas ao
distúrbio hidroeletrolítico decorrente da
êmese constante.
COMPLICAÇÕES GASTROINTESTINAIS:
Na bulimia nervosa verifica-se a presença do
Sinal de Russel (calo no dorso da mão, pela
lesão da pele com os dentes ao provocar o
vômito), eritema no palato, faringe e gengiva
e alterações dentárias como erosão do
esmalte dentário que fica com aspecto liso e
opaco, e maior susceptibilidade a cáries.
Ocorre hipertrofia das glândulas parótidas
devido ao elevado consumo de carboidratos
que podem causar intensa estimulação das
glândulas. A regurgitação contendo ácido
gástrico, a alcalose metabólica, a
desnutrição e o aumento do estímulo
autonômico secundário à estimulação dos
receptores linguais gustativos aumentam a
liberação de enzimas proteolíticas
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pancreáticas contribuindo também para a
parotidite.
A constipação está entre as manifestações
mais frequentes tanto na anorexia quanto na
bulimia e decorre do uso de laxantes que, se
utilizados por longos períodos, podem levar
a danos irreversíveis ao cólon intestinal.
Observa-se também um retardo no
esvaziamento gástrico nesses grupos de
pacientes, que se queixam de sensação de
plenitude pós-prandial e distensão
abdominal.
Anoréxicos podem desenvolver pancreatite,
alteração de enzimas hepáticas, diminuição
do peristaltismo intestinal e esteatose
hepática relacionada ao jejum.
Bulímicos sentem dores abdominais, podem
desenvolver gastrite, erosões
gastresofágicas, sangramentos e prolapso
retal. Em casos mais graves ocorre
perfuração esofágica e ruptura gástrica. Os
vômitos frequentes levam à perda do reflexo
da náusea e ao relaxamento do esfíncter
esofagiano inferior, causando esofagite e
sangramento da mucosa intestinal,
culminando com uma laceração grave.
A anemia e a leucopenia são achados
frequentes nos dois transtornos típicos. A
anemia é, usualmente, do tipo normocítica e
normocrômica, porém também pode ocorrer
anemia do tipo ferropriva, em decorrência da
deficiência de ingestão de ferro ou de
sangramento retal por uso excessivo de
laxativos. A anemia macrocítica ocorre por
déficit de vitamina B12 ou folato, leucopenia
com linfocitose relativa e trombocitopenia.
COMPLICAÇÕES METABÓLICAS:
Alterações metabólicas são encontradas
tanto na bulimia quanto na anorexia, tendo
como exemplos a hipoglicemia,
hipercolesterolemia, hipocalemia,
hiponatremia, hipocloremia e alcalose
metabólica, além de desidratação.
A hipoglicemia tanto pode ocorrer após
jejuns prolongados, como em resposta a um
episódio de compulsão alimentar seguido de
vômitos, sendo normalmente assintomática.
A hipercolesterolemia é frequente na AN e
decorre, provavelmente, da redução dos
níveis de T3 e da globulina carreadora de
colesterol, perda do colesterol intra-hepático
ou da diminuição da excreção fecal de ácidos
biliares e colesterol. A redução dos níveis de
T3 em anoréxicos ocorre provavelmente
como um mecanismo adaptativo à
desnutrição. Clinicamente, o paciente pode
apresentar pele seca e amarelada
(hipercarotenemia), constipação,
intolerância ao frio e bradicardia.
Os distúrbios do equilíbrio ácido-base
ocorrem principalmente nos casos de uso de
laxativos ou de diuréticos e também com a
prática de vômitos auto-induzidos,
resultando, respectivamente, em acidose
metabólica e alcalose metabólica
hipocalêmica. A hipocalemia é uma das
complicações mais encontradas nos TA e
das de maior risco para o desenvolvimento
de arritmias cardíacas. É causada pelo
vômito, desnutrição e abuso de
medicamentos depletores de potássio (como
os produtos usados na purgação). Os
sintomas incluem fraqueza, confusão,
náusea, palpitações, arritmia, poliúria, dor
abdominal e constipação. A
hipomagnesemia pode acompanhar a
hipocalemia em 30% dos casos, sendo
comum na AN, e pode ser uma
consequência da grande ingestão de água
ou às flutuações do hormônio antidiurético
(ADH). A hiperfosfatemia pode ser resultado
da desnutrição ou surgir como parte da
síndrome de realimentação.
Alterações endócrinas são encontradas
tanto em pacientes com AN quanto com BN,
porém a observação de uma menor
gravidade das complicações nesta última
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
pode ser explicada pela ausência de perda
de peso significativa.
Pacientes com bulimia podem sofrer de
irregularidade menstrual, porém nas
anoréxicas as consequências são mais
graves, pois há ausência da menstruação,
infertilidade, diminuição de gonadotrofina,
hormônio luteinizante e estrogênio, aumento
do hormônio de crescimento e cortisol, e
diminuição do T3 reverso. A amenorreia
pode ser acompanhada de várias
anormalidades, como regressão dos ovários
para estágios pré-puberais com múltiplos
folículos pequenos, regressão do tamanho
mamário e raramente, perda parcial dos
pelos pubianos. O útero também se encontra
diminuído e observam-se mudanças
atróficas na parede vaginal levando a
dispareunia (dor durante o ato sexual) e
diminuição da libido.
A AN, quando ocorre no sexo masculino,
está acompanhada de níveis baixos de
testosterona e hormônios gonadotróficos
(FSH e LH), associados a uma redução do
volume testicular com oligo ou azoospermia.
Outra característica é a redução da libido que
pode persistir mesmo após a recuperação do
peso corporal.
COMPLICAÇÕES IMUNOLÓGICAS:
Em 1960 foram iniciados estudos que
buscam relacionar a nutrição com a
capacidade imunológica do organismo,
descrevendo que a alimentação constitui um
fator crítico para a função imune. Vários são
os nutrientes que estão envolvidos na
integridade deste sistema e sua depleção
representa risco para uma resposta precária.
A desnutrição energético-proteica pode levar
a atrofia linfoide, com redução do tamanho e
peso do timo. A nível histológico existe
redução na diferenciação da região
corticomedular com redução das células
linfoides. As respostas soro-anticorpo são
mantidas em quadros de desnutrição
energético-proteica, porém a afinidade da
ligação encontra-se reduzida. A atividade
fagocítica, e a concentração e atividade de
muitos componentes do sistema
complemento estão também diminuídas.
Outro fator que também pode contribuir para
redução da função imune em pacientes
anoréxicos é a deficiência nas
concentrações de Leptina (Lp) sérica e no
fluido cerbroespinhal. Este fato pode ser
explicado devido a grave depleção de massa
gorda refletida também no baixo IMC que
existe nesta patologia.
A Lp é uma proteína produzida e liberada por
adipócitos em proporção a quantidade de
lipídios armazenada no tecido adiposo. A
leptina tem sido relacionada à regulação de
diversos sistemas incluindo o sistema imune,
através de seus efeitos imumoduladores. A
Lp ativa linfócitos T, aumenta a resposta Th1,
atua sobre monócitos e macrófagos
favorecendo sua sobrevivência, proliferação
e ativação. Já foram identificados receptores
para leptina nas células hematopoiéticas,
nas quais a leptina, estimula o
desenvolvimento normal de células
mieloides e eritroides. Além disso, a leptina
age sinergicamente com outras citocinas
melhorando a proliferação de leucócitos,
especificamente das células T4.
COMPLICAÇÕES SISTÊMICAS:
Pacientes anoréxicos sofrem de alterações
no sistema renal como edema, cálculo renal
e elevação de ureia devido à desidratação ou
ao catabolismo proteico. A hipocalemia
decorrente das práticas compensatórias
pode determinar uma alteração tubular renal,
conhecida como nefropatia hipocalêmica. A
desidratação crônica e os níveis elevados de
oxalato de cálcio favorecem o
desenvolvimento de cálculos renais.
Indivíduos tanto bulímicos quanto anoréxicos
podem sofrer de hipotensão, bradicardia,
arritmias, insuficiência cardíaca,
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
miocardiopatia, alterações do
eletrocardiograma e parada cardíaca. A
hipotensão arterial pode ser encontrada em
até 85% dos pacientes com AN e resulta do
estado de depleção crônica de volume
circulante. A bradicardia decorre da redução
do metabolismo em adaptação a inanição,
por alterações na conversão do T4 em T3 ou
por hiperatividade vagal. A taquicardia pode
também ocorrer como resposta à da enzima 5-alfa redutase. Os cabelos
desidratação. A desnutrição pode conduzir à
atrofia do músculo cardíaco e a uma redução
da massa ventricular esquerda com
consequente desenvolvimento de prolapso
mitral. A hipocalemia, por sua vez, pode
induzir o aparecimento de arritmias graves.
Durante o tratamento, os pacientes com
anorexia podem apresentar a chamada
síndrome de realimentação, quadro
caracterizado por um colapso cardiovascular
após a introdução da alimentação em um
paciente desnutrido. Ocorre devido à
sobrecarga de ingestão calórica na presença
de capacidade reduzida do sistema
circulatório.
Alterações respiratórias como edema
pulmonar, secundário à falência cardíaca
congestiva na síndrome de realimentação,
pneumomediastino secundário à momento final da menoridade, de acordo
broncoaspiração, em decorrência dos
vômitos excessivos, taquipneia decorrente
da acidose metabólica, e bradipneia em
resposta à alcalose metabólica.
Em aproximadamente metade dos
indivíduos com AN, a densidade mineral
óssea está muito abaixo do normal. A má
nutrição reduz a formação de osso, que
associada à puberdade atrasada, ao
hipercortisolismo, à diminuição da ingestão
de cálcio, proteínas e vitamina D, favorecem
à queda da densidade óssea, levando a uma
diminuição ou suspensão do crescimento
ósseo linear. Quando a AN ocorre na fase
precoce da puberdade, pode ocorrer
osteopenia ou até mesmo osteoporose
irreversível. A osteopenia também pode
ocorrer no sexo masculino, em decorrência
da diminuição da testosterona sérica.
Pacientes com anorexia possuem, além de
pele seca e amarelada em decorrência do
acúmulo de betacaroteno, também há a
presença de lanugo, oriundo do estado de
hipotireoidismo ou da redução da atividade
encontram-se ralos, finos e opacos, por
vezes quebradiços e avermelhados, as
unhas podem se encontrar frágeis e com
crescimento lento, favorecendo o
desenvolvimento de quadros micóticos.
Em decorrência da inanição presente em
alguns casos de TA, pode surgir catarata,
atrofia do nervo óptico, degeneração da
retina e diminuição da acuidade visual.
DESENVOLVIMENTO PSIC OSSOCIAL NA
ADOLESCÊNCIA – INTERAÇÕES SOCIAIS,
FAMILIARES, ESCOLARES E DE AUTOIMAGEM:
A adolescência pode ser definida de diversas
formas: para a antropologia, representa um
período sociocultural iniciado com os ritos de
passagem e que se encerra com a chegada
à fase adulta, conforme as normas vigentes
naquela sociedade; para o direito, esse é o
com a legislação correspondente, ocorrendo
logo ao final da infância; no âmbito da
sociologia, essa fase é uma etapa do
homem, determinada por cada sociedade; e,
por fim, para a medicina, corresponde a um
período de crescimento e desenvolvimento
do ser humano, em vários aspectos,
estendendo-se dos dez aos vinte anos de
idade.
É nessa etapa da vida que se instalam as
características definitivas da personalidade
adulta, sendo o último conflito evolutivo antes
da maturidade. De acordo com a psicanálise,
a adolescência é caracterizada por uma crise
narcísica, com intensas angústias da pessoa
na busca por sua identidade e autonomia.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O desenvolvimento é identificado como um
processo amplo e dinâmico de diferenciação
e amadurecimento, representando um
aspecto fundamental para a distinção dos
termos puberdade e adolescência. Enquanto
o primeiro engloba o conjunto de mudanças
físicas que transformam o corpo infantil em
adulto, compondo a base biológica da
adolescência, esta última inclui também os
componentes psicológicos e sociais
característicos desse momento.
A puberdade é um fenômeno único, universal
e inexorável, independente da vontade do
indivíduo. É possível determinar com
precisão o seu início (marcos do estágio 2 de
Tanner) e término (estabilização do
crescimento e função reprodutiva plena).
Como todo processo de crescimento, é
possível avaliar a puberdade por meio de
parâmetros preestabelecidos, como peso,
estatura ou índice de massa corporal, e
compará-la por intermédio dos gráficos e
escalas internacionais.
A adolescência, também de caráter
transitório, apresenta, no entanto,
características mais complexas e criativamente, de formular ideias próprias e
imprecisos, particularmente porque se
complementa de forma particular conforme o
contexto sociocultural no qual esse jovem
está inserido.
Esse é um período difícil, no qual o indivíduo
deve se preparar para o exercício de sua
autonomia de forma plena, sendo nessa fase
que se compreende a importância biológica,
social e afetiva do outro para a consolidação
de si mesmo.
CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DO
DESENVOLVIENTO PSICOSSOCIAL:
Mesmo que ao considerar a adolescência os
aspectos cronológicos percam sua
relevância, para que se possa compreender
a evolução do processo, é interessante
analisar o desenvolvimento dividido por
idade, compondo assim três grandes etapas:
adolescência inicial, dos 10 aos 13 anos;
adolescência média, dos 14 aos 16 anos; e
adolescência final, dos 17 aos 20 anos.
A adolescência inicial é marcada pelo rápido
crescimento e pela entrada na puberdade. A
adolescência média caracteriza-se pelo
desenvolvimento intelectual e pela maior
valorização do grupo, e na adolescência
tardia consolidam-se todas as mudanças
anteriores e o adolescente se prepara para
assumir o mundo adulto, o que ocorrerá
quando todas as transformações tiverem
ocorrido como previsto, incluindo a presença
de suporte familiar e do grupo de iguais.
ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E
MORAL:
Do ponto de vista cognitivo, o adolescente
conquista a capacidade de abstrair, o
raciocínio hipotético, a habilidade de pensar
originais, de julgar o impacto de suas
decisões, e de criar opiniões pessoais que
fomentam a individualidade. Ou seja, além
da evolução do pensamento concreto para o
pensamento lógico formal (possibilidade de
interpretação figurada dos acontecimentos),
é na adolescência que as necessidades
intelectuais e a capacidade para utilizar o
conhecimento atingem seu pico máximo.
Como esses processos podem se
desenvolver em ritmos bastante diferentes,
adolescentes da fase inicial podem ter a
capacidade de usar o raciocínio lógico em
trabalhos escolares, mas não em dilemas
pessoais, uma vez que a carga emocional
excessiva pode causar regressão ao
raciocínio operacional, interferindo na
capacidade de ponderar acerca dos
resultados a longo prazo de uma decisão.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O desenvolvimento do raciocínio moral é
paralelo à evolução cognitiva. Enquanto
crianças menores veem suas relações com
adultos em termos de poder e temem a
punição, os pré-adolescentes começam a
perceber o certo e o errado como absolutos
e inquestionáveis, tornando-se cada vez
mais multidimensionais à medida que aquele
jovem chega próximo da maturidade,
permitindo que eles contemplem situações
hipotéticas.
Alguns teóricos argumentam que a transição
de operações concretas para formais é
consequência de aumentos quantitativos em
conhecimento, experiência e eficiência
cognitiva, e não de uma reorganização
qualitativa do raciocínio, opinião que está de
acordo com a tendência observada para o
aumento da velocidade de processamento
de informações desde o final da infância até
s anos iniciais da maturidade, estando
associada a uma remoção de vias sinápticas
pouco utilizadas e à mielinização constante
de neurônios, otimizando a função do
cérebro.
Os adolescentes também vivenciam o
desenvolvimento do córtex pré-frontal
dorsolateral e do giro temporal superior,
áreas responsáveis pela habilidade de inibir
impulsos, pesar as consequências de
decisões, priorizar e traçar estratégias. Com
relação à maturação do comportamento
neurológico, os adolescentes podem
experimentar maior intensidade de emoções
ou maior tendência a buscar experiências
que criem tais sensações. O AUTOIMAGEM E CONCEITO DE SI PRÓPRIO:
desenvolvimento cognitivo também difere de
acordo com o sexo, com as meninas se
desenvolvendo mais cedo que os meninos.
Na adolescência média, devido à transição
para o pensamento formal lógico, os jovens
passam a questionar e analisar
extensivamente as situações a sua volta,
tendo capacidade cognitiva suficiente para
entender a complexidade do mundo, refletir
sobre si mesmos (metacognição) e começar
a entender suas ações num contexto moral e
legal.
O questionamento sobre convenções morais
estimula a criação de códigos pessoais de
ética, que podem ou não serem semelhantes
ao de seus pais. Há maior noção acerca do
motivo pelo qual as regras existem nesse
período, uma vez que a visão de mundo dos
adolescentes passa a não ser estritamente
dicotômica, sendo possível questionar de
forma mais concreta aspectos referentes à
justiça, à segurança e ao bem comum.
Durante a adolescência tardia, por fim, a
cognição deixa de ser autocentrada,
havendo mais pensamentos sobre
patriotismo, história e a importância do
“justo”.
Os adolescentes mais velhos são mais
orientados para o futuro e capazes de agir
com planos de longo prazo, retardar a
gratificação, assumir compromissos, impor
limites e pensar independentemente. Nesse
momento é comum que os jovens sejam
idealistas, mas podem também ser
absolutistas e intolerantes a pontos de vista
que não os seus. Nesse sentido, grupos
políticos e/ou religiosos são especialmente
atraentes.
Com a emancipação iminente, os
adolescentes mais velhos iniciam a transição
para papéis de adultos no trabalho e nos
seus relacionamentos.
A individualidade é um aspecto intrínseco ao
processo de desenvolvimento que se
constrói durante toda a vida. Desde o
nascimento, a criança interage com o meio
ambiente, contato que formará sua
identidade e inteligência, suas emoções,
seus medos, sua personalidade e sua
autonomia. Assim, a construção da
identidade encontra-se diretamente
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
relacionada ao desenvolvimento
psicossocial, com íntima dependência da
cultura e da sociedade.
Vários teóricos no âmbito da psicanálise
discutiram o fenômeno da adolescência.
Entre eles, Anna Freud acreditava que a
relação entre as principais instâncias da
mente (id, ego e superego) passa por
mudanças qualitativas durante a puberdade,
sendo possível ocorrer desequilíbrios e
conflitos entre elas. Seria a fase de
perturbações transitórias entre os mundos
psicológicos relativamente estáveis da
infância e da idade adulta. Como exemplos,
citam-se a intelectualização e o ascetismo
típicos da adolescência.
A adolescência corresponde também a uma
crise normativa, um processo de evolução
caracterizado pela organização do indivíduo.
A aquisição do sentimento de identidade,
como a consciência que a pessoa tem de si
mesma, é o aspecto mais importante do
desenvolvimento psicológico do
adolescente. Por isso, considera-se que a
denominada crise da adolescência é,
fundamentalmente, uma crise de identidade,
tendo como finalidade a descoberta do “eu”.
A impulsividade, típica do adolescente, é a
externalização desse processo.
O desenvolvimento psicossocial do
adolescente se desenrola como um exercício
de aprendizagem acerca de si mesmo, que
lhe possibilita alcançar, além da identidade
(conhecimento de si mesmo), intimidade
(capacidade para relacionar-se de forma
madura), integridade (aptidão para assumir
atitudes e comportamentos socialmente
responsáveis) e independência. Nesse
momento evolutivo, não será apenas o jovem
que sofrerá transformações estruturais, mas
a família também deverá alterar sua
estrutura interna e seus padrões de
relacionamento entre os membros.
Na adolescência primária, a autoconsciência
está centrada em características externas, o
que é invertido para o outro extremo, o da
introspecção, durante a fase tardia desse
processo. É normal que adolescentes jovens
se preocupem com as mudanças físicas,
esquadrinhem sua aparência e sintam que
todos estão olhando para eles.
A mídia, com sua super-representação de
sexo, violência e uso de drogas, tem
influência profunda sobre as normas
culturais e sobre o senso de identidade do
adolescente, principalmente no atual
contexto cultural, no qual a exposição aos
meios digitais é constante.
Esse contato desmedido pode levar as
meninas a desenvolver um senso deturpado
de feminilidade, dando margem para o
desenvolvimento de transtornos alimentares.
Da mesma maneira, os meninos podem ter
dificuldades com sua autoimagem, pois as
imagens de masculinidade podem ser
confusas, levando a dúvidas, insegurança e
conceitos incorretos sobre o comportamento
masculino.
Os adolescentes que se desenvolvem antes
de seus pares, especialmente as garotas,
podem apresentar taxas mais altas de
dificuldade escolar, insatisfação com o corpo
e depressão. Esses jovens parecem adultos
e podem ter expectativas adultas sobre eles
mesmos, mas não estão cognitiva ou
psicologicamente maduros para satisfazê-
las.
Os indivíduos que vivenciam a fase média da
adolescência aceitam melhor suas
mudanças corporais, se afiliando a um grupo
de iguais como um mecanismo importante de
confirmação da identidade e da autoimagem
de si próprio. É normal que os adolescentes
se identifiquem com pessoas diferentes,
mudando seu estilo de roupas, grupos de
amigos e interesses de forma frequente.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Sentimentos intensos de agitação interna e
sofrimento são comuns. As meninas tendem
a definir a si e a seus colegas de acordo com
relacionamentos interpessoais, enquanto os
meninos podem focar. Nessa faixa etária, os
meninos que se desenvolvem mais tarde que
seus pares, podem experimentar uma
autoimagem pior e ter taxas maiores de
dificuldade escolar.
RELAÇÕES INTERPESSOAIS – FAMÍLIA, AMIGOS E A
SOCIEDADE:
Para que a busca da identidade adulta possa
acontecer, é necessário que o jovem
vivencie o luto por três grandes perdas,
sendo a primeira a perda do corpo infantil, a
segunda a perda dos pais da infância
(representada pelos conflitos mais intensos
com os familiares e pelo possível
distanciamento moral), e a terceira, a perda
da identidade e do papel infantil.
A elaboração dessas perdas manifesta-se
por meio de atitudes comportamentais e
emocionais que se caracterizam como uma
manifestação semipatológica perturbadora
para o mundo adulto, denominada como
síndrome da adolescência normal (SAN). A
ocorrência dessa síndrome pode ser
explicada pela interação de sinais que
expressam desestabilização nas áreas
biológica, psicológica e social e compreende
as seguintes manifestações de conduta:
busca de si mesmo e da identidade adulta,
separação progressiva dos pais, tendência
grupal, necessidade de intelectualizar e
fantasiar, crises religiosas, deslocação
temporal, contradições sucessivas nas
manifestações de conduta, atitude social
reivindicatória, constantes flutuações do
humor e do estado de ânimo e evolução
sexual.
A separação progressiva dos pais pode ser
observada facilmente nas etapas iniciais da
adolescência, quando determinados
comportamentos familiares são rejeitados
pelos adolescentes, que passam a se vestir
de forma diferente e a rejeitar
demonstrações públicas de afeto. Muitas
vezes, esse tipo de atitude é interpretado
como distanciamento, mas essa
manifestação de conduta é até esperada
como parte do processo de independência e
autonomia.
Na medida em que se afastam dos pais, os
adolescentes aproximam-se cada vez mais
do grupo de amigos ou de iguais. O grupo
não necessariamente apresenta
peculiaridades reconhecidas por muitos
adultos como radicais, podendo ser a turma
com a qual o indivíduo convive em suas
atividades cotidianas. O que caracteriza esse
bando é o interesse comum e a possibilidade
de identificação entre seus pares.
A provocação dirigida ao sexo oposto,
comentários e atos homofóbicos e fofocas
relacionadas a sexo são comuns nesse
período inicial e indicam o aumento da
consciência sexual. Embora inapropriados,
são meios de lidar com inseguranças
pessoais e buscar aprovação social, pois
nessa faixa etária, pertencer é o mais
importante.
O relacionamento de um adolescente jovem
com a sociedade está centrado na escola. A
mudança do ensino fundamental para o
ensino médio envolve deixar a proteção de
um ambiente mais intimista para assumir as
responsabilidades inerentes à reta final da
educação básica. Essa mudança na
estrutura escolar reflete e reforça as
mudanças envolvidas na separação da
família.
A adolescência média representa o período
estereotipado do desenvolvimento, com o
relacionamento com os pais tornando-se
cada vez mais tenso e distante, com a
energia neles investida direcionada para o
convívio com os colegas. Os namoros
podem se tornar o gatilho de batalhas entre
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
pais e filhos, e o problema real pode ser a
separação dos pais e não a questão “com
quem” ou “quão tarde”.
Como parte da preocupação com o futuro, os
jovens começam a pensar seriamente sobre
o que querem ser quando adultos, uma
questão confortavelmente hipotética até
então. Esse processo envolve a Tendo
autoavaliação e a exploração das
oportunidades disponíveis. A presença ou a
ausência de modelos realistas, ao contrário
daqueles idealizados em períodos
anteriores, pode ser crucial para a escolha
individual.
Na fase terminal da adolescência, as
emoções são mais constantes, tornando-os
menos impulsivos. A necessidade de
pertencimento a um grupo diminui, com o
aumento da precedência de relacionamentos
íntimos, que criam um importante
componente da identidade desse grupo. Ao
contrário dos namoros superficiais do meio
da adolescência, estes relacionamentos
envolvem cada vez mais amor e
compromisso. As decisões sobre a carreira
tornam-se mais prementes, pois o
autoconceito do adolescente está cada vez
mais ligado ao seu papel emergente na
sociedade.
CONSUMO DE DROGAS LÍ CITAS E ILÍCITAS NA
ADOLESCÊNCIA:
Os adolescentes são influenciados por uma
complexa rede de fatores envolvendo o
desenvolvimento biológico e psicossocial, as
mensagens vindas do ambiente e as atitudes
da sociedade com a qual convivem diante do
consumo de substâncias como álcool,
tabaco e maconha. O uso eventual de
bebidas alcoólicas, por exemplo, pode ser
visto como “normal” ou como um “rito de
passagem”, tendo em vista o grande número
de jovens que relatam já terem consumido
álcool alguma vez. Contudo, tendo em vista
os riscos adicionais relacionados ao
consumo de álcool e outras substâncias
psicoativas (como trauma relacionado a
acidentes de trânsito e violência), mesmo o
uso eventual deve ser motivo de
preocupação.
ETIOLOGIA DO ABUSO DE SUBSTÂNCIAS:
em vista o estágio de
desenvolvimento em que os adolescentes se
encontram, é fundamental que o pediatra e
demais profissionais envolvidos em seu
atendimento levem em consideração as
condicionantes biológicas, psicológicas e
sociais que os tornam mais vulneráveis aos
efeitos das substâncias psicoativas quando
comparados aos adultos.
O aspecto biológico fundamental é que o
cérebro do adolescente ainda está em
processo de crescimento e desenvolvimento,
e essa dinâmica pode ser prejudicada pela
exposição a agentes químicos externos,
tornando o jovem que frequentemente usa
ou abusa de substâncias psicoativas mais
susceptível a falhas cognitivas e de funções
executivas cerebrais.
As vulnerabilidades psicológicas nessa faixa
etária, intimamente relacionadas com a
vulnerabilidade biológica, estão ligadas ao
fato de que habilidades como capacidade de
controlar impulsos, adotar um processo
racional de tomada de decisões, exercitar
julgamentos e perceber o impacto de suas
decisões ainda não estão totalmente
desenvolvidas, o que, somado ao aumento
nos níveis de receptores de dopamina no
córtex pré-frontal e no sistema límbico,
favorece o uso de drogas e a participação de
atividades que ativem a via do sistema de
recompensa.
Quanto ao aspecto social, quando grande
parte da energia do adolescente está voltada
aos processos de obtenção da substância
psicoativa, é bem possível que haja
comprometimento de suas relações
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
interpessoais, no estabelecimento de grupos
sociais estáveis que atuem como suporte e
na aquisição de conhecimentos e
habilidades avaliadas como positivas.

Os fatores de risco para o uso de drogas

pelos adolescentes podem ser diferentes dos
fatores de risco para o abuso de drogas
pelos mesmos. O uso de drogas está mais
relacionado com fatores sociais e com seus
pares, enquanto o abuso resulta mais
frequentemente de uma interação de fatores
psicológicos e biológicos. A probabilidade de
um adolescente normal sob todos os outros
aspectos experimentar drogas pode
depender da disponibilidade da droga, do
bem-estar proporcionado ou alguma outra
forma de valorização, do risco associado
percebido do uso, além da presença ou
O uso abusivo de drogas não é um fenômeno
ausência de restrições determinadas por
isolado. Ocorre em todos os segmentos da
valores importantes para o adolescente. O
população e é um dos problemas mais
jovem que abusa de drogas, por outro lado,
desafiadores de saúde pública enfrentados
pode ter fatores genéticos ou biológicos
pela sociedade. O desafio para o médico é
coexistindo com a dependência de uma
identificar jovens em risco de abuso de
droga em particular usada para enfrentar as
substâncias e oferecer uma intervenção
atividades do dia a dia.
precoce. O desafio para a comunidade e a
Os transtornos psiquiátricos são muitas sociedade é criar normas que diminuam a
vezes comorbidamente associados com o probabilidade de desfechos adversos para a
uso de substâncias na adolescência. Os saúde dos adolescentes promovendo e
transtornos de conduta e de personalidade facilitando a escolha de opções mais
antissocial são os diagnósticos mais comuns saudáveis e seguras.
coexistindo com o abuso de substâncias,
CONCEITOS IMPORTANTES:
particularmente em homens. Os
 Abuso de substâncias: refere-se ao
adolescentes com depressão, transtorno de
padrão inadequado de uso de
déficit de atenção e transtornos alimentares
substâncias que leva a angústia ou
têm altas taxas de uso de substâncias.
comprometimento clínico importantes,
sendo manifestada por uma ou mais das
seguintes alterações ao longo de um
intervalo de 12 meses:
o Uso recorrente da substância
resultando em falhas no cumprimento
de obrigações pessoais;
o Uso recorrente da substância em
condições fisicamente perigosas;
o Problemas legais causados pelo uso
da substância;
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
o Perpetuação do uso da substância,
mesmo em meio a problemas sociais e
interpessoais de repetição;
 Dependência de substâncias: um
indivíduo pode ser considerado como
portador de um distúrbio de dependência
quando apresenta pelo menos dois dos
seguintes sintomas:
o Falha na execução de obrigações
importantes por conta do uso de
substâncias;
o Uso em situações fisicamente
perigosas;
o Uso continuado apesar de problemas
sociais ou interpessoais recorrentes;
o Desenvolvimento de tolerância;
o Crises de abstinência;
o Consumo da substância em grandes
quantidades ou por períodos maiores
do que o pretendido inicialmente;
o Desejo persistente pela substância
acompanhado por esforços
malsucedidos no sentido de cortar ou
diminuir seu consumo;
o Grande gasto de tempo em atividades
que envolvam a substância (aquisição,
consumo ou recuperação);
o Redução ou abandono de atividades
sociais;
o Uso continuado da substância mesmo
quando reconhece sofrer de
problemas físicos ou psicológicos em
decorrência desse composto.
 Fissura (craving): é definida como um
desejo forte ou compulsão para fazer uso
de uma substância, como álcool ou
outras drogas;
 Síndrome de abstinência (dependência
física): resulta da administração ou uso
prolongado de uma substância e
manifesta-se quando seu uso é
descontinuado. A extensão e a
magnitude dos sinais e sintomas estão
relacionados à quantidade e ao tempo de
exposição à substância antes da retirada
ou suspensão do uso, além de depender
de fatores intrínsecos ao composto de
abuso.
EPIDEMIOLOGIA:
Os dados epidemiológicos mais recentes
sobre o uso de substâncias na adolescência
são preocupantes no Brasil e no mundo. A
Pesquisa Nacional sobre Uso de Drogas e
Saúde, divulgada pelo Instituto Nacional
sobre Abuso de Drogas (NIDA) dos Estados
Unidos, mostra que, em 2011, nos
adolescentes entre 12 e 17 anos, 34,5%
consumiram bebidas alcoólicas ao menos
uma vez na vida, 27,8% no último ano e
13,3% no último mês. Em relação a drogas
ilícitas, em geral, 25,5% consumiram alguma
vez na vida, 19% no último ano e 10% no
último mês.
Um estudo brasileiro publicado em 2012
sobre o uso de drogas lícitas e ilícitas, com
uma amostra de 3.007 indivíduos de 14 anos
e 761 outros de 14 a 19 anos, mostrou, entre
outros dados, que a idade média do início do
consumo de álcool foi de 15,8 anos e que
11,3% dos adolescentes foram identificados
como presentemente usuários ou
abusadores dessa substância. Quanto ao
tabaco, a idade média de início de consumo
foi 14,7 anos, sendo 7,1% fumantes e quase
1/3 (28,3%) fumantes de 20 ou mais cigarros
por dia. Examinando todas as substâncias de
forma conjunta, o levantamento mostrou que
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
cerca de 3% havia usado ao menos uma
droga ou substância ilícita nos últimos 12
meses. O consumo de maconha envolveu
1,6% dos adolescentes, inalação de
solventes, 1,1%, e crack/cocaína, 0,5%.
DIAGNÓSTICO:
O Comitê sobre Abuso de Substâncias da
Academia Americana de Pediatria (AAP)
considera que o abuso de substâncias por
adolescentes possa ser o diagnóstico
pediátrico mais falho, sendo necessária
atenção constante tanto do médico quanto
dos demais profissionais de saúde para a
manifestação e comportamentos
tendências de risco. Alguns sinais de alerta
podem sugerir que o adolescente tenha
problemas relacionados a álcool e outras
substâncias, como problemas escolares,
problemas de saúde frequentes, problemas
na dinâmica familiar e problemas com os
companheiros.
O pediatra pode também lançar mão de
questionários estruturados que foram
validados para rastrear e identificar de forma
breve adolescentes com problemas de
abuso de substâncias, como o CRAFFT,
elucidado pelo esquema a seguir:
Duas ou mais respostas positivas sugerem
que o jovem possa ter envolvimento sério
com o álcool ou outras substâncias,
e necessitando de acompanhamento mais
intenso. A investigação laboratorial, como a
realização de exames de urina buscando
detectar substâncias ou seus metabólitos,
pode ser necessária para esclarecer se
comportamentos disfuncionais, outras
alterações no estado mental e achados
suspeitos no exame físico têm relação com
uso de substâncias psicoativas.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:
A abordagem do adolescente que abusa de
álcool e outras substâncias é complexa e
requer uma equipe multidisciplinar,
envolvendo desde o pediatra até o psiquiatra
especializado em adolescentes ou no
manejo e reabilitação de dependentes de
substâncias psicoativas. O nível em que se
dará o tratamento dependerá de fatores
como grau de cooperação do paciente e da
família, podendo inicialmente se dar em nível
ambulatorial, incluindo suporte de
organizações de autoajuda como Alcoólicos
e Narcóticos Anônimos, e do grau de
comprometimento do usuário, que poderá
levar à necessidade de internação para
avaliação e tratamento psiquiátrico ou
detoxificação. O entendimento de que o
tratamento do abuso de substâncias
costuma envolver muitas recaídas deve ser
levado em conta. Para a maioria dos
pacientes, permanecer no tratamento por um
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
mínimo de 3 meses resultará em melhora
significativa.
A disponibilidade do pediatra em participar
do seguimento ambulatorial após
tratamentos bem-sucedidos é considerada
como essencial na prevenção de recaídas.
Por fim, apesar de o cenário mais comum
entre os adolescentes ser particularmente
com relação a álcool e maconha, um uso
ocasional sem alterações de comportamento
ou de desempenho escolar deve levar o
pediatra a oferecer aconselhamento sobre os
riscos envolvidos, mesmo que não solicitado.
comunidade. Os períodos de maior risco
para o abuso de substâncias são as
transições de vida, como a passagem do
ensino fundamental para o ensino médio e,
deste último, para a universidade. Nesse
sentido, as medidas intervencionistas devem
focar nessas etapas de maior tensão para os
adolescentes a fim de antecipar-se ao
eventual início do abuso de substâncias.

Desfechos positivos no manejo de

adolescentes afetados pelo abuso de
substâncias estão diretamente vinculados à
participação em grupos pós-tratamento. O
padrão de uso de substâncias entre seus
companheiros ou por parte dos pais tem
influência importante no prognóstico dos
pacientes do sexo masculino, junto à
comorbidades por distúrbios de aprendizado
ou conduta. Entre as meninas, autoestima e
ansiedade interferem mais nesse processo.
Teóricos apontam que prognósticos
favoráveis estão associados a influências
construtivas por parte de companheiros,
suporte familiar e religioso, envolvimento
efetivo dos familiares, pressão judicial
(especialmente na fase inicial) ou quando há
participação voluntária no processo de
tratamento.
PREVENÇÃO:
Para que sejam bem-sucedidos, os
programas de prevenção quanto ao uso e
abuso de drogas devem direcionar seus
investimentos de forma a aumentar os
fatores de proteção (como suporte familiar) e
reduzir os fatores de risco (como
autocontrole frágil).
Devem-se abordar todas as formas de abuso
de drogas, lícitas e ilícitas, e os tipos
específicos identificados dentro de cada
SUBSTÂNCIAS MAIS UTILIZADAS:
ÁLCOOL:
O álcool etílico, também conhecido como
etanol, é uma das substâncias mais
utilizadas por adolescentes. É considerado
responsável por mais acidentes e mortes em
jovens do que aqueles produzidos por todas
as drogas ilícitas somadas.
Farmacologicamente, é um depressor do
SNC, mas que apresenta efeitos iniciais
euforizantes. Após a ingestão, é absorvido
rapidamente, sendo biotransformado no
fígado em duas vias: parte por ação da
enzima desidrogenase alcoólica, formando
acetaldeído, e outra parte pelo citocromo
P450.
Em doses elevadas, leva a progressivo
rebaixamento do sensório, podendo chegar
à depressão respiratória. Antes disso,
principalmente nos bebedores iniciantes,
ocorre a evolução clássica para
incoordenação motora (ataxia), diplopia, fala
arrastada, náuseas e vômitos.
 Júlia Figueirêdo – NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO
O diagnóstico nos episódios agudos pode
ser feito pela história do abuso de bebidas
alcoólicas e pelos achados clássicos de
embriaguez, podendo ser confirmados por
provas de função hepática alteradas ou
dosagem da alcoolemia. Níveis maiores que
150 mg/dl costumam acompanhar os sinais
clínicos de embriaguez, e acima de 200
mg/dl em adolescentes pode haver risco de
morte. A presença de coma com níveis
inferiores a 400 mg/dl deve alertar para
associação com trauma craniano,
hipoglicemia ou com outras drogas ou
fármacos depressores.
O manejo do quadro agudo baseia-se em
fluidoterapia, fornecimento de glicose e
tiamina, principalmente em pacientes
crônicos, e, nos casos graves, suporte
ventilatório e, mais raramente, hemodiálise.
Quanto à abstinência, o manejo está
baseado na administração de
benzodiazepínicos (diazepam) em doses
elevadas e a intervalos curtos, até o controle
das manifestações, que podem ser
exemplificadas por inquietude, agitação e
tremores. As formas mais graves de
abstinência, como o delirium tremens, com
desorientação grosseira e hiperatividade
autonômica, não são comuns em
adolescentes.
Após um atendimento de emergência ou
mesmo no contexto da atenção primária, o
pediatra dispõe de instrumentos, como o
CRAFFT, previamente abordado, que
podem ser utilizados no rastreamento de
adolescentes suspeitos do abuso de bebidas
alcoólicas e problemas comportamentais.
Em um estudo realizado em 2017 foi
apontado que 23,1% dos jovens de 16 a 19
anos em condições socioeconômicas
favoráveis tem como hábito o binge drinking,
termo que se refere ao consumo de cinco ou
mais doses de bebida alcoólica num curto
período de tempo para indivíduos do sexo
masculino e quatro ou mais para aqueles do
sexo feminino, sendo essa prática associada
à maior prevalência para o consumo de
droga ilícitas (aumento de 31,7%).
TABACO:
A nicotina é uma substância extraída de uma
planta denominada Nicotiana tabacum. Ao
se tragar o cigarro, esse composto é levado
aos pulmões, sendo rapidamente absorvido
e levado ao cérebro. Este percurso dura, em
média, nove segundos.
Entre os efeitos conhecidos da nicotina há a
ação no sistema nervoso central,
provocando elevação do humor e diminuição
do apetite e do tônus muscular, o que leva à
sensação de relaxamento e,
consequentemente, à necessidade cada vez
mais frequente de se buscar outro cigarro
para obter novamente a mesma sensação.
Além de atuar no SNC, essa substância
também causa aumento na liberação de
catecolaminas séricas, promovendo
vasoconstrição e aumentando a frequência
cardíaca com subsequente elevação da
pressão arterial. Aumenta também a
adesividade plaquetária, atua no sistema
digestivo estimulando a liberação de ácido
clorídrico, e ainda promove a liberação de
substâncias quimiotáxicas no pulmão, o que
acaba gerando a destruição da elastina e,
por fim, provocando o enfisema pulmonar.
Os efeitos do uso constante incluem
náuseas, dores abdominais, diarreia, vômito,
cefaleia, tontura, bradicardia e fraqueza e
aumento das frequências cardíaca e
respiratória, da pressão arterial e da
atividade motora. Esses sintomas iniciam-se
com indução de dependência química e de
tolerância à droga, elevando assim, a longo
prazo, o consumo desta substância.
Existem diversas outras substâncias tóxicas
no tabaco, além da nicotina, como o alcatrão
(composto de diversas substâncias tóxicas
presentes em veneno para ratos e
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herbicidas), amônia, formaldeído, naftalina,
monóxido de carbono e acetato de celulose.
O uso contínuo do cigarro pode aumentar a
incidência de infecções respiratórias, câncer
(de pulmão, boca, faringe, laringe, esôfago,
pâncreas, rim, bexiga, colo de útero e
leucemia mielocítica aguda), doenças
cardiovasculares, como infarto agudo do
miocárdio e angina, doenças pulmonares
obstrutivas crônicas (DPOC), enfisema
pulmonar e bronquite, trombose vascular,
aneurismas arteriais, acidente vascular
cerebral, úlcera digestiva, impotência sexual,
catarata, entre muitas outras.
No Brasil, um terço da população adulta
fuma, e a prevalência de fumantes na
adolescência varia entre 1% e 37%. A região
Sul é a que possui maior número de
fumantes (42% da população), e a zona rural
tem maior número de fumantes, talvez
motivado, para tentar copiar o estilo urbano
e por ter menos acesso aos conhecimentos
de seus malefícios.
Estudos recentes revelaram uma redução de
adolescentes fumantes, mas é importante
que esse número continue a diminuir. O uso
inicial de tabaco é bastante precoce na vida
dos estudantes da rede pública de ensino,
sendo que, entre 10 e 12 anos de idade,
cerca de 11,6% já fizeram pelo menos uso
experimental do cigarro, de acordo com o
estudo realizado pelo Centro Brasileiro de
Informações sobre Drogas Psicotrópicas
(CEBRID). Nesse mesmo trabalho foi
observado que 6% dos adolescentes nesses
ambientes são usuários frequentes do
tabaco.
Outros produtos do tabaco, como cigarros de
palha enrolados à mão e narguilés, que
apresentam os mesmos efeitos adversos
que o cigarro regular, são usados por 4,8%
dos escolares brasileiros, segundo dados de
2012, enquanto o percentual total do uso
dessa substância é de 7,6%
MACONHA/CANNABIS:
A planta Cannabis sativa, popularmente
conhecida como maconha ou marijuana,
além do aproveitamento para obtenção de
fibras com fins industriais, tem sido utilizada
há séculos com fins medicinais e
recreacionais por vários grupos humanos. A
forma mais comum se dá pelo consumo de
cigarros (“baseado”), no qual fragmentos da
planta desidratada são fumados.
O princípio ativo da planta com propriedades
psicoativas é o delta-9-tetra-hidrocanabinol
(THC), presente em uma concentração em
torno de 10% no baseado. Outro derivado da
planta, a resina chamada haxixe, apresenta
concentrações acima de 10%, e o óleo de
haxixe, mais concentrado, acima de 20% de
THC.
É importante comentar que existem
compostos quimicamente diferentes do THC
(canabinoides sintéticos), referidos na
literatura de forma crescente e divulgados na
internet como “sais de banho” ou spice. São
substâncias psicoativas destinadas a serem
misturadas a cigarros comuns, causando
efeitos intensos e complicações agudas que
demandam atendimento de emergência.
Os efeitos do consumo de cigarros de
maconha são relaxamento e leve estado de
euforia, com melhora do humor e aumento
de apetite (conhecido como “larica”). A
resposta pode variar com o ambiente e o
contexto social no momento do uso. Os
usuários relatam efeitos sensoriais, como
maior percepção de sons e imagens.
Contudo, como ocorrem prejuízos
cognitivos, na tomada de decisões e na
percepção de tempo, há favorecimento da
ocorrência de injúrias físicas e acidentes de
trânsito envolvendo o usuário.
O abuso, consumo de cigarros com erva
procedente de plantas com maior teor de
THC ou consumo de haxixe pode produzir
efeitos desagradáveis como ansiedade,
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disforia e até desencadeamento de surtos
psicóticos em adolescentes com
comorbidades.
O consumo de um cigarro tem efeitos de
curta duração (1 a 2 horas). Usuários
crônicos podem apresentar complicações
respiratórias e cardíacas que necessitem de
cuidados de emergência. Usuários habituais
que param o consumo apresentam síndrome
de abstinência 24 a 48 horas após, com
sonolência excessiva ou insônia, cansaço,
ansiedade, depressão e óbvia fissura. As
manifestações agudas do consumo de
maconha raramente levam o usuário à
emergência.
Quadros de agitação e ansiedade extremas
costumam ceder a diazepínicos e pulmonar em graus variados, caracterizando
abordagem tranquilizadora (talk down),
porém manifestações psiquiátricas mais
graves podem exigir o uso de antipsicóticos,
como haloperidol. Eventuais complicações
orgânicas, como broncoespasmo e dor
torácica (angina) devem ser esclarecidas e
manejadas adequadamente.
COCAÍNA:
A cocaína é um alcaloide da planta
Erythroxylun coca, nativa da América do Sul,
consumida pelos indígenas da região andina
desde a era pré-colombiana. As formas mais
utilizadas são o pó (hidrocloreto de cocaína),
cheirado, aplicado em mucosas ou injetado,
e o crack ou “pedra”, que é fumado.
A cocaína em pó é absorvida (em torno de
50%) quando em contato com a mucosa
nasal, atingindo seus efeitos psicoativos em
torno de 10 a 15 minutos, e em 2 a 3 minutos
quando injetada. O crack, fumado com
auxílio de cachimbos artesanais ou
improvisados, permite o acesso rápido da
cocaína ao sistema nervoso central a partir
da circulação pulmonar, com pico de efeito
psicoestimulante em cerca de 1 minuto.
A exposição à cocaína produz uma síndrome
simpaticomimética típica, com agitação,
taquicardia, hipertensão arterial, sudorese,
tremores e midríase, acompanhada de
efeitos subjetivos como euforia, redução do
sono e do apetite e disposição aumentada
para atividades físicas, mesmo que intensas,
e sexuais. Algumas vezes, pode haver
efeitos indesejáveis, como agitação extrema,
agressividade e surtos psicóticos.
Complicações orgânicas graves
neurológicas, como hemorragia
intracraniana, e cardíacas, exemplificadas
pelo vasoespasmo coronariano ou infarto
agudo do miocárdio não têm poupado
indivíduos jovens usuários de cocaína. Os
usuários de crack têm também dano
o chamado “pulmão do crack”.
A abstinência, descrita em todas as formas
de uso, é caracterizada por intensa disforia
pós-consumo, seguida de fissura importante.
Nas situações agudas de agitação e
agressividade pode ser tentada a sedação
com diazepínicos e, se necessário,
haloperidol. As manifestações cardíacas,
quando restritas ao vasoespasmo
coronariano, costumam responder a nitratos
e sedação com diazepam, mas
complicações cardíacas graves e
hemorragias do SNC demandam
acompanhamento e manejo especializado.
INALANTES:
Os inalantes são compostos voláteis,
pertencentes a variados grupos químicos,
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presentes em uma infinidade de produtos de
uso doméstico e industrial. Eles são inalados
a partir da própria embalagem, embebidos
em algum tecido ou simplesmente após
serem derramados em sacos plásticos, com
a finalidade de produzir efeitos psicoativos.
Entre os mais utilizados, estão solventes
(solvente de tintas, cola de sapateiro ou de
carpete, fluido de isqueiro, lança-perfume) e
gases (sprays diversos, propano).
As manifestações iniciais do consumo são
parecidas com aquelas decorrentes da
embriaguez alcoólica, com euforia, agitação
e rubor facial perceptível, podendo ser
sucedidas por tontura, náuseas, vômitos e
alucinações.
No Brasil, o composto de maior destaque é o
tolueno, um hidrocarboneto aromático de
toxicidade aguda e crônica relevantes. Esse
composto produz irritação de conjuntivas
oculares e das vias respiratórias, vertigens e
incoordenação motora, além dos efeitos
psicoativos na exposição aguda. O abuso
crônico é acompanhado de déficit cognitivo
importante e alterações morfológicas no
SNC, como atrofia cerebelar difusa, com
consequente ataxia cerebelar e alterações
de massa branca. Perdas auditivas e visuais
são também descritas.
ALUCINÓGENOS:
A grande diversidade no número de
substâncias de origem natural ou sintética
com propriedades alucinógenas, incluindo
diversos compostos ainda não colocados na
ilegalidade, fazem com que os integrantes
desse grupo sejam amplamente consumidos
por adolescentes e adultos. São, em geral,
estruturas químicas semelhantes aos
neurotransmissores, como serotonina e
outras catecolaminas. Aqueles com maior
prevalência de uso têm sido a dietilamina do
ácido lisérgico (LSD ou “doce”) e a MDMA,
popularmente conhecida como ecstasy ou
“bala”.
O LSD produz efeitos alucinógenos
importantes com doses mínimas, sendo
consumido a partir de pequenos pedaços de
papel em forma de selo ou por comprimidos.
O efeito máximo ocorre em cerca de 2 horas,
mas pode durar até 12 horas. Tem poucos
efeitos orgânicos prejudiciais, evidenciados
por alterações dos níveis de pressão arterial,
taquicardia e náuseas, mas tem alto risco em
relação à associação com trauma e morte
sob seus efeitos.
O manejo dos quadros de agitação ou
inquietude gerados pelas alucinações (bad
trips) deve ser feito em ambiente calmo,
podendo ser necessária a intervenção com
benzodiazepínicos. Outra complicação do
LSD é tardia, os chamados flashbacks,
quando o usuário apresenta alterações
sensoriais muito tempo após o consumo.
O ecstasy é uma anfetamina com
propriedades alucinógenas, apresentando
alguma similaridade estrutural com a
mescalina. Consumida na forma de
comprimidos ou em pó aplicado na mucosa
da boca, produz euforia, aumento de energia
e busca de contato físico (entactógeno),
além de manifestações simpaticomiméticas,
como taquicardia, agitação, hipertensão
arterial, hipertermia e sudorese. Esses
efeitos, somados ao local de consumo,
geralmente em festivais de música ou festas
rave, com dança e atividade física intensa,
pode ocasionar quadros graves com risco de
morte.
O tratamento é de suporte, com avaliação
criteriosa das funções neurológica,
cardiovascular e renal. O abuso crônico pode
ser responsável por disfunções do sistema
serotoninérgico, cujos sintomas principais
são depressão e irregularidades no sono.
Outro agente que teve consumo aumentado
nos últimos anos é a ketamina, um
analgésico dissociativo usado em
anestesiologia humana e veterinária, com
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propriedades alucinógenas. Sua ação se dá
nos receptores NMDA glutamato,
bloqueando estímulos visuais, dolorosos e
auditivos, levando a uma privação virtual dos
sentidos e ao estado onírico, podendo
chegar a despersonalização (sensação de
sair do próprio corpo), como descrita também
por usuários de LSD.

Encontrada em forma de pó ou líquido, pode

ser consumida por via oral, inalada ou
misturada a cigarros e fumada. Além dos
efeitos psicoativos, observa-se nistagmo
rotatório, ataxia com marcha alterada,
tremores, movimentos mioclônicos
(espasmos musculares involuntários) e
pupilas geralmente mióticas (dilatadas). O
comportamento pode variar da
agressividade à catatonia.

O tratamento consiste em sedação com

diazepínicos e acomodação num ambiente
tranquilo. Em casos de agitação extrema,
trauma associado e aumento da temperatura
corporal com rabdomiólise é necessário
manejo cuidadoso e avaliação de função
renal. O abuso crônico tem efeitos como
déficit cognitivo e complicações
gastrointestinais, principalmente nas vias
biliares, e urológicas, como disúria e
hematúria.