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Feducacdo, Sociedaae & Culturas, n° 22, 2004, 9-25
REAGeRPERRRETEEEN ORT RE TRAN
EDUCACAO, TRABALHO:
Problematicas Contemporaneas
Convergentes*
REEEeRAavERIESIREN RR Sea Sc
Neste artigo retomamos a bistéria do pensamento filosdfico sobre conceitos
de Educacdo e Trabalho Sublinbando 0 seu miituo isolamento Levanta-se
a questiio se saber se a educacio se deve a escola ou ao trabalho a firm de
introduzir quest6es actuais que abordam o trabalbo e a educagao enquanto
actividades realizadas por um sujeito, produtor de sentido e de normas
Esta abordagem permite-nos seguir os trabalbos de Yues Schwartz e de ai
encontrar pontos comuns com a nossa propria pesquisa
1. Educagao e Trabalho: da ignorancia platonica ao encontro de um
momento em Hegel
Durante muito tempo, a questo da educacio e a do wabalho estiveram
completamente desligadas no pensamento filos6fico A questZio da educacio
era central, enquanto que a do trabalho era marginal. Decerto, Platio, e mais
ainda Descartes, Spinoza ou os Enciclopedistas do periodo das Luzes prestaram
uma ceita ateng4o ao trabalho, como o mostrou Yves Schwartz na sua confe-
réncia inaugural, mas o trabalho permanecia um tema marginal ¢ o pensa-
mento filosdfico nao se preocupava em ligar as questdes da educacao e do tra-
balho, Assim, em Platéo, cujo pensamento marcou profundamente a filosofia
* Texto traduzido pela Prof Ms Marie-Annik Bemier, Departamento de Letras, I1., URMI, ¢ produ
Zido no &mbito do Seminirio Educagdo 2003s, Instituto de Educagio, UEMT, Cuiabé-MT, Brasil
* Professor emérito na Universidade de Paris 8, Pesquisador-Visitante do CNPq CUFMI)erUCAGgy
sociepape & curruras
classica, educat @ desviar »0 olho da alma» em dizeccdo ao mundo das Ideias,
enquanto que o trabalho acorrenta a alma ao corpo ¢ ao mundo sensivel
Podemos decerto estender 0 termo «trabalho» para fazé-lo recobrir todo tipo de
actividade humana, incluindo a da alma que se eleva em direc¢o ao mundo
das Ideias ou a da divida metédica em Descartes, e entto poderemos falar da
educac4o como de um trabalho da alma ou do espirito Mas se reservarmos 0
termo de trabalho para uma actividade que supde uma despesa de energia
fisica € uma confrontagdo com a materialidade do mundo, a questio da educa-
cio parece estranha a do trabalho, e vice versa
Esta dissociacao entre educagio e uabalho é completamente Logica quando
a educacio é resetvada aqueles que nao so destinados a trabalhar com seus
corpos Os trabalhadores manuais sO recebem uma educa¢do por impregnacio
do meio (torna-se camponés trabalhando com seus pais camponeses), comple-
tada por uma inculcagao religiosa Ha aqueles que trabalham com seus corpos,
e aqueles que se educam Desde envio, seria bem surpreendente que a ques-
to da educacao, que aparece como fundamental em todas as grandes filosofias
classicas, se apoderasse da questo do trabalho Ainda no século XVII,
incluindo entre os filsofos franceses das Luzes, as duas questdes permanecem
esuanhas uma da outta Voltaire escreve muito cinicamente que nao é preciso
ensinat o latim aqueles cujos bragos devem puxar 0 atado e, se Rousseau
ensina a carpintaria a Emile, nfo é porque o trabalho seria educativo, € antes
de mais nada para assegurar-lhe uma autonomia, e ento permitir-lhe escapar a
sujeigdo, o que quer que acontecesse na vida de Emilio
Parece-me que € em Hegel que a questio da educagéo € a do trabalho
comegam a ligar-se, profundamente Decerto, a filosofia de Hegel imteressa-se
pelo trabalho do conceito, de fato pela actividade do Espitito, muito mais do
que pelo trabalho produtivo e mercantil, como o destacou Yves Schwartz
Existe todavia uma das figuras do Espirito, tornada célebre, que merece aqui
nossa atencao: a dialéctica do senhor e do escravo Hegel mostra ai como 0
escravo, por confrontar-se com a natureza no deoorter de seu trabalho pasa 0
senhor, forma-se, enquanto o senhor, ao conttatio, cai numa total dependéncia
em telacdo ao escravo, incluindo para sua sobrevivéncia material H4 ai uma
ideia fundamental: o trabatho forma Ha até duas ideias fundamentais jé que, &
precedente, é preciso aciescentar esta: 0 trabalho € um processo de dominio:tat
eDUCACaG
socrspape & cviruras
dominio da natureza, de si-proprio e, pelo menos a prazo, dominagio daquele
que no tabalha por aquele que tabalha
Marx se engajaré nesta pista, nessas duas pistas O Marx dos Manuscritos de
1844 sustentard que o trabalho é a esséncia do homem Quando o trabalhador
esti privado do dominio do processo e do resultado do seu trabalho, ele se
torna estrangeiro a si proprio, entie
instituigao de formagdo € periodo de estigio, € 4 ideia que 0 sucesso escolar €
essencialmente para ter um bom emprego mais tarde» Entretanto, a ideia que
9 trabalho forma esté esclarecida pela ideia de que a educacio é ela mesma
uma actividade O momento sem divida chegou de formula: em termos novosgoUCacay
socrzpape & curruras
a questo das relagdes entre educacio e trabalho Numa época em que se
afirma a ambigéo de uma -Educacdo Para Todos, numa €poca em que as novas
tecnologias da comunicacao multiplicam a informagao disponivel mas aumen-
tam também o risco de uma confusdo entre saber e informacio, poderia ser
muito importante repensar assim, sobre bases novas, a questio das relacdes
entre trabalho € educacio Eu espero que este semindrio tera contribuido para
isso.
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