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A questão das mentes criminosas:

Abordagem crítica acerca do sujeito e sua prática delitiva


Publicado por Yorranna Cunha

INTRODUÇÃO
O presente artigo fará uma abordagem crítica acerca das mentes criminosas,
no tocante ao sujeito e sua prática delitiva, utilizando-se do ramo da
Psicologia Criminal e do conhecimento acerca do criminoso, possibilitando-
se assim, o esclarecimento dos motivos que o levaram ao cometimento do
ilícito penal, bem como a prevenção da prática deste ato atentatório à paz
social.

O foco dessa abordagem científica é o transtorno comportamental


antissocial, motivo pelo qual, sucintamente serão demonstrados os
principais tipos de psicopatia presentes no contexto social contemporâneo;
sendo possível, através de uma análise perfunctória, identificar que os
portadores deste transtorno que ingressam na vida criminosa representam a
minoria dos existentes em nosso convívio.

O presente trabalho acadêmico traçará, através de métodos de estudo e


observação de elementos endógenos e exógenos ao fato criminoso, o perfil
criminológico, na tentativa de uma mediata prevenção ao cenário delitivo,
bem como facilitação no que diz respeito à identificação e consecutiva
persecução desta mente criminosa.

Utilizar-se-á uma análise documental em torno de uma amostra de materiais


bibliográficos, eletrônicos e documentais, substantivamente representativos
acerca da produção técnico-científica da psiquiatria brasileira no tocante ao
tema.

Será abordado o ciclo de um psicopata na justiça brasileira, através da


estruturação da sucessão fática a que tais mentes criminosas são submetidas
desde o repasse de sua tutela ao Poder Judiciário, configurando-se um ciclo
vicioso incompatível com portadores de tal patologia, haja vista seus
estrondosos índices de reincidência.
Restar-se-á consolidado que não há como se falar em ressocialização destes
sujeitos aqui intitulados de psicopatas criminosos, haja vista que a
consciência nunca lhes faltou, pelo contrário, são seres detentores de mentes
ardilosas e por vezes cruéis.

Esse artigo discorre sobre pessoas manipuladoras, imorais, transgressoras


de regras sociais, desprovidas de compaixão, culpa ou ainda, remorso. Esses
indivíduos estão integrados à sociedade, em meio a pessoas comuns,
recônditos, infiltrados em todos os setores da sociedade.

A realidade é cruel, entretanto, o mais impactante é que a maioria


esmagadora está do lado de fora das prisões, convivendo em sociedade, se
passando por “pessoas de bem” e a ínfima parcela subjugada ao manto
estatal utiliza-se dos demais integrantes desse sistema carcerário deplorável
como meras peças de um tabuleiro, onde se objetiva tão somente a satisfação
de um orgulho egocêntrico, gélido e insaciável.

Portanto, o presente artigo científico irá demonstrar a necessidade de


proteção da sociedade em razão destes indivíduos, devendo-se oferecer o
tratamento adequado a eles e em consequência, à sociedade, que
contemporaneamente figura como vítima impotente às espreitas de um
incógnito e cruel ataque.

Buscar-se-á, desse modo, avançar na extensão do saber psicológico em


interligação ao trabalho judiciário na área criminal, fundamentalmente, a
emissão de laudos de sanidade mental e de cessação de periculosidade, dois
dos principais momentos em que o saber-técnico é convocado como fonte
legítima para a emissão de “verdades” e de “provas”.

1 PERICULOSIDADE PROPRIAMENTE DITA


Cada ação criminosa em sua singularidade, como qualquer ato humano,
resulta da combinação de fatores endógenos e exógenos; particulares e por
consequência, dotados de sua pluralidade, seja em relação à motivação ou
ainda, modus operandi.

Neste raciocínio, cada atuação delitiva – essencialmente díspar em relação à


amostragem a qual integra - é dotada de fatores, em tese, distintos. Assim,
faz-se mister a análise da possibilidade de combinação, na tentativa de se
vislumbrar grupos de agentes criminosos, haja vista que a metodização
acarretaria no auxílio à previsão de reincidência, ou ainda na identificação
deste sujeito em meio ao contexto social em que se encontra inserido.

Os esforços para se obter uma sistematização não consiste, desde sua


origem, em uma tarefa coroada com muito êxito, haja vista a complexidade
em que reside a mente humana, o que é potencializada quando se refere à
mente criminosa.

Estabelecer uma tipologia facilita a catalogação dos sujeitos praticantes de


atos delituosos, resultando assim, em possíveis orientações quanto à
elaboração de medidas preventivas da criminalidade, ou ainda tecnicamente
denominadas de profilaxia criminal.

Nestas linhas, o presente trabalho utilizar-se-á da Criminologia Clínica, a


qual serve como meio de orientação por meio de determinadas concepções.
Segundo as ciências sob as quais este estudo se preconiza, existem variados
transtornos da personalidade, todos tendo como objeto de deficiência a
mente humana, outrossim, os distúrbios não se confundem.

Neste sentido, Alvino Augusto de Sá (2010, p. 16):

Seja qual for á concepção que se tenha de Criminologia Clínica, ela deverá
dar subsídios para se enfrentarem estas três questões: análise da conduta
que o direito criminal define como criminosa e da pessoa que a praticou (ou,
numa linguagem de viés crítico, da pessoa que foi selecionada pelo sistema
punitivo), a análise do cárcere e suas vicissitudes e a discussão em torno das
estratégias de intervenção. Assim, o critério sobre o qual se baseou a
sequência dos temas são essas três questões enfrentadas pela Criminologia
Clínica e Psicologia Criminal [...]

O viés que justifica a interrelação desta ciência à temática abordada neste


artigo, reside na análise do criminoso, sua mente e comportamentos, do
inter criminis e à consumação.

Como já observara Sérgio Salomão Shecaira, a Criminologia é uma ciência


interdisciplinar, que recorre ao método empírico, tendo por objetos de
estudo o delito, o delinquente, a vítima e as instâncias de controle, voltando-
se assim, para programas de prevenção.

Abdalla Filho ensina que não há um consenso sobre o conceito de


transtorno, já que este é objeto de considerações não somente do ponto de
vista científico ou médico, como também do ponto de vista social, político e
jurídico. (ABDALLA FILHO, 2004, p. 282)

Utiliza-se para este artigo científico as classificações publicadas pela


Organização Mundial de Saúde (OMS), intitulada Classificação Internacional
de Doenças (CID). Sob o Código F60 cuida-se de descrever os transtornos
específicos da personalidade e por suas subclassificações especifica-os. A
Classificação F60, adotada pelo Ministério de Saúde da República Federativa
do Brasil explana acerca do distúrbio:
Trata-se de distúrbios graves da constituição caracterológica e das
tendências comportamentais do indivíduo, não diretamente imputáveis a
uma doença, lesão ou outra afecção cerebral ou a outro transtorno
psiquiátrico. Estes distúrbios compreendem habitualmente vários elementos
da personalidade, acompanham-se em geral de angústia pessoal e
desorganização social; aparecem habitualmente durante a infância ou a
adolescência e persistem de modo duradouro na idade adulta. (CID F60)
Para que seja possível a visualização das diferenças existentes entre os
distúrbios de personalidade, o que é de suma importância para o objeto
investigado neste artigo científico, está carreado a este de modo sucinto cada
um dos distúrbios nos termos exatos do CID F60.

De acordo com Abdalla Filho, os transtornos da personalidade também


podem ser considerados como um tipo de transtorno mental, embora nem
sempre sejam vistos dessa forma por muitos psiquiatras, que normalmente a
chamam de personalidade psicopática. (DAVISON, 2002 apud ABDALLA
FILHO, 2004, p. 282).

Abdalla Filho acrescenta que a falta de consenso entre os psiquiatras sobre


os transtornos de personalidade só aumenta a importância do tema, bem
como a necessidade de aprofundamento dos estudos pertinentes a ele.
(ABDALLA FILHO, 2004, p. 281).

Segundo o psiquiatra forense José G. V. Taborda, “(...) cabe formular a


questão: o doente mental será de fato o melhor exemplo de individuo
perigoso na realidade brasileira?” (TABORDA, 2004, p. 23).

Para o autor o crime em realidade seria o resultado de “fatores culturais


prevalentes em uma sociedade enferma em termos de conduta moral.”
(Taborda, 2004, p. 24). Contudo, a posição majoritariamente encontrada na
literatura da área caracteriza-se por questionar o grau e alcance das relações
entre doença mental e periculosidade criminal.

Embora os posicionamentos críticos de muitos autores questionem a suposta


relação estreita entre doença mental e criminalidade, na concepção de
Taborda (2004, p.25):

Periculosidade é uma questão social e jurídica, porém absolutamente fora do


campo psicopatológico. O que o psiquiatra pode dizer sobre o examinando
restringe-se à sua saúde mental. Existem pessoas perigosíssimas sem
nenhum problema psiquiátrico, e vice-versa.

Embora em vários dos textos analisados apareçam comentários em torno da


necessidade de relativizar as relações entre doença mental e periculosidade
criminal, observa-se, igualmente, a presença de afirmações que estabelecem
uma sorte de identidade perfeita entre doença ou anomalia mental e
periculosidade.

Assim, por exemplo, Teitelbaum classifica a periculosidade em permanente e


transitória, e aponta que pode ser permanente, “(...) como nos casos de
retardo mental, em alguns transtornos de personalidade e transtornos
delirantes crônicos, entre outros quadros de permanência também
duradoura.” (TEITELBAUM, 2003, p. 911)

Neste sentido, compreende-se que no contexto social em que estamos


inseridos, tanto leigos quanto profissionais da área, carregam preconceito
acerca do tema, e por isso agem com repulsa, sendo que justamente pela
dificuldade de compreensão que paira sobre a psicopatia é que esta questão
deveria sempre estar sob o enfoque de estudos, não só da psiquiatria ou da
psicologia, mas também dos operadores do direito, tendo em vista a direta
ligação do tema com as áreas do direito penal e direitos humanos.

2 TRANSTORNO COMPORTAMENTAL
ANTISSOCIAL (PSICOPATIA)
Como se depreende por meio da análise das classificações dos distúrbios
dissociais dentro da classificação da OMS, a psicopatia é um distúrbio
mental grave de desvio de caráter, ausência de sentimentos e aguçada
capacidade de mentir e agir como se fossem verdadeiros os sentimentos e as
intenções. Os psicopatas têm normalmente inteligência acima da média e
por isso mesmo são excelentes manipuladores.

Atualmente, adota-se a classificação proposta pela CID 10, que apresenta os


seguintes “tipos”: paranóide; impulsivo; esquizóide; limítrofe; anti-social;
histriônico.

A psicopatia consiste assim na soma de questões psíquicas, aliadas às


condições do meio em que vive o indivíduo.

Em seu livro Mentes Perigosas, Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva destaca que
ninguém vira psicopata da noite para o dia: eles nascem assim e
permanecem assim durante toda a sua existência. Os psicopatas apresentam
em sua história de vida alterações comportamentais sérias, desde a mais
tenra infância até os seus últimos dias, relevando que antes de tudo, a
psicopatia se traduz numa maneira de ser, existir e perceber o mundo
(SILVA, 2008, p. 170).

O tipo de crime depende do grau de psicopatia. Muitos cometem fraudes e


estelionatos, outros optam pela violência, como homicídios, estupros.
Abdalla Filho descreve com riqueza de detalhes características da
personalidade dos psicopatas. Segundo ele, o transtorno é caracterizado
pelos seguintes aspectos: indiferença e insensibilidade diante dos
sentimentos alheios; atitude persistente de irresponsabilidade e desprezo
por normas, regras e obrigações sociais; incapacidade de manter
relacionamentos estabelecidos; baixa tolerância à frustração e baixo limiar
para a deflagração de agressividade e violência; incapacidade de
experimentar culpa e grande dificuldade de aprender com a experiência ou
com a punição que lhe é aplicada; tendência a culpar os outros e a apresentar
argumentações e racionalizações plausíveis para explicar um
comportamento que leva o portador desse tipo de transtorno a entrar em
conflito com a sociedade. (ABDALLA FILHO, 2004, p. 286)

Maria Nunes, em seu brilhante artigo “Crime – psicopatia, sociopatia e


personalidade anti-social”, escreve sobre a complexidade das peculiaridades
inerentes à personalidade psicopata, anotando que acerca da psicopatia
pode-se considerar uma constelação de características aos níveis emocional,
interpessoal e comportamental, conducente a um modo de funcionamento
patológico, que pode resumir-se numa desordem emocional que potencia o
risco para a emergência de comportamentos extremamente anti-sociais.
(NUNES, 2009, p.152)

Para Odon Ramos Maranhão, a psicopatia trata-se muito mais de um defeito


do que um distúrbio. (GUIMARÃES, 2012. P.78)

Conforme podemos verificar, os estudiosos são unânimes ao relatar acerca


da ausência de emoções e o sentimento de culpa; bem como o elevado grau
de inteligência e consequente pensamento racional.

Nesse diapasão, é de suma importância a observação de Luiz Flávio Gomes


(Gomes, 2012. P.04) sobre esta problemática, senão vejamos:

A personalidade psicopática, por ultimo, sugere hoje dois problemas


fundamentais: seu suposto correlato orgânico ou fisiológico, cuja verificação
foi atentada por numerosos autores, e a relevância criminógena da mesma.

Quanto às investigações empíricas, com grupo de controle ou sem ele


(população reclusa), destinadas a comprovar a relação entre a psicopatia e a
criminalidade, seus resultados - equívocos desconcertantes e até mesmo
contraditórios – ensejam toda sorte de interpretações. A discussão cientifica
sobre o problema continua aberta.

Face à complexa e enigmática personalidade dos portadores da psicopatia


reside a dificuldade em lidar com as situações em que estes indivíduos
estejam envolvidos.
Robert D. Hare afirma que de acordo com psiquiatras, psicólogos,
neurologistas e outros estudiosos do tema, os psicopatas são completamente
diferentes dos seres humanos, embora sejam considerados da mesma
espécie, pois são desprovidos de emoção ou sentimento, portanto, sendo
impossível se colocar no lugar do próximo, ou seja, haver algum tipo de
sentimento em relação ao outro. (CLECKLEY apud HARE, ROBERT D. P.05)

Faz-se mister ressaltar que os psicopatas possuem níveis variados de


gravidade, quais sejam, leve, moderado e grave. Os primeiros se dedicam a
aplicar pequenos golpes; roubos e estelionatos são práticas do nível
intermediário deste transtorno, mas provavelmente não cometerão crimes
dolosos contra a vida. Já os últimos primam pela crueldade, sentimento que
lhes proporciona prazer inigualável ao realizar tais atos brutais.

É necessário ter em mente que a psicopatia não possui cura, é um transtorno


de personalidade e não uma fase de alterações comportamentais
momentâneas. Porém, é relevante ter em mente que tal transtorno apresenta
formas e graus diversos de se manifestar e que somente os casos mais graves
apresentam barreiras intransponíveis de convivência.

Além de psicopatas, eles também recebem várias outras denominações, tais


como sociopatas, personalidades antissociais, personalidades psicopáticas,
personalidades dissociais, personalidades amorais, entre outras. Alguns
especialistas tentam diferenciá-los, mas as maiorias destes estudiosos tratam
como equivalentes.

Nesse diapasão, na tentativa de facilitar a compreensão do portador deste


transtorno, cabe a comparação deste com o parasita, tendo em vista que o
último associa-se a outros organismos com o único intuito de enfraquecê-los,
aproveitando-se a situação ao máximo que lhe compete, o que ocorre
exatamente com o psicopata na sociedade.

3 TRATAMENTO DADO PELO


SISTEMA PENAL BRASILEIRO
Quando descoberto, o portador do transtorno antissocial nega de maneira
categórica a prática do ilícito penal, utilizando-se de recursos para se passar
por doente mental ou ainda, detentor de múltiplas personalidades; não
tendo assim, consciência e domínio dos próprios atos, com o ardiloso
propósito de confundir os operadores do direito bem como, as pessoas que
foram vítimas diretas ou ainda indiretas de seus atos, quanto à sua inocência
ou insanidade.

Diante destas manobras, o magistrado possui caminhos restritos a percorrer


quanto à decisão no que tange aos psicopatas, sendo possível assim, de
acordo com o Código Penal Brasileiro permitir ao julgador declará-lo
imputável, ou seja, declarar pela consciência de seus atos e
consequentemente, este será submetido às sanções aplicáveis a qualquer
outro cidadão que pratica ilícito penal.
Noutra vertente, é facultado ainda ao julgador declarar a semi-
imputabilidade ou ainda, levando-se em consideração a possibilidade de
distúrbio comportamental grave, a inimputabilidade, pautando seu
posicionamento na tese de que este indivíduo não tem capacidade de
controlar seus atos, embora tenha consciência deles, ou respectivamente,
não tem consciência de sua atitude; situação de difícil detecção, haja vista
nossa defasagem quanto à comissões multidisciplinares para atestar esta
realidade no Judiciário brasileiro. Neste caso, o julgador poderá reduzir a
pena de um a dois terços; determinar sua internação em hospital de
custódia, ou ainda aplicando-lhe medida de segurança, conforme preceitua o
Título V da Lei Penal pátria.

Em razão do psicopata não poder ser considerado um criminoso comum,


configuram-se maiores empecilhos ao tratamento destes sujeitos, haja vista
não haver prisão especial para os portadores deste transtorno no Brasil,
como no Canadá, o psicopata no sistema carcerário brasileiro ficará preso
junto com os demais criminosos, causando grandes problemas nos
estabelecimentos penitenciários onde estiverem, provocando rebeliões e
consequentemente, prejudicando a reabilitação dos demais “reeducandos”,
tendo em vista seu ardiloso e extremamente manipulador discurso.

Neste ínterim, para os especialistas o caminho mais plausível residiria no


julgamento do psicopata como semi-imputável e por consequência, fosse
determinado encarceramento deste em estabelecimentos prisionais
especiais, com acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, composta
dentre outros por psiquiatras, psicólogos, juristas, e demais profissionais
especializados que proporcionariam o “tratamento” adequado, assim como à
sociedade, vítima deste indivíduo detentor de discursos altamente
persuasivos. Mas, como sabemos, esse pensamento é uma utopia para a
realidade brasileira, onde se pode pensar, no máximo, na separação em
pavilhões.

4 PERFIL CRIMINAL: ELABORAÇÃO,


APLICAÇÃO e VALIDADE
A ciência utiliza-se de meios empíricos de identificação de um psicopata,
porém não vem logrando muito êxito nestes métodos, bem como no que
tange à descoberta da forma de tratar estes predadores sociais.

Identificar estes indivíduos em meio ao contexto social em que se encontram


inseridos é um passo na direção da evolução da prática ostensiva,
possibilitando assim, trazer às famílias das vítimas e à sociedade, respostas
acerca destas práticas delitivas que atualmente não tem muitos de seus casos
solucionados, haja vista a dificuldade de identificação destes predadores
sociais, aliado à sua perspicácia em se esquivar do ordenamento jurídico.

Diante desta realidade, o presente trabalho científico identifica os principais


métodos empíricos que podem, e são utilizados em outros países, para
funcionar como auxílio à polícia investigativa na detecção do psicopata,
diante de informações que estão disponíveis, sendo elas apenas estruturas de
forma a garantir mais eficiência aos seus operadores.

Segundo R. N. Kocsis, os perfis criminais são definidos como uma técnica de


investigação da cena do crime, utilizada para analisar padrões de
comportamento que melhor definem um crime violento ou uma série de
crimes que podem estar associados, com o propósito de identificar as
características do presumível ofensor. Esta técnica integra processos de
recolha e análise da cena de um crime, com o objetivo de predizer o
comportamento, as características de personalidade e os indicadores sócio-
demográficos do ofensor que cometeu esse mesmo, estreitando o campo de
suspeitos e ajudando na sua detenção. (KOCSIS, 2003, apud SOEIRO 2009,
p. 37).

A construção de um Perfil Criminal é uma técnica de investigação evolutiva


que tem como base as ciências humanas e comportamentais, tais como a
Psicologia, a Psicopatologia, a Psiquiatria Forense, levando-se em conta
também a percepção do serviço investigativo militar. O ponto central desta
técnica passa por determinar com certa exatidão no tocante à predisposição
das características de um ofensor desconhecido.

Podemos considerar que a técnica de elaboração de um Perfil Criminal,


tendo em conta os objetivos tradicionais associados, pretende responder às
cinco questões fundamentais da investigação criminal (KOCSIS, 2006,
p.458):

a. Quem cometeu o crime?

b. Quando cometeu o crime?

c. Como foi executado o crime?

d. Qual a motivação que está na base deste (s) comportamento (s)?

e. Onde foi cometido o crime?


A resposta a estas questões, na maioria dos crimes investigados é adquirida
através do trabalho que é desenvolvido pelos profissionais de polícia. O
recurso à técnica surge associado a crimes sem motivação aparente, com
recurso a violência extrema. Na realidade, o trabalho desenvolvido pelo FBI
em matéria de Perfis Criminais é nitidamente orientado para casos de crimes
violentos cometidos em série, associados a comportamentos fora do vulgar e
que estariam ligados a perturbações graves da personalidade ou outro tipo
de doença mental grave (KOCSIS, 2006, p.459).

Neste sentido, através de uma abordagem sistematizada, objetivando


auxiliar a polícia no âmbito da investigação criminal na análise de cenas de
crimes violentos ou em série, no sentido de promover indicadores que
permitam a identificação de características que melhor definam o ofensor
associado a um contexto criminal, faz-se importante traçar o perfil criminal.

É possível perceber que existem diferentes abordagens que caracterizam a


fase científica da execução dos Perfis Criminais. No entanto, a construção
desta técnica, não obstante as simplificações de determinadas teorias, é
claramente uma arte complexa e minuciosa.

O percurso de desenvolvimento da técnica dos Perfis Criminais, apesar de


requerer um trabalho sistematizado de estudo da eficácia de cada uma das
metodologias, permite considerar que as tipologias obtidas são importantes,
não apenas para a intervenção nos casos de crimes ainda não resolvidos, mas
também, de uma forma mais global, para caracterizar a complexidade de
cada tipo de crime violento praticado por um determinado tipo de
indivíduos, quais sejam, os abordados por este trabalho científico, os
psicopatas.

Este contributo dado pelas tipologias permite orientar os profissionais que


lidam com a realidade criminal, numa ótica de identificar previamente
determinadas características comuns, possibilitando assim, uma facilitação
na identificação deste sujeito criminoso em meio ao contexto social em que
se encontra inserido.

Contrariamente a outras técnicas forenses, tais como impressões digitais ou


kits faciais de identidade, as origens do Perfil Criminal provêm da
investigação de crimes atípicos, que geralmente apresentam um indivíduo
com comportamento desviante, cujos motivos aparecem fora de padrões
típicos de polícia criminal e os procedimentos de investigação (Fischer, 1993,
citado por Kocsis, 2006, p. 470), enquadrando-se assim, no objeto de estudo
do presente artigo científico.

Na verdade, a génese do perfil como uma técnica parece indissociável do


conceito de assassino em série. Vários estudos têm mostrado que a polícia é,
muitas vezes, afortunada quando solicita perfis nas suas investigações
(JACKSON, VAN KOPPEN & HERBRINK, 1993, citado por KOCSIS, 2006,
p. 471).

Uma vez que nem todos os crimes são passíveis de Perfis Criminais, Holmes
e Holmes verificaram que os perfis apenas são apropriados em casos nos
quais o conhecido ofensor mostra sinais de psicopatologia ou se o crime é
particularmente violento ou contém um certo ritual. (MULLER, 2000, p.
234).

Constata-se, assim, que os principais objetivos dos perfis são orientar as


investigações, com a ajuda das Ciências Humanas e das Ciências Criminais,
relacionar os casos, identificar crimes com as mesmas características,
moldar as estratégias ao perfil do criminoso e emitir recomendações em
vários domínios da Criminologia (TOUTIN, 2002, citado por CORREIA,
LUCAS & LAMIA, 2008, p. 595).

A prevenção de crimes praticados por psicopatas é uma tarefa muito


complicada, haja vista ser muito difícil detectá-lo na prática de um crime.
Como estamos analisando crimes violentos, após sua consumação a
dificuldade amplia-se, haja vista a perspicácia destes indivíduos em lidar as
possíveis provas que poderiam incriminá-los, bem como receio e falta de
testemunhas que possam contribuir com informações de fato a esclarecer o
ocorrido.

É importante notar que na elaboração dos Perfis Criminais existem diversas


e distintas abordagens para os perfis, listando-se assim, três modelos
principais dos Perfis Criminais (Muller, 2000, p. 235): Avaliação e
Diagnóstico (DE), Psicologia Investigativa (IP) e Análise da Cena de Crime
(CSA).

Abordagem de Avaliação e Diagnóstico (DE – Diagnostic Evaluation)

O trabalho desenvolvido no âmbito desta abordagem é baseado no


conhecimento, experiência, treino e intuição para predizer as características
do ofensor, adquiridos a partir da experiência prática clínica e forense do
Profissional que organiza o perfil criminal (HOLMES & HOLMES, 1996,
citado por SOEIRO, 2009, p. 49).

Apesar desta abordagem ser considerada pioneira da abordagem estatística,


importa mencionar que ela é, ainda hoje, utilizada em algumas instituições
policiais, na resolução de casos complexos, isoladamente ou de forma
articulada com uma perspectiva quantitativa (SOEIRO, 2009, p.50).

Fundamenta todo o processo de predição das características de um ofensor


no estudo das características e do comportamento de indivíduos que
cometeram crimes definidos como sendo semelhantes ao crime para o qual
está a ser elaborado um Perfil Criminal (CANTER, 2004, p. 293).

Apoiam-se na elaboração de Perfis Criminais com base em cálculos


estatísticos criados a partir das variáveis resultantes do estudo dos crimes
resolvidos, bem como na análise comparativa de cada caso não resolvido
com os Perfis Criminais originados através deste conjunto de procedimentos
estatísticos multivariados. Nesta abordagem, que utiliza-se da vertente
estatística podem ser identificadas diferentes metodologias de trabalho na
elaboração dos Perfis Criminais (SOEIRO, 2009, p. 52).

O trabalho desenvolvido pelo FBI associa a informação recolhida de casos


resolvidos, permitindo, assim, a sua comparação estatística com casos de
crimes não resolvidos. A esta metodologia deu-se o nome de Criminal
Investigative Analysis (CIA), uma vez que possibilita a formulação de
hipóteses sobre o possível ofensor, no que diz respeito quer a características
pessoais, da personalidade, quer a características comportamentais
(KOCSIS, IRWIN, HAYES & NUNN, 2000, citado por SOEIRO, 2009, p. 53).

Embora a identificação do ofensor não seja imediata, esta metodologia não


deixa de ser um grande apoio para a investigação criminal (BURGESS,
DOUGLAS & RESSLER, 1988, apud SOEIRO, 2009, p.53).

Psicologia Investigativa (IP – Investigative Psychology)

O fundador desta abordagem foi o Psicólogo britânico, o Professor David


Canter. Esta metodologia, à qual o autor pretende conceder um grau de
complexidade semelhante a uma área especializada da Psicologia, define
que, a partir da análise das ações criminais de um grande número de
ofensores violentos, é possível propor teorias e hipóteses que permitem
estabelecer relações entre as ações dos ofensores e as suas características de
personalidade. De acordo com este autor, um Perfil Criminal deve, então,
basear-se na elaboração de hipóteses consistentes que, para terem essa
característica, devem ser geradas a partir de pressupostos de natureza
conceptual. (SOEIRO, 2009, p.55)

Segundo Canter (1995), a elaboração de um Perfil Criminal tem como


pressuposto que o Modus Operandi (a forma como o crime foi praticado)
exige características que são próprias de uma determinada pessoa, ou seja, a
forma como um ofensor pratica os seus crimes é condicionada pelas suas
características de personalidade e distingue-se do estilo da agressão de
outros indivíduos que praticaram crimes idênticos (SOEIRO, 2009, p. 59).

Para este autor, uma perspectiva teórica pode emergir da construção de elos
de ligação a partir dos estudos realizados nesta área. Um dos elos possíveis é,
por exemplo, a constatação de que qualquer crime é sempre uma transação
interpessoal que envolve as características do ofensor, nomeadamente na sua
forma de lidar com as outras pessoas. Assim, será de esperar que, durante o
crime, ele se comporte de acordo com as suas características de
personalidade, como no caso da psicopatia. O autor baseia, deste modo, o
seu processo de elaboração de um Perfil Criminal num conjunto de
abordagens teóricas de onde se destacam as tipologias psicodinâmicas,
diferenças de personalidade, carreiras criminais e as narrativas interpessoais
(KOCSIS, 2003, p. 664).

O alargamento e aprofundamento do contributo que a Psicologia pode ter


nas investigações policiais, além dos assassinos em série e perfis de
personalidade, para incluir a utilização efetiva da informação policial,
através de entrevistas e relatórios de polícia, bem como o estudo de
investigações policiais e sistemas de suporte de decisão conduziram à
identificação de um domínio prévio de Psicologia aplicada. Canter (1994)
chamou-lhe Psicologia Investigativa (IP). Ele ressaltou que o campo é rico
em questões desafiadoras para a Psicologia, tornando-o mais do que a mera
aplicação de princípios estabelecidos no trabalho dos investigadores
(CANTER, 2004, p. 313).

As questões centrais deste campo são, portanto, relativas aos aspectos


salientes das atividades criminais, a base de ligação de uma série de crimes a
um ofensor comum e os procedimentos para guiar a prioridade dos suspeitos
(CANTER & ALISON, 1999, citado por CANTER, 2004, p. 314).

A Psicologia Forense tende a focar o tratamento e a gestão dos ofensores,


uma vez que eles sejam apanhados. A IP foca-se em como a ciência
comportamental pode ajudar na detenção de ofensores ou questões de
investigação que poderiam ajudar na defesa ou acusação dos suspeitos
(CANTER, 2004, p. 314).

O professor David Canter usou o termo Psicologia Investigativa para


descrever as suas atividades de pesquisa em Perfis Criminais, justificando
este termo presumivelmente com a identificação de tentativas psicológicas
relacionadas com a investigação de crimes e de Perfis Criminais em
particular (CANTER, 1994, citado por KOCSIS, 2006, p. 460).

Perfil da Ação Criminal (CAP – Crime Action Profiling)

Esta metodologia, desenvolvida por Kocsis (2006, p. 470), considera este


instrumento como uma técnica psicológica que tem por base o corpo de
conhecimento formado pela Psicologia Forense. Conforme o autor, os Perfis
Criminais são um instrumento que se insere na Psicologia Forense e no
conhecimento científico acerca da dinâmica da personalidade e da
psicopatologia, contrariamente às duas metodologias anteriores. De fato, o
trabalho desenvolvido pelo FBI define a técnica dos Perfis Criminais como
técnica de investigação criminal, integrada num campo de conhecimentos
associados ao trabalho de polícia, ao passo que a Psicologia Investigativa
tenciona conceitualizar este trabalho como uma disciplina específica da
Psicologia.

Esta metodologia partilha de uma perspectiva idêntica à do FBI,


comparativamente à importância da análise da cena do crime, no entanto
fundamenta todo o trabalho nos conhecimentos teóricos da Psicologia
Forense (LOUCEIRO, 2008, citado por SOEIRO, 2009, P. 1091).

O trabalho de Kocsis (2006, p. 460), quando comparado com a metodologia


da IP, expõe uma orientação mais empírica, na qual define os Perfis
Criminais como uma mera técnica forense que investe no estudo dos padrões
comportamentais intrínsecos ao crime violento e nos processos, estrutura,
precisão e competências essenciais à elaboração de um Perfil Criminal
(SOEIRO, 2009, p. 1094).

No trabalho de Kocsis (2009, p.10), observa-se uma maior aproximação à


perspectiva do FBI. Este autor também considera que a técnica dos Perfis
Criminais deve ser aplicada a crimes excepcionais, cuja análise e
compreensão requer mais informação do que a necessária nos crimes mais
usuais. Apesar de recorrer, tal como o faz a IP, à estatística multivariada
para analisar os comportamentos criminais, distingue-se da mesma quanto
ao objetivo.

4.1 ELABORAÇÃO E APLICAÇÃO DE UM PERFIL CRIMINAL


Considerando agora o contributo apresentado pela Psicologia e Psicologia
Criminal, verifica-se que a técnica dos Perfis Criminais tem por base os
conhecimentos produzidos pelo campo das teorias da personalidade. Uma
das premissas mais importantes na construção de um Perfil Criminal está
relacionada com o fato de se considerar que o ofensor, ao cometer um crime
em determinada circunstância, apresenta certos comportamentos que se irão
repetir de forma similar noutros crimes que venha a praticar depois,
atendendo às características estáveis que revelam a sua personalidade. Deste
modo, é possível considerar que diferentes ofensores, em diferentes
localizações, cometem um crime violento de forma idêntica, devido às
características similares das suas personalidades (HORN, 1988, citado por
SOEIRO, 2009, p. 1092).

Com o intuito de satisfazer a necessidade de conhecimento e explicação


acerca do ofensor violento e facilitar a atuação da polícia de investigação
criminal, o FBI, em 1978, desenvolveu um estudo piloto que envolve o
recurso a estratégias de análise psicológica no estudo de casos de crimes
violentos (FEDERAL BUREAU OF INVESTIGATION, 1990, citado por
SOEIRO, 2009, p. 1093).
É neste contexto particular que se desenvolve a técnica dos Perfis Criminais,
orientada para o estudo da motivação e das características da personalidade
que podem ser imputadas ao ofensor a partir dos dados associados ao ato
criminal deste ofensor (FEDERAL BUREAU OF INVESTIGATION, 1990,
citado por SOEIRO, 2009, p.1093).

Trata-se de um estudo baseado em entrevistas com indivíduos encarcerados


que cometeram crimes violentos e crimes em série, em conjugação com a
análise de informação recolhida da cena do crime e dos relatórios periciais
relativos às vítimas. As entrevistas realizadas tinham como finalidade
adquirir uma observação mais sistemática e detalhada dos seus
comportamentos, da sua estrutura da personalidade e forma geral de
funcionamento e identificar, igualmente, qual o conjunto de características
que mais se ressaltam nestes ofensores violentos. Surge, assim, um
instrumento psicológico próprio para as necessidades de trabalho da
investigação criminal, que se baseia nos estudos sobre o comportamento
destes ofensores violentos, tendo sido, por isso, denominado “Perfil Criminal
do Agressor Violento” (HICKS & SALES, 2006, citado por SOEIRO, 2009, p.
1093).

É neste âmbito que se insere o conceito tradicional da técnica dos Perfis


Criminais que, conforme Horn, abrange sete passos (BULL, COOKE,
HATCHER, WOODHAMS, BILBY & GRANT, 2006; apud SOEIRO, 2009, p.
1090):

a. Uma avaliação meticulosa do ato criminal

b. Uma análise indulgente da cena do crime

c. Uma análise compreensiva da vítima

d. Uma avaliação de casos anteriores que estejam em poder da polícia

e. Avaliação dos resultados dos exames da autópsia em casos de homicídio

f. Desenvolvimento do perfil com a sugestão de possíveis características do


ofensor

g. Sugestões para a investigação criminal.

Segundo este cientista social, para construir um perfil é, então, fundamental


reunir o máximo de informação possível acerca do crime e do ofensor que o
cometeu, informação essa resultante de entrevistas realizadas com ofensores
que cometeram crimes semelhantes e também com o provável autor do
crime, laudo psiquiátrico deste, bem como proceder à recolha de
determinados materiais (por exemplo, fotografias da cena do crime, um
mapa que contenha todas as localizações significantes) e, em casos de
homicídio, o perfil deve conter o resultado da autópsia, tal como em casos de
agressões sexuais deve ser incluído um exame médico da vítima, além da sua
ocupação profissional, descrição física, estado civil, residência, reputação no
trabalho, status financeiro, história familiar, história médica, medos, hábitos
referentes à sua personalidade e hábitos sociais, referência ao uso de drogas
e de álcool, hobbies, amigos e inimigos, recentes mudanças no seu estilo de
vida, reação ao interrogatório pela polícia, possível registo policial, grau de
maturidade sexual, possibilidade de ter cometido uma ofensa semelhante no
passado, se o indivíduo pode voltar a atacar, etc..

A qualidade do perfil depende da qualidade do exame da cena de crime e da


exatidão da vítima ou entrevistas de testemunhas. De acordo com Dietz
(1985), Douglas et al. (1986) e Geberth (1990), um analista especializado
necessita tipicamente da seguinte informação: fotografias e descrições
completas da cena de crime, incluindo da vítima (isso inclui informações
sobre o carácter geral do local, incluindo os padrões de tráfego e a facilidade
do acesso de vários tipos de indivíduos); se se trata de um homicídio é
necessária uma autópsia da vítima e respectivo relatório da autópsia, bem
como os resultados de todos testes de laboratório; no caso de uma violação,
espera-se que a vítima possa reconstruir todas as interações com o violador,
sobretudo todas as técnicas verbais e não verbais por ele utilizadas, de forma
a obter o controlo e todos os detalhes do incidente, incluindo o tempo; a
localização, a arma usada e a reconstituição da sequência de eventos; o
Profissional também exige uma entrevista detalhada da vítima ou de alguma
testemunha ocular, incluindo o estilo de vida geral e uma descrição
pormenorizada dos comportamentos anteriores à vitimização (todas as
provas físicas deverão estar à disposição do Profissional, o que inclui indícios
clássicos como pegadas, pingos de sangue e ferramentas ou materiais
utilizados). (BULL, COOKE, HATCHER, WOODHAMS, BILBY & GRANT, et.
Al, 2006; citado por DAVIS 1999, p. 292)

É também necessária a seguinte informação básica acerca da vítima:


descrição física, incluindo vestuário na hora do incidente; estado civil,
incluindo crianças e membros familiares próximos; residência; ocupação;
reputação na vizinhança e no emprego (DAVIS, 1996; DOUGLAS, 1986 et.
Al., citado por DAVIS, 1999, p. 293).

Em seguida, o Profissional, tenta dar uma descrição o mais completa


possível do autor. Isso pode incluir sexo, idade, raça ou etnia, nível de
inteligência ou escolaridade, ser portador ou não de transtorno mental,
estado do serviço militar, o status do trabalho, condições de residência, a
natureza das relações interpessoais e até mesmo a marca e cor do carro do
ofensor. As numerosas declarações descritivas são vistas como hipóteses,
não se esperando que todas venham a ser corretas. Muitas dessas hipóteses
são apenas generalizações baseadas na experiência e formação do
Profissional; outras hipóteses são muito mais intuitivas, reencenando o
crime mentalmente e imaginando que tipo de pessoa estaria envolvida.
(HOMANT & KENNEDY, 1998, p. 320)

A informação que o Profissional utiliza é habitualmente tirada da cena do


crime e tem em conta fatores, tais como o estado da cena do crime, que
armas foram usadas no crime (se existirem algumas) e o que foi feito e dito à
vítima. Outra informação usada nos perfis pode incluir os padrões
geográficos dos crimes, como o ofensor chegou à cena de crime e de onde
veio e onde o ofensor vive. O atual processo dos perfis difere de um
Profissional para outro (dependendo do seu treino), mas o objetivo
permanece o mesmo: concluir o suficiente acerca do comportamento,
personalidade e características físicas do ofensor para poder detê-lo
(MULLER, 2000, p. 235).

Pode, então, concluir-se que a técnica do Perfil Criminal do ofensor violento


é um instrumento psicológico usado como auxílio na investigação criminal.
Segundo Toutin (2000), a elaboração do Perfil Criminal do ofensor provém
de uma experiência sólida na investigação criminal, na lógica e na intuição.
De certo modo, o autor compara esta técnica ao processo clínico de
diagnóstico e ao plano de tratamento que lhe pode estar associado, ou seja, a
situação é reconstruída, são formuladas hipóteses, o perfil é desenvolvido e
testado e os resultados são reportados a quem deles necessita (SOEIRO,
2009, p. 50).

Para além das características biográficas dos ofensores, os Perfis Criminais


podem procurar apresentar informação relativa à localização probabilística
do local de residência de um determinado ofensor. Esta informação resulta
da elaboração de um perfil geográfico que, de acordo com Kocsis (2006),
deve ser encarado como uma subcomponente da informação que pode ser
introduzida num Perfil Criminal. Na verdade, apesar de recorrer a
procedimentos estatísticos próprios para se adquirir este tipo de informação,
os perfis geográficos somente oferecem uma componente particular do que é
importante considerar na elaboração de um Perfil Criminal (SOEIRO, 2009,
p.52).

A técnica de elaboração dos Perfis Criminais constitui um instrumento de


trabalho para a investigação criminal e uma fonte de informação elementar
sobre as características dos ofensores, das vítimas e do fenômeno criminal
respectivo (HOLMES & HOLMES, 1996, citado por SOEIRO, 2009, p. 53)

Estes perfis possibilitam, não só associar os aspectos do comportamento


criminal às características psicológicas dos ofensores e do seu contexto de
vida, como também adquirir indicadores de vitimação (Salfati, 2000, citado
por Soeiro, 2009, p. 55) e definir tipologias constantes sobre a complexidade
do comportamento criminal, que podem ser associadas a cada tipo de crime
violento.

4.2 VALIDADE DOS PERFIS CRIMINAIS COMO TÉCNICA


FORENSE
Os Perfis Criminais conjugam a prática de interpretar o comportamento, a
personalidade e as características demográficas de um criminoso baseadas
em evidências da cena do crime (HICKS & SALES, 2006, p. 26).

Essa prática tem sido utilizada pelos agentes da polícia de todo o mundo,
apesar de não haver nenhuma evidência científica convincente de que é
confiável, válido ou útil. De fato, há poucos estudos que empiricamente
verificam a exatidão dos Perfis Criminais. Outrossim, eles representam um
avanço na busca pelo psicopata, devendo assim ter sua aplicabilidade vista
como auxílio no processo investigativo.

A questão da validade do perfil da cena de crime assume diferentes formas


dependendo do contexto. A partir do ponto de vista legal, não há necessidade
de esperar por garantias de que o perfil em geral é um processo válido,
enquanto não houver alternativas mais promissoras e enquanto o processo é
utilizado com cautela. Do ponto de vista científico e social, há uma
necessidade de validar perfis, não apenas para cada um dos objetivos
individuais para os quais ela é usada, mas também para cada tipo de crime.
Como uma estratégia investigadora, é claro, pode começar-se por tentar
estabelecer a validade do processo para a sua utilização principal e, em
seguida, o foco depois de seu uso. (HOMANT & KENNEDY, 1998, p. 320)

A estratégia de investigação para analisar perfis tem sido a de usar uma


abordagem mais fracionada (por exemplo, olhar para as relações entre os
tipos de criminosos conhecidos e as suas cenas de crime). O grande
problema é que o conjunto de instrumentos adequados é relativamente
pequeno e, provavelmente, não é muito expressiva da população de tais
ofensores (HOMANT & KENNEDY, 1998, p 321).

Poucos são os estudos que têm explorado a exatidão dos perfis de forma
empírica. Estes estudos indicam que as pessoas parecem diferir na sua
capacidade de descrever com exatidão o perpetrador de um crime quando o
investigador tem a informação em sua posse (KOCSIS & HAYES, 2004, p.
820).

Apesar da aparente falta de evidência empírica para sustentar a sua validade,


é importante explicar o crescimento dos perfis. Há, possivelmente, três
grandes fatores que geralmente têm contribuído para esta situação:
a. O primeiro fator diz respeito à ficção em torno da técnica (Harris, 1999,
citado por Kocsis, 2006, p. 460). Essas representações são raramente
precisas e muitas vezes apresentam uma expectativa favorável para a técnica,
embora fantasiosa.

b. O segundo fator é que, diferentemente da maioria das outras técnicas


psicológicas, os perfis têm sido desenvolvidos e utilizados por agentes da
polícia.

De fato, dada a posição comum do perfil como um instrumento de


investigação (Vorpagel, 1982, citado por Kocsis, 2006, p. 470) e não como
uma forma regular de provas legais, por si só, a técnica muitas vezes escapa
ao tipo de controle judicial de outras formas de Medicina Legal e as provas
são frequentemente submetidas como parte do processo de justiça criminal
(ORMEROD, 1999, citado por KOCSIS, 2006, p. 471).

c. O terceiro fator diz respeito a uma razão circunstancial e um tanto circular


que é o fato de que, por vezes, os Profissionais são obrigados a fornecer
alguma argumentação para as suas práticas (KOCSIS, 2006, p. 471).

Segundo Kocsis (2003, p. 140), os Profissionais empregam abordagens


muito diversas (que vão, por exemplo, desde uma dependência de ideias ao
uso de comportamento das tipologias) e provenientes de diferentes países,
tais como o Reino Unido, os Estados Unidos e a Austrália. Além disso,
determinados perfis não têm qualquer direito de execução (Kocsis, 2004, p.
670), criando motivos para questionar em que medida os resultados são
generalizados para a maioria dos profissionais (pelo menos na América do
Norte) que têm experiência da aplicação da lei (BENNEL, JONES, TAYLOR,
& SNOOK, 2006, p. 350).

O trabalho de Kocsis (1997, 2003; 2006) constitui a melhor tentativa de


testar empiricamente a validade dos Perfis Criminais.

Conclusões destes estudos tendem a apoiar a validade da técnica,


mostrando, por exemplo, que produz previsões de perfis mais precisas (por
exemplo, os atributos não físicos do ofensor, os dados da cena do crime e do
comportamento delinquente antes, durante e após o crime) de um ofensor
desconhecido, em comparação com outros grupos (por exemplo, os
detetives, estudantes universitários e médiuns). Entretanto, poucos estudos
têm examinado os pressupostos subjacentes à técnica de Perfis Criminais.
(BEAUREGARD, LUSSIER & PROULX, 2007, p. 90)

CONCLUSÃO
O estudo acerca de mentes criminosas, no que se refere a transtornos
comportamentais e demais anomalias psíquicas, encontra sérias barreiras na
tentativa se der positivado e encarado de modo técnico e preciso, haja vista a
dificuldade de identificar o sujeito delinquente em meio aos grupos sociais
em que se encontra inserido, devido à carência de características
perceptíveis pelos demais integrantes e assim elaborar um perfil criminoso
de identificação simplificada.

Neste sentido, a partir do estudo da personalidade criminosa propriamente


dita, verifica-se que em caso de o delinquente possuir patologia biológica
criminosa esta pode ser agravada por fatores sociais que eventualmente
podem ocorrer na vida deste, fazendo assim com que ele desenvolva sua
personalidade delitiva, tornando-se um criminoso constante e reincidente,
como no caso do psicopata.

As atrocidades cometidas por mentes criminosas tornam-se cada vez mais,


bem articuladas e de difícil solução por parte dos órgãos competentes, os
quais muitas vezes se veem desmuniciados, em relação a equipamentos,
contingentes humanos que integram as equipes especializadas e ainda, o
principal, técnicas de inteligência que facilitam a localização e caracterização
de mentes criminosas em meio à sociedade brasileira, para posterior
aplicação da respectiva lei penal.

A questão levantada por profissionais responsáveis pela solução de casos


perversos reside na dificuldade de encontrar o indivíduo possuidor de uma
mente de tamanha truculência, haja vista este não ser detentor de
características físicas que possibilitem sua localização com maior precisão e
facilidade.

Neste sentido, objetivando-se auxiliar na fase investigativa surge a figura do


perfil criminal, sendo ele resultado da organização sistematizada de
características pessoais e comportamentais, bem como demais elementos
existentes no caderno inquisitivo, resultando assim, na reunião de
predisposições que possam facilitar a identificação do sujeito portador deste
transtorno comportamental.

A elaboração de perfis criminosos é um processo lógico e racional, baseado


em estudos psicológicos e sociológicos. Utilizam-se métodos baseados em
ciência forense e consistem na análise científica acurada das provas para a
interpretação dos fatos que envolvem o caso.

A técnica dos Perfis Criminais apresenta atualmente um crescente interesse


na comunidade científica, haja vista sua possibilidade real de auxílio e
simplificação do processo investigativo, que por inúmeras vezes resta-se
frustrado, pela impossibilidade de identificação do sujeito criminoso;
situação agravada pela alta capacidade de manipular, esquivar e utilizar-se
de situações e pessoas a seu favor, características do portador do transtorno
comportamental antissocial, objeto de estudo do presente trabalho
científico.

Este impacto promoveu o desenvolvimento de trabalhos que transformaram


uma abordagem de natureza empírica e pouco sistematizada em uma técnica
de Psicologia Forense associada às necessidades da investigação criminal e
de outros contextos profissionais que lidam com o contexto da criminalidade
complexa.

Assim, um trabalho que começou por ser um apoio da Psicologia Clínica e da


Psiquiatria à Polícia de Investigação Criminal, nas situações em que os
crimes eram pouco usuais e não apresentavam motivação aparente, evoluiu
para uma abordagem sistematizada, com o objetivo de ajudar a Polícia de
Investigação Criminal na análise de cenas de crimes violentos ou em série,
no sentido de promover indicadores que permitam a identificação de
características que melhor definem o ofensor associado a um contexto
criminal.

Neste sentido, o estudo dos perfis criminais diante de sua progressiva


evolução apresenta possibilidades de identificação de características
comportamentais que possibilitam a identificação deste sujeito em meio ao
contexto social em que encontra inserido, sendo que estas devem ser
sistematicamente interpretadas e aplicadas aos demais elementos coligidos
ao caderno inquisitivo objetivando-se um maior sucesso quando à utilização
desta técnica e satisfação do caso em análise.

Sabe-se que há muito ainda que se evoluir quando se trata desta técnica,
outrossim é inegável que seus avanços despertam a cada dia interesse dos
profissionais relacionados a este área, haja vista a complexidade que
encontram quanto a necessidade de dar à sociedade respostas acerca dos
crimes praticados por mentes cruéis e ardilosas, que buscam se passar por
vítimas sociais.

O estudo dos portadores de transtorno comportamental antissocial está em


evolução, porém esta realidade se deu diante da crescente ocorrência de
casos em que o psicopata era o autor do delito e ao final das investigações
simplesmente declarado inimputável e neste sentido, impossibilitado de
sofrer sanção penal plausível, decorrido certo lapso temporal este mesmo
indivíduo, outrora considerado “vítima”, voltava a atacar, assumindo seu
status inicial de predador social.

Neste sentido, faz-se mister a evolução contínua de métodos de investigação,


por mais diversos que sejam, desde que lhe conferidos validade, no sentido
de possibilitar a identificação destes psicopatas e assim, a revisão da lei
penal no sentido de proteger a sociedade e tentar inibir estes indivíduos em
suas práticas criminosas que atentam ao bem de maior valor, protegido pelo
ordenamento jurídico pátrio, a vida.

Muitas foram as vítimas que tiveram seus casos arquivados por falta de
provas, indícios de autoria e materialidade; os operadores do direito não
podem se manter inertes a esta realidade, e o modo mais eficiente a alterar
este cenários é o estudo científico que posteriormente será validado e poderá
assim, conferir auxílio ímpar para que seja a dignidade da pessoa humana
devidamente resguardada.

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