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DADOS DE COPYRIGHT

Copyright © 2017 [Vagner Oliveira]

Sobre a obra:

A presente obra é disponibilizada pelo advogado Vagner Oliveira através da


equipe ACADEMIA DO DIREITO DE TRANSITO, com o objetivo de oferecer
conteúdo para uso em pesquisas e estudos acadêmicos, bem como o simples
teste da qualidade da obra.

É expressamente proibida e totalmente repudiável a venda, aluguel ou qualquer


uso comercial do presente conteúdo.

Sobre nós:

A ACADEMIA DO DIREITO DE TRANSITO e seus parceiros, disponibilizam cursos


práticos para advogados e empreendedores na área de trânsito.

Você pode encontrar nossos cursos em nosso site:

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O AUTOR

Vagner Oliveira é advogado expert em Direito de Trânsito, palestrante, professor


de direito de trânsito e mentor para advogados iniciantes no Direito de Trânsito.
Decidiu se graduar na área Jurídica para viver sua paixão.

É o idealizador da Academia do Direito de Trânsito e mantém o blog


ww.transitonaveia.wordpress.com onde publica assuntos polêmicos e
atualizações da área.

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INDICE

INTRODUÇÃO ....................................................................... 4

MONTANDO UMA ESTRATEGIA DE DEFESA ......................... 7

1º PASSO – ANALISE O AUTO DE INFRAÇÃO ....................... 8

2º PASSO – ARGUMENTAÇÃO ............................................. 12

3º PASSO – PROCURE BRECHAS ........................................ 16

Brecha 1 – A dupla notificação ........................................... 17

Brecha 2 – A falta de Tipificação da Conduta Infratora ..... 20

Brecha 3 – Recusa ao Teste de “Bafômetro” sem sinais de


embriaguez ........................................................................ 25

Brecha 4 – INFRAÇÕES DE TRÂNSITO IMPOSSÍVEIS ........ 32

Brecha 5 – INFRAÇÕES SIMULTÂNEAS .............................. 38

CONCLUSÃO ....................................................................... 44

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INTRODUÇÃO

Primeiramente, deixe-me esclarecer uma dúvida que a maioria dos


meus alunos têm quando começam a estudar sobre recursos
administrativos contra penalidades de trânsito: Estamos procurando
por “brechas” no Código de Trânsito? Não, querido leitor. A lei
não possui “brechas”. Quem possui “brechas”, são os homens
que elaboram e aplicam as leis.

Antes de continuar essa leitura, devo advertir que esse e-book não
trata da manipulação da lei em favor de infratores, como muitos
pensam, trata, sim, da elaboração da melhor estratégia na busca do
direito de defesa do condutor.

Aliás, quando eu falo em “brechas” no Código de Trânsito Brasileiro


muitas pessoas que são ligadas à administração acabam dando um
sentido pejorativo à essa palavra, e fazem questão de dizer que não
existem “brechas” para infratores tentarem “burlar” a lei.

Não é esse o sentido.

“Brecha” significa “abrir caminho”, “buscar uma solução” ou uma


“oportunidade”. É justamente a isso que esse e-book se destina.

Portanto, se você é daqueles que têm discursos hipócritas sobre


multas de trânsito, que tacham de “criminosos” que bebem e dirigem
mas aceita que seu pai, seu filho, seu irmão, seus amigos bebam e
dirijam depois de um churrasco, me desculpe, mas esse e-book ou
mesmo os meus cursos, não são para você.

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Aliás, conheço inúmeras pessoas que defendem a aplicação de


penalidades mais rigorosas aos condutores mas que, quando não tem
ninguém olhando, “furam” o sinal vermelho, não respeitam a faixa de
travessia de pedestres, transitam acima da velocidade máxima
permitida para o local.

Então, nesse momento, se você for uma dessas pessoas, peço


encarecidamente que deixe de ler esse pequeno artigo e se concentre
em doutrinas que pregam especificamente a penalização e o rigor,
que pregam multas mais caras e penalidades mais constantes,
esquecendo que se trata de um fator cultural, que só pode ser
mudado pela educação.

As dicas a seguir são exclusivamente para defensores de condutores,


que já atuam na área de recursos de multas ou que pretendam atuar
nessa área, e que desejam a busca do melhor interesse do cliente, a
JUSTIÇA e a efetivação do direito constitucional da ampla defesa.

Mas Você já se perguntou por que alguns defensores de condutores


conseguem atingir alto nível de deferimento de suas peças,
administrativas ou judiciais, enquanto outros não tem sucesso nem
nas defesas mais simples?

Já observou que o consenso geral é de que não adianta recorrer de


multas, que o DETRAN nunca cancela uma penalidade e que é
dinheiro jogado fora contratar um profissional que elabore uma peça
administrativa de defesa?

Pois bem, eu estou aqui para te dizer que não é bem assim.

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A grande maioria dos recursos administrativos não conseguem êxito


porquê são elaborados sem qualquer fundamento legal, tentam
justificar o cometimento da infração ao invés de alegar os vícios
formais de procedimento ou vícios existentes no próprio processo
administrativo.

Recorrer sem observar os requisitos obrigatórios de um auto de


infração (validade, existência e eficácia), sem observar os
procedimentos que devem ser adotados pelo agente de trânsito no
momento da lavratura do auto e que estão previstos no Manual
Brasileiro de Fiscalização de Trânsito ou mesmo recorrer sem produzir
um mínimo de provas em favor do cliente, não vai contribuir em nada
para o processo de defesa.

Apesar de parecer complicado, digo que com um pouco de pratica é


perfeitamente possível que o defensor de condutores consiga um alto
índice de deferimentos apenas conhecendo os detalhes do processo
administrativo.

Evidentemente que este E-book traz apenas algumas das inúmeras


“brechas” que ensino em meu curso FOI MULTADO? RECORRA!
Como montar um escritório de recursos, entretanto, são
suficientes para que você comece a entender como elaborar uma boa
tese de recurso.

E antes de mais nada, lembre-se que a palavra “BRECHA” também


significa “caminho”. Então? Vamos percorrer esse “caminho” na
defesa dos interesses de seus clientes?

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MONTANDO UMA ESTRATEGIA DE DEFESA

Se você deseja realmente obter resultados práticos na defesa de


condutores contra as penalidades de trânsito, antes de confeccionar
os seus recursos elabore uma estratégia processual, prevendo cada
uma das etapas de defesa e cada uma das possíveis argumentações
que poderá utilizar em favor de seu cliente.

Não adianta tentar convencer o julgador de que seu cliente é inocente


se não conseguir apresentar provas que afastem a presunção de
legalidade e veracidade do agente de trânsito.

Sim, meu caro amigo, o ônus da prova é totalmente do seu cliente e


não do agente de trânsito.

Portanto, ao invés de fazer um “livro”, dizendo como o seu cliente é


um bom cidadão, cumpridor de seus deveres e como é inaceitável a
afirmação do agente de trânsito de que ele cometeu uma infração de
trânsito, às vezes, muito melhor e mais eficaz concentrar-se em dizer
em apenas uma página como o auto de infração é inconsistente, quais
as razões para que seja cancelado ou demonstrar as provas de que
seu cliente realmente não cometeu a infração.

Vamos seguir alguns passos para que a estratégia seja melhor


definida.

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1º PASSO – ANALISE O AUTO DE INFRAÇÃO

O auto de infração de trânsito é a peça inaugural e principal do


Processo Administrativo para a imposição da penalidade de Multa,
devendo estar revestido de requisitos essenciais à sua validade, que
efetivem os princípios constitucionais que o norteiam, quais sejam o
Princípio da Publicidade, da Ampla Defesa e do Contraditório e da
obediência das formas.

Esse último, em especial, é a manifestação do ato administrativo,


expressa em Lei, quase sempre de forma escrita, o que não exime
formas verbais, gestuais ou sonoras ou por simbologias, sendo um
elemento vinculado cuja inobservância acarreta na nulidade do
ato administrativo.

O Artigo 280, do Código de Trânsito Brasileiro, em conjunto com o


Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, trazem em seus textos
quais são os elementos formais que devem estar contidos no
auto de infração, requisitos esses de EXISTENCIA, VALIDADE e
EFICACIA do ato administrativo:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de


trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

I - tipificação da infração;

II - local, data e hora do cometimento da infração;

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III - caracteres da placa de identificação do veículo, sua


marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à
sua identificação;

IV - o prontuário do condutor, sempre que possível;

V - identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou


agente autuador ou equipamento que comprovar a infração;

VI - assinatura do infrator, sempre que possível, valendo


esta como notificação do cometimento da infração.

Os REQUISITOS DE EXISTENCIA são os elementos que


estruturam o auto de infração, necessários para demonstrar a
perfeição do auto de infração para que possa gerar efeitos. São 3
(três) os elementos:

1. Conduta que possa ser enquadrada como infração de


trânsito;

2. Lavratura do auto de infração pela autoridade de


transito ou seu agente;

3. Forma escrita (condições de legibilidade, não pode


conter rasuras ou adulterações);

Os REQUISITOS DE VALIDADE, são exigências que o órgão de


transito deve observar antes de impor a penalidade de multa,
seguindo a determinação do artigo 281, que impõe o cancelamento
do auto de infração caso verificada a sua inconsistência ou
irregularidade:

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1. Agente de transito competente, conforme circunscrição,


determinadas pelo Código de Trânsito Brasileiro e
Resolução 66, do CONTRAN;

2. Tipificação correta da infração e descrição da situação


observada pelo agente de trânsito, estabelecendo a
conduta praticada e a norma violada, conforme
procedimentos previstos no Manual Brasileiro de
Fiscalização de Trânsito;

3. Elementos de identificação do infrator (nome, registro de


cnh, nº do CPF ou RG), da infração (código da infração,
artigo da infração, local, data e horário do cometimento),
do veículo (placa, renavam, marca e modelo) e
identificação do agente autuador;

Os REQUISITOS DE EFICACIA, são elementos que garantem a


perfeição do auto de infração.

1. Flagrante do cometimento da infração

2. Assinatura e identificação do agente de transito que


flagrou a infração e identificação e assinatura do condutor
quando possível.

E não basta que todos os elementos dos requisitos estejam presentes.


O auto de infração deve estar na forma escrita e não pode conter
rasuras, emendas, uso de corretivos ou qualquer tipo de adulteração.

As rasuras ocorrem quando o texto do auto de infração é alterado


voluntariamente pelo agente de trânsito, incluindo ou retirando letras

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na tentativa de corrigir o que estava escrito, provocando borrões,


desgastes, rabiscados, tornando difícil a leitura.

O texto emendado é aquele em que o agente de trânsito, a fim de


corrigir eventual informação que foi colocada de forma errada no auto
de infração, introduz a informação correta no campo de
“observações”, retificando os dados.

Corretivos são substancias (tinta especial branca) utilizadas para


apagar totalmente o que havia sido escrito em determinados campos
no auto de infração, possibilitando a inserção de novas informações
sobre aquelas apagadas.

Por fim, a adulteração significa introduzir uma alteração no auto de


infração, uma modificação ou manipulação tentando simular a
regularidade da autuação. Nesses casos, encontramos facilmente
autos de infração que foram preenchidos posteriormente à sua
lavratura, com canetas de outras cores, letra de outro agente de
trânsito, dados divergentes entre a primeira via (deixada com o
infrator) e a segunda via que instrui a peça administrativa.

A inobservância da forma ou dos procedimentos previstos para o


preenchimento do auto de infração produzem o mesmo resultado, a
NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO.

Art. 281. A autoridade de trânsito, na esfera da competência


estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a
consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.

Parágrafo único. O auto de infração será arquivado e seu registro


julgado insubsistente: I - se considerado inconsistente ou irregular;

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2º PASSO – ARGUMENTAÇÃO

As primeiras linhas de sua peça de recurso serão sempre responsáveis


pelo conceito que o julgador fará sobre o seu cliente e a disposição
em julgá-lo convenientemente ou não.

Por mais que a administração diga que os julgadores são imparciais,


que os membros da JARI julgam de acordo com a legislação de
trânsito e observando todas as provas que compõem a peça de
recurso, nós estamos falando de um colegiado que compõe o órgão
de trânsito que está impondo a penalidade.

Assim, começar um texto de forma ofensiva, investindo contra o


agente de trânsito que lavrou a autuação, colocando em cheque seu
caráter ou questionando sua capacidade, aumentará as chances de
indeferimento de seus pedidos.

Ademais, o recurso se destina a contestar a autuação e não o


agente de trânsito. Se seu cliente deseja realmente questionar a
atuação do agente de trânsito, o recurso administrativo não é a via
indicada para fazê-lo.

Primeira regra para um recurso eficaz: “Fale tudo, mas fale


pouco”.

Existe uma crença de que quanto maior for o recurso, maiores são as
chances de deferimento, mas é justamente o contrário.

Um recurso muito longo fica cansativo para o julgador. Muito

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provavelmente, num recurso de 20 ou 30 páginas, o julgador vai se
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limitar a ler os trechos iniciais de cada tópico, proferindo a decisão ao


final sem ler inteiramente TUDO o que foi argumentado.

Assim, muito melhor um recurso que contemple apenas poucas


páginas, mas que esboce exatamente toda a ideia da defesa, do que
um livro com ideias desorganizadas e desencontradas.

Segunda regra: “Organize o roteiro de seu recurso”.

Pense em uma introdução, no desenvolvimento da sua tese e feche


o recurso com uma conclusão.

A introdução relata como os fatos compreendidos no processo, como


seu cliente foi autuado e como essa autuação se mostra inconsistente
ou irregular, sem adentrar muito às teses que serão utilizadas.
Basicamente, diz o “porquê” do recurso interposto.

O desenvolvimento das teses compreende as normas de direito que


serão invocadas em favor do seu cliente e como a jurisprudência e a
doutrina entendem o tema. Ademais, todas as alegações trazidas no
recurso devem ser fundamentadas e comprovadas. Lembre-se que o
ônus da prova é do seu cliente e não do agente. “Alegar sem provar
é o mesmo que não alegar”.

Por fim, a conclusão diz quais são as razoes pelas quais o recurso
merece ser deferido, correlacionando as provas aos fatos
apresentados.

Terceira regra: “organize seus pedidos”.

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O pedido deve ser feito ao final do recurso, em separado das teses


de defesa, devendo contemplar exatamente aquilo que seu cliente
pretende obter do julgamento.

O que seu recurso pretende? Que a autuação seja declarada nula?


Que passados 30 dias do recurso seja concedido o efeito suspensivo?
Quer as copias do julgamento? Quer os pareceres dos julgadores?

Então, organize seu pedido de acordo com aquilo que você pretende.

Quarta regra: “organize o seu recurso”

Facilite a vida do julgador. Faça o recurso. Junte as copias dos


documentos essenciais (auto de infração, documentos pessoais,
documentos do veículo), depois, junte as copias dos documentos
probatórios e, por fim, outros documentos que julgar necessários ao
processo.

O julgador não pode perder tempo procurando a documentação que


você está citando no recurso. Quanto mais acessível, melhor.

Quinta regra: “Nunca, nunca faça um recurso manuscrito”.

Não que eu esteja dizendo que você tem a letra feia, mas
convenhamos, uma carta de amor deve ser redigida de forma
manuscrita e nunca um documento técnico.

Além de passar mais credibilidade, um recurso impresso, bem


formatado e bem elaborado, terá mais chances de ser lido e
compreendido do que um recurso manuscrito, que além de ser
cansativo, demonstra despreparo e desprezo pelo julgador.

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3º PASSO – PROCURE BRECHAS

Como eu já disse anteriormente, “BRECHAS” não são formas de


burlar a lei e sim caminhos adotados pelo defensor de condutores
para defender o seu cliente da melhor maneira possível.

Pense da seguinte forma: Um auto de infração corretamente


preenchido, dificilmente fornecerá qualquer tipo de subsidio que
possa ser utilizado para o seu cancelamento. Um processo
administrativo em que todas as formas e procedimentos
estabelecidos são observados pela autoridade de trânsito, dificilmente
será declarado nulo.

Então, as “brechas” são fornecidas pela administração, não podendo


o administrado ser criticado por utilizá-las.

Mas, todo processo administrativo para a aplicação de penalidades de


trânsito possui brechas? Não, claro que não.

Entretanto, alguns órgãos e agentes de trânsito têm,


sistematicamente, cometido erros e equívocos que levam ao
cancelamento do processo administrativo.

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Brecha 1 – A dupla notificação

O Código de Trânsito Brasileiro exige duas notificações no processo


administrativo para imposição das penalidades de trânsito. A
primeira, notificando sobre a autuação por infração de trânsito ou
instauração do processo administrativo e a segunda notificando
sobre a imposição da penalidade.

Esse tema já foi devidamente pacificado pelo Superior Tribunal de


Justiça em sua súmula 312:

Súmula 312 - No processo administrativo para


imposição de multa de trânsito, são necessárias as
notificações da autuação e da aplicação da pena
decorrente da infração. (Súmula 312, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 11/05/2005, DJ 23/05/2005 p.
371)

As notificações são enviadas pelo correio e se por algum motivo a


correspondência não for entregue (“proprietário ausente”,
correspondência “não procurada” na sede do correio,
“endereço fora do perímetro de entrega”, “numeração
insuficiente”, “não encontrado”, etc), desde que o endereço do
proprietário do veículo esteja atualizado no DETRAN e não tenha se
“mudado”, as notificações não podem ser consideradas como
entregues. É o que chamamos de incidentes de notificação.

Veja o que diz o artigo 282, do Código de Trânsito Brasileiro:

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Art. 282. Aplicada a penalidade, será expedida notificação


ao proprietário do veículo ou ao infrator, por remessa postal
ou por qualquer outro meio tecnológico hábil, que assegure
a ciência da imposição da penalidade.

§ 1º A notificação devolvida por desatualização do endereço


do proprietário do veículo será considerada válida para todos
os efeitos.

Segundo esse artigo, a validade da notificação depende de ter sido


expedida por qualquer meio hábil que assegure a ciência da
imposição da penalidade e será considerada válida se, quando
expedida via postal, for devolvida por desatualização do endereço do
infrator.

Só que essa validade da notificação é uma exceção à regra.

Digo exceção porque a regra é simples: SE NÃO FOI ASSEGURADA


A CIENCIA DO COMETIMENTO DA INFRAÇÃO OU DA
IMPOSIÇÃO DA PENALIDADE, A NOTIFICAÇÃO É INVALIDA.

Nesse mesmo sentido, a jurisprudência tem entendido que houve o


cerceamento de defesa no caso de não ter sido providenciada outras
formas de notificação, quer seja pessoalmente, quer seja por edital:

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO INOMINADO. AÇÃO


DECLARATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO E DE AUTO DE
INFRAÇÃO. NOTIFICAÇÕES ENVIADAS AO ENDEREÇO
CORRETO DO INFRATOR. NÃO RECEBIMENTO DOS ARs.
NÃO COMPROVAÇÃO DA CIÊNCIA DO INFRATOR DE QUE

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AS CORRESPONDÊNCIAS FICARIAM DISPONIBILIZADAS NO
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CORREIO AGUARDANDO A RETIRADA. AUSÊNCIA DE


NOTIFICAÇÃO POR EDITAL, NA FORMA PREVISTA NO ART.
13, CAPUT, DA RESOLUÇÃO Nº 363/2010 DO CONTRAN.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO ATO
ADMINISTRATIVO QUE CASSOU O DIREITO DE DIRIGIR
QUE, CONTUDO, NÃO SE ESTENDE AO AUTO DE
INFRAÇÃO. RENOVAÇÃO DOS ATOS NA FORMA LEGAL. 1.A
ausência de notificação por edital do infrator que reste
impossibilitado de ser notificado por AR, conquanto as
correspondências sejam enviadas ao seu endereço
corretamente cadastrado no DETRAN macula de nulidade o
ato administrativo tendo por finalidade a imposição da
cassação do direito de dirigir. [...] (TJPR - 3ª Turma Recursal
em Regime de Exceção - Decreto Judic¡ário nº 103-DM -
0079154-19.2014.8.16.0014/0 - Londrina - Rel.: Daniel
Tempski Ferreira da Costa - - J. 21.09.2015)

Então, antes de começar a elaborar a defesa do seu cliente, procure


saber se o endereço do seu cliente está atualizado, se as notificações
retornaram ao DETRAN com essas informações “proprietário
ausente”, correspondência “não procurada” na sede do
correio, “endereço fora do perímetro de entrega”,
“numeração insuficiente”, “não encontrado” e se houve a
notificação via Edital.

Não tendo sido notificado, monte seu recurso com base na violação
ao princípio da ampla defesa, conforme modelos de recurso no final
desse e-book.

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Brecha 2 – A falta de Tipificação da Conduta Infratora

O Artigo 280, do Código de Trânsito Brasileiro, em conjunto com o


Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, trazem em seus textos
quais são os elementos formais que devem estar contidos no auto de
infração, requisitos esses de EXISTENCIA, VALIDADE e EFICACIA do
ato administrativo:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de


trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

I - tipificação da infração;

II - local, data e hora do cometimento da infração;

III - caracteres da placa de identificação do veículo, sua


marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à
sua identificação;

IV - o prontuário do condutor, sempre que possível;

V - identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou


agente autuador ou equipamento que comprovar a infração;

VI - assinatura do infrator, sempre que possível, valendo


esta como notificação do cometimento da infração.

Para que seja considerado regular, o auto de infração deve estar na


forma escrita e não pode conter rasuras, emendas, uso de corretivos
ou qualquer tipo de adulteração.

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Entretanto, um dos elementos do requisito de validade


frequentemente não é observado pelo agente de trânsito durante o
preenchimento do auto de infração, o que leva à sua inconsistência e
consequentemente ao cancelamento da autuação, pois representa
um vício insanável do processo administrativo.

Que elemento é esse? A tipificação da infração.

A tipificação nada mais é do que a descrição exata da conduta


praticada pelo infrator, sujeitada em um tipo legalmente previsto no
na lei de trânsito como sendo uma infração.

Significa enquadrar em um artigo especifico do CTB a conduta


praticada pelo infrator.

Só que de alguns artigos do Código de Trânsito Brasileiro trazem


objetivamente a conduta infratora, ou seja, traz uma única conduta
infratora, por exemplo:

Art. 202. Ultrapassar outro veículo:

I - pelo acostamento;

Outros artigos oferecem tipificações com alternativas de


enquadramento. Por exemplo:

Art. 193. Transitar com o veículo em calçadas, passeios,


passarelas, ciclovias, ciclofaixas, ilhas, refúgios,
ajardinamentos, canteiros centrais e divisores de pista de
rolamento, acostamentos, marcas de canalização, gramados
e jardins públicos:

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Nesse caso, ao invés do legislador criar catorze artigos para tipificar


as infrações, reuniu todas as condutas infratoras em um único artigo,
cabendo ao agente de trânsito escolher, entre uma delas, a conduta
que vai tipificar o auto de infração.

Se o agente de trânsito simplesmente mencionar o artigo ou o código


da infração, sem tipificar a conduta no auto de infração, acaba
violando o direito de ampla defesa e contraditório do condutor.

Em outros artigos, o legislador criou uma regra genérica, que pode


comportar vários tipos de conduta infratora a critério do agente de
trânsito, que deve preencher a conduta infratora de acordo com a
situação observada.

Por exemplo:

Art. 230. Conduzir veículo:

IX - sem equipamento obrigatório ou estando este


ineficiente ou inoperante;

Nesse caso, a norma apenas indica a regra geral aplicada aos


equipamentos obrigatórios, de forma subjetiva, cabendo ao agente
de trânsito preencher, de forma objetiva a conduta infratora,
descrevendo “qual” equipamento obrigatório, dentre todos aqueles
estabelecidos na legislação de trânsito, estava faltando, estava
ineficiente ou inoperante.

Sem a descrição da conduta, nesses casos, não tem como o infrator


se defender, já que não sabe ao certo do que está sendo acusado.

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Nesse sentido, a jurisprudência tem reconhecido que a falta da


tipificação correta é causa do cancelamento do processo
administrativo de multa de trânsito:

JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO


ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO.
AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO DA INFRAÇÃO. EXIGÊNCIA
POSTA NO COMANDO DO ARTIGO 280, INCISO I, DO
CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. INOBSERVÂNCIA.
IRREGULARIDADE DA AUTUAÇÃO. NULIDADE DO ATO
ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. RECURSO CONHECIDO
E IMPROVIDO. (TJ-DF - ACJ: 20120110873337 DF 0087333-
98.2012.8.07.0001, Relator: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA,
Data de Julgamento: 25/06/2013, 1ª Turma Recursal dos
Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF)

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE


INFRAÇÃO DE TRÂNSITO - ENQUADRAMENTO LEGAL
PREVISTO NOS AUTOS DE INFRAÇÃO - EQUIVOCADO -
MULTA INEXIGÍVEL - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO
PROVIDO. A correta tipificação da infração tem sua razão de
ser na exatidão da penalidade a ser imposta ao infrator, de
modo que incorretamente tipificada a conduta resta
prejudicada a aplicação da punição. (TJ-MS - AC: 6062 MS
2005.006062-3, Relator: Des. Paschoal Carmello Leandro,
Data de Julgamento: 13/12/2005, 4ª Turma Cível, Data de
Publicação: 17/01/2006)

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PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE


TRÂNSITO. ART. 218 DO CTB. IRREGULARIDADE NO AUTO
DE INFRAÇÃO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 281. ILEGALIDADE.
MANUTENÃO DA SENTENÇA. DECISÃO UNÂNIME. 1. A
devida tipificação da transgressão no auto de
infração é necessária para aplicação da punição. 2. A
cobrança da multa não pode ser exigida se houver
irregularidade na tipificação, sendo o auto de
infração insubsistente nos termos do artigo 281. 3.
Reexame necessário improvido para manter a sentença.4.
Apelação prejudicada. 5. Decisão unânime. (TJ-PE - REEX:
75064020048170001 PE 0007506-40.2004.8.17.0001,
Relator: Fernando Cerqueira, Data de Julgamento:
16/11/2011, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: 216)

Em outras palavras, a simples menção ao artigo ou a anotação do


código da infração não são suficientes para tipificar a conduta
infratora.

Nesse caso, ainda que a palavra do agente de trânsito goze da


presunção de legitimidade e veracidade, o auto de infração não pode
prevalecer se ano oferecer um mínimo de informações ao condutor
que o possibilite saber do que está sendo acusado para poder se
defender.

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Brecha 3 – Recusa ao Teste de “Bafômetro” sem sinais de


embriaguez

O artigo 165-A, recentemente incorporado ao Código de Trânsito


Brasileiro pela Lei 13.281, ainda é causa de inúmeras divergências
doutrinárias.

Esse artigo deve ser analisado em conjunto com o artigo 277 e a


Resolução 432, do CONTRAN:

Art. 277. O condutor de veículo automotor envolvido em


acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de
trânsito poderá ser submetido a teste, exame clínico,
perícia ou outro procedimento que, por meios
técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo
Contran, permita certificar influência de álcool ou
outra substância psicoativa que determine dependência.

§ 1o (Revogado).

§ 2o A infração prevista no art. 165 também poderá ser


caracterizada mediante imagem, vídeo, constatação de
sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran,
alteração da capacidade psicomotora ou produção de
quaisquer outras provas em direito admitidas.

§ 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas


administrativas estabelecidas no art. 165-A deste Código ao

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condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos


procedimentos previstos no caput deste artigo.

Já a Resolução 432 traz a seguinte previsão:

Art. 3º A confirmação da alteração da capacidade


psicomotora em razão da influência de álcool ou de outra
substância psicoativa que determine dependência dar-se-á
por meio de, pelo menos, um dos seguintes
procedimentos a serem realizados no condutor de veículo
automotor:

I – exame de sangue;

II – exames realizados por laboratórios especializados,


indicados pelo órgão ou entidade de trânsito competente ou
pela Polícia Judiciária, em caso de consumo de outras
substâncias psicoativas que determinem dependência;

III – teste em aparelho destinado à medição do teor


alcoólico no ar alveolar (etilômetro);

IV – verificação dos sinais que indiquem a alteração


da capacidade psicomotora do condutor.

Analisando os dispositivos sob a ótica do princípio nemo tenetur se


detegere, mais conhecido no direito de que “ninguém pode ser
obrigado a produzir prova contra si mesmo”, é possível extrair que,
ao ser “convidado” a realizar os testes que permitam CERTIFICAR a
influência de álcool, o condutor pode se negar a realizar 3 (três) dos
procedimentos previstos na legislação de trânsito para a confirmação

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da embriagues: O teste em etilômetro, o exame de sangue e o exame


laboratorial.

Só que o condutor não pode, entretanto, se insurgir contra a


verificação dos sinais que indiquem a alteração da capacidade
psicomotora, já que se trata de uma constatação do agente da
autoridade de trânsito, uma prova do estado contra o condutor e não
do condutor contra si próprio.

Ou seja, a recusa do condutor não pode constituir em um óbice, em


um impedimento, em um empecilho para a confirmação da
embriagues, cabendo ao agente de trânsito indicar os sinais de
embriagues para CERTIFICAR a influência de álcool, lavrando a
autuação.

A questão é saber se, diante dos sinais de embriaguez constatados


pelo agente de trânsito, cabe a autuação por infração ao artigo 165,
por dirigir sob a influência de álcool ou autuação por infração ao artigo
165-A, diante da recusa promovida pelo condutor.

Parece um tanto óbvio que, constatada a embriagues através de um


conjunto de sinais, a autuação correta deve ser aquela que for mais
especifica (princípio da especificidade). Nesse caso, sendo constatada
a embriaguez, a infração é ao artigo 165.

Mas e a recusa?

O artigo 165-A se destina a punir os casos em que não for possível


CERTIFICAR a embriaguez. Por exemplo: O condutor se recusa a
fazer os testes mas o agente de trânsito constata a existência de

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apenas um sinal de embriaguez, o hálito etílico. Nesse caso, não é
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possível CERTIFICAR a embriaguez, pois o artigo 5º, da Resolução


432 diz que “para confirmação da alteração da capacidade
psicomotora pelo agente da Autoridade de Trânsito, deverá
ser considerado não somente um sinal, mas um conjunto de
sinais que comprovem a situação do condutor”.

Então, é possível admitir duas hipóteses diante da existência de sinais


de alteração da capacidade psicomotora:

a) Se existir um conjunto de sinais, resta certificada a embriaguez,


então, o enquadramento correto é no artigo 165;

b) Se existir apenas um sinal, a embriaguez não poderá ser


certificada, o que tipifica a conduta prevista no artigo 165-A.

Mas e se não houverem sinais de influência de álcool?

NESSE CASO, NÃO HÁ EMBRIAGUEZ A SER CERTIFICADA.

E não havendo embriaguez a ser CERTIFICADA, não cabe nem o


enquadramento no artigo 165 e tão pouco o enquadramento no artigo
165-A.

A infração cometida pelo condutor, então, é por desobedecer as


ordens emanadas pelo agente de trânsito, não havendo qualquer
relação com embriaguez.

Esse entendimento também é adotado pela jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE


INSTRUMENTO. AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. TESTE
DO BAFÔMETRO. RECUSA. NECESSIDADE DE OUTROS

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MEIOS DE PROVA. ANULAÇÃO. - O art. 277 do CTB dispõe


que a verificação do estado de embriaguez, ao menos para
cominação de penalidade administrativa, pode ser feita por
outros meios de prova que não o teste do etilômetro. A
despeito das discussões acerca do art. 277, §3º, CTB,
a jurisprudência exige que a embriaguez esteja
demonstrada por outros meios de prova, não
podendo ser decorrência automática da recusa em
realizar o teste. (TRF4, AG 5027508-56.2015.404.0000,
Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle
Pereira, juntado aos autos em 10/09/2015)

Aliás, o Conselho Estadual de Trânsito de Santa Catarina, já pacificou


a jurisprudência junto aos demais órgãos de trânsito, através da
seguinte ementa:

EMENTA. A mera recusa do condutor em se


submeter aos exames de alcoolemia, sem que haja
suspeita pautada em elementos plausíveis para
desconstituir a presunção de inocência que milita a
seu favor, não é suficiente para sustentar a punição
prevista no art. 165-A do CTB. (PARECER Nº
328/2017/CETRAN/SC. Conselheiro Relator: José
Vilmar Zimmermann. Aprovado por unanimidade na
Sessão Ordinária n.º 02, realizada em 24 de janeiro
de 2017)

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Segundo o artigo 261, do Código de Trânsito Brasileiro, a penalidade


de suspensão do direito de dirigir será imposta nos seguintes
casos:

I - sempre que o infrator atingir a contagem de 20 (vinte) pontos, no


período de 12 (doze) meses, conforme a pontuação prevista no art.
259;

II - por transgressão às normas estabelecidas neste Código, cujas


infrações preveem, de forma específica, a penalidade de suspensão
do direito de dirigir.

Entretanto, a lei confere um tratamento especial aos motoristas que


exercem atividade remunerada em veículos, podendo optar por
participarem de um Curso Preventivo de Reciclagem.

Esta norma está prevista no mesmo artigo 261, em seus parágrafos


5º, 6º e 7º:

§ 5º O condutor que exerce atividade remunerada em


veículo, habilitado na categoria C, D ou E, poderá optar por
participar de curso preventivo de reciclagem sempre que, no
período de 1 (um) ano, atingir 14 (quatorze) pontos,
conforme regulamentação do Contran.

§ 6o Concluído o curso de reciclagem previsto no § 5o, o


condutor terá eliminados os pontos que lhe tiverem sido
atribuídos, para fins de contagem subsequente.

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§ 7º O motorista que optar pelo curso previsto no § 5º não


poderá fazer nova opção no período de 12 (doze) meses.

Evidentemente que, ao estabelecer que o condutor PODERÁ


optar, de um lado, conferiu ao condutor um direito, desde que
cumpridos os requisitos objetivos e subjetivos previstos em lei, ao
mesmo tempo em que estabeleceu para a administração uma
obrigação em disponibilizar o curso.

Como funciona esse curso preventivo? Não funciona. O CONTRAN


ainda não regulamentou a matéria.

Só que a falta de regulamentação não pode servir como desculpa


para impor a penalidade de suspensão do direito de dirigir por
acumulo de 20 pontos aos condutores que exercem atividade
remunerada.

Por exemplo, se o condutor fizer o pedido preventivo de realização


do curso ao órgão executivo de trânsito estadual, ao atingir os 14
pontos no prontuário, ainda que lhe seja negado o pedido por falta
de regulamentação, os pontos não poderão compor um futuro
processo de suspensão do direito de dirigir, já que os pontos devem
ser eliminados para fins de contagem subsequente.

Importante dizer que não é o condutor profissional que está dando


azo ao processo de suspensão acumulando 20 pontos e sim o órgão
de trânsito, que está deixando de eliminar 14 pontos do prontuário
do condutor.

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Brecha 4 – INFRAÇÕES DE TRÂNSITO IMPOSSÍVEIS

Existem artigos do Código de Trânsito Brasileiro que trazem as


chamadas “infrações impossíveis”, quer seja pela técnica legislativa
empregada, quer seja pelo enquadramento errado no artigo pelo
agente de trânsito, quer seja pela própria lógica atribuída à infração.

De qualquer forma, ainda que sejam impossíveis, podem compor um


auto de infração, que somente será cancelado mediante a
interposição de recurso.

O exemplo mais comum são as autuações decorrentes do artigo 163


e 164, de responsabilidade do proprietário do veículo quando este
também é o condutor infrator.

Veja:

Art. 163. Entregar a direção do veículo a pessoa nas


condições previstas no artigo anterior:

Infração - as mesmas previstas no artigo anterior;

Penalidade - as mesmas previstas no artigo anterior;

Medida administrativa - a mesma prevista no inciso


III do artigo anterior.

Art. 164. Permitir que pessoa nas condições referidas


nos incisos do art. 162 tome posse do veículo
automotor e passe a conduzi-lo na via:

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Infração - as mesmas previstas nos incisos do art.


162;

Penalidade - as mesmas previstas no art. 162;

Medida administrativa - a mesma prevista no inciso


III do art. 162.

É faticamente impossível, nesses casos, que o proprietário entregue


o seu veículo ou permita a posse a e ele mesmo (proprietário), para
que conduza o veículo em via pública cometendo infração ao artigo
162.

Apesar de ser uma questão lógica, muitos agentes de trânsito


cometem essa gafe, pois estão condicionados a preencher
concomitantemente os dois autos de infração (162+163 ou 164).

Outro exemplo bastante comum é a autuação por “racha”:

Art. 173. Disputar corrida:

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa (dez vezes), suspensão do direito


de dirigir e apreensão do veículo

Medida administrativa - recolhimento do documento


de habilitação e remoção do veículo.

Parágrafo único. Aplica-se em dobro a multa


prevista no caput em caso de reincidência no período
de 12 (doze) meses da infração anterior

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A materialidade da infração está na simples disputa entre condutores


de veículos, que tentam se superarem na corrida entre dois pontos.

A disputa de corrida envolve, obrigatoriamente, a presença de dois


ou mais participantes, que têm como intuito percorrerem a distância
entre dois pontos no menor tempo possível, em alta velocidade,
saindo vencedor aquele que primeiro chegar ao ponto final, sendo
obrigatório que o agente de trânsito descreva a situação observada e
informe a placa ou o nº do A.I.T lavrado ao outro condutor.

Sem essas informações, é impossível admitir que tenha ocorrido a


disputa de corrida, já que a autuação lavrada a apenas um único
veículo, ainda que esteja em alta velocidade, configura a infração ao
artigo 218 e não ao artigo 173.

Agora responda rápido: VOCÊ JÁ VIU UMA PLACA INDICANDO


PROIBIDO PARAR?

Claro que não. Essa placa não existe.

Entretanto, o Código de Trânsito Brasileiro trouxe essa previsão:

Art. 182. Parar o veículo:

X - em local e horário proibidos especificamente


pela sinalização (placa - Proibido Parar):

Infração - média;

Penalidade - multa.

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Evidentemente que se trata de um erro do legislador que não pode e


não deve ser considerado para efeitos de autuação, por absoluta falta
de previsão legal.

Vejamos outro artigo:

Art. 200. Ultrapassar pela direita veículo de


transporte coletivo ou de escolares, parado para
embarque ou desembarque de passageiros, salvo
quando houver refúgio de segurança para o
pedestre:

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa.

Segunda a mais exata definição contida no Anexo I, do Código de


Trânsito Brasileiro, ULTRAPASSAGEM é o movimento de passar à
frente de outro veículo que se desloca no mesmo sentido, em
menor velocidade e na mesma faixa de tráfego, necessitando sair
e retornar à faixa de origem.

Se uma das condições para que a manobra de ultrapassagem se


caracterize é justamente o movimento de passar à frente de outro
veículo que se desloca no mesmo sentido, TORNA-SE IMPOSSIVEL
ultrapassar veículo que esteja PARADO.

Sem o deslocamento, a manobra não configura sequer uma


“passagem” por outro veículo.

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Assim, ainda que o veículo de transporte coletivo ou de escolares


esteja PARADO para o embarque ou desembarque de passageiros,
não há como configurar a infração de trânsito ao artigo 200.

Da mesma forma, o artigo 203 e o artigo 211:

Art. 203. Ultrapassar pela contramão outro veículo:

IV - parado em fila junto a sinais luminosos,


porteiras, cancelas, cruzamentos ou qualquer outro
impedimento à livre circulação;

Art. 211. Ultrapassar veículos em fila, parados em


razão de sinal luminoso, cancela, bloqueio viário
parcial ou qualquer outro obstáculo, com exceção
dos veículos não motorizados:

Infração - grave;

Penalidade - multa.

Para não ficar cansativo, pois o rol de infrações impossíveis não


param por aqui, vejamos os artigos 245 e 246 do CTB:

Art. 245. Utilizar a via para depósito de mercadorias,


materiais ou equipamentos, sem autorização do
órgão ou entidade de trânsito com circunscrição
sobre a via:

Infração - grave;

Penalidade - multa;

Medida administrativa - remoção da mercadoria ou


do material.

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Parágrafo único. A penalidade e a medida


administrativa incidirão sobre a pessoa física ou
jurídica responsável.

Art. 246. Deixar de sinalizar qualquer obstáculo à


livre circulação, à segurança de veículo e pedestres,
tanto no leito da via terrestre como na calçada, ou
obstaculizar a via indevidamente:

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa, agravada em até cinco vezes, a


critério da autoridade de trânsito, conforme o risco à
segurança.

Parágrafo único. A penalidade será aplicada à pessoa


física ou jurídica responsável pela obstrução,
devendo a autoridade com circunscrição sobre a via
providenciar a sinalização de emergência, às
expensas do responsável, ou, se possível, promover
a desobstrução.

As autuações ao artigo 245 e 246 não comportam pontos no


prontuário do condutor, eis que se tratam de infrações
administrativas, não guardando relação com o veículo ou condutor.

Ainda que seja flagrado a descarga das mercadorias, materiais ou


equipamentos pelo transportador, a regra impede seja autuado o
proprietário ou condutor do veículo, já que não são os responsáveis
pela carga. Logo, é impossível penalizar o prontuário do condutor ou

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do veículo com multas e pontos ao artigo 245 e 246.
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Brecha 5 – Infrações Simultâneas

Infrações de trânsito simultâneas são aquelas observadas pelo agente


de trânsito ao mesmo tempo, em concurso material, quando o
condutor pratica duas ou mais ações gerando dois ou mais resultados
diferentes ou em concurso formal, quando uma única ação gera dois
ou mais resultados.

Apesar do Código de Trânsito Brasileiro ter adotado como regra o


princípio da cumulatividade das penalidades, o CONTRAN, através do
Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, fez distinções entre
infrações que devem ser penalizadas individualmente e aquelas em
que a conduta mais especifica absorve as demais condutas
praticadas, devendo ser lavrada uma única autuação.

Partindo da premissa utilizada pelo CONTRAN, podemos classificar as


infrações simultâneas em 3 (três) tipos: 1. Concorrentes; 2.
Concomitantes; 3. Continuadas.

INFRAÇÕES CONCORRENTES

Infrações de trânsito concorrentes são aquelas em que o condutor,


através de uma única conduta, gera dois ou mais resultados,
caracterizando o concurso formal de infrações.

Se o intuito do condutor era a pratica de uma infração específica, que

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para ser realizada tinha como consequência o cometimento de outra
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infração, apesar de serem infrações simultâneas, a conduta mais


especifica deve prevalecer sobre a conduta secundária.

Por exemplo, a intenção do condutor é ultrapassar pelo acostamento


(art. 202) mas para realizar a manobra, necessita também transitar
pelo acostamento (art. 193). Ambas as condutas são tipificadas como
infração de trânsito, entretanto, a mais específica, que demonstra o
desígnio, a intensão, a finalidade do condutor é o artigo 202, por
ultrapassar pelo acostamento. Apesar da conduta produzir duas
infrações distintas, a intensão do condutor era cometer uma única
infração, e essa justamente será o fato gerador de uma única
autuação.

Para ser qualificada como infração de trânsito concorrente, devem


estar presentes as seguintes características: 1. Uma única ação; 2.
Tipificação de duas ou mais infrações; 3. Simultaneidade das
autuações; 4. Uma única intensão específica.

INFRAÇÕES CONCOMITANTES

Infrações concomitantes são aquelas absolutamente independentes,


que não guardam qualquer relação entre si, apesar de terem ocorrido
simultaneamente.

Ambas as condutas praticadas pelo condutor possuem força suficiente


para gerarem resultados diferentes, devendo o condutor responder
por ambas as infrações.

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É o caso, por exemplo, do condutor que arranca bruscamente com o


seu veículo ao sinal verde do semáforo, com o intuito de exibir-se
(art. 175), ao mesmo tempo em que deixa de observar a preferência
do pedestre que não havia concluído a travessia da via (art. 214, II).

Nesse caso, ambas as condutas tipificam infrações distintas e


independentes, gerando resultados diferentes e consequentemente
uma autuação para cada infração.

Para ser qualificada como infração concomitante, devem estar


presentes as seguintes características: 1. Simultaneidade das
autuações; 2. Ausência de dependência entre as condutas; 3.
Resultados diferentes pelas condutas praticadas.

INFRAÇÕES DE TRÂNSITO CONTINUADAS

Infrações continuadas têm como característica principal a lavratura


de várias autuações, no mesmo artigo infracional, em mesmo
local, no mesmo dia, em horários aproximados.

Não se trata de múltiplos cometimentos de infrações e sim de uma


única infração de trânsito ocorrida de forma continuada, constatada
por agentes de trânsito diversos ou por flagrante em vários aparelhos
eletrônicos instalados no mesmo trecho e que originaram duas, três
ou mais autuações distintas.

Para configurar uma infração de trânsito continuada, as autuações

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devem possuir os seguintes requisitos: a) pluralidade de autuações;
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b) infrações da mesma espécie; c) conexão temporal e geográfica


entre as infrações; d) Autuações Subsequentes.

A pluralidade de autuações é um critério matemático, constituindo


na lavratura de dois ou mais autos de infrações de trânsito de forma
simultânea em um determinado período de tempo.

As infrações da mesma espécie são aquelas que possuem o


mesmo fato gerador. Ex: Art. 218 - Transitar em velocidade superior
à máxima permitida para o local, medida por instrumento ou
equipamento hábil, em rodovias, vias de trânsito rápido, vias arteriais
e demais vias.

Nesse caso, ainda que as autuações sejam tipificadas por incisos


diferentes (218, I – 218, II ou 218, III), o fato gerador das infrações
continua o mesmo.

A conexão temporal e geográfica implica tenham ocorrido as


infrações em mesmo dia, em locais e horários aproximados.

Por último, as Autuações Subsequentes devem estar


caracterizadas por um vínculo entre as infrações, com autos de
infração lavrados um em seguida do outro, pelo mesmo órgão de
trânsito e com o mesmo modus operandi, ou seja, constatadas da
mesma maneira.

Há que se dizer que o Superior Tribunal de Justiça já consolidou o


entendimento de que para infrações administrativas de mesma
natureza, ocorridas dentro de um mesmo período, de forma
continuada, a multa administrativa deve ser singular:

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ADMINISTRATIVO. DISPOSITIVO DE LEI TIDO COMO


VIOLADO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS
Nºs 282 e 356 do STF. SUNAB. LEI DELEGADA Nº 04/62.
INFRAÇÃO CONTINUADA. MULTA SINGULAR. [...] II - É
assente o entendimento nesta Corte de que a
seqüência de diversos ilícitos de mesma natureza,
apurados em uma única ação fiscal, é considerada
como infração continuada e, portanto, sujeita à
imposição de multa singular. Precedentes: REsp nº
175.350/PB, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ
de 25/09/2000; REsp nº 191.991/PE, Rel. Min. JOSÉ
DELGADO, DJ de 22/03/1999 e REsp nº 83574/PE, Rel. Min.
HUMBERTO GOMES DE BARRO, DJ de 21/03/96. (REsp
1041310/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 27/05/2008, DJe 18/06/2008)

A manutenção das penalidades decorrentes de infrações continuadas


viola o princípio nem bis in idem, que em uma breve explicação,
indica a ideia de que um único fato não pode gerar duas penalidades
distintas.

Destarte, nas autuações de trânsito decorrentes de infrações


continuadas estão presentes a tríplice identidade, que caracterizam o
bis in idem:

1. Mesmo condutor infrator; 2. Mesmo órgão autuante; 3. Mesmo


fundamento para autuação.

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O Conselho Nacional de Trânsito adotou o mesmo entendimento,


ainda que de forma implícita e tímida, ao estabelecer no Manual
Brasileiro de Fiscalização de Trânsito que:

“O agente só poderá registrar uma infração por auto e, no


caso da constatação de infrações em que os códigos
infracionais possuam a mesma raiz (os três primeiros
dígitos), considerar-se-á apenas uma infração.

Exemplo: condutor e passageiro sem usar o cinto de


segurança, lavrar somente o auto de infração com o
código 518-51 e descrever no campo ‘Observações’ a
situação constatada (condutor e passageiro sem
usar o cinto de segurança).” (Manual Brasileiro de
Fiscalização de Trânsito, Resolução 371/561, capitulo 7, fls.
17)

Há que se concluir, portanto, que restando caracterizada a ocorrência


de infrações de natureza continuadas, é dever do órgão de trânsito
manter apenas a primeira autuação lavrada, promovendo o
cancelamento das demais, enquanto perdurar a conexão temporal e
geográfica da infração.

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CONCLUSÃO

O Código de Trânsito Brasileiro, apesar de ser uma das codificações


sobre direito de trânsito mais modernas de todo o mundo, sofre com
o preciosismo, com a péssima técnica legislativa e com a
inconsequente alteração ou inclusão de artigos na Lei, apenas para
satisfazer o anseio popular.

Ainda, o contingente reduzido de agentes de trânsito, aliado à falta


de atualização e capacitação constante desses agentes, juntamente
com as constantes falhas verificadas nos procedimentos
administrativos para a imposição das penalidades, contribuem para
que cada vez mais condutores utilizem as “brechas” do sistema para
conseguirem o cancelamento de processos, quer seja na via
administrativa ou judicial.

De outro lado, possibilita o surgimento do profissional especializado


em recursos de multa e penalidades, um dos setores que mais cresce
atualmente e que está passando longe da crise nacional. Recorrer
multas e penalidades de transito tem se mostrado uma excelente
oportunidade para quem busca uma nova área de atuação ou
simplesmente agregar um serviço a mais em seu escritório. E cada
vez mais esses profissionais estarão em destaque, já que a tendência
do mercado é ter cada vez mais condutores infratores.

Só que isso, está longe de acontecer. Desejo sucesso na área.

Vagner Oliveira.

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