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RESUMO
Este artigo pretende fazer um levantamento teórico sobre a temática, a partir da abordagem
multidisciplinar que envolve os conceitos da criminologia, da psicologia e da sociologia, com
o objetivo de discutir os elementos de um saber sobre o crime, buscando identificá-los nas
práticas de seletividade penal das instituições de atendimentos de jovens e adultos que
cometeram práticas delituosas na região do Vale do Itajaí/SC.
PALAVRAS – CHAVE: adaptação/exclusão social; crime; delinqüência.
1 Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Licenciatura em
História pela Pontifícia Universidade Católica – PUC/RS; Mestre em Ciências Sociais - Organizações
e Sociedade, pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/RS; Especialista em História do Rio Grande
do Sul, pela Faculdade Portoalegrense-FAPA. Professor titular de Sociologia nos cursos de
Administração e Direito, Sociologia das Organizações no curso de Ciências Contábeis, Teoria
Política nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda, Fundamentos Sociológicos e
Fundamentos Históricos do Esporte no curso de Educação Física, no IBES SOCIESC - Instituto
Blumenauense de Ensino Superior e como professor substituto as disciplinas de Antropologia e
Sociologia Rural, no curso de Medicina Veterinária, Sociologia no curso de Medicina e Odontologia,
Sociologia das Religiões no curso de Ciências da Religião, Sociologia Jurídica e Ciência Política, no
curso de Direito, Desafios Sociais Contemporâneos no curso de Bacharel em Ciências da
Computação e Antropologia no curso de Design, na FURB - Fundação Universidade Regional de
Blumenau, em Santa Catarina.
INTRODUÇÃO
informais que a sociedade usa para lidar com a infração (penalística); e a natureza e
distúrbios com sintomas inequívocos. Estes são uma minoria, ainda que se incluam
excluídos, no mundo associativo ou no universo das ações coletivas, assim como das
tal, a elucidação de suas origens requer que lancemos mão de teorias e concepções
bioantropológicos possuem sua relevância, mas não esgotam o debate sobre ele. A
contribuições para uma investigação mais completa sobre o fenômeno criminal. Este,
estudo deve ser vista, na ciência, não apenas como um obstáculo, mas antes de tudo
ocultas.
DISPOSIÇÃO PSÍQUICA
A Criminologia é, via de regra, vista como uma ciência voltada para uma
investigação empírica acerca dos fatores básicos da criminalidade. Desse modo, seu
poderíamos dizer, haveria duas partes da ciência da Criminologia: uma parte teórica
ambiente são filtradas pela vida psíquica do indivíduo. Assim, o crime consumar-se-
humanos e a cultura criada pelo homem. Mas é na família de origem que se forma a
ambiente:
3 ALBERGARIA, Jason. Criminologia teórica e prática. Rio de Janeiro: AIDE, 1988. p. 112-113.
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aprendizagem profissional e a indisciplina ou deserção no serviço militar são comuns
oposição à cultura dominante, nem sempre hegemônica, mas uma cultura que surge
opostos a ela.
certo estigma social. O sujeito que ganha status numa subcultura perde-o, na razão
Pode-se perceber esses aspectos, a partir dos dados empíricos sobre os atos de
adolescentes em atendimento são 94, dos quais, a maioria é do sexo masculino (90
infração: o furto (39 casos); o roubo (18 casos); o tráfico de entorpecentes (18 casos);
agressões e brigas (11 casos) e porte e uso de drogas (10 casos), em alguns casos o
adolescentes infratores, na maioria dos casos (15) a renda per capita é de até ½ do
salário mínimo, e a situação familiar revela que a maioria (17) dos lares é constituida
corrida pelos bens escassos, desvantagem esta sobretudo pelo teor da socialização,
uma vez que é no processo de socialização que se distingue uma classe social da
outra. Neste contexto, os oriundos das camadas excluídas estão fadados ao fracasso,
que por sua vez, provoca um forte sentimento de frustação e humilhação, angústia e
culpa. Uma possível saída é repudiar o jogo e sair dele, criando um novo jogo com
do maior número de criminosos. Uma analogia sugerida afirmava que o meio social é
elemento que tem importância no dia em que encontrar o caldo que irá fermentar. A
criminologia. Segundo esses críticos, a gênese do crime não pode ser atribuída
pode adotar a teoria absoluta do meio, e nem a teoria absoluta da disposição. Alguns
afirmam que não se pode falar em causa exógena ou em causa endógena do crime.
mesógenos:
entrevistados), como aspectos influenciadores de suas ações. São citados ainda pelos
(destino, falta de caráter), ou nas palavras de uma apenada: “Um ato desesperado
pelos filhos”.
de que a ação criminosa é determinada pelo contexto social, definindo uma espécie
governamentais.
seria uma expressão dos mesmos processos biológicos que determinam a forma do
corpo. A teoria de Cesare Lombroso destaca-se como uma das principais teorias
menciona a tatuagem, com suas formas obscenas difundidas por todo o corpo, e a
física, ao mesmo tempo em que nos lembra os hábitos análogos dos selvagens.
traço mais saliente de seu caráter; insensibilidade de tal ordem que os priva até
facilidade com que vêem ou provocam a morte dos outros. Tais atos chegam a
especialmente a vaidade do delito. Além disso são atraídos pelas bebidas alcoólicas,
pelo jogo e pela luxúria, que substitui o amor e extingue-se bem rápido:
Sem dúvida, os delinqüentes não ignoram o que é justiça, mas não a sentem:
deformam a moral e a religião ao sabor de suas paixões. Daí decorre a
freqüência das reincidências, que para certos delitos, em particular para a
rebelião (100%), o roubo (70 a 72%, as agressões e ferimentos (57 a 60%), a
bigamia (50%) e o incêndio (40%), tornam-se mais a regra do que a exceção; e
se colocamos esses delitos em relação aos crimes mais freqüentes cometidos
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na juventude, roubo, estupro, vadiagem, agressões e ferimentos, homicídios,
incêndios, vemos que constituem o contingente especial dos delinqüentes
natos. Efetivamente só podemos assim qualificá-los do ponto de vista
jurídico quando constatada a reincidência, direta ou indireta, pouco
importa.6
exatidão, em muitos casos, no louco moral. Tais fatos explicam porque é tão difícil
humanidade. Ele afirma que é muito pequena a diferença, às vezes nula, entre o
delinqüente, o homem do povo sem educação e o selvagem. Por isso, não ficaremos
6 LOMBROSO, Cesare. O homem criminoso. Trad. Maria Carlota Carvalho Gomes. Rio de Janeiro:
Rio-Sociedade Cultural, 1983. p. 491-492.
7 Idem.
verdadeira predileção pelo criminoso, fazer dele uma espécie de herói, acabando por
render-lhe, depois da morte, honras divinas. Os prisioneiros das galés não nos
Observem que nossos filhos, antes que os eduquemos, ignoram, não fazem
distinção alguma entre o vício e a virtude: eles roubam, batem, mentem, sem
a menor apreensão. Depois disso, como ficar surpresos quando tantas
crianças, abandonadas ou órfãs, dedicam-se ao mal, demonstrando uma
precocidade assustadora no delito? Compreendemos finalmente que o traço
de caráter mais odioso do culpado e do louco moral, a maldade sem causa,
pode ser considerada continuação da idade infantil, um estado de “infância
prolongada”: e que a loucura moral, como a delinqüência, podem se
manisfestar apenas em decorrência de uma má educação, que em lugar de
frear, facilita tendências congênitas.8
do tipo físico dos criminosos, que aparecem na obra L’Uomo Delinquente. Na qual,
que o levaram a concluir que o crime era biologicamente determinado. Uma dessas
os animais inferiores”.9
certo número de delitos. Em suma, o delito, tanto pela estatística como pelo exame
uma triste variante. Eis que os atos instintivamente cruéis dos animais não parecem
perdera”.
três fases: a fase das primeiras relações da criança com seus pais; a fase de formação
infância), anal (2º e 3º ano), fálica (3º e 5º ano), para terminar no período de latência,
e repressão. Até os 4 anos, os sentimentos que ligam a criança à mãe podem provocar
do menor.
formação do indivíduo.
psíquico da criança, uma vez que a familia é, por exelência, o local de troca
da criança consiste de reação do id. A criança aprende que certos objetos causam
formam o ego.
identificação da criança com os pais, educadores e outros que ela tomou como
...o ser humano entra no mundo como criminoso. Durante os primeiros anos
de vida a sua criminalidade estaria no mais alto grau. A adaptação social
começaria depois de vencido o complexo de Édipo. O futuro criminoso não
consegue levar adiante a adaptação social. A criminalidade não é um defeito
congênito, mas um defeito de educação. A delinqüência seria expressão
substituta de experiências de uma personalidade reprimida.11
chamada tipologia de Jenkis, por exemplo, procura explicar, à luz da psicanálise, três
reação se define como neurose. O tipo II, com fraco superego, “agressivo não-
O tipo III tem o superego normal para os membros de seu grupo, mas
group (a gangue); mas é inadequado esse envoltório a respeito de todo out group,
dando livre expressão às pulsões primitivas. Segundo alguns autores, este estudo
constitui uma das tentativas mais notáveis para convalidar uma teoria da deviance
essencialmente freudiana.
agressão. Tais teorias partem de Freud e foram elaboradas por outros. Segundo essa
tendência atingir o seu fim. O organismo vivo, quando frustado, tende a reagir
controle pode evitar que a agressividade se dirija para o exterior, conduzindo-a para
Muitas foram as teorias sociológicas que procuraram lançar novas luzes sobre
valores das zonas de taxa elevada de delinqüência e das zonas de taxa de fraca são
culturais delinqüentes e não delinqüentes, pelos quais estes desejos são satisfeitos. O
A teoria do conflito cultural, por sua vez; distingue dois tipos de conflito como
conflito cultural é estudado pelo psicólogo como conflito mental (conflito interno). O
incorporadas na personalidade.
A teoria da anomia tem sua origem nos trabalhos de Durkheim, que tentou
surge como resultado da estrutura das classes sociais. A conduta desses grupos seria
bando é uma conseqüência natural para os jovens da classe baixa, que se reúnem por
oposição aos valores da classe média, oposição que se caracteriza por sua
malignidade em face a tudo que for virtuoso, hedonismo que busca satisfações
marco da obra “Vigiar e Punir”, pois este conceito permanece circunscrito ao espaço
sobre o direito à vida, que se exerce sobre uma população. Fazer viver ou deixar
morrer é uma inversão do antigo poder de fazer morrer ou deixar viver, um poder
que investe na vida, em cujo exercício verifica-se tanto uma sujeição dos corpos
tecnologia de poder que não é somente disciplinar, uma tecnologia de poder que se
13 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 28. ed.
Petrópolis: Vozes, 2004.
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neo-darwinista, um racismo biológico. Há um retorno do biológico ao social e a
a junção entre racismo e crime, entre biopolítica e saber sobre o crime. Ou seja, existe
uma contrução de uma exclusão social a partir da discriminação, seja ela econômica,
outro indivíduo ou grupo social, seja pertencente a uma classe ou categoria social, a
sempre conflitos e lutas pelo poder, uma contenda sobre qual o grupo deterá o uso e
que procura descrever e explicar as causas do crime. Fomos levados por este trabalho
concluir afirmando que, a despeito dos múltiplos fatores que podem explicar a
Pois, o que verificamos, nos casos até agora estudados, é que: os indivíduos
controle social, com a repressão, por outro lado, percebemos que existe uma crise da
dominação do Estado, que não cumprindo com o seu papel, deixa emergir, ou
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. José de Faria Costa. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1988.
SANTOS, José Vicente Tavares dos (org.). Violências no tempo da Globalização. São
Paulo: Hucitec, 1999.
TAYLOR, I.; WALLON, P.; YOUNG, J. Criminologia Crítica. México: Siglo XXI,
1977.
Enviado: 26/08/08
Aceito: 28/08/08
Publicado: 31/12/08