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A PSICOPATIA SOB A ÓTICA DO DIREITO PENAL:

DO PROCESSO AO CONVÍVIO SOCIAL.

Max Allan Lima Oliveira do Nascimento

RESUMO
Justifica-se o presente tema, em decorrência das polêmicas a cerca do assunto e a divergência entre
doutrinadores além da falta de jurisprudência congruente relacionada ao assunto levando em consideração
a utilização do art. 26, § único do Código Penal que é utilizado em parte dos casos relacionados aos
psicopatas e devido a isso há de ter uma análise profunda a cerca do artigo e da temática principalmente no
que diz respeito a falta da utilização do artigo como analogia. Também foi analisado na pesquisa científica
quanto a imputabilidade do agente que é fator primordial para a decisão quanto ao seguimento das premissas
do artigo citado ou não. Posteriormente foi abordado a forma de tratamento dos indivíduos portadores de
psicopatia e sua forma de restrição de liberdade e posteriormente o seu ingresso a sociedade em que a
ressocialização deveria ser o foco. Por fim, foi trazido casos emblemáticos ocorridos no Brasil e sua
dualidade quanto ao cumprimento da restrição de liberdade. Devido aos fatos, endossa, o presente trabalho,
que a busca por tratamentos alternativos de pessoas com distúrbio de personalidade é vital para uma
ressocialização e uma volta ao convívio social, a qual não há o emprego atualmente nos hospitais de
custódia.
Palavras-Chave: psicopatia; imputabilidade; ressocialização.

ABSTRACT
The present theme is justified, due to the controversies about the subject and the divergence between
doctrine makers in addition to the lack of congruent jurisprudence related to the subject taking into
consideration the use of art. 26, the only § of the Penal Code that is used in part of the cases related to
psychopaths and due to that there must be a deep analysis about the article and the thematic, mainly with
regard to the lack of use of the article as an analogy. It was also analyzed in scientific research as to the
imputability of the agent, which is a major factor in the decision regarding the follow-up of the premises of
the article cited or not. Subsequently, the form of treatment of individuals with psychopathy and their form
of restriction of freedom were addressed, and later their entry into the society in which resocialization
should be the focus. Finally, emblematic cases that occurred in Brazil and their duality regarding
compliance with the restriction of freedom were brought. Due to the facts, it endorses, the present work,
that the search for alternative treatments of people with personality disorder is vital for a resocialization
and a return to social life, which is not currently used in custody hospitals.
Key words: psychopathy; liability; resocialization.

1. Introdução

No sistema prisional atual o apenado entra e ao invés de ser ressocializado, sai para
as mazelas da sociedade marginalizado, mas, no que se diz respeito aos psicopatas essa
diferença é ainda mais drástica pois começa a dissociação a partir da conceitualização de
que enquadramento o psicopata tem quanti a sua imputabilidade.

*Graduando no Curso de Direito da Faculdade Pio Décimo – SE Email: maxdm.se@gmail.com


Visto isso, passa a ser caracterizado o psicopata como uma pessoa cruel e sem nenhum
tipo de humanidade e muitas vezes se pensa que estes indivíduos agem por que querem,
mas não é ressaltado o fato deles serem portadores de um distúrbio o que acarreta a
marginalização desses indivíduos, dentro e fora das prisões.

A definição da forma de responsabilização dos psicopatas é de suma importância, pois


a imputabilidade é o princípio norteador do que será a vida desta pessoa. O
acompanhamento, psicológico ou a falta dele, as condições sanitárias onde vive, as
medicações ou a falta delas entre outras medidas auxiliam ou restringem influenciam
diretamente na vida destas pessoas em restrição de liberdade.

Além dos fatores antes citados, também tem que haver uma reflexão sobre o sistema
prisional e a adequação dele para o tratamento e a ressocialização dos indivíduos a
sociedade, visto que este é um dos principais fatores motivacionais da restrição de
liberdade e caso este não ocorra apenas a punição será exercida, levando a sociedade
pessoas revoltadas, marginalizadas e não ressocializadas fazendo com que voltem a
cometer delitos o que é de alto índice entre os psicopatas.

A psicopatia é um transtorno de personalidade que alcança 3,6% da população em


geral, então deve ser tratada com seriedade visto que é capaz de trazer consequências
graves para a sociedade principalmente nos casos em que seus portadores tem seu grau
mais severo.

Assim, é importante tratar a discussão acerca da psicopatia principalmente em relação


ao sistema prisional e seus desdobramentos para a condenação do indivíduo que comete
o delito diante das peculiaridades de sua personalidade que deve ser cuidada de perto por
profissionais capacitados a fim de gerar qualidade de vida pra estes indivíduos o que
acarreta menor risco a sociedade quanto ao cometimento de novos delitos.

É importante ressaltar, que não se trata de uma discussão acerca da culpabilidade do


agente e sim quanto a sua punibilidade, o indivíduo que comete o delito ele vai sim ser
julgado, porém, é de suma importância que se leve em consideração a sua capacidade
mental de discernimento e seu distúrbio psicológico a fim de preservar a isonomia jurídica
que se trata de princípio fundamental e tem seu devido valor visto que todos os seres
humanos merecem e possuem direito a dignidade.
2. Fundamentação Teórica

A psicopatia pode ser considerada uma doença mental, uma doença moral ou um
transtorno de personalidade, porém, no final das contas é um problema involuntário do
indivíduo e que não há forma específica de tratamento e nem cura.

Todavia, no que se refere a real tipificação desta condição a Classificação


Internacional de Doenças (CID) e o Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disorders (DSM) declaram que a Psicopatia é um transtorno de personalidade, recebendo
do CID o nome “transtorno da personalidade dissocial” e do DSM-5 o nome “transtorno
da personalidade antissocial”.

Essas classificações se dão ao fato de que o psicopata possui discernimento d certo


e errado e controle dos seus atos, não podendo ser classificado como “loucura” pois este
não sofre de delírios e alucinações. Na realidade estes indivíduos possuem uma dualidade
nas suas características por serem bem específicas e comuns ao mesmo tempo, como por
exemplo: frieza, QI acima da média, extremamente calculista, sociável, comunicativo,
desapegado, etc.

No que se refere a imputabilidade da pena, nada mais é do que a qualidade do ser


imputável, ou seja, aquele que pode ser responsabilizado por prática de ato criminoso
ressalvado os casos abrangidos pelo artigo 26 do Código Penal.

Neste sentido, leciona Bitencourt (2012, p. 179-180):

“Existem determinadas condições psíquicas que afetam a


capacidade intelectual para compreender a ilicitude, como, por
exemplo, nos quadros de oligofrenia, de doenças mentais, ou de
desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Além disso,
existem certas espécies de psicoses e neuroses, notadamente as
neuroses obsessivo-compulsivas, consideradas pela psiquiatria
como doença mental, que não eliminam o senso valorativo da
conduta, afetando somente a capacidade de autodeterminação
daquele que a padece. Se o agente não tiver uma dessas
capacidades, isto é, se uma delas lhe faltar inteiramente, no
momento da ação, ou seja, no momento da prática do fato, ele é
absolutamente incapaz, nos termos do caput do art. 26. Pela
redação utilizada pelo Código Penal, deve-se dar abrangência
maior do que tradicionalmente lhe concederia a ciência médica
para definir uma enfermidade mental. Porque não é atribuição do
legislador penal nem do juiz da ação penal classificar nem
resolver as questões médicas e técnicas que concernem à
psiquiatria, mas, sim, valorar os efeitos que determinado estado
mental pode ter sobre os elementos que compõem a capacidade
de culpabilidade penal.”

Portanto, devemos considerar que esse conceito de doença mental deve ser
analisado em sentido lato, ou seja, deve abranger todas as doenças, sejam elas de origem
patológica ou toxicológica. (NUCCI, 2014). Haja vista deve ser estendida de forma
analógica aos distúrbios.

A definição da imputabilidade do psicopata é de suma importância, pois esta, de


forma conflituosa, vem a preencher requisitos das sanções aplicáveis a estes indivíduos,
que são: estabelecer as consequências jurídico-penais para a infração (pena ou medida de
segurança); a finalidade da sanção (prevenção e reprovação ou tratamento e cura); o
fundamento do exercício do ius puniendi estatal (culpabilidade ou periculosidade).

Ao que se refere às consequências para a infração, o que difere as duas espécies


são os aspectos fundamento, finalidade e duração.

A pena tem por fundamento a culpabilidade do agente e deve ser aplicada a


criminosos imputáveis e semi-imputáveis, por finalidade a reprovação da conduta ilícita
e a prevenção para que novos delitos não aconteçam e duração sejam fixadas com termo
final certo.

Já a medida de segurança, tem por fundamento a periculosidade do agente e deve


ser aplicada a criminosos inimputáveis, por finalidade o tratamento e cura do agente
infrator e duração possui apenas o tempo mínimo, sendo aplicadas por tempo
indeterminado.

Contudo a jurisprudência acerca da matéria é divergente na caracterização da


imputabilidade o que gera a insegurança jurídica do assunto, fazendo com que exista
diversos psicopatas espalhados pelas diversas fases e tipos de execução penal destoando
a característica do princípio da igualdade e isonômico.

Existe decisões que declaram o psicopata um ser imputáveis pois estes possuem
discernimento do caráter ilícito do fato e por não ser considerado transtorno ou doença
pelas classificações dos órgãos de saúde mundial. Porém, existem decisões que tornam
os psicopatas semi-imputáveis pois estes possuem o discernimento, porém não consegue
controlar seus atos e por fim também há decisões que classificam os psicopatas como
inimputáveis pois não há controle sobre suas ações mesmo que haja um entendimento
sobre o fato ilícito.

Essas decisões geram grande problemática para o caráter fundamental da


execução penal que é punir e ressocializar, gerando instabilidade e livre interpretação
acerca do que é, como afeta e o que provoca no indivíduo essa condição a qual o indivíduo
não escolheu para si.

Embora não haja senso comum acerca da classificação do psicopata quanto a


imputabilidade, o Brasil mantém a maioria dos seus psicopatas em sistema prisional
comum, sem nenhuma espécie de acompanhamento ou tratamento, podendo viver até 30
anos em regime fechado com os outros detentos que não possuem nenhum tipo de
disfunção.

O confinamento nada mais é que uma experiência inútil, além de provocar nos
demais presos comuns efeitos negativos na expectativa de consumação daquelas
finalidades da pena privativa de liberdade. Sendo assim, após o término da pena esses
indivíduos com o transtorno tendem a voltar a delinquir, ocorrências futuras essas
pressentíveis ante os traços da personalidade do psicopata.

De acordo com Ana Beatriz Barbosa (2014, p. 152):

“Estudos revelam que a taxa de reincidência criminal


(capacidade de cometer novos crimes) dos psicopatas é cerca de
duas vezes maior que a dos demais criminosos. E quando se trata
de crimes associados à violência, a reincidência cresce para três
vezes mais.”

Ainda vale ressaltar que os psicopatas que conseguem ser classificados como
inimputáveis e recebem tratamento, este é o mesmo que pessoas com doenças mentais e
transtornos recebem, sendo ineficazes no tratamento dos psicopatas e acaba que estes
voltam a sociedade sem acompanhamento posterior.
O que se tem é uma sensação de insegurança, medo e receio de que estes
indivíduos voltem a sociedade sem um acompanhamento por parte do Estado, devido a
todos estes fatores os psicopatas são reincidentes em seus crimes tornando o ato ilícito e
seu período no sistema prisional um ciclo vicioso, onde o fim vem apenas com o
desfalecimento do indivíduo portador da psicopatia.

3. A Imputabilidade e sua relação controversa com a psicopatia

A imputabilidade vive uma relação íntima de “amor e ódio” com a psicopatia. Por
se tratar de um transtorno de personalidade e não de uma doença, o psicopata é visto como
um indivíduo que possui discernimento para o julgamento do certo e do errado, pois este
indivíduo tem o conhecimento de que o delito que possa a vir cometer é errado, mesmo
assim o faz para o próprio prazer, trata-se de sua própria vontade e os julgamentos
externos não interferem em suas decisões.

Em relação a imputabilidade, o psicopata é visto como um precipício de dúvida


entre o entendimento dos juristas. Existem entendimentos divergentes que conflitam
sobre a caracterização deste indivíduo quanto a sua imputabilidade. Segundo Mirabete:

“O agente tem capacidade psíquica que lhe permitia ter


consciência e vontade dentro do que se determina
autodeterminação, diante de suas condições psíquicas, a
antijuridicidade de sua conduta de adequar essa conduta à sua
compreensão, essa capacidade psíquica denomina-se a
imputabilidade (MIRABETE, 2001-a, p. 196).”

Devido a isso, é de entendimento geral que não é possível obter a plena certeza de
que um indivíduo com transtorno de personalidade possui capacidade psíquica de
consciência para interagir com a sociedade de maneira.

Desta forma, um delito tem que ser avaliado sob o olhar do dolo, da culpa e da
imputabilidade, sendo que esta tem relação direta com a consciência do autor sob o fato
a ser julgado. O art. 26 em seu parágrafo único do Código Penal, trata sobre a semi-
imputabilidade que possuem redução em sua compreensão ou vontade no cometimento
do ato criminoso e por isso devem ser julgadas de forma diferentes dos demais, o que se
enquadra perfeitamente com o caso dos psicopatas, que não perdem o discernimento dos
crimes que cometem e possuem sim o entendimento do fato criminoso, porém possuem
uma diminuição na capacidade volitiva e até intelectual para a compreensão do fato. Neste
caso a culpabilidade e o dolo não são afastados, são apenas diminuídos.

A doença mental deve ser compreendida por doença mental: as psicoses, incluindo
os estados de alienação mental da personalidade do agente e, portanto, deve haver cautela,
por parte da perícia e do magistrado para a constatação da psicopatia de um indivíduo,
por se tratar de um transtorno de personalidade e, portanto, tais situações são consideradas
limítrofes, ou seja, não chegam a ser normais, mas também não caracterizam a
anormalidade a que o artigo 26 do Código Penal brasileiro refere-se.

Ainda diz Jorge Trindade:

“Em que pese a existência de posicionamento jurisprudencial


referindo a posição de que os psicopatas apresentam capacidade
penal diminuída, imaginar a psicopatia como uma doença mental
clássica e incapacitante sob o aspecto cognitivo e volitivo,
fazendo com que, sob o aspecto jurídico, o psicopata seja isento
de pena, é o mesmo que privilegiar a sua conduta delitiva
perpetrada ao longo da vida e validar seus atos”. (TRINDADE,
Jorge. Manual de Psicologia Jurídica, 6. ed. rev. atual. e ampl. –
Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012, p. 179.)”

O indivíduo que comete crime e possui a psicopatia atualmente é acometido a


julgamento como sendo semi-imputável, mas isso não o torna um agente passível de
tratamento em hospital de custódia e ao mesmo tempo não deveria estar em convívio com
outros detentos que não possuem distúrbios psíquicos em presídio. A imputabilidade
reduz a pena destes indivíduos, mas não altera a forma de aplicação da pena.

4. A psicopatia e a aplicação da pena e da medida de segurança


A privação de liberdade é a pena de maior punibilidade do indivíduo, visto que é
um direito que afeta de forma instantânea e contínua, diferentemente da perda de direitos
políticos ou da execução de serviços comunitários. Desta forma, perder o direito de ir e
vir, por si só, já afeta o psicológico de qualquer indivíduo que venha a cometer um delito.
Em equiparação a privação de liberdade, está a execução por mandado de segurança desta
que é citada no art. 26 do Código Penal, neste contexto, o suposto apenado irá receber
tratamento no hospital de custódia e será acompanhado por especialistas que cuidarão do
seu caso em específico, com a utilização de medicamentos, terapias ou qualquer outro
tipo de cuidado que seja necessário. Ou seja, no sistema penal brasileiro o psicopata
possui duas vias que podem ser seguidas a depender da sua condenação.

Segundo Geraldo José Ballone (2015):

“Havendo dolo ou culpa a pessoa será considerada punível,


portanto, imputável. Não havendo nenhum dos dois, será dita
inimputável. Entre um estado e outro estão os casos considerados
semi-imputáveis. A semiimputabilidade ou Responsabilidade
Diminuída são os chamados casos fronteiriços, isto é, as pessoas
que não tem em sua plenitude, as capacidades intelectivas e
volitivas. Aparece nas formas menos graves de oligofrenia e de
doenças mentais. A semi-imputabilidade não exclui a
culpabilidade, sendo tão somente uma causa especial de
diminuição de pena.”

Devido a este fato, pode-se observar que quando há a inimputabilidade, o sujeito


do autor do delito é absolvido e consequentemente submetido à medida de segurança,
mas quando há semi-imputabilidade, o agente do crime não é absolvido, porém tem a
pena reduzida e também é submetido à medida de segurança. Contudo, Capez em relação
a consequência da aferição da semi-imputabilidade discorre (2008, p.301 e 302):

“Não exclui a imputabilidade, de modo que o agente será


condenado pelo fato típico e ilícito que cometeu. Constatada a
redução na capacidade de compreensão ou vontade, o juiz terá
duas opções: reduzir a pena de 1/3 a 2/3 ou impor medida de
segurança (mesmo aí a sentença continuará sendo condenatória).
A escolha por medida de segurança somente poderá ser feita se o
laudo de insanidade mental indicá-la como recomendável, não
sendo arbitrária essa opção. Se for aplicada pena, o juiz estará
obrigado a diminuí-la de 1/3 a 2/3, conforme o grau de
perturbação, tratando-se de direito público subjetivo do agente, o
qual não pode ser subtraído pelo julgador.”

Analogicamente, os indivíduos que são condenados e classificados como semi-


imputáveis ou inimputáveis, a pena é convertida em mandado de segurança e estes passam
a receber o mesmo tratamento ofertado a pessoas com doenças mentais e com a aplicação
da pena sendo o mínimo pré-estabelecido e o máximo indeterminado visto que o foco
neste tipo de aplicação é o tratamento e não a punição do indivíduo. Trindade (2009)
relata que até agora não existe evidência de que os tratamentos psiquiátricos aplicados a
psicopatas tenham mostrado eficiência real na redução da violência ou da criminalidade,
pelo contrário, alguns tipos de tratamentos que são eficientes para outros criminosos são
considerados contraindicados para os psicopatas, levando em consideração que os
mesmos burlam as normas de disciplinas dos estabelecimentos, aumentando a fragilidade
do sistema, além de trazerem consigo a frieza e negatividade.

Todavia, através da Lei de Execução Penal, em seu §1º do artigo 97, o indivíduo
condenado a cumprir o mandado de segurança deve ficar preso por tempo máximo
indeterminado, perdurando pelo tempo necessário até que se comprove através de perícia
médica o fim de sua periculosidade. Neste caso, o indivíduo não tem o direito a saber o
tamanho de sua restrição do direito à liberdade, ficando à mercê da interpretação dos
profissionais de saúde que o acompanham.

Neste sentido, Jorge Trindade alude que:

“os psicopatas iniciam a vida criminosa em idade precoce, são os


mais indisciplinados no sistema prisional, apresentam resposta
insuficiente nos programas de reabilitação, e possuem os mais
elevados índices de reincidência criminal”. (TRINDADE, Jorge.
Psicopatia - A máscara da justiça/Jorge Trindade, Andréa
Beheregaray, Mônica Rodrigues Cuneo. – Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2009.).

“Ninguém se torna psicopata da noite para o dia: eles nascem assim e permanecem
assim durante toda a sua existência”, segundo Ana Beatriz Barbosa (2008). Devido a isso,
considerando suas peculiaridades e a falha do tratamento utilizado contra esse transtorno
antissocial, deve a execução da reprimenda penal pelos psicopatas, com fulcro no próprio
princípio da igualdade e a busca pela dosimetria, ocorrer de forma diferenciada dos
demais sentenciados.

Já em relação aos indivíduos que foram condenados como imputáveis, estes


possuem a pena pré-determinada e convivem com outros detentos livremente como se
não possuíssem qualquer tipo de transtorno que altere sua personalidade. Neste caso,
todos partilham uma sociedade interna dentro dos presídios, local onde os indivíduos ali
presentes já estão com seu psicológico afetado o que abre brecha para possíveis
manipulações e incitações a violência. Em meio a esse tipo de ambiente social, uma
relação tóxica entre os psicopatas e outros indivíduos é mais que possível, é muitas vezes
real e perigosa, não só para o bem comum dentro do cárcere, mas também para os agentes
penitenciários e para a população a qual este indivíduo portador da psicopatia será
reinserido ao final de sua pena.

5. A ressocialização dos psicopatas e sua volta ao convívio social

A volta do indivíduo a sociedade é uma das maiores preocupações do Estado em


todo o processo de execução da pena, seja este indivíduo imputável ou inimputável. A
inserção na realidade da sociedade acarreta pressão social pois o indivíduo é a todo
momento contestado sobre sua moralidade em detrimento do ato ilícito que cometeu e
sobre os psicopatas não é diferente. A grande diferença é que longe de tratamento ou com
o tratamento errado para sua condição estas pessoas muitas vezes voltam a sociedade da
mesma forma e voltam a cometer delitos.

Segundo Jorge Garcia (apud OLIVEIRA,2015):

“É inútil qualquer tentativa de reeducação ou regeneração, pois


não existe na sua personalidade o móvel ético sobre o que se
possa influir. Ainda não suficiente, os psicopatas são também
contrários a tratamentos psicoterapêuticos ou a medicações, até
porque não existe cura, sendo que a internação para tratamentos
psiquiátrico ou ambulatorial de nada se mostraria eficaz contra
tal elemento portador da psicopatia.”
Portanto, a ressocialização que tem por finalidade trazer uma nova oportunidade
para que o praticante do delito possa ter um novo futuro a partir do reconhecimento de
seu erro e capacidade de mudança não ocorre, principalmente se atrelada ao descaso em
que se encontra o sistema prisional em questões de saúde, higiene e violência. Deve-se
levar em consideração também a resposta da sociedade a esta liberdade, o indivíduo por
muitas vezes é marginalizado e não consegue ser reinserido na sociedade por preconceito
e falta de fé na ressocialização, estes motivos reunidos fazem com que o indivíduo que já
possui um distúrbio de personalidade conflite cada vez mais dentro de si mesmo.

O tema ressocialização deve ser tratado com delicadeza quando relacionado a


psicopatia, visto que os indivíduos que a portam possuem a moralidade ao avesso e não
costumam seguir regras o que torna a prisão meramente punitiva e preventiva e não
ressocializadora, voltando então a cometer delito e a cada vez que for punido será mais
difícil o considerar culpado pois este ficará cada vez mais atento a seus deslizes.

“Mesmo décadas de prisão não bastam para “re-educar’” o


psicopata. Ele não se arrepende nem sente remorso. Uma vez
soltos, 70% deles voltam acometer crimes. A única coisa ele
aprende é evitar os erros que levaram à prisão. Da próxima vez,
agirá com mais cuidado” (SZKLARZ, 2009, p. 19).

Isso prova nada mais que o psicopata não possui ética e bom senso e que não se
arrepende de seus delitos pois busca prazer neles que é o mais importante para si, não
podendo, portanto, levar em consideração a ressocialização para estes indivíduos já que
os sentimentos importantes para o convívio social estes indivíduos não conseguem sentir.
Este apontamento vale-se para os dias atuais podendo a ciência desenvolver um
tratamento eficaz para a psicopatia que possa unir estes indivíduos ao campo social.

Vale ressaltar que o tratamento dado a um criminoso comum deve ser totalmente
diferente ao oferecido a um psicopata, visto que o detento comum em cárcere possui
capacidade de ser ressocializado e reinserido na sociedade de forma passe a ter uma vida
comum, já o psicopata por possuir tal transtorno não pode ser tratado da mesma forma
visto que a isonomia entre ambos é necessária e este precisa de um acompanhamento
psiquiátrico.

Neste sentido, aduz Cestari (2016):


“A maioria dos psicopatas cumprem pena em estabelecimento
prisional comum, devido a facilidade de dissimular bom
comportamento carcerário. Ao atingirem o prazo máximo de 30
anos de internação, psicopatas serão inseridos ao seio da
sociedade, mesmo que a perícia conclua pela não cessação da
periculosidade. Como estará a sociedade protegida de psicopatas,
que pesquisas apontam um baixo índice de ressocialização?
Psicopatas serão colocados em liberdade, mesmo que sem
respaldo para tal.”

Por fim, a psicopatia tem suas nuances relacionadas a ressocialização que é muito
necessária a sociedade para que esta continue seguindo a diante, mas é de suma
importância observar casos em específicos de psicopatas e seu futuro como seres sociais.

6. Casos Emblemáticos

Francisco da Costa Rocha, conhecido por “Chico Picadinho”, viveu uma infância
e juventude problemáticas, pois houve a falta de afeto por parte de seus parentes e um
envolvimento precoce com drogas e prostituição. Não conseguia manter vínculos
trabalhistas e relacionamentos duradouros, mantendo relacionamentos sexuais com várias
pessoas, traços comuns entre os psicopatas. Já em sua infância, feriu e matou diversos
animais, principalmente gatos, sobre o pretexto de ter curiosidade em saber se realmente
possuíam sete vidas.

É um brasileiro condenado pela morte de duas mulheres, nos anos de 1966 e 1976,
valendo-se do mesmo “modus operandi” na prática dos delitos. Em ambos os delitos teve
relacionamentos sexuais violentos com as suas vítimas, matando-as e esquartejando-as
para esconder os cadáveres, adormecendo no sofá que possuía em sua casa.
Posteriormente, foi condenado a 20 anos e 6 meses e obteve comutação da pena para 14
anos e 4 meses de reclusão. Após cumprir 8 anos de sua pena, obteve liberdade, com a
exclusão do diagnóstico de psicopatia.

Dois anos depois, em 1976, veio a cometer novo delito, tendo sido condenado a
22 anos e 6 meses de reclusão, e diagnosticado como semi-imputável, por ser portador de
personalidade psicopática de grau severo. Teve extinta a sua punibilidade em 07 de junho
de 1998, e em 14 de dezembro do mesmo ano foi decretada a sua interdição civil.
Francisco se encontra encarcerado até os dias hoje, havendo várias críticas com relação a
esse cenário, haja vista a falta de previsão legal para essa prisão por interdição civil.

Contra pondo o caso de “Chico Picadinho, Francisco de Assis Pereira, conhecido


como o “Maníaco do Parque”, é um assassino em série brasileiro que, por volta de 1998,
estuprava e matava mulheres.

Estima-se que ele tenha atacado um total de quinze mulheres, conseguindo matar
seis delas. As vítimas eram todas jovens de até 24 anos, e Francisco as abordava
identificando-se como sendo um caça-talentos de uma importante revista. Após
conversar, oferecia um bom cachê e convidava as moças para uma sessão de fotos em um
ambiente ecológico.

Ao atraí-las para um local isolado, utilizava-se de uma pequena corda ou um


cadarço de tênis, estrangulava-as e estuprava-as. Os delitos ocorriam sempre no Parque
do Estado, situado na região sul da capital do estado de São Paulo, local no qual também
foram localizados os corpos das vítimas.

O laudo psiquiátrico de Francisco de Assis Pereira, no entanto, não constatou a


presença de nenhuma doença mental, mas o diagnóstico dado foi de portador do
transtorno de personalidade da psicopatia. Assim o perito responsável concluiu se tratar
de sujeito semi-imputável.

Embora o laudo técnico apontasse para a semi-imputabilidade, o que significaria


a aplicação de uma pena reduzida o Conselho de Sentença formado pelo júri popular,
entendeu pela imputabilidade do agente, ou seja, o “Maníaco do Parque” foi julgado como
plenamente capaz de ser responsabilizado pelos crimes.

Assim, somando as penas recebidas pelos homicídios, estupros, atentados


violentos ao pudor e ocultação de cadáver, o “Maníaco do Parque” computou duzentos e
setenta e um anos de reclusão.

Os casos narrados acima tratam da dualidade trazida através da definição da


imputabilidade do agente, acarretando diferentes tipos de restrição de liberdade, nestes
casos especificamente, em relação a crimes de estupro e homicídio.

Visto assim que em casos praticamente iguais onde houve homicídios,


estupros entre outros crimes, um foi julgado como semi-imputável e o outro como
plenamente capaz, trazendo à tona a disparidade nos julgamentos dos casos dos
psicopatas.

7. Considerações Finais

Ante o exposto, foi concluído que a psicopatia não é uma doença, trata-se de um
distúrbio de personalidade e devido a isso não possui cura ou tratamento específico.
Levou-se em consideração também os conceitos de pena e de mandado de segurança,
recursos estes aplicáveis a indivíduos que portam o distúrbio da psicopatia e cometeram
crimes, assim como também foi tratado os conceitos de imputabilidade, inimputabilidade
e semi-imputabilidade.

Porém, é evidente que a jurisprudência não é unânime quanto ao que um psicopata


é em relação a sua imputabilidade, visto que cabe ao campo da psicologia desvendar
vielas ainda indefinidas sobre como funciona o psicológico indefinido desses indivíduos,
haja vista seja complexo o pensamento e personalidade humana.

Quanto a pena ou medida de segurança, constatou-se que nenhum dos dois é eficaz
no que se diz respeito a ressocialização. A pena que leva o psicopata ao cárcere comum
não é munida de qualquer tipo de acompanhamento psicológico e auxílio no que diz
respeito ao distúrbio que sofre. Já em relação ao mandado de segurança, o indivíduo fica
à mercê de tratamentos específicos para doenças mentais e não para distúrbios, além de
não haver qualquer tipo de acompanhamento ao ser reinserido na sociedade sendo
literalmente abandonado pelo Estado e marginalizado pela sociedade, visto que graus
mais severos da psicopatia seus crimes são hediondos e muitas vezes cruéis o que faz com
que não tenham oportunidade de mudança e se vejam excluídos socialmente.

E vale ressaltar que devido à falta da pena de caráter perpétuo estritamente


proibida no Brasil pela Constituição Federal, estes indivíduos voltarão a sociedade de
qualquer forma e independente de ter sido ressocializado ou recebido tratamento
adequado, ao que se vê essas pessoas passam a não ter sua isonomia garantida em relação
aos outros indivíduos sociais no tocante ao que é necessário para que seja reintegrado a
sociedade de forma digna.
Nos casos dos psicopatas, ressocialização é ligada diretamente a conceitualização
da imputabilidade e essa decisão resume como será o seu destino no que se trata da sua
estadia custodiado e na sua reinserção a sociedade.

Nos casos citados no trabalho, há uma disparidade entre quem é tratado como
imputável e quem é tratado como semi-imputável, tanto em relação a suas penas quanto
em relação a seu tratamento que mesmo não sendo o mais apropriado ainda sim é melhor
do que nada.

Assim, a utilização do Pshychopathy checklist ou PCL no sistema prisional


brasileiro permitiria a identificação dos sentenciados portadores desse transtorno
antissocial (quando a identificação não tiver ocorrido durante o processo criminal),
separando estes indivíduos na execução de suas penas dos demais sentenciados,
disponibilizando pessoal tecnicamente preparado para lidar com esse público e suas
peculiaridades (uma vez que os psicopatas sabem dissimular bom comportamento e
regeneração, entretanto, estando em liberdade, certamente voltam a delinquir).

É importante a discussão da temática pouco abordada em sociedade, mas que de


tempos em tempos aparece em discussão social visto os crimes que alguns dos psicopatas
comentem de forma truculenta, para que idealize novas políticas públicas acerca do tema,
além de buscar uma nova forma de tratar de forma alternativa esses indivíduos e o
acompanhamento posterior ao cumprimento de suas penas a fim de conter a reincidência.

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