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1. Introdução

Crescer em uma sociedade heteronormativa tem severas consequências na


psique de muitas crianças LGBTQAIP+, existindo uma consciência coletiva na qual
todas as crianças merecem proteção do Estado e, principalmente, dos seus pais.
Todavia, qual perfil de criança estamos falando? É aquela construída pelos
defensores da família, uma criança pressupostamente heteroxessual e com gênero
neutro ou uma criança transviada? O Estado aproveita-se do "fato de que é
impossível para uma criança rebelar-se politicamente contra o discurso dos adultos:
ela é sempre um corpo a quem não se reconhece o direito de governar"
(PRECIADO, Paul). Podando a existência das crianças queer atráves de ataques
diretos a sua persona, por exemplo, proferindo frases "vira homem", "viado nojento",
"bicha" e "sapatão".
Assim, um homem gay que desde da sua infância é exposto a esse tipo de
violências cresce com auto-imagem fragilizada, punindo a si mesmo e os seus
semelhantes, outros homens gays, com um ódio semeado por anos de rejeição.
Embora, o homem gay moderno tenha conquistado alguns direitos civis e uma maior
liberdade para explorar sua sexualidade, a masculinidade compulsória dentro da
comunidade revela uma dicotomia entre o culto a divas pop, drag queen e aspectos
femininos com a hipervaloriação da própria masculinidade e do seu parceiro. Além
disso, o cinema criou uma imagem estereotipada e ultrafeminina de homessexuais
seja pelo comportamento, gesto, modo de falar e vestir, na psique da sociedade
resultando em um processo de masculinização desses homens gays.
Esse comportamento revela uma tendência dos homens gays rejeitam corpos
que performam mais feminilidade, evidenciando como dentro da própria comunidade
há uma hierarquização entre o gays "afeminados" e os "masculinos" fruto de um
auto-ódio que afasta o homem gay moderno da sua anima, como uma estratégia de
adaptação ao meio social que valoriza bem mais a masculinidade em relação a
feminilidade. Além disso, como dito por Gabriel Andrade, "para os homossexuais
essa pressão tem um tom muito mais dramático. Se para o heterossexual não ser
reconhecido como masculino coloca em xeque sua sexualidade, para o
homossexual não ser reconhecido como masculino revela sua sexualidade." Ou
seja, para proteger-se de frequentes violências a sua identidade gays tendem em
abdicar de sua feminilidade construindo uma aversão a imagem do feminino mesmo
que vista pelo espelho.
Ademais, o filme The boys in the band consegue elaborar em sua narrativa
questões profundas sobre uma experiência homoafetiva até então nunca debatida
em outras obras cinematográficas. Em sua mise-en-scène os atores aproveitam para
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usar o corpo como forma de expressão usando um único espaço fílmico, sendo
potente seus discursos com a gestualidade das personagens. Assim, é uma obra
que dialoga com o auto-ódio presente no interior das relações homoafetivas.
Desse modo, por que o homem gay valoriza a hipermasculinidade, semeando
ódio e aversão pela feminilidade de outros gays e de si mesmo?

2. Hipótese

"Vira homem" é um frase muito presente na mente de muitos homexessuais


que buscam adequar-se as noções de heteronormatividade, a fim de protege-se
diante de tantas feridas não cicatrizadas pela homofóbia. Desde da infânicia até a
fase adulta, a sociedade atrela o homessexual a feminilidade e, principalmente, a
chacota e depravação, sendo os homens heterossexual um referêncial aceitável
pelos homens gays seguirem como exemplo de ser homem. Dito isso, os
homessexuais são criados a odiar feminilidade e hipervalorizar masculinidade dentro
de si e de seus relacionamentos afetivios. Assim, a aversão a anima resulta em uma
rejeição a corpos afeminados, seguindo essa lógica, iniciam um processo desses
mesmo corpos odiarem a si mesmo. Logo, vira-se um ciclo vicioso de um auto-ódio
alimentado pela sociedade e retroalimentado pela comunidade gay.

3.Objetivo Geral

Analisar o filme The boys in the band fazendo uma leitura narratológica e
psicológica das personagens a fim de evidenciar o auto-ódio dentro da comunidade
gay.
Objetivo Específico

Apontar as causas e consequência da hipervalorização da masculinidade


nos relacionamentos homoafetivos.
Mostrar como a falta de cuidado para a criança queer tem como resultado
adultos com sério problemas de com a imagem e suas relações românticas.

4. Metodologia

Para iniciar a análise do filme, foram selecionadas narrativas dentro da obra


que dialoguem com o presente corpus da pesquisa. A fim de evidenciar as
dinâmicas do meio homessexual dentro da ficção e comparando com as relações
reais.
A análise da gestualidade das personagens é uma das partes mais
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importantes do projeto relacionando o comportamento, fala e gesto com a


movimentação pelo espaço, buscando uma linguagem visual do corpo que
potencializa os discursos presentes no âmago da narrativa. A encenação além de
assegurar camadas aos drama do longa, também constitui o encontro de diferentes
trajetórias dentro do apartamento de Michel, que surge como o espaço do
espetáculo, o espaço fílmico apresentado como um palco teatral no qual as
personagens perambulam por ele na criação de uma composição fática.
A psique das personagens é um ponto crucial presente neste artigo, no qual
busco apresentar a fragilidade emocional das personagens em decorrência de um
Estado opressor que não assegurou-lhes proteção na infância resultando em
homens adulto com problemas de relacionamento com sua própria identidade e de
seus parceiros sexuais, através dos textos de Pual Preciado, sobre a falta de
cuidado à criança transviada.
Ademais, faço uma análise empírica para selecionar trechos dos monólogos
que evidenciem o auto-ódio e a valorização por corpos masculinizados dentro da
comunidade gay, pela tonalidade da obra em fluir com discursos agridoces. Assim,
apresentar as feridas não cicatrizadas dessas crianças viadas já crescidas, mas que
ainda carregam marcas de uma sociedade heteronormativa .

5. Justificativa

A escolha do tema é uma frustração pessoal de não encontrar em narrativas


LGBTQIAP + dentro do cinema e audiovisual, que explorem de fato uma vivência
concreta para além de uma romantização dos relacionamentos homoafetivos. Assim,
busco neste artigo debater a dicotomia entre feminilidade e masculinidade, anima e
animus, dos homens gays e seu ódio latente pela performance feminina em seus
corpos tendo como unicamente como objeto de desejo uma masculinidade tóxica.
Exaltando elementos, símbolos e códigos hipermasculinos e, consequentemente,
criando uma auto-ódio sobre a imagem de gays “femininos” e qualquer
representação midiática dessa natureza.
O escolha do filme The boys in the band veio em razão da obra conseguir
dialogar com essas questões, como outrora comentado, pouco difundida nos meios
de comunicação explorando novas temáticas ao universo gay que não sejam
superficiais, estereotipadas e rasas com o único objetivo de lucrar, pinkmoney, em
cima de histórias vazias de conteúdo nas quais objetifica o relacionamento
homoafetivo criando um olhar de desejo para o universo feminino, para as mulheres.
Desse modo, a obra analisada é uma criação audiovisual roteirizada, produzida e
interpretadas por homens gays direcionada a outros homens gays.
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Logo, minha contribuição para a academia estar em discurtir novas formas de


representar uma vivência homessexual em divergência com a produção
mercadológica de narrativas, nas quais exploram unicamente vivências singulares e
bidimensionais tendo público alvo o olhar de desejo das mulheres e um apelo sexual
a esses corpos masculino. E enfatizando como a experiência homessexual é
multipla e complexa para além de uma superficialidade a libertinagem sexual.

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