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POLÍTICASDE
DE
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POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL
SAÚDE
SAÚDEMENTAL
MENTAL
Desafios
DesafiosnonoBrasil
Brasil
Pós-Pandemia
Pós-Pandemia
Organizador
Organizador
Marcelo
Marcelo Kimati
Kimati Dias
Dias
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Marcelo Kimati Dias
(Organizador)
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Editora CRV
Curitiba – Brasil
2022
oto
última
de de
quadros
autores
página
e tabelas
par
P762
Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-3816-9
ISBN Físico 978-65-251-3815-2
DOI 10.24824/978652513815.2
2022
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
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Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Claudiane Tavares (UNILA)
Anselmo Alencar Colares (UFOPA) Luciene Alcinda de Medeiros (PUC-RJ)
Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Maria Regina de Avila Moreira (UFRN)
Carlos Alberto Vilar Estêvão (UMINHO – PT) Patrícia Krieger Grossi (PUC-RS)
Carlos Federico Dominguez Avila (Unieuro) Regina Sueli de Sousa (UFG)
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Cesar Gerónimo Tello (Univer. Nacional Thaísa Teixeira Closs (UFRGS -RS)
Três de Febrero – Argentina) Vanessa Rombola Machado (Universidade
Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG) Estadual de Maringá)
Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Vinícius Ferreira Baptista (UFRRJ)
Elizeu Clementino de Souza (UNEB)
Élsio José Corá (UFFS)
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Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
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APRESENTAÇÃO������������������������������������������������������������������������������������������ 13
Marcelo Kimati Dias
PREFÁCIO
PLANEJAR A RETOMADA DA REFORMA PSIQUIÁTRICA A PARTIR
DE 2023, EM TODAS AS SUAS FRENTES, MAS DE OLHO CRÍTICO
NOS ENORMES DESAFIOS DA CONJUNTURA BRASILEIRA���������������� 17
Eduardo Mourão Vasconcelos
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PARTE I
POLÍTICAS EM SAÚDE MENTAL
H
á pouco mais de 12 anos, estávamos próximos à realização de IV Conferência
Nacional de Saúde Mental. Na ocasião, atuava como assessor da coorde-
nação nacional de saúde mental e havia participado de diversas de etapas
municipais e estaduais, particularmente no Nordeste do país. A política nacional
sofria ataques em três frentes. Ao longo dos anos anteriores à conferência, o uso de
crack, em especial por jovens de classe média, havia se tornado um tema recorrente
na mídia, que dava sistematicamente mais espaço para psiquiatras, em particular
aqueles ligados à associação brasileira de psiquiatria. Esta, junto a outras entidades
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S
enti-me muito honrado com o convite de prefaciar esta coletânea tão impor-
tante organizada pelo Kimati. Vem de longe essa amizade e camaradagem,
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E mais: essa relevância se acentua depois de pelo menos seis anos de uma clara
política de contrarreforma psiquiátrica, pelos dois governos federais que assumiram
18
para avaliar o espaço possível de mudanças a partir de 2023, com base na análise que
consigo vislumbrar no momento em que escrevo, em agosto de 2022.
Apesar desta publicação estar sendo prevista para sair em outubro ou novembro
do presente ano, ou seja, após o resultado das eleições, há enormes perigos a frente
até lá que podem comprometer de forma radical o futuro político do país, se pelo
menos uma das várias ameaças de golpe ou de atraso no processo eleitoral, venti-
ladas atualmente pelos comentaristas políticos, se concretizarem. Elas podem ser
implementadas pelas seguintes estratégias:
que tem sido arregimentado pela campanha de Lula, incluindo atores da direita,
como políticos do PSDB e mesmo de partidos que atuam no chamado Centrão, que
até então apoiavam o atual governo. Isso pode ter importância no enfrentamento e
na derrota eleitoral do atual presidente, mas pode implicar em numerosas limitações
para a implementação de um governo voltado para os interesses majoritários da
maioria da população brasileira. As forças políticas conservadoras que hoje compõem
esta coalizão vão cobrar presença nos cargos do governo, reivindicar abrandamento
de medidas populares mais efetivas, como também cobrar concessões “não muito
republicanas” para manter o apoio ao novo governo dentro do Legislativo.
A crise de longo prazo que atingiu a economia internacional desde 2008, e que
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atingiu o Brasil desde 2013/14 não arrefeceu, foi por outro lado aprofundada pela
pandemia de coronavírus e mais recentemente pela guerra na Ucrânia (que os analistas
assinalam ser de longa duração) e seus desdobramentos na crise e aumento de preço
mundial de combustíveis e de algumas commodities. As principais economias mundiais,
como a China, Estados Unidos, Inglaterra e Comunidade Europeia, estão com baixo
crescimento, inflação e juros mais altos, com inúmeros reflexos para países como o Bra-
sil, que é muito dependente da demanda destes países para compra de nossos produtos.
No país, temos um retorno tímido e lento de algum crescimento econômico em
2022, com uma leve queda na taxa de desemprego formal até julho, mas com quase
metade dos trabalhadores ainda no mercado informal e o rendimento médio mais
baixo que nos anos anteriores. Quase 80% das famílias brasileiras tinham dívidas
em julho, o patamar mais alto desde o início desta série de indicadores, em 2010.
Junte-se a isso um índice de inflação nos preços ao consumidor (IPCA) nos últimos
12 meses que atingiu em maio quase 12%, segundo o IBGE, somado a uma taxa de
juros crescente que chegou em agosto a 13,75%, sem um viés de baixa.
De outro lado, o Estado brasileiro apresenta um quadro de forte crise fiscal,
gerada no longo prazo pelas políticas neoliberais, e no curto prazo principalmente
pelo descontrole do atual governo para gastos populistas com a população, com
objetivos claramente eleitorais, e com as inúmeras benesses a altos cargos do Exe-
cutivo, do Judiciário e particularmente do Legislativo federal, incluindo a emendas
parlamentares secretas, estimuladas pela atual gestão federal.
Este cenário implica em entraves sérios para o novo governo federal em 2023
tentar políticas de retomada do crescimento econômico, como também para desfazer
a PEC do teto de gastos sociais e retomar o devido financiamento de políticas sociais
básicas, como educação, saúde, assistência social, previdência, moradia, emprego etc.
implicar em dificuldades enormes para um novo governo federal tentar retomar esse
poder, e para formar uma coalizão estável de apoio no Congresso Nacional e nos
governos estaduais e assembleias legislativas, sem fazer concessões ao “toma lá, dá
cá” típico das relações atuais com os parlamentares e com seus partidos políticos,
com enorme risco de alimentar a corrupção.
As pesquisas sobre a dinâmica das redes sociais no Brasil indicam uma clara
hegemonia bolsonarista neste campo, estimulada por “gabinetes do ódio”, robôs de
repetição de mensagens, financiamento de empresários endinheirados de ultradireita
e descarado uso de fake news, constituindo verdadeiras “bolhas de comunicação”
Em segundo, o crescimento dessas igrejas tem aspectos paradoxais que precisam ser
reconhecidos. Na ausência de serviços sociais públicos, muitas dessas igrejas ofere-
cem apoio social, inserção comunitária para a população nas periferias das cidades
e estratégias de conversão de identidades sociais associadas ao crime e ao consumo
problemático de drogas, particularmente para homens, mas ao mesmo tempo, fomen-
tam a intolerância religiosa e o conservadorismo (Vasconcelos, 2019). Como indiquei
nesta obra, a simplificação da abordagem e não levar em conta todos esses aspectos
paradoxais não só constituem um equívoco analítico, como também bloqueiam o
nosso processo de comunicação e diálogo com vastos setores populares, levando-os
de forma ainda mais acentuada para os braços do conservadorismo.
resistência e avanços:
mais estratégicas e estruturantes. Do meu ponto de vista, é possível indicar alguns itens
que considero fundamentais nessa pauta, dos quais não podemos abrir mão:
Para encerrar, creio ser necessário esclarecer bem: a análise produzida neste
prefácio não pretendeu fomentar qualquer forma de pessimismo. A argumentação se
sustenta não só na formação em ciência política, mas particularmente nos “cabelos
brancos e na calvície”, ou seja, na longa experiência histórica daqueles que viveram
e iniciaram seu ativismo durante a ditadura civil-militar. Naquela época, era quase
impossível fazer reuniões, ter acesso a informações, por conta a censura draconiana,
e mesmo assim, alimentamos a teimosia e a coragem para fazer política e promover
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 29
a luta contra a ditadura, e conseguimos superar pelo menos a sua face mais visí-
vel. Essa experiência nos ensinou que a realidade é sempre dialética, que por trás
das aparências ela é cheia de contradições, e, portanto, que nós precisamos saber
identificá-las bem para podermos vislumbrar as boas oportunidades de resistência e
avanços. Junte-se a isso uma boa pitada de paciência histórica, misturada com uma
visada de mais longo prazo, e uma direção ético-política e emocional marcada pela
proximidade, trabalho de base e amizade com as Marias e Josés que conhecemos nas
populações mais oprimidas de nossa sociedade.
Assim, as dificuldades e limitações sempre estiveram presentes nesta cami-
nhada, e a esperança não arrefece perante elas. A gente precisa é manter a coragem,
esse compromisso de base, nutrir a sabedoria para desvendar os sinais da história,
e... seguir lutando!
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Referências
PARTE I
POLÍTICAS EM SAÚDE MENTAL
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A defesa e a garantia de direitos como medida forte da
qualidade das redes, serviços e práticas de saúde mental
A
afirmação da liberdade e dos direitos das pessoas com problemas de saúde
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1 World Health Organization. Gulbenkian Global Mental Health Platform. Innovation in deinstitutionalization:
a WHO expert survey. Geneva, World Health Organization, 2014.
2 Almeida, J. M. C. de. (2019). Política de saúde mental no Brasil: o que está em jogo nas mudanças em
curso. Cadernos de Saúde Pública [on-line]. 35(11).
3 Cruz, N. F. de O., Gonçalves, R. W. & Delgado, P. G. G. (2020). Retrocesso da reforma psiquiátrica: o
desmonte da política nacional de saúde mental brasileira de 2016 a 2019. Trabalho, Educação e Saúde
[on-line]. 18(3).
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 35
colocar em prática ações para pôr fim nesse cenário, afirmando a obrigação dos Esta-
dos, incluindo o Brasil, a tomar medidas para “integrar plenamente uma perspectiva
de direitos humanos nos serviços de saúde mental e comunitários”.
Um segundo documento a ser mencionado é o relatório produzido pelo Alto Comis-
sariado de Direitos Humanos, apresentado na 35ª sessão do Conselho de Direitos Humanos
da ONU, em 2017. Como resposta à mencionada Resolução, publicada no ano anterior,
este relatório recomenda o fim das violações contra pessoas com problemas de saúde
mental e aconselha capacitação e suporte técnico aos Estados membros nesse sentido
(UN, 2017). Sobre esses dois documentos, se, dito de modo geral, no cenário internacional
eles têm como papel traçar uma linha de base na defesa dos direitos das pessoas com
problemas de saúde mental, no cenário nacional esses documentos podem ser tomados
tanto como referência internacional da inaceitabilidade da violência perpetrada contra
pessoas com problemas de saúde mental – o que inclui a exclusão e segregação social
– como instrumento para demandar do Estado brasileiro ações para garantir direitos.
Já os relatórios produzidos pelo Relator Especial da ONU para o direito ao
mais alto padrão de saúde física e mental durante o mandado de 2014 a 2020 são
interessantes porque apresentam discussão e propõe uma agenda de direitos para a
saúde mental. Dentre os vários relatórios apresentados no período, dois deles são par-
ticularmente interessantes porque abordam questões amplas (UN, 2017; UN, 2020).
Em 2017, na esteira da menciona resolução, o Relator Especial da ONU para o
direito ao mais alto padrão de saúde física e mental publica um relatório que adota
uma posição de denúncia dos abusos e práticas nocivas em psiquiatria e pressiona
por uma “mudança de paradigma” na área. Mais do que afirmar que existe um
4 United Nations General Assembly. Human Rights Council. Resolution adopted by the Human Rights Council
on 1 July 2016. Mental health and human rights. 2016. A/HRC/RES/32/18.
5 United Nations General Assembly. Human Rights Council. Report of the United Nations High Commissioner
for Human Rights. Mental health and human rights. 2017. UN doc. A/HRC/34/32.
6 United Nations General Assembly. Human Rights Council. Report of the Special Rapporteur on the right of everyone
to the enjoyment of the highest attainable standard of physical and mental health. 2017. UN doc A/HRC/35/21.
7 United Nations General Assembly. Human Rights Council. Report of the Special Rapporteur on the right
of everyone to the enjoyment of the highest attainable standard of physical and mental health. 2020. A/
HRC/44/48.
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cenário de violações de direitos, no relatório é descrito por quais razões esse cenário
persiste, sendo identificados três grandes obstáculos para pessoas com problemas de
saúde mental gozarem de direitos: o domínio do modelo biomédico, as assimetrias
de poder e o uso tendencioso das evidências.
Sobre o modelo biomédico, o relator destaca que este é um paradigma reducio-
nista e ultrapassado que culmina na elaboração de políticas públicas que negligenciam
o contexto social e na alocação de recursos para “tratamentos individuais, o que é
um equívoco”. O relator argumenta que
[...] boa saúde mental e bem-estar não podem ser definidos pela ausência de algum
sintoma, mas devem ser determinados pelo ambiente social, psicossocial, político,
econômico e físico, o que possibilita que indivíduos e populações vivam uma vida de
dignidade, com pleno gozo de seus direitos e em busca equitativa de seu potencial”.
pessoas com problemas de saúde mental em todos os níveis do sistema. O relator afirma
que as iniciativas lideradas pelas pessoas com problemas de saúde mental devem “ter a
mesma importância do que outras abordagens para a formulação de políticas de saúde
mental que estejam em conformidade com as obrigações de direitos humanos”. Além
da redistribuição de poder no interior dos serviços, o que é proposto é a ampliação de
poder e de participação social em todas as esferas e espaços de formulação e execução
da política, dos programas e das estratégias de saúde mental.
Em uma mudança de perspectiva sobre como lidar com a questão das evidências,
fazendo uma inversão do raciocínio usual que assume que o valor está nas evidências
produzidas por dados e estas que devem orientar a prática, o relator assinala que é
necessário superar as “práticas baseadas em evidências” para, tendo como ponto de
partida e horizonte a produção de direitos, produzir “evidências baseadas em práti-
cas”. Ou seja, são as práticas que revelam as evidências que devem ser seguidas, pois
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elas que demonstram na realidade o que garante e o que não garante direitos. Ainda,
tensionando o debate das proposições de saúde mental global, o relator argumenta
que as práticas globais devem ser aquelas realizadas em nível local. Dito de outra
maneira, é a prática realizada em contextos e realidades locais – ou seja, a prática em
cada um dos serviços de cada um dos territórios, lá onde as pessoas vivem e tem seus
direitos violados – que se inventa modos de defender e garantir direitos. Trata-se de
posição importante porque coloca para o cenário internacional a primazia das práticas
alinhadas à perspectiva dos direitos humanos para ditar as evidências que devem ser
seguidas na atenção em saúde mental.
Uma terceira reflexão apresentada no relatório é a de que as práticas de saúde
mental precisam considerar os determinantes sociais e, indo além, de que é preciso se
“afastar dos modelos individualizados e causais dos determinantes da saúde e abordar
as condições estruturais e as causas básicas”. Sem entrar no debate entre determinantes
sociais versus determinações sociais, a essência deste enunciado é a de que na formula-
ção de políticas públicas de saúde é preciso reconhecer os determinantes sociais – sendo
um deles a iniquidade social – e incorporar nas propostas em saúde mental respostas
para estes. Ou seja, a direção colocada é a de que é preciso que as respostas às necessi-
dades das pessoas reconheçam as condições estruturais envolvidas na determinação das
necessidades singulares e construam saídas que abranjam essas determinações sociais.
Trata-se, assim, de afastar-se de um raciocínio simplista e redutor na leitura de um pro-
blema para compreender a complexidade das necessidades das pessoas nas relações e
em seus contextos de vida, do que segue que as respostas formuladas precisam abranger
essas relações e esses contextos, criando maneiras de abordar as condições estruturais
em cada situação – enfrentar a miséria, buscar estratégias para garantir moradia digna,
criar práticas para promover o direito ao trabalho e à renda, e assim por diante.
Por fim, este relatório, ao tratar de práticas baseadas em direitos, de seus prin-
cípios fundamentais e de seus enquadres normativos, afirma que em alguns lugares e
de maneira focalizada essas práticas já ocorrem. O Relator cita especificamente dois
exemplos de países que, mais do que experiências locais, fizeram robustas reformas
no sistema de saúde mental a partir do paradigma dos direitos: a Itália e o Brasil.
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importante para ser apreendido pelos atores da reforma psiquiátrica brasileira porque
institui direitos para as pessoas com, tal como denominado nos termos da Convenção,
desabilidades psicossociais – o que significa que ela abrange as pessoas usuárias dos
serviços de saúde mental.
À propósito, sobre esta terminologia é pertinente uma observação: no original,
na língua inglesa, ela recebe o nome de Convention on the Rights of Persons with
Disabilities, mas a tradução para a língua portuguesa optou por traduzir o termo disa-
bility por “deficiência”. Ocorre que no contexto dos debates internacionais, disability,
ou desabilidade, se refere a uma experiência temporária ou permanente vivenciada
pelas pessoas que resulta da interação entre uma deficiência (por exemplo, uma defi-
ciência intelectual) ou uma condição de saúde (por exemplo, um problema de saúde
mental) e fatores pessoais e ambientais, incluindo atitudes negativas, inacessibilidade
e apoio social limitado (WHO, 2021)10. A desabilidade pode ser permanente, mas
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também pode ser temporária e a extensão da desabilidade vivida por uma pessoa está
relacionada com as barreiras sociais existentes, incluindo a iniquidade social (WHO,
2021). Isso significa que contextos diferentes produzem desabilidades distintas e que,
na construção de percursos para garantia de direitos, é preciso responder às neces-
sidades pessoais e, também, transformar os contextos e as relações. Tal é o sentido
da ideia de desabilidade e da compreensão da população abrangida pela Convenção.
Isso posto, a CDPD inclui as pessoas com desabilidades psicossociais, o que
significa afirmar que este documento é um importante instrumento internacional para o
campo da saúde mental. Justamente, reconhecendo isso, a iniciativa Direito é Qualidade
(QualityRights) da OMS, lançada em 2012 e mencionada anteriormente, é fundamen-
tada no disposto nesta convenção. Esta iniciativa da OMS parte da constatação que
a violação dos direitos humanos das pessoas com desabilidades psicossociais é uma
realidade ainda hoje presente no cenário mundial e que a discriminação se concretiza
em diferentes dimensões da vida das pessoas com problemas de saúde mental, sendo
negados às pessoas direitos fundamentais (Drew et al., 2011)11. Tendo esse cenário em
vista e reconhecendo a necessidade de agir para mudá-lo, a iniciativa foi lançada para
“unir e capacitar as pessoas para melhorar a qualidade dos cuidados de saúde mental
e serviços afins e promover os direitos das pessoas com desabilidades psicossociais,
intelectuais e cognitivas” (QualityRights website, s.d.)12.
As ações desenvolvidas no âmbito da iniciativa Direito é Qualidade (Qua-
lityRights) “utilizam uma multiplicidade de estruturas e estratégias para promover
sistemas, serviços e práticas de saúde mental que priorizem o respeito aos direitos
humanos” (Funk & Drew, 2020)13. Desde seu lançamento, essa iniciativa vem bus-
10 World Health Organization. (2021). WHO policy on disability. Geneva: World Health Organization.
11 Drew, N., Funk, M., Tang, S., Lamichhane, J., Chávez E, Katontoka, S., Pathare. S., Lewis, O., Gostin,
L., Saraceno, B. (2011). Human rights violations of people with mental and psychosocial disabilities: an
unresolved global crisis. Lancet, 378: 1664-75.
12 WHO QualityRights Initiative. About WHO QualityRights. Recuperado em 10 abr. 2022, de https://
qualityrights.org/resources/about-qualityrights/.
13 Funk, M., Drew, N. (2020). WHO’s QualityRights Initiative: Transforming Services and Promoting Rights
in Mental Health. Health and Human Rights Journal, 22: 69-75.
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cando transformar o cenário das políticas, serviços e práticas de saúde mental pela
oferta de suporte técnico aos países e pela apresentação de materiais que objetivam
fortalecer o conhecimento e a capacitação sobre direitos humanos e transformar os
serviços de saúde mental de maneira que eles respeitem e promovam os direitos
humanos (Funk & Drew, 2020). Nesse sentido que esta iniciativa tem relevância no
cenário mundial, pois parte da assunção de posição de que a qualidade das políticas,
legislações e rede de serviço em saúde mental está diretamente relacionada com a
garantia de direitos, incluindo o direito ao cuidado em liberdade, e trabalha para
promover essa agenda.
Das ações realizadas e dos materiais lançados pela inciativa para refletir sobre
aspectos de qualidade das redes, serviços e práticas de saúde mental cabe mencionar
dois documentos. Primeiro, o material para avaliação e melhoria dos serviços de
saúde mental com base na qualidade dos direitos humanos assegurados, traduzido
14 Brasil (2015). Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas
Estratégicas. Direito é qualidade: kit de ferramentas de avaliação e melhoria da qualidade e dos direitos
humanos em serviços de saúde mental e de assistência social. Brasília: Ministério da Saúde.
15 Brasil (2015). Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas
Estratégicas. Direito é qualidade: kit de ferramentas de avaliação e melhoria da qualidade e dos direitos
humanos em serviços de saúde mental e de assistência social. Brasília: Ministério da Saúde.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 41
pela qualidade do direito defendido e promovido, nada poderia ser mais pertinente
do que isso: é a medida do respeito (e também da violação) de direitos o indicador
confiável para planejar, implementar e monitorar políticas públicas, redes, serviços
e práticas de saúde mental.
Ao tomar a qualidade do direito respeitado ou violado como indicador é preciso
definir parâmetros que apontem se as práticas desenvolvidas violam ou defendem
direitos, aumentando vulnerabilidade ou potencializando a vida. Entende-se aqui que
a violação de direitos, aumentando a vulnerabilidade da pessoa, está relacionada ao
risco aumentado da opressão e da desigualdade vividas pela pessoa; portanto, os cri-
térios que indicam se o direito de uma pessoa está sendo violado são correlatos àquilo
que produz mais risco de vulnerabilidade e desigualdade. Já a promoção de direitos
é entendida como relacionada ao aumento da potência de vida e da oportunidade de
gozar direitos, ampliando o poder da pessoa nas relações sociais e contextos sociais;
(Art. 24), direito ao trabalho e ao emprego (Art. 27), direito à participação na vida
política e pública (Art. 29) e direito à participação na vida cultural e em recrea-
ção, lazer e esporte (Art. 30). Ou seja, é indicador de qualidade de um serviço de
saúde mental quando nos PTSs, por exemplo, são abrangidas estratégias e ações que
ampliem o acesso das pessoas usuárias a esses direitos.
As Resoluções da ONU podem ser tomadas como instrumentos que afir-
mam a inaceitabilidade de as pessoas estarem expostas a situações de violências,
incluindo a segregação e a institucionalização; ou seja, políticas, legislações e
redes de serviço que são coniventes e promovem violências, tomando o direito
como indicador, precisam ser consideradas como de baixa qualidade. Ainda, dos
relatórios mencionados, uma reflexão crítica que pode ser tomada como critério
que indica se direitos são promovidos ou violados é se há estratégias para enfrentar
a assimetria de poder em todos os níveis do sistema.
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Dos documentos da OMS aquele que seguramente pode ser tomado para definir
indicadores de qualidade é o kit de ferramentas Direito é Qualidade, dado que esta
é a estrutura do documento. Para além dele, vale consultar as Orientações da OMS
sobre serviços de saúde mental de base comunitária, com ênfase nas descrições da
RAPS brasileira e de um CAPS III; a leitura de outros serviços pode ser relevante
para conhecer uma diversidade de arranjos e práticas, mas vale o cuidado de não
tomar o exposto no documento como modelo, e nem reproduzir abordagens padroni-
zadas e externas à realidade brasileira nos serviços de saúde mental da RAPS. Ora, a
reforma psiquiátrica brasileira construiu e consolidou em um território de proporções
continentais uma perspectiva de atenção em saúde mental sustentada pelo paradigma
da afirmação do cuidado em liberdade e dos direitos de cidadania – daí ser exemplo
de agenda, pois os serviços buscam construir na prática condições para exercício de
direitos e, em sendo exemplo, tanto mais interessante fortalecer o que já é instituído
e ir além em diálogo com isso.
Agora, enquanto crítica, dado que a reflexão sobre indicadores de qualidade se
baseia em normativas, documentos e orientações institucionais, é preciso lembrar que
a afirmação de direitos em normativas e documentos não significa que esses direitos
serão gozados pelos que estão em risco de deles não se beneficiarem – e, de fato,
muito frequentemente não se beneficiam. Por óbvio, o fundamental é que o expresso
nesses documentos seja traduzido em práticas no cotidiano que instituam direitos e
poder nas relações sociais e contextos reais de vida, daí a necessidade de construir
condições concretas nas redes e cotidianos dos serviços de saúde mental para que os
direitos afirmados possam ser usufruídos – isso de tal maneira que gozar de direitos
signifique a possibilidade de cada um viver a vida com dignidade e beleza.
Esta via passa pela transformação de contextos e de relações, o que só é possível
de se fazer localmente e nos encontros entre pessoas. Por isso, não cabe arrolar uma
lista ou instituir manual de indicações sobre o que e como fazer: os contextos mudam,
as pessoas são diferentes e é na relação com os contextos, territórios e entre pessoas
que se produz cuidado e direitos em saúde mental. Reconhecendo isso, apresentamos
questões que podem jogar luz em reflexões sobre as práticas em contextos locais.
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pessoa, sua história, seu contexto, o que é ofertado como possibilidade de produção
de vida e quais recursos no território podem ser ativados para ampliar a produção de
vida, bem como considerem como o próprio serviço está desrespeitando ou produ-
zindo direitos e como as relações no serviço estão produzindo assimetrias de poder
e fazendo com que diferenças se tornem desigualdades. Assim, a ação a partir do
que demonstra os indicadores se expressa tanto em revisões dos PTSs, como em
reformulação das práticas e construção de estratégia para transformação das relações.
mais expressão na arena de debates e que reafirma o Sistema Único de Saúde como
grande sistema público garantidor de direitos humanos. À propósito, a afirmação de
que o acesso à serviços de saúde para todas as pessoas deve ser garantido é parte
da agenda internacional de direitos humanos, sendo objetivo da agenda 2030 para o
desenvolvimento sustentável (objetivos 3.5 e 3.8); e mais recentemente, foi adotada
como resolução na assembleia geral da ONU (A/RES/72/139)17 a primeira Reunião
de Alto Nível das Nações Unidas (HLM) sobre Cobertura Universal de Saúde (UHC),
na qual foi estabelecido compromisso para ampliar os esforços para implementar
estes objetivos. Assim, afirmar o direito à saúde pública, universal e gratuita – o
que inclui a saúde mental – tem respaldo no que vem sendo promovido na agenda
de saúde global.
Ademais, também na perspectiva de reflexão crítica, tomando como referência
teórico prática a perspectiva da desinstitucionalização, cabe afirmar não apenas o
direito à saúde, mas a necessidade de fortalecimento dos serviços públicos porque
esses trabalham com e no território. O serviço público mapeia recursos do território
– pessoas, grupos, um canteiro que pode ser uma horta coletiva, um bar que é um
ponto de encontro de jovens, uma praça que pode ser ocupada – e ativa e engaja esses
recursos; investe nas pessoas, nas relações e no comum do território; mobiliza afetos,
corpos e ideias, reorganiza convivências, amplia e redistribui poder nas relações e,
assim, produz comunidade. O serviço público constrói percursos singulares de cui-
dado atentos às necessidades das pessoas e, ao mesmo tempo, intervém no território
para transformá-lo em um território que cuida, desenvolvendo a própria cidade.
Por esses motivos o serviço privado nunca poderá fazer o que o serviço público – e
territorial – faz, porque é do serviço público construir um comum em um trabalho
contínuo de produção de cidadania, de coesão social e de dignidade humana.
Isso importa porque o direito afirmado, em si, não é o fim. Inclusive, a liberdade
afirmada pela reforma psiquiátrica não se refere apenas a viver fora dos muros dos
manicômios, tampouco os direitos de cidadania afirmados se referem tão somente
17 United Nations. General Assembly (2019). Human Rights Council. Resolution adopted by the General
Assembly on 10 October 2019. Global health and foreign policy. A/RES/72/139.
48
Introdução
O
suicídio é um fenômeno complexo e multifacetado, que varia enormemente
entre os indivíduos e o contexto sociocultural. Pensamentos e comportamen-
tos suicidas podem ocorrer com qualquer pessoa, em qualquer momento
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2019, 97.339 pessoas morreram por suicídio na região. De 2000 a 2019, o número de
mortes por suicídio aumentou 56%, de 62.401 mortes, em 2000, para 97.339 mortes
em 2019. No período, a região das Américas foi a única com taxas crescentes de
suicídio padronizadas por idade, atingindo um aumento de 17%. Ressalta-se, ainda,
que a taxa de mortalidade por suicídio foi consistentemente maior em homens (14,2
mortes por 100.000 pessoas) do que em mulheres (4,1 mortes por 100.000 pessoas)
(Paho, 2014; 2021).
Assim como nas Américas, no Brasil, observa-se tendência de aumento da
taxa de mortalidade por suicídio. Entre 2010 e 2019, ocorreram 112.230 mortes por
suicídio, o que representa um aumento de 43% no número anual de mortes, de 9.454,
em 2010, para 13.523 em 2019, ano em que a taxa de mortalidade foi de 6,6 por 100
mil habitantes. (Ministério da Saúde, 2021). O suicídio é considerado importante
problema de saúde pública, contudo, é possível preveni-lo e, por conseguinte, reduzir
Tabela 1
Leis, normas e portarias do Governo Federal relativas à prevenção do suicídio
ANO LEI/NORMA/PORTARIA DESCRIÇÃO
Institui incentivo aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios para a Vigilância
2006 Portaria nº 1.356 de Acidentes e Violências em Serviços Sentinela, com recursos da Secretaria de
Vigilância em Saúde.
Universaliza a notificação de violência doméstica, sexual e outras violências para
todos os serviços de saúde, incluindo-a na relação de doenças e agravos de
notificação compulsória que são registradas no Sinan.
“Define as terminologias adotadas em legislação nacional, conforme o disposto
2011 Portaria MS/GM nº 104
epidemiológico publicado pelo Ministério da Saúde em 2017 faz uma análise da mor-
talidade por suicídio no intervalo 2011-2015 e de tentativas de suicídio entre 2011 e
2016. Entretanto, a análise realizada pelo boletim não analisa o total anual de óbitos
ano a ano de forma comparativa, privilegiando a evolução dos dados. Ao contrário,
toma a média dos óbitos no período, realizando a análise comparativa referenciada
em variáveis como gênero, etnia e método. Os dados comparativos mostraram um
aumento das taxas no período, com predomínio do aumento no gênero masculino.
O boletim aborda pela primeira vez a totalidade das tentativas e lesões autoprovo-
cadas, mostrando um aumento ano a ano em ambos os gêneros. O desdobramento
deste boletim foi a publicação da Portaria nº 2.491 de 2017 que financiava projetos
de prevenção ao suicídio. Os achados publicados no boletim também influenciaram
a criação da lei da política nacional prevenção a automutilação de 2019.
Procuramos sintetizar a seguir os principais achados comuns a maior parte das
em 2019, respectivamente, 10, 41; 8,30 e 6,28 mortes por 100 mil habi-
tantes (Saúde, 2021). As diferenças regionais em relativas às taxas de
suicídio estão associadas à maior exposição de químicos e agrotóxicos,
assim como ao suicídio em indígenas. O risco de óbito por suicídio na
população indígena se destaca por superar em mais de duas vezes o risco
na população branca, com taxa de mortalidade geral de 15,2 mortes 100
mil habitantes, em 2016. No mesmo ano, indígenas do sexo masculino
apresentaram a maior taxa de mortalidade por suicídio no país, 23,1 mortes
100 mil habitantes (Brasil, 2017). A população rural e os trabalhadores
expostos a agrotóxicos também são grupos vulneráveis. Estima-se, ainda,
que as taxas devam ser maiores devido à subnotificação.
Políticas de prevenção
A maior parte das políticas de prevenção ao suicídio se baseiam na identificação
de populações que estariam em maior risco com referência em seu perfil sociodemo-
gráfico-psiquiátrico-psicológico. Ou seja, a partir das características de mortalidade
associadas ao suicídio, identifica-se fatores associados (de forma explicativa ou não)
e por meio dela traçam-se populações alvo para estas políticas. Os achados epide-
miológicos, no entanto, não se configuram como um modelo teórico-explicativo: os
motivos de um maior risco de suicídio masculino que feminino não são os mesmos
que associam uma maior mortalidade indígena, entre desempregados, alcoolistas e
idosos e suicídio. O fenômeno é abordado com frequência na literatura a partir dos
riscos escalonados, de características psicológicas, de saúde física, sociodemográficas
e psiquiátricas. Esta tendência procura estabelecer o perfil de risco de suicídio, numa
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Considerações finais
A compreensão do fenômeno do suicídio requer uma análise sensível aos aspec-
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O desafio da gestão da informação para a rede de
atenção psicossocial: por um sistema de informação
integralizado e incorporado ao cotidiano dos serviços
A
produção de dados e informações sistematizadas sobre uma determinada
política pública – em especial, a política de saúde – é uma condição necessária
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Sistemas de Informação em Saúde (SIS) são instrumentos que, por meio do pro-
cessamento de dados coletados em serviços de saúde e outros locais, dão suporte
à produção de informações para a melhor compreensão dos problemas e tomada
de decisão no âmbito das políticas e do cuidado em saúde.
1 Para saber mais sobre o recente processo de retrocesso na Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e
Outras Drogas, ver: Onocko-Campos, R. T. (2019, nov.) Saúde mental no Brasil: avanços, retrocessos e
desafios. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 35(11). Recuperado em 20 ago. 2022, de http://cader-
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2 DAPES/SAPS/MS (2021). Dados da rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no Sistema único de Saúde
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-programas/caps/raps/arquivos/rede_raps_2021_modelo_saps_julho_2021.pdf.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 69
Desse mesmo modo, o Mental Health Atlas 2020, também da OMS, apresentou
um capítulo intitulado Information Systems and Search For Mental Health (OMS,
2021, p. 14) no qual reforça a necessidade de que cada país membro construa e atua-
lize seu sistema de informação em saúde mental como parte de uma estratégia de
monitoramento do progresso da realização dos objetivos da política de saúde mental
definida em cada contexto.
Considerando que os dados da PSMAD estão vinculados à política de saúde como
um todo, um dos desafios é a constituição a própria forma como se compuseram os SIS
no Brasil. Coelho Neto e Chioro (2021, p. 12) identificaram 54 SIS em funcionamento
no Brasil entre 2010 e 2018, “(...) um indicativo da complexidade, da frágil integração
e pouca transparência (...)”. Essa diversidade de SIS também se reflete na política
de saúde mental. Atualmente as informações sobre o funcionamento da RAPS estão
dispersas em um grande número de subsistemas de informação que são heterogêneos
e com pouco diálogo entre si. Aliado a isso, a RAPS é, entre as redes prioritárias,
a que contém a maior quantidade de pontos de atenção. São cerca de 22 diferentes
pontos de atenção quando considerada a Portaria GM nº 3.088/2011 e a Portaria GM
nº 3.588/2017. Esses pontos de atenção em saúde estão distribuídos na atenção básica,
3 Nesse documento, a OMS sugere que os dados e indicadores básicos de um sistema de informação
em saúde mental devem contemplar os seguintes aspectos: “magnitude do problema (prevalência dos
transtornos mentais e determinação social dos principais fatores de riscos e de proteção em relação à saúde
e o bem-estar mental); alcance das políticas, leis, intervenções e serviços (em particular, defasagem entre
o número de pessoas com transtorno mental e o de pessoas que recebem tratamento e se beneficiam de
um conjunto de serviços adequados, como serviços sociais); dados sobre resultados sanitários (incluídas
as taxas de suicídio e de mortalidade prematura no conjunto da população, assim como melhoras, ao nível
individual e por grupos, relacionadas com sintomas clínicos, níveis de deficiência, funcionamento global
e qualidade de vida) e dados sobre resultados sociais e econômicos (níveis relativos de estudo, moradia,
emprego e renda das pessoas com transtornos mentais)” (OMS, 2013, p. 20).
70
4 a) Sistema de Informação em Saúde para Atenção Básica; b) Sistema de Informação Ambulatorial (SAI);
c) Sistema de Informação Hospitalar (SIH); d) Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em
Saúde; e) Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 71
Há um cálculo que chama a atenção pelo poder que tem para lançar luz sobre
um sistema de atenção à saúde. Trata-se do cálculo da lacuna de tratamento (treatment
gap). Uma lacuna de tratamento se forma quando, num cenário onde existe tratamento
para um transtorno, pessoas seguem sem ser tratadas. A lacuna é a diferença entre a
prevalência de um determinado transtorno e o número de pessoas tratadas, entre as
afetadas, e é geralmente expressa em percentagem. A OMS convoca, desde 2008, os
países para agirem a partir de dados sobre a lacuna em saúde mental em suas regiões.
Estima-se que a lacuna média de tratamento da esquizofrenia no mundo seja de 32,2%.
A lacuna média de tratamento da depressão é estimada em 56,3%, chegando a 78,1%
para os casos de transtornos devido ao uso abusivo de álcool e outras drogas (Kohn,
Saxena, Levav & Saraceno, 2004).
Ainda não temos meios para calcular as lacunas de tratamento nos municí-
pios, estados, regiões, ou mesmo no Brasil. Sabemos, no entanto, que as lacunas
existem e são grandes. Nos interessa aqui identificar dados que – quando colhidos e
72
A proporção de uso (cobertura real) pode ser maior ou menor que a cobertura
potencial, o que indica a necessidade de redimensionamento do acesso.
Para planejar a cobertura é importante considerar a densidade populacional e
as estimativas epidemiológicas atualizadas. A Organização Pan-americana de Saúde
(OPAS) apresentou um levantamento com estimativas sobre a “La carga de los
transtornos mentales en la Región de las Américas” (OPAS, 2018). De acordo com
esse levantamento, estima-se que no Brasil, na categoria de “transtornos mentais
comuns”, os transtornos depressivos e distimia estão presentes em 9,3% da popu-
lação, enquanto os transtornos de ansiedade afetam 7,5%. Os quadros considerados
severos ou graves, incluindo esquizofrenia e transtorno bipolar, estão presentes em
1,6% da população. No Brasil o uso abusivo de substâncias psicoativas, exceto o
álcool, está presente em 0,8% da população. Em âmbito mundial, considerando os
casos que demandam atenção especial, a OMS estimou que 13% da população vivia
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 73
5 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estimativas da População. Tabelas enviadas ao TCU. Tabelas
de estimativas para 1 de julho de 2021, atualizadas e enviadas ao TCU após a publicação no DOU.
Recuperado em 8 ago. 2021, de https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9103-estimativas-
de-populacao.html?=&t=resultados
74
6 Para aprofundar o tema, ler: Brasil. Ministério da Saúde (2015). ASIS – Análise de Situação de Saúde.
Brasília: Universidade Federal de Goiás. Recuperado em 8 ago. 2022, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/
publicacoes/asis_analise_situacao_saude_volume_1.pdf
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 75
7 E-Gestor Atenção Básica. Informação e Gestão da Atenção Básica. Recuperado de 22 ago. 2022, de
https://egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relCoberturaAPSCadastro.xhtml
76
saúde e os pontos de atenção da rede especializada. A RAPS tanto mais potente quanto
mais os serviços estão integrados, interconectados, fazendo rede, literalmente. A
integração em saúde, que não deve ser confundida com integralidade, é a criação de
um método de governança comum entre diferentes atores e pontos de atenção, a fim
de que a coordenação do cuidado em saúde esteja pautada na cooperação e interde-
pendência entre todos os envolvidos. Essa condição é imprescindível para a atenção
psicossocial. O uso dos SIS pode oferecer boas pistas para a reorganização da gestão
e do cuidado. Seria importante ter na gestão local um “painel de monitoramento”
regular e contínuo desses dados com a devida avaliação (formativa) envolvendo
trabalhadores dos diferentes pontos de atenção da RAPS.
9 Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência, encarregada pela gestão da Base de Dados Sociais
Brasileira, inicialmente também responsável pelos dados do então Instituto Nacional de Previdência Social
(INPS), posteriormente transformado em INAMPS.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 79
mações do SIH10 podem ser mais apropriadas para uma avaliação dos internamentos.
Esse sistema também permite identificar o perfil de morbidade (por local de
internação ou por local de residência), considerando ano, média de permanência,
sexo, raça, idade. É possível ajustar a ferramenta de busca para identificar até mesmo
a unidade hospitalar que realizou o internamento.
É interessante considerar que o SIH permite localizar internamentos de acordo
com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10). Nesse sentido, quando
usada essa possibilidade de filtro, é possível rastrear os internamentos motivados
por transtornos mentais em qualquer hospital, seja em hospital geral ou em hospital
psiquiátrico. Usando esse recurso, Lima Júnior (2022, p. 329) constatou que na Bahia,
entre 2017 e 2020, o maior número de internamentos com diagnóstico de transtornos
mentais ocorreu em hospitais gerais, mesmo sem que as unidades estudadas pos-
suíssem leitos habilitados para tal oferta. Isso pode ser um indício da mudança do
perfil clínico também em relação aos hospitais gerais, historicamente vistos como
refratários à prestação de cuidados em saúde mental. Diante de evidências como essa,
a gestão de saúde pode redimensionar o planejamento da RAPS, especialmente dos
“componentes” da gestão hospitalar.
Como ocorre com os demais SIS descritos anteriormente, com o SIH também
há lacunas e dificuldades operacionais. O Sistema é a alimentado com base em
Autorização de Internação Hospitalar (AIH), eventualmente há possibilidade de
um mesmo usuário ter duas AIH por problemas distintos, ou por ter mudado de
hospital ou mesmo por ter mudado de setor, ou seja, uma mesma intercorrência
pode resultar e mais de uma AIH, gerando uma distorção para o cálculo da oferta.
Mesmo com as incompletudes e eventuais distorções, esse sistema como um todo
continua sendo a principal referência para o acompanhamento da atenção hospitalar
no SUS. O uso dos dados nele contidos é imperativo para a integração do cuidado
em saúde mental. A propósito, para a compreensão do processo de transformação
assistencial outrora hegemonicamente hospitalocêntrico, as informações sobre a
realidade da assistência hospitalar em psiquiatria no âmbito municipal – conside-
rando o município de residência- é um indicador da efetividade da reorientação
do modelo. Portanto, é também uma das informações imprescindíveis.
Considerações finais
Referências
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Introdução
E
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colocação no poder do vice Michel Temer, tomando uma série de medidas neoliberais.
Foram impostos inúmeros retrocessos em todos os campos de política social, como por
exemplo, a Emenda Constitucional 95, que congela os gastos sociais por 20 anos. A
Coordenação de Saúde Mental é repassada para lideranças da Associação Brasileira de
Psiquiatria (ABP), contrária à perspectiva de reforma psiquiátrica e da luta antimanicomial,
e que impõe nova ênfase na internação psiquiátrica tradicional e, no campo das drogas,
o repasse maciço de verbas para comunidades terapêuticas, via Ministério da Cidadania.
O governo Bolsonaro, de extrema direita e com características neofascistas,
assumiu em 2019 com uma plataforma antidemocrática, antipopular e ultra neoli-
beral no campo econômico, no qual a estratégia principal tem sido desconstruir as
principais políticas públicas e sociais e realizar cortes. Isso está implicando em um
desmonte profundo das estruturas e instituições democráticas, das políticas sociais e
do pacto político expresso na Constituição de 1988. Na saúde mental, se aprofunda
as mesmas tendências já esboçadas no governo Temer.
No entanto, o movimento antimanicomial continuou mantendo uma relativa
resistência a medidas que tentaram desfigurar a estrutura da RAPS. Apesar dessa
resistência, as maiores derrotas têm acontecido na área da política de drogas, cuja
coordenação foi deslocada do Ministério da Saúde para o Ministério da Cidadania,
com uma diretriz clara de financiar e expandir as chamadas comunidades terapêuticas
(CTs) para usuárias(os) de drogas, em detrimento dos recursos para a RAPS. Para
isso, uma das estratégias adotadas foi acabar com todos os mecanismos que possibi-
litavam ter transparência sobre o orçamento e o fluxo real de recursos do campo da
saúde mental e drogas como um todo.
1 O contexto histórico e os desafios políticos que determinaram a origem e as características de cada uma
dessas duas tendências do movimento antimanicomial são descritos mais adiante neste texto.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 87
estaduais e locais e a realização de encontros nacionais a cada dois anos, mas nesse
período nunca conseguiu organizar sua Secretaria Nacional Executiva (SENC)
e uma articulação nacional capaz de direcionar as lutas e campanhas nacionais.
Ainda durante esta fase, no qual o Dr. Pedro Gabriel Delgado, liderança inde-
pendente do movimento, mas mais identificado com o MNLA, ocupava o cargo de
coordenador nacional da política de saúde mental no Ministério da Saúde, as bases
do MNLA se sentiram representadas no plano nacional, e não buscaram construir
internamente esta articulação (Vasconcelos, 2012, 2021a).
4.a fase: 2010-2015: Hegemonia da RENILA na Coordenação Nacional de
Saúde Mental e nas lutas nacionais: Com a entrada do Dilma Roussef no governo,
duas lideranças nacionais independentes, mas com ligações mais orgânicas com a
RENILA, o psiquiatria paulista Roberto Tikanory e um pouco mais tarde também a
Prof.a da USP Fernanda Nicácio, assumiram a coordenação no Ministério da Saúde.
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2 Principio e abordagem “6. Empowerment of persons with mental disorders and psychosocial disabilities: Persons
with mental disorders and psychosocial disabilities should be empowered and involved in mental health advocacy,
policy, planning, legislation, service provision, monitoring, research and evaluation” (WHO, 2013, p. 10).
90
4 “They can only be those that are led, directed and governed by persons with disabilities. A clear majority
of their membership should be recruited among persons with disabilities themselves”, in UN Committee on
the Rights of Persons with Disabilities. General comment Nº 7 (2018) on the participation of persons with
disabilities, including children with disabilities, through their representative organizations, in the implementation
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Br7QovZhbuyqzjDN0plweYI46WXrJJ6aB3Mx4y%2FspT%2BQrY5K2mKse5zjo%2BfvBDVu%2B42R9iK1p
92
Eu acho que os ideais da Reforma Sanitária devem ser revistos e que devemos
tentar ir além da mera defesa do SUS. Nós ficamos muito prisioneiros de defender
o SUS. Então, eu acho que é uma hora de resgate, mas por outro lado é de avançar
para além do que o SUS pôde fazer até agora. (...) É um momento para repensar o
próprio modelo de conferências que de alguma forma vem se esgotando ao longo
do tempo. A ideia de ser um espaço de diálogo, um espaço de construção da
vontade política foi sendo substituída por mera votação, sem que haja diálogo
político – um ponto muito importante da ideia original das conferências6
(ênfases do autor do presente texto).
Esse último tópico exige maiores esclarecimentos. Para essas pessoas, e particu-
larmente para as pessoas com sofrimento mental mais contínuo e severo, o ativismo
e as relações e conflitos de poder envolvem processos subjetivos mais sutis, com-
plexos e duradouros, e específicos para cada situação, que dificultam ainda mais
o protagonismo. Além disso, essas pessoas são historicamente objeto de diferentes
formas de discriminação, segregação, estigma, que por sua vez, tendem a ser
6 In Passos, J. (2022, mar./abr.). Associações de vítimas da covid-19 buscam acesso à saúde, direito à
memória e reparação. Revista Poli – saúde, educação e trabalho, XIV(32): 11. Rio de Janeiro: Fiocruz:
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default/files/poli_82_web_0.pdf
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 95
chedda, 1989). Esses contraexemplos mostram que, sem uma atenção às demandas
específicas dos familiares nos serviços, já que geralmente são vistos e acionados
apenas como coadjuvantes do tratamento de seus parentes com sofrimento men-
tal, e sem um investimento mais claro na valorização deles como atores políticos
pelo movimento antimanicomial, criando associações e outros dispositivos de
ajuda e suporte mútuos, uma parte dos familiares pode ser cooptada pelas forças
manicomiais. Isso está acontecendo novamente nos últimos anos, com associações
apoiando as comunidades terapêuticas para usuárias(os) de drogas.
Pirado, Pirou, com atividades na maior parte do ano, culminando no desfile na época
do carnaval, e que existem até o dia de hoje. Os últimos dados oficiais mostravam
que em 2015 havia 4.500 acões em mais de 1 mil municípios brasileiros (Amarante
& Lima, 2008; Abrasme, 2016).
Essas duas importantíssimas áreas de fomento ao protagonismo das pes-
soas usuárias e familiares e de componente fundamental no processo de reabili-
tação das pessoas com sofrimento mental, foram praticamente desmobilizadas nos
governos Temer e particularmente Bolsonaro. No entanto, representam programas
fundamentais para uma retomada do processo de reforma psiquiátrica em um
eventual governo Lula, a partir de 2023, de forma ainda mais sistemática e
com projetos mais regulares e duradouros.
a) alguns desses movimentos optam por ter uma vanguarda ou direção mais
avançada, no formato de coordenação central menor, com lideranças
com mais recursos intelectuais, financeiros, organizacionais e políticos,
e, portanto, mais ágil para avaliar a conjuntura, decidir e coordenar cam-
panhas e lutas. Contudo, tem riscos mais altos de tomarem decisões de
cima, de forma vertical, supervalorizando as divergências e a compe-
tição com movimentos concorrentes e buscando sempre a hegemonia
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7 Esse paradoxo é objeto de longa discussão no seio da esquerda internacional, a partir de uma polêmica
formulação do líder russo Wladimir Lênin de 1902, em um contexto de forte repressão e com sua atuação
possível apenas no exílio, quando defendeu a organização de um partido liderado apenas por intelectuais
profissionais, e que o conjunto dos trabalhadores poderiam chegar no máximo a uma consciência sindical,
mas não a uma consciência mais integral de um novo projeto histórico diferenciado, consciência esta que
deveria ser inculcada “de fora e de cima para baixo” pela vanguarda do partido nas massas trabalhadoras.
Esse tema é discutido em profundidade em outra de minhas obras (Vasconcelos, 2010b). No entanto, é
importante lembrar aqui que este paradoxo tem, em primeiro lugar, sua intensidade associada à composição
social e posição de classe dos participantes desses movimentos. Por exemplo, movimentos sociais de
trabalhadores industriais, ou seja, inseridos no centro do conflito capital/trabalho, têm um potencial para uma
consciência social e política muito mais avançado que outros movimentos sociais populares de composição
muito heterogênea, como os movimentos de bairro, comunidades eclesiais de base e de pessoas usuárias
e familiares do campo da saúde mental. Em segundo, outro determinante deste paradoxo é o nível de
desigualdade econômica, social e educacional da maioria da população de um país. No Brasil, um dos
países mais desiguais do mundo, esse paradoxo ganha dimensões muito mais significativas, exigindo que
os movimentos sociais populares invistam ainda mais no trabalho de base, em educação popular e em
reivindicações de cotas no ensino público de todos os níveis.
100
Para que possamos compreender em toda a sua extensão esse dilema dos movi-
mentos sociais populares e principalmente do protagonismo de pessoas usuárias e
familiares da saúde mental em países periféricos como o Brasil, precisamos siste-
matizar, mesmo que brevemente as principais razões dessa maior fragilidade
organizativa na realidade brasileira:
de atenção psicossocial.
Por sua vez, a maioria das pessoas usuárias do SUS, mais pobre e com níveis
mais baixos de escolaridade, e com uso hegemônico da cultura oral, forma o
contingente de pessoas usuárias e familiares dos projetos de empoderamento e
protagonismo dos serviços públicos de saúde mental, e daí, vários dos limites para
um ativismo mais autônomo e independente, como vimos anteriormente no perfil
hegemônico das associações de pessoas usuárias e de familiares do país.
et al., 2013).
n) Projetos de educação popular e divulgação na grande mídia de produ-
ção de cartilhas, manuais, materiais diversos de mídia, para o público
interno da saúde mental, como também para divulgação na sociedade,
para combate ao estigma e discriminação (Streck & Esteban, 2013;
Vasconcelos, 2014; Grupo Temático de Educação Popular em Saúde –
ABRASCO, 2018).
o) Capacitações para lideranças para a criação de associações de usuá-
rios/as e familiares e para atuar em conselhos de saúde e conselhos
gestores de serviços de atenção psicossocial (Vasconcelos, 2014; Brasil,
Ministério da Saúde & Universidade Federal do Paraná, 2021).
p) Projetos e programas de defesa de direitos (advocacy) com estratégias
informais (pelos próprios usuários e familiares, com suporte profissional)
e formais (com suporte de profissionais de saúde mental e de direito)
(Vasconcelos, 2014).
Para a grande maioria das pessoas usuários e familiares brasileiros que utilizam
os serviços de atenção psicossocial do SUS, não basta disponibilizar recursos
108
Considerações finais
No momento em que escrevo este texto, em agosto de 2022, ainda não temos
uma avaliação segura da conjuntura política que se desdobrará a partir das eleições
presidenciais de outubro do presente ano, bem como sobre as notícias sobre eventuais
tentativas de ruptura institucional e da democracia no país, veiculadas já há alguns
Referências
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Pistas para a composição de itinerários formativos
em saúde mental
Gustavo Zambenedetti
Michele da Rocha Cervo
N
este artigo, buscamos mapear pistas de modelagens formativas na interface
da saúde coletiva1 com a saúde mental2, através da exploração de experiên-
cias concretas e ferramentas conceituais que têm nos inspirado na produção
de processos formativos. As pistas oferecem caminhos possíveis na constituição de
itinerários formativos comprometidos do ponto de vista ético, técnico e político com
a saúde mental, em uma perspectiva psicossocial3.
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1 Compreendida como uma conformação que incorpora as contribuições das ciências sociais e humanas
no campo da saúde, interroga as perspectivas exclusivamente biomédicas e amplia os objetos e âmbitos
de produção de saber e intervenção (Birman, 2005; Vieira-Silva, Paim& Schraiber, 2014).
2 A saúde mental e a atenção psicossocial não se constituem como sistemas fechados, mas como processos
sociais complexos, que buscam incorporar novos aspectos, atores, problemas da realidade (Amarante,
2007). Enquanto a psiquiatria constitui-se como uma disciplina específica, a saúde mental possui caráter
multiprofissional, inter e transdisciplinar, ampliando o objeto de estudo e intervenção da doença/transtorno
mental para o sujeito em sofrimento em relação ao contexto social (Baságlia, 2005).
3 A atenção psicossocial se configura a partir das práticas desenvolvidas tendo por base a reforma psiquiátrica,
com tendência a uma modificação do objeto e dos meios de trabalho, ampliação dos dispositivos institucionais
e proposição de relações transversais entre equipes de trabalho e usuários (Costa-Rosa, 2000).
122
5 Para mais informações sobre campo e núcleo de competências profissionais, ver Campos (2002).
124
6 O primeiro autor integrou a equipe de estagiários do VER-SUS Rio Grande do Sul em 2004 e os dois
autores atuaram na organização do VER-SUS Rio Grande do Sul em 2005.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 125
7 A escolha deste município foi viabilizada pelo fato de uma estudante que participou de uma das edições
do VER-SUS Paraná, assim como de outros estágios curriculares e experiências formativas em saúde
mental (Iniciação Científica, Projeto de Extensão), ter concluído sua graduação e ingressado na rede de
saúde daquele município, via concurso público, atuando em um CAPS, evidenciando a relação entre o
itinerário formativo e a inserção profissional.
126
hospícios ainda” (Zarpelon & Zambenedetti, 2019). Tal passagem indica a necessidade
de criação de estratégias que rompam com a noção de saúde mental reduzida à doença
mental, ao momento da crise, ao hospital psiquiátrico, ao tratamento medicamentoso
e à abordagem uniprofissional.
Em paralelo ao VER-SUS, diversas outras políticas foram criadas, visando redi-
recionar o modelo formativo em direção ao SUS, com destaque para o Programa de
Reorientação da Formação em Saúde (Pró-Saúde), o Programa de Ensino Tutorial
em Saúde (PET-Saúde), o Programa de Pesquisas para o SUS (PPSUS) etc. Estes
programas buscam incentivar a articulação ensino-serviço-comunidade através de
diferentes estratégias, colocando o SUS e as demandas em saúde como orientadoras
da formação; destaca-se a adoção de metodologias ativas de ensino, a aprendizagem
vivencial através da inserção em territórios assistenciais e comunitários desde o início
dos cursos, a aprendizagem baseada em problemas, a produção de projetos de ensino,
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São muitos os desafios na atuação e formação voltados para uma prática demo-
crática e coerente com a saúde coletiva e a atenção psicossocial. Os territórios e
práticas compartilhadas/habitadas pelos profissionais evidenciam um outro campo
de disputas e de construção. As desigualdades entre as regiões e estados brasileiros
não estão presentes somente no desenvolvimento econômico e social, presentifican-
do-se também nos modelos de atenção operados e implementados pelos municípios.
A instalação de um modelo formativo pautado nos princípios da reforma psiquiátrica
e no modelo de atenção psicossocial nem sempre acompanham as realidades locais,
onde verifica-se uma defasagem ou mesmo resistência em operar a partir dessas
diretrizes. Como operar e formar profissionais-trabalhadores em contextos em que
os modelos de atenção são hospitalocêntricos, centrados na doença e administrados
pela lógica coronelística e colonizadora?
É importante resgatar por que a reforma psiquiátrica é concebida como um “pro-
Entretanto, constatar que um determinado cenário está mais distante dos prin-
cípios da reforma psiquiátrica ou do SUS não deveria deslegitimar este processo e
sistema, senão compor um diagnóstico, sobre o qual estratégias devem ser traçadas
e articuladas, parceiros devem ser agenciados, visando a ampliação dos graus de
aproximação com aqueles.
O SUS foi fruto de muitas disputas, as quais não cessaram no momento da
publicação das Leis nº 8.080/1990, nº 8.142/1990, nº 10.216/2001, senão seguiram
se atualizando. Tais leis devem ser reconhecidas em duas dimensões: enquanto pro-
duto e enquanto processo. É fácil acessá-las enquanto produto, ou seja, aquilo que se
consolidou e “foi para o papel”. O desafio é proporcionar um dispositivo de ensino
que possa apreendê-las como processo. Ou seja, como resultado de debates, arranjos
possíveis, acordos entre diversos atores. Muitas vezes, uma solução de compromisso,
fruto do processo político de negociações, na qual ocorre a cedência ou afrouxa-
11 A ideia de liberdade trazida aqui remete a Foucault (2004), onde a liberdade é compreendida como uma
prática possível dentro dos sistemas de verdade formados nos regimes de saber e poder.
132
famílias na garantia de acesso aos serviços previstos nas políticas públicas. Essa
experiência formativa finaliza com a leitura da narrativa de cada família à equipe do
CRAS correspondente, permitindo também deslocamentos entre os profissionais que
compõem os serviços, multiplicando modelos e apostando na tessitura das redes e
defesa de modelos mais democráticos e singularizados de cuidado em saúde mental.
Nesta experiência se evidencia a ampliação do grau de exposição dos estu-
dantes aos arranjos de vida de pessoas, grupos e comunidades, além de ser uma
estratégia de afirmação de uma política de memória que resgata a história a partir
da vivência de acesso a rede de cuidado compartilhada pelos relatos das famí-
lias. São estes relatos que agenciam as discussões sobre os modelos de atenção,
afirmando em ato como cuidar, como constituir redes, colocando em análise os
processos de implementação das políticas públicas e as contradições existentes. Há
também uma diversidade que intersecciona as famílias acompanhadas, passando
e a autonomia dos sujeitos, pois percebem tanto as forças que convergem para a
negligência ou abandono das equipes e estado, assim como as forças que podem
atuar na garantia de cuidado da população. As famílias compartilham suas histórias
com pessoas que estão disponíveis e ainda não institucionalizadas pelos discursos
técnico-científicos. Discursos estes fundamentais para o exercício do cuidado, mas
como nos disse Tosquelles, o pensamento precisa vir depois de pisar nos territórios.
Ao serem acolhidas, as famílias também recebem orientações e os estudantes resgatam
junto às equipes uma tecitura da rede e recolocam, a partir da narrativa, os sujeitos
no centro do cuidado.
A intersetorialidade como diretriz permite que possamos reconhecer e comparti-
lhar o cuidado, não sendo preciso antecipar as questões e problemáticas que envolvem
o modelo hospitalocêntrico e biomédico, pois os próprios sujeitos e suas famílias apre-
sentaram os efeitos desses modelos em suas trajetórias de vida. Partindo desses relatos
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Referências
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In Paim, J. S. & Almeida Filho, N. Saúde Coletiva: Teoria e prática (pp. 3-12). Rio
De Janeiro: Medbook.
E
sse artigo tem por finalidade contribuir para o desenvolvimento do tema
sobre políticas públicas de saúde mental, cooperativismo e associativismo
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No período que foi dessa articulação em 2004 até o golpe legislativo de 2016,
do ponto de vista da cobertura territorial, a Política Nacional de Saúde Mental e Eco-
nomia Solidária, em números, demonstrava uma curva de crescimento consistente,
ascendente, em termos quantitativos em todas as unidades federativas. Do ponto de
vista do investimento financeiro para fortalecimento das iniciativas, as chamadas
do Ministério da Saúde, nos termos da Portaria nº 1.169, nas suas diversas edições,
desde 2005, observava-se também uma curva ascendente e, com o passar dos anos,
mais distribuída pelos Estados da Federação (Brasil, 2010; Aranha e Silva, 2012).
Do ponto de vista da formulação do marco jurídico para a Política Nacional de
Saúde Mental e Economia Solidária, quatro encontros nacionais se destacam, como
fóruns dos movimentos organizados da saúde mental
Este ambiente político, legislativo e teórico passou a orientar uma nova ordena-
ção e alinhamento conceitual e prático das iniciativas de geração de trabalho, renda
e cultura incubadas nos CAPSs, Ceccos, CERSANS, entre outros dispositivos da
RAPS, e impôs também um novo e radical desafio – que é atual nos fóruns de debates
e trocas de experiências – que trata exatamente da operacionalização real e concreta
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(...) foram realizadas Chamadas de: Projetos de Arte, Cultura e Renda (contem-
plando projetos desenvolvidos em CAPS, Centros de Convivência e Cultura,
na Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária, nas Associações de
Usuários/as, Familiares e nas Unidades Básicas de Saúde); Projetos de Reabi-
litação psicossocial (por exemplo: projetos relacionados à economia solidária
e geração de trabalho e renda, à alfabetização, à inclusão digital e à cultura), e
de Protagonismo de usuários/as e familiares da RAPS (contemplando projetos
com temas, dentre outros, de fortalecimento do controle social, inclusão social,
criação e fortalecimento de associações de usuários/as e familiares, atividades
comunitárias, acesso à cultura) (Documento, 2022).
(...) Em 2011, com a publicação da Portaria no 3088, de 23 de dezembro de 2011,
que instituiu a RAPS, republicada em 2013, os centros de convivência e cultura
constituem pontos de atenção do componente da atenção básica. Não obstante
a realização dessas importantes iniciativas e o reconhecimento da potência das
experiências locais, é fundamental construir as referências normativas para os
Centros de Convivência e Cultura (Cecco), promover a articulação intersetorial,
garantir adequado financiamento e sustentabilidade, e, efetivamente, propiciar
sua expansão (Documento, 2022).
140
(...) serviços de extrema relevância para a história da saúde mental, pois além de
se constituir como uma retaguarda para a rede de saúde e um polo de comunicação
entre diversos serviços (UBS, CAPS, Hospitais, dentre outros), os Ceccos locali-
zam-se em um campo fronteiriço entre o que usualmente denominamos de campo
da clínica e o campo social. O cuidado com o sofrimento psíquico, anteriormente
subordinado à rede de psiquiatria, passou a se estender para a comunidade, a partir
da instalação desse serviço nos espaços públicos.
visuais, artes plásticas, música, artesanato, literatura, cerâmica, bordado, entre outras
atividades e projetos que promovem cuidado, inclusão e cidadania2.
Esses dispositivos encontram limites impostos por legislações locais para a
realização e concretização da atividade econômica, comercialização, circulação de
dinheiro, exatamente por estarem localizados no interior de serviços e espaços públi-
cos. A contradição a ser enfrentada é que se de um lado a gestão pública cumpre sua
função de fomentar, apoiar e incubar esses dispositivos, por outro também impõe
barreiras intransponíveis na operacionalização da atividade econômica, sinônimo de
geração de renda e ganho real.
Outra questão que se coloca é poder identificar tecnologias sociais, tanto no
que se refere a produtos como a processos, aplicáveis ao campo da atenção em saúde
mental, junto às pessoas usuárias e seus familiares, sobretudo, pelas vulnerabilidades
sociais, aprofundadas na crise sanitária, econômica e política atual.
Um ator social responsável pelo desenvolvimento de tecnologias sociais são
as Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares, ITCPs, que vinculadas a
universidades públicas ou comunitárias se dedicam “ao desenvolvimento de coope-
rativas formadas por gente pobre, excluída ou sem acesso ao mercado de trabalho e
resolveu se associar para, em conjunto, se reintegrar na economia” (Singer, 2000).
Ainda de acordo com Singer,
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2 Recuperado em 8 de ago. 2022, de https://prefeitura.pbh.gov.br/saude/informacoes/atencao-a-saude/
atencao-primaria/centro-de-convivencia
142
deste modo o envolvimento das mesmas com a economia solidária tomou fôlego.
As incubadoras mais antigas ensinavam o ofício às novas. Em 1999, surgiu a Rede
Universitária de ITCPs. O Proninc, porém, só dispôs de recursos para oferecer apoio
às primeiras seis incubadoras, tendo as que vieram depois que contar com a ajuda das
próprias universidades – as ITCPs são projetos de extensão das universidades – e de
governos municipais, engajados no fomento da economia solidária (Singer, 2000).
3 Exemplos de Associações importantes dessa geração, muitas das quais resistem até hoje na experiência
paulista são: Associação Franco Basaglia, SOS Saúde Mental, ecologia e cultura, Associação 18 de maio
e Associação Nima (São Paulo); Associação Cornélia Vlieg (Campinas e Guarulhos); Associação Arte e
Convívio (Botucatu); Recriart (São Carlos); Associação Maluco Beleza (São Vicente); Associação Livre
(Diadema) – isso só para tomar algumas dessas organizações no Estado de São Paulo.
4 Recuperado em 8 ago. 2022, de https://frenteestamiradecaps.org/2022/03/28/saiu-o-cadastro-atualizado-
-de-marco-de-2022-cadastro-nacional-de-associacoes-e-coletivos-de-usuarios-e-ou-familiares-do-cam-
po-da-saude-mental/
144
5 Em diversas formas: núcleos, fóruns municipais, regionais e estaduais e na Plenária e Executiva nacionais
do Movimento. Em cada reunião a composição da mesa de coordenação era sempre tripartite: usuário,
familiar e trabalhador, e as associações defendiam ferrenhamente essa configuração organizativa. Após
o V ENLA (Encontro Nacional de Luta Antimanicomial), realizado em São Paulo em 2005, a composição
passou a ser quadripartite, com os estudantes reivindicando também seu lugar de fala.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 145
deixa de lado essa miríade tão ampla, que segue resistindo e insistindo
em cantar, dançar, pintar e bordar.
8 Uma OSCIP é uma qualificação jurídica atribuída a diferentes tipos de entidades privadas atuando em
áreas típicas do setor público com interesse social, que podem ser financiadas pelo Estado ou pela
iniciativa privada sem fins lucrativos. Ou seja, as entidades típicas do terceiro setor. A OSCIP está
prevista no ordenamento jurídico brasileiro como forma de facilitar parcerias e convênios com todos os
níveis de governo e órgãos públicos (federal, estadual e municipal) e permite que doações realizadas
por empresas possam ser descontadas no imposto de renda. Recuperado em https://www.sebrae.com.
br/sites/PortalSebrae/bis/oscip-organizacao-da-sociedade-civil-de-interesse-publico,554a15bfd0b1741
0VgnVCM1000003b74010aRCRD
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 147
Alegre. Também permitiu dar início aos preparativos do VI ENLA, que ocorreu em
São Paulo em 2006 (com dinheiro público destinado pela coordenação nacional de
saúde mental, que apoiou ambas as organizações do movimento nacional, entendendo
a importância da existência desses atores políticos para a continuidade e avanço da
reforma). A vinda do dinheiro do Ministério da Saúde foi viabilizada pela AVA.
Paralelamente, fornecia-se, desorganizadamente, notas fiscais aos empreen-
dimentos que necessitavam, e que destinavam 10% do valor da nota para ajudar a
cobrir os custos operacionais e encargos. Esse processo resultou deficitário, e não
foram poucas as vezes que foi necessário “passar o chapéu” para cobrir custos. Esta
condição impôs à Associação a necessidade de aprimorar a atividade contábil, sua
própria higidez no fluxo de atividade econômica e fiscal.
Outra iniciativa importante desse início foi a inauguração da Casa do Saci,
um espaço no bairro de Perdizes (bem próximo ao Instituto Sedes Sapientiae), que
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Entre 2015/16 foi realizado o primeiro censo da Rede de Saúde Mental e Econo-
mia Solidária, pelo Grupo Interdisciplinar de Estudos em Saúde Mental e Economia
Solidária da USP. Uma pesquisa participativa com desenho metodológico censitário,
financiado pela SENAES, identificou 132 projetos de geração de trabalho e renda
em 7 regiões do Estado de São Paulo. Dados atualizados nos indicam cerca de 180
projetos. Estimamos cerca de 1.500 pessoas envolvidas diretamente com a Rede e, por
consequência, seus familiares, vizinhanças, entornos sociais e territoriais, interferindo
e desconstruindo a cultura que associa a loucura como algo perigoso, incapacitante,
minorizante do ponto de vista da cidadania.
Daqueles 132 projetos, cerca de 20% não obtinham renda mensal, 75% obtinham
renda mensal que variavam de $100,00 a 3.000,00 e apenas 5% faziam renda acima
desse valor. Considerando uma média de 10 pessoas por projeto, a nossa pirâmide
econômica é a mesma que a da economia capitalista. Muitos com nada ou muito
pouco e poucos com muito.
Esta é uma contradição e um aspecto fundamental para a discussão e implanta-
ção de dispositivos ativos e eficazes para o acesso ao Direito ao trabalho associado
e cooperado, autogestionário e solidário.
Numa análise parcial de 2021, relatada a seguir e produzida de forma participa-
tiva com 30% das Redinhas de Economia Solidária e Saúde Mental de São Paulo11,
nos tópicos identitários ao campo da Economia Solidária encontrou-se temas fun-
damentais para contribuir na formulação de teses para a V CNSM na perspectiva de
produção de real inclusão econômica e social.
que na maior parte das organizações estes são do serviço público, mas a
renda resultante do trabalho vira propriedade dos trabalhadores; que as
regras do serviço determinam quem guarda a chave do armário, o horário
de funcionamento, as pessoas que querem ou precisam ficar mais tempo.
Por outro lado, há situações em que os instrumentos de trabalho não per-
tencem ao grupo, mas a autonomia de acesso aos mesmos é mantida e em
outra ainda, os instrumentos pertencem ao grupo, decidido em assembleia
a aquisição de novos equipamentos.
• Os dados sobre o capital e propriedade da empresa social indicam que
prevalece mais na lógica das oficinas de trabalho do que na lógica do tra-
balho como direito. Nas realidades, os meios de produção não pertencem
ao grupo, o que dificulta a modernização dos instrumentos de trabalho.
• A forma de gestão, nesta amostra, demonstra que o controle das horas
trabalhadas é feito por técnicos que são responsáveis pela guarda e
partilha do dinheiro, e que as pessoas que trabalham nesses núcleos
produtivos têm dificuldade de desatrelar do trabalho no CAPS. Inter-
namente decidem tudo em assembleia, sendo que as produções são
limitadas pelo horário de funcionamento do serviço.
• Com relação à representação e voto esta amostra indica que prevalece o
voto de técnicos e facilitadores e que algumas vezes na argumentação os
técnicos podem invalidar o voto contrário dos usuários que trabalham nos
projetos. Há uma afirmação, nesta amostra, que existe hierarquia de saberes
nos espaços de discussão e de decisão e prevalece o saber dos técnicos.
11 A realização de um novo diagnóstico censitário está em curso (2020/2022) entre o Núcleo de Ensino e
Pesquisa da Associação Vida em Ação e o Grupo de Pesquisa Interdisciplinar de Políticas Públicas de
Saúde Mental do Instituto de Estudos Avançados da USP. Com a finalidade de garantir a enunciação e
avaliação coletiva e autônoma das Unidades Produtivas da Rede SM/Ecosol, por meio da análise de sua
práxis, e longitudinalmente construir linhas de fortalecimento com vistas à superação, na perspectiva
da construção de arranjos produtivos locais como estratégia de desenvolvimento comunitário e que
reduza desigualdades.
150
Referências
Prefeitura de São Paulo (2021). Lei nº 17.587, de 26 de julho de 2021. Lei Paul Sin-
ger – Marco Regulatório Municipal da Economia Solidária, bem como a Política, o
Sistema e o Conselho Municipal de Economia Solidária em São Paulo. São Paulo.
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PARTE II
SAÚDE MENTAL E
VULNERABILIDADES
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Reflexões sobre a política de saúde mental e a
temática racial: incluir para avançar
Sônia Barros
Luís Eduardo Batista
Marcia Aparecida Ferreira de Oliveira
P
ara a psiquiatria e os psiquiatras do início do século XX, no Brasil, os fenô-
menos psíquicos e culturais explicavam-se pela hipótese de uma causalidade
biológica que justificava a intervenção médica em todos os níveis da socie-
dade. Costa (1989) afirma que, para aqueles psiquiatras, os fenômenos psíquicos e
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Batista (2002) utilizou a mesma chave analítica utilizada por Barbosa (1998)
em seu estudo “Mulheres e homens negros saúde doença e morte”. A pesquisa foi
realizada com dados de mortalidade do Estado de São Paulo para o ano de 1999 e
164
Tabela 1
N 168 152 16
Pretas
Tx 11,09 10,03 1,06
continua...
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 165
continuação
Principais Causas
CAP V - Transtornos Transtornos mentais e Restantes dos Trans Mentais
mentais e Comportamentais comportamentais e Comportamentais
N 313 277 36
Outras
Tx 3,63 3,21 0,42
TOTAL
Fonte: Batista, L. E. (2002). p. 71. Elaborado a partir de dados da Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados-FSEADE. Tabulações especiais. Taxa de mortalidade por 100 mil habitantes.
psiquiátrica prestada no Brasil era de má qualidade e que esta situação era decorrente,
principalmente, do modelo assistencial então vigente centrado no leito hospitalar
psiquiátrico indica prioridades e propõe estratégias para uma ação transformadora
no campo de Saúde Mental.
Desde então, normas, portarias e a Lei nº 10.216/2001 vem construindo e imple-
mentando uma política de Estado, de saúde mental, e neste processo as Conferências
de saúde mental tem sido um mecanismo de articulação, proposição e participação.
Aceitando que as Conferências Nacionais de Saúde Mental têm constituído
dispositivos fundamentais de participação, controle social, debate e de indução de
diretrizes políticas e medidas operacionais, e ainda um papel crucial de definir as
estratégias e rumos na implementação da Reforma Psiquiátrica, os relatórios das Con-
ferências foram revisitados na expectativa de identificar proposições de inclusão nas
políticas de saúde mental de diretrizes e ações para enfrentamento ao racismo e seus
efeitos na saúde mental da população negra considerando os dados epidemiológicos
que evidenciam esse sofrimento.
etnia, de acordo com o IBGE, nos instrumentos de coleta de dados nos sistemas de
informação dos serviços de saúde mental. Fomentar a realização de pesquisas que
desagreguem dados por sexo e idade ao tratar dos principais quadros clínicos entre os
usuários negros nos serviços de saúde mental, que busquem compreender o impacto
do racismo na subjetividade.
No Eixo III – Direitos Humanos e Cidadania como desafio ético e intersetorial,
os princípios e diretrizes do sub-eixo 3.1 – Direitos Humanos e Cidadania é citado
como princípios fundamentais dos direitos humanos no campo da saúde mental o
combate ao estigma e o respeito à diversidade.
A IV Conferência reafirma a importância da aplicação da Lei nº 10.216/2001 e
da Constituição Federal no tocante ao enfrentamento dos preconceitos referentes à
saúde mental, assim como de garantir a equidade dos cidadãos, de forma a assegurar
o respeito à diversidade e às diferenças étnicas raciais, entre outros grupos. Para isso,
o Relatório afirma é preciso promover políticas públicas específicas que garantam a
inserção social de todas as populações excluídas, tais como negras, e outros grupos.
Destaca, que para todas estas pessoas é fundamental garantir, em todos os níveis de
atenção, o atendimento humanizado e qualificado às pessoas com sofrimento psíquico,
sem qualquer tipo de discriminação ou desrespeito, bem como assegurar processos
de monitoramento e avaliação das ações pertinentes ao combate a todas as formas
de racismo e de discriminação.
No sub-eixo 3.4 –Justiça e Sistema de Garantia de Direitos encontra-se no item
Garantia de Direitos Humanos e Civis a proposição 751. Garantir a intersetorialidade e
a integralidade das políticas no âmbito da atenção psicossocial e dos direitos humanos
da população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais), idosos,
pessoas com deficiência, população negra, pessoas em situação de rua, mulheres e
profissionais do sexo.
No sub-eixo 3.5 – Educação, inclusão e cidadania, no item sobre Formação
e Educação Permanente para Profissionais de Saúde e Saúde Mental foi aprovada
a proposta 792: Incluir o tema étnico/racial nos processos de formação e educação
permanente dos trabalhadores da saúde mental e no exercício do controle social, con-
siderando as consequências do racismo na saúde mental da população discriminada;
172
Quadro 1
Recomendações de Ações Componentes para a Política de Saúde Mental, Álcool e
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foi possível evidenciar que (1) a população branca é numericamente maior que a negra (preta e parda) entre os
residentes nos hospitais psiquiátricos do estado, mas quando comparado proporcionalmente a população do
estado, a população negra residente nos hospitais psiquiátricos é maior que a média; (2) pretos e pardos estão
sendo internados mais jovens e assim permanecem hospitalizados, (3) os pretos e pardos tem maior dificuldade
de serem desinstitucionalizados por possuírem menor renda e menor apoio da família.
Realizar um censo e incluir as várias sexo, idade, raça/cor/etnia, sexualidade entre os dados de identificação
RECOMENDAÇÕES
dados de raça/cor e nenhum deles discutia esses dados. Ressaltam a importância da utilização do quesito
cor nos instrumentos, nos estudos da área da saúde e para o aprimoramento das políticas públicas que visam
diminuir as desigualdades raciais em saúde.
2. No estudo Perfil de usuários e práticas de serviço de saúde mental infantojuvenil: uma perspectiva racial,
(Barros & Batista, 2021) constata-se que foi mais frequente, entre os brancos, ter técnico de referência e projeto
terapêutico singular. A indicação de um profissional de referência é uma forma de construção de relações entre
profissionais e usuários, cabendo ao primeiro elaborar o projeto terapêutico singular junto com este, e, em diálogo
com a família e com o serviço, construir caminhos de cuidado. A importância do registro do quesito cor nos
formulários de atendimento dos CAPS também se coloca como uma forma de identificar o acesso da população
negra aos serviços CAPS, e como se dá a sua inserção nos serviços, e mais do que isso, ele é fundamental
para a construção de projetos terapêutico que orientaram o cuidado, aponta o estudo.
continua...
176
continuação
(1) a coleta do quesito cor não deve acontecer somente no cadastro dos usuários e na porta de entrada do
equipamento; (2) É fundamental considerar a ficha cadastral não como um elemento burocrático, mas sim
como elemento processual de transformação dos serviços, como quesito analítico; (3) incluir os familiares como
coparticipantes desse processo, abarcando a história da família na ficha cadastral, a história das mães, das
crianças e jovens; (4) a coleta precisa ocorrer ao longo do cuidado, especialmente nesse período específico da
vida ou seja, a infância e a juventude, em que a identidade e a construção identitária estão em curso, logo ela
deve compor o Projeto Terapêutico Singular (PTS) e os Projetos Terapêuticos Institucionais (PTI) e levá-la para
os atendimentos, para dentro das reuniões de equipe, incluindo e discutindo no raciocínio clínico e de cuidado.
• Incluir o quesito raça/cor nos sistemas de informação, avaliação e monitoramento, coleta de dados,
censos, bem como em ações e programas da Coordenação de Saúde Mental nos 3 níveis de gestão (o
preenchimento do campo raça/cor deverá ser obrigatório e respeitar o critério da autodeclararão, conforme
RECOMENDAÇÕES
critérios de classificação utilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), branco, preto,
O estudo ofereceu elementos para entender a gravidade dos efeitos do racismo na saúde e a necessidade de
intervenções nas dimensões particulares, singular e estrutural, assim como o desenvolvimento de políticas
intersetoriais para enfrentamento dessa iniquidade. Mesmo sendo realizado em um serviço sensível à questão
racial, o estudo identificou lacunas, dentre elas a necessidade dos profissionais de saúde registrarem todas as
atividades realizadas sobre esse tema, para que gestores possam partilhar, publicar e difundir seus resultados
e avaliar sua eficácia – estratégia basilar para o combate ao racismo; evidenciou a necessidade de identificar
e mapear parceiros nos territórios, associações, entidades da comunidade, coletivos e grupos culturais como
parceiros necessários à implementação e consecução de políticas intersetoriais e fortalecimento de estratégias
PRODUÇÃO ACADÊMICA
antirracistas nos territórios; sensibilizar e capacitar a comunidade escolar acerca da temática racial, e, privilegiar
intervenções longitudinais, distribuídas ao longo do ano e planejadas para estarem presentes no cotidiano do
serviço. Mesmo sendo realizado em um serviço sensível à questão racial, o estudo identificou lacunas, dentre
elas a necessidade dos profissionais de saúde registrarem todas as atividades realizadas sobre esse tema, para
que gestores possam partilhar, publicar e difundir seus resultados e avaliar sua eficácia – estratégia basilar para
o combate ao racismo; evidenciou a necessidade de identificar e mapear parceiros nos territórios, associações,
entidades da comunidade, coletivos e grupos culturais como parceiros necessários à implementação e consecução
de políticas intersetoriais e fortalecimento de estratégias antirracistas nos territórios; sensibilizar e capacitar a
comunidade escolar acerca da temática racial, e, privilegiar intervenções longitudinais, distribuídas ao longo do
ano e planejadas para estarem presentes no cotidiano do serviço. Alguns desses resultados foram apresentados
e discutidos com gestores da área técnica de saúde mental da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo
em 2020 durante Diálogo Deliberativo “O processo de cuidar em saúde mental da criança/adolescente negro
usuário de CAPSij”. Em 2021, o quesito cor passou a ser obrigatório nos sistemas de informação da Secretaria
Municipal de Saúde. Outra ação importante realizada pela da SMS foi retirar a informação “ignorado” como opção
de preenchimento. Portanto, o sistema de informação da SMS – São Paulo tem o quesito cor de preenchimento
obrigatório e como categorias, branco, preto, pardo, amarelo e indígena.
continua...
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 177
continuação
RECOMEN- • DATASUS incluir o quesito cor nos instrumentos de pagamento e gestão, em especial aqueles da saúde
DAÇÕES mental como Registro das Ações Ambulatoriais (RAS);
• Inserir o quesito cor nos sistemas de avaliação da política e dos serviços de saúde mental;
• Incluir indicadores referentes à saúde da população negra, ao pactuar os indicadores de saúde mental.
TEMA DAS CONFERÊNCIAS – Estabelecer metas específicas para melhorar os indicadores da saúde mental
da população negra
O artigo Indicadores de monitoramento e avaliação da implementação da Política Nacional de Saúde Integral
da População Negra” (Batista, et. al., 2020) indica a taxa de internação por transtorno mental segundo sexo,
ACADÊMICA
PRODUÇÃO
idade e raça/cor como indicador para monitorar e avaliar a política de saúde. Esse indicador foi definido, com
a preocupação de não se criar novos indicadores, mas, atualizar aqueles comumente utilizados no campo da
saúde mental, mas desagregados por raça/cor, e promover a comparação desses indicadores de saúde nas
diferentes regiões e municípios, a fim de realmente validar o impacto e os avanços alcançados na implantação
de ações de enfrentamento ao racismo efetuadas no contexto da política de saúde mental.
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• Definir que os indicadores de monitoramento de saúde mental, das Secretarias de saúde, sejam
desagregados segundo sexo/idade e raça/cor;
• Identificar e promover atividades de avaliação e monitoramento em saúde mental para o aprimoramento
do modelo de atenção e aumento da resolubilidade das ações e serviços prestados à população segundo
sexo, idade e raça/cor;
• Definir recursos financeiros para indução de pesquisas para validar e comparar os indicadores de saúde
e saúde mental e estabelecer o planejamento metas diferenciadas.
TEMA DAS CONFERÊNCIAS – Sensibilizar e capacitar a comunidades escolar acerca da temática racial
A inclusão do tema, cuidado em saúde metal e impacto do racismo na saúde mental, nas disciplinas ministradas,
nas orientações e nos eventos vem sendo uma ação estratégica do grupo de pesquisa para sensibilizar a
ACADÊMICA
PRODUÇÃO
comunidade escolar, acadêmica, profissionais e gestores. Durante o diálogo deliberativo os integrantes apontaram
a importância da discussão sobre racismo e a branquitude na formação, para capacita a comunidade escolar.
Os participantes lembraram que os serviços de saúde mental são campos de estágios das universidades,
portanto eles fazem formações, recebem os estudantes e devem demandar essa pauta, nos contratos com as
universidades provocando assim que a universidade faça formação sobre a temática.
outras drogas;
• Promover a inclusão da temática racial e do tema racismo e saúde mental nos processos de formação e
educação permanente;
• Estabelecer parcerias com instituições formadoras para o desenvolvimento do campo
docente-assistencial;
• Promover a interlocução com as universidades e instituições formadoras para a discussão e adequação
dos currículos de cursos de graduação e de formação na área sobre racismo e saúde mental, incluindo tema
álcool e outras drogas.
continua...
178
continuação
TEMA DAS CONFERÊNCIAS – Desenvolver estratégias e material de divulgação sobre o tema saúde mental da
população negra
As ações e estudos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa indicam que a formação dos profissionais de saúde
ACADÊMICA
PRODUÇÃO
é fundamental para mudança na cultura dos serviços e da sociedade sobre o racismo. É necessário, não
só discutir racismo, mas, também discutir os privilégios da população branca e assumir uma posição crítica
quando à branquitude – não apenas para reconhecimento de seus privilégios, mas também enquanto criação
de padrão de opressões.
• Garantir recursos para a promoção de atividades/eventos/seminários com o tema racismo e sofrimento
mental;
RECOMENDAÇÕES
• Incluir a divulgação dos dados epidemiológicos relacionados a saúde mental desagregados por raça/cor
na rotina do Ministério da Saúde/Secretaria Estadual e ou Secretaria Municipal de Saúde;
• Fomentar a produção do conhecimento sobre a temática impacto do racismo na saúde mental;
• Estimular o diálogo sobre racismo e branquitude nos equipamentos de saúde mental;
• Estimular que nas assembleias dos serviços as temáticas raciais sejam trabalhadas – estimular a
As recomendações apresentadas são alguns dos exemplos do que deve ser rea-
lizado massivamente de forma a avançar na inclusão da temática racial nos serviços
e na política de saúde mental álcool e outras drogas, e traz algumas recomendações
no sentido de convidar as defensoras e defensores da Reforma Psiquiátrica a retomar
a luta para que a saúde mental da população negra seja efetivamente incorporada a
Política de Saúde Mental Álcool e Outras Drogas.
Considerações finais
A proposição de ações estratégicas que interseccionam gênero, classe e raça
se coloca como um desafio para as políticas de saúde mental álcool e outras drogas.
O atravessamento étnico, racial, de classe e gênero destacados aqui como um dos
fatores que se inscrevem no sofrimento mental até o momento se configuram como
um desafio da RAPS.
As recomendações apontadas evidenciam a importância da articulação entre
Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) em articulação
com a Política de Saúde Mental (PSM) e a Política de Atenção Integral à saúde de
usuários de Álcool e outras Drogas como uma ação estratégica para potencializar o
reconhecimento do racismo como determinante social da saúde mental.
Ao resgatarmos o processo de exclusão da temática racial no contexto da saúde
mental, buscamos aqui identificar proposições de inclusão nas políticas de saúde
mental álcool e outras drogas algumas diretrizes e ações que possam vir a orientar
movimentos sociais, profissionais de saúde e gestores em suas ações de enfrentamento
ao racismo e seus efeitos na saúde mental da população negra.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 179
Referências
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Igualdade Racial. Altera as Leis nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, 9.029, de 13 de
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doi.org/10.1590/S0104-12902017164968”\h
Introdução
Falo de milhões de homens arrancados a seus deuses,
suas terras, seus costumes, sua vida,
a dança, a sabedoria.
(Césaire, 2020, p. 25)
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P
ouco se tem pensado criticamente sobre os efeitos do racismo entre povos indí-
genas. Constitui um tema que não deveria ter sido deixado de lado. Entretanto
há um autor que vem sendo cada vez mais conhecido no Brasil cujos textos
principais Pele Negra, Máscaras Brancas (Fanon, 2008; 2020b) e Os Condenados da
Terra (Fanon, 1968)2 tem sido lido a partir do século passado trazendo contribuições
relevantes para o Movimento Negro Unificado (MNU) e abordadas por autoras como
Neusa Santos Souza (Souza, 2021) e Cida Bento (Bento, 2022). Em 2020 sua obra
ganha um destaque ainda maior com a tradução de sua obra no Brasil (Fanon, 2020a;
2020c; 2020d; 2021; 2022)3, novas edições para o português (Fanon, 2020b) e com
publicações de outros autores como as de Faustino (2018; 2020; 2022), Magno e Passos
(2020), Lippold (2021) e Gabriel (2021). Este brilho do metal, adotando a expressão
de Achille Mbembe4, chama-se Frantz Omar Fanon (1925-1961). Destacarei, pois, dois
dos principais aspectos na obra do autor: o primeiro podemos traduzir pelo racismo
engendrado pelo colonialismo; o segundo, associado a este, consiste no efeito do colo-
nialismo na subjetividade dos indígenas5. Mas não se trata somente destas questões. A
relevância de trazermos Fanon para um texto sobre “saúde mental e povos indígenas”
é fundamental.
O martinicano Frantz Fanon foi médico-psiquiatra e trabalhou com povos
culturalmente diferentes. Fanon também trabalhou com Tosquelles e sabemos da
1 O termo saúde mental em contexto indígena foi utilizado pela primeira vez em 2014 em entrevista dada
previamente ao 4º Congresso Brasileiro de Saúde Mental. Ver nota 28.
2 Em 1961, sete anos antes da edição brasileira, foi publicado uma edição portuguesa (Fanon, 1961).
3 O segundo livro do autor o Ano V da Revolução Argelina ainda não foi traduzido no Brasil. Este livro foi
publicado na Argentina com o título Sociología de una revolución (Fanon, 2012).
4 “Eu, pelo menos, fui atraído pelo nome e pela voz de Fanon porque ambos têm o brilho do metal” (Mbembe,
2022, p. 23).
5 Utilizo a expressão “indígena”, posta em itálico ao longo do texto de forma política. Fanon utilizou a
expressão se referindo aos nativos que atendeu na Argélia, como os Amazighen (berberes), por exemplo.
Utilizo desta maneira com fins de problematizar a condição imposta a populações originárias de maneira
geral, incluindo o que entendemos como povos indígenas no Brasil, muitas vezes também chamados de
negros da terra (Monteiro, 1994).
184
importância deste para o campo da Saúde Mental. Porém, Fanon não é citado histo-
ricamente como referência neste campo, mesmo tendo trabalhado em Saint-Alban6 e
ter sido lembrado pelo próprio Tosquelles em um texto em sua homenagem7, além de
Franco Basaglia e Ernesto Venturini (Venturini, 2012). De acordo com Jean Khalfa,
Fanon publicou
entre grupos etnicamente diferentes, esta política institui-se como referência a pro-
teção de pessoas com transtornos mentais tornando-se universalizada para todos
os grupos étnicos no Brasil de forma indireta. Isso pressupõe três questões cen-
trais problemáticas.
A primeira pressupõe que as diferentes categorias médico-psiquiátricas de base
ocidental são tomadas e reconhecidas como universais e por isso também aplicadas
aos distintos povos indígenas no Brasil que estejam com algum transtorno. É por esta
ideologia que a Política de Atenção Integral à Saúde Mental das Populações Indígenas,
aprovada seis anos depois, vai considerar o CAPS e a Reforma Psiquiátrica como
referências, além de propor a intensificação de um “Programa de Formação Perma-
nente de Recursos Humanos para a Reforma Psiquiátrica, em áreas de concentração
de população indígena”.
A segunda, que o tratamento desses transtornos mentais deve ser realizado
povos indígenas (Sistema Único de Saúde & Conselho Nacional de Saúde, 2010,
p. 83) assim como a criação e implementação de políticas que possibilitem a supe-
ração de preconceitos e estigmas relacionados, dentre outros, a etnia, referente a
povos indígenas aldeados e em contexto urbano. É reiterado o acesso universal aos
cuidados em saúde mental e a garantia de acesso diferenciado a pessoas indígenas e
o desenvolvimento de projetos de intervenção junto a povos indígenas, considerando
seus saberes e o respeito às diferenças étnico-raciais e especificidades de cada comu-
nidade (Sistema Único de Saúde & Conselho Nacional de Saúde, 2010, p. 99-102).
Embora a Política de Atenção Integral à Saúde Mental das Populações Indí-
genas, já tivesse sido criada em 2007, o Relatório da IV Conferência Nacional
de Saúde Mental destaca a implementação de “uma política de atenção à saúde
mental que respeite as peculiaridades de saúde específicas de determinadas etnias,
como indígenas” (Sistema Único de Saúde & Conselho Nacional de Saúde, 2010,
20 Neste texto refiro-me a III e a IV Conferência Nacional de Saúde Mental (III e IV CNSM).
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 191
21 Apesar do esquema apresentado por Paulo Amarante, a partir de Franco Rotelli, no que diz respeito
ao campo da Saúde Mental e da Atenção Psicossocial serem compreendidos como Dimensões do
processo social complexo, a dimensão Sociocultural, apresentada pelo autor não compreende a
inclusão de povos culturalmente diferentes. Esta dimensão entende o sociocultural relacionado às
artes como a música e o teatro, por exemplo, e não a questões étnicas, mesmo mencionando que
“(...) novos elementos, novas situações, pressupõe que existam novos atores sociais, com novos (...)
interesses, ideologias, visões de mundo, concepções teóricas, religiosas, étnicas, de pertencimento,
de classe social... (...)” (Amarante, 2007, p. 63). Nas palavras do autor, a dimensão sociocultural “(...) é
portanto, uma dimensão estratégica, e uma das mais criativas e reconhecidas, nos âmbitos nacional e
internacional, do processo brasileiro da reforma psiquiátrica. Um dos princípios fundamentais adotados
nesta dimensão é o envolvimento da sociedade na discussão da reforma psiquiátrica com o objetivo
de provocar o imaginário social a refletir sobre o tema da loucura, da doença mental, dos hospitais
psiquiátricos, a partir da própria produção cultural e artística dos atores sociais envolvidos (usuários,
familiares, técnicos, voluntários)” (Amarante, 2007, p. 73).
22 “Quanto à locução ‘Saúde Mental’ em si, sua aplicação torna-se necessária a partir do período da história
brasileira relativamente recente, no qual uma série de outras disciplinas passou a disputar, de direito e de
fato, um campo que até então era exclusivo da psiquiatria” (Costa-Rosa, 2013, p. 12).
23 Ao todo aconteceram cinco Conferências Nacionais de Saúde Indígena: 1ª Conferência Nacional de Proteção
à Saúde do Índio realizada entre 26 a 29 de novembro de 1986 em Brasília/DF; 2ª Conferência Nacional de
Saúde Indígena realizada entre de 25 a 27 de outubro de 1993 em Luziânia/GO; 3ª Conferência Nacional
de Saúde Indígena realizada entre 14 a 18 de maio de 2001 em Luziânia/GO; 4ª Conferência Nacional de
Saúde Indígena realizada entre 27 a 31 de março de 2006 em Rio Quente/GO e a 5ª Conferência Nacional
de Saúde Indígena realizada entre 2 a 6 de dezembro de 2013 em Brasília/DF. A 6ª Conferência Nacional
de Saúde Indígena tem previsão para acontecer este ano entre 14 e 18 de novembro de 2022.
24 Embora estes documentos sejam tomados como referência não foram encontrados ou não estão disponíveis.
192
(...) casas ou centros regionais de práticas tradicionais de cura indígena, nos polos-
-base, nas capitais dos estados e nas cidades sedes dos Dseis, conforme a realidade
de cada etnia e região. Nesses centros serão oferecidas práticas tradicionais de cura
e a manufatura dos medicamentos fitoterápicos. Será garantido o apoio logístico para
o transporte dos pacientes aos locais de atendimento e o trabalho dos pajés, curan-
deiros, rezadeiras, parteiras, e outros, viabilizando a continuidade da cura tradicional
(Brasil – Funasa, 2007, p. 130).
26 Está previsto para acontecer neste ano de 2022 a VI Conferência Nacional de Saúde Indígena (VI CNSI).
194
Embora tenha sido elaborado em conjunto com trinta e dois (32) dos trinta e
quatro (34) Responsáveis Técnicos de Saúde Mental dos Distritos Sanitários Especiais
Indígenas do Brasil, em cooperação técnica com a Organização Pan-americana de
Saúde (OPAS) e com representantes da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool
e outras Drogas, dentre outras, o documento orientador de Atenção Psicossocial
aos Povos Indígenas toma como referência a Portaria que estabelece as diretrizes
gerais para a Política de Atenção Integral à Saúde Mental das Populações Indígenas.
Entretanto entende que
(...) a atenção à saúde mental tem sido um campo desafiador para os Distritos
Sanitários Especiais Indígena (DSEI), uma vez que ultrapassa o domínio das
dimensões estritamente biológicas. Por estar envolvida com aspectos relacionais
da experiência humana, inexoravelmente ligados à cultura e ao social, a atenção à
saúde mental exige que os profissionais de saúde tenham que lidar com dimensões
às quais não estão habituados em sua prática. Além disso, a experiência institucio-
nal no desenvolvimento de ações em saúde mental em contexto indígena é recente.
A soma desses fatores torna a atenção psicossocial para as populações indígenas
uma área do serviço de saúde que ainda precisa ser melhor compreendida pelos
profissionais, gestores e usuários (SESAI, 2019, p. 8).
27 O termo “saúde mental em contexto indígena” foi utilizado pela primeira vez por Abdala-Costa (2014) em
uma entrevista dada previamente ao 4º Congresso Brasileiro de Saúde Mental, cujo tema Navegando pelos
rios da Saúde Mental na Amazônia: Diversidades Culturais, saberes e fazeres do Brasil, realizado entre
04 e 07 de setembro de 2014 na cidade de Manaus, Amazonas possibilitou contar com um dia exclusivo
196
Contribuir para a potencialização dos projetos de bem viver das diferentes comu-
nidades, famílias e indivíduos indígenas a partir de ações de promoção da saúde,
sobre o tema da Saúde Mental em Contexto Indígena, favorecendo o envio de diferentes trabalhos, mesas
redondas, rodas de conversa e a participação de jovens indígenas como Dario Kopenawa, filho de Davi
Kopenawa e Kaiulu Yawalapiti, da associação de mulheres indígenas xinguanas Yamurikumã, além de
sabedores indígenas como Higino Tenório Tuyuca (in memorian) e Seu Luiz Laureano Baniwa. O termo
utilizado pelo autor também constituiu o 15º Eixo do Congresso e fora definido pelo mesmo da seguinte
maneira: “O eixo tem como proposta promover um diálogo entre a Saúde Mental e a Saúde Indígena,
abordando questões conceituais como a utilização do termo ‘Saúde Mental Indígena’ e a reflexão sobre
sofrimento psíquico e a Atenção Psicossocial neste contexto. Para além da questão conceitual deseja refletir
sobre a atuação da psicologia no contexto indígena, uso de medicamentos psicotrópicos, possibilidade de
atender a alteridade indígena nos serviços de referência – CAPS, Pontos de Atenção, Hospitais e Hospitais
Psiquiátricos – e problematizar categorias médico-psiquiátricas, tidas como universais, como relativas e
culturais. Destaca-se ainda a relação processo saúde/doença propondo diálogo entre formas diferentes
de atenção à saúde (tradicional x científica) e o trabalho dos profissionais de Saúde Indígena a partir do
Programa de Saúde Mental em diferentes Distritos Sanitários (DSEIs) do país instituído pelo Subsistema
de Atenção à Saúde Indígena (SASISUS)” (Abrasme, 2014). Destaco que uma das Reuniões Técnicas
para a construção do documento orientador de Atenção Psicossocial aos Povos Indígenas ocorreu antes
do 4º Congresso Brasileiro de Saúde Mental contando com a maioria dos Responsáveis Técnicos de
Saúde Mental dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas do Brasil, com o intuito de que estes pudessem
também contribuir e participar das diferentes rodas de conversa e mesas redondas no dia mencionado.
28 Tenho a impressão que o termo aparece pela primeira vez no Projeto VIGISUS II.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 197
30 – “Do you mind if i call you Charlie? I have difficulties to pronounce foreing names”. Charlie responde em
seu próprio idioma: “-Agora eu sou um estrangeiro?”
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 199
Considerações finais
O trabalho do psiquiatra Frantz Fanon traz de forma concreta uma análise das
condições de sujeitos provenientes de outras culturas como a muçulmana internados
em Hospitais Psiquiátricos. Para o campo da Saúde Mental e da Reforma Psiquiá-
trica é uma referência invisível por conta de algo muito específico: o racismo. Suas
31 Termo utilizado pelos europeus para designar seu ponto de vista sobre os indígenas a partir de seus
referencias católico-cristãos. Ver Guisard (1999).
200
Referências
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O
envelhecimento da população brasileira já não é uma novidade. Desde os
anos 1950, os censos demográficos, as estimativas e projeções populacionais
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam para o
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1 IBGE. Transição da Estrutura Etária no Brasil: Oportunidades e Desafios para a sociedade nas próximas
décadas. Borges, G. M., Campos, M. B.; Castro e Silva, L. G.; In Ervati, L. R., Borges, G. M., Jardim, A. P.
(Org.). (2015). Estudos e Análises. Informação Demográfica e Socioeconômica (n. 3). Rio de Janeiro: IBGE.
2 IBGE. Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e
Análises da Dinâmica Demográfica. Projeção da população do Brasil e Unidades da Federação por sexo e
idade para o período 2010-2060
208
3 Conceito Envelhecimento Ativo é definido pela OMS como o “processo de optimização de todas as opor-
tunidades para a saúde, participação e segurança, para melhorar a qualidade de vida das pessoas que
envelhecem”. World Health Organization: Envelhecimento ativo: uma política de saúde / World Health Orga-
nization; tradução Suzana Gontijo. – Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2005.
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 209
na Cidade Tiradentes, bairro periférico de baixa renda da região leste, foi observada
a menor média, de 58,3 anos de idade ao morrer (Mapa da Desigualdade, 2021).
que decorre a crescente demanda por cuidados de longa duração e por serviços
hospitalares e ambulatoriais especializados.
O Brasil apresenta um cenário peculiar de transição epidemiológica, em que
coexistem o crescimento das doenças crônico-degenerativas com a persistência de
doenças infectocontagiosas características de países subdesenvolvidos, além da pre-
sença importante de morbimortalidade provocada por causas externas, representadas
por acidentes de transportes terrestres, violências, suicídio, dentre outros agravos.
No entanto, conforme apontado, é preciso observar que as pessoas não enve-
lhecem da mesma forma, sendo o processo de envelhecimento altamente heterogê-
neo, diverso, variando muito de pessoa para pessoa. Parte dessa diversidade pode
acontecer em função de questões genéticas, mas ocorrem, principalmente, em função
dos ambientes físicos e sociais, aos quais as pessoas estão vinculadas ao longo de
seu percurso de vida. Estas condições podem afetar diretamente a saúde, impondo
barreiras ou apresentando facilitadores que influenciam as capacidades, as oportu-
nidades, as decisões e os comportamentos dos indivíduos. Questões relacionadas a
raça, gênero, condições socioeconômicas, nível educacional, dentre outras, afetam
diretamente o processo de envelhecimento de cada pessoa. Assim, existem muitas
formas de envelhecer e as pessoas idosas são tão múltiplas e diversas o quanto foram
ao longo de suas vidas.
Como consequência deste processo, que também é marcado pelo acesso ou não
a políticas públicas, teremos maiores ou menores oportunidades e garantias de um
envelhecimento saudável e com dignidade.
A Organização Mundial da Saúde (2015) define o envelhecimento saudável
como “o processo de desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional que
permite o bem-estar na idade avançada”.
O conceito de capacidade funcional é central para a saúde das pessoas idosas,
sendo o resultado da interação entre os recursos físicos e mentais do próprio indiví-
duo (a capacidade intrínseca da pessoa) e os ambientes físicos e sociais em que este
indivíduo está inserido para a realização de atividades consideradas importantes para
si e para sua sobrevivência.
210
O sofrimento psíquico que muitos idosos vivenciam não deve ser naturalizado
como sendo parte do envelhecer. Quando normalizamos tais vivências, corremos o
risco de não identificar, não investigar aspectos que são fundamentais na sua vida,
e consequentemente deixaremos de ofertar o cuidado necessário. Vale lembrar que
a taxa de mortalidade por suicídio entre pessoas com 70 anos é a mais prevalente
entre todas as faixas etárias, sendo essa razão da ordem de 8,9/100 mil habitantes4.
O sofrimento mental associado à perda da capacidade funcional pode ter forte
impacto na autonomia e independência dos idosos, e tal perda pode levar a outras
doenças e/ou situações que têm como desfecho a ansiedade, a depressão, o suicídio e o
desenvolvimento de transtornos mentais, refletindo na necessidade de cuidados de longa
duração, de cuidadores e até mesmo levar a institucionalização ou internações evitáveis.
Segundo um artigo da revista The Lancet, publicado em julho de 2020, a depres-
são e o isolamento social estão entre os 12 fatores de riscos reconhecidos para demên-
Referências
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Índice remissivo
A
Álcool e outras drogas 17, 18, 19, 20, 26, 27, 28, 33, 34, 59, 66, 68, 71, 74,
85, 88, 90, 91, 98, 106, 108, 138, 151, 156, 166, 169, 170, 175, 177, 178, 189,
190, 193, 195, 225, 227, 228
Ansiedade e depressão 56
Assistência social 19, 23, 28, 40, 55, 78, 131, 133, 155, 169
Associativismo 92, 137, 144, 147, 155
Atenção básica 19, 42, 69, 70, 74, 75, 77, 81, 136, 139, 144, 174, 193, 229
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Atenção psicossocial 4, 11, 14, 18, 19, 24, 40, 42, 52, 53, 65, 66, 67, 68, 76,
77, 78, 81, 83, 84, 87, 96, 103, 106, 107, 113, 121, 123, 124, 128, 130, 131,
134, 135, 148, 151, 152, 155, 156, 170, 171, 173, 175, 179, 181, 188, 191,
195, 196, 201, 202, 204, 215, 225, 227
C
Capacidade funcional 209, 210, 212, 213, 214
Comunidades terapêuticas 13, 18, 26, 28, 30, 46, 68, 84, 85, 97
Contrarreforma psiquiátrica 17, 87, 155
Cooperativismo social 138, 139, 147, 148, 151, 155, 157
Crise econômica 23, 24, 25, 56, 84, 85
D
Desabilidades psicossociais 39
Direitos de cidadania 33, 43, 45, 47, 48, 143, 168
Direitos humanos 18, 19, 28, 30, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 47, 48,
90, 100, 104, 105, 113, 114, 118, 119, 133, 146, 152, 170, 171, 172, 173,
203, 213, 215, 226
E
Economia solidária 12, 15, 28, 92, 96, 97, 106, 110, 113, 115, 133, 137, 138,
139, 141, 142, 144, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 154, 155, 156, 157, 225
Entidades médicas 13
Envelhecimento saudável 209, 210, 213, 214, 215, 216
220
G
Garantia de direitos 11, 14, 33, 34, 38, 39, 40, 42, 43, 48, 171, 187
Golpe político 20, 21, 22
I
Igualdade racial 163, 173, 180
Isolamento social 24, 56, 95, 153, 211, 212, 216
L
Luta antimanicomial 19, 33, 48, 85, 86, 88, 100, 110, 111, 112, 117, 126,
143, 144, 145, 146, 147, 148, 154
P
Pessoas idosas 49, 51, 54, 61, 95, 207, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 215, 216
Políticas de Saúde Mental 3, 14, 37, 154, 162, 167, 174, 175, 178, 229
Políticas Públicas 4, 12, 15, 17, 36, 37, 44, 46, 57, 59, 70, 85, 90, 91, 102,
104, 115, 127, 130, 131, 132, 136, 137, 142, 143, 146, 147, 148, 149, 156,
167, 169, 171, 175, 190, 207, 209, 213, 216, 225, 226, 227, 228, 229
Políticas Sociais 19, 23, 28, 55, 84, 85, 95, 97, 101, 102, 103, 112, 155, 170,
213, 225, 226
População Negra 162, 163, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171, 172, 173, 174,
175, 176, 177, 178, 179, 180, 181
Populações indígenas 14, 51, 53, 57, 58, 59, 172, 185, 187, 188, 189, 190,
191, 193, 194, 195, 196, 203
Práticas de saúde 11, 14, 33, 34, 37, 39, 40, 43, 44, 48, 70, 169, 194, 229
Preconceitos 35, 166, 170, 171, 172, 190
POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: desafios no Brasil pós-pandemia 221
Prevenção da Automutilação 52
Problemas de saúde mental 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 41, 44, 137, 151, 172,
210, 211
R
Racismo na saúde 163, 166, 171, 173, 175, 176, 177, 178
Reabilitação psicossocial 24, 41, 77, 139, 148, 151, 154, 156, 227
Recursos humanos 135, 168, 169, 186, 187, 188, 192, 194, 195, 215
Rede de atenção 11, 13, 14, 18, 24, 42, 52, 53, 65, 66, 68, 83, 84, 87, 103,
128, 133, 148, 151, 155, 156, 170, 177, 214
Redes sociais 22, 26, 108, 110
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Reforma psiquiátrica 4, 11, 13, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 27, 30, 33, 34, 38, 39,
41, 43, 45, 47, 48, 68, 83, 84, 85, 86, 91, 96, 97, 98, 101, 104, 112, 113, 115,
116, 117, 118, 121, 123, 125, 126, 128, 130, 131, 135, 136, 137, 138, 140,
142, 144, 145, 146, 147, 154, 167, 168, 169, 174, 175, 178, 180, 184, 187,
188, 189, 191, 192, 194, 195, 199, 200, 202, 226, 227, 229
Relações sociais 33, 43, 44, 45, 46, 48, 102, 200
S
Saúde coletiva 19, 62, 82, 114, 116, 121, 122, 123, 125, 127, 128, 131, 134,
135, 136, 202, 217, 225, 226, 227, 228, 229
Saúde indígena 185, 186, 187, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 197, 200, 202
Saúde mental 3, 4, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 24, 26, 27, 28, 30,
31, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 56,
59, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 73, 74, 75, 76, 77, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86,
87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 103, 104, 105, 106,
107, 108, 109, 110, 112, 113, 114, 115, 116, 117, 118, 119, 121, 122, 123,
124, 125, 126, 127, 128, 129, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139,
140, 141, 142, 143, 144, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, 154,
156, 159, 161, 162, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171, 172, 173, 174, 175,
176, 177, 178, 179, 180, 181, 183, 184, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191,
192, 193, 194, 195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 203, 204, 205, 207, 209,
210, 211, 212, 214, 225, 226, 227, 228, 229
Saúde pública 4, 34, 47, 49, 50, 52, 68, 78, 81, 82, 116, 124, 179, 216, 217,
225, 226, 227, 228, 229
Sistema de informação hospitalar 70, 74, 78
Situações de vulnerabilidade 14, 51, 58
222
Sofrimento psíquico 14, 141, 143, 170, 171, 196, 210, 211, 212, 227
Substâncias psicoativas 72, 73, 74, 75, 130, 164, 169
Suicídios 49, 53, 54, 56, 57, 58, 59, 61, 69, 190
SUS 11, 12, 14, 18, 19, 20, 24, 28, 48, 52, 65, 66, 67, 68, 72, 74, 75, 76, 77,
78, 79, 80, 81, 83, 84, 85, 91, 92, 93, 94, 95, 102, 103, 107, 109, 113, 116,
122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 130, 131, 134, 135, 136, 137, 142, 143,
144, 146, 148, 152, 155, 167, 169, 174, 185, 186, 187, 189, 217, 229
T
Taxa de mortalidade 50, 55, 58, 164, 165, 169, 212
Temática racial 12, 161, 173, 174, 175, 176, 177, 178
V
Vulnerabilidade psicossocial 194, 195
Sobre o Organizador e autores
Organizador
Marcelo Kimati Dias
Médico Psiquiatra, mestre em Ciências Médicas pela Universidade Estadual de Cam-
pinas (2002) e doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas
(2007). Possui experiência em antropologia, saúde mental, saúde coletiva, gestão em
saúde pública e política de álcool e drogas. Atuou como assessor na Coordenação de
Saúde Mental (Ministério da Saúde), Diretor de Saúde Mental e Política de Drogas
em Curitiba. Atualmente atua como professor Saúde Coletiva UFPR, coordena o
Núcleo Interdisciplinar de Estudos Sobre Drogas (NIED) da UFPR. Tesoureiro da
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Autores
Ana Lúcia Ferraz Amstalden
Possui graduação em Psicologia e mestrado em Psicologia Escolar e do Desenvolvi-
mento Humano, ambos pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo/
USP. Tem especialização em Gestão de Serviços de Saúde, pela Universidade Federal
de São Paulo/UNIFESP. Possui experiência no campo educacional e de gestão de
Políticas Públicas de Saúde, tendo atuado em diferentes Secretarias e Áreas Técni-
cas do Ministério da Saúde, desde 2003. Em especial, atuou no campo da Política
de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas, com atuação no Ministério da Justiça e
em gestão municipal, gerenciando processos de desinstitucionalização psiquiátrica,
organização e coordenação de Serviços Residenciais Terapêuticos, Unidades de Aco-
lhimento e Núcleos de Geração de Trabalho e Renda. É servidora pública federal da
carreira de desenvolvimento de políticas sociais, atualmente, na Escola Nacional de
Administração Pública – ENAP.
Caroline Ballan
Doutoranda em Saúde Mental e Direitos Humanos pela Universidade de São Paulo.
Enfermeira de formação com experiência clínica na atenção psicossocial no SUS, e
atuação nos seguintes temas: saúde mental, economia solidária, serviços comunitários
de atenção à saúde, soberania alimentar, desenvolvimento sustentável, territórios,
Gustavo Zambenedetti
Professor Adjunto do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação
em Desenvolvimento Comunitário (PPGDC) da Universidade Estadual do Centro-
-Oeste (UNICENTRO) / Campus Irati-PR. Mestre e Doutor em Psicologia Social e
Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Graduado
em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM. Concluiu a Resi-
dência Integrada em Saúde, Ênfase em Dermatologia Sanitária em Saúde Coletiva pela
Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul – ESP/RS. Tem experiência na área
de Psicologia Social/Institucional e Psicologia da Saúde, atuando principalmente nos
seguintes temas: saúde mental; saúde coletiva; reforma psiquiátrica; redes de atenção
em saúde; processos de estigmatização e HIV-AIDS, estratégias de descentralização
da atenção em HIV-Aids
226
Renata Weber
Doutora em Saúde Mental pelo Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria e Saúde
Mental - IPUB/UFRJ. Mestra em Antropologia Social, pelo Programa de Pós-Gra-
duação em Antropologia Social do Departamento de Antropologia da Universidade de
Brasília. Graduada em psicologia pela Universidade de Brasília. Temas de interesse:
reforma psiquiátrica, políticas de saúde mental, CAPS, financiamento em saúde, ava-
liação de serviços, saúde coletiva, inimputabilidade, violência e gênero. Experiência
em pesquisa social em saúde. Também é cantora, compositora e artista visual.
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Sônia Barros
Graduada em Enfermagem de Saúde Pública pela Universidade Federal da Bahia
(1973), mestrado em Enfermagem Psiquiátrica pela Universidade de São Paulo (1982)
e doutorado em Enfermagem pela Universidade de São Paulo (1996). É Professora
Titular aposentada pelo Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica
da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e, atualmente, Professora
Sênior no Instituto de Estudos Avançados da USP. Tem experiência na área de Enfer-
magem, com ênfase em Saúde Mental, atuando principalmente nos seguintes temas
de pesquisa: Políticas de saúde mental, exclusão social de pessoas com doenças
mentais, processo ensino aprendizagem, enfermagem em saúde mental. Coordena
grupo de Pesquisa Enfermagem e Políticas e Práticas de Saúde mental cadastrado
no CNPq. Coordena o Departamento de Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental
da Associação Brasileira de Enfermagem (DEPSM /ABEn). Conselheira Fiscal da
Associação Brasileira de Saúde Mental e Membro da Diretoria do Capítulo Brasileiro
da Associação Mundial para a Reabilitação Psicossocial, (WAPR, Brasil).
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
SOBRE O LIVRO
Tiragem: Não comercializada
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5/11,5/13/16/18
Arial 8/8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)