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Formações CPGP

Formação

Introdução à Ilustração Arqueológica

Materiais Cerâmicos

Módulo IV

O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento.

Formador

Fernanda Sousa
Módulo IV
O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

Copyrigth © 2017 Centro Português de Geo-História e Pré-História

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Módulo IV
O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

OBJECTIVOS E COMPETÊNCIAS A DESENVOLVER

Objectivos Gerais

• Executar a reconstituição da forma de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento,


aplicando a normalização formal em conjunto com a simbologia convencional do Desenho
Arqueológico.

Objectivos Específicos

• Orientar um fragmento cerâmico;


• Implementar as técnicas de reconstituição do diâmetro do bordo ou da base;
• Utilizar o pente de perfis
• Traçar uma secção

CONTEUDOS PROGRAMÁTICOS

• O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento


o Materiais
o Orientação
o Reconstituição geométrica do diâmetro
o Desenho da esquadria e transferência de medidas
o Trabalhar com o pente de perfis
o Traçado da secção
o Projecção do fragmento

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Módulo IV
O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

1. O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

Fig. 1-Partes de um recipiente cerâmico (adaptado de Madeira, 2013:18)

Diedro de cartolina - construção

Para peças de pequena dimensão


podemos utilizar um diedro de
cartolina.
Para o construir precisamos de um
rectângulo de cartolina com cerca
de 14 por 6 cm (opcional), em
seguida dobramos o rectângulo ao
meio e obtemos um diedro com 7
por 6 cm.

Construção de um diedro de Cartolina

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O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

Qualquer fragmento cerâmico inscreve-se sempre numa forma específica que pode ser
conhecida. Através das propriedades dos sólidos de revolução e com dados provenientes
desse mesmo fragmento, como o diâmetro (inferido da sua curvatura) e a orientação, é
possível a restituição da sua forma inicial.

Técnica gráfica (bordos/fundos orientáveis e com diâmetro calculado)

Material
Papel milimétrico ou papel branco, papel esquiço ou vegetal, lapiseira, borracha, compasso e
compasso de pontas curvas, pente de perfis, régua e esquadro, craveira, bostik, diedro de
cartolina, esquadro de madeira (opcional).

Orientação

Primeiro é necessário conhecer a correcta


orientação do fragmento para poder
posicioná-lo para desenho. O fragmento é
orientado como se estivesse na sua posição
de repouso para os fragmentos de base e
bojos, no caso de fragmentos de bordo esta
posição está invertida.

Para orientar um fragmento do bordo ou da


base encostam-se todos os seus pontos a
uma superfície plana de modo a que a luz
não passe nesse espaço entre o fragmento e
a superfície plana (Fig.2). Quando se trata de
um fragmento de bojo é necessário mais Fig. 2- Orentação do fragmento. Só a orientação 3
informação inferida da sua manufactura como em baixo está correcta, as orientações 1 e 2 estão
incorrectas, deixam passar a luz.
sulcos deixados pelo de torno, a orientação
da decoração, etc.

Com o fragmento orientado, temos que


decidir qual o melhor ponto a projectar, um
ponto da extremidade de uma das suas
faces ou outro ponto que seja fácil de
identificar no perfil. Quando a forma é
aberta, o ponto a projectar é normalmente
um ponto da extremidade interna, isto é um
ponto onde a face interna encosta à fractura
(Fig.3). No caso de um recipiente fechado o
Fig. 3 – Anatomia de um fragmento de bordo

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ponto a projectar é um ponto da extremidade externa, isto é um ponto onde a face externa
encosta à fractura (Fig.3). O fragmento de bordo é fixo com bostik. Posiciona-se o esquadro
(ou diedro de cartolina) de modo que este encoste no ponto da extremidade escolhido (Figs.4,
5 e 6).
Não esquecer esta informação, apontar sempre ao lado dos pontos projectados a indicação
de proveniência (externa ou interna). Este ponto é projectado com a a ajuda de um esquadro
ou com o diedro de cartolina.

Legenda das Figuras 4, 5 e 6

Pontos a e b são as extremidades das paredes do bordo sendo a a a parede externa e a b a


parede interna. Os pontos a’ e b’ são as projecções dos pontos a e b. Os pontos c e c’ indicam o
local onde se obtém o diâmetro do bordo (fundo) e d a zona onde o lábio (bordo) ou o pé (base)
tocam o plano.

Fig. 4-Tipos de base

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O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

Fig. 5 - Tipos de bordo de recipientes com forma fechada.

Fig. 6 - Tipos de bordo de recipientes com forma aberta.

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O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

Reconstrução geométrica do diâmetro

O método mais preciso para obtenção do diâmetro é a reconstrução geométrica. Quanto


maior for o fragmento, maior e mais precisa é a possibilidade de reconstrução do seu
diâmetro.

Reconstrução da circunferência a partir de um arco de círculo (Fig.7)

Fig. 7- Reconstrução da circunferência a partir de um arco de círculo (modificado de De Laurenzi, 2006:6)

Com o fragmento posicionado numa folha de papel branco e correctamente orientado


desenha-se um arco de círculo (Fig.7.1) e definem-se neste arco 2 pontos bem conservados
do bordo/base (interno ou externo) perto das suas extremidades.
a. Em cada um destes pontos (A e B) constrói-se uma circunferência com o centro
nesses pontos e com um raio maior do que a metade do arco (para que haja
intersecção das circunferências) (Fig.7.2).
b. Unem-se os pontos C’ e C’’ obtendo assim um terceiro ponto, o ponto C, que
determina o centro do arco (Fig.7.3).
c. Com o compasso desenham-se 3 circunferências de raio igual, e com centros nos
pontos A, B e C (Fig.7.4).
d. Une-se através de um segmento de recta os pontos de intersecção das
circunferências, (d’ com d’’ e e’ com e’’). Obtem-se assim o pondo D - a medida do
raio do bordo/base (Fig.7.5).

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e. Com o compasso no raio (ponto D) criamos uma nova circunferência que passa pelo
ponto I, o ponto que indica a projecção da orientação (Fig.7.6).

Reconstrução da circunferência a partir de 3 pontos (Fig.8)

Fig. 8-Reconstrução da circunferência a partir de 3 pontos (adaptado de De Laurenzi, 2006:7)

a. Com o fragmento posicionado numa folha de papel branco e correctamente orientado


desenham-se 3 pontos, 2 perto das suas extremidades (A e C) e o último mais ou menos
a meio (B) (Fig.8.1) (definir se estes pontos são internos ou externos).
b. Com o centro em cada um destes pontos (A, B e C) constróiem-se 3 circunferências (deve
haver intersecção das circunferências) (Fig.8.3).
c. Definem-se os pontos de intersecção das circunferências e unem-se os mesmos (d’ com
d’’ e e’ com e’’) com segmentos de recta (Fig.8.3).
d. Com a intersecção destes segmentos de recta obtém-se o ponto D, este ponto representa
a medida do raio do bordo/base (Fig.8.5).
e. Com o compasso no raio (pondo D) criamos uma nova circunferência que passa pelo
ponto I, o ponto que indica a projecção da orientação (Fig.8.6).

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Obtenção do diâmetro com a tabela de diâmetros (gráfico de curvas concêntricas)

Este método envolve a utilização de uma


tabela de diâmetros, esta tabela apresenta
uma série de círculos concêntricos, com 5 mm
de distância entre si. O fragmento é sobreposto
nesta tabela com a inclinação correcta, até
coincidir com a curvatura de um dos arcos de
círculo, em seguida, faz-se a leitura do seu
diâmetro. Este método é recomendado para
ilustradores mais experientes e com um bom
conhecimento das formas que vão desenhar.
Não deve ser utilizado em formas ovais ou Fig. 9-Tabela de diâmetros
deformadas (Fig.9).

Desenho da esquadria e transferência de medidas

Numa folha de papel limpa, desenha-se uma linha recta de


define o plano da abertura ou da base e divide-se ao meio,
traça-se uma linha perpendicular para materializar o eixo
de rotação. Com o compasso transfere-se a medida do
raio, obtida no ponto anterior, para cada um dos lados da
linha de eixo (Fig.10).
Trabalha-se no lado esquerdo do desenho, a vista interna
e transfere-se a medida da inclinação do fragmento, obtida
Fig. 10-Transferência da medida do
em e) ou f). Traça-se uma linha paralela ao eixo de
raio
rotação, será uma linha auxiliar ao desenho.

Trabalhar com o pente de perfis


Pente de perfis
O pente de perfis é um instrumento constituído por um conjunto de lamelas finas de metal (ou
plástico) ajustadas numa espécie de caixilho. Quando pressionado contra um objecto, as
lamelas adquirem a sua forma e o perfil assim obtido pode então ser copiado. É utilizado em
marcenaria, canalização, arquitectura e em ilustração arqueológica.

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Fig. 12- Modo de utilização do pente de perfis em superfícies côncavas e convexas (adapato de Rigoir,
1975:32)

Deve ser utilizado com cuidado com peças frágeis. Quando os fragmentos são demasiado
grandes para serem cobertos na sua totalidade pelo pente de perfis, o seu perfil pode ser
transferido em vários segmentos, tendo sempre em atenção de criar áreas de referência para
assegurar pontos de união entre os segmentos (Fig.12).

Fig. 11-Utilização do pente de perfis em fragmentos de grande dimensão (adapato de Rigoir, 1975:33)

Na obtenção de um perfil reentrante, com formas côncavas e convexas onde não é possível
chegar a todos os lados com o pente de perfis ao mesmo tempo, procede-se também em
várias fases, modificando neste caso a direcção do pente de modo a cobrir toda a superfície,
e ir transferindo as formas obtidas não esquecendo as áreas de referência que se sobrepõem
para obter correctamente a forma (Fig.13).

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Fig. 13-Utilização do pente de perfis em formas reentrantes (adapato de Rigoir, 1975:34)

Traçado da secção
Com o pente de perfis vai-se obter o contorno do fragmento, pressionado-o contra a sua
superfície interna ou externa, e transfere-se este perfil para a folha de papel, conforme os
pontos obtidos anteriormente.
Por vezes e por uma questão de facilidade de trabalho, os pontos retirados para o diâmetro e
para a inclinção, não estão na mesma superfície ou seja um deles está numa face enquanto

Fig. 14 –Diâmetro interno e inclinação externa

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que o outro está noutra. Neste caso escolhe-se uma das faces e transferem-se todos os
pontos para uma mesma face. Para isso é necessário proceder do seguinte modo:

Diâmetro interno com inclinação externa (Fig.14)

Optou-se por usar a face externa, assim é necessário transferir o ponto do diâmetro
interno para um ponto externo:
• Marcar o diâmetro interno no papel (c’);
• Medir a peça entre a zona onde se retirou o diâmetro e a área externa do lábio;
• Transferir essa medida para o papel;

Transferir este perfil externo para o papel.


Com o auxílio do compasso de pontas
curvas ou da craveira, medir a secção do
fragmento para determinar a espessura
deste. Obter no mínimo duas medidas
(Fig.15.A) uma junto ao lábio e a outra na
extremidade do fragmento. Em perfis mais
complexos aconselha-se obter mais
medidas, em áreas bem demarcáveis
(Fig.15.B).

Transferir as medidas assim obtidas para o


papel. Com o pente de perfis traçar o perfil
Fig. 15-Medidas da espessura
da face oposta ajustando-o aos pontos
previamente marcados (Fig16).

Quando o lábio é complexo utiliza-se o


pente de perfis especificamente para a
obtenção do seu perfil e obter um desenho
preciso do lábio (Fig.17).

Projecção do perfil externo no lado direito


do eixo de rotação

Com papel esquiço decalcar o perfil


externo assim como o ponto do diâmetro
obtido anteriormente, para o lado direito do
desenho e transferir o mesmo (Fig.18). Fig. 16-Obtenção do perfil da superfície
Quando se trabalha com software interna

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O desenho de um recipiente cerâmico a partir de um fragmento

informático, esta acção é feita posteriormente.

Projecção do fragmento
A projecção do fragmento para a construção da parede
externa é feita no lado direito do desenho, quando este
fragmento é muito grande é colocado a meio. Quando o
recipiente não apresenta decoração nem elementos de
preensão não é necessário fazer-se a projecção do
fragmento.
Esta projecção (ortogonal) é feita com a ajuda do diedro de
cartolina e do compasso. O fragmento pode estar orientado ou
não.
Fig. 17-Desenho do perfil do
Colocar o fragmento no papel e transferir todos os pontos
lábio com o pente de perfis
necessários para a obtenção do contorno assim como outra
informação importante (arestas,
sulcos, decorações, elementos de
preensão, etc.) (Fig.19).
O desenho de elementos de
preensão, pés e perfurações será Fig. 18-Transferência do perfil para o lado direito do desenho
referido na segunda parte deste
módulo. As técnicas de desenho da
decoração serão referidas em módulo
próprio.

Fig. 19-Projecção do fragmento

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Bibliografia

Adkins, L., & Adkins, R. (1989). Archaeological Illustration. Cambridge: Cambridge University
Press.

Arcelin, P., & Rigoir, Y. (1979). Normalisation du dessin en céramologie, Méthodes et


Techniques 1, Table Ronde de Montpellier. Lambesc: Association pour la Diffusion
de l'Archéologie Méridionale éditions.

Collett, L. (2012). An introduction to drawing archaeological pottery. Reading: Inst. for


Archaeologists.

De Laurenzi, A.(2006). Introduzione al disegno della ceramica romana. Pisa: CNAP

Griffiths, N., Jenner, A., Wilson, C., (1990). Drawing Archaeological Finds: A Handbook.
Occasional paper No. 13, London: Institute of Archaeology, University College

Madeira, J. (2013). O Desenho na Arqueologia, Cadernos de Arqueologia e Arte, 5 (2ª


ed.). Coimbra: Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de
Coimbra.

Rigoir, Y. (1975). Le dessin technique en céramologie. Lambesc: Laboratoire d’Etude et


Documentation des Sigillés Paléochrétiennes.

Sousa, F. (1999). Introdução ao Desenho Arqueológico. (N. d. História, Ed.) Almada: Câmara
Municipal de Almada.

Veiga da Cunha, L. (1999). Desenho Técnico (11ª ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

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