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O CPP não apresenta uma definição concreta do que seja perícia, mas acaba por se
definir como um meio de prova, que permite percecionar e/ou apreciar factos, tendo
como condição de recurso a necessidade de um especial conhecimento técnico,
científico ou artístico, na definição do art. 151.º”
Existem diversos tipos de perícias, dentro das quais se encontram as perícias em geral
(art. 152.º), as perícias médico-legais (art. 159.º, n.º 1), nas quais se integram as perícias
psiquiátricas (art. 159.º, n.º 2) e as perícias sobre a personalidade (art. 160.º, n.º 2), às
quais iremos dar mais ênfase no decorrer do trabalho.
Dentro das perícias médico-legais, destacamos as perícias psiquiátricas, que têm como
objetivo a avaliação psicopatológica, avaliando questões como a inimputabilidade e
perigosidade em virtude de anomalia psíquica e, se o agente, à data dos factos, era capaz
de avaliar a ilicitude dos mesmos. (por definição).
No entanto, sem presença de anomalias psíquicas, destaca-se a necessidade de avaliação
da personalidade e da perigosidade do arguido que supõe, entre outros parâmetros de
análise, uma tomada de posição sobre o seu grau de socialização e, esta avaliação será
por meio da perícia à personalidade, que tem como objetivo “descodificar um ato,
situado num contexto sociocultural e civilizacional e numa história de vida”(Silva,
1993, p.30), ou seja, perceber as motivações para a alegada conduta com base na
compreensão do funcionamento do sujeito, avaliando as suas intenções, capacidade de
controlo face às situações, características psíquicas independentes de causas
patológicas, o seu grau de socialização e a sua interiorização de normas sociais e valores
da cultura onde se insere (Doron & Parot, 2001).
A perícia sobre a personalidade, constitui um instrumento de natureza psico-sócio-
jurídica, uma vez que, “o conhecimento da personalidade do arguido passou a ser,
assim, um dos vetores indispensáveis à aplicação do sistema penal, quer para a
criminalização, quer quanto à graduação das penas, quer quanto à definição dos índices
de perigosidade do agente” (Barreiros, 1992, p.52 citado por Agulhas, & Anciães, 2015,
p.41). “
Esta perícia está prevista e regulada no artigo 160º do Código Penal de 1987 devido às
alterações do Código Penal de 1982, onde se passa a ter interesse pela personalidade do
infrator para a medida de aplicação da pena e do seu cumprimento (Gonçalves, 1998,
citado por Rua ,nd,). , “1 - Para efeito de avaliação da personalidade e da
perigosidade do arguido pode haver lugar a perícia sobre as suas características
psíquicas independentes de causas patológicas, bem como sobre o seu grau de
socialização. A perícia pode relevar, nomeadamente para a decisão sobre a
revogação da prisão preventiva, a culpa do agente e a determinação da sanção. 2 - A
perícia deve ser deferida a serviços especializados, incluindo os serviços de
reinserção social, ou, quando isso não for possível ou conveniente, a especialistas em
criminologia, em psicologia, em sociologia ou em psiquiatria. 3 - Os peritos podem
requerer informações sobre os antecedentes criminais do arguido, se delas tiverem
necessidade.”
-Função de Perito
O artigo 154 do CPP veio consagrar que a determinação da perícia ocorre por despacho
da autoridade judiciária, seja de forma oficiosa ou mediante solicitação formal. Esse
despacho inclui informações como a especificação do objeto da perícia, os
questionamentos que os peritos devem abordar e a identificação da entidade, laboratório
ou dos peritos designados para conduzir o exame. Assim e segundo o nº2 do mesmo
artigo, a autoridade judiciária tem de fornecer toda a informação necessária para a
realização da perícia, sendo que caso existam mudanças no decorrer do processo estas
devem ser transmitidas aos responsáveis. Desta forma, se o objeto de perícia for alvo de
dúvidas o perito deverá esclarecê-las junto da entidade solicitadora da perícia, não
devendo iniciar a avaliação sem que o esclarecimento seja feito (Agulhas & Anciães,
2015). pg
Assim a perícia é realizada por um perito designado para o tipo de perícia em questão,
tendo em conta a área territorial. Caso a delegação não apresente meios suficientes estes
exames serão deferidos, preferencialmente, para os serviços de Psiquiatria e Psicologia
que integram o Serviço Nacional de Saúde, tendo em consideração a área de residência
dos examinandos, estando isto previsto no artº 24 da mesma lei (Lei nº45/2004, de 19 de
agosto).
Processo de Avaliação
Segundo Simões (1999) citado por Agulha e Ansiães (2015), pg “avaliação da
personalidade é uma estratégia orientada para o estudo da pessoa como entidade
única”, ou seja, irão ser avaliadas características individuais e também características
compartilhadas pela maioria das pessoas.
No decorrer do processo avaliativo o perito tem acesso a vários tipos de informação,
porém aqui destaca-se a informação judicial, principalmente acerca da natureza do
crime praticado e todas as circunstâncias envolvidas . Esta consulta deve ser feita,
preferencialmente, antes do processo de avaliação, de forma a permitir uma melhor
compreensão do funcionamento do sujeito aquando da prática do alegado crime (Miller,
2013).
Widiger & Samuel (2009), defendem que as entrevistas devem ser semi-estruturadas,
pois assim pode-se recolher e sistematizar informação, mas o indivíduo pode referir de
forma espontânea as suas motivações. Desta forma deve seguir guidelines específicas,
pois permitirá ao perito investigar acerca de temáticas que sejam relevantes para a
situação em questão.
Tem de ser realçado que os critérios presentes no artigo 155º do CPP, não são aplicáveis
às perícias efetuadas em delegações e gabinetes médico-legais do INMLCF, I.P., como
está previsto no artigo 3º da Lei nº45/2004, de 19 de agosto (Agulhas & Anciães, 2015,
p. 38).
Existe também o assessor, que pode ser qualquer especialista numa dada área, que seja
nomeado pelo juiz para auxiliar na análise de certos casos ou na realização de atos
processuais, como por exemplo, inquirição de vítimas para memória futura (Agulhas &
Anciães, 2015, p. 39).
Valor da perícia
É especialmente importante no âmbito penal, uma vez que o juízo técnico, científico ou
artístico da perícia, é considerado em relação à livre apreciação do julgador,
constituindo uma exceção ao princípio da livre apreciação da prova, que “implica,
contrariamente ao sistema de prova legal, que o juiz não se encontre sujeito a regras,
prévias e legalmente fixadas sobre o modo como devem valorar a prova, pelo que, por
exemplo, pode reputar mais convincentes as declarações do arguido ou o depoimento de
uma única testemunha que todos os restantes depoimentos” (Latas, 2006, citado por
Agulhas, & Anciães, 2015, p.34).
Atualmente, prevalece a compreensão de que diante de um parecer cientificamente
comprovado, em conformidade com as exigências legais, o tribunal desfruta de total
liberdade para analisar a base fática em questão. No entanto, essa avaliação também
deve ser conduzida de maneira científica, o que pode implicar a necessidade de uma
nova perícia para fundamentar a discordância manifestada pelo juiz. Sempre que houver
incertezas em relação ao parecer pericial, mesmo após todos os esclarecimentos
fornecidos, se necessário, o tribunal deve ordenar a realização de uma segunda perícia.
A legislação reconhece a necessidade de confiar no julgamento técnico, científico ou
artístico dos peritos, presumindo que esses elementos estão fora da livre apreciação
subjetiva do julgador, como uma forma de assegurar a imparcialidade e a expertise
técnica na avaliação das provas , nesse sentido, a credibilidade do que o perito afirma
em seu relatório pericial é determinante. (encontrar ref)
Sublinha-se, porém, que, apesar do valor das perícias, o juiz é o perito dos peritos, o
perito peritorum, tendo margem para se desvincular, fundadamente, das conclusões
periciais, atenta a sua visão holística e prudente do processo com vista à boa decisão da
causa.
A avaliação psicológica é uma tarefa profissional própria da Psicologia, mas que nos
últimos anos tem sido cada vez mais requisitada para fins forenses. No entanto, a
relação profissional que se estabelece não se baseia numa relação terapêutica, na
avaliação psicológica forense são o tribunal e o sistema judicial os “sujeitos” a ser
acompanhados (Machado & Gonçalves, 2005; Mezquita, 2005; Shapiro, 1999), dessa
forma espera-se uma atitude mais imparcial e objetiva (Cordeiro, 2008; Fonseca, 2006;
Heltzel, 2007).
Sendo uma resposta a um pedido feito pelo sistema judicial, a avaliação psicológica
feita ao sujeito, e as suas implicações, são para uso do sistema judicial, ou seja, não só
os resultados da avaliação não são confidenciais como o psicólogo forense não terá
possibilidades de os reformular, tornando-se, deste modo, num juízo definitivo sobre o
qual poderá ter que prestar esclarecimentos (Machado & Gonçalves, 2005). Além disso,
o psicólogo forense não pode assumir, a priori a veracidade de qualquer informação,
devendo incluir na sua avaliação múltiplas fontes de informação e utilizar diversos
métodos, de modo e encontrar “a verdade histórica dos factos” (Greenberg & Shuman,
1997; Greenberg & Shuman, 2007).
Segundo Agulhas & Anciães (2015) pg o desenvolvimento da perícia deve decorrer com
zelo e respeitando os deveres éticos e deontológicos que regem o estatuto e a profissão,
sendo este desempenho feito por meio de um compromisso de honra perante a
autoridade que é competente. Caso o perito não atue tendo isso em vista ele poderá ser
destituído e substituído e poderá ter de pagar uma multa, tal como consta no nº 3 e nº4
do artigo 153º do CPP, e no artº 469º do CPC. Uma situação mais gravosa diz respeito
ao depoimento ou apresentação de um relatório falso, onde o perito pode ser punido
criminalmente com pena de prisão de 6 meses a 3 anos ou com pena de multa não
inferior 60 dias, sendo estas situação mais agravadas após o depoimento ter sido
prestado, sendo consagrado no artº 360º do CP.
Um outro aspeto que deve ser tido em conta prende-se com a confidencialidade, onde o
perito deverá salvaguardar os factos que não apresentem qualquer relação com o objeto
de perícia e que não sejam essenciais à avaliação, sendo ele um interveniente direto num
processo penal, tal como nos indica o artº 86º do CPP. Desta forma, o perito pode pedir
a escusa quando as condições indispensáveis para a realização da perícia não estejam
reunidas, podendo ser de cariz pessoal ou profissional, podendo esta ser recusada (artº
153º nº2 do CPP e artigo 470º do CPC). O psicólogo também deve seguir o princípio da
intervenção mínima, tentando obter apenas a informação essencial conforme os
objetivos da avaliação (Agulhas, 2012b).
Segundo o artigo 2 da lei 45/2004 de 19 de Agosto, lei estipula que ninguém se pode
eximir de ser submetido a um exame médico-legal quando este se mostrar necessário ao
inquérito ou instrução de qualquer processo, sendo requerido pelas entidades
competentes.
É necessário, no início da avaliação o examinando prestar consentimento informado
(Knapp & VandeCreek, 2001), que também poderá ser verbal, como estipulado no
artigo 38 do CP. Caso o examinando for menor de idade, o consentimento deverá ser
dado pelo seu representante legal.
O processo de consentimento informado e esclarecido é essencial para estabelecer um
clima de confiança e, dessa forma, excluir uma postura resistente por parte do
examinando, diminuir a sua probabilidade em simular ou manipular respostas,
encorajando a sua adesão ao processo, uma vez que está informado sobre tudo o que vai
ser avaliado.
O relatório social com avaliação psicológica pode ser solicitado pelo Ministério Público,
na fase de inquérito, ou pelo Juiz na fase jurisdicional previamente à tomada de decisão
judiciária, sendo obrigatório quando se prevê a possibilidade de aplicação de uma
medida tutelar de internamento em regime aberto ou semiaberto e, deverá ser
apresentado no prazo máximo de 30 dias.