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Economia

brasileira
contemporânea
Economia brasileira
contemporânea

Andréia Moreira da Fonseca Boechat


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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Boechat, Andréia Moreira da Fonseca


B669e Economia brasileira contemporânea / Andréia Moreira da
Fonseca Boechat. – Londrina : Editora e Distribuidora
Educacional S.A., 2016.
168 p.

ISBN 978-85-8482-459-5

1. Brasil – Política econômica. 2. Brasil – Condições


econômicas. 3. Estabilização econômica – Brasil. 4. Brasil –
Política e governo. I. Título.

CDD 338.981

2016
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CEP: 86041-100 — Londrina — PR
e-mail: editora.educacional@kroton.com.br
Homepage: http://www.kroton.com.br/
Sumário

Unidade 1 | Economia brasileira até os anos 1970 7

Seção 1 - Breve revisão da economia cafeeira até o plano de metas 11


1.1 | A economia cafeeira 13
1.1.1 | Oscilações de preços do café 14
1.1.2 | As políticas de defesa do café 15
1.1.3 | Superprodução e a crise de 1930 17
1.2 | O processo de industrialização 18
1.2.1 | Processo de Substituição de Importações (PSI) 21
1.2.2 | Mecanismos de proteção à indústria nacional durante o PSI 23
1.2.3 | Dificuldades na implementação do PSI 24
1.2.4 | Papel da agricultura na industrialização brasileira 25
1.3 | O Plano de Metas (1956-1960) 25

Seção 2 - A crise dos anos 60, PAEG e as reformas e o milagre


econômico 31
2.1 | A crise dos anos 1960 31
2.2 | Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) e as reformas 33
2.2.1 | Medidas de combate à inflação 33
2.2.2 | As reformas do PAEG 34
2.3 | O milagre econômico 35

Seção 3 - Crescimento com endividamento 39


3.1 | II Plano Nacional de Desenvolvimento 39

Unidade 2 | A década perdida 49

Seção 1 - Crise Internacional, restrição externa e descontrole


inflacionário 53

Seção 2 - As tentativas de estabilização I: o debate


macroeconômico entre os ajustes ortodoxo e heterodoxo 57
2.1 | Debates sobre as causas da inflação no Brasil 58
2.2 | Ajustes heterodoxos e ortodoxos 59

Seção 3 - As tentativas de estabilização II: Os planos cruzado,


Bresser e verão 61
3.1 | Plano cruzado 62
3.1.1 | Plano cruzado II 64
3.2 | Plano Bresser 66
3.3 | Plano verão 67
Seção 4 - O plano Collor e as reformas estruturais 71
4.1 | As reformas estruturais 73
4.1 | Os Planos Collor de estabilização econômica 75

Seção 5 - Anos 1990: quais desafios a superar? 79

Unidade 3 | O plano real e a estabilização macroeconômica 85

Seção 1 - O plano real, da criação aos primeiros anos no governo FHC 89


1.1 | Implantação do plano real 90
1.2 | Impactos e problemas do plano real 97

Seção 2 - O plano real e as crises financeiras internacionais:


México, Ásia, Rússia e Argentina 103
2.1 | A crise do México (1994) 103
2.2 | A crise da Ásia (1997) 106
2.3 | A crise da Rússia (1998) 107
2.4 | A crise Argentina (2001/2002) 111

Seção 3 - A crise cambial e o sistema de metas de inflação 115

Unidade 4 | Plano real no contexto de mudança de governo 127

Seção 1 - Mudança e continuidade no governo Lula 131

Seção 2 - Política fiscal, monetária no novo governo 137


2.1 | Meta da inflação: 8,5% em 2003 e 5,5% em 2004 138
2.2 | Segundo governo Lula (2007 – 2010) 141

Seção 3 - Política exterior e transição econômica 147

Seção 4 - O PAC e seus desdobramentos no governo Lula 153


4.1 | Resultados da primeira fase do Programa de Aceleração do Crescimento 155
4.2 | Segunda fase do PAC 157

Seção 5 - O plano real sob o governo Dilma 161


Apresentação

Olá, caro(a) acadêmico(a),

Seja muito bem-vindo(a) à disciplina de Economia Brasileira Contemporânea.


Ela proporcionará a você conhecimentos históricos da economia brasileira,
oferecendo uma análise histórica de seu desenvolvimento e seu do crescimento,
desde quando a economia nacional era agroexportadora, passando pelo início da
industrialização, pela saga dos planos de estabilização, chegando aos dias atuais,
durante o governo Dilma Rousseff.

Para atingirmos o objetivo e conhecermos a evolução histórica da economia


brasileira, o livro foi dividido em quatro unidades. Na Unidade 1, faremos uma breve
revisão da economia agroexportadora até a década de 1970, durante o golpe
militar.

Na Unidade 2, discutiremos a década de 1980, que ficou conhecida como


década perdida, uma vez que tínhamos altas taxas de inflação, baixo crescimento
econômico, um parque industrial obsoleto, entre outras variáveis econômicas
que eram instáveis. E, claro, ao falarmos da década de 1980, não podemos nos
esquecer dos cinco planos de estabilização econômica que não deram certo.

Na Unidade 3 veremos o único plano econômico que tinha como objetivo a


estabilização da economia, o qual, de fato, deu certo, que foi o plano Real. Nessa
unidade discutiremos os motivos que fizeram com que esse plano atingisse o objetivo
e os demais não. Também na terceira unidade, falaremos sobre as crises financeiras
internacionais que colocaram “à prova” a estabilidade da economia brasileira.

Para finalizar a nossa disciplina, na Unidade 4 chegaremos aos anos 2000 e à


mudança política ocorrida em nosso país quando um governo considerado de
esquerda assumiu a Presidência da República. Assim, conheceremos as mudanças
e continuidades desses novos governos frente ao anterior.

Ao final do livro e da disciplina, você terá compreendido a situação econômica


atual, já que, para conhecermos o presente e prevermos o futuro, é necessário
conhecermos nossa história. E, para isso, nada mais adequado que a disciplina de
Economia Brasileira Contemporânea.

Bons estudos!

Andréia Moreira da Fonseca Boechat.


Unidade 1

ECONOMIA BRASILEIRA ATÉ OS


ANOS 1970

Andréia Moreira da Fonseca Boechat

Objetivos de aprendizagem:

Nesta unidade você será levado a entender as origens da industrialização


brasileira, assim como os acontecimentos econômicos que marcaram os anos
1960 e 1970.

Seção 1 | Breve revisão da economia cafeeira até o plano de


metas
Nesta seção faremos uma breve revisão da economia cafeeira brasileira até
o plano de metas. Discutiremos ainda os itens: modelo agroexportador; crise de
1929; processo de substituição de importações, governos Getúlio Vargas; e o
Plano de Metas.

Seção 2 | A crise dos anos 60, PAEG e as reformas e o


milagre econômico
Nesta seção discutiremos os principais acontecimentos que marcaram a
economia brasileira nas décadas de 1960 e 1970, as reformas institucionais feitas
e o impacto nos indicadores econômicos.

Seção 3 | Crescimento com endividamento


Nesta seção abordaremos o tema crescimento com endividamento.
Discutiremos a mudança da economia brasileira, que saiu do milagre econômico
e passou a ter alta dívida externa.
U1

8 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Introdução à unidade

Seja bem-vindo à primeira unidade do livro Economia Brasileira Contemporânea.


Para entender a situação econômica brasileira atual, precisamos voltar algumas
décadas na história do nosso país, o que faremos a partir de agora. Retornaremos uns
anos antes da década de 1930 para relembrarmos o funcionamento da economia
agroexportadora, a maneira como esse tipo de economia “quebrou” e por que o
parque industrial brasileiro, de fato, começou a se desenvolver.

Esta primeira unidade está dividida em três seções. Na primeira, faremos uma
breve revisão da economia cafeeira até o plano de metas. Na sequência, vamos
compreender a crise econômica da década de 1960, o Programa de Ação Econômica
do Governo (PAEG) e o modo como as reformas institucionais foram feitas no Brasil
na década de 1960 para solucionar a crise econômica. Ainda na segunda seção,
veremos o período conhecido como milagre econômico, no qual o país cresceu
consideravelmente. Para finalizar o capítulo, na terceira seção discutiremos como
o nosso país cresceu tanto em termos de produção como em termos de dívida
externa. Preparado(a)?

Economia brasileira até os anos 1970 9


U1

10 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Seção 1

Breve revisão da economia cafeeira até o plano de


metas
De 1500, quando o Brasil foi descoberto, a 1930 a economia brasileira dependeu
basicamente das exportações de certos produtos primários, as chamadas commodities
agrícolas. Já negociávamos no mercado internacional mercadorias como o açúcar,
o algodão, a borracha, o café, entre outros. Cada período de tempo era marcado
pela produção e pela exportação de um desses produtos que dinamizavam o balanço
de pagamentos e faziam com que aquele período ficasse conhecido como ciclo
econômico do “produto” em questão. Por exemplo, entre meados do século XVI
e meados do século XVIII, o açúcar era produzido na região Nordeste brasileira e
depois exportado era a principal atividade econômica do período – esse período ficou
conhecido como ciclo do açúcar. Como outro exemplo podemos citar o ciclo do
café, que teve início em 1840, quando o café passou a ser o principal produto da pauta
de exportação brasileira.

Commodity, ou no plural, commodities, é uma palavra que tem origem


na língua inglesa e significa “produto”, sendo um tipo particular de
mercadoria em estado bruto, ou produto primário, que é produzido em
larga escala e comercializado no mercado internacional.

Como você já deve ter notado, éramos economicamente dependentes das


nossas exportações, e essa dependência caracterizou o Brasil como uma economia
agroexportadora (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Ou seja, o
desempenho da economia brasileira dependia das condições do mercado internacional,
sendo, portanto, vulnerável aos países importadores dos nossos produtos.

Nesse sentido, uma das maiores estudiosas da economia brasileira, Maria da


Conceição Tavares (1975), chama esse tipo de estrutura econômica (agroexportadora)
de “modelo de desenvolvimento voltado para fora”. Segundo Gremaud, Vasconcellos

Economia brasileira até os anos 1970 11


U1

e Toneto Júnior (2011), o desenvolvimento do Brasil e da maior parte dos países da


América Latina caracterizava-se por possuir alto peso relativo do setor externo na
estrutura econômica. Porém, como os mesmos autores observam, o maior problema
não era o peso do setor externo e sim a desarmonia entre a estrutura de consumo
desses países e a base produtiva. Em outras palavras, se os produtos fabricados pelo
país fossem os mesmos demandados pelos consumidores, não haveria problema.
No entanto, o que ocorria na economia brasileira era o oposto: produzíamos e
consumíamos produtos distintos.

Para ficar mais fácil o entendimento do modelo de desenvolvimento voltado


para fora, podemos comparar as principais características dos países (Brasil e demais
países da América Latina) que adotaram esse tipo de modelo com o que ocorria nos
países que não adotaram esse tipo de modelo, os países centrais. As características e
consequentemente as diferenças entre os dois tipos de países são apresentadas no
Quadro 1.1.

Quadro 1.1 | Principais características dos países agroexportadores e centrais

Países Agroexportadores Países Centrais


A exportação é a variável quase que exclusiva na Além das exportações, os investimentos
determinação da renda nacional e a única fonte determinam a renda nacional.
de dinamismo.
A base de exportações é concentrada em Produtos manufaturados fazem parte da pauta
poucos produtos primários. de exportações.
As importações atendem boa parte da demanda As importações atendem parte da demanda
interna. interna.
Diferença entre base produtiva e estrutura de Proximidade entre base produtiva e estrutura de
demanda. consumo.
Fonte: Elaboração da autora com base em Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

Como podemos perceber, a economia dos países agroexportadores é bem


diferente da dos países centrais. Ao passo que os primeiros dependiam basicamente
da produção e da exportação de poucos produtos primários, os países centrais já
exportavam outros tipos de produtos, como os manufaturados, e faziam investimentos,
principalmente com o progresso tecnológico associado.

Em termos de importações, os dois tipos de modelo econômico são bem diferentes.


Para atender à demanda interna, os países agroexportadores importavam praticamente
tudo, ao passo que os países centrais não o faziam, uma vez que produziam o que a
população demandava.

12 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Agora que você conhece um pouco mais o significado de


economia agroexportadora, reflita sobre a seguinte questão:
Atualmente podemos afirmar que deixamos de depender das
exportações de produtos primários?
Dica: Pense na balança comercial brasileira nas últimas
décadas.

1.1 A economia cafeeira


Agora que você relembrou como funcionava uma economia agroexportadora,
podemos discutir um pouco mais sobre um dos períodos mais grandiosos da
economia brasileira, o último grande ciclo econômico brasileiro antes do período
industrial, que foi o ciclo do café. A importância desse ciclo se dá em razão das
inúmeras mudanças no modo de produção brasileiro, tendo como consequência o
fim do modo de produção colonial e o início no capitalismo industrial.

Podemos citar como mudanças principais a transição do trabalho escravo para


o livre e os avanços na tecnologia, nos transportes e no sistema financeiro que
ocorreram na segunda metade do século XIX e que proporcionaram condições
necessárias à industrialização (SOUZA, 2009). Vamos entender cada uma dessas
mudanças?

a) Transição do trabalho – a transição do trabalho escravo para o livre teve início


em 1850, com a promulgação da Lei Eusébio de Queiroz, com base na qual o tráfico
negreiro foi proibido, o que reduziu a oferta e, consequentemente, encareceu a
“mercadoria”1. Para resolver o problema da escassez de mão de obra, os cafeicultores
passaram a contratar trabalhadores, tanto brasileiros quanto estrangeiros.

A entrada dos estrangeiros foi se intensificando ao longo das décadas seguintes.


Em 1884 o governo brasileiro passou a subsidiar a vinda de europeus e japoneses
para o Brasil. Apesar disso, a escassez de mão de obra continuava se agravando,
principalmente a partir de 1888, quando a Lei Áurea foi promulgada, acabando de
vez com a escravidão no país. A consequência foi a criação definitiva do mercado de
trabalho assalariado. Com isso, o mercado consumidor se tornou maior, já que esses
trabalhadores passaram a receber salário e passaram a demandar bens.

1
Os escravos eram tratados como mercadoria/produto.

Economia brasileira até os anos 1970 13


U1

Para saber um pouco mais da criação do mercado de trabalho brasileiro,


leia o artigo “A formação do mercado de trabalho no Brasil: uma análise da
legislação sobre locação de serviços no século XIX”. Disponível em: <www.
anpec.org.br/encontro2003/artigos/A23.pdf>. Acesso em: 16 fev. 2016.

b) Construção de ferrovias – inicialmente com capital inglês e depois com


investimento dos cafeicultores paulistas, diversas ferrovias foram construídas com o
objetivo de escoar a produção de café.

c) Avanços tecnológicos – implantação de máquinas para beneficiamento do café


e substituição dos engenhos por usinas na região Nordeste.

d) Formação do sistema creditício – os bancos comerciais e outras instituições


passaram a financiar os novos empreendimentos.

1.1.1 Oscilações de preços do café

Como sabemos, o café é uma commodity. O bom desempenho da economia


brasileira dependia, então, das condições do mercado internacional. Portanto, a
condição do mercado de café não dependia exclusivamente do Brasil. Nesse sentido,
Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011) observam que, apesar de o Brasil ser
o principal produtor mundial de café, outros países também influenciavam a oferta
do produto, além de parte do mercado ser controlada por grandes companhias
atacadistas que especulavam com estoques. Os mesmos autores afirmam que a
demanda dependia do crescimento mundial, aumentando em momentos de
expansão da economia internacional e reduzindo em situações de crises. Para você
ter uma ideia de como o preço do café oscilou vamos analisar o Gráfico 1.1
Gráfico 1.1 | Preço do café de 1851 a 1906

Fonte: Delfim Netto (1966 apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

14 Economia brasileira até os anos 1970


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Podemos perceber que, entre 1851 e 1906, três ciclos completos de preço
ocorrem, com períodos de ascensão e outros de queda. Segundo Gremaud,
Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), as oscilações se devem a duas condições:
o lado da demanda e o lado da oferta. O primeiro está relacionado aos ciclos da
economia mundial, que refletem na demanda. Por outro lado, mudanças climáticas,
como geadas e pragas, fazem reduzir a oferta, e o investimento em novos cafezais
aumenta a oferta. Porém, é importante observar que a diferença entre plantar pés de
café e colhê-los era de quatro anos, o que explica, também, as oscilações de preços.

Certamente você deve ter ficado confuso com a afirmação anterior. Veja a
explicação: quando os preços estavam altos, novos investimentos eram feitos,
porém, somente após quatro anos, ocorreria o retorno desse investimento. Então,
durante esse período, o aumento do preço pode ter sido causado por outro motivo,
como aumento da demanda, e não pelo aumento da oferta.

Quatro anos depois de o investimento ter sido feito, então, a oferta de café
aumentava. Se a oferta estivesse mais alta do que a demanda, o preço do café reduzia.
Caso contrário, se a demanda fosse mais alta do que oferta, o preço aumentava. E o
mercado do café funcionava dessa forma!

Voltando ao Gráfico 1.1, percebe-se que o primeiro ciclo vai de 1851 a 1871; o
segundo, de 1872 a 1886; e o terceiro, de 1887 a 1906. Como saber disso? Volte ao
Gráfico 1.1 e veja que, dentro de cada um dos três períodos citados acima, temos
aumento e redução do preço do café, e, no início de cada período, o aumento do
preço é muito significativo, ou seja, o preço fica bem mais alto.

1.1.2 As políticas de defesa do café

Como as economias agroexportadoras dependem da exportação das


commodities, a oscilação dos preços desses produtos acarreta diversos impactos
na economia nacional, tanto impactos positivos quanto negativos, dependendo da
situação:

a) Aumento nos preços – quando os preços estão altos há aumento da


lucratividade e parte desse lucro é reinvestido na própria plantação do café, o que
gera aumento do número de empregos (mas não de renda, pois existia uma grande
oferta de mão de obra europeia).

b) Redução nos preços – quando os preços do café estavam baixos, os


investimentos reduziam, pois os lucros eram menores, o que aumentava o
desemprego.

Para que não houvesse essa redução de preços, o governo utilizou dois
mecanismos de proteção de preços do café no mercado internacional, que foram
a desvalorização cambial e a política de valorização do café. Porém, ambos os

Economia brasileira até os anos 1970 15


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mecanismos foram eficientes no curto prazo, mas geravam efeitos negativos no


longo prazo.

Vamos entender cada um desses mecanismos e os impactos gerados por eles?

a) Desvalorização cambial – a desvalorização cambial era utilizada para proteger


o lucro do setor cafeeiro. Para facilitar o entendimento, vamos supor que o preço do
café no mercado internacional reduzisse de 15 para 10 dólares a saca. Se o câmbio
fosse de 15 mil réis por dólar, cada saca nacional passaria de 225 mil para 150 mil
réis. Agora, se o governo resolvesse fixar o câmbio em 25 mil réis (25 mil réis = 1
dólar), a saca do café valeria 250 mil réis, ou seja, mesmo com o preço da saca no
mercado internacional mais baixo, no mercado nacional o preço aumentava. Por
que o governo adotaria essa medida? Porque era uma forma de manter a renda dos
cafeicultores e manter o nível de empregos na economia.

E quais são os problemas gerados pela desvalorização cambial? São dois os


problemas: o primeiro é que a desvalorização “camuflava” a situação real do
mercado, não deixando transparecer se havia excesso de oferta e fazendo com
que os investimentos continuassem sendo feitos. Porém, essa é uma situação
impraticável em longo prazo, uma vez que, quanto mais investimento há, maior é a
oferta, e o preço seria reduzido cada dia mais.

O segundo problema é que uma desvalorização cambial fazia com que todos
os produtos importados ficassem mais caros, e a base de consumo da população
brasileira era de produtos importados. Esse fato gerava inflação e toda a população
era prejudicada. Esse prejuízo social foi chamado por Celso Furtado de socialização
das perdas já que, para proteger um grupo restrito da sociedade brasileira da época,
toda a sociedade era prejudicada.

Figura 1.1 | Celso Furtado Celso Furtado foi um dos mais importantes
e influentes intelectuais da nossa história.
Autor de dezenas de livros, ensaios
e teses, contribuiu de forma decisiva
para a interpretação das barreiras ao
desenvolvimento no Brasil e na América
Latina.
Celso Furtado se destacou como um
dos primeiros autores no pós-guerra
Fonte: <http://www.criaticidades. a tratar a realidade latino-americana a
com.br/noticias/celso-furtado-
aimportancia-do-intelectual- partir de suas especificidades sociais e
nacultura-do-pais/>. Acesso em: 17 econômicas. Ele enxergava o fenômeno do
jun. 2016.

16 Economia brasileira até os anos 1970


U1

subdesenvolvimento não como uma etapa inevitável para a constituição


das economias capitalistas, mas como um processo histórico autônomo,
espécie de deformação dessa dinâmica (BARRETO, 2009).

b) Política de valorização do café – neste instrumento, o governo comprava e


estocava parte do café, com o objetivo de reduzir a quantidade ofertada do produto e
fazer com que o preço não caísse mais. Dois eram os problemas deste instrumento:
o que fazer com o estoque e como financiar a estocagem. O segundo problema
foi resolvido pelo financiamento do setor externo. O primeiro, no entanto, é mais
delicado.

A prática da estocagem é muito comum na agricultura, a qual conhecemos


como política de preços mínimos e de estoques reguladores. Nesse contexto sabe-
se que, quando a safra é abundante, haverá muita oferta e os preços tenderão a cair
consideravelmente. Na entressafra, com pouca oferta, os preços aumentam muito
e os consumidores são afetados negativamente. Nessa situação a ideia é: estocar
parte da safra e vender o produto na entressafra; em razão disso os preços reduzem
menos na safra e aumentam menos na entressafra.

Para entender um pouco mais sobre a política de preços mínimos, acesse


o site disponível em: <http://www.faespsenar.com.br/faesp/pagina/
exibe/assuntos/politica-agricola/157-59>. Acesso em: 14 abr. 2016.

No entanto, o preço do café não oscilava entre a safra e a entressafra, razão pela
qual, então, não era possível vender o estoque do produto futuramente. Portanto,
a compra de estoques só fez aumentar ainda mais o problema, pois, quanto mais
o governo adquiria café, mais os produtores produziam, uma vez que conseguiam
manter sua renda. Ou seja, a política implementada acabou incentivando ainda mais
a produção.

1.1.3 Superprodução e a crise de 1930


Os instrumentos de proteção ao preço do café fizeram com que a produção
aumentasse ainda mais, já que, mesmo que o preço do produto no mercado
internacional estivesse reduzindo consideravelmente, os cafeicultores não estavam
sentindo essa redução e conseguiam manter sua rentabilidade. O incentivo, ainda

Economia brasileira até os anos 1970 17


U1

que sem querer, ao aumento da produção do café brasileiro agravou ainda mais as
condições do mercado internacional.

Mesmo com os mecanismos de proteção do café, o preço reduzia cada dia


mais, diferentemente da oferta, que continuava aumentando (não esqueça que o
tempo entre os investimentos feitos nos cafezais e a colheita era de quatro anos).
A situação chegou ao colapso total em 1930, quando dois elementos estavam
presentes: a grande produção brasileira de café, que fazia com que o preço do
produto reduzisse cada dia mais, e a crise da economia mundial.

O elemento “crise mundial” merece destaque neste momento. Lembra-se de


que falamos que o governo brasileiro aderiu à política de estocagem para proteção
do café e que o financiamento da compra de estoque era feito por investimentos
estrangeiros?! Agora fica a pergunta: com o mundo em crise, quem iria financiar a
compra do café para manter preços altos? Ninguém mais, razão pela qual a crise
mundial do final da década de 1920 afetou tanto a economia brasileira.

Como afirma Furtado, era totalmente impossível obter crédito no exterior para
financiar a retenção de novos estoques, pois o mercado internacional de capitais
se encontrava em profunda depressão e o crédito do governo desaparecera com a
evaporação das reservas.

Então, se nossa balança comercial e a renda nacional dependiam basicamente


de apenas um produto; para que o preço do café não reduzisse, o governo passou a
comprar parte da produção via financiamento estrangeiro, e o mundo, em crise, não
teria mais condições econômicas de manter a política de proteção ao café.

E, assim, a crise de 1930 foi um momento de término do modelo agroexportador


brasileiro. O Brasil não conseguia mais proteger o preço do café e sentiu a necessidade
de se industrializar. Nesse sentido, a industrialização virou a principal meta brasileira.

Agora que você conhece um pouco mais sobre os mecanismos


de proteção ao preço do café, reflita:
O que poderia ter acontecido se o governo brasileiro não
tivesse implementado a política de proteção ao café?

1.2 O processo de industrialização


A partir do início da década de 1930, a industrialização passou a ser a meta do
governo brasileiro (não o início da indústria brasileira), já que a crise mundial reduziu

18 Economia brasileira até os anos 1970


U1

a demanda pelo café, fez com que os preços do produto reduzissem ainda mais e
reverteu os fluxos de capital.

Atenção

A partir da década de 1930, a meta/objetivo principal do governo brasileiro


era a industrialização. Porém, antes da crise mundial já havia indústrias no
Brasil.

A maneira com que o governo do Brasil, que na era Getúlio Vargas encarou
a crise, foi chamado por Furtado como deslocamento do centro dinâmico da
economia brasileira, no qual o elemento essencial na determinação do nível de
renda deixa de ser a demanda externa, como antes da década de 1930, e passa a ser
atividades voltadas ao mercado interno, como consumo e investimento doméstico
(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). O deslocamento citado
pode ser visto no Gráfico 1.2

Gráfico 1.2 | Participação dos setores no valor adicionado (1928-1945)

Fonte: Haddad (1978 apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Analisando o Gráfico 1.2 podemos perceber que o setor industrial aumenta sua
participação na economia brasileira de, aproximadamente, 22% para 37%, enquanto
a participação da agricultura é reduzida de 52% para 48%, aproximadamente. Esses
dados confirmam que, entre 1928 e 1945, houve troca entre a agricultura e indústria
na geração de valor adicionado.

É claro que a crise mundial impactou negativamente a economia brasileira, mas


os efeitos foram menores e duraram menos tempo do que em outros países. Para
entender melhor, vamos analisar o Gráfico 1.3

Economia brasileira até os anos 1970 19


U1

Gráfico 1.3 | Evolução do produto real na década de 1930 – Brasil versus EUA

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

Analisando o Gráfico 1.3, percebe-se que o produto real de ambos os países


foi reduzido até 1931. Porém, nos anos seguintes, o produto real brasileiro voltou
a crescer, diferentemente do dos Estados Unidos, que somente em 1933 teve um
pequeno aumento. Por que isso aconteceu?

O desempenho da economia brasileira na década de 1930 pode ser explicado por


duas medidas: a manutenção da renda e o deslocamento da demanda (GREMAUD;
VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Vamos entender cada uma delas?

a) Manutenção da renda – o governo brasileiro manteve o nível de renda por meio


da política de proteção de defesa do café que vimos no item 1.1. Até a crise mundial
da década de 1930, o financiamento do estoque era feito por capital estrangeiro;
depois da crise, parte dessa política foi financiada com crédito e emissão de moeda
doméstica. Assim, o nível de emprego e renda da economia como um todo, não
apenas do setor cafeeiro, foi mantido.

b) Deslocamento da demanda – como a renda foi mantida, a demanda


continuava existindo. Porém, existiam problemas no balanço de pagamentos, já que
houve redução considerável nas exportações e na entrada de capital estrangeiro,
e a importação de produtos manufaturados era presente. Para solucionar esse
problema, o governo brasileiro tomou algumas medidas, como a moratória sobre
uma parte da dívida externa, a desvalorização a moeda nacional e a regulação dos
gastos com as divisas que entravam no país.

Uma medida que merece mais destaque é a desvalorização cambial, que


encareceu os produtos importados e fez com que os produtos nacionais se
tornassem atraentes. Assim, o que antes era importado passou a ser substituído por

20 Economia brasileira até os anos 1970


U1

mercadorias fabricadas internamente. E você saberia responder qual foi o impacto


disso na economia brasileira? A produção nacional passou a gerar rentabilidade (já
que existia demanda pelos produtos produzidos internamente) que, em função
da queda de rentabilidade do setor cafeeiro, atraía capital de outros setores e do
reinvestimento do próprio lucro no setor. Daí que vem o termo “deslocamento
da demanda”, contexto a partir do qual começou o Processo de Substituição de
Importações.

1.2.1 Processo de Substituição de Importações (PSI)


A partir da década de 1930 o setor industrial brasileiro avançou consideravelmente.
Esse avanço teve determinadas características que levaram à industrialização por
substituição de importações. Essas características são:

a) Industrialização fechada: a industrialização brasileira era voltada para dentro,


ou seja, produzia-se para consumo interno e não mais para exportação, como
durante a economia agroexportadora; dependia-se de medidas para proteger a
indústria nacional dos produtos importados.

b) Industrialização por etapas: a industrialização brasileira aconteceu a partir de


um modelo de desenvolvimento que tinha a seguinte sequência:

I. Estrangulamento externo: o valor das exportações caía e a demanda


interna continuava, sendo necessário importar. Porém, com baixa exportação, as
divisas ficavam escassas.

II. Proteção à indústria nacional: para controlar a crise, o governo tomava


medidas que acabavam protegendo a indústria nacional preexistente, aumentando
a competitividade e a rentabilidade da produção doméstica.

III. Produção interna do que antes era importado: com a proteção à indústria
nacional, os investimentos naqueles setores protegidos aumentavam e, assim, o
que antes era importado passou, então, a ser produzido internamente. Com isso,
houve aumento da renda nacional e da demanda agregada, já que empregos eram
gerados.

IV. Novo estrangulamento: com a demanda maior, houve aumento das


importações em setores nos quais não havia produção interna e parte do investimento
se transformou em matérias-primas e equipamentos importados. Como a demanda
por importação aumentava mais rápido do que o crescimento das exportações,
novos pontos de estrangulamento apareciam e o processo iniciava novamente em
outro setor.

O processo acima pode ser apresentado na Figura 1.2

Economia brasileira até os anos 1970 21


U1

Figura 1.2 | Ciclo do processo de substituição de importações

Extrangulamento
externo

Aumento das Políticas


importações de restritivas às
matérias-primas exportações

Aumento da Capital nacional


renda nacional e mira para outros
de demanda setores

Fonte: A autora.

Analisando a Figura 1.2 podemos perceber que o motor dinâmico, ou melhor,


o elemento principal do Processo de Substituição de Importações (PSI); era o
estrangulamento externo, e o PSI foi feito por etapas/ciclos, pois o fim de um ciclo
gera demanda por outros bens e assim sucessivamente.

Atenção

Estrangulamento era o elemento principal do PSI.

Podemos imaginar duas formas de industrializar um país:

1) Construir todos os setores industriais ao mesmo tempo de forma a equilibrar os


setores, embora nenhum atenda, inicialmente, totalmente à demanda interna, que
continua sendo atendida pelas importações.

2) Construir um setor de cada vez, nesta sequência: o primeiro ciclo concentrou-


se na produção de bens não duráveis, como roupas e alimentos; depois contemplou
a produção de bens duráveis, como eletrodoméstico e automóvel; na terceira
rodada o foco foi a produção de bens intermediários, como cimento e aço. E, por
último, a produção interna seria de bens de capital, como máquinas e equipamentos,
conforme Figura 1.3

22 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Figura 1.3 | Industrialização por etapas

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

O caso brasileiro se aproxima mais da segunda forma, embora não tenha sido
exatamente um setor depois do outro o que aconteceu na industrialização brasileira.
A ideia do processo de substituição de importações foi caracterizada, segundo
Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), pela “construção nacional”, ou
seja, fazer com que o país alcançasse o desenvolvimento e a autonomia através
da industrialização, para, assim, superar as restrições externas e a tendência à
especialização de produtos primários para exportação.

Agora que você conhece as etapas do PSI, reflita:


Será que o Brasil chegou ao final do processo, ou seja, hoje,
produzindo tudo aquilo de que necessitamos ou ainda
precisamos importar bens fundamentais? Cite um exemplo.

1.2.2 Mecanismos de proteção à indústria nacional durante o PSI

Como discutimos, quando a economia brasileira entrava em crise cambial, o


governo adotava medidas que reduziam as importações e protegiam a indústria
nacional, proporcionando, assim, o desenvolvimento industrial. Essas medidas são
apontadas por Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011) como:

a) Desvalorização real do câmbio: desvalorizava-se fortemente o câmbio, acima


do aumento de preços no mercado interno, método com o qual os produtos
importados ficavam muito caros se comparados aos produtos nacionais, protegendo-
se, assim, a indústria nacional. A desvantagem era a de que os produtos necessários

Economia brasileira até os anos 1970 23


U1

à produção interna, como matérias-primas e equipamentos, ficavam mais caros


também, dificultando o investimento. Foi utilizada pelo governo Getúlio Vargas.

b) Controle de câmbio: era estabelecida licença para importação, controlando-


se, assim, o acesso dos demandantes de divisas à moeda estrangeira. Como poucas
licenças eram concedidas e reduziam-se as importações, a desvantagem era a de
que se criavam um mercado paralelo de câmbio e um aumento da corrupção para
obtenção das licenças, além de não gerar estímulos às exportações, já que não se
alterava o valor do câmbio. Foi utilizada pelo governo Dutra.

c) Taxas múltiplas de câmbio: esta medida estabelecia vários mercados cambiais


como, por exemplo, câmbio livre, câmbio flutuante, destinando-se cada tipo de
câmbio a um mercado específico. Dessa forma, o câmbio foi desvalorizado em
mercados nos quais o objetivo era proteger a indústria nacional e valorizado em
mercados em que o objetivo era importação de matérias-primas. Foi utilizada no
segundo governo Getúlio Vargas.

d) Elevação das tarifas aduaneiras: as tarifas nas importações eram alteradas


conforme o objetivo. Para proteger alguns setores, elevam-se as tarifas; para
incentivar a importação, reduz-se a tarifa aduaneira. Foi utilizada durante o governo
Juscelino Kubitschek.

1.2.3 Dificuldades na implementação do PSI


O Processo de Substituição de Importações durou três décadas, de 1930 a 1960,
e foi modificando as características da economia brasileira. No entanto, não foi
uma tarefa simples, tendo havido inúmeras dificuldades, dentre as quais, segundo
Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), as principais foram:

a) Tendência ao desequilíbrio externo: política cambial, indústria nacional sem


competitividade e elevada demanda por importações fizeram com que houvesse
desequilíbrio externo.

b) Aumento da participação do Estado: o Estado teve que adequar o arcabouço


institucional à indústria, como a implantação da legislação trabalhista; gerou
infraestrutura, principalmente nas áreas de transporte e energia; forneceu insumos
básicos; captou e distribuiu a poupança.

c) Aumento do grau de concentração de renda: durante o PSI houve aumento


na concentração de renda, em razão do êxodo rural, já que a agricultura não foi
incentivada e o caráter intensivo do investimento industrial não permitia grande
geração de empregos nas cidades.

d) Escassez de fontes de financiamento: dificuldade de financiamento dos


investimentos, pois era necessário um grande volume de poupança para viabilizar

24 Economia brasileira até os anos 1970


U1

os investimentos. Esta dificuldade ocorreu em virtude da quase inexistência de um


sistema financeiro e da ausência de uma reforma tributária ampla.

1.2.4 Papel da agricultura na industrialização brasileira


Apesar de não ser mais o foco da economia brasileira, a agricultura exerceu papel
fundamental no processo de industrialização, como:

a) Liberação de mão de obra: transferência de mão de obra do campo para as


indústrias.

b) Fornecimento de alimentos e matérias-primas: a medida que as cidades vão


se desenvolvendo, a agricultura passa a fornecer alimentos e matérias-primas para
as indústrias.

c) Transferência de capital: transferência de capital do campo para a indústria.

d) Geração de divisas: a agricultura exporta os produtos primários e transfere


divisas para que a indústria importe máquinas e equipamento.

e) Mercado consumidor: a agricultura demanda produtos industriais.

1.3 O Plano de metas (1956-1960)


O Plano de Metas foi adotado no governo Juscelino Kubitschek e é considerado
o auge do período de industrialização brasileira, uma vez que o rápido crescimento
do produto e da industrialização à época amenizou os problemas já mencionados.
No entanto, é importante observar que a lógica do Plano de Metas foi mais
profunda do que o processo de substituição de importações, já que esse plano
tinha como objetivo construir uma estrutura industrial e não somente responder aos
estrangulamentos externos gerados.

Atenção

O objetivo do Plano de Metas era estabelecer as bases de uma economia


industrial, principalmente o setor de bens de consumo duráveis, como o
setor automobilístico.

Economia brasileira até os anos 1970 25


U1

Figura 1.4 | Presidente Juscelino Kubitschek

Fonte: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/biografias/juscelino_kubitschek>. Acesso em: 21 fev. 2016.

Para saber mais sobre o ex-presidente Juscelino Kubitschek acesse o


link: <https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/biografias/juscelino_
kubitschek>. Acesso em: 21 fev. 2016.

Segundo Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), a racionalidade do plano


tinha como base os estudos do grupo BNDE / Cepal, que identifica a existência de
uma demanda reprimida por bens de consumo duráveis. Eles conseguiam enxergar
nesse setor uma importante fonte de crescimento pelos efeitos interindustriais
que gerava sobre a demanda por bens intermediários e por meio da geração de
empregos, além de estimular o desenvolvimento de novos setores, principalmente
os fornecedores de matéria-prima para as indústrias de bens de consumo duráveis.

Por exemplo, pela lógica do modelo, ao incentivar o desenvolvimento do setor


automobilístico, o setor de autopeças também iria se desenvolver. Com isso, novos
empregos seriam gerados.

O plano pode ser dividido em três principais pontos:

a) Investimentos estatais em infraestrutura: investimento nos setores de


transporte, principalmente rodovias (já que o objetivo era desenvolver o setor
automobilístico) e energia elétrica.

b) Estímulo ao aumento da produção de bens intermediários: principalmente


aço, carvão, cimento e zinco.

c) Incentivo à introdução dos setores de consumo duráveis e de capital.

Para atingir as metas, alguns instrumentos foram utilizados. Os principais foram


os investimentos feitos pelas empresas estatais, o crédito com juros baixos e a longa
carência dada pelo Banco do Brasil e pelo BNDE, a política de reserva de mercado e
a concessão de empréstimos externos.

Para atrair as empresas multinacionais, o governo brasileiro incentivou o capital

26 Economia brasileira até os anos 1970


U1

estrangeiro através da permissão do investimento estrangeiro sem cobertura cambial


e isenções fiscais e garantias de mercado.

Nesse sentido, ao ofertar infraestrutura, o plano atacava os pontos de


estrangulamento e evitava os novos pontos, além de alguns setores serem tomados
como pontos de germinação, referentes ao investimento que gerava novas
demandas que, por sua vez, geravam novos investimentos, razão pela qual o Brasil
cresceria. A construção de Brasília e a transferência da capital para a nova cidade são
um exemplo de ponto de germinação.

Atenção

Cuidado para não confundir os conceitos de pontos de estrangulamento


e de pontos de germinação. O primeiro refere-se à demanda não satisfeita;
o segundo, às áreas que geram demanda derivada.

Para saber mais sobre a construção de Brasília e o motivo da sua escolha


para ser a nova capital, acesse o link disponível em: <http://www.
infoescola.com/historia-do-brasil/construcao-de-brasilia/>. Acesso em:
20 fev. 2016.

As metas estabelecidas foram, na maioria, atingidas, razão pela qual houve um


rápido crescimento econômico e mudanças estruturais significativas. A evolução do
crescimento dos setores econômicos pode ser vista na Tabela 1.1.
Tabela 1.1 | Taxas de crescimento do produto nos setores econômicos entre 1955 e 1961

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011)

Economia brasileira até os anos 1970 27


U1

Conforme se pode perceber na Tabela 1.1, a agricultura foi o setor econômico


que teve pior desempenho durante o governo Juscelino Kubistchek, chegando, em
1956, a decrescer; por outro lado, o setor industrial cresceu consideravelmente. Esses
fatos estão de acordo com as metas do plano, segundo o qual era a industrialização
a prioridade.

Para ilustrar as mudanças trazidas pelo Plano de Metas, vamos analisar a taxa de
crescimento da produção industrial de alguns setores específicos entre 1955 e 1962.

Quadro 1.2 | Taxa de crescimento da produção industrial – 1955 a 1962


Setores industriais específicos Taxa de crescimento – 1955 a 1962
Materiais de transporte +711%
Materiais elétricos e de comunicações +417%
Alimentos +54%
Têxtil +34%
Bebidas +15%
Fonte: A autora.

Analisando o Quadro 1.2 é possível perceber claramente a mudança do foco da


produção industrial brasileira, que antes era de bens de consumo não duráveis e no
governo JK passou a ser o setor de bens de consumo duráveis.

Até aqui discutimos apenas os pontos positivos do Plano de Metas. No entanto,


este não foi um plano somente com impactos positivos na economia brasileira. Os
problemas consistiam na questão do financiamento, pois, com tantos investimentos
públicos, sem reforma fiscal (não foram feitas mudanças na estrutura tributária
brasileira), os gastos do governo aumentaram muito e, para financiar as metas,
optou-se pela emissão de moeda. E, como você já sabe, ao emitir moeda, mais
ela circula, o que, consequentemente, dá a falsa impressão do aumento do poder
aquisitivo, faz os preços subirem e gera inflação. Além do aumento considerável da
inflação, podemos citar como problemas gerados pelo Plano de Metas:

a) Deterioração do saldo em transações correntes.

b) Crescimento da dívida externa.

c) Aumento da concentração de renda.

28 Economia brasileira até os anos 1970


U1

1. Explique, com suas palavras, o término do modelo


agroexportador.

2. Discuta as principais medidas no governo JK.

Economia brasileira até os anos 1970 29


U1

30 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Seção 2

A crise dos anos 60, PAEG e as reformas e o


milagre econômico
Na década de 1960, inúmeras mudanças, políticas e econômicas, ocorreram e
impactaram a sociedade brasileira. Em termos políticos, o sistema brasileiro passou
de um sistema democrático para o regime militar. Em termos econômicos, a década
de 1960 inicia-se com uma crise, mas, depois, mudanças institucionais acontecem e
recuperam a economia.

2.1 A crise dos anos 1960


O governo Juscelino Kubistchek termina em 1961 e já em 1963 acontece uma
grande crise econômica brasileira, a primeira na fase industrial. O cenário econômico
brasileiro era o seguinte: queda significativa nos investimentos e na renda e altas
taxas de inflação (mais de 90% ao ano em 1964) herdada do governo anterior (JK).
Essa situação pode ser vista na Tabela 1.2.

Tabela 1.2 | Situação econômica do Brasil entre 1961 e 1965

Fonte: A autora, com base em Abreu (1990).

Como podemos ver, o PIB brasileiro aumentou pouco no período, chegando a


crescer menos de 1% em 1963, assim como a produção industrial, que decresceu
em 1963 e 1965. Por outro lado, a taxa de inflação quase dobrou de 1961 a 1965.
A crise mostrada na Tabela 1.2 é explicada por Gremaud, Vasconcellos e Toneto
Júnior (2011) em quatro grandes grupos, sendo os dois primeiros (a e b) de caráter
político e os dois últimos (c e d) de caráter estrutural.

Economia brasileira até os anos 1970 31


U1

a) Instabilidade política: o presidente eleito em 1961, Jânio Quadros, era de


um partido, e o vice eleito, João Goulart (na época presidente e vice eram eleitos
separadamente), era de uma coligação rival. Após 8 meses de mandato, Jânio
renuncia ao cargo e seu vice teve dificuldade em assumir a presidência, tendo
conseguido fazê-lo apenas depois de um período no exterior e da mudança da
forma política presidencialista para a parlamentarista. Após conturbado mandato, é
instituído o Golpe Militar em 1964. O impacto dessa instabilidade política era a não
manutenção de uma política econômica consistente.

Para conhecer mais sobre os sistemas políticos, acesse o link disponível


em: <http://www.escoladegoverno.org.br/index.php/biblioteca/162-
regimes-politicos>. Acesso em: 20 fev. 2016.

b) Crise do populismo: desde 1030 o Brasil era governado por presidentes


considerados populistas. Quando chegou o início da década de 1960, as medidas
populistas foram postas em dúvida pelas elites brasileiras.

Populismo é basicamente um “modo” de exercer o poder. Ou seja, dá-se


importância ao povo, às classes menos favorecidas, cuida-se delas e, assim,
conquista-se sua confiança, o que permite que se exerça um autoritarismo
consentido, uma dominação que não é percebida por quem é dominado.
ARAUJO, Francisca Socorro. Populismo. Infoescola, 2016. Disponível em:
<http://www.infoescola.com/politica/populismo/>. Acesso em: 24 fev. 2016.

Reflita sobre os pontos positivos e negativos do chamado


populismo.

c) Política econômica recessiva de combate à inflação: como vimos, o governo


JK deixou altas taxas de inflação. Então, até 1967, foi adotada uma política econômica
regressiva para combater a inflação. Dentre as medidas restritivas, podemos citar o

32 Economia brasileira até os anos 1970


U1

controle dos gastos públicos, a redução do crédito e o combate ao excesso da política


monetária. Além disso, diversos problemas climáticos ocorreram, prejudicando o
setor agrícola e a geração de energia elétrica.

d) Crise do PSI, crise cíclica e inadequação institucional: redução do


crescimento econômico que se deve ao esgotamento do processo de substituição
de importações; ou a redução dos investimentos em bens de capital em razão do
excesso de capacidade gerada pela dinâmica do plano de metas; ou, ainda, falta de
reforma institucional para proporcionar um quadro favorável de investimentos.

2.2 Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) e as reformas


Com objetivo de superar a crise econômica, o governo Castelo Branco lançou o
Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG). Esse plano foi dividido em duas linhas
de atuação: políticas conjunturais de combate à inflação e reformas estruturais, e
tinha como objetivos: acelerar o ritmo de desenvolvimento econômico, conter a
inflação, amenizar os desequilíbrios setoriais e regionais, aumentar o investimento
e o emprego e corrigir a tendência ao desequilíbrio externo. Desses objetivos, o
combate à inflação era considerado o principal do plano. Para isso, eram necessárias
reformas institucionais. Daí que surgem as duas linhas de atuação do PAEG.

2.2.1 Medidas de combate à inflação

Como o principal objetivo do PAEG era o combate à inflação, que chegou a


83,2% no ano de 1963, primeiramente precisamos compreender o tipo de inflação
da época. A inflação foi diagnosticada como de demanda. Ou seja, os preços subiam
em razão do excesso de demanda, o qual, como explicavam os militares, ocorreu em
virtude das medidas populistas dos governos anteriores, principalmente em termos
de política salarial, da tendência do déficit público e da expansão do crédito. Para
combater o excesso de demanda e consequentemente solucionar os problemas
que causavam a inflação, o PAEG definiu algumas metas. Vamos entender cada uma
delas?

I. Déficit público: para reduzir o déficit público, houve redução dos gastos e
ampliação das receitas. Para isso, foi feita uma reforma tributária e aumento das
tarifas públicas. O impacto dessa medida foi redução do déficit de 4,2% do PIB em
1963 para 1,1% em 1966.

II. Expansão do crédito: para restringir o crédito, os juros reais da economia e o


passivo das empresas aumentaram. Com isso, diversas empresas faliram e houve
uma onda de fusões e aquisições. As pequenas e médias empresas dos setores
de vestuários, alimentos e construção civil foram as que mais sofreram com essas
medidas.

Economia brasileira até os anos 1970 33


U1

III. Política salarial: a taxa de desemprego foi considerada baixa e, para conter o
salário alto (desemprego baixo, salário alto e vice e versa), foi lançada a Circular 10
de 1965, na qual eram decididos os reajustes de salários. A consequência foi redução
do salário real.

O impacto das medidas citadas acima foi a redução da taxa de inflação de 91,8%
em 1964 para 22% em 1968; no entanto, o crescimento econômico retraiu no
mesmo período.

2.2.2 As reformas do PAEG


Para fazer com que o país voltasse a crescer e aprender a conviver com taxa
de inflação moderada (para o governo militar, a inflação é um mal inevitável para
o desenvolvimento econômico e deve-se aprender a conviver com ela), algumas
reformas foram feitas:

a) Reforma tributária: os principais elementos da reforma tributária foram: a


introdução da correção monetária; transformação dos impostos tipo cascata em
imposto tipo valor adicionado; criação de novos impostos, como IPI, ICM e ISS;
redistribuição do espaço tributário entre as três esferas (federal, estadual e municipal)
do governo; criação de fundos de transferência intergovernamental; e centralização
das decisões tributárias no governo federal.

Como consequências da reforma tributária, podemos citar o aumento da


arrecadação e a centralização da arrecadação e das decisões tributárias na união.

b) Reforma monetária – financeira: o objetivo desta reforma era criar condições


para que a política monetária fosse conduzida independentemente. Para isso, quatro
grupos de medidas foram tomados:

I. Instituição da correção monetária e criação das Obrigações Reajustáveis do


Tesouro nacional (ORTN); assim, as taxas de juros reais positivas estimulavam a
poupança e ampliavam a capacidade de financiamento da economia, tendo sido
desenvolvido o mercado de títulos.

II. Criação do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central (Bacen) –


o CMN passou a ser o órgão normativo da política monetária; e o Bacen, o executor
da política monetária e o agente fiscalizador do sistema financeiro.

III. Criação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e do Banco Nacional da


Habitação (BNH).

IV. Reforma do mercado de capitais – definiu as regras de atuação dos agentes


financeiros, tendo como base o quadro institucional americano. Assim, os bancos
comerciais deveriam operar no crédito de curto prazo; as financeiras eram as

34 Economia brasileira até os anos 1970


U1

agentes de crédito ao consumidor; os bancos de investimentos foram criados na


reforma, ofereceriam crédito de médio e longo prazos e incentivariam as operações
do mercado de capitais; regulação e subordinação ao Bacen da bolsa de valores,
corretoras e distribuidoras.

c) Reforma da política externa: tinha como objetivo estimular o desenvolvimento


econômico, evitando pressões sobre o balanço de pagamentos e, assim, eliminar as
distorções criadas pelo Processo de Substituição de Importações (PSI). Para atingir
esse objetivo, foram definidas duas linhas de atuação: melhorar o comércio externo,
mediante estimulação e diversificação das exportações via incentivos fiscais, e atrair
capital estrangeiro.

2.3 O milagre econômico


Após as reformas institucionais do PAEG, que alteraram todo o quadro institucional
brasileiro, o período compreendido entre 1968 a 1973 foi marcado pelas maiores
taxas de crescimento do produto nacional em conjunto com relativa estabilidade
de preços. Esse período ficou conhecido como milagre econômico, quando a taxa
média de crescimento foi acima de 10% ao ano e com taxa de inflação entre 15% e
20% ao ano, conforme Tabela 1.3.

Tabela 1.3 | Taxas de crescimento (%) entre 1968 e 1973

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011)

Como podemos ver, o PIB cresceu de 9,8% em 1968 para 14% em 1973, e o
principal responsável pelo crescimento foi o setor industrial, isso porque as reformas
institucionais que foram feitas pelo PAEG e a recessão econômica do período anterior
geraram capacidade ociosa no setor industrial e as condições necessárias para a
retomada da demanda. Além disso, a economia mundial cresceu consideravelmente.

Ao final do PAEG e início do milagre econômico, o diagnóstico da inflação mudou,


antes era o excesso de demanda considerado a variável responsável pelas altas taxas
de inflação. Naquele momento, no entanto, os custos é que foram definidos como
o principal determinante. Com a alteração da causa da inflação, as políticas de

Economia brasileira até os anos 1970 35


U1

contenção da demanda (monetária, creditícia e fiscal) foram ficando mais frouxas.


Somente a política salarial continuou restritiva, pois era considerada um elemento do
custo. Em 1968 foi criado o Conselho Interministerial de Preços (CIP) para controlar
o aumento de preços.

A retomada do crescimento econômico, por sua vez, deveria ser feita via
investimentos em setores diversificados, com menor participação do Estado. Assim,
os principais resultados do período foram:

I. Retomada do investimento público em infraestrutura, já que o setor público se


recuperou após a reforma fiscal.

II. Aumento do investimento das empresas estatais, como Petrobrás e Vale do Rio
Doce (atual Vale), e criação de 231 novas empresas públicas.

Para conhecer as maiores empresas estatais no Brasil atualmente, acesse


o link disponível em: <http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/as-
50-maiores-estatais-do-brasil>. Acesso em: 23 fev. 2014.

III. Aumento da demanda por bens duráveis.

IV. Com a expansão do crédito imobiliário, houve crescimento do setor de


construção civil.

V. Com o crescimento do comércio mundial e da melhora nos termos de troca,


houve aumento das exportações.

VI. Os setores de bens de consumo leve e a agricultura apresentaram desempenhos


modestos.

VII. Aumento médio de 18,1% ao ano no setor de bens de capital.

VIII. Aumento médio de 13,5% ao ano no setor de bens intermediários.

IX. Elevada participação do Estado nos preços da economia, como salários,


câmbio, juros e tarifas, e nas decisões de investimentos.

XI. Aumento, significativo, na concentração de renda. A política do governo militar


ficou conhecida como “teoria do bolo”, segundo a qual era defendido que, primeiro,
o país deveria crescer e, somente depois, os benefícios seriam repartidos, assim
como um bolo, que primeiro cresce e cujos pedaços são depois cortados por nós.

36 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Relacionando as reformas institucionais feitas pelo PAEG e o


período do milagre econômico, podemos afirmar que a retomada
do crescimento econômico no início da década de 1970 foi em
função das reformas e recessão do período anterior?

1. Para fazer com que o Brasil voltasse a crescer, foi elaborado


pelo governo Castelo Branco o Plano de Ação Econômica do
Governo (PAEG), que tinha como objetivos: acelerar o ritmo de
desenvolvimento econômico, conter a inflação, amenizar os
desequilíbrios setoriais, e regionais, aumentar o investimento e
o emprego, e corrigir a tendência ao desequilíbrio externo. Cite
as duas linhas de atuação do PAEG.

2. Entre 1968 e 1973, a economia brasileira teve desempenho


magnífico, o que pode ser relacionado a fatores internos e
externos. Com base no que discutimos na Seção 2, discorra
sobre as características do período conhecido como milagre
econômico.

Economia brasileira até os anos 1970 37


U1

38 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Seção 3

Crescimento com endividamento


A década de 1970 se inicia, então, com o milagre econômico. Apesar disso, ela
não foi uma década, economicamente falando, estável. Logo no início, em 1973,
aconteceu o choque do petróleo, em razão do qual os preços do barril subiram
muito, tendo sido, também, rompido o acordo mundial que procurava estabilizar as
taxas de câmbio internacionais. O mundo, é claro, reagiu a esses acontecimentos.
Nesta seção veremos como o Brasil se portou diante desse quadro. Além disso, outros
acontecimentos marcaram o período. Vamos lá?

3.1 II Plano Nacional de Desenvolvimento


Começamos a década de 1970 com o rápido crescimento da economia
brasileira, o que acabou gerando alguns desequilíbrios que impactaram na inflação e
na balança comercial. Para você ter uma ideia, ao final do milagre econômico a taxa
de inflação era de 15% ao ano; em meados da mesma década, a inflação subiu para
40% ao ano e em 1979 já estava em 77,2% ao ano.

Para piorar a situação, em 1973 os países membros da Organização dos Países


Exportadores de Petróleo (OPEP) quadriplicaram o preço do barril do petróleo,
desencadeando assim o chamado primeiro choque do petróleo. Sendo o petróleo
um insumo fundamental, o mundo entrou em crise.

Com o aumento nos preços no barril de petróleo, o saldo de transação em conta


corrente do balanço de pagamentos brasileiro apresentou déficits, uma vez que o
valor das importações aumentou em razão do preço do petróleo e também em
virtude dos bens de capital e insumos básicos necessários para manter a produção
que foi iniciada durante o milagre econômico. Para pagar este déficit, foi necessário
utilizar as reservas.

Economia brasileira até os anos 1970 39


U1

A OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), fundada em


1960, é, como diz o nome, uma organização internacional composta
pelos países produtores de petróleo. A organização tem como objetivos
principais: estabelecer uma política petrolífera comum aos países
membros; definir estratégias de produção; controlar preços do petróleo
e controlar a quantidade produzida.

A crise do petróleo teve início quando se descobriu, na década de 1970,


que o recurso natural não é renovável. Em decorrência disso, ou utilizando
o fato como pretexto, o preço do petróleo sofreu muitas variações a
partir de tal década, marcando efetivamente cinco momentos de crise
do produto. Disponível em: <http://www.infoescola.com/economia/
crise-do-petroleo/>. Acesso em: 24 fev. 2016.

Dada a situação apresentada acima, em 1974 começou a se discutir o que fazer


para solucionar os problemas conjunturais. A discussão se situou na dicotomia entre
ajustamento ou financiamento. Vamos ver o que significa cada um dos termos?

a) Ajustamento: conter a demanda interna e evitar que o choque externo impactasse


em altas taxas de inflação permanentes e corrigir, assim, o desequilíbrio externo.

b) Financiamento: manter crescimento elevado e fazer um ajuste gradual dos


preços relativos. Neste caso, partir-se-ia do princípio de que a crise seria pequena e
rápida.

Após analisar as opções, o então ministro Mário Henrique Simonense sinalizou a


opção pelo ajustamento, controlando a demanda via controle da liquidez. Porém,
como se instaurou uma crise financeira internacional e houve aumento da assistência à
liquidez, a opção pelo ajustamento não pode ser levada adiante. Além disso, o aumento
da insatisfação ao Regime Militar fez com que o governo desistisse de conter a demanda
e resolvesse, em 1974, lançar o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).

O II PND foi uma estratégia de financiamento com ajustes na estrutura de oferta


de longo prazo. Em outras palavras, a estrutura produtiva brasileira seria alterada para,
no longo prazo, reduzir a necessidade de importações e aumentar as exportações.
Porém, até isso ser alcançado, seria necessário financiar o desequilíbrio externo.

40 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Nesse sentido, o objetivo do II PND era manter o crescimento econômico por


volta de 10% ao ano e o crescimento industrial por volta de 12% ao ano. Vamos ver se
de fato o objetivo foi atendido? Analise a Tabela 1.4.

Tabela 1.4 | Taxas de crescimento entre 1974 e 1979

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

Como podemos ver na Tabela 1.4, o objetivo do governo ao lançar o II PND não foi
atingido. De fato, no período analisado, houve aumento do crescimento econômico,
mas a níveis mais baixos do que nos anos anteriores.

Apesar de não ter alcançado, em termos de crescimento econômico, o resultado


esperado, o II PND transformou totalmente as prioridades da industrialização brasileira
do período anterior, de um padrão baseado no crescimento do setor de bens de
consumo duráveis com alta concentração de renda para o de crescimento baseado
no setor produtor de meios de produção (bens de capital e insumos básicos). Segundo
Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), esperava-se também:

• Reduzir as importações no setor de bens de capital de 52% para 40%.

• Gerar excedente exportável de US$200 milhões.

• Aumentar a produção de aço de 7 milhões de toneladas para 18 milhões de


toneladas.

• Triplicar a produção de alumínio.

• Aumentar a produção de zinco de 15 mil toneladas para 100 mil.

• Ampliação na produção de minério de ferro – Projeto Carajás.

• Aumentar a capacidade hidroelétrica – Projeto Itaipu.

• Incentivar as ferrovias e hidrovias.

O II PND tinha a seguinte lógica: se as empresas estatais investissem e dessem


incentivos ao setor de insumos, a demanda gerada estimularia o setor privado a investir
no setor de bens de capital.

Economia brasileira até os anos 1970 41


U1

Entretanto, dois problemas surgiram para executar o plano: apoio político e


financiamento do processo. Para o primeiro problema, a solução foi modernizar as
regiões não industrializadas, como, por exemplo, a construção da siderúrgica em
Itaqui na Bahia. O financiamento, por sua vez, foi feito por empréstimos estrangeiros
(o crédito estava fácil em função dos petrodólares), o que aumentou ainda mais a
dívida externa.

Atenção

Petrodólares representa uma transação comercial entre um país que


compra petróleo com dólares e outro que vende o petróleo e recebe em dólar.

A situação da economia brasileira no início da década de 1980 era:

a) Economia brasileira vulnerável às condições externas, em razão do segundo


choque do petróleo em 1979 e da reversão nas condições de financiamento
internacional.

b) Deterioração da situação fiscal do Estado, com a redução na carga tributária


bruta; aumento das transferências, como de juros sobre a dívida; déficit das estatais;
déficit no orçamento monetário.

c) Pressões inflacionárias em função do desequilíbrio externo, choques de oferta e


déficits públicos.

d) Mudança de governo (de Geisel para Figueiredo).

Durante o regime militar, o Brasil teve cinco presidentes e uma Junta


Governativa Provisória, que foram:
• Castelo Branco (15/04/1964 a 15/03/1967).
• Arthur da Costa e Silva (15/3/1967 a 31/8/1969).
• Junta Governativa Provisória (31/08/1969 a 30/10/1969).
•Emílio Garrastazu Médici (30/10/1969 a 15/3/1974).
•Ernesto Geisel (15/03/1974 a 15/03/1979).
•João Baptista Figueiredo (15/03/1979 a 15/03/1985).

Com o novo presidente, Figueiredo, a inflação voltou a ser considerada de


demanda, e o ministro Delfim Netto implementou algumas medidas para combater a
inflação e retomar o crescimento econômico. As principais foram:

42 Economia brasileira até os anos 1970


U1

I. Controle sobre a taxa de juros.

II. Expansão do crédito para a agricultura.

III. Eliminação de alguns incentivos fiscais às exportações.

IV. Estímulo à capitação externa.

V. Maxidesvalorização de 30% do cruzeiro em dezembro de 1979.

Com as medidas, o principal resultado obtido em 1980 foi a aceleração inflacionária


para os 100% ao ano.

1. Explique, com suas palavras, o II Plano Nacional de


Desenvolvimento.

2. Explique o impacto do “petrodólar” na economia brasileira.

Nesta unidade você aprendeu que:


• O modelo econômico brasileiro até 1930 era o chamado
agroexportador.
• Com a crise mundial de 1929, o café perdeu mercado
consumidor e seu preço foi reduzido consideravelmente.
• Após a crise, o Brasil sentiu necessidade de se industrializar.
• O Processo de Substituição de Importações (PSI) durou de 1930
a 1960 e tinha como objetivo substituir os produtos importados
pela produção interna.
• Na década de 1950, durante o governo JK, crescemos 50 anos
em 5, e o Brasil passou por mudanças em sua infraestrutura,
embora tenha aumentado a dívida.
• Com a crise econômica e política no início da década de 1960,

Economia brasileira até os anos 1970 43


U1

o Brasil sofreu um golpe militar.


• O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) foi implementado
pelo primeiro presidente militar, Castelo Branco, para superar
a crise econômica instaurada, mas o objetivo não foi atingindo
totalmente.
• As reformas institucionais feitas durante o PAEG foram fundamentais
para que o país tivesse as maiores taxas de crescimento econômico
do período industrial.
• Após o milagre econômico, a economia brasileira passou por
inúmeras dificuldades, que foram agravadas pelos choques do
petróleo na década de 1970.
• Aumentou a dívida externa brasileira entre as décadas de 1950 e
final de 1970.

Finalizamos a primeira unidade do livro Economia Brasileira


Contemporânea. Agora você conhece como e por que se
iniciou a industrialização brasileira e o impacto desse período na
economia brasileira. Reflita sobre as vantagens e desvantagens
do processo de industrialização para a população e a maneira
como ainda hoje sofremos os impactos desse período.

1. Qual foi a característica da economia brasileira até 1930?


Cite as dificuldades desse tipo de modelo e o porquê de ele
ter sido superado.

2. Podemos afirmar que a atividade cafeeira favoreceu o


desenvolvimento do parque industrial brasileiro? Justifique
sua resposta.

44 Economia brasileira até os anos 1970


U1

3. Discuta o papel do Estado no Processo de Substituição de


importações.

4. Sabendo que a inflação pode ser causada por excesso de


demanda, pelo aumento dos custos ou pode ser inercial.
Compare o diagnóstico da inflação do PAEG e do início do
milagre econômico e diferencie as medidas tomadas para
cada tipo de inflação nos períodos solicitados.

5. Discorra sobre os problemas enfrentados pela economia


brasileira após o período do milagre econômico.

Economia brasileira até os anos 1970 45


U1

46 Economia brasileira até os anos 1970


U1

Referências

ABREU, M. P. (Org.). A ordem do progresso: cem anos de política econômica


republicana-1989 -1989. Rio de Janeiro: Campus, 1990.
BARRETO, Pedro. Crescimento com distribuição de renda e justiça social. Ano 6,
vol. 53. Brasília: IPEA, 2009. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.
php?option=com_content&view=article&id=2275:catid=28&Itemid=23. Acesso em
11 maio 2016.
GREMAUD, A. P.; VASCONCELLO, M. A. S.; TONETO JÚNIOR, R. Economia brasileira
contemporânea. São Paulo: Atlas, 2011.
SOUZA, J. M. de. Economia brasileira. São Paulo: Pearson, 2009.

Economia brasileira até os anos 1970 47


Unidade 2

A DÉCADA PERDIDA

Andréia Moreira da Fonseca Boechat

Objetivos de aprendizagem:

Nesta unidade você será levado a compreender a crise econômica dos


anos 1980 e os planos econômicos que tinham como objetivo principal a
estabilização econômica.

Seção 1 | Crise Internacional, restrição externa e descontrole


inflacionário
Nesta seção estudaremos os principais problemas econômicos que
ocorreram na década de 1980 e que a caracterizaram como a década
perdida.

Seção 2 | As tentativas de estabilização I: o debate


macroeconômico entre os ajustes ortodoxo e heterodoxo
Nesta seção debateremos os ajustes ortodoxos e heterodoxos para
o combate à inflação, assim como as características de cada um deles.

Seção 3 | As tentativas de estabilização II: Os planos cruzado,


Bresser e verão
Nesta seção discutiremos os planos de estabilização econômicos da
segunda metade da década de 1980, denominados Cruzado, Bresser e
Verão, e o impacto sobre a economia brasileira.
U2

Seção 4 | O plano Collor e as reformas estruturais


Nesta seção conheceremos o Plano Collor, as reformas estruturais
que ocorreram no início da década de 1990 e o impacto sobre a taxa de
inflação e a sociedade brasileira.

Seção 5 | Anos 1990: quais desafios a superar?


Nesta seção estudaremos os desdobramentos dos anos 1990 que
culminaram culminaram na criação e a implementação do Plano Real,
e os motivos que fizeram com que esse fosse o único plano a estabilizar
os preços.

50 A década perdida
U2

Introdução à unidade

Seja bem-vindo(a) à segunda unidade do livro Economia Brasileira


Contemporânea. Conforme discutimos na Unidade 1, nos últimos cinquenta anos
(não esqueça que neste momento dos estudos estamos no início da década de
1980) a economia brasileira passou por diversas fases, desde o término do modelo
agroexportador e, consequentemente, o início do processo de industrialização do
país, até por momentos de instabilidade política (golpe militar) e econômica, em
que tivemos períodos com altas taxas de crescimento econômico e outros com
altas taxas de inflação e baixo crescimento do Produto Interno Bruno (PIB).

Assim, podemos dizer que a década de 1970 foi bastante movimentada, razão
pela qual o País inicia os anos 1980 com a economia em uma situação bastante
complexa. Para se ter uma ideia, a década que vamos estudar nesta unidade, a de
1980, é conhecida como década perdida, uma vez que tínhamos altas taxas de
inflação e desemprego, baixo crescimento econômico, nossa dívida externa estava
altíssima e houve diversos planos de estabilização da economia.

Para compreendermos melhor a década perdida, esta unidade foi dividida em


cinco seções. Na primeira, discutiremos a crise internacional e a restrição externa
que impactaram diretamente a nossa economia, além do descontrole inflacionário
do período. Na segunda seção, debateremos duas linhas de pensamentos distintos
para tentar estabilizar a economia, que são a ortodoxia e a heterodoxia. Na terceira
e quarta seções vamos discutir os planos de estabilização econômica e o impacto
desses planos sobre a taxa de inflação. E, para finalizar a unidade, serão abordados
os desafios, que não são poucos, da década de 1990. Preparado(a)?

A década perdida 51
U2

52 A década perdida
U2

Seção 1

Crise Internacional, restrição externa e descontrole


inflacionário
No início da década de 1980, o Brasil e os demais países em desenvolvimento
passaram pela chamada crise da dívida externa. Para você entender melhor essa
crise, vamos voltar às décadas anteriores.

Nas décadas de 1960 e 1970, o Brasil passou por períodos de crescimento


econômico significativo. O maior crescimento econômico aconteceu entre 1968
e 1973, durante o chamado milagre econômico. Porém, para manter o ritmo, era
necessário tomar empréstimos estrangeiros, que, dada a oferta abundante, eram,
portanto, baratos e fáceis de se conseguir. No entanto, com o tempo, os juros
reais desses empréstimos aumentaram consideravelmente, e a solução foi pedir
empréstimo ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O FMI, no entanto, exigiu
que os países aderissem a um programa que ficou conhecido como Consenso de
Washington.

O Fundo Monetário Internacional (FMI), criado em 1945, é uma


organização composta por 188 países que trabalham para promover a
cooperação monetária global, assegurar a estabilidade financeira, facilitar
o comércio internacional, promover o emprego elevado e o crescimento
econômico sustentável e reduzir a pobreza em todo o mundo.
Disponível em: <http://www.imf.org/external/about.htm>. Acesso em: 4
mar. 2016.

O Consenso de Washington tinha como objetivo final a quitação das dívidas.


Para que isso ocorresse, era exigido que o país passasse a ter superávits fiscais e
comerciais. E como fazer isso? Cortando gastos públicos, reduzindo a demanda
interna e priorizando as exportações. As principais regras, segundo Silva (s.d.), eram:

A década perdida 53
U2

1. Ajuste fiscal.

2. Reforma fiscal e tributária.

3. Abertura comercial e econômica.

4. Taxa de câmbio de mercado competitivo.

5. Investimento estrangeiro direto, eliminando as restrições.

6. Privatização, com a venda das estatais.

7. Desregulamentação.

8. Direito à propriedade intelectual.

O impacto do Consenso de Washington foi a redução no Produto Interno per


capita (PIB per capita) e o envio de bilhões de dólares para o exterior. Ainda assim, a
inflação continuava em alta.

É importante observar que, segundo os defensores da ortodoxia, quando há


recessão econômica e, consequentemente, cortes nos gastos e demanda menor,
automaticamente a inflação é reduzida. No entanto, não foi isso o que ocorreu.
A partir daquele momento se começou a levantar a hipótese de a inflação ser
inercial. Antes de discutirmos inflação inercial, vamos entender como o ambiente
inflacionário foi formado no Brasil.

Consenso de Washington é o nome dado ao encontro ocorrido na


capital dos Estados Unidos, no ano de 1989. Convocados pelo Institute
for International Economics, reuniram-se, naquela ocasião, diversos
economistas latino-americanos liberais, funcionários do Fundo
Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) e do governo norte-americano.
Disponível em: <http://www.estudopratico.com.br/consenso-de-
washington-objetivos-regras-e-o-brasil/>. Acesso em: 4 mar. 2016.

A partir de 1973 houve um significativo aumento da taxa de inflação em razão dos


sucessivos choques externos e internos, tais como o primeiro e o segundo choques
do petróleo (1974 e 1979), dos choques das taxas de juros internacionais no início
da década de 1980, das quebras de safras (os chamados choques agrícolas), das
alterações cambiais, entre outros fatores (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO
JÚNIOR, 2011).

54 A década perdida
U2

No Brasil, mesmo com o baixo crescimento econômico e a recessão econômica,


as taxas de inflação continuavam altas. Em outras palavras, os agentes econômicos
conseguiam aumentar os seus preços em qualquer cenário para poderem preservar
a renda, o que fazia com que a inflação aumentasse ainda mais. Por esse motivo, a
inflação não era causada pelo nível de atividade econômica.

Apesar de não ter afetado a inflação, a recessão do início da década de 1980,


mais exatamente 1981 a 1983, contribuiu para melhorar o balanço de pagamentos,
revertendo o déficit em superávit comercial (5,3%). O déficit comercial foi revertido
porque houve redução, significativa, das importações em 1981/1983 e aumento
das exportações em 1984, já que a economia mundial se recuperou. Além disso,
implementaram-se a política de desvalorização cambial e os projetos de incentivo às
exportações durante o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).

Então, a chamada Nova República (1985-1989) iniciou com o seguinte cenário:

a) Econômico: economia em crescimento, conta transações correntes do


balanço de pagamentos equilibrado, e a taxa de inflação em torno de 200% ao ano.

Por que a redução da taxa de inflação era o principal objetivo


da década de 1980?

b) Político: politicamente, a década de 1980 começou com um quadro


conturbado, pois Tancredo Neves venceu as eleições, mas adoeceu e morreu nas
vésperas da posse, razão pela qual o vice, José Sarney, que havia sido indicado
pela oposição, assumiu o cargo e se tornou presidente da república, marcando a
transição entre o regime militar e a volta da democracia. Em 1986, aconteceram as
primeiras eleições diretas para governador e para o Congresso Nacional, congresso
este que faria a nova Constituição nacional.

A Constituição de 1988 foi elaborada em 20 meses por 558 constituintes


entre deputados e senadores da época. É a sétima na história do país
desde sua independência. Promulgada no dia 5 de outubro de 1988,
ganhou quase que imediatamente o apelido de constituição cidadã, por
ser considerada a mais completa entre as constituições brasileiras, com

A década perdida 55
U2

destaque para os vários aspectos que garantem o acesso à cidadania.


Para conhecer um pouco mais sobre a Constituição de 1988, acesse o
link disponível em: <http://www.infoescola.com/direito/constituicao-
de-1988>. Acesso em: 3 mar. 2016.

E, como sabemos, em razão de não conseguirmos separar economia de política,


as indefinições e mudanças políticas da época, então, foram refletidas nas políticas
econômicas. Em 1985, o ministro da Fazenda Francisco Dornelles defendia os
choques ortodoxos de combate à inflação. Por sua vez, o ministro do Planejamento
era a favor de choques heterodoxos. Além da inflação, existiam outras diferenças,
como a análise sobre o déficit público. A discussão era se o déficit era causado por
excesso de gastos ou se era um componente financeiro. Cada concepção trazia
medidas distintas de combate ao déficit e à inflação.

Os problemas não acabavam por aí: a expansão econômica ocorrida no ano


de 1984 agravou ainda mais os problemas relacionados à estabilização econômica,
pois, no início de década de 1980, a economia brasileira passou por forte recessão e,
em 1984, com um novo cenário, a capacidade ociosa foi ocupada sem problemas,
razão pela qual empregos foram criados. Entretanto, a continuidade do crescimento
em 1985, em razão do aumento das exportações com a indexação financeira,
cambial e salarial, piorava ainda mais a inflação.

1. Discuta como o Fundo Monetário Internacional (FMI)


influenciou a economia brasileira nos anos de 1970/1980.

2. Explique a relação entre a situação política da década de


1980 e a situação econômica do mesmo período.

56 A década perdida
U2

Seção 2

As tentativas de estabilização I: o debate


macroeconômico entre os ajustes ortodoxo e
heterodoxo
Como discutimos, a década de 1980 foi marcada por diversos problemas
econômicos que caracterizaram o período como década perdida. O principal
desafio era estabilizar a economia, já que a inflação chegara a mais de 80% ao mês.
Assim, a meta principal dos governos era combater a inflação. Para isso, tivemos
diversos planos de estabilização.

Castro (2005) afirma que, do ponto de vista econômico, a chamada “Nova


República”, apesar de ter sido um período curto (1985-1989), se caracterizou por um
conjunto de experiências malsucedidas de estabilização da inflação. Foram lançados
três planos de estabilização: Cruzado (1986), Bresser (1987) e Verão (1989), nenhum
dos quais conseguiu obter êxito no combate à inflação, tendo havido apenas
momentos de crescimento econômico.

A Nova República é um período da história brasileira que durou de 1985 a


1989 e teve início entre o fim da ditadura militar e o início da democracia,
ou seja, é um período de transição política e de diversos problemas
econômicos.

Apesar disso, e de parecer um laboratório de experiências de combate à inflação,


a Nova República proporcionou aprendizado e discussões das teorias econômicas,
principalmente na discussão entre ajustes ortodoxos ou heterodoxos para combater
a inflação.

Porém, antes de falarmos sobre os planos econômicos em si, vamos


compreender o que, de fato, significam ortodoxia e heterodoxia, e o motivo desse
debate na economia. Você certamente ouvirá essa discussão durante toda a sua vida
profissional.

A década perdida 57
U2

2.1 Debates sobre as causas da inflação no Brasil


O maior problema da economia brasileira na década de 1980 era a inflação, que,
mesmo nos períodos menos prósperos da economia, com baixo crescimento, não
se reduzia. A taxa de inflação chegou a 224% em 1984.

Diante desse cenário era quase um consenso que a correção monetária


criada pelo Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) era uma variável que
dificultava o combate à inflação. Apesar do consenso sobre a necessidade de fazer a
desindexação da economia, a forma de realizá-la não era consensual.

Segundo Castro (2005), em 1984 existiam quatro propostas de desindexação,


que são:

a) Pacto social: a corrente dos economistas do PMDB e da UNICAMP defendiam


que a inflação era resultado de uma disputa entre os setores da sociedade por uma
participação maior na renda nacional e, a cada momento em que se conseguia
aumentar a renda, maior era a inflação. A solução era um país democrata em que
empresários e trabalhadores aceitassem não aumentar os preços.

Para saber mais sobre o Pacto Social e a Inflação, leia o texto “Inflação e
o Pacto Social” do autor Luiz Carlos Bresser Pereira, disponível no link:
<http://bresserpereira.org.br/view.asp?cod=3115>. Acesso em: 7 mar.
2016.

b) Choque ortodoxo: foi defendido por alguns economistas da FGV que


afirmavam que a inflação no Brasil era igual a de qualquer outro lugar, sendo causada
por excesso de moeda para financiar os gastos do governo. A solução seria realizar
bruscos cortes de gastos, aumento das receitas e tributos, liberação total dos preços
e corte na emissão de moeda e títulos da dívida.

c) Choque heterodoxo: defendido por Francisco Lopes da PUC/Rio, tinha como


principal solução o congelamento de preços.

d) Reforma monetária: defendido por André Lara Resende e Pérsio Arida da PUC/
Rio, tinha como solução introduzir uma moeda indexada que circularia paralelamente
à moeda oficial (cruzeiro, no caso).

Os economistas da PUC/Rio, tanto os que defendiam o choque heterodoxo


quanto os que defendiam a reforma monetária, acreditavam que a inflação era
inercial, ou seja, que a inflação corrente dependia da inflação passada e que a
influência do produto sobre a inflação era muito pequena, por exemplo: 15% de

58 A década perdida
U2

redução do produto reduzia 4% ou 6% da inflação ao ano. Nesse sentido, a inflação


era causada não pela demanda ou oferta, mas sim pela indexação da economia.
Para acabar com a inflação era necessária a desindexação da economia.

Os planos econômicos na década de 1980 utilizaram o instrumento de


congelamento de preços, proposto pela linha heterodoxa.

Veja a seguir a discussão do que são ajustes heterodoxos e ortodoxos.

2.2 Ajustes heterodoxos e ortodoxos


Embora classificar uma política econômica de ortodoxa ou heterodoxa seja uma
tarefa complexa, com limites nem sempre muito bem definidos, podemos afirmar
que, do ponto de vista dos ortodoxos, a inflação é um processo no qual a inflação
corrente é baseada na inflação esperada. Para os heterodoxos, por sua vez, a inflação
atual é formada com base na inflação passada, ou seja, tem causa inercial.

Em termos do “remédio” que cada linha de pensamento defende, podemos


afirmar que, quando falamos em choques/ajustes heterodoxos, nos referimos
à política econômica para combater a inflação que defende o congelamento de
preços por um determinado período, assim como a independência das políticas
monetária e fiscal (SANDRONI, 2000).

Já a política econômica ortodoxa defende que, para conter a inflação, é


necessário realizar um corte severo na expansão monetária e reduzir o déficit
público. Os preços, por sua vez, devem ser liberados para que consigam chegar
ao equilíbrio de mercado. Como resultado, há elevação da taxa de juros, redução
dos gastos públicos (investimentos), contenção do consumo e, consequentemente,
recessão econômica, cuja duração e profundidade dependem de uma série de
fatores (SANDRONI, 2000).

Se você fosse o presidente da época, teria optado pelos


choques ortodoxos ou heterodoxos de combate à inflação?
Justifique.

Diante da inflação intensa que diversos países sofreram a partir do final dos anos
1970, a política do choque heterodoxo foi aplicada em vários casos, destacando-se
a Argentina, Israel, Bolívia e Brasil.

A década perdida 59
U2

1. Diferencie as causas da inflação de acordo com os


pensamentos heterodoxo e ortodoxo.

2. Qual é o “remédio” contra a inflação segundo as políticas


heterodoxas e ortodoxas.

60 A década perdida
U2

Seção 3

As tentativas de estabilização II: Os planos cruzado,


Bresser e Verão.
De 1985 a 1994, a principal preocupação brasileira era combater a inflação, que,
como já vimos, chegou a valores percentuais altíssimos. Para combater a inflação e
estabilizar a economia tivemos, em nove anos, seis planos econômico que tinham
como objetivo principal estabilizar a economia brasileira. Ou seja, percebe-se que,
praticamente todo ano, tínhamos novos programas mal sucedidos, além de dez
diferentes ministros da fazenda, alguns dos quais eram ortodoxos e outros eram
heterodoxos.

A cada novo plano econômico novas características lhe eram incorporadas, uma
vez que cada um dos planos objetivava tentar não cometer os mesmos erros do
plano anterior. No entanto, praticamente todos os planos tinham um ponto em
comum, que era o diagnóstico da inflação como inercial e, portanto, utilizavam o
mesmo instrumento: o congelamento de preços.

Existem três tipos principais de inflação:


a) Inflação de demanda – os preços aumentam em razão do aquecimento
da demanda sem uma resposta na mesma magnitude da oferta.
b) Inflação de oferta ou custo – os preços aumentam em função do
aumento nos custos de produção, como, por exemplo, desvalorização
cambial, que faz com que os produtos importados fiquem mais caros.
c) Inflação inercial – espécie de memória inflacionária, no qual os preços
do período aumentam em função do aumento de preços no período
anterior.

A década perdida 61
U2

Nesta seção vamos discutir três dos seis planos de estabilização econômica da
segunda metade da década de 1985, que são os planos Cruzado, Bresser e Verão.
Os planos Collor serão discutidos na próxima seção. Vamos lá?

3.1 Plano cruzado


O primeiro plano de estabilização econômica da década de 1980 foi o Cruzado,
sendo implementado no governo José Sarney no dia 27 de fevereiro de 1986, por
meio do Decreto-Lei n. 2.283. Esse plano tinha como objetivo principal combater a
inflação.

Figura 2.1 | José Sarney

Fonte: <http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/jose-sarney>. Acesso em: 2 mar.


2016.

José Sarney é advogado, nascido na cidade de Pinheiro, estado do


Maranhão, em 24 de abril de 1930. Bacharelou-se pela Faculdade de
Direito do Maranhão (1953) e ingressou na Academia Maranhense de
Letras (1953).
Em 1984 passou a integrar a Frente Liberal, que o lançou como vice-
presidente da República na chapa de Tancredo Neves, do PMDB,
tendo sido eleito pelo Colégio Eleitoral em janeiro de 1985. Assumiu
interinamente a presidência, em 15 de março de 1985, em virtude da
doença de Tancredo Neves e, com a morte de Tancredo, em 21 de abril,
foi efetivado no cargo.
Disponível em: <http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/
ex-presidentes/jose-sarney/biografia>. Acesso em: 2 mar. 2016.

62 A década perdida
U2

As principais medidas adotadas pelo Plano Cruzado foram:

I. Congelamento de preços: com exceção da energia elétrica, que aumentou


20%, todos os demais preços da economia, incluindo as tarifas públicas, foram
congelados no nível do dia do lançamento do plano, 27/02/1986. Essa medida foi
tomada para tentar que a inflação passada não contaminasse a inflação futura.

II. Mudança na unidade do sistema tributário: a moeda deixou de ser cruzeiro e


passou a ser cruzado (um cruzado era equivalente a mil cruzeiros).

III. Ativos financeiros: substituição da ORTN pela OTN com valores congelados
por 12 meses; para contratos pós-fixados, os juros acima da correção monetária
viraram juros nominais e foram proibidos de serem indexados com prazo menor do
que um ano; a poupança passou a ter correção trimestral; para contratos pré-fixados,
foi introduzida a tablita, que era uma tabela de conversão com desvalorização diária
de 0,45%.

IV. Congelamento dos salários: os salários foram convertidos pelo poder de


compra dos últimos seis meses mais 8% para salário acima do mínimo e 16% para o
salário-mínimo e depois congelados.

V. Congelamento do salário-mínimo: em CZ$ 804,00.

VI. Gatilho salarial para reajuste dos salários: toda vez que a inflação chegasse a
20%, os salários seriam reajustados.

VII. Taxa de câmbio: a taxa de câmbio foi fixada no nível no dia 27/02/1986.

VIII. Aluguéis: valores médios dos aluguéis foram recompostos via fatores
multiplicativos com base em relações média-pico.

IX. Política monetária: a oferta de moeda deveria ser igual a demanda por
moeda, e a taxa de juros foi a variável escolhida para verificar o grau de liquidez
da economia. O impacto foi a monetização excessiva da economia, reduzindo-se
consideravelmente a taxa de juros. Para você ter uma ideia disso, em março de 1986
o estoque de moeda aumentou em 80%.

Inicialmente, o impacto das medidas do plano cruzado surtiu efeito. A população ficou
animada com o “término” da inflação. Porém, esse entusiasmo durou poucos meses
porque os efeitos não foram duradouros, conforme podemos observar no Quadro 2.1.

Quadro 2.1 | Evolução da taxa de inflação em 1986

Jan. Fev. Mar. Abr. Maio Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov.
17,79 14,98 5,52 -0,58 0,32 0,53 0,63 1,33 1,09 1,39 2,46

Fonte: Souza (2009).

A década perdida 63
U2

Analisando o Quadro 2.1, verifica-se que, assim que o Plano Cruzado foi lançado,
a taxa de inflação reduziu de 14,98% em fevereiro para 5,51% em março, e em abril,
houve deflação. Porém, no mês de maio, a taxa de inflação voltou a subir e, a cada
mês, se tornou mais alta. Essa volta à inflação pode ser explicada pelas seguintes
razões:

a) O congelamento e o tabelamento de preços não eram possíveis em produtos


não padronizáveis (roupas e moradias).

b) Os preços do setor público foram congelados antes de serem alinhados.

c) Houve estímulo do consumo e inibição da poupança em virtude da eliminação


da correção monetária e da redução das taxas de juros nominais, o que fez com
que diversos produtos faltassem nas prateleiras dos supermercados e surgisse um
mercado negro.

Para tentar solucionar os problemas da oferta sem abrir mão do congelamento


de preços, o governo tomou algumas medidas, entre elas a isenção de impostos,
os subsídios e a liberação da importação de produtos alimentícios, o confisco de
cabeças do gado entre outras. Porém, com o tempo, o ágio foi criado e os produtos
foram maquiados.

d) Alguns empresários maquiaram os produtos para escapar do congelamento


e do tabelamento.

e) A taxa cambial foi congelada durante nove meses e os preços no mercado


interno se elevaram, pois as importações foram estimuladas e as exportações
desestimuladas, aumentando ainda mais a dívida externa.

Em 24 de junho, foi lançado um pacote fiscal chamado de cruzadinho, que


implantou o sistema de empréstimos compulsórios para compra de gasolina,
automóveis e passagens aéreas internacionais e, com os recursos obtidos, o plano
de metas do governo seria financiado. Porém, o pacote fiscal não teve o resultado
esperado, uma vez que os produtos que tiveram aumento de preços não foram
contabilizados no índice de inflação para que o “gatilho” não fosse disparado. E a
hipótese do término do congelamento de preços não era aceita, principalmente
em razão das eleições para a Assembleia Constituinte e para os governos estaduais
(GRAMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

3.1.1 Plano cruzado II


Após as eleições e com ampla vitória do governo, no dia 21 de novembro de
1986 o Plano Cruzado II foi lançado com objetivo principal de controlar o déficit
público. Para isso, era necessário aumentar em 4% as receitas, o que seria feito via

64 A década perdida
U2

aumento das tarifas e dos impostos indiretos. Segundo Souza (2009), as principais
medidas do plano foram:

I. Aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 80% para


automóveis, 120% para cigarros e 100% para bebidas.

II. Aumento de certos preços administrados como, por exemplo, 60% para
combustível, 35% para telefonia e serviços postais e 60% para energia elétrica.

III. Retorno da minidesvalorização cambial.

O impacto não foi positivo e a inflação continuava aumentando, conforme


Quadro 2.2.

Quadro 2.2 | Evolução da taxa de inflação após o plano Cruzado II


1986 1987
Nov. Dez. Jan. Fev. Mar. Abr. Maio Jun.
2,46 7,56 12,04 14,11 15,0 20,08 27,58 25,88

Fonte: Souza (2009).

Conforme podemos ver no Quadro 2.2, o Plano Cruzado II foi lançado em final
de novembro de 1986, quando a taxa de inflação era de 2,46%. No mês seguinte, a
taxa de inflação passou para 7,56% e, com o passar do tempo, só foi aumentando,
chegando a 25,88% em junho de 1987, sete meses após o lançamento do plano.

Além da inflação, outras variáveis sofreram negativamente, como o aumento da


taxa real de juros - em virtude da incerteza inflacionária, razão pela qual o crédito
ficou restrito - , o desaquecimento da demanda a desestruturação da oferta em razão
do longo período de congelamento de preços; a perda de reservas; e o anúncio da
moratória em fevereiro de 1987. Com isso, o ministro da fazenda Dilson Funaro caiu
e Bresser Pereira assumiu o cargo. E, assim:

encerra de forma de desastrosa a tentativa do cruzado. Seu


fracasso pode ser atribuído tanto a problemas de concepção
como de execução. A duração excessiva do congelamento,
os fatores que provocam o crescimento descontrolado
da demanda e o descaso pelas contas públicas externas
com certeza contribuíram para esse desfecho (GREMAUD;
VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 430).

O fracasso do Plano Cruzado deixou marcas profundas na economia brasileira.


A primeira diz respeito à introdução de um elemento novo, a expectativa do

A década perdida 65
U2

congelamento, ou seja, toda vez que a taxa de inflação aumentava, os agentes


econômicos esperavam que um novo congelamento fosse ocorrer e acabavam
aumentando os preços dos seus produtos antecipadamente, causando aceleração
inflacionária. Em termos políticos, o governo teve a credibilidade reduzida, já que
lançou o Plano Cruzado II uma semana após as eleições e alterou os índices de
preços cinco vezes em pouco tempo.

Porém, o Plano Cruzado deixou algumas lições como, por exemplo, a necessidade
do controle da demanda após a estabilização, a necessidade de choques neutros no
sentido distributivo, impossibilidade de manter o congelamento de preços por muito
tempo, entre outras.

Significado da palavra moratória:

1 Prorrogação que o credor concede ao devedor para o prazo do


pagamento da dívida. 2 Adiamento dos vencimentos das dívidas, com
suspensão dos pagamentos e da ação da justiça, decretado pelo governo
quando o país enfrenta circunstâncias excepcionalmente graves.
Fonte: Dicionário Michaelis (2016). Disponível em: <http://michaelis.
uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-
portugues&palavra=morat%F3ria>. Acesso em: 6 maio 2016.

3.2 Plano Bresser


Após o fracasso do Plano Cruzado e de diversas sequelas para a economia
brasileira, no dia 16 de junho de 1987 foi lançado um novo plano econômico, o
plano Bresser, com elementos ortodoxos e heterodoxos, além de características
positivas do plano cruzado.

Diferente do plano anterior, o objetivo do plano Bresser era conter a aceleração


inflacionária, promovendo choque deflacionário sem o “gatilho”, além da redução
do déficit público. As principais medidas foram:

I. Congelamento de salários por três meses no nível de 12 de junho de 1987.

II. Congelamento de preços por três meses. Houve, no entanto, aumento de


diversos preços, incluindo os públicos, antes do congelamento.

III. Mudança da base do Índice de Preços ao Consumidor para 15 de junho.

IV. Desvalorização cambial de 9,5% e minidesvalorizações diárias, sem


congelamento.

66 A década perdida
U2

V. Congelamento de aluguéis.

VI. Contratos pós-fixados não foram alterados, ao passo que, para os contratos
pré-fixados, foi introduzida a chamada tablita com desvalorização de 15% ao mês.

VII. Criação de um novo indexador, a unidade referencial de preços (URP) para


correção dos salários dos três meses seguintes. A URP entraria em vigor a partir de
setembro de 1987.

VIII. Políticas monetária e fiscal com taxa real de juros para evitar a especulação
com estoques e o consumo.

O plano Bresser não conseguiu conter a inflação por muito tempo e, assim como
o plano Cruzado, somente inicialmente surtiu efeito. Os impactos do plano foram a
recuperação da balança comercial e a queda significativa da produção industrial. No
entanto, ele não conseguiu conter a aceleração inflacionária conforme podemos
verificar no Quadro 2.3.

Quadro 2.3 | Evolução da taxa de inflação após o Plano Bresser

Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.


25,88 9,33 4,5 8,02 11,15 14,47 15,89

Fonte: Souza (2009)

Como pode ser verificado no Quadro 2.3, o Plano Bresser foi criado quando
a taxa de inflação estava em 25,88% ao mês. Após sua implementação, a taxa de
inflação reduziu consideravelmente para 9,33% em julho e 4,5% em agosto. Porém,
a partir de setembro de 1987, ela voltou a aumentar.

O Plano Bresser terminou sem atingir o objetivo principal e com o pedido de


demissão do então ministro Bresser Pereira. O seu lugar foi assumido por Maílson
da Nóbrega.

3.3 Plano verão


Maílson da Nóbrega assumiu o Ministério da Fazenda em dezembro de 1987
e adotou o que ficou conhecido como política feijão com arroz, já que nenhuma
mágica seria feita, rejeitando-se, portanto, choques heterodoxos de combate à
inflação. A política do ministro tinha como objetivos estabilizar a inflação a uma taxa
de 15% ao mês e reduzir o déficit operacional de 8% para 4% do PIB.

Para atingir os objetivos, os empréstimos ao setor público foram congelados,


houve contenção salarial e redução do prazo de recolhimento dos impostos, e, no
início de janeiro, a moratória foi suspensa.

A década perdida 67
U2

O impacto da política feijão com arroz foi a contenção da inflação para menos do
que 20% ao mês no primeiro semestre, mas, no segundo semestre, a inflação voltou
a subir em razão da recomposição das tarifas públicas. Para agravar mais ainda a
situação, as contas da União estavam desequilibradas, pois a Constituição de 1988
aumentou as transferências da União para estados e municípios, sem repassar as
obrigações. Além disso, o custo da mão de obra aumentava, o que só fazia aumentar
a inflação, que chegou a 28,8% em dezembro de 1988.

No dia 14 de janeiro de 1989, o Plano Verão foi lançado, tendo sido mais um
plano com elementos heterodoxos e ortodoxos. Os elementos ortodoxos tinham
como objetivo conter a demanda, pela diminuição dos gastos públicos e da elevação
das taxas de juros. Os elementos heterodoxos, por sua vez, visavam promover a
desindexação da economia; para isso, os preços, novamente, foram congelados.
Porém, desta vez os preços foram congelados após o aumento dos diversos preços
administrados, e a data de comparação dos índices de preços foram alteradas para o
dia 15 de janeiro de 1989. Além dos elementos citados acima, outras medidas foram
tomadas:

I. Reforma monetária: a moeda cruzado foi trocada pelo cruzado novo e três
zeros foram cortados; assim, NCz$ 1,00= CZ$ 1.000,00.

II. Salários foram convertidos pela média dos últimos doze meses mais a aplicação
da Unidade Referencial de Preços (URP) de janeiro.

III. Tablita foi aplicada para contratos pré-fixados.

IV. Desvalorização cambial de 18% do cruzado e, na sequência, a taxa de câmbio


fixa foi adotada em NCz$1,00 = US$ 1,00.

O Plano Verão foi curto e o governo não fez nenhum ajuste fiscal, o que fez com
que os déficits públicos continuassem elevados e crescentes. Em termos políticos,
a negociação com o Congresso para aprovar cinco anos de mandato do presidente
impediu quaisquer medidas mais severas e, em 1989, aconteceria a primeira eleição
direta para presidente após o golpe militar, motivo pelo qual nenhuma medida
impopular seria aceita. O impacto foi o aumento da inflação para 80% ao mês no
último mês do governo.

O Quadro 2.4 apresenta, de forma resumida, as principais medidas dos planos de


estabilização da economia da Nova República, os planos Cruzado, Bresser e Verão.

68 A década perdida
U2

Quadro 2.4 | Resumo dos planos de estabilização da Nova República


Medida/Plano Cruzado I Bresser Verão
Causa da inflação Inercial Inercial + demanda Inercial + demanda
Preços Congelados por 11 Congelados em três Congelados por tempo
meses fases indeterminado
Moeda 1.000 cruzeiros = 1 1.000 cruzados = 1
x
cruzado cruzado novo
Políticas monetária e Proposta: Proposta: Proposta: corte das
fiscal acomodatícia contracionista despesas e aumento
Prática: expansionista Prática: expansionista nas receitas
Prática: não aprovada
pelo congresso
Câmbio Fixo com base em Desvalorização real Desvalorizado em
28/02 16,38%
Indexação Proibida por um ano Novo indexador URP Indexador IPC ou
overnight (o que fosse
maior)
Fonte: Giambiagi e Villela (2005).

Como podemos ver no Quadro 2.4, os planos Cruzado, Bresser e Verão eram
muito parecidos. Todos adotaram o instrumento heterodoxo de combate à inflação,
que é o congelamento de preços. O que variou foi o tempo desse congelamento.
Outro ponto é a indexação da economia, que permaneceu em todos os planos.
Por último, o resultado foi o mesmo: inicialmente a inflação foi reduzida, mas logo
depois voltou a aumentar.

1. Demonstre quais são os pontos em comum dos planos


Cruzado, Bresser e Verão.

2. Discuta as principais diferenças entre os planos Cruzado,


Bresser e Verão.

A década perdida 69
U2

70 A década perdida
U2

Seção 4

O plano Collor e as reformas estruturais


Em 1989 acontece a primeira eleição direta para presidente da república após
mais de vinte anos de governo militar (a última eleição direta aconteceu em 1960
quando Jânio Quadros foi eleito). O novo presidente é o mais jovem da história
do Brasil, na época com apenas 40 anos. Fernando Collor de Mello, do Partido da
Reconstrução Nacional (PRN), derrotou políticos tradicionais, como Leonel Brizola
do PDT e Luiz Inácio Lula da Silva do PT.

Atenção

O regime militar durou de 1964 a 1985.

Figura 2.2 | Fernando Collor de Mello

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Governo_Collor>. Acesso em: 6 mar. 2016.

Jornalista, nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 12 de agosto de


1949, também se formou em Economia, pela Universidade Federal de

A década perdida 71
U2

Alagoas (1972). Iniciou sua carreira política como prefeito de Maceió


(1980-1982). Fundou o Partido da Reconstrução Nacional (PRN) e, nessa
legenda, elegeu-se presidente da República em 1989. Em 2 de outubro
de 1992, foi afastado temporariamente da presidência da República, em
decorrência da abertura do processo de impedimento na Câmara dos
Deputados. Renunciou ao cargo de presidente em 29 de dezembro de
1992, data da sessão de julgamento do processo de impedimento no
Senado, que o tornou inelegível por oito anos.
Disponível em: <http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/
ex-presidentes/fernando-collor/biografia>. Acesso em: 6 mar. 2016.

Collor assumiu a presidência em março de 1990, trazendo grandes esperanças


para o país, com um discurso moderno no qual dizia que seria o “caçador de
marajás”, daria assistência às pessoas menos favorecidas, além de prometer que
solucionaria os problemas da década de 1980. Como afirma Castro (2005), “é
eleito, pelo povo brasileiro, Fernando Collor de Mello, numa operação de autêntico
marketing eleitoral, sem precedentes na história do Brasil” (CASTRO, 2005, p. 141).
Porém, entrou para a história como o primeiro presidente brasileiro a passar por um
processo de impeachment, tendo renunciado, entretanto, antes do resultado.

O significado da palavra impeachment:

Segundo o Dicionário Michaelis (2016), impeachment é:

1 Pol impedimento legal de exercer mandato, de ocupar cargo. 2


contestação.
3 repreensão. 4 ação de pôr em dúvida. 5 depreciação.
Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/ingles/definicao/
ingles-portugues/impeachment%20_458025.html>. Acesso em: 6 mar.
2016.

Agora convido você a entender um pouco mais sobre os dois anos de mandato
do Collor e o seu plano de combate à inflação. Vamos lá?

72 A década perdida
U2

4.1 As reformas estruturais


As reformas feitas por Collor tinham como objetivo romper com o modelo de
crescimento brasileiro anterior. À época, o crescimento econômico estava associado
à política de substituição de importações e de incentivo à exportação. Assim,
podemos relembrar, afinal estudamos esse modelo na Unidade 1, que o modelo
do pós-guerra até início da década de 1990 foi marcado pela participação direta
do Estado na infraestrutura e em setores prioritários - como siderurgia, mineração
e petroquímica - , proteção à indústria nacional e financiamento de novos projetos,
através de crédito relativamente fácil. Já as reformas propostas por Collor estavam
relacionadas à abertura comercial e financeira da economia brasileira e ao processo
de de privatização e essa seria uma condição essencial para que a economia se
estabilizasse, mas não foi bem isso o que aconteceu.

As políticas relacionadas à abertura comercial e às privatizações estavam inseridas


na chamada Política Industrial e de Comércio Exterior (PICE), que foi lançada assim
que Collor assumiu a presidência. Porém, na prática, a competição se tornou mais
forte do que a competitividade, com base no resultado das urnas, no contexto
internacional, na população não satisfeita com os serviços públicos prestados e na
crise do Estado.

Competição e competitividade são conceitos diferentes. O primeiro


refere-se à concorrência, a ser melhor do que o outro, ou seja, está
relacionado ao mercado com grande número de vendedores. A
competitividade, por sua vez, está relacionada à capacidade de competir
com as demais empresas. No caso brasileiro, atualmente a indústria
nacional não é tão competitiva.

Dentro da Política Industrial e de Comércio Exterior (PICE) havia o Plano Nacional


de Desestatização (PND), que tinha como objetivos:

I. Redesenhar/modernizar o parque industrial brasileiro.

II. Estabilizar a economia através do novo parque industrial.

III. Reduzir a dívida pública (os títulos seriam aceitos como moeda de privatização).

Porém, na prática, as privatizações não atingiram as metas otimistas criadas


pelo governo. Segundo Castro (2005), durante os governos Collor e Itamar Franco,
foram privatizadas 33 empresas federais, principalmente nos setores de siderurgia,
petroquímica e fertilizantes, que geraram receita de US$ 8,6 bilhões, dos quais US$

A década perdida 73
U2

3,3 bilhões foram transferidos para o setor privado como pagamento de parte da
dívida.

Castro (2005), para explicar os resultados das privatizações, levanta as seguintes


hipóteses:

1) Muitas empresas públicas não estavam em boas condições financeiras e não


existiam interessados por elas.

2) Havia dificuldade em avaliar os ativos das estatais, após anos de alta inflação.

3) Havia resistência do público e perda da credibilidade do governo.

4) De acordo com a Constituição de 1988, alguns setores, como o de jazidas


minerais e o elétrico, não poderiam ser privatizados.

5) Não havia experiência em privatizações mais complexas.

Além dos fatores citados acima, a inflação alta e persistente acabou virando
prioridade, e as privatizações foram deixadas em segundo plano.

Em relação às demais reformas estruturais, podemos citar as intensas alterações na


política de comércio exterior e a adoção da taxa de câmbio livre, que desenvolveram,
ainda mais, a política de importações implementada no final da década de 1980.
Como medidas, podemos citar o término da lista de produtos com emissão de
guias de importação e de regimes especiais de importação, menos a Zona Franca
de Manaus, drawback e bens de informática. No lugar, foi implantado o controle
tarifário com alíquotas que diminuem ao longo do tempo e de forma gradual, para
importações de todos os produtos, conforme Quadro 2.5.

Quadro 2.5 | Alíquotas de importação de setores selecionados (1990-1994)


Setor 1990 1991 1992 1993 1994
Insumos industriais básicos 12,6 8,3 6,1 4,8 4,3
Bens de capital 36,0 29,2 25,0 21,0 19,3
Veículos de passageiros 85,0 59,3 49,3 39,3 34,3
Peças e acessórios de bens de capital 34,0 27,8 24,3 20,9 19,1
Peças e acessórios de equip. transporte 39,1 31,5 26,3 21,2 18,6
Outros 51,2 40,7 33,5 25,7 19,3
Fonte: Castro (2015).

Analisando o Quadro 2.5, podemos perceber que a proposta de redução das


tarifas de importações ocorreria de forma lenta e duraria quatro anos. No entanto, o
governo Collor acabou em 1992 com a renúncia do então presidente.

74 A década perdida
U2

Vamos refletir sobre o tema:


Caso Fernando Collor de Mello não tivesse renunciado à
presidência e não tivesse o risco de impeachment, qual teria
sido o impacto da redução gradual das tarifas de importações
para a indústria nacional?

4.2 Os Planos Collor de estabilização econômica


Assim como os demais planos econômicos, Cruzado, Bresser e Verão, o Plano
Collor tinha como preocupação principal o combate à inflação. Porém, em razão da
experiência dos outros - que tinham fortes características heterodoxas - e do fracasso
deles, surgiu um novo diagnóstico da inflação e justificativas para que os planos
anteriores não terem dado certo. A principal justificativa foi a de que os choques
inflacionários do governo Sarney não teriam dado certo em razão da elevada e
crescente liquidez dos haveres financeiros não monetários.

Haveres financeiros não monetários são ativos financeiros que rendem


juros, como, por exemplo, a poupança.

Assim, a possibilidade de mudança levava a reações que não eram a favor das
políticas, o que as tornavam inviáveis; ou seja, a possibilidade rápida da monetização
das aplicações financeiras levava ao aumento da demanda de bens de consumo, de
ativos reais e de risco, razão pela qual a inflação aumentava. Outra consequência
era a desvalorização cambial em razão do aumento da demanda por produtos
importados.

Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011) explicam que a “fuga” dos ativos
financeiros em função da queda na taxa de juros nominal é causa por:

I. Ilusão monetária: a queda do retorno nominal e a dificuldade de cálculo das


taxas reais de juros elevam a demanda por bens de consumo.

II. Expectativa e o risco de volta da inflação: antecipam o consumo.

III. Inflação alta: os preços variam e fazem com que a correção monetária
funcione como um hedge.

A década perdida 75
U2

Hedge é uma espécie de cerca/proteção, ou seja, são operações


financeiras que têm como objetivo proteger os preços. É uma prática
muito comum na agricultura.

Para que os fatos citados acima não ocorressem e para que se evitasse a
especulação, era necessário que o governo mantivesse a taxa de juros alta e estável.
Para isso, e dada a situação do país naquele momento, o instrumento com o qual o
governo contava eram as operações de mercado aberto ou open market.

A operação de mercado aberto consiste na compra e na venda de títulos públicos.


Com a incerteza da época, o Banco Central formava, com base na expectativa da
inflação, as taxas diárias no overnight, indexando os ativos. A indexação dos ativos
impactava os preços e a taxa de câmbio, que acabavam sendo indexados, ao que se
chama indexação plena ou “financeirização”.

E essa indexação inviabilizava as políticas monetária, fiscal e cambial. Na visão do


governo Collor, os planos econômicos até ali criados não conseguiram romper com
os mecanismos de indexação e, por isso, fracassaram no quesito combate à inflação.

Para romper com a indexação da economia, o governo Collor tomou algumas


medidas, que são, segundo Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011):

i. Reforma monetária – consistiu no bloqueio de metade dos depósitos à vista, 80%


das aplicações de overnight e fundos de curto prazo e 1/3 dos depósitos em poupança.
70% do M4 da economia foi bloqueado. O objetivo era evitar as pressões de consumo
e fazer com que o banco Central fosse capaz de realizar política monetária ativa.

Os economistas dividem os meios de pagamento em quatro grupos,


conforme Quadro 2.6.
Quadro 2.6 | Composição dos meios de pagamentos
Meios de pagamento Composição
M1 Base monetária: soma das cédulas e moeda em
poder do público e depósitos à vista no sistema
bancário.
M2 M1 + total dos depósitos a prazo no sistema
bancário, incluindo os Certificados de depósitos
bancários e interbancários (CDB e CDI), e a parte
dos títulos públicos.

76 A década perdida
U2

M3 M2 + total de depósitos em caderneta de


poupança.
M4 M3 + títulos públicos em poder de bancos e de
fundos de investimentos e títulos privados, como
letras hipotecárias e de câmbio.

Fonte: <www12.senado.leg.br/manualdecomunicacao/guia-de-economia>. Acesso em: 6 mar. 2016.

II. Reforma fiscal: os objetivos da reforma fiscal eram promover ajuste fiscal em
10% do PIB, eliminar um déficit projetado de 8% do PIB e gerar um superávit de 2%.
Para atingir o objetivo, o ajuste seria feito via redução do custo de rolagem da dívida
pública, suspensão dos subsídios, incentivos fiscais e isenções, ampliação da base
tributária, tributação das grandes fortunas, proibição de cheques ao portador e IOF
alto sobre o estoque de ativos financeiros.

III. Reforma administrativa: programa de privatizações, melhorias dos instrumentos


de fiscalização e de arrecadação para reduzir a sonegação e as fraudes, maior controle
sobre os bancos estaduais.

IV. Congelamento de preços e desindexação dos salários em relação à inflação


passada: nova regra de prefixação de preços e salários a partir de 1 de maio de 1990.

V. Mudança do regime cambial: com objetivo de abrir a economia, haveria redução


qualitativa das tarifas de importação de 40% para menos de 20% em média em quatro
anos (vide quadro).

VI. Contratos e ativos financeiros: não houve alteração nas regras de indexação.

A principal medida do Plano Collor I foi o confisco da liquidez. Porém, o impacto


imediato foi a desestruturação do sistema produtivo (redução nas encomendas,
demissões, férias coletivas, redução na jornada de trabalho, redução nos salários etc.),
o que fez com as condições de emprego e produção fossem desorganizadas. Com
isso, o PIB retraiu 8% no segundo trimestre de 1990.

Com a rejeição da população ao plano econômico e o impacto sobre o PIB, o


medo de uma recessão surgiu, razão pela qual o governo tomou algumas medidas.
Entre elas, podemos citar:

I. Devolução da liquidez da maior parte da população pelas chamadas “torneirinhas”


do Banco Central. Com isso, a liquidez foi retomada, mas de forma desigual entre os
setores econômicos.

II. Relaxamento no controle de preços e salários a partir de maio, o que levou, junto
com a liquidez, ao aumento da inflação.

A década perdida 77
U2

III. Superávit de 1,2% do PIB.

IV. Não implantação da proposta de demissão dos funcionários públicos, uma vez
que ela não tinha apoio do Congresso.

V. Duras críticas às regras do Programa de Privatização.

VI. Valorização da taxa de câmbio no segundo semestre, o que impactou em


déficit na balança comercial. O governo foi obrigado a intervir no mercado cambial,
desvalorizando, fortemente, o cruzeiro, o que contribuiu para o aumento da inflação.

Com todas as dificuldades do Plano Collor I, em primeiro de fevereiro de 1991, um


novo plano, desta vez mais heterodoxo, foi criado: o Plano Collor II, que tinha como
objetivo combater a inflação que estava a 20% ao mês.

Para atingir o objetivo, o Plano Collor II tomou as seguintes medidas: racionalização


dos gastos da administração pública, corte das despesas e aceleração do processo de
modernização do parque industrial (CASTRO, 2005).

O Plano Collor II propunha, também, acabar com a indexação da economia, que


era a principal causa da inflação. Para isso, o Bônus do Tesouro Nacional e os fundos
de investimento de curto prazo foram extintos. Foi criado o Fundo da Aplicação
Financeira (FAF) que teria a Taxa Referencial (TR) como rendimento; e alteração na
indexação da TR, que agora era baseada na inflação futura e não mais na passada.

Inicialmente, a taxa de inflação foi reduzida. Entretanto, com tantos escândalos


políticos e com a discussão sobre o impeachment do presidente Collor, o governo
perdeu credibilidade e a inflação voltou a subir. Após a crise política, em dezembro
de 1992, Fernando Collor de Mello renunciou, e seu vice, Itamar Franco, assumiu a
presidência da república.

1. Discuta o diagnóstico da inflação definido pelo Plano Collor I.

2. Explique a diferença do Plano Collor I para os demais planos


econômicos elaborados durante o Governo José Sarney.

78 A década perdida
U2

Seção 5

Anos 1990: quais desafios a superar?


Após inúmeras tentativas de combate à inflação da década de 1980, os anos
1990 se iniciam cheios de desafios, não apenas no lado econômico, mas também
no lado político.

Qual era o maior desafio da década de 1990?

Economicamente, passamos por cinco planos econômicos que tinham como


objetivo principal o combate à inflação, nos quais foram utilizados para execução
os choques heterodoxos, mesmo que, em alguns períodos, choques ortodoxos
estivessem presentes. Porém, como sabemos, nenhum dos planos atingiu o objetivo,
e a década de 1990 continuava com o desafio de estabilizar os preços, sem falar na
recessão que a economia brasileira atravessava.

Em 1991, após a substituição da Ministra Zélia Cardoso e com o fim do Plano


Collor II, a política econômica ficou restrita ao controle do fluxo de caixa, ou seja,
redução das despesas, incluindo redução nos investimentos. Naquele mesmo ano,
o congresso aprovou a indexação de impostos, tendo sido lançado um programa
anti-inflacionário com forte restrição do crédito, recuperação das finanças púbicas e
manutenção da taxa de câmbio real. O impacto foi recessão sem redução da taxa
de inflação.

Do ponto de vista externo, em razão das altas taxas de juros e com uma política
cambial definida na manutenção da taxa de câmbio real, combinadas com a
abertura financeira e com um cenário de desaquecimento internacional, promoveu-
se a entrada de capital externo no Brasil e, consequentemente, houve elevação das
reservas (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

O impacto negativo foi o aumento da dívida pública, uma vez que a entrada
de recursos externos pressionava a expansão monetária e, para que não houvesse
valorização cambial, eram lançados títulos públicos no mercado.

A década perdida 79
U2

Em termos políticos, no início da década de 1990 passávamos pela crise política


do impeachment, o que trouxe ainda mais instabilidade à nossa economia. Em
dezembro de 1992, Collor renunciou e em seu lugar assumiu Itamar Franco, que se
colocava como um governo de transição, tornando a política econômica indefinida
com troca de ministros.

Em 1993, Fernando Henrique Cardoso assumiu o Ministério da Fazenda e


começou a gestão do Plano Real. As primeiras medidas foram relacionadas à
melhorias das contas públicas, com a aprovação do Imposto Provisório sobre
Movimentação Financeira (IPMF) e do Plano de Ação Imediata (PAI).

O Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), que


foi criado em 1993 e extinto em dezembro de 1994, tinha alíquota de
0,25%. Porém, em 1996 ressurgiu como Contribuição Provisória sobre
Movimentação Financeira (CPMF).

Com a melhoria nas contas públicas, o aumento da indexação e a ausência de


choques, a inflação voltou a ter caráter inercial. De 1993 a 1994, o fluxo de capitais
cresceu, o que ampliou as reservas cambiais brasileiras e, em junho de 1994, o novo
plano econômico, o Real, foi lançado. Sobre o Plano Real discutiremos na Unidade
3 deste livro.

1. Explique o motivo que fez com que a economia brasileira


atravessasse uma recessão em 1991/1992.

2. Quais foram as medidas implementadas para que as contas


públicas melhorassem durante o governo Collor?

80 A década perdida
U2

Nesta unidade você aprendeu:


• Como a crise internacional afetou o Brasil.
• Os motivos da restrição externa.
• O percurso para o descontrole inflacionário.
• O porquê de a década de 1980 ser chamada de década perdida.
• As medidas ortodoxas e heterodoxas de combate à inflação.
• As características dos planos de estabilização da Nova República.
• As semelhanças e diferenças das medidas dos planos de
estabilização.
• A situação política brasileira e seu impacto na economia.
• O início da democracia e a forma como esta afetou os planos
de estabilização da economia.
• A esperança do povo brasileiro no novo presidente Collor.
• As reformas monetária, fiscal e administrativa feitas pelo
governo Collor.
• A polêmica medida de bloqueio da poupança do Plano Collor I.
• Os desafios, que não eram poucos, da década de 1990.

Finalizamos a segunda unidade do livro Economia Brasileira


Contemporânea. Agora você compreendeu como as medidas
das décadas de 1960 e 1970 impactaram a economia brasileira
na década de 1980. Você também entendeu por que a década
de 1980 é, para a economia, considerada a década perdida, além
de todos os pontos em comum, ou seja, os ajustes heterodoxos,
dos planos de estabilização.
Agora reflita sobre o que teria acontecido com a economia do
Brasil se o primeiro plano de estabilização, o Cruzado, tivesse
atingindo seu objetivo e tivesse conseguido reduzir a inflação;
será que a economia brasileira teria voltado a crescer? E se, após
o fracasso do plano Cruzado, o plano Bresser tivesse optado
pelo ajuste ortodoxo, será que o resultado teria sido outro?

A década perdida 81
U2

1. Discuta, de forma sucinta, sobre a situação econômica


brasileira da década de 1980.

2. Redija um parágrafo argumentativo sobre o debate


“ortodoxia e heterodoxia” de combate à inflação.

3. Explique as medidas adotadas pelos planos Cruzado,


Bresser e Verão, apontando os motivos do fracasso de todos
os planos.

4. Explique, detalhadamente, por que o Plano Collor I optou


pelo confisco dos ativos financeiros.

5. Quais foram as maiores lições deixadas pela década de


1980 e quais eram os desafios que os anos 1990 deveriam
enfrentar?

82 A década perdida
U2

Referências

CASTRO, L.B. Esperança, frustrações e aprendizado: a história da Nova república


(1985-1989). In: GIAMBIAGI, F; VILLELA, A. Economia brasileira contemporânea
(1945-2004). Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
GIAMBIAGI, F; VILLELA, A. Economia brasileira contemporânea (1945-2004). Rio de
Janeiro: Elsevier, 2005.
GREMAUD, A.P.; VASCONCELLOS, M.A.S.; TONETO JÚNIOR, R. Economia brasileira
contemporânea. São Paulo: Atlas: 2011.
SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de economia. São Paulo: Best Seller, 2000.
SILVA, Débora. Consenso de Washington. Rio de Janeiro: Estudos Práticos, s.d.
Disponível em <http://www.estudopratico.com.br/consenso-de-washington-
objetivos-regras-e-o-brasil/>. Acesso em: 11 maio 2016.
SOUZA, J.M de. Economia brasileira. São Paulo: Pearson, 2009.

A década perdida 83
Unidade 3

O PLANO REAL E
A ESTABILIZAÇÃO
MACROECONÔMICA
Andréia Moreira da Fonseca Boechat

Objetivos de aprendizagem:
Nesta unidade você será levado a entender as fases da implantação do Plano
Real, assim como os motivos que fizeram com que esse plano atingisse o objetivo
e conseguisse estabilizar a economia. Além disso, você vai compreender não só
a forma como as crises financeiras internacionais afetaram a economia brasileira,
mas também a crise cambial, que fez com que o Brasil sentisse necessidade da
adoção do sistema de metas de inflação.

Seção 1 | O plano real, da criação aos primeiros anos no


governo FHC
Nesta seção, você entenderá como o Plano Real foi criado e o impacto
dele na economia brasileira durante os primeiros anos do governo
Fernando Henrique Cardoso.

Seção 2 | O plano real e as crises financeiras internacionais:


México, Ásia, Rússia e Argentina
Nesta seção, você compreenderá o que foi e como as crises financeiras
da década de 1990 e da Argentina no início dos anos 2000 afetaram a
economia brasileira.

Seção 3 | A crise cambial e o sistema de metas de inflação


Nesta seção, você entenderá como a crise cambial alterou a política
macroeconômica brasileira e fez com que o Brasil adotasse o chamado
sistema de metas de inflação.
U3

Introdução à unidade

Seja bem-vindo(a) à terceira unidade do livro de Economia Brasileira


Contemporânea.

Você viu na unidade anterior as tentativas de estabilização da economia feitas


pelos governos José Sarney e Fernando Collor de Mello, e conheceu os cinco
planos econômicos implantados, os quais não atingiram o objetivo principal, que
era combater as altas taxas de inflação.

Após tantas tentativas fracassadas de combate à inflação e de diversos


problemas causados na economia brasileira em razão da alta constante de preços,
no final do ano de 1993, os primeiros passos para a implantação de um novo plano
econômico de combate à inflação foram dados. Assim, em 1994, a economia
brasileira, finalmente, foi estabilizada.

A década de 1990, no entanto, foi marcada por crises financeiras internacionais,


como a do México, a da Ásia, a da Rússia e a da Argentina, que afetaram a economia
de diversos países, principalmente os emergentes ou em desenvolvimento,
incluindo o Brasil. O final da década de 1990 foi marcada, também, por mudanças
no regime de política econômica.

Nos anos 2000, houve uma grande mudança política no Brasil, quando um
presidente considerado de esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva, assume a presidência
e governa o país por dois mandatos seguidos, e elege, em 2010, sua sucessora,
Dilma Rousseff. Apesar da mudança política, durantes muitos anos a estabilização
econômica foi mantida, mas outros problemas nunca foram superados.

Com base no exposto, esta unidade de estudo foi dividida em três seções. Na
primeira, discutiremos o Plano Real e a maneira como este foi criado, conseguindo
estabilizar a economia. Na segunda seção, entenderemos as crises financeiras
que afetaram a economia brasileira, com foco para as crises na Argentina, na
Rússia, na Ásia e no México. Na terceira seção veremos a solução encontrada pelo
governo brasileiro para amenizar os danos causados pelas crises internacionais na
economia brasileira, a crise cambial e o sistema de metas de inflação, que perdura
até os dias atuais.

Vamos lá?

O plano real e a estabilização macroeconômica 87


U3

88 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Seção 1

O Plano Real, da criação aos primeiros anos no


governo FHC
Nesta seção você entenderá como o Plano Real foi criado, a diferença deste
plano para os anteriores e o impacto dele na economia brasileira durante os anos
iniciais do governo Fernando Henrique Cardoso.

O Plano Real é considerado um dos planos mais habilidosos de combate à


inflação implementados no Brasil e, diferentemente dos planos econômicos até aqui
elaborados (lembrando que estamos no início da década de 1990), ele conseguiu
atingir o principal objetivo: combater a inflação.

Assim como o Plano Cruzado, o Plano Real diagnosticou a inflação como inercial.
Certamente você deve estar se perguntando: qual foi a diferença então? Por que o
Plano Real deu certo e o Plano Cruzado não? A grande diferença está na solução
dessa inflação inercial.

Para conhecer um pouco mais sobre a inflação inercial, leia o texto “A


descoberta da inflação inercial” do autor Luiz Carlos Bresser Pereira. Esse
artigo foi publicado na revista de Economia Contemporânea no ano de
2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex
t&pid=S1415-98482010000100008>. Acesso em: 24 abr. 2016.

Lembra-se de que discutimos, na Unidade 2, sobre as diversas formas de


combate à inflação, desde choques heterodoxos até choques ortodoxos? Então,
ao passo que o Plano Cruzado optou pelo congelamento de preços (proposta
heterodoxa), o Plano Real optou pela proposta da PUC/Rio, que ficou conhecida
como Larida, na qual eram defendidas a reforma monetária e a adoção de duas
moedas momentaneamente.

O plano real e a estabilização macroeconômica 89


U3

Atenção

A proposta que ficou conhecida como Larida foi defendida pelos


economistas e professores da PUC/Rio Pérsio Arida e André Lara Resende, na
qual defendiam que o controle inflacionário deveria ser feito a partir da adoção
de uma moeda indexada que circularia paralelamente a uma moeda oficial.

1.1 Implantação do plano real


Após a renúncia de Fernando Collor de Mello e o processo de impeachment,
Itamar Franco assumiu a presidência da república em 29 de dezembro de 1992, com
a situação econômica brasileira complicada. Em maio de 1993, Fernando Henrique
Cardoso assumiu o Ministério da Fazenda e começou a elaborar um novo plano de
estabilização.

Figura 3.1 | Fernando Henrique Cardoso

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Henrique_Cardoso>. Acesso em: 15 mar. 2016.

Fernando Henrique Cardoso (1931) é um sociólogo, professor


universitário, escritor e político brasileiro. É considerado um dos maiores
intelectuais na área de ciência política e da sociologia da América Latina.
Foi Presidente do Brasil por dois mandatos, de 1995 a 2002.
Disponível em: <http://www.e-biografias.net/fernando_henrique_
cardoso/>. Acesso em: 15 mar. 2016.

90 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Este novo plano, o Real, não poderia cometer os mesmos erros dos planos
anteriores. Portanto:

I. O plano Real seria adotado de forma gradual e não de surpresa como os


anteriores. Como você pode perceber, o termo “forma gradual” está em negrito
para indicar que o Plano Real não aconteceu de repente como os planos anteriores,
o que foi fundamental para que desse certo, uma vez que foi sendo adotado aos
poucos, dando maior credibilidade ao plano e o tornando mais duradouro.

Por que um dos pontos positivos do Plano Real se refere à sua


implantação feita de forma tranquila e com antecedência?
Qual é o impacto desse fato para o governo?

II. Diferentemente, também, dos planos anteriores, o Plano Real não optou pelo
congelamento de preços como defendido pela proposta heterodoxa, tendo escolhido
a substituição gradual da moeda, conforme a proposta conhecida por Larida.

III. Haveria preocupação com a correção dos desequilíbrios existentes.


Diferentemente dos planos anteriores, o Plano Real procurou corrigir os desequilíbrios
econômicos e, somente após a correção, a nova moeda seria lançada.

IV. Novo contexto: reingresso no fluxo de recursos externos e abertura comercial.


Quando os demais planos econômicos foram lançados, a situação brasileira era bem
diferente, pois, nas décadas de 1960, 1970 e 1980 vivíamos o regime militar com a
economia fechada. Já em 1994, quando o Plano Real foi lançado, o ex-presidente
Fernando Collor de Mello tinha aberto a economia. Então, o Plano Real foi lançado
após a abertura econômica.

Dentro desse novo contexto, o Plano Real foi implementado em três fases,
conforme descreve a Figura 3.2.
Figura 3.2 | Fases da implantação do Plano Real

2ª fase: 3ª fase: reforma


1ª fase: ajuste
indexação plena monetária
fiscal - junho/93
(URV) - março a (Criação do Real)
a março/94
julho/94 - julho/94

Fonte: Souza (2009).

O plano real e a estabilização macroeconômica 91


U3

1ª fase: ajuste fiscal – a primeira fase do novo plano iniciou-se em junho de 1993
e terminou em março de 1994, tendo sido chamada de ajuste fiscal. Ela teve como
objetivo solucionar o desequilíbrio orçamentário e evitar as pressões inflacionárias
geradas a partir desse desequilíbrio. O governo então fez um ajuste fiscal que consistiu
em:

a) Cortes de despesas através do lançamento do Plano de Ação Imediata (PAI) em


meados de 1993, que visava o corte de US$ 7 bilhões nas despesas de investimentos
e pessoal.

O PAI (Programa de Ação Imediata) foi um conjunto de medidas


econômicas elaborado em julho de 1993, que “preparou a casa” para o
lançamento do Plano Real um ano depois. Nessa época, o presidente
era Itamar Franco, e Fernando Henrique Cardoso já era o Ministro da
Fazenda.
Fonte: <http://www.infoescola.com/economia/plano-real/>. Acesso
em: 26 abr. 2016.

O Programa de Ação Imediata consistiu em (SOUZA, 2009):

• Corte de gastos públicos de aproximadamente 6 bilhões de dólares no orçamento


de 1993, em todos os ministérios.

• Elaboração de uma proposta orçamentária para 1994 com base em uma previsão
realista da receita.

• Privatização das empresas dos setores siderúrgico, petroquímico e fertilizantes, e


início da privatização nos setores elétrico e ferroviário.

O que é privatização? A privatização ocorre quando o governo vende


empresas estatais para a iniciativa privada (empresas nacionais, grupos de
investimentos, multinacionais). Dessa forma, a empresa torna-se privada.
Geralmente, a privatização ocorre quando uma empresa estatal não está
gerando os lucros necessários para competir no mercado ou quando
ela passa por dificuldades financeiras. No Brasil, na década de 1990,
várias empresas estatais foram privatizadas, como, por exemplo: Telesp,

92 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Companhia Vale do Rio Doce, Banespa, entre outras. A privatização


ocorreu e está ocorrendo em diversos países do mundo, pois é uma
das características do mundo globalizado em que vivemos.
Fonte: <http://www.suapesquisa.com/historia/dicionario/privatizacao.
htm>. Acesso em: 26 abr. 2016.

• Tratamento mais rígido com os bancos estaduais e com as dívidas dos estados e
municípios.

• Aumento de 5% na alíquota de todos os tributos federais.

O que são tributos federais?


Os tributos federais, no Brasil, correspondem a uma gama extensa de
tributos arrecadados pela União, previstos pela Constituição Federal,
entre os quais:
• Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social
(COFINS).
• Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
• Imposto sobre a Exportação (IE).
• Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).
• Imposto sobre Operações de Crédito (IOF).
• Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (IR – pessoa
física e jurídica).
• IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).
• Programa de Integração Social (PIS).
Fonte: <http://www.portaltributario.com.br/tributario/tributosfederais.
htm>. Acesso em: 26 abr. 2016.

b) Aumento dos impostos pela criação do Imposto Provisório sobre Movimentação


Financeira (IPMF) com uma alíquota de 0,25% sobre o valor de todas as operações.

Para conhecer mais sobre a polêmica criação do Imposto Provisório sobre


Movimentação Financeira (IPMF) em 1993, acesse a Lei Complementar n.
77 de 13 de junho de 1993 disponível no link: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp77.htm>. Acesso em: 26 abr. 2016.

O plano real e a estabilização macroeconômica 93


U3

c) Redução nas transferências do governo via aprovação do Fundo Social de


Emergência (FSE), que liberava 15% da arrecadação de todos os impostos para a união.

Criada em 1994 com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE), essa


desvinculação foi instituída para estabilizar a economia logo após o Plano
Real. No ano 2000, o nome foi trocado para Desvinculação de Receitas da
União. Na prática, permite que o governo aplique os recursos destinados
a áreas como educação, saúde e previdência social em qualquer despesa
considerada prioritária e na formação de superávit primário.
Disponível em: <http://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-
assunto/dru>. Acesso em: 14 mar. 2016.

2ª fase: indexação da economia – teve início em primeiro de março de 1994 com


a criação de um indexador chamado Unidade Real de Valor (URV), que visava simular
os efeitos de uma hiperinflação e correção dos preços relativos.

Para saber quanto valia a Unidade Real de Valor (URV) por dia, acesse o
link <http://www.idealsoftwares.com.br/indices/urv.html>. Acesso em:
26 abr. 2016.

Atenção

A Unidade Real de Valor (URV) não era uma moeda física.

A URV funcionava da seguinte forma: o valor em cruzeiros reais (moeda da época)


seria corrigido diariamente pela taxa de inflação medida pelos principais índices
(IGP-M, IPC, IPC-FIPE e IPCA-Especial), que funcionaria como uma unidade de conta
do sistema (GREUMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Em outras palavras, de primeiro de março a 30 de junho de 1994, o Banco Central


diariamente fixava a paridade entre o cruzeiro real e a URV, tendo como base a perda
do poder aquisitivo do cruzeiro real (CASTRO, 2005).

94 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Inicialmente, o valor da URV manteria paridade fixa de um para um dólar; em outras


palavras, o valor da URV seria a taxa de câmbio. Quando foi implementada, 1 URV valia
CR$ 647,50 (uma URV era igual a 647,50 cruzeiros reais). Assim, diversos preços e
rendimentos, como preços oficiais, salários, contratos e impostos, foram convertidos
instantaneamente e os demais preços foram convertidos voluntariamente.

Então foi instituído um sistema bimonetário, segundo o qual a URV funcionava


como unidade de conta que expressava o preço da mercadoria, mas as transações
eram feitas em cruzeiro real. Em outras palavras, quando uma pessoa fosse comprar
um pão francês, por exemplo, o preço do produto era expresso em URV e, no
momento da compra, era convertido em cruzeiro real pela cotação do dia da URV. A
ideia era que a inflação persistia na moeda corrente e não na indexada (URV).

Atenção

Sistema bimonetário ocorre quando duas moedas circulam no país no


mesmo momento.

3ª fase: reforma monetária – em 1 de julho de 1994, quando quase todos os


preços estavam expressos em URV, a nova moeda, o Real, foi introduzida e seu valor
correspondia a URV e consequentemente ao dólar, já que a URV estava de acordo
com o dólar. Assim, um real era igual a 2.750,00 cruzeiros reais. Assim, a partir de
01/07/94 todos os preços em cruzeiro real foram divididos pela URV e transformaram-
se em real.

A Tabela 3.1 mostra o valor da URV diária entre 1 de janeiro de 1994 e 30


de junho de 1994.

Tabela 3.1 | Unidade Real de Valor (URV) em 1994


1994
Dia Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho
01 333,17 466,66 647,50 931,05 1.323,92 1908,68
02 333,17 475,31 657,50 931,05 1.323,92 1.942,11
03 333,17 484,11 667,65 931,05 1.345,54 1.942,11
04 338,52 493,09 677,98 931,05 1.367,56 1.976,13
05 343,95 502,23 688,47 948,93 1.389,94 1.976,13

O plano real e a estabilização macroeconômica 95


U3

06 349,97 502,23 688,47 967,16 1.412,74 1.976,13


07 355,09 502,23 688,47 985,74 1.435,92 2.010,74
08 360,79 511,53 699,13 1.004,68 1.435,92 2.046,38
09 360,79 521,01 709,96 1.023,98 1.435,92 2.082,65
10 360,79 530,67 720,97 1.023,98 1.459,76 2.119,80
11 366,58 540,51 732,18 1.023,98 1.484,27 2.157,78
12 372,47 550,52 743,76 1.043,65 1.509,20 2.157,78
13 378,45 550,52 743,76 1.063,70 1.534,66 2.157,78
14 384,52 550,52 743,76 1.084,13 1.560,55 2.196,55
15 390,70 550,52 755,52 1.104,96 1.560,55 2.236,02
16 390,70 550,52 767,47 1.126,18 1.560,55 2.276,91
17 390,70 560,73 779,61 1.126,18 1.586,87 2.318,55
18 396,97 571,12 792,15 1.126,18 1.613,64 2.361,49
19 403,35 581,70 805,53 1.147,81 1.640,86 2.361,49
20 409,82 581,70 805,53 1.169,80 1.668,54 2.361,49
21 416,40 581,70 805,53 1.191,93 1.696,69 2.406,05
22 423,09 592,48 819,80 1.191,93 1.696,69 2.452,17
23 423,09 603,46 834,32 1.213,97 1.696,69 2.499,18
24 423,09 614,65 849,10 1.213,97 1.725,31 2.547,09
25 429,88 626,04 864,14 1.213,97 1.754,41 2.596,58
26 436,78 637,64 879,45 1.235,99 1.784,00 2.596,58
27 443,80 637,64 879,45 1.258,12 1.814,09 2.596,58
28 450,92 637,64 879,45 1.280,19 1.844,69 2.647,03
29 458,16 - 895,03 1.302,65 1.844,69 2.698,46
30 458,16 - 913,50 1.323,92 1.844,69 2.750,00
31 458,16 - 931,05 - 1.875,82 -
Fonte: <http://www.idealsoftwares.com.br/indices/urv.html>. Acesso em: 28 mar. 2016.

Além disso, a outra peça-chave para a estabilização da economia era a chamada


âncora cambial, com base na qual um real equivalia a um dólar. Segundo Souza (2009),
o nome dado era em razão de o funcionamento ser igual ao das ancoras dos navios,
uma vez que a moeda nova, que é fraca, fica ancorada a uma moeda forte, cujo poder
aquisitivo pouco varia, o dólar.

Para conhecer mais sobre o Plano Real e a âncora cambial, leia o artigo
intitulado “Plano Real e a âncora cambial” da autora Maria Luiza Falcão

96 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Silva, publicado na Revista de Economia Política no ano de 2002.


Disponível em: <http://www.rep.org.br/pdf/87-1.pdf>. Acesso em: 26
abr. 2016.

Porém, para que fosse possível o mecanismo da âncora cambial, era necessário
haver reservas cambiais, o que era o caso do Brasil. Então, toda vez que ocorressem
ataques especulativos ao real, o governo injetaria moeda (dólar) no mercado, não
deixando que o real desvalorizasse.

No entanto, como a causa da inflação era inercial, era fundamental quebrar a


possibilidade de os agentes repassarem choques de custos para preços e fazer com
que esses choques fossem eliminados com o tempo (GREUMAUD; VASCONCELLOS;
TONETO JÚNIOR, 2011). Para isso, o governo elaborou algumas medidas que ficaram
conhecidas como âncoras monetárias:

I. Expansão monetária restritiva, como limitação das operações de crédito e


depósitos compulsórios de 100% sobre as captações adicionais do sistema financeiro.

ii. Controle da demanda e desestímulos a processos especulativos, com as taxas


de juros elevadas.

1.2 Impactos e problemas do Plano Real


O Plano Real atingiu seu objetivo principal: a taxa de inflação reduziu de mais
de 40% ao mês em julho de 1994 para 3,34% em agosto e permaneceu em 1 a
2% nos meses seguintes. Em termos de taxa de inflação anual, podemos analisar a
Tabela 3.2, em que percebemos que a inflação reduziu de forma gradual nos anos
seguintes ao lançamento do Plano Real.
Tabela 3.2 | Taxa de inflação anual entre 1995 e 1998
Ano Taxa de inflação
1995 14,8%
1996 9,3%
1997 7,55%
1998 1,7%

Fonte: Adaptado de Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

Além da redução da inflação, mesmo com medidas monetárias restritivas


e aumento da taxa de juros, tivemos crescimento significativo da demanda e da

O plano real e a estabilização macroeconômica 97


U3

atividade econômica. Certamente você deve estar se perguntando: “como, com


taxas de juros elevadas, a demanda pode ter aumentado?”.

São vários os fatores que explicam o aumento da demanda, entre eles o aumento
do poder aquisitivo da classe de baixa renda, a recomposição dos mecanismos de
crédito - pois com a economia estável a incerteza reduziu, tendo sido possível prever
a taxa de juros nominal futura -, o aumento do número de empréstimos (mesmo
com a taxa de juros alta) e o aumento dos investimentos das empresas. Com a
demanda maior, a atividade econômica foi expandida, principalmente nos setores
de bens de consumo duráveis e bens de capital.

Outra consequência do Plano Real está relacionada à taxa de câmbio, uma vez
que, ao estabilizar a economia utilizando-se o câmbio, no Brasil, assim como em
todos os países que adotaram essa estratégia, a moeda nacional sofreu uma grande
valorização em razão da inflação residual não repassada à taxa de câmbio. Para os
bens importáveis/exportáveis, não há problema, já que, com a concorrência, os
preços não aumentam.

Por sua vez, para os bens que não são negociáveis no mercado internacional,
como o setor de serviços, os preços continuam aumentando, uma vez que, com o
crescimento econômico, em conjunto com a estabilização, os salários reais sobem
e, como não há concorrência internacional, os custos são repassados aos preços.

Essa situação pode ser vista na Tabela 3.3, que demonstra a variação percentual
de alguns itens entre agosto de 1994, mês seguinte ao do lançamento do Plano Real,
e janeiro de 1997.
Tabela 3.2 | Taxa de inflação anual entre 1995 e 1998
Item Variação no preço
Equipamentos eletrônicos 11,25%
Roupas de cama, mesa e banho 18,12%
Gêneros alimentícios 20,93%
Roupas 29,01%
Material escolar 36,41%
Medicamentos 39,36%
Alimentação fora do domicílio 48,14%
Médicos e dentistas 92,46%
Educação – cursos formais 132,13%
Aluguel 198,12%

Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011).

É possível perceber que itens relacionados a serviços, como aluguel e educação,


aumentaram muito mais do que itens industriais, como equipamentos eletrônicos e

98 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

roupas de cama, mesa e banho.

A valorização cambial, somada à demanda aquecida, fez com que o Brasil


importasse mais do que exportasse, gerando déficit comercial, conforme podemos
ver na Tabela 3.4.
Tabela 3.4 | Balança Comercial entre 1993 e 1998

1993 1994 1995 1996 1997 1998


Importação 25.256 33.079 49.972 53.346 59.747 57.714
Exportação 38.555 43.545 46.506 47.747 52.994 51.140
Balança 13.299 10.466 -3.466 -5.599 -6.753 -6.575
Comercial
Fonte: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior et al. (2011).

Analisando a Tabela 3.4, pode-se ver que havia, no Brasil, superávit comercial em
1993 e 1994. No entanto, no ano seguinte ao do lançamento do Plano Real, 1995, o
País passou a ter déficit de 3.466 milhões de dólares. Esse déficit só foi aumentando
com o passar dos anos. Qual é o maior problema do déficit na balança comercial?
Os superávits na balança comercial financiavam os déficits da balança de serviços e,
assim, conseguíamos ter um saldo equilibrado na conta Transações Correntes.

Porém, com déficits na balança comercial, o Brasil voltou a ter saldos negativos
em transações correntes, sendo esses saldos financiados pelas reservas cambiais
e/ou por recursos externos. No curto prazo, não há grandes problemas, mas, no
longo prazo, a dívida externa vai aumentando, a qual, em algum momento, deverá
ser paga.

A solução seria aumentar a competitividade e criar condições de gerar recursos


futuros, mas não foi o que aconteceu no Brasil. A importação de automóveis e bens
de consumo aumentaram consideravelmente, 208% e 185% respectivamente; e o
capital que entrava no país eram os chamados investimentos de portfólio, como
ações, fundos de aplicação financeira e fundos de privatização. Em outras palavras,
o déficit em transações correntes era financiado com recursos voltados para o
financiamento do consumo e recursos voláteis, que não aumentavam a capacidade
futura de pagamento.

Para tentar controlar a demanda e solucionar os problemas citados, em outubro


de 1994, após o primeiro turno das eleições presidenciais, Fernando Henrique
Cardoso tomou algumas medidas de imposição de crédito, tais como: diminuição
nos prazos de financiamento, proibição de financiamento às empresas de factoring
e cartões de crédito, aumento dos depósitos compulsórios. O impacto inicial foi
o aumento da taxa de juros, mas, no mês seguinte, novembro, as taxas de juros
voltaram a cair e a demanda continuou aquecida.

O plano real e a estabilização macroeconômica 99


U3

Factoring
Também conhecida como fomento mercantil ou comercial, a factoring
é uma modalidade de empresa que presta basicamente dois tipos de
serviços: assessoria no gerenciamento da área de contas a receber e a
troca de títulos a receber, tais como duplicatas, promissórias ou cheques
pré-datados, por dinheiro à vista, dando às empresas que detinham o
crédito a possibilidade de antecipar o recebimento e alimentar seu caixa.
É claro que as factoring não cobrem o valor integral dos títulos. Elas
descontam juros e taxas pelo adiantamento, que variam de 80% a 50%
do valor de face.
Fonte: adaptado de Wolffenbüttel (2006).

Outra medida foi em relação à entrada do capital estrangeiro: foram feitas


algumas restrições e definiu-se a margem dentro da qual o dólar poderia variar (de
R$ 0,84 à R$ 0,86), porém o déficit em transações correntes continuava.

Resumindo, o Plano Real atingiu seu objetivo principal, que era o combate à
inflação, porém dois outros problemas macroeconômicos foram agravados, que
foram:

a) Desequilíbrio externo: ocorreu em razão do aumento das importações e da


redução das exportações. Consequentemente, houve aumento da dívida externa,
decorrente da necessidade de financiamento do déficit comercial e na conta
Transações Correntes. Para se ter uma ideia, o déficit em conta-corrente passou de
US$ 2 bilhões em 1994 para US$ 30 bilhões em 1997 (CASTRO, 2005).

b) Crise fiscal: o déficit público nominal foi de 7% do PIB entre 1995 e 1998.

1. Explique, com suas palavras, as três fases do Plano Real.

2. Por que, mesmo com todas as medidas de restrição ao


crédito, a demanda aumentou após a implantação do Plano
Real?

100 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Para finalizar esta Seção 1 da Unidade 3 do nosso livro de Economia Brasileira


Contemporânea, vamos analisar o Gráfico 3.1, que demonstra o comportamento da
taxa de inflação mensal de 1985, quando a Nova República teve início, até 1996, dois
anos após a implantação do Plano Real.

Gráfico 3.1 | Comportamento da taxa de inflação mensal entre 1985 e 1996

Fonte: Castro (2005).

Analisando o Gráfico 3.1, percebe-se, claramente, que há redução significativa da


inflação no mês seguinte ao do lançamento de um novo plano econômico, mas,
logo depois, a inflação aumenta consideravelmente e a taxa é maior do que a de
antes do lançamento do plano de estabilização, com exceção do Plano Real, que,
ao ser lançado, quando a taxa de inflação era de, aproximadamente, 45% ao mês, a
reduziu a 1%, poucos meses depois, tendo permanecido nesse patamar.

Essa redução da taxa de inflação imediatamente após o lançamento de um


plano econômico e o aumento considerável dos preços poucos meses depois são
características fortes da economia brasileira, o que é próprio da inflação inercial.

Certamente você deve estar se perguntando: o que a inflação inercial tem a ver
com a redução imediata dos preços e o aumento deles logo depois do lançamento?!

Como a inflação inercial é uma espécie de memória inflacionária – ou seja, como


os agentes econômicos aumentam os preços hoje com base no aumento de preços
do passado –, quando um novo plano era lançado e os preços eram congelados (não
esqueça que somente o Plano Real deixou de optar por essa medida), os preços caíam.

Porém, poucos meses depois, o congelamento não fazia mais efeito e os agentes,
em função do passado e das expectativas futuras (negativas, é claro), aumentavam
os preços e a taxa de inflação, então, voltava a subir até o lançamento de um novo
plano de estabilização econômica.

O plano real e a estabilização macroeconômica 101


U3

O que mais podemos inferir do Gráfico 3.1? Lembre-se de


relacionar as taxas de inflação aos planos econômicos.

102 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Seção 2

O Plano Real e as crises financeiras internacionais:


México, Ásia, Rússia e Argentina
Nesta seção você será levado a compreender o que foram essas crises e como
as crises financeiras da década de 1990 e a da Argentina, no início dos anos 2000,
afetaram a economia brasileira. Além disso, você conhecerá as medidas que
o governo brasileiro adotou para amenizar os impactos das crises financeiras na
economia brasileira.

O Plano Real foi marcado por inúmeras e sequenciais crises financeiras


internacionais que, definitivamente, colocaram à prova a estabilidade da economia
brasileira e a eficácia do Plano Real. Dentre essas crises, pode-se citar a do México,
no ano do lançamento do Plano Real, a da Ásia em 1997, a da Rússia em 1998 e a da
Argentina entre 2001 e 2002. Vamos entender cada uma dessas crises financeiras e
como elas afetaram a economia brasileira?

Antes de estudar cada uma das crises citadas, no entanto, vamos compreender
o que são crises financeiras internacionais. Uma crise financeira acontece quando
uma ou algumas situações fazem com que instituições ou ativos financeiros se
desvalorizem repetidamente.

Em geral, em uma crise financeira, os investidores, como não desejam perder


dinheiro, saem daquele país, ou seja, acontecem as fugas de capitais e todos os
países com aquelas mesmas características acabam sofrendo consequências.

2.1 A crise do México (1994)


A primeira crise financeira internacional que impactou a economia brasileira após
a implantação do Plano Real foi a crise do México em 1994, que ficou conhecida
como efeito tequila e deixou importantes lições ao governo brasileiro.

O plano real e a estabilização macroeconômica 103


U3

Para saber mais sobre as consequências da crise mexicana, veja o filme


O Efeito Tequila.

Gênero: Comédia Dramática.


País: México.
Ano: 2010.
Duração: 100 minutos.
Direção: Leon Serment.

Sinopse: Jose Fierro é um jovem corretor da bolsa de valores. Em 1994, ele


se rende à tentação do aparente boom da economia mexicana, que mais
tarde se torna um desastre nacional. Jose se envolve em negociações
financeiras ilícitas e se depara com grandes forças políticas e econômicas,
enquanto sua mulher, Ana Luiza, inicia uma relação extraconjugal.

Em 1994, o México apresentava profundos desequilíbrios macroeconômicos


(anos de déficit em transações (anos de déficit em transações correntes, situação
semelhante a do Brasil, que também se encontrava em situação deficitária). e um
conturbado quadro político, ou seja, o país estava vivendo uma crise política e social
em decorrência do estrangulamento da economia interna.

O saldo em transações correntes

É um dos principais resultados computados no balanço de pagamentos.


A conta-corrente, ou conta de Transações Correntes, reúne a balança
comercial (exportações e importações) e a balança de serviços
(transportes, seguros, remessas e recebimento de juros e lucros, rendas
e transações unilaterais). Só não contabiliza o investimento direto e os
créditos financeiros. O saldo em conta-corrente é visto de várias formas:
indica se os habitantes de um país estão concedendo ou tomando
empréstimos do resto do mundo; o déficit menos o investimento
estrangeiro direto líquido mostra a necessidade de financiamento

104 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

externo; os modelos pós-keynesiano e estruturalista consideram o


déficit em conta-corrente uma das principais restrições ao crescimento
econômico; outros interpretam que o déficit, ao contrário, pode resultar
de expectativas otimistas sobre o crescimento econômico futuro.
Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.
php?option=com_content&view=article&id=2152:catid=28&Item
id=23>. Acesso em: 28 abr. 2016.

No final de 1994, após seis anos do peso mexicano sobrevalorizado, as reservas


internacionais baixaram consideravelmente em função de déficit no saldo da conta
Transações Correntes. Nesse contexto, o governo foi obrigado a desvalorizar a
moeda e os investidores saíram do país, desencadeando uma grande crise financeira,
a qual reduziu a produção e gerou desemprego de mais de 60%.

Como os investidores do México perderam dinheiro, o medo dos investidores de


outros países em situação semelhante, como Brasil e Argentina, aumentou, uma vez
que estes poderiam seguir o mesmo caminho mexicano. Assim, em março de 1995,
os investidores começaram a tirar dólares do Brasil, fazendo especulações sobre o
Real. Desse contexto vem o nome “efeito tequila”.

Com a crise no México, ficou claro que as contas externas não poderiam mais ser
deterioradas, ou seja, apesar de o objetivo principal ser a estabilização da economia,
a situação externa não poderia ficar de lado, caso contrário poderíamos passar por
uma crise cambial. Nesse momento, Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011)
afirmam que o Plano Real passou para uma segunda fase.

A solução encontrada pelo governo FHC em março de 1995 foi ampliar o controle
da demanda interna ainda mais para evitar a perda das reservas. Para isso, a equipe
econômica optou, entre outras medidas, por restrição do crédito, elevação da taxa
de juros para atrair capital estrangeiro, desvalorização em 6% da taxa de câmbio e
alargamento das bandas de flutuações.

O impacto dessas medidas foi positivo e o governo conseguiu minimizar os


ataques especulativos. O principal instrumento do governo, então, passou a ser a
taxa de juros, que foi utilizada para conter a demanda, controlar a inflação, impedir
déficits comerciais elevados, manter o país atrativo ao capital estrangeiro, entre
outros fatores (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Porém, no segundo semestre de 1995, a atividade econômica retraiu, a


inadimplência das empresas e dos consumidores aumentou significativamente
e dois bancos faliram, restaurando o princípio de uma crise financeira, que foi
contornada pelo Banco Central por meio do Programa de Estímulo à Reestruturação

O plano real e a estabilização macroeconômica 105


U3

e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER) e do Programa de


Reestruturação dos Bancos Estaduais (PROES).

Para conhecer o PROER, acesse o link disponível em: <http://www.bcb.


gov.br/?PROER> (acesso em: 18 abr. 2016).

Apesar disso, a crise financeira de 1995 e o processo de reestruturação do sistema


financeiro provocaram aumento da dívida pública, que, em 1994, era de 30% do PIB
e, em 1998, passou para 44% do PIB. Houve ruptura no crescimento econômico e
aumento do desemprego.

2.2 A crise da Ásia (1997)


A segunda crise financeira internacional que afetou a economia brasileira foi a
crise asiática em 1997, que ficou conhecida como a Crise dos Gigantes Asiáticos. Ela
teve início no verão de 1997 na Tailândia, quando houve fuga de capital e deflação
de ativos financeiros, atingindo, inicialmente, Malásia, Indonésia e Filipinas e, depois,
os tigres asiáticos Coréia do Sul e Hong Kong.

Quem são os Tigres Asiáticos?

O termo Tigres Asiáticos se refere a quatro países da Ásia (Hong Kong,


Cingapura, Coreia do Sul e Taiwan), que a partir da década de 1970
alcançaram um acelerado desenvolvimento industrial e econômico.
Em razão da agressividade administrativa e da localização desses
países, eles receberam tal denominação. Foram vários os fatores
responsáveis pelo desenvolvimento econômico dos Tigres Asiáticos.
Implantou-se nesses países um modelo industrial caracterizado como
IOE (Industrialização Orientada para a Exportação). Esse modelo
econômico é fundamentalmente exportador; dessa forma, sua produção
é diversificada e voltada para o mercado de países desenvolvidos. No
entanto, o consumo interno não é incentivado, uma vez que os impostos
inseridos nos produtos são elevados.
Fonte: <http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/tigres-
asiaticos.htm>. Acesso em: 26 abr. 2016.

106 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

A gota d’agua para a crise foi a desvalorização em 15% da moeda Tailandesa,


afetando a confiança das instituições financeiras domésticas. Dois meses depois, as
moedas das Filipinas, Malásia e Indonésia também foram desvalorizadas e assim a
crise foi ficando cada vez maior.

Canuto (2000) aponta duas características da crise que foram responsáveis pela
forte saída de capital: a acentuada desvalorização da moeda dos países envolvidos e
a queda nos preços dos ativos em mercados acionários. Para se ter uma noção da
evasão de capital, em 1996, US$ 93 bilhões entraram nos países asiáticos, ao passo
que, em 1997, US$ 12 bilhões saíram.

Reflita sobre o papel da confiança na crise financeira asiática.

Durante a crise asiática, as reservas brasileiras foram reduzidas em US$ 20 bilhões,


e, em resposta à crise, o governo brasileiro aumentou a taxa de juros (a SELIC chegou
a 20% ao ano) e lançou pacotes fiscais que não foram cumpridos, o que deteriorava
as condições de financiamento.

O impacto foi a recuperação das reservas, o aumento do desemprego e a redução


do produto interno bruto. Além disso, o mercado passou a não confiar na política
fiscal que foi descumprida pelo governo e reagiu rejeitando os títulos pré-fixados.

Para conhecer mais sobre a crise da Ásia e seus impactos sobre a


economia brasileira, leia o artigo “A crise asiática e seus desdobramentos”
do autor Otáviano Canuto, publicado pela Revista Econômica em 2000.
O texto está disponível no link: <http://www.uff.br/revistaeconomica/
v2n2/3-otaviano.pdf>. Acesso em: 26 abr. 2016.

2.3 A crise da Rússia (1998)


A economia brasileira ainda não tinha se recuperado da crise asiática e já sofria o
impacto da crise russa, que ficou conhecida como a moratória russa.

O plano real e a estabilização macroeconômica 107


U3

Atenção

O que significa moratória?

Moratória “é um termo utilizado geralmente no campo da economia para


referir-se à espera ou dilação que o credor concede ao devedor e que vai além
do prazo estipulado como final para a conclusão de uma determinada dívida. Tal
entendimento está ligado no Brasil geralmente à matéria do Direito Tributário,
[em que] o contribuinte se beneficia de determinada concessão atribuída pelo
fisco, configurando-se assim o instituto que naquela matéria específica também
recebe o nome de moratória.

Já em um campo mais abrangente da economia estatal, o termo moratória


pode ser entendido também como [...] o ato de adiar, por parte do devedor, os
vencimentos de sua dívida externa, suspendendo os pagamentos e a respectiva
ação da justiça. Assim, esta será decretada pelo governo de um país que esteja
enfrentando circunstâncias econômicas ou estruturais excepcionalmente
graves, como, por exemplo, um conflito armado, revolução, crise econômica,
calamidade pública”.

Fonte: <http://www.infoescola.com/economia/moratoria/>. Acesso em: 26


abr. 2016.

Com o fim da União Soviética, em 1991, a Rússia realizou inúmeras medidas para
se encaixar no modelo capitalista ocidental, tais como privatização e redução do
papel do Estado na economia, tendo de controlar a inflação. Ao realizar privatizações,
o governo russo abriu a economia aos investimentos externos, e as exportações, em
sua maioria commodities, entre elas o petróleo, tiveram o preço consideravelmente
reduzido.

A União Soviética foi o país que representou o bloco comunista no


mundo a partir de 1922 e combateu a polaridade capitalista até 1991.
Após a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética travou grande conflito
com os Estados Unidos pela influência ideológica no mundo. No início da
década de 1980, a União Soviética já se mostrava desgastada e incapaz de
se sustentar em sua ideologia. Em 1989 foi derrubado o Muro de Berlim,
símbolo da Guerra Fria. Muitos consideram a ocasião como o marco do
fim do socialismo no mundo. A União Soviética, por sua vez, chegou ao

108 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

fim em 1991, quando foi desmembrada em vários outros países.


Disponível em: <http://www.infoescola.com/historia/uniao-sovietica/>.
Acesso em: 16 mar. 2016.

A Crise da Ásia em 1997 afetou as economias emergentes, dentre as quais estava


a russa, desvalorizando a moeda. No entanto, o governo russo manteve a paridade
do rublo (moeda russa) com o dólar, política cambial que, no entanto, foi uma
medida de alto custo para o governo.

A paridade do rublo com o dólar e a queda nas receitas oriundas das exportações
fizeram com que a dívida aumentasse. Sem dinheiro para pagar a dívida, o presidente
russo Boris Yeltsin declarou moratória. Essa medida aumentou a desconfiança dos
investidores internacionais.

A Rússia então fez um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para
pagamento da dívida. Com isso, houve troca de rublos por dólares no país e os
dólares eram enviados ao exterior; o resultado interno foi o aumento do desemprego.
Para reverter a situação, o governo russo desvalorizou a moeda com o objetivo de
os investidores retornarem ao país.

A recuperação da Rússia após a crise de 1998 ocorreu em virtude, principalmente,


das receitas de exportação de petróleo e gás, que foram fortemente valorizadas no
mercado internacional. Para você, caro(a) estudante, ter uma ideia, o país cresceu
a uma taxa média anual de 7% em função do desenvolvimento do mercado de
petróleo e gás que atraiu exportadores e investidores internacionais.

A conjuntura favorável apresentada acima fez com que, dez anos após a crise,
a Rússia se transformasse em uma das dez maiores economias do mundo, com
reservas internacionais de, aproximadamente, US$ 584,4 bilhões, redução do
desemprego e aumento da renda nacional.

Dona da maior reserva de gás natural do mundo e da segunda maior


de petróleo, a Rússia tem 60% de suas exportações sustentadas pelo
setor energético. O país também é grande produtor de outras matérias-
primas, como metais e madeira, tendo se beneficiado, como o Brasil, da
alta no preço das commodities nos últimos anos.

O impacto da crise russa para o Brasil foi:

a) A perda de US$ 30 bilhões nas reservas brasileiras entre agosto e setembro de

O plano real e a estabilização macroeconômica 109


U3

1998. Vamos analisar a tabela 3.5 que mostra a evolução das reservas internacionais
brasileiras entre 1997 a 2002.

Tabela 3.5 | Evolução das reservas internacionais brasileiras


Ano Reservas internacionais (bilhões US$)
1997 52,173
1998 44,556
1999 36,342
2000 33,011
2001 35,866
2002 37,823
Fonte: Banco Central (2016).

Analisando a tabela, podemos entender a variação das reservas internacionais


brasileiras entre 1997, ano anterior ao da crise russa, até 2002, último ano do governo
Fernando Henrique Cardoso. Vemos que, após as crises financeiras internacionais,
as reservas brasileiras foram reduzidas consideravelmente, voltando a aumentar
apenas em 2001.

b) A queda no preço dos títulos da dívida externa, conforme se pode ver no


Gráfico 3.2. A “dívida bruta” engloba todo tipo de débito do Estado brasileiro: títulos
públicos vendidos ao “mercado”, empréstimos bancários, empréstimos feitos por
organismos internacionais, débitos estaduais e municipais assumidos pelo governo
federal. Por sua vez, no cálculo da “dívida líquida”, desconta-se tudo o que o País tem
em caixa – seja em reais depositados aqui, seja em dólares mantidos no exterior – ou
vai receber no futuro, inclusive o montante que vai receber do mesmo “mercado” de
quem o Brasil é devedor.
Gráfico 3.2 | Evolução da dívida pública brasileira

Fonte: Banco Central (2016).

110 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Conforme se pode ver no Gráfico 3.2, a dívida pública brasileira aumentou


consideravelmente após a crise do México e continuou aumentando com a crise da
Ásia e da Rússia, chegando a praticamente 50% do Produto Interno Bruto (PIB) em
2000.

c) A negociação com o FMI de um pacote de ajuda no valor de US$ 42 bilhões,


no qual se exigia que o Brasil mantivesse, no mínimo, US$ 20 bilhões de reservas
cambiais, dificultando a defesa da taxa de câmbio e aumentando a possibilidade de
especulação.

No entanto, 1998 foi ano de eleição presidencial, e o presidente Fernando


Henrique Cardoso tentaria a reeleição, dada a estabilidade conquistada com o
Plano Real. Como afirma Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 468)
“o presidente ainda tinha a estabilização como a grande conquista de seu primeiro
mandato; assim, esta não poderia ser colocada em risco. Para empurrar a crise, o
governo teve que assumir o ônus de uma mudança latente na taxa de câmbio”.
Assim, FHC foi eleito presidente do Brasil pela segunda vez.

2.4 A crise Argentina (2001/2002)


A Argentina entrou na década de 1990 com hiperinflação e, Domingo Cavallo,
ministro das Finanças, lançou um plano de estabilização econômica, no qual foi
definido que um peso valeria um dólar. Essa política é conhecida como currency
board (conselho de moeda), modelo que, segundo Batista Júnior (2002), é
recomendado particularmente para países que, como a Argentina, experimentaram
crises monetárias agudas e prolongadas; é uma variante rígida da ancoragem
cambial. As principais características do currency board são:

I) Fixação da taxa de câmbio em relação ao dólar.

II) Eliminação de restrições à transformação de moeda nacional em moeda


estrangeira e vice-versa.

III) Definição de um "lastro" para a moeda nacional.

Com o modelo currency board adotado, o país voltou a crescer, assim como a
dívida externa pública, já que era preciso financiar essa paridade.

O plano real e a estabilização macroeconômica 111


U3

Currency board

Para o leigo, o termo soa esquisito, mas realmente não existe tradução
definitiva para o português. Alguns traduzem como Caixa de Conversão
ou Agência de Conversão, outros traduzem como Conselho da Moeda.
O princípio de operação de um Currency Board é bastante simples e,
quando obedecido ortodoxamente, muito eficaz. O Currency Board é o
arranjo que se implementa quando se quer adotar uma genuína "âncora
cambial", o que faz com que a moeda de um país se torne um mero
substituto de uma moeda estrangeira. A única função de um Currency
Board é trocar moeda nacional (que ele próprio emite) por moeda
estrangeira, e vice-versa, a uma taxa fixa.
No caso específico da Argentina, o Banco Central convertido em
Currency Board tinha a função de trocar, sem custo e sem demora,
1 peso por 1 dólar e 1 dólar por 1 peso. Para cada dólar que entrasse
no país, o Currency Board emitiria um peso argentino em troca desse
dólar. A operação inversa ocorreria no caso de uma saída de dólar (peso
argentino seria entregue ao Currency Board que, em troca, enviaria o
dólar para o destinatário estrangeiro).
Fonte: <http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1562>. Acesso em: 26
abr. 2016.

A Argentina sofreu forte impacto das crises mexicana e asiática, que reduziram
consideravelmente os investimentos. Para piorar a situação Argentina, a política
cambial brasileira em 1999, quando o Real foi desvalorizado, tornou as exportações
argentinas caras. Com redução da receita e a paridade rígida do peso com o dólar,
a Argentina não tinha como pagar as altas dívidas externas e declarou moratória em
2001.

E qual foi o impacto da crise argentina para a economia brasileira? A crise


argentina fez com que ocorresse saída de capital do Brasil, o que desvalorizou ainda
mais nossa moeda (Real). Com a moeda desvalorizada, as exportações brasileiras
continuaram aumentando, o que pressionou a inflação.

Com a possibilidade de volta da inflação, o Banco Central elevou a taxa de


juros, o que reduziu os investimentos. Além disso, em 2001 passamos por uma
crise energética que retraiu o consumo e o investimento ainda mais. Com baixo
crescimento econômico e, consequentemente, aumento do desemprego, câmbio
pressionado e taxas de juros altas, a dívida pública brasileira aumentou. Assim termina
o governo Fernando Henrique Cardoso, em 2002.

112 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

1. Explique por que todas as crises financeiras internacionais


do período afetaram a economia brasileira.

2. Qual é a principal variável que o governo alterou para


amenizar os efeitos das crises financeiras internacionais?

O plano real e a estabilização macroeconômica 113


U3

114 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Seção 3

A crise cambial e o sistema de metas de inflação


Nesta seção você entenderá como a crise cambial alterou a política
macroeconômica brasileira e fez com que o Brasil adotasse o chamado sistema de
metas de inflação. Você também verá o impacto do sistema de metas na economia
brasileira.

Como discutimos na Seção 1, após a estabilização econômica, diversos


desequilíbrios surgiram, entre os quais podem ser citados o déficit fiscal e o déficit
externo como os principais.

Como você já sabe, durante o primeiro mandato de FHC, o câmbio brasileiro


foi sobrevalorizado, o que fez com que a dívida pública brasileira aumentasse
significativamente, já que é caro manter o real valendo tanto frente ao dólar, e houve
baixo crescimento econômico.

Com as crises financeiras da Ásia e da Rússia e a perda significativa das reservas


para amenizar os efeitos da crise, aumentou a preocupação do governo brasileiro
com a situação econômica. Para agravar ainda mais, a recessão econômica na qual
o país vivia, que causou altas taxas de desemprego, deterioração do saldo em conta-
corrente e elevação da razão dívida pública/PIB, justificou a mudança cambial em
meados de 1998 (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Sem falar
da redução dos termos de troca, da não aprovação do ajuste fiscal e da moratória
mineira em 1999, que agravaram ainda mais a crise cambial.

O problema é que, em 1997, 62% do endividamento externo era do setor


privado, e uma desvalorização cambial poderia causar a deterioração patrimonial
das empresas, com risco de crise econômica, quando há queda do consumo e do
investimento, e crise financeira, como, por exemplo, as falências.

Porém, não foi isso o que ocorreu com o Brasil, uma vez que o setor público
ofereceu hedge1 aos agentes para minimizar o risco cambial. As proteções cambiais
oferecidas foram:

1
Ver na Unidade 2 a explicação de hedge.

O plano real e a estabilização macroeconômica 115


U3

a) Venda de moeda estrangeira, que impactou a redução das reservas cambiais


em US$ 30 bilhões entre agosto e setembro de 1998.

b) Alteração na composição da dívida pública: houve retração nos títulos


prefixados de 55% para 3% em 1998 e aumento da participação dos títulos indexados
à taxa de câmbio, fazendo com que a dívida aumentasse ainda mais.

c) Venda de dólares ao setor privado.

Conclusão: quando houve a alteração cambial, apenas uma pequena parte


da dívida externa do setor privado não estava protegida. Por outro lado, as perdas
oriundas da desvalorização cambial concentravam-se no setor público e em poucos
agentes do setor privado.

Nesse contexto, entre dezembro de 1998 e janeiro de 1999, novamente houve


fuga de capitais e as reservas brasileiras reduziram em mais de US$ 1 bilhão ao dia,
sinalizando o agravamento da crise cambial brasileira. O cenário político também foi
favorável à mudança cambial, já que alguns governadores eleitos queriam renegociar
o pagamento da dívida dos estados, agravando ainda mais a situação fiscal.

Com a saída do presidente do Banco Central, Gustavo Franco, que era contra
a desvalorização cambial, e com a entrada de Francisco Lopes, que era a favor da
desvalorização, inicialmente o câmbio sofreu uma leve desvalorização, mas, como
os recursos continuavam saindo do país, o mercado solicitou uma desvalorização
maior.

Depois de escândalos e incerteza, novamente houve troca do presidente do


Banco Central. No início de 1999 Armínio Fraga assume a presidência do BACEN e
adota o regime cambial flutuante. O impacto foi imediato e o câmbio desvalorizou
em 70%, chegando a valer R$ 2,00 em fevereiro de 1999.

Existem três tipos de regimes cambiais principais, que, resumidamente, são:

a) Fixo: Banco Central determina o valor. Por exemplo, R$1,00 = US$1,00

b) Flutuante: o câmbio varia de acordo com a oferta e demanda de


moeda.

c) Bandas de flutuação: o Banco Central determina os valores mínimo e


máximo e, dentro desses limites, é o mercado quem os determina.

116 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

A taxa de câmbio desvalorizada poderia trazer a inflação de volta, como foi o caso
do México e dos países asiáticos, mas, para evitar que isso novamente acontecesse,
o governo adotou uma política monetária restritiva. Na gestão de Armínio Fraga,
portanto, foi criado o Comitê de Política Monetária (COPOM), que estipulou uma
meta de 45% ao ano para a taxa de juros SELIC para conter a saída de recursos e
reduzir a especulação na taxa de câmbio.

Objetivos do Copom são: "implementar a política monetária, definir a


meta da Taxa Selic e seu eventual viés, e analisar o Relatório de Inflação".
A taxa de juros fixada na reunião do Copom é a meta para a Taxa Selic, a
qual vigora por todo o período entre reuniões ordinárias do Comitê. Se
for o caso, o Copom também pode definir o viés, que é a prerrogativa
dada ao presidente do Banco Central para alterar, na direção do viés,
a meta para a Taxa Selic a qualquer momento entre as reuniões
ordinárias. As reuniões ordinárias do Copom dividem-se em dois dias:
a primeira sessão às terças-feiras e a segunda às quartas-feiras. Mensais
desde 2000, as reuniões ordinárias tiveram seu número reduzido para
oito ao ano a partir de 2006, sendo o calendário anual divulgado até
o fim de junho do ano anterior. As atas em português das reuniões do
Copom são divulgadas às 8h30 da quinta-feira da semana posterior a
cada reunião, dentro do prazo regulamentar de seis dias úteis, sendo
publicadas na página do Banco Central na internet ("Atas do Copom") e
para a imprensa. Ao final de cada trimestre civil (março, junho, setembro
e dezembro), o Copom publica o documento "Relatório de Inflação", que
analisa detalhadamente a conjuntura econômica e financeira do País,
bem como apresenta suas projeções para a taxa de inflação.
Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/htms/copom/a-hist.asp>.
Acesso em: 18 mar. 2016.

Alguns dos impactos da mudança cambial foram: aumento da taxa de inflação


em fevereiro de 1999, sua redução nos meses seguintes e leve valorização cambial
em abril/maio do mesmo ano. Depois o câmbio permaneceu por volta de R$1,90
até final de 2000.

Além disso, com a desvalorização cambial, a dívida pública aumentou


consideravelmente, já que diversos títulos estavam conectados ao dólar. Com a
taxa de juros elevada, pelo menos incialmente, os gastos com pagamento de juros
aumentaram.

Então, com a mudança do regime cambial em julho de 1999, foi adotado o sistema

O plano real e a estabilização macroeconômica 117


U3

de metas de inflação como a principal diretriz da política monetária brasileira. A partir


de então o cumprimento da meta estabelecida tem sido a função do Conselho de
Política Monetária (COPOM).

Segundo o Banco Central (2016), os elementos que caracterizam um regime de


metas para a inflação são:

I) Conhecimento público de metas numéricas de médio-prazo para a inflação.

II) Comprometimento institucional com a estabilidade de preços como objetivo


primordial da política monetária.

III) Estratégia de atuação pautada pela transparência para comunicar claramente


o público sobre os planos, objetivos e razões que justificam as decisões de política
monetária.

IV) Mecanismos para tornar as autoridades monetárias responsáveis pelo


cumprimento das metas para a inflação. Portanto, o regime de metas para a inflação
envolve mais do que o anúncio público de metas numéricas para a inflação. A
transparência e a prestação de contas regulares à sociedade e a seus representantes
são elementos essenciais desse regime.

Assim, pelo sistema de metas para a inflação, a função básica do Banco Central e,
portanto, da política monetária, é cumprir a meta definida pelo Conselho Monetário
Nacional e, para isso, seria utilizada a taxa de juros.

A versão contemporânea da meta de inflação (inflation targeting) surgiu


em 1990, na Nova Zelândia, e ganhou notoriedade dois anos depois,
quando a Grã-Bretanha a utilizou como uma alternativa para abandonar
o sistema cambial europeu, mantendo a libra esterlina fora da zona do
euro. A solução típica para cumprir a meta, inclusive no caso brasileiro,
é usar a taxa de juros. Por norma legal, se a meta não for atingida, o
presidente do BC é obrigado a divulgar uma carta aberta dando os
motivos do descumprimento.
Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.
php?option=com_content&view=article&id=2158:catid=28&Item
id=23>. Acesso em: 18 mar. 2016.

Você lembra qual é a relação da taxa de juros com a taxa de inflação? A taxa de
juros impacta a demanda e, consequentemente, os preços e a inflação. Assim, é de
se esperar que, se a inflação estiver acima da meta do governo, eleve-se a taxa de

118 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

juros e, com isso, reduzam-se a demanda e os preços também, fazendo com que a
inflação seja reduzida.

Além do Brasil, diversos outros países adotam o sistema de metas de


inflação, entre os quais estão Canadá, México, Turquia, Austrália, Chile,
Noruega, Reino Unido, África do Sul, Colômbia, entre outros.

Para se ter uma ideia do impacto do sistema de meta de inflação na inflação


efetiva, vamos analisar o Gráfico 3.3, que demonstra o histórico anual das metas
estipuladas pelo governo e a inflação efetiva, ou seja, a inflação real daquele ano.
Lembre-se de que a meta é o ideal, segundo o governo, mas a inflação é aceitável
com dois pontos percentuais para mais ou para menos, ou seja, se a meta é 4,5% ao
ano, é aceitável que a inflação fique entre 2,5 % e 6,5%.

Gráfico 3.3 | Histórico das metas para inflação – Taxas efetivas no Brasil

Fonte: Banco Central do Brasil (2016).

Analisando o Gráfico 3.3, pode-se perceber que, em praticamente todos os anos,


a inflação ficou acima da meta mas abaixo do limite da meta, com exceção dos anos
2001, 2002, 2003, 2004 e 2015, quando a inflação ultrapassou o limite da meta.

O plano real e a estabilização macroeconômica 119


U3

Para acompanhar o Sistema de Metas de Inflação no Brasil, leia o


conteúdo do link disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/n/
sismetas>. Acesso em: 16 mar. 2016.

Depois de toda nossa discussão sobre metas de inflação, você deve estar
perguntando: qual é o índice de preços que o Banco Central escolhe para
acompanhar a inflação no Brasil?

Segundo o próprio Banco Central (2016), a meta para a inflação foi definida em
termos da variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),
calculado pelo IBGE. O IPCA é índice de preços ao consumidor, diferentemente de
outros índices, como os de preços no atacado e gerais. A escolha do índice de preços
ao consumidor é frequente na maioria dos regimes de metas para a inflação, pois é
a medida mais adequada para avaliar a evolução do poder aquisitivo da população.

Dentro do conjunto de índices de preços ao consumidor, o IPCA foi escolhido


por ser, dentre os dois índices com cobertura nacional (o outro é o Índice Nacional
de Preços ao Consumidor – INPC), o que tem maior abrangência: ao passo que o
INPC mede a inflação para domicílios com renda entre 1 e 5 salários-mínimos (na
época da escolha, entre 1 e 8 salários-mínimos), o IPCA inclui domicílios com renda
entre 1 e 40 salários-mínimos.

1. Quais fatores levaram o Brasil a mudar a política cambial em


1999?

2. Explique, com suas palavras, o sistema de metas de inflação.

120 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Nesta unidade você aprendeu:


• A necessidade de implantação de um novo plano econômico.
• As etapas de criação do Plano Real.
• Os motivos que fizeram com que o plano Real conseguisse
estabilizar a economia e com que os demais planos não o
fizessem.
• As principais crises financeiras internacionais (México, Ásia,
Argentina e Rússia) e seus impactos na economia brasileira.
• A crise cambial e a necessidade de mudança.
• O funcionamento do sistema de metas de inflação.
• O primeiro e segundo governos FHC e seu impacto na economia
brasileira.
• O tripé da política econômica dos governos FHC

Finalizamos a terceira unidade do livro de Economia Brasileira


Contemporânea. Começamos a discutir a implantação do Plano
Real e o porquê de esse plano de estabilização econômica ter
atingido o objetivo de combate à inflação. Na sequência, tratamos
das principais crises financeiras internacionais que afetaram a
economia brasileira e que colocaram à prova a eficácia do plano
Real.
Sabendo que os anos de 2015 e 2016 estão sendo conturbados
para a política brasileira e, consequentemente, para a economia,
vamos refletir sobre como as crises políticas, sem levar em
consideração o partido político ou governo, afetam a economia.
Será que a crise política causa recessão econômica ou a recessão
econômica causa crise política?

O plano real e a estabilização macroeconômica 121


U3

1. Comparando o Plano Real implementado em 1994 com


os demais planos econômicos da década de 1980, qual foi
o principal motivo para que o mencionado plano atingisse o
objetivo de estabilizar a economia quando os demais planos
haviam fracassado?

a) A forma como foi implementado.


b) A reforma cambial.
c) A abertura da economia.
d) A indexação da economia.
e) O apoio da população.

2. Ao implementar um novo plano econômico que tenha


como objetivo principal a estabilização da economia, é
importante definir a causa da inflação e, assim, tomar as
medidas necessárias para que os preços sejam reduzidos.
Se a inflação for diagnosticada de forma correta, o resultado
do plano econômico será satisfatório; o contrário também
é verdadeiro. Com base no exposto, qual foi o tipo de
inflação que o Plano Real diagnosticou?

a) Inflação de demanda.
b) Inflação de custos.
c) Inflação de oferta.
d) Inflação inercial.
e) Inflação presente.

3. A economia mundial passou por diferentes crises


financeiras que afetaram uma grande parte dos países,
incluindo o Brasil. Em relação às crises do México, Ásia,
Argentina e Rússia, marque a alternativa que mostra
corretamente a principal lição deixada para o governo
brasileiro.

122 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

a) Mudança na taxa de inflação.


b) Mudança no regime cambial.
c) Necessidade de valorização cambial.
d) Aumento da taxa de juros.
e) Alteração dos objetivos microeconômicos.

4. Todas as crises financeiras que ocorreram na década de


1990 e no início dos anos de 2000, como a do México, a da
Ásia, a da Rússia e a da Argentina, tiveram alguns pontos em
comum. Marque a alternativa que informa corretamente
um desses pontos:

a) Alta taxa de inflação.


b) Fuga da capital.
c) Governo populista.
d) Dívida com o FMI.
e) Moratória.

5. O Brasil em 1999 adotou o sistema de metas de inflação,


segundo o qual o Banco Central define o valor aceitável
da taxa de inflação para o próximo ano e toma medidas
para que essa meta seja atingida. Para isso, é utilizado
um indicador que pede a inflação. No Brasil, qual é esse
indicador?

a) IGP-10.
b) IGP-DI.
c) IPCA.
d) IPC.
e) IGP- M.

O plano real e a estabilização macroeconômica 123


U3

124 O plano real e a estabilização macroeconômica


U3

Referências

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/


home>. Acesso em: 27 abr. 2016.
BATISTA JÚNIOR, P. N. Argentina: uma crise pragmática. Revista Estudos Avançados,
vol. 16, n. 44, São Paulo: 2002.
CANUTO, O. A crise asiática e seus desdobramentos. Revista Econômica, Niterói, vol.
2, n. 3, 2000.
CASTRO, L. B. Esperança, frustações e aprendizado: a história da Nova República
(1985-1989). In: GIAMBIAGI, F; VILLELA, A. Economia brasileira contemporânea (1945-
2004). Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
GREMAUD, A. P.; VASCONCELLOS, M. A. S.; TONETO JÚNIOR, R. Economia brasileira
contemporânea. São Paulo: Atlas: 2011.
SOUZA, J. M. de. Economia brasileira. São Paulo: Pearson, 2009.
WOLFFENBÜTTEL, Andrea. O que é factoring? Desafios do desenvolvimento, n. 26,
ano 3, Brasília: 2006.

O plano real e a estabilização macroeconômica 125


Unidade 4

PLANO REAL NO CONTEXTO


DE MUDANÇA DE GOVERNO

Andréia Moreira da Fonseca Boechat

Objetivos de aprendizagem:
Nesta unidade vamos explorar o Plano Real no contexto de mudança do
governo PSDB para o governo PT e os impactos sobre a economia brasileira.
Iniciaremos nossa discussão, na Seção 1, falando um pouco sobre as
mudanças que o governo Lula trouxe para a economia brasileira e, também,
os pontos que não foram alterados. Na sequência, estudaremos as três
principais políticas macroeconômicas, a fiscal e a monetária, na Seção 2, e,
na Seção 3, a política externa do governo Lula. Além disso, na terceira seção
também veremos como se deu a transição de governo Lula para Dilma. E,
para finalizar nossa unidade, na Seção 4 entenderemos o que é o Programa
de Aceleração do Crescimento (PAC), sua importância e seus resultados no
governo Lula, além de discutir a economia durante o governo Dilma.

Seção 1 | Mudança e continuidade no governo Lula


Nesta seção, você estudará os dois governos Lula (2003-2006 e 2007-
2010) tanto as mudanças feitas pelo novo governo em relação ao anterior
quanto às continuidades políticas/econômicas.

Seção 2 | Política fiscal, monetária no novo governo


Nesta seção, você conhecerá as políticas fiscal e monetária dos dois
governos Lula e os impactos sobre a economia brasileira.

Seção 3 | Política exterior e transição econômica


Nesta seção, você estudará a política externa implementada nos
governos Lula e as mudanças econômicas do período.
U4

Seção 4 | O PAC e seus desdobramentos no governo Lula


Nesta seção você entenderá o significado, funcionamento e principais
resultados do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) criado no
governo Lula.

Seção 5 | O plano real sob o governo Dilma


Nesta seção entenderemos como a economia vem se comportando
no governo Dilma e a situação política conturbada do período.

128 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Introdução à unidade

Seja bem-vindo(a) à última unidade do nosso livro de Economia Brasileira


Contemporânea. Nas unidades anteriores estudamos a economia brasileira desde
os tempos de modelo agroexportador até o período final do governo Fernando
Henrique Cardoso.

Vimos nesses quase 150 anos (iniciamos nossa discussão no século XIX) que
a economia brasileira passou por períodos de expansão e por momentos de
retração, causados por inúmeros motivos, desde instabilidade política interna até
especulações oriundas de crises financeiras internacionais. E todos esses fatos
tiveram impactos diretos na economia brasileira e fizeram com que chegássemos
até aqui da maneira que estamos.

Agora que você conhece a economia brasileira e a forma como chegamos à


situação atual, nesta unidade podemos explorar a mudança política ocorrida em
2003 com a entrada do Partido dos Trabalhadores (PT) na presidência da república
e seus impactos sobre a economia brasileira. Para isso, esta unidade está dividida
em cinco seções.

Na Seção 1, “Mudança e continuidade no governo Lula”, você estudará os dois


governos Lula (2003-2006 e 2007-2010), as mudanças feitas pelo novo governo
em relação ao anterior e as continuidades políticas e econômicas. Na Seção 2,
“Política Fiscal e monetária no novo governo”, você conhecerá as políticas fiscal
e monetária dos dois governos Lula e os impactos sobre a economia brasileira. A
Seção 3, “Política externa e transição econômica”, levará você a conhecer a política
externa implementada nos governos Lula e as mudanças econômicas do período.

Na Seção 4, “O PAC e seus desdobramentos no governo Lula”, falaremos sobre


o significado, o funcionamento e os principais resultados do Plano de Aceleração
do Crescimento (PAC) criado no governo Lula. Na Seção 5, “O Plano Real sob o
governo Dilma”, entenderemos a forma como a economia vem se comportando
no governo Dilma e a situação política conturbada do período.

Vamos lá?!

Plano real no contexto de mudança de governo 129


U4

130 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Seção 1

Mudança e continuidade no governo Lula


No dia primeiro de janeiro de 2003, Luiz Inácio Lula da Silva toma posse se
tornando o novo presidente do Brasil, sendo reeleito em 2007 e assumindo a
presidência em 2008.

O governo Lula iniciou-se com um quadro de instabilidade econômica, no qual


podemos citar as pressões cambiais, aceleração inflacionária, baixo crescimento
econômico (2,5% durante o primeiro mandato e 2,1% no segundo mandato de FHC),
aumento do desemprego (12,6% em 2002) e dívida pública em torno de 60% do Produto
Interno Bruto, decorrentes do perfil (modalidades, prazo e tipos de indexadores) e do
baixo crescimento econômico (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Além disso, havia a incerteza quanto ao novo presidente, considerado de esquerda


e oriundo do Partido dos Trabalhadores (PT), que, historicamente, defendia a redução
do superávit primário, a redução das despesas com juros, a rejeição ao FMI, com críticas
ao regime de metas de inflação, questionamento sobre privatizações, entre outros
pontos que colocavam em dúvida a seriedade do governo para com a estabilidade
econômica e a preservação dos contratos. Essas dúvidas geraram a chamada “crise
eleitoral” em 2002.

Para conhecer mais sobre a crise eleitoral de 2002 e o impacto na economia


brasileira, leia o texto “A economia brasileira às vésperas das eleições de
2002” do autor Luiz Carlos Bresser Pereira. O artigo está disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/papers/2002/61adenauer-eleicoes.
pdf>. Acesso em: 27 abr. 2016.

Plano real no contexto de mudança de governo 131


U4

Qual é a relação entre eleição e crise econômica?

Durante o ano de 2002, percebe-se uma mudança significativa no discurso


do PT, com objetivo de conseguir credibilidade. O primeiro passo foi indicar para
coordenador do programa do governo o ex-prefeito de Ribeirão Preto, Antônio
Palocci, o qual tinha aproximação com o setor privado.

Assim, durante a campanha, foi sendo transmitida aos principais segmentos


da economia a ideia de manutenção da estabilidade, de defesa dos contratos, de
preservação do ajuste fiscal e da garantia de pagamento das dívidas (GREMAUD;
VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Nesse cenário, Lula é eleito presidente
do Brasil em 2002.

Figura 4.1 | Luiz Inácio Lula da Silva

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_In%C3%A1cio_Lula_da_Silva#/media/File:Lula_-_foto_
oficial05012007_edit.jpg>. Acesso em: 21 mar. 2016.

Luiz Inácio Lula da Silva (1945-) nasceu no dia 27 de outubro de 1945 na


localidade de Caetés, na cidade de Garanhuns, Pernambuco. Foi eleito
presidente da república duas vezes, ficando no cargo entre 1 de janeiro
de 2003 até 1 de janeiro de 2011. Foi um dos fundadores do Partido dos
Trabalhadores (PT) e hoje é seu Presidente de Honra. Depois de três
derrotas (1889,1994 e 1998) em eleições para presidente do Brasil, ele foi
eleito em 2002 e reeleito em 2006. Lula foi condecorado com mais de
300 prêmios e honrarias, dentro e fora do país.
Fonte: <http://www.e-biografias.net/luiz_inacio_lula_silva/>. Acesso
em: 21 mar. 2016.

132 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

O novo governo (2003) já teve início com diversas demandas, ou seja,


necessidades, sendo as principais delas as de estabilizar a economia, aprofundar o
ajuste fiscal, reverter a tendência de crescimento da dívida pública e a situação de
dominância fiscal, garantir a preservação dos superávits comerciais e fazer com que
o país voltasse a crescer. O único ponto positivo foi o bom desempenho do setor
externo em 2002 (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Para solucionar os problemas citados acima e cumprir as promessas de


campanha, Palocci foi indicado ao ministério da Fazenda, tendo sido mantida a
diretoria do Banco Central, havendo apenas a troca de seu presidente: Henrique
Meirelles assumiu o lugar de Armínio Fraga; os acordos com o FMI, por sua vez,
foram renovados.

O Ministério da Fazenda
É o órgão responsável por planejar, formular e executar as políticas
econômicas nacionais. Todos os assuntos relacionados à administração
dos recursos públicos estão sob sua responsabilidade, assim como as
regras de condução e fiscalização de operações de crédito, arrecadação
tributária federal, preços e tarifas públicas, seguros, consórcio e
previdência privada.
As negociações econômicas e financeiras com governos, organismos
multilaterais e agências governamentais também são atribuições do
Ministério da Fazenda, assim como toda a fiscalização e controle do
comércio exterior. O órgão também propõe a realização de estudos e
pesquisas para acompanhamento da conjuntura econômica.
Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/economia-e-
emprego/2009/11/ministerio-da-fazenda>. Acesso em: 2 abr. 2016.

Qual é a importância do Banco Central para a economia?

Os principais pontos do governo Lula são apresentados por Souza (2009) como:

a) Continuidade da política econômica: desde 2002, com a carta que ficou


conhecida como Carta ao Povo Brasileiro, Lula sinalizava o abandono das antigas
teses, como, por exemplo, o rompimento com o Fundo Monetário Internacional

Plano real no contexto de mudança de governo 133


U4

(FMI) e o compromisso com o tripé macroeconômico do governo Fernando


Henrique Cardoso, câmbio flutuante + superávit primário + sistema de metas de
inflação. A continuidade citada foi confirmada quando Henrique Meirelles foi mantido
na presidência do Banco Central pelos dois mandatos de Lula.

Carta ao Povo Brasileiro


“O Brasil quer mudar. Mudar para crescer, incluir, pacificar. Mudar para
conquistar o desenvolvimento econômico que hoje não temos e a justiça
social que tanto almejamos. Há em nosso país uma poderosa vontade
popular de encerrar o atual ciclo econômico e político...”.

Para ler, na íntegra, a “Carta ao Povo Brasileiro” do ano de 2002, entre


no link:
<http://novo.fpabramo.org.br/uploads/cartaaopovobrasileiro.pdf>.
Acesso em: 5 maio 2016).

b) Queda de desigualdade: uma das principais conquistas do governo Lula foi a


redução das desigualdades. Para se ter uma ideia, o índice de Gini reduziu de 0,61
em 1990 para 0,54 em 2009. Essa melhora ocorreu em virtude da consolidação da
estabilidade do Plano Real e das políticas sociais, como o Programa Bolsa Família e
o Prouni, ampliados durante o governo Lula.

Vamos entender o que significa políticas sociais? Segundo Vianna (2002), política
social é um conceito que a literatura especializada não define precisamente. No
entanto, no geral, a política social é entendida como modalidade de política pública
e, assim, como ação de governo com objetivos específicos.

Esses objetivos podem estar relacionados à distribuição de renda, como no caso


do programa Bolsa Família, à redução do analfabetismo, à vacinação e a tantos
outros problemas sociais existentes.

No caso, o Bolsa Família, criado em outubro de 2003 e ampliado durante o


governo Lula, é um programa social que contribui para combater a pobreza e as
desigualdades sociais e econômicas no país. Segundo o Ministério Social e Combate
à Fome (2015), o Bolsa Família possui três eixos principais: complemento da renda,
acesso a direitos, articulação com outras ações.

O outro programa social citado acima, o Prouni, é um programa do Ministério da


Educação (MEC), criado em 2005, que oferece bolsas de estudos parciais e integrais
nas instituições privadas de ensino superior a estudantes de nacionalidade brasileira.

134 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

O que é Índice de Gini?

O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, é um


instrumento para medir o grau de concentração de renda em determinado
grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e os
dos mais ricos. Numericamente, varia de zero a um (alguns apresentam
de zero a cem). O valor zero representa a situação de igualdade, ou
seja, todos têm a mesma renda. O valor um (ou cem) está no extremo
oposto, isto é, uma só pessoa detém toda a riqueza. Na prática, o Índice
de Gini costuma comparar os 20% mais pobres com os 20% mais ricos.
No Relatório de Desenvolvimento Humano 2004, elaborado pelo PNUD
(Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), o Brasil aparecia
com Índice de 0,591, quase no final da lista de 127 países. Apenas sete
nações apresentavam maior concentração de renda, ou seja, um índice
pior do que o Brasil. Já em 2014, o Índice de Gini brasileiro passou para
0,490, o que demonstra que, apesar de ainda termos certa concentração
de renda, a renda brasileira está se tornando menos concentrada. Esse
fato pode ser explicado pelos programas sociais implementados nos
últimos anos, como o polêmico Programa Bolsa Família. Porém, ainda há
um longo caminho a percorrer (IPEA, 2004).

c) Retomada do crescimento: o governo Lula foi beneficiado pela economia


estabilizada e um cenário externo favorável. Com isso, segundo Gremaud,
Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), durante o governo Lula o país cresceu em
média 4% ao longo dos dois mandatos. Esse crescimento foi baseado no aumento
do consumo.

1. Apresente a situação econômica brasileira em 2003, quando


Luiz Inácio Lula de Silva assumiu a presidência da república
pela primeira vez.

2. Explique, com suas palavras, a importância do ministro da


Fazenda Palocci para o governo Lula.

Plano real no contexto de mudança de governo 135


U4

136 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Seção 2

Política fiscal, monetária no novo governo


O primeiro desafio do novo governo era reverter a instabilidade ocorrida em
2002, quando se elevou o risco-país, além de terem sido geradas pressões cambiais
e inflacionárias. Você deve estar se perguntando: como saímos de uma situação tão
favorável e voltamos à instabilidade econômica?

Veja um resumo da situação: com a taxa de juros praticada nos últimos anos
do governo Fernando Henrique Cardoso, com baixo crescimento econômico, e
o valor da dívida, o superávit primário que o governo prometia (3,75% do PIB) não
era suficiente para estabilizar a dívida. Então, o governo Lula deveria gerar superávit
maior do que o prometido pelo governo anterior, sem deixar de lado a estabilidade
de preços e o regime de metas de inflação.

Assim, as primeiras medidas da nova equipe econômica foram:

a) Elevação da meta de superávit primário para 4,25% do PIB: esta meta foi
colocada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)


Orienta a elaboração e a execução do orçamento anual e trata de vários
outros temas, como alterações tributárias, gastos com pessoal, política
fiscal e transferências da União. Para maiores informações sobre a LDO,
veja o conteúdo do link: <http://www12.senado.gov.br/orcamento/ldo>.
Acesso em: 5 maio 2016.

b) Aumento da taxa de juros: já na primeira reunião do COPOM foi introduzido


o chamado viés de alta, que quer dizer a tendência da taxa de juros; em outras
palavras, um indicativo de que a taxa de juros tende a aumentar (ou baixar, caso seja
anunciado o viés de baixa).

Plano real no contexto de mudança de governo 137


U4

Vamos analisar a Gráfico 4.1 que demonstra a evolução da meta da taxa SELIC
entre 2000 e 2006.

Gráfico 4.1 | Evolução da meta da taxa SELIC (%) entre 2000 e 2006

Fonte: Vasconcelos, Gremaud e Toneto Júnior (2009) apud Banco Central do Brasil (2011).

Ao verificar o Gráfico 4.1, é possível perceber que, até 2003, a meta anunciada
pelo COPOM da taxa SELIC só aumentava, tendo reduzido ao final de 2003 e 2004,
quando voltou a subir.

Em 2002 e 2003 a taxa SELIC bateu recorde no período analisado, chegando a


quase 28%, tendo tido uma redução significativa em 2004 de, aproximadamente,
12%. Outro período de alta na taxa básica de juros foi em 2005. Porém ela não
aumentou tanto quanto em 2003.

2.1 Meta da inflação: 8,5% em 2003 e 5,5% em 2004

Antes mesmo de colocar em prática as medidas citadas, a situação econômica


brasileira já estava melhor somente pelo fato de as medidas garantirem que o governo
se preocupava com a estabilidade econômica e que renovaria o acordo com o FMI.

Em termos da situação fiscal, o desempenho foi melhor do que o do governo


Fernando Henrique Cardoso. Lembra-se de que falamos que a meta do governo
Lula era superávit primário de 4,24% do PIB?! Então, nos três primeiros anos do
governo Lula, o superávit foi maior do que a meta, reduzindo apenas um pouco
no quarto ano. O superávit primário variou entre 4,5% e 5% do PIB (GREMAUD;
VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). O impacto desse superávit primário foi
a redução da dívida líquida do setor público em relação ao Produto Interno Bruto já
a partir de 2004.

138 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Outra melhora feita pelo primeiro governo Lula ocorreu em relação ao perfil
da dívida pública, quando foram praticamente eliminados os títulos acoplados
com o dólar, tendo havido redução dos títulos conectados a SELIC e aumento da
participação dos títulos prefixados e dos títulos indexados pelos índices de preços.

O impacto da mudança do perfil da dívida pública é que diminuiu o risco de


ajustes patrimoniais em razão da elevação da SELIC ou da desvalorização cambial.

É importante observar, também, que o aumento da carga tributária brasileira


ajudou na melhora dos indicadores fiscais. Para conhecer a evolução da relação
carga tributária /PIB, analise o Gráfico 4.2.

Gráfico 4.2 | Evolução da relação carga tributária/PIB

Fonte: Amaral et al. (2015).

Ao verificar o Gráfico 4.2, pode-se perceber que a carga tributária brasileira


aumentou nas últimas décadas, tendo uma média de 34% durante o governo Lula.

A junção de melhoras nos indicadores fiscais e melhoras nos indicadores externos


fez com que o risco-país reduzisse e com que o Real valorizasse. Com a valorização
cambial, a taxa de juros começou a reduzir em 2003, conforme vimos no Gráfico
4.1.

Em relação ao crescimento econômico, o desempenho não foi bom, com


média de 2,6% ao ano, Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011) procuram
explicar que o baixo crescimento pode ter ocorrido em razão do baixo investimento
e, que em 2004, quando houve aumento do crescimento econômico, a capacidade
produtiva da indústria não o acompanhou, fazendo com que houvesse pressões
inflacionárias e, em virtude da alta carga tributária, incertezas regulatórias, baixa
poupança pública e redução dos investimentos públicos em setores prioritários.

Plano real no contexto de mudança de governo 139


U4

A baixa capacidade produtiva da indústria brasileira é um dos


entraves para o crescimento econômico brasileiro?
Se a capacidade produtiva aumentasse, haveria crescimento
econômico significativo?

Apesar do baixo crescimento econômico, as famílias expandiram o consumo


graças à expansão das transferências via aumento das transferências de renda, por
meio dos programas assistenciais, como o programa Bolsa Família e, também,
mediante expansão do crédito, principalmente da baixa renda, como a criação do
Banco Popular e do crédito consignado para reduzir o risco. Apesar do aumento do
crédito, este foi bem mais baixo do que nos outros países. Por exemplo, em 2002 os
empréstimos eram de 25% do PIB e em 2006 passou para 35% do PIB (GREMAUD;
VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).

Programa Bolsa Família – é um programa, criado em 2003, que contribui


para o combate à pobreza e à desigualdade no Brasil, através de três
eixos principais:
• Complemento da renda – todos os meses, as famílias atendidas
pelo Programa recebem um benefício em dinheiro, que é transferido
diretamente pelo governo federal. Esse eixo garante o alívio mais
imediato da pobreza.
• Acesso a direitos: as famílias devem cumprir alguns compromissos
(condicionalidades), que têm como objetivo reforçar o acesso à educação,
à saúde e à assistência social. Esse eixo oferece condições para as futuras
gerações quebrarem o ciclo da pobreza, graças a melhores oportunidades
de inclusão social. Importante: as condicionalidades não têm uma lógica
de punição e sim de garantia de que direitos sociais básicos cheguem à
população em situação de pobreza e extrema pobreza. Por isso, o poder
público, em todos os níveis, também tem um compromisso: assegurar a
oferta de tais serviços.
• Articulação com outras ações: o Bolsa Família tem capacidade de integrar
e articular várias políticas sociais a fim de estimular o desenvolvimento das
famílias, contribuindo para que elas superem a situação de vulnerabilidade
e de pobreza.
Para conhecer um pouco mais sobre o Programa Bolsa Família, veja o link:
<http://mds.gov.br/assuntos/bolsa-familia>. Acesso em: 22 mar. 2016.

140 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

2.2 Segundo governo Lula (2007 – 2010)

Em 2006 acontecem as eleições presidenciais, na qual Luiz Inácio Lula da Silva


do PT tenta a reeleição, tendo como principal oponente Geraldo Alckmin do PSDB.
No segundo turno, Lula vence as eleições com 60,83% dos votos válidos, iniciando
o novo mandato em janeiro de 2007, com término em dezembro de 2010.

A política econômica do segundo governo Lula foi alterada, gerando resultados


positivos em termos macroeconômicos, principalmente nas variáveis crescimento
econômico (5,1% entre 2006 e 2008) e distribuição de renda. Nesse sentido,
Barbosa e Souza (2010) observam que o crescimento econômico foi atingido em
razão da sustentação da estabilidade econômica e que as reservas internacionais
aumentaram, a vulnerabilidade externa reduziu, tendo havido, além disso, redução
no resultado primário.

As medidas de política fiscal tomadas, que marcaram a alteração econômica,


foram:

a) Elevação do salário-mínimo de R$ 240,00 em 2003 para R$ 510,00 em 2010.

Para conhecer a evolução do valor do salário-mínimo entre 2000 e 2015,


veja a Tabela 4.1:

Tabela 4.1 | Pessoas em ambientes diversos realizando atividades diversas


VIGÊNCIA VALOR MENSAL VALOR DIÁRIO VALOR HORA
01.01.2015 R$ 788,00 R$ 26,27 R$ 3,58
01.01.2014 R$ 724,00 R$ 24,13 R$ 3,29
01.01.2013 R$ 678,00 R$ 22,60 R$ 3,08
01.01.2012 R$ 622,00 R$ 20,73 R$ 2,83
01.03.2011 R$ 545,00 R$ 18,17 R$ 2,48
01.01.2011 R$ 540,00 R$ 18,00 R$ 2,45
01.01.2010 R$ 510,00 R$ 17,00 R$ 2,32
01.02.2009 R$ 465,00 R$ 15,50 R$ 2,11
01.03.2008 R$ 415,00 R$ 13,83 R$ 1,89
01.04.2007 R$ 380,00 R$ 12,67 R$ 1,73
01.04.2006 R$ 350,00 R$ 11,67 R$ 1,59
01.05.2005 R$ 300,00 R$ 10,00 R$ 1,36
01.05.2004 R$ 260,00 R$ 8,67 R$ 1,18
01.04.2003 R$ 240,00 R$ 8,00 R$ 1,09
01.04.2002 R$ 200,00 R$ 6,67 R$ 0,91
01.04.2001 R$ 180,00 R$ 6,00 R$ 0,82
03.04.2000 R$ 151,00 R$ 5,03 R$ 0,69

Fonte: <http://buscajus.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2319&catid=8>. Acesso em: 28 mar. 2016.

Plano real no contexto de mudança de governo 141


U4

b) Aumento do investimento público, principalmente em melhorias das estradas,


com o programa “tapa-buracos” em 2006, com o objetivo de melhorar a produtividade
da economia; e a criação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em
2007, com investimento previsto de R$ 504 bilhões e que gerou aumento de 0,7%
no PIB e 19% do PIB de investimento em capital fixo. Esta medida será discutida na
Seção 4.

c) Reestruturação da política de cargos e salários dos servidores públicos a partir


de 2006, com o objetivo de aperfeiçoar as funções do Estado e a necessidade de
aumentos salariais (os funcionários públicos estavam com o salário defasado). Para
isso, três ações foram feitas: aumentos salariais para carreiras típicas de Estado, com a
finalidade de atrair bons profissionais para a esfera pública; ampliação de contratações
por concurso público, a fim de fortalecer as áreas com maior carência de pessoal,
sobretudo na fiscalização, segurança e educação; e substituição de funcionários
terceirizados por servidores públicos em atividade tipicamente de Estado, com o
objetivo de atender a uma determinação do poder judiciário (BARBOSA; SOUZA, 2010).

Os impactos das medidas fiscais foram:

a) Redução de 2,5% para 2,3% do superávit primário – a evolução dos resultados


fiscais pode ser vista no Gráfico 4.3.

Gráfico 4.3 | Resultados fiscais na economia brasileira

Fonte: Tesouro Nacional (2012).

Analisando o Gráfico 4.3, é possível entender a evolução do superávit primário


e nominal da economia brasileira. O superávit primário do setor público superou
a meta no ano de 2011, atingindo R$ 128,7 bilhões, o que equivale a 3,1%, com
previsão de permanência desse percentual.

142 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Certamente, com a análise anterior, você deve estar se perguntando: o que, no


entanto, são superávits primário e nominal?! Vamos lá! Superávit primário ocorre
quando o governo recebe mais do que gasta. Por outro lado, quando o governo
gasta mais do que recebe, haverá déficit primário. É importante observar que, nesse
caso, o pagamento com juros da dívida é excluído, ou seja, não entra nesse cálculo.

No superávit nominal, por sua vez, entra o pagamento da dívida. Por exemplo, se
o governo pagou todas as suas contas, incluindo os juros com a dívida e, mesmo
assim, tem saldo positivo, dizemos que houve superávit nominal. Caso contrário,
déficit nominal.

b) Redução da dívida pública – a evolução da dívida pública brasileira pode ser


vista no Gráfico 4.4

Gráfico 4.4 | Evolução da dívida pública brasileira

Fonte: Banco Central do Brasil (2012).

Analisando o Gráfico 4.4, pode-se perceber que a dívida pública foi reduzida até
2008, tendo aumentado em 2009, voltando a ser reduzida nos anos seguintes. Esse
fato pode ser explicado pelo comprometimento do governo com as metas fiscais.

c) Aumento das reservas internacionais.

d) Criação de postos de trabalho e aumento da renda média.

e) Aumento do crédito.

f) Redução no saldo transações correntes em função do aumento de remessas


de lucros enviadas ao exterior.

g) Redução da taxa de inflação até 2006 e aumento dos preços, principalmente


dos alimentos, em 2007, conforme se pode ver no Gráfico 4.5.

Plano real no contexto de mudança de governo 143


U4

Gráfico 4.5 | Evolução da taxa de inflação (IPCA)

Fonte: Banco Central do Brasil (2015).

Em 2008, a economia mundial passou por uma crise econômica, com a falência
do banco de investimento americano Lehman Brothers, o que fez reduzir a liquidez
no mercado financeiro internacional e aumentou a desconfiança do sistema
bancário mundial.

Os impactos no Brasil foram: a contração da oferta de crédito doméstico,


que, apesar de ter sido forte, foi rápida; a redução do preço dos commodities e,
consequentemente, a queda nas exportações brasileiras; e a depreciação cambial.
Esses fatos fizeram com que a demanda e também o investimento fossem reduzidos.

O governo brasileiro tomou algumas medidas de combate à crise. Segundo


Barbosa e Souza (2010), diferentemente do que o correu com as medidas tomadas
nas crises internacionais anteriores, as autoridades brasileiras optaram por medidas
monetárias e fiscais anticíclicas, ou seja, medidas contra a tendência econômica
daquele momento, como, por exemplo, aumento da liquidez ou redução da carga
tributária em momento de crise financeira. Essas medidas tinham como objetivo
evitar que a crise internacional contaminasse o sistema financeiro brasileiro e
recuperar a atividade econômica. Dentre essas medidas, podemos citar:

I. Expansão da liquidez para solucionar o problema da falta de liquidez.

II. Venda de dólares no mercado para evitar a desvalorização cambial.

III. Oferta de linhas de financiamento de curto prazo para as exportações.

As medidas citadas acima, em conjunto com as medidas tomadas antes da crise,


como aumento do salário mínimo e dos investimentos, fizeram com que a crise
financeira mundial de 2008 tivesse pouco impacto na economia brasileira.

144 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

1. Explique o comportamento do produto (crescimento


econômico) durante os governos Lula.

2. Escolha um indicador e compare a evolução que o indicador


escolhido teve do primeiro ao segundo governo Lula.

Plano real no contexto de mudança de governo 145


U4

146 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Seção 3

Política exterior e transição econômica


A estabilização econômica foi a grande preocupação do primeiro mandato Lula
(2003-2006). Para isso, foram utilizadas as taxas de câmbio e de inflação para definir
a política monetária. O impacto da política restritiva do governo foi amenizado pelo
desempenho satisfatório do setor externo, que, consequentemente, gerou superávit
comercial.

O bom desempenho das exportações brasileiras durante o primeiro mandato


Lula pode ser explicado pela elevação do preço das commodities, pelo crescimento
econômico mundial, pela desvalorização do câmbio e pela redução dos tributos para
exportação. Para entendermos o comportamento da balança comercial durante o
primeiro e segundo governos Lula, vamos analisar a Tabela 4.2.

Tabela 4.2 | Balança Comercial brasileira entre 2002 e 2010 (US$)

Ano Exportação Importação Saldo da Balança Comercial


2010 39.229.803.496 38.349.134.977 880.668.519
2009 31.177.551.028 28.190.359.963 2.987.191.065
2008 38.689.578.733 35.932.724.011 2.756.854.722
2007 34.002.328.764 25.274.763.230 8.727.565.534
2006 29.458.076.475 20.129.693.244 9.328.383.231
2005 24.499.503.588 16.151.802.074 8.347.701.514
2004 19.486.826.674 13.323.762.022 6.163.064.652
2003 15.066.605.381 11.244.415.031 3.822.190.350

Fonte: BRASIL, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Estatística do Comércio Exterior. Disponível em
http://www.desenvolvimento.gov.br//sitio/interna/interna.php?area=5&menu=5294. Acesso em: 27 maio. 2016.

Analisando a Tabela 4.2, podemos perceber, claramente, o aumento nas


exportações brasileiras. Vê-se que as importações não aumentaram na mesma
proporção nos primeiros anos do governo Lula. Para melhor visualização, é possível
fazer uma comparação entre exportações, importações e taxa de câmbio entre
2004 e 2012, conforme o Gráfico 4.6.

Plano real no contexto de mudança de governo 147


U4

Gráfico 4.6 | Relação entre balança comercial e taxa de câmbio

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

Como podemos ver no Gráfico 4.6, as exportações superaram as importações


mesmo quando tivemos valorização cambial. Consequentemente, a balança
comercial (exportações menos importações) geraram superávit comercial, o que
possibilitou superávit no saldo transações correntes e redução no passivo externo.

Com isso, os indicadores que mostram a situação externa do Brasil – tais como
transações correntes/PIB; dívida externa/exportações; reservas internacionais –
melhoraram significativamente, o que fez com que o risco-país fosse reduzido.
Vamos entender a evolução de algumas dessas variáveis?

A primeira a ser apresentada é a evolução da dívida externa brasileira em relação


a reservas cambiais e também a exportações, como podemos ver no Gráfico 4.7.

Gráfico 4.7 | Evolução da dívida pública brasileira

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

148 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Como podemos ver no Gráfico 4.7, a razão entre dívida externa e reservas cambiais
(linha de cima, azul) reduziu ao longo dos anos, o que significa que nossa dívida
pública foi reduzida de 557,1% das reservas em 2002 para 81,6% em 2012; diferente
da razão entre dívida externa e exportações, que reduziu até 2008 e aumentou nos
anos seguintes. Apesar desse aumento nos últimos anos, a relação dívida externa/
exportações apresentou decréscimo de 349% para 125% entre 2002 e 2012.

Podemos entender também a relação entre dívida líquida do setor público e as


reservas internacionais, conforme Gráfico 4.8.

Gráfico 4.8 | Relação entre dívida líquida do setor público e as reservas internacionais

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

Ao analisar o Gráfico 4.8, pode-se ver que a dívida líquida do setor público em
relação ao PIB foi um pouco reduzida entre 2004 e 2012. Por sua vez, as reservas
internacionais aumentaram em relação ao PIB em virtude da atuação do Banco
Central no mercado de câmbio.

Agora vamos analisar a evolução das reservas cambiais brasileira sem relacionar
uma outra variável, conforme se pode ver no Gráfico 4.9.
Gráfico 4.9 | Evolução das reservas cambiais brasileiras (US$ bilhões)

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

Plano real no contexto de mudança de governo 149


U4

Ao verificar o Gráfico 4.9, é possível perceber que as reservas cambiais


aumentaram entre 2004 e 2012, ou seja, houve acúmulo de reservas, seguindo a
tendência mundial do período. Esse fato pode ser explicado pela ampla liquidez
internacional e pelo aumento do fluxo de entrada de moeda no país.

Outro dado interessante a se conhecer é o tipo de moeda que temos em nosso


país, conforme mostra o Gráfico 4.10.

Gráfico 4.10 | Distribuição por moeda das reservas internacionais

Legenda: Ouro = ouro / AUD = dólar australiano / CAD = dólar canadense / GBP = libra
esterlina / JPY = Iene japonês / EUR – euro / US$ = dólar

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

Como você pode observar no Gráfico 4.10, em 2004, aproximadamente 60%


das moedas que tínhamos era dólar (US$). Com o passar dos anos, esse percentual
aumentou e, em 2012, as nossas reservas internacionais chegaram a ser compostas
por quase 80% de dólar. Para entender melhor a distribuição das moedas das reservas
internacionais, em termos de valores percentuais, analise a Tabela 4.3.
Tabela 4.3 | Distribuição percentual de moeda das reservas internacionais

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

150 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Outra variável externa a ser analisada é o saldo em transações correntes, que é


uma das contas no balanço de pagamentos, sendo composta pela balança comercial
(exportações menos importações), conta de serviços (viagens internacionais,
transporte, etc.) e pelas transferências unilaterais. O ideal é que o resultado dessa
conta seja superavitário. Se o saldo da conta Transações Correntes for negativo, o
país está acumulando dívida com o exterior. No caso brasileiro, os resultados podem
ser vistos no Gráfico 4.11.

Gráfico 4.11 | Saldo em transações correntes

Fonte: Banco Central do Brasil (2013).

Analisando o Gráfico 4.11, é possível perceber que, ao comparar o saldo em


transação corrente com o IED (investimento estrangeiro direto) entre 1999 e 2001
e 2010 e 2013 (os círculos vermelhos), apesar de o IED ter sido positivo, o saldo em
transações correntes foi negativo praticamente na mesma proporção.

Por último, vamos analisar o risco-país. Para isso, no entanto, primeiro vamos
entender o conceito. Segundo o Banco Central (2015), risco-país é um conceito que
expressa o risco de crédito que os investidores estrangeiros estão enfrentando ao
investir no país, ou seja, é um indicador diário que mostra o risco de se investir no
Brasil, por exemplo. Assim, quanto menor for o risco-país, mais investimentos teremos.

Para conhecer mais sobre a variável risco-país, leia o texto do Banco


Central disponível em: <http://www4.bcb.gov.br/pec/gci/port/focus/
faq%209-risco%20pa%C3%ADs.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2016.

Plano real no contexto de mudança de governo 151


U4

Gráfico 4.12 | Evolução do risco-país

Fonte: Banco Central do Brasil. Relatório da inflação. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/?RI>. Acesso em: 27 maio 2016.

Analisando o Gráfico 4.12, pode-se ver que o risco-país teve redução até 2006,
aumentando consideravelmente entre 2007 e 2008, quando voltou a ser reduzido,
voltando a aumentar somente em 2013.

1. Discuta a evolução da situação econômica brasileira em


termos de política externa.

2. Conceitue, com suas palavras, o que é o risco-país,


mostrando a importância deste para a economia.

152 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Seção 4

O PAC e seus desdobramentos no governo Lula


O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi implementado no início do
segundo governo Lula, mais exatamente em 28 de janeiro de 2007, com o objetivo
principal de desenvolver o país de forma acelerada e sustentável, via planejamento
e execução de obras de infraestrutura, tais como obras sociais, urbanas, logísticas
e enérgicas no Brasil (BRASIL, 2016). Além desse objetivo, podemos citar como
objetivos específicos do PAC:

a) Consolidar a agenda de desenvolvimento econômico e social.

b) Acelerar o crescimento da economia, estimulando o investimento, o mercado


de massa e implementando um amplo programa de infraestrutura.

c) Aumentar o emprego e a renda e diminuir as desigualdades sociais e regionais.

d) Manter os fundamentos macroeconômicos (inflação, consistência fiscal e


solidez nas contas externas).

A ideia era de que, para fazer obras e melhorar a infraestrutura, seria necessário
haver mão de obra e então, novos empregos seriam gerados e haveria aumento da
renda nacional. Além disso, haveria aumento dos investimentos públicos e privados.
Com isso, o Brasil voltaria a crescer.

De acordo com Kupfer (2007), o principal ponto positivo do PAC é o fato de ser
voltado para o que o autor chamou de economia real, uma vez que o PAC procurou
alterar a essência da política econômica sempre voltada para preservação das contas
públicas. Assim, o Estado voltaria a ser o indutor do desenvolvimento econômico
por meio de obras públicas e melhorias em infraestruturas.

Para isso, quando o PAC foi criado, foi reduzido o superávit primário em 0,5%
para que esse valor fosse investido nas obras de infraestrutura. O valor total a ser
investido era de R$ 503,9 bilhões até 2010.

Plano real no contexto de mudança de governo 153


U4

Para se ter uma ideia, ao longo da década de 1970 o investimento em infraestrutura


no Brasil foi de aproximadamente 5% do PIB, dos quais 4% tinham origem no setor
público. Com o passar dos anos, esse índice foi reduzido, passando para menos de
1% do PIB (gasto público) e 1% do PIB (parceria com o setor privado) (KUPFER, 2007).

E qual é o impacto desse baixo investimento? A competitividade brasileira é


muito baixa mesmo se comparada a outros países emergentes. Qual é o impacto
do aumento do investimento? O aumento da taxa de investimentos exerce efeito
de transbordamento, ou seja, movimenta a atividade produtiva, gera emprego e
aumenta a renda.

Apesar de o PAC ter sido capaz de fazer com que o país voltasse a crescer, o
efeito poderia ser outro. Segundo Kupfer (2007), se o PAC não conseguisse aumentar
o investimento privado no país, a economia dificilmente conseguiria crescer. Além
disso, de acordo com o autor, se a indústria não fosse capaz de ofertar a demanda que
surgiria, haveria aumento das importações, fazendo com que a balança comercial
voltasse a ser deficitária.

Para que o programa desse certo, ele foi dividido em fases. A primeira fase teve
início em 2007 e terminou em 2010; a segunda teve início em 2011 e permanece
até os dias atuais.

Ao analisar o PAC, três dimensões devem ser estudadas (KUPFER, 2007):

1. Econômica: esforço com objetivo de revigorar o investimento no Brasil, através


das melhorias em infraestrutura.

2. Política interna: o Estado retoma ao papel ativo da condução da economia, ou


seja, de indutor do desenvolvimento econômico.

3. Política externa: fazer com que o Brasil se torne atrativo para investimentos
estrangeiros.

A partir das dimensões citadas, Mereb e Zilberman (2013) apontam três grandes
conjuntos de medidas implementadas durante a primeira fase do PAC, que são:

a) Isenção por parte do governo de investimentos em habitação e projetos de


infraestrutura e aquisição de máquinas e equipamentos. Para isso:

• Foi encaminhada a PEC 233/2008 (ainda não aprovada), que visa unificar alguns
tributos federais e reduzir/simplificar a legislação do ICMS. Além disso, visa à redução
da tributação sobre a folha de pagamentos e bens considerados essenciais.

b) Aumento do crédito imobiliário para pessoas físicas, principalmente para o


Programa “Minha Casa, Minha Vida”. Para isso, foram realizados:

154 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

• Financiamento do capital de giro para obras de infraestruturas e logísticas das


empresas privadas.

• Criação do Fundo de Investimento em Infraestrutura com recursos do FGTS.

• Aumento do limite de crédito ao setor público para investimentos em


saneamento e habitação.

c) Aumento do investimento público em grandes projetos de infraestruturas,


principalmente os de energia e transporte.

4.1 Resultados da primeira fase do Programa de Aceleração do


Crescimento
Agora que você conhece os objetivos do PAC e suas linhas de ação, veja alguns
resultados do PAC entre 2007 e 2010. Iniciamos analisando o Gráfico 4.13, que
demonstra a taxa de crescimento da economia antes e após a implantação do PAC.

Gráfico 4.13 | Taxa anual de crescimento do PIB

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

Analisando o Gráfico 4.13, vemos duas linhas, a azul, que mostra o crescimento
econômico real/efetivo no período entre 1998 e 2010, e a vermelha pontilhada, que
mostra a proposta de crescimento econômico no PAC a partir do seu lançamento.
Podemos ver que o país cresceu mais do que o pensado/previsto pelo PAC, em dois
momentos: no ano do seu lançamento, 2007 e em 2010; e cresceu menos do que
projetado em 2008 e 2009.

Outro dado que podemos analisar é a criação de postos de trabalho na primeira


fase do PAC, conforme o Gráfico 4.14.

Plano real no contexto de mudança de governo 155


U4

Gráfico 4.14 | Criação de postos de trabalho

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

Analisando o Gráfico 4.14, podemos perceber que, no ano do seu lançamento,


o PAC criou 2.452 novos postos de trabalho, número reduzido nos anos seguintes.
Esse fato significa não que tenha havido aumento do desemprego de 2007 para
2008 e de 2008 para 2009, mas sim que houve criação de um número menor de
novos postos de trabalho.

Agora vamos analisar a taxa de investimento da primeira fase no PAC. Para isso,
analisaremos o Gráfico 4.15.

Gráfico 4.15 | Taxa de investimento

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

Analisando o Gráfico 4.15 percebe-se que, com exceção do ano de 2009, a taxa
de investimento aumentou consideravelmente após a criação do PAC, passando de

156 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

16,4 em 2006 para 19,1 no ano seguinte ao da criação do PAC e para 19,0 em 2010.

Por sua vez, a taxa de investimento público em relação ao Produto Interno Bruto
(PIB) é apresentada no gráfico 4.16.

Gráfico 4.16 | Investimento público (% PIB)

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

Lembre-se de que um dos planos de ação do PAC é o aumento do investimento


público. Podemos, então, perceber no Gráfico 4.16 que a participação tanto do
governo federal (central) quanto das empresas estatais nos investimentos em relação
ao PIB aumentou com o passar dos anos após a criação do Programa de Aceleração
do Crescimento.

4.2 Segunda fase do PAC


A segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) teve início
em 2011 no governo Dilma Rousseff, que manteve o mesmo ideial da primeira fase,
porém com melhorias e com mais parcerias com estados e municípios. Nessa fase,
o investimento esperado até 2014 era de R$ 955 bilhões.

As principais melhorias do PAC 2 em relação à primeira fase referem-se às medidas


institucionais quanto ao crédito, ao financiamento e ao ambiente de negócios. Essas
medidas podem ser vistas nos gráficos 4.17 e 4.18

Plano real no contexto de mudança de governo 157


U4

Gráfico 4.17 | Medidas institucionais de estímulo ao crédito e ao financiamento

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

Gráfico 4.18 | Medidas institucionais quanto a melhorias do ambiente de negócios

Fonte: BRASIL. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 2016. Disponível em: <http://www.pac.gov.br/>. Acesso em:
29 abr. 2016.

1. Explique o objetivo do Programa de Aceleração do


Crescimento (PAC).

158 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

2. Apresente os principais resultados da primeira fase do


Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Plano real no contexto de mudança de governo 159


U4

160 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Seção 5

O Plano Real sob o governo Dilma


Após ser ministra da Casa Civil no governo Lula por cinco anos (2005-2010), com
apoio de Lula, Dilma Rousseff do PT se candidatou à presidência da república nas
eleições de 2010 e, com 56,05% dos votos, contra 43,95% de José Serra do PSDB,
no segundo turno, ganhou e se elegeu a primeira mulher presidente da república
brasileira, tendo sido reeleita nas eleições de 2010.

Figura 4.2 | Dilma Rousseff

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Dilma_Rousseff>. Acesso em: 29 abr. 2016.

Dilma Vana Rousseff nasceu no dia 14 de dezembro de 1947, em Belo


Horizonte. Formada em economia pela Universidade Federal de Minas
Gerais, foi chefe da Casa Civil entre 2005 e 2010, durante o governo Lula,
e eleita duas vezes presidente da república (2010 e 2014), tornando-
se a primeira mulher a ocupar o cardo da presidência do Brasil. Até o
fechamento deste material, o quadro político brasileiro está conturbado
e se fala em possibilidade de impeachment.

Plano real no contexto de mudança de governo 161


U4

Dilma iniciou o governo com uma proposta de continuidade do governo anterior e


esperança da população em continuar com o desempenho econômico do governo
Lula, com crescimento econômico e redução da desigualdade (BRESSER PEREIRA,
2013). Porém, a economia cresceu a taxas discretas e, a partir de 2015, estas foram
negativas. Além da recessão econômica, no segundo mandato de Dilma, o país está
passando por um quadro político bastante conturbado.

Ao ser eleita, Dilma anunciou Alexandre Tombini como o novo presidente do


Banco Central, que, com uma visão mais desenvolvimentista, reduziu a taxa de juros
nominal e real (as taxas de juros real foram reduzidas para 3% ao ano). Assim, a
política econômica do primeiro governo Dilma foi ancorada no regime de metas
de inflação, superávit primário e taxa de câmbio flutuante. Tendo a retomada do
crescimento econômico como um dos principais objetivos, não obteve sucesso.

Em 2014, depois de uma eleição disputadíssima, Dilma Rousseff foi reeleita e o Brasil
entrou em crise política e econômica, com rejeição de parte da população e recessão
econômica. Como afirmam Pinto et al. (2016), a crise econômica e política persiste sem
sinais de reversão, em decorrência da imobilidade política e econômica do governo e
com os desdobramentos políticos e empresariais da “Operação Lava Jato”.

Os principais resultados econômicos dos governos Dilma podem ser vistos na


Tabela 4.4

Tabela 4.4 | Principais resultados econômicos do governo Dilma


Variável 2011 2012 2013 2014 2015 20161
Metas para inflação 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5
Inflação efetiva 6,5 5,84 5,91 6,41 10,67 7,43
Taxa SELIC anual 11,69 8,35 8,27 10,93 13,25 14,15
Taxa de câmbio (R$/US$) 1,67 1,95 2,15 2,35 3,33 4,20
Crescimento econômico 3,9 0,9 2,3 0,1 -3,8 -3,54
(PIB%)
1
Fonte: Adaptado do Banco Central do Brasil (2016). Os dados apresentados são uma previsão.

Ao analisar a Tabela 4.4 é possível perceber claramente a piora na economia.


Apesar de a meta para a inflação ser de 4,5%, com dois pontos percentuais para mais
ou para menos, ou seja, a inflação aceitável estaria entre 2,5% e 6,5%, em 2015 a taxa
de inflação ultrapassou a meta.

O governo utilizou o aumento da taxa Selic para tentar reduzir a inflação. Percebe-
se que, a partir de 2014, a Selic tendeu à alta, mas sem sucesso de combater a
inflação, que continuou aumentando. A taxa de câmbio Real/Dólar, uma vez que
o Real sofreu forte desvalorização, passou de R$4,00, duas vezes mais do que em
2011, no início do governo.

162 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

O crescimento econômico brasileiro, que já vinha sendo baixo durante dos


governos FHC e Lula, foi ainda menor no governo Dilma, chegando a ser negativo
em 2015; ou seja, nesse ano a economia entrou em forte recessão.

Para tentar solucionar esses problemas, o governo tomou medidas de ajuste fiscal,
que foram feitas pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy que, sem muito sucesso,
pediu demissão e foi substituído em dezembro de 2015 por Nelson Barbosa.

Tabela 4.5 | Balança Comercial brasileira entre 2011 e 2016 (US$)

Ano Exportação Importação Saldo da Balança Comercial


1
2016 40.584.774.255 32.186.376.937 8.398.397.318
2015 42.775.243.863 48.324.685.198 -5.549.441.335
2014 49.587.957.494 55.667.095.887 -6.079.138.393
2013 50.836.618.141 56.018.352.662 -5.181.734.521
2012 55.078.868.555 52.661.022.967 2.417.845.588
2011 51.232.800.184 48.090.668.773 3.142.131.411
1
Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (2016). Primeiro trimestre.

Para conhecer mais sobre a taxa de câmbio no Brasil, leia o texto “Estudos
sobre a taxa de câmbio no Brasil”, organizado por Toneto Júnior no ano
de 2013. O texto está disponível no link: <http://www.fiesp.com.br/
arquivodownload/?id=139236>. Acesso em: 3 abr. 2016.

1. Sabendo que, ao aumentar taxa de juros, a inflação tende


a reduzir, e analisando os resultados econômicos do governo
Dilma, podemos afirmar que houve relação positiva entre taxa
de juros e taxa de inflação? Justifique sua resposta.

2. Explique a necessidade do ajuste fiscal no segundo governo


Dilma.

Plano real no contexto de mudança de governo 163


U4

Nesta unidade você aprendeu:


• O contexto econômico no qual Lula assumiu a presidência.
• A relação entre expectativa política e eleição.
• A política monetária durante o primeiro e o segundo governo
Lula.
• A política fiscal durante o primeiro e segundo governo Lula.
• Como se deu a relação entre setor externo e a política brasileira.
• Conheceu a elaboração e resultados do Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC) durante o governo Lula.
• A segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC).
• A economia no governo Dilma.
• A situação econômica brasileira durante o mandato da
presidente Dilma.

Finalizamos a quarta e última unidade do livro Economia


Brasileira Contemporânea. Nesta unidade discutimos a economia
brasileira a partir da transição política ocorrida em 2003 quando
Luiz Inácio Lula da Silva se tornou, após quatro tentativas, o
novo presidente do Brasil, que permaneceu no cargo por dois
mandatos consecutivos, elegendo, depois, por duas vezes, Dilma
Rousseff. Assim chegamos, após quase 150 anos de história
econômica, a 2016.
A partir deste momento, e depois de tantas histórias contadas,
convido você a refletir sobre todos esses anos analisados e a
maneira como chegamos até aqui. Independentemente da sua
convicção política, analisando apenas dados e fatos, o Brasil
melhorou nesses 150 anos ou piorou? Qual foi o melhor e o pior
momento da economia brasileira? Seguindo a mesma tendência,
ou seja, se continuarmos fazendo as mesmas escolhas, o futuro
brasileiro é promissor?

164 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

1. No ano de 2002 aconteceram as eleições presidenciais,


nas quais um partido considerado de esquerda tinha grandes
chances de ganhar, como de fato aconteceu. Por esse
motivo, houve a chamada crise eleitoral de 2002. Essa crise
teve origem na expectativa do mercado quanto às medidas
que o futuro governo tomaria. Para amenizar a crise e adquirir
credibilidade do povo brasileiro, o então candidato Lula
encontrou uma solução. Qual foi?
a) Uma carta enviada ao povo brasileiro.
b) Indicar Antonio Palocci para Ministro da Fazenda.
c) Declarar moratória ao FMI.
d) Acordo com Banco Mundial.
e) Visita ao governo americano.

2. O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado


Gini, é um instrumento para medir o grau de concentração
de renda em determinado grupo. Ele aponta a diferença
entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos.
Numericamente, varia de zero a um. Vamos supor que o Brasil
tivesse o índice de Gini igual a 1; o que esse valor significa?
a) Todas as pessoas têm a mesma renda.
b) A renda é altamente concentrada.
c) Só uma pessoa detém toda a riqueza.
d) A renda é altamente distribuída.
e) Nada se pode afirmar.

3. A política econômica do segundo governo Lula foi alterada,


gerando resultados positivos em termos macroeconômicos,
principalmente nas variáveis crescimento econômico e
distribuição de renda. Nesse sentido, Barbosa e Souza (2010)
observam que o crescimento econômico foi atingido em
razão de:

Plano real no contexto de mudança de governo 165


U4

a) Sustentação da estabilidade econômica.


b) Desvalorização cambial
c) Aumento da taxa de inflação.
d) Programas sociais.
e) Bolsa Família.

4. O risco-país é um conceito que expressa o risco de crédito


que os investidores estrangeiros estão enfrentando ao investir
no país, ou seja, é um indicador diário que mostra o risco de
se investir no Brasil, por exemplo. Em relação ao risco-país,
marque a alternativa correta:
a) Quanto maior for o risco-país, maiores serão os
investimentos.
b) Quanto menor for o risco-país, mais investimentos
teremos.
c) É utilizado apenas em países subdesenvolvidos.
d) Mostra o risco especulativo do país.
e) Não se utiliza no Brasil, uma vez que este é considerado
um país seguro para investimentos.

5. Em 2007 foi lançado o Programa de Aceleração do


Crescimento (PAC), que tinha como objetivo principal fazer
com que o país retomasse o crescimento econômico via
investimentos em infraestrutura. Com relação ao PAC,
marque a alternativa que corretamente mostra a vantagem
do programa.
a) Melhorou a infraestrutura das cidades do Nordeste.
b) Não aumentou o investimento privado.
c) Aumentou consideravelmente o investimento público.
d) Aumentou o investimento em infraestrutura
e) Não houve vantagens, na verdade.

166 Plano real no contexto de mudança de governo


U4

Referências

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