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UFPE - Campus Recife

Gabriela Gomes de Melo


Cinema e Infância
Orientação: Nina Flor, Bruno Mesquita, Ângela Pryston
Trabalho final

GINA - EXPERIMENTO 1
Filme: https://youtu.be/eqvvxQVxWn4

Introdução

Uma vez li no Instagram que existe uma conexão muito forte entre neta e avó materna, Isso
porque um bebê de sexo biológico feminino já nasce com todos os óvulos que terá a vida
inteira, É como se eu, assim como minha mãe, tivesse sido de certa forma carregada por minha
avó. Sou neta de uma mulher nascida em Frexeiras, Pernambuco. Ambrosina Rodrigues dos
Santos, carinhosamente chamada de Gina. Minha vó nasceu em 1931, num engenho de cana
de açúcar, e esse mês de outubro completou seus 90 anos. A memória de minha vó é incrível,
ela sempre lembra, no dia, o aniversário dos 10 filhos, mais de 30 netos, mais de 20 bisnetos e
ainda dos genros e noras. Eu sou profundamente orgulhosa das mulheres da minha família.
Elas são símbolos de força, de alegria, de sabedoria e de arte. Minha vó, mesmo vivendo num
local tão isolado, sabia cordéis inteiros decorados, peças teatrais inteiras, e sempre declamou
eles pra mim, desde muito pequenininha. Tenho tias poetas, tias costureiras e minha mãe tem a
mente criativa e extremamente ativa do artista, sempre que olho ela está criando uma nova
forma de arte. Cresci ouvindo mainha cantarolando tantas e tantas músicas, e exatamente
enquanto escrevo esse texto ela acaba de começar a cantar "Vira Virou - MPB4". Ver a imagem
tão forte da arte nessas mulheres que não tiveram incentivo financeiro ou cultural para exercer
ofícios artísticos, mas que não conseguem negar suas naturezas artesãs, me faz, enquanto
parte da primeira geração de artistas em minha família que realmente tem condições de
estudar e sobreviver de arte, extremamente orgulhosa do legado que carrego.

Construção criativa

A ideia surgiu com a intenção de fazer um filme em homenagem à minha vó, filme esse que
gostaria de lhe mostrar em vida. Um filme pra ela, principalmente para ela, e não para as outras
gerações da minha família lamentarem a saudade que inevitavelmente virá, ao mesmo tempo
sei que será um registro importante sobre minha vó para a posteridade, mas quero muito que
ela veja. Então o questionamento principal foi: como fazer que esse filme toque pessoalmente
minha vó dentro de sua história, que lhe traga identificação, que seja simples, singelo. Esse é o
meu maior desafio. Infelizmente não consegui fazer esse filme a tempo. Os motes de
inspiração para esse projeto foram os filmes Nossos Traços e Gigante, de Rafael Spínola,
assistidos em sala de aula. Eles me tocaram muito a respeito de memória, de ausência e de
presença e eu quis trabalhar de alguma forma esses três conceitos. Além disso, me atravessou
muito a singeleza dos filmes, algo que acho dificílimo de alcançar.
Para a construção do roteiro, houveram duas ideias principais, a crise de pensamento do
lamento por não ter mais memórias dos conteúdos das poesias que voinha declamava pra mim
antigamente somada ao pensamento que ela em breve pode partir, e minha experiência
pessoal sobre o que seria a excentricidade e sofrimento do artista, na figura da tia Bedé, que é
uma personagem fictícia que busca homenagear as mulheres de minha família e de certa
forma busca também mostrar como muitas vezes me sinto socialmente enquanto artista de
teatro e música, que vive de teatro e música.

Imageticamente, utilizei imagens de uma casa no início tentando trazer aconchego mas ao
mesmo tempo melancolia pela ausência de pessoas e também para, de certa forma,
paramentar a narração da personagem dentro de uma casa, em uma visita. E as imagens do
meu quarto no final foram com a ideia de mostrar um pouco como o legado dessas mulheres
influi fisicamente no meu espaço/vida. Já o meio, com as fotografias de minha vó eu gostaria
de personificar a presença dela, principalmente por ela não ser a personagem que é citada,
mas sim a personagem que escuta a narração. E para representar a tia Bedé, que não existe,
cobri fotos de minha mãe com recortes de cabeças e de pés calçados. E no final, quando
revelo a história da carochinha, quis também revelar quem é a mulher por trás das fotos, que
de fato não é a personagem que estava ali representada e que inclusive está calçada, além de
querer registrar a minha mãe em vídeo porque acho ela tão bonita. A câmera na mão foi na
verdade um improviso, minha intenção era escanear as fotos e aproximar elas, passar por
partes delas, para ter qualidade de imagem, mas depois gostei de como ficou esse passeio
pela linha das fotos.

Para a parte sonora eu quis muito abrir e fechar com áudios de minha vó que fiz recentemente
durante a cadeira. A cadeira de Cinema e Infância abriu muito meus olhos para a observação
das histórias reais ao meu redor. Como as paredes contam histórias, como as pessoas contam
histórias o tempo todo, como os olhares contam histórias, e tenho gostado de exercitar essa
atenção. Foi isso que me incentivou a gravar a voz dela e registrar o tanto que ela tem pra
contar. A música que ela canta no final era de uma apresentação de teatro que ela fez na
escola aos 7 anos e ainda sabe toda decorada. No fim, eu quis colocar uma mistura de
músicas que me remetem a minha história com minha mãe e minha avó, mas foi bem difícil
escolher porque são muitas, futuramente quero amplificar esse sentido musical do filme.

Considerações finais

Esse trabalho foi um experimento para formas de como posso trabalhar o filme sobre voinha
Gina, e foi profundamente emocionante trabalhar esse material, achei relíquias, descobri coisas
sobre minha família que quero carregar em mim.

Créditos
Texto, concepção, filmagem e edição: Gabriela Melo Participações especiais: mãos do
meu irmão mais novo, Filipe Melo, e voz da minha mãe, Luzia Melo. Trecho de poema citado
por tia Bedé: Presságio IV - Hilda Hilst.

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