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POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SÃO PAULO

Investigador (a)
Concurso Público 2023

3 - Noções de Criminologia
Conteúdo
3.1 Conceito, método, objeto e finalidade da Criminologia.
3.2 Criminologia do Consenso e do Conflito.
3.3 Vitimologia, Vitimização e Vitimodogmática.
3.4 Criminalidade de Massa, Moderna e Organizada.
3.5 Nova Criminologia.
3.5.1 Criminologia Feminista.
3.5.2 Criminologia Cultural.
3.5.3 Criminologia Queer.
3.5.4 Criminologia Ambiental.
3.5.5 Criminologia Racial.
3.5.6 Criminologia Clínica.
3.6 Modelos de Prevenção e Reação ao Fenômeno Criminal.

Coletânea de Exercícios para Fixação

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Conceito, métodos, objetos e finalidade da Criminologia
A origem da palavra Criminologia, hibridismo greco- conceitos fundamentais relações de produção e as
latino, tem a sua criação atribuída a Raffaele Garofalo questões de poder econômico e político. Já a
(Itália, 1851-1934), que com ela intitulou sua principal criminologia da reação social é definida como uma
obra. Consta, porém, que tal vocábulo já tinha sido atividade intelectual que estuda os processos de
empregado anteriormente na França, por Topinard criação das normas penais e das normas sociais que
(1830-1911). estão relacionados com o comportamento desviante.

Este vocábulo, a princípio reservado ao estudo do O campo de interesse da criminologia organizacional


crime, ascendeu à ciência geral da criminalidade, antes compreende os fenômenos de formação de leis, o da
denominada Sociologia Criminal ou Antropologia Cri- infração às mesmas e os da reação às violações das
minal. leis. A criminologia clínica destina-se ao estudo dos
casos particulares com o fim de estabelecer
A criminologia é uma ciência social, filiada à Sociologia, diagnósticos e prognósticos de tratamento, numa
e não uma ciência social independente, desorientada. identificação entre a delinquência e a doença. Aliás, a
Em relação ao seu objeto – a criminalidade – a própria denominação já nos dá ideia de relação médico-
criminologia é ciência geral porque cuida dela de um paciente.
modo geral. Em relação a sua posição, a Criminologia
é uma ciência particular, porque, no seio da Sociologia O objeto da moderna criminologia é o crime, suas
e sob sua égide, trata, particularmente, da circunstâncias, seu autor, sua vítima e o controle social.
criminalidade. Deverá ela orientar a política criminal na prevenção
especial e direta dos crimes socialmente relevantes, na
A criminologia é a ciência que estuda: intervenção relativa às suas manifestações e aos seus
1- As causas e as concausas da criminalidade e da efeitos graves para determinados indivíduos e famílias.
periculosidade preparatória da criminalidade; Deverá orientar também a Política social na prevenção
2- As manifestações e os efeitos da criminalidade e da geral e indireta das ações e omissões que, embora não
periculosidade preparatória da criminalidade e, previstas como crimes, merecem a reprovação
3- A política a opor, assistencialmente, à etiologia da máxima.
criminalidade e da periculosidade preparatória da
criminalidade, suas manifestações e seus efeitos. Quando nasceu, a criminologia tratava de explicar a
origem da delinquência utilizando o método das
Conceito de Criminologia: A Criminologia é um ciências, o esquema causal e explicativo, ou seja,
conjunto de conhecimentos que estudam o fenômeno e buscava a causa do efeito produzido.
as causas da criminalidade, a personalidade do delin-
quente e sua conduta delituosa e a maneira de Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o
ressocializá-lo. É a definição de Sutherland. Ciência efeito, como se fosse suficiente fechar as maternidades
que como todas as que abordam algum aspecto da para o controle da natalidade.
criminalidade deve tratar do delito, do delinquente e da
pena. Segundo a Unesco, a criminologia se divide em Academicamente a criminologia começa com a
geral (sociológica) e clínica. publicação da obra de Cesare Lombroso chamada de
L´Uomo Delinquente, em 1876. Sua tese principal era a
Na concepção de Newton Fernandes e Valter do delinquente nato.
Fernandes, criminologia é o “tratado do Crime”.
Já existiram várias tendências causais na criminologia.
A interdisciplinaridade da criminologia é histórica, Baseado em Rousseau, a criminologia deveria procurar
bastando, para demonstrar isso, dizer que seus a causa do delito na sociedade, baseado em Lombroso,
fundadores foram um médico (Cesare Lombroso), um para erradicar o delito deveríamos encontrar a eventual
jurista sociólogo (Enrico Ferri) e um magistrado causa no próprio delinquente e não no meio. Um
(Raffaele Garofalo). extremo que procura as causas de toda a criminalidade
na sociedade e o outro, organicista, investiga o
Assim, além de outras, sempre continuam existindo as arquétipo do criminoso nato (um delinquente com
três correntes: a clínica, a sociológica e a jurídica, determinados traços morfológicos). Isoladamente,
que, ao nosso ver, antes de buscarem soluções tanto as tendências sociológicas quanto às orgânicas
isoladas, devem caminhar unidas e Inter-relacionadas. fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-
A criminologia radical busca esclarecer a relação psico-social. Volta a tomar força os estudos de
crime/formação econômico-social, tendo como endocrinologia que associam a agressividade do
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delinquente à testosterona (hormônio masculino), os crises de excitação psicomotora e estado depressivo. A
estudos de genética ao tentar identificar no genoma fase maníaca é caracterizada por hiperatividade motora
humano um possível “gene da criminalidade”, e psíquica, com agitação e exaltação da afetividade e
juntamente com os transtornos da violência urbana, de do humor. O maníaco não permanece quieto, é
guerra, da forme, etc. eufórico. A melancólica ou depressiva caracteriza-se
pela inibição ou diminuição das funções psíquicas e
De qualquer forma, a criminologia transita pelas teorias motoras. O indivíduo apresenta um quadro marcado
que buscam analisar o crime, a criminalidade, o pela tristeza, pessimismo, sentimento de culpa. As
criminoso e a vítima. Passa pela sociologia, pela tentativas de suicídio são frequentes nesta fase
psicopatologia, psicologia, religião, antropologia, melancólica (GENIVAL, 1998, p. 356).
política, enfim, a criminologia habita o universo da
ação humana. A psicose carcerária é decorrente da privação da
liberdade do indivíduo submetido a estabelecimentos
A Criminologia e o Comportamento carcerários que não dispõem, em sua grande maioria,
Humano de condições adequadas de espaço, iluminação e
alimentação. A pessoa acometida deste mal manifesta
Um dos aspectos da Criminologia são os distúrbios da a “síndrome crepuscular de Ganser”, apresentando
personalidade. Dentre os mais frequentes desses sintomas com as seguintes características: estranhas
distúrbios, podemos citar as neuroses, as psicoses, as alterações da conduta motora e verbal do indivíduo
personalidades psicopáticas e os transtornos da que, quando interrogado, encerra-se em impenetrável
sexualidade ou parafilias. Neuroses são estados mutismo ou passa a exibir para respostas, como se
mentais da pessoa humana, que a conduzem à estivera acometido de um estado deficitário orgânico,
ansiedade, a distúrbios emocionais como: medo, raiva, não raro acompanhado de sintomas depressivos ou
rancor, sentimento de culpa. Pode-se afirmar que as catatônicos (FERNANDES, 2002, p. 225).
neuroses são afecções muito difundidas, sem base
anatômica conhecida e que, apesar de intimamente A personalidade psicopática é caracterizada por uma
ligadas à vida psíquica do paciente, não lhe alteram a distorção do caráter do indivíduo. Os indivíduos
personalidade como as psicoses, e consequentemente acometidos por tal personalidade geralmente
se acompanham de consciência penosa e apresentam o seguinte quadro característico: são
frequentemente excessiva do estado mórbido inteligentes, amorais, inconstantes, insinceros; faltam-
(MARANHÃO, 2004, p. 356). Nessa perspectiva, de acordo
lhes vergonha e remorso; são egocêntricos, inclinados
com Newton e Valter Fernandes (2002, p. 213), podemos à condutas mórbidas. Citamos como tipos, dentre
citar as neuroses obsessivas, caracterizadas pela outros: os explosivos ou epileptoides, os perversos ou
constante de obsessões, fobias e tiques obsessivos, amorais, os fanáticos e os mitomaníacos.
cujas formas de projeção alinham-se à cleptomania, à
piromania, ao impulso ao suicídio e ao homicídio. Os explosivos ou epileptoides são indivíduos que
manifestam em seu comportamento a habitualidade de
O termo psicose surgiu para enfatizar as afecções um estado colérico, raivoso, agressivo, tanto
mentais mais graves. As psicoses são conjuntos de verbalmente como fisicamente.
doenças caracterizadas por distúrbios emocionais do
indivíduo e sua relação com a realidade social, com o Os perversos ou amorais são maldosos, cruéis,
convívio em sociedade. Citamos, dentre outras, a destrutivos. Tais características revelam-se
paranoica, a maníaco-depressiva e a carcerária. precocemente em crianças, nas tendências à preguiça,
inércia, indocilidade, impulsividade, indiferença,
Segundo Genival França (1998, p. 357), “as psicoses propensos à criminalidade infanto-juvenil. Na fase
paranoicas são transtornos mentais marcados por adulta, o indivíduo possui grau elevado de inteligência,
concepções delirantes permitindo manifestações de podendo ser observadas mentiras, calúnias, delações,
autofilia e egocentrismo, conservando-se claros furtos, roubos. Encontram-se no rol dos amorais os
pensamentos, vontades e ações”. Os paranoicos incendiários, os vândalos, os “vampiros” e os
fantasiam, e nos seus delírios relacionam o seu bem- envenenadores (FERNANDES, 2002, p. 209).
estar ou a dor com as pessoas que lhes rodeiam,
atribuindo a estas a causa de seu estado. Temos por Os fanáticos tendem a um ânimo constante de
exemplo, a paranoia do ciúme, a de perseguição, a euforismo, extrema exaltação daquilo que desejam.
erótica. Seriam paranoicos os assassinos de Abraham Lutam por seus ideais de forma impulsiva, sem limites,
Lincon, Gandhi, John Lennon e o que atentou contra a sem controle. São capazes de praticar qualquer ato
vida do Papa João Paulo II (FERNANDES, 2002, p. 221). delinquente na busca incessante por seus objetivos.

A psicose maníaco-depressiva, hoje estudada como Os mitomaníacos, por sua vez, são acometidos de um
transtorno bipolar do comportamento, é marcada por desequilíbrio da inteligência no tocante à realidade. São
propensos à mentira, à simulação, à fantasia.
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Conseguem distorcer, de forma quase convincente, a a que chama rei, vendendo suas colheitas tão caro
realidade dos fatos, podendo chegar a extremos de quanto puder, reunindo-se com outros em certos dias
delírios e devaneios. do ano para entoar preces numa língua
incompreensível. Um rei sempre encara toda a espécie
O estudo da sexualidade anômala ou transtornos da humana como seres feitos para obedecer-lhe e aos
sexualidade interessa à medicina legal, são distúrbios seus semelhantes (VOLTAIRE, 1978, p. 61).
caracterizados por degeneração psíquica ou por fatores
orgânicos glandulares. Citamos como exemplo o
sadismo, o masoquismo, a pedofilia, o vampirismo e a
necrofilia. O sadismo, também chamado algolagnia História natural do delito
ativa, é transtorno sexual em que o indivíduo inflige
sofrimentos físicos à parceira para obter o prazer O delito se define por ele mesmo, sempre a partir de
sexual. O termo tem origem no nome do Marquês de uma teoria, e a melhor teoria é aquela que se aproxima
Sade (1740), que acometido do mal, o relatou em seus da realidade histórico-social do objeto questionado.
romances Justina e Julieta. O marquês sentia prazer Teoria e prática se implicam de uma tal forma no campo
em cortar as carnes de suas parceiras e em tratar as jurídico-penal que até não mais se concebe a menor
chagas das prostitutas (GOMES, 2004, p. 471). tentativa de enfoque parcelado, à guisa de análise. É o
todo que carece de ser analisado, para que não se
Já o masoquismo é algolagnia passiva, isto é, o perca de vista aquele momento crítico de
indivíduo só consegue sentir prazer sexual ao sofrer, ao intercomunicação recíproca de fatores e elementos, em
ser humilhado. Jean Jacques Rousseau, filósofo perpétua dinamicidade unitária e autotransformadora.
francês que viveu nos idos anos de 1712 a 1778, Os fatos sociais com sua enorme carga valorativa,
bastante conhecido por sua obra Do Contrato Social participam do delito como o sol participa do movimento
(onde trabalha a formação e desenvolvimento da dos planetas. A propósito, elimine-se o sol da vida dos
sociedade civil e do próprio Estado), em um de seus planetas e se verá que não serão apenas estes que
livros publicados após sua morte, Confissões, revela sentirão os efeitos do repentino cataclisma
ser acometido deste transtorno da sexualidade: gravitacional das esferas celestes inseridas na Via
“Ajoelhar- se aos pés de uma amante imperiosa, Láctea.
obedecer às suas ordens, pedir perdão de faltas que
cometera eram para mim gozos divinos “(GOMES, 2004, p. O delito não existe sem o fato social que lhe regula
471).
ciberneticamente o rumo a ser alcançado, por via de
alterações de sentido geradoras de novas formas e
A pedofilia é parafilia caracterizada pela atração por
matizes. Deve ser definido por seu conteúdo, nos
parceiros sexuais crianças ou adolescentes. O
limites de sua própria efemeridade factual e
vampirismo é a aberração venérea na qual a
contraditória, ao invés de ser aprisionado pelo método
gratificação é alcançada com o degenerado sugando
esquizofrênico de certas filosofias ontológicas ou
obsessivamente o sangue de seu parceiro sexual
(CROCE; CROCE JÚNIOR, 2004, p. 681).
essencialistas.

A necrofilia, por sua vez, trata-se de transtorno O delito e suas circunstâncias, historicamente
caracterizado por prática de relações sexuais com condicionadas, não se amoldam a figurinos estanques
cadáver. “Alguns necrófilos chegam a violar covas, desenhados por uma natureza intrínseca, como se
retirar corpos em decomposição para satisfazerem seu nascessem de um mesmo e único ovo, idêntico a si
instinto” (GOMES, 2004, p. 474). próprio. Os milhões de anos de vida sobre a terra
atestam exatamente o contrário. Não se há de construir
Conclusões o presente com dispensa dos materiais que lhe servem
de sustentáculo.
Muitos outros são os distúrbios e doenças mentais que
Sem a empiricidade dos fatos, potenciais ou
acometem a pessoa humana e a levam à prática de
consumados, não vale nenhuma teoria, se procura uma
atos ilícitos contra seu semelhante, ademais, como
verdade ontológica. Fora dos fatos qualquer teoria tem
Voltaire nos lembra em seu Tratado de Metafísica,
valor, pois se alimenta de si mesma, de seu próprio
muito pouco sabemos sobre o ser humano e sua mente,
enunciado unilateral. É dolo o que for como tal
objetos constantes do conhecimento filosófico, jurídico
predeterminado. É culpa o que se encaixa no conceito
e científico. Muitos mistérios ainda a desvendar. Como
inventado de culpa.
dizia Voltaire, poucas pessoas se preocupam em ter
uma noção do que seja o homem. A única ideia que os
Qualquer estudo sobre delitos ou transgressões sociais
camponeses de uma parte da Europa têm da nossa
não pode prescindir do homem. Por sua natureza, o
espécie é a de um animal de dois pés, de pele trigueira,
delito induz a uma regulação da coletividade, e, por
articulando algumas palavras, cultivando a terra,
conseguinte, é uma ação, um fenômeno social. Se o
pagando, sem saber por que, tributos a um outro animal
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delito faz parte da natureza social do homem, então tipicidade, nem a injuricidade, nem a culpabilidade. O
podemos aceitar o que disse Mariano Funes em crime já existia, na face da terra, antes que essas
"Actualidad de la Venganza" (Buenos Aires, 1943:41): expressões fossem inventadas. Povos cultos e
"(...). El delito es un fenómeno de normalidad social, em civilizados, mesmo nos dias de hoje, conseguem
cuanto producto de la humana convivencia; y de fabricar seus delitos sem que seus mais eminentes
anormalidad de la conducta, en cuanto la conducta dogmatas sequer conheçam o significado nuclear
criminal es inferior em su expresión numérica y en su dessas mágicas palavras do moderno direito penal.
frecuencia a los otros actos externos de las conductas Nem mesmo nós, no Brasil, eméritos copistas, nos
normales" últimos decênios, das elucubrações fantasiosas de
divertidos penalistas alemães (com qual deles
O crime, por incrível que pareça, não é estaremos, nos próximos anos?), chegamos a nos
necessariamente nocivo para o sistema social, o que entender no assunto, o que não é de causar espanto.
faz Durkheim apontar a funcionalidade do crime. O As palavras, afinal, significam o que se espera que elas
referido filósofo promoveu a despatologização do crime signifiquem, seja para quem fala, seja para quem
e assinalou o funcionalismo do crime e da pena. (...) escuta.

O crime é indispensável à evolução normal da moral e Ninguém escapa à tentação (para evitar-se o termo
do direito. É fator de saúde pública. É fundamental o incompetência) de acrescentar seu condimento
legado de Durkheim para se entender o crime, o preferido, na retransmissão da receita. Um condimento
criminoso e o castigo nas sociedades contemporâneas. que se pretende coincidente com a norma legislada ou
Sua teoria sistêmica veio contrariar o determinismo com os princípios avançados de justiça e equidade.
positivo lombrosiano dominante à sua época. E,
profetiza: “Não há sociedade sem crime". A premissa do crime é o fato social porque é este que
sintetiza a tipicidade, a antijuridicidade e a
Delito é a representação dos conflitos sociais mais culpabilidade, sem que a recíproca se mostre
agudos, por agredir sentimentos como a moral e ética verdadeira. É o fato social que controla e catalisa a
social. punibilidade, marca registrada do crime ou delito. Fato
social, ou seja: atitude, comportamento ou realidade
Nada é bom indefinidamente e sem medida. Para a intrinsecamente cativos ou persuasivos na vida de
própria evolução da autoridade é imprescindível que relação dos indivíduos.
não seja excessiva, seja, portanto, contestada. Muitas
vezes, com efeito, o crime não é senão uma Como fenômeno jurídico (ou antijurídico, pouco
antecipação da moral por vir um encaminhamento ao importa), depende o crime, para subsistir, da
direito que será". resistência que lhe opõe a ordem social estabelecida.
Matar índios é crime entre os índios, mormente se
Se o delito, as transgressões e os crimes são pertencem à mesma tribo.
fenômenos sociais, então são históricos. Portanto,
obedecem as estruturas dialéticas da sociedade em Matar índios é serviço à comunidade no período de
que eles se dão. Pode-se argumentar que alguns implantação e expansão de colônias europeias no Novo
crimes não são históricos, como o assassinato e o Mundo. Haveria sequestro, entre nós, na confinação
roubo; ocorrem em todas as sociedades, forçada de dissidente político em hospital psiquiátrico?
independentes do sistema sócio-produtivo. Mesmo
assim, nem todos os assassinatos e roubos são Verdades tão banais se relegam, todavia, a segundo
considerados como transgressões; o colonialismo é um plano nos compêndios de direito penal, ou se reputam
exemplo – hoje atende sob a alcunha de "globalização". reservadas à pesquisa histórico-sociológica. Descobre-
O conceito de crime não é imutável, absoluto, sendo se que ao penalista cabe penetrar na estrutura ou
mesmo relativo e por isso é que tem sido discutido e essência jurídica do crime, auxiliado, ou não, pelo
não inaceitáveis as definições absolutas de crime. legislador.

Sociologicamente, crime é a infração de um costume É assim que figuras como o estado de necessidade,
ou de uma lei, contra a qual reage a sociedade, legítima defesa, exercício de direito e cumprimento do
aplicando uma pena ao infrator" e "antropologicamente, dever ganham ares de autonomia ontológica perante os
crime é qualquer afronta a uma crença dominante fatos do homem, os mesmos fatos que lhes fornecem,
como, por exemplo, crime com o desrespeito ao totem" nada obstante, a mais concreta e tangível juridicidade
ou crença religiosa ou política. ocasional. No arranha-céu dos dogmatas até o vazio
das paredes se transforma em estrutura.
Premissa do Crime E como ele é invisível, resiste com altivez
camaleonesca às mais disparatadas transformações da
Ora, a premissa do crime é o fato social. Não é a sociedade e do indivíduo, desde tempos imemoriais.

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O Direito Penal trabalha com três conceitos de delito: Penal), o jurado quer perscrutar os fatores que levaram
material, formal e analítico. à ocorrência daquele homicídio. O Tribunal do Júri é
pura Criminologia!. Ali estão presentes delito,
O conceito material está vinculado ao ato que possui delinquente, vítima e o controle social.
danosidade social ou que provoque lesão a um bem
jurídico. A Criminologia moderna não mais se assenta no dogma
de que convivemos em uma sociedade consensual.
O conceito formal está ligado ao fato de existir uma lei Pelo contrário, vivemos em uma sociedade conflitiva.
penal que descreva determinado ato como infração Não basta afirmar que crime é o conceito legal. Isso não
criminal explica tudo e não ajuda em quase nada na percepção
da origem do crime. O crime é muito complexo, ele
Já o conceito analítico expõe os elementos estruturais pode ter origens das mais diversas como o excessivo
e aspectos essenciais do conceito de crime. desnível social de uma localidade, defeitos hormonais
no corpo de uma pessoa, problemas de ordem psíquica
Perguntando a um penalista sobre o conceito analítico como traumas, fobias e transtornos de toda ordem
de delito, ele irá responder (pelo menos a grande emocional etc.
maioria) que o crime é um ato típico, ilícito e culpável.
Outros responderão que o crime é um fato típico e A Criminologia moderna busca se antecipar aos fatos
ilícito. E agora, também, retornando ao conceito de que que precedem o conceito jurídico-penal de delito. O
o crime é um fato típico, ilícito, culpável e punível, Direito Penal só age após a execução (ex.: tentativa) ou
haverá respostas apontando esses quatros elementos na consumação do crime. A Criminologia quer mais. Ela
essenciais. quer entender a dinâmica do crime e intervir nesse
processo com o intuito de dissuadir o agente de praticar
Esses conceitos são fundamentais para que a o crime, o que pode ocorrer das mais variadas formas.
hermenêutica possa ser utilizada. Assim, é possível ao Mas para que isso seja feito, a Criminologia teve que
intérprete da norma aplicar a norma abstrata ao caso desenvolver outros conceitos para o delito. Conceitos
concreto com a segurança que tais situações exigem. estes mais próximos e íntimos da realidade que o
fenômeno criminal apresenta.
Na verdade, os conceitos formal e material não
traduzem com precisão que seja crime. Se há uma lei Diversos conceitos foram surgindo no desenvolvimento
penal editada pelo Estado, proibindo determinada da Criminologia. Já foram tratados aqui os três
conduta, e o agente a viola, se ausente qualquer conceitos utilizados pelo Direito Penal, os quais são
cláusula de exclusão da ilicitude ou dirimente da obrigatórios pontos de partida da Criminologia, mas não
culpabilidade, haverá crime. Já o conceito material esgotam o problema.
sobreleva a importância do princípio da intervenção
mínima quando aduz que somente haverá crime Molina (MOLlNA, Gomes, 2002, p. 66) leciona que Garofalo
quando a conduta do agente atenta contra os bens chegou a criar a figura do delito natural, ou seja, para
mais importantes. Contudo, mesmo sendo importante e ele, delito seria: "uma lesão daquela parte do sentido
necessário o bem para a manutenção e subsistência da moral, que consiste nos sentimentos altruístas
sociedade, se não houver uma lei penal protegendo-o, fundamentais (piedade e probidade) segundo o padrão
por mais relevante que seja, não haverá crime se o médio em que se encontram as raças humanas
agente vier a atacá-lo, em face do princípio da superiores, cuja medida é necessária para a adaptação
legalidade. do indivíduo à sociedade", outros autores, no entanto,
realçam a nocividade social da conduta ou a
Mas esses conceitos são rasos. Eles não traduzem a periculosidade do seu autor.
profundidade do fenômeno criminal. Isso fica visível na
diferença que existe na aplicação da lei penal pela A sociologia criminal já utiliza outro parâmetro, bastante
Justiça Criminal togada e pelo Tribunal do Júri. O crime em voga na atualidade: o de conduta desviada ou
é muitas vezes visto de forma distanciada, sem desvio. Esse critério utiliza como paradigma as
emoção, comparando-se com jurisprudências e mais expectativas da sociedade. As condutas desviadas são
jurisprudências; no Tribunal do Júri é tudo insólito, a aquelas que infringem o padrão de comportamento
emoção nos julgamentos está presente, os jurados em esperado pela população num determinado momento.
seu íntimo se colocam no banco dos réus e se É um conceito que não se confunde com o de crime,
perguntam se teriam feito a mesma coisa. Antes de mas que o abrange.
acusação e defesa discursarem sobre legítima defesa
e inexigibilidade de conduta diversa, o jurado já fez, Anthony Giddens ensina que podemos definir o desvio
pelo menos por algumas vezes, a operação mental de como o que não está em conformidade com
ter se colocado no lugar do réu, com as condições determinado conjunto de normas aceitas por um
pessoais do mesmo e na hora dos fatos. Antes da número significativo de pessoas de uma comunidade
descrição abstrata do crime (utilizado pelo Direito ou sociedade. Como já foi enfatizado, nenhuma
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sociedade pode ser dividida de um modo linear entre os ela e da necessária superação dos enfoques
que se desviam das normas e aqueles que estão em individualistas em atenção aos objetivos político--
conformidade com elas. A maior parte das pessoas criminais. O centro de interesse das investigações -
transgride, em certas ocasiões, regras de ainda que não tenha abandonado a pessoa do infrator
comportamento geralmente aceitas. Quase toda a - deslocou-se prioritariamente para a conduta delitiva,
gente, por exemplo, já cometeu em determinada altura para a vítima e para o controle social. Em todo caso, o
atos menores de furto, como levar alguma coisa de uma delinquente é examinado, "em suas interdependências
loja sem pagar ou apropriar-se de pequenos objetos do sociais" como unidade biopsicossocial e não de uma
emprego - como papel de correspondência - e dar-lhes perspectiva biopsicopatológica como sucedera com
uso privado. A dada altura de nossas vidas, podemos tantas obras clássicas orientadas pelo espírito
ter excedido o limite de velocidade, feito chamadas individualista e correcionalista da Criminologia
telefônicas de brincadeira (trote), ou fumado marijuana tradicional.
(maconha).
No entanto, também não há dúvida de que a Psicologia
Desvio e crime não são sinônimos, embora muitas Criminal, com toda sua técnica de investigação, possa
vezes se sobreponham. O âmbito do conceito de desvio contribuir sensivelmente para a Criminologia com seus
é mais vasto do que o conceito de crime, que se refere estudos, individuais ou coletivos, do delinquente.
apenas à conduta inconformista que viola uma lei.
Muitas formas de comportamento desviante não são A Psicologia Criminal destina-se a estudar a
sancionadas pela lei. Sendo assim, os estudos sobre personalidade do criminoso. A personalidade refere-se,
desvio podem examinar fenômenos tão diversos como usualmente, aos processos estáveis e relativamente
os naturalistas (nudistas), a cultura "rave" ou os coesos de comportamento, pensamento, reação e
viajantes "new age". O conceito de desvio pode aplicar- experiência, que são característicos de uma
se tanto ao comportamento do indivíduo, como às determinada pessoa. Por intermédio dessas
atividades dos grupos. características poderemos compreender e até prever
grande parte do comportamento do indivíduo. O estudo
O conceito de desvio tem íntima relação com a política da personalidade das pessoas em conflito com a lei (e
de controle da criminalidade conhecida como tolerância aqui podemos incluir as crianças e adolescentes) pode
zero. O controle da criminalidade naquele modelo contribuir efetivamente para se entender o fenômeno
começa na repressão de condutas desviadas. criminal.

O delinquente Uma das maiores contribuições criminológicas que a


Psicologia pode dar nesse sentido é ajudar na criação
O delito foi o objeto principal de estudo da Escola de programas que auxiliem a redução da reincidência
Clássica criminal. Foi com o surgimento da Escola criminal, campo que ainda não foi explorado totalmente.
Positiva que houve um giro de estudo, abandonando-
se a centralização na figura do crime e passando o As escolas penais
núcleo das pesquisas para a pessoa do delinquente.
Todas as legislações sustentam o poder e autoridade
A Escola Positiva surgiu no contexto de um acelerado do Estado para orientar, controlar e punir os seres
desenvolvimento das ciências sociais (Antropologia, humanos, com a finalidade de regular a vida social
Psiquiatria, Psicologia, Sociologia, Estatística etc.). harmoniosamente. Por conseguinte, a historicidade da
Esse fato determinou de forma significativa uma nova sociedade humana tem sua imagem nas
orientação nos estudos criminológicos. Ao abstrato regulamentações jurídicas. Desta forma tendem a se
individualismo da Escola Clássica, a Escola Positiva adequar aos projetos político-sociais de cada
opôs a necessidade de defender mais enfaticamente o sociedade, nação ou Estado.
corpo social contra a ação do delinquente, priorizando
os interesses sociais em relação aos indivíduos. Longe da uniformidade, o pensamento jurídico-penal
orienta-se por filosofias jurídicas chamadas de Escolas
Na atualidade, os modelos biológicos de explicação da Penais. Mesmo a aceitação da denominação de Escola
criminalidade perderam quase que totalmente a sua Penal não é hegemônica. "Não obstante, a
força. denominação se impôs e foi incorporada ao estudo do
direito criminal" (Heitor Júnior; Op. cit. :37).
Todavia, não foram totalmente eliminados, dentro de
suas limitações também podem contribuir para a Assim, Mestieri conceitua Escola Penal como: "(...) o
compreensão do fenômeno criminal. elenco de soluções típicas do problema penal
abrangendo-o em todos os seus aspectos principais,
Na moderna Criminologia, o estudo do homem quais sejam: o delinquente, a responsabilidade
delinquente passou a um segundo plano, como penal, o crime e a pena" (apud; Heitor Júnior; op. cit. :37).
consequência do giro sociológico experimentado por
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2) "É imposta para a ressocialização do criminoso";
Dos movimentos que se propuseram encaminhar 3) "A máquina judiciária criminal deve ter em mira o
soluções características aos problemas penais homem, no sentido de que a execução da pena tenha
tentando explicar o crime, a pena, o homem um conteúdo humano".
delinquente, sua responsabilidade, temos as Escolas:
Clássica, Positiva, Intermediária (Eclética) e Nova Finalidade das penas
Defesa Social. Renato Marcão (2002), nos dá um bom
resumo das principais Escolas: A partir da publicidade do Direito Penal, no qual o
Estado detém o monopólio da aplicação das sanções,
Escola Clássica: Também chamada idealista, e também, da não uniformidade do pensamento jurídico
filosófico-jurídica, crítico-forense etc., que é livre- penal, a aplicação das medidas disciplinadoras adquire
arbitrista, invidualista e liberal, considerando o crime o caráter filosófico-utilitário da Escola Penal que tanto o
fenômeno jurídico e a pena, meio retributivo. Os legislador quanto o sentenciador estão concertados.
clássicos são contratualistas e racionalistas; foram, via Entretanto, dificilmente o legislador e o sentenciador
de regra, jusnaturalistas, aceitando, o predomínio de estão em harmonia entre si no tocante à finalidade da
normas absolutas e eternas sobre as leis positivas. pena. Tentarei mostrar mais adiante esta terrível
Para a Escola Clássica, a pena é um mal imposto ao contradição no Estatuto da Criança e do Adolescente,
indivíduo que merece um castigo em vista de uma falta e como o Serviço Social vira "marisco" nesta "briga do
considerada crime, que voluntária ou conscientemente, rochedo com o mar".
cometeu.
No momento vamos ver os "instrumentais" jurídico-
filosóficos do direito de punir. Assim, temos as teorias
Escola Positiva: É determinista e defensivista,
Retributiva, Relativa e as Mistas ou Sincréticas.
encarando o crime como fenômeno social e a pena
como meio de defesa da sociedade e de recuperação A Teoria Retributiva: Parte do princípio autoritário
do indivíduo. Chama-se positiva, não porque aceite o de que a pena é sempre merecida pelo infrator. A
sistema filosófico mais ou menos "comteano", porém, sanção penal é essencialmente retributiva porque
pelo método. opera causando um mal ao transgressor. Destina-se à
Para a Escola Positiva, o crime é um fenômeno natural reposição do status quo ante através da reposição,
e social, e a pena meio de defesa social. Enquanto os indenização ou da restituição.
clássicos aceitam a responsabilidade moral, para os
positivistas todo homem é responsável, porque vive e Na lição de Cezar Roberto Bitencourt, "A pena tem
enquanto vive em sociedade (responsabilidade legal ou como fim fazer Justiça, nada mais. A culpa do autor
social). deve ser compensada com a imposição de um mal, que
é a pena, e o fundamento da sanção estatal está no
Escola Intermediária: Em meio aos extremos bem questionável livre arbítrio, entendido como a
definidos das Escolas Clássica e Positiva, surgiram ao capacidade de decisão do homem para distinguir entre
longo dos tempos posições conciliatórias. Embora o justo e o injusto".
acolhendo o princípio da responsabilidade moral, não
aceitam que a responsabilidade moral fundamente-se Destarte, na teoria retributiva a "pena encontra seu
no livre arbítrio, substituindo-o pelo "determinismo fundamento somente em sua referência ao delito;
psicológico". Desta forma, a sociedade não tem o segundo sua gravidade determina-se sua quantia como
direito de punir, mas somente o de defender-se nos que se satisfazem as exigências do ordenamento
limites do justo. jurídico e a Justiça. Assim como a boa ação merece
reconhecimento, a má ação requer reprovação e
Escola da Nova Defesa Social: Depois da II compensação".
Guerra Mundial, reagindo ao sistema unicamente
retributivo, surge a Escola do Neodefensivismo Social. As Teorias Relativas: Baseiam a pena por seus
Segundo seus postulados não visa punir a culpa do efeitos preventivos. Distinguem dois tipos de
agente criminoso, apenas proteger a sociedade das prevenção: a geral, e a especial.
ações delituosas. Essa concepção rechaça a ideia de
um direito penal repressivo, que deve ser substituído A geral é a intimidação, ameaça com sanções os
por sistemas preventivos e por intervenções educativas prováveis infratores. Dispõe-se a intimidar todos os
e reeducativas, postulando não uma pena para cada membros da comunidade jurídica pela ameaça da
delito, mas uma medida para cada pessoa. pena.

Damásio E. de Jesus ensina que na Defesa Social, a A especial atua diretamente sobre o autor da violação
pena tem três finalidades: penal, para que não volte a delinquir, tentando corrigir
1) "Não é exclusivamente de natureza retributiva, os que são possíveis de ressocialização e isolar os
visando também a tutelar os membros da sociedade"; irrecuperáveis. Dirige-se exclusivamente ao
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delinquente, para que este não volte a delinquir. unificadora defende que a retribuição e a prevenção,
geral e especial, são distintos aspectos de um mesmo
As Teorias Mistas ou Sincréticas: Mesclam as fenômeno, que é a pena.
retributivas e as relativas, afirmando de que a pena é
retribuição, sem olvidar dos fins preventivos (buscam Em resumo, as teorias mistas ou sincréticas acolhem a
reunir em um conceito único os fins da pena). A doutrina retribuição e o princípio da culpabilidade como critérios
limitadores da intervenção da pena.

Criminologia do Consenso e do Conflito.

Teorias criminológicas, em geral, têm como objeto sociedade são fundadas na força e na coerção, na
quatro elementos: a lei, o criminoso, o alvo e o lugar. A dominação por alguns e sujeição de outros; ignora-se a
forma como são classificadas diz respeito aos diversos existência de acordos em torno de valores de que
níveis de explicação, que variam do individual ao depende o próprio estabelecimento da força.
contextual. As teorias criminológicas que adotam o
nível individual de análise partem do pressuposto de Dentro desses dois grupos vamos encontrar,
que o crime - a explicação de suas causas e o controle principalmente, as seguintes teorias: escola de
de sua ocorrência na sociedade - se deve aos fatores Chicago, teoria da associação diferencial, teoria da
internos aos indivíduos que os motivam, ou melhor, os anomia, teoria da subcultura delinquente, labelling
impulsionam a cometerem um ato criminoso. Variáveis aproach (interacionismo simbólico) e teoria critica.
como idade, raça, posição social e educação seriam
algumas das medidas consideradas fundamentais para São consideradas de consenso: escola de Chicago,
explicar a atitude criminosa de um indivíduo. associação diferencial, anomia e subcultura
delinquente.
A maioria das teorias criminológicas mais importantes
são explicações relativamente precisas que aspiram a São conflitivas labelling e a teoria critica.
propor dedutivamente hipóteses claras e consistentes
entre si e que possam ser submetidas a propósitos de Escola de Chicago
refutação e superá-los com êxito.
É considerada uma teoria de consenso.
Com o surgimento das teorias sociológicas da
criminalidade, houve uma bifurcação muito poderosa Pode-se dizer que a criminologia americana, como tal,
dessas pesquisas em dois grupos principais. Essa se iniciou nas décadas de 20 e 30, à sombra da
divisão leva em consideração, principalmente, a forma Universidade de Chicago, com a teoria ecológica e os
como os sociólogos encaram a composição da múltiplos trabalhos empíricos que inspirou. Na linha da
sociedade: consensual ou conflitual. obra pioneira de Robert Park e Ernest Burguess (de
ambos os autores, Introduction to the Science of
Sociology, 1921, e The City - 1925) em sede de
sociologia, a escola criminológica de Chicago encarou
o crime como fenômeno ligado a uma área natural.
Historicamente coincidente com o período das grandes
migrações e da formação das grandes metrópoles, teve
a escola de Chicago que se afrontar com o problema
característico do ghetto. As sucessivas ondas de
imigrantes arrumavam-se segundo critérios
rigidamente étnicos, dando origem a comunidades
tendencialmente estanques. Parecia, assim, natural
que se optasse por um modelo ecológico - ou seja, de
equilíbrio entre a comunidade humana e o ambiente
Teorias macrossociológicas natural - para o enquadramento dos fenômenos sociais.
Para a perspectiva das teorias consensuais, a
finalidade da sociedade é atingida quando há um Caracterizou-se pelo seu empirismo e sua finalidade
perfeito funcionamento de suas instituições, de forma pragmática, isto é, pelo emprego da observação direta
que os indivíduos compartilhem os objetivos comuns a em todas as investigações (da observação dos fatos
todos os cidadãos, aceitando as regras vigentes e são induzidas as oportunas teses) e pela finalidade
compartilhando as regras sociais dominantes. Para a pragmática a que se orientavam: um diagnóstico
teoria do conflito, no entanto, a coesão e a ordem na confiável sobre os urgentes problemas sociais da

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realidade norte-americana de seu tempo. Seus
representantes iniciais não eram sociólogos nem
juristas, senão jornalistas, predominando em todo o
caso, como setor de procedência, o amplo espectro das
ciências do espírito.

A escola de Chicago pode ter seu trabalho melhor


compreendido dividindo-o em duas fases: a Primeira
Escola vai de 1915 a 1940, enquanto a segunda escola
vai de 1945 a 1960. O trabalho dessa escola explorou
a relação entre a organização do espaço urbano e a
criminalidade.

A escola de Chicago se tornou bastante importante


para o estudo da criminalidade urbana. As teorias
estabelecidas por seus sociólogos durante aquele
período influenciaram valiosos estudos urbanos sobre
o crime, que foram posteriormente conduzidos nos
Estados Unidos e na Inglaterra. Sua atuação foi
marcada pelo pragmatismo, e, dentre outras inovações
que preconizou, destacam-se o método da observação Teoria das zonas concêntricas
participante e o conceito de ecologia humana.
Para a teoria das zonas concêntricas as cidades não
A sociologia não estava interessada em fatos, mas em crescem em seus limites, mas tendem a se expandir a
como as pessoas reagiam a eles. Nesse compasso, a partir do seu centro e de formas concêntricas
experiência prática era considerada fundamental, visto denominadas zonas.
que a melhor estratégia de pesquisa era aquela em que
o pesquisador participava diretamente do objeto de seu A Zona II é a área imediatamente em torno da Zona I e
estudo. Este método inovador e cuja introdução na representa a transição do distrito comercial para as
pesquisa se deve a Escola de Chicago é o da residências. Normalmente ocupada pelas pessoas
observação participante. Nesse método, o observador mais pobres é a chamada zona em transição ou, ainda,
toma parte no fenômeno social que estuda, o que lhe zona de transição. A Zona III contém residências de
permite examiná-lo da maneira como realmente ocorre. trabalhadores que conseguiram escapar das péssimas
Assim, o conhecimento tem por base não a experiência condições de vida da Zona II, sendo composta
alheia, mas a própria experiência do pesquisador. geralmente pela segunda geração de imigrantes. A
Zona IV chamada de suburbia, é formada por bairros
A primeira das teorias que eclodem com surgimento da residenciais e é caracterizada por casas e
escola de Chicago e a teoria ecológica. Para os apartamentos de luxo. É onde residem as classes
defensores dessa teoria, a cidade produz delinquência. média e alta. A Zona V denominada exurbia, fica além
Existiriam para esses autores até áreas bastante dos limites da cidade e contém áreas suburbanas e
definidas, onde a criminalidade se concentra e outras cidades-satélites. É habitada por pessoas que
em que seria bastante reduzida. trabalham no centro e despendem um tempo razoável
no trajeto entre casa e trabalho. Esta área não é
A teoria ecológica explica esse efeito criminógeno da caracterizada por residências proletárias. Ao contrário,
grande cidade, valendo-se dos conceitos de normalmente é composta de casas de classe média-
desorganização e contagia inerentes aos modernos alta e alta. O conceito de subúrbio das cidades norte-
núcleos urbanos e, sobretudo, invocando o americanas é diverso do das cidades da América
debilitamento do controle social desses núcleos. A Latina. Enquanto nas cidades latino-americanas o
deterioração dos grupos primários (família etc.), a subúrbio é usualmente caracterizado por ser uma área
modificação qualitativa das relações interpessoais que pobre, nos EUA, é onde residem pessoas de alto
se tornam superficiais, a alta mobilidade e a padrão socioeconômico.
consequente perda de raízes no lugar de residência, a
crise dos valores tradicionais e familiares, a Pesquisadores consideravam a Zona II como de
superpopulação, a tentadora proximidade às áreas particular interesse, eis que era a área que as
comerciais e industriais onde se acumula riqueza e o estatísticas indicavam com maior incidência de crime.
citado enfraquecimento do controle social criam um Eles observaram que a expansão do bairro central
meio desorganizado e criminógeno. acarretava no deslocamento dos residentes da Zona II.
Foi dessa época que surgiram os estudos de um dos
subprodutos da Zona II e que também é um dos temas

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centrais da Criminologia hoje: as gangues. As gangues oportunidades para usá-las de maneira desviante. Tudo
e a delinquência juvenil são problemas graves e que isso é aprendido e promovido principalmente em
desafiam a intervenção que a sociedade (e a própria grupos tais como gangues urbanas ou grupos
Criminologia) prevê para esses casos. empresariais que fecham os olhos a fraudes,
sonegação fiscal ou usa de informações privilegiadas
Podemos considerar que o esquema de divisão da no mercado de capitais.
cidade em cinco zonas características é mero artifício
didático, posto que nenhum processo pode ser A teoria da associação diferencial parte da ideia
apontado estatisticamente. Cada uma dessas zonas segundo a qual o crime não pode ser definido
encontra-se em expansão, o que resulta na expansão simplesmente como disfunção ou inadaptação das
da cidade como um todo. Nesse processo, porém, uma pessoas de classes menos favorecidas, não sendo ele
área forçosamente invade a outra para fazer sua exclusividade destas. Em certo sentido, ainda que
expansão. Assim, a zona comercial para crescer tem influenciado pelo pensamento da desorganização
de invadir a zona adjacente, impingindo-Ihe sempre um social de William Thomas, Sutherland supera o
caráter transitório, posto que sempre comportando conceito acima para falar de uma organização
elementos da Zona I (comércio e indústria) e da Zona II diferencial e da aprendizagem dos valores criminais. A
(residências). Esse aspecto da expansão urbana pode vantagem dessa teoria é que, ao contrário do
ser denominado de sucessão, importante princípio positivismo, que estava centrado no perfil biológico do
ecológico. criminoso, tal pensamento traduz uma grande
discussão dentro da perspectiva social. O homem
Em resumo: com a escola de Chicago, a Criminologia aprende a conduta desviada e associa-se com
abandonou o paradigma até então dominante do referência nela.
positivismo criminológico, do delinquente nato de
Lombroso, e girou para as influências que o ambiente, Teoria da Associação Diferencial de
e no presente caso, que as cidades podem ter no Sutherland
fenômeno criminal. Ganhou-se qualidade
metodológica. Com os estudos da escola de Chicago Segundo Molina e Gomes, a teoria da associação
criou-se também o ambiente cultural para as teorias diferencial de Sutherland é resumida com nove
que se sucederam e que são a feição da moderna proposições.
Criminologia.
1) A conduta criminal se aprende, como se aprende
Foi a sociologia americana, em especial, com a escola também o comportamento virtuoso ou qualquer outra
de Chicago, que passou a utilizar os social surveys atividade: os mecanismos são idênticos em todos os
(inquéritos sociais) na investigação da criminalidade. É casos.
um importante instrumento para o conhecimento do
índice real da criminalidade de uma cidade ou bairro. 2) A conduta criminal se aprende em interação com
outras pessoas, mediante um processo de
Teoria da associação diferencial comunicação. Requer, pois, uma aprendizagem ativa
por parte do indivíduo. Não basta viver em um meio
É considerada uma teoria de consenso. criminógeno, nem manifestar, é evidente, determinados
traços da personalidade ou situações frequentemente
Foi iniciada por Edwin Sutherland, um dos sociólogos associadas ao delito. Não obstante, em referido
que mais influenciou a Criminologia moderna, tendo se processo participam ativamente, também, os demais.
inspirado, em parte, nas ideias de Gabriel Tarde.
Sutherland, que nasceu em 1883 e viveu até 1950, teve 3) A parte decisiva do citado processo de
seu primeiro contato com a Criminologia no início do aprendizagem ocorre no seio das relações mais íntimas
século XX, com a escola de Chicago, sendo por ela do indivíduo com seus familiares ou com pessoas do
influenciado. seu meio. A influência criminógena depende do grau de
No final dos anos 30, Sutherland cunha a expressão intimidade do contato interpessoal.
whitecollar crimes, que passa a identificar os autores de
crimes diferenciados, que apresentavam pontos 4) A aprendizagem do comportamento criminal inclui
acentuados de dessemelhança com os criminosos também a das técnicas de cometimento do delito, assim
chamados comuns. Dez anos mais tarde, em 1949, como a da orientação específica das correspondentes
revê parcialmente sua teoria, chegando a uma motivações, impulsos, atitudes e da própria
formulação mais próxima da que conhecemos hoje. racionalização (justificação) da conduta delitiva.
Segundo Edwin Sutherland, a associação diferencial é
o processo de aprender alguns tipos de comportamento 5) A direção específica dos motivos e dos impulsos se
desviante, que requer conhecimento especializado e aprende com as definições mais variadas dos preceitos
habilidade, bem como a inclinação de tirar proveito de legais, favoráveis ou desfavoráveis a eles. A resposta

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aos mandamentos legais não é uniforme dentro do
corpo social, razão pela qual o indivíduo acha-se em Como exemplo prático disso, podemos tomar a
permanente contato com outras pessoas que têm situação de dificuldade de controle da ordem pública
diversos pontos de vista quanto à conveniência de que a força de paz da ONU enfrenta no Haiti. O colapso
acatá-los. Nas sociedades pluralistas, dito conflito de do governo anterior gerou uma situação de anomia nos
valorações é inerente ao próprio sistema e constitui a país (ex.: saques, estupros e violações de direitos
base e o fundamento da teoria sutherlaniana da humanos, como torturas e aumento dos homicídios). E
associação diferencial. uma situação de caos, onde os índices de criminalidade
encontram terreno propício para forte elevação. Não
6) Uma pessoa se converte em delinquente quando as será fácil a tarefa de restabelecer a ordem pública no
definições favoráveis à violação da lei superam as Haiti. O Iraque é outro exemplo a ser citado.
desfavoráveis, isto é, quando por seus contatos
diferenciais aprendeu mais modelos criminais que No âmbito das teorias mais propriamente sociológicas,
modelos respeitosos ao Direito. o princípio do bem e do mal foi posto em dúvida pela
teoria estrutural-funcionalista da anomia e da
7) As associações e contatos diferenciais do indivíduo criminalidade. Esta teoria, introduzida pelas obras
podem ser distintas conforme a frequência, duração, clássicas de Emile Durkheim e desenvolvida por Robert
prioridade e intensidade dos mesmos. Contatos Merton, representa a virada em direção sociológica
duradouros e frequentes, é lógico, devem ter maior efetuada pela Criminologia contemporânea. Constitui a
influência pedagógica, mas que outros fugazes ou primeira alternativa clássica a concepção dos
ocasionais, do mesmo modo que o impacto que exerce caracteres diferenciais biopsicológicos do delinquente
qualquer modelo nos primeiros anos de vida do homem e, por consequência, a variante positivista do princípio
costuma ser mais significativo que o que tem lugar em do bem e do mal. Nesse sentido, a teoria funcionalista
etapas posteriores; o modelo é tanto mais convincente da anomia está na origem de uma profunda revisão
para o indivíduo quanto maior seja o prestígio que este crítica da Criminologia de orientação biológica e
atribui à pessoa ou grupos cujas definições e exemplos caracterológica, na origem de uma direção alternativa
aprende. que caracteriza todas as teorias Criminológicas das
quais se tratara mais adiante.
8) Precisamente porque o crime se aprende, isto é, não
se imita, o processo de aprendizagem do Da abordagem sociológica do suicídio nas obras de
comportamento criminal mediante contato diferencial Durkheim, podemos destacar uma regra geral: quando
do indivíduo com modelos delitivos e não delitivos se criam na sociedade espaços anomicos, ou seja,
implica a aprendizagem de todos os mecanismos quando um indivíduo ou um grupo perde as referências
inerentes a qualquer processo deste tipo. normativas que orientavam a sua vida, então
enfraquece a solidariedade social, destruindo-se o
9) Embora a conduta delitiva seja uma expressão de equilíbrio entre as necessidades e os meios para sua
necessidades e de valores gerais, não pode ser satisfação. O indivíduo sente-se livre de vínculos
explicada como concretização deles, já que também a sociais, tendo, muitas vezes, um comportamento
conduta adequada ao Direito corresponde a idênticas antissocial ou inclusive autodestrutivo.
necessidades e valores.
Segundo Figueiredo Dias, a teoria da anomia e uma
Teoria da anomia versão criminológica das teorias funcionalistas em
sociologia, que tiveram em The Social System (1950),
É considerada uma teoria de consenso. A anomia é de T. Parsons, a sua expressão mais acabada. A teoria
um dos temas mais estudados pela moderna da anomia foi, pela primeira vez, enunciada por Robert
Criminologia. Merton, em 1938, num artigo publicado na American
Sociological Review, sob o título de Social Stroctre and
A anomia e uma situação social onde falta coesão e Anomie. A teoria da anomia radica a explicação do
ordem, especialmente no tocante a normas e valores. crime no defasamento entre a estrutura cultural e a
Se as normas são definidas de forma ambígua, por estrutura social. A primeira impõe a todos os cidadãos
exemplo, ou são implementadas de maneira causal e a persecução dos mesmos fins e prescreve para todos
arbitrária; se uma calamidade como a guerra subverte os mesmos meios legítimos. A segunda reparte
o padrão habitual da vida social e cria uma situação em desigualmente as possibilidades de acesso a estes
que se torna obscuro quais normas têm aplicação; ou meios e induz, por isso, o recurso a meios ilegítimos.
se um sistema é organizado de tal forma que promove Noutros termos, o crime é, segundo Merton, uma das
o isolamento e a autonomia do indivíduo a ponto das formas individuais de adaptação no quadro de uma
pessoas se identificarem muito mais com seus próprios sociedade agônica em torno de meios escassos. Na
interesses do que com os do grupo ou da comunidade mesma linha se mantém, entre outras, a obra de A.
como um todo - o resultado poderá ser a anomia, ou Cloward e L. Ohlin, Deliquency and Opportunity A
falta de normas. Theory of Deliquent Gangs (1960), com a
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particularidade de encarar o crime como solução alcançarem a riqueza e/ou o prestígio. E aqui posso
coletiva e sub-cultural. citar um caso relativamente comum no leste de Minas
Robert King Merton foi quem deu melhor desenvol- Gerais, de jovens que passam a trabalhar na ilicitude
vimento ao conceito de anomia. E, embora tenha sido do envio de pessoas para trabalhar ilegalmente em
enunciada pela primeira vez em 1938, você poderá outros países, algumas vezes falsificando passaportes,
constatar a seguir que a mesma pode auxiliar também comprando vistos de entrada de passaportes originais,
a compreensão do fenômeno criminal na atualidade. emprestando dinheiro à juros extorsivos para as
famílias iniciarem a viagem ao país de destino,
Merton afirma que em todo contexto sociocultural extorsões etc. Esses jovens preferiram abandonar a
desenvolvem-se metas culturais. Estas expressam os tentativa de progredir socialmente pelos meios
valores que orientam a vida dos indivíduos em institucionalizados (ex.: trabalho) e optaram por chegar
sociedade. Coloca-se então uma questão: como uma ao sucesso e prestígio com condutas criminais. Para
pessoa pode atingir essas metas? Merton diz que, para eles, o risco de serem processados e condenados vale
tal efeito, cada sociedade estabelece meios. Trata-se a pena. Em tempo relativamente curto, passam a
de recursos institucionalizados ou legítimos que são comprar carros importados, frequentar colunas sociais,
socialmente prescritos. Existem também outros meios organizar festas de arromba etc. Não são também
que permitem atingir estas mesmas metas, mas que incomuns os casos de pessoas que se envolvem em
são rejeitados pelo grupo social. A utilização destes quadrilhas de extorsão mediante sequestro e trafico de
últimos é considerada como violação das regras sociais drogas com o mesmo objetivo. Muitas vezes elas não
em vigor. passam por dificuldades financeiras, mas escolhem
esse caminho - o do comportamento desviante - para
O insucesso em atingir as metas culturais devido à atingir a meta cultural da riqueza e do sucesso.
insuficiência dos meios institucionalizados pode
produzir o que Merton chama de anomia: manifestação Então, basicamente no conceito de anomia de Merton,
de um comportamento no qual as regras do jogo social temos um conflito de dois pontos: metas culturais (ex.:
são abandonadas ou contornadas. O indivíduo não riqueza, sucesso, status profissional etc.) versus meios
respeita as regras do comportamento que indicam os institucionalizados. Merton criou então um esquema
meios de ação socialmente aceitos. Surge então o onde ele explica os meios de adaptação dos indivíduos,
desvio, ou seja, o comportamento desviante. que chamou de modos de adaptação, e que são cinco:
conformidade, inovação, ritualismo, evasão e rebelião.
Não sabemos exatamente quais fatores levam algumas O sinal positivo sinaliza quando o indivíduo aceita o
pessoas a cometerem infrações criminais ou não. Mas, meio institucionalizado ou meta cultural. O sinal
em entrevistas individuais, algumas vezes encontramos negativo é quando não os aceita. Vejamos então o
casos de pessoas que simplesmente praticam o delito esquema de Merton:
porque entenderam que é o caminho mais rápido para

Modos de Adaptação Metas culturais Meios institucionalizados


Conformidade + +
Inovação + -
Ritualismo - +
Evasão - -
Rebelião +- +-
Classificação da Anomia de Robert Merton (modos de adaptação)

Conformidade: também chamado de comportamento o atendimento das metas socialmente dominantes. Por
modal. Aqui o indivíduo aceita os meios sociais um motivo ou outro, a pessoa acredita que nunca
institucionais para alcançar as metas culturais. Ele atingira as metas culturais, e mesmo assim continua
adere totalmente ao comportamento aceito e esperado respeitando as regras sociais, mas agindo como uma
pela sociedade e não apresenta comportamento espécie de ritual. É um conformista. Neste modelo há
desviante. Os demais comportamentos são não modais uma focalização nos meios e não nos objetivos sociais.
ou desviantes e sinalizam a ocorrência de anomia.
Evasão: neste conjunto encontramos os párias,
Inovação: na inovação o indivíduo aceita as metas mendigos, bêbados e drogados crônicos, etc. Enquanto
culturais, mas não os meio institucionalizados. Quando para Merton o conformismo era o modo de adaptação
o indivíduo verifica que não estão acessíveis a ele mais comum, a evasão já é o modo mais raro. Neste
todos os meios institucionais, ele rompe com o sistema modelo o indivíduo vive num determinado ambiente
e passa ao desvio para atingir as metas culturais. social, mas não adere às suas normas sociais, nem aos
meios institucionais e nem a metas culturais. E um
Ritualismo: neste modelo o indivíduo vê com descaso comportamento claramente anômico.

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pela Criminologia tradicional. A referida ordem social, a
Rebelião: consiste na rejeição das metas e dos meios teor deste novo modelo, é um mosaico de grupos,
dominantes - julgados como insuficientes ou subgrupos, fragmentado, conflitivo; cada grupo ou
inadequados - e na luta pela sua substituição. A subgrupo possui seu próprio código de valores, que
conduta da rebelião busca assim a configuração de nem sempre coincidem com os valores majoritários e
uma nova ordem social. Por essa razão, Merton oficiais, e todos cuidam de fazê-los valer diante dos
entende que essa conduta não pode ser considerada restantes, ocupando o correspondente espaço oficial.
especificamente como negativa, utilizando
simultaneamente como símbolos os sinais positivos e Aqui podemos identificar os fundamentos dessa teoria
negativos. Exemplos claros da conduta de rebelião (ou teorias, porquanto existem variantes) nos casas das
constituem os movimentos de revolução social. gangues de delinquência juvenil. Ao participar de uma
gangue, o jovem passa a aceitar os valores daquele
Três elementos básicos emergem desta construção grupo, fazendo-os valer para si, em muitos casos, mais
teórica: objetivos (ou fins) culturais, normas que os valores sociais dominantes.
institucionalizadas e oportunidades reais. Eles são
independentes, mas podem, em variações autônomas, Uma subcultura profissional muito estudada pela
provocar estados de defasagem recíproca. Em relação Criminologia na atualidade é a policial. Os policiais
às defasagens dos elementos da estrutura cultural, elas trabalham com o perigo diariamente em sua profissão.
podem oscilar entre duas situações-limite, expressando Possuem laços de relacionamento muito fortes com a
as formas mais sérias de desintegração cultural. De um corporação. O chamado espírito de corpo dos policiais
lado, está a sociedade que atribui excessivo valor aos é um reflexo claro do dever de lealdade que os seus
fins e relega a segundo plano as normas, a procura do membros devem ter com a subcultura policial. O
sucesso a qualquer preço. De outro, a sociedade que membro que desrespeita esse espírito de corpo esta
concede prioridade aos meios e descuida dos objetivos, fadado a ser isolado do convívio dos demais policiais e
caindo na armadilha da conformidade absoluta e do familiares. Passa a ser evitado e visto com reservas
apego desmedido à tradição como valores dominantes. pelos colegas, mesmo quando faz legalmente uma
denúncia de desvio de comportamento ilegal de algum
Teoria da subcultura delinquente membro de sua unidade. Sem o estudo profundo da
subcultura profissional policial é difícil criar mecanismos
É considerada uma teoria de consenso. O criador mais eficientes para se controlar a criminalidade
dessa teoria foi o sociólogo norte-americano Albert K. derivada da corrupção policial.
Cohen e teve como marco o ano de lançamento de seu
livro Deliquent boys, em 1955. A conduta delitiva para as teorias sub-culturais -
diferentemente do que sustentavam as teses
A subcultura é uma cultura associada a sistemas ecológicas - não seria produto da desorganização ou
sociais (incluindo subgrupos) e categorias de pessoas da ausência de valores, senão reflexo e expressão de
(tais como grupos étnicos) que fazem parte de sistemas outros sistemas de normas e valores distintos: os sub-
mais vastos, como organizações formais, comunidades culturais. Teria, portanto, um respaldo normativo.
ou sociedades. Bairros étnicos urbanos - variando de Assim, tanto a conduta normal, regular e adequada ao
indianos em Londres e muçulmanos em Paris, a Direito, como a irregular, desviada e delitiva seriam
americanos em Hong Kong ou chineses em Nova York definidas em relação aos respectivos sistemas sociais
compartilham frequentemente de linguagens, ideias e de normas e valores oficiais e sub-culturais, isto é,
práticas culturais que diferem das seguidas pela contariam com uma estrutura e significação muito
comunidade geral, mas, ao mesmo tempo, sofrem semelhante, visto que o autor, em última análise
pressão para conformar-se, em certo grau, a cultura (delinquente ou não delinquente), o que faz é refletir
mais vasta na qual está enraizada a subcultura. O com sua conduta o grau de aceitação e interiorização
mesmo fato pode acontecer também em sistemas dos valores da cultura ou subcultura a qual pertence
sociais menores, como grandes empresas, (não por decisão própria), valores que se interiorizam -
departamentos do governo ou unidades militares, que reforçam e transmitem - mediante idênticos mecanismo
se aglutinam muitas vezes em torno de interesses de aprendizagem e socialização, tanto no caso de
especializados ou de laços criados por interações conduta normal ou regular como no de conduta
diárias e interdependência mútua. irregular ou desviada.

As teorias sub-culturais sustentam três ideias Teoria do labelling aproach/ interacionismo


fundamentais: o caráter pluralista e atomizado da simbólico, etiquetamento ou rotulação.
ordem social, a cobertura normativa da conduta
desviada e a semelhança estrutural, em sua gênese, do É considerada um dos marcos das teorias de conflito.
comportamento regular e irregular. A premissa dessas
teorias sub-culturais é, antes de tudo, contrária à A teoria do etiquetamento rompeu paradigmas. Ela deu
imagem monolítica da ordem social que era oferecida
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um giro profundo na forma de se analisar o crime. interdependentes, recíprocas e inseparáveis. O desvio
Deixou de centrar estudos no fenômeno delitivo em si e não é uma qualidade intrínseca da conduta, senão uma
passou a focar suas atenções na reação social qualidade que lhe é atribuída por meio de complexos
proveniente da ocorrência de um determinado delito. processos de interação social, processos estes
altamente seletivos e discriminatórios.
Os principais representantes dessa linha de
pensamento são Erving Goffman e Howard Becker. Do ponto de vista metodológico, há que se realçar a
importância da descoberta do defasamento quantitativo
Seguindo Becker, os grupos sociais criam os desvios e, sobretudo, qualitativo entre a delinquência potencial
ao fazerem as regras cuja infração constitui o desvio e (ou secreta) e a delinquência real. Tal fato permitiu ao
ao aplicarem tais regras a certas pessoas em particular, labelling, por um lado, contestar os fundamentos
qualificando-as como marginais. Os processos de epistemológicos da criminologia tradicional e, por outro
desvios, assim, podem ser considerados primários e lado, retirar a ideia de delinquência de sua dimensão
secundários. O desvio primário corresponde a primeira ontológica. O que os delinquentes têm em comum, o
ação delitiva do sujeito, que pode ter como finalidade que verdadeiramente os caracteriza, é apenas a
resolver alguma necessidade, por exemplo, econômica, resposta das audiências de controle. Ou seja, não e o
ou produz-se para acomodar sua conduta às crime em si que vai ser o ponto central da visão
expectativas de determinado grupo sub-cultural. O criminológica, mas sim a respectiva reação social que
desvio secundário se refere a repetição dos atos e deflagrada com a prática do ato pelo delinquente.
delitivos, especialmente a partir da associação forçada Temos um giro nos sistema que sai do crime para a
do individuo com outros sujeitos delinquentes. reação social ao mesmo.

A tese central dessa corrente pode ser definida, em Deslocando o problema criminológico do plano de ação
termos muito gerais, pela afirmação de que cada um de para o da reação social - dos bad actors para os
nós se torna aquilo que os outros veem em nós e, de powerful reactors – o labelling erige as "audiências
acordo com essa mecânica, a prisão cumpre uma sociais em variáveis críticas do estudo da deviance”,
função reprodutora: a pessoa rotulada como segundo a expressiva formulação de Erikson. Noutros
delinquente assume, finalmente, o papel que lhe é termos, toda a investigação interacionista gravita em
consignado, comportando-se de acordo com o mesmo. torno da problematização da estigmatização, assumida
Todo o aparato do sistema penal esta preparado para como variável dependente (quais os critérios em nome
essa rotulação e para o reforço desses papéis. dos quais certas pessoas, e só elas, são
estigmatizadas como delinquentes?), quer como
Como exemplo nítido dessa situação podemos citar o variável independente (quais as consequências desta
personagem Carlito Brigante, representado par AI estigmatização?). Nesse plano de ideias podemos citar
Pacino em O Pagamento Final (Carlito’s Way) filme o caso de envolvimento de agentes de classes mais
dirigido por Brian de Palma, em 1993. Nesse filme, humildes com a contravenção penal de embriaguez no
Carlito é traficante de drogas e consegue sair da cadeia Brasil.
com uma brecha da lei. Ele tenta então dar um novo
rumo à sua vida, mas seus ex-colegas do crime, a Com as teorias da criminalidade e da reação penal
polícia, sua família e o resto do sistema rotularam baseadas sobre o labelling approach e com as teorias
Carlito como "criminoso". Uma linha invisível vai conflituais, tem lugar no âmbito da sociologia criminal
conduzindo a vida de Carlito, até o mesmo se contemporânea a passagem da criminologia liberal
enquadrar novamente em seu rótulo. para a criminologia crítica. Uma passagem, como
parece evidente, que ocorre lentamente e sem uma
Surgida nos Estados Unidos par volta dos anos 70, o verdadeira solução de continuidade. A recepção alemã
labelling approach privilegia, na análise do do labelling approach em particular é um momento
comportamento desviado, o funcionamento das importante dessa passagem. Essa direção de pesquisa
instâncias de controle social (criminalização parte da consideração de que não se pode
secundária), ou seja, a reação social aos compreender a criminalidade se não se estuda a ação
comportamentos assim etiquetados. Crime e reação do sistema penal que a define e reage contra ela,
social são, segundo esse enfoque, manifestações de começando pelas normas abstratas até as instâncias
uma só realidade: a interação social. Não há como oficiais (polícia, juízes, instituições penitenciárias que
compreender o crime senão em referência aos as aplicam), e que, por isso, o status social do
controles sociais. delinquente pressupõe, necessariamente, o efeito da
atividade das instâncias oficiais de controle social da
De acordo com essa perspectiva interacionista, não se delinquência, enquanto não adquire esse status aquele
pode compreender o crime prescindindo da própria que, apesar de ter realizado o mesmo comportamento
reação social, do processo social de definição ou punível, não é alcançado, todavia, pela ação daquelas
seleção de certas pessoas e condutas etiquetadas instâncias. Portanto, este não é considerado e tratado
como delitivas. Delito e reação social são expressões pela sociedade como delinquente.
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a redefinição do próprio objeto da Criminologia.
O discurso jurídico-penal ficou irremediavelmente
desqualificado pela demonstração incontestável de sua A National Deviance Conference nasce como uma
falácia, enquanto a criminologia etiológica, reação ao pragmatismo da criminologia europeia, na
complemento teórico sustentador desse discurso, viu- busca da visão interdisciplinar associada à sociologia,
se irreversivelmente desmentida. A parir dessas e com uma postura crítica ao positivismo e às posições
contribuições teóricas, o sistema penal já não podia reformistas e correcionais da criminologia tradicional. O
permanecer fora dos limites da Criminologia, grupo inglês entende que a solução para a redução da
convertendo-se em seu objeto necessário ao revelar-se criminalidade passa pela extinção da exploração
como mecanismo reprodutor da realidade criminal. Por econômica e da opressão das classes políticas. Em
isso, afirmamos que as investigações interacionistas e resumo: a criminologia radical se apresenta
fenomenológicas constituem o golpe deslegitimador expressamente como uma criminologia marxista.
mais forte recebido pelo exercício de poder do sistema
penal, do qual o discurso jurídico-penal não mais As bases dessa linha de pensamento se materializaram
poderá recuperar-se, a não ser fechando-se na crítica às posturas tradicionais da criminologia do
hermeticamente a qualquer dado de realidade, por consenso, incapazes de compreender a totalidade do
menor que seja, isto é, estruturando-se como um delírio fenômeno criminal. A premissa do pensamento estava
social. indubitavelmente ancorada no pensamento marxista,
pois sustentava ser a delito um fenômeno dependente
Não interessam, enfim, à perspectiva interacionista as do modo de produção capitalista. Todavia, sabemos
causas da desviação primária, mas só os processos de hoje que até na antiga União Soviética havia crime
criminalização secundária, vale dizer, os processos de durante o comunismo. A China comunista (mesmo com
funcionamento de reação e controle sociais, que são, abertura) hoje enfrenta com mão de ferro a
em última análise, os responsáveis pelo surgimento do criminalidade, utilizando a pena de morte com
desvio como tal. Ou seja, para o interacionismo, o delito excessivo rigor para o controle da criminalidade do
é apenas um rótulo social derivado do processo de país. Há notícia de 2004 que cerca de 10 mil pessoas
etiquetamento. são condenadas à morte e executadas anualmente na
China. Então, não há como acusar de forma simplista
Teoria crítica, radical ou "nova criminologia" que o capitalismo é o principal gerador da
criminalidade. Tanto no comunismo mais denso e
É considerada teoria de conflito. fechado da antiga URSS como no comunismo
mesclado com a abertura da China, há muita
Essa perspectiva criminológica - a mais recente – criminalidade também. Nesse contexto, e bastante
afirmou-se em plena década de 1970. Ela surgiu quase provável também que a máfia russa já operasse
ao mesmo tempo nos Estados Unidos e na Inglaterra, naquele país na época do comunismo, talvez não com
irradiando depois para a generalidade dos países a ousadia de hoje.
europeus - sobretudo Alemanha, Itália, Holanda,
França e países Nórdicos -, para o Canadá etc. De qualquer modo, é quando o enfoque
macrossociológico se desloca do comportamento
O ramo americano da criminologia radical desenvolveu- desviante para os mecanismos de controle social dele,
se sobretudo a partir da escola criminológica de em especial para o processo de criminalização, que o
Berkeley (com os Schwendinger e T. Platt). Criou a momento crítico atinge sua maturação na Criminologia,
organização, a Union of Radical Criminologists, e a sua e ela tende a transformar-se de uma teoria da
revista própria, Crime and Social Justice. Na Inglaterra, criminalidade em uma teoria crítica e sociológica do
a criminologia radical, organizada em torno da National sistema penal. De modo que, deixando de lado
Deviance Conference, é encabeçada por I. Taylor, P. possíveis diferenciações no seu interior, ela se ocupa
Walton e J. Young, autores do mais conhecido tratado hoje em dia, fundamentalmente, da análise dos
de criminologia desse tipo, The New Criminology: For a sistemas penais vigentes.
Social Theory of Deviance (1973) e organizadores da
coletânea Critical Criminology (l975). A atenção da nova criminologia - da criminologia crítica
- se dirigiu principalmente para o processo de
O Grupo de Berkeley surge como reação aos objetivos criminalização, identificando nele um dos maiores nós
básicos da escola de Criminologia que se teóricos e práticos das relações sociais de
consubstanciava na formação de técnicos e desigualdades próprias da sociedade capitalista, e
profissionais treinados para a luta contra o crime. perseguindo, como um de seus objetivos principais,
Tratava-se de um confronto entre os interesses básicos estender ao campo do Direito Penal, de modo rigoroso,
do Estado, em sua política de criação de novos a crítica do direito desigual.
profissionais para o exercício do controle funcional da
criminalidade, e os teóricos universitários que queriam Igualmente expressiva foi a ruptura metodológica e
epistemológica com a criminologia tradicional. Ela
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significa, desde logo, o abandono do paradigma sociedade?
etiológico-determinista (sobretudo no plano individual)
e a substituição de um modelo estático e descontínuo O modelo explicativo da criminologia radical se
de abordagem do comportamento desviante por um reconduz aos princípios do marxismo. A criminologia
modelo dinâmico e contínuo. Traduz-se, por outro lado, radical distingue entre crimes que são expressão de um
na desvalorização das estatísticas oficiais como sistema intrinsecamente criminoso (v.g., a
instrumento de acesso à realidade do crime, e que por criminalidade de white-collar, o racismo, a corrupção, o
isso colocavam necessariamente aporias insuperáveis belicismo) e crimes das classes mais desprotegidas.
dum ponto de vista gnosiológico. Este, que constitui o verdadeiro problema criminal da
sociedade capitalista, nem sempre é encarado com
A criminologia radical é, em grande parte, uma simpatia pelos criminólogos radicais. Na medida em
criminologia da criminologia, principalmente a que se traduz num ato individual de revolta, este crime
discussão e analise de dois temas: a definição do revela uma falta de consciência de classe e representa
objeto e do papel da investigação criminológica. um dispêndio gratuito de energias que importa
Nesse sentido, uma das principais demandas da canalizar para a revolução.
Criminologia radical, consequente da sua visão
marxista, é a da própria redescoberta do problema da A teoria crítica combateu diversos posicionamentos das
definição criminológica do que é um delito. outras teorias da criminalidade. Esse clima de
questionamento da criminologia da criminologia
A Criminologia radical recusa o estatuto profissional e propiciou o florescimento, alguns anos depois, de três
político da criminologia tradicional, considerada como tendências da Criminologia: o neorrealismo de
um operador tecnocrático a serviço do funcionamento esquerda, o direito penal mínimo e o abolicionismo
mais eficaz da ordem vigente. O criminólogo radical se criminal. O abolicionismo criminal não encontra grande
recusa a assumir esse papel de tecnocrata; desde logo aceitação na América Latina, e, em especial, no Brasil.
porque considera o problema criminal insolúvel numa Eventualmente encontramos defensores do Direito
sociedade capitalista; depois, e, sobretudo, porque a Penal Mínimo que recusam o rótulo de abolicionistas,
aceitação das tarefas tradicionais é em absoluto mas que agem como tais. O neorrealismo de esquerda
incompatível com as metas da criminologia radical. (e o seu respectivo movimento de law and order) e o
Como poderiam os criminólogos propor-se a auxiliar a direito penal mínimo são, talvez, duas das posições
defesa da sociedade contra o crime, se o seu propósito ideológicas de maior debate na atual Criminologia.
último é defender o Homem contra esse tipo de

Vitimologia, Vitimização e Vitimodogmática.

O Que é Vitimologia relações existentes entre vítima e agressor.

Vitimologia pode ser definida como o estudo científico A vitimologia é hoje um campo de estudo orientado
da extensão, natureza e causas da vitimização criminal, para a ação ou formulação de políticas públicas.
suas consequências para as pessoas envolvidas e as
reações àquela pela sociedade, em particular pela A vitimologia não deve ser definida em termos de direito
polícia e pelo sistema de justiça criminal, assim como penal, mas de direitos humanos. Assim, a vitimologia
pelos trabalhadores voluntários e colaboradores deveria ser o estudo das consequências dos abusos
profissionais. contra os direitos humanos, cometidos por cidadãos ou
agentes do governo.
A definição abrange tanto a vitimologia penal quanto a
geral ou vitimologia orientada para a assistência. As violações a direitos humanos são hoje consideradas
questão central na vitimologia.
O termo “vitimologia” foi utilizado por primeiro pelo
psiquiatra americano Frederick Wertham, mas ganhou A expressão “vítimas” significa pessoas que, individual
notoriedade com o trabalho de Hans von Hentig “The ou coletivamente, sofreram dano, incluindo lesão física
Criminal an his Victim”, de 1948. Hentig propôs uma ou mental, sofrimento emocional, perda econômica ou
abordagem dinâmica, interacionista, desafiando a restrição substancial dos seus direitos fundamentais,
concepção de vítima como ator passivo. Salientou que através de atos ou omissões que consistem em
poderia haver algumas características das vítimas que violação a normas penais, incluindo aquelas que
poderiam precipitar os fatos ou condutas delituosas. proscrevem abuso de poder.
Sobretudo, realçou a necessidade de analisar as
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Na Declaração da ONU, de 1985, "victims" are defined posição equivalente à de família.
in the broad sense as persons who, individually or
collectively, have suffered harm, including physical or Ao lado do conceito mais amplo de vítima, surgiu
mental injury, emotional suffering, economic loss or também o de vitimização, que examina tanto a
substantial impairment of their fundamental rights, propensão para ser vítima quanto os vários
through acts or omissions that are violations of national mecanismos de produção de danos diretos e indiretos
criminal laws or of internationally recognized norms sobre a vítima.
relating to human rights.”
Israel Charny entende que o processo de vitimização
As vítimas de atos ilícitos, especialmente de delitos, diz respeito a relações humanas, que podem ser
passaram por fases que, no dizer de Garcia-Pablos de compreendidas como relações de poder. Fattah (1979)
Molina, correspondem a um protagonismo, identificava no crime como que uma transação em que
neutralização, e redescobrimento. agressor e vítima desempenhavam papéis.

O protagonismo correspondeu ao período da vingança Assim, a identificação de vulnerabilidade e de


privada, em que os danos produzidos sobre uma definibilidade da vítima são essenciais no processo.
pessoa ou seus bens eram reparados ou punidos pela
própria pessoa. A vulnerabilidade da vítima decorre de diversos
fatores (de ordem física, psicológica, econômica e
As chamadas ciências criminais - Ciência do Direito outras), o que faz com que o risco de vitimização seja
Penal, Criminologia e Política Criminal, “abandonaram” diferencial, para cada pessoa e delito. Nesse sentido, o
a vítima, quando sua atenção volta-se para o infrator. exame dos recursos sociais efetivos da vítima também
deve ser levados em conta.
A resposta ao delito assume critérios vingativos e
punitivos, quase nunca reparatórios. Kurt Vonnegut Jr., com uma certa ironia, afirma que “Os
evangelhos ensinaram, de fato, o seguinte:” Antes de
A ideia de neutralização da vítima entende que a matar alguém, certifique-se de que ele não é bem
resposta ao crime deve ser imparcial, desapaixonada, relacionado.”
despersonalizando a rivalidade. O problema daí
decorrente é que a linguagem simbólica do direito e Os judeus mataram Cristo. Mais de 2.000 anos depois,
formalismo transformaram vítimas concretas em mais de um bilhão de pessoas diariamente escutam,
abstrações. em todas as partes do mundo, a narrativa de sua morte.
“Não sabíamos que era o Filho de Deus”, poderão
Observe-se, ainda, que a punição serviria como responder. Como, em Brasília, os garotos que
prevenção geral. Pouca preocupação havia com a brincaram de incendiários, e queimaram o índio Galdino
reparação. Pataxó disseram: “Não sabíamos que era um índio.
Pensávamos que fosse só um mendigo”.
O redescobrimento da vítima é um fenômeno do pós
2ª Guerra Mundial. É uma resposta ética e social ao Contribuições da vitimologia
fenômeno multitudinário da macrovitimização, que
atingiu especialmente judeus, ciganos, homossexuais, Os estudos de vitimologia têm dado imensa
e outros grupos vulneráveis. Esse redescobrimento não contribuição para a compreensão do fenômeno da
persegue nem retorno à vingança privada; nem quebra criminalidade, contribuindo para melhor enfrentamento,
das garantias para os delinquentes: a vítima quer a partir da introdução do enfoque sobre as vítimas
justiça. atingidas e os danos produzidos.

A vitimologia vem, efetivamente, conferir novo status à O primeiro aspecto observado por Garcia-Pablos diz
vítima, contribuindo para redefinir suas relações com o respeito à compreensão da dinâmica criminal, e da
delinquente; com o sistema jurídico; com autoridades, interação delinquente-vítima. Em que medida a vítima
etc. interfere para o desencadear da ação, ou sua
precipitação. Em que medida suas ações ou reações
A propósito, o próprio conceito de vítima precisou ser condicionam ou direcionam as ações dos agressores.
revisto, posto que já não corresponde apenas ao sujeito E em que delitos o papel da vítima é de menor
passivo (protagonista) do fato criminoso. Exemplo de importância.
modo amplo de compreender vítima é trazido por Sue
Moody, ao mencionar como o principal documento Análise sobre a vítima também se faz relevante para a
definidor de política pública para vítimas de delitos, na prevenção do delito. A introdução da chamada
Escócia, trata a questão: Vítima é qualquer pessoa que “prevenção vitimaria”, que se contrapõe à prevenção
tenha sido sujeita a qualquer tipo de crime, como criminal, realça a importância de se evitar que delitos
também sua família ou aqueles que gozam de uma aconteçam, a partir da reorientação às vítimas, e aos
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próprios órgãos do estado, para que adotem condutas subnotificação. Ou seja, os delitos praticados são em
e perspectivas distintas, que reduzam ou eliminem as número superior às ocorrências registradas. Por que se
situações de risco. A reflexão parte da constatação de subnotifica? Quem melhor pode responder é a vítima, e
que o crime é um fenômeno seletivo, e que atinge os o sistema não pode ser indiferente às suas percepções.
mais vulneráveis, no momento de maior
vulnerabilidade. Assim, a prevenção é dirigida aos Ora, a alienação em relação ao sistema diz tanto
grupos mais vulneráveis ou mais propensos à quanto a afirmação de notificar. O certo é que a vivência
vitimização. Além disso, essa prevenção vitimaria exige da vítima, e suas características e atitudes são
adoção de políticas públicas sociais, ensejando elementos e fatores relevantes para o adequado
intervenção não penal. Finalmente, corresponsabiliza funcionamento do sistema penal.
todos. O que é muito próprio, já que vivemos em uma
sociedade de risco. A relação existente entre crimes conhecidos ou
esclarecidos pela Polícia, ou processados, e o papel
Outro aspecto absolutamente relevante é que a vítima desempenhado pela vítima. Identificam que os crimes
é fonte de informações. conhecidos ordinariamente resultam de uma pro-
atividade da polícia, ou de uma reatividade. Na pro-
Com efeito, as pesquisas de vitimização fornecem atividade, a polícia seleciona suspeitos pelos
imensos subsídios a respeito de como os delitos estereótipos. Isso pode implicar em procedimentos
ocorrem, em que circunstâncias de tempo e lugar, e por discriminatórios por parte da polícia, desde que há
quais fatores desencadeantes. A partir da vítima, que é grupos antecipadamente considerados como mais
conhecida, e acessível de pronto, é possível identificar propensos à prática de delitos, e outros grupos imunes
relações existentes ou não com a pessoa do agressor, à suspeita, ou investigação.
e outros fatores relevantes.
Na reatividade, a denúncia da vítima desempenha
O medo do delito e o medo coletivo de ser a próxima papel vital. Mas eles advertem: nem toda vítima faz
vítima são também objeto do estudo da vitimologia. O desencadear investigações. Só as capazes de se
medo, percepção e sentimento individual, mas com justificarem como tais. Ou seja, não é toda vítima que
forte conteúdo de objetividade, ajuda a reconhecer a consegue fazer com que a polícia inicie uma
presença do risco, e orientar a conduta para minimizá- investigação. E é a polícia que define quem e o que
lo ou mitigar seus efeitos. Mas também o medo investigar.
aprisiona, e termina sendo, ele mesmo, fator de
vitimização. A sensação de insegurança coletiva, que As conclusões a que chegaram esses pesquisadores
enseja a adoção de políticas criminais fortemente apontam no sentido de que a polícia não investiga
repressoras, plenas de abusos de direitos, e destruição quando a vítima se opõe fortemente, nem quando o
de prerrogativas dos cidadãos, encontra aí sua raiz. investigado é muito poderoso.

Também o modo como a política criminal trata a vítima Por outro lado, o ministério público também constrói
é tema de relevo. O modo tradicional tenta, quando o seu perfil de vítima ideal.
faz, uma ressocialização do delinquente. Mas
raramente se percebe que também a vítima precisa se Esta deve ser aquela que pode ser uma boa
encontrar, e ser reintroduzida ao convívio social. Não testemunha.
sendo percebida, torna-se esquecida em todas as fases
das políticas criminais. A chave para sua inclusão está Finalmente, os estudos de vitimologia ajudam a melhor
no respeito a seus direitos, para evitar vitimização compreender a interação existente entre a vítima e
secundária. Esta termina acontecendo quando se tem justiça penal. O modelo clássico, com efeito, tem a
a lesão e sua não reparação; o crime e sua impunidade; vítima como objeto, ou pretexto, para a investigação.
a vitimização e a ausência de investigação, de Mas ordinariamente não leva em conta seus interesses
processo e de condenação. Uma tendência que tem legítimos. Isso fez com que fossem identificados fatores
sido observada é a introdução de programas de que pudessem contribuir para mensurar a qualidade de
assistência à vítima, que incluem assistência strictu uma justiça criminal. Entre esses, são examinados
sensu, reparação pelo infrator, programas de como se concebe o fato delitivo e o papel dos
compensação, e programas especiais de assistência, protagonistas; como ou se se satisfaz a expectativa dos
quando a vítima for declarante. protagonistas; qual o custo social; qual a atitude dos
usuários da justiça.
Talvez as maiores contribuições estejam sendo dadas
a partir das reflexões sobre as relações existentes entre O Conselho de Ministros da União Europeia publicou
a vítima e sistema legal, e a vítima e a justiça penal. uma Decisão Referencial sobre a Presença das Vítimas
nos Procedimentos Criminais. Como padrão mínimo é
O sistema legal costuma realizar perseguição aos incluído o dever de informação sobre tipos de apoio
delitos noticiados. Estudos revelam que há disponíveis para a vítima; onde e como comunicar a
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queixa; os procedimentos criminais e o papel da vítima; irresponsavelmente joga a culpa ao acusado,
acesso a proteção e aconselhamento; elegibilidade recorrendo a qualquer manobra com a intenção de
para compensação; resultado do julgamento e da fazer justiça num erro.
sentença.
Meldelsohn conclui que as vítimas podem ser
Uma boa comunicação com a vítima é exigida em todas classificadas em 3 grandes grupos para efeitos de
as fases do processo criminal. aplicação da pena ao infrator:

Tipologia das Vítimas 1 – Primeiro grupo: vítima inocente: não há


provocação nem outra forma de participação no delito,
Classificações de Benjamín Mendelsohn (Tiplogias, Centro mas sim puramente vitimal.
de Difusion de la Victímologia, 2002). 2 – Segundo grupo: estas vítimas colaboraram na
ação nociva e existe uma culpabilidade reciproca, pela
O vitimólogo israelita fundamenta sua classificação na qual a pena deve ser menor para o agente do delito
correlação da culpabilidade entre a vítima e o infrator. (vítima provocadora)
É o único que chega a relacionar a pena com a atitude 3 – Terceiro grupo: nestes casos são as vítimas as
vitimal. Sustenta que há uma relação inversa entre a que cometem por si a ação nociva e o não culpado deve
culpabilidade do agressor e a do ofendido, a maior ser excluído de toda pena.
culpabilidade de uma é menor que a culpabilidade do
outro. Vitimologia, vitimização e
Vitimodogmática.
1 – Vítima completamente inocente ou vítima ideal: é a
vítima inconsciente que se colocaria em 0% absoluto Como aponta Edmundo de Oliveira, "Iter Victimae é o
da escala de Mendelsohn. É a que nada fez ou nada caminho, interno e externo, que segue um indivíduo
provocou para desencadear a situação criminal, pela para se converter em vítima, o conjunto de etapas que
qual se vê danificada. Ex. incêndio se operam cronologicamente no desenvolvimento de
vitimização (Vitimologia e direito penal, p.103-4)".
2 – Vítima de culpabilidade menor ou vítima por
ignorância: neste caso se dá um certo impulso Fases do Iter Victimae, segundo a esquematização
involuntário ao delito. O sujeito por certo grau de culpa elaborada pelo próprio Edmundo de Oliveira em sua
ou por meio de um ato pouco reflexivo causa sua obra Vitimologia e o Direito Penal – O crime precipitado
própria vitimização. Ex. Mulher que provoca um aborto pela vítima, 2001, p. 101, in verbis:
por meios impróprios pagando com sua vida, sua
ignorância. Intuição (intuito) - A primeira fase do Iter Victimae é a
intuição, quando se planta na mente da vítima a ideia
3 – Vítima tão culpável como o infrator ou vítima de ser prejudicado, hostilizada ou imolada por um
voluntária: aquelas que cometem suicídio jogando com ofensor.
a sorte. Ex. roleta russa, suicídio por adesão vítima que
sofre de enfermidade incurável e que pede que a Atos preparatórios (conatus remotus) - Depois de
matem, não podendo mais suportar a dor (eutanásia) a projetar mentalmente a expectativa de ser vítima, passa
companheira (o) que pactua um suicídio; os amantes o indivíduo à fase dos atos preparatórios (conatus
desesperados; o esposo que mata a mulher doente e remotus), momento em que desvela a preocupação de
se suicida. tornar as medidas preliminares para defender-se ou
ajustar o seu comportamento, de modo consensual ou
4 – Vítima mais culpável que o infrator. com resignação, às deliberações de dano ou perigo
Vítima provocadora: aquela que por sua própria articulados pelo ofensor.
conduta incita o infrator a cometer a infração. Tal
incitação cria e favorece a explosão prévia à descarga Início da execução (conatus proximus) -
que significa o crime. Posteriormente, vem a fase do início da execução
Vítima por imprudência: é a que determina o acidente (conatus proximus), oportunidade em que a vítima
por falta de cuidados. Ex. quem deixa o automóvel mal começa a operacionalização de sua defesa,
fechado ou com as chaves no contato. aproveitando a chance que dispõe para exercitá-la, ou
direcionar seu comportamento para cooperar, apoiar ou
5 – Vítima mais culpável ou unicamente culpável. facilitar a ação ou omissão aspirada pelo ofensor.
Vítima infratora: cometendo uma infração o agressor
cai vítima exclusivamente culpável ou ideal, se trata do Execução (executio) - Em seguida, ocorre a autêntica
caso de legitima defesa, em que o acusado deve ser execução distinguindo-se pela definitiva resistência da
absolvido. vítima para então evitar, a todo custo, que seja atingida
Vítima simuladora: o acusador que premedita e pelo resultado pretendido por seu agressor, ou então se

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deixar por ele vitimizar. Penal, justifica assim, a preocupação com a vítima:
“Fez-se referência expressa ao comportamento da
Consumação (consummatio) ou tentativa (crime falho vítima, erigido, muitas vezes, em fator criminógeno, por
ou conatus proximus) - Finalmente, após a execução, constituir-se em provocação ou estímulo à conduta
aparece a consumação mediante o advento do efeito criminosa, como, em outras modalidades, o pouco
perseguido pelo autor, com ou sem a adesão da vítima. recato da vítima nos crimes contra os costumes’’
Contatando-se a repulsa da vítima durante a execução,
aí pode se dar a tentativa de crime, quando a prática do O art. 59, caput do CP e a aplicação da pena.
fato demonstrar que o autor não alcançou seu propósito
(finis operantis) em virtude de algum impedimento Diante do que discorre o artigo 59, caput, então passou
alheio à sua vontade. (Edmundo de Oliveira. Vitimologia e dreito a ser dever do magistrado na dosimetria da pena,
penal. 2001, p. 105) analisar o comportamento da vítima (antes e depois do
delito) como circunstância judicial na individualização
Perigosidade Vitimal da pena imposta ao acusado.

No importante estudo sobre o comportamento da As circunstâncias judiciais são muito importantes, pois
vítima, é relevante discorrermos brevemente sobre a é através delas que o juiz fixa a (pena base), obedecido
perigosidade vitimal, que é a etapa inicial da o disposto no art. 59; considera-se em seguida as
vitimização. Perigosidade vitimal é um estado psíquico circunstâncias atenuantes e agravantes (pena
e comportamental em que a vítima se coloca provisória); incorpora-se ao cálculo, e finalmente as
estimulando a sua vitimização, ex., a mulher que usa causas de diminuição e aumento (pena definitiva).
roupas provocantes, estimulando a libido do estuprador
no crime de estupro (Lúcio Ronaldo Pereira Ribeiro. Vitimologia, Nesse sentido, Celso Delmanto, explana: "O
2000, p. 36.) comportamento do ofendido deve ser apreciado de
modo amplo no contexto da censurabilidade do autor
A compreensão do conceito de "Perigosidade Vitimal’’é do crime, não só diminuindo, mas também a
de suma importância para o entendimento dos aumentando, eventualmente. Não deve ser igual a
próximos textos, pois estaremos discorrendo dentre censura que recai sobre quem rouba as fulgurantes
outras, da vítima provocadora e de casos de joias que uma senhora ostenta e a responsabilidade de
vitimização com o consentimento da vítima. quem subtrai donativos, por exemplo, do Exército da
Salvação’’(Código Penal Comentado, 2000, p. 104).
Vitimodogmática
O consentimento da vítima (ofendido).
O Artigo 59, Caput do Código Penal
Brasileiro Um fato importantíssimo que deve ser investigado, é no
tocante ao consentimento do ofendido (vítima).
No nosso ordenamento jurídico temos alguns Dependendo do comportamento do ofendido, a conduta
dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que do sujeito ativo pode resultar em atípica e antijurídica.
falam sobre a vítima, como o Art. 59, 61, II, c, in fine; Uma situação importante de consentimento da vítima,
65, III, c, do Código Penal e art. 245 da Constituição e que deve ser analisada pelo magistrado é que, nos
Federal de 1988. Mas, o nosso estudo se concentra na delitos sexuais, não é raro a contribuição, consciente
principal mudança e preocupação concernente à vítima ou inconsciente da vítima nesses tipos de delitos
no Brasil, que ocorreu no ano de 1984 com a reforma (atentado violento ao pudor e estupro).
do Código Penal, o artigo 59, caput.
José Eulálio Figueiredo de Almeida, comenta: "O
Tal mudança ocorreu com o advento da Lei 7.209, DE consentimento ou aquiescência da ofendida, insista-se,
11 DE JULHO DE 1984, da Nova Parte Geral do Código obtém nota de relevo nos crimes sexuais, desde que
Penal, assim passando a vigorar no Capítulo III – DA não tenha sido viciado, porque permite ao Juiz, diante
APLICAÇÃO DA PENA, o artigo 59, caput com a da confirmação de tal circunstância, declarar a
seguinte redação: atipicidade da conduta do acusado ou a sua
antijuridicidade. (...) Se, por outro lado, esse
Art. 59. "O juiz, atendendo à culpabilidade, aos consentimento é evidente exclui-se não apenas a
antecedentes, à conduta social, à personalidade do ilicitude, mas a tipicidade da conduta, isto é, não há
agente, aos motivos, às circunstâncias e delito a punir - nullum crimen sine culpa" (José Eulálio
consequências do crime, bem como o comportamento Figueiredo de Almeida. Sedução - Instituto lendário do código penal,
2002)
da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime".
E a "vítima’’, deve ser punida?
A Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código
Como já apontado anteriormente, seja através das
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tipologias, seja através dos casos estudados com privacidade; proteção contra agressor; informação
consentimento da vítima, pudemos constatar que sobre a tramitação processual, e garantia de presença
existem vítimas provocadoras, que atraem para si uma em corte; acesso ao acusador público; restituição das
determinada situação ou desencadeiam algum coisas indevidamente tomadas ou apreendidas;
processo para que se torne vítima de algo ou alguém, informação sobre a condenação, a sentença, a prisão e
o chamado processo de vitimização. a libertação do agressor.

Oportuno que sejam transcritas algumas ementas, para A Declaração sobre os princípios fundamentais de
assim, demonstrar como a jurisprudência vem se justiça para as vítimas de delitos e do abuso de poder,
pronunciando a respeito de um tem tão relevante. da ONU, deram a direção que foi seguida pela norma
americana: garantia de ACESSO A JUSTIÇA E
EMENTA - Nº 17876 - ESTUPRO – Não caracterização TRATAMENTO JUSTO; tratamento com compaixão e
– Nos crimes sexuais, a palavra da vítima, para gozar respeito; Informação sobre seu papel e alcance;
da presunção de veracidade necessita ser verossímil, assistência apropriada (legal, medica, psicológica);
coerente e escudada no bom comportamento anterior – ressarcimento dos danos; informação sobre a
No caso o comportamento da vítima deixa muita a tramitação processual.
desejar – Absolvição decretada. (Relator: Celso
Limongi – Apelação Criminal 100.223-3 – Candido Mota Direitos Humanos e Vitimologia
– 23.01.91)
Direitos Humanos e vitimologia resultam de um novo
EMENTA - Nº 28859 - ATENTADO VIOLENTO AO olhar sobre as vítimas, como consequência dos
PUDOR – Não caracterização – Ausência de violência horrores da 2a Guerra e do nazi-fascismo. Não é obra
física – Atos praticados com consentimento da vítima – do acaso o fato de o primeiro instrumento vinculante,
Versões apresentadas por esta, que se mostram em promulgado no âmbito da ONU, ter sido a Convenção
contradições – Réu de porte físico menor que o da contra o Genocídio, em 9 de dezembro de 1948, um dia
ofendida, e que não se apresentava armado – antes da promulgação da Declaração Universal de
Comportamentos dos quais não se extrai violência Direitos Humanos.
reação – Absolvição decretada – Recurso provido. Para
que se configure o delito do artigo 224 do CP a A vitimologia é uma espécie de “filha” da Criminologia,
oposição ao ato libidinoso deve ser sincera e positiva, ou parte dela. Integra com esta última os pilares das
manifestando-se por inequívoca resistência, não ciências criminais (ciência do direito penal, criminologia
bastando recusa meramente verbal ou oposição e política criminal). Analisa o sistema de justiça e
passiva e inerte, apenas simbólica. (Ap. Criminal n. segurança. O seu objeto de estudo faz parte (estando
182.101-3 – São Paulo – 2º Câmara Criminal Férias contido) no âmbito de atuação dos direitos humanos. O
Julho/95 – Relator: Prado de Toledo – 12.07.95 – V.U.). âmbito dos direitos humanos é mais amplo. Abrange os
direitos civis e políticos (como vida, liberdade,
EMENTA – Nº 71022 - ESTUPRO – Presunção de integridade física e mental, julgamento justo,
violência – Vítima de mau comportamento menos de 14 propriedade, etc.), mas também acrescenta os direitos
anos – Relações sexuais mantidas anteriormente com econômicos, sociais e culturais, conhecidos como
outros homens – Circunstâncias que elide presunção, DESCs. Assim, vítimas de fome, despejos forçados e
de caráter relativo – Absolvição - Inteligência dos arts. coletivos, desemprego, discriminação, doenças, etc.,
213 e 224, "a", do CP (Ement) RT 557/322. são sujeitos de direitos no direito internacional dos
direitos humanos. O olhar solidário as enxerga, e as
No tocante aos crimes sexuais, a participação ou traz para protagonizarem as lutas em defesa do
consentimento da vítima, é algo muito mais sério do que reconhecimento e respeito de seus direitos.
imaginamos, pois mostramos anteriormente com
algumas ementas que há casos de absolvição em Quanto ao modo de atuar, a interdisciplinaridade
processos que envolvam conjunção carnal, sedução, caracteriza tanto a criminologia e a vitimologia quanto
atentado violento ao pudor, estupro, etc. os estudos de direitos humanos.

Direitos das vítimas No Brasil, o município de São Paulo editou, em 2001,


Lei de Assistência às vítimas de Violência. A norma, por
Basicamente os direitos das vítimas consistem em sua importância seminal, segue transcrita na íntegra,
tratamento justo e respeito à sua dignidade e

Lei nº 13.198, 30 de outubro de 2001


Dispõe sobre a assistência às vítimas de violência e dá
outras providências. MARTA SUPLICY, Prefeita do Município de São Paulo,

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no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, no artigo 1º desta lei, consistirá em:
faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 10 de I - garantia de assistência médica e psicológica integral,
outubro de 2001, decretou e eu promulgo a seguinte lei: de forma exclusiva ou subsidiária, durante todo o tempo
necessário à reabilitação das vítimas;
Art. 1º - O Município, por intermédio de seus órgãos da II - atendimento prioritário pelos programas sociais e
administração direta ou indireta, prestará assistência às assistenciais oferecidos pelo Município;
vítimas de violência. III - orientação e assessoria técnica para a proposição
e acompanhamento de ações visando o ressarcimento
Art. 2º - Para efeitos desta lei, é considerada vítima de dos danos causados pela violência.
violência a pessoa que tenha sofrido lesão de natureza
física ou psíquica em consequência de ações ou Art. 4º - O Poder Executivo regulamentará a presente
omissões tipificadas como crime na legislação penal lei no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da data de
vigente. sua publicação.
Parágrafo único - Nos crimes de homicídio, são
equiparadas às vítimas de violência, para efeito de Art. 5º - As despesas com a execução desta lei
concessão dos benefícios previstos nesta lei: correrão por conta de dotações orçamentárias próprias,
I – o (a) cônjuge, companheiro ou companheira suplementadas, se necessário.
sobrevivente;
II - os filhos e filhas da vítima; Art. 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua
III - ascendentes e descendentes em linha reta ou publicação, revogadas as disposições em contrário.
colaterais, até o terceiro grau, desde que comprovem
relação de dependência econômica com a vítima. PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 30 de outubro
de 2001
Art. 3º - A assistência às vítimas de violência, prevista

Decreto nº 43.667, de 26 de agosto de 2003


Regulamenta a Lei nº 13.198, de 30 de outubro de de Educação, bem como das Coordenadorias
2001, que dispõe sobre a assistência às vítimas de Especiais da Mulher e dos Assuntos da População
violência e dá outras providências. Negra, visando ao desenvolvimento de ações e à
implantação e manutenção de um sistema de
MARTA SUPLICY, Prefeita do Município de São Paulo, informações relativas ao atendimento às vítimas de
no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, violência.
§ 1º. A coordenação do Comitê Gestor caberá à
D E C R E T A: Secretaria Municipal de Assistência Social.
§ 2º. O Comitê Gestor contará com o apoio de uma
Art. 1º. A Lei nº 13.198, de 30 de outubro de 2001, que Comissão Consultiva, constituída por representantes
dispõe sobre a assistência às vítimas de violência, fica de organizações não-governamentais e universidades,
regulamentada na conformidade das disposições deste cuja composição e atribuições serão definidas por
decreto. portaria da Secretaria Municipal de Assistência Social.

Art. 2º. Caberá às Secretarias Municipais, no âmbito Art. 4º. A Secretaria Municipal de Assistência Social
das respectivas competências, articular ações voltadas será o órgão local de referência para o atendimento de
à prevenção, ao atendimento e à redução dos casos de que trata este decreto, centralizando, por intermédio do
violência, priorizando aqueles motivados pelo gênero Comitê Gestor, as informações referentes aos casos
ou praticados contra crianças e adolescentes. atendidos de vítimas de violência, devendo tais dados
Parágrafo único. Os casos de violência cometidos apontar, obrigatoriamente, o número de casos
contra crianças ou adolescentes serão comunicados assistidos e o respectivo tipo de violência, relacionados
pelas Secretarias Municipais que deles tiverem por Subprefeitura e distrito de ocorrência, na forma
conhecimento ao Conselho Tutelar do domicílio dos prevista em portaria.
respectivos pais ou responsáveis ou, na sua ausência, § 1º. Na disponibilização dos dados mencionados no
do lugar onde se encontre a vítima, nos termos do "caput" deste artigo, deverá ser mantido sigilo quanto à
disposto nos artigos 138 e 147 da Lei Federal nº 8.069, identidade das vítimas, a fim de garantir sua
de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do privacidade e segurança, podendo ser efetivada
Adolescente). mediante solicitação, por escrito, de indivíduos
devidamente identificados, nos seguintes casos:
Art. 3º. Fica instituído o Comitê Gestor, composto por I - a pedido da vítima;
representantes das Secretarias Municipais de II - por requisição de autoridades policiais, judiciárias e
Assistência Social, da Saúde, de Segurança Urbana e do Ministério Público;

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III - para pesquisas científicas, cujo Protocolo de de forma exclusiva ou subsidiária, durante todo o tempo
Pesquisa esteja devidamente aprovado pelo Comitê de necessário à reabilitação das vítimas;
Ética em Pesquisa - CEP que referenda a investigação, II - encaminhar as vítimas de violência e seus
conforme disposto nas Diretrizes e Normas familiares, se for o caso, às Secretarias competentes,
Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres para a inserção em programas e serviços de
Humanos, vigentes no território nacional, sob a assistência social existentes, nos quais poderão ter
condição de que, em nenhuma hipótese, serão prioridade de atendimento, sempre que possível;
divulgados dados que possibilitem a identificação das III - encaminhar as vítimas de violência aos núcleos
vítimas. pertencentes à Secretaria Municipal de Assistência
§ 2º. O Comitê Gestor emitirá relatórios trimestrais Social ou à rede conveniada local de atendimento, para
relativos às informações referidas no "caput" deste orientação e prestação dos serviços previstos no § 1º
artigo, omitindo todos os dados que permitam a do artigo 5º deste decreto.
identificação das pessoas atendidas. Parágrafo único. O encaminhamento das vítimas de
violência pelos serviços de saúde pública da rede
Art. 5º. Compete à Secretaria Municipal de Assistência municipal será feito pelo profissional de saúde que
Social: realizou o atendimento inicial ou pelo profissional de
I - expandir os núcleos de atendimento regionalizados, assistência social lotado na unidade.
preferencialmente nas Subprefeituras e sempre em seu
território de abrangência, compostos por profissionais Art. 7º. A Secretaria Municipal de Segurança Urbana -
das áreas de saúde e por assessoria técnica gratuita, SMSU utilizará as informações e dados estatísticos
para o atendimento integral às vítimas de vidência do relativos a vítimas de violência no Município de São
Município de São Paulo; Paulo, enviados pela Secretaria Municipal de
II - identificar, no âmbito de suas ações, os casos que Assistência Social, na elaboração de políticas
apresentam características vitimárias, inserindo-os vinculadas a suas competências.
prioritariamente nos serviços e programas existentes e
encaminhando-os aos demais serviços de apoio a Art. 8º. As Subprefeituras e as Secretarias Municipais
cargo de outros órgãos; que prestam atendimento direto à população
III - garantir a capacitação profissional contínua e a capacitarão seus servidores, a fim de identificarem,
supervisão técnica às equipes multiprofissionais de dentre os usuários de seus serviços, aqueles expostos
atendimento às vítimas de violência. a situações de violência, de modo a orientá-los a
§ 1º. Os núcleos de atendimento mencionados no inciso recorrerem ao atendimento adequado.
I do "caput" deste artigo prestarão serviços de
acolhimento, atendimento, triagem para adequação Art. 9º. Os programas e serviços de assistência às
dos casos a serem atendidos aos serviços e programas vítimas de violência serão instalados primeiramente em
existentes no âmbito municipal, educação para os áreas da Cidade de São Paulo com registro de maiores
direitos humanos e assessoria técnica gratuita, que índices de violência.
possibilite a propositura e o acompanhamento de ações
visando ao ressarcimento de danos materiais e morais Art. 10. As despesas com a execução deste decreto
causados pela violência. correrão por conta das dotações orçamentárias
§ 2º. O Executivo Municipal poderá firmar convênios próprias, suplementadas se necessário.
com universidades e organizações da sociedade civil
para a efetivação das medidas e finalidades previstas Art. 11. Este decreto entrará em vigor na data de sua
neste artigo. publicação.

Art. 6º. Compete à Secretaria Municipal da Saúde - PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 26 de agosto
de 2003, 450º da fundação de São
SMS:
Paulo.
I - oferecer atendimento médico e psicológico integral,

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Criminalidade de Massa, Moderna e Organizada.

Diuturnamente, a criminalidade de massa afeta a vida desembocam na existência de uma criminalidade


do cidadão comum, através de inúmeras infrações considerada como “organizada” e, de outro lado, a
perpetradas por criminosos que, não necessariamente, chamada “criminalidade de massa”.
possuem vínculos organizacionais com facções ou
associações criminosas. A criminalidade de massa projeta a ideia de infrações
penais impulsionadas, na maioria dos casos, por
A criminalidade de massa é identificável dentre os circunstâncias de oportunidade. As sensações
crimes definidos há muito na construção do direito populares de desproteção e debilidade dos
penal moderno, tendo em vista que se trata de um mecanismos estatais de coerção, advindas pela prática
fenômeno criminal caracterizado pela lesão a bens de crimes violentos, com vítimas reais ou potenciais,
jurídicos bem definidos, como a vida, a integridade que assolam a todos de forma diária, são próprias da
física e patrimônio (DINIZ, 2017, p. 185). Em que pese, criminalidade de massa. Hassemer (2007, p. 142) aduz
como dito, o conceito de criminalidade de massa ser que o sentimento de insegurança da população e o
facilmente apreensível, ele possui especificidades que crescente medo são influenciados mais pela
precisam ser trabalhadas. criminalidade de massa e muito menos pela
criminalidade organizada, que representa mais obscuro
Guinote (apud DINIZ, 2017, p. 185/186) menciona que e a qual quase não tangencia a experiência cotidiana.
“[...] inclui todos os tipos de crimes que são cometidos Já a criminalidade organizada possui característica
frequentemente e em que as vítimas são facilmente eminentemente difusa, sem vítimas individuais, ou seja,
identificáveis”. Outrossim, o autor complementa que a o dano não é restrito a uma ou mais pessoa,
criminalidade de massa abrange a pequena alcançando a sociedade como um todo.
criminalidade (furto, dano, roubo, difamação,
homicídios, injúria, tráfico de drogas etc.), crimes estes Fernando Shimidt de Paula (2009, p. 219) narra que
que apresentam elevados índices criminais. Ao longe se encontra o tempo em que a concepção
contrário da criminalidade organizada, aqui a vítima é humana de crime foi cingida ao mero desatendimento
de fácil identificação, porém, o crime de massa afeta aos preceitos sancionadores dos códigos penais
mais que somente o indivíduo vítima, “[...] repressivos. Para ele, afora as benesses do mundo
exponenciando majoritariamente o índice de moderno, o desenvolvimento trouxe consigo a evolução
insegurança subjetiva”. da má vida, organizada, de face empresarial e muito
mais perniciosa à sociedade.
Nesta toada, Edilson Mongenot Bonfim (apud
MORAES, 2008, p. 53): Como bem destaca Paulo Fayet (apud CABETTE; NAHUR,
2014, p. 111), o conceito de crime organizado parece
A criminalidade de massa atinge a todos, enquanto a claro, mas necessita de uma definição resoluta no
criminalidade organizada costuma ter endereço fixo. campo jurídico, evitando qualquer obscuridade:
Uma desserve a todos diretamente, outra pode atingir
igualmente a todos, mas indiretamente. Uma é clara e [...] a criminalidade organizada, fenômeno que,
induvidosa, antiga e identificável, mas até então, aparentemente, se apresenta de fácil compreensão,
insanável. Outra é mais moderna e mais modista, por pelos exemplos que são (diariamente!) divulgados e
vezes sombria e sem identificação, mas que está na debatidos pela imprensa de todo o mundo, mas que, na
pauta de todas as discussões sobre criminalidade no prática jurídica e nos bancos legislativos, se apresenta
exterior, buscando lhe eficazmente uma solução. de uma forma complexa e de difícil conceituação.

É fundamental que não se confunda os conceitos de Longa (e tormentosa) foi a cronologia legislativa e
criminalidade de massa e organizada, na visão de doutrinária de construção de um consenso em torno de
Hassemer (2007, p. 140) há clara distinção entre estas um conceito jurídico brasileiro de criminalidade
modalidades de criminalidade. organizada. Contudo, com a edição da Lei Federal n.º
12.850/2013, esta incômoda lacuna do ordenamento
Criminalidade organizada e criminalidade de jurídico-penal pátrio foi superada, que era a falta de
massa. uma definição juridicamente segura.

Os estudos criminológicos do fenômeno criminal na De acordo com os requisitos insculpidos no artigo 1º, §
sociedade apontam diferenças substanciais e 1º da referida legislação, para a subsunção típica de
organizacionais entre as espécies delitivas que organização criminosa, é necessário a associação de

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quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e constituem um novo fenômeno que afeta, direta e
caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que intensamente, a economia no âmbito internacional e
informalmente, com objetivo de obter, direta ou nacional, além das dimensões políticas das sociedades
indiretamente, vantagem de qualquer natureza, em geral.
mediante a prática de infrações penais cujas penas
máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam Não obstante nossas breves ponderações sobre a
de caráter transnacional (BRASIL, 2013). criminalidade dita “organizada”, feitas para melhor
entendimento do leitor, na tentativa de viabilizar uma
Portanto, ponderando o conceito jurídico brasileiro de visão um pouco mais ampla do enfoque criminal, o foco
organização criminosa, para fins de aplicação da Lei deste trabalho, como dito, será na criminalidade de
Federal n.º 12830/2013, percebemos a presença de massa. Por essa razão, passa-se a pormenorizar esta
elementos característicos deste tipo de criminalidade, outra classificação e sua relação com o tema deste
quais sejam: associação de pessoas; divisão de texto.
tarefas; objetivo econômico; prática de infrações
consideradas graves. Essas características estão Criminalidade Moderna
presentes na maioria dos conceitos existentes de
organização criminosas. A criminalidade adota formas definidas, sendo duas as
principais: a macro-criminalidade e a micro-
Guaracy Mingardi (apud ANSELMO, 2017), ao tratar do criminalidade. A macro-criminalidade ou criminalidade
tema, aponta as seguintes características: previsão de mediata pode ser subdividida em: a) criminalidade
lucro, hierarquia, divisão de trabalho, ligação com organizada, com marcante presença no tráfico de
órgãos estatais, planejamento das atividades e drogas, lavagem de dinheiro, prostituição, tráfico de
delimitação de área de atuação. pessoas e terrorismo; b) criminalidade supostamente
organizada, constituída pelos crimes contra o meio
Alberto da Silva Franco (apud ANSELMO, 2017), por sua ambiente, os crimes financeiros, a corrupção, a fraude
vez, indica os seguintes atributos: caráter fiscal, os crimes eleitorais; e, c) criminalidade
transnacional; proveito de deficiências do sistema globalizada, da qual fazem parte os novos crimes
penal, a partir de sua estruturação organizacional e de telemáticos (invasão "remota" de bancos de dados), os
sua estratégia de atuação global; atuação resulta em informáticos (delitos comuns via internet) e os
dano social acentuado; realiza várias infrações, com telefônicos (extorsão, estelionato, interceptação ilegal e
vitimização difusa ou não; aparelhado com clonagem de aparelhos).
instrumentos tecnológicos modernos; conexão com
outros grupos criminosos, organizados ou não; mantém A micro-criminalidade ou criminalidade imediata, a seu
ligações com pessoas que ocupam cargos oficiais, na turno, é constituída pela criminalidade cotidiana, ou
vida social, econômica e política; utiliza-se de atos de seja, pelos delitos considerados comuns, dentre eles:
violência; e beneficia-se da inércia ou fragilidade de os hediondos e raciais, os de menor potencial ofensivo,
órgãos estatais. os crimes de bagatela e as contravenções penais.

Eugenio Raúl Zaffaroni (1996, p. 53), na obra “Crime A identificação das formas de criminalidade é
Organizado: uma categoria frustrada”, deslinda críticas caracterizada como exercício básico para o
às conceituações em torno do que caracterizaria a desenvolvimento de uma estratégia de ataque voltada
criminalidade organizada, estabelecendo seu ponto de à sua minimização. Muitos já se prontificaram a
vista no seguinte sentido: esclarecer a sua natureza, no entanto, ninguém
conseguiu definí-la com exatidão, sendo ainda pouco
[...] o crime organizado seria o conjunto de atividades conhecida as suas origens.
ilícitas que operam no mercado, disciplinando-o quando
as atividades legais ou o estado não o fazem. Em No que pese a criminalidade moderna possuir
termos mais preciosos, sua função econômica seria a identidade multifacetária e poder ser examinada em
de abranger as áreas de capitalismo selvagem que perspectivas e profundidades diversas, pode-se
carecem de um mercado disciplinado. verificar certos traços que guardam relativa
correspondência entre suas várias manifestações,
Eduardo Luiz dos Santos Cabette e Marcius Tadeu inclusive por seus atos simbólicos e
Maciel Nahur (2014, p. 57) assinalam que a prática de desconcertantemente reproduzidos mesmo diante de
crimes remonta aos primórdios da humanidade, porém, diferenças e distâncias temporais, espaciais, regimes
em relação às peculiaridades da criminalidade políticos e conformações sociais.
organizada, fazem ressalva no seguinte sentido:
Tal constatação pode ser útil para sugerir a adoção
[...] o crime global, a formação de redes entre e/ou adaptação de mecanismos estatais de combate
poderosas organizações criminosas e seus tentáculos, que obtiveram resultados positivos em casos
com atividades compartilhadas em todo mundo assemelhados, mesmo que em contexto social diverso
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e em épocas distantes, no que pese respostas estratégico e adoção de medidas mais eficazes e
definitivas continuarem inconclusivas. Estudar a macro- seletivas para o combate às grandes organizações
criminalidade através do estudo comparativo de criminosas.
cenários torna-se, pois, favorável ao planejamento

Nova Criminologia.

A Criminologia Crítica, também chamada de Nova processos de incriminação legal e de criminalização


Criminologia, se dirige, principalmente, para a pelos instrumentos coibitórios.
universalidade do delito. Ela oferece uma nova
legitimação de um sistema penal atualizado, dentro de Por ser um posicionamento ideológico diversificado,
uma sociedade capitalista. este estudo se difere das demais criminologias pela
especialidade do seu objeto (o crime e seu controle),
Ela teve seu surgimento amparado em uma construção por suas teorias, e também por sua política criminal
materialista de Karl Marx, ou seja, uma teoria alternativa.
econômico-política do desvio, dos comportamentos
socialmente negativos e da criminalização. Portanto, É nesse sentido que o método crítico analisa o crime e
estuda a criminalidade como criminalização, explicada o controle sob o prisma da base material do capitalismo,
por processos seletivos de construção social do argumentando que a disparidade econômica que
comportamento criminoso e de sujeitos criminalizados, assola uma sociedade seria o fator basilar do
como forma de garantir as desigualdades sociais entre comportamento desviante.
riqueza e poder, das sociedades contemporâneas.
Nesse sentido Juarez CIRINO DOS SANTOS (2008, p.
A Criminologia Crítica tem seu marco imediato no 132) arremata:
movimento estudantil de 1968, face a revolta
universitária aos interesses e preconceitos do "São tarefas complementares da política criminal
neocapitalismo. Houve importantes trabalhos acerca da alternativa da Criminologia Radical (a) conjugar os
conduta desviada e do controle social realizados por movimentos de presos com as lutas dos trabalhadores,
Nagel, Taylor, Walton e Yong, desenvolvendo-se, a (b) inverter a direção ideológica dos processos de
partir daí, estudos científicos de cunho político-culturais formação da opinião pública pela intensificação da
levando ao extremo as indicações metodológicas dos produção científica radical e a difusão de informações
teóricos da reação social e do conflito, e do paradigma sobre a ideologia do controle social, (c) coordenar as
etiológico, dando lugar à rica discussão acerca do lutas contra o uso capitalista do Estado e a organização
processo de criminalização e sobre a legitimação e capitalista do trabalho e (d) desenvolver o contra poder
funcionamento do Sistema Penal. proletário."

Para os críticos da criminologia “o homem é Não obstante, a criminologia dialética com seu
socialmente variável, malgrado sua individualidade”. argumento polêmico, questiona o fenômeno criminal
pelas condições estruturais da desigualdade material e
Nesse sentido, o núcleo principal da Criminologia crítica a exploração de classes, questionamento este que tem
ou dialética é a supressão da desigualdade social, por arrimo o pensamento marxista.
defendendo a tese de que a solução para a
problemática do crime depende da abolição da Defendem ainda, que a criminalidade não será
exploração econômica e da arbitrariedade política equacionada enquanto não houver alterações na
sobre as classes dominadas. sociedade capitalista.

Este ramo da Criminologia propõe uma alternativa ao Contestaram ainda vários posicionamentos de outras
controle social da sociedade capitalista, com teorias criminológicas, o que ocasionou o surgimento
fundamento na separação das estruturas da de outras inclinações da criminologia, quais sejam:
criminalidade que corresponde à classe dominante neorrealismo de esquerda (marxista), o direito penal
versus classe dominada, proveniente da acumulação mínimo (ultima ratio) e o abolicionismo penal
legal e ilegal de capital, juntamente com o controle dos (descriminalização).

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Criminologia Feminista.

Os estudos sobre mulheres infratoras e mulheres como o direito recria o gênero, [...] o Direito
vítimas tomaram força na década de 1970 e, em pouco Penal é um campo de negatividade.
tempo, as criminólogas feministas iniciaram uma
extensa produção literária sobre o assunto. Consoante Ademais, é importante mencionar algumas
Alessandro Baratta (1999, p. 19), contribuições do feminismo para os estudos
criminológicos. Baratta (2002, p. 24) reforça este
A questão feminina tornou-se, assim, um componente entendimento dizendo que a construção social do
privilegiado da questão criminal. Desde então, temas gênero, dos papéis e das posições correspondentes
como a falta de proteção das mulheres dentro do não pode ser compreendida se não considerarmos a
sistema da justiça penal frente à violência masculina, a contribuição que lhes é dada pelas instituições. Uma
baixa taxa de incriminação feminina, bem como suas delas foi a introdução da perspectiva de gênero como
formas específicas de criminalidade (aborto e forma de analisar as mulheres dentro do sistema penal.
infanticídio) conseguiram sair completamente da Destarte, almeja-se entender com mais precisão a
marginalidade acadêmica. própria seletividade que produziu a criminalidade
feminina, bem como propor políticas de reforma das
Portanto, os diversos matizes dos movimentos prisões femininas. Uma outra contribuição do
feministas deram ênfase ao estudo sobre mulheres, e feminismo é a possibilidade de inserir as histórias das
visibilidade à demanda de retirar as mulheres do campo mulheres para compreender como o sistema penal
de exclusão social e da visão masculina de mundo. atua, e reconstruir os direitos das mulheres perante
Ademais, consoante supracitado, esclarece-se que esse sistema. Se o direito penal foi construído por
dentro dos estudos feministas sobre o sistema penal homens e para homens, fato é que sempre selecionou
existem dois campos que têm as mulheres como objeto mulheres. É preciso reinventar o direito e reler a
de estudo. Um deles pretende compreender como o criminologia pela ótica das mulheres e para as
sistema penal trata as mulheres quando são vítimas de mulheres (MENDES, 2014, p. 171-176). Por meio das
crime e o outro avança para os estudos sobre os histórias contadas pelas mulheres de toda sua
critérios de seletividade do sistema penal para experiência vivida, alarga-se o cunho relacional da
criminalizar as mulheres. Nesse sentido, entendendo problemática do sistema penal. Outrossim, os estudos
que são recentes os estudos da criminologia sobre a feministas têm apontado as bases androcêntricas e
construção da delinquência feminina, comparados com parciais acerca da criminologia, assim como tem
aqueles que enfocam as mulheres como vítimas, relativizado as relações entre o feminino e o masculino.
existem ainda duas concepções mais tradicionais
relativas à figura feminina autora de delitos. A primeira Espinoza (2004, p. 77) ressalta:
estuda as mulheres sob uma visão androcêntrica e a Mais do que nunca devemos proceder às
segunda, uma concepção mais contemporânea, dá análises que adotem a perspectiva de gênero
ênfase aos ditames da Criminologia Feminista. para olhar a mulher e todos os indivíduos
Todavia, essa ciência não teve um desenvolvimento inseridos no sistema punitivo. Assim, a óptica
uniforme. Apesar das críticas, a Criminologia Feminista do gênero deve nos levar a questionamentos
abriu espaço para o desenvolvimento de novas teorias, a respeito da própria estrutura do sistema,
bem como conseguiu tornar visível a criminalidade desconstruindo o universo das formas
feminina, consolidando os pilares dessa ciência. tradicionais de legitimação punitiva e
procurando soluções mais equitativas, que
Segundo Carmen Hein de Campos (2002, p. 146), valorizem as situações concretas nas quais
A criminologia feminista revelou que as evoluem os diferentes protagonistas da
mulheres não são tratadas pelo Direito Penal intervenção penal.
como sujeitos, pois a proteção penal não se
destina às mulheres, mas à família e à Acreditamos que a criminologia feminista é, com efeito,
maternidade. Assim pode ser entendida a o marco teórico adequado para o estudo das
proteção jurídica dos delitos de lesões percepções e expectativas das mulheres.
corporais, aborto, infanticídio e outros. Nos
crimes contra a liberdade sexual, é a Dentro destes parâmetros, Campos (2002, p. 147)
moralidade da mulher que norteia toda a preceitua:
proteção jurídica. Recebe proteção a mulher A Criminologia feminista é o elo capaz de tirar
criada pelo discurso jurídico: a mulher o pensamento criminológico moderno do
honesta. Esta expressão demonstra que, isolacionismo androcêntrico. A categoria de

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gênero permite entender que o mesmo Direito suas teorias, tendo em vista que a junção de ambos
penal que trata desigualmente homens ricos resulta no referencial teórico apropriado para estudar
e pobres, beneficia homens em detrimento de como o sistema penal trata as mulheres, seja enquanto
mulheres. vítimas ou criminosas.

Deste modo, é interessante mencionar que a Por fim, cumpre examinar mais detidamente a
criminologia crítica encontrou nos estudos feministas, criminologia feminista, como novo campo de estudos
mais precisamente na categoria teórica de gênero, um criminológicos. Só assim, conseguiremos de FATO,
campo ideal para o acolhimento e desenvolvimento de uma análise REALISTA da sociedade.

Criminologia Cultural.

A criminologia cultural é uma aproximação teórica que mercado de trabalho -; Entramos na faculdade e na
busca suas referências nas noções de transgressão, sequência devemos trabalhar, ter uma carreira sólida,
subcultura e desvio, analisa a experiência criminal comprar um carro (do ano, de preferência), assistir a
através de imagens, significados e interferências novela as vinte e uma horas, comer fast-foods, pagar
culturais e sociais. contas, casar com alguém do sexo oposto, comprar
uma casa com trinta anos e pagar o instituto de
O crime e o controle da criminalidade fazem parte das previdência para ter uma aposentadoria de miséria
interações sociais e culturais da sociedade; analisar o quando não pudermos mais trabalhar.
contexto em que esses estão inseridos se faz
necessário para uma compreensão real de suas causas Para Ferrel, a indústria cultural de massa
e consequências. Entendendo como superados muitos institucionaliza o tédio, promete prazeres calculados e
dos métodos utilizados pelas teorias ortodoxas que não entretenimento previsível e consumível.
partem de um ponto correlacional do crime, a
Criminologia Cultural toma forma na busca de Analisando o amadurecimento do mundo moderno,
entendimento dos processos simbólicos que interagem podemos ver o tédio sendo institucionalmente
no momento da experiência criminal. coletivizado na pratica do cotidiano – e pior,
institucionalizado no contraponto existencial do ethos
Ao nos depararmos com a realidade atual, resultado de moderno do sentido de cada cidadão na participação
fatores econômicos, sociais e culturais históricos, democrática na construção do dia a dia. (T.A.)
inferimos situações que serão desenvolvidas ao longo
deste estudo tangente à criminologia cultural. A linha de montagem estipulada para a produção das
fábricas industriais agora se reproduz no cotidiano em
A importância da abordagem da cultura de série, seres humanos na linha de montagem industrial.
massa no controle social Não estamos mais acostumados e não há mais lugar
na sociedade para quaisquer desvios mínimos do
Na análise da criminologia cultural, principalmente no padrão. O indivíduo que não se enquadrar nesta
último século, houve uma enxurrada burocrática e margem da sociedade, marginalizado. “As inúmeras
racional que saiu do controle. Aliás, que colocou tudo agências de produção em massa e da cultura por ela
no controle. criada servem para inculcar no indivíduo os
comportamentos normalizados como únicos naturais,
Somos controlados a todo instante: vigiados por decentes, racionais”. Devemos entrar sem reclamar em
câmeras; trabalhando nas fábricas e produzindo em todas as filas – principalmente as de pagamento de
série oito horas por dia; fagocitamos o produto da mídia contas e oportunidades de trabalho – como bois em
– leia-se principalmente a televisão, com programas dia direção ao matadouro.
a dia mais estúpidos e alienantes -; moramos em
pombais localizados em condomínios gradeados; Pagamos parcelado não só o crediário e a hipoteca da
somos dominados cada dia mais pela falta de emoção casa, parcelamos nossas vidas em doses
e humanidade em nossa vida. homeopáticas e apáticas. E parcelamos por um preço
muito além do que nos dizem que vale. A televisão nos
Temos por socialmente estabelecido um calendário de diz o que devemos comprar e em quantas vezes
metas anuais e uma vida préagendada: deve-se podemos nos despedaçar para gastar um dinheiro que
aprender a andar no primeiro ano de idade, falar com não temos. Ao valor das coisas parceladas é embutido
dois, entrar para a escola com seis e terminar o ensino um juro sutil, descamado em folhas de cheques que
médio com dezessete - melhor ainda se no ‘combo’ vier valem mais que os produtos.
um ensino técnico que nos coloque imediatamente no

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Então, novamente, o mesmo maquinário da
modernidade que produziu em massa estas condições Através da racionalização positivista, a criminologia
cotidianas de tédio foi utilizado para contrapor e corrigir faliu ao entender a realidade do crime, que não pode
a produção em massa: um novo mundo cultural de mais deixar de ser analisado sem o contexto sócio-
entretenimentos mediados e excitações préagendadas, cultural atual. No meio deste planejamento industrial, as
disponíveis tanto para o secretário de produção e imagens de uma sociedade utópica e consumista, na
quanto para o professor de maneira igual. E, no qual o ter vale mais que o ser, os valores de certo e
entanto, ao que parece, cada momento calculado de errado e os significados se perderam há muito.
excitação serviu apenas para ampliar o vazio ritmado
da vida cotidiana. (T.A.) A manipulação cultural pela indústria de massa é uma
forma de reprodução do poder simbólico em um
Com a difusão da indústria cultural de massa, os sistema ideológico, caracterizando a dominação de um
indivíduos são levados a um sem fim de reificações, de pequeno grupo como classe dominante, que detém
supressão de sua capacidade de discernimento e de monopólio de capital cultural (e econômico, tendo em
suas habilidades. O movimento dos eventos culturais vista que a estrutura social atual permite quase sempre
atinge uma velocidade quase inalcançável para que tenha capital cultural quem possua capital
compreensão; por todos os lados surgem imagens de econômico) sobre uma classe dominada, sem posse de
padrões a serem seguidos, pensamentos a serem instrumentos culturais e materiais – sobretudo tempo
pensados, profissões a serem consumidas, palavras a livre e capital cultural -, essenciais para uma formação
serem ditas, sentimentos certos e errados... É a social desenvolvida, o que influencia na participação
massificação do indivíduo. Ao mesmo tempo em que política dos indivíduos.
cada um quer ser o outro e vestir o que o outro veste,
este não se coloca a sentir o que o outro sente, sem se O campo político (BOURDIEU, 2010) é o lugar em que
preocupar com o bem-estar da sociedade ou do seu são gerados os produtos políticos - problemas,
entorno. conceitos, acontecimentos - consumidos pelo cidadão
comum, e seu grau de entendimento destes eventos se
Para Adorno e Horkheimer, a materialização do homem afasta tanto quanto este é afastado do lugar onde são
à força pela evolução da sociedade e a consequente gerados estes produtos. Assim:
divisão do trabalho imposta como decorrência da
dominação e para a autoconservação dos dominados, Dado que os produtos oferecidos pelo campo político
bem como o positivismo característico da ciência são instrumentos de percepção e de expressão do
culminaram no que ele denomina esclarecimento, mundo social (ou, se assim se quiser, princípios de
assim: divisão) a distribuição das opiniões numa população
(N) O mundo esclarecido, a mitologia invadiu a e determinada depende do estado dos instrumentos de
dominação não é meramente a alienação dos homens percepção e de expressão disponíveis e do acesso que
com relação aos objetos dominados; com a coisificação os diferentes grupos têm a esses instrumentos
do espírito, as próprias relações dos homens foram .
enfeitiçadas, inclusive as relações de cada indivíduo A delimitação do campo da formulação das ideias, o
consigo mesmo. (...) O animismo havia dotado a coisa que é dito ou pensado politicamente se dá na relação
de uma alma, o industrialismo coisifica almas. (...) A de interesses de uma classe e a capacidade de
partir do momento em que as mercadorias, com o fim expressão deste interesses de acordo com sua posição
do livre intercâmbio, perderam todas as suas nas relações de produção cultural e o acesso a
qualidades econômicas salvo seu caráter de fetiche, informações. Bem resume Wittgenstein:
este se espalhou como uma paralisia sobre a vida da
sociedade em todos seus aspectos15 Uma intenção encarna-se numa situação, em costumes
. e instituições humanas. Se a técnica do jogo de xadrez
Este processo de reificação do indivíduo, a não existisse, eu não poderia ter a intenção de jogar
manipulação cultural, onde até o divertimento - que xadrez. Se posso ter em vista a construção de uma
segundo Adorno seria possível somente quando se frase, é porque sei falar a língua em questão.
isola a totalidade do processo social, renunciando ao
que seria a pretensão de qualquer obra, refletir o todo Ao refletirmos sobre a chamada sociedade de massa,
– seria então a negação do próprio pensamento a partir consequência direta do processo progressivo de
de uma prometida libertação através do industrialização, difusão de valores abstratos,
entretenimento, culminando no que ele define como revolução comercial
desencantamento do mundo, esta perda de
significações, de sentido; é a cegueira em que se Desta forma, a homogeneização do indivíduo e o
encontra a sociedade atual, que desaprendeu a pensar, enfraquecimento de sua reflexão é um campo de ação
perdeu contato com a subjetividade e na qual as direta da massa media, onde o que acontece está além
pessoas não passam de estatísticas e números da experimentação percebida pelo indivíduo isolado e
consumíveis. alheio a significações e expectativas.
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Diante destas dinâmicas sociais, o ambiente simbólico A problemática de todas as criminologias ortodoxas é
ocupado pelos indivíduos e grupos, a cultura humana, justamente ater-se a um único método, o que leva à
não pode ser reduzida a um produto da estrutura de expectativa de criação de verdades imutáveis. A
classes, apesar de ser sustentada por ela; é, por outro Criminologia Cultural se baseia em não se basear num
lado também a subcultura independente de resistência único estudo. Ela utiliza todos ou nenhum. É
dos marginalizados, é a força cultural advinda dos multidisciplinar e ao mesmo tempo não é. Tanto o
problemas dos atores sociais e, assim, estão crime, quanto o criminoso, quanto os fenômenos
intimamente atreladas às experiências criminais. decorrentes destes vetores são analisados,
engavetados e enquadrados quando poderiam ser
Episódios significativos de práticas de violência nas sentidos, vividos e compreendidos. Para a Criminologia
ruas como, por exemplo, o aumento contínuo do Cultural os métodos convencionalmente empregados
aparecimento de gangues, ataques neonazistas, pelas criminologias ortodoxas podem ou não nos dizer
bombardeios terroristas, crimes de guerra, da mesma muito sobre o crime, mas uma coisa é clara: elas são
forma como as interações midiáticas da cultura cuidadosamente projetadas para serem mantidas
contemporânea ressaltando acepções de incólumes e asseadas após a sua utilização.
agressividade, machismo, dominação simbólica, a
brutalidade sendo vendida, consumida e assistida É tão penetrante esta estética da precisão acadêmica
como forma de entretenimento. que, de fato, começamos a suspeitar que o apelo da
criminologia ortodoxa – uma orientação acadêmica que
Estas são feridas abertas na sociedade, e não são geralmente nega a validade de emoções e estilos na
somente físicas, são sentidas no âmago da sociedade, investigação da experiência humana – é precisamente
e devem ser percebidas e enfrentadas – não digamos este estilo aridamente meticuloso, e as emoções
nem curadas, pois não almejamos tanto, sabemos que assépticas que tal estilo é criado entre aqueles que
são cortes profundos que deixam marcas indeléveis na anseiam pela certeza e segurança. (T.A.)
camada mais perceptível da pele da sociedade -, deve-
se tomar conhecimento de como fora feitas e como Assim, essas regras de conduta são estabelecidas de
podem ser evitadas. Desta forma, a violência e suas acordo com a cultura existente em uma sociedade.
consequências devem ser entendidas como uma A criminologia cultural percebe o ato de transgredir com
comunicação de significados dentro da complexidade variados pontos de atração, sendo através da quebra
cultural da sociedade. Uma nova aproximação teórica de regras que os problemas sociais buscam uma
que perceba esta dinâmica cultural não se dá na solução.
tentativa de minimizar a seriedade com que deve ser
tratado o assunto, mas sim operar com todas as Desta forma, a reflexão dos processos de formação
considerações e variáveis, deve penetrar no movimento cultural da elaboração de condutas sociais, bem como
da sociedade. as transformações de ascensão e o declínio do crime e
das organizações de controle são outras ferramentas
As explicações atuais nas tentativas de entender as das quais podemos dispor para a melhor compreensão
práticas de crime, de controle e de punição parecem do processo criminológico. Estes processos cada dia se
cada dia mais inapropriadas e menos convincentes; as tornam mais rápidos e mais imbricados com a
medidas penais são ineficazes e métodos de velocidade da transmissão da informação e o turbilhão
enquadramento dos indivíduos e da sociedade estão de sobreposição em que estas se encontram acaba por
falidos. não ser mais claro onde estes processos começam e
terminam.
Evidencia-se a necessidade de uma aproximação
teórica que perceba essa dinâmica cultural na postura A criminologia cultural busca ultrapassar os limites das
de tratamento da transgressão, das práticas do crime e teorias criminológicas estudadas até o presente,
seu controle. avançando principalmente na visão do indivíduo
enquanto ser, além dos aspectos cognitivos da cultura
Nesta senda é que a criminologia cultural se propõe a enquanto avaliação das corretas formas de sanção e
procurar perspectivas alternativas, novas maneiras de punição na sociedade contemporânea. Busca estudar
se enxergar o crime e o contexto social no seu entorno. imagens, interferências e significados simbólicos entre
crime, controle e subculturas em estruturas sociais em
Juntamente com as teorias da criminologia já conflito, fatores intrínsecos de dinâmica social na
estabelecidas, a criminologia cultural quer provocar o experiência criminal, as formas de transgressão social
surgimento de novas orientações intelectuais que atual e a repercussão desses significados entre si e na
possam compartilhar o estudo da criminalidade com as sociedade de maneira geral.
realidades em que está inserida.
Ao mesmo tempo em que a proliferação da mídia de
A (não) metodologia da criminologia cultural massa dificulta reconhecer espaço de interação entre
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as construções na natureza cultural do desvio, também da atividade criminológica no momento em que o ato de
podemos perceber que atualmente há uma ênfase transgredir é realizado. Tem por maior interesse o
extraordinária na criatividade, no individualismo e primeiro plano da experiência do crime, apreendendo
geração de estilos de vida diferentes. As referências de visualmente e sensorialmente os símbolos de
mundo, de vocabulário, de grupo, a identidade global percepção e realização do crime. Esta aproximação do
está inserida em um mundo virtual tão real quanto ideal. primeiro momento se dá na tentativa de estar o mais
perto da realidade, o que não ocorre quando estes
A criminologia cultural, mais do que pretender analisar mesmos crimes são apresentados como estatísticas
o crime, a figura do criminoso, e as organizações de atreladas ao método de racionalização objetivo e
controle do crime, busca colocar em evidência o sentido científico.

Criminologia Queer.
A teoria queer (queer theory) é uma teoria de gênero
que afirma que a orientação sexual e identidade de Nesse sentido, a criminologia queer propõe uma nova
gênero dos indivíduos são o resultado de uma releitura dos estudos criminológicos, questionando a
construção social e que, portanto, não existem papéis criminologia até então heterocisnormativa, a partir do
de gênero essencial ou biologicamente definidos na questionamento de diversos tipos de violência
natureza humana, mas tão somente formas cometidos contra pessoas queer, tais como:
socialmente variáveis de desempenhar um ou vários
papéis sociais de gênero. Violência simbólica: ocorre a partir da construção
social de discursos de inferiorização da diversidade
Assim, a teoria queer busca ir além das teorias sexual e de orientação de gênero.
baseadas na oposição homens vs. mulheres e também
aprofundar os estudos sobre minorias sexuais Violência institucional: ocorre por parte do Estado e
(bissexuais, gays, lésbicas e pessoas trans), dando de instituições sociais, trata-se do controle social formal
maior atenção aos processos sociais amplos e sobre o comportamento desviante a partir dos
relacionados que sexualizam a sociedade como um processos de criminalização (direito penal) e de
todo de maneira a a heterossexualizar instituições, patologização (psiquiatria) da diversidade de gênero e
discursos, direitos. de orientação sexual.

A teoria queer propõe explicitar e analisar esses Violência interpessoal: prática de atos físicos de
processos a partir de uma perspectiva comprometida violência contra pessoas queer.
com aqueles socialmente estigmatizados, dando maior
atenção à formação de identidades sociais normais ou Assim, busca-se pensar em políticas públicas criminais
"desviantes" e nos processos de formação de sujeitos e a forma de como o ordenamento jurídico regula o
do desejo classificados em legítimos e ilegítimos. delito. Ora, pessoal, é inegável que o direito penal
seleciona de maneira diferente pessoas LGBTTI+.
O termo “queer”, do inglês, significa “estranho, Nesse sentido, basta pensar que em muitos países a
esquisito” e se relaciona à apropriação desse termo, homossexualidade ainda é considerada crime. Além
costumeiramente voltado à agressão de pessoas disso, a LGBTTfobia sofrida por tais indivíduos na
lésbicas, gays, bissexuais, transexuais ou qualquer sociedade, nas relações de trabalho e até mesmo no
pessoa que não siga o padrão normativo vigente. âmbito doméstico faz com que tais indivíduos sofram
sérios processos de marginalização econômica e
Em síntese, a teoria queer questiona os papéis social, o que pode levar os indivíduos ao cometimento
socialmente pré-definidos de gênero, seja em relação à de pequenos delitos, porém com intensa seletividade
orientação sexual, seja em relação à identidade de penal.
gênero. Assim, questiona a heteronormatividade e a
cisnormatividade. No contexto prisional, a heterocisnormatividade impede
tanto as mulheres de ter uma estrutura pensada em
Partindo de tais premissas, a criminologia queer surge suas necessidades, bem como faz com que grupos
nos EUA, no final dos anos 80, dialogando com as LGBTT sejam forçados a um meio de potencial
teorias feministas, os estudos culturais, a sociologia da exclusão e estigmatização do preconceito, negando a
sexualidade, a psicologia social e o direito sob a suas necessidades em situação de prisão.
tradição jurídica da common law, compartilhando a
noção de sexualidade como construção social e A figura do preso na sociedade já garante uma
histórica. marginalização, sendo que a mulher ou a pessoa

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LGBTT presa possui uma vulnerabilidade ainda maior, consideração a autodeclaração dos cidadãos, que o
pois sofre situações de machismo e LGBTTfobia dentro sistema penal respeite seus direitos e os juízes
do próprio cárcere. Tais atos de violência – que busquem exercer a possibilidade do cumprimento de
desaguam até mesmo em assassinatos – violam o pena dos LGBTIs em presídios que possuam alas
princípio da dignidade humana, o direito à não diferenciadas para essa população. As análises devem
discriminação em razão da identidade de gênero ou em ser feitas caso a caso.
razão da orientação sexual, o direito à vida e à
integridade física, o direito à saúde, à vedação à tortura A regra também deve ser aplicada aos adolescentes
e ao tratamento desumano ou cruel. em cumprimento de medida socioeducativa que se
autodeterminem como parte da população LGBTI,
Por fim, quero lembrá-los, nesse contexto, sobre a enquanto não for elaborado lei própria, considerando-
questão das pessoas trans encarceradas. Por exemplo, se a condição de pessoa em desenvolvimento, com as
uma mulher trans deve ir para um presídio masculino devidas adaptações, conforme previsão do Estatuto da
ou feminino? Pessoal, deve ser levado em conta o Criança e do Adolescente (ECA).
critério da autoidentificação, bem como a pessoa trans
deve ser ouvida. Isso é, deve ser perguntada se prefere Portanto, a partir de agora, as pessoas condenadas
estar em um presídio feminino ou masculino. devem ser direcionadas a presídios e cadeias conforme
sua autoidentificação de gênero. A medida permite que
Nesse sentido, recentemente foi editada normativa pelo lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis ou
CNJ (Resolução nº 348 do CNJ), em conformidade com intersexo (LGBTI) condenados e privados de liberdade
tratados internacionais ratificados pelo Brasil, demais possam cumprir suas penas em locais adequados ao
normativas internacionais (como os Princípios de seu gênero autodeclarado.
Yogyakarta) com a legislação nacional relativa a
Direitos Humanos e com a Constituição Federal. A nova Enfim, esse tema é importante e tem tudo para ser
resolução determina que a Justiça leve em cobrado nos próximos concursos!

Criminologia Ambiental.

A teoria ambiental da criminologia tem como base a criminosos. Isso pode ser feito por meio de políticas
ideia de que o ambiente em que as pessoas vivem pode públicas que busquem promover o desenvolvimento
influenciar o comportamento humano, incluindo o social e econômico, melhorar a qualidade de vida das
comportamento criminoso. Essa abordagem destaca a pessoas e reduzir a desigualdade social.
importância dos fatores sociais e estruturais na
compreensão da criminalidade, ao invés de focar A teoria ambiental da criminologia também destaca a
exclusivamente em fatores individuais. importância da prevenção, em vez da punição, como
forma de combater a criminalidade. Isso inclui a
De acordo com essa teoria, a pobreza, a desigualdade implementação de políticas de prevenção ao crime, que
social, a falta de oportunidades, o acesso limitado à busquem criar um ambiente seguro e propício para o
educação e aos serviços públicos, a exclusão social e desenvolvimento humano, a fim de reduzir o risco de
a violência urbana podem aumentar o risco de comportamentos criminosos.
comportamentos criminosos. Isso ocorre porque esses
fatores criam um ambiente desfavorável, que pode Apesar de algumas críticas à teoria ambiental da
levar as pessoas a sentirem-se impotentes e sem criminologia, ela tem se mostrado uma abordagem
saída, o que pode resultar em comportamentos de eficaz para compreender as relações entre o ambiente
desespero e até mesmo criminosos. e a criminalidade, especialmente em áreas urbanas e
em países em desenvolvimento.
Por outro lado, a teoria ambiental da criminologia
também destaca a importância do ambiente físico na Alguns dos principais doutrinadores que discutem a
ocorrência do crime. Por exemplo, locais abandonados, teoria ambiental da criminologia são:
áreas escuras, ruas mal iluminadas e áreas de tráfico
de drogas podem se tornar ambientes propícios para a David Garland: autor do livro "A Cultura do Controle:
prática de crimes, especialmente nas áreas urbanas. Crime e Ordem Social na Sociedade Contemporânea",
que explora a relação entre a cultura, a política e o
Nesse sentido, a teoria ambiental da criminologia crime, destacando a importância das políticas públicas
propõe que é necessário melhorar as condições de vida e do ambiente social e físico na prevenção da
nas áreas mais vulneráveis, a fim de reduzir os fatores criminalidade.
que podem aumentar o risco de comportamentos

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Robert Sampson: autor do livro "Neighborhoods and A teoria ambiental da criminologia é uma abordagem
Crime: The Dimensions of Effective Community que busca entender a relação entre o ambiente físico e
Control", que apresenta evidências empíricas sobre a social e a criminalidade. Ela destaca a importância dos
relação entre o ambiente social e físico e a fatores sociais e estruturais na compreensão da
criminalidade, destacando a importância do criminalidade, além de ressaltar a importância da
planejamento urbano e das políticas de prevenção, em vez da punição, como forma de
desenvolvimento social na prevenção da criminalidade. combater a criminalidade.

John Braithwaite: autor do livro "Rebuilding Corporate De acordo com essa teoria, a pobreza, a desigualdade
Culture: Crime, punishment, and social control", que social, a falta de oportunidades e a exclusão social
discute a relação entre a cultura corporativa, a política podem aumentar o risco de comportamentos
e o crime, destacando a importância das políticas de criminosos. Além disso, o ambiente físico, como áreas
prevenção, em vez da punição, como forma de escuras e locais abandonados, pode se tornar propício
combater a criminalidade. para a prática de crimes. Dessa forma, a melhoria do
ambiente físico e social pode ser uma estratégia eficaz
Steven Messner: autor do livro "Social Ecology and the para prevenir o comportamento criminoso.
Roots of Juvenile Delinquency", que explora a relação
entre a ecologia social e a delinquência juvenil, Assim, a teoria ambiental da criminologia tem sido
destacando a importância do ambiente social e físico utilizada para orientar políticas públicas de combate à
na prevenção do comportamento criminoso. criminalidade, especialmente em áreas urbanas e em
países em desenvolvimento, onde a violência urbana e
Esses doutrinadores e muitos outros têm contribuído a criminalidade são mais comuns. Ela tem se mostrado
para o desenvolvimento da teoria ambiental da uma abordagem eficaz para compreender as relações
criminologia, destacando a importância do ambiente entre o ambiente e a criminalidade, destacando a
físico e social na compreensão da criminalidade e na importância da prevenção e da melhoria das condições
implementação de políticas públicas eficazes para de vida das pessoas como forma de combater a
prevenção do crime. criminalidade.

Criminologia Racial.

A criminologia racial é um campo de estudo que analisa concepção de inferioridade desses grupos.
as relações entre raça, crime e justiça. A criminologia
racial se ocupa de compreender as dimensões do Ademais, a criminologia racial busca trazer para o
poder e da opressão que afetam as pessoas negras e estudo da criminologia temas de suma importância,
outras minorias étnicas no sistema penal brasileiro. A como a seletividade do sistema penal brasileiro, o
criminologia racial também busca resistir aos encarceramento em massa de pessoas negras e a
estereótipos raciais, étnicos e de gênero que construção do estereótipo do negro como criminoso.
contribuem para a seletividade e o encarceramento em
massa desses grupos. Assim, é importante refletir sobre a relação entre
criminologia racial, direito penal subterrâneo e
A criminologia racial, questiona os objetivos seletividade penal (teoria do etiquetamento). Para
hegemônicos estruturais e funcionais da criminologia Zaffaroni, o direito penal subterrâneo é exercido por
tradicional e propõe que o estudo da criminologia leve agências executivas de controle, pertencentes ao
em conta os marcadores sociais relacionado a raça. Estado, mas à margem da lei e de forma e arbitrária,
Essa corrente criminológica parte do pressuposto que contando com a participação ativa ou passiva, em
direta ou indiretamente, grande parte das escolas da maior ou menor grau, dos demais operadores que
criminologia tem aspectos racistas, seja por compõem o sistema penal. Relacionando com o
considerarem as pessoas negras como potencialmente racismo, é fácil lembrarmos que as atuações mais
criminosas, seja por não levarem em consideração a recorrentes de violência policial ocorrem em
questão da raça quando abordam o tema da comunidades e têm como vítimas pessoas negras (vide
criminalização. Caso Favela Nova Brasília).

Nesse sentido, basta lembrar do surgimento da Quanto à seletividade penal, relacionada à teoria do
Criminologia como ciência, com a Criminologia Positiva etiquetamento, a Labeling Approach Theory é uma
no Século XIX, em que o discurso sobre a criminalidade teoria criminológica marcada pela ideia de que as
diferencial de negros e indígenas era sustentado na noções de crime e criminoso são construídas

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socialmente a partir da definição legal e das ações de estudo, como a sociologia, a antropologia, a história e
instâncias oficiais de controle social a respeito do o direito. A sociologia ajuda a entender como as
comportamento de determinados indivíduos. Ou seja, a relações raciais são construídas e mantidas na
criminalidade não é uma propriedade inerente a um sociedade. A antropologia ajuda a entender como as
sujeito, mas uma “etiqueta” atribuída a certos indivíduos diferenças culturais e étnicas são percebidas e tratadas
que a sociedade entende classifica como delinquentes. no sistema penal. A história ajuda a entender como as
E qual é a relação com o racismo? Pessoal, a relação políticas públicas e as leis foram moldadas ao longo do
é que, em razão do racismo estrutural de nossa tempo para perpetuar o racismo estrutural no sistema
sociedade (tema que abordaremos em outra postagem penal. O direito ajuda a entender como as leis são
logo logo), as pessoas negras são reiteradamente aplicadas de forma desigual com base na raça e como
etiquetadas como criminosas, delinquentes, em razão o sistema penal pode ser reformado para garantir a
da cor da sua pele, de maneira que são muito mais igualdade racial. A criminologia racial também se
selecionadas pelo sistema penal do que pessoas relaciona com outras áreas de estudo, como a
brancas. psicologia, a economia e a política pública, para
entender melhor as causas do crime e da violência em
Criminologia racial se relaciona com outras áreas de comunidades marginalizadas

Criminologia Clínica.
Natureza Biológica, Sociológica e Psicológica da criminalidade

É a parte da Criminologia que estuda o homem históricas e o manancial de conhecimentos teóricos e


criminoso num conceito de homem total, dissecando-o empíricos disponível. Num primeiro momento, os
nos mais minúsculos elementos e dimensionamentos comportamentos delinquentes foram explicados
de sua estrutura, de sua constituição através do recurso a fatores externos aos homens mas,
biopsicossomática, e sua personalidade como produto de alguma forma inexplicáveis, uma vez que foram
de toda a constelação de fatores, tanto endógenos remetidos para as causas sobrenaturais subjacentes a
como exógenos, com o fim de fornecer o mais fidedigno todo o tipo de eventos e de comportamentos. Os
diagnóstico de suas potencialidades criminais, a comportamentos delinquentes, e as suas causas e as
classificação do delinquente, o prognóstico de seu suas relações, eram simplesmente atribuídos à ação de
tratamento. deuses ou outros poderes sobrenaturais.

Parte das reflexões e das pesquisas sobre aquilo que Num segundo momento, os comportamentos
hoje designamos de comportamentos desviantes, delinquentes passaram a ser explicados através do
delinquentes ou criminosos, consoante as perspectivas recurso a fatores internos ou, melhor dizendo, a
teóricas, tem-se traduzido numa única e simples qualidades intrínsecas a alguns indivíduos, mesmo que
questão: por que motivo, ou motivos, alguns indivíduos relativamente abstratas, como a maldade, a
parecem mais predispostos que outros ao cometimento imoralidade, o egoísmo ou a desonestidade. Embora
de delitos? ainda persistissem explicações de natureza externa,
essencialmente sobrenaturais, a percepção de que
A conduta criminosa tende a ser compreendida como alguns seres humanos transportavam em si uma
conduta anormal, desviada, como possível expressão incapacidade para se conformar às exigências das
de uma anomalia física ou psíquica, dentro de uma sociedades modernas, intrinsecamente justas e
concepção pré-determinista do comportamento, pelo racionais, começou a tornar-se preponderante.
que ocupa lugar de destaque o diagnóstico de
periculosidade. Num terceiro momento, já dominado por paradigmas
científicos ou «positivos», os comportamentos
Logo, a criminologia clínica é uma ciência delinquentes passaram a ser explicados através do
interdisciplinar que visa analisar o comportamento recurso a características biológicas, psicológicas ou
criminoso e estudar estratégias de intervenção junto sociais específicas e passíveis de serem facilmente
ao encarcerado, às pessoas envolvidas com ele e com observadas e medidas.
a execução de sua pena. Essa ciência foca-se nos
fatores sociais e individuais que promoveram e Ao longo deste percurso, apenas um pressuposto se
facilitaram a criminalização por parte do sistema manteve inalterado. Quem se envolve em delitos é,
penal; e a vulnerabilidade do encarcerado perante o necessariamente, diferente, e só essa diferença, seja
sistema punitivo. ela biológica, psicológica ou social, permite explicar, e
eventualmente prever e prevenir, os comportamentos
As respostas têm variado consoante as épocas delinquentes. Este pressuposto marcou todas as

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reflexões teóricas que foram desenvolvidas até quase passível de mensuração e descrição. Por isso é que
ao final do século XX. seu resultado acaba sendo a limitação do Direito às
normas legais, evitando a consideração de fatores
No campo da biologia, por exemplo, a diferença foi axiológicos, metafísicos etc.
remetida para atavismos que se manifestavam, quer a
um nível intelectual, quer a um nível físico. Até pelo O afastamento rigoroso das questões que não fossem
menos ao final da segunda grande guerra mundial, os subsumíveis ao método de experimentação científico,
atavismos foram concebidos como sendo hereditários, ensejou, no bojo das ciências criminais, o nascimento
concepção que legitimou, entre outras práticas da busca de relações e regras constantes que tivessem
«preventivas», o isolamento dos «criminosos» ou a sua a capacidade de esclarecer o fenômeno da
esterilização forçada, por forma a que não se criminalidade.
pudessem reproduzir, e, no limite, a sua eliminação
física. A Criminologia exsurge dessa efervescência, desse
entusiasmo pelo método científico, dando destaque
No campo da psicologia, a diferença foi remetida, nunca dantes constatado ao estudo do homem
quase invariavelmente, para a questão da criminoso e à pesquisa das causas da delinquência.
personalidade e dos seus diferentes traços, o que
sustentou toda uma série de estudos e de programas Em meio a esse clima, a criminalidade somente poderia
de tratamento e de adaptação forçada da ser estudada com sustentação em dados empíricos
personalidade, imatura, impulsiva ou agressiva, do ofertados pela demonstração experimental de leis
delinquente, às características e às exigências da vida naturais seguras e imutáveis.
em sociedade.
O criminoso passa a ser objeto de estudo, uma fonte de
A própria sociologia não escapou a este pressuposto. pesquisas e experimentos com vistas à descoberta
Os delinquentes foram quase sempre conceptualizados científica das causas do fenômeno criminal.
como sendo diferentes, mesmo que essa diferença se
situasse nas diferentes tensões ou pressões sociais A obstinada busca de causas explicativas do agir
exercidas sobre alguns grupos sociais, e tal motivou criminoso em oposição às condutas conforme a lei,
todo um conjunto de programas de redução dessas somente poderia resultar na negação do “livre arbítrio”,
tensões ou pressões como principal estratégia de apontado até então pela Escola Clássica como
prevenção de comportamentos delinquentes. verdadeiro fundamento legitimador da
responsabilidade criminal.
O grande marco a inaugurar verdadeiramente os É claro que a noção de livre arbítrio não poderia servir
estudos criminológicos encontra-se no surgimento do a uma concepção positivista, pois que ensejava um
Positivismo e, mais especificamente, da chamada total descontrole e imprevisibilidade quanto às práticas
“Antropologia Criminal”. Nessa ocasião opera-se criminosas. A postura positivista não se coaduna com
uma mudança singular no que diz respeito ao objeto tal insegurança. Deseja apropriar-se de um
das preocupações da ciência criminal. Enquanto a conhecimento que propicie o domínio seguro de leis
Escola Clássica Liberal preocupava-se com o estudo constantes a regerem o mundo e, por que não, o
dos postulados jurídico – penais, procurando comportamento humano, inclusive aquele desviado.
desenvolver uma formulação teórico – dogmática do
Direito Penal, o advento da Antropologia Criminal A consequência imediata foi a consideração do
propicia uma alteração de perspectiva, voltando os criminoso como um “anormal”. A partir daí, bastaria
olhos da pesquisa científico – criminal para o estudo do dotar o pesquisador de instrumentos hábeis a
fenômeno do crime e, especialmente, da figura do selecionar, de forma científica, os criminosos
criminoso. (anormais), em meio à população humana
aparentemente homogênea ou normal.
O Positivismo exerce grande influência na conformação
dessa nova postura, pois que defende a irradiação do O primeiro grande passo dado por um pesquisador
método científico para todas as áreas do saber nesse sentido foi a doutrina preconizada por Cesare
humano, até mesmo às da filosofia e da religião. Nesse Lombroso, destacando-se a publicação de sua
contexto, o Direito e especificamente o ramo jurídico – conhecida obra “O homem Delinquente”, em 1876.
criminal, também passaram a sofrer influências
importantíssimas desse referencial teórico então Lombroso entendia ser possível detectar no criminoso
dominante. uma espécie diferente de “homo sapiens”, o qual
apresentaria determinados sinais, denominados
O Positivismo Jurídico aproxima o Direito, o quanto “stigmata”, de natureza física e psíquica. Esses sinais
possível, ao método das ciências naturais, objetivando caracterizariam o chamado “criminoso nato” (forma da
limitá-lo àquilo que tenha de concreto, observável, calota craniana e da face, dimensões do crânio, maxilar
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inferior procidente, sobrancelhas fartas, molares muito comum a busca de uma explicação etiológica
salientes, orelhas grandes e deformadas, corpo endógena do crime e do homem criminoso. Procura-se
assimétrico, grande envergadura dos braços, mãos e apontar uma causa da conduta criminosa que estaria
pés, pouca sensibilidade à dor, crueldade, leviandade, no próprio homem, enquanto alguma forma de
tendência à superstição, precocidade sexual etc.). anormalidade física e/ou psíquica. Também todas
Todos esses sinais indicariam um “regresso atávico”, essas teorias apresentam um equívoco comum:
tendo em conta sua clara aproximação com as formas pretendem explicar isoladamente o complexo
humanas primitivas. Ademais, Lombroso intentou fenômeno da criminalidade.
demonstrar uma ligação entre a epilepsia e aquilo que
chamava de “insanidade moral”. Em contraposição à “Criminologia Clínica”, surge a
denominada “Criminologia Sociológica”, tendo como
Percebe-se claramente o conteúdo determinista das seu mais destacado representante Enrico Ferri. A
teorias lombrosianas, o qual conduziria a importantes “Criminologia Sociológica” propõe uma revisão crítica
conclusões e consequências para a Política Criminal. da “Criminologia Clínica”, pondo a descoberto que a
insistência desta nas causas endógenas da
Ora, se o criminoso estava exposto à conduta desviada criminalidade, olvidava as importantes influências
forçosamente, tendo em vista uma congênita ambientais ou exógenas para a gênese do crime. Aliás,
predisposição, seria injusto atribuir-lhe qualquer para os defensores da “Criminologia Sociológica”, as
reprovação que fosse ligada ao desvalor de suas causas preponderantes da criminalidade seriam
escolhas quanto à sua conduta, isso pelo simples mesmo ambientais ou exógenas, de forma que mais
motivo de que não atuava por sua livre escolha, mas relevante do que perquirir as características do homem
sim dirigido por forças naturais irresistíveis a impeli-lo criminoso, seria identificar o meio criminógeno em que
para os mais diversos atos criminosos. Assim sendo, ele se encontra.
jamais poderia ser exposto a apenações morais e
infamantes. Não obstante, sendo as práticas No entanto, a “Criminologia Sociológica” em nada inova
criminosas componentes indissociáveis de sua no que tange à postura de procurar uma etiologia do
personalidade, estaria a sociedade legitimada a delito. Os criminólogos ainda insistem em encontrar
defender-se, impondo-lhe desde a prisão perpétua até “causas” para o crime, somente alterando a natureza
a pena de morte. destas, transplantando-as do criminoso para o
ambiente criminógeno. Em suma, muda o “locus” da
A doutrina lombrosiana, no entanto, foi grandemente pesquisa, mas não muda a natureza claramente
criticada e desmentida por estudos ulteriores que etiológica desta.
comprovaram a inexistência de indícios seguros a
demonstrarem qualquer diferença fisiológica, física ou Os estudos relativos à atuação do ambiente na
psíquica entre homens que perpetraram atos criminalidade são variegados, podendo-se mencionar
criminosos e indivíduos cumpridores da lei. alguns ramos a título meramente exemplificativo:
Geografia Criminal e Meio Natural, Metereologia
Não obstante, deve ser atribuído a Lombroso o mérito Criminal, Higiene e Nutrição, Sistema Econômico, Mal
de ser o primeiro a impulsionar os estudos que dariam vivência, Ambiente familiar, Profissão, Guerra,
origem à Criminologia. Ele iniciou, com a sua Migração e Imigração, Prisão e contágio moral, Meios
Antropologia Criminal, os estudos do homem de Comunicação etc.
delinquente, razão pela qual tem sido considerado o
verdadeiro “Pai da Criminologia”. A partir dele Ainda no matiz sociológico deve-se dar atenção
começam os mais diversos campos de pesquisa de especial às chamadas “Teorias Estrutural-
elementos endógenos capazes de ocasionarem o Funcionalistas”, as quais podem ser tratadas como
comportamento criminoso. item apartado, tendo em vista suas peculiaridades.

Inúmeras investigações científicas nos mais variados As Teorias Estrutural-Funcionalistas afirmam que o
campos das ciências naturais e biológicas lograram crime é produzido pela própria estrutura social,
conformar um conjunto de teorias elucidativas do inclusive exercendo uma certa função no interior do
fenômeno criminal. A esse conjunto costuma-se sistema, de maneira que não deve ser visto como uma
denominar “Criminologia Clínica”. anomalia ou moléstia social.

Pode-se exemplificar essa corrente criminológica com A base teórica principal é ofertada por Émile Durkheim
alguns de seus ramos mais destacados: Biologia que dá ênfase para a normalidade do crime em toda e
Criminal, Criminologia Genética, Psiquiatria Criminal, qualquer sociedade. Aduz o autor em referência que “o
Psicologia Criminal, Endocrinologia Criminal, Estudos crime é normal porque uma sociedade isenta dele é
das Toxicomanias etc. completamente impossível”. Mas, o autor vai além,
chegando a reconhecer que o crime não somente é
Todas essas linhas de pesquisa têm como traço normal, mas também “é necessário” para a coesão
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social, sendo uma sociedade sem crimes indicadora, Atualmente, apesar da ciência não ter ainda algum
esta sim, de deterioração social. Durkheim indica o consenso definitivo sobre a questão, sabe-se, no
fenômeno criminal como reafirmador da ordem social mínimo, que qualquer abordagem isolada do ser
violada e, portanto, legitimador de sua existência. Toda humano corre enorme risco de errar. Assim sendo,
vez que acontece um crime, a reação desencadeada atualmente usamos o modelo bio-psico-social, na
contra ele reafirma os liames sociais e ratifica a tentativa de compreender as pessoas e os fatores que
validade e a vigência das normas legais. influenciam seus comportamentos (Agra, 1986). Dentre
esses três modelos (biológico, psicológico e social),
Portanto, o desvio é funcional, somente tornando-se sem dúvida a abordagem biológica da pessoa é um dos
perigoso ao exceder certos limites toleráveis. Em tais aspectos mais criticados e polêmicos.
circunstâncias pode eclodir um estado de
desorganização e anarquia, no qual todo o A utilização do modelo biológico (personalidade)
ordenamento normativo perde sua efetividade. Não como justificativa do comportamento criminoso não é
emergindo disso um novo ordenamento a substituir recente na história da medicina e da sociologia. A ideia
aquele que ruiu, passa-se a uma situação de carência parece ter vindo de encontro à crença popular de que
absoluta de normas ou regras, ficando a conduta "o criminoso já nasce assim", tendência pela qual se
humana à margem de qualquer orientação. A isso procura identificar traços de personalidade que o
Durkheim dá o nome de “anomia”, efetiva causadora de caracterizam como psicopata, sociopata ou criminoso,
desagregação e deterioração social. enfim, traços que o tornam diferente dos outros seres
humanos (Mannheim, 1984).
O conceito de “anomia” e o reconhecimento da Mas, modernamente considerando que qualquer
funcionalidade do crime no meio social produzem uma tentativa de explicação biológica para o crime,
revolução quanto às finalidades e fundamentos da geralmente desencadeia um juízo prévio de que seria
pena, vez que estes já não devem mais ser buscados difícil alterar o que é determinado biologicamente,
na fantasiosa profilaxia de um suposto mal. Outra foram sendo progressivamente realçadas as
formulação teórica relevante de matiz estrutural- investigações sobre fatores psicológicos e/ou sociais.
funcionalista deve-se a Robert Merton. Ele se apropria
do conceito de “anomia” para demonstrar que o desvio Esta rejeição ao modelo biológico se mantém muito
não passa de um produto da própria estrutura social. enfático ainda atualmente. É sempre importante cultivar
Portanto, absolutamente normal, considerando que um bom senso suficiente para evitar que o
esta própria estrutura é que vem a compelir o indivíduo politicamente correto interfira no cientificamente
à conduta desviante. Merton expõe detalhadamente o constatado. As modernas pesquisas sobre alterações
mecanismo estrutural que conduz o indivíduo ao crime genéticas associadas ao comportamento violento
no seio social: a sociedade apresenta-lhe metas, mas (Bader, 1994), ainda são capazes de estimular debates
não lhe disponibiliza os meios necessários para o seu inflamados sobre a validade e o interesse das
alcance legal. O indivíduo perde suas referências, abordagens biológicas.
sentindo-se abandonado sem possibilidades “normais” Mesmo correndo o risco de suscitar críticas amargas
de conseguir seus objetivos. Sem os meios legais, mas sociopsicológicas, cientificamente podemos agrupar a
pressionado para a conquista de certos objetivos causalidade criminosa em quatro grandes categorias
sociais, o indivíduo precisa preencher esse vácuo de fatores: genéticos, bioquímicos, neurológicos e
(anomia) de alguma maneira. E a única maneira psicofisiológicos.
disponível será a perseguição dos fins colimados por
meios ilegítimos, ilegais e desviantes, uma vez que os Fatores genéticos
legítimos não estão acessíveis.
Os estudos incluídos nesta categoria utilizam como
Condicionantes Biológicos metodologia os estudos de gêmeos e de adoção. Nos
estudos em gêmeos (Cloninger & Gottesman, 1987;
É habitual a questão do crime envolver uma série de Mednick, Gabrielli e Hutchings, 1987; Mednick e
reflexões e comentários que ultrapassam em muito o Kandel, 1988), foram encontrado o dobro da correlação
ato delituoso em si; são questões que resvalam na para o comportamento criminoso entre estes, em
ética, na moral, na psicologia e na psiquiatria oposição à menor concordância em irmãos não
simultaneamente. Sempre há alguém atribuindo ao gêmeos.
criminoso traços e características psicopatológicas ou
sociológicas: porque Fulano cometeu esse crime? Comparando a concordância de comportamento entre
Estaria perturbado psiquicamente? Estaria encurralado gêmeos monozigóticos e dizigóticos, os
socialmente? Seria essa a única alternativa? Ou, ao monozigóticos apresentam o dobro de correlações
contrário, seria ele simplesmente uma pessoa no comportamento criminoso, sugerindo a existência
maldosa? Portadora de um caráter delituoso, etc. de fatores genéticos atrelados ao crime.

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Para resolver a argumentação contrária de que os corrente sanguínea por inibição da produção de
gêmeos geralmente teriam experiências vivenciais glucose hepática. Deste modo, o álcool ao fazer
semelhantes, na mesma família, escola e sociedade e, diminuir a quantidade de açúcar no sangue pode ser
por isso, tenderiam a ter o mesmo comportamento, apontado como um fator facilitador do crime.
foram estimulados os estudos de adoção.
Quanto ao colesterol a situação é mais curiosa ainda.
Esses estudos de adoção utilizaram pessoas que não Virkkunen mostrou que a relação entre o colesterol e o
conheceram seus pais biológicos, bem como sujeitos álcool pode ter até uma finalidade discriminante. Ele
que ignoravam serem adotivos, buscando separar conseguiu isolar dois grupos de pessoas envolvidas
melhor os efeitos ambientais dos efeitos genéticos. com o alcoolismo; um grupo representado por pessoas
Esses trabalhos (Mednick, Gabrielli e Hutchings, 1984) que ficam agressivas quando bebem e outro, por
demonstraram que existe uma elevada concordância pessoas que bebem mas não ficam agressivos. Os
entre comportamento criminoso dos pais biológicos primeiros mostraram menor nível de colesterol do que
com comportamento criminoso de seus filhos adotados os segundos e, estes, menor nível ainda do que os
por outras famílias. sujeitos não delinquentes, verificando-se que a maior
violência aparece associada a menor quantidade de
Parece também existir uma relação maior entre o colesterol.
comportamento criminoso da mãe biológica com o
comportamento criminoso de seu filho adotado (Baker No que diz respeito ao nível neuroendócrino, a
e col., 1989), do que a mesma comparação entre pai e hormônio mais relacionado à agressividade é a
filho. Alguns autores consideram esse fato sugestivo de testosterona. A pesquisa verifica os níveis desse
uma transmissão genética associada ao cromossomo hormônio tomando por base três comparações; entre
X. criminosos, entre criminosos e não criminosos (grupo
controle) e entre não criminosos relacionando-se com a
Apesar da evidência dos dados apontarem para a agressividade e não agressividade.
existência de importantes fatores genéticos associados
à criminalidade, o papel do ambiente parece também Nas investigações entre pessoas não criminosas os
ter importante influência. Cadoret e col. (1990), num resultados são muito variáveis e até contraditórios,
estudo com crianças adotadas e filhas de pais concluindo-se por vezes que não há correlações entre
biológicos com comportamentos criminosos, testosterona e potencial para agressividade (Rubin,
verificaram que quando os pais adotivos pertenciam a 1987). Entre criminosos e não criminosos (Olweus,
meio socioeconomicamente desfavorecido, as crianças 1987; Rubin, 1987; Schalling, 1987) os resultados são
apresentavam mais comportamentos criminosos do mais consistentes, mas nem sempre são significativos.
que aquelas cujos pais adotivos pertenciam a classes Alguns desses resultados mostram criminosos
de estatuto socioeconômico superior. apresentando maior nível de testosterona do que os
não criminosos.
Diante disso, será sensato acharmos que, apesar de
existir um fator genético capaz de aumentar a Sobre as influências neuroquímicas no comportamento
suscetibilidade da criança para comportamentos agressivo, algumas das substâncias mais estudadas
criminosos, esta suscetibilidade estará sujeita às (Rubin, 1987; Magnusson, 1988; Bader, 1994) são a
condições ambientais. serotonina, que existiria em menor quantidade, o ácido
fenilacético e a norepinefrina, que existiriam em maior
Fatores bioquímicos quantidade nos criminosos.

Os estudos neste grupo causal procuram dosar Esses estudos procuram estabelecer uma correlação
algumas substância possivelmente envolvida com o entre alterações bioquímicas capazes de desencadear
comportamento violento, como por exemplo, o comportamentos criminosos, bem como as
colesterol, a glicose, hormônios e alguns associações entre tais alterações, ingestão de álcool e
neurotransmissores. criminalidade.

Virkkunen, em 1987, procurou demonstrar a diminuição Fatores neurológicos


nos níveis séricos de colesterol em pessoas com
comportamento criminoso, da mesma forma como Esses estudos (Buikhuisen, 1987; Hare & Connolly,
também se associava os baixos níveis de glicose. 1987; Nachshon & Denno, 1987; Pincus, 1993)
associam desordens do comportamento com eventuais
Como o álcool é frequentemente relacionado com o alterações cerebrais, essencialmente no hemisfério
comportamento violento, foi também estudada a sua esquerdo.
associação com glicose e colesterol. Fisiologicamente
se demonstra que, de fato, o álcool diminui o açúcar na Os estudos parecem apontar na identificação das

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disfunções neuropsicológicas relacionadas ao adolescentes (Magnusson, 1988), e demonstraram que
comportamento violento estar presente no lobo frontal as crianças com comportamentos considerados
e nos lobos temporais. O Lobo Frontal se relaciona à desviantes apresentam maior ativação do sistema
regulação e inibição de comportamentos, a formação nervoso. No entanto estudos longitudinais (Raine,
de planos e intenções, e a verificação do Venables & Williams, 1990 e 1995) demonstraram que
comportamento complexo, suas alterações teriam adolescentes com comportamentos antissociais e que
como consequência dificuldades de atenção, posteriormente vieram a cometer crimes apresentavam
concentração e motivação, aumento da impulsividade e significativamente menor ativação cardiovascular e
da desinibição, perda do autocontrole, dificuldades em eletrodérmica, do que os que não cometeram crimes.
reconhecer a culpa, desinibição sexual, dificuldade de
avaliação das consequências das ações praticadas, Conclusão
aumento do comportamento agressivo e aumento da
sensibilidade ao álcool (sintomas positivamente Através da apresentação das quatro categorias citadas
correlacionados com o comportamento criminoso), bem é possível constatar que foram realizados diferentes
como incapacidade de aprendizagem com a estudos. Apesar das metodologias utilizadas e dos
experiência (sintoma correlacionado positivamente resultados serem por vezes questionados, a
com a alta incidência de recidivas entre alguns tipos de maior parte dos trabalhos podem ser considerados
criminosos). científicos e metodologicamente corretos,
demonstrando que de fato, podem existir fatores
Os Lobos Temporais regulam a vida emocional, biológicos implicados no crime, sejam estes
sentimentos, instintos, comandam as respostas identificados como genes, hormônios,
viscerais às alterações ambientais. Alterações nesses neurotransmissores, etc.
lobos resultam em inúmeras consequências
comportamentais, das quais se destacam a dificuldade Constata-se também que, apesar de alguns estudos
de experimentar algumas emoções, tais como o medo não referirem apenas as variáveis biológicas, mas
e outras emoções negativas e, consequentemente, também as variáveis psicológicas e contextuais, a
uma incapacidade em desenvolver sentimentos de divulgação dos seus dados é efetuada segundo uma
medo das sanções, postura esta frequente em lógica reducionista e determinista, tentando
criminosos. Esses estudos procuram associar o crime estabelecer uma causalidade linear entre fatores
com alterações cerebrais específicas. (Cristina biológicos e o crime e, contribuindo deste modo para a
Queirós, A importância das abordagens biológicas no rejeição das abordagens biológicas no estudo do crime.
estudo do crime)
Funcionando de acordo com esta perspectiva linear, se
Fatores psicofisiológicos um sujeito cometeu um crime porque as suas
características biológicas assim o determinam, e se
O enfoque psicofisiológico se baseia essencialmente estas são fáceis de identificar (ex.: medir a quantidade
na avaliação da função cerebral (fisiopatologia), como, de glicose, colesterol, EEG, etc.), porque não prevenir
por exemplo, a Atividade Elétrica da Pele, o o crime em pessoas, digamos, "de risco". Avançando
Eletroencefalograma e o Eletrocardiograma, um pouco mais, porque não efetuar terapias genéticas
trabalhando sobretudo em contexto laboratorial. Falta, no embrião para os sujeitos que apresentam a este
no momento, uma metanálise de outros tipos de nível alterações identificadas como características do
investigação da função cerebral, como por exemplo, os criminoso?
estudos com PET e SPECT.
Perante estas questões levanta-se uma outra, que é do
Os estudos demonstraram que, tanto a ativação tônica arbítrio individual, anulando esta liberdade através da
(reação global do sujeito na ausência de estimulação certeza do comportamento ser desse jeito porque é
específica) quanto a ativação fásica (reação a determinado unicamente por fatores biológicos. Essas
estimulação específica), é menor nos criminosos. questões são de primordial importância na Psiquiatria
Também, apresentam os criminosos, uma média menor Forense porque dizem respeito à imputabilidade,
do ritmo cardíaco, menor nível de condutância da pele culpabilidade e responsabilidade. De qualquer forma,
e maior tempo de resposta na atividade elétrica da pele, parece que a ideia da biologia ser a única e/ou
bem como registros eletroencefalográficos com maior principal determinante do comportamento é
incidência de anormalidades (Fowles, 1980; Hemming, universalmente rejeitada.
1981; Satterfield, 1987; Volavka, 1987; Hodgins &
Grunau, 1988; Milstein, 1988; Venables, 1988; Assim sendo, tentar explicar o comportamento e as
Buikhuisen, Eurelings-Bontekoe & Host, 1989; Patrick, atitudes humanas, apenas a partir de fatores biológicos
Cuthbert & Lang, 1994). não parece ser um bom método, pois qualquer
comportamento, incluindo o comportamento criminoso,
Alguns estudos trabalharam também com crianças e é considerado como um conjunto de inúmeros
processos em complexa interação. Em nosso caso,
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essa interação se dá através do vocábulo tríplice; bio- coerente, organizado e resistente;
psico-social.  vitalidade: caracterizando um conjunto animado e
hierarquizado, com oscilações interiores (fatores
Segundo Cristina Queirós, a perspectiva biológica endógenos) e estímulos exteriores (fatores exógenos),
utilizada pelos vários estudos descritos pode ser que reage e responde;
considerada como uma "biologia das causas". A  consciência: que mantém a informação sobre o si
alternativa a esta perspectiva mecanicista seria a mesmo e o meio;
"biologia dos processos", que começa a ser utilizada  relações com o meio ambiente: caracterizadas pela
atualmente, através da abordagem bio-psico-social, regulação entre o eu e o meio ambiente.
a qual tenta articular os fatores biológicos com os
restantes níveis do comportamento humano. Personalidade Normal
É difícil estabelecer um critério de personalidade
Na avaliação da biologia do crime, mesmo normal. Vários autores adotaram diversos critérios para
reconhecendo ser necessário perscrutar as bases atingir tal fim. Exemplificamos duas classificações: a
biológicas do crime, esta deverá considerar, primeira, baseada no critério biopsicológico e, a
obrigatoriamente, a interação com outros fatores segunda, baseada em tipos somáticos.
envolvidos (Farrington, 1987; Raine & Dunkin, 1990;
Farrington, 1991), não esquecendo que o todo o O critério biopsicológico, descrito por kretschmer,
indivíduo é um ser biológico em interação com o meio apresenta três tipos somáticos:
(Karli, 1990).
a) Leptossômico
Em suma, pode-se concluir que as abordagens Alto, magro, pouco musculoso, rosto afilado, encanece
biológicas, apesar de serem geralmente vistas como precocemente, é introvertido e oscila da insensibilidade
polêmicas e discricionárias, também são importantes à hipersensibilidade (esquizotímico).
no estudo e na compreensão do crime e do
criminoso, não devendo nem ser negadas nem b) Pícnico
supervalorizadas. Baixo, gordo, com abdome volumoso, sem pescoço,
com tendência à calvície, apresenta variações
Interpretando os fatores biológicos como frequentes de humor, da euforia à depressão
representantes da personalidade da pessoa, será (ciclotímico).
possível articular este aspecto constitucional com
outros níveis da personalidade, bem como com os c) Atlético
níveis do ato transgressivo e com o significado deste. De aspecto trapezoidal, ombros largos, relevos
musculares evidentes é explosivo e agressivo
Condicionantes Psicológicos (epileptóide).

Personalidade Sheldon descreveu os tipos somáticos, com base


embriológica, englobando três tipos básicos:
Segundo Porot, personalidade é a síntese de todos os endomorfo, mesomorfo e ectomorfo.
elementos que concorrem para a conformação mental
de uma pessoa, de modo a conferir-lhe fisionomia Outras classificações de menor importância são
própria. Em termos gerais podemos dizer que é o baseadas em critérios filosóficos, sociológicos e
hardware da pessoa. psicanalíticos.

Na constituição da personalidade interferem ou atuam O critério jurídico é definido pelos códigos:


múltiplas variáveis de ordem biopsíquica (constituição  Penal – dirige-se a entender o caráter do fato e a
biopsíquica) somadas às experiências vividas determinar-se conforme esse entendimento.
(integração). Como colocado por Odon Ramos  Civil, de acordo com Maranhão – presume
Maranhão, constituição é o conjunto da estrutura do capacidade geral e faz restrições parciais e absolutas,
organismo e do temperamento. considerando as capacidades de discernimento,
intenção, consciência e juízo.
A estrutura da personalidade é integrada por:
 tipo morfológico: conformação básica; Personalidades Patológicas
 tipo temperamental: disposição emocional básica; Ante o exposto, mais uma vez baseado nos trabalhos
 caráter: conjunto de experiências vividas. do Professor Odon Ramos Maranhão, podemos
considerar fazendo parte das personalidades
A personalidade apresenta particularidades, que são patológicas as seguintes perturbações:
suas bases fundamentais (maranhão), a saber:
 unidade e identidade: que lhe permitem ser um todo  do desenvolvimento e da continuidade,

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representadas pelos atrasos e infranormalidades – são Demências
as oligofrenias; De acordo com o pensamento de Seglas, as demências
 da senso-percepção, da ideação e do juízo crítico, ou deteriorações mentais são caracterizadas por um
representadas pelas psicoses (alienações) e pelas enfraquecimento (deterioração) intelectual progressivo,
demências (deterioração mental); global e incurável. Podem ser exemplificadas pelas
 da harmonia intrapsíquica, provocando sofrimentos senis (arteriosclerose, demência e Alzheimer) e pelos
conscientes de causa inconsciente, representadas traumatismos. São inimputáveis, via de regra.
pelas neuroses;
 do caráter, de base constitucional, representadas
Personalidades Psicopáticas
pelas personalidades psicopáticas. Personalidades psicopáticas ou antissociais são as
determinadas por conduta anormal, social ou não
Oligofrenias (reação antissocial).
As oligofrenias, também denominadas atrasos ou
debilidades mentais, são insuficiências congênitas, Segundo entendimento de Maranhão são indivíduos
caracterizadas pelo não-desenvolvimento da cronicamente antissociais, sempre em dificuldades,
inteligência; diferem das demências, caracterizadas por que não tiram proveito das experiências vividas, nem
deterioração da inteligência normalmente das punições sofridas e que não mantém lealdade real
desenvolvida. a qualquer pessoa, grupo ou código.

São vários os critérios diagnósticos: Apresentam ausência de sentimentos, incluindo


sentimento de culpa, tendência à impulsividade,
a) Psicométrico agressividade, falta de motivação e intolerância à
Baseado em medidas do quociente de inteligência, é o frustração. Normalmente são religiosos. São semi-
critério mais conhecido, mas que por apresentar muitas imputáveis, via de regra.
deficiências, é atualmente muito combatido. Divide os
deficientes em três grupos: Os criminosos em série geralmente são psicopatas. Um
 Idiotas: com Q.I. até 30, para alguns autores, e até termo usado para designar não somente doenças
20 para outros. mentais. "Um psicopata pode não ser exatamente um
 Imbecis: com Q.I. entre 30 e 60 segundo um critério doente mental", afirma a psicóloga Maria de Fátima
e entre 20 e 40 em outro. Franco dos Santos professora de Psicologia Forense
 Débeis: com Q.I. entre 60 e 90 segundo um critério da Puc de Campinas - SP. São pessoas com
e entre 40 e 65 em outro. personalidades de difícil relacionamento social. A
personalidade é uma peça que começa a ser formada
b) Escolar bem cedo no ser humano, desde a sua concepção e
Baseado no desenvolvimento e na cronologia é o termina por volta dos cinco anos de idade. Neste
critério mais aceito e mais justo, dividindo as período, a criança recebe os elementos necessários
deficiências em ligeiras (débeis), médias e profundas vão servir de base para o seu comportamento pelo
(idiotas). Permite ainda um tipo denominado atrasados resto da vida. Daí grande parte dos criminosos
profundos, equivalentes aos idiotas do critério psicopatas serem frutos de famílias desestruturadas e
psicométrico. de lares violentos.
Outros critérios diagnósticos são o social e o clínico;
porém, são pouco utilizados. São inimputáveis. Já os doentes mentais interagem com o mundo a partir
de uma realidade que eles mesmos criam. Os
Alienações psicopatas, ao contrário, interferem na realidade a partir
Alienações ou psicoses são alterações psíquicas que de sua personalidade desajustada aos padrões sociais.
tornam o indivíduo impossibilitado de manter uma vida São assim alguns estupradores e assassinos de série,
normal e de participar da vida em sociedade (vida sendo estes últimos os casos mais graves.
coletiva e social), resultando daí as designações
alienação ou alienados. São os “loucos de todo o Veja algumas características deste tipo de criminoso:
gênero” do Código Civil e a “doença ou doente mental” - São em grande maioria psicopatas;
do Código Penal. - Gostam de demonstrar poder (são narcisistas,
onipotentes, dominadores, machistas);
São exemplos a psicose maníaco-depressiva (atual - Sempre reincidentes, raramente comete o crime
distúrbio bipolar), as epilepsias, as senis, a somente uma vez;
esquizofrenia e as alterações decorrentes do - Sadismo, sentem prazer em assistir o sofrimento
alcoolismo, da sífilis, das drogas, da arteriosclerose e alheio;
dos traumatismos crânio- encefálicos. São - Não assumem o crime, geralmente só confessam por
inimputáveis, via de regra. deslizes movidos pelo prazer em reviver o momento do
crime.

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-São levados ao crime por motivos diversos: uma de adequadas inibições, o que o leva a desordens do
homossexualidade latente pode levar à violência contra comportamento e à ação antissocial, enquanto a
a mulher, por ser a criatura odiada, ou à violência contra personalidade pseudo social (delinquente) se mostra
homens, em uma tentativa de atacar a morbidade capaz de se adaptar a grupos de comportamento
encontrada em si mesmo. desviado.

Atenção: psicopatas não são tipos raros. Estima-se Neuroses


que 40% da população seja formada por psicopatas, ou As neuroses manifestam-se por alterações frequentes,
seja, pessoas que sofrem de sérios distúrbios de geralmente sem base anatômica conhecida, que não
personalidade a ponto de interferir em seu alteram a personalidade. Caracterizam-se por
relacionamento social. perturbações afetivas, inadaptação à realidade e
sensação de insuficiência afetiva e social, dentre
Preste atenção nos detalhes abaixo para se proteger: outras.

Como agem? - Modus Operandis São exemplificadas por distúrbios neurovegetativos


(azia, dor e/ou batedeira no peito etc.), doenças
- Atacam em locais públicos; psicossomáticas (gastrite, colite etc.), fobias (“medo” de
- Escolhem vítimas sozinhas; altura, de pontas, de aranha etc.), histeria, angústia e
- Os ataques são, em sua maioria, noturnos e durante compulsão, dentre outros.
finais de semana; As pessoas portadoras de neuroses são pessoas
- Abordam pedindo informação ou oferecendo algo capazes, pois a personalidade está preservada.
atrativo;
Incidente de Sanidade Mental
Personalidade Delinquente Quando há dúvida sobre a integridade psíquica do
Os indivíduos com personalidade delinquente são agente criminal, determina-se o “exame prévio”, nos
portadores de defeitos graves do caráter, quase termos dos arts. 149 e 151 do Código de Processo
sempre estruturados e geralmente irreversíveis. Penal.
Considerados delinquentes essenciais, primários ou
verdadeiros, são também conhecidos como portadores Como complemento, apresentamos baseadas nos
de personalidades dissociais. trabalhos de maranhão, as diferenças mais
significativas entre as neuroses e a personalidade
De acordo com Jerkins, citado por Maranhão, o delinquente.
psicopata (personalidade psicopática) apresenta falta

Neuroses Personalidade delinquente


Com conflito interno Sem conflito interno
Agressividade voltada a si Agressividade voltada à sociedade
Gratifica-se por fantasias Alivia tensões internas por meio de ações criminosas
Admite seus impulsos e os reconhece como seus Atribui seus impulsos ao mundo exterior
Desenvolve relações emocionais positivas Desenvolve defesas emocionais
Socialmente ajustado Comportamento dissocial
Reage à passividade e dependência com sofrimento, Procura negar a passividade e a dependência com
mas admite a situação. atitudes agressivas
Caráter normal Caráter deformado (dissocial)

Considerações lhes é comum, a menores neuróticos e menores


delinquentes, é a instabilidade da atenção.
As características psicológicas profundas da Consequentemente, atrasam-se na escola. O menor
delinquência estão catalogadas, hoje, graças às delinquente devaneia menos, pois está dominado pelas
investigações de autores muito sérios. tendências a dramatizar suas fantasias em ações.
Quanto à conduta sexual, as diferenças mais
Os menores delinquentes, por exemplo, raramente significativas que se registram entre menores
apresentam sintomas neuróticos. São de manejo difícil delinquentes e menores neuróticos dizem respeito às
mas procuram conquistar a atenção e os sentimentos perversões manifestas, mais comumente observadas
de pena dos circunstantes, assim como só naqueles. No referente à formação da personalidade, o
excepcionalmente apresentam dificuldade de que se aponta com mais frequência nos delinquentes é
aprendizagem escolar em relação a certas matérias, o a distorção do superego.
que, no entanto é frequente, nas crianças neuróticas,
devido à inibição intelectual de causa afetiva. O que De ordinário, os menores delinquentes sofrem
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pressões ambientais mais traumatizantes que os extremamente comprometido o processo do
neuróticos. E ainda ressalta o fato de terem passado, pensamento. Com efeito, pensar implica retardar a
muitas vezes, um bom tempo de sua infância recolhidos ação, esperar o momento apropriado para a
a instituições, do gênero reformatório. Os neuróticos gratificação desejada.
provêm de lares que aparentam uma relativa
estabilidade, enquanto, entre delinquentes, o habitual é Como explicar, então, as habilidades mentais e
que provenham de lares totalmente destruídos. Os pais motoras que caracterizam a maioria dos delinquentes,
de menores delinquentes dão mostras de instabilidade a ponto de escaparem impunes de inúmeros roubos,
temperamental ou mesmo de tendências ou atuações assassínios, embustes, etc.? É que, como salientou
antissociais francas. Os pais de crianças rotuladas Edgardo Rolla, esses "indivíduos fizeram de sua forma
como neuróticas são em geral neuróticos manifestos. de viver um tipo de especialização da coordenação
Os laços emocionais entre filho e pai, entre filho e mãe, motora estriada, e consequentemente da coordenação
assim como os dos pais entre si, são de hábito do pensamento, que lhes permite cometer com o
conturbados no caso de delinquentes, muito mais do máximo de impunidade as ações fundamentais
que nos lares de onde provêm os jovens obsessivos características do psicopata".
fóbicos.
Acentua-se ainda que, na psicopatologia desses
Curiosamente, porém, assinalam alguns autores, não indivíduos, se evidencia uma outra peculiaridade do
se verificam diferenças de vulto no trato entre os psiquismo, que é a perturbação de função sintética do
irmãos, quer consideremos um ou outro dos grupos ego, da qual depende a integração dos impulsos e o
comparados. seu aproveitamento para o desenvolvimento da
personalidade. Daí o déficit de autocrítica, a
A conduta leviana, incoerente, dos pais, influi de modo desconsideração da realidade e a sempre possível
nocivo na estruturação da personalidade da criança eclosão criminosa.
que poderá vir a ser um psicopata delinquente.
Também importa mencionar aqui a proporção de Um dos aspectos do nosso tema, que talvez seja o que
menores perturbados da conduta que foram mais empolga no momento, é o da delinquência juvenil
amamentados pela mãe é insignificante e, quando o cujo substrato psicopatológico pode consistir em
foram, o desmame se deu precocemente. Com os qualquer tipo de psicopatia. Duas séries de fatores
conhecimentos que possuímos hoje acerca da objetivos, convergindo para os sentimentos da infância
formação da personalidade, é fácil compreender que e seus privilégios, de um lado, e de outro, a expectativa
esses fatores negativos estão no núcleo dinâmico e ansiosa do futuro, contribuem para o quadro
genético do problema que ora nos ocupa. A base de complexíssimo que configura a crise da adolescência.
toda a situação psicopática-delinquente é um impulso, Nessa crise, de ação e de expressão, o jovem corre
devido à carência das funções de adaptação aloplástica atrás de suas definições: a sexual e a de identidade. As
do ego. Entretanto, como a confusão é frequente, expressões fenomenológicas dessa etapa subordinam-
importa salientar que impulso e compulsão são se às defesas antidepressivas. Nesse jogo defensivo,
diferentes. A compulsão caracteriza o ato obsessivo, recorrem à mentira, à má-fé, às identificações
mandato interior para fazer algo sentido como projetivas maciças e, mais gravemente, às crises de
desagradável, por doloroso, cruel ou repugnante. Na despersonalização. A atividade desses jovens
prática clínica, os atos compulsivos podem às vezes psicopatas, que facilmente caem no delito, tanto em
com fundir-se com os impulsos, principalmente se estes casa como na escola, no trabalho, nos locais de
estão sobrecarregados de culpa. diversão, tende a ser predominantemente negativa,
tanto do ponto de vista da produtividade quanto da
A delinquência, que se impõe como expressão mais ética. Procedem de lares carentes de figuras parentais
ostensiva da psicopatia, é um transtorno psíquico apropriadas para uma boa identificação. São pais de
essencialmente evolutivo, que atinge o processo de caráter muito infantil, desejosos de transformar os filhos
personificação. Em consequência, há um déficit do em seus protetores, nos diferentes níveis emocionais.
sentido de realidade, de sentimento de identidade, da O resultado de tal relacionamento com os pais é
noção do esquema corporal e da capacidade de síntese desastroso. Sem modelos maduros, esses jovens são
do ego. A adaptação à realidade, não obstante a capazes de desenvolver as qualidades que levam
fachada de lucidez, é uma pseudo adaptação, naturalmente ao equilíbrio adulto. Crescem, se é que se
decorrente da falta de integração adequada no nível pode chamar a isso crescer, na dependência de
afetivo e da inaptidão a aprender com a experiência. E mecanismos de repressão maciça e de negação dos
sobre isso somem-se as deficiências de abstração, o instintos, o que os isola da realidade. Incrementando-
que leva o psicopata delituoso a incorporar lhes o narcisismo e as fantasias de onipotência, fonte
experiências concretas sem seu correspondente valor de suas defesas antidepressivas. Como lhes faltam
simbólico. Portanto, se não vivencia o significado pais para uma relação interpessoal salutar, tampouco
efetivo de muitas situações existenciais, importantes, podem adquirir confiança em si mesmos, o que
consegue apenas verbalizar suas emoções e tem constitui um pré-requisito indispensável para
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desenvolver o espírito de independência e socialização. caminhos trilhados por Cândido Motta, podemos,
É que não puderam tornar próprios, assimilados, os basicamente, ter cinco tipos de criminosos:
controles externos. E mais, para neutralizar a angústia
que lhes provoca essa impotência, negam seu valor 1º- Os Impetuosos: Agem em curto-circuito, por
como norma de vida. Tudo isso interfere negativamente amor à honra, sem premeditação, fruto de uma
na compreensão da realidade, que tentam manejar
anestesia momentânea do senso crítico. Dentre os
magicamente. O fracasso dessa defesa tem uma das
delitos que praticam relacionam-se principalmente
primeiras manifestações na ansiedade que lhes
o crime passional e alguns tipos de assassinatos e
provoca a escolha profissional, devido à incapacidade
para renunciar. Escolher então assume o significado, de agressão física. Em geral é um criminoso
não de aquisição, mas de perda de algo. Muitas de suas honesto, principalmente quando se trata de um
ações agressivas tomam aspectos de substitutivos de delito passional dos amantes, dos maridos e das
sintomas psíquicos. Haja vista a esfera de genitalidade. mulheres traídas.
Como a conduta genital se expressa em todas as
atividades, o fracasso de identidade sexual no 2º- Os Ocasionais: São os levados pelas
psicopata manifesta-se em todos os campos da condições pessoais e influências do meio. Os
conduta humana. fatores têm muito peso. Os delitos que mais
praticam são o furto e o estelionato.
A delinquência exprime o distúrbio da personalidade
resultante do conflito crônico com os pais, com as 3º- Os Habituais: São aqueles cujos marginais são
pessoas que são ou representam autoridades, com a incapazes de readquirir uma existência honesta. A
sociedade em geral. O comportamento desses emenda é a exceção. Cometem toda a sorte de
indivíduos atesta o fracasso mais flagrante da luta delitos como assaltos, tráfico de drogas e
defensiva contra os impulsos, contra as premências assassinatos em série. Esses últimos são co-
reivindicantes. nhecidos como “assassinos de aluguel ou
justiceiros”.
A pesquisa das raízes do verdadeiro sentido desse O criminoso habitual é o que tem como profissão o
distúrbio do existir levou os estudiosos do assunto a
crime; sai de casa para “trabalhar” cuja atividade é
considerá-lo multidisciplinar, epigenético. Portanto,
o delito.
será um enfoque errôneo pôr demasiada ênfase num
só fator dominante da personalidade delituosa. As
séries complementares do desenvolvimento dos 4º- Fronteiriços: Não são propriamente doentes
indivíduos - instintos, família, costumes comunitários, mentais e também não são normais. Apresentam
sistema socioeconômico - todos amalgamados permanentes deformidades do sendo ético-moral
determinam vicissitudes de caráter e de conduta distúrbio de afeto e da sensibilidade cujas
dificilmente reversíveis. Temos aí, referidas de relance, alterações psíquicas os levam ao delito.
as ciências básicas do homem: a Biologia, a Psicologia, Quando dão de ser violentos, são os que praticam
a Ecologia, a Antropologia, e a Sociologia. Quando os atos mais perversos e hediondos dentre todos
ocorre uma falha na interação dessas séries os outros tipos de criminosos.
complementares, o que pode sobrevir é o transtorno no A característica principal dos criminosos
engajamento pessoal, dificultando a colaboração fronteiriços é a extrema frieza e insensibilidade
coletiva a favor das transformações do ambiente, que moral com que tratam as vítimas.
se faz através das influências renovadoras. E então o
indivíduo - ante a angústia de sentir-se ameaçado de 5º- Loucos Criminosos: Os delitos que praticam
marginalização, se a comunidade o abandona podem ser divididos em dois grandes grupos:
impiedosamente à sua imaturidade psicológica, I- aqueles que agem graças a um processo lento e
deixando-o entregue à indigência de seus recursos reflexivo e
naturais de aprendizagem para a vida - ou reagirá II- aqueles que agem por impulso momentâneo.
destrutivamente contra a sua organização comunitária
ou se retrairá como unidade social e se apagará no
No primeiro caso, a ideia surge do nada,
autismo. Noutras palavras: ou se extravia no crime, ou
inesperadamente, é a obsessão doentia e
se desagrega na psicose.
invencível.
No segundo caso, a deliberação do crime é fruto de
Classificação dos Delinquentes uma impulsão momentânea; é seguido de imediata
execução. O ato é em curto-circuito, reação
Classificação dos Criminosos: primitiva, sem motivo algum que possa justificar o
tipo de atitude.
Observando os ensinamentos do doutrinador Guido
Arturo Palomba, ilustre Psiquiatra Forense, seguindo os No campo da execução penal importante ressaltar sua
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natureza e objeto. Quanto a natureza, a jurisprudência os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.
e a doutrina nos apontam as divergências reinantes,
pois para alguns a execução criminal tem incontestável São várias as consequências da condenação e os
caráter de processo judicial contraditório. É de natureza direitos atingidos pela sentença, como por exemplo:
jurisdicional.
1- Lançamento do nome do réu ao rol dos culpados, o
Para Ada Pellegrini Grinover a execução penal é uma que só é possível após o transito em julgado da
atividade complexa, que se desenvolve nos planos sentença penal condenatória;
jurisdicional e administrativo. Segundo Paulo Lúcio No- 2- Prisão do réu;
gueira a execução penal é de natureza mista, complexa 3-Tornar certa a obrigação de indenizar o dano
e eclética no sentido de que certas normas da causado pelo crime;
execução pertencem ao direito processual enquanto 4- Perda de cargo, função pública e mandato eletivo;
que outras que regulam a execução propriamente dita 5- Constitui obstáculo à naturalização do condenado;
pertencem ao direito administrativo.
Por outro lado, não são atingido pela sentença penal
Para Júlio Fabbrini Mirabete a execução é de índole condenatória os seguintes direitos:
predominantemente administrativa. 1- Inviolabilidade do direito à vida, liberdade, igualdade,
Quanto ao objeto, visa-se pela execução fazer cumprir à segurança e à propriedade;
o comando emergente da sentença penal condenatória 2- Igualdade entre homens e mulheres em direitos e
ou absolutória imprópria, assim considerada aquela obrigações;
que não acolhe a pretensão punitiva mas reconhece a 3- Integridade física e moral, não podendo ser
prática da infração penal e impõe ao réu medida de submetido a tortura ou tratamento desumano ou
segurança. degradante;
4- Liberdade de manifestação do pensamento;
De acordo com o Artigo 3º da Lei de Execução Penal – 5- Individualização da pena;
Ao condenado e ao internado serão assegurados todos

Modelos de Prevenção e Reação ao Fenômeno Criminal

Criminologia Prevencionista fatores criminógenos ou causas do caráter criminoso do


delinquente.
A base da sistemática prevencionista está no conceito
de Criminologia Prevencionista. 2ª) Fase de Pós-delinquência - através da prevenção
da reincidência, por meios de mecanismos, critérios,
Conceito de Criminologia Prevencionista medidas e ações capazes de recuperar ou ressocializar
os criminosos perigosos e/ou antissociais e integrá-los
Criminologia Prevencionista é uma ciência humana e à comunhão social como cidadãos decentes.
social que estuda: Princípios Básicos da Criminologia
Prevencionista
1 - o homem criminoso e os fatores criminógenos ou
causas que contribuem para a formação de seu caráter 1 – Existencialismo Absoluto da relação Causa-
perigoso e/ou antissocial; Efeito
Nada existe sem causa geradora.
2 - a criminalidade, como o conjunto de criminosos e
seus crimes, numa determinada região e num 2 – Só pela Prevenção será possível neutralizar as
determinado tempo, suas geratrizes, sua nocividade ou Causas ou Fatores Criminógenos
periculosidade e suas oscilações em decorrência de Evitada ou eliminada a causa, não há como surtir efeito.
medidas que se implementem contra ela;
3 – A Solução para o problema criminal está em
3 - solução. Esta só poderá ser alcançada à nível de transformar o Mau Caráter para Bom Caráter
segurança pública e paz social, pela prevenção do A vontade está sempre vinculada ao caráter. O caráter
crime, em duas fases: é que empresta à vontade a disposição para os atos. A
vontade não age por si só, mas de acordo com o
1ª) Fase de Pré-delinquência - através de políticas caráter. Se o caráter é bom (moralmente bem-
governamentais, capazes de evitar ou eliminar os formado), a vontade não vai agir para a consecução de

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fins maus; se o caráter é mau (moralmente concorrentes como migração, favelização,
malformado), a vontade só pode agir para a adensamento populacional, mídia, drogas, álcool,
consecução de fins maus. prostituição, corrupção, porte de armas, etc.

REGRA - Se o crime decorre da má formação do Nos fatores endógenos, se encontram várias


caráter, basta que os pais e educadores, formem bem modalidades de portadores de personalidade
e moralmente o caráter das crianças e dos psicopáticas, neuróticas e doenças mentais,
adolescentes para que não se tenha, no futuro, manifestadas no ser humano e reveladas através de
criminosos perigosos e antissociais e, se assim mesmo desvios da conduta deformada – anômala ou anormal
ocorrer o crime, basta depurar o caráter moralmente em relação aos padrões socialmente aceitáveis.
malformado, através de um processo restaurador,
resgatando-se a dignidade daquele que a perdeu, Política Criminal de Prevenção do Delito
oportunizando-se com isso, a sua volta à comunhão
social. Prevenção do delito
A sociedade não pode conviver com indivíduos A constante busca de um ideal, seja moral, religioso,
perigosos e antissociais. político ou social, tem caracterizado sempre a aventura
humana. Essa permanente indagação deu origem a
EXCEÇÃO A ESTA REGRA - o mau caráter resulta determinadas crenças, algumas das quais, pelo seu
tanto de fatores exógenos como endógenos. Se o mau caráter perene e pela distância as separa da realidade
caráter resultou de fatores exógenos ou fatores sociais, observável, têm-se transformado às vezes em mitos de
a raiz do problema é apenas moral e o criminoso é grande importância. Esses mitos dominam numerosos
passível de recuperação por meios pedagógicos aspectos da vida social, sendo especialmente
(laborpsicoterapia) e o índice da incidência, neste caso, abundantes no setor da justiça penal. Um deles é o da
é de 90 a 95%, mas se resultou de fatores endógenos, prevenção da delinquência.
o seu portador só pode ser recuperado por meios
médico-psiquiátricos, desde que isso seja possível ou Existe um consenso generalizado em considerar que a
viável (5 a 10%). prevenção do delito constitui um objetivo importante do
sistema penal. Afirma-se com frequência que é melhor
Fatores Criminógenos como Fontes de prevenir o crime do que reprimi-lo. De forma mais
Abastecimento do Crime na Sociedade concreta, quase todos os especialistas na matéria
estimam que a prevenção do delito representa, senão
Conceitos Gerais sobre Causa-Efeito a principal função, pelo menos uma das funções mais
importantes e tradicionais da polícia.
Causa é tudo o que provoca uma consequência ou um
resultado. Obviamente que efeito é a consequência ou Apesar de certos filósofos terem abordado esse tema
resultado da causa. há muito tempo e dado ainda que diversas instituições
jurídicas parecem ter respondido a idênticas
O criminologista brasileiro, ORLANDO SOARES, em inquietações, a preocupação com a prevenção do delito
seu livro “CRIMINOLOGIA”, 1976, falando de “Fatores é uma tendência atual. O direito clássico não poderia
Criminógenos” e “Fenômenos Sociais”, declara: acolhê-la na medida em que o legislador, para efeitos
“considera-se fator aquilo que pelas suas da sanção penal, pretendia da injúria feita contra a lei
características ou condições, contribui ou concorre para ou simplesmente a dor do dano causado pela infração.
um resultado, isto é, torna viável o efeito, servindo-se A noção moderna de prevenção aparece timidamente
de nexo, entre este e a causa, relacionando-os com a escola clássica, segundo a qual a pena exerce
naturalmente”. Mas, assim como em Matemática, um uma importante função de intimidação geral, mas tem a
só fator não dá produto, o caráter criminoso não resulta sua verdadeira origem na escola positiva de finais do
de um só fator. século XIX.

Nada ocorre ao acaso. Não há geração espontânea. Entre as principais razões que colocaram em evidência
Todos os fenômenos, tudo o que for capaz de a necessidade de novos enfoques em relação à
impressionar os sentidos humanos, produz-se devido a prevenção, devem ser mencionadas as seguintes:
relação causa e efeito. 1) o aumento da delinquência grave e o aparecimento
de novas formas de criminalidade;
Como já vimos, os fatores criminógenos são divididos 2) as repercussões do delito na sociedade (lesões,
em fatores exógenos e endógenos. Os fatores perdas econômicas, impacto emocional, efeitos
exógenos são os fatores sociais como os desfavoráveis sobre a qualidade de vida, etc.) e, em
sociofamiliares, socioeducacionais, socioeconômicos, particular, em determinados grupos (pessoas idosas,
socioambientais (más companhias) e outros deficientes físicos, mulheres, crianças, etc.);

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3) o sentimento de insegurança cada vez maior dos  prevenção primária através de programas político-
cidadãos e suas consequências (inibição, sociais que se orientem para a valorização da
desconfiança, angustia, solicitação de medidas cidadania, dando atendimento às necessidades
repressivas, mudanças nas condutas normais, básicas como emprego, educação, saúde, habitação,
organização de sistemas coletivos de proteção, lazer etc.;
utilização com fins políticos ou partidários do  reestruturação urbana dos espaços conflitivos,
sentimento de medo do crime, etc.); incidindo positivamente no habitat físico e ambiental,
4) os custos cada vez mais elevados do conjunto do com implicações na ativa prevenção do delito e dos
sistema penal e, em particular, dos serviços policiais, riscos para o delinquente, porém, fomentando-se
assim como os custos indiretos do delito (sistemas de atitudes positivas de solidariedade e responsabilidade
segurança, seguros, etc.); pois a barreira física, apenas, leva a outros delitos e ao
5) a baixa percentagem de solução do delito; desenvolvimento de técnicas ofensivas mais
6) a pouca participação do público no funcionamento da elaboradas;
justiça penal e a insatisfação generalizada da  prevenção de reincidência dos condenados através
população em relação ao conjunto do sistema penal; da ressocialização. Apesar de ser um programa de
7) a ausência de parâmetros para a articulação de uma tratamento, indiretamente também é preventivo devido
política criminal moderna e progressista. à enorme reincidência - há muito mais delitos que
delinquentes;
Com relação à prevenção, as principais carências  substitutivos penais para os infratores eventuais de
são: crimes sem gravidade, sem índole e habilidade
1) a imprecisão e inadequação do significado desse criminosas, mas que poderão desenvolvê-las em
termo; contato com os condenados das prisões. O substitutivo
2) por um lado, a falta de informação e de penal também evita a estigmatização;
conhecimentos nesse setor e, por outro lado, e,  ações públicas e comunitárias dirigidas ao jovem
paradoxalmente, a proliferação de programas; grupo mais vulnerável à criminalidade em geral (como
3) a ausência de continuidade nas ações autor ou vítima), e com participação elevada nos
empreendidas; índices de morte violenta, a chamada “morte evitável”.
4) a falta de coordenação entre os órgãos que se Programas de orientação cognitiva (treinamento e
ocupam da prevenção e a carência de aquisição de habilidades) podem ser altamente
responsabilidades precisas desses órgãos; positivos para o extravasamento da violência e das
5) o pouco apoio profissional e material necessário para frustrações, canalizando-as para ações positivas.
uma ação eficaz nesse setor; Sabendo-se que a maior parte dos jovens delinquentes
6) a relativa ausência de participação da comunidade tem família, mesmo que desestruturada, é dever dela
na prevenção do delito. (família), da escola, através das organizações civis e do
poder público promover ações educativas e
Finalmente, no que tange à prevenção policial, reintegradoras do jovem à sociedade;
devem ser assinaladas as seguintes lacunas:  desenvolvimento de pesquisas independentes
1) a existência de diversas concepções sobre o que através de surveys de vitimização, mais realistas que
deve ser a sua ação preventiva; as estatísticas oficiais. A grande distância entre a
2) uma certa confusão sobre os objetivos da polícia criminalidade “real” e a “registrada” denuncia, também,
(prevenção, repressão, detecção do delito, etc.); as imunidades institucionais da classe média e alta, que
3) a existência de poucos policiais que receberam uma faz os seus componentes serem menos detectados
formação suficiente sobre as técnicas e os métodos e/ou detidos e processados, e, em menor grau, ainda,
preventivos; condenados;
4) muitos programas mal concebidos ou mal aplicados;
 campanhas de prevenção vitimária, articuladas pelos
5) são poucos os recursos humanos e materiais
meios de comunicação, de mudança de
destinados à prevenção;
comportamento das pessoas integrantes dos
6) são também raras as avaliações sobre os programas
chamados “grupos de risco”, potencialmente sujeitas a
desse tipo colocados em pratica pela polícia;
vitimização - to be in the wrong place at the wrong time.
7) alguns deles não se prestam a uma fácil avaliação.
Diversos estudos na área de Saúde Pública
consideram agressão e direção perigosa,
Políticas criminais para a prevenção de delitos: características de pessoas similares com tendências
suicidas e/ou homicidas;
 investimentos em pesquisas sistemáticas que  programas de mudança de mentalidade da polícia e
coloquem suas conclusões à disposição dos da sociedade em geral sobre a necessidade de
segmentos da sociedade, preocupados com a reportagem dos crimes para a redução da criminalidade
qualidade de vida humana e com a redução nos níveis oculta. O aparato de controle envolve as atitudes da
de violência; vítima e da polícia (ignorar ou registrar), que por sua

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vez está condicionado também ao grau de confiança alternativo no mercado de trabalho (Becker, 1968) e então
que esta inspira àquela; decide sua participação em atividades criminosas a
 programas de sensibilização e solidariedade à vítima, partir desta avaliação entre ganhos e perdas.
especialmente dos crimes sexuais, que são altamente
subestimados por seu caráter estigmatizante; Já a moderna criminologia aceita a possibilidade de
 programas de redução de circulação de armas de diminuir a delinquência através de diversas outras
fogo para uso particular. Diminuindo o número de formas que não exclusivamente o delinquente,
armas de fogo em circulação haveria redução destacando as formas de prevenção primária,
na mortalidade, mesmo que não reduzisse a violência, secundária e terciária.
devido à alta letalidade dessas armas. Ademais,
indiretamente estaria deixando de armar o bandido que A prevenção primária ressalta a educação, a habitação,
tem na vítima uma das formas de aquisição desse o trabalho, a inserção do homem no meio social, a
instrumento. Paralelamente, a vigilância nas fronteiras qualidade de vida, como elementos essenciais para a
também seria uma forma de desarmamento já que a prevenção do crime, elementos estes que operam
origem da maior parte das armas em circulação é sempre a longo e médio prazo e se dirigem a todos os
externa ao país. cidadãos. São estratégias de política econômica, social
 reavaliação do conteúdo disciplinar das escolas de e cultural, cujo objetivo primário seria oferecer
formação de policiais (civil e militar), dando maior qualidade de vida ao cidadão, e último seria dotar o
ênfase às humanidades. A atuação policial reveste-se, cidadão de capacidade social para superar eventuais
muitas vezes, de tanta arbitrariedade e violência, que conflitos de forma produtiva.
desvirtua a sua tarefa de proteção do cidadão e
manutenção da ordem pública. A prevenção secundária atua mais tarde, nem quando
 Implantação definitiva da polícia comunitária, vista nem onde o conflito criminal se produz ou é gerado mas
como uma nova filosofia de comportamento integrado onde se manifesta ou se exterioriza. Opera a curto e
com a sociedade. A integração dos segmentos (polícia médio prazo e se orienta seletivamente a grupos
e comunidade) reduz a violência policial e aumenta a concretos, ou seja, grupos ou subgrupos que ostentam
conscientização da sociedade para a sua maiores riscos de padecer ou protagonizar o problema
responsabilidade no processo criminal. criminal. São exemplos a política legislativa penal e a
ação policial, políticas de ordenação urbana, controle
dos meios de comunicação.
Políticas públicas de prevenção da violência e
a prevenção vitimária. A prevenção terciária tem um destinatário
perfeitamente identificável, o recluso, o condenado, e
Segundo a criminologia moderna, a violência não é um objetivo certo, qual seja o de evitar a reincidência
somente um problema da polícia e os esforços no seu através de sua ressocialização.
combate não devem ser direcionados somente ao
infrator. Falar sobre combate à criminalidade é falar A seguir, trataremos dos principais programas de
principalmente sobre prevenção. A melhor forma de se prevenção, em teoria, e as devidas correntes
combater ou diminuir a criminalidade é alcançando o criminológicas nas quais se inspiraram.
crime em suas causas, suas raízes, não suas
consequências.
Principais programas de prevenção
Mas o que podemos entender como prevenção da
criminalidade? Garcia-Pablos de Molina afirma que a Prevenção sobre áreas geográficas: é nos
criminologia clássica direciona todos os seus esforços núcleos urbanos industrializados que se identifica a
preventivos para o infrator, pois entende a ameaça da concentração dos mais elevados índices de
aplicação da pena como modo eficaz de neutralizá-lo. criminalidade, por serem áreas muito deterioradas,
“Não existe, pois, outro possível destinatário dos pobres de infraestrutura, e com significativos níveis de
programas de prevenção criminal, tendo em vista o desorganização social. É com base na Escola de
protagonismo absoluto que se outorga ao delinquente” Chicago que se faz uma análise sobre a expansão das
(Molina & Gomes, 1997: 74). cidades e o fenômeno da industrialização, de onde
emergem novos fenômenos sociais, a partir das
É como se o infrator fizesse um balanço entre os custos provocadas mudanças na ordem econômica,
e benefícios caso cometa o crime, e de uma maneira demográfica e espacial. É desse turbilhão que surge
refletida, decide consumá-lo. É a Teoria da Escolha um novo ambiente, marcado por grandes
Racional, onde o indivíduo confronta, de um lado, o desigualdades e propício ao surgimento de condutas
volume da punição, e principalmente as probabilidades desviadas, muitos deles tipificados pela legislação
de detenção e aprisionamento, e de outro, o custo da como crime.
oportunidade de cometer crime, os potenciais ganhos
resultantes da ação criminosa, traduzido como salário

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O crime é então um produto social do urbanismo. Essa urbana. Desta forma, o público alvo destes programas
teoria baseia-se na perspectiva de vida coletiva como seriam com frequência os marginalizados, ou aqueles
um processo adaptativo consistente de uma interação que pelo fato de estarem à margem numa série de
entre meio-ambiente, população e organização (Freitas, aspectos, habitam nos bairros menos favorecidos ou
2002). O comportamento humano é visto como sendo mais conflituosos.
moldado por vetores socioambientais, portanto, o crime
não é considerado um fenômeno individual, mas Prevenção dirigida à reflexão axiológica: seria a
ambiental, no sentido de que o ambiente compreende revisão de atitudes, de valores e de pautas de
os aspectos físico, social e cultural da atividade comportamento. Para evitar certos comportamentos no
humana. futuro, faz-se necessário substituir os valores sociais
que os sustentam no presente. A criminalidade dos
Sugere-se então atitude de intervenção dos poderes jovens e crianças é um exemplo, pois o crime é
públicos nestas áreas marginalizadas, com programas aprendido, segundo a teoria do Aprendizado Social (ou
de reordenação urbana, melhoria de infraestrutura, da Associação Diferencial).
oferecimento de serviços públicos básicos. A
prevenção do delito também pode acontecer por meio De acordo com Sutherland (apud Kuhn, 2002, 41) os
da reestruturação física ou urbanização dos bairros, indivíduos determinam seus comportamentos a partir
procurando-se assim neutralizar o risco criminógeno ou de suas experiências pessoais com relação a situações
vitimário de certos espaços, a partir, por exemplo, de de conflito, por meio de interações pessoais e com base
medidas de melhoramento das vias de acesso as no processo de comunicação. Desta aprendizagem,
residências ou local de trabalho, melhorias na determinam-se os comportamentos favoráveis e
iluminação, no sistema de transporte público e da desfavoráveis ao crime. Neste sentido, tanto os
criação de pontos de observação ou vigilância. Seriam contatos pessoais, como o contato com métodos e
espécies de barreiras ao crime, que dificultariam o técnicas criminosas são formas de aprendizado que
acesso e incrementariam o risco para o infrator motivariam e legitimariam o comportamento delituoso.
potencial.
Sutherland então constrói nove hipóteses onde a
Todavia, devemos observar a possibilidade desta primeira, a segunda e a quarta são consideradas as
política de prevenção se tornar em política de conteúdo mais relevantes. O comportamento criminal é
ofensivo e discriminatório, com base no entendimento apreendido (primeira hipótese). É dentro do processo
segundo o qual a criminalidade estaria concentrada nos de comunicação com as outras pessoas (segunda
locais de alta densidade demográfica, e menos hipótese) que a aprendizagem começa pela
favorecidos. Seriam então vítimas de discriminação transmissão e imitação de técnicas e de atitudes
principalmente os cidadãos marginalizados, pois criminosas (quarta hipótese).
frequentemente residem nos ambientes onde há
grande concentração demográfica e falta de estrutura

Esta teoria pode explicar claramente a delinquência Todavia, são feitas críticas no que se refere a relação
juvenil dos bairros menos favorecidos das cidades de causalidade desta teoria. São os contatos com
brasileiras. A sociedade adulta deveria passar criminosos que levam o indivíduo a uma vida criminosa,
mensagens de êxito ou triunfo pessoal, mas não a ou o indivíduo criminoso procura laços com grupos de
qualquer preço. E ainda, não somente evitar criminosos?
comportamentos negativos, mas levar mensagens e
modelos positivos de conduta que outorguem um Prevenção do delito de inspiração político
sentido a existência. social: boa parte da criminalidade de que uma
sociedade padece tem raízes em conflitos sociais,
como situações carenciais, desigualdades, conflitos
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não resolvidos. Isto fica bem claro a partir da teoria da Em síntese, inspirado por Sutherland, Merton explica
Anomia, que deve ser entendida na perspectiva de que existem sociedade extremamente pobres (carência
Durkheim (1897) e de Merton (1957). de bens disponíveis, anômicas) onde os índices de
criminalidade são baixos, como na Índia. Então não
Segundo Durkheim o crime é um fato social. O homem seria necessariamente a falta de bens de primeira
não vive num ambiente de eleição, mas sujeito a uma necessidade o que é determinante, mas sim a tensão
ordem imposta, estabelecendo-se, assim, as condições resultante da estrutura social destes países onde
para a produção do crime. encontramos desigualdade. A criminalidade é resultado
da distância entre o desejo de vencer na vida e os
Introduzindo a teoria da anomia, Durkheim explica que meios disponíveis para vencer na vida, como
o crime é uma manifestação de um desregulamento educação, saúde, trabalho e dinheiro (apud Kuhn, 2002).
social. O crime é fruto da estimulação de desejos,
decorrentes da modernização. Anomia significa uma Observando o contexto social do nosso país, a tensão
falta, um espaço, um branco, que devido ao seu não decorrente do modo de vida advindo dessa estrutura
preenchimento de forma lícita, estimula no homem o nos faz concluir que temos que buscar suporte
instinto de preenchê-lo de qualquer maneira, ainda que principalmente nesta teoria, para justificarmos o
de forma ilícita. A modernização e a urbanização são aumento da criminalidade, e assim, portanto, tentar
fenômenos que provocam a anomia, pois, aumentam a buscar soluções de caráter principalmente social que
quantidade e a variedade de bens de consumo, mas ao possam amenizar o problema. Uma ambiciosa política
mesmo tempo, provocam na sociedade uma social se converte então no melhor programa de
insuficiência de bens, pois nem sempre são prevenção criminal, já que pode intervir nas causas, do
disponíveis. Ainda mais, a satisfação do homem é qual o crime é um mero sintoma ou indicador.
evolutivamente refinada. Desta forma, a anomia é a
distância entre o crescimento de bens disponíveis e a Prevenção Vitimária: é a prevenção a partir da
evolução dos desejos do homem. vítima, verificando o seu potencial vitimal. A partir da
Quanto mais a sociedade se moderniza, mais será consciência do papel ativo da vítima na dinâmica do
anomica pois os desejos do homem serão sempre delito, a prevenção vitimária sugere uma intervenção
maiores que os recursos disponíveis. Em período de nos grupos de vítimas potenciais que ostentam, por
crise econômica por exemplo, onde produção e diversos motivos, tais como condição social, física,
recursos diminuem de maneira brutal, os desejos idade, sexo ou origem, maiores riscos de sofrerem
humanos continuam a crescer. Não há então uma agressões. “O crime é um fenômeno altamente seletivo,
equivalência ou adaptação entre ambos. não casual, nem fortuito ou aleatório: busca o lugar
oportuno, o momento adequado, e a vítima certa
Merton (1957) reformulou a teoria de Durkheim também. A condição de vítima – ou risco de chegar a
trazendo uma nova abordagem. Segundo ele a sê-lo – tampouco depende do azar ou da fatalidade,
motivação para a delinquência decorreria da senão de certas circunstâncias concretas, suscetíveis
impossibilidade de o indivíduo atingir as metas de verificação” (Molina & Gomes, 1997: 75).
desejadas por ele, como o sucesso econômico. Esse
modelo de explicação funcionalista consiste em É a teoria da ocasião ou do situational approach,
reportar o crime a uma possível contradição entre segundo a qual o homem é influenciado por elementos
estrutura social e estrutura cultural. A cultura, em que estão ao seu redor para a prática do crime. Desta
determinado momento do desenvolvimento de uma forma, segundo o estilo de vida da vítima (life style
sociedade, propõe ao indivíduo determinadas metas, model, de Hondenlang, Gottfredson e Garofalo, 1978),
como, por exemplo, um certo nível de bem-estar e de o risco de se sofrer uma vitimização pode também ser
sucesso econômico, o carro X, a roupa Y. Proporciona maior, bastando que a vítima potencial encontre um
também modelos de comportamento autor motivado.
institucionalizados que resguardam que aquelas metas
deverão ser alcançadas através de meios legítimos. No aspecto prevencional, a teoria da ocasião de certa
forma contribuiu para algumas inovações na política
Todavia, pode existir desproporção entre os fins criminal. A noção de hot spots trouxe para as
culturalmente reconhecidos como válidos e os meios discussões criminais a preocupação com locais onde
legítimos de que dispõe o indivíduo para alcançá-los. E exista uma concentração de causas que possam levar
esta desproporção está na origem dos comportamentos ao crime, como bairros menos favorecidos e
desviantes. A Anomia é, portanto, “crise da estrutura marginalizados, ou locais frequentados pela noite,
cultural, que se verifica especialmente quando ocorre ainda que em bairros mais favorecidos, mas onde se
uma forte discrepância entre normas e fins culturais, possa encontrar uma combinação de fatores que
por um lado, e as possibilidades socialmente possam levar ao crime, tais como drogas, bebida e
estruturadas de agir em conformidade com àquelas, do dinheiro
outro lado” (Merton, 1957).

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Ainda segundo a mesma teoria da ocasião, o segundo O outro aspecto das políticas de prevenção vitimária
aspecto a ser observado para a prevenção vitimária que é importante ressaltar é a cultura do medo que
seria a rotina de vida: routine activity approach (Chen & estas políticas podem desenvolver. O medo que
Felson, 1979). Não somente o lugar que a vítima frequenta cidadãos, ou vítimas em potencial, passam a
é importante, mas também sua rotina de vida. O crime desenvolver em seu psíquico através do mecanismo
é cometido quando o autor motivado encontra sua natural de autodefesa.
vítima potencial e desprotegida. Desta forma, há um
equilíbrio entre as condições objetivas que oportunizam Modelos e Sistemas de Segurança Pública
o crime, e as condições objetivas produzidas pela
própria vítima, a partir da sua rotina.
Sistema
Sondagens de vitimização foram feitas em alguns
países da Europa, na intenção de mesurar a Um sistema é um conjunto de elementos
criminalidade oculta e traçar o perfil das vítimas mais interconectados harmonicamente, de modo a formar
frequentes de crimes. Perguntou-se ao entrevistado se um todo organizado. Vindo do grego o termo "sistema"
já havia sido vítima de algum delito, qual delito, em que significa "combinar", "ajustar", "formar um conjunto".
período, em que lugar, quais as características do
infrator, se o infrator era conhecido, qual foi o prejuízo Em um sistema, todos são importantes. Observe um
advindo do crime, se o fato foi noticiado à autoridade exemplo de um sistema: a Polícia Militar conduz um
competente e se houve intervenção desta (Killias, 2001; criminoso à Delegacia. A Polícia Civil registra a
Molina & Gomes, 1997). ocorrência e dá início ao Inquérito Policial. Ao ser
concluído, o Inquérito é encaminhado ao Ministério
O que foi identificado nestas pesquisas, além da total público que, por sua vez, pode pedir o arquivamento ou
discordância entre os delitos registrados na polícia e os novas diligências ou aceitar como está e oferecer a
índices de vitimização detectados pela pesquisa, denúncia que é remetida à Vara Criminal. O Poder
principalmente nos delitos sexuais, foi que alguns Judiciário, aceitando a denúncia do promotor, dá início
delitos podem ser evitados a partir do momento em que à instrução criminal. Caso o réu seja condenado, o
se conhece o público alvo das infrações e as condições Sistema Penitenciário entra em ação para cumprimento
físicas em que estes se desenvolvem Com frequência, de pena e promoção da ressocialização do indivíduo.
são mais vítimas de violência pessoas que tem uma
rotina mais agitada, e que declaram passar mais tempo A boa integração dos elementos é chamada sinergia,
fora do que dentro de casa, seja trabalhando ou se determinando que as transformações ocorridas em
divertindo. Inclui-se ai os índices de violação de uma das partes influenciará todas as outras. A alta
domicílio, que aumenta também entre as pessoas que sinergia de um sistema faz com que seja possível a este
viajam com mais frequência (Killias, 2001). É comum que cumprir sua finalidade com eficiência; já sua falta pode
a vítima conheça seu agressor, principalmente quando implicar em mau funcionamento, inclusive falha
falamos de mulheres vítimas de violência. Os jovens do completa. Podemos também dizer nesses últimos
sexo masculino e os que têm nível superior de casos que a entropia sistêmica está alta.
escolaridade são o público mais frequentemente alvo
da criminalidade urbana (Kahn, 2002). Ordem Pública
O Decreto 88.777, de 1983, define ordem pública como
Isto demonstra a possibilidade de detectarmos os sendo...
indicadores que convertem as pessoas em candidatos “o conjunto de regras formais, coativas, que
à vitimização. Através de um estudo do emanam do ordenamento jurídico da nação,
comportamento, do perfil da vítima, e das objetivando disciplinar as relações sociais em
possibilidades que algumas têm de se tornarem todos os níveis e estabelecer um clima de
vítimas, pelo meio em que vivem, ou por serem de convivência aceitável e pacífico constitui, assim,
classes mais vulneráveis, tais como mulheres, uma situação ou condição que conduz ao bem
crianças, idosos, estrangeiros, marginalizados, comum.”
podemos elaborar políticas criminais de segurança
pública mais objetivas. Podemos verificar também os Esse conceito, embora o R-200 (Regulamento para as
locais e momentos mais prováveis de vitimização, Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares),
trabalhando com estas pessoas de forma que evitem ainda não tenha sido modificado, enfrenta alguns
estes espaços e comportamentos considerados mais conflitos conceituais. Para Diogo de Figueiredo Moreira
perigosos, ou então que organizem sua vida de forma Neto (1987), ele é contraditório quando confunde
a evitar sofrerem crimes, que assumam atitudes em ordem jurídica com a “ordem nas ruas”. E explica que
defesa de seus próprios interesses, desde o momento embora uma violação a norma jurídica possa se
em que já conhecem o motivo que as torna mais constituir numa inflação a ordem pública, nem sempre
vulneráveis. as violações à ordem pública podem ser consideradas
com inflação a ordem jurídica. Dessa forma, ele propõe
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um “conceito sintético”, que a seu ver “parece conter o mesmo em fazer aquilo que a lei não lhe veda, não
essencial”, e postula que “Ordem Pública, objeto da pode ir além da liberdade assegurada aos demais,
Segurança Pública, é a situação de convivência ofendendo-a”. Plácido Silva
pacifica e harmoniosa da população, fundada nos
princípios éticos vigentes na sociedade”. E acrescenta “Segurança Pública é o estado antidelitual, que resulta
que ao definir a Ordem Pública com “objeto” da da observância dos preceitos tutelados pelos códigos
Segurança Pública, ele esta fazendo uma vinculação penais comuns e pela lei das contravenções, as ações
“operativa”. O termo “situação” deve ser entendido que promovem a segurança pública são ações policiais
como um fato e não uma norma. E por “convivência repressivas ou preventivas típicas. As mais comuns são
pacifica e harmoniosa” deve ser compreendido a as que reprimem os crimes contra a vida e a
ausência da “violência, do terror, da intimidação e dos propriedade. Todavia, a segurança pública pode
antagonismos capazes de romper a situação resultar da simples ausência, mesmo temporária, dos
desejada”. Por último, o Jurista enfatiza que “a menção delitos e contravenções”. MÁRIO PESSOA
aos princípios éticos, vincula a situação, a ser mantida
ou recuperada, às vigências éticas e que não é, de “A Segurança Pública é uma atividade pertinente aos
nenhum modo, uma atividade repressiva: a repressão órgãos estatais e à comunidade como um todo,
dos crimes compete aos tribunais”. realizada com o fito de proteger a cidadania,
prevenindo e controlando manifestações da
Para outro Jurista, Álvaro Lazzarini, o conceito contido criminalidade e da violência, efetivas ou potenciais,
no R-200, que define Ordem Pública como “conjunto de garantindo o exercício pleno da cidadania nos limites
regras formais, que emanam do ordenamento da lei”. SENASP
jurídico(...)”, também é conflitante, e sugere que seja
abandonado ou substituído. Para ele... O Manual Básico de Policiamento Ostensivo, instituído
no início dos anos 80, do último século, definiu
“a ordem pública não é figura jurídica, nem Segurança Pública como “a garantia que o Estado
instituição política ou social. É situação fática de (União, Unidades Federativas e Municípios)
respeito ao interesse da coletividade e aos proporciona à Nação, a fim de assegurar a Ordem
direitos individuais que o Estado assegura, pela Pública contra violações de toda espécie, desde que
constituição da República e pelas leis, a todos os não contenha conotações ideológicas”.
membros da comunidade. Daí decorre a
variedade do conceito de “ordem pública” no Neste conceito percebe-se claramente a preocupação
tempo e no espaço.” do Governo Federal em excluir as violações da Ordem
Pública de cunho ideológico. Todavia tudo estava sob
O conceito de ordem pública tal qual foi concebido no o controle direto do Governo Central, através do
R-200, fortalece a doutrina do fiel cumprimento da lei, Exército, que tinha elementos do seu quadro ocupando
excluindo as variáveis sociais, econômicas e políticas, os cargos de Secretário de Segurança Pública e
que são mutáveis no tempo e no espaço, Comandante Geral da Policia Militar. Além disso, a
independentemente do sistema jurídico em vigor. Mas Policia Militar como Força reserva e auxiliar do Exército,
embora o texto legal não tenha sido reformado, a teria que anteceder o emprego da Força de Linha e
verdade é que o Brasil mudou. Se antes vivíamos sob executar as atividades operativas planejadas pela
um Regime de exceção, hoje convivemos num Estado Secretaria de Segurança Pública. Na pratica isso
Democrático de Direito, onde a participação do cidadão significava que a Policia Militar, como Instituição
deve ser privilegiada, e sua opinião valorizada no responsável pelo Policiamento Ostensivo, era quem
planejamento das políticas públicas e no fortalecimento teria de enfrentar cotidianamente as contestações
da Democracia. contra o Governo instalado.

Compreende: Todavia, no período de exceção, a Ordem Pública nas


 Tranquilidade Pública; ruas não apresentava níveis intoleráveis de
 Segurança Pública; e, criminalidade e violência. Os crimes sem ideologia se
 Salubridade Pública. resumiam a furtos, assaltos contra transeuntes, poucos
homicídios, e outros delitos de incidências reduzidas e
Segurança Pública menores potenciais. Não havia sequestros, assaltos a
bancos, roubos de carros e nem as elevadas taxas de
“É o afastamento, por meio de organizações próprias, homicídios. A propósito, Sapori (in Ratton & Barros,
de todo perigo, ou de todo mal, que possa afetar a 2007:100), afirma “que o crescimento dos indicadores
ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade, ou de criminalidade nas últimas duas décadas em nosso
dos direitos de propriedade do cidadão. A segurança Pais coincide temporariamente com o processo de
pública, assim, limita as liberdades individuais, fortalecimento de nossas instituições democráticas”.
estabelecendo que a liberdade de cada cidadão, Disso pode-se concluir que o maior empenho da Polícia
Militar era justamente no controle e na contenção de
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manifestações de ruas contrárias ao Regime, ou seja, pública – que é a ordem pública”. E lembra que essa
aquelas com conotações ideológicas, pois a Segurança destinação o texto constitucional atribuí às policias
Pública estava sob controle. militares. E apesar da distância do tempo em que foram
formulados (1989), os ensinamentos de Diogo de
Sobre a Segurança Pública, Diogo de Figueiredo Figueiredo ainda contribuem para a compreensão da
explica que afirmar que algo está seguro implica em segurança pública na ordem democrática do Estado de
afirmar que esse algo está garantido contra alguma Direito.
coisa que possa oferecer algum risco. E se o objeto da
preocupação (o algo) é a Ordem Pública, esta deve ser Com a redemocratização, iniciada em 1985, nos
protegida contra os riscos que a violem. Daí o seu governos democráticos, os Direitos Humanos e a
entendimento de Segurança Pública como “a garantia participação do cidadão passaram a ter relevo em todos
da Ordem Pública. Sendo uma atividade – meio, ela se os assuntos relativos a segurança pública. O grande
submete aos mesmos condicionamentos da Ordem desafio é a formação de uma Polícia democrática
Pública, que é sua finalidade: deve ser legal, legítima e defensora dos direitos e da cidadania. Nesse esforço, a
moral”. Para ele, quatro elementos estão implícitos na SENASP definiu a Segurança Pública como uma ...
Segurança Pública: o valor garantido; o autor da
garantia; o risco e modalidade de poder: “...atividade pertinente aos órgãos estatais e à
comunidade como um todo, realizada com o fito
1. O valor garantido é a convivência pacífica e de proteger a cidadania, prevenindo e
harmoniosa, que exclui a violência nas relações sociais: controlando manifestações da criminalidade e da
é a ordem pública; violência, efetivas ou potenciais, garantindo o
exercício pleno da cidadania nos limites da lei”.
2. Autor da Garantia: o monopólio do uso de força
nas sociedades organizadas é o Estado, que toma a si Esse texto, inspirado no caput do Art 144 da
a responsabilidade de proporcionar a garantia da Constituição Federal, atribui a responsabilidade pela
ordem pública. Esta responsabilidade, todavia, não é segurança pública tanto ao Estado como a sociedade
excludente; civil. A variável ideológica é a cidadania, como direito
do cidadão, e como atributo para a atuação dos órgãos
3. O risco é o antivalor, a perturbação potencial ou do Estado em consórcio com as comunidades de um
efetiva da ordem pública causada pelos seus modo geral.
perturbadores, sejam ou não tipificados penalmente;
Todavia, o estabelecimento de conceitos modernos,
coerentes com Estado Democrático de Direito, por si só
4. Fator de Garantia é o meio empregado para
não provocará as mudanças desejadas. A tarefa
evitar, reduzir ou eventualmente eliminar o risco. Na
implica em mudanças institucionais e culturais, além do
segurança pública, o Estado atua pelo poder de polícia,
envolvimento de outras agências públicas e privadas, e
exercitado em suas quatro modalidades da ação: a
da sociedade civil na construção das políticas de
ordem de polícia, geralmente um comando negativo; o
segurança pública adequadas ao momento
consentimento de polícia, que subordina certas
contemporâneo.
atividades a um controle prévio; a fiscalização de
polícia, que se dá para verificar o cumprimento das
ordens ou a observância das condições do Segurança Pública na Constituição Federal
consentimento e a sanção de polícia da sociedade: o
direito, o costume e a moral. Com a transição da democracia, a Constituição
Fundamental de 1988 estabeleceu as normas básicas
Os conceitos oferecidos por Diogo de Figueiredo não e os princípios para a formulação e a implementação
citam a participação do cidadão na construção da de políticas de segurança pública. Uma das grandes
política de Segurança Pública. Contudo, ao definir que inovações foi a diferenciação e a separação entre as
compete ao Estado a garantia da Ordem Pública, ele funções de segurança pública, atribuídas
afirma que essa responsabilidade “não é excludente”. prioritariamente à forças policiais e às guardas
Outro aspecto a ser considerado é que ele, embora municipais, e as funções de defesa nacional, estas
reconheça que a Polícia Civil esteja na estrutura atribuídas prioritariamente às Forças Armadas.
organizacional do Poder Executivo, as suas
competências de polícia judiciária as tornam um” órgão No seu art. 144, a Constituição Federal de 1988 define
auxiliar e preparatório da ação do Poder Judiciário”. O expressamente a segurança pública e, de forma ainda
Jurista reconhece que as ações da Polícia Civil ao mais específica, a preservação da ordem pública e da
realizar detenções de criminosos, também contribuem incolumidade das pessoas e do patrimônio, como
para a Segurança Pública. Todavia, sugere que a “sua funções das forças policiais. O mesmo artigo discrimina
destinação de polícia judiciária não é a manutenção as funções de cada uma das forças policiais (polícia
direta e imediata das condições gerais da segurança federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária

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federal, polícias civis e militares e corpos de bombeiros regime político ou de uma particular ideologia ou de um
militares) que integram o sistema de segurança pública. grupo detentor do poder.
Esta inovação normativa introduzida pela Carta Magna
em vigor foi posteriormente incorporada às Já no concernente à Defesa das instituições
constituições estaduais e por elas reforçada. democráticas afirmamos que o equilíbrio constitucional
consiste na existência de uma distribuição
No que se refere às Guardas Municipais, a Constituição relativamente igual de poder, de tal maneira que
apenas reconheceu aos Municípios a faculdade de nenhum grupo, ou combinação de grupos, possa
constituí-las, destinadas à proteção de seus bens, dominar sobre os demais; a democracia é o equilíbrio
serviços e instalações, conforme dispuser a lei. mais estável entre os grupos de poder.

A missão constitucional dos Corpos de Bombeiros Artigo144 da Constituição Federal:


Militares também é descrita pela Constituição Federal, “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,
em seu art. 144, § 5º, segundo o qual “aos Corpos de direito e responsabilidade de todos, é exercida para a
Bombeiros Militares, além das atribuições definidas em preservação da ordem pública e da incolumidade das
lei, incube a execução de atividades de Defesa Civil”. pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
Outra inovação importante da Constituição Federal de II - polícia rodoviária federal;
1988 foi a subordinação das polícias militares e civis III - polícia ferroviária federal;
aos governadores dos estados que passaram a ser IV - polícias civis;
responsáveis pela formulação e pela implementação de V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
políticas de segurança pública nos estados. Desta § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão
forma, a organização da segurança pública passou a permanente, organizado e mantido pela União e
ser da competência e responsabilidade de cada estruturado em carreira, destina-se a: (Redação dada pela
unidade da federação, tendo em vista as peculiaridades Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
regionais e o fortalecimento do princípio federativo. I - apurar infrações penais contra a ordem política e
social ou em detrimento de bens, serviços e interesses
Consequentemente, essa inovação permitiu o da União ou de suas entidades autárquicas e empresas
fortalecimento das Secretarias Estaduais de Segurança públicas, assim como outras infrações cuja prática
Pública (ou Secretarias de Defesa Social, como são na tenha repercussão interestadual ou internacional e exija
maioria dos casos denominadas atualmente) repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
possibilitando que os governos estaduais, através II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes
delas, passassem a organizar e empregar as polícias e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem
de acordo com políticas e estratégias voltadas para prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos
segurança pública e não para a defesa nacional, que, nas respectivas áreas de competência;
como vimos, não é a missão precípua das forças III - exercer as funções de polícia marítima,
policiais e sim, das Forças Armadas. aeroportuária e de fronteiras; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998)
Inovação da mesma forma relevante, e que não poderia IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia
deixar de ser comentada neste tópico (muito embora judiciária da União.
venha a ser abordada de maneira mais pormenorizada § 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente,
em um momento específico das nossas aulas), foi organizado e mantido pela União e estruturado em
atribuir ao Ministério Público a função de exercer o carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
controle externo da atividade policial (art. 129, inciso ostensivo das rodovias federais. (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
VII). No caso da polícia federal, o controle externo da
§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente,
atividade policial está previsto na Lei Complementar nº
organizado e mantido pela União e estruturado em
75/93 (Estatuto do Ministério Público da União), que
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
estabelece que o Ministério Público da União exercerá
ostensivo das ferrovias federais. (Redação dada pela
o controle externo mediante medidas judiciais e Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
extrajudiciais. No caso das polícias estaduais, civis e § 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia
militares, o controle externo das atividades policiais de carreira, incumbem, ressalvada a competência da
cabe ao Ministério Público estadual. Pois bem, o Título União, as funções de polícia judiciária e a apuração de
V da Constituição Federal trata “Da Defesa do Estado infrações penais, exceto as militares.
e das instituições democráticas”. § 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e
a preservação da ordem pública; aos corpos de
Quando nos referimos à Defesa do Estado tratamos, bombeiros militares, além das atribuições definidas em
inicialmente, da defesa do território contra invasão lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
estrangeira (art. 34, inciso II, e art. 137, inciso II). Desta § 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros
forma, é a defesa da soberania nacional e a defesa da militares, forças auxiliares e reserva do Exército,
própria Pátria. Não se trata da defesa deste ou daquele
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subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Controle social
Territórios.
§ 7º - A lei disciplinará a organização e o funcionamento Controle social são os freios que a sociedade apresenta
dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de aos indivíduos que almejam a prática de alguma
maneira a garantir a eficiência de suas atividades. conduta antissocial. Existem inúmeros critérios para
§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas classificar as instâncias de controle social. A dualidade
municipais destinadas à proteção de seus bens, mais comumente utilizada na criminologia é aquela que
serviços e instalações, conforme dispuser a lei. separa controle social formal de controle social
§ 9º A remuneração dos servidores policiais integrantes informal. O critério que diferencia uma categoria da
dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na outra é a presença ou ausência de Estado. Como
forma do § 4º do art. 39. (Incluído pela Emenda exemplos de freios sociais informais podem ser citados
Constitucional nº 19, de 1998)” a família, a vizinhança, o trabalho, a igreja, a opinião
pública, os clubes, as associações, os meios de
Defesa Social comunicação de massa. Já os agentes de controle
social formal são a polícia, o Poder Judiciário, a
“A Defesa Social supõe inicialmente uma concepção administração penitenciária, o sistema penal etc. A
geral do sistema anticriminal que não visa unicamente criminologia deu seus primeiros passos para incluir o
à expiação de uma falta por meio de um castigo, mas controle social entre seus objetos de estudo no começo
busca proteger a sociedade contra as ações criminais”. do século XX. Isso se deu com a Escola de Chicago e
(Ancel, 1979, p.17) seu enfoque empírico e transdisciplinar, que se propôs
a discutir múltiplos aspectos da vida humana, todos
“Assim, a história das ideias penais nos apresenta duas relacionados com a vida na cidade.
concepções principais, fundamentalmente diferentes, Entre os anos 1920 e 1930, Robert Ezra Park, Ernest
da noção de defesa social: a) a concepção antiga, W. Burgess e seus alunos produziram mais de 20 obras
defendida ainda por muitos, que a limita à proteção da sobre a ecologia urbana da cidade de Chicago,
sociedade através da repressão ao crime; b) a abordando problemas como falta de moradia,
concepção moderna, que encontra sua expressão na desorganização social, guetos, zonas residenciais ricas
excelente fórmula adotada pelas Nações Unidas e pobres, distribuição de doentes mentais na cidade,
quando da criação, em 1948, de sua Secção de Defesa entre outros.
Social: a prevenção do crime e o tratamento dos Em diversas dessas obras, os bairros de Chicago são
delinquentes. Prevenção e tratamento são, poder-se-ia divididos e analisados de acordo com seus problemas
dizer, as duas dimensões que faltavam à concepção sociais. Esses bairros ou áreas seriam analisados
tradicional”. (Ancel, 1979, p. 10) também a partir das possibilidades moralizadoras ou de
―controle social que geravam em seus habitantes. A
“A Defesa Social inclui, entre outras atividades, a cidade, em geral, permitia a confusão, a mobilidade e,
prestação de serviços de segurança pública e de portanto, o refúgio e a criação de personalidades
defesa civil”. SENASP conflitivas, como vagabundos, alcoólatras, prostitutas e
delinquentes. Todos eles, porém, seriam reprimidos e
“Defesa Social é o conjunto de ações desenvolvidas por censurados em determinadas áreas morais, nas quais,
órgãos, autoridades e agentes públicos, cuja finalidade em virtude desse controle social, não se verificariam
exclusiva ou parcial seja a proteção e o socorro conflitos sociais significativos.
públicos, através de prevenção, ou repressão de ilícitos
penais ou infrações administrativas, a defesa social Percebe-se, assim, que as instâncias de controle
visa, antes de tudo, a atingir um elenco de soluções que social, sobretudo as informais, começaram a ser
levam à harmonia social. A Defesa Social consiste, estudadas como fatores que influenciam a
então, num conjunto de ações adotadas para proteger criminalidade de um determinado local. No entanto, não
os cidadãos contra os risco decorrentes da própria foi ainda nessa oportunidade que o controle social se
sociedade. A Defesa Social é exercida pelos poderes consolidou como objeto da criminologia, até mesmo
constituídos, instituições, órgãos e entidades públicos porque o papel das agências formais no fenômeno
ou privados, que tenham por fim proteger o cidadão e a criminoso ainda não era olhado com interesse.
sociedade, através de mecanismos que assegurem a
ordem pública”. PMMG Isso viria a ocorrer algumas décadas mais tarde,
sobretudo a partir dos anos de 1960, nos Estados
É o entendimento de que a criminalidade não se resolve Unidos, com o labelling approach, também conhecido
no contexto restrito do Direito Penal, mas sim num como teoria do etiquetamento, teoria da rotulação
programa de ampla defesa social que envolva o punir social ou teoria interacionista. Rompendo com o ideal
(quando útil e justo) e o tratamento ressocializante do consensual de sociedade, o labelling propugnava que
criminoso e do foco social de onde ele emerge. estudar a realidade social implicava estudar os

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processos de interação individual ocorridos no seio da
própria sociedade. Ou seja, não se pode compreender A polícia cumpre, então, um papel determinante na
o crime prescindindo do entendimento da própria sociedade: o de selecionar nas ruas – longe, portanto,
reação social. A desviação não é uma qualidade dos olhos dos demais intervenientes no processo penal
intrínseca da conduta, mas um atributo que lhe é
conferido por meio de complexos processos de – quem será considerado criminoso. Quando a polícia
interação social. É decisivo, então, para compreender o não é representativa da população que serve e realiza
crime, compreender como funcionam os mecanismos um trabalho pouco conectado com a vizinhança da
sociais que atribuem o status de delinquente a alguém. área, com mais razão pode-se esperar uma atuação
Conforme os teóricos interacionistas, para cada uma seletiva e estigmatizante.
das ações desviadas é possível encontrar inúmeras
ações similares que não serão rotuladas de criminosa, Policiar é, simbolicamente, representar nas ruas e
por não serem levadas em consideração ou por não se quartéis o monopólio estatal do uso da força. O policial
apresentarem de maneira evidente como desviadas. tem a seu dispor uma gama de instrumentos que
Diante de cada fato, as instituições atuam como filtros, simbolizam a força: desde talonários de multas e rádio
definindo sua natureza. Frente às condutas humanas, para pedir reforço a algemas, capacetes, cassetetes,
portanto, as agências formais de controle social atuam escudos, armas, viaturas, a delegacia mais próxima, o
como uma grande peneira, a separar quais devem ser procedimento penal, o cárcere. Cada contato com o
etiquetadas como criminosas e quais não merecem o cidadão é mediado pela potencial ou efetiva presença
rótulo. desses instrumentos. Ou seja, em toda interação entre
policial e cidadão a possibilidade de uso da força se faz
Assim, o labelling approach reconhece o caráter presente, gerando uma assimetria em que o detentor
constitutivo do controle social formal, considerado do monopólio do uso da força está em posição de
instrumento seletivo e discriminatório. Deixa-se de superioridade. Em realidade, esse é o traço distintivo
questionar o porquê de um indivíduo cometer crimes, e da polícia: “a única característica exclusiva da polícia é
passa-se a indagar a razão de certa conduta ser que ela está autorizada a usar a força física para regular
etiquetada com o rótulo de desviada. Nesse as relações interpessoais nas comunidades”
questionamento, as agências de controle social
adquirem enorme importância e passam a ser A polícia possui, portanto, uma carga de poder que
estudadas criteriosamente. Se hoje é comum que haja deve ser levada em consideração institucionalmente. O
capítulos sobre a polícia, o Ministério Público, as controle social formal que exerce, sobretudo em
instituições prisionais, o sistema judiciário nos livros e relação às camadas mais baixas da população, pode
manuais de criminologia, isso, em grande parte, deve- produzir efeitos profundos na sociedade. Afinal, quando
se ao paradigma inaugurado pelo labelling approach, o uso da força é potencial ou eventual, o policiamento
que tanto valor atribuiu aos respectivos papéis na parece estar caminhando bem. Quando, ao revés, os
constituição do delito. abusos cometidos pela polícia – seja no tocante ao uso
excessivo da força, seja no tocante à corrupção – se
A polícia é o first-line enforcer da lei criminal. O seu tornam mais ou menos corriqueiros, nasce um
papel no processo de seleção é, por isso, determinante. problema estatal de profundas dimensões. Isso é ainda
É a polícia que processa o caudal mais volumoso de mais sério quando se considera que em muitos locais,
desviação. Nesse sentido, explica, é o filtro mais sobretudo em bairros afastados de grandes
poderoso entre todos aqueles que, unidos, formam o metrópoles, a polícia é a única forma de presença
sistema de Justiça criminal. A polícia, como instância estatal. E se a única instância estatal é corrompida,
portadora de controle social formal, é uma agência que, bastante problemáticos serão os reflexos de sua
no processo de aplicação das leis, faz uso de filtros atuação na população.
altamente seletivos, discriminatórios e estigmatizantes.
García-Pablos de Molina relata que, para a criminologia Reação Social
positivista, o noticiante, a polícia e o processo penal são
concebidos como meras correias de transmissão que A criminologia da reação social (ou interacionista) e
aplicam fielmente, com objetividade, a vontade da lei. A seus desdobramentos em criminologia crítica e radical
polícia, assim como os demais agentes do controle surge na década de 60, nos EUA, e redireciona o foco
social, se orientaria pelo critério objetivo do dos estudos criminológicos, afastando-o da percepção
merecimento (o fato cometido) e se limitaria a detectar positivista (e revigorada pela teoria da defesa social) de
o infrator, independentemente de quem fosse tal análise do “ser criminoso”, ou seja, do homem e sua
delinquente. Mas para o labelling approach, os agentes disfunção biológica e social como fonte causadora do
do controle social formal não são meras correias de delito, e orientando-o para parâmetros de subjetividade
transmissão da vontade geral, senão filtros a serviço de inter-relacional, buscando enfatizar questões de
uma sociedade desigual que, por meio deles, perpetua valoração social de comportamentos, incidência dos
suas estruturas de dominação e incrementa as mesmos (valores) na constituição das regras jurídicas
injustiças que a caracterizam.
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e sociais, e as consequências que dita valoração e etiquetamento sobre o desviante, torna-se necessária a
regras geram no campo da criminologia[3]. Como o observância da vítima (quem foi o lesado) e do
próprio nome desta corrente informa, a maneira pela praticante do ato (em sua posição social e econômica);
qual se dá a interação entre indivíduo e sociedade é o reflexo destes dois fatores frente à sociedade (o grau
que irá designar o conceito de desvio e desviante, em que a sociedade reage frente ao ato, considerados
sendo que tal processo irá ocorrer através da formação os fatores retro) irá determinar a reação e,
da identidade social, a socialização dos indivíduos consequentemente, o etiquetamento.
frente à mesma e aos valores que representa (através
dos processos de rotulação e etiquetamento) e, por fim, Como claramente se percebe, os conceitos de desvio e
da concretização de tais valores na lei. desviante adquirem um caráter de absoluta
transitoriedade, eis que por força das mudanças
A Escola interacionista subdivide-se, basicamente, em ocorrentes no processo de etiquetamento/rotulação do
duas correntes, quais sejam a norte-americana e a indivíduo, ou até pelo fato de o mesmo, ainda que
alemã. Para os interacionistas norte-americanos, a lei, praticando ato previsto em lei, não ter sido alcançado
sendo o exemplo desta concretude de valores, serve pela ação institucional, poderá passar da categoria de
para dividir os homens em dois gêneros distintos – os “ser normal” para desviante, e vice-versa, sem que,
delinquentes e os não delinquentes – através da para tanto, tenha modificado seu próprio
rotulação de comportamentos “não aceitos” pelo ente comportamento.
social.
Três dos principais efeitos deste processo de rotulação
Desta visão (norte americana) depreende-se a e etiquetamento são: os fatores que levam um indivíduo
importância que a lei volta a deter frente ao estudo ao comportamento desviante não difere dos mesmos
criminológico, eis que, através do simbolismo que que conduzem outros indivíduos ao comportamento
carrega, passa a ser a fonte original do delito e do não desviante; os indivíduos desviantes são
delinquente. O rótulo de desviante deixa de ser, como segregados pelos não desviantes; tal segregação faz
na Escola Positiva, uma qualidade inerente à pessoa, e com que os desviantes também acabem por formar um
passa a ser uma consequência da aplicação da lei – grupo próprio e passem a estigmatizar os não
rótulo – sobre a pessoa – etiquetamento. desviantes; gera a continuidade do comportamento
desviado naquele que já teve contra si a etiqueta de
A teoria da reação social, ao trabalhar em seus desviante.
fundamentos com os paradigmas da rotulação social
(comportamentos e consequências da rotulação) e, ao Os adeptos da reação social se preocupam, então, com
buscar em autores como Goffman e Becker as bases o estudo da maneira pela qual as instituições oficiais
de seu desenvolvimento, traz como consequência uma recaem sobre o indivíduo (labelling approach), assim
instabilidade e incerteza no que diz respeito ao objeto a como os efeitos de tal situação, modificando o
ser catalogado como desviante, eis que, partindo do paradigma da Escola Positivista (que era o homem em
pressuposto de que é a lei quem origina o delito e, na si, sendo o desviante um produto da natureza) através
medida em que a lei (regra jurídica) nada mais é do que do entendimento do fenômeno/ binômio “criminalidade
o reflexo do exercício de poder em uma sociedade, tem- e criminoso” como algo que surge de uma realidade
se que, pela própria evolução da sociedade, a lei se social (identidade nacional concretizada) preexistente
modifica e, daí, modifica-se também o conceito de ao próprio indivíduo.
desvio e o desviante.
Neste viés, tem-se que a lei nada mais é do que reflexo
Mais: não basta que o indivíduo tenha cometido um e maneira de controle exercido pelo poder político e
comportamento que se amolde ao ditame legal (e, por econômico, e o processo de criminalização, que
consequência, ao comportamento rotulado) para que redunda na estigmatização do indivíduo, ocorre em três
seja tido como desviante; dois indivíduos podem níveis diferentes: (a) criminalização de novas condutas
realizar uma ação idêntica e, mesmo assim, somente anteriormente lícitas; (b) criminalização do indivíduo
será etiquetado com tal conceito aquele que tornar-se através da submissão do mesmo aos procedimentos
objeto da ação dos entes institucionais (no caso, penais que culminarão com cunhar-lhe a merca de
polícia, Poder Judiciário, etc.), entes estes que, por sua desviante; (c) criminalização do próprio desviante,
vez, determinam-se frente à reação social ao delito. através do estigma/segregação social que se impõe a
qualquer um que tenha sofrido o processo de
Constatada a necessidade de que, primeiro, ocorra etiquetamento.
uma reação social ao fato e ao indivíduo para, após,
ocorra o processo de rotulação/etiquetamento do A maior preocupação dos interacionistas norte-
mesmo, os interacionistas norte-americanos apontam americanos encontra-se na análise dos efeitos que o
alguns aspectos que determinam a (inexistência da processo de rotulação gera no indivíduo submetido ao
reação apontada. Para que a mesma se verifique, mesmo, especialmente no que diz respeito à
deflagrando, desta maneira, o processo de criminalização secundária; o indivíduo é atacado em
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sua identidade individual (eis que a identidade utilizada Para os interacionistas alemães, existem metaregras a
pelo mesmo vai contra a identidade social, ou seja, serem observadas quando do processo de
contra seu próprio paradigma) e social (eis que a criminalização. Enquanto os norte-americanos limitam
imagem que projetava ao ente social passa, os processos de criminalização à lei e à sua incidência
imediatamente, a ser reformulada ante o estigma) sobre o indivíduo (processo microssocial), os alemães
desde que ingressa no mundo dos desviantes; após tal adotam as “teorias de conflito”, ou seja, não é a lei em
ingresso, o ente social passa a ter expectativas sobre si (regras) e a incidência da mesma sobre o indivíduo
seus atos (voltadas, estas, à prática de novos atos que determina a criminalização ou a criminalidade
desviados), o próprio indivíduo passa a acreditar em (rotulação/etiquetamento), mas sim os mandamentos
tais expectativas (eis que a expectativa social sociais que, além de criarem ditas leis, condicionam
condiciona a expectativa individual) e, sua aplicabilidade (metaregras – processo
consequentemente, direciona seu comportamento macrossocial).
conforme as mesmas[20], ou seja, volta a cometer o
delito. Como se percebe, o próprio processo de Na escola alemã, as meta-regras deveriam ser
criminalização e reação social passam a gerar a analisadas de um ponto de vista objetivo e sociológico
conduta estereotipada. e seriam regras objetivas do sistema social que
determinariam todo o processo de filtragem que faz
Tal constatação, qual seja a de que a própria com que uma parte da conduta delituosa total seja
sociedade, através de seus mecanismos de rotulação e criminalizada e outra não(…). Desta maneira, a
etiquetamento é quem cria o desvio e o desviante, criminalização pode ser entendida como uma
assim como através da reação social à prática do ato construção social que está em constante criação e que
rotulado acaba por gerar uma nova criminalidade provém não das regras de Direito Penal, mas das meta-
(secundária), interfere, direta e inexoravelmente, nas regras que condicionam a atividade de definição das
razões da punição a ser imposta pelo sistema (pena). instâncias de controle.
Diferentemente da Escola Clássica, onde a pena
detinha caráter retributivo e preventivo, da Escola A incidência destas metaregras no caso em concreto
Positivista, onde a pena detinha caráter de tratamento pode variar em acordo com a perspectiva adotada
e defesa social, e da Escola Garantista, onde a pena pelos autores que versam sobre o tema; no entanto,
detém caráter de retribuição e segurança ao próprio depreende-se que, em sua totalidade, as mesmas,
delinquente, para os interacionistas a pena serve, em incidentes através de um sistema de condicionamento
verdade, para a perpetuação do caráter desviante (socialização) e vigília sobre o indivíduo que se iniciam
sobre o indivíduo já etiquetado uma vez. desde seu núcleo familiar[30], são reflexo de exercício
de domínio econômico de uma classe social sobre a
Do entendimento de que o desvio e o desviante outra, e a observância deste sistema serve para
formam-se exclusivamente da lei, surge a diferenciação desmascarar a política penal vigente de que o
entre a escolas norte-americana e alemã do labelling criminoso é um ser desajustado e em minoria frente ao
aproach; neste sentido: ente social.

a) Para a Escola norte americana, em acordo com a Por intermédio desta visualização do fenômeno desvio
teoria da rotulação (Gofmann, Becker) e com o e desviante, a lei, tida como ente máximo do processo
desenvolvimento supra, os níveis do processo de de criminalização do labelling aproach norte americano,
criminalização resumem-se em três passos cede seu espaço à identidade e condicionamento
(criminalização do ato, do indivíduo e do desviante), social; incrementa-se a valoração subjetiva da conduta
todos decorrentes da incidência da lei sobre o e dos indivíduos participantes do processo (autor,
indivíduo; volta sua análise, ante este processo, aos vítima, juiz, autoridade policial, etc.), que passam, neste
efeitos que a incidência do rótulo sobre o indivíduo momento, a serem os responsáveis diretos pela
pode gerar, especialmente no que tange à destruição ocorrência ou inocorrência do etiquetamento legal.
da identidade social, criação de expectativas (sociais e
individuais) e ação em acordo com as mesmas – A Escola alemã substitui a influência da rotulação norte
condicionamento do agir e criminalização secundária americana (lei) pelo estereótipo; a divisão de classes
por parte do rotulado. existente na sociedade e a supremacia de uma sobre a
outra acabam por criar imagens, modelos de
b) A Escola alemã, por sua vez, direciona seu foco para comportamento que se ajustam a determinados grupos
a criminalização diferencial de indivíduos (…) fulcrada sociais; daí decorre uma maior incidência da
esta diferenciação na classificação social dos mesmos. criminalização dos indivíduos que pertençam a tal
A interação social, para os alemães, surge da interação grupo – não pelo fato de os mesmos cometerem mais
entre classes sociais, ou seja, transcende a perspectiva “delitos”, mas sim pelo fato de os mesmos se
individual da escola norte americana. O delinquente, na amoldarem ao estereótipo social do desviante.
ótica do interacionismo alemão, é vítima de uma
sociedade dividida em classes.
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O estereótipo faz com que as classes sociais direito penal, mas, também, e principalmente, conforme
dominadas sejam alvo de maior observação por parte as meta-regras, tomadas no seu sentido objetivo antes
das instituições legais, tornando-se, desta maneira, indicado.
mais vulneráveis à ação do processo criminógeno; tal
situação cria aquilo que Gofmann já descrevera como A criminalidade, neste viés passa a ser encarada como
auto afirmação ante o próximo, eis que, na medida em um “bem negativo”, e é “distribuída” socialmente da
que um indivíduo observa em um terceiro estereotipado mesma forma que os “privilégios”; o desvio não é uma
as qualidades que despreza, passa, diretamente, a característica do comportamento adotado em si, mas
reforçar em si próprio a presença das qualidades que sim uma característica atribuída a dito comportamento
valoriza. A estereotipização do terceiro nada mais é do (comportamento desviante é o que os outros definem
que um processo de reafirmação do sistema de valores como desviante). Para melhor entendimento deste
do grupo dominante (grupo observador). sistema de distribuição da criminalidade, vale recorrer
novamente à questão formulada por Sutherland; a
O estereótipo, além de servir à reafirmação supra classe alta, formada por indivíduos que cometem,
mencionada, é extremamente funcional quando tradicionalmente, os comportamentos definidos como
utilizado para dirigir a agressividade das classes sociais “crimes de colarinho branco”, não é atingida pelo
mais baixas contra o ser estereotipado, ao invés de ser processo de criminalização, pois seus integrantes não
utilizada, como seria de se esperar, contra o poder se enquadram no estereótipo social do desviante. Esta
dominante e, ao reverso, permite às classes média e não criminalização do “criminoso de colarinho branco”
alta…descarregar simbolicamente as suas culpas ocorre, consoante advertência de Chapman, por força
sobre esse grupo pequeno e bem definido de da influência que a linguagem exerce sobre a
criminosos de classe baixa, de vez que derivam para sociedade, e cita como exemplo que, nas
eles a sua hostilidade contra a classe proletária. Em representações teatrais, como no rádio e na televisão,
suma, a existência do estereótipo reduz a tensão social os autores descrevem os que cometem crimes contra a
existente nas relações interclasses e possibilita o propriedade como pessoas repelentes e de
exercício de dominação social já retratado. características pessoais desagradáveis, ou seja, o
“criminoso” é um estereótipo exatamente oposto à
A observância do processo de figura do “magnata” alto, saudável, de feições bem
criminalização/criminalidade por tal viés acaba por delineadas, bem vestido e bem sucedido, cujo
destruir mitos fundantes do Direito Liberal surgido no comportamento, ante esta imagem vitoriosa frente à
modernismo; o princípio da igualdade dos indivíduos vida, acaba ratificado pela admiração e o êxito.
frente à lei, por exemplo, é absolutamente negado, e
um exemplo marcante de tal negação é a Concluindo: a criminologia da reação social, tanto
criminalidade(?) do colarinho branco (Sutherland) e a através da corrente norte-americana quanto pela
cifra negra que acompanha tal desvio, fornecendo, corrente alemã, traz em si um mérito incontestável:
inclusive, uma falsa percepção da distribuição do expõe de forma clara e precisa que o sistema penal
fenômeno criminógeno junto às classes sociais. O existente nada mais é do que uma maneira de
princípio da legalidade também acaba por ser negado dominação social (seja política, seja econômica). Neste
junto ao seu entendimento positivista de imperativo sentido, a função seletiva do sistema penal em face dos
categórico (o crime só nasce da lei…), pois não é a lei interesses específicos dos grupos sociais, a função de
que faz nascer o crime, mas sim, e fundamentalmente, sustentação que tal sistema exerce em face dos outros
a observação, interpretação e valoração do ato por mecanismos de repressão e de marginalização dos
parte das instâncias oficiais, em acordo com o grupos sociais subalternos, em benefício dos grupos
estereotipo predeterminado . sociais dominantes -hipóteses sobre as quais o
‘labelling approach’ já havia chamado nossa atenção –
Dentro de tal perspectiva, a Escola alemã, parece, portanto, colocar-se como motivo central para
contraditando a Escola norte americana, aduz que a uma crítica da ideologia penal, também no interior desta
criminalidade deixa de ser um fenômeno pré- recente reflexão.
constituído à atuação de tais instâncias, e passa a ser
uma qualidade atribuída por estes últimos (referindo-se
aos juízes) a determinados indivíduos. E isto não
somente conforme o comportamento destes últimos se
deixe ou não subsumir dentro de uma figura abstrata do

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O Papel da Polícia Judiciária

Criminologia trabalhadores qualificados. São sexualmente


competentes e, provavelmente, o irmão mais velho.
Se considerarmos o crime como fator inerente a Podem ser pais com emprego estável, possuindo
convivência humana em sociedade, faz-se necessário disciplina consciente na infância, e apresentam um
conhecermos um pouco sobre Criminologia. Trata-se comportamento controlado durante o crime. O uso de
da ciência que estuda o crime, a vítima, o criminoso e álcool está associado ao crime e o estresse situacional
as formas de controle social, analisando as causas e precipita a conduta. Moram com alguém e podem
consequências do crime para a sociedade. Para locomover-se, utilizando um bom carro. Têm interesse
García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes, trata-se nas notícias do crime. Após o crime, podem mudar de
de emprego, bairro ou região.
[...] uma ciência empírica e interdisciplinar, que se
ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da Os criminosos desorganizados possuem inteligência
vítima e do controle social do comportamento delitivo, e abaixo da média, sendo socialmente inadequados. São
que trata de subministrar uma informação válida, trabalhadores desqualificados e sexualmente
contrastada, sobre a gênese, a dinâmica e as variáveis incompetentes. São dos irmãos mais novos, com o pai
principais do crime. em emprego instável. Na infância, podem ter sido
submetidos à disciplina rígida. Ficam ansiosos durante
Crimes cometidos por pessoas portadoras de o crime, podendo fazer uso mínimo de álcool. O
psicopatologias levaram os estudiosos a elaborarem estresse situacional é mínimo. Moram sozinhos e
técnicas que pudessem ajudar a identificar o criminoso trabalham perto da cena do crime. Não se interessam
através de seu comportamento diante da vítima, tal pela mídia. Após o crime, mudam de comportamento
como: o seu modus operandi; sua assinatura; a escolha ou fogem. Aqui, observamos a importância da
da vítima; o local escolhido; etc. preservação do local do crime.
Na utilização da entrevista com vítimas ou com aquelas
A assinatura é sempre única, como uma digital, e que presenciaram algum fato criminoso, deve o
sempre está ligada à necessidade do criminoso serial Investigador de Polícia estar alerta ao que preconizam
em cometer o crime. Eles têm necessidade de Fiorelli e Mangini12 quanto à necessidade de se atentar
expressar suas violentas fantasias, e, quando atacar, para a impossibilidade de recordação e, até distorção,
cada crime terá sua expressão pessoal ou ritual por conta do trauma causado pelo evento, pelo efeito
particular baseada em suas fantasias. de droga, pela idade da vítima ou testemunha. Alentam
os autores sobre a necessidade de atenção aos relatos
A preservação do local do crime é muito importante apresentados, sejam eles espontâneos ou por
para a elaboração do perfil do criminoso. O FBI interrogatório, e aos seus riscos. No relato espontâneo,
classificou os criminosos violentos como portadores de os riscos que prejudicam são as características
personalidades organizadas, desorganizadas e mistas. pessoais do indivíduo, tais como: detalhes da
Os criminosos organizados premeditam seus crimes, personalidade (exemplo: narcisista), experiência em
escolhendo a vítima que se encaixe nas suas fantasias, expor as próprias ideias e aspectos fonoaudiológicos
demonstrando capacidade de se adaptarem às ou de linguagem (exemplo: gagueira, troca de sílabas,
adversidades que porventura surjam no desenrolar de má escolha da palavra, etc.). Nos relatos por
sua ação, além da utilização de materiais que serão interrogatório, os autores acima atentam para alguns
utilizados, denominados pelos pesquisadores como “kit riscos que são inerentes, tais como: a emoção, que leva
crime”, e que pode conter os seguintes itens: cordas, o sujeito a preencher lacunas, a inserção de ideias
algemas, lençol, toalha, arma branca ou de fogo, luvas, (preconcebidas ou não). Apontam fatores sociais e
preservativos, etc. Já os criminosos desorganizados psicológicos que se combinam para influenciar nas
escolhem suas vítimas de forma aleatória, pois não lhe respostas, tal confissão de um erro ou algum fato que
interessa a identidade ou as características da vítima, e cause constrangimento a si mesmo.
geralmente utilizam instrumentos que estão ao seu
alcance no momento do cometimento do crime. Do que foi acima exposto, podemos observar que os
conhecimentos acima demonstrados, entre outros,
Analisando a classificação proposta pelo FBI, podemos devem fazer parte do processo de formação e
analisar características típicas de criminosos aperfeiçoamento dos Investigadores de Polícia, para
organizados e desorganizados. Os criminosos que se possa garantir uma prestação de serviço público
organizados apresentam inteligência acima da média, condizente com a complexidade apresentada pelo tipo
são socialmente habilidosos e possivelmente
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de crime, de criminoso e a forma como esse crime foi Dignidade da Pessoa Humana
cometido, levando consequentemente ao seu autor.
É considerado fundamento estabelecido na CF/88, no
Atribuições do Agente de Polícia Judiciária art. 1º, inciso III. Aplica-se a todas as pessoas físicas
na Investigação Criminal indistintamente, estando assegurados todos os direitos
e garantias inerentes a sua condição. A Convenção
Ocorrido um fato criminoso, deve a equipe policial se Americana de Direitos Humanos, assinada em 25 de
deslocar até o local do fato. O Agente de Polícia é o dezembro de 1992, também conhecida por Pacto de
responsável pelas atividades operacionais, tais como: San José da Costa Rica, estabelece o dever de respeito
comparecer ao local do fato criminoso; localizar e a direitos e liberdades, garantindo seu livre e pleno
identificar criminoso(s), testemunha(s) e vítima(s), bem exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua
como a localização de produto(s), proveito(s) e jurisdição, sem discriminação alguma, por motivo de
objeto(s) utilizado(s) na prática de crimes; realização de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas, ou
vigilância policial (campana); infiltração policial; de qualquer outra natureza, origem nacional ou social,
interceptação telefônica; além de cumprir e fazer posição econômica, nascimento ou qualquer outra
cumprir as determinações judiciais; entre outras. condição social. Com isso, a Dignidade é considerada
como o atributo essencial da pessoa humana,
A investigação policial é um conjunto de procedimentos independentemente de suas características físicas ou
sistematizados, de natureza interdisciplinar, que busca sociais. Incluem-se, nesse contexto, os portadores de
elementos de convicção que auxiliem na produção de deficiência mental e os presos, que terão tratamento
provas da infração penal, buscando identificar autoria, condizente com a sua condição humana, ou seja, terão
a materialidade e as circunstâncias em que ocorreu. direito aos seguintes aspectos: vida digna, assistência
à saúde, educação, proteção do Estado, assistência
O resultado da investigação policial será enviado ao familiar, integridade física, etc.
Poder Judiciário para que sejam realizados os
procedimentos legais. Princípio da Não Culpabilidade
O conhecimento de uma infração penal pode chegar à O art. 5º, inciso LVII, da CF/88 prevê que ninguém será
Polícia de várias formas: através da própria vítima, de considerado culpado até o trânsito em julgado de
parentes, vizinhos, da imprensa, telefonema anônimo, sentença penal condenatória. Este princípio deve ser
etc. Ao tomar conhecimento da ocorrência de uma observado pelo Investigador Policial, pois o investigado
infração penal, o Investigador de Polícia deve buscar é sujeito de direitos. Observar este princípio significa
informações que subsidiem as ações que serão impedir que um inocente seja punido ou que um
executadas. Toda atividade policial, por mais simples culpado fique sem a penalidade cabível. O Estado deve
que seja, deve ser precedida de um planejamento que provar que o cidadão cometeu o crime e não o cidadão
leve em consideração o grau de dificuldade da provar que é inocente. O ônus da prova cabe ao
atividade a ser executada. É o que se conhece por Estado, valendo ressaltar que a presunção de não
Planejamento Operacional no qual devem estar culpabilidade é relativa, ou seja, cabe prova em
previstos, sempre que possível: o início e o término da contrário que deve ser trazida pela Polícia.
investigação; a composição da equipe e as técnicas Desse princípio, decorrem direitos, quais sejam: o
que serão aplicadas, sempre considerando o grau de direito à ampla defesa e ao contraditório; o direito de
complexidade da missão a ser desenvolvida. recorrer em liberdade, se for o caso; o duplo grau de
jurisdição e o direito ao silêncio, que é a impossibilidade
Princípios Constitucionais Inerentes à de obrigar o acusado a colaborar na apuração dos fatos
Atividade Investigativa Policial que possam causar a sua prisão.
Um dos aspectos mais próximos da população e que
No exercício da atividade de Investigação Policial, envolve a presunção de não culpabilidade é a forma
principalmente no que concerne à Polícia Judiciária, como a imprensa sensacionalista abusa do seu poder
podemos observar que vários princípios, garantias e de informar, ao noticiar os crimes. De acordo com as
direitos estabelecidos pela Legislação Brasileira garantias constitucionais, o investigado dever ser
deverão ser observados. Para que isso ocorra, faz-se preservado de qualquer tipo de constrangimento,
necessário que o Investigador de Polícia tenha evitando que sua imagem seja divulgada durante a
conhecimentos básicos sobre Direito Constitucional, investigação policial que corre contra ele.
Penal e Processual Penal. Entre esses conhecimentos,
destacaremos alguns, para que o leitor possa ter a real Princípio da Legalidade
dimensão da matéria.
O inciso II do art. 5 CF/88 estabelece que “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei”. Trata-se do Princípio da
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Legalidade, que está inserido no capítulo referente aos pessoas envolvidas, dos crimes que são praticados, do
Direitos Individuais. O cidadão pode fazer tudo que não modo de agir dos criminosos ou de organização
esteja proibido por lei. Já para os Investigadores de criminosa. Divide-se em três etapas, a seguir
Polícia, somente é lícito atuar quando a lei determina especificadas.
ou autoriza. No inciso XXXIX do artigo 5º da CF/88,
encontramos o Princípio da Legalidade Criminal, que Preliminar
estabelece o seguinte: “não há crime sem lei anterior Ocorre antes da infiltração propriamente dita, consiste
que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. na escolha do Investigador de Polícia que vai ser
infiltrado, levando em consideração os seguintes
Direitos e Garantias Fundamentais do pontos:
Investigado a) análise do perfil do policial infiltrado;
b) criação de falsa identidade, preparando-o para o
O art. 5º caput da CF/88 prevê que todos são iguais meio;
perante a lei, indistintamente, sendo garantida, aos c) criação de uma cobertura (história que apague sua
brasileiros e estrangeiros residentes no País, a condição de policial);
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à d) tempo de duração;
igualdade, à segurança e à propriedade. Estabelece e) custo.
que homens e mulheres sejam iguais em direitos e
obrigações e que ninguém será submetido à tortura Introdução
nem a tratamento desumano ou degradante. Consiste na colocação do Investigador de Polícia no
Estabelece que a casa é asilo inviolável do indivíduo, seio da organização criminosa, que pode ocorrer das
sendo proibida a entrada, salvo no caso de seguintes formas:
consentimento do morador, de flagrante delito ou a) através de informante (pessoa que tem laços com
desastre, para prestar socorro, ou, durante o dia, por membros da organização, porém não faz parte dela);
determinação judicial. Em relação à pessoa submetida b) membro da organização (integrante que pretende os
a prisão, estabelece o artigo supra que ninguém será benefícios da delação premiada);
preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e c) autocolocação (mais difícil e demorada, porém mais
fundamentada de autoridade judiciária competente, eficaz e segura para o policial).
salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar. A prisão de qualquer pessoa e o Acompanhamento das Atividades do
local onde se encontre serão comunicados Agente Infiltrado
imediatamente ao juiz competente e à família do preso Após a infiltração, inicia-se o processo de colheita de
ou à pessoa por ele indicada; o preso será informado dados e informações que levem identificação da autoria
de seus direitos, entre os quais o de permanecer e dos crimes que estão sendo praticados pela
calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família organização criminosa. Durante esse período devem
e de advogado, além de ter direito à identificação dos ser levados em consideração os seguintes pontos:
responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório a) tempo de duração;
policial. b) técnicas empregadas;
c) colheita de dados e informações;
Atividade Policial e Práticas Operacionais d) custo da operação; e;
e) resultados obtidos.
No exercício da atividade, o Investigador de Polícia
deverá empregar as práticas policiais mais eficazes e Vigilância Policial
adequadas à apuração de dados e informações, tudo a É a prática policial que consiste em se aproximar o
depender do grau de complexidade do fato investigado. máximo possível do(s) investigado(s), tendo por fim
Destacamos que a conduta do Policial deve estar colher informações necessárias à investigação criminal.
pautada em lei, sempre com a observância dos direitos Tem por objetivo a identificação e/ou confirmação de
e garantias fundamentais da pessoa investigada. pessoas, coisas, lugares, hábitos, bem como a
Adiante, demonstraremos algumas práticas utilizadas, descoberta de participação de outras pessoas na
alertando que o rol apresentado é exemplificativo. prática de crimes. Deve ser feita de forma velada, a pé
ou com a utilização de veículos. Deve ter, no mínimo,
Infiltração Policial quatro (04) policiais, equipados com câmeras de
Prevista nas leis de crime organizado e tráfico de filmagem e de fotografia discretas.
drogas, mas que poderia ser regulamentada para ser
utilizada para investigações de assassinos em série Diligências para Localização de Pessoas e
que agem em grupo.
É a prática que consiste na colocação do Investigador
Coisas
de Polícia no seio da organização criminosa, com o fim É prática policial que consiste em localizar
de buscar informações que levem à identificação das testemunhas, vítimas e infratores, bem como produto

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e/ou proventos de infração penal, podendo ser As declarações das testemunhas, do investigado e da
utilizados os mais variados bancos de dados à vítima podem trazer informações que deverão ser
disposição do Policial. Para o cumprimento de uma levadas em consideração pelo Investigador de Polícia
diligência desse tipo, deve o Investigador Policial e que podem levar a outros dados acerca de coautoria,
buscar nas peças de informações que originaram a participação, materialidade e circunstâncias da
investigação. Em seguida, pode fazer uso de sites ocorrência da infração penal.
busca (ex.: Google), de relacionamento (ex.: facebook,
orkut), de pessoas desaparecida; catálogo telefônico ou Ilana Casoy, descrevendo o método de David Canter,
bancos de dados oficiais (ex. Infoseg). Após obter estas dá ênfase à coerência interpessoal entre vítima e
informações, o Investigador de Polícia deverá buscar agressor, acrescentando que “[...] a vítima representa
confirmar estas informações nos antigos endereços alguém na vida ou no passado do agressor (como sua
residenciais e de trabalho da pessoa procurada, mãe ou sua ex-namorada)”. Por isso, nas declarações
entrevistando vizinhos, parentes ou pessoas próximas prestadas pela vítima, o Investigador de Polícia deve
ao procurado. estar atento para a interação entre criminoso e vítima,
buscando algo que foi dito, a conduta do agressor
Interceptação Telefônica antes, durante e depois da violência, seu
Procedimento previsto na Lei 9.294/96 que consiste na comportamento e instrumentos utilizados como luvas,
prática policial realizada por Investigador de Polícia preservativos, cordas, etc.
com o fim de em capturar, em tempo real, conversas
realizadas entre dois ou mais interlocutores, sem a Preservação de Local de Crime
ciência destes. Nos Estados Unidos são muito A primeira equipe a chegar ao local de crime deve
utilizadas para colher dados de grupos como os diligenciar no sentido de conservar o estado das coisas,
skinheads, grupo de neonazistas, que pregam o de forma que propicie a atuação dos peritos criminais.
racismo e são responsáveis por vários crimes, dentre A delimitação de uma área superior ao local do fato se
eles homicídios. O Investigador de Polícia deverá faz importante, pois propicia, se for o caso, uma maior
separar os diálogos que interessam à Investigação e, colheita de vestígios. Os peritos deverão realizar vários
ao final do prazo, elaborará um relatório procedimentos, dentre eles podemos destacar:
circunstanciado do que tenha sido apurado, separando fotografar toda a cena do crime; proceder à busca de
o que interessa à investigação e descartando o vestígios (ex. pólvora, tinta, produtos químicos),
restante. impressões (ex. digitais, palmares, plantares e de
ferramentas); fluídos corporais (ex. saliva, sangue,
Requerimento de Informações de Entes esperma, vômito); documentos (ex. diários, agendas,
Públicos e Privados bilhetes, e-mails).
É prática policial que consiste em buscar informações
referentes a pessoas investigadas e que componham Busca Pessoal e Domiciliar
bancos de dados de entes públicos ou privados, É busca pessoal é prática realizada com o objetivo de
obedecido ao critério de autorização judicial, quando o encontrar arma, papéis ou objeto que constituam corpo
sigilo dos dados estiver sob proteção legal, como no de delito. Independe de mandado no caso de fundadas
caso de obtenção de dados telefônicos, fiscal e suspeitas ou no cumprimento de uma prisão em
bancários, por exemplo: dados cadastrais de conta- flagrante. Pode ser efetuada de dia ou de noite, e ser
corrente; aplicações financeiras; etc. determinada no curso de uma busca domiciliar, com
observâncias das restrições legais. A busca domiciliar
Declarações de Testemunha(s) e vítima(s) é procedimento que deve ser executado durante o dia,
São procedimentos executados pelos Investigadores mediante a apresentação do mandado judicial ao
de Polícia, com o objetivo de buscar o maior número de morador, devendo o policial ler o conteúdo do mandado
informações acerca do fato em análise. antes de adentrar no recinto. Ao final da diligência,
deverá ser lavrado pelo Investigador de Polícia um
Nas declarações prestadas pela testemunha, deverá o termo circunstanciado do que for encontrado.
Investigador de Polícia atentar para o máximo de dados
possíveis, por exemplo: hora e local que podem indicar Considerações Finais
se o criminoso tem familiaridade ou não com a vítima
ou outras pessoas, utilização de uniformes que possam Diante da existência de várias Investigações Policiais
indicar sua profissão ou empresa onde trabalha; que relatam crimes de homicídio e estupro cometidos
sotaques; cor da pele; tatuagens; corte de cabelo; por pessoas portadoras de algum tipo de transtorno
roupas; etc. Outros dados podem ajudar na mental, crimes estes, muitas vezes, praticados com
identificação do agressor: placa e tipo de veículos; extrema crueldade, concluímos sobre a necessidade de
utilização de cordas; arma de fogo, arma branca; etc. formação e aperfeiçoamento dos profissionais de
polícia com conhecimentos específicos em Psicologia
Criminal e Criminologia. Esta medida tem por finalidade

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incrementar a busca de dados e informações que levem No Brasil, a falta de preparo da Polícia em identificar
à identificação da autoria, materialidade e crimes cometidos por assassinos em série ficou patente
circunstâncias em que ocorreu o crime. Os quando analisamos o caso dos Emasculados de
procedimentos policiais acima expostos, entre outros, Altamira: 42 meninos assassinados no período de 1989
são fundamentais para o resultado da Investigação a 2003; de 4 a 15 anos; residentes nos Estados do Pará
Policial. A preservação do local do crime é importante e Maranhão, e que foram vítimas de Francisco das
para a colheita de dados iniciais e informações que Chagas Rodrigues de Brito. Foram quase 14 anos
podem conduzir a elementos de convicção que cometendo esses crimes sem ser importunado pelos
ajudarão a localizar e capturar o delinquente. Vestígios Agentes do Estado. Um banco de dados de caráter
(exemplo: saliva, esperma) são importantes porque nacional, que relacionasse as informações colhidas
colocam o criminoso no local do crime, bem como pelas Investigações realizadas pelos Estados,
possibilitam a sua identificação. As declarações possibilitaria a análise das ocorrências, com a possível
trazidas pela(s) testemunha(s) e vítima(s) do crime comparação de dados e informações, acarretando a
ajudam a elaborar o perfil do agressor, bem como a identificação do seu modus operandi, que consistia em
confecção do seu retrato falado. convidar os meninos para caçar passarinhos ou pegar
frutas na mata. Uma vez na mata, estrangulava a
Todo esse conhecimento pode ser utilizado para vítima, cortava partes do corpo e levava como troféu.
elaboração do perfil do criminoso, estabelecendo seu De início, o caso foi tratado pela polícia como sendo
modus operandi e sua assinatura. Outras práticas crimes comuns e sem ligação um com o outro. Com o
policiais, tais como a infiltração policial, interceptação protesto dos pais das crianças, a Polícia aprofundou as
telefônica e vigilância policial, podem ser empregadas investigações e as concluíram com a prisão de
quando se tenta identificar criminosos e seu modus Francisco no Maranhão.
operandi, organizações ou grupos liderados por
portadores de transtorno mental. Foi o caso dos Esse caso, dentre outros, sinaliza para a necessidade
assassinatos cometidos pela “família Manson”,: grupo de modificações e incrementos nas técnicas de
liderado por Charles Manson, que foi acusado de Investigação Policial que passem pelo processo de
balear, esfaquear e espancar até a morte a atriz Sharon formação e aperfeiçoamento do Investigador de Polícia,
Tate, esposa do diretor cinematográfico Polanski e que visando capacitá-lo a entender, colher dados e formular
estava grávida, e mais quatro amigos do casal. O informações que apontem para autores de crimes
mesmo grupo foi acusado de assassinar o casal cometidos por portadores de algum tipo de transtorno
Rosemery e Leno Labianca. mental.

Exercícios para Fixação


Respostas (gabarito), no final dos exercícios

01) Atualmente, são objetos de estudo da de um shopping center, é surpreendido por bandido
Criminologia: armado que estava homiziado em local próximo,
a) o delito, o delinquente, a vítima e o controle social. aguardando a primeira pessoa a quem pudesse
b) o delito, a antropologia e a psicologia criminais. roubar, é:
c) o delito e os fatores biopsicológicos da criminalidade. A) tão culpado quanto o criminoso.
d) o delito e o delinquente. B) vítima ideal.
e) o delinquente e os fatores biopsicológicos da C) mais culpado que o criminoso.
criminalidade. D) exclusivamente culpado.
E) vítima de culpabilidade menor.
02) Podemos considerar a ciência que analisa o
crime, seu agente, a vítima e todas as 04) O período antropológico de estudo da
circunstâncias, de que resultam o fenômeno criminalidade foi iniciado pelo médico
criminal, sugerindo um controle social mais A) Enrico Ferri.
eficiente dos delitos, como: B) Cesare Lombroso.
A) direito penal C) Cesare Bonesana.
B) procedimento penal D) Emile Durkheim.
C) criminologia E) Hans von Hentig.
D) todas as alternativas estão corretas
05) A atuação das polícias, do ministério público e
03) Um indivíduo que, ao abrir a porta de seu da justiça criminal, quando focada em
veículo automotor, a fim de sair do estacionamento determinados grupos ou setores da sociedade, por
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possuírem maior risco de praticar o crime ou de ser 11) A corrente de pensamento criminológico que
vitimados por este, constitui programa de critica a exibição de cenas em televisão e cinema,
prevenção: de abuso de drogas ilícitas, prática de roubos,
A) secundária. sequestros, bem como outras condutas delituosas,
B) quaternária. alçando seus protagonistas a status de “heróis” ou
C) primária. “justiceiros”, fomentando sua imitação pelas
D) quinária. pessoas, principalmente jovens, é a Teoria:
E) terciária. A) da Identificação Diferencial.
B) da Reação Social.
06) O legislador brasileiro, ao dispor sobre as C) da Criminologia Radical.
funções da reprimenda pela prática de infração D) da Associação Diferencial.
penal no artigo 59 do Código Penal – O juiz, E) da Criminologia Crítica.
atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à
personalidade do agente, aos motivos, às 12) É considerado o pai da Vitimologia:
circunstâncias e consequências do crime, bem A) Cesare Lombroso.
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, B) Raffaele Garofalo.
conforme seja necessário e suficiente para C) Émile Durkheim.
reprovação e prevenção do crime... –, adotou a D) Benjamin Mendelsohn.
teoria da: E) Cesare Bonesana.
A) função reeducativa da pena.
B) função de prevenção especial da pena. 13) Entende(m)-se por vitimização terciária:
C) função de prevenção geral da pena. A) os danos materiais e morais diretamente causados
D) função retributiva da pena. pelo delito, em face da vítima.
E) função mista ou unificadora da pena. B) a conduta de terceiros ou de eventos oriundos da
natureza.
07) São Objetivos próprios da Criminologia: C) o aborrecimento e o temor causados pela
A) busca da etiologia do crime necessidade de comparecer aos órgãos encarregados
B) a análise da personalidade e conduta do criminoso de persecução criminal para o formal registro da
C) identificação das circunstâncias e fatores ocorrência bem como para a indicação de seu algoz.
determinantes da criminalidade D) a discriminação que a vítima recebe de seus
D) todas as alternativas estão corretas familiares, amigos e colegas de trabalho, em forma de
segregação e humilhação, por conta do delito por ela
08) Servir como central de informações sobre o sofrido.
crime, é considerada: E) a sobrevitimização, como o suicídio ou a autolesão.
A) uma função da Criminologia
B) uma tarefa policial 14) O efeito criminógeno da grande cidade,
C) uma atribuição da Polícia Civil valendo-se dos conceitos de desorganização e
D) todas as alternativas estão corretas contágio inerentes aos modernos núcleos urbanos,
é explicado pela:
09) Estudar todos os aspectos genéticos do agente A) Teoria do Criminoso Nato.
do crime, desde sua anatomia, sua fisiologia, B) Teoria da Associação Diferencial
eventuais patologias, e, ainda, a estrutura C) Teoria da Anomia.
bioquímica do criminoso cabe: D) Teoria do Labelling Aproach.
A) ao Delegado de Polícia E) Teoria Ecológica.
B) à Biologia Criminal
C) ao médico psiquiatra 15) O comportamento abusivo, praticado com
D) todas as alternativas estão corretas gestos, palavras e atos que, praticados de forma
reiterada, levam á debilidade física ou psíquica de
10) São teorias do conflito as teorias: uma pessoa
A) das áreas criminais, da identificação diferencial e da A) define reação ao crime.
criminologia crítica. B) define assédio moral.
B) da desorganização social, da neutralização e das C) é um mecanismo intimidatóno, mas não criminoso.
áreas criminais. D) é a despersonalização do eu, que aflige grande
C) do conflito cultural, do etiquetamento e da número de detentos.
associação diferencial. E) define efetividade do impacto dissuasório.
D) da associação diferencial, da subcultura e do
estrutural-funcionalismo. 16) A prevenção terciária da infração penal, no
E) da criminologia crítica, da rotulação e da Estado Democrático de Direito, está relacionada:
criminologia radical. A) ao controle dos meios de comunicação.
B) aos programas policiais de prevenção.
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C) à ordenação urbana.
D) à população carcerária. 23) Entende-se por Etiologia Criminal a ciência que
E) ao surgimento de conflito. estuda e investiga:
A) a criminalística, isto é, o processo de
17) Assinale a alternativa incorreta. A Teoria do desenvolvimento do crime.
Etiquetamento: B) a transmissão congênita de fatores psicológicos,
A) é considerada um dos marcos das teorias de propensos ao desenvolvimento da criminalidade.
consenso. C) a criminogênese, que objetiva explicar quais são as
B) é conhecida como teoria do labelling aproach. causas do crime.
C) tem como um de seus expoentes ervinh goffman. D) o fenômeno do delito e as formas de prevenção
D) tem como um de seus expoentes howard becker. secundária.
E) surgiu nos estados unidos. E) a transmissão genética de fatores biológicos,
propensos ao desenvolvimento da criminalidade.
18) Assinale a afirmativa correta.
A) A Escola de Chicago faz parte da Teoria Crítica. 24) A Teoria do Etiquetamento ou do labelling
B) 0 delito não é considerado objeto da Criminologia. approach inspirou no Direito Penal Brasileiro a
C) A Criminologia não é uma ciência empírica. instituição
D) A Teoria do Criminoso Nato é de Merton. A) da Lei de Segurança Nacional.
E) Cesare Lombroso e Raffaelle Garofalo pertencem à B) do Código Penal Militar.
Escola Positiva. C) da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
D) da Teoria do Direito Penal do Inimigo.
19) O Positivismo Criminológico, com a Scuola E) da Lei dos Crimes Hediondos.
Positiva italiana, foi encabeçado por:
A) Lombroso, Garofolo e Ferri 25) Complete com a alternativa correta:
B) Luchini, Ferri e Del Vecchio Considerado o principal idealizador da Sociologia
C) Dupuy, Ferri e Vidal. Criminal ............ tem como obra principal ................
D) Lombroso, Dupuy e Garofolo. A) Lombroso – “O Homem Delinquente”
E) Baratta, Adolphe e Vidal. B) Garofalo – “O Ambiente Criminal”
C) Ferri – “Sociologia Criminal”
20) A Escola Técnico-jurídica estabelece os D) Carrara – “Sociedade e Crime”
seguintes princípios fundamentais: E) Lacassagne – “Sociedade e Miséria”
A) o delito é pura relação jurídica, de conteúdo
individual e social 26) A teoria do “Labelling Approach” ou da Reação
B) a pena constitui uma reação e uma consequência do Social é também conhecida como
crime (tutela jurídica), com função preventiva geral e A) Teoria da Anomia.
especial, é aplicável aos imputáveis B) Teoria da Subcultura.
C) a responsabilidade é moral (vontade livre) C) Teoria Ecológica.
D) todas as alternativas estão corretas D) Teoria do etiquetamento ou rotulação.
E) Teoria Espacial.
21) As pessoas que, individual ou coletivamente,
tenham sofrido danos, inclusive lesões físicas ou 27) A associação entre hereditariedade / delito e
mentais, sofrimento emocional, perda financeira ou anomalias cromossômicas / comportamento
detrimento substancial de seus direitos criminal inserem-se no modelo da:
fundamentais, como consequência de ações e A) Biologia Criminal.
omissões que violem a legislação penal vigente nos B) Sociologia Criminal.
Estados Membros, incluída a que proíbe o abuso de C) Psicologia Criminal.
poder, podem ser consideradas: D) Psiquiatria Criminal.
A) vítimas E) Frenologia Criminal.
B) prejudicado
C) inocente 28) O termo cifra dourada é indicativo
D) todas as alternativas estão corretas A) dos crimes praticados por membros da realeza.
B) da violência doméstica ocorrida nas classes altas e
22) A teoria que sustenta que a criminalidade é não relatadas à polícia.
manifestação da maioria — e não de uma minoria C) dos crimes esclarecidos mediante à oferta de uma
como é identificado pelas demais escolas, recompensa.
denomina-se: D) do número de jovens de alto poder aquisitivo
A) teoria do Labelling approach envolvidos com o narcotráfico.
B) teoria de aproximação emocional E) dos crimes denominados de “colarinho branco”.
C) teoria da criminalização
D) todas as alternativas estão corretas 29) A Escola Clássica:
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A) Tem em Garófalo um dos seus precursores. B) Teoria da Associação Diferencial.
B) baseia-se no método empírico-indutivo. C) Teoria Crítica.
C) crê no livre arbítrio. D) Teoria da Anomia.
D) surge na etapa científica da Criminologia. E) Teoria da Subcultura.
E) criou a figura do criminoso nato.
36) A ciência que estuda o crime como fenômeno
30) A Escola Positiva: social, próprio do meio social em que seus
A) crê no determinismo e defende o tratamento do personagens se inserem, é conhecida como:
criminoso. A) medicina legal
B) tem em bentham um de seus precursores. B) psicologia jurídica
C) foi consolidada por carrara. C) sociologia criminal
D) baseia-se no método dogmático e dedutivo. D) todas as alternativas estão corretas
E) surgiu na etapa pré-científica da criminologia.
37) Estado Democrático de Direito tem como
31) Para Garcia Pablo de Molina é entendido como objetivo:
o conjunto de instituições, estratégias e sanções A) ressocializar o delinquente
sociais que pretendem promover e garantir a B) fazer a reparação do dano
submissão dos indivíduos aos modelos e normas C) prevenir o crime
comunitárias. D) todas as alternativas estão corretas
O texto se refere:
A) à Criminogênese. 38) Assinale a alternativa que indica um dos objetos
B) aos fatos condicionantes biológicos. de estudo da criminologia moderna.
C) ao controle social. A) O controle social.
D) aos fatos condicionantes sociológicos. B) A justiça.
E) aos fatos condicionantes criminais. C) O direito penal.
D) O desiquilíbrio psicológico.
32) Consolidada na década de 70 e inspirada nas E) A lei.
ideias marxistas, alçou a sociedade capitalista a
categoria de principal desencadeador da 39) Constituem objeto de estudo da Criminologia
criminalidade. A) o delinquente, a vítima, o controle social e o
O texto se refere à: empirismo.
A) teoria ecológica. B) o delito, o delinquente, a interdisciplinaridade e o
B) teoria da associação diferencial. controle social
C) teoria da anomia. C) o delito, o delinquente, a vitima e o controle social.
D) teoria da subcultura. D) o delinquente, a vitima, o controle social e a
E) teoria crítica. interdisciplinaridade.
E) o delito, o delinquente, a vítima e o método.
33) Atua como agente informal de controle social:
A) a Polícia Civil. 40) Sobre a Criminologia, é correto afirmar que
B) a opinião pública. A) ela não é considerada uma ciência para a maior
C) o Ministério Público. parte dos autores.
D) o Juiz de Direito. B) tal conhecimento encontra-se inteiramente
E) o Sistema Prisional. subordinado ao Direito Penal.
C) ela ocupa-se do estudo do delito e do delinquente,
34) Dentre as alternativas, assinale a que é mas não se ocupa do estudo da vítima e do controle
apontada como a menos compatível com a social, uma vez que tal assunto constitui objeto de
dignidade da pessoa humana e o Estado interesse da Sociologia.
Democrático de Direito. D) ela ocupa-se do estudo do delito e do controle social,
A) O Direito Penal do Inimigo. mas não se ocupa do estudo do delinquente e da
B) O abolicionismo penal. vítima, uma vez que tal assunto constitui objeto de
C) O Direito Penal Mínimo. estudo da Psicologia.
D) A “Terza Scuola”. E) ela constitui um campo fértil de pesquisas para
E) A Lei da Saturação Criminal psiquiatras, psicólogos, sociólogos, antropólogos e
juristas.
35) Consolidada na década de 70 e inspirada nas
ideias marxistas, alçou a sociedade capitalista a 41) A Teoria do labelling approach, a qual explica
categoria de principal desencadeador da que a criminalidade não é uma qualidade da
criminalidade. conduta humana, mas a consequência de um
O texto se refere à: processo em que se atribui tal estigmatização,
A) Teoria Ecológica. também é denominada teoria
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A) da desorganização social. normativamente, ele atua com defeito volitivo e se
B) da rotulação ou do etiquetamento. revela infiel ao direito.
C) da neutralização. C) Claus Roxin, na formulação da sua teoria da
D) da identificação diferencial. imputação objetiva, entende que a finalidade do direito
E) da anomia. penal é a de garantir a segurança das expectativas em
relação ao cumprimento dos papéis atribuídos a cada
42) Entende-se por vitimização secundária ou um, e não a de impedir todos os danos possíveis,
sobrevitimização aquela paralisando a vida social. Por essa razão, não devem
A) provocada pelo cometimento do crime e pela ser imputados aos indivíduos os resultados danosos
conduta violadora dos direitos da vítima, provenientes de condutas socialmente adequadas.
proporcionando danos materiais e morais, por ocasião D) Na dogmática penal brasileira contemporânea, a
do delito. posição adotada por Juarez Tavares, no tocante ao
B) que não concorreu, de forma alguma, para a conceito de ação como condição para a existência do
ocorrência do crime. delito, distancia-se do finalismo, por não admitir um
C) que, de modo voluntário ou imprudente, colabora conceito pré-jurídico de conduta, e aproxima-se do
com o ânimo criminoso do agente. modelo social, pela afirmação de que a conduta
D) que ocorre no meio social em que vive a vítima e é humana não é somente um fenômeno individual, mas
causada pela família, por grupo de amigos etc. deve ser estruturada sob a característica de constituir
E) causada pelos órgãos formais de controle social, ao atividade social. Essa abordagem se identifica com o
longo do processo de registro e apuração do delito, funcionalismo, por vincular o conceito de ação,
mediante o sofrimento adicional gerado pelo exclusivamente, a um sistema ou processo de
funcionamento do sistema de persecução criminal. imputação.
E) Conforme a teoria pessoal da ação, nem as
43) No tocante à temática da prevenção da infração atividades insuscetíveis de controle pela consciência e
à lei penal, é correto afirmar que a prevenção pela vontade nem os simples pensamentos constituem
A) secundária consiste em, dentre outras, políticas ação como manifestação da personalidade, porque
criminais voltadas exclusivamente à reintegração do aquelas não são atribuíveis ao centro de ação
preso na sociedade. psicoespiritual humana e estes, a despeito de sua
B) terciária consiste em políticas públicas de natureza psicoespiritual, não chegam a se manifestar
conscientização de todos os cidadãos quanto à no mundo exterior.
importância de se cumprirem as leis, mediante o
fornecimento de serviços públicos de qualidade, tais 45) Acerca de prescrição, classificação jurídica dos
como saúde, educação e segurança. crimes e aspectos da teoria do delito, assinale a
C) geral busca, por meio da pena, intimidar os opção correta.
indivíduos propensos a delinquir, inibindo-os de A) O termo inicial de contagem do prazo da prescrição
transgredir a lei penal. da pretensão executória é a data em que a sentença
D) geral negativa busca, por meio da pena, a condenatória transita em julgado para a acusação.
reeducação e a ressocialização do criminoso. B) Inimputável o agente, dispensa-se a análise dos
E) primária consiste em, dentre outras, ações policiais demais elementos da culpabilidade, potencial
de repressão às práticas delituosas. consciência da ilicitude e exigibilidade de
comportamento diverso.
44) Com relação às teorias que versam sobre o C) O furto somente se compatibiliza com a desistência
delito e a pena, assinale a opção correta. voluntária antes de iniciada a fase de execução.
A) Decorre do pós-finalismo, mais propriamente da D) Conforme entendimento sumulado do STJ, a
teoria social da ação desenvolvida por Hans-Heinrich reincidência influi no prazo da prescrição da pretensão
Jescheck, a afirmação de que a culpabilidade não punitiva.
constitui condição suficiente para a imposição da pena, E) Delito de resultado cortado e delito mutilado de dois
mas apenas um dos elementos que, juntamente com a atos são conceitos sinônimos, ambos espécies do
necessidade preventiva, passa a integrar a categoria gênero delito de tendência interna transcendente.
denominada responsabilidade.
B) Entre as teorias contemporâneas do delito, apenas 46) Considerando o conceito e a evolução
a teoria do defeito da motivação jurídica, ou teoria da dogmática da teoria do crime, é CORRETO afirmar
motivação, realiza a crítica ao livre arbítrio como A) que, exercendo a tipicidade, conforme a teoria da
expressão de absoluto indeterminismo e como ratio essendi, função incidiária da ilicitude, pode-se falar
fundamento ontológico da culpabilidade. Essa teoria foi em causas justificantes legais, mas não em causas
desenvolvida a partir da ideia de censura sobre o autor supralegais, por ferirem estas o princípio da legalidade.
que defrauda as expectativas da norma penal, porque, B) que, para a teoria diferenciadora, adotada por nosso
apesar de possuir a capacidade de reconhecer e acatar Código Penal, o estado de necessidade é justificante,
a motivação de comportamento prescrita afastando a ilicitude do fato típico praticado pelo
agente.
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C) que, para a teoria social da ação, a ação é B) moderna tem como meta erradicar as causas do
concebida como o exercício de uma atividade final crime, pois desta forma também se estará eliminando
dirigida concretamente a fato juridicamente relevante. os seus efeitos.
D) que são elementos da culpabilidade normativa pura C) tem como um dos objetivos orientar a política
a imputabilidade, a consciência potencial da ilicitude e criminal na prevenção especial e direta dos crimes
a exigibilidade de conduta diversa. socialmente relevantes.
D) é uma ciência que trata do delito, do delinquente e
47) Assinale a alternativa correta, a respeito da da pena.
Criminologia. E) é um conjunto de conhecimentos que estuda o
A) Constitui seu objeto a análise apenas do delito e do fenômeno e as causas da criminalidade, a
delinquente, ficando o estudo da vítima sob a alçada da personalidade do delinquente e sua conduta delituosa,
psicologia social. incluindo também a maneira de ressocializá-lo.
B) São características fundamentais de seu método o
dogmatismo e a intervencionalidade. 51) Sobre a vitimologia, é correto afirmar que
C) É uma técnica de investigação policial, que faz parte A) pouco tem ainda contribuído para a formulação de
das Ciências Jurídicas. políticas públicas, já que nem sempre utiliza dados de
D) São suas finalidades a explicação e a prevenção do interesse governamental.
crime bem como a intervenção na pessoa do infrator e B) a reparação do dano causado à vítima interessa e
avaliação dos diferentes modelos de resposta ao crime. se constitui uma exigência social.
E) É uma ciência dogmática e normativista, que se C) a vulnerabilidade da vítima decorre de diversos
ocupa do estudo do crime e da pena oriunda do fatores comuns, o que faz com que o risco de
comportamento delitivo. vitimização seja equânime para as pessoas em geral,
assim como o próprio delito.
48) Assinale a alternativa correta. D) os estudos de vitimologia têm auxiliado a
A) No modelo clássico (tradicional) de Justiça Criminal, compreensão do fenômeno da criminalidade, a partir da
a vítima é encarada como mero objeto, pois dela se introdução do enfoque de que algumas delas devem
espera que cumpra seu papel de testemunha, com ser protegidas pelo Estado.
todos os inconvenientes e riscos que isso acarreta. E) não deve ser definida em termos de direito penal,
B) A Vitimologia não possui relação com a Sociologia. mas sim de direitos humanos.
C) A Vitimologia não estuda a vítima e suas relações
com o infrator e com o sistema de persecução criminal. 52) Na moderna concepção de prevenção das
D) A Vitimologia não possui relação com a infrações penais e o Estado Democrático de Direito,
Criminologia. A) as atuações do Poder Judiciário e do Ministério
E) No modelo clássico (tradicional) de Justiça Criminal, Público enquadram-se na prevenção terciária.
a vítima é encarada como sujeito passivo da relação B) a efetiva materialização de políticas públicas faz
jurídica, pois dela se espera que cumpra seu papel de parte da prevenção primária do crime.
ofendido, com todos os direitos e deveres que isso C) o trabalho desenvolvido pelas instituições públicas
acarreta. ou privadas na área social, qual seja, a respon
sabilidade social, faz parte da prevenção secundária.
49) A moderna Criminologia D) a construção de presídios e a atuação dos policiais
A) tem por seus protagonistas o delinquente, a vítima e são analisadas de forma apartada na questão das
a comunidade. prevenções primária, secundária e terciária.
B) vislumbra o delito como enfrentamento formal, E) a atuação das Organizações Não Governamentais,
simbólico e direto entre dois rivais - o Estado e o infrator ONG, tem hoje enquadramento na prevenção
- que se enfrentam, isolados da sociedade, à secundária e, às vezes, na terciária.
semelhança da luta entre o bem e o mal.
C) não considera como seu objeto de debate os 53) É correto afirmar que a Criminologia
aspectos político-criminais das técnicas de intervenção A) é uma ciência do dever-ser.
social e de seu controle. B) não é uma ciência interdisciplinar.
D) tem o castigo do infrator por exaurimento das C) não é uma ciência multidisciplinar.
expectativas que o fato delitivo desencadeia. D) é uma ciência normativa.
E) tem por seus principais objetivos a reparação do E) é uma ciência empírica.
dano causado ao Estado, a ressocialização do
delinquente e a repressão do crime. 54) É correto afirmar que a Criminologia
contemporânea tem por objetos
50) Sobre a criminologia é INCORRETO afirmar: A) o delito, o delinquente, a vítima e o controle social.
A) estuda crimes socialmente relevantes, tendo B) a tipificação do delito e a cominação da pena.
interesse em estudar homicídios dolosos e roubos. C) apenas o delito, o delinquente e o controle social.
D) apenas o delito e o delinquente.
E) apenas a vítima e o controle social.
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E) vitimologia.
55) A história da Criminologia conta com grandes
autores que, com suas obras, contribuíram 60) Quanto ao estatuto da disciplina Criminologia e
significativamente na construção desse ramo do sua relação com a Política criminal, é correto
conhecimento. É correto afirmar que Cesare afirmar:
Bonesana (1738~1794), o marquês de Beccaria, foi A) A Criminologia desenvolvida com base no chamado
autor da obra “paradigma etiológico”, de matriz positivista, e a Política
A) O Homem Delinquente. criminal dela decorrente, exerceram influência
B) Dos Delitos e das Penas. marcante sobre vários níveis do sistema penal
C) Antropologia Criminal. brasileiro (legal, doutrinário), exceto na execução
D) O Ambiente Criminal. penal.
E) Sociologia Criminal. B) A seletividade do sistema penal significa que a
criminalização é desigualmente distribuída entre os
56) Cesare Lombroso (1835~1909), médico e vários grupos e classes sociais, apesar da prática de
cientista italiano, foi considerado um dos condutas legalmente definidas como crime ocorrer em
expoentes da corrente de pensamento denominada todos eles e que a Lei, em princípio, é igual e geral para
A) Escola Positiva. todos, resultando a desigualdade no momento da
B) Escola Clássica. seleção dos criminosos pela Polícia, Ministério Público
C) Escola Jusnaturalista. e Justiça.
D) Terza Scuola. C) A Criminologia desenvolvida com base no chamado
E) Escola de Política Criminal ou Moderna Alemã. “paradigma da reação ou controle social”, que origina a
Criminologia crítica, estuda o sistema penal, incluindo a
57) A respeito dos fatores impulsionadores da agência policial, como parte integrante de seu objeto, e
criminalidade, assinale a alternativa correta. conclui que a seletividade estigmatizante é a lógica
A) O bom funcionamento do sistema de educação e estrutural de seu funcionamento.
ensino não é fator inibitório de criminalidade na D) A obra “Dos delitos e das penas” (1764), de Cesar
sociedade. Beccaria, constitui a matriz mais autorizada do
B) O crescimento populacional de uma determinada nascimento da Criminologia como uma disciplina
localidade sempre eleva os índices criminais. autodenominada de “ciência” causal-explicativa da
C) Não há qualquer relação entre o aumento do poder criminalidade.
aquisitivo de determinado grupo social e o crescimento E) A Criminologia é uma disciplina complexa e plural,
da delinquência. pois existem diferentes paradigmas e teorias
D) A má distribuição de renda influencia o aumento de criminológicas que, desde o século XVII, se
todos os índices criminais de uma determinada desenvolvem no mundo ocidental, inclusive na América
localidade. Latina e no Brasil. Seu objeto varia de acordo com os
E) A pobreza influi no aumento de índices criminais de diferentes paradigmas. Entretanto, seu método
cunho patrimonial. experimental tem permanecido constante.

58) Fenômeno comum em países em 61) Ao longo dos anos, verificou-se, por meio dos
desenvolvimento ou emergentes, ____________ estudos da criminologia, que a vítima sempre foi
propicia(m) a promiscuidade, o afrouxamento dos deixada em um segundo plano; a contar do
freios morais, o desrespeito ao próximo e outros momento em que o Estado monopolizou a
desvios comportamentais, empurrando aqueles distribuição da justiça, a vítima foi esquecida.
que vivem ou sobrevivem nessas situações a uma Como contraponto desses estudos, o Brasil
existência marcada pela inclinação ao crime. elaborou algumas leis que priorizam a vítima,
Assinale a alternativa que preencha corretamente a dentre elas, pode-se citar:
lacuna do texto. A) a Lei n.º 11.923/09, que criou a figura do sequestro
A) a migração relâmpago (§ 3.º do art. 158 do CP).
B) a religião B) a Lei n.º 11.690/08, que vedou a utilização de provas
C) o subemprego ilícitas no processo penal (art. 157 do CPP).
D) as condições precárias de habitação C) a Lei n.º 11.343/06, que instituiu o Sistema Nacional
E) a política de Políticas Públicas sobre Drogas.
D) a Lei n.º 9.503/97, que instituiu o Código de Trânsito
59) O comportamento inadequado da vítima que de Brasileiro.
certo modo facilita, instiga ou provoca a ação de E) a Lei n.º 9.099/95, que instituiu os juizados especiais
seu verdugo é denominado civis e criminais.
A) vitimização terciária.
B) vitimização secundária. 62) São objetos de estudo da Criminologia moderna
C) periculosidade vitimal. __________, o criminoso,_________e o controle
D) vitimização primária.
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social. Assinale a alternativa que completa, correta 68) O indivíduo abúlico é aquele cuja personalidade
e respectiva- mente, as lacunas do texto. psicopática se caracteriza
A) a desigualdade social ... o Estado A) pela falta de vontade, sendo uma pessoa
B) a conduta ... o castigo sugestionável e vulnerável aos fatores criminógenos e
C) o direito ... a ressocialização que age por indução.
D) a sociedade ... o bem jurídico B) por ser uma pessoa arrojada, intrépida, combativa,
E) o crime ... a vítima destemida e decidida.
C) por ser destituído de confiança ou de esperança,
63) A criminologia é uma ciência que dispõe de leis propenso a tremores e que se preocupa e sofre
A) imutáveis e evolutivas. exageradamente com o menor revés.
B) inflexíveis e evolutivas. D) por aparentar placidez e felicidade, porém pode
C) permanentes e flexíveis. explodir subitamente em fúria.
D) flexíveis e restritivas. E) por ser vaidoso e ter mania de grandeza,
E) evolutivas e flexíveis. aparentando ser mais do que é.

64) Dentre as ideias defendidas pelo Marquês de 69) A anormalidade psicossexual consistente na
Beccaria, relativamente aos delitos e às penas, a exaltação ou impulsividade sexual sem freio,
pena deveria verificada no indivíduo do sexo masculino, é
A) ser prontamente imposta para que o castigo pudesse conhecida por
relacionar-se com o crime. A) ninfomania.
B) ser imposta somente após um período de prisão do B) anerotismo.
delinquente para que este pudesse refletir sobre seus C) erotismo.
atos. D) masoquismo.
C) sempre ser imposta de forma a configurar um E) satiríase.
confisco de bens do delinquente.
D) ser imposta de forma a corresponder a uma ação 70) O período antropológico de estudo da
ofensiva igual àquela praticada pelo ofensor. criminalidade foi iniciado pelo médico
E) imposta somente pelo Santo Ofício da Inquisição. A) Enrico Ferri.
B) Cesare Lombroso.
65) “L’uomo delinquente” ou “O homem C) Cesare Bonesana.
delinquente” é uma obra clássica da criminologia, D) Emile Durkheim.
de autoria de E) Hans von Hentig.
A) Marquês de Beccaria.
B) Césare Lombroso. 71) O movimento “Lei e Ordem” e a teoria das
C) Francesco Carrara. “janelas quebradas” (“broken windows”) defendem
D) Pellegrino Rossi. que pequenas infrações, quando toleradas, podem
E) Enrico Pessina. levar à prática de delitos mais graves.
O texto acima se refere à:
66) Segundo a teoria behaviorista, o homem comete A) Criminologia Radical.
um delito porque e seu comportamento B) Defesa Social.
A) é uma resposta às causas ou fatores que o levam à C) Tolerância Zero.
prática do crime. D) Escola Retribucionista.
B) decorre de sua própria natureza humana, E) Lei de Saturação Criminal.
independentemente de fatores internos ou externos.
C) é dominado por uma vontade insana de praticar um 72) Atualmente, são objetos de estudo da
crime. Criminologia:
D) não permite a distinção entre o bem e o mal. A) o delito, o delinquente, a vítima e o controle social.
E) impede-o de entender o caráter delituoso da ação B) o delito, a antropologia e a psicologia criminais.
praticada. C) o delito e os fatores biopsicológicos da
criminalidade.
67) O indivíduo incapaz de cuidar-se e bastar-se a D) o delito e o delinquente.
si mesmo, com “QI” abaixo de 20 e idade mental E) o delinquente e os fatores biopsicológicos da
abaixo de 3 anos, tem seu estado mental criminalidade.
caracterizado como
A) hipofrênico. 73) O paradigma da reação social
B) débil mental. A) surgiu na Europa a partir do enfoque do
C) imbecil. interacionismo simbólico.
D) idiota. B) afirma que os grupos sociais criam o desvio, o qual
E) hiperfrênico. é uma qualidade do ato infracional cometido pela
pessoa.
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C) indica que é mais apropriado falar em criminalização estudar o crime pelo método estatístico, em que o
e criminalizado que falar em criminalidade e criminoso. criminoso era avaliado a partir do comportamento do
D) afirma que a criminalidade tem natureza ontológica. homem médio.
E) pode ser chamado, também, de labbeling approach, C) Cesare Lombroso, precursor da escola positivista,
etiquetamento ou paradigma etiológico. ao estudar o crime pelo método experimental, em que
se desenvolve a figura do criminoso nato, associando-
74) No âmbito da criminologia da reação social, o o ao atavismo.
trabalho da Polícia Civil pode ser considerado D) Lambert Adolphe Quetelet, precursor da escola
como a clássica, ao estudar o crime pelo método lógico-
A) expressão do controle social informal. abstrato, em que a pena, de caráter retributivo, deveria
B) contribuição de uma agência do controle social ser severa, certa e clara.
formal. E) Enrico Ferri, precursor da escola sociológica do
C) manifestação do controle social difuso. consenso, ao estudar o crime pelo método
D) manifestação do controle empresarial. probabilístico, em que se parte de um pressuposto de
E) expressão particular de uma visão de justiça. que há valores fundamentais que orientam a ordem
social.
75) A corrente de pensamento criminológico que
aponta, como técnica utilizada pelo criminoso para 78) Para a criminologia, deve ser encarado como
sua autojustificação, um procedimento racional em um problema social e comunitário
que atribui a culpa pelos seus atos antissociais aos A) delito.
agentes públicos encarregados de sua punição B) o delinquente.
(policiais, membros do ministério público, C) o controle social.
magistrados), os quais seriam corruptos, parciais e D) a vítima.
inescrupulosos, é denominada teoria E) a atuação do Estado.
A) do estrutural-funcionalismo.
B) da criminologia crítica. 79) O crime como resultado do inadequado
C) da neutralização. funcionamento da sociedade, em razão,
D) do conflito cultural. especialmente, de uma situação social desprovida
E) da criminologia radical. de regras ou lei, não se vislumbrando o delito como
uma anomalia e considerando-se a sociedade um
76) O modelo restaurador de reação ao delito, todo orgânico, é característica da teoria sociológica
também conhecido por modelo integrador ou de A) ecologia criminal.
justiça restaurativa, tem por objetivo(s) B) etiquetamento.
A) aplicar pena ao condenado, buscando desestimulá- C) anomia.
lo à prática de novos delitos. D) associação diferencial.
B) buscar a recuperação do delinquente, proporcionar E) subcultura criminosa.
assistência à vítima e restabelecer o controle social
abalado pela prática do delito. 80) Tadeu é Delegado de Polícia lotado no
C) punir o delinquente, como meio de castigá-lo e Município de Catalão-GO. Além disso, cursa pós-
retribuir-lhe o mal pelo delito praticado. graduação em nível de mestrado em Direito e
D) proteger os bens jurídicos violados pela prática pesquisa a delitividade das ocorrências na sua
delitiva. circunscrição. Ao se debruçar sobre possíveis
E) reinserir o condenado à sociedade por meio da escolas criminológicas, Tadeu optou por priorizar a
religião e da laborterapia. atuação preventiva do Estado, diminuindo a
repressão, com estudos centrados em
77) Segundo Eduardo Viana (2018), a criminologia é investigações empíricas em cada localidade.
uma ciência relativamente nova e não pode, de Assim, é correto afirmar que ele utilizou o método
modo algum, ser esquecida ou ladeada em razão de da
uma inaceitável preferência pelo dogmatismo A) Teoria da Associação Diferencial.
acrítico e isolacionista. O enfrentamento da B) Escola de Chicago.
(moderna) criminalidade depende, e muito, da C) Criminologia do Consenso.
conjugação dos esforços da Criminologia e do D) Escola Austríaca.
Direito Penal. Contribuindo para a construção da E) Teoria da Anomia Preventiva.
criminologia enquanto ramo do saber, destaca-se
A) Cesare Beccaria, precursor da escola positivista 81) As opções a seguir apresentam postulados da
sociológica, ao estudar o crime pelo método teoria da associação diferencial, desenvolvida pelo
observacional, em que o fenômeno criminológico é tido criminólogo estadunidense Edwin Sutherland, à
como decorrente de fatores físicos, sociais e exceção de uma. Assinale-a.
antropológicos. A) Em suas interações sociais, indivíduos aprendem
B) Paul Topinard, precursor da escola cartográfica, ao valores, comportamentos e habilidades que explicam
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por que algumas pessoas cometem determinados tipos seus protagonistas (autor, vítima e comunidade),
de crimes. motivo pelo qual sua prevenção passa por várias
B) A teoria explica por que pessoas de classes sociais etapas, surgindo assim a classificação da
mais altas têm maior probabilidade de cometer crimes prevenção em primária, secundária e terciária. Em
do colarinho branco que delitos patrimoniais violentos. face, do exposto, assinale a alternativa correta.
C) Medições antropométricas divergentes do padrão A) A prevenção primária destina-se a setores da
podem auxiliar na identificação da propensão delitiva sociedade que podem vir a padecer do problema
em alguém. criminal e não ao indivíduo, manifestando-se a curto e
D) O comportamento criminoso é aprendido médio prazos.
principalmente em grupos de pessoas com intimidade B) A prevenção secundária trabalha diretamente no que
entre si; assim, meios de comunicação de massa têm tange a educação, emprego, moradia, segurança etc.
menor influência nesse sentido. ou seja, atua na qualidade de vida do povo,
E) A pessoa torna-se criminosa em virtude da instrumentos preventivos de médio e longo prazos.
preponderância de fatores propícios à violação da lei C) A prevenção terciária tem como foco o preso,
em seu meio social. visando sua recuperação por meio de medidas
socioeducativas.
82) Enquanto o prendiam, a golpes de martelo, à D) As Políticas Criminais, por exemplo, as que buscam
argola de ferro, ele chorava [...] Partiu para Toulon. evitar a reincidência do condenado ou as penas
Lá chegou após uma viagem de vinte e sete dias restritivas de direitos, são características da prevenção
sobre uma charrete e com a corrente no pescoço. primária por se tratar de uma ação do Estado.
Em Toulon, colocaram-lhe a vestimenta vermelha. E) A recuperação de vias, limpeza de terrenos
Desde então, tudo o que constituíra sua existência abandonados e melhoria na iluminação pública são
se apagou, até mesmo seu nome; não era mais Jean características da prevenção terciária.
Valjean, era apenas o número 24.601.
(HUGO, Victor. Os miseráveis. Tradução de Regina Célia de 85) De acordo com a psicologia forense, um
Oliveira, São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 104)
indivíduo de boa formação moral e de bons
O direito das pessoas presas ao chamamento princípios pode ter seu equilíbrio rompido e
nominal se trata de influência no direito brasileiro cometer uma infração penal por reação. Dessa
da teoria denominada forma, é importante verificar a dinâmica do ato
A) labeling approach. criminoso com a adição de fatores primários, que
B) associação diferencial. A) estão relacionados à personalidade; e de
C) subcultura delinquente. secundários, que são fatores solicitantes.
D) minimalista. B) são responsáveis pela conduta criminosa; e de
E) neorrealismo de esquerda. secundários, que estão relacionados à personalidade.
C) estão relacionados à influência do meio social; e de
83) De acordo com a teoria da anomia, o crime é secundários, que ocorrem em razão de um trauma de
entendido como infância.
A) uma anomalia que tem como resultado a fragilização D) são exógenos; e de secundários, que são
da solidariedade e dos valores éticos da sociedade. endógenos.
B) um fenômeno normal da sociedade, que pode em E) são fatores solicitantes; e de secundários, quando o
alguns casos ajudá-la a consagrar sua identidade em indivíduo presencia algum tipo de violência.
torno de certos valores.
C) uma justificativa para o controle político e legal das 86) No âmbito da criminologia da reação social, o
classes sociais e varia de acordo com a estrutura trabalho da Polícia Civil pode ser considerado
econômica e política de cada sociedade. como a
D) uma busca de status em determinado grupo social A) expressão do controle social informal.
quando praticado por jovens que aderem a padrões da B) contribuição de uma agência do controle social
subcultura. formal.
E) um comportamento aprendido através da interação C) manifestação do controle social difuso.
com outras pessoas, resultante de um processo de D) manifestação do controle empresarial.
comunicação social. E) expressão particular de uma visão de justiça.
84) A Criminologia Moderna entende que o delito
está diretamente relacionado com a dinâmica de

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Gabarito

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71 - C 72 - A 73 - C 74 - B 75 - C 76 - B 77 - C 78 - A 79 - C 80 - B
81 - C 82 - A 83 - B 84 - C 85 - A 86 - B

FIM

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