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De vez em sempre, me deparo estática encarando seus olhos castanho escuros.

E me vejo obcecada
em observar cada pequeno detalhe daquelas linhas, como se fossem desenhadas, debaixo de suas
pálpebras. Longos cílios espalhados desordenados para todo o lado, aaah, como eu adoro aquele
caos. E as sombrancelhas, que podem ser vistas à kms de distância, quantas vezes pensei se um dia
eu seria capaz de retratá-las e imaginei se seria possível captar toda sua essência e intensidade. A
perfeição daquele contorno, e aquela boca a me delegar ideias, desejos, inseguranças talvez... Como
uma epifania, me pego perplexa em perceber que você talvez pudesse estar fazendo o mesmo,
explorando meus segredos, atento a cada repuxão de boca ou brilho diferente de olhar. Dizemos
tanto um pro outro nesses momentos...mas engraçado que quando com você, não sinto ameaça, nem
medo...me sinto a vontade em estar aberta, exposta... essa exposição não me trás insegurança,
porque sinto que esse também é seu modo de funcionamento, seu modo de estar e ser no
mundo...Talvez seja esse o fato que me assuste. Medo de que chegue um dia que esta intensidade se
tornará tão grande que nos engolirá, e já não será possível separarmos eu de você e você de mim...
A simples menção desse pensamento me faz estremecer. Porque já vivi isso antes, não na mesma
intensidade, ou jeito, nem circunstâncias. E não sei se você já teve alguma experiência semelhante,
se você já amou e perdeu, se você já sentiu aquela imensa cratera no peito, onde costumava ser
você, mais ou menos ali onde dizem estar o coração, agora totalmente em retalhos. Eu era outra
pessoa, talvez até muito diferente, e talvez tenha sido o tempo que eu tenha levado para
compreender tudo o que aconteceu, dentro de mim principalmente. O tempo que eu levei pra
entender que todos aqueles pequenos pedaços me compunham, como todo ser vivo que já passou na
minha jornada, desde meu nascimento, todos com quem cruzei me levaram até ali, naquele
momento. Aos poucos, comecei a costurá-los, fragilmente, um passo de cada vez. Com o passar dos
dias, foi ficando mais forte e evidente, e percebi tanta beleza e vontade de vida, arte, cores, verde,
luz do dia, fins de tarde, folhas pautadas e papel para desenho. Me descobri bela, única,
interessante, interessada, inteligente, gentil, empática, até um ponto que até quem tava de fora
conseguia enxergar, e essa autenticidade chama muita atenção, pois entendi que é raro alguém ser
de verdade, ao invés de parecer ser aquela ou outra determinada coisa. Mas junto com o conhecer-
se, houve a ruptura de limites, de classificações, de rótulos. Minha visão já estava tão mais clara e
abrangente, aberta à quase tudo, me desvinculei de muitos conceitos previamente formados, sobre
mim e sobre outros, não depois de muitas lágrimas e horas de pensamento livre, sede de profundo e
com isso a negação de partes de mim não tão belas assim...Consegui transpassar, claro que se trata
de uma luta diária e constante. Agora, muito mais atenta, aprendi a viver e a lidar comigo. E então
você me aparece. Depois que a desesperança já havia me assolado, e eu me via convencida de que o
melhor seria estar só, do que expondo terceiros à minha confusão e dúvida. Você, sorrateiro, me
aparece. Num dia qualquer de um fim de semana, assim meio chapado de um dia inteiro fumando
maconha, num canto recluso atento a qualquer movimento, você veio. E eu confesso, me segurei e
me fiz de desinteressada daquele menino misterioso, carinha de moleque. Preferi nem olhar
naqueles olhos, o vislumbre já era chamativo demais, talvez porque eu soubesse que eu não seria
capaz de resistir... Mas depois, sem perceber, era nós dois quem estava conversando, bastante
natural, de vez em quando alguém se pronunciava, ficava nisso uns minutos e era isso, a verdadeira
comunicação foi instantânea. Depois veio o “magnetismo dos corpos” num abraço ensaiado, minha
audição meio falha, ou talvez bloqueio da razão, ou vibrações de terceiros e quartos, me impediram
de senti-lo também. Talvez tivesse que ser assim, para a libertação de um grito e uma falta de
caráter encoberta...
Sei que grandes doses de você me deixa totalmente desorientada. Logo eu, tão segura de minha
posição, ali com a juba erguida. Perto de você a fera se acalma, e é quase que instantâneo, o
vislumbre de você me amansa. Talvez seja pela previsão de eternos beijos, sentimento de boca com
boca, tão macio e viciante, na espreita daqueles olhos penetrantes. E eu me perco, me fundo. De
repente sou só aquele instante, seus olhos, sua boca, sua pele. Minhas mãos entrelaçadas no seu
cabelo sentindo sua nuca nua. Minha vontade é de absorvê-lo por completo. Só depois, quando só,
entendo que essa absorção leva um pedaço de mim, me desorienta, me reconecta com aquele
sentimento de vazio esperando para me invadir depois de você. Me confunde, a dúvida sempre me
acompanha, mas sei que não adianta ponderar, medir, pesar, quando com você, a intensidade é como
uma onda que lava todas essas preocupações. E eu só consigo ficar ali, estática, a admirar seus
olhos a me fitar. Aterrorizada em pensar que você poderia estar lendo todos esses meus
pensamentos. Aterrorizada de que você consiga enxergar todas minhas dores, medos, inseguranças.
Aterrorizada por não saber o que você poderia fazer se soubesse, se eu finalmente te disesse o que
meus olhos te contam todos os dias...estou me apaixonando por você.

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