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SUMÁRIO

1. DO SENTIDO DA VIDA......................................4
2. DO AMOR..............................................................12
ORAÇÃO DO PAPA CLEMENTE XI..............................38

3. DA PRUDÊNCIA..................................................41
4. DA TEMPERANÇA..............................................66
5. DA JUSTIÇA..........................................................94
6. DA FORTALEZA.................................................103
ORAÇÃO DA LITURGIA EUCARÍSTICA....................120

7. DA VIDA DE ORAÇÃO....................................121
8. DA VIDA INTELECTUAL................................130
9. DA VIDA AFETIVA...........................................151
10.DA VIDA SOCIAL............................................172
11. DA MISSÃO......................................................182
12.DA FELICIDADE..............................................198
13.DO SOFRIMENTO...........................................211

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_________________________________________
Tomemos as exortações expostas nesta obra como frutos de
meditações e de um humilde entendimento concedido pela
graça de Deus ao autor que vos escreve, que também se
inclui na necessidade de moldar-se cada vez mais por estas
lições e pela busca da santidade.
!"""!"""!

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1. DO SENTIDO DA VIDA

1.1 O sentido da vida deve ser um único:


amar e servir a Deus na esperança de um dia
estar com Ele, reunidos, na glória eterna do
céu.

1.2 O foco de todas as atitudes e decisões do


ser humano deve apontar exclusivamente
para essa meta, delimitando o abismo de
importância que há entre isso e todas as
outras coisas.

1.3 Este desígnio só pode ser alcançado


através de um caminho: a obsessão pela
santidade.

1.4 Queres tu saber qual é a medida da


bondade para atingir a santi cação? Santo
Agostinho de Hipona nos exorta com a
autoridade que tem no assunto: “Se podes ser
melhor do que és, é evidente que ainda não é
tão bom quanto deves”.

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1.5 A santidade é o estado de espírito
alcançado pelo indivíduo que se submeteu a
um processo de morti cação carnal intenso e,
pela graça de Deus, vivencia a pureza da alma
em todos as suas ações, atos e palavras.

1.6 Atingir a pureza da alma signi ca que já


não é mais você quem vive, mas Cristo vive
em ti e, através da sua vida, Ele pode se fazer
presente também na vida do teu próximo.

1.7 Um processo de morti cação carnal é o


esforço diário que devemos despender a m
matar os nossos desejos, o nosso
individualismo, as nossas reações, os nossos
vícios et cetera.

1.8 “Quem souber morrer a tudo terá vida


em tudo” — São João da Cruz.

1.9 O corpo humano é composto de uma


realidade física que, inconscientemente, faz o
indivíduo perseguir a satisfação pessoal em
tudo o que realiza.
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1.10 O apologeta católico G. K. Chesterton já
nos instigava a re etir: “Por que todos os tolos
do mundo pensam que a alma só é livre
quando desobedece a uma ordem?”. Ora, se
os ensinamentos bíblicos se desdobram em
forma de orientações eclesiásticas para o
nosso BEM, a quem devemos atribuir o papel
de advogado do diabo que insiste em nos
tentar na direção da desobediência?

1.11 O homem pensa ser livre ao exercer essa


liberdade e satisfazer os seus instintos, porém
é o maior dos escravos, pois é tão iludido que
desperdiça a vida inteira obedecendo a um
senhor, cuja existência ele sequer reconhece.

1.12 Esse senhor é o EGO.

1.13 O Ego é o anticristo da alma, que nos


acompanha durante a vida; e os servos que
trabalham para ele são chamados orgulho,
vaidade, ganância, egoísmo, impulsividade,
desequilíbrio, intemperança e descontrole.
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1.14 Já o antídoto necessário para derrotar os
servos do ego são as virtudes cardeais da
Prudência, Temperança, Justiça e Fortaleza.

1.15 “Cardeais” porque elas têm o papel de


nortear todo o nosso ser.

1.16 Essas quatro virtudes são o conjunto de


habilidades espirituais e comportamentais
que devemos desenvolver para sermos
capazes de AMAR verdadeiramente — a
Deus, a nós mesmos e ao próximo.

1.17 Não há dúvida: estamos inseridos em


uma realidade em que existe a chamada
vocação universal à santidade.

1.18 Ou seja, é da vontade de Deus que


TODOS sejamos santos. Ele criou o homem
para ser santo à imagem e semelhança de
Nosso Senhor Jesus Cristo, o nosso modelo
eterno.

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1.19 Mesmo assim, muitos rejeitam este
chamado que vem do Alto e depois
perguntam-se, abismados, onde foi que Deus
se en ou quando precisam dEle.

1.20 É a charada que Santa Teresa d’Ávila


matou ao declarar: “Se não dermos ouvidos
ao Senhor quando Ele nos chama, pode
acontecer que não logremos encontrá-lo
quando o quisermos”.

1.21 Por isso, Deus nos convida a tomar


partido nessa batalha da carne versus espírito;
e devemos respondê-lo de todo o coração,
com um “Sim” igual ao de Maria! É desejo
dEle que o mal seja vencido no interior de
cada um de nós. Que nos tornemos os
governadores do próprio corpo e
reorientemos o nosso leme na direção do céu.

1.22 Chegando en m a esse avançado ponto,


poderemos dizer um dia: “Senhor, Senhor,
pela graça tocaste a minha alma. Fizeste de
mim um governador, mas tu és o verdadeiro
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REI. Que seja feita a vossa vontade, pois o
governador existe para cumprir os desejos do
seu superior. Agora, pois, eu renuncio ao meu
posto — não sou digno de tal prestígio — e
coloco-o inteiramente em tuas mãos,
juntando-me ao teu exército, como o menor
dos teus soldados.”

1.23 Se quisermos, portanto, oferecer tamanha


satisfação ao nosso Deus, temos que procurar
desenvolver as ferramentas capazes de nos
transformar neste sentido.

1.24 O batismo é um só. Mas a conversão é


diária e contínua.

1.25 A ordem de Cristo foi clara. Disse-nos Ele


para morrermos, a m de que nascesse em
nosso lugar um novo homem (Ef 4,22-24; Cl
3,9-11; Rm 6,4; Rm 6,11; Gl 2,20; Jo, 3,3; Jo
3,5-7).

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1.26 Soma-se nesta mesma direção, os
conselhos de Santo Agostinho: “Desapropria-
te de ti mesmo e lança-te nos braços de Deus”.

1.27 Repita consigo, então: “Senhor Jesus, eu


lhe prometo que vou morrer e morrer até que
não haja mais NADA em mim que o ofenda.
Não poderia mais conviver comigo mesmo,
sabendo que o próprio Deus se fez homem
pela minha conversão e que, no lugar de
tomar o meu lugar de choro, juntamente com
Maria aos pés da Cruz, eu tenho agido como o
soldado que martela os pregos cada vez mais
fundo em sua carne.

1.27 Não quero ser aquele que zomba da tua


cruci cação. Aquele que te conduz ao
Calvário e te prega na Cruz novamente todos
os dias, rindo da tua desgraça. Não é possível
mais viver feliz sabendo que eu tenho
rejeitado quem mais me amou e cuspido na
face de quem deu a vida por mim. Essa
história de amor terá um nal feliz, eu te

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prometo e, com a sua ajuda poderosa, eu vou
conseguir. Amém.”

1.28 Prepare-te, soldado, pois a guerra ao


pecado está declarada e tu foste convocado
para defender a bandeira do Reino dos Céus!

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2. DO AMOR

2.1 Deus é amor.

2.2 Ouvimos essa frase com certa frequência.


Talvez a repetição em certos casos tenha o
efeito negativo de banalizar o sentido das
coisas. De tornar comum.

Mas medite no signi cado isso: Deus é


2.3
amor e o amor é Deus.

2.4 Será que realmente compreendemos o que


é Deus? Será que realmente sabemos o que é o
amor?

2.5 Quando um jovem enamorado diz “eu te


amo” para a sua amada, ele está na verdade
dizendo: “Isso que temos entre nós é a
manifestação de Deus”.

2.6 Esse jovem está enganado. Ele não ama a


sua namorada. Ele tem sentimentos por ela
que ele confunde com amor.
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2.7 Quantos são os que se confundem dessa
maneira? Incontáveis. Há também os que
chegam ao m da vida sem sequer darem-se
conta de que não sabiam amar ou que nunca
foram amados verdadeiramente.

2.8 Contudo, se o propósito de vida é estar


com Deus na eternidade, precisamos nos
assemelhar a Ele para salvar o nosso lugar no
Reino dos Céus.

2.9 Para isso, há de se buscar a santidade. E


não há santidade sem conhecer e vivenciar o
verdadeiro amor de Deus.

2.10 Amor não é um sentimento.

2.11 Há quem diga que é um sentimento, mas,


essas pessoas estão enganadas.

2.12Há quem diga também que o amor é uma


decisão que tomamos. Estão igualmente
enganados.
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2.13 O amor é uma pessoa! Jesus Cristo.

2.14 E para sermos capazes de amar


verdadeiramente só há UM caminho: a
imitação do Nosso Senhor.

2.15 Jesus foi aquele que amou o mundo de


tal maneira que, mesmo sabendo que seria
rejeitado e assassinado, se doou pela
humanidade.

2.16 Mesmo sabendo que os homens não


mereciam tamanho sacrifício, não deixou de
fazer absolutamente nada que estava no plano
do Pai. Ele simplesmente FEZ, porque era o
certo, porque era o que deveria ser feito e não
porque merecíamos. Ele se doou e se
entregou.

2.17 Deus nos amou primeiro.

2.18 Deus deu o primeiro passo.

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2.19 E Deus foi rejeitado.

2.20 O homem, pois, diria: “Basta. Não vale a


pena. Não merecem o meu amor.”

2.21 Mas, o homem não sabe amar. Deus, por


outro lado, deu o segundo e o terceiro passo,
dizendo: “Não tem problema. Você vira as
costas para mim, mas Eu vou te amar duas
vezes mais… três vezes mais, se preciso for.”

2.22 Resultado nal: foi rejeitado de novo.


Pregaram o seu Filho em uma cruz, mataram-
no como o pior dos ladrões e assim
continuamos a fazer todos os dias a cada
pecado que cometemos.

2.23 Mas o amor verdadeiro, como diz São


Paulo: “Tudo sofre, tudo crê, tudo espera,
tudo suporta”. (1 Co 13,7)

2.24 Quantas vezes nós não desistimos de


amar porque o outro, ao nosso ver, “não
merecia”? Quantas vezes não endurecemos o
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nosso coração porque fomos rejeitados ou
feridos?

2.25 Pobre homem. Quão fraco pode ser?

2.26 Se o amor funcionasse assim, a


humanidade estaria condenada, pois Deus já
teria desistido de nós há muito tempo.

2.27 Mas Ele se revela aos seus lhos amados


para mostrar o modelo e nos convida a ser
mais como Ele.

2.28 Por acaso, ao rezar o Pai Nosso, a oração


que Jesus nos ensinou, não rogamos a Deus
para que nos perdoe e nos ame assim como
nós temos perdoado e amado aos nossos
irmãos? Será que, agora, estaríamos bem ou
mal, se Deus decidisse olhar para nós com o
mesmo rigor com que temos olhado aos
outros? Se Ele decidisse realmente impor a
nós a mesma régua que impomos aos demais?

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2.29 Dizemos que queremos amar, mas basta
que o outro não satisfaça adequadamente a
nossa expectativa que já desistimos. Estamos
servindo ao orgulho e não ao amor.

2.30 E lembrem-se para quem o orgulho


trabalha.

2.31 Agimos assim porque, na verdade, não


s a b e m o s a m a r. E s t a m o s s e m p r e
condicionados a buscar a fatídica satisfação
pessoal.

2.32 Queremos amar porque isso nos trará


benefícios. As pessoas nos amarão de volta.
Seremos lembrados como alguém bondoso e
por isso nos elogiarão, o que alimentará o
EGO.

2.33 Seremos bons para com os outros, pois


assim os outros também serão bons conosco.
E, na medida em que eles não são, morrem
para nós.

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2.34 “Fui traído!” — esbravejamos — “Como
pôde atentar contra mim desta forma? Não
falarei mais com ela a não ser que se humilhe
pedindo perdão.”

2.35 Ora, Deus — que é o Todo Poderoso


criador do céu e da terra — não só NÃO exige
isso de nós, mesmo depois de ter sofrido o
que nenhum ser humano jamais suportaria
sofrer, como ainda por cima está sempre
pronto para nos receber de volta, com um
sorriso no rosto e um abraço caloroso.

2.36 Deus não se faz de difícil. Não se coloca


em um pedestal (embora Ele muito o
merecesse). Por que tu ou eu haveríamos de
agir assim?

2.37Por acaso somos maiores ou mais dignos


do que o próprio Deus? Pobre homem.
Quanta soberba há em seu coração…

2.38 O amor não é nada disso. O amor é uma


pessoa!
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2.39 E, por isso, devemos imitar essa pessoa.

2.40 A frase que mais deve estar na ponta da


língua de qualquer cristão é: “O que Jesus
faria agora, em meu lugar?”. Questione-se
dessa forma em toda situação e verá que a sua
vida mudará de ponta cabeça.

2.41 Não espere que o próximo mereça o teu


amor. Nem espere que tu sintas vontade de
amá-lo.

2.42 Ame antes dele merecer. Ame antes de


sentirdes vontade. Pois, que mérito podemos
ter em amar a quem nos ama?

2.43 Até mesmo as piores pessoas conseguem


amar a quem as ama. O cristão veio ao mundo
para ser diferente, para conseguir o
improvável, para causar constrangimento,
para confundir as cabeças e dar testemunho
de que o poder de Deus é capaz de realizar o
impossível.
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2.44 Os nossos sentimentos são passageiros.
Não demos, portanto, tanta importância para
eles.

2.45 Tanto os melhores quanto os piores


sentimentos nunca duram. Se sentimos afeto
por alguém, se sentimos desejo da companhia
de alguém, se sentimos um chamado para
fazer o bem a tal pessoa, que nós
correspondamos a esses sentimentos!

2.46 Mas, tomemos cuidado para não


condicionar as nossas ações a tais sensações,
pois, de certo, chegará o dia em que elas se
ausentarão.

2.47 Mesmo a mais saborosa iguaria enjoará


o teu paladar se tentares comer seis ou sete
dela e a mais divertida das atividades poderá
se tornar monótona após a décima vez.

2.48 Como procederá, então, o homem que


baseia as suas ações nos sentimentos?
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2.49 De certo, ele poderá comer outra coisa
ou revezar as atividades para que não voltem
a enjoá-lo. Mas, amar… praticar a caridade…
obedecer a Deus… quanto a isso ele não tem
escolha. Não há alternativa.

2.50 Compreendamos de uma vez: enquanto


os sentimentos são favoráveis, NÃO
AMAMOS.

2.51 Estamos, simplesmente, buscando o


prazer pessoal de experimentar mais e mais
daquela sensação que produz reações
químicas agradáveis em nosso cérebro.

2.52 Ninguém diz comer um deleitoso


alimento por amor ao alimento. Seria risível
que propuséssemos tal inversão. Amamos
apenas o prazer que ele nos proporciona e
ponto.

2.53 Quando falamos de atividades,


igualmente. Dizemos, por exemplo, amar o
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determinado passatempo, quando na verdade
amamos a nós mesmos.

2.54 Amamos tanto que buscamos fazer mais


e mais daquilo que nos traz prazer e
satisfação. Se as condições mudarem e isso
deixar de ser divertido, o homem que há cinco
minutos dizia amar a sua atividade preferida,
mudará de recreação sem o menor peso na
consciência.

2.55 Por outro lado, é quando falamos do


afeto relacionado a um outro ser humano que
tudo ca nebuloso de vez. Pois, como foi dito,
não podemos substituir pessoas conforme
substituímos as outras coisas da vida.

2.56 Amigos, colegas, namorados, cônjuges e


familiares proferem juras de amor eterno…
até a página 2.

2.57 Amamos, na verdade, a sensação de ter


alguém para nos acompanhar. Com quem
podemos fazer planos e que nos distraia
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quando estamos solitários. Amamos a
existência de pessoas, em quem enxergamos a
capacidade de satisfazer alguma lacuna de
necessidade em nossas vidas — seja ela qual
for. Podemos dizer que amamos, na verdade,
a utilidade daquele indivíduo.

2.58 Amamos saber que existem pessoas que


nos admiram e que nos têm com grande
estima, por isso, tentamos ser mais e mais
bondosos para com elas pois sabemos que,
assim, seremos cada vez mais valiosos aos
olhos alheios e, consequentemente,
recompensados nessa mesma medida.

2.59 Ego! Buscamos ser o melhor marido, a


melhor esposa, o melhor amigo, o melhor isso
e aquilo, apenas porque desejamos que o
destinatário do nosso “amor” nos perceba
como a melhor pessoa do mundo. A mais
incrível e fantástica.

2.60Queremos ser únicos na vida das pessoas


com quem convivemos. Buscamos “deixar
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saudades”, marcar a memória delas e fazê-las
desejarem a nossa companhia.

2.61 No fundo, temos a pretensão de fazer


com que essas pessoas jamais consigam se
sentir tão bem na presença de outras pessoas,
como se sentem conosco, para que assim
possam depender de nós.

2.62 Já imaginou vislumbrar a hipótese de


uma pessoa ser feliz sem precisar da gente?

2.63 Que terrível afronta para o homem que


necessita ter o seu ego afagado e condiciona a
sua realização pessoal a isso!

2.64 Re ita sobre as reais motivações que


levam o ser humano a manter uma postura
aparentemente amorosa e chegue à conclusão
de que muito poucos são aqueles que
realmente conheceram o amor altruísta.

2.65 Nós não amamos desinteressadamente.


E como poderíamos? Desde a infância somos
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ensinados que amor se resume a um beijo
acalorado em nal do lme ou na utopia de
um “felizes para sempre”. Ninguém nos
explicou que o amor não era nada disso!

2.66 Quem não ama desinteressadamente


também não é capaz de ser verdadeiramente
LEAL. Tudo o que essa pessoa faz é para se
certi car de que a sua fonte de sensações
prazeirosas esteja garantida.

2.67 Não queremos correr riscos de perder


algo tão essencial. Por isso, cuidamos de
nossas relações como quem cuida de um
animal de estimação: alimentamos e zelamos
para que, quando o quisermos, ele esteja apto
a nos entreter e alegrar. Da mesma forma, o
homem tem pavor de sentir-se solitário,
desprezado e sem valor. Por isso, mantém a
relação com as pessoas a sua volta para
usufruir da utilidade que cada uma pode ter
na sua vida.

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2.68 Mas, na medida em que os sentimentos
se ausentam — eles sempre se ausentam mais
cedo ou mais tarde —, a pessoa recorre a essas
fontes, ou seja, a mesma fonte de sensações
prazeirosas de antes, e não recebe mais os
mesmos estímulos. Logo, ela tende a procurar
outra fonte, porque ela se viciou em satisfazer
a ela mesma.

2.69 A fonte passou esse tempo todo


acreditando na ilusão de que era amada. Mas,
quem a visitava todos os dias só estava
interessado na água que ela oferecia. Acabou a
água… fonte inútil!

Mudam os interesses, muda-se também a


2.70
LEALDADE.

2.71 Da mesma forma, devemos cuidar para


construir o nosso relacionamento com Deus
sobre o amor verdadeiro e não sobre os
sentimentos que essa relação nos propicia.

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2.72 Muitos são os que vão à igreja atrás de
sentimentos. De sensações…

2.73 Querem sentir-se em dia com o seu dever


religioso. Querem sentir-se em paz após ouvir
as pregações que lhes convencem de que Deus
está cuidando de tudo. Querem sentir-se
emocionados com a música, com as repetidas
a r m a ç õ e s c o n s o l a d o r a s . Q u e re m s e
impressionar com a agitação do local… e a
isso não hesitam em dar o nome de unção.

2.74 Ora, a mente humana é feita de reações


físicas cerebrais.

2.75 O que muitos sentem, ao ir à igreja em


um domingo e presenciar essa “unção”
fabricada por instrumentos musicais e altas
vozes, é — por vezes — exatamente a mesma
coisa que um jovem sente ao se envolver na
energia da multidão em meio ao show da
banda que ele idolatra. É o mesmo que o
torcedor sente quando está na arquibancada,
envolto pela massa eletrizante e colocando
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todas as emoções para fora em prol do seu
time de futebol.

2.76 Se vou à igreja atrás de experimentar


dessa energia e, ao sentir tais sensações, logo
as apelido de unção, julgo imediatamente
estar na presença do Espírito Santo, não
estaria eu me enganando em relação à
experiência do amor de Deus, quando, na
verdade, estou apenas estimulando a minha
própria necessidade de sentir prazer e boas
sensações?

2.77 Desconhecemos os motivos de Deus para


tantas coisas, mas, o fato é que pessoas
comuns e até mesmo grandes santos já
viveram períodos de silêncio de Deus que
chegaram a perdurar por anos.

2.78 Madre Teresa de Calcutá no auge do seu


apostolado se queixava com Deus pelos seus
frequentes “sumiços”. O que, diante de tal
contradição, faria um cristão que rmou a sua

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relação com Deus nos sentimentos auspiciosos
que sentia?

2.79 Certamente, a vida desta santa mulher


nos ensina que amar não é sentir. Amar é
NÃO SENTIR e fazer mesmo assim.

2.80 Da mesma forma como o tempo da


provação passou para ela, passará também
para todos. Contudo, quem o sabe aproveitar
como oportunidade de evoluir na fé, chega ao
seu m muito mais maduro e mais próximo
de Deus. Diferente dos que basearam suas
ações nas emoções que sentiam e que, agora
— nos tempos silenciosos do deserto —,
muito provavelmente, tiveram que abandonar
a fé.

2.81 Igualmente, inúmeros são os que vão à


igreja para viver bem.

2.82 Querem as bênçãos do Altíssimo.


Perseguem as curas e a libertação. Temem os
dias difíceis que podem vir pela frente e por
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isso se apegam à prática religiosa, na
esperança de que Deus os livre das tormentas,
proteja-os dos inimigos e os ajude
pro ssionalmente.

2.83 E ainda dizem estar na igreja por amor à


Deus.

2.84 Pergunte-se e investigue no seu interior:


O que REALMENTE te faz sair de casa e ir à
igreja? O que REALMENTE te faz orar? Será
que se tu já tivesses absolutamente TUDO o
que desejas na tua vida, ainda assim estarias
tão apegado e dedicado à Deus? Ou será que
o teu fervor é fruto do interesse pessoal que
há em participar das promessas que Ele fez?

2.85 Talvez seja por isso que Deus fez as


promessas.

2.86 Porque Ele nos ama e sabia que, se não


fossem as recompensas, talvez o homem
jamais se interessaria em buscá-lo de volta.

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2.87 Mas, “não tem problema” — diz Ele —
“eu sou Deus e mesmo assim me humilho
pelo amor dos meus lhos”.

2.88 Te r í a m o s c o n d i ç õ e s d e a m á - l o
simplesmente por quem Ele é? Por admiração
da glória que é ser o criador do céu e da terra?
Por ter nos colocado neste mundo e permitido
que tenhamos tudo o que precisamos para
viver?

2.89 Por reger o universo dia e noite, ter


idealizado todas as maravilhas da natureza e
oferecido tudo o que há no planeta para servir
ao homem, o seu projeto mais precioso?

2.90 Seríamos capazes de continuar


freqüentando a igreja quando as sensações de
prazer por estar ali diminuem com o tempo?
Seríamos capazes de continuar dobrando os
joelhos ao chão e abrindo o coração a Deus, se
parássemos de sentir a sua presença?

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2.91 Seríamos capazes de continuar rmes na
vivência do ideal cristão, mesmo se a
motivação sumisse e passássemos a nos sentir
atraídos por um outro objetivo?

2.92 Amor é ter a certeza de que não importa


o que nos ofereçam, pois, não trocamos aquilo
que temos por nada. Seríamos capazes de
continuar éis a Deus mesmo que nos
oferecessem todo o dinheiro, saúde e poder
do mundo? Se a resposta for sim, então,
podemos dizer que o amamos de verdade.

2.93 Caros irmãos, quem constrói a sua casa


sobre as vigas da emoção, está fadado a
perdê-la nas primeiras ventanias.

2.94 Nós não sabemos amar. Mas, felizmente,


olhando para Deus nós podemos aprender!

2.95 E Ele nos diz que o amor não é um


sentimento. O amor é uma pessoa que entra
em cena para nos suprir, justamente quando

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os sentimentos ACABAM. Quando eles se
ausentam ou quando eles não existem.

2.96 Se não temos prazer em amar alguém, se


não temos desejo de praticar o bem em favor
do próximo, GLÓRIA A DEUS.

2.97 Porque, se tivéssemos prazer nisso, que


mérito teríamos?

2.98 Quando é difícil, quando é duro e


desconfortável, quando contraria todas as
nossas vontades pessoais, aí é que o amor
demonstra QUEM ele é!

2.99 Porque o amor verdadeiro (Deus) é a


única coisa capaz de fazer um ser humano
agir contra a sua vontade, matar o seu desejo,
reprimir os seus instintos e colocar a
satisfação, o interesse e o bem do outro acima
do seu.

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2.100 Se pararmos para analisar friamente,
esse comportamento contraditório não faz o
menor sentido.

2.101 Mas, é assim mesmo. Enquanto nós


estamos logicamente compreendendo tudo,
estamos fazendo as coisas ao modo dos
homens; mas quando passamos a não
entender mais nada, é porque atingimos as
coisas de Deus, que por vezes parecem
loucura aos olhos do ser humano!

2.102 En m, nas palavras de Santa Teresa


d’Ávila: “É justo que muito custe o que muito
vale”. Portanto, se o objetivo é o céu,
conheçamos a face do amor verdadeiro que é
Cristo Jesus, o ÚNICO caminho para lá
chegarmos.

Meditação:

2.103 Para começar a se familiarizar com o


amor verdadeiro, temos que exercitar uma
única tarefa: manter uma atitude amorosa
34
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independente de nos sentirmos compelidos a
agir de tal forma ou não.

2.104 Principalmente quando não sentimos, aí


é que estamos amando.

Na próxima vez em que o colega lhe


2.105
importunar, não esbraveje com ele. Atenda-o
com paciência quantas vezes forem precisas.

2.106 Isso treinará os seus instintos a ter maior


resistência.

2.107 Quando sentir que está sem vontade de


amar alguém — exemplo: o cônjuge que lhe
tira do sério, o amigo que o ofendeu, os pais
que não lhe compreendem et cetera — reúna
todas as suas forças, diga para si mesmo “eu
preciso aprender a amar” e ame essa pessoa
duas vezes mais.

2.108De certo, tal atitude surpreendente


quebrará o coração de pedra que o outro

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porventura possa ter e dará um novo rumo à
situação, favorável aos dois.

2.109 Não tenha medo de demonstrar amor


para alguém que, ao seu ver, “não merece” ou
está deliberadamente querendo lhe ferir.

2.110 Quem planta esse receio em nosso


coração é o Ego. Somos orgulhosos pois não
queremos “nos rebaixar”, mas esta é apenas a
visão pobre do homem sobre as coisas.

2.111 Quem disse que estaríamos nos


rebaixando ao amar alguém que nos fere?

2.112 Será possível existir fortaleza maior do


que alguém que é capaz de agir com tamanha
nobreza de pagar a agressão com amor?

2.113 Esse homem não está se diminuindo em


nada. Ele certamente é o maior e mais forte de
todos os homens, pois as suas ações não estão
condicionadas aos sentimentos.

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2.114 Ele não é um escravo dos seus instintos
que o forçam a ter atitudes que vão contra os
seus próprios interesses e lhe afastam do céu.

2.115 Esse homem é livre para obedecer a


Deus. Para fazer o que é CERTO e o que é
moralmente melhor para ele, mantendo o foco
no propósito da vida que é a salvação através
do amor a Jesus Cristo e ao próximo.

37
ORAÇÃO DO PAPA CLEMENTE XI
————————————————————
Para rezar e meditar. Cada linha dessa oração possui
um pedido a Deus, tanto quanto uma orientação para
nós, que aponta na direção em que devemos progredir.
————————————————————

Meu Deus, eu creio em vós, mas forti cai a


minha fé. Espero em vós, mas tornai mais
con ante a minha esperança. Eu vos amo, mas
afervorai o meu amor. Arrependo-me de ter
pecado, mas aumentai o meu arrependimento.

Eu vos adoro como primeiro princípio, eu vos


desejo como m último. Eu vos louvo como
benfeitor perpétuo, eu vos invoco como
benévolo defensor. Que vossa sabedoria me
dirija, vossa justiça me contenha, vossa
clemência me console, vosso poder me
proteja.

Meu Deus, eu vos ofereço meus pensamentos,


para que eu só pense em vós. Minhas
palavras, para que eu só fale em vós. Minhas

38
fi
fi
fi
ações, para que elas sejam do vosso agrado.
Meus sofrimentos, para que eles sejam por
vosso amor. Quero o que quiserdes, o que
quereis, como o quereis e enquanto o quereis.

Senhor eu vos peço: iluminai minha


inteligência, in amai minha vontade, puri cai
meu coração e santi cai a minha alma. Dai-
me chorar os pecados passados, repelir as
tentações futuras, corrigir as más inclinações e
praticar as virtudes do meu estado.

Concedei-me, ó Deus de bondade, ardente


amor por vós e aversão por meus defeitos,
zelo pelo próximo e desapego do mundo. Que
eu me esforce para obedecer aos meus
superiores, auxiliar os que dependem de mim,
dedicar-me aos amigos e perdoar os inimigos.

Que eu vença a sensualidade pela


austeridade, a avareza pela generosidade, a
cólera pela mansidão e a tibieza pelo fervor.
Torne-me prudente nas decisões, corajoso nos
perigos, paciente nas adversidades e humilde
39
fl
fi
fi
na prosperidade. Fazei Senhor, que eu seja
atento na oração, sóbrio nos alimentos,
diligente no trabalho e rme nas resoluções.

Que eu procure possuir pureza de coração e


modéstia de costumes, um procedimento
exemplar e uma vida reta. Que eu me aplique
sempre em vencer a natureza, colaborar com a
graça, guardar os mandamentos e merecer a
salvação. Aprenda convosco como é pequeno
o que é da terra, como é grande o que é
divino, breve o que é desta vida e duradouro
o que é eterno. Dai-me preparar-me para a
morte, temer o dia do juízo, fugir do inferno e
alcançar o paraíso.

Por Cristo Nosso Senhor.


Amém.

40
fi
3. DA PRUDÊNCIA

3.1 A primeiríssima virtude, a qual Santo


Agostinho chama de virtude-mãe, é a
Prudência.

3.2 Virtude-mãe, pois, a Prudência é a


sabedoria que de ne a medida de todas as
coisas e permite que nós saibamos nos
posicionar em cada situação.

3.3 Ela nos permite agir com cautela e com


razão, protegendo-nos de nós mesmos.

3.4 O Catecismo da Igreja Católica nos ensina


que “a Prudência dispõe a razão para
discernir, em todas as circunstâncias, o
verdadeiro bem e a escolher os justos meios
para o atingir. Ela conduz a outras virtudes,
indicando-lhes a regra e a medida”. (CIC nº
380)

41
fi
3.5 O indivíduo imprudente é aquele que se
exaspera diante dos acontecimentos e se
precipita em respondê-los.

3.6 Reage conforme os seus impulsos. Seja


positivamente, seja negativamente, a reação
impulsiva tende a realizar comportamentos
impensados, que não maturaram, e que,
portanto, são apenas respostas aleatórias que
o nosso insconsciente externaliza.

3.7 O indivíduo prudente dá um passo atrás.


Silencia. Não reage até que tenha a situação
por compreendida verdadeiramente.

3.8 Dizem, ainda, que a nossa opinião sobre


algo vale o tanto de tempo que nós
demoramos para formá-la, analisando todas
as perspectivas, estudando as variáveis e
possibilidades. Reunindo o maior número de
dados e informações.

3.9Permitindo que a percepção inicial assente


com calma e seja lapidada pelos minutos,
42
horas, dias ou anos seguintes — dependendo
do caso.

3.10Quanto menor é o tempo entre o ocorrido


e a sua referente resposta (seja uma reação
pessoal, a emissão de um juízo ou o
fechamento de uma opinião) maior é o risco
dessa resposta ser equivocada e trazer
consequências negativas.

3.11O imprudente se precipita em tomar por


compreendida toda a situação e julga ter
capacidade de responder a ela de forma
adequada logo nos primeiros segundos.

3.12Ora, convivemos com a nossa própria


pessoa desde o momento do nascimento e,
ainda assim, vivemos aprimorando a noção
que temos de nós mesmos, re nando o nosso
olhar para atentar a detalhes da personalidade
antes desconhecidos e nos compreendendo
cada vez melhor.

43
fi
3.13 Não seria por deveras temerário pensar
que qualquer outra coisa alheia ao nosso
próprio ser seja de entendimento tão fácil,
considerando o mistério que ainda somos,
mesmo depois de décadas convivendo com
nós mesmos 24 horas por dia?

3.14 Por isso, o prudente tarda em reagir. E,


também por isso, São Francisco de Salles
ensinava: “É preciso fazer um contrato com a
língua, de não falar quando o coração estiver
agitado”.

3.15 O prudente não é omisso, nem é


negligente.

3.16 Pelo contrário, a sua não ação fala mais


do que a possível ação e ela diz que o erro
custa caro. Que um mal julgamento causa
prejuízos por vezes irreparáveis e a ação
precipitada, danos maiores do que a eventual
ação tardia.

44
3.17 O prudente é humilde. A sua intervenção
tem o caráter de entrar em cena
exclusivamente com o propósito de dar um
bom conselho, de estender uma mão amiga,
de fazer o bem, de MELHORAR a situação.

3.18 Se for para piorar, a sua intervenção é


inútil e dispensável.

3.19 Mais do que isso, é um instrumento do


diabo que se aproveita da brecha aberta pelo
imprudente para tripudiar em cima dos lhos
de Deus e que vê, na sua imprudência, na sua
intempestividade, na sua impulsividade, uma
forma de potencializar a confusão, as mágoas,
a depressão, os problemas.

3.20 O imprudente é descuidado a ponto de


sequer perceber o seu papel de assistente do
diabo. De auxiliador, nas suas tramas e
confusões.

3.21 Sua mente agitada não silencia por um


segundo, a ponto de permitir que os seus
45
fi
pensamentos sejam colocados em ordem no
fundo da sua mente. Está sempre fervilhando,
borbulhando, autocentrada em seus próprios
julgamentos e opiniões.

3.22 Ele bate a cabeça pela vida afora pois se


comporta como um atordoado que não
raciocina antes de agir.

3.23 Ele fala demais e ouve de menos. Ele


reage demais e analisa de menos. Ele conclui
demais e pergunta de menos.

3.24 Se agisse diferentemente, teria tempo e


espaço para descobrir quem tem sido o seu
patrão. Quem tem sido bene ciado com os
estilhaços provocados pelas suas atitudes
intempestivas.

3.25 O mesmo homem que é capaz de


trabalhar como um burro de carga em nome
de uma empresa irrita-se por ter que ajudar a
esposa em casa. A mesma mulher que suporta
inimagináveis desaforos na rua perde o
46
fi
controle das emoções diante do menor
desagrado possível vindo do seu marido.

3.26 Os dois são capazes de repetir a mesma


apresentação incontáveis vezes em prol dos
seus empregos, mas perdem a paciência
quando têm que explicar alguma coisa ao
lho mais de uma vez em casa.

3.27 Por que essa diferença? Por que o


controle pleno das emoções dá lugar a um
pavio tão curto, tão facilmente?

3.28 Porque, no trabalho, a punição para a


rebeldia é o desemprego e a falta de dinheiro.
Fora dele, há no máximo uma mágoa da outra
pessoa, que — esperamos — logo passa.

3.29 Aproveitamos da situação em que o lho


não tem como deixar de ser nosso lho, os
pais não podem deixar de ser nossos pais e os
cônjuges — em tese — também não podem
deixar de ser marido e mulher.

47
fi
fi
fi
3.30 Já no trabalho, basta um deslize para que
o patrão troque o sujeito pelo primeiro que
aparecer na sua frente.

3.31 Se somos capazes de nos controlar tão


e cientemente por dinheiro, temos que ser
capazes de fazer o mesmo por amor.

3.32Aguentando, sofrendo, suportando e


SERVINDO. É assim que se prova o amor
verdadeiro nos moldes de Deus.

3.33 E não é possível agir assim sem


desenvolver a virtude da Prudência.

3.34 Sem controlar a língua, os impulsos e o


temperamento. Sem aprender a ser MANSO e
humilde, como Jesus.

3.35 Sem se manter focado no propósito da


vida, quando as pequenas oportunidades
surgem no dia a dia para que sejamos úteis a
alguém, para que sirvamos ao próximo, para
que acrescentemos algo de bom à vida dos
48
fi
que nos cercam, para que façamos uma boa
ação, tenhamos um gesto de cuidado e
carinho, seja para alguém da nossa intimidade
ou desconhecido.

3.36 O imprudente não tem visão. Ele olha


para essa situação e vê uma inconveniência,
algo que o está incomodando. Ele só quer car
no conforto da sua inutilidade e do seu
egoísmo, que permite apenas que ele faça
aquilo que lhe trará benefícios pessoais. Ele só
faz o que traz satisfação para ele.

3.37 Não entende que o propósito da vida não


é viver para si mesmo, mas para Deus. E que,
para viver para Deus, temos que buscar
honrá-lo através da vida dos nossos irmãos;

3.38 Onde Ele se faz presente todos os dias,


esperando que nós sejamos uns para com os
outros aquilo que estaríamos mais do que
dispostos a ser, caso o próprio Cristo
aparecesse em nossa frente.

49
fi
3.39 Se faríamos por Cristo, por que não
faríamos igualmente pelo próximo? Se
seríamos capazes de lavar os pés de Jesus e
lhe preparar um belo um banquete, por que
não nos dedicaríamos igualmente ao que
mora ao nosso lado dia e noite?

3.40 Acaso não lembramos da vez em que


fomos exortados pelo próprio Jesus (Mt 25,
40): “Quando o fazes a um destes irmãos, a
mim o zestes”?

3.41Queres salvar o mundo enquanto tua casa


está em ruínas? Queres agradar a Deus
enquanto despreza quem está ao teu lado? A
melhor forma de salvar o mundo e agradar a
Deus é cumprindo o nosso papel nessas
pequenas coisas que Ele nos con a.

3.42 Quanto mais competentes formos como


funcionário, patrão, amigo, pai, mãe, lho,
marido, esposa, menos o mundo precisará de
heróis que o salvem.

50
fi
fi
fi
Meditação:

3.43 Para treinar a Prudência, busque, a partir


de agora, conter os seus impulsos mais
corriqueiros.

3.44 Aqueles mesmos impulsos e desejos que


já estão enraizados no âmago da nossa
personalidade e que, possivelmente,
acreditamos já ser parte do nosso caráter.

3.45Não são parte de coisa alguma. São


produtos do desleixo que imperou até hoje.
Apenas até hoje e nenhum dia a mais!

3.46 Dê pequenos passos. Evolua em um dia


de cada vez e se comprometa, pelas próximas
24 horas, a não mais:

● 3.47 Emitir julgamentos. Não importa se o


julgamento é correto ou não. Se o alvo
merece aquela crítica ou não.

51
3.48 Se não houver nada de POSITIVO a ser
dito, então não diga nada.

3.49 Controle a língua. Reprima o Ego. A sua


opinião não tem essa importância toda que
você dá a ela.

3.50 Ninguém sentirá falta do seu comentário


malicioso se você decidir silenciar.

3.51Procure identi car o que há por trás desse


comportamento. O que te leva a tão
apressadamente soltar a língua para maldizer
alguma coisa ou alguém, se não a ânsia do
Ego em lhe fazer sentir superior em relação ao
alvo da crítica?

3.52 No mínimo do mínimo, tens o péssimo


defeito de ser juiz da vida alheia, crítico e
reclamão. O que te faz igual ao pior do que o
alvo da crítica.

52
fi
3.53 Silencie. Não disfarce, chamando isso de
“crítica construtiva”, ou diga que você fala a
verdade pois tem a qualidade da franqueza.

3.54 Se o patrão pedisse a tua opinião sobre o


terrível almoço que foi preparado para lhe
receber, você certamente guardará a língua,
pois teme que a sua tão prezada franqueza te
leve a perder o emprego.

3.55Guarde-a, portanto, também, quando


quem tem algo a perder é o outro e não você.

● 3.56 Reclamar. Re ita: reclamar é um dos


comportamentos mais inúteis do ser
humano. Santo Padre Pio de Pietrelcina já
dizia: “Reza e espera. Não te agites. A
agitação é inútil!”.

3.57 De fato, no fundo, esse hábito se dá


muito em função da mentalidade paternalista
que assola a sociedade contemporânea e faz
os seus integrantes crescerem acreditando que
merecem ser felizes, ter uma bela casa, viver
53
fl
em um mar de rosas, ter um amor de cinema,
um salário generoso et cetera, pelo simples fato
de eles serem quem eles são.

3.58Ser feliz não é um direito. Jesus não


prometeu felicidade nessa vida a ninguém.

3.59Realizações de vida não são direitos. A


sociedade não nos deve coisa alguma,
tampouco o governo, tampouco aqueles que
nos cercam.

3.60 Entretanto, o indivíduo acredita piamente


na falácia de que é obrigação da sociedade lhe
garantir dignidade, bens e acesso ao que ele
quiser, ao preço de serem taxados de
malvados exploradores se assim não o
zerem.

3.61Da mesma forma, estão sempre na


procura de mais pessoas, nas costas das quais
poderão assentar os seus fardos. Não hesitam
em querer compartilhá-lo com os pais,
amigos, namorados, colegas…
54
fi
3.62 Não é justo. As outras pessoas já têm os
delas, não queira ser um estorvo a mais. Que
cada um enfrente a sua vida e assuma a sua
responsabilidade por ela.

3.63 Um adulto mimado, desacostumado com


a ideia de que o único responsável pela sua
vida é ele mesmo e mais ninguém, tende a ser
reclamão, pois incorpora o vício da
murmuração diante dos contratempos
corriqueiros da vida, na esperança de que
alguém surja, e, com uma dó profunda de ver
essa pessoa tão maravilhosa sendo injustiçada
pelo destino, oferecerá ajuda e resolverá o
problema no lugar dela.

3.64 Por isso, almejamos as consolações,


desejamos ocupar o posto de vítima e nos
reconfortamos com o sentimento de pena, tão
intensamente. E para quê? De que nos servem
todas essas enganações?

3.65É o nosso inconsciente acreditando


cegamente no ditado popular: “Quem não
55
chora, não mama”. Isso pode fazer sentido
para os recém-nascidos que não sabem se
comunicar e são seres extremamente
dependentes de terceiros, contudo, entre os
adultos, o reclamão que choraminga estará
apenas incomodando os outros e criando um
problema extra para si.

3.66 A criança precisa dessa ferramenta da


reclamação, pois ela não tem a mínima
capacidade de realização, sequer para
satisfazer suas necessidades básicas. Logo, ela
aprendeu a sinalizar sua insatisfação e esperar
que algum adulto a socorra.

3.67 Porém, muitos são os que crescem e


continuam com tal mentalidade. Ao passo em
que já deviam ter trocado de papel nesta
dinâmica e ser, agora, as pessoas que
efetivamente socorrem, ainda permanecem
lançando ao mundo os seus sinais — em
forma de reclamação — esperando que
alguém resolva os seus problemas e elimine as
suas di culdades do dia a dia.
56
fi
3.68 Acredite: ninguém vai aparecer.

3.69Nossos problemas são apenas nossos e de


mais ninguém.

3.70 Ninguém, de fato, tem obrigação de se


importar com eles e a reclamação só torna
tudo pior: além continuar com o problema a
ser resolvido, as demais pessoas ainda
quererão se afastar o quanto antes do
intragável reclamão que deseja partilhar o seu
problema entre os que o cercam.

3.71 Comece com as pequenas coisas do dia e


elimine esse vício terrível: seu celular está sem
bateria? Evite exclamar um “mas que droga!”.
Saíste mais tarde e pegaste trânsito no
caminho? Já vais chegar atrasado de todo
jeito, então reclamar não vai ter o poder de te
teletransportar para onde deves estar. Caiu
molho na camiseta? Solte uma risada, a
exemplo do que farias se o mesmo
acontecesse com um colega teu.
57
3.72 Tr e i n e d i a n t e d e s s e s p e q u e n o s
contratempos e vá evoluindo ao ponto de
assimilar o seguinte: o que é, é… e o que não
é, não é. Simples assim.

3.73 Reclamar não tem poder de mudar isso.


Nem de resolver problemas. Apenas faça o
que cada situação exige que seja feito e ponto
nal. Se aprendermos a simpli car as nossas
reações, os problemas também tornar-se-ão
menores automaticamente.

3.74 Ao contrário, muito sofremos por fazer


exatamente o inverso. Reagimos de forma
desproporcional às situações e a
transformamos em problemas maiores do que
são.

3.75 Se algo não vai fazer diferença na tua


vida daqui a 1 ano, não perca mais do que 1
minuto preocupado com aquilo. Tiremos o
foco tanto do momento presente e invertamos
a lógica. Se o mundo diz que o futuro é uma
58
fi
fi
ilusão e só temos o agora, pense: na verdade,
a eternidade é a única coisa real, tudo o mais
que vivemos hoje é que vai passar, é que vai
ser tirado, é que vai sumir com o tempo, é que
vai se tornar ilusão.

3.76 “Quem se queixa ou murmura não é


cristão perfeito, nem mesmo um bom cristão”
— São João da Cruz.

3.77 Se precisar, se o problema for muito


difícil, ofereça o sacrifício a Deus dizendo:
“Deus, eu lhe agradeço por este problema,
mesmo que eu não tenha ainda a solução para
ele, sei que o Senhor me ajudará a encontrá-la.
Pois a sua Palavra é clara e nos exorta a dar
graças diante de TUDO. Até dos dias ruins.
Eis-me aqui, então, como um servo que aceita
o fardo de hoje com alegria, pois amanhã será
um novo dia que viverei na paz do Senhor.
Amém. ”

● 3.78 Precipitar nas reações. Dê um passo


atrás. Olhe para o exemplo dos santos,
59
visualize o seu modo de agir e reagir: são
mansos, não são explosivos ou
destemperados, aprenderam a controlar as
suas emoções e a não deixar que elas os
controlassem. Não dão desculpas para
justi car os seus erros, alegando que
erraram pois o outro os provocou, cruzando
os limites do tolerável.

3.79 Não podemos controlar as ações alheias,


mas podemos controlar onde posicionamos a
nossa fronteira do aceitável com o inaceitável.

3.80 De fato, o ser humano imprudente é um


sujeito naturalmente intolerante. O seu limite
é curto demais e a paz — com os outros e
consigo — torna-se impossível.

3.81 Force os seus próprios limites a m de


ser mais brando nas reações. “Quem tarda em
irar-se é mais forte que o poderoso e quem
domina a si mesmo vale mais do que um
conquistador de cidades”. (Pr 16:32)

60
fi
fi
3.82 Isso, de forma alguma, é uma orientação
para que permitamos que os outros abusem
de nós ou que pisem em nossas cabeças como
bem entenderem.

3.83 Como foi dito anteriormente, o prudente


não é omisso. Não é covarde. Ele age, sim,
mas com sabedoria.

3.84 Não é preciso se exaltar para se impor.


Não é preciso retrucar para ser rme. A
Prudência está justamente nesta sabedoria de
equilibrar os meios justos de se fazer o bem e
evitar os meios errados de fazer o mal.

3.85 Conviver com o ruído. Silencie. Não


tenha medo de fazer um profundo silêncio e
car a sós contigo e com Deus.

3.86 A vida moderna nos perturba por todos


os lados, com muitos ruídos, muito barulho,
muita informação. Quase nunca
experimentamos um momento de silêncio.
Mesmo quando não estamos falando, estamos
61
fi
fi
ouvindo a nós mesmos em uma fala mental
ou obstruídos pelo fone de ouvido, pelos
aparelhos eletrônicos.

3.87 Deus é silêncio. Deus fala no silêncio.


Precisamos urgentemente aprender a nos
aquietar. A acalmar a nossa mente. A controlar
a agitação do cérebro que insiste em nos
manter na super cialidade das coisas. Sem
isso, jamais conseguiremos ouvir a Deus ou
encontrá-lo dentro de nós.

3.88 No livro A Força do Silêncio, o brilhante


Cardeal Robert Sarah diz que o silêncio é uma
oportunidade real de aproximação do homem
com Deus e o declínio religioso
experimentado no ocidente moderno se dá,
entre outros fatores, pela multiplicação dos
ruídos, pelo bloqueio constante que fazemos a
essa oportunidade de recolhimento.

3.89 É como se quiséssemos que uma pessoa


entrasse em contato conosco, mas
desligássemos o telefone. Depois, ainda nos
62
fi
sentimos decepcionados com ela pela falta de
contato.

3.90 Estamos sempre “fora de área” para


Deus. Sempre falando. Sempre cercados de
barulho. Até mesmo nos templos modernos,
onde as pessoas vão com o exato propósito de
conectar com Deus, constatamos que impera
— também lá — a ideia de que, quanto mais
alto, melhor. Quanto mais vibrante, mais
unção. Quanto mais ensurdecedor, mais
Espírito Santo. Quanto mais canto, choro e
discurso, mais conversões teremos.

3.91 Ora, o que é o encontro com Deus se não


um exercício de introspecção? Se não uma
viagem silenciosa ao interior do nosso próprio
íntimo? Se não a sensibilidade de ouvir a voz
dEle, falando em nossos corações, assim como
o pescador que pacientemente espera sentir
pela mais sutil e milimétrica tremulação do
anzol?

63
3.92 Parece que o homem moderno tem medo
de car a sós consigo mesmo e inquieta-se na
sua própria presença. Aprendamos, pois, a
silenciar, treinemos nossos ouvidos para
escutar a Deus e nos livremos dos ruídos que
a todo o tempo tentam nos atordoar e
bloquear a voz dEle.

3.93 Logicamente, a Prudência não se resume


apenas à prática desses pontos citados aqui,
que são exercícios para que possamos
desenvolver essa importante virtude e
incorporá-la em toda a nossa vida diária.

3.94 Devemos, então, treinar com as pequenas


coisas, para acertar nas grandes. Portanto,
façamos assim diante de todas as situações do
quotidiano, em relação a todos os atos e
palavras que realizamos, para que sejamos
homens e mulheres mais prudentes na
condução dos nossos dias.

3.95“Não fales, não respondas, não medites,


nada faças, en m, sem antes pensares se
64
fi
fi
aquilo agrada a Deus e serve para exemplo e
edi cação do teu próximo” — Santo Inácio de
Loyola.

65
fi
4. DA TEMPERANÇA

4.1Temperantia, em latim, signi ca “guardar o


equilíbrio”.

4.2 O indivíduo equilibrado é aquele que não


está sujeito aos vícios e aos excessos.

4.3 Vícios e excessos de toda ordem, desde


uma bebida alcóolica até exageros
comportamentais, como o ato de falar
demasiadamente na presença dos outros,
trabalhar intensamente até perder a saúde ou
focar excessivamente em alguma área da vida
em detrimento das outras.

4.4 Combater os vícios pode parecer tarefa


fácil para quem não tem nenhuma condição
aparente, como alcoolismo, fumo ou
entorpecentes.

4.5Mas, como foi dito, os vícios e exageros


comportamentais são menos evidente, porém,

66
fi
igualmente prejudiciais, na medida em que
fazem de nós pessoas desequilibradas.

4.6De que adianta ter dinheiro e não ter


saúde? Ou ter uma vida sossegada mas sem
um tostão a m de prover para a família? De
que adianta dar ores num dia, se no outro a
amada precisar de compreensão e não a
encontrar em ti? De que adianta a ternura da
mulher nos dias bons, se, quando o marido
precisa de compreensão, ele encontra nela
uma juíza e não uma amiga?

4.7 A Temperança é fundamental.

4.8 E, para desenvolvermos mais essa virtude,


é preciso combater os vícios.

4.9Vícios são comportamentos automatizados


pelo nosso inconsciente, tão enraizados, que
não conseguimos nos livrar deles
simplesmente através da boa vontade.

67
fi
fl
4.10 Se um alcoólatra se conscientiza que tem
um problema com a bebida, mesmo assim, ele
não será capaz de simplesmente parar de
beber do dia para a noite. Se temos o vício do
desequilíbrio, não conseguiremos também
simplesmente manter a razão diante de uma
discussão, por exemplo.

4.11 Precisamos desenvolver essa habilidade,


que não nasce conosco. Ninguém nasce
equilibrado.

4.12 A criança é o exemplo maior de


desequilíbrio que existe, pois não sabe lidar
com situação nenhuma; é incapaz — pela sua
pouca idade — de usar a razão e externaliza
os seus sentimentos em forma de choro,
pirraça, manha e chiliques.

4.13 Ao deixar por conta, uma criança se


alimentará apenas do que considera apetitoso
e jamais frequentará a escola, a m de
permanecer em casa se divertindo durante os

68
fi
seus dias. É a expressão maior do
desequilíbrio.

4.14 Aí entra a educação dos pais, que servirá


para dar limites a esse comportamento
desordenado e ensiná-la a CONTER esse
instinto.

4.15 Por medo dos castigos, das broncas e das


punições, a criança desenvolve a capacidade
de não mais chorar e se desesperar, caso a sua
vontade não seja realizada.

4.16 Com o passar do tempo, a criança cresce


e elimina alguns comportamentos próprios da
infância, mas os desa os também crescem.

4.17 Suas expectativas, seus sonhos, vontades


e desejos agora são outros. Ela já aprendeu
que não se deve perder a cabeça quando não
ganha o mimo que ela queria ou quando é
proibida de fazer o que desejava, mas será que
essa mesma pessoa — agora crescida —
aprendeu a não perder a cabeça também,
69
fi
quando ela se vê frustrada diante dos “nãos”
que a vida adulta nos dá?

4.18 Ou será que, assim como ela agia na


infância, vai reagir a isso agora com um
comportamento igualmente irracional e
transformar a situação em um novo m do
mundo?

4.19 Se o desenvolvimento da Temperança


tiver parado no tempo, é provável que sim.

4.20 Esse estágio em que alcançamos a


Temperança é o resultado de um trabalho
longo, que inicia na infância e que não pode
parar jamais. Deve, inclusive, atualizar-se com
o passar do tempo para se manter efetivo
diante dos diferentes níveis de desa os que a
vida trará em cada fase dela.

4.21 Não há, em essência, a menor diferença


entre a criança frustrada por não ter recebido
um sorvete dos pais e o adulto frustrado por

70
fi
fi
não ver as coisas saindo do jeito que ele
queria em qualquer área da vida.

4.22 Pensamos, com a maturidade de hoje,


que o sorvete é uma banalidade sem
importância, mas, para a criança — um ser
que possui nível de Temperança zerado — o
sorvete representa tudo na vida dela, naquele
momento. Ela não consegue imaginar como
poderá viver sem o sorvete, o que pode
parecer ridículo para o adulto, que,
igualmente, pensa muitas vezes não ser capaz
de viver sem o carro w, sem o emprego x, sem
a pessoa y, sem a casa z.

4.23 Ou seja, da mesma forma que olhamos


para a criança que sofre por um sorvete, Deus
deve olhar para nós, sofrendo amargamente
por conta das banalidades da vida adulta, e se
por a lamentar pela temperança juvenil de
alguns dos seus lhos já crescidos.

4.24 Como alcançar a Temperança, então?

71
fi
4.25 O homem deve treinar para ser capaz de
viver sem as coisas que ele tanto ama.

4.26 Exemplo: se quero governar o meu desejo


de apreciar bebidas alcoólicas, eu tenho que
estar preparado e CAPACITADO a nunca
mais encostar uma gota de álcool na boca, se
preciso for.

4.27 Assim, estarei certo de que, caso decida


tomar uma taça de vinho, um dia, será porque
eu, uma pessoa que já desenvolveu a virtude
da Prudência — e agora a da Temperança —,
estou consciente de que isso não me
prejudicará em nada (risco de beber em
excesso, tornar-me inconveniente, soltar a
língua mais do que devo, in uenciar a
tomada de decisões, a forma como trato os
demais, causar um acidente na volta para
casa, ser multado por dirigir após beber et
cetera).

Ou seja, este será um comportamento


4.28
EQUILIBRADO.
72
fl
4.29 Se tanto quero alcançar um determinado
objetivo, tenho que estar preparado também
para não alcançá-lo e viver igualmente em paz
sem aquilo, se assim for da vontade de Deus.
Assim, não cairei no erro de atrelar a minha
saúde mental à realização dessa meta.

4.30 Ou seja, este será um comportamento


EQUILIBRADO. E assim também devemos
agir com todo o resto.

4.31 Se o homem é capaz de viver sem aqueles


objetos de desejo que tanto fazem a sua
cabeça, saberá que só vai recorrer a eles de
forma sensata, prudente e moderada.

4.32Não se entregará aos seus desejos para


que eles o consumam. Mas, para aproveitar da
alegria que Deus pode proporcionar aos seus
lhos através do alimento, do lazer, do
casamento, das amizades, do entretenimento e
a ns.

73
fi
fi
4.33 Ao contrário, o que a maioria faz é
consumir todas essas possibilidades de forma
desregulada, ao recorrer a elas para
justamente compensar outros desequilíbrios
mais profundos.

4.34 Esse comportamento certamente não


funcionará e apenas nos tornará dependentes
dessa válvula de escape utópica — que
promete uma satisfação ao inconsciente, mas
não nos preenche plenamente, fazendo com
que busquemos mais e mais, como num poço
sem fundo.

4.35 A nossa paz de espírito não é dependente


dessas coisas. Não somos escravos de nenhum
prazer e não precisamos de coisa alguma para
viver bem, a não ser o que é da vontade de
Deus.

4.36Pois, o prazer que te torna escravo se


chama VÍCIO.

74
4.37 Se Deus é o criador de todas as coisas e
Ele efetivamente está em todas as coisas,
então temos que usá-las conforme as
intenções do seu criador.

4.36 Aquilo que é usado de acordo com a


utilidade que existe no seu SER, realiza o seu
propósito.

4.37 Exemplo: as cadeiras foram criadas para


servirem de assento para as pessoas se
apoiarem em posição de descanso. Se as
posicionarmos de forma a bloquear a porta,
para impedir que o cachorro entre em casa,
essas cadeiras não estarão cumprindo o seu
propósito, pois estamos desvirtuando a sua
utilidade.

4.38 Assim como o fazemos também com o


exagero da bebida, com a obsessão pelo
trabalho, com a obsessão pelo lazer, com as
emoções “negativas” e tantas outras coisas.

75
4.39 Falamos das emoções negativas, pois, a
raiva, o ódio, a dor… Todos os sentimentos
têm a sua razão de existir e não podemos
dizer que são eles ruins em si. Mesmo os que
parecem negativos, de início, têm a sua função
e nós é que os tornamos maus, na medida em
que desvirtuamos a sua utilidade.

4.40 A raiva serve, siologicamente, como um


catalizador de energia que será útil ao
indivíduo em momentos em que ele deve se
impor diante de um perigo.

4.41 Exemplo: ao ver alguém sofrendo uma


injustiça, um ente querido sendo atacado,
uma criança apanhando ou um idoso sendo
maltratado, imediatamente nos enchemos de
raiva e voamos para cima do agressor para
salvar a vítima. Sem o elemento da raiva, não
teríamos esse impulso que instintivamente
nos faz partir para ação com uma força
multiplicada.

76
fi
4.42 É por isso que seres humanos são capazes
de levantar pesos e realizar façanhas que
exigem força física no momento do desespero,
como no caso de mães tentando salvar seus
lhos, que seriam impossíveis para nós em
condições normais.

4.43 Mas, quando permitimos que esse


impulso se dê contra pessoas que amamos,
por exemplo, diante de situações muito
diferentes da mencionada antes, estamos
usando a raiva para o MAL.

4.44 O ódio, igualmente, tem o seu valor.

4.45 Pois, é dever do cristão ODIAR o pecado


e tudo aquilo que ofende a Deus.

4.46Somente quando conseguimos nutrir ódio


do pecado (não do pecador) é que
conseguimos focar em não mais pecar!

Mas, quando agimos como se odiássemos


4.47
uma pessoa, estamos nós mesmos pecando e,
77
fi
assim, usando o ódio — que, em si, não é
ruim — para o mal.

4.48 En m, a Prudência combinada com a


Temperança será capaz de nos iluminar no
quotidiano, para manter a calma, usar a
RAZÃO e assim saber discernir com qual
comportamento devemos responder a cada
situação.

Meditação:

4.49 A m de desenvolver a virtude da


Temperança, o cristão pode se aproveitar dos
efeitos valiosos e auxiliadores de quatro
práticas milenares, ensinadas pela Igreja
desde sempre, que são: jejum, abstinência,
castidade e prece.

4.50Santa Teresinha do Menino Jesus dizia:


“Minhas morti cações consistem em refrear a
minha vontade, sempre prestes a se impor”.

78
fi
fi
fi
4.51 Aprendamos com ela, então, que o
caminho para a santidade está na morti cação
das vontades da carne e que, para isso,
precisamos treinar os nossos hábitos até
chegarmos a esta alta capacidade de negação.

4.52 Já Santo Afonso Maria de Ligório


completa sabiamente, a rmando: “Quem
vence a si mesmo, facilmente vencerá todas as
di culdades”.

4.53 Agora, pois, aprendamos com ele que o


maior de nossos inimigos está no interior de
nós mesmos e que, se lograrmos a vitória
nessa disputa interior, não haverá obstáculo
externo que poderá se levantar em nosso
caminho.

● 4.54Jejum. A repressão de uma necessidade


básica do ser humano, por um determinado
período de tempo, tem o poder de treinar os
nossos instintos para suportar o desejo
extremo.

79
fi
fi
fi
4.55 Conforme nos tornamos, cada vez mais,
os governadores da nossa carne, também nos
tornamos mais resistentes à tentação e
capacitados para rejeitar as cobiças maiores.

4.56 Se conseguimos nos negar comida — que


nos faz bem —, mesmo com a fartura de
possibilidades acessível, conseguiremos
igualmente negar o pecado — que nos faz
mal.

4.57 É importante lembrar que o jejum,


sozinho, é uma ferramenta poderosa para
treinamento da mente e do corpo. Mas,
combinado à vida de oração se torna muito
mais forte e útil.

● 4.58 Abstinência. O ato de abster-se ou


privar-se de algo.

4.59 Conforme foi dito antes, o indivíduo


deve veri car se ele é capaz de viver em paz
SEM as coisas que ele tanto deseja no dia a

80
fi
dia, para garantir a sua liberdade e o foco
exclusivo nas coisas de Deus.

4.60 Identi que aquilo que mais lhe apetece e


causa desejo. Que mais povoa o seu
imaginário como fonte garantida de prazer e
satisfação. Resista por exemplo a uma
sobremesa desnecessária, a uma colherada a
mais, aos cinco minutos extras de sono após o
toque do despertador, a falar mais do que
deve, a dar uma opinião que não lhe foi
pedida, ao automático re exo de ignorar o
mendigo pedinte. Aprenda, com esses testes, a
domar o seu corpo antes que ele te dome!

4.61 Te n t e i m a g i n a r a s u a v i d a s e m
determinadas coisas que tanto te
descompensam. Seja café, cigarro, bebida,
doces, televisão, internet, sexo, música,
cochilos, dinheiro, amigos, esporte, qualquer
coisa. Cada um deverá saber identi car o seu.
E tente viver um dia sem isso. Dois dias. Três
dias.

81
fi
fl
fi
4.62 Analise como se sente.

4.63 Um sintoma evidente do vício é que a


abstinência, ou seja, o ato de negar-lhe o vício,
causa um incômodo angustiante. Por vezes,
até acarretando reações físicas como náusea,
estresse e dor de cabeça.

4.64Reações menos graves, como inquietação


e ansiedade, também podem aparecer. Mas,
encare isso como algo bom, a nal, acabaste de
encontrar uma oportunidade para se
desenvolver!

4.65 De todo modo, os incômodos mais ou


menos intensos servirão como sinal de que é
preciso equilibrar a sua relação com essa
válvula de escape, que está lhe fazendo perder
o eixo. Seja bravo e resista.

4.66Pratique a abstinência de início, a m de


mensurar como a sua mente reage.

82
fi
fi
4.67 Se não for algo mau em si — como seria
no caso de um vício real —, mas apenas um
exagero da tua parte na relação com aquilo —
como seria por exemplo a destemperança da
gula —, não é necessário eliminar o hábito
de nitivamente da tua vida. Volte a vivencia-
lo depois dessa experiência de privação, mas
com moderação. Diminua o ritmo, o tempo e a
frequência para não recair na compulsão.

4.78 Trans ra toda a sua dependência


exclusivamente para Deus e se apegue a Ele
em oração, caso a tentação bata mais forte.

4.79 Seja livre de você mesmo, para que tu


possas se entregar a Ele mais e mais.

● 4.80 Castidade. É a abstinência anterior, mas


voltada especi camente a práticas sexuais
que ferem a pureza espiritual. Assim como
o jejuador que se nega alimento podendo tê-
lo, por estar com o foco apurado na busca
pela santidade, o teste da castidade
funciona também como uma forma muito
83
fi
fi
fi
e caz de escalar a hierarquia do
autocontrole até se tornar o governador de
si mesmo.

4.81 Se ainda não consegue praticá-la, é


porque infelizmente ainda há algo no seu
interior que lhe domina e que impede de ser
verdadeiramente livre.

4.82 Realize os experimentos propostos nesta


parte de meditação para se conhecer melhor e
mensurar em que nível você pode estar
atualmente na dita hierarquia do
autocontrole.

4.83 Tome esses sinais como dicas que o corpo


dá a respeito de quem tem sido o teu
verdadeiro senhor: a tua mente ou os teus
instintos.

4.84 Falamos aqui, exclusivamente, da


castidade no sentido da utilidade que ela tem
no processo de treino para santi cação do
espírito e morti cação da carne.
84
fi
fi
fi
4.85 Não obstante, é bom lembrar que as
principais vantagens da castidade não
residem nisso, mas na pura obediência a uma
determinação de Deus.

4.86 Vejamos: Deus não faz exigências


aleatórias, como um ditador despropositado.

4.87 Mas, na condição de nosso criador,


conhece in nitamente melhor do que nós
mesmos o nosso SER, o propósito da vida e o
que precisamos para atingi-lo. Mistérios esses
que jamais conheceremos na totalidade, em
vida.

4.88 Por isso, ao reconhecer a essência de


todas as coisas, Deus, em sua in nita
bondade, proíbe práticas e hábitos, de toda
espécie, que Ele reconhece como contrárias à
lei natural da criação e que ferem o nosso ser,
para o nosso BEM.

85
fi
fi
4.89 Um casal que decide adiar a satisfação
imediata para obedecer e agradar a Deus,
estará construindo um relacionamento
rmado em valores muito mais sólidos que
jamais poderão ser comparados com os casais
que se unem baseados na atração física.

4.90 Negar um prazer imediato por uma


glória futura é a honra dos homens e
mulheres fortes. Neste sentido, o experimento
da castidade é uma poderosa ferramenta para
exercitar o nível de renúncia que precisamos
alcançar.

4.91 E assim funciona em todos os campos da


vida: primeiro vem o tempo da semeadura, do
trabalho, da construção, de arar a terra.
Depois vem o tempo da colheita, da
recompensa e da satisfação.

4.92 Aquele que decide colher antes de plantar


estará consumindo o que não tem e criando
uma dívida.

86
fi
4.93 Mas aquele que decide rmar uma
sociedade com Deus e plantar junto com Ele,
colherá eternamente.

● 4.94 Reze o terço. Sem entrar no mérito dos


inúmeros benefícios espirituais que a
prática desta devoção milenar carrega
consigo, desde os primeiros séculos do
cristianismo, a santa récita do terço tem o
poder de quebrantar o coração do seu
orador. Algo essencial para quem busca a
santidade.

4.95 Ao passo em que os não entendidos


julgam ser esse um exercício vazio de pura
repetição, a Igreja nos convida a atentar para o
valor que há na humilhação do ego de um
cristão em formação.

4.96 Aquele que se coloca a rezar de forma


curta, simples, obediente e religiosa — mas,
ao mesmo tempo, fervorosa e devota — está
exercitando a humildade de não necessitar os
aplausos, as honrarias, os holofotes. Assim
87
fi
como Jesus repreendeu aqueles que “gostam
dos primeiros lugares nos banquetes e
primeiras cadeiras nas sinagogas”.

4.97 Quem nunca viu, pois, um casal de


apaixonados que, após esgotar todas as
alternativas de declaração de amor possíveis,
apenas repete de forma simples mas
verdadeira que se amam e se amam,
insistentemente, até cansar?

4.98 Não veríamos na pureza dessa


simplicidade uma prova de amor mais
humilde e sincera do que um longo discurso
ou grandiosas exibições de afeto?

4.99 Não dispensemos o valor dessas


manifestações, mas, saibamos que com elas
vêm o anseio de sermos reconhecidos pelo
nosso mérito, pela nossa distinção entre os
demais, pela nossa excepcionalidade.

4.100 Na hora de amar a Deus, pois, é bom


que treinemos a humildade.
88
4.101 O terço foi criado para ser a oração dos
pequeninos, dos humildes, dos analfabetos,
dos incultos. E Deus promete tornar grande
no céu aqueles se fazem pequenos na terra!

4.102 É o antídoto para a vaidade. É a


ferramenta do amante que só intenta deixar
saber que ama.

4.103Mesmo nos casos da oração introspectiva


em que somos enganados pelo inconsciente
com a falsa impressão de que, quanto mais
enriquecermos a nossa fala mental com
palavras, argumentações e minutos, mais
agradaremos ao Senhor.

4.104Bobagem. Assim escolhendo não fazer, o


humilde exercita o seu poder de governo
sobre a carne e conscientemente prostra-se
diante do Cordeiro de Deus, sabendo, pois,
que não é o discurso sumptuoso da oração
que toca o coração do Senhor, mas, o ardoroso

89
clamor com que entregamos a nossa alma
inteiramente a Ele.

4.105 O terço é a oração dos santos. Mesmo


um Tomás de Aquino que foi, ao mesmo
tempo, um grande santo e o maior dos
lósofos medievais, — e que, portanto,
poderia ter sido o autor das mais comoventes
orações — não caiu na tentação de ignorar o
valor do santo rosário e da submissão.

4.106 Será possível, então, que tantos santos


magní cos da história da Igreja tenham
alcançado esta graça através da simplicidade
radical, mas, nós, contudo, necessitamos
palestrar majestosamente para Deus?

4.107 Que, enquanto tantos chegaram ao céu


fazendo-se pequenos, nós o alcançaremos
fazendo-nos grandiosos?

4.108 A porta para o céu é pequena e os


grandiosos por ela não passam!

90
fi
fi
4.109 Nós, sentados bem no alto de nossas
cátedras, precisamos que todas as coisas
passem pelo crivo do nosso entendimento e
julgamos digno de nós somente aquilo que
vence esse criterioso ltro.

4.110Colocamo-nos acima da Igreja. Acima da


sabedoria dos santos. Acima das re exões que
vêm maturando pelos últimos dois milênios.
Tudo em função de palpites que não
chegamos a analisar seriamente nem por dois
anos, nem por dois dias, nem por dois
minutos.

4.111 O auge da humildade humana já se foi.


Na Idade Moderna, impera a lei dos
iluministas: quanto mais o homem TEM, mais
ele julga SER.

4.112 E com isso vem a religião do homem.


Aquela que se adequa a ele. Aquela que
presta, na medida em que ele entende. Na
medida em que ele aprova.

91
fi
fl
4.113 Se desejamos a santidade, é urgente que
sejamos humildes. Que quebremos a nossa
necessidade de entender e aprovar os
mistérios da fé; e desenvolvamos a habilidade
de nos submeter!

4 . 11 4Pontos nevrálgicos do nosso


comportamento insolente que nos levam a
desapontar a Deus uma vez atrás da outra:
sempre estamos em busca de explicações
sobre o que Deus faz, o que Deus permite
acontecer e o que Deus pede de nós —
quando na verdade deveríamos apenas fechar
os olhos e CONFIAR — e buscamos estar no
controle, tomar as decisões e satisfazer as
nossas próprias vontades — quando na
verdade deveríamos apenas dar um passo
atrás e nos SUBMETER.

4.115 Isso, sem contar com a eterna luta contra


os desejos da carne, na qual teremos um
valioso aliado no adestramento pessoal para
nos ajudar a focar quando a carne quer
dispersar, em rmar uma consistência quando
92
fi
a carne desistir, em suportar quando a carne
quer fraquejar, em priorizar o DEVER quando
a carne deseja tão somente ceder ao prazer
com todas as suas forças.

4.116 Persigamos, pois, a reparação desses


vícios, que tanto nos atrapalham na busca
pela santidade, e permitamos que o santo
terço seja o nosso amigo, que tão bem nos
auxilia a exercitar essas virtudes.

93
5. DA JUSTIÇA

5.1 Talvez, dentre as quatro virtudes cardeais,


seja esta a mais fácil de ser desenvolvida.
Apesar de não ser extremamente fácil, mas,
certamente, mais fácil do que as outras três.

5.2 A Justiça é a virtude de entender o que é o


certo e o errado e — o mais importante —
aplicar esse conceito teórico na vida
quotidiana.

5.3 Se temos Prudência e Temperança,


seguramente a Justiça não será um desa o tão
intransponível. Ela se revela desa adora, na
medida em que o indivíduo não desenvolveu
ainda as duas primeiras virtudes cardeais, que
norteiam o comportamento no sentido de
fazer o que é certo e praticar o que é bom.

5.4 Um juiz qualquer pode ser uma pessoa


imoral, fraca e sem virtudes. Mas, ao passo
em que está escrito na lei que ele deve dar a
sentença y, ele não pode jamais dar a sentença
94
fi
fi
z. Ele é um servo das leis e não há margem
para relativismos.

5.5 Já na nossa vida pessoal, onde os


relacionamentos são regidos por convenções
sociais e não por leis, com previsão de pena et
cetera, a coisa ca de fato mais embaraçada,
uma vez que abre a possibilidade para que as
pessoas possam agir da forma como bem
quiserem.

5.6 Somado a isso, nessas situações, não há


um árbitro posto entre nós e os demais para
mediar os nossos con itos, o que gera a
complicação da diversidade de sentenças: um
acredita estar com a razão, enquanto o outro
crê igualmente estar correto. Ambos têm seus
argumentos e explicações que consideram
plausíveis.

5.7 O juiz, nesse caso, é a nossa própria


consciência e é preciso ter uma maturidade
muito desenvolvida para dar uma sentença
desfavorável a nós mesmos, declarando-nos
95
fi
fl
culpados e a outra parte “vencedora”. Mas,
apesar de difícil, é muitas vezes necessário
que assim façamos.

5.8 Ora, se somos capazes de enxergar, agora,


a mancha em nossas ações, muito
provavelmente teríamos agido de forma
distinta antes que o con ito se instalasse. Se
não fomos capazes de identi car o erro na
hora da ocorrência, di cilmente o seremos
mais tarde.

5.9 A virtude da Justiça consiste justamente


em distinguir esses momentos; em agir como
um juiz imparcial, mesmo quando somos nós
uma das partes envolvidas no caso; em
declarar que o outro está com a razão e que
nós erramos.

5.10E sabe por que isso é tão difícil? Por causa


do Ego — sempre ele — que toma esse
reconhecimento como uma facada em nosso
orgulho, na nossa imagem. Na verdade, o que
há por trás do justo, aquele que desenvolveu a
96
fi
fl
fi
virtude da Justiça, são duas características
simples: humildade e honestidade.

5.11 Humildade para conseguir desapegar do


orgulho e reconhecer o erro; e Honestidade
para não sermos t entados a t er um
posicionamento ou atitude — que sabemos
estar errado — apenas para obter vantagem
sobre a outra parte, seja no âmbito nanceiro,
social, emocional…

5.12O justo tem a nobreza de discernir os


meios e não apenas focar nos ns.

5.13 Determinado m pode ser extremamente


vantajoso, mas, se o preço a pagar por isso for
a picardia contra alguém, o justo saberá negar
esses proveitos e almejará apenas os
resultados consequentes de uma conduta
limpa.

5.14Até aí não há enormes mistérios. Fazer o


que é certo e agir com retidão: tarefa simples
de entender. Porém, a parte difícil é que, ao
97
fi
fi
fi
contrário do caso do juiz que apenas consulta
uma listagem de situações para aplicar a pena
referente a cada uma, nós fazemos a nossa
própria lei. Somos nós os legisladores e os
aplicadores da lei: receita para o abuso. E o
pior: ela sequer reside escrita em algum lugar
para que se mantenha coerente através dos
tempos.

5.15 Isso permite diversas distorções, como:


julgarmos justo aquilo que é injusto;
julgarmos injusto aquilo que é justo; e até
mesmo julgarmos uma determinada situação
justa, no dia de hoje, e julgarmos uma
situação idêntica como injusta, amanhã.

5.16 A exibilidade nos corrompe, pois


permite que sempre estejamos pendendo para
o juízo mais favorável a nós mesmos.

5.17 Por isso que a di culdade em vivenciar a


virtude da Justiça não se dá na hora da sua
aplicação, mas, antes, na consolidação das
“leis” na mente de cada um.
98
fl
fi
5.18Se não tivermos uma noção clara do certo
e do errado enraizada em nossa mente e
automatizada em nosso comportamento,
caremos à mercê dos julgamentos
corrompidos pelo egocentrismo e
oportunismo.

5.19 Bendito é aquele que, na hora da dúvida,


recorre ao Senhor. Que busca orientação nas
Escrituras para guiá-lo através das situações.

5.20 Pois essa é a Constituição dos justos!

5.21 Para se tornar uma pessoa que domina a


virtude da Justiça, o indivíduo precisa estar
em dia com a noção de certo e errado
verdadeira. Ou seja, aquela que nos é
apresentada por DEUS.

5.22O mundo jaz no maligno e as impressões


que temos são, muitas vezes, distorcidas.
Assimilamos ideias, opiniões, entendimentos
de acordo com a média das pessoas que nos
99
fi
cercam. De acordo com os ditos
“especialistas” que a mídia nos impõe e coisas
deste tipo.

5.23Mas, a nossa vontade não deve estar em


agradar o mundo ou em seguir a maré.
Estamos aqui para sermos santos. E se
quisermos ser santos, precisamos imitar
aquele que é a fonte de toda a santidade.

Meditação:

● 5.24 Leia a Bíblia. Contemple as lições


apresentadas ali e incorpore-as ao seu dia a
dia. Este é um livro que possui TODAS as
respostas que precisamos para todas as
situações possíveis. Basta que saibamos
procurar por elas.

● 5.25 Exercite a vida de oração, pedindo para


que Deus quebre o seu orgulho e lhe dê
clareza nas decisões, no trato com os seus
irmãos, no seu posicionamento perante a vida.
Peça a Ele que te dê a sabedoria para não ser
100
injusto com ninguém, não exigir mais do que
devem, não impor-lhes fardos pesados e nem
cobrá-los pelo que não têm responsabilidade.

● 5.26 Conforme for se deparando com


situações em que você sentirá claramente qual
é o correto e justo a ser feito, não hesite em
fazê-lo. Exemplo: dê esmola a um pedinte;
atenção a um necessitado, consolo a um
sofredor, orientação a um perdido. Treine-se
para não se omitir diante da possibilidade de
fazer uma boa ação.

5.27 O mundo já está repleto de pessoas que


não desperdiçam uma chance de fazer o mal,
se os bons se omitirem das suas
responsabilidades, esta será uma guerra
perdida de vez.

5.28 Force no começo, se for preciso, para sair


da tua zona de conforto em favor de uma
outra pessoa — o quão belo isso pode ser aos
olhos de Deus! — e com o tempo você terá
enraizado a prática da Justiça da mesma
101
forma como os injustos andam dia e noite à
procura de oportunidades para se dar bem às
custas dos outros. Assim, tu serás como um
enviado de Deus, colocado por Ele para
cruzar o caminho de outras pessoas.

5.29 Santo Padre Pio de Pietrelcina já dizia:


“Não deixemos para amanhã o que podemos
fazer hoje. Do bem adiado estão cheios os
sepulcros”. Não queira que o teu sepulcro um
dia esteja cheio de bens não feitos, faça-os
hoje.

102
6. DA FORTALEZA

6.1 Quais são os limites do homem? O quão


forte ele pode ser?

6.2Para existirmos ainda hoje tivemos que


sobreviver aos maiores testes de resistência
possíveis.

6.3 Passamos nas provas da história pois


somos seres extremamente adaptáveis,
capazes de qualquer coisa pela defesa da
existência.

6.4 Os instintos da carne nos fazem lutar


como gladiadores contra a fome, o frio e os
predadores.

6.5 Mas, o espírito não tem instinto. Se ele


não for conscientemente defendido, sofre
calado e morre, sem esboçar qualquer pio.

103
6.6 O ser humano é capaz de tudo para
garantir uma condição favorável na vida
temporal, mas, por outro lado, de quase nada
por uma boa condição na vida eterna.

6.7 É assim porque as necessidades básicas e


biológicas demandam uma satisfação diária e
o ser humano não pode se dar ao luxo de
esperar a maturidade para começar a se
alimentar, abrigar-se do frio e proteger-se dos
perigos. Ele já precisa nascer com este foco.

6.8 Logo, a bondade de Deus colocou em


nosso inconsciente, sabiamente, os impulsos
automáticos de procurar por essas satisfações
desde os primeiros instantes de vida.

6.9 Já as demandas espirituais são objetivos


de longo termo, para os quais Deus nos dá a
vida inteira como prazo, como um caminho
de aperfeiçoamento.

6.10 Conclui Ele que o homem assimilará a


consciência com o tempo e o buscará por
104
vontade própria; não por uma obrigação
instintiva.

6.11 Decepcionamos, pois, ao revelar a Deus


que essa lógica nem sempre é seguida e que
damos tanta importância à satisfação carnal
de curto prazo que não temos tempo nenhum
de nos dedicar ao objetivo de longo prazo da
vida: a santidade.

6.12 Deus provê o lar, a família, o alimento, o


emprego… Tudo aquilo que precisamos para
apaziguar a inquietação física e deixar a
mente livre para nos concentrar em melhores
grandezas. Mas, ao invés de nos darmos por
satisfeitos e partirmos para a persecução da
grande meta, distraímos a nós mesmos com a
busca de mais e mais miudezas imediatas.

6.13 Ora, se não é o mesmo instinto que nos


possibilita a sobrevivência corporal o fator
que perturba a pertinácia da vivência
espiritual…

105
6.14 Como em tudo na vida, a diferença entre
o veneno e o remédio está na dose. Eis,
portanto, a necessidade de encontrarmos a
dose oportuna de carne e de espírito que
devemos cultivar no interior.

6.15 Se o objetivo da vida é a santidade e não


a satisfação pessoal, então é bom que se
reprima todas as demandas que vêm para
comprometer tal desígnio.

6.16 Como numa corporação, existem as


atividades- m e atividades-meio, também as
temos em nossa essência. Para a construtora, a
atividade- m é a construção — a razão de ser
daquele grupo — e as atividades- m são
aquelas que possibilitam a existência para que
a atividade- m possa ser cumprida —
limpeza, nanceiro, recursos humanos e a ns.

6.17 Para o ser humano, a atividade- m — a


razão de ser da sua existência — é a
santidade. É para isso que Deus nos criou e
nos colocou aqui. Já a satisfação dos desejos
106
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da carne são as atividades-meio — cruciais
para que tenhamos saúde, segurança, bem-
estar et cetera.

6.18 Uma empresa jamais permitiria a


continuidade de setores internos da atividade-
meio que jogam contra a sua atividade- m,
permitira? Por que nós assim fazemos, então?

6.19 É porque representamos, ao nível do


indivíduo, o bizarro caso das organizações
que desconhecem a sua nalidade. Elas não
sabem por qual motivo existem, o que devem
produzir e o que têm a vender. Assim são os
seres humanos na sua passagem pelo mundo.

6.20 A m de alcançar o equilíbrio, então,


devemos modi car a estrutura, hierarquia e
ressigni car os setores desta empresa perdida.

6.21 Algo extremamente custoso, tendo em


vista que, como foi dito antes, a força com que
os instintos humanos se revelam no seu grito
desesperado para serem atendidos é capaz de
107
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instigar os comportamentos mais animalescos
do homem.

6.22 Portanto, a m de se sobrepor a uma


força tão indomável da natureza, é capital que
se construa uma força em oposição, ainda
m a i s p o d e ro s a : q u e é a v i r t u d e d a
FORTALEZA.

6.23 A quarta virtude cardeal, a Fortaleza, é


aquilo que nos ajuda a fazer o que DEVEMOS
no lugar do que QUEREMOS.

6.24 É, em suma, aquilo que nos permite


praticar a Prudência, a Temperança e a Justiça.
Pois, sem uma grande dose de Fortaleza,
torna-se irrealizável conter os impulsos como
um ser humano prudente, moderar os hábitos
como um indivíduo temperado e agir
corretamente como um homem justo.

6.25 A criatura humana não tem capacidade,


para, sozinha, lutar contra a sua própria
natureza.
108
fi
6.26 O que levaria por exemplo um indivíduo
qualquer, faminto, a dividir a sua comida com
um desconhecido, se não a inspiração de
Deus?

6.27 Ou seja, não somos capazes de vencer os


instintos da carne e do Ego, que nos domina e
se fazem obedecer, a não ser que entreguemos
a nossa vida a Cristo Jesus, para que Ele supra
em nós as de ciências humanas com a graça
divina.

6.28 Quando a vontade de agradar a Deus for


maior do que tudo, o temor de ofendê-lo for
grandioso e a santidade for o alvo principal,
então teremos força su ciente para rejeitar
tudo o que nos conduz ao pecado.

6.29 Por acaso não nos debateríamos até a


última ponta de energia para sobreviver se
caíssemos nas águas geladas do mar? Pois
lutemos, então, em igual medida, pela

109
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salvação da vida espiritual que agoniza nas
trevas deste mundo sem Deus.

6.30 Por acaso não seria o homem capaz de


roubar um pedaço de pão que lhe saciasse a
fome ou matar pela defesa dos seus bens
materiais?

6.31 Se empenhamos as maiores atrocidades


pelas necessidades físicas, o que dirão de
fazer o bem pelas necessidades espirituais que
são muito maiores? Ainda mais fácil deveria
ser.

6.32 Mas não é. Assim como o incauto que


esbanja os seus recursos imediatos em
detrimento do futuro, o homem tende a se
concentrar demasiadamente nas questões do
dia a dia e a não olhar para onde elas o estão
levando em longo prazo.

6.33 A abnegação de satisfações, prazeres e


recompensas acessíveis em função de metas
distantes demanda Fortaleza.
110
6.34 Vejamos se não é difícil renunciar à
compra instantânea de um objeto de consumo
para investir em capacitação que trará
p o s s í v e i s re t o r n o s s o m e n t e d a q u i a
longínquos anos.

6.35 É preciso ter FORÇA para optar desta


forma.

6.36 Por que — pergunte-se agora — somente


a ín ma minoria das pessoas é plenamente
realizada e bem sucedida, seja em qual ramo
pro ssional ou área da vida for? Resposta:
porque somente a minoria das pessoas é
FORTE o su ciente para fazer as ESCOLHAS
certas.

6.37 A maioria faz o que é mais fácil. O que


todo mundo faz e o que trará menos
desconforto imediato. Por isso, a maioria
acaba compartilhando entre si os mesmos
resultados medíocres.

111
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fi
fi
6.38 Já o indivíduo que tem a virtude da
Fortaleza faz o que deve ser feito e não o que
ele quer. Faz o que será melhor para o seu
futuro e não o que ele sente vontade de fazer
naquele momento. Toma decisões que são
alinhadas com o seu objetivo maior de vida e
não de acordo com as intempéries do dia.

6.39 Ser forte é muito mais do que não ser


fraco. É ter a capacidade de tomar o caminho
A, quando a carne tenta nos arrastar pelo B
afora. É ter a capacidade de ser bom,
enquanto os outros são maus. É ter a
capacidade de ser correto, enquanto os outros
são oportunistas. É ter a capacidade de ser
altruísta, enquanto os outros são movidos
pelo egoísmo. É ter a capacidade de pensar
por si mesmo, enquanto os outros seguem o
bando. É ter a capacidade de remar contra a
maré, em um mundo que navega feliz na
direção do abismo.

112
6.40 Ser forte é, sobretudo, anunciar Jesus
Cristo e amar a Deus, enquanto o mundo vira
as costas para Ele.

6.41 De certo, sem a Fortaleza seria utópico


almejar a santidade. Seria utópico até mesmo
almejar o emagrecimento do corpo diante das
tentações da gula, objetivo deveras menor.

6.42 Se Santo Agostinho apelidou a Prudência


como a virtude-mãe, tendo em vista o seu
papel de conduzir as demais virtudes, esta
obra coloca a Fortaleza na condição de
virtude-servidora, em função do seu ofício de
servir às outras três e auxiliá-las em seus
propósitos. Enquanto uma lidera, a outra
oferece o suporte necessário.

6.43 Dito isso, é razoável pensar que o


desenvolvimento da Fortaleza se alcança a
partir da execução impecável da Prudência,
da Temperança e da Justiça.

113
6.44Se não logramos êxito na execução
imaculada dessas três, é porque ainda não
temos Fortaleza su ciente.

6.45 Ou seja, o exercício da Fortaleza não se


aplica através de hábitos próprios dela, mas,
sim, através dos diversos hábitos propostos
nas partes anteriores desta obra referentes às
demais virtudes.

6.46 Tome as proposições já apresentadas de:


manter uma atitude amorosa em relação ao
próximo, independente dos seus sentimentos
e emoções; cortar os julgamentos proferidos;
cessar as lamúrias e reclamações; aprender a
guardar a língua e os impulsos; fugir do
barulho que causa ruído na conexão com
Deus e viver a profundidade do silêncio; fazer
jejum com certa freqüência; treinar a fortaleza
através da abstinência dos hábitos e vícios
dominantes; viver a castidade; rezar o terço;
ler a Bíblia; desenvolver a vida de oração; e
praticar obras de caridade.

114
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6.47 Eis acima doze conselhos valiosos para
provar, diariamente, a Fortaleza de um
pecador que busca a santidade.

6.48 Caso ele consiga incorporar esses dez


hábitos de maneira meritória, estará apto para
governar plenamente o seu espírito na direção
do céu.

6.49 Caso esbarre em di culdades — que é o


desa o de todos nós — deverá usar a medida
em que a di culdade se impõe entre ele e os
seus objetivos para mensurar a estatura da
sua Fortaleza de momento.

6.50 Uma Fortaleza principiante, que ainda


carece de evolução notável, deve ter em suas
forti cações externas o acréscimo de pedras
diário, a m de interromper urgentemente a
vulnerabilidade que a sua proteção de ciente
tem oferecido aos valores que são guardados
no interior.

115
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fi
fi
6.51 Assim também o homem deve se
posicionar diante da vulnerabilidade
espiritual e levantar as muralhas necessárias
para se isolar do pecado.

6.52 O homem que é sério em seu intento não


se deixa desanimar diante dos estorvos
quotidianos.

6.53 Mas, ao contrário, ele se lembra da


Escritura Sagrada que nos exorta a dar Graças
a Deus diante de TUDO e não apenas diante
daquilo que é aparentemente favorável aos
nossos olhos.

6.54 Lembremos neste momento de Santo


Antônio de Pádua, que disse: “Quem ama não
conhece nada que seja difícil”.

6.55 De fato, quem já não testemunhou


histórias sobre a capacidade que o amor tem
d e v e n c e r o b s t á c u l o s a p a re n t e m e n t e
insuperáveis? Quem ama desconhece o
impossível. Quem ama desconhece a
116
distância, as fronteiras, os limites, a lógica e a
razão…

6.56 Por isso, o homem de Fortaleza evoluída


encara esses momentos como oportunas
ocasiões de MELHORAR no amor a Deus. De
ser melhor, de se entregar um pouco mais e de
amar um tanto mais forte.

6.57 Como exemplo de comportamento


contrário a isso, podemos ressaltar as vezes
em que recorremos a Deus, dizendo: “Senhor,
Senhor, torna-me mais forte! Torna-me mais
sábio. Torna-me mais isso e aquilo.”

6.58 Ora, devemos pensar que as orações


funcionam como a invocação de um gênio da
lâmpada. Que Deus lançará o seu “feitiço”
enquanto dormimos e na manhã seguinte
acordaremos fortes, sábios e tudo o mais que
adjuramos a Ele.

6.59 Mas de que valem as súplicas insistentes,


se, ao mesmo tempo, ignorarmos todas as
117
oportunidades que Deus produz justamente
para que façamos progresso naquela
qualidade que pedimos?

6.60 O problema do homem é que ele quer


tocar o violão sem tomar as aulas. Quer ter
dinheiro sem trabalhar. Quer ser esbelto sem
se exercitar. Quer ser inteligente sem estudar.
Quer evoluir na fé sem se dedicar a construir
um relacionamento com Deus.

6.61 Moral da história: queremos ser fortes


sem vencer desa o algum!

6.62 Por isso, da próxima vez que sentir-se


desa ado pela vida, pense consigo: “Glória a
Deus! Eu tanto pedi para ser mais forte que
Deus está me dando a chance de assim ser.
Não desperdiçarei!”

6.63 Pelo contrário, há quem não possua


sequer o domínio de relevar um tropeção sem
externar todo o seu descontentamento e ainda

118
fi
fi
mantém as ilusões de que um dia conseguirá
“ser mais forte” com a “ajuda de Deus”.

6.64 Deus já está ajudando. Nós é que não


temos feito a nossa parte.

6.65 Se não conseguimos no pouco, também


não conseguiremos no muito!

6.66 Desse modo, treinemos com as pequenas


coisas, a m de nos prepararmos para as
grandes, e alcançarmos, com isso, as virtudes
que tanto buscamos ter.

6.67 Moral: “Qual o m que vos motiva a


sustentar todas estas coisas de bom grado?”
— perguntou o abade a São João Cassiano. Eis
que ele respondeu: “Por causa do Reino dos
Céus é que toleramos tudo isto”.

Custodi focus in caelum. Seja forte e


6.68
“mantenha o foco no céu”.

119
fi
fi
—————————————————
ORAÇÃO DA LITURGIA
EUCARÍSITCA DA SANTA MISSA
—————————————————

Livrai-nos de todos os males, ó Pai, e


dai-nos hoje a vossa paz. Ajudados pela
vossa misericórdia, sejamos sempre
livres do pecado e protegidos de todos
os perigos. Enquanto vivendo a
esperança, aguardamos a vinda do
Cristo Salvador.

Vosso é o Reino, o poder e a glória


para sempre!

Amém.

120
7. DA VIDA DE ORAÇÃO

7.1São Josemaria Escrivá dizia: “Um católico


sem oração é como um soldado sem armas”.

7.2 A oração é a forma com que o homem


conecta o seu coração com o coração de Deus.

7.3 Se a santidade é o estado de pureza


espiritual capaz de nos tornar intimamente
unidos a Cristo, então, ela é também o estado
em que o coração do homem se torna UM
com o coração de Deus, numa comunhão
de nitiva.

7.4 Isso posto, podemos assegurar que a


santidade é a vivência de uma oração
contínua e permanente.

7.5 Mas como poderá viver o homem em um


estado de oração perpétuo, se possui tantos
outros afazeres para dar conta?

121
fi
7.6 São Filipe Néri responde sabiamente:
“Quem não puder dedicar longo tempo à
oração deve, pelo menos, elevar muitas vezes
o seu coração a Deus”.

7.7 Ou seja: basta que tomemos todos os


nossos atos do quotidiano como formas de
oração, como forma de igual conexão com o
coração de Deus.

7.8 Se vamos trabalhar, trabalhemos para


orgulhar a de Deus de nossos frutos. Se vamos
nos casar, casemos para que a nossa família
honre o nome dEle. Se vamos nos divertir, que
a nossa alegria preste testemunho da
bondade divina. Se vamos sair à rua, que o
nosso proceder seja a única Bíblia que muitos
terão a chance de ler naquele dia.

7.9 Santo Antônio de Pádua sabia bem:


“Podemos orar de três formas: com a boca,
com o coração ou com as mãos”. Dessa forma,
alcançaremos que todos os nossos

122
pensamentos, atos e palavras tornar-se-ão
orações.

7.10 Muitos são aqueles que oram como


carneirinhos e agem como lobos. Que, na
igreja, são verdadeiros santos e, fora dela,
verdadeiros ateus.

7.11 Se a oração não se fundir com toda a


nossa forma de ser e se limitar aos momentos
designados especialmente para ela, de nada
— ou de muito pouco — servirá. O último
estágio na vida de oração que um cristão pode
alcançar é estar em constante oração mesmo
quando não se está orando.

7.12 Tome todos os passos que as tuas pernas


derem, todas as palavras que saírem da tua
boca, todos os pensamentos que rondarem a
tua mente e todas as ações que forem de tua
responsabilidade como ORAÇÃO. Assim,
verás que não há Cristo que não possa existir
novamente nessa terra, através da tua vida.

123
7.13 De todo modo, não obstante tudo o que
foi exposto, a vida de oração necessita sim de
momentos exclusivos e separados para isso.

7.14 Imagine que o marido sai para trabalhar


a m de prover para a família. Ele sai de
manhã cedo e retorna à casa tarde da noite.
Perde nais de semana sem jamais ter um
descanso.

7.15 Tudo o que ele faz é pela família e a eles


não falta nada. É um servidor exemplar.

7.16 Porém, não há uma ligação durante o dia


para saber sobre a esposa. Não há um
momento durante a noite em que ela poderá
compartilhar o dia com ele. Não existe um só
instante em que os lhos poderão usufruir da
presença do pai.

7.17 De que adiantaria? Há serviço demais,


porém, relacionamento de menos. Mais
valeria a escassez dos bens materiais por um
tanto mais de presença.
124
fi
fi
fi
7.18 Se isso vale para nós, humanos, que
somos dependentes dos bens materiais,
quanto mais para Deus, que, de nós, quer a
afeição em primeiro lugar (“Amai a Deus
sobre todas as coisas” — Primeiríssimo
Mandamento).

7.19 Portanto, imagine um relacionamento


afetivo entre namorados, em que uma das
partes é sedenta por essa conexão e a outra
nunca se mostra disponível, sempre encontra
algo mais importante para fazer e para ocupar
o seu dia.

7.20 Quanto tempo demorará para que a


parte desvalorizada se encha disso e rompa
com a relação?

7.21 Muitos são os que já passaram por isso


e sentiram na pele a dor da indiferença e da
rejeição por parte de um outro indivíduo.
Imagine, agora, a tristeza de Deus que há

125
tantos anos é renegado por muitos às últimas
e subalternas prioridades.

7.22 Ele não se enche. Ele não termina. Ele


pacientemente espera que, um dia, tu o ames
de volta.

7.23 Se somos capazes de sofrer por alguém,


simplesmente porque julgamos merecer tal
afeto, mesmo que nunca tenhamos feito nada
de grandioso por ela, imagine aquele que deu
a vida por nós: o que Ele não tem esperado?

7.24 A maior história de amor possível é a de


alguém que dá a vida por um outro. É quando
o nosso bem mais precioso, a vida, é oferecido
em prol de alguém que amamos.

7.25 Essa é a belíssima história do amor que


Jesus Cristo escreveu conosco e que, por nossa
culpa, tem se tornado uma história de amor
não correspondido.

126
7.26 Não permita que isso acabe dessa
maneira e retome o relacionamento. Abra o
seu coração HOJE e diga: “Perdão, Senhor. Eu
não te correspondi por tanto tempo mas a
partir de hoje será uma nova história!”

7.27 Concentre-se em desenvolver uma vida


de oração, nos moldes de entrega em que você
sonha viver com o seu amor terreno.

7.28 Não é bom acordar e receber uma


mensagem de “Bom dia” do seu amado?
Portanto, acorde e não esqueça de consagrar o
dia que virá pela frente ao bom Deus.

7.29 Não é bom receber surpresas durante o


dia que te fazem saber que o amado lembrou
de ti? Pois então diversas vezes ao dia pare o
que está fazendo e diga: “Senhor Jesus, eu te
amo e te quero presente aqui comigo!”

7.30 Não é bom ser lembrado de que o


emprego do seu cônjuge serve ao propósito de
construir uma vida juntamente contigo ou que
127
os exercícios físicos que ambos fazem servem
para se manterem belos um para o outro?
Sendo assim, lembre-se igualmente de dedicar
as suas atividades a Ele!

7.31 Não é bom chegar ao nal do dia e ter


uma longa conversa sobre tudo o que se
passou com você? Portanto, entre no seu
quarto, feche a porta e conte tudo a Deus. Ele
espera ansioso por esse momento!

7.32 Um dos mais proeminentes teólogos da


era patrística da Igreja, São Gregório de
Nazianzo, já nos emprestou a régua e ensinou
a justa medida: “É preciso se lembrar de Deus
com mais frequência do que se respira”.

7.33 Logicamente, o Deus onisciente já sabe


de tudo o que se passou durante o dia. Mas,
Ele está ávido para viver esse
RELACIONAMENTO conosco.

128
fi
7.34 Por isso, São Gregório ainda completaria
dizendo: “Deus tem sede que tenhamos sede
dEle”.

129
8. DA VIDA INTELECTUAL

8.1“O que deseja a alma com mais veemência


do que a verdade?” — questionou Santo
Agostinho.

8.2 A vida intelectual deve ser pautada por


quatro passos: buscar a verdade, compreender
a verdade, assimilar a verdade e difundir a
verdade.

8.3 As Escrituras ensinam que Jesus a rmava


— não apenas — ser o caminho e a vida, mas,
também, a própria Verdade. Somado a isso,
sabemos (também biblicamente) que em Deus
subsistem todas as coisas.

8.4 Ou seja, Deus, que É a própria verdade,


está presente em todas as coisas e nós, na
nossa missão intelectual de busca pela
verdade, temos que encontrá-lo em cada uma
delas.

130
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8.5 Santa Teresa Benedita já dizia que: “Quem
procura a verdade, consciente ou não, procura
a Deus”. Isso quer dizer que a vida intelectual
deve treinar o homem para buscar o Senhor.

8.6 Deus faz-se presente através do que é


BOM, BELO e VERDADEIRO. Por isso,
quando o homem entra em contato com
quaisquer coisas que o remetam a esses
valores, ele se eleva e se aproxima de Deus
numa conexão natural.

8.7 Por isso, devemos buscá-lo em tudo. Não


simplesmente no sentido religioso e espiritual
propriamente dito, como nos estudos da
teologia, mas, buscar a Deus em TUDO
mesmo. Se estudamos matemática, biologia,
história, artes, loso a, geogra a…
absolutamente qualquer objeto de estudo
pode ser encarado como uma busca por Deus.

8.8 Se Ele está em todas as coisas, se Ele é o


criador do céu, da terra e de tudo o que nela
existe de visível e invisível, não é de se
131
fi
fi
fi
e s p a n t a r q u e e n c o n t re m o s D e u s n a s
entrelinhas dos fenômenos da natureza.

8.9 Ou no brilhantismo de um lósofo que


desvenda complexidades existenciais e as
expõe de uma forma tão rica para nós, coisa
que prontamente nos eleva por beber de sua
fonte.

8.10 Ou na expressão artística de um pintor,


um poeta, um escultor, um arquiteto, um
músico, cuja obra nos deixa maravilhados e,
por isso, in a a pequenez de nosso espírito
rumo a uma transcendente grandeza divina.

8.11 Se a cosmovisão cristã assegura que os


talentos humanos são dons concedidos a nós,
logo, aquilo que fazemos de bom com essas
aptidões dão testemunho das suas origens
celestes.

8.12Moral: em tudo o que há neste mundo


podemos ver as digitais de Deus.

132
fl
fi
8.13 Se estudamos sobre teologia, estamos
estudando Deus diretamente. Se estudamos a
realidade elementar do mundo e dos seres
humanos, estamos, também, estudando Deus
— mesmo que indiretamente —, pois, seria
este nada menos do que o estudo das suas
obras.

8.14 Poderíamos, por acaso, estudar as maçãs


e ignorar as macieiras de onde elas vêm? Tal é
o absurdo que o homem moderno se atreve a
cometer: tentar conceber a realidade e
responder as questões existenciais da vida,
ignorando o criador de tudo isso.

8.15 “Não busco compreender para crer, mas


crer para compreender” — Santo Anselmo de
Cantuária já havia descoberto a ordem natural
das coisas no século XI, muito embora, dez
séculos depois a humanidade ainda não a
tenha assimilado perfeitamente.

8.16 Quando falamos de realidade, inclui-se


nisso igualmente as ideias, os pensamentos, as
133
vertentes ideológicas que disputam a
con ança do ser humano.

8.17 Ao estudar a formação das nuvens de


chuva, por exemplo, poderíamos até mesmo
encontrar diversas explicações cientí cas
con itantes. Mas, em todas elas, é possível
conciliar a conclusão a que chegam os
especialistas com a certeza de que Deus está
por trás do processo conduzindo tudo e
mantendo a harmonia da natureza.

8.18 Porém, em relação às ideias, não temos


as mesmas garantias, uma vez que este campo
— mais precisamente a nossa mente — é onde
o diabo mais gosta de colocar as suas
confusões para, então, no lugar de nos
aproximarmos de Deus através da busca pelas
verdades, possamos nos afastar dEle ao nos
deixarmos seduzir por FALSAS verdades.

8.19 É por isso que o foco na verdade deve


ser sempre a coisa mais importante na vida
intelectual.
134
fi
fl
fi
8.20 Muitos, porém, são os que colocam
outras importâncias na frente disso e
terminam por subjugar a verdade ao serviço
de uma ideia.

8.21 Nós, se deixarmos por conta dos


estímulos e in uências exteriores que
recebemos ao longo da vida, tornar-nos-emos
logo um apanhado aleatório de características,
vícios e opiniões que se formam mediante a
dinâmica natural de ação (vinda de fora para
dentro) e reação (de dentro para fora).

8.22 Durante a nossa formação isso acontece


espontaneamente até o momento em que o
homem, maduro, decide tomar o controle da
sua personalidade e decidir, por si, o que ele
será no futuro; qual homem ele quer ser.

8.23 Aquele que rejeita o amadurecimento e


consequentemente vive sem jamais
reivindicar o seu posto ao volante da própria
vida, torna-se um escravo desta personalidade
135
fl
aleatória que se forma e, por vezes, busca na
vida intelectual nada mais do que um
respaldo para pensamentos, sentimentos e
comportamentos já incorporados.

8.24 Um respaldo aparentemente razoável e


lógico que explique o seu próprio eu na
relação com a realidade exterior, de uma
forma que silencie as contradições da alma e
ludibrie a sua consciência, a m de apascentar
possíveis sentimentos de culpa e contradição.

8.25 É como se uma pessoa buscasse se


adequar à verdade, enquanto outra quisesse
forçar a verdade a se adequar a ela.

8.26 Desnecessário dizer que esses dois


indivíduos estarão separados por um abismo,
que se torna praticamente inconciliável na
medida em que pensam, agem e raciocinam
baseados em duas realidades paralelas —
uma real e outra ilusória.

136
fi
8.27 Deus não se divide. Deus não dá
direcionamentos contraditórios. Deus não
possui duas verdades. São Maximiliano Kolbe
avisava: “Nada pode mudar a verdade. Só se
pode buscá-la, reconhecê-la e segui-la”.

8.28 Se dois entram em con ito a respeito


das “verdades de cada um”, é possível que:
um esteja certo e o outro esteja enganado ou
que os dois estejam enganados; mas, não é
possível que os dois estejam certos ao mesmo
tempo.

8.29 Por assim ser, a busca pela verdade deve


ser, antes de mais nada, um exercício de
honestidade e sinceridade.

8.30 E, caso a verdade buscada e


compreendida seja contrária aos nossos
prévios conceitos, deve-se impor a eles e
substituí-los com humildade.

8.31Mais vale um homem que muda de ideia


cem vezes e chega por m ao entendimento,
137
fi
fl
do que aquele que permanece a vida inteira
rme em suas crenças, porém enganado em
todas elas.

8.32 Por isso, a vida intelectual serve para


pautar esse descobrimento em relação ao
próprio Deus e a sua criação, o que inclui a
nós, seres humanos.

8.33 Ninguém — e isso é lógico —,


conscientemente, deseja ser enganado,
acreditar em mentiras e colecionar falsas
premissas. Mas, na medida em que cuidamos
desta área da vida com pouco zelo, abrimo-
nos ao risco temerário de permitir que tudo
isso aconteça. Ou seja, pecamos pelo desleixo.

8.34 Na medida em que deixamos a preguiça


dos estudos nos abater ou o orgulho de não
dar o braço a torcer nos dominar, estamos
optando, por assim dizer, pela situação em
que a comodidade é mais importante do que o
conhecimento verdadeiro.

138
fi
8.35 As consequências desse tipo de
comportamento são nefastas, pois, se há
alguém que se interessa em impedir — ou
atrapalhar, ao menos — que os seres humanos
cheguem à verdade e reconheçam Deus em
todas as coisas, esse alguém é o diabo.

8.36Como poderíamos continuar vivendo do


mesmo modo, sabendo que estamos presos
em uma armadilha diabólica?

8.37 Devemos buscar, devemos compreender,


devemos assimilar e devemos difundir, para
ajudar aqueles que ainda não despertaram em
suas próprias caminhadas. Eis um dever
moral!

8.38 São Tomás de Aquino diz, na Summa


Theologiae: “Contemplata Aliis Tradere”. Ou
seja, as verdades contempladas por nós
devem ser levadas aos demais como uma obra
de caridade, obrigatoriamente.

139
8.39 Aliás, essa diretriz vem desde o século
primeiro! No Didaqué — a chamada “instrução
dos doze apóstolos” de Jesus na fase
primitiva em que a Igreja Católica ainda se
estruturava — essa missão cristã já estava
bem clara a todos os seus: “O Pai quer que se
dê parte a todos nos dons que se recebe”.

8.40 Haverá de existir, pois, obra de caridade


maior do que ganhar uma alma para Deus?
Do que abrir os olhos de um cego? Do que dar
entendimento a um perdido? Do que ajudar
um principiante a se posicionar perante a vida
de uma forma mais condizente com o que
Deus espera dele?

8.41 Se uma simples esmola que damos ao


mendigo já signi caria tanto para Deus,
vislumbremos o agrado com que o seu
coração se regozija diante de tais realizações.

8.42 Portanto, repito: a vida intelectual deve


ser pautada por quatro passos. 1. Buscar a

140
fi
verdade; 2. Compreender a verdade; 3.
Assimilar a verdade; e 4. Difundir a verdade.

8.43 Esse processo se desdobra da seguinte


forma: começamos a buscar a verdade quando
decidimos investigar as controvérsias da vida
— seja em que área de estudo for — como o
policial que conduz um inquérito.

8.44 Não existe NADA que pode se colocar


entre o investigador e a verdade sobre a
autoria do crime.

8.45 Da mesma forma, devemos levar nossos


estudos com idêntica seriedade, sob pena de
estarmos condenando à prisão o inocente e
absolvendo o culpado, que, no caso da vida
intelectual, terá nós mesmos como o inocente
condenado (presos à uma realidade FALSA) e
o diabo (pai da mentira) como o criminoso
absolvido, posto na rua em liberdade a m de
roubar e matar mais pessoas.

141
fi
8.46 Lembrem-se: o valor de uma opinião vale
o tanto de tempo que ela demorou para ser
formada. Não nos apressemos em fechar as
questões, mas, ao contrário disso, tentemos
adiar essa conclusão ao máximo possível e
analisar — com sinceridade — a maior gama
de dados sobre o objeto de estudo. É a virtude
da Prudência em jogo.

8.47Assim teremos não só buscado a verdade


com e ciência, mas, também, estaremos no
caminho de compreendê-la corretamente.

8.48 Seguindo: assimilar a verdade signi ca a


consciência prática daquela ideia.

8.49 Ou seja, a nossa capacidade de ajustar a


teoria com a vida real. É a vivência concreta
das ideias e dos conceitos abstratos.

8.50 Se há na teoria uma linda ideia, que, na


prática, traduz-se em desastre, essa ideia é tão
desastrosa quanto a sua aplicabilidade sugere
e nada pode ter de lindo.
142
fi
fi
8.51 Igualmente, de nada pode adiantar, por
exemplo, chegar à verdade sobre o que é o
amor e não proceder de forma condizente
com esse entendimento. Melhor seria que o
entendimento jamais tivesse chegado, pois,
assim, pelo menos poderíamos argumentar
que não sabíamos.

8.52 Deus não condenará aqueles que jamais


tiveram a chance de conhecê-lo, mas,
fulminará os hipócritas, porque esses sabem,
falam, mas não fazem.

8.53 Lembrando que, assim como Santo


Afonso de Ligório dizia: “A misericórdia
divina foi prometida a quem teme a Deus e
não a quem abusa dela!”. Logo, se temos o
conhecimento, ajamos de acordo com ele.

8.54 E, por m: difundir a verdade. Como foi


dito anteriormente, é uma obra de caridade!

143
fi
8.55 Se Deus nos ensina a partilhar a riqueza
material com aqueles que menos têm, para
saciar suas necessidades físicas, imaginem o
que Ele não espera que façamos com a riqueza
intelectual e espiritual, que são de valor
imensamente maior.

8.56 Certamente, o que Ele espera de nós não


seria o ato de guardá-las para nós mesmos
enquanto o mundo a nossa volta padece por
falta de conhecimento.

8.57 A vida intelectual, ao contrário do que


muitos pensam, não é uma vocação de alguns
poucos. De uma elite destinada a absorver o
conhecimento e se distinguir dos demais.

8.58 Ocorre que alguns nascem com um maior


interesse genuíno, maior resistência às longas
horas de estudo, são mais curiosos por
natureza…

8.59Contudo, se todos são chamados a


conhecer Deus, todos são igualmente
144
chamados a conhecer a verdade. Se todos são
chamados a viver a santidade, todos são
chamados a viver a intelectualidade.

8.60 Não apenas a m de conhecer a verdade


principal de que Jesus Cristo é o nosso Senhor
e Salvador — verdade a qual muitos religiosos
se concentram a estudar com exclusividade
—, mas, também, todas as verdades
coadjuvantes que decorrem desta, sobre todas
as coisas da vida, e que podem — com
absoluta certeza — enriquecer mais ainda a
nossa noção sobre a verdade principal e a
nossa relação com o sobrenatural.

8.61 Podemos pensar que não, mas, estas


verdades coadjuvantes têm grande
capacidade de nos aproximar ou afastar da
verdade principal e é, através delas, que a
maioria das pessoas cai nas armadilhas do pai
da mentira.

8.62 Portanto, não é bom que o homem seja


alheio ao conhecimento disponível e é dever
145
fi
de todos estar em dia com essa demanda, de
modo a se PROTEGER e a não permanecer
vulnerável.

8.63 Mais importante do que estudar para


fazer-se culto, é tornar-se um indivíduo
blindado, que não se deixará enganar, nem
cairá nas garras do mundo.

8.64 Inúmeros são os casos em que pessoas


são sgadas durante os estudos sobre temas
diversos, como economia, por exemplo. Disso,
partem para o engajamento com uma visão de
mundo materialista e, quando se dão conta,
estão demonizando o cristianismo.

8.65 Ou nos estudos sobre as ciências, que


levam indivíduos à soberba de formar uma
visão de mundo racionalista e crer somente
naquilo que a sua mente consegue explicar
através do método cientí co. Tão cedo,
quando se dão conta, estão negando a
existência de qualquer aspecto espiritual.

146
fi
fi
8.66 Ou se deixam levar por fábulas históricas
que transformam heróis em vilões, assassinam
reputações e reescrevem a realidade dos fatos
de modo a fazer a mentira se espalhar.
Quando percebem, já tornaram-se defensores
do erro e críticos da maltratada verdade.

8.67 E assim é possível que aconteça quase


que em qualquer área de estudo. Por isso,
precisamos estar sempre atentos: o diabo
trabalha nos detalhes. Oremos e vigiemos.

8.68 Não tenhamos medo em rever os nossos


conceitos e crenças. Podemos submeter cada
uma delas a essa avaliação e, se forem justas,
que a mantenhamos. Caso estejam
equivocadas, que alívio será reparar um erro!

8.69 Se de nimos a busca pela verdade como


a busca por Deus, deixemos para trás a
suscetibilidade às artimanhas que pretendem
nos desvirtuar do caminho.

147
fi
8.70É por isso que a Ordem dos Dominicanos,
em seus 800 anos de sabedoria, carrega
consigo a essência com que seu fundador, São
Domingos de Gusmão, encarou a vida; e que é
resumida numa palavrinha que virou lema
para os seus frades: Veritas (Verdade).

8.71 Dizem, eles, que, quanto mais


conhecemos, mais amamos!

8.72 Grande instrução. De fato, não podemos


amar aquilo que não conhecemos. E, portanto,
quanto mais conhecimento, mais capacidade
de amar verdadeiramente. Seja a Deus, ao
próximo, ao mundo ou a nós mesmos.

8.73 Seguindo esse raciocínio, lembremos que


Deus é amor e, portanto, amar o mundo, as
pessoas, a sociedade, o seu país e tudo o que
nos cerca — ou seja, toda a criação — signi ca
simplesmente querer para eles aquilo que
Deus planejou quando os trouxe à existência.

148
fi
8.74 Se esse é o signi cado de amar e não é
possível amar sem conhecer profundamente,
logo, nossa missão aqui na Terra é totalmente
dependente da vida intelectual.

8.75 Somos capazes de amar na mesma


medida em que somos capazes de
compreender a realidade; seja do mundo, das
pessoas, da vida.

8.76 Muitos são extremamente inteligentes,


mas não são capazes de amar
verdadeiramente. Isso ocorre pois adquirir
cultura não é sinônimo de construir sabedoria.

8.77 Ler, raciocinar e acumular informações


são práticas que não garantem acesso à
verdade, se não forem atreladas a uma vida
de oração, que colocará o cérebro para agir a
serviço da bondade, da caridade e do amor.

8.78 Qual seria a diferença entre um


estrategista maligno que trama um plano para
o mal das pessoas e um santo doutor da Igreja
149
fi
que usa o seu intelecto para aproximar essas
pessoas de Cristo?

8.79 Ambos são inteligentes e cultos. Mas um


possui o coração voltado para Deus; coração
esse que a oração e a graça se encarregaram
de tornar fértil.

8.80 O outro possui um coração estéril, onde


o conhecimento chega mas não oresce. É
plantado, mas não dá frutos.

8.81 E nos lugares onde Deus não é bem-


vindo, o diabo logo toma para si o papel de
colocar coisas que ocupem esse vácuo.

8.82 Ora, o que pode querer uma pessoa sem


Deus, se não poder, riquezas, fama, satisfazer
suas vaidades e necessidades físicas?

8.83 Assim é usado o conhecimento nas mãos


dos que não o buscam com o objetivo de
aproximar-se de Deus.

150
fl
9. DA VIDA AFETIVA

9.1 A Bíblia narra no evangelho de Lucas que


Marta, ao receber a visita de Jesus em sua
casa, inquietou-se, pois, sua irmã permanecia
aos pés de Jesus, focada totalmente nEle e nos
seus ensinamentos, enquanto ela fora deixada
sozinha com as tarefas domésticas.

9.2 Ao questionar as atitudes de sua irmã,


Jesus interpelou: “Marta, tu te preocupas e
andas agitada com muitas coisas. No entanto,
uma só é necessária. Sua irmã escolheu a
melhor parte e esta não lhe será tirada.”

9.3 Só existe uma coisa realmente necessária


à vida e ela é Jesus.

9.4 Em nossas vidas, também nós andamos


preocupados e agitados com muitas e muitas
coisas, assim como Marta.

9.5 Porém, não precisamos que Jesus surja e


nos repita a mesma lição. Ela já nos foi dada e
151
basta que tomemos o texto bíblico como um
direcionamento de Deus que se perpetua ao
longo da história para todas as gerações.

9.6 Como foi dito ao longo de toda esta obra,


o sentido da vida é, exclusivamente, a
santidade.

9.7 E, para viver a santidade, precisamos


estar conscientes desta realidade inescapável:
a única coisa que realmente importa é Jesus; o
resto se trata apenas de distrações.

9.8 Marta, por assim dizer, estava distraída.


Vejam só: Jesus apresentou-se pessoalmente.
Visitava-a em sua casa, pregando e ensinando.
Que privilégio! Entretanto, ela permaneceu
inquieta com os afazeres domésticos e
desperdiçou a oportunidade de estar com Ele.

9.9 Quantas vezes, também, não nos


inquietamos com mil e uma frivolidades e
perdemos o senso de que só há uma coisa
necessária?
152
9.10 Q u a n t a s v e z e s n ã o p e rd e m o s a
oportunidade de estar na sala, aos pés de
Jesus, como a irmã de Marta, porque estamos
com a atenção voltada ao trabalho, aos
amigos, ao entretenimento, ao lazer, aos
passatempos ou a nós mesmos?

9.11 Jesus enfatizou que a escolha da irmã de


Marta não lhe seria tirada, porque Ele é a
única coisa que tem o poder de nos preencher
verdadeiramente de forma eterna e plena.

9.12 Já as demais são passageiras e corroídas


com o tempo. Se não nos forem tiradas ainda
em vida — como são a maioria —, mesmo
assim de nada valem, pois, não chegarão
conosco ao outro lado dela, onde restarão
apenas a nossa alma, a nossa fé e as nossas
boas obras.

9.13 Como disse Santa Teresinha: “A vida é


apenas um instante entre duas eternidades”.

153
9.14 Temos que estar conscientes de que
estamos aqui somente para investir! Não para
colher.

9.15 Receberemos, sim, aquilo que for


necessário para o propósito de Deus em nossa
vida. A muitos — é verdade — é dado
dinheiro, outros são alçados a cargos de poder
e alguns alcançam grande sucesso…. Mas, não
são todos cuja missão perpassa por essas
benesses terrenas.

9.16 Via de regra, o foco do cristão deve ser


exclusivamente a ordem que a Escritura
atribui a Jesus para conosco: “Tome a sua
cruz, dia após dia, e me siga”. Todos têm a
sua.

9.17 “Quem se impacienta com a sua cruz


fatalmente achará uma outra mais pesada” —
dizia São Filipe Néri.

154
9.18 Não almejemos, portanto, o cristianismo
que nos promete a prosperidade, a felicidade
e as maravilhas que o mundo tem a oferecer.

9.19 É certo que Deus não quer a nossa


infelicidade, mas QUEM DISSE que a
felicidade reside nessas coisas materiais da
vida? Dinheiro, segurança, status, saúde,
beleza, paixões… Certamente não foi Ele
quem disse.

9.20 Essa é a ideia que a nossa carne faz da


felicidade. E — lembremos agora — que a
busca pela santidade se faz justamente no ato
de morrer para os desejos da carne.

9.21 Tais dádivas podem até mesmo serem


dadas a ti e, se vierem, glória a Deus por isso!
Mas, saibamos também nos alegrar diante das
di culdades e da vida menos glamourosa,
pois a condição que Jesus impôs para segui-lo
não foi a de gozar das bençãos nesta vida,
mas, sim, saber suportar a cruz.

155
fi
9.22 Jamais a rmou Ele: “Sigam-me e terão
uma vida de cinema”.

9.23 Pelo contrário, assim o disse: “No


mundo, terás a ições. Mas tenham calma, Eu
venci o mundo.” (Jo 16:33).

9.24 Isso quer dizer que Jesus venceu o


mundo em vida? Não, Ele teve de morrer para
isso acontecer. Sua glória veio somente depois
da cruci cação. A coroa de ouro que Ele
ostenta hoje, sentado à direita do Pai, em vida
não passou de uma humilhante coroa
espinhos.

9.25 Se o próprio Cristo teve que esperar até


lá para viver a sua glória, por que haveríamos
de exigir a nossa logo agora?

9.26 Responderiam alguns: “Porque, se uns


vivem essa boa vida aqui na Terra, por que
não eu também, que muito mais merecedor e
temente a Deus sou?”

156
fi
fl
fi
9.27 Nem sempre as regalias nos são
concedidas para o bem. Mas, com muita
freqüência, elas vêm para nos acomodar e
distrair com os prazeres da vida e, assim, tirar
o foco da santidade — que só se alcança
através das di culdades, dos apuros e dos
reveses.

9.28 “Está em grande perigo de cair quem se


julga seguro” — Santo Afonso Maria de
Ligório.

9.29 Devemos vigiar e orar com a mesma


força, tanto nos dias bons, quanto nos dias
maus; pois, enquanto as tempestades chegam
para ameaçar o homem tão claramente e pô-lo
em alerta imediato, a calmaria vem para iludir
e corrompê-lo sorrateiramente.

9.30 Para fazê-lo relaxar e descansar, bem


como os discípulos que dormiram (enquanto
Jesus orava no Getsêmani) e foram
repreendidos: “Vigiai e orai para não cairdes

157
fi
em tentação, pois o espírito está pronto, mas a
carne é fraca!” (Mt 26,41)

9.31 Ou seja, muitas ciladas surgem no


caminho do cristão, que, normalmente, espera
por elas em forma de doença, desemprego e
tristezas em geral. Mas, igualmente perigosas
são as ciladas positivas, que surgem em forma
de sucesso, saúde, notoriedade, romance… e
nos dizem maldosamente ao pé do ouvido:
“Veja só, o que fazes já está bom. Não precisa
de mais nada… não se dedique demais, você
já tem o que precisa, não se cobre tanto…”.

9.32 Muito mais letal é a artimanha do diabo


que nos envolve com as coisas sedutoras da
boa vida e, ainda por cima, faz-nos acreditar
que essas são retribuições divinas pelo nosso
irrepreensível comportamento, do que
comparada àquelas que nos enche de temor,
desespera e faz correr direto para o colo de
Deus.

158
9.33 Permaneçamos, então, focados em
conquistar o nosso modesto lugar no Reino
dos Céus, pois, diante das duas eternidades
de alegria a que Santa Teresinha se refere, não
há tempo de sofrimento que possa não valer a
pena neste breve instante passageiro.

9.34 Exposto tudo isso, trazemos agora esta


ideia para o campo dos relacionamentos.

9.35 O casamento é uma das escolhas mais


importantes que o ser humano faz em vida,
pois é quando ele escolhe, entre as bilhões de
possibilidades existentes no mundo, aquela
única pessoa com a qual ele se fundirá e se
tornará UMA.

9.36 Logo, se a “única coisa necessária” é


Jesus, o foco é o céu e a missão de vida é a
santidade, devemos escolher alguém cuja
companhia nos aproximará disso.

159
9.37 Ao vislumbrar as suas possibilidades,
pergunte-se: essa pessoa me aproximará do
céu ou me afastará dele?

9.38 Gastamos muitas energias fazendo


criteriosas listas de prioridades, onde nos
colocamos como verdadeiras Martas,
dispersos com coisas sem importância.

9.39 Ao casar, Deus nos dá duas obrigações


apenas: 1. Amar a outra pessoa e os lhos
resultantes desta relação, ao ponto de dar a
sua vida por eles se for preciso; e 2. Garantir
que eles sejam salvos e estejam reunidos, um
dia, contigo e com Deus na vida eterna.

9.40 Todo o resto é prescindível. Qualquer


coisa além disso é construção da nossa cabeça
tentando nos desviar do foco.

9.41 “Que não vos detenham as coisas deste


mundo, pois os bens do céu vos esperam” —
Papa São Leão Magno.

160
fi
9.42 Pode, talvez, parecer que todo o exposto
n e s t a a p re s e n t a ç ã o s o b re p ro v a ç õ e s ,
desprendimento e renúncia nada tem a ver
com o tema do casamento e da vida afetiva.
Mas, tem tudo a ver.

9.43 O casamento é o espaço onde homens e


mulheres mais vão aprender a renunciar e a
amar verdadeiramente.

9.44 O casamento santi ca!

9.45 Embora uns possam dizer: “Não o meu!


O meu me faz é pecar e ser uma pessoa pior”.
Ora, as provações que lhe são impostas
através da vida do seu marido ou esposa
servem EXATAMENTE para lhe fazer
desenvolver as virtudes que Deus espera que
você construa.

9.46 No lugar de olhar para os erros e


comportamentos incompreensíveis do outro e
atribuir-lhe a culpa, olhe para si mesmo e

161
fi
pergunte-se: o que será que Deus quer que EU
desenvolva com essa provação?

9.47 Se um é irritante, será que não é um


chamado para que o outro evolua na
paciência? Se um é desordeiro, será que não é
um convite para que o outro se torne menos
sistemático e controlador? Se um não tem
bens, será que não é Deus tentando forçar o
outro a ser menos materialista?

9.48 De verdade, qualquer problema entre


duas pessoas pode ser encarado como uma
tarefa conjunta, onde os dois deverão
encontrar-se na metade do caminho: um, por
amor, deve eliminar ou ao menos reduzir o
que incomoda o outro; e esse outro, também
por amor, deverá eliminar as reclamações e
reeditar a sua mente para se incomodar
menos com aquilo.

9.49 Digo isso, pois, é evidente que não é


porque devemos encarar as di culdades da
vida positivamente, que o parceiro de cada
162
fi
um deve impô-las de forma intencionada
sobre o outro ou então não ligar de preservá-
las. Isso não é amor. Enquanto um se santi ca
através do sacrifício da aceitação, o outro
também deve se sacri car através do sacrifício
da renúncia. Há uma oportunidade dupla que
o casal, como UM, deverá equilibrar.

9.50 O mal das pessoas é que elas não


con am em Deus e dizem “serei feliz se eu
tiver isso”, “serei infeliz se eu não tiver
aquilo”.

9.51 Assim, muitas vezes culpam o seu


parceiro e colocam sobre ele o fardo de lhe
fornecer o que a sua carne demanda.
Enxergam na outra pessoa o inconveniente
obstáculo entre si e a felicidade e tentam
moldá-la em função das suas projeções.

9.52 Projeções que são, apenas, resultado de


um recurso inconsciente do nosso cérebro que
tende a buscar sempre as situações de
comodidade e conforto.
163
fi
fi
fi
9.53 A nossa carne quer buscar o consumo
e ciente das energias. Ela, há milhares de
anos, quer que o ser humano faça de tudo
para se colocar na condição mais favorável
possível, pois, assim, quando uma
necessidade básica surgisse — caçar o
alimento, proteger-se de predadores et cetera
—, estaríamos mais aptos a obter êxito.

9.54 Esse é o motivo da zona de conforto ser


tão sedutora e isso foi muito útil durante
milhares de anos em que realmente
dependíamos dos nossos esforços físicos para
sobreviver.

9.55 Enquanto o homem ainda possuía pouca


capacidade de raciocinar, se não houvesse um
instinto interior que o levasse a buscar abrigo
em locais estratégicos, acumular alimentos e
não desperdiçar energia com atividades
dispensáveis para a sobrevivência,
provavelmente ele teria sido extinto.

164
fi
9.56 Mas, passados milhares de anos e depois
do desenvolvimento de toda uma civilização,
esse instinto não faz mais tanto sentido.
Principalmente quando abordamos a fuga —
ou pior: a terceirização da culpa — em relação
aos problemas de um relacionamento.

9.57 Quando fugimos da oportunidade de


vencer um desa o colocado por Deus em
nossa vida, estamos rejeitando o caminho da
santidade e optando pelo caminho da
comodidade.

9.58Estamos preferindo a famosa porta larga.


Optando pelo que é mais fácil e cômodo.

9.59“Entrai pela porta estreita; porque larga é


a porta e espaçoso é o caminho que conduz à
perdição.” (Mt. 7:13)

9.60 Assim, preferimos abandonar o outro


com o problema que achamos que é só dele.
Evidentemente, é muito mais fácil dizer:

165
fi
“Resolva logo isso, pois és tu o motivo da
minha infelicidade.”

9.61 Resultado: a cumplicidade acaba, os dois


se tornam adversários, passam a competir
entre si e o casamento vai à falência.

9.62 No entanto, os casais deveriam encarar


todas as questões como oportunidades criadas
por Deus para que cresçamos naquilo que é
preciso.

9.63 E se não entendemos o propósito,


busquemos entender! O problema persistirá
até que ele seja vencido por ti.

9.64 Em todos nós, existem pontos negativos


a serem abandonados e pontos positivos a
serem desenvolvidos. Muitos deles são
possíveis de serem ajustados sozinhos em
nossa vida a sós, mas isso tem um limite.

9.65 Chega a um ponto em que o ser humano


bate na margem da sua capacidade e isso
166
interrompe o crescimento. É nesse momento
em que Deus coloca uma outra pessoa em
nossa vida.

9.66 Uma pessoa — assim como nós — cheia


de defeitos, cheia de pontos a serem
igualmente trabalhados… Mas, a despeito de
tudo isso, Ele ainda assim nos ordena: ame-a
até a morte, dê a sua vida pela salvação dessa
pessoa e JAMAIS te separe dela.

9.67 Que missão!

9.68 É preciso realmente estar morto para si


mesmo e cheio do Espírito Santo de Deus para
ser bem sucedido neste ofício.

9.69 E é por isso que muitos preferem não se


casar, porque, humanamente, é impossível
viver o matrimônio nos moldes que Deus
espera.

9.70 Digo “humanamente”, porque, com Ele,


tudo é possível.
167
9.71 E, pela graça de Deus, será possível
experimentar do amor verdadeiro ainda nessa
vida, através da pessoa que Ele colocou ao
nosso lado.

9.72 Recordemos o início desta obra quando


de nimos o que era o amor verdadeiro: Jesus
Cristo.

9.73 Logo, amar verdadeiramente é fazer


Cristo presente na vida de alguém. Não
apenas aproximando essa pessoa de Deus,
mas SENDO para ela o que Jesus seria se aqui
estivesse.

9.74 Isso signi ca não apenas fazer de tudo


para levá-la até o céu, mas, também, trazer o
céu até ela! Tornar a vida dela melhor, mais
leve e mais fácil!

9.75 Por outro lado, se não estamos


preparados para suportar por alguém as dores

168
fi
fi
que Cristo sofreu por nós, então não estamos
preparados para amar.

9.76 Como diria São João da Cruz: “O amor


não consiste em sentir grandes coisas, mas em
despojar-se e sofrer pelo amado”.

9.77 A medida do amor é o sofrimento. É o


quanto se doa e não o quanto se recebe.

9.78 Amamos na mesma proporção em que


estamos dispostos a sofrer por alguém. Por
isso que o maior amor do mundo é o amor
daquele que deu a vida por nós, pois sofreu o
maior dos sofrimentos já existentes.

9.79 Em contrapartida, o amor que desiste, o


amor que acaba, o amor que não vence as
di culdades e o amor que não nos aproxima
de Deus nunca foi amor. Mas, apenas uma
tentativa frustrada de autossatisfação.

9.80 A evolução na vida espiritual, a


construção da santidade e o fortalecimento da
169
fi
fé — objetivos para os quais o amor é
condição obrigatória — possui um processo
idêntico à construção dos músculos e o
fortalecimento do corpo: dói, é
desconfortável, obriga-nos a renunciar
diversos prazeres, a eleger prioridades, tira-
nos da zona de conforto, acordamos todos os
dias com preguiça de fazer o que é preciso ser
feito… Mas, mesmo assim, quem tem esse
objetivo precisa pagar o preço, porque é o
único caminho.

9.81 Toma as misérias do teu quotidiano como


degraus bondosamente colocados por Deus
em tua rota para que sejas capaz de subir até
Ele! Santa Catarina de Siena dizia: “Cristo
cruci cado fez do seu corpo uma escada, a
m de que subamos às alturas da vida
celeste”.

9.82 Portanto, não ataques o teu companheiro


pelas penas que deves suportar, mas sejas
grato porque os custos que tiveres de pagar
por ele serão investimentos para ti no Reino
170
fi
fi
dos Céus, bem como os custos que ele tiver de
pagar por ti serão patrimônio acumulado para
a vida eterna dele.

9.83 Ora, a busca pela santidade é justamente


o processo de aproximação e fusão com o
sagrado coração de Jesus em vida, para que
após a morte possamos estar em comunhão
perfeita.

9.84 Não nos enganemos achando que teremos


esse privilégio sem passar por tal puri cação.
O preço é pago aqui e agora; e verdadeiro
suicídio é adiar o pagamento disso para a vida
de lá.

9.85 Ou seja, caso passemos a enxergar o


casamento como o meio de alcançar o objetivo
eterno, estaremos nalmente deixando de ser
Martas — preocupadíssimos com questões
passageiras — e nos tornando mais e mais
como a sua irmã, que possuía foco exclusivo
no “único necessário”.

171
fi
fi
10. DA VIDA SOCIAL

10.1 “Ubi vera amicitia est, ibi idem velle, et idem


nolle, tanto dulcius, quanto sincerius”. Tradução:
“Onde está a verdadeira amizade, aí está o
mesmo querer e o mesmo não querer, tanto
mais agradável, quanto mais sincero”. Assim,
São Tomás de Aquino de niu a amizade na
Summa Theologiae.

10.2 Em palavras mais simples, isso quer


dizer que: amigo é quem quer as mesmas
coisas que você e quem rejeita as mesmas
coisa que você.

10.3 Muitos acreditam nos dias de hoje que o


correto é ser amigo de todos e que desfazer
amizades por certas diferenças é sinal de
imaturidade.

10.4 Engano. O relativismo nos prega peças


traiçoeiras quando nos obriga a crer que é
moralmente obrigatória a manutenção de

172
fi
relacionamentos com pessoas de hábitos,
valores e crenças das mais distintas.

10.5 Pior: faz com que nós acreditemos ainda


que seria essa a exortação que Jesus nos faria
se pudéssemos questioná-lo.

10.6 Por acaso o evangelho de Mateus não


narra as palavras do próprio Cristo a rmando
que Ele não veio à terra a m de trazer paz,
mas, sim, causar divisão até mesmo entre pais
e lhos?

10.7 De certo, não é prudente interpretar


como se Jesus se interessasse pela discórdia.
Não é esse o seu objetivo. Mas, ao proferir tal
a rmação estava Ele prevendo que a nossa
escolha em segui-lo demandaria um estilo de
vida inconciliável com o daqueles que
decidiram não segui-lo.

10.8 Por isso, continuou dizendo: “Quem


ama o pai e a mãe mais do que a mim, não é
digno de mim”.
173
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fi
10.9 Maravilhoso seria que todos optassem
por seguir o Caminho, a Verdade e a Vida.
Mas, para a nossa tristeza, muitos assim não
fazem.

10.10 Como cristãos, temos o dever de


evangelizar e buscar a conversão dessas
pessoas, por amor a elas e a Deus.

10.11 Mas, não temos obrigação — e nem é


bom que assim seja — de sermos colegas de
quem vive em um outro mundo, totalmente
diferente do nosso. Mesmo que o próprio
Cristo tenha andado no meio dos perdidos,
Ele assim o fez única e exclusivamente a m
de salvá-los da vida mergulhada no pecado e
não para misturar-se com eles e com os seus
hábitos.

10.12 “Bem-Aventurado aquele que não anda


segundo o conselho dos ímpios, nem se distrai
pelo caminho dos pecadores, nem se assenta
na roda dos escarnecedores. Antes, tem o seu
174
fi
prazer na lei do Senhor e na sua lei medita de
dia e de noite.” (Sl 1, 1-2)

10.13 É também no evangelho de Mateus que


Cristo ordena: “Se um dos teus olhos te faz
pecar, arranca-o e lança-o fora. É melhor
entrares no céu com um só olho, do que com
dois seres lançado ao inferno”.

10.14 Se assim é dito a respeito de uma parte


tão importante do nosso corpo, o que dirá
sobre a amizade com o ímpio?

10.15 Assim, sigamos o valioso exemplo de


São Domingos Sávio, que anunciava
sinceramente: “Antes morrer do que pecar!”

10.16 Uma das maiores causas de desgraça


para a alma de um cristão é tentar conciliar a
vida espiritual com o mundo.

10.17 Quando irão aprender? Não é possível


conciliar! O cristão foi feito, mesmo, para ser
diferente; para ser tomado como estranho;
175
para ser zombado e para sentir-se um peixe
fora d’água… assim como Jesus sentiu-se
quando aqui esteve.

10.18 É urgente escolher a quem desejamos


imitar: Jesus ou as celebridades seculares?
Preferimos a renúncia ou o glamour?
Buscamos a cruz ou as curtidas? Encontremos
a beleza que há por trás desse duro dilema.

10.19 Adapte, pois, as citadas palavras de


Cristo para a tua vida neste momento e re ita:
“Se amas mais ‘o que quer que seja’ do que a
mim, não és digno de mim”.

10.20 Se tentas progredir na vida espiritual


fechado em teu quarto, mas, aos olhos do
mundo, tenta manter as aparências
descoladas que esperam de ti, “não és digno
de mim”.

10.21 Se vais a igreja semanalmente e és


fervoroso na adoração, mas, fora dela, não

176
fl
defendes a tua fé diante das ofensas do
mundo, “não és digno de mim”.

10.22 Por acaso, aceitaríamos um namoro


com alguém que jura amor verdadeiro
enquanto a sós, mas, na presença alheia,
esconde, omite e renega o seu “amado”?

10.23 É inconciliável. Ou você pega o teu


amor por Deus e o apresenta ao mundo
batendo no peito e cantando aos quatro
ventos ou “não és digno de mim”.

10.24 Seja como for, se o objetivo da vida é a


santidade e o objetivo da amizade é nos unir
com quem tem os mesmos interesses que nós,
devemos sempre nos perguntar: essa amizade
acrescenta O QUE na minha caminhada para
o céu? Ou, no máximo: o que eu posso
acrescentar na caminhada dessa pessoa rumo
a glória eterna?

10.25 Se a resposta for “nada”, ame à


distância. Não é necessário o corte de relações,
177
continue sendo bondoso e amável, útil e
solícito se precisarem de ti como um bom
cristão deve ser. Mas, não se apegue ao que
pode te atrapalhar e tirar o teu foco do “único
necessário”, que é Jesus.

10.26 Não hesite em perder amizades de


infância ou desagradar quem já foi muito
próximo de ti. Seja rme. Toda transformação
gera rupturas e é urgente deixar para trás o
que não está mais em sintonia com o teu novo
homem.

10.27 Por que tanta di culdade em abandonar


a roda de amigos? Por que tanta di culdade
em ser aquele que não sorri frente aos
comentários de baixo nível? Por que tanta
di culdade em ser aquele que tenta elevar o
nível das pessoas ao redor? Por que tanta
di culdade em demonstrar descontentamento
diante de comportamentos imorais?

10.28 Resposta: porque o homem é fraco e


prefere morrer a não ser aceito pelo grupo.
178
fi
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fi
fi
fi
Prefere vender a sua alma ao diabo do que ter
que se levantar sozinho contra a maioria! Ele
não vê que isso faz dele o fracote mais
patético que pode existir?

10.29 Nem todos têm a vocação para a vida


monástica, portanto, não é preciso viver
isolado: se for preciso, arrume um novo
grupo. Faça amizades melhores. Frequente
outros tipos de lugar.

10.30 Ninguém vai morrer por causa disso.


Aliás, só tendemos a nos bene ciar com essa
mudança.

10.31 Não quemos, pois, olhando para trás,


remoendo lamentações sobre aquilo que
supostamente perdemos. Foque no que tens a
ganhar.

10.32 Alguém, por acaso, aceitaria continuar


envolvido com “amigos” que em todo
encontro sempre nos fazem perder dinheiro?

179
fi
fi
10.33 Por que aceitaríamos então manter a
relação com “amigos” que nos fazem perder o
nosso — tão mais valioso — lugarzinho no
céu?

10.34 O que tanto te impede de romper com


as más in uências? O orgulho pelo que vão
pensar? A dependência da aprovação do
grupo? O medo da solidão? Se amas mais a
sua própria imagem do que a Cristo, não és
digno dEle.

10.35Faça hoje mesmo um favor para si


mesmo e deixe de ser fraco.

10.36 Perceba que as respostas para essas


perguntas sempre serão pontos da
personalidade que precisam urgentemente ser
eliminados: dependência, vaidade, orgulho,
fraqueza, acomodação, vícios…

10.37 São coisas que nos prendem em uma


realidade sombria e que tentam impedir a
transformação que Deus quer fazer em nós.
180
fl
Santo Inácio de Loyola alertava: “Ninguém
sabe o que Deus faria de nós, se não
opuséssemos tantos obstáculos à sua graça!”

10.38 Em complemento a isso, São João


Crisóstomo também ponderava que:
“Ninguém pode buscar a perfeição sem ser
diferente”. Portanto, resista a essa tendência
que atrai o ser humano a seguir o bando.
Perceba a beleza que há em ser diferente, em
destacar-se do grupo, em andar na contramão
do mundo.

10.39 Seja forte e aceite esse convite: Jesus


quer ter você com Ele na vida eterna! Cerque-
se de pessoas que não só queiram o mesmo
para as suas respectivas vidas, como também
alegrar-se-ão em vê-lo progredir na direção da
sua.

10.40 Diga agora para ti mesmo: “Meu foco


é o céu e só é meu amigo quem me ajuda a
conseguir essa graça!”. Pronto: eis aí a
fórmula para a verdadeira amizade.
181
11. DA MISSÃO

11.1A missão do homem e da mulher nesta


vida é: amar a Deus sobre todas as coisas,
amar o próximo como a ti mesmo e pregar o
evangelho. Simples assim.

11.2 Engana-se quem pensa que recebeu a


missão de ser um advogado, um atleta, um
professor. Pro ssão não é sinônimo de missão
para o homem.

11.3 Existem vocações que Deus nos dá, para


que possamos SERVIR a sociedade — o que
faz parte do segundo ponto: amar o próximo
— mas, são essas vocações que devem nos
AUXILIAR na missão principal.

11.4 Com as nossas vocações, sim, poderemos


construir uma carreira e nos tornarmos bons
pro ssionais em quaisquer áreas, inclusive no
sacerdócio.

11.5 Entretanto, quem busca chegar ao m da


vida e ser lembrado com um bom advogado,
182
fi
fi
fi
um excelente professor ou um notável artista
está embaralhando as prioridades: temos que
chegar ao m da vida e sermos lembrados
principalmente como grandes homens e
mulheres DE DEUS.

11.6 As pessoas devem olhar para nós e ver


o amor a Cristo Jesus sendo maior e mais
aparente do que tudo!

11.7 Assim, mesmo que jamais abríssemos a


boca para anunciar o evangelho, estaríamos
levando-o aos corações alheios, ao menos
através do EXEMPLO.

11.8 Muitos indivíduos, infelizmente, têm o


coração endurecido para as coisas do alto.

11.9 Muitas pessoas, mais infelizmente ainda,


foram criadas em famílias completamente
afastadas de Deus.

11.10 Em função de toda a propaganda


anticristã que a cultura moderna empenha
contra os lhos de Deus, são muitos os que
183
fi
fi
rejeitam uma aproximação da Igreja sem ao
menos dar uma chance a ela primeiro.

11.11 Essas pessoas têm menos culpa do que


pensamos, porque são vítimas da artimanha
perspicaz criada pelo diabo para afastar mais
e mais pessoas do céu, e foram seduzidas,
desde cedo, desde a infância, sem nunca
terem tido a chance real de lutar contra isso.

11.12 Portanto, o nosso papel em meio a essa


realidade em que estamos inseridos é
simplesmente fazer cumprir a nossa missão:
amar a Deus sobre todas as coisas, amar o
próximo como a nós mesmos e pregar o
evangelho.

11.13 Se assim o zermos, estaremos en m


assimilando o verdadeiro cristianismo, que,
não consiste simplesmente em frequentar a
Igreja, mas, em SER a Igreja.

11.14 Não consiste apenas em aceitar Jesus


como nosso Senhor e Salvador, mas,
sobretudo, em SER Jesus e fazê-lo presente na
184
fi
fi
vida das outras pessoas, para que a nossa vida
dê testemunho do seu amor.

11.15 Os que nos cercam no dia a dia


precisam VER e SENTIR Jesus nas nossas
palavras e atos.

11.16 Antes de converter os demais,


transformemos a nós mesmos, então, em uma
Bíblia ambulante e permitamos que aquelas
pessoas que nunca a pegaram para ler possam
lê-la pela primeira vez através da nossa vida,
através do nosso contato com elas.

11.17 O homem que deseja salvar-se sozinho,


não se salvará.

11.18Percebam que das três partes da missão,


duas são diretamente ligadas às outras
pessoas.

11.19 Dito isso, vejamos agora como o ser


humano pode viver esta missão aqui na terra
de forma e caz.

185
fi
11.20 Primeira re exão que deve ser feita é: se
morrêssemos hoje, o que será que Deus nos
falaria ao encontrar-nos? Será que cumprimos
o que Ele esperava de nós no tempo em que
estivemos aqui? Será que usamos os dons, a
vocação e o nosso tempo de vida para
assegurar o nosso lugar no céu ou apenas
visamos dinheiro, notoriedade e
materialismos? E, por m, a questão mais
importante: será que, hoje, a porta do paraíso
estaria aberta ou fechada para nós?

11.21 Segunda re exão: agradeça porque a


situação anterior foi apenas um exercício de
imaginação e ainda temos tempo pela frente
para mudar o rumo das coisas. Porém, este
momento de fato chegará mais cedo ou mais
tarde — embora não saibamos quando
exatamente — e, nesse dia, não poderemos
abrir os olhos e nos aliviarmos por ter sido
apenas uma conjectura. Será real e a conclusão
irreversível!

186
fl
fl
fi
11.22 Logo, a questão principal dessa segunda
re exão é: quando efetivamente tivermos
morrido e a nossa vida expirada, sem nem
mais um minuto para mudar qualquer coisa
que seja, qual é a “obra acabada” que
gostaríamos de ter deixado? Qual é o homem
que eu quero ter sido?

11.23 Pense em todas as qualidades que você


gostaria de possuir, todos os defeitos que você
gostaria de não ter, todas as boas obras que
você gostaria de realizar e coloque-as no
papel. Anote mesmo.

11.24 Mas, lembre-se, esse ideal tem que estar


em harmonia com a missão do homem e com
as três partes que a compõem.

11.25 Isso não quer dizer que a única forma


de viver a nossa missão de vida é fazendo de
si um missionário, um padre, um pregador ou
algo ligado diretamente à religião. Contudo,
sua vida deve estar voltada para essa missão
(de amar a Deus sobre todas as coisas, amar o

187
fl
próximo como a si mesmo e pregar o
evangelho — explícita ou implicitamente),
seja você uma dona de casa, o presidente da
república, um professor primário ou um
empreendedor.

11.26 Após ter isso de nido, o que você


precisa fazer a partir de agora é viver os seus
dias em função de alcançar esses objetivos.

11.27 Trace caminhos até eles. Caminhos que


te levarão da pessoa que é hoje, para a pessoa
que pretende ser amanhã.

11.28 Exemplo: digamos que uma pessoa


queira abandonar — entre outros defeitos — a
preguiça, desenvolver — entre outras
qualidades — a capacidade de falar em
público e quer deixar a boa obra de ter sido
um grande agente in uenciador que motivou
milhares de pessoas a desenvolver hábitos
saudáveis.

11.29 Essa pessoa tem o dever de pesquisar


e estudar meios de eliminar o defeito que ela
188
fl
fi
deseja abandonar. Métodos e ferramentas de
como se livrar da inércia, tornar-se mais ativa
et cetera. E dia após dia, a partir de então,
policiar-se neste sentido.

11.30 Essa pessoa tem, igualmente, o dever


de pesquisar e estudar formas de desenvolver
a sua capacidade de falar em público. Perder o
medo dos holofotes, saber as técnicas de
discurso et cetera. E, dia após dia, a partir de
então, treinar essa nova qualidade.

11.31 Lembrem-se, para isso, da virtude da


Fortaleza. Ambas as metas serão difíceis.
Abandonar vícios e transformar di culdades
em virtudes nunca é fácil, MAS, todo e
qualquer ser humano é capaz de aprender e
de mudar.

11.32 Apenas faça o que deve ser feito, sem


car dando brecha para as reclamações e os
pensamentos limitantes. Tenha foco e
determinação.

189
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fi
11.33 Pois, a Bíblia diz: “O Reino dos Céus é
dos violentos!”

11.34 Isso quer dizer que para ser salvo


precisamos espancar os outros e agir com
brutalidade? Claro que não. Signi ca que é
imprescindível que sejamos agressivos no
cumprimento da nossa meta!

11.35 Nada pode nos separar dela. Nada pode


nos conter. Nada pode nos impedir. O Reino
dos Céus não é para quem o quer “mais ou
menos”! É para quem não pensa em outra
coisa a não ser estar lá um dia.

11.36 Será que Jesus se alegraria em ver que


Ele foi humilhado e cruci cado para salvar
esta multidão de preguiçosos que só sabem
reclamar sobre o quanto que tudo é difícil
demais para eles?

11.37 Será que Deus se orgulharia de nós, ao


perceber que Ele pagou um preço
inimaginavelmente caro por nossas vidas,
190
fi
fi
para que sejamos acomodados e medíocres
em tudo o que fazemos?

11.38 “Queres saber o teu valor? Olha para a


Cruz. Tu vales um Deus cruci cado” (Santo
Agostinho). O Deus-Pai entregou o seu Filho à
morte para que nós tivéssemos vida. Façamos
então algo de útil com ela!

11.39 Honremos a partir de hoje esse sacrifício


e não permitamos que ele tenha sido em vão.

11.40 Por acaso, se víssemos o nosso pai


trabalhar dia e noite, em dois empregos, por
vezes deixando de comer e abdicando das
menores regalias que poderia ter para juntar
dinheiro e pagar os nossos estudos ou nos
comprar um carro, será que seríamos capazes
de desdenhar desse presente?

11.41 Será que teríamos a audácia de matar


aulas com freqüência, de tirar notas baixas ou,
no caso do carro, de deixar ele ao relento sem
os devidos cuidados?
191
fi
11.42 Certamente, quereríamos cuidar desses
presentes com o mesmo zelo que
dedicaríamos a jóias preciosas, devido ao
sacrifício de alguém que tanto nos amou e que
foi empenhado especialmente por nós. Certo?

11.43 Por que, então, tantos e tantos não


hesitam em jogar as suas vidas no lixo,
sabendo que o sacrifício feito para salvá-la foi
maior do que todos os outros sacrifícios
possíveis somados?

11.44 Por que tantos insistem em ser


completos inúteis, egoístas que passam pela
terra focando apenas em si mesmos, nas suas
próprias satisfações, se Deus tinha planos tão
mais nobres para as suas vidas?

11.45 Se quando Deus pensou em cada um


de nós pela primeira vez e planejou a nossa
vida, a nossa personalidade, o nosso destino,
sonhava Ele com uma realidade tão melhor do
que essa que nós temos vivido?
192
11.46 É nosso dever e obrigação resgatar essa
pessoa potencial que há dentro de nós.

11.47 Em outras palavras, perguntemo-nos:


como seria a versão perfeita do meu ser aos
olhos de Deus? Essa deve ser a resposta para
as re exões que este capítulo propõe e
também o ideal a ser buscado, dia após dia,
por todos nós.

11.48 Terceira re exão: agora sobre a “obra


acabada” que buscaremos deixar. Sejamos
pro ssionais da área que for, sejamos donas
de casa, mães, pais et cetera, se amamos a Deus
sobre todas as coisas e o próximo como a nós
mesmos, então as nossas atividades devem
servir com o propósito de: 1. Honrar a Deus e
jamais ferir os valores provenientes disso; e 2.
Melhorar a vida das outras pessoas de alguma
forma.

11.49 Podemos pensar que a única forma de


exercer uma atividade que melhore a vida de
193
fi
fl
fl
terceiros seja o trabalho voluntário de
caridade, cuidando dos doentes, alimentando
os mendigos e atividades deste tipo.

11.50 Porém, um empresário que disponibiliza


um produto de qualidade está com isso
servindo à sociedade e melhorando a vida das
pessoas, fazendo uso das competências que
Deus lhe deu para isso. Além do óbvio fato de
estar ganhando honestamente o sustento com
o qual sustentará a sua família e poderá
ajudar os necessitados que cruzarem seu
caminho.

11.51 Da mesma forma, pro ssionais de


quaisquer áreas são capazes de colocar as suas
habilidades à disposição da sociedade e ainda
ganhar o seu sustento de contrapartida, o que
faz bem para a comunidade como um todo.

11.52 Os únicos critérios que um indivíduo


deve respeitar a m de conciliar a sua
atividade com a busca pela santidade são os
de não se engajar em práticas imorais e não
194
fi
fi
disseminar valores que ferem os princípios
cristãos. Exemplo: políticos que sucumbem à
corrupção ou escritores que usam o seu dom
para desvirtuar a mente da sociedade com
conteúdos imorais.

11.53 Se amamos a Deus verdadeiramente,


tudo o que fazemos é dedicado a Ele. Mesmo
se tratando do ofício de um cozinheiro que
prepara os pratos com o maior carinho ou de
uma mãe que dedica a sua vida a formar os
lhos no caminho do céu.

11.54 Todas as atividades são capazes de


glori car a Deus, depende apenas da nossa
POSTURA ao exercê-la.

11.55 Provérbios 16,3: “Consagre ao Senhor


tudo o que você faz”.

11.56 Se amamos a Deus verdadeiramente, é


lógico imaginar que em consequência disso
quereremos o bem do próximo; e não enganá-
lo, não o seu mal e não a sua perdição.
195
fi
fi
11.57 Se amamos a Deus verdadeiramente,
também não é possível imaginar que a nossa
atitude positiva perante a vida e perante as
pessoas, bem como as bênçãos e vitórias que
experimentamos diariamente — cujos méritos
daremos sempre a Jesus —, não contagiará
aqueles que nos cercam e não fará com que se
aproximem dEle.

11.58 Logo, se amamos a Deus


verdadeiramente, o cumprimento da missão
de amá-lo sobre todas as coisas, o próximo
como a nós mesmos e difundir o evangelho, é
cumprida da forma mais natural possível.

11.59 Essa é a missão verdadeira: viver de


forma a ir para o céu e fazer com que a maior
quantidade de pessoas possível possa ir
também.

11.60 Vocação, carreira, talentos e dons são


apenas ocupações e ferramentas que Deus nos
dá para que possamos movimentar as coisas
196
aqui na terra, sustentar as nossas casas e
auxiliar na missão principal, fazendo do nosso
dia a dia uma celebração de ação de graças,
que empenharemos em tudo o que zermos a
m de agradá-lo e enchê-lo de orgulho.

11.61 Tudo bem se a tua vida não tem


cumprido a missão até o dia de hoje. Reveja os
teus conceitos e mude essa história a partir
daqui.

11.62 Lembremos do alerta feito pelo Papa


Francisco: “Não diga que é católico se você
não dá testemunho. Em vez disso, você pode
apenas dizer: ‘sou de educação católica, mas
sou morno, sou mundano. Peço desculpa, não
me olhem como exemplo.’ Isso é tudo o que se
deve dizer.”

197
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12. DA FELICIDADE

12.1 A cultura moderna nos faz crescer


acreditando em alguns mantras muito
danosos para a nossa salvação.

12.2 “O que importa é ser feliz” — dizem.


Ou: “Devemos buscar a felicidade a todo
custo”. Pior ainda: “Nada é errado se te faz
feliz”.

12.3 É esse tipo de norte sem sentido que a


sociedade usa para se orientar, viver e se
basear em tudo o que faz nos dias de hoje.
Não à toa experimentamos tempos em que o
ser humano parece estar nos seus mais baixos
níveis de humanidade e nobreza.

12.4 De fato, a modernidade trouxe muitas


riquezas materiais. Avanços tecnológicos
inimagináveis, avanços cientí cos estupendos,
qualidade de vida, produtos, serviços e
segurança são exemplos de todos os pontos

198
fi
nos quais a presente geração se privilegia em
relação aos nossos antepassados.

12.5 Contudo, a que custo todo esse


desenvolvimento foi conseguido?

12.6 Por séculos em sequência, engajar os


esforços de sociedades inteiras na meta de
enriquecer tem o seu lado positivo. Mas,
certamente, isso acontecerá em detrimento de
outras áreas da vida.

12.7 Se um indivíduo qualquer focar toda a


sua energia no objetivo pro ssional, ele
poderá até alcançar tal objetivo — e
provavelmente o irá —, porém, logo, ele
estará sem saúde, sem amigos, família e a
quilômetros de distância de Deus.

12.8 Será um crescimento desequilibrado.

12.9 Podemos constatar o mesmo fenômeno


ocorrendo com as sociedades modernas, que
muito têm e pouco são.
199
fi
12.10 Ao passo em que avançaram tanto nas
questões materiais, regrediram imensamente
na moral, na tradição, na nobreza do homem,
na loso a, na teologia, na qualidade dos
valores que alimentam o senso comum…

12.11 Vivemos e nos comportamos como


tontos, que não sabem de onde vieram nem
para onde vão.

12.12 Baseamos nossas vidas em estímulos


que chegam até nós através de mídias de
entretenimento e celebridades.

12.13 Recorremos logo a cantores para nos


informar sobre economia; a artistas para nos
dizer em quem votar; a atletas para copiar os
seus estilos de vida e a blogueiras para forjar
nossas metas de relacionamento. Ou seja, os
modelos que usamos como inspiração estão
de ponta cabeça!

200
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fi
12.14 Admitamos: em toda a história, a
humanidade jamais esteve tão vulnerável nas
mãos do diabo como está neste momento
presente. Nunca foi tão fácil nos levar para o
inferno.

12.15 Os exemplos e os modelos que


escolhemos para a nossa vida são cruciais
para determinar aquilo que seremos.

12.16 Com quem nós desejamos nos


assemelhar? Quais os tipos de
comportamentos que nos causam admiração?
Quem são as pessoas com quem buscamos
conselhos? Qual o nível das companhias que
nos cercam?

12.17 A resposta para essas perguntas vai


determinar quem somos.

12.18 Comecemos agora a colocar a nossa


mente em ordem, então, atacando uma das
armas preferidas do diabo: a atração que a
nossa carne sente pela ilusão da felicidade.
201
12.19 Não existe nada mais fácil nos dias de
hoje do que enganar um homem ou uma
mulher. Basta prometer felicidade.

12.20 “Faça isso e serás feliz”ou “corte aquilo


que te impede de viver alegre” — apontam os
gurus da modernidade.

12.21 Basta que apontem o dedo em uma


determinada direção que nós corremos feito
bobos para lá, mesmo que esta seja a direção
do abismo. A ânsia de ser feliz é tão grande
que nos cega e bloqueia a Prudência.

12.22Fomos enganados quando nos disseram


que estamos nessa vida para sermos felizes!
Quem nos disse isso?

12.23 A própria Escritura Sagrada trata dessa


questão, em incontáveis ocasiões: o que o
homem veio fazer aqui na terra? Em nenhuma
delas a resposta é “procurar a felicidade”.

202
12.24 Muito pelo contrário. O texto bíblico
apenas nos exorta insistentemente a buscar a
renúncia, o sacrifício, em se alegrar diante do
sofrimento.

12.25 Nada remotamente parecido com a


noção de felicidade que o mundo nos ensinou
a ter.

12.26 Mesmo assim, é incrível ver cristãos


cada vez mais e mais empenhados nas suas
próprias buscas pela felicidade.

12.27 E pior: usando a religião como uma


maneira de serem mais felizes. Pois, se
honrarmos a Deus, certamente teremos
sucesso, dinheiro, um casamento perfeito e
saúde eterna — pensam os iludidos.

12.28 Novamente: se alguém nos prometeu


isso, esse alguém não foi Jesus!

12.29 Perseguir a felicidade é uma tarefa


desumana que jamais nos realizará, pensada
203
perfeitamente com o propósito de formar
expectativas inalcançáveis dentro de nós e
resultar em almas frustradas, corações
quebrados e mentes doentes.

12.30 Procuramos ser mais felizes na medida


em que temos mais e mais daquilo que nos
entretém momentaneamente: dinheiro,
aquisições, reconhecimento, notoriedade,
amigos, elogios, viagens, sensações de prazer
et cetera.

12.31 Mas, é lógico que nada disso pode ser


uma constante. Um ser humano pode se
alegrar pontualmente com a realização dessas
metas, mas é um momento de alegria em troca
de in nitos momentos de ansiedade que o
precedem — sem contar nos eternos
momentos de angústia que sucederão após a
morte.

12.32 Após a realização do seu desejo,


impõem-se outras metas e outros sonhos, pois
o ser humano que não tem o consolo de Deus
204
fi
para o seu coração se torna insaciável na
busca de preencher tamanho vazio.

12.33 Pense no seguinte: passamos a vida


inteira vislumbrando que, caso tenhamos
tudo o que imaginamos precisar — o
emprego, o carro, a casa, o corpo, dentre
outras coisas — seremos, então, plenamente
felizes.

12.34 Mas olhe a sua volta. As pessoas que


realmente chegam a esse nível de ter tudo,
muitas vezes, são as mais infelizes. Quantos
artistas, belos, ricos e famosos já não vimos
perder tudo o que tinham por causa das
drogas? Quantas celebridades belas, ricas e
famosas já não vimos cair em profundas
depressões (fora as tantas que passam por isso
sem que nunca tomemos conhecimento)?

12.35 Não é verdade também que os países


desenvolvidos e mais ricos do mundo são os
que possuem os maiores índices de suicídio?

205
12.36 Uma vida sem problemas reais para
ncar os nossos pés no chão e manter o senso
da realidade é uma vida sem parâmetros.
Ficamos sem referência da realidade e
passamos a buscar problemas que não existem
para que tenhamos algo pelo qual sofrer.

12.37 Começamos a acreditar que não ter a


promoção que queríamos, a atenção que
desejávamos, o emprego que acreditamos
merecer ou as viagens que sonhamos fazer é o
m do mundo. Perdemos o senso das
proporções.

12.38 Ah, nada como uma doença terminal,


um tragédia acidental ou uma catástrofe
natural para recolocar as coisas em ordem!
Precisaremos realmente pagar para ver?

12.39 Por livre e espontânea vontade,


mergulhamos de cabeça em uma luta
incansável que suga todas as nossas energias
em função de coisas que vêm, acontecem e
simplesmente passam num estalar de dedos.
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12.40 Não queiramos, portanto, ser felizes.
Queiramos fazer aquilo que o Nosso Senhor
Jesus Cristo nos pediu.

12.41 Queiramos ser bondosos e amáveis,


queiramos ser úteis aos planos de Deus aqui
na terra, queiramos agregar algum valor à
vida das pessoas que nos cercam e queiramos
nos desenvolver na busca pessoal pela
santidade.

12.42 Se conseguirmos isso, não há dúvida:


seremos felizes!

12.43 Ao contrário do que esse capítulo pode


ter feito parecer até aqui, não há nada de
errado com a felicidade em si. Deus não nos
fez para que fôssemos infelizes e nem sente
prazer com o nosso sofrimento.

12.44 Mas, Ele nunca — e nem poderia —


disse que devemos perseguir a felicidade
como a meta principal de nossas vidas.
207
Devemos buscar uma boa condição através do
trabalho, devemos buscar uma boa saúde
através de hábitos saudáveis, devemos buscar
o que existe de bom… mas, não cair no erro
de vender a nossa alma pela concretização de
nenhum desses desejos. Saibamos atribuir as
devidas prioridades!

12.45 A felicidade, por assim dizer, é uma


consequência que acontece em função da
realização do nosso chamado. Chamado esse
que viemos destrinchando ao longo de toda a
obra e que, a essa altura, já conhecemos pelo
nome de santidade.

12.46 Quantos foram os santos na história da


nossa querida mãe Igreja que se alegraram
quando outros não veriam alternativa a não
ser tirar a própria vida? Que sorriram quando
outros apenas conseguiriam chorar? Que
amaram a Deus mais e mais quando outros
sentiriam rancor e amargura?

208
12.47 Nisso reside a santa felicidade: não em
ter a vida ideal, mas em fazer do ideal a sua
vida.

12.48 Preste atenção e medite nas palavras de


São Francisco de Assis: “Se algo rouba a paz
do teu coração é porque esse algo roubou,
primeiro, o lugar de Deus na tua vida”.

12.49 Não encorpemos, portanto, o culto à


felicidade terrena. Nós não viemos a este
mundo PARA sermos felizes. Nós viemos
para cumprir um propósito muito claro e é a
realização deste propósito que nos fará felizes,
em consequência.

12.50 Conheces liberdade maior do que essa?


É possível, sim, que a sua felicidade
independa do que lhe acontece.

12.51 Seja nos melhores ou piores dias, a


felicidade de saber que EM CRISTO estamos
salvos, é consoladora e paci ca os ânimos do
coração atribulado.
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12.52 Em nenhuma parte da Bíblia
encontraremos escrito: “Bem-aventurados os
que sentem felicidade, porque deles é o Reino
dos Céus”.

12.53 Por outro lado, o que existe de fato é:


“Bem-aventurados os que sofrem, porque
deles é o Reino dos Céus”. (Mt 5,10)

12.54 A sabedoria bíblica ensina assim, pois,


aquele que busca o seu galardão em vida já o
recebeu. Mas, aquele que não o recebe em
vida e mesmo assim espera no Senhor o terá
pela vida eterna.

12.55 Podemos fazer de tudo para conquistar


as maiores façanhas em vida, mas, estas
durarão no máximo algumas décadas e nos
serão tiradas.

12.56 No entanto, aquele que planta na terra


para colher no céu, receberá uma safra
perpétua.
210
13. DO SOFRIMENTO

13.1 Santa Teresa de Lisieux certa vez


questionou-se: “Sofro intensamente, mas, será
que sofro BEM?”

13.2 Como seria possível sofrer “bem”, se o


sofrimento se con gura na vivência de uma
situação obviamente ruim? O presente
capítulo se propõe a responder essa pergunta.

13.3 O sofrimento humano sempre vem


acompanhado de: uma origem; uma
explicação; e um propósito.

13.4 A origem pode ser explicada pela


analogia da luz e da escuridão: assim como a
escuridão não é algo, em si, mas,
simplesmente, o nada na ausência de luz, o
mal é a consequência direta do
distanciamento das pessoas em relação a
Deus.

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13.5Já a explicação é simples: se não existisse
o mal, que parâmetro nós teríamos para
conhecer o que é o bem?

13.6 Em uma situação de dualidade, as


próprias partes demandam o antagonismo do
seu contrário para serem de nidas e
identi cadas em função uma da outra.

13.7 A de nição do que é belo, por exemplo,


existe justamente para separar os limites entre
a beleza e a feiúra. Sem uma, não é possível
reconhecer a outra; e o mesmo acontece com o
bem e o mal.

13.8 Falando bem praticamente: se não


houvesse a pobreza, não seria possível
exercitar a caridade; e, se não existissem
pessoas com problemas, não seria possível
exercitar a compaixão.

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13.9 Já o propósito é a parte mais complexa
e onde muitos acabam por perder a fé.

13.10 A nal, é difícil entender as motivações


de Deus para deliberadamente permitir que
nós soframos. Devemos, portanto, estabelecer
algumas premissas antes de nos
aprofundarmos na questão:

13.11 Primeiro: enquanto nós enxergamos a


realidade pela limitada janela do presente, o
entendimento divino compreende todo o
passado, presente e futuro de uma só vez,
bem como todas as possibilidades e ameaças
— mesmo aquelas que jamais chegam a
passar pelo nosso radar.

13.12 Logo, a noção que temos daquilo que


merece o nosso sofrimento é confusa, pois,
muitas vezes, sofremos exclusivamente pela

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angústia de não sabermos o que acontecerá na
frente. Sendo, que, Deus sempre sabe!

13.13 Deus nunca perde o controle das coisas.

13.14 Segundo: é errado avaliar as situações


de acordo com aquilo que acreditamos ser
justo ou injusto, merecido ou imerecido por
nós, pois isso incute à gura de Deus uma
mentalidade humana que Ele certamente não
tem.

13.15 Deus jamais pensará com a nossa cabeça


e devemos nos sentir aliviados por isso!

13.16 Muito embora não sejamos capazes de


identi car a lógica, de início, por trás de cada
situação de di culdade que se apresenta, em
algum momento ela se revela e, então, o
entendimento vem como uma tocha que tudo
ilumina em meio às trevas.

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13.17 Com isso exposto, podemos partir para
a de nição dos propósitos: o sofrimento que te
move para a frente; o sofrimento que te move
para o lado; e o sofrimento que te move para
cima.

13.18 O que te move para a frente é aquele


gera o desconforto necessário para fazer a
pessoa transformar sua vida e rotina.

13.19 Por exemplo, uma doença que vem em


função de vícios e maus hábitos, problemas
nanceiros que vêm em consequência da
acomodação e da preguiça de batalhar pelo
que se quer ou relacionamentos que vão mal.

13.20 Tudo isso pode acontecer para mostrar


que estamos no caminho errado e fazer com
que cresçamos na vida, com que

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abandonemos comportamentos prejudiciais e
nos tornemos pessoas melhores.

13.21 Muitos problemas que enfrentamos na


vida são como pedras e barrancos que servem
para desviar o curso de um rio. Da mesma
forma, Deus pode permitir que di culdades
se apresentem para que sejamos forcados a
dar outro rumo ao que estamos fazendo.

13.22 A sabedoria está em reconhecer essa


necessidade de mudança e deixar que a
vontade dEle molde o novo curso.

13.23 Isso tem o mesmo efeito de uma


reprovação que o aluno sofre no período
escolar.

13.24 Se focarmos apenas no fato de que,


anualmente, os colégios de todo o mundo
obrigam uma parcela de todos os seus alunos

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a passarem por todos os estudos novamente,
fazendo-os perderem um ano de suas vidas e
a companhia dos colegas, isso poderá soar
como uma desventura sem tamanho e
imerecida, mesmo pelo pior dos estudantes.

13.25 Mas, se olharmos pelo lado de que o


mau desempenho do estudante repetente é
fruto de hábitos que ele precisa ajustar para o
seu próprio BEM, conseguiremos entender o
valor que a reprovação poderá ter para o
destino futuro desse jovem.

13.26 Bem como entender também que se o


ano seguinte for iniciado com a mesma
postura do passado, a reprovação não terá
servido de nada e a vida continuará a lhe
estapear na face.

13.27 Assim, além de ter sofrido em vão, o


aluno colecionará outros percalços futuros,

217
desnecessariamente. Simplesmente porque
não assimilou o propósito que havia por trás
do seu problema.

13.28 Já o sofrimento que te move para o lado


é aquele que nos obriga a olhar para o
próximo; para os pobres e necessitados — não
só de recursos nanceiros, mas, também, de
saúde, de atenção e do que quer que seja.

13.29 Muitas vezes acontecem adversidades


na vida de pessoas boas e pensamos: “Isso
não é justo. Ele não merecia.”

13.30 Contudo, um problema na vida daquela


pessoa é uma oportunidade para que os que a
cercam possam praticar a caridade e a
bondade que suas almas necessitam para
entrar no céu.

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13.31 Se não houvesse sofrimento no mundo,
como poderíamos cumprir essa determinação
de Cristo?

13.32 Devemos lembrar agora que, ao ser


perguntado sobre quem havia pecado para
que um determinado cego tivesse nascido
com essa condição, Jesus disse: “Ele não
pecou, nem seus pais pecaram, mas é assim
para que se manifestem nele as obras de
Deus!” (Jo 9,1-3).

13.33 Poderia existir, supostamente, honra


maior do que ser um instrumento da glória
divina na Terra?!

13.34 Obviamente que ser cego não é algo


b o m , m a s , D e u s s a b e r e c o m p e n s a r.
Novamente: Deus não prometeu aos que
sofrem o Reino dos Céus? (Mt 5,10)

219
13.35 Reiteradamente, caímos no erro de
pensar que a religião cristã serve para que
tenhamos a famosa “vida em abundância” a
que se refere a Bíblia.

13.36 Quem assim interpreta está muito


claramente procurando a seita da autoajuda,
dos que buscam a Deus para que Ele o sirva e
não ao contrário. Ora, a vida em abundância
se dará na SALVAÇÃO DA TUA ALMA e não
na satisfação da tua carne.

13.37 Logo, a religião cristã não existe para


nos proporcionar uma vida melhor do que
aquela levada pelos descrentes, mas para nos
fazer encarar as misérias terrenas de uma
forma mais adequada.

13.38 Se quisermos saber como, basta que


voltemos nossos olhos para o exemplo de São
Francisco de Assis: “É tão grande o bem que

220
espero (o céu), que todo o sofrimento me é um
grande prazer”.

13.39 Apenas se deprimem os que acreditam


que foram feitos para este mundo! Lembrem-
se que: “A vida é apenas um instante entre
duas eternidades”.

13.40 Portanto, não nos escandalizemos com o


sofrimento alheio, mas, ao contrário disso,
saibamos entendê-lo como oportunidades que
Deus nos dá para subir alguns degraus na
direção do céu.

13.41 Aquele que olha para o sofrimento e se


amargura diante dele está não somente
rejeitando subir as escadas que Deus lança do
Alto para nós, como também permitindo que
o sofredor padeça em vão.

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13.42 Por m, o sofrimento que nos move
para cima é aquele que nos coloca em uma
situação tão desesperadora que não temos
mais nada nem ninguém a recorrer, a não ser
a Deus.

13.43 Sentimos a nossa impotência, damos


conta da nossa pequenez, vulnerabilidade e
constatamos que, de fato, por mais que
pareçamos fortes, não somos nada sem Ele.

13.44 Deus nos quer por perto e nos dá todas


as chances de nos conscientizarmos disso por
nós mesmos, sem que precisemos sofrer. Mas,
ainda assim, existem aqueles que necessitam
ser chacoalhados pelo medo ou pelo
desespero para se darem conta de que estão
no caminho errado e ignorando o amor de
quem deu a vida por eles!

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13.45 Quem, nem por uma única vez, não
ouviu dos seus pais ameaças de que não
receberia ajuda deles caso insistissem em fazer
aquilo que eles reprovaram?

13.46 O mesmo acontece em nossa relação


com Deus, que é o nosso Pai Celestial, quando
insistimos em não obedecer e Ele resolve
permitir que certos eventos aconteçam para
que possamos tomar um choque de realidade.

13.47 Feliz daquele que passa por isso e


aprende de primeira, pois, muitos
permanecem teimosos pela vida inteira, cegos
e batendo cabeça na direção do abismo.

13.48 “Os obstáculos são ensinamentos para


o seu espírito” — Santa Rita de Cássia.

13.49 Mas, independentemente se é para


frente, para os lados ou para cima, o nosso

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desa o, então, é identi car o propósito
naquilo que passamos e corrigir o que deve
ser corrigido, para que não volte a acontecer.

13.50 Deus fala nas entrelinhas. Logo, se


desejamos ser santos, precisamos estar
prontos para saber ouvi-lo.

13.51 A única coisa que não pode acontecer é


deixarmos que o sofrimento seja algo que nos
move para baixo e nos afunde na depressão,
na mágoa, na perda da fé ou na desistência,
porque, desse jeito, anulamos o seu propósito
de oportunizar a manifestação das obras de
Deus e as provações acabam se convertendo
no contrário disso, conduzindo-nos
diretamente ao inferno, ao invés do céu.

13.52 Pois, assim trabalha o diabo: ele nos


tenta a fazer o que é errado e, depois que o
sofrimento aparece, surge novamente para

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apontar o dedo e nos fazer sentir culpados,
para dizer ao pé do ouvido que sofremos
porque Deus nos abandonou e que não há
solução para a nossa vida.

13.53 “Você é um caso perdido” — diz ele.


“Jamais conseguirá agradar a Deus… Por que
não termina logo com isso?”… “Sua vida é
uma perda de tempo”.

13.54 Não deixemos que ele jogue assim com


a nossa mente.

13.55 Não deixemos que ele nos afaste do


amor de Deus.

13.56 Pois — assim como a Igreja nos ensinou


a rezar lindamente pelos últimos dois mil
anos — “o Deus, que instrui o coração dos
vossos éis, com a luz do Espírito Santo, faz
com que apreciemos retamente todas as coisas

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e gozemos sempre da sua consolação! Ele
envia o vosso Espírito e, com isso, tudo é
criado para renovar a face da terra!”

Por Cristo, Senhor Nosso. Amém.


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