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Co-autora
Joana Gayardi Magnabosco
Capa
Estúdio Ponta do Lápis
Revisão
Janice Ap. de S. Salvador
Revisão Final
Bruno Marcos Radunz
Classificação
Narrativa
Páginas
148 páginas
Tipografia
ITC Franklin Gothic Std (10,0)
Impressão 1º Edição
Midiograf Todos os direitos sobre a obra são
reservados à família de Jonas Kazmirczak
Site Site: www.jonaskaz.com
Ícone Agência Digital E-mail: jonas@jonaskaz.com
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou
reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização por escrito do autor.
Kazmirczak, Jonas
Agora é a tua vez: A jornada de um voluntário na África.
Toledo, Paraná
148p.
jonas@jonaskaz.com
www.jonaskaz.com
APRE
SEN
TA
ÇÃO
Eu tenho boas memórias dos Estados Unidos e da África, mas também me
recordo de muitos momentos difíceis. Estávamos em um time, onde bons e maus
momentos aconteceram e entre os nove membros da equipe, nós montamos um
trio, eu, Jonas e Mai. E, juntamente com eles, vivenciei coisas maravilhosas que eu
nunca poderia ter experimentado na Coreia do Sul, meu país de origem. Com eles,
consegui fazer o projeto de forma mais eficiente para que mais aldeias pudessem
se beneficiar de nossos projetos. Eu espero que você aprecie nossa jornada com
este livro! Nahyun Nana Kim
RIA
sorrisos dos leitores deste livro.
Jonas Kaz
RIO
31 Ruptura
PARTE II - Estados Unidos
41 Uma nova casa
47 Arrecadação de fundos
51 Um lugar seguro para dormir
57 54 mil dólares em 45 dias
61 O desafio só aumentava
65 O inesperado
PARTE III - Malawi
71 Uma descoberta em cada passo
75 Uma nova família
79 Mudança de planos
83 Trabalho sem ferramentas
87 Todos os dias serão assim?
91 Páscoa de barro
95 Clube das agricultoras
101 O mundo de Francisco
107 A fé através das obras
109 Educação, o futuro de um país
115 A notícia se espalhou
119 Surpresas acontecem
123 Inauguração da última pré-escola
127 Viver eternamente
131 Julgamos uns aos outros
135 Fundo da justiça
139 A tempestade
143 You = Me
formatura
vida vazia
RUPTURA
acontecesse.
Ao voltar em direção ao meu quarto, percebi que o dormitório
era composto por uma lavanderia, uma miniacademia e um corredor
estreito com carpete cinza e paredes coloridas. Como já estava com
minha própria chave, não me preocupei se teria alguém para me
receber ou não. Ao abrir a porta, me deparei com meu companheiro
de quarto. O asiático me lançou um olhar de desconfiança, tirou o
cabelo do rosto e me deu um seco e rápido oi, ao mesmo tempo em
que colocava a mochila nas costas para se retirar. Foi um choque
perceber o quanto ele era reservado, afinal, eu esperava dividir os
aposentos com alguém que pudesse ser meu camarada nos próxi-
mos meses.
Coloquei os meus pertences sobre a cama de solteiro. Em
seguida, reparei que o guarda-roupas de duas portas seria mais
que o suficiente para acomodar tudo o que eu trouxera na mala. Ao
abri-la, fui surpreendido ao encontrar bilhetes da minha mãe e das
minhas irmãs. Me emocionei ao ler as palavras carinhosas, com
frases de apoio e incentivo. Essa simples atitude me deu forças
para enfrentar as saudades que sentiria dali em diante. Agradeci a
Deus pela minha família, por minha chegada em segurança e pedi
proteção. Me entreguei ao cansaço e finalmente caí no sono.
Acordei animado e, após tomar banho, me dirigi para o café da
manhã junto aos colegas. Frutas, mel, granola e queijo fizeram parte do
desjejum, junto a uma agradável energia de boas-vindas. Por questões
linguísticas, me aproximei dos brasileiros para puxar assunto. Esta
interação foi breve, o papo foi interrompido pelo soar de um sino para
dar início à reunião com os novos voluntários. Fomos orientados de
que todas as manhãs aconteceria o alinhamento a respeito das ativi-
dades do dia. Para a minha surpresa, depois de trinta minutos, iniciou
o cleaning time, a hora da limpeza. Todos os alunos, professores e até
mesmo a diretora, ajudam a manter a organização do local. Colaborei,
levemente contrariado.
A nova turma foi encaminhada para uma sala com um teto alto,
grandes janelas e carpete no chão. As mesas de metal formavam
um círculo, composto por colegas brasileiros, colombianos, japone-
ses e sul coreanos, sob a coordenação de uma professora mexicana
com estilo rastafári.
Não foi necessário muito tempo para sentir dificuldades com
o novo idioma. Cheguei a duvidar se eu daria conta de cooperar
com a limpeza e de me comunicar em inglês. Estava aflito por não
compreender algumas conversas e, para contornar a situação, decidi
interagir o máximo possível, a fim de aprender a língua por imersão.
As semanas seguintes foram desafiadoras. Pouco a pouco eu
melhorava meu inglês, em paralelo, aprendia as técnicas que me
ajudariam futuramente na África. Até então eu era só um farmacêu-
tico que mal sabia consertar uma porta, muito menos plantar. Como
parte do projeto, foi necessário passar o dia cultivando o solo e
atuando através do trabalho braçal. Carpir, cavoucar, fazer composto,
construir galinheiro e poço d’água passaram a fazer parte da rotina.
Em meio a todas essas atividades, me perguntava o que eu
estava fazendo ali, se estava sendo explorado ou se realmente
estava aprendendo algo relevante. Analisei minhas habilidades a
fim de atuar por meio de algo com que eu me identificasse. Criei
coragem e propus à diretora se eu poderia contribuir de outra forma.
Pacientemente, ela explicou que não havia outra atividade a ser
desenvolvida senão essas, as quais poderiam fazer parte de um dos
projetos futuros na África. Como não havia outra alternativa, procurei
me dedicar o melhor que pude a esses afazeres para desenvolver
essas habilidades.
arrecadação
de fundos
Uma das mais importantes decisões era
escolher qual tarefa cada aluno gostaria de
liderar naquela primeira fase nos Estados
Unidos. Assumi a responsabilidade de
coordenar a arrecadação de fundos,
capazes de bancar nossa estadia de seis
meses, fosse no Malawi, em Moçambique
ou qualquer outro país próximo dali. Minha
equipe era composta por nove pessoas
e cada uma deveria arrecadar seis mil
dólares. A meta total de 54 mil dólares
deveria ser atingida em 45 dias exclusivos
para esse fim. O pedido de doações seria
alternado com os estudos e afazeres da
escola, onde apenas 10 dias eram dedica-
dos para as arrecadações, pois ainda falta-
vam cinco meses para irmos à África.
Como líder das finanças junto aos
colegas, chegamos a um consenso sobre
a maneira como atingiríamos a meta e
a equipe decidiu pedir doações. Essa
escolha foi um baque para mim. “Eu
arrecadando dinheiro.
Após minha reclamação, um dos rapazes ficou irritado e disse
“Jonas, se você quiser ir, vá sozinho. Seu inglês é péssimo e você só
vai gastar combustível. Então se vire para ir a pé”. Senti-me extrema-
mente incomodado com essas palavras, mas ficar tomando refil de
Coca Cola no Burguer King estava fora de cogitação para mim. Era
um verdadeiro desperdício de tempo. Já não eram mais 45 dias que
faltavam para atingir a meta, mas sim 44 dias e meio. Sem nem
pensar duas vezes, peguei a chave do carro e os deixei para trás.
Por meio de mímicas e de arranhadas no inglês, consegui liberação
em três lojas para o dia seguinte. Ao final da tarde, passei para buscar
a Mai e a Nana. Em seguida, voltei ao Burguer King pegar os meninos.
Como eu já esperava, eles aproveitaram até o último instante para
beber de graça os refis de refrigerante.
um lugar seguro
para dormir
Como os pedidos de doações aconte-
ceriam em cidades distantes, não compen-
saria de forma alguma voltar à ONG. Em
consequência, encontrar um lugar para
dormir era essencial. Não poderíamos
desperdiçar dinheiro, muito menos usar
os fundos das arrecadações para ficar em
um hotel. Hospedagem pelo Couchsurfing
foi algo impossível para a primeira noite.
Ninguém estava disposto a receber cinco
pessoas de última hora.
A única alternativa encontrada foi
dormir em um camping, uma vez que tínha-
mos uma barraca capaz de acomodar três
pessoas. Ajudei a armá-la e, quando voltei
do banho, os meninos e a Mai decidiram
ficar confortáveis dentro dela. Para mim e
a Nana, sobrou dormir no carro. Contra-
riado pela falta de democracia e pela
injustiça nessa escolha, deitei no banco
da frente exausto. Fui contagiado por
um sentimento de saudades da família,
mesmo para encarar uma banheira imunda, além dos cachorros que
se recusaram a sair do sofá no qual eu iria dormir, me restando
apenas o chão sujo e empoeirado. Apesar de tudo, me senti grato
por conhecê-lo e por sua hospitalidade.
54 mil dólares
em 45 dias
Dia após dia, a equipe trabalhou em
prol da gigantesca meta de atingir 54 mil
dólares. Além de ser inadequado ficar em
um estabelecimento por muito tempo,
logo os clientes começavam a se repetir, o
que inviabilizava a arrecadação no mesmo
ponto. Percorri várias cidades e conheci
várias pessoas gentis. Quando elas perce-
biam que eu estava lá por horas, recebia
refeições dos funcionários do local e da
sua clientela.
Fiquei surpreso ao perceber a quanti-
dade de jovens que se solidarizavam com
o projeto. Muitos deles compartilhavam
comida e palavras de motivação, me
dando forças para conquistar meu sonho
em meio a todos os desafios em que eu
estava enfrentando. Afinal, era uma árdua
tarefa aquecer os pés no ar quente desti-
nado para secar as mãos no banheiro
ou então colocar jornal no sapato para
proteger os pés da neve. Apesar da roupa
O desafio
só aumentava
Ao passar de 30 dias de arrecadações,
realizamos uma reunião para calcular a
quantia coletada. Para nossa frustração,
constatou-se que, após todo o esforço,
somente 47% da meta fora atingida. O
sonho de ir para a África pareceu distante.
Contaminada pelo desânimo, a equipe
entrou em uma calorosa discussão acerca
dos pontos positivos e negativos da
estratégia utilizada.
No início, todos estavam educados e
ponderados, até que os ânimos começaram
a se alterar em meio a acusações de corpo
mole, desculpas e encrencas. O time,
composto por latinos, asiáticos e ameri-
canos, tornava a discussão ainda mais
confusa e acirrada. Para ajudar, a profes-
sora mexicana incentivava o conflito entre
os alunos com seu espírito guerrilheiro.
Exausto com o clima, finalmente veio o
intervalo e um tempo para tomar uma
água, descansar a cabeça, respirar sozinho
O inesperado
Uma descoberta
em cada passo
A diferença de temperatura entre
Chicago e Johannesburg era brutal. Saí de
uma temperatura de -20 ºC nos Estados
Unidos e me deparei com 25 ºC positivos na
África do Sul. Fui surpreendido pela alegria
das aeromoças que pouco se importavam
em agir com formalidade ou em fazer silên-
cio. Elas trabalhavam cantando e conver-
sando alegremente, com o inglês carre-
gado no RRR. Comparando com os “rrr” em
português, se assemelha ao sotaque de
algumas pessoas do sul do Brasil, ao falar
“carrro, carrroça”. Elas falavam “house”
com a pronúncia “rrrouse”.
No mesmo avião em que embarquei,
estavam as jogadoras de rugby do time
feminino sul-africano. Conversei com
algumas meninas e, claro, a conversa
só ficou mais interessante porque há
pouco tempo eu havia assistido Invictus.
Baseado na história de Nelson Mandela, o
filme relata a Copa do Mundo de Rugby em
seu país, no ano de 1995. Naquele período, esse esporte era prati-
cado somente pela elite branca e, em paralelo, a nação se dividia
entre brancos e negros, pela austeridade do Apartheid.
Mandela enxergou nesse evento mundial uma oportunidade de
praticar a tolerância e implantar a política multirracial, instalar a
chamada “rainbow nation”, nação do arco-íris. Sua estratégia parecia
uma grandiosa loucura, mas sua audácia, sob o slogan de “um time,
uma nação”, teve como resultado a vitória da união e da tolerân-
cia. Se há mais de 20 anos essa foi uma imensa conquista para o
time masculino, a participação da seleção feminina no mundial nos
Estados Unidos foi mais um sinal do avanço cultural.
Em 2010, a África do Sul cedeu espaço para a Copa do Mundo.
Esse espetáculo evidenciou que os esforços da população e de
Mandela valeram à pena. O evento integrou ainda mais a população
da África do Sul para que o Apartheid se tornasse uma vergonhosa
cicatriz dos embates humanos, capaz de ser recordada e superada,
tal qual ele fez com o time Springbocks, apelido dado à seleção de
rugby do país, há duas décadas.
Cheguei ao Malawi no dia seguinte. No aeroporto era evidente a
simplicidade e a diferença entre as capitais Johannesburg e Lilongwe.
Na alfândega, o guarda me perguntou se eu havia tomado a vacina
contra a Febre Amarela. Devido ao descuido desse esquecimento,
tentei passar reto, no jeitinho brasileiro. De prontidão, ele me segurou
pelo braço e, como reflexo, falei com uma voz segura e confiante: “me
larga, eu sou farmacêutico”. Ele me olhou sério, no fundo dos meus
olhos, e me soltou. Apesar do nervosismo, percebi que a sorte estava
a meu favor.
Malawi possui um território pequeno, faz fronteira com Moçam-
bique, Zâmbia e Tanzânia, ao sudeste do continente. Por ser um país
estreito, seus 24 distritos são divididos apenas entre sul, centro e
norte. Sua agricultura gira em torno do cultivo de chá, cana-de-açú-
car, milho e tabaco. Por mais que 80% da população viva em área
rural, o índice de subnutrição chega a 29%, o equivalente a mais de
4 milhões de pessoas, reduzindo consideravelmente a expectativa
de vida. Os homens vivem aproximadamente 37 anos enquanto a
estimativa para as mulheres é de 43 anos.
A moeda oficial chama-se quacha malawiana e sofre constan-
tes desvalorizações. Um real equivale, em média, a 250 kwachas
(cálculo realizado em outubro de 2016). Apesar de ser colonizado
pelos ingleses, somente nas principais cidades, a população fala
inglês. Já na área rural predominam o chichewa e chitumbuca,
línguas locais.
Foi possível reconhecer a ONG de longe, sua arquitetura seguia
os padrões da organização norte-americana. As paredes, a porta e a
pintura deixam claro que, apesar de ser o mesmo padrão, a qualidade
do material era muito inferior. Observei ao redor e reconheci alguns
objetos de decoração, pois eram idênticos com aqueles utilizados lá
nos Estados Unidos. Com o ambiente tão familiar, foi fácil me acomo-
dar e me sentir confortável com a ideia de, que pelos próximos três
dias, ficaria ali hospedado.
Há poucas horas do anoitecer, saí para explorar as redondezas.
Entrelacei os chinelos nos meus dedos e corri sem direção pelos
caminhos abertos, marcados pela lama seca, em meio ao mato e às
moradias de barro. Percebi que algumas crianças gritavam algo como
“bo” ou “bobo”. Ao ouvir, me perguntei se estavam me xingando.
Quando as mãos acenaram um abano de oi ou de tchau, fiquei mais
tranquilo em perceber que era apenas uma forma de cumprimentar.
Mudei a rota no retorno para a ONG e cheguei a um pequeno
campo de futebol. As crianças brincavam com uma bola improvisada
com sacolas plásticas amarradas com barbante. Apreciei essa cena
na medida em que corria pela extensão do campo, até olhar para o
lado e notar vários trabalhadores retornando para casa, com suas
Mudança de
planos
Em meio à escuridão e ao silêncio
da noite, após o jantar, um barulho de
motor e uma forte luz de farol entraram
pela janela. Um homem moreno, de 1,80
metros e de barriga saliente (algo atípico
para a região), se apresentou para nós
como Alex, o diretor do Clube das Agricul-
toras, em que eu realizaria o trabalho
voluntário.
Ao longo dos seis meses em que
estivesse no Malawi, a estimativa desse
projeto era atender aproximadamente
5.250 mulheres. Por meio dos conheci-
mentos adquiridos na ONG, ao cavoucar
a terra, plantar e colher, lhes ensinaria a
tirar o proveito da terra a fim de melhorar a
alimentação de centenas de famílias. Alex
explicou os detalhes de como funcionava
o projeto e, em seguida, deu uma notícia
inesperada. Devido às circunstâncias, ao
atraso da verba e à indisponibilidade dos
colaboradores, o Clube das Agricultoras
Trabalho sem
ferramentas
Já nos primeiros passos, percebi a
superlotação. Os corredores estavam
abarrotados de pessoas, em uma enorme
fila para atendimento e outra para receber
os medicamentos. Perguntei o que era
aquele local que possui as telhas de
Brasilit e me responderam que é lá onde
ficam alojadas as famílias dos internados.
Devido à distância das casas em relação
ao hospital, era mais cômodo que elas
se hospedassem naquele lugar até que o
familiar se recuperasse. Inclusive, naquele
mesmo ambiente, essas pessoas prepara-
vam a refeição para seus parentes enfer-
mos, pois o hospital não disponibilizava
alimentação alguma.
Ao chegar à farmácia hospitalar, me
deparei com uma área abarrotada de
comprimidos vencidos. Várias instituições
do mundo doavam fármacos sem consultar
qual era a realidade local. A maioria deles
nem sequer era utilizada, não havia serven-
Todos os dias
serão assim?
Consciente de que o dia seguinte
seria longo, acordei procurando forças e
motivação para enfrentar aquela dura reali-
dade do hospital. Assim foi ao longo de toda
aquela semana, período em que passei
também a colaborar com as auxiliares de
enfermagem nas consultas de pré-natal
devido à falta de médicos. Minha energia
se consumia cada dia mais, minha vontade
de levantar da cama era nula e me sentia
energeticamente sugado. Sentia que minha
ajuda não tinha poder algum para mudar a
realidade daquelas pessoas.
Exausto e deprimido, aproveitei o
domingo para ficar em casa, descansar
a cabeça e me reequilibrar. Foi um ótimo
dia e passou mais rápido do que gostaria.
Quando chegou a segunda-feira, não tive
ânimo algum para ir até o hospital. Essa
indisposição era extremamente atípica.
Senti necessidade de mudar algo. A minha
atuação não era efetiva e muito menos
Páscoa de Barro
suas amigas. Foi uma surpresa observar a reação dele, pois não havia
necessidade de dividir a paçoca. Ele poderia ter comido sozinho e
longe delas. Sua atitude foi baseada no instinto de partilha e ele
decidiu compartilhar o seu presente.
Ver a alegria e a criatividade das crianças me reenergizava. Me
impressionei com os brinquedos construídos por elas. O barro servia
para a produção de seus brinquedos, cuja fonte de matéria-prima era
abundante e permitia soltar a imaginação para confeccionar o que
desejassem. Com toda essa quantidade, uma simples casinha tinha
barro suficiente para se tornar um imenso castelo. Uma caixa de
leite, quatro tampas de garrafas e um cabo de madeira transforma-
vam-se em um carro muito bem desenhado, com direito a passageiro.
Para tornar a brincadeira ainda mais divertida, construíam pontes e
incrementavam o cenário conforme a imaginação fluía.
Certo dia, não identifiquei qual era o brinquedo na mão de uma
menina, pois todos eram da mesma cor, de barro misturado com
água. Ela respondeu: “essa sou eu”. Então percebi que tinha duas
pernas, dois braços e uma cabeça. Concluí que era assim a Barbie
do Malawi. Essa mesma simplicidade acompanhou a Páscoa.
Só soube que seria a Páscoa quando recebi a ligação da minha
mãe. Ela contou que comprou os ovos de chocolate para meus sobri-
nhos e então fiquei curioso para saber se também era celebrada no
Malawi. Até então não tinha ouvido ninguém comentar. Descobri que
sim ao ver a procissão na Sexta-Feira Santa, realizada por centenas
de pessoas. Sob o mais forte brilhar do sol, elas caminhavam e
se ajoelhavam em um asfalto escaldante. No domingo de Páscoa,
eu estava na sede da ONG, em Blantyre e encontrei voluntários da
Lituânia, Ucrânia, Espanha, Romênia, Itália, Eslováquia, República
Tcheca e Grécia. Cada um realizou o seu rito conforme sua crença.
Naquela mesma manhã, as ameaças da Coréia do Norte sobre a
Coréia do Sul tiveram grandes repercussões e aborreceram a todos,
Clube das
A g r i c u lt o r a s
As próximas duas semanas demoraram
para passar até que, finalmente, chegou
o dia de iniciar o Clube das Agricultoras.
Esse projeto era composto por 21 líderes,
sendo que cada um era responsável por
trabalhar com 250 mulheres, totalizando
5.250 integrantes. A família de cada uma
era composta em média por 5 membros,
portanto, o impacto desse trabalho atingi-
ria aproximadamente 26 mil pessoas.
Minha missão, junto com a Mai e a
Nana, era ensinar para aquelas mulheres
as maneiras mais simples do cultivo da
terra, além de demonstrar a preparação
de alguns dos alimentos plantados, como
feijão, milho, soja e hortaliças. A soja
poderia virar leite vegetal para alimentar
bebês cujas mães tivessem dificuldade de
amamentar. Já as árvores de Moringa e
de Sorgo oferecem nutrientes riquíssimos
para combater a desnutrição: vitamina A
e C, minerais, aminoácidos, cálcio, ferro,
potássio e proteínas.
Para afastar o fantasma da subnutrição, somente as mulheres
eram convidadas para essa luta. Essa mesma certeza não seria
possível caso fosse ensinada aos homens. Infelizmente, muitos deles
se perdiam em busca da prostituição e de bebidas. Em consequência,
o benefício obtido pela terra nem sequer seria compartilhado com a
família, dificultando até mesmo as necessidades básicas de alimen-
tação do próprio filho. Nesta cultura, as mulheres não têm voz e nem
vez, são submissas a seus maridos. Como líderes e responsáveis
pela vida de suas crianças, as esposas faziam o possível e o impos-
sível para dar aos pequenos o que comer.
O primeiro dia iniciou com uma reunião com Bamos, líder de
projeto e tradutor. Em sua comunidade, estavam 100 mulheres e,
para chegar até elas, caminhamos mais de uma hora e levamos em
torno de 30 minutos para reuni-las. Divididas em dois grupos, seus
aprendizados de cultivo foram praticados em um jardim comunitário
e em uma pequena fazenda, espaço de terra dividido entre elas.
Foi surpreendente encontrar o projeto já em andamento e ver
os pés de milho com dois metros de altura, sem o uso de fertili-
zantes. Para que crescessem assim, utilizavam o sistema orgânico
de plantio, ensinado através deste projeto, tal qual aprendi nos
Estados Unidos. Ao sentar na sombra, percebi que uma delas contou
a quantidade de pés de milho e carreiras de soja, com a ajuda de
Bamos. Foi emocionante escutar que ela calculou a quantidade
exata, afinal, elas não foram alfabetizadas e plantaram os grãos por
meio de tecnologia artesanal, em que a enxada era feita com galho
de árvore e um metal afiado na ponta.
As sombras das árvores faziam o papel de sala de aula. As
mulheres sentavam-se no chão e assistiam às nossas explicações,
com o auxílio de Bamos. A matéria era escrita em cartolinas, poste-
riormente, presas nas paredes de barro (quando se conseguia
fixá-las).
Os dias alternavam-se em aulas que orientavam a respeito do
plantio dos alimentos, seus nutrientes, colheita e preparação da
comida. Uma das cenas mais comuns era vê-las plantando com
os seus bebês nas costas, suas crianças sentadas ou brincando
na sombra. As mães dedicavam-se com afinco para dar-lhes os
melhores alimentos, por meio do próprio suor e das próprias mãos,
semeando o futuro de seus filhos.
Estipulávamos metas de plantio e, quando as mulheres
conquistavam, as presenteávamos com almoços regados a salada,
carne de soja e nsima. Esse último é feito com farinha de milho e
água, tal como polenta. A diferença está no sal, o nsima não tinha
muito gosto devido à ausência dele, afinal, o sal custa dinheiro,
coisa escassa na comunidade.
Quando os progressos eram significativos, as recompensas eram
diferentes. Em uma das ocasiões elas aprenderam, no mesmo dia, a
cantar uma música, parte em chechewa e parte em inglês. Presentea-
mos a todas com Fanta Laranja e Coca Cola. Em seguida, perguntei
se elas já haviam tomado e responderam que não conheciam. Apenas
sabiam que era um líquido doce. Após tomar o refrigerante, contagia-
das pela alegria, cantaram a música recém aprendida: “We are happy
to be togheter”/ “somos felizes por estarmos juntos”.
A união e a força dessas mulheres refletiam em uma comuni-
dade inteira. Em meio a um sol insuportável e à escassez em suas
vidas, visto que o básico muitas vezes não era suprido, faziam com
O mundo de
Francisco
A rotina se estendia com o trabalho
no Clube das Agricultoras de segunda a
sexta. Ao pôr do sol, eu e minhas amigas
voltávamos para casa de bicicleta, para
cozinhar a nossa janta, antes do anoite-
cer. A curiosidade para saber o que o
homem branco fazia levava as crianças
a rodear nossa casa aos finais da tarde,
principalmente quando ia para o lado
de fora acender o fogo. Geralmente,
não tinha eletricidade nesse horário e
éramos obrigados a acender o carvão no
fogareiro. Eu sentia dificuldade em realizar
essa simples tarefa sem a ajuda de álcool
e, por sorte, quem sempre estava lá para
me ajudar era o pequeno Francisco e seus
amigos.
As crianças ficavam em volta muito
sorridentes, comentando em chechewa
as minhas bizarrices. Elas eram mais
habilidosas do que eu para acender o
fogo. Com maestria, faziam a proeza
mou-se da gente, curioso para saber o que era aquilo. Mostrei onde
era o Brasil, o Japão, a Coreia do Sul e o Malawi. A princípio, ele
imaginava que o Malawi era o continente africano inteiro, pois ele
conhecia apenas o mapa da África. Fiquei chocado e, ao mesmo
tempo motivado, pois aquelas crianças poderiam aprender o quanto
o mundo é grande. Incrédulo, ele se recusou a acreditar nas expli-
cações e no atlas. Por fim, ele deu de ombros, acreditava que estáva-
mos enganando e foi para casa.
Em três dias, a “Parede do Conhecimento” ganhou vida. Final-
mente tínhamos um lugar melhor para dar continuidade às aulas dos
pequenos. Convidamos toda a turma para a inauguração. O Chico
apareceu com sua melhor roupa, vestia um paletó preto, camiseta
e shorts azul, com o cordão para o lado de fora e descalço. Já os
seus amigos apareceram com calçados, algo realmente atípico,
mostrando a importância do evento.
Pedi ao Chico que se posicionasse em frente à parede para tirar
sua foto. Ele convidou seus dois melhores amigos e ainda trouxe o
cachorro. Ele negou quando pedi para que arrumasse o cordão da
bermuda: “cadarço pro lado de fora”, respondeu ele. Também se
recusou a tirar o cachorro da cena. Disse: “cachorro fica”. Após tirar
a foto, pedi para que eles sentassem para repassar o alfabeto para
todas as crianças e assim filmar aquele momento. Chico balançou
a cabeça e disse “eu”. Perguntei: “o que foi agora, Chico?”. Ele
respondeu: “eu serei o professor”. E assim, nesse clima, aconteceu
a inauguração do mural.
Em uma atípica noite com eletricidade em casa, tive o desafio
de preparar pastel para minhas colegas. Naquela mesma tarde,
comprei ovos e farinha na feira para fazer a massa. Já o recheio
seria de vegetais picados. Enquanto abria a massa com o auxílio
de uma garrafa de refrigerante, para minha surpresa, apareceu o
Chico. Estranhei, pois não era costume receber visitas após anoite-
cer. Ele estava mais tímido que o normal, mas não conseguia conter
o sorriso ao mesmo tempo em que segurava um papel A4 na mão,
diante da porta.
Continuei focado na minha atividade e expliquei para ele o que
estava fazendo. Depois de contar, ele disse: “então, Jhona” - como
costumava me chamar. “Fala Chico”, respondi prontamente. Ele
emendou com muita empolgação: “quero te convidar para o meu
aniversário”. Nesse instante, ele entrou em casa e me estendeu
a folha A4, onde estava escrito: “Convite para o meu aniversário”,
incrementado com uma figura desenhada.
Aquele convite era especial e inimaginável. Era uma formalidade
trazida em uma folha A4, feita com um carinho muito sincero. Instinti-
vamente o abracei e o ergui no colo, deixando o menino todo sujo de
farinha. A bagunça atraiu a atenção da Mai e da Nana, que ficaram
curiosas para se inteirar do que havia acontecido. Após terminar de
contar, percebi que ele não havia convidado as meninas.
Dois dias depois, chegou a data de comemorar o aniversário do
Chico. Seus amigos estavam com as melhores roupas, acompanha-
dos de suas sacolas plásticas com comida preparada por suas mães.
Todas as crianças estavam sentadas em um tecido próximo da casa
dele. Um pouco mais à frente, na varanda, ele estava sentado em uma
cadeira elevada, como se fosse um rei e seu melhor amigo estava ao
lado, em uma cadeira um pouco mais baixa. Todos eles se deliciavam
com uma bacia de salgadinho de milho e conversavam animados.
Fiquei admirado, olhando aquela cena incrível. Em seguida, um a
um se levantou e começou a dançar, numa espécie de demonstração
de habilidades. Me aproximei e sentei no tecido, como todos os
outros. O Chico me viu e acenou, mas continuou sentado em seu
trono, pois aquele era o dia dele. Fiquei por mais alguns minutos e me
retirei, deixando-os à vontade para curtir a festa.
A fé através
das obras
Os dias se passavam e, ao longo da
semana, eu permanecia trabalhando
no Clube das Agricultoras. Nos finais de
tarde, dava aulas de inglês; aos sábados
e domingos saía para conhecer a região.
Em uma das minhas idas para a cidade
de Blantyre, fui ao hospital consultar. Lá
conheci um casal de brasileiros, Dr. Gerson
e a enfermeira Arnes de Araújo. O hospital
em que eles eram missionários pertence
a Igreja Adventista do Sétimo Dia. Gentis e
simpáticos, me convidaram para visitá-los
em um final de semana, a fim de conhecer
mais sobre o projeto e a igreja.
Doutor Gerson tem uma história
fantástica, digna de virar livro. Sua missão
iniciou-se logo após o genocídio em
Ruanda, onde atuou como missionário,
em 1994. Atualmente, ele, sua esposa
e sua filha Alice vivem em missão para
colaborar com a saúde e longevidade dos
moradores do Malawi. Foram inúmeros
Educação, o
futuro de um país
Após agradáveis finais de semana,
tudo retornava à rotina. Quando as bicicle-
tas não estavam quebradas, pedalava
rumo à vila para dar continuidade ao
Clube das Agricultoras. Os filhos ficavam
aconchegados no colo da mãe ou sobre
um tecido embaixo da sombra, chamado
de chechenja, em chechewa. Assim, as
mulheres poderiam trabalhar, pois não
tinham outro lugar para deixar os filhos.
Ao ver essas crianças brincando o tempo
inteiro, comecei a perceber que, se não
intercedêssemos pelos pequenos, em
pouco tempo o mesmo projeto seria
realizado com eles.
Transformar a ideia da pré-escola em um
projeto concretizado exigia a autorização
do Alex, diretor do Clube das Agricultoras.
A Mai, a Nana e eu explicamos para ele a
necessidade de construí-la, a fim de propor-
cionar às crianças um futuro melhor do que
o de seus pais. Prontamente ele entendeu
para fazer o melhor pela sua filha e pelo futuro dela. O agradecimento
dele tocou meu coração. Ouvir as simples palavras me deixou feliz e
convicto de que estava fazendo a coisa certa.
Apesar dos reparos não acontecerem na velocidade em que
gostaríamos, a cada dia mais e mais pessoas vinham cooperar. As
reformas aconteciam no final da tarde e aos finais de semana, após
o expediente do trabalho de todos. Através da união de forças, refor-
mamos a primeira pré-escola.
Os professores eram essenciais para que a escolinha funcio-
nasse. Com essa preocupação, a japonesa Mai confeccionou
materiais didáticos e convidou os pais dos alunos para tornarem-se
educadores voluntários.
A notícia se
espalhou
A notícia se espalhou e recebi o
convite para ir com meus colegas em uma
comunidade em que a pré-escola não teve
sua construção concluída. Inclusive, quem
estava responsável por esse serviço era
o casal de brasileiras que encontrei nos
Estados Unidos, no dia em que cheguei à
ONG. Elas pediram para que concluísse-
mos o trabalho e assim decidimos fazer.
Como toda a exigência de uma aldeia,
foi realizado o acordo com o pajé. Combi-
namos de iniciar as atividades após
concluir a reforma de outras três pré-esco-
las, que já haviam sido negociadas com as
outras comunidades. Ao final da conversa,
olhei para frente e vi uma casa com uma
quantia considerável de amendoim, ainda
com casca, exposto ao sol para secar.
Apaixonado por amendoim in natura, me
dirigi até lá para experimentar um.
Fui avistado pela dona da casa. A
senhora veio em minha direção com um
estava sonhando.
Devido à diferença de fuso horário, o Malawi está adiantado cinco
horas em relação ao Brasil. A empolgação estava grande naquele
domingo, afinal, era o Dia das Mães. A japonesa Mai foi a primeira
a falar, pois o Japão tem cinco horas a mais. Eu e a Nana não
conseguíamos conter a ansiedade.
Recebi pelo celular uma foto da minha mãe, junto das minhas
irmãs e de um grande amigo. Paulo Junior foi na minha casa dar
um abraço nelas por mim. Foi impossível conter as lágrimas diante
daquela foto carinhosa com as mulheres da minha vida. Conversei
com elas por telefone. As três são mães maravilhosas e a saudade
tomou conta.
Este foi um final de semana marcante. Não gostaria que tivesse
acabado tão rápido. Os dias se passaram e realizou-se a reforma de
duas pré-escolas. Em seguida, surgiu a necessidade da construção
de uma nova pré-escola em uma outra aldeia. Eles procuraram minha
equipe e solicitaram nossa ajuda. Ninguém tinha o conhecimento
para iniciar uma construção do início ao fim. Apesar disso, como
não aceitar o desafio? Foi firmada a parceria com os moradores, os
quais disponibilizaram dois homens que detinham o conhecimento.
Visualizar um pedaço de terra com capins a um metro e meio de
altura e imaginar que ali surgiria uma pré-escola era desafiador.
Compramos cimento, pregos, portas e telhado. Assim como nas
comunidades anteriores, as mulheres se encarregaram dos tijolos
de barro e os homens das madeiras de alicerce. Ao final, pedimos
para que eles desenhassem nas paredes o que acreditavam ser
mais importante para a educação de seus filhos. Eles rabiscaram a
figura de uma criança e seu coração. Ao lado, apontaram as palavras
boné, olho, nariz, boca, braço, perna e, lógico, coração.
SURPRESAS
ACONTECEM
A notícia da construção se espalhou
rápido. A novidade estava presente nas
conversas das vans, das tendas do comér-
cio e durante o plantio das agricultoras.
Mais convites para novas construções
surgiram e as aldeias nos procuravam.
Neste ritmo, ao total, reformamos quatro
pré-escolas e construímos outras três.
Para a inauguração da sétima escola,
convidei o diretor do Clube das Agricul-
toras, para mostrar-lhe o trabalho desen-
volvido aos finais de semana.
No dia da inauguração, acordei cedo e
pedalei até a aldeia. Ao chegar, estranhei
o professor já ter começado a aula, pois
sempre se realizava uma oração antes. Tal
celebração realizada nas aldeias anteriores
era muito bonita, sempre acompanhada
de uma dança ao redor da escola. Senti
que o olhar do professor era um pouco
distante, acenei com a mão, mas não
obtive resposta.
Inauguração da
ú lt i m a p r é - e s c o l a
Em seguida, iniciaram-se as festividades.
Fomos surpreendidos por uma dança organi-
zada pelo líder e pelas mulheres em sinal de
agradecimento. Percebi então ter sido esse
o motivo que o deixara tão ocupado e o
porquê de não ter me dado atenção. Estava
concentrado em fazer uma surpresa e não
queria que fosse vista antes da hora.
Tambala, o professor cego, deu uma
demonstração da sua aula após a dança
das mulheres. O respeito daquelas
crianças com ele era admirável. Todos
respondiam prontamente às suas pergun-
tas feitas em chechewa. Tambala compar-
tilha a importância da educação na vida
do ser humano. A educação mudou a vida
dele e, mesmo sem a visão, ele estava
realizando o seu sonho de ser professor.
Aquela era a sua vez de dinamizar a vida
de todas as crianças daquela comunidade.
O almoço daquele dia teve alguns ingre-
dientes patrocinados. Conforme a tradição,
Viver
eternamente
A sensação de que viveria eternamente
naquela comunidade foi interrompida
quando chegou o dia de partir. Não existiram
despedidas. Aconteceu tão rápido quanto o
tempo de apertar o interruptor e a lâmpada
acender. De um momento para outro, Alex
avisou que, na manhã seguinte, retornaría-
mos para a sede da ONG em Blantyre e
permaneceríamos por lá até o voo.
Encontrei o Francisco de saída com sua
família. Eles iriam visitar seus parentes em
outro povoado. Na despedida, a sensação
de que estava deixando toda minha
história no Malawi para trás apertou meu
coração. A alegria compartilhada com ele
e seus amigos na convivência diária me
dava forças para encarar os meus dias no
terceiro país mais pobre do mundo.
Encontrei voluntários de todos os
lugares no mundo em Blantyre. Todos
aqueles que estavam espalhados pelo
Malawi retornariam para as sedes iniciais
Alegria compartilhada.
Julgamos uns
aos outros
Ao desembarcar nos Estados Unidos,
identifiquei as regalias de uma potência
mundial. Nos primeiros passos, eram
perceptíveis os privilégios de um ambiente
climatizado, escada rolante e um forte
esquema de segurança. Caminhei em
direção ao departamento de imigração
para dar entrada no país, agora seguro do
meu inglês.
Mai e Nana estavam a minha frente
e deram entrada no país. Entretanto, o
agente me convidou para entrar em uma
sala reservada e seguir um caminho dife-
rente. Dentro do recinto, haviam inúmeras
cadeiras e somente um homem barbudo
sentado, vestindo uma túnica branca, traje
tipicamente utilizado no Oriente Médio.
Na mochila, eu carregava apenas
lembranças do Malawi, como pequenos
pedaços de madeira e tecidos. As únicas
roupas que eu tinha estavam no meu
corpo. Minha pele estava queimada do
Fundo da Justiça
A tempestade
dirigiu no meio das plantações, pois não era mais possível identificar
onde estava a estrada. Ele nos levou até a ONG, onde pude desfrutar
do banho quente mais gratificante da minha vida.
You = me
Não espere ser Martin Luther King para dar o teu melhor discurso,
“I have a dream”. Não espere ser preso como Nelson Mandela para
lutar pela igualdade entre os povos. Não espere ser eleito o papa
para compartilhar o amor. Não espere ter a sabedoria de Mahatma
Gandhi para compartilhar a paz. O teu amor é sentido e a tua paz é
vivida. Construa a história que desejas viver, pois agora é a tua vez!
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