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S um ár io

Apresentação......................................................................................................................... 3

Introdução .............................................................................................................................. 4

1. O líder que Deus usa [Ne 1.1-11].................................................................... 9

2. Deus nos dará sucesso [Ne 2.1-20] .............................................................16

3. Mãos à obra! [Ne 3.1-32] ..................................................................................24

4. Deus pelejará por nós [Ne 4.1-23] ...............................................................32

5. Resolvendo conflitos internos [Ne 5.1-19] .............................................41

6. Cuidado com os inimigos [Ne 6.1-19] ........................................................49

7. Deus se importa com seus servos [Ne 7.1-73] ......................................57

8. O poder da Palavra de Deus [Ne 8.1-18] ..................................................67

9. Nosso grande Deus [Ne 9.1-37] .....................................................................76

10. O Preço do avivamento [Ne 10.1-39] .........................................................85

11. Deus não é injusto [Ne 11.1-36] ....................................................................96

12. O Deus de toda alegria [Ne 12-1-47] ....................................................... 104

13. O perigo da tolerância [Ne 13.1-31] ........................................................ 112

Referências ........................................................................................................................ 124

2
Apresentação

O livro de Neemias é um dos livros mais extraordinários e belos que Deus


deu a Sua igreja. O encorajamento e ensinamentos contidos em Neemias são
imensuráveis!
Tive o privilégio de apresentar estes estudos às quartas-feiras, durante o
inverno de 2012, na Igreja Presbiteriana em Tabuazeiro. Foi um tempo muito
precioso de edificação, comunhão e adoração. Sou grato aos irmãos que
participaram e contribuíram com suas sugestões e comentários.
Agradeço, também, ao Conselho da IPB em Tabuazeiro por me permitir
investir tanto tempo em estudos expositivos como este, especialmente quando
havia outras tarefas que exigiam minha presença e esforço.
Meu desejo é que a leitura destes estudos seja um instrumento de
encorajamento para sua vida, como foi para minha. Além disso, oro para que o
Espírito Santo utilize o exemplo da persistência e piedade de Neemias para gerar
em seu coração o desejo de ser tudo o que Deus quer que você seja.

“... Lembra-te de mim, Deus meu, para o meu bem” (Ne 13.31).

Jocarli Junior

Vitória-ES, setembro de 2012.

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Introdução

Deus havia prometido a Israel que, se eles O obedecessem, seriam


abençoados. Se eles não o fizessem, então seriam julgados e levados para o
cativeiro (Dt 28). Essa promessa foi repetida a Salomão com uma aplicação
específica para sua própria vida. Se ele, como rei de Israel, obedecesse ao Senhor,
experimentaria a bênção. Caso contrário, Deus tiraria o seu poder e posição como
rei (1Rs 9.1-9).
Entretanto, como aconteceu com muitos líderes de Israel, um bom começo
teve um final infeliz. Salomão pecou contra Deus, especialmente ao se casar com
muitas mulheres estrangeiras e ter adorado seus falsos deuses (1Rs 11.1-5). Diante
disto, fiel a sua palavra de disciplina, Deus usou os assírios e os babilônios como
seus instrumentos, para executar sua punição sobre os obstinados reinos de Judá e
Israel.1
O reino foi dividido em 931 a.C. O do Norte caiu primeiro e as pessoas foram
levadas para o cativeiro pelos assírios em 722 a.C. As dez tribos do norte foram
inicialmente governadas por Jeroboão, e as tribos do sul (Judá e Benjamin) foram
descartadas, inicialmente, por Roboão.
Ambos os reinos, no entanto, continuaram na idolatria e imoralidade. O
Reino Norte teve dezenove reis e oito dinastias. Todavia, nenhum desses reis se
dobrou diante do Senhor. Pelo contrário, todos se rebelaram contra Deus.
Já o reino do Sul teve vinte reis na mesma dinastia davídica. Judá não
aprendeu com a destruição do Reino do Norte e Deus usou os Caldeus para
saquear, destruir e quase despovoar Jerusalém (2Rs 25). Deus disciplinou seu povo
com 70 anos de cativeiro na Babilônia, em 586 a.C. (Jr 25.11).
Grande parte dos israelitas do Reino do Norte foram absorvidos pela Assíria
e, uma pequena parte, por outras culturas. No entanto, o povo do Reino do Sul
permaneceu intacto na Babilônia, e depois que ela foi derrotada pelos medos e
persas em 539 a.C., muitos judeus voltaram a sua pátria.2
Mas com a ascensão do Império Medo-Persa e a subsequente derrota dos
babilônios, os judeus receberam do rei Ciro a permissão de retornar a sua terra
natal (2Cr 36.22-23). Eles o fizeram sob vários líderes ao longo de um período de
cerca de cem anos (Zorobabel em 538, Esdras em 458 e Neemias em 444).
Em 458 a.C., um segundo grupo de judeus retornou, liderados por Esdras
(Ed 7.1-10). Ao chegarem a Jerusalém, eles encontraram os judeus em um
profundo estado de degradação espiritual e moral. Eles haviam se casado com
povos descrentes das nações vizinhas e estavam participando de suas práticas
pagãs. Uma impressionante lista de sacerdotes, levitas e leigos, num total de 114
indivíduos, se tornara culpada de casamentos mistos com os pagãos. No entanto,
através do ministério fiel de Esdras, a maioria dessas pessoas abandonou o pecado
e mais uma vez seguiram a vontade de Deus (Ed 10).

1 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible
Studies (8). Nashville, TN: W Publishing Group.
2 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). Vol. 1: The Bible

Knowledge Commentary: An Exposition of the Scriptures (673). Wheaton, IL: Victor Books.

4
Em 444 a.C., 14 anos após o retorno de Esdras a Jerusalém, Neemias
também retornou e Deus o usou para guiar Judá na reconstrução dos muros e na
reordenação da vida social e econômica de Jerusalém.
Neemias foi um judeu, nascido no exílio, após a queda de Jerusalém para os
babilônios, em 605-586 a.C. Neemias era copeiro do rei Artaxerxes (Ne 1.11 e 2.1).
O que ele conseguiu em um breve período de tempo foi um feito esplêndido.
Neemias tornou-se um lembrete visível para o povo israelita da misericórdia
imutável de Deus.3

Autor:

Embora seja difícil saber com certeza quem escreveu o livro em sua forma
final, a maioria dos expositores concorda que Neemias é autor do livro que leva seu
nome. Grande parte do livro é um relato, na primeira pessoa, das circunstâncias de
seu retorno a Jerusalém (capítulos 1-7; 12.31-13.31).4 É quase certo que os bisavós
de Neemias foram levados em cativeiro quando Jerusalém caiu diante dos
babilônios. Neemias provavelmente nasceu na Pérsia, em algum momento durante
ou logo após o ministério de Zorobabel, em Jerusalém.
Embora grande parte desse livro tenha sido nitidamente tirado dos diários
pessoais de Neemias e escrito do ponto de vista pessoal (1.1-7.5; 12.27-43; 13.4-
31), tanto a tradição judaica como a cristã reconhecem Esdras como o seu autor.5
Esdras e Neemias formavam um único livro na Bíblia hebraica até o século
XV. Isto é baseado na evidência externa que se reflete na LXX e a Vulgata Latina, e
6

também se baseia em provas internas, tais como a “mão do Senhor”, tema


recorrente que domina tanto Esdras quanto Neemias, e o papel do autor como um
sacerdote escriba. Como escriba, ele teve acesso aos arquivos reais da Pérsia, que
representam a miríade de documentos administrativos registrados nos dois livros,
especialmente no Livro de Esdras. Poucas pessoas teriam acesso aos arquivos reais
do Império Persa, mas Esdras provou ser uma exceção (Ed 1.2-4; 4.9-22; 5.7-17;
6.3-12). A Vulgata Latina dividiu-os em dois livros, denominando Esdras “Esdras A”
e Neemias, “Esdras B”.7 A Bíblia evangélica e a hebraica moderna os dividem em
dois, denominando-os Esdras e Neemias em homenagem as suas figuras
proeminentes.
Nada sabemos acerca da infância de Neemias, sua juventude e família,
exceto que o nome de seu pai era Hacalias (1.1), e o seu irmão se chamava Hanani
(1.2). Ele havia alcançado uma posição de destaque em um ambiente pagão e
servia ao rei Artaxerxes como seu copeiro pessoal (1.11; 2.1). A posição de

3 Brown, R. (1998). The Message of Nehemiah: God’s Servant in a Time of Change. (J. A.
Motyer & D. Tidball, Orgs.) (p. 17). England: Inter-Varsity Press.
4 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). Vol. 1: The Bible

Knowledge Commentary: an exposition of the scriptures (673–674). Wheaton, IL: Victor


Books.
5 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible

studies (1). Nashville, TN: W Publishing Group.


6 Mathews, K. A. (1998). The historical books. In D. S. Dockery (Ed.), Holman concise Bible

commentary (D. S. Dockery, Ed.) (182). Nashville, TN: Broadman & Holman Publishers.
7 ELLISEN, Stanley A. Conheça melhor o Antigo Testamento. São Paulo: Editora Vida, 2002, p.

124.

5
Neemias, por si só, revela muito sobre sua capacidade intelectual, maturidade
emocional e seu status espiritual.8

Propósito e Teologia:

Neemias relata a história da comunidade restaurada em Jerusalém. Esdras e


Neemias tratam da reestruturação da vida social e religiosa dos exilados com base
na Lei de Moisés (capítulos 5, 8-13).9

1. O Culto.
Neemias destaca o papel dos levitas e sacerdotes que foram os primeiros a
iniciar os trabalhos nos muros (3.1, 17, 22, 28), e foram proeminentes entre
aqueles que repovoaram a cidade (11.10-23; 12.1-26, 29). Eles trabalhavam como
professores e funcionários do templo (8.7-8; 9.4, 12.27-36, 45-46). Os levitas eram
líderes de Israel (9.38; 10.9-13, 28), e ganharam a aprovação da comunidade para
o seu serviço (12.44, 47). No entanto, não escaparam da necessidade de
restauração desde que seus pecados foram expostos (13.4-11, 28, 30).

2. O Deus Criador.
A soberania do Senhor é vista mais claramente na nomeação e proteção de
Neemias, realizada através dos poderosos reis da Pérsia (2.8, 18). Ele garantiu o
sucesso de Neemias (2.20), e até mesmo os inimigos admitiram que a restauração
dos muros foi algo divino (6.16; 4.15, 20). Deus também é descrito como o Deus da
aliança que, com fidelidade, guardou e protegeu o seu povo (1.5-7; 9.7-37). Além
do mais, Ele é Santo e exige um povo justo, um sacerdócio santificado, e um lugar
sagrado de culto (12.30; 13.9, 23-28, 30).

3. A Oração.
As orações de Neemias polvilham a narrativa com invocações da bênção
divina (5.19; 6.9b; 13; 14; 22b; 31b) ou maldições sobre a oposição dos ímpios
(4.4-5; 6.14; 13.29; 2.4-5; 4.9). Orações de confissão também são encontradas no
livro (1.4-11; 9.5 b-37).

4. A Escritura.
A Lei de Moisés, em particular, foi a linha de prumo na qual mediram o
sucesso de sua reconstrução espiritual. A Lei foi lida, interpretada e aplicada à vida
da comunidade (8.1–18; 9.3). A Lei condenou (8.9; 9.2–3), incitou à adoração
(8.11–18) e gerou a reforma (13.1–3, 17–22a, 23).

5. O Templo.
Os muros de Jerusalém, mesmo nos dias de Neemias, não ofuscaram o
templo: “... não desampararíamos a casa do nosso Deus” (10.39). Assim, os judeus
cumpriram suas obrigações de culto na casa de Deus através dos dízimos, ofertas e

8 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). Vol. 1: The Bible
knowledge commentary: an exposition of the scriptures (674). Wheaton, IL: Victor Books.
9 Dockery, D. S., Butler, T. C., Church, C. L., Scott, L. L., Ellis Smith, M. A., White, J. E., &

Holman Bible Publishers (Nashville, T. (1992). Holman Bible handbook (293–294).


Nashville, TN: Holman Bible Publishers.

6
primícias de acordo com a Lei de Moisés (10.32-39; 12.44). Porém, a santidade e a
perpetuação do templo foi a agenda do segundo mandato de Neemias como
governador (13.4-13, 30).

Esboço:

I. Retorno de Neemias e reconstrução do muro (1.1—7.3)

A. Retorno de Neemias (1.1—2.10)


1. Preparativos para o retorno (1.1—2.8)
a. O relatório de Judá (1.1-3)
b. A resposta de Neemias (1.4-11)
c. A súplica perante o rei (2.1-8)
2. A viagem e o início do conflito (2.9,10)

B. Reconstrução das muralhas (2.11—7.3)


1. Inspeção e proposta para a obra (2.11-18)
2. Primeira ampliação do conflito (2.19, 20)
3. Reconstrução começada (capítulo 3)
4. Segunda ampliação do conflito (4.1-6)
5. Reconstrução continuada (4.7-23)
6. Problemas internos ameaçam a reconstrução (capítulo 5)
7. Clímax do conflito (6.1-14)
8. Fim do conflito (6.15—7.3)

II. Retorno dos exilados e reconstrução da comunidade (7.4—13.31)

A. Retorno dos exilados (7.4-73)


1. A Necessidade de repovoar Jerusalém (7.4, 5)
2. Registro dos que retornaram (7.6-73)

B. Reconstrução da comunidade (7.73—13.31)


1. Renovação da aliança (7.73—10.39)
a. A leitura da Lei (7.73—8.18)
b. A confissão de pecado (9.1-37)
c. A ratificação do juramento (9.38—10.39)

2. Dedicação dos muros (capítulos 11 e 12)


a. Listagem dos residentes (capítulo 11)
b. Listagem dos sacerdotes e levitas (12.1-26)
c. A dedicação (12.27-43)
d. Estipulações para o clero (12.44-47)

3. Reforma do povo (capítulo 13)


a. Exclusão dos estrangeiros (13.1-3)
b. Atenção ao templo (13.4-14)
c. Observância do sábado (13.15-22)
d. O fim dos casamentos mistos (13.23-31)

7
O RETORNO DO EXÍLIO
Fase Data Referência Líder Rei Extensão Eventos
Primeira 538 a.C. Esdras 1-6 Zorobabel Ciro - Qualquer um que - Holocaustos foram
Josué quisesse poderia ir e feitos.
voltar. - A Festa dos
- O templo de Tabernáculos foi
Jerusalém era para celebrada.
ser reconstruído. - A reconstrução do
- A tesouraria real templo foi iniciada.
financiou a - O governante persa
reconstrução do mandou reconstruir e
templo. interrompeu a obra.
- Artigos de ouro e - Dario, rei da Pérsia,
prata do templo autorizou a retomada
foram tomados por da restauração dos
Nabucodonosor muros de Jerusalém,
foram devolvidos. em 520 a.C
- O Templo foi
concluído e dedicado ao
Senhor, em 516 a.C.
Segunda 458 a.C. Esdras 7-10 Esdras Artaxerxes - Qualquer um que Homens de Israel
quisesse poderia ir e casaram-se com
voltar. mulheres estrangeiras.
- A tesouraria real
financiou a obra.
- Os magistrados
judeus e juízes
foram permitidos.

Terceira 444 a.C. Neemias 1-13 Neemias Artaxerxes A reconstrução de - A reconstrução do


Jerusalém foi muro de Jerusalém, a
permitida. oposição de Sambalate,
o horonita, Tobias, o
amonita, e Gesém, o
árabe.
- A reconstrução do
muro foi concluída em
52 dias.
- Os muros foram
dedicados a Deus.
- Esdras leu o Livro da
Lei para o povo.
- Neemias iniciou as
reformas.

8
O líder q ue D eus us a
[Estudo 1 – Ne 1.1-11]

Catherine Genovese voltava para casa depois de um dia de trabalho, na


madrugada de abril de 1964, quando foi atacada e esfaqueada várias vezes. Apesar
de seus gritos de socorro serem ouvidos por 38 moradores, que presenciaram o
ataque, de suas janelas, ninguém fez nada. Ao todo se passaram 45 minutos desde
o primeiro ataque até sua morte, só então um vizinho de Catherine Genovese
chamou por socorro. Os policiais chegaram dois minutos depois e encontraram a
jovem sem vida.
Tristemente, a política do não envolvimento tem sido cada vez mais o
padrão da geração. O Pastor Fleming conta sobre um homem que deixou a igreja
em que ele pastoreava em busca de uma igreja maior, onde literalmente se perdia
no meio da multidão. Ele disse ao pastor Fleming que preferia assim. Dessa forma,
ninguém lhe pedia para fazer nada.10 Ele queria ficar isolado e evitar qualquer
envolvimento ou responsabilidade.
No entanto, Deus nos dá um exemplo de um homem que optou por não ficar
à margem; mas em vez disso, optou por se envolver! Neemias não poupou esforços
e nunca se acovardou diante de um conflito. Sua vida e o seu zelo pela obra de Deus
têm muito a nos ensinar.
O comentarista bíblico Warren Wiersbe estava certo quando escreveu:
Neemias era o tipo de pessoa que se importava. Ele se preocupava
com as tradições do passado e as necessidades do presente. Ele se
preocupava com as esperanças do futuro. Ele se preocupava com
sua herança, sua cidade natal, e a glória do seu Deus.11

Neemias revelou esta atitude solidária de três maneiras diferentes.

1. Neemias se importava o suficiente para perguntar


1
As palavras de Neemias, filho de Hacalias. No mês de quisleu, no
ano vigésimo, estando eu na cidadela de Susã, 2 veio Hanani, um de
meus irmãos, com alguns de Judá; então, lhes perguntei pelos judeus
que escaparam e que não foram levados para o exílio e acerca de
Jerusalém. 3 Disseram-me: Os restantes, que não foram levados para o
exílio e se acham lá na província, estão em grande miséria e desprezo;
os muros de Jerusalém estão derribados, e as suas portas, queimadas.

Neemias era um copeiro do rei “Artaxerxes”, que governava a Pérsia. Ele é


identificado como o filho de Hacalias para distingui-lo de outros judeus com o
mesmo nome (Ne 3.16; Ed 2.2).
Estava interessado em saber como se encontravam as pessoas que haviam
retornado a Jerusalém com Esdras, aproximadamente quatorze anos antes. Essa
história cobre o período desde a volta de Zorobabel, construtor do templo, até o

10 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall. James L. Fleming.


11 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. Wheaton, Ill.: Victor Books.

9
retorno de Neemias, reconstrutor dos muros. Na realidade, foram três grupos que
deixaram o cativeiro na babilônia: Zorobabel, em 538 a.C., Esdras, em 458 a.C., e os
cativos com Neemias, em 444 a.C.
Curiosamente, um dos irmãos de Neemias, Hanani, tinha acabado de
retornar de Judá com outros homens. Então Neemias, que estava profundamente
interessado, fez perguntas sobre o bem-estar de seu povo e a condição da cidade
de Jerusalém.
Todavia, antes de falar de seu interesse pelos outros, alguns fatos nos
chamam à atenção na vida deste homem de Deus. Vejamos:

Em primeiro lugar, o seu nome. O nome de Neemias significa “Deus


conforta, Deus consola”.12 Ele era um consolador, um homem sensível aos
problemas dos outros. Era um judeu nascido no exílio, depois da queda de
Jerusalém pelos babilônios. Nesta época, diversos judeus tinham alcançado altos
postos no governo persa e, com certeza, exerciam grande influência na corte, como
outros judeus antes dele: Daniel e seus três amigos, Sadraque, Mesaque e Abede-
Nego, bem como Mordecai e a jovem Ester, que se tornou rainha da Pérsia. Assim,
Neemias alcançou uma posição de influência na corte do rei estrangeiro e mesmo
cercado por um ambiente contrário e hostil, ele cresceu como um homem
comprometido com Deus.

Em segundo lugar, sua função. “Nesse tempo eu era copeiro do rei” (Ne
1.11). O cargo de copeiro soa muito humilde, mas esta não era a situação. O cargo
surgiu em sociedades antigas por causa do perigo que um imperador ou rei tinha
de ser envenenado por algum rival. O copeiro era uma pessoa de confiança,
nomeado para cuidar e provar o vinho para se certificar de que estava seguro antes
de ser servido ao rei. Essa pessoa era, obviamente, muito estimada e confiável.13
Por causa de seu acesso constante e regular ao governante, Neemias naturalmente
adquiria influência não apenas diante do rei, mas também diante de outros líderes
militares e nobres. Ele tinha acesso ao rei, contudo, o seu coração estava com o
povo de Deus.

Em terceiro lugar, sua preocupação. Neemias sentia a dor dos seus


descendentes. Seus ouvidos estavam abertos e seu coração profundamente
sensível às necessidades do seu povo. Ele não conhecia a cidade dos seus pais, mas
se importava com ela. Neemias nasceu na Babilônia; ele não conhecia Jerusalém.
Era um homem de conhecimentos, influência e poder, mas estava profundamente
interessado na causa daqueles que eram oprimidos pelo sofrimento. Um líder que
não ama os seus liderados é como um corpo sem o coração, que promove apenas
tristeza, ao invés de alegria e vida.

O Relatório de Hanani - notícias ruins!


E o que ele ouviu? Más notícias! Os homens relataram que os judeus
estavam em grande aflição, porque os muros de Jerusalém estavam em ruínas e as

12 Elwell, W. A., & Comfort, P. W. (2001). Tyndale Bible dictionary. Tyndale reference library
(942). Wheaton, IL: Tyndale House Publishers.
13 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (15). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.

10
portas destruídas pelo fogo (v. 3). As más notícias que Neemias recebeu podem ser
resumidas em quatro palavras: insegurança, injustiça, indigência e inferiorização.

Insegurança – O primeiro problema que Jerusalém enfrentava era a


insegurança. Hanani disse a Neemias: “... os muros de Jerusalém estão derrubados”
(v.3). A cidade estava desprotegida, o povo estava sem defesa. Os invasores podiam
entrar quando quisessem. A cidade fortificada de Davi estava desguarnecida,
estava nas mãos dos bandidos. Na cidade cujo nome significa “ensino de paz”, não
havia paz.

Injustiça – Disse ainda Hanani: “... e as suas portas, queimadas” (1.3). A


porta era o local onde ficavam os juízes em Jerusalém. Com suas portas queimadas,
Jerusalém estava sem liderança, a cidade estava em caos. Não havia justiça, não
havia quem julgasse a causa do povo.

Indigência – Hanani prossegue com o relatório, dizendo: “... Os restantes,


que não foram levados para o cativeiro e se acham lá na província, estão em grande
miséria...” (v. 3). O povo judeu tinha voltado para Jerusalém. No entanto, mais de
cem anos depois, a pobreza ainda assolava o povo. Conforme o historiador Flávio
Josefo, era possível ver os corpos dos mortos jogados nas ruas.14

Inferiorização – O quarto problema que Jerusalém estava enfrentando era


o desprezo. Hanani conclui, dizendo: “... estão em grande miséria e desprezo” (v. 3).
Além de viverem numa cidade insegura e pobre, o povo era também ultrajado pelo
desprezo. Era um povo esquecido, digno de toda zombaria e tratado de forma
indigna.
O que você faz quando recebe notícias ruins? Neemias orou! As notícias
foram tão terríveis que levaram Neemias às lágrimas.

II. Neemias se importava o suficiente para clamar


4
Tendo eu ouvido estas palavras, assentei-me, e chorei, e lamentei por
alguns dias; e estive jejuando e orando perante o Deus dos céus.

Quando Neemias soube das más notícias sobre Jerusalém, ele poderia ter
dito: “Isso é muito ruim, mas o que posso fazer?” Todavia, no versículo 4, cinco
verbos expressam o que se passava em seu coração: ele se sentou, lamentou,
chorou, jejuou e orou.

1. Ele se sentou – Como Daniel, Neemias tinha, provavelmente, uma sala


privada onde costumava clamar a Deus com o rosto em direção a
Jerusalém (Dn 6.10; 1Rs 8.28-30).15 Esta palavra “sentar” tem a ideia de
uma habitação permanente. Ou seja, provavelmente, sua reação
aconteceu em um ambiente em que ele estivesse acostumado a orar.
Longe de ser um exercício religioso convencional, a oração era para
Neemias uma experiência diária vital.

14 JOSEFO, Flávio. A história do povo hebreu. Editora CPAD, São Paulo, 2002, p.
15 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (16). Wheaton, Ill.: Victor Books.

11
2. Ele lamentou e chorou – São palavras frequentemente usadas para os
períodos de luto, na Bíblia. Neemias lamentou e chorou por algum
tempo. Inconscientemente, Neemias estava imitando o luto dos judeus
cativos na Babilônia, anos antes (Sl 137.1). Ele não foi a última pessoa a
chorar sobre os problemas de Jerusalém. Durante a última semana de
seu ministério, Jesus olhou para a cidade rebelde e achou impossível
conter as lágrimas (Lc 19.41-44). Como Neemias, Ele também estava
infinitamente mais preocupado com o bem-estar do povo do que o dele.

3. Ele jejuou – O jejum era exigido somente dos judeus, uma vez por ano,
no dia anual de expiação (Lv 16.29), mas Neemias passou vários dias em
jejum, chorando e orando. O jejum bíblico não significa simplesmente
“deixar de comer”. O jejum bíblico sempre acontece acompanhado da
oração. Todos podem orar sem jejuar, mas ninguém pode jejuar sem
orar. Jejum bíblico significa privar-se de alimento por uma razão
espiritual: comunicação e relação com o Pai.

4. Ele orou – Neemias tornou-se um árbitro entre Deus e os moradores


da Judéia.16 A oração era um hábito para ele. Porém, neste caso, pelo
menos, Neemias orou pela simples razão de que somente Deus poderia
realizar o que precisava ser realizado em Jerusalém. Michaell Catt estava
certo quando escreveu: “A vida pública de Neemias era fortalecida pela
sua vida privada. A oração era fundamental, não suplementar”.17 Sua
obra foi banhada pela oração.

A oração é o que nos sustenta quando os problemas se levantam contra nós.


Abraham Lincoln confessou: “Tenho sido levado muitas vezes a ajoelhar-me pela
convicção esmagadora de que eu não tinha outra saída. Minha própria sabedoria e
a dos que estão ao meu redor pareciam insuficientes para o dia”.18
Durante todo o livro, apesar das decisões importantes e corajosas, Neemias
não abria mão da oração. A oração caminhava lado a lado com suas resoluções.

1. Grandes líderes são grandes homens de oração.


5
E disse: ah! SENHOR, Deus dos céus, Deus grande e temível, que
guardas a aliança e a misericórdia para com aqueles que te amam e
guardam os teus mandamentos!

Esta é a primeira das doze orações registradas no livro (1.5-11; 2.4, 4.4, 9;
5.19; 6.9, 14; 9.5; 13.14, 22, 29, 31). Em 9.5, a oração foi realizada pelos levitas.
Porém, o Livro de Neemias abre e fecha com oração.19 Três fatos nos chamam à
atenção nessa primeira oração de Neemias:

16 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 1.4). James L. Fleming.
17 CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 114.
18 Cyril J. Barber, in Nehemiah and the dynamics of effective leadership (Neptune, NJ:

Loizeaux Brothers, 1976), 19.


19 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (16–17). Wheaton, Ill.: Victor Books.

12
Neemias reconhece a grandeza de Deus
“E disse: ah! SENHOR, Deus dos céus, Deus grande e temível...” (v. 5) – Neemias
não pede nada antes de reconhecer o caráter de Deus. Em sua oração ele focaliza a
grandeza de Deus, antes de pensar na grandeza do seu problema. Quanto maior
Deus se torna para ele, menor se torna o seu problema.20 O verdadeiro intercessor
aproxima-se de Deus sabendo que Ele é soberano, onipotente, capaz de resolver
qualquer dificuldade.

Neemias reconhece a desobediência do povo


“Temos procedido de todo corruptamente contra ti...” (v. 7) – Neemias sabia
que o pecado dos israelitas havia causado o juízo de Deus, que resultou na
destruição de Jerusalém. O que é mais impressionante sobre a sua confissão é que
ele se inclui no reconhecimento desses pecados: “os quais temos cometido contra ti;
pois eu e a casa de meu pai temos pecado” (v. 6).21 O pecado foi a causa do cativeiro.
Deus entregou o povo nas mãos do rei da Babilônia. O pecado foi a causa da
miséria dos que voltaram do cativeiro. O pecado produz fracasso, derrota,
vergonha e opróbrio. Aqui está um segredo da verdadeira liderança: os
verdadeiros líderes são aqueles que reconhecem suas falhas. Quando os líderes
esquecem a gravidade de seus pecados, eles tropeçam e perdem a capacidade de
liderança.

Neemias reconhece a fidelidade de Deus


“Estes ainda são teus servos e o teu povo que resgataste com teu grande poder
e com tua mão poderosa” (v. 10) – Estas palavras expressam o princípio claramente
registrado nos capítulos 28 e 30 de Deuteronômio. A aliança tinha dois lados: (1)
bênção e (2) julgamento. Era condicional. Se o povo obedecesse a Deus, eles seriam
abençoados. Neemias observa essa promessa, porque embora contenha um aviso
de disciplina, também contém bênção, caso o povo se arrependesse. Somos o povo
de Deus; quando oramos, podemos nos agarrar nas promessas dessa aliança.

2. A persistência na oração.
1
No mês de nisã, no ano vigésimo do rei Artaxerxes, uma vez posto o
vinho diante dele, eu o tomei para oferecer e lho dei; ora, eu nunca
antes estivera triste diante dele.

Neemias orou em favor de seu povo dia e noite (v. 6). Ele orou até que
obteve a resposta de Deus. Sabemos que ele era persistente em suas orações por
causa de um detalhe que liga o primeiro versículo do capítulo 1 com o primeiro
versículo do capítulo 2. No capítulo 1, Neemias diz que a delegação de Jerusalém foi
até ele no mês de quisleu, que corresponde aos nossos meses de
novembro/dezembro. No capítulo 2, quando Artaxerxes ouve o pedido de Neemias
e concede permissão para ir a Jerusalém e reconstruir seus muros, é o mês de nisã,
que corresponde aos nossos meses de março/abril. Em outras palavras, quatro ou

20 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 18.
21 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (19). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.

13
cinco meses se passaram entre o momento em que Neemias começou a suplicar a
Deus sobre Jerusalém e o tempo em que suas solicitações foram atendidas.
Essa é a perseverança da oração, uma característica de todos os grandes
líderes. Alguns são ótimos em perseverar com os homens. Neemias era grande
nessa área, mas antes de perseverar com os homens ele perseverou com Deus, e foi
bem-sucedido.

III. Neemias se importava o suficiente para trabalhar


11
Ah! Senhor, estejam, pois, atentos os teus ouvidos à oração do teu
servo e à dos teus servos que se agradam de temer o teu nome;
concede que seja bem sucedido hoje o teu servo e dá-lhe mercê
perante este homem. Nesse tempo eu era copeiro do rei.

Durante os quatro meses de oração, Neemias viu os problemas com maior


clareza e permaneceu atento às oportunidades. Também começou a compreender
a parte que teria que desempenhar como resposta a sua própria oração.22 Ele
planejou ir a Jerusalém e supervisionar a reconstrução dos muros. Não pediu a
Deus para enviar alguém, ele disse: “Eis-me aqui, envia-me!”23
Teria sido fácil para Neemias ignorar o problema. Afinal de contas, ele
estava na cidade de Susã, que ficava a 240 km ao norte do golfo Pérsico, e a leste da
cidade bem conhecida da Babilônia.24 Ele poderia simplesmente ter se escondido
no conforto do palácio real de inverno, sentindo-se triste sobre o estado da sua
pátria e desejando que alguém organizasse um plano para remediar a situação.
Mas um verdadeiro líder sempre toma a iniciativa. Depois de identificar o
problema (v. 7), Neemias encontra uma solução: “... concede que seja bem sucedido
hoje o teu servo e dá-lhe mercê perante este homem” (v. 11). Ele pede ao Senhor
para que seja bem-sucedido ao tornar o seu plano conhecido ao rei Artaxerxes. Ele
tinha consciência que seria mais difícil deixar o palácio do que lhe foi para chegar.
Foi um sacrifício custoso? Sim e não. Sim, pois ele teve de desistir do
conforto e suportar uma série de dificuldades. Mas não, no sentido de que ele não
seria feliz fazendo o que costumava fazer. Por outro lado, ele encontrou grande
alegria em fazer o que Deus queria que ele fizesse.
O restante do livro é um relato de como ele superou um obstáculo após o
outro. Houve evidente e secreta oposição dos inimigos. Entretanto, Neemias
persistiu e os muros foram restaurados em 52 dias!

1. O líder que Deus usa.


O escritor Cyril J. Barber, ao analisar a reação de Neemias, com muita
proeminência destaca duas lições para àqueles que são líderes ou almejam a
liderança. Observe:

22 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 21.
23 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (21). Wheaton, Ill.: Victor Books.
24 Elwell, W. A., & Comfort, P. W. (2001). Tyndale Bible dictionary. Tyndale reference library

(1228). Wheaton, Ill.: Tyndale House Publishers.

14
Em primeiro lugar, o líder sábio se preocupa com as pessoas. O
verdadeiro líder se assegura de que os problemas dos seus liderados sejam
resolvidos antes de lidar com seus próprios problemas. Um líder que se identifique
de perto com aqueles a quem lidera poderá motivá-los a conseguir mais. Conforme
disse Bernard L. Montgomery: “O início da liderança é uma luta pelos corações e
pelas mentes dos homens”.25

Em segundo lugar, o líder sábio é um homem de oração. Um homem de


oração é a exigência básica para a liderança cristã. O livro que leva o seu nome
possui 13 capítulos e doze orações. Neemias descobriu que a oração é uma imensa
fonte de poder. Através da oração, Neemias teve nova perspectiva dos fatos, foi
levado a restabelecer suas prioridades e recebeu novo sentido de propósito. Na
realidade, nossas orações diárias diminuem nossas preocupações diárias.26 Além
disso, ela nos mantém no lugar em que Deus quer nos usar.

Conclusão:
Um líder é uma pessoa do povo. Um líder vê as necessidades dos outros e
sofre com eles. Neemias ouviu sobre a situação precária do seu povo e chorou.
Contudo, ainda mais importante do que suas lágrimas foi o fato de que Neemias
orou. Todavia, mais importante do que sua amizade com as pessoas foi a sua
amizade com Deus, pois somente Deus poderia mudar o coração do rei e prover
suas necessidades.
Abraão se importou e clamou a Deus pela vida de Ló (Gn 18-19). Moisés se
importou e libertou os israelitas do Egito. Davi levou a nação e o reino de volta ao
Senhor. Ester se importou e arriscou sua vida para salvar a sua nação de genocídio.
Paulo levou o Evangelho por todo o Império Romano.27 Deus ainda está
procurando por pessoas que se importam, pessoas como Neemias, que se
importam o suficiente para lamentar, chorar, jejuar e clamar a Deus por ajuda e,
em seguida, oferecer-se para o trabalho.
É tempo dos verdadeiros intercessores se levantarem. Onde estão os
intercessores de Deus? Onde estão os Neemias de Deus?

25 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 22.
26 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,

p. 22-23.
27 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (22). Wheaton, Ill.: Victor Books.

15
Deus nos dará sucesso
[Estudo 2 – Ne 2.1-20]

Uma das grandes características dos jovens é o idealismo. O entusiasmo dos


jovens pode inspirar fé, coragem e esperança diante das muitas batalhas da vida.
Alguém disse: “Os ideais são como as estrelas. Nós nunca os alcançaremos, mas,
como os marinheiros no mar, definimos nosso curso por eles”.28
Todavia, quando amadurecemos, percebemos que as coisas nem sempre
acontecem da maneira como gostaríamos, mesmo quando investimos tempo em
oração. Seguir a Jesus não garante uma vida livre de problemas. Na verdade,
muitas vezes nos leva a problemas mais profundos. Mas parte da maturidade é
aprender a lidar com as intempéries da vida.
Neemias 2 têm algumas lições sobre as realidades de servir a Deus. Ele
enfrentou problemas reais, mas com a graça de Deus foi capaz de transformá-los
em grandes realizações. Este capítulo nos mostra três fatos de extrema
importância: Neemias se preparou para uma grande obra, avaliou a situação e
aproveitou as oportunidades.

I. Neemias se preparou para uma grande obra


“As palavras de Neemias, filho de Hacalias. No mês de quisleu, no
ano vigésimo, estando eu na cidadela de Susã... No mês de nisã, no
ano vigésimo do rei Artaxerxes, uma vez posto o vinho diante dele,
eu o tomei para oferecer e lho dei; ora, eu nunca antes estivera triste
diante dele” (Ne 1.1; 2.1)

A fim de transformar os obstáculos em degraus para alcançar o sucesso é


necessário um tempo de preparação. O livro começa com uma nota cronológica
que, em comparação com 2.1, fica evidente que quatro meses se passaram entre o
momento que Neemias ouviu o relatório de Hanani “mês de quisleu” (novembro-
dezembro) até a sua oportunidade de falar com o rei, “mês de nisã” (março-abril).
Durante esse período, Neemias lamentou, chorou, jejuou e orou a Deus para fazer
algo sobre a grave situação em Jerusalém.
Comparado com outros homens na Bíblia, quatro meses pode ser
considerada uma espera pequena. Abraão esperou mais de 25 anos para receber o
filho da promessa, Isaque. O povo de Israel permaneceu escravizado no Egito
durante 400 anos. Moisés passou 40 anos no deserto antes de ser um instrumento
nas mãos de Deus para libertar o povo do Egito. Em seguida, Moisés caminhou com
o povo por mais 40 anos no deserto. Davi passou vários anos fugindo do rei Saul. O
apóstolo Paulo passou 3 anos sozinho na Arábia antes de usado por Deus, de forma
mais significativa. Esperar é difícil! Mas o que você faz enquanto espera? Neemias
fez duas coisas.

28 Carl Schurz, Readers Digest [5/84], p. 66.

16
1. Neemias orou.
Ao longo do livro, encontramos Neemias orando nada menos do que 11
vezes em 13 capítulos (1.5-11; 2.4, 4.4, 9; 5.19; 6.9, 14; 13.14, 22, 29, 31). Muitas
delas são orações frases, como em 2.4, mas refletem o fato de que em toda e
qualquer situação, Neemias buscava a ajuda Deus.

“O rei me disse: Por que está triste o teu rosto, se não estás doente? Tem
de ser tristeza do coração. Então, temi sobremaneira” (v. 2) – Neemias tinha
esperado pacientemente pela oportunidade certa para se apresentar diante do rei
Artaxerxes e fazer o seu pedido. Ele corria um grande risco. Os reis gostam de estar
rodeados de pessoas felizes. Essa atitude poderia ter causado a perda do emprego.
A gravidade de sua situação pode ser vista quando ele declara: “Então, temi
sobremaneira” (2.2). Era a oportunidade que ele estava esperando, mas quando
surgiu, estava apavorado. Como lidar com isso? Neemias orou!

“Disse-me o rei: Que me pedes agora? Então, orei ao Deus dos céus” (Ne
2.4) – Sua oração foi um grito silencioso de “Ajuda-me, Senhor!” Ou: “Senhor, dá-
me sabedoria agora!” Esta oração rápida mostra que Neemias dependia do Senhor
em cada situação. Neemias não atribuiu a resposta favorável do rei à boa sorte.
Mais adiante, ele declara: “E o rei mas deu, porque a boa mão do meu Deus era
comigo” (Ne 2.8). Como Provérbios diz: “Como ribeiros de águas assim é o coração
do rei na mão do SENHOR; este, segundo o seu querer, o inclina” (Pv 21.1). Ou, como
Hudson Taylor disse: “É possível mover os homens através de Deus somente pela
oração”.29
Se você deseja realizar qualquer coisa grandiosa para Deus, precisa começar
pela oração. Charles Trumbull declarou: “Orar é liberar as energias de Deus. Pois a
oração é pedir que Deus faça aquilo que não podemos fazer”.30 Neemias era um
homem de oração.
Além do mais, é importante destacar a grande diferença entre o trono de
Artaxerxes com o trono de Deus. Neemias teve que esperar por um convite antes
de compartilhar a sua dor com o rei, mas a Bíblia diz que podemos chegar ao trono
da graça a qualquer momento, com qualquer necessidade (Hb 4.14-16). Artaxerxes
viu a tristeza no rosto de Neemias, mas nosso Senhor vê nossos corações e não
apenas conhece as nossas tristezas, mas também sente a nossa dor. Warren
Wiersbe, com muita propriedade, declarou que: “Nunca temos certeza sobre o
ânimo de um líder humano, mas você sempre pode ter a certeza de que será bem-
vindo diante do Deus amoroso”. 31

29 Citado por Charles Swindoll, Hand me another brick [Thomas Nelson Publishers], p. 43.
30 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 30.
31 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (26). Wheaton, Ill.: Victor Books.

17
2. Neemias planejou.
5
e disse ao rei: se é do agrado do rei, e se o teu servo acha mercê em
tua presença, peço-te que me envies a Judá, à cidade dos sepulcros de
meus pais, para que eu a reedifique. 6 Então, o rei, estando a rainha
assentada junto dele, me disse: Quanto durará a tua ausência? Quando
voltarás? Aprouve ao rei enviar-me, e marquei certo prazo.

Enquanto orava e esperava a resposta de Deus, Neemias teve tempo para


planejar. Em sua oração em 1.11, e em suas ações subsequentes, é notório que ele
já estava formulando um plano. Seu planejamento tornou-se claro quando o rei
perguntou quanto tempo duraria sua ausência. Neemias já sabia quanto tempo era
necessário para a obra, porque ele disse: “Marquei certo prazo” (2.6). Esse prazo é
descrito no capítulo 5, onde está registrado que ele ficou em Jerusalém durante 12
anos (5.14); provavelmente, ele terminou os muros e retornou para relatar ao rei
Artaxerxes, e depois voltou para servir como governador em Jerusalém.
Não obstante, Neemias fez alguns pedidos específicos ao rei, que
demonstram um planejamento cuidadoso (2.7-8). Ele pediu cartas para os
governadores das províncias que lhe permitissem passar através de seu território.
Ele pediu uma carta para o guarda da floresta do rei, para obter madeira para fazer
reparações nos muros e portões, e para sua própria casa. John Maxwell
corretamente afirma que o líder segue a lei do carpinteiro: mede duas vezes e corta
apenas uma.32
Embora Neemias não fosse pedreiro ou empreiteiro de construção, ele
soube planejar cuidadosamente. Ele refletiu sobre todo o empreendimento,
antecipou as dificuldades e desenvolveu soluções com antecedência. Ele tinha
calculado minuciosamente o investimento.33 Neemias tinha um plano bem
formulado e persistiu nele. Tudo isso fluiu da sua vontade de se envolver e tomar a
iniciativa.
Aqui está uma preciosa lição. Muitas vezes os líderes negligenciam um
planejamento cuidadoso, seja na igreja, no mundo dos negócios ou no governo.
Tristemente, nos círculos cristãos, a falta de planejamento tem sido tratada não
como relaxo, mas como falta de espiritualidade. O comentarista James M. Boice
descreve o diálogo comum de um sonhador espiritual:
“Deus me disse para fazer assim e assim”, diz o sonhador.
“Sim? E como você vai fazer isso?”
“Eu não sei. Acho que só vou começar e ver o que o Senhor vai fazer”.

As pessoas que começam desta maneira geralmente retornam com o


trabalho não terminado.34 Planejar com sabedoria é crucial antes de qualquer
tarefa (Lc 14.28-33). Assim, enquanto você espera no Senhor, deve orar e planejar.
Essa atitude é uma confiança de que Deus vai concretizar os seus planos para Sua
glória, e quando Ele o fizer, esteja preparado para receber.

32 MAXWELL, John. 21 minutos de poder na vida de um líder. Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2007, p. 77.
33 MACARTHUR, John. O livro sobre liderança. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2009, p. 31.
34 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (29). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.

18
II. Neemias avaliou a situação
11
Cheguei a Jerusalém, onde estive três dias. 12 Então, à noite me
levantei, e uns poucos homens, comigo; não declarei a ninguém o que
o meu Deus me pusera no coração para eu fazer em Jerusalém. Não
havia comigo animal algum, senão o que eu montava.

Os versos de 11 a 15 descrevem a viagem de Neemias durante a noite em


Jerusalém. Até o momento ele não tinha informado a ninguém que estava ali para
reconstruir os muros de Jerusalém (v. 12). Além disso, antes de revelar seus
planos, ele queria ver a situação pessoalmente.
Antes de falar ao rei sobre o desejo de ir a Jerusalém, Neemias formulou um
plano. Aqui, mais uma vez, antes de falar com o povo e os líderes, Neemias espera o
momento certo e, cuidadosamente, elabora mais um plano. Quais são os passos na
produção de um bom plano?

1. Informação.
“De noite, saí pela Porta do Vale, para o lado da Fonte do Dragão...” (v. 13) –
Esse é um dos incidentes mais conhecidos no livro de Neemias, quando ele cavalga
pela noite para inspecionar o muro da cidade. Há muitas coisas que poderíamos
esperar que Neemias fizesse ao chegar pela primeira vez em Jerusalém: talvez
assumir o poder, talvez realizar entrevistas com os homens mais importantes da
cidade, talvez até mesmo tentar criar alianças com os líderes das cidades
circunvizinhas.35 No entanto, durante os primeiros três dias, ele não fez nada.
Então, no terceiro dia, à noite, leva alguns homens de confiança e sai examinando
os muros. Ele é tão detalhado em seu relatório que até hoje este (juntamente com o
cap. 3) é o melhor registro histórico da extensão da cidade no período pós-exílico.
Em determinado lugar, o entulho era tanto que impediu que Neemias
passasse a cavalo. Como líder, ele precisava saber exatamente a situação da cidade
para desenvolver um plano prático de ação. Neemias não encobriu os problemas.
Ele os descreve ao povo como sendo “uma miséria... um opróbrio” (v. 17).

2. Avaliação.
Depois de reunir as informações necessárias, Neemias desenvolveu um
conceito de como a reconstrução poderia ser feita. Alguém pode argumentar se,
após uma inspeção noturna dos muros danificados, Neemias poderia ter adquirido
todas as informações necessárias para reconstruí-los. A resposta é não! Mas apesar
de Neemias provavelmente não ter recebido todas as informações que precisava
para concluir a reconstrução, ele tinha o suficiente para ter formulado um plano
(capítulo 3).
Warren Wiersbe mais uma vez estava certo quando escreveu: “Neemias viu
mais à noite do que os moradores viram à luz do dia, pois ele viu o potencial, bem
como os problemas. É isso que faz um líder!”36 Para ter um plano exequível, não é
necessário obter toda a informação, mas é necessário ter a informação necessária
e, em seguida, formular um plano sábio. Neemias fez isso antes de falar ao povo de
Jerusalém.

35 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (33–34). Grand Rapids, Mich.:


BakerBooks.
36 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (31). Wheaton, Ill.: Victor Books.

19
3. Implementação
Neemias foi positivo, ele centrou-se na glória e grandeza do Senhor. Ele
tinha estado na cidade, apenas a alguns dias, mas falou de “nós” e “nós” e não
“você” e “eles”. Como fez em sua oração (1.6-7), ele se identificou com as pessoas e
suas necessidades. A cidade era um opróbrio para o Senhor (1.3, 4.4, 5.9), mas a
mão do Senhor estava com eles.
Os judeus responderam fortalecendo as mãos para a boa obra (v. 18). Eles
nem lembram a Neemias que o rei havia embargado a restauração no tempo de
Esdras (Ed 4).
A boa mão de Deus estava sobre o líder, e os seguidores “fortaleceram as
mãos” para o trabalho (Ne 2.8, 18). É preciso ambas as mãos da liderança e as
mãos dos cooperadores para realizar a obra do Senhor. Os líderes não podem fazer
o trabalho sozinhos, e os trabalhadores não podem realizar muito sem a liderança.

III. Neemias aproveitou as oportunidades


2
O rei me disse: Por que está triste o teu rosto, se não estás doente?
Tem de ser tristeza do coração. Então, temi sobremaneira 3 e lhe
respondi: viva o rei para sempre! Como não me estaria triste o rosto se
a cidade, onde estão os sepulcros de meus pais, está assolada e tem as
portas consumidas pelo fogo?

Deus graciosamente moveu o coração do rei. Todavia, Neemias aproveitou


cada pergunta para ser bem-sucedido em sua empreitada. As boas perguntas
ajudam-nos a esclarecer situações como também dissipar dúvidas e suspeitas.37
Neemias viu a sua oportunidade quando o rei perguntou: “Que me pedes agora?”
Deus abriu a porta com estas palavras.

1. Neemias teve tato para lidar com o rei.


Quando o rei perguntou por que ele estava triste, Neemias respondeu com
outra pergunta. Muitos teriam dito: “Por que estou triste? Eu vou te dizer por que
estou triste. Treze anos atrás, no sétimo ano do seu reinado, uma delegação de
judeus foi a Jerusalém com o escriba Esdras e tentaram cumprir o decreto de seu
antecessor, Ciro, para reconstruir o templo e os muros. Mas quando os
governadores do além Eufrates ouviram falar sobre isso, apelaram ao senhor para
que o trabalho cessasse; o senhor nem sequer ouviu o outro lado da história. O
senhor não viu que os governadores eram invejosos e tinham medo de que a
cidade de Jerusalém revitalizada se tornasse algo prejudicial aos seus interesses.
Se Neemias tivesse agido assim, teria desperdiçado uma grande
oportunidade. Em vez disso, Neemias perguntou: “Como não me estaria triste o
rosto se a cidade, onde estão os sepulcros de meus pais, está assolada e tem as portas
consumidas pelo fogo?” (v. 3). Desta forma, o rei entendeu que Neemias tinha
motivos para ficar triste e queria ajudá-lo.38

37
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 31.
38 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (26). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.

20
Neemias sabia que o seu pedido exigiria a reversão de uma ordem do rei
Artaxerxes (Ed 4.7-23), e ele entendia que qualquer pedido para fortificar uma
cidade seria suspeito. Então, Neemias tratou o assunto como uma questão pessoal.
É interessante notar que, apesar de Neemias pedir permissão para
reconstruir os muros de Jerusalém, em nenhum momento ele menciona o nome da
cidade. Ele se referiu a ela como “a cidade onde estão os sepulcros dos meus pais” (v.
3) e “a cidade de Judá” (v. 5). É um ponto simples, mas de extrema sabedoria. Como
Dale Carnegie expressou: “Se você quer recolher o mel, não chute a colmeia”.39
Além disso, Neemias havia adquirido o respeito do rei através de sua
competência no trabalho. O questionamento do rei sobre o tempo que ele ficaria
em Jerusalém demonstra sua importância no palácio. Todo cristão deve ser uma
testemunha em seu emprego por seu caráter, competência e pelas suas palavras.

2. Neemias teve tato para lidar com o povo.


17
Então, lhes disse: Estais vendo a miséria em que estamos, Jerusalém
assolada, e as suas portas, queimadas; vinde, pois, reedifiquemos os
muros de Jerusalém e deixemos de ser opróbrio. 18 E lhes declarei
como a boa mão do meu Deus estivera comigo e também as palavras
que o rei me falara. Então, disseram: Disponhamo-nos e edifiquemos.
E fortaleceram as mãos para a boa obra.

Neemias teve sucesso diante do rei, mas agora, ao chegar a Jerusalém, ele
enfrentou outros dois problemas: uma derrota na memória do povo e um grupo de
trabalhadores desencorajados.

A. A história da derrota. Neemias chegou a Jerusalém no vigésimo ano do


rei Artaxerxes, cerca de 445 a.C., Entretanto, o trabalho tinha realmente começado
no segundo ano do rei Ciro em 538 a.C., mais de noventa anos antes. Na época, o
primeiro contingente de judeus tentou reconstruir o templo, mas a tarefa se
revelou difícil, levando quinze anos para seu fim. Então, quando a primeira
tentativa de restaurar os muros foi feita, a oposição se levantou e apelou ao rei
Artaxerxes para que a mesma fosse embargada. Isso aconteceu após o retorno de
um segundo grupo de exilados no sétimo ano de Artaxerxes. Quando Neemias
chegou, havia treze anos que a obra estava parada. Neemias enfrentou não apenas
uma tarefa difícil, mas a inércia, também.

B. Um grupo de trabalhadores desencorajados. Para piorar a situação, as


únicas pessoas que Neemias poderia contar, no trabalho de restauração, estavam
desencorajadas.
Uma tarefa árdua? Sim. Mas os grandes obstáculos são oportunidades para
grandes homens, como Neemias. Ele passou três dias observando e pensando
como apresentar seu projeto ao povo e superar as objeções. Depois disso, chamou
os líderes judeus e afirmou muito claramente o problema: “Estais vendo a miséria
em que estamos, Jerusalém assolada, e as suas portas, queimadas; vinde, pois,
reedifiquemos os muros de Jerusalém e deixemos de ser opróbrio” (2.17).

39Dale Carnegie, How to win friends and influence People (New York: Simon & Schuster,
1963), 19.

21
Neemias mexe com o brio do povo. Desperta no coração do povo o
sentimento de patriotismo. Em seguida, convoca o povo para o trabalho. Neemias
os desafiou com a obra a ser feita: os motivou para a realização da tarefa, e os
encorajou com a segurança do sucesso.40 Neemias deve nos ensinar a combinar
sabedoria e tato com a verdade simples.
Felizmente, o povo aceitou a visão do seu líder e o seguiu. Eles estavam
prontos para reconstruir o muro. Mas lembre-se que nem todos ficarão felizes
quando você começar a fazer algo grande para Deus.

3. Neemias teve tato para lidar com os inimigos.


19
Porém Sambalate, o horonita, e Tobias, o servo amonita, e Gesém, o
arábio, quando o souberam, zombaram de nós, e nos desprezaram, e
disseram: Que é isso que fazeis? Quereis rebelar-vos contra o rei?

Quando você tenta coisas grandes e impossíveis para Deus, o inimigo estará
ali para rir, desprezá-lo, ridicularizá-lo e tentar destruir a sua fé.41 Sambalate era o
governador de Samaria, ao norte. Tobias, cujo nome é judeu (Jeová é bom),
governava os Amonitas, ao leste. Gesém era o líder dos árabes, ao sul. Todos eles se
opuseram a uma Jerusalém fortificada porque ameaçava a suas posições políticas.
Eles estavam descontentes (2.10), se uniram para ridicularizar o projeto e
acusaram o povo de rebelião contra o rei (2.19).
Se Jerusalém fosse reconstruída, haveria interferência na supremacia
econômica de Samaria. A estratégia de Sambalate era diminuir a autoestima,
enfraquecer a determinação e destruir a moral deles. Os críticos só agem em seu
próprio interesse.42
Neemias demonstra sabedoria ao lidar com estes inimigos. Ele enfrentou
corajosamente e desenhou a linha entre eles e o povo de Deus para que não
pudessem participar do projeto com o objetivo de sabotá-lo. Ele não usou o poder
político das cartas do rei, mas a influência espiritual: “O Deus do céu nos dará
sucesso” (2.20, NTLH).
Toda vez que o povo de Deus disser: “Vamos levantar e construir”, o inimigo
dirá: “Vamos levantar e detê-los”. Um líder piedoso deve ter o discernimento de
saber quando trabalhar com as pessoas e quando confrontá-las. Às vezes, os líderes
têm de negociar, mas há momentos em que os líderes devem desenhar uma linha e
defendê-la. Infelizmente, nem todo mundo concordou, em Jerusalém, com o seu
líder, alguns deles colaboraram com Sambalate, Tobias e Gesém.43
Todo líder enfrentará críticas. Só existe uma forma de não recebê-las: não
faça nada e não diga nada. Se você está fazendo a vontade de Deus, espere
oposição. Elogios e críticas vêm e vão. Agradar a Deus é tudo que importa.
Assim, para servir a Deus de forma realista, você deve aprender a esperar
em Deus e trabalhar com pessoas.

40
Cyril J. Barber, in Nehemiah and the dynamics of effective leadership (Neptune, NJ:
Loizeaux Brothers, 1976), 39.
41 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 2.19–20). James L. Fleming.
42
CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 117.
43 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (33–34). Wheaton, Ill.: Victor Books.

22
Conclusão:
O povo de Jerusalém foi motivado pela sua cidadania terrena e respondeu,
como a história mostra, através da reconstrução dos muros de sua cidade. Mas nós
não apenas temos uma cidade, e sim uma pátria celestial (Fp 3.20). Temos orgulho
dessa cidadania? Somos motivados a trabalhar com entusiasmo para a expansão do
reino de Deus, aqui? Há trabalho a ser feito, muros a serem reconstruídos. Além
disso, o que construímos neste mundo, seja nosso caráter ou nossas boas ações,
durará para sempre (Ap 14.13).
Antes de concluir este estudo, devemos olhar um princípio final
demonstrado por Neemias. Ele disse aos seus inimigos “vós, todavia, não tendes
parte, nem direito, nem memorial em Jerusalém” (v. 20). Pense sobre o que ele está
dizendo. Os poderes das trevas, representados por esses três homens que se
levantariam contra a reconstrução do programa físico ou espiritual, não têm
nenhum direito legal no passado, presente ou futuro dentro do Reino de Deus (veja
Cl 2.13-15).44
Portanto, você não tem que sucumbir às acusações de Satanás e suas
mentiras. Se você é filho de Deus, o Eterno fará com que você tenha sucesso em sua
jornada. Não desista dos seus sonhos!

44 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 2.19–20). James L. Fleming.

23
Mãos à obra!
[Estudo 3 – Ne 3.1-32]

Durante a defesa da península de Bataan, nas Filipinas, por ocasião da


Segunda Guerra Mundial, um dos comandantes alinhou os seus homens e pediu um
voluntário para uma perigosa missão. Ele disse que qualquer soldado que estivesse
disposto a servir nesta missão deveria dar dois passos à frente. Olhando para o seu
memorando por um momento, exclamou com espanto: “O quê, não há nenhum
voluntário?” Rapidamente alguém explicou: “Capitão, o senhor não está
entendendo. Todos os homens avançaram dois passos!”45 Neemias experimentou
uma resposta semelhante ao desafiar o povo de Jerusalém a se juntar a ele em uma
missão aparentemente impossível.
À primeira vista, o capítulo 3 parece ser nada mais do que uma simples lista
dos trabalhadores que participaram da restauração dos muros de Jerusalém.
Alguma coisa pode ser mais desinteressante do que uma lista de nomes que mal
conseguimos pronunciar? Muitas pessoas parecem pensar assim, e não somente os
leigos. O escritor Charles Swindoll, em seu excelente estudo sobre Neemias, (Hand
me another brick), ignora o capítulo três, passando do desafio de Neemias ao povo
para a oposição durante a restauração dos muros no capítulo quatro. Porém,
Neemias 3, é na verdade, um dos capítulos mais importantes do livro. Uma análise
mais aprofundada revela várias lições sobre a liderança, à natureza humana e o
trabalho duro.46 Quando o capítulo é devidamente compreendido, pode ser visto
como um registro de uma realização notável.47
Por que Deus incluiu Neemias 3 nas Escrituras? O que podemos aprender
com a leitura e o estudo deste capítulo? Creio que o capítulo 3 foi escrito para nos
mostrar a importância de trabalhar juntos para alcançar o propósito de Deus.

I. A visão
“Então, disseram: Disponhamo-nos e edifiquemos. E fortaleceram as
mãos para a boa obra” (Ne 2.18)

Para cumprir o propósito de Deus, precisamos de uma visão comum para a


tarefa. Você não pode trabalhar em conjunto em uma obra, se todas as pessoas
possuem uma noção diferente do objetivo da mesma. No capítulo 3, Neemias deixa
claro a sua visão e mostra ao povo como executá-la.

1. O mesmo propósito.
A tarefa dos trabalhadores era específica e mensurável: restaurar os muros
em torno de Jerusalém para fornecer uma defesa contra seus inimigos. Neemias

45 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 3.1–32). James L. Fleming.
46 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible
studies (28). Nashville, TN: W Publishing Group.
47 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (41). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.

24
dividiu os muros em indivíduos e grupos diferentes. Utilizou pessoas diferentes, de
profissões diferentes e de graus culturais diferentes para a restauração. O capítulo
3 pode ser dividido em três partes: 1. A expressão junto a ele (3.1-15); 2. A
expressão depois dele (3.16-31); 3. A expressão entre (3.32).48
Ao analisar os escombros em Jerusalém durante três dias (Ne 2), Neemias
foi capaz de elaborar uma estratégia para que o trabalho fosse iniciado e concluído
com sucesso. Ele sabia onde cada pessoa ou grupo trabalharia, e designou os
homens de Tecoa, Jericó, Mispa, entre outros, para a restauração dos muros.
Isso é maravilhoso, pois cada pessoa sabia onde deveria estar. Sabia,
também, qual era a responsabilidade de reconstruir sua parte do muro desde o
alicerce, enquanto outros tiveram apenas de fazer reparos.49 Ou seja, tinham a
mesma visão. Em todo o trabalho havia coordenação de esforços.

2. A mesma causa.
Há trinta e oito nomes mencionados neste capítulo. Isso significa que
Neemias teve ampla ajuda dos moradores de Jerusalém. Nenhum grupo ou
indivíduo pode fazer todo o trabalho; mas sim, o trabalho de restauração dos
muros foi compartilhado por numerosos indivíduos. Neemias nos mostra que
todos são importantes e necessários para completar a obra.
Este capítulo é um belo exemplo do que a igreja pode fazer quando se
trabalha em conjunto, quando se está unido com o mesmo propósito e a mesma
causa: o reino de Deus. As palavras de Jesus em Sua oração sacerdotal devem ser a
força motivadora para todo o ministério cristão: “Eu te glorifiquei na terra,
consumando a obra que me confiaste para fazer” (Jo 17.4). Deus tem uma tarefa
especial para cada um de Seus filhos (Ef 2.10), e quando fazemos essa tarefa em
humildade e fidelidade, glorificamos o Seu nome.
A reconstrução dos muros e a fixação das portas também significavam
proteção e segurança para as pessoas. Todavia, ao longo dos anos, os cidadãos
tinham se acostumado com a situação. Como muitos crentes na igreja, eles se
contentaram em viver o status quo. Então Neemias chegou ao local e os desafiou a
reconstruir a cidade para a glória de Deus.50
A cooperação obtida por Neemias demonstra até que ponto ele pôde unir
tão diversificado grupo.51 Todos que trabalharam tinham um objetivo comum e a
mesma visão. Isto é, os membros da equipe completam-se uns aos outros – jamais
competem uns com os outros.52
Hoje as pessoas estão desesperadas por líderes verdadeiros na política, nos
negócios e na igreja. Onde aprender a escolher e ser o que nós e tantos outros
desejamos? Neemias é um excelente livro sobre liderança.

48 Irmão André, Edificando um mundo em ruínas. São Paulo: CPAD, 2009, 119-120.
49
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 44.
50 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (37). Wheaton, Ill.: Victor Books.
51
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 46.
52
MAXWELL, John. 21 minutos de poder na vida de um líder. Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2007, p. 212.

25
II. A missão
1
Então, se dispôs Eliasibe, o sumo sacerdote, com os sacerdotes, seus
irmãos, e reedificaram a Porta das Ovelhas; consagraram-na,
assentaram-lhe as portas e continuaram a reconstrução até à Torre dos
Cem e à Torre de Hananel. 2 Junto a ele edificaram os homens de
Jericó; também, ao seu lado, edificou Zacur, filho de Inri.

A visão apresenta a convicção de que algo deve ser feito; a missão


representa os desafios e caminhos para a concretização. As pessoas listadas em
Neemias 3 estavam acostumadas com os escombros dos muros há anos. Mas, o
Senhor moveu o coração de Neemias, e o seu trabalho pode ser visto em todo o
capítulo, de sete maneias:

1. Um líder não deve se importar se o crédito vai para os


outros.
Neemias não queria um memorial ou uma placa de bronze sobre a porta
principal dos muros, com seu nome. Em vez disso, ele estava comprometido com a
tarefa. Ele queria que os muros fossem restaurados de modo que o nome de Deus
fosse exaltado em Jerusalém e Seu povo não fosse mais um opróbrio. Neemias
sabia que Deus reconheceria os seus esforços (13.31; cf. Hb 6.10).
Você já reparou que nesta longa lista de trabalhadores não encontramos o
nome de Neemias? Ele era tão ativo como qualquer pessoa, mas quando chegou à
hora de dar crédito, ele não disse, como Nabucodonosor, “... não é esta a grande
Babilônia que eu edifiquei como a residência real, pelo meu grandioso poder e para
glória da minha majestade?” (Dn 4.30). Nabucodonosor tomou a glória para si
mesmo e foi julgado por isso. Por outro lado, Neemias deu crédito aos outros,
listando o que cada um havia feito. Então, quando a obra foi concluída, deu a glória
a Deus. Ele declarou: “... por intervenção de nosso Deus é que fizemos esta obra” (Ne
6.16).53 Aqui está o padrão para um líder bem-sucedido, metas dignas e a glória de
Deus.

2. Um líder deve motivar as pessoas.


O comentarista James M. Boice acertadamente declara que nos três
capítulos é possível encontrar três dinâmicas da liderança: A primeira dinâmica é
encontrada no capítulo primeiro, ou seja, a relação do líder com Deus. Onde é que
vamos adquirir as competências que caracterizam os verdadeiros líderes? Lembre-
se do comentário de Peter Drucker: “Os executivos eficazes fazem primeiro as
primeiras coisas e eles fazem uma coisa de cada vez”.54 Ou seja, o relacionamento
de um líder com Deus tem prioridade em sua agenda. A segunda dinâmica é a
relação do líder com seu superior ou superiores. Deus é o supremo. Mas são
poucas as pessoas que não têm superiores seculares. É importante saber como
lidar de forma correta e criativa com essas pessoas. Neemias teve tato para
trabalhar com o rei Artaxerxes. A terceira dinâmica é o relacionamento do líder
com os seus liderados. Isso envolve a definição de metas claras, comunicação

53 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (48). Grand Rapids, Mich.:


BakerBooks.
54 Peter F. Drucker, The effective executive (New York: Harper & Row, 1985), 100.

26
correta e encorajamento. Neemias também se destacou nesta área, mesmo que
estivesse lidando com um povo desencorajado, que tivera uma história de
derrota.55
Segundo J. Packer “... todo líder verdadeiro é um mestre da motivação”.56
Motivação é a chave para a produtividade. Uma maneira sábia que Neemias
utilizou a fim de motivar as pessoas foi fazer com que muitos grupos trabalhassem
sobre a parte dos muros que tinham particular interesse. Os sacerdotes
trabalharam na Porta das Ovelhas (3.1), onde as pessoas levavam os sacrifícios
para o templo. O portão ficava perto da área do templo, por isso o interesse dos
sacerdotes. Outros repararam os muros em frente dos seus próprios lares (3.10,
23, 28-30). Muitos foram designados para (ou escolheram) partes dos muros de
Jerusalém na frente ou junto às suas casas. O judeu Jedaías trabalhou na parte do
muro “... defronte de sua casa; e, ao seu lado” (v. 10), Benjamim e Hasube repararam
“... defronte de sua casa” (v. 23), e Azarias reparou “... junto a sua casa” (v. 23), e
assim por diante. Isto seria conveniente para tudo, até mesmo para não perder
tempo ao sair para almoçar em casa. Eles tinham um incentivo especial para fazer
um bom trabalho! Uma pessoa faria o melhor trabalho e deixaria a parte do muro
mais fortalecida, onde a sua própria casa precisasse ser protegida.
James M. Boice estava certo quando escreveu: “A melhor gestão reconhece
um elemento de auto-interesse, mesmo nos melhores trabalhadores e até nos
projetos mais altruístas”.57 Warren Wiersbe, sabiamente comentando sobre esses
versos, declarou que, “Se todos nós seguíssemos este exemplo, os nossos bairros e
cidades estariam muito melhor! Claro, há uma lição espiritual aqui: o serviço
cristão começa em casa”.58

3. Um líder deve planejar e organizar.


Neemias sabiamente dividiu o trabalho em partes menores. Segundo J.
Packer, “... a extensão dos muros era de quase dois quilômetros, e os novos
deveriam ter cerca de um metro de largura, e cinco ou seis metros de altura”.59 Mas
ao dividir o trabalho em 40 ou 41 segmentos distintos, o projeto tornou-se viável.

A. Um líder deve delegar.


Neemias não poderia realizar o trabalho sozinho. Ele teve que designar
trabalhadores. Às vezes, é mais fácil fazer o trabalho do que delegá-lo. Mas quando
o trabalho cresce, a necessidade de delegação também cresce. Neemias designou
indivíduos de todas as esferas para ajudá-lo. Sacerdotes (v. 1 e 28), ourives e
perfumistas (v. 8), nobres (v. 12, 14, 16), levitas (v. 17), governantes, servos e
comerciantes aderiram ao trabalho (v. 31-32).

55 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (42). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.
56 Packer, J. I. (1995). A passion for faithfulness: wisdom from the book of Nehemiah.

Wheaton, Ill.: Crossway Books.


57 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (48). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.
58 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (41). Wheaton, Ill.: Victor Books.
59 Packer, J. I. (1995). A passion for faithfulness: Wisdom from the book of Nehemiah.

Wheaton, Ill.: Crossway Books.

27
B. Um líder deve supervisionar.
Delegar não significa abandonar o trabalho. Ao designar as tarefas, Neemias
inspecionou o andamento, conversando com seus líderes, ajudando-os a manter as
coisas em ordem e na direção correta. Em 3.20, ele observa que Baruque reparou
“com grande ardor” uma parte do muro. Aparentemente, Neemias sabia não só o
que estavam fazendo, mas também como eles estavam fazendo. Baruque fez um
trabalho excepcional.

4. Um líder deve dar o devido reconhecimento.


Neemias foi capaz de registrar resumidamente o que cada trabalhador fez.
Alguns são mencionados como trabalhando em mais de uma parte do muro (3.4,
21 e 27). Mas o importante não foi o fato de Neemias reconhecer todos os
trabalhadores, mas que Deus os reconheceu, incluindo seus nomes aqui.
O capítulo 3 pode dar a impressão de que uma vez que Neemias havia
cuidadosamente atribuído a todos uma determinada parte do muro, a partir desse
momento tudo transcorreu sem dificuldades. Não foi bem assim! A obra de Deus
raramente prossegue sem oposição.60

5. Um líder não deve se distrair com aqueles que não estão


cooperando.
5
Ao lado destes, repararam os tecoítas; os seus nobres, porém, não se
sujeitaram ao serviço do seu senhor.

Neemias 3.5 menciona os nobres de Tecoa que se recusaram a participar do


projeto, talvez por orgulho ou por alguma restrição a Neemias. Todavia, é
interessante notar que o descontentamento de seus líderes não impediu que os
homens de Tecoa trabalhassem. Eles não só construíram uma parte dos muros (v.
5), mas aparentemente restauraram outra parte também (v. 27).61 Além do mais,
alguns nobres de outras cidades arregaçaram as mangas e conjuntamente
trabalharam (3.9, 12). Entretanto, Neemias não gastou tempo nem energia para
lidar com os nobres de Tecoa. Em vez disso, ele trabalhou com aqueles que
estavam dispostos a cooperarem com a obra. Os nobres que não se envolveram
perderam uma excelente oportunidade de contribuir com a obra de Deus. Na
realidade, além da preguiça, esses nobres estavam comprometidos com Tobias em
troca de ganho pessoal (6.17-19).
O que teria acontecido se Neemias tivesse parado a obra para responder aos
críticos? Será que o muro teria sido restaurado em 52 dias? A resposta é simples:
Não! Nunca deixe alguém que não faz nada dizer a você como fazer algo.62
O comentarista Fleming, J. L. conta a história de um capitão que, no meio de
uma batalha, perdeu um de seus homens. Ele lembrou que a última vez que não
tinha visto o soldado, eles estavam passando por uma vila a alguns quilômetros de

60 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1983-). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 3.28–32). Wheaton, IL: Victor Books.
61 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (47). Grand Rapids, Mich.:

BakerBooks.
62
CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 122.

28
distância. Assim que pode, o capitão deixou os homens em segurança e foi à vila e
encontrou o soldado passeando em um belo jardim. Ele foi submetido a corte
marcial e sua única defesa foi: “Mas eu não estava fazendo nada!” Isso,
naturalmente, era o motivo de sua convicção de que em um momento de conflito,
ele estava totalmente indiferente às ordens de seu superior.63
Lamentavelmente, os soldados e desertores, trabalhadores e preguiçosos,
estão conosco hoje. Você é como os nobres de Tecoa, que queriam os benefícios de
uma Jerusalém reconstruída, mas se recusam a se envolver no trabalho do Senhor?

III. Os valores
Para cumprir o propósito de Deus, precisamos de trabalhadores dispostos a
fazer a sua parte. As pessoas ouviram a visão de Neemias e lhe responderam:
“Vamos levantar e construir” (2.18). Trabalhando juntos, conseguiram o que
ninguém poderia ter realizado individualmente.

1. Os trabalhadores estavam unidos por uma causa geral.


Enquanto alguns trabalhavam na frente de seus próprios lares (como já
observado), outros apareceram de cidades distantes para ajudar (3.2, 5, 7, 13, 14,
16, 17). Depois que o projeto terminou, eles voltaram para seus respectivos lares
sem qualquer aparente benefício pessoal. Talvez eles pudessem habitar com mais
segurança nas suas aldeias, com a capital Jerusalém fortalecida. Eles teriam
gostado de saber que o templo estava seguro por trás dos muros, para que
pudessem voltar a participar das festas anuais. Mas além de quaisquer benefícios
pessoais, eles estavam dispostos a trabalhar por uma causa geral, para que o nome
do Senhor e o Seu povo não fossem mais considerados opróbrios entre as nações.

2. Os trabalhadores estavam dispostos a trabalhar fora de


suas áreas de atuação.
Os sacerdotes (incluindo o sumo sacerdote Eliasibe), estavam envolvidos na
reforma da porta das ovelhas e uma parte da parede (3.1). Eles não aprenderam
como fazer isso no seminário! Talvez eles tivessem obtido algumas instruções
sobre como construir e assentar uma porta com homens experientes. Alguns dos
trabalhadores eram ourives e fabricantes de perfumes (3.8). Eles não estavam
acostumados com este tipo de trabalho robusto. Além disso, Neemias declara que
um homem fez os reparos com suas filhas (3.12)! Aparentemente, eles fizeram
mais do que sabiam ou estavam acostumados. Mas fizeram!
Às vezes as pessoas se esquivam dos trabalhos da igreja com o seguinte
argumento: “Eu não ajudo na limpeza da cozinha da igreja, porque esse não é meu
dom espiritual”. Porém, o dom que recebemos do Altíssimo deve nos ajudar; a
saber, onde concentrar nossos esforços; mas existem muitos postos de trabalho
onde todos nós somos chamados a arregaçar as mangas, sendo o nosso dom ou
não. O ponto de Neemias 3 é que todos devem se envolver. O Novo Testamento é
claro ao afirmar que se você é um cristão, você está no ministério (serviço), e você
vai prestar contas do ministério diante do Mestre (Mt 25.14-30).

63 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 3.1–32). James L. Fleming.

29
Infelizmente, hoje temos que concordar com a afirmação de James M. Boice:
“... as igrejas se assemelham, mais do que qualquer outra coisa, a um jogo de
futebol em um grande estádio. Há oitenta mil espectadores nas arquibancadas que
precisam de muito exercício, e há vinte e dois homens no campo que precisam
muito de um descanso.64

3. Alguns trabalhadores estavam dispostos a fazer o menos


atraente.
Em 3.14, está registrado que Malquias reparou a Porta do Monturo. Esta
ficava ao sul da cidade, próximo ao Vale de Cidron, onde as pessoas levavam todo o
lixo possível para queimar. Se Malquias é o mesmo mencionado em 3.31, ele era
um ourives de profissão, e também ajudou nos reparos de outra parte do muro.
Havia, provavelmente, mais voluntários para reparar a Porta da Fonte do que o
Portão do lixo! Porém, Malquias percebeu que o trabalho era necessário, e ele
estava disposto a fazê-lo.
Não há nenhum registro de reclamação por parte de Malquias. Ele não pede
para trabalhar em um local mais agradável. Ele não insiste em “um quarto com
uma vista melhor” (e cheiro). Não, ele simplesmente pegou a atribuição dada e
executou, “ele a edificou e lhe assentou as portas com seus ferrolhos e trancas” (Ne
3.14).
De que forma você compreende a vontade de Deus? De que forma você
descobre o que Deus quer que você faça em sua igreja? A resposta pode ser
encontrada ao analisar o nome e a cidade de origem de Malquias. O seu nome
significa, “O Senhor é meu rei”. Quando uma pessoa tem um rei, ele obedece ao que
o rei lhe diz para fazer. Além disso, o nome do distrito de Malquias é chamado de
Bete-Haquerém, que significa “a casa de alguém que é totalmente dedicado ao
Senhor”.65 Quando somos dedicados inteiramente ao Senhor, não importa o que
Ele nos peça para fazer, iremos fazê-lo!

Conclusão:
Quando se trata da obra do Senhor, não há lugar para espectadores,
conselheiros ou críticos. Mas há sempre espaço para os trabalhadores.66 O povo
trabalhou com disposição, zelo e coragem. Como resultado, os muros foram
restaurados em 52 dias (6.15). O que parecia impossível tornou-se realidade.
O trabalho do Senhor requer o envolvimento de todos os tipos de pessoas
de diferentes esferas da vida. Quando olhamos para Neemias, capítulo 3,
descobrimos que indivíduos de todas as esferas da vida estavam lá para ajudar
(sacerdotes, ourives, boticários, comerciantes, entre outros).
Os trabalhadores também surgiram de diferentes partes da Judéia. Alguns
de Jerusalém (v. 1), homens de Jericó (v. 2), Tecoa (v. 5) e Gibeão, assim como de

64 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (47). Grand Rapids, Mich.:


BakerBooks.
65 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 3.1–32). James L. Fleming.
66 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined (35). Wheaton, Ill.: Victor Books.

30
outros lugares, como Mispa e Bete-Zur.67 Este foi um trabalho que exigiu todo o
povo de Deus, independentemente de onde eles viviam.
Além disso, homens e mulheres se juntaram ao trabalho (Ne 3.12). Isso nos
ensina que todos são necessários. Não importa de onde somos. Não importa se
homens ou mulheres. Não importa o tipo de trabalho. Todos são necessários na
edificação da obra do Senhor.
Os muros separam e protegem as pessoas. Essa é a razão pela qual eles são
construídos. A Grande Muralha da China foi construída para impedir a entrada de
tribos saqueadoras. Em contraste, o Muro de Berlim, na Alemanha, mantinha as
pessoas separadas por questões econômicas, ideológicas e políticas. No entanto, a
reconstrução dos muros de Jerusalém serviu para unir as pessoas. Além de
oferecer proteção, esse muro foi uma demonstração do trabalho em equipe. Todos
estavam juntos com seus dons e talentos, estavam unidos para realizar muito mais
do que poderia ser feito individualmente.
Deve ser assim na igreja, hoje. Nossos dons e talentos são presentes de Deus
e devem ser utilizados para a edificação do Seu reino. Trabalhamos melhor quando
trabalhamos juntos.
Com demasiada frequência, a igreja transmite a mensagem equivocada de
que precisa de voluntários para servir a Jesus. O problema com essa visão é que se
você pode escolher servir, então você também pode optar por não servir ou deixar
de servir se o trabalho não está do seu agrado. Mas um recruta não tem escolha. Se
você já passou pelo exército você sabe muito bem o que significa ser chamado para
servir. Você pode não gostar da comida, você pode não gostar dos dormitórios,
você pode não gostar do acampamento na selva, mas, você teve que servir de
qualquer maneira, porque você estava debaixo das ordens do seu comandante.
De forma semelhante, é assim que os cristãos devem ver a si mesmos. Se
Cristo comprou a sua vida com o Seu sangue derramado na cruz, você pertence a
Ele como Seu escravo. Escravos não escolhem servir. Se o serviço não é agradável
ou divertido, ele não tem o direito de abandoná-lo.
Em uma escala de 1 a 10, que nota você dá para o seu envolvimento na vida
e ministério de sua igreja? Você é um trabalhador incansável ou um expectador de
braços cruzados?
O que impede você de um maior grau de envolvimento na vida e ministério
de sua igreja?

67 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 3.1–32). James L. Fleming.

31
Deus pelejará por nós
[Estudo 4 – Ne 4.1-23]

Quando Igor Sikorsky, o legendário pioneiro de aviação, tinha 12 anos de


idade, seus pais lhe disseram que as autoridades competentes haviam provado que
voar era impossível. No entanto, Sikorsky construiu o primeiro helicóptero. Em sua
fábrica, ele afixou a seguinte placa: “De acordo com testes aerotécnicos, o zangão
não pode voar por causa da forma e do peso do seu corpo em relação à área total
da asa. Todavia, o zangão não sabe disso, então ele vai em frente e voa de qualquer
maneira”.68
Neemias teria amado essa placa! Sua história mostra que, se você tenta
realizar algo significativo para Deus, terá que enfrentar uma forte oposição.
Sempre que o povo de Deus se levanta para trabalhar, o inferno se agita e o mundo
se levanta contra. O nome “Satanás” significa “adversário”, ou seja, ele sempre se
opõe ao Altíssimo e aos Seus filhos, especialmente quando eles são zelosos e
dispostos a exaltar a glória de Deus.
O capítulo 4 de Neemias é um resumo do que aconteceu durante os 52 dias
de restauração dos muros em Jerusalém. Se tivéssemos apenas o capítulo 3,
teríamos a impressão de que o trabalho não teve nenhum problema. Porém, há um
ciclo de avanço e retrocesso através dos capítulos de 3 a 6:

Capítulo 3.1-32: Avanço Capítulo 4.1-3: Retrocesso


Capítulo 4.4-6: Avanço Capítulo 4.7-8: Retrocesso
Capítulo 4.9: Avanço Capítulo 4.10-12: Retrocesso
Capítulo 4.13-23: Avanço Capítulo 5.1-6: Retrocesso
Capítulo 5.7-19: Avanço Capítulo 6.1-14: Tentativa de revés
Capítulo 6.15-16: Avanço final Capítulo 6.17-19: Tentativa de revés

Este ciclo mostra que a vida cristã é uma guerra contínua. Enquanto o povo
em Jerusalém estava acomodado com a situação da cidade, o inimigo os deixou
sozinhos; mas quando os judeus começaram a servir ao Senhor, o inimigo tornou-
se ativo.69
Como lidar com a oposição e como vencer o inimigo? A primeira defesa
contra o inimigo é estar ciente dos tipos de ferramenta que ele usa. Vamos olhar
primeiro para as várias formas de oposição, e depois para a forma como devemos
responder a cada uma delas.

68 Tan, P. L. (1996). Encyclopedia of 7700 illustrations: signs of the times. Garland, TX: Bible
Communications, Inc.
69 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (46). Wheaton, IL: Victor

Books.

32
I. É impossível fazer a obra de Deus sem oposição
1
Tendo Sambalate ouvido que edificávamos o muro, ardeu em ira, e
se indignou muito, e escarneceu dos judeus. Obra num só dia?
Renascerão, acaso, dos montões de pó as pedras que foram
queimadas?

Em Neemias capítulo 4 descobrimos que o inimigo nos ataca usando vários


métodos. Nosso texto revela, pelo menos, seis tipos de oposições:

1. Ira e indignação.
“Tendo Sambalate ouvido que edificávamos o muro, ardeu em ira, e se
indignou muito, e escarneceu dos judeus...” (v. 1) – Sambalate, o governador de
Samaria, ficou irado e indignado (4.1, 7). A expressão “ardeu em ira” significa
“tornar-se furioso ou inflamar-se”.70 Uma Jerusalém segura e independente seria
uma ameaça ao seu domínio e minaria o seu controle sobre a rota de comércio com
a região; assim prejudicaria sua economia.71
Um inimigo comum e uma causa comum fizeram com que quatro grupos
diferentes se unissem para atrapalhar o trabalho dos muros de Jerusalém. A cidade
estava completamente cercada por inimigos! Ao norte estavam Sambalate e os
samaritanos, ao leste, Tobias e os amonitas, ao sul, Gesém e os árabes, ao oeste, o
asdoditas (v. 7).
Você já observou que as pessoas do mundo não têm nenhuma dificuldade
em se unir em oposição à obra do Senhor (Sl 2.1-2, At 4.23-30, Lc 23.12)? Mas, às
vezes, o povo de Deus tem muitas dificuldades em trabalhar unido!
Quando os inimigos viram e ouviram que o trabalho estava progredindo,
ficaram irritados e planejaram um ataque secreto contra Jerusalém. Se a ira não
parar o trabalho, Satanás utilizará outra ferramenta.

2. Zombaria e sarcasmo.
“Tendo Sambalate ouvido que edificávamos o muro, ardeu em ira, e se
indignou muito, e escarneceu dos judeus...” (v. 1) – Além de ficar irado,
Sambalate escarneceu os judeus. A palavra hebraica para “escarnecer” significa
“gaguejar ou balbuciar”.72 Os inimigos continuaram repetindo seus comentários
negativos, esperando desencorajar o povo e sua obra. Chuck Swindoll escreveu:
“Parte dos requisitos implícitos que um líder deve ter para um emprego é a
habilidade de lidar com a crítica. Faz parte do pacote da liderança. Se nunca for
criticado, é possível que você nunca consiga realizar algo”.73
A maneira mais fácil de se opor a algo que não gostamos é ridicularizá-lo, e
esta é a primeira coisa que Sambalate e Tobias fizeram. Eles e seus amigos fizeram
várias perguntas sarcásticas (4.2). É a arma mais antiga do inimigo. O crítico e
escritor escocês Thomas Carlyle chamou a zombaria de “a língua do diabo”.74

70 Strong, J. (2009). Vol. 2: A concise dictionary of the words in the greek testament and the
hebrew Bible (43). Bellingham, WA: Logos Bible Software.
71 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: An expositional commentary (50–51). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.
72 Strong, J. (2009). Vol. 2: A concise dictionary of the words in the greek testament and the

hebrew Bible (60). Bellingham, WA: Logos Bible Software.


73
CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 119.
74 Wiersbe, W. W. (1996). Be Determined (p. 49–50). Wheaton, IL: Victor Books.

33
Muitos personagens das Escrituras experimentaram o peso e a dor do escárnio.
Golias zombou de Davi quando viu apenas um estilingue em sua mão (1Sm 17.41-
47). Jesus foi zombado pelos soldados durante o seu julgamento (Lc 22.63-65), e
pela multidão, enquanto estava pendurado na cruz (23.35-37); e alguns dos heróis
da fé tiveram de suportar a zombaria (Hb 11.36). No entanto, escreveu Warren
Wiersbe, acertadamente, “nunca devemos esquecer de que, quando o inimigo ri do
povo de Deus, geralmente é um sinal de que Deus vai abençoar o Seu povo de uma
forma maravilhosa”.75 Quando os inimigos se enfurecem na terra, Deus ri no céu (Sl
2.4).
Se a crítica não funcionar, os inimigos utilizarão outra ferramenta. Os
oponentes de Neemias ficaram furiosos e resolveram combater o trabalho o tempo
todo (4.7-8).

3. Ameaças e intimidações.
“Que fazem estes fracos judeus? Permitir-se-lhes-á isso? Sacrificarão?
Darão cabo da obra num só dia? Renascerão, acaso, dos montões de pó as
pedras que foram queimadas?” (v. 2) – Os inimigos de Neemias tinham que ter
cuidado, pois os judeus estavam trabalhando com a permissão do rei Artaxerxes.
Eles não podiam simplesmente reunir as suas tropas e marchar contra Jerusalém,
ou seriam acusados de oposição ao rei. Mas, eles fizeram ameaças de violência (4.8,
11), que circularam entre os judeus que viviam perto deles (4.12). Assim, como os
militantes muçulmanos, hoje, a ameaça terrorista colocou os judeus sob intensa
pressão psicológica.
Satanás ainda usa ameaças sutis, ou ostensivas, de intimidação para oprimir
os cristãos. “Se você não ficar quieto sobre a corrupção do chefe, você vai ser
demitido”. Anos atrás, uma igreja evangélica em Phoenix, nos Estados Unidos, teve
um poderoso advogado e membro do Conselho envolvido em um caso
extraconjugal. Quando os Presbíteros o confrontaram e lhe disseram para
abandonar o cargo, ele os ameaçou com um processo que levaria a igreja à falência
com os honorários advocatícios, mesmo se eles ganhassem a causa. Ele finalmente
concordou em deixar o cargo se todos os presbíteros também renunciassem.
Infelizmente, a igreja cedeu diante das ameaças!

4. Desânimo e cansaço.
Aparentemente havia um provérbio ou música desanimadora que circulava
entre os trabalhadores neste momento: “Os carregadores já estão cansados, e
ainda há muito entulho para carregar...” (4.10) – As pessoas estavam cansadas e
os escombros não diminuíam.
O desânimo é uma arma fundamental no arsenal de Satanás. Foi o desânimo
que impediu Israel de entrar na Terra Prometida em Cades-Barnéia (Nm 13). “Nós
não somos capazes de ir contra o povo, porque eles são mais fortes do que nós” (v.
31). Os dez espias incrédulos “... desencorajaram o coração dos filhos de Israel”
(32.9), e como resultado, a nação vagou no deserto quarenta anos até que a nova
geração estivesse pronta para conquistar a terra.

75Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (50). Wheaton, IL: Victor
Books.

34
A história é contada do dia em que o diabo realizou um leilão. Ele colocou
algumas de suas ferramentas à venda em um leilão público. Quando os possíveis
compradores se reuniram, uma ferramenta estranha tinha um rótulo diferente com
a seguinte inscrição: “Não está à venda!” Perguntado a respeito, o diabo respondeu:
“Eu posso dispensar ou trocar todas as minhas ferramentas, exceto essa. Ela é a
mais útil de todas. Eu a chamo “Desânimo”, e com ela eu posso trabalhar em
corações geralmente inacessíveis. Com essa ferramenta eu penetro a mente de uma
pessoa, o que não conseguiria com nenhuma outra; consigo plantar qualquer coisa
que queira. O desânimo suscita dúvida; a dúvida leva à derrota; a derrota ao
desalento; o desalento à depressão; a depressão à destruição. Tudo o que eu
preciso é essa única ferramenta, o desânimo, para trabalhar a minha maneira na
vida das pessoas”.
Note que o inimigo ataca, muitas vezes, quando estamos fracos (v. 10).
Nesse momento de fraqueza, podemos facilmente nos tornar desanimados.76

5. Negativismo.
“Quando os judeus que habitavam na vizinhança deles, dez vezes, nos
disseram: De todos os lugares onde moram, subirão contra nós” (v. 12) – A
crítica e a zombaria (4.2-3) surgiram do inimigo. Mas este negativismo veio dos
próprios judeus que viviam perto deles (4.12). Essas pessoas não estavam
envolvidas no trabalho da restauração do muro. Isso é significativo! Eles viviam
perto do inimigo e, assim, estavam constantemente expostos aos seus ataques
negativos sobre o trabalho. Deste modo, estavam ouvindo relatos negativos e
ameaças e não ficaram sabendo, em primeira mão, o que Deus estava fazendo em
Jerusalém. Eles vieram repetidamente (“dez vezes” é uma expressão que significa
em hebraico “muitas vezes”) para avisar Neemias e aqueles que trabalhavam nos
muros.77
Sentimentos negativos destroem nossa confiança. Porém, precisamos
entender que nossa preocupação com dada situação não fará com que ele
desapareça. Cyril Barber estava certo ao escrever: “A ansiedade nunca tira a
tristeza do amanhã; só tira a força do hoje”.78
Invariavelmente, o negativismo na igreja surge a partir de cristãos
professos que vivem perto do inimigo e não estão envolvidos na obra do Senhor.
Tal negativismo é o inimigo da fé. “Também vimos ali gigantes (os filhos de Anaque
são descendentes de gigantes), e éramos, aos nossos próprios olhos, como gafanhotos
e assim também o éramos aos seus olhos” (Nm 13.28-29, 31-33).
Neemias não ignorou o perigo, mas se tivesse escutado esses profetas do
desânimo, ele nunca teria terminado o muro.

6. Medo.
“... inspecionei, dispus-me e disse aos nobres, aos magistrados e ao resto
do povo: não os temais...” (v. 14) – O medo é o efeito cumulativo de todos os
fatores acima. As pessoas haviam visto a ira do inimigo e tinham ouvido suas

76 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 4.10). James L. Fleming.
77 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (54–55). Wheaton, IL:
Victor Books.
78
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 59.

35
constantes ameaças. Eles estavam trabalhando à exaustão. Em seguida,
repetidamente ouviram a melancolia e a tristeza de seus companheiros Judeus que
viviam perto do inimigo. Neemias identificou o medo e os exortou a não temerem.
Satanás usa o medo para paralisar o povo de Deus de realizar algo
significativo para o Senhor. Foi um ponto crítico no projeto, e as pessoas
provavelmente teriam abandonado o trabalho se não fosse por Neemias. Ele estava
orando, sabia da força desta ameaça; também sabia de suas limitações. Acima de
tudo, ele sabia que a força de Deus estava do seu lado.79
Essas são algumas das táticas que Satanás usa para se opor ao trabalho de
Deus. Entretanto, como devemos responder a essa oposição? O restante do
capítulo quatro é um relato detalhado de como Neemias respondeu às ameaças dos
inimigos.

II. Como levar a obra de Deus adiante, apesar da oposição


4
Ouve, ó nosso Deus, pois estamos sendo desprezados; caia o seu
opróbrio sobre a cabeça deles, e faze que sejam despojo numa terra de
cativeiro.

Sempre que você encontrar oposição, você têm várias opções. Você pode
abandonar o que estava fazendo, boa parte das pessoas tomam essa atitude! Você
pode tentar elaborar um acordo, ou enfrentar a oposição e continuar trabalhando.
A última abordagem é a única atitude biblicamente correta. Neemias decidiu
enfrentar seus adversários. Sua atitude pode ser dividida em quatro aspectos: eles
clamaram a Deus em oração, colocaram seus corações no trabalho, eles
mantiveram os olhos sobre o inimigo em constante vigilância, e eles mantiveram
suas mentes focadas no Senhor, com fé.

1. Eles buscaram a Deus em oração.


“Ó nosso Deus, escuta como eles caçoam de nós!” (v. 4, NTLH) – As coisas
que as pessoas dizem podem nos ferir, mas elas não podem nos prejudicar, a
menos que deixemos entrar em nosso coração e envenenar-nos. Na realidade, se
gastarmos tempo ponderando sobre as palavras do inimigo, vamos dar a Satanás
uma posição da qual ele pode lançar outro ataque. A melhor coisa a fazer é orar e
levar toda a ofensa que recebemos diante do Senhor e, em seguida, voltar ao
trabalho.80
Muitas vezes, quando enfrentamos oposição, nossa primeira reação é
retaliar. Porém, nossa primeira resposta deve ser sempre a oração (4.4, 9). John
Bunyan sabiamente observou: “Você pode fazer mais do que orar depois de ter
orado, mas você não pode fazer nada mais do que orar até ter orado”. A oração nos
lembra que Deus é soberano, mesmo sobre aqueles que estão nos atacando.
Neemias derramou a sua alma perante o Senhor. Ele admitiu que estava
magoado e irritado: “Estamos desprezados” (v. 4). No entanto, a obra era de Deus, e
Neemias foi, portanto, capaz de colocar o seu problema nas mãos de Deus e deixá-

79 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (56). Grand Rapids, MI:


BakerBooks.
80 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (52). Wheaton, IL: Victor

Books.

36
lo ser o árbitro da disputa e o juiz dos “adversários” dos judeus. “Caia o seu
opróbrio sobre a cabeça deles...” (v. 4). Além disso, ele pediu a Deus para que os
seus inimigos fossem “despojados numa terra de cativeiro” (v. 4).
A oração eficaz e sincera restaura a nossa perspectiva e nos dá respostas
positivas em vez de emoções negativas. A oração sincera faz brotar em nosso
coração a esperança; a esperança nos dará confiança renovada; e o resultado será
um novo surto de ânimo.81
Apesar de tudo, Neemias continuou com o trabalho. Tendo em vista que ele
havia deixado as provocações de seus inimigos com Deus, não precisava mais se
preocupar com eles e poderia continuar com a tarefa que Deus lhe dera. O que ele
diz é maravilhoso: “Assim, edificamos o muro, e todo o muro se fechou até a metade
de sua altura; porque o povo tinha ânimo para trabalhar” (v. 6).
Neemias nos ensina que a oração é a coisa mais prática que podemos fazer
na crise, mas também que ela não é um substituto da ação.82 A maneira como
reagimos às críticas revelará se temos coragem ou se estamos intimidados. As
palavras doeram, mas não produziram o menor tremor de indecisão, somente
indignação.83 A oração deve ser a nossa primeira resposta à oposição.

2. Eles colocaram o coração no trabalho.


“Assim, edificamos o muro, e todo o muro se fechou até a metade de sua
altura; porque o povo tinha ânimo para trabalhar” (v. 6) – Neemias certificou-
se de manter o povo focado. Ele os manteve ocupados. Sua primeira reação foi a
oração. A segunda foi colocar guardas no muro dia e noite (v. 9). Ele ensinou ao
povo que não fomos chamados para contar nossos inimigos, pelo contrário, fomos
chamados para o trabalho.
Há momentos em que é necessário refutar os falsos mestres e defender a sã
doutrina. Na verdade, esta é uma das tarefas dos presbíteros (Tt 1.9-16). Mas
nunca devemos ficar tão distraídos em combater os falsos mestres e nos esquecer
de nosso propósito principal, que é proclamar o evangelho tanto aqui quanto em
todo o mundo, através de missões. A espada e a espátula são necessárias, mas a
razão da espada é para que possamos usar a espátula. Defendemos a fé com a
espada da Palavra de Deus para que possamos construir o Seu reino com a
espátula.

3. Eles mantiveram os olhos sobre o inimigo.


“Porém nós oramos ao nosso Deus e, como proteção, pusemos guarda
contra eles, de dia e de noite” (v. 9) – Não basta orar, é preciso vigiar. Neemias
não estava disposto a deixar que essas ameaças interrompessem o trabalho de
restauração dos muros. Em vez disso ele colocou guardas sobre os muros para
detectar qualquer invasão do inimigo com suas armas (v. 13). Ele então encorajou
os construtores com estas palavras: “lembrai-vos do Senhor, grande e temível, e
pelejai pelos vossos irmãos, vossos filhos, vossas filhas, vossa mulher e vossa casa” (v.
14).

81
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 59.
82 LOPES, Hernandes Dias. Neemias, o líder que restaurou uma nação. São Paulo: Editora

Hagnos, 2006, p. 67.


83 KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 98.

37
Entretanto, é importante observar que a oração de Neemias não fez com
que o inimigo fosse embora: ao contrário, o inimigo aumentou as ameaças! Orar
não significa que você deve ignorar as ameaças do inimigo ou fingir que eles não
existem. Neemias colocou em prática um sistema de alerta, de modo que onde a
trombeta fosse tocada, os trabalhadores rapidamente deveriam se reunir e
defender suas famílias e a cidade (v. 19-20). Os trabalhadores não tiravam nem a
roupa durante a noite para que estivessem sempre prontos para defender a cidade
(v. 23). Vigilância!
No entanto, muitos cristãos estão alheios aos ataques do nosso adversário, o
diabo, que anda como um leão que ruge, buscando nos devorar (1Pe 5.8). Se você
não quer ser vítima do inimigo, você tem que definir uma estratégia de defesa. A
Bíblia possui muitos exemplos de homens e mulheres que não vigiaram e caíram
diante das armadilhas do inferno. Sansão caiu não diante de um exército inimigo,
mas no colo de uma mulher (Jz 13-16). Davi não perdeu a batalha mais importante
de sua vida no campo de guerra contra seus inimigos, mas na cama do adultério.
Devemos permanecer alertas, vigiar, orar e nos manter firmes. Precisamos
ser fortes quando as pessoas tentam nos derrubar ou impedir o trabalho que
estamos fazendo. Quanto maior o progresso do trabalho do Senhor, maior a crítica.
Quanto mais bem-sucedido o trabalho, mais intensos são os ataques.84

4. Eles mantiveram suas mentes focadas no Senhor.


“lembrai-vos do Senhor, grande e temível, e pelejai pelos vossos irmãos,
vossos filhos, vossas filhas, vossa mulher e vossa casa” (v. 14) – Um dos grandes
testes para um líder é a capacidade de perseverar. A maioria de nós desiste com
rapidez. Deste modo, deixamos os críticos ganharem porque não somos
persistentes em terminar a tarefa que Deus nos concedeu.
As pessoas estavam desencorajadas porque tinham tirado o foco do
trabalho e colocado sobre as ameaças do inimigo, as pilhas de escombros, e todo o
trabalho que restava (v. 10). Neemias corretamente direcionou o foco de volta para
o Senhor que é grande e temível e para as coisas que estavam em jogo, ou seja, suas
famílias (v. 14). Aqui está o segredo para grandes vitórias na vida cristã, devemos
continuamente colocar nossos olhos em Deus em vez de colocá-los nas
circunstâncias.
Neemias foi capaz de enfrentar a oposição como um bom nadador que
enfrenta as violentas ondas do mar. Quando a ameaça se tornou conhecida, ele
respondeu estabelecendo vigias dia e noite (v. 9). Quando os rumores de violência
continuaram, ele foi mais longe: (1) ele parou o trabalho (cf. v. 13, 15), (2) armou o
povo (v. 13), e (3) organizou as pessoas em grupos familiares nos locais mais
expostos ao longo do muro (v. 13). Os dividiu em famílias e aumentou a
consciência de cada pessoa sobre os riscos. Neemias sabia que eles iriam lutar mais
ferozmente quando a vida de suas próprias famílias estivesse em risco.85 Assim, o
desânimo, uma das mais fortes armas de Satanás, foi eficazmente combatido. Pela
graça de Deus, e na força de Deus, a obra continuou.86

84CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 119.
85 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (56–57). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
86 Packer, J. I. (1995). A passion for faithfulness: wisdom from the book of Nehemiah.

Wheaton, IL: Crossway Books.

38
Neemias não só organizou os trabalhadores e guardas e os encorajou a
confiar no Senhor, mas também definiu o tipo certo de exemplo diante deles (v.
23). Ele era um líder que servia e um servo que liderava. Ele permaneceu no
emprego e estava alerta em todos os momentos.87 Ele inspecionava as defesas da
cidade todas as noites e se certificava de que os guardas estavam de plantão (v.
14).

“Disse eu aos nobres, aos magistrados e ao resto do povo: Grande e


extensa é a obra, e nós estamos no muro mui separados, longe uns dos outros”
(v. 19) – Mais uma vez, Neemias incentivou o povo a trabalhar. Lembrou que eles
estavam envolvidos em uma grande obra. Afinal, estavam servindo um Deus
grande e reconstruindo os muros de uma grande cidade. Também lembrou de que
eles não estavam trabalhando sozinhos, mesmo que não pudessem ver todos os
seus colegas de trabalho. Deus estava com todos eles e viria e os defenderia (v. 20).
Além disso, Neemias também instituiu um “segundo turno” e exigiu que os
trabalhadores de outras cidades ficassem em Jerusalém à noite para protegê-la (v.
22). Neemias foi capaz de transformar até mesmo o medo e a sensação de fraqueza
em um terreno para a fé.88 Muitas vezes é enquanto dormimos que o inimigo faz o
seu trabalho mais insidioso (Mt 13.25), e devemos permanecer em guarda.
Se você conhece a Cristo e tenta realizar qualquer coisa para Ele, vai
enfrentar oposição, especialmente se você estiver na liderança. Ao invés de
retaliar, responda como Neemias, com oração, mantendo-se firme no trabalho,
vigiando contra o inimigo, e mantendo seu foco sobre o grande e maravilhoso Deus
a quem servimos.

Conclusão:
Cyril Barber, acertadamente, declarou que: “Foi a fé que tirou Neemias do
vale do desespero e transladou seus esforços em façanhas nobres. Sua fé gerou
confiança. Sua confiança inspirou a outros. O segredo do sucesso de Neemias pode
ser nosso.89 Como disse o apóstolo João: “Esta é a vitória que venço o mundo, a
nossa fé” (1Jo 5.4).
E quando o desânimo chegar? Como lidar com o desânimo? Alguém, certa
vez, perguntou ao pregador Charles Haddon Spurgeon se ele nunca ficou
desanimado. Ele disse: “Não nos últimos 20 anos, eu acho”. Quando perguntado
como ele explicava isso, disse, “Porque não passo 15 minutos sem pensar em
Cristo” (Hb 12.3).
Um ministro desanimado certa vez sonhou que estava em pé, no topo de
uma grande rocha de granito, tentando quebrá-la com uma picareta. Ele trabalhou
várias horas sem nenhum resultado. Por fim, disse: “É inútil, vou parar”.
87 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (57). Wheaton, IL: Victor
Books.
88 Carson, D. A., France, R. T., Motyer, J. A., & Wenham, G. J. (Orgs.). (1994). New Bible

commentary: 21st century edition (4th ed., p. 435). Leicester, England; Downers Grove, IL:
Inter-Varsity Press.
89 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,

p. 59.

39
De repente, um homem que estava ao seu lado, perguntou: “Você não
recebeu esta tarefa? Então, por que você vai abandoná-la?”
“Meu trabalho é em vão, eu não consigo causar nenhum arranhão sobre o
granito”, foi a resposta do ministro.
Em seguida, o estranho, solenemente, respondeu: “Seu dever é bater na
rocha, e não ficar preocupado com os resultados. O trabalho é seu, os resultados
estão nas mãos de outros; trabalhe!”
Em seu sonho, o ministro voltou ao trabalho, e em seu primeiro golpe a
pedra voou em centenas de pedaços.
Não permita que o desânimo tome conta do seu coração. Não permita que
pensamentos ou palavras negativas tirem a sua paz e, principalmente, os seus
olhos do Senhor. São aqueles que conhecem a Deus que são capazes de manter o
controle diante da oposição e do desânimo, e eles podem fazer isso por causa do
que está em seu coração. Para onde você olha quando fica desanimado? Quem você
ouve? Quando olhamos para o Senhor nada mais importa!

40
Resolvendo conflitos internos
[Estudo 5 – Ne 5.1-19]

Um homem ouviu sua filha e alguns de seus amigos discutindo alto, no


quintal. Ele saiu e repreendeu-a. “Mas Papai”, ela protestou: “estávamos apenas
brincando de igreja”.
É triste, mas é verdade que a igreja de Jesus Cristo tem sido, muitas vezes,
mais caracterizada pelas facções do que pela comunhão. J. Vernon McGee observa
que: “Na história da igreja, vemos que quando o diabo não pode destruir a igreja
pela perseguição, ele se junta a ela!” Se você é um cristão há muito tempo, você
provavelmente já esteve em uma igreja que passou por uma cisão.
Em nosso último estudo no capítulo 4, Neemias não teve uma tarefa fácil na
tentativa de restaurar os muros de Jerusalém. Os capítulos 4 e 6 mostram como ele
teve que enfrentar a oposição dos inimigos externos. Todavia, o capítulo 5 mostra
como ele teve que lidar com os conflitos internos.
O capítulo se divide em três partes: os versículos de 1 a 5, as queixas que
Neemias ouviu; os versículos de 6 a 13, os passos que ele tomou; os versículos de
14 a 19, o exemplo de Neemias.90 O comentarista Warren Wiersbe sabiamente
divide o capítulo cinco em três atos: um grande clamor (5.1-5); uma grande
assembleia (5.6-13) e um grande exemplo (5.14-19).91

I. Um grande clamor (5.1-5)


1
Foi grande, porém, o clamor do povo e de suas mulheres contra os
judeus, seus irmãos. 2 Porque havia os que diziam: Somos muitos, nós,
nossos filhos e nossas filhas; que se nos dê trigo, para que comamos e
vivamos.

No meio de uma “grande e extensa obra” (4.19) para um “grande Deus”


(1.5), um “grande clamor” (5.1) foi ouvido entre os judeus. Eles não estavam
gritando contra os samaritanos, os amonitas ou os árabes, mas contra seu próprio
povo! Judeus estavam explorando judeus, e a situação econômica tornou-se tão
desesperada que até as mulheres se juntaram ao protesto.92 A crise havia chegado
a um nível tal que não ameaçava apenas a sobrevivência das famílias mais pobres,
mas inclusive a conclusão da restauração dos muros.
Os cinco primeiros versículos do capítulo cinco apresentam as queixas de
três fontes diferentes. Observe as frases: “porque havia os que diziam...” (v. 2),
“Também houve os que diziam...” (v. 3), e “Houve ainda os que diziam...” (v. 4). As
queixas não surgiram apenas de um grupo, mas a partir de três grupos diferentes.
Há três grupos distintos mencionados nestes versículos.

90
Packer, J. I. (1995). A passion for faithfulness: wisdom from the book of Nehemiah.
Wheaton, IL: Crossway Books.
91 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (57). Wheaton, IL: Victor

Books.
92 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (57–59). Wheaton, IL:

Victor Books.

41
O primeiro grupo a reclamar foram os mercadores e trabalhadores
(Ne 5.2). Embora os moradores houvessem retornado para Jerusalém muitos anos
antes, eles ainda estavam cercados de problemas econômicos. Devemos lembrar
que aqueles que estavam trabalhando nos muros eram, em sua maioria,
agricultores que haviam deixado suas terras para cooperarem com a obra. E não
havia ninguém para cuidar de suas plantações. Agora, sem fonte de renda, já não
podiam sustentar os que dependem deles. Seus recursos foram usados. A situação
que enfrentaram era negra. Não havia saída do impasse, a não ser que recebessem
ajuda de fora.93 Apesar de terem penhorado os filhos, esse grupo ainda não tinha
comida.

O segundo grupo a reclamar foram os fazendeiros (Ne 5.3). “As nossas


terras, as nossas vinhas e as nossas casas hipotecamos para tomarmos trigo nesta
fome” – O segundo grupo também estava enfrentando a escassez de alimento.
Diante disto, o fazendeiro, para sustentar a família, tomava dinheiro emprestado,
hipotecando o campo, ou dando a colheita como garantia. Aparentemente, a
inflação estava em ascensão, e os preços estavam cada vez mais elevados. A
combinação de dívida e inflação é suficiente para acabar com patrimônio de uma
pessoa muito rapidamente.94 Os juros eram exorbitantes. Aqueles que tinham
posse estavam cada vez mais ricos e os pobres mais desprovidos.
Os agiotas judeus não hesitavam em tomar as terras e até mesmo os filhos e
filhas dos pobres infelizes para receberem o seu dinheiro. E o próprio Deus é
contra a essa prática opressora (cf. Dt 23.19-20; 24.10-13; Êx 22.25-27). Ela
também feria o princípio do ano do jubileu (Lv 25.10, 14-17, 25-27).

O terceiro grupo a reclamar foram os que sofriam com os impostos (Ne


5.4). Judá, como todas as demais províncias da Pérsia, tinha de pagar impostos:
uma parte em dinheiro, outra em produtos da terra. Ou seja, além da fome e das
dívidas contraídas para terem o pão de cada dia, ainda tinham de pagar pesados
tributos a Pérsia.
Aqueles que não queriam hipotecar os seus bens tinham que pedir dinheiro
emprestado aos seus irmãos judeus para pagar os impostos ao rei Artaxerxes (v.
4). Para reembolsar seus credores, os judeus desfavorecidos tiveram que vender
seus filhos para a escravidão (cf. Êx 21.2-11; Dt 15.12-18). Isto, obviamente, os
deixou em um estado sem esperança.95
A Lei permitia que os judeus emprestassem dinheiro uns aos outros, mas
não deveriam cobrar juros como faziam os agiotas (Dt 23.19, 20). Antes, deveriam
tratar uns aos outros com respeito e não deveriam aceitar nada como garantia
prolongada (Dt 24.10-13; Êx 22.25-27; Lv 25.35-46).
Um dos propósitos do “Ano de Jubileu” (Lv 25) era equilibrar o sistema
econômico de Israel a fim de que os ricos não pudessem ficar ainda mais abastados
e os pobres ainda mais destituídos. O ano de libertação e restauração era

93
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 70.
94 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (59). Wheaton, IL: Victor

Books.
95 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge

commentary: an exposition of the scriptures (Ne 5.1–5). Wheaton, IL: Victor Books.

42
comemorado de 50 em 50 anos, em Israel. Nesse ano a terra não era cultivada;
todas as terras vendidas ou confiscadas eram devolvidas aos seus donos
anteriores; e todos os escravos eram libertados (Lv 25.8-55; 27.16-25).96 Além
disso, no quinquagésimo ano, todas as dívidas tinham de ser perdoadas.97
Além das questões apontadas nos vv. 2-4, o v. 5b indica que muito
provavelmente as jovens eram abusadas sexualmente por aqueles a quem elas
tinham sido entregues como penhor.98 “... e eis que sujeitamos nossos filhos e nossas
filhas para serem escravos, algumas de nossas filhas já estão reduzidas à escravidão”
(v. 5). A palavra “sujeitar” (kābaš, em hebraico), é usada no sentido de
forçar/violentar sexualmente [em Ester 7.8]. O desespero dos pais diante dessa
situação humilhante de suas filhas é que eles não podiam fazer mais nada.
A atitude de Neemias diante desse problema foi uma demonstração de
verdadeira liderança.

II. Uma grande assembleia (5.6-13)


6
Ouvindo eu, pois, o seu clamor e estas palavras, muito me aborreci.

Neemias é um exemplo de liderança piedosa. Ele poderia ter dito a essas


pessoas, “Estou muito ocupado na restauração dos muros. Volte em seis semanas e
vamos conversar”. Mas Neemias percebeu que os problemas eram significativos e
urgentes. Assim, ele interrompeu a reforma dos muros para ouvir e ajudar a
resolver este assunto. Ele tomou cinco decisões que os líderes devem imitar:

1. Neemias ficou muito aborrecido.


“Ouvindo eu, pois, o seu clamor e estas palavras, muito me aborreci...”
(v. 6) – Franky Schaeffer escreveu: “Há momentos em que qualquer pessoa com
um pingo de princípio moral deve ficar profundamente irritada”.99 Para Neemias,
este era um desses momentos.
A raiva de Neemias surgiu do fato de que os nobres e magistrados, em vez
de agirem com compaixão para com os menos afortunados, viram isso como uma
oportunidade de explorar os pobres.

“... repreendi os nobres e magistrados...” (v. 7) – A palavra “repreender”


implica numa admoestação severa por comportamento inadequado que precisa ser
mudado! De fato, Deus não estava satisfeito com o comportamento ganancioso e
explorador dos “ricos”.

“... Vocês estão explorando os seus irmãos!” (v. 7, NTLH) – Os judeus ricos
estavam cobrando juros de seus irmãos que estavam precisando,
desesperadamente, de uma ajuda financeira somente para colocar comida na mesa.

96 Kaschel, W., & Zimmer, R. (1999). Dicionário da Bíblia de Almeida 2ª ed. Sociedade Bíblica
do Brasil.
97 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (59–60). Wheaton, IL:

Victor Books.
98 TÜNNERMANN, Rudi. As reformas de Neemias. São Paulo: Editora Sinodal, 2001, p. 148.
99 Franky Schaeffer. A time for anger: the myth of neutrality. Westchester, Ill.: Crossway

Books, 1982, p. 15.

43
Moisés instruiu os israelitas como tratar um irmão com dificuldades financeiras:
“Se você emprestar dinheiro a algum pobre do meu povo, não faça como o agiota, que
cobra juros” (Êx 22.25, NTLH).

“Disse-lhes: nós resgatamos os judeus, nossos irmãos, que foram


vendidos às gentes, segundo nossas posses; e vós outra vez negociaríeis vossos
irmãos, para que sejam vendidos a nós?” (v. 8) – Além disso, Neemias acusa-os
de fazer a mesma coisa que os judeus tinham sofrido. Ou seja, os judeus tinham
acabado de sair do cativeiro na babilônia, e agora os nobres e os magistrados
estavam escravizando os próprios irmãos. Neemias apontou o absurdo do
comportamento de vender os judeus aos gentios, visto que eles haviam sido
resgatados uma vez (Lv 25). Os nobres e magistrados estavam claramente violando
a Lei de Deus. Eles estavam mais preocupados com os “bolsos” do que em obedecer
à Palavra de Deus.

2. Neemias teve domínio próprio.


“Depois de ter considerado comigo mesmo...” (v. 7) – Isso é muito
significativo! Ele não saiu irado a fim de confrontar àqueles que estavam errados.
Ele parou, “esfriou a cabeça”, pensou e, certamente, clamou a Deus sobre esse
assunto, e só então agiu. O livro de Provérbios tem muito a nos ensinar sobre isso:
“Melhor é o longânimo do que o herói da guerra, e o que domina o seu espírito, do
que o que toma uma cidade” (Pv 16.32). Todos, mas especialmente os líderes,
precisam exercer o domínio próprio quando ficam com raiva.
Ao “considerar” a situação dos oprimidos, Neemias resolveu confrontar os
opressores, biblicamente. Primeiro, de forma particular, depois, de forma pública,
conforme Mateus 18. Não sabemos se Neemias teve testemunhas diante do
encontro com os poderosos, mas ele estava seguindo o procedimento geral.100
Ele foi bem sucedido? Aparentemente, não! Assim, Neemias passou para um
confronto público.

3. Neemias seguiu os princípios de confronto bíblico.


“... e convoquei contra eles um grande ajuntamento” (v. 7) – É fácil ficar
com raiva, mas depois de esfriar a cabeça, não fazer nada. Antes de tudo, é difícil e
desconfortável enfrentar aqueles que estão causando problemas. É mais difícil
ainda confrontar aqueles que são ricos e poderosos, “nobres e magistrados”. E se
eles agissem na defensiva e deixassem de apoiar o projeto? E se eles usassem o
poder para causar mais danos. Talvez, outro líder terminaria a restauração dos
muros primeiro, para somente depois, tratar o problema com os ricos e poderosos.
Mas não foi isso que Neemias fez.
Ele convocou uma grande assembleia e explicou o problema, em seguida, ele
repreendeu os líderes (5.8), apontou como ele e outros tinham redimido seus
irmãos judeus que haviam sido vendidos às nações, e que agora eram os próprios
judeus que vendiam seus irmãos à escravidão. Eles não podiam achar uma palavra
para responder (v. 9). Ele ainda afirmou que seu comportamento não era bom
diante dos inimigos.

100Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (63–64). Grand Rapids, MI:


BakerBooks.

44
Alguns pensam que Neemias (5.10) está admitindo seu próprio passado
falho ao emprestar dinheiro a juros aos seus compatriotas judeus (com base no
plural “vamos deixar de fora a usura”), porém, ao que tudo indica, ele está apenas
usando o plural para se identificar com estes homens. Neemias havia emprestado
dinheiro de acordo com a Lei, sem cobrança de juros. Ele, na verdade, está
apelando aos homens ricos para se juntarem a ele para fazerem o mesmo. Em
seguida, suplica aos nobres e magistrados para restituírem as terras, vinhas, olivais
e suas casas, como também o centésimo do dinheiro, do trigo, do vinho e do azeite,
que exigistes deles (v. 11).
Há muitos líderes cristãos que têm medo de enfrentar aqueles que falharam,
seja em particular ou em público. Esse temor aumenta quando a pessoa é rica e
poderosa. Mas devemos seguir o exemplo de Neemias de confrontar aqueles que
estão em pecado. Neemias exibiu a ira adequada e domínio próprio. Sua raiva lhe
deu a coragem para enfrentar aqueles que estavam errados.

A grande assembleia foi concluída com três ações que enfatizavam a


gravidade da ocasião:

Em primeiro lugar, Neemias sacudiu as dobras de seu manto. Na


tradição dos profetas, ele dramaticamente sacudiu seu manto na frente deles e
disse: “Assim o faça Deus, sacuda de sua casa e de seu trabalho a todo homem que
não cumprir esta promessa; seja sacudido e despojado” (5.13). Isso é fazê-los assinar
na linha pontilhada! Surpreendentemente, ninguém disse: “Você não confia em
nós?” Pelo contrário, eles acataram o pedido de Neemias.

Em segundo lugar, a assembleia respondeu com um amém coletivo. Era


um consentimento solene ao que havia sido dito e feito (Ne 8.6 e Dt 27.14). O
termo amém significa “assim seja”; em outras palavras: “Que o Senhor faça tudo
que tu disseste!” Era um ato de adoração que tornava a assembleia toda parte das
decisões tomadas.101

Em terceiro lugar, a assembleia unida louvou ao Senhor. Como Davi,


que depois de fazer votos a Deus, cantou e louvou ao Senhor, Sl 56.12. Mas o que se
segue foi ainda melhor: “... E o povo fez segundo a sua promessa” (v. 13). Eles
fizeram de acordo com esta promessa, e respeitaram o que tinha sido estabelecido,
e não como o povo na época de Jeremias. Povo este que libertou os escravos, mas
depois mudou de ideia, e os fazendo voltar e os obrigando a se tornarem escravos,
novamente (Jr 34.10–11). Promessas são coisas boas, mas boas ações são tudo em
todos.102 Este resultado mostra que Deus pode ser glorificado quando lidamos de
modo certo com as questões.103
Em todos esses anos como pastor posso dizer que ver as pessoas
respondendo prontamente à correção é algo raro! Mas não deveria ser. Em
Hebreus temos uma exortação que soa estranha em nossos dias quando as pessoas

101 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (65). Wheaton, IL: Victor
Books.
102 Henry, M. (1994). Matthew Henry’s commentary on the whole Bible: Complete and

unabridged in one volume (Ne 5.6–13). Peabody: Hendrickson.


103 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,

p. 18.

45
não têm noção de estar sob a autoridade espiritual: “Lembrai-vos dos vossos guias,
os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua
vida, imitai a fé que tiveram” (Hb 13.7).

III. Um grande exemplo (5.14-19)


14
Também desde o dia em que fui nomeado seu governador na terra
de Judá, desde o vigésimo ano até ao trigésimo segundo ano do rei
Artaxerxes, doze anos, nem eu nem meus irmãos comemos o pão
devido ao governador.

Em nossos dias de escândalos públicos em quase todas as áreas da vida,


especialmente na política, como é refrescante encontrar um homem como
Neemias, que colocou o serviço do povo à frente de seus próprios interesses.
Durante seu primeiro mandato de doze anos como governador, e depois
durante seu segundo mandato (Ne 13.6-7), ele usou seus privilégios para ajudar as
pessoas, e não as pessoas para ter privilégios. Vemos neste texto alguns atributos
de um verdadeiro líder. O líder deve ser reconhecido por aquilo que faz e também
por aquilo que não faz.

Em primeiro lugar, ele colocou de lado os seus direitos e não tirou


proveito de sua posição e poder (5.14-15).
Neemias não usufruiu de alguns dos privilégios que teria como governador
persa de uma província. O primeiro direito do qual abriu mão foi o de receber o
“pão devido ao governador” (v. 14), uma cota estipulada de gêneros alimentícios
para manter a chancelaria.104 Neemias menciona que os governadores anteriores
não agiam assim. Pelo contrário, exploravam o povo, cobrando 40 siclos de prata
(450g) diários (v. 15). Além disso, os funcionários da província exploravam o povo.
Neemias diz que assumiu os custos da manutenção da estrutura administrativa por
causa do temor a Deus.
Muitos líderes cristãos caem na armadilha de pensar que sua posição dá-
lhes certos direitos e poder. Devemos seguir o exemplo do Senhor Jesus, que pôs
de lado os seus direitos para assumir a forma de servo e ser obediente até a morte
na cruz (Fp 2.1-11).

Em segundo lugar, ele temia a Deus e se preocupava com pessoas


feridas (5.15 b, 18b).
Neemias dá duas razões pelas quais contrariou a tendência de seus
antecessores e pôs de lado os seus direitos: ele temia a Deus (5.15 b), e estava
preocupado, “porque a servidão do povo era grande” (5.18 b). Cada homem na
liderança deve lembrar, constantemente, que é apenas um servo em Deus, e que
vai prestar contas a Deus um dia. Isto é, não é a “minha igreja”, e sim, a “igreja de
Cristo”, o Supremo Pastor.

104
TÜNNERMANN, Rudi. As reformas de Neemias. São Paulo: Editora Sinodal, 2001, p. 160.

46
Em terceiro lugar, ele foi generoso e pronto para compartilhar (5.17-
18).
Todos eles participaram da reconstrução do muro (v. 16). Eles não eram
assessores que, ocasionalmente, saíam de suas torres de marfim, mas
trabalhadores que estavam com as pessoas na reconstrução da defesa da cidade.
Jesus disse: “Eu estou entre vocês como quem serve” (Lc 22.27), e Neemias e seus
assessores tiveram a mesma atitude.

“Antes, também na obra deste muro fiz reparação, e terra nenhuma


compramos...” (v. 16) – Jerusalém estava prestes a passar por um “boom”
imobiliário. Sabendo disso, Neemias e seus companheiros poderiam ter comprado
terras mais baratas antes de anunciar o projeto, e depois vendê-las a um lucro
exorbitante. Mas o soldado em serviço não se envolve em assuntos do cotidiano, de
modo que ele pode agradar a quem o alistou (2Tm 2.4). Neemias manteve seu foco
no trabalho.

“Também cento e cinquenta homens dos judeus e dos magistrados e os


que vinham a nós, dentre as gentes que estavam ao nosso redor, eram meus
hóspedes” (v. 17) – Além disso, ele regularmente alimentava mais de 150
convidados, ambos residentes e visitantes, e dava-lhes uma refeição maravilhosa!
(Veja 1Reis 4.22-23). Estima-se que esta quantidade de comida atenderia às
necessidades de mais de 500 convidados, assim Neemias deve ter mantido a “casa
aberta” constantemente. Neemias era generoso com os outros e não exigiu
nenhuma recompensa.
Foi algo custoso alimentar a todos de seu próprio bolso, mas ele estava
disposto a fazê-lo para que não tivesse que impor um fardo àqueles que já estavam
sobrecarregados. Um líder deve ser um exemplo de generosidade.

Em quarto lugar, Ele trabalhou para a aprovação de Deus (5.19).


Neemias não estava trabalhando para aplausos, mas para alcançar a
aprovação de Deus. Matthew Henry escreve:

Ele menciona a Deus em oração não porque achava que tinha que
merecer qualquer favor de Deus, como uma dívida, mas para
mostrar que ele não olhava para nenhuma recompensa da
generosidade dos homens, mas dependia apenas de Deus para dar
até mesmo o que ele tinha perdido, o favor de Deus era o
suficiente.105

Esta é a quarta oração de Neemias (1.5; 2.5; 4.4), uma maravilhosa


expressão de adoração e humildade. Ele pode deixar de lado as vantagens
temporais porque buscava apenas a aprovação de Deus. Ele estava satisfeito por
saber que sua recompensa viria do Senhor.106 Ele continuava mais interessado na
aprovação divina do que nas vantagens que poderia alcançar em seu cargo como
governador, ou até mesmo dos aplausos que poderia angariar. Que grande
exemplo, que grande líder, que grande coração!

105 Henry, M. (1994). Matthew Henry’s commentary on the whole Bible: Complete and
unabridged in one volume (Ne 5.14–19). Peabody: Hendrickson.
106
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 84.

47
Conclusão:
Poderíamos nos perguntar: “Por que Deus incluiu este capítulo sobre os
conflitos internos dos judeus?” Talvez a melhor resposta seja esta: conflitos não
resolvidos e lutas internas causarão mais danos para a restauração dos muros em
Jerusalém, do que poderiam fazer os inimigos Sambalate e Tobias.
O capítulo 5 de Neemias é um grande incentivo para resolver os conflitos na
igreja, com sucesso. Problemas não resolvidos podem trazer terríveis
consequências. Às vezes guardamos mágoas em nosso coração, ressentimentos que
duram anos e nenhum bem trazem à nossa saúde. As decepções armazenadas ao
longo dos anos servem apenas para destruir nossas forças, fomentar intrigas e
privar-nos da alegria de viver em paz e harmonia.
Lidar com a amargura é algo extremamente sério. Alguém, sabiamente,
declarou: “... não devemos magoar o coração de uma pessoa, afinal de contas,
podemos estar dentro dele!”
Você teria a coragem de usar a mesma leiteira do dia anterior para ferver o
leite, sem antes lavá-la? O leite certamente ficaria azedo. O mesmo acontece com o
nosso coração quando permitimos que amargura crie raízes. Nosso coração azeda,
bem como nossas palavras.
Existem pessoas com as quais você tem “alguma coisa contra”, em sua
igreja? Como podemos “andar no temor do nosso Deus” no meio do conflito?

Conforme Warren Wiersbe, o capítulo cinco oferece algumas lições


importantes àqueles que são líderes, observe:

Em primeiro lugar, espere problemas no meio do povo. Onde houver


pessoas, há potencial para problemas. Onde quer que a obra de Deus prospere, o
inimigo faz todo o possível para também haver dificuldades. Não se surpreenda
quando as pessoas de seu grupo nem sempre conseguirem se dar bem umas com
as outras.

Em segundo lugar, tenha coragem para confrontar os problemas. Não


ignore os problemas. Todo problema ignorado criará raízes mais profundas e dará
frutos amargos. Ore pedindo a ajuda de Deus e trate do problema o mais rápido
possível.

Em terceiro lugar, veja em cada problema uma oportunidade para


Deus lhe dar a vitória. Resolver os problemas que surgem no ministério não é um
exercício intelectual, mas sim uma experiência espiritual. Tudo o que dissermos e
fizermos deve ser motivado pelo amor, controlado pela verdade e feito para a
glória de Deus.107

Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (68). Wheaton, IL: Victor
107

Books.

48
C u i d a d o c o m o s i n i m i go s
[Estudo 6 – Ne 6.1-19]

Em seu objetivo de reconstruir os muros de Jerusalém, Neemias teve que


enfrentar as ameaças violentas do inimigo (capítulo 4). Ele teve que lidar, também,
com o conflito interno entre os judeus ricos e pobres (capítulo 5). Agora, quando os
muros estavam quase prontos, Neemias teve de enfrentar mais uma vez o inimigo
(capítulo 6).
No capítulo 6, Neemias descobre que a luta ainda não acabou. Os inimigos se
levantam contra ele com quatro ataques diferentes. Mas cada um foi projetado
para tirar sua vida ou minar sua eficácia como líder.

I. O primeiro ataque: intriga (Ne 6.1-4)


1
Tendo ouvido Sambalate, Tobias, Gesém, o arábio, e o resto dos
nossos inimigos que eu tinha edificado o muro e que nele já não havia
brecha nenhuma, ainda que até este tempo não tinha posto as portas
nos portais, 2 Sambalate e Gesém mandaram dizer-me: Vem,
encontremo-nos, nas aldeias, no vale de Ono. Porém intentavam
fazer-me mal.

A primeira ferramenta utilizada por Sambalate, Tobias e Gesém, contra


Neemias, foi a intriga. Convidaram Neemias para se reunir com eles em uma das
aldeias do vale de Ono, que ficava cerca de 25 quilômetros a noroeste de Jerusalém,
cerca de 6 km a sudeste de Jope.108 Ou seja, o vale de Ono ficava a uma boa
distância de Jerusalém, mas perto da fronteira de Samaria, na província da casa de
Sambalate. Os inimigos articularam uma cilada. Sambalate e seus companheiros
queriam ter uma conferência de paz, mas o motivo oculto era acabar com Neemias.
Porém, Neemias viu, claramente, o plano, e declarou “... Porém intentavam fazer-me
mal” (v. 2).

1. Satanás tem como alvo os líderes.


Se Satanás conseguir destruir um líder, todo o rebanho sofre. Mas se você é
um líder ou não, o inimigo usa os mesmos esquemas para tentar sabotar a sua
caminhada com Deus. Observe duas coisas:

A. Satanás usa o engano, mas sua intenção é destruir-nos.


“Vem, encontremo-nos, nas aldeias, no vale de Ono”. “Devemos tentar
resolver nossas diferenças”. “Você é a favor da paz, não é? Você não quer boas
relações com seus vizinhos?” “Nós apenas queremos promover compreensão
mútua”. Tudo parecia tão bem, mas Neemias percebeu, corretamente, que sua
intenção era uma emboscada.

108 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 6.1–4). James L. Fleming.

49
Satanás ainda usa todos os tipos de apelos aparentemente inocentes para
atrair crentes em uma armadilha. Ele não está brincando: ele quer devorar você
(1Pe 5.8).
Observe como o apóstolo Paulo enfrentou a forte oposição dos judaizantes.
Aqueles homens alegavam crer em Jesus como Senhor e Salvador. Acreditavam que
Ele era o Messias. Por que, então, Paulo se opôs a eles? Porque eles disseram que,
além de crer em Jesus, o gentio tinha que ser circuncidado para ser salvo. E Paulo
disse: “Seja anátema” (Gl 1.8, 9). Paulo declarou que, ao acrescentar qualquer obra
humana, o indivíduo está separado de Cristo, caiu da graça (Gl 5.4). O objetivo de
Satanás é destruir o povo de Deus através do engano sutil. Cuidado com as ciladas
do inimigo. Ele é “o pai da mentira” (Jo 8.44).

B. Satanás é persistente em seus planos.


“Quatro vezes me enviaram o mesmo pedido...” (v. 4) – Eles enviaram
mensageiros a Neemias quatro vezes com o mesmo convite. Quatro vezes ele
enviou de volta a mesma resposta: “Eu estou fazendo uma grande obra e eu não
posso descer...” (6.3). O líder deve ser um homem corajoso. É preciso coragem para
enfrentar os críticos.
Esse pedido parece muito magnânimo. O convite promete uma resolução
amigável das diferenças de muitos anos. Parece ainda mais razoável porque se
sabe que os judeus estão em grande aperto, cansados e sofrendo pela fome.109
Quatro vezes os convites chegaram a Neemias, e quatro vezes Neemias respondeu-
lhes da mesma maneira. O inimigo não desiste facilmente. Veja como Dalila usou
Sansão com o mesmo pedido, para descobrir o segredo de sua força. Quando ele
cedeu, o inimigo triunfou.
Entretanto, qual o problema em se reunir com o inimigo? Não é sempre
melhor falar do que lutar para manter as linhas de comunicação abertas? Qual o
problema em conversar com o inimigo, tendo em vista que o trabalho havia
acabado?
Esse era o problema: o trabalho não havia acabado. É verdade, a
restauração dos muros estava concluída, mas restavam os portões da cidade.
Além do mais, ao responder desta forma, Neemias estava dando aos
inimigos uma oportunidade de provar se eles eram sinceros, se realmente queriam
a paz.110

C. Neemias resistiu às intrigas de Satanás reafirmando suas


prioridades.

“Estou fazendo grande obra, de modo que não poderei descer...” (v. 3) –
Ele não estava sendo arrogante. Ele sabia que o que estava fazendo era
extremamente importante. Sabia que os muros ainda não estavam concluídos, eles
estavam sem as portas. Muros sem portas são ineficazes contra os inimigos. Sua
prioridade era terminar a reconstrução. Ele não permitiu que uma reunião
desnecessária com o inimigo o distraísse do seu objetivo.

109 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 86.
110 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge

commentary: an exposition of the scriptures (Ne 6.1–4). Wheaton, IL: Victor Books.

50
A maior defesa de um homem é a obra que ele está fazendo.111 Se um líder
reage constantemente aos ataques dirigidos a si, não consegue trabalhar e não
conseguirá cumprir o seu objetivo.
Como crentes, a nossa prioridade é glorificar a Deus (Mt 6.33). Tudo o que
nos afasta desta prioridade é um truque do diabo. Ao nos distrair com outras
coisas, mesmo boas coisas, cedemos aos esquemas do inimigo.
Um líder deve saber dizer não. Algumas pessoas não conseguem fazer isso.
Seja por causa da própria insegurança ou do desejo desequilibrado de sempre
agradar aos outros. No entanto, Neemias teve a coragem de dizer “não” quatro
vezes.
A intriga de Sambalate, Tobias e Gesém, não produziu os resultados
desejados. E assim, eles utilizaram outros meios para se livrar do grande líder
judeu, Neemias.

II. O segundo ataque: insinuação (Ne 6.5-9)


5 Então, Sambalate me enviou pela quinta vez o seu moço, o qual
trazia na mão uma carta aberta, 6 do teor seguinte: Entre as gentes se
ouviu, e Gesém diz que tu e os judeus intentais revoltar-vos; por isso,
reedificas o muro, e, segundo se diz, queres ser o rei deles, 7 e puseste
profetas para falarem a teu respeito em Jerusalém, dizendo: Este é rei
em Judá. Ora, o rei ouvirá isso, segundo essas palavras. Vem, pois,
agora, e consultemos juntamente.

Depois de quatro tentativas frustradas de atrair Neemias para o vale de


Ono, o inimigo mudou de tática. Ele enviou uma carta aberta a Neemias, que
continha falsas acusações contra ele. Os inimigos disseram que Neemias havia
contratado profetas para anunciar em Jerusalém que ele era o novo rei. Além disso,
a carta também continha uma ameaça de que o assunto seria levado ao rei
Artaxerxes, caso Neemias não aceitasse se encontrar com eles, em Ono (6.5-7).

1. Satanás espalha boatos caluniosos contra líderes


piedosos.
Normalmente as cartas eram seladas e privadas. Sambalate sabia que o
servo, antes de entregar a carta, certamente iria lê-la, e assim inúmeras outras
pessoas, ao longo do caminho. Invariavelmente, esses rumores atacam o caráter e
os motivos de um líder religioso. “Você sabe o que Neemias estava planejando?”
“Não, mas eu perguntei por que ele estava trabalhando duro nos muros”. “Com
certeza faz sentido!” “Onde tem fumaça tem fogo”. A principal arma do diabo é a
mentira.
Aqueles que espalham tais falsidades nunca perguntam a pessoa ofendida o
que realmente aconteceu. Como Neemias respondeu a este esquema do diabo?

2. Neemias resistiu às insinuações de Satanás com a


verdade e com oração.
Uma vez que esta carta aberta era uma grave acusação pública contra
Neemias, ele não permaneceu em silêncio.

111 CATT, Michael. Vivendo corajosamente. São Paulo: Imprensa da Fé, 2012, p. 120.

51
Primeiro, enviou uma mensagem de volta a Sambalate, afirmando a verdade
e, firmemente, negando as acusações: “Nada do que você está dizendo é verdade. Foi
você quem inventou tudo isso...” (v. 8, NTLH). A resposta corajosa de Neemias
demonstrou sua confiança em Deus.112
A única maneira de lidar com um falso rumor é negá-lo imediatamente; foi
exatamente o que Neemias fez.113 Depois que perdeu a eleição presidencial para
Gorge Bush, em 1988, Michael Dukakis foi questionado sobre a causa do seu
fracasso. Dukakis respondeu culpando a campanha de Bush por seus ataques a ele.
Ele disse: “Nosso erro foi não responder a essas acusações falsas de imediato”.
Quer sejam acusações verdadeiras ou falsas, as pessoas vão julgar de diferentes
maneiras.
Em seguida, como Neemias fez regularmente, ele orou, desta vez pedindo a
Deus força. Ele disparou outra de suas orações, “Agora, pois, ó Deus, fortalece as
minhas mãos” (v. 9). É maravilhoso perceber que as ameaças de Sambalate, ao
invés de enfraquecê-lo, fizeram Neemias voltar para a obra com determinação
ainda maior.114 Pela fé e oração podemos suplicar a graça de Deus e silenciar
nossos medos, e reforçar nossas mãos enquanto os inimigos se esforçam para nos
destruir.
A crise não faz a pessoa, a crise revela a pessoa. Em um momento de
provação, você busca aquilo no qual você confia. Um alcoólatra se volta para a
garrafa. Um viciado busca, nas drogas, o alívio. Uma pessoa do mundo se volta para
a sabedoria do mundo. Um cristão deve se voltar para o Senhor.
Durante um terremoto, há alguns anos, os habitantes de uma pequena
aldeia ficaram alarmados com o tremor, mas também ficaram alarmados com a
tranquilidade e a alegria aparente de uma mulher idosa, que todos conheciam.
Alguém perguntou a ela: “A senhora não tem medo?” “Não!”, ela respondeu: “Eu me
alegro em saber que tenho um Deus que pode agitar o mundo”.
Neemias resistiu aos ataques do inimigo, pois permaneceu firme em suas
prioridades, não abriu mão da verdade e da oração. Mas Satanás não desistiu.

III. O terceiro ataque: intimidação (Ne 6.10-14)


10 Tendo eu ido à casa de Semaías, filho de Delaías, filho de
Meetabel (que estava encerrado), disse ele: Vamos juntamente à Casa
de Deus, ao meio do templo, e fechemos as portas do templo; porque
virão matar-te; aliás, de noite virão matar-te.

1. Satanás usa até mesmo pessoas religiosas para nos


assustar e manchar a nossa reputação.
“Tendo eu ido à casa de Semaías, filho de Delaías...” (v. 10) – Aqui o
inimigo combina decepção com intimidação e medo. Semaías, um profeta
mercenário (v. 12), elaborou um plano inteligente para prender Neemias. Ele se

112 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 6.8–9). Wheaton, IL: Victor Books.
113 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (72). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.
114 Willamson, H. G. M. (1998). Vol. 16: Ezra, Nehemiah. Word biblical commentary (257).

Dallas: Word, Incorporated.

52
trancou em sua casa e deu a impressão de que, como Neemias, sua vida estava em
perigo. Quando Neemias chegou para vê-lo, Semaías sugeriu que ambos se
refugiassem no templo, onde o inimigo não poderia alcançá-los (Êx 21.13-14; 1Rs
1.50-53). Suas palavras foram muito ameaçadoras: “Nós dois precisamos nos
esconder juntos no Lugar Santo, no Templo. E vamos fechar as portas porque eles
virão matar você. Sim, qualquer noite destas eles virão matá-lo” (v. 10, NTLJ).
Isto merece uma explicação. Quando Semaías sugeriu que ele e Neemias
fugissem para a “Casa de Deus”, para se salvarem, o termo que ele usou significa
“Lugar Santo” (como na Nova Tradução na Linguagem de Hoje), e não apenas o
recinto do templo. Esta foi uma sugestão pagã, pois todos os judeus sabiam que
ninguém poderia se salvar fugindo para o templo. Os judeus tinham um dispositivo
similar nas seis cidades de refúgio (cf. Dt 19.1-13; Js 20.1-9.), embora estes fossem
culpados apenas de homicídio involuntário, e não assassinato. Não havia nada na
Lei em referência ao templo. Semaías estava falando como um pagão neste
momento.
Além disso, ele estava sugerindo algo que era contrário ao ensinamento do
Antigo Testamento. Neemias era um leigo, e os leigos não eram permitidos nas
partes internas do templo (Nm 18.7). O Rei Uzias, que violou a referida proibição,
tinha tido a sorte de escapar, mas ficou leproso (2Cr 26.16-21). Se Neemias
sucumbisse às sugestões engenhosas de Semaías, ele poderia até mesmo perder a
vida. Se Neemias tivesse agido com medo e fugido para o templo, seus inimigos
teriam espalhado a notícia e arruinado sua reputação (Ne 6.13).
Cyril Barber escreve que Neemias triunfou, “não por quebrar a Lei de Deus
para fugir do assassínio, mas por guardá-la!”115
Tenha cuidado quando alguém que se diz um cristão o convidar para fazer
algo que você sabe que é errado. Ele pode usar táticas assustadoras para
pressioná-lo: “Todo mundo faz isto”. “Se você não participar, ninguém vai gostar de
você”, etc. É o inimigo tentando pressioná-lo a um comportamento pecaminoso
para arruinar o seu testemunho. Não se renda! Como Neemias respondeu?

2. Neemias resistiu à intimidação de Satanás com uma


oração destemida.
“Lembra-te, meu Deus, de Tobias e de Sambalate, no tocante a estas suas
obras, e também da profetisa Noadia e dos mais profetas que procuraram
atemorizar-me” (v. 14) – O versículo 14 indica que houve uma conspiração contra
Neemias entre os profetas, incluindo uma profetisa chamada Noadia. Isso criou
uma grande pressão para Neemias, pois os judeus tinham um grande respeito por
seus profetas. Neemias estava em desvantagem numérica, mas ele se manteve
firme. 116
Ele se recusou a entrar no Santo dos Santos e orou entregando o assunto a
Deus. Nos versículos 9 e 14, temos a quinta e sexta orações “expressas” de Neemias

115
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 96.
116 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (76). Wheaton, IL: Victor

Books.

53
em tempos de crise. Porém, por trás dessas orações breves estava uma vida de
oração que lhe dava força diária.
O resultado de manter-se firme na presença de Deus fez com que Neemias
concretizasse a obra em 52 dias (v. 15). Um feito surpreendente para uma tarefa
considerada impossível aos olhos humanos.

IV. Quarto ataque: infiltração (Ne 6.17-19)


17 Também naqueles dias alguns nobres de Judá escreveram muitas
cartas, que iam para Tobias, e cartas de Tobias vinham para eles.
18 Pois muitos em Judá lhe eram ajuramentados porque era genro de
Secanias, filho de Ará; e seu filho Joanã se casara com a filha de
Mesulão, filho de Berequias. 19 Também das suas boas ações falavam
na minha presença, e as minhas palavras lhe levavam a ele; Tobias
escrevia cartas para me atemorizar.

1. A vitória de Neemias.
Quando os inimigos e as nações vizinhas viram que os muros estavam
restaurados, eles temeram e admitiram que este trabalho havia sido concluído por
causa de Deus (6.16). Todos os inimigos que Sambalate envolveu em suas tramas
contra os judeus só ampliaram o círculo da glória de Deus quando a obra terminou.
Isso deve ser um modelo para nós. Devemos trabalhar tão duro como se o
sucesso dependesse de nós, mas ao mesmo tempo devemos lembrar que se o
Senhor não edificar a casa e guardar a cidade, nosso trabalho será em vão (Sl
127.1).
Em seguida, lemos: “Então Satanás desistiu da batalha e foi para casa, e
Neemias e os judeus viveram felizes para sempre”. Não exatamente!
Precisamos prestar atenção ao conselho do ministro escocês Andrew A.
Bonar, que disse: “Permaneçamos tão vigilantes depois da vitória, quanto antes da
batalha”.117

2. Satanás perdeu a batalha, mas não desistiu.


O versículo 18 nos diz que, “Pois muitos em Judá lhe eram ajuramentados...”
(Tobias). Muitos judeus eram, portanto, fiéis a Tobias. Esta lealdade parece
resultar dos casamentos dos filhos de Tobias com as famílias judaicas.
Como esses judeus foram capazes de virar as costas para seu próprio povo?
A resposta é simples: os laços humanos eram mais fortes que os laços
espirituais.118 Porém, àqueles que se juntaram a Tobias, esqueceram de que havia
uma aliança com Deus, e lhe deviam amor e lealdade.
Mas esses traidores foram ainda mais longe: eles repetidamente falavam
das boas coisas que Tobias havia feito e contavam a ele tudo o que Neemias dizia.
Satanás frequentemente se infiltra na igreja com os agentes secretos que

117 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (77). Wheaton, IL: Victor
Books.
118 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (78). Wheaton, IL: Victor

Books.

54
professam ser crentes. Mas seus corações estão no mundo, e eles se opõem aos
homens piedosos, como Tobias se opôs a Neemias.
Quando firmamos compromisso com as pessoas do mundo, dificultamos o
trabalho de Deus. Tobias e seu filho haviam feito aliança com alguns dos nobres
judeus. Tobias os convenceu de que ele era uma pessoa boa (6.19), mesmo que
estivesse em oposição ao projeto de Neemias. Mais tarde, durante a ausência de
Neemias, que estava na Pérsia para dar um relatório ao rei Artaxerxes, o sacerdote
Eliasibe concedeu a Tobias uma sala grande onde antes eram guardadas as ofertas
de cereais e de incenso, e os objetos usados no Templo, porque havia se ligado com
Tobias por laços de parentesco.
Mas quando Neemias voltou, ele viu isso como uma aliança com o mundo, e
pessoalmente jogou todos os móveis de Tobias para fora da sala. Depois deu ordem
para que a sala fosse purificada e que os objetos do Templo, as ofertas de cereais e
o incenso fossem colocados ali, novamente (13.4-9).
Todos nós precisamos ponderar sobre a advertência do apóstolo João: “Não
ameis o mundo nem as coisas do mundo. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não
está nele” (1Jo 2.15).

Conclusão:
Há uma história de uma senhora que nunca falava mal de ninguém. A amiga
lhe disse: “Eu acredito que você diria algo bom até mesmo sobre o diabo”.
“Bem”, ela respondeu, “você não tem que admirar, mas ele é persistente”.
Ela estava certa: ele é persistente! Com isto em mente, parece apropriado
reconhecer o valor da liderança e fazer o máximo para proteger e preservar nossos
líderes.
O comentarista bíblico Fleming, J. L., com sabedoria e de forma prática, nos
dá quatro sugestões de como proteger nossos líderes dos ataques do inimigo.119
Vejamos:

1. Ore pelos seus líderes – “Irmãos, orai por nós” (1Ts 5.25). “Finalmente,
irmãos, orai por nós, para que a palavra do Senhor se propague e seja glorificada,
como também está acontecendo entre vós” (2Ts 3.1). “Orai por nós, pois estamos
persuadidos de termos boa consciência, desejando em todas as coisas viver
condignamente” (Hb 13.18).

2. Apoie seus líderes – “Ora, as mãos de Moisés eram pesadas; por isso,
tomaram uma pedra e a puseram por baixo dele, e ele nela se assentou; Arão e Hur
sustentavam-lhe as mãos, um, de um lado, e o outro, do outro; assim lhe ficaram as
mãos firmes até ao pôr-do-sol. E Josué desbaratou a Amaleque e a seu povo a fio de
espada” (Êx 17.8-16).

3. Incentive seus líderes – O que você acha que encorajou Neemias? Estou
convencido de que, ao se levantar todos os dias e começar a trabalhar nos muros, o
que o incentiva era o fato de que todo mundo também estava lá para ajudá-lo. Eles

119 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 6.17–19). James L. Fleming.

55
enfrentaram muitas das mesmas provações e tribulações que Neemias enfrentou.
E, no entanto, acreditavam em sua liderança e passaram a trabalhar acreditando
que Deus lhes permitira completar o muro.

4. Peça a Deus para dar-lhes sabedoria para lidar com os ataques do


inimigo – Os líderes precisam de integridade para manter o caráter em meio aos
ataques, e discernimento para ver o inimigo. Na carta de Tiago está escrito: “Se,
porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá
liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida” (Tg 1.5).

Agora chegamos ao fim desta parte da história: “Acabou-se, pois, o muro...”


(6.15). Mas isto marca um novo começo, pois agora Neemias deve proteger o que
realizou. Como ele fez isso é o tema do restante do livro.

56
Deus se importa com seus servos
[Estudo 7 – Ne 7.1-73]

Neemias 7 é um daqueles capítulos que nos fazem pensar porque Deus


permitiu que estivesse na Bíblia! Fazemos essa pergunta, principalmente, quando
percebemos que os versículos de 6 a 73 são praticamente os mesmos registrados
em Esdras 2! Por que Deus colocou esta longa lista de nomes impronunciáveis duas
vezes?
O capítulo 7 serve como uma dobradiça no livro de Neemias. Os capítulos de
1 a 6 descrevem a restauração dos muros de Jerusalém. Os capítulos de 8 a 13
tratam da restauração do povo de Judá. O capítulo 7 começa com três versos que
descrevem a precaução de Neemias em proteger a cidade dos inimigos. Os
versículos de 4 a 73 descrevem como Neemias repovoou a cidade para que ela se
tornasse um centro vital para a vida nacional e espiritual.
Esta lista de nomes foi usada por Neemias para incutir nas pessoas um
lembrete de sua identidade pessoal e nacional, e para incentivá-los a cumprir as
suas responsabilidades à luz dessa identidade.
Ao ler o capítulo 7, percebemos quatro motivos porque Deus achou
necessário incluir este capítulo em Sua Palavra.

I. A adoração é importante para Deus


1 Ora, uma vez reedificado o muro e assentadas as portas,
estabelecidos os porteiros, os cantores e os levitas, 2 eu nomeei
Hanani, meu irmão, e Hananias, maioral do castelo, sobre Jerusalém.
Hananias era homem fiel e temente a Deus, mais do que muitos
outros.

A primeira atitude de Neemias após ter concluído a restauração dos muros


foi estabelecer os responsáveis pela adoração. Os primeiros versículos do capítulo
7 nos dizem sobre três categorias gerais de nomeações (porteiros, cantores e
levitas). Os cantores e levitas tiveram prioridade, porque a adoração era a razão de
ser de Jerusalém.120 A razão para proteger a cidade dos invasores não foi apenas
para que todos pudessem viver em segurança. Mas também para que a adoração
fosse realizada no templo.
O puritano John Owen nos lembra que a verdadeira adoração, ainda que
oferecida na terra, é conectada nos céus.121 É importante lembrar, também, das
palavras de John Piper, “Missões não é o objetivo final da igreja. A adoração é.
Missões existe porque a adoração não existe. Adoração é o objetivo final, não
missões, porque Deus é o objetivo, não o homem”. Ele acrescenta, “O objetivo das
missões é a alegria dos povos na grandeza de Deus”.122
Os melhores vendedores são sempre aqueles que amam o seu produto. Eles
estão convencidos de que você não pode realmente desfrutar da vida a menos que

120 KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 11.
121 John Owen. The works of John Owen (Carlisle: The Banner of Truth, 1990), IX: 77.
122 PIPER, John. Let the nations be glad! [Baker Academic], 2 nd ed., p. 17

57
tenha o que eles estão vendendo. E enquanto as vendas e a evangelização não
sejam análogas, as testemunhas mais eficazes são aqueles que, obviamente, são
cativados pela grandeza de Deus e Sua salvação.
Em Apocalipse, aprendemos que uma boa parte do céu será investida em
louvor e adoração a Deus. Os santos se reunirão com os anjos, com os quatro seres
viventes e com os 24 anciãos e cantarão: “Digno é o Cordeiro que foi morto de
receber o poder, e riqueza, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e louvor” (Ap 5.9,
12, 13). Seremos tão impactados pela beleza da glória de Deus que nos juntaremos
aos seres celestiais para glorificar ao Eterno!
Quando você contempla um cenário de beleza natural, como um pôr do sol
nas montanhas ou na praia, mesmo que não conheça ninguém ao seu lado, você
sente o desejo de dizer alguma coisa às pessoas que estão em sua volta: “Uau, isso é
incrível, não é!” Fazemos isso porque a beleza gera em nosso coração um louvor
espontâneo, e o louvor é melhor quando compartilhado. O céu será um tempo de
contemplar da beleza de Deus, e compartilhá-la com os outros, eternamente.
Entretanto, é relevante destacar que a adoração não é algo que os crentes
devem aprender somente no céu. O pregador britânico Charles H. Spurgeon disse
que, “Se queremos ser fiéis ao coral celestial, às melodias devem ser aprendidas
aqui em baixo”.123

II. Um caráter piedoso é importante para Deus


2
eu nomeei Hanani, meu irmão, e Hananias, maioral do castelo, sobre
Jerusalém. Hananias era homem fiel e temente a Deus, mais do que
muitos outros. 3 E lhes disse: não se abram as portas de Jerusalém até
que o sol aqueça e, enquanto os guardas ainda estão ali, que se fechem
as portas e se tranquem; ponham-se guardas dos moradores de
Jerusalém, cada um no seu posto diante de sua casa.

Neemias foi um líder exemplar, ele sabia que para ser eficaz, era necessário
delegar responsabilidades. Enquanto certas habilidades administrativas são
necessárias para uma liderança efetiva, o requisito principal é um caráter piedoso.
Neemias nomeou dois homens. Hanani, o seu irmão, que tinha chegado a
Susã com o triste relatório a respeito de Jerusalém (1.1-3), como o seu líder civil. Já
Hananias foi nomeado como o líder militar porque “ele era homem fiel e temente a
Deus, mais que muitos” (v. 2). Juntos, eles deveriam abrir os portões de Jerusalém
somente quando o sol começasse a esquentar. E deveriam fechar os portões antes
que os guardas deixassem o serviço. Também receberam a ordem para escolher
guardas entre o povo que morassem em Jerusalém (v. 3).

1. A fidelidade.
“Hananias era homem fiel...” (v. 2) – Alguns escritores têm acusado
Neemias de nepotismo por nomear o próprio irmão. Porém, em um ambiente
cercado por corrupção e acordos escusos, essa pode ter sido a razão pela qual
Hanani foi o escolhido de Neemais. Não foi um caso de nepotismo, mas a escolha do
melhor e mais fiel para o trabalho. Hanani já havia demonstrado preocupação com
o bem-estar da cidade, fazendo a longa viagem para a Babilônia (Ne 1.1-2).

123 Charles Spurgeon. The treasury of the Bible (reprint, Grand Rapids: Baker, 1981), 8:743.

58
A palavra hebraica para fidelidade (’emeth), significa confiável, verdadeiro e
firme. Além de Hanani, Neemias também nomeou Hananias para ocupar o cargo de
chefe dos guardas. Ele era um homem que Neemias poderia confiar. A palavra
“fiel”, em hebraico, expressa o conceito básico de apoio e é usada no sentido dos
braços fortes de um pai apoiando a criança indefesa.124
A fidelidade é fruto que o Espírito Santo produz em nós quando andamos na
dependência dele (Gl 5.16, 22). Todos nós somos mordomos dos dons e do tempo
que Deus nos concede. Paulo disse que, o que se exige dos administradores é que
sejam encontrados fiéis (1Co 4.2).
A fidelidade é também um ingrediente essencial nos relacionamentos. Se
você não confia em alguém, você não vai querer se aproximar dessa pessoa. No
entanto, o nosso Deus é um Deus fiel, que sempre fala a verdade e guarda a sua
palavra, assim como crescemos em santidade, devemos, também, crescer em
fidelidade.

2. O temor a Deus.
“Hananias era homem temente a Deus...” (v. 2) – A palavra “temor” (yare’,
em hebraico), tem várias significados que enriquecem a nossa compreensão.
Incluem terror, reverência, obediência e adoração. Muitas dessas nuances são
encontradas em Deuteronômio: “Agora, pois, ó Israel, que é que o SENHOR requer de
ti? Não é que temas o SENHOR, teu Deus, e andes em todos os seus caminhos, e o
ames, e sirvas ao SENHOR, teu Deus, de todo o teu coração e de toda a tua alma, para
guardares os mandamentos do SENHOR e os seus estatutos que hoje te ordeno, para
o teu bem?” (Dt 10.12-13).
O temor ao Senhor pode ser equiparado com a entrega total da própria vida
a Deus. Quem teme a Deus não aceita suborno, não se corrompe. Havia fortes
pressões internas e externas e só um homem temente a Deus poderia cuidar da
cidade.125 O temor ao Senhor fala da vida total voltada à realidade de que Deus
existe, e que Ele é o centro da vida. Temor do Senhor ainda incita a servir a Deus
com todo o coração. É o grito do coração de Isaías: “Eis-me aqui Senhor, envia-me”
(Is 6).
Entretanto, sabemos que nem todo mundo é chamado a ser um Neemias,
mas alguns de nós podem ser Hananis ou Hananias, trabalhar e servir ao Senhor, e
ajudar aos líderes a fazerem um excelente trabalho. Deus está à procura de homens
e mulheres fiéis e tementes a Deus, que terão a coragem e a convicção de servi-Lo
em todas as circunstâncias.126

3. A vigilância.
“E lhes disse: não se abram as portas de Jerusalém até que o sol
aqueça...” (v. 3) – Neemias não só restaurou os muros de Jerusalém com a espada
e com a colher de pedreiro, ele também colocou guardas e deu instruções
cuidadosas sobre a necessidade de vigiarem a cidade. Ele confiava em Deus, mas
também vigiava a cidade (cf. 4.9). Os dois não estão em oposição.

124 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 7.1–4). James L. Fleming.
125 LOPES, Hernandes Dias. Neemias, o líder que restaurou uma nação. São Paulo: Editora
Hagnos, 2006, p. 124.
126 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (84). Wheaton, IL: Victor

Books.

59
Note que um momento de sucesso é um momento crítico para estar em
guarda. Os muros estavam restaurados, os portões estavam no local. Teria sido
fácil relaxar e ensarilhar as armas. O inimigo muitas vezes nos ataca logo após uma
vitória.
Neemias sabia deste fato. De que adiantaria portas novas e fortes se
ninguém estivesse guardando e controlando a entrada da cidade? A Grande
Muralha da China foi penetrada pelo inimigo, pelo menos, quatro vezes, e cada vez
os guardas foram subornados.127 Portas e muros são bons itens de segurança, mas
não podemos esquecer as pessoas que os protegem.
Além disso, precisamos estar especialmente atentos em nossos próprios
lares. Neemias deu instruções aos guardas para que se posicionassem na frente de
sua própria casa (7.3). Precisamos de guardas também em nossos lares.
Precisamos de homens e mulheres fiéis que amem ao Senhor e estão dispostos a
defender suas famílias a qualquer custo. Precisamos de vigias sobre os muros para
nos avisar quando o inimigo está se aproximando, ou o inimigo assumirá nossos
lares e nossas igrejas (2Co 11.13-15).

III. As pessoas são importantes para Deus (7.4-73)


4
A cidade era espaçosa e grande, mas havia pouca gente nela, e as
casas não estavam edificadas ainda.

A maior parte do capítulo 7 foi extraído de Esdras 2, como mencionei


anteriormente. Este era, sem dúvida, um documento importante, uma vez que é
encontrado não só aqui e em Esdras 2, mas no livro apócrifo de 1Esdras,
também.128 Sua presença no livro de Neemias tem um propósito completamente
diferente do que no livro de Esdras.129
Se deparar com esta longa lista de nomes difíceis pode ser uma tarefa
entediante para qualquer leitor, mas essas pessoas foram a “ponte” construída por
Deus entre as derrotas do passado e as esperanças do futuro. Esdras 2 e Neemias 7
são para o Antigo Testamento o que Hebreus 11 é para o Novo Testamento: uma
lista das pessoas cuja fé e coragem permitiram que as coisas acontecessem.130

127 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (84). Wheaton, IL: Victor
Books.
128 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (80). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.
129 Embora eles contenham praticamente os mesmos nomes e os agrupamentos, as duas

listas, no entanto, não são idênticas. O total de indivíduos é o mesmo: 42.360 (Ed 2.64; Ne
7.66.). Mas os itens individuais se somam aos totais diferentes e contraditórios: 29.818 em
Esdras e 31.089 em Neemias. Houve tentativas para explicar os milhares desaparecidos
como os membros das tribos do norte, mulheres ou crianças. Mas o texto não diz nada
sobre isso, e nenhuma explicação científica foi inteiramente convincente. A opinião entre os
estudantes da Bíblia é que os erros aconteceram no texto por causa das diversas cópias,
devido à dificuldade especial de compreender e reproduzir listas numéricas ou nomes
muito parecidos. Para uma discussão sobre esses problemas, consulte Derek Kidner, Esdras
e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011), e Howard F. Vos, Bible study commentary:
Ezra, Nehemiah, and Esther (Grand Rapids: Zondervan, 1987), 36, 115.
130 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (86). Wheaton, IL: Victor

Books.

60
A RELAÇÃO DOS QUE VOLTARAM A JERUSALÉM EM ESDRAS 2 E NEEMIAS 7

CLÃS FAMILIARES Esdras 2.3-60 Neemias 7.8-62 Diferença


Parós 2172 2172
Sefatias 372 372
Ará 775 652 -123
Paate-Moabe 2812 2818 +6
Elão 1254 1254
Zatu 945 845 -100
Zacai 760 760
Bani (Binui) 642 648 +6
Bebai 623 628 +5
Azgade 1222 2322 1100
Adonicão 666 667 +1
Bigvai 2056 2067 + 11
Adim 454 655 201
Ater 98 98
Besai 323 324 +1
Jora (Harife) 112 112
Hasum 223 328 105
Gibar (Gibeão) 95 95

HABITANTES DE CIDADES Esdras 2.3-60 Neemias 7.8-62 Diferença


Belém e Netofa 179 188 9
Anatote 128 128
Azmavete (Bete-Azmavete) 42 42
Quiriate-Jearim, Cefira, e
743 743
Beerote
Ramá e Geba 621 621
Micmás 122 122
Betel e Ai 223 123 -100
Nebo 52 52
Magbis 156 - -156
O outro Elão 1254 1254

61
Harim 320 320
Lod, Hadide e Ono 725 721 -4
Jericó 345 345
Senaá 3630 3930 300

SACERDOTES Esdras 2.3-60 Neemias 7.8-62 Diferença


Jedaías 973 973
Immer 1052 1052
Pasur 1247 1247
Harim 1017 1017

LEVITAS 74 74

CANTORES/ASAFE 128 148 + 20

PORTEIROS 139 138 -1

SERVOS DO TEMPLO 392 392

OS FILHOS DE DELAÍAS,
OS FILHOS DE TOBIAS, 652 642 - 10
OS FILHOS DE NECODA

TOTAL: 29.818 31.089 1271

A questão de Esdras era religiosa: quem entre o corpo dos exilados retornou
com os judeus? Em Neemias, a questão é: quem está disponível para repovoar e
revitalizar a cidade? O documento contém nove categorias.131

1. Os líderes (v. 6-7). Não sabemos quem foram estas pessoas, mas pelo
menos, as duas primeiras são bem conhecidas e importantes. Eles são Zorobabel,
chefe civil, e Jesua (ou Josué), o líder religioso que, juntos, conduziram o primeiro
grupo de exilados de Judá. Esses líderes figuram fortemente em dois dos últimos
livros do Antigo Testamento, os profetas Ageu e Zacarias. Zorobabel era da
linhagem real de Judá. Ele é descendente de 14 sucessivas gerações de sacerdotes.

2. Leigos (v. 8-38). Esta é uma lista longa e numericamente significativa,


como seria de esperar. Está dividida em duas partes. A primeira parte apresenta 18

131Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (82). Grand Rapids, MI:


BakerBooks.

62
indivíduos e seus descendentes. A segunda parte apresenta 20 cidades de onde
voltaram os exilados.

3. Sacerdotes (v. 39-42). Davi tinha organizado os sacerdotes em 24


famílias, cada uma responsável por uma escala de duas ou três semanas de dever
no templo. A lista de Neemias menciona apenas quatro dessas famílias,
presumivelmente os únicos que retornaram.

4. Levitas (v. 43). Os levitas eram os descendentes de Levi, um dos


originais 12 patriarcas. Os levitas também atuavam em escala, e seu trabalho era
ajudar os sacerdotes descendentes de Aarão. Surpreendentemente, Neemias
menciona um número muito pequeno (74), o que significa que apenas uma minoria
dos levitas havia retornado da Babilônia.

5. Cantores (v. 44). Os cantores, como os porteiros, foram retirados dentre


os levitas. A sua tarefa era ajudar na adoração no templo (cf. 2Cr 25-26).

6. Porteiros (v. 45). Os levitas, cantores e porteiros pertenciam à categoria


dos responsáveis pelo templo. Eles não são nomeados aqui, é claro, porque
estavam ente os seus descendentes.

7. Servidores do templo (v. 46-56). Servidores do templo eram


assistentes dos levitas, assim como levitas assistiam os descendentes de Aarão. Os
gibeonitas tinham sido nomeados para este papel, depois de terem enganado os
israelitas no tempo da conquista (Js 9).

8. Os filhos dos servos de Salomão (v. 57-60). Este grupo estava


intimamente ligado ao anterior, um serviço comum total para ambos os grupos.

9. Aqueles cuja ascendência era questionável (v. 61-65). Estes são


descritos em duas categorias: os leigos e aqueles que afirmavam ser sacerdotes. A
situação dos sacerdotes era mais grave por envolver questões de pureza ritual e
contaminação para todo o povo. A decisão foi tomada para excluir essas pessoas de
suas funções sacerdotais até o caso ser decidido, submetendo-o ao Urim e
Tumim.132

Os grupos enumerados em Neemias 7.8-62 totalizam 31.089, enquanto os


grupos enumerados em Esdras 2.3-60 totalizam 29.818. A diferença de 1281 é
visto em 19 dos 41 itens. Essas variações podem ser erros dos copistas, ou Esdras e

132Dois pequenos objetos usados pelos sacerdotes israelitas para consultarem a Deus a fim
de se saber qual a sua vontade sobre algum assunto (Êx 28.30; Nm 27.21; 1Sm 28.6).
Kaschel, W., & Zimmer, R. (1999). Dicionário da Bíblia de Almeida 2ª ed. Sociedade Bíblica
do Brasil. Pouco se sabe sobre o Urim e Tumim. Eles são mencionados pela primeira vez em
Êxodo como sendo mantido pelo sumo sacerdote em um “peitoral do juízo” (Êxodo 28.15-
30). Mais tarde, Moisés deu à tribo de Levi a responsabilidade especial por seus cuidados
(Dt 33.8). Após a morte de Arão e de Moisés, Eleazar deveria transportar e utilizar os
objetos para consultar o Senhor (Nm 27.18-23). Holman illustrated Bible dictionary. 2003
(C. Brand, C. Draper, A. England, S. Bond, E. R. Clendenen, T. C. Butler & B. Latta, Ed.)
(1643). Nashville, TN: Holman Bible Publishers.

63
Neemias pode ter tido razões para as diferentes figuras que não foram citadas;
portanto, hoje desconhecidas.133

A lista ilustra três pontos importantes que se aplicam a todos nós:

1. Os indivíduos são importantes para Deus.


Apesar dos nomes difíceis de serem pronunciados e de não significarem
muita coisa para nós, eles querem dizer algo para Deus. O Altíssimo conhece o Seu
povo pelo nome. Jesus, o Bom Pastor, “chama as suas ovelhas pelo nome, elas o
seguem, porque conhecem a sua voz” (Jo 10.3-4). Eu tento aprender e gravar o nome
de todas as pessoas que frequentam regularmente a igreja que pastoreio, todavia,
meu cérebro é limitado. Mas mesmo que eu esqueça, existe alguém que nunca se
esquece, o Bom Pastor!
Entretanto, certifique-se de que Jesus te conhece pelo nome! No dia do
julgamento, Ele vai dizer a alguns que clamam: “Senhor, Senhor”, que fizeram
muitas coisas em Seu nome, “Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que
praticais iniquidade” (Mt 7.23). Eles não eram verdadeiramente Suas ovelhas,
porque não O seguiam. Ele dá a vida eterna as Suas ovelhas, e elas jamais
perecerão, e ninguém pode arrebatá-las de Sua mão (Jo 10.28). Logo, certifique-se
de que você é uma de Suas ovelhas!

2. As famílias são importantes para Deus.


A lista contém muitos grupos familiares (7.8-25). Deus projetou a família
como a célula mater da sociedade. Um homem e uma mulher devem deixar as suas
próprias famílias de origem e unirem-se em uma só carne. Nesse contexto, os filhos
devem crescer nos caminhos do Senhor como revelado em Sua Palavra. A família
também é o bloco de construção da igreja local. Dizer isso não é, de forma alguma,
desvalorizar os solteiros, que são uma parte vital da família de Deus. Mas é
reconhecer que a igreja só é forte quando as famílias são fortes. Não é de se
admirar que Satanás ataque, com frequência, as famílias cristãs.

3. Os homens são importantes para Deus.


A lista é composta por homens. Isso não significa que as mulheres não sejam
importantes para Deus. A Bíblia eleva as mulheres a um status que era
desconhecido por outras religiões. Maridos são herdeiros da mesma graça de vida
(1Pe 3.7).
Mas ao mesmo tempo existe uma hierarquia de papéis na família e na igreja.
O marido é o cabeça do lar, assim como Deus é o cabeça de Cristo e Cristo é o
cabeça da igreja (1Co 11.3; Ef 5.23). Porém, só porque a esposa deve se submeter
ao marido, isso não dá o direito de agir como um tirano. Se o padrão da mulher no
casamento é elevado, o padrão do homem é ainda maior. Ele deve amar sua esposa
como Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela. Nenhuma mulher vai
ter dificuldade de se submeter a um homem que a ama assim. Se Satanás não
consegue quebrar uma família por meio do divórcio, a sua próxima tática é fazer
com que o homem se torne passivo.

133Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 7.7). Wheaton, IL: Victor Books.

64
Entretanto, o marido deve amar a sua esposa e cooperar na formação de
seus filhos. O marido jamais deve transferir tão grande responsabilidade ou
despejar todo o trabalho para sua esposa!

IV. Seu lugar na família de Deus é importante (7.4-73)


5
Então, o meu Deus me pôs no coração que ajuntasse os nobres, os
magistrados e o povo, para registrar as genealogias. Achei o livro da
genealogia dos que subiram primeiro, e nele estava escrito:

“Então, o meu Deus me pôs no coração que ajuntasse os nobres, os


magistrados e o povo, para registrar as genealogias...” (v. 5) – Neemias diz que
Deus colocou em seu coração o desejo de realizar um levantamento sobre a
genealogia do povo em Jerusalém. Como Derek Kidner coloca, “... a preocupação de
Neemias era deixar seu povo corretamente orientado, tanto da sua herança quanto
da sua vocação”.134
Como cristãos, nossa linhagem física não é tão importante quanto nossa
linhagem espiritual. Precisamos saber que nascemos espiritualmente na família de
Deus, a igreja, por meio da fé no Senhor Jesus Cristo. E, é preciso ter alguma prova
do mesmo.

“Adom e Imer, porém não puderam provar que as suas famílias e a sua
linhagem eram de Israel... “ (v. 61) – Aqueles que afirmavam ser sacerdotes e não
conseguiram encontrar qualquer registro, foram excluídos do sacerdócio (7.61-
65). Mesmo assim, um crente deve ser capaz de verificar onde Deus promete vida
eterna àqueles que creem em Cristo e dizer: “Eu coloquei a minha confiança nessa
promessa específica de Deus”. E, o crente deve ver alguma evidência de que Deus
mudou o seu coração. Antes, éramos inimigos de Deus. Agora, por Sua graça,
amamos a Deus e as coisas de Deus.
O mais lindo neste capítulo não é contar todas as pessoas que foram
registradas, mas perceber que as pessoas foram contadas, elas não foram
esquecidas. Conforme o comentarista bíblico Warren Wiersbe, é possível encontrar
no capítulo 7 algumas lições importantes.135 Vejamos:

Em primeiro lugar, Deus mantém um registro de todos os Seus servos.


Ele sabe de onde viemos, a que família pertencemos, quanto contribuímos e
o quanto fizemos por Ele. Quando estivermos diante do Senhor, teremos que
prestar contas de nossas vidas antes de receber nosso galardão (Rm 14.7-12), e
devemos apresentar um bom relatório.

Em segundo lugar, o Senhor mantém Sua obra em funcionamento.


O primeiro grupo de exilados judeus deixou a Babilônia rumo a Jerusalém
em 538 a.C. e, apesar de muitas dificuldades, reconstruíram o templo. Oitenta anos
depois, Esdras voltou com outro grupo, e quatorze anos depois, Neemias chegou e
reconstruiu os muros e portões. Durante os dias de Zorobabel, Deus levantou os

134
KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 112.
135Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (90–92). Wheaton, IL:
Victor Books.

65
profetas Ageu e Zacarias para proclamar uma mensagem ao Seu povo. Não importa
quão desanimadora seja a situação, Deus é capaz de cumprir Seus propósitos se
confiarmos Nele e fizermos a Sua vontade.

Em terceiro lugar, devemos ter certeza de que pertencemos à família


de Deus. Não importa o quanto eles argumentassem ou protestassem, os
sacerdotes sem genealogias legítimas não podiam entrar nos recintos do templo.
Deus não se impressiona com o nosso primeiro nascimento, o que Ele quer é que
experimentemos um segundo nascimento e nos tornemos Seus filhos. Se você não
estiver certo de sua genealogia espiritual, leia João 3.1-18 e 1João 5.9-13, e
certifique-se de que seu nome esteja escrito no céu (Lc 10.20).

Conclusão:
É bom aprender com exemplos piedosos, seja na Bíblia ou na história da
igreja. Mas também é importante chegar a um acordo sobre como Deus criou você.
Não despreze a si mesmo! Você ficará frustrado se começar a se comparar com
outras pessoas e com o trabalho que elas fizeram. Eu amo o pregador Charles H.
Spurgeon, mas não chego nem aos seus pés. Eu desejo aprender muito com ele,
mas eu não sou Spurgeon!
Cada um de nós é único e Deus atribuiu a cada pessoa um papel diferente a
cumprir. Em Neemias 7, alguns eram sacerdotes, outros porteiros, cantores e
funcionários do templo. Cada papel é importante para Deus. Descubra quem você é
em Cristo e comprometa-se, totalmente, a ser tudo o que Deus quer que você seja.
Jim Elliot, que deu a sua vida pela causa do Evangelho, escreveu em seu diário:
“Onde quer que você esteja, esteja todo lá. Viva ao máximo cada situação que você
acredita ser a vontade de Deus”.136 Comprometa-se com as coisas que importam
para Deus. Essa é a única maneira de fazer com que a vida realmente valha a pena!

136 ELLIOT, Elisabeth. Through gates of splendor [Spire Books], p. 19-20.

66
O poder da Palavra de Deus
[Estudo 8 – Ne 8.1-18]

Ao longo dos séculos, o povo de Deus enfrenta períodos onde a Sua Palavra
tem sido negligenciada e, como resultado, a vida espiritual se deteriora. No
entanto, em Sua graça, Deus envia tempos de refrigério. Inevitavelmente, uma das
marcas principais de tal renovação é uma ênfase na Palavra de Deus.
A Reforma Protestante (iniciada em 1517), por exemplo, teve como objetivo
precípuo uma volta às Sagradas Escrituras, a fim de reformar a Igreja que havia
caído, ao longo dos séculos, numa decadência teológica, moral e espiritual.137 O
“reavivamento” da pregação da Palavra foi um dos marcos fundamentais da
Reforma. Além disso, os Reformadores criam que se as Escrituras estivessem numa
língua acessível, todos poderiam ouvir a voz de Deus. John Wycliffe e William
Tyndale trabalharam para obter a Bíblia traduzida em inglês. Martinho Lutero
traduziu a Bíblia para o alemão. João Calvino começou a pregar sermões
expositivos, explicar e aplicar a Palavra ao povo de Genebra. A Reforma foi
construída sobre o fundamento da centralidade da Bíblia. O princípio da Sola
Scriptura (“Somente as Escrituras”) ensinava que somente a Escritura Sagrada tem
a palavra final em matéria de fé e prática.138
A Palavra de Deus é viva e eficaz. É o leite que pode nutrir a vida nova e
fortalecer a alma. É um martelo e um fogo para se livrar do pecado e bálsamo para
curar as feridas. É uma espada para derrotar o diabo e mel para o coração.139
Não é de surpreender as tantas vezes que Neemias deixou a sua colher de
pedreiro de lado para tomar o Livro da Lei. Neemias 8 nos apresenta três marcas
de uma renovação espiritual relacionada com a Palavra de Deus:

I. O Reavivamento começa com um retorno à Palavra de


Deus
“Em chegando o sétimo mês, e estando os filhos de Israel nas suas
cidades, todo o povo se ajuntou como um só homem, na praça, diante
da Porta das Águas; e disseram a Esdras, o escriba, que trouxesse o
Livro da Lei de Moisés, que o SENHOR tinha prescrito a Israel” (Ne
8.1)
É importante notar que Esdras e Neemias colocam a Palavra de Deus em
primeiro lugar na vida do povo. O Espírito de Deus usa a Palavra para limpar e
revitalizar os corações do povo de Deus.

137 COSTA, Herminsten Maia Pereira. Raízes da teologia contemporânea. São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2003, p. 80.
138 MacArthur, J. F., Jr. (1992). Rediscovering expository preaching (47). Dallas: Word

Publishing.
139 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 8.1–6). James L. Fleming.

67
1. A Palavra procurada.
“Em chegando o sétimo mês, e estando os filhos de Israel nas suas
cidades, todo o povo se ajuntou...” (v. 1) – A fase inicial dos muros foi concluída
no dia 25 de Elul, o sexto mês (6.15). No primeiro dia do sétimo mês, todos os que
viviam em áreas periféricas se reuniram como um só homem, em Jerusalém.
O sétimo mês era um momento especial no calendário judeu porque eles
celebravam a Festa das Trombetas, no primeiro dia; o Dia da Expiação, no décimo
dia; e a Festa dos Tabernáculos, do décimo quinto dia ao vigésimo primeiro dia (Lv
23.23-44).140 Era o momento perfeito para a nação se reconciliar com Deus e
começar uma nova caminhada com o Altíssimo.
As pessoas se reuniram e pediram a Esdras que trouxesse o livro
(pergaminho) da Lei de Moisés, que o Senhor tinha dado a Israel (8.1). Todos
queriam ouvir a Palavra de Deus. Aparentemente, desde a destruição de Jerusalém,
em 586 a.C., não somente os cultos do templo haviam cessado, mas parece que
tudo associado com a adoração do Senhor Deus havia sido interrompido. Agora,
depois que a cidade estava reconstruída, as pessoas ansiavam por um retorno as
suas raízes espirituais.141

“... diante da Porta das Águas...” (v. 1) – Os líderes escolheram o Portão


das Águas como local do ajuntamento. Na Bíblia, a água para lavar é uma imagem
da Palavra de Deus (João 15.3; Ef 5.26), enquanto a água para beber é uma imagem
do Espírito de Deus (João 7.37-39). Quando aplicamos a água da Palavra em nossas
vidas, então o Espírito pode trabalhar e trazer a ajuda que precisamos. É
refrescante para a alma quando você recebe a Palavra e permite que o Espírito lhe
ensine.142
Peter Deyneka Jr. conta sobre um casal cristão em viagem pela Rússia. Em
um determinado hotel, uma funcionária implorou a eles pelo Evangelho de João,
que havia sido deixado sobre a cabeceira da cama. Ela explicou que era cristã e que
a sua a Bíblia tinha sido destruída há 30 anos durante o cerco alemão de
Leningrado. O casal, alegremente, presenteou a funcionária com uma pequena
Bíblia; ela recebeu com gratidão e depois saiu rapidamente. Na manhã seguinte a
empregada encontrou o casal no corredor, e disse, “Eu tinha que vê-los. Devo
agradecer de novo o presente precioso que vocês me deram ontem. Por 30 anos
tenho orado por uma Bíblia. Ontem eu fiquei a maior parte da noite lendo”.143
Quem, de fato pode medir o valor e a bênção da Palavra de Deus?

“... e disseram a Esdras, o escriba, que trouxesse o Livro da Lei de


Moisés...” (v. 1) – Cópias da Lei de Moisés eram, provavelmente, raras. Mesmo no
Novo Testamento, Paulo instruiu Timóteo a dar atenção às reuniões da igreja “para
a leitura pública da Escritura, à exortação e ao ensino” (1Tm 4.13). Até à invenção
da impressa, no Século XV, a Bíblia tinha que ser copiada à mão, e muitas vezes só
havia uma cópia em uma cidade, muitas vezes acorrentadas aos púlpitos. Como o
número de analfabetos era assustador, a Bíblia deveria ser lida publicamente.

140 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (96). Wheaton, IL: Victor
Books.
141 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 8.1–6). James L. Fleming.
142 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (96). Wheaton, IL: Victor

Books.
143 Campbell, Nehemiah: man in charge. p. 73.

68
Nós vivemos em uma cultura onde quase todos sabem ler. Aqueles que não
sabem ou não leem bem, podem facilmente aprender. Nós temos várias traduções
da Bíblia em nossa língua. Porém, boa parte dos cristãos gasta mais tempo
brincando no computador ou sentado em frente à TV, do que lendo e estudando a
Palavra de Deus.
Para o bem da sua alma, quero desafiá-lo a ler e reler a Bíblia todos os dias
de sua vida. Se você quer uma renovação espiritual, ela virá por meio da Palavra de
Deus. No Salmo 119, nove vezes o autor menciona como a Palavra de Deus traz
avivamento (Salmo 119.25, 50, 93, 107, 149, 154, 156). Para uma renovação
espiritual, o povo de Deus deve ler a Sua Palavra.

2. A palavra proclamada.
“Edras, o sacerdote, trouxe a Lei perante a congregação, tanto de
homens como de mulheres e de todos os que eram capazes de entender
o que ouviam. Era o primeiro dia do sétimo mês” (v. 2)

Embora essa seja a primeira vez que o nome de Esdras aparece no livro de
Neemias, há um livro inteiro que leva o seu nome. A Bíblia diz que “Ele era escriba
versado na Lei de Moisés, dada pelo SENHOR, Deus de Israel; e, segundo a boa mão do
SENHOR, seu Deus, que estava sobre ele, o rei lhe concedeu tudo quanto lhe pedira”
(Ed 7.6).
Não obstante, o coração de Esdras nos é revelado em seu livro, “... Esdras
tinha disposto o coração para buscar a Lei do SENHOR, e para a cumprir, e para
ensinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos” (Ed 7.10). Ele não só queria
conhecer o que a Lei ensinava, mas o mais importante, ele queria obedecê-la!
Esdras voltou a Jerusalém em 458 a.C., um total de 14 anos antes de
Neemias. Seu principal objetivo era ensinar a Lei de Deus aos judeus. Quando
Esdras chegou a Jerusalém, as condições morais e espirituais do povo eram
deploráveis. Não havia templo, sacerdócio, sacrifícios e cultos.
Quatorze anos depois, em 444 a.C., Neemias chegou a Jerusalém e desafiou o
povo a confiar em Deus e reconstruir os muros. E com a renovação da esperança
veio um desejo sincero de ouvir o livro da Lei de Moisés.
Que momento emocionante deve ter sido para Esdras quando este grupo se
aproximou dele e, em essência, disseram, “Nós queremos ouvir a Palavra. Vá, pegue
o livro da Lei para compartilhá-lo conosco!” Uma das maiores alegrias de qualquer
líder é ouvir o povo de Deus pedir para ouvir a Palavra.144

144 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 8.1–6). James L. Fleming.

69
3. A Palavra explicada.
“E leu no livro, diante da praça, que está fronteira à Porta das Águas,
desde a alva até ao meio-dia, perante homens e mulheres e os que
podiam entender; e todo o povo tinha os ouvidos atentos ao Livro da
Lei. Esdras, o escriba, estava num púlpito de madeira, que fizeram
para aquele fim; estavam em pé junto a ele, à sua direita, Matitias,
Sema, Anaías, Urias, Hilquias e Maaseias; e à sua esquerda, Pedaías,
Misael, Malquias, Hasum, Hasbadana, Zacarias e Mesulão” (v. 3 e 4).

As pessoas estavam atentas e reverentes, enquanto a Palavra de Deus era


lida por Esdras. O versículo 3 menciona sua atenção e os versículos 5 e 6 mostram
a reverência. Eles se levantaram, como se cumprimentassem um visitante real, e
prostraram-se em adoração.
Quando Esdras levantou o pergaminho e desenrolou-o para a passagem que
ele iria ler, as pessoas que estavam sentadas na praça honraram a Palavra de Deus,
e ficaram em pé. Eles sabiam que não seria um mero homem que iria compartilhar
de suas próprias ideias; eles estavam prestes a ouvir a Palavra de Deus (1Ts 2.13.).
As pessoas permaneceram de pé, enquanto a Lei era lida e explicada (v. 7). Esdras
começou a sua leitura e ensino no início da manhã e se estendeu até o meio-dia (v.
3), significa que a congregação levantou-se e ouviu por cinco ou seis horas, e isso
continuou por uma semana (v. 18). Sem dúvida, de tempos em tempos, ele permitia
que as pessoas descansassem, mas as pessoas estavam lá para ouvir Deus falar e
estavam dispostos a ficar em pé e ouvir.145
Rowland Hill foi um pregador inglês do Século XVIII, grandemente usado
por Deus. Pouco antes de sua morte, ele estava conversando com um velho amigo,
que lhe disse que ele ainda podia se lembrar do texto e parte de um sermão que
tinha ouvido de Hill há 65 anos antes. Hill perguntou-lhe o que ele se lembrava. O
amigo declarou que Hill havia dito que algumas pessoas, quando escutam um
sermão, não gostam da entrega do pregador. Então continuou: “Imagine que você
tenha sido convidado para ouvir a leitura de um testamento de um parente seu, e
você espera que ele tenha deixado alguma coisa para você. Você dificilmente
pensaria em criticar a forma como o advogado iria ler o testamento. Em vez disso,
você teria toda a atenção para ouvir se alguma coisa foi deixada para você e, se
assim for, quanto. Esta deve ser a maneira de ouvir a pregação do evangelho”.146
Renovação espiritual acontece quando ouvimos com reverência a Palavra
de Deus enquanto ela é lida e pregada.

145 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (93). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
146 Charles Spurgeon. Lectures to my students [Zondervan], p. 391-392)

70
II. O Reavivamento inflama com a compreensão da
Palavra de Deus
“E Jesua, Bani, Serebias, Jamim, Acube, Sabetai, Hodias, Maaseias,
Quelita, Azarias, Jozabade, Hanã, Pelaías e os levitas ensinavam o
povo na Lei; e o povo estava no seu lugar. Leram no livro, na Lei de
Deus, claramente, dando explicações, de maneira que entendessem o
que se lia” (v. 7 e 8).

Os versículos 7 e 8 declaram que alguns homens estavam ao lado de Esdras


para explicar a Lei ao povo. O objetivo deles era ajudar a todo o povo de Deus a
entender a Palavra. Aqueles que estavam lá e ouviram a Palavra experimentaram
as mesmas dificuldades que enfrentamos algumas vezes. “O que Deus está
dizendo?” “O que Deus quer que eu faça?”

“Leram no livro, na Lei de Deus, claramente, dando explicações...” (v. 8) –


É possível que algumas pessoas, no meio da multidão, não soubessem hebraico.
Então, é provável que os líderes falassem em aramaico. Mesmo que este não seja o
caso, tudo indica que eles estavam traduzindo as Escrituras em terminologia
compreensível para que o povo pudesse entender.
Grande parte da Bíblia é clara para qualquer um que consiga ler. Todavia,
como a conhecida declaração de Mark Twain, não são as porções da Bíblia que ele
não podia entender que o incomodava. Mas as partes que ele entendia é que o
perturbavam! Mas há algumas seções na Escritura que são difíceis de entender; e
por isso Deus tem dado pastores e mestres para ajudar as pessoas a entender e
aplicar a Sua Palavra em suas vidas. Além disso, somos abençoados com muitas
excelentes ferramentas de estudo para nos auxiliarem a aprender a Palavra de
Deus.
Para aplicar corretamente a Bíblia, você deve interpretá-la corretamente.
Para interpretar corretamente, você deve entender o que o autor quis dizer para as
pessoas a quem ele estava escrevendo, no contexto da época. Além disso, desde
que a Bíblia se encaixe como um todo unificado, você deve obter um entendimento
de tudo o que a Bíblia ensina sobre um assunto, por comparar a Escritura com a
Escritura, interpretar a Bíblia por si mesma.
Calvino sustentava que a Escritura é a melhor intérprete de si mesma. 147 A
sua posição é a de que o pregador deve se limitar ao que foi revelado: “... Que esta
seja a nossa regra sacra: não procurar saber nada mais senão o que a Escritura nos
ensina. Onde o Senhor fecha seus próprios lábios, que nós igualmente impeçamos
nossas mentes de avançar sequer um passo a mais.”148 Ele defendia que o principal
encargo do ministro é pregar a Palavra de Deus. Ou seja, “... a tarefa dos mestres
consiste em preservar e propagar as sãs doutrinas para que a pureza da religião
permaneça na Igreja”.149 Mais a frente ele diz: “A Igreja de Deus será educada pela
pregação autêntica de sua Palavra e não pelas invenções dos homens [as quais soa
madeira, feno e palha]”.150

147 CALVINO, João. Romanos, São Paulo: Edições Paracletos, 1997, p. 430-432.
148 CALVINO, João. Romanos, p. 330.
149 CALVINO, João. 1Coríntios. São Paulo: Edições Paracletos, 1996, p. 377.
150 CALVINO, João. 1Coríntios. São Bernardo do Campo, SP: Edições Paracletos, 2003.

71
Calvino recebeu o título de o “príncipe dos expositores”.151 Até mesmo um
dos mais conhecidos opositores das doutrinas de Calvino, Jacobs Arminius,
reconheceu a excelência dos seus comentários e chegou a recomendá-los: “Depois
da leitura das Escrituras eu recomendo a leitura dos Comentários de Calvino... Pois
afirmo que na interpretação das Escrituras, Calvino é incomparável, e que seus
Comentários são mais valiosos do que qualquer coisa que nos tenha sido legado
nos escritos dos pais.”152
Lutero explicava e frisava a lição do dia, enquanto Calvino falava de todo um
livro da Bíblia, dia após dia, passagem por passagem. Mas se hoje quisermos usar a
capa deixada pelos reformadores, não precisamos seguir servilmente seus
métodos. “Tal como eles tentaram interpretar a Palavra escrita em padrões de
pensamento da sua própria época, também nós temos que apresentar a verdade de
Deus em formas que apelem ao povo dos nossos dias.”153 Martyn Lloyd-Jones
escreveu que “... a tarefa da pregação é relacionar o ensino das Escrituras com
aquilo que está acontecendo em nossos próprios dias”.154
As palavras de John Stott certamente são oportunas neste momento: “... o
ideal no sermão é que a Palavra de Deus fale, ou melhor, Deus fale através de sua
Palavra... O pregador fica mais satisfeito quando sua pessoa é eclipsada pela luz
que brilha da Escritura, e quando sua voz é superada pela voz de Deus.”155
Mesmo os apóstolos, que foram ensinados diretamente por Cristo, tiveram
que dedicar-se à oração e ao ministério da Palavra (At 6.4). Se eles tiveram que se
dedicar à tarefa da pregação, quem somos nós!
Mas os que são ensinados também devem estar comprometidos com a
Palavra. Na igreja, isso significa que aqueles que não são chamados para ensinar
assumem outras tarefas ministeriais necessárias para que aqueles que ensinam
possam estudar e se preparar. Em outras palavras, deve haver uma divisão do
trabalho de acordo com os dons espirituais.
Isso é muito claro em Neemias 8. Até agora, Neemias estava na vanguarda.
Ele era um administrador talentoso que poderia organizar e mobilizar as pessoas
para conseguir a restauração dos muros. Mas quando chegou a hora de ensinar a
Palavra, ele deu lugar a Esdras, que era hábil na Lei de Moisés, que tinha preparado
o seu coração para estudá-la, praticá-la e ensiná-la (Ed 7.6, 10). Estes dois homens
ilustram plenamente o princípio do ministério de equipe. Assim, para renovação
espiritual, o povo de Deus deve ler e ouvir, reverentemente, a Sua Palavra quando
esta é ensinada.

151 MURRAY, John. Calvin as theologian and expositor. Carlisle, Pennsylvania, The Banner of

Truth Trust, Collected Writings of John Murray, Vol. I, 1976, p. 306.


152 Carta escrita a Sebastian Egbertsz, publicada em 1704. Vd. F.F. BRUCE, The history of

New Testament study. In: I.H. MARSHALL, ed. New Testament interpretation; essays on
principles and method, p. 33. A. Mitchell HUNTER, The teaching of Calvin: a modern
interpretation, p. 20; P. SCHAFF, History of the christian church, Vol. VIII, p. 280.
153 BLACKWOOD, Andrew Watterson, A preparação de sermões. Rio de Janeiro: Editora

Juerp e Aste, 1981, p. 80.


154 LLOYD-JONES, Martyn. Pregação & pregadores. São Paulo: Editora Fiel, 2001, p. 29.
155 STOTT, John. O perfil do pregador. São Paulo: Editora Sepal. 1989, p. 37.

72
III. Para uma renovação espiritual, o povo de Deus deve
responder a Sua Palavra
“Neemias, que era o governador, e Esdras, sacerdote e escriba, e os
levitas que ensinavam todo o povo lhe disseram: Este dia é consagrado
ao SENHOR, vosso Deus, pelo que não pranteeis, nem choreis. Porque
todo o povo chorava, ouvindo as palavras da Lei” (v. 9).

É espiritualmente perigoso estudar a Palavra sem o objetivo de uma


resposta obediente. Conhecimento sem a obediência leva a orgulho (1Co 8.1).
Nosso objetivo deve ser, sempre, transformar nossas vidas pela Escritura. Existem
três respostas aqui:

1. Arrependimento.
“Porque todo o povo chorava, ouvindo as palavras da Lei” (v. 9) – O povo
chorou quando eles ouviram e entenderam a Palavra de Deus (8.9). Esta é a mesma
palavra usada para descrever o luto diante da morte de um ente querido. Essas
pessoas estavam experimentando a mesma profundidade do luto pela sua
incapacidade de viver de acordo com os caminhos de Deus.156
Além disso, normalmente, quando pensamos em choro, automaticamente
pensamos no derramamento de muitas lágrimas. No entanto, quando as pessoas do
Oriente Médio estavam tristes, eles expressavam com gritos de lamento. Tal é o
caso aqui. Com o coração quebrado por causa das relações rompidas com Deus, às
leis e os mandamentos quebrados, essas pessoas estavam experimentando o
verdadeiro arrependimento.
Quando o apóstolo Pedro se dirigiu aos judeus, na festa de pentecoste,
disse-lhes que desejava falar sobre o homem chamado Jesus. Então, em Atos 2.36,
Pedro continua a dizer: “... a este Jesus, que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e
Cristo” (At 2.36). Agora, quando a multidão ouviu esta mensagem, compungiu-se-
lhes os corações. Eles perguntaram a Pedro o que deveriam fazer. Eles perceberam
que tinham feito! Eles perceberam que Deus enviou o seu Messias, mas O haviam
crucificado. O que eles deveriam fazer?
As palavras de Pedro foram: “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado
em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do
Espírito Santo” (At 2.38).
Arrependam-se, arrependam-se! Quando ouvimos a Palavra de Deus,
sempre temos a mesma necessidade, e isso é para se arrepender, para transformar
nossas vidas de volta ao que Deus quer e voltar para onde Deus nos quer.

2. Alegria.
“... não vos entristeçais, porque a alegria do SENHOR é a vossa força” (v.
10) – Que belas palavras de incentivo! A alegria de Deus é uma cobertura protetora
para o filho de Deus. A alegria de saber que Deus perdoou todos os nossos pecados
e que somos o seu povo, deve preencher nossos corações.
O que eles deveriam fazer? Deus lhes disse o que fazer: “... comer, beber,
enviar porções e a regozijar-se grandemente, porque tinham entendido as palavras

156 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 8.9). James L. Fleming.

73
que lhes foram explicadas” (v. 11). Em outras palavras, todas essas delícias que
adoramos comer, eles deveriam comer! Preparem o jantar de Ação de Graças e
chamem a família, e celebrem o amor de Deus.
O que o escritor está dizendo aqui é que se você está em um lugar de perigo,
Deus tem um abrigo para você na hora da tempestade. E que o abrigo é a alegria do
Senhor. Esta alegria não é a alegria de assistir a um filme engraçado, mas a alegria
de saber que o seu futuro está nas mãos do Senhor.
O efeito inicial era de que as pessoas estivessem condenadas e angustiadas
sobre sua incapacidade de manter a Lei de Deus. Mas com a ajuda dos levitas,
Neemias convenceu as pessoas da misericórdia e do perdão de Deus.
Consequentemente, um profundo sentimento de alegria permeou o povo de Deus.
Com grande alegria, eles celebraram a Festa dos Tabernáculos.

3. Obediência.
As pessoas que ouviram a leitura da Lei entenderam que deveriam observar
a Festa dos Tabernáculos (v. 16). Os israelitas não tinham celebrado uma Festa
como esta desde o tempo de Josué (8.17)! Novamente, nota-se que a sua
obediência resultou em grande regozijo.
A Festa dos Tabernáculos era um festival de colheita, mas era para ser feita
de forma que pudesse lembrar as pessoas dos dias de sua peregrinação no deserto.
Era uma festa de sete dias, começando no dia quinze do mês. Neste ponto, eles
ainda tiveram duas semanas para se preparar para ela. Eles deveriam recolher
gravetos e fazer abrigos temporários fora ou sobre os telhados de suas casas. As
cabanas serviriam para lembrá-los dos quarenta anos de caminhada pelo deserto,
e a maneira como Deus os levou para uma terra que mana leite e mel.157 Ao
celebrarem a festa, eles deveriam lembrar que foi Deus quem os tinha sustentado e
abençoado abundantemente.
O resultado? Jerusalém não era apenas uma cidade com muros restaurados,
era uma cidade povoada por pessoas com um novo espírito e uma nova
determinação de viver à luz da Palavra de Deus!158

Conclusão:
A última parte do versículo 17 diz: “... E houve mui grande alegria entre o
povo de Deus”. Por quê? Porque eles se voltaram para a Palavra de Deus, eles se
arrependeram de seus pecados, eles adoraram a Deus, eles obedeceram, e o
reavivamento eclodiu entre eles.159
Algumas pessoas vêm à igreja com reverência a Deus e Sua Palavra,
dizendo: “Deus, me ensine! Eu quero aprender mais de Ti!” Eles estão prontos para
responder à Palavra. Eles aproveitam o ensino. Outros vêm para o mesmo culto
com o coração cheio de pecado e não desejam tratá-los. Eles estão desligados

157 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (95). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
158 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible

Studies (74). Nashville, TN: W Publishing Group.


159 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 8.13–18). James L. Fleming.

74
diante da mesma mensagem que ajuda aos outros a crescerem. Se você quer uma
renovação espiritual, verifique seu coração. Ela acontece quando nossos corações
estão sensíveis e reverentes a Palavra de Deus, quando esta é lida e proclamada
com fidelidade.
Conta-se a história sobre um pai que teve que fazer uma viagem até a cidade
para comprar provisões para sua família. Antes de sair em viagem, ele disse a seu
filho para limpar o canal que conduzia água ao poço da casa.
O filho começou a fazer a tarefa todos os dias, mas depois ficou cansativo
para ele; assim, ele parou de ir ao canal e limpar os detritos que se acumulavam lá.
No dia seguinte, a mãe percebeu que a água já não estava fluindo de maneira
correta em casa.
Quando o pai chegou de viagem, uma das primeiras coisas que a mãe lhe
disse foi que a água já não estava fluindo corretamente. O pai chamou o filho e
perguntou se ele havia limpado o canal que conduzia água ao poço a cada dia. O
filho confessou que havia deixado de fazer a tarefa. Juntos, pai e filho foram até o
canal e limparam os escombros. Mais uma vez a água da montanha fluiu
perfeitamente até a cisterna da casa.
Assim é a nossa vida. Às vezes permitimos que os detritos se acumulem em
nosso relacionamento com o nosso Deus. Precisamos limpar os escombros para
que as águas vivificantes de Deus possam fornecer o alimento espiritual a sua
necessidade!
Depois de estudar Neemias 8, quais são os seus desejos pessoais para o
crescimento e reavivamento?

75
Nosso grande Deus
[Estudo 9 – Ne 9.1-37]

Em Neemias 8, as pessoas ouviram a Palavra de Deus e choraram em


arrependimento, reconhecendo quão seriamente eles e seus antepassados tinham
pecado contra Deus. Porém, aquele era um momento de festa e, assim, Neemias e
os outros líderes exortaram as pessoas a não chorar, mas, se alegrarem,
acrescentando que “a alegria do Senhor é a nossa força” (8.10). Agora, dois dias
depois da Festa dos Tabernáculos, o povo se reúne novamente, desta vez, em
jejum, com pano de saco e terra sobre a cabeça. Uma demonstração externa de uma
profunda lamentação e peso no coração pela própria iniquidade. O povo estava
arrependido!
Mais uma vez, a Lei do Senhor foi lida por várias horas, e em seguida, os
levitas, talvez liderados por Esdras, fizeram uma grande oração de confissão de
pecados. Juntamente com Esdras 9 e Daniel 9, esta é uma das grandes orações de
arrependimento e confissão da Bíblia. Esta oração é cheia de instruções sobre
quem é Deus, quem somos, e como Deus tem graciosamente trabalhado em favor
do Seu povo.
O capítulo 9 traz três lições simples, mas importantes:

I. Nós somos propensos a pecar


“No dia vinte e quatro deste mês, se ajuntaram os filhos de Israel com
jejum e pano de saco e traziam terra sobre si. Os da linhagem de Israel
se apartaram de todos os estranhos, puseram-se em pé e fizeram
confissão dos seus pecados e das iniquidades de seus pais.
Levantando-se no seu lugar, leram no Livro da Lei do SENHOR, seu
Deus, uma quarta parte do dia; em outra quarta parte dele fizeram
confissão e adoraram o SENHOR, seu Deus” (Ne 9.1-3)

“No dia vinte e quatro deste mês, se ajuntaram os filhos de Israel...” (v. 1)
– Quando o povo se reuniu na porta das Águas era o primeiro dia do mês, quando
se juntaram para ouvir a Lei do Senhor durante toda a manhã, possivelmente por
cinco horas de duração. No segundo dia, os chefes de família retornaram, e
descobriram em seu estudo nos livros da Lei de Deus que não estavam mantendo a
Festa dos Tabernáculos - a Festa da Colheita. Então, no dia quinze do mês, eles
celebraram a Festa dos Tabernáculos – uma festa que durava sete dias. E no oitavo
dia realizaram uma assembleia solene. Mas agora, no vigésimo quarto dia, depois
da alegria da Festa dos Tabernáculos, o povo começou a chorar e a lamentar.
Durante um quarto do dia (v. 3), eles ouviram a leitura das Escrituras, e por mais
três horas adoraram e confessaram seus pecados a Deus.
Na maioria das igrejas, hoje, seis horas de culto, com três horas de pregação
e três horas de oração, provavelmente resultaria em alguns pedidos de demissão

76
do Pastor, mas para o povo judeu, aquele dia era o começo de uma nova vida para
eles e sua cidade.160

“Os da linhagem de Israel se apartaram de todos os estranhos, puseram-


se em pé e fizeram confissão dos seus pecados e das iniquidades de seus pais”
(v. 2) – Finalmente, eles colocaram em prática as palavras de Esdras. As pessoas se
separaram do mundo enquanto se aproximavam do Senhor (Ne 9.2; Ed 6.21). Uma
separação sem devoção ao Senhor torna-se isolamento, mas a devoção sem
separação é hipocrisia (ver 2Co 6.14-7.1). A nação de Israel foi escolhida por Deus
para viver separado das nações pagãs ao seu redor (Lv 20.26). O apóstolo Pedro
aplicou estas palavras para os crentes na igreja de hoje (1Pe 1.15; 2.9-10).
Esse chamado para se divorciarem de suas esposas de origem pagã era
necessário, porque o que havia sido feito sob a liderança de Esdras, 14 anos antes
(Ed 10), só havia alcançado um êxito parcial. Muitos tinham se esquivado do
divórcio e permanecido com suas mulheres pagãs. Talvez novos transgressores
também tivessem surgido, e estivessem sendo confrontados pela primeira vez. Os
esforços de Neemias para eliminar esse tipo de mistura maligna foram bem-
sucedidos.

“Levantando-se no seu lugar, leram no Livro da Lei do SENHOR, seu


Deus, uma quarta parte do dia...” (v. 3) – Eles leram por mais de três horas a
respeito dos pecados de seus pais e, por mais de três horas confessaram a sua
participação em obras más, semelhantes (v. 2). A Bíblia desnuda a verdadeira
condição de nossos corações diante de Deus. “... A palavra de Deus é viva, e eficaz, e
mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de
dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e
propósitos do coração. E não há criatura que não seja manifesta na sua presença;
pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem
temos de prestar contas” (Hb 4.12-13).
João Calvino abre o Livro I, de suas Institutas, tratando acerca do
“Conhecimento de Deus”. Para ele, quando temos qualquer conhecimento de Deus,
conseguimos ver quem realmente somos:

É notório que o homem jamais chega ao puro conhecimento de si


mesmo até que haja antes contemplado a face de Deus, e da visão
dele desça a examinar-se a si próprio. Ora, sendo-nos o orgulho a
todos ingênito, sempre a nós mesmos nos parecemos justos, e
íntegros, e sábios, e santos, a menos que, em virtude de provas
evidentes, sejamos convencidos de nossa injustiça, indignidade,
insipiência e depravação. Não somos, porém, assim convencidos,
se atentamos apenas para nós mesmos e não também para o
Senhor, que é o único parâmetro pelo qual se deve aferir este
juízo.161

Assim, temos que ler este capítulo e perceber que estamos olhando no
espelho. Ele descreve a propensão do nosso coração!

160 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (107). Wheaton, IL:
Victor Books.
161 CALVINO, João. As institutas da religião cristã. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006, p.

48.

77
“... em outra quarta parte dele fizeram confissão e adoraram o SENHOR,
seu Deus” (v. 3) – No vigésimo quarto dia do mesmo mês, três semanas e meia
mais tarde, um dia nacional de arrependimento foi realizado.162 O povo também
teve tempo para confessar os seus pecados (v. 2-3) e buscar o perdão do Senhor. O
Dia anual da Expiação havia passado, mas os adoradores sabiam que precisavam
de uma purificação e renovação do Senhor.
Oito levitas se levantaram e expressaram seu sofrimento espiritual. Um
segundo grupo de oito levitas conduziu uma oração responsiva de louvor.
Aparentemente, todos eles recitaram a oração em uníssono, por isso deve ter sido
escrita antes. Tendo em vista que a linguagem é semelhante à oração em Esdras 9,
é bem provável que, o grande escriba e sacerdote seja o autor da oração (9.3-4).163
As pessoas não só reconheceram o seu pecado individual, mas também
entenderam que eles faziam parte de um povo ou nação e, portanto, também eram
coletivamente culpados (v. 2).
Este é o oposto do que algumas pessoas fazem hoje. Quando os judeus dos
dias de Neemias confessaram os pecados de seus pais, eles reconheceram a própria
culpa pelos pecados de seus pais. Hoje, se as pessoas se referem aos pecados de
seus pais, eles se desculpam, em vez de assumirem qualquer responsabilidade. Eles
culpam seus erros em seus temperamentos ou pela maneira como foram
educados.164
Há um paradoxo na vida cristã: quanto mais você anda com Deus, mais você
fica ciente da depravação terrível de seu próprio coração. Não foi no início da vida
cristã de Paulo, mas justamente no fim que ele disse, “... Cristo Jesus veio ao mundo
para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal” (1Tm 1.15). Ele não disse,
“entre os quais eu costumava ser o maior de todos”, mas em vez disso, “Eu sou o
maior de todos”. Quanto mais Paulo andava com Deus e contemplava Sua justiça
perfeita, mais ele estava consciente de seu próprio pecado, ainda que em sua
caminhada diária ele estivesse crescendo em santidade. Assim, quanto mais você
conhece a Deus e seu próprio coração, através de Sua Palavra, mais você vai
perceber o quão propenso ao pecado você realmente é.
Em uma ocasião, o grande reformador Martinho Lutero estava muito
deprimido. Não desejava levantar-se a despeito dos apelos da família e amigos.
Finalmente, sua esposa, Katie, colocou um vestido preto, parecendo uma viúva, em
luto. Quando Lutero percebeu, perguntou-lhe quem havia morrido. Ela respondeu
que Deus, no céu, deve ter morrido, a julgar pelo comportamento de Lutero. Sua
depressão foi embora de imediato, ele sorriu e beijou a sua sábia esposa.
Você pode estar deprimido hoje - talvez devido ao seu pecado ou talvez
devido a algumas outras circunstâncias difíceis, como no caso de Lutero. Apenas
lembre-se, não importa o quão quebrado você esteja, o caminho de volta ao nosso
soberano Senhor, suficiente e gracioso, está sempre aberto. Ele convida você a
voltar para Ele.

162 Packer, J. I. (1995). A passion for faithfulness: wisdom from the book of Nehemiah.
Wheaton, IL: Crossway Books.
163 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey Series (Ne 9.1–4). Joplin,

MO: College Press.


164 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (100). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

78
II. Deus é tão rico em misericórdia
“Os levitas Jesua, Cadmiel, Bani, Hasabneias, Serebias, Hodias,
Sebanias e Petaías disseram: Levantai-vos, bendizei ao SENHOR, vosso
Deus, de eternidade em eternidade. Então, se disse: Bendito seja o
nome da tua glória, que ultrapassa todo bendizer e louvor. Só tu és
SENHOR, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra
e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e tu os
preservas a todos com vida, e o exército dos céus te adora. Tu és o
SENHOR, o Deus que elegeste Abrão, e o tiraste de Ur dos caldeus, e
lhe puseste por nome Abraão” (Ne 9.5-7)

Neemias 9 é composto por uma grande oração de confissão feita pelos


levitas (v. 5-38). Mas é também uma oração que conduz os pensamentos dos
ouvintes à bondade e ao poder de Deus, e os prepara para um último apelo por
misericórdia em sua condição angustiante.165
A oração dos levitas é uma das mais longas na Bíblia. Ela começa com uma
confissão da grandeza de Deus, Seu poder na criação, Sua aliança com Abraão e a
terra prometida a Israel.166 Porém, a abundante misericórdia de Deus é o tema
dominante nesta oração.
Os levitas começam a oração exaltando a Deus (9.5), e então prosseguem
onde a Bíblia inicia, com Deus como o Criador onipotente de tudo, que dá vida a
todos os seres vivos. Todos os anjos curvam-se diante dEle (9.6). Deus escolheu
Abrão, tirou-o de Ur dos caldeus, e lhe deu o nome de Abraão (9.7, a única
Referência do Antigo Testamento fora de Gênesis). Deus fez uma aliança com
Abraão para lhe dar, e aos seus descendentes, a terra de Canaã (9.8). Deus
entregou o Seu povo à escravidão no Egito e os libertou e os guardou durante a
caminhada no deserto (9.9-15).

1. A obra de Deus na criação (v. 5-6).


“Só tu és SENHOR, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra
e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e tu os preservas a todos com
vida, e o exército dos céus te adora” (v. 6). Os levitas estavam mais próximos da
Escritura do que muitos estudiosos contemporâneos. Hoje, os capítulos iniciais do
livro de Gênesis são um campo de batalha para as teorias da origem: evolução,
evolução teísta, a teoria do intervalo, criacionismo de seis dias e criacionismo
progressivo. Essas teorias devem ser tratadas em seu devido lugar e no momento
adequado. Mas elas não são o que Gênesis 1 e 2 são. Esses capítulos tratam da
natureza de Deus, o seu poder e bondade e sobre o que o homem deve a Deus como
seu Criador.167 Neemias 9.5-6 reflete essa perspectiva.
Conta-se a história de um rabino, chamado Joshua bem Hananiah, que
recebeu a visita de um imperador. Este pediu que lhe fosse permitido ver o Deus de
Joshua. O rabino lhe disse que era impossível; resposta que não satisfez o

165 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (100). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
166 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament Survey Series (Ne 9.5–15). Joplin,

MO: College Press.


167 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (101). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

79
imperador. Então, o rabino levou o imperador para fora e pediu-lhe que olhasse
diretamente para o sol do meio-dia. – Impossível! – respondeu o imperador.
- Se você não consegue olhar para o sol que Deus criou – respondeu o rabino
– muito menos poderá ver a glória do próprio Deus!168

2. Uma revisão da história de Israel (v. 7-31).


A segunda parte da oração é uma revisão da história de Israel. Séculos
antes, Moisés havia alertado aos hebreus para não se esquecerem de Deus (Dt 8).
Infelizmente, a nação não agradeceu a Deus em tempos de bênção; contudo, eles
eram rápidos para buscá-Lo em tempos de sofrimento (Sl 105-106). Esse padrão
trágico é visto em todas as fases da história de Israel.

3. Formando a nação (Ne 9.7-18).


Deus graciosamente escolheu Abraão e o tirou de uma terra idólatra,
chamada Ur dos caldeus (Js 24.2-3). Em seguida, Deus mudou seu nome de Abrão
(“pai exaltado”) para Abraão (“pai de muitos”), porque Deus havia prometido fazer
dele uma grande nação (Gn 12.1-3; 17.1-8). Embora Abraão tivesse lapsos
ocasionais de fé, por um século ele confiou no Senhor e andou em obediência a Sua
vontade. Sua fé obediente foi especialmente evidente quando ele teve coragem de
atender a voz de Deus e entregar o próprio filho, Isaque, para ser sacrificado (Gn
22; Hb 11.17-19).
O próximo parágrafo reconta os acontecimentos do Êxodo de forma breve
(v. 9-12) e, novamente, Deus é o sujeito de cada ação: (1) “Viste a aflição de nossos
pais no Egito”, (2) “e lhes ouviste o clamor junto ao mar Vermelho”, (3) “Fizeste
sinais e milagres contra Faraó e seus servos”, (4) “porque soubeste que os trataram
com soberba”, (5) “e, assim, adquiriste renome, como hoje se vê”, (6) “Dividiste o
mar perante eles”, (7) “lançaste os seus perseguidores nas profundezas”, (8)
“Guiaste-os, de dia, por uma coluna de nuvem e, de noite, por uma coluna de fogo”.
Além disso, estas declarações revelam, também, os atributos de Deus. Elas
mostram que ele é onisciente (“Viste a aflição de nossos pais”), todo-poderoso
(“Fizeste sinais e milagres contra Faraó e seus servos”), justo (“lançaste os seus
perseguidores nas profundezas”), e misericordioso, tendo em vista que, esse é um
relato de libertação.169
Entretanto, em Neemias 9.16-18, os levitas nos mostram como a nação
respondeu a tudo o que Deus tinha feito por eles: eles se recusaram a ceder à
autoridade dele (“endureceram a cerviz”), a escutar a Sua Palavra (“não deram
ouvidos”), ou obedecer à Sua vontade. Em Cades-Barnéia, eles tentaram tomar o
assunto em suas próprias mãos e nomear um novo líder para levá-los de volta ao
Egito (v. 17; Nm 14.1-5). Quando Moisés estava no monte com Deus, as pessoas
fizeram e adoraram um ídolo (Ne 9.18; Êx 32). Moisés intercedeu pelo povo, e Deus
graciosamente os perdoou.

168 MCGRATH, Alister. Teologia para amadores. São Paulo: Editora Mundo Cristão, 2008, p.
12.
169Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (102). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.

80
Como essas pessoas deram as costas para Deus, depois de tudo o que Ele
havia feito por Eles? Não é essa também a nossa reação diante da graça de Deus,
muitas vezes?

4. Levando a nação (Ne 9.19-26).


Durante os quarenta anos de disciplina de Israel no deserto, a velha geração
morreu e uma nova geração nasceu, mas Deus nunca abandonou seu povo. Ele os
conduziu por uma nuvem e uma coluna de fogo, ensinou-lhes a Palavra, forneceu-
lhes as necessidades, e deu-lhes a vitória sobre seus inimigos. Deus sempre cumpre
Suas promessas e Seus propósitos.
Todavia, os judeus se esqueceram dos feitos gloriosos que Deus tinha em
mente para a nação. Se tivessem meditado sobre as promessas e propósitos do
Altíssimo (Gn 12.1-3; Êx 19.1-8), não teriam vontade de voltar ao Egito ou se
misturar com as nações ímpias ao seu redor.170 Israel era um povo que tinha
muitos privilégios, mas não aceitava a vontade de Deus plenamente para suas
vidas.

5. Corrigindo a nação (Ne 9.27-31).


Deus prometeu multiplicar o seu povo, e Ele manteve sua promessa (Gn
22.17). Também prometeu dar-lhes uma boa terra, e Ele cumpriu essa promessa
(Gn 13.14-18; 17.7-8). Era uma “terra fértil”, e Israel tornou-se “pessoas gordas”
(nutridas, satisfeitas, v. 25), e isso levou a sua queda (Dt 32.15). As advertências de
Moisés foram ignoradas (Dt 8). Israel se encantava com a grande bondade de Deus,
mas eles não se deliciavam no Senhor. Como o filho pródigo (Lc 15.11-24), eles
queriam as riquezas do Pai, mas não a vontade do Pai.171
Uma vez na terra, Israel desfrutou de paz durante os dias de Josué e os
anciãos que haviam servido com ele, mas quando esses líderes piedosos morreram,
a nova geração se afastou do Senhor (Jd 6-15). Deus os disciplinou, de modo que
gritaram por socorro, e Deus levantou libertadores para resgatá-los. Em seguida,
eles andavam nos caminhos de Deus, mas logo voltavam ao pecado, e o ciclo se
repetia. O livro de Juízes registra a triste história de como Deus disciplinava o Seu
povo em sua própria terra, permitindo que seus vizinhos pagãos os dominassem.
Os pecados de Israel, finalmente tornaram-se tão repugnantes a Deus que
Ele decidiu discipliná-los longe de sua terra. Ele usou os Assírios para destruir o
Reino do Norte, e então levantou os babilônios para levar o Reino do Sul cativo,
(Judá) e para destruir Jerusalém e o templo.
A disciplina de Deus é prova do Seu amor (Hb 12.1-11). No entanto, ao lado
dessa cacofonia de vozes rebeldes, Deus continuou a falar calmamente e mostrar
Sua misericórdia. No verso 31 está registrado: “Mas, pela tua grande misericórdia,
não acabaste com eles nem os desamparaste; porque tu és Deus clemente e
misericordioso” (Ne 9.31).
Agora, depois de tudo o que vimos até aqui, o melhor é saber que Deus
estava sempre lá. Ele trabalhou na história, Ele é o Senhor da História. O relato de
Neemias 9, não foi meramente um ajuntamento de nomes, datas, fatos e lugares,

170 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (112–113). Wheaton, IL:
Victor Books.
171 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (113). Wheaton, IL:

Victor Books.

81
como uma aula de História, mas os atos graciosos de Deus na história que estavam
sendo contados.172

III. O Arrependimento deve marcar nossa vida


“Agora, pois, ó Deus nosso, ó Deus grande, poderoso e temível, que
guardas a aliança e a misericórdia, não menosprezes toda a aflição que
nos sobreveio, a nós, aos nossos reis, aos nossos príncipes, aos nossos
sacerdotes, aos nossos profetas, aos nossos pais e a todo o teu povo,
desde os dias dos reis da Assíria até ao dia de hoje. Porque tu és justo
em tudo quanto tem vindo sobre nós; pois tu fielmente procedeste, e
nós, perversamente” (Ne 9.32-33).

Deus foi bom para com o Seu povo quando eles não foram bons para com
Deus. Ele, pacientemente, enviou-lhes profetas para ensiná-los e exortá-los, mas a
nação se recusou a ouvi-Lo (2Cr 36.14-21). Ele foi misericordioso ao perdoá-los
quando eles clamavam por socorro, e Ele foi longânimo quando eles,
repetidamente, se rebelaram contra a Sua Palavra (Êx 32.10; Nm 14.11-12);
entretanto, Ele misericordiosamente os poupou. Em Sua misericórdia, Deus não
nos dá o que merecemos, e na sua graça, Ele nos dá o que não merecemos.173

“Porque tu és justo em tudo quanto tem vindo sobre nós; pois tu


fielmente procedeste, e nós, perversamente...” (v. 33) – O verdadeiro
arrependimento aceita a responsabilidade para o pecado e não culpa a Deus. Note
que os levitas usaram o pronome “nós” e não “eles”. Enquanto oravam, eles se
identificaram com a nação e reconheceram sua própria culpa. Neemias orou da
mesma forma no início do livro (1.6-7).

“Eis que hoje somos servos; e até na terra que deste a nossos pais, para
comerem o seu fruto e o seu bem, eis que somos servos nela” (v. 36) – Os levitas
reconheceram a grandeza e a bondade de Deus, e agora, com base na sua graça,
pediram-lhe um novo começo para a nação. Eles não poderiam mudar a servidão
em que estavam, mas poderiam entregar-se a um Mestre maior e buscar a Sua
ajuda.
Israel merecia tudo o que tinha experimentado. Assim, naquele momento,
mesmo que estivessem vivendo na terra que Deus havia prometido a seus pais,
viviam como escravos uma nação estrangeira. Os impostos persas consumiam
grandes porções de seus produtos de origem agrícola, inclusive gados (9.32-37).174
Sendo escravos, eles tinham que pagar impostos para a Pérsia. A oração dos levitas
termina com uma confissão melancólica de sua grande angústia.175

172 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 9.1–38). James L. Fleming.
173 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (115). Wheaton, IL:
Victor Books.
174 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 9.32–37).

Joplin, MO: College Press.


175 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The bible knowledge

commentary: an exposition of the scriptures (Ne 9.32–37). Wheaton, IL: Victor Books.

82
“Por causa de tudo isso, estabelecemos aliança fiel e o escrevemos; e
selaram-na os nossos príncipes, os nossos levitas e os nossos sacerdotes” (v.
38) – Os líderes civis, religiosos (levitas e sacerdotes), e todas as demais pessoas
concordaram em colocar os seus selos num acordo por escrito de que eles iriam
obedecer às prescrições da Lei de Moisés (cf. v 29). A lista começa com Neemias,
que mais uma vez foi um excelente exemplo para o povo (Ne 10.1).

Diante de tudo isso, o que precisamos fazer?176 A resposta é claramente


indicado em 2Crônicas: “Se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e
orar, e me buscar, e se converter dos seus maus caminhos, então, eu ouvirei dos céus,
perdoarei os seus pecados e sararei a sua terra” (2Cr 7.14).

Precisamos nos humilhar. Por natureza, não somos humildes. É somente


quando estamos diante de Deus que reconhecemos quem somos, de fato, criaturas
pecadoras e rebeldes.

Devemos orar. Nós, naturalmente, não oramos. Por quê? Porque


acreditamos que somos autossuficientes. É por isso que Deus, muitas vezes, tem de
nos levar ao fundo do poço. São nas profundezas da vida, quando tudo está
desmoronando ao nosso redor, que estamos dispostos a voltar para Deus e clamar
por socorro.

Devemos buscar a face de Deus. Buscar a face de Deus significa buscar o


Seu favor e não o favor do mundo, e buscar Sua vontade e não a nossa. Buscar a
face de Deus significa uma mudança radical no uso de nosso tempo, talentos,
recursos e estilo de vida.

Devemos retornar dos nossos maus caminhos. Nada é mais difícil do que
se arrepender. Se arrepender é andar na contramão de nossa natureza
pecaminosa, mas é necessário para a felicidade pessoal e a bênção de Deus. A
promessa é que, se nos arrependermos dos nossos pecados, então Deus ouvirá do
céu (Ele nunca tapa os ouvidos ao arrependido), perdoará nossos pecados (o
quanto precisamos dele), e sarará a nossa terra.

176Boice, J. M. (2005). Nehemiah: An expositional commentary (104). Grand Rapids, MI:


BakerBooks.

83
Conclusão:
O comentarista bíblico John MacArthur estava certo quando escreveu:

A igreja hoje é frequentemente culpada de fornecer aos crentes


uma armadura de papel de bons conselhos, programas, atividades,
técnicas e métodos, quando o que eles precisam é a armadura
divina de uma vida santa. Nenhum programa, método ou técnica
pode trazer plenitude e felicidade para o crente que não esteja
disposto a enfrentar e abandonar o seu pecado.177

O ponto central de Neemias 9 não são os muros, os inimigos de Deus, um


grande líder, nem mesmo o povo de Deus. O ponto central é o próprio Deus. A
leitura pública da Palavra de Deus (Neemias 8), quebrantou os corações dos
construtores cansados dos muros. O resultado foi que os ouvintes lembraram-se da
grandeza de Deus e da sua própria incapacidade de viver de forma adequada para
a Sua glória.
Por que Deus permitiu que essa história fosse registrada novamente? Por
que precisamos ler e ouvir a história do povo de Israel e sua rebeldia diante do
Senhor? Do estudo de Neemias 9 podemos ganhar coragem por saber que Deus
está ativo na história.178 Além disso, outra importante lição é nos lembrar de que
servimos a um Deus amoroso, que sempre esteve lá e sempre estará lá.
Precisamos ser lembrados de que há um Deus amoroso e gracioso que cuida de
nossa vida.
O comentarista bíblico JC Ryle conta a história de uma mãe cuja filha fugiu e
viveu uma vida de pecado. Por algum tempo, ninguém sabia onde ela estava, mas
finalmente ela retornou para casa e voltou-se para Cristo, em arrependimento.
Alguém perguntou a mãe o que ela tinha feito para trazer a filha de volta, e ela
respondeu: “Eu orei por ela dia e noite”. Mas isso não foi tudo. Ela também disse
que sempre deixou a porta da frente destrancada, mesmo à noite. Ela não queria
que a filha, ao voltar para casa no meio da noite, encontrasse a porta trancada.
Quando a menina voltou e tentou abrir a porta, encontrou-a aberta e entrou, para
nunca mais sair.
Essa porta é uma bela imagem do coração de Deus para com os pecadores.
Ela está aberta para você, se você voltar para Ele (1Jo 1.9).

177 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible
studies (92–93). Nashville, TN: W Publishing Group.
178
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 120.

84
O preço do avivamento
[Estudo 10 – Ne 10.1-39]

Um pastor estava ensinando sobre como estudar a Bíblia. Ele mostrou como
encontrar as promessas e os mandamentos nas Escrituras. Finalmente, revisou e
perguntou: “Agora, o que você faz com os mandamentos?” Uma senhora levantou a
mão e disse: “Eu os sublinho com caneta azul”.
Sublinhar os mandamentos da Bíblia, em azul, pode deixar a Bíblia colorida,
mas os mandamentos existem para serem obedecidos. Infelizmente, algumas
pessoas possuem muitas informações acerca da Bíblia, mas não obedecem ao que a
Bíblia ordena. Esse é, sem dúvida alguma, um dos grandes problemas da igreja
contemporânea, pouco conhecimento e pouca obediência.
O falecido pastor Presbiteriano James M. Boice, em seu comentário sobre
Neemias, disse que algo que sempre o intrigou era o fato de que dificilmente as
pessoas mudam de comportamento depois de anos de terapia ou aconselhamento
com especialistas. Certa vez, ele perguntou a um amigo psicólogo, “Por que há tão
pouca mudança através da terapia?” O amigo respondeu: “É porque as pessoas
realmente não querem mudar. As mudanças não ocorrem, a menos que você
queira”.179
Em Neemias 8, vimos o início de um avivamento quando o povo de Deus se
reuniu para ouvir a Sua Palavra lida e explicada. No capítulo 9, o povo se
arrependeu e confessou seus pecados. Agora, no capítulo 10, eles fazem um pacto
para colocar a verdade de Deus em prática em várias áreas específicas. O texto
revela cinco áreas onde o povo estava decidido a aplicar, de forma pessoal, à
verdade de Deus.

I. Aplicação pessoal da verdade de Deus deve começar


com a liderança
“1 Os que selaram foram: Neemias, o governador, filho de Hacalias, e
Zedequias, 2 Seraías, Azarias, Jeremias, 3 Pasur, Amarias, Malquias,
4 Hatus, Sebanias, Maluque, 5 Harim, Meremote, Obadias, 6 Daniel,
Ginetom, Baruque, 7 Mesulão, Abias, Miamim, 8 Maazias, Bilgai,
Semaías; estes eram os sacerdotes”.

A lista começa com Neemias e Zedequias, que era, provavelmente, seu


assistente. Neemias deu o exemplo, colocando seu nome no topo da lista. Em
seguida, assinaram o pacto 21 sacerdotes e os chefes das famílias sacerdotais
(10.2-8). O nome de Esdras não está aqui, porque o cabeça de seu lar era Seraías
(10.2; Ed 7.1). Em seguida, vêm os nomes dos 17 chefes das famílias dos levitas
(10.9-13), seguido por 44 chefes das famílias mais importantes (10.14-27).180

179 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (106). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
180 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 9.38–10.27).

Joplin, MO: College Press.

85
Alguns destes nomes são idênticos aos da lista de Esdras 2 e Neemias 7. Outros
representam famílias novas que se dividiram no tempo de Zorobabel, ou recém-
chegados da Babilônia.
A desobediência traz, inevitavelmente, o castigo; e os judeus sentiam que já
tinham sofrido bastante. Agora querem a bênção de Deus. Seu primeiro
compromisso, portanto, foi com a sua Palavra.181 Primeiramente, eles se
comprometeram em submeter-se à Palavra de Deus e separar-se de seus vizinhos
pagãos. Mas o pacto incluiu, também, questões envolvendo o templo (v. 32-39).
Leis para todas as ofertas de forma a não “negligenciar a casa de Deus” (v. 39).182
Neemias foi o primeiro a colocar o seu selo sobre o documento. Cyril Barber
estava certo quando disse que, “Ele dá um passo e oferece exemplo para que os
demais o sigam”.183 Os líderes colocaram seus nomes na linha pontilhada e
comprometeram-se a fazer o que eles esperavam que os seus liderados fizessem.
Certa mãe, que mentia sobre a idade do filho só para não pagar de forma
integral a passagem de ônibus, foi reprender o menino por não dizer a verdade.
“Johnny”, ela disse com firmeza: “você sabe o que acontece com meninos que
dizem mentiras?” “Sim”, respondeu o menino, “eles viajam pagando a metade da
passagem”. Ele, obviamente, tinha aprendido com a liderança de sua mãe!
O exemplo de contar as chamadas “mentiras brancas”, quando,
aparentemente, não teremos nenhuma vantagem ao dizer a verdade, pode levar
nossos filhos a aprender rapidamente! Pregar uma mensagem e viver de forma
diferente é hipocrisia.
A mudança na vida do povo de Deus começa na liderança. O povo segue os
seus líderes. Na verdade, o povo é como um espelho que reflete sua liderança.

II. Aplicação pessoal da verdade de Deus começa com uma


santidade baseada na compreensão
“28 O resto do povo, os sacerdotes, os levitas, os porteiros, os
cantores, os servidores do templo e todos os que se tinham separado
dos povos de outras terras para a Lei de Deus, suas mulheres, seus
filhos e suas filhas, todos os que tinham saber e entendimento,
29 firmemente aderiram a seus irmãos; seus nobres convieram, numa
imprecação e num juramento, de que andariam na Lei de Deus, que foi
dada por intermédio de Moisés, servo de Deus, de que guardariam e
cumpririam todos os mandamentos do SENHOR, nosso Deus, e os seus
juízos e os seus estatutos;”

Após a assinatura do documento, o próximo passo na renovação da aliança


foi a cerimônia de juramento. As pessoas se uniram aos seus líderes, tomando
sobre si “uma maldição e um juramento” de acordo com a Lei de Deus. O não
cumprimento dos termos do pacto iria, automaticamente, acionar a “maldição”,
que estipulava penalidades para desobediência (Dt 27.15-26 e 28.15-68). Ou seja,

181
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 125.
182 MacArthur, J. (2001). Nehemiah: experiencing the good hand of God. MacArthur Bible

studies (96). Nashville, TN: W Publishing Group.


183
BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 124.

86
os judeus estavam se comprometendo a viver sob a autoridade da Lei de Moisés
que Deus havia dado a eles.
Ao referir-se à Lei como “Lei de Deus”, dada por meio de Moisés, eles
estavam afirmando que acreditavam na plena inspiração e autoridade dos Escritos
de Moisés como Palavra de Deus. Porque ela é a Palavra de Deus, não a palavra de
Moisés; eles eram obrigados a obedecer a tudo.
Se a Bíblia é a Palavra de Deus, então nós não podemos obedecer apenas às
partes que gostamos e rejeitar o que não gostamos. O conhecimento das Escrituras
deve produzir uma transformação em nossa vida.
John Bunyan, o autor do best-seller “O Peregrino”, disse, com inteireza:
“Somente quando a Palavra for verdadeiramente guardada em nosso coração é que
seremos capazes de declarar sua verdade aos outros com autoridade e graça”.
O mais prestigiado centro de estudos islâmicos do mundo é a Universidade
Al-Azhar, na cidade do Cairo, Egito. A universidade conta com trinta mil alunos.
Porém, o que chama mais atenção é o pré-requisito para estudar lá, ou seja, a
capacidade de recitar o Alcorão de cor. O alcorão tem 114 capítulos e cerca de 78
mil palavras.184

“... e todos os que se tinham separado dos povos de outras terras para a
Lei de Deus...” (v. 28) – Além disso, observe que as pessoas deste pacto “tinham se
separado dos povos de outras terras”. O ensino da separação precisa ser enfatizado
em nossos dias. Todavia, em algumas situações o povo de Deus se separa de tal
modo do mundo, que se isola daqueles que foram chamados a evangelizar.
No entanto, parece que os cristãos têm oscilado ao outro extremo, onde não
existe uma diferença significativa entre a maneira como vivem e a maneira como o
mundo vive.
O equilíbrio que precisamos manter é o de estarmos no mundo, mas não
sermos do mundo (Jo 17.14-17). Devemos viver no mundo para influenciar
costumes culturais (Mt 5.13-16). Mas temos que ser distintos porque devemos
obedecer à Palavra de Deus (Jo 17.14, 17; Ne 10.28). Esse conhecimento nos faz
diferentes do mundo em termos de nossos relacionamentos, metas e valores.

III. Aplicação pessoal da verdade de Deus deve se


estender ao lar
30 de que não dariam as suas filhas aos povos da terra, nem tomariam
as filhas deles para os seus filhos;

As pessoas tinham se comprometido a guardar toda a Lei, de acordo com os


versículos 28 e 29. Mas uma promessa geral, sem detalhes, não significa muito. Em
seguida, eles expressaram suas intenções em uma série de compromissos
específicos.
O povo concordou em não casarem os filhos com os povos de outras terras.
Deus advertiu Israel desse perigo quando estavam prestes a entrarem na terra de

DIETZ, Wilhelm, Holy war, New York, Macmillan, 1984, p. 108 e 109. apud. LARSEN, L.
184

David, Anatomia da pregação. São Paulo: Editora Vida, 1999, p. 14.

87
Canaã (Dt 7.3-4). Embora existam muitos casos em que Deus, graciosamente,
utiliza uma pessoa para levar o cônjuge incrédulo à salvação, essas situações não
podem justificar a desobediência à ordem clara de Deus para não entrar em um
jugo desigual com os incrédulos (2Co 6.14). Esdras tinha lidado com este problema
alguns anos antes (Ed 10), e Neemias teria de lidar com esse problema novamente
no final do período de seu serviço em Jerusalém (Ne 13).
Essa decisão de não se envolver com outros povos não era um preconceito
étnico, uma vez que o povo judeu sempre teve alguns indivíduos de outros povos.
Moisés se casou com uma etíope. Raabe de Jericó, e Rute, a moabita, foram
incluídas ao povo de Israel. A preocupação não era racial, mas religiosa (Êxodo
34.12-16).185 Casamento misto é um caminho muito tênue que pode levar o povo
de Deus para longe dos caminhos do Senhor.
Quando os crentes se afastam dos caminhos de Deus, mais cedo ou mais
tarde vão se juntar com pessoas erradas. E Satanás usa pessoas erradas para levá-
lo ainda mais para longe do Senhor. O Apóstolo Paulo escreveu: “Não vos enganeis:
as más conversações corrompem os bons costumes...” (1Co 15.33). Se você deseja ser
um homem ou uma mulher segundo o coração de Deus, então você não pode
fomentar amizades com aqueles que se opõem a Deus e as pessoas de Deus.
A tentação de casamentos mistos tem sido uma armadilha permanente que
Satanás tem usado por séculos contra o povo de Deus. Se você é solteiro, não se
case com um incrédulo! Além disso, cuidado com crentes nominais que afirmam
conhecer a Cristo, mas que não sejam comprometidos em viver em obediência a
Ele. O apóstolo Paulo sabia disso. Nas palavras que ecoam a preocupação do povo
judeu sob Neemias, ele escreveu: “Não vos ponhais em jugo desigual com os
incrédulos; porquanto que sociedade pode haver entre a justiça e a iniquidade? Ou
que comunhão, da luz com as trevas? Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou que
união, do crente com o incrédulo?” (2Co 6.14-15; 7.1).
Assim, a aplicação pessoal da verdade espiritual deve começar com a
liderança. Ela começa com a santidade pessoal, baseada em submissão à Palavra de
Deus, e estende-se ao lar.

IV. Aplicação pessoal da verdade de Deus deve se


estender ao nosso trabalho
31 de que, trazendo os povos da terra no dia de sábado qualquer
mercadoria e qualquer cereal para venderem, nada comprariam deles
no sábado, nem no dia santificado; e de que, no ano sétimo, abririam
mão da colheita e de toda e qualquer cobrança.

O próximo compromisso firmado pelo povo foi a decisão de guardar o


sábado, abster-se de toda atividade comercial e observar o ano sabático da terra,
um tempo onde os campos não seriam cultivados. A exigência tem precedentes em
Deus desde a criação, que descansou no sétimo dia e também nos Dez
Mandamentos, que diz: “Lembra-te do dia de sábado, para o santificar” (Êx 20.8).
Mesmo tendo em conta o fato de que a Lei sobre o sábado era um dos Dez
Mandamentos, ela foi negligenciada pelos israelitas. No tempo de Neemias, os

Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (108–109). Grand Rapids, MI:


185

BakerBooks.

88
judeus lidavam com o sábado como qualquer outro dia. O versículo 31 indica que a
venda de bens e alimentos no sábado se tornou uma prática comum: “trazendo os
povos da terra no dia de sábado qualquer mercadoria e qualquer cereal para
venderem, nada comprariam deles no sábado” (v. 31). Mas agora, eles estavam
destinados a transformar o sábado em um dia de descanso dedicado ao Senhor.
É importante saber que a palavra “shabbath”, traduzida por sábado, em
Êxodo 20, significa, literalmente, “descanso”. Essa informação é importante, pois
mostra que os cristãos que guardam o domingo não descumprem o mandamento.
Nós continuamos descansando um dia, depois de seis trabalhados. O Shabbath
seria um dia que marca o fim da semana e a cessação do seu trabalho.186
Embora existam opiniões diferentes sobre se os cristãos devem guardar ou
não o sábado, a Bíblia diz que não estamos mais debaixo da Lei (Rm 6.14). Assim, o
domingo não é o sábado cristão, com uma lista de coisas que podemos ou não
podemos fazer (Rm 14.5; Gl 4.10; Cl 2.16-17). Entretanto, ao mesmo tempo há
princípio nas Leis do sábado no Antigo Testamento que podemos e devemos
aplicar hoje.
Murray afirma corretamente que “... o Shabbath... não deve ser definido em
termos de cessação das atividades, mas cessação do tipo de atividade que fazia
parte do trabalho nos outros seis dias”.187 Domingo é também um bom dia para
investir tempo com outros crentes, e tempo com o Senhor durante os horários que
estávamos ocupados durante a semana, no trabalho.
Conforme a Confissão de Fé de Westminster, “Deus designou
particularmente um dia em sete para ser um sábado (descanso) santificado por
Ele; desde o princípio do mundo, até a ressurreição de Cristo, esse dia foi o último
da semana; e desde a ressurreição de Cristo foi mudado para o primeiro dia da
semana, dia que na Escritura é chamado Domingo, ou dia do Senhor, e que há de
continuar até ao fim do mundo como o sábado cristão”. Ref. Êx 20.8-11; Gn 2.3; 1Co
16.1-2; At 20.7; Ap 1.10; Mt 5.17-18. (Capítulo XXI, Do Culto Religioso e do
Domingo, Seção VII).

1. Jesus é o Senhor do Sábado.


Quando nos voltamos para o Novo Testamento, de forma especial para os
Evangelhos, percebemos que o foco da instituição do sábado dentro do judaísmo é
muito evidente. Assim, é possível compreender que diante de tanta ênfase algo
novo foi acrescentado ao sábado. No Antigo Testamento, o sábado era um dia de
descanso e não de adoração.188 Com o surgimento da sinagoga, Israel teve a
oportunidade de reunir-se nas sinagogas no dia de sábado. No entanto, mesmo
tendo Jesus observado o sábado, Ele declarou ser o cumprimento do sábado. Isso
não quer dizer que Ele não obedeceria ao mandamento do sábado, significa que, de
fato, Ele representa e cumpre esse mandamento, porque é o Senhor do sábado.
Ao ser questionado pelos fariseus, quando os discípulos foram acusados de
quebrar o sábado porque haviam colhido espigas, Jesus declarou: “Mas, se vós
soubésseis o que significa: Misericórdia quero e não holocaustos, não teríeis

186 CARSON, D. A. (organizador), Do Shabbath para o dia do Senhor. São Paulo: Editora
Cultura Cristã, 2006, p. 23.
187 MURRAY, John. Principles of conduct (Grand Rapids: Eerdmans, 1957), p. 33.
188 MOHLER Jr. R. Albert. Palavras do fogo. Como ouvir a voz de Deus nos Dez Mandamentos.

São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010, p. 68.

89
condenado inocentes. Porque o Filho do Homem é senhor do sábado” (Mt 12.7-8).
Jesus honrou e reconheceu o sábado, mas ainda o mais importante, Ele identificou-
se como o Senhor do sábado.
Mais adiante os fariseus, tentando apanhar Jesus na quebra do sábado,
questionaram se era lícito curar no sábado. Observe o que aconteceu: “Tendo Jesus
partido dali, entrou na sinagoga deles. Achava-se ali um homem que tinha uma das
mãos ressequida; e eles, então, com o intuito de acusá-lo, perguntaram a Jesus: É
lícito curar no sábado? Ao que lhes respondeu: Qual dentre vós será o homem que,
tendo uma ovelha, e, num sábado, esta cair numa cova, não fará todo o esforço,
tirando-a dali? Ora, quanto mais vale um homem que uma ovelha? Logo, é lícito, nos
sábados, fazer o bem. Então, disse ao homem: Estende a mão. Estendeu-a, e ela ficou
sã como a outra. Retirando-se, porém, os fariseus, conspiravam contra ele, sobre
como lhe tirariam a vida” (Mt 12.9-14).
Para os fariseus, o sábado havia se tornado uma imposição e uma mera
instituição. Contudo, somente Deus tem o direito de definir o sábado e Ele o faz,
definitivamente, em Cristo.189 Perceba que os fariseus estavam dispostos a tirar a
vida do Senhor Jesus e assim quebrar o sexto mandamento “não matarás” (Êx
20.13), simplesmente porque entendiam que Jesus não cumpria o quarto
mandamento.

2. O Sábado foi substituído pelo domingo da ressurreição.


Ao analisar a vida da igreja no Novo Testamento, não encontramos um
padrão sabatino. Em vez disso, encontramos a celebração do Dia do Senhor. Em
Atos, encontramos os fiéis reunidos no primeiro dia da semana, em plena conexão
com a ressurreição do Senhor Jesus (At 20.7).
Quando Paulo instruiu os coríntios a contribuir para a coleta dos santos na
Judéia, no primeiro dia da semana, pressupõe que o domingo era o dia em que eles
se reuniam (1Co 16.2). Paulo, em sua carta aos Colossenses, instruiu aos seus
leitores dizendo que a observância do sábado não era necessária (Cl 2.16). Inácio,
bispo de Antioquia, escreveu no início do segundo século que o Dia do Senhor deve
ser observado no lugar do sábado (Ign. Magn. 9.1).190
É interessante observar que a estratégia missionária de Paulo era entrar nas
sinagogas no sábado e pregar sobre Cristo aos judeus. Todavia, a igreja se reunia
no Dia do Senhor, no primeiro dia da semana.
Além do mais, cada um dos Evangelhos enfatiza a tradição que Jesus
ressuscitou no primeiro dia da semana. Essa ênfase, provavelmente, reflete a
prática litúrgica. Esta associação é especialmente clara em Lucas, onde a história
de Emaús liga o primeiro dia da semana a ressurreição de Jesus e o partir do pão
(Lc 24.13-35).
A frase “Dia do Senhor” ocorre apenas uma vez no Novo Testamento, em
Apocalipse 1.10. Uma frase similar aparece também na obra Didache (“ensino”, em
grego), escrita no final do primeiro século, provavelmente na Síria. Os leitores
deste trabalho são instruídos a se reunir no dia do Senhor para partir do pão e dar
graças (Did. 14.1).

189
MOHLER Jr. R. Albert. Palavras do fogo. Como ouvir a voz de Deus nos Dez Mandamentos.
São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010, p. 70.
190 Achtemeier, P. J., & Society of Biblical Literature. (1985). Harper’s Bible dictionary (1st

ed.) (574–575). San Francisco: Harper & Row.

90
3. O Propósito do Dia do Senhor.
O propósito do Dia do Senhor é o mesmo do sábado do Antigo Testamento?
A resposta é não! No Novo Testamento, o Dia do Senhor é principalmente sobre
adoração, sobre a pregação da Palavra, sobre a Ceia do Senhor, onde a comunhão
dos santos aponta para uma refeição que ainda está por vir. O Dia do Senhor
aponta não apenas para o passado, para a ressurreição do Senhor Jesus Cristo, mas
também aponta para frente, escatologicamente, para aquele descanso que vamos
desfrutar quando estivermos na presença do Senhor e não houver mais nenhum
trabalho.191 “Portanto, resta um repouso para o povo de Deus. Porque aquele que
entrou no descanso de Deus, também ele mesmo descansou de suas obras, como Deus
das suas” (Hb 4.9-10).
No céu, não haverá evangelismo, missões ou obras de caridade. Tudo vai ser
perfeito. Todos ficarão bem! Todos os olhos estarão secos e cada lágrima será
enxugada.

4. O Dia do Senhor não é uma imposição.


O domingo (Dia do Senhor) deve ser um dia específico para um fim
específico (Is 58.1). A questão principal é o que devemos fazer em vez do que não
devemos fazer no dia do Senhor.
Há coisas que não devemos fazer no Dia do Senhor? Certamente. Qualquer
coisa que venha a prejudicar nossa adoração não deve ser feita. Tudo o que possa
roubar do Dia do Senhor a prioridade da adoração, não deve ser feita.192 Nesse dia,
devemos nos envolver em atividades de adoração, ensino e aprendizado das
Escrituras.
Para os cristãos, este dia não é um dia de regras humanas (Cl 2.16) para
alcançar a salvação (Gl 4.9-10). Pelo contrário, é o Dia do Senhor (Ap 1.10), o dia
para celebrar a ressurreição (Jo 20.1, 19) e da vinda do Espírito Santo (At 2.1). É
um tempo de renovação (Êx 20.8-11), bênção (Mt 12.9-14) e alegria (Is 58.13).
Logo, os cristãos não estão sob as Leis específicas do sábado do Antigo
Testamento (Gl 4.10). Mas nos foi dado um novo dia, o “Dia do Senhor”, para
desfrutar. É um dia de culto alegre e vivo. Mas será que realmente apreciamos
como tal? Será que realmente o utilizamos o domingo para o culto e testemunho
cristão? Ou apenas fingimos fazê-lo, ao passar alguns momentos formais na igreja e
o restante assistindo futebol ou simplesmente descansando?193

191 MOHLER Jr. R. Albert. Palavras do fogo. Como ouvir a voz de Deus nos Dez Mandamentos.
São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010, p. 74.
192
MOHLER Jr. R. Albert. Palavras do fogo. Como ouvir a voz de Deus nos Dez Mandamentos.
São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010, p. 76.
193 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (111). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

91
Algumas considerações sobre o domingo:

1. Jesus Cristo ressuscitou no primeiro dia da semana (Jo 20.1).


2. Jesus, após a ressurreição, apareceu aos discípulos no primeiro dia da
semana (Jo 20.19, 20);
3. A descida do Espírito Santo no dia de pentecostes aconteceu no primeiro
dia da semana (At 2.1);
4. Os discípulos partiram o pão no primeiro dia da semana (At 20.7);
5. A evidência em Corinto sugere que a igreja se reunia no primeiro dia da
semana (1Co 16.2);
6. Jesus apareceu para João, na ilha de Patmos, no primeiro dia da semana
(Ap 1.10).
7. Os apóstolos não permitiram que os cristãos gentios fossem obrigados a
viver de acordo com costumes judaicos (Cl 2.16-17, At 15.20, Rm 14.5-
6);
8. O início do quarto mandamento encontra o seu propósito e realização
em Cristo (Hb 4.1-16);
9. A ausência de uma ordem explícita para os escravos e cristãos mestres
para observar o sábado (Ef 6.5-9, Cl 3.22-4.1, 1Tm 6.2, 1Pe 2.18), sugere
que o Novo Testamento não exigia uma observação de um domingo
cerimonial (ou sábado).

“... e de que, no ano sétimo, abririam mão da colheita e de toda e


qualquer cobrança” (v. 31) – Além do sábado, o povo assumiu o compromisso
solene de também observar o Ano Sabático (Lv 25.1-7, 20-22; Dt 15.1-11). A cada
sétimo ano, os judeus precisavam deixar a terra descansando para que ela pudesse
se restaurar, um excelente princípio da ecologia.194 Depois de sete anos sabáticos,
eles deveriam celebrar o quinquagésimo ano como o “Ano do Jubileu” (Lv 25.8).
Nesse ano a terra não era cultivada; todas as terras vendidas ou confiscadas eram
devolvidas aos seus donos anteriores; e todos os escravos eram libertados (Lv
25.8-55; 27.16-25).
A nação não tinha fielmente celebrado estas observâncias especiais
sabáticas. Esta foi uma das razões por que Deus os enviou ao cativeiro (2Cr 36.21),
para que pudessem dar a terra 70 anos de descanso (Jr 29.10).

194 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (123). Wheaton, IL:
Victor Books.

92
V. Aplicação pessoal da verdade de Deus deve se estender
ao nosso compromisso com a igreja
“32 Também sobre nós pusemos preceitos, impondo-nos cada ano a
terça parte de um siclo para o serviço da casa do nosso Deus, 33 e para
os pães da proposição, e para a contínua oferta de manjares, e para o
contínuo holocausto dos sábados e das Festas da Lua Nova, e para as
festas fixas, e para as coisas sagradas, e para as ofertas pelo pecado, e
para fazer expiação por Israel, e para toda a obra da casa do nosso
Deus”.

A maior parte do compromisso do povo, no capítulo 10, se refere às


responsabilidades financeiras do templo e do sistema sacrificial. Os versículos de
32 a 39 mostram a renovação e preocupação do povo em adorar ao Deus
verdadeiro através do templo, sacrifícios e ofertas. Esses versos mencionam uma
série de compromissos específicos para fornecer ao culto do templo, resumida por
“e, assim, não desampararíamos a casa do nosso Deus” (10.39). A frase “a casa do
nosso Deus” ocorre nove vezes nestes versos.

1. O imposto do templo (v. 32-33).


“Também sobre nós pusemos preceitos, impondo-nos cada ano a terça
parte de um siclo para o serviço da casa do nosso Deus” (v. 32) – A primeira
responsabilidade mencionada é o imposto do templo. Este imposto era destinado
aos itens necessários para as ofertas em momentos diferentes no templo. Os
judeus concordaram em reinstituir esse imposto do templo.
Especificamente, as pessoas concordaram em pagar o imposto do templo de
um terço de um siclo, anualmente.195 Em Êxodo 30.11-16, era a metade de um siclo.
Alguns dizem que o siclo babilônico e o hebraico tinham diferentes avaliações, o
que pode ser verdade. Outros dizem que o imposto em Êxodo era cobrado apenas
no ano do censo, um imposto anual. Outros, como John MacArthur, afirmam que o
valor foi reduzido, tendo em conta aqui a pobreza das pessoas. Qualquer que seja a
solução, as pessoas concordaram em assistir às necessidades da casa de Deus.

2. A oferta da lenha (v. 34)


“Nós, os sacerdotes, os levitas e o povo deitamos sortes acerca da oferta
da lenha que se havia de trazer à casa do nosso Deus” (v. 34) – A segunda
responsabilidade era fornecer madeira para os sacrifícios do templo.
O povo não havia se contentado apenas com o pagamento do imposto do
templo. Eles reconheceram que o serviço do templo necessitava de outras coisas
que eles também poderiam fornecer, especificamente madeira para o grande altar,
e as primícias das suas colheitas e árvores.

195O siclo era a unidade básica de peso. Além do siclo regular, houve um siclo “real” (2Sm
14.26). O siclo tem sido estimado em (11,4 gramas). O siclo é usado nas Escrituras quase
exclusivamente em contextos que lidam com valor monetário. Se a prata, o ouro, a cevada,
ou farinha, a avaliação da mercadoria atribui um valor relativo a siclo na economia. As
exceções a isto são a armadura e lança de Golias (1Sm 17.5-7), que são descritos em termos
do seu peso - siclo. Elwell, W. A., & Comfort, P. W. (2001). Tyndale Bible dictionary. Tyndale
reference library (1299). Wheaton, IL: Tyndale House Publishers.

93
O fogo no altar de bronze deveria ser mantido aceso constantemente (Lv
6.12-13), sendo necessária uma fonte constante de madeira.

“os levitas e o povo deitamos sortes acerca da oferta da lenha...” (v. 34) –
Os líderes sorteavam e atribuíam às famílias o tempo em que deveriam levar a
madeira até o altar. Nem todo mundo em Israel era um sacerdote ou levita. Alguns
poderiam doar cordeiros ou bois para sacrifícios, mas todo mundo poderia levar
um pouco de madeira e ajudar a manter o fogo aceso.196
Eles prometeram fornecer a madeira necessária para o templo. Da mesma
forma, organizações sem fins lucrativos precisam de doações de alimentos e
roupas. Podemos oferecer nossa experiência em determinadas áreas.197 E, o mais
importante, podemos contribuir com nosso tempo.

3. As primícias.
“E que também traríamos as primícias da nossa terra e todas as
primícias de todas as árvores frutíferas...” (v. 35) – A terceira responsabilidade
foi renovar a oferta de primícias (v. 35-37a). Esta oferta é mencionada várias vezes
na Lei do Antigo Testamento (Êx 23.19, 34.26 e Dt 26.2). A Lei declarou que o
primogênito de cada família, bem como o primogênito de todos os rebanhos,
pertencia ao Senhor. A oferta de primícias era entregue em reconhecimento de que
tudo o que se seguia também vinha das mãos do Senhor, como um presente
gracioso ao seu povo.

4. O dízimo.
“As primícias da nossa massa, as nossas ofertas, o fruto de toda
árvore...” (v. 37) – A quarta responsabilidade foi o dízimo (v. 37b-39). O dízimo
diferia da oferta das primícias, sendo a décima parte de tudo o que era produzido
pelos judeus. O precedente foi estabelecido por Abraão, que apresentou um décimo
dos seus despojos a Melquisedeque, o sacerdote de Salém. Todo judeu do Antigo
Testamento sabia que 10 por cento de toda sua renda era devido ao Senhor. Essa
responsabilidade, evidentemente, também caiu no esquecimento.
Novamente, não estamos sob a Lei de Moisés, mas há princípios, nela, que se
aplicam a nós. O princípio geral é que devemos estar comprometidos com a casa do
Senhor. Dar as primícias significa que devemos dar o melhor ao Senhor e não as
sobras. Nossa oferta deve ser planejada e alegre, mostrando que Deus tem o
primeiro lugar em nossos corações (1Co 16.1-2; 2Co 8 e 9).
O padrão do Novo Testamento para dar o dízimo não é (10%), mas 100%
(1Co 16.2). Ele é o dono de tudo, nós apenas administramos para fins do Seu reino.
Administrar bem as finanças à luz do propósito de Deus é um indicador muito
confiável do seu compromisso com Jesus Cristo (Lc 16.10-13).
Deus não precisa do nosso dinheiro para manter Sua obra. Nem a Igreja
deixará de existir, se alguns membros forem infiéis no dízimo, porque nosso Deus
tem todo poder para multiplicar pães e peixes (Mc 6.41). Quando entregamos os

196 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (125). Wheaton, IL:
Victor Books.
197 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (112). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

94
dízimos e ofertas estamos adorando e, sobretudo, com a afirmativa de que não
estamos escravizados aos bens, e que confiamos no Senhor (Hb 13.5-6; 1Tm 6.7-
10).
Lamentavelmente, existem muitos crentes infiéis que, por causa da
infidelidade e do devorador, tornaram-se reféns da farmácia, do agiota, da oficina
mecânica, dos acidentes na empresa, incêndios, negócios mau feitos, etc. (Dt 28.15-
68; JI 1.4;12; Ag 1.6; At 5). Tudo por causa da infidelidade.
A maneira de acabar com esta maldição financeira não é pedindo a Pastores
que orem por você, nem jejuando ou fazendo votos de dar isto ou aquilo outro para
a igreja ou alguma entidade filantrópica; porém, tomando uma atitude de ser fiel a
Deus nos seus dízimos e nas suas ofertas. Assim, o devorador desaparecerá da sua
vida (MI 3.11).
Deus tem o remédio ideal para acabar com a crise financeira em nossa vida.
O nome deste precioso remédio é fidelidade. Devolva aquilo que pertence ao
Senhor. Comece hoje uma vida de fidelidade com Deus.

Conclusão:
Uma fé que não custa nada não vale nada.198 Se desejamos experimentar
uma renovação espiritual, precisamos aplicar a Palavra de Deus em todas as áreas
de nossa vida.
Uma senhora de cabelos grisalhos, que era membro de longa data da sua
igreja, saiu pela porta num domingo e disse ao seu pastor, “foi um sermão
maravilhoso. Tudo o que o Senhor disse se aplica a alguém que eu conheço”. A
chave para a renovação espiritual não é aplicar a verdade de Deus aqueles que
conhecemos. Na verdade, devemos aplicá-la pessoalmente e especificamente.
Você quer a bênção de Deus em sua vida? Se você disser que sim, então não
seja um ouvinte negligente da Palavra. Seja um praticante eficaz e você será
abençoado por Deus.

198Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 10.30–39).
Joplin, MO: College Press.

95
Deus não é injusto
[Estudo 11 – Ne 11.1-36]

Quando Winston Churchill foi nomeado primeiro-ministro da Inglaterra


durante os primeiros dias da Segunda Guerra Mundial, as perspectivas de vitória
eram muito pequenas. Churchill motivou a nação não prometendo nada, mas
apenas sangue e lágrimas. Ele caminhava pelas ruas bombardeadas de Londres
desafiando os cidadãos da capital e do interior a segui-lo.
Um dos britânicos, que aceitou o desafio de trabalhar duro para derrotar os
alemães, foi uma adolescente chamada Elizabeth, a filha do rei George VI. Ela vestiu
macacão e se dispôs a dirigir um caminhão para apoiar o esforço de guerra. Com o
tempo, outros aliados, incluindo os Estados Unidos, desempenharam papéis
importantes na guerra, mas por um bom tempo, em 1940, o ingleses ficaram
praticamente sozinhos e perseveraram, porque eles aceitaram o desafio de seu
primeiro-ministro.199
No início do livro de Neemias somos informados à respeito da situação de
Jerusalém: “A cidade era espaçosa e grande, mas havia pouca gente nela, e as casas
não estavam edificadas ainda” (Ne 7.4). Neemias, como o primeiro-ministro
Winston Churchill, acima citado, desafiou o povo a reconstruir e repovoar a capital.
Neemias 11 é mais uma daquelas porções da Escritura que você olha e
pensa: “Por que Deus colocou isso em Sua Palavra inspirada?” Todavia, ao
examinar essa lista, é possível encontrar três lições preciosas acerca do nosso
envolvimento na obra do Senhor.

I. O ministério envolve o desejo de viver onde Deus quer


que você viva
1
Os príncipes do povo habitaram em Jerusalém, mas o seu restante
deitou sortes para trazer um de dez para que habitasse na santa
cidade de Jerusalém; e as nove partes permaneceriam em outras
cidades. 2 O povo bendisse todos os homens que voluntariamente se
ofereciam ainda para habitar em Jerusalém.

Os muros estavam reconstruídos, mas não havia muitas pessoas vivendo na


cidade (7.4). Quando o povo voltou do exílio, os muros estavam derrubados e havia
muitos escombros. Era necessário muito trabalho para limpar e restaurar a cidade.
Além disso, a cidade estava vulnerável e poderia facilmente ser tomada pelos
inimigos.

“Os príncipes do povo habitaram em Jerusalém, mas o seu restante...” (v.


1) – Os líderes do povo, é claro, moravam em Jerusalém. Mas a maioria do povo

199Restoring and renewing the people of God (A Study of Ezra & Nehemiah) by Jack W.
Hayford with Joseph Snider. Nashville, TN: Thomas Nelson Publishers, Inc. 1998 by Jack W.
Hayford. Page 133.

96
vivia nas cidades ou em vilarejos longínquos. No primeiro momento não era um
oportunidade econômica habitar na capital. Era muito mais fácil viver e cultivar o
seu próprio pedaço de terra. Assim, a maioria das pessoas se contentava em não
abandonar as terras e viver nas aldeias vizinhas.
Por que não havia muitas pessoas vivendo na cidade Jerusalém? A cidade
estava sem muros por cerca de 160 anos. Os judeus passaram 70 anos na
Babilônia, e um adicional de 90 anos se passou antes de Neemias entrar em cena.
Assim, por mais de 160 anos, Jerusalém era uma pilha de escombros. Então, o que
as pessoas fizeram? Eles construíram casas espaçosas, ricamente decoradas, no
subúrbio. A maioria dos judeus havia abandonado a vida urbana.
A outra razão para a falta de pessoas foi o fato de que, se alguém mudasse
para a cidade, teria muito trabalho para fazer. Então, como é que eles levaram as
pessoas para a cidade? Isso deve ter incomodado a Câmara de Comércio de
Jerusalém, nos dias de Neemias. Eles tinham que elaborar um plano.
Veja o versículo 1 de Neemias 11. Alguém vivia em Jerusalém? Sim, os
membros da Câmara de Comércio: “Os líderes do povo viviam em Jerusalém”. Eles
tinham que morar lá, era parte do trabalho. Recebiam um bônus anual, que
provavelmente fazia parte de um plano de incentivo para encorajar a viver na
cidade.200 Mas o restante do povo, não. Eles viviam nas aldeias vizinhas, atraentes
pelo vale-subúrbio.

“... mas restante deitou sortes para trazer um de dez para que habitasse
na santa cidade de Jerusalém...” (v. 1) – Neemias sabia que para a cidade se
tornar forte e próspera, ela teria que ser habitada por pessoas dispostas a defendê-
la. Porém, foi necessário tirar a sorte e escolher um de cada dez pessoas para
morar em Jerusalém.
Alguns desses cidadãos tiveram que ser quase “arrastados” para Jerusalém
(Ne 11.1-2). O povo havia prometido dizimar seus produtos (Ne 10.37-38). Agora,
Neemias decidiu dizimar o povo, e 10 por cento dele foi escolhido por sorteio para
abandonar as aldeias em Jerusalém. 201

“O povo bendisse todos os homens que voluntariamente se ofereciam


ainda para habitar em Jerusalém” (v. 2) – Porém, algumas pessoas que não
foram escolhidas se ofereceram para viver na cidade (11.2). Os que ficaram nas
aldeias elogiaram àqueles que estavam dispostos a mudar-se para Jerusalém. É
provável que aqueles que se ofereceram tenham sido incluídos nos dez por cento
do povo, em vez de serem adicionados.202
Não é de admirar que a conduta desses voluntários tenha suscitado o
tributo e admiração do público, pois eles sacrificaram a sua segurança pessoal e
conforto para os interesses da comunidade.203

200 Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson
Company], 1998, p. 135).
201 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (129–130). Wheaton, IL:

Victor Books.
202 Willamson, H. G. M. (1998). Vol. 16: Ezra, Nehemiah. Word biblical commentary (350–

351). Dallas: Word, Incorporated.


203 Jamieson, R., Fausset, A. R., & Brown, D. (1997). Commentary critical and explanatory on

the Whole Bible (Ne 11.1). Oak Harbor, WA: Logos Research Systems, Inc.

97
“... Os homens voluntariamente se ofereciam...” (v. 2) – O que torna esta
ação dos voluntários significativa é a palavra traduzida por “voluntariamente”. É
uma palavra hebraica (nadab), que significa “impulsionar, impelir, incitar a partir
de dentro”. Inerente à palavra está a ideia de generosidade interior e vontade. Em
outras palavras, bem no fundo, estes voluntários foram despertados, eles foram
impelidos por Deus a se moverem.204 E eles o fizeram de boa vontade e
generosidade. Se não houvesse voluntários, a cidade não teria prosperado, nem
poderia ter resistido aos ataques inimigos que surgiram nos anos posteriores.
Aqueles que se mudaram tiveram que arrancar as raízes de onde estavam,
desistir de sua área cultivada e mudar-se para o que, rapidamente, se tornou uma
cidade povoada. Com base no número de homens que se mudaram para a cidade
(3044), havia cerca de 10.000 pessoas (uma estimativa conservadora), que se
mudaram para a cidade, com uma população total de 100.000 judeus na terra.205
Embora fosse inconveniente, essas pessoas estavam dispostas a viver onde Deus
queria que eles estivessem, a fim de servi-Lo em Seu propósito.
O registro dos que mudaram para Jerusalém inclui os filhos de Judá (468, Ne
11.6), os filhos de Benjamin (928, Ne 11.8), sacerdotes (822, Ne 11.12), levitas
(284, Ne 11.18), porteiros (172, Ne 11.19) e outros. Os cantores do templo tinha
um estatuto especial na cidade sob ordem direta do rei Artaxerxes (11.3-24).206
Uma das primeiras considerações que qualquer servo de Deus deve pensar
é: “Onde Deus quer que eu viva?” Você já imaginou o que iria acontecer se na igreja
local dez por cento dos membros fossem convidados a se mudar, a fim de
fortalecer e ampliar o trabalho do Senhor em outra região? Será que teríamos
algum voluntário?

II. O ministério envolve servir na área em que Deus


chamou você para servir
3
São estes os chefes da província que habitaram em Jerusalém;
porém nas cidades de Judá habitou cada um na sua possessão, nas suas
cidades, a saber, Israel, os sacerdotes, os levitas, os servidores do
templo e os filhos dos servos de Salomão.

Dois grupos diferentes são mencionados em Neemias 11.4-9. Representam


duas tribos separadas. Judá é uma tribo grande, enquanto Benjamim é bem
pequena.207 O capítulo 11 lista os chefes de famílias em Jerusalém (11.3-9):
sacerdotes (11.10-14); levitas (11.15-18); porteiros e guardas do templo (11.19-
21); várias autoridades nomeadas pelo rei da Pérsia (11.22-24), e as pessoas que
moravam fora da cidade (11.25-36).

204
Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson
Company], 1998, p. 136).
205 See Howard F. Vos, Bible study commentary: Ezra, Nehemiah, and Esther (Grand Rapids:

Zondervan, 1987), 127.


206 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 11.1–24).

Joplin, MO: College Press.


207 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,

p. 133.

98
“Dos sacerdotes: Jedaías, filho de Joiaribe, Jaquim... Dos levitas: Semaías,
filho de Hassube, filho de Azricão, filho de Hasabias, filho de Buni” (v. 10 e 15) –
Em seguida, os sacerdotes, levitas, e os trabalhadores do templo são nomeados (Ne
11.10-24). No entanto, é importante notar que Deus havia reservado cidades
especiais para eles (Js 21), para que pudessem legitimamente viver fora de
Jerusalém; mas eles escolheram morar com o povo, enquanto serviam a Deus no
templo. Como Jeremias, eles optaram por permanecer com o povo, mesmo que
fosse mais seguro e mais confortável viver em outro lugar (Jr 40.1-6).
Os sacerdotes oficiavam no altar, e os levitas os assistiam. Alguns
supervisionavam a manutenção do templo (Ne 11.16), enquanto outros
ministravam com oração e louvor (v. 17, 22); e ambos eram importantes. Havia
cerca de 300 homens designados para proteger o templo (v. 19). Uma vez que os
dízimos e ofertas eram armazenados no templo, era importante que o edifício fosse
protegido.208
Eram necessárias muitas pessoas, com habilidades diversas, para manter o
ministério em Jerusalém, e cada pessoa servia a Deus em sua respectiva área.
Aqueles que viviam fora de Jerusalém tinham que cultivar sua terra e fornecer
alimentos para os outros moradores vizinhos. Cada um tinha um papel diferente,
mas cada papel era fundamental para a causa inteira.
De forma semelhante, no corpo de Cristo, cada membro é vital para o
funcionamento e saúde do corpo (1Co 12.12-30). Devemos aprender a cooperar
uns com os outros sem atrito ou rivalidade. Deus usa muitas pessoas com
diferentes dons e habilidades para fazer o seu trabalho neste mundo. O importante
é se entregar ao Senhor para que Ele possa nos usar como Seus instrumentos, para
realizar a Sua obra. Cada pessoa é importante e cada tarefa é significativa.
A vida de João Calvino é um belo exemplo do que significa viver para a
glória de Deus. Em 1538 os líderes de Genebra reagiram contra as doutrinas dos
pastores protestantes; Calvino e vários outros clérigos foram banidos da Suíça.
Porém, em maio de 1541, o Conselho de Genebra revogou a proibição de exercer
atividades litúrgicas de Calvino, e até o considerou como um homem de Deus. Isso
criou uma decisão agonizante para ele, porque sabia que a vida em Genebra seria
cheia de controvérsia e perigos. Mais tarde, em outubro, ele disse a William Farel
que, embora preferisse não ir, “... eu sei que eu não sou o meu próprio mestre, eu
ofereço meu coração como um verdadeiro sacrifício ao Senhor”. Isto se tornou o
lema de Calvino, e a imagem do seu emblema incluiu uma mão segurando um
coração para Deus, com a inscrição Prompte et sincero (“pronto e sinceramente”).
Na terça-feira, 13 setembro de 1541, Calvino entrou Genebra pela segunda
vez para servir à igreja até a sua morte, em 27 de maio de 1564.209
Quando ele tinha 30 anos de idade, descreveu uma cena imaginária de si
mesmo, no final de sua vida, prestando contas a Deus. Ele disse: “A coisa [ó Deus]
em que eu principalmente busco, e para o qual eu trabalhei mais diligentemente,
foi que a glória de tua bondade e justiça... resplandecesse, que a virtude e as
bênçãos de Cristo... pudessem ser totalmente exibidas”.210

208 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (130–131). Wheaton, IL:
Victor Books.
209 Piper, J. (2009). John Calvin and his passion for the majesty of god. Wheaton, IL:

Crossway.
210 John Dillenberger, John Calvin, selections from his writings (Atlanta: Scholars Press,

1975), 110.

99
Vinte e quatro anos depois, inalterado em suas paixões e metas, e um mês
antes de realmente prestar contas a Cristo, no céu (ele morreu com 54 anos), as
últimas palavras de Calvino foram: “Eu não escrevi nada por ódio a qualquer
pessoa, mas eu fielmente sempre propus e estimei viver para a glória de Deus”.

III. O ministério envolve uma disposição de servir sem


aplausos
4
Habitaram, pois, em Jerusalém alguns dos filhos de Judá e dos filhos
de Benjamim. Dos filhos de Judá: Ataías, filho de Uzias, filho de
Zacarias, filho de Amarias, filho de Sefatias, filho de Maalalel, dos
filhos de Perez;
5
e Maaséias, filho de Baruque, filho de Col-Hozé, filho de Hazaías,
filho de Adaías, filho de Joiaribe, filho de Zacarias, filho do silonita.
6
Todos os filhos de Perez que habitaram em Jerusalém foram
quatrocentos e sessenta e oito homens valentes.

A maioria destes nomes não significa nada para nós. Alguns não foram nem
citados, mas foram relacionados com todos os seus parentes como um grupo
(11.12-14). Zabdiel é nomeado (11.14) e, embora não signifique nada para nós, os
seus 128 parentes, não mencionados, eram guerreiros valentes. Eles, mesmo não
tendo o nome mencionado, se destacam por manter a cidade segura.
Em Neemias 11 encontramos três grupos específicos que, voluntariamente,
se ofereceram para povoar a cidade, embora a sua entrega permanecesse anônima.

O primeiro grupo incluiu aqueles que, voluntariamente, se mudaram


para a cidade (Ne 11.2). Eles deixaram suas casas, começaram do zero, e ainda se
submeteram a um governo que não haviam escolhido. Eles abriam mão da
vantagem pessoal pelo bem da coletividade. Embora pareçam insignificantes, eles
eram muito importantes porque se tornaram os novos habitantes da cidade.

O segundo grupo é formado pelos Sacerdotes (Ne 11.10-14). Dos


sacerdotes: Jedaías, filho de Joiaribe, Jaquim, Seraías, filho de Hilquias, filho de
Mesulão, filho de Zadoque, filho de Meraiote, filho de Aitube, líder da casa de Deus
e os seus parentes que realizavam o trabalho do templo, 822.
Havia 822 pessoas que voluntariamente trabalhavam no templo (Ne 11.12).
O templo não tinha técnicos de iluminação, sonoplastia ou engenheiros estruturais,
como em algumas de nossas igrejas, hoje; mas todos, no grupo de 822, tiveram um
trabalho muito importante.211 Os sacerdotes tinham a função de orar pelo povo,
ensinar a Lei e representar o povo diante de Deus.

O terceiro grupo é formado pelos Levitas (Ne 11.15-19, 22). Os


versículos 15 e 16 dizem que os Levitas presidiam “o serviço de fora da Casa de
Deus...”. Eles cuidavam de todos os aspectos da Casa de Deus, uma espécie de
diácono do Antigo Testamento. Os serviços realizados fora da Casa de Deus deviam
ser a coleta e armazenamento de provisões, a coleta dos dízimos e impostos e a

211Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson


Company], 1998, p. 138).

100
supervisão das instalações externas do edifício do templo (cf. Ed 8.33; 10.15; Ne
8.7). Embora tivessem uma função tão sublime, provavelmente você não se lembra
de um de seus nomes!

Matanias, o responsável pela oração.


Entre os Levitas, Neemias menciona “Matanias, filho de Mica, filho de Zabdi,
filho de Asafe, o chefe, que dirigia os louvores nas orações” (v. 17). Você
provavelmente nem sabia que existia um homem chamado Matanias. Mas Deus
sabia! Ele era um líder, e, acredite ou não, ele era uma das principais causas para o
sucesso do templo. Ele era o chefe dos louvores e orações do templo.
Ao que parece, hoje, gastamos mais tempo com reuniões de planejamento
do que com oração. Parece que as prioridade estão invertidas. Os recursos
parecem vir dos homens e não de Deus. Confia-se mais na força do ser humano do
que na capacitação divina.
Entretanto, os maiores e mais conhecidos líderes da história foram homens
de oração. João Crisóstomo, Agostinho, Martinho Lutero, João Calvino, Richard
Baxter, Jonathan Edwards e muitos outros.
Grande parte dos presbiterianos já ouviu falar sobre o reformador escocês
John Knox. Ele foi o precursor do presbiterianismo na Escócia. John Knox é
conhecido por sua vida de oração e pela declaração feita pela Rainha da Escócia,
Maria. Ela disse que tinha mais medo das orações de John Knox do que um exército
de dez mil homens. O que poucos sabem é que o genro de John Knox também era
um homem de oração. John Welsh orava sete horas por dia. “Eu me surpreendo
como um cristão pode se deitar em sua cama à noite e não se levantar para orar”,
ele dizia. Certa vez sua esposa o encontrou chorando, no chão, depois da meia-
noite e lhe perguntou o porquê. “Ó, minha querida”, ele disse, “tenho 3.000 almas
pelas quais responder, e eu não sei como estão muitas delas”. Em outra ocasião, ela
o ouviu suplicando: “Senhor, tu não vais me dar a Escócia?”212
Assim como o oxigênio é importante para nossa vida, é a oração para a vida
cristã. Charles Simeon, um reavivalista inglês, investia quatro horas por dia a Deus,
em oração. John Fletcher, um clérigo e escritor inglês, marcava as paredes do seu
quarto com o hálito das suas orações. Algumas vezes ele passava a noite toda em
oração. David Brainerd dizia: “Eu amo estar só em minha cabana, onde eu posso
gastar muito tempo em oração.”213
Os segredos da vida oculta de oração e jejum devem ser buscados por
aqueles que são chamados para liderar o povo de Deus (Atos 6 e 7). Que Deus
levante entre nós mais pessoas como “Matanias”. Homens e mulheres conhecidos
pela piedade.

Uzi, o responsável pela adoração.


Finalmente, Neemias 11.22 nos diz sobre o desconhecido superintendente
dos levitas em Jerusalém, cujo nome era Uzi. O que ele fazia? Bem, ele estava entre
os filhos de Asafe, os cantores da Casa de Deus. Essas pessoas voluntariamente
cantavam para a glória de Deus.

212 ARMSTRONG, John, O ministério pastoral segundo a Bíblia. São Paulo: Editora Cultura
Cristã, 2007, p. 73.
213 BOUNDS, E. M., Purpose in prayer, Pensilvânia, Whitaker House, 11-14. apud. LOPES,

Hernandes Dias, A Importância da pregação expositiva para o crescimento da igreja. São


Paulo: Editora Candeia, 2004, p. 177.

101
Hoje, esses nomes são desconhecidos; mas o fato de não serem conhecidos
não tem nada a ver com suas recompensas finais. Deus nunca verifica um medidor
de aplausos para determinar nossas recompensas.
De forma semelhante, a igreja precisa de muitas pessoas para funcionar
bem. A igreja teria sérios problemas se não tivéssemos pessoas trabalhando nos
bastidores. Existem pessoas que nunca aparecem debaixo dos holofotes, mas
fazem o que Deus lhes deu para fazer, nos bastidores. Eles são como nossos órgãos
vitais: você nunca irá vê-los, mas quando um deles se fecha para baixo, você está
em apuros! Observe duas coisas sobre essas pessoas:

1. A fidelidade, não a fama, é a questão.


O motivo é o que realmente importa. Se trabalharmos para tentar ganhar
reconhecimento dos outros, trabalharemos pelo motivo errado. Ficaremos
desapontados quando os outros não nos derem os elogios que buscamos. Charles
R. Swindoll escreveu, com sabedoria: “Se você deseja fama e reconhecimento, você
vai falhar como líder e seus esforços não serão recompensados por toda a
eternidade. Isso não é uma ameaça, é uma promessa”.214 Ele cita as palavras do
Senhor Jesus em Mateus, “Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens,
com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso
Pai celeste” (Mt 6.1).
Deus está pronto para abençoar os líderes que realmente não se importam
em receber a glória.

2. Deus não é injusto.


Deus achou por bem registrar esses nomes que não significam
absolutamente nada para nós. Mas significam algo para o Altíssimo, e é isso que,
em última análise, importa. Se você está ficando chateado porque ninguém na
igreja percebe tudo o que você faz, o seu foco está no lugar errado. Olhe para o
Senhor, a quem você está servindo. E lembre-se: “Porque Deus não é injusto para
ficar esquecido do vosso trabalho e do amor que evidenciastes para com o seu nome,
pois servistes e ainda servis aos santos” (Hb 6.10).
Em Efésios, o apóstolo Paulo declara que a igreja só cresce à medida em que
cada membro trabalha em conjunto. Quando um crente não pratica corretamente
seu dom como despenseiro de Deus (1Pe 4.10), a obra de Deus sofre, porque Deus
não chamou outro cristão da mesma forma, ou para fazer exatamente o mesmo
trabalho. É por isso que nenhum cristão deve ser um espectador.215 Todo crente,
está na equipe com os dons que recebeu do Altíssimo. Esse é o plano de Deus; cada
membro com suas próprias habilidades, posição e responsabilidades.
Em festas de casamentos, aniversários e outras ocasiões, muitas vezes
recebemos algum presente que não usamos. Às vezes, colocamos em uma gaveta,
guardamos na garagem, ou mais tarde presenteamos a alguém. Mas com Deus é
diferente. Cada um de Seus dons é exatamente o que precisamos para cumprir
nosso trabalho. Ele nos presenteou com habilidades e capacitação correta que
precisamos para servir. Não somente nossos dons nos fazem um membro
insubstituível do Corpo de Cristo, mas é um sinal do grande amor do Altíssimo.

214 Charles Swindoll. Hand me another brick. [Thomas Nelson Publishers], p. 133).
215 MacArthur, J. (1996). Ephesians (137). Chicago: Moody Press.

102
Os dons que recebemos podem nos tornar importantes, mas não
necessariamente famosos. Talvez você não se considere tão importante quanto
Neemias ou Esdras, porém, você não é anônimo para Deus.

Conclusão:
O missionário pioneiro, William Carey, era um sapateiro antes de ir para o
campo missionário. Ele mantinha um mapa da Índia em sua loja, parando de vez
em quando para estudá-lo, com o desejo de pregar o evangelho naquele país.
Um dia um amigo o aconselhou pelo fato de negligenciar o seu negócio.
“Negligenciar o meu negócio?” Carey disse: “Meu negócio é proclamar o reino de
Deus. Eu apenas conserto sapatos para pagar as despesas”. Essa deve ser a
mentalidade de cada cristão. Se você conhece a Cristo como seu Salvador, você está
no ministério, agora!
Não há nada de errado em ser bem sucedido nos negócios. Deus deseja que
sejamos diligentes e zelosos em nosso trabalho. Também não significa que todos os
cristãos devem deixar o emprego “secular” e trabalho em tempo integral em uma
agência missionária. Alguns são chamados para fazer isso, como William Carey o
foi, mas certamente não todos. É apenas uma questão de dom e de chamado.
Entretanto, se você é um seguidor de Jesus Cristo, você deve adotar o Seu
propósito para a sua vida. Sua palavra para todos nós é: “Não acumuleis para vós
outros tesouros sobre a terra...” e “... buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a
sua justiça...” (Mt 6.19, 33). O seu objetivo deve ser o de glorificar a Deus e seu foco
principal é se tornar uma testemunha de Jesus Cristo através de seu
comportamento, atitudes e palavras. As pessoas que se relacionam com você são o
seu campo missionário.
Não muito tempo atrás, a organização Gallup realizou uma pesquisa com
moradores de cidades com população superior a 50 mil habitantes, perguntando
que organização poderia melhorar a vida da cidade. Havia todos os tipos de
sugestão: a prefeitura, a câmara de vereadores, jornais locais, empresas locais,
grupos de moradores, a câmara de comércio, bancos, clubes de serviços,
construtoras, tudo o que você possa imaginar. Você sabe que grupo liderou a lista?
As igrejas locais! Eles venceram com 48 por cento dos votos, à frente até mesmo da
prefeitura, que ficou em segundo lugar. Ela teve apenas 39 por cento.216
O mundo está esperando para ver o que os verdadeiros cristãos podem
fazer. Na realidade, Deus também está esperando. Os únicos que podem mudar
uma cidade são aqueles que amam a Deus sobre todas as coisas, e estão dispostos a
fazer o que Deus quer que eles façam.
Você está servindo a Deus de acordo com os dons que recebeu Dele?

216Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (123). Grand Rapids, MI:


BakerBooks.

103
O Deus de toda alegria
[Estudo 12 – Ne 12-1-47]

A dedicação dos muros é o tema central de Neemias 12. Depois de terem se


mudado para a cidade, os cidadãos resolveram dedicar esse projeto a Deus.217 No
entanto, encontramos muito mais do que isso. Encontramos pessoas cujos
corações estavam realmente felizes! Mesmo cheio de incertezas quanto ao futuro,
mesmo que tivessem que pedir ajuda financeira para construir suas casas, eles
realmente estavam alegres, porque os seus olhos estavam no Senhor.
A narrativa conta como Neemias foi capaz de reunir os levitas, músicos e
cantores de várias regiões do país para adorar ao Senhor. Neemias organizou dois
grandes corais, que andaram por cima dos muros até chegarem ao templo. Cada
grupo era liderado por sacerdotes e músicos que bendiziam o nome de Deus em
uma grande celebração, uma grande festa espiritual de dedicação dos muros.
Na verdade, o capítulo 12 é o ápice do livro de Neemias. É também um novo
capítulo na história de Jerusalém. É um momento de intensa alegria na presença do
Eterno. Depois de ouvirem a Palavra pregada (Ne 8); depois de uma belíssima
oração de arrependimento (Ne 9); depois de assumirem um compromisso de
obedecerem aos mandamentos de Deus (Ne 10); depois de mudarem para
Jerusalém, o povo recebeu a graça de se alegrar em Deus (Ne 12.43). As palavras
do Salmista são oportunas neste momento: “Os que com lágrimas semeiam
com júbilo ceifarão. Quem sai andando e chorando, enquanto semeia, voltará com
júbilo, trazendo os seus feixes” (Sl 126.6).
Assim, no capítulo 12, encontramos as etapas necessárias para uma vida
cheia da presença de Deus e, consequentemente, cheia de alegria. O processo se
divide em três etapas: preparação, proclamação e provisão.

I. A preparação
“27 Na dedicação dos muros de Jerusalém, procuraram aos levitas de
todos os seus lugares, para fazê-los vir a fim de que fizessem a
dedicação com alegria, louvores, canto, címbalos, alaúdes e harpas.
28 Ajuntaram-se os filhos dos cantores, tanto da campina dos
arredores de Jerusalém como das aldeias dos netofatitas, 29 como
também de Bete-Gilgal e dos campos de Geba e de Azmavete; porque
os cantores tinham edificado para si aldeias nos arredores de
Jerusalém. 30 Purificaram-se os sacerdotes e os levitas, que também
purificaram o povo e as portas e o muro”.

Em Neemias 6, descobrimos que os muros foram restaurados em 52 dias


(Ne 6.15). Mas porque somente agora, no capítulo 12, encontramos a dedicação
dos muros de Jerusalém? Por que o capítulo 12 pode ser considerado o clímax do
livro?

217
Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson
Company], 1998, p. 144).

104
O livro pode ser divido em duas partes. A primeira diz respeito à construção
e restauração dos muros, uma tarefa na qual Neemias desempenhou o papel
principal (1-7). A segunda parte, mais curta, refere-se ao avivamento em
Jerusalém. Neste avivamento, Esdras, o sacerdote e chefe espiritual da nação, é a
figura mais proeminente (8.1-12.26). Todavia, na dedicação dos muros, essas duas
importantes seções do livro se encontram e se unem. Esdras está presente para
levar metade das pessoas em celebração. Neemias leva a outra metade.218 Além
disso, o mais importante é o fato de que os dois grupos circulam pelos muros que
Neemias construiu, e convergem para o templo, o centro espiritual de Jerusalém.

“Então, fiz subir os príncipes de Judá sobre o muro e formei dois grandes
coros em procissão...” (v. 31) – É significativo observar que a narrativa está na
primeira pessoa. O que foi feito na primeira metade do livro, é retomado agora; ou
seja, Neemias havia assumido um papel secundário, enquanto Esdras, o sacerdote,
assumiu o papel principal e conduziu o povo em uma renovação e dedicação ao
Senhor. Mas agora, Neemias reassume a liderança. Era certamente apropriado que
ele conduzisse as pessoas na dedicação dos muros, uma vez que ele havia sido o
motor principal na sua reconstrução.

“Na dedicação dos muros de Jerusalém, procuraram aos levitas de todos


os seus lugares, para fazê-los vir a fim de que fizessem a dedicação com
alegria, louvores, canto, címbalos, alaúdes e harpas” (v. 27) – Os judeus tinham
razão para estar contentes. Deus, graciosamente, havia tomado a situação
angustiante em que eles viviam e, através de Neemias, transformou-a em algo
alegre e cheio de esperança. Deus havia mudado o coração do rei Artaxerxes,
envergonhado os inimigos e capacitado Neemias com sabedoria e espírito de
liderança. Depois de 52 dias, e muito trabalho, o povo tinha muito o que celebrar.
Por várias vezes, nas Escrituras, somos convidados a ser um povo alegre. O
Salmo 100, por exemplo, começa dizendo, “Celebrai com júbilo ao SENHOR, todas as
terras. Servi ao SENHOR com alegria, apresentai-vos diante dele com cântico” (Sl
100.1-2). O Salmo 98 parece muito semelhante: “Celebrai com júbilo ao SENHOR,
todos os confins da terra; aclamai, regozijai-vos e cantai louvores” (Sl 98.4). O
profeta Isaías havia proclamado: “Assim voltarão os resgatados do SENHOR e virão
a Sião com júbilo, e perpétua alegria lhes coroará a cabeça; o regozijo e a alegria os
alcançarão, e deles fugirão a dor e o gemido” (Is 51.11). Mesmo Neemias havia
declarado: “não vos entristeçais, porque a alegria do SENHOR é a vossa força” (Ne
8.10).
A alegria cristã verdadeira é um privilégio e um dever. Isso significa que não
devemos ficar esperando que as circunstâncias mudem para realmente nos alegrar
em Deus. Na verdade, somos ordenados a viver sempre alegres (1Ts 5.16).
Devemos nos alegrar sempre (Fp 4.4). A alegria não é uma opção disponível
apenas para aqueles cujo temperamento é propício para isso. Deus deseja que cada
um de Seus filhos apresente o fruto da alegria.219
Alguém roubou a sua alegria? Se a alegria está ausente em sua vida, hoje,
você precisa orar como Davi: “Restitui-me a alegria da salvação” (Sl 51.12). Não

218 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (126). Grand Rapids, MI:
BakerBooks.
219 Bridges, J. (2006). The fruitful life: the overflow of God’s love through you (75–77).

Colorado Springs, CO: NavPress.

105
deixe Satanás, ou qualquer outra pessoa, roubar-lhe esse dom precioso de Deus
para sua vida.

“Purificaram-se os sacerdotes e os levitas, que também purificaram o


povo e as portas e o muro” (v. 30) – Um dos obstáculos mais comuns para a falta
de alegria é o pecado em nossa vida. A alegria cristã é, essencialmente o fruto da
comunhão com Deus. Obviamente, o pecado quebra essa comunhão e a alegria de
Sua presença.
A fim de continuar a celebração dos muros, o coração tinha que ser
preparado. Da mesma forma, precisamos nos lembrar de que, antes de ministrar
aos outros, nossos corações devem estar limpos diante de Deus. Santidade precede
à felicidade. Charles Swindoll estava certo quando escreveu: “O primeiro passo
para um semblante feliz é um coração limpo”.

II. A proclamação
“31 Então, fiz subir os príncipes de Judá sobre o muro e formei dois
grandes coros em procissão, sendo um à mão direita sobre a muralha
para o lado da Porta do Monturo”.

A dedicação dos muros foi um tempo precioso para louvar a Deus. Neemias
organizou dois corais para caminhar em sentidos opostos por cima dos muros, até
que os dois se encontrassem no templo.

“Ajuntaram-se os filhos dos cantores...” (v. 28) – Neemias reuniu os levitas


de várias cidades ao redor de Jerusalém (cf. 11.3, 20), e também de outras cidades,
para a cerimônia de dedicação. Era para ser um momento para entoar músicas de
ação de graças (Ne 12.8) a Deus, com instrumentos musicais (cf. 1Cr 25.1).
Cantores, que eram levitas, subiram do sul de Jerusalém (as aldeias de Netofa), do
leste (Bete-Gilgal), e do norte (as cidades benjamitas de Geba e Azmavete).220 Os
preparativos também incluíam limpeza cerimonial de todas as pessoas e das
portas dos muros (Lv 16.30). Isso foi feito, sem dúvida, pela aspersão do sangue de
animais sacrificados.
Eles cantaram louvores com acompanhamento de pratos, harpas e liras. É
interessante observar que o capítulo se refere seis vezes a Davi, duas vezes
chamado de “homem de Deus” (12.24, 36, 37 [duas vezes], 45, e 46). Davi era um
homem segundo o coração de Deus, porque ele era um adorador. Ele montou todo
o sistema de adoração que essas pessoas procuravam seguir (12.46).

1. Um grande coral.
“Então, fiz subir os príncipes de Judá sobre o muro e formei dois grandes
coros em procissão... Esdras, o escriba, ia adiante deles...” (v. 31 e 36) – Neemias
reuniu dois corais (v. 8, 27). O número de cada coro não é indicado. Os dois grupos,
provavelmente, começaram perto da porta do Vale, avançando em direções
opostas, que curiosamente é o lugar onde Neemias começou e terminou sua
inspeção noturna dos muros que estavam em ruínas (Ne 2.13-15).

220Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 12.27–30). Wheaton, IL: Victor Books.

106
O grupo sob a liderança de Esdras caminhou por cima dos muros em
direção à Porta do Monturo (v. 31), passando pela Porta da Fonte até a Porta das
Águas.

“O segundo coro ia em frente, e eu, após ele; metade do povo ia por cima
do muro, desde a Torre dos Fornos até ao Muro Largo...” (v. 28) – O segundo
grupo caminhou em sentido horário, provavelmente começando na porta do Vale e
passando por várias portas e torres, até chegar ao Portão da Guarda. Este grupo
incluía Neemias e metade dos magistrados (12.40), sacerdotes (sete deles, com
trombetas), e outras oito pessoas que, aparentemente, eram cantores.
Mas por que Esdras e Neemias organizaram este tipo de culto de dedicação?
Por que eles não se encontram na área do templo com os levitas e sacerdotes? Ao
que parece, a caminhada em cima dos muros (v. 31, 38) era uma excelente resposta
aos inimigos. Tobias havia declarado que depois de ser restaurado, o muro seria
tão fraco que mesmo uma raposa, em cima dele, seria capaz de destruí-lo (Ne
4.3).221
Ver as duas procissões marchando por cima dos muros deve ter sido uma
visão impressionante. Sem dúvida alguma, foi uma oportunidade para mostrar a
todos que o trabalho foi feito pelas mãos de Deus (6.16).

A procissão nos muros de Jerusalém


Grupo da Esquerda Grupo da Direita

Liderado por Neemias (v. 38) Liderado por Esdras (v. 31-37)

Coro (v. 38) Coro (v. 31)

Neemias (v. 38) Hosaías (v. 32)

Metade dos Funcionários (v. 40) Metade dos Príncipes (v. 32)
Sete sacerdotes com Sete sacerdotes com
trombetas, nomeados (v. 41) trombetas, nomeados (v. 33-35)
Oito Cantores liderados Oito instrumentistas liderados
por Jezraías (v. 42) por Zacarias (v. 35-36)

2. Uma grande alegria.


O mais importante sobre a dedicação dos muros não foi a marcha ao redor
dele, mas a expressão de alegria e louvor das pessoas. Quando o povo de Deus se
consagra, Deus os alegra (v. 43).

“No mesmo dia, ofereceram grandes sacrifícios e se alegraram; pois


Deus os alegrara com grande alegria... de modo que o júbilo de Jerusalém se
ouviu até de longe” (v. 43) – Quando os dois grupos se encontraram, sacrifícios
foram feitos e as pessoas se alegraram tão alto que podia ser ouvido de longe. Esta
foi a terceira vez na história de Israel que os “gritos” foram ouvidos “de longe”. Os
soldados gritaram quando a arca da aliança entrou no acampamento (1Sm 4.5),

221Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 12.31). Wheaton, IL: Victor Books.

107
mas depois houve derrota vergonhosa. Quando a fundação do templo foi lançada,
quase um século antes, os trabalhadores gritavam de alegria, mas a alegria foi
misturada com a tristeza de muitos idosos. As pessoas mais velhas se lembravam
do antigo templo, que foi destruído por Nabucodonosor, e contrastavam com a
nova fundação (Ed 3.8-13). No entanto, os gritos na dedicação dos muros foram de
pura alegria, para a glória do Senhor. Warren Wiersbe sabiamente escreveu: “... por
causa desse registro na Palavra de Deus, aquele grito foi ouvido em todo o
mundo”!222

“No mesmo dia, ofereceram grandes sacrifícios e se alegraram; pois


Deus os alegrara com grande alegria; também as mulheres e os meninos se
alegraram...” (v. 43) – O versículo 43 é o clímax da história, e é impressionante
que a raiz da palavra hebraica para alegria, ou regozijo, ocorre quatro vezes em
apenas um versículo.223
As pessoas estavam alegres porque “Deus os alegrara com grande alegria”.
Sua alegria era espiritual, e não apenas algo hedonista. Era exatamente o que Paulo
escreveu aos Filipenses: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Outra vez vos digo: Alegrai-
vos” (Fp 4.4).

“... também as mulheres e os meninos se alegraram...” (v. 43) – A alegria


não contagiou apenas os “músicos profissionais” que louvavam a Deus, mas
também as mulheres e crianças se juntaram ao grande coral (Ne 12.43). Eles
tinham ouvido a Palavra na Porta das Águas (8.2), por isso era justo que eles agora
expressassem sua adoração ao Senhor.
Foi um dia muito especial para o povo de Deus, em Jerusalém. A vida é cheia
de momentos agradáveis e felizes como esse. Você, certamente, já experimentou
um desses momentos alegres. A alegria de passar no vestibular, de conseguir o
primeiro trabalho, a felicidade do casamento, entre outros. Este foi um desses dias.
Deus tinha sido misericordioso e tinha renovado sua aliança com eles. Havia
esperança neste dia!
É um quadro de grande paz e tranquilidade. Porém, esses bons momentos
são atenuados pela realidade de que a vida não possui apenas ocasiões majestosas,
mas também períodos de intensa dor e muitas lágrimas. A vida é cheia de
incertezas! Grandes provações podem bater à nossa porta de repente! Logo, a
grande questão é: como podemos suportar esses períodos de intensa dor?
O Salmo 23 descreve a Deus como o Supremo Pastor; Ele alimenta, conduz e
cuida de Suas ovelhas. E no versículo 4 está escrito: “Mesmo que eu ande pelo vale
da sombra da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo”. Deus não nos
promete ausência de vales. No entanto, Ele diz que ao passarmos pelos vales, Ele
estará conosco.
Assim, a escolha é nossa. Podemos ser cristãos sem alegria, ou podemos ser
cristãos alegres. Nós podemos passar a vida entediados, tristes e reclamando, ou
podemos nos alegrar no Senhor, em saber que o nosso nome já está escrito no céu,
na esperança de uma herança eterna. É um privilégio e nossa obrigação ser

222 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (136). Wheaton, IL:
Victor Books.
223 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (131). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

108
alegre.224 Viver sem alegria é desonrar a Deus e negar o seu amor e o seu controle
sobre nossas vidas.
Quero convidá-lo, neste momento, a olhar para a fidelidade Deus. Você pode
não entender o que está acontecendo, mas se você ama ao Senhor, você pode ter a
certeza de que todas as coisas cooperam para o seu bem (Rm 8.28). Na verdade,
Deus pode realizar algo extraordinário em sua vida. Mattew Henry disse que,
quanto mais clara for a nossa visão da soberania e do poder do céu, menor será
nosso temor diante das calamidades desta terra.225
Não quero minimizar a sua dor, mas desejo que você tenha uma visão maior
da glória futura. Eu não quero que você finja que o sofrimento seja algo agradável,
mas que você seja capaz de dizer, como Paulo: “Por isso nunca ficamos
desanimados. Mesmo que o nosso corpo vá se gastando, o nosso espírito vai se
renovando dia a dia. E essa pequena e passageira aflição que sofremos vai nos trazer
uma glória enorme e eterna, muito maior do que o sofrimento. Porque nós não
prestamos atenção nas coisas que se vêem, mas nas que não se vêem. Pois o que pode
ser visto dura apenas um pouco, mas o que não pode ser visto dura para sempre”
(2Co 4.16-18, NTLH).
Um poema de um autor desconhecido descreve muito bem a promessa da
fidelidade de Deus na vida daqueles que O seguem e obedecem aos Seus
mandamentos:

Deus não prometeu


Céu sempre azul, e
Caminhos floridos
Sempre para você.

Deus não prometeu


Sol sem chuva,
Alegria sem tristeza,
Paz sem dor.

Mas Ele prometeu


Força do alto,
Compaixão infalível,
E amor eterno.

224 Bridges, J. (2006). The fruitful life: the overflow of God’s love through you (85–86).
Colorado Springs, CO: NavPress.
225 Henry, Matthew: Matthew Henry's commentary on the whole Bible: Complete and

unabridged in one volume. Peabody: Hendrickson, 1996, c1991, S. 2Rs 6:13

109
III. A provisão
“47 Todo o Israel, nos dias de Zorobabel e nos dias de Neemias, dava
aos cantores e aos porteiros as porções de cada dia; e consagrava as
coisas destinadas aos levitas, e os levitas, as destinadas aos filhos de
Arão”.

Com o ímpeto renovado, o povo de Judá toma providências para assegurar


que os sacerdotes e levitas sejam bem cuidados. Uma coisa é gritar numa ocasião
grandiosa, outra coisa é oferecer sacrifícios de louvor continuamente e fazer
provisões realistas para as necessidades da igreja.226 É interessante que esta
preocupação estendeu-se até aos cantores e guardas. Eles sabiam que se não
cuidassem de sustentar aqueles que contribuíssem para o seu bem-estar espiritual,
sofreriam as consequências da sua negligência (Ne 12.44-47).227

“Ainda no mesmo dia, se nomearam homens para as câmaras dos


tesouros, das ofertas, das primícias e dos dízimos, para ajuntarem nelas...” (v.
44) – O povo tinha feito uma aliança com Deus para apoiar o ministério do templo
(Ne 10.32-39), e mantiveram suas promessas. Alguns dos levitas foram nomeados
para supervisionar a coleta e o armazenamento das ofertas no templo. Aqui temos
uma importante lição, há uma conexão entre os lábios e o bolso.228 Adoramos a
Deus como nossos lábios e honramos a Deus com as primícias de nossa renda.

“... pois Judá estava alegre, porque os sacerdotes e os levitas


ministravam ali” (v. 44) – Onde há união entre o povo de Deus, ali o Senhor
ordena a Sua bênção e a vida para sempre (Sl 133.3).
As pessoas entregavam seus dízimos e ofertas, não só porque era o
mandamento de Deus, mas também porque eles estavam “alegres com os
sacerdotes e os levitas que ministram” (v. 44). Os ministros do templo se tornaram
espelho para o povo, tanto em sua pureza pessoal quanto em sua obediência à
Palavra de Deus (v. 30, 45). Além disso, eles conduziram o culto, não de acordo
com suas próprias ideias, mas em obediência às instruções dadas por Davi e
Salomão (v. 46).
O resultado deste culto alegre, de dedicação, foi uma oferta abundante de
produtos para sustentar o trabalho do ministério. O povo contribui “não com
tristeza ou por necessidade”, mas com alegria e gratidão (2Co 9.7). O missionário
Hudson Taylor costumava dizer: “Quando a obra de Deus é feita do jeito de Deus e
para a glória de Deus, nunca faltará o sustento de Deus”.229

“Todo o Israel, nos dias de Zorobabel e nos dias de Neemias, dava aos
cantores e aos porteiros as porções de cada dia...” (v. 47) – Neemias, com muito
cuidado, utiliza as palavras “Ainda no mesmo dia” (v. 44); “nos dias” (v. 47) e
“naquele dia” (13.1).
226 KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 140.
227 BARBER, Cyril J. Neemias e a dinâmica da liderança eficaz. São Paulo: Editora Vida, 1991,
p. 144.
228 LOPES, Hernandes Dias. Neemias, o líder que restaurou uma nação. São Paulo: Editora

Hagnos, 2006, p. 190.


229 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (137). Wheaton, IL:

Victor Books.

110
Isso significa que os tempos de alegria, embora sejam importantes, não são
fins em si mesmos. Neemias, ao invés de deixar o leitor em um final de conto de
fadas de celebração imaculada nos pátios do templo, declara como essa alegria
poderia ser mantida a longo prazo.230
Que dia foi aquele! Que celebração foi aquela! As pessoas deixaram os seus
interesses de lado e se voltaram completamente para o Senhor. Eles
experimentaram uma alegria genuína, uma alegria que veio do céu, da parte de
Deus. Você não gostaria de experimentar um dia assim?

Conclusão:
Como isso é possível? Warren Wiersbe estava certo quando disse que, “... é
nossa adoração constante que nos prepara para as crises da vida”.231 Ou seja,
aquilo que a vida faz conosco depende do que a vida encontra em nós.
A felicidade não depende de circunstâncias externas, mas de uma
perspectiva correta dos fatos. A crise não faz a pessoa, a crise revela a pessoa. Em
um momento de provação, você busca o que você confia. Um alcoólatra se volta
para a garrafa. Um viciado se entrega às drogas. Uma pessoa do mundo se volta
para a sabedoria do mundo. Um cristão deve voltar-se para o Senhor.
A pessoa que abandona “a sua fé” quando as coisas ficam difíceis está
apenas provando que ele realmente não tinha fé.232 Mas a fé genuína crescerá mais
forte através das provações. A melhor decisão a tomar em meio às aflições da vida
é confiar no coração amoroso e misericordioso do Eterno. Fé significa entregar
tudo a Deus e obedecer a Sua Palavra, a despeito das circunstâncias, consequências
ou sentimentos. As tragédias devem nos levar a uma fé mais profunda e duradoura
em Deus, como a única âncora que pode nos manter firmes durante os
vendavais.233
Com a ajuda de Deus, podemos acertar nossa perspectiva no meio da
calamidade e sair do outro lado melhores do que entramos. Podemos
experimentar, hoje, alguns benefícios da glória futura. O príncipe dos pregadores,
Charles Spurgeon, costumava dizer, “Uma fé pequena levará sua alma para o céu,
mas uma grande fé trará o céu a sua alma”.234
Os judeus se alegraram com a restauração dos muros e com provisão de
Deus. Eles cantaram juntos, e o júbilo de Jerusalém se ouviu até de longe. As
circunstâncias mudaram? Não, eles tinham mudado. E você?

230Willamson, H. G. M. (1998). Vol. 16: Ezra, Nehemiah. Word Biblical commentary (389).
Dallas: Word, Incorporated.
231 WIERSBE, Warren W. Comentário bíblico expositivo. São Paulo: Editora Geográfica, 2007,

Vl, p. 198.
232 Wiersbe, W. W. (1996). The Bible exposition commentary (1Pe 1.6). Wheaton, Ill.: Victor

Books.
233 HYBELS, Bill. Encontrando Deus nas dificuldades da vida. São Paulo: Editora Textus, p.

2003, p. 61.
234 Wiersbe, W. W. (1996). The Bible exposition commentary (1Pe 1.8). Wheaton, Ill.: Victor

Books.

111
O Perigo da tolerância
[Estudo 13 – Ne 13.1-31]

O Senhor Jesus Cristo chamou Sua igreja para ser santa e pura em meio ao
pecado. A primeira instrução de Cristo a Sua igreja foi a respeito de como
confrontar o pecado (Mt 18.15-17).
No livro de Apocalipse, a carta à igreja de Tiatira é a mais longa das sete,
embora dirigida à menor das sete cidades. Ela tem uma mensagem importante
para a igreja de hoje: a falsa doutrina e o pecado não são permitidos, mesmo sob a
bandeira do amor, tolerância e unidade. Pode haver muita coisa que seja louvável
em uma igreja. Ela pode ter um ministério eficaz, pode ser uma igreja grande, e até
mesmo benquista na sociedade. Contudo, a imoralidade e a falsa doutrina, se não
forem confrontadas, trarão o julgamento do Senhor da Igreja.235 Alex D. Montoya
estava certo quando escreveu: “O que toleramos hoje, nossos filhos praticarão
amanhã”.236
Os cristãos de hoje também são tentados a buscar realização pessoal fazendo
concessões indevidas. Porém, a igreja não pode tolerar o pecado de qualquer
forma. Para a igreja de Corinto, que tolerava um homem acusado de incesto, Paulo
escreveu: “Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda? Lançai fora o
velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento...” (1Co
5.6-7). Se Deus é absolutamente intolerante com o pecado, a igreja também deve
ser! Aliás, se a igreja não for pura, o que vai proclamar ao mundo?
Neemias enfrentou o problema da permissividade moral. Depois de 12 anos
como governador de Jerusalém (Ne 5.14), ele voltou para a Pérsia (Ne 13.6). Não
sabemos quanto tempo ele ficou lá, mas durante a sua ausência houve uma
tolerância espiritual por parte da liderança que atingiu também o povo.
É interessante obsevar que Neemias tinha aproximadamente 65 anos
quando retornou para Jerusalém. Nesta idade, boa parte das pessoas, hoje em dia,
procura se aposentar. Mas isso não passava pela cabeça Neemias. Neste capítulo,
ele volta para Jerusalém e alcança algumas de suas mais importantes vitórias.237
Neemias enfrentou corajosamente o problema da permissividade espiritual. Seu
exemplo nos ensina que para lidar com a tolerância espiritual, devemos estar
cientes das áreas problemáticas e devemos enfrentá-las vigorosamente.

Contexto:

Neemias deixou Jerusalém no 32º ano de Artaxerxes, em 433 a.C. (cf Ne


5.14; 13.6) e, como havia prometido, retornou à Pérsia (Cf. 2.6). Durante a sua
ausência, o povo voltou aos seus costumes pecaminosos, liderados pelo sumo
sacerdote Eliasibe (v. 4-5). Foi durante a ausência de Neemias que Malaquias
também escreveu o seu livro profético, acusando os sacerdotes e o povo por sua

235 MacArthur, J. (1999). Revelation 1-11 (94). Chicago: Moody Press.


236 Alex D. Montoya. Homosexuality and the church, p. 169.
237 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (135). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.

112
falha pecaminosa. Possivelmente tendo ouvido a respeito da iniquidade de
Eliasibe, Neemias retornou (v. 4-7).

“Naquele dia, se leu para o povo no Livro de Moisés; achou-se escrito que
os amonitas e os moabitas não entrassem jamais na congregação de Deus...”
(v. 1) – Em Deuteronômio, Deus havia declarado que nenhum amonita ou moabita
deveria entrar em aliança com o povo de Israel, por causa da maneira como essas
nações haviam tratado Israel quando eles estavam no deserto (Dt 23.3-5).
Amom e Moabe nasceram da união incestuosa de Ló e suas duas filhas (Gn
19.30-38), e seus descendentes tornaram-se inimigos declarados dos judeus.238 Foi
o casamento misto que deu a Moisés tantos problemas (Êx 12.38; Nm 22.4-6), e dá
problema à igreja, hoje. 239
Porém, no Antigo Testamento há uma história maravilhosa de uma moabita,
chamada Rute. Uma história que serve como um lembrete de que a nossa
fidelidade desempenha um papel no cumprimento das promessas de Deus.

A história de Rute (a moabita)

A Bíblia diz que “... havia fome em Israel; e um homem de Belém de Judá saiu a
habitar na terra de Moabe...” (Rt 1.1). Havia escassez de alimentos em Belém,
cidade cujo nome significa “casa do pão”! A fome era evidência da disciplina de
Deus por seu povo haver pecado contra Ele (Lv 26.18-20; Dt 28.15, 23, 24).
Diante das dificuldades, um homem chamado Elimeleque leva sua mulher,
Noemi, e seus dois filhos para encontrar comida em Moabe.
Nos velhos tempos, o povo de Moabe tinha sido hostil com os israelitas em
sua jornada para Canaã. Suas mulheres também foram acusadas de seduzir os
homens de Israel e persuadi-los a adorar ao deus Baal (Nm 25.1-3). Como
resultado, os moabitas foram proibidos de se casar com israelitas por dez gerações
(Dt 23.3)!
Depois de dez anos vivendo em Moabe, Elimeleque e seus filhos morreram.
Naomi se sente abandonada por Deus - com o dilema de enfrentar a vida sem a
segurança de um marido ou filhos em uma terra estrangeira. Todavia, ouvindo que
a fome havia acabado em Belém, ela decide voltar para o seu povo.
No entanto, Naomi sabia que suas noras seriam consideradas estrangeiras
em Belém. Por isso, ela tenta convencê-las a voltar para suas próprias famílias. Sua
nora Orfa concorda, mas Rute insiste em ficar com Noemi e profere palavras
comoventes; ela se compromete com a sua sogra e com o Deus de Israel:

“16 Disse, porém, Rute: Não me instes para que te deixe e me obrigue
a não seguir-te; porque, aonde quer que fores, irei eu e, onde quer que
pousares, ali pousarei eu; o teu povo é o meu povo, o teu Deus é o

238 Quando os israelitas chegaram a Cades, eles encontraram um reino bem organizado,
Edom. Mas foram proibidos de atravessar o território edomita (Nm 20.14-21). Eles
viajaram para o norte, que era ocupado pelo rei dos amorreus, Seom. Ele também proibiu
que o povo de Israel atravessasse por sua terra, mas os israelitas o derrotaram e ocuparam
seu país (Nm 21.21-24). Eles foram instruídos por Deus através de Moisés para não tentar
ocupar o território amonita, como já tinha sido dado aos descendentes de Ló (Dt 2.19, 37).
239 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (139). Wheaton, IL:

Victor Books.

113
meu Deus. 17 Onde quer que morreres, morrerei eu e aí serei
sepultada; faça-me o SENHOR o que bem lhe aprouver, se outra coisa
que não seja a morte me separar de ti” (Rt 1.16-17).

A escolha de Rute é notável, porque tudo o que ela sabe é tragédia e perda.
No entanto, ela, uma estrangeira em Israel, foi capaz de colocar sua confiança no
Senhor.
Quando Naomi chega em Belém, ela diz a todos de sua perda. Quando ela
saiu, tinha uma família, mas agora estava sozinha. Seu nome significa “agradável”,
mas sua vida se tornou amarga. Então, um raio de esperança invade a história. A
colheita da cevada estava começando.
A história de Rute continua com seu encontro com Boaz (Rt 2.1–3.18), um
parente de seu marido morto. Nos tempos do Antigo Testamento, era costume que
uma viúva que não retornasse à casa de seu pai se casasse com alguém da família
de seu marido morto. O parente mais próximo tinha esse privilégio e obrigação.
Na manhã seguinte, na porta da cidade, Boaz se reúne com o outro parente-
redentor. Ele o convida a comprar as terras de Elimeleque e se casar com Rute.
Havia uma lei na qual um homem deveria se casar com a viúva de seu irmão e
capacitá-la a ter um filho para continuar a linhagem da família (Dt 25.5-6).
O parente mais próximo recusa a oferta. Ou ele não queria se casar com uma
estrangeira, ou não podia se dar ao luxo de comprar um campo apenas para deixá-
lo para outra pessoa. O caminho estava aberto para Boaz para comprar o campo e
se casar com Rute.240
Boaz se casa com Rute e eles têm um filho, Obede. Seu nome significa
“servo”. Orgulhosamente Naomi leva seu neto e cuida dele. Agora ela tem um
parente! Obede foi o pai de Jessé; ele, por sua vez, foi o pai de Davi. O rei Davi
nasceu em Belém, a casa do pão. Ou seja, Rute se tornou um membro da genealogia
de Jesus. O Senhor Jesus também nasceu em Belém.
A história de Rute começou com rebelião, com uma família que vai a sua
própria maneira, ao invés da maneira de Deus, sofrendo as consequências
amargas. Ele termina com a renovação de Naomi e com os outros se regozijando
com ela diante da bondade de Deus, que havia concedido um parente-redentor.
Toda a esperança dela estava agora sobre o neto que nasceu, assim como a
esperança do cristão é focado no Filho, que nasceu para ser o Redentor.
É uma das histórias mais gloriosas do Antigo Testamento; por isso é
importante entender que a natureza dessa proibição “... achou-se escrito que os
amonitas e os moabitas não entrassem jamais na congregação de Deus...” (Ne 13.1),
não é contra a etnia. Este não é um texto para justificar a superioridade de uma
etnia sobre a outra - neste caso, os israelitas ou os judeus contra os amonitas e os
moabitas. A preocupação aqui é sobre a pureza da adoração.

“Naquele dia, se leu para o povo no Livro de Moisés; achou-se escrito que
os amonitas e os moabitas não entrassem jamais na congregação de Deus...”
(v. 1) – Antes da decadência moral se instalar em Jerusalém, as pessoas tinham
ouvido a leitura das Escrituras, que os tornaram conscientes dos preceitos de Deus

Knowles, A. (2001). The Bible guide (1st Augsburg books ed.) (130–131). Minneapolis,
240

MN: Augsburg.

114
(13.1-3). A razão por que Deus não queria que Israel aceitasse os estrangeiros em
seu meio era porque isso poderia corromper o povo de seguir somente ao Senhor.
Por exemplo, Balaão era um profeta mercenário que tentou amaldiçoar
Israel, mas cada uma de suas maldições se transformou em bênção para Israel (Nm
22-24). Todavia, Balaão incentivou os moabitas a praticar a política da “boa
vizinhança”. Ele os orientou para que convidassem os judeus a participarem de
suas festas religiosas, o que envolvia imoralidade e idolatria (Nm 25). Como
resultado, Israel foi punido por Deus, e 24.000 pessoas morreram (Nm 25.9).
Assim, em algum momento durante a ausência de Neemias, a leitura da
Escritura havia levado à obediência. A única maneira de detectar a permissividade
espiritual tanto na igreja quanto em nós mesmos é por meio da Palavra de Deus.
Entretanto, Satanás arquitetou um plano contra o povo de Israel, e o povo
de Deus cedeu à permissividade espiritual em quatro áreas.

I. Tolerância quanto aos relacionamentos errados (13.4-9).


“4 Ora, antes disto, Eliasibe, sacerdote, encarregado da câmara da casa
do nosso Deus, se tinha aparentado com Tobias; 5 e fizera para este
uma câmara grande, onde dantes se depositavam as ofertas de
manjares, o incenso, os utensílios e os dízimos dos cereais, do vinho e
do azeite, que se ordenaram para os levitas, cantores e porteiros, como
também contribuições para os sacerdotes. 6 Mas, quando isso
aconteceu, não estive em Jerusalém, porque no trigésimo segundo ano
de Artaxerxes, rei da Babilônia, eu fora ter com ele; mas ao cabo de
certo tempo pedi licença ao rei e voltei para Jerusalém”.

Quando Neemias voltou a Jerusalém, enfrentou uma tarefa que, em alguns


aspectos, deve ter sido mais difícil do que a reconstrução dos muros.241 O templo
continha algumas salas que eram usadas para armazenar as ofertas de cereais,
utensílios e os dízimos do povo (13.5). Na ausência de Neemias, o sumo sacerdote,
Eliasibe, havia esvaziado uma sala grande e outras salas menores (13.5, 9), de
modo que Tobias, o amonita, pudesse se estabelecer confortavelmente!

“Ora, antes disto, Eliasibe, sacerdote, encarregado da câmara da casa do


nosso Deus, se tinha aparentado com Tobias” (v. 4) – Tobias era um
escarnecedor que se opôs fortemente aos esforços de Neemias para reconstruir os
muros (2.10, 19; 4.3, 7-8). Mas por que o sumo sacerdote permitiu tal coisa?
Primeiro, o antigo inimigo de Neemias sempre tivera admiradores e apoiadores
ligados por juramento a ele, nos mais altos círculos de Judá (Ne 6.17-19).242 Talvez,
porque Tobias tivesse um nome judeu (que significava, “Deus é bom”). Então, ele
não era totalmente amonita! Apenas parcialmente!
Além disso, a palavra “aparentado” (qarob, em hebraico), significa estar
intimamente ligado ou estar perto. É utilizada no livro de Rute, para descrever a
relação estreita que existia entre Boaz e Noemi (um parente “chegado” - Rt 2.20). A
palavra também é utilizada para descrever um relacionamento familiar e amizade

241 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 12.44–47). Wheaton, IL: Victor Books.
242 KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 142.

115
(Jó 19.14).243 Assim, Eliasibe, um israelita de destaque, estava em estreita aliança
com o inimigo (Tobias) de Israel, se não completamente íntimo dele.

“Então, soube do mal que Eliasibe fizera para beneficiar a Tobias...” (v.
7) – Quando Neemias tomou conhecimento do que Eliasibe havia feito, ficou
indignado e considerou tal atitude como algo mal. A palavra “mal” é (ra ,̀ em
hebraico), muitas vezes é utilizada em contraste com a palavra “bom” (tov, em
hebraico). Ou seja, a palavra “bom” se refere a algo da revelação divina. Foi a
maneira como Deus criou as coisas e as projetou para funcionarem. Vemos um
retrato disto em Gênesis, onde o escritor diz: “Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que
era muito bom. Houve tarde e manhã, o sexto dia” (Gn 1.31). Logo, a palavra ra '- é o
modo oposto de como Deus criou para funcionar.244 Assim, para Neemias, o
comportamento de Eliasibe era exatamente o oposto da maneira como Deus queria
que as câmaras fossem utilizadas.
Relacionamentos errados podem danificar seriamente nossa vida espiritual.
Paulo disse a Timóteo sobre aqueles que detêm uma forma de piedade, mas negam
o seu poder, “... Foge também destes” (2Tm 3.5).

“Isso muito me indignou a tal ponto, que atirei todos os móveis da casa
de Tobias fora da câmara” (v. 8) – Quando Neemias descobriu o que Eliasibe
tinha feito, ele não perdeu tempo, quer investigando ou negociando. Ele
simplesmente jogou todos os bens de Tobias para fora! Em seguida, ordenou a
limpeza do Templo e tornou a trazer as ofertas de cereais para o local de origem.
Imagine como Tobias deve ter reagido quando chegou em casa, perguntou o que
aquela pilha de móveis estava fazendo do lado de fora e, em seguida, abriu a porta
e viu seu “apartamento” cheio, até o teto, com grãos!

II. Tolerância quanto à infidelidade nos dízimos (13.10-14).


“10 Também soube que os quinhões dos levitas não se lhes davam, de
maneira que os levitas e os cantores, que faziam o serviço, tinham
fugido cada um para o seu campo. 11 Então, contendi com os
magistrados e disse: Por que se desamparou a Casa de Deus? Ajuntei
os levitas e os cantores e os restituí a seus postos. 12 Então, todo o
Judá trouxe os dízimos dos cereais, do vinho e do azeite aos
depósitos”.

Um grande líder não anda de forma displicente. Na verdade, ele está sempre
atento, com os ouvidos e os olhos bem abertos. De forma semelhante, pais sábios
sempre olham e ouvem o que seus filhos estão fazendo.245 Eles ouvem atentamente
a música que sai do quarto, e descobrem o que está acontecendo por trás de
qualquer porta que permanece fechada.

“Também soube que os quinhões dos levitas não se lhes davam...” (v. 10)
– Este problema está ligado ao anterior. Problemas espirituais raramente ocorrem

243Strong, J. (2001). Enhanced strong’s lexicon. Bellingham, WA: Logos Bible Software.
244Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 13.4–9). James L. Fleming.
245 Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson

Company], 1998, p. 154).

116
isoladamente! Porque Tobias havia se mudado para o templo, não havia salas
suficientes para os dízimos. Assim, os sacerdotes não exigiam que as pessoas
entregassem seus dízimos e, como resultado, os levitas tiveram que abandonar as
suas possibilidades na Casa de Deus e realizar trabalho nos campos para garantir a
sobrevivência.
A razão da negligência dos dízimos não significa que Tobias havia se
apropriado deles.246 A Bíblia simplesmente declara que as pessoas não davam os
quinhões (a porção) dos levitas. Ora, se Eliasibe, o sumo sacerdote, estava agindo
de forma inescrupulosa, as pessoas provavelmente tinham começado a perder a
confiança no estabelecimento sacerdotal, e é compreensível que os dízimos fossem
negligenciados. Por outro lado, a obrigação do dízimo permanecia,
independentemente da qualidade espiritual da liderança; o dízimo era um
mandamento bíblico (Ml 3.8-10).247

“Então, contendi com os magistrados e disse: Por que se desamparou a


Casa de Deus? Ajuntei os levitas e os cantores e os restituí a seus postos” (v. 11)
– Neemias lidou com esse problema através dos próprios magistrados, uma vez
que a responsabilidade pela cobrança dos dízimos era deles. Ele repreendeu,
restabeleceu os levitas em sua posição, e restabeleceu o sistema de recolhimento
dos dízimos.

“Então, todo o Judá trouxe os dízimos dos cereais, do vinho e do azeite


aos depósitos” (v. 12) – Além de repreender os líderes por sua negligência,
Neemias tomou medidas para corrigir o problema (cf. 13.17-19). Ele nomeou
quatro homens para supervisionar a tesouraria e distribuir os dízimos e ofertas
(Selemias, Zadoque (justo), Pedaías e Hanan), “porque estes homens foram
achados fiéis” (v. 13). Note que estes homens representavam os sacerdotes, levitas,
escribas e leigos, mas todos eles tinham uma coisa em comum: eles eram fiéis ao
Senhor.248 Além disso, requer dos despenseiros que “seja encontrado fiel” (1Co
4.2).
A menção de Zadoque como “escriba” é importante. Uma vez que somente
Esdras foi chamado de “o escriba”. Antes de Zadoque, é razoável supor que Esdras
não estivesse mais na cidade (talvez tenha voltado para a Babilônia), ou estivesse
muito idoso para oficiar (tinha chegado em Jerusalém antes de Neemias), ou
estivesse morto.
O profeta Malaquias estava ministrando neste momento. Ele condenou as
pessoas por roubarem a Deus, por não trazerem seus dízimos à casa do tesouro
(Ml 3.8-10). O dízimo não é invenção da Igreja, é um princípio estabelecido por
Deus. O dízimo é ensinado em toda a Bíblia: antes da Lei (Gn 14.20), na Lei (Lv
27.30), nos livros históricos (Ne 12.44), poéticos (Pv 3.9,10), proféticos (MI 3.8-
12), e também no Novo Testamento (Mt 23.23; Hb 7.8).

246 Nem todos concordam com esta interpretação. Para Hernandes Dias Lopes, “as ofertas
para o sacerdócio foram desviadas para Tobias. Por isso, os obreiros da Casa de Deus, por
falta de sustento, precisaram fugir para os campos” (LOPES, Hernandes Dias. Neemias, o
líder que restaurou uma nação. São Paulo: Editora Hagnos, 2006, p. 207).
247 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (139). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.
248 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (144). Wheaton, IL:

Victor Books.

117
“Por isto, Deus meu, lembra-te de mim e não apagues as beneficências
que eu fiz à casa de meu Deus e para o seu serviço” (v. 14) – Em seguida,
Neemias orou para que Deus se lembrasse dessas ações tomadas em nome de sua
casa (13.11-14).
Esta é a primeira oração registrada desde 6.14, e a sétima oração “rápida”
encontrada no livro. São encontradas mais três orações em 13.22, 29 e 31. Ele
tinha o hábito de falar com Deus enquanto trabalhava, um bom exemplo para
seguirmos.249 Ele lembrou a Deus de sua fidelidade e orou para que aquilo que
havia feito não fosse apagado.

“... e não apagues as beneficências que eu fiz à casa de meu Deus e para
o seu serviço” (v. 14) – A expressão “as beneficências” pode ser traduzida: “meus
atos de amor leal” (hesed, em hebraico). Uma qualidade que aceita uma obrigação e
a cumpre, custe o que custar.250 No verso 22 é Deus quem demonstra esta
qualidade.

Neemias não estava pedindo bênçãos sobre a função do seu mérito pessoal,
porque ele sabia que as bênçãos de Deus vêm só por causa da misericórdia de Deus
(v. 22). Esta oração é semelhante ao registrado em 5.19, onde Neemias apenas
pede a Deus para lembrar-se dele, e do que havia feito. Ele queria a recompensa de
Deus, não dos homens.

III. Tolerância quanto à quebra do dia do Senhor (13.15-22).


“15 Naqueles dias, vi em Judá os que pisavam lagares ao sábado e
traziam trigo que carregavam sobre jumentos; como também vinho,
uvas e figos e toda sorte de cargas, que traziam a Jerusalém no dia de
sábado; e protestei contra eles por venderem mantimentos neste dia.
16 Também habitavam em Jerusalém tírios que traziam peixes e toda
sorte de mercadorias, que no sábado vendiam aos filhos de Judá e em
Jerusalém”.

A maior seção de Neemias 13 lida com a profanação do sábado (13.15).


Outro compromisso que Israel havia feito por escrito foi o de manter a Lei de Deus
sobre o sábado (10.31). Neemias também descobriu que as pessoas tinham violado
esta promessa.

“Naqueles dias, vi em Judá os que pisavam lagares ao sábado e traziam


trigo que carregavam sobre jumentos...” (v. 15) – Neemias descobriu que muitos
do povo estavam trabalhando no dia de sábado, como faziam nos outros dias da
semana. Alguns comerciantes da cidade de Tiro estavam negociando, em pleno
sábado, peixe importado e mercadorias (v. 16). Sem dúvida, os judeus poderiam
utilizar algumas desculpas para violar o sábado. “Se eu não pisar minhas uvas

249 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (145). Wheaton, IL:
Victor Books.
250 KIDNER, Derek. Esdras e Neemias. São Paulo: Editora Vida Nova, 2011, p. 143.

118
neste dia, elas vão apodrecer!” “Todo mundo está negociando” ou “Todos os peixes
importados vão apodrecer, se não vendermos!”
Antes de tudo, se faz necessário destacar que os cristãos não estão sob a Lei
específica do sábado do Antigo Testamento (Gl 4.10). Nos foi dado um novo dia, o
“Dia do Senhor”, para desfrutar. O dia do Senhor tem um direito de graça sobre
todos os filhos da graça. Nunca devemos esquecer isto. Isso não significa que não
devamos desfrutar no espírito de graça e liberdade; mas usá-lo para proveito
próprio não é usá-lo para Cristo.251 Agir assim é agir como aqueles que não
conhecem a Deus, os gentios.
No Novo Testamento, o Sábado foi substituído pelo domingo da
ressurreição. No entanto, o domingo (Dia do Senhor) deve ser um dia específico
para um fim específico (Is 58.1). A questão principal é o que devemos fazer em vez
do que não devemos fazer no dia do Senhor. Para um estudo mais aprofundado leia
o comentário do capítulo 10.

Neemias tomou quatro atitudes típicas de seu estilo de liderança.252


Primeiro, ele repreendeu os nobres que eram responsáveis pela vida da
cidade, alertando-os de que por tais abusos o juízo de Deus havia recaído sobre
Israel (v. 17-18). Neemias focou no pecado da quebra do sábado, sabendo que Deus
castigaria o povo por causa da desobediência. A natureza do exílio que eles
estavam vivendo poderia ser, em parte, explicada em função da quebra do sábado,
no passado.253 Era característico de Neemias trabalhar com aqueles que estavam
oficialmente no comando.
Segundo, ele trancou as portas no sábado, colocando alguns de seus
próprios homens sobre elas. Se as portas não estivessem abertas, nenhuma
mercadoria entraria na cidade.
Terceiro, quando os mercadores (provavelmente os comerciantes de Tiro),
permaneceram acampados fora de Jerusalém, esperando por uma mudança no
regulamento do sábado, ou talvez à procura de uma maneira de contorná-las,
Neemias os ameaçou de forma contundente (v. 20). Ele não queria que eles
ficassem mesmo em torno do perímetro da cidade judaica.
Finalmente, Neemias instruiu os levitas para purificarem-se e, em seguida,
assumissem a tarefa de guardar os portões da cidade, no sábado (v. 22). Neemias
queria garantir que nenhuma compra ou venda fosse feita neste dia.

“Deus meu, lembra-te de mim; e perdoa-me segundo a abundância da


tua misericórdia” (v. 22) – Depois de contar o que fez para restaurar a
observância do sábado, Neemias busca a Deus, na segunda das quatro orações
semelhantes neste capítulo: “Deus meu, lembra-te de mim...”. Sua consciência era
clara, pois ele sabia que havia feito tudo para o bem do povo e à glória de Deus.
Provavelmente haveria pouca valorização das pessoas, apesar de seus sacrifícios,
mas ele sabia que Deus iria recompensá-lo adequadamente.

251 KELLY, William. Estudos sobre os livros de Esdras & Neemias. São Paulo: Depósito de
Leitura Cristã, 2007, p. 101.
252 Boice, J. M. (2005). Nehemiah: an expositional commentary (139). Grand Rapids, MI:

BakerBooks.
253 MOHLER Jr. R. Albert. Palavras do fogo. Como ouvir a voz de Deus nos Dez Mandamentos.

São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010, p. 68.

119
IV. Tolerância quanto aos casamentos mistos (13.23-29).
“23 Vi também, naqueles dias, que judeus haviam casado com
mulheres asdoditas, amonitas e moabitas. 24 Seus filhos falavam meio
asdodita e não sabiam falar judaico, mas a língua de seu respectivo
povo”.

O povo de Judá também havia prometido, por escrito, que não iria se casar
com pessoas pagãs (10.30). No entanto, quando Neemias chegou a Jerusalém,
descobriu que muitos tinham violado, também, este compromisso (cf. Ed 9.1-4;
10.44; Ml 2.10-11), casando-se com mulheres asdoditas, amonitas e moabitas (cf.
Ed 10.1-3). Isso também tinha sido proibido na Lei de Moisés (Êx 34.12-16; Dt 7.1-
5).
Além do mais, as crianças estavam crescendo em lares onde eram incapazes
de falar a língua de Judá. Neemias viu, claramente, que o casamento misto estava
corrompendo a segunda geração, bem como a primeira. Neemias não podia
permitir que o compromisso de sua geração destruísse anos de trabalho duro. A
situação era desesperadora (13.23-24).

“Contendi com eles, e os amaldiçoei, e espanquei alguns deles, e lhes


arranquei os cabelos...” (v. 25) – Neemias contendeu com os homens que tinham
casado com essas mulheres estrangeiras. Ele “amaldiçoou”, ou seja, colocou uma
maldição religiosa sobre eles. Ele açoitou alguns e arrancou os cabelos. Estes eram
castigos que, sem dúvida, faziam parte das penalidades previstas nos juramentos
que estes homens tinham feito alguns anos antes (cf. 10.30).
Em uma ação semelhante, Esdras arrancou o próprio cabelo e a barba (Ed
9.3), mas Neemias arrancou o cabelo de alguns dos judeus! Conforme Walvoord,
ter os cabelos arrancados era uma vergonha (2Sm 10.4; Is 50.6).254 A atitude de
Neemias pode parecer violenta e inadequada para um homem de Deus. No entanto,
ele estava preocupado de que o juízo de Deus não caísse novamente sobre Judá.
Neemias estava tão indignado com a injustiça desses judeus que, literalmente,
correu ao redor arrancando os cabelos deles.255 Essa atitude era um indicativo da
intensidade emocional que Neemias estava sentindo. Ele sabia que Deus não iria
tolerar este pecado.

“Não pecou nisto Salomão, rei de Israel? Todavia, entre muitas nações
não havia rei semelhante a ele, e ele era amado do seu Deus...” (v. 26) – Em
seguida, Neemias cita o exemplo de Salomão para apoiar o argumento de que se
uma pessoa, tanto material quanto espiritualmente, poderia ser levada ao pecado
por intermédio de suas esposas estrangeiras (1Rs 11). As esposas e concubinas
estrangeiras levaram o rei Salomão à idolatria e pecado, e todo Israel sabia disso.
Salomão procurou garantir a paz e a prosperidade para Israel através de seus
muitos casamentos, mas ao invés disso, garantiu uma erosão espiritual e
instabilidade.256

254 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 13.25–27). Wheaton, IL: Victor Books.
255 Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson

Company], 1998, p. 157).


256 Fleming, J. L. (2005; 2005). Rebuilding the wall (Ne 13.23–31). James L. Fleming.

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Satanás nunca chega e diz a um jovem cristão: “Você não gostaria de se
casar com esta simpática jovem de Asdode? Ela vai levar os seus filhos para o mau
caminho. Seus filhos serão meio-pagãos e seus netos serão totalmente pagãos”. Em
vez disso, ele diz, “Seus pais são muito rigorosos. Eles seguem as Leis de Deus e
insistem que você as siga também. Saia fora! Olha quanta diversão você teria com
as jovens de Asdode! Você não tem que se casar com ela. Apenas saia e divirta-se
um pouco!” E antes que ele perceba, sua vida moral estará comprometida,
enquanto, ao mesmo tempo, ele promete que vai seguir o seu Deus depois que se
casar.

“Um dos filhos de Joiada, filho do sumo sacerdote Eliasibe, era genro de
Sambalate, o horonita, pelo que o afugentei de mim” (v. 28) – Neemias também
descobriu que o neto do sumo sacerdote havia se casado com a filha de Sambalate,
o horonita, um amargo inimigo que havia resistido tão resolutamente à construção
do muro (Ne 2.10,19; 4; 6).
Neemias expulsou de Jerusalém o neto de Eliasibe. Ele havia jogado os
móveis de Tobias fora do templo (v. 8), agora, ele faz o mesmo com o genro de
Sambalate.257
As relações familiares têm sido, muitas vezes, a causa da decadência
espiritual do povo de Deus. E, ainda hoje, os crentes colocam os interesses dos
membros da família sobre o bem-estar da igreja e da obra de Deus. Todo crente
precisa estar em guarda para manter a “família” na perspectiva correta. A
complacência é como uma pequena rachadura em uma barragem que, sutilmente,
vai crescendo até destruir tudo em sua volta. Nesse ponto, o dano é grave e
generalizado.
Outras medidas tomadas por Neemias, em seu retorno, incluíram: (1) a
purificação das pessoas de todos os estrangeiros; (2) a nomeação de deveres
específicos para os sacerdotes e levitas, (3) a organização do suprimento de
madeira para o templo, e a organização das primícias.

“Lembra-te de mim, Deus meu, para o meu bem” (v. 31) – Pela quarta vez
neste capítulo, Neemias busca a presença de Deus (13.14, 22, 29, 31). Isso significa
que ele não estava agindo contra a permissividade do povo por seu próprio bem.
Ele estava fazendo isso por amor a Deus.258
Este livro ressalta a importância da proteção física para o povo de Deus em
Jerusalém, todavia, o mais importante: salienta a necessidade de seu povo
obedecer a sua Palavra, não cedendo ao pecado pela negligência, compromisso ou
desobediência.
A perseverança é uma qualidade de todos os grandes líderes. Devemos
cultivá-la até que possamos dizer com o apóstolo Paulo, “Combati o bom combate,
completei a carreira, guardei a fé. Já agora a coroa da justiça me está guardada, a
qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele Dia; e não somente a mim, mas também a
todos quantos amam a sua vinda” (2Tm 4.7-8).

257 Walvoord, J. F., Zuck, R. B., & Dallas theological seminary. (1985). The Bible knowledge
commentary: an exposition of the scriptures (Ne 13.28–29). Wheaton, IL: Victor Books.
258 Wiersbe, W. W. (1996). Be determined. “Be” commentary series (148). Wheaton, IL:

Victor Books.

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Para estas reformas Neemias orou para que Deus se lembrasse dele para
sempre.259 A inclusão das memórias de Neemias no cânon sagrado foi uma
resposta a sua oração (13.30-31).

Conclusão:
O último capítulo de Neemias reforça a impressão já criada nos capítulos
anteriores sobre este homem. Ele era fervoroso em seu zelo para com Deus. Ele
possuía uma Santa ousadia capaz de confrontar de maneira franca seus amigos e
inimigos. Além disso, Neemias era um planejador e magistral motivador. Ele
também era um homem de ação. Mais importante ainda, ele era um homem das
Escrituras e um homem de oração. O comentarista Smith, J. E, acertadamente
declarou: “Um homem que se aproxima de Deus de joelhos vai ficar acima de
qualquer geração”.260
O capítulo 13 pode ser resumido em três importantes palavras: retidão,
convicção e devoção.261

Em primeiro lugar, a retidão. Seja honesto com suas ações. Você deve
defini-las de acordo com a Palavra de Deus. Isso é retidão. Isso é ser honesto!
Talvez, o problema seja uma aliança comprometedora que você assumiu em sua
empresa, em sua vida social, ou em sua vida amorosa.
Hoje, no novo evangelho, a salvação é substituída pela terapia. O pecado dá
lugar à auto-estima; e a doutrina da justificação pela fé perde espaço para a
doutrina do pensamento positivo. Essa nova versão do cristianismo faz da Bíblia
não uma Palavra de salvação, mas um manual de instruções detalhadas para uma
vida feliz.262
Precisamos ser honestos com nossos erros, caso contrário, pagaremos um
preço alto por negligenciá-los. Sansão andou tão longe de Deus que nem percebeu
que Deus havia se apartado dele (Jz 16.20). Ele nem sabia que Deus o havia
deixado! Sansão tinha vivido uma mentira por tanto tempo que ele não conseguia
ver o impacto de sua hipocrisia.

Em segundo lugar, a convicção. Uma caminhada piedosa requer


determinação e a tomada de medidas fortes para se manter firme.
Josué disse: “... escolhei, hoje, a quem sirvais: se aos deuses a quem serviram
vossos pais que estavam dalém do Eufrates ou aos deuses dos amorreus em cuja terra
habitais. Eu e a minha casa serviremos ao SENHOR” (Js 24.15).
Note que ele não disse, “Vamos discutir essa ideia? Gostaria de falar sobre
isso?” Ele disse: “É isso!” Se você deseja agradar a Deus, então seja firme em suas
convicções. Não negocie a sua fé.

259 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 13.30–31).
Joplin, MO: College Press.
260 Smith, J. E. (1995). The books of history. Old Testament survey series (Ne 13.30–31).

Joplin, MO: College Press.


261 Swindoll, Charles R. Hand me another brick. [Word Publishing, Thomas Nelson

Company], 1998, p. 159).


262 VEITH, Gene Edward. Reforma hoje. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1999, p. 76.

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Em terceiro lugar, a devoção. Este é o lugar onde muitos cristãos bem
intencionados perdem. Devemos manter um equilíbrio entre defender o que é
verdadeiro, e manter um coração vivo diante do Senhor.
Neemias termina o seu livro como começou: de joelhos! Ele lutou muito
para fazer o que era correto, mas ao mesmo tempo manteve seu coração firme
diante do Senhor. Ele era um homem reto, dedicado e piedoso.

Que Deus levante mais Neemias em nossa geração.

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