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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

CONTRATOS PÚBLICOS

PARTE I » CONTRATO PÚBLICO E CONTRATO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1. Contrato como categoria geral do direito:


O contrato é a figura jurídica que, por excelência, procede à constituição, modificação e extinção de relações jurídicas. E
como instrumento de produção de efeitos jurídicos, o contrato estabelece uma estreita ligação com o direito privado. De
facto, historicamente o direito privado apresenta-se como “matriz de origem” do contrato. No entanto, é hoje
incontestável que a figura contratual ultrapassou as fronteiras do direito privado, conhecendo uma aplicação
generalizada em todos os setores do ordenamento jurídico.
Enquanto categoria geral do direito, o contrato também pertence ao direito público. Aliás, nos tempos mais recentes, o
contrato tem vindo a ocupar o centro do universo jurídico-público.
Ora, me termos gerais, o conceito de “contrato” convoca dois elementos essenciais, que são transversais a qualquer
área normativa:
a) Acordo ou consenso entre as vontades de duas ou mais pessoas;
b) Intuito de desencadear efeitos jurídicos que vinculam as partes.

2. Contrato na Administração Pública:


A introdução da figura do contrato no Direito Administrativo deu-se paulatinamente, passando por diversas fases:
1. Finais do séc. XIX: o contrato surgia como instrumento de atuação do “Estado comprador” – era utilizado
sobretudo para a realização de compras de bens e serviços imprescindíveis ao funcionamento dos organismos públicos.
Neste período assistiu-se à difusão da ideia de que o “Estado não pode contratar”, mas este entendimento das coisas
dizia respeito à esfera de atuação em que o Estado atuava no exercício do ius imperii.
2. Passagem do séc. XIX para o séc. XX: além das “compras”, a Administração Pública passou a servir-se do
contrato também como processo para enquadrar uma relação especial de colaboração com entidades particulares às
quais confiava a construção e gestão de uma infraestrutura ou serviço públicos.
3. Finais do séc. XX: o contrato surge como motor do processo de privatização da Administração Pública,
convertendo-se numa ferramenta decisiva para enquadrar a transferência para mãos privadas da gestão de serviços
públicos, bem como do encargo de financiamento de infraestruturas públicas. É neste contexto que surgem figuras como
as “parcerias público-privadas”. Em muitos sistemas jurídicos, o contrato vai entrar em domínios relacionados com
“funções inerentemente públicas” e realizar um outsourcing de funções soberanas. Estamos no período de afirmação da
tendência de downsizing do Estado Administrativo. Simultaneamente, começa a vingar um conceito de consenso nas
relações administrativas internas. Como resultado de todo este processo, o contrato veio impor-se como mecanismo
jurídico alternativo ao ato administrativo.
4. Passagem do séc. XX para o séc. XXI: a “cultura do contrato” está hoje definitivamente estabelecida no nosso
espaço cultural; o Estado transformou-se, então, num “Estado Contratante”.

3. Contratos da Administração Pública e Direito Administrativo:


A circunstância de a Administração Pública utilizar o contrato na sua atuação não tem de corresponder a uma espécie de
apropriação da figura pelo Direito Administrativo. Não obstante essa apropriação não ser necessária, a verdade é que
entre nós reconhece-se a figura do “contrato de Direito Administrativo”.
! A consagração do contrato como categoria específica do Direito Administrativo (ao lado do regulamento e do ato
administrativo) pressupõe a regulação de certos contratos por normas jurídico-administrativas, em virtude de tais
contratos serem subscritos por uma entidade da Administração Pública. Por outras palavras, o contrato de direito
administrativo terá ser necessariamente regulado, de forma abrangente, por um regime jurídico de Direito
Administrativo, sendo que essa regulação se justifica com base na circunstância de uma das partes do contrato ser uma
entidade administrativa. A nossa lei refere-se a esta figura como “contrato administrativo” – art. 1º/1 CCP.
Tendo em conta as indicações legais, o contrato administrativo é, tendencialmente, uma categoria de contrato público.
E daqui se depreende facilmente que as duas figuras não se confundem:

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− CONTRATO ADMINISTRATIVO: contrato submetido a um regime de direito administrativo quanto à sua


formação e execução. Ex: contrato de empreitada de obras públicas, contrato de concessão de obras públicas e de
serviços públicos, contrato de aquisição de serviços, etc.
− CONTRATO PÚBLICO: contrato celebrado por uma entidade adjudicante. A classificação de um contrato como
contrato público assenta numa nota orgânica ou subjetiva – a qualidade de entidade adjudicante.
Ou seja, pode ser um contrato:
a) Celebrado por uma das entidades adjudicantes elencadas no artigo 2.º, n.º 1 (entidades integradas, em
geral, na Administração Pública “clássica”);
b) Celebrado por uma das entidades adjudicantes a que se refere o artigo 2.º, n.º 2 (os “organismos de
direito público”);
c) Ou celebrado por uma das entidades adjudicantes abrangidas pelo artigo 7.º (“entidades dos sectores
especiais”; entidades que exercem actividades nos sectores da água, da energia, dos transportes e dos serviços
postais).

Decorre do exposto que só ficarão submetidos a um regime substantivo de Direito Administrativo aqueles contratos que
sejam configurados, nos termos da lei, como contratos administrativos. Com efeito, o que se afigura decisivo para
assinalar a autonomia do contrato administrativo é o fator de a sua regulação operar através de um regime substantivo
específico.
No entanto, o Direito Administrativo interessa-se também por regular apenas a formação de certos contratos da
Administração Pública (que não, portanto, contratos administrativos). Trata-se aqui de disciplinar, não tanto o contrato
em si mesmo, num plano substantivo, mas antes de disciplinar a atuação que a Administração desenvolve no iter de
formação e em vista da conclusão do contrato. Procura-se aqui:
• Assegurar a realização de uma contratação eficiente para o setor público;
• Proteger e promover a concorrência entre os operadores económicos.

Note-se, que a autonomia do contrato administrativo não está dependente do número de espécies contratuais
abrangidas, nem pressupõe a distinção entre o grupo que eles formam e um eventual grupo de contratos da AP
submetidos a um regime de direito privado (art. 200ºCPA – espécies de contratos).
Ou seja, segundo o CPA, temos:
• Contratos administrativos: contratos submetidos a um regime de direito administrativo quanto à sua formação e
execução. Ex: contrato de empreitada de obras públicas, contrato de concessão de obras públicas, etc.
• Contratos de direito privado: art. 202º/2 CPA.

Por fim, numa terceira dimensão, o Direito Administrativo ocupa-se ainda dos contratos da Administração Pública no
campo das suas incidências contenciosas – aqui estarão em causa normas de direito processual administrativo.

Em síntese, a regulação jurídico-administrativa de contratos celebrados pela Administração Pública pode atingir a (1)
formação, (2) a execução e (3) o contencioso.

4. Conceito de contrato público (art. 1º/2 CCP), compreende 2elementos essenciais:


4.1 “Contrato”
O contrato público é, antes de mais, um contrato: um acordo formado por duas ou mais declarações de vontade que se
ajustam para a produção de certos efeitos jurídicos.

4.2 “Público”
Desde logo, refira-se que assumimos uma equivalência prática entre contrato público e contrato da Administração
Pública, sendo que, como exposto, esta figura não se confunde com o “contrato administrativo”.
Posto isto, a nota caraterizadora dos contratos públicos (ou contratos da Administração Pública) é a circunstância de
uma das partes ser classificada como entidade adjudicante, pertencendo ao universo da Administração Pública.
Portanto, o caráter público de um contrato resultará de se tratar de um contrato celebrado por uma entidade que integra
o universo orgânico-funcional da Administração Pública:
• Pessoas coletivas de direito público:
− Estado;

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− Regiões Autónomas;
− Autarquias Locais;
− Institutos Públicos (“serviços personalizados” do Estado e entidades reguladoras independentes);
− Associações Públicas.
• Entidades privadas sob o controlo de pessoas coletivas públicas:
− Empresas públicas;
− Empresas municipais;
− Associações com participação maioritária pública.
• Entidades privadas que exercem funções materialmente administrativas (em virtude de uma conceção ou
delegação pública).

Logo, como resulta do art. 1º/2 CCP, há um nexo entre: um elemento objetivo (contrato) e um elemento subjetivo
(entidade adjudicante).

Em síntese:
Em geral, os contratos da AP são CP’s e os CP’s são os contratos da AP. Mas há exceções a estas duas proposições, uma
vez que:
• Há contratos da AP (em sentido orgânico-funcional) que não são CP’s – celebrados por entidades dedicadas ao
exercício de funções administrativas, mas que não são entidades adjudicantes (ex: concessionários de serviços
públicos);
• Há CP’s que não envolvem a presença da AP – contratos celebrados por entidades adjudicantes que não
integram a AP (ex: associações de direito privado que preenchem os elementos do conceito de organismo de direito público).

4.3 Alcance jurídico do conceito de contrato público


A figura do contrato público, porque dependente apenas da circunstância de uma das partes ser uma entidade
integrada na Administração Pública, não está associada, em si mesma, a nenhum regime jurídico concreto, nem tão-
pouco a um regime de direito público. De facto, nem o regime jurídico aplicável aos contratos públicos é uniforme, nem
todos eles se subordinam ao direito público (é perfeitamente concebível um contrato público não submetido à incidência
de qualquer norma jurídico-pública). Esta categoria cumpre a função exclusiva de delimitação segundo uma perspetiva
subjetiva ou orgânica (limita-se a agrupar os contratos celebrados por entidades adjudicantes). Por isso mesmo, esta é
uma figura com modesto interesse normativo: o facto de um contrato se qualificar como público não permite extrair
nenhuma ilação sobre os traços do regime jurídico a que o mesmo se subordina, nem quanto ao regime de formação ou
mesmo o regime de execução. O único interesse normativo que desta figura se pode extrair é que a todos os contratos
públicos se aplicam os princípios gerais da atividade administrativa, porquanto eles se aplicam a toda a atuação da
Administração Pública.

4.4. Conceito de Contrato Público no DUE


O conceito de CP pressuposto no art. 1º/2 CCP afasta-se do conceito europeu de CP, desde logo pela sua amplitude.
Contudo, o propósito fundamental do CCP era transpor as diretivas europeias sobre CP’s.
Deste modo, no DUE, CP é o “contrato, a título oneroso, celebrado por escrito entre um ou mais operadores
económicos e uma ou mais autoridades adjudicantes (ex: Estado, autoridades locais e regionais, organismos direito público,
etc.), que tenha por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos e a prestação de serviços” (art. 2º/1
Diretiva 2014/24/UE).
Este é um conceito funcional, delimitado por preocupações substanciais, não sendo concebido para corresponder ao
conceito formal de contrato dos ordenamentos dos EM’s. Assim, pode haver CP segundo o direito nacional que o não
sejam para efeitos das diretivas (ex: contratos de doação produtos; contratos de alienação bens móveis pela AP) OU pode
haver contratos para efeitos de aplicação das diretivas que podem não corresponder a contratos em sentido formal
segundo o direito nacional dos EM.
Posto isto, o conceito de CP das diretivas compreende elementos de identificação de:
• Caráter Orgânico: indicam as partes ou sujeitos do contrato; por um lado, autoridades adjudicantes; por outro
lado, operadores económicos.
• Caráter Substancial: referenciam o objeto do contrato (execução de obras, fornecimento de produtos),
qualificando-o, além disso, como contrato de aquisição, que envolve uma seleção do contratante e que não se
reconduz a uma concessão obras públicas ou serviços.

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Trata-se de um conceito pensado sobretudo para os contratos de compras públicas e que, portanto, não abrange todos
os outros contratos da AP (ex: não abrange os contratos de concessão, aos quais refere a Diretiva 2014/23/UE).
Concluindo, os objetivos das diretivas da UE sobre contratação pública são o da garantia das liberdades fundamentais de
circulação e defesa da máxima abertura à concorrência em observância dos princípios da igualdade, da transparência e da
não-discriminação (objetivos do DUE).

5. Regime jurídico dos contratos públicos


Uma vez que não é referenciável “um” regime jurídico do contrato público, em regra o regime aplicável variará de acordo
com o tipo de contrato em causa (ex.: contrato de concessão de serviços públicos, contrato de empreitada de obras
públicas, etc.). Mas nem isto é linear, pois inúmeros contratos públicos não se reconduzem a nenhum dos tipos
contratuais regulados.

5.1 Âmbito e sentido da regulamentação dos contratos públicos


A regulamentação de direito público relativa a contratos públicos abrange três setores:
1. Regulamentação do procedimento de formação do contrato: a regulamentação aqui em causa abrange o
procedimento pré-contratual – art. 201º CPA - (= a sucessão ordenada de atos e formalidades relativos à formação e
manifestação da vontade da entidade pública que terminará com a outorga/celebração do contrato).
No setor das “compras públicas”, por força do DUE, a lei prevê uma regulamentação específica do procedimento de
formação, uma vez que razões de interesse público, de caráter financeiro e de igualdade de oportunidades dos
operadores económicos determinam essa especificidade. Esta regulamentação específica traduz-se na previsão de
procedimentos de seleção concorrencial que as entidades da Administração ficam obrigadas a seguir. Nos casos em que o
contrato público não suscite preocupações concorrenciais, o procedimento de formação segue um outro modelo, e, salvo
legislação especial, a sua formação rege-se pela disciplina geral do procedimento administrativo estatuído pelo CPA, com
as necessárias adaptações (art. 201º/3 CPA).
2. Regulamentação (substantiva) da relação contratual: aqui está em causa a regulamentação substantiva da
relação contratual – relação entre as partes do contrato já celebrado e a produzir efeitos. Portanto, estarão em causa
normas que se ocupam dos aspetos substantivos e de fundo da relação contratual.
Por conseguinte, certos contratos da AP são alvo de uma regulamentação legal especificamente ditada pelo facto
de serem contratos da AP – Contratos Administrativos, por pertencerem ao Direito Administrativo; por ser esta a
disciplina a fornecer a regulamentação da relação jurídica contratual (entre as partes).
De notar, que os contratos da AP dividem-se em: “contratos administrativos” e “contratos submetidos a um
regime de direito privado” – art. 200º/1 + 202º/2 CPA.
Deste modo, nem todos os CP’s se encontram submetidos a uma regulamentação específica de direito público, ou
seja, nem todos os contratos públicos (de entidades adjudicantes) são contratos administrativos.
Os Contratos Administrativos são atualmente os contratos que, estando sujeitos à parte II do CCP, “configurem
relações jurídicas contratuais administrativas”, tendo de preencher os elementos descritos no art. 280º/1. »» aplicação
de um regime em bloco.
Desde a revisão do CCP de 2017, além dos contratos administrativos (desde que sujeitos à parte II), ficam
abrangidos, neste caso, por uma parte do regime substantivo constante da Parte III do CCP todos os outros contratos
públicos sujeitos à Parte II – contratos que não configurem relações jurídicas administrativas. Nos termos do art.
280º/3, este conjunto de contratos ficam sujeitos a um regime substantivo misto, que conjuga o direito privado e o
direito administrativo (contratos submetidos a um regime de direito privado) » ampliação do âmbito de incidência de uma parte
da Parte III do CCP, que assim passa a aplicar-se a contratos não administrativos. E, por conseguinte, há uma atenuação
do âmbito de incidência entre a Parte II e a Parte III, restringindo a aplicação da Parte III.
Por sua vez, os CP’s (de entidades adjudicantes) não abrangidos pela incidência da Parte III do CCP ficam sujeitos
a um regime de direito privado » considerados “contratos submetidos a um regime de direito privado” » art. 200º/1,2 +
202º/2 CPA.
Por força da revisão de 2017 do CCP, passamos a ter três possibilidades de regime substantivo dos CP’s,
celebrados por entidades adjudicantes:
• Regime em bloco da Parte III do CCP, para os contratos administrativos sujeitos à Parte II do CCP;
• Uma parte da Parte III, em relação aos contratos não administrativos sujeitos à Parte II;
• Regime do direito privado para todos os outros CP’s.

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3. Regulamentação do contencioso da formação e da execução do contrato: o regime jurídico-público aqui em


causa abrange os processos próprios e as regras especiais de resolução de litígios que envolvam (certos) contratos
públicos.

Concluindo, …
Essas são as áreas eventuais do âmbito de um regime jurídico-público do contrato público. Pode haver contratos públicos
não abrangidos por qualquer regulação pública, assim como contratos públicos abrangidos apenas por uma ou duas
daquelas áreas de regulamentação pública ou contratos abrangidos por todas elas. E, nos termos que temos vindo a
referir, nem todos os contratos públicos serão contratos administrativos, já que estes últimos supõem necessariamente
uma regulamentação jurídico-administrativa substantiva (setor da execução do contrato).

5.2 Natureza do direito dos Contratos Públicos


O direito dos CP’s é um conjunto de princípios e regras jurídicas que tem o propósito de regular, em termos específicos, a
formação, a execução ou o contencioso de certos contratos da AP ou de entidades privadas, por força do art. 4º/1/e ETAF
+ 100º/2 CPTA.
Sendo, que o direito dos CP’s é direito administrativo. Contudo, isto não exclui que, marginalmente, os CP’s não sejam
regulados pelo direito (especifico) dos CP’s, ficando, portanto, submetidos a uma regulação de direito (geral) privado.

EM SÍNTESE:

À formação dos contratos (contratos públicos) celebrados pelas entidades adjudicantes aplica-se o regime da Parte II
do CCP (artigos 16.º a 277.º), “independentemente da… designação e natureza” desses contratos (artigo 1.º/2 do CCP).

Significa isto que, para o CCP:

1. Há contratos públicos que podem assumir a natureza de contratos administrativos, aplicando-se a estes
contratos:
a) O regime de formação dos contratos (isto é, o regime que disciplina o procedimento pré-contratual)
estabelecido na Parte II do CCP (artigos 16.º a 277.º);
b) Bem como a globalidade do regime da Parte III do CCP, que estabelece o regime substantivo dos
contratos públicos que revistam a natureza de contrato administrativo e cuja formação esteja sujeita à
disciplina da Parte II do CCP (art. 1.º/1,5 e arts 278.º e segs.);
c) Enquadram-se neste âmbito os contratos celebrados pelas entidades adjudicantes enumeradas no artigo
2.º, n.º 1, do
d) CCP: o contrato de empreitada de obras públicas; o contrato de aquisição de serviços/prestação de
serviços; o contrato de aquisição ou de locação de bens móveis; o contrato de concessão de obras
públicas; e o contrato de concessão de serviços públicos.

2. E há contratos públicos que não revestem a natureza de contrato administrativo, aplicando-se a estes
contratos:
a) O regime de formação dos contratos (isto é, o regime que disciplina o procedimento pré-contratual)
estabelecido na Parte II do CCP (artigos 16.º a 277.º);
b) E apenas alguns aspectos do regime substantivo da Parte III do CCP, “em concreto as disposições relativas
aos regimes de invalidade, limites à modificação objetiva, cessão da posição contratual e subcontratação
são aplicáveis, com as devidas adaptações, aos contratos sujeitos à parte II, ainda que estes não
configurem relações jurídicas contratuais administrativas” (artigo 280.º, n.º 3);
Enquadram-se neste âmbito os contratos públicos celebrados por determinadas entidades, mesmo que
de natureza privada, que, em virtude de certos requisitos, sejam qualificadas como “organismos de
direito público” e, por isso, subsumíveis ao artigo 2.º, n.º 2, como entidades adjudicantes.

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Nota: Antes de 2017, o CCP era assim:


• Parte II – disciplina do procedimento pré-contratual (formação do contrato); aplicável a contratos públicos. Sendo que nem todos os
contratos públicos estão sujeitos a regulamentação de direito publico ou, mesmo que o estejam, podem não estar sujeitos a
regulamentação relativa à formação do contrato.
• Parte III – disciplina da própria relação contratual (execução do contrato); aplicável a contratos administrativos – só estes estão sujeitos a
uma disciplina substantiva do direito público. Estes contratos, embora sujeitos necessariamente à parte III, podem não se submeter à
disciplina da Parte II.

6. Fontes de regulamentação dos CP’s


A atual regulamentação tem origem essencialmente no DUE, bem como em várias fontes do direito português. Alem
destas duas fontes principais, existe uma profusão de normas convencionais e de “soft law” que operam no plano
internacional.

6.3 Direito Português


O ordenamento jurídico português conta, desde o ano de 2008, com um Código dos Contratos Públicos. Todavia, acima
do CCP, importa referir, num patamar supralegislativo, os princípios da contratação pública decorrentes de princípios de
natureza constitucional: princípios da transparência, concorrência e da igualdade.
Além da legislação assente no CCP, há legislação avulsa relativa aos CP’s, que procedem à expressa exclusão do âmbito
de aplicação do CCP de determinadas categorias contratuais, que ficam abrangidas por outras regras (ex: art. 4º, 5º, 5º-
A, 6º-A). Sendo que também há casos de contratos que estão regulamentados fora do CCP (ex: contratos no âmbito das
relações de emprego e contratos no domínio da defesa e da segurança).

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PARTE II » REGIME DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA NO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS

A Parte II do CCP, relativa à fase da formação do contrato, tem como epígrafe a expressão “contratação pública”. É esta a
matéria que nos ocupará de seguida.

8. Procedimento de formação de Contratos Públicos:


Constitui a série ou sucessão ordenada de atos que concorrem para a formação, a conclusão e a produção de uma
plena eficácia jurídica de um contrato público.
Trata-se, em rigor, do “procedimento do contrato” ou do “procedimento contratual” (e não apenas da formação do
contrato). Em si mesmo, o contrato, o negócio que consubstancia o acordo entre as partes, apresenta-se como o ato
principal, central e decisivo desse mesmo procedimento. Em volta do contrato (antes e depois da sua celebração)
agregam-se e sucedem-se atos preparatórios e complementares, marcados pelo seu caráter acessório, sendo que todos
contribuem para que o contrato de firme e produza os seus efeitos jurídicos programados pelas partes.

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PROCEDIMENTAL:


O procedimento de formação dos CP’s é um procedimento legalmente regulado. O princípio incide de forma
particularmente intensa na disciplina dos procedimentos de seleção concorrencial, pelo facto de na fase de adjudicação
que os mesmos integram, participarem vários interessados e competição ou em disputa pelo acesso ao contrato.
Esta circunstância determina que o legislador defina os momentos que constituem a tramitação do procedimento para
garantir a imparcialidade administrativa e igualdade de tratamento, limitando o informalismo e amplitude do principio da
adequação formal (art. 56ºCPTA).
Contudo, isto não elimina todo e qualquer espaço de discricionariedade administrativa para a adequação procedimental.
O que de verifica é que legislador estabelece as linhas mestras, dentro das quais permite aos órgãos administrativos pôr
em prática a adequação procedimental.

Concluindo, a alusão a procedimentos de formação de contratos públicos remete para uma:


• Dimensão empírica (do “ser”): traduzida, p.e., na realização de efetivas negociações ou na adoção de certas
diligências.
• Dimensão normativa (do “dever ser”): que impõe a observância de princípios e de regras legais e regulamentares
que disciplinam a atução das entidades adjudicantes ao longo do procedimento de formação do contrato, fixando
uma ordem sequencial dos atos e diligencias a empreender.

8, b). Conceito e fases do procedimento de formação de Contratos Públicos:


A lei institui princípios e regras que disciplinam a atuação dos contraentes públicos, fixando, designadamente, uma
ordem sequencial de atos e diligências que deve ser observada.
Como sucede com outros atos públicos (mormente, atos administrativos), os procedimentos de formação de formação de
contratos públicos desenvolvem-se em três grandes fases:
1. Fase preparatória: fase que inclui todos os atos jurídicos prévios ordenados à conclusão do contrato público
(fase longa e complexa). Esta fase desagrega-se, em regra, em duas sub-fases:
a. Fase de iniciativa do procedimento: pode ser pública (se a iniciativa é da Administração) ou particular (se
“provocada” por um particular);
b. Fase de instrução: aqui incluem-se:
i. Fase das negociações;
ii. Fase de adjudicação (aplicável a certos contratos).
2. Fase principal ou conclusiva: fase em que o contrato público se conclui, tornando-se perfeito. Em certos casos,
a conclusão do contrato reclama a sua outorga ou celebração através de uma forma determinada.
3. Fase integrativa de eficácia ou complementar: após a conclusão, o contrato nem sempre fica em condições de
produzir, imediatamente, os seus efeitos e de ser objeto de execução, sendo exigível a prática de atos complementares
(ex.: vistos, aprovações, autorizações, etc.).

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9. Tipos de procedimentos de formação de Contratos Públicos:


Não existe um tipo único de procedimento aplicável à formação de todos os contratos públicos. As tipologias dos
procedimentos de formação de contratos públicos podem definir-se de acordo com vários critérios.

9.1 Critério da previsão de uma fase de seleção concorrencial


a) Procedimentos com fase de seleção concorrencial ou competitiva
Em muitos casos, a formação do contrato público integra uma fase de seleção ou de escolha do operador económico ou
entidade que vai contratar com a Administração Pública (seletividade). Isto verifica-se sempre que estejam em causa a
formação de um contrato cujo objeto abranja prestações que estejam, ou sejam suscetíveis de estar, submetidas à
concorrência de mercado (arts. 16º/1 CCP e 201º/1 CPA). Noutros termos, é o interesse concorrencial (= circunstância de
a celebração do contrato poder interessar a vários operadores económicos) do contrato que exige que na respetiva
formação se siga um procedimento de seleção concorrencial.
Em geral, a exigência de seleção concorrencial decorre do princípio da igualdade, que determina para a Administração
Pública uma regra de proibição da discriminação entre operadores económicos e a obriga a seguir um procedimento que
garanta a igualdade de chances entre eles. Uma vez que a outorga de cada contrato é um facto único, a chance de acesso
a esse contrato deve ser oferecia a todos os interessados, de modo que todos eles disponham da oportunidade de auferir
a vantagem económica que a adjudicação representa.
Quando o procedimento de formação do contrato integra esta categoria de procedimentos, ele compreenderá uma fase
de adjudicação. Consequentemente, o procedimento passará a assumir-se como procedimento complexo, integrando um
sub-procedimento de adjudicação (ex: casos em que aplica a Parte II do CCP) – aqui definem-se as modalidades do
procedimento de adjudicação dos contratos de compras públicas (empreitada de obras públicas) e de concessão (de
serviços públicos), bem como contratos com interesse concorrencial que não integrem a contratação excluída (art.5º,5º-
A) ou não sejam regulados por lei especial..
Por conseguinte, as modalidades do procedimento de adjudicação estão previstas no art. 16º/1 CCP são as seguintes:
• Ajuste direto;
• Consulta prévia;
• Concurso público;
• Concurso limitado por prévia qualificação;
• Procedimento de negociação;
• Diálogo concorrencial;
• Parceria para a inovação.
Refira-se que o nº 2 do art. 16 CCP elenca, exemplificativamente, um conjunto de contratos que se consideram
submetidos à concorrência do mercado (portanto, aos quais se aplica este tipo de procedimento).
Note-se, que o CCP não esgota a regulamentação dos procedimentos de seleção concorrencial, sendo que estes
procedimentos são também regulados em legislação especial. Assim sucede, p.e., com: o procedimento de formação de contratos de
concessão de apoio financeiro e de concessão de incentivos às empresas no âmbito do programa Portugal 2020; e do procedimento de formação de
contratos de apoio financeiro no setor da cultura.
Com a revisão de 2017, o CCP passou a regular os procedimentos de alienação de móveis (art. 266º-A a 266º-C).
precisamente em função da presença de um interesse concorrencial, a alienação é efetuada, em regra, no âmbito de um
procedimento de seleção concorrencial, a hasta pública (sendo que também se pode efetuar por negociação direta nos
casos do art. 266º-C/3).

b) Procedimentos sem fase de seleção concorrencial ou competitiva


Os contratos da Administração Pública nem sempre são formados no âmbito de procedimentos que compreendem uma
fase de adjudicação e de seleção concorrencial. De facto, os procedimentos com fase de seleção concorrencial (que
culmina no ato de adjudicação) não fazem sentido quando a Administração não tem de efetuar uma escolha do seu
contraente. Os procedimentos que se aplicam nestas hipóteses podem ser:
• Procedimentos de formação de atos administrativos: nos termos do CCP, os “contratos com objeto passível de
ato administrativo (1) e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos (2) ficam sujeitos às normas
constantes do CCP, com as devidas adaptações (art. 5º-B/2, em relação aos contratos dessa natureza que se
encaixem nos art. 5º e 5º-A (contratação excluída), e, em geral, o art. 201º/3 CPA).
Como é evidente, a estes pressupostos acresce aquele que referimos acima, a contrario: (3) falta de interesse
concorrencial do contrato.
• Procedimentos regulados em lei especial: legislação especial, externa ao CCP, pode regular procedimentos de
formação sem fase de seleção concorrencial diferentes do procedimento de formação de atos administrativos
regulado no CPA. Ex: procedimento de formação de contratos e apoios e incentivos a grandes projetos de investimento, nos termos do DL 191º/2014.

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2.2 Critério da iniciativa procedimental


A celebração de contratos públicos pode representar o momento conclusivo de um:
a. Procedimento de iniciativa pública: o procedimento é desencadeado pela Administração Pública, com vista à
celebração de um contrato destinado a satisfazer uma necessidade pública (ex.: compras públicas);
b. Procedimento de iniciativa particular: a celebração do contrato responde imediatamente a um interesse da
entidade particular que desencadeia o procedimento (ex.: pedido de utilização privativa de um bem público).
Note-se, que pode haver desvios à associação entre procedimentos de iniciativa pública e procura pública; e
procedimentos de iniciativa particular e satisfação de interesses privados. Pode até haver, por força da lei, um
procedimento de iniciativa particular que inclua depois uma fase de procura pública, por causa de razões de igualdade de
oportunidades no acesso a recursos escassos.

2.3 Critério da existência de regulamentação da tramitação


Embora seja pouco frequente, há contratos públicos cuja formação se encontra fora do âmbito de incidência de regras
procedimentais. Pode, aliás, tratar-se de contratos que pressupõem uma “escolha” (livre) do contratante ou beneficiário.
Noutros casos, é a entidade pública a própria prestadora do serviço que o outro contratante procura. Fala-se aqui em
procedimento de adjudicação não regulado. Ex: contratos relativos a bens imóveis celebrados por associações públicas.
Uma outra situação que também pode reconduzir-se a este domínio é a do “regime simplificado de ajuste direto” (art.
128º+129º CCP): nos contratos de aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de serviços cujo preço contratual
não seja superior a 5.000€, a aquisição pode ser feita diretamente sobre a fatura emitida pela entidade convidada
(vendedora ou locadora), sem qualquer ato prévio ou formalidade posterior.
Contudo, apesar do procedimento não ser regulado por lei de direito publico, podem existir normas regulamentares
aplicáveis (ex: eventual regulamento municipal).
Neste ponto importa apontar o disposto no art. 201º/3 CPA: “na ausência de lei própria, aplica-se à formação dos
contratos administrativos o regime geral do procedimento administrativo estatuído no presente Código”.

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CAPÍTULO I » ÂMBITO DE INCIDÊNCIA DA PARTE II DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS

1. Âmbito SUBJETIVO de incidência da Parte II do CCP: as entidades adjudicantes


Se o conceito de “contrato público” assenta fundamentalmente na circunstância de um dos contraentes ser uma entidade
adjudicante (art. 1º/2 CCP), então, naturalmente, o Código de Contratos Públicos aplicar-se-á a entidades adjudicantes.
Deste modo, em termos simplistas, as entidades adjudicantes são aquelas às quais incumbe tomar a decisão de
adjudicação ou de não adjudicação (arts. 73º e 79º CCP).

10.1 Entidades adjudicantes no art. 2º/1 CCP


1. Estado: todos os órgãos e serviços do Estado (AR; PR, ministérios, etc.), ou seja, a atividade contratual do
Estado é desempenhada pelos serviços da sua administração direta – são estes os serviços centrais e periféricos que, pela
natureza das suas competências e funções, devam estar sujeitos ao poder de direção do respetivo membro do Governo.
Nos termos da Lei nº 4/2004, de 15 de janeiro, podemos então incluir aqui:
1. Serviços centrais: serviços que exercem uma competência extensiva a todo o território nacional,
independentemente de possuírem, ou não, unidades orgânicas geograficamente desconcentradas (direções-
gerais e inspeções gerais);
2. Serviços periféricos: serviços que dispõem de competência limitada a uma área territorial restrita (direções
regionais, inspeções regionais).
Além destes serviços, naturalmente também contrata em nome do Estado o próprio Governo, através dos seus membros
(ministros e secretários de Estado).
NOTA: todas estas entidades contratam em nome do Estado; elas mesmas não são entidades adjudicantes, por carecerem
de personalidade jurídica (art. 2º/1 CCP).
2. Regiões Autónomas: as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira são entidades adjudicantes porquanto
prosseguem, com autonomia, os interesses das respetivas populações.
3. Autarquias Locais: integram-se aqui os municípios e as freguesias (L.75º/2013, de 12Setembro).
4. Institutos Públicos: serviços e fundos do Estado e das Regiões Autónomas dotados de personalidade jurídica
(para estes efeitos, importas as universidades, os institutos politécnicos, as entidades administrativas independentes e as
entidades reguladoras de atividades económicas) – L. 3/2004, que aprova a lei-quadro dos IP, republicada pelo DL 5/2012.
5. Entidades administrativas independentes: são órgãos/organismos sem personalidade jurídica, como, pe., a
Comissão Nacional de Proteção de Dados.
6. Banco de Portugal: mas a Parte II do CCP só é aplicável aos contratos que abranjam prestações típicas da
empreitada de obras públicas, concessão de serviços públicos, locação e aquisição de bens móveis ou aquisição de
serviços (art. 5º/8), ou seja, a sujeição do Banco ao CCP é em relação aos contratos abrangidos pelas diretivas.
Observe-se, contudo, a integração do BP no Sistema de Bancos Centrais Europeus que lhe confere uma estrutura
bipolar: instituição nacional + unidade funcional do SBCE. Deste modo, os contratos celebrados pelo BP podem ter de
seguir regras instituídas pelo Banco Central Europeu (ex: contratos para a produção de notas de euro).
7. Fundações públicas: no conceito de fundação pública integram-se as fundações públicas de direito público,
bem como as fundações públicas de direito privado (L.24/2012).
As fundações públicas de direito público, nos termos da Lei n.º 24/2012, de 9 de Julho, que aprova a lei-quadro
das fundações, ou seja, as fundações criadas exclusivamente por pessoas colectivas públicas (caso dos legalmente
designados “fundos personalizados” criados exclusivamente por pessoas colectivas públicas: trata-se de institutos públicos com
finalidades de natureza social, cultural, artística…, dotados de um património cujos rendimentos constituam uma parte considerável
das respectivas receitas. Estas entidades são reconduzíveis ao conceito de fundação pública);
E também as legalmente designadas fundações públicas de direito (regime) privado, de que podem constituir
exemplo as universidades que tenham assumido a forma de “fundação pública com regime de direito privado”. Não
obstante a designação legal de fundações públicas de direito privado, pelo regime a que se encontram sujeitas podem
reconduzir-se a pessoas colectivas públicas.
6. Associações públicas (associações de direito público):
• As associações públicas de entidades privadas (as associações públicas profissionais - as ordens
profissionais e as câmara profissionais -, nos termos da Lei n.º 2/2013, lei-quadro das associações públicas
profissionais. Contudo, o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 12-9-2013, Proc. C-
526/11, sobre a Ordem Profissional dos Médicos da Alemanha);
• As associações públicas de entidades públicas (p. ex., as entidades intermunicipais – áreas metropolitanas
e as comunidades intermunicipais - Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro);
• E as associações de freguesia de direito público;

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A problemática da extensão da figura da associação pública tem vindo a gerar divergência na doutrina,
salientando-se as seguintes posições:
1. Vital Moreira: incluem-se apenas as associações públicas profissionais;
2. Freitas do Amaral: incluem-se, além das associações públicas profissionais, as associações ou consórcios de
entidades públicas (ex.: associações de freguesias), bem como algumas associações de caráter misto (que
congregam entidades públicas e privadas).
À parte deste debate doutrinal, a verdade é que da conjugação das alíneas f) e g) do preceito que nos ocupa resulta que
todas as associações são abrangidas. Mesmo que se acolha uma conceção mais restrita de associação pública, a alínea g),
ao conjugar-se com a alínea f), engloba todas as associações.

7. Associações de que façam parte uma ou várias pessoas coletivas referidas nas alíneas anteriores: a inserção
de uma concreta associação nesta alínea depende da verificação dos seguintes requisitos:
1. Requisito da participação: financiamento maioritário de uma pessoa coletiva pública das referidas;
2. Requisito da dependência: sujeição ao controlo e gestão de uma pessoa coletiva pública das acima referidas
ou a maioria dos titulares do órgão de administração, direção ou fiscalização designados por uma daquelas
entidades.
Podem aqui integrar-se tanto associações de direito privado como associações de direito público. Integram-se aqui, por
exemplo, as entidades intermunicipais (áreas metropolitanas), as associações de desenvolvimento local ou regional, as
entidades regionais de turismo, etc.

10.2 Entidades adjudicantes do art. 2º/2 CCP » organismos de direito público


Nos termos da alínea a) do art. 2º/2 CCP, são também entidades adjudicantes quaisquer pessoas coletivas que,
independentemente da sua natureza pública ou privada:
− Tenham sido criadas especificamente para satisfazer necessidades de interesse geral, sem caráter industrial ou
comercial; e
− Sejam maioritariamente financiadas pelas entidades elencadas no nº 1 do art. 2º CCP ou estejam sujeitas ao
controlo e gestão de uma dessas entidades, ou tenham um órgão de administração, direção ou fiscalização cuja
maioria dos titulares seja designada por aquelas entidades.

Para a sua qualificação como entidades adjudicantes terão, então, de se verificar três requisitos:
1. Personalidade jurídica: os organismos têm de dispor de personalidade jurídica, não relevando a natureza jus-
privatista ou jus-publicista do seu estatuto.
2. Prossecução de atividades de interesse geral sem caráter industrial ou comercial (“o fim”): integra-se aqui um
conjunto bastante amplo e heterogéneo de atividades, ligadas a interesses públicos como a saúde pública, o
ambiente, a ordem pública, etc.
A jurisprudência do TJUE delimitou os critérios para avaliar se uma atividade desenvolvida por uma sociedade
pública é desprovida de carácter industrial ou comercial:
i) As circunstâncias que presidiram à constituição dessa sociedade; e
ii) As condições em que a mesma exerce a sua atividade, incluindo, nomeadamente, a ausência de um fim
lucrativo a título principal e a não assunção dos riscos associados à referida atividade, bem como o eventual
financiamento público da atividade em causa.
P. ex.: nos termos da Lei n.º 50/2012, de 31-8, os municípios devem transferir para as empresas municipais os meios necessários para a
cobertura dos respectivos prejuízos e assegurar o seu (re)equilíbrio financeiro. Pelo que estas empresas não assumem o risco económico-
financeiro que resulte das actividades desenvolvidas.
3. Estreita dependência em relação a uma entidade do art. 2º/1 (critério do financiamento publico maioritário e o
critério do controlo de gestão): entidades financiadas por uma entidade adjudicante, mas sem a exigência de
contraprestações específicas por conta do auxílio financeiro concedido, ou controladas por uma entidade
adjudicante, implicando o controlo de gestão o exercício de um poder de orientação ou de supervisão que
determina as finalidades e os objectivos a prosseguir pela entidade controlada).

Os “organismos de direito público” e pessoas colectivas (privadas) de utilidade pública são, p. ex., instituições particulares
de solidariedade social, misericórdias e outras entidades particulares de interesse público.

A “interpretação funcional” da jurisprudência do TJUE: estas entidades prosseguem fins de interesses gerais; caso o
respetivo financiamento seja, “em mais de metade”, de proveniência pública, isto é, proveniente do orçamento das
entidades do n.º 1 do artigo 2.º ou de (outros) organismos de direito públicos, serão subsumíveis ao conceito de
“organismos de direito público” e, consequentemente, entidades adjudicantes.
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O diferente âmbito de aplicação da Parte II do CCP quanto às entidades adjudicantes do artigo 2.º
1. Contratos a celebrar pelas entidades do n.º 1 do artigo 2.º do CCP: para as entidades do n.º 1 do artigo 2.º do
CCP vale a cláusula geral do artigo 16º, n.º 1, isto é, estas entidades são entidades adjudicantes para todos os
contratos cujas “prestações estão ou sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado”,
ficando, por isso, sujeitas à Parte II do CCP relativamente à formação de todos os contratos que reúnam esta
característica
2. Para os “organismos de direito público”: a Parte II do CCP só é aplicável aos contratos que abranjam prestações
típicas da empreitada de obras públicas, concessão de obras públicas, concessão de serviços públicos, locação e
aquisição de bens móveis ou aquisição de serviços – n.º 8 do artigo 5.º
Em todo o caso, o designado “efeito de contágio ou de contaminação”: quaisquer contratos dos mencionados,
mesmo que não estejam relacionados com a acividade de interesse geral que justificou a criação e/ou a
qualificação da entidade com organismo de direito público

10.3 Entidades adjudicantes do art. 7º CCP


O art. 7º CCP ocupa-se das entidades adjudicantes que atuam nos setores especiais/operadores de serviços de rede (e
que não sejam entidades adjudicantes do art. 2º/1 ou organismos de direito público): atividades nos setores da água, da
energia, dos transportes e dos serviços postais.
Ou seja, são também entidades adjudicantes:
i) As pessoas coletivas que estejam sob a influência dominante de entidades adjudicantes do artigo 2.º, n.ºs 1 e 2
(desde que aquelas pessoas coletivas não constem como entidades adjudicantes no mesmo artigo – nos n.ºs 1 e 2 do
artigo 2.º);
ii) E, ainda que atuem em condições normais de mercado e em contexto concorrencial (isto é, expostas à
concorrência), tenham por objeto o exercício de atividades nos setores especiais (isto é, nos setores da água, da energia,
dos transportes ou dos serviços postais)
Exemplo: abrangem-se neste âmbito empresas do Estado (empresas públicas) ou empresas municipais que exerçam a respectiva actividade naqueles
sectores especiais (desde que não sejam organismos de direito público).

O art. 7º/2 esclarece o conceito de “influência dominante” utilizado no art. 7º/1/a): considera-se que uma entidade
adjudicante pode exercer influência dominante quando detiver, nomeadamente, a maioria do capital social, a maioria dos
direitos de voto, o controlo de gestão ou o direito de designar, direta ou indiretamente, a maioria dos titulares de um
órgão de administração, de direção ou de fiscalização.

Os arts. 9º e 10º CCP especificam e delimitam o que se deve considerar atividades nos setores especiais.

Contratos a celebrar pelas entidades dos sectores especiais – art. 11º, n.º 1, e art. 474.º, n.º 4:
Os seguintes tipos de contratos e desde que o seu objeto esteja relacionado com a actividade do sector especial que
justificou a sujeição da entidade ao CCP:
• Empreitadas de valor igual ou superior a 5 548 000 € (alínea a) do n.º 4 do artigo 474.º)
• Concessão de obras públicas;
• Concessões de serviços públicos;
• Locação ou aquisição de bens móveis e aquisição de serviços de valor igual ou superior a 443 000 € (alínea b) do
n.º 4 do artigo 474.º);
• Aquisição de serviços sociais ou outros específicos enumerados no anexo IX ao CCP, cujo valor seja igual ou
superior a 1000.000 €

Contratos a celebrar por “organismos de direito público” que operem (ou também operem) nos sectores especiais:
À formação dos contratos a celebrar pelas entidades adjudicantes referidas no n.º 2 do artigo 2.º que exerçam uma ou
várias atividades nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais são aplicáveis as regras especiais
relativas à formação dos contratos a celebrar pelas entidades adjudicantes referidas no n.º 1 do artigo 7.º, desde que
esses contratos digam direta e principalmente respeito a uma ou a várias dessas atividades – artigo 12.º
P. ex.: uma empresa do sector empresarial local que seja um organismo de direito público que opere num dos sectores especiais é-lhe extensivo, nesta
parte, o âmbito da contratação nos sectores especiais da água, energia, transportes e dos serviços postais

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10.4 Outras entidades adjudicantes »» Centrais de compras – artigo 260.º do CCP, DL n.º 200/2008 e DL n.º 37/2007
As centrais de compras são entidades, com ou sem personalidade jurídica, constituídas pelas entidades adjudicantes do
artigo 2.º (as “entidades adjudicantes referidas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 2.º podem constituir centrais de compras para
centralizar a contratação de empreitadas de obras públicas, de locação e de aquisição de bens móveis e de aquisição de
serviços” – n.º 1 do artigo 260.º). P. ex.: a Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I.P. (ESPAP) e o Serviços Partilhados do
Ministério da Saúde, EPE; unidades ministeriais de compras (UMC). As UMC não dispõem de personalidade jurídica.
As centrais de compras do Estado integram entidades compradoras vinculadas (entidades que estão obrigadas bens e
serviços através da central de compras, como sucede com os serviços da Administração directa do Estado e os institutos
públicos do Estado) e entidades compradoras voluntárias (entidades que, por vontade própria, poderão aderir àquelas
centrais, como sucede com os municípios e as entidades do sector público empresarial)

Funções das centrais de compras do Estado – artigo 261.º:


1.3.1. Realizam aquisições como “grossistas”: adquirem bens ou serviços para revenda às entidades adjudicantes
do artigo 2.º, promovendo, assim, o agrupamento de encomendas (p. ex., aquisição de um grande número de
computadores ou de bens de consumo corrente das entidades adjudicantes – alínea b) do n.º 1 do artigo 261.º)
1.3.2. Funcionam como mandatárias/representantes (contrato de mandato administrativo) das entidades
adjudicantes, na organização e condução dos procedimentos de adjudicação, para a celebração de contratos de
aquisição de serviços, de aquisição bens móveis e de empreitadas de obras públicas – alínea a) do n.º 1 do artigo 261.º
1.3.3. Organizam e conduzem procedimentos de adjudicação destinados à celebração de acordos-quadro
(designados por “contratos públicos de aprovisionamento” - artigos 265.º e 266.º), para a posterior celebração, pelas
entidades adjudicantes do artigo 2.º (entidades vinculadas ou voluntárias) e ao abrigo destes acordos-quadro, de
contratos de aquisição de serviços, de aquisição de bens móveis e de empreitadas de obras públicas – alínea c) do n.º 1
do artigo 261.º, artigos 257.º a 259.º.

11. Variabilidade da situação concreta da entidade adjudicante quanto à incidência da Parte II do CCP
O facto de uma entidade se qualificar como entidade adjudicante não responde logo à questão de saber em quer termos
precisos se lhe aplica a Parte II do CCP. Com efeito, os termos de aplicação da Parte II do CCP variam consoante a
entidade adjudicante concretamente em causa se localize no art. 2º/1, no art. 2º/2 ou no art. 7º CCP.

Em relação às entidades do art. 2º/1 CCP (exceto quanto ao BP): temos a aplicação mais exigente da Parte II do CCP,
uma vez que, salvo os contratos excluídos (art. 4º e 5º), todos os contratos destas entidades que não estejam submetidos
à concorrência do mercado estão subordinados à Parte II (art. 5º+ 16º CCP).
Por outro lado, os contratos a celebrar por essas entidades que digam direta e principalmente respeita a atividades dos
setores especiais não beneficiam do regime específico para a formação destes contratos (art. 12º CCP).

Em relação às entidades do art. 2º/2 CCP (organismos de direito público e BP): a Parte II aplica-se aos contratos que
abranjam prestações típicas dos contratos de empreitada de obras públicas, de aquisição de serviços, etc. (art. 5º/8 CCP).
Por outro lado, estas mesmas entidades beneficiam do regime específico da contratação nos setores especiais (art.
12º+33ºCCP).

Quanto às entidades do art. 7º CCP (bem como os organismos de direito público, quanto aos contratos que celebrem
no âmbito dos setores especiais): a Parte II só se aplica aos contratos que:
1. Digam direta e principalmente respeito a uma ou várias das atividades exercidas nos setores especiais;
2. O objeto abranja prestações típicas de contratos de empreitada de obras públicas, de aquisição de serviços, de
locação ou aquisição de bens moveis, de concessão de obras publicas e de serviços públicos;
3. No caso de contratos de empreitada, de aquisição ou locação de bens moveis e de aquisição de serviços, desde
que o respetivo valor se situe acima do limiar de aplicação do CCP que existe neste caso;
4. Prevê restrições especificas quanto à aplicação do CCP decorrentes da demonstração de que a entidade
adjudicante exerce uma atividade exposta à concorrência e no âmbito da contratação entre a entidade
adjudicante e empresas associadas;
5. As entidades adjudicantes podem adotar, em alternativa, qualquer procedimento de adjudicação.

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12. Extensão do âmbito de aplicação da Parte II do CCP


Os arts. 275º e 276º CCP procedem à extensão do âmbito de aplicação da Parte II do CCP:

• Entidades com “contratos subsidiados” (art. 275º): aos contratos de empreitada (de obras ou serviços) ainda que
celebrados por entidades não referidas nos arts. 2º e 7º CCP (ou seja, entidades não adjudicantes) são aplicáveis
as regras do CCP. » (ver requisitos do art. 275º/nº1)
Ou seja, este art. aplica-se à formação de contratos subsidiados de entidades não adjudicantes. Já há formação
dos contratos subsidiados de entidades adjudicantes aplicam-se as regras gerais a que essas entidades se
encontram sujeitas.
Ver ainda nº2 – obrigação das entidades adjudicantes que concedem os subsídios.
O CCP não estabelece um regime geral da adjudicação de contratos subsidiados, pelo que os contratos
subsidiados por entidades não adjudicantes que não sejam de empreitadas ou serviços associados a empreitadas
não são abrangidos pela extensão do âmbito de aplicação do CCP.
Contudo, este art. não estabelece em que termos se processa a aplicação da Parte II.
Nota: considera-se que os contratos de aquisição de serviços são complementares, dependentes ou se encontrem,
por qualquer forma, relacionados com o objeto de um contrato de empreitada a cuja formação seja aplicável o
disposto no nº 1.
Subsídio (noção): é toda e qualquer vantagem financeira atribuída, direta ou indiretamente, a partir de verbas do
orçamento de uma entidade adjudicante, qualquer que seja a designação ou modalidade adotada, a que não
corresponde uma contrapartida específica, isto é, uma prestação individualizada ou determinada, a afetuar pelo
beneficiário no interesse direto da entidade adjudicante (as do art. 2º+7º). Ex: concessão benefícios fiscais.
Revisão de 2017 – estabeleceu, no nº3, a exclusão de contratos com subsídios, sujeitos a reembolso integral.
Contudo, no nº4, determinou a aplicação dos princípios gerais da contratação pública.

• Concessionários de obras públicas que não sejam entidades adjudicantes (art. 276º): para estes casos, é
estabelecido um regime especial (art. 276º CCP), pelo que não há aqui uma verdadeira extensão do âmbito de
aplicação da Parte II do CCP. Ex: concessionários de auto-estradas.

• Outras entidades submetidas ao regime da Parte II do CCP:


− Entidades que contratam na qualidade de mandatários: entidades que contratam em nome próprio, mas
em benefício de uma entidade adjudicante (p. ex., uma fundação ou uma associação de direito privado substitui-se a
uma entidade adjudicante, adquirindo propositadamente bens móveis para esta. A falta de um mandato expresso – mandato sem
representação - não obsta à aplicação da Parte II do CCP);
− Entidades sujeitas por “lei avulsa” ao CCP (artigo 23.º, n.ºs 1 e 2, do Estatuto das Instituições Particulares de
Solidariedade Social - Decreto-Lei n.º 119/83, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 172-A/2014): a
empreitada de obras de construção ou grande reparação pertencentes às instituições, devem observar o
estabelecido no CCP, com excepção das obras realizadas por administração directa até ao montante
máximo de 25 mil euros. Mas, por força do n.º 2 aquele artigo, este regime não se aplica às instituições
que não recebam apoios financeiros públicos.
Nota: estas entidades, quando o financiamento público seja maioritário, são subsumíveis ao conceito de “organismo
de direito público” (n.º 2 do artigo 2.º do CCP)
− Entidades que assumem perante a Administração Pública o compromisso de cumprir a Parte II do CCP:
A imposição administrativa, através de regulamento ou da aposição de cláusula acessória (cláusula modal
aposta a um acto administrativo, nos termos do artigo 149.º do Código do Procedimento Administrativo)
O exemplo do regime de contratação pública nos domínios da defesa e da segurança (Decreto-Lei n.º 104/2011, de 6-10): com
base neste regime a entidade adjudicante pode impor ao adjudicatário a escolha dos seus subcontratados em conformidade com
regras e princípios do direito dos contratos públicos – artigo 59.º do Decreto-Lei n.º 104/2011

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2. ÂMBITO OBJETIVO de incidência da Parte II do CCP (contratos)


Neste âmbito, iremos ver quais contratos estão as entidades adjudicantes obrigadas a formar nos termos definidos na
Parte II do CCP ou segundo um dos tipos de procedimentos disciplinados nesta Parte do CCP (art. 16º a 278º CCP).

Note-se, que os contratos de entidades adjudicantes não estão todos sujeitos à Parte II do CCP, não pelo facto de serem
excluídos, mas porque não devem considerar-se incluídos no âmbito objetivo de incidência da Parte II.

Pelo elemento literal do n.º 1 do artigo 2.º do CCP extraem-se dois segmentos essenciais:
a) Que há contratos públicos celebrados pelas entidades adjudicantes enumeradas no CCP (artigos 2.º e 7.º) cujo
procedimento de formação decorre necessariamente nos termos disciplinados na Parte II do CCP;
b) E que existem outros contratos públicos celebrados pelas mesmas entidades adjudicantes cujo procedimento
de formação se encontra excluído dessa disciplina.

Por conseguinte, há critérios delimitadores do universo dos CP’s cujo procedimento de formação se encontra sujeito à
Parte II do CCP (critérios doutrinais e jurisprudenciais):
• Critério da procura pública (contratos de procura pública);
• Critério do interesse concorrencial e benefício económico.

14.1 Contratos de procura pública


O CCP só se aplica a contratos de procura pública (com interesse concorrencial) pela insistência do art. 1º/2, ou seja,
aqueles contratos cuja execução corresponde à satisfação de um interesse e de uma necessidade da entidade
adjudicante. É o que sucede tipicamente com os contratos do art. 16º/2.

Os designados contratos públicos na terminologia do DUE (contratos de empreitada de obras públicas, de


aquisição/locação de bens móveis e aquisição de serviços) e outros contratos como, p.e. os contratos de obras públicas, de
concessão de serviços públicos, de exploração de bens públicos e de sociedade

Por conseguinte, este conceito identifica as várias categorias de contratos que as entidades adjudicantes celebram em
vista da satisfação de necessidades próprias e, por isso, no âmbito e na sequência de procedimentos desencadeados por
um ato da sua própria iniciativa, sendo que este ato representa o inicio de um processo que levará a entidade adjudicante
a obter os bens ou os serviços de que carece.
Incluem-se como categorias principais: os contratos de compras públicas (empreitadas de obras publicas, p.e. – são os
“contratos públicos”), os contratos de concessão (de serviços públicos, p.e. – contratos de sociedade, p.e.).
Deste modo, este conceito abrange os contratos públicos de compra e utilização de bens móveis e os contratos públicos
de colaboração (pelos quais o contraente assume o encargo de colaborar com o contraente publico mediante a execução
de uma certa atividade).
Note-se, que esta situação está confirmada pelo facto de o procedimento de formação de qualquer contrato se iniciar
com a decisão de contratar - art. 36º.
Por conseguinte, o contrato surge como o resultado de um procedimento que se inicia com uma decisão de contratar da
entidade adjudicante. Sendo que o contrato é um instrumento de satisfação de uma necessidade própria da entidade
adjudicante e permite uma compreensão geral do contratante selecionado como um colaborador da entidade
adjudicante.

Todo o dispositivo da Parte II está baseado na idealização de um procedimento desencadeado pela entidade adjudicante
e ordenado para a adjudicação de um contrato em que o contraente privado se vê convocado a executar, a
desenvolver uma atividade (construir, prestar um serviço, p.e.) em execução do contrato. São estas prestações do
contraente que dão razão de ser ao próprio contrato.

É importante ainda mencionar, que o CCP é visivelmente um código de compras públicas, que passou a incluir três
artigos sobre a venda de bens móveis, sendo que a sua aplicação se faz num contexto procedimental que não tem
qualquer comunicação com qualquer outra regra do CCP (subsistem com uma vida à parte dentro do CCP).

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14.2 Interesse concorrencial


A parte II aplica-se aos contratos cujo objeto abranja prestações que estão ou sejam suscetíveis de estar submetidas à
concorrência de mercado (art. 16º/1). De forma mais linear, a ideia que se pretende traduzir é a de que estarão
submetidos à Parte II do CCP os contratos com interesse concorrencial: contratos cuja celebração seja do interesse,
possível ou potencial, de uma pluralidade de interessados/operadores económicos do mercado, na medida em que aos
mesmos está associada a possibilidade de um beneficio económico.

Deste modo, o contrato de procura pública é um objeto disputado e tem interesse concorrencial quando tem um valor e,
portanto, está em condições de produzir um benefício económico para quem venha a celebrá-lo (art. 17º, conjugado com
o art. 97º, sobre o preço contratual). Este beneficio pode consistir em:

a) Benefício económico correspondente ao preço contratual e, ou ao valor de quaisquer contraprestações da


entidade adjudicante:
Este benefício resultante da celebração de um contrato liga-se, em regra, à onerosidade do contrato para a
entidade adjudicante. Com efeito, esta celebração de um contrato representa um encargo (sacrifício patrimonial)
para a entidade adjudicante, que envolve, à partida, a mobilização de recursos financeiros públicos (pagamento
de um preço).
Sendo certo que o beneficio económico a alcançar pelo contratante privado resulta da remuneração que aufere
(o preço) - contrapartida da prestação que ele próprio realiza. » art. 17º/1, 2(1ªparte) + art. 97º. Ex: transmissão do
direito de utilizar bens da entidade adjudicante.
Nota: interesse concorrencial e beneficio económico  lucro, porque a prestação da entidade adjudicante (o
preço) poderá limitar-se a cobrir os custos incorridos na execução do contrato pelo contratante. Contudo, há aqui
interesse concorrencial em obter o contrato e em alcançar o benefício económico que do mesmo resulta.

b) Beneficio económico assente no direito ao exercício de uma atividade geradora de receitas:


O interesse concorrencial e a procura de um benefício económico podem estar presentes em contratos em que a
entidade adjudicante não assume um encargo de remunerar o contratante.
Sucede quando o contrato é um meio de a entidade adjudicante atribuir ao contratante o direito ao exercício de
uma atividade (exploração de uma obra pública, p.e.) geradora de receitas – art. 17º/2.

c) Beneficio económico assente em vantagens diretas da execução do contrato pelo contratante:


O direito português ignora a exigência de onerosidade e admite existir interesse concorrencial/benefício
económico em contratos de procura pública que não envolvem qualquer encargo a suportar pelo contraente
público.
Deste modo, o art. 17º/2 inclui no benefício económico (além do preço e de outras contraprestações a efetuar
em favor do adjudicatário) “o valor das vantagens que decorrem diretamente para o adjudicatário da execução
do contrato e que possam ser configuradas como contrapartidas das prestações que lhe incumbem”.
Ex1: contrato de fornecimento gratuito de equipamento para deficientes com o mero propósito de incremento das vendas por
via de publicidade feita a partir desse fornecimento gratuito.
Por conseguinte, se houver uma ligação entre a execução de um contrato público e a produção de vantagens
diretamente para o contratante (sendo estas contrapartidas do contrato), a lei assume que o contrato, embora
não oneroso, produz um benefício para o contratante e corresponde a um contrato com interesse concorrencial.
Logo, tem de ser sujeito ao CCP.
Note-se, que o contraente não atua com um espírito de liberalidade, mas sim em busca de um beneficio
económico, com o objetivo de alcançar vantagens diretas que decorram da execução do contrato e que possam
ser configuradas como contrapartidas das prestações que lhe incumbem.
Ex2: um contrato de restauração de um museu público no qual o contraente privado adquire o direito de inscrever o seu
nome, de forma visível, na entrada principal do mesmo. Neste sentido, o contrato poderá não pressupor o pagamento de um
preço pela entidade adjudicante, mas envolve a obtenção de vantagens pelo co-contratante que suscitam – ou podem
suscitar – interesse concorrencial – isto é, benefício económico – para os operadores económicos)

Por conseguinte, a lógica do CCP inspira-se no benefício económico que o contrato proporciona ao contratante privado,
sendo que este benefício é partilhado por vários agentes – interesse concorrencial. O contrato submetido à Parte II é,
pois, como um bem jurídico escasso que interessa a uma pluralidade de pessoas.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

Contudo, o interesse concorrencial/benefício económico resultante de um contrato não se limita, não tem de consistir
num preço a pagar pela entidade adjudicante, podendo haver (e há) contratos que não envolvam o pagamento de um
preço pelas entidades adjudicantes como resulta dos arts. 36º/2; 47º/2; 88º/1; 109º/3; 96º/1/d.

Ausência de interesse concorrencial (“contratos sem valor”) – art. 17º/9:


Esta categoria abrange os contratos que não geram qualquer benefício económico, qualquer vantagem direta que possa
configurar como contrapartida das prestações efetuadas pelos contratantes.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

15. Delimitação dos contratos sujeitos à Parte II em função das entidades adjudicantes
O conceito de CP’s com interesse concorrencial delimita o “âmbito da incidência máxima” da Parte II. Mas em termos
práticos, a Parte II acaba por não atingir uma incidência efetiva em relação a todos os contratos abstratamente atingidos,
desde logo por força de exclusões efetuadas pelo CCP – art. 4º; 5º; 5º-A e 6º-A. E também o âmbito de incidência objetiva
não atinge nos mesmos termos todas as entidades adjudicantes (ponto 11).

15.1 Entidades adjudicantes institucionais (art. 2º/1), exceto o Banco de Portugal:


O CCP aplica-se com a sua intensidade máxima; vale em pleno a cláusula geral do art. 16º/1, conjugado com o art. 5º/1
CCP. Logo, todos os contratos (ou atos unilaterais) dessas entidades que correspondam a contratos de procura pública
com interesse concorrencial são abrangidos, desde que não sejam expressamente excluídos.

15.2 Organismos de direito público e Banco de Portugal (art. 2º/2):


Para os contratos celebrados pelos organismos de direito público (art. 2º/2) e para o BP (art. 2º/1/f) vale a regra
estabelecida no art. 5º/8.
Ou seja, estão apenas abrangidos pela Parte II os contratos destas entidades e BP que abranjam prestações típicas da
empreitada de obras públicas e concessão de obras públicas, p.e.
Efeito imediato desta opção: os contratos excluídos do âmbito de aplicação da Parte II ficam sujeitos ao regime da
contratação excluída, nos termos no art. 5º-A.

15.3 Entidades adjudicantes dos Setores Especiais e organismos de direito público que exercem atividades dos setores
especiais (art. 7º): setores da água, energia, transportes e serviços postais
Em relação às entidades adjudicantes do art. 7º, o CCP seguiu um sistema de inclusão taxativa e identificou os contratos
abrangidos. Logo, nos termos do art. 11º/1, a Parte II só é aplicável:
▪ Aos contratos que digam direta e principalmente respeito a uma ou a várias atividades por elas exercidas nos
setores da água, energia, transportes e serviços postais;
▪ Desde que o objeto desses contratos abranja prestações típicas dos contratos de empreitada de obras públicas,
de aquisição de serviços, etc.

Nota: os organismos de direito público (art. 2º/2) que exerçam uma ou várias atividades nos setores da água, energia,
transportes e serviços postais beneficiam deste regime da contratação nos setores especiais em relação aos seus
contratos que digam direta e principalmente respeito a atividades por eles exercidas nos setores especiais.
Em relação aos contratos que não digam apenas respeito a uma dessas atividades (ex: contrato para a construção da sede de uma
empresa que exerce uma atividade de energia dos setores especiais e uma atividade fora dos setores especiais) e não seja possível determinar
qual a atividade a que dizem principalmente respeito, os organismos de direito público não beneficiam deste regime da
contratação dos setores especiais, submetendo-se, assim, ao regime geral (art. 33º/3).

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

3. Atos Administrativos substitutivos de contratos sujeitos à Parte II do CCP (art. 1º/3)


Por força do art. 1º/3, a Parte II do CCP também se aplica a atos administrativos (ou equiparados) praticados em
substituição da celebração de CPúb.

De notar, que a identificação dos AA’s a que se pretende ver aplicada a Parte II pressupõe a prévia delimitação do
conceito de CPúb submetido a essa mesma Parte. A formação do AA que substitui um CP será regulada pela Parte II, se e
quando o CP que o mesmo substitui estivesse, também ele, sujeito à Parte II. Ou seja, a celebração do CP (substituído pelo
AA) tem necessariamente de estar sujeita a algum dos procedimentos disciplinados na Parte II.

Esta é uma substituição material ou de resultado, porque os efeitos práticos de um ato unilateral pode proporcionar à AP
um resultado que ela teria de obter por via da celebração de um CP.

Finalidade deste regime: evitar que as entidades adjudicantes sigam a via do aproveitamento da forma do AA para fugir
aos procedimentos de contratação. Trata-se, pois, de prevenir o risco de uma fuga para o AA e da utilização perversa das
formas jurídicas da ação administrativa.

Ex: atribuição de uma autorização para a execução de obras de reabilitação de edifícios particulares, mas acompanhada
de encargos para restaurar um museu municipal sito na mesma zona.

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4. Contratos Excluídos (Art.4º) E Contratação Excluída (Art. 5º)

20. Contratos Incluídos vs. Contratos Excluídos:


Os “contratos incluídos” são os contratos abrangidos pela incidência objetiva do CCP e, em particular, da sua Parte II. Ou
seja, são os contratos de procura pública com interesse concorrencial.

Os “contratos excluídos” são os contratos desprovidos de interesse concorrencial (sem valor ou cujas prestações não se
encontram submetidas à concorrência de mercado) ou com os contratos cujo objeto consiste na atribuição de
subvenções (não são de procura pública) – art. 5º/1.

21. Distinção legal entre Contratos Excluídos e Contratação Excluída:


Os “contratos excluídos” são aqueles contratos a que o CCP não se aplica de todo (sobretudo a Parte II e III) – art. 4º.

A “contratação excluída” são aqueles contratos a que não se aplica a Parte II, ou seja, são contratos cujo procedimento
de formação/celebração não se encontra sujeito à Parte II - art. 5º.

Esta distinção é irrelevante, porque se restringiu, na revisão de 2017, a aplicação da Parte III do CCP. » O critério de
sujeição à Parte III reside na sujeição do contrato à Parte II.

Contudo, o CCP ocupa-se da “contratação excluída” (universo referenciado em três preceitos: art. 5º, 5º-A e 6º-A/1) e
chega até a indicar o regime aplicável a essa contratação (art. 5º-B, 6º-A/2).
Em relação aos contratos excluídos não há qualquer indicação.

Note-se, que, por força da lei, o contrato excluído da incidência da Parte II fica também excluído da incidência da Parte III.
A lei adota, deste modo, uma lógica de “dupla exclusão”: art. 280º/1.

Vale para todos os contratos, incluindo os contratos administrativos (contratos que configurem relações jurídicas
administrativas).

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

CONTRATAÇÃO EXCLUÍDA

1. Contratos desprovidos de interesse concorrencial e contratos que não podem ser submetidos à concorrência
(art. 5º/1): trata-se, neste caso, de colocar de fora da incidência do CCP contratos com interesse concorrencial,
mas que não são de procura pública (“compras”) ou, tendo como objeto a realização de compras, não podem ser
submetidos à concorrência de mercado, em razão da sua natureza, características, posição relativa das partes ou
no contexto da sua formação.

2. Contratos adjudicados no âmbito do setor público (art. 5º/2; 5º-A):


Nota: Referência a alguns “precedentes jurisprudenciais” do TJUE:
- Acórdão do TJUE, de 13 de Junho de 2013, Proc. C-386/11 – contrato celebrado entre duas colectividades territoriais para limpeza de
instalações;
- Acórdão do TJUE, de 19 de Dezembro de 2012 - contrato celebrado entre duas entidades públicas (Agência Sanitária Local de
Lecceuma e a Università del Salento), para o “estudo e avaliação da vulnerabilidade sísmica de estruturas hospitalares”
- Acórdão do TJUE, de 9 de Junho de 2009, Proc. C-480/06 – cooperação entre autarquias locais - adjudicação de serviços de tratamento
de resíduos.
- N.º 6 do artigo 1.º da Diretiva 2014/24, de 26-2-2014 (nova Dirctiva relativa aos contratos públicos): os acordos, decisões ou outros
instrumentos jurídicos que organizem a transferência de poderes e responsabilidades pela execução de missões públicas entre autoridades
adjudicantes ou agrupamentos de autoridades adjudicantes, e que não prevejam uma remuneração pela execução dos contratos, são
considerados uma questão de organização interna dos Estado-Membro em causa e, como tal, não são de forma alguma afetados pela
presente diretiva.

▪ Contratos de delegação entre entidades adjudicantes e que não prevejam uma remuneração: art. 5º/nº2
refere-se aos contratos entre entidades adjudicantes que organizem a transferência ou delegação de
poderes pela execução, com autonomia e responsabilidade própria da entidade delegatária, de missões
públicas originárias da entidade delegante, ou seja, não prevêem qualquer remuneração.
Importa ainda esclarecer que a exclusão de uma remuneração não significa que tais contratos não
prevejam a alocação para a entidade delegatária dos recursos que a entidade delegante poderia dispor
para exercer as competências transferidas.
Ex: acordos de delegação entre municípios e freguesias.

▪ Contratos de cooperação entre entidades adjudicantes (art. 5º-A/nº5,6): contratos exclusivamente


celebrados entre duas ou mais entidades adjudicantes quando se verifiquem cumulativamente os
requisitos do art. 5º-A/nº5 e 6:
i) O contrato estabelece uma cooperação entre as entidades adjudicantes, no âmbito de tarefas
públicas que lhes estão atribuídas e que apresentam uma conexão relevante entre si;
ii) A cooperação é regida exclusivamente por considerações de interesse público;
iii) As entidades adjudicantes não exercem no mercado livre mais de 20% das atividades abrangidas
pelo contrato de cooperação.
Se estes requisitos não estiverem todos reunidos, o contrato através do qual as entidades públicas instituem uma
cooperação entre si está sujeito ao CCP e não pode ser celebrado fora dos procedimentos ali previstos e regulados.

Nota 1: p. ex., dois ou mais municípios podem, por contrato, criar serviços intermunicipalizados para a gestão comum de
interesses públicos municipais (n.º 5 do artigo 8.º da Lei n.º Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto, que aprova o regime jurídico da
atividade empresarial local e das participações locais)
Nota 2: para efeitos do apuramento da percentagem referida deve ser tido em conta o volume médio total de negócios, ou uma
medida alternativa adequada, baseada na actividade, tais como os custos suportados pela pessoa colectiva em causa no que diz
respeito a serviços, fornecimentos ou obras, nos três anos anteriores ou, quando não tenha três anos de actividade concluídos, a
projecção de atividades a desenvolver -» n.º 6 do artigo 5.º-A.

▪ Contratos “in house” (art. 5º-A/nº1,2,3,4): abrange-se, aqui, a designada “contratação interna”, que se
refere a contratos celebrados entre entidades formalmente autónomas (com personalidade jurídica
própria), mas, em regra, ligadas entre si por laços de dependência jurídica ou organizativa (controlo
análogo) e de dependência económica (destino da atividade).
Requisitos cumulativos da relação “in house”:
a) Relação permanente (estável);
b) Essencial da atividade em benefício da entidade adjudicante (desde que a pessoa coletiva
controlada realize mais de 80 % das suas atividades no cumprimento de funções que lhe tenham sido

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

confiadas pela autoridade adjudicante controladora ou por outras pessoas coletivas controladas por
essa autoridade adjudicante);
c) Controlo análogo ao exercido sobre os próprios serviços: controlo análogo isolado ou controlo
análogo conjunto – alínea a) do n.º 1, n.º 3 e alíneas a), b) e c) do n.º 4 do artigo 5.º-A;
d) A inexistência de participação directa de capital privado na pessoa colectiva controlada (admite-se
excepcionalmente essa participação, desde que observados os requisitos da 2.ª parte da alínea c) do
n.º 1 do artigo 5.º-A).

Notas:
» Acórdão Coditel Brabant, de 13-11-2008, Proc. C-324/07, sobre o controlo análogo conjunto sobre a Brutélé, uma sociedade
cooperativa intermunicipal (concessionária de serviços dos municípios membros)
Acórdão SUCH, de 19 de Junho de 2014, Proc. C-574/12, sobre a relação entre o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais e os
hospitais portugueses, na sequência de um pedido de reenvio formulado pelo Supremo Tribunal Administrativo
» Acórdão Tragsa, de 19.04.2007 - Proc. C – 295/05:
- Capital social da Tragsa – 99% Estado Espanhol, 1% distribuído por 4 Comunidades Autónomas
- Obrigação de realizar as obras encomendadas pelos sócios, com prévia estipulação do preço (haveria contrato ou
determinação, isto é, “ordemencomenda”?)
» Acórdão Sea, de 10 de Setembro de 2009, Proc. 573/07: a participação, ainda que minoritária, de uma empresa privada no
capital de uma sociedade na qual também participa a entidade adjudicante em causa excluiu que esta entidade adjudicante possa
exercer sobre essa sociedade um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. Isto abrange quer a possibilidade
de a sociedade estar aberta ao capital privado e, portanto, abertura a participações privadas posteriores: tem de haver concurso
porque há uma alteração fundamental ao contrato.

▪ Contratos de sociedade entre entidades adjudicantes: art. 5º/4/d refere-se à formação de contratos de
sociedade (entre entidades adjudicantes) cujo capital social se destine a ser exclusivamente detido pelas
entidades adjudicantes referidas no art. 2º/1.
Ex: contrato de sociedade entre uma universidade e um município.

▪ Contratos com entidades adjudicantes titulares de direitos exclusivos (art. 5º/4/a): entidades cujos
direitos exclusivos lhe tenham sido atribuídos de forma compatível com as normas e os princípios
constitucionais e comunitários aplicáveis.

▪ Contratos com centrais de compras (art. 5º/4/g): por força do art. 260º/1, as entidades adjudicantes do
art. 2º podem constituir centrais de compras para centralizar a contrtação de empreitadas de obras
públicas, de locação e de aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços.
As centrais de compras podem ser serviços internos das entidades adjudicantes ou entidades com
personalidade jurídica como sucede com a ESPAP (Entidade Serviços Partilhados da AP).

3. Outra contratação excluída: art. 5º/nº4:


• Contratos de atribuição de subsídios ou subvenções (al.c): contratos de atribuição de subsídios ou
subvenções pelas entidades adjudicantes do art. 2º/1, a que não corresponda, como contrapartida, a
prestação de um serviço especifico por parte do beneficiário. Ex: entidade adjudicante financia uma atividade
cultural, não prevendo a satisfação de um interesse seu.
Toda e qualquer vantagem financeira atribuída, direta ou indiretamente, a partir de verbas do orçamento das entidades
adjudicantes, qualquer que seja a designação ou modalidade adotada, e à qual não corresponde uma contrapartida especifica
(uma prestação individualizada e determinada) a realizar pelo beneficiário no interesse direto da entidade adjudicante.

• Contratos de aquisição de serviços financeiros (al. e): contratos de aquisição de serviços financeiros
relativos à emissão, compra, venda ou transferência de valores mobiliários ou outros instrumentos
financeiros, na aceção da Diretiva 2004/39/CE, e respetivos serviços auxiliares, bem como os contratos a
celebrar em execução das politicas monetária, cambial ou de gestão de reservas e os de aquisição de
serviços de caráter financeiro (prestados) pelo Banco de Portugal e operações realizadas com o Fundo
Eueopeu de Estabilidade Financeira e com o Mecanismo Europeu de Estabilidade.

• Contratos de aquisição de serviços financeiros de emissão e gestão da divida publica e de gestão da


tesouraria do Estado (al. f);

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• Contratos no domínio da defesa e da segurança (al. h): a formação destes contratos, celebrados por
qualquer das entidades adjudicantes nos termos do CCP que prossigam atribuições nos domínios de
defesa e segurança, é disciplinada pelo DL. 104/2011, que transpôs a Diretiva 2009/81/CE, com o
propósito de adaptar as regras de contratação pública, tendo em consideração as especificidades do
objeto da contratação nos domínios e da segurança.
Este DL consagra um procedimento por negação sem publicação de anúncio de concurso. Este rege-se, com as
necessárias adaptações, pelo regime geral do Ajuste Direto com fase de negociação (procedimento de consulta
prévia), nos termos do art. 112º/1; art.113º e art. 114º a 126º CCP.
Ex: fornecimento de equipamento militar, incluindo quaisquer partes, componentes e ou elementos de ligação do
mesmo; fornecimento de equipamento sensível, incluindo quais partes, componentes e ou elementos de ligação do
mesmo; empreitadas de obras públicas, fornecimentos e serviços diretamente ligadis com o equipamento referido
anteriormente; e empreitadas de obras públicas, fornecimentos e serviços para fins militares específicos, ou obras e
serviços sensíveis.
Sempre que não se encontrem previstas normas específicas no DL, aplica-se o regime do CCP (visa garantir
a segurança jurídica e coerência entre os regimes de contratação pública) – concessões de obras públicas
e serviços públicos, p.e.
Nota: a contratação pública no setor da defesa está associada aos contratos de contrapartidas
(“contratos offset”): contratos celebrados entre um contraente público e uma empresa, pelos quais esta,
em contrapartida da venda de material de defesa, se compromete a realizar prestações que contribuem
para o desenvolvimento tecnológico de projetos determinados como condição da compra pelo Estado de
bens e serviços. Tais contratos interligam-se, pois com contratos de compras públicas, em regra, de
compra de material de defesa. »» Estão proibidos, por força do DL 105º/2011, pelo menos neste âmbito
da defesa.

• Contratos secretos e contratos cuja celebração deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança
+ contratação excluída para a proteção de interesses essenciais de defesa e segurança do Estado (al. i):
contratos que, nos termos da lei, sejam declarados secretos ou cuja execução deva ser acompanhada de
medidas especiais de segurança, bem como quando os interesses essenciais de defesa do Estado o
exigirem (interesses de natureza militar; de segurança interna ou de certos documentos oficiais) . Ex: contratos
celebrados no âmbito da L. 2/2014, alterada pela L.1/2015 relativa ao Segredo de Estado.
Só não se aplica o CCP em casos excecionais – quando se justifica a exclusão da adjudicação concorrencial
de um contrato, num quadro que evidencie a impossibilidade de medidas menos radicais.

• Contratos de aquisição de serviços de investigação e desenvolvimento (al.j): contratos de aquisição de


serviços de investigação e desenvolvimento abrangidos pelos códigos CPV referidos no Anexo VIII do CCP,
desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes condições:
i) Os resultados obtidos com os respetivos serviços não reverterem exclusivamente a favor da
entidade adjudicante, para utilização da sua própria atividade; quer isto dizer que a exclusão
destas aquisições de contratação pública procede apenas na falta de interesse económico direto.
Assim, se a entidade adjudicante contrata serviços de I&D com o propósito de vir a utilizar os
respetivos resultados na execução das suas missões, não se verifica esta condição.
ii) O pagamento dos serviços em causa não ser integralmente suportado pela entidade adjudicante
por se tratar de projeto cofinanciado por fundos nacionais ou europeus; ou seja, os serviços de
I&D contratados não poderão ser totalmente pagos pela entidade adjudicante que os adquire
(terão de ser financiados por entidades diferentes da entidade adjudicante) - Ideia de que de não
está aqui um serviço para ou no interesse exclusivo da entidade adjudicante.
Quando não se verifiquem estas duas condições, estes contratos (de aquisição de serviços de I&D) ficam
sujeitos ao CCP.

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4. Contratos de organismos de organismos de direito público e do Banco de Portugal (art. 5º/8): o legislador exclui
da sujeição à Parte II todos os contratos destas entidades que não abranjam determinadas prestações típicas da
empreitada ou concessão de obras públicas; concessão de serviços públicos, etc.

5. Contratos de serviços sociais e de outros serviços específicos/conexos (art. 6º-A): trata-se de contratos públicos
que tenham por objeto a aquisição de serviços sociais e de outros serviços específicos referidos no Anexo IX do
CCP, salvo quando o valor de cada contrato for igual ou superior ao limiar previsto no art. 474º/3/d (isto é, de
750.000€) – neste último caso aplica-se o disposto no art. 250º-A.
Assim, a adjudicação de contratos relativos a serviços enumerados no anexo IX faz-se fora do quadro de aplicação
do CCP, se o valor for inferior a 750.000€.
Ex: serviços de saúde; serviços administrativos nas áreas social, da educação e da saúde; serviços prestados por
organizações religiosas; outros serviços administrativos e das administrações públicas; prestações de serviços à
comunidade; serviços internacionais.

39. Contratos Excluídos do CCP e Contratos Excluídos da Diretiva 2014/24/UE


O CCP procede à transposição da Diretiva 2014/24/UE. Contudo, há relevantes diferenças entre estes.
Desde já importa mencionar que o âmbito objetivo de aplicação destes dois diplomas é diferente (contratos tipificados,
no caso da diretiva; e contratos de procura publica com interesse concorrencial, no caso do CCP) e que a exclusão de
aplicação prevista na Diretiva tem, em geral, o efeito de dispensar as entidades adjudicantes de lançarem os
procedimentos de contratação no âmbito da UE, enquanto exclusão da aplicação do CCP tem um outro significado.
Por conseguinte:
− aplica-se a Diretiva apenas aos contratos acima de determinado valor; enquanto que o CCP não utiliza o valor
como critério da sua aplicação (art. 17º/9; 31º/2, p.e.);
− o CCP sujeita ao regime de ajuste direto contratos que a Diretiva exclui do seu âmbito de aplicação (ex: contratos
relativos a serviços de arbitragem e de conciliação (27º/1/d CCP + 10º/c Diretiva);

40. Regime da Contratação excluída


Depois da revisão de 2017 do CCP, perdeu sentido a distinção entre contratos excluídos e contratação excluida: os casos
de contratação excluída (contratos a que não se aplica a parte II) correspondem também a casos de contratos excluídos,
segundo a regra da “dupla exclusão” contemplada no art. 280º/1 CCP.
Contudo, a distinção entre estas duas categorias mantém-se no CCP e, de certo modo, apresenta-se relevante no quadro
de aplicação do art. 5º-B.

Este art. define o “regime da contratação excluída”, que atinge os contratos referidos no art. 5º (contratação excluída) e
no art. 5º-A (contratos no âmbito do setor publico).

Além disso, corresponde igualmente à indicação de um regime de contratação excluída o disposto no art. 6º-A/2, que
estabelece o regime aplicável a contratos a cuja formação não se aplica a parte II, nos termos do art. 6º-A/1.

O regime jurídico aplicável à contratação excluída pelos arts. 5º, 5º-A e 6º-A/1 encontra-se indicado em três preceitos:
➢ Em dois deles (art. 5º-B/1,2) estipula-se o regime aplicável à contratação excluída nos termos dos arts. 5º e 5º-A;
➢ Um terceiro (art. 6º-A/2) indica o regime aplicável à contratação excluída nos termos do art. 6º-A/1.

Nota: embora as indicações do art. 5º-B/1 e 6º-A/2 se apresentem próximas (ambas concovam a aplicação dos princípios gerais da
contratação publica), é importante distinguir estas duas situações.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

40.1 Regime da contratação excluída pelos arts. 5º e 5º-A:

Regime aplicável à generalidade dos contratos:


Estabelece o art. 5º-B/1 que a celebração dos contratos a que se referem os arts. 5º e 5º-A fica sujeita aos princípios
gerais da atividade administrativa e aos princípios gerais da contratação publica previstos no art. 1º/1, devendo haver
menção à norma que fundamenta a não aplicação da parte II ao contrato em causa.
Propõe-se aqui uma adaptação restritiva do art. 5º-B/1 no sentido de o considerar aplicável apenas à formação dos
contratos excluídos que: não sejam objeto de regulação específica (ex: contratos de aquisição de serviços); e que correspondam a
contratos incluídos no âmbito de incidência natural da parte II, ou seja, os contratos de procura publica com interesse
concorrencial.
Em relação à formação de contratos que não preencham qualquer das duas condições referidas, a aplicação do regime
previsto no art. 5º-B não se revela de todo adequada » redução teleológica do art. 5º-B.

Regime aplicável aos contratos sobre o exercício de poderes públicos:


Em termos diversos, o art. 5º-B/2 refere-se apenas aos contratos excluídos do CCP que tenham um objeto passível de
ato administrativo. Ou seja, estabelece que “os contratos com objeto passível de AA e demais contratos sobre o exercício
de poderes públicos ficam sujeitos ás normas constantes do CPA, com as necessárias adptações”.
Nota: o CCP indica, neste preceito, o regime geral dos contratos sobre o exercício de poderes públicos excluídos do seu âmbito de
aplicação – quer o regime de formação, quer o regime substantivo. Não acolhe, deste modo, apenas o regime da formação ou da
celebração, como sucede no art. 6º-A/1,2.
Com efeito, os arts. 336º e 337º aplicam-se apenas aos contratos sobre o exercício de poderes públicos sujeitos à parte II – art. 280º/1.

40.2 Regime da contratação excluída pelo art. 6º-A/1:


O art. 6º-A/1 estabelece que a parte II do CCP não é aplicável à formação dos contratos públicos que tenham por objeto a
aquisição de serviços sociais e de outros serviços específicos referidos no anexo IX ao CCP, salvo quando o valor de cada
contrato for igual ou superior a 750.000€, caso em que aplica os arts. 250º-A e ss.
Este art. promove a exclusão (de todo e qualquer procedimento) da aplicação da parte II de contratos de manifesto
interesse concorrencial, que seriam abrangidos pelo CCP.

Ora o art. 6º-A/2 estipula que, à celebração dos contratos referidos no número anterior (contratos referidos no art. 6º-A/1 de
valor não superior a 750.000€), são aplicáveis os princípios gerais da contratação pública previstos no art. 1º-A, com as devidas
alterações.
Há, deste modo, uma solução de vinculação por princípios em vez de vinculação às regras e procedimentos (como sucede
no art. 5º-B/1). Daí não haver razão para distinguir graus de aplicação ou níveis diferenciados de vinculação.
Nestes termos, entende-se que as entidades adjudicantes estão obrigadas a promover formas de publicitação da intenção
de adjudicar, com a indicação do objeto do contrato, bem como a adotar procedimentos transparentes de prestação de
esclarecimento e de resposta a todos os interessados em aceder ao contrato.
Além disso, aplica-se o regime dos impedimentos previstos no CPA ao procedimento de formação dos contratos.

Pergunta: os princípios gerais de contratação pública também podem ser mobilizados em casos de contratos excluídos
da sujeição ao CCP por força de legislação avulsa?
Nos casos em que a legislação avulsa, que determina a exclusão do CCP, nada diz sobre a aplicação de princípios gerais à
adjudicação dos contratos excluídos, supomos que se aplica os princípios constitucionais da atividade administrativa (ex:
princípios da prossecução, intresse publico, igualdade, imparcialidade).
Os preceitos do CCP que convocam os princípios gerais da contratação pública pouco ou nada acrescentam, neste caso, á
sujeição constitucional da AP aos princípios fundamentais consagrados no art. 266º.

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41. Regime Jurídico da formação dos CONTRATOS MISTOS (com prestações de contratos excluídos e de contratos
abrangidos pelo CCP)
À formação dos contratos excluídos aplica-se os princípios gerais da contratação pública, se for o caso, mas o CCP, a sua
parte II, não se aplica.
Por sua vez, aos contratos abrangidos (não excluídos) aplica-se o regime jurídico de formação definido na parte II do CCP.
Já em relação aos contratos mistos, estes são relativos a prestações que, em parte, correspondem a contratos excluídos
e, noutra parte, correspondem a contratos abrangidos; contratos cujo objeto abranja simultaneamente prestações
típicas de mais do que um tipo de contrato (art. 32º/1). Ex: contrato que inclui prestações do tipo de contrato de aquisição de bens
móveis (aquisição de um computador) e prestações do tipo de contrato de aquisição de serviços (manutenção de uma rede informática).

Note-se, que a aplicação de regras da contratação faz-se em função do tipo de contrato e este, por sua vez, determina-se
a partir do seu conteúdo, das prestações que constituem o respetivo objeto. Deste modo, define-se um contrato como
empreitada de obras públicas ou de sociedade. A importância desta tipificação encontra-se, por exemplo, nos arts. 19º e 20º ou
25º e 26º.

Esta determinação do objeto do contrato deve atender a elementos como o “valor estimado do contrato” ou as
“prestações essenciais” (art. 32º/2). O nº3 deste artigo acrescenta que, sendo possível identificar separadamente as
diferentes partes de um determinado contrato, o seu objeto principal é determinado em função do valor estimado da
parte do contrato com um valor estimado mais elevado.

Por conseguinte, os contratos mistos têm de ser objeto de uma qualificação típica e reconduzidos a um tipo de contrato,
devido à aplicação das regras do CCP em função do tipo de contrato.

Veja-se ainda o nº 4 do art. 32º, no sentido da aplicação “a todo o contrato do regime correspondente da parte II,
relevando para o efeito o valor total do contrato”. Ou seja, o CCP não estende a estes casos a possibilidade de se
identificar o objeto principal do contrato para o efeito de se determinar o regime aplicável.

Ex: contrato que integra a prestação de um serviço de assistência ao domicílio e a realização de obras de reparação nas
casas onde vivem as pessoas assistidas (contrato de empreitada de obras publicas) no valor de 500.000€.
Na parte a que se refere a serviços é um contrato excluído nos termos do art. 6º-A/1; na parte em que se refere às obras
de reparação é um contrato abrangido.
Conclui-se, que o contrato fica sujeito ao CCP, mesmo que o seu objeto principal (e o valor estimado mais elevado) seja a
assistência ao domicilio.

42. Exclusões específicas dos SETORES ESPECIAIS


Em relação aos setores especiais (art. 11º e 12º), o art. 13º estabelece uma restrição e, portanto, a não aplicação do CCP.
De notar, neste contexto, a exclusão dos contratos celebrados entre entidades adjudicantes (operadores de rede) e
empresas associadas, bem como os contratos a celebrar por uma entidade adjudicante cuja atividade esteja diretamente
exposta à concorrência em mercado de acesso não limitado, desde que tal seja reconhecido pela Comissão Europeia, a
pedido da República Portuguesa, da entidade adjudicante em causa ou por iniciativa da própria CE, nos termos do art. 34º
da Diretiva 2014/25/UE. Atribui-se, neste ultimo caso, relevância ao facto de as entidades adjudicantes dos setores
especiais desenvolverem as suas atividades em ambiente de mercado e, por conseguinte, expostas à concorrência.
Concluindo, estas entidades não devem ser oneradas com a sujeição às regras de contratação pública, porque o ambiente
de mercado em que atuam oferece garantias de que as suas compras sejam efetuadas segundo uma lógica comercial.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

CONTRATOS EXCLUÍDOS (mera enumeração):


Contratos excluídos do âmbito do CCP, da Parte II e da Parte II do CCP:
1. Contratos celebrados ao abrigo de regras internacionais - artigo 4.º, n.º 1, do CCP (trata-se, em geral, de
contratos disciplinados por convenções ou acordos internacionais)
2. Contratos de trabalhos em funções públicas e contratos individuais de trabalho – alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º
(os primeiros são disciplinados pela Lei n.º 35/2014, Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, e aos segundos é
aplicável o Código do Trabalho)
3. Contratos de doação de bens móveis a favor de qualquer entidade adjudicante (liberalidade) – alínea b) do n.º 2
do artigo 4.º
4. Contratos de compra e venda, de doação, de permuta e de arrendamento de bens imóveis ou contratos
similares – alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º ;
5. Contratos de prestadores de serviços de comunicação social – alínea d) do n.º 2 do artigo 4.º
6. Contratos sujeitos a um regime aplicável nos termos gerais do direito internacional – alínea e) do n.º 2 do
artigo 4.º

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

CAPÍTULO II » PRINCÍPIOS GERAIS DA CONTRATAÇÃO PÚBLICA (art. 1º-A)

Os princípios gerais da contratação pública, constantes no art. 1º/-A, constituem normas que condensam os valores
fundamentais da ordem jurídica neste setor específico. Isto sem prejuízo de se aplicarem também aqui os princípios
gerais da atividade administrativa, já que a contratação é também uma atividade pública regulada por normas de direito
administrativo.

Importante relembrar, que os princípios são normas jurídicas que impõem que algo se realize na maior medida possível
(imperativos de otimização), segundo as possibilidades fáticas e jurídicas (que são determinadas essencialmente pelos
princípios opostos). Deste modo, a aplicação de um princípio exige uma tarefa de ponderação; sendo certo que os
princípios podem colidir entre si, embora não deixem de ser aceites como normas válidas de uma ordem jurídica.

Pelo contrário, as regras são normas jurídicas precisas e detalhadas que, quando se verificam determinados
comportamentos nelas previstos, desencadeiam uma consequência jurídica definitiva, isto é, autorizam, ordenam ou
proíbem algo em termos taxativos e definitivos.

46.1. Princípio da Concorrência


O princípio a concorrência é um valor comum, central e prioritário para o direito da contratação pública, conferindo
unidade de sentido ao CCP, bem como o é para o direito da concorrência. Sucede, contudo, que o princípio da
concorrência não cumpre a mesma intenção normativa nessas duas disciplinas. De facto, ao princípio da concorrência
podem ser apontadas duas dimensões distintas: Liberdade Concorrencial e Igualdade Concorrencial.

No direito da contratação pública, o princípio da concorrência surge como expressão concretizada da primazia da
igualdade – tratamento igualitário de todos os operadores económicos (exigência reclamada à AP). Este princípio
adstringe a entidade adjudicante de usar procedimentos de adjudicação abertos a todos os operadores económicos
(igualdade de acesso), impondo-lhe ainda a obrigação de tratar igualmente os participantes – na qualidade de candidatos
e na qualidade de concorrentes - (igualdade de tratamento).

Logo, este princípio serve para igualizar as respetivas condições de participação (e não para igualizar os concorrentes ou
os seus poderes de oferta).
Por conseguinte, o princípio da concorrência, na sua dimensão de igualdade concorrencial, é orientado para o plano
procedimental, e não para o plano material.

Este princípio impõe um certo tipo de configuração legislativa de toda a contratação pública: de entre os vários
procedimentos de adjudicação, haverá que dar primazia aos procedimentos abertos de seleção concorrencial (ex:
concursos públicos), sobre os procedimentos de acesso limitado ou fechados (ex: ajuste direto e consulta prévia).
Assumindo como base da contratação pública a igualdade concorrencial, o legislador terá necessariamente de fixar os
procedimentos abertos como modelo ou padrão de referência; os procedimentos fechados devem ser vistos como
desvios àquela regra, apenas podendo ser convocados em situações excecionais.

Esta primazia dos procedimentos abertos não se impõe apenas por força do princípio da igualdade. Ao mesmo resultado
conduz a compreensão do princípio como instrumento da proteção do interesse público financeiro: princípio da
concorrência, neste seguimento, impõe soluções e opções legislativas como um certo recorte procedimental, de favor à
participação dos interessados.

Nota: a organização de toda a regulação legal da contratação em conformidade com os cânones da abertura à
concorrência não dita apenas uma hierarquia de procedimentos; além disso, o princípio da concorrência vai ainda
conhecer uma concretização numa rede de “sub-princípios de direito adjudicatório, designadamente no âmbito dos
concursos (ex: princípios da estabilidade das regras, das propostas e dos concorrentes; principio da comparabilidade das
propostas)”.

Posto isto, será que, além deste relevo procedimental, o princípio da concorrência também tem relevância no plano
material, isto é, no plano das decisões da Administração Pública adjudicante?
Pode, de facto, desvelar-se um efeito direto do princípio da concorrência nesta matéria. Desde logo, o princípio define um
padrão de interpretação e de integração de prescrições específicas do CCP. E, além disso, apresenta-se como critério de
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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

decisão para situações em que não há regras explícitas ou em que as regras da contratação poderiam admitir várias
soluções: a opção no sentido de maximizar a concorrência deve ter preferência, o que pode determinar a ilegalidade de
decisões que, sem fundamento direto na lei, não se orientem pelo princípio da maior abertura possível à concorrência.

Assim, o princípio da concorrência pode ver-se mobilizado para justificar certas decisões da entidade adjudicante (em
defesa da concorrência), desde logo, sempre que o próprio CCP integra a ideia de concorrência ou de infração à
concorrência como critério de decisão da entidade adjudicante, bem como, p.e., a decisão de recusar o acesso a
informações que possam colocar em perigo os valores da concorrência e da igualdade no âmbito de um procedimento de
adjudicação, ou a de excluir um agrupamento que congregue todas as empresas que atuam num determinado setor da
economia, abolindo assim a concorrência.

Parece ser também este princípio que está em causa no contexto da recusa de sistemas de presunções inilidíveis em
matéria de causas de exclusão dos concorrentes pela jurisprudência europeia – entende-se que haverá sempre que se
verificar se, em concreto, a situação em causa é ou não suscetível de falsear a concorrência, para o efeito de determinar a
exclusão de concorrentes.
O efeito direto do princípio da concorrência ocorre também a nível judicial: Com efeito, os tribunais socorrem-se, por
vezes, da concorrência como critério ou padrão de apreciação da legalidade de decisões e procedimentos das entidades
adjudicantes.

46.2 Princípio da Prossecução do Interesse Público


A europeização do direito da contratação pública determinou a acentuação dos valores da concorrência, da
transparência, da igualdade e da não-discriminação e uma relativa secundarização da prossecução do interesse público.
Historicamente, a regulamentação da contratação pública sempre esteve marcada por uma lógica de boa utilização dos
dinheiros públicos. E, embora outros valores assumam relevância crescente, a realização de interesses públicos continua
a orientar a contratação pública, sobretudo a realização do interesse público financeiro. Daí a célebre expressão: “Best
Value for Money”: pretende-se obter o melhor “negócio” para o dinheiro público, de modo que este nunca seja mal
empregue.
Não só uma dimensão financeira integra o interesse público. No âmbito da contratação pública estratégica (como
instrumento de regulação pública e de implementação de políticas públicas) assumem-se como valores fulcrais: a
inovação tecnológica, a sustentabilidade, as políticas sociais e ambientais e apoio às pequenas e médias empresas.

46.3 Princípio da Igualdade e o Princípio da não-discriminação


O princípio da não-discriminação (não referenciado no CCP) constitui uma específica expressão do princípio da
igualdade de tratamento, conferindo especial enfoque à ideia de não-discriminação em razão da nacionalidade.
De notar, que algumas das dimensões do princípio da igualdade encontram-se abrangidas pelo princípio da concorrência,
na sua vertente de “concorrência-igualdade”.
Deste modo, o princípio da igualdade tem incidência quanto aos seguintes aspetos:
o Acesso aos procedimentos de adjudicação: os concorrentes devem ser tratados de igual forma na apresentação,
comparação e avaliação das propostas, devendo ser-lhes aplicáveis as mesmas regras e condições – relevância no
domínio dos procedimentos pré-contratuais;
o Tratamento dos concorrentes nos procedimentos de adjudicação: os concursos não podem ser organizados no
intuito de reduzir artificialmente a concorrência, isto é, de favorecer indevidamente um ou outro operador
económico (art. 18º/1,2ªparte), ou seja, proíbe-se o favorecimento ou desfavorecimento indevido – relevância no
domínio dos procedimentos de formação de contratos públicos.

O que foi dito não obsta a que a nossa lei admita “contratos reservados” (arts. 20º e 77º CCP). Sucede, porém, que estas
são hipóteses em que o desvio ao princípio da igualdade é legítimo, pelo que a redução da concorrência não se afigura
como “indevida”. Aliás, nestes casos há um desvio à igualdade no acesso aos procedimentos, mas já não à igualdade de
tratamento dos concorrentes.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

NOTA: O princípio da igualdade, em conjugação com o princípio da concorrência, projeta-se ainda em outros princípios
da contratação pública: comparabilidade e imodificabilidade das propostas, estabilidade objetiva (das peças do
procedimento) e subjetiva (dos candidatos e concorrentes).

46.4 Princípio da Transparência


O princípio da transparência tem como finalidade garantir a ausência de qualquer risco de favoritismo ou de arbítrio por
parte da entidade adjudicante. De facto, este princípio implica que todas as condições e modalidades do procedimento
de adjudicação sejam formuladas de forma clara, precisa e unívoca no anúncio ou nas peças do procedimento (i.é. não
ambíguas). Ademais, este princípio impõe ainda que todas as informações técnicas necessárias à boa compreensão do
anúncio e das peças do procedimento sejam disponibilizadas a todos os participantes.
Do que foi dito resulta um dado incontornável: o princípio da transparência cumpre uma função importante na
prevenção de conflitos de interesse e de eventuais violações do princípio da imparcialidade (ver art. 1º-A, nº3). O
respeito pelas exigências da transparência traduzir-se-á numa evidente redução da conflitualidade.
Um instrumento fundamental para assegurar a transparência é a publicidade, seja ela dirigida aos participantes ou ao
público em geral. Logo, tem de haver uma publicidade das peças do procedimento (ex: anúncio do procedimento,
programa do procedimento, caderno de encargos, …). Esta publicitação das peças do procedimento é realizada na
plataforma eletrónica da entidade adjudicante. Tem também de haver publicitação do anúncio do procedimento no
Diário da República e, quando se imponha em função do valor do contrato a celebrar no Jornal Oficial da UE (JOUE).
Uma refração essencial da transparência é o dever de fundamentação das decisões adotadas nos procedimentos de
formação dos contratos, sobretudo o dever de fundamentação da decisão de adjudicação, desde o início do
procedimento (art. 36º a 38ºCCP) até à decisão de adjudicação (art. 73º), incluindo a decisão de não adjudicação (art.
79º) e a revogação da decisão de contratar (art. 80º). Revisão de 2017 alargou consideravelmente o dever de fundamentação de decisões
das entidades adjudicantes.
Concluindo, as regras do procedimento e as informações técnicas disponibilizadas devem ser claras e precisas, de forma a
possibilitar uma compreensão razoável e uniforme entre todos os interessados/operadores económicos, ficando estes em
igualdade de condições para apresentar candidaturas ou propostas em conformidade com essas regras.

46.5 Princípio da Imparcialidade


Encontra-se referenciado no art. 1º-A, nº3 CCP (art. 9º+ art. 69º a 76º do CPA) e no art. 1º-A, nº4 CCP.
Decorre deste princípio a obrigação, para a entidade adjudicante, de tratar de forma imparcial todos os interessados,
candidatos e concorrentes, devendo considerar com objetividade todos e apenas os interesses relevantes no contexto
decisório e adotando as soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção
administrativa e à confiança nessa isenção (art. 9º CPA, aqui aplicável por ser assumir como um princípio geral da
atividade administrativa).
Por força do princípio da imparcialidade aplica-se aos procedimentos de formação de contratos (aos membros do júri e
titulares do órgão adjudicante) o sistema de impedimentos e de suspeições previsto no CPA – arts. 69º a 76º.
Ou seja, há um grau máximo de vinculação para o júri dos procedimentos, para o órgão decisor da entidade adjudicante e
para os peritos que auxiliam o júri. Sendo que estes, antes do inicio de funções, tem de subscrever uma declaração de
inexistência de conflito de interesses (art. 67º/5 CCP)
A revisão de 2017 introduziu no CCP o tema dos conflitos de interesses e criou obrigações específicas para os membros dos júris dos
procedimentos.

46.6 Princípio da Proporcionalidade


Este principio determina que as entidades adjudicantes adotem comportamentos adequados e proporcionados aos fins
prosseguidos.
Como ensina a doutrina, o princípio da proporcionalidade inclui uma tripla exigência:
1. Adequação: o comportamento adotado pela entidade adjudicante deve ser adequado aos fins prosseguidos;
2. Exigibilidade: o comportamento da entidade adjudicante deve ser, in casu, o menos oneroso/gravoso;
3. Proporcionalidade em sentido estrito (relação proporcionada entre custos e benefícios): o comportamento
adotado deve acarretar benefícios ponderadamente superiores aos custos implicados.
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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

O princípio encontra-se referenciado, em termos gerais no CCP, no art. 1º-A, nº1, e conhece concretizações em vários
preceitos como, por exemplo:

Proporcionalidade na fixação dos requisitos de acesso aos procedimentos de adjudicação dos Contratos Públicos, p.e.:
• Na definição dos requisitos mínimos da capacidade técnica no concurso limitado por prévia qualificação, os quais
“devem ser adequados à natureza das prestações objeto do contrato a celebrar” – art. 165º/1 CCP;
• E na definição dos requisitos mínimos da capacidade financeira também no concurso limitado por prévia
qualificação, que “não podem exceder o dobro do valor do contrato, salvo …” – art. 165º/3 CCP.

Proporcionalidade em matéria de impedimentos, de forma a evitar a exclusão (desproporcionada) dos concorrentes: p.e.
só deverão ser excluídas entidades – singulares ou coletivas – que “estejam abrangidas por conflito de intresses que não
possam ser eficazmente corrigidos por outras medidas menos gravosas que a exclusão” – art. 55º/1/k, conjugado com o
nº2 do mesmo art.

O princípio da proporcionalidade pode ser a porta de entrada (integração) das preocupações concorrenciais na
contratação pública: a proporcionalidade pode ser considerada como parâmetro para aferir se as condutas das entidades
adjudicantes são excessiva ou desproporcionadamente lesivas da concorrência. O que se pretende nesta sede é
averiguar se, em condições normais de aplicação do direito da concorrência (portanto, em relações entre particulares),
uma conduta semelhante àquela que foi levada a cabo por uma entidade adjudicante seria ou não classificada como
abuso de posição dominante (tendo sido praticada por um particular). A conduta de uma entidade adjudicante que
constitua abuso de posição dominante à face do direito da concorrência será, seguramente, uma conduta excessiva,
violadora do princípio da proporcionalidade (proibição do excesso). Ou seja, o princípio da proporcionalidade pode
constituir um critério para aferir e reprimir casos de “abuso de posição adjudicante”.

46.7 Princípio da Legalidade e o Princípio da Discricionariedade


A legalidade constitui um princípio geral da contratação pública. Sendo que as entidades adjudicantes estão vinculadas à
legalidade e à juridicidade (art. 1º-A CCP e 3º CPA).
Toda a intervenção da Administração Pública, inclusivamente em matéria de contratação pública (escolha do procedimento
de adjudicação e estrutura da tramitação procedimental, p.e.), deve ser feita em obediência à lei, ou pelo menos com um padrão
normativo estabelecido. Não obstante, isto não significa que se retire à Administração toda e qualquer liberdade de
atuação. À entidade adjudicante reconhece-se, de facto, uma margem de discricionariedade – uma discricionariedade de
conformação normativa = liberdade de definir, dentro dos limites impostos na lei, as regras do procedimento, a qual é
patente, sobretudo, na escolha do procedimento a seguir e no estabelecimentos dos requisitos de participação e dos
critérios de adjudicação. Ou seja, opera especialmente na definição das regras do procedimento, designadamente no
programa do procedimento (art. 41º CCP) e no estabelecimento das cláusulas a incluir no contrato a celebrar através do
caderno de encargos (art. 42º/1 CCP).
Sendo que esta discricionariedade não opera tanto no patamar das decisões concretas do procedimento, as quais, em
geral, têm de se conformar com regras (legais e regulamentares) preestabelecidas. Portanto, a legalidade assume maior
força no patamar decisório. Há um dever de fundamentação das concretas decisões que concretizam a lei ou as regras
adotadas pela entidade adjudicante e controlo jurisdicional destas decisões (em relação com o contencioso pré-contratual
urgente).
Todavia, também no que diz respeito à tramitação procedimental se verifica uma acentuada intrusão legislativa. Desta
forma, o legislador veio retirar, em certa medida, da esfera da entidade adjudicante o poder de definir a tramitação
procedimental, reduzindo assim o âmbito da discricionariedade regulamentar (poventura na convicção de que esta maior
densidade da lei é recomendada pela natureza de um procedimento que acolhe pretensões concorrentes e em que tem de assegurar a escolha da
melhor proposta).
Uma outra dimensão da discricionariedade – discricionariedade estratégica: exprime-se em muitas decisões estratégicas
das entidades adjudicantes, a começar pela decisão de contratar (decidir se devem ser incluídas externalidades
ambientais ou sociais no facto de adjudicação ou o custo do ciclo de vida do produto ou serviço, adjudicar por lotes, etc.);
esta discricionariedade apresentar especificidades no âmbito da contratação pública.

Observe-se, por fim, que, com a revisão de 2017, se verificou um aumento significativo das normas que definem em termos vagos e
imprecisos os pressupostos de decisões dos órgãos adjudicantes. Por exemplo, ocorre com as decisões sobre a adjudicação de lotes e

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

a verificação de casos de impedimentos. Nestes casos, o CCP onera a entidade adjudicante com deveres específicos de
fundamentação. Ou seja, sem a exigência de fundamentação, tais decisões não teriam sequer autonomia procedimental - casos da
fundamentação das decisões de não adjudicação por lotes (art. 46º-A/2 ou da não fixação do preço base (art. 47º/2). Apesar da
indeterminação das normas, o juízo do órgão competente para as aplicar não deve considerar-se discricionário, designadamente
quando esteja e causa uma apreciação que se deva efetuar segundo critérios jurídicos (apreciação sobre a execução de contratos de
forma deficiente).

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

CAPÍTULO III » PROCEDIMENTO DE ADJUDICAÇÃO DE CONTRATOS PÚBLICOS

O procedimento de adjudicação de CP’s regulado na Parte II do CCP é um procedimento complexo, que integra vários
procedimentos (ou sub-procedimentos), entre os quais o procedimento de adjudicação.
Note-se, que o próprio procedimento de adjudicação também integra vários procedimentos, com a sua tramitação
própria, com o seu próprio ato principal (ex: decisão de contratar, aprovação das peças do procedimento) e que se encaixam,
numa sequência ordenada, dentro da “operação faseada” ou procedimento amplo e complexo de formação de um CP.
O ato principal do procedimento (complexo) de adjudicação é a decisão de adjudicação.

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

SUJEITOS do procedimento de adjudicação

47. Entidades adjudicantes


Encontram-se indicadas no art. 2º e 7º CCP. Todas têm personalidade jurídica. Só não é assim no caso das centrais de
compras.

48. Agrupamento de entidades adjudicantes (art. 39º CCP)


Conjunto ou agregação das entidades que se agrupam, ao qual não corresponde qualquer exigência de formalização.
Pode ser um agrupamento de entidades nacionais OU de entidades nacionais e de entidades de outro(s) EM’s da UE – art.
39º.
O agrupamento não tem órgãos ou estruturas próprias, limitando-se o CCP a exigir, de entre as entidades adjudicantes
agrupadas, a designação de uma delas como representante do agrupamento (39º/2).
Posto isto, esta contratação conjunta pode dever-se a:
− Interesses indivisíveis: contratos de aluguer de equipamento por duas entidades que se juntam para realizar uma
feira.
− Interesses convergentes/paralelos: contrato de empreitada de duas freguesias para o pavimentação de um troço
de estrada pertencente, em parte, a uma e, noutra parte, a outra.
As entidades podem agrupar-se com vista à … (art. 39º/1)
Ver ainda nº 3 (decisões a tomar) e nº 6 (responsabilidade solidária).

49. Órgão adjudicante: órgão competente para a decisão de contratar (art. 36º)
É o órgão da entidade adjudicante ao qual o CCP atribui a responsabilidade de proferir todas as decisões fundamentais e a
maior parte das decisões de procedimento de adjudicação.
Competente para a decisão de contratar é o órgão indicado na lei orgânica ou nos estatutos da entidade adjudicante
(36º/2).
Quando o contrato envolve o pagamento de um preço, o CCP esclarece que essa competência cabe então ao órgão
competente para autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar (36º/1) – regra geral.
Evidentemente, se os estatutos da entidade adjudicante dispuserem em sentido diverso, então é esse o regime aplicável
(e já não aquele art. 36º/1 CCP).
Ao “órgão competente para a decisão de contratar” o CCP confere um conjunto vasto de competências. Devido a essa
vastidão do elenco de competências que lhe são atribuídas denominamos o órgão competente para a decisão de
contratar como órgão adjudicante (pois, no fundo, é ele que toma a grande maioria das decisões, inclusivamente a
decisão de adjudicação).
O órgão adjudicante é o órgão decisor; órgão da entidade adjudicante competente para tomar as decisões
principais/fundamentais do procedimento de adjudicação (desde a decisão de contratar (para satisfazer uma certa
necessidade) até à decisão de adjudicação), ou seja, compete-lhe, em geral, a tomada de todas as decisões que tenham
ou possam ter efeitos externos no procedimento. Fora do seu domínio ficam de fora, num primeiro momento, apenas as
competências próprias do júri do procedimento.

Atente-se, então, concretamente nas COMPETÊNCIAS do órgão adjudicante:


• Decisão de contratar (art. 36º CCP), atribuída pela lei ou estatutos da entidade adjudicante (e não pelo CCP);
• Decisão de escolha do procedimento (art. 38º CCP);
• Prestação de esclarecimentos aos interessados sobre as peças do procedimento, oficiosamente ou a pedido
daqueles (art. 50.º, nº5/a), e o n.º 7 CCP);
• Pronúncia sobre os erros e omissões identificados pelos interessados e, quando os aceite, a indicação dos
respectivos termos de suprimento (art. 50.º, n.º 5/b), e o n.º 6 CCP);
• Rectificação/alteração das peças do procedimento e suprimento de erros ou omissões das peças do
procedimento (art. 50.º, n.º 5/b), e n.ºs 6 e 7, e art. 64.º/ 1 CCP);
• Decisão sobre a prorrogação do prazo de apresentação de propostas (art. 64.º/4 CCP);
• Designação do júri do procedimento e de (eventuais) peritos ou consultores (art. 67.º/ 1, e 68.º/6 CCP);

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Contratos Públicos 2017/2018 Cátia Fernandes

• Decisões de qualificação ou de exclusão de candidaturas, sob proposta do júri do procedimento, constante do


relatório final da fase de qualificação (art. 168.º/4 CCP);
• Decisões de ordenação ou de exclusão de propostas, sob proposta do júri do procedimento, constante de
relatório deste (art. 124.º/4, e 148.º/4);
• Decisão de não adjudicação (art. 79.º CCP);
• Decisão sobre a dispensa da redução do contrato a escrito (art. 95.º/2 CCP);
• Decisão de apresentação de ajustamentos ao conteúdo do contrato a celebrar (art. 99.º/1 CCP);
• Decisão sobre a aprovação da minuta do contrato (art. 98.º/1 CCP) e representação da entidade adjudicante na
outorga do contrato (artigo 106.º/1 CCP);
• Apreciação e decisão de impugnações administrativas (art. 274.º CCP).

Delegação de competências pelo órgão adjudicante (art. 109º):


O art. 109º/1 não indica possíveis órgãos delegatários, ao contrário do que sucede com a delegação prevista no respetivo
nº2.
Pela conjugação do art. 109º/1 e 69º/2, o órgão adjudicante encontra-se habilitado a delegar no júri do procedimento
todas as competências que lhe são atribuídas pelo CCP, com exceção das competências indelegáveis (constantes no art.
69º/2), bem como daquelas que o orgão adjudicante exercer previamente (como a decisão de contratar, a decisão de
escolha do procedimento e a aprovação das peças do procedimento).
Art. 109º/3 – salvo reserva feita no próprio ato de delegação, a delegação da competência para a decisão de contratar
implica a delegação em bloco de todas as competências que o CCP atribui ao órgão adjudicante, incluindo, neste caso, as
do nº2, do art. 69º (nos termos do CCP, estas competências só não podem ser delegadas no júri do procedimento).
Ex: uma lei habilita um determinado órgão (presidente da câmara municipal) em relação aos contratos do município, a
efetuar a delegação da sua competência para a decisão de contratar num outro órgão (vereador). Essa delegação, por
força do 109º/3 arrasta, em bloco, todas as competências que o CCP atribui ao órgão competente para a decisão de
contratar.

50. Júri do Procedimento


O júri do procedimento constitui um órgão administrativo interno (da entidade adjudicante) e temporário (art. 20º/2
CPA), constituído ad hoc para cada concreto procedimento. A lei confere a este órgão, em termos genéricos, a função de
“conduzir o procedimento” (art. 67º/1 CCP).

Júri como órgão responsável pela instrução do procedimento:


Embora não se revele claramente a sua natureza, o júri pode considerar-se o órgão instrutor do procedimento de
adjudicação. De facto, é ao júri que cabe a direção da instrução do procedimento (competência própria do júri), ainda
que não lhe seja atribuída qualquer função decisória final. Não cabe ao júri adotar decisões com efeitos externos, mas
antes uma tarefa procedimental – a tarefa de preparar as decisões finais e externas que outro órgão irá tomar (salvo a
existência de delegação de competências deste no júri).
Uma outra nota de relevo na caraterização do júri do procedimento é a de que este é um órgão funcionalmente
independente, já que não se encontra hierarquicamente subordinado a nenhum outro e, no exercício das suas
competências próprias, não deve obediência a ordens, instruções ou diretivas de órgão adjudicante ou de outros órgãos.
Todavia, este princípio da independência não deve ser considerado de forma absoluta:
• As deliberações do júri são impugnáveis para o órgão adjudicante (arts. 267º e ss. CCP, em particular o 271º/2) »
o órgão adjudicante poderá, no seguimento do recurso administrativo, anular e revogar as deliberações tomadas
pelo júri, no exercício das competências delegadas ou próprias;
• As competências que o júri exerce ao abrigo de delegação do órgão adjudicante são exercidas no contexto de uma
relação de supremacia jurídica do delegante (relação de delegação – art. 49º CPA);
• Os titulares do órgão adjudicante podem ser membros do júri (67º/2), mas com a consequência prevista no art.
69º/1/d CPA, ficando impedidos de participar, naquela qualidade, na tomada das decisões propostas pelo júri.

Regra da existência obrigatória do júri; exceções à regra (art. 67º):


O júri é um órgão de existência obrigatória em todos os procedimentos de adjudicação. Contudo, esta regra tem
exceções:

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• Art. 67º/1 – Procedimento do ajuste direto » procedimento em que é apenas convidada uma entidade e em que,
por isso, haverá lugar à apresentação de apenas uma proposta (112º/2). Deste modo, há a dispensa de várias
diligências procedimentais da competência normal do juri (elaboração de relatórios, realização de audiência
previa).
• Art. 67º/3 – Decisão do órgão adjudicante » o serviço da entidade adjudicante substitui o júri e todas as
referencias do CCP ao júri devem considerar-se feitas pelo júri.
• Art. 67º/4 – Dispensa do júri » nos casos em que só é apresentada uma proposta. Esta dispensa ocorre já dentro
do procedimento, após o decurso do prazo de apresentação de propostas; sendo que isto não altera a tramitação
normal, salvo no caso do art. 125º/2 (proc consulta prévia).

Quando não exista júri ou este seja dispensado, deverá haver lugar à designação de um responsável do procedimento,
nos termos do art. 55º CPA.

Composição e funcionamento do júri:


O júri apresenta-se como órgão administrativo plural, com um mínimo de três membros efetivos e dois suplentes, todos
designados pelo órgão adjudicante (art. 67º/1 CCP).
Se um titular do órgão adjudicante integrar o júri ficará impedido de participar como titular do órgão adjudicante na
tomada de decisões sobre as propostas do júri, por força do art. 69º/1/d) CPA.
O CCP não define quaisquer exigências de competência técnica, profissional ou de habilitação dos membros do júri; e
também não indica a origem dos membros do júri, salvo no caso no art. 67º/2.
Ver art. 68º (funcionamento). Havendo a faculdade de indicar peritos ou consultores (68º/6).

Competências (próprias) do júri:


A existência do júri do procedimento traduz o intuito do legislador de separar a instrução do procedimento de
adjudicação, enquanto tarefa de natureza técnica e instrumental, da tomada de decisões finais, que definem a situação
jurídica dos intervenientes no procedimento.
Assim, se ao júri incumbe a condução da instrução, então as suas competências reconduzem-se à prática de atos
instrumentais, que desenvolvem uma função procedimental de preparação das decisões a tomar pelo órgão
adjudicante:
o Competências indicadas no art. 69º/1 CCP;
o Publicitação da lista de candidatos ou concorrentes (arts. 177º/1 e 138º/1 CCP);
o Apreciar e decidir as reclamações de candidatos ou concorrentes não incluídos nas listas e fixar novos prazos de
apresentação de propostas e candidaturas. Neste caso (único no CCP), o júri, ao decidir as reclamações, toma uma
decisão com eficácia externa, que pode ser objeto de reclamação facultativa para o próprio júri ou de recurso
administrativo para o órgão adjudicante (arts. 177º/3 e 4; 138º/3 e 4; 269º; 271º/2 CCP);
o Conduzir as negociações ou o diálogo (arts. 118º, 149º, 201º, 213º CCP), quando eles tiverem lugar.
o Realizar audiências prévias dos candidatos ou concorrentes;
o Solicitar o suprimento de irregularidades das candidaturas e das propostas e proceder oficiosamente à retificação
de erros de escrita ou calculo que as mesmas contenham (art. 72º/3 e 4);
o Solicitar esclarecimentos aos candidatos ou concorrentes sobre as respetivas candidaturas ou propostas (art.
183º/1 e 72º/1).

A revisão de 2017 do CCP confirmou que é ao órgão adjudicante que, no convite ou no programa do procedimento, cabe definir o
critério de desempate na avaliação das propostas (74º/4).

Competências delegáveis pelo órgão adjudicante no júri:


O júri do procedimento tem competências próprias, mas, além destas, podem ser-lhe delegadas competências do órgão
adjudicante – art. 69º/2 »» função de norma de habilitação, juntamente com o art. 109º/1.

Competências do órgão adjudicante que são indelegáveis no júri do procedimento:


• Retificação das peças do procedimento, ou seja, retificação, alteração e suprimento de erros ou omissões
detetados pelos interessados e aceites pelo órgão adjudicante ou detetados e retificados oficiosamente por este
(art. 50º, nº5/b; nº6 e nº7);
• Decisões sobre erros ou omissões identificados pelos interessados: estes podem dar origem à retificação das
peças do procedimento OU podem ser rejeitados expressa ou tacitamente, nos termos do art. 50º/5/b – para que
o órgão adjudicante assuma sempre a responsabilidade sobre as decisões relacionadas com erros e omissões das
peças do procedimento, quer para as corrigir, quer para manter o que nelas se estabelece;

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• Decisão de qualificação dos candidatos (art. 187º e 188º);


• Decisão de adjudicação – decisão de aprovação de todas as propostas que constam no relatório final do juri para
efeitos de adjudicação (art. 124º/4 e 148º/4), o que inclui a decisão sobre a ordenação e sobre a exclusão das
propostas;
• Decisão de seleção das propostas ou dos concorrentes para a fase de negociação (art. 148º/4 e 149º/2)
• Competências para a tomada de decisões antes da entrada em funções do júri ou após a cessação das suas
funções (competências indelegáveis por impossibilidade).

Publicitação da delegação de competências:


Basta a indicação nas peças do procedimento das competências (delegadas) que o júri exerce no âmbito daquele
procedimento.
Logo, a delegação de competências no júri não tem de ser publicada, como exige, em geral, o art. 47º/2 CPA.

Note-se, que esta possibilidade de delegação não promove um alargamento do domínio de intervenção do júri tão extenso
quanto se poderia deduzir da lei, uma vez que, por um lado, há as competências indelegáveis e, por outro, as
competências próprias do júri.

Natureza Jurídica das deliberações do júri:


Em geral, as deliberações do júri são atos de efeitos jurídicos internos, que produzem um resultado consumido dentro do
procedimento de adjudicação e que irradiam os seus efeitos para as decisões que preparam (estas com efeitos jurídicos
em relação aos candidatos/concorrentes), da competência do órgão adjudicante. Deste modo, o júri é um órgão interno,
em geral, que desenvolve competências com efeitos procedimentais, de preparação de decisões do órgão adjudicante,
desprovidos da capacidade de, por si mesmas, atingirem direta e imediatamente a esfera jurídica dos
candidatos/concorrentes (art. 138º/4 e 177º/4) – neste caso, o júri exerce uma competência decisória própria que atinge,
de forma direta e imediata, o reclamante, considerando-o incluído ou excluído da lista.
A deliberação fundamental do júri consiste na aprovação do designado relatório final (art. 124º, 148º, 186º). Este é
elaborado após a audiência prévia dos concorrentes e o relatório preliminar, o júri procede à ordenação das propostas e
propõe a exclusão das propostas (se houver motivos) » relatório do responsável pela direção do procedimento (a que se
refere o art. 126º CPA). Neste documento são condensados todos os resultados da ação instrutória do júri. Este é um ato
instrumental pré-decisório, obrigatório, mas não vinculativo: embora o órgão adjudicante não possa decidir sem o
relatório do júri (caráter obrigatório do relatório), não lhe é vedado decidir em termos diversos dos constantes do relatório
(efeito não vinculativo do relatório).
O que foi dito decorre da letra da lei (arts. 124º/4, 148º/4 e 186º/4 CCP), mas, mesmo que assim não fosse, sempre
resultaria da própria ratio que subjaz à opção do legislador com a imposição da criação deste órgão.
Efetivamente, a lei efetua uma separação orgânica explícita:
Procedimento de adjudicação:
➢ Competências de instrução: atos instrumentais (sem efeitos externos vinculativos) » Júri do procedimento –
propõe.
➢ Competências de decisão: atos decisórios finais (com efeitos externos vnculativos) » Órgão Adjudicante –
decide se aceita ou rejeita todas ou algumas propostas do relatório.

Se o órgão adjudicante discorda/desconfia do bem fundado das propostas constantes do relatório pode acontecer
uma destas alternativas:
• Devolução do relatório ao júri, para que este proceda à revisão do mesmo;
• OU Efetivação da revisão pelo próprio órgão adjudicante.
Nestes casos de discricionariedade de apreciação ou avaliação, é o órgão adjudicante quem deve ter a ultima palavra,
pois é este que tem o poder, decorrente da lei, de formular o juízo discricionário (órgão adjudicante assume como
suas as referidas propostas).

Concluindo, o júri apenas é titular de competências para a prática de atos instrutórios, destinados à preparação das
decisões do órgão adjudicante, destacando-se, entre estes, o relatório final do procedimento, que contém o resumo
final do procedimento, a proposta de adjudicação e a respetiva fundamentação. Consequentemente, as deliberações
do júri apenas produzem efeitos internos (isto é, efeitos dentro do procedimento a que digam respeito); são meros atos
preparatórios das decisões do órgão adjudicante.

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Impugnações das deliberações do júri:


As deliberações do júri do procedimento são suscetíveis de impugnação para o próprio júri, bem como suscetíveis de
recurso administrativo para o orgão adjudicante (art. 271º/2).
O recurso administrativo pode ter por objeto deliberações tomadas pelo júri no exercício de competências próprias. Tais
deliberações correspondem a atos internos e preparatóriosm com efeitos jurídicos que se esgotam dentro do
procedimento (não sendo, por isso, suscetíveis de impugnação judicial). Ac. Do TCAS de 4/10/2012, Proc. 09099/12.
Esta regra da insuscetibilidade de impugnação judicial não se aplica no caso das deliberações do júri sobre a não inclusão
de interessados nas listas de candidatos/concorrentes, que representam decisões externas, com efeitos diretos e
imediatos e, portanto, atos impugnáveis, nos termos do art. 51ºCPTA.

Garantias de imparcialidade na atuação do júri:


A revisão de 2017 veio exigir que, antes do inicio de funções, os membros do júri e todos os demais intervenientes no
processo de avaliação de propostas (designados no art. 68º/6), têm de subscrever declaração de inexistência de conflito
de interesses, conforme modelo previsto no anexo XIII ao CCP.
Os membros do júri estão, nesta sua condição sujeitos ao regime de impedimentos do art. 69º CPA. Tratando-se de um
órgão ad hoc, a verificação de uma situação de impedimento deve conduzir à substituição do referido membro do júri.

Caso especial do júri dos concursos de conceção de ideias:


Excecionalmente, nestes procedimentos as deliberações do júri têm caráter vinculativo para a entidade adjudicante (art.
219º-E/3).
Ver ainda: Arts. 219º-D/1/d; 219º-E/2; 219º-I/1.

51. Entidades Gestoras de plataformas eletrónicas


Com exceção do ajuste direto e da consulta prévia, a regra instituída pelo CCP é a da tramitação eletrónica obrigatória dos
procedimentos de adjudicação, ou seja, em vez do suporte físico (papel) emprega-se meios informáticos e eletrónicos na
tramitação do procedimento.
Deste modo, todos os atos de incidência procedimental dos sujeitos do procedimento têm de ser comunicados,
divulgados ou publicitados com recurso a meios eletrónicos.
Esta opção legislativa de desmaterialização dos procedimentos de adjudicação implica a utilização de insfraestruturas
eletrónicas específicas. Neste sentido, quando pretendam celebrar contratos, as entidades adjudicantes t~em de aceder,
de utilizar e de disponibilizar aos interessados a essas infraestruturas » “modelo de mercado”, de outsourcing » as
entidades adjudicantes têm de adquirir, no mercado, os serviços de plataformas eletrónicas prestados por empresas
gestoras de plataformas eletrónicas (art. 5º Lei Plataformas eletrónicas).
Logo, há um modelo de liberdade de instalaçã e de prestação de serviços de plataformas eletrónicas – entidades
adjudicantes podem escolher, no mercado, as plataformas que utilizam para a tramitação de procedimentos de
adjudicação de CP’s. Sendo certo que há uma interligação e interoperabilidade entre as várias infraestruturas existentes
no mercado (pluralidade de plataformas eletrónicas).
Ver arts. 15º, 13º, 60º, 20º e 22º, 23º e 24º, 54º da Lei Plataformas eletrónicas.

52. Interessados
CCP  CPA (art. 65º/2)
Os conceitos jurídicos mais comuns para referenciar os atores principais do procedimento de adjudicação são os de
candidatos e concorrentes. Estes constituem duas categorias de interessados, que participam no procedimento de
adjudicação mediante a apresentação de uma candidatura e de uma proposta (art. 52º e 53º).
Mas o CCP também recorre ao conceito “interessados” para identificar quaisquer entidades que têm a pretensão de
intervir e que intervêm mesmo no procedimento de adjudicação.
A Lei das plataformas eletrónicas define “interessados” no art. 2º/c.
Contudo, são vários os preceitos que no CCP se referem a interessados, indicando entidades que não são (ou ainda não
são) candidatos ou concorrentes: arts. 50º/1; 64º/3; 66º/1; 138º/3.
Uma outra categoria particular de interessados é constituída por aqueles que, em resposta/sequência de anúncios que
convidem à manifestação de interesse em participar num procedimento, tenham apresentado à entidade adjudicante essa
manifestação de interesse: arts. 250º-B/1/b; 35º, 167º/3 a 6.

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Esta manifestação de interesse pelo operador económico é uma declaração que corresponde à solicitação de um convite
dirigida à entidade adjudicante – art. 167º - interessados tem o direito ao convite para apresentação de
candidatura/proposta.

53. Candidatos e Concorrentes; agrupamentos


Os candidatos e concorrentes são “interessados com estatuto específico” nos procedimentos de adjudicação. A destrinça
entre as duas figuras reconduz-se à distinção entre procedimentos unifásicos e bifásicos:
• Procedimentos unifásicos: não compreendem uma fase de qualificação prévia;
• Procedimentos bifásicos: compreendem uma fase de candidatura e de qualificação prévia, anterior à fase de
proposta e adjudicação, na qual participam os operadores económicos que tenham sido qualificados na 1ªfase.
Assim, nestes procedimentos, os interessados apresentam a candidatura e são, portanto, candidatos.

Dentro da fase da instrução (que integra a fase preparatória), individualizam-se duas sub-fases:
1. Fase de candidatura e qualificação: destinada à apresentação de candidaturas, para efeitos de qualificação dos
candidatos;
2. Fase de proposta e adjudicação: destinada à apresentação de propostas e adjudicação de uma proposta, de entre as
que sejam apresentadas pelos concorrentes.

Com base no exposto, já se compreende os termos da destrinça que ora nos ocupa:
» CANDIDATOS (art. 52º): sujeitos que apresentam uma candidatura; são os interessados que participam na 1ªfase (de
candidatura e qualificação) dos procedimentos bifásicos. Ou seja, é candidato a entidade (pessoa singular ou coletiva)
que participa na fase de qualificação de um concurso limitado por prévia qualificação, de um procedimento de
negociação, de um diálogo concorrencial ou de uma parceria para a inovação, mediante a apresentação de uma
candidatura.
» CONCORRENTES (art. 53º): sujeitos que apresentam uma proposta; são os interessados que participam nos
procedimentos unifásicos e na 2ªfase dos procedimentos bifásicos. Ou seja, é concorrente a entidade (pessoa singular ou
coletiva) que participa em qualquer procedimento de formação de um contrato, mediante a apresentação de uma
proposta.

Os candidatos e concorrentes podem ser pessoas singulares ou pessoas coletivas (entidades com personalidade jurídica),
podendo ainda constituir-se AGRUPAMENTOS DE PESSOAS SINGULARES OU COLETIVAS sem que entre elas exista
qualquer modalidade jurídica de associação (art. 54º/1) – o agrupamento constitui, portanto, uma “associação informal”.
Nestes casos, apesar da falta de personalidade jurídica, a lei considera o próprio agrupamento como candidato ou
concorrente. Em caso de adjudicação, todos os membros do agrupamento, e apenas estes, devem associar-se, antes da
celebração do contrato, na modalidade jurídica prevista no programa do procedimento (art. 54º/4 CCP). Se a associação
não se der nestes termos, haverá caducidade da adjudicação (art. 105º/1 CCP). Refira-se que, sendo constituída a
associação nos termos do programa do procedimento, gera-se para os membros do agrupamento uma obrigação de
permanência na nova entidade (art. 54º/4 CCP). Na hipótese de um membro pretender abandoná-la, deve exigir-se
autorização do contraente público, nos mesmos termos em que se exige a autorização da cessão da posição contratual
(arts. 318º/1 e 319º/1 CC – aplicados analogicamente).
Logo, os agrupamentos podem ser candidatos ou concorrentes agrupamentos de pessoas singulares ou coletivas,
qualquer que seja a atividade por elas exercida, sem que entre as mesmas exista qualquer modalidade jurídica de
associação.

54. Adjudicatário (art. 73º)


O adjudicatário é o concorrente cuja proposta foi aceite ou escolhida pelo órgão adjudicante. Em princípio, o
adjudicatário será a contraparte no contrato a celebrar com a entidade adjudicante (art. 104º CCP).
No entanto, este princípio pode sofrer desvios por diversas causas, previstas na lei:
− O adjudicatário não comparece à outorga do contrato;
− A adjudicação caduca (arts. 86º, 87º, 91º, 93º e 105º CCP);
− O agrupamento concorrente passa a constituir uma associação nova (art. 54º/4 CCP).

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INÍCIO DO PROCEDIMENTO DE FORMAÇÃO DE CP’S (art. 36º)


O procedimento de formação de qualquer contrato inicia-se com a decisão de contratar, a qual deve ser fundamentada e
cabe ao órgão competente para autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar, podendo essa decisão estar
implícita nesta última (art. 36.º/1 CCP).

DECISÃO DE CONTRATAR
A decisão de contratar é, simultaneamente, ato inicial e ato final: inicia o procedimento de formação de um contrato
público e finda o procedimento prévio no qual a entidade adjudicante verifica a existência de uma determinada
necessidade. Isto corrobora o que temos vindo a dizer: o procedimento de formação do contrato não pode ser visto como
um momento estático e isolado, ele tem antecedentes e terá uma fase subsequente de execução.
Em qualquer caso, a decisão de contratar deve delimitar o conteúdo do contrato a celebrar: o art. 98º/3 CCP estabelece
um “imperativo de conformidade” entre o conteúdo do contrato e a decisão de contratar. Isto significa que o contrato
que venha a ser celebrado deve ser conforme com as linhas orientadoras estabelecidas na decisão de contratar.
Num caso excecional a decisão de contratar não se revela autónoma nem previamente ao procedimento de adjudicação –
é o caso do “regime simplificado de ajuste direto” (art. 128º CCP).

58. Preparação da decisão de contratar


A decisão de contratar é o resultado de ponderações acerca dos seguintes aspetos:
• Despesa exigida pelo contrato;
• Necessidade de contratar;
• Idoneidade do contrato projetado para satisfazer a necessidade.

Na linguagem própria da análise económica do direito, pode dizer-se que a decisão de contratar consubstancia uma
opção de “desintegração vertical”: ao contratar a entidade adjudicante está, tacitamente, a excluir a hipótese de fazer ou
produzir o bem ou serviço, com recurso ao seu pessoal e aos seus meios. Por isso mesmo, a decisão de contratar deve ser
tomada no contexto de um procedimento racional e consistente (ponderando, por ex., os custos de transação, as
implicações políticas, económicas e jurídicas da contratação, etc.), não sendo uma decorrência direta da deteção de uma
necessidade da entidade adjudicante.
Impõe-se a correta operação de identificação e avaliação das necessidades a satisfazer, mas, além disso, a formulação de
um correto juízo sobre a adequação, no caso, de uma solução contracting out.
Por conseguinte, a decisão de contratar é proferida, em regra, no exercício de um poder discricionário da entidade
adjudicante (discricionariedade de decisão), com projeção no plano organizativo, que, em regra, utiliza recursos externos
(e não próprios).
Contudo, esta discricionariedade tem limites:
o Casos em que a entidade adjudicante em concreto não dispõe do poder de escolher entre contratar ou, porque,
para desempenhar uma determinada função que lhe está confiada, não dispõe de recursos próprios;
o Por força do princípio da proteção do interesse público financeiro e de acordo com o princípio da boa
administração e de economicidade, a entidade adjudicante só pode decidir contratar para satisfazer necessidades
reais.
Por outro lado, a decisão de contratar pressupõe também um juízo sobre a possibilidade legal e constitucional de
contratação de um determinado serviço ou prestação » entidade adjudicante deve ponderar se o objeto do contrato que
pretende celebrar é um objeto negociável. Sendo certo que as entidades adjudicantes não são livres de dispor das suas
competências (art. 36º CPA), pelo que os contratos que envolvam a transferência de responsabilidades públicas ou a
delegação da gestão de tarefas públicas são possíveis apenas na medida em que uma lei autorize as entidades
adjudicantes a efetuar essa transferência ou delegação.
Além disso, note-se, que a lei pode estabelecer proibições e restrições à competência para a decisão de contratar.
Ainda nesta matéria, a decisão de contratar encerra também uma decisão sobre certa forma ou modalidade de
contratação – a estratégia de compra deverá orientar o tipo contratual a seguir.

No âmbito da preparação do procedimento e com o propósito de fundamentar a decisão de contratar, a revisão de 2017
estabeleceu a exigência de um estudo prévio que a entidade adjudicante tem de fazer quando o valor do contrato for
igual ou superior a 5.000.000€ e não tenha por objeto a contratação de bens ou serviços de uso corrente – 36º/3.
O estudo prévio consiste numa avaliação do custo/beneficio e deve conter, nomeadamente e quando aplicável (art.
36º/3):
− Identificação do tipo de beneficiários do contrato a celebrar;

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− Taxa prevista de utilização de infraestruturas, serviço ou bem;


− Análise da rentabilidade;
− Custos de manutenção;
− Avaliação dos riscos potenciais e formas de mitigação dos mesmos;
− Impacto previsível para a melhoria da organização;
− Impacto previsível no desenvolvimento ou na reconversão do país ou da região coberta pelo investimento.
Esta exigência do CCP está em concordância com o art.18º/3 da Lei Enquadramento Orçamental.
De notar, que a não elaboração do estudo prévio constitui uma infração à lei, que determina a invalidade da decisão de
contratar, sendo que esta invalidade se transmite à decisão final do procedimento (adjudicação).
Note-se, que seja qual for o valor dos contratos que comportem despesa, quando se trata de entidades adjudicantes
abrangidas pela incidência das regras financeiras do Estado, aplica-se os critérios estabelecidos no art. 18º LEO.

Art. 36º/5 » foi introduzido pela revisão de 2017; e diz-nos que as peças do procedimento devem identificar todos os
pareceres prévios, licenciamentos e autorizações necessárias que possam condicionar o procedimento e a execução do
contrato.
Este artigo é alvo de diversas interpretações. Contudo, resulta dos princípios da boa administração e da prossecução do
interesse público, bem como da exigência mais elementar da racionalidade da ação administrativa que as entidades
adjudicantes não lancem procedimentos para adjudicação de contratos cuja execução depende de licenciamentos, de
autorizações ou de pareceres de terceiras entidades, sem, previamente, terem a certeza que os vão obter.

59. Autorização da despesa inerente ao contrato a celebrar


A determinação da competência para a decisão de contratar e o cumprimento das condicionantes relativas aos aspetos
orçamentais (ex: cabimentação – registo, em verba orçamental própria, de uma determinada dotação (montante),
visando a realização da despesa; sendo que, por força da cabimentação, o montante em causa fica cativado/congelado)
reclamam uma definição prévia do valor do contrato a celebrar ou, pelo menos, do valor máximo que a entidade
adjudicante se dispõe a pagar pela execução do contrato (sobre o preço base, art. 47º).

O preço base, que deve ser definido pela entidade adjudicante no caderno de encargos, é o montante máximo que esta
entidade se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objecto do contrato, incluindo
eventuais renovações do contrato – n.º 1 do artigo 47.º

Deste modo, sempre que o contrato implique a realização de um gasto e, portanto, a aplicação/mobilização de
dinheiros públicos, torna-se necessário uma autorização (ex: âmbito de autarquias locais – competente para permitir a
autorização é o presidente da câmara e os conselhos de administração dos serviços municipalizados).
Esta indicação quanto à autorização está ainda hoje fixada no Decreto-Lei nº 197/99, de 8 de Junho, quanto à
administração do Estado e às autarquias locais.
Refira-se que quanto às decisões de autorização de despesa em geral o art. 22º do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de Julho
impõe a verificação dos seguintes pressupostos:
1. Conformidade legal: existência de lei prévia que autorize a despesa;
2. Regularidade financeira: inscrição orçamental e adequada classificação da despesa;
3. Economia, eficácia e eficiência: objetivo de obter o máximo de rendimento com o mínimo de dispêndio.

Note-se, que o contrato cria um compromisso financeiro para a entidade adjudicante, mas esta só poderá efetuar fluxos
financeiros ao abrigo do contrato dentro dos limites desse compromisso.

60. Decisão de contratar implícita na DECISÃO DE AUTORIZAÇÃO DA DESPESA


A decisão de contratar pode estar implícita na decisão de autorizar a despesa (art. 36º/1 CCP). Entende-se que o que a lei
pretende com esta possibilidade é que, sempre que não exista uma decisão de contratar documentada autonomamente,
ela seja considerada como integrada na decisão de autorização de despesa. Obviamente, esta hipótese não é possível se
os órgãos responsáveis por uma e outra decisão não forem o mesmo.
Num caso excecional, a decisão de contratar não se revela autonomamente nem é prévia ao procedimento de
adjudicação: art. 128º (ajuste direto simplificado) – desprocedimentalização da formação de CP’s – ato de compra leva implícita a
decisão de contratar (bem como a decisão de escolha do procedimento.

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61. Competência para a decisão de contratar


A competência para a decisão de contratar cabe, como referido, ao órgão adjudicante, o qual será designado na lei
orgânica ou nos estatutos da entidade adjudicante ou, na falta desta designação, será o órgão competente para autorizar
a despesa gerada pelo contrato (art. 36º/2 CCP). Ver ainda art. 37º

62. Natureza jurídica da decisão de contratar


A decisão de contratar é um ato interno, sem projeção exterior. Todavia, converte-se num ato externo e, portanto, num
ato administrativo impugnável, quando se revela através do anúncio ou do convite à apresentação de propostas. Estes
atos, funcionalmente autónomos, não são, pois, atos de publicitação da decisão de contratar, eles são elementos que, em
conjunto com a decisão interna de contratar, compõem um ato administrativo composto – a decisão de contratar com
efeitos externos. E se assim é, este ato composto pode ser impugnado quanto a ilegalidades próprias da decisão (ex: falta
de autorização ou de cabimento da despesa). Sem prejuízo, claro, da eventual ratificação.
De notar, que a decisão de contratar tem de ser fundamentada, que varia em função das circunstancias.

65. Revogação da decisão de contratar


Do art. 80º/1 CCP decorre que a revogação da decisão de contratar resulta da decisão de não adjudicação. Apesar de a
letra da lei não ser expressa quanto a este ponto, entende-se que a revogação da decisão de contratar é efeito
automático da decisão de não adjudicação (esta decisão implica a destruição de todo o procedimento de formação do
contrato, desde o seu início). Consequentemente, em tais casos, o início de um novo procedimento implica a adoção de
uma nova decisão de contratar (art. 79º/3 CCP).
Nestes termos, o nº 1 do art. 80º CCP não se refere a um concreto “poder” de revogação da decisão de contratar, mas
antes a uma revogação automática. Ao poder autónomo de revogação refere-se o nº 2 do mesmo preceito: se verificadas
as circunstâncias previstas nas alíneas c) e d) do art. 79º/1 CCP até ao termo do prazo de apresentação das propostas, a
decisão de contratar pode se revogada. Se as referidas circunstâncias ocorrerem após o termo desse prazo, será adotada
uma decisão de não adjudicação.

66. Anulação administrativa da decisão de contratar


A anulação distingue-se da revogação porque funda-se na invalidade da decisão de contratar (165º/2 CPA).
Não se vê obstáculos à mobilização, neste âmbito, das regras gerais sobre a competência do órgão adjudicante para
proceder à revogação de atos próprios que sejam anuláveis. Porém, este poder de anulação só pode ser posto em marcha
antes da celebração do contrato. Após esse momento, a anulação terá de ocorrer pela via judicial.

!!Ponto 65 e 66 não lecionados!!

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DECISÃO DE ESCOLHA do procedimento de adjudicação (art. 38º)


A decisão de escolha do procedimento de adjudicação tem lugar já dentro do procedimento de formação do contrato.
Esta solução faz todo o sentido se recordarmos que o que está em causa é a escolha da tramitação do sub-procedimento
de adjudicação, o qual se integra no procedimento complexo e global de formação do contrato (a fase de adjudicação só
tem lugar após a fase da iniciativa).
Também a decisão de escolha do procedimento de adjudicação constitui um ato interno até que se converta num ato
externo com o convite ou anúncio à apresentação de propostas.
A decisão de escolha do procedimento não carece de formalização, não tendo de constar de um documento específico e
isolado. Sendo que pode vir apenas a materializar-se na elaboração do programa do procedimento pertinente.
De notar, que a decisão de escolha do procedimento tem de ser fundamentada e cabe ao órgão competente para a
decisão de contratar – art. 38º.

67.1 Tipos de procedimentos de adjudicação


Os procedimentos de adjudicação consistem em sequências de atos destinadas à seleção da proposta que se pretende
aceitar. Sendo que a escolha deverá recair sobre um dos procedimentos de adjudicação indicados no art. 16º.

Os tipos de procedimentos de adjudicação previstos na nossa lei (art. 16º/1 CCP) são:
a) Ajuste direto - arts. 112º a 129º CCP: definição no art. 112º/2; com a revisão de 2017, os elementos distintivos do
ajuste direto são:
o Trata-se de um procedimento baseado em convite (não em anúncio, como todos os outros com a
exceção da consulta prévia);
o Facto de o convite ser dirigido apenas a uma entidade (distinguindo-se, assim, da consulta prévia).
No entanto, pode haver exceções: concurso de conceção, concurso de ideias e o art. 24º/3.

b) Consulta prévia – arts. 112º a 129º CCP: definição no art. 112º/1 (+ art.114º/1); baseia-se num convite (como o
ajuste direto), mas o convite tem de ser enviado a três entidades, pelo menos;

c) Concurso público – arts. 130º a 161º CCP: procedimento objeto de anuncio num jornal oficial (DR ou JOUE) no
qual, através da apresentação de uma proposta, pode participar qualquer entidade que preencha os requisitos
gerais de participação;

d) Concurso limitado por prévia qualificação – arts. 162º a 192º CCP: procedimento objeto de anuncio num jornal
oficial (DR ou JOUE) que se desenvolve em duas fases:
o Numa primeira, de qualificação, pode participar, através da apresentação de uma candidatura, qualquer
entidade interessada em demonstrar que preenche os requisitos mínimos de capacidade exigidos pela
entidade adjudicante;
o Numa segunda, de adjudicação, podem participar, através da apresentação de uma proposta, as
entidades qualificadas na primeira fase, que, para o efeito, são convidadas pela entidade adjudicante;

e) Procedimento de negociação – arts. 193º a 203º CCP: segue o modelo do concurso limitado por prévia
qualificação, mas inclui uma terceira fase, de negociação das propostas;

f) Diálogo concorrencial – arts. 204º a 218º CCP: começa por incluir uma fase de qualificação e envolve a
apresentação de soluções e diálogo com os candidatos qualificados e, depois, a apresentação de propostas
seguida da adjudicação.

g) Parceria para a inovação – arts. 218º-A a 218º-D CCP: é um procedimento complexo, que integra as seguintes
fases, as quais podem ser adaptadas em função da complexidade e relevância financeira da parceria a celebrar:
o Fase da apresentação das candidaturas, podendo a respetiva seleção incluir a qualificação dos candidatos
quando se trate do desenvolvimento de projetos dotados de especial complexidade;
o Fase de apresentação de propostas de projetos de investigação e desenvolvimento;
o Fase de análise das propostas de projetos de investigação e celebração da parceria.

Vigora, nesta matéria, o princípio da taxatividade dos procedimentos de adjudicação (sistema numerus clausus): os
procedimentos que a entidade adjudicante pode escolher constam de uma lista fechada de tipos de procedimentos.

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Ao princípio da taxatividade acresce, nesta sede, um princípio de formalização legal, nos termos do qual a lei tem de
definir, com detalhe, o desenvolvimento da tramitação de cada tipo de procedimento. Ao órgão adjudicando está vedada
a instituição de novos momentos do procedimento, bem como a alteração da respetiva ordenação. As opções que o
órgão adjudicante poderá tomar nesta matéria serão apenas as autorizadas por lei.

70. Escolha do procedimento em função do valor (estimado) do contrato »» adoção segundo o CRITÉRIO FINANCEIRO:
Situações em que a entidade adjudicante escolhe ou pode escolher um determinado procedimento em função do valor
do contrato a celebrar:
• Procedimentos de compras públicas – contratos que geram uma obrigação de pagamento de preço para a
entidade adjudicante. A entidade ainda não tem uma ideia definitiva sobre o preço contratual que irá pagar ao
seu contratante (art. 96º/1/d e 97º), contudo a entidade pode estimar o valor do contrato (preço que irá pagar)
»» valor estimado do contrato.

» Este conceito surge em várias partes do CCP como, p.e., no art. 17º/7; 26º/1/b; 27º/1/e; 32º/3.
» O valor estimado do contrato coincide com o preço estimado, a que acresce o valor estimado de outras
contraprestações a efetuar pela entidade adjudicante que sejam suscetíveis de se traduzirem num montante monetário.
Logo, o valor do contrato não inclui o valor das vantagens que integram o benefício económico do adjudicatário (art.
17º/2).
» Neste contexto, o valor do contrato é o valor monetário que a entidade adjudicante estima, projeta vir a pagar; é em
função deste valor estimado/calculado que a entidade escolhe o procedimento e é em função dele que se determina a
competência para a decisão de contratar (quando esta se encontra limitada pelo valor do contrato).
» Deverá ser calculado, abrangendo o valor monetário das condições de modificação previstas no caderno de encargos
(96º/1/j) – incluem-se as prestações que possam a vir a ser executadas em desenvolvimento do contrato que se pretenda
celebrar, abrangendo as modificações baseadas em condições previstas no caderno encargos.
» Valor do contrato deve coincidir com o preço base (47º/1), sendo que o cálculo do valor estimado do contrato deve
atender às indicações do art. 47º/2.

Em função do critério exclusivo do valor estimado do contrato a celebrar, a entidade adjudicante pode escolher
procedimentos de ajuste direto, consulta prévia, concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação.

70.1 Escolha do ajuste direto em função do valor


O ajuste direto pode ser escolhido em função do valor nos termos seguintes:
1. Contratos de empreitada de obras públicas – art. 19.º/d;
2. Contratos de locação ou de aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços – art. 20.º/1/d;
3. Contratos de concessão de obras públicas e de serviços públicos – art. 31.º/4;
4. Outros contratos – art. 21º/1/c e /2;

70.2. Escolha da consulta prévia em função do valor


A consulta prévia pode ser escolhida em função do valor nos termos seguintes:
1. Contratos de empreitada de obras públicas – art. 19.º/c;
2. Contratos de locação ou de aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços – art. 20.º/1/c;
3. Contratos de concessão de obras públicas e de serviços públicos – art. 31.º/4;
4. Outros contratos – art. 21º/1/b e /2;

70.3. Escolha do concurso público ou do concurso limitado por prévia qualificação sem publicação no JOUE
Estes procedimentos com publicação no JOUE podem sempre ser utilizados, qualquer que seja o valor do contrato.
Contudo, em função do valor, a entidade adjudicante pode adotar procedimentos de concurso sem publicação no JOUE,
quando se trate de contratos de empreitada de obras públicas, de locação ou aquisição de bens imóveis ou aquisição de
serviços abaixo dos limiares europeus (art. 19º/b e 20º/1/b) – o facto de os contratos a celebrar terem valor inferior aos
limiares europeus autoriza concursos nacionais.

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71. Escolha do procedimento em função de CRITÉRIOS MATERIAIS


Casos em que a entidade adjudicante pode adotar um certo procedimento, mas só depois de verificar, no caso concreto,
se estão reunidos os pressupostos/condições materiais de que a lei faz depender a escolha daquele procedimento –
Capítulo III da Parte II: arts. 23º a 30º-A.

71.1. Escolha do ajuste direto (ou consulta prévia) em função de critérios materiais (23º a 27º)
Não condiciona o valor do contrato a celebrar, permitindo a celebração de contratos de qualquer valor. No entanto,
existem algumas exceções de limite de valor (ressalva prevista no art. 23º, in fine).
Assim, nos arts. 24º a 27º prevêem-se situações em que a adoção do procedimento do ajuste direto depende: da
verificação de pressupostos materiais E do valor do contrato (ex: art. 25º/1/b; 26º/1/b; 27º/1/e; 27º/3+27º/1/b).
O art. 24º indica os pressupostos que permitem a adoção do ajuste direto para a celebração de quaisquer contratos.
O art. 25º a 27º indicam os pressupostos que autorizam a adoção desse procedimento para a formação de contratos de
empreitada de obras públicas (25º), de locação ou aquisição de bens móveis (26º) e de aquisição de serviços (27º).

NOTA: a autorização para adotar o ajuste direto nesses preceitos é, de certo modo, derrogada pelo art. 27º-A, que
estabelece uma regra de preferência da consulta prévia sobre o ajuste direto. Logo, o disposto no art. 24º a 27º, a
possibilidade de ajuste direto tem de se articular com esta regra de preferência.

71.1.1 Ajuste direto (ou consulta prévia, por força do art. 27º-A) para a formação de quaisquer contratos
Ou seja, qualquer que seja o objeto do contrato a celebrar, pode sempre adotar-se o ajuste direto quando se verifiquem
as circunstâncias seguintes:
• Ausência de candidaturas ou propostas em procedimentos de concurso;
• Exclusão de todas as propostas em anterior procedimento de concurso ou diálogo concorrencial;
• Motivo de urgência imperiosa;
• Se trate de contratos para permitir a prestação de serviços de telecomunicações;
• As prestações do contrato só podem ser efetuadas por uma determinada entidade.

RAZÕES PROCEDIMENTAIS
2.1. Situação em que um concurso fique deserto, por (artigo 24.º, n.º 1, alínea a)):
i) Num concurso limitado por prévia qualificação nenhum candidato se tenha apresentado;
ii) Ou num concurso público nenhum concorrente tenha apresentado proposta;
iii) E ainda a hipótese prevista no n.º 6 do artigo 24.º, conjugado com o n.º 5 do mesmo artigo, quando estejam em
causa entidades dos setores especiais (ou atividades dos sectores especiais), abrangendo-se também aqui o
procedimento de negociação.
Mas note-se, que para o ajuste direto ser possível, nesta situação, a entidade adjudicante não pode alterar
substancialmente o caderno de encargos e, quando for o caso, os requisitos mínimos de capacidade técnica e
financeira estabelecidos no procedimento primitivo » exigência de identidade substancial entre o objeto do
procedimento que ficou deserto (e que foi aberto à concorrência) e o objeto do procedimento de acesso restrito que
venha a lançar.
Ver art. 24º/9 (não há identidade quando…);
Ver art. 24º/7 e 8 (prazo para recorrer ao ajuste direto e consulta prévia, por força do art. 27º-A).

2.2. Situação em que, num concurso público, num concurso limitado por prévia qualificação ou num procedimento
de diálogo concorrencial, todas as propostas são excluídas por razões formais – artigo 24.º, n.º 1, alínea b),
conjugada com o artigo 146.º
Desde que o caderno de encargos não seja substancialmente alterado.
Este é mais um insucesso de um procedimento aberto de seleção concorrencial. Admite-se o recurso a um
procedimento de acesso restrito, porque o procedimento anterior já assegurou a publicidade e concorrência. Aplica-
se, também neste caso, as condições e limites na situação anterior: identidade substancial do caderno de encargos
(24º/9) e o limite temporal previsto no 24º/7 e 8.

2.3. Situação em que todas as propostas são excluídas por razões materiais – artigo 24.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2,
conjugados com o artigo 70.º, nº 2 (na generalidade dos casos, as razões de exclusão mencionadas neste n.º
equivalem a razões materiais)

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2.4. Inaplicabilidade dos limites de valor/financeiros referidos, desde que (n.º 2 do artigo 24.º):
i) Tenha havido publicitação do anúncio do procedimento anterior no Jornal Oficial da União Europeia
ii) E sejam convidados a apresentar proposta todos, e apenas, os concorrentes cujas propostas tenham sido excluídas
apenas com fundamento no n.º 2 do artigo 70.º (na generalidade dos casos trata-se de razões materiais de exclusão)
»» Ajuste direto com vários convidados

RAZÕES DE URGÊNCIA
2.5. As razões de urgência: os casos de urgência imperiosa resultantes de acontecimentos imprevisíveis – artigo
24.º, n.º 1, alínea c). As razões de “estado de necessidade” (administrativo)
O ónus da entidade adjudicante
Demostrar a verificação dos pressupostos necessários e de aplicação cumulativa para o recurso ao procedimento por
ajuste direto por motivos de urgência imperiosa:
i) Motivos de urgência imperiosa;
ii) Resultantes de acontecimentos imprevisíveis e inesperados (facto/acontecimento que um decisor público
normal e razoável, colocado na posição do real decisor, não podia ter previsto, nem tinha obrigação de prever);
iii) Não imputáveis, em caso algum, à entidade adjudicante (não resulta da falta de diligencia desta em,
atemadamente, desencadear outro procedimento pré-contratual);
iv) Que o recurso ao ajuste direto é ou seja feito na medida do estritamente necessário (procedimento sem
convite – ajuste direto ou consulta prévia – será usado apenas para satisfazer necessidades imediatas,
abrangendo apenas o período que decorre até que possam ser encontradas soluções mais estáveis, no quadro da
contratação não urgente); e
v) Que não possam ser cumpridos os prazos previstos para os processos de concurso público.
Note-se, que estas condições são cumulativas!
Esta situação tem de ser explicada na fundamentação da decisão de adotar o ajuste direto. Mas, nos termos da lei, o
órgão adjudicante não tem este dever – basta que se preencham os requisitos.
Mas note-se, que há casos em que o órgão adjudicante tem o dever de explicar as razões que determinam o convite
de entidades que, em função das condições do contexto, parecem não ter capacidade para responder à urgência
devida.

Exemplo: o colapso de uma ponte autoriza um procedimento sem convite para a contratação de um serviço de transporte fluvial
por um período limitado de tempo, mas não autoriza a contratação de uma empreitada para a construção de uma nova ponte ou
de um serviço de transporte fluvial pelo prazo que durar a construção da nova ponte. Em ambos os casos, tratar-se-ia de adotar
procedimentos sem convite além di estritamente necessário para responder ao motivo de urgência imperiosa.

NOTA: preferência legal da consulta prévia sobre o ajuste direto (art. 27º-A) – coloca a consulta prévia ao nível dos
procedimentos abertos e obriga à demonstração de que os prazos mais longos deste procedimento (devido a uma
tramitação procedimental mais exigente) não podem ser cumpridos por incompatibilidade com a situação de
urgência.

RAZÕES RELATIVAS AO OBJETO DO CONTRATO


2.6 Aquisições para a prestação de serviços de telecomunicações – art. 24º/1/d
Um procedimento com convite (ajuste direto ou consulta prévia) pode ser adotado quando as prestações que
constituem o objeto do contrato a celebrar se destinem, a título principal, a permitir à entidade adjudicante a
prestação ao público de um ou mais serviços de telecomunicações » entidades adjudicantes exercem atividades
expostas à concorrência e, portanto, em competição com operadores económicos.
Com efeito, admite-se uma derrogação à regra geral de adoção de procedimentos abertos, em atenção ao facto de
estar em causa a formação de contratos cujo objetivo principal é o de permitir à entidade adjudicante desenvolver
uma atividade exposta à concorrência.

2.7 Exclusividade do prestador ou do fornecedor – art. 24º/1/e


O ajuste direto pode ser adotado quando as prestações que constituem o objeto do contrato só possam ser confiadas
a determinada entidade por uma das razões enunciadas no art. 24º/1/e - i),ii), iii).
Por conseguinte, a existência de apenas um operador apto a realizar a prestação contratual pode surgir:
• Nos casos em que esteja em causa a criação ou aquisição de uma obra de arte ou de um espetáculo artístico
(motivos artísticos) – 24º/1/e, i)
• Nos casos em que esteja em causa motivos técnicos – 24º/1/e, ii)
• Nos casos em que à necessidade de proteger direitos exclusivos, incluindo direitos de propriedade intelectual
– 24º/1/e, iii)
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Relativamente aos motivos técnicos e necessidade de proteger direitos exclusivos, o art. 24º/4 acrescenta que o
ajuste direto só pode ser adotado quando não exista alternativa ou substituto razoável e quando a inexistência de
concorrência não resulte de uma restrição desnecessária face aos aspetos do contrato a celebrar – este limite reflete-
se no dever de fundamentação da escolha do procedimento.
Note-se, que não se revela fácil definir e fundamentar a inexistência de substituto razoável.

71.1.2 Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de contratos de empreitada de obras públicas » art. 25º
Além dos casos em que pode ser utilizado nos termos do art. 24º, o ajuste direto ainda pode ser utilizado nos termos do
art. 25º.

71.1.3 Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de contratos de aquisição de bens móveis » art. 26º
O ajuste direto também pode ser utilizado nos termos do art. 26º.

71.1.3 Ajuste direto (ou consulta prévia) para a formação de contratos de aquisição de serviços » art. 27º
O ajuste direto pode ainda utilizar-se nos termos do art. 27º.

NOTAS:
(1) No entanto, o (novo) limite à escolha do ajuste direto ao abrigo dos critérios materiais introduzido pelo Artigo 27.º-A
(Consulta prévia) »» “Nas situações previstas nos artigos 24.º a 27.º, deve adotar-se o procedimento de consulta prévia sempre que o recurso a mais de uma
entidade seja possível e compatível com o fundamento invocado para a adoção deste procedimento”
A introdução desta limitação, designadamente quando esteja em causa a adoção do ajuste direto por razões de
urgência, e o (novo) regime do contencioso pré-contratual urgente.
Razões que poderão ser invocadas para fundamentar o recurso ao ajuste direto: o confronto entre a razão da
urgência e o “risco” procedimental e o “risco” processual (contencioso).

(2) O critério do interesse público (apenas) para contratos de sociedade: “Quando razões de interesse público relevante o
justifiquem, pode adotar-se o ajuste direto para a formação de contratos de sociedade” – n.º 3 do artigo 31.º

(3) LIMITES À ESCOLHA DAS ENTIDADES CONVIDADAS NO AJUSTE DIRETO:

» Limite em função do valor acumulado – art. 113º/2 »» caráter trienal; sendo que o limite abrange indistintamente o
ajuste direto e a consulta prévia.

Solução para o limite trienal


Exemplo (artigo 20.º, n.º 1, alínea c) – consulta prévia para a aquisição de serviços (75.000 €):
Janeiro 2018 - 50.000 €
Março 2019- 20.000 €
Fevereiro de 2020 - ? Pode celebrar contrato até € 74.999.
Nota: o valor do novo contrato que se pretenda celebrar por ajuste direto/consulta prévia não é incluído no cálculo do preço contratual acumulado
i) Cada tipo de procedimento tem um limite trienal próprio
ii) Cada operador terá duas “contas-correntes”: uma para ajustes diretos e outra para consultas prévias
iii) Os contratos de empreitada contam-se sempre autonomamente relativamente aos contratos de aquisição/locação de móveis e de
aquisição de serviços

» Delimitação do âmbito subjetivo para a aplicação do limite trienal – 113º, nº3 (no Estado e Regiões Autónomas) e nº4
(nos municipios).

» Critério do valor no caso de entidades convidadas em agrupamentos – art- 117º/2/a


No caso de ajuste direto/consulta prévia adoptados em função do critério do valor, as entidades convidadas não podem
integrar agrupamentos (artigo 117.º, n.º 2, alínea a))
O escasso valor do contrato, o “caráter pessoal” do convite e a possibilidade (inconveniente) de o agrupamento integrar
um operador económico que a entidade adjudicante nunca convidaria (mas se estas duas últimas razões forem válidas,
então não se percebe a razão pela qual não deveriam valer para a – regra geral – do n.º 1 do artigo 17.º)
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» Liberalidades – art. 113º/5


➢ O limite não se aplica a comportamentos juridicamente enquadráveis (p. ex: descontos comerciais em
contratos);
➢ Mas inclui-se o que se tenha feito por preços “simbólicos”;
➢ A liberalidade tem ser feita para a própria entidade adjudicante;
➢ Não abrange a oferta de liberalidades ou doações feitas aos membros de uma entidade adjudicante, mas sim à
própria entidade adjudicante;
➢ Vale para qualquer ajuste directo/consulta prévia (em função do valor ou de critério material);
➢ Regra geral: para que uma prestação gratuita escape ao n.º 5 do artigo 113.º é necessário que a mesma esteja
prevista no caderno de encargos do procedimento e, consequentemente, no contrato (ex: a obrigação de
prestar formação profissional, como contrapartida da adjudicação de um determinado contrato);
➢ Se a entidade adjudicante exigir ao fornecedor que, fora do contrato, efetue uma qualquer prestação gratuita e
o fornecedor aceder, ficará este sujeito à proibição de ser contratado.

EM SÍNTESE:

Art. 112º;

Em que condições se pode utilizar o ajuste direto?


• Critério do valor do contrato;
• Critérios materiais (seja qual for o valor do contrato – art. 24º a 27º).
• Razões procedimentais;
• Razões de urgência;
• Razões relativas ao objeto do contrato

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76. Desenho legal da tramitação dos principais procedimentos


A tramitação exposta de seguida refere-se aos procedimentos de adjudicação com aplicação mais frequente: ajuste
direto, consulta prévia, concurso público e concurso limitado por prévia qualificação, procedimento de negociação,
diálogo concorrencial, parceria para a inovação.

76.1 AJUSTE DIRETO


O ajuste direto é o procedimento de adjudicação que apresenta uma tramitação mais simples e, em princípio, mais
célere, classificando-se como procedimento unifásico (contemplando apenas uma fase de adjudicação).
O art. 112º/2 CCP define o ajuste direto. Mas há a situações em que podem ser convidadas várias entidades para o ajuste
direto: arts. 24º/3; 114º/2; 219º-J/8.
Note-se a lei dispensa, neste caso, a instituição do júri do procedimento (67º/1), sendo que a prática dos atos de
instrução pode ser assegurada diretamente pelo órgão adjudicante ou pelos serviços que dele dependem.
Em traços gerais, a tramitação deste procedimento consiste no seguinte:

1. Convite: o procedimento inicia-se com o envio de um convite a uma entidade escolhida pelo órgão adjudicante. O
convite contém obrigatoriamente: Regulamentação do procedimento; Caderno de encargos; entre outras – art. 115º/1.
Logo, o programa do procedimento é substituído por um convite, acompanhado de caderno de encargos.
Aqui aplica-se os limites à livre escolha das entidades a convidar, decorrentes do art. 113º/2 a 5, sendo que a
escolha das entidades convidadas cabe ao órgão competente para tomar a decisão de contratar (113º/1).

2. Solicitação e prestação de esclarecimentos das peças do procedimento (+) retificação de erros e omissões; prazo
constante no art. 116º;
Em regra, aplicar-se-á o art. 50º, podendo os esclarecimentos sobre as peças ser prestados e as retificações ser efetuadas
até ao termo do 2º terço do prazo de apresentação de propostas.

3. Apresentação de propostas: as entidades convidadas apresentam as suas propostas através de meios eletrónicos,
não sendo obrigatória (para a entidade adjudicante) a utilização de plataforma eletrónica (115º/4);
Note-se, que não há um prazo mínimo legal e imperativamente fixado, ou seja, o prazo para a apresentação das
propostas é o que for fixado no convite – art. 115º/1/f, podendo ser um prazo inferior ou superior a 9dias. Logo, a fixação
do prazo está na discricionariedade da entidade adjudicante, mas tem de ser um prazo adequado/proporcionado.
Caso de apresentação de propostas por agrupamentos – art. 117º: em regra, um agrupamento de pessoas singulares ou
coletivas pode apresentar uma proposta, desde que um dos seus membros tenha sido convidada para o efeito (117º/1).
Contudo, há uma exceção – se o procedimento for escolhido em função do valor (117º/2)

4. Os serviços da entidade adjudicante podem pedir esclarecimentos sobre a proposta apresentada e convidar o
concorrente a introduzir melhorias na sua proposta (não havendo, contudo, lugar às fases de negociação e de audiência
prévia, nem à elaboração dos relatórios preliminar e final - art. 125º) x1;

5. Na sequência, os serviços da entidade adjudicante submetem o projeto da decisão de adjudicação ao órgão


competente para a decisão de contratar.

6. O órgão adjudicante profere o ato de adjudicação.

7. Celebração do respetivo contrato: que deve ser objeto de publicidade, pela entidade adjudicante, no portal dos
CP’s. De acordo com o art. 127º/3, a publicitação da celebração do contrato é a condição de eficácia do contrato,
nomeadamente para efeitos de pagamentos, independentemente de o contrato ter sido ou não reduzido a escrito (art.
94º e ss.).

Este é o regime geral do ajuste direto

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No caso de estarmos perante um ajuste direto simplificado, previsto no art. 128º e 129º:
A adjudicação pode ser feita pelo órgão adjudicante diretamente sobre uma fatura ou um documento equivalente
apresentado pela entidade convidada, sendo pressuposto da decisão de adjudicação a decisão de contratar e a decisão de
escolha do ajuste direto, nos termos do art. 19º/d + 20º/1/d.
Encontram-se, assim, dispensadas todas as demais formalidades, designadamente o recurso a meios eletrónicos, a
celebração de contrato e a obrigação de publicitação.
Este regime aplica-se nas “compras presenciais” e nas compras de serviços e produtos através de plataformas de
intermediação online.
Conta para efeitos do limite trienal (113º/2).

NOTA x1: Adjudicação no caso de apresentação de UMA proposta (artigo 125.º)


TRAMITAÇÃO:
a) Adopção de um procedimento simplificado:
i) Os serviços da entidade adjudicante pedem (podem pedir) esclarecimentos sobre a proposta;
ii) Submissão do projecto de decisão de adjudicação ao órgão competente para a decisão de contratar.
b) Características:
i) Desnecessidade de júri;
ii) Não há lugar à fase de negociação;
iii) Não há lugar a audiência prévia;
iv) Não há lugar à elaboração dos relatórios preliminar e final;
v) Possibilidade de convite para melhorar a proposta– artigo 125.º/2, in fine;
vi) Manutenção da obrigação de publicitação (artigo 127.º)

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76.2 CONSULTA PRÉVIA


O art. 112º/1 define a consulta prévia.
Assume um caráter mais complexo, desde logo atendendo ao número de entidades a convidar para efeito de
apresentação de propostas.

Em traços gerais, a tramitação deste procedimento consiste no seguinte:

1. Convite: o procedimento inicia-se com o envio de um convite a, pelo menos, três entidades escolhidas pelo
órgão adjudicante. Sendo que se tem de assegurar o envio simultâneo a todos os operados ao longo do procedimento.
Aqui também se aplica os limites à livre escolha das entidades a convidar, decorrentes do art. 113º/2 a 5, sendo que a
escolha das entidades convidadas cabe ao órgão competente para tomar a decisão de contratar (113º/1).

2. Convite enviado às entidades convidadas deve conter, além das menções obrigatórias, previstas no art.
115º/1, também aquelas que constam no nº2, ou seja, o convite deverá indicar se as propostas apresentadas serão (ou
não) objeto de negociação e, em caso afirmativo:
• Quais os aspetos da execução do contrato a celebrar que a entidade adjudicante não está disposta a
negociar; e
• Se a negociação decorrerá parcial ou totalmente, por via eletrónica e os respetivos termos e qual o
critério de adjudicação e os eventuais fatores e subfatores que o densificam, não sendo, porém,
necessário um modelo de avaliação das propostas.

3. O convite é acompanhado do caderno de encargos, sendo enviado, tal como a proposta, através de meios
eletrónicos (entidade adjudicante não está obrigada a usar a plataforma eletrónica) e deve ser formulado por escrito –
115º/4.
O programa do procedimento é substituído por um convite, acompanhado de um caderno de encargos.

4. Solicitação e prestação de esclarecimentos das peças do procedimento (+) retificação de erros e omissões; no
prazo constante no art. 116º;
Em regra, aplicar-se-á o art. 50º, podendo os esclarecimentos sobre as peças ser prestados e as retificações ser efetuadas
até ao termo do 2º terço do prazo de apresentação de propostas.

5. Apresentação de propostas: as entidades convidadas apresentam as suas propostas através de meios


eletrónicos, não sendo obrigatória (para a entidade adjudicante) a utilização de plataforma eletrónica (115º/4).
Após a apresentação das propostas, o desenvolvimento da tramitação varia, conforme haja lugar a negociação ou não:
• Não havendo negociação: o júri procede à análise e à avaliação das propostas apresentadas e elabora o
relatório preliminar (ver ponto 7).
Note-se, que não há um prazo mínimo legal e imperativamente fixado, ou seja, o prazo para a apresentação das
propostas é o que for fixado no convite – art. 115º/1/f, podendo ser um prazo inferior ou superior a 9dias. Logo, a fixação
do prazo está na discricionariedade da entidade adjudicante, mas tem de ser um prazo adequado/proporcionado.
Caso de apresentação de propostas por agrupamentos – art. 117º: em regra, um agrupamento de pessoas singulares ou
coletivas pode apresentar uma proposta, desde que um dos seus membros tenha sido convidada para o efeito (117º/1).
Contudo, há uma exceção – se o procedimento for escolhido em função do valor (117º/2)

6.A. O júri, após a análise das propostas apresentadas, conduz uma negociação que incidirá apenas sobre os
atributos dessas propostas (aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de
encargos) e não sobre os termos e condições - Objeto das negociações – art. 118º/1, conjugado com o art. 115º/2. Não
há lugar à negociação de propostas que devam ser excluídas, aplicando-se, para o efeito, os fundamentos de exclusão do
art. 146º/2.
!!A fase de negociação só existe no caso de consulta prévia e se estiver previsto no convite (art. 118º).
Há um direito dos concorrentes à negociação e o dever (dos mesmos) em negociar.

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6.B. Os termos a adotar na fase de negociação serão fixados pelo júri e transmitidos aos concorrentes na
notificação que lhes é enviada para efeitos de agendamento da 1ªsessão de negociações (art. 120º) - Formalidades a
observar:
i) Convocatória – art. 120.º/1: o local pode ser um endereço eletrónico;
ii) Formato adoptado para as negociações – art. 120.º/2;
iii) Elaboração de actas – art. 120.º/3;
iv) Dever de sigilo durante a fase de negociação – art. 120.º/4
v) Modo de realização das negociações – art. 120.º/2: trata-se de um critério discricionário da entidade adjudicante
(podem decorrer em separado, ou em conjunto com os diversos concorrentes)
vi) O princípio da alterabilidade das propostas: os concorrentes devem ter idênticas oportunidades de propor, de
aceitar e de contrapor modificações das respectivas propostas durante as sessões de negociação – art. 120.º/4
vii) Modo de representação dos concorrentes nas negociações – art. 119.º: os concorrentes podem fazer-se
representar, bem como fazer-se acompanhar de técnicos nas sessões de negociação

6.C. Encerrada a negociação, o júri fixa o prazo para a apresentação de versões finais integrais das propostas
(propostas finais) – art. 121º.
Existência de um duplo limite:
i) As propostas não podem conter atributos diferentes dos constantes das respetivas versões iniciais no que
respeita aos aspetos da execução do contrato a celebrar que a entidade adjudicante tenha indicado não estar disposta a
negociar (causa de exclusão – art. 122.º/2)
ii) Depois de entregues as versões finais das propostas, não podem as mesmas ser objeto de quaisquer
alterações: passa a valer inteiramente o princípio da inalterabilidade/intangibilidade das propostas.

6.D. Após a apresentação das propostas finais, o júri analisa as propostas (iniciais e finais) e procede à respetiva
avaliação.
Note-se, que o órgão competente para a decisão de contratar poderá dispensar a existência de júri (artigo 67.º/3). Em tal
caso, os procedimentos são conduzidos pelos serviços da entidade adjudicante: o serviços assumem a função de júri.
E quando não exista júri ou este seja dispensado, deverá haver lugar à designação de um responsável do procedimento,
nos termos do artigo 55.º do CPA.

7. Após a análise e avaliação das propostas, passa-se à “preparação da adjudicação”, começando o júri por
elaborar um relatório preliminar, no prazo de 3dias, propondo ao órgão adjudicante a ordenação das propostas e, se for
o caso, a exclusão de algumas delas, constando, igualmente, deste documento a referencia aos esclarecimentos
prestados pelos concorrentes (art. 122º, conjugado com o art. 146º/2 e 3).

8. Este relatório preliminar é enviado a todos os concorrentes, sendo-lhes concedido um prazo, não inferior a
3dias, para se pronunciarem ao abrigo do seu direito de audiência prévia (art. 123º).

9. Findo o prazo fixado para este efeito, o júri elabora um relatório final, no qual, ponderando as observações
dos concorrentes, essencialmente decide manter ou modificar as conclusões constantes do relatório preliminar (art.
124º/1). Caso altere essas conclusões, terá de ouvir novamente os concorrentes interessados (nova audiência prévia) e,
seguidamente, produzir um segundo relatório final (art. 124º/2).
Envio do relatório final ao órgão competente para a decisão de contratar – art. 124º/3 e 4.

10. Perante as conclusões finais do júri, o órgão adjudicante emite o ato de adjudicação, escolhendo uma de
entre as várias ofertas.

11. A celebração do contrato, que se segue à adjudicação, é objeto de publicitação pela entidade adjudicante, no
portal dos CP’s, sendo a publicitação da celebração do contrato condição de eficácia do mesmo, incluindo para efeitos de
pagamentos, independentemente de o contrato ter sido (ou não) reduzido a escrito (art. 127º/3).

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76.3 CONCURSO PÚBLICO


É um procedimento unifásico (contemplando apenas uma fase de adjudicação) e apresenta uma tramitação mais
complexa.

Princípio geral relativo à escolha do procedimento » a escolha do contrato público permite a celebração de contratos de
qualquer valor (19º/a; 20º/1/a; 21º/a).

Contudo, há certos limites a este princípio geral: ver ppt

Critério Material » art. 28º e art. 23º a 27º

Regime geral:

1. Anúncio: o procedimento inicia-se com a publicação do anúncio (no DR ou no JOUE, se exigível). A partir dessa
data, são ainda disponibilizadas, na respetiva plataforma eletrónica de contratação pública, de forma livre, completa e
gratuita, as peças do procedimento (programa do procedimento e caderno de encargos.

2. Solicitação e prestação de esclarecimentos, bem como da retificação de “erros e omissões” das peças do
procedimento.

3. Apresentação de propostas: os interessados apresentam as suas propostas, sendo posteriormente publicada


uma lista dos concorrentes e facultada a estes a consulta de todas as ofertas apresentadas;

4. Análise e avaliação das propostas;

5. Leilão eletrónico: para certos contratos e se assim estiver previsto no programa do procedimento, terá lugar
um procedimento eletrónico destinado a permitir aos concorrentes melhorar progressivamente os atributos da respetiva
proposta (arts. 140º e ss. CCP); Esta é uma fase facultativa e prevista apenas para certos contratos (contratos de
aquisição de bens móveis, p.e.)!

6. Relatório preliminar: o júri do procedimento elabora o relatório preliminar no qual propõe ao órgão
adjudicante a ordenação das propostas e a eventual exclusão de algumas delas (art. 146º CCP);

7. Audiência prévia: todos os concorrentes têm possibilidade de se pronunciar sobre o relatório preliminar, que
lhes foi previamente enviado pelo júri (art. 147º CCP);

8. Relatório final: o júri elabora o relatório final, ponderando as observações dos concorrentes, no qual mantém
ou modifica as conclusões do relatório preliminar;
(+) Se houver alteração na ordenação das propostas, o júri terá de conceder nova audiência prévia aos concorrentes e de
elaborar um segundo relatório final (art. 148º CCP).

9. Negociação: em determinados contratos poderá haver lugar a uma fase de negociação dos atributos das
propostas, aberta a todos os concorrentes ou apenas àqueles que foram ordenados nos lugares cimeiros. Havendo esta
fase, seguem-se-lhe as seguintes (arts. 149º e ss. CCP):
a) Apresentação das propostas finais;
b) Segundo relatório preliminar;
c) Audiência prévia;
d) Segundo relatório final (se o segundo relatório preliminar for alterado na sequência da audiência).
Esta fase é exclusiva de determinados contratos » (i) contratos de concessão de obras públicas ou de serviços de qualquer
valor, (ii) contratos de empreitadas de obras públicas e contratos de locação ou aquisição de bens ou serviços, cujo valor
se situe abaixo dos limiares europeus.
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10. Ato de adjudicação: o órgão adjudicante escolhe entre as várias ofertas.

11. Pós-adjudicação e celebração do contrato.

NOTA: os arts. 155º e ss. CCP disciplinam o designado “concurso público urgente”.

FASES CONCURSOS PÚBLICOS » SÍNTESE:


1ª. Fase Fase da iniciativa
2ª. Fase Fase da apresentação das propostas dos concorrentes
3ª. Fase Fase da análise e avaliação das propostas pelo júri
4ª. Fase Fase de preparação da adjudicação
5ª. Fase (Eventual) fase de negociação das propostas (149º e ss.)
6ª. Fase Fase da adjudicação

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76.4 CONCURSO LIMITADO POR PRÉVIA QUALIFICAÇÃO


É um procedimento bifásico, uma vez que contempla uma fase de qualificação e uma fase de adjudicação (na qual
participam os operadores económicos qualificados na 1ªfase).
Em traços essenciais, a tramitação da fase de qualificação desenvolve-se da seguinte forma:

1. Anúncio: o procedimento inicia-se com a publicação de um anúncio no DR e, eventualmente, no JOUE. São


ainda disponibilizados aos interessados as peças do procedimento (Programa do procedimento; Caderno de encargos);

2. Solicitação e prestação de esclarecimentos (+) retificação de “erros e omissões” contidos nesses documentos
(sub-fase de apresentação de candidaturas);

3. Apresentação de candidaturas: os candidatos apresentam as candidaturas, sem disponibilizada uma lista dos
candidatos e facultado o acesso a todas as candidaturas recebidas;

4. Relatório preliminar da fase de qualificação: o júri elabora o relatório preliminar, no qual propõe ao órgão
adjudicante a qualificação dos candidatos e, eventualmente, a exclusão de algumas candidaturas (art. 184º) – sub-fase de
qualificação dos candidatos);

5. Audiência prévia: todos os candidatos têm direito a pronunciar-se, depois de terem recebido o relatório
preliminar, enviado pelo júri (art. 185º CCP);

6. Relatório final da fase de qualificação: o júri pode manter ou alterar as conclusões a que havia chegado no
relatório preliminar (art. 186º CCP);

7. Decisão de qualificação: o órgão adjudicante seleciona os candidatos a prosseguir para a fase seguinte,
notificando-lhes a sua decisão (art. 188º) ou, nos procedimentos com anúncio no JOUE, todos os candidatos qualificados
(art. 187º), juntamente com o relatório final (art. 187º).

8. Nos procedimentos com anúncio no JOUE, segue-se, sob pena de caducidade de decisão de qualificação, a
apresentação de documentos comprovativos do preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade técnica ou
financeira e a confirmação dos compromissos de terceiras entidades, nos termos do art. 187º.

Note-se, que, decorrido o prazo de apresentação de candidaturas, segue-se a fase de análise das candidaturas. Nesta
fase, o júri procede à verificação do preenchimento dos requisitos mínimos de capacidade técnica e financeira (art. 178º
CCP).
A qualificação dos candidatos pode ser realizada de acordo com dois modelos (arts. 179º e 181º CCP):
• Modelo simples de qualificação (art. 179º) são qualificados todos os candidatos que preencham os requisitos
mínimos de capacidade técnica e financeira;
• Modelo complexo de qualificação (art. 181º) a qualificação é efetuada segundo o critério da maior capacidade
técnica e financeira (segundo um modelo de avaliação sujeito ao disposto no art. 139º CCP).
Portanto, se no modelo simples são qualificados todos os candidatos que preencham os requisitos mínimos, no
modelo complexo só serão qualificados os candidatos que, preenchendo os requisitos mínimos, se encontram nos lugares
cimeiros de uma listagem que os ordena segundo a sua maior capacidade técnica e financeira (de acordo com o disposto
no art. 164º/1/m) CCP) + art. 165º.

A tramitação subsequente corresponde a uma fase de adjudicação:

9. Convite à apresentação de propostas: com a notificação da decisão de adjudicação, o órgão adjudicante envia
aos candidatos qualificados um convite à apresentação de propostas (art. 189º CCP);

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10. Daqui em diante o procedimento segue os mesmo termos que o concurso público (nos pontos 2. e ss. dos
acima expostos), com uma importante diferença: o concurso limitado por prévia qualificação não admite fase de
negociação (art. 162º CCP) !

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PEÇAS do procedimento (art. 40º)


O art. 40º/1 CCP enuncia as peças do procedimento consoante o tipo de procedimento em causa. Fundamentalmente,
são peças do procedimento:
• o caderno de encargos (exigível em todos os procedimentos);
• o programa do procedimento (não exigível apenas no ajuste direto e consulta prévia);
• o anúncio (apenas não presente no ajuste direto e consulta prévia); e
• o convite à apresentação das propostas (apenas não presente no concurso público).

NOTA: caso particular do diálogo concorrencial que inclui, além do mais, o convite à apresentação das soluções (art. 209º)
e a memória descritiva (art. 207º).

Note-se, que o catálogo legal das peças do procedimento, desde a revisão de 2017, inclui o anúncio. Este assinala o inicio
do procedimento, a que se referem o art. 130º, 131º, 157º, 167º, 197º, 208º e 218º-A/2.
Contudo, o art. 40º não inclui o convite à participação em leilão eletrónico (art. 142º).

As peças do procedimento são aprovadas pelo órgão competente para a decisão de contratar (art. 40º/2). Sendo que
esta aprovação constitui uma etapa decisiva do procedimento de formação de um contrato, em que o órgão adjudicante
declara para o exterior a sua intenção de contratar (anúncio), define os termos específicos e particulares da
regulamentação aplicável ao procedimento (programa do procedimento e convite) e descreve os elementos essenciais do
conteúdo do contrato que pretende celebrar (caderno de encargos).

Quanto aos meios de publicitação das peças do procedimento: art. 133º/1, 2, 6 e 7.


 do ajuste direto e consulta prévia – art. 115º/4 – convite efetuado por meios eletrónicos.

1.1 Programa do procedimento (art. 41º)


Nos termos do art. 41º CCP, o programa do procedimento é o regulamento: “que define os termos a que obedece a fase
de formação do contrato até à sua celebração”. Logo, a natureza jurídica do programa do procedimento é indicada pelo
CCP – regulamento administrativo.
Quanto ao conteúdo dos diversos programas do procedimento vejam-se as seguintes normas:
• Concurso público » art. 132º CCP;
• Concurso limitado por qualificação prévia » art. 164º CCP;
• Procedimento de negociação » art. 196º CCP;
• Diálogo concorrencial » art. 206º CCP.
No conteúdo do programa do procedimento destacam-se a indicação do critério de adjudicação e, quando for caso disso,
a apresentação do modelo de avaliação das propostas (nas hipóteses de procedimentos bifásicos).

1.2 Caderno de encargos (art. 42º)


O caderno de encargos pode definir-se como (art. 42º/1 CCP): “a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir
no contrato a celebrar”.

Os conteúdos das cláusulas (e dos anexos) do caderno de encargos cumprem, em geral, as seguintes funções principais:
• Proceder à identificação do objeto do contrato, mediante descrição das suas características, designadamente em
termos de desempenho e de requisitos funcionais (ex: construção de um edifício de uma certa dimensão e com
certas características);
• Determinar, em termos definitivos, fechados e finais, certos aspetos da execução do contrato (ex: as condições de
execução da empreitada do contrato de construção de um edifício).

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• Indicar, em termos não definitivos (em termos mais abertos e flexíveis), certos aspetos de execução do contrato,
que serão determinados no contrato nos termos da proposta selecionada (ex: edifício deverá estar concluindo em
16-20meses);
• Indicar os aspetos de execução do contrato que devem ser definidos na proposta dos concorrentes e em função
dos quais cada proposta vai ser avaliada e classificada (ex: o preço);
• Indicar as condições jurídicas do contrato (ex: penalidades e causas de resolução).

Ver ainda art. 43º (caderno encargos do procedimento de formação de contratos de empreitadas); art. 44º (caderno de
encargos relativos a contratos de concessão); art. 45º (caderno de encargos das parcerias público-privadas); art. 46º
(formulários de caderno de encargos – formulários-tipo de caderno de encargos).

E art. 49º » cláusulas sobre o objeto do contrato: especificações técnicas.

As cláusulas sobre aspetos de execução do contrato podem descrever e distinguir (art. 42º/11):
• Aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência;
• Aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência.

Cláusulas sobre condições de natureza social, ambiental ou relativas a outras finalidades públicas (art. 42º/6).

Sublinhe-se que, em caso de divergência, o disposto no caderno de encargos prevalece sobre o teor da proposta ou do
clausulado contratual (art. 96º/5 e 6 CCP).

1.3 Convite
O convite pode surgir em momentos diferentes consoante o procedimento:
• Ajuste direto e consulta prévia: inicia todo o procedimento, “substituindo”, de certa forma, o anúncio e o
programa do procedimento (art. 115º CCP).
• Procedimentos bifásicos: inicia a 2ª fase do procedimento (fase de proposta e adjudicação), dirigindo-se aos
candidatos selecionados na 1ª fase (arts. 189º, 199º, 217º e 218º-B CCP).

83. Princípio da estabilidade das peças do procedimento


Os princípios da concorrência e da igualdade determinam a estabilidade das peças do procedimento, ou seja, a proibição
de alterar as regras nelas contidas, pelo menos após a apresentação de candidaturas ou propostas.
Não obstante, esta não é uma proibição absoluta. Em determinados casos, a alteração das peças do procedimento pode
ser legítima e, por isso, não violar o princípio da estabilidade.

Alteração das peças do procedimento até ao final do prazo de apresentação das propostas (art. 50º). Sendo que o CCP
não regula as alterações após esse prazo.

84. Prevalência do CCP sobre as peças do procedimento (art. 51º)

85. Impugnação das peças do procedimento (art. 103º/1 CPTA)

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PROPOSTA e CANDIDATURA
1. Candidatura
Art. 52º » candidato

2. Proposta
Art. 56º/1 » concorrente

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ADJUDICAÇÃO: critério de adjudicação » o critério da proposta económica melhor » art. 74º

Duas modalidades:
• Critério multifatorial (qualidade-preço):
• Critério unifatorial (preço): só é permitida nos casos do art. 74º/3

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