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0|Kingdom Hearts - RE:Coded: A Romantização

KINGDOM HEARTS -
RE:CODED:
A ROMANTIZAÇÃO
EDIÇÃO ESPECIAL DO 20º ANIVERSÁRIO

KINGDOM HEARTS - RE:CODED: THE NOVEL (A ROMANTIZAÇÃO)


TOMOCO KANEMAKI
ILUSTRAÇÕES: SHIRO AMANO
OBRA ORIGINAL: TETSUYA NOMURA, DAISUKE WATANABE

Traduzido, revisado e editado por Sorinha Phantasie.

Esse livro é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e incidentes são obra da
imaginação do autor ou usados de forma fictícia. Quaisquer semelhanças com eventos, locais ou
pessoas, vivas ou mortas, são coincidências.

KINGDOM HEARTS © Disney Enterprises, Inc.


Personagens da série de videogames FINAL FANTASY © 1990, 1994, 1997, 1999, 2000, 2001,
2002, 2003, 2005, Square Enix Co., Ltda.
Todos os direitos reservados.

Tradução em português brasileiro pela PHANTASIE TRANSLATE, 2019. A versão atual desta
tradução foi revisada e reenviada em 2022.
A tradução deste material foi elaborada e disponibilizada sem fins lucrativos. Se você pagou
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KINGDOM HEARTS -
RE:CODED:
A ROMANTIZAÇÃO
EDIÇÃO ESPECIAL DO 20º ANIVERSÁRIO

ÍNDICE
CAPA
PÁGINAS COLORIDAS

PRÓLOGO

CAPÍTULO 1: Castelo Disney

CAPÍTULO 2: Ilhas do Destino

CAPÍTULO 3: Traverse Town

CAPÍTULO 4: País das Maravilhas

CAPÍTULO 5: Coliseu do Olimpo

CAPÍTULO 6: Agrabah

CAPÍTULO 7: Hollow Bastion

CAPÍTULO 8: Renascimento/Reverso

CAPÍTULO 9: Castelo do Esquecimento

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ADEUS.

Isso é tudo o que posso fazer para me redimir por ter mentido esse tempo todo. Se nunca
mais voltarmos a nos ver, se você se esquecer de mim — é como tem que ser. Afinal, isso tudo
aconteceu porque eu não tive coragem o bastante.
Mas então, você disse uma coisa.

Não, adeus não!

Não entendi o que estava querendo dizer, então só consegui balançar a cabeça, quieta.

Quando eu acordar, vou te encontrar. E aí não vai ter mais mentiras. Nós vamos ser amigos
de verdade. Prometa pra mim, Naminé.

Uma promessa...
Mas você vai se esquecer dessa promessa. Não vai se lembrar de mim quando acordar.
Eu queria acreditar em você. E sinto que posso confiar que você se lembrará de mim. Afinal,
é você, Sora. Você tem tantas memórias que se formaram dentro de ti. Mesmo que a corrente de
memórias se desfaça, os elos ainda continuarão lá. A memória da nossa promessa sempre estará
dentro de você, em algum lugar.
Isso é o que eu escolhi acreditar.

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8|Kingdom Hearts - RE:Coded: A Romantização
O GRILO FALANTE OLHAVA PARA O SEU PAR DE DIÁRIOS E REFLETIA SOBRE
suas duas longas aventuras em uma das muitas salas do Castelo Disney, o mundo sob regime do Rei
Mickey. O rei, o Pato Donald e Pateta estavam descansando após suas jornadas, passando um tempo
com a Rainha Minnie, Margarida e Pluto.
O Grilo os havia acompanhado nessas missões para salvar o mundo duas vezes — uma para
impedir que a escuridão se espalhasse e outra para pôr todos os corações perdidos de volta em seus
devidos lugares.
Embora ambas as jornadas tivessem sido bastante difíceis, o Grilo não chegara a participar
de nenhuma luta. Seu papel era apenas o de cronista. No fim, aqueles registros de suas viagens eram
tudo o que ele tinha para mostrar seus esforços.
Enquanto passava pelas páginas dos dois volumes, o Grilo pensou no garoto e seus amigos,
aqueles viveram a verdadeira aventura. Mas as páginas do primeiro diário continuavam todas em
branco — exceto por uma única frase:

Agradecer Naminé.

Bom, talvez fosse porque estas eram as únicas palavras que aquele livro devia ter.
Enquanto o Grilo folheava as páginas em branco, seu coração se agitou de emoção. Podia
ver vividamente em sua cabeça tudo o que acontecera com Sora, Donald e Pateta. Isso lhe trouxe
um sorriso ao rosto.
Foi quando aconteceu.
O Grilo perdeu o fôlego por um instante quando descobriu mais um texto em uma das
páginas do diário que devia estar em branco:

Sua dor será apaziguada quando você voltar para findá-la.

Ele nunca tinha visto aquele trecho antes — sequer se lembrava de tê-lo escrito.
O Grilo fechou o diário com força e saiu correndo da sala, disparando pelo corredor em
direção ao estúdio do rei — Mickey.
— Vossa Majestade! Vossa Majestade!
O Grilo passou pela pequena porta aninhada no canto de uma maior às pressas, perturbado
demais para se preocupar em bater, e saltou sobre a mesa de Mickey, que ficou um pouco perplexo
diante daquilo.
— Nossa, Grilo, qual o problema?
— É o diário! Tem uma mensagem que eu nunca vi antes! — Ele abriu o pequenino livro
diante de Mickey.
— Uma mensagem misteriosa?
— Aham. Tenho certeza que não a escrevi. E você sabe que eu nunca deixo o diário fora de
vista, nem uma única vez.
Mickey olhou de perto para o diário do Grilo. Como o Grilo era muito menor que ele, o
diário era absolutamente minúsculo.
— Não faço ideia de quando alguém poderia ter tido a chance de fazer isso... — O Grilo
inclinou a cabeça enquanto Mickey cruzava os braços.
— Sua dor será apaziguada? Puxa, Grilo. Parece que alguém precisa da nossa ajuda e não
sabe o que fazer. Vamos chegar ao fundo disso.
— É claro, mas como? — perguntou o Grilo, apreensivo, erguendo o olhar para Mickey. —
Todas as outras páginas estão completamente em branco.
— Claro, as palavras sumiram, mas não quer dizer que o diário esteja vazio. — Mickey
assentiu com um sorriso e se levantou.

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10 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
Algumas horas depois, duas pequenas figuras corriam apressadamente de um lado para o
outro pelo estúdio do rei — os irmãos esquilos, Tico e Teco. A dupla estava montando uma espécie
de grande máquina, com um enorme monitor e um teclado ligados a ela.
Donald e Pateta os observavam, curiosos.
— Sabe o que eles tão aprontando? — perguntou Donald.
— Não. — Pateta deu de ombros, igualmente estarrecido.
— Eles vão extrair as memórias do meu diário — explicou o Grilo.
— Hã? — Donald inclinou a cabeça.
— O que acontece é que o diário ainda deve conter as memórias dos mundos sobre os quais
eu escrevi quando os visitamos.
— Mas não foi tudo apagado? — Também confuso, Pateta inclinou a cabeça ainda mais para
o lado que Donald.
— Bom, sim, as palavras desapareceram, mas as memórias ainda devem estar lá, pelo
menos de acordo com a minha teoria. Se convertermos o diário em dados e os analisarmos, talvez
possamos encontrar alguma pista — explicou Mickey, sério, enquanto observava Tico e Teco
trabalhando duro. A explicação não ajudou Donald e Pateta em nada.
— Vossa Majestade! Está tudo pronto!
— Vossa Majestade! O que o Tico disse! — exclamaram Tico e Teco, voltando-se para o
Rei Mickey. O rei assentiu e Tico pressionou um botão na máquina.
Dentro da cápsula do dispositivo, um raio de luz foi disparado em direção ao diário do Grilo,
fazendo o livro aparecer no monitor. No instante seguinte, uma enxurrada de imagens saltou do
livro, todas de lugares que eles haviam visitados em suas viagens anteriores. Parecia mesmo que as
memórias permaneceram dentro do diário.
A extração de dados parecia estar indo bem, até que um grande número de blocos estranhos
surgiu no monitor. Cubos negros cujas superfícies eram cobertas de figuras geométricas vermelhas,
brilhando em meio a uma luz sinistra. As imagens começaram a desaparecer atrás de todo aquele
preto e vermelho.
— Ei, o que está havendo? — Teco parecia confuso, mas não particularmente preocupado.
— O diário do Grilo! Acho que ele pirou na casquinha de noz! — Tico cruzou os braços
com um olhar preocupado.
— Noz? Onde?
— Não foi o que eu quis dizer! — Tico repreendeu seu irmão trapalhão e então começou a
digitar alguma coisa no teclado acoplado ao dispositivo. Mas o monitor já estava infestado daqueles
blocos estranhos.
— Não sei exatamente o que está causando isso, mas tem algo de errado com os mundos
dentro do diário. Também não estamos conseguindo analisar aquela mensagem! — disse Teco.
Mickey suspirou.
— Hmm, não há mais nada que possamos tentar?
Olhando para o monitor, Pateta murmurou uma sugestão:
— Poxa, se a gente conseguisse entrar lá de algum jeito para consertar os dados, podíamos
descobrir o que há de errado.
Tico sorriu, como se uma lâmpada tivesse acendido sobre sua cabeça.
— É isso mesmo! — exclamou. Todos se viraram para olhar para ele. — Podíamos procurar
por alguém que já esteja no diário e pedir pra essa pessoa explorar os mundos e consertar os dados.
É uma ótima ideia, Pateta!
— Alguém para explorar os dados do lado de dentro... — disse o Grilo, cruzando os braços
enquanto pensava na proposta de Tico.
Com uma ideia lhe cruzando a cabeça, Mickey se levantou.
— E acho que todos sabemos quem é o cara certo para o trabalho! Não é verdade, amigos?
Havia apenas uma pessoa em quem podiam pensar para aquilo:
— O Sora! — gritou Donald em meio a um pulo.
— Mas como...? — ponderou Pateta.
— Vai ficar tudo bem. Não é, Sora? — Mickey sorriu para o monitor.
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Sora estava afundando em meio às profundezas de um mar muito, muito profundo — um
mar de feito de dados. Aquele registro do garoto dentro do diário ao mesmo tempo era e não era o
Sora — era um Sora digital, um Digi-Sora. Ainda assim, qualquer Sora continuava sendo um Sora,
independentemente de sua forma.
Ele abriu os olhos.
— Pode me ouvir? Agora, um passo adiante. Consegue fazê-lo?
Não sabia de onde aquela voz estava vindo, mas Sora deu um passo em frente conforme lhe
havia sido orientado.
— O poder está adormecido dentro de ti. Dê-lhe forma... e ele te dará força.
Ele já ouvira aquelas palavras antes — em algum outro momento, em algum outro lugar.
Aquele era o início de sua jornada.
Estava na hora de partir — sua aventura estava prestes a começar.

— Estamos dentro! Conseguimos reescrever os dados do Sora. — exclamou Teco. A forma


de Sora foi exibida claramente no monitor.
— Reescrever? — Pateta inclinou a cabeça, confuso.
— Isso! Manipulamos os dados para que ele já possa usar a Keyblade. Agora ele pode nos
ajudar a desbugar os dados do diário! — explicou Tico.
— Esses dados são um novo Sora? — Pateta inclinou a cabeça tão para o lado que estava
quase caindo. Quem era aquele Sora dentro dos dados?
— São um Sora baseado em tudo o que o Grilo escreveu.
— Quer dizer que não é o mesmo Sora que conhecemos na nossa jornada de antes? — Dessa
vez, era Donald quem tinha perguntas.
— A sua jornada com o verdadeiro Sora foi toda registrada em forma de dados. Então ele é
o Sora de antes, só que outra versão — respondeu Mickey com um sorriso no rosto, mas Donald e
Pateta ainda pareciam um pouco perdidos.
— E como ele ainda é o Sora, pode nos ajudar a restaurar todos os mundos ao estado em que
deveriam estar.
Tico parou seu trabalho por um momento quando um alarme soou do monitor e a imagem
começou a se distorcer.
— Algo errado? — perguntou Mickey, preocupado.
— Pode ser alguma coisa travando o sistema.
— Esperem aqui. Vamos passar na sala ao lado para dar uma olhada. Voltamos já!
Tico e Teco assentiram um para o outro e saíram correndo do estúdio. Após um momento, o
alarme desligou e Sora podia ser visto parado em meio ao monitor, exatamente como antes.
— Bom, acho que Tico e Teco descobriram qual era o problema — disse o Grilo em meio a
um suspiro aliviado.
Foi quando uma pergunta lhe ocorreu de súbito e Pateta se voltou para Mickey:
— Então, hã, Vossa Majestade... o que estamos fazendo exatamente?
— Ah! Alguém escreveu uma mensagem estranha no diário do Grilo. E a única forma de
descobrir quem pode ter sido é analisando o livro — respondeu Mickey.
— O que diz a mensagem? — Agora era Donald quem fez a pergunta.
— “Sua dor será apaziguada quando...”
Antes que Mickey pudesse terminar, o Grilo saltou em seu ombro e apontou para a tela,
interrompendo-o:
— Curioso...
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— O que houve? — Mickey também olhou para a tela.
— Ei! Olha só, no monitor! O que ele tá fazendo ali?! — exclamou Donald, notando uma
figura inesperada.
Havia alguém que vestia um casaco negro parado atrás de Sora.
— Poxa, achei que o Sora tivesse dito que estava sozinho nesse sonho — comentou Pateta,
igualmente preocupado com o recém-chegado suspeito.
Aquela pessoa parada ali — quem era ela?

Sora encarou a figura de preto, furioso. Aquele lugar ficava dentro dos dados — ou, por
assim dizer, dentro dos sonhos de Sora, mas o próprio Sora não sabia disso.
— Quem... é você?
O indivíduo misterioso não respondeu à pergunta. Em vez disso, deu meia-volta e começou
a partir, seguindo por um caminho que se materializou diante de si.
— Escuta! Consegue me ouvir? Você precisa segui-lo!
Quando aquela voz que por algum motivo lhe parecia tão familiar chamou por ele outra vez,
Sora saiu correndo. O caminho o levou a uma plataforma repleta de luz que se assomava em meio à
escuridão, assim como a que estivera antes. Não havia ninguém lá.
Quando Sora tentou continuar a busca, dois Heartless — Sombras, a espécie mais básica
dessas criaturas — surgiram diante de si.
— Cuidado! São Heartless! Use os seus poderes!
— Usar o quê?
Quando Sora inclinou a cabeça, confuso, uma espada em forma de chave — a Keyblade —
surgiu em suas mãos.
— Como...?
— Você ganhou o poder para lutar. É também o poder para a sua sobrevivência. Haverá
ocasiões onde você terá que lutar. Nunca deixe que a sua luz se apague.
Sora podia sentir a força crescendo dentro de si frente àquelas palavras. Ele empunhou sua
Keyblade e se lançou contra as Sombras diante de si. Sora atacou com a Keyblade e, quando atingiu
seus inimigos, eles desapareceram em meio a uma descarga de luz. Ao mesmo tempo, uma grande
porta surgiu à sua frente.
— Agora abra a porta. Aponte a Keyblade para ela.
Conforme orientado pela voz, Sora estendeu a Keyblade em direção à porta. Um feixe de luz
foi disparado da ponta e a porta pareceu engolir a luz e se abriu.
— Agora vá em frente!
Sora assentiu para a voz e então se lançou em direção ao outro lado.
Por um momento, seus olhos foram ofuscados, até que se deu conta que havia voltado para
casa, para suas ilhas — as Ilhas do Destino.
— Hã? Como é que eu voltei aqui? — murmurou. Embora ligeiramente aliviado com a vista
e sons familiares, Sora estava um pouco desapontado.
Foi quando ouviu a voz novamente:
— Sora.
— Quem tá falando comigo? — respondeu Sora, olhando em volta. Ainda não conseguira
encontrar o dono da voz. Era quase como se o som estivesse vindo de cima da sua cabeça... não, de
dentro da sua cabeça.
— Sora, você está bem?
— Como você sabe o meu nome? A gente se conhece? — Sora respondeu com suas próprias
perguntas.

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— Puxa, bom, mais ou menos. Meu nome é Mickey. Digamos só que eu te conheço, Sora, e o
Sora me conhece. Somos bons amigos.
Sem saber ao certo aonde aquele que dizia se chamar Mickey queria chegar, Sora cruzou os
braços, perdido em pensamentos.
Nós nunca nos conhecemos, mas eu sei quem é esse Mickey e nós somos bons amigos? Isso
não faz muito sentido. Não era possível ser amigo de alguém que você nunca conheceu, certo?
Sora decidiu manifestar seus pensamentos de forma direta:
— Isso... não faz muito sentido.
Ele ouviu uma risadinha em resposta.
— Sabe, eu sou de outro mundo e... puxa, é uma longa história. Eu e os meus amigos temos
um mistério que estamos tentando desvendar. Mas não conseguimos chegar ao seu mundo, então
esperávamos que você nos desse uma mão.
— Eu vou ter que desvendar um mistério? — Sora pensou a respeito por um instante. Agora
estava ainda mais confuso.
Para começar, toda aquela história de mundos diferentes já o deixara intrigado. E o motivo
pelo qual o Mickey não consegue chegar aqui, mesmo conseguindo falar comigo é porque... hã...
— Bom, estamos buscando uma resposta em algum lugar desse mundo onde você está. E
você é o único que pode encontrá-la.
— Hmm, eu não sei o que tá rolando, mas você tá dizendo que quer que eu explore a ilha?
— Isso, exatamente! E se você precisar de alguma coisa, vou estar bem aqui.
— Beleza!
— Certo. A primeira coisa que estamos procurando são “erros”. Algo fora do comum.
Sora deu de ombros. Tinha achado que o lugar continuava tão tedioso quanto de costume
quando chegara apenas um momento antes, mas agora podia ver que algo de fato havia mudado —
e era claro como o dia: a ilha estava entulhada do que pareciam estranhos blocos pretos e vermelhos
— nunca tinha visto nada como aquilo antes.
— Bom, é fácil. Esses blocos! Como foi que eles chegaram na ilha?
Sora deu um bom golpe de sua Keyblade num bloco próximo e o mesmo desapareceu sem
deixar rastros. Talvez descobrisse alguma coisa se continuasse a se livrar deles.
— Perfeito! Isso é parte do nosso mistério.
— Então beleza. Vou tentar perguntar por aqui! — disse Sora. Ele viu Selphie um pouco
mais adiante na praia e começou a correr até ela.
— Obrigado! E lembre-se, Sora — respondeu Mickey enquanto ele avançava, a voz cheia de
esperança. — Podemos estar em mundos separados, mas é só falar que vou fazer o meu melhor para
guiá-lo. Não importa o que aconteça, estarei sempre com você em espírito.

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Este é o lugar onde toda a história se originou,
assim como os erros.
E por um bom motivo — porque nada acontece
por acaso nas nossas histórias.
Tudo está conectado.
Foi bem aqui também que outra pessoa partiu
em sua própria jornada, muito tempo atrás.
Esse mundo parece pequeno para você, Sora?
Ou parece grande?
Quem desvendará os segredos deste mundo —
das Ilhas do Destino?
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SORA SAIU CORRENDO EM DIREÇÃO À GAROTA DE VESTIDO AMARELO, SUA
amiga Selphie, que estava parada na beira da água. Estava cercada pelos blocos que Mickey lhe
pedira para investigar.
— Sora, onde você tava?! — Selphie chamou Sora com aquele seu jeitão alegre de sempre.
— Pode dar uma olhada na ilha? Estamos com blocos cobrindo até a cabeça! — reclamou.
Sora parou. Selphie estava tão surpresa com toda aquela circunstância incomum quanto ele.
Será que não sabia algo a respeito?
— Quem colocou eles aqui? — perguntou Sora, cruzando os braços.
— Ninguém! Eles ficam brotando do meio do nada!
Então ela também não fazia ideia do que estava acontecendo. Também era a primeira vez
que via aqueles blocos.
— Vamos acabar enterrados vivos desse jeito. Isso se o Tidus e o Wakka já não estiverem a
sete palmos embaixo desses blocos.
Agora que ela mencionara, Sora não vira nenhum dos outros rostos que costumava ver pela
ilha. O que queria dizer que ele devia perguntar:
— Por quê? Aonde eles foram?
— Lá na praia, pra investigar.
— Bom, não fica muito longe. Vou ver o que rolou.
Sora disparou pela areia que cobria o litoral. Exceto pelos blocos, a ilha parecia a mesma de
sempre, com o som das ondas, a areia com seu barulho agradável sob seus pés e o grande mar azul.
Wakka chamou Sora quando ele se aproximou:
— Ei! Sora! O bagulho tá ficando tenso por aqui, ya? Tudo certo contigo, maninho?
Wakka era só um pouco mais velho que Sora e os outros que costumavam visitar a ilha. Era
alguém que todos sabiam que podiam procurar para pedir ajuda.
— Tem sido um dia... interessante. De onde vieram esses blocos, Wakka?
— Eles meio que apareceram. Antes que perceba, já estão por todo lado. E se você se livrar
deles, eles voltam logo depois.
Wakka aparentemente também estava no escuro com toda aquela história, o que não era bem
uma surpresa. Ele também nunca vira nada como aquilo antes.
— Deixa que eu dou uma olhada! — declarou Sora.
Wakka abaixou os ombros, apreensivo.
— Tem certeza?
— Claro, espera aqui — respondeu Sora, batendo com a mão no peito, cheio de convicção.
Mickey se oferecera para ajudar e, além de tudo, ele tinha aquela chave estranha. Ficaria tudo bem.
Ele se virou para sair em disparada pela praia.
— Ei, Sora! Enquanto isso, pode me fazer um favor e dar uma olhada no Tidus pra mim? —
gritou Wakka.
— Cadê ele?
— A gente se separou pra investigar. Ele não deve ter ido muito longe, mas tu conhece a
figura... deve tá dando um passo maior que a perna.
— Relaxa, eu dou uma mãozinha pra ele.
— Valeu, maninho!
Sora se jogou de cabeça na tarefa, mas ainda não sabia qual era a melhor estratégia. Talvez
pudesse começar destruindo os blocos enquanto procurava por Tidus — mas eram muitos deles. De
acordo com o que Selphie e Wakka haviam dito, eles também continuavam reaparecendo, mas ele
precisava fazer alguma coisa.
Sora refletia enquanto eliminava os blocos espalhados pela praia — seria impossível brincar
de pega ali, mesmo se quisesse. Seria perigoso correr muito rápido com todos aqueles obstáculos.
— Hã?
Sora parou quando notou uma coisa. A ponte que levava à ilha menor havia sumido. Talvez
fosse outro “erro”, devido àqueles blocos. Sora também podia ver uma silhueta que parecia a de
Tidus em meio à ilhota.
— Acho que vou tentar passar pra lá mesmo assim...
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A ponte costumava começar junto à pequena barraca nos fundos da praia. Quebrando os
blocos no caminho com a Keyblade, Sora chegou à cabana — e quando o fez, uma pessoa de casaco
negro passou por ele. Aquele cara...!
Era o mesmo sujeito que Sora encontrara naquele lugar estranho onde estava antes de chegar
às Ilhas do Destino. Tentou correr atrás dele, mas ele logo desapareceu.
— Hã?
Sora andou em volta, tentando procurá-lo por mais um instante, mas não teve sorte.
De repente, o mundo escureceu. Não — era como se o mundo estivesse piscando diante de
seus olhos. O que tá acontecendo...?
E então ele ouviu a voz de Mickey:
— Sora, estou captando algum tipo de sinal estranho. Espera, estou analisando e... é, sem
dúvida. Tem uma espécie de porta invisível perto da sua localização.
Sora parou por um instante e pensou sobre as palavras de Mickey.
— Porta invisível? É outro erro?
— Pode ser que sim. Sora, siga o sinal e dê uma olhada em volta. Acho que finalmente
estamos chegando a algum lugar!
— Entendido! Vou procurar a porta e encontrar aquele cara! — respondeu Sora, começando
então sua busca.
Foi quando notou algo estranho perto da entrada da barraca.
Ele meio que havia encontrado o que estava procurando e, quando tentou dar uma olhada
mais de perto, o ar pareceu se abrir e criou um buraco.
— Uou! O que é isso?
Estava escuro demais para que Sora pudesse dizer o que havia dentro, mas achava que podia
ver as mesmas estampas vermelhas daqueles blocos.
— Sora, esse mundo é feito de dados, então tudo funciona com base num programa. Se puder
derrotar os bugs no programa que controla esse mundo, tudo deve voltar ao normal.
As palavras que saíam da boca de Mickey deixaram Sora ainda mais confuso e ele se perdeu
em pensamentos. O que são esses “dados” que ele tá falando? É tipo um jogo de tabuleiro? E esses
“programas”? Esses “bugs”...?
— Eu preciso entrar aqui e derrotar alguma coisa do outro lado, é isso?
— Estou contando com você, Sora!
Assentindo frente às palavras de Mickey, Sora adentrou a fissura.

Diante de si, havia um espaço bizarro construído com base em formas quadriláteras. Havia
também vários daqueles blocos familiares, um empilhado no outro. Eles se encaixavam muito bem
naquele lugar bizarro e era indubitavelmente claro que aquela era a fonte do problema.
— Beleza, manda ver!
Sora empunhou sua Keyblade e saiu em disparada. Quando o fez, aqueles mesmos monstros
que lhe deram a primeira oportunidade de usar a chave apareceram à sua volta. Como é que eles se
chamavam mesmo? Heartless.
Sora os atacou com a Keyblade, eliminando os Heartless exatamente da mesma forma que
fizera antes. Aqueles eram os tais “bugs”...?
Quando terminou com todos os Heartless, algo que mais parecia um pilar de luz se ergueu
no centro da sala.
— Você deve conseguir voltar ao mundo normal com isso.
Assentindo frente à explicação de Mickey, Sora adentrou o pilar luminoso.
No momento em que a forte luz engoliu seu corpo por completo, Sora se encontrou de volta
na praia tão familiar das Ilhas do Destino. Assim como antes, os blocos estavam por toda parte e ele

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não via nada de muito especial que pudesse ter mudado. A ponte também ainda não estava no lugar
e ele não encontrara o sujeito de casaco negro.
Sentindo-se um pouco desanimado, Sora deu um passo em frente — e então, em meio a um
forte brilho, a ponte surgiu em seu lugar diante dele.
Mickey tinha dito que aquele lugar com todos aqueles quadrados era um tipo de programa,
certo? Então talvez ele pudesse consertar os problemas no mundo real se livrando dos “bugs”
naquele reino de “dados”.
— Tá, vamos em frente.
Sora atravessou a ponte até a ilhota e chamou por Tidus:
— Tidus, aí está você! O Wakka tava preocupado.
Tidus se virou para olhar para Sora, sua espada de madeira em mãos.
— Cara, tu viu isso? A ponte tinha sumido... e aí brotou de volta do nada! E esses blocos...
Até onde eu saiba, não é primeiro de abril — resmungou Tidus, gesticulando com a espada.
— Uma pena que a gente não saiba o que tá causando tudo isso.
— He, he! Ou será que sabe? — cacarejou Tidus, orgulhoso, esfregando o dedo no nariz.
— Não creio! Você descobriu de onde os blocos tão vindo?
— Bom, não... — Dessa vez, a resposta de Tidus soou um pouco mais incerta.
— Como assim?
— Eu encontrei uma pista.
— Sério?
— Como assim, “sério”?
Embora Sora não soubesse exatamente o que era, podia dizer que Tidus realmente tinha uma
pista. Mentir não era do feitio de Tidus, então Sora sabia que podia confiar em sua palavra.
— Bom, beleza, então fala o que é.
— Se quer saber da pista que eu encontrei, vai ter que merecê-la.
— Beleza, cai dentro! — disse Sora, invocando sua Keyblade.
— Não vai dar pra trás, hein!
Tidus fechou a distância entre eles num instante. Sora bloqueou a investida e então desferiu
vários de seus próprios ataques em sequência. Tidus caiu de bunda no chão, mas voltou a se erguer
no mesmo instante, atacando novamente com sua espada de madeira. Sora se esquivou e o atingiu
no ombro com a Keyblade por trás.
— Ai... — Tidus parou. — Vivo esquecendo como você é forte.
Ele se sentou, esgotado.
— Só não vá esquecer o que prometeu.
— Beleza. Eu vi sujeito um estranho andando pela ilha — disse Tidus, seus ombros subindo
e descendo a cada respiração. — Não acha um pouco suspeito? Primeiro aparecem esses blocos e aí
brota um esquisitão de casaco negro?
Um casaco negro... só pode ser aquele cara!
Sora fez sua Keyblade desaparecer e ajudou Tidus a se levantar.
— Casaco negro? — perguntou. — Você viu aquele cara?!
— Perto da cachoeira. Então eu virei o rosto por um segundo e ele já não tava mais lá —
disse Tidus, limpando a poeira das calças.
Sora rapidamente desviou o olhar para a cachoeira em questão. Falando nela, não tinha uma
pequena caverna mais ao lado?
— A cachoeira. Entendido! Valeu, Tidus.
Sora correu de volta pela ponte em direção à ilha e continuou em direção à caverna ao lado
da cachoeira. Uma corrente de ar fria e úmida circulava pelo interior. As paredes estavam cobertas
de rabiscos e desenhos que todos eles tinham feito.
Sora olhou em volta, mas não viu nenhum casaco negro — só uma grande porta nos fundos.
Ele deve ter passado por aqui, pensou Sora, aproximando-se.
De repente, o chão começou a tremer.
— Uou! O-O quê...?

18 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
“Se a dor de nosso mundo você findar, o caminho da reivindicação poderá trilhar.”

Ele ouviu uma voz vindo de algum lugar — e não era a de Mickey. Quem falou comigo?
O mundo continuou a sacudir e chacoalhar sob seus pés. Naquele instante, uma forte luz
começou a emanar da Keyblade de Sora, engolindo-o.

Algo igualmente estranho estava acontecendo no monitor no Castelo Disney.


— Hã? O quê...? O que é essa luz brilhante?
— Wak! Não consigo ver nada!
O brilho da Keyblade de Sora era tão forte que Mickey e todos em volta do computador
tiveram que fechar os olhos diante dela.
A luz que emanava do monitor se intensificou, como se fosse engolir o estúdio inteiro.
— Wak? — Abrindo os olhos por um momento, Donald examinou a área ao redor. Nada
parecia fora do normal.
— Poxa, o que houve? Ainda estou vendo estrelas, iac! — Pateta espiou por entre os dedos,
mas a sala parecia a mesma de sempre.
— Hã?! — exclamou o Grilo. — De novo não... Vejam o diário! Tem um novo registro!
Outro trecho fora escrito no diário no monitor.
— “Se a dor de nosso mundo você findar, o caminho da reivindicação poderá trilhar” —
Mickey leu em voz alta.
Atrás dele, Donald e Pateta olharam um para o outro.
— O que isso quer dizer? — perguntou Donald.
Pateta também só podia presumir. Da mesma forma, Mickey cruzou os braços, parando para
pensar com uma expressão séria no rosto.
— O mundo está sentindo dor?
Ao que exatamente “o mundo” se referia? Talvez significasse que o mundo que estavam
vendo no monitor agora estava sentindo dor.
— Não só “o” mundo. O “nosso” mundo... — O Grilo parecia ter as mesmas perguntas.
Foi quando Pateta notou outra coisa:
— Hã? Ei, olhem pro monitor!
Na tela, podiam ver Sora e...

— Esse mundo foi conectado. — Na caverna escura, o homem de casaco negro falou pela
primeira vez.
— Hã? Ei, eu tava te procurando!
— Ligado à............ — prosseguiu, e Sora instintivamente empunhou a Keyblade.
— O quê? — indagou Sora, incapaz de ouvi-lo claramente.
Mas a resposta do homem foram exatamente as mesmas palavras que Sora acabara de ouvir
em sua cabeça:
— Se a dor de nosso mundo você findar, o caminho da reivindicação poderá trilhar.
— Qual “dor”? Tá falando dos blocos? — Sora perguntou ao homem, mas não parecia que
ia conseguir as respostas que queria.
— Para tornar este lugar completo, a Keyhole é o lugar certo — foi tudo o que o sujeito
declarou, virando-lhe as costas enquanto partia.
— Ei, espera! — Sora tentou segui-lo, mas uma... coisa gigante se formou em sua frente. O
que era aquilo? Poderia ser a tal “Keyhole”?
— Sora, está na escuta?
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Sora parou quando ouviu a voz de Mickey.
— Mickey, tem algo estranho aqui comigo. Aquele cara de preto deixou para trás uma...
Bom, parece uma fechadura.
— Hmm, alguma ideia?
Olhando fixamente para o objeto diante de si, Sora respondeu:
— Na verdade... o que foi que ele disse mesmo? “Para tornar este lugar completo, a Keyhole
é o lugar certo”. Acho que eu preciso passar por ela.
— Hmm... Por que não tenta usar a Keyblade? Pode ser que ela faça alguma coisa.
— É claro! Vou tentar.
Quando Sora ergueu a Keyblade em direção à fechadura como Mickey havia sugerido, ouviu
um click, como se algo estivesse sendo destrancado e uma forte luz o encobriu.
Antes que pudesse se dar conta do que havia acontecido, Sora se encontrou em meio à uma
tempestade, castigado pelo vento e pela chuva.
— Uou! Que lugar é esse?
Ainda era seu lar, as Ilhas do Destino, mas o clima ali tinha mudado drasticamente para pior.
— Sora! Você está bem?
— Pelo menos por enquanto. Alguma ideia de que lugar é esse? — respondeu Sora, mas as
palmas de suas mãos estavam completamente molhadas de suor. Essas... são as minhas ilhas, né?
Mas elas foram destruídas...!
— Não tenho certeza. Mas vou te dizer uma coisa... Não sei o que está causando os erros,
mas deve estar aí dentro com você.
— E se eu descobrir a causa, posso trazer a ilha de volta ao normal?
— Apenas tenha cuidado, Sora. Seja lá o que for, é poderoso.
— Certo.
Quando Sora assentiu em concordância, o céu se partiu em meio a uma poderosa lufada de
vento. Das profundezas do mar negro, — uma visão inimaginável para alguém acostumado às águas
plácidas da ilha — um Heartless colossal se ergueu. Era um Lado Negro.
— É você que tá fazendo essa bagunça toda!
Preparando-se para a luta, Sora se lançou contra o Lado Negro com sua Keyblade em mãos.
Ao mesmo tempo, o Lado Negro bateu com o punho no chão. Tinha sido só a imaginação de Sora
ou aquele punho lembrava os blocos que estavam por toda a ilha? O que estava acontecendo ali?
Quando Sora conseguiu atingir o punho do Lado Negro com a Keyblade, o Heartless parou
de se mexer. O vento aumentou novamente, atirando Sora em meio ao ar.
O que foi isso? Argh, tenho que achar um jeito de vencer esse cara!
Quando o Lado Negro voltou a se mexer com seus movimentos lentos e pesados, ele notou a
sinistra cavidade em forma de coração aberta em seu peito.
Enfrentando seus medos, Sora se reergueu e encarou o Lado Negro mais uma vez. Toda vez
que seus punhos atingiam o chão, eles se tornavam blocos, que, por sua vez, começavam a atacá-lo.
Sora acabou com eles usando a Keyblade e então desferiu uma série de golpes contra a criatura
negra que os estava gerando.
Quando já não conseguia mais contar quantas investidas tinha acertado, o Lado Negro urrou
enquanto era engolido pelo céu tempestuoso.
As ilhas também estavam sendo sugadas em meio ao ar, junto ao próprio Sora.
Ele se agarrou desesperadamente a um pedaço de madeira, lutando contra o vendaval, mas o
vórtice no céu acabou vencendo seus esforços. Sora gritou enquanto também era devorado por ele.

— Acham que o Sora está bem? — perguntou Mickey, inquieto, olhando para o monitor.
Mais que depressa, o Grilo começou a digitar no teclado acoplado à máquina com os pés.
— Espera, estou rastreando ele agora.
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O diário apareceu na tela mais uma vez.
— Uou! — exclamou o Grilo quando viu o livro.
— O que houve? — perguntou Donald, erguendo o olhar para a tela.
— Um novo registro no diário!

Há mais dores a findar além da que acabou de apaziguar.

— Mais dores a findar... além da que acabamos de apaziguar? — Pateta leu em voz alta,
confuso, mas então a imagem no monitor mudou.
— Ei, vejam!
O que apareceu na tela foi a tempestade nas Ilhas do Destino — mas Sora não estava lá.
Em vez dele, era Riku quem estava na ilhota. E diante dele, havia um homem misterioso de
robe marrom. Quando o encapuzado apontou para Riku, uma escuridão completamente negra se
formou atrás dele.
A gravação então foi cortada.
— Ora, isso não pode estar certo. Se os dados foram reparados, devíamos estar vendo as
coisas que estavam escritas dentro do meu diário, certo? Mas o que acabamos de ver... isso nunca
aconteceu. Ou pelo menos eu nunca escrevi — disse o Grilo, a voz um pouco trêmula.
Se o monitor estava exibindo eventos que o Grilo não se lembrava de ter registrado, queria
dizer que o diário estava sendo reescrito? Ou talvez...
— Quer dizer que ele está mostrando eventos que você nunca viu? — Donald inclinou a
cabeça, também confuso.
De repente, uma luz verde começou a piscar no canto do monitor.
— A-há! Encontramos o Sora! — anunciou o Grilo.
Uma imagem se expandiu da luz verde, mostrando o beco de uma cidade mal iluminada.

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É como um déjà vu? Ou parece mais com o
começo de uma nova jornada?
Às vezes me pergunto com o que você estará
sonhando agora.
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UM CACHORRO LAMBEU O ROSTO DE SORA. ELE ESTAVA INCONSCIENTE EM
meio a um beco — havia apenas uma pequena luz brilhando ao virar da esquina.
— Hmm...
Sora abriu os olhos pesados devagar, mas o que viu não foi o oceano das Ilhas do Destino ou
mesmo o céu azul sobre sua cabeça, mas uma cidade que nunca tinha visto antes... e um cachorro.
Após ser soprado das ilhas, ele chagara à Traverse Town. Era um lugar onde as pessoas que
perderam seus lares para os “erros” podiam viver, embora jamais se esquecessem de onde tinham
vindo. Havia algo tranquilizante naquele lugar com todas as suas placas de néon que contrastavam
com o céu noturno cheio de estrelas.
— Mas que sonho... — murmurou Sora, fechando os olhos novamente. Um mundo como
aquele tinha que ser um sonho, afinal.
Mas o cachorro — o amigo do rei, Pluto — pulou na barriga de Sora.
— Ahh! Não é um sonho...!
Sora se levantou, esfregou os olhos e então olhou em volta. Que lugar é esse...?
Agora que Sora estava de pé, Pluto olhou para ele e sacudiu o rabo, todo contente.
— Caramba... Ei, você sabe onde a gente tá?
Hã? Mas como foi que eu...? Enquanto Sora pensava, Pluto saiu correndo adiante.
Sora o seguiu até um distrito pavimentado com tijolinhos. Parecia uma espécie de praça.
— Sora, você está bem?
— Uou! — Sora levou um susto com a voz vindo do meio do nada, mas suspirou aliviado
quando se lembrou que pertencia a Mickey. Ele não se lembrava de muita coisa, mas aquela voz era
a de Mickey e Mickey era um amigo que ele tecnicamente nunca tinha conhecido. — Mickey, o que
houve? Onde eu tô?
— Puxa, você deve ter sido levado a algum lugar.
Sora cruzou os braços, considerando a resposta de Mickey. Algumas coisas começavam a
lhe voltar à cabeça.
Todos aqueles blocos estranhos apareceram nas minhas ilhas e eu usei a Keyblade para me
livrar deles. Então uma tempestade me jogou longe.
O que aconteceu depois disso...?
— Espera! A ilha! Eu consegui concertá-la? — perguntou Sora, pensando que talvez Mickey
pudesse saber.
— Sim! Todos os blocos sumiram. Você fez um belo trabalho, Sora.
Então o que foi aquela tempestade...? De toda forma, os blocos haviam desaparecido e era
isso o que importava. Todos provavelmente estavam de volta à praia, brincando como de costume.
— Então, tá, eu tô numa cidade estranha... Por quê? Esse lugar também tá cheio de erros?
Pelo que tinha visto, não havia nenhum daqueles blocos estranhos ali.
— Pode ser que sim. Pode dar uma olhada?
— Claro, deixa comigo.
Com isso, Sora olhou ao redor da praça e viu um homem sozinho no alto de uma lance de
escadas mais adiante. Parecia ser talvez de meia-idade, com óculos na cabeça, uma faixa alaranjada
na barriga e uma carranca no rosto. Seus braços também estavam cruzados. Será que havia alguma
coisa o incomodando?
Sora subiu correndo pelas escadas e o chamou:
— Opa!
— Hein? Ah, fala aí, garoto. — O homem retribuiu o cumprimento animado de Sora com
outro igualmente bem-disposto.
— Nunca te vi por aqui antes. É novo em Traverse Town?
— O nome é Sora! É um prazer te conhecer.
— Pode crer, eu sou o Cid. Essa aqui é a minha loja. — Cid apontou com o queixo para um
prédio com uma placa na frente indicando que se tratava de uma loja de acessórios. Ele deu então
mais uma olhada no rosto de Sora e, pensativo, passou a mão pela barba por fazer. — Diga, Sora...
será que por acaso você não topou com os trigêmeos quando tava vindo pra cá?

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— Trigêmeos? — Sora inclinou a cabeça frente à pergunta de Cid.
— Sim, são três, saca? Uno, dos, tres? Eles saíram pra ver o que tá deixando a cidade toda
zoada e... bom, ainda não voltaram.
— Tem algo de errado com a cidade?
— Hã, vou te contar. Brotaram uns blocos estranhos por tudo que é canto. Se você tenta
destruir os troços, eles voltam logo depois.
Blocos estranhos? Talvez sejam os mesmos da minha ilha. Pelo que parecia, aquele mundo
também estava com problemas. Em todo caso, os blocos não estavam naquela praça...
— Mas não tô vendo nenhum bloco agora.
— Ah, é só dar uma volta por aí. Não dá pra não ver.
— Tá, vou fazer isso — respondeu Sora. Ele deu as costas para Cid e saiu correndo. Embora
conhecesse cada metro quadrado das Ilhas do Destino, aquela cidade estaria cheia de lugares que
não conhecia. Descobri-los seria divertido.
— Ei! — chamou Cid. Sora parou e se voltou para ele.
— Enquanto estiver zanzando pela cidade, vê se encontra os trigêmeos, pode ser?
— Claro. Como eles se chamam?
Se esses trigêmeos estavam investigando os erros, talvez pudesse descobrir alguma coisa se
falasse com eles.
— Bom, tem o Huguinho, que é o carinha de vermelho. O Zezinho veste azul e o Luisinho tá
sempre de verde.
— Huguinho, Zezinho e Luisinho. Beleza. Vou dar uma olhada.
— Show de bola. Se tiver alguma dúvida, é só perguntar pela cidade.
— Pergunto sim. Até depois, Cid!
E com isso, a busca de Sora começou.

Havia duas grandes passagens nas portas — seriam um bom lugar para começar. Ele desceu
correndo pelas escadas e seguiu para a porta da esquerda, mas ela não abria.
Será que a Keyblade não resolve? Ele a ergueu em direção à porta, mas ela não reagiu. Não
saiu luz nem nada.
Sora deu um pequeno suspiro e então tentou perguntar a um sujeito parado ao lado da porta:
— Ei, essa porta não abre?
O sujeito respondeu com um olhar perturbado no rosto:
— A porta do Terceiro Distrito nem se mexe. Eu até tentaria sair por aí pra descobrir o que
aconteceu, mas não sou páreo pra todos aquele Heartless.
— Tá de boa. Eu cuido deles.
Aparentemente, aquela porta que não abria tinha algum tipo de segredo escondido.
— Sério...? Mas... bom, se você diz. Você vai ter que passar pelo Segundo Distrito para
chegar ao Terceiro. Siga pela porta do norte.
— Então esse aqui é o Primeiro Distrito?
— Isso mesmo.
— Obrigado por me explicar!
Com isso, Sora refez o caminho que acabara de trilhar e seguiu para o norte, atrás da loja de
Cid. Embora não houvesse blocos na praça, ali havia alguns. Destruindo os blocos à medida que
avançava, Sora chegou ao fim do caminho, onde se deparou com uma grande porta de madeira igual
à anterior. Com um leve empurrão, ela se abriu facilmente.
Sora espiou pela fresta e viu fileiras e mais fileiras de prédios que passavam uma impressão
bastante diferente da do Primeiro Distrito. Enquanto tudo no Primeiro Distrito era feito de tijolos, as
coisas ali eram de ladrilhos. Os blocos pretos e vermelhos por todos os lados eram a única coisa que
tinham em comum. Como é que eu vou chegar no Terceiro Distrito?

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Mais ao longe, havia uma torre do relógio com uma janela de vitral. Podia ser um bom lugar
para começar. Sora seguiu trotando para lá.
— Socooorro!
Quando chegou na frente da torre do relógio, Sora ouviu um pequeno grito. Procurando pela
fonte, viu um garoto vestido de vermelho e com um chapéu da mesma cor em cima de um bloco —
e diante dele havia um bando de Heartless.
— Ele tá com problemas! Tenho que ajudar.
Sora empunhou sua Keyblade e partiu para cima deles. Pelo menos não eram muitos. Ele
atacou com a Keyblade e derrotou os Heartless, um atrás do outro. Quando se certificou de que
todos haviam sido eliminados, Sora subiu no bloco com um pulo e falou com o garoto:
— Você tá bem, hã...? — Ele tá vestindo vermelho, então deve ser...— Vou chutar que você
é o Huguinho, isso?
— O próprio! Eu e o resto da galera estávamos tentando descobrir o que tava entupindo a
cidade com esses blocos!
Aquele definitivamente era um dos gêmeos que Cid lhe pedira para encontrar. Eles não
estavam investigando juntos?
— Quer dizer, você e... o Zezinho e o Luisinho, não era? Cadê eles?
— Não sei. A gente se separou. Eles devem ter ido checar o beco dos fundos.
— Beleza. Vou dar uma olhada. — Sora começou a correr, mas então parou. Espera, onde
fica esse beco dos fundos?
Huguinho notou e chamou por ele:
— Vem, me segue!
— Obrigado!
Huguinho assumiu a dianteira e mostrou o caminho a Sora.
— E-Eita! — Mas então parou em meio a um grito quando mais um bando de Heartless
surgiu, aparentemente mais fortes que os que Sora acabara de enfrentar.
— Para trás! Eu cuido disso.
Sora entrou na frente de Huguinho para protegê-lo e encarou os Heartless. Havia muito mais
deles que antes! Ele ainda conseguiu derrotá-los, mas a batalha acabou o deixando sem fôlego.
Finalmente, ele se voltou para Huguinho de novo. O garoto estivera assistindo tudo atrás de
um canto seguro, claramente assustado, mas quando teve certeza de que os Heartless haviam de fato
sido eliminados, correu até Sora com tamanho entusiasmo que ele quase achou que ia abraçá-lo.
— Uau, você é forte — disse Huguinho, aliviado, erguendo o olhar para Sora.
— Volta pra loja do Cid, Huguinho. Pode deixar que eu encontro o Zezinho e o Luisinho.
— Certo. — Huguinho não estava mais muito entusiasmado com a ideia de ficar andando
sozinho por ali depois de ver aqueles Heartless. — Ah, é! Aqui, pode ficar com isso!
O garoto ofereceu a Sora o que parecia ser um pedaço brilhante de... alguma coisa.
— Uau, é um... o que é isso?
— Encontrei enquanto tava investigando. Bem legal o jeito que fica brilhando, né não?
Embora o brilho realmente chamasse atenção, Sora não fazia ideia do que se tratava. Até
onde podia dizer, podia muito bem ser um pedaço de lixo.
— É, hmm... obrigado! Exatamente o que eu sempre quis...
— Enfim, vou atrás do Cid. Dá pra chegar no beco dos fundos pela passagem atrás da fonte!
Sora olhou para onde Huguinho estava apontando e viu uma fonte que ficava perto da porta
por onde havia passado pouco antes, quando veio do Primeiro Distrito. Junto a ela, havia uma porta.
— Muito bem... próxima parada, o beco!

Sora correu em direção à fonte, onde se virou e abriu a porta que levava ao beco. Na rua dos
fundos havia um pequeno canal — provavelmente conectado à fonte.

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— Oi? Tem alguém aí? — disse uma voz que vinha de algum lugar, mas não havia qualquer
sinal de seu dono. Será que não veio de cima...?
Sora ergueu o olhar, mas tudo o que conseguiu ver foi a parte de baixo de uma sacada.
Seguindo em frente, seu caminho foi bloqueado por uma série de Heartless. Havia mesmo
uma porção deles por ali.
De repente, ouviu a voz de novo:
— Ei, aqui!
É, definitivamente estava vindo de cima — então queria dizer que quem quer que estivesse
chamando por ele estava na sacada?
Após se livrar dos Heartless, Sora foi subindo nos blocos espalhados pelo beco e chegou a
uma das sacadas. Na seguinte havia um garoto vestido de azul.
— Ufa, valeu! Achei que eles iam me pegar pra valer!
— Sem problemas, hã... vejamos, azul... Zezinho, né? Eu sou o Sora. Você tá bem?
— Tô sim! Não conseguia descer por causa de todos aqueles Heartless lá embaixo! —
respondeu Zezinho, aos berros, olhando aliviado para a rua abaixo.
— Bom, é melhor você voltar pra loja do Cid enquanto pode.
— Ah, deixa eu te dar uma coisa por ter me ajudado. — Zezinho enfiou a mão no bolso. —
Você nunca vai acreditar no que eu achei enquanto tava inves... hã? Sumiu!
Num pequeno pulo alarmado, o garoto começou a procurar pela sacada.
— O que sumiu?
— A coisa! Puxa, devo ter derrubado em algum lugar pelo Segundo Distrito... tenho que
encontrar de novo! — Em pânico, Zezinho pulou da sacada e saiu correndo em direção à porta do
Segundo Distrito.
— Ei, espera! Onde você...?
Sora também desceu num pulo e correu atrás dele. Assim que entrou no Segundo Distrito,
viu Zezinho abaixado em frente à fonte, procurando alguma coisa.
— Hmm, aquela coisa brilhante deve ser fácil de achar...
— Ei! Não sai correndo desse jeito. É perigoso.
— Ah, qual é. Tá com medo do quê, monstros? — retrucou Zezinho com um sorriso.
Bom, aquele lugar realmente estava cheio de inimigos quando Sora salvou Huguinho apenas
um pouco antes.
— Ainda não conseguiu encontrar? O que foi que você...?
— Droga! Heartless! — exclamou Zezinho em meio a um pulo antes que Sora conseguisse
concluir a pergunta. Outro bando havia surgido.
— Zezinho! Vá pra um lugar seguro! — mandou Sora, preparando sua Keyblade.
Embora os Heartless agora fossem mais ferozes, Sora ainda assim conseguiu derrotá-los.
— Eu disse que é perigoso — Sora repreendeu Zezinho.
O garoto estava um pouco chateado agora:
— Mas eu quero que você veja a coisa que eu achei!
Isso é bem legal da parte dele e tal, mas é arriscado demais ficar procurando por isso com
tantos Heartless por aí.
— Zezinho, vá ficar com o Cid. É sério!
— Ahh! Mas Sora, eu não posso voltar de mãos vazias! Por favor, deixa eu dar só mais uma
procuradinha.
— Ai, ai... Tá bom, mas vê se fica longe de problemas até eu voltar.
Quando Sora desistiu de tentar impedi-lo, Zezinho rapidamente se jogou de volta ao chão e
continuou sua busca desenfreada por seja lá o que fosse o que havia perdido. As penas brancas de
seu rabo sacudiam pelo ar.
— O que exatamente você tá procurando?
— ...Achei! — exclamou Zezinho, levantando-se.
— Ah, que ótimo!
Em sua mão, havia um misterioso fragmento brilhante.
— Tá vendo como fica bonito quando reflete a luz? Quero que fique com ele, Sora.
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Todo animado, Zezinho entregou o objeto brilhante a Sora.
Calma, isso não me parece familiar...? Sora tirou o presente que recebera de Huguinho do
bolso. Ambos tinham formas bastante semelhantes, mas não exatamente iguais.
— Ei, que legal! Será que eles encaixam? — comentou Zezinho, olhando na mão de Sora.
— Na real... sim, se eu colocar desse jeito...
Sora juntou os dois fragmentos. Eles encaixavam perfeitamente, mas ainda não dava para
dizer do que eles eram fragmentos.
— Nossa! Será que formam alguma coisa? — perguntou Zezinho, curioso.
— Pode ser... mas olha. Ainda tá faltando umas partes.
Talvez conseguissem descobrir o que era se tivessem todas as partes.
— Então vamos procurá-las! — Animado, Zezinho começou a saltitar, pronto para sair em
outra caça ao tesouro, mas Sora o agarrou pela camiseta azul e o parou ali mesmo.
— Hã, você por acaso já esqueceu o que acabou de acontecer aqui? Você vai voltar pra loja
do Cid, onde é seguro.
— Ahh! Mas eu quero ir com você!
— Nada de “mas”! Eu levo as peças lá quando terminar. Agora vê se bota essas pernas pra
funcionar.
— Tá. Tô indo pra lá, prometo.
Zezinho abaixou a cabeça docilmente e então foi embora a passos arrastados. Mas algo ali
não parecia certo — não, Sora sabia exatamente o que ele estava tramando. Faria a mesma coisa se
estivesse no lugar de Zezinho.
— Não tão rápido! — Sora segurou sua camiseta azul outra vez. — A loja do Cid fica pro
outro lado, espertalhão.
— M-Mas eu conheço um atalho! — Zezinho balançou a cabeça, cheio de determinação.
— Sei. Melhor eu ir com você.
— Ahh, droga...
Sora tomou Zezinho pela mão e seguiu de volta ao Primeiro Distrito. Pelo caminho certo.
Zezinho ergueu o olhar para Sora e, enquanto iam andando, disse:
— Você é bem durão, hein?
— Nem sou, na real. Tenho um amigo que é muito mais.
Na verdade, o que aconteceu com o Riku...?
— Meu tio também é forte, mas não tem nada a ver com você.
— Seu tio...? Tá falando do Cid?
— Não! O Cid só tá cuidando da gente. Ah, olha ele ali!
Assim que viu o homem em questão, Zezinho soltou a mão de Sora e saiu correndo.
— Zezinho! Você tá bem?
— Tô ótimo, Cid — respondeu Zezinho, todo animado. Huguinho estava ao lado de Cid.
— Mas que coisa, hein! Onde você tava? — perguntou seu irmão, ligeiramente aborrecido.
— No beco atrás do Segundo Distrito — respondeu Zezinho.
— O Luisinho tava contigo?
— O quê? Achei que ele tava contigo! — Zezinho sacudiu a cabeça em negação. Luisinho
era o último dos trigêmeos.
— Pode ser que ele esteja no Terceiro Distrito — disse Cid, claramente preocupado, e
cruzou os braços. — Desculpa, Sora... mas acha que pode ir lá dar uma checada?
— Claro, dá nada não. Na verdade, também tenho uma caçada própria pra fazer agora —
disse Sora, assentindo.
— Ah, é? Pelo quê?
— Já viu um desses antes? — Sora mostrou a Cid os fragmentos que recebera dos garotos.
— Bom, hã, claro! É um... hã, um... Não, nem ideia.
— A gente que encontrou! — disseram os garotos em uníssono.
Cid ergueu os fragmentos em direção ao céu e os examinou com um dos olhos fechados.
— As outras peças devem estar em algum lugar pela cidade — exclamou Zezinho em meio a
um pulo. Huguinho assentiu.
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— E o que é que acontece quando se junta todas elas? — Cid ainda as estava observando
atenciosamente.
— Quem sabe? Alguma coisa legal, imagino!
— É!
Tanto Huguinho quando Zezinho pareciam bem confiantes.
— Acho que é o que vamos descobrir — disse Sora. — Vamos ver o que eu encontro
enquanto procuro o Luisinho.
Cid devolveu os fragmentos e, voltando a cruzar os braços, assentiu.
— Valeu, Sora.
— Deixa comigo!

Sora voltou ao Segundo Distrito.


— Hã?
Os blocos pretos e vermelhos estavam em lugares diferentes dos que estavam em sua última
visita. Eles bloqueavam algumas áreas antes — talvez ele agora conseguisse acesso a elas.
Sora explorou o Segundo Distrito e encontrou um caminho que agora estava liberado. Ele
provavelmente o levaria ao Terceiro Distrito.
— Beleza, vamos nessa!
Os Heartless em seu caminho eram teimosos, mas Sora rapidamente os eliminou com sua
Keyblade. Ele correu em direção ao Terceiro Distrito.
Aquela região era cheia de luzes de néon brilhantes, muito diferente do Segundo ou Primeiro
Distritos.
— Luisinho! Tá por aqui? Luisiiiinho! — Ele chamou e chamou, mas não havia nem sinal
do garoto. Talvez não estivesse lá, afinal...?
Foi quando uma figura surgiu silenciosamente diante dele — e estava vestindo um casaco
negro bastante familiar.
— Hã? Ei! — Sora empunhou sua Keyblade, pronto para lutar, mas o homem de casaco
negro não se mexeu. — Tá, pode ir falando! Esses erros são coisa sua! — Sora gritou novamente.
Mas, sem dizer nada, o homem de casaco negro começou a se afastar.
— Ei! Eu tô falando com você!
Ele adentrara o Segundo Distrito. Sora o seguiu de volta pela rua estreita que levava à praça
do Segundo Distrito, mas foi recebido por uma vista bastante incomum.
O céu não parecia ser o céu — onde deviam estar as estrelas, havia uma tela negra cheia de
luzes vermelhas, assim como nos blocos. Além disso, a torre do relógio mais ao lado estava envolta
numa estranha luz verde.
— O que tá acontecendo aqui? — murmurou Sora, seguindo em direção à torre do relógio.
— Eita, mas o que é isso?! Esse prédio... é liso feito uma panqueca!
O que Sora encontrou não era uma torre do relógio, mas algo que mais parecia um adereço
de cenário que se usaria numa peça de teatro.
— Tem alguém aí? Ooooi! — Havia alguém gritando com a voz cheia de urgência.
— Luisinho?! Onde você tá?
— Hã, posso fazer essa pergunta pra você? Só o que eu sei é que tô no alto de um prédio...
Então quando o prédio fora distorcido, Luisinho desaparecera junto com ele.
Agora que parava para pensar, a ponte na ilha também desaparecera... podia ser um daqueles
erros. O que queria dizer que devia haver outra fissura neste mundo que podia levá-lo àquele espaço
alternativo. Se Sora derrotasse os bugs ou o que quer que encontrasse lá dentro, assim como havia
feito na ilha, devia conseguir encontrar Luisinho.
Após fazer uma busca minuciosa, uma fenda — um Setor Sistêmico — se abriu na parede,
exatamente como o outro fizera antes.
— Beleza, aguenta firme aí, Luisinho! — exclamou Sora, entrando na abertura.
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— Isso trás mesmo de volta umas boas memórias — disse Donald, a voz suave, enquanto
olhava para o monitor.
— Verdade... — respondeu Pateta.
— Foi onde nos encontramos com o Sora pela primeira vez.
— E com a Aerith, a Yuffie e depois o Leon... Como será que eles estão agora? — Os dois
iam recordando com carinho.
Embora não houvesse mais quaisquer registros de sua primeira jornada no diário do Grilo
devido aos eventos no Castelo do Esquecimento, todos que haviam vivido aqueles eventos ainda se
lembravam deles.
Assim como as memórias podiam ser relembradas, talvez os registros que descobriram no
diário após convertê-lo em dados também pudessem ser recuperados com o tempo.
— Foi aí que vocês conheceram o Sora então? — comentou Mickey, tão pensativo quanto os
outros dois.
— Isso me faz pensar, Vossa Majestade. Quando nós digitalizamos tudo no diário, todos os
registros ainda estavam lá. Então o Pluto que acordou o Sora veio dos dados, não foi? — Pateta
inclinou a cabeça enquanto pensava.
— Aonde quer chegar?
— Bom, o resto de nós também não devia ter versões digitais lá dentro?
— Hmm... faz sentido... O que você acha, Grilo? — Mickey cruzou os braços e se voltou
para o Grilo.
— Eu também ainda não entendo muito bem como esse mundo funciona. Esses blocos não
nos deixam dar uma boa olhada nos registros. Meu palpite é que os mundos nesses dados estão
incompletos... fragmentados, eu diria. Mas que mistério...
— Hmm... — ponderou Mickey, olhando para baixo.
— Wak! Mas tenho certeza que o Sora pode consertar! — disse Donald, saltitando como
seus sobrinhos. Se uma coisa era certa, era que esse Digi-Sora nascido dos registros de sua versão
original realmente era o Sora que conheciam. Não importava se era digital ou real.
— Tem razão. Se alguém pode chegar ao fundo dessa história, esse alguém é o Sora.
E com isso, os quatro voltaram sua atenção ao monitor.

Sora erradicou os bugs daquele setor — os Heartless — e voltou ao Segundo Distrito.


Tudo havia voltado ao normal.
— Oi? Tem alguém aí embaixo? — Ele ouviu um grito vindo de cima que parecia ser de
Luisinho. O garoto devia estar na torre do relógio.
Sora foi subindo pelos blocos espalhados por ali e encontrou um garoto de chapéu verde —
Luisinho.
— Você tá bem?
— Tô sim, graças a você! — Luisinho rapidamente se lançou em direção a Sora e agarrou
sua perna, aliviado.
— Ótimo. Agora vamos levá-lo de volta ao Cid.
Sora pegou Luisinho nos braços e saltou do alto da torre.
— O que houve? — perguntou o garoto, inquieto, quando Sora o pôs de volta no chão.
— Também não sei dizer. Ah! Luisinho... você viu uma coisa assim? — Sora mostrou a
Luisinho os fragmentos que Huguinho e Zezinho haviam lhe dado.
— Hã? Ah, sim! Eu também tenho uma! Dá uma olhada! — respondeu o garoto, tirando do
bolso uma peça brilhante igual às outras.

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— Veja se ela junta com as peças que eu tenho. — Sora pôs os três fragmentos juntos.
— Uau, junta mesmo! Mas olha... — Luisinho parecia decepcionado.
Aparentemente ainda faltava um segmento, mas pelo menos agora já conseguiam dizer mais
ou menos o que era para ser. Queria dizer que faltava apenas uma peça.
— O que você acha que era pra ser? Uma fechadura? — Luisinho examinou as peças com a
cabeça inclinada.
— Uma fechadura?
A palavra lembrou Sora da Keyhole das Ilhas do Destino — ela brilhava assim como essa.
— Qual o problema?
— Ah, não é nada. Foi mal. Vem, vamos voltar lá no Cid.
Sora segurou a mão de Luisinho e começou a andar.
Mas quando abriram a porta do Primeiro Distrito, Sora se deparou cara a cara com o homem
de casaco negro, que balançou com a brisa.
— Luisinho, pra trás! Não, corra! Vai direto até o Cid! — A fim de protegê-lo, Sora se pôs
imediatamente em frente ao garoto, assumindo posição de combate com a Keyblade em mãos. A
loja de Cid não era longe.
— Tá bom. Toma cuidado!
Quando teve certeza de que ouvira Luisinho sair correndo, Sora encarou a figura de preto.
— Espero que esteja feliz com todos os problemas que os seus erros causaram!
Em resposta à acusação de Sora, o homem de casaco preto lhe jogou uma coisa.
— O que você...? — Sora rapidamente pegou o objeto em meio ao ar. — Espera... isso é...?
Era outro fragmento brilhante. Sora ergueu o olhar depressa, mas o homem de preto já havia
desaparecido naquele breve instante.
— Hã?!
Sora tirou as outras peças do bolso e elas logo começaram a flutuar, os quatro fragmentos se
combinando para formar uma fechadura.
— Eu sabia. É igual a antes.
— Sora, consegue me ouvir?
Foi quando ouviu a voz de Mickey. Sora decidiu perguntar a ele:
— Mickey, escuta só. Lembra daquela Keyhole da ilha? Eu encontrei outra. Se funcionar
igual a antes...
— Você acha que a fonte dos erros pode estar esperando lá dentro.
— Exato. E se eu passar pela Keyhole e a derrotar...
— A cidade pode voltar ao normal... Você faria isso, Sora?
— Já chegamos tão longe. Deixa comigo!
Sora empunhou sua Keyblade em direção à Keyhole que flutuava no ar. Um raio de luz foi
disparado contra ela e uma porta surgiu junto ao som de uma tranca se abrindo.
— Certo, vamos lá!
No instante que passou pela porta, Sora caiu de cabeça.
— O que houve?! Essa é Traverse Town? — vociferou Sora, tombando tão rápido que era
como se algo o estivesse puxando para baixo.
— Sora, cuidado! Estou captando inimigos bem perto de você!
Sora pousou enquanto Mickey estava falando e, bem diante de si, ouviu o som de metal
batendo em metal. Em meio a um enorme estrondo, um Heartless gigante em forma de armadura —
a Armadura de Guarda — se revelou.
Se eu derrotar essa coisa, esses erros vão pro saco!
— Beleza, vamos começar a festança!
A Armadura de Guarda subitamente saltou no ar, pronta para cair com tudo sobre Sora.
Esquivando-se do ataque, Sora deu a volta por trás do Heartless e o golpeou nas costas com
a Keyblade. Isso fez com que a Armadura de Guarda parasse. Ela rapidamente girou sua grande
cabeça, procurando por ele.

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— He, he! Tô aqui! — zombou Sora, e a Armadura de Guarda respondeu com um súbito
raio laser disparado de seu rosto.
Sora deu uma cambalhota para sair do caminho e se posicionou atrás do Heartless de novo,
atacando-o com a Keyblade.
— Hora de acabar com isso!
Com um grande salto, Sora se lançou contra a Armadura de Guarda com a Keyblade em
mãos, fazendo-a parar por completo. Após um momento, seu corpo caiu no chão em pedaços que se
desfizeram em luz.
— Consegui! — Sora fez uma pose máscula e abriu um sorriso.
A Keyhole então o jogou para fora, atirando-o aos tropeços em meio ao Primeiro Distrito.
Os blocos continuavam lá, mesmo após achar que havia derrotado sua fonte.
— Por que os blocos ainda estão aqui? Eu não me livrei do inimigo que tava controlando
eles? — murmurou. Mickey respondeu sua pergunta:
— Derrotou. Agora só precisa dar uma faxinada. Use o seu poder, Sora, e acabe com os erros
daqui de uma vez por todas.
— O meu poder?
Sora olhou para sua mão. Qual poder...?
— Aham. Um poder que é seu e só seu. Use a Keyblade para trancar a Keyhole de vez!
Sora levantou a cabeça e viu que a Keyhole continuava pairando mais adiante. Então ele só
precisava fechá-la?
— Beleza! Lá vai.
— Isso deve acabar com todos os blocos da cidade. Bom trabalho, Sora! Você desvendou os
mistérios desse mundo.
Sora assentiu e ergueu a Keyblade em direção à Keyhole novamente. Dessa vez, ouviu a
tranca se fechando e porta brilhou até desaparecer sem deixar rastros.
Bom — a cidade agora voltara ao normal. Mas Sora ainda continuava incomodado com o
homem de casaco negro. Será que é mesmo ele que tá mexendo com os mundos...?

Assim que Sora fechou a Keyhole, o monitor ficou distorcido com estática.
— O que tá acontecendo? — perguntou Donald, apreensivo.
Com uma mão na cartola para segurá-la, o Grilo deu um pequeno pulo.
— É outro novo registro!
Frente ao grito de surpresa do Grilo, Mickey e os outros olharam todos para o diário dentro
do digitalizador.

Há mais dores a findar além da que acabou de apaziguar.

— Hmm... Me parece que uma nova mensagem é adicionada toda vez que um mundo dentro
do diário é reparado — comentou Mickey, pensativo.
— É! Igual a antes. Então quer dizer... — Donald ergueu o olhar para o monitor.
Riku tinha aparecido na tela depois de Sora concertar as Ilhas do Destino. O Grilo não tinha
feito nenhum registro daquele evento, então talvez também acabassem vendo algo novo dessa vez.
Após alguns instantes, a tela mostrou Sora juntando as mãos com Donald e então com Pateta
em Traverse Town, não muito depois de terem se encontrado pela primeira vez. Os verdadeiros
Donald e Pateta estavam pensando a respeito desse primeiro encontro mais cedo.
— Poxa! Eu me lembro disso — comentou Pateta.
— Então quer dizer que a gente aparece no diário agora que o mundo foi concertado? —
perguntou Donald.

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Mas o ponto de vista da imagem na tela mudou um pouco, mostrando Pluto no que parecia
um beco mais ao fundo. Ele foi avançando cada vez mais pelo beco, farejando alguma coisa. Mais
adiante, havia um daqueles portais completamente negros que haviam encontrado tantas vezes
durante sua segunda jornada — um Corredor das Trevas. A gravação cortou quando Pluto correu
em sua direção.
— Engraçado. Quando estávamos lá... o Pluto estava com a gente?
— Bom, eu certamente não escrevi nada assim no diário. — O Grilo estava tão confuso
quanto Donald. Algo que nunca fora registrado havia aparecido no monitor. Ainda não havia como
saber se era um evento que realmente acontecera ou não.
— Ei, vocês não acham que talvez o diário esteja tentando nos dizer alguma coisa? —
ponderou Pateta. O que exatamente estava acontecendo naquele livrinho?
De repente, algo muito estranho aconteceu.
— Wak! — exclamou Donald.
Algo havia aparecido na sala junto a eles — um grupo de Heartless.
— Aqui, no castelo? Mas como? — vociferou o Grilo, em pânico.
Mickey logo saltou da cadeira e empunhou sua Keyblade. Num único movimento, todos os
Heartless foram eliminados.
— Temos que checar o resto do castelo agora!
Donald e Pateta seguiram Mickey enquanto ele disparava em direção à porta. Mas...
— Ela não abre! — Eles bateram na porta, mas ela sequer se mexia. Tico e Teco, assim
como Minnie, Margarida e Pluto estavam todos do outro lado.
— Ei! Olá?! Tem alguém aí?
Sem resposta.
— Esse não é o nosso dia — disse o Grilo, a voz baixa.
— Bom, pessoal... eu odeio admitir, mas estamos presos — disse Mickey, abaixando os
ombros enquanto se afastava da porta.
— Estamos o quê?! Mas pode ter mais Heartless vagando pelo castelo — disse Donald com
um tom preocupado. Será que Margarida estava a salvo?
Foi quando um alarme indicando outro registo veio do computador. Todos rapidamente
checaram o monitor e viram mais um novo registro no diário do Grilo:

Se a dor se findar, o caminho há de se liberar.

— O que isso quer dizer? — Confuso, o Grilo levou uma mão à cabeça. Todos aqueles
novos registros... o que isso queria dizer?
— “Se a dor se findar, o caminho há de se liberar”? — Mickey leu a mensagem em voz alta.
— Poxa, nós estamos tentando. Ele disse que já tínhamos findado um pouco dela, não é? —
disse Pateta, pensando de braços cruzados.
— Bom, vamos ter que continuar em frente, reparando os dados do diário o mais rápido
possível — respondeu Mickey. Donald e Pateta trocaram um olhar.
De repente, a imagem no monitor mudou outra vez para exibir Sora.
— Vossa Majestade — disse o Grilo, voltando-se novamente para Mickey. — Acredito que
Sora tenha chegado ao próximo mundo.
— Mas temos que fazer algo a respeito do castelo! — suplicou Donald.
— Estou tão preocupado quanto você, Donald, mas agora a nossa melhor esperança é
concertar o diário.
Com isso, Mickey se virou para olhar para o Sora na tela. Donald e os outros fizeram o
mesmo, confiando que seu rei estava certo.

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Nossas memórias estão conectadas, como os
elos de uma corrente. Essas mesmas correntes
são o que nos unem.
Eu não destruo memórias, apenas separo os
elos e os rearranjo.
Essa conexão — ela é que é importante, Sora.
Tanto nas nossas memórias quanto nos laços
que temos uns com os outros.
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ANTES QUE PUDESSE PERCEBER, SORA ESTAVA EM UM LUGAR NOVO.
Estava em Traverse Town apenas um momento antes, mas bastou que fechasse os olhos por
um segundo e então estava parado ali.
Sora olhou em volta, completamente confuso quanto ao que tinha acontecido. Estava agora
em um jardim magnificamente bem tratado, cercado por arbustos podados para formar paredões de
cercas vivas com ângulos quadrados perfeitos. O cenário era absolutamente adorável — exceto por
todos os blocos.
— Sora, está na escuta?
— Mickey, o que está acontecendo? Pra onde foi a cidade? Eu tava lá um segundo atrás, não
tava? — perguntou Sora, aliviado em ouvir a voz de Mickey.
— Sinto muito, Sora. Eu não sei o que está acontecendo. Eliminar os bugs de um mundo
deve abrir caminho para o próximo. “Se a dor se findar, o caminho há de se liberar”...
Sora tirou um momento para pensar no que Mickey dissera. Deviam ser os bugs o que estava
causando a dor.
— Espera, então aquela coisa que eu mandei pro saco dentro da Keyhole... aquilo era um
“bug”? Mas então... quer dizer que esses blocos também devem ser bugs, né? — Sora olhava em
volta enquanto falava. Eles estavam arruinando um jardim tão bonito. Era impossível apreciar a
vista sem algo no caminho para atrapalhar.
— Exatamente... ou pelo menos estão sendo causados pelos bugs. Até agora, os maiores bugs
parecem estar escondidos dentro das Keyholes. Você provavelmente também vai precisar encontrar a
Keyhole desse mundo.
Outro caminho se abriria caso ele se livrasse dos bugs e, com isso, provavelmente seria
lançado a um novo mundo — um mundo que nunca havia visto antes. Estava começando a gostar
da ideia de ver tantas coisas novas.
— Pode contar comigo! Eu sempre quis ver outros mundos. É só me apontar na direção
desses bugs!
— Ha, ha! Esse é o espírito!
Sora assentiu entusiasmadamente frente ao estímulo de Mickey. Além do mais, abrir esses
novos caminhos ajudaria pessoas que estavam com problemas.
— Alguém! Socorro! — De repente, ele ouviu o grito de uma garota.
Sora rapidamente tomou sua Keyblade em mãos e correu em direção ao som. Uma garota de
cabelos loiros que usava um vestido azul e um avental saiu às pressas de trás de um bloco e foi até
ele, apavorada.
— Me ajude! Por favor!
— Qual o problema?
Diversos Heartless vieram atrás da garota, tentando pegá-la.
— Certo. Pra trás, eu cuido deles! — exclamou Sora, lançando-se então contra os Heartless.
Eles contra-atacaram em resposta, mas com a ajuda de sua Keyblade e um pouco de magia, Sora
logo acabou com eles.
— Ufa! Já vão tarde. — A garota sorriu para Sora.
— Você tá bem? — perguntou ele, fazendo a Keyblade desaparecer.
— Ora, sim! Obrigada, er... perdão, nós nos conhecemos? — A garota inclinou a cabeça,
ligeiramente curiosa.
— Ah, eu sou o Sora. Qual o seu nome?
— Bom, é... é... — A garota parecia estar pensando profundamente a respeito da pergunta.
— Qual o problema?
— Não adianta! Eu simplesmente não consigo me lembrar de nada! — Ela sacudiu a cabeça.
Como assim? Não consegue se lembrar de nada?
No mesmo momento, um gato apareceu de repente diante de Sora e da garota — bom, na
verdade foi sua cabeça o que apareceu. Era de um roxo exuberante, com uma boca gigantesca.
— Pode-se dizer que a mente dela está como eu... um pouco confusa.
— Hã?! O que quer dizer? Ela tá com amnésia?
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Em vez de responder à pergunta de Sora, a cabeça flutuante continuou falando:
— Saúde! Não, bobinho. O que estou dizendo é que o que a mocinha acabou perdendo está
literalmente jogado por todo o loteamento. Sim, suas memórias... e as de todos os outros também. O
lugar ficou bastante bugado, esse é o porém. Talvez entenda o que quero dizer... ou talvez não, vai
saber. — Enquanto o gato ia explicando, o resto de seu corpo com listras roxas e cor-de-rosa foi
aparecendo devagar.
— Bugado? É o que o Mickey disse... Então os bugs deixaram as memórias de todo mundo
confusas? É melhor eu encontrar aquela fechadura rápido — disse Sora.
A garota olhou para ele, surpresa.
— Uma fechadura? Era uma fechadura bem grande?
— Sim, uma Keyhole! Você a viu? Onde?
— Hmm... puxa, não consigo me lembrar... — murmurou ela, aflita.
— Pobrezinha — disse o gato. — Como é que poderia se lembrar se suas memórias não
estão mais lá?
Seu corpo desapareceu de novo, até que ele não fosse nada além de uma cabeça saltitando
estranhamente de um lado para o outro.
— Não, para fazer a garota pensar, de um palpite você vai precisar. — O rabo do gato
reapareceu e apontou para algo brilhante perto de um bloco mais ao canto do jardim.
— Um palpite? O que isso vai fazer?
— Nem adianta você me olhar! Não tenho um palpite pra poder palpitar! Mas se conseguir
encontrar, dessa confusão todos vão se esquecer. Ou será que vão se lembrar?
E com essas palavras de despedida, o Gato Risonho desapareceu.
— E-Ei! Nossa...
O gato não parecia que ia voltar tão cedo. Enfim, agora temos que pegar esse palpite.
— Espere aqui.
Sora correu até o canto do jardim, subiu nos blocos e pegou o objeto brilhante.
ALICE estava escrito no que parecia um pequeno fragmento. Será que esse é o nome dela...?
Bom, só tem um jeito de descobrir.
Sora saltou do alto dos blocos e voltou até a garota.
— Ah, qual era mesmo o meu nome? Está na ponta da língua...
— É Alice — Sora disse a ela, oferecendo-lhe o palpite brilhante.
A luz desapareceu em meio a ela e então a garota — Alice — sorriu.
— Sim, é claro! Eu me chamo Alice!
— Ei, que ótimo! A sua memória voltou! E aí, Alice, onde foi que você viu a Keyhole?
— Bom, me deixa pensar. Ela meio que... brilhava, se bem me lembro — ponderou Alice.
Se Sora conseguisse encontrar a Keyhole, poderia se livrar dos distúrbios por ali.
— Sim, sim, essa mesma! Onde estava?
— Hmm, bem... poxa. Creio que os detalhes ainda estão um pouco nebulosos para mim.
Com Alice claramente inquieta, o Gato Risonho reapareceu então diante dela e de Sora.
— Mas a neblina que a deixa entristecida pode ser removida se a memória for devidamente
sacudida. — Se o que o gato estava dizendo fosse verdade, a lenta recuperação de memória de Alice
também a ajudaria a lembrar onde estava a Keyhole.
— Mas onde eu posso achar mais palpites? — perguntou Sora.
O gato fez uma acrobacia e parou de ponta-cabeça. Sora nunca tinha visto um gato de ponta-
cabeça antes. Bom, também nunca tinha visto um gato que podia aparecer e desaparecer assim.
— Ah, por aqui, por ali, acolá. E não vá se lembrar: até nos recantos onde não dá para
passar. — O Gato Risonho girou em meio ao ar.
— Tá, aguenta firme, Alice. Vou voltar com mais coisas pra você lembrar.
— Obrigada. — Alice assentiu, um pouco desconfortável.
— Ah, mas tome cuidado. É preciso achar as lembranças certas. Os palpites da Alice estão
por aí, é bem verdade, mas os dos outros também estão! A pergunta é: quais são memórias dela e
quais são memórias deles?
Com isso, o gato se desfez novamente, como se fosse uma nuvem de fumaça.
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Então queria dizer que as memórias de todos os outros também estavam bagunçadas. Bom,
se Sora encontrasse todas as memórias, as de Alice estariam inclusas.
— Acho que vou ter que dar meu jeito.
Quando Sora estava prestes a partir, o homem de casaco negro apareceu diante dele.
— Isso mesmo. Dê seu jeito e acabe com a dor. Nosso mundo ainda está ferido e o seu
próximo caminho ainda aguarda.
— O que você quer? E como você quer que eu descubra?!
O sujeito sequer se dignou a responder à pergunta de Sora. Em vez disso, desapareceu tão
subitamente quanto o Gato Risonho.
Sora ainda não fazia a menor ideia do que aquele cara podia querer. Mas agora, precisava
encontrar as memórias de Alice. Ele deixou o jardim para procurar mais uma, mas as cercas vivas
ali formavam um labirinto. Enquanto avançava por ele, Sora acabou tendo o caminho bloqueado por
um soldado-carta com uma lança com a ponta em forma de coração a postos.
— Você aí. O que está fazendo?
— Eu? Ah, só estava procurando por, hã... uma coisa que eu perdi.
— Bom, então por gentileza procure em outro lugar! Estes jardins são propriedade de Vossa
Majestade, a Rainha de Copas. Fique vagando por aí, rapaz, e receio que lhe cortarão a cabeça.
Nesse caso, Sora teria que passar sem chamar atenção.
Ele fingiu dar meia-volta, mas assim que estava fora da vista do soldado, seguiu por uma
rota diferente que o mantinha escondido atrás dos paredões de cerca viva. Havia uma série de rosas
crescendo aqui e ali ao longo do jardim. Tinham um cheiro maravilhoso, mas os caules eram cheios
de espinhos dolorosos e pontiagudos.
— Hã? Ei, isso não é...?
Havia um palpite escondido em meio às roseiras. Estava escrito ROSAS BRANCAS nele.
Quando Sora o recolheu com todo o cuidado, uma voz se dirigiu a ele por trás:
— Ei!
— Vish! Me viram!
Sora saiu correndo em pânico com o soldado-carta de copas em seu encalço. Ele conseguiu
despistar seu perseguidor mas acabou parando num beco sem saída onde havia outro soldado-carta
de guarda. Esse era de espadas.
— Eu dei uma baita mancada dessa vez. “Cortem-lhe a cabeça”, a Rainha de Copas vai
dizer. Olha só para mim! Trabalhei tão duro que estou coberto de terra! E para quê?! Entendi tudo
errado. Mas qual foi o meu erro?
Então aquele soldado também estava com amnésia. Era verdade, ele estava mesmo coberto
de terra... e o único trabalho que havia por ali era jardinagem.
E Sora tinha apenas um palpite com relação a isso.
— Talvez... rosas brancas?
— Isso! Eu plantei rosas brancas em vez das vermelhas! Rápido! Você sabe onde posso
encontrar um pouco de tinta? Aqui, pode ficar com isso em gratidão por me ajudar a lembrar.
O soldado-carta deu a Sora o palpite “Rainha de Copas”. Espero que essa rainha não corte a
cabeça desse soldado...
Sora continuou avançando até chegar a um portão imediatamente em frente a um beco sem
saída. Assim que passou por ele, deu um grito:
— O quê?! O que houve?! Eu tô pequeno!
Aquele lugar em nada parecia com o jardim onde estava antes. Era uma sala comum com um
mobiliário muito bem organizado, perfeitamente normal, com exceção de uma única coisa: tudo na
sala era estranhamente grande. Aparentemente, Sora havia encolhido.
Foi quando o Gato Risonho apareceu. Por algum motivo, ele sempre surgia para conversar
quando algo estranho se apresentava.
— Ser pequeno é o mesmo que grandes problemas, não? Ainda mais com eles à espreita. O
que fazer, o que fazer? — Com essas palavras enigmáticas, o gato desapareceu outra vez.
— Ei! N-Não vai embora desse jeito!
O que ele quis dizer com “eles”?
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Do meio do nada, um Heartless enorme apareceu diante dele.
— Ahh! Heartless gigante! — gritou Sora, assustado com o tamanho.
O Heartless crescera tanto quanto ele encolhera. Algo grande daquele jeito seria muito mais
difícil de destruir.
— Mas você não vai me vencer!
De alguma forma, Sora acabou conseguindo derrotar o tal Heartless. Por sorte, era só um.
Duvidava que teria tanta sorte assim se fosse atacado por vários Heartless desse tamanho.
Com essas dúvidas em mente, Sora seguiu em direção à mesa no meio da sala, onde o Gato
Risonho surgiu novamente. Agora havia duas pequenas garrafas — uma vermelha, outra azul — em
cima da mesa. Do que se tratavam?
— Surpreso em me ver? Aqui está uma coisinha para aumentar o desafio. Após a comoção,
talvez queira tomar essa poção. — E com isso, ele se foi novamente.
Sora foi deixado com um palpite e duas garrafas do que o Gato Risonho havia chamado de
“poção”. O fragmento brilhante tinha as palavras GATO RISONHO escritas nele.
Alice já devia conhecer aquele nome. Quanto às garrafas, a vermelha tinha uma ilustração
que mostrava uma árvore crescendo, enquanto a azul mostrava uma árvore encolhendo.
— Acho que quer dizer... essa aqui. — Sora pegou a garrafa vermelha e bebeu tudo de uma
só vez. Ele ficou maior, assim como imaginara. Agora devia conseguir passar por aquele lugar sem
muitos problemas.
Sora vasculhou a sala e encontrou uma pequena porta. Mas a maçaneta estava torta.
— Que maçaneta esquisita — murmurou Sora... e então a maçaneta se contorceu. — Eita!
— “Esquisita”? Impertinente! Entre nós dois, eu diria que você parece esquisito para uma
maçaneta.
— Ela fala?! — Quando Sora recuou, chocado, a maçaneta deu um largo bocejo.
— Tinha acabado de tirar um baita de um cochilo e aí o mundo todo vira de lado! Hmm... É
bom se cuidar. Nunca se sabe quando outra ironia do destino pode bater à sua porta.
Uma ironia do destino batendo à sua porta...? Devia se tratar de outro Setor Sistêmico.
— Deve ser outro bug. Não se preocupe, vou achar um jeito de ajeitar as coisas de novo.
— Por favor, faça isso... Estou tão cansado...
Sora deu mais uma volta pela sala e logo encontrou outra fissura em meio ao ar.
— Beleza, pra dentro!
Sora adentrou o Setor Sistêmico.

— Palpites... e memórias — disse o Grilo, a voz suave enquanto observava o monitor.


— Alguma coisa lhe veio à cabeça, Grilo? — perguntou Mickey.
O Grilo inclinou a cabeça, pensativo.
— Vocês se lembram como Naminé era chamada naquele relatório?
— ...Uma bruxa de memórias! — exclamou Donald antes que Mickey pudesse responder.
Durante sua segunda jornada, eles descobriram o relatório secreto de Ansem — o relatório
de Ansem, o Sábio — e nele havia uma descrição a respeito de Naminé.
Naminé era uma bruxa que controlava as memórias dos outros.
— Uma coisa tem me incomodado. — O Grilo tirou o outro diário do bolso.
— No seu segundo diário? — perguntou Pateta, olhando para as mãos do Grilo.
— O diário que está nos dando esse problema todo é o meu primeiro. O que diz “Agradecer
Naminé”. O segundo diário está perfeitamente bem.
O Grilo folheou as páginas do livro em questão. Em meio às várias anotações, havia alguns
detalhes sobre Naminé.
— Está dizendo que ela pode ter algo a ver com os erros? — perguntou Mickey.
— Não posso dizer que é certeza... mas tenho a impressão de que ela está conectada de
alguma forma — respondeu o Grilo.
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Mickey cruzou os braços por um momento, pensativo, mas logo ergueu a cabeça.
— Enfim, vamos continuar assistindo — disse ele, voltando sua atenção ao monitor.

Quando Sora voltou do Setor Sistêmico, foi saudado com um enorme bocejo da maçaneta.
— Isso deve deixar as coisas mais quietas por aqui.
— Hmm, finalmente, um pouco de paz e tranquilidade. Vou voltar àquele cochilo agora.
Pegue isso como um símbolo da minha gratidão.
A maçaneta deu um palpite para Sora. Estava escrito RELÓGIO nele.
— Beleza, bons sonhos.
— Boa noite.
Despedindo-se da maçaneta, cujos olhos já estavam fechados, Sora deixou a sala por uma
entrada lateral.
— Qual é a desse lugar?
Era outro jardim, tão impecavelmente bem-cuidado quanto os outros. No centro havia uma
grande mesa, sobre a qual Sora encontrou os restou do que parecia ter sido uma festa recente. Será
que havia alguém por ali?
— Ei, tem alguém aqui?! — vociferou Sora, mas sua resposta foi a chegada do pior tipo de
visitantes inesperados: Heartless. — Não, vocês não!
Sora os atacou com a Keyblade enquanto se esquivava de seus golpes, mas um dos Heartless
conseguiu desviar da investida e pousou em cima da mesa, onde logo começou a chutar pratos para
todos os lados.
— Não, aí não! Eu tô aqui! — chamou Sora, e a criatura foi atrás dele mais uma vez. —
Beleza, a festa acabou!
Ele eliminou o Heartless num piscar de olhos e então abriu um sorriso. Mas podia ver que
ainda havia alguma coisa embaixo da mesa.
— Saia daí!
— Uhh, eu tenho que correr daqui, de verdade. Já é tarde, é tarde, tarde, tarde, tarde!
— Uou!
O convidado misterioso saiu aos pulos de seu esconderijo: um coelho branco com um par de
óculos no rosto.
— Hã, o-oi. O que você tava fazendo embaixo da mesa?
— Ora, estava me escondendo, é claro! Aquelas sombras apareceram e... ó céus, ó vida —
murmurou o coelho, ajeitando os óculos.
— O quê, os Heartless? Já dei um jeito deles. Agora é seguro! — anunciou Sora. O coelho
branco olhou atentamente para Sora e então inclinou a cabeça.
— Sim, isso é tudo muito bom e tal, mas estou muito atrasado para... alguma coisa. Alguma
coisa importante. O que será que era?
Então aquele coelho também havia perdido a memória.
— Desculpe, eu não me lembro. Só sei que estava indo a algum lugar com muita pressa. —
O coelho ficou ali parado de braços cruzados, perdido em pensamentos.
Sora decidiu lhe fazer uma pergunta:
— Escuta, você sabe alguma coisa sobre uma garota chamada Alice?
— Hmm, Alice, você diz? E uma garota? Sim, talvez eu saiba...
— Sério? Isso é ótimo! É que eu...
— Mas talvez não saiba. Simplesmente não consigo me lembrar.
Eles não chegariam a lugar nenhum desse jeito. Provavelmente também teria que encontrar
as memórias do coelho.
— Só o que me lembro é que olhei para alguma coisa e aí percebi que estava terrivelmente
atrasado! Mas o quê?
O que pode ser...? Pra onde se olha quando se está com pressa?
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Sora se lembrou do palpite que recebera da maçaneta um pouco antes.
— Foi isso, você acha? — O palpite brilhante que Sora mostrou para ele tinha a palavra
RELÓGIO escrita.
— Sim, mas é claro! Eu vi a hora e soube que ia me atrasar para o julgamento!
Assim que aceitou o palpite, o coelho saiu correndo antes que Sora conseguisse ter qualquer
outra palavra com ele. E quando o coelho se foi, outro objeto brilhante foi deixado para trás — o
palpite “Coelho Branco”.
Talvez essa fosse a memória de Alice. Sora saiu em disparada para entregar os palpites a ela.

Alice estava esperando apreensivamente no meio do jardim.


— Oi, Alice. Voltei — chamou Sora.
— Acha que agora você consegue me ajudar a desembaraçar as minhas memórias?
— Com certeza! — respondeu Sora, pegando então os três fragmentos que havia obtido.
— Eu estava num campo florido, pelo que me lembro... Foi quando vi alguém e comecei a
seguir seu rastro...
Sora tinha três palpites consigo: “Coelho Branco”, “Gato Risonho” e “Rainha de Copas”. O
Gato Risonho seria difícil de seguir, já que ele gostava de aparecer e desaparecer aleatoriamente, e a
Rainha de Copas era do tipo que gostava de cortar a cabeça das pessoas, então provavelmente não
passaria o tempo num campo florido. Então só lhe restava um.
— Só pode ser o Coelho Branco.
Sora entregou o palpite “Coelho Branco” para Alice. Ela sorriu.
— Sim, era um Coelho Branco e ele parecia com muita pressa. Eu o segui até uma toca e
então caí por um buraco bastante peculiar. Foi assim que cheguei aqui.
O Coelho Branco definitivamente também deixara Sora às pressas.
— Você lembra o que aconteceu depois, Alice?
— Eu tentei perguntar a alguém como voltar para casa. Puxa, a quem será que foi?
Sora ainda tinha o “Gato Risonho” e a “Rainha de Copas”. Fora o Gato Risonho quem lhe
dissera a respeito dos palpites. Sendo assim, a resposta só podia ser...
— Foi ao Gato Risonho, não foi? — Sora lhe deu o palpite.
— Isso mesmo, ao Gato Risonho. E aí ele sugeriu que eu visitasse o castelo... de alguém
importante.
Só restava um.
— E essa seria a Rainha de Copas.
— Precisamente! E enquanto tentava perguntar à Rainha de Copas como voltar para casa...
Ah! Foi na corte dela onde eu vi a Keyhole! — Alice sorriu alegremente. Ela se lembrara de tudo.
— Fico feliz que você tenha recuperado a sua memória, Alice.
— Sim, graças a você. Mas o que devemos fazer agora? Ir até lá para dar uma olhada?
— Pode apostar!
E com isso, Sora e Alice partiram em direção ao castelo da rainha.
Mas então, de repente — o homem de casaco negro apareceu atrás deles, observando-os
enquanto partiam.
— ...A verdade está do outro lado da Keyhole. E junto a ela, as verdadeiras memórias... —
murmurou ele, a voz baixa, desaparecendo logo em seguida.
Sora e Alice continuaram seguindo em direção ao castelo, sem notar ou olhar para trás.

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O “castelo da rainha” era um lugar estranho — estava mais para uma câmara de audiências
num jardim do que para um castelo propriamente dito e, em meio a ela, a rainha estava sentada no
alto de seu grande trono enquanto o coelho aguardava obedientemente mais ao lado.
Assim que viu Sora e Alice, a rainha apontou seu cetro de copas em sua direção e gritou:
— Quem vem lá?!
— Ah, nem ligue para nós. Só precisamos dar uma olhadinha em volta. — Sem prestar
muita atenção à rainha irritadiça, Alice foi entrando com tudo.
— Pare onde está! Este é o meu jardim e sou eu quem decido quem pode dar uma olhadinha
em volta, em ida ou em qualquer outra direção. Está claro?
— Sim. Bem, não... é que, compreenda, estamos com pressa...
Talvez Alice estivesse com um pouco de pressa demais. Quando parou em frente ao trono, a
rainha a examinou de cima abaixo e então anunciou sua decisão:
— Hmph, uma história plausível! Exijo que ambos vão a julgamento imediatamente!
— O quê?! — exclamou Sora. Por que de repente eles estavam sendo julgados?
— Ora, por favor, Majestade! Nós não fizemos nada! — vociferou Alice.
— A-há! Isso é o que eu chamo de mentira. Mais uma prova de que vocês são os ladrões que
levaram a minha memória!
Não sabia que a rainha também tinha perdido a memória. Bem que eu podia ter procurado
mais uns palpites...
— Ei! — exclamou ele, na defensiva. — Não é culpa nossa! Foram os erros que tiraram a
sua... ugh.
— Ah, então agora estão dizendo que foi um erro? Não adianta dar uma de arrependido!
“Erros” não foi a melhor escolha de palavra. A rainha apontou seu cetro para Sora e Alice e
então ergueu a outra mão.
— Por favor, seja razoável — argumentou Alice. — Você não tem quaisquer provas!
— Mas é óbvio que tenho! Por exemplo, eu decidi que vocês são os culpados! — disparou a
rainha, indiferente. O que ela dizia era um absurdo completo, mas antes que qualquer um pudesse
responder, a rainha deu seu veredito: — Guardas! Cortem as cabeças!
Um grande círculo de soldados-carta se formou em volta de Sora e Alice.
— Essa não! Fuja, Sora!
— Espera, Alice. Cadê a Keyhole? Você disse que tinha visto.
— Sim, bem ali! Dentro daquela gaiola! — Alice apontou para uma pequena gaiola coberta
por um pano ao lado do trono da rainha.
Embora estivesse bem no alto, Sora viu que havia um timão mais ao lado. Se conseguisse
girá-lo, provavelmente abaixaria a gaiola.
— Valeu!
— Sora! — exclamou Alice quando ele começou a correr. — Aonde você...?
Ele parou. Provavelmente perderia sua chance de chegar à Keyhole se fugissem agora — e
ele não podia permitir isso.
— Eu preciso chegar na Keyhole e essa pode ser minha única chance. Não esquenta comigo.
Vai, foge daqui!
— Mas...
— Eu vou ficar bem. Confia em mim.
— Bom... tudo bem. Mas não deixe eles te pegarem.
Quando se certificou de que Alice tinha conseguido fugir à salvo, Sora correu diretamente
até ao timão. Mas os soldados-carta entraram em seu caminho. Enquanto enfrentava vários deles,
Sora percebeu que cinco ou seis golpes de sua Keyblade eram suficientes para esgotá-los.
— Ele está se afastando! Atrás deles, imbecis! — rosnou a rainha, extremamente furiosa.
Dando uma olhadinha de soslaio em direção a ela, Sora abriu caminho em meio às infinitas
ondas de soldados até que finalmente chegou ao leme. Ele o girou com toda a força. Assim como
imaginara, a gaiola desceu.
— Não o deixem escapar! — gritou a Rainha de Copas.
Ao lado dela, Sora removeu o pano de cima da gaiola. Lá estava ela! A Keyhole.
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Assim como antes, Sora ergueu sua Keyblade. Uma luz foi disparada da ponta e adentrou a
Keyhole, fazendo com que uma porta aparecesse.
Enquanto a rainha rosnava e esbravejava, Sora passou por ela.

— Eita! Onde eu tô agora?! — exclamou Sora.


Do outro lado da porta, ele se deparou com algo que nunca havia visto antes. A terra e o céu
estavam de ponta-cabeça e mais adiante havia um Heartless gigante com enormes braços e pernas
que atacavam com uma série de movimentos bizarros — o Mestre das Artimanhas.
O monstro lançou seus malabares flamejantes contra ele em meio a uma dança inescrutável,
mas Sora conseguiu manter distância e os apagou com uma magia de sua Keyblade atrás da outra.
Mas as esquisitices não pararam aí. De repente, o mundo virou para o lado, de forma que o
teto ficasse na direita e o chão na esquerda. Estava ficando difícil de entender mais qualquer coisa.
Pelo que parecia, o mundo ia girando de vez em quando.
— Ah, qual é!
Sora precisava acabar com aquela luta, e rápido. Do contrário, com certeza sucumbiria aos
joguinhos de seu oponente.
Mudando um pouco de estratégia, Sora saltou da parede — ou seria aquele o teto agora? —
em direção ao Mestre das Artimanhas. Então, com toda a sua força, rapidamente atacou o Heartless
no peito com a Keyblade. O impacto foi tão intenso que Sora pôde senti-lo em suas mãos.
Os braços do Mestre das Artimanhas, flexíveis como um pedaço de tecido, eram o âmago da
ofensiva ardilosa que dera bastante trabalho a Sora — mas eles finalmente pararam por completo. E
quando o fizeram, o Mestre das Artimanhas desapareceu em meio a um grande feixe de luz.
Por fim, o mundo girou de volta à posição correta.
— Agora as memórias de todos devem voltar ao normal! — Sora rodopiou a Keyblade em
sua mão e então a pousou no ombro em meio a um grande sorriso.

— E agora temos mais um mundo reparado — comentou Mickey, abrindo um largo sorriso
enquanto observava Sora no monitor.
— Veja, exatamente como pensamos! Outra frase apareceu no meu diário! “Há mais dores a
findar além da que acabou de apaziguar” — disse o Grilo, observando o diário no digitalizador. Ele
se virou de volta para Mickey, mas Donald e Pateta não pareciam muito felizes.
— Isso não me parece bom...
— Hã, pessoal... a porta ainda está trancada.
A porta do estúdio não parecia mais perto de se abrir do que antes. Eles continuavam presos.
Pateta tentara forçar a porta, mas ela não havia sequer se mexido. Estavam esperando que corrigir
os erros no mundo digital também fosse resolver os problemas em seu mundo, mas aparentemente
era necessário mais que só isso.
— “Se a dor se findar, o caminho há de se liberar”. Outros mundos no diário ainda devem
precisar da nossa ajuda — disse Mickey, à contragosto. Quantas dores exatamente será que existiam
nos mundos dentro do diário? E o que eles precisavam fazer para sair daquela sala?
— Então o Sora vai seguir para um novo mundo?
O Grilo ergueu o olhar em direção ao monitor novamente. Na tela, deparou-se com Sora e...
— Vejam! É ele! — exclamou.
— O que ele quer dessa vez? — Donald estava igualmente surpreso.

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Sora estava encarando a figura de casaco negro.
— Agora eu te peguei! — Ele empunhou sua Keyblade, pronto para enfrentá-lo em combate,
mas o homem nem se mexeu. — Eu quero respostas! Tem alguém por trás desses erros. É você ou
não? — perguntou.
Finalmente, o sujeito respondeu:
— Esse mundo foi conectado. Memória e realidade agora são como um. E chegou a hora de
você descobrir a verdade. — Ele abriu uma espécie de portal negro e o adentrou a passos lentos.
— Ei! Vota já aqui! — Sora foi correndo atrás dele.

— Como vamos descobrir quem ele é? — murmurou o Grilo, inquieto.


— E se ele for da Organização XIII? — perguntou Donald, preocupado.
A Organização XIII era conhecida pelos casacos negros de seus membros. O problema era
que, até onde sabiam, a Organização havia sido eliminada. Mas os mundos dentro do computador
eram mundos de suas memórias — então talvez a Organização existisse lá em forma de dados?
— Não se preocupem. O Sora vai pegá-lo. Aí vamos saber com certeza — Mickey garantiu
a eles, tentando manter a sobriedade.
De repente, ouviram um barulho do lado de fora da sala.
— Quem é? — Donald correu até a porta. Havia alguém do outro lado.
— Tico e Teco devem ter voltado para nos salvar! — exclamou Pateta, animado.
E então, a porta se abriu.
— Wak!
Donald caiu para trás em choque quando viu quem era — Sora, empunhando a Keyblade.
— Você está aqui?! — Mickey saltou de sua cadeira e correu em direção a Sora.
— Essa voz... Mickey? É você? — Claramente confuso, Sora abaixou a Keyblade.
— O que houve?
— Eu só... segui aquele cara e...
Antes que Sora pudesse continuar, a tele abruptamente ficou cheia de estática.
— Majestade! Veja, no monitor! — exclamou o Grilo.
Todos ergueram o olhar ao mesmo tempo. Após menos de um segundo, o que apareceu...
foram as costas de Mickey. Donald, Pateta e o Grilo também estavam lá.
— O que está havendo aqui?
De repente, parado junto a Sora, estava — o homem de casaco negro.
— Wak!
— Iac!
Quando Donald e Pateta gritaram de surpresa, o capuz do tal sujeito se desfez como uma
imagem desaparecendo da tela. E quem estava parado diante deles era...
— Riku?! — gritaram todos os presentes em uníssono. Aquele tempo todo, o homem de
casaco negro era Riku.
Mas, sem pressa, o garoto apenas sacudiu a cabeça.
— Sinto muito. Mas não. Assim como o Sora aqui, eu não passo de zeros e uns que apenas
assumiram a aparência de alguém que vocês conhecem — explicou ele, devagar. Sora olhou para
ele, boquiaberto.
Riku começou a digitar alguma coisa no teclado e o diário do Grilo apareceu na tela.
— O diário do Grilo costumava ser repleto de memórias... mas quando essas memórias
foram arrancadas fora e depois as remendaram de volta, os bugs surgiram. Foram esses bugs que
impediram que o livro fosse completamente restaurado. De todos os receptáculos que podiam
proteger os dados, eu fui o escolhido pelas páginas do diário. Todas as memórias ali armazenadas
foram transferidas para dentro de mim, a fim de que não fossem corrompidas.

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Todos pareciam confusos com sua explicação. Um receptáculo para proteger memórias...?
Olhando para todos aqueles rostos perdidos, Riku deu uma risada e então prosseguiu:
— Então, de certa forma... eu na verdade sou o diário do Grilo.
— Você é o meu diário? — perguntou o Grilo, chocado.
Então aquele Riku era o Riku, mas ao mesmo tempo também não era? Era um receptáculo
que armazenava todas as memórias de dentro do diário? Mas para um receptáculo, ele certamente
parecia ter vontade própria. Um propósito — uma mente. Será que ele vinha do próprio Riku? Ou
seria a “mente” das memórias dispersas dentro dele? Ou talvez até mesmo a mente de alguém
conectado às memórias dentro do diário...?
Enquanto o Grilo tentava tirar algum sentido de tudo aquilo, Riku continuou digitando até
que as palavras escritas no diário aparecessem no monitor.

Sua dor será apaziguada quando você voltar para findá-la.

— Eu tomei a liberdade de importar todos vocês para ajudarem a desvendar o mistério por
trás desse registro.
— “Importar”? Para onde? — Donald não fazia ideia do que ele estava falando. Ele inclinou
a cabeça para o lado, confuso.
— Sério? Vocês não notaram? — indagou Riku, ligeiramente indignado.
Mickey olhou para o monitor e viu sua imagem fazer o mesmo. O que queria dizer...
— Você está dizendo que...?
— Sim, estamos dentro do diário. Esse é o mundo digital: o digespaço.
Riku assentiu enquanto pressionava uma última tecla.
— Vossa Majestade! Vossa Majestade!
— Se puder nos ouvir, por favor, diga alguma coisa!
Eram Tico e Teco.
— Tico? Teco? — Mickey respondeu às vozes que pareciam vir do ar. Exatamente como
Sora quando respondia às chamadas de Mickey.
— Finalmente conseguimos contato!
— Quando voltamos, a sala estava vazia e começamos a vasculhar os dados atrás de vocês
desde então!
Enquanto Tico e Teco explicavam, Pateta cruzou os braços, pensativo.
— Bom, se o Sora está aqui com a gente e o Tico e o Teco estão lá fora nos procurando do
lado de dentro, então...
— Então estamos mesmo dentro do digespaço, como disse o Riku — concluiu Mickey,
assentindo para Pateta.
Riku estava parado em silêncio ao lado deles, os braços cruzados. Mickey se voltou para ele
e perguntou:
— Imagino que você possa nos dizer... há alguma forma de voltarmos para casa?
Antes que Riku pudesse responder, um alarme tocou. Era o mesmo som que Mickey e os
outros haviam escutado bem no início, quando ligaram o dispositivo de analiso.
— Essa não!
— Tem alguém tentando invadir os dados de fora!
Ouvindo os gritos de Tico e Teco, Riku se voltou para o teclado de novo. Uma infinidade de
blocos pretos e vermelhos havia surgido em meio ao monitor.
— Um hacker! Se for verdade, então não haverá como vocês saírem.
Riku digitava desesperadamente no teclado na tentativa de consertar as coisas, mas os blocos
na tela simplesmente não desapareciam.
— Vocês têm que fugir antes que...
Os gritos dos esquilos se silenciaram.
— Tico? Teco! — gritou Mickey, mas não houve resposta.

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— Sem sorte. A conexão com o mundo real foi completamente cortada. — Riku sacudiu a
cabeça e suas mãos recaíram sobre as teclas.
— Que tal boas notícias? — Os olhos de Donald se voltaram para Riku, apreensivos.
— Se eu restaurar a conexão, um novo caminho deve se abrir — respondeu Riku. — Claro,
isso se esses bugs não estivessem no caminho.
Isso de pouco serviu para animar qualquer um.
De repente, Sora se pronunciou:
— Não tô entendendo bulhufas, mas basicamente quer dizer que vocês não podem ir pra
casa, né? Beleza. Deixa que eu vou lá e acabo com esses bugs pra vocês.
— Você vai?! — Donald abraçou as pernas de Sora, todo contente.
— Que maravilha! — Pateta também abriu um sorriso.
Finalmente, Mickey lhe ergueu uma mão.
— Sora. Essa é mais uma que vamos ficar te devendo — disse ele, extremamente grato.
Sora aceitou o aperto de mão.
— Quem disse que estamos contando? Somos todos amigos, né não?
Foi uma resposta tão sincera que fez Mickey e os outros trocaram um olhar. O Sora sempre
seria o Sora.
— Certo. Até depois.
Sora rapidamente se virou para deixar a sala, pronto para sair em disparada — mas então se
voltou para eles novamente, coçando a cabeça.
— ...Na verdade, pra onde é que eu tenho que ir?
— Desculpa, Sora. Vou abrir o caminho para um mundo que ainda esteja bugado. — Riku
pressionou algumas teclas e um portal negro se abriu adiante, assim como o que trouxera Sora ali do
mundo de Alice.
— Beleza, agora sim, tô indo nessa!
Sora respirou fundo e partiu novamente.

44 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
Quem você acha que fez esse mundo especial?
E o que você acha que foi necessário para
entrar nele?
Eu quero ver você, Sora. Tem tanta coisa que
quero te contar.
Isso é tudo para que você possa estar pronto.
O mundo está cheio de dor — os verdadeiros
bugs. O que você acha que está por trás disso?
45 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
QUANDO SORA DEIXOU O ESTÚDIO DE MICKEY, TUDO ESTAVA DIFERENTE — O
ar, os cheiros, até mesmo as cores.
Ele se encontrou em mais um mundo desconhecido, tão subitamente quanto antes. Estava
em um lugar que mais parecia uma praça e diante dele havia um grande edifício de pedra. Seria um
templo ou coisa do tipo?
— Sora. — Normalmente era a voz de Mickey que vinha do ar, mas não dessa vez.
— Essa voz... Riku, é você? — exclamou Sora, empolgado.
Ele ouviu uma risadinha de Riku antes de receber outra pergunta como resposta:
— Como estão as coisas?
— Até agora, tá tudo bem quieto.
Pelo que Sora podia dizer olhando em volta, não havia sinal de Heartless ou qualquer coisa
fora do comum. Também não havia blocos.
— Bom, não espere que vá continuar assim. Um dos bugs interferindo com a conexão está no
Coliseu do Olimpo, tenho certeza disso. E você sabe onde ele estará escondido. Encontre a Keyhole.
Se as minhas conclusões estiverem corretas, isso o levará ao núcleo do mundo. Livre-se de seja lá o
que for o que estiver ferindo o núcleo e o resto dos bugs será eliminado com ele.
— Sim, foi o que eu e o Mickey tínhamos imaginado. Beleza, volto antes que consiga dizer
“desfragmentação”! — Sora começou a andar em direção à entrada da estrutura de pedra.
— Certo, tome cuidado.
Enquanto Riku o advertia, Sora entrou no templo. A primeira coisa que viu quando fechou a
porta atrás de si foi um pequeno sátiro barbado — Phil — andando de um lado para o outro.
— Ugh, isso é um pesadelo. Por que ele tá demorando tanto?
Lá estavam eles, diante de Phil. Vários daqueles blocos cada vez mais familiares haviam
formado uma pilha que era impossível contornar.
— O que tá demorando tanto? — perguntou Sora.
— O campeão! Primeiro me aparecem esses blocos idiotas... e agora ele sumiu e... e por que
eu tô contando isso pra um fedelho feito você? — Phil lançou um rápido olhar para Sora e logo
continuou a andar.
— Primeiramente, o nome é Sora. Segundamente, você tem que contar pra alguém, né? —
retrucou Sora, um tanto irritadiço.
Fedelho? Qual é. Quer dizer, eu sei que ainda sou uma criança, mas também sou o único
que pode corrigir esses erros.
Phil deu uma longa olhada em Sora.
— ...Hmm.
Após um momento pensando, ele prosseguiu, devagar:
— Faz sentido. Mas é só olhar em volta! Não tenho nada contra arquitetura moderna, mas
essas coisas têm que ir embora! E isso que você ainda não viu lá dentro. O campeão, Hércules, foi
investigar eras atrás...
Phil cruzou os braços, sem dar mais explicações.
— O quê, ele não voltou? Mas isso é terrível! É melhor eu entrar lá pra ver o que houve —
incitou Sora. Mas Phil sacudiu a cabeça veementemente.
— Nada feito, garoto. A entrada tá bloqueada... Se bem que, parando pra pensar, isso é meio
que óbvio, né? Seria preciso algum tipo de herói pra entrar aí, mas só o que eu tô vendo sou eu e
um... garoto qualquer?
Sem esperar que o sátiro terminasse a frase, Sora invocou sua Keyblade e destruiu os blocos
num piscar de olhos.
— Como é que...? — Phil ficou espantado.
E Sora também. Tinha encontrado a Keyhole. Normalmente, ele só conseguia descobrir uma
Keyhole depois de ficar correndo para lá e para cá até cansar, mas aquela aparecera logo de cara.
Além disso, atrás da Keyhole devia haver um Heartless poderoso — mais um daqueles bugs.
O que exatamente estava acontecendo naquele mundo? De toda forma, aquele provavelmente era o
único jeito de chegar ao Coliseu.
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— Essa é a Keyhole. Ela leva ao Coliseu? Bom, só tem um jeito de descobrir!
— Olha, não sei não... apesar que talvez você tenha o que é preciso. O nome é Phil. Só tome
cuidado lá dentro. Entrar é uma coisa, garoto. Sair é outra — disse Phil, cheio de preocupação.
Sora respondeu com um sorriso:
— Pode deixar, vou tomar cuidado, Phil.
— Apenas lembre do segredo pro sucesso. Quatro palavras: Uma... vitória... de cada... vez!
Quatro palavras...? Me pareceu mais que foram cinco, mas tanto faz.
— Hã... valeu. Logo eu tô de volta.
Sora então empunhou sua Keyblade em direção à Keyhole. A espada disparou um feixe de
luz contra a fechadura e uma porta apareceu em seu lugar. Sora rapidamente passou por ela.

Hércules ergueu a cabeça, notando algo estranho.


Parecia haver alguém lá — mas talvez fosse apenas sua mente lhe pregando peças. Não
conseguia imaginar quantas pessoas seriam capazes de chegar até ali.
Ele tinha conseguido chegar até o Coliseu, até aí tudo bem, mas, por algum motivo, ele se
tornara um labirinto no qual era impossível avançar sem quebrar aqueles blocos esquisitos. E ainda
pior, estava infestado de monstros.
É pior que o treinamento do Phil, pensou Hércules em meio a um sorriso.
— Espero encontrar um jeito de consertar o Coliseu... — murmurou. Ele socou uma parede
de blocos diante de si, desmoronando-a para revelar um novo caminho.
Beleza, hora de avançar!

Enquanto isso, em meio às profundezas do labirinto, encontrava-se um sujeito de aparência


sinistra, a pele de aspecto enfermo tomada por um tom azul-claro — Hades, o Senhor dos Mortos.
A chama azul de seus cabelos era ainda mais tenebrosa que sua aparência.
— Hmph. Parece que deixam qualquer um entrar aqui — murmurou ele, passando a mão
pelo queixo quando notou Sora no labirinto. — Desculpa estragar a tua baclava, garoto, mas você
escolheu o labirinto errado pra se perder. Se nem um heroizinho de meia-tigela consegue encontrar
a saída, quem dirá você?
Hades continuou resmungando:
— Agora, de volta pro que me importa: Hércules! Tá na hora de eu chutar aquele traseiro
heroico dele direto pro Mundo Inferior! Mas, bom, primeiro acho que vou assistir o pirralhote sofrer
um pouquinho. Ah, como eu vou curtir isso...
Hades desapareceu numa nuvem de fumaça.

Sora parou quando viu o que havia do outro lado da porta. Seja lá o que fosse, não parecia
um coliseu. Na verdade, a série de pequenas salas mais lhe lembrava um labirinto. Havia Heartless
por toda parte.
Aquela era a primeira vez que encontrava uma Keyhole no primeiro lugar que procurava e
também a primeira vez que se deparava com um labirinto tão complicado. O erro ali devia ser mais
severo que todos os outros que já havia enfrentado.
Encontrar Hércules o mais rápido possível parecia ser o melhor plano de ação.
— Sora, ainda consegue me ouvir?
A voz em meio ao ar dessa vez não era a de Riku e sim a de Mickey.

47 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
— Consigo sim, Mickey! Você devia ver os erros aqui — respondeu Sora.
— Sim, as leituras de bugs estão nas alturas. Quase parece que... puxa, Sora. Parece que o
Coliseu se transformou num labirinto.
— Então não há tempo a perder. Temos que descobrir o que tá causando esse problema todo
— declarou Sora, mais para si mesmo que para Mickey. Quão fortes precisavam ser os bugs ali para
de repente transformarem um mundo num labirinto?
— Eu concordo, mas Sora... dessa vez os erros também estão afetando você.
— Então é só eu improvisar — respondeu Sora, abrindo um sorriso e batendo no peito.
Foi quando um Heartless ali perto decidiu pular em cima dele.
— Uou!
Sora rapidamente se defendeu com sua Keyblade, mas então caiu de joelhos, exausto. Os
Heartless no labirinto eram bastante fortes. Ainda assim, ele ainda não estava pronto para jogar a
toalha. Sora se levantou e se lançou contra eles.

Após observar Sora por um tempo, Hades passou a mão pelo queixo e gemeu de leve.
— Hmph, bem durão pra um baixotinho.
Isso o incomodava — aquele moleque tinha um poder especial, o que também o lembrava do
outro garoto. Aquele poder... Quem era ele, afinal? Podia ser inútil sozinho, mas Hades tinha a
impressão de que esse poderia não ser o caso se ele se unisse a Hércules.
O que surgiu na cabeça de Hades enquanto pensava a respeito foi a imagem de um jovem
solitário. Hades não sabia como ele havia chegado lá, mas talvez pudesse se aproveitar dele.
— He, he... — E em meio a uma risada, Hades desapareceu numa nuvem de fumaça.

— Hmm, sem saída.


Sora avançava cada vez mais fundo ao longo do labirinto, enfrentado todo Heartless que
surgia em seu caminho. Havia vasculhado aquela última sala de cima a baixo, mas não conseguia
encontrar um novo caminho em lugar nenhum, mesmo após eliminar todos os blocos e Heartless ali.
Não havia como prosseguir. Tudo o que via eram paredes marrons.
Talvez eu ache outra passagem se eu voltar. Sora estava prestes a dar meia-volta, quando
ouviu um alto barulho atrás de si.
Ele se virou e viu que a parede que bloqueava o caminho em frente havia tombado e,
emergindo da fenda, havia um jovem musculoso. Quando Sora imaginava um herói, aquele era o
tipo de sujeito que lhe vinha à mente.
— Uau! Como você fez isso? Deixa eu adivinhar... Hércules? — perguntou Sora, correndo
em direção ao jovem.
— Hm, isso mesmo. E você é...? — Hércules perguntou de volta, um pouco confuso.
— Finalmente! Er... digo, sou o Sora. Já tava na hora de te encontrar! O Phil me pediu pra
ver como você tava.
— O Phil te mandou pra cá? Não sei se devo dizer “obrigado” ou “lamento”. Enfim, é um
prazer conhecê-lo, Sora. Imagino que o Phil tenha mencionado que eu sou o campeão do Coliseu.
Eu treinei com ele pra me tornar um verdadeiro herói. — Hércules abriu um sorriso com seus dentes
brancos e brilhantes. — Mas você também deve ser bem durão se chegou longe assim sozinho!
— He, he! Bom, a minha Keyblade ajudou — respondeu Sora em meio a um sorriso, com as
mãos juntas atrás da cabeça. — Você também tá trabalhando sozinho por aqui?
Hércules franziu o cenho.
— Sim. Estou tentando descobrir o que exatamente transformou o Coliseu... nisso. — Ele
começou a pensar.
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Enquanto olhava para Hércules, a expressão no rosto de Sora também se tornou mais séria.
Tinha a sensação de que podia falar com um herói sobre o problema que haviam recaído sobre
aquele mundo.
— Eu também. Tem alguém tentando machucar esse mundo... e eu tenho certeza que o
culpado está aqui com a gente — explicou.
— Como assim, “machucar”? — A expressão no rosto de Hércules ficou ainda mais severa.
— Os blocos. O labirinto. Todas essas coisas estranhas que tem acontecido estão conectadas
a um vilão.
— Entendo... mas, hã, como você sabe disso?
— Ah, err... é uma história comprida. Desculpa, eu não posso...
Hércules provavelmente não entenderia o que eram “bugs”. Nem mesmo Sora entendeu no
começo e não tinha certeza se entendia agora. Ainda assim, podia ao menos garantir que Hércules
entendesse o que queria dizer.
— Me fala, H... Você tem alguma ideia de quem pode ser o nosso vilão? Quem iria querer
machucar o mundo?
Hércules cruzou os braços e pensou a respeito.
— Hmm... Bom, com certeza tem alguém que me vem à mente — respondeu ele com um
olhar desconfiado. — Hades, o Senhor dos Mortos. Ele deve ter armado tudo isso, de alguma forma.
Só de ouvir que ele era o “Senhor dos Mortos” já dava a Sora uma impressão bem ruim a
respeito do sujeito.
— Certo, vamos fazer uma visitinha a ele!
— Acho que esse é o jeito mais rápido de descobrir. Mas ele não está aqui perto, isso eu
posso garantir. Diga, Sora. Já que estamos nós dois aqui, o que me diz que unirmos forças? — A
expressão no rosto de Hércules se suavizou e ele estendeu a mão direita. Como estavam trabalhando
em prol ao mesmo objetivo, lutar em equipe seria muito melhor.
— Claro, se você não se importar! — Sora sorriu e apertou a mão de Hércules com firmeza,
e o herói retribuiu da mesma forma. A palma de sua mão era grande e forte.
— Mas é claro que não! — disse Hércules, cheio de alegria. Mas no instante seguinte, sua
expressão voltou a ficar severa. E o motivo era óbvio: mais Heartless. — Ainda mais agora que
temos companhia. Vamos, Sora. Vamos acabar com esses caras e tomar o Coliseu de volta!
Hércules disparou em direção ao aglomerado de Heartless e os atacou com seus punhos. A
pressão do vento gerada pelo golpe foi suficiente para eliminar um dos monstros, sem o soco sequer
chegar a atingi-lo. Mesmo desarmado, ele era incrivelmente forte.
— Bom trabalho, herói! — Sora passou o dedo por baixo do nariz e, pegando sua Keyblade,
atacou um dos Heartless. Ele também conseguia acabar com aqueles caras.
— Você também não tá se saindo nada mal! Se continuarmos assim, vamos acabar antes do
jantar! — exclamou Hércules, voltando-se para o jovem companheiro. Sora nunca tinha lutado do
lado de ninguém antes, então até que era divertido.
E com isso, os dois seguiram rumo às profundezas do labirinto, derrotando os Heartless ao
longo do caminho.

— He, he...
A risada nefasta de ecoou pelo labirinto. Sua aura era tão sinistra que o próprio ar à sua volta
se tornou mais escuro.
— Se liguem, perdedores. Como se lutar comigo fosse fazer o labirinto malvadão ir embora.
Tá, agora é contigo. Vai lá e acaba com o sofrimento daqueles palhaços.
Havia um jovem de cabelos loiros parado diante de Hades. Ele carregava uma espada quase
da sua altura e tinha uma capa vermelha pendurada nos ombros. Uma única asa negra brotava de
suas costas.
O nome daquele jovem era Cloud.
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— E o caminho para o próximo mundo se abrirá se eu os derrotar em combate...? — Cloud
perguntou a Hades.
— Exactamundo, espetadinho. E essa é a sua grande chance de ver o que move um herói. É
isso que você tá procurando, né?
Era uma incógnita se ele acreditara nisso ou não — Cloud não disse nada.
— Olha, eu sei, eu entendo. No passado, você sempre pisava na bola quando importava de
verdade. Mas com a força de um verdadeiro herói... ainda tá comigo aí? Bom, meu chapa, digamos
só que você nunca mais vai pisar na bola. Agora vai lá e mostra pro Hércules quem que realmente
vai vencer distâncias. — Hades falava depressa, como se para incitá-lo. Mas a expressão no rosto de
Cloud permaneceu imutável.
— Vamos esclarecer uma coisa. — A sobrancelha direita de Hades se ergueu, descontente
com o tom frio da resposta de Cloud. — Não estou fazendo isso por você. Essa é a minha luta.
Então fique fora dela.
Por fim, Cloud virou as costas para Hades e, com um balançar de sua capa, partiu.

Olhando para Hércules, Sora pensou em como as coisas podiam não ter ido tão bem se
estivesse sozinho. Ele não teria desistido, claro, mas passar por tudo aquilo sozinho definitivamente
seria desolador.
— Cara, como heróis são legais.
— De onde você tirou isso? E, ei, você também é bem legal — disse Hércules, dando risada.
— Ah, não sei não.
— Sei que algum dia você vai ser ainda mais forte que eu, Sora.
— É, quem me dera — disse Sora em meio a um sorriso, e então destruiu um bloco com o
balançar de sua Keyblade.
— Bom, uma coisa eu posso afirmar com certeza: você quebra esses blocos melhor que eu.
Eles estavam quase se divertindo enquanto destruíam essas coisas e seguiam de um lado
para o outro. Parecia que podiam continuar com isso para sempre — mas então, uma lufada de
vento soprou diante deles.
— Você é o herói Hércules?
O vento trouxe consigo um jovem de cabelos loiros — Cloud.
— Quem é você? — Sora imediatamente assumiu posição defensiva, pronto para a batalha.
Seu oponente empunhou sua espada gigante.
— Para vocês... um problema — disse ele, a voz suave. — Mostrem-me que têm uma boa
razão para lutar... e veremos como ela se compara à minha.
Sem qualquer aviso, a espada de Cloud disparou implacavelmente contra eles. Por pouco,
Sora conseguiu bloquear o golpe com sua Keyblade.
Reagindo rapidamente, Hércules desferiu um soco contra Cloud.
— Urgh! — Jogado para trás por um instante, Cloud recobrou o equilíbrio enquanto buscava
uma abertura em seus dois inimigos.
A batalha intensa continuou por mais um tempo. As habilidades com espada do jovem eram
tão ferozes que era impossível contra-atacar. Não sei se eu conseguiria vencer essa sozinho, pensou
Sora. Mas com nós dois juntos...
Após trocar vários golpes com Cloud, a dupla entrou em sincronia e começou a ver uma
abertura na defesa de seu oponente. O próximo ataque decidiria a batalha.
Cloud saltou do chão e se lançou contra Hércules. Em vez de se esquivar, Hércules deu um
passo em direção a Cloud, juntou as mãos e as sacudiu com toda a força contra o ombro do jovem.
Sora escolheu o mesmo momento para atacar o peito de Cloud com a Keyblade.
— Que tal isso?! — vociferou Hércules enquanto Cloud caía de joelhos.
— Então o que ele disse sobre você é mesmo verdade — disse Cloud, a voz baixa em meio à
respiração entrecortada.
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— Quem é você, afinal?
— Cloud. Não sou amigo de heróis.
Encarando os dois, Cloud se levantou e empunhou a espada outra vez.
— Ei, o que a gente fez pra...?
Antes que Sora pudesse terminar a pergunta, o que parecia uma bola de luz pálida e intensa
foi disparada contra eles, vinda de algum lugar mais ao lado. Foi tão de repente. Sem tempo para se
esquivar, tudo o que Sora pôde fazer foi fechar os olhos.
— Ngh! — Sora abriu os olhos de novo, as mãos trêmulas de medo, apenas para descobrir
que Cloud corajosamente oferecera seu corpo para proteger os dois.
— Tsc. Errei. — Hades surgiu em meio a uma nuvem de fumaça estranha, a cara fechada
numa carranca.
— Hades! Eu disse que a luta era minha! Fique fora disso! — exclamou Cloud, furioso.
— Qual é. Isso parou de ser sobre você faz, tipo, eras já... falou? — comentou Hades, dando
de ombros desinteressadamente.
— O quê? — rosnou Cloud.
— Ah, claro, você podia ter sido útil. Quer dizer, ô-oi? Eu não minto pra otários feito você
se não for ganhar uns quilômetros de vantagens. Você só tinha que distrair o Irk-ules o suficiente
pra eu arruinar a mussaca dele. Mas nããão! — Antes que Hades pudesse lavar mais roupa suja com
suas reclamações, Sora o atacou com a Keyblade.
— Beleza, admita! Você é o cara que fez isso com o Coliseu?
— Ah, saquei, vamos implicar com o cara com ambições de dominar o mundo. Bzzt, errou!
— retrucou Hades com um sorrisinho no rosto.
— Não foi você? — exclamou Hércules, descrente. Ele ainda estava pronto para uma luta.
— Foi mal, garotão, mas parece que eu não sou a única pinha na sua pita. Esse labirinto tem
outro guardião. Mas ó, eu até que sou um deus bem justo. Não vou ficar no seu caminho. Pra que
trabalhar quando posso só ficar de boa, relaxando enquanto assisto vocês todos virarem pó?
Com isso, Hades se virou.
— Volte aqui!
— Té mais, espetadinho. Vá achar umas botas pra bater.
Cloud foi atrás dele, mas Hades desapareceu numa cortina de fumaça diante de seus olhos.
— Cara legal — disse Sora em meio a um suspiro sarcástico.
Junto a ele, Cloud continuava olhando para onde Hades desaparecera com uma expressão
sombria estampada no rosto.
— Então eu fui enganado... — murmurou, começando então a partir.
— Ei, espera! — Hércules o chamou, tentando detê-lo.
— Esqueça que tudo isso aconteceu. — Cloud desapareceu em meio ao labirinto sem olhar
para trás.
— Qual o problema dele? — disse Sora, aborrecido, enquanto via o jovem partir.
— Ele é só mais uma vítima dos esquemas sujos do Hades — Hércules assegurou a Sora, a
voz cheia de gentileza.
— Isso não explica por que tem uma atitude tão nojenta — reclamou Sora, franzindo o
cenho. Ele vem aqui e ataca a gente do meio do nada e depois vai embora desse jeito? Não devia
pelo menos ter dito “obrigado”? Ou “sinto muito”?
— ...Ninguém é perfeito? Bom, se Hades não é o nosso culpado, então temos um problema.
Agora que Hércules apontava o verdadeiro dilema, o descontentamento de Sora para com
Cloud finalmente começou a passar. Ele cruzou os braços, pensativo.
— É, não podemos sair daqui enquanto não descobrirmos quem é o verdadeiro vilão.
— Acho que voltamos então à estaca zero.

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Enquanto Sora e Hércules continuavam em sua aventura, seguindo ainda mais para o fundo
do labirinto...
— Ei, aquele não é...?
A dupla reconheceu Cloud mais ao longe, encurralado em meio a um círculo de Heartless.
Ah, ele de novo, pensou Sora. Mas, mesmo assim, não conseguiu deixar de ir até lá para se
certificar de que ele estava bem.
A gigantesca espada de Cloud girava furiosamente à sua volta. Mas ele estava em menor
número e parecia estar tendo complicações para enfrentar todos eles.
— Cloud! Você tá bem?!
— Aguenta firme! Nós já vamos te... — Sora e Hércules tentaram se aproximar, mas Cloud
gritou de volta para eles:
— Me deixem! Saiam já daqui, os dois!
— Mas Cloud! Não podemos simplesmente... — Hércules hesitou e olhou para Sora.
— Eu me enterrei nesse buraco e quase arrastei vocês comigo. Agora vou pagar pelo que fiz.
— Isso é papo de doido! — gritou Sora e, antes que percebesse, já estava entre Cloud e os
Heartless. Não podia deixar o jovem sozinho.
— Vocês dois não se mancam?
Quando Cloud tentou recusar a ajuda, Sora respondeu se lançando com sua Keyblade contra
um Heartless. Da mesma forma, Hércules disparou ao lado de Sora e começou a atacar os monstros
que vinham em sua direção.
— Por que estão me ajudando? Por piedade? — perguntou Cloud atrás de Sora.
Sora virou para ele e pegou sua Keyblade, que retornava a suas mãos após um lançamento.
— Caramba, mas que coisa — retrucou. — Dói muito deixar a gente te fazer um favor?
Sem esperar uma resposta, Sora disparou novamente contra o grupo de Heartless.
— Vamos, dessa vez você vai lutar do nosso lado! — disse Hércules. Ele foi atrás de Sora e
esmurrou um Heartless.
Cloud rapidamente fechou a distância para que pudesse se juntar a eles, lançando sua grande
espada contra a horda de monstros. Com dois ou três Heartless desaparecendo de uma só vez, Sora
e Hércules sorriram. Eles lutaram em trio e, juntos, eliminaram pelo menos dez Heartless.
— Não importa o que eu faça, sempre vou decepcionar alguém. — No momento que todos
os monstros em cena haviam sido destruídos, Cloud virou as costas para Sora e Hércules, pronto
para sair andando sozinho outra vez.
— Cloud, espera. O que me diz de trabalharmos juntos? — sugeriu Hércules. Cloud parou.
— Por quê? Eu os ataquei. — Ele ainda estava de costas viradas.
— Mas só por que o Hades te enganou, certo?
— Não importa. Eu não tenho o direito de me juntar a vocês. Não sou forte o bastante.
Hércules não ia desistir assim tão fácil. Ele estava para pressioná-lo um pouco mais, mas
Cloud não parecia ter a menor intenção de unir forças a eles.
— Ugh! — Sora bateu o pé diante de Cloud e seu comportamento, e então deu um passo em
frente e agarrou sua capa. Cloud se virou, deparando-se com o olhar de Sora. — A gente não tá
perguntando se você é qualificado pro trabalho. O que você quer fazer?
— Hã?
Embora Cloud parecesse ter seus motivos para ser assim tão frio, nada disso importava. Era
perigoso demais atravessar aquele labirinto sozinho e se Cloud estava determinado em derrotar
Hades, então fazia sentido trabalharem juntos.
— Se você é completamente contra, não vamos te forçar. Mas é melhor que ficar perdendo
tempo arranjando desculpinha. — Cloud respirou fundo, mas Sora continuou pressionando: — Se
você está perdido, basta escolher uma direção e seguir em frente! Pode acabar encontrando alguma
coisa pelo caminho, alguma coisa que te coloque de volta no rumo certo.
Hércules acompanhou a reprimenda furiosa de Sora com uma um pouco mais gentil:
— Você nos protegeu quando Hades atacou e aposto que nem pensou a respeito. Esse é
quem você realmente é. Alguém forte, em quem podemos confiar.

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Por uma fração de segundo, a expressão no rosto de Cloud se suavizou com um sorriso
envergonhado, mas ele rapidamente desviou o olhar, como se para escondê-lo, e então sacudiu a
cabeça de leve.
— Não era força, era... He, parece que estou mesmo arranjando desculpas. Cara, vocês vão
se arrepender...
— Então você tá dentro? — respondeu Sora, animado.
Cloud ergueu a cabeça e tirou a mão de Sora de sua capa.
— Não vá entendendo errado. Eu preciso encontrar uma saída daqui, assim como vocês. Só
vou acompanhá-los no meio-tempo.
Cloud saiu andando sem esperar outro momento, mas sua postura não parecia tão teimosa
quanto antes.
— Então tá bom, valentão — retrucou Sora, aos sussurros, enquanto ia seguindo atrás dele.
Hércules avançou a seu lado.
— Bom, nem todo mundo é uma pessoa sociável — disse ele, em meio a um sorriso. —
Alguns são melhores para encontrar a força que há lá dentro.
— Hmph. Eu não entendo.
— Talvez ainda seja um pouco demais para você entender.
— O que quer dizer com isso?
Enquanto Sora e Hércules discutiam, Cloud se virou e chamou:
— Apressem-se, vocês dois.
— Ah, é? E por que você acha que a gente desacelerou pra começo de conversa, sabichão?
— disparou Sora antes de lhe dar um tapa no pescoço.
— ...Ai.
— Essa é pra você aprender.
— Tá, galera, acho que a brincadeira acabou — disse Hércules, num tom sério, parando
mais à frente. Havia uma grande porta diante deles.
— Isso não devia estar aqui, né? — perguntou Sora, sua voz baixa e tensa.
— Duvido que vamos encontrar algo agradável do outro lado. — Cloud parecia um pouco
nervoso. A atmosfera atrás da porta era extremamente ameaçadora.
— Certo, vamos nessa! — Hércules assentiu com toda a determinação junto a Sora e Cloud
e então abriu a porta.
Do outro lado, encontraram uma câmara subterrânea escura e úmida. Podiam ver uma cela
fechada com barras de ferro diretamente em frente. Havia algo muito errado com o ar que vinha da
escuridão lá dentro. Tinha um cheiro pútrido, como de carne estragada.
— Seja lá o que for o que estamos enfrentando, está perto — disse Hércules e, assim que o
fez, as barras começaram a se erguer em meio a um chiado metálico sinistro.
— Grrr... — Alguns segundos depois, o rosnado profundo de uma fera ecoou em meio à
escuridão lá dentro.
— O que foi isso...? — Sora franziu o cenho frente ao súbito frio no ar.
— Acho que estamos prestes a descobrir.
— Sim. Não dá pra saltar do trem onde estamos agora...
Sora e os outros passaram sob as barras de ferro e foram avançando de pouco em pouco,
permanecendo vigilantes, até que a silhueta de uma fera gigantesca foi surgindo à vista devagar. Em
meio a um grande rugido, um cachorro preto com três cabeças apareceu diante deles...
— Essa não. É o Cérbero, guardião do Mundo Inferior! Bom... mais ou menos. Tem alguma
coisa errada com ele!
Hércules abriu os braços e abaixou o corpo, pronto para a luta. Com saliva pingando de suas
mandíbulas, Cérbero rosnou baixo.
— Cérbero? Eis um nome que eu já ouvi antes. — Cloud empunhou sua espada.
— Esse é o pior erro que eu já vi... É ele. Ele é que tá mexendo com esse mundo! — Sora
também preparou sua Keyblade.
Cérbero saltou.

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— Escute Sora. Se quiser ser um herói algum dia, lembre-se disso: não importa quão ruins
pareçam as coisas, onde quer que você precise que esteja um amigo, ele estará lá!
— Um amigo?
— Estou falando de você e do Cloud! Nós estivemos lutando lado a lado, então agora vocês
são meus camaradas. Eu confio em vocês. Cuidado, lá vem ele!
Cérbero se lançou em frente e uma das cabeças da fera abocanhou o ombro de Hércules com
toda a ferocidade.
— Ugh!
— Hércules!
Cloud partiu para cima de outra das cabeças, enquanto Sora avançava e golpeava a cabeça
restante com sua Keyblade.
Quando a fera recuou um passo, Hércules escapou de suas presas afiadas e caiu de joelhos,
um pouco ofegante. Mas não demorou muito para voltar a se erguer. Ele se lançou contra a criatura
com toda a força e enfiou o punho no peito de Cérbero. O canino soltou um rugido de dor.
— Para trás, vocês dois — murmurou Cloud.
— Hã?
Sora e Hércules se viraram e pensaram ver a asa de Cloud bater.
— Vou acabar com isso...
Cloud subitamente saltou no ar e começou a desferir uma série de cortes rápidos com sua
espada. O ataque extraordinário era quase rápido demais para que o olho acompanhasse — era o
Omnislash.
— Uau... — murmurou Sora, admirado.
Cérbero deu um último uivo em direção ao céu antes de seu grande corpo cair de lado e
desaparecer em meio a uma forte luz.
— Conseguimos! — Sora pulou de alegria e posou com seus braços em volta de Cloud.
— Hmph. Já estava na hora de encontrar o caminho de casa — disse Cloud, a voz cansada,
enquanto tirava o garoto de cima de si.
Hércules deu uma risadinha enquanto os observava.
— Isso deve trazer o Coliseu de volta ao normal — disse ele em meio a um sorriso. —
Vamos contar as boas novas ao Phil!
Enquanto os três iam conversando, cheios de alívio e alegria, um sujeito alto surgiu numa
nuvem de fumaça.
— Hã, com licença, não estão esquecendo umas pontinhas soltas aqui não? Pois é, oi, eu tô
bem aqui. — Ele soava um pouco deprimido, o que o deixava ainda mais bizarro que de costume.
— Hades!
O perverso Senhor dos Mortos ainda estava lá. Ele olhou para o trio de baixinhos e roeu as
unhas, infeliz.
— Eu finalmente achei uma armadilha com todas as armadilhagens certas e o que vocês me
fazem? Vão lá e arruínam ela. Sabem qual é o lance de labirintos mortais? Você tem que morrer
neles. Mas tô vendo que vou precisar de uma abordagem mais pessoal!
Hades cerrou os punhos, juntando sua força, e então os jogou para o alto enquanto a chama
azul-claro em sua cabeça passava a queimar num vermelho brilhante.
— Ei, hã, H, acho que sei de outro truque pra virar um herói — disse Sora, completamente
calmo, enquanto empunhava sua Keyblade.
— Ah, é? — Seguindo o exemplo de Sora, Hércules se preparou para outra luta.
— Vamos ouvir. — Cloud fez o mesmo.
— No fim do dia... é só garantir que você ainda esteja de pé!
Nenhum dos três sentia que perderia hoje.
— Ah, me dá uma folga aqui, bando de paspalhos! — Hades invocou uma grande bola de
fogo e a atirou contra Sora e seus companheiros.
— Você não vai derrotar a gente assim tão fácil! — Sora rebateu a bola de fogo com sua
Keyblade, enquanto Cloud deu a volta por ela e atacou sem que Hades conseguisse sequer vê-lo.
— Seu bando de ranhentos insolentes!
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— Ei, nada de roubar os holofotes, Cloud! — Hércules flexionou os braços, preparando-se
para seu grande ataque, e então bateu os punhos no chão com toda a força que conseguiu juntar. O
impacto criou uma onda de choque que fez a terra tremer por todo o caminho até Hades.
— Rrgh! — O Senhor dos Mortos gritou enquanto era jogado no ar.
— Já foi o suficiente?
— Não vão pensando que venceram! Tenho mais de quinhentas milhões de vidas! Claro, a
maioria delas são vidas que eu tirei... mas eu vou voltar!
Com esse grito de despedida, Hades desapareceu em mais uma nuvem de fumaça, batendo
em retirada. O próprio ar pareceu relaxar à sua volta. Tudo parecia mais brilhante.
— Vocês dois são mesmo incríveis.
— É porque somos heróis — disse Hércules em meio a um sorriso.
— Heróis, hm... — sussurrou Cloud.
— É. Mas ei, o Phil deve estar preocupado. Prontos pra voltar? — perguntou Hércules.
Sora assentiu alegremente.

— Santa Hera! Vocês voltaram inteiros?!


Phil recebeu Sora e os outros com um sorriso quando chegaram de volta ao vestíbulo.
— Ó, homem de pouca fé — respondeu Sora, orgulhoso.
Hércules ergueu a mão direita para Sora.
— Obrigado, Sora. Não teria conseguido sem você.
Sora respondeu apertando a mão de Hércules, mas então notou uma coisa.
— Ei, cadê o Cloud? — perguntou, olhando em volta.
— O quê, o sujeitinho de cabelo espetado? Foi embora. Disse alguma coisa sobre partir na
próxima jornada — respondeu Phil.
— O quê?! Ele podia pelo menos ter se despedido... — Sora soltou a mão de Hércules e
abaixou a cabeça, desapontado.
Que otário, indo embora desse jeito. E justo quando estávamos começando a ficar amigos.
— Se bem que ele chegou a deixar uma mensagem. Disse “dê meus cumprimentos ao herói
e ao futuro herói”.
— Calma, futuro herói? Eu?
Uau, o Cloud acha que eu posso ser um herói?
— Em outras palavras, garoto, você ainda tá na liga juvenil.
— Ahh, que droga. — Sora se inclinou para frente, entristecido, suas mãos tocando os
joelhos. Achei que eu tinha ido tão bem lá dentro.
— Ha, ha! Tenho certeza que você será um grande herói algum dia, Sora. Seria ótimo ter um
amigo como você por aqui para ajudar a manter o Olimpo seguro. O que me diz? — disse Hércules,
pousando uma mão encorajadora no ombro de Sora.
— Oferta tentadora, mas eu tenho que ir. Tenho amigos esperando. Mas se precisar de mim
outra vez, virei correndo! — Sora respondeu a Hércules, sorrindo novamente. A mão do herói era
grande e calorosa. Espero que possa ser um herói como ele algum dia.
— Bom saber. Mande lembranças aos seus amigos. — Hércules deu um tapinha amigável
nas costas de Sora.
— Mando sim.
— E garoto, continua no ramo de herói. Você tem potencial. Aparece por aí se algum dia
quiser treinar! — disse Phil com toda a seriedade, dando a Sora um conselho verdadeiro.
— Obrigado, Phil! Bom, vejo vocês depois!
Sora acenou para os dois e deixou o salão às pressas, seguindo em direção ao grande pátio.

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— Mickey, deu certo?
O monitor no estúdio mostrava Sora falando com o céu em meio ao pátio. Enquanto Mickey
e os outros só puderam assistir ao que acontecera naquele mundo, Sora conseguiu trazer tudo de
volta ao normal com a ajuda de seus dois amigos, Hércules e Cloud.
— Sim, Sora, obrigado — Mickey disse a Sora do outro lado da tela.
A seu lado, Donald inclinou a cabeça, confuso.
— Ei, espera. Dessa vez, não recebemos um vídeo.
Toda vez que Sora restaurava os mundos anteriores, um novo vídeo com eventos dos quais o
Grilo não se lembrava de ter registrado aparecia no monitor. Dessa vez, não houve nada.
— Certo. Aquelas cenas... elas se originaram na minha mente — respondeu Riku.
— Hã? — Donald estava confuso.
— Quando vocês se livraram dos bugs, me deram um acesso mais profundo às memórias
associadas àqueles mundos. As últimas coisas que eu vi devem ter encontrado o caminho de volta
através da conexão e aparecido no seu monitor.
— Ora, mas quem diria. Se aquelas memórias vêm do fundo do próprio diário, então não me
espanta que não nos sejam familiares. Elas não pertencem a nenhum de nós! — disse o Grilo,
assentindo várias vezes.
Então aqueles vídeos eram memórias especiais, desconhecidas até para os próprios dados.
Ainda assim, nunca tinha ouvido falar de um diário que tivesse uma mente própria. Riku dissera que
ele era os dados de dentro do diário, mas não o diário em si. A vontade do diário e a existência do
Digi-Riku pareciam coisas separadas.
O que estava acontecendo com o diário?
Enquanto o Grilo ponderava a respeito de tudo isso, Pateta ergueu o olhar e disse:
— Hmm? Tá acontecendo alguma coisa... — Um estranho recém-chegado havia aparecido
diante de Sora no monitor.
— Hã? Não pode ser!
Reconhecendo quem era, Mickey deu um pulo em direção ao monitor.
— Bwa, ha, ha, ha! Há quanto tempo!
A voz que ribombava dos alto-falantes era familiar e indesejável.
— O Bafo está aqui?! Como você entrou? — vociferou Mickey.
Ouvindo seu nome, Bafo ergueu o olhar para o céu e disse:
— Igualzinho a vocês. Resolvi tirar umas férias do mundo exterior.
De alguma forma, Bafo parecia saber que Mickey e seus amigos estavam no digespaço.
— Bom, esse mundo aqui agora é meu, então caiam fora!
Com isso, Bafo virou as costas para Sora e desapareceu em meio a um misterioso espaço
espiralante com uma luz curiosa e brilhante.
— Ele deve estar tramando alguma coisa. Rápido! Atrás dele! — exclamou Mickey.
Sora assentiu e passou correndo pelo portal atrás de Bafo.

56 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
De pouco em pouco, cada vez mais, o mundo
está despertando. E também está mudando.
Todos os mundos podem mudar, seja através
da cura ou através da dor.
Eu quero acreditar que o sono sempre termina
com o despertar.
57 | K i n g d o m H e a r t s - R E : C o d e d : A R o m a n t i z a ç ã o
DO OUTRO LADO DO MISTERIOSO PORTAL DE BAFO HAVIA UMA CIDADE CHEIA
de areia, com construções feitas de pedra. Sora conseguia sentir o ar quente e seco em sua pele.
Ele vasculhou a área em volta, mas não havia nem sinal de Bafo.
Mickey parecia conhecer aquele tal de Bafo, mas o que ele poderia estar tramando?
Sora começou a andar, procurando enquanto avançava. Nada pulou para cima dele de um
possível esconderijo, mas ele não tinha a impressão de que aquele cara seria fácil de encontrar.
De toda forma, as ruas estavam bastante quietas. Havia algumas lojas aqui e ali, mas nem
uma única alma a vista. Em vez das pessoas que deviam morar ali, havia apenas aqueles mesmos
blocos de antes. Não tem ninguém pra quem eu possa perguntar?
Ele saiu em busca de pessoas, mas, como sempre, Heartless lhe bloquearam o caminho.
Alguém também devia ter ferido aquele mundo.
Após destruir os Heartless diante de si, Sora encontrou uma praça com um grande portão.
Do outro lado, havia um enorme edifício com um teto circular e ricamente colorido. Poderia ser um
palácio ou coisa do tipo? Parado diante dos portões estava um jovem rapaz que parecia estar
pensando em alguma coisa.
— Fala aí — Sora o chamou. — Por que não tem ninguém na rua?
O jovem se virou, ligeiramente surpreso.
— Ah, você é humano — disse, levando a mão ao peito. — Blocos estranhos? Monstros
esquisitos? Dá pra escolher o motivo. Eu consegui escapar daquela caverna, mas preciso garantir
que a minha amiga do palácio está segura, então... ei, você devia estar aqui fora? Não é seguro nas
ruas — o jovem disse a Sora, preocupado. Ele parecia legal. Não acho que seja um vilão.
— Posso cuidar de mim mesmo — respondeu Sora com um sorriso.
— Ha, ha! Retiro o que disse. Bom, só vê se fica de olhos abertos, tá? — O jovem parou
para pensar por um momento e então acrescentou: — Ah! Ei, espera! Você tem um minuto? Estou
precisando de ajuda. — A expressão franca e amigável em seu rosto ficou extremamente séria.
— Claro, o que rola?
— Estou procurando uma amiga minha. O nome dela é Jasmine e ela... bom, ela é especial.
Estive morrendo de preocupação, mas não estou conseguindo encontrá-la. Vou continuar dando
uma olhada no palácio. Se estiver tudo bem por você...
Sora respondeu antes que o jovem pudesse terminar:
— Não precisa dizer mais nada. Também estou procurando alguém, então vou ficar de olho
na Jasmine enquanto vasculho a cidade. Tem problema não!
— Ótimo! Vai salvar a minha vida. Meu nome é Aladdin, a propósito.
Um sorriso se abriu no rosto de Aladdin enquanto ele estendia sua mão direita para Sora.
Sora a apertou com firmeza e também se apresentou:
— Sora! É um prazer conhecê-lo. Eu te aviso se descobrir alguma coisa, beleza? Até depois!
— Certo! Obrigado, Sora!
Sora assentiu com força e então saiu correndo em busca de Jasmine e Bafo.
Mas rapaz, as ruas eram uma bagunça só. A grande avenida também servia como um bazar,
mas as casas de pedra de ambos os lados eram coladas umas nas outras, formando um labirinto
complexo. Sora seguiu em frente, totalmente perdido o tempo todo, até que ouviu a voz de uma
mulher. Ele parou em meio a um beco.
— ...sar com você? Nem um milhão de anos, sua víbora!
Sora correu em direção à voz e se deparou com uma garota que parecia estar discutindo com
um sujeito esguio atrás de uma série de blocos. Ambos trajavam roupas extremamente finas, mas
enquanto a garota parecia uma pessoa honesta e determinada, o sujeito tinha uma aura sinistra que
não conseguia ocultar por completo.
— He, he, he. Você faria bem em reconsiderar, minha cara. Eu odiaria muito vê-la ferida.
— Minha resposta nunca mudará, Jafar! Eu preferiria morrer a me casar com você!
— Rrgh! Isso pode ser arranjado! — O homem chamado Jafar ergueu seu cajado.
— Deixa ela em paz! — Sora pulou entre os dois e encarou o sujeito, protegendo a garota
atrás de si.
— Quem é você? — perguntou ela, insegura.
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Ele olhou de volta para ela e perguntou:
— O nome é Sora. Hmm... você é a Jasmine?
Ela assentiu de leve.
— O Aladdin tá te procurando.
— O quê?! Aladdin! — Jafar reagiu ao nome, suas sobrancelhas se erguendo para tornar a
expressão vil em seu rosto ainda mais desagradável. — Achei que tinha me livrado desse rato de rua
inútil! Hmm... não importa. Posso encontrá-lo depois de lidar com você!
Jafar ergueu o cajado novamente.
— Jasmine, para trás. Vou tirar esse esquisitão do teu pé — exclamou Sora, antes de se
lançar contra Jafar. Com a Keyblade em mãos, ele atingiu o homem no queixo barbado.
— Ungh!
Um momento depois, Jafar se teletransportou. Então ele podia usar magia...
Enquanto Sora tentava descobrir aonde ele tinha ido, uma bola de fogo gigantesca foi
lançada do alto em sua direção.
— Cuidado! — gritou Jasmine.
Graças a seu aviso, Sora se esquivou por um fio de cabelo, então olhou para o ponto de
origem do caminho que ela tinha feito e encontrou Jafar em cima de um telhado. Sora deu um
grande salto, fez um arco no ar em direção ao topo do prédio e atacou o inimigo com a Keyblade.
— Que tal isso?
— Grrrah! Isso está longe de ter acabado! — disparou Jafar. Recuando aos tropeços, ele
desapareceu graças à mesma magia de antes.
— Obrigada, Sora. — Jasmine saiu do esconderijo e correu até ele.
— Sem problema, mas... por que aquele cara tava te incomodando?
— O Jafar? Ele é muito irritante...
Com a voz baixa, Jasmine começou a explicar suas circunstâncias.

Enquanto isso, Jafar estava recuperando o fôlego num canto do bazar. Ele nunca vira aquele
rato antes. Estava indo tudo de acordo com o plano até que aquele infeliz resolveu aparecer.
Enquanto Jafar trincava os dentes de raiva, ele ouviu uma risada.
— Gah, ha, ha, ha! Problemas com roedores?
Quem aparecera diante de Jafar era um sujeito rechonchudo de aparência malvada, com uma
grande boca e orelhas — Bafo, o mesmo vilão que Sora estava caçando.
— Tenho a solução bem aqui pra você, camarada.
— O quê? Como ousa se dirigir a mim de forma tão...? — Jafar estreitou os olhos frente às
palavras arrogantes de Bafo... até que notou o que ele carregava consigo. — Essa lâmpada! É a que
estou buscando! A lâmpada mágica que concede desejos!
Era uma das lendas daquele mundo.
Bafo sorriu. A reação de Jafar era exatamente o que estava esperando.
— Não exatamente. Eu usei os erros desse mundo pra criar uma dupla... uma duplique...
Uma cópia. — Ele ergueu a lâmpada diante de Jafar.
— “Ê-rrols”? De que tipo de feitiçaria poderosa está falando? Me dê de uma vez! — Jafar
praticamente arrancou a lâmpada das mãos de Bafo.
— Mas quanta agressividade. — Bafo cruzou os braços enquanto Jafar fitava a lâmpada
atentamente. — Só faça um favor ao velho Bafo aqui e mergulhe esse mundo nas tre... hã?
Jafar começou a gargalhar ruidosamente.
— He, he. HAAA, ha, ha, ha! Enfim, todos os meus planos se tornarão realidade! — Ele
esfregou a lâmpada e chamou: — Ouça-me, espírito da lâmpada! Para o meu primeiro desejo, eu
quero o poder de deter qualquer um que entrar no meu caminho! Sim...! Sim!
Uma poderosa luz irradiou da lâmpada e envolveu o corpo de Jafar.

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— Uau, então você é uma princesa de verdade? Quem esse Jafar acha que é? — Sora havia
escutado a história de Jasmine.
— Infelizmente, ele é o vizir real. E está tramando algo terrível, tenho certeza disso. Mas
quando tentei avisar aos outros no palácio, ninguém acreditou em mim. Jafar é um homem
respeitado. — Ela abaixou o olhar e sacudiu a cabeça, entristecida.
— Pois é, o que tá havendo com a cidade?
— Não tenho certeza. Apareceram todos esses blocos estranhos e essa era justamente a
desculpa que o Jafar precisava para fazer sua jogada. Enquanto estavam todos distraídos pelo caos,
ele tentou me capturar. — Jasmine respirou fundo em meio a um suspiro pesado e melancólico.
Agora que você mencionou, o Aladdin tinha dito que a Jasmine era especial...
Sora perguntou outra coisa a Jasmine:
— O Aladdin sabe sobre o Jafar?
— Não. Ainda não. Queria poder falar com ele... — Jasmine ergueu o olhar novamente,
lutando contra as lágrimas. — Espera, como você sabe sobre o Aladdin?!
Sora recuou um passo — Jasmine quase parecia pronta para agarrá-lo.
— Eu encontrei com ele na frente do palácio — respondeu. — Ele disse que tinha escapado
de uma caverna...
— Ele está vivo! Ah, que maravilha! — Jasmine juntou as mãos diante do peito, fechando
os olhos de alívio e alegria. Aparentemente, ela acreditava que Aladdin havia partido para sempre.
— Aham. E ele tava morrendo de preocupação por você. Vamos atrás dele que aí ele te
conta a história toda.
— Perfeito! Eu vou com você.
Jasmine assentiu entusiasticamente com um sorriso brilhante.

Assim que viu Aladdin na praça, Jasmine passou correndo por Sora e disparou até ele.
— Jasmine! Você está bem!
— Aladdin! Que bom que está tudo bem com você.
Um pouco mais adiante, Sora observou enquanto os dois olhavam nos olhos um do outro e
se sentiu um pouco aliviado. Agora só o que precisava fazer era encontrar Bafo.
— Só queria poder dizer o mesmo de Agrabah. — A expressão de Jasmine escureceu.
— Não se preocupe, eu tenho a resposta para os nossos problemas bem aqui. Sabe, eu tava
numa caverna estranha no meio do deserto e espera só até ver o que eu encontrei. Os dias do Jafar
estão contados!
Quando Aladdin terminou de falar, uma sombra negra pairou sobre eles.
— Isso é o que vamos ver, rato de rua!
Era o vizir.
— Jafar! — Sora correu até Aladdin e Jasmine, invocando sua Keyblade. Mas antes que
pudesse detê-lo, Jafar tomou Jasmine pelo braço.
— Ngh! Me... solte!
— Jasmine! — gritou Aladdin, correndo para agarrar Jafar, mas uma força estranha o jogou
para trás.
— He, he, he! Agora toda Agrabah pertence a mim. Com a princesa como minha esposa, eu
governarei esta terra como o sultão!
— Você não pode! — O próprio Sora tentou libertar Jasmine, apenas para ser repelido pelo
mesmo poder misterioso.
— Ha, ha! É claro que posso! Compreenda, a lâmpada me deu um incrível poder. Ninguém
agora pode me desafiar.

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— A lâmpada?! Mas como você...? — Em pé novamente, Aladdin levou a mão ao bolso.
— Infelizmente, casamentos levam tempo para planejar. E como sou eu que estou falando
agora, vocês podem calar as bocas para sempre! — Jafar ergueu a lâmpada no alto.
— O quê...?!
Sora fechou os olhos por um breve instante frente à súbita onda de luz brilhante. Quando os
reabriu — tudo parecia igual, exceto por Jasmine e Jafar, que já não estavam mais lá.
— Não! Eles se foram! Rápido, Aladdin, temos que ir atrás deles! — Sora chamou Aladdin,
pronto para partir, mas havia algo de errado com ele. Ele estava completamente imóvel. Em sua
mão, havia uma lâmpada muito parecida com a que Jafar tinha antes.
— Hã... Aladdin?
Sora sacudiu a mão diante os olhos abertos e estáticos do jovem, mas ele não moveu um
músculo sequer. Era como se o tempo houvesse parado para ele.
Confuso, Sora ouviu a voz de Mickey:
— O Jafar parece ter conjurado uma espécie de feitiço poderoso contra a cidade.
— Mickey! Você tá vendo isso? Qual o diagnóstico?
— Bom, hã... puxa. Parece... parece que o Jafar conseguiu parar o tempo na cidade inteira!
— Hã? Mas eu ainda consigo me mexer — respondeu Sora, olhando para si mesmo.
— Você tem a Keyblade. Jafar não levou isso em conta. Ainda assim, mesmo a Keyblade não
vai segurar o feitiço para sempre.
— O quê?! Então eu preciso sair daqui! Mas... não posso simplesmente deixar o Aladdin e a
cidade desse jeito.
Enquanto Sora falava com Mickey, um papagaio o observava. O feitiço não o havia afetado,
o que queria dizer que ele estava conspirando com Jafar. Com um balançar de suas asas ricamente
coloridas, ele surrupiou a lâmpada da mão de Aladdin.
— E-Ei! — gritou Sora.
Segurando a lâmpada firmemente em ambas as patas, o papagaio — Iago — saiu voando.
— O quê? — vociferou. — Nunca ouviu falar do desconto especial para pássaros? O Jafar
não me diz o que essa lâmpada faz, mas seja lá o que for, vai me fazer um papagaio muito feliz!
Iago então foi embora.
— Ugh, ótimo.
— Sora, você tem que reaver aquela lâmpada! Tem um amigo lá dentro que pode te ajudar!
Mickey também parecia um pouco tenso.
— “Lá dentro”? Bom, se você diz!
— Lembre-se, você não tem muito tempo. Você tem que encontrar a lâmpada antes que seja
tarde demais!
— Deixa comigo!

Sora saiu correndo, mas não fazia ideia de para onde Iago tinha ido.
Pelo menos tinha um lado bom naquilo tudo — o feitiço do tempo também tinha congelado
os Heartless.
A primeira parada de Sora foi no palácio real, mas não havia nem sinal de Iago lá.
— Onde ele pode estar...?
Estava ficando cansado depois de toda aquela correria, mas tinha que se apressar se não
quisesse acabar congelado também.
Parando para pensar — aquele beco onde havia encontrado Jasmine e Jafar pela primeira vez
daria um ótimo esconderijo. Com um novo destino em mente, Sora disparou pelas ruas.
— Aí está você! Por favor, você tem que me devolver isso!
— Ah, sinto muito. Não fazia ideia que era tão importante pra você. Agora eu tenho certeza
que vale a pena ficar com ela! Tchauzinho!
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Iago saiu voando de novo. Sora estava com a sensação de que teria que recuperar a lâmpada
à força. Ele saiu correndo atrás do papagaio, voltando pelo bazar e seguindo em direção aos portões
do palácio. Espiando Iago do topo de uma loja, Sora parou para recuperar o fôlego.
Tá, nada de pedir gentilmente dessa vez. Tenho que pular em cima dele com tudo!
Observando sua presa de seu esconderijo, Sora saltou no instante em que Iago pousou.
— Peguei! — Sora agarrou Iago com ambas as mãos e olhou para o pássaro.
— Ah! Alego insanidade! Eu não sabia o que estava fazendo! Eu imploro, tenha piedade! Dê
uma chance a esse pássaro! — O papagaio rapidamente soltou a lâmpada e começou a implorar por
misericórdia, desesperado. Sora era muito forte; Iago provavelmente estaria na pior se o enfrentasse.
— Vou deixar passar dessa vez. Mas não vai ter uma segunda chance.
— Ai, ai! — No instante que Sora soltou Iago, ele chiou de um jeito nada papagaiesco e saiu
voando às pressas. Sora recolheu a lâmpada de onde havia caído no chão e a examinou de perto.
— Ufa! Tava na hora.
A relíquia extremamente brilhante parecia milenar. Por que Aladdin teria algo como aquilo?
Era o que ele havia encontrado na caverna, certo?
Sora aproximou o rosto para tentar ver se havia mais alguma coisa na lâmpada que ele não
havia percebido e, de repente, ela sacudiu.
— O-O quê?! — A lâmpada saltitou outra vez e então disparou um jato de fumaça. — Uou!
O que emergiu na lâmpada era...
— Problemas, Al? Eita! ...Ei, você. Você não é o Al.
Um grande homem azul estava flutuando no ar sobre Sora. Analisando melhor, Sora viu que
sua forma não tinha pernas. Em vez de andar sobre os dois pés, ele estava flutuando.
Mas Sora não podia ficar ali parado em choque. O tempo era precioso.
Talvez esse “Al” seja o Aladdin! Vamos ver.
— É, o Aladdin não consegue se mexer porque o Jafar parou o tempo. Hã... quem é você?
— perguntou Sora.
A figura azul girou num círculo em meio ao ar e estalou os dedos.
— O nome é Gênio, sobrenome “da lâmpada”. E aí, como vai? Você tá com um problema,
meu jovem? É só fazer um pedido e problemas resolvidos! Erros acertados! É só esperar que o
serviço vem já! — divagou ele. Sora piscou.
— Você vai conceder todos os meus desejos? — perguntou.
O Gênio se aproximou, talvez perto até demais, e ergueu três dedos.
— Não, senhor! Três por cliente, enquanto durar o estoque. Esse é o limite. Não pode
esperar que outra pessoa vá cuidar de tudo pra você.
Sora começou a pensar por um momento, deslumbrado em parte pelo entusiasmo do Gênio e
em parte porque não conseguia acreditar muito que qualquer desejo seu podia ser concedido.
— Não acredita em mim? — indagou o Gênio, desconfortável.
Será mesmo possível que tudo o que eu desejo se torne realidade? Me parece algo tirado de
um sonho. Bom, o Gênio não parece um bandido...
Além do mais, ele é amigo do Aladdin. Acho que posso ir na onda dele.
— Hmm, então é melhor eu fazer os meus pedidos valerem à pena. Sabe o quê? Eu desejo
que esse mundo tenha menos problemas!
— Desejou, levou, garoto. Bada-bim!
O Gênio rodopiou no ar em meio a um estalar de dedos e uma breve piscadela. O mundo
estremeceu de leve.
— E aí? O que achou da sua nova cidade fantasma completamente livre de fantasmas?
— Ah! Hã... eles sumiram! Obrigado! Isso também descongelou o tempo pro Aladdin?
— Hã? Puxa... — O Gênio sacudiu a cabeça. — Gênio ficando contrito em três, dois, um...
— O quê?! Quer dizer que você não ajudou ele? — Sora abaixou a cabeça, desanimado.
— Bom, você disse “menos problemas”... Desculpa, garoto, acho que eu acabei levando ao
pé da letra.
O Gênio também parecia descontente. Seu show dramático e decepção na verdade ajudaram
Sora a se sentir um pouco melhor.
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— Não, é culpa minha. Devia ter sido mais específico.
— Bom, não vou ficar com um pedido concedido pela metade no meu registro permanente!
Vamos dizer que esse foi de cortesia. E adivinha só: pra compensar pra você, eu até rastreei o seu
vilão. Fala a verdade, isso é o que eu chamo de prestar um bom serviço, né não? — O Gênio pôs o
braço em volta do ombro de Sora.
— Vilão... Tá falando do Jafar? Aí eu boto fé! Vamos tentar outra vez. Gênio, eu desejo que
você me leve até o Jafar!
— Pode deixar, chefe! Aperta o cinto porque lá... vamos... nóóós! — O Gênio estendeu os
braços e começou a girar, criando um redemoinho.
O tornado jogou Sora e o Gênio voando até uma grande estátua da cabeça de um tigre em
meio ao deserto. Havia algo de especial a respeito daquele lugar.
A boca do tigre estava fechada — e, parado diante da estátua, estava Jafar.
— Jafar!
— O quê?! Como chegou aqui? Ah, é claro. Então você obteve a verdadeira lâmpada. E não
há dúvidas de que a culpada é esta sua arma ridícula. — Jafar explicou sua teoria, esfregando o
queixo com toda convicção.
— O que você fez com a Jasmine?
— Minha futura rainha está descansando, lá do outro lado da porta.
— Porta? Que porta? — retrucou Sora. O vizir deu risada.
— Que porta poderia ser? Você nunca vai encontrá-la, garoto.
— Você vai me contar quando eu tiver acabado contigo!
— Oh-ho, eu acho que não. Infelizmente, preciso ir roubar o coração de Jasmine. E você não
interferirá novamente. Espírito da lâmpada! Ouça meu segundo desejo! Impeça que essas pestes me
sigam! — Jafar balançou a mão para cima e uma névoa odiosa envolveu a área.
— O que você...?
Sora observou seus arredores atentamente por um momento, mas nada aconteceu. A névoa
eventualmente também acabou baixando, mas havia dado a Jafar tempo suficiente para desaparecer.
— ...Parece que tá tudo bem certinho por aqui, garoto — disse o Gênio, flutuando de um
lado para o outro.
— Putz. Pra onde o Jafar fugiu agora?
— Bom, a boca do tigre normalmente fica aberta... — comentou o Gênio, a cabeça inclinada
para o lado.
— Fica?! Então pode ser... Lá está! — Sora encontrou uma fissura bastante familiar junto à
cabeça do tigre.
— O que é isso?
— Espere aqui, Gênio!
Sora adentrou o Setor Sistêmico.

— O Gênio nunca muda, né? — comentou Pateta, todo contente, assistindo aos eventos no
monitor.
— Eu também queria ver o Aladdin e a Jasmine de novo. — Donald abriu um pequeno
sorriso enquanto se lembrava.
O mundo na tela fora construído com base nos registros de suas jornadas, então era natural
que os dois ficassem sentimentais. Ver os mundos que visitaram e os amigos que conheceram com
Sora fazia com que se sentissem numa nova aventura.
— Mas para onde o Bafo foi? — Mickey inclinou a cabeça.
— Ele certamente não parece ser do digespaço. — O Grilo cruzou os braços, pensativo.
— Então quer dizer que tem algum outro jeito de entrar nesse mundo além do computador
no mundo real?

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— É impossível. A única cópia do diário está aqui. — Mickey logo negou a sugestão do
Grilo. Não iam conseguir nenhuma resposta sobre o que estava acontecendo com o diário e com o
digespaço sem a ajuda de Sora.
— Tenho certeza que o Sora vai resolver tudo — disse Donald. Fosse no digespaço ou no
mundo real, o Sora sempre seria o Sora e todos tinham fé absoluta nele.
— Mas o Bafo me preocupa. Temos que estar preparados para o pior com ele — respondeu
Mickey, olhando então para o garoto com a Keyblade em mãos dentro do monitor.
— Se precisamos estar preparados para o pior... talvez haja algo que possamos fazer — disse
Riku, a voz suave.
Mickey e os outros se voltaram para ele, esperançosos.

Depois que Sora deixou o Setor Sistêmico, a boca do tigre se escancarou. O Gênio espiou do
outro lado e então enrolou os braços em volta do corpo, trêmulo.
— Hmm, isso não vai ser nada fácil, chefe. Estou sentindo uma dose tripla de armadilhas no
meu lâmpa-dar.
— É aquela lâmpada idiota do Jafar. Mas se ele tá aumentando a segurança, só pode querer
dizer que a Jasmine tá lá dentro — respondeu Sora, dando uma olhada na boca do tigre, assim como
o Gênio. Acrescentar mais armadilhas era um claro anúncio de que havia um tesouro precioso ali.
— Me parece uma ótima teoria.
— Vamos encontrá-la e colocar o Jafar no seu lugar.
Sora adentrou a boca do tigre. A Caverna dos Tesouros do outro lado era um lugar escuro e
empoeirado. Uma tocha ou outra perdida ao longo das paredes provia alguma luz, mas não era o
suficiente para iluminar o caminho em frente.
Após atravessarem um caminho desagradavelmente estreito e infestado de Heartless, eles
ouviram um estrondo sinistro.
— O quê? Uou!
Notando o que estava causando o barulho, Sora parou no último segundo possível. Era uma
armadilha que lançava gigantescos pedregulhos redondos contra ele. Se um deles passasse por cima
dele, Sora não teria a menor chance.
Quando descobriu qual seria o momento certo para poder avançar sem ser esmagado, Sora
disparou pelo caminho estreito de uma só vez.
— Ufa... — Ele parou para tomar fôlego quando viu a saída para a próxima câmara. O
Gênio subitamente apareceu atrás dele.
— Hmm, esse lugar não me cheira bem... e olha que nem estamos num banheiro público.
— Então o Jafar deve estar perto. Acha que há esperança para o Aladdin e para a cidade? —
perguntou Sora, erguendo o olhar para seu companheiro azul flutuante.
— Ora, claro que há! Um ou dois pontapés na buzanfa do Jafar já deve reiniciar o tempo em
Agrabah. E o Al vai ficar livre como um pássaro! Pra ser franco, fico com inveja. Eu daria qualquer
coisa por essa liberdade, mas estou preso até que o meu mestre deseje me libertar — disse ele com
um triste balançar da cabeça.
— Você quer ser livre... foi mal. Eu nunca me coloquei nos seus pés.
Ele tá preso dentro de uma lâmpada há tanto tempo — deve ser solitário, sem mencionar o
quão doloroso.
— Tá tudo bem, eu não tenho pés. Mas eis como é ser um gênio: Poderes cósmicos
fenomenais, numa casinha minúscula... Eita, déjà vu! Acho que eu disse a mesma coisa pro Al.
Sabe, ele parecia entender mais que os outros... — Os olhos do Gênio se fecharam de leve à medida
que se lembrava daqueles tempos.
— Foi nessa caverna que vocês se conheceram, né? O Aladdin é um bom amigo. Quando
nós nos conhecemos, ele também ficou preocupado comigo. Vem, Gênio. Ele precisa da gente.

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— Mostre o caminho! — O Gênio abriu um sorriso frente às palavras de encorajamento de
Sora, rodopiou no ar e voltou para a lâmpada.
— Hora de ir em frente!

Eles finalmente chegaram à câmara principal da caverna — a grande área cavernosa onde a
lâmpada mágica do Gênio costumava ficar. Jafar estava em pé sobre uma plataforma elevada que
mais parecia um altar.
Eu vou derrotá-lo, seja como for! Vou salvar a Jasmine e o Aladdin!
— Acabou, Jafar! Você não tem mais pra onde fugir! — Sora atirou sua Keyblade com tudo
contra o inimigo.
— O quê? Como você escapou de todas aquelas armadilhas? Hmph, agora me parece claro...
Você não é um rato de rua. Por que não me serve? O que quer que deseje, eu posso tornar realidade
— ronronou Jafar.
— O que quer que eu deseje? Beleza... — Sora sorriu. — Eu desejo que o Aladdin seja o
sultão! Faça acontecer!
— Ele?! Não brinque comigo, moleque. Talvez você precise de uma lição para ver o que um
verdadeiro governante pode fazer. Isso é, se conseguir distinguir o verdadeiro dos demais!
Jafar abruptamente se dividiu em três cópias suas. Cada uma delas tinha uma expressão
extremamente arrogante no rosto, prontas para atacar. Mas sem hesitar por um momento sequer,
Sora partiu para cima de um dos vizires e o atacou com a Keyblade.
— Ah! Como soube que era eu?!
— Porque os outros são transparentes, dã! Desista, Jafar! Liberte a Jasmine! E a cidade
também! — Sora estava ficando irritado enquanto atacava Jafar com a Keyblade.
— Rrgh! Você me deixa com pouca escolha! Estava guardando o meu último desejo para
fazer com que Jasmine me amasse... — rosnou Jafar, balançando então seu cajado para o alto. —
...mas eu agora simplesmente tomarei a princesa e a cidade à força! Espírito da lâmpada! Eu desejo
que você me torne um gênio todo-poderoso!
O vizir parecia muito mais formidável agora. Ao fazer seu desejo, ele foi engolido por uma
grande luz.
— Aonde ele foi?
Jafar havia desaparecido sem deixar rastros.
— Haaa, ha, ha, haaa! Eu disse, garoto: você nunca verá o outro lado da porta. E agora...
todo este poder! Nada pode me impedir de moldar o mundo do jeito que achar apropriado! Saboreie
seus últimos momentos, garoto! Em breve, eu vou esmagá-lo!
A própria caverna começou a sacudir com um poderoso estrondo. Daquele jeito, o mundo se
tornaria o brinquedinho de Jafar. Eu tenho que fazer alguma coisa. Mas eu não sei aonde ir... O que
posso fazer?
— Não precisa entrar em pânico, Sora. O Jafar está mais perto do que imagina.
Ele ouviu uma voz bastante calma em meio ao ar. Com o coração cheio de alívio, Sora
sorriu e respondeu:
— Mickey! Tem certeza disso?
É verdade. Eu não tô sozinho nessa. O Mickey e o Gênio estão comigo.
— Pense a respeito: o que a gente sabe sobre portas escondidas? O Jafar deve estar dentro da
Keyhole! Você tem que encontrá-la, e logo.
— Deixa comigo — respondeu Sora, examinando a câmara.
Bem, um lugar em específico imediatamente lhe chamou a atenção. Aqueles blocos pretos e
vermelhos não se encaixavam ao cenário e parecia ter alguma coisa atrás deles.
Sora atacou os blocos com a Keyblade e eles logo desapareceram, como de costume.
Atrás deles, uma Keyhole apareceu.

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— Lá vai! — Sora ergueu sua Keyblade em direção à Keyhole e então adentrou o reino do
outro lado da porta.
Era um lugar de um calor escaldante, cheio de lava borbulhante ao redor. Era praticamente
impossível reconhecer Jafar agora — ele havia se transformado num gigantesco gênio carmesim.
Mas seu olhar odioso continuava o mesmo.
— Impressionante, garoto. Mas sua persistência de nada valeu. Eu sou invencível! O que
você poderia fazer?
O Jafar Gênio atirou uma bola de magma colossal contra Sora. O garoto mal conseguiu se
esquivar a tempo.
— Rrgh... — murmurou ele. — Ainda vou pegar você...
O calor estava deixando difícil de respirar.
— Gênio falando. Está na escuta, Sora? — Dessa vez, a voz no ar era a do Gênio, alegre e
energética como sempre, apesar das circunstâncias.
— Alto e claro, Gênio!
— Ele não tá de brincadeira sobre a parte de ser invencível. Nenhum dos seus ataques pode
feri-lo. Mas Jafar é um gênio agora. O que significa...
Quando Sora se acalmou e começou a procurar em volta, viu aquele papagaio — Iago —
circulando mais ao alto, segurando uma lâmpada com toda o cuidado em suas patas.
— A lâmpada! Entendido, Gênio! Câmbio, desligo! — Sora respondeu ao Gênio depressa e
então foi saltando pelos blocos espalhados pela área para perseguir Iago.
— Você já zanzou o suficiente por aqui. Este é o fim, garoto!
O Gênio Jafar disparou um raio de seus olhos com o poder de desacelerar os movimentos de
Sora. Ele se esquivou por pouco, mas Iago aproveitou a oportunidade para sair voando para ainda
mais longe.
— Huff... huff... Vish! Já não aguento mais. — Mas o papagaio estava começando a cansar.
É claro que estava; aquela lâmpada era um fardo muito pesado para um pássaro brincando de pique.
Sora aproveitou a chance para correr até o topo dos blocos e arrancar a lâmpada das garras
de Iago com sua Keyblade.
— Ei! Tá bom, tá bom, eu desisto! Só cuidado com as penas do meu rabo! — Batendo as
asas barulhentamente, Iago saiu voando em disparada, mas Sora simplesmente o ignorou e foi atrás
da lâmpada caída.
— Não! A minha lâmpada!
O Gênio Jafar estendeu os braços em sua primeira demonstração de pânico, mas Sora estava
um passo à frente. Quando finalmente pegou a lâmpada, o Gênio lhe deu uma última orientação:
— Agora, Sora! Prenda o Jafar na lâmpada!
Sem perder um momento sequer, Sora ergueu a lâmpada no alto e exclamou:
— Beleza! Tá na hora de conhecer a sua nova casa, Jafar!
A lâmpada brilhou por um instante e Jafar então foi sugado para a abertura por uma força
bestial. Quando o vizir finalmente se foi, a lâmpada fez um fraco barulho de chocalho em protesto
nas mãos de Sora. O som logo foi se dissipando, até que a lâmpada por fim desapareceu.
— Então... acabou? — ofegou Sora, exausto após todo aquele penoso jogo de pique.
Infelizmente, não havia acabado. Bafo os estivera observando de algum lugar e finalmente
apareceu, correndo em sua direção.
— Grrrrr! Não vale! Aquele palhaço devia mergulhar esse mundo nas trevas! — ele
resmungou em voz alta consigo mesmo.
— Hã? Bafo!
Aquele era o último lugar onde esperava encontrá-lo, mas Sora acabou cruzando justamente
com quem estivera procurando. Ele imediatamente começou a correr atrás de Bafo, mas o Gênio
então brotou diante de si, fazendo-o parar.
— Sora! Já está indo embora?
— Sim, Gênio... Eu tenho que ir. Será que você pode ajudar a Jasmine a voltar para a cidade
e devolver a lâmpada para o Aladdin? — Sora parou, olhando para o Gênio com uma pontada de
melancolia.
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— Considere feito! Esse é o desejo número dois!
Então aquilo contara como um desejo — o que queria dizer que ainda restava um.
— E o que temos no cardápio para o desejo número tres, mi amigo — perguntou o Gênio,
todo animado.
Eu já sei qual é o meu terceiro desejo, mas não sou quem deve fazê-lo.
— Eu dou o meu terceiro desejo para o Aladdin.
Os olhos do Gênio se arregalaram.
— Ele encontrou a lâmpada primeiro... Bom, na verdade, o que importa é que ele foi seu
amigo primeiro. Ele vai fazer o que é certo.
— Caramba, Sora... — O Gênio escondeu seu rosto atrás do braço, como se houvesse
lágrimas em seus olhos... ou pelo menos foi o que Sora pensou, até que ele saiu girando pelo ar,
exatamente como quando os dois se conheceram. — Isso foi tão bonito! Vou contar ao Al que é isso
o que você sente. Obrigado!
— Tá brincando? Sou eu que agradeço! Se cuida, Gênio. Diga a todos que eu mandei um oi.
E com isso, Sora saiu correndo atrás de Bafo. Ele ainda não devia estar muito longe.

Após disparar pela caverna, ele saiu aos pulos da boca do tigre. No entanto, Bafo estava
esperando por ele.
— Beleza, Bafo! Chega de fugir.
Quando Sora empunhou a Keyblade, Bafo apenas deu risada:
— He, he, he, quem disse alguma coisa sobre fugir?
Ele parece muito seguro de si. O que tá rolando?
— Muito bem, aparece e mostra pra ele quem é que manda... Malévola! — exclamou Bafo,
e uma mulher de robe negro apareceu: Malévola.
— Quem é você?
— Piada engraçada, garoto, mas uma que não posso tolerar. Se deseja um lembrete do meu
poder... então lhe darei um! — A fada do mal logo ergueu o cajado em sua mão, criando uma rajada
de chamas verdes que atingiu Sora.
— Ngh!
Sora acabou soltando a Keyblade e ela caiu com tudo no chão.
— Não é estranho? — murmurou Malévola, fazendo a Keyblade flutuar em meio ao ar. Sora
tentou pular para recuperá-la, mas era tarde demais. Com um breve balançar de seu cajado, a fada
facilmente destruiu a Keyblade, bem diante dos seus olhos.
— ...O quê?! — Chocado, tudo o que Sora pôde fazer foi olhar.
Fitando-o de esguelha, Malévola gargalhou.
— Vemos então que aquela coisa não passava de uma farsa. E agora que se foi, esse mundo
será todo meu.
O que eu faço? Não dá pra lutar sem a minha Keyblade. Mas eu tenho que tentar.
— Sim, meus lacaios leais! Arrastem tudo em sua frente para a mais profunda das trevas!
Enquanto Sora tentava se erguer, Malévola invocou uma horda de Heartless diante dele. Os
monstros lentamente o foram rodeando e logo se lançaram contra ele.
— Ugh...!
Daquele jeito, a escuridão o consumiria por inteiro. Sora se preparou para o fim, mas quando
os Heartless estavam para atingi-lo, foram todos eliminados num piscar de olhos.
— Você está bem? — alguém lhe perguntou.
Ele ergueu a cabeça, vendo que Riku e Mickey haviam chegado. Os dois olharam de volta
para Sora com aqueles mesmos sorrisos familiares.
— Malévola. O que está fazendo aqui no digespaço? — indagou Mickey, encarando-a.
— “Digestivo”? Poupe-me desses seus detalhes tediosos — disse ela, franzindo o cenho.

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— Mas já que quer saber, foi tudo ideia minha, seu palhaço — Bafo se gabou para Mickey.
— A gente descobriu que vocês tavam tramando alguma coisa. Então resolvi te fazer uma visitinha
sob ordens da Malévola. Só ia dar uma espiada na sua sala, mas acabei sendo sugado pelo show de
luzes. Acordei sozinho num lugar todo esquisito. E aí comecei a fuxicar. Acontece que esse lugar tá
diretamente ligado àquele seu castelo — explicou Bafo, a voz apressada. Ele então bufou e cruzou
os braços. — Ou pelo menos costumava estar, antes de eu tomar o controle da única saída —
acrescentou, cheio de desdém.
Sora finalmente se levantou, entrando em posição de luta.
— Então foi você que cortou a conexão!
Malévola respondeu no lugar de Bafo:
— Eu lhe asseguro: ambos os mundos serão meus muito em breve. Quando mergulhar este
nas trevas, posso mandar a minha horda de Heartless de volta para o seu castelo! — Enquanto
olhava para o rei, um sorriso confortável se estendeu em seu rosto.
— Não! — exclamou Mickey, chocado.
Malévola prosseguiu, devagar:
— O longo sono acabou e uma nova era se inicia: uma em que todos os mundos me
pertencem! Mas os meus mundos devem ser livres de luz e o seu brilha até demais. Dessa vez, será
você quem vai dormir! — Ela acenou com a mão para provocá-lo.
— Errado. Este aqui é um mundo que eu não vou deixar que você toque! — Riku se lançou
contra ela. Mas...
— Hmph! Garoto tolo!
Uma explosão de chamas verdes saídas de seu cajado atingiu Riku com tudo e ele berrou:
— Arrrgh!
Quando o garoto perdeu a consciência, Bafo o recolheu do chão.
— Riku! — Mickey chamou seu nome, mas ele não se mexeu.
— Agora, você, garoto... Você pertence à escuridão, não à luz. Eu o levarei comigo. Tenho
certeza que ele se provará... útil. — Malévola desapareceu em meio a uma risada altiva.
— Chequeeeee-mate! Falou, otários! Gah, ha, ha, ha! — Com uma poderosa gargalhada,
Bafo desapareceu atrás dela, levando Riku consigo.
— Não! — Sora tentou persegui-los, mas eles já haviam partido.
— Riku... — Mickey abaixou a cabeça, cheio de pesar.

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Não existem coincidências. O destino sempre
se dá conforme o planejado.
Agora, com relação a quem o planejou... eu
não poderia dizer. Não ainda.
Mas, Sora, nós somos amigos. Nós sempre
seremos amigos — sempre.
Todos aqueles que você encontrou ao longo do
caminho — Riku, Mickey, Donald e Pateta —
estamos todos aqui por você.
Não se esqueça disso.
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O RIKU SE FOI. O BAFO E A MALÉVOLA LEVARAM ELE E É TUDO CULPA MINHA,
porque fui descuidado.
Depois que Sora voltou ao estúdio no Castelo Disney com Mickey, ele começou a andar de
um lado para o outro, resmungando consigo mesmo mais ao canto.
— Isso é terrível! Pobre Riku. — O Grilo levou as mãos à cabeça quando Mickey o pôs a
par de tudo.
— Ei, pessoal, o Riku não tem todos os dados do diário dentro dele? — disse Pateta,
pensando de braços cruzados.
— Se a Malévola o atirar nas trevas... então o digespaço todo vai pro beleléu. — O rosto de
Donald estava tenso de preocupação.
O sequestro de Riku significava que Malévola agora tinha os próprios dados em suas garras.
Embora ainda não soubessem qual era o sentido por trás das memórias perdidas, era fácil ver como
podiam ser usadas para o mal.
— Quantos mundos ainda têm bugs, Grilo? — perguntou Mickey.
O Grilo subiu no teclado do computador e pressionou uma série de teclas com o pé.
— Err... só um, pelo que parece. Estávamos tão perto, mas agora... — O Grilo balançou a
cabeça. Estavam mesmo quase acabando. Mas agora, Riku havia partido.
— Esse era o seu caminho de volta pra casa, né...? — murmurou Sora, a voz fraca. — Sinto
muito, pessoal. Eu estraguei tudo.
Nada disso teria acontecido se eu fosse mais forte. Não importava para Sora que esse Riku
fosse um receptáculo para os dados. O Riku continuava sendo o Riku — seu melhor amigo.
— Não é culpa sua, Sora. E não se preocupe. Eu vou cuidar disso. — Mickey sorriu e
invocou sua Keyblade em mãos.
— V-Vossa Majestade?! — O Grilo deu um pulo.
— Ora, por que não? Eu vou achar um jeito de consertar os bugs e de resgatar o Riku
também! — declarou o rei diante de Sora e dos outros.
— Deixe-me ajudar, Mickey. Dessa vez, não vou deixar ninguém pegar a Key... — Sora
tentou invocar sua Keyblade em mãos, mas ela não apareceu. — Hã? Que estranho. A Keyblade
não... eu não consigo invocá-la!
Era verdade que Malévola havia quebrado sua Keyblade, mas ela nunca o decepcionara
quando Sora a desejava em suas mãos. Agora que estava quebrada, queria dizer então que ela nunca
mais apareceria?
— Sora... eu lamento. Malévola destruiu a sua Keyblade — Mickey disse a ele, a voz triste.
— Para sempre?
— Preciso ser honesto com você. Aquela Keyblade foi algo que programamos no digespaço
lá de fora. Agora que estamos presos dentro do digespaço, não temos como trazê-la de volta.
— Mas eu quero...
Sora abaixou o olhar. Eu... eu odeio isso. Não posso fazer nada.
— Eu sei. Mas você já fez muito por nós! Está na hora de ver o que eu posso fazer — disse
Mickey, empático. — Agora, quero que todos esperem bem aqui!
Com essas palavras de despedida, Mickey abriu a porta e partiu num passo decidido.
— Estou preocupado. Vocês não acham que o rei vai precisar da nossa ajuda? — Donald o
observou partir com uma expressão aflita no rosto.
— Ah, ele consegue. Você não vira rei à toa! — respondeu Pateta.
Donald cruzou os braços, claramente pensando fundo a respeito de alguma coisa.
— Bom, a gente consegue mostrar uma coisinha ou duas pra esses Heartless, mas...
Enquanto os outros conversavam, Sora continuava imóvel, perdido em pensamentos.
— Agora a Malévola e o Bafo estão à solta. E não vamos nos esquecer... — murchou o Grilo
em meio a um grande suspiro.
— Dos bugs... Poxa, essa coisa de preocupação é contagiosa.
— Mas ele disse para esperarmos aqui.
Sem dizer uma única palavra, Sora começou a sair de fininho enquanto Pateta e Donald
conversavam. Não posso ficar aqui parado esperando.
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— Sora, o que você acha que devemos fazer? — perguntou Donald, mas não havia mais
sinal do garoto. — ...Hm, Sora?
Donald correu por todo o estúdio. Sora não estava mais lá, nem embaixo da mesa, nem atrás
das prateleiras.
— Ele estava aqui um segundo atrás. — O Grilo suspirou outra vez. Agora tinham mais um
problema com que se preocupar.
— Hã, pessoal, vocês não acham...?
Pateta se voltou para a porta do estúdio.

Sora chegou ao último mundo onde ainda havia bugs, Hollow Bastion, e assimilou a vista e
sons do misterioso maquinário à sua volta.
Mesmo não tendo uma Keyblade, eu ainda posso ajudar. Preciso pelo menos salvar o Riku.
Uma forma familiar cruzou o caminho de Sora mais adiante:
— Bafo! — exclamou, correndo em sua direção.
— Hein? Você de novo? O que um fracassado feito você tá fazendo aqui? — ridicularizou
ele, rude, praticamente dizendo que, sem a Keyblade, Sora não representava a menor ameaça.
— Pode ir falando, Bafo! Onde estão deixando o Riku?
— Bom, que seja, se quer descobrir tanto assim, vai ter que me pegar primeiro... seu
palerma! E boa sorte tentando! Acabei de dar uma mexida nos dispositivos por aqui, à moda do
Bafo. Você não vai durar nem dez passos!
Bafo bufou e bateu em disparada.
— E-Ei! É o que você pensa!
— Falou, otário!
Bafo desapareceu por uma porta que levava a um grande castelo e Sora logo saiu correndo
atrás dele. Lá dentro havia um grande salão com duas escadarias que subiam em ambos os lados.
— Apareça, Bafo! — gritou Sora, apenas para que uma série de blocos pretos e vermelhos
subitamente surgissem à sua volta, cercando-o. — Ei! O Bafo deve tá querendo me prender.
— Gah, ha, ha, ha! Tu é mesmo uma figura, entrando aqui com tudo quando não pode fazer
nadica de nada! — berrou Bafo, gargalhando ao topo dos blocos.
— Posso fazer o suficiente pra arrancar esse sorrisinho da tua cara!
— Uhh, tô tremendo na base. Heartless? Peguem ele!
Ao comando de Bafo, os Heartless surgiram. O que eu faço? Não posso enfrentá-los sem a
minha Keyblade.
— Agora brinquem direitinho enquanto eu termino de ajeitar o nosso show de marionetes.
— Volta aqui! — gritou Sora, mas Bafo saltou de cima dos blocos e sumiu de vista.
Só o que restava era Sora e uma horda de Heartless — e os monstros estavam chegando cada
vez mais perto.
Um dos Heartless saltou contra Sora, arranhando-o na bochecha.
— Ngh!
Esses caras estariam acabados se eu tivesse a minha Keyblade...!
Foi quando Sora ouviu uma voz arrastada familiar junto à uma série de passos pesados:
— Cuidado, Sora! Ahh-hoo-hoo-hooey! — Com o escudo em mãos, Pateta se atirou contra
os blocos e os jogou longe.
— Pateta!
O capitão de guarda se posicionou protetoramente entre Sora e os Heartless, lançando-se
contra a horda a fim de dispersá-la. Ele olhou de volta para Sora com um sorriso no rosto.
— Poxa, Sora! O rei disse para esperarmos lá. Você não devia ter saído correndo sozinho
daquele jeito.

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Sora podia ver que Pateta estava um pouco exaltado e isso o fez se sentir mal. Ele havia
ignorado a preocupação do rei, partido sozinho e então acabou preso. Se não fosse pela chegada de
Pateta, não havia como saber o que podia ter acontecido.
— Eu sei, desculpa, é que...
Só o que posso fazer é ficar parado no estúdio e deixar o rei cuidar de tudo. Não tenho mais
a minha Keyblade.
— Não. Não diga mais nada. Vamos indo.
— Tá bom... eu vou. — Sora começou a se arrastar obedientemente em direção à saída.
— Iac, vai aonde? É por ali! — Pateta chamou por ele, confuso.
— Hã? A gente não vai voltar? — perguntou Sora. Ele se virou. Quer dizer, eu não consigo
mais lutar...
— Estamos indo atrás do Bafo, não estamos? Temos que nos apressar, antes que ele vá
muito longe!
— Você não tá bravo? Valeu, Pateta, te devo uma.
Pateta parecia tão confuso que Sora também começou a ficar confuso. E então o capitão riu.
— Me deve uma pelo quê? Você mesmo disse, Sora: amigos não contam favores.
— Certo!
Sora abriu um sorriso e correu até Pateta. Mal conseguia resistir à vontade de abraçá-lo. A
minha Keyblade não é tudo o que eu tenho pra lutar. Ainda tenho os meus amigos.
— Você por acaso não chegou a ver o Donald, chegou? — Pateta perguntou a Sora quando
começaram a andar.
— Hã? O Donald também tá aqui?
— Estávamos procurando você juntos, mas devemos ter nos separado em algum lugar pelo
caminho — disse Pateta, preocupado.
— Espero que ele esteja bem. Vamos ficar de olhos abertos enquanto procuramos o Bafo.
— Pra onde será que ele pode ter ido...?
Sora e Pateta começaram sua busca subindo as escadas para o segundo andar do salão.
— O Bafo foi por aqui, certo?
— Acho que foi.
Sora não tinha muita certeza porque não tinha conseguido ver por trás da parede de blocos.
Mas sabia que havia algo suspeito mais à frente.

No alto das escadas do grande salão, Sora e Pateta encontraram uma grande porta que ficava
do lado oposto à entrada.
— Não parece que... nnngh... vai abrir... — Pateta inclinou a cabeça, curioso, enquanto
tentava forçar a porta.
Sora também olhou mais de perto. Havia estranhas reentrâncias talhadas na superfície.
— Espera, olha só esses buracos na porta. Essa forma parece o emblema dos Heartless —
murmurou ele. A forma das reentrâncias lembrava a marcação que havia nos Heartless.
— É verdade! Que esquisito.
— Se encontrarmos as peças que encaixam nos buracos...
— Tenho certeza que você está certo, Sora. Vamos procurar as peças do emblema!
Sora assentiu frente à ideia de Pateta.
— Mas onde será que elas estão...?
— Vamos ter que fuçar por aí.
Enquanto se afastavam da porta, ainda conversando...
— Iac!
— Donald!

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...os dois avistaram a buzanfa branca e a blusa azul de alguém bastante familiar deixando o
castelo. Os dois desceram correndo pela escada e saíram lá fora atrás de seu amigo, mas Donald já
não estava mais por perto.
— Lá está ele!
— Onde?
Pateta apontou para uma passagem repleta de blocos. Mas Sora não conseguiu ver Donald
— ele provavelmente já estava longe.
— Vamos, rápido!
Eles saíram correndo novamente, mas tiveram o caminho bloqueado por uma série de
Heartless e blocos móveis.
— Fique atrás de mim, Sora!
— Desculpa, Pateta.
Sora avançou com Pateta e seu escudo lhe protegendo. Não conseguir usar sua Keyblade
estava começando a lhe dar nos nervos.
Após atravessarem o caminho infestado de blocos, encontraram um teleférico que mais
parecia uma grande gaiola. Parecia levar ao subsolo.
— Será que temos que pegar carona nisso...?
— Parece que sim.
Sora e Pateta subiram a bordo e o teleférico começou a descer. Eles logo chegaram a uma
passagem subterrânea escura.
— Aonde foi o Donald?
— Tenho a sensação que ele está por aqui.
Diante deles havia uma grade que lembrava as barras de ferro de uma cela. Não parecia fácil
de atravessar.
— Não é ele ali? — perguntou Pateta.
Sora conseguiu enxergar a silhueta de Donald atrás das barras.
— Donald!
Ele se virou frente ao grito de Sora.
— Finalmente nos alcançamos! — Pateta sorriu enquanto Donald corria até a grade.
— Sora! E Pateta! Pra onde vocês foram? Isso não são horas de ficar sumindo por aí! —
disse Donald, enfiando a cabeça em meio às barras.
— Não foi você que tinha sumido? — Sora tentou protestar, mas Donald apenas continuou
reclamando:
— Ah, tanto faz! Tem alguma ideia do quão preocupado eu estava?
Ainda assim, não era surpresa que Donald estivesse preocupado com Sora, já que ele não
estava com a sua Keyblade.
— Desculpa, Donald. Eu arrastei vocês pra uma baita confusão... e olha que nem conheço
vocês direito.
Donald e Pateta se olharam enquanto Sora se desculpava. Então, Donald caiu na gargalhada.
— Opa, espera um pouquinho aí! Não foi problema nenhum — disse ele, erguendo o olhar
para Sora.
— Hã? — Ele não sabia o que motivaria Donald a dizer algo assim.
— A gente meio que gosta de ser arrastado pras suas confusões! — Pateta riu.
— Hm... por quê?
— Não é nada divertido ficar olhando do outro lado de uma tela de computador! Estávamos
procurando uma desculpa para poder ajudar... para que pudéssemos viver aventuras juntos, como
nos velhos tempos.
Eles queriam ter aventuras juntos...
Isso deixava Sora feliz. Ele sempre esteve sozinho, mas, na verdade, tinha todo mundo lá
com ele o tempo todo. Agora, ele não ficaria mais sozinho.
— Podemos não ser uma nova Keyblade, mas você com certeza pode contar com a gente! —
Pateta deu um tapinha no ombro de Sora.
— Não sei o que dizer. Mas vou começar com “obrigado”! — disse Sora, enrubescido.
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Donald sacudiu seu cajado e disse:
— Pode deixar os Heartless comigo. Vou mostrar a eles quem é que manda! Mas e aí, como
eu saio daqui?
Agora que ele tinha mencionado, aquela grade de ferro continuava entre eles e Donald.
— Como você chegou aí? — perguntou Pateta.
— Eu disparei minhas magias num Heartless, e de repente as barras caíram — respondeu
Donald. — Desse jeito!
Donald ergueu o cajado e uma bola de fogo se formou na ponta. Assim que o fez, um objeto
em forma de lanterna junto a ele se acendeu e a grade que os separava imediatamente se levantou.
— Quem diria? Essa coisa reagiu à sua magia.
— Reagiu? Er, reagiu! Assim como... o planejado? — Sora e Pateta riram enquanto Donald
gaguejava, não muito convincente.
Embora fosse a primeira vez que Sora passava tanto tempo com aqueles dois, por algum
motivo, tinha a sensação de que eram melhores amigos há uma eternidade.
— A propósito, encontrei isso lá dentro. — Donald mostrou a Sora uma série de fragmentos
brilhantes bastante estranhos.
— Você acha que são...
— ...peças do emblema?
Sora e Pateta olharam um para o outro.
— Wak? Como assim? — Donald inclinou a cabeça.
— Vamos voltar lá na porta!
— Hã?
Deixando Donald ainda confuso, Sora e Pateta correram em direção ao teleférico.
— E-Esperem por mim!
— É melhor acelerar se não quiser ficar pra trás, Donald!
— Corta essa, Sora!
Donald correu atrás de Sora e Pateta, balançando seu cajado de um lado para o outro.

Com os três a bordo, o teleférico subiu de volta para a superfície e eles foram para o castelo
pelo mesmo caminho de antes.
Uma vez lá dentro, Sora se virou para Donald e Pateta e exclamou:
— Rápido! O último que chegar na porta é mulher do padre!
— Hã?
— Wak! Não vale! Você não tinha dito que era uma corrida!
Sora disparou pelas escadas que levavam à porta, dois degraus de cada vez, e então se virou
para os outros, sem fôlego.
— Primeiro!
— Poxa, Sora... Você não pode sair correndo desse jeito... — Pateta estava recuperando o
fôlego com uma mão apoiada na parede.
— Chega dessas corridas do nada! — Donald se sentou recostado na parede com os pés
jogados para os lados.
— Tem certeza que vocês dois não tão fora de forma?
— Claro que não! — protestou Donald, erguendo-se novamente.
— Vamos tentar logo usar essas peças, Sora. Com sorte, vai resolver o problema da porta.
Pateta também tirou a mão da parede e seguiu até a porta, incitando Sora a fazer o mesmo.
Sora pegou as peças que Donald havia encontrado e tentou colocá-las nas reentrâncias da
porta. Encaixavam perfeitamente.
Os fragmentos emitiram uma luz deslumbrante e, com isso, a porta se abriu.
— Funcionou!

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— Você disse que o Bafo passou por aqui, certo? — Um pouco apreensivo, Donald espiou o
outro lado pela fresta na porta. Podiam sentir uma brisa sibilando por ali. A porta devia ser uma
saída para a área externa.
— Sim... Ele disse alguma coisa sobre um “show de marionetes”... — murmurou Sora,
inquieto. O que será que ele quis dizer com “show de marionetes”? E por que isso tá me deixando
tão preocupado?
— Seja lá o que tiver aí dentro, pessoal, temos que tomar cuidado — advertiu Pateta.
Sora assentiu e então examinou o que havia em frente. Estava com medo — qualquer um
estaria. Mas temos que seguir em frente e salvar o Riku!
— É o Bafo que vai ter que tomar cuidado!
Sora passou pela porta com Donald e Pateta logo atrás. Após um momento, o chão sob eles
subitamente começou a subir. Quando notaram o que estava acontecendo, ele já estava se mexendo
extremamente rápido e eles se deram conta de que estavam a bordo de um teleférico gigante.
— Uau! Aonde vocês acham que isso leva? — indagou Pateta, cruzando os braços enquanto
olhava para o céu.
— Cuidado! — Donald empurrou Sora para fora do caminho quando um Heartless
subitamente se lançou contra ele do meio do ar. Os monstros alados estavam tentando atacar Sora.
— Para trás, Sora!
Donald saltou e disparou uma poderosa Trovoada contra os Heartless.
— Lá vou eu!
Em sequência, Pateta começou a girar e atingiu os Heartless em alta velocidade, eliminando-
os de uma vez por todas.
Eles estavam atrás de mim e só o que eu posso fazer é fugir. Era difícil, mas Sora dava o seu
melhor para pelo menos continuar em movimento e não entrar no caminho dos outros.
Quando conseguiram derrotar todos os Heartless, Donald e Pateta se sentaram onde estavam,
parecendo um pouco cansados. Não devia ter feito eles apostarem corrida antes...
— Desculpa não poder ajudar mais...
— Nem parece que é você falando! — Donald se levantou e bateu no peito de Sora com seu
cajado. — Essa não é a primeira vez que você perde a sua Keyblade, certo?
— Hã?
Quando Sora reagiu com surpresa, Donald simplesmente sacudiu o cajado com mais força.
— Isso não aconteceu com esse Sora — Pateta lhe lembrou.
— Ah, é, tinha esquecido! — Donald finalmente juntou dois e dois e então, reavendo a
compostura, ergueu o olhar de volta para Sora. — Mas você ainda é você! — Seu rosto estava
completamente sério.
Repleto de felicidade, Sora sorriu.
— Donald, Pateta... fico feliz por ter vocês comigo.
— Iac! De onde tirou essa? — perguntou Pateta.
— É que... é estranho, sabe? Quando estou com vocês dois, sinto que posso fazer qualquer
coisa. Não riam, mas... bom, sinto quase como se já tivéssemos feito isso antes.
O outro mundo com outro Sora, dados, bugs — Sora ainda não entendia muito bem nada
disso, mas sentia um pequeno calor no peito quando estava com aqueles dois.
— Bom, isso bem aí é um sinal de que você encontrou amigos de verdade! — disse Donald,
assentindo enquanto cruzava os braços.
— É divertido fazer o mesmo amigo duas vezes — acrescentou Pateta.
Parecia mesmo algo divertido. Sora não sabia ao certo como era a sua contraparte do mundo
real, mas tinha que agradecer a eles por amigos como aqueles. Eu sou eu, então esse outro Sora é e
não é eu, eu acho. Como será que ele é?
— Mas agora está na hora de levarmos isso a sério — disse Donald, seu rosto assumindo
uma expressão severa.
— Certo! Não se esqueçam, o Riku ainda está esperando por nós! — prosseguiu Pateta.
— Beleza, vamos lá! — exclamou Sora.

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Quase no mesmo exato momento, o teleférico parou. O vento uivava lá em cima — devia ser
o topo do castelo.
— Aquela parece ser a entrada.
Sora e seus amigos foram subindo cada vez mais, eliminando os blocos e Heartless que
entravam em seu caminho.
— Hmm, acham que é um beco sem saída?
— Ei, aquilo ali embaixo parece meio suspeito — disse Sora, dando uma espiada pela beira
da plataforma alta na qual haviam chegado.
— Hã? Onde? — Donald enfiou a cabeça para olhar por trás de Sora.
— Dá pra pular lá embaixo?
Quando Pateta se juntou a eles, seu peso junto ao de Donald fez Sora perder o equilíbrio.
— Uooouuu!
— Waaak!
— Ahh-hoo-hoo-hooey!
Sora conseguiu pousar de pé, mas Donald caiu de bunda e Pateta de cabeça — ambos bem
em cima dele.
— Ah, dá um tempo! — gritou Sora embaixo dos companheiros.
— Foi mal aí.
— Levanta de uma vez! — grasnou Donald, tentando tirar o traseiro de Pateta de cima de si.
Quando o trio finalmente se levantou outra vez, encontraram a entrada do que parecia uma
câmara escura.
— Não acho que algo de bom aconteça aí dentro, pessoal... — disse Pateta, espiando o lugar.
— O Bafo só pode estar aí, você não acha? — Atrás dele, Donald também deu uma olhada.
— Prontos, galera?
— É claro!
— Deixa com a gente!
Os dois se voltaram para Sora e assentiram com toda a força. Os três amigos adentraram
então a escuridão obviamente maligna.

Assim que chegaram ao outro lado, foram recebidos por uma grande gargalhada:
— Gah, ha, ha, ha, ha! — Era Bafo, como já imaginavam.
— Te pegamos agora, Bafo!
Sora estreitou os olhos em meio às sombras e o viu parado no meio de um grande salão,
como se estivesse esperando por eles.
— Viu que não conseguia fazer nada sozinho e aí foi chorando pros amiguinhos, é? Bom,
não vai adiantar de nada! — gralhou, Bafo cruzando os braços. Finalmente, ele ergueu as mãos e
um grupo de Heartless apareceu de uma só vez.
— Cuidado, Heartless!
— Deixa comigo!
Donald e Pateta se lançaram contra os inimigos.
— He, he! Peguei vocês!
Quando Bafo ergueu o braço outra vez, uma série de blocos surgiu em meio ao teto vazio,
caindo com tudo em cima de Sora.
— Sora!
— Cuidado!
Pateta empurrou Sora para fora do caminho enquanto Donald atacava os blocos que caíam
de cima com magia. Infelizmente, foram Donald e Pateta que acabaram sendo pegos em seu lugar,
os blocos os prendendo como uma parede sólida e apertada.
— Não consigo... me mexer... — gemeu Pateta.

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— Donald! Pateta! — Sora gritou os nomes de seus amigos, mas ele não conseguia sequer
quebrar os blocos, muito menos atacar Bafo.
O que eu faço? Tem alguma coisa que eu possa fazer?
— Gah, ha, ha, ha! Que par de idiotas! Por que arriscar seus pescoços por um amontoado de
dados? Pois é, eu sei tudo sobre essa cópia fajuta. Vocês criaram ele, assim como aquela Keyblade
falsa que ele tem! — Bafo zombava de Donald e Pateta, presos em sua armadilha.
— Nunca fale do Sora desse jeito. Ele é nosso amigo nesse e em qualquer outro mundo
também! — gritou Donald, sacudindo-se no espaço minúsculo entre seu corpo e a parede para tentar
atingir os blocos com seu cajado. De nada adiantou.
— Donald...
Fico tão feliz por te ouvir dizendo isso, mas... é verdade. Eu sou mesmo inútil agora.
— Hmph, talvez lá fora, mas aqui ele é só uma casca vazia. O garoto não tem coração —
prosseguiu Bafo.
Coração? O que é um coração?
— Isso não é verdade! Nós temos o coração do Sora bem aqui! — Dessa vez, foi Pateta
quem gritou em resposta.
— Ah, é? — O sorriso desapareceu do rosto de Bafo.
— Você também veria se estivesse procurando. Por que ele continuaria lutando por nós, não
importa o perigo, não importa quão difícil fiquem as coisas... se não se importasse? — acrescentou
Donald, tentando passar o rosto só um pouco por uma das frestas entre os blocos.
— Isso aí! — concordou Pateta. — E nós também vamos lutar por ele. Quer saber por quê?
Porque ele está nos nossos corações, assim como nós estamos no dele.
Quando eles declararam essa verdade irrefutável, os três corações se tornaram um.
— O nosso amigo é o nosso poder!
Um grande calor se espalhou pelo peito de Sora, como um feixe de luz cortando as trevas.
Meus amigos são o meu poder.
— Ahh, fechem a matraca! Vocês já eram — vociferou Bafo, batendo o pé. — Vamos ver se
esse seu “poder” vai protegê-los disso!
Os blocos começaram a se juntar para esmagar Donald e Pateta.
— Wak!
— Ai, ai!
— Donald, não! Pateta!
O que eu faço? O que posso fazer? Não posso salvá-los.
— Boa noite, otários! — Bafo pulava sem parar.
Não posso deixar isso acontecer! Não vou deixar que esse seja o fim para eles!
— Pare... Por favor, não os machuque... NÃO!
Sora cerrou o punho e o lançou no ar... e uma luz ofuscante engoliu a área.
— O que... houve...? — murmurou Sora. Ele simplesmente não conseguia acreditar no que
havia acontecido. Em suas mãos havia uma Keyblade.
Os blocos que prendiam Donald e Pateta sumiram no mesmo instante.
— Q-Que papo é esse?! Eu vi a Malévola destruir esse troço! — Frustrado, Bafo começou a
correr de um lado para o outro.
Nesse momento, Sora ouviu uma voz familiar:
— Sora, você é mesmo cheio de surpresas! — Mickey veio correndo em sua direção.
— Mickey! Por quê? O que eu fiz? — perguntou Sora.
— Não tenho certeza, Sora. Só o que posso dizer é que algo em você mudou. A Keyblade
tira seu poder da força do coração do portador. Mas um velho amigo uma vez me disse que um
coração é muito mais que qualquer sistema. — Mickey fitou Sora atentamente. — Eu te dei uma
Keyblade de dados e nunca esperei que ela fosse ter o mesmo poder da verdadeira Keyblade. Acho
que a Malévola conseguiu destruí-la porque era uma cópia sem a verdadeira força.
Sora olhou para a Keyblade em sua mão.

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— Mas durante a sua jornada, você fez uma conexão... conosco. Você foi além que qualquer
sistema, Sora, e conseguiu um poder diferente do de qualquer outro. E isso foi o que trouxe a sua
Keyblade de volta. — Mickey abriu um sorriso.
— Uau...
— Acho que estávamos todos destinados a cuidar dos bugs desse mundo juntos!
Os quatro então encararam Bafo.
— Isso acaba agora, Bafo! — Mickey empunhou sua Keyblade.
— Não é justo! Fazer brotar uma Keyblade nova é trapaça. Melhor eu fazer uma retirada
estratégica antes que...
— Não tão rápido! Primeiro, entregue o Riku, ou então... — Sora também empunhou sua
Keyblade.
— Hmmm... Que tal conversarmos sobre isso...?
Bafo foi recuando lentamente até que acabou com as costas contra a parede. Mas então, de
repente, o mundo sacudiu.
— Hã? E agora?
O chão se partiu sob os pés de Sora e o mundo à sua volta começou a se apagar e voltar a
aparecer.
— Falou, palermas! — exclamou Bafo.
Sora tentou segui-lo, mas a visibilidade era extremamente limitada e os tremores ainda não
haviam parado, então ele mal conseguia andar direito.
Ele finalmente chegou ao ponto onde haviam encurralado Bafo.
— Essa não! Perdemos ele!
Ele estava apenas alguns segundos atrasado, mas o patife deixara uma única pista para trás:
— Mas achamos uma Keyhole! — Pateta rapidamente apontou para o objeto que flutuava
sobre a cabeça de Sora.
— Vamos entrar! — Donald sacudiu o cajado, ansioso.
Entretanto, Sora juntou os lábios com força e deu um passo em frente.
— Espera, galera — disse ele, a voz baixa. — Deixem essa comigo.
— Por quê? — retrucou Donald.
— Eu nunca teria chegado aqui sem vocês três. Mas agora é a minha vez. Deixem-me ser a
sua luz e eu vou lhes mostrar o caminho de volta para casa!
Donald cruzou os braços e olhou para Sora de esguelha enquanto batia um pé no chão.
— O-O que foi, Donald?
— Hm, você não tá exagerando um pouquinho? Fala a verdade, você só quer testar os seus
novos poderes, não é?
— Qual é... deixa eu ter o meu momento. — Sora coçou a cabeça.
Donald estava certo — ele realmente queria testar o poder dessa “conexão” da qual Mickey
havia falado. Devia estar ainda mais forte do que era antes.
— Iac! Vamos deixar passar dessa vez. — Pateta deu uma risadinha, um pouco tenso.
— Você não tem que fazer isso sozinho, Sora. Lembre-se que você é parte de uma equipe.
Quando você se machuca, nós nos machucamos — indicou Mickey, a voz cheia de gentileza.
— Como é que eu poderia esquecer? Prometo que vou voltar a salvo. Agora, lá vou eu!
— Até breve!
Quando Mickey e os outros olharam em frente, Sora ergueu sua Keyblade em direção à
Keyhole. Uma luz foi disparada dela e adentrou a Keyhole, de onde veio o click de uma tranca se
desfazendo. Em seguida, uma porta apareceu.
Sora disparou em direção à abertura a toda velocidade.

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Dentro havia uma capela com janelas de vitral. O Bafo não pode ter ido muito longe, pensou
Sora e, como imaginava, logo encontrou seu inimigo respirando fundo depois de finalmente ter
conseguido escapar.
— Fim da linha, Bafo!
— O quê? Você não sabe quando ir embora?
— Faça a si mesmo um favor e venha sem resistir.
— Hmph! Depois de todas as vezes que você arruinou os meus planos? Nem pensar! É a
minha vez de te ensinar um ou três dos meus truques!
Bafo subitamente se lançou em sua direção e atirou um braço contra ele. Sora bloqueou o
poderoso golpe, mas quase foi jogado longe.
— Ngh!
Era uma competição de força — Bafo tentando forçar seu braço para baixo e Sora tentando
segurá-lo no lugar com a Keyblade.
— Você e esses seus bracinhos mixurucas não são páreos para mim!
— Eu posso não ter muito músculo, mas...
Sora relaxou os braços de propósito, fazendo Bafo perder o equilíbrio o suficiente para que
conseguisse se afastar e atacá-lo com magia.
— Hmph, nada mal, palhaço... mas agora chega do Sr. Bafo Bonzinho!
— E você vai desejar que o Sr. Bafo Bonzinho fosse um pouco mais bonzinho!
Sora fechou a distância entre eles num instante e atacou Bafo no estômago com a Keyblade.
— Ugh... De novo não. — Bafo se curvou, levando as mãos à barriga.
— Desiste?
— He, he! Eu ainda tenho um ás na manga! Venha cá e diga oi! — exclamou Bafo. E quem
apareceu foi...
— Riku?
Em vez de seu casaco negro, Riku estava usando um traje preto e roxo com um estranho
símbolo no peito. Ele parecia uma pessoa completamente diferente.
— Para trás, Sora. Hrrrngh!
Sora estava prestes a correr até ele, mas parou frente à advertência de Riku. O rosto de seu
amigo se contorceu de agonia.
— Riku? Q-Qual o problema?
— Tomei a liberdade de tomar a liberdade dele. Só o que tive que fazer foi carregar alguns
desses bugs aí nos dadomatrônicos do teu camarada. Agora, vejamos o que o meu novo lacaio pode
fazer. O mestre mandou... você atacar! — disse Bafo em meio a um sorriso.
— Hrgh! Sem chance... — gemeu Riku, tentando resistir.
— Hmm? Nada feito, é? Acho que vamos precisar de mais um pouquinho...
Bafo pegou um bloco no chão e o atirou em Riku, que pareceu absorvê-lo. Sora se lembrou
que os próprios blocos eram bugs. Se aqueles blocos eram a fonte dos erros ao redor dos mundos,
então seria fácil para eles contaminarem Riku — ele era a personificação dos dados dos mundos.
— Arrrgh! — Riku caiu no chão.
— Deixa ele em paz! — gritou Sora, correndo até Riku para ajudá-lo a se levantar.
— Deve ser o bastante. Vou deixar vocês dois se conhecerem de novo. Té mais! — Mais
uma vez, Bafo saiu correndo, mas não era hora de ir atrás dele.
Riku... Preciso ajudá-lo!
— Riku! Fala comigo! — vociferou Sora, mas não houve resposta de seu amigo, caído em
meio ao chão.
— Sora, eu ouvi um grito. O que está havendo aí?! — Sora podia ouvir a voz preocupada de
Mickey. Ele ergueu a cabeça e suplicou desesperadamente:
— Mickey, é o Riku! Colocaram bugs nele!
Eu não consigo fazer nada sozinho. Preciso da ajuda do Mickey... mas como?!
— O quê?! Riku, consegue me ouvir? Riku!
Como se os pensamentos de Mickey o tivessem alcançado, Riku abriu os olhos.

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— Vamos, Riku!
Mas Riku começou a se afastar de Sora, quase como se tentasse fugir dele, e então saltou
para trás. Surpreso com o movimento súbito, Sora olhou para seu amigo. Riku estava congelado,
olhando fixamente para o chão, como se estivesse enfrentando alguma coisa dentro de si mesmo.
— Você não consegue nos ouvir...?
— Ngh... Acabe... comigo.
— O quê?
Antes que Sora pudesse perguntar mais sobre o que ele queria dizer, Riku atirou um disparo
mágico de sua mão.
— Riku!
Sora se esquivou da magia com agilidade, mas Riku podia ler facilmente um movimento
simples como esse. Ele fechou a distância entre os dois de uma só vez e atacou.
— Para com isso, Riku! — Se as coisas continuassem desse jeito, Sora estaria acabado.
Tenho que achar um jeito de detê-lo...!
Bloqueando as investidas do amigo, Sora desferiu uma série de golpes com a Keyblade que
só o feriram de leve.
— Sinto muito, Riku!
Com um poderoso ataque de sua Keyblade, Sora conseguiu jogar Riku longe, cruzando o ar
caindo com tudo de volta no chão.
— ...Riku!
Alguns dos blocos pretos e vermelhos começaram a emergir do corpo de Riku. Eles estavam
profundamente submersos dentro dele — como conseguiria tirá-los?
Quando Sora caiu no chão, exausto depois da batalha, uma poderosa luz irradiou atrás dele.
— Sora! Riku!
Mickey e os outros apareceram em meio ao clarão.
— Bom, se os bugs tomaram controle do Riku... então quer dizer... que ele pode nunca
conseguir acordar... a menos que nos livremos dos bugs primeiro — explicou o rei, olhando para
Riku, preocupado.
— Então se eu desbugá-lo, o Riku vai voltar pra gente. Pessoal, tenho que ir lá dentro pra
dar uma olhada — disse Sora, ajoelhando-se ao lado do amigo com uma determinação inabalável.
— Mas e quanto a você?
— Quem pode dizer se sequer é seguro dentro do Riku?
Preocupados, Donald e Pateta tentaram deter o amigo.
— Eu sei que é arriscado. Mas se um amigo precisa que eu esteja lá, eu estarei lá... para
ajudar! — Sora fitou Mickey, Donald, Pateta e o Grilo, um de cada vez. — Eu quero ajudar a todos.
A expressão nos rostos deles se suavizou.
— Bom, acho que esse é mesmo o Sora — comentou o Grilo, feliz, mas também um pouco
contrariado.
— Não vai ter como te fazer mudar de ideia, hein? — Donald sacudiu a cabeça, abrindo
também um sorriso.
— Iac! Mas vamos fazer tudo o que pudermos para ajudar! — Pateta deu uma boa batida
nas costas de Sora.
— Valeu, pessoal. — Um sorriso se formou no rosto de Sora, que juntou forças para se
levantar. — Vou nessa.
Os quatro assentiram com firmeza e Sora ergueu a Keyblade em direção ao peito de Riku.
Uma Keyhole se ergueu de dentro de seu corpo, abrindo uma porta.
— Sora, não se esqueça: você não vai entrar lá sozinho — Mickey lhe assegurou. — Seus
amigos estarão com você, lutando ao seu lado em espírito, não importa aonde vá.
Sora sorriu enquanto corria em direção à luz.

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SORA ADENTROU O MUNDO DENTRO DE RIKU — OU TALVEZ FOSSE MELHOR
chamá-lo do digespaço do diário do Grilo, para o qual Riku servia como receptáculo. Era escuro,
com ocasionais fios de luz cruzando o espaço negro ao redor.
— É tão... vazio — sussurrou Sora, inquieto, olhando para seus pés.
De repente, uma onda de choque lhe percorreu o corpo, como se algo muito pesado tivesse
caído sobre seus ombros.
— Ahh! — Sora gritou enquanto uma bola de luz saía de dentro dele. O peso em seus
ombros permaneceu. Sentia que seus joelhos estavam para ceder sob ele. — O que tá acontecendo?
Me sinto m-meio... engraçado.
Era quase como se toda a sua energia lhe tivesse sido tirada. O que teria acontecido?
— Sora! Você está bem? — Riku veio correndo em sua direção.
— Riku! E quanto a você? Você tá legal?
Sora continuava preocupado com o amigo, ainda que suas pernas estivessem tão bambas que
ele mal conseguia ficar de pé.
Riku assentiu de leve em resposta.
— Você não devia estar aqui. Ainda posso combater os bugs por mais um tempo... mas eles
estão se espalhando. Em breve, tomarão o controle de todos os meus dados.
Os bugs estavam começando a vencer a batalha. O que aconteceria quando o controle deles
fosse absoluto?
— Você se sente fraco, não é? É porque os bugs roubaram os seus dados. Você não vai durar
muito aqui. Pegue isso e fuja enquanto pode. — Riku lhe ergueu um estranho fragmento brilhante.
— O que é isso?
Sora olhou para o objeto na mão de Riku. Em meio à luz opaca, viu vários lampejos de algo
que tinha um brilho mais forte. Mas não fazia ideia do que se tratava.
— Dados que encontrei na minha outra partição. Eles não pertencem ao diário do Grilo.
Alguém os adicionou após o ocorrido.
Sora pegou o fragmento e o segurou sobre a cabeça, examinando-o mais de perto, mas não
conseguiu discernir nada de especial. O que podia estar oculto naqueles dados adicionais?
— A mesma pessoa que escondeu os conteúdos do diário dentro de você?
— Não tenho certeza. Agora cabe a você descobrir — disse Riku. — Graças a você, todos os
bugs fora de mim foram eliminados. Se você conseguir desvendar o mistério por trás desses dados
adicionais, então o diário será completamente restaurado. Isso deve abrir o caminho de volta para o
Mickey e os outros.
O Riku tá falando pra deixar ele aqui? Não, eu não posso fazer isso.
— Mas e quanto a você?! — exclamou Sora.
— Vou afundar na escuridão e levar esses bugs comigo. Eles nunca verão a luz novamente
— declarou Riku, decidido, antes que Sora pudesse prosseguir. Ele abriu um pequeno sorriso.
Mas... eu não quero deixá-lo para trás. Sora abaixou o olhar.
— Vá, Sora. Enquanto ainda estou no controle. Os bugs estão ficando mais fortes, mas ainda
há tempo o bastante.
— Bom, nesse caso... acho que esse é o jeito.
Por que ele sempre faz isso? Sora lhe lançou um longo olhar.
— Certo. — Riku assentiu. — Então é melhor você...
— Se tem tempo o bastante para fugir, então tem tempo o bastante para deter os bugs. A
gente pode acabar com isso, Riku! — Com um grande sorriso no rosto, Sora apresentou a solução
que tinha encontrado.
— O quê? Você não está escutando! — protestou Riku.
— He, he! Qual é, Riku. Você não achou mesmo que eu ia desistir e ir embora, né? —
Enquanto Sora ria, Riku respirou fundo.
— Sora, eu... Ugh, por que eu ainda tento? Quando você põe uma ideia na cabeça, não tem
como tirar. — Riku também abriu um sorriso.
Sim, eu sou teimoso feito uma mula.
— Bom, pelo menos você aprendeu a parar de tentar! Já diria que é um progresso!
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— Muito bem. Então, os bugs roubaram os seus poderes. Sendo assim, a primeira coisa que
você tem que fazer é recuperá-los.
Riku estendeu o braço, abrindo a mão com a palma para frente, e uma porta que levava a um
destino desconhecido apareceu. O outro lado parecia tomado por uma luz ofuscante, talvez porque o
lugar onde estavam agora era extremamente escuro.
— Essa luz leva às profundezas dos meus dados. Dentro há um mundo baseado nas minhas
memórias...
— Nas suas memórias?
— Sim, exatamente. Nas memórias da minha versão digital. Os bugs que roubaram os seus
dados também estão lá. Se recuperar os dados, recupera os seus poderes. É simples. Depois disso,
pode se preocupar comigo. Tome cuidado.
— Beleza. Eu volto já! — Sora assentiu e seguiu em direção à luz.
— Boa sorte aí dentro. E obrigado.
— Nem esquenta! — Ainda sorrindo, Sora adentrou a passagem brilhante sem qualquer
hesitação.

Diante dele estavam as Ilhas do Destino. Sora arfou ao ver o estado em que estavam as ilhas.
— Caramba. Que bagunça!
Seu lar estava coberto de blocos e a brisa do oceano, certa vez refrescante, era agora bem
desagradável. Era como se cada passo que dava lhe drenasse o que restava de sua força. Se não
recuperasse seus poderes, mesmo andar para frente seria difícil.
Sora atacou o bloco diante de si. Ele desapareceu normalmente, mas, dessa vez, ele também
sentiu uma parte de sua força retornar. Então se livrar dos blocos iria restaurá-lo.
— Tá, eu consigo!
Sora eliminou todos os blocos à sua volta. Seu corpo ainda parecia feito de chumbo, mas
podia ver que sua força estava voltando aos poucos. Após limpar a praia, ele atravessou a ponte e
foi correndo em direção à ilhota. Quando destruísse os bugs ali, teria acabado.
— E esse é o fim!
As Ilhas do Destino estavam agora livres de bugs. Tá, mas e agora?
Enquanto Sora pensava a respeito, Riku apareceu em sua frente.
— Riku?
— Consigo acessar esse mundo agora que você enfraqueceu os bugs. É a nossa ilha... —
Riku deu uma olhada na vista do mar.
— Sim... Ei, lembra de quando você me deu a Keyblade?
Embora parecesse fazer uma eternidade desde então, tinha acontecido bem recentemente.
— Você precisava de uma chance para se provar com a Keyblade... e aprender como as
coisas funcionam no digespaço. — Riku se virou para Sora.
— É, as charadas foram um toque legal. Você sabia que eu ia ter que lutar com aquela coisa
lá dentro?
— Era tudo ou nada. Desculpe. O tempo estava correndo. Dentro do diário, os Heartless já
tinham destruído as paredes entre os mundos e a parede entre o digespaço e o mundo real estava sob
ataque dos bugs. Me aproveitei disso e trouxe o Mickey e os outros aqui para ajudar.
Riku abaixou o olhar, apenas por um momento.
— Tinha uma... mensagem misteriosa, né? — comentou Sora, a voz suave. — A gente não
progrediu muito com isso.
Ele começou a pensar. Havia desbugado todo tipo de mundo, mas ainda restavam diversos
mistérios que não foram desvendados.
— Não devia ter arrastado todo mundo para isso sem pedir permissão. — Riku parecia
profundamente arrependido de suas ações.

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— Bom, não tem problema, contanto que a gente consiga levá-los pra casa — Sora lhe
reconfortou com um sorriso e então deu de ombros. — Tá, o que me diz? Vamos voltar ao trabalho?
— Certo. Venha comigo — respondeu Riku e, logo em seguida, os dois desapareceram.

O próximo ponto de partida de Sora foi em Traverse Town.


Assim como nas Ilhas do Destino, as ruas estavam tomadas por blocos. Sora os destruiu um
atrás do outro e, a cada um que eliminava, podia sentir cada vez mais de sua força retornar. Ele
disparou pela cidade até eliminar todos.
E como nas ilhas, Riku apareceu diante de Sora quando ele terminou.
— Parece que você também cuidou dos bugs aqui.
— Riku!
— Obrigado, Sora. Da última vez que estive aqui, foi para manter os trigêmeos seguros —
comentou Riku, recordando.
— Huguinho, Zezinho e Luisinho? — Sora se lembrava bem daqueles três irmãos agitados.
— Isso. Eles estavam com os fragmentos da Keyhole, o que fazia deles alvos. Alguém
precisava cuidar deles.
Eu não sabia de nada disso. Sora estreitou os lábios, descontente.
— Riku, por que você só não me disse o que estava acontecendo?
— Você ainda precisava se fortalecer um pouco sozinho. Você tinha um trabalho difícil pela
frente e se não conseguisse fazê-lo... — Riku abaixou o olhar. — Bom, acho que eu estaria por
conta própria.
Sora suspirou pesadamente. Algumas coisas nunca mudam.
— Riku, você sempre tenta fazer tudo sozinho — disse ele, e Riku ergueu o olhar. — Mas
eu gosto de ser arrastado pras suas confusões. O Donald e o Pateta disseram o mesmo pra mim.
— Talvez, mas...
— Esquece esse papo de “por conta própria” de uma vez.
Eu sei que o Riku não tinha ninguém pra ajudar a lidar com todas essas coisas complicadas
naquela época, mas ele não tá mais sozinho.
É por isso que eu fico triste ouvindo ele falando que tem que fazer tudo por conta própria.
Quer dizer, meio que me faz pensar que eu sou o único que acha que nós somos amigos.
— Desculpa... Você tá certo.
— E para de pedir desculpa. Temos coisas melhores a fazer! Tá pronto?
Sora riu, mas a expressão no rosto de Riku continuava entristecida quando eles seguiram
para o próximo mundo.

O País das Maravilhas também estava infestado de blocos. Mais uma vez, Riku chegou
quando todos foram destruídos.
— Sora... Sério, me descul...
— Não! Não peça!
Mesmo depois de tudo isso, Riku continuava deprimido.
— Você pode me culpar? Eu não devia ter deixado os bugs entrarem desse jeito. Sempre que
preciso enfrentar uma força externa, eu acabo cedendo e... — Riku olhou para a palma das mãos.
Eu entendo que esteja preocupado, mas você não é assim, Riku.
— Riku, quer fechar a matraca um pouquinho? — disse Sora. — Em quantos mundos já
estivemos até agora? Um montão, né?
— Sim... — Riku fechou a mão em um punho.

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— Bom, não muito tempo atrás, a resposta teria sido “um”. Mas agora, você e eu estivemos
em todo tipo de lugar. Em vez de sonhar com o que tem lá fora, nós só temos que lembrar. Temos
todo um universo dentro da gente.
Sora relembrou todos os mundos que haviam visitado em suas jornadas. Existe todo tipo de
mundo lá fora e tem vários deles que nós nunca vimos.
— Tenta assimilar isso por um segundo.
— ...É mesmo incrível.
Riku assentiu e Sora continuou:
— Todos esses mundos aí dentro de você e sabe o que mais? Você ainda é o Riku. Não
importa quantas “forças externas” você tem que enfrentar... porque tudo o que você toca te faz mais
forte. Sempre fez.
— O-Obrigado. — Riku finalmente ergueu a cabeça e olhou para Sora.
— He, he, gostou? Baita sabedoria desbalanceada pra minha idade, né? — Sora deu risada,
um pouco encabulado, e Riku finalmente sorriu com ele.
— Um pouco cheio de frufru, mas deu pra se fazer entender, baixotinho.
— E-Ei! Vou me lembrar disso quando for mais alto que você! — retrucou Sora. Aquilo já
era baixaria!
— Ha, ha! Essa eu quero ver. — A risada de Riku foi parando aos poucos e ele olhou para
Sora outra vez. — E Sora?
— Sim?
Riku parecia querer dizer alguma coisa, mas apenas sacudiu a cabeça de leve.
— ...Esquece. Te digo quando tudo isso acabar.
— Tá, claro... quando eu te ver do outro lado. Esse próximo é o último, certo?
— Certo.
Riku assentiu e a dupla desapareceu do País das Maravilhas.

O último lugar onde Sora chegou foi no interior da caverna de Agrabah.


Não só o local estava atolado de blocos, mas Sora também teve que lidar com as inúmeras
armadilhas da caverna, desde suas profundezas até chegar à saída. Boa parte de seus poderes já
havia voltado agora e Sora disparou pela caverna quase sem suar. Ainda não estava completamente
restaurado, mas se sentia anos-luz melhor que quando estava eliminando os das Ilhas do Destino.
Fora da caverna, ele destruiu também todos os blocos diante da grande cabeça de tigre.
— Riku! — Sora correu até o amigo quando ele chegou como das outras vezes.
— Lembra desse lugar? — disse Riku, ligeiramente melancólico, como já era de costume.
— Sim. Foi onde a Malévola me emboscou. Se não fosse por você, eu estaria acabado.
O que teria acontecido comigo então se o Riku e o Mickey não tivessem aparecido?
— Eu e o Mickey sabíamos que o Bafo tinha outro truque na manga.
E foi quando a Malévola destruiu a minha Keyblade.
— Bom, foi um baita truque. Eu perdi a minha Keyblade — disse Sora, a voz suave, e então
abriu um sorriso. — Mas olha, isso só prova que as coisas vão funcionar!
— Hã? Como? — perguntou Riku.
— Não importa o que você perca, você sempre pode recuperar. E isso quer dizer que você
pode recuperar a si mesmo! — declarou Sora, confiante.
Riku sacudiu a cabeça de leve e sorriu, incrédulo.
— He, he. Às vezes eu invejo quão simples é o seu mundo.
— Isso... é um elogio? — perguntou Sora em meio a um breve protesto.
— Eu invejo seja lá o que for o que te faz acreditar que seja.
— Nossa, valeu aí — comentou Sora enquanto Riku ria.
— Ha, ha, ha. Corrida de volta.

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— E-Ei, espera! — Riku desapareceu primeiro dentre uma risada, mas Sora imediatamente
foi correndo atrás dele.

Quando Sora e Riku voltaram àquele reino escuro onde estavam antes, uma passagem
brilhante se formou junto a eles.
— Certo. Dores suficientes foram findadas para que você possa acessar os mais longínquos
recantos dos meus dados.
Riku apontou para a nova entrada.
— Aí dentro está a fonte de todas as outras fontes de bugs. Tome cuidado: não sabemos o
que é, de onde vem ou por que realmente está aqui.
— Não... mas sabemos que destruí-la vai acabar com todos os problemas que ainda restam
no digespaço. Certo?
Sora encarou a porta por um instante.
— Certo. Tudo deve voltar a ser como antes — disse Riku, olhando para a passagem com
determinação semelhante. Sora se virou para o amigo.
— Obrigado por tudo, Riku. Sinto que passar pelas suas memórias me tornou mais forte.
— Você não tem que me agradecer.
— É claro que tenho! Você me guiou pelo caminho todo.
Na verdade, se parar para pensar, o Riku estava lá desde o primeiro momento, quando eu
despertei. Também devia agradecer por isso.
— Você estava lá até quando eu acordei, quando peguei a Keyblade pela primeira vez.
Mas Riku pareceu confuso.
— Hã? Não, a primeira vez que eu te vi foi na nossa ilha.
— O quê? Mas eu tenho certeza que te vi lá... com o seu casaco negro. Não? Que estranho.
Sora tinha certeza que também encontrara alguém de casaco negro lá. Se era outra pessoa
vestindo a mesma coisa, então quem poderia ter sido?
— Bom, mantenha o foco — disse Riku. — Está pronto para essa luta? Não posso entrar
sem você.
Sora ergueu o olhar para ele.
— Só o que posso te dizer agora é que não se segure, não importa o que veja lá dentro.
Havia algo que Riku não estava lhe contando — talvez ele soubesse o que havia do outro
lado da porta.
— Hã? Beleza... Me deseja sorte. — Sora deu um passo em direção à passagem.
Atrás dele, Riku repetiu o conselho:
— Apenas lembre-se do que eu disse.
— Não me segurar, não importa o que eu veja. Pode deixar — disse Sora, passando então
pela porta.
— Apenas... tome cuidado, Sora — disse Riku, a voz suave.

Do outro lado da entrada brilhante, Sora se deparou com a capela de Hollow Bastion. E logo
a frente estava...
— Riku?! — gritou Sora. — Mas como...?!
Riku estava vestindo aquele traje preto e roxo que usara quando estava sob controle de Bafo.
— Não... Você não é ele.
Sora logo percebeu que aquele diante de si era e ao mesmo tempo não era Riku — tratava-se
de um bug que extraíra seus poderes para que pudesse tomar a sua forma.
— Isso explica os avisos — sussurrou Sora, empunhando a Keyblade.

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Ele não tinha medo de um Riku falso. Era só um bug. Sora se lançou contra ele e diminuiu a
distância entre os dois.
Embora estivesse apenas parado ali, aparentemente em transe, o bug bloqueou o ataque de
Sora. Ele então recuou num pulo e disparou uma série de bolas de fogo brancas e brilhantes.
— Ngh! — Apesar das tentativas de Sora de defletir cada uma das esferas flamejantes que
eram atiradas em sua direção, uma delas o atingiu com tudo e o jogou longe.
Sora podia ter boa parte de seus poderes de volta, mais ainda não era 100%. A poderosa
investida o acertara em cheio e ele precisou de toda a força para resistir. Mas ainda não estava
pronto para perder. Sora se levantou e disparou uma magia que lhe deu a abertura que precisava
para desferir uma enxurrada de golpes contra o bug.
Quando seu inimigo caiu imóvel e desapareceu, Sora pôde sentir toda a sua força voltando
para si. Isso significa que todos os bugs devem ter sido destruídos!
Sora fez uma pose de vitória máscula — e então se deu conta de que havia voltado para
aquele espaço negro.
— Você conseguiu! Bom trabalho, Sora. — Riku recebeu Sora com um sorriso.
— Valeu! — Sora ergueu a mão e Riku bateu nela com a sua.
— O bug tentou usar os meus poderes como seus, não foi?
— Foi... Como você sabia? — Sora perguntou em retorno.
A expressão no rosto de Riku escureceu um pouco.
— Foi só um pressentimento. Imaginei que ele poderia tentar explorar a escuridão dentro de
mim. — Riku fez uma breve pausa e então abriu um sorriso com uma pontada de tristeza. —
Talvez... eu sempre tenha te invejado um pouco. Você está sempre cercado de amigos que confiam
em você e estão lá para te apoiar...
Mas Sora não queria mais escutar aquilo.
— Tá, pode ir parando por aí. Primeiro, eu confio em você. Segundo, meus amigos também
são seus amigos. Pergunta só pra eles!
— Riku! Sora! Vocês dois estão bem aí? — Eles imediatamente ouviram a voz de Mickey.
— Esmaga uns bugs aí por mim! — Donald também estava lá.
— Iac! Deem um grito se precisarem de ajuda! — E finalmente, Pateta. Os três eram grandes
amigos de Sora e Riku.
— He, he. Tá bom, você venceu. — Riku assentiu e, abaixando a cabeça, abriu um sorriso.
— Vamos. Eles estão esperando por nós! — declarou Sora. Mas então, um terrível tremor
sacudiu o lugar. As luzes que atravessavam o ar piscaram intensamente e o mundo sacudiu.
— Hm, Riku...?
— Não! — Riku virava a cabeça de um lado para o outro. — Sora, você tem que fugir,
agora! Alguém está tentando fechar o caminho de volta para o mundo exterior!
Os tremores estavam começando a ficar tão fortes que era difícil sequer ficar em pé.
— Rápido, ou vai acabar ficando preso aqui! — Riku estendeu sua mão e um portal negro
apareceu. — Vá, agora! — disse, agarrando Sora pelo braço e o empurrando em direção a ele.
— T-Tá, tô indo!
— Obrigado de novo — Riku disse a ele enquanto Sora seguia até o portal. — Te vejo do
outro lado!
— É uma promessa!
Sora se virou, acenou e começou a correr em direção à passagem.

Aquele espaço negro era um reino estranho. Havia blocos que se mexiam à sua volta e
ficavam entrando em sua frente, mas Sora não faria progresso algum se não se aproveitasse dos
obstáculos animados.

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Ele correu em frente, subindo nos blocos e derrotando os Heartless que o atacavam, até que
se deparou com alguém que lhe bloqueou o caminho:
— Malévola!
— Devia ter ficado lá fora, garoto. Lá, o pior dos destinos que poderia recair sobre você
seria o sono eterno.
— Foi você que fez isso?! Mas que coisa. Quando você vai embora? — retrucou Sora,
empunhando sua Keyblade pronto para uma luta.
— Ah, mas eu apenas comecei. É uma pena que você entenda tão pouco sobre a escuridão.
O mundo deseja o abraço dela! — A fada do mal ergueu seu cajado de leve enquanto falava.
— Aham, claro.
— Não há nada na escuridão — entoou Malévola com reverência. — Não há tristeza, não há
motivo para a dor... Na escuridão, não é possível enxergar seus erros ou os sonhos que não se
tornaram realidade.
— E também não se pode conhecer a felicidade, ou como é se divertir! Você não pode forçar
a escuridão num mundo que nunca pediu por ela. Isso é só dar a si mesma o que você quer!
Essa ideia é completamente repugnante. O que tem de bom num mundo em que você não
pode ver a diversão que há nele?
— E qual o problema nisso? Afinal, a Rainha do Mal tem o direito... e o poder para fazer
acontecer! — Malévola fez um grande círculo com seu cajado e uma estranha chama verde se
ergueu à sua volta.
— Se você não vai escutar a razão, vou ter que te deter à foça — declarou Sora. Sem
demora, ele desferiu um poderoso golpe de sua Keyblade.
— Enfim concordamos. Vou dar fim à sua intervenção aqui e agora!
A aura verde esmeralda brilhante que emanava de Malévola irrompeu às alturas e ela se
transformou num gigantesco dragão negro que cuspiu fogo contra Sora.
— ...Aggh!
Sora habilmente rolou pelo chão, afastando-se das chamas e seguindo para baixo de seu
enorme corpo, onde a atingiu com a Keyblade.
A Malévola dragão rugiu e começou a bater o pé com toda a força no chão. Entretanto, Sora
saltou em suas costas, subiu pelo pescoço comprido e atacou sua cabeça com a Keyblade.
— Graaah!
Em meio a um terrível urro, sua adversária caiu imóvel.
— Você não vai tomar esse mundo! — vociferou Sora. Com um grande salto, ele atingiu a
cabeça do dragão novamente com a Keyblade, dessa vez com cada fibra de força que tinha.
Envolto em chamas verdes, o dragão se transformou de volta em Malévola.
— Todos os mundos são meus, garoto! Um dia, você vai ver... — Com essas palavras de
despedida, Malévola cambaleou e desapareceu por uma porta que se materializou atrás de si.

Finalmente tinha acabado. Passando pela porta, Sora chegou de volta à Hollow Bastion —
especificamente, ao grande salão onde havia recuperado sua Keyblade e partido para salvar Riku.
— Sora! Ele voltou, pessoal! — Pateta jogou Sora no chão com um forte abraço.
— Já tava na hora! O Pateta tava preocupado. — Donald se atirou nele pelo outro lado.
— Ei, corta essa, galera!
Sorrindo, Mickey se aproximou de Sora antes que seus outros dois amigos lhe apertassem
até ficar completamente sem ar.
— Bem-vindo de volta, Sora. Fico muito feliz por você não estar ferido. Bom, boas notícias:
você conseguiu! Os últimos bugs foram eliminados do digespaço. Não posso agradecer o bastante.
— Sempre feliz em ajudar. Ei! Cadê o Riku? Ele tá bem?! — exclamou Sora, saindo do
abraço apertado de seus amigos. Nada disso tem sentido se o Riku não conseguiu voltar.
Foi quando Riku apareceu mais ao lado.
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— Estou bem. Desculpa por te fazer passar por tudo isso.
— Aí está você!
Riku ofereceu uma mão a Sora e o ajudou a se levantar.
— Parece que conseguimos cumprir aquela promessa. Queria que tivéssemos tempo para
ficar aqui parados e conversar, mas o Mickey e os outros precisam se apressar. Por aqui, pessoal.
Como prometido, aqui está o caminho de casa, de volta para o mundo real. — Ele apontou para
frente e uma grande porta apareceu.
— Então é isso... hora de dizer adeus ao digespaço — disse Mickey, sereno.
— Verdade seja dita, fico triste em partir. Foi mesmo uma experiência incrível explorar o
interior do meu diário! — refletiu o Grilo sobre o ombro de Mickey.
— Bom, vocês podem voltar a qualquer hora! — disse Sora enquanto Mickey e os outros
seguiam em direção à porta.
— Sim! E na próxima vez, vamos trazer todo mundo junto!
— Vai ser divertido!
Pateta e Donald pareciam felizes.
— Na verdade... — disse Riku, a voz baixa. — Tem algo importante que eu não disse a
vocês. Agora que... bom, é que... — Ele parecia estar tendo problemas para concluir o pensamento.
— Qual o problema, Riku?
— Quer saber? Eu não devia prendê-los aqui por mais tempo. Posso contar depois que vocês
tiverem voltado — respondeu Riku, sacudindo a cabeça de leve.
Parando para pensar, o Riku também queria me dizer alguma coisa antes. O que será que
ele quer que a gente saiba?
— Bom... então tá certo. Obrigado por toda a sua ajuda! Cuidem-se, vocês dois. — Mickey
se despediu, assentindo para Sora e depois para Riku.
— A gente se vê!
— Até a próxima!
Donald, Pateta e o Grilo passaram pela porta atrás de Mickey. Quando chegaram do outro
lado, ela desapareceu em meio a um flash de luz.

— Uhul! Vocês voltaram!


— Sejam bem-vindos, pessoal!
Tico e Teco estavam pulando em cima da grande mesa.
— Tico e Teco estão aqui...
— Então quer dizer...
Donald e Pateta se abraçaram.
— Conseguimos! Nosso castelo real no mundo real! — exclamou o Grilo, saltitando de
empolgação.
— Parece que funcionou. Conseguem me ouvir?
Diante da voz que saía do monitor, todos ergueram o olhar.
— Alto e claro, Riku! Puxa vida, o que teríamos feito sem vocês? — Mickey respondeu para
a tela adiante.
— Sim, com relação a isso... eu e o Sora aqui não podemos mais ajudar vocês.
A voz de Riku soou bem baixa.
— Hã? O que quer dizer? — Donald bamboleou às pressas em direção ao monitor.
— Com os bugs eliminados, o diário deve ser revertido ao seu estado original. Isso para vocês
não é novidade, certo?
— Certo. Ele deve voltar a ser como era quando eu o escrevi. — O Grilo comentou sobre a
explicação de Riku.

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— Bom, essa é a questão... eu e o Sora também seremos resetados. Não nos lembraremos de
nada disso. Afinal, não há menção no diário a respeito da luta para reparar os bugs.
— Espera... Quer dizer que vocês vão se esquecer de todo esse tempo que passamos juntos?
Mesmo as coisas que estamos falando agora? — exclamou Donald, entristecido.
— Somos dados. É assim que funciona.
Depois que Riku expôs os fatos, Pateta se curvou, desanimado.
— Mas não é justo!
— Mickey, ainda tá aí? — A próxima voz que ouviram foi a de Sora. — O Riku tinha me
explicado isso tudo antes de falar com vocês. A gente devia estar comemorando! É assim que são as
coisas no nosso mundo.
— É, mas mesmo assim... — Donald abaixou a cabeça, deprimido.
— Você passou por tanta coisa para nos ajudar! Não é certo tirar isso tudo! — O Grilo tirou
a cartola da cabeça, infeliz, e a segurou diante do peito.
— Você é um bom amigo, Grilo. Não se preocupa. Você não vão se livrar da gente assim tão
fácil. Podemos perder as nossas memórias, mas ainda temos vocês. E as partes nossas que não
ficarem no diário sempre estarão dentro de vocês, né? Os mundos podem desaparecer, mas as
memórias jamais. Guardem elas pela gente. É só nos deixarem nos seus corações e nós sempre
estaremos lá quando mais precisarem.
O Grilo fungou.
— Ah, Sora...
Donald e Pateta disseram seu nome quase ao mesmo tempo.
— Bom, a gente vai desligar por aqui. Tchau pra vocês. Mandem um abraço pros “nós” aí do
seu mundo!
Mas quando Sora estava terminando de se despedir, o alarme de erros soou do digitalizador.
— O que é isso?! — Donald virou a cabeça de um lado para o outro, apreensivo.
O monitor instantaneamente ficou preto e uma mensagem misteriosa apareceu na tela:

DADOS RECUPERADOS... 100%


COMPILAÇÃO DE DADOS COMPLETA

— O que isso quer dizer? — Mickey leu as palavras no monitor com uma expressão severa
no rosto.

ERRO ENCONTRADO NA ESCURIDÃO.


DESPERTANDO ERRO DAS TREVAS.
DELETAR O DIGESPAÇO SIM/NÃO?
SIM

De volta ao grande salão de Hollow Bastion, Sora e Riku estavam em meio a um terrível
terremoto. Podiam escutar um barulho estridente por toda a volta, como se o mundo todo estivesse
gritando em meio à pressão.
— Está sentindo isso? É um bug! Não, ele... ele é o que está no controle dos bugs!
Deixando-os malucos!
— Bugs?! Mas achei que tínhamos nos livrado de todos! — Eles ouviram a voz de Pateta
vindo do alto.
Mas eles não haviam eliminado todos os bugs do diário? Ou será que isso queria dizer que
ainda restavam alguns?
— Eu não sei! Talvez tenhamos deixado um passar? — A voz de Riku soava tensa.
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— O que a gente faz? — Donald parecia em pânico.
— Ele disse que vai deletar o digespaço. Não podemos deixar algo grande assim à solta.
Selem os dados do diário! Rápido! — Riku orientou Mickey, ainda no mundo real.
— Mas... se fizemos isso, perderemos você, o Sora e o que havia no diário!
Antes que Mickey terminasse de falar, o Grilo também deu um grito:
— Ah! Céus, acabei de me lembrar! A Malévola e o Bafo ainda estão lá dentro! Eles também
serão deletados!
Tinha me esquecido desses dois, pensou Sora. Eles com certeza ainda estão por aqui. E se o
diário fosse selado, eles se perderiam junto a todos os dados.
— Maus ou não, não podemos deixar que isso aconteça!
Diante das palavras de Mickey, Riku mordeu o lábio.
— Então selar os dados não é uma opção? — Ele gemeu. — O mundo real está em jogo!
Junto a ele, Sora olhava para frente. Se as coisas continuassem assim, teria sido tudo em vão.
Não tenho escolha senão ir até lá.
— Aguenta firme, galera! Só me deem um tempinho!
— Espera, Sora! Aonde está indo? Sora! — Riku agarrou Sora pelo braço quando ele
começou a correr. — O digespaço não vai aguentar muito mais tempo! Sora, pare!
Sora não pretendia fazer isso.
— Sora, ficou maluco? — apelou Riku, ainda segurando com força no braço do amigo.
— Não podemos simplesmente deixá-los! Você ouviu o Mickey. Eu vou atrás deles!
— Atrás deles onde?! Tem alguma ideia de onde eles estão?
— Em algum lugar! — disparou Sora.
Riku segurou Sora por ambos os ombros e o fitou nos olhos em um esforço para fazê-lo
entender. Sora o olhou de volta.
— Não está com medo? — perguntou Riku, a voz suave. — Não estamos falando apenas de
perder umas memórias aqui. Podemos ser apagados. Esse mundo inteiro pode ser apagado!
— É claro que eu tô com medo. Você não estava?
— Hã?
Sora tirou as mãos de Riku dos ombros devagar.
— Você esteve no meu lugar. Você enfrentou o impossível sozinho. Porque sabia que dava
menos medo que ficar parado esperando o fim.
O que dá medo é não fazer nada. Não tentar. Ser condenado ao vazio sem nem lutar.
— Eu não sei se podemos vencer... mas sei que eu tenho que tentar. Não tem como saber o
que vai acontecer depois. Mas agora é a hora de ir até lá e fazer alguma coisa!
— ...Não tem mesmo como te parar quando você põe alguma coisa na cabeça. — Riku lhe
lançou o menor dos sorrisos.
— O mesmo vale pra você! Me deixa cuidar disso!

CORPO ERRANTE, CAÍDO EM COMBATE.


AGORA, ELE SERVIRÁ À VONTADE DAS TREVAS.

Era aquela voz estranha de novo. Sora não sabia a quem pertencia, mas tinha a sensação de
que já a havia escutado antes. No mesmo instante, uma porta brilhante apareceu diante dele.
— Está nas suas mãos agora, Sora.
Com a voz de Riku atrás de si, Sora correu em direção ao portal.

Do outro lado, deparou-se com um estranho caminho que parecia se estender infinitamente.
Sora bateu em disparada, eliminando toda horda de Heartless que tentava detê-lo.

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Podia ver uma luz mais à frente. Ela foi ficando cada vez mais brilhante e, quando ficou
quase clara demais para que conseguisse olhar diretamente em sua direção, Sora se viu em meio a
um reino bizarro.
— Hã, Malévola? Não acho que estejamos fazendo muito progresso por aqui...
— Hmph! Um oponente menor seria um insulto.
Bafo e Malévola estavam se defendendo de um Heartless gigante com um ataque atrás do
outro, mas não havia quaisquer indícios de que seus esforços estavam surtindo algum efeito.
O tal Heartless era bastante parecido com o gigantesco Lado Negro que Sora enfrentara nas
Ilhas do Destino, ainda bem no início de sua jornada. Talvez ele não tenha desaparecido porque a
escuridão acabou engolindo nós dois.
Sora correu para frente de Bafo e Malévola.
— Malévola! Bafo! Vocês dois precisam sair daqui! — Sora disse a eles com a Keyblade
empunhada.
— Eu não recebo ordens de você!
— Hã... eu voto pra escutarmos o baixotinho.
— Silêncio, covarde! Você fará o que eu disser!
Malévola sacudiu seu cajado, furiosa. A chama esmeralda foi disparada contra a segunda
encarnação daquele Heartless gigante, — o Neo Lado Negro — mas não houve o menor sinal de
dano visível. Sem hesitar, o Neo Lado Negro ergueu um dos braços gigantescos e bateu com o
punho no chão.
— O quê?!
Malévola e Bafo sumiram. Teriam eles sido esmagados pelo golpe?
— Bafo! Malévola! — exclamou Sora.
O Neo Lado Negro encarou Sora com um olhar cheio de frieza. O garoto vacilou por um
instante, sobrepujado por aquela presença tão intensa. O Heartless tinha uma aura extremamente
opressiva, muito pior que na primeira vez que o havia enfrentado. Era quase como se fosse algo
completamente diferente.

RAIVA... ÓDIO...
E AGORA OS ERROS ALIMENTAM A MINHA ESCURIDÃO.

Sora sentiu que a voz estava vindo do Neo Lado Negro. Ele se alimentava de erros?
— Espera... é isso! Você não foi o único que evoluiu no digespaço!
Sora ergueu o olhar quando ouviu a voz de Riku.
— Riku, quer me atualizar?
O que Riku disse em seguida foi extremamente difícil de assimilar de uma só vez:
— Eu descobri de onde os bugs vêm, todos eles! É a sua sombra... o seu Heartless!
— O meu Heartless?! — gritou Sora, descrente. Eu tive um Heartless?!
— Você pode não lembrar, mas você se tornou um Heartless uma vez. Isso estava escrito no
diário. Mas esses registros desapareceram junto às suas memórias, não muito após a sua primeira
jornada. Você recuperou a memória, mas as páginas do diário... elas continuaram em branco.
— E você acha que o meu Heartless é o responsável?
Sora não entendia exatamente do que Riku estava falando. Mas tinha certeza de que a ideia
geral era que o seu próprio Heartless era a origem de todos os bugs.
— Faz sentido. Tudo no diário girava em torno de você. Esse tempo todo, enquanto você
evoluía no digespaço, enquanto encontrava uma nova força, o seu Heartless estava absorvendo
dados e fazendo o mesmo.
— Mas nós restauramos todos os dados! Isso o enfraqueceu, né? Eu ainda posso detê-lo! —
Sora ergueu sua Keyblade e encarou o Neo Lado Negro mais uma vez.
— Não... eu devia ter me dado conta disso antes. Normalmente, quando um Heartless é
derrotado, ele libera um coração que então retorna à pessoa que o perdeu. Mas quando um Heartless

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é derrotado aqui no digespaço, isso não libera um coração. Em vez disso, são as mentes dos Heartless
que são liberadas.
— Suas mentes? E onde elas foram parar?
Sora não entendia muita coisa a respeito de corações ou Heartless, ou sobre como o mundo
funcionava. Não como Riku. O que exatamente tá acontecendo aqui, afinal? Os corações e mentes
dos Heartless são mesmo assim tão diferentes?
— Bem na sua frente! O seu Heartless os estava reunindo para então devorar as intenções
negras dos Heartless derrotados. É disso que ele tira o seu poder: de dados negros! E agora, assim
como você, ele se tornou algo maior.
O meu Heartless... e ele agora é algo novo. Não tem como saber o que aconteceria com o
Mickey e os outros — com todo mundo no mundo inteiro — se esse cara conseguir sair daqui.
— Eu tenho que protegê-los. E com toda a força que eles me deram, eu posso!
Como se respondendo à sua voz, o Neo Lado Negro olhou para Sora. Com um rosnado, ele
disparou raios de luz de seu peito em direção ao céu. Os raios ascenderam cada vez mais alto e
então viraram uma chuva em volta de Sora.
— Ugh!
Sora tentou se esquivar do dilúvio enquanto avançava contra o Neo Lado Negro, mas a
criatura bateu com o punho no chão novamente.
Sora recuou num pulo e atacou seu braço com a Keyblade.
O Neo Lado Negro pareceu parar por um momento, mas então atirou ambos os braços para o
alto e disparou uma onda de luz de seu corpo. Sora a bloqueou com a Keyblade e então se lançou
diretamente contra o peito do Heartless, atingindo-o com uma série de golpes que continuaram até
ele finalmente parar de se mexer.
— Acabou?!
Quando ele fez uma pose de vitória, a mesma voz de antes voltou a soar em sua cabeça:

RAIVA... ÓDIO... E ERROS PARA ALIMENTAR A MINHA ESCURIDÃO...


E, EM BREVE, CORAÇÕES PARA SACIAR A MINHA FOME!

— O que é isso?! Ele tá mudando de novo?! Não... está evoluindo!


O que se encontrava agora parado diante de si era exatamente igual a Sora — ou quase. As
feições e o tamanho eram os mesmos, mas a criatura era inteiramente negra. Aquele de fato era o
Heartless de Sora.
Ele ergueu sua própria Keyblade sobre si, com outras três Keyblades a orbitando. Cada uma
das armas evidentemente perigosas estava coberta de trevas.
— Mas o que é isso?!
A trindade de Keyblades atacou Sora repetidamente, mas ele conseguiu se esquivar delas por
tempo o suficiente para que se aproximasse e golpeasse seu Heartless. Após uma série de investidas
semelhantes, Sora desferiu uma série de ataques que usou toda a força que conseguiu juntar.
Ainda assim, aqueles olhos brilhantes em meio às trevas continuavam assustadoramente
felizes. A criatura flutuou em meio ao ar e invocou diversas Keyblades infundidas em trevas ao
redor de seu corpo.
— O quê?!
As Keyblades negras se lançaram contra Sora todas ao mesmo tempo, enquanto mais uma
— dourada, dessa vez — se erguia sobre a cabeça do Heartless. A Keyblade dourada traçou uma
linha no ar enquanto partia em direção a Sora.
Mas Sora habilmente rebateu a cópia dourada, jogando-a no chão com sua própria Keyblade.
Depois, ele a recolheu e imediatamente a lançou de volta contra o Heartless. Um golpe certeiro.
Com a força drenada, o Heartless de Sora encolheu — até retornar à sua forma de Sombra.
Sombras eram os menores e mais fracos dos Heartless — Sora já derrotara vários deles antes. Na
verdade, fora o primeiro tipo de Heartless que havia enfrentado, ainda nas Ilhas do Destino. Sora
lançou sua Keyblade contra a criaturinha fraca que se contorcia pelo chão.
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— Agora foi?!
Mas quando Sora estava começando a relaxar — seu Heartless reapareceu. Mas agora havia
três deles. O garoto os enfrentou desesperadamente, assim como fizera antes, até que finalmente
conseguiu eliminá-los, apenas para outro trio assumir seu lugar. Sora agora estava começando a
fraquejar, mas juntou toda a força de seu coração vacilante e continuou a lutar. E quando pensou
que tinha acabado com o último deles — o Neo Lado Negro voltou.
— Quando isso vai acabar?!
Foi o suficiente para fazê-lo querer jogar a toalha, ainda que suas pernas não estivessem
literalmente cedendo sob seu corpo. Não fazia ideia de quanto tempo se passara desde que a luta
tivera início. Sora caiu de joelhos, sentindo que sua consciência estava começando a abandoná-lo.

O que tá acontecendo comigo?


Caindo... caindo... na escuridão...

— Você não pode desistir!


Sora ergueu o olhar frente àquela voz tão familiar e reconfortante. Parado diante dele estava
— Mickey!
— Mickey? O que está fazendo aqui? — Sora sentiu uma nova força brotar em seu corpo já
caindo de exaustão.
— Ajudando o meu amigo. Eu não disse? Você nunca precisa enfrentar nada sozinho.
Sora se levantou devagar. Ele tá certo... eu não estou sozinho. Estão todos aqui comigo.
— Quando a escuridão se aproximar, é só olhar lá dentro... e você sempre encontrará a luz.
Mickey disparou um raio de luz de sua Keyblade contra o buraco em forma de coração no
peito do Neo Lado Negro. Quando a poderosa luz o engoliu, o grande Heartless se transformou em
uma única Sombra diante de seus olhos.
— Vamos! É agora!
Sora atacou a Sombra com a Keyblade e a criatura sumiu sem deixar rastros.
— Conseguimos! — exclamou ele enquanto o mundo se enchia de luz. Aquele devia ser o
último dos bugs.
O brilho engoliu Sora e Mickey também — e, antes que se dessem conta, os dois estavam de
volta ao grande salão de Hollow Bastion. Malévola e Bafo também estavam lá, mais ao canto. E
Riku também, é claro.
— Bafo! Malévola! Vocês estão bem! — exclamou Sora.
Riku sorriu para ele.
— Eu os encontrei presos numa fenda em meio aos dados — disse, dando de ombros.
Malévola fez uma careta amarga.
— Hmph! Vocês não ouvirão palavras de gratidão da minha parte. Nossa dívida está paga.
— Eu já tava louco pra cair fora daqui! Té mais, otários. Tô indo pra casa! — Bafo começou
a ir embora, mas era difícil dizer se ele realmente sabia onde era a saída. Malévola o seguiu.
— Vou ficar de olho enquanto vão embora — disse Riku, incitando-os a irem em frente.
— Da próxima vez, vocês vão ver! — ralhou Bafo.
Sora e Mickey trocaram um olhar.
— Ha, ha! O Bafo nunca vai mudar.
— Não.
Sorrindo, os dois se viraram de frente um para o outro.
— Os dados vão começar a voltar ao normal agora. A como eram antes de todos esses bugs
aparecerem — disse Mickey.
— Então acho que agora é mesmo um adeus. — Sora fechou um punho sobre o peito. —
...Hã? O que é isso? Esse aperto na minha garganta... é mais um erro?
Por algum motivo, eu me sinto triste. Por quê...?
— Não, Sora. É assim que despedidas nos fazem sentir.
A mão de Sora permaneceu onde estava enquanto ele ouvia ao que Mickey tinha a dizer:

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— Puxa... esse tempo que passamos juntos me trouxe de volta uma verdadeira enxurrada de
lembranças. O dia que saí na minha primeira aventura. O dia que fiz um novo amigo.
Uma enxurrada de lembranças... O que poderia haver guardado nas memórias de Mickey?
— Isso me fez perceber que o diário não é só uma lista de eventos. É uma coleção de tudo o
que sentimos juntos... é os nossos corações.
Corações não podiam ser convertidos em dados... mas o diário era uma coleção deles...?
— Prometo que vamos contar ao Sora e ao Riku o que aconteceu aqui. Assim, poderemos
compartilhar esse diário com vocês. Essas memórias sempre manterão nossos corações conectados.
Isso mesmo! Se os nossos corações se conectarem e formarem um laço, essa conexão vai
durar mesmo que as memórias desapareçam.
— Amigos para sempre, Sora!
Mickey ergueu sua mão direita para Sora.
— Amigos para sempre, Mick... Vossa Majestade.
Sora abriu a mão e a estendeu para o rei e, com isso, os dois apertaram as mãos com firmeza.
— Certo, estou indo agora.
Mickey começou a seguir em direção à porta de luz.
Quando Mickey desapareceu em meio ao brilho e Sora teve certeza de que chegara ao outro
lado, ele ergueu sua Keyblade e a apontou para a porta. O raio de luz familiar logo a trancou.
E então...

Donald, Pateta, o Grilo, Tico e Teco saudaram Mickey quando ele voltou ao Castelo Disney.
— O que é isso?!
O Grilo apontou para o monitor, onde viram uma mensagem de Sora:

OBRIGADO, PESSOAL!

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Ei, Sora, você se lembra?
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O CLIMA NO ESTÚDIO DO CASTELO DISNEY ESTAVA ATÉ QUE RELATIVAMENTE
relaxado e tranquilo. A aventura finalmente tinha acabado e o Sora do digespaço tinha perdido todas
as memórias daquela jornada. O monitor do computador analisando o diário agora exibia apenas os
conteúdos normais do livro.
— Ei, sabem de uma coisa... nós nunca chegamos a desvendar aquela mensagem misteriosa
— comentou Pateta, parado junto à cadeira do Rei.
Do outro lado, Donald suspirou profundamente. Eles haviam se livrado dos bugs de uma vez
por todas, mas não conseguiram o que originalmente estavam buscando.
De repente, a tensão voltou ao ar e Donald foi o primeiro a notar o motivo:
— Wak!
Riku havia aparecido no monitor.
— Pessoal, boas notícias. Um novo mundo apareceu no diário.
— Como assim? — perguntou Pateta, curioso.
— Eu encontrei outra porta que levava a dados adicionais. Alguém deve tê-los incluído
quando os outros dados foram restaurados.
— E se explorarmos esse mundo...
— ...Então finalmente devemos encontrar respostas sobre essa mensagem. — Riku concluiu
a frase de Mickey.

Sua dor será apaziguada quando você voltar para findá-la.

A estranha mensagem voltou a aparecer na tela. A quem ela estava se referindo? O que
estava causando toda essa dor a essas pessoas?
— Ótimo! — Mickey se levantou de seu assento. — Vamos pedir ao Sora para...
— Quando consertamos os dados, tudo no diário voltou a ser como no início, lembra? —
disse Pateta, um pouco tristonho. Donald suspirou do outro lado de Mickey.
— O que significa que a jornada do Sora pelo digespaço... ela nunca aconteceu para ele.
Agora, ele é o mesmo garoto que era antes de conhecer qualquer um de nós — confirmou o Grilo, a
voz baixa. Agora que o diário fora completamente restaurado, a memória de Sora havia voltado a
ser como antes de sua jornada. Agora, ele se lembrava apenas das Ilhas do Destino.
— Eu estou bem, a minha partição não pode ser afetada. Mas o Sora... nós não podemos
simplesmente enviá-lo lá sendo que ele não faz ideia do que está acontecendo. — Riku olhou para a
tela, preocupado.
Mickey pensou por um momento.
— Espera. Ei, Riku — disse ele. — Poderia me ajudar a voltar ao digespaço mais uma vez?
Donald, Pateta e o Grilo se viraram para Mickey.

Pluto lambeu o rosto de Sora. Ele estava inconsciente em meio a um beco — havia apenas
uma pequena luz brilhando ao virar da esquina.
— Hmm...
Sora abriu os olhos pesados devagar, mas o que viu não foi o oceano das Ilhas do Destino ou
o céu azul sobre sua cabeça, mas uma cidade que nunca tinha visto antes... e um cachorro.
— Mas que sonho... — murmurou Sora, fechando os olhos novamente... até que Pluto pulou
em sua barriga. — Ahh! Não é um sonho...!
Sora se levantou, esfregou os olhos e então olhou em volta. Que lugar é esse...?
Agora que Sora estava de pé, Pluto olhou para ele e sacudiu o rabo, todo contente.
— Caramba... Ei, você sabe onde a gente tá?
Hã? Como foi que eu...?
Enquanto Sora pensava, Pluto saiu correndo adiante.
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Sora o seguiu em direção a um distrito pavimentado com tijolinhos — Traverse Town. E
então deparou-se com uma figura misteriosa com grandes orelhas pretas:
— Sora, este foi o dia em que a sua jornada começou. Sei disso porque eu também estava
aqui. Está na hora da verdade.
Não faço a menor ideia do que ele tá falando. Ou do que é essa cidade estranha. O que tá
acontecendo aqui?
— Onde eu tô? Como cheguei aqui? E quem é você? — Sora começou a bombardeá-lo com
as perguntas em sua cabeça.
— O nome é Mickey. Eu vim aqui de outro mundo — explicou o tal sujeito, aparentemente
chamado Mickey. Mas não era lá uma explicação muito boa.
— Sério? — perguntou Sora.
— Acontece que alguém deixou uma mensagem misteriosa para mim e os meus amigos:
“Sua dor será apaziguada quando você voltar para findá-la”. E você é o único com o poder de
desvendar esse mistério.
— Eu? Por que eu? — Sora inclinou a cabeça, extremamente confuso, quando uma grande
chave, a Keyblade, surgiu em sua mão em meio à um forte clarão. — Uou! — exclamou.
Aquela devia ser a primeira vez que ele a via, mas era bom tê-la em mãos, quase como se
sempre a tivesse tido. Como se tivesse sentido falta de tê-la comigo.
— Bom. Você perdeu a memória, mas não os seus poderes — disse Mickey, um pouco
aliviado. — Poderia me ajudar, Sora? Eu preciso descobrir a verdade.
Alguma coisa lhe agitou o peito frente ao pedido de Mickey.
— Mas isso é tão estranho. Eu nem te conheço... Err, ou conheço? Algo me diz que você
parece vagamente... Nah. Essa verdade que você tá falando, ela tem algo a ver comigo?
Mickey sorriu com gentileza. Sora sempre fora um livro aberto.
— Honestamente, eu não tenho certeza. Mas seja lá o que for, tenho a sensação de que é
algo que você precisa saber.
— Hmm, então tá certo... — Acho que tenho muito o que fazer, pensou. — Beleza, Mickey.
Só mostrar o caminho.
Sinto como se tivesse uma tempestade se formando no meu peito... Acho que ir com ele
também vai me ajudar com isso.
— Obrigado, Sora! Agora, levante essa sua Keyblade.
Sora fez exatamente isso e, ao mesmo tempo, Mickey invocou sua própria Keyblade e a
ergueu para o céu. Uma luz foi disparada das duas Keyblades, abrindo uma porta, e os dois
seguiram para o outro lado.

Eles emergiram numa sala bastante espaçosa e construída de algo que parecia mármore. O
lugar parecia tão frio e sem vida — a verdade estava mesmo ali? Sora olhou em volta, mas não
encontrou sinal de Mickey. Teria ele seguido em frente?
Sem ver outra escolha, Sora começou a caminhar, quando um homem apareceu do meio do
nada diante dele. Estava coberto da cabeça aos pés por um casaco de capuz negro.
— Hã?! Quem é você? — Sora instintivamente empunhou a Keyblade. Não podia ver sequer
a expressão do sujeito, menos ainda seu rosto. Mas ainda assim... havia algo de familiar nele?
— Eu? Não sou ninguém... — disse a figura encapuzada, a voz baixa. — Neste lugar,
encontrar é perder e perder é encontrar. É como funcionam as coisas no Castelo do Esquecimento.
— Castelo do Esquecimento? — repetiu Sora.
O homem de preto assentiu e continuou:
— Sim... Aqui, você encontrará pessoas que você conhece. Pessoas das quais sente falta. —
Ele entregou uma carta para Sora. Nela, estava estampada a imagem de uma ilha em meio a um mar
azul. Ei, calma aí...

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— Use esta carta e prossiga. Você encontrará a verdade adormecida. — Com isso, o homem
de casaco negro desapareceu.
O que ele queria dizer com “usar a carta e prosseguir”? Sora examinou a sala novamente,
mas o único caminho em frente era uma porta no alto de um pequeno lance de escadas ali perto.
Sora levantou a carta diante da porta e ela se abriu num clarão.
Do outro lado havia outra câmara branca, muito semelhante à anterior, mas dessa vez cheia
de estranhos blocos que ele nunca tinha visto. O que eles eram? Enquanto Sora pensava a respeito,
o sujeito de preto apareceu novamente.
— Essa carta que você usou fará com que veja pessoas... ilusões... que vêm do diário do
Grilo: os mesmos dados que você consertou.
— Eu consertei o quê? Quem é Grilo? — Sora não sabia aonde ele queria chegar. O que
Mickey tinha dito também não fizera muito sentido, mas aquilo era ainda pior.
— Ah, erro meu. Alguém apertou o botão de reset na sua memória? De toda forma, você se
lembrará das pessoas que encontrar aqui.
— Isso não faz sentido nenhum. Quer dizer que eu vou encontrar umas... ilusões, mas e
depois...?
Deve ter alguma coisa que eu precise fazer depois.
Mas o homem de preto tinha apenas uma coisa a dizer e não era o que Sora esperava:
— Faça o que você quiser.
— Hã? — respondeu Sora.
— Não há um roteiro a ser seguido. O diário é o mais perto disso que você tem, mas não
quer dizer que você verá as coisas que ele diz. E, na verdade, quem é que liga? Tudo o que acontece
aqui... todos que você encontrar... é tudo uma ilusão.
Como isso é possível? Nada aqui é real? Então eu posso fazer... qualquer coisa?
— Faça tudo que quiser. Mas lembre-se: as coisas que vai encontrar dependem das ações
que você tomar.
E com isso, o homem de casaco negro desapareceu de novo.
— Ei, volta! ...Ele foi embora...
Quando Sora andou em volta, explorando a área, ele viu uma garota.
Essa não é a...?
— Selphie! O que está fazendo num lugar como esse? — ele chamou pela garota de vestido
amarelo. Diferente de Mickey e do sujeito de casaco negro, ele conhecia Selphie muito bem. Era
uma de suas amigas de infância das ilhas.
— Hã, oi? Eu praticamente moro nessa ilha.
— Nessa... “ilha”? Quer dizer “castelo”.
— Não, quero dizer “ilha”, mas podemos fazer de conta que é um castelo se você quiser —
disse Selphie, um pouco confusa. Então ela acreditava que estavam em casa, em uma das ilhas.
O homem de casaco negro havia mencionado que a carta lhe mostraria “ilusões”, mas Sora
não sabia dizer se era Selphie quem estava vendo as ilusões ou se ela própria era a ilusão.
— Sora, você tá agindo tão estranho hoje! E onde é que você tava, afinal? Será que você
pode dar uma olhada na ilha? Estamos com blocos cobrindo até a cabeça!
Eu sabia disso. Tinha ouvido alguém dizer isso antes... mas onde?
— Isso tá arruinando o meu dia, de verdade. Pode me fazer um favor e descobrir de onde
esses blocos tão vindo?
— Claro! — Sora aceitou a tarefa alegremente e Selphie sorriu.
— Obrigada e boa sorte. Espero uma investigação completa!
Sora assentiu para ela e bateu em disparada. Durante seu trabalho destruindo os blocos, ele
viu Wakka com sua sempre presente bola de blitzball.
— Ei! Sora! O bagulho tá ficando tenso por aqui, ya? Tá tudo certo, maninho?
— Hmm... Tem sido... um dia interessante? — Sora inclinou a cabeça. Ele já tinha tido essa
conversa antes, não tinha?
— Bacana. Mas, ei, será que você pode me fazer um favor? Pode dar uma olhada no Tidus
pra mim? Ele foi investigar os blocos.
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Então Tidus também devia estar andando por ali.
— Claro! — respondeu Sora, todo animado, e continuou em frente.
— Valeu, maninho! Ele não deve ter ido muito longe, mas tu sabe como é a figura, né? —
exclamou Wakka.
Mas enquanto Sora avançava, o sujeito de casaco negro apareceu mais uma vez diante dele.
— Não deixe que as suas memórias controlem as suas ações. Não quando existem outras
possibilidades a serem encontradas... outras histórias esperando para se desdobrar. — Com isso, ele
se foi novamente.
O que ele quer dizer? Histórias diferentes de antes... Eu não devo procurar o Tidus?
Subitamente notando uma pilha de blocos mais adiante, Sora correu até ela e a destruiu com
sua Keyblade. Quando terminou, o homem de casaco negro apareceu outra vez.
— Você me encontrou. Estou impressionado.
Sora estava ficando cada vez mais em dúvida. Mas dessa vez, quando o sujeito desapareceu,
foi substituído por estranhas criaturas — Heartless.
— Hã? O que tá acontecendo?
Sora conseguiu eliminar todos os Heartless e, como por um palpite, destruiu também os
blocos do outro lado.
Assim como antes, ele voltou a aparecer — o sujeito de casaco negro.
— Ainda mais impressionante. Mas... vejamos se você realmente tem o necessário para
seguir em frente.
Mais Heartless chegaram para tomar o seu lugar e Sora deu tudo de si para derrotá-los. E
então — pela enésima vez — o sujeito de preto voltou.
— E você conseguiu de novo, Sora.
...Mas dessa vez, sua voz estava diferente.
— Espera... Riku? O que está fazendo aqui?
Frente à reação pasma de Sora, Riku riu um pouco embaixo do capuz.
— Tenho algo que preciso que você veja.
— Ah, é? — perguntou Sora, curioso.
— Uma verdade oculta que não faz parte das suas memórias — respondeu Riku. — Quero
que você a veja. E quero que você a sinta.
Uma verdade oculta que não faz parte das minhas memórias? Não faço ideia do que isso
possa ser. Mas...
— Bom, tá certo. Sei que você não pediria se não fosse importante. — Sora lhe abriu um
sorriso sincero.
— Obrigado, Sora. Feche os olhos.
Sora assim o fez, em silêncio. Uma forte luz cintilou atrás de suas pálpebras e então ele viu
uma grande lua no céu. Ele não reconhecia o lugar.
Riku estava erguendo a mão em direção à lua. Ele a fechou à sua volta — mas, claro, não
podia de fato arrancá-la do céu. Ele se virou e, atrás dele — estava Kairi.
Sora abriu os olhos de súbito.
— Era você e a Kairi. Eu estava numa jornada para encontrá-los.
Agora eu me lembro. Mas não entendo bem como.
— A escuridão tinha tomado posse do meu coração e a Kairi perdeu o dela por completo.
Mas no final da sua jornada, Sora, você nos salvou. Agora, o que eu e a Kairi tínhamos em comum?
Quando você nos viu... o que sentiu? — perguntou Riku, a voz suave.
— Hmm...
— Era a “dor” — explicou. — Ambos havíamos nos perdido e estávamos feridos. O que
você teria feito, então?
Que tipo de pergunta era aquela? Havia apenas uma resposta.
— Ajudado vocês, é claro! Teria encontrado um jeito de mandar essa dor embora.
Sora não conseguia ver embaixo do capuz de Riku, mas podia dizer que havia um pequeno e
caloroso sorriso nos lábios do amigo.
— Imaginei que diria isso. E você está certo, é o que teria feito. É o que vai fazer.
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— Hã... e qual é a dessa espiadinha do futuro? — Sora cruzou os braços, pensativo.
Riku se aproximou um passo. Sora deu uma olhada embaixo de seu capuz, curioso, mas não
conseguir discernir o olhar no rosto de Riku.
— Só queria que visse que você sempre faz as escolhas certas. No caminho adiante, mais
que uma verdade virá à luz. Você esquecerá coisas, perderá coisas importantes e nem sempre tudo
fará sentido. Pode doer tanto que você vai sentir como se estivesse a ponto de se perder. Mas você
não vai. Não você. Você é como uma esponja. Não importa quanta dor seja lançada em você, você
vai absorvê-la, jogá-la para fora e deixará tudo um pouco melhor. É só seguir o seu coração e você
vai mudar vidas. Não precisa fazer nada especial. Basta fazer o que sempre faz.
É sempre um pouco difícil entender do que o Riku fala... mas sei onde ele quer chegar. Se eu
continuar seguindo o meu coração como sempre segui e não desistir, vai dar tudo certo.
— Beleza.
— Se cuida, Sora.
Sora assentiu com firmeza e Riku desapareceu.
De repente, o mundo reluziu e ficou borrado diante de seus olhos.

Quando deu por si, Sora estava de volta naquele grande corredor completamente branco e,
dessa vez, o estranho de casaco negro — o que não era o Riku — parecia estar esperando por ele.
— E então? Se divertiu passando um tempo com os fantasmas?
— Ei, não chama eles de “fantasmas”! Tá, podia ter algo estranho lá, mas eles ainda são
meus amigos — ralhou Sora, um pouco indignado.
A figura de casaco negro pareceu decepcionada.
— Não me diga? E quais eram mesmo os nomes deles?
— Pfft, essa é fácil. Eram... O quê...? Não, não, eu os conheço! Por que não consigo me
lembrar? — Exatamente, ele não conseguia se lembrar. Não faço ideia de quem eu acabei de ver ou
do que eu fiz...
— Como eu disse, tudo nesse castelo é uma ilusão. Suas ações podem levá-lo ao final
verdadeiro ou a paradoxos e todos os desfechos ficarão com você na forma de uma carta. Mas
quando as ilusões sumirem, você esquecerá tudo a respeito da sua reunião, como se ela nunca
tivesse acontecido.
— O quê?!
Isso é terrível. Se esse cara for o motivo pelo qual eu tô me esquecendo das coisas, não vou
deixar ele se safar dessa.
— Ei, não é nada demais. O fato de você não conseguir se lembrar só quer dizer que já não
eram importantes desde o princípio.
— Isso é mentira! É claro que os meus amigos são importantes pra mim! Tá, talvez eu tenha
esquecido quem eles são... e o que aconteceu... mas eu vou lembrar. Você vai ver!
— Hmm. Se você diz. — O estranho bufou ironicamente e sacou um conjunto de cartas.
Dessa vez, eram cinco delas.
— Mais cartas?
Sora olhou para as cartas. A primeira mostrava uma cidade noturna — ele tinha a impressão
de que já a havia visto em algum lugar antes. A segunda tinha um labirinto de arbustos num jardim.
Não fazia ideia do que se tratava. Na carta número três havia uma arena onde as pessoas podiam
testar sua força — nada feito com relação àquela também. A quarta carta mostrava um palácio no
deserto. Também não lhe lembrava nada. E na quinta e última carta, um castelo se assomava
sinistramente em meio às trevas. Seu coração acelerou só de olhar para as imagens nas cartas.
— Todas elas foram criadas com base nos dados do diário. E todas lhe mostrarão mais
ilusões. De agora em diante, elas não serão suas amigas. Você acaba de sair da sua ilha, o que faz
deles totais estranhos. Mas aqui vai uma ideia legal: essas pessoas que você vai encontrar? Você
pode usar e abusar delas o quanto quiser.
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— Hã?
Não se pode fazer isso... com ninguém.
Mas o homem de preto ainda não tinha acabado:
— Por que se importar? São todos estranhos, ilusões ainda por cima. Apenas fragmentos
vazios de dados. Não sabem dizer o que é real. Vão olhar para esse castelo e ver o mundo que
chamam de lar. De toda forma, a verdade seria desperdiçada com eles. Só estarão lá até não estarem
mais. Vê onde quero chegar? Você pode partir os coraçõezinhos que eles não têm e se esquecer
disso logo em seguida. Sem sentimentos feridos, sem mágoas. Você não tem um coração. É algo
cem por cento isento de culpa.
— Não é não. — Sora imediatamente refutou a ideia.
— Oh? — indagou o homem de preto.
— Eu nunca trataria mal alguém que acabei de conhecer — respondeu Sora, com firmeza.
— Se eu os magoasse, iria me arrepender. E... mesmo que eu não me lembrasse do que fiz, o
arrependimento ainda ficaria comigo. É isso o que você quer dizer com sentimentos feridos, não é?
Por que eu iria querer carregar esse tipo de dor comigo?
O estranho pareceu abrir um sorriso embaixo do capuz.
— E com isso, você chegou à primeira pergunta — murmurou, desaparecendo novamente.
— Hã?
Eu não faço ideia do que ele está procurando. Mas...
Sora olhou para as cinco cartas que lhe restavam em mãos. Estava um pouco nervoso com a
ideia de usá-las para encontrar pessoas que não conhecia — mas também lhe parecia divertido.
Sora pegou a primeira carta — a da cidade noturna — e se aproximou da porta.

Do outro lado, em Traverse Town, Sora encontrou os mesmos trigêmeos de antes, sãos e
salvos. Mas ainda assim...
Assim que retornou, já não conseguia mais lembrar quem acabara de encontrar ou o que
fizera. Sua memória estava completamente em branco.
— Por que me sinto tão engraçado? — Sora pressionou a mão no peito em meio ao corredor.
Algo doía lá dentro. — Eu sei... que sinto falta deles.
Seu peito — seu coração — doía de solidão. Mas se estava esquecendo tudo sobre todos que
conhecia, então não devia sentir falta de ninguém. Isso queria dizer que ao menos algumas das
memórias persistiam. Ou talvez, mesmo que as memórias partissem, parte daqueles sentimentos
ainda permanecia com ele.
Dada a oportunidade certa, ele suspeitava que tudo voltaria para ele. Por algum motivo, Sora
sentia que havia obtido coragem.
— Certo, vamos nessa!
Ele ergueu a segunda carta — com o País das Maravilhas e seu jardim labiríntico estampado
nela — e a ofereceu à porta.

No País das Maravilhas, Sora também encontrou várias pessoas, respondeu várias perguntas
e a rainha chegou até a levá-lo a julgamento.
E quando ele finalmente retornou, o sujeito de casaco negro apareceu outra vez.
— E aí, como foi o tempo que passou com... Desculpa, com quem foi mesmo?
— Você sabe muito bem que eu não consigo me lembrar — disse Sora, um tanto indiferente.
Não tem problema se eu me esquecer. Sei que vai tudo voltar pra mim.

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— He, he. Você parece bem calmo — disse o homem de preto, não exatamente de forma
simpática. — Acho que decidiu que não valia a pena se estressar por eles. O que os olhos não veem,
o coração não sente, não é verdade?
— Errado. Eu me esqueci deles, como você disse, mas ainda consigo senti-los. Sinto várias
coisas. Frustração... Solidão... Você disse que não haveria sentimentos feridos. Mas eu sinto a dor
deles. — Sora podia sentir que o sujeito o estava fitando atentamente embaixo de seu capuz. —
Mas... isso é uma coisa boa, não é? Toda vez que as memórias se vão, elas deixam um buraco.
Deixam a dor. Mas essa dor é a chave para recuperar as memórias.
— ...Exatamente — disse o estranho, para ninguém em particular. E com isso, ele voltou a
desaparecer.
Então Sora ergueu a terceira carta — a que tinha a imagem da arena, o Coliseu do Olimpo.

Lá, Sora participou de diversas batalhas e encontrou alguns amigos. Todos eram bem fortes,
pensou ele. Mas ao voltar ao corredor, tudo havia se perdido. A solidão, aquela terrível solidão,
estava sendo talhada cada vez mais fundo em seu coração.
O sujeito de casaco negro o saudou novamente:
— A tristeza de saber que se esqueceu de alguém importante... ela vai lhe atormentar para
sempre. E você acredita que carregar esse tipo de dor consigo vai trazer de volta as memórias que
você perdeu? É sério isso, Sora?
— Essa é a teoria. — Sora assentiu, resoluto.
O homem de casaco deu uma risada alta.
— Qual é a graça?
— Só não consigo acreditar que você caiu nessa tão fácil assim.
— Caí nessa o quê? — perguntou Sora, ligeiramente furioso.
— Eu disse quando você chegou aqui — explicou o sujeito, a voz baixa. — Neste lugar,
encontrar é perder e perder é encontrar. Bom, você perdeu as suas memórias e encontrou a dor no
lugar. E ao decidir que essa dor era a chave para se lembrar, você desistiu de toda e qualquer
esperança de se livrar dela algum dia!
A dor... não é algo que se possa simplesmente jogar fora. É claro que não. Se Sora perdesse
a solidão que estava sentindo, então todas as memórias realmente se perderiam para sempre.
— Você não vê? A dor o controla agora, Sora. É como uma ferida que nunca vai sarar. Esse
buraco no seu coração só vai crescer cada vez mais, até que a escuridão finalmente se aposse dele!
A tristeza, a solidão e todas as outras emoções dolorosas realmente levam à escuridão?
— Então isso tudo era um truque para me arrastar para a escuridão?
— Receio que sim — respondeu o outro. — E só foi preciso um punhado de ilusões. Foi
fácil demais quebrar o seu coração.
— É, vamos ver quem vai quebrar primeiro!
Sora tinha muitas perguntas, mas o homem sumiu antes que pudesse fazê-las. Sua ansiedade
só aumentou. A dor era mesmo uma emoção negra?
De toda forma, ele precisava continuar em frente para descobrir.
Sora ergueu a quarta carta — a de Agrabah, o palácio no deserto — frente à porta.

Em Agrabah, Sora encontrou um papagaio escondido em meio a um amontoado de blocos.


Quando voltou, esqueceu tudo outra vez.
— Não é tarde demais para fugir.
— O quê?
Como sempre, o sujeito de casaco negro chegara com seus comentários enigmáticos.

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— Você ainda pode se libertar da dor. Apenas diga a si mesmo que se esqueceu deles porque
não se importa de verdade. Não terá ninguém para sentir falta. Sem motivos para a solidão. Sem dor
para corroer o seu coração.
Sora cerrou o punho e o manteve firme em frente ao peito. Essa dor no meu peito — se ela
for embora, eu não vou mais ficar triste...?
— A decisão é sua, Sora. Atenha-se às memórias que perdeu e à dor que elas trazem até que
ela o arraste à escuridão. Ou... pode simplesmente deixar tudo para lá. Ser livre. Ser feliz! Pense a
respeito. — Após terminar seu discurso, ele se foi.
— Espera! — Sora quis ir atrás dele, mas era sempre muito lento.
Ele não sabia o que fazer. Só restava uma carta. Se a usasse, encontraria mais alguém,
esqueceria essa pessoa, e então vivenciaria outra perda. Essa perda machucaria seu coração. E a dor
dessas feridas acabaria com ele, o faria sucumbir à escuridão.
Sua única salvação era deixar a dor de lado?
— ...Sora? Sora! Consegue me ouvir? — Sora estava quase se lançando em um beco sem
saída mental de preocupações quando ouviu a voz de Mickey.
— M-Mickey...? É você? Onde você tá?
— Desculpa, ainda estou tentando chegar à sua posição. Só o que consigo por ora é enviar a
minha voz.
Sora decidiu descarregar todos os seus sentimentos nele:
— Tudo bem. Mas... Mickey? Estou com um problema aqui. Eu fico me esquecendo de todo
mundo nesse lugar. E tem um cara de preto... ele disse que se eu me apegar ao que perdi, a dor vai
acabar me consumindo.
— Hmm... entendo. Mas e então, você vai deixar essas pessoas que esqueceu de lado?
Quando Mickey lhe perguntou isso, duas pessoas surgiram vagamente diante de Sora. Mas
elas não estavam em suas memórias. Não conseguia se lembrar delas.
— Você pode não se lembrar delas, mas elas pensam em você como um amigo.
Ele ouviu uma voz bastante distinta sobre a de Mickey:
— Wak! Nós passamos por um montão de aventuras juntos!
A voz que veio em seguida era descontraída e reconfortante:
— Iac! E mesmo que você não saiba quem nós somos, Sora, você sempre será superespecial
pra gente!
Quando ouviu essas duas vozes, um súbito calor se espalhou pelo peito de Sora.
— Mas... espera, como isso funciona?
— Pergunte ao seu coração. O que está sentindo agora?
— Eu sinto... bom, eu não lembro quem eles são. Não acho que a gente tenha se conhecido.
Mas sinto... que o nosso lugar é juntos.
Eles pareciam tão, tão familiares. Sora podia sentir a coragem e força crescendo dentro de si.
— As memórias podem desaparecer, mas os sentimentos não... nem mesmo quando os seus
dados foram resetados. Em algum lugar dentro do seu coração, as aventuras que você compartilhou
com eles no digespaço continuam vivas. E sabe o que mais? O mesmo vale para todas as pessoas que
essas cartas te mostraram.
Sora pensou a respeito. A dor no meu coração é como esse calor que eu senti...? Enquanto
ponderava sobre isso, os dois desapareceram.
— Uh-oh! Parece que usei um pouco de energia demais. Eu logo vou chegar aí, Sora, eu
prometo. Aguenta firme!
— Mickey?! — exclamou Sora, mas não houve resposta. Estava sozinho de novo... e agora
se sentia extremamente solitário. Essa sensação era outro tipo de dor? Essa dor o arrastaria para a
escuridão...?
Ainda lhe restava uma carta em mãos. Aquele castelo enorme e sinistro — Hollow Bastion.
Não havia mais aonde ir senão para frente.

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Em Hollow Bastion, ele enfrentou dois inimigos, venceu e, no instante em que voltou, tudo
se foi. O homem de preto recebeu Sora como se só o estivesse esperando.
— Você usou a última das cartas. Eu perguntaria se gostou da viagem, mas ambos sabemos
que se esqueceu dela. Aposto que se sente bem vazio.
— Nada disso. Posso não lembrar quem eu encontrei, mas me lembro de tê-los encontrado.
E saber que eu os esqueci... me dá saudade. — Sora levou a mão ao peito. Ele abaixou o olhar de
leve. Por que não consigo me lembrar?
— E isso dói. Bom, espero que não tenha se esquecido do meu aviso. Essa dor vai arrastá-lo
para a escuridão. Você precisa se livrar dela.
— ...Não preciso. A dor é o que me lembra do que eu esqueci. É a prova de que tem algo lá,
algo... importante. Eu não vou fugir. Ela continuará no meu coração até o dia que eu me lembrar.
Eu não posso me livrar da dor. É o que me deixa lembrar, no fundo do meu coração.
— Você se perderá na escuridão muito antes disso.
— Mas se eu deixar a dor de lado, vou perder meus laços com quem é importante pra mim.
Não. Eu já me decidi: posso até acabar caindo nas trevas, mas vou levar essa dor comigo. Só vou
me livrar dela no dia que eu me lembrar. Mas até lá, é ela que mantém tudo o que me resta em seu
lugar... e eu a aceito.
Os ombros do estranho iam subindo e descendo de fúria.
— Você... a aceita? — vociferou ele. — Ha! Não me faça rir! Está na hora de você aprender
o que é dor de verdade!
O mundo foi engolido por uma luz branca...

Sora se encontrou em um mundo novo e desconhecido. Não havia nada lá além de um chão
branco e gelado, pairando em meio às trevas. Um arrepio lhe subiu a espinha.
O homem de casaco negro estava parado diante dele com uma Keyblade em cada mão.
Numa fração de segundo, ele fechou a distância entre os dois e atacou Sora com ambas as armas.
Ele acertou um golpe em cheio que jogou Sora longe. Por um instante, Sora sentiu dor —
mas não apenas dor física. Ela também afetava o seu coração. O que era aquilo...?
Em meio a um grito, o sujeito criou colunas de luz à sua volta e atingiu Sora outra vez.
Talvez... a dor que eu senti fosse a mágoa no coração de alguém? Eu a senti com ainda
mais clareza que a dor do meu corpo. É difícil de aguentar, mas... algo nela é também quase
confortavelmente familiar.
É uma dor especial, nascida da mesma coisa que as minhas memórias perdidas.
Eu quero fugir dela. Mas eu não vou.
Sora segurou sua Keyblade com força.
— Aaah! — Juntando sua força, Sora pôs todas as suas emoções no próximo ataque.
Ele desferiu uma série de golpes que jogaram seu oponente para trás e então disparou uma
enxurrada de magias contra ele.
Mas o homem de casaco negro se ergueu novamente e, flutuando em meio ao ar, invocou
uma incessante torrente de luz branca. Sora se esquivou de cada uma das esferas luminosas até
conseguir se aproximar novamente e então o atacou com sua Keyblade.
— Ngh! — Enfim, o homem de preto caiu de joelhos. — Vamos, Sora... ande logo! Acabe
comigo — disse ele, ofegante.
Sora destruiu as Keyblades do sujeito e então lhe estendeu uma mão.
— O que você...? — Ele rejeitou a ajuda de Sora e se levantou sozinho. — Ah! Hmph. Acho
que você viu através da minha última ilusão: eu sou como todos os outros que você encontrou nesse

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lugar, feito de dados. Não valho nem o esforço, não é isso? Não tem porque destruir algo que nunca
nem existiu. He, he.
Mas em meio a um sorriso, Sora deu de ombros desajeitadamente.
— Pra uma ilusão, você dá um baita de um soco! — E a dor desses ataques me mostrou
uma coisa... — Você não tava brincando quando disse que ia me mostrar o que é dor.
O homem não tinha nada a dizer em resposta ao sorriso de Sora. Talvez aquilo não devesse
ter sido surpresa. Sora continuou falando, mais sério dessa vez:
— Mas a dor que eu senti era ainda maior... Claro, eu posso ter me machucado na nossa luta,
mas eu senti uma dor diferente em você.
Sora se lembrou do que sentira no meio da batalha. Era um tipo diferente de dor. Não sabia o
que fazia dela especial, mas sabia que era. Essa dor os havia conectado.
— Era como uma... agonia, forte e intensa. Mas também era um pouco familiar... quase
como se fosse minha. Senti como se estivéssemos conectados... e compartilhássemos da mesma dor.
Se isso de alguma forma me aproxima das pessoas assim, então carregar uma dorzinha não pode ser
tão ruim. — Sora sorriu para ele de novo.
— “Não pode ser tão ruim”? Tá bem, eu desisto. Aqui. — Em meio a um sorriso, o homem
de casaco negro atirou uma carta para Sora. Nela, havia um edifício de formato estranho que Sora
nunca havia visto antes. — Você passou, Sora. Parabéns, você compreende a dor. Agora, use isso
para encontrar a verdade.
— Como assim, “passei”? — Sora inclinou a cabeça, olhando para a carta.
— Meu papel era ver se você estava pronto para tomar posse da dor dentro de si. E agora
que cumpri esse papel, só o que me resta fazer... é ir embora.
— Você vai voltar pra casa? — Sora não sabia o que ele queria dizer com “ir embora”.
Ainda que fosse apenas uma ilusão, ir embora soava como algo... horrível.
— Não sei se eu tenho uma casa, mas... tem um lugar para onde eu quero ir. — Pela
primeira vez, a voz do sujeito se suavizou.
— Onde? — perguntou Sora.
Em vez de responder, o homem de casaco negro se aproximou — e se mesclou ele.
— Hã?
Sora ficou em choque quando o homem desapareceu em meio a ele. Mas naquele instante,
quando eles se tornaram um, Sora sentiu uma onda de nostalgia. Na verdade, aquelas mais pareciam
as memórias dele — as lembranças do estranho de preto.
Sora viu um lugar que ele queria chamar de lar — um lugar que certa vez ele chamara de
lar. O lar que ele perdera. Uma cidade em meio ao crepúsculo. Suas primeiras e últimas...

...férias de verão.

Ele ouviu a voz do jovem que vestia o casaco negro. No fundo de sua mente, pôde ver o
garoto sorrindo — Roxas.
— Pode ficar tranquilo... A sua dor pode ser minha agora — sussurrou Sora, olhando então
para a última carta. Hora de ir em frente.
— Sora! — alguém lhe chamou.
Sora ergueu o olhar e, correndo em sua direção estava...
— Mickey!
— Finalmente te alcancei! Desculpa a demora. Não quis te deixar fazer todo o trabalho.
— Nem se preocupa com isso. Aqui, dá uma olhada! — Sora mostrou a última carta para
Mickey. — Parece que esse é a carta que leva à verdade.
— Hmm... Então talvez a gente finalmente consiga descobrir de onde veio aquela mensagem
misteriosa.
— Vamos descobrir... juntos!
Sora ergueu a carta diante da porta e a luz liberada por ela encobriu tanto ele quanto Mickey.

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Parada diante deles estava uma garota de cabelos dourados. Atrás dela havia uma grande
cápsula em forma de flor.
— Quem é você?
Sora estava confuso — ela era tão familiar. Foi como quando conheceu Mickey. Não tinha
como eles já terem se conhecido, mas, por algum motivo, sentia que tinha boas memórias dela.
— É um prazer conhecê-lo. Meu nome é Naminé. Você não me conhece, mas eu o conheço.
— Hm... não sei se eu tô entendendo — respondeu Sora, perplexo.
— Eu explico — disse Mickey. — A dado momento, você perdeu todas as suas memórias,
Sora. A Naminé aqui foi a pessoa que te salvou.
— Uau, então eu te devo pra caramba! — disse Sora, sorridente.
Naminé sacudiu a cabeça de uma forma ligeiramente melancólica.
— Não, não deve. É verdade que eu reuni as suas memórias dispersas, mas também fui eu
que as desencadeei. Não só isso, os bugs que apareceram no diário do Grilo... eles também são
culpa minha. — Ela abaixou o olhar.
— O que quer dizer?
Em vez de responder à pergunta de Mickey, Naminé estendeu sua mão direita em meio ao ar
e uma esfera brilhante se ergueu dela.
— Tudo começou com essas memórias, memórias que estavam adormecidas no fundo do
coração do Sora.
— São memórias minhas? — perguntou Sora, olhando para o fragmento de memória que
Naminé havia projetado. Mesmo depois que ela abaixou a mão, o fragmento cintilante continuou
pairando no ar. Era brilhante, quase demais. Tão brilhante que parecia até machucar ao toque.
— Não. Não suas. Elas pertencem a pessoas conectadas a você.
— O quê? Não é estranho ter memórias de outra pessoa dentro de mim?
Eu não devia ter memórias apenas de coisas que eu mesmo vivenciei?
— Certo, isso normalmente não é possível. Na primeira vez que as encontrei, quando estava
reparando a sua memória, achei que havia cometido um erro. Mas todas as evidências que encontrei
provavam que elas pertenciam ao seu coração, onde estiveram adormecidas por muito... muito
tempo. Um dia, o Sora terá que trazê-las de volta à superfície. São memórias importantes... mas
muito perigosas.
Sora não conseguia entender o que Naminé estava dizendo.
— Perigosas como? — indagou Mickey enquanto Sora tentava fazer algum sentido daquilo.
— Essas memórias são muito dolorosas. Se manejadas da forma errada, podem danificar o
coração do Sora... talvez até quebrá-lo. Eu precisava que você encontrasse uma forma de enfrentar
esse tipo de dor. Foi por isso que deixei a mensagem.

Sua dor será apaziguada quando você voltar para findá-la.

Aquela era a mensagem no diário.


— Foi você?
Dessa vez, Naminé assentiu para Mickey.
— Quando mexi nas memórias do Sora e dos outros, lembra que isso também apagou as
palavras do diário do Grilo? Bom, isso só mostra quão profundamente o diário e o Sora estão
conectados. Quando eu desmontei as memórias do Sora, elas permaneceram em seu coração e
também no diário, mesmo depois do texto ter sido apagado. Foi por isso que vocês conseguiram
renderizá-las em forma de dados.
Enquanto observava Mickey escutando à história de Naminé com certa preocupação, Sora
ainda não fazia a menor ideia do que ela estava falando.
— Mas os dados estavam uma confusão por causa de todos aqueles bugs. O Grilo nunca
escreveu sobre nada disso — disse Mickey.
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— Não... isso também fui eu. Quando pus essas memórias no diário, eu pus “dor”. Achei
que se vocês combatessem os bugs que brotaram dessas memórias, poderiam aprender a enfrentar a
dor das memórias em si. — Naminé abaixou o olhar novamente. Aquilo parecia difícil para ela.
— Puxa, parece que você passou por um bocado de confusão.
— Sinto muito. — Naminé abaixou a cabeça. — Queria poder ter dito tudo isso em pessoa.
Mas a verdadeira eu agora se foi.
A “verdadeira eu”...? Então onde está a verdadeira Naminé?
E se esse é um mundo dentro de um punhado de dados, então... hã?
Então onde... quem é o verdadeiro eu? Eu sou esse cara, o Sora, e o Sora sou eu. Mas aí
tem esse mundo que é feito de memórias, o que significa que...?
Sora deu um longo suspiro e então sorriu.
— Hm... pessoal? Eu não tô entendendo absolutamente nada disso... Eu sou burro?
Naminé riu.
— É claro que não. Afinal, você conseguiu. Você aprendeu como enfrentar a dor.
— Aprendi? — Sora inclinou a cabeça. Embora fosse verdade que ele não decidira se
desfazer da dor durante sua luta contra o garoto de casaco negro, ele ainda não sabia como enfrentá-
la. Tudo o que tinha feito fora decidir ficar com ela.
— Algumas pessoas acham que a dor é algo que se possa simplesmente extinguir... e às
vezes talvez você possa. Mas nem toda dor pode ser apagada. A única forma de lidar com ela é
aceitá-la de cabeça erguida.
Talvez sejam a mesma coisa — aceitá-la de cabeça erguida e escolher não se desfazer dela.
Naminé prosseguiu:
— E se a dor for grande demais para aguentar sozinho... bom, então você pode recorrer a um
amigo que seja próximo ao seu coração.
— Porque a dor nos tornará mais próximos e nos fará mais fortes — disse Sora, a voz baixa,
assimilando o que ela estava dizendo. Ele ergueu o olhar para a luz que pairava diante de si.
— Beleza, vamos tentar! — declarou ele. Naminé lançou um olhar confuso para Sora. —
Com as memórias que você encontrou. Estou pronto para aceitá-las, não importa quão dolorosas
elas sejam.
— Sora...
Naminé assentiu de leve. Antes que Sora pudesse erguer a mão, Mickey correu até ele.
— Espera! Vou me juntar a vocês.
— Beleza! — Sora se virou para Mickey e assentiu. Talvez ele não conseguisse aguentá-las
sozinho, mas se fossem eles dois, ficaria tudo bem.
— Obrigada. — Naminé também ergueu o olhar para o fragmento de memória. — Toquem
nisso e as memórias seladas lá dentro fluirão para dentro dos seus corações.
Sora e Mickey juntaram as mãos e então as levaram em direção à luz. O brilho das memórias
era quase forte demais e uma grande dor os tomou no momento em que a tocaram. Doía demais, era
difícil de respirar. Seus peitos foram ficando cada vez mais apertados.
— Fica firme, Sora!
Frente ao encorajamento de Mickey, Sora fechou os olhos com força e trincou os dentes.
Finalmente, uma imagem turva de duas pessoas começou a aparecer em meio à luz atrás de suas
pálpebras. Estavam de costas viradas para ele.
— Quem...?
Ambos estavam vestindo casacos negros. Um era um sujeito muito parecido com o que Sora
havia enfrentado mais cedo. O outro era um homem ruivo que ele não conhecia.
Roxas e Axel.
— Ah! — exclamou Mickey, atônito.
— Essas são verdades ocultas que o Sora vinha mantendo trancadas bem no fundo de si
mesmo. Lembrem-se, essas memórias não são dele — disse Naminé, a voz baixa.
A dupla desapareceu, substituída por outra. Uma das pessoas agora era Naminé, a outra, uma
garota de cabelos negros que vestia um casaco como o dos dois primeiros. Ela era bastante parecida
com Naminé.
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Certo — seu nome era Xion.
Sora não achava que conhecia aqueles quatro, mas sentiu uma saudade dolorosamente
melancólica e um pesar que ameaçava esmagar seu coração. Isso é dor...?
— Essas pessoas estão esperando pelo Sora... o único que pode findar sua dor. DiZ me disse
que ele fez alguma coisa dentro de você durante o ano que passou adormecido. Perguntei o quê,
mas só o que ele disse foi que estava “limpando sua consciência”. O Sora deve ser a chave para
salvar as pessoas que vocês viram...
A outra Naminé e a garota de cabelos negros desapareceram da luz branca e dessa vez outros
três estranhos surgiram: um jovem rapaz, uma mulher e o terceiro... era um garoto muito parecido
com o primeiro rapaz que havia aparecido.
Terra, Aqua — e Ven.
— ...e essas outras também.
— Não pode ser! — Mickey exclamou novamente.
— Talvez você saiba o quanto eles estão sofrendo.
Sora abriu os olhos e viu que Naminé o estava fitando com um olhar tranquilo.
— Esses três também eram chaves. Conectados à verdade por trás da Keyblade. E ainda
estão conectados, Sora, em algum lugar bem fundo dentro de você.
— Engraçado. Eu sinto como... se os conhecesse — sussurrou Sora. Mas ele simplesmente
não se lembrava.
— Sim, dois deles você conheceu. Quanto ao terceiro... eu nunca notei, mas... você e ele
compartilham uma conexão muito especial.
Eu não entendo, mas ainda consigo sentir a conexão.
— Naminé. Você disse que o Sora precisa trazer essas memórias de volta à superfície. Está
na hora? — perguntou Mickey. Era possível que ele também soubesse algo sobre aquele trio.
— Não sei dizer ao certo. Mas sei que chegará um dia em que eles precisarão se erguer de
seu sono. E então, o único que poderá salvá-los... será o Sora. — Naminé sorriu para ele.
— O laço que eles todos compartilham... essa será a chave, certo? — Mickey soltou a mão
de Sora e ergueu o olhar para Naminé. — Não se preocupe, Naminé. Vou me certificar de repassar
isso para o Sora... você sabe, o do mundo exterior!
— Aham, por favor.
Mickey assentiu profundamente para Naminé.
— Bem...
— Só um segundo. — Sora interrompeu a despedida de Naminé.
Ela inclinou a cabeça para o lado.
— Hm?
— A nossa promessa... A sua promessa para o eu que eu não conheço. Você a cumpriu, né?
— perguntou ele.
Seu olhar se tornou distante.
— Eu posso ter partido, mas as minhas promessas para ele são eternas. E de toda forma... eu
devo isso a ele. Por todas... todas essas pessoas que eu machuquei.
Ela sacudiu a cabeça, entristecida.
— Então o que vai acontecer com você? Essa que está bem aqui?
— Eu sou apenas dados feitos para repassar uma mensagem. Eu não devia... sequer existir
nesse diário. E agora, esse meu registro vai desaparecer. Mas quando vocês passarem a minha
mensagem para o outro Sora, apenas lembrem-se de dizer a ele todas as coisas que vocês viram... e
tudo o que sentiram. Se fizerem isso, então vamos ficar em paz... ela, e eu também.
O outro Sora, a outra Naminé que havia partido — e todas as outras pessoas que faziam dele
quem ele era.
— Junto a todos que estão conectados ao Sora... Naminé, pode deixar.
Agora, Sora sabia a verdade.
— Certo. — Naminé sorriu para ele.
— Ah, é! Já ia quase me esquecendo. Eu também tenho uma mensagem pra você. — Sora
olhou para Naminé.
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De alguma forma, ele sabia que precisava dizer isso a ela, não importava como.
— Obrigado.
Ela ficou assustada a princípio, mas sua expressão logo se transformou num sorriso. E então,
ainda sorrindo, Naminé desapareceu em silêncio.

E assim terminou nossa jornada para conectar “essas” memórias “àquelas”.


Eu quis contar imediatamente... sobre as memórias do passado que dormem dentro
de você — e sobre os fragmentos que irão ligá-lo ao seu futuro.

Sora, Riku, Kairi...


A verdade por trás da Keyblade passou por tantas pessoas e agora eu sei que ela
repousa em seus corações.

Sora...
Você é quem é por causa dessas pessoas, mas elas estão sofrendo e você é o único
que pode acabar com a tristeza delas. Elas precisam de você.

É possível que todas as jornadas até agora só os estivessem preparando para essa
nova grande tarefa que está à espera. Eu devia saber que não haviam coincidências —
apenas elos numa cadeia de eventos muito maior.

E agora, a porta para a sua próxima jornada está pronta para ser aberta.

Reconectado a — KINGDOM HEARTS

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— Yen Sid, acho que finalmente estamos perto de descobrir onde está o coração do Ven —
disse o rei.
— É mesmo? — respondeu o feiticeiro. — Então só nos falta o Terra.
— Certo. E temos que salvar todos os três — declarou Mickey.
— Hmm... A pergunta é: o que Xehanort pretende fazer a seguir?
— Xehanort? — Mickey estava surpreso. Aquele nome já era algo do passado, não era? —
Mas suas duas metades se foram. Tinha o Ansem, que comandava os Heartless, e o Xemnas, que
comandava os Nobodies. O Sora não derrotou os dois?
Aquela batalha havia acabado, ou pelo menos era o que ele pensava. Mas Yen Sid fechou os
olhos de coruja e se levantou, parado junto à janela.
— Correto. Esses dois encontraram o seu fim. Entretanto, é justo aí onde mora o nosso
problema. Sua destruição agora garante a reconstituição do Xehanort original.
— Hã? — Mickey engoliu em seco.
— O coração de Xehanort, antes preso em sua forma de Heartless, está agora livre. E seu
corpo, que havia se tornado seu Nobody, foi eliminado. Ambas as metades agora se reunirão para
formar um todo. Resumindo... isso significa que Mestre Xehanort retornará.
Mestre Xehanort — o homem que certa vez tentara mergulhar o mundo na escuridão.
— E o senhor acha... o senhor acha que ele vai tentar alguma coisa?
— Um homem como Xehanort terá deixado muitas portas abertas.
— Bom, não importa o que ele trame. Eu e o Sora estaremos prontos. E o Riku também! —
anunciou o rei, confiante.
Entretanto, o feiticeiro se voltou novamente para Mickey, sacudindo a cabeça devagar.
— Sim, eles certamente são fortes. Mas... não são verdadeiros Mestres da Keyblade como
você. Diga-me... seria um único de você o bastante se o que enfrentasse não fosse um único dele?
— O quê? O que quer dizer?
Yen Sid abriu os olhos, mas não respondeu à pergunta:
— Mickey, por favor, pode chamar Sora aqui? Riku também.
— É claro, mas... por quê?
— Para que nos mostrem a Marca da Maestria.

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