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03/09/2023, 02:16 O QUE É DISPENSACIONALISMO PROGRESSIVO?

| Bibotalk

Ao longo dos últimos séculos, dispensacionalistas e


pactualistas debatem sobre quem tem a melhor estrutura
hermenêutica para ler e entender as Escrituras. No meio
de toda essa discursão, novas posições vão surgindo à
medida que um “ferro afia a outro ferro”.
Uma destas posições é o  dispensacionalismo
progressivo. Seus defensores tentam aprender com os
pactualistas e corrigem o que precisa
no  dispensacionalismo. Porém, eles ainda se agarram
em algumas ideias a respeito das dispensações.
Se você, então, deseja entender toda esta conversa, leia
a entrevista abaixo feita com o professor Antônio Neto,
dispensacionalista progressivo e professor da Escola
Charles Spurgeon. Uma conversa bacana com o Mac e o
Victor Fontana que vai ajudar muito em saber as
principais características e crenças dos
dispensacionalistas progressivos.

O que você vai ler agora é a transcrição do BTCast


224, o podcast de teologia aqui do site  (se quiser
ouvir, clique aqui). Agradecemos ao
ouvinte  Marcelo Ferreira  que fez a transcrição
desse episódio!

O QUE É DISPENSACIONALISMO
PROGRESSIVO?
MAC –  Pessoal, não sei se este episódio se encaixa na
série Plenitude dos Tempos, porque o
dispensacionalismo não é necessariamente um tema
escatológico, embora o senso comum diga que sim.
Entrevistaremos o Antônio Neto, que nos falará sobre o
dispensacionalismo progressivo. Ele começará nos
mostrando algumas distinções, já que o
dispensacionalismo clássico (talvez o adjetivo aqui nem
caia bem, melhor seria o “dispensacionalismo que está
na boca do povo”) levanta muitas controvérsias. Quando
se fala dele no meio acadêmico, o pessoal já torce o
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nariz. A aversão é automática. O Yago Martins, que


também é dispensacionalista progressivo, já havia nos
falado dessas dificuldades, mesmo quando se tenta
defender algo novo sobre o tema. Não adianta. O
dispensacionalismo adquiriu certa conotação pejorativa,
como é comum a outros nomes ou conceitos teológicos.
E para piorar as coisas e confundir ainda mais àqueles
que só conheciam o dispensacionalismo dos Deixados
para trás, aparece agora o progressivo. Antônio, tira a
gente dessa enrascada.
ANTÔNIO NETO –  O dispensacionalismo progressivo,
como o próprio nome diz, é uma modificação dentro da
tradição dispensacionalista. Gosto de distinguir o
dispensacionalismo tradicional do progressivo da
seguinte forma: há os dispensacionalistas mais antigos,
que são aqueles da bíblia Scofield, defensores de sete
ou oito dispensações, que fazem aqueles gráficos bem
interessantes; pouco depois, vieram os
dispensacionalistas revisados, dos quais fazem parte os
famosos Charles C. Ryrie e John F. Walvoord, todo
aquele pessoal do Dallas , ali pela década de 60, 70 do
século XIX. De toda essa tradição dispensacionalista
anterior, a progressiva se diferencia por ver as
dispensações como avanços ou progressos dentro dos
planos de Deus. Mas segundo os dispensacionalistas
mais antigos, as dispensações são como testes divinos
pelos quais os homens devem passar. Por exemplo, na
Dispensação Adâmica, Deus testa Adão com uma ordem
e estabelece um juízo. Uma vez que Adão pecou, Deus dá
início à nova dispensação. A atual dispensação também
tem um teste, uma ordem e um juízo que é a tribulação
futura. Depois dessa tribulação, inicia-se nova
dispensação, a do Milênio. O dispensacionalismo
progressivo rompe com essa visão, influenciado pela
teologia bíblica europeia e pela teologia do reino de
George Ladd, autor do monumental Teologia do Novo
Testamento. Dessa forma, os progressivos procuraram
corrigir todos os excessos dos dispensacionalistas
tradicionais, vendo os planos divinos como algo
unificado. A Bíblia apresentaria então um centro
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unificador, que é o avanço do Reino de Deus, e cada


dispensação é um progresso das conquistas divinas
durante o Seu plano.
MAC –  Então o dispensacionalismo progressivo
contrasta com o clássico que, dependendo do teólogo
dispensacionalista, acredita em cinco ou sete
dispensações. É isso?
ANTÔNIO NETO –  Sim. E se você for ler os principais
livros dos dispensacionalistas progressivos, seus
autores nem sequer abordam a questão do número de
dispensações. Para eles isso é irrelevante. A maioria dos
progressivos que eu conheço, entre eles professores
meus, defendem basicamente três dispensações: uma
primeira, antes de Cristo; a atual, entre as duas vindas
de Cristo; e a dispensação futura, depois de Cristo. E na
verdade essa crença se assemelha à de muitos
aliancistas que entendem que a Bíblia fala apenas de
uma antiga e de uma nova dispensação. Para o
dispensacionalista progressivo o mais importante é
entender que Deus tem um plano unificado, que avança
na História. E essa visão promove uma série de
mudanças na tradição dispensacionalista. Por exemplo,
na ideia de que Deus tem um plano para Israel e outro
para a Igreja. Os progressivos não defendem essa ideia,
pois creem que o plano unificado de Deus abrange tanto
judeus quanto gentios. Isso quer dizer que a Igreja e os
judeus estão inclusos num único plano divino. A partir
dessa concepção, nota-se o quanto o
dispensacionalismo progressivo se afasta do tradicional,
ao mesmo tempo em que se aproxima de outras
tradições, como a aliancista e a teologia na nova aliança.
Creio que essa foi a principal mudança promovida pelo
dispensacionalismo progressivo.
MAC –  Inclusive ele foge daquele aspecto do
dispensacionalismo clássico…Clássico ou tradicional,
Antônio?
ANTÔNIO NETO – Você pode chamar de tradicional.
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VICTOR FONTANA –  Há os dispensacionalistas mais


clássicos, aqueles do Scofield e do Darby, que são mais
apegados às divisões em dispensações e àqueles mapas
absurdos. Mas, a partir da década de 50 do século
passado, surgiram os revisionistas, aquele pessoal do
Dallas Theological Seminary. Mas de qualquer maneira, a
diferença entre um Charles Ryrie e um Scofield não é tão
grande quanto à diferença deles a Darrell Bock, que é um
progressivo.
AN – Perfeito. Por isso que a minha sugestão é distinguir
os dispensacionalistas em tradicionais e progressivos,
embora a diferença entre eles esteja em alguns detalhes.
Os tradicionalistas dizem que Deus tem um plano para o
povo da terra e outro para o povo do céu. Aí vieram os
revisionistas e trocaram o “povo da terra” por “Israel” e
o “povo do céu” pela “Igreja”. Um plano divino distinto,
o tempo da Igreja como um parêntesis, a ênfase no pré-
tribulacionismo e no pré-milenismo – tudo isso faz parte
da tradição dispensacionalista. Os progressivos rompem
com todos esses pontos. E, por conta disso, segundo os
alguns tradicionais, os progressivos não podem ser
considerados dispensacionalistas. A alguns amigos, que
são progressivos ou se alinham com esse pensamento,
sugeri até a ideia de uma nova denominação para a
corrente aqui no Brasil. Isso porque o termo
dispensacionalismo no Brasil já está tão desgastado
que, basta mencioná-lo, e mesmo com o adjetivo
progressivo, o pessoal já faz cara de aversão. Então
alguns desses amigos têm sugerido o nome “pré-
milenista futurista”. E professores do seminário onde
estudei preferem ser chamados de “os da escola do
Ladd”, o que não muda lá muita coisa. Por isso que
insisto nos termos tradicional e progressivo. E mais uma
sugestão: coloquem dentro dos tradicionais toda essa
turma – os clássicos, os revisados, os “desrevisados”
etc. Tudo de ruim do dispensacionalismo pode colocar
dentro desse pacote. Fiquem à vontade. [risos]

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VF – A esse respeito, acho importante pontuar uma


coisa. Concordo que, devido ao próprio nome, o
dispensacionalismo progressivo carrega dentro de si
uma identidade próxima da tradição dispensacionalista.
Mas ainda assim, segundo o que percebo, quando
olhamos para a teoria e para hermenêutica, o
dispensacionalismo progressivo se aproxima mais da
teologia pactual. Pelos menos no método e não nas
conclusões. E assim posso entender o porquê do
estranhamento dos dispensacionalistas tradicionais em
relação aos progressivos. É que esses últimos tocaram
nos alicerces do dispensacionalismo. Por exemplo, a
questão de Israel. Nesse ponto os tradicionais são
irredutíveis.

AN – Você foi perfeito. É exatamente isso. Segundo os


tradicionais, a hermenêutica dos progressivos se
aproxima da teologia da aliança. Os progressivos não
veem dessa forma. Creem, sim, que a sua hermenêutica
é uma espécie de interface entre o dispensacionalismo
tradicional e a teologia da aliança. Na primeira obra que li
sobre o dispensacionalismo progressivo, cujo subtítulo
traduzido é Uma inferface entre a teologia
dispensacionalista e a teologia não-dispensacionalista, o
autor Robert Saucy deixa essa ideia bem clara. No livro,
os não-dispensacionalistas são os da teologia do pacto.
É como se os progressivos fossem o caminho do meio.
O que, em algumas situações, mostra-se como o melhor
caminho.
MAC – Ou, em outros casos, são aqueles que ficam em
cima do muro. [risos]
AN – De fato algumas posições dos progressivos vão
contra a tradição dispensacionalista, ao mesmo tempo
em que concordam com alguns pontos do pacto. E vice-
versa. É por isso que os dispensacionalistas
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progressivos são caracterizados por essa interface.


Dentro do espectro da teologia bíblica, os progressivos
estão bem próximos da teologia da nova aliança. Aqui,
no Brasil, já existe uma galera que segue os teólogos da
nova aliança sem nem saber. Por exemplo, são da nova
aliança o Piper e Carson. É preciso divulgá-la mais no
Brasil.
MAC – Ainda com relação à hermenêutica, li em seus
trabalhos, Antônio, que existem quatro aspectos a serem
considerados: os contextos histórico, gramatical,
literário e teológico.
AN – Isso mesmo. Foi uma grande transformação dentro
do método hermenêutico do dispensacionalismo com o
acréscimo de dois aspectos novos, o literário e o
teológico.
VF – E nesse sentido acredito que houve uma
aproximação não apenas da metodologia dos aliancistas,
mas também daquela que geralmente é aplicada na
academia. Então quando se pensa em metodologia não
apenas teológica, mas também exegética, está se
referindo a todo um conjunto de meios também
utilizados por qualquer acadêmico moderno. História,
gramática, contexto literário, gênero literário, posições
canônicas e as implicações e interpelações entre os
vários textos – de tudo isso até mesmo os liberais do
método histórico-crítico não abrem mão.
AN – Exatamente. A hermenêutica do
dispensacionalismo progressivo resulta de avanços no
terreno da interpretação. É só a gente olhar para as
obras de Darrell Bock e Craig Blasing (que se Deus
quiser serão traduzidas para o português), para notar
que elas começam com uma forte abordagem na
hermenêutica. E desse modo percebem-se no
dispensacionalismo as implicações de muitos princípios
da linguística atual e das novas metodologias de leitura e
interpretação de textos. Foi como se os avanços
hermenêuticos desaguassem no dispensacionalismo.
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Por isso passamos a ter sensibilidade para abordar


outros aspectos, enquanto que muitos
dispensacionalistas tradicionais continuam na
abordagem histórico-gramatical. Eles ainda concebem
os significados como estáveis. Por exemplo, o que é dito
sobre Israel, só se refere a Israel. Só se aplica à Igreja, se
for uma analogia. Alguém lê então num texto do Novo
Testamento Pedro chamando os gentios de raça eleita,
sacerdócio real e povo de propriedade exclusiva de
Deus, e chega à conclusão de que todas essas
expressões foram usadas para Israel. Mas aí vem a
pergunta: “Cadê a hermenêutica histórico-gramatical?
Por que não foi empregada nesse caso? Sumiu?”
Atualmente, e o Vitor apontou muito bem, a galera
moderna (a mais ligada da academia) é aberta ao fato de
que, quando você se aproxima de um texto, tem que se
levar em consideração não apenas o seu contexto
histórico e sua gramática, mas também as suas
características literárias, principalmente nas questões
proféticas. E isso é ainda mais importante quando
estamos diante do texto bíblico, que é um progresso de
eventos na história da redenção. E nesse caso também
devem ser usados o contexto teológico e as posições
canônicas. Por exemplo, o Salmo 110 ganha nova
perspectiva em Atos 2 quando é interpretado à luz de
novos eventos na história da redenção. No caso, a vinda
do Messias em duas etapas.
VF – Para aquela pessoa que acaba de ouvir falar sobre o
dispensacionalismo, o assunto é complicado. E as
coisas pioram quando essa mesma pessoa fica sabendo
que há os dispensacionalistas clássicos, os revisionistas
e os progressivos. E geralmente o assunto é associado à
escatologia. Mas a gente não está discutindo isso aqui.
Discutimos aqui como olhar a história bíblica como um
todo. Queremos entender a narrativa dessa história:
como ela começa; o trabalho divino durante o desenrolar
dessa história; e como ela termina. Aí, sim, começa a
parte escatológica. Em outras palavras, quando olho
para a história bíblica, eu tenho que escolher os óculos
com os quais eu a quero enxergar. Posso usar os
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“óculos” dos dispensacionalistas progressivos, os dos


aliancistas, etc. Resumi bem, Antônio, ou você teria
outra colocação?
AN – As posições mencionadas por você são chamadas
de chaves hermenêuticas. Como você bem disse, são os
óculos com os quais iremos nos aproximar das
Escrituras. E através das lentes dispensacionalistas
entende-se que Deus administra o seu plano através de
dispensações. E dessa primeira visão dispensacionalista
tradicional, passada pelo crivo de novas lentes, surgiram
então crenças distintas. E também foi muito bom
destacarmos que o dispensacionalismo não é só
escatologia. Quando lemos obras clássicas sobre o
dispensacionalismo, não se vê nelas ênfase à
escatologia. Um bom exemplo é o livro de Charles Ryrie
(Dispensacionalismo hoje) em que a ênfase é dada à
história bíblica. Mas reconheço que existe uma espécie
de “escatomania” dentro da tradição dispensacionalista.
O pessoal é vidrado em escatologia. Viajam o mundo só
palestrando sobre isso.
VF – Antônio, eu penso que ainda existem muitas turmas
diferentes dentro dos dispensacionalistas tradicionais,
seja entre os clássicos ou entre os revisados. Dessas
duas vertentes saem outros grupos. Embora eu discorde
radicalmente de muitos pontos dos dispensacionalistas,
principalmente da metodologia, acredito que existe muita
gente séria entre eles, mesmo os que gostam muito de
escatologia. Por outro lado, muitos viajam o mundo
ganhando dinheiro com especulações futurísticas que
nada tem a ver com o dispensacionalismo que a gente lê
em livros de pessoas sérias, que têm preocupações
acadêmicas. Por isso que é necessário fazer uma
distinção. Senão, mesmo os dispensacionalistas
tradicionais, acabam adquirindo má fama por causa
daqueles que representam as maçãs podres do meio.
Esse pessoal que proíbe os outros de comprar com o
cartão de crédito, que diz que o código de barra e o chip
são a marca da besta, etc.

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MAC – Pelo menos o lado bom dessas muitas vertentes


foi a popularização do dispensacionalismo, fazendo com
a teologia chegasse aos leigos. Só que algumas
pessoas, infelizmente, fizeram mau uso dessa
popularização. Assim as coisas saem do controle e se
chega a extremos. Daí a importância das vozes
acadêmicas para fazerem as ponderações em meio aos
excessos.
Interessante as colocações do VICTOR FONTANA a
respeito do assunto. Mas, ao mesmo tempo, achei isso
engraçado. Um presbiteriano tentando desfazer a
“confusão” que outros presbiterianos fizeram tempos
atrás. [risos] Talvez a galera não saiba, mas o
dispensacionalismo surgiu no meio dos presbiterianos.
Estou certo, Antônio?

QUANDO SURGIU O
DISPENSACIONALISMO?
AN – Sim, você está certo. O dispensacionalismo surgiu
das famosas conferências bíblicas e proféticas. Por isso
que a força do dispensacionalismo está na exposição
bíblica. Na verdade, ele surgiu com o objetivo de ajudar
as pessoas a entenderem melhor a Bíblia. Tanto é assim,
que a primeira Bíblia comentada foi a de Scofield. Com
essa obra e muitas outras publicações, o
dispensacionalismo cresceu muito. Mas, infelizmente, o
senhor Tim LaHaye resolveu escrever ficção a respeito
do assunto. Eu costumo brincar dizendo que o
dispensacionalismo é tão legal que até dá para escrever
livro e fazer filme a respeito dele. Já a teologia da aliança
é tão sem graça, que nem dá para fazer filmes. [risos]
VF – A teologia da aliança produz outro tipo de alegoria.
Por exemplo, As Crônicas de Nárnia. [risos]
AN – Aí não. Nárnia é do Milênio. [risos] Voltando para o
Tim LaHaye. Ele me inventa de escrever o Deixado para
trás, e depois vieram os filmes. Agora passamos a ter o
dispensacionalismo da academia e (como ouvi num dos
BTCast do Yago) o dispensacionalismo do chão de
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igreja, onde rola de tudo. Por exemplo, as questões


sobre pré-tribulacionismo e o arrebatamento. O que está
na boca do povo? A ideia do arrebatamento secreto, e de
que a qualquer momento a gente irá sumir e subir,
ficando as roupas intactas no lugar onde o arrebatado
estava. Aí então haverá acidentes de avião, de carros, e
aquele caos todo. Mas isso tudo é ficção. Foi o que,
infelizmente, se popularizou. Por outro lado, quando
você pega as obras de dispensacionalistas revisados,
como as de John F. Walvoord, e as de progressivos,
como as de Craig Blaising, você nota o quanto eles
defendem de maneira sólida a ideia do pré-
tribulacionismo. Eles, sim, merecem respeito e
consideração, pois defendem aquilo em que creem não
como deslumbrados ou apaixonados, mas baseados
numa boa exegética. E fazem isso tão bem que, mesmo
os que não acreditam no pré-tribulacionismo, levam a
sério os seus argumentos. E outro ponto, MAC: você tem
razão quando diz que os dispensacionalistas souberam
como conquistar a atenção do povo. Eu me lembro de
que, quando era criança, fui discipulado sobre a
escatologia do dispensacionalismo. Toda a igreja
assistia a vídeos, onde nos era mostrado o mundo se
preparando para a chegada do anticristo. Lembro
também de num retiro assistir a um filme onde havia um
anticristo de nome Nicolau. [risos]
VF – Mas espera um pouco. Quando se fala que o nome
do anticristo é Nicolau, a gente corre dois riscos
tremendos. O primeiro é achar que o anticristo é o Papai
Noel. [risos] O segundo, e mais sério, é achar que uma
obra de ficção possa ser utilizada como chave
hermenêutica. Ao invés de usarem, em sua exegese,
meios próprios do dispensacionalismo, as pessoas
acabam usando o filme “Deixados para trás” ou o livro
de mesmo nome. E chegou a tal ponto a popularização
dessa obra de ficção que até os que não a leram, sabem
tanto dela, que é como a tivessem lido. E isso aconteceu
no meio evangélico e também no católico.

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AN – Olhando por outra perspectiva, eu também alertaria


os aliancistas brasileiros, porque estão lendo o
dispensacionalismo pelas lentes do Deixados para trás.
Conheci inúmeros deles que nem sequer tinham lido as
obras básicas do dispensacionalismo. Um dia um
aliancista me disse que não receberia um
dispensacionalista em sua igreja. O motivo, segundo ele,
era que o dispensacionalismo acredita na salvação por
meio das obras do Antigo Testamento e, de quebra, tem
uma soteriologia arminiana. Mas isso não condiz com a
realidade. A tradição dispensacionalista floresceu dentro
do calvinismo. Foi o dispensacionalismo brasileiro que
assumiu ares arminianos. Mas, em sua origem, ele nunca
foi arminiano. Existem muitos equívocos a esse respeito.
Eu ouvi o podcast do reverendo Leandro Lima sobre o
Amilenismo. Com todo o respeito ao reverendo, mas
fiquei me perguntando onde foi que ele leu a respeito do
dispensacionalismo. Porque aquele descrito por ele, eu
não conheço. Mas em alguns pontos, dou razão a ele,
porque acredito que o reverendo estava mencionando
esse dispensacionalismo que se popularizou no Brasil.
Por isso minha intenção nesta entrevista é trazer para a
roda de discussão o dispensacionalismo de fato.
MAC – Colocar os pingos nos is. Fazer as devidas
distinções.
AN – Exato.
VF – Constato uma coisa. Por mais paradoxal que
pareça, o dispensacionalismo é ainda a corrente
dominante na cabeça do brasileiro. Embora as melhores
obras do dispensacionalismo não estejam traduzidas
para o português. E isso é nevrálgico. Por mais que na
academia o pessoal tenha acesso aos textos em inglês,
os professores de seminários enfrentam dificuldades
para produzir suas ementas devido ao reduzido número
de obras. Por exemplo, as obras do Darrell Bock,
traduzidas para o português, não são sobre o
dispensacionalismo, mas de exegese e um pouco de
teologia bíblica. Confesso que quando tive contato com
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o Bock pela primeira vez, um pouco antes de entrar no


seminário, foi através de um livro sobre Jesus. Fiquei me
perguntando se ele era ou não dispensacionalista.
Infelizmente é uma dificuldade com o qual temos que
saber lidar.
AN – E essa dificuldade é de todos nós. Eu sofro muito
com os dispensacionalistas tradicionais, devido às
publicações que fazem com que o movimento seja tão
desprivilegiado. Um dia vi uma publicação no facebook
onde se comparava os sete dias da criação com as sete
dispensações. [risos] Por causa de coisas desse tipo, dá
até vontade de desistir. [risos]
VF – Se a pessoa estava só comparando, a gente pode
até tolerar. [risos] Mas há aqueles que impõem, “o
sentido é este e pronto!”.
AN – Mas acho que era essa justamente a ideia da
postagem. Essa atitude enfraquece o movimento
dispensacionalista no Brasil.
VF – Vou polemizar a respeito da heilsgeschichte ou
história da redenção. Os adeptos dela, sob a liderança
do Ladd, não aceitam ser chamados de
dispensacionalistas progressivos. Dizem que esse termo
está contaminado. E aí entraremos de novo na
escatologia, embora a gente saiba que o
dispensacionalismo não é somente isso. Na obra The
Meaning of the Millennium (O significado do Milênio)
quatro autores se posicionam sobre o Milênio. O George
Ladd defende o pré-milenismo histórico; Herman Hoyt, o
pré-milenismo dispensacionalista; Loraine Boettner, o
pós-milenismo; e Anthony Hoekema, o amilenismo.
Nesse livro, Ladd tenta se distanciar do
dispensacionalismo, não economizando em suas
críticas. Nem Hoekema, um amilenista, criticou tanto o
dispensacionalismo nesse livro, quanto o Ladd. Chega
até ser engraçado. E as coisas acabam ficando confusas
por conta das diferentes metodologias. Do prisma em
que a história da redenção acaba se tornando, a gente
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pode extrair pessoas como os neo-aliancistas, os da


teologia da nova aliança, os calvinistas amilenistas como
Michael Goheen, proeminente autor histórico-redentivo,
cujas obras estão sendo traduzidas no Brasil, entre
outros. E ainda assim teremos dispensacionalistas
progressivos heilsgeschichte, como é o caso do Darrell
Bock.
Antônio, quando você e seus colegas falam da história
da redenção e ao mesmo tempo começam a se distanciar
do dispensacionalismo clássico, vocês não despertam a
ira dos dispensacionalistas tradicionais?
AN – Sim, em certa medida. Darrell Bock escreveu um
artigo chamado “Porque eu sou um dispensacionalista”.
Nesse artigo, ele lida justamente com o problema
mencionado por você. Muitos tradicionalistas afirmam
que os progressivos são uma espécie de pré-milenismo
do Ladd. Na verdade, da teologia de Ladd, os
dispensacionalistas progressivos só mantiveram a
distinção entre Israel e a Igreja, mas apenas com relação
ao cumprimento das profecias a respeito daquele povo
como nação no futuro. E muitos da teologia da nova
aliança também pensam da mesma forma. O Douglas
Moo, talvez um dos mais famosos defensores da teologia
na nova alinça, acredita que ainda existem promessas
para a nação de Israel. O Ladd já não pensa assim. Ele
deixou bem claro em sua Teologia do Novo Testamento,
que Deus deixou a nação de Israel de lado, e desde os
primeiros discípulos trabalha com um novo Israel. Mas,
ainda segundo Ladd, no futuro haverá uma conversão
em massa dos judeus, e não necessariamente a
restauração da nação de Israel, com seu retorno a uma
terra, etc. Basicamente são essas as modificações que o
dispensacionalismo progressivo fez na teologia do Ladd.
Abraçamos todo o esquema metodológico da
heilsgeschichte que lida com atos redentivos de Deus na
História, como também a “ideia do já e ainda não”, ou
seja, acreditamos que Jesus antecipou o futuro, trouxe o
seu cumprimento para os nossos dias, embora não o
tenha ainda consumado. Não partilhamos da crença da
tradição dispensacionalita que diz que Jesus adiou o
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Reino. Segunda ela, quando Jesus veio ao mundo, Ele


ofereceu o Reino. E, como este foi rejeitado, Jesus o
adiou para cumpri-lo no futuro. E, por isso, atualmente
estamos no período da era da Igreja. E com respeito à
hermenêutica do Ladd, o dispensacionalismo
progressivo possui visão diferente. As palavras dele no
livro The Meaning of the Millennium têm toda uma aura
do que chamo de “hermenêutica espiritualizante” – o
Novo Testamento reinterpreta o Velho Testamento, dando
a ele significados espirituais, como é o caso do trono de
Davi. Ladd é muito claro em dizer que o trono prometido
a Davi para ser cumprido na terra, na verdade foi
transferido para céu, e sua natureza é espiritual. Um
dispensacionalista progressivo jamais faria uma
afirmação desse tipo.

A HERMENÊUTICA DO
DISPENSACIONALISMO PROGRESSIVO
MAC – Antônio, vou levantar uma nova questão. Uma
camarada se converte. É um leitor comum, não afeito à
academia, e começa folhear a Bíblia. De repente, ele lê
no Antigo Testamento profecias como a de Isaías 7, que
fala de uma virgem que irá conceber o Messias. Se essa
pessoa se basear apenas nesse texto, sem as lentes do
Novo Testamento, ele não terá nenhum significado
especial, muito menos será entendido como profético.
Mas tudo mudará quando houver uma leitura paralela do
Velho com o Novo Testamento. Isso acontecerá não
apenas com o texto de Isaías 7, mas também com muitos
outros textos do Velho Testamento. Até agora,
abordamos bastante a hermenêutica do
dispensacionalismo progressivo. E em alguns materiais
que você nos mostrou, é dito que o Antigo Testamento
tem prioridade sobre o Novo Testamento e deve
estabelecer contexto para a sua interpretação. E essa
afirmação é do dispensacionalismo tradicional. Mas, em
contrapartida, o Novo Testamento também tem
prioridade sobre o Antigo, da mesma forma sendo
contexto para esse último. Essa é a posição da teologia
da nova aliança. E estou fazendo essas colocações de
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forma bem resumida. E, como você já disse, o


dispensacionalismo progressivo tenta promover um
meio-termo entre essas duas posições. Para entender as
coisas de maneira prática, eu queria um estudo de caso
com um texto específico. Então que texto pode ser
colocado sobre a mesa e analisado a partir dessas
questões que abordamos?
AN – O melhor texto é Atos 2, onde Pedro fala do trono
de Davi. Com esse texto, e de maneira clara, pode-se
fazer a distinção da hermenêutica do
dispensacionalismo progressivo, tanto da hermenêutica
da tradição dispensacionalista quanto a da teologia da
nova aliança. Nesse capítulo de Atos, Pedro afirma que
Jesus sentou-se no trono de Davi.
MAC – Em Atos 2.30-36, lemos o seguinte: “Mas ele era
profeta e sabia que Deus lhe prometera sob juramento
que colocaria um dos seus descendentes em seu trono.
Prevendo isso, falou da ressurreição do Cristo, que não
foi abandonado no sepulcro e cujo corpo não sofreu
decomposição. Deus ressuscitou este Jesus, e todos
nós somos testemunhas desse fato. Exaltado à direita de
Deus, ele recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e
derramou o que vocês agora vêem e ouvem. Pois Davi
não subiu ao céu, mas ele mesmo declarou: ‘O Senhor
disse ao meu Senhor: Senta-te à minha direita até que eu
ponha os teus inimigos como estrado para os teus pés’.
Portanto, que todo Israel fique certo disto: Este Jesus, a
quem vocês crucificaram, Deus o fez Senhor e Cristo”.
AN – O que se pode concluir desse texto? O apóstolo
Pedro está interpretando alguns textos do Velho
Testamento. Um deles é o Salmo 16, em que Davi diz:
“porque tu não me abandonarás no sepulcro, nem
permitirás que o teu santo sofra decomposição.” Ao
utilizar as palavras do salmista, Pedro argumenta que
Davi não falava de si mesmo, mas sim de Jesus, pois
fazia referência à ressurreição de um corpo que não
entrou em decomposição. Como à época todos sabiam
que Davi não havia ressuscitado, pois conheciam o seu
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túmulo, o salmista só podia estar falando de outra


pessoa. E essa pessoa era Jesus. Por que Pedro achou
importante utilizar em seu argumento um texto do Antigo
Testamento para mencionar a ressurreição de Jesus?
Pedro queria deixar claro para seus ouvintes que, ao
ressuscitar, Cristo foi exaltado e elevado ao Seu trono. O
salmista referia-se ao cumprimento da promessa divina
em colocar um descendente de Davi no trono. E é a partir
daqui que são levantadas algumas questões. Segundo o
dispensacionalismo tradicional, o trono de Davi no
Antigo Testamento é literal e situado em Jerusalém.
Então a promessa divina feita a Davi somente será
cumprida quando, nos dias atuais, um descendente dele
sentar-se em um trono concreto, físico, em Jerusalém. E
esse descendente será o Messias. E a respeito da
ressurreição, mencionada por Davi, os tradicionais
concordam que ela se refere a Jesus, que ainda não se
sentou no trono. Essa é a interpretação
dispensacionalista tradicional.
VF – Esse é o maior problema do dispensacionalismo
tradicional. E seria bom termos aqui um tradicional sério
para se defender. Não é legal a gente só falar onde eles
estão equivocados. A gente acaba criando algumas
caricaturas da posição tradicional. Mas, repito, o
problema deles, em passagens como essas que
abordamos, é acharem que estão sempre com a razão.
Mas, quando começam a exegese, eles constroem tantos
nexos “lógicos” entre diversos e diferentes outros
textos, que acabam se distanciando do que é dito no
texto analisado. E tudo acaba num silogismo que na
verdade não passa de um castelo de cartas.
MAC – Mas e a posição da teologia da aliança?

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AN – Já vimos que o dispensacionalismo tradidicional


acredita que o trono descrito no Antigo Testamento é na
terra. Como esse trono ainda não está em Jerusalém, e
tampouco Jesus nele se sentou, a profecia não se
cumpriu. Já o teólogo da aliança entende que Pedro, em
Atos 2, está estabelecendo o contexto com o qual
devemos ler o Salmo 110. Em Atos 2.33, 34, Pedro diz:
“Exaltado à direita de Deus, ele recebeu do Pai o Espírito
Santo prometido e derramou o que vocês agora veem e
ouvem. Porque Davi não subiu ao céu…” Segundo as
palavras de Pedro, nesse texto, o trono de Davi está no
céu. Baseado nisso, o teólogo da aliança tem o seguinte
raciocínio: se Pedro afirma que o trono de Davi está no
céu, então quando eu ler o Salmo 110, tenho que
entender que no trecho “assenta-te à minha direita” o
salmista está se referindo a algo que também aconteceu
no céu. Assim, o aliancista crer que as promessas
messiânicas do Reino são espirituais e ocorrem no céu.
Em seus textos, Ladd, numa interpretação semelhante à
aliancista, afirma que o trono terreno de Davi foi
transferido para o céu, que há um templo celestial, etc.
Mas aí pergunto: Na passagem de Atos 2, Pedro está
realmente dizendo como interpretar determinadas
passagens do Velho Testamento? O dispensacionalismo
progressivo propõe-nos o seguinte exercício: ler o
Salmo 110 e entendê-lo no contexto dele; e, segundo
passo, compreender a interpretação que o apóstolo
Pedro deu a esse mesmo texto na época dos Atos dos
Apóstolos. Então, a partir da leitura de Pedro, feita no
momento histórico da morte e ressurreição de Cristo, o
Salmo 110 ganha novas dimensões. E a mais patente é a
celestial. Mas isso não quer dizer que toda promessa
terrena feita no Antigo Testamento deva sempre ser
interpretada espiritualmente e adquirir significado
celestial. Levando-se em consideração esses aspectos, e
a interface como posição, o dispensacionalismo
progressivo usa a chamada hermenêutica complementar.
E por isso mesmo vê no exemplo de Pedro um
complemento de um novo referente para a compreensão
do Salmo 110. Mas esse novo referente não anula ou
reinterpreta o que é dito no Salmo 110 em seu contexto
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próprio. Portanto, Jesus reina no trono de Davi e também


reinará futuramente no seu trono na terra. Mas há no
Novo Testamento indícios que apontam existir no Salmo
110 uma dimensão futura? Sim. Em Romanos 11.26,
Paulo diz o seguinte: “E assim todo o Israel será salvo,
como está escrito: ‘Virá de Sião o libertador que desviará
de Jacó a impiedade.” A frase “virá de Sião o libertador”
é uma menção ao versículo 2 do Salmo 110. Conclui-se,
então, que Pedro dá dimensão presente ao primeiro
versículo do Salmo 110, enquanto que Paulo projeta o
segundo versículo como evento escatológico. E mais.
Em Atos 3, Pedro também menciona que no futuro
haverá a restauração de todas as coisas, e isso, na
perspectivas dos primeiros discípulos (de acordo com
Atos 1.6) referia-se à restauração de Israel. E de fato é
essa a intenção de Pedro, porque ele está falando a
judeus.
A partir desses textos, mais uma vez percebe-se que
Pedro não está reinterpretando o Salmo 110, encarando-
o como literal no passado e espiritual no presente. De
maneira diferente, o dispensacionalismo tradicional
acredita que o descrito naquele salmo é literal e, até o
presente momento, não se cumpriu. Mas, como já foi
dito, Jesus morreu, ressuscitou e já se sentou no trono,
embora não ainda no contexto de consumação. Essa é a
visão dos progressivos. Eles acreditam na vinda do
Messias em duas etapas (a primeira já realizada). Em
Mateus 25.31 diz-se que o Messias sentará no trono,
numa clara menção a um evento futuro.
VF – Antônio, depois de ouvir essas explicações, não
tem como não imaginar um dispensacionalista
tradicional dizendo: “Viu, não falei? Esses progressivos
nunca foram dispensacionalistas.” [risos] A premissa
básica do dispensacionalismo tradicional, no caso
específico abordado por você, foi completamente
descartada, da qual o pessoal não abre mão.
AN – Não me complica, cara. [risos]

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VF – Já o aliancista pode concordar, em alguns termos,


com você. Ele pode abrir mão de um ponto ou de outro, e
se encontrar com a posição progressiva em algum ponto
do caminho. E é compreensível a revolta dos
tradicionais, diante do que você expôs, e também
quando ouvem o Darrell Bock comentando a mesma
coisa no texto de Atos. Em outras palavras, do ponto de
vista metodológico, o dispensacionalismo progressivo é
muito próximo do método que os aliancistas usaram
para chegar ao aliancismo e também do dos teólogos da
nova aliança. Os resultados podem até diferir em alguns
aspectos, mas não na essência. Por exemplo, se Jesus
senta-se no trono no Milênio ou em definitivo numa
vinda futura – discussão que ocorrerá entre um
progressivo e um aliancista, mas nunca entre um
progressivo e um tradicional, porque metodologicamente
houve entre a posição deles um corte no cerne da
questão: literalidade ou espiritualidade. Por isso que
quando vejo essa exegese aplicada, entendo porque os
dispensacionalistas tradicionais dizem que os
progressivos foram longe demais.
AN – De fato, a questão é metodológica. Se houve corte
na hermenêutica, cortou-se também a raiz.
VF – É como se os progressivos dissessem aos
tradicionais: “Desculpa a gente ter quebrado as pernas
de vocês, mas a gente não queria chegar a tanto.” [risos]
MAC – Aí se vê como o pessoal da teologia da nova
aliança é gente boa. Eles acabam com a intriga entre os
dois irmãos adotivos e gêmeos que brigam entre si (o
progressivo e o tradicional), e aliam-se a um deles.
[risos]

DISPENSACIONALISMOS
PROGRESSIVO X TEOLOGIA DA
ALIANÇA

Ô
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ANTÔNIO NETO – Ouso dizer que o dispensacionalismo


progressivo, no debate teológico, ainda tem como
principal oponente a teologia da aliança; mas quanto à
hostilidade, ela vem por parte dos dispensacionalistas
tradicionais. Os teólogos da nova aliança são simpáticos
aos progressivos porque estes corrigiram os excessos
da visão dos tradicionais. Mas quando o debate se
aprofunda em outros textos, como, por exemplo, aqueles
que descrevem a relação dos judeus com os gentios ou
de Israel com a Igreja, os ânimos entre progressivos e
teólogos da aliança se acirram também. [risos] Um outro
exemplo. Pregando o texto de 1 Pedro 2.9, o reverendo
Nicodemos diz que a referência ali é à Igreja, que é o
novo Israel. Dessa forma, ele aplica a hermenêutica da
teologia da nova aliança. Mas, como já se sabe, o
dispensacionalismo progressivo, diante desse texto, tem
diferente ponto de vista. O que foi dito para os judeus,
serve somente para eles; quanto ao que foi dito para
gentios e judeus, a ambos compete, pois diante da
promessa comum mostra-se que eles são coerdeiros e
participantes de um mesmo corpo. Mas isso não
significa que a Igreja atual seja o novo Israel. Há a
distinção entre os judeus e os gentios. Deus não anulou
as promessas feitas à Israel. Ser judeu não é algo
totalmente irrelevante. Paulo deixa isso claro em
Romanos de 9-11: dos judeus vêm os patriarcas, os
profetas, o Cristo. E o apóstolo dos gentios finaliza seus
argumentos afirmando que os judeus serão restaurados,
voltando a ser povo de propriedade exclusiva de Deus,
como o é atualmente a Igreja.
MAC – Antônio, você tem algo a acrescentar, e que você
faz questão de mencionar?
AN – Seria importante mencionar as implicações do
dispensacionalismo progressivo nos eventos
escatológicos. Creio que os tradicionais, que porventura
lerem essa entrevista, têm essa expectativa. Talvez
queiram saber se nós acreditamos ainda em uma
tribulação de sete anos, num arrebatamento secreto, etc.
Por conta das modificações metodológicas e
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hermenêuticas, os progressivos concluíram que não é


preciso ser pré-tribulacionista. Não concebemos a ideia
de que o arrebatamento acontecerá antes da grande
tribulação. A lógica por trás da visão dos tradicionalistas
é que Deus arrebatará primeiro a Igreja e depois tratará
com o povo de Israel. Os progressivos não admitem essa
secção no tratamento divino, pois entendem que a Igreja
engloba gentios e judeus, ambos herdeiros das mesmas
promessas. Já no caso dos dispensacionalistas
progressivos que são pré-tribulacionistas, como é o
caso do Craig Blaising, eles o são por convicção bíblica,
e não por causa de sua teologia. Não é a teologia que os
força a acreditar no arrebatamento da Igreja e do
posterior tratamento divino exclusivo para com Israel. É
através da Bíblia que os progressivos pré-
tribulacionistas têm a convicção de que a tribulação
futura é o Dia do Senhor e que, como diz Paulo, o próprio
Deus resgatará a Igreja antes desse evento. Mas existem
progressivos que entendem que o Dia do Senhor é uma
parte da grande tribulação, mais especificamente a
segunda metade desta. E, por conta disso, muitos deles
não são pré-tribulacionistas e divulgam uma posição
chamada de pré-ira. Essa posição é uma espécie de pós-
tribulacionismo em que a Igreja é arrebatada no
momento do retorno de Jesus e do simultâneo
derramamento de sua ira. Creio que a pré-ira ainda vai se
consolidar aqui no Brasil. E há ainda os progressivos
que são pré-milenistas históricos, pois entendem que a
Igreja será arrebatada depois da grande tribulação. De
tudo isso, depreende-se que os dispensacionalismo
progressivo não está preso ao arrebatamento antes da
tribulação. Mas, em sua essência e preferencialmente, os
progressivos são pré-milenistas. Eles entendem que
Apocalipse 20 descreve o Milênio: o cumprimento do
reinado davídico pleno de Jesus Cristo com o Seu povo
aqui na terra. E durante esse reinado Israel será alvo de
todas as promessas feitas no Antigo Testamento,
juntamente com os gentios.
E há ainda outros pontos a destacar. Muitos acham que
os dispensacionalistas progressivos são
necessariamente pós-tribulacionistas. O que não é
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verdade. Muitos até já me taxaram como tal, quando


souberam que eu era progressivo. E com respeito à
tribulação e ao que é descrito no Apocalipse, o
dispensacionalismo progressivo não é totalmente
futurista. Somos chamados de futuristas parciais. O
progressivo entende que os eventos mencionados em
Mateus 24 e em Apocalipse têm cumprimento futuro, mas
também já aconteceram em algum período da história
humana.
MAC – O John MacArthur é progressivo ou tradicional?
AN – Em minha opinião, o MacArthur e o pessoal de seu
seminário são quase progressivos. Não chegam a usar
para si essa denominação, pois eles querem se
distinguir apenas na questão de Jesus assentado em
Seu trono. Mas essa questão não é sine qua non ao
dispensacionalismo progressivo. É aceitável discordar
da interpretação de Atos 2, e entender que ali descreve-
se Jesus sentado no trono de Davi atualmente e, ainda
assim, manter todos os outros postulados do
dispensacionalismo progressivo. E é isso que MacArthur
e o seu pessoal fazem. Bruce Ware, um calvinista
americano famoso, é também um progressivo.
MAC – Há no Brasil algum mainstream ou alguém
importante que levante a bandeira do
dispensacionalismo progressivo nas redes sociais e
outras mídias?
AN – Na verdade, ainda não. Ouvi o Yago no podcast do
“Dois dedos de teologia”. Embora ele tenha se declarado
progressivo, eu não o vejo defendendo essa posição na
internet. Nem eu a defendo abertamente, por exemplo, na
minha página no Facebook. As pessoas me procuram
para obter informações porque me viram no debate na
Escola Charles Spurgeon. O que existe de fato, no Brasil,
são muitos estudantes abraçando o dispensacionalismo
progressivo, especialmente no Ceará. Eu diria que lá tem
sido o berço desse movimento. E penso que daqui a
alguns anos, quando esse pessoal que ainda está
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estudando começar também a escrever e a palestrar, o


dispensacionalismo progressivo finalmente vai se tornar
uma posição mainstream no Brasil.
MAC – Pelo jeito, expulsaram todos os aliancistas do
Ceará. [risos]
AN – No Ceará tem muita gente boa que domina quando
o assunto é dispensacionalismo progressivo. Esse
pessoal só não é ainda famoso. Mas à medida que eles
começarem a ganhar os títulos de mestrado e doutorado,
depois escreverem e palestrarem, aí as coisas vão andar.
E há também instituições americanas
dispensacionalistas progressivas investindo no Brasil. O
Jackson Jacques, também no podcast do “Dois dedos”,
disse ser o futuro da teologia do dispensacionalismo
progressivo no Brasil. [risos] Queria ouvi-lo falar mais a
respeito, pois concordo em parte com o que ele disse.
Embora eu reconheça que o movimento não é o futuro e
nem vai ganhar todo o país. Vai ser que nem a iniciativa
do Mac, que queria, com o seu blog, difundir o
amilenismo no Brasil…
MAC – Fracassei vergonhosamente… [risos]
AN – Acredito que pelo menos a hegemonia aliancista vai
sofrer, a princípio, um pequeno baque frente a esse
aumento do movimento progressivo no Brasil.
Atualmente, o estudante da Bíblia que faz pesquisas na
internet geralmente se torna um aliancista. Há muito
material desse tipo na rede. Mas, repito, quando o
pessoal do progressivo começar a publicar, o debate vai
melhorar.

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