O que mais surpreende, são aqueles momentos sorrateiros, que chegam disfarçados de rotina, de

uma jornada de dia lotado, e que acabam se revelando sublimes instantes de contemplação da
essência de viver...A compreensão da eternidade de cada segundo que é passado e que se configura
daquela determinada forma, que é única no sentido de que nunca mais vai se repetir daquela
maneira. Gratidão por gozar do sentir, de ter olhos e ouvidos com os quais explorar o mundo e as
relações que permeiam à volta do exterior áquele que assiste. Mas mais que ver e ouvir, é a gratidão
pela sensibilização da empatia, do enxergar e perceber justamente o não dito, de transparência de
interesse pela história que o outro têm a partilhar. E as vezes, na contemplação, penso se há alguém
também ali no mesmo ambiente que eu que consiga pescar esses mágicos instantes findáveis, com
olhar frenético, vidrados colecionadores de segundos alheios, ricos amontoados de momentos
verdadeiramente humanos, de olhos sinceros, de indignação partilhada, de preocupação consciente,
de percepção do estar no mundo, do questionamento do real sentido de estármos aqui, vivendo um
segundo por vez, sem acesso físico ao passado ou presente, representações criadas de tempo. De vez
em quando encontro outros observadores, curiosos natos, atentos também a minha movimentação. E
compartilho aquele sorriso lateral de compreensão e compartilhamento, de reconhecimento de
semelhantes. Tem dias que me sinto com uns 100 anos a mais! Mas não de peso...de acúmulo desses
momentos alheios roubados de ouvidos e olhar atento, tão preciosamente interiorizados como se
fossem cargas de energia de vida, de boas vibrações. Por isso gosto de pessoas autênticas, abertas
consigo mesmas e com os outros. Verdadeiras em sua transparência de ser, ou de não ser aquilo que
era o esperado. Pessoas sem rótulos, restrições. Transbordantes do viver, reais atores do cotidiano
que se dá nessas trocas de iguais. Sem divisões, ou hierarquização de relações. Nudez de anos,
status, gênero, sexualidade. Apenas pessoas, conversando sobre coisas reais, sobre verdadeiros
sentimentos de humanidade. São por momentos assim que anseio viver, que desejo utilizar meus
segundos, minutos, horas...São dias assim que me enchem de esperança e sentimento de realização,
sentimento de que no final existirá sim a sensação de vida vivida.