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Mateináticos
Uma Perspectiva Pessoal
Terence Tao
■!SBM
COLEÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA
E scrito por um destacado matemático, esse estimulante e
claramente apresentado texto conduz o leitor através de várias
táticas para a resolução de Problemas Matemáticos, em nível de
Olimpíadas. Cobrindo teoria de números, álgebra, análise,
geometria euclidiana e geometria analítica, éomo Resàlver
Problemas Matemáticos inclui ao longo de seu corpo numerosos
exercícios e modelos de solução. Tendo como pré-requisito apenas
conhecimentos de matemática básica do ensino médio, o texto é
ideal para um amplo público e para estudantes com idade a partir
dos 14 anos, interessados em matemática pura.
Tao, Terence
Tl 71c Como resolver problemas matemáticos - Uma perspectivà
pessoal/ Terence Tao; tradução de Paulo Ventura. - Rio de
Janeiro: SBM, 2013.
168 p. (Coleção do Professor de Matemática; 31)
ISBN 978-85-85818-94-4
1. Estratégias de resolução de problemas. 2. Teoria
qos números - ejtE:mplos. 3. Análise - exemplos. 4.
Algebra - análise. I. Verrtura, Paulo, trad. II. Título.
Com.o Hesolver Problem.as
Matem.áticos
Uma Perspectiva Pessoal
Terence Tao
1' edição
2013
;ltio de Janeiro
■!SBM
COLEÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁT'ICA
■!SBM
SOCEDADE BRASLEIRA DE MATEMÁTEA
Prefácio Vll
4 Geometria euclidiana 67
V
Vl SUMÁRIO
5 Geometria analítica 95
Referências 139
vii
viii Prefácio
A ~ B
··-·-··· .
1 N. do T. Denotamos por AB o segmento de reta de extremidades A e B, e por
IAHI o c:0111pri11w11to desse) scgirwnto.
XVI Prefácio da primeira edição
Este livro foi escrito há quinze anos; para mim, literalmente, me-
tade da vida. Nos anos entretanto decorridos saí de casa, mudei de
país, fiz estudos de pós-graduação, ensinei, escrevi artigos de pesquisa,
fui orientador de alunos de doutorado, casei com minha mulher, tive-
mos um filho. É claro que minha perspectiva da vida e da matemática
é hoje diferente do que era há quinze anos. Há muito tempo que não
estou envolvido em competições de problemas matemáticos, e se fosse
escrever agora um livro sobre o assunto ele seria muito diferente deste
que o leitor tem em mãos.
A matemática é um assunto multifacetado, e o modo como a expe-
rimentamos e apreciamos vai mudando com o tempo e a experiência.
Como aluno da escola primária, a matemática me atraiu pela beleza
abstrata da manipulação formal, e por sua habilidade notável em usar
repetidamente regras simples para obter respostas não triviais. Como
aluno de liceu e participante de competições matemáticas, a matemá-
tica me dava o prazer de um esporte, em que eram propostos problemas
ou puzzles habilmente formulados (como os deste livro) ·e o objetivo
Pra encontrar o truque certo que revelasse a solução. Como aluno uni-
xvm Prefácio da segunda edição
Departamento de Matemática
Universidade da Califónia, Los Angeles
Dezemb.ro de 2005
Terence Tao
XX Prefácio da segunda edição
CAPÍTULO 1
• questões do tipo mostre que ... ou calcule ... , em que se deve pro-
var que uma certa afirmação é verdadeira, ou manipular uma
expressão para obter um certo resultado;
• questão do tipo existe ou não ... , em que se tem que provar uma
afirmação ou fornecer um contraexemplo (e portanto cai num
dos dois tipos anteriores).
o objeto a encontrar deve obedecer, de modo que eles sejam mais fá-
ceis de satisfazer. Os problemas do tipo existe ou não ... são em regra
os mais difíceis, pois primeiro temos que decidir se um certo objeto
existe ou não, e depois fornecer uma prova ou um contra-exemplo.
É claro que nem todos os problemas encaixam de modo claro numa
destas categorias, mas ainda assim o formato geral de uma pergunta
indica a estratégia básica a seguir. Se o problema a resolver for, por
exemplo, o de encontrar nesta cidade um hotel onde pernoitar, po-
demos primeiro modificar os requisitos, procurando antes um hotel a
menos de 5 quilômetros com um quarto vago por não mais que 50
euros por noite, e em seguida usar eliminação simples. Esta estratégia
é melhor do que provar que um tal hotel existe ou não existe, e é pro-
vavelmente também melhor do que escolher ao acaso um hotel mais a
mão e tentar demonstrar que é possível dormir nele.
O Problema 1.1 é do tipo calcule.... Há que exprimir certas in-
cógnitas à custa das variáveis dadas. Isto sugere que se tente urna
abordagem algébrica em vez de geométrica, com muitas équações re-
lacionando d, t e as incógnitas - incógnitas essas que são os lados
e ângulos do triângulo, e em relação às quais queremos resolver as
equaçoes.
Entender os dados. Quais são os dados do problema? Usualmente,
a questão é acerca de uns tantos objetos com certas propriedades espe-
cíficas. Para entendermos os dados do problema, precisamos de saber
como interagem esses objetos com tais propriedades. Isto é impor-
tante para focarmos a atenção nas técnicas e notaçôes apropriadas ao
problema. Em nossa questão modelo, por exemplo, ·os dados são um
triângulo, sua área, e o· fato de seus lados formarem uma progressão
aritmética de razão d. Dado que temos um triângulo, e consideramos
sua área e seus lados, vamos precisar, para lidar com o problema, de
teoremas que relacionem lados, ângulos e áreas; por exemplo, as leis
dos senos e dos cossenos e a fórmula da área.
Entender o objetivo. · O que é que queremos? Podemos precisar
4 Estratégias de resolução de problemas
(c) o ato físico de escrever aquilo que sabemos pode detonar novas
ideias e conexões.
b-d b
área t
ª·
b+d
16
2d2 + 4d4 + -3 t2 .
Como verificação, podemos ver que, quando d = O, isto está de
acordo com nosso cálculo anterior de b = 2 t 112 /3 114 . Uma vez calcu-
lados os lados b - d, b, b + d, os valores dos ângulos a, /3, 'Y seguem
pelas leis dos senos e dos cossenos, e está feito!
12 Estratégias de resolução de problemas
CAPÍTULO 2
A teoria dos números poderá não ser divina, mas há a sua volta
uma aura de misticismo. Ao contrário da álgebra, cuja espinha dor-
sal são as regras de manipulação das equações, a teoria dos números
parece tirar seus resultados de uma fonte desconhecida. Veja, por
exemplo, o teorema de Lagrange (conjecturado primeiro por Fermat)
de que qualquer inteiro positivo é a soma de quatro quadrados perfei-
tos (por exemplo, 30 = 42 + 32 + 22 + 12 ). Em termos algébricos, esta é·
uma equação extremamente simples; mas, como nos restringimos aos
inteiros, as regras da álgebra fracassam. O ar inocente do resultado
ó irritante, e alguma experimentação mostra que ele parece funcio-.
nar, mas não sabemos porquê. De fato, o teorema de Lagrange não
14 Exemplos da teoria dos números
2 .1 Algarismos
Mencionamos em cima que é possível aprender algo sobre um dado
número (em particular, se é divisível por 9) somando seus algarismos.
Na matemática mais avançada, sabe-se que esta operação não é afinal
particularmente importante (tem sido muito mais eficaz estudar os
números diretamente em vez de se usar sua expansão decimal), mas é
muito popular na matemática recreativa e há mesmo quem lhe tenha
atribuído conotações místicas! O que é certo é que a soma dos algaris-
mos surge frequentemente em problemas de competições matemáticas,
como este a seguir.
Problema 2.1 (Taylor, 1989, p. 7). Mostre 9-ue, entre quaisquer 18
números consecutivos com três algarismos, há pelo menos um que é
divisível pela soma de seus. algarismos.
Trata-se este de um problema finito: há 900 números com três
algarismos, e portanto em teoria poderíamos resolver o problema ma-
nualmente. Mas vejamos se podemos poupar algum trabalho. Em
primeiro lugar, o objetivo parece um pouco estranho: queremos que
um número seja divisível pela soma dos algarismos. Comecemos por
traduzir esse objetivo numa fórmula matemática, de modo a poder-
mos manipulá-lo mais facilmente. Um número de três algarismos pode
ser escrito na forma abc 10 , onde a, b, e são os algarismos; escrevemos
abc 10 para evitar confusão com abc; assim, abc 10 = 100 a+ 10 b + e,
mas abc = a x b x e. Empregando a notação usual alb para significar
que a divide b, o que queremos é obter a relação
equação? É possível que sim, mas não há como simplificá-la para algo
minimamente decente (ou seja, uma equação que relacione a, b e e de
modo útil e direto). Na verdade~ (1) é horrível de manipular, mesmo
depois de substituirmos abc 10 por 100 a + 10 b + e. Olhemos para as
soluções abc 10 de (1):
100, 102, 108, 110, 111, 112, 114, 117, 120, 126, ... , 990, 999.
Elas parecem ser aleatórias, mas suficientemente frequentes para
que cada sucessão de 18 números consecutivos contenha alguma delas.
E, seja como for, que significado tem 18? Supondo que não seja uma
pista falsa (talvez 13 números consecutivos já cheguem, e o 18 seja
só para despistar), por que darem-nos 18? Pode ocorrer a alguns de
nós que a soma dos algarismos de um número está relacionada com
o número 9 (por exemplo, cada número dá o mesmo resto quando
dividido por 9 que sua soma de algarismos) e que 9 está relacionado
com 18, e por isso pode haver aqui alguma vaga conexão. Ainda assim,
números consecutivos e divisibilidade não combinam bem. Para que
tenhamos uma esperança de resolver a questão, parece· que· temos que
reformulá-la ou substituí-la por outra relacionada.
Agora que estamos em alerta para tudo o que tenha a ver com o
número 9, devemos notar que a maioria dos números que realmente
verificam (1) são múltiplos de 9, ou pelo menos múltiplos de 3. De fato,
na lista acima há apenas três exceções (100, 110 e 112), e praticamente
todos os múltiplos de 9 satisfazem (1). 'Assim, em vez de tentarmos
provar diretamente que
Em quaisquer 18 números consecutivos, há no mínimo uma solução
de (1);
podíamos tentar algo como
Em quaisquer 18 números consecutivos, há um múltiplo de 9 que
ó solução de (1).
Esta via parece quebrar a barreira entre nossos dados (18 núme-
roH consecutivos) e nosso objetivo (uma solução de (1)), pois em 18
11úmcroH consecutivos há sempre algum múltiplo de 9 (de fato há até
18 Exemplos da teoria dos números
Isto leva a crer que o que aqui faz falta é uma estratégia ardilosa.
A primeira habilidade é tentarmos adivinhar a resposta. As provas
circunstanciais (o fato .de o problema ter aparecido numa competição·
matemática) sugerem que esta não é uma questão para resolver por
tentativas, e portanto a resposta provável deverá ser não. (Por outro
lado, quem sabe se não será possível, por alguma construção parti-
cularmente engenhosa, obter uma hábil reordenação dos algarismos?
2 .1 Algarismos 21
Mas uma tal construção não deve ser fácil de encontrar. É melhor ten-
tarmos primeiro as vias mais simples. Se acertarmos, teremos poupado
muito tempo ao não enveredarmos por vias difíceis. Se não acertar-
mos, estaríamos em qualquer caso condenados a um caminho penoso.
Isso não significa que devamos descartar uma via promissora por ser
difícil, mas apenas que devemos lançar um olhar comedido à nossa
volta antes de mergulharmos em águas profundas.)
Tal como no Problema 2.1, os algarismos são de algum modo uma
pista falsa. No Problema 2.1, só precisávamos saber duas coisas sobre
a soma dos algarismos: a primeira era um critério de divisibilidade,
a segunda uma majoração de seus possíveis valores. Com isso, evita-
mos as complicações de uma equação exata. Provavelmente ocorrerá
aqui coisa muito semelhante: temos que simplificar o problema ge-
neralizando o processo de permutação dos algarismos. De um ponto
de vista estritamente lógico, ficamos em situação mais difícil porque
temos que provar mais; mas ganhamos terreno em termos de clareza
e simplicidade. (Para que nos sobrecarregarmos com· dados que não
podemos usar e servem apenas para nos confundir?)
Temos portanto que selecionar as propriedades mais relevantes das
potências de 2 e das permutações de algarismos - com sorte, algumas
propriedades de umas serão incompatíveis com as das outras. Trate-
mos primeiro das potências de 2, mais fáceis de analisar. Ei-las:
1, 2,4, 8, 16, 32, 64,128,256,512, 1024, 2048,4096, 8192, 16384,
32 768, 65 536, ...
Bom, não há muito que aqui possamos dizer sobre os algarismos. O
último algarismo de qualquer potência de 2 (com exceção do número
1) é obviamente par, rrias os restantes algarismos parecem bastante
aleatórios. Tomemos o número 4096, por exemplo: um algarismo·
ímpar, os outros pares, e um deles até é O. O que nos impede de
o reordenar em outra potência de 2? Poderíamos transformá-lo, por
exemplo, em 24256 = 1523 ... 936? Claro que não, responderíamos. E
por quê? Porque esse número é grande demais. Então o tamanho
22 Exemplos da teoria dos números
j, ('O> i;l:>
::l
~
......
'O
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o §i ~
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o
C/) •
2k I; algarismos 2k E algarismos 2k I: algarismos 1:-.j i;l:>
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2.1 Algari8mos 25
exemplo,
-
o►
~
q
u.i"
s
oUl
~
-.J
28 Exemplos da teoria dos números
Este problema foi simplificado por etapas, até que suas compo-
nentes menos manuseáveis ou menos amigáveis foram substituídas por
outras mais naturais, flexíveis .e cooperantes. Esta simplificação pode
ser um caso de tentativa e erro: há sempre o perigo de simplificarmos
demais, ou (atraídos por uma pista falsa) de simplificarmos no sen-
tido errado. Mas, numa pergunta como esta, quase tudo era melhor
do que tentarmos trab_alhar com permutações de algarismos, e por
isso a simplificação não poderia fazer grande estrago. É possível que
simplificaç9es e outras manobras nos lancem numa busca fútil, mas,
se estivermos mesmo ~mperrados, vale sempre a pena experimentar
alguma ideia.
2.2 Equações diofantinas 29
e em seguida
(a+ b) 2 = nab. (2)
E agora? Poderíamos eliminar o n, e dizer que
ab (a+ b?
1
2n + 7 = O (mod X),
ou talvez módulo 7, o que dá
2n + 7 ~ x 2 (mod 4).
Em outras palavras, temos
Exercício 2.2. Determine o maior inteiro positivo n tal que n:J + 100
seja divisível por n + 10. (Sugestão: use (mod n + 10), eliminando n
através da igualdade n = -10 (mod n-+ 10).)
2. 3 Somas de potências
. .
Problema 2.5 (Hajós et al., 1963, p. 74). Demonstre que, para
qualquer inteiro não-negativo n, o número 1n + 2n + 3n + 4n é divisível
por 5 se e só se n não for divisível por 4.
célebre por sua dificuldade. Mas nossa pergunta é muito menos dura.
Queremos mostrar que um certo número é (ou não é) divisível por 5.
A menos que haja uma fatoração evidente a efetuar, teremos que usar
a abordagem modular. (Ou seja, teremos que mostrar que 1n + 2n +
3n+4n = O (mod 5) se 4 não dividir n, e 1n+2n+3n+4n -:f. O (mod 5)
se 4 dividir n.)
Já que estamos lidando com números pequenos, podemos calcular
à mão alguns valores de 1n + 2n + 3n + 4n (mod 5). O melhor é
estudarmos separadamente os termos 1n (mod 5), 2n (mod 5), 3n
(mod 5) e 4n (mod 5) antes de os somarmos:
(mod 5)
n 1n 2n 3n 4n 1n + 2n + 3n + 4n
o 1 1 1 1 4
1 1 2 3 4 o
2 1 4 4 1 o·
3 1 3 2 4 o
4 1 1 1 1 4
5 1 2 3 4 o
6 1 4 4 1 o
7 1 3 2 4 o
8 1 1 1 1 4
Exercício 2.3. Mostre que a equação x 4 + 131 = 3y4 não tem solução
se x e y forem inteiros.
que provar que 2 (1 k + 2k +: ••+ nk)= O (mod n(n + 1)). Isto acaba por ser mais
ou menos equivalente à abordagem que seguimos aqui.
2.3 Somas de potências 37
e
lk + 2k + • • • + (2ml = O(mod m).
Tratemos primeiro do (mod 2m + 1). .Este caso é semelhante ao
Problema 2.5 mas um pouco mais fácil, pois sabemos que k é ímpar.
Usando o módulo 2m + 1, 2m fica igual a -1, 2m - 1 a -2, e assim
por diante, de forma que nossa expressão 1k + 2k + · · · + (2m )k fica
lk + 2k + 3k + · · · + (m - 1t + mk + (m + 1t + · · ·
+ (2m - ll + (2ml = O (mod m).
a
Exercício 2.4. Complete demonstração precedente, averiguando o
que acontece quando n é par.
2 X 3 X · ·· X (p - 1) + 1 X 3 X · ·· X (p - 1) + · · · + 1 X 2 X 3 X ·· · X (p - 2)
(p - 1)!
Suponhamos que conseguimos mostrar que este numerador é divi-
sível por p 2 • De que modo isto nos ajuda a mostrar que o numerador
reduzido é também divisível por p 2 ? Afinal, o que ê o numerador re-
duzido? É o mesmo que tínhamos antes após cance1armos os fatores
comuns com o denomin'ador. Este cancelamento pode destruir a divi-
sibilidade por p 2 ? Sim, se for cancelado algum múltiplo de p. Mas não
há como cancelar tais múltiplos, pois o denominador é primo com p (p
é primo, e (p- 1)! exprime-se como produto de números menores que
p). Aha! Isto quer dizer que só temos que provar que nosso impressi-
cmante numerador é divisível por p 2 , o que é melhor do que trabalhar
40 Exemplos da teoria dos números
2 X 3 X··· X (p - 1) + 1 X 3 X ··· X (p - 1) + · · ·
· · · + 1 x 2 x 3 x · · · x (p - 2) = O (mod p 2 ).
(Retomamos a aritmética modular, que usualmente fornece a melhor
forma de mostrar que um dado número divide outro. Contudo, quando
a pergunta em causa envolve mais do que uma questão de divisibilidade
- por exemplo, se envolve todos os divisores de um dado número -
então há outras técnicas que podem ser melhores.)
Temos agora uma equação, mas falta simplificá-la, pois é muito
confusa. O que temos no membro esquerdo é uma soma indetermi-
nada de produtos indeterminados (este indeterminado significa apenas
que tais expressões contêm reticências). Mas podemos representar es-
ses produtos indeterminados de forma mais elegante: cada um deles
contém basicamente todos.º~ fatores de 1 a p - 1 exceto um deles,
digamos i, e exprime-se de forma compacta como (p-1)!/i; é legítimo
dividir por i (mod p 2 ) porque i é primo com p2 : Assim, nosso objetivo
agora é mostrar que
Fatorando, obtemos
(p - 1) ! [ -1 + -1 + -1
1 2 3 p-1
l
+ · · · + -1- = O (mod
.
p 2) . (6)
!1 + !2 + !3 + · · · +-1-
p-1
= O (mod p 2 ).
-
(Isto parece muito nossa equação original, com a diferença de es-
tarmos considerando toda a soma e não apenas o numerador. Mas
não podemos saltar de uma formulação para a outra sem tomarmos
cuidados. As complicações em cima eram necessárias.)
Estamos reduzidos a uma questão em aritmética modular de as-
pecto relativamente benigno. Mas para onde devemos avançar? Tal-
vez um exemplo nos ajude. Considerando o mesmo exemplo que nos
é dado no enunciado - ou seja, p = 5 - , temos
1 1 1 1 .
1 + 2 + 3 + 4 = 1 + 13 + 17 + 19 = O (mod 25),
como queríamos. Mas por que razão isto funciona? Os números 1, 13,
17 e 19 parecem ser aleatórios, mas dão a soma certa como p'or magia.
Talvez tenha sido um golpe de sorte. Tentemos o 7:
1 1 1 1 1 1 ·
1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6 = 1 + 25 + 33 ~ 37 + 10 + 41 = O (mod 49).
Outra vez a mesma sorte! Como é que isto funciona? Não é claro
como é que tudo se cancela (mod p 2 ). Talvez, tendo em conta nosso
objetivo (b), possamos primeiro verificar a equação (mod p); ou seja,
vamos primeiro mostrar. que
1 1 1 1
-1 + -2 + -3 + · · · + - - = O (mod
p-1
p). (7)'
1 1 1 1
-+- + - + ... + - -
1 2 3 p-1
1 l 1 ]. 2
- [ + +···+ mod
-P lx(p-1) 2x(p-2) (p-1)/2x(p+l)/2 ( p)
A primeira vista, parece que complicamos ein vez de simplificar.
Mas lucramos um fator p no membro direito, o que é muito importante.
Agora, em vez de termos que mostrar que
que é equivalente a
ou, equivalentemente, a
1 1 1
12 + 22 + .. : ~ ((p- 1)/2)2 = O (mod p).
1 [ 1 1 1
= 2 12 + 2_2 + ... + ( (p - 1) / 2) 2
1 1 1 ]
+ (-1)2 + (-2)2 + ... + (-(p - 1)/2)2 (mod p)
l[l
=- - 1 + ··· + --
+ -- 1 - ] (mod p).
2 12 22 · . (p-1) 2
2.3 Somas de potências 45
1 1 1
-+-+··•+---=O
12 22 (p-1)2
(mod p) (8)
=1 2 +2 2 +3 2 +42 (mod5)
= O (mod 5).
O modo como isto funciona com p = 5 mostra o caminho no caso
geral. Parece, à luz dos exemplos anteriores, que as classes dos resíduos
1/1, 1/2, 1/3, ... , 1/(p- 1) (mod p) são apenas uma reordenação dos
números 1, 2, 3, ... , p- 1 (mod p); daremos uma demonstração desse
fato no final desta discussão. Assim sendo, podemos afirmar que os
números 1/ 12, 1/ 22, ... , 1/ (p - 1) 2 são simplesmente uma reordenação
de 12 , 22 , ... , (P. - 1)2. Em outras palavras,
1 1 1 1 2 2 2· 2
12 + 22 + 32 + · · · + (p _ 1) 2 = 1 + 2 + 3 + · · · + (p - 1) (mod p).
Vamos à tal prova de que os inversos 1/1, 1/2, 1/3, ... , 1/(p - 1)
(mod p) são uma permutação dos números 1, 2, 3, ... , p- 1 (mod p):
isso é equivalente a dizer que ca.da classe não-nula de resto (mod p) é
a inversa de uma e uma só classe não-nula (mod p), o que é óbvio.
Isto significa, entre outras coisas, que a soma dos primeiros cubos é
sempre um quadrado; por exemplo, 1 + 8 + 27 + 64 + 125 = 225 = 25 2 •
Existe, porém, mais do que uma álgebra. A álgebra básica é o es-
tudo dos números e de suas operações: adição, subtração, multiplica-
ção e divisão. A álgebra das matrizes, por exemplo, faz praticamente
o mesmo, mas trata com conjuntos de números em vez de números
simples. Outras álgebras usam uma grande diversidade de operações
sobre toda a espécie de números - mas o que é por vezes surpreendente
é como essas álgebras tendem a ter muitas das propriedades da álge-
bra normal. Por exemplo, uma matriz quadrada A pode satisfazer,
sob certas condições, a equação algébrica
Exercício 3.1. Seja f uma função dos números reais· em· si próprios
que satisfaz (9). Mostre que, para todos os números reais x, f(x) =
x + 1. (Sugestão: comece por provar a afirmação para .x inteiro,
depois para x racional, é finalmente para x real.)
Esta inequação parece ser insuficiente para mostràr o que nos pe-
dem.· Afinal, como podé uma desigualdade implicar uma igualdade?
Outros problemas do mesmo tipo (como o do Exercício 3.1) envolvem
equações funcionais, e são mais fáceis de manejar porque podemos
aplicar várias substituições e coisas do gênero, de modo a moldar gra-
dualmente os dados em formas mais tratáveis. Este problema parece
ser completamente diferente.
52 Exemplos da álgebra e da análise
Esta fórmula é muito útil, pois significa que f é uma função cres-
cente (fato nada óbvio a partir de (10)). Isto quer dizer que f(m) >
f(n) se e só sem> n; logo, nossa equação original, que é
n + 1 > f(n)
(a) f (2) = 2;
(b) J(2)=0;
3.2 Polinômios
Muitos problemas algébricos têm a ver com polinômios de uma ou
mais variáveis, e por isso fazemos uma pausa sobre eles para recapitu-
larmos algumas definições e resultados.
Um polinômio de uma variável é uma função, digamos f (x), da
forma
J(x, y, z) = L ak,l,mXkylzm,
k,l,m
-b ± ✓b 2 - 4ac
X=
2a
Também há fórmulas· para as raízes dos polinômios cúbicos e quár-
ticos, mas são muito mais confusas do que esta e, na prática, não
muito úteis. Quando passamos aos polinômios de grau 5 ou superior,
já não existe qualquer fórmula elementàr! E os polinômios de duas
ou mais variáveis são ainda piores: em regra têm uma infinidade de
raízes.
As raízes de um fator são um subconjunto das raízes do polinômio
original: esta parte da informação pode ser útil para decidir se um
dado polinômio divide outro. Em particular, x - a divide J(x) se e só•
se f(a) = O, visto que a é uma raiz de x - a; mais geralmente, para
qualquer polinômio f (x) de uma variável e para qualquer número real
t, x - t divide f(x) - J(t).
Vamos agora a alguns'problemas que envolvem polinômios.
60 Exemplos da álgebra e da análise
(x - 1)2(x + 2) 2 + 1 ~ x 4 + 2x 3 - 3x 2 - 4x + 5
conclusão é que p(ai) e q(ai) são ambos inteiros. Temos assim que o
produto de dois inteiros é 1, o que só pode ocorrer quando ambos são
1 ou ambos são -1. Em escrita abreviada,
o que é um disparate (pois tem que valer p·ara todo o x). O caso
r = s = - l é análogo, e a prova ·está concluída.
Geometria euclidiana
AI'---~--~--~____, B
o
em graus.
69
Daqui
como queríamos.
Este é um modo bonito de resolver problemas geométricos: sim-
plesmente calcular os ângulos. É mais fácil lidar com eles do que com
os lados (que são governados por fórmulas desagradáveis como as leis
dos senos e dos cossenos), e suas regras são mais fáceis de recordar.
São mais indicados para questões que não refiram o comprimento dos
lados, e em que disponhamos de muitos triângulos e circunferências
para manipular. Porém, para chegarmos a ângulos mais recônditos,
temos usualmente que calcular uma grande quantidade de outros ân-
gulos.
Problema 4.2 (Taylor, 1989, p.8, Ql). Num triângulo ABC, a bis-
setriz do ângulo em B interseta AC em D, a bissetriz do ângulo em C
interseta AB em E, e as duas bissetrizes intersetam-se em O. Suponha
que IODI = IOEI. Mol'ltre que L BAC= 60º ou ABC é isósceles de
base BC.
e e
72 Geometria euclidiana
Em suma, dois certos ângulos têm senos iguais. Isto significa uma
de duas coisas:
ou
Verificamos assim que dois dos três quocientes que nos foram dados,
IABI/IFCI e IGAI/IAEI, são iguais. O t~rceiro quociente, IFCI/IGAI,
não se materializa facilmente num triângulo. Mas observemos o termo
intermediário de (15): esses dois segmentos parecerri vagamente rela-
cionados com FC e GA. De fato, FC é uma porção de·BC e GA é uma
porção de BG. Palpita-nos que poderá ser mais fácil provar que
IFCI/IGAI = IGBI/IBCI
do que
IFCI/IBGI = IGAI/IBCI.
Esta última equação não parece ser uma grande melhoria, mas
na anterior os produtos IFCI x IBCI e IGAI x IGBI talvez nos sejam
familiares. De fato, pode vir a mente o seguinte resultado (que aparece
geralmente em livros de texto para o ensino médio mas é raramente
usado):
provar que L ACB > L ABC (desde que A, B e C não sejam coli-
neares). Ou, se nos surgir uma questão sobre áreas de triângulos,
apelamos a fatos como o de triângulos com a mesma base e mesma
altura terem a mesma área, ou de que, se reduzirmos a base de um
triângulo à metade, a área também é dividida por dois. Isto não sig-
nifica que devamos construir todas as possíveis extensões da figura
que nos ocorram, ou anotar uma grande profusão de fatos (a menos
que estejamos mesmo emperrados), mas que um palpite informado e
uns tantos diagramas podem funcionar. Por vezes, podemos recor-
rer a casos especiais ou extremos para tentar encontrar o caminho
(no problema atrás, por exemplo, poderíamos ter considerado os ca-
sos em que ABEF é um quadrado, ou em que ABEF degenerasse, ou
em que fosse IDCI = IDGI = O). Mas sempre mantendo em vista os
dados (IDCI = IDGI, ABEF é um retângulo) e o objetivo a alcançar
(IFCI x IBCI = IGAI x IGBI, ou outra qualque_r formulação). E tente-
mos conduzir nossos passos na direção dos dados ou objetivos menos
usuais (no nosso caso, a estranha iguáldade IDCI = IDGI). Afinal,
é de esperar que precisemos de todos os dados para atingir todos os
objetivos, e portanto cada pedaço de informação deverá ser de algum
modo invocado.
O segredo aqui foi recordar um certo resultado em geometria eu-
clidiana, neste caso o Teorema 4.2. Com experiência suficiente em
geometria estas coisas podem nos ocorrer depois de termos observado
cada parte do problema e assimilado a natureza da questão (estas
coisas em geral também só ocorrem depois de todos os outros meios
terem falhado). Sem uma tal inspiração, devemos nos restringir à ge-
ometria das coordenadas ou mesmo à das pseudo-coordenadas (de D,
baixamos perpendiculares a AB e AC, digamos, e usamos o teorema·
de Pitágoras para representar IDCI e IDGI - o que é, no fundo, fazer
geometria- das coordenadas sem fixar um sistema de eixos).
li
?
l2 B
-[>
l3
A
?
_ _ _ _ _ _ l2 --t>
______ ___ _.__ [3
e
Temos agora um só objeto por determinar: o ponto B. Há portanto
menos graus de liberdade, e o problema deve agora ser mais simples.
Queremos que B obedeça a dois requisitos:
(a) B está em 12 ;
(b) a imagem de B pela rotação de 60º em torno de A está cm 13 .
(a) B está em 12 ;
(b') B está em 1;.
• b + 1 é par;
• bc = 48;
• e é uma po.tência de 2.
. ?
•
---{>
k k
X
A
?
•
---t>
X
A A
DX D
?
•
xª --t> B
e e
X
R4
R1 .
Ro
R3
R2
R4
R1
Ro
R3
R2
88 Geometria euclidiana
Mas R 3 não pode obedecer a essas duas ordens a menos que elas
sejam no mesmo sentido. Na figura acima, o retângulo R 3 pode ajus-
tar-se ao retângulo R 2 ou ao retângulo R 4 , mas não a ambos (recorde-
mos que R3 também tem que ter a mesma área que R2 e R4 ). Começa
a fazer-se luz sobre o modo como a pergunta funciona: a exigência de
áreas iguais, mais a necessidade de os retângulos se ajustarem sem so-
breposições, deve deixar o quadrado interior como única possibilidade.
Deve ser impossível deformar esse arranjo simétrico em cruz suástica
sem que alguma coisa corra mal, como exemplifica a figura atrás.
Para que R 3 tenha a área correta, terá que ser (1 ·- ab/(l - a)) x
( 1 - ab / ( 1 - b)) = ab,. e podemos resolver isto em relação a a, b e·
daí concluir que R 0 é um quadrado. Este método funciona, mas é
um pouco .trabalhoso, e por isso vamos tentar algo mais simples, mais
intuitivo, e menos baseado no uso de coordenadas (como seria na re-
alidade a abordagem e~ cima).
89
a 1-a
ab/(1-a)
. R4
b R1
Ro
1-ab/(1-a)
R3
1-b R2
são reunidos em um só. De fato, se for a+b =/- 1, então um dos vizinhos de R 1 (i.e.,
R 2 ou R 4) é mais esguio do que R1: ou seja, admitindo que a :S b, esse tal vizinho
tem dimensões a' x b', onde a' < a (mais estreito) e b' > b.(mais comprido). Se
for a+ b < 1, então aquele dos vizinhos com um lado igual ~ 1 - a (> b) é mais
comprido do que R 1 (logo, tendo a mesma área, é também mais estreito); e, se for
a+ b ·> 1, então aquele dos vizinhos com um lado igual a 1 - b ( < a) é mais estreito
do que R 1 (logo, tendo a mesma área, é também mais comprido). Dado que em
nenhum dos retângulos R 1, R2, R3, R4 a soma de lados é 1 (pois, como já vimos, se
fosse 1 em algum deles seria 1 em todos), o mesmo argumento mostra que cada um
deles tem um vizinho mais esguio. Mas isto significa que, começando por exemplo
com R. 1 , podemos construir uma sucessão infinita de retângulos Ri. cada vez mais
Psµ;nios, o que é absurdo pois dispomos somente de quatro retângulos.
92 Geometria euclidiana
D e
LEAF= LBAF-LBAE
ou talvez
LEAF= LDAB-LDAF-LBAE.
Mas L BAE e L ABF são ângulos do· mesmo triângulo ABE. Visto
que já escrevemos tanto L DAF como L EAF em função dos ângulos
de ABE, esta é claramente uma boa altura para nos focarmos neste
triângulo.
Bom, ABE está inscrito numa semicircunferência. Isso deve recor-
dar o teorema de Tales (Teorema 4.1), que nos diz que L BEA= 90º.'
Portanto, os dois ângulos L ABF e L BAE ficam ligados um ao outro,
já que a soma dos ângulos de um triângulo é 180º. Mais precisa-
mente, temos L ABF + L BAE+ L BEA= 180º, e portanto L BAE__:_
90º - L ABF. Podemos inserir isto em nossa expressão para L EAF,
94 Geometria euclidiana
obtendo
= L~AF.
Mas não temos que ser tão formais assim. quando buscamos uma
solução. Manipular os ângulos L DAF e L EAF na esperança de que
alguma vez eles se encontn::m não é assim tão tolo, desde que saibamos
o que estamos fazendo. Se tentarmos a cada passo simplificar os dados
e relacioná-los uns com os outros, temos boas· chances de tropeçar na
solução. (Supondo que ela existe, claro, e. a maioria dos problemas
não está brincando conosco.)
CAPÍTULO 5
Geometria analítica
n X
2? 4?
3 3
4 6
6 8
· · · + IA1An+2-ml 2) ·
. .
Notemos que, quando n é par, a parcela IA 1Aml 2 = 4, correspon-.
dente à diagonal, aparece duas vezes nesta soma. Podemos dar um
jeito nisto, e somar ainda a parcela IA1A 1I2 por razões de simetria,
obtendo então
(16)
100 Geometria analítica
quando n é ímpar, e
(17)
(18)
n X y
2? 4? 4?
3 3 6
4 6 8
6 8 12
Da tabela podemos conjecturar que Y = 2n; isto implicaria, por
(16) e (17), que fosse X= n quando n é ímpar e X= n + 2 quando n é
par. É provável que seja esta a resposta certa, mas falta provar.
É altura de usarmo_s a geometria vetorial, já que ela nos fornece
alguns utensílios úteis para manipular expressões como (18). Dado qtw
101
(a) Temos que considerar casos, pois o lado inteiro de cada um dos
sub-retângulos tanto pode ser vertical como horizontal;
rece promissor, mas esse número nem sempre decresce a cada jogada
(embora a longo prazo deva decrescer), como mostra a figura:
--t>
D
D-------- B
A~---------~ª
o
X
D e
O X
X-
D e
O professor tem que estar no ponto Y (onde IAYI = 3IOXI): ele
não é rápido suficiente para ter ultrapassado Y no momento em que
o rapaz atinge X; e, caso ainda não tenha atingido Y, o rapaz pode
fazer o resto do percurso até M e assim escapar. Portanto, o professor
tem que ir até Y.
Temos agora que o rapaz está em X e o professor foi obrigado a
ir para Y. Haverá necessidade real de o rapaz continuar até M? A
ameaça de atingir M foi suficiente para pôr o professor onde ele está
agora, mas ameaça e conrretização são coisas diferentes. Agora que o
professor está encalhado na aresta AB, por que é que o rapaz não se
desvia abruptamente para CD, a aresta oposta? Só precisa percorrer
meia unidade para chegar lá - e, ao contrário do que sucedeu quando
o rapaz se dirigiu pela primeira vez para uma aresta, o professor está
mal posicionado. De fato, se a distância de X a M for superior a
1/4, mostra-se sem dificuldade que o professor está lorige demais para
apanhar o rapaz. O rapaz pode assim escapar facilmente.
Exercício 5.2. (*) Mostre que, se o professor correr a uma velocidade
seis vezes maior do que aquela a que o rapaz nada, então o rapaz não
pode escapar. (Sugestão: desenhe um quadrado imaginário de lado
1/6 centrado em O. Logo que o rapaz abandone esse quadrado, o
professor fica em posição de vantagem.)
116 Geometria analítica
Exemplos variados
terceira cor. Podemos nos focar nesta fusão. Quando temos água em
dois recipientes desiguais ligados pela base, os dois níveis de água fun-
dem-se num mesmo nível intermédio. Mas a quantidade total de água
permanece constante. Fará sentido dizer que a quantidade total de
cor permanece constante?
Temos obviamente que definir quantidade total de cor para que isto
seja boa matemática. Tomemos o exemplo de um camaleão cinzento
e outro vermelho fundindo-se em dois camaleões castanhos. Se dis-
sermos, por exemplo, que cada camaleão cinzento vale O pontos, cada
castanho vale 1 ponto, e cada vermelho vale 2, então esta jogada pre-
serva a pontuação total (ou a cor total). (Um O e um 2 combinam-se
em dois 1's.) Mas isto já não funciona quando tentamos fundir um
camaleão vermelho com um castanho, por exemplo. Não parece haver
sistema de pontuação que sirva para as três possibilidades de fusão
(ou mesmo só para duas delas).
A dificuldade tem a ver com o caráter. cíclico das jogadas. Mas não
vamos desistir já. Uma terttátiva não completamente bem sucedida
pode vir a ser parte de urna abordagem de sucesso. (Mas também um
sucesso insignificante não é coisa que nos deva entusiasmar muito.)
Pensemos nas cores primárias: vermelho, azul e verde. Se um feixe
de luz vermelha coincidir com outro de luz verde, temos um feixe com
dupla intensidade de luz roxa, que é a cor oposta ao azul (ou anti-azul).
As cores primárias funcionam também em ciclos. Conseguiremos tirar
partido desta analogia com os feixes coloridos?
Bem, a diferença essencial é que, com a luz, vermelho e verde com-
binam-se não para dar azul mas sim anti-azul. Mas um momento!
Podemos fazer com que o azul e o anti-azul sejam iguais usando a
aritmética modular. Com isso em mente, podemos tentar reduzir nos-
sos vetores módulo 2: começamos na posição (1, 1, 1), e queremos ver
que daí não conseguimos chegar a (1, O, O), (O, 1, O) ou (O, O, 1). Infeliz-
mente, isto não funciona. M~s agora o gênio saiu da garrafa: podc~rnos
tentar outros módulos. Rapidamente pensamos no m<'>d11lo :1 (ali11al,
121
são três as cores em ciclo). Podemos optar agora por uma das duas
táticas seguintes para resolver o problema:
N-(x+y+z)=39,
Mas nem todas estas alternativas são viáveis. A hipótese (a), por
exemplo, diz que houve apenas uma prova. Isto contradiz o enunciado
do problema, que menciona pelo menos duas provas (Álgebra e Geo-
metria). E as hipóteses (c) e (d), além de contemplarem um número
suicida de provas, não funcionam se queremos que x, y e z sejam in-
teiros, positivos e distintos (o que obriga x + y + z a ser no mínimo
6). A única possibilidade que resta é (b): houve portanto três provas,
e a soma x + y + z é 13.
As possibilidades estão assim fortemente restringidas. Há duas coi-
sas que ainda não sabemos e que devem ser importantes: não sabemos
os valores exatos de x, y e z; e não sabemos que nota teve cada moça
em cada prova. A primeira pergunta é parcialmente respondida pelo
fato de x, y e z serem inteiros positivos distintos cuja soma é 13, e
quanto à segunda a resposta parcial que temos é que Betty teve x em
Álgebra. Como me.lhorar estas respostas parciais?
Uma informação de que ainda não tiramos todo o proveito é a das
classificações totais individuais.
.. Observando essas somas, vemos que
Alice teve resultados bastante melhores do que Betty e Carol, o que
deve implicar que ela teve boas notas (ou seja,· x ou y) em todas as
provas. Mas Betty teve a nota mais alta numa das provas, e portanto
Alice não pode só ter tido x's. No máximo teve dois x's e um y.
Analogamente, é pouco provável que Carol tenha tido a classificação
máxima x em alguma das provas, e é mais que provável que as notas
dela tenham sido sobretudo z's. Haverá como dar forma matemática
a estas especulações?
Para começar, a resposta é talvez. Consideremos, por exemplo, as
notas de Alice. Quando muito, elas somam 2x + y. Talvez possamos
provar que somam exatamente 2x + y: afinal, Alice tem um total
bastante superior aos dàs outras duas: 20 é muito mais do que 10
ou 9. Que outras possibilidades h~ para as notas de Alice? Eis a
lista delas: 2x + z, x + 2y, x + y + z, x + 2z, 3y, 2y + z, y + 2z e
3z. As últimas parece~ dar totais demasiado baixos para atingirem
125
20, e devem poder ser eliminadas. Mas, para tentarmos provar isto
rigorosamente, precisamos de majorantes razoáveis para x, y e z. Esta
é portanto nossa próxima tarefa: delimitar os valores de x, y e z para
que possamos eliminar várias das alternativas.
Tudo o que sabemos é que x, y, z são inteiros, que x + y + z = 13,
e que x > y > z. Mas isso é suficiente para delimitarmos bastante
bem os valores de x, y e z. Tratemos do z, por exemplo: ele não pode
subir muito alto, porque senão x e y teriam ainda de subir mais alto,
e com isso x + y + z provavelmente atingiria um valor superior a 13.
Concretizando, y é pelo menos z + l e x é pelo menos z + 2, de modo
que
13 = x + y + z ~ (z + 2) + (z + 1) + z = 3z + 3,
o que impõe z S 3. Esta majoração z S 3 é a melhor que conseguimos
sem usarmos informação adicional, pois há a possibilidade x = 6, y = 4
e z = 3.
Tentemos agora o y. Podemos fazer coisa semelhante a de cima,
minorando x por y + l, mas quanto a z só podemos dizer que é no
mínimo 1. Isso, porém, é suficiente:
13 = x + y+ z ~ (y + 1) + y + l = 2y + 2,
e daí y s 5. O exemplo x = 7, y = 5 e z = l mostra que isto é outra
vez o melhor possível. Por fim, podemos majorar o x: z é no mínimo
1 e y é no mínimo 2, de modo que 13 = x + y + z ~ x + 2 + 1, e
portanto x S 10. E isto é o melhor possível, pois poderia ser x = 10,
y=2ez=l.
Sabemos portanto que z S 3, y S 5 e x s 10. Mas podemos
fazer ainda melhor. Lembremos que Betty teve um x e mais duas
notas; como só totalizou 10, sabemos que x não pode chegar a 10.
Se chegasse, Betty teria tido zero nas outras duas provas, o que é
impossível: todas as classificações foram inteiras e positivas, como
sabemos. De fato, x nem pode chegar a 9, pois caso contrário nas
126 Exemplos variados
outras duas provas Betty só totalizaria 1: assim, teria tido zero numa
delas, o que é outra vez contraditório. Temos assim de fato x :S 8.
Está na hora de começarmos a eliminar possibilidades. Primeiro vemos
que as notas de Alice têm que ser 2x + y: todas as outras alternativas
ficam abaixo de 20. Por exemplo, 2x + z é no máximo 2 x 8 + 3 = 19.
De modo que Alice teve dois x's e um y. Uma vez que Betty
teve x em Álgebra, Alice teve y nessa prova. Podemos reunir toda a
informação já coligida numa tabela:
Exame Alice Betty Carol Total
Álgebra y X ? 13
Geometria X ? ? 13
Outro X ? ? 13
Total 20 10 9 39
Vemos agora que Carol deve ter tido z em Álgebra, pois essa é a
única nota que falta atribuir.
Estamos nos aproximando de nosso objetivo; sabemos que uma das
duas, Betty ou Carol, teve a segunda melhor nota, y, em Geometria.
Mas ainda não chegamos lá. Olhando para a colÚna de Alice na tabela,
a
há outra informação a usar, que é de ser y + x + x = 20. Recordando
que x > y e x :S 8, isso dá-nos só duas soluções: x = 8 e y = 4, ou
x = 7 e y = 6. Mas, como x + y + z = 13, não pode ser x = 7 e
y = 6, pois isso imporia z = O. Só podemos então ter x = 8 e y = 4,
o que impõe z = l. Este foi um grande avanço, pois determinamos
completamente os valores de x, y e z. Podemos então atualizar nossa
tabela:
Exame Alice Betty Carol Total
Álgebra 4 8 1 13
Geometria 8 ? ? 13
Outro 8 ? ? 13
Total 20 10 9 39
127
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
.
1
1
I·
1
7
(3, 10)
(6,10)
(6,7)
(1, 1)
•
1 N.
do T. Conjunto de tod?s os pontos de coordenadas inteiras no plano (rela'.-
tivamente a um certo sistema de eixos).
130 Exemplos variados
(a) d= 2;
(b) d= n;
(c) (*)d=4;
(d) (*) Caso geral.
irmão mais velho deu ao mais novo seu canivete, que valia um número
inteiro de rublos. Quanto valia o canivete?
x 2 = 10n + 10 + lün + a
ou
x 2 = 10(2n + 1) + a.
Mas o que isto tem a ver com o canivete? A variável dependente
que queremos calcular é p, o preço do canivete. Precisamos de uma
equação que relacione p com qualquer outra coisa, de preferência x, que
é a variável independente. Antes de entregar o canivete, o irmão mais
velho tinha embolsado lün + 10, contra lün +ado mais novo. Uma
vez concretizada a entrega, o lucro do irmão mais velho desceu para
lOn+lO-p, e o do mais novo subiu para lOn+a+p. Para que a divisão
seja equitativa, estas duas quantias têm que ser iguais. Igualando-as,
obtemos por fim a.desejada equação relacionando p com a:
x2 = 10(2ri + 2) - 2p..
É destas equações que temos que tirar o valor de p. Parece que
não dispomos aqui de informação suficiente, pois não nos foram dados
os valores de x, n ou a. Como. fazer para limitar mais nossa~ possi-
bilidades? A grande dificuldade é que há incógnitas demais à solta.
Algumas delas podem ser eliminadas usando aritmética modular. Por
exemplo, se reduzirmos· a última equação módulo 20, obtemos
p = O, 2, ou 8 (mod 10).
(a) x 2 = 10(2n + 1) + a;
(b) O< a< 10;
(c) a= 10 - 2p.
Devemos tentar fisgar cada pedaço de informação, por mais que
ele nos pareça inútil. Por exemplo, eu poderia ter acrescentado que n
era provavelmente não-negativo, ou que pera provavelmente positivo
(para que mencionar o canivete na questão se ele não tivesse qualquer
valor?), ou que o número de ovelhas era inteiro, e assim por diante.
Logo que tudo esteja encapsulado em equações, as coisas ficam muito
mais fáceis de manipular corretamente.
Referências Bibliográficas
variáveis, 4
eliminação de, 84
em expoente, 31-33
vetores
cores dos camaleões, 119-121
em geometria, 100-102