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Publicado em NOVA ESCOLA 20 de Outubro | 2023

Carreira

Mês dos professores: carta


para uma jovem
educadora
Colunista de Educação Infantil compartilha reflexão a
respeito de trajetória e desafios da carreira
Paula Sestari

Professora Paula Sestari compartilha reflexão a respeito da trajetória


Olá queridos professores e professoras,
Neste mês em que é tão ressaltada a figura dos educadores, quero
compartilhar algumas reflexões necessárias, tendo em vista a importância da
nossa profissão – ainda que hoje continuemos sendo pouco valorizados, não
somente em termos de remuneração, mas no que diz respeito às condições
mínimas de trabalho.
Pensando aqui em como desenrolar essa conversa, senti vontade de escrever
uma carta para uma jovem, que há 20 anos iniciava na carreira. Sim, eu sou ela.
“Querida Paula,
Escrevo desde 2023 para compartilhar experiências que tivemos a
oportunidade de vivenciar ao longo dos últimos 20 anos, desde o dia em que
você, sem recursos para pagar a mensalidade da faculdade de Pedagogia, optou
por cursar o Magistério. Seu senso otimista ressignificou aquele momento
como uma forma de compreender se essa profissão era realmente o que
queria.
Deixa eu te contar: que bom que você nunca esqueceu daquela fala inicial da
professora Marli, de que ‘o professor deve ser o profissional da leitura e da
escrita’. Nossa profissão exige contínua pesquisa e produção – como
imaginamos desde o começo, você vai gostar muito dessa parte, irá se sentir
cada vez mais desafiada e motivada a compreender mais sobre a infância. Nós
pensamos que lidar com os pequenos não seria nossa praia, mas tenho de te
dizer que hoje eles são o motivo pelo qual você escreve, lê, reflete e orienta
suas atividades.
No início nos avisaram sobre as dificuldades e falta de valorização da profissão.
Não sei se já sabe, mas na Educação Infantil é ainda pior. Lembro que um dos
primeiros livros sugeridos no curso de Magistério foi “Professora sim, Tia Não”,
de Paulo Freire. Ele foi importante para saber se colocar diante de uma
sociedade que ainda não reconhece a importância desse papel.
Irá se deparar com situações em que sua formação é desqualificada pelo fato
de querer estar em sala e terá que continuamente afirmar que é justamente
com as crianças que os melhores e mais bem preparados professores devem
estar.
Em 2014, você ganhará o Prêmio Educador Nota 10 e fará um discurso
enfatizando que o profissional da Educação Infantil é sim um professor. Foi um
dos momentos mais incríveis de nossas vidas. Foi eleita a Educadora do Ano,
um reconhecimento que a grande maioria de seus colegas não terão a
oportunidade de vivenciar.
E não digo isso pelos holofotes, mas pelo cuidado, pela escuta atenciosa, pelo
enaltecimento da profissão, pela oportunidade de conhecer outros professores
engajados e determinados. Essa experiência de reconhecimento deveria ser
rotineira e não somente nesse mês de outubro ou em eventos externos tão
prestigiados como esse.
Depois do Prêmio, você terá outras oportunidades incríveis, desde conhecer
profissionais que já admira pelos livros e materiais de estudo, muitos lugares
do país e fora dele – você vai viajar para Nova Iorque, acredite! Também terá a
possibilidade de compartilhar, como formadora de educadores, sua experiência
profissional.
Enquanto escrevia a respeito dessas experiências bacanas que tivemos, vejo o
quanto elas nos transformaram como profissional e como pessoa.
Ao longo do caminho, você conhecerá trabalhos incríveis que não são
divulgados, professores que investem o tempo livre e os próprios recursos para
realizar um trabalho de qualidade. Encontrará essa desvalorização em todo o
país na forma de prefeituras que deixam profissionais não habilitados, ou em
fase de formação inicial, na regência de turmas dos bebês e crianças pequenas
– revelando que grande parte da sociedade pensa que a Educação Infantil não
exige ter profissionais bem formados.
Vai escutar, como aconteceu comigo em 2023, que a creche é lugar de
cuidadores e não de professores pós-graduados. De lá para cá, a etapa não é
responsabilidade da assistência social, no entanto essa perspectiva está tão
entranhada na concepção de Educação que ainda temos um longo caminho a
percorrer para que na sociedade, essa visão seja desconstruída.
Minha querida, saiba que tudo vai valer a pena, todos cursos, pós-graduações, o
sonho realizado de cursar um mestrado, a experiência de atuar em várias áreas
da gestão escolar. Esses movimentos vão te dar uma bagagem para que se
sinta ainda mais comprometida com o mais elementar da carreira docente, que
é o compromisso com a qualidade da Educação dos pequenos que estão sob
sua responsabilidade. Irá tornar-se uma defensora da escola pública de
qualidade, pois reconhecerá que é somente fortalecendo-a que o país terá
condições de avançar.
Você terá momentos difíceis, situações que vão mexer com suas estruturas,
mas posso garantir que o seu lugar de fortalecimento será na escola com as
crianças. É para lá que deve sempre se voltar quando as coisas parecerem sem
solução. Ali, entre elas, enxergando a vida sob suas perspectivas, você vai
(re)descobrindo que ser professora foi sua melhor escolha!”
Caros colegas, sintam-se abraçados por estas minhas palavras e espero que
elas te ajudem a também retornar para o primeiro “sim” à docência e te faça
enxergar o quão valeu a pena tornar-se um educador.
Feliz mês dos professores, um grande abraço e até breve!
Paula Sestari é professora da Educação Infantil da rede municipal de ensino de
Joinville (SC), com dez anos de experiência nessa etapa, e mestra em Ensino de
Ciências, Matemática e Tecnologias. Em 2014, recebeu o Prêmio Educador Nota
10, da Fundação Victor Civita, e foi eleita Educadora do Ano com um projeto
com crianças pequenas na área de Educação Ambiental.

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