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Ponto dos Concursos

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CURSOS ON-LINE – POLÍTICAS PÚBLICAS P/ TCU
PROFESSOR MARCELO GONÇALVES

Olá pessoal,
É com muita alegria e satisfação que recebo o convite do Ponto dos Concursos
para elaborar um curso on-line de políticas públicas para os candidatos ao cargo de
ANALISTA DE CONTROLE EXTERNO do TCU (orientações: auditoria
governamental e planejamento e gestão). Se já fiquei honrado com o primeiro convite,
por ocasião do concurso da CGU, ficou ainda mais por perceber que o trabalho anterior
rendeu bons frutos. Além disso, fico deveras muito feliz porque, novamente, poderei
contribuir para o esforço de centenas de candidatos que se colocam a prova para
ingressar em uma das carreiras de maior prestígio no País (isso sem falar na
remuneração, que é bastante interessante – dá para sobreviver!).
Minha formação possibilitou-me um contato constante com temas práticos e
teóricos no campo de políticas públicas e minha carreira tem possibilitado uma vivência
ainda mais aprofundada no tema. Uma vez que atuo em contato direito com temas de
políticas sociais. É com o conhecimento acumulado nos últimos anos que pretendo
propiciar a melhor preparação possível para vocês.
É bom que saibam um pouco mais ao meu respeito. Sou formado em ciência
política pela Universidade de Brasília – UnB (graduação e mestrado), onde trabalhei em
diversos projetos de pesquisa até ingressar na carreira de especialistas em políticas
públicas e gestão governamental, cuja formação é responsabilidade da Escola Nacional
de Administração Pública – ENAP. Já atuei em escritório de consultoria em Brasília e
ministrei aulas na Universidade de Brasília e em cursinhos preparatórios para as
carreiras de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) e
Analista de Finanças e Controle da CGU em Brasília e outras capitais. Também sou
professor colaborador na ENAP e, atualmente, estou lotado no Ministério do Trabalho e
Emprego, onde exerço o cargo de Coordenador de Planejamento e Projetos do
Departamento de Qualificação.
Pronto, agora, vamos ao que interessa. O último edital do TCU traz uma novidade
bastante interessante: acompanhando a tendência dos concursos mais recentes, apresenta
uma preocupação considerável com o conhecimento de políticas públicas dos
candidatos a carreiras de Estado. Trata-se de um edital que, praticamente, copiou a parte
de políticas públicas do concurso de Analista de Finanças e Controle da CGU. A
diferença é que colocou o conteúdo dentro de administração pública. Por isso, e por
sugestão do professor Eduardo Fávero, resolvi ingressar nessa aventura com vocês.

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O assunto é bastante conceitual e genérico, por isso, tende a exigir do candidato


uma vivência mais profunda da área. Como nem todo mundo teve oportunidade para
isso, as aulas buscarão abordar todos os pontos principais de cada assunto e apresentar
um panorama geral do estágio dos estudos de políticas públicas no país, focalizando,
obviamente, os itens do edital em questão.
Tentei formatar um curso rápido, mas que atenda tanto aos candidatos que tenham
formação na área ou que já fizeram cursos presenciais da disciplina – e querem apenas
revisar o conteúdo – quanto aos que não tiveram contato nenhum com a matéria. Assim,
para os iniciados, essa é uma oportunidade de reforçar seus conhecimentos e fixá-los
para prova. Em alguns momentos, pode acontecer de eu se repetitivo, mas isso permite
que os alunos menos familiarizados com o tema possam acompanhar e se preparar para
o certame.
Esse curso é o segundo que ministro no PONTO, sendo que o primeiro foi voltado
para os candidatos a AFC/CGU. Acredito que seja interessante saber que, naquele
curso, tive a seguinte avaliação, feita pelos alunos inscritos:
Perguntas Ótimo Bom Deficiente
Conteúdo do curso: 90 114 5
Didática do professor: 92 114 3
Respostas ao fórum de dúvidas: 81 125 3
Você faria outro curso com este professor? Sim: 96,17% Não: 3,82%
Nota Geral do Curso: 8

Advertências:
1. Se você conhece políticas públicas, esse curso pode se tornar muito
enfadonho, portanto, ao ler a aula introdutória, avalie bem se está te
acrescentando conhecimento!
2. Por fim, como cada turma é uma turma, com características e necessidades
próprias, o feedback dos candidatos é fundamental para o bom andamento do
nosso trabalho. Sendo que raramente uma crítica não é construtiva. Nesse
sentido, a participação dos alunos no fórum é absolutamente relevante.

O curso abordará os 03 itens previstos no edital em 04 aulas (contando com a


demonstrativa). O conteúdo será todo coberto dentro do espaço de tempo que temos.
Resolveremos algumas questões de concursos anteriores e utilizaremos o fórum ao

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máximo para poder dissecar todos os temas. Sugestões serão sempre bem vindas. E ao
trabalho
Um abraço a todos e sucesso,

Marcelo Gonçalves
POLÍTICAS PÚBLICAS – cronograma de aulas:

Aula 0 - Processo de Formulação e Desenvolvimento de Políticas: construção de


agendas, formulação de políticas, implementação de políticas.

Aula 1 - As Políticas públicas no Estado brasileiro contemporâneo. Descentralização e


democracia. Participação, atores sociais e controle social. Gestão local, cidadania e
eqüidade social.

Aula 2 - Planejamento e Avaliação nas Políticas Públicas - Conceitos básicos de


planejamento. Aspectos administrativos, técnicos, econômicos e financeiros.

Aula 3 - Formulação de programas e projetos. Avaliação de programas e projetos. Tipos


de Avaliação. Análise custo-benefício e análise custo-efetividade.

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PROCESSO DE FORMULAÇÃO E

DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

INTRODUÇÃO: A IMPORTÂNCIA DO TEMA

Muita gente pode está se perguntando porque políticas públicas estão assumindo
tanto espaço dentro de concursos públicos. Esse fenômeno é resultado da1visibilidade
que o campo vem adquirindo no Brasil. E tudo indica que a disciplina chegou pra ficar.
Essa observação não é um chute no escuro, principalmente quando vemos vários
concursos de cargos administrativos inserindo a matéria em seus programas ou
aumentando o seu peso relativo entre as disciplinas (é o caso, por exemplo, dos
concursos de gestores federal e estaduais, de alguns cargos administrativos federais e
estaduais, da CGU e, claro, do TCU). O aumento da visibilidade do campo de políticas
públicas acontece pelas seguintes razões:

a. Adoção de políticas restritivas de gastos (ajuste fiscal e focalização no lugar de


universalização), especialmente nos países em desenvolvimento. O que exige
mais eficiência e efetividade nas políticas implementadas, logo a demanda por
conhecimento especializado aumenta;
b. O declínio das políticas keynesianas e sua substituição por políticas restritivas de
gastos. As intervenções do Estado passam a ser pontuais, logo devem ser
precisas;
c. Não há, em países de democratização recente, coalizões políticas capazes de
equacionar, minimamente, a questão de como desenhar as políticas públicas
capazes de impulsionar o desenvolvimento econômico e promover a inclusão
social. Isso contribui ainda mais para o aumento da demanda por conhecimento
especializado.

1 Celina Souza. Políticas Públicas no Brasil.

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Os primeiros estudos relevantes sobre políticas públicas, analisando exatamente


sobre a produção dos governos, surgem nos EUA no séc. XX. Estes estudos têm como
foco a ação dos governos e assume como pressuposto a idéia de que, em democracias
estáveis, o que o governo faz ou deixa de fazer pode ser formulado cientificamente e
analisado por pesquisadores independente. Logo, configurou-se um campo
multidisciplinar (administração, ciência política, economia, sociologia etc.) que busca
explicar a natureza e o processo das políticas públicas. É nesse campo que entraremos
agora. Mas, primeiro, dois conceitos precisam ficar bem claros: política (politics) e
política pública (policy).

O QUE É POLÍTICA?

Uma das definições mais tradicionais e mais utilizadas foi elaborada por P.
Schmitter, que dizia que a política (politics) é a resolução pacífica de conflitos.
Contudo, seguindo a opinião de uma das melhores professoras de políticas públicas que
conheci (Maria das Graças Rua), “este conceito é demasiado amplo, restringe pouco”.
Seria possível delimitar um pouco mais e afirmar que a política consiste no conjunto de
procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se
destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto a bens públicos.
Ou seja, todas as sociedades contemporâneas têm valores materiais
compartilhados, os quais são resultado dos impostos que seus cidadãos pagam e das
riquezas que o país possui. Esses valores são utilizados para a provisão de bens públicos
– que nem sempre são destinados a todos os cidadãos – como cada um tem na cabeça
sua imagem própria de mundo ideal e não dá para atender a todo mundo, surgem os
conflitos sobre as alocações dos recursos e dos bens públicos. É o objetivo da política
resolver esses conflitos alocativos de forma pacífica.

O QUE POLÍTICA PÚBLICA?

Existem várias definições de política pública. Todas elas levam sempre à idéia
de que política pública é um conjunto de ações governamentais (ainda que sejam
executadas por entidades de direito privado) que distribuem recursos ou bens públicos
atendendo, satisfatoriamente ou não, às demandas da sociedade e/ou do sistema político.

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Como esse conceito pode ficar meio nebuloso para algumas pessoas, seguem-se
algumas definições para mais interessantes:
1. Lynn (1980): um conjunto específico de ações do governo que irão produzir um
efeitos específicos.
2. Dye (1984): o que o governo decide fazer ou não.
3. Peters (1986): soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou por
delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos.
4. Lasswel (1936); decisões e análises sobre política públicas implicam responder
às seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz.
5. Lowi: uma regra formulada por alguma autoridade governamental que expressa
uma intenção de influenciar, alterar, regular, o comportamento individual ou
coletivo através do uso de sanções positivas ou negativas.

Uma de minhas definições favoritas é oferecida por Maria das Graças Rua2:

“As políticas públicas (policies), são outputs („produtos‟), resultantes da atividade


política (politics): compreendem o conjunto das decisões e ações relativas à alocação
imperativa de valores. Nesse sentido é necessário distinguir entre política pública e
decisão política. Uma política pública geralmente envolve mais do que uma decisão e
requer diversas ações estrategicamente selecionadas para implementar as decisões
tomadas. Já uma decisão política corresponde a uma escolha dentre um leque de
alternativas, conforme a hierarquia das preferências dos atores envolvidos, expressando
uma certa adequação entre os fins pretendidos e os meios disponíveis. Além disso, por
mais óbvio que possa parecer, as políticas públicas são „públicas‟ – e não privadas ou
apenas coletivas. A sua dimensão „pública‟ é dada não pelo tamanho do agregado social
sobre o qual incidem, mas pelo seu caráter imperativo. Isto significa que uma das suas
características centrais é o fato de que são decisões e ações revestidas da autoridade
soberana do poder público” (com adaptações).
Nesse sentido, as políticas públicas seriam o resultado direto do processamento
pelo sistema político dos incentivos (inputs) originários do meio ambiente social e de
dentro do próprio sistema político (withinputs). Esses incentivos nada mais são que as
demandas dos atores da sociedade civil e do próprio sistema político (pois, o governo,

2Prometo não ficar usando citações o tempo inteiro, mas é que essa é muito boa.
Resume muito bem a idéia do processo estudado.

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os deputados, os burocratas, atores internos, também têm interesses envolvidos nas


políticas públicas) e os apoios que algumas idéias/soluções recebem ao longo de seu
processamento pelo sistema político.

Processamento
pelo sistema
político

Estabelecidos os conceitos fundamentais, passemos ao processo de fabricação


das políticas públicas.
ADVERTÊNCIA: O importante aqui, todavia, não memorizar os nomes
apresentados. “Pegue” a idéia, entenda o processo e a sua essência. De todas as provas
que vi até hoje, é isso que importa. Dificilmente, uma prova vai trazer o nome desses
autores.

PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS

Para fins didáticos, o processo de políticas públicas costuma ser apresentado


como uma linha evolutiva que parte da formação da agenda até o processo de avaliação,
passando pela formulação e pela implementação. Outra forma bastante utilizada é a
apresentação do processo como sendo um ciclo, conforme o diagrama abaixo:

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Todavia, é preciso ter em mente que essa racionalidade não condiz com a
realidade do processo de políticas públicas. Na vida real, esses estágios tendem a se
confundir, sendo comum encontrar situações, por exemplo, em que a formulação
continua na etapa da implementação. Além disso, a concepção da agenda como uma
etapa estática é completamente desvinculada da realidade. Logo, a idéia da metáfora é
apenas oferecer um referencial lógico para entender o processo como um todo.
Uma breve conceituação das etapas do processo de desenvolvimento de
políticas públicas:
1. Formação da agenda: é o primeiro momento de uma política pública,
quando um tema entra para a discussão em uma arena pública. Sem
despertar a atenção ou interesse de algum ator relevante, um tema jamais
poderá existir como política. Os temas da agenda normalmente são
inseridos como demandas na forma de problemas, que precisam de uma
solução;
2. Formulação: nesse momento são apresentadas ao sistema político as
possíveis soluções para o tema em pauta. As alternativas costumam estar
prontas; o sistema político apenas vai escolher uma ou combinar algumas
das alternativas apresentadas;
3. Implementação: decido que será feito, é hora de tirar a solução do papel.
Momento em que a política pública deixará de ser um documento para ser
materializada;
4. Avaliação: embora seja feita normalmente após certo período de
implementação, existem vários tipos de avaliação, sendo que tem avaliação

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que pode ser feita antes mesmo da implementação. A avaliação serve para
apontar os efeitos da política, seus pontos fracos e fortes, sua eficiência,
sua efetividade etc.

As três primeiras etapas serão estudadas nesta aula e a última na quarta aula.

FORMAÇÃO DA AGENDA

A principal abordagem que trata da formação de agenda é de autoria de John


Kingdon. O modelo de fluxos múltiplos (multiples streams model) foi elaborado para
tentar explicar porque alguns temas entram para a agenda governamental e outros não,
e, além disso, porque alguns temas dessa agenda recebem maior atenção dos
formuladores e entram na agenda decisória e outros não.

Agenda governamental é o conjunto de questões que, por despertarem, em algum


momento, a atenção ou interesse de formuladores, ingressou na agenda do governo.
Contudo, a quantidade e a complexidade dos temas presentes na agenda
governamental faz com que esses atores “escolham” alguns temas para serem
abordados de imediatos, deixando outros para outras ocasiões. Surge, assim, uma
segunda agenda, a agenda decisória, que é o subconjunto de questões da agenda
governamental que estão prontas para uma decisão ativa dos formuladores. Ou seja,
estão prestes a virar políticas públicas.

Quando um tema não encontra espaço em nenhuma dessas agendas, diz-se que é
tão somente um “estado de coisas”. Um estado de coisas é algo que incomoda,
prejudica, gera insatisfação para muitos indivíduos, mas não chega a constituir um item
da agenda governamental, ou seja, não se encontra entre as prioridades dos tomadores
de decisão. Quando este estado de coisas passa a preocupar as autoridades e se toma
uma prioridade na agenda governamental, então passar a ser um „problema político‟.
Mas nem sempre isso acontece. Algumas vezes existem situações que permanecem
„estados de coisas‟ por períodos indeterminados, sem chegar a serem incluídos na
agenda governamental, pelo fato de que existem barreiras culturais e institucionais que

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impedem que sequer se inicie o debate público do assunto. (...) Nesses casos,
configura-se o que Bachrach e Baratz conceituam como „não-decisão‟3.

Mas porque alguns assuntos deixam de ser “estado de coisa” e tornam-se


problemas de uma agenda governamental? Isso é o que Kingdon busca responder.
O modelo de fluxos múltiplos parte do pressuposto que o governo é uma
“anarquia organizada” permeada por três fluxos decisórios que funcionam de forma
relativamente independente:
1. Fluxo de problemas (problem stream);
2. Fluxo de soluções e alternativas ou fluxo da política governamental (policy
stream);
3. Fluxo da política (politics stream).

Fluxo de problemas: muitos “estados de coisas” não conseguem ser tratados


como problemas efetivamente, pois não recebem a devida atenção dos formuladores.
Quando o interesse e a atenção dos formuladores são despertados passa assumir um
lugar na agenda governamental. Para que isso aconteça, existem três mecanismos que
trabalham para transformar um estado de coisas em um problema político da agenda
governamental:
1. Indicadores: os indicadores de uma situação social, por exemplo, podem fazer
com que debates outrora ignorados ocupem espaços na agendas de grupos
sociais relevantes, os quais trabalham para inserir seus temas na agenda
governamental. É o caso do movimento negro no Brasil.
2. Crises, eventos e símbolos: momentos de crise ou eventos que chamam a
atenção do público são propícios para atuação de atores preocupados com certas
questões. Movimentos em prol de saneamento básico podem utilizar momentos
de surtos epidêmicos para promover suas idéias;
3. Feedback de ações governamentais: a análise de das políticas anteriores pode
levar a alteração nas ações futuras.

3 Maria das Graças Rua. Ainda segundo a professora: “A não decisão não se refere à ausência de decisão
sobre uma questão que foi incluída na agenda política. Isso seria, mais propriamente resultado do
emperramento do processo decisório. Não-decisão significa que determinadas temáticas que ameaçam
fortes interesses, ou que contrariam os código de valores de uma sociedade (e, da mesma forma, ameaçam
interesses) encontram obstáculos diversos e de variada intensidade à sua transformação de um estado de
coisas em um problema político - e, portanto, à sua inclusão na agenda governamental”.

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Contudo, é forçoso reconhecer que este fluxo está intimamente conectado com o
fluxo da atividade política.
O fluxo de soluções, por sua vez, é onde são desenvolvidas as diversas
alternativas de políticas governamentais. Algumas delas, inclusive, sem problemas
correlatos – pois, idéias e problemas não caminham de par a par. As idéias surgem em
comunidades de política pública (policy communities) as quais são formadas por
especialistas (pesquisadores, empreendedores, parlamentares, burocratas etc.) com
preocupações compartilhadas voltadas para uma área de política (policy area).
Trata-se de um fluxo de conhecimento onde prevalece a persuasão e a busca do
consenso. Os defensores de uma proposta tentam difundi-la dentro de suas comunidades
até convencer seus pares de que ela é a melhor solução para atender a preocupação que
compartilham. Em seguida, esses especialistas partem para fora da comunidade de que
fazem parte para conseguir adeptos no público em geral, pois sabem que esse suporte
pode ser fundamental para o sucesso da alternativa proposta durante o período de
formulação na arena decisória.
Os fatores que determinam o sucesso de uma alternativa são fundamentalmente:
1. Viabilidade técnica;
2. Custos toleráveis;
3. Representação de valores compartilhados.

Por fim, o fluxo político segue lógica própria, a lógica da atividade política
stritu senso. A formação de consenso e a persuasão são substituídas pela formação de
coalizões, pela barganha e pelas negociações. Nesta dimensão do processo de formação
da agenda, três elementos exercem influência fundamental para uma idéia ser
impulsionada para a agenda pela atividade política:
1. O clima nacional (national mood). Muitas pessoas compartilham uma situação
ao mesmo tempo;
2. Forças políticas organizadas – especialmente grupos de pressão. Podem medir o
nível de conflito para os formuladores;
3. Mudanças dentro do governo. Exemplo: Pessoas, gestão, legislatura etc.

Segundo Kingdon, quando os três fluxos convergem ocorrem mudanças na


agenda decisória (dentro da agenda governamental). Mais precisamente, quando ocorre
a convergência de todos os fluxos há oportunidade de mudança na agenda, pois (i) há

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um problema reconhecido, (ii) uma solução está disponível e (iii) as condições políticas
tornam o momento propício para a mudança. Esse tipo de oportunidade Kingdon
classificou como “janela da política” (policy windows).
Todavia, o mesmo autor reconhece que não é preciso que os três fluxos sempre
convirjam juntos para que fenômenos politicamente relevantes aconteçam. É
plenamente possível que uma questão ascenda à agenda governamental quando os
fluxos de problema e da política (politics) convergem. A convergência dos três fluxos é
fundamental apenas para um tema assumir um lugar na agenda decisória, pois nesta
agenda decide-se sobre qual alternativa será implementada de imediato.
Outro fator fundamental para sucesso de uma idéia na agenda (governamental ou
decisória) é a atuação de um empreendedor de políticas públicas, que nada mais é que
especialista disposto a investir em uma idéia. Ele faz a sua promoção, muitas vezes,
desde a sua concepção como um problema.
Modelo de fluxos Múltiplos:

Fluxo de problema Fluxo de soluções Fluxo político


Indicadores Viabilidade técnica Humor nacional
crises Aceitação pela comunidade Forças organizadas
Eventos focalizadores Custos toleráveis Mudanças de governo
Feedback de ações

Oportunidade de Mudança
Convergência dos fluxos
pelos empreendedores

Formação da agenda
Acesso de uma questão à
agenda decisória

Formulação de Políticas Públicas

A formulação das alternativas é um dos momentos mais importantes do processo


decisório, porque é quando se colocam claramente as preferências dos atores,
manifestam-se os seus interesses e é então que os diversos atores entram em confronto
com os recursos de poder que possuem em busca da maximização de suas preferências.

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A maioria dos modelos assume que os atores atuam na busca da maximização de


seus interesses, ou preferências, que dependem de um cálculo de custo X benefício de
cada ator em relação às alternativas em jogo. As preferências formam-se em torno de
issues, que são os itens ou aspectos das decisões que afeta os interesses de vários atores,
gera expectativas e catalisa o conflito. Nesse sentido, as preferências são formadas em
torno dos pontos controversos de cada política, e o processo de formulação tem como
objetivo resolver esses conflitos para que a política tome uma forma definida.

Neste processo a dinâmica de interação entre os atores pode assumir a forma de


luta, jogo ou debate4. Luta quando envolve questões que se configuram como jogos de
soma-zero, isto é, um ator só vence (+1) se o outro perde (-1), não há ponto de
equilíbrio. Esse tipo de situação é típico de políticas redistributivas e tende a sofre
vários entraves ao longo do processo. Jogo é o tipo de situação mais comum na política.
O objetivo não é destruir o oponente, mas simplesmente vencê-lo, mantendo-o no jogo.
As regras são claras, conhecidas e aceitas e é comum a prática de barganhas e
negociações e alianças. O debate é típico das comunidades de políticas públicas, a idéia
não é vencer, nem destruir, apenas cativar, convencer por meio da persuasão. Enfim,
durante o processo de formulação, de acordo com a situação e os bens públicos
envolvidos, é comum ver os atores utilizarem várias técnicas para defender suas
preferências (persuasão, pressão pública, exercício da autoridade, obstrução etc.)

TIPOLOGIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Desde a etapa da construção da agenda é possível vislumbrar algumas


características sobre a natureza da política que nascerá no processo de formulação.
Contudo, é no processo de formulação que são definidos com precisão esses caracteres,
de acordo com os quais é possível classificar as políticas em determinadas tipologias. A
tipologia mais conhecida é a de Lowi (novamente, não é preciso decorar o nome do

4 Anatol Rapoport.

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autor, mas as classificações sim!), segundo o qual as políticas podem ser classificadas
em quatro grupos5:

1. Políticas distributivas: decisões tomadas pelo governo que desconsideram a


questão dos recursos limitados. Além disso, políticas distributivas são
caracterizadas por um baixo grau de conflito dos processos políticos, visto que
políticas de caráter distributivo só parecem distribuir vantagens e não acarretam
custos – pelo menos diretamente percebíveis – para outros grupos. É marcante a
presença do consenso e da indiferença amigável. Em geral, políticas distributivas
beneficiam um grande número de destinatários, todavia em escala relativamente
pequena; potenciais opositores costumam ser incluídos na distribuição de
serviços e benefícios.

2. Políticas regulatórias: regulamentações que envolvem a burocracia, os políticos


e grupos de interesses. Essas políticas trabalham com ordens e proibições,
decretos e portarias. Os efeitos referentes aos custos e benefícios não são
determináveis de antemão; dependem da configuração concreta das políticas.
Custos e benefícios podem ser distribuídos de forma igual e equilibrada entre os
grupos e setores da sociedade, do mesmo modo como as políticas também
podem atender a interesses particulares e restritos. Os processos de conflito, de
consenso e de coalizão tendem a se modificar conforme a configuração
específica das políticas.

3. Políticas redistributivas: atinge maior número de pessoas e impõe perdas


concretas e a curto prazo para certos grupos sociais e ganhos incertos e futuros
para outros (tributos, políticas sociais universais, previdência etc.). Assim, a
característica principal deste tipo de política é o conflito e a polarização que ela
é capaz de gerar. Isso é absolutamente natural, uma vez que seu objetivo é o
desvio e o deslocamento consciente de recursos financeiros, direitos ou outros
valores entre camadas sociais e grupos da sociedade.

5 Esta tipologia e as idéias que compõe esta seção, e parte das seguintes, são baseadas principalmente nos
texto de Celina Souza. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias n.16 Porto
Alegre jul./dez. 2006. Disponível no site http://www.scielo.br. e Klaus Frey. Políticas Públicas: Um
Debate Conceitual e Reflexões Referentes à Prática da Análise de Políticas Públicas no Brasil.
Planejamento e Políticas Públicas. No 21 - Jun de 2000

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4. Políticas constitutivas: lidam com procedimentos. São políticas estruturadoras


ou políticas modificadoras de regras. Transformam as instituições em que os
atores agem, determinam as regras do jogo e com isso a estrutura dos processos
e conflitos políticos, isto é, as condições gerais sob as quais vêm sendo
negociadas as políticas distributivas, redistributivas e regulatórias.

MODELOS DE FORMULAÇÃO

Para melhor explicar a interação dos atores e o próprio processo de formulação


de políticas públicas, existem várias abordagens propostas principalmente por autores
da academia americana. Abaixo são apresentadas apenas as principais leituras sobre o
processo de formulação.

ADVERTÊNCIA: os nomes dos modelos têm pouca importância. Foque nas


idéias, nas idéias que eles transmitem. O objetivo não é apenas entender a formulação,
lembre-se disso!

1. Incrementalismo

Uma das leituras mais tradicionais em políticas públicas, o incrementalismo


assume que há pouco espaço na administração para a realização de mudanças
substanciais e que a experiência passada tende a guiar as opções do presente. Dessa
forma, a esmagadora maioria das decisões não teria o objetivo de mudar radicalmente
nenhum modus operandi ou situação vigente, ao contrário, as decisões e ações sempre
tendem para mudanças marginais, ou incrementais na situação existente.

Pode dizer-se que esse fato tem como uma de suas causa a “dependência da
trajetória” (path dependence). Esse conceito, formulado por Douglass North (nobel de
economia), descreve o fato de que uma decisão tende a criar uma série de interesses e
processos ao seu redor, os quais resistem a qualquer tentativa de mudança, tornando-a
tão custosa que, em algumas situações, passa a ser quase impossível. Dessa maneira,
uma vez que uma política é colocada numa direção, é difícil mudar sua trajetória, pois
uma rede de instituições e interesses é criada ao seu redor (pense na dificuldade que o

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sucessor de Lula terá para extinguir alguns dos programas sociais existente, mesmo que
sejam comprovadamente ineficientes ou ineficazes – não estou dizendo que é o caso!).

Tendo isso em mente, ao invés de especificar objetivos (uma situação ideal) e de


avaliar que decisões podem atender a esses objetivos, os tomadores de decisão escolhem
alternativas mediante comparação de algumas alternativas disponíveis e da estimativa
de qual dessas alternativas produzirão os melhores resultados no contexto dado. A
situação ideal é pouco factível, logo é feito “o que dá para fazer”. Busca-se uma decisão
que seja adequada às limitações existentes e acomode os interesses em jogo.

Esse tipo de abordagem é muito utilizado em contexto de alto potencial de


conflito ou de limitação de recursos ou de conhecimento. Nessas situações, qualquer
decisão mais ousada pode ter conseqüências gravíssimas. Contudo, é preciso reconhecer
que leituras incrementalistas têm pouca capacidade explicativa em situações de ajuste
fiscal – quando são operadas mudanças radicais em políticas e procedimentos
consideradas ineficientes – e um forte viés conservador – um país que precisa adotar
mudanças substanciais em sua condição social não pode prescindir de abordagens mais
ousadas.

2. Modelo Racional (ou Racional-Compreensivo)

Para essa abordagem, o governo é uma entidade monolítica, um ator unitário.


Não são considerados os diversos atores existentes dentro da administração pública, diz-
se apenas que O governo fez isso, O governo disse aquilo etc. Essa entidade monolítica
trata seus problemas de forma estratégica, estabelecendo quais são seus objetivos, quais
as alternativas disponíveis e as estuda de forma exaustiva a ponto de saber quais as
conseqüências de cada uma delas. Em seguida, o Estado escolhe a que produz a melhor
conseqüência e age.

Em outras palavras, o modelo presume que o problema possa ser conhecido de


tal forma que seja possível tomar decisões de grande impacto, não apenas incrementais.
E que essas decisões são potencialmente capazes de maximizar as preferências do ator
“governo”.

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Para chegar a essa conclusão, o modelo tem que assumir que o governo tem
informações “completas” sobre os problemas que enfrenta e sobre as alternativas
apresentadas – inclusive sobre seus potenciais efeitos futuros. E também que o
problema da assimetria informacional entre os atores não existe.

Apesar de possibilitar uma leitura interessante para algumas situações, como as


de crise externa, o modelo peca por exagerar as capacidades do Estado e por
menosprezar os efeitos dos jogos políticos internos ao governo no resultado de suas
políticas.

3. Modelo Mixed-Scanning

Diante das críticas ao modelo incremental (muito conservador e pouca


capacidade de lidar com necessidade de mudanças radicais) e ao modelo racional (não
considera adequadamente relação de forças entre os atores e desconsiderar a
possibilidade de informação imperfeita), Etzione, um cientista político italiano, propõe
uma combinação dos dois modelos, afirmando que existem dois tipos de decisões na
área pública: incrementais (ordinárias, do dia-a-dia) e fundamentais (estruturantes,
estratégicas).

Para Etzione, os tomadores de decisões tendem a engajar-se em uma ampla


revisão do campo de decisão, sem se descuidar da análise detalhada de cada alternativa.
Esta revisão permite que alternativas de longo prazo sejam examinadas e levem a
decisões estruturantes. As decisões incrementais, por sua vez, decorrem das decisões
estruturantes e envolvem análise mais detalhada de alternativas específicas. Ou seja,
pensa-se o todo, as estruturas, da forma mais racional possível e as decisões mais
detalhadas tendem a ser elaboradas e implementadas de forma incremental.

4. Modelo da lata de lixo (garbage can)

Existem vários modelos que compartilham esse tipo de estrutura analítica


chamada de lata de lixo. É o caso do Multiple Stream analisado anteriormente. Esses
instrumentos analíticos têm em comum o fato de considerar as organizações, inclusive o

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Estado, formas anárquicas que compõem um conjunto de idéias com pouca


consistência.

Nesse contexto, os atores não constroem alternativas de acordo com suas


preferências individuais, elas são resultado de uma atividade coletiva (das comunidades
de políticas públicas ou das arenas públicas). Os atores apenas escolhem uma entre as
soluções disponibilizadas pelas organizações, as quais estão, a todo tempo, criando
novas soluções de políticas públicas que não têm, a priori, uma relação com nenhum
problema e estão em uma “lata de lixo”. Assim, as soluções procuram por problemas,
não necessariamente surgem para resolver um problema específico. Em algum
momento, algum ator (ou vários) vai apresentar uma (ou várias) das alternativas da lata
de lixo como solução para algum problema, então ocorrerá a formulação da política.

Por fim, é preciso observar que o trabalho de construção de conhecimento é


coletivo e a compreensão dos problemas e das soluções é limitada. Logo, as
organizações operam em um contexto de incerteza e em um sistema de tentativa e erro,
leitura que se aproxima da abordagem incremental.

5. Coalizões de defesa

Esse modelo assume que o sistema político determina os recursos e limitações


com os quais os atores devem lidar e que determinam, em grande parcela, o seu
comportamento. Dentro do sistema político, existem os subsistemas de políticas (policy
subsystem: áreas específicas de políticas públicas) nos quais os atores operam de acordo
com seus interesses em políticas públicas.

Dentro dos sistemas representativos, um ator sozinho, geralmente, é incapaz de


mover o subsistema político em seu favor, logo, deve busca aliados para formar
maiorias. Os atores que compartilham crenças e valores formam, então, coalizões de
defesa em prol das políticas que representam seus ideais. O funcionamento do sistema
político seria regido, portanto, pela interação dessas coalizões dentro de seus respectivos
subsistemas políticos.

Essa abordagem expõe a importância das redes sociais como elo de interações
entre os atores.

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6. Equilíbrio pontuado

O modelo de equilíbrio pontuado surgiu numa tentativa de explicar a tendência


da administração públicas de combinar longos períodos de estabilidade com momentos
de mudanças profundas.

Primeiramente, as políticas públicas são caracterizadas por estabilidade,


principalmente, porque a capacidade humana de processar informação é limitada. Isso
tende a levar a hesitação e decisões mais incrementais em função da aversão ao risco ou,
apenas, pela dificuldade de absorver as informações necessárias para atitudes mais
radicais.

Todavia, em períodos de instabilidade (social, política ou econômica), a


insatisfação com o status quo tende a ser tão elevada que a oportunidade para levar a
diante plano de grandes mudanças aparece. Às vezes, a transformação profunda é vista
como a única maneira de superar o período de instabilidade.

Em todo caso, a maneira como as mudanças ocorrem e a sua direção é resultado,


em boa medida, da policy image, ou seja, da percepção que o grande público, ou dos
atores mais relevantes, têm da política necessária. Daí o papel fundamental da mídia no
modelo.

7. Modelos influenciados pelo Gerencialismo

Os anos 1990 foram anos de ajuste fiscal para muitos países em


desenvolvimento. No bojo das políticas de ajuste, ganhou espaço os princípios do
gerencialismo, ou da administração pública gerencial (da qual o Plano Diretor da
Reforma de Estado, de Bresser-Pereira é o principal documento brasileiro). Um
resultado natural do avanço dessas idéias no setor público e no imaginário de parcela
significativa da população é o impacto que o gerencialismo exerceu sobre as políticas
públicas dos países que o adotaram.

As máximas dos modelos influenciados pelo gerencialismo são a busca da


eficiência e o aumento da racionalidade nos gastos e nas ações do governo. Isso se deve

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à ênfase na necessidade de produzir mais, para atender as demandas da sociedade, com


cada vez menos, devido ao ajuste fiscal e às políticas econômicas de matriz ortodoxa.

Outro ponto importante para esses modelos é a busca pela credibilidade. Nesse
sentido, as regras que regem as políticas devem ser pré-definidas de forma clara e
precisa, de maneira que reste o menor espaço possível para a discricionariedade dos
agentes públicos. Fator que contribuiria para reduzir o nível de incerteza com que os
atores, públicos ou privados, devem lidar.

Além dessas características, há outras bastantes marcantes derivadas do


gerencilaismo. Entre elas destacam-se, a delegação de competência a instituições com
“independência” política (ex. oscips, ONGs, OSs etc.), a desregulamentação, os
processos de privatização e as reformas no sistema social. Todas essas atitudes têm
como base o incentivo da participação de agentes privados na promoção de bens
públicos, o aumento da eficiência do Estado e a redução da sua presença em área em
que, supostamente, atores privados possam ser mais eficientes.

Por fim, o equivalente político da eficiência nesses modelos é o fato de as


políticas públicas assumirem um caráter cada vez mais participativo. O fenômeno da
publicização é um reflexo imediato disso.

Além dos pontos apresentados acima, é possível apontar outras máximas do


gerencialismo aplicadas à área de políticas públicas. Segundo essas leituras, a política
pública:

y É abrangente, não se limite a leis e regras;

y Permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz;

y Envolve vários atores (formais e informais) e níveis de decisão, embora seja


materializada nos governos

y É uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados;

y Embora com efeitos no curto prazo, é de longo prazo;

y Envolve processos subseqüentes após sua decisão e proposição, ou seja, implica


também implementação e avaliação.

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INSTITUIÇÕES E POLÍTICAS PÚBLICAS

Em muitos estudos sobre a produção de bens e serviços públicos, logo, de


políticas públicas, o papel das instituições é bastante salientado. É o caso dos estudos
institucionalista. Não entraremos em detalhes sobre as abordagens desse matiz, pois não
me parece necessário. Vamos direto às idéias principais.

Primeiramente é preciso saber que interesses individuais compartilhados não


geram ação coletiva (olson). Os indivíduos tendem a se comportar de forma a
adquirirem o melhor benefício com o mínimo de esforço ou custo. Daí o fenômeno do
carona (free rider) ser tão presente no campo da ação coletiva (exemplo: um indivíduo
pode concordar com uma greve e não participar dela, pois não terá seu salário suspenso
e, ao mesmo tempo, qualquer benefício auferido pelo movimento será também para ele,
uma vez que a greve reivindica pontos para toda a categoria).

Além disso, a ação coletiva não produz necessariamente bens coletivos (Arrow),
ações de indivíduos perfeitamente racionais, em arenas bem institucionalizadas e
organizadas podem gerar as políticas mais obtusas.

Esses são apenas dois achados da ciência política que, entre outros, chamaram a
atenção para o papel das instituições no processo de desenvolvimento de políticas
públicas. Para resolver esses problemas da ação coletiva, Olson conjecturou que bens
coletivos e ação coletiva podem ser gerados por desenhos institucionais que gerem
incentivos seletivos. Isso porque as instituições modelam preferências dos indivíduos
que estão inseridos ou lidando com elas. Assim, o conjunto das instituições poderia, até
um certo ponto, “moldar” o comportamento dos atores para uma certa direção ou
colocar limites para que não agissem de uma forma indesejada. Dessa forma, estaria
fazendo a seleção de comportamento dos atores (ou pelo menos evitando
comportamento indesejado).

Nesse contexto, é possível afirmar que as instituições influenciam as políticas


públicas porque, dentre outras coisas: tornam o curso de algumas políticas mais fácil
que o de outras, definem as posições dos atores e as alternativas que são viáveis.

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Duas teoria chamam bastante interessantes ligadas ao institucionalismo:


Escolha racional (rational choice): comportamento guiado por preferências que
dependem da percepção dos indivíduos que é influenciada pelo meio.
Escolha pública (public choice): ênfase na racionalidade limitada. Assimetria
informacional, incerteza, informações incompleta, auto-interesse dos atores. Decisões
do mercado melhores que decisões políticas.

IMPLEMENTAÇÃO: A MATERIALIZAÇÃO DA POLÍTICA

O que é?

Implementação é o conjunto de ações realizadas por grupos ou indivíduos de


natureza pública ou privada, as quais são direcionadas para a consecução de objetivos
estabelecidos mediante decisões anteriores quanto a políticas. Ou seja, ações que fazem
uma política sair do papel e funcionar efetivamente.
Para a maioria dos cientistas políticos, a implementação é a evolução do
processo de formulação. Isso dá a ela um caráter de continuação deste processo. Tal
fato, deve-se à constatação de que muitas decisões que, em tese, deveriam ser tomadas
durante o processo de formulação são realizadas, na prática, durante a implementação.
Isso ocorre por diversas razões, as principais delas são:
• Os tomadores de decisão, formuladores, não têm como saber de todas as
condições que estarão presentes no momento da implementação;
• A política pode não ser definida com suficiente clareza para os
implementadores;
• Os implementadores podem encontrar obstáculos, interesses, realidades que
os formuladores não considerados;
• Os implementadores têm seus interesses próprios e podem tentar influenciar
a política na direção que acreditam mais adequada.

O que seria necessário para uma implementação perfeita?

Segundo Mª das Graças Rua, existem 10 pré-condições uma para implementação


perfeita:
1. As circunstâncias externas à agência implementadora não devem impor
restrições que a desvirtuem;

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2. O programa deve dispor de tempo e recursos suficientes;


3. Os recursos devem estar disponíveis no tempo devido;
4. A política a ser implementada deve ser baseada em uma teoria adequada
entre causa (do problema) e efeito (da solução proposta);
5. Esta relação de causa e efeito deve ser direta e, se houver fatores
intervenientes, devem ser mínimos;
6. Deve haver uma só agência implementadora, que não depende de outras
agências para ter sucesso; se houver outras agências envolvidas, a relação de
dependência deve ser mínima em número e importância;
7. Deve haver completa compreensão e consenso quanto aos objetivos a
serem atingidos e esta condição deve permanecer durante todo o processo de
implementação;
8. Deve ser possível especificar as tarefas a serem realizadas por cada
participante e seu momento;
9. É necessária perfeita coordenação e comunicação entre os envolvidos;
10. Os atores em comando devem ser obedecidos.

Como esse negócio de “10 isso ou 10 aquilo” tende a gerar algumas suspeitas,
digamos apenas, a guisa de conclusão desse tópico que para analisar a implementação
de uma política alguns fatores são essenciais:
1. A natureza da política (não deve haver ambigüidades, ou seja, é preciso
saber, de fato, que tipo de política está sendo realizada);
2. O tipo de arena em que está inserida (quais as instituições e atores
envolvidos);
3. A estrutura de implementação (elos da cadeia);
4. A prevenção de interferências externas (é necessário? É possível? Quais
os riscos envolvidos?..);
5. O controle sobre os atores envolvidos;
6. A implementação nem sempre se distingue do processo de
formulação (implementação = formulação em processo). “Um dos motivos que leva
a falhas nos resultados de políticas públicas é a dissociação que se faz entre elaboração
e implementação no processo de planejamento” (José A. Puppim de Oliveira)

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OUTROS PONTOS IMPORTANTES CONCERNENTES À IMPLEMENTAÇÃO

Como o principal instrumento de políticas públicas nacionais no Brasil é o PPA


e seus desdobramentos. E como adotamos um sistema de planejamento baseado na
instrumentalidade do orçamento-programa, toda vez em que é formulada uma nova
política (que tende a assumir a forma de programa) é necessário observar como um
novo programa se relaciona com os programas já existentes. Do contrário, é possível
que haja desperdícios, retrabalho, políticas com valores e/ou objetivos antagônicos em
funcionamento etc. logo, a compatibilização de política novas com antigas é essencial.
Outro fator ao qual o analista da implementação deve está atento é a
possibilidade de adoção simbólica de políticas, a qual acontece com certa freqüência. É
aquela situação em que nível de poder toma uma decisão que na realidade não quer ver
implementada. Então a decisão é tomada, mas nenhuma ação é realizada no sentido de
fazer a política funcionar. Por exemplo, um governo pode adotar uma política que
vários atores sociais o pressionam para realizar, mas não destina a ela o montante de
recursos necessários à sua implementação. Ora, as chances de sucesso desta política são
mínimas, pois, recursos materiais e de tempo são essenciais para o sucesso de uma
política.
Além disso, mudanças na estrutura política (no sistema político, polity) ou
mesmo da própria política pública são fatores críticos para o sucesso de uma política
pública. Por um lado, uma política que é implementada em ambiente político totalmente
diferente daquele em que foi implementa, pode ser tratada com amarga indiferença
pelos atores sociais relevantes para seu desenvolvimento. Por outro, se uma política
muda de forma o tempo inteiro, pode acabar tão desfigurada que pode perder o elo com
sua razão de ser, seus objetivos.
Por fim, o acompanhamento e controle das políticas requer que se tenha em
mente sempre que muitas políticas:
1. Podem representar compromissos entre valores e objetivos conflitantes –
ambigüidades resultantes do jogo político (logrolling) presente no processo de
formulação ou da própria falta de informações em relação ao problema enfrentado;
2. Envolvem compromissos com interesses poderosos dentro da estrutura de
implementação – exemplo: políticas de reforma da Administração sempre terão de lidar
com o apoio ou a aversão dos fortes sindicatos de servidores;

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3. Envolvem compromissos com interesses poderosos sobre quem será afetado


pela implementação;
4. São formuladas sem que tenha sido dada a devida atenção aos potenciais veto
players – ou seja, aqueles atores que podem colocar obstáculos ao desenvolvimento da
política de forma a impedir seu desenvolvimento.

QUESTÕES DE PROVAS ANTERIORES:

1. (EPPGG – Esaf – questão 75) A partir da década de 80 e sobretudo a partir da década


de 90, desenvolveu-se internacionalmente um amplo processo de reforma do Estado.
Independentemente das especificidades nacionais, esse processo tem algumas
características comuns:

Uma série de características são apontadas a seguir:

1- O papel do Estado como agente econômico é substituído pelo papel de regulador,


ocorrendo um processo de privatização em escala variável.

2- A dicotomia estatal/privado, predominante até então, abre espaço para formas


intermediárias com a emergência de parcerias e de organizações públicas não-estatais.

3- O setor público incorpora em sua avaliação critérios tradicionalmente considerados


como inerentes à iniciativa privada, tais como eficácia, eficiência, metas, produtividade
e controle de custos.

4- A gestão das políticas públicas e o controle da ação estatal passam a ser feitos por
organismos com crescente participação social. Os mecanismos de consulta pública
(audiências, exigência de aprovação prévia de medidas por parte de conselhos, etc) se
multiplicam.

Em relação a essas afirmações pode-se dizer que:

a) estão todas corretas.

b) apenas a nº 1 está correta.

c) apenas a nº 2 está correta.

d) apenas a nº 3 está correta.

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e) estão todas incorretas.

A partir da leitura do tópico “Modelos influenciados pelo Gerencialismo”


acima, é possível constatar que a questão faz menção, em todas as suas afirmativas, a
fenômenos que surgiram na Administração Pública a partir da década de 1990. Na
assertiva 1, regulação e privatização; na assertiva 2, ao fato de o Estado buscar a
coordenação de suas atividades com atores privados, de forma que público e privado
passam a ser ter mais integração na realização das políticas. .Quanto à assertiva 4, um
dos fundamentos do gerencialismo é justamente a aproximação da administração
pública com os conceitos da administração de empresas. Ou seja, plenamente correta.
E por fim, o item 4, apenas ilustra o fenômeno da publicização das políticas públicas,
ao qual me referi acima.

Sendo assim, a alternativa correta só pode ser a “A”

2. Existem muitas classificações para as políticas públicas a partir de suas


características, as quais se tornam evidentes durante o processo de formulação. Com
relação ao tipo de políticas, julgue as assertivas abaixo e depois marque a alternativa
verdadeira.

1. A universalização do ensino fundamental no Brasil pode ser considerada uma meta de


políticas distributivas, pois é caracterizada por alto grau de consenso, busca um grande
número de beneficiados e não sujeita a implementação da política a limitações
orçamentária, por se tratar de uma prioridade;

2. As regras definidas pela Constituição de 1988 estabeleceram diversas mudanças nos


tipos de relações entre os atores políticos, de forma que redistribuiu o poder entre as
classes governantes. Nesse sentido, essas novas regras podem ser consideradas políticas
redistributivas;

3. Políticas regulatórias são apenas aquelas que instituem organismos destinados ao


controle de algumas atividades econômicas, como a Anatel e Anac.

4. A instituição de uma tabela regressiva de imposto pode ser considerada uma forma de
políticas redistributiva.

5. Uma das tendências atuais do governo com relação a políticas com alto grau de
conflito é a participação dos atores mais próximos do tema no processo de formulação.

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Esse tipo de atitude, como fóruns, seminários e audiências, pode ser útil tanto em
políticas regulatórias como em políticas redistributivas.

Em relação a essas afirmações pode-se dizer que:

a) estão todas corretas.

b) apenas a 1 e a 5 estão corretas.

c) apenas a nº 2 e a 3 estão incorretas.

d) apenas a nº 3 está correta.

e) estão todas incorretas.

Alternativa correta 3:

Porque: 2. Os diplomas legais que definem distribuição de poder, posição dos atores
etc. são políticas constitutivas. A noção de redistribuição sempre envolve diretamente
bens materiais. 3. A idéia expressa na alternativa limita a noção de política regulatória
que, conforme visto acima é bem mais ampla. Sempre que o governo regulamenta a
atividade de qualquer setor está definindo uma política

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