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O presente artigo trata-se da polêmica na doutrina e na jurisprudência, quando o psicopata fica à frente do Código Penal

Brasileiro. Artigos 26, 27 do Código Penal e 228 da Constituição Federal // Artigo 26, § único do Código Penal
Brasileiro.
O PSICOPATA FRENTE AO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO
THE PSYCHOPATH FRONT THE BRAZILIAN CRIMINAL CODE

Valéria Santos de Oliveira


Curso de Graduação em Direito

RESUMO
O presente artigo trata-se da polêmica na doutrina e na jurisprudência, quando o
psicopata fica à frente do Código Penal Brasileiro. Desta forma, demonstraremos no
decorrer da pesquisa o conceito de psicopatia, sua evolução histórica, relatando alguns
tipos de transtornos de personalidade e quando e como surgiu a origem da psicopatia; a
criminologia e o estudo da psicopatia; a culpabilidade; a inimputabilidade e
imputabilidade e a semi-imputabilidade à luz do Código Penal Brasileiro. Por fim,
encerrando o estudo, chega-se à conclusão de que supramencionados indivíduos,
psicopatas, não sejam eles merecedores com o “benefício” da semi-imputabilidade,
prevista no artigo 26, § único do Código Penal Brasileiro.
Palavras-chave: Psicopata. Criminologia. Código Penal Brasileiro. Transtornos.
ABSTRACT
This article deals with the controversy in doctrine and jurisprudence, as the psychopath
is ahead of the Brazilian Penal Code. In this way, we will demonstrate in the course of the
research the concept of psychopathy, its historical evolution, reporting some types of
personality disorders and when and how the origin of psychopathy arose; Criminology
and the study of psychopathy; Guilt; Unimputability and imputability and semi-
imputability in light of the Brazilian Penal Code. Finally, ending the study, it is concluded
that the aforementioned individuals, psychopaths, are not deserving of the "benefit" of
semi-imputability, provided for in article 26, sole paragraph of the Brazilian Penal Code.
Keywords: Psycho. Criminology. Brazilian Penal Code. Disorders.

INTRODUÇÃO
O presente artigo terá como objeto de apreciação, o psicopata frente ao Direito Penal
Brasileiro vigente. O tema escolhido é recorrente nos dias atuais, face a crescente onda
de crimes cometidos por agentes portadores desse transtorno de personalidade. Devido
a isso, abordaremos suas peculiaridades essenciais.
O problema que se formula busca saber como o psicopata é visto pela sociedade e pelo
direito penal na atualidade. Visto que, há muito tempo pessoas comentem esse tipo de
crime na sociedade, a história está carregada de pessoas que cometeram verdadeiras
atrocidades contra outras.
O objetivo geral é averiguar a visibilidade de um psicopata frente ao direito penal versus
sociedade. Tem como objetivo especifico, analisar as leis aplicadas e se estas são
eficientes; e identificar a melhor forma de punir um psicopata.
No capitulo inicial irá abordar a criminologia e o estudo da psicopatia. No segundo, a
culpabilidade; o terceiro, a imputabilidade, inimputabilidade e semi-imputabilidade.
Destacamos que a psicopatia vai muito mais além do que nos mostram a mídia
sensacionalista. Tantos crimes absurdos e inexplicáveis para a maioria da população,
necessita-se de maior clareza. Compreender o que é a psicopatia é imprescindível na
hora da cominação da pena. Ajustando, pois, a sanção adequada, à condição mental do
agente passivo do crime.
CONCEITO DE PSICOPATIA
O termo Psicopata apresenta vários sinônimos, como: Personalidade Psicopática,
Transtorno Dissocial, e atualmente alude-se o termo psicopata com Sociopata.
A palavra psicopata, corriqueiramente, é utilizada para definir aquela pessoa que possui
uma predisposição para assassinar, cometer ilícitos bárbaros, enfim, um comportamento
tendente para um crime brutal. Os delitos cada vez mais apresentam um alto nível de
violência, despertando o interesse dos estudiosos do comportamento do ser humano
como psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, em aprofundar sobre essa questão, que ainda
se mostra obscura.
O termo psicopatia origina-se no grego e significa “psiquicamente doente”. Foi nos
séculos XIX e XX que o tema ganhou relevância e os estudos tiveram consideráveis
avanços. Tendo em vista, as pesquisas clínicas desenvolvidas, mais precisamente no
campo da neurobiologia, sobretudo referente à personalidade, facilitou-se detectar
alguns pontos que possam denunciar um traço psicopático, entretanto, somente essa
análise não é suficiente para diagnosticá-lo, e é a partir disso, somado a um estudo
antropológico, com análises na sociologia, até mesmo na filosofia, que servem de base
para o que se entende de psicopatia.
Observa-se a complexidade e a dificuldade para encontrar um consenso em conceituar
precisamente o psicopata, haja vista se tratar de um quadro emocional, interpessoal,
subjetivo, comportamental. Atualmente é aceito, a evolução dos conceitos sobre a
personalidade psicopática transcorreu, durante mais de um século, oscilando entre a
bipolaridade orgânica-psicológica, passando à transitar também sobre as tendências
sociais e parece ter aportado, finalmente, numa ideia bio-psico-social.
Evolução histórica da psicopatia
Girolano Cardamo (1501-1596), um professor de medicina da Universidade de Pavia,
deu o início da identificação do traço psicopata. O filho de Cardamo foi decapitado por
ter envenenado sua mulher com raízes venenosas. Nessa ocasião, Cardamo fala em
"improbidade", o que não alcançava a insanidade total porque as pessoas que sofriam
disso, mantinham a aptidão para dirigir sua vontade. Pablo Zacchia (1584-1654),
considerado por muitos como fundador da Psiquiatria Médico Legal, descreve, em
Questões Médico Legais, importantes concepções que logo conceituariam às
"psicopatias" e os "transtornos de personalidade".
Em 1801, Philippe Pinel publica o Tratado Médico Filosófico sobre a alienação mental e
descreve as manias que todas as pessoas possuem, mas não criam a face ao delírio. Pinel
chamava de mania aos estados de furor persistentes e comportamento florido, distinto
do conceito atual de mania (BERRIOS, 1993a, p. 98).
No tratado relatava, que se admirava de ver muitos loucos que, em nenhum momento,
apresentavam prejuízo algum do entendimento, e que estavam sempre dominados por
uma espécie de furor instintivo, como se o único dano fosse em suas faculdades
instintivas. A falta de educação, uma educação mal dirigida ou traços perversos e
indômitos naturais, podem ser as causas desta espécie de alteração (BERRIOS, 1993b, p.
101).
Foi em 1835 que James Cowles Prichard publica sua obra Treatise on insanity and other
disorders affecting the mind, a qual falava da Insanidade Moral. A partir dessa obra, o
historiador G. Berrios (1993c, p. 102) discute o conceito da Insanidade Moral como o
equivalente ao atual conceito de psicopatia.
Em 1888, Koch (Schneider, 1980a, p. 58) fala de Inferioridades Psicopáticas, mas se
refere à inferioridades no sentido social e não moral. Para Koch, as inferioridades
psicopáticas eram congênitas e permanentes e divididas em três formas:
• Disposição psicopática;
• Tara psíquica congênita e
• inferioridade psicopática.
Kraepelin, quando faz a classificação das doenças mentais em 1904, usa o termo
Personalidade Psicopática para referir-se, a este tipo de pessoas que não são neuróticos
nem psicóticos, porém não estão incluídas no esquema de mania-depressão, mas que se
mantêm em choque contundente com os parâmetros sociais vigentes. Incluem-se aqui os
criminosos congênitos, a homossexualidade, os estados obsessivos, a loucura impulsiva,
os inconstantes, os embusteiros e farsantes e os querelantes (SCHNEIDER, 1980b, p. 59).
Para Kraepelin, as personalidades psicopáticas são formas frustras de psicose,
classificadas segundo um critério fundamentalmente genético e considera que seus
defeitos se limitam essencialmente à vida afetiva e à vontade.
Em 1923, Schneider elabora um conceito e classificação do que é, para ele, a
Personalidade Psicopática. Schneider (1980c, p. 64) descarta no conjunto classificatório
da personalidade atributos tais como, a inteligência, os instintos e sentimentos corporais
e valoriza como elementos distintivos o conjunto dos sentimentos e valores, das
tendências e vontades.
Para Kurt Schneider as Personalidades Psicopáticas formam um subtipo daquilo que
classificava como Personalidades Anormais, de acordo com o critério estatístico e da
particularidade de sofrerem por sua anormalidade e/ou fazerem outros sofrer
(SCHNEIDER, 1980d, p. 65).
A classificação de Personalidade Psicopática não pode ser reconhecida ou aceita pelo
próprio paciente e, às vezes, nem mesmo por algum grupo social, pois, a característica de
fazer sofrer os outros ou a sociedade é demasiadamente relativo e subjetivo: um
revolucionário, por exemplo, é um psicopata para alguns e um herói para outros.
Em consequência dessa relatividade de diagnóstico (devido à relatividade dos valores),
não é lícito ou válido realizar um diagnóstico do mesmo modo que fazemos com as outras
doenças. Resumindo, pode-se destacar neles certas características e propriedades que os
caracterizam de maneira nada comparável aos sintomas de outras doenças.
O Psicopata é, simplesmente, uma pessoa assim. O psicopata não tem uma psicopatia, no
sentido de quem tem uma tuberculose, ou algo transitório, mas ele é um psicopata.
Psicopata é uma maneira de ser no mundo, é uma maneira de ser estável.
Como em tantas outras tendências, também há certo determinismo na concepção de
Schneider. Para ele os psicopatas são assim em toda situação vital e sob todo tipo de
circunstâncias. O psicopata é um indivíduo que não leva em conta as circunstâncias
sociais, é uma personalidade estranha, separada do seu meio.
A psicopatia não é, portanto, exógena, sendo sua essência constitucional e inata, no
sentido de ser pré-existente e emancipada das vivências.
A conduta do psicopata nem sempre é toda psicopática, existindo momentos, fases e
circunstâncias de condutas adaptadas, as quais permitem que ele passe desapercebido
em muitas áreas do desempenho social. Essa dissimulação garante sua sobrevivência
social.
Kurt Schneider, psiquiatra alemão, englobou no conceito de Personalidade Psicopática,
todos os desvios da normalidade não suficientes para serem considerados doenças
mentais francas, incluindo nesses tipos, também aquele que hoje entendemos como
sociopata. Dizia que a Personalidade Psicopática (que não tinha o mesmo conceito do
sociopata de hoje) como aquelas personalidades anormais que sofrem por sua
anormalidade e/ou fazem sofrer a sociedade.
Ele distinguia os seguintes tipos de Personalidade Psicopática:
• Hipertímicos;
• Depressivos;
• Inseguros;
• Fanáticos;
• Carentes de Atenção;
• Emocionalmente Lábeis;
• Explosivos;
• Desalmados;
• Abúlicos e
• Astênicos.
Em 1941, Cleckley escreveu um livro chamado "A máscara da saúde", o qual se referia a
esse tipo de pessoas. Em 1964 descreveu as características mais frequentes do que hoje
chamamos de psicopatas. No livro, ele estabeleceu alguns critérios para o diagnóstico do
psicopata, e em 1976, Hare, Hart e Harpur, completaram esses critérios. Somando-se as
duas listas podemos relacionar as seguintes características (BRUNO, 1996, p. 152):
• Problemas de conduta na infância;
• Inexistência de alucinações e delírio;
• Ausência de manifestações neuróticas;
• Impulsividade e ausência de autocontrole;
• Irresponsabilidade;
• Encanto superficial, notável inteligência e loquacidade;
• Egocentrismo patológico, auto-valorização e arrogância;
• Incapacidade de amar;
• Grande pobreza de reações afetivas básicas;
• Vida sexual impessoal, trivial e pouco integrada;
• Falta de sentimentos de culpa e de vergonha;
• Indigno de confiança, falta de empatia nas relações pessoais;
• Manipulação do outro com recursos enganosos;
• Mentiras e insinceridade;
• Perda específica da intuição;
• Incapacidade para seguir qualquer plano de vida;
• Conduta anti-social sem aparente arrependimento;
• Ameaças de suicídio raramente cumpridas e
• Falta de capacidade para aprender com a experiência vivida.
Foi-se definindo aos longos dos anos, os traços característicos da psicopatia com termos
tais como; perturbações afetivas, perturbações do instinto, deficiência superegoica,
tendência a viver só o presente, baixa tolerância a frustrações. Esse transtorno como
anomalias do caráter e da personalidade, ressaltando sempre a impulsividade e a
propensão para condutas anti-sociais (KOLB, 1097, p. 41).
K.Eissler, no final da década de 40, considerava os psicopatas como indivíduos com
ausência de sentimentos de culpa e da ansiedade normal, superficialidade de objetivos
de vida e extremo egocentrismo. Os irmãos Mc Cord, em 1956, descrevem sua "síndrome
psicopática" com as seguintes características: escasso ou nenhum sentimento de culpa,
capacidade de amar muito prejudicada, graves alterações na conduta social,
impulsividade e agressão
Atualmente, a Personalidade Psicopática tem sido caracterizada principalmente por
ausência de sentimentos afetuosos, amoralidade, impulsividade, falta de adaptação
social e incorregibilidade.
DA CRIMINOLOGIA E DO ESTUDO DA PSICOPATIA
A existência do crime, ocorreu desde os primórdios da civilização humana, próprios de
cada período histórico. Inicialmente, percebe-se os registros encontrados na Bíblia
Sagrada, um dos livros mais antigos já escritos. Logo em "GÊNESIS", quando Caim, filho
de Adão e Eva, assassina seu irmão Abel sem apresentar sentimento algum, tornando-se
responsável, como assim ditam os doutrinadores mais aclamados sobre o tema, pelo
"crime original".
Ilustradas as considerações iniciais acerca da origem do delito, constatamos que o seu
estudo fora tardio, à medida em que criminalidade avançava sem precedentes. No
entanto, antes de adentrarmos ao tema da ora proposto, devemos nos ater à
Criminologia. Etimologicamente, esse termo vem do latim crimino (crime) e do grego
logos (estudo, tratado), significando o "estudo do crime".
Filho (2012a, p. 17), pode-se conceituar criminologia como "a ciência empírica (baseada
na observação e na experiência) e interdisciplinar que tem por objeto de análise o crime,
a personalidade do autor do comportamento delitivo, da vítima e o controle social das
condutas criminosas".
Shecaira (2008, p. 31) nos informa que:
Criminologia é um nome genérico designado a um grupo de temas estreitamente ligados:
o estudo e a explicação da infração legal; os meios formais e informais de que a sociedade
se utiliza para lidar com o crime e com atos desviantes; a natureza das posturas com que
as vítimas desses crimes serão atendidas pela sociedade; e, por derradeiro, o enfoque
sobre o autor desses fatos desviantes.
Filho (2012b, p. 17) ainda complementa que podemos compreender que "a criminologia
é uma ciência do ‘ser’, empírica, na medida em que o seu objeto (crime, criminoso, vítima
e controle social) é visível no mundo real e não no mundo do valores, como ocorre com
o direito, que é uma ciência ‘dever-ser’, portanto normativa e valorativa".
Por possuir uma característica interdisciplinar, apesar de ser uma ciência dotada de
autonomia, tem influência profunda de diversas outras áreas, tais como a sociologia, a
psicologia, o direito, a medicina legal etc. E é deste modo que ela acaba nos direcionando
ao tema principal de nossa pesquisa: a psicopatia. Pois observamos desde já que a análise
do delinquente se mostra muito sério e importante. Superficialmente, para a Escola
Clássica, era um ser que havia pecado, optado pelo mal, embora pudesse e devesse
escolher o bem.
Porém, o apogeu do valor do estudo do criminoso ocorreu durante o período do
positivismo penal, com destaque para a antropologia criminal, a sociologia criminal, a
biologia criminal etc. A Escola Positiva entendia que o criminoso era um ser atávico,
preso a sua deformação patológica (às vezes nascia criminoso) (FILHO, 2012c, p. 20).
Outra dimensão do delinquente foi confeccionada pela Escola Correcionalista (de grande
influência na América espanhola), para a qual o criminoso era um ser inferior e incapaz
de se governar por si próprio, merecendo do Estado uma atitude pedagógica e de idade.
Ainda podemos citar a visão do Marxismo, que enxergava o criminoso como uma vítima
das estruturas econômicas.
Destarte, atualmente, a criminologia se utiliza de métodos biológicos e sociológicos.
Como é uma ciência experimental, busca o auxílio dos artifícios estatísticos e históricos,
além do já mencionado fator biológico. Mas, ainda assim, ela acredita não ser suficiente
esses meios para delimitar as causas da criminalidade.
Agora, explorado o campo da criminologia, ilustremos a Psicopatia, inserida dentro da
Psicologia criminal e Psiquiatria criminal. Segundo nos informa Penteado Filho, a
primeira área tem por objeto de estudo a personalidade "normal" e os fatores que
possam influenciá-la, quer sejam de índole biológica, mesológica (meio ambiente) ou
social. E a última tem por escopo a compreensão dos transtornos anormais da
personalidade, isto é, as doenças mentais, retardos mentais (oligofrenias), demências,
esquizofrenias e outros transtornos, de índole psicótica ou não (FILHO, 2012d, p. 21).
Alinhadas essas duas vertentes (psicologia e psiquiatria), entendemos a priori que a
Psicopatia é creditada como um transtorno de personalidade, e não tecnicamente uma
doença, por representar anomalias do desenvolvimento psíquico, sendo consideradas
perturbações da saúde mental. Esse transtorno revela desarmonia da afetividade e da
excitabilidade com integração deficitária dos impulsos, das atitudes e das condutas,
manifestando-se no relacionamento interpessoal, que assume ou pode assumir, um
comportamento delituoso recorrente.
DA CULPABILIDADE
O termo em epígrafe é alvo de uma constante evolução na história. Isto, desde os tempos
em que bastava o simples nexo causal entre a conduta e o resultado, até os tempos atuais,
onde a culpabilidade apresenta como elementos a imputabilidade, a essencial
consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa.
Sobre o tema, Bitencourt (2000, p. 125) disserta:
Hodiernamente, a culpabilidade é vista como possibilidade de reprovar o autor de um
fato punível porque, de acordo com os fatos concretos, podia e devia agir de modo
diferente. Sem culpabilidade não pode haver pena e sem dolo ou culpa não pode existir
crime. Pelo exposto, a responsabilidade objetiva é insustentável no sistema penal
brasileiro, que, certamente, encapou as idéias da responsabilidade penal subjetiva.
Para Nucci (2011, p. 300):
Trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o
agente ser Imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a
possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, seguindo as regras impostas pelo
Direito (teoria normativa pura, proveniente do finalismo).
Capez (2011), predispõe que a finalidade do Direito Penal é a proteção de valores
fundamentais para a subsistência do corpo social, tais como a vida, a saúde, a liberdade,
a propriedade [...].
Portanto, é mister entender que o Direito Penal coloca-se como “protetor” de alguns bens
jurídicos considerados essenciais, e que, quando um desses bens jurídicos é atingido, há
uma cobrança relevante da sociedade, no sentido de que o Estado propicie uma resposta
ao crime cometido. Destarte, o Direito Penal é a área do nosso ordenamento jurídico
responsável pelas definições de crimes, cominações de penas e a possível aplicação da
medida de segurança ao agente criminal. É por meio do Direito Penal que essa resposta
é disposta à sociedade. (OLIVEIRA, 2011).
DA IMPUTABILIDADE, INIMPUTABILIDADE E SEMI-IMPUTABILIDADE
De acordo com Greco (2010, p. 396), destacamos algumas considerações relevantes
sobre imputabilidade, inimputabilidade e semi-imputabilidade:
Para que o agente possa ser responsabilizado pelo fato típico e ilícito por ele cometido é
preciso que seja imputável. A imputabilidade é a possibilidade de se atribuir, imputar o
fato típico e ilícito ao agente. A imputabilidade é a regra; a inimputabilidade, a exceção.
Destarte, imputabilidade é um conjunto de características que quando atribuídas ao
agente, admite ou não a culpabilidade do mesmo.
Assim:
A imputabilidade é constituída por dois elementos: um intelectual (capacidade de
entender o caráter ilícito do fato), ouro volitivo (capacidade de determinar-se de acordo
com esse entendimento). O primeiro é a capacidade (genérica) de compreender as
proibições ou determinações jurídicas. Bettiol diz, eu o agente deve poder ‘prever as
repercussões que a própria ação poderá acarretar no mundo social’ deve ter, pois, ‘a
percepção do significado ético-social do próprio agir’. O segundo, a capacidade de dirigir
a conduta de acordo com o entendimento ético-jurídico. Conforme Bettiol é preciso que
o agente tenha condições de avaliar o valor que o impele à ação e, do outro lado, o valor
inibitório da ameaça penal. (Brodut, 1996 apud Greco, 2010, p. 395).
A imputabilidade apresenta um aspecto intelectivo, consistente na capacidade de
entendimento, e outro volitivo, que é a faculdade de controlar e comandar a própria
vontade. Faltando um desses elementos, o agente não será considerado responsável
pelos seus atos.
Nosso ordenamento Penal Brasileiro classifica o psicopata como sendo semi-imputável,
alegando que o portador possui uma perturbação mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado que torna o indivíduo parcialmente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com tal entendimento, como dispõe
o parágrafo único do artigo 26 do Código Penal.
No Código Penal Brasileiro segundo Nucci (2013), existem duas situações nas quais um
agente pode ser considerado inimputável: Inimputabilidade por doença mental e
Inimputabilidade por maturidade natural.
Como assegura os artigos 26, 27 do Código Penal e 228 da Constituição Federal, em que
destacamos junto a Nucci (2013):
Art. 26. - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Art. 27. - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos
às normas estabelecidas na legislação especial.
Art. 228. - São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas
da legislação especial.
Para a constatação da inimputabilidade penal, é mister observar alguns critérios:
I – higidez biopsíquica (saúde mental +capacidade de apreciar a criminalidade de fato);
II – Maturidade (desenvolvimento físico + mental que permite o ser humano viver em
harmonia social).
Ainda de acordo com Nucci (2013), nosso código penal, no art. 26, parágrafo único, para
um agente ser considerado semi-imputável, o crime deve ter sido cometido nas seguintes
condições:
Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude
de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou
retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento (NUCCI, 2013).
A semi-imputabilidade deve ser atribuída ao indivíduo cuja responsabilidade é
considerada mínima, em razão de seu estado mental no momento do fato ilícito
(PEREIRA, 2011, apud SANTOS).
O que difere a inimputabilidade da semi-imputabilidade é que na primeira há a doença
mental, já na última, há a necessidade de se existir no agente a perturbação mental, e que
este retire do portador somente parcialmente a capacidade do agente de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com tal entendimento.
Assim dispõe, o doutrinador Miguel Reale Júnior, aduzindo que no caso da semi-
imputabilidade não se trata mais de doença mental, mas de perturbação mental, o que se
enquadraria nas psicopatologias, em especial a falha no caráter do portador de
personalidade psicopática, ou anormal, que apresente grau considerável de inteligência,
mas ausência de afetividade, de sentimentos, e logo de arrependimentos (JÚNIOR, 2000,
p. 209).
O código Penal Brasileiro em nada disciplinou acerca da psicopatia, tampouco sobre a
existência de tal anomalia, e o que justifica a ausência legislativa sobre este aspecto é a
incerteza da psiquiatria em definir supra personalidade. Entretanto, o fato de haver
omissão legislativa não nos impede de analisar a psicopatia conforme as regras
estabelecidas pelo Código Penal Brasileiro, bem como o entendimento de alguns
doutrinadores.
CAPACIDADE DE CULPABILIDADE DO PSICOPATA
Nossa doutrina ainda não tem um entendimento homogêneo a respeito da culpabilidade
do psicopata. Umas das grandes dificuldades do Direito Penal Mundial é classificar os
psicopatas como imputáveis, não entendendo que tais indivíduos são mentalmente
desenvolvidos e possuidores de plena capacidade de saber que sua conduta contraria os
mandamentos da ordem jurídica.
No entanto, por compreender a ilicitude de seus atos, mas não ver nenhum problema
neles, os psicopatas, são considerados perante o direito penal, como semi-imputáveis,
sendo condenado, porém tem sua pena reduzida.
A grande pergunta é: os portadores de psicopatia, que segundo a medicina, são
desprovidos de um senso interno presente nas pessoas sãs, que lhes impede de sentir
remorso ou empatia pela dor alheia quando esta mesma dor provém de ato por ele
cometido, seriam eles doentes ou teriam um distúrbio mental que atenua a capacidade
de discernir e ter autocontrole perante atos ilícitos e criminosos?
Em suma, uma pessoa que tem a capacidade de matar, humilhar e agredir apresentando
tamanha frieza e indiferença pela vida alheia, deveria ser sujeita à medidas de segurança
ao invés de uma pena?
Sendo considerada apenas perigosa e não culpável? A verdade é que, segundo a
psiquiatria, os criminosos psicopatas não necessariamente têm baixa capacidade
intelectual. Desta forma, quando erram, cometem um ato ilícito penal, eles sabem
exatamente o que estão fazendo e têm plena consciência do que é certo e errado. Porém,
quanto mais ausentes do sentimento de arrependimento e sensibilidade com a vida ou
patrimônio alheio, demonstram apurada habilidade em criar e manipular versões que
acabam por absolvê-los de culpa, ou até mesmo em simular arrependimento.
São causas de exclusão da culpabilidade segundo Tangerino (2007, p. 3):
• Coação moral irresistível;
• Obediência hierárquica ou devida;
• Estado de necessidade exculpante.
Nesse sentindo, levando-se em consideração o artigo 26 do Código Penal, que trata sobre
o tema em estudo, à inimputabilidade penal e as características esmiuçadas pela
psiquiatria dos criminosos portadores de psicopatia, defende-se a imputabilidade penal
destes indivíduos, entendendo-se que o distúrbio de personalidade que os mesmos são
portadores, não afeta sua compreensão a respeito da desconformidade de sua conduta
com a ordem jurídica e social imperante, onde, eles não são apenas perigosos, mas
absolutamente responsáveis e acima de tudo, culpáveis pelos seus atos delituosos.
ETIOLOGIA DA PSICOPATIA
A etiologia acerca da psicopatia continua sendo um dos maiores questionamentos por
profissionais da área da psiquiatria, bem como por juristas e doutrinadores, e isso se
deve às várias consequências decorrentes de sua adoção. Parece mais fácil e concreto,
indicar o passado do transgressor como responsável do seu futuro tortuoso, do que
adentrar em um campo obscuro e realizar infindáveis, e muitas vezes, inconclusivas
teorias.
Deste modo a psicopatia vem sendo descrita como transtorno de personalidade
antissocial, encontrando-se no rol Internacional das Doenças, na parte destinada à
disposição das doenças mentais. Por esta razão, alguns doutrinadores e juristas vêm
defendendo a psicopatia como doença mental, bem como ao fato de que no decorrer do
tempo a citada expressão “psicopatia” venha a ser sinônimo de doença mental.
Porém, grande parte dos pesquisadores (Jorge Trindade, Andréa Baheregaray, Mônica
Rodrigues, Robert Hare, etc.) não consideram a psicopatia como uma doença mental, por
não provocar qualquer sintoma em seu portador, como ocorre com as demais doenças
como a esquizofrenia, psicose e etc. Os adeptos desse entendimento ainda justificam seu
posicionamento sustentando que os psicopatas têm plena consciência dos seus atos e dos
instrumentos necessários para alcançar seus mais sórdidos crimes. São conhecedores
das normas legais e sociais e as desconsideram na prática de seus atos (ABREU, 2015,
p.57-58).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir desse estudo, foi possível observar, que a psicopatia não consiste em doença
mental, e tampouco desenvolvimento mental incompleto ou retardado, vez que não
provoca qualquer mudança na capacidade psíquica do indivíduo. Mesmo que fosse
considerada uma doença, não sairia do psicopata a capacidade de compreender o caráter
ilícito dos fatos, ou de determinar-se conforme esse entendimento, devido as razões de
ordem genética e psicossociais.
O psicopata sabe perfeitamente das normas e leis que imperam à sociedade, bem como
suas consequências. Mas mesmo assim, planeja cuidadosamente e age até onde lhe for
mais conveniente. Neste contexto consideramos que este transtorno não pode tornar o
agente inimputável. Se por acaso, o psicopata sofrer de algum tipo de doença mental em
caráter permanente, (dependência química ou alcoolismo) e esta doença for suficiente
para que no momento dos fatos delituosos afastar a capacidade de compreender o
querer, teremos aí caracterizada a inimputabilidade, nessa situação a inimputabilidade
declarada não pela psicopatia, mas em decorrência da doença mental.
No sentido da semi-imputabilidade, o psicopata não pode ser considerado portador de
uma perturbação de saúde mental. A psicopatia não vem a provocar qualquer tipo de
alteração na saúde mental de seu portador, o fato do agente externar comportamento
antissocial não quer dizer necessariamente comprometimento desta. Mesmo que fosse
considerada perturbação da saúde mental, tal circunstância não teria o caráter de
diminuir a capacidade de discernir.
Assim, esses indivíduos não são loucos, mormente no que se refere à visão ou conceito
de louco que medianamente se tem, nem apresentam qualquer tipo de desorientação,
bem como sofrem de delírios ou alucinações (como a esquizofrenia) e tampouco
apresentam intenso sofrimento mental (como a depressão ou o pânico). Tratam-se de
pessoas que sem levantar qualquer suspeita, utilizam-se da facilidade que detém de
controlar seus sentimentos e/ou simular a existências destes para aproximarem-se de
pessoas, e transformam a vida destas num estado lamentável, muitas vezes até as
destruindo, e fazendo com que a vítima tenha sérios problemas emocionais, físicos,
sócias e psicológicos.
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