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Jornada Mundial da Juventude – Lisboa 2023

Discursos/Intervenções do Papa Francisco:

Discurso no encontro com as Autoridades Portuguesas _ CCB


Encontro com as autoridades Eclesiásticas e Agentes Pastorais _ Jerónimos
Discurso aos jovens universitários _ UCP
Discurso aos Jovens na Celebração de Acolhimento _ Colina do Encontro
Discurso na Scholas Occurrentes _ Cascais
Discurso no Centro de S. Vicente _ Bairro da Serafina
Homília da Via-Sacra
Intervenção em Fátima
Intervenção na Vigília _ Campo da Graça/Parque Tejo
Homília Missa de Envio
Discurso de Agradecimento ao Papa _ Dom Manuel Clemente
Discurso no Encontro com os Voluntários _ Algés
Conferência de Imprensa do Papa durante o voo de regresso ao Vaticano

https://rr.sapo.pt/video/actualidade/2023/08/06/104-horas-em-104-segundos-os-melhores-momentos-do-papa-
na-jmj/357022/?fbclid=IwAR33w_go-GjmIVaJ9LUeiDa_z4CJusHuCjMmAFmjpV1h1kHbuhlLR1NLBVA
Discurso do Papa Francisco no encontro com as Autoridades Portuguesas _ CCB

JMJ Lisboa 2023: Discurso do papa Francisco no encontro com as autoridades em Portugal
Lisboa, 02 Ago. 23 / 10:54 am (ACI).

- No primeiro dia de sua visita a Portugal, para a Jornada Mundial da Juventude, o papa Francisco teve o
tradicional encontro com as autoridades, a sociedade civil e o corpo diplomático.

Em seu discurso, inspirado na vocação oceânica do país, fez uma reflexão sobre a alma da Europa e
propôs três “laboratórios de esperança”: o meio ambiente, o futuro e a fraternidade.

A seguir, as palavras pronunciadas pelo papa Francisco no Centro Cultural de Belém hoje (2):

Senhor presidente da República, senhor presidente da Assembleia da República, senhor primeiro-


ministro, membros do Governo e do Corpo Diplomático, autoridades, representantes da sociedade civil e
do mundo da cultura, senhoras e senhores:

Saúdo-vos cordialmente a todos vocês e agradeço ao senhor presidente o acolhimento e as


amáveis palavras que me dirigiu. Estou feliz por estar em Lisboa, cidade do encontro que abraça vários
povos e culturas e que, nestes dias, se mostra ainda mais universal; torna-se, de certo modo, a capital do
mundo.

Isto condiz bem com o seu caráter, porque os jovens são o futuro, multiétnico e multicultural - penso,
por exemplo, no bairro da Mouraria, onde vivem em harmonia pessoas provenientes de mais de
sessenta países - e revela os traços cosmopolitas de Portugal, que afunda as suas raízes no desejo de se
abrir ao mundo e explorá-lo, navegando rumo a novos e amplos horizontes. Navegando.

Não muito longe deste lugar, no Cabo da Roca, há um monumento com uma lápide onde está gravada a
frase dum grande poeta desta cidade: «Aqui… onde a terra se acaba e o mar começa» (L. Vaz de
Camões, Os Lusíadas, canto III, 20).

Durante séculos, acreditou-se que lá estivessem os confins do mundo. E em certo sentido é verdade,
estamos no fim do mundo, porque este país confina com o oceano, que delimita os continentes. E, do
oceano, Lisboa conserva o abraço e o perfume. Faço meu, com muito gosto, aquilo que os portugueses
costumam cantar: «Lisboa tem cheiro de flores e de mar» (A. Rodrigues, Cheira bem, cheira a Lisboa,
1972).

Um mar que é muito mais do que um elemento paisagístico, o mar é uma vocação impressa na alma de
cada português «mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim» (S. de Mello Breyner Andresen, Mar
sonoro).

À vista do oceano, os portugueses são levados a refletir sobre os imensos espaços da alma e sobre o
sentido da vida no mundo. Nesta linha, gostaria também eu de partilhar convosco algumas reflexões,
deixando-me levar pela imagem do oceano.

Segundo a mitologia clássica, Oceano é filho do céu (Urano): a sua vastidão leva os mortais a olharem
para cima elevando-se para o infinito. Ao mesmo tempo, porém, Oceano é filho da terra (Gea) que
abraça, convidando assim a envolver de ternura todo o mundo habitado. Com efeito, o oceano não liga
apenas povos e países, mas também terras e continentes; por isso Lisboa, cidade do oceano, lembra a
importância do conjunto, a importância de conceber as fronteiras, não como limites que separam, mas
como zonas de contato.

Sabemos que os grandes problemas de hoje são globais, mas muitas experimentamos a nossa
insuficiência à hora de responde a eles, precisamente porque o mundo, diante de problemas comuns, se
mantém dividido ou pelo menos não suficientemente unido, incapaz de enfrentar juntos aquilo que nos
põe em crise a todos. Parece que as injustiças planetárias, as guerras, as crises climáticas e migratórias
correm mais rapidamente do que a capacidade e, muitas vezes, a vontade de enfrentar em conjunto tais
desafios.

Lisboa pode sugerir uma mudança de ritmo. Em 2007, foi assinado aqui o homônimo Tratado de reforma
da União Europeia. Nele se lê que “a União tem por objetivo promover a paz, os seus valores e o bem-
estar dos seus povos” (Tratado de Lisboa que altera o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui
a Comunidade Europeia, art. 1.4/2.1); mas vai mais longe afirmando que, “nas suas relações com o resto
do mundo (…), contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a
solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza
e a proteção dos direitos humanos” (art. 1,4/2.5).

Não se trata apenas de palavras, mas de marcos miliários no caminho da comunidade europeia,
esculpidos na memória desta cidade. Este é o espírito do conjunto, animado pelo sonho europeu
dum multilateralismo mais amplo do que o mero contexto ocidental.

Segundo uma etimologia controversa, o nome Europa derivaria duma palavra que indica a direção do
ocidente. O certo é que Lisboa constitui a capital mais ocidental da Europa continental, lembrando a
necessidade de abrir caminhos de encontro mais vastos, como aliás Portugal está a fazer sobretudo com
os países de outros continentes irmanados pela mesma língua.

Espero que a Jornada Mundial da Juventude seja, para o “velho continente”, um impulso de abertura
universal, um impulso de abertura que vai dirigido aos jovens. Porque o mundo tem necessidade da
Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste
europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente.

Assim poderá a Europa trazer, para o cenário internacional, a sua originalidade específica; vimo-la
delineada no século passado quando, do crisol dos conflitos mundiais, fez saltar a centelha da
reconciliação, tornando verdadeiro o sonho de se construir o amanhã juntamente com o inimigo de
ontem, o sonho de abrir percursos de diálogo e inclusão, desenvolvendo uma diplomacia da paz que
extinga os conflitos e acalme as tensões, capaz de captar o mais débil sinal de distensão e de o ler por
entre as linhas mais tortas da realidade.

No oceano da história, estamos a navegar num momento tempestuoso e sente-se a falta de rotas
corajosas de paz. Olhando com grande afeto para a Europa, no espírito de diálogo que a caracteriza,
apetece perguntar-lhe: Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para
acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo?

E ainda, alargando o campo: Que rota segues, Ocidente? A tua tecnologia, que marcou o progresso e
globalizou o mundo, sozinha não basta; e muito menos bastam as armas mais sofisticadas, que não
representam investimentos para o futuro, mas empobrecimento do verdadeiro capital humano que é a
educação, a saúde, o estado social. Fica-se preocupado ao ler que, em muitos lugares, se investem
continuamente os recursos em armas e não no futuro dos filhos.

É verdade, dizia um economista. O melhor investimento é a fabricação de armas. Investe-se mais em


armas e não no futuro dos filhos.

Sonho uma Europa, coração do Ocidente, que use o seu engenho para apagar focos de guerra e acender
luzes de esperança; uma Europa que saiba reencontrar o seu ânimo jovem, sonhando a grandeza do
conjunto e indo além das necessidades imediatas; uma Europa que inclua povos e pessoas, sem correr
atrás de teorias e colonizações ideológicas, respeitando a sua própria cultura. Nisso vão nos ajudar os
pais fundadores da Europa. Tinham uma grande criatividade.

Com a sua imensa vastidão de água, o oceano recorda as origens da vida. No mundo evoluído de hoje,
paradoxalmente, tornou-se prioritário defender a vida humana, posta em risco por derivas utilitaristas
que a usam e descartam, a cultura da morte. Penso em tantas crianças não-nascidas e idosos
abandonados a si mesmos, na dificuldade de acolher, proteger, promover e integrar quem vem de longe
e bate às nossas portas, no desamparo em que são deixadas muitas famílias com dificuldade para trazer
ao mundo e fazer crescer os filhos.

Também aqui apetece perguntar: Para onde navegais, Europa e Ocidente, com o descarte dos idosos, os
muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios? Para onde ides se, perante o
tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte,
solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar? Penso em
tantas leis sofisticadas a esse respeito.

Mas Lisboa, abraçada pelo oceano, oferece-nos motivos de esperança. É uma cidade da esperança. Há
uma maré de jovens que se espraia sobre esta cidade acolhedora. Quero agradecer o grande trabalho e
generoso empenho empreendidos por Portugal para acolher um evento tão complexo de gerir, mas
fecundo de esperança, pois – como se diz por aqui – «ao lado dos jovens, não se envelhece». Jovens
provenientes de todo o mundo que cultivam anseios de unidade, paz e fraternidade, desafiam-nos a
realizar os seus sonhos bons. Não andam pelas ruas a gritar sua raiva, mas a partilhar a esperança do
Evangelho. E se, em muitos lugares, se respira hoje um clima de protesto e insatisfação, terreno fértil
para populismos e conspirações, a Jornada Mundial da Juventude é ocasião para construir juntos.
Reaviva o desejo de criar coisas novas, fazer-se ao largo e navegar juntos rumo ao futuro.

Vêm à mente algumas palavras ousadas de Fernando Pessoa: «Navegar é preciso; viver não é preciso
(…); o que é necessário é criar» (Navegar é preciso). Trabalhemos, pois, com criatividade para
construirmos juntos! Imagino três estaleiros de construção da esperança onde podemos trabalhar todos
unidos: o meio ambiente, o futuro, a fraternidade.

O meio ambiente. Portugal partilha com a Europa muitos esforços exemplares na defesa da criação. Mas
o problema global continua extremamente grave: os oceanos aquecem e, das suas profundezas, sobe à
superfície a torpeza com que poluímos a nossa casa comum. Estamos a transformar as grandes reservas
de vida em lixeiras de plástico. O oceano lembra-nos que a existência humana é chamada a viver de
harmonia com um ambiente maior do que nós; este deve ser guardado com cuidado, tendo em conta as
gerações mais novas. Como podemos dizer que acreditamos nos jovens, se não lhes dermos um espaço
sadio para construir o seu futuro? Esse é o meio ambiente.
O futuro é o segundo estaleiro de obras. E o futuro são os jovens. Mas muitos fatores os desanimam,
como a falta de trabalho, os ritmos frenéticos em que se veem imersos, o aumento do custo de vida, a
dificuldade de encontrar uma casa e, ainda mais preocupante, o medo de constituir família e trazer filhos
ao mundo. Na Europa e em geral no Ocidente, assiste-se a uma triste fase descendente na curva
demográfica: o progresso parece ser uma questão que diz respeito ao desenvolvimento técnico e ao
conforto dos indivíduos, enquanto o futuro pede para se contrariar a queda da natalidade e o declínio da
vontade de viver.

A boa política pode fazer muito neste sentido; pode gerar esperança. Com efeito, não é chamada a
conservar o poder, mas a dar às pessoas a possibilidade de esperar. É chamada, hoje mais do que nunca,
a corrigir os desequilíbrios econômicos dum mercado que produz riquezas, mas não as distribui,
empobrecendo de recursos e de certezas os ânimos. É chamada a voltar a descobrir-se como geradora
de vida e de cuidado da criação, a investir com clarividência no futuro, nas famílias e nos filhos, a
promover alianças intergeracionais, onde não se apague o passado mas se favoreçam os laços entre
jovens e idosos.

A isto mesmo faz apelo o sentimento da saudade portuguesa, que exprime nostalgia, desejo dum bem
ausente, que só renasce em contato com as próprias raízes. Os jovens têm que encontrar suas raízes nos
idosos. Neste sentido, é importante a educação, que não pode limitar-se a fornecer noções técnicas para
se progredir economicamente, mas destina-se a introduzir numa história, transmitir uma tradição,
valorizar a necessidade religiosa do homem e favorecer a amizade social.

O último estaleiro de esperança é o da fraternidade, que nós, cristãos, aprendemos do Senhor Jesus
Cristo. Em muitas partes de Portugal, está ainda muito vivo o sentido de vizinhança e solidariedade.
Contudo, no contexto geral duma globalização que nos aproxima mas não nos dá uma proximidade
fraterna, somos todos chamados a cultivar o sentido da comunidade, começando por ir ter com quem
vive ao nosso lado. Com efeito, como observou Saramago, «o que dá verdadeiro sentido ao encontro é a
busca; e é preciso andar muito, para se alcançar o que está perto» (Todos os nomes, 1997). Como é bom
voltar a descobrir-nos irmãos e irmãs, trabalhar pelo bem comum, deixando para trás contrastes e
diferenças de visão! Também aqui servem de exemplo os jovens que nos levam, com o seu grito de paz e
ânsia de vida, a derrubar as rígidas divisórias de pertença erguidas em nome de opiniões e crenças
diversas.

Soube de muitos jovens que cultivam, aqui, o desejo de se fazerem próximo dos outros; penso na
iniciativa «Missão País», que leva milhares de jovens a viver no espírito do Evangelho experiências de
solidariedade missionária em zonas periféricas, sobretudo nas aldeias do interior, indo ao encontro de
muitos idosos sozinhos. Isso é uma unção para a juventude. Quero agradecer e encorajar a tantos que
na sociedade portuguesa se preocupam com os outros, nomeadamente a Igreja, e que fazem tanto bem
mesmo longe dos holofotes. Sintamo-nos chamados, todos juntos fraternalmente, a dar esperança ao
mundo em que vivemos e a este magnífico país. Deus abençoe Portugal!

https://www.acidigital.com/noticias/jmj-lisboa-2023-discurso-do-papa-francisco-no-encontro-com-as-
autoridades-em-portugal-65279

https://www.youtube.com/watch?v=rG8XyRDMSNg
Encontro com as autoridades Eclesiásticas e Agentes Pastorais _ Jerónimos

INTERVENÇÃO DO PAPA FRANCISCO


Prezados Irmãos Bispos,
Amados sacerdotes e diáconos, consagradas, consagrados e seminaristas,
Queridos agentes pastorais, irmãos e irmãs, boa tarde!
Estou feliz por me encontrar no meio de vós não só para viver, juntamente com muitos jovens, a Jornada
Mundial da Juventude, mas também para partilhar o vosso caminho eclesial com as suas canseiras e
esperanças. Agradeço a D. José Ornelas as palavras que me dirigiu; desejo rezar convosco, para – como
disse – nos tornarmos, junto com os jovens, ousados em abraçar «o sonho de Deus e encontrar
caminhos para uma participação alegre, generosa e transformadora a bem da Igreja e da humanidade».
Mergulhei na beleza do vosso país, terra de passagem entre o passado e o futuro, local de antigas
tradições e de grandes mudanças, embelezado por vales viçosos e praias douradas debruçadas sobre o
imenso e fascinante oceano, que banha Portugal.
Tudo isto me sugere o ambiente da vocação dos primeiros discípulos, que Jesus chamou nas margens do
Mar da Galileia. Quero deter-me sobre esta chamada, que põe em evidência o que acabámos de ouvir na
Lectio brevis das Vésperas: o Senhor salvou-nos e chamou-nos não em atenção às nossas obras, mas
segundo a sua graça (cf. 2 Tm 1, 9).
O mesmo aconteceu na vida dos primeiros discípulos, quando Jesus, ao passar, “viu dois barcos que se
encontravam junto do lago. Os pescadores tinham descido deles e lavavam as redes” (Lc 5, 2). Então
Jesus subiu para o barco de Simão e, depois de ter falado às multidões, mudou a vida daqueles
pescadores, convidando-os a fazerem-se ao largo e lançarem as redes. Salta aos olhos o contraste: por
um lado, os pescadores descem do barco para lavar as redes, ou seja, limpá-las, guardá-las e voltar para
casa e, por outro, Jesus sobe para o barco e convida a lançar novamente as redes para a pesca.
Sobressaem as diferenças: os discípulos descem, Jesus sobe; os primeiros querem guardar as redes, o
Mestre quer que saiam de novo para o mar a fim de pescar.
Em primeiro lugar, temos os pescadores que descem do barco para lavar as redes. Esta é a cena que se
apresenta aos olhos de Jesus, e Ele pára ali mesmo. Pouco antes quisera começar a sua pregação na
sinagoga de Nazaré, mas os seus conterrâneos expulsaram-No da cidade e tentaram até matá-Lo (cf. Lc
4, 28-30). Então Jesus sai do lugar sagrado e começa a pregar a Palavra no meio da gente, pelas estradas
onde labutam dia a dia as mulheres e os homens do seu tempo.
Cristo está interessado em fazer sentir a proximidade de Deus precisamente nos lugares e situações
onde as pessoas vivem, lutam, esperam, às vezes colecionando nas suas mãos fracassos e insucessos,
precisamente como aqueles pescadores que não tinham pescado nada durante a noite.
Jesus olha com ternura para Simão e seus companheiros que, cansados e angustiados, lavam as suas
redes, realizando um gesto repetitivo, mas também cansado e resignado: não havia mais nada a fazer
senão voltar para casa de mãos vazias.
Às vezes, podemos sentir um cansaço semelhante no nosso caminho eclesial, quando nada mais temos nas
mãos além das redes vazias. Trata-se dum sentimento bastante difundido nos países de antiga tradição
cristã, atravessados por muitas mudanças sociais e culturais e cada vez mais marcados pelo secularismo,
pela indiferença para com Deus, por um progressivo afastamento da prática da fé.
Aliás isto vê-se, com frequência, acentuado pela desilusão e a aversão que alguns nutrem face à Igreja,
devido às vezes ao nosso mau testemunho e aos escândalos que desfiguraram o seu rosto e que nos
chamam a uma humilde e constante purificação, partindo do grito de sofrimento das vítimas que sempre
se devem acolher e escutar.
O risco, porém, quando nos sentimos desanimados, é descer do barco, acabando presos nas redes da
resignação e do pessimismo. Ao contrário, confiemos que Jesus continua a tomar pela mão e a levantar a
sua Esposa amada. Por isso levemos ao Senhor as nossas canseiras e as nossas lágrimas, para poder
enfrentar as situações pastorais e espirituais, dialogando entre nós com abertura de coração para
experimentar novos caminhos a seguir.
Quando estamos desanimados, consciente ou inconscientemente, nós aposentamos-nos do selo
apostólico e vamos perdendo e transformamo-nos em funcionários do sagrado. É muito triste quando
uma pessoa que é consagrada a Deus se transforme em funcionário, em mero administrador. É muito
triste.
De facto, logo que os apóstolos descem para lavar as ferramentas usadas, Jesus sobe para o barco e
depois convida a lançar de novo as redes.
Em momentos de desânimo e de jubilação, deixemos que Jesus suba à barca de novo. Com a ilusão
inicial, que deve ser revivida, reconquistada, reeditada.
Ele vem procurar-nos nas nossas solidões e crises para nos ajudar a recomeçar.
A espiritualidade é recomeço, não tenham medo. É assim a vida, cair e recomeçar, aborrecer-se e
receber de novo a alegria. Receber essa mão de Jesus.
E hoje continua a passar pelas margens da existência para despertar a esperança e dizer, também a nós,
como a Simão e aos outros: «Faz-te ao largo; e vós lançai as redes para a pesca» (Lc 5, 4).
Quando se perde a ilusão ficamos com mil argumentos para não lançar as redes. Sobretudo essa
resignação amarga, que corrói a alma.
Irmãos e irmãs, vivemos certamente um tempo difícil, mas a interpelação que o Senhor dirige hoje à
Igreja é esta: «Queres descer do barco e afundar na desilusão, ou fazer-Me subir permitindo que seja
mais uma vez a novidade da minha Palavra a tomar na mão o leme?
Sacerdotes, bispos e consagrados, querem apenas conservar o passado que ficou para trás ou lançar de
novo e com entusiasmo as redes para a pesca?». Eis o que nos pede o Senhor: despertar a ânsia pelo
Evangelho.
Quando se acomodam ou se aborrecem ou a missão transforma-se numa espécie de emprego. É o
momento de dar lugar à segunda chamada de Jesus, que nos chama de novo, sempre. Chama-nos para
nos deixar caminhar, para nos recriarmos. Não tenham medo dessa segunda chamada de Jesus.
E podemos dizer que esta é a ânsia «boa» que vos comunica, a vós portugueses, a imensidão do oceano:
fazer-se ao largo, não para conquistar o mundo, mas para o alegrar com a consolação e a alegria do
Evangelho. Sob este ponto de vista, podemos ler as palavras dum vosso grande missionário, o Padre
António Vieira, chamado «Paiaçu – pai grande».
Segundo ele, para nascer, Deus ter-vos-ia dado uma pequena terra, mas, ao fazer-vos debruçar sobre o
oceano, deu-vos o mundo inteiro para morrer: «Para nascer, pequena terra; para morrer, toda a terra:
para nascer, Portugal; para morrer, o mundo» (A. Vieira, “Sermão de Santo António”, Roma 1670, IV, in:
Homilias, vol. III, tomo VII, Porto 1959, p. 69).
Somos chamados a lançar de novo as redes e a abraçar o mundo com a esperança do Evangelho. Não é
momento de parar e desistir, de atracar o barco à margem nem de olhar para trás; não devemos escapar
deste tempo, só porque nos mete medo, para nos refugiarmos em formas e estilos do passado. Não!
Este é o tempo da graça que o Senhor nos concede para nos aventurarmos no mar da evangelização e da
missão.
Mas, para o conseguir, precisamos também de fazer opções. Quero indicar três, inspiradas no
Evangelho.
A primeira opção: fazer-se ao largo. Para lançar novamente as redes ao mar, é preciso sair da margem
das desilusões e do imobilismo, afastar-se daquela tristeza melosa e daquele cinismo irónico que nos
assaltam à vista das dificuldades. Temos de o fazer para passar do derrotismo à fé, como Simão que,
apesar de ter trabalhado em vão toda a noite, conclui: «Porque Tu o dizes, lançarei as redes» (Lc 5, 5).
Mas, para nos fiarmos dia a dia no Senhor e na sua Palavra, não bastam palavras, é necessário muita
oração.
Como rezo eu? Como um papagaio: blá, blá, blá, blá, blá… Ou a dormir a sesta durante a eucaristia
porque não sei como falar com o Senhor. Como rezo?
Apenas na adoração, só diante do Senhor, é que encontramos o gosto e a paixão pela evangelização.
Então vencemos a tentação de continuar com uma «pastoral nostálgica feita de lamentações»….
Uma monja lamentava-se de tudo e deram-lhe a alcunha de “Só Lamentadora”. Quantas vezes as nossas
impotências e as nossas desilusões as transformamos em lamentações. E deixando essas lamentações
ganha-se outra vez força para navegar mar adentro, sem ideologias nem mundanismos.
A mundanidade espiritual que origina o clericalismo… O clericalismo não é só dos padres, os laicos
clericalizados são piores do que os padres, esse clericalismo que nos arruína e, como dizia um grande
mestre espiritual: essa mundanidade espiritual que provoca o clericalismo é um dos males mais graves
que pode acontecer à Igreja
Superar estas dificuldades sem ideologias e mundanidade, animados por um único desejo: que chegue a
todos o Evangelho. Neste caminho, não vos faltam exemplos! E, dado que nos encontramos no meio dos
jovens, apraz-me recordar um jovem lisboeta, São João de Brito, que há séculos, no meio de muitas
dificuldades, partiu para a Índia e lá não desdenhava falar e vestir-se à maneira das pessoas locais
contanto que lhes pudesse anunciar Jesus.
Também nós somos chamados a mergulhar as nossas redes no tempo em que vivemos, a dialogar com
todos, a tornar compreensível o Evangelho, mesmo que para isso tenhamos de correr o risco de alguma
tempestade. Como os jovens que aqui vêm de todo o mundo para desafiar as ondas gigantes da Nazaré,
façamo-nos ao largo também nós sem medo. Sim! Não temamos enfrentar o mar alto, porque no meio
da tempestade e dos ventos contrários, Jesus vem ao nosso encontro e diz: «Coragem, sou Eu, não
temais!» (Mt 14, 27).
Como segunda opção, levar juntos por diante a pastoral. No texto, Jesus confia a Pedro a tarefa de fazer-
se ao largo, mas depois fala no plural, dizendo «e vós lançai as redes» (Lc 5, 4): Pedro guia o barco, mas
todos estão no barco e todos são chamados a fazer descer as redes. E, quando apanham uma grande
quantidade de peixes, não pensam conseguir arranjar-se sozinhos, nem gerem a dádiva como posse e
propriedade privada, mas «fizeram sinal – diz o Evangelho – aos companheiros que estavam no outro
barco, para que os viessem ajudar» (Lc 5, 7). Assim encheram, não um, mas dois barcos: um significa
solidão, fechamento, pretensão de autossuficiência; dois significa relação.
A Igreja é sinodal, é comunhão, ajuda mútua, caminho comum. E a isto tende o Sínodo em curso, que
terá o seu primeiro período de assembleia geral no próximo mês de outubro.
Na barca da Igreja, deve haver lugar para todos: todos os batizados são chamados a subir para ela e
lançar as redes, empenhando-se pessoalmente no anúncio do Evangelho.
Sublinho esta palavra: todos, todos, todos. Toca-me muito no coração aquela passagem do Evangelho
em que o Senhor da festa diz: tragam todos. Doentes e sãos, novos e velhos, justos e pecadores. Todos.
A Igreja não seleciona quem entra ou não. Todos.
É um grande desafio, especialmente em contextos onde os sacerdotes e os consagrados estão cansados
porque, enquanto as necessidades pastorais vão aumentando sempre mais, eles são cada vez menos.
Mas podemos olhar para esta situação como uma ocasião para, com fraterno entusiasmo e sã
criatividade pastoral, envolver os leigos.
Assim as redes dos primeiros discípulos tornam-se uma imagem da Igreja, que é uma «rede de relações»
humanas, espirituais e pastorais. Se não houver diálogo, corresponsabilidade e participação, a Igreja
envelhece. Permiti que o exprima assim: nunca um Bispo sem o próprio presbitério e o Povo de Deus;
nunca um padre sem os seus irmãos sacerdotes; e todos juntos – sacerdotes, religiosas, religiosos e fiéis
leigos – como Igreja, nunca sem os outros, sem o mundo. Sem mundanismo, mas não sem o mundo.
Na Igreja, ajudamo-nos, apoiamo-nos reciprocamente e somos chamados a difundir, também fora dela,
um clima de fraternidade construtiva. Aliás, como escreve São Pedro, nós somos as pedras vivas usadas
para a construção dum edifício espiritual (cf. 1 Ped 2, 5). E poderia acrescentar numa linguagem que vos
é familiar: vós, fiéis portugueses, formais uma «calçada», sois os ladrilhos preciosos que compõem um
tal pavimento acolhedor e brilhante que o Evangelho há de pisar; e não pode faltar uma pedrinha
sequer, senão imediatamente se dá conta. Tal é a Igreja que, com a ajuda de Deus, somos chamados a
construir!
Enfim a terceira opção: tornar-se pescadores de homens.
Não tenham medo, isso não é fazer proselitismo. É anunciar o Evangelho que provoca.
Jesus confia aos discípulos a missão de se fazerem ao largo no mar do mundo. Muitas vezes, na Sagrada
Escritura, o mar simboliza o lugar do mal e das forças adversas que os homens não conseguem dominar.
Por isso pescar as pessoas e tirá-las para fora da água significa ajudá-las a voltar a subir de onde
afundaram, salvá-las do mal que ameaça afogá-las, ressuscitá-las de todas as formas de morte.
Com efeito, o Evangelho é um anúncio de vida no mar da morte, mas sem proselitismo, mas com amor.
Quando um movimento eclesial, um bispo, um padre, uma freira ou um laico fazem proselitismo, isso
não é cristão. Ser cristão é convidar, acolher, ajudar, mas sem proselitismo.
O Evangelho é um anúncio de vida no mar da mortede liberdade nas voragens da escravidão, de luz no
abismo das trevas. Como afirma Santo Ambrósio, «os instrumentos da pesca apostólica são como as
redes: de facto, as redes não fazem morrer quem fica preso nelas, mas conserva-o em vida, arrasta-o
dos abismos para a luz» (Exp. Luc. IV, 68-79).
Não faltam trevas na sociedade atual, inclusive aqui em Portugal. Prova-se a sensação de que tenha
diminuído o entusiasmo, a coragem de sonhar, a força para enfrentar os desafios, a confiança no futuro;
entretanto, vamos navegando nas incertezas, na precariedade económica, na pobreza de amizade social,
na falta de esperança.
A nós, como Igreja, cabe a tarefa de nos fazermos ao largo nas águas deste mar, lançando a rede do
Evangelho, sem acusar ninguém, mas levando às pessoas do nosso tempo uma proposta de vida nova,
que é a de Jesus: levar o acolhimento do Evangelho a uma sociedade multicultural; levar a proximidade
do Pai às situações de precariedade e pobreza, que crescem sobretudo entre os jovens; levar o amor de
Cristo onde é frágil a família e se encontram feridas as relações; transmitir a alegria do Espírito onde
reinam o desânimo e o fatalismo.
Assim se exprime um escritor vosso: «Para se chegar ao infinito, e julgo que se pode lá chegar, é preciso
termos um porto, um só, firme, e partir dali para Indefinido» (F. Pessoa, Livro do Desassossego, Lisboa
1998, 247). Queremos sonhar a Igreja Portuguesa como um «porto seguro» para quem enfrenta as
travessias, os naufrágios e as tempestades da vida.
De coração vos agradeço, irmãos e irmãs, a atenção prestada, tudo o que fazeis, o vosso exemplo e
constância. Muito obrigado! E confio-vos a Nossa Senhora de Fátima, à guarda do Anjo de Portugal e à
proteção dos vossos grandes Santos e, aqui em Lisboa, de modo especial a Santo António, apóstolo
incansável, pregador inspirado, discípulo do Evangelho atento aos males da sociedade e cheio de
compaixão pelos pobres. Que ele interceda por vós e vos dê a alegria duma nova pesca milagrosa. E, por
favor, não vos esqueçais de rezar por mim.

Análise da vaticanista Aura Miguel:

Nesta intervenção o Papa Francisco também improvisou e improvisou muitas vezes sobre aspetos da
vida religiosa. Ele identificou ou desmonta muitos dos vícios que se vão acumulando. Por exemplo, ele
perguntou aos presentes como se reza. Como um “papagaio: blá, blá, blá…” ou “a dormir a sesta”
durante a missa. Também contou a história de uma freira que se estava sempre a lamentar. E isso
arruina a vida religiosa e faz mal aos que estão à nossa volta, disse o Papa. Francisco também criticou o
clericalismo de padres e de leigos.

As palavras de Francisco aos responsáveis da Igreja portuguesa foram muito realistas. Ele conhece bem o
cansaço de muitos, o avanço do secularismo, a indiferença de tantos fiéis que deixaram a prática
dominical, a desilusão e até aversão, disse o Papa, por causa dos abusos - disse e reconheceu que
vivemos tempos difíceis.

Então qual é a opção, o que fazemos, perguntou Francisco? Fica-se no desânimo ou lança-se de novo as
redes? Ficamos presos ao passado ou abraçamos o mundo com esperança? O Papa convidou as forças
vivas da Igreja em Portugal a fazer três opções.

A primeira é “Faz-te ao largo!”, como arriscou em tempos fazer S. João de Brito, indo até aos confins da
Índia sem medo. Como exemplo mais moderno, lembrou a coragem dos jovens que se arriscam a surfar
a onda da Nazaré. É isso mesmo que agora é preciso para evangelizar.

A segunda opção é que só é possível fazê-lo juntos e há lugar para todos. Francisco foi buscar uma
imagem muito bonita que tem a ver connosco: a imagem da calçada portuguesa, onde basta uma pedra
estar desajustada para se perceber que não há equilíbrio.

A terceira opção chama-se “Pescadores de homens”. Ele disse mesmo que é como se fosse uma opção
para não deixar que as pessoas se afundem, hoje em dia, com tantas incertezas, pobreza e falta de
esperança.

Queremos sonhar a Igreja portuguesa como um porto seguro, disse o Papa Francisco, para quem
enfrenta travessias, naufrágios e tempestades da vida.

No final, também em jeito de abraço ao encontro da nossa identidade, pediu a proteção de Nossa
Senhora de Fátima, do Anjo de Portugal e de Santo António, que são três grandes pilares da nossa
religiosidade e que o Papa hoje valorizou nesta visita histórica aos Jerónimos.
Discurso aos jovens universitários _ UCP

Papa Francisco aos jovens universitários – UCP - 03/08/2023 - JMJ Lisboa 2023
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Obrigado, senhora Reitora, pelas suas palavras. Afirmou que todos nos sentimos «peregrinos», palavra
esta cujo significado merece ser meditado. Literalmente, significa deixar de lado a rotina habitual e pôr-
se a caminho com um intento, que pode ser o de um passeio pelos campos ou ir mais além dos nossos
confins habituais; seja como for, deixando o espaço de conforto pessoal rumo a um horizonte de
sentido. Na imagem do «peregrino», espelha-se a condição humana, pois todos somos chamados a
confrontar-nos com grandes interrogativos para os quais não basta uma resposta simplista ou imediata,
mas convidam a realizar uma viagem, superando-se a si mesmo, indo mais além. Trata-se dum processo
que um universitário compreende bem, pois é assim que nasce a ciência. E de igual modo cresce
também a busca espiritual. Desconfiemos das fórmulas pré-fabricadas, das respostas que nos parecem
ao alcance da mão, extraídas da manga como se fossem cartas viciadas de jogar; desconfiemos das
propostas que parecem dar tudo sem pedir nada. Vemos numa parábola de Jesus que só encontra a
pérola de grande valor quem a procura com sabedoria e iniciativa, quem dá tudo e arrisca tudo o que
tem para a possuir (cf. Mt 13, 45-46). Procurar e arriscar: eis os verbos dos peregrinos.
Fernando Pessoa diz, de modo atormentado, mas correto, que «ser descontente é ser homem»
(Mensagem, O Quinto Império). Não devemos ter medo de nos sentir inquietos, de pensar que tudo o
que possamos fazer não basta. Neste sentido e dentro duma justa medida, ser descontente é um bom
antídoto contra a presunção da autossuficiência e o narcisismo. O ser incompleto carateriza a nossa
condição de indagadores e peregrinos, pois, como diz Jesus, estamos no mundo, mas não somos do
mundo (cf. Jo 17, 16). Somos chamados a algo mais, a uma decolagem sem a qual não há voo.
Portanto, não nos alarmemos se nos encontramos intimamente sedentos, inquietos, incompletos,
desejosos de sentido e de futuro, com saudades do futuro. Não estamos doentes, mas simplesmente
vivos! Preocupemo-nos antes quando estamos prontos a substituir a estrada a fazer por qualquer
estação de serviço que nos dê a ilusão do conforto; quando substituímos os rostos pelos ecrãs, o real pelo
virtual; quando, em vez das perguntas lacerantes, preferimos as respostas fáceis que anestesiam.
Amigos, permiti dizer-vos: procurai e arriscai. Neste momento histórico, os desafios são enormes e os
gemidos dolorosos, mas abracemos o risco de pensar que não estamos numa agonia, mas num parto;
não no fim, mas no início dum grande espetáculo. Por isso sede protagonistas duma «nova coreografia»
que coloque no centro a pessoa humana, sede coreógrafos da dança da vida. As palavras da senhora
Reitora serviram-me de inspiração sobretudo quando afirmou que «a universidade não existe para se
preservar como instituição, mas para responder com coragem aos desafios do presente e do futuro». A
auto preservação é uma tentação, um reflexo condicionado pelo medo, que nos faz olhar para a
existência de forma distorcida. Se as sementes se preservassem a si mesmas, desperdiçariam
completamente a sua força geradora e condenar-nos-iam à fome; se os invernos se preservassem a si
mesmos, não existiria a maravilha da primavera. Por isso, tende a coragem de substituir os medos pelos
sonhos: não administradores de medos, mas empreendedores de sonhos!
À universidade que se comprometeu a formar as novas gerações, seria um desperdício pensá-la apenas
para perpetuar o atual sistema elitista e desigual do mundo com o ensino superior que continua a ser
um privilégio de poucos. Se o conhecimento não for acolhido como uma responsabilidade, torna-se
estéril. Se quem recebeu um ensino superior –que hoje, em Portugal e no mundo, continua a ser um
privilégio –, não se esforça por restituir aquilo de que beneficiou, significa que não compreendeu
profundamente o que lhe foi oferecido. No Génesis, as primeiras perguntas que Deus faz ao homem são:
«Onde estás?» (3, 9) e «Onde está o teu irmão?» (4, 9). Ponhamo-nos a pergunta: Onde
estou? Permaneço fechado no meu mundo ou abraço o risco de sair das minhas seguranças para me
tornar um cristão praticante, um artesão de justiça e beleza? E perguntemo-nos ainda: Onde está o meu
irmão? Experiências de serviço fraterno como a «Missão País» e muitas outras, que nascem no meio
académico, deveriam ser consideradas indispensáveis para quem passa por uma universidade. Com efeito,
o título de estudo não deve ser visto apenas como uma licença para construir o bem-estar pessoal, mas
como um mandato para se dedicar a uma sociedade mais justa e inclusiva, ou seja, mais avançada.
Disseram-me que a vossa grande poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen, em entrevista que é uma
espécie de testamento, à pergunta «o que gostaria de ver realizado em Portugal neste novo século?»,
respondeu sem hesitar: «Gostaria que se realizasse a justiça social, a diminuição das diferenças entre ricos
e pobres» (“Entrevista feita por Joaci Oliveira”, Cidade Nova, nº 3/2001). Dirijo agora a mesma pergunta
a vós, caros estudantes, peregrinos do saber: Que quereis ver realizado em Portugal e no mundo? Quais
mudanças, quais transformações? E como pode a universidade, especialmente a Católica, contribuir para
isso?
Beatriz, Mahoor, Mariana e Tomás, agradeço os vossos testemunhos. Em todos havia um tom de
esperança, uma carga de entusiasmo realista, sem queixumes nem escapadelas idealistas. Quereis ser
«protagonistas da mudança», como disse a Mariana. Ao escutar-vos veio-me ao pensamento uma frase
do escritor Almada Negreiros, que talvez vos seja familiar: «Sonhei com um país onde todos chegavam a
Mestres» (A Invenção do Dia Claro). Também este idoso que vos fala sonha que a vossa geração se torne
uma geração de mestres: mestres de humanidade, mestres de compaixão, mestres de novas
oportunidades para o planeta e seus habitantes, mestres de esperança.
Como alguns de vós sublinharam, devemos reconhecer a urgência dramática de cuidar da casa comum.
No entanto, isso não pode ser feito sem uma conversão do coração e uma mudança da visão
antropológica subjacente à economia e à política. Não podemos contentar-nos com simples medidas
paliativas ou com tímidos e ambíguos compromissos. Neste caso, «os meios-termos são apenas um
pequeno adiamento do colapso» (Francisco, Carta enc. Laudato si’, 194). Trata-se, pelo contrário, de
tomar a peito o que infelizmente continua a ser adiado: a necessidade de redefinir o que chamamos
progresso e evolução. É que, em nome do progresso, já abriu caminho muito retrocesso. Vós sois a
geração que pode vencer este desafio: tendes instrumentos científicos e tecnológicos mais avançados,
mas, por favor, não vos deixeis cair na cilada de visões parciais. Não esqueçais que temos necessidade
duma ecologia integral, de escutar o sofrimento do planeta juntamente com o dos pobres; necessidade de
colocar o drama da desertificação em paralelo com o dos refugiados; o tema das migrações juntamente
com o da queda da natalidade; necessidade de nos ocuparmos da dimensão material da vida no âmbito
duma dimensão espiritual. Não queremos polarizações, mas visões de conjunto.
Obrigado, Tomás, por nos teres dito que «não é possível uma verdadeira ecologia integral sem Deus, que
não pode haver futuro num mundo sem Deus». Também eu gostaria de vos dizer: tornai credível a fé
através das vossas escolhas. Porque se a fé não gera estilos de vida convincentes, não faz levedar a
massa do mundo. Não basta que um cristão esteja convencido, deve ser convincente; as nossas ações
são chamadas a refletir a beleza jubilosa e simultaneamente radical do Evangelho. Além disso, o
cristianismo não pode ser habitado como uma fortaleza cercada de muros, que ergue baluartes contra o
mundo. Por isso, achei tocante o testemunho de Beatriz, quando disse que é precisamente «a partir do
campo da cultura» que se sente chamada a viver as Bem-aventuranças. Em cada época, uma das tarefas
mais importantes para os cristãos é a de recuperar o sentido da encarnação. Sem a encarnação, o
cristianismo torna-se ideologia; é a encarnação que permite maravilhar-se com a beleza que Cristo
revela através de cada irmão e irmã, cada homem e mulher.
A propósito, é interessante que, na vossa nova cátedra dedicada à «Economia de Francisco», tenhais
acrescentado a figura de Clara. De facto, é indispensável o contributo feminino. Aliás vê-se, na Bíblia,
como a economia familiar está em grande parte na mão da mulher. É ela a verdadeira «governante» da
casa, com uma sabedoria que não visa exclusivamente o lucro, mas o cuidado, a convivência, o bem-
estar físico e espiritual de todos, bem como a partilha com os pobres e os estrangeiros. Abordar os
estudos económicos com esta perspetiva é entusiasmante, tendo em vista devolver à economia a
dignidade que lhe compete, para que não caia como presa do mercado selvagem e da especulação.
A iniciativa do Pacto Educativo Global e os sete princípios da sua arquitetura incluem muitos desses temas,
desde o cuidado da casa comum à plena participação das mulheres, à necessidade de encontrar novas
formas de entender a economia, a política, o crescimento e o progresso. Convido-vos a estudar o Pacto
Educativo Global e a apaixonar-vos por ele. Um dos pontos que trata é a educação para o acolhimento e a
inclusão. Não podemos fingir que não ouvimos as palavras de Jesus no capítulo 25 de Mateus: «era
estrangeiro e recolhestes-me» (25, 35). Acompanhei emocionado o testemunho de Mahoor, quando
lembrou o que significa viver com o «sentimento constante de ausência de um lar, da família, dos
amigos, (...) de ter ficado sem teto, sem universidade, sem dinheiro, (...) cansada, exausta e abatida pela
dor e pelas perdas». Disse-nos que reencontrou a esperança porque alguém acreditou no impacto
transformador da cultura do encontro. Sempre que alguém pratica um gesto de hospitalidade,
desencadeia uma transformação.
Amigos, sinto-me feliz por ver-vos uma comunidade educativa viva, aberta à realidade, com o Evangelho
que não se limita a servir de ornamento, mas anima as partes e o todo. Sei que o vosso percurso engloba
diversos âmbitos: estudo, amizade, serviço social, responsabilidade civil e política, cuidado da casa
comum, expressões artísticas... Ser uma universidade católica significa antes de mais nada que cada
elemento está em relação com o todo e o todo revê-se nas partes. Assim, ao mesmo tempo que se
adquirem competências científicas, vai-se amadurecendo como pessoa, no conhecimento de si mesmo e
no discernimento do próprio caminho. Então avante! Uma tradição medieval conta que quando os
peregrinos se cruzavam no Caminho de Santiago, um saudava o outro exclamando «Ultreia» ao que este
respondia «et Suseia». Trata-se de expressões de encorajamento para prosseguir a busca e o risco da
caminhada, dizendo a si mesmo: «Vai mais longe e mais alto!» «Coragem, força, anda para diante!» Isto
é o que vos desejo também eu, de todo o coração.

Cerca de 7000 jovens, ouviram o discurso do Papa Francisco.


Discurso aos Jovens na Celebração de Acolhimento _ Colina do Encontro

DISCURSO ESCRITO NA ÍNTEGRA QUE FRANCISCO LEU AOS JOVENS NO PARQUE EDUARDO VII, (Colina do
encontro), 03-08-2023.

“NA IGREJA HÁ ESPAÇO PARA TODOS, E QUANDO NÃO HOUVER, FAÇAMOS COM QUE HAJA"

"Queridos jovens, boa tarde! Sede bem-vindos e obrigado por estardes aqui. Fico feliz por vos ver e
também por escutar o simpático barulho que fazeis, contagiando-me com a vossa alegria. É bom
estarmos juntos em Lisboa: para aqui fostes chamados por mim, pelo Patriarca, a quem agradeço as suas
palavras, pelos vossos Bispos, sacerdotes, catequistas e animadores. Agradeçamos-lhes por isso com
uma grande salva de palmas!

Mas foi sobretudo Jesus quem vos chamou: agradeçamos-Lhe! Amigos, não estais aqui por acaso. O
Senhor chamou-vos, não só nestes dias, mas desde o início dos vossos dias. Sim, Ele chamou-vos pelo
nome. Chamados pelo nome: tentai imaginar estas três palavras escritas em letras grandes e, em
seguida, pensai que estão escritas dentro de vós, nos vossos corações, como que formando o título da
vossa vida, o sentido do que sois: tu és chamado pelo nome, tu és chamada pelo nome, eu sou chamado
pelo nome.

Ao princípio da teia da vida, ainda antes dos talentos que possuímos, das sombras e feridas que
carregamos dentro de nós, recebemos um chamamento. Chamados, porque amados.

Aos olhos de Deus somos filhos preciosos, que Ele cada dia chama para abraçar e encorajar; para fazer
de cada um de nós uma obra-prima única e original, cuja beleza mal conseguimos vislumbrar. Nesta
Jornada Mundial da Juventude, ajudemo-nos a reconhecer esta realidade essencial: sejam estes dias
ecos vibrantes da chamada amorosa de Deus, porque somos preciosos a seus olhos, apesar do que às
vezes os nossos olhos veem, enevoados pela negatividade e ofuscados por tantas distrações.

Sejam dias em que o teu nome, através de irmãos e irmãs de muitas línguas e nações que o pronunciam
com amizade, ressoe como uma notícia única na história, porque único é o pulsar do coração de Deus
por ti. Sejam dias para fixar no coração que somos amados tal como somos. Este é o ponto de partida da
JMJ, mas sobretudo da vida.

Chamados pelo nome: não é um simples modo de dizer, é Palavra de Deus (cf. Is 43, 1; 2 Tm 1, 9).
Amigo, amiga, se Deus te chama pelo nome significa que, para Ele, não és um número, mas um rosto.
Quero fazer-te notar uma coisa: muitos, hoje, sabem o teu nome, mas não te chamam pelo nome. Com
efeito, o teu nome é conhecido, aparece nas redes sociais, é processado por algoritmos que lhe
associam gostos e preferências. Mas tudo isso não interpela a tua singularidade, mas a tua utilidade para
pesquisas de mercado.
Quantos lobos se escondem por trás de sorrisos de falsa bondade, dizendo que conhecem quem és, mas
sem te querer bem, insinuando que creem em ti e prometendo que serás alguém, para depois te
deixarem sozinho, quando já não lhes fores útil. São as ilusões do mundo virtual e devemos estar atentos
para não nos deixarmos enganar, porque muitas realidades que nos atraem e prometem felicidade
mostram-se depois pelo que são: coisas vãs, supérfluas, substitutos que deixam o vazio interior.
Jesus, não! Ele tem confiança em ti, para Ele tu contas. E assim nós, sua Igreja, somos a comunidade dos
chamados: não dos melhores - não, absolutamente não -, mas dos convocados, de quantos acolhem,
juntamente com outros, o dom de ser chamados. Somos a comunidade dos irmãos e irmãs de Jesus,
filhos e filhas do mesmo Pai.
Nas cartas que me enviastes (são SALA DE IMPRENSA DA SANTA SÉ 5/2 lindas, obrigado!), dissestes:
«Assusta-me porque sei que há pessoas que não me aceitam e que acham que não há um lugar para
mim (...), eu própria chego a questionar-me se há um lugar para mim ou não». E ainda: «sinto que na
minha paróquia não há espaço para errar».

Amigos, quero ser claro convosco, que sois alérgicos às falsidades e a palavras vazias: na Igreja há espaço
para todos e, quando não houver, por favor façamos com que haja, mesmo para quem erra, para quem
cai, para quem sente dificuldade.

Porque a Igreja é, e deve ser cada vez mais, aquela casa onde ressoa o eco da chamada pelo nome que
Deus dirige a cada um. O Senhor não aponta o dedo, mas alarga os braços: assim no-Lo mostra Jesus na
cruz. Não fecha a porta, mas convida a entrar; não mantém à distância, mas acolhe. Nestes dias
transmitamos a sua mensagem de amor, que liberta o coração e deixa uma alegria que não desaparece.

Como? Chamando os outros pelo nome. Perguntai o nome a quem encontrais e, depois, pronunciai o
nome do outro com amor, acrescentando sem medo: «Deus ama-te, Deus chama-te». Lembrai-vos
mutuamente que sois preciosos. E não temais ajuntar: «Irmão, irmã, é bom que tu existas». Acreditais
nisto? Posso contar convosco? Nesta tarde, vós também me fizestes perguntas, muitas perguntas. E
perguntar, é bom; aliás muitas vezes é melhor que dar respostas, pois quem pergunta permanece
«inquieto» e a inquietude é o melhor remédio contra a habituação, aquela normalidade rasteira que
anestesia a alma.

Por isso, gostaria de vos convidar a fazer uma segunda coisa nestes dias: as perguntas que trazeis dentro
de vós, aquelas importantes que dizem respeito aos vossos sonhos, afetos, grandes anseios, à esperança
e ao sentido da vida, não as guardeis para vós, mas colocai-as a Jesus.
Chamai-O pelo nome, como Ele faz convosco. Levai-Lhe os vossos interrogativos e confiai-Lhe os vossos
segredos, a vida dos vossos queridos, as alegrias e preocupações, e também os problemas do vosso país
e do mundo inteiro. Então descobrireis uma coisa nova e surpreendente: quando se pergunta ao Senhor,
quando se Lhe abre diariamente o coração, quando se reza de verdade, verifica-se uma reviravolta
interior.

Pois, no diálogo da oração, Deus não cessa de surpreender-te: já que Ele não é um motor de busca, mas
o Amigo verdadeiro, não Se limita a dar respostas simples às perguntas que Lhe fazes, mas prefere em
vez disso apresentar-te solicitações. Enquanto Lhe pedes o que precisas, começas a sentir dentro de ti
outras questões, as d'Ele, que tocam os nervos descobertos da alma e desafiam para o bem, atraem para
um amor maior e levam o coração a dilatar-se.
Assim Deus entra em diálogo connosco e faz-nos maturar naquilo que verdadeiramente conta: dar a
vida. Foi isto que aconteceu no Evangelho que escutamos: os discípulos, que ainda há relativamente
pouco tempo viviam com Jesus, lá permaneciam à espera de respostas. E que faz Ele? Uma surpresa:
envia-os em missão. Envia-os sem uma preparação adequada, sem seguranças, sem «bolsa, nem alforge,
nem sandálias»: confia tanto neles que os envia «como cordeiros para o meio de lobos» (Lc 10, 3.4). E
Jesus deposita a mesma confiança em vós. Os discípulos voltaram, felizes, daquela aventura da missão.
Amigos, há uma felicidade que Jesus preparou para vós, para cada um de vós: não passa por acumular
coisas, mas por colocar em jogo a vida. Também a ti diz o Senhor: «Vai, porque há um mundo que
precisa daquilo que tu, e só tu, lhe podes dar».

Poderias replicar: «Mas o que é que eu posso levar aos outros?» Uma coisa só, uma notícia maravilhosa,
a mesma que Ele confiou aos seus discípulos: «Deus está próximo» (cf. Lc 10, 9). Esta é a pérola preciosa
da existência. Todos precisam de saber que Deus está próximo; espera apenas o mínimo aceno do
coração para cumular de maravilha as nossas vidas.
Mas poderias ainda objetar: «Não sou capaz, tenho medo, não me fio!» Todos temos os nossos temores:
o ponto em questão não está aqui, somos humanos! O busílis é o que havemos de fazer com os medos
que temos. Deus chama-nos precisamente nos nossos medos, nos nossos fechamentos e solidões. Não
chama aqueles que se sentem capazes, mas torna capazes aqueles que chama.

O Senhor fez maravilhas com Abraão que era velho e já se sentia chegado ao fim, com Moisés que tinha
medo de falar porque gaguejava, com Pedro que era impulsivo e errava com frequência, com Paulo que
estava manchado por grandes culpas. Nenhum deles era perfeito, mas todos se uniram ao Senhor,
«conectaram-se» com Ele. Aqui está o segredo: permanecer conectado com o Senhor.
Dissestes-me numa das vossas cartas: «Reconheço em mim uma dificuldade cada vez maior em ter um
olhar treinado, atento para as coisas do Céu». É verdade! Não é fácil, mas estamos aqui para nos treinar,
criar rede e conectar-nos com a chamada de Deus. Dispomos duma grande ajuda - uma Mãe - que,
especialmente nestes dias, nos toma pela mão e indica o caminho: Maria. É a maior criatura da história!
E não porque tivesse uma cultura superior ou habilidades especiais, mas porque nunca se separou de
Deus.
O seu coração não se deixou distrair nem poluir: foi um espaço aberto ao Senhor, sempre conexo com
Ele. Teve a coragem de se aventurar pelos caminhos da Palavra de Deus e, assim, trouxe esperança e
alegria ao mundo. Maria ensina-nos a caminhar na vida, mas sobre isto falaremos no sábado à noite.

Por agora limitemo-nos a recordar o ponto de partida: somos todos chamados pelo Senhor, chamados
porque amados. E façamos duas coisas: primeiro, chamemo-nos pelo nome e lembremos uns aos outros
a beleza de ser amados e preciosos! Segundo: ponhamos as nossas questões a Jesus, que nestes dias
espera muitas chamadas da nossa parte. Estejamos em conexão com Ele. Conectados com o amor, a
alegria crescerá. Feliz JMJ"

Rádio Renascença: https://rr.sapo.pt/especial/religiao/2023/08/03/discurso-na-integra-do-papa-na-


cerimonia-de-acolhimento-da-jmj/341580/

2.57 (duas horas e 57 minutos)


Discurso na Scholas Occurrentes _ Cascais

Papa. “Mesmo os que não rezem por mim, mandem uma boa onda”
03 ago, 2023 - 13:40 • Maria João Costa , Manuela Pires
O Papa Francisco visitou, em Cascais, a Scholas Occurrentes, uma organização internacional de direito
pontifício. No diálogo com os jovens pediu-lhes para se porem “a caminho” e enfrentarem as crises.
Francisco participou na pintura final de um mural de mais de três quilómetros.
É cor verde esperança o traço redondo que o Papa deixou gravado nas paredes da sala da Scholas
Occurrentes que visitou esta quinta-feira, em Cascais. Francisco juntou-se assim ao projeto do mural de
mais de três quilómetros com que os jovens desta instituição lançada pelo então Jorge Mário Bergoglio,
cardeal em Buenos Aires, marcaram a visita do Papa a Portugal.
Na casa amarela que é hoje teto da Scholas e que já foi a escola primária Conde Ferreira de Cascais, o
Papa conversou com três jovens de diferentes nacionalidades e religiões. Francisco escutou Aladje,
muçulmano da Guiné-Bissau; Paulo, evangélico do Brasil e Mariana, católica de Portugal.
Deles recebeu perguntas e respondeu de improviso. Numa sala com o teto e as paredes pintadas a que
Francisco chamou de “Capela Sistina”, o Papa desafiou os jovens. “Põe-te a caminho. Ajuda a respeitar o
outro”, diz Francisco.
Aos jovens que o questionaram sobre o “caos” que se vive, Francisco explicou a origem da palavra crise e
sublinhou que “uma vida sem dificuldades é uma vida asséptica". "É como água destilada. Não tem
sabor”. Por isso, o Papa deixou um pedido a estes jovens: “Há que enfrentar as crises”.
Num registo descontraído, como se estivesse em casa nesta que é uma das 190 representações de uma
instituição que criou, Francisco disse ainda que é preciso “passar do caos para o cósmico”. Desabafando,
disse que “não queria fazer de catequista”, mas apontou: “somos chamados a dar sentido” e a vida, por
vezes, enfrenta provações.
Mensagens escutadas numa sala onde marcaram também presença o presidente da República, Marcelo
Rebelo de Sousa, o autarca de Cascais, Carlos Carreiras, e o seu vice-presidente Miguel Pinto Luz; o
presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude, o cardeal D. Américo Aguiar e o padre Nuno
Coelho, prior de Cascais, bem como alguns dos jovens que colaboram com a Scholas Occurrentes.
Em Cascais, Francisco deixou também um presente. Trouxe um quadro e explicou aos jovens tratar-se de
“O Bom Samaritano”. O Papa sublinhou: “Nenhum está excluído de ser o Bom Samaritano”.
A fechar a sua intervenção, Francisco pediu, como é sempre seu hábito, para que rezem por ele.
"Mesmo que não rezem por mim, mandem uma boa onda!”, pediu, num concelho onde o surf é
desporto rei.
Já no pátio, o Papa, que se deslocou em cadeira de roda, abençoou uma oliveira que está no canto do
jardim da escola enquanto a fadista Cuca Roseta interpretou à capela o tema “Recado” e tocou à
guitarra um “Avé Maria”.
A primeira visita de um Papa a Cascais
Ao longo do percurso de três quilómetros onde foi colocado o mural pintado por cerca de três mil
pessoas, estavam espalhadas milhares de pessoas que quiseram ver a passagem do Papa Francisco,
naquela que é a primeira deslocação de um alto representante do Vaticano ao concelho de Cascais.
Nem todos conseguiram chegar às ruas estreitas onde fica a Scholas Occurrentes. Quem conseguiu
chegar mais perto gritou vivas ao Papa quando este saiu do carro para entrar na instituição.
Já depois da visita do Papa, muito emocionado, o autarca de Cascais, Carlos Carreiras revela
à Renascença como é que surgiu a ideia de Francisco chamar “Capela Sistina” à sala onde esteve.
“Isso era uma piada, porque o José Maria Corral dizia que tinha feito aqui uma Capela Sistina e, pelos
vistos, deve ter dito isso também ao Santo Padre. A casa ficou pintada e o mural acabou por ficar com
3500 metros, mais aquele bocado dentro da casa que também faz parte do mural”, revela Carlos
Carreiras à Renascença.
Já depois da saída de Francisco rumo a Lisboa, a “Capela Sistina” encheu-se de dezenas de jovens que
colaboram com o projeto da Scholas Occurrentes. Tiraram uma foto de família. Entre eles estavam
Margarida e Rafael, dois jovens de 18 anos, ela do concelho de Oeiras e ele de Cascais que frequentam a
escola.
Questionados pela Renascença sobre esta visita papal, Margarida confessava “muita alegria". "É uma
experiência única, inovadora”. Depois de escutar as palavras de Francisco, Margarida conta o que reteve:
“O conselho que ele deu é para os jovens não ficarem agarrados à zona de conforto e viverem
experiências novas”.
Já Rafael afirma: “Sem dúvida, é um momento que nos vai marcar para o resto das nossas vidas... saber
que estivemos com o Papa tão perto e que tivemos a oportunidade de estar num projeto incrível, com
pessoas incríveis e participar no mural de três quilómetros e meio, que é algo inédito".

Discurso no Centro de S. Vicente _ Bairro da Serafina

"Queridos irmãos e irmãs, bom dia!


Agradeço ao pároco as suas palavras, e saúdo a todos os presentes, em particular aos amigos do Centro
Paroquial da Serafina, da Casa Família Ajuda de Berço e da Associação Acreditar. É bom estarmos aqui
juntos, enquanto, no contexto da Jornada Mundial da Juventude, olhamos para a Virgem Maria que Se
levanta e vai ajudar Isabel, sua parente idosa (cf. Lc 1, 39). De facto, a caridade é a origem e a meta do
caminho cristão, e a vossa presença, realidade concreta de «amor em ação», ajuda-nos a não esquecer a
rota, o sentido daquilo que fazemos. Obrigado pelos vossos testemunhos, dos quais quero destacar três
aspetos: fazer juntos o bem, agir no concreto e estar próximo dos mais frágeis.
Primeiro, fazer juntos o bem. «Juntos» é a palavra-chave, que ouvi repetir muitas vezes nas vossas
intervenções. Viver, ajudar e amar juntos: jovens e adultos, sãos e doentes… juntos. O João disse-nos
uma coisa importante: é preciso não se deixar «definir» pela doença, mas fazer dela parte viva do
contributo que prestamos ao conjunto, à comunidade. É verdade! Não devemos deixar-nos «definir»
pela doença ou pelos problemas, porque não somos uma doença nem um problema. Cada um de nós é
um dom, um dom único com os seus limites, um dom precioso e sagrado para Deus, para a comunidade
cristã e para a comunidade humana. E, assim como somos, enriquecemos o conjunto e deixamo-nos
enriquecer pelo conjunto!
Segundo, agir no concreto. Também isto é importante. A Igreja não é um museu de arqueologia, mas –
como nos recordava o padre Francisco, inspirando-se em São João XXIII – é «o antigo fontanário da
aldeia que dá água às gerações de hoje, como a deu às do passado» (Homilia na Liturgia em Rito
Bizantino- Eslavo em honra de São João Crisóstomo, 13/XI/1960). O fontanário serve para matar a sede
dos caminhantes que chegam, carregando o peso real e as canseiras concretas do seu caminho! Por
conseguinte é necessária concretização, atenção ao «aqui e agora», como aliás já fazeis com o cuidado
dos pormenores e sentido prático, belas virtudes típicas do povo português. Quando não se perde
tempo a lamentar-se da realidade, mas se tem a preocupação de ir ao encontro das carências concretas,
com alegria e confiança na Providência, acontecem coisas maravilhosas. Assim o testemunha a vossa
história: do encontro com o olhar de um idoso na rua, nasce um centro de caridade «de todo o
respeito», como este em que nos encontramos; de um desafio moral e social qual é a «campanha pela
vida», nasce uma associação que ajuda grávidas e sua família, crianças, adolescentes e jovens em
dificuldade, para encontrarem um projeto de vida seguro, como nos contou Sandra; da experiência da
doença nasce uma comunidade de apoio a quem luta contra o cancro, especialmente crianças, de modo
que «os progressos no tratamento e a melhor qualidade de vida se tornem realidade para eles», como
nos disse o João. Obrigado pelo que fazeis! Continuai com mansidão e gentileza a deixar-vos interpelar
pela realidade, com as suas pobrezas antigas e novas, e a responder de forma concreta, com criatividade
e coragem.
O terceiro aspeto: estar próximo dos mais frágeis. Todos somos frágeis e necessitados, mas o olhar feito
de compaixão, próprio do Evangelho, leva-nos a ver as necessidades de quem mais precisa. Leva-nos a
servir os pobres, os prediletos de Deus que Se fez pobre por nós (cf. 2 Cor 8, 9): os excluídos, os
marginalizados, os descartados, os humildes, os indefesos. São eles o tesouro da Igreja, são os preferidos
de Deus! E recordemo-nos sempre de não estabelecer diferenças entre eles; de facto, para um cristão,
não há preferências face a quem, necessitado, bate à nossa porta: compatriotas ou estrangeiros,
pertencentes a este ou àquele grupo, jovens ou idosos, simpáticos ou antipáticos...
A propósito de caridade, quero agora contar-vos uma história, especialmente a vós, crianças, que talvez
não conheçais. É a história real dum jovem português que viveu há muito tempo. Chamava-se João
Cidade e habitava em Montemor-o-Novo. Sonhava com uma vida aventureira; por isso, adolescente
ainda, partiu de casa à procura da felicidade. Achou-a depois de vários anos e muitas aventuras, quando
encontrou Jesus. E ficou tão contente com a descoberta que até decidiu mudar o nome, chamando-se a
partir de então, não João Cidade, mas João de Deus. E fez uma coisa ousada: foi pela cidade e começou a
pedir esmola pelas ruas, dizendo às pessoas: «Fazei bem, irmãos, a vós mesmos!» Compreendeis? Pedia
a esmola, mas dizia a quantos lha davam que, ajudando-o a ele, na realidade estavam a ajudar antes de
mais nada a si próprios! Ou seja, explicava que os gestos de amor são um dom primariamente para
quem os cumpre, antes mesmo de o serem para quem os recebe; porque tudo o que se acumula para si
mesmo perder-se-á, enquanto aquilo que se dá por amor nunca se desperdiça, mas será o nosso tesouro
no céu.
Por isso dizia: «Fazei bem, irmãos, a vós mesmos!» Porém o amor não torna felizes só no céu, mas já
aqui na terra, porque dilata o coração e permite abraçar o sentido da vida. Se queremos ser
verdadeiramente felizes, aprendamos a transformar tudo em amor, oferecendo aos outros o nosso
trabalho e o nosso tempo, dizendo palavras edificantes e realizando boas ações, mesmo com um sorriso,
com um abraço, com a escuta, com o olhar. Queridos adolescentes, irmãos e irmãs, vivamos assim!
Todos podemos fazê-lo e disto mesmo todos precisamos, aqui e em qualquer lugar do mundo.
Sabeis o que aconteceu depois a João? Não o entenderam! Pensavam que estava maluco e fecharam- no
num manicómio. Mas ele não se desmoralizou, porque o amor não se arrende e quem segue Jesus não
perde a paz nem se põe a lamentar a sua sorte. E foi precisamente lá, no manicómio, carregando a cruz,
que chegou a inspiração de Deus. João deu-se conta de quanto aqueles doentes precisavam de ajuda e,
quando finalmente o deixaram sair, depois de alguns meses, começou a cuidar deles com outros
companheiros, fundando uma Ordem Religiosa: os Irmãos Hospitaleiros. Alguns, porém, começaram a
designá-los doutro modo, ou seja, com as palavras «fazei bem, irmãos…» que aquele jovem ia repetindo
a todos. Assim são chamados em Roma: Fatebenefratelli. É um belo nome, e um ensinamento
importante! Ajudar os outros é um dom para si próprio e faz bem a todos. É verdade! Amar é um dom
para todos! Recordemo-nos: «o amor é um presente para todos!» Vamos repetir juntos: o amor é um
presente para todos!
Amemo-nos assim! Continuai a fazer da vida um presente de amor e de alegria. Fico-vos grato e
recomendo a todos, mas especialmente às crianças: continuai a rezar por mim. Obrigado!"

Análise:
O Papa discursou, dia 4 de agosto,, no Centro Paroquial da Serafina, em Lisboa. Nas primeiras filas
estiveram dezenas de sacerdotes e alguns políticos, como o Presidente da República, Marcelo Rebelo de
Sousa, e o autarca de Lisboa, Carlos Moedas.

Francisco cpmeçou o discurso por saudar todos, em particular das associações presentes, como a Ajuda
de Berço e a Acreditar, além de dirigir um agradecimento especial aos "amigos do Centro Paroquial da
Serafina".

"A caridade é a meta do espírito cristão. A vossa ação ajuda-nos a não esquecer o caminho. Obrigado
pelos testemunhos", diz.

Sobre os discursos anteriores, das associações, o Sumo Pontífice destacou três pontos: "Fazer o bem
juntos, atuar concretamente e estar perto dos mais frágeis".

"Juntos é a palavra-chave, que se repetiu nas intervenções. Viver a ajudar, não deixar as pessoas serem
definidas pela doença. Cada um de nós é um dom único, com os seus limites, mas sagrado para Deus."

O santo padre, que lia o discurso de um papel, interrompeu a leitura para dizer que não estava a
conseguir ler bem e, por isso, continuou a discursar sem a cábula.

Já sem o papel, remata: "Não há amor abstrato. O amor concreto é o que nos suja as mãos. Não poderia
existir uma JMJ sem caridade. Vocês geram vida continuamente, com este compromisso."
Homília da Via-Sacra

Via-Sacra. Papa pede "sentinelas da esperança" numa humanidade "sedenta de paz"


04 ago, 2023 - 19:00 • Ricardo Vieira

Perante os peregrinos da Jornada Mundial da Juventude, Francisco disse que Jesus Cristo nunca vai
desistir “de esperar por nós”. "Ele chora connosco porque nos acompanha na escuridão que trazemos
dentro", declarou.

O Papa pede que todos sejam "sentinelas da esperança" numa humanidade "sedenta de paz". O apelo
foi deixado por Francisco no discurso oficial para a Via-Sacra desta sexta-feira, no Parque Eduardo VII,
em Lisboa.

Perante 800 mil peregrinos da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o Papa foi espontâneo, improvisou
bastante e não leu grande parte do discurso oficial divulgado aos jornalistas.

Perante os conflitos armados, as guerras interiores de cada um e as crises, o Papa recordou no discurso
oficial o exemplo de Jesus Cristo aos participantes no acontecimento da JMJ.

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Retomando a ideia da Igreja aberta a todos e de braços abertos para acolher, Francisco disse que Cristo
veio ao nosso encontro, “a ponto de Se abaixar aos nossos pés para os lavar, a ponto de receber as
nossas chagas para as curar, a ponto de tocar o fundo da nossa humanidade: as solidões, os medos, os
sofrimentos, a dor, o abandono, a morte”.

Jesus “caminha ao nosso lado”, declarou, “sem parar, sem descansar, sem pensar minimamente que seja
inútil, sem cessar de esperar por nós, sem cessar de nos amar”, afirmou o Santo Padre na “capital do
mundo”, que por estes dias é Lisboa.

E se o Filho de Deus caminha ao nosso lado, o Papa pede a todos que abram os corações ao Seu amor, se
deixem iluminar pela “luz da beleza” que ofusca as “paralisias da tristeza, da resignação, daquela acédia
da alma que te apaga o entusiasmo”.

Que ouçam o chamamento e sejam “sentinelas de esperança capazes de ousar novos passos na
escuridão da noite, de não nos amolgar-mos no passado, de não nos deixarmos amedrontar pelo
futuro”, salientou o Papa.

Jesus carrega a cruz em nome da humanidade e Francisco pede-Lhe que “tome mais uma vez sobre Si as
injustiças, as violências, as discriminações, os horrores da guerra e tudo o que fere os pobres e devasta a
criação”.

“Levemos-Lhe os gritos desoladores da nossa humanidade sequiosa, sedenta de paz. Olhemos com
confiança para Aquele que «é a nossa paz» (Ef 2, 14). A Ele, trespassado por nós, abramos o coração.
N’Ele confiemos. O sangue e a água, que correm do seu lado, desçam sobre nós, nos purifiquem e
transformem; tornem-nos profetas apaixonados do Evangelho, testemunhas ousadas de esperança”,
concluiu o Papa na Via-Sacra, no discurso escrito que acabou por ler apenas algumas partes no Parque
Eduardo VII.

800 mil peregrinos em silêncio. "Ele chora connosco"

Num discurso marcado por momentos de interação com os fiéis, Francisco pediu desafiou os peregrinos
da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) a seguirem o caminho de Jesus Cristo, porque "ninguém tem
mais amor do que aquele que dá a vida pelos outros".

Nas palavras de improviso aos peregrinos durante a Via-Sacra desta sexta-feira, no Parque Eduardo VII,
em Lisboa, Francisco disse que nunca estão sozinhos porque Jesus caminha ao seu lado.

Nos momentos mais baixos e sombrios, "Jesus espera com o seu amor e ternura dar-nos consolo,
enxugar as nossas lágrimas".

Perante 800 mil pessoas, o Papa desafiou a multidão à reflexão e ao silêncio.

"Eu faço-vos agora uma pergunta, mas não respondam em voz alta. Respondam para dentro. Eu choro
de vez em quando? Há coisas na vida que me fazem chorar? Todos na vida chorámos e choramos toda a
vida. Ele chora connosco porque nos acompanha na escuridão que trazemos dentro. Façam um breve
silêncio e diga a Jesus porque coisas choram na vida… ", interpelou.

Francisco disse aos jovens que "amar é arriscado, mas é preciso correr o risco de amar. Vale a pena
correr o risco porque Ele acompanha-nos sempre, sempre durante toda a vida está junto a nós".

Hoje vamos caminhar com Ele, percorrer o caminho do seu sofrimento, de muitas ansiedades, das
nossas solidões.

De seguida, o Papa pediu mais alguns segundos de silêncio. "Pensem no vosso próprio sofrimento,
ansiedades, nas próprias misérias. Não tenham medo. E pensem na vontade que têm que a alma volte a
sorrir", declarou.

https://www.youtube.com/watch?v=TJJufUvXWAM
(1:58)

https://rr.sapo.pt/especial/religiao/2023/08/04/via-sacra-papa-pede-sentinelas-da-esperanca-numa-
humanidade-sedenta-de-paz/341727/
1:57
Intervenção em Fátima

Os discursos que o Papa preparou para Fátima e não leu


À medida que os dias passam, e que a proximidade com a multidão é cada vez maior, o Papa Francisco
tem vindo a improvisar nos discursos, acrescentando algumas palavras, retirando outras, um pouco
como se respondesse ao sentir do momento. Esta manhã foi assim em Fátima. Levava dois discursos
preparados. Não os leu, não há justificação oficial sobre o porquê, mas o Papa falou sobre o que sentia.

No quinto dia em Portugal, e penúltimo em Portugal, para cumprira a sua estada na Jornada Mundial da
Juventude (JMJ) 2023, o Papa Francisco chegou à Capelinha das Aparições em Fátima e acabou por não
ler o que levava escrito. Falou de Maria, como mulher, e sobretudo como Mãe, brincando que em
português se dizia "Maria segue apressada, apressada, porque é Mãe", "Mãe que acolheu todos e
apontou para Jesus". Mas esta passagem não estava no discurso.
Aliás, poucas foram as frases que o Papa pronunciou e estavam no discurso oficial. Este foi, sem dúvida,
a maior improvisação até agora. Não se sabe ainda porquê, nem a organização nem ele próprio
explicaram este improviso, embora Francisco já o tenha feito antes, quando esteve em Cascais, no
Scholas Ocurrentes, porque "estava com a vista cansada", na Missa de Acolhimento, para ouvir a
multidão a dizer que na "Igreja há lugar para todos, todos, todos" e ontem.

O DN deixa aqui o discurso escrito preparado para ler na Oração do Terço em Fátima, onde esteve com
112 peregrinos com deficiência e reclusos, durante duas horas, e onde fala da "estrada para a grandeza,
que é a pequenez", pedindo mesmo que se "apaixonem pela vida verdadeira". No discurso, o Papa
agradecia a D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal, que lhe dirigiu algumas palavras.
_____________________________________________________________________________
Discurso do Papa
"Queridos irmãos e irmãs, bom dia! Obrigado, D. José Ornelas, pelas suas palavras e, a vós todos,
obrigado pela presença e a oração. Rezámos o terço, uma oração muito bela e vital; vital, porque nos
põe em contacto com a vida de Jesus e de Maria. E meditámos os mistérios da alegria, que nos lembram
que a Igreja não pode ser senão a casa da alegria.
A Capelinha onde nos encontramos constitui uma bela imagem da Igreja: acolhedora e sem portas; é um
santuário a céu aberto no coração deste recinto que lembra um grande abraço materno. Assim seja na
Igreja, que é mãe: portas abertas para todos a fim de facilitar o encontro com Deus; e lugar para todos,
porque cada um é importante aos olhos do Senhor e de Nossa Senhora.
Encontramo-nos aqui, sob o seu olhar materno; aqui aonde vem tanta gente peregrina. A peregrinação é
precisamente o traço mariano que liga os mistérios que rezámos. De facto, Maria recebe o anúncio da
alegria - aquele «alegra-Te» (Lc 1, 28) - que Lhe muda a vida e, imediatamente, inicia uma peregrinação
que se estende pelos mistérios sucessivos: vai a casa de Isabel, depois a Belém, em seguida ao templo de
Jerusalém, aonde voltará por último para reencontrar Jesus.
Maria caminha, não fica parada. O mesmo faz ao longo da história, descendo até ao nosso meio, como
aqui em Fátima, e convidando a pormo-nos em peregrinação não só com o corpo, mas sobretudo com a
vida. Como? Avançando dia a dia com alegria e esperança, porque temos uma meta - o Céu -, e ao
mesmo tempo com perseverança e paciência, porque a vida na terra não é um videojogo para entreter,
mas um caminho a percorrer com coragem e constância.
Quero agradecer-vos, a vós que estais aqui e sabeis continuar em frente quer na doença quer na
reclusão. Carregais a cruz, mas, com Deus, as vossas cruzes não terão por meta o nada, mas serão portas
para a glória. É verdade! Porque, com Jesus, toda a cruz termina em ressurreição, toda a escuridão em
luz e todo o abandono em comunhão. Obrigado! Obrigado porque sois testemunhas de que a vida vale
mais que a saúde e que a alegria não vem das coisas que se possuem, mas do amor que se dá e recebe.
Maria está convosco. Ela realizou sonhos maiores do que aqueles que podia imaginar. Como? Não
procurando o sucesso, o poder, a riqueza e as aparências mundanas, mas caminhando pelas sendas de
Deus, pela estrada da verdadeira grandeza. E sabeis como se chama esta estrada para a grandeza?
Chama-se pequenez, o caminho da pequenez. Deus escolhe sempre os pequenos, que para Ele são
grandes; escolhe os simples e são eles que Lhe permitem realizar na história os seus grandes desígnios:
como os discípulos no Evangelho, como as crianças aqui em Fátima. Deus prefere-os. E a pequenez que
Deus ama sugere que nos mantenhamos afastados duma tentação perigosa: o perfecionismo. Parece
que hoje não se pode ser nada menos do que perfeito; é preciso mostrar-se grande, eficiente e
realizado. Qualquer fragilidade aparece como uma culpa, enquanto os modelos inculcados pela
sociedade da imagem são sempre resplandecentes e rutilantes.
Mas estão maquilhados... E, por conseguinte, são falsos, porque a vida é feita de verdade e realidade,
não de mentiras e aparências. E quem segue as aparências do mundo, permanece triste por dentro.
Quantos jovens carregam, hoje, a aflição de não conseguir êxito, de lhe ter corrido mal, de serem SALA
DE IMPRENSA DA SANTA SÉ 8/2 inadequados e até errados; exteriormente procuram estar à altura,
mostrar-se em forma, mas dentro o coração grita dor. Amigos, não nos deixemos contagiar pelo
perfecionismo, não nos deixemos enganar por miragens, não nos tornemos discípulos das modas.
Apaixonemo-nos pela vida verdadeira, porque somos chamados a ser artistas da existência, não
especialistas em fotos retocadas; chamados a colorir de sentido os dias que vivemos, não a envernizá-los
com aparências. Ajudemo-nos a avançar juntos, de mãos dadas, com os pés assentes na terra e o olhar
voltado para o céu. Pensemos que as fragilidades não são obstáculos intransponíveis, mas degraus para
chegar mais alto, porque é precisamente através da nossa pequenez que Deus realiza grandes coisas.
Tenhamos isto sempre presente: Jesus faz maravilhas com a pequenez.
Mais ainda: Ele identificou-se com os pequenos. Assim o diz o Evangelho: «Sempre que fizestes isto a um
destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). E entre estes pequeninos
estais vós, doentes e reclusos. Amigos, Jesus ama-vos até ao ponto de Se identificar convosco. E pede-
vos para colaborardes com Ele, fazendo-vos intercessores. Mas como? Fátima ajuda-nos, pois é uma
escola de intercessão. Os pastorinhos de Fátima tornaram-se grandes na intercessão, graças a um anjo
que, um ano antes da vinda de Nossa Senhora, os instruiu. Apareceu-lhes dizendo: «Não tenhais
medo!». Sempre que chega Deus, desaparecem os temores. Em seguida o anjo apresenta-se: «Sou o
anjo da paz».
Onde está Deus, sempre há paz. Depois faz-lhes um pedido: «Rezai comigo». E ensina-lhes orações que
não tinham em vista eles mesmos nem as próprias necessidades, como muitas vezes fazemos nós, mas
eram orações de adoração e intercessão. Adoração a Deus e intercessão pelos outros. Então o anjo
ajoelha-se com a fronte inclinada até ao chão e convida-os a rezar dizendo: «Meu Deus! Eu creio, adoro,
espero e amo-Vos. Peço-Vos perdão para os que não creem, não adoram, não esperam e não Vos
amam». E acrescenta: «Os Corações de Jesus e de Maria estão atentos à voz das vossas súplicas».
Temos a certeza de que Deus ouve sempre as nossas orações; estas nunca são inúteis, mas sempre
necessárias, porque a oração muda a história. O anjo da paz explica que as orações e os sacrifícios feitos
com amor atraem a paz ao mundo. Eis as últimas palavras que dirige às crianças, quase confiando-lhes
uma tarefa: «Consolai o vosso Deus».
Não precisamos só nós da consolação de Deus; também Ele pede para ser consolado por nós, porque
sofre: sofre com o mal, as divisões, a falta de paz, e pede oração e amor. Que grande missão temos nós
na história! Verdadeiramente não podemos considerar-nos inúteis; somos preciosos. Aquilo que vivemos
e oferecemos pode transformar o mundo. Aqui está o coração palpitante e sempre atual da mensagem
de Fátima. Em 1917, quando Nossa Senhora aparece precisamente no mês de agosto, diz uma coisa
surpreendente. São-Lhe apresentados alguns doentes, e Ela interessa-Se por eles; mas imediatamente
depois veem-Na assumir um aspeto sério e triste, como se estivesse a assinalar uma doença mais
preocupante, e acrescenta: «Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas
para o inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas». Poderíamos esperar que Ela dissesse:
há quem se perca, porque é mau, porque o mundo está torto, porque há pouca fé, porque existe
ateísmo, relativismo... Mas não.
Nossa Senhora não faz estes discursos. É Mãe e não acusa ninguém, nem a sociedade; não critica nem Se
lamenta; simplesmente Se preocupa, porque falta compaixão pelos que andam longe, porque não há
quem reze e se ofereça a Deus por eles, porque escasseiam o amor e o zelo. Acolhamos hoje este
convite à responsabilidade, convite a cuidarmos de quem não crê, não espera, não ama. E Deus cuidará
de nós. Rezemos, porque Fátima é um ginásio de treino para a oração. Hoje, como aliás no tempo das
Aparições, há guerra. Nossa Senhora pediu para rezar o terço pela paz. Fez o pedido, não como se fosse
um favor, mas com apreensão materna: «Rezem o terço todos os dias, para alcançarem a paz para o
mundo e o fim da guerra». Unamos os nossos corações, rezemos pela paz, continuemos a consagrar a
Igreja e o mundo ao Coração Imaculado da nossa terna Mãe.
_____________________________________________________________________________
Oração a Maria
Maria, estamos aqui na vossa presença. Vós sois Mãe e cuidais de nós. Conheceis as nossas
penas e as nossas canseiras. Nós levantamos o olhar para Vós, deixamo-nos envolver pelos vossos olhos
e confiamo-nos ao vosso coração. Este não esteve isento de dúvidas e medos: sentistes temor, quando o
anjo Vos visitou em Nazaré, apreensão quando não encontráveis alojamento em Belém, angústia quando
perdestes Jesus no templo. Mas, nas provas, fostes corajosa e destemida: tudo confiastes a Deus, e
respondestes ao temor com o amor, à apreensão com a solicitude, à angústia com o oferecimento. Nos
momentos decisivos, nunca recuastes, antes tomáveis a iniciativa: solícita fostes ter com Isabel, nas
bodas de Caná batestes ao coração de Jesus, no Cenáculo mantivestes unidos os discípulos. No calvário,
uma espada traspassou-Vos a alma, mas Vós, mulher humilde e forte, iluminastes com a esperança
pascal a noite do sofrimento. E agora olhai para nós, sofrei connosco e por nós.
O vosso coração é sensível aos nossos problemas. Lançamo-los no vosso regaço: tomai de novo a
iniciativa por nós, nestes tempos atribulados pela injustiça e devastados pelas armas. Voltai o vosso
olhar materno para a família humana, que perdeu o caminho da paz, perdeu o sentido da fraternidade e
não reencontra o calor de casa. Intercedei pelo nosso mundo em perigo e tumulto, para que acolha a
vida e rejeite a guerra, cuide dos que sofrem e salvaguarde a criação. Vimos a Vós, procuramos refúgio
no vosso Coração Imaculado. Imploramos misericórdia, Mãe de misericórdia; paz, Rainha da Paz!
Convertei os ânimos de quem alimenta ódio e fomenta conflitos, de quem pensa que a guerra resolva os
problemas. Tocai o coração dos que andam afastados, de quem não tem a alegria de conhecer Deus.
Amparai quem está sozinho, sustentai quem está doente, consolai quem está desanimado. Neste diálogo
convosco, Rainha do santo Rosário, recordamos os vossos apelos maternos.
Viestes pedir oração e penitência. Quantas vezes, porém, nos deixamos atrair por outras coisas:
preocupados com as nossas necessidades e distraídos por tantos interesses, mostramo-nos surdos aos
vossos convites. Mas Vós amais-nos e não Vos cansais de nós. Continuai a recordar-nos que Deus
merece o primeiro lugar. Ajudai-nos a converter-nos. Guardai a unidade na Igreja, quando é polarizada
por ideologias, ferida pelos pecados dos seus filhos, tentada pelo mundanismo. Vós, pequenina,
exaltastes as grandes coisas que o Senhor realizou em Vós; recordai-nos que a humildade e a mansidão
são as chaves que abrem o escrinho do coração de Deus, permitindo que o seu Espírito Se derrame
sobre o mundo.
Confortai os humildes e os simples, aqueles que creem, adoram, esperam e amam; encorajai-os na sua
missão. Acendei em todos nós o zelo apostólico e tomai os jovens pela mão: fazei resplandecer neles o
desejo de arriscar a vida por sonhos grandes e belos. Ó Maria, nós Vos amamos e confiamos em Vós. E
agora de novo nos entregamos a Vós. Com coração de filhos, Vos consagramos as nossas vidas, todas as
fibras do nosso ser, tudo o que temos e somos, para sempre. Nós Vos consagramos a Igreja e o mundo,
especialmente os países em guerra. Alcançai-nos a paz. Vós, Virgem do Caminho, abri sendas onde
parece que não há. Vós, que desatais os nós, desfazei os emaranhados do egoísmo e os laços do poder.
Vós, que nunca Vos deixais vencer em generosidade, enchei-nos de ternura, colmai-nos de esperança e
fazei-nos saborear a alegria que não passa, a alegria do Evangelho.
Amen."

SIC Notícias:
https://sicnoticias.pt/especiais/jmj/2023-08-05-A-Igreja-nao-tem-portas-o-discurso-do-Papa-em-Fatima-
3dd1d49c

FATIMA, 05 Ago. 23 / 07:06 am (ACI).- Hoje (5), terceiro dia de sua viagem a Portugal, por ocasião da JMJ
Lisboa 2023, o papa Francisco foi a Fátima onde rezou o terço acompanhado por doentes e cerca de 200
mil pessoas. Depois da oração, ele deu um discurso.

A seguir, o texto completo do discurso do Papa Francisco em Fátima:

Queridos irmãos e irmãs: Bom dia!

Obrigado, Dom Ornelas, pelas suas palavras, obrigado a todos pela vossa presença e pelas vossas
orações. Rezamos o Terço, uma oração bonita, cheia de vida, porque nos põe em contato com a vida de
Jesus e de Maria. E meditamos os mistérios gozosos, que nos recordam que a Igreja só pode ser uma
casa cheia de alegria. A pequena capela em que nos encontramos é como uma bela imagem da Igreja:
acolhedora, sem portas, a Igreja não tem portas para que todos possam entrar.

E aqui também podemos insistir que todos podem entrar, porque esta é a casa da Mãe, e uma Mãe tem
sempre o coração aberto para todos os seus filhos, todos, todos, todos, sem exclusão! Estamos aqui sob
o olhar materno de Maria, estamos aqui como Igreja, Igreja Mãe. A peregrinação é uma caraterística
mariana, porque a primeira a peregrinar depois da Anunciação de Jesus foi Maria. Quando soube que a
prima estava grávida, a prima, que já era muito velha, fugiu. A tradução é um pouco imprecisa, mas o
Evangelho diz "fugiu apressadamente". Nós diríamos: "saiu correndo". Saiu correndo, na ânsia de ajudar,
de estar presente.
Há tantas invocações de Maria, mas uma - que também podemos dizer, pensando bem - é esta: a Virgem
que vem correndo, sempre que há um problema, sempre que a invocamos, ela não se demora, vem,
apressada: Nossa Senhora apressada. Gostam? Vamos dizê-lo todos juntos: Nossa Senhora apressada.
Apressa-se para estar junto de nós, apressa-se porque é Mãe, apressada, em português chama-
se apressada, diz Dom Ornelas. Nossa Senhora Apressada.

Assim, ela acompanha a vida de Jesus e não se esconde depois da Ressurreição. Acompanha os
discípulos à espera do Espírito Santo e acompanha a Igreja que começa a crescer depois do Pentecostes.

Nossa Senhora Apressada e Nossa Senhora que acompanha, acompanha sempre. Ela nunca é a
protagonista. O gesto de acolhimento de Maria Mãe é duplo. Primeiro, acolhe e depois, assim [aponta
com o dedo] Por que isto? Ela aponta para Jesus. Na sua vida, Maria não faz outra coisa senão apontar
para Jesus: Fazei o que Ele vos disser. Aponta Jesus. Estes são os dois gestos de Maria, pensemos bem:
acolhe-nos a todos e aponta para Jesus. E isto é feito um pouco apressada, apressada, Nossa
Senhora Apressada, que acolhe a todos e aponta para Jesus. E cada vez que vimos aqui, lembramo-nos
disto. Maria fez-se presente aqui de uma forma especial para que a incredulidade de tantos corações se
abrisse a Jesus. Com a sua presença, ela aponta-nos para Jesus, aponta-nos sempre para Jesus, e hoje
está aqui entre nós. Ela está sempre entre nós, mas agora sentimo-la muito mais perto. Maria apressada.

Amigos, Jesus ama-nos a tal ponto que se identifica conosco e pede-nos que colaboremos com ele, e
Maria indica-nos o que Jesus nos pede: que caminhemos pela vida colaborando com ele.

Gostaria que olhássemos hoje para a imagem de Maria e que cada um de nós pensasse: o que é que
Maria, como Mãe, me está a dizer, o que é que me está a apontar com o dedo? Ela aponta para Jesus,
por vezes aponta também para alguma coisinha no nosso coração que não funciona bem, mas aponta
sempre. Mãe, o que é que me está a apontar? Façamos um pequeno momento de silêncio e cada um de
nós, no seu coração, diga: Mãe, o que é que me apontas? O que é que há na minha vida que te
preocupa? O que é que há na minha vida que te comove? O que é que há na minha vida que te
interessa? E tu, tu apontas.

E aí aponta-nos o coração para a vinda de Jesus. E tal como nos aponta para Jesus, aponta Jesus para o
coração de cada um de nós.

Queridos irmãos e irmãs, sintamos hoje a presença de Maria, nossa Mãe, a Mãe que sempre dirá: "Fazei
o que Jesus vos disser". Ela aponta-nos para Jesus. Mas a Mãe que diz a Jesus: "Faz o que ele te pede".
Essa é Maria, essa é a nossa Mãe, Nossa Senhora que se apressou a estar perto de nós. Que ela nos
abençoe a todos.
Intervenção na Vigília _ Campo da Graça/Parque Tejo

Vigília _ Campo da Graça _ Parque Tejo – 5 de agosto


Papa no Parque Tejo: "O único momento em que é lícito olhar uma pessoa de cima é para a ajudar a
levantar-se" (discurso na íntegra) - CNN Portugal (iol.pt)

O Papa Francisco no Parque Tejo, na vigília deste sábado, pediu aos jovens que levem a alegria aos outros
e que se transformem em "raízes de alegria", destacando o exemplo de Maria

"Quem ama voa e corre feliz", começou por dizer o Papa Francisco perante 1,5 milhões de pessoas de
olhos postos no altar-palco do Parque Tejo. Destacando o exemplo de Maria, o chefe da Igreja Católica
sugeriu aos jovens que fechassem os olhos e pensassem naqueles que são as suas "raízes da alegria", os
"pais e avós, padres e freiras, catequistas, animadores, professores".

Discurso na íntegra:

Queridos irmãos e irmãs, boa noite! Que bom ver-vos! Obrigado por terdes viajado, caminhado e
chegado aqui! Também a Virgem Maria teve de viajar para chegar a casa de Isabel. «Levantou-se e partiu
apressadamente» (Lc 1, 39): diz o Evangelho desta JMJ. Poderíamos perguntar-nos: Mas porque é que
Maria se levanta e vai apressadamente ter com a prima? Certamente porque acaba de saber que ela
está grávida, mas também Maria o está. Então por que foi ela, se o anjo não lho pediu, nem Isabel?
Maria realiza um gesto não solicitado e sem ser obrigada, simplesmente porque ama e «quem ama voa,
corre feliz» (A Imitação de Cristo, III, 5). Maria não espera, toma a iniciativa: vai ajudar a prima e,
sobretudo, apressa-se a dar-lhe o que há de mais precioso: a alegria. É missionária da alegria e por isso
tem pressa. Certamente já vos aconteceu alguma vez viver uma coisa tão bela que não conseguistes
guardá-la só para vós! Pois bem! Esta é a pressa boa de Maria, aquela que impele a partilhar o bem com
os outros.

Maria levanta-se e vai. Caminha com passo veloz impelida pelas palavras que lhe disse o anjo: «Alegra-te
(...), o Senhor está contigo. (...) Não temas» (Lc 1, 28.30). São as palavras que leva a Isabel. Como é bom,
quando alguém nos diz: «Estou contigo, não tenhas medo». Assim faz Maria: para partilhar a beleza de
Deus que está próximo, faz-se próxima ela mesma. Amigos, se estamos aqui é porque alguém nos trouxe
a proximidade de Deus, bateu à nossa porta não para nos pedir algo, mas pela necessidade
transbordante de partilhar a alegria do Senhor. Repassemos então com o pensamento quem fez nascer
o sol do amor de Deus sobre as nossas vidas. Todos tivemos pessoas que foram raios de luz: pais e avós,
padres e freiras, catequistas, animadores, professores … São as raízes da nossa alegria.

Raízes de alegria. Por momentos fechai os olhos e imaginai uma árvore, uma árvore grande e bela...
Como consegue aquela árvore resistir às tempestades e aos ventos que a sacodem! Como pode ela
permanecer firme? Graças às raízes. Connosco dá-se o mesmo: as raízes dão-nos a estabilidade de que
precisamos. São as fontes escondidas da alma. Amigos, tornemo-nos dignos das nossas raízes, de quem
nos deu vida, fé e amor! E pensemos que também nós podemos ser raízes de alegria para os outros.
Mas surge, espontânea, a pergunta: Como é possível tornar-se raízes de alegria? Mostra-no-lo Maria. Ela
cultiva a alegria, pondo-se em caminho. Diz-nos que, para aumentar e conservar a alegria, é preciso
aprender a arte do caminho. Esta exige um ritmo cadenciado, regular, enquanto hoje se vive de
emoções rápidas, sensações momentâneas, instintos que duram instantes. Não! A alegria não nasce
assim. Maria ensina-nos que é preciso a constância da caminhada, a mesma que demonstrastes para
chegar até aqui. Passo a passo, chega- se longe. Os campeões desportivos, assim como os músicos e os
cientistas, mostram que as grandes metas não se alcançam num átimo. Quanto treino há por trás dum
golo, quanto trabalho por trás duma canção que nos deixa emocionados, quanto estudo por trás duma
descoberta importante!

Se isto é verdade para o desporto, a música e a pesquisa, por maior razão há de valer para aquilo que
mais conta, para o amor e para a fé. Aqui, porém, o risco é deixar tudo à improvisação: rezo se me
apetece, vou à missa quando tenho vontade, faço bem se gosto... Ao passo que o segredo está no
caminho, está em manter um percurso dia após dia, passo após passo, pelas pegadas já assinaladas por
outros, em conjunto. Isto – em conjunto – é muito importante. O «arranja-te» nas grandes coisas não
funciona, e por isso vos digo: por favor, não vos isoleis, procurai os outros, fazei juntos a experiência de
Deus, caminhai em grupo sem vos cansardes. Entretanto poderias dizer-me: «Mas ao meu redor cada
qual segue a sua estrada com o seu telemóvel, seguem as séries televisivas, estão presos às redes sociais
e aos videojogos...» E tu vai contracorrente, sem medo: toma a vida nas mãos, entra em liça; apaga a TV
e abre o Evangelho; deixa o telemóvel e encontra as pessoas!

Parece-me ouvir já a vossa objeção: «É exigente, é difícil ir contracorrente». Olhemos para Maria! Os
Evangelhos dizem-nos que ela caminha muito; nisto só Jesus a ultrapassa. Mas sabeis qual é a constante
das suas viagens? Que são praticamente todas a subir: de Nazaré à região montanhosa de Isabel, depois
subindo em direção a Belém e Jerusalém, em seguida para o Calvário e, por fim, vai para o andar
superior do Cenáculo. Caminha a subir, porque só subindo é que se chega ao cimo. Claro! Para subir uma
pessoa cansa-se, e é preciso um passo regular. Mas vale a pena. É assim quando se vai contracorrente:
mas o esforço e a perseverança no bem compensam. Não sei se já te aconteceu chegar ao cimo duma
montanha depois duma longa caminhada, depois de muito esforço, para em seguida ter uma vista
fabulosa diante dos teus olhos, que compensa todos os esforços, enquanto dentro te sentias livre e em
paz.

O mesmo acontece quando uma pessoa caminha atrás de Jesus: não é tudo fácil e a descer, porque Ele é
o Deus da aventura, do êxodo, não dos passeios tranquilos. Não é alguém que se limita a dar-te uma
palmada nos ombros e vai embora, mas o verdadeiro Amigo que te acompanha ao longo da estrada; e,
enquanto caminha, ajuda-te a vencer os medos e eleva-te até às alturas para as quais foste feito. Ele
conhece-te, sabe quanto vales, sabe que és capaz de o conseguir. «Mas eu – poderias dizer – não estou
à altura; sinto-me frágil, débil, caio muitas vezes!» Quando te sentires assim, por favor «muda de
perspetiva»: não te vejas com os teus olhos, mas pensa no olhar de Deus. Quando erras e cais, que faz
Ele? Fica ali junto de ti e sorri-te, pronto a levar-te ternamente pela mão. Foi o que nos contou o padre
António, mas, se queres uma confirmação, abre o Evangelho e vê o que Ele fez com Pedro, com Maria
Madalena, com Zaqueu e tantos outros: fez maravilhas com a fragilidade deles. Deus não Se deixa
prender pelos nossos erros, nem o seu amor depende dos nossos comportamentos. Como nos disse
Jesus, Deus é Pai e, quando caímos no caminho, Ele vê um filho ou uma filha para levantar, nunca um
malfeitor para castigar. É fiel e conta connosco. Fiemo-nos d’Ele!

Amigos, quero ainda dizer-vos uma coisa importante a propósito do caminho. Aqui, juntos, vivemos dias
felizes e intensos, mas quando regressarmos a casa, como fazer para caminhar, donde se começa cada
dia? Deixemo-nos ajudar novamente por Maria, que Se levanta e vai. Estes são os dois passos para
caminhar cada dia: levantar-se e ir.

Primeiro: levantar-se. Levantar-se da terra, porque fomos feitos para o Céu; manter-se de pé na vida,
não ficar sentado no sofá. Levantar-se das tristezas e olhar para o alto. Levantar-se para responder à
beleza insuprível que somos. Em suma, levantar-se para receber-se como dom. Acolher-se como um
dom, isto é, reconhecer em primeiro lugar que somos um dom, filhos amados e preciosos. Isto não é
autoestima, mas realidade: é o ponto de partida quotidiano. É o primeiro passo a realizar pela manhã
quando acordas: desce da cama e acolhe-te como um dom. Como? Agradecendo, dizendo obrigado a
Deus. Antes de te lançares nas coisas a fazer, pára um momento para Lhe dizeres: «Senhor, obrigado
pela minha vida. Senhor, faz-me amar a vida. Senhor, Tu és a minha vida». Depois rezas o Pai Nosso, cuja
primeira palavra é a chave da alegria: dizes «Pai» e assim te reconheces filho amado, filha amada.
Recordas-te de que, para Deus, não és «uma silhueta», mas um filho; tens um Pai nos céus e, portanto,
és filho do céu. Aqui está a nossa força, que nos levanta das quedas e mantém de pé nas provas, como
testemunhou a Marta. Levantemos o olhar, ergamos ao alto os nossos corações!

Levantar-se e depois, como segundo passo, ir. Se a vida é um dom, não posso deixar de fazer dela uma
dádiva. Portanto, se o primeiro movimento era receber-se como dom, o segundo é fazer-se dom.
Amigos, embora hoje tudo pareça incerto, a precariedade que se respira não pode ser desculpa para
ficarmos parados: não estamos no mundo para fazer servir os nossos interesses, mas para nos
desinquietarmos indo ao encontro de quem precisa de nós. É assim que nos encontramos a nós
mesmos. Sabeis porque é que muitas vezes nos enganamos no caminho? Porque ficamos a orbitar à
volta de nós próprios. Pelo contrário, quem sai da sua órbita encontra-se, quem se gasta pelos outros
ganha-se a si mesmo, porque a vida só se possui dando-a. Como Maria, que recebe um dom de Deus e
imediatamente Se faz dom para Isabel. Mas se girarmos apenas à volta do nosso «eu», das nossas
necessidades, daquilo que nos falta, sempre nos encontraremos no ponto de partida, a lamentar a nossa
sorte com trombas, talvez com a ideia de que estão todos contra nós. Quantas vezes caímos vítima de
tristezas sem razão de ser que mandam em fumo as nossas melhores energias! Não, não nos deixemos
cair reféns da solidão nem paralisar pela melancolia, mas vamos ao encontro dos outros. Saiamos dos
«porquês», perguntando-nos «por quem»: por quem posso fazer qualquer coisa? A quem posso
oferecer o meu tempo, a quem servir?

Pensai nisto: O Pai nosso criou tudo para nós, mas nós, para quem criamos qualquer coisa de belo?
Vivemos imersos em produtos feitos pelo homem, que nos fazem perder o deslumbramento com a
beleza que nos rodeia, mas a criação convida-nos a ser criadores de beleza, a fazer algo que antes não
havia. Sim, a vida exige ser doada, não administrada; pede para sair da dependência do virtual, do
mundo hipnótico das redes sociais que anestesia a alma. Jovens, não sejais profissionais da digitação
compulsiva, mas criadores de novidade! Uma oração feita com o coração, uma página que escreves, um
sonho que realizas, um gesto de amor por alguém que não pode retribuir: isto é criar, imitar o estilo com
que Deus criou o mundo. É o estilo da gratuidade, que nos afasta da lógica niilista do «faço para ter» e
do «trabalho para ganhar». Sede criativos com gratuidade, dai vida a uma sinfonia de gratuidade num
mundo que vive de lucros! Assim sereis revolucionários. Ide e dai, sem medo!

Jovem que estás aqui, cansado porque caminhaste tanto mas feliz porque fizeste mais leve a alma com
uma sensação de liberdade que as coisas não te dão, levanta-te: abre o coração a Deus, agradece-Lhe,
abraça a beleza que és; enamora-te da sua vida e descobre cada dia que és amado. E depois vai: sai,
caminha com os outros, procura os que estão sozinhos; colora o mundo com os teus passos e pinta de
Evangelho as estradas da vida. Levanta-te e vai. Escuta Jesus que te dirige este convite. Ele, a muitas das
pessoas que ajudava e curava, dizia precisamente assim: «Levanta-te e vai» (Lc 17, 19). Precisamos de O
ouvir repetir isto. É o que acontece agora, na Adoração: nós olhamos para Jesus e Ele olha para nós. No
silêncio, deixamos ressoar a sua voz entusiasta e gentil, que fala ao coração, consola, encoraja, cura e
envia. Não é um encontro intimista, é a força para se levantar e caminhar. O autor de O Senhor dos
Anéis, num dos caminhos mais aventureiros de todos os tempos, escreveu ao seu filho: «Ofereço-te a
única coisa grande na terra para amar: o Santíssimo Sacramento. Lá encontrarás fascínio, glória, honra,
fidelidade e o verdadeiro caminho de todos os teus amores na terra» (J.R.R. Tolkien, Carta 43, março de
1941). Diante da Eucaristia encontramos o caminho, porque Jesus é o caminho (cf. Jo 14, 6). Nesta noite,
renovemos o nosso encontro com Jesus. Digamos-Lhe: «Senhor Jesus, eu Te agradeço e Te sigo. Amo-Te
e quero caminhar contigo».

Grande festa dos jovens com o Papa no Campo da Graça, no Parque Tejo em Lisboa, na Vigília de dia 5
de agosto. Um momento intenso de oração através da arte, repleto de luzes e cores, cantos,
coreografias, testemunhos e Adoração Eucarística.

Inspirando-se no lema desta JMJ, Maria levantou-se e partiu apressadamente, o Santo Padre recordou
que Maria não espera, toma a iniciativa: vai ajudar a prima Isabel e, sobretudo, apressa-se a dar-lhe o
que há de mais precioso: a alegria. "A alegria é missionária", afirmou.

E não só, Maria ensina-nos que é preciso a constância da caminhada. O Papa faz uma metáfora
futebolística para que assim como é preciso de muito treino para marcar um gol, o mesmo acontece na
vida:

"Às vezes, não temos vontade de caminhar, não temos vontade de nos esforçar, copiamos nas provas
porque não queremos estudar e não conseguimos. Não sei se algumas pessoas gostam de futebol. Eu
gosto. O que há por trás de um gol? Muito treinamento. O que há por trás do sucesso? Muito
treinamento. E na vida, nem sempre podemos fazer o que queremos, mas o que a vocação que tenho
dentro de mim - todo mundo tem sua própria vocação - nos leva a fazer. Caminhar; se eu cair, levantar-
me ou ser ajudado a me levantar; não ficar no chão; e treinar, treinar ao longo do caminho."

Tudo isso é possível, acrescentou Francisco, não porque fazemos cursos sobre o caminho - não há curso
para nos ensinar a caminhar na vida. Na vida, você aprende, e isso é um treinamento ao longo do
caminho.
"Deixo vocês com esta ideia: andem e, se caírem, levantem-se; andem com um objetivo; treinem todos
os dias na vida. Na vida, nada é gratuito. Tudo é pago. Só há uma coisa gratuita: o amor de Jesus.
Portanto, com essa coisa gratuita que temos (o amor de Jesus) e com o desejo de caminhar,
caminhemos com esperança, olhemos para nossas raízes e sigamos em frente, sem medo, sem medo,
sem medo. Não tenham medo!"

Após o pronunciamento do Santo Padre, seguiu a Adoração Eucarística e o silêncio tomou conta do
Parque Tejo, não obstante a presença de um milhão e meio de pessoas.

Línk:
Papa no Parque Tejo: "O único momento em que é lícito olhar uma pessoa de cima é para a ajudar a
levantar-se" (discurso na íntegra) - CNN Portugal (iol.pt)

Observador:
Papa pede aos jovens que não julguem: “Olhar de cima para baixo só para ajudar alguém a levantar-se” –
Observador
Homília Missa de Envio

Homilia do Papa Francisco na Missa de Envio - 06/08/2023

As palavras do Apóstolo Pedro no Monte da Transfiguração são as mesmas que, depois destes dias
intensos, queremos fazer nossas: «Senhor, é bom estarmos aqui!» (Mt 17, 4). Foi bom o que
experimentámos com Jesus, o que vivemos juntos e como rezámos. Mas, depois destes dias,
perguntamo-nos: Que levamos connosco quando regressarmos ao vale da vida quotidiana?
A partir do Evangelho que ouvimos, quero responder a esta pergunta com três verbos: resplandecer,
ouvir, não temer.

Resplandecer. Jesus transfigura-Se e – diz o texto – «o seu rosto resplandeceu como o sol» (Mt 17, 2).
Recentemente tinha anunciado a sua paixão e morte na cruz, quebrando assim a imagem dum Messias
poderoso e mundano, e frustrando as expectativas dos discípulos. Agora e para os ajudar a acolher o
amoroso projeto de Deus, que chega à glória pelo caminho da cruz, Jesus toma consigo três deles –
Pedro, Tiago e João – condu-los ao alto dum monte e transfigura-Se: o seu rosto torna-se
resplandecente e as suas vestes cândidas. Este «banho de luz» prepara-os para a noite que terão de
atravessar.

Caros amigos, também hoje nós precisamos de algo de luz para enfrentar a escuridão, que nos assalta na
vida, tantas derrotas quotidianas, para as confrontar com a luz da ressurreição de Jesus. Ele é a luz que
não se apaga, a luz que brilha ainda de noite. Vêm-me ao pensamento as palavras do sacerdote Esdras,
que encontramos na Sagrada Escritura e que também nós podemos repetir depois destes dias passados
em conjunto: «O nosso Deus quis fazer brilhar os nossos olhos» (Esd 9, 8). O nosso Deus ilumina o nosso
olhar, ilumina o nosso coração, ilumina a nossa mente e a nossa vontade de fazer algo da nossa vida.

Mas também gostava de vos dizer uma coisa: não nos tornamos luminosos quando nos colocamos sob
os holofotes, quando exibimos uma imagem perfeita e nos sentimos fortes e bem-sucedidos. Mas
brilhamos quando, acolhendo Jesus, aprendemos a amar como Ele amou. Amar como Jesus- isso faz-nos
luminosos, isso leva-nos a fazer atos de amor. Não se enganem, vão ser luz no dia em que tiverem atos
de amor. Se em vez de fazermos atos de amor, olharmos para dentro, com egoísmo, a luz apaga-se.

O segundo verbo é escutar. No monte, uma nuvem luminosa cobre os discípulos e a voz do Pai indica
que Jesus é o Filho amado. O mandamento que o Pai dá é simples e direto: «Escutai-O» (Mt 17, 5). Está
tudo aqui: tudo aquilo que se deve fazer na vida cristã, está nesta palavra: escutai-O. Ouvir Jesus, escutar
o que é que Jesus diz, pegai no Evangelho e leiam o que diz Jesus e o vosso coração, porque Ele tem para
nós palavras de vida eterna para todos nós. Ele revela que Deus é Pai e amor, Ele ensina-nos o caminho
do amor. Escutem Jesus, porque embora tenhamos a melhor das vontades, seguimos caminhos que
parecem caminhos de amor, mas são egoísmos disfarçados de amor. Escutem o Senhor, porque Ele nos
vai dizer qual o caminho do amor.

Resplandecer, ouvir e, por fim, não temer. São as últimas palavras que Jesus pronuncia no monte para
animar os discípulos assustados: «Levantai-vos e não tenhais medo» (Mt 17, 7). Uma ideia que nos
Evangelhos é tão repetida: “Não tenham medo”. A vós, jovens, que cultivais sonhos grandes mas
frequentemente ofuscados pelo medo de não os ver realizados; a vós, jovens, que às vezes pensais que
não ides conseguir; a vós, jovens, tentados neste tempo a desanimar, a julgar-vos inadequados ou a
esconder a vossa dor disfarçando-a com um sorriso; a vós, jovens, que quereis mudar o mundo e lutais
pela justiça e a paz; a vós, jovens, que investis o melhor da vosso esforço e imaginação, ficando porém
com a sensação de que não bastam; a vós, jovens, de quem a Igreja e o mundo têm necessidade como a
terra da chuva; a vós, jovens, que sois o presente e o futuro... precisamente a vós, jovens, é que Jesus
diz: «Não tenhais medo».

Queridos jovens, gostaria de poder fixar nos olhos a cada um de vós e dizer: não tenhas medo! Mas
anuncio-vos algo muito mais belo: o próprio Jesus agora olha para vós, Ele que vos conhece e lê no vosso
íntimo; olha para o vosso coração, conhece as alegrias e as tristezas, os êxitos e as derrotas. E Ele hoje
diz-vos, aqui em Lisboa, nesta Jornada Mundial da Juventude: “Não temam! Não tenham medo!
Animem-se!”.

Missa do Envio. Papa Francisco pede aos jovens que "se animem e não tenham medo"
06 ago, 2023 - 09:44 • Eduardo Soares da Silva

O Papa Francisco desafia os jovens a refletir sobre "o que levamos connosco quando regressarmos ao vale
da vida quotidiana".

Papa Francisco pede aos jovens que "se animem e não tenham medo"
O Papa Francisco desafiou novamente os jovens, na manhã de domingo, 6 de agosto, a "animarem-se e
não terem medo".

Na homilia da Missa do Envio, no último dia da Jornada Mundial da Juventude, o Papa lançou a questão
aos jovens: "O que levamos connosco quando regressarmos ao vale da vida quotidiana?"

"Foi bom o que vivemos juntos e como rezámos", começou Francisco, respondendo à pergunta anterior
com três pontos: "Resplandecer, ouvir e não temer".

"Amigos, também nós precisamos de alguns lampejos de luz para enfrentar a escuridão da noite, os
desafios da vida, os medos que nos inquietam, a escuridão que muitas vezes vemos ao nosso redor. O
Evangelho revela-nos que esta luz tem um nome", afirma.

“Não tenham medo" de viver. Papa oferece o amor de Jesus aos jovens da JMJ
Perante um milhão e meio de pessoas na vigília da (...)
Mas o Papa não deixou de fazer um alerta aos jovens: "Não nos tornamos luminosos quando nos
colocamos sob os holofotes, quando exibimos uma imagem perfeita e nos sentimos fortes e bem
arranjados. Fortes e bem sucedidos, mas não luminosos."

"Somos luminosos quando acolhemos Jesus e aprendemos a amar como ele. Amar como Jesus é o que
nos torna luminosos. Não se enganem, vais ser luz no dia em que fizeres obras de amor. Quando se
viram para dentro e são egoístas, a luz apaga-se", apontou.

Francisco recorreu ao "simples e direto" mandamento "que o Pai dá": "Escutai-O". "Está tudo aqui: tudo
aquilo que se deve fazer na vida cristã, está nesta palavra", diz.

"Ele tem a palavra de vida eterna para nós, ensina-nos o caminho do amor. Escuta Jesus. Com boa
vontade aprendemos caminhos que parecem ser do amor, mas na verdade é egoísmo disfarçado de
amor. Atenção, escuta-O. Só ele é o caminho do amor.", afirma.

A terminar a homilia, o Papa insisitu no pedido aos jovens para "não temerem". "É uma frase que se
repete tanto na Bíblia. Não tenham medo", recordou.

"Vocês jovens que cultivam sonhos grandes, às vezes ofuscados pelo medo de não os verem realizados,
pensam que não vão ser capazes. Neste tempo são tentados pelo desânimo, por se considerarem
desadequados. Vós que quereis mudar o mundo e lutar pela justiça e pela paz, vocês jovens que
investem o melhor do vosso esforço e dedicação, mas que parece que não é suficiente, vocês de quem a
Igreja tem necessidade como a terra da chuva. Vocês que são o presente o futuro, digo-vos para não
terem medo."

Francisco pediu um momento de silêncio para que todos repetissem interiormente: "Não tenham
medo."

O Papa "anuncia algo muito belo" a fechar: "Ele Vos ama sempre e infinitamente. Conhece-vos, lê o
vosso íntimo, conhece as alegrias e os fracassos. Conhece o coração de cada um. Diz-vos hoje aqui, em
Lisboa, nesta Jornada Mundial da Juventude: não tenham medo. Animem-se, não tenham medo",
termina.

A Santa Sé avança que estiveram cerca de um milhão e meio de pessoas na missa de encerramento da
JMJ, dos quais 30 são cardeais, 700 bispos e cerca de 10 mil sacerdotes.

Sobram apenas dois pontos na agenda do Papa Francisco antes do fim da sua visita a Portugal e da
Jornada Mundial da Juventude. Esta tarde, às 16h30, Francisco encontra-se com os voluntários da JMJ,
no Passeio Marítimo de Algés, antes de cerimónia de despedida, na base aérea de Figo Maduro, às
17h50.
Discurso de Agradecimento ao Papa _ Dom Manuel Clemente

Logo no início da Celebração Eucarística, o cardeal Patriarca de Lisboa dirigiu-se ao Papa Francisco para
agradecer pela Jornada, bem como a todos que possibilitaram a sua realização. - Vatican News
A Missa de Envio da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 foi a ocasião para o Patriarca de Lisboa,
cardeal Manuel José Macário do Nascimento Clemente, fazer seu agradecimento ao Papa Francisco -
que entre outros animou-os a prosseguir na realização da Jornada, ultrapassando adiamentos e
obstáculos - bem como às instituições e pessoal que contribuíram para a realização da JMJ. Eis suas
palavras:

"Santo Padre
Estas palavras de saudação e agradecimento a Vossa Santidade estão naturalmente preenchidas por
tudo quanto nos foi dado viver nestes dias da Jornada Mundial da Juventude. Foi tanto o que vivemos e
muito especial convosco, Santidade, que não o posso resumir senão numa palavra: OBRIGADO!
Na nossa língua portuguesa, a palavra indica que não só recebemos como nos sentimos levados a
retribuir o que nos foi dado. E Vossa Santidade deu-nos tantos nestes dias, com a presença, a palavra e
os gestos que generosamente repartiu, que nunca mais deixaremos de lhe retribuir com imensa gratidão
e oração constante pela vida, saúde e ministério de Vossa Santidade. Muito obrigado!
Desde o primeiro momento, Santo Padre, aceitastes e estimulastes a realização desta Jornada. Quisestes
que ela fosse ocasião de encontro duma multidão juvenil provinda dos cinco continentes, aberta e
proposta a todos com a largueza do Evangelho de Cristo, que não exclui ninguém e globalmente se
oferece.
Quisestes que a Jornada fosse, muito especialmente para os jovens, uma ocasião de reencontro e
encorajamento no sentido da solidariedade e da construção dum mundo mais capaz de corresponder às
justas aspirações de todos, depois duma pandemia que os confinou e de tudo o mais que os possa alhear
dos outros e do melhor de si próprios.
Estivestes sempre connosco, animando-nos a prosseguir na realização da Jornada, ultrapassando
adiamentos e obstáculos, que não faltaram também. Esta Jornada foi muito especialmente vossa, Santo
Padre, e dos jovens que congregastes aqui. E assim será lembrada no futuro, como momento decisivo
duma geração que construirá um mundo mais belo e mais fraterno.
A vossa figura e o vosso exemplo, Santo Padre, concitaram desde logo a cooperação e o apoio de
contribuições pessoais e institucionais que não faltaram. Do Estado às autarquias, muito em especial,
que permitiram fazer deste bela terra de Lisboa e Portugal a terra duma multidão provinda do mundo
inteiro. Às entidades públicas juntaram-se muitas outras contribuições particulares, que permitiram à
incansável organização e aos seus magníficos colaboradores e voluntários levarem a bom termo esta
Jornada.
Todos acolheram as vossas mensagens de estímulo, tão sugestivas e mobilizadoras como foram. Todos
estão convosco nesta Santa Missa, dando graças a Deus pela Jornada Mundial da Juventude
Lisboa/2023. E como tudo o que a Deus se devolve, também este momento final readquire a frescura
original. Essa mesma, que nem a idade nem os problemas de saúde retiram a Vossa Santidade. Neste
sentido, sois o mais jovem entre os jovens que aqui estão.
Muito obrigado, Santo Padre!"

+ Manuel Clemente, 6 de agosto de 2023


Discurso no Encontro com os Voluntários _ Algés

Papa a 25 mil voluntários: sejam surfistas do amor, e a JMJ a primeira das ondas boas.

Francisco fez o seu último pronunciamento oficial em terras portuguesas para o grupo de voluntários
que fez a JMJ de Lisboa acontecer neste ano de 2023. Agradeceu pela "corrida" para servir em nome de
Jesus e motivou também a pegar grandes ondas do amor e da caridade, como aquelas das praias de
Nazaré: "continuem assim, sejam «surfistas do amor»! Seja o serviço da JMJ a primeira de tantas ondas
boas"- Andressa Collet - Vatican News

Se na missa desta manhã de domingo (6), no Parque Tejo, o Papa Francisco exortou aos jovens que "não
tivessem medo", no último compromisso oficial em Lisboa, no Passeio Marítimo Algés no final da tarde,
o Pontífice motivou os cerca de 25 mil voluntários a continuarem em frente com as obras de Deus, com
a caridade e o amor. Assim, a agenda de 5 dias do Papa em Portugal chegou ao fim, inclusive já tendo
anunciado o destino da próxima JMJ que será em Seul, na Coreia do Sul, em 2027.
O empenho sem barulho e nem protagonismos
Ao encontrar voluntários centrais, paroquiais e de saúde, Francisco reforçou o seu "obrigado" a todos
que trabalharam "tanto e bem: tornaram possível estes dias inesquecíveis! Lutaram durante vários
meses, de forma escondida, sem barulho e sem protagonismos, para que todos pudéssemos encontrar-
nos aqui a cantar juntos". Um exemplo de serviço feito em grupo, testemunhando o que se viveu na JMJ
de Lisboa.
Um serviço de amor gratuito revelado no Evangelho, citou o Papa em discursco, pela Virgem Maria, "que
«se levantou e partiu apressadamente» (Lc 1, 39) para servir a prima"; por Zaqueu, "que desce
apressadamente da árvore para encontrar Jesus (cf. Lc 19, 6)"; pelas mulheres e pelos discípulos "que,
na Páscoa, correm num vaivém do Cenáculo para o túmulo e vice-versa a fim de anunciar que Cristo
ressuscitou (cf. Jo 20, 1-18)". "Quem ama não fica de braços cruzados, quem ama serve e quem ama corre
a servir, corre a se empenhar no serviço aos outros", disse ainda o Papa ao acrescentar: "e vocês
correram, heim! Correram muito nestes meses!". Apesar do cansaço para responder às urgências, os
voluntários tinham "os olhos luminosos pela alegria do serviço: obrigado! Vocês fizeram este encontro
mundial da juventude acontecer".
“Correram tanto, mas não numa corrida frenética e sem meta que às vezes caracteriza o nosso mundo,
não. Você correram de um outro modo, correram ao encontro dos outros para servir os outros em nome
de Jesus. Vocês vieram a Lisboa para servir e não para ser servidos! Obrigado, muito obrigado!”
O testemunho de Chiara, Francisco e Filipe

O Papa então trouxe os testemunhos de Chiara, Francisco e Filipe: "vocês três nos falaram de um
encontro especial com Jesus". Como disse Chiara, quando descobriu que está perto dEle:
"E experimenta-se que um pequeno «sim» a Jesus pode mudar a vida. Mas também os «sins» ditos aos
outros nos fazem bem, quando estou para o serviço: no momento do cansaço, vocês se reanimaram e se
alçaram dizendo 'sim' para servir os outros. Obrigado por isso."
Já Francisco disse que na JMJ encontrou o que precisava sem nem mesmo estar procurando.
Caminhando, trabalhando e rezando com os outros conseguiu colocar a vida em ordem com a ajuda de
Jesus e dos irmãos: "É bonito isso: esta Jornada é útil, ajuda muito a colocar a vida em ordem. Mas por
que, graças à Jornada? Não, graças a Jesus, que caminha ao nosso lado e se mostra a nós. Para colocar
nossa vida em ordem, não precisamos de coisas, não precisamos de distrações, não precisamos de
dinheiro. É preciso dilatar o coração. E se vocês dilatam o coração, colocarão a sua vida em ordem. Não
tenham medo: dilatem o seu coração!."
E por fim, o testemunho de Filipe, que viveu na JMJ "um duplo encontro, com Jesus e com os outros",
sejam eles voluntários do evento ou os companheiros da paróquia de origem, entre idosos e
adolescentes da catequese.

Sejam surfistas do amor


Ao finalizar seu último pronunciamento oficial em terras portuguesas, o Papa trouxe a imagem das
ondas gigantes - de até 30 metros de altura - das praias de Nazaré, a cerca de 100 Km de Lisboa. Nestes
dias, disse Francisco, "também vocês enfrentaram uma onda enorme, não de água, mas de jovens,
jovens como vocês, que afluíram a esta cidade" que, com a ajuda de Deus e dos companheiros, os levou
ainda mais alto:
“Vocês cavalgaram esta grande onda: são corajosos! Confiem! Obrigado! Quero dizer: continuem assim,
continuem a cavalgar as ondas do amor, as ondas da caridade, sejam «surfistas do amor»! E esta é a
tarefa que lhes confio neste momento: que o serviço que prestaram nesta JMJ seja a primeira de tantas
ondas boas; cada vez serão levados mais alto, mais perto de Deus, e isto irá permitir a vocês ver de uma
perspetiva melhor o vosso caminho.”
Algés, XXXVII JMJ, Encontro com os Voluntários da JMJ, 06 de agosto de 2023 Papa Francisco - YouTube
https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2023-08/papa-francisco-discurso-encontro-voluntarios-jmj-
lisboa-2023.html

Discurso do Papa Francisco aos voluntários da JMJ Lisboa 2023

Papa Francisco no encontro com os voluntários da JMJ Lisboa 2023. - Crédito: Daniel Ibáñez / ACI Prensa
REDAÇÃO CENTRAL, 06 agosto de 2023.

Queridos amigos, bom dia! E obrigado!

Obrigado ao patriarca de Lisboa pelas suas palavras, a dom Américo Aguiar e a todos vós por terem
trabalhado tanto e tão bem: fizeram possível que estes dias fossem inesquecíveis! Trabalharam durante
meses, discretamente, sem barulho nem protagonismos, para que todos nós pudéssemos estar aqui a
cantar juntos: « Jesus vive e não nos deixa sós: já não deixaremos de amar». E não só por isto fostes
exemplo; fostes também porque vos unistes para trabalhar em grupo! Mais do que trabalho, o vosso foi
um serviço.

Vimo-lo na Virgem Maria, que «se levantou e partiu apressadamente» (Lc 1, 39) a servir sua prima Isabel,
sentindo urgência de partilhar a alegria no serviço: pensemos em Zaqueu, que subiu apressadamente à
árvore para encontrar Jesus e recebê-Lo em sua casa (cf. Lc 19, 6); pensemos nas mulheres e nos
discípulos que, na Páscoa, correram do Cenáculo para o túmulo e vice-versa a fim de anunciar que Cristo
ressuscitou (cf. Jo 20, 1-18). Quem ama não fica de braços cruzados. Quem ama, serve. E quem ama vai
correr para servir, vai correr para se entregar no serviço aos outros. E vós, correstes bastante nestes
meses. Eu apenas vi o final destes dias. Vi-vos dar resposta a inúmeras necessidades, às vezes com o
rosto marcado pelo cansaço, outras vezes um pouco abrumados com as urgências do momento, mas
sempre com o sorriso e de olhos luminosos, porque cheios da alegria do serviço. Obrigado!

Todos vocês fizeram possível este encontro mundial da juventude. Fizeram grandes coisas a partir dos
gestos mais pequenos, como a garrafa de água oferecida a um desconhecido, isso cria amizade.
Correram muito, mas não numa corrida frenética e sem meta que às vezes caracteriza o nosso mundo.
Correram uma corrida que os leva ao encontro dos outros, para servir em nome de Jesus. Todos vieram
a Lisboa para servir e não para ser servidos! Obrigado, muito obrigado!

E agora quero servir-vos de amplificador, para que ecoe mais longe aquilo que nos dissestes nos vossos
testemunhos. Clara, Francisco e Filipe: os três falaram de um encontro especial com Jesus. Lembremo-
nos que o encontro mais famoso, o motor de todos os outros, aquele que faz a vida avançar é o
encontro com Ele. É o encontro mais importante de nossas vidas. Renovar a cada dia o encontro com
Jesus é o centro da vida cristã. E precisamos renová-lo dia a dia para mantê-lo fresco, não apenas na
cabeça, mas também no coração. Experimentamos um pequeno “sim” para Jesus, que pode mudar a
vida. Mas também o “sim” que também faz bem aos outros através do serviço. Todos vocês, ao sofrerem
com o cansaço, disseram “sim” a servir aos outros. Obrigado por isso!

Tu, Francisco, disseste que aqui encontraste qualquer coisa que precisavas e nem sequer a procuravas.
Caminhando, trabalhando e rezando com os outros, compreendeste que não te podias deixar preso pelo
caos, pelas «camas desarrumadas» do passado, nem viver com o coração atormentado pelos
sentimentos de imperfeição, mas que com a ajuda de Jesus e dos irmãos, tens a oportunidade de
reordenar «o quarto» da vida. Esta jornada ajuda muito a reordenar a nossa vida. Jesus, que está no
meio de nós, nos ajuda nisto. Para pôr ordem na vida, não servem as distrações e o dinheiro; o que serve
é dilatar o coração, vai pôr ordem em suas vidas. Não tenham medo, dilatem o coração.

E finalmente tu, Filipe, entre tantas experiências formosas que partilhaste, disseste uma que quero
sublinhar: viveste aqui um duplo encontro, com Jesus e com os outros. Isto é importante: o encontro
com Jesus é um momento pessoal e único, que se pode descrever e contar só até certo ponto, mas
sempre tem lugar graças a um caminho feito com os outros, feito por meio da intercessão de outros. Se
encontrar com Jesus, se encontrar com os outros, isso é muito importante. O encontro com Jesus é um
momento pessoal e se pode descrever até certo ponto, mas sempre chega graças ao caminho percorrido
em companhia graças à ajuda dos outros. Encontrar Jesus, é encontrar o caminho para servir aos outros.

Amigos, por fim, gostaria de vos deixar uma imagem. Como sabem muitos de vós, e soube também eu,
existe a norte de Lisboa há uma localidade – Nazaré – onde se podem ver ondas que chegam aos trinta
metros de altura que são uma atração mundial, especialmente para os surfistas que as desafiam. Nestes
dias, também vós enfrentastes uma verdadeira onda, não de água, mas de jovens que inundaram esta
cidade. Mas, com a ajuda de Deus, com muita generosidade e apoiando-vos mutuamente, vocês
desafiaram esta grande onda. Desafiaram esta grande onda, são muito corajosos. Obrigado.

Quero dizer que continuem assim, continuem a seguir nas ondas do amor, nas ondas da caridade.
Sigam sendo os surfistas do amor. Sejam os surfistas do amor. Esta é uma tarefa que eu vos encomendo
neste momento. Que o serviço que fizeram nesta jornada mundial da juventude seja a primeira de
muitas ondas do bem; que cada vez sejam levados mais alto, mais perto de Deus, e isto vos permita ver
melhor o vosso caminho.Obrigado, muito obrigado. Bom caminho! E peço, por favor, que continuem a
rezar por mim! Obrigado!
Conferência de Imprensa do Papa durante o voo de regresso ao Vaticano

O Papa: em Fátima rezei pela paz sem publicidade

No voo de regresso de Lisboa, Francisco explicou aos jornalistas por qual motivo escolheu rezar em
silêncio no santuário e deixar de lado os discursos preparados aos jovens e falar com eles de forma mais
eficaz. Reafirmou a "tolerância zero" em relação aos abusos contra menores. Explicou os motivos da
viagem a Marselha e repetiu que a Igreja está aberta a todos, mesmo para aqueles que não podem
receber alguns sacramentos. E mais: “Minha saúde está bem” - Vatican News
“Boa noite e muito obrigado por esta experiência. Hoje, há um aniversário. Parabéns, depois chegará o
bolo!”
Essas foram as primeiras palavras dirigidas aos jornalistas presentes no voo papal de regresso a Roma na
tradicional coletiva de imprensa no avião. O aniversário anunciado pelo Pontífice era o de Rita Cruz.
A primeira pergunta foi feita pela veterana das viagens pontifícias, Aura Miguel, da Rádio Renascença.
Santidade, antes de tudo obrigado por sua visita a Portugal. Todos já a consideravam um sucesso. Todos
muito contentes. Obrigado por ter vindo. Encontrei um alto chefe da polícia, que me disse que nunca tinha
visto uma multidão assim obediente e pacífica. Foi belíssimo. A minha pergunta diz respeito a Fátima. Nós
sabemos que o senhor foi ali e rezou em silêncio na capelinha. Porém, havia uma grande expectativa, no
local justamente onde Nossa Senhora fez um pedido para rezar pelo fim da guerra (e estamos em guerra
neste momento infelizmente) de uma renovação da parte do Santo Padre, publicamente, de uma oração
pela paz. Os olhos de tudo o mundo estavam fixados sobre o senhor ontem pela manhã, em Fátima. Por
que não o fez?
Rezei, rezei. Rezei a Nossa Senhora e rezei pela paz. Não fiz propaganda. Mas rezei. E devemos
continuamente repetir esta oração pela paz. Ela, na Primeira Guerra Mundial, tinha pedido isto. E eu,
desta vez, isto pedi a Nossa Senhora. Rezei. Não fiz publicidade.
Pergunta 2 - Joao Francesco Gomez - Observador
Em fevereiro deste ano, foi publicado um relatório sobre a realidade dos abusos em Portugal, quase 5000
crianças foram vítimas nas últimas décadas. E eu pergunto: o senhor foi informado sobre este relatório
entregue aos bispos? Que pensa deveria acontecer com os bispos que sabiam dos casos de abusos e não
os comunicaram às autoridades?
Como sabem, de modo muito reservado, recebi um grupo de pessoas que foram abusas. Como sempre
faço nesses casos, dialogamos sobre esta peste, esta peste terrível. Na Igreja, se seguia mais ou menos a
mesma conduta que se segue atualmente nas famílias e nos bairros...se encobre. Pensemos que 42 %
dos abusos acontecem nas famílias ou nos bairros. Ainda devemos amadurecer e ajudar a descobrir
essas coisas. Desde o escândalo de Boston, a Igreja se conscientizou que não podia seguir caminhos
aleatórios, mas se deveria segurar o “touro pelo chifre”. Dois anos e meio atrás, houve uma reunião dos
presidentes das Conferências Episcopais, onde foram fornecidas também estatísticas oficiais sobre os
abusos. E é grave, a situação é muito grave. Na Igrrja, há uma frase que estamos usando continuamente:
tolerância zero, tolerância zero. E os pastores, que de alguma maneira não assumiram sua
responsabilidade, devem arcar com esta irresponsabilidade. O mundo dos abusos é muito duro e, por
isto, exorto a serem muito abertos sobre tudo isso. O que me perguntaram como está indo o processo
na Igreja portuguesa, está indo bem. Está indo bem e com serenidade se busca a seriedade nos casos de
abusos. Os números, às vezes, se revelam exagerados, um pouco pelos comentários que sempre
gostamos de fazer, mas a realidade é que está indo bem e isto me dá certa tranquilidade. Gostaria de
tocar em um ponto e gostaria de pedir a colaboração de vocês, jornalistas. Vocês têm um telefone hoje?
Um telefone. Bem, em qualquer um desses telefones, a pagamento ou com uma senha, se tem acesso a
abuso sexual contra menore. Isso entra em nossas casas e o abuso sexual contra menores é filmado ao
vivo. Onde é filmado? Quem são os responsáveis? Esta é uma das pragas mais graves, ao lado de todo o
mundo (...) mas quero sublinhar isso porque, às vezes, não nos damos conta de que as coisas são assim
tão radicais. Quando se usa uma criança para fazer espetáculo de um abuso, se chama a atenção. O
abuso é como "comer" a vítima, né?, ou pior, machucá-la e deixá-la viva. Conversar com pessoas
abusadas é uma experiência muito dolorosa, o que também me faz bem, não porque em agrada ouvir,
mas porque me ajuda a assumir esse drama. Ou seja, para a sua pergunta eu diria o que eu disse: o
processo está andando bem, estou informado de como estão as coisas. As notícias podem ter ampliado
a situação, mas as coisas estão andando bem a esse respeito. Mas também, com isso, digo a vocês, de
alguma forma, ajudem, ajudem para que todos os tipos de abusos possam ser resolvidos, o abuso sexual,
mas não é o único. Existem também outros tipos de abuso que clamam aos céus: o abuso do trabalho
infantil, o abuso do trabalho com crianças e é usado; o abuso das mulheres, certo? Ainda hoje, em
muitos países, fazem-se cirurgias nas meninas: retira-se-lhes o clitóris, e isto é hoje, e faz-se com uma
navalha, e adeus... Crueldade... E o abuso do trabalho, isto é, dentro do abuso sexual, que é grave, e
tudo isso: existe uma cultura do abuso que a humanidade deve rever e converter.
Pergunta 3 - Jean-Marie Guénois - LE FIGARO
Santo Padre, como está a sua saúde, como prossegue a convalescência? O senhor não leu ou leu somente
pequenos trechos de cinco discursos. É sem precedentes nas viagens: por quê? Teve problema nos olhos,
cansaço? Textos demasiados longos? Como se sente? E se me permite uma pequena pergunta sobre a
França. O senhor irá a Marselha, mas nunca visita a França. A população não entende, talvez muito
pequena ou o senhor tem algo contra a França?
A minha saúde vai bem. Os pontos foram tirados, levo uma vida normal, uso uma faixa por dois ou três
meses para evitar uma (...incompreensível..) até que os músculos estarão mais fortes. A vista. Naquela
paróquia, cortei o discurso porque havia uma luz na frente e não conseguia ler, vinha a luz e por isso
cortei. Algumas pessoas, através do Matteo, perguntaram por que eu abreviei as homilias que vocês
têm. Quando falo, não as homilias acadêmicas, busco fazê-lo de maneira mais clara. Quando falo,
sempre busco a comunicação. Vocês viram que mesmo na homilia acadêmica, alguma brincadeira,
alguma risada faço para controlar a comunicação. Com os jovens, os discursos longos tinham o essencial
da mensagem, o essencial da mensagem, e eu agia ali segundo sentia a comunicação. Vocês viram que
fiz algumas perguntas e logo o eco me indicava para onde ia a coisa, se estava errado ou não. Os jovens
não mantêm muito tempo de atenção. Imagine que se você faz um discurso claro com uma ideia, uma
imagem, um afeto, podem acompanhar por oito minutos. Entre parêntesis, na Evangelii Gaudium, a
primeira exortação que fiz, escrevi um longo, longo capítulo sobre a homilia. Porque aqui está um pároco
(referindo-se ao Pe. Benito Giorgetta, pároco de Termoli, ndr), que sabe que as homilias às vezes são
uma tortura, uma tortura, que falam blá, bl[a, e as pessoas… Em alguma cidadezinha, não sei se em
Termoli, os homens saem para fumar e voltam. A Igreja deve se converter neste aspecto da homilia:
breve, clara, com uma mensagem clara e afetuosa. Por isso, eu controlo como vai com os jovens e os
faço dizer. Mas eu abreviei porque me interessa a ideia com os jovens. E passemos à França. Fui a
Estrasburgo, irei a Marselha, mas na França não. Há um problema que me preocupa, que é o problema
Mediterrâneo. Por isso, vou à França. É criminoso a exploração dos migrantes. Aqui na Europa não,
porque somos mais cultos, mas nos lager do norte da África… eu recomendo uma leitura. Há um
pequeno livro, pequeno, que escreveu um migrante que para ir da Guiné à Espanha levou creio três anos
porque foi capturado, torturado, escravizado. Os migrantes naqueles lagers do norte: é terrível. Neste
momento – semana passada – a associação Mediterranea Saving Human estava fazendo um trabalho
para resgatar os migrantes que estavam no deserto entre a Tunísia e a Líbia, porque os haviam
abandonado ali para morrer. Aquele livro de chama “Hermanito” - em italiano “Fratellino” (Irmãozinho)
– mas se lê em duas horas, vale a pena. Leiam e verão o drama dos migrantes ao se aventurarem. Os
bispos do Mediterrâneo farão este encontro, também com algum político, para refletir seriamente sobre
o drama dos migrantes. O Mediterrâneo é um cemitério, mas não é o maior cemitério. O maior
cemitério é o norte da África. É terrível isto, leiam. Vou a Marselha por isto. Na semana passada, o
presidente Macron disse que tem intenção de ir a Marselha e estarei ali um dia e meio: chegarei à tarde
e terei o dia seguinte inteiro.
(O senhor não tem nada contra a França – afirma Matteo Bruni, repetindo a pergunta):
Não. Não, a respeito disto é uma política. Estou visitando os pequenos países europeus. Os grandes
países, Espanha, França, Inglaterra, deixo para depois, no final. Mas como opção comecei pela Albânia e
assim os menores. Não há nada. A França, duas cidades: Estrasburgo e Marselha.
Pergunta 4 - Emma Elisabeth Hirschbeck - ARD ROMA
O Santo Padre em Lisboa disse-nos que na Igreja há lugar para todos, todos, todos. A Igreja está aberta a
todos, mas ao mesmo tempo nem todos têm os mesmos direitos, oportunidades, no sentido de que, por
exemplo, mulheres e homossexuais não podem receber todos os sacramentos. Santo Padre, como explica
esta incoerência entre uma Igreja aberta e uma Igreja que não é igual para todos? Obrigada.
Você me faz uma pergunta sobre dois pontos de vista diferentes. A Igreja é aberta a todos, depois
existem leis que regulam a vida dentro da Igreja. Alguém que está dentro está de acordo com a
legislação, o que você diz é uma simplificação: “Não pode receber os sacramentos”. Isso não significa
que a Igreja seja fechada, cada um encontra Deus pelo próprio caminho dentro da Igreja, e a Igreja é
mãe e guia cada um pelo seu caminho. Por isso não gosto de dizer: venham todos, mas tu, este, mas o
outro... Todos, cada um na oração, no diálogo interior, no diálogo pastoral, procura uma forma de seguir
em frente. Para isso, fazer uma pergunta: por que os homossexuais não… Todos! E o Senhor é claro:
doentes. Saudáveis, velhos e jovens, feios e bonitos… bons e maus! Há como um olhar que não entende
essa inserção da Igreja como mãe e pensa nela como uma espécie de empresa que para entrar tem que
fazer isso, fazer desta forma e não de outra... Outra coisa é a ministerialidade da Igreja, que é o modo
para levar em frente o rebanho e uma das coisas importantes é a paciência, na ministerialidade:
acompanhar as pessoas passo a passo em seu caminho de amadurecimento. Cada um de nós tem esta
experiência: que a Igreja mãe nos acompanhou e nos acompanha no seu próprio caminho de
amadurecimento. Não gosto da redução, isso não é eclesial, isso é gnóstico. É como uma heresia
gnóstica que está um pouco na moda hoje. Um certo gnosticismo que reduz a realidade eclesial e isso
não ajuda. A Igreja é mãe, acolhe todos, e cada um faz o próprio caminho dentro da igreja, sem
publicidade, e isso é muito importante. Obrigado pela coragem de fazer esta pergunta. Obrigado.
O Papa deseja compartilhar uma opinião sobre a JMJ, fala Matteo Bruni, diretor da Sala de Imprensa da
Santa Sé
Como vivi a JMJ. Esta é a quarta que vivo. A primeira foi no Rio de Janeiro, que era monumental, a la
brasileña, bela. A segunda em Cracóvia, a terceira no Panamá, esta é a quarta. Esta é a mais numerosa.
Os dados concretos, verdadeiros, eram mais de um milhão. Antes ainda, na vigília à noite calculava-se
um milhão e quatrocentos e um milhões e seiscentos mil. Impressionante a quantidade. Bem preparada!
Esta é aquela que eu vi melhor preparada.
E os jovens são uma surpresa. Os jovens são jovens. Aprontam, a vida é assim. Mas procuram seguir em
frente. E eles são o futuro. A questão é acompanhá-los. O problema é saber acompanhar. E é que não se
separem das raízes. Por isso insisto tanto no diálogo entre velhos e jovens, os avós com os netos. Esse
diálogo é importante, mais importante do que o diálogo entre pais e filhos. Os avós, as raízes. Depois, os
jovens são religiosos, eles buscam fé, não artificial. …eles procuram um encontro com Jesus e issso não é
fácil... Alguns dizem, mas os jovens nem sempre seguem uma vida segundo a moral. Mas quem de nós
não cometeu um erro moral na própria vida? Todos! Com qualquer dos mandamentos. Cada um de nós
tem as próprias quedas na própria história. A vida é assim. Mas o Senhor sempre nos espera porque é
misericordioso , é pai. E a misericórdia supera tudo......Isso queria dizer sobre a JMJ.
Pergunta 6 - Justin Scott Clellan – CNS
Falando de JMJ. Ouvimos nestes dias talguns estemunhos de jovens que lutaram pela saúde mental, com a
depressão. O senhor já lutou com isso? E se alguém decidir cometer suicídio, o que diria à família dessa
pessoa que sofre com o ensinamento católico sobre o suicídio, pensando que tenha ido para o inferno?
Hoje o suicídio juvenil é importante, importante em número. A mídia não fala tanto, porque não é
informado às mídias. Fiquei – não a confissão, não – em diálogo com os jovens, porque aproveitei para
dialogar. Um bravo jovem me disse: posso lhe fazer uma pergunta? O que o senhor pensa sobre o
suicídio? Ele não falava a nossa língua, mas eu entendi bem e começamos a conversar sobre o suicídio. E
no final ele me disse: obrigado, porque ano passado estava indeciso se cometia ou não. Tantos jovens
angustiados, deprimidos, mas não só psicologicamente... depois em alguns países que são muito, muito
exigentes na universidade, os jovens que não conseguem se formar ou encontrar aquele trabalho se
suicidam, porque sentem uma vergonha muito grande. Não digo que seja uma coisa de todos os dias,
mas é um problema, um problema atual, uma coisa que acontece.
Bruni: Obrigado Sua Santidade por suas respostas
O Papa: obrigado a vocês pelo que fizeram e não se esqueças hein… 'Hermanito', 'Fratellino', o livro do
migrante. Obrigado!

2023 08 06 Papa Francesco conferenza stampa integrale aereo viaggio apostolico in Portogallo -
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O Papa: em Fátima rezei pela paz sem publicidade - Vatican News

Informação retirada de diversas fontes on-line,


organizada por
Isidro Pinheiro

Agosto de 2023.

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