Você está na página 1de 24

I - Deliberações sociais


1 - Noção e formas de deliberação dos sócios

O conjunto dos sócios (órgão comum a todos os tipos de sociedade comercial - “coletividade de sócios” ou
“assembleia de sócios”) decide mediante “deliberação”. Embora sem o afirmar expressamente, é neste pressuposto
que assenta o CSC, desde logo ao intitular o Capítulo IV da sua Parte Geral de “deliberações dos sócios” (arts. 53º e
ss.). Da leitura dessas normas resulta ainda que o legislador seguiu um conceito amplo de deliberação, uma vez
que não o associou exclusivamente ao chamado “método de assembleia” - para que se possa falar de
“deliberação dos sócios” não é mister que estes tenham decidido em reunião (falando-se em reunião de sócios,
assembleia de sócios ou colégio dos sócios) - presença no mesmo local e ao mesmo tempo -, bastando que os sócios
tenham contribuído com a sua declaração de vontade - o voto - para tal decisão, ainda que essas declarações de
vontade tenham sido por si emitidas em tempos e/ou lugares distintos1. Por ser assim, o CSC também apelida de
deliberações aquelas decisões tomadas sem reunião dos sócios, como é o caso das “deliberações unânimes por voto
escrito” (art. 54º/1, 1ª Parte) e das “deliberações por voto escrito” (art. 247º/1 CSC). Ponto é que, uma vez mais, as
decisões sejam imputáveis ao órgão coletividade dos sócios.

A lei, para além de ter prescindido da existência de uma reunião dos sócios no conceito que adotou de “deliberação”,
também não distingue consoante a decisão seja tomada por unanimidade dos votos ou apenas pela maioria
destes, tanto podendo a deliberação resultar de uma decisão alcançada por vontade unânime dos sócios, como
por vontade de uma maioria2 apenas.

O CSC já não trata, porém, de definir a natureza jurídica das deliberações dos sócios3 . Tanto a doutrina nacional quanto
a doutrina estrangeira estão longe de subscrever uma opinião que se possa considerar unânime. Contudo, entre nós
parecia prevalecer, até há uns anos, o entendimento de que a deliberação é, ao menos em regra, como negócio jurídico
da sociedade, formado pela declaração de vontade dos sócios - expressa através do seu voto4 . Nas palavras de
COUTINHO DE ABREU, “as deliberações dos sócios são, em regra, negócios jurídicos: atos jurídicos constituídos por uma5
ou mais declarações de vontade (votos), com vista à produção de certos efeitos sancionados pela ordem jurídica”.
Sublinhe-se, por um lado que a deliberação é um negócio jurídico da sociedade (e não dos sócios), e por outro

1Desde 2006, passou a ser admitido nas assembleias gerais de todas as sociedades anónimas, e não apenas nas sociedades abertas, o voto por correspondência (art. 384º/9
CSC). Sendo emitidos votos por correspondência, as deliberações tomadas, na medida em que passam a resultar de votos emitidos fora da assembleia - e portanto, num tempo e
espaço diferente -, não resultam de um funcionamento puramente colegial do órgão, podendo falar-se de um funcionamento misto, em parte colegial e em parte conjunto.

2Maioria que tanto pode ser simples (art. 386º/1 CSC), como qualificada (arts. 265º/3, 294º/1 e 386º/3 CSC); maioria que, por outro lado, tanto poderá ser achada por referência aos
votos emitidos (art. 386º/1 e 3 CSC), como à totalidade dos votos correspondentes ao capital social (arts. 265º e 294º/1 CSC), consoante a lei ou o contrato determinem. Sublinhe-
se, por isso, que a determinação do quórum deliberativo assenta em 2 fatores distintos - por um lado o universo de votos que deverá ser considerado [se todos os votos
correspondentes ao capital social, se os votos correspondentes aos sócios presentes na assembleia, se apenas os votos emitidos (não se considerando, então as abstenções)]; por
outro lado, a fração ou percentagem de votos que, nesse universo previamente determinado, se exige para que a deliberação se considere aprovada (se mais de metade dos votos,
se 2/3, se 3/4, etc...

3Ainda de que do facto de os arts. 55º e ss. CSC tratarem da invalidade (em sentido amplo) das deliberações se possa retirar um argumento a favor da qualificação das
deliberações como negócios jurídicos.

4 Veja-se a divergência existente:

1. V. LOBO XAVIER, MENEZES CORDEIRO e E. LUCAS COELHO subscreviam esta posição.

2. LUIS BRITO CORREIA - “as deliberações sociais podem, pois, ser negócios jurídicos ou meras declarações negociais (componentes de outros negócios jurídicos) singulares (e
unilaterais) ou plurilaterais. Têm, pois, uma natureza sui generis, constituindo uma categoria própria, que se distingue tanto dos (demais) negócios jurídicos unilaterais, como
dos (demais) negócios jurídicos plurilaterais.”.

3. J. OLIVEIRA ASCENSÃO - “a deliberação é um ato colegial subespécie do ato coletivo”.

4. PINTO FURTADO - “preferimos ver na deliberação constituída por uma declaração unilateral de vontade plurissubjetiva uma categoria jurídica sui generis e não um negócio
jurídico.”.

5Ao admitir que a deliberação possa decorrer da declaração de vontade de um sócio apenas, COUTINHO DE ABREU afasta-se da opinião, subscrita por alguma doutrina, segundo a
qual não há deliberação (sem sequer assembleia) nas decisões tomadas por um sócio apenas.

Página 1 de 24
lado que é apenas à deliberação que cabe a qualificação de negócio jurídico e já não aos votos de que ela resulta - tais
votos constituem isso sim, declarações de vontade dos sócios6.

2 - “Formas” de deliberação. Princípio da taxatividade

O art. 53º CSC fixa o chamado princípio da taxatividade das “formas” de deliberação dos sócios.

1. Em qualquer tipo de sociedade, os sócios podem tomar:

1. Deliberações em assembleia convocada (arts. 189º/1, 247º/1 in fine, 373º/1 e 472º/1 CSC);

2. Deliberações em assembleia universal (art. 54º/1/2ª Parte CSC);

3. Deliberações unânimes por escrito (art. 54º/1/1ª Parte CSC).

2. Nas sociedades por quotas e nas sociedades em nome coletivo podem ainda ser tomadas deliberações por
voto escrito (arts. 247º/1 e 189º/1 CSC).

2.1 - Deliberações tomadas em assembleia geral convocada e deliberações tomadas em assembleia universal

Ambas resultam de uma reunião dos sócios, mas distinguem-se por um aspeto do seu procedimento - as segundas são
adoptadas numa assembleia que não foi precedida de um ato de convocação7 dirigido a todos os sócios - como deveria
ter sido -, mas em que todos estiveram presentes e, além disso, em que todos manifestaram vontade de que a
assembleia se constituísse e deliberasse sobre determinado assunto (art. 54º/1/2ª Parte). Identificamos, pois, 3
pressupostos cumulativos que se têm de verificar para ocorrer assembleia universal:

1. Presença de todos os sócios - basta que esteja ausente um sócio para que a assembleia já não possa ser
considerada universal. PINTO FURTADO acrescenta ainda outro requisito - o da presença de todos aqueles sujeitos
que não sendo sócios todavia podiam ou tinham o dever de assistir à assembleia geral (como os administradores e
administradores executivos nas sociedades anónimas, dos gerentes nas sociedades por quotas, membros do
conselho fiscal obrigacionistas das sociedades anónimas, etc...) -, mas PEDRO MAIA, e aparentemente também E.
LUCAS COELHO e PAULO OLAVO CUNHA discordam.

2. Assentimento de todos os sócios em que a assembleia se constitua - não vale o encontro ocasional de todos
os sócios, sendo precisa a vontade destes (todos!) de se constituírem em assembleia; também não se trata de
assembleia universal se alguns deles não quiserem que a assembleia se constitua.

6Sendo que em alguns casos o voto talvez não deva ser entendido como uma declaração de vontade, mas sim como uma declaração de ciência (p. ex., na deliberação de
aprovação do relatório e contas da sociedade) - V. LOBO XAVIER, LUÍS BRITO CORREIA e PINTO FURTADO (este último ainda distingue o voto como declaração de sentimento).

7 Ou não existiu de todo convocação, ou a convocação efetuada padece de algum vício - PINTO FURTADO.

Página 2 de 24
3. Vontade também unânime de que a assembleia a constituir delibere sobre determinado assunto - todos os
sócios terão de concordar em que se delibere sobre determinado assunto; porém, uma vez decidido por
unanimidade que a assembleia deliberará sobre tal assunto, a deliberação a tomar considerar-se-á aprovada
quando reúna os votos necessários para o efeito nos termos gerais, que pode não ser a unanimidade (art. 54º/2
CSC).


Compreendem-se as razões que levaram o nosso legislador a admitir que os sócios possam deliberar em assembleia
universal - a falta do ato de convocação não prejudica quaisquer interesses, uma vez que os sócios estão
presentes e todos manifestam a sua vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado
assunto. No fundo, os propósitos do ato de convocação (chamar os sócios a estarem presentes numa reunião) foram
conseguidos (eventualmente de modo mais eficaz) mesmo sem esta.

Uma vez constituída validamente a assembleia universal, esta rege-se pelos mesmos preceitos legais e contratuais
relativos ao funcionamento das assembleias convocadas (art. 54º/2 CSC). Note-se que numa sociedade anónima,
especialmente naquelas em que haja alguma disseminação do seu capital, dificilmente ocorrerão na prática os
pressupostos que a lei exige para a validade das deliberações tomadas em assembleia não convocada.

2.2 - Deliberações unânimes por escrito

Estas não são adoptadas em assembleia dos sócios. A derrogação ao chamado “método da assembleia” justifica-se
com a desnecessidade ou inutilidade de tal método quando os sócios tenham uma opinião unânime. Se todos os sócios
estão de acordo com a deliberação a tomar, uma eventual assembleia de nada aproveitaria - nenhum sócio ia mudar de
opinião porque nenhum outro o iria persuadir a tal. Por isso é que o legislador dispensou a realização de uma
assembleia, com os incómodos e custos daí advenientes, quando todos os sócios votem unanimemente uma dada
proposta de deliberação.

2.3 - Deliberações por voto escrito

As deliberações por voto escrito só são admitidas nas sociedades por quotas, e em nome coletivo (comandita
simples?)8 . Também nestas não há uma reunião de sócios. Mas, seguindo o processo disposto no art. 247º CSC, estas
não têm que ser aprovadas por unanimidade para que sejam válidas, antes podem resultar da mesma maioria
exigida para a aprovação de idêntica deliberação em assembleia de sócios. Ponto é que todos tenham sido
convidados a exercer o seu direito de voto e tenham aceite dispensar a realização de uma assembleia. Mas, uma vez
verificado esse convite, podem não votar todos os sócios, e a deliberação será aprovada mesmo com votos contra
(desde que reúna o quórum deliberativo exigido). Assim, E. LUCAS COELHO defende que a aludida diferença não permite,
nem por analogia a aplicação do regime das deliberações unânimes por escrito. L. BRITO CORREIA discorda.

As deliberações por voto escrito constituem uma exceção mais relevante ao “método de assembleia” do que as
deliberações unânimes por voto escrito, uma vez que nestas a opinião unânime dos sócios sobre determinado assunto

8Cabe questionar se não se aplicará também às sociedades anónimas, sobretudo tendo em consideração a reforma de 2006 - agora admite-se o voto por correspondência,
questionando-se qual a razão para proibir o voto escrito. Se se entender que pode ser aprovada uma deliberação apenas com base em votos por correspondência (em virtude de
nenhum acionista ter comparecido à assembleia) dificilmente se poderá recusar a adoção de um iter processual que é até mais exigente, como sucede com a deliberação por voto
escrito, visto que para esta se exige o consentimento unânime dos sócios para a dispensa do método colegial (art. 247º/3 CSC).

Página 3 de 24
justifica a inexistência de uma reunião. Nas deliberações por voto escrito, visto que não se exige a unanimidade, sempre
se poderá dizer que a assembleia - e a concomitante discussão no seu seio sobre o assunto a deliberar - poderia ditar
um diferente sentido de voto de algum ou alguns dos sócios. Em tais casos, a observância do “método de assembleia”
poderia interferir no sentido da deliberação. É por a derrogação do método de assembleia se mostrar aqui mais grave
que o legislador só previu este tipo em dois tipos de sociedades.

Note-se que E. LUCAS COELHO sustenta a admissibilidade do voto por correspondência a todos os tipos de sociedade, opinião que não
sufragamos em linha com J. OLIVEIRA ASCENSÃO.

A alteração introduzida pela Reforma de 2006, no art. 384º/9 CSC assume uma grande relevância dogmática, visto que
se passou a admitir, supletivamente, o voto por correspondência para todas as sociedades anónimas, com o que o
papel da colegialidade foi diminuído evidentemente.

Cfr. art. 384º/9 CSC, admitindo-se a emissão de voto por correspondência nas anónimas, salvo disposição do contrato em sentido
contrário. Todos os contratos de sociedade anónima devem, afinal, tratar do voto por correspondência - mesmo o contrato de
sociedade que não preveja o voto por correspondência nem por isso poderá deixar de o regular (nos casos em que seja excluído,
então terá de ser regulado); nas sociedades que o admitam, deve ser regulado “o seu exercício, estabelecendo, nomeadamente, a forma de
verificar a autenticidade do voto e de assegurar, até ao momento da votação, a sua confidencialidade (…)” - art. 389º/4 CSC. Assim, todas as

sociedades anónimas tiveram de proceder a uma alteração do respetivo contrato, e por força do art. 63º/2 do DL nº76-A/2006, poderá
efetuar-se até 30 de Junho de 2007 (uma vez que é matéria que cuja aplicação pode ser afastada pelos estatutos). No que toca às
sociedades anónimas abertas, uma vez que o voto por correspondência não pode ser totalmente afastado pelos estatutos (art. 22º
CMV), não se aplicou o prazo referido mas antes a data de entrada em vigor do novo CSC (30 de Junho de 2006). E note-se que este
regime, já em vigor antes anteriormente para as sociedades abertas, não corresponde em rigor com aquele agora previsto para todas
as sociedades anónimas - agora exige-se que o contrato de sociedade regule a matéria (anteriormente, apenas se exigia que na
convocatória fosse regulado o voto por correspondência); por outro lado agora impõe-se que o contrato previna a possibilidade de as
propostas de deliberação serem alteradas no decurso da assembleia (ou de nesta surgirem novas propostas), prevendo a lei 1 de 2
possibilidades de tratamento a dar aos votos por correspondência (art. 384º/9/a) e b) CSC), e o contrato de sociedade terá de
mencionar qual das 2 opções colhe, sendo que o contrato que não exclua o voto por correspondência terá de ser alterado de forma
respeitar tal exigência.

3 - Competência deliberativa dos sócios

A assembleia de sócios/coletividade de sócios é o “órgão supremo da sociedade” no sentido não de os sócios terem
todos os poderes sociais, mas antes de que as matérias mais importantes e decisivas matérias na vida da sociedade
inscritas na sua esfera de competências. É aos sócios que cabe a eleição dos membros do órgão de gestão e do órgão
de fiscalização da sociedade; deliberar sobre a aprovação de contas e a aplicação de resultados; alteração do contrato,
etc... Seja diretamente - quando deliberem eles próprios sobre determinados assuntos - ou indiretamente - quando são
chamados a eleger os membros dos órgãos com competência para decidir sobre tais matérias - sempre se pode afirmar
que, em última instância, é aos sócios que pertence todo o poder dentro da sociedade. Claro está que, na prática,
muitas vezes os sócios se alheiam da vida da sociedade, acabando por ser o órgão de gestão a decidir (ou até a
determinar de facto a decisão) sobre a generalidade das matérias sociais - fala-se de um grande absentismo dos sócios
nas assembleias gerais, naquelas sociedades anónimas em que ocorreu uma pulverização do capital social, levando a
uma transição de poderes da assembleia para o conselho de administração/conselho geral.

Vejamos o elenco das competências dos sócios:

Página 4 de 24
1. Sociedades em nome coletivo - o art. 189º CSC remete para o regime das sociedades por quotas (art. 246º CSC).
Porém, veja-se o nº3. Uma vez que as matérias aqui referidas (excetuando a nomeação de gerentes de comércio)
integram igualmente o círculo de competências dos sócios das sociedades por quotas [arts. 246º/1/e) e g) e art.
254º/1 CSC] e tendo em conta a remissão efetuada no art. 189º/1 CSC, cabe perguntar qual o sentido deste nº3. Por
que razão o legislador terá vindo estabelecer especificamente, no art. 189º/3 CSC a competência imperativa dos
sócios para deliberar sobre certas matérias, sendo certo que essa competência já decorreria aparentemente da
remissão do nº1? Parece que não é de admitir que a remissão feita para o art. 246º CSC já engloba as
competências dos sócios.

2. Sociedade por quotas - o art. 246º CSC arruma as competências em 3 grupos:

1. Competências imperativas ou mínimas - aquelas que cabem necessariamente aos sócios, não podendo o
contrato de sociedade atribuí-las a outro órgão (nº1).

2. Competências dispositivas ou supletivas - aquelas que cabem aos sócios, a não ser que o contrato
disponha diversamente (nº2).

• Ex.: quanto à designação de gerentes, nos termos do art. 252º/2 CSC, esta em vez de resultar de deliberação dos
sócios, pode revestir outra forma, como será o caso de um direito especial de um ou vários sócios designarem um ou
vários gerentes.

3. Competências contratuais ou estatutárias - as que pertencem aos sócios caso o contrato assim o
determine; mas na falta dessa previsão, tais competências incumbem a outro órgão (corpo do art. 246º/1
CSC).

4. Competência residual (art. 259º CSC) - os sócios, além das competências que a lei ou o contrato
especificamente lhe atribuam, detêm ainda uma competência residual. Mesmo sem expressa previsão legal
(competências imperativas ou dispositivas) ou contratual (competência estatutária), os sócios podem
deliberar sobre todos os assuntos relacionados à sociedade, a não ser que tais matérias se inscrevam, por
força de lei ou do contrato, na esfera de competência de outro órgão.

3. Sociedades anónimas - a distribuição de competências entre a assembleia (coletividade de sócios) e o órgão de


administração é muito mais rígida que nas sociedades por quotas (art. 373º/2 CSC). Podemos falar de:

1. Competências imperativas - aquelas que pertencem por força da lei aos acionistas e não lhes podem ser
retiradas pelo contrato (exs.: arts. 376º/1/b); c) + 455º/1; d) + 391º/1; d) + 435º/1; d) + 415º/1; 85º/19; 456º/1
+ 457º/1; 94º/1; 103º; 120º; 133º CSC, etc…).

2. Competências dispositivas - aquelas que, atribuídas por lei aos acionistas, podem ser, dentro de certos
limites, diferidas pelo contrato de sociedade a outro órgão - p. ex., aumento do capital social, art. 456º/1
CSC; e alteração da sede da sociedade, art. 12º/2 CSC. Poderá colocar-se a questão de se saber se o
contrato de sociedade, do mesmo passo que remete para outro órgão certas competências da assembleia,

9 A não ser nos casos excecionais em que a lei admite a atribuição cumulativa dessa competência a algum outro órgão.

Página 5 de 24
pode retirar a esta tais poderes ou se, ao invés, deve entender-se que a assembleia permanecerá (de par
com outro órgão) necessariamente competente para efetuar o aumento de capital ou a alteração da sede.

3. Competências contratuais - as que o contrato, ao abrigo do art. 373º/2, remeta para os acionistas,
ressalvado o limite imperativo do nº310.

4. Competência residual - como decorre da 2ª parte do art. 373º/2, os accionistas são ainda competentes para
deliberar sobre aquelas matérias que não caibam, por força da lei ou do contrato, nas atribuições de outro
órgão.

4. Sociedades em comandita - arts. 474º (remissão do regime das comanditas simples para o da sociedade em nome
coletivo) e 476º CSC (remissão do regime das comanditas por ações para o da sociedade anónima).

II - Deliberações dos sócios ineficazes e inválidas

Como negócio jurídico que é, a deliberação pode ser ineficaz em sentido amplo:

•  Invalidade (nulidade ou anulabilidade)

•  Ineficácia em sentido estrito



Todos estes casos de ineficácia em sentido amplo das deliberações foram previstos no CSC - a ineficácia em sentido
estrito no art. 55º; a nulidade no art. 56; e a anulabilidade no art. 58º. 


1 - Deliberações ineficazes

O art. 55º CSC dispõe que, “salvo disposição legal em contrário, as deliberações tomadas sobre assunto para o
qual a lei exija o consentimento de determinado sócio são ineficazes para todos enquanto o seu interessado
não der o seu acordo, expressa ou tacitamente” - justifica-se nos casos em que a “imperfeição” da deliberação não
se traduz nem numa anulabilidade (não se requer uma ação anulatória para a privar dos seus efeitos) nem numa
nulidade (já que a deliberação, vencida a falta ou o vício de um elemento externo ao negócio, produzirá efeitos jurídicos)
- V. LOBO XAVIER.

Trata-se, p. ex., de situação em que os sócios deliberam retirar ou restringir um direito especial de um consócio. Não se
conceberia, por um lado, que uma tal deliberação pudesse produzir os seus efeitos sem, ou mesmo contra a vontade do
sócio afetado. Mas, por outro lado, tanto o regime da nulidade como o da anulabilidade seriam imprestáveis - a nulidade
não colhe porque, estando em causa um direito disponível pelo sócio, seria absurdo sujeitar a deliberação a uma reação
tão severa como a da nulidade; a anulabilidade também não se mostra adequada, uma vez que sempre obrigaria o
sócio, para obstar à produção dos efeitos jurídicos a que a deliberar tendia, a interpor ação anulatória, devendo

10 Coutinho de Abreu defende o caráter imperativo deste nº3 somente para as sociedades anónimas de estrutura dualista (modelo germânico).

Página 6 de 24
conformar-se com a sanação do vício, caso não exercesse o seu direito de anulação no apertado prazo previsto para o
efeito (30 dias, art. 59º/1 CSC).

Com a ineficácia, os efeitos da deliberação ficam “paralisados”, sem que para tanto o sócio afetado precise de
intentar qualquer ação. Basta que ele não dê o seu acordo - mais vantajoso para o sócio que a anulabilidade.

O enunciado do art. 55º CSC sugere que só serão ineficazes aquelas deliberações que requeiram o consentimento de
“determinado sócio”, isto é, só serão ineficazes as deliberações que afetem direitos especiais de sócios (art. 24º
CSC).

É vasto o elenco de possíveis direitos especiais dos sócios. Exs.:

1. art. 250º/2 CSC - direito de voto duplo nas sociedades por quotas;

2. art. 257º/3 CSC - direito à gerência;

3. art. 391º/2 CSC - direito de veto na eleição de parte do conselho de administração da sociedade anónima;

4. art. 265º/2 CSC - direito de veto nas deliberações de alteração do contrato de sociedade por quotas. Importa notar que será
ineficaz a deliberação que altere o contrato de sociedade dele retirando a cláusula que atribua o direito especial; mas já não uma
qualquer deliberação de alteração do contrato que, deixando intacto o direito especial, não tenha colhido o voto favorável do sócio
titular do referido direito especial [esta deliberação é anulável, uma vez que padece de um vício de procedimento - art. 58º/1/a)
CSC]

Todavia, outros casos há em que, não obstante não se preceituar a necessidade de acordo de determinado
sócio, se exige o consentimento de todos os sócios, e em que parece justificar-se, igualmente, o regime da
ineficácia. Exs.:

1. Deliberação que altere o contrato de sociedade por quotas, introduzindo-lhe uma causa de amortização da quota em
que tal deliberado seja favoravelmente votado por todos os sócios (arts. 233º/2 in fine CSC) 11;

2. Deliberação que introduza no contrato de sociedade anónima uma cláusula restringido a transmissão de ações
nominativas sem o consentimento dos respetivos titulares (art. 328º/3 CSC)12.

3. Deliberação que aprove a transformação de uma sociedade de responsabilidade limitada (por quotas ou anónima)
numa sociedade em nome coletivo, sem que os sócios tenham votado unanimemente essa deliberação (art. 133º/2
CSC)13.

4. Aumento das prestações impostas pelo contrato aos sócios (art. 86º/2 CSC).

5. Caso de fusão de sociedades (art. 103º/2 e 3 CSC).

11 Posição de V. LOBO XAVIER, em face do Projeto do Código.

12 Posição de M. NOGUEIRA SERENS.

13 Ainda que este art. aluda à validade da deliberação, parece que aí se trata de uma verdadeira ineficácia.

Página 7 de 24
6. Em matéria de transformação de sociedades (art. 136º/1 CSC).

7. Amortização da quota (art. 233º CSC).

8. Destituição de administradores sem justa causa (art. 403º/2 CSC).

De notar que a ineficácia só ocorre quando a exigência do consentimento de determinado sócio (ou de todos os
sócios) decorra da lei. Se, ao invés, for o contrato de sociedade a impor, p. ex., o consentimento de todos os sócios
para aprovar uma deliberação sobre determinado assunto, não se cumprindo esse requisito, a deliberação será anulável
(deliberação anulável por vício de procedimento, decorrente da violação de uma cláusula estatutária) e já não ineficaz.

A ineficácia prescrita no art. 55º CSC é absoluta, visto que a deliberação não produz quaisquer efeitos.

2 - Deliberações inválidas

Abordaremos apenas o regime geral da invalidade das deliberações dos sócios. Não iremos aqui tratar, p. ex., o regime especial
da invalidade das deliberações atinentes à aprovação de contas e do relatório de gestão (art. 69º CSC). Sobre esse regime especial
cabe referir que o legislador se guiou por 2 preocupações principais:

1. Em primeiro lugar, tornar claro que a nulidade de tais deliberações ocorrerá sempre que sejam violados preceitos legais relativos à
constituição, reforço ou utilização da reserva legal, bem como de preceitos cuja finalidade exclusiva ou principal seja a proteção dos
credores ou do interesse público (art. 69º/3 CSC);

2. Por outro lado, permitir que as contas em si mesmas irregulares sejam corrigidas “em casos de pouca gravidade ou fácil correção”,
só havendo lugar à anulação da deliberação que as tenha aprovado caso a correção ordenada pelo juiz não seja efetuada dentro
do prazo por si fixado (art. 69º/2 CSC).

O regime da invalidade das deliberações assenta na distinção entre vícios ocorridos no procedimento deliberativo
e vícios do conteúdo da deliberação14.

O procedimento deliberativo constitui uma sucessão de atos ordenados de certo modo em vista da produção de
determinado efeito final. Integram-se, pois, entre outros, no procedimento de uma deliberação:

1. Convocação da reunião;

2.  Reunião (se for esse o caso) dos sócios;

3. Discussão e apresentação de propostas;

4.  Votação;

5. Contagem dos votos;

14 Por influencia da obra de V. LOBO XAVIER.

Página 8 de 24
6. Apuramento do resultado;

7. Etc. 


Existindo um vício em qualquer um destes aspetos, isto é, havendo uma desconformidade com o disposto na lei ou no
contrato de sociedade a respeito (ex.: da convocação - da sua forma, conteúdo, antecedência, autoria -, da reunião -
onde deve ocorrer, quem lhe deve presidir, quem tem o direito de estar presente ou de se fazer representar, quem não
pode estar presente, qual a percentagem de capital necessária para que a assembleia possa reunir -, da discussão e
apresentação de propostas - quem e em que termos pode intervir na discussão, quem pode apresentar propostas -, da
votação - quem pode votar, a quantos votos tem direito cada sócio ou o seu representante -, da contagem de votos, do
apuramento do resultado - qual a maioria necessária para se considerar aprovada determinada proposta de deliberação
-, etc) teremos um vício no procedimento da deliberação.

Diferente será o caso de um vício ocorrido no conteúdo da deliberação que é a regulamentação de interesses a que o
ato dá vida, podendo suceder que aquilo que se deliberou atente contra a lei ou o contrato. No vício de procedimento,
o que está em causa é como se chegou a certa deliberação, seja ela qual for. No vício de conteúdo, aquilo que
se sanciona é o que se deliberou. Em regra, os vícios de procedimento conduzem à anulabilidade da deliberação,
sendo que só em casos excecionais [art. 56º/1/a) e b) CSC] lhe cabe a nulidade, nulidade essa que não é pura, e
comunga em alguns aspetos do regime da anulabilidade.

Exemplo de escola - suponha-se uma deliberação de designação de 2 gerentes de uma sociedade por quotas tomada em assembleia,
cujo aviso convocatório foi expedido com a antecedência de 8 dias e suponha-se uma outra deliberação, tomada em assembleia
convocada com 15 dias de antecedência, que introduzisse no contrato de sociedade por quotas uma cláusula que encurtasse o prazo
de convocação das assembleias de sócios de 15 para 8 dias:

1. Na primeira deliberação observa-se um vício no seu procedimento - no “processo de formação do ato”, ato de eleição de 2
gerentes, ocorreu uma desconformidade com a lei, no caso com o art. 248º/3 CSC, que obriga a que a convocatória seja expedida,
no mínimo, com 15 dias de antecedência (e não 8 dias como no caso).

2. Ao invés, na segunda deliberação, supondo que na sua formação não ocorreu nenhuma desconformidade com a lei ou com o
contrato, ocorreu um vício no seu conteúdo - foi aquilo que se deliberou, introduzir no contrato de sociedade determinada cláusula
que atenta contra a lei (art. 248º/3 CSC), a qual não permite que o contrato de sociedade fixe um prazo inferior a 15 dias para a
expedição da convocação.

1. Vícios do procedimento

1.1. Violação de uma norma legal

1.1.1. Imperativa: anulabilidade, salvo invalidade mista [art. 56º/1/a), b), nºs 2 e 3 CSC]

1.1.2. Dispositiva: anulabilidade
1.2. Violação de uma disposição estatutária: gera anulabilidade
2. Vícios no conteúdo

2.1. Violação de uma norma legal
2.1.1. Imperativa: nulidade

2.1.2. Dispositiva: anulabilidade
2.2. Violação de uma disposição estatutária: gera anulabilidade
2.3. Violação da ordem pública ou dos bons costumes: nulidade

Página 9 de 24
Tomando como referência a natureza das normas violadas, poderemos dizer que a violação de uma norma legal
imperativa gerará nulidade - quando o vício ocorra no conteúdo da deliberação - ou anulabilidade - caso o vício ocorra
no procedimento dela, salvo os casos excecionais do art. art. 56º/1/a) e b) CSC. Já a violação de norma dispositiva ou
disposição estatutária não poderá implicar senão a anulabilidade, quer essa violação ocorra no procedimento, quer no
conteúdo (a menos que a disposição do contrato se limite a reproduzir um preceito legal, caso em que, segundo o art.
59º/2 CSC, se considerará diretamente violada a lei, a qual, sendo imperativa e tratando-se de um vício do conteúdo da
deliberação, determinará a nulidade da deliberação).

Qual a razão para esta opção pelo legislador? A explicação está nos diferentes interesses afetados com uma e
outra deliberação.

1. Com um vício de procedimento só serão afetados interesses disponíveis daqueles que no momento do ato eram
sócios, e que por via de regra podem defender através de ação anulatória. A eles e só a eles (os únicos afetados
com tal vício de procedimento), cabe decidir se pretendem a destruição do ato, ou em vez de propor a ação para
destruir o ato, pretendam saná-lo ou renová-lo por entenderem que assim prosseguem melhor os seus interesses.

2. Outro tanto não se pode dizer já no que toca aos vícios de conteúdo da deliberação, que advenham da violação de
norma legal imperativa. A imperatividade da norma só se poderá justificar pela existência de interesses que não
sejam dos sócios (de terceiros, do público em sentido estrito), ou que sendo dos sócios não sejam por estes
disponíveis. A deliberação contra norma imperativa visa derrogar o regime legal, regulamentando os interesses de
forma distinta daquela que a lei efetuou (fixando um regime distinto daquele ínsito na lei) e que foi subtraída à
autonomia privada (daí o caráter cogente da norma). Em tais casos, compreende-se que a produção dos efeitos
jurídicos a que a deliberação tendia não possa aceitar-se, pelo que a deliberação há-de ser nula.

Assim se percebe que a deliberação cujo procedimento atente contra uma norma legal imperativa só serão nulas nos
casos previstos no art. 56º/1/a) e b) CSC, já não assim quanto à violação no procedimento deliberativo de um preceito
de caráter imperativo (meramente anulável) ao contrário do regime civil regra do art. 294º CCiv..

2.1 - Deliberações nulas

As 4 alíneas do art. 56º/1 CSC apresentam as diversas causas de nulidade das deliberações dos sócios15.

• Nas alíneas a) e b) prevêem-se casos em que, contra o que é regra, um vício de procedimento não torna a
deliberação anulável, mas sim nula.

• As alíneas c) e d) cominam a nulidade da deliberação para determinados vícios de conteúdo.


2.1.1 - Deliberações nulas por vícios de procedimento



São nulas as deliberações tomadas em AG não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou

15Parece que além daquelas expressamente previstas no art. 56º CSC, serão ainda causa de nulidade da deliberação quaisquer outras análogas (J. OLIVEIRA ASCENSÃO). MENEZES
CORDEIRO sustenta que não se trata de uma “verdadeira tipicidade taxativa”, visto que a norma abrange “situações de grande amplitude”.

Página 10 de 24
representados [art. 56º/1/ a) CSC]. A falta de convocação pode ser suprida nos casos da chamada assembleia universal
(art. 54º/1/, 2ª Parte, CSC). Nessa hipótese, as deliberações tomadas não padecerão de nenhum vício de procedimento
decorrente da falta de convocação. Ao invés, quando não se cumpram os requisitos da assembleia universal (presença
de todos os sócios, assentimento de todos os sócios em que a assembleia se constitua, e delibere sobre determinado
assunto), haverá que distinguir:

a) Se a reunião da assembleia não convocada tiver ocorrido sem a presença de todos os sócios, as
deliberações nela tomadas são nulas nos termos do art. 56º/1/ a) CSC. A nulidade entende-se bem pelo facto de
que o regime da anulabilidade constituiria um pesado ónus para os sócios não convocados, que ficariam obrigados
a propor ação de anulação para impedir que esta se convalidasse; além de que a falta de convocação põe em causa
importantes direitos dos sócios (como sejam o direito a participar nas deliberações e o direito de voto).

b) Se a reunião da assembleia não convocada tiver ocorrido com a presença de todos os sócios, mas nem
todos tiverem dado o seu assentimento para que a assembleia se constituísse e deliberasse sobre
determinado assunto, as deliberações são meramente anuláveis 16. Ora neste caso, todos os sócios tomaram
conhecimento da existência da assembleia e da deliberação (todos estavam presentes), não se encontrando razões
para excecionar o regime-regra da anulabilidade nas deliberações com vícios de procedimento. O sócio que
compareceu na reunião (mas que não deu o assentimento para que se deliberasse sobre determinado assunto) terá
de lançar mão de uma ação anularia da deliberação se quiser destruir os efeitos jurídicos do negócio. De resto, esta
situação é semelhante àquela em que, em assembleia regularmente convocada, se delibere sobre assunto não
constante da convocatória [art. 59º/1/c) CSC]

Importa ainda sublinhar que para efeitos do art. 56º/1/a) CSC, são equiparadas à total ausência de convocatória aquelas
situações em que apesar de existir o aviso convocatório, seja assinado por quem não tenha essa competência, aquelas
de cujo aviso convocatório não constem o dia, a hora e o local da reunião e as que reúnam em dia, hora ou local
diversos dos constantes do aviso (art. 56º/2 CSC). Esta solução mereceu o aplauso de V. LOBO XAVIER, porém J.
OLIVEIRA ASCENSÃO critica a porventura exagerada amplitude da extensão.

Por outro lado, parece que, não havendo convocação de todos os sócios mas apenas de alguns, deverá aplicar-
se igualmente o art. 56º/1/a) CSC por estarem em causa os mesmos interesses que justificam o preceituado
naquela norma. Assim a deliberação será nula quer tenha sido tomada pela assembleia para que nenhum sócio foi
convocado, quer em assembleia para que apenas parte dos sócios não foram chamados a participar (com V. LOBO
XAVIER, PEDRO MAIA, A. MENEZES CORDEIRO, mas contra PINTO FURTADO).

A alínea b) do 56º/1 CSC comina a nulidade para as deliberações “tomadas mediante voto escrito sem que todos
os sócios com direito de voto tenham sio convidados a exercer esse direito, a não ser que todos eles tenham
dado por escrito o seu voto”. As razões que determinam o regime da alínea a) justificam mutatis mutandis a nulidade
para estes casos.

16Parece ser esta a solução que resulta da letra do art. 56º/1/a) CSC, onde se afasta a nulidade no caso de todos os sócios estarem presentes, sem se exigir, como se exige no art.
54º CSC que, além da presença de todos, todos assintam em que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado assunto.

1. Neste sentido A. PEREIRA DE ALMEIDA, CARLOS OLAVO, LUÍS BRITO CORREIA, J. OLIVEIRA ASCENSÃO e PAULO OLAVO CUNHA.

2. Contra M. CARNEIRO DA FRADA e J. PINTO FURTADO.

Página 11 de 24
2.1.2 - Deliberações nulas por vícios de conteúdo

Nas alíneas c) e d) do art. 56º/1 CSC encontram-se os casos de nulidade da deliberação decorrente de vício no seu
conteúdo.

Na alínea c) dispõe-se que são nulas as deliberações cujo conteúdo não esteja, por natureza, sujeito a
deliberação dos sócios; depois, a alínea d) prescreve a nulidade para as deliberações “cujo conteúdo,
diretamente ou por atos de outros órgãos que determine ou permita, seja ofensivo dos bons costumes ou de
preceitos legais que não possam ser derrogados, nem sequer por vontade unânime dos sócios”.

A alínea d) consagra a doutrina de VASCO LOBO XAVIER que defendia a nulidade das deliberações cujo conteúdo -
e já não o procedimento - ofenda preceitos legais imperativos. A única dificuldade que poderá surgir na aplicação
do preceito residirá na identificação do carácter imperativo da norma violada, sendo um verdadeiro problema de
interpretação da lei.

1. Não raras vezes será muito facilitada pelo facto de o texto nos fornecer uma indicação clara do seu carácter
imperativo - exs.: arts. 22º/3 e 4, 24º/1, 27º/1, 31º/1, 33º, 69º/3, 74º/1 e 2, 85º/1, 87º/3, 131º/1, 202º/1, 236º/1, 248º/2
e 3, 252º/1, 265º/1 e 3, 377º/4, 384º/2/a) e 5, 414º-A/3 CSC.

2. Outras vezes, porém, teremos de recorrer ao critério dos interesses tutelados pela norma para concluir sobre a sua
natureza cogente - serão imperativas as que visem proteger os interesses de terceiros (ex.: arts. 25º, 26º, 28º, 29º/3,
32º, 33º, 218º e 295º/1 CSC), dos sócios futuros 17, interesses indisponíveis de quaisquer sócios (art. 246/1 CSC) e o
interesse público em sentido estrito (art. 273º/2 CSC, e antigamente o art. 384º/3 in fine CSC18).

Esta alínea sanciona ainda com a nulidade as deliberações cujo conteúdo seja contrário aos bons costumes - a
deliberação ofensiva dos bons costumes não poderá deixar de ser nula (como qualquer outro negócio jurídico, valem as
considerações em geral feitas pela doutrina sobre a nulidade do negócio jurídico por contrariedade aos bons costumes).
A idêntica solução se chegaria na ausência de indicação expressa no art. 56º CSC, por aplicação do art. 280º CCiv.
(posição de V. LOBO XAVIER e A. FERRER CORREIA antes da expressa previsão neste sentido).

A alínea c) determina a nulidade das deliberações cujo conteúdo não esteja, por natureza, sujeito a deliberação
dos sócios.

Várias posições foram avançadas sobre o que se deva entender por “conteúdos que, por natureza, não estejam sujeitos
a deliberação dos sócios”. V. LOBO XAVIER defendia, a este propósito, que “os autores do Projeto tiveram aqui em vista
sobretudo certos casos de outra índole (…): aqueles em que a assembleia geral (…) resolve interferir na esfera jurídica
de terceiros - geralmente dos sócios enquanto terceiros (ou, de qualquer modo, em qualidade diversa da de sócio) ou
de outros terceiros ligados à empresa social. Pense-se nas hipóteses (…) de a AG deliberar suspender os pagamentos

17Diz V. LOBO XAVIER que “as aludidas normas que protegem futuros sócios serão aquelas que pretendem tutelar quantos podem vir a adquirir a qualidade de sócio ao longo da vida
da corporação…”, o que se verifica nas sociedades anónimas mas não nas sociedades por quotas, porque o número de futuros sócios é naquelas sociedades “potencialmente
vastíssimo, e porque, dada a facilidade e rapidez com que podem adquirir tal qualidade, deixarão frequentemente de tomar conhecimento das cláusulas estatutárias ou das
deliberações sociais que porventura fixem disciplina contrária à prevista no mencionado esquema legal”.

18Cujo conteúdo tratava de isentar o Estado e as entidades a ele equiparadas dos chamados tetos de voto. Deste modo, o Estado deixou de constituir um acionista privilegiado
para estes efeitos, sujeitando-se como os demais acionistas aos tetos de voto previstos no respetivo contrato de sociedade. Contudo, que a altercai da lei não resolve de per si os
casos em que a sociedade anónima tenha sido constituída ope legis, uma vez que a alteração do CSC poderá não se aplicar a tais sociedades nesta parte (V. LOBO XAVIER, e em
sentido próximo A. MENEZES CORDEIRO)

Página 12 de 24
devidos a gerentes ou a trabalhadores ou diferir a realização da prestação do preço do prédio comprado pela sociedade
a um sócio.”.

Mais dúvidas levantam as hipóteses de deliberações dos acionistas sobre matérias que estejam compreendidas nas
atribuições de outros órgãos da sociedade anónima. Opinião diversa têm PINTO FURTADO, J. OLIVEIRA ASCENSÃO e A.
MENEZES CORDEIRO.

2.1.3 - Ação de declaração de nulidade

O regime das deliberações inválidas nos termos do art. 56º CSC não é o mesmo para todas elas.

1. Alíneas a) e b) - a lei não admite que a nulidade seja “invocada quando os sócios ausentes e não
representados ou não participantes na deliberação por escrito tiverem posteriormente dado por escrito o
seu assentimento à deliberação” (art. 56º/3 CSC). Acresce que tais deliberações são susceptíveis de
renovação, que pode até operar retroativamente (art. 62º/1 CSC). O regime das deliberações inválidas à luz das
alíneas a) e b) não é de nulidade pura, mas de uma invalidade mista 19.

2. Alíneas c) e d) - não sofrem os desvios ao regime próprio da nulidade.



O art. 57º/1 CSC determina que “O órgão de fiscalização da sociedade deve dar a conhecer aos sócios, em assembleia geral, a
nulidade de qualquer deliberação anterior, a fim de eles a renovarem, sendo possível, ou de promoverem, querendo, a respectiva

declaração judicial.”. Daqui resulta que o legislador se serviu do órgão de fiscalização para a rápida clarificação dos

efeitos jurídicos produzidos pela deliberação. O órgão de fiscalização, dando a conhecer aos sócios a invalidade da
deliberação, desencadeará um processo que, no prazo de 2 meses, poderá conduzir à renovação da deliberação - só
possível, contudo, quando o vício da deliberação resulte da violação das alíneas a) ou b) do art. 56º/1 CSC (62º/1 CSC)
- ou à declaração judicial de nulidade - em ação promovida pelos sócios (art. 57º/1 CSC) ou pelo próprio órgão de
fiscalização (art. 57º/2 CSC). O órgão de fiscalização tem o dever quer de comunicar aos sócios a invalidade da
deliberação (art. 57º/1 CSC), quer de promover a ação de declaração judicial de nulidade, caso nem a deliberação
tenha sido renovada nem a sociedade tenha sido citada para a referida acção no prazo de dois meses (art. 57º/2 CSC).
Nas sociedades que não tenham órgão de fiscalização, tais poderes/ deveres cabem a qualquer gerente (art. 57º/4
CSC).

O órgão de fiscalização tem o dever e não apenas o poder, quer de comunicar aos sócios a invalidade da deliberação,
quer de promover a ação de declaração judicial de nulidade, caso nem a deliberação tenha sido renovada nem a
sociedade tenha sido citada para a referida ação no prazo de 3 meses. Nas sociedades que não tenham órgão de
fiscalização, tais poderes/deveres cabem a qualquer gerente (art. 57º/4 CSC). Sendo a ação intentada pelo órgão de
fiscalização, este deve pedir logo ao tribunal que nomeie um sócio para representar a sociedade (art. 57º/3 CSC).


19 Sustenta V. LOBO XAVIER que “parece-nos perfeitamente razoável: não feriria interesses de que os sócios anuintes não pudessem dispor, e atenuaria o rigor da nulidade,
permitindo sobretudo remediar eventuais lapsos de procedimento, sem prejuízo de ninguém”. M. NOGUEIRA SERENS segue esta posição. Já J. OLIVEIRA ASCENSÃO considera que se
trata de um caso de nulidade relativa e não de invalidade mista.

Página 13 de 24
O regime a que o art. 57º CSC sujeita a nulidade da deliberação não afasta a aplicação do art. 286º CCiv.. Assim,
a nulidade da deliberação é invocável a todo o tempo por qualquer interessado (e não apenas pelos sócios e pelo
órgão de fiscalização referidos no art. 57º CSC) e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal20.

2.2 - Deliberações anuláveis

2.2.1 - Deliberações anuláveis ilegais

a) Por vícios de conteúdo

Quando o vício de conteúdo decorra da violação de uma norma legal dispositiva, a deliberação será anulável21 [art.
58º/1/ a) CSC].

b) Por vícios de procedimento

As deliberações viciadas no seu procedimento por desconformidade com a lei - quer a norma seja imperativa,
quer seja dispositiva - são anuláveis, excetuados os casos dos arts. 56º/1/a) e b) CSC. É esta a conclusão que se
tira do art. 58/ 1/a) conjugado com o art. 56º CSC.

Um caso particular de deliberação anulável por vício de procedimento decorrente de violação da lei é o das
deliberações não precedidas de elementos mínimos de informação. Com efeito, o art. 58º/1/c) CSC estatui a
anulabilidade para aquelas deliberações que “não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de
informação”. A isto, o nº4 do mesmo preceito junta que se consideram, para efeitos deste artigo, elementos

mínimos de informação os que indica nas suas alíneas.

Esta norma insere-se numa tendência muito vincada no CSC de tutela do direito de informação dos sócios,
inegavelmente de aplaudir. Já dúvidas se poderão suscitar quanto à utilidade e ao alcance do art. 58º/4 CSC.

1. Contra a utilidade da norma pode dizer-se que os vícios nela enunciados sempre gerariam a anulabilidade da
deliberação ao abrigo do art. 58º/1/a) CSC, visto de aí se tratar de vícios do procedimento deliberativo. Mas, a favor
do preceito milita o facto de servir para estabelecer que tais vícios conduzem mesmo à anulabilidade da deliberação,
o que, eventualmente, poderia ser duvidoso.

2. Mais difícil se revela a questão de saber qual o alcance da norma, isto é, se ela tem caráter taxativo [só haverá lugar
à anulabilidade nos termos da art. 58º/1/c) CSC quando ocorra alguma das situações enunciadas no nº4 - PINTO
FURTADO], ou, ao invés, se se reveste de caráter meramente exemplificativo (V. LOBO XAVIER e L. BRITO CORREIA).
Parece esta última a melhor solução.

20J. OLIVEIRA ASCENSÃO, que fundamenta a aplicação do regime civil com o art. 2º CSC, e PINTO FURTADO. Porém, no que toca às deliberações nulas por vício de procedimento,
quanto à legitimidade e prazo para invocar o vício, a aplicação do regime geral de nulidade do negócio jurídico afigura-se duvidosa (PEDRO MAIA)

21À primeira vista, seria de supor que a violação de uma norma legal dispositiva nunca conduziria à invalidade da deliberação (anulabilidade, no caso), exatamente por a norma,
sendo dispositiva, admitir a sua derrogação. Sucede que o art. 9º/3 CSC estabelece que “Os preceitos dispositivos desta lei só podem ser derrogados pelo contrato de sociedade, a não ser que este
expressamente admita a derrogação por deliberação dos sócios.”. Ignorando a polémica gerada em torno desta norma (saber se deve ser a lei ou o contrato a admitir, expressamente, a
derrogação por deliberação dos sócios) o que importa salientar é que, na ausência dessa referência expressa, as normas dispositivas não podem ser contrariadas por deliberação
dos sócios, mas apenas pelo contrato de sociedade. Assim, a deliberação cujo conteúdo atente contra uma norma dispositiva será anulável, a não ser que a própria lei (ou o
contrato se assim se entender) tenha admitido a derrogação por via de deliberação social.

Página 14 de 24
Convém salientar que a hipótese do art. 58º/1/c) CSC não se confunde com a do art. 290º/3 CSC (aplicável às
sociedades por quotas por força do art. 214º/7 CSC), que conduz igualmente à anulabilidade da deliberação:

1. No artigo 58º CSC sanciona-se com a anulabilidade aqueles casos em que o dever de informar por iniciativa da
própria sociedade não foi observado. A sociedade deveria informar mesmo sem o pedido do sócio, mas não o fez.

2. Diversamente, no art. 290º/3 CSC comina-se a anulabilidade quando, requerida a informação pelo sócio, a
sociedade, injustificadamente, tenha recusado prestar a informação ou a tenha prestado de modo insuficiente ou
erróneo. O sócio pediu informações (que a sociedade não estaria obrigada a prestar por sua própria iniciativa), as
quais foram, todavia, indevidamente recusadas.

2.2.2 - Deliberações anti-estatutárias

As deliberações anti-estatutárias - quer o vício se encontre no procedimento, quer se encontre no conteúdo - são
sempre meramente anuláveis [art. 58º/1/a) CSC, conjugado com as várias alíneas do art. 56º/1 CSC].

Claro está que, “quando as estipulações contratuais se limitarem a reproduzir os preceitos legais, são estes considerados
diretamente violados” (art. 58º/2 CSC), pelo que a deliberação cujo conteúdo atente contra o disposto numa norma legal

imperativa será nula, ainda que tal norma tenha sido reproduzida no contrato da sociedade.

2.2.3 - Deliberações abusivas

O CSC consagrou uma doutrina que, já na vigência da lei antiga, admitia a invalidade de deliberações por abuso de
direito. Discutia-se quais as exatas circunstâncias em que deveria ter ligar a dita invalidade.

O atual art. 58º/1/b) CSC veio esclarecer que são anuláveis as deliberações “apropriadas para satisfazer o propósito de um
dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da
sociedade ou de outros sócios ou simplesmente prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido

tomadas mesmo sem os votos abusivos”.

Para a deliberação ser abusiva, requer-se a presença de:

1. Intenção do sócio de conseguir, para si ou para terceiros, vantagens especiais, em prejuízo da sociedade ou
de outros sócios. A intenção do sócio vai dirigida à obtenção de uma vantagem especial para ele ou para terceiro,
e só se verifica quando o beneficio desejado implicar objetivamente um prejuízo para a sociedade ou para os outros
sócios.

OU

Página 15 de 24
2. Intenção do sócio de, através do exercício do seu direito de voto, prejudicar a sociedade e/ou outros sócios.
Procura apenas infligir, através do seu voto, um prejuízo à sociedade ou aos outros sócios, bastando o requisito
subjetivo da intenção. Trata-se de uma deliberação emulativa.

Em ambas as hipóteses haverá, porém, de demonstrar a idoneidade objetiva da deliberação para provocar os
resultados lesivos prosseguidos. Por essa razão, o legislador exige que a deliberação seja “apropriada” a conseguir
certos fins.

A deliberação não será, contudo, inválida caso se prove que, mesmo sem os votos abusivos, ela teria sido
tomada [art. 58º/1/b) in fine CSC]. A deliberação é assim sujeita a uma “prova de resistência”, que ditará a sua
validade ou invalidade - se se provar que, mesmo sem os votos abusivos, ela teria sido igualmente tomada, a
deliberação é válida; se, sem tais votos abusivos, o sentido da deliberação teria sido outro, então, a deliberação será
anulável.

Em rigor, parece que a deliberação não terá de ser, necessariamente, sujeita à referida “prova de resistência”, tal sucederá apenas
caso a sociedade invoque a circunstância de os votos abusivos não terem relevado para a determinação do sentido da deliberação.

A concepção de deliberação abusiva abraçada neste artigo bem como o regime a aplicar em tais casos não merecem a
concordância de boa parte da nossa doutrina, ainda que por as mais diversas razões (PINTO FURTADO, e J. COUTINHO DE
ABREU que já dirigia ao § 243 da Aktiengesetz alemã, onde o nosso legislador se inspirou, as mesmas críticas)

Exs. de deliberações abusivas que ilustram a importância prática deste instituto (enumeração não exaustiva)22 :

1. Deliberação de não distribuição de lucros com a intenção de forçar os sócios minoritários a cederem as suas quotas
ou com o intuito de baixar a cotação das ações;

2. Deliberação sobre a remuneração de titulares de órgãos sociais (administradores gerentes), fixando um valor
excessivamente alto (a hipótese não se confunde com a previsão do art. 255ºº/2 CSC);

3. Deliberação de aumento de capital com o fim de reforçar o poder dos maioritários, visto ser previsível que os sócios
minoritários não poderão acompanhar o referido aumento, ou de diminuir o poder de todos os sócios, por o aumento
ser efetuado mediante a entrada de novos sócios;

4. Deliberação de dissolução da sociedade, com o intuito de os maioritários licitarem a empresa na liquidação ou


adquirirem-na através de uma outra sociedade em que participem;

5. Deliberação de alteração da sede social, para assim se dificultar a presença de certos sócios (minoritários) nas
assembleias.

22 J. COUTINHO DE ABREU, Do abuso…

Página 16 de 24
2.2.4 - A ação de anulação

A deliberação anulável só deixará de produzir os seus efeitos caso seja anulada por sentença judicial (tem efeitos
constitutivos). Até esse momento, e ressalvada a hipótese de suspensão da deliberação, esta produz os efeitos jurídicos
a que tendia.

a) Prazo

A ação deve ser interposta no prazo de 30 dias, contados a partir [arts. 59º/2/a), b) e c) CSC]:

• Da data em que foi encerrada a assembleia (mesmo para os sócios ausentes) - regra;


• Do 3º dia subsequente à data do envio da ata da deliberação por voto escrito; 


• Da data em que o sócio teve conhecimento da deliberação (não há qualquer dever de diligencia no sentido de os
sócios se inteirarem das deliberações tomadas em assembleia de sócios e que por isso o prazo de 30 dias só se
conta a partir do conhecimento psicológico pelo sócio, segundo J. OLIVEIRA ASCENSÃO), se esta incidir sobre
assunto que não constava da convocatória - excecionalmente;

O prazo curto protege a necessidade de promover a rápida definição da sorte da deliberação (interesse particularmente
premente na vida das sociedades comerciais). Prazo muito mais curto do que aquele previsto na lei civil para a anulado
do negócio jurídico em geral (art. 287º/1 CCiv.), fixado em 1 ano.

b) Legitimidade activa 


A ação pode ser arguida pelo órgão de fiscalização ou por qualquer sócio que não tenha votado no sentido que
fez vencimento, nem posteriormente tenha aprovado a deliberação, expressa ou tacitamente (art. 59º/1 CSC).

A arguição pelo órgão de fiscalização não constitui um dever (como nos casos de nulidade), mas sim um poder do
órgão. Pedro Maia defende que em casos excecionais talvez seja de entender que o órgão de fiscalização tem o dever
de intentar ação anulatória.

A legitimidade dos sócios para impugnação depende de não terem votado no sentido que fez vencimento. A expressão
da lei justifica-se com a necessidade de abranger 2 situações distintas:

1. A das deliberações positivas - em que o resultado da votação é a aprovação da proposta apresentada. Aqui,
os sócios que não votaram no sentido que fez vencimento são, desde logo, aqueles que votaram contra a
proposta de deliberação.

2. A das deliberações negativas - em que o resultado da votação é a rejeição da proposta apresentada a


sufrágio. Aqui, os sócios que não votaram no sentido que fez vencimento são, desde logo, aqueles que votaram a
favor da proposta de deliberação.

Página 17 de 24
Além dos sócios que votaram, mas em sentido diferente daquele que prevaleceu, também os sócios que não votaram
- por se terem abstido ou por estarem ausentes da assembleia (M. NOGUEIRA SERENS) - têm legitimidade para impugnar
a deliberação.

J. OLIVEIRA ASCENSÃO limita a legitimidade para a impugnação ao sócio a quem não tiverem sido fornecidos elementos
mínimos de informação e ao órgão de fiscalização.

O critério geral de legitimidade fixado no art. 59º CSC pode ser, em concreto, afastado pela proibição de venire
contra factum proprium (PEDRO MAIA).

Quando se trate de deliberação tomada por voto secreto, a lei impõe que o sócio, para poder impugnar a deliberação,
faça consignar - na própria assembleia ou perante notário nos 5 dias seguintes à assembleia - que votou contra a
deliberação tomada (art. 59º/6 CSC).

3 - Disposições comuns às ações de nulidade e de anulação

Por ser um negócio jurídico da sociedade, tanto a ação de declaração de nulidade, como a ação de anulação de
deliberação deve ser proposta contra a sociedade (art. 60º/1 CSC).

Quando a ação seja intentada pelo órgão de fiscalização - ou por qualquer gerente - a sociedade suportará os
respetivos encargos (art. 60º/ 3 CSC).

III - CASOS PRÁTICOS DE DELIBERAÇÕES

Caso Prático nº1

A, B, C e D, são sócios de uma sociedade por quotas com o capital social de 2000 € sendo que a cada um deles cabe
uma participação social de igual valor. Apenas A e B são gerentes. No passado mês de Abril foram aprovadas em
assembleia geral (convocada com 15 dias de antecedência por carta registada pelo C) as seguintes deliberações:

1. Retirar do contrato de sociedade a cláusula que pedia o direito especial à gerência do sócio B;

2. Introduzir no contrato de sociedade uma cláusula que permite a convocação de assembleias gerais por telefone com
10 dias de antecedência.

As deliberações foram aprovadas com os votos a favor de A e C. B votou contra em relação a ambas e o D esteve
ausente.

1 - Pronuncie-se sobre a validade das aludidas deliberações.

Página 18 de 24
Resolução:

Esta situação da vida realidade envolve várias das considerações precedentes, como vamos ver. Desde já podemos
avançar que uma mesma deliberação pode padecer de vários vícios e importa, na resolução de um caso e na vida
concreta, por exemplo se se pretende pedir a nulidade ou anulabilidade de uma deliberação, referir todos os vícios de
que a mesma padeça (ou pareça ter). No nosso caso, tal também acontece, como vamos analisar - efetivamente temos
apenas duas deliberações mas encontramos vários vícios.

Para começar, notamos logo um vício na convocação da assembleia, pois o sócio C, que tomou a iniciativa de fazer a
convocação, é apenas sócio e não gerente, já que essa qualidade cabe apenas a A e B. Estamos perante um vício de
procedimento porque está relacionado com o modo como a deliberação foi tomada, com o percurso seguido até se
chegar à decisão final, sendo que este “mal” resulta da violação do art. 248º/3 CSC, onde se pode ler que “A
convocação das assembleias gerais compete a qualquer dos gerentes…”, o que não acontece neste caso. Assim sendo,

podemos dizer que tal enfermidade implica uma consequência jurídica - como estudamos, e visto estarmos perante
um vício de procedimento, parece que haveria espaço a anulabilidade da deliberação; mas a verdade é que este é um
dos casos excecionais, que cabe na previsão do art. 56º/1/a) e nº2 CSC, o que significa que estas deliberações são
nulas por ter ocorrido um vício procedimental muito grave - a “má” convocação desta assembleia é equiparada à
sua não convocação. No que respeita ao regime jurídico desta nulidade, podemos dizer que são aplicáveis as regras
do art. 56º/3 CSC, pois estamos perante a chamada nulidade mista (e não pura, prevista nos termos gerais do CCiv.).
Nestes termos, a deliberação tomada - apesar de nula - pode ser sanada - pode ocorrer a renovação da deliberação
(se os sócios decidirem tomar uma outra decisão, no mesmo sentido mas sem os vícios) como se prevê no artigo 62º, e
só pode ser arguida por aqueles que estiveram ausentes, votaram contra ou se abstiveram no momento da votação.

Analisado o primeiro erro, que afeta ambas as deliberações, importa agora debruçarmo-nos sobre a primeira
deliberação - nesse caso, em que se pretendia afastar o direito de B à gerência, estamos perante um outro vício, ainda
mais gravoso que o anterior, que implica a ineficácia da deliberação. Neste caso, a consequência jurídica será a
consideração da deliberação como ineficaz, o que implica a não produção de qualquer efeito, porque estamos perante
um caso em que a deliberação só podia avançar, ser aprovada, se o sócio cujo direito especial estava a ser suprimido
(neste caso, o sócio B) tivesse prestado o seu consentimento nesse sentido, nos termos do art. 24º/5 CSC, o que não
aconteceu - uma vez que B rejeitou as duas propostas. Efetivamente, nos termos da mencionada norma, “os direitos
especiais não podem ser suprimidos ou coartados sem o consentimento do respetivo titular” mas, por outro lado, também não

podemos esquecer os arts. 256º e 257º/6, CSC nos termos do qual um gerente (só) pode ser destituído por justa causa
- caso contrário terá de ser paga uma indemnização - e, sendo essa a situação que aqui podia estar em causa, como
nada é dito no enunciado, parece que B só podia ser afastado a gerência se manifestasse essa intenção. Em suma,
como B votou contra a deliberação, não prestou o seu consentimento, logo a deliberação é ineficaz em termos
absolutos, nos termos do art. 55º CSC.

No que diz respeito à possibilidade de convocar a assembleia por contacto telefónico, estamos permite um vício de
conteúdo, pois está a votar-se a possibilidade de introduzir, nos estatutos, uma cláusula que irá permitir a convocação
de assembleias de tal forma. No fundo, os sócios que propuseram esta deliberação estão a tentar afastar as exigências,
previstas na lei, para a convocação de assembleias, o que significa que se está a violar o art. 248º/3 CSC, uma norma
relativamente imperativa, onde se prevê que as assembleias devem ser convocadas por carta registada, a não ser
que os estatutos sejam mais exigentes. Sendo esta uma norma legal imperativa, e estando em causa um vício de
conteúdo, a consequência jurídica é a nulidade da deliberação, nos termos do art. 56º/1/d) CSC. Quanto ao regime

Página 19 de 24
desta nulidade, é de seguir o previsto no art. 286º CCiv., já que estamos perante uma nulidade típica ou em sentido
próprio, o que significa que a nulidade é invocável a todo o tempo, por qualquer interessado, e pode ser declarada
oficiosamente. No mais, ela não admite a renovação (essa hipótese é exclusiva das anulabilidades e nulidades por
vício de procedimento).

2 - Imaginemos agora que tinha sido esta assembleia que tinha sido convocado por telefone e com 10 dias de
antecedência. Seria a mesma situação?

Nesse caso, estaríamos perante uma deliberação ferida por um vício de procedimento, com “falhas” ao nível do
percurso seguido até à tomada de decisão, por violação do art. 248º/3 CSC, apesar de ser uma norma legal
relativamente imperativa, a consequência jurídica seria a anulabilidade [já que é um vício de iter e não cabe nas
hipóteses previstas pelas alíneas a) e b) do art. 56º CSC, mas sim no art. 58º/1/a) CSC].

Mas, no nosso caso, tínhamos ainda outros problemas - desde logo, como estas deliberações visavam alterar o contrato
de sociedade - uma queria retirar e a outra introduzir uma cláusula - podemos concluir que estamos perante uma
deliberação de alteração do contrato social, o que significa que não foi cumprido o quórum deliberativo. De facto,
como temos uma sociedade por quotas, para alterar os seus estatutos é necessária maioria qualificada, um quórum
mais exigente, nos termos dos arts. 250º/3 e 265º/1 CSC - nestes casos, não basta uma maioria simples para que a
alteração ao contrato social seja aprovada (não basta que o números de votos favoráveis seja superior ao número de
votos desfavoráveis e que as abstenções não sejam contabilizadas) e somos mais exigentes, sendo necessário uma
maioria de 3/4 dos votos correspondentes ao capital social, ou ainda uma maioria mais exigente - tem de existir um
quórum deliberativo reforçado. Nestes casos, temos de fazer “contas” e saber se os votos a favor da deliberação
perfazem ou não os 75% do capital social. Neste caso, o quórum deliberativo acaba por se confundir com o quórum
constitutivo pois, de certa forma, exigimos também uma maioria qualificada de sócios presentes para se aprovar a
deliberação; a lei não o diz mas, indiretamente, tem de estar presente uma maioria de ¾ dos sócios, pelo menos, e
todos votarem a favor.

No nosso caso, 2 dos quatro sócios votaram a favor das duas deliberações, o que significa que só estão reunidos 50%
dos votos a favor da aprovação destas deliberações, o que significa que elas não foram validamente aprovadas e, como
estamos, perante um vício de procedimento, por violação do art. 265º CSC, que é uma norma relativamente
imperativa (admite que o contrato seja ainda mais exigente) há lugar à anulabilidade da deliberação, nos termos do art.
58º/1/a) CSC. Finalmente, quanto ao regime jurídico desta anulabilidade, podemos dizer que ela deve ser arguida
num prazo de 30 dias, pois é esse o tempo que o nosso código confere para a ação ser proposta, nos termos do art. 59º
CSC; para tal, têm legitimidade ativa os sócios B e D, um porque votou contra e o outro porque esteve ausente, e a
legitimidade passiva é da sociedade. Há ainda a possibilidade de renovação da deliberação, pelo disposto no artigo 62º,
nº 2.

Caso Prático nº2

Carlos, a sua mulher Diana e três sobrinhos (Francisco, Ester e Gil) constituíram em 2006 a sociedade “Carlos das
Frutas, Lda”, sociedade por quotas destinada ao comércio de produtos hortícolas e de fruta. O capital social é de
50.000€. Carlos e a mulher têm cada um uma quota com o valor nominal de 17.500€. cada um dos restantes sócios

Página 20 de 24
têm uma quota igual a 5.000€ cada. Em Assembleia de sócios convocada regularmente e realizada em Março deste
ano, foram tomadas as seguintes deliberações:

1. Por proposta de Ester, a distribuição de 80.000€ dos 110.000€ de lucro de exercício distribuíveis

2. A desafetação da reserva legal de 2.500€ para gratificar dois motoristas da sociedade.

a) Sabendo que o lucro de balanço era de 60.000€, que todos os sócios estavam presentes, que Carlos e Diana foram
os únicos que votaram favoravelmente as propostas de que resultaram aquelas deliberações, diga quem e, em que
termos poderá, no caso de serem inválidas, impugná-las!

b) Entretanto foi convocada uma nova Assembleia com a expedição (aviso convocatório) a ser feita com antecedência
de 5 dias que viria a ser realizada a 20.04.2013. na data aprazada e na sede da sociedade vieram a encontrar-se todos
os sócios, e apesar de Francisco e Gil não terem tido conhecimento da realização da Assembleia nem da ordem dos
trabalhos, todos concordaram em reunir-se e em deliberarem sobre todos os pontos propostos para discussão. Assim,
deliberou-se retirar do contrato de sociedade a cláusula que previa o direito especial à gerência do sócio Francisco, o
que foi votado desfavoravelmente por ele.

Também se decidiu, com voto desfavorável de Gil, alterar uma outra cláusula do pacto sobre a maioria necessária para
se aprovarem deliberações em Assembleia, que passaria a ser de 70% dos votos correspondentes ao capital social.
Nesse mesmo pacto constava uma cláusula que dispunha que os sócios, Francisco e Gil tinham direito de vetar
qualquer modificação a que se procedesse ao contrato. Finalmente o sócio Gil, pediu alguns esclarecimentos sobre a
alienação de um terreno que a Assembleia estava prestes a deliberar, mas Ester respondeu-lhe que ele tinha nada a ver
com isso em consequência este sócio votou contra.

Aprecie a validade e eficácia das deliberações tomadas nesta Assembleia e diga quem pode impugná-las e, em que
termos.

Resolução:

1-

1ª Deliberação:

Ao lucro que se apure nesse exercício deduzem-se as quantias destinadas a reservas necessárias para cobrir prejuízos
que resultem do ano anterior (art. 33º CSC) e obtém-se assim o lucro distribuível. Temos que consultar ainda o lucro de
balanço (o lucro de exercício) - art. 32º CSC - a propósito do qual se fala do princípio da intangibilidade do capital
social (o património social não pode ficar abaixo do nível do capital social).

Lucro de balanço: valor do património social - soma do capital social com o valor das reservas. O lucro de balanço
funciona como limite, como valor máximo que pode ser distribuível no limite.

Como o lucro de balanço era de €60.000, no caso prático eles estavam a querer distribuir mais do que a lei permite.

Página 21 de 24
Temos de ver ainda se o art. 32º CSC é uma norma imperativa - em alguns casos a própria letra da lei diz se a
própria norma é ou não imperativa. Na maioria dos casos não temos que saber interpretar a norma. Uma norma
considera-se sempre imperativa quando se destina a proteger o interesse dos credores da sociedade, dos
sócios futuros, presentes (atuais) daqueles interesses que sejam indisponíveis, que é precisamente o caso do art.
32º CSC - tem em vista proteger, garantir os credores. Os credores sabem qual o real valor do capital social da
sociedade.

Portanto, esta primeira deliberação seria nula por contrariar uma norma imperativa [art. 56º/1/d) CSC - preceitos legais
imperativos].

Regime que opera quando uma deliberação é nula (art. 57º CSC, e art. 286º CCiv.):

1. O órgão de fiscalização deve dar a conhecer aos sócios qualquer nulidade de deliberação a fim de que eles,
querendo, renovem essa deliberação. Há casos em que é possível sanar a invalidade de uma deliberação. Tal só é
possível quando os vícios são os previstos no art. 56º/1/a) e b) CSC - art. 62º CSC. Os próprios sócios podem
promover a declaração judicial dessa mesma nulidade (ação judicial). Se tal não acontecer, nem renovar, nem ação
judicial, deve o próprio órgão de fiscalização fazê-lo (art. 57º/2 CSC). Nota - quando não há órgão de fiscalização, o
nº4 do art. 57º CSC dispõe que o disposto no números anteriores aplica-se a qualquer gerente.

2. O prazo para intentar a ação de nulidade é invocável a todo o tempo. Aplica-se o regime geral do CCiv..

2ª Deliberação:

É uma gratificação - se se demonstrasse que não se tratava de uma doação remuneratória, a deliberação
poderia ser nula por extravasar a própria capacidade jurídica da sociedade. A sociedade não é constituída para
praticar atos gratuitos. Embora a sociedade possa praticar certos actos gratuitos. À parte disso, essa gratificação foi
feita com dinheiro da reserva legal (arts. 295º, 296º e 69º/3 CSC). Os arts. 295º e 296º CSC são aplicáveis às
sociedades por quotas por força do art. 218º CSC. Resulta do art. 296º CSC que as reservas legais só podem ser
utilizadas para as finalidades estipuladas no mesmo artigo. O dinheiro que está na reserva não pode ser
canalizado para gratificar os motoristas pelo que houve violação de uma norma legal. Esta norma legal é
imperativa ou supletiva? O art. 69º/3 CSC diz-nos claramente que uma deliberação que viole estas normas é nula.
Aplicar-se-ia o art. 56º/1/d) CSC.

Quanto à convocação dos sócios, temos de atender que nas sociedades por quotas (art. 268º/3 CSC), a antecedência
mínima para seguir o aviso convocatório é de 15 dias. Como só foram 5 dias, há erros de procedimento e estes
tipicamente conduzem à anulabilidade. No entanto, podem conduzir à nulidade se forem os previstos no art. 56º/1/a) e
b) e nº 2 CSC. Contudo esta assembleia foi convocada! Mas mal convocada. No nº 2 do artigo 56º não fala da
possibilidade de a convocatória não ser feita com a antecedência devida. Logo, há anulabilidade. Todavia, esse vício
acaba por não ter relevância aqui. Mesmo quando as assembleias não são convocadas essa nulidade já não se verifica
se os sócios acabarem por se encontrar e aprovar favoravelmente = Conjunto de Deliberações adoptadas em AG não
convocada [arts. 54º/1, 2ª parte e 56º/1, al.a) do CSC - “excepto se tiverem sido adoptadas numa Assembleia Geral não

Página 22 de 24
convocada”]. O vício ao nível da convocatória não tem relevância. Ao nível do procedimento não temos propriamente um

problema.

2-

1) Direito especial de Gerência

É possível que em sede de contrato social se atribua a um dos sócios um direito especial (art. 16º CSC). Trata-se de
uma dada vantagem que os outros sócios não têm. Os direitos especiais previstos no art. 16º CSC têm uma
particularidade que resulta do art. 24º/5 CSC - é reiterado especificamente para as sociedades por quotas no artigo
257º/3, e dispõe que os direitos especiais não podem ser eliminados ou limitados sem o consentimento do respetivo
titular.

No nosso caso prático o Francisco não concordou. E como tinha um direito especial ele tinha de concordar. Qual a
consequência? Ineficácia da deliberação nos termos do art. 55º CSC. Os direitos especiais só podem ser “tocados”
com o consentimento do próprio visado. A ineficácia não carece de qualquer decisão judicial. O direito especial à
gerência não iria sair do pacto social.

2) A maioria passaria a ser de 70% dos sócios

O objeto desta deliberação tem um aspeto procedimental. Se concluíssemos que esta deliberação violara uma norma
legal, o vício seria um vício de conteúdo e não um vício de procedimento. Tal deliberação contende com o art. 250º/3
CSC (sociedades por quotas). Segundo a lei para uma deliberação se considerar adotada basta a maioria dos votos
emitidos (mais de 50% desses votos). A lei não opõe-se a que o contrato estipula uma percentagem maior. Esta matéria
é supletiva, dispositiva ao dizer “salvo disposição diversa de lei ou contrato”. A lei está a admitir que esta regra dos 50 %
seja afastada por deliberação, logo passível de afastamento. Assim não haveria um choque entre o conteúdo da
deliberação e da norma.

Mas há outra coisa que temos que ter em conta - ao deliberarem isto, os sócios alteraram uma cláusula do contrato
social. Trata-se de uma deliberação que afeta o próprio conteúdo do contrato social. Ora, sempre que se altera o
contrato social é necessário uma maioria qualificada, nos termos do art. 265º CSC (maioria de ¾ dos votos
correspondentes ao capital social - tem que se apurar à luz dos sócios em concreto, os votos abstratamente possíveis.
No enunciado diz apenas que votou contra o Gil, portanto temos 4/5 dos votos que é mais que ¾ dos votos, logo este
requisito está cumprido. O voto seria por cada sócio, independentemente da presença do sócio ou não.

Art. 250º/3 CSC - tal não significa que a deliberação seja válida. No que tange à cláusula que estipula que os sócios Gil
e Francisco tinham o direito de vetar, uma das pessoas com o direito de veto votou contra, portanto foi violada uma
cláusula do contrato com esta deliberação e por esta via nos termos do art. 58º/1/a), Parte Final CSC teríamos uma
anulabilidade. Quando são violados preceitos dispositivos a consequência é a anulabilidade (art. 58º CSC). O art. 59º
CSC regula o funcionamento da ação de anulação:

1. Pode ser feita pelo órgão de fiscalização.

Página 23 de 24
2. Prazo - 30 dias nos termos do nº 2 do art. 59º CSC.

3) Alienação de um terreno

O direito à informação dos sócios é um dos direitos integrantes da participação social [art. 21º/c) CSC]. No caso
das sociedades por quotas interessa particularmente o art. 214º CSC, onde se diz que deve ser prestada a qualquer
sócio informação da sociedade. Ao nº7 do art. 214º do CSC é aplicado o disposto no art. 290º/3 CSC - a recusa
injustificada das informações é causa de anulabilidade da deliberação. O próprio art. 58º/1/c) CSC diz que são
anuláveis as deliberações que sejam precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.

Consequência - anulabilidade. Gil tinha legitimidade para impugnar, e o prazo era de 30 dias que no concreto caso já
tinha passado.

Página 24 de 24

Você também pode gostar